CONTOS DE TERROR E MISTÉRIO

Transcrição

CONTOS DE TERROR E MISTÉRIO
ENSINO DE GÊNEROS TEXTUAIS: UMA PROPOSTA COM O GÊNERO
“CONTOS DE TERROR E MISTÉRIO”
Daiana Campani de C ASTILHOS (Faccat-Faculdades de Taquara)
Liane Filomena MÜLLER (Faccat-Faculdades de Taquara)
ABSTRACT:This paper aims at giving an account of the results of a research based on the interaction between
Faculdades de Taquara – Faccat and the City Department of Education from Igrejinha, in RS. During the year
of 2006, municipal teachers and Faccat professors developed a research based on “terror and mystery tale” text
genre, which was put into practice with 7° grade students. The research indicates the advantages of a theoretical
conception worried about the teaching and learning of text genres instead of typological aspects. It also points
out how good the interchange between college institutions and municipal schools can be.
KEYWORDS: text genre; teaching; terror and mystery tale
1. Introdução
Neste trabalho, objetivamos relatar os resultados de uma pesquisa que se construiu na
interação entre as Faculdades de Taquara – Faccat e a Secretaria Municipal de Educação de
Igrejinha-RS1. Percebendo a necessidade de proporcionar aos professores da rede municipal
um espaço de estudos relacionados a formas de auxiliar o aluno em suas habilidades de leitura
e produção de textos, a Secretaria Municipal de Educação buscou uma parceria com o curso
de Letras da FACCAT. Esse projeto teve sua origem em 2003, nos grupos de aprendizagem,
promovidos pela Secretaria Municipal de Educação, aos professores da rede municipal, onde
foi constatada a necessidade de aprofundar as discussões sobre o processo de construção dos
conhecimentos de língua materna por parte dos alunos.
Em 2004, a SME buscou junto à Faccat o acompanhamento de profissionais do curso
de Letras. Assim, os estudos tiveram continuidade num grupo especialmente constituído com
essa finalidade, reunindo professores de todas as escolas e diferentes séries e áreas de
conhecimento, coordenados em parceria estabelecida entre a Secretaria Municipal de
Educação e o curso de Letras da Faccat. Durante esse ano e no seguinte, os estudos
centraram-se na discussão do tema “ortografia”, que era uma constante preocupação dos
professores. Vários trabalhos foram realizados, entre eles diagnóstico inicial, estudos teóricos,
elaboração de atividades de intervenção e diagnóstico final.
Em 2006, a partir de uma sugestão da Faccat, o grupo de pesquisa entrou numa
segunda fase, embasada no estudo dos diferentes gêneros textuais. O projeto foi construído
considerando os seguintes fatores: (a) os Parâmetros Curriculares Nacionais (1988) apontam
os gêneros como objeto de ensino e os textos como unidade de ensino; (b) o ensino de língua
supõe o ensino de diferentes gêneros; (c) os estudos sobre gêneros textuais parecem não
chegar ao professor da educação básica; (d) a noção de gênero de texto constitui-se uma
importante ferramenta para um trabalho com leitura e produção de textos; e (e) os resultados
da avaliação externa da aprendizagem realizada no município de Igrejinha em 2005, na área
de Língua Portuguesa, com os alunos de 5ª série, levam a pensar que uma das possíveis
causas de dificuldades dos alunos esteja na limitação do trabalho com diferentes gêneros
textuais.
1
Este trabalho contou com a colaboração especial das professoras Andrea Jaqueline Konrath e Fabiana Fischer,
da E. M. E. F. Machado de Assis, de Igrejinha-RS. Na Secretaria de Educação, as responsáveis pelo trabalho
foram Sigrid Becker e Flávia Corso.
O trabalho em questão, iniciado em março de 2006, tomou como base a proposta de
ensino de gêneros textuais em seqüências didáticas de Schneuwly e Dolz (2004). Nos
encontros do primeiro semestre, que eram realizados mensalmente, foram discutidos,
inicialmente, com os 30 professores envolvidos, textos teóricos sobre gêneros, como o de
Marcuschi (2002) e o de Schneuwly e Dolz (2004). Em seguida, foram elaboradas, a partir do
trabalho de Campani (2005), atividades para uma seqüência didática com o gênero textual
conto humorístico infantil. Já no segundo semestre, o grupo resolveu investir na preparação de
uma seqüência sobre um outro gênero, o conto de terror e mistério. São os resultados da
experiência com esse gênero textual que procuramos dividir com o leitor neste artigo.
