Deysiane Oliveira da Silva
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Deysiane Oliveira da Silva
RESENHA DE: COUTO, Hildo Honório do. O Que é Português Brasileiro. 7° Ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 1993. Deysiane Oliveira da SILVA1 A Língua Portuguesa transmitida ou ensinada nas escolas, a língua culta composta de regras gramaticais, é diferente da língua falada pela maioria da população brasileira, e por existir essa diferença entre ambas, o ensino da língua erudita nas escolas torna-se cada vez mais complexa. Além dessa diferença em relação à língua portuguesa dita padrão, a língua falada pela maioria da população apresenta variações linguísticas, que foram denominadas “distorções”. A obra O Que é Português Brasileiro do Professor aposentado de Linguística da Universidade de Brasília Hildo Honório do Couto trata com muito cuidado a questão das distorções, e o autor procura esclarecer a realidade da língua portuguesa, suas particularidades e a ênfase maior é em relação ao ensino. A obra se divide em sete capítulos, sendo o último apenas indicações para leitura. No primeiro deles é explorada a crença dos brasileiros em relação ao português por acharem que é "difícil demais” é uma das línguas “mais difíceis do mundo”, é através deste ponto de vista da população que o autor procura as causas e as consequências que existem no ensino referente a língua portuguesa no Brasil. Neste capítulo, segundo Couto, há uma série de distorções devido à mentalidade centralizadora e elitista da sociedade burguesa, capitalista, mais subdesenvolvida, em que a minoria a serviço das classes dominantes atribui em favor do “português correto” não atentando para o fato de que a língua de uma comunidade é aquela que ela usa. Se não há linguagem comum não haverá comunidade, nem intercâmbio entre seus membros, mas este fato parece não ser levado em conta por eles (Gramáticos e Filólogos). As classes dominantes por meio de seus pressupostos, gramáticos e filósofos praticaram distorções. O autor cita três destas distorções: temporal, espacial e social. Segundo Hildo, existe a possibilidade de outra distorção: distorção grupal que para Couto são “as imposições da linguagem de um grupo a toda a comunidade”. O autor finaliza o capítulo levantando as seguintes questões: “O que é a norma geral do português brasileiro? Ou não há norma geral?”. 1 Acadêmica do curso de letras da Universidade Federal de Roraima (UFRR) trabalha na disciplina Discurso: Leitura e Produção de Textos e Hipertextos, ano 2014-11-27, segundo semestre. O segundo capítulo refere-se a distorção temporal do português, esta distorção se caracteriza pelo fato de que hoje, o português, por vezes arcaico, ainda predomina como regra no Brasil, e que o vocabulário de escritores como Machado de Assis e Camões ainda são atuais, e segundo o autor, toda língua apresenta em sua história fases precisas, adequadas ao modo de produção da qual faz parte, as relações sociais medievais da língua portuguesa no período arcaico serviram de instrumento de comunicação a sociedade da época. O mesmo se aplica as fases posteriores visto que a língua está em constante mudança, ou seja, a cada época surgirá uma nova expressão linguística inovando o modo de produção e distribuição de bens na sociedade chamando atenção para a inovação da língua, Hildo afirma que os olhos dos gramáticos estão sempre voltados para o passado e essa ideia de purismo rejeita qualquer mudança evolutiva da língua portuguesa, tornando a língua falada pela maioria esmagadora da população e que foi enriquecida pelos vários imigrantes do século XV, como impura e errada, e o idioma arcaico como correto. A distorção espacial é tratada no terceiro capítulo, e faz referência às diferenciações entre o português falado nas mais diversas regiões do Brasil, essas diferenciações levam alguns gramáticos a estabelecerem parâmetros entre a língua portuguesa desta ou daquela região do Brasil. O autor cita o exemplo do Rio de Janeiro que por ter sido a sede da corte e, posteriormente da capital federal, surgiu uma crença recentemente da superioridade do português carioca sobre as demais regiões do Brasil, o português carioca seria a norma para todo o país. Hildo rebate dizendo que o povo brasileiro não é só o povo carioca e se ele for aceito como a norma para todo o Brasil, estaríamos excluindo as outras regiões do país. No quarto, capítulo o autor frisa a distorção social. O Brasil por ser um país que possui diferentes e distintas classes econômicas, cada cidadão fala de acordo com sua classe e seu meio social, assim pessoas com menos estudos criam seus próprios costumes na fala deixando seu dialeto vulgar, porém com entendimento para quem fala sua língua. A desigualdade e o preconceito social, cultural e econômico são aspetos tratados neste capítulo. Segundo o autor, a distorção social se patenteia na imposição da linguagem de uma classe (aquela que toda a elite dominante considera a melhor) a todas as outras. A consequência é que todas estas falariam “errado”, sua linguagem seria um “desvio” da “boa linguagem”. O autor admite no, quinto capítulo, que é necessário que exista uma norma linguística oficial. Couto faz uma dura crítica ao projeto NURC (Norma Urbana Culta) acusando-o de elitista por pesquisar somente as linguagem dos grandes centros e seguir à risca as distorções comentadas no livro, segundo o autor o projeto ao final estará defasado devido à lentidão com que vem sendo implantado e a norma estabelecida pelos gramáticos se distancia cada vez mais da realidade linguística do país. Para que se tenha uma norma geral que se aproximaria muito das gramáticas lusitanizantes, ele sugere que seja levada em conta a linguagem usada pelas pessoas cultas do país inteiro. Em relação ao nível sintático, Couto afirma que uma característica geral do português do Brasil é que ele, no que toca ao funcionamento dos pronomes átonos (me, te, se, lhe, o, a, etc) tem uma colocação mais proclítica, não sendo encontrável em Portugal, enquanto a gramática lusitana prega e obriga a colocação enclítica o que para os brasileiros soa de forma não natural. No último capítulo, o autor trata da questão do ensino, mostrando que os meios de comunicação estão todos voltados a linguagem culta a considerada correta, a mesma cobrada em concursos públicos por todo o país, é essencial que deva ser ensinada nas escolas, porém ela é utilizada pelas classes dominantes e a prejudicada seria as classes menos favorecidas. E como levar a norma culta brasileira a esses alunos? Couto responde a esta pergunta citando quatro fatos de equívocos cometidos por professores, em um desses casos é do próprio autor, os quais não conseguem preparar e ambientar o aprendizado da língua portuguesa. No final do capítulo, o autor retoma mais uma vez a questão de que grande parte dos problemas existentes na língua desapareceria se já tivessem definido a norma culta brasileira dando lugar a uma sociedade mais justa. A obra de Hildo O Que é Português Brasileiro apresenta uma leitura curta e de fácil entendimento, porém, enriquece o nosso conhecimento sobre a língua portuguesa, principalmente a brasileira. Apesar de ser uma língua que contenha uma grande diversidade ela não deixa de ser nossa língua, porém, cada um em sua região adaptandose a sua maneira, com suas qualidades e seus vícios de linguagem, no que se refere ao português do Brasil, o problema é que o ensino está direcionado para a norma da linguística de Portugal. Conclui-se que não há uma língua correta e outra errada e sim diferenças que atendam as necessidades linguísticas de cada um, ou seja, o brasileiro sabe falar português, apenas as regras de funcionamento são diferentes da gramática falada em Portugal. REFERÊNCIA 1. FERIGO, Ivana; RIPE, Antônio; VIEIRA, Rogério. Considerações sobre O Que é Português Brasileiro de Hildo Honório do Couto.
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1 Mestre em Linguística e Doutorando em Linguística, pela Universidade Federal da Bahia, Salvador. Correio eletrônico: [email protected].
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