Evangelho segundo S. Lucas 23,35-43.
Transcrição
Evangelho segundo S. Lucas 23,35-43.
Evangelho segundo S. Lucas 23,35-43. – cf.par. Mt 27,33-44; Mc 15,22-32; Jo 19,18-25 O povo permanecia ali, a observar; e os chefes zombavam, dizendo: «Salvou os outros; salvese a si mesmo, se é o Messias de Deus, o Eleito.» Os soldados também troçavam dele. Aproximando-se para lhe oferecerem vinagre, diziam: «Se és o rei dos judeus, salva-te a ti mesmo!» E por cima dele havia uma inscrição: «Este é o rei dos judeus.» Ora, um dos malfeitores que tinham sido crucificados insultava-o, dizendo: «Não és Tu o Messias? Salvate a ti mesmo e a nós também.» Mas o outro, tomando a palavra, repreendeu-o: «Nem sequer temes a Deus, tu que sofres o mesmo suplício? Quanto a nós, fez-se justiça, pois recebemos o castigo que as nossas acções mereciam; mas Ele nada praticou de condenável.» E acrescentou: «Jesus, lembra-te de mim, quando estiveres no teu Reino.» Ele respondeu-lhe: «Em verdade te digo: hoje estarás comigo no Paraíso.» „Pai, perdoai-lhes: não sabem o que fazem.“ – Lu 23,34 Como o Senhor vos perdoou e acolheu, perdoai e acolhei vossos irmãos! 1. Não pagues o mal com mal, * nem injúria com inuúria; * ao contrário abençoai, pois Deus chamou-nos para isto. 2. O Senhor, na sua cruz, * carregou nossos pecados; * carreguemos também nós * as fraquezas dos irmãos! 3. O Senhor pregado à cruz * implorou por seus algozes: * „Perdoai-lhes, ó meu Pai, * pois não sabem o que fazem!“ 4. Tende em vós os sentimentos * que Jesus teve por vós: * sendo Deus se humilhou, * fez-se servo e nos salvou. 5. Senhor santo e inocente, * que sofrestes injustiças: * ensinai-nos vosso exemplo * tão sublime de perdão. Pe. José Weber – Cantos e orações, 196 São João Crisóstomo (c. 345-407), bispo de Antioquia e posteriormente de Constantinopla, doutor da Igreja Homilia sobre a cruz e o bom ladrão, 1, 3-4 «Colocaram uma inscrição por sobre a sua cabeça: 'Este é o rei'» «Senhor, lembra-te de mim quando vieres inaugurar o teu reino». O ladrão não ousou fazer esta prece sem antes, pela confissão, se ter libertado do fardo dos pecados. Vê bem, cristão, a força da confissão. Ele confessou os pecados e o paraíso abriu-se-lhe; confessou os pecados e ganhou confiança bastante para pedir o reino dos céus, depois de tantos roubos cometidos… Queres conhecer o Reino? Que vês portanto aqui que se lhe assemelhe? Tens debaixo dos olhos os pregos e uma cruz, mas essa cruz, dizia Jesus, é o próprio sinal do Reino. E eu, ao vê-Lo na cruz, proclamo-O Rei. Não é próprio de um rei morrer pelos seus súbditos? Ele próprio o disse: «O bom pastor dá a vida pelas suas ovelhas» (Jo 10, 11). Isto é igualmente verdade para um bom rei: também ele dá a vida pelos seus súbditos. Proclamá-Lo-ei portanto Rei por causa da dávida que fez da sua vida: «Senhor, lembra-te de mim quando estiveres no teu Reino». Compreendes agora que a cruz é o sinal do Reino? Eis outra prova. Cristo não deixou a sua cruz na terra, ergueu-a e levou-a com Ele para o céu. Sabemo-lo porque Ele a terá junto de Si quando voltar pleno de glória. Para perceberes o quanto esta cruz é digna de veneração, repara em como Ele a tomou como um título de glória […], Quando o Filho do homem vier, «o sol escurecerá e a lua perderá o brilho». Reinará então uma claridade tão viva que até os astros mais brilhantes se eclipsarão. «As estrelas cairão do céu. Aparecerá então no céu o sinal do Filho do homem» (Mt 24,29ss). Vês bem a força do sinal da cruz? […] Quando um rei entra numa cidade, os soldados pegam nos estandartes, içam-nos aos ombros e marcham à sua frente para anunciar a chegada régia. De igual modo, legiões de anjos precederão a Cristo, quando Ele descer do céu. Trarão aos ombros esse sinal anunciador da vinda do nosso Rei. S. João Crisóstomo (c. 345-407), bispo de Antioquioa depois de Constantinopla, doutor da Igreja. Homilia 1 sobre a Cruz e o Ladrão «Logo que entrares no teu Reino» O paraíso fechado desde há milhares de anos, foi-nos «hoje» aberto pela Cruz. Pois foi hoje que o Senhor lá introduziu o ladrão. Realiza assim duas maravilhas: abre o paraíso e deixa lá entrar um ladrão. Hoje Deus devolveu-nos a nossa velha pátria, hoje reconduziu-nos à cidade paterna, hoje abriu a Sua casa à humanidade no seu todo. «Hoje, diz Ele, estarás comigo no paraíso». Que dizes Tu, Senhor? Estás crucificado, pregado com pregos, e prometes o paraíso? – Sim, para