2. Pressupostos teóricos: a contribuição de Schneuwly e Dolz
De acordo com Schneuwly e Dolz, seguidores da teoria do interacionismo
sociodiscursivo (ISD)2, é “através dos gêneros que as práticas de linguagem materializam-se
nas atividades dos aprendizes” (SCHNEUWLY E DOLZ, 2004, p. 74). Para os autores, é
dever da escola auxiliar o aluno a dominar as características específicas de determinados
gêneros de texto. Esses autores partem do pressuposto de que “comunicar-se oralmente ou por
escrito pode e deve ser ensinado sistematicamente”. E são os gêneros textuais que constituem,
para esses autores, “o instrumento de mediação de toda estratégia de ensino e o material de
trabalho, necessário e inesgotável, para o ensino da textualidade” (SCHNEUWLY E DOLZ,
2004, p. 51). Agora, como, segundo eles, o gênero deve ser trabalhado em sala de aula? Como
levar o aluno a construir as habilidades necessárias à produção de um determinado gênero de
texto? Seria por meio de um procedimento que eles denominam seqüência didática.
Uma seqüência didática pode ser definida como “um conjunto de atividades escolares
organizadas, de maneira sistemática, em torno de um determinado gênero textual oral ou
escrito”, que tem a finalidade de ajudar o aluno a dominar melhor tal gênero escolhido,
“permitindo-lhe, assim, escrever ou falar de uma maneira mais adequada numa dada situação
de comunicação” (SCHNEUWLY e DOLZ, 2004, p. 97).
Conforme esses autores, uma seqüência didática é composta de quatro partes: a
apresentação da situação, a primeira produção, os módulos e a produção final. Na
apresentação da situação, são dadas as informações necessárias para que os alunos conheçam
o projeto de comunicação que será realizado na produção final e a aprendizagem de
linguagem a que se relaciona. Ao mesmo tempo, essa parte prepara os alunos para a primeira
produção, que não deixa de ser uma tentativa de “realização do gênero” que será trabalhado
nos módulos.
A segunda etapa de uma seqüência didática é a primeira produção. Nesse momento, os
alunos tentam elaborar um primeiro texto pertencente gênero escolhido, de forma a revelar o
que eles conhecem sobre ele. Esse primeiro texto não resulta ainda em uma produção
completa, com todas as características do gênero. Tal produção tem, por isso mesmo, um
papel de “reguladora” da seqüência, tanto para os alunos quanto para o professor. Para os
alunos, mostrará o que eles já conhecem sobre o gênero e, para o professor, indicará o que ele
deverá abordar nos diversos módulos ou oficinas para auxiliar o aluno a construir aqueles
conhecimentos que ele ainda não tem sobre o gênero. Na etapa dos módulos ou oficinas, são
trabalhados, durante algumas aulas3, as características do gênero. Finalmente, na etapa da
produção final, o aluno pode pôr em prática o que construiu nos módulos: ele vai produzir o
seu texto final e poderá, em seguida, compará-lo ao seu texto inicial, percebendo os
progressos que teve durante o trabalho.
2
3
As idéias da teoria do ISD podem ser encontradas, entre outros trabalhos, em Bronckart (1999).
O tempo de duração das oficinas e da seqüência fica a critério do professor.
3. A modelização do gênero
Após estudar essa proposta de trabalho, nosso grupo passou a organizar a construção
da seqüência didática sobre o gênero escolhido para os alunos de 7ª série do referido
município. Para isso, foi necessária uma pesquisa sobre o gênero em questão. Ele foi
escolhido devido ao desejo dos próprios alunos, que revelaram interessar-se por terror e
mistério. Após uma seleção de textos feita por todo o grupo, começaram a surgir os primeiros
desafios: quais seriam, de fato, as características do gênero? O que poderíamos chamar de
histórias de terror e mistério?
