10.03.2009 às 23:22 Impressões da Costa Rica 4
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10.03.2009 às 23:22 Impressões da Costa Rica 4
10.03.2009 às 23:22 Impressões da Costa Rica 4: revolução, ‘paredón’ e beleza Homero Fonseca Como toda e qualquer revolução, o Movimento de Libertação Nacional da Costa Rica, vitorioso em 1948, teve marchas e contramarchas, tendências conflitantes e confusões. Mas prevaleceram, no geral, as concepções do seu principal líder, Don Pepe Figueres. Uma delas foi a de evitar uma repressão feroz contra os partidários do regime deposto. Henrietta Boggs, a jovem americana que se tornara, agora, primeira dama do País, conta, no seu livro “Casada con una Leyenda – Don Pepe”, que, após a rendição das tropas governistas “como a muitas outras pessoas, a mim pareceu que os termos do Pacto de Paz eram demasiado clementes com os culpados, porém evidentemente se havia decidido que o país necessitava de paz acima de tudo”. Questionando o marido – do qual se separaria alguns depois, acusando-o de, obcecado em construir uma nova república, ser um marido e pai ausente – Henrietta ouviu o que seria o ‘leitmotiv’ de sucessivos discursos dele: “As armas nos deram a vitória, mas somente as leis nos farão livres”. Assim, ao invés do “paredón” a revolução costarriquenha notabilizou-se, entre outros aspectos, pela anistia. Os contrarrevolucionários se refugiaram na Nicarágua, a partir de onde, com o apoio do ditador Anastacio Somoza, num primeiro momento e dele e mais Trujillo, da República Dominicana, num segundo, tentaram invadir o país e desestabilizar o novo regime, segundo derrotados nas duas tentativas, apesar de a Costa Rica ter extinto seu Exército. Algo parecido com o que aconteceria, 12 anos depois, em Cuba, na fracassada invasão da Baía dos Porcos. Don Pepe Figueres O escritor e político (Partido Verde) Alfredo Sirkis , que também andou pela Costa Rica há alguns anos, analisa as diferenças nos desenlaces das revoluções costarriquenha e cubana com base na geopolítica e nas personalidades e origem social de seus principais líderes: “A revolução de 1948 foi de certa forma uma prévia do que poderia ter sido a revolução cubana, 11 anos mais tarde. É provável que o levante popular de Don Pepe Figueres inspirasse Fidel, em Sierra Maestra, quando daquela sua famosa entrevista ao jornalista Herbert Mathews, do New York Times, em 1959. No caso cubano fizeram a grande diferença histórica a quase imediata hostilidade norte-americana, a dinâmica implacavelmente polarizadora da guerra fria -- em 48, ainda nos primórdios, em 60, no apogeu-- e a personalidade de Fidel Castro. Há quem atribua a diferença entre Fidel e Pepe à idade e origem social: Pepe, filho de um modesto médico catalão, era um pequeno fazendeiro e tinha 42 anos quando liderou a revolução. Fidel, filho de um grande latifundiário de origem galega, era estudante quando chefiou o assalto ao quartel de Moncada depois do qual conheceu apenas a prisão, o exílio e Sierra Maestra. Pepe era acostumado a ouvir, negociar, comerciar, regatear. Fidel, nascera para mandar e ser obedecido.” E continua: “Pepe apoiou a revolução cubana, em 59, com dinheiro e armas, da mesma forma com que, duas décadas mais tarde, ajudaria os sandinistas, a ponto de seu próprio filho ter participado dos combates nas fileiras da FSLN. Em ambos os casos Pepe acabou rompendo com os revolucionários uma vez consolidados no poder. Pepe colocava-se como arauto de uma “esquerda democrática”, adepto da social-democracia de estilo europeu, ou, como gostava de se classificar, um “socialista utópico”. Acrescento eu, para se entender melhor o pensamento desse fazendeiro-engenheiro-humanista, trechos de discursos e escritos de Don Pepe Figueres coletados pelo sociólogo Manuel Barahona Montero (“Don Pepe Figueres: ideario y legado”, in www.elespiritudel48.org/multi/legado.ppt): - "Cada vez que tratamos de estabilizar nossos preços [referindo-se aos produtos de exportação] a um nível que nos permita viver e progredir, somos tachados de ‘socializantes’, ‘rosados’ ou o que esteja na moda. O respeitável é o ‘mercado livre’, com alternativas de fome e de festa para nossos povos, porém com muita mais fome que festa”. Muito iluministicamente, afirmava: - “O estudo, a técnica, a ciência constituem a única solução possível do problema nacional. La reforma deve consistir em libertar o homem do trabalho rude; em acabar com o homem-motor e substituí-lo pelo homem-pensante. O trabalho rude desgasta e produz pouco. O trabalho técnico enaltece e produz mais”. E, por fim, esta pérola: “A guerra contra a miséria extrema não deve ser somente a atuação de um organismo, nem o trabalho de um certo número de cidadãos de boa vontade. Há de ser, em realidade, igual que a limpeza e o cultivo da beleza, uma atitude nacional”. NÃO LEMBRO DE HAVER LIDO, NUNCA, QUALQUER DISCURSO OU CITAÇÃO DE UM CHEFE DE GOVERNO FALANDO EM LIMPEZA E BELEZA COMO ATITUDES NACIONAIS.