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Análise topográfica e correlação entre difusão e FLAIR
Em 05 pacientes com Doença de Creutzfeldt-Jakob
Renato Maia Gama, Marcelo Barbosa, Gilberto Miazaky Otta, Lázaro Luís Faria do
Amaral, Nelson Fortes Ferreira, Renato Adam Mendonça, Sérgio Santos Li ma
Med Imagem - Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo - SP – Brasil
INTRODUÇÃO
A Doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ) constitui a mais freqüente das síndromes
causadas por uma proteína infecciosa, denominada prion, resistente a protease.(1,2,3)
As Doenças Priônicas ou Encefalopatias Espongiformes Transmissíveis (EET) também
compreendem em humanos Kuru, Insônia Familiar Fatal e Síndrome de GerstmannStraussler, além de no mínimo 06 doenças diferentes em ani mais, como a variante da
DCJ (Doença da Vaca Louca). (4,5,6,7)
Na ausência de partícula viral ou ácido nucléico detectáveis neste grupo de
desordens, Pursi & col. formularam a “hipótese priônica”, propondo que o agente
transmissor das EET compunha-se inteiramente de versão anormal de uma glicoproteína
de superfície celular, a proteína priônica (PPr), distribuída largamente pelo corpo e
expressa em níveis maiores nos neurônios, assim como possuidora de um gene
conservado através das espécies mamíferas (No homem localiza-se no braço curto do
cromossomo 20). (7)
A DCJ divide-se nas formas esporádica (85% dos casos), familiar e adquirida. A
primeira ocorre em humanos com prevalência de 1/ 1000.000 no mundo, possuindo
patogenia desconhecida. A forma familiar (10-15% dos casos) associa-se a mutações no
gene da PPr e a adquirida ocorre através de diversas vias, sobretudo por recepção de
córnea ou de hormônio de crescimento hipofisário de cadáveres hospedeiros da proteína.
(1,7).
OBJETIVOS
Caracterizar e comparar os achados nas seqüências Difusão (DWI) e FLAIR em
05 pacientes com DCJ, comparando os dados obtidos com a literatura.
MATERIAL E MÉTODOS
Análise retrospectiva de casos do arquivo didático da Medimagem-SP de exames
de RM do encéfalo de 03 homens e 02 mulheres entre 41 e 75 anos realizados em
aparelhos GE Medical Sistem 1,5T Sigma (LX, Horizon e CVI) incluindo estudos com
imagens ponderadas em Difusão (IPD) e FLAIR, avaliando-se a topografia das lesões e a
conspicuidade das lesões nas seqüências citadas.
Os parâmetros das seqüências ponderadas em difusão foram: b- 1000; TR- 10000;
TE- 100; Técnica EPI; Matriz- 128 x 128; Cortes de 4/1,5; FOV- 24; 1 NEX; e os da
seqüência FLAIR: TR- 11000; TE- 100; TI- 2400; Banda- 31; Matrix- 256 x 192; Cortes de
4/1,5; FOV- 24; 1 NEX.
RESULTADOS
Prevaleceu a forma familiar (03 casos) sobre a esporádica (02 casos).
O acometimento com hiperintensidades de sinal nas IPD e/ou nas sequências
FLAIR bilaterais e simétricas ocorreu no putamen, núcleo caudado e córtex parietooccipital nos 05 casos; na ínsula e giro do cíngulo em 03 pacientes e no globo pálido, em
02. Do mes mo modo, detectaram-se lesões talâmicas e hipocampais bilateralmente em
01 caso. (Tabela 1) (Figuras 1-3)
DISTRIBUIÇÃO TOPOGRÁFICA DAS LESÕES DETECTADAS
NOS EXAMES DE RM POR PACIENTE (PCTE)
Figura 1 - Imagens ponderadas em difusão demonstrando acometimento dos núcleos da
base(A e B) e córtex cerebral (A-C).
Figura 2 A-C - Imagens ponderadas em FLAIR demonstrando acometimento do estriatum.
Existe também sinais sugestivos de lesão cortical occipito-parietal à esquerda.
Figura 3 - Imagens do paciente V ponderadas em difusão com lesões nos pulvinares dos
tálamos (A) e nos hipocampos (B).
Concomitantemente, notou-se hiperintensidade de sinal nas IPD e na sequência
FLAIR localizada na porção posterior e para-mediana direita da ponte em 01 paciente
com a forma familiar. (Figura 4)
Figura 4 A e B - Imagens ponderadas em difusão e FLAIR evidenciando hiperintensidade
de sinal pontina para-mediana direita.
Comparativamente, as IPD evidenciaram todas as lesões mais claramente, através
de restrição confirmada com ADC map. A seqüência FLAIR mostrou as lesões corticais
enfaticamente em apenas um paciente portador da forma esporádica e com
comprometimento preferencialmente cortical, em detrimento dos núcleos da base, e não
acusou uma lesão em núcleo caudado direito. (Figuras 5, 6 e 7)
Figura 5 A e B - Comparação entre difusão e FLAIR em paciente com comprometimento
preferencialmente cortical.
Figura 6 - Pacientes I(A eB)e III (C e D) com hiperintensidade de sinal nos núcleos da
base e córtex parieto-occipital perante a difusão. O FLAIR não mostra as lesões corticais
claramente.