que aprendas qual é o meu poder sobre a cruz. É que não foi ressuscitando um morto, dominando o mar e o vento, expulsando demónios, mas sim crucificado, pregado com pregos, coberto de insultos, de escarros, de troça e de ultrajes que conseguiu modificar o mau estado de espírito do ladrão, para que possas ver os dois aspectos do poder. Ele abalou toda a criação, fendeu os rochedos e atraiu a alma do ladrão, mais dura do que a pedra... Certamente que nenhum rei consentiria a um ladrão ou a qualquer outro de seus súbditos que se sentasse com ele, ao entrar numa cidade. Mas Cristo fê-lo: quando entra na Sua santa pátria, leva consigo um ladrão. Agindo deste modo, não menospreza o paraíso, não o desonra pela presença de um ladrão; bem pelo contrário, honra o paraíso, pois é uma glória para o para o paraíso ter um dono que consegue tornar um ladrão digno das delícias que aí se saboreiam. De igual modo, quando introduz os publicanos e as prostitutas no Reino dos Céus, não é para desrespeito deste, mas sim para sua honra, pois mostra que o dono do Reino dos Céus é suficientemente forte para tornar prostitutas e publicanos estimáveis ao ponto de serem dignos de uma tal honra e de um tal dom. A grande contradição do cristão, segundo o pregador do Papa Padre Cantalamessa comenta o Evangelho deste domingo ROMA, sexta-feira, 19 de novembro de 2004 (ZENIT.org).- Publicamos o comentário do padre Raniero Cantalamessa, pregador da Casa Pontifícia, à passagem evangélica da liturgia do próximo domingo, dia 21 de novembro (lc 23, 35-43), na solenidade de Jesus Cristo, Rei do Universo. *** Lucas (23, 35-43) Estava o povo olhando; os magistrados zombavam, dizendo: «A outros salvou; que se salve a si mesmo, se ele é o Cristo de Deus, o Eleito». Também os soldados zombavam dele e, aproximando-se, ofereciam-lhe vinagre e lhe diziam: «Se tu és o Rei dos judeus, salva-te!». Havia acima dele uma inscrição: «Este é o Rei dos Judeus». Um dos malfeitores crucificados o insultava, dizendo: «Não és tu o Cristo? Pois salva-te, a ti e a nós!». Mas o outro lhe respondeu dizendo: «Não temes a Deus, tu que sofres a mesma condenação? E nós, com razão, porque merecemos por nossos feitos; ao contrário, este nada fez de mal». A solenidade de Cristo Rei, como instituição, é bastante recente. Foi estabelecida pelo Papa Pio XI, em 1925, em resposta aos regimes políticos ateus e totalitários, que negavam os direitos de Deus e da Igreja. O clima em que nasceu a festa é, por exemplo, o da revolução mexicana, quando muitos cristãos se encaminharam à morte gritando até o último alento: «Viva Cristo Rei!». Mas ainda que a instituição da festa seja recente, não o é seu conteúdo nem sua idéia central, que é antiqüíssima e nasce, pode-se dizer, com o cristianismo. A frase «Cristo reina» tem sua equivalente na profissão de fé: «Jesus é o Senhor», que ocupa um lugar central na pregação dos apóstolos. A passagem evangélica é a da morte de Cristo, porque é naquele momento que Cristo começa a reinar sobre o mundo. A cruz é o trono deste rei: «Há em cima dele uma inscrição: “Este é o Rei dos judeus”». O que nas intenções dos inimigos devia ser a justificação de sua condenação, era, aos olhos do Pai celestial, a proclamação de sua soberania universal. Para descobrir como nos toca esta festa de perto, basta pensar em uma distinção simplíssima. Existem dois universos, dois mundos ou cosmos: o macrocosmo, que é o universo grande e exterior a nós, e o pequeno universo, que é cada homem. A liturgia mesma, na reforma que seguiu ao Concílio Vaticano II, sentiu a necessidade de trasladar a ênfase, remarcando o aspecto humano e espiritual da festa mais que o, por assim dizer, político. A oração da festa já não pede, como fazia antes, «conceder a todas as famílias dos povos submeter-se à doce autoridade de Cristo», mas fazer que «toda criatura, livre da escravidão do pecado, sirva-lhe e o louve sem fim». No momento de sua morte, lê-se na passagem evangélica, sobre a cabeça de Cristo pendia uma inscrição: “Este é o Rei dos judeus”; os presentes o desafiavam a mostrar abertamente sua majestade, e muitos, também entre os amigos, esperavam uma demonstração espetacular desta realeza. Mas ele elege manifestá-la preocupando-se com um só homem, um malfeitor: «“Jesus, lembra-te de mim quando estiveres no teu reino”. Ele respondeu-lhe: “Em verdade te digo, hoje estarás comigo no Paraíso”». Partindo desta