combate, 30 anos de paixão.

Transcrição

combate, 30 anos de paixão.
COMBATE, 30 ANOS DE PAIXÃO.
algumas paixões duram para sempre,
como esta,
que em minha vida é eterna...
dedico a
Dóris, Cynthia e Gabriela.
PARTE I
O COMBATE AMA.
Capítulo 1 – O início.
Competição de combate é uma prova em que dois aeromodelos voam simultaneamente num
mesmo círculo, por um tempo pré determinado, com o objetivo de cortar uma fita de papel
crepom fixada atrás da linha centro-longitudinal do modelo adversário...
Corria o ano de 1969, mês de agosto, o homem acabara de pisar na Lua com a Apolo 11, eu
treinava o vôo de dorso com um Tamanco B tracionado por um “potente” WB 2,5, a vida
seguia seu rumo e o aeromodelismo de VCC engatinhava na cidade de Santos, litoral de
São Paulo.
Nosso grupinho era pequeno, e se degladiava em fazer voar modelos que não eram
ajudados pelos motores nacionais da época, os WB, fabricados no interior do Paraná, na
cidade de Apucarana.
Ouvíamos falar das novidades sempre vindas da capital que, felizmente, para nós, era bem
pertinho, era só subir a serra, cerca de 50 minutos de carro, e já seguíamos para a Mobral
ou Aero Brás, onde adquiríamos material e ficávamos por dentro das novas e de datas de
provas, até então só pra assistir, claro.
Fiquei sabendo que no dia 16 de agosto, um sábado, iam ter duas provas no Ibirapuera,que
nem inaugurado ainda fôra mas já estava em pleno uso. Seriam duas provas de combate,
uma modalidade que na capital já estavam praticando, muito timidamente.
Dia 16, lá estava eu, um calor forte, o Ibirapuera estava lindo, e com bastante público.
Estavam programadas duas provas de combate, uma AMA, que a gente já ouvira falar, e
um tal de FAI.
Com o tradicional “jeitinho”, consegui entrar nas pistas e fui olhar as asas de pertinho. De
cara notei uma coisa que me chamou muito a atenção, as asas em nada se pareciam com os
modelos das Revistinhas da Aéro Brás para combate AMA, a Pirata, o Sabre, e o Jaguar da
Hobbylandia.Conversei então com um senhor que estava participando das provas, que mais
tarde se tornaria um grande amigo e meu maior concorrente em São Paulo, o Paschoal Del
Boni. Ele me explicou que essas asas eram todas plantas americanas e que ninguém ali no
meio usava aqueles modelos nacionais. Todo mundo ali usava o mesmo desenho, uma tal
de VOO DOO que também eu iria usar às dúzias num futuro bem próximo.
Naqueles dias as asas eram enteladas ou com papel silks pan ou com tecido (organza ou
musseline de nylon). Ele me ensinou a técnica de entelagem com os tecidos, eram super
resistentes, mas ficava bem mais pesada que o papel, pois precisava de umas 6 ou 7 demãos
de dope para tapar todos os furos dos tecidos. Todos ali estavam competindo no AMA, não
apareceu ninguém para fazer combate FAI. Paschoal me informou que essa modalidade era
para motores .15 e cabos de 15 metros, mas que ninguém havia se entusiasmado. Lembrome muito bem que um dos organizadores das provas disse na ocasião:
— A Federação Paulista deveria eliminar essa modalidade do seu calendário.
O que realmente acabou acontecendo, as provas FAI só retornariam com força mesmo em
1976, 8 anos depois, já na era FAI sacramentada pelo Nutini, com regulamentos editados
pelo DEFER e tudo o mais, e com o fim do combate AMA no Brasil. Eu tenho certeza
absoluta que nosso clube de Santos, a USM (União Santista de Modelismo), foi o grande
responsável pelos anos dourados do AMA no Brasil, pois formaríamos grandes pilotos e
realizaríamos provas memoráveis na pista da Ponta da Praia.
Naquele dia no Ibirapuera, não deu pra ver um único combate, porque simplesmente
eles não existiram, em toda a prova não teve um corte sequer. Os motores não davam
partida, e o tempo acabava estourando, ou quando um pegava, o outro não.Quando subiam
logo descarburavam, com os cabos trançando, modelos quebrando, uma lástima.
O resultado da prova foi:
1 – Paschoal Del Boni
2 – Michel Peregny
3 – Hans Friedrich
4 – Antonio Arcangelo
Competiram ainda: Samuel Garcia, Orlando Almeida, Adalberto Borges, Conrado Seródio
(que logo abandonaria o combate para se dedicar à acrobacia) e Abaeté Sperandio.