Logo de início, descartamos todas as narrativas relacionadas à solução de misteriosos
assassinatos, que pertencem à literatura policial. Porém, algumas dúvidas persistiram: essas
histórias teriam como característica básica a presença do elemento sobrenatural? Ou seriam
elementos fundamentais os crimes cometidos por personagens doentias, obsessivas,
fascinadas pela morte? O próprio nome do gênero suscitou questionamentos: “contos de
terror”, “contos de mistério”, ou “contos de terror e mistério”? Embora alguns autores façam
uma distinção entre esses elementos, a partir das discussões das oficinas, considerando
questões pedagógicas e a série a que se destinava o trabalho, resolvemos proporcionar aos
alunos a leitura de textos que tivessem algum desses elementos — crimes ou elementos
sobrenaturais — ou os dois juntos. Entendemos que as duas situações suscitam no leitor
sustos, horror e medo e levam-no a refletir sobre situações além da vivência cotidiana ou da
imaginação (NICOTTI, GONZAGA E GONZAGA, 2006).
Além dessas características específicas, é importante ressaltar algumas características
que o gênero em questão possui em comum com outros gêneros mais próximos a ele: o
gênero em questão, de acordo com a proposta de Schneuwly e Dolz (2004) pertencente ao
agrupamento do narrar, que se relaciona à cultura literária ficcional. O gênero, como as
demais narrativas ficcionais, apresenta uma seqüência narrativa de ações imaginárias como se
fossem reais, envolvendo personagens em um determinado tempo e em um determinado
espaço. Entretanto, é preciso ressaltar que a construção das descrições espaciais, nesse caso,
tem um papel crucial para a sugestão do clima de mistério e suspense.
De acordo com Gotlib (1985), o conto é uma forma narrativa breve, em que o autor
economiza meios narrativos, mediante, por exemplo, contração de impulsos e condensação de
recursos. Todos os elementos que não estiverem relacionados à conquista do efeito único para
atrair a atenção do leitor devem ser suprimidos. Ainda de acordo com autora, a brevidade,
característica presente em todas as tentativas de definição do conto, não tem a ver
propriamente e simplesmente com o tamanho do texto. A questão estaria ligada, sim, a
provocar ou não impacto no leitor. Assim, para a autora, a base diferencial do conto é a sua
contração: a condensação da matéria para que apenas os melhores momentos sejam
apresentados.
4. A construção das oficinas
Para a construção das oficinas, combinamos que o trabalho realizado não seria,
necessariamente, o mesmo para todas as professoras. Todas realizariam as produções inicial e
final, mas as oficinas poderiam ser diferenciadas. Entretanto, sugerimos algumas atividades
que abordariam os seguintes aspectos:
-
fatos narrados/seqüência narrativa (elemento sobrenatural; crimes perversos)
personagens;
espaço;
tempo;
-
narrador.
Dentre esses elementos, detivemo-nos no estudo relativo ao espaço e à descrição dos
personagens dentro do gênero, devido ao importante papel que esses elementos ocupam no
gênero em estudo. As atividades realizadas estão em anexo.
Outras duas atividades interessantes, que foram aplicadas com os professores, foram a
técnica de motivação e a de criação de contos de terror e mistério em grupos. Como técnica de
motivação, propusemos a leitura de um texto de terror, ao som de uma música clássica, que
suscita suspense, por um leitor caracterizado de fantasma, segurando uma vela.
5. Resultados parciais
Ao final do ano, reunimos o grupo para a avaliação do projeto e verificação dos
possíveis progressos dos alunos. Buscamos, para isso, textos de alunos e depoimento dos
professores que aplicaram as atividades. Apresentamos, nesse momento, o depoimento das
professoras Andrea e Fabiana sobre a experiência de aplicação das propostas em sala de aula:
Após estudarmos a diferença entre tipo e gênero, percebemos que, quando
trabalhávamos em sala de aula com a tipologia textual, os alunos produziam bons
textos, porém parece-nos que faltavam alguns elementos para que as produções
apresentassem as características desse texto.
No entanto, ao trabalharmos com gênero, observamos que os alunos tiveram
uma melhora significativa, tendo mais facilidade ao escrever, pois os elementos de
determinado gênero ficavam mais explícitos porque havia um trabalho específico
sobre o gênero em estudo.
O gênero escolhido pelo grupo foi o conto de terror, que é um gênero que
desperta grande interesse por parte dos alunos, principalmente nos adolescentes.