ótica, a questão mais importante que há que se propor na festa de Cristo Rei não é se ele reina ou não no mundo, mas se reina ou não dentro de mim; não se sua realeza é reconhecida pelos Estados e pelos governos, mas se é reconhecida e vivida por mim. É Cristo Rei e Senhor de minha vida? Quem reina dentro de mim, quem fixa os objetivos e estabelece as prioridades. Cristo ou outro? Segundo São Paulo, existem dois modos possíveis de viver: «ou para si mesmo ou para o Senhor» (Cf. Rm 14, 7-9). Viver «para si mesmo» significa viver como quem tem em si mesmo o próprio princípio e o próprio fim; indica uma existência fechada em si mesma, orientada só à própria satisfação e à própria glória, sem perspectiva alguma de eternidade. Viver «para o Senhor», ao contrário, significa viver em vista dele, por sua glória, por seu reino. Trata-se verdadeiramente de uma nova existência frente a qual a própria morte perdeu seu caráter irreparável. A contradição máxima que desde sempre o homem experimenta --aquela entre a vida e a morte-- foi superada. A contradição mais radical já não é entre «viver» e «morrer», mas entre viver «para si mesmo» e viver «para o Senhor». [Original italiano publicado por «Famiglia Cristiana». Tradução realizada por Zenit] ZP04111901 Pregador do Papa: Cristo é Rei e Senhor da minha vida? Comentário do Pe. Cantalamessa sobre a liturgia do próximo domingo ROMA, quinta-feira, 23 de novembro de 2007 (ZENIT.org).- Publicamos o comentário do Pe. Raniero Cantalamessa, ofmcap. – pregador da Casa Pontifícia – sobre a liturgia do próximo domingo, XXXIV do tempo ordinário. *** XXXIV Domingo do tempo ordinário [C] 2 Samuel 5, 1-3; Colossenses 1, 12-20; Lucas 23, 35-43 Jesus Cristo, Rei do universo e dos corações A solenidade de Cristo Rei, quanto à sua instituição, é muito recente. Foi estabelecida pelo Papa Pio XI em 1925, em resposta aos regimes políticos ateus e totalitários que negavam os diretos de Deus e da Igreja. O clima em que nasceu a solenidade é, por exemplo, o da revolução mexicana, quando muitos cristãos enfrentaram a morte gritando até o último suspiro: «Viva Cristo Rei». Mas, se a instituição da festa é recente, não é assim seu conteúdo e seu ideal, que é antiga e nasce, pode-se dizer, com o cristianismo. A frase «Cristo reina» tem seu equivalente na profissão de fé «Jesus é o Senhor», que ocupa um lugar central na pregação dos apóstolos. A passagem evangélica é a da morte de Cristo, porque é nesse momento quando Cristo começa a reinar no mundo. A cruz é o trono desse rei. «Havia acima dele uma inscrição: ‘Este é o Rei dos judeus’». Aquele que nas intenções dos inimigos devia ser a justificação de sua condenação era, aos olhos do Pai celestial, a proclamação de sua soberania universal. Para descobrir como a aproximação desta festa nos toca, basta recordar uma distinção simplíssima. Existem dois universos, dois mundos ou cosmos: o macrocosmo, que é o universo grande e exterior a nós, e o microcosmo, ou pequeno universo, que é cada homem. A própria liturgia, na reforma que seguiu o Concílio Vaticano II, sentiu a necessidade de mudar o acento da festa, enfatizando seu aspecto humano e espiritual, mais que o – por assim dizer – político. A oração da solenidade já não pede, como fazia antes, que «se conceda a todas as famílias do mundo submeter-se à doce autoridade de Cristo», mas, que «toda criatura, livre da escravidão do pecado, sirva à vossa majestade e vos glorifique eternamente». No momento da morte de Cristo, lê-se na passagem evangélica – recordemos –, pendia sobre sua cabeça a inscrição «Jesus é o Rei dos judeus»; os presentes o desafiavam a mostrar abertamente sua realeza e muitos, também entre os amigos; esperavam uma demonstração espetacular de sua realeza. Mas Ele escolheu mostrar sua realeza preocupando-se por um homem solitário e malfeitor: «Jesus, lembra-te de mim quando estiveres em teu reino. Respondeu-lhe: ‘Em verdade te digo, hoje mesmo estarás comigo no paraíso’». Nesta perspectiva, a pergunta importante que devemos fazer na solenidade de Cristo Rei não é se Ele reina ou não no mundo, mas se reina ou não dentro de mim; não se sua realeza está reconhecida pelos Estados e pelos governos, mas, se é reconhecida e vivida por mim. Cristo é Rei e Senhor da minha vida? Quem reina dentro de mim, quem fixa os objetivos e estabelece as prioridades: Cristo ou algum outro? Segundo São Paulo, existem duas formas