Três pessoas naquele dia me chamaram muito a atenção, apesar do desastre daquela prova,
e eu passaria a conviver com elas durante muito tempo: Paschoal Del Boni, e dois jovens
irmãos gêmeos franceses, Michel e Ernest Peregny. Michel pilotava e Ernest era seu
mecânico, ninguém mexia nas asas do Michel, só seu irmão. Somente uns dois anos mais
tarde é que convenceríamos o Ernest a pilotar também.
Apesar de não ter visto um combate digno de nota, a idéia me fascinou, eu queria fazer
aquilo. Desci para Santos com uma planta da tal VOO DOO, tudo que pude ver nas asas na
cabeça, e com um esboço do regulamento no verso da planta.
Pronto, eu estava infectado, e sabia que enquanto praticasse o VCC o vírus nunca mais me
abandonaria.
Capítulo 2 – Aprendendo a voar asas.
Os meses seguintes em Santos foram intensos, começamos a voar todos com o mesmo
modelo, a asa voadora Pirata da Aéro – Brás, em função da facilidade de se construir, pois
era só adquirir o kit. Construímos 04. Eu com um FOX 35, o César Delamonica com um
FOX 35, o Gianpaolo com um FOX 36 X, e o Dirceu com um Enya 35. Começamos a
entender que voar uma asa era uma coisa relativamente fácil, difícil era fazer voar rápido, e
carburada do início ao final. Entendi então que naquela prova do Ibirapuera o grande vilão
era o mesmo que nos atormentava, o tanque!!! O tanque da Pirata era horroroso, era uma
caixa totalmente retangular, e pra complicar os motores eram aspirados. Foi então que
tivemos nosso primeiro impulso, no início de 1970 tivemos a graça de conhecer dois
grandes personagens da história do aeromodelismo santista, Athayde Lopes, um
publicitário de uma visão espantosa que era também artista plástico e se apaixonou pelo
vôo a cabo, pelas suas mãos conseguimos a tão sonhada pista e também nos colocou em
contato com o maior aeromodelista que conheci, o saudoso João Jaime Mônaco.
Aí as coisas começaram a caminhar, e a clarear. Passamos a freqüentar a residência do
Mônaco quase todas as noites, e ele tinha a maior paciência, às vezes eram três ou até
quatro “pentelhos” ao mesmo tempo querendo aprender, e ele parava a construção de seus
modelos de Team Racing ou de R/C para nos ensinar. E a lição número um foi exatamente
o tanque, para suportar as manobras rápidas sem perder o giro os motores não podiam ser
aspirados, precisavam ter um auxílio que era a pressurização, parece óbvio, não? Mas
lembrem-se que era início de 1970, aqui no Brasil estávamos engatinhando no tal combate.
Foi então que eu tomei ferro pela primeira vez, como pressurizar um velho FOX 35?
Motores como o FOX 36 X, e o ENYA 35 tinham o pressurizador que era instalado na
tampa do carter. Os jovens com os modelos pressurizados começaram a andar muito
melhor, mas então surgiu outro problema. Os tanques da Aéro Brás não agüentavam a
pressurização, a solda abria e era uma festa. Mônaco passou a desenhar os tanques para nós,
com duas ou com quatro saídas, com abafador ou sem abafador interno, ensinou tudo sobre
solda, o melhor ferro, o melhor latão, a melhor solda, etc;etc;etc. Tratei logo de conseguir
um motor melhor, e comprei um ENYA 35. Ele era lindo, uma verdadeira jóia, vinha com
03 venturis de plástico um com o diâmetro interno maior que o outro. Usava o venturi 3
pressurizado e o Mônaco nos ensinava a preparar as hélices da Aéro Brás (9X6,9X7).
Caras acreditem, a Pirata voava!!!
Nesse meio tempo, Athayde já tinha fundado pra nós a União Santista de Aeromodelismo,
que durou de julho de 1970 a dezembro de 1975, e em meados de 1970 uma grande loja de
brinquedos da cidade, a FERNANDO’S BRINQUEDOS criou um departamento de
aeromodelismo, com seu proprietário e seu filho mais velho aderindo de cabeça ao esporte.
Eu já estava voando bem, já tinha ganhado várias provas de acrobacia e o Fernando, dono
da loja, resolveu me patrocinar. O Mônaco achou que já era hora da gente aposentar as
Piratas, partir para a VOO DOO, e subir a serra.
Capítulo 03 – As asas VOO DOO.