Seguimos os seguintes passos: primeira produção, escolha de textos, criação e
aplicação de atividades. Após a aplicação das atividades, os alunos realizaram
uma segunda produção textual, onde conseguiram escrever um texto melhor do que
o primeiro, pois tiveram um esclarecimento sobre o conto de terror: características
do personagem, espaço, ações...
Um dos principais progressos a que as professoras se referem no depoimento podem
ser percebidos nos excertos de textos dos alunos abaixo reproduzidos:
Aluna P., produção inicial:
Num belo dia, quatro amigos foram até um campo de futebol. Michel era um
cara muito esperto, pouco medroso, já Paulo era corajoso, forte e inteligente. [...]
Aluna P., produção final:
Numa tarde de chuva, Maria queria ir ao mercado, pois precisava comprar
pães. Lá foi ela. Pegou algumas moedas e foi ao porão sem luz, frio, misterioso
pegar seu guarda-chuva, fechou a casa por inteiro. [...]
Aluna J., produção inicial:
Era um dia lindo Taís e seu namorado sairam para acampar, foram no sitio do seu
vô.
Era uma casa linda com um pátio enorme e uma piscina, encontraram na casa e
foram para seu quarto e Taís disse:
Ui! que quarto sinistro, parece que tem asombração. [...]
Aluna J., produção final:
Uma velha comprou um sítio, era uma casa assombrada, com uma grande
varanda envidraçada e um jardim.
Era um sítio que todo mundo falava que era mal-assombrada, mas ela nem se
importava pelo que os outros falavam dela. [...]
A partir desses excertos, percebemos um claro progresso da produção inicial para a
final, uma vez que os alunos conseguiram, na produção final, sugerir um tom mais misterioso
e aterrorizante já a partir dos primeiros parágrafos. Na produção inicial das alunas P. e J., os
fatos se passavam em um dia “belo” e “lindo”, talvez lembrando características de outros
gêneros a que eles estavam acostumados, como os contos de fadas, por exemplo. Outro
aspecto nesse sentido diz respeito a um possível início estereotipado do “tipo” de texto
narrativo, o mais explorado na escola. Provavelmente, para os alunos, todo texto narrativo
deveria começar com “era uma vez, num belo dia”. Já na produção final, o dia não era lindo e
percebe-se que há um direcionamento espacial e temporal que, já no início do texto, conduz à
criação de um clima de terror e mistério (casa assombrada, porão sem luz, tarde de chuva).
Quanto a esses aspectos, vejamos o depoimento de duas alunas sobre a experiência:
Na primeira produção realizada, quando a professora pediu que escrevêssemos
um conto de terror, logo pensei no lobisomem, lembrei da lenda. Vi que seria difícil
escrever, pois não sabia nem como começar.
Depois a gente trabalhou com os contos de terror, vi como são os personagens,
o lugar onde acontece a história e as partes que tem que ter.
Achei legal, pois além de trabalhar os contos, produzir meus textos, também fiz
uma trilha do terror, um jogo com os elementos do conto (personagens, espaço,
objeto...) (Andressa)
Quando eu fui escrever o meu texto, logo pensei no filme do “Drácula” e no
“Premonição” que me inspirou para escrever. Porém eu achei difícil de fazer,
porque não tínhamos estudado o que era um conto de terror. É ruim quando não
temos muitas informações sobre o que escrever e de que maneira.
Quando escrevi o segundo texto, tive mais facilidade porque sabia exatamente o
que escrever. Gostei muito, conto de terror é um barato! (Francine)
Essa questão da inspiração em filmes ou em lendas para a primeira produção a que as
meninas se referem pode ser percebida claramente no texto abaixo, produção inicial da
menina D:
Uma linda manhã de sol na escola Maria Dolaral as alunas Luisa, Emily e Samara
estavam copiando o tema quando caiu um aviãozinho de papel em sua classe, no
aviãozinho estava escrito “Eu sei o que você fez no verão passado”. Passou 3
semanas e os bilhetes não paravam de chegar, cada dia com uma coisa diferente.
[...]
Já nas produções finais, isso não mais ocorreu, já que os alunos, a partir das atividades
propostas pelas professoras, souberam criar espaço, tempo, personagem e ação conforme as
características do gênero estudado, o que comprova que os alunos, conhecendo o gênero, vão
conseguir lançar mão de sua criatividade, sem precisar recorrer a estereótipo.