possíveis de viver: ou para si mesmo ou para o Senhor (Rm 14, 7-9). Viver «para si mesmo» significa viver como quem tem em si mesmo o próprio princípio e próprio fim; indica uma existência fechada em si mesma, orientada somente pela própria satisfação e glória, sem perspectiva alguma de eternidade. Viver «para o Senhor», ao contrário, significa viver por Ele, isto é, por e para sua glória, por e para seu reino. Trata-se verdadeiramente de uma nova existência, frente à qual a morte perdeu seu caráter irreparável. A contradição máxima que o homem experimenta desde sempre – aquela entre a vida e a morte – foi superada. A contradição mais radical já não é aquela entre «viver» e «morrer», mas, entre viver «para si mesmo» e viver «para o Senhor». [Traduzido por Zenit] «Deus demonstra seu amor por nós»; Pregação da Sexta-feira Santa do Pregador do Papa na celebração da Paixão do Senhor no Vaticano CIDADE DO VATICANO, sexta-feira, 14 de abril de 2006 (ZENIT.org).- Publicamos a pregação feita pelo padre Raniero Cantalamessa, ofmcap., pregador da Casa Pontifícia, na celebração da Paixão do Senhor, nesta Sexta-feira Santa na Basílica de S. Pedro, no Vaticano, na presença de Bento XVI. *** «Deus demonstra seu amor por nós» Pregação de Sexta-feira Santa de 2006 na Basílica de S. Pedro do Pregador da Casa Pontifícia Pe. Raniero Cantalamessa, ofmcap. 1. «Sede, cristãos, mais firmes ao mover-vos!» «Pois virá um tempo em que alguns não suportarão a sã doutrina; pelo contrário, segundo os seus próprios desejos, como que sentido comichão nos ouvidos, rodear-se-ão de mestres. Desviarão os seus ouvidos da verdade, orientando-os para as fábulas» (2 Tim 4, 3-4). Esta palavra da Escritura –sobretudo a menção ao desejo de ouvir coisas novas– está-se realizando de modo novo e impressionante em nossos dias. Enquanto nós celebramos aqui a memória da paixão e morte do Salvador, milhões de pessoas são induzidas por hábeis contadores de lendas antigas a crer que Jesus de Nazaré nunca foi, na verdade, crucificado. Nos Estados Unidos, existe um best seller do momento, uma edição do Evangelho de Tomé, apresentado como o evangelho que «nos evita a crucificação, torna desnecessária a ressurreição e não nos obriga a crer em nenhum Deus chamado Jesus». [1] «Existe uma percepção penosa na natureza humana, escrevia anos atrás o maior estudioso bíblico da história da Paixão, Raymond Brown: quanto mais fantástico é o cenário imaginado, mais sensacional é a propaganda que recebe e mais forte o interesse que suscita. Pessoas que não se dão ao trabalho de ler uma análise séria das tradições históricas sobre a paixão, morte e ressurreição de Jesus, ficam fascinadas por toda nova teoria segundo a qual ele não foi crucificado e não morreu, especialmente se a seqüência da história compreende sua fuga com Maria Madalena para a Índia [ou para a França, segundo a versão mais atualizada]... Estas teorias demonstram que quando se trata da Paixão de Jesus, a despeito da máxima popular, a fantasia supera a realidade, e é, querendo ou não, também mais rentável». [2] Fala-se muito da traição de Judas e não se percebe que se está repetindo. Cristo é agora vendido, não mais aos chefes do sinédrio por trinta moedas, mas a editores e livrarias por milhares de moedas... Ninguém voltará a frear essa onda especulativa que, mais ainda, registrará um crescimento com o lançamento iminente de um certo filme, mas me tendo ocupado por anos da História das origens cristãs, sinto o dever de chamar a atenção sobre um equívoco descomunal que está no fundo de toda esta literatura pseudo-histórica. Os evangelhos apócrifos sobre os quais se apóia são textos conhecidos há tempos, no todo ou em parte, mas com os quais nem sequer os historiadores mais críticos e mais hostis ao cristianismo pensaram, antes de hoje, que se pudesse fazer história. Seria como se entre qualquer século se pretendesse reconstruir a história atual baseando-se em romances escritos em nossa época. O equívoco descomunal consiste no fato que se utilizam estes escritos para fazê-los dizer exatamente o contrário daquilo que pretendiam. Estes fazem parte da literatura gnóstica dos séculos II e III. A visão gnóstica –uma mescla de dualismo platônico e de doutrinas orientais revestidas de idéias bíblicas– sustenta que o mundo material é uma ilusão, obra do Deus do Antigo Testamento, que é um deus mau, ou ao menos inferior; Cristo não morreu na