As notícias de São Paulo chegavam pra gente por meio do Mônaco, não tinha nada de novo
que a gente não soubesse e não tivesse acesso também. O pessoal de lá usava a VOO DOO,
mas tinham motores melhores que os nossos, eles todos usavam FOX 36 X, e o FOX 36 X
BB.
Em 21 de setembro de 1969, fomos a São Paulo assistir a mais uma prova de combate, na
pista da Mooca. Todos os competidores estavam usando a VOO DOO. Tivemos sorte,
nesse dia vimos alguns combates. O Valdir Mônaco, filho de nosso grande amigo
competiu, mas ficou claro que o negócio dele era Team Racing mesmo.
O resultado ficou assim:
1º Michel Peregny
2º Paschoal Del Boni
3º Valdir Mônaco
4º Jorge Arakelian
Nessa prova conheci o sr. José Arakelian, outro que se tornaria um grande amigo meu, ele
era mecânico do filho e brigavam mais do que o pessoal combatia.
Viramos as VOO DOO do avesso de tanto fuçar as asas. Voltamos pra Santos com muitas
idéias e anotações, íamos finalmente começar a voar com as famosas asas VOO DOO.
Tivemos um complicador para iniciar a construir as VOO DOO, seu bordo de ataque era
um bloco de balsa já com perfil e ranhuras para encaixe das nervuras, isso no kit era ótimo,
mas construir o tal bordo era complicado pois tratava-se de um modelo para combate, que
podia durar apenas um vôo, não era como um F2B que durava anos, ou seja perdia-se muito
tempo selecionando uma vareta de balsa de 2,5x2,0 cm, dando o perfil da planta, além de
ser caro para quebrar na primeira prova, ou até mesmo nos treinos. Ela não tinha varetas em
cima e embaixo das nervuras, mas apenas uma de 6x6 cm que atravessava as nervuras no
meio, cerca de 2/3 da largura da asa. Só possuía chapeado no centro, de um lado cobria o
balancim e do outro cobria o tanque. Dois garfos de compensado 3 mm sustentavam o
profundor. Só muito tempo pra frente, com o José Celio Pinho praticando combate e dono
da Mobral é que as coisas iriam melhorar na construção das VOO DOO. Primeiro ele
colocaria os bordos de ataque prontinhos pra nós na sua loja e depois faria o kit completo.
A asa voava pra caramba, muito ágil e bastante rápida.
Com as VOO DOO iniciamos os campeonatos, e o primeiro combate AMA a ser realizado
em Santos não teve nenhum participante de fora. A prova teve a direção do Mônaco, que se
tornaria nosso eterno diretor de provas, simplesmente dirigiu todas as provas de combate
realizadas em Santos, um verdadeiro recorde!!!
Fevereiro de 1970, debaixo de um calor abrasador tivemos nossa primeira prova que foi
muito superior àquela primeira que eu assistira em São Paulo em 1969. Tivemos vários
combates, e já as primeiras lenhas no asfalto. Ficou assim nosso primeiro campeonato de
combate AMA:
1º Eduardo Belmonte
VOO DOO
ENYA 35
2º César Roberto Delamonica
VOO DOO
FOX 35
3º Marcus Lubliner
VOO DOO
OS MAX 35
4º Mario Augusto Martinez
VOO DOO
ENYA 35
Competiram também nesse dia: Pablito, Jairo, e Nelsinho, todos com VOO DOO.
Aqui agora vai uma nota digna de registro, o competidor Jairo apareceu com um motor que
assombrou todo mundo naquele dia, um tal de SUPER TIGRE G 21/35. No ano seguinte
(1971), nós de Santos iríamos adotar esse motor até o fim do combate AMA no Brasil.
Capítulo 04 – 1971 o ano do TIGRE.
Meu grande amigo Gianpaolo Canepa é filho de italianos, e nas décadas de 60 e 70 a cada
dois anos a família ia para a Itália passar as férias de julho, bem nessa época nós já
estávamos desesperados pra conseguir aquele motor do Jairo que com certeza seria um
divisor de águas, e o dito cujo era fabricado em Bolonha, na Itália. Gian já fazia parte do
nosso grupo, voava uma Pirata com um FOX 36 X.
Ele aproveitou aquela viagem e foi até a fábrica, comprou vinte motores, desses vinte, doze
eram G 21/35, e ainda uma grande quantidade de peças de reposição.
A gente tinha definitivamente montado junto com o pessoal de São Paulo o “circo” do
combate AMA no Brasil.