6. Considerações finais
Com o término desta etapa da pesquisa, verificamos a pertinência de trabalhos que
nasçam da interação entre uma instituição de ensino superior e a escola de educação básica. É
importante que as IES façam a ponte entre pesquisas acadêmicas recentes e o trabalho em sala
de aula, o que, efetivamente, aconteceu nessa experiência, com o envolvimento ativo dos
professores do município de Igrejinha, coordenados pela equipe da SME, que buscou os
subsídios teórico-práticos com a Faccat. Alguns desafios permanecem, como a percepção de
que é preciso trabalhar ainda mais a questão da seqüência narrativa, de modo que o aluno
concentre-se em apenas um conflito e resolva-o, sem criar série de acontecimentos sem
relações de causa e efeito. Também é importante o grupo de professores da escola reunir-se
para montar um programa de progressão de gêneros, a fim de estabelecer critérios que
deverão levar em conta os graus de complexidade e de exigência da tarefa, conforme a série a
que se destina.
ANEXOS
RECADO DE FANTASMA
Flávia Muniz
Tudo começou quando nos mudamos para aquela casa. Era um antigo sobrado, com uma
grande varanda envidraçada e um jardim. Eu me sentia tão feliz em morar num lugar espaçoso
como aquele, que nem dei atenção aos comentários dos vizinhos, com quem fui fazendo
amizade. Eles diziam que a casa era mal-assombrada. Alguns afirmavam ouvir alguém
cantando por lá às sextas-feiras.
— Deve ser coisa de fantasma! — falavam.
— Se existe, nunca vi! — E então contava a eles que as casas antigas, como aquela, com
revestimentos e assoalho de madeira, estalam por causa das mudanças de temperatura. Isso é
um fenômeno natural, conforme meu pai havia me explicado. Mas meus amigos não se
convenciam facilmente. Apostavam que mais dia menos dia eu levaria o maior susto.
Certa noite, três anos atrás, aconteceu algo impressionante. Meus pais haviam saído e eu
fiquei em casa com minha irmã, Beth. Depois do jantar, fui para o quarto montar um quebracabeça de 500 peças, desses bem difíceis.
Faltava um quarto para a meia-noite. Eu andava à procura de uma peça para terminar a
metade do cenário quando senti um ar gelado bem perto de mim. As peças espalhadas pelo
chão começaram a tremer. Vi, arrepiado, cinco delas flutuarem e depois se encaixarem bem
no lugar certo. Fiquei tão assustado que nem consegui me mexer. Só quando tive a impressão
de ouvir passos se afastando é que pude gritar e sair correndo escada abaixo. Minha irmã
tentou me acalmar, dizendo que tudo não passava de imaginação, mas eu insisti e implorei
que ela viesse até o quarto comigo. Uma segunda surpresa me esperava: o quebra-cabeça
estava montado, formando a imagem de uma casa com um jardim bem florido. No entanto,
meu jogo formava o cenário de uma guerra espacial, eu tinha certeza!
No dia seguinte, fui até a biblioteca pesquisar o tema. Eu e Beth encontramos dúzias de
livros que tratavam de fatos extraordinários e aparições.
E a explicação para eventos desse tipo foi a seguinte:
-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------*
Hoje minha casa tem o jardim mais bonito da rua. Centenas de lindas margaridas
brancas florescem a maior parte do ano (para total espanto da vizinhança). O fantasma?
Nunca mais vi. Decerto passeia feliz pelo jardim, nas noites de lua cheia.
*Espaço reservado para a imaginação da turminha
SUGESTÃO DE EXERCÍCIOS – TEXTO “RECADO DE FANTASMA”
1- O início do texto apresenta-nos a descrição do antigo sobrado. No primeiro quadrinho, escreva as
informações que o texto nos indica sobre esse local. No segundo, desenhe como você imagina ser esse
sobrado.
______________________
______________________
______________________
______________________
______________________
______________________
______________________
______________________
______________________
2- O sobrado passa por uma transformação depois dos fatos ocorridos. Faça o mesmo que no exercício
anterior, porém agora contemplando a descrição do local feita ao final do texto.
______________________
______________________
______________________
______________________
______________________
______________________
______________________
______________________
______________________
3- Que características do personagem principal podemos perceber no texto? Escreva-as nos quadrinhos
abaixo, justificando cada característica dada com passagens do texto.
