A UnATI faz pesquisa há muito tempo sobre a atenção à saúde do

Transcrição

A UnATI faz pesquisa há muito tempo sobre a atenção à saúde do
A UnATI faz pesquisa há muito tempo sobre a atenção à saúde do idoso. Qual o seu último
projeto?
Foi um livro, publicado pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) no início deste
mês, intitulado “O Modelo de Hierarquização da Atenção ao Idoso com Base na
Complexidade dos Cuidados”. Trata-se da sistematização de um modelo empírico que vem
sendo elaborado a partir da experiência de mais de 20 anos da UnATI/UERJ.
Sua concepção serve tanto para o serviço público de saúde quanto para o privado. Ele será
aplicado primeiro pelo setor privado, porque está muito embasado em melhorar a assistência
com
redução
de
custo,
e
as
empresas
estão
quebrando.
O que mais acontece é o seguinte: vamos pensar num plano mediano para um idoso, com
custo de R$ 1.000 por mês. O idoso tem sua carteirinha, não está se sentindo bem, vai ao
hospital, entra pela emergência. Normalmente quem atende é um residente, um pouco
inseguro com o quadro, porque o idoso tem muitas doenças… Avalia e decide internar o
paciente
para
poder
pesquisar
melhor.
Aí vai ver e não tem vaga nos quartos, interna na UTI, faz uma série de exames. Depois de
um dia consegue uma vaga no quarto, onde o paciente fica por mais três ou quatro dias. Daí a
pessoa melhora e vai para casa. Isso custa em média R$ 18 mil, o que corresponde a 18
meses de pagamento do plano do paciente. Então é preciso esperar que essa pessoa fique um
ano e meio sem problemas de saúde para o plano poder empatar. É inviável.
“É preciso se antecipar à doença, em vez de deixar que ela aconteça; monitorar dá melhores
resultados”
O
que
o
modelo
defendido
pela
UnATI/UERJ
propõe?
Que cada médico tenha um grupo de pacientes, entre 300 e 400, como no modelo inglês,
trabalhando ao lado de uma enfermeira. Que cada paciente tenha em média cinco consultas
por ano, com acompanhamento periódico da enfermeira por telefone ou até em casa: “Fez o
exame? Tomou o remédio?”. Por que isso? Porque se sabe que, em um determinado
momento da vida, a probabilidade de doenças é maior. Então é preciso se antecipar à doença,
em vez de deixar que aconteça, porque se acontecer a pessoa vai para o hospital. Monitorar,
acompanhar,
dá
melhores
resultados.
O
que
as
operadoras
acham
desse
modelo?
Normalmente as operadoras dizem: “Isso é muito caro!” Eu sempre respondo: “O
profissional de saúde é barato, caro é um dia de UTI”. Temos que mudar essa lógica, que está
muito focada nos equipamentos, no hospital. Temos de fazer coisas mais leves. Não sou
contra hospital nem tecnologia, mas acho que devemos usar esses recursos quando é preciso
e pelo menor tempo possível. Além de ser muito caro, ao entrar no hospital, a primeira coisa
que o idoso pensa é: “Será que eu vou voltar pra casa?”. Há ainda a questão da infecção
hospitalar. O hospital só tem desvantagem e, apesar disso, é o modelo que usamos para tudo.
Qual
a
importância
dessa
mudança
para
a
população
idosa
brasileira?
O modelo atual foi feito no Brasil de antigamente, o Brasil jovem, em que as pessoas só
tinham uma doença aguda. Agora são múltiplas doenças crônicas. E doença crônica, depois
de estabilizada, vai continuar para o resto da vida. Os idosos compõem o grupo etário que
mais cresce no país hoje. As pessoas não vão morrer cedo, será aos 90, 100 anos. Se não
houver uma assistência adequada, o que vai acontecer é que vai ampliar o sofrimento ano
após ano, trazendo problemas para a família, para a sociedade, mais custo etc.
Então cuidar bem do idoso é uma questão estratégica para a saúde pública e para o setor
privado. E as empresas começaram a ficar muito preocupadas, porque perceberam que fazer
o que faziam antigamente não dá mais certo e estão perdendo dinheiro. Mas ainda não
conseguiram mudar a lógica, que é muito centrada no hospital, no especialista. Essa mudança
de cultura, de modelo assistencial, é a linha que eu tenho batido bastante nas pesquisas e nos
trabalhos da UnATI e apresentado às pessoas, discutido com as empresas, com o Ministério
da Saúde. Achamos que esse é um movimento extremamente correto, do bem.
“Hoje, se você tem uma dor, vai a um médico, depois ao segundo, ao terceiro, ao quarto; e
cada
um
vai
indicar
remédios
e
exames
complementares”
Como distribuir essa demanda para desafogar os hospitais e o modelo dar certo?