cruz porque jamais havia assumido, a não ser em aparência, um corpo humano, sendo este indigno de Deus (docetismo). Se Jesus, segundo o Evangelho de Judas, do qual se falou muito nos dias passados, ordena seu próprio apóstolo a traí-lo, é porque, morrendo, o espírito divino que está nele poderá finalmente livrar-se do invólucro da carne e voltar a subir ao céu. O matrimônio orientado aos nascimentos deve ser evitado (encratismo); a mulher se salvará só se o «princípio feminino» (thelus) personificado por ela se transformar no princípio masculino, isto é, se deixar de ser mulher. [3] O cômico é que hoje há quem crê ver nestes escritos a exaltação do princípio feminino, da sexualidade, do pleno e desinibido gozo deste mundo material, em polêmica com a Igreja oficial, que, com seu maniqueísmo, teve sempre inculcado tudo isto! O mesmo equívoco que se nota a propósito da doutrina da reencarnação. Presente nas religiões orientais como uma punição devida a precedentes culpas e como aquilo ao que se deseja terminar com todas as forças, essa é acolhida no ocidente como uma maravilhosa possibilidade de tornar a viver e gozar indefinidamente este mundo. São coisas que não merecem ser tratadas neste lugar e neste dia, mas não podemos permitir que o silêncio dos crentes seja tomado por vergonha e que a boa fé (ou a ignorância?) de milhões de pessoas seja brutalmente manipulada pela mídia, sem alçar um grito de protesto em nome não só da fé, mas também do bom senso e da sã razão. É o momento, creio, de ouvir novamente a advertência de Dante Alighieri: «Sede, Cristãos, firmes ao mover-vos: não sejais como a pluma sensível a todos os ventos, e não creiais que qualquer água vos lave. Tendes o novo e o velho Testamento, e o pastor da Igreja que vos guia; isto vos basta para vossa salvação... Sede homens, e não ovelhas insensatas». [4] 2. A Paixão precedeu a Encarnação! Mas, deixemos de lado estas fantasias que possuem todas uma explicação comum: estamos na era da mídia e à mídia não interessa a verdade, mas a novidade. Concentremo-nos sobre o mistério que estamos celebrando. O melhor modo de refletir, este ano, sobre o mistério da Sexta-Feira Santa é saber reler por inteiro a primeira parte da encíclica do Papa, «Deus caritas est». Não podendo fazê-lo aqui, quero ao menos comentar algumas de suas passagens que mais diretamente referem-se ao mistério deste dia. Lemos na encíclica: «O olhar fixo no lado trespassado de Cristo, de que fala João, compreende o que serviu de ponto de partida a esta Carta Encíclica: “Deus é amor”. É lá que esta verdade pode ser contemplada. E começando de lá, pretende-se agora definir em que consiste o amor. A partir daquele olhar, o cristão encontra o caminho do seu viver e amar». [5] Sim, Deus é amor! Se todas as Bíblias do mundo –foi dito– fossem destruídas por qualquer cataclismo ou furor iconoclasta e nos permanecesse somente uma cópia; e ainda que esta copia fosse assim danificada que só uma página estivesse agora inteira, e ainda que esta página fosse estragada que só uma linha pudesse ser lida agora: se tal linha for a linha da Primeira carta de João onde está escrito «Deus é amor», toda a Bíblia estaria salva, porque tudo está contido lá. O amor de Deus é luz, é felicidade, é plenitude de vida. É a torrente que Ezequiel viu sair do templo e que, aonde chega, cura e suscita vida; é a água que sacia toda sede prometida à samaritana. Jesus também repete a nós, como a ela: “Se conhecesses o dom de Deus”. Vivi minha infância em uma casa de campo a poucos metros de uma rede elétrica de alta tensão, mas nós vivíamos às escuras ou à luz de velas. Entre nós e a rede elétrica estava a via férrea, e, com a guerra em marcha, ninguém pensava em superar o pequeno obstáculo. Assim ocorre com o amor de Deus: está ali, ao alcance da mão, capaz de iluminar e aquecer tudo em nossa vida, mas passamos a existência na escuridão e no frio. É o único motivo verdadeiro de tristeza da vida. Deus é amor, e a cruz de Cristo nos é a prova suprema, a demonstração histórica. Existem dois modos de manifestar o próprio amor para os demais, dizia um autor do oriente bizantino, Nicolas Cabasilas. O primeiro consiste em fazer o bem à pessoa amada, em dar-lhe presentes; o segundo, muito mais comprometedor, consiste em sofrer por ela. Deus amou-nos no primeiro modo, com amor, isto é, de generosidade, na criação, quando nos encheu de dons, dentro e