Característica:_________________
Passagem do texto:
___________________
___________________
___________________
___________________
___________________
Característica:_________________
Passagem do texto:
___________________
___________________
___________________
___________________
___________________
4- No texto, não encontramos o nome do personagem principal. Que nome você daria a ele? Por quê?
5- Quem narra a história? O narrador é em 1a. ou em 3a. pessoa? Justifique.
6- Ordene os fatos do texto. Em seguida, represente esses momentos em forma de desenho.
( ) O quebra cabeça aparece montado.
( ) O personagem muda-se para um antigo sobrado.
( ) O personagem monta o quebra-cabeça e as peças começam a tremer. Cinco delas encaixam-se no
lugar.
( ) O personagem e Beth vão à biblioteca pesquisar.
( ) Beth tenta acalmar o personagem.
1-
2-
3-
4-
5-
7- O texto apresenta fatos em seqüência. Complete o quadro abaixo de modo a resumir os
acontecimentos narrados.
O personagem muda-se para um velho casarão.
Beth tenta acalmar o personagem principal.
O personagem principal e Beth vão à biblioteca pesquisar.
8- Reescreva o quinto parágrafo do texto como se o narrador fosse:
a) a mãe do personagem principal:
b) a irmã do personagem principal:
9- Por que, no segundo e no terceiro parágrafo, usa-se o travessão? De quem são aquelas vozes?
10- Quanto tempo se passa desde o momento em que o fato impressionante aconteceu até o momento
em que o narrador conta os fatos?
11- O que, na sua opinião, era o “ar gelado” que o narrador sentiu bem perto de si?
12- Faça um levantamento de todos os fenômenos sobrenaturais que são mencionados no texto.
13- Explique o título do texto.
TRABALHANDO O ESPAÇO NAS HISTÓRIAS DE TERROR E MISTÉRIO
Nas histórias de terror e mistério, o espaço em que ocorrem os fatos narrados é muito importante
e contribui de maneira significativa para sugerir ao leitor o suspense e o mistério que o autor deseja
criar. Observe o fragmento abaixo, do conto “Venha ver o pôr-do-sol”, de Lygia Fagundes Telles:
“Ela subiu sem pressa a tortuosa ladeira. À medida que avançava, as casas iam rareando,
modestas casas espalhadas sem simetria e ilhadas em terrenos baldios. No meio da rua sem
calçamento, coberta aqui e ali por um mato rasteiro, algumas crianças brincavam de roda. A débil
cantiga era a única nota viva na quietude da tarde.
(...)
– Podia ter escolhido um outro lugar, não? – Abrandara a voz. – E que é isso aí? Um cemitério?
Ele voltou-se para o velho muro arruinado. Indicou com o olhar o portão de ferro, carcomido
pela ferrugem.”
1- Procure, nesse fragmento, verificar como o narrador caracteriza:
a) A ladeira: .........................................................................................................................
b) As casas: .........................................................................................................................
c) Os terrenos: .....................................................................................................................
d) A rua: ..............................................................................................................................
e) O mato: ............................................................................................................................
f) A cantiga: ........................................................................................................................
g) O muro do cemitério: .....................................................................................................
h) O portão de ferro: ...........................................................................................................
2- Agora, compare a descrição apresentada no primeiro exercício com a seguinte e, após, faça o que se
pede:
“Ela subiu sem pressa a bela ladeira. À medida que avançava, as casas iam ficando mais luxuosas. No
meio das ruas asfaltadas e seguras, as crianças brincavam tranqüilamente naquele belo dia de sol. A
animada cantiga misturava-se ao som dos pássaros e do movimento das árvores.”
a) Desenhe como você imagina o espaço em que ocorrem as ações narradas a partir das duas
descrições feitas:
Descrição 1:
Descrição 2:
b) O que você percebe comparando essas duas descrições? Qual delas sugere maior mistério desde o
início ao leitor? Por quê?
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
c) O que você concluiu, então, sobre a descrição do espaço nas narrativas de terror e mistério?
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
3- Nos fragmentos abaixo, procure dar às descrições de espaço um tom de maior mistério,
completando as lacunas4:
a) A tempestade ..................................................... durante toda ............................, mas nada digno de
nota ocorreu. Na manhã seguinte, porém, quando eles desceram para o ..............................,
encontraram novamente a .................................... no................................ (“O fantasma de
Canterville”).
b) Às onze horas a família recolheu-se e meia hora depois todas as luzes..........................................