Figura 7 A-C - Imagens de “ADC map” com hipointensidades de sinal nos núcleos da
base e córtex parieto-occipital, confirmando a restrição à difusão da água.
DISCUSSÃO
Realiza-se o diagnóstico definitivo da DCJ somente com biópsia e /ou necrópsia.
(1-7) Entretanto, achados clínico-eletroencefalográficos, laboratoriais e de imagem em
conjunto são característicos, apesar de não patognomônicos.
Clinicamente o diagnóstico da DCJ permanece difícil (2,4), mas classicamente
descrevem-se demência rapidamente progressiva, mais freqüente em idosos, mioclonus e
descargas periódicas sincrônicas no EEG. (1,2,5,7). Os pacientes com DCJ podem não
ter estes achados em até 25% dos casos. (1,3).
Laboratorialmente, no contexto clínico adequado, considera-se a presença da
proteína 14-3-3 no líquor (LCR) como um critério para o diagnóstico de DCJ,
apresentando alta sensibilidade (90-96%) e a maior especificidade (93-100%). (1,5)
Nos exames de RM, descreve-se a hiperintensidade de sinal difusa, bilateral e
simétrica nos gânglios da base como sinal específico de DCJ em pacientes com
demência rapidamente progressiva, tornando a RM útil para avaliação da DCJ em estágio
precoce. (1,2,4).
Os relatos iniciais sobre RM na DCJ demonstravam apenas atrofia cortical até
Gertz e col. descreveram o aumento de sinal nos núcleos da base em imagens
ponderadas em T2 em paciente com DCJ esporádica. (6,8) Desde então a literatura
confirma o achado, (1-6) atribuindo-lhe alta especificidade de 93% e sensibilidade de 6779%, principalmente por aparecerem tardiamente no curso da patologia na seqüência T2.
Também se detectou o acometimento do córtex, notadamente o do lobo occipital. (1)
A prevalência neste trabalho da forma familiar opõe-se a discrepante prevalência
da esporádica na literatura (85%). Isto se deve ao pequeno número de casos estudados
(05 casos) associado ao fato da forma familiar ocorrer em indivíduos com grau de
parentesco próximo, facilitando o rastreamento e o diagnóstico. Logo, houve um viés da
amostra, desautorizando-nos questionar a prevalência das formas da DCJ.
O acometimento preferencial do striatum de forma bilateral e simétrica, em
detrimento do tálamo e do globo pálido, condiz com a literatura (1-4,6,9). Murata & col. (2)
sugerem como causas principais desta distribuição a maior vascularização daqueles e a
mielinização mais densa nestes funcionando como barreira. É digno de nota que a
literatura atual mostra o comprometimento cortical sempre associado ao nuclear basal,
mas o inverso não foi encontrado.
Descreve-se como incomum o acometimento preferencial do córtex, em detrimento
dos núcleos da base, como aquele encontrado em um paciente.(1-3, 6, 8)O predomínio
das lesões no lobo parieto-occipital neste trabalho correlaciona-se com os dados de
literatura.
Na literatura não encontramos relatos de lesão pontina como a presente em 01
paciente estudado com a forma familiar, inferindo etiologia diferente.
Murata & col. e Urbach & col relatam importante prevalência de DCJ com achados
em T2 ausentes ou discretos o suficiente para passarem despercebidos. (2,6)
A introdução de novas seqüências de pulso como FLAIR e as imagens
ponderadas em difusão (IPD) elevaram a utilidade diagnóstica da RM na DCJ.(2) De
acordo com os resultados descritos neste trabalho, as IPD demonstraram mais lesões e
de forma mais clara que a seqüência FLAIR, sobretudo as corticais. Atribui-se isto ao fato
de que as IPD apresentam maior índice de contraste/ruído e tempo de aquisição menor,
atenuando artefatos, principalmente os de movimento, tão importantes em pacientes
portadores de mioclonus.(2)
Estabelecida a maior acurácia das IPD em relação às demais seqüências de RM,
a utilidade desta seqüência, per si, aparenta ser maior. Embora não se tenha realizado
EEG para comparar com as IPD de nossos pacientes na época do exame de RM, MaoDraayer & col. (1) relatam as IPD demonstrando hiperintensidades de sinal corticais 1-2
meses antes da presença de alterações no EEG no segmento de pacientes com
demência rapidamente progressiva e comprovadamente com DCJ.
CONCLUSÃO:
As lesões predominaram nos núcleos da base, principalmente striatum, e no córtex
parieto-occipital de forma bilateral e simétrica.
A maior freqüência da forma familiar neste trabalho deve-se ao viés da amostra,
desautorizando-nos a questionar a prevalência da forma esporádica na literatura.
Até onde sabemos, a lesão pontina presente em um caso familiar não foi descrita
na literatura como parte do espectro da DCJ, inferindo etiologia diferente para esta lesão.
As imagens ponderadas em difusão mostraram-se mais conspícuas e sensíveis
que a seqüência FLAIR para detecção das lesões e podem evidenciá-las, segundo a
literatura, antes do aparecimento de alterações no EEG. Logo, as IPD são fundamentais
para o diagnóstico precoce da DCJ.
BIBLIOGRAFIA
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