Mais duas provas caseiras e nosso time estava formado:
Eduardo Belmonte
Gianpaolo Canepa
José Célio Pinho
Fernando Nunes Cunha
César Roberto Delamonica
SUPER TIGRE G 21/35
SUPER TIGRE G 21/35
SUPER TIGRE G 21/35
FOX 36 X BB
SUPER TIGRE G 21/35
Quem conhece o Célio há mais tempo deve estar se perguntando porque ele foi fazer parte
do pessoal de Santos se residiu em São Paulo a vida toda? Acontece que sua esposa, a
Rose, era de Santos, então todo final de semana o Célio descia a serra pra casa da sogra e
treinava com a gente. E a gente treinava, voávamos todo sábado e domingo, e fazíamos
combates verdadeiros treinando. O Célio sempre foi muito atentado, um belo dia eu ia fazer
um vôo com o César. Os dois com G 21/35, o Célio vai lançar minha asa e quando dou
sinal para largar, ele rapidamente vira a asa e solta em dorso.
O pior é que ele gostou da brincadeira e de vez em quando surpreendia a gente com o
lançamento de dorso. Esse é o Célio.
Quando começamos a competir fora de Santos, a gente estava sempre vencendo, eu, o Gian
e o Célio nos alternávamos na primeira colocação, e diversas vezes fazíamos a final
entre nós, nas pistas de São Paulo.
A superioridade dos G 21/35 era tão grande que o pessoal de São Paulo começou a buscar
alternativas, que partiram do José Arakelian. Na dificuldade de conseguir os SUPER
TIGRE, o velho Araka radicalizou, mandou vir dos Estados Unidos uma cacetada de K&B
TORPEDO 40 e dividiu entre seu filho e o Paschoal Del Boni. Credo, vocês precisavam ver
um combate entre o Jorge Arakelian e o Célio, ou entre o Paschoal e eu, ou ainda entre o
Célio e o Gian. E ainda tinha o terceiro time, também de São Paulo, dos gêmeos Michel e
Ernest, sempre fiéis ao FOX 36 X BB. Eles tiravam bastante potência dos FOX, pois só
rodavam com nitrometano, usavam o FOX MISSILE MIST como combustível. Ainda nas
férias de julho, os irmãos também viajaram para Nova York e trouxeram um modelo novo,
a BIG IRON, ela voava tão bem quanto a VOO DOO, e seu bordo de ataque era uma vareta
simples chapeada em cima e embaixo, mas os gêmeos franceses jamais cederam a planta
pra ninguém.
Até aquele ano os SUPER TIGRE ainda não tinham penetração nos Estados Unidos, na
verdade foi somente depois que Terry Prather desenhou a WINDER para o G 21/35 é que
eles começaram a invadir a América, de onde nunca mais saíram. Sobre essa asa, vou falar
um pouco mais pra frente.
O ano de 1971 foi pródigo para os poderosos G 21/35, pois além de reinarem absolutos no
combate AMA eles eram imbatíveis no RAT RACING.
Os dados técnicos do equipamento utilizado pelos pilotos “Top de Linha” eram:
MODELO
VOO DOO
ENTELAGEM MOTOR
TANQUE
HÉLICE
Papel Silkspan
SUPER TIGRE 4
saídas 9X7 de madeira
G 21/35
pressurizado
O combustível variava muito de piloto para piloto, mas posso citar alguns exemplos para
enriquecimento dos fatos:
Eduardo Belmonte : 4 partes de metanol PA, 1 parte de óleo de rícino.
Gianpaolo : 4 partes de metanol, 1 parte de óleo de rícino.
César Delamonica : 4 partes de metanol, 1 parte de óleo de rícino, 5% de nitrobenzol.
Jorge Arakelian : 4 partes de metanol, 1 parte de óleo Castrol M, 20 a 40% de nitrometano.
Paschoal Del Boni : 4 partes de metanol, 1 parte de óleo de rícino, 20% de nitrometano.
Eu pratiquei o combate AMA de 1971 a agosto de 1976, e durante esses 07 anos só usei o
SUPER TIGRE G 21/35, creio ter usado uns 8.