Por exemplo, uma empresa tem, digamos, 10 mil idosos. No modelo inglês, o médico tem
uma carteira de pacientes eu adicionei uma enfermeira nessa equação e, para uma carga
horária de 20 horas, ele toma conta de mais ou menos 380 pessoas. Isso dá em média quatro
atendimentos por ano para cada pessoa, que é monitorada o tempo todo pela enfermeira.
Essa dupla tem uma resolutividade de 85% a 90%, que são os resultados ingleses. A cada 20
casos, 17 ele resolve, e 3 ele manda para um especialista. Depois, o especialista devolve o
paciente ao médico gestor, que é quem tem o prontuário da pessoa. Evita a repetição de
remédios, de exames etc. Só nisso já tem uma grande redução de custo, porque hoje você tem
uma dor, vai a um médico, depois ao segundo, ao terceiro, ao quarto. Cada médico vai
indicar
alguns
remédios
e
exames
complementares.
Quando a pessoa começa a se sentir melhor, acaba desistindo de ir buscar os exames feitos na
primeira ou na segunda consulta. O número de exames realizados que não são retirados pelos
paciente somam 38%. Isso é dinheiro jogado fora. E gera transtorno familiar, porque alguém
vai ter de deixar de trabalhar para levar o idoso ao “tour” pelos laboratórios. O paciente idoso
fica
cansado.
Qual
deve
ser
o
perfil
desse
médico
“gestor”?
Deve ser um generalista, um médico de família. Isso precisa ser valorizado na cabeça dos
estudantes de medicina. Em vez de todos quererem ser cirurgiões vasculares, investir na
formação de clínicos. E aquele que quiser ser um especialista vai saber que esse médico
gestor vai mandar para ele alguns casos que não consegue resolver. Então o número de
pessoas que vão para o especialista vai diminuir muito, e o sistema vai ficar mais eficiente.
“Proponho um sistema de bonificação. Se o médico faz uma boa prática médica, ganha um
percentual em cima disso. E o paciente que segue a rotina estabelecida tem uma redução na
mensalidade”
Como
incentivar
essa
mudança
de
paradigma
na
formação?
Eu proponho um sistema de bonificação. Se o médico faz uma boa prática médica, se está
dando lucro para a operadora, nada mais justo que ele ganhe um percentual em cima disso. É
o ganha-ganha. É mais racional. Também haveria uma bonificação para o paciente. Aquele
que seguir a rotina estabelecida, terá uma redução na mensalidade. Todo mundo ganha.
Recentemente a UnATI e o Instituto de Longevidade Mongeral Aegon fecharam uma
parceria.
Como
será
esse
trabalho?
A UnATI vai participar para que a gente possa reforçar esse movimento do Instituto de
Longevidade Mongeral Aegon. Estou me colocando à disposição para que a gente possa
ampliar ainda mais esse tipo de discussão. A parceria está começando. É um grupo do bem.
Ainda não sei exatamente como serão as atividades, mas serão de apoio a boas causas.
O Instituto de Longevidade Mongeral Aegon tem como missão promover a participação de
pessoas com mais de 50 anos na sociedade, especialmente nas áreas de trabalho, cidades e
mobilização social. Qual a importância de destacar a longevidade na agenda de
desenvolvimento
social?
O idoso cada vez vai estar mais presente na sociedade brasileira. O número de idosos está
aumentando no país. Essa pessoa vai se aposentar e precisa ser inserida na sociedade, em
projetos sociais. Para isso, ela precisa ter saúde. Por isso essa parceria com a UnATI é
fundamental.
“Se não formarmos as pessoas para lidar com os idosos, vai ser um caos para esses
pacientes”
O aumento da longevidade é um fenômeno mundial. No Brasil, começou recentemente, mas
está
caminhando
de
forma
acelerada.
Quais
as
consequências
disso?
Se não formarmos as pessoas para lidar com os idosos, vai ser um caos para esses pacientes.
Eles vão viver doentes, na cama, tirando alguém do trabalho para cuidar deles. Alguns vão
ficar abandonados. É o pior dos mundos. Mas ainda temos condições de reverter isso.
É
possível
envelhecer
no
Brasil
com
saúde
e
qualidade
de
vida?
Sem dúvida. Desde que o país siga o caminho correto. O que não dá é a pessoa ter hábitos de
risco, como o fumante, o que não tem alimentação correta, aquele que não faz exercício. A
probabilidade é de que essas pessoas tenham um final de vida com mais fragilidade, mais
doenças,
mais
sofrimento.
O que é preciso para começar a reorientar esses serviços e obter melhores resultados
assistenciais
e
econômico-financeiros?
Pensar diferente. Não podemos manter o modelo antigo, que está defasado e anacrônico. E
temos de pensar em uma forma de cuidar desse idoso, sabendo que ele vai ter doenças, mas,
se elas estiverem estabilizadas, ele pode usufruir a grande conquista atual que é viver mais.