fora de nós; amou-nos com amor de sofrimento na redenção, quando inventou a própria aniquilação, sofrendo por nós as mais terríveis dores, a fim de convencer-nos de seu amor [6]. Por isso, é sobre a cruz que se deve contemplar agora a verdade de que «Deus é amor». A palavra «paixão» tem dois significados: pode indicar um amor veemente, «passional», ou um sofrimento moral. Há uma continuidade entre as duas coisas e a experiência quotidiana mostra quão facilmente de uma se passa à outra. Assim ocorreu também, antes de tudo, com Deus. Há uma paixão --escreveu Orígenes-- que precede à encarnação. É «a paixão de amor» que Deus desde sempre nutre em relação ao gênero humano e que, na plenitude dos tempos, levou-o a vir sobre a terra e padecer por nós. [7] 3. Três ordens de grandeza A encíclica «Deus caritas est» adiciona um novo modo de fazer apologia da fé cristã, talvez o único possível hoje e certamente o mais eficaz. Não contrapõe os valores sobrenaturais aos naturais, o amor divino ao amor humano, o eros ao ágape, mas nos mostra a originária harmonia, sempre a redescobrir e curar por causa do pecado e da fragilidade humana. «O eros --escreve o Papa-- quer-nos elevar “em êxtase” para o Divino, conduzir-nos para além de nós próprios, mas por isso mesmo requer um caminho de ascese, renúncias, purificações e saneamentos» [8]. O evangelho está, sim, em concorrência com os ideais humanos, mas no sentido literal de que concorre à sua realização: cura-o, eleva-o, protege-o. Não exclui o eros da vida, mas o veneno do egoísmo do eros. Existem três ordens de grandeza, disse Pascal em um célebre pensamento [9]. A primeira é a ordem material ou do corpo: nela sobressai quem tem muitos bens, quem é dotado de força atlética ou beleza física. É um valor para não desprezar, mas o mais baixo. Acima dessa há a ordem do gênio e da inteligência, na qual se distinguem os pesadores, os inventores, os cientistas, os artistas, os poetas. Esta é uma ordem de qualidade diversa. Ao gênio não acrescenta e não tolhe nada o ser rico ou pobre, belo ou feio. A deformidade física da própria pessoa não tolhe em nada a beleza do pensamento de Sócrates e da poesia de Leopardi. Este valor do gênio é um valor certamente mais alto que o precedente, mas não ainda o supremo. Acima dele há uma outra ordem de grandeza, e é a ordem do amor, da bondade. (Pascal chama de ordem da santidade e da graça). Uma gota de santidade, dizia Gounod, vale mais de um oceano de gênio. Ao santo não acrescenta e não tolhe nada o ser belo ou feio, douto ou iletrado. Sua grandeza é de uma ordem diversa. O cristianismo pertence ao terceiro nível. No romance Quo vadis, um pagão pergunta ao apóstolo Pedro recém-chegado a Roma: «Atenas deu-nos a sabedoria, Roma a força; a vossa religião, o que nos oferece? E Pedro responde: o amor! [10] O amor é a coisa mais frágil que existe no mundo; é representado, e o é, como uma criança. Pode-se matar por muito pouco -vimos com horror na Itália nas passadas semanas--, como se pode fazer com uma criança. Sabemos bem no que se tornam o poder e a ciência, a força e o gênio, sem o amor e a bondade… 4. Amor que perdoa «O eros de Deus pelo homem --prossegue a encíclica-- é ao mesmo tempo totalmente agape. E não só porque é dado de maneira totalmente gratuita, sem mérito algum precedente, mas também porque é amor que perdoa» (n. 10). Também esta qualidade refulge no máximo grau no mistério da cruz. «Ninguém tem amor maior que aquele que dá a vida pelos próprios amigos», disse Jesus no cenáculo (Jo 15, 13). Queria exclamar: Sim, existe, ó Cristo, um amor maior que dar a vida pelos próprios amigos. O vosso! Vós não destes a vida por vossos amigos, mas por vossos inimigos! Paulo disse que a duras penas se encontra quem seja disposto a morrer por um justo, mas se encontra. «Por um homem de bem talvez alguém se atreva a morrer; mas a prova de que Deus ama-nos é que Cristo, sendo nós ainda pecadores, morreu por nós»; «Cristo morreu pelos ímpios no tempo estabelecido» (Rm 5,6-8). No entanto, não se tarda a descobrir que o contraste é só aparente. A palavra «amigos» em sentido ativo indica aquele que te ama, mas em sentido passivo indica aquele que é amado por ti. Jesus chama Judas de «amigo» (Mt 26, 50), não porque Judas o amasse, mas porque ele o amava! Não há amor maior que dar a própria vida pelos inimigos, considerando-os amigos: eis o sentido da frase de Jesus. Os homens