Passado algum tempo, o Sr. Otis foi despertado por um ...................... no..............................., do lado
de fora de................................. (“O fantasma de Canterville”).
c) Numa das ruas que davam na pracinha de Belém, na antiga cidade de Huaraz, havia uma casa dos
tempos coloniais que sempre estava ............................... e que vivia cercada de..............................
Diziam que estava repleta de ..................................., que era uma casa............................... (“O tesouro
enterrado”)
d) Os amigos o deixaram na frente do lugar e foram embora. No terreno vizinho, havia
um...................... e, na frente, um..........................................Néas entrou na casa. Logo,
............................ O lugar era........................, fedendo a .............................. Havia ................ em todos
os lugares e, quando olhava para algum lado, via...................................... e ouvia....................................
(“A velha casa”).
e) O céu estava ................................................................................................................. Manezinho
apressou o passo na estrada................... meio sem saber o que fazer. Tinha pegado uma carona até o
trevo e agora caminhava em direção à cidade que se escondia do lado de lá na pequena montanha. (“O
casal de velhos”).
3- Agora faça o contrário. Reelabore os fragmentos abaixo, tirando a sua sugestão de mistério.
a) Nessa mesma noite, enquanto Maria Angula e o marido dormiam, escutaram-se uns gemidos nas
redondezas. Ela acordou sobressaltada. O vento zumbia misteriosamente nas janelas, sacudindo-as, e
de fora vinham uns ruídos muito estranhos, de meter medo a qualquer um. (“Maria Angula”).
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
b) Pararam diante de uma capelinha coberta de alto a baixo por uma trepadeira selvagem, que a
envolvia num furioso abraço de cipós e folhas. A estreita porta rangeu quando ele a abriu de par em
par. A luz invadiu um cubículo de paredes enegrecidas, cheias de estrias de antigas goteiras. (“Venha
ver o pôr-do-sol”).
4
Os dois primeiros excertos foram adaptados do texto de Oscar Wilde, e os demais foram retirados de contos da
obra de Gonzalez (1998).
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
4- Às vezes, um espaço aparentemente simples pode transformar-se em um local de muito mistério. A
partir do desenho abaixo, construa um cenário para uma possível história de terror e mistério. Em
seguida, descreva este cenário.
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
5- Muitas vezes também um simples ato de um personagem, como um encontro amoroso, uma noite
de sono ou uma refeição, por exemplo, podem suscitar muito mistério. Transforme os seguintes atos
dos personagens em ações de muito mistério, a partir da descrição de espaço que sugira esse mistério.
a) Uma menina precisa ir comprar pão.
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
b) Um garoto vai ao treino de futebol.
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
Referências
BRONCKART, Jean Paul. Atividade de linguagem, textos e discursos. São Paulo: Educ,
1999.
CAMPANI, Daiana. Questões para além da didatização do gênero: um olhar para o ensino de
pontuação em seqüência didática sobre o gênero textual conto humorístico infantil.
Dissertação de Mestrado. São Leopoldo: UNISINOS, 2005.
GONZALEZ, Neide T. Maia (Org). Contos de assombração. São Paulo: Ática, 1998.
GOTLIB, Nádia Batella. Teoria do conto. São Paulo: Ática, 1985.
MARCUSCHI, Luiz Antônio. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONÍSIO,
Ângela Paiva, MACHADO; Anna Rachel, BEZERRA; Maria Auxiliadora. Gêneros textuais e
ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2002, p. 19-36.
MUNIZ, Flávia. Recado de fantasma. Nova Escola: Edição Especial – Contos para crianças e
adolescentes. n. 153. São Paulo: Abril, jun-jul 2002.
NICOTTI, João Armando; GONZAGA, Sergius; GONZAGA, Pedro (Org.). Contos de
misterio e morte. Porto Alegre: Leitura XXI, 2006.
SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim et al. Gêneros orais e escritos na escola.
Campinas: Mercado das Letras, 2004
Texto publicado no CD do 4º SIGET, Simpósio Internacional de Estudos de Gêneros Textuais, em Tubarão, SC,
em agosto de 2007.