podem ser, ou fazer papel de inimigos de Deus, Deus não poderá jamais ser inimigo do homem. É a terrível vantagem dos filhos sobre os pais (e sobre as mães). Devemos refletir em que modo, concretamente, o amor de Cristo sobre a cruz pode ajudar o homem de hoje a encontrar, como diz a encíclica, «o caminho de seu viver e de seu amor». Isso é um amor de misericórdia, que desculpa e perdoa, que não quer destruir o inimigo, mas, no caso, a inimizade (cf. Ef 2, 16). Jeremias, o mais próximo entre os homens do Cristo da Paixão, pede a Deus dizendo: «Eu verei a tua vingança contra eles» (Jr 11, 20); Jesus morre dizendo: «Pai, perdoa-os, porque não sabem o que fazem» (Lc 23, 34). É justamente desta misericórdia e capacidade de perdão que temos necessidade hoje, para não deslizar sempre mais no abismo de uma violência globalizada. O Apóstolo escrevia aos Colossenses: «Portanto, como eleitos de Deus, santos e amados, revesti-vos de sentimentos (ao pé da letra: de vísceras!) de compaixão, de bondade, humildade, mansidão, longanimidade, suportando-vos uns aos outros, e perdoando-vos mutuamente, se alguém tem motivo de queixa contra o outro; como o Senhor vos perdoou, assim também fazei vós» (Col 3, 12-13). Ter misericórdia significa apiedar-se (misereor) no coração (cordis) em relação ao próprio inimigo, entender de que matéria somos todos feitos e, portanto, perdoar. O que pode acontecer se, por um milagre da história, no Oriente Próximo, os dois povos há décadas em luta, de uma só vez, começassem a pensar uns no sofrimento dos outros, a apiedar-se uns dos outros. Não seria mais necessário nenhum muro de divisão entre eles. A mesma coisa deve-se dizer de tantos outros conflitos em ação no mundo, compreendidos aqueles entre as diversas confissões religiosas e igrejas cristãs. Quanta verdade no verso do nosso Pascoli: «Homens, paz! Na extensa terra grande é o mistério» [11]. Um comum destino de morte incumbe sobre todos. A humanidade é envolvida por tanta obscuridade e inclinada («prona») sob tanto sofrimento que deveríamos ter também um pouco de compaixão e de solidariedade uns pelos outros! 5. O dever de amar Há um outro ensinamento que nos vem do amor de Deus manifestado na cruz de Cristo. O amor de Deus pelo homem é fiel eternamente: «Eu te amei com amor eterno», diz Deus ao homem nos profetas (Jr 31, 3), e ainda: «Em minha lealdade não falharei» (Sl 89,34). Deus uniu-se para amar para sempre, privou-se da liberdade de voltar atrás. É este o sentido profundo da aliança que em Cristo tornou-se «nova e eterna». Na encíclica papal, lemos: «Faz parte da evolução do amor para níveis mais altos, para suas íntimas purificações, que ele procure agora o caráter definitivo, e isso em um duplo sentido: no sentido da exclusividade – “apenas esta única pessoa” – e no sentido de ser “para sempre”. A amor compreende a totalidade da existência em toda a sua dimensão, inclusive a temporal. Nem poderia ser de outro modo, porque sua promessa visa o definitivo: o amor visa a eternidade». [12] Em nossa sociedade, questiona-se cada vez com maior freqüência que relação pode haver entre o amor de dois jovens e a lei do matrimônio; que necessidade de «vincular-se» tem o amor, que é todo impulso e espontaneidade. Assim são sempre mais numerosos aqueles que rejeitam a instituição do matrimônio e escolhem o assim chamado amor livre ou a simples convivência de fato. Só se se descobre a profunda e vital relação que há entre lei e amor, entre decisão e instituição, pode-se responder concretamente àquela pergunta e dar aos jovens um motivo convincente para «unir-se» e amar para sempre e não ter medo de fazer do amor um «dever». «Portanto, quando há o dever de amar, --escreveu o filósofo que, depois de Platão, escreveu as coisas mais belas sobre o amor, Kierkegaard--, agora somente o amor é garantido para sempre contra toda alteração; eternamente livre em santa independência; assegurado em eterna santidade contra todo desespero» [13]. O sentido destas palavras é que a pessoa que ama, quanto mais ama intensamente, mais percebe com angústia o perigo que corre seu amor. Perigo que não vem dos outros, mas dela mesma. Essa sabe bem, de fato, ser volúvel e que amanhã, querendo ou não, pode já estancar-se e não amar mais ou mudar o objeto de seu amor. É já que, agora que está nela a luz do amor, vê com clareza qual perda irreparável isto comporta, eis que se previne «unindo-se» para amar com o vinculo do dever e ancorando, deste modo, à eternidade seu ato de amor posto no tempo. Ulisses queria chegar a rever sua pátria e sua esposa, mas devia passar através do local das sereias que os navegantes encontravam com seu canto e os levavam a bater contra os recifes. É um mito, mas ajuda a entender o porquê, ainda que humano e existencial, do matrimônio «indissolúvel» e, sobre um plano diverso, dos votos religiosos. O dever de amar protege o amor do «desespero» e o torna «santo e independente», no sentido que protege do desespero de não poder amar para sempre. Dai-me um verdadeiro apaixonado --dizia o mesmo pensador-- e ele vos dirá se, em amor, há oposição entre prazer e dever; se o pensamento de «dever» amar por toda a vida traz ao amante medo e angústia, ou não muito mais alegria e felicidade total. Aparecendo um dia da Semana Santa à Beata Ângela da Foligno, Cristo lhe disse uma palavra que ficou célebre: «Não te amei por brincadeira!» [15]. Cristo não nos amou verdadeiramente por brincadeira. Há uma dimensão lúdica e jocosa no amor, mas ele mesmo não é um jogo; é a coisa mais séria e mais cheia de conseqüências que existe no mundo; a vida humana depende dele. Ésquilo compara o amor a um leãozinho que se cria em casa, «antes dócil e terno mais que uma criança», com o qual se pode até brincar, mas que, crescendo, é capaz de fazer estrago e encher a casa de sangue. [16] Estas consideração não bastarão para mudar a cultura existente que exalta a liberdade de mudar e a espontaneidade do momento, a prática do «usar e jogar fora» aplicada também ao amor. (Encarregar-se-á, lamentavelmente, a vida de fazê-lo, quando ao fim se encontrar com as cinzas nas mãos e a tristeza de não ter construído nada de duradouro com o próprio amor). Mas que, pelo menos sirvam, estas considerações, para confirmar a bondade e a beleza da própria escolha àqueles que decidiram viver o amor entre o homem e a mulher segundo o projeto de Deus, e sirvam para animar muitos jovens a fazer a mesma escolha. Não nos resta outra coisa senão entoar com Paulo o hino ao amor vitorioso de Deus. Ele nos convida a fazer com ele uma maravilhosa experiência de cura interior. Pensa em todas as coisas negativas e nos momentos críticos de sua vida: a tribulação, a angústia, a perseguição, a fome, a nudez, o perigo, a espada. Contempla isso tudo à luz da certeza do amor de Deus e grita: «Mas em tudo isso somos mais que vencedores, graças àquele que nos amou!». Levanta então o olhar; desde sua vida pessoal passa a considerar o mundo que o circunda e o destino humano universal, e de novo a mesma jubilosa certeza: «Pois estou convencido de que nem a morte nem a vida..., nem o presente nem o futuro, nem as potestades, nem altura, nem a profundeza, nem qualquer outra criatura poderá nos separar do amor de Deus manifestado em Cristo Jesus, nosso Senhor» (Rm 8, 37-39). Recolhamos seu convite nesta Sexta-Feira da Paixão, e repitamos entre nós suas palavras enquanto dentro em pouco adoremos a cruz de Cristo. [1] H. Bloom, no ensaio interpretativo que acompanha a edição de M. Meyer, The Gospel of Thomas, HarperSan Francisco, s.d., p. 125. [2] R. Brown, The Death of the Messiah, II, New York 1998, pp. 1092-1096. [3] Ver o número 114 no mesmo Evangelho de Tomé (ed. Mayer, p. 63); nos Evangelho dos Egípcios Jesus diz: «Vim para destruir as obras da mulher» (Cf. Clemente Al., Stromati, III, 63). Isto explica por que o Evangelho de Tomé se converte no evangelho dos maniqueístas, enquanto que foi combatido severamente pelos autores eclesiásticos (por exemplo, por Hipólito de Roma) que defendiam a bondade do matrimônio e da criação em geral. [4] Paradiso, V, 73-80. [5] Benedicto XVI, Enc. «Deus caritas est», n.12. [6] Cf. N. Cabasilas, Vita in Cristo, VI, 2 (PG 150, 645) [7] Cf. Orígenes, Homilias sobre Ezequiel, 6,6 (GCS, 1925, p. 384 s). [8] Enc. «Deus caritas est», n.5. [9] Cf. B. Pascal, Pensieri, 793, ed. Brunschvicg. [10] Henryk Sienkiewicz, Quo vadis, cap. 33. [11] Giovanni Pascoli, «I due fanciulli». [12] Enc. «Deus caritas est», n.6. [13] S. Kierkegaard, Gli atti dell’amore, I, 2, 40, ed. a cura di C. Fabro, Milano 1983, p. 177 ss. [14] Cf. Odisea, canto XII. [15] Il libro della Beata Angela da Foligno, Instructio 23 (ed. Quaracchi, Grottaferrata 1985, p. 612). [16] Eschilo, Agamennone, vv. 717 ss. [Tradução do original italiano realizada por Zenit] ZP06041405