Capítulo 05 – 1º Campeonato Pan Americano
Em abril de 1972 foi realizado, no Ibirapuera, o 1º Campeonato Pan Americano de
aeromodelismo, a importância da prova era tão grande que a União Santista de Modelismo
resolveu, por meio de sua diretoria, montar uma equipe para disputar a prova de combate
AMA, é claro que deu “pano pra manga”, nós tínhamos três dos melhores pilotos da
temporada, comprovados pelos campeonatos que os três já tinham levantado, mas na
ocasião eu não escondi de ninguém que eu queria ter entrado como piloto, até defendi com
unhas e dentes que nós três deveríamos entrar na prova, mas infelizmente na reunião de
Diretoria eles acharam que o Célio deveria ser o piloto e eu e Gianpaolo seríamos seus
mecânicos. Então a equipe ficou assim formada:
Chefe de Equipe: Fernando Nunes Cunha (Presidente da USM)
Piloto: José Célio Pinho
Mecânico: Eduardo Belmonte
Mecânico: Gianpaolo Canepa
Nós (eu e o Gian) fomos para São Paulo na quinta-feira e ficamos hospedados na casa do
Célio, na sexta-feira fomos ao Ibirapuera treinar. Estávamos com uma VOO DOO com um
SUPER TIGRE G 21/35 voando pra ganhar a prova, e ainda outra reserva com outro G
21/35. No finalzinho da tarde, já no último vôo, testando uma hélice, o Célio comete um
erro terrível e espatifa a VOO DOO de bico no asfalto da pista de acrobacia. Asa e motor
ficaram completamente destruídas. Ficamos apenas com uma VOO DOO, e sem asa
reserva.
Naquela época a gente nunca tinha mais do que três ou quatro asas, usava-se uma só por
combate. O Célio é uma pessoa maravilhosa, tem um coração de ouro, mas sempre foi
muito brincalhão e meio relaxado, não tinha se preocupado em construir mais do que duas
asas, e agora só tinha uma. À noite, em sua casa, a única coisa “voável” que encontramos
foi um kit de uma MIG da Mobral, (ele ainda não era o dono da loja). Eu e o Gian
começamos a construir o modelo às 20:30 h e terminamos de envernizá-la as 03:30 h. O
melhor motor que achamos foi um VECO 35. Pelo menos o Célio já tinha um modelo
reserva.
Sábado de sol, para nós três a emoção de ouvir o Hino Nacional num dia de prova foi um
negócio muito sério, foi fantástico. Confesso que fiquei meio preocupado, pois senti o
Célio muito tenso, mas também não era pra menos, apenas alguns meses antes eu ensinava
o Célio a voar de dorso e agora lá estava ele num campeonato pan-americano,
representando Santos com a galera inteira na arquibancada. A nata inteira do combate
estava presente, só eu e o Gian ficamos de fora, atuando como mecânicos. Eu acho que o
Célio estava sentindo que naquele dia as coisas não seriam boas para nós, algo como
intuição ou sei lá o quê. Só sei que foi muito estranho o que a prova reservou para nós.
Entre os competidores estranhamos a presença de um rapaz que já conhecíamos do Team
Racing e do Rat Racing,o bom Henry Wingetter, mas nunca soubemos que ele praticava
combate!!! Pois não é que o Célio foi sorteado justamente para combater com o Henry? Fui
checar o material dele, era uma VOO DOO, lógico, e um motor 29 de válvula rotativa
(carburador traseiro) muito usado nos Rat Racers por seu altíssimo giro. O que aconteceu
foi o seguinte, seu modelo voava extremamente rápido mas o Henry não fazia manobra
nenhuma, parecia que ele estava numa corrida. O Célio até hoje não sabe dizer o que
aconteceu, mas o que vimos foi o Henry atravessar nossa VOO DOO pelo meio, não sobrou
quase nada do modelo. Os juízes deram o combate para o Célio, mas só restara a
ultrapassadíssima MIG com um velho e corajoso VECO 35 aspirado!!!
A perda da VOO DOO foi fatal para os ânimos do Célio, ele se entregou por completo,
nunca vimos ele voar tão mal numa prova, na verdade acho que tudo foi uma grande
somatória de fatalidades, desde a tarde anterior quando perdemos a VOO DOO principal,
até o fatídico combate com o Henry.
Por outro lado os franceses funcionavam como um relógio suíço, Michel voava muito, e seu
irmão Ernest tirava tudo e mais alguma coisa do FOX 36 X BB. Ah, como eu queria ver o
Célio com a VOO DOO titular na final com o Michel, mas infelizmente não seria dessa
vez.
Resultado final:
1º Michel Peregny
2º Jorge Arakelian
3º Paschoal Del Boni
4º José Célio Pinho
Competiram ainda:
José Ruiz Villalba, Assumpto Iaconelli,Francisco Iaconelli,e outros.
Capítulo 06 – Uma estranha no ninho.
Logo após nosso fracasso no pan americano,nosso amigo Athayde Lopes nos mostrou uma
edição da revista americana Flying Models que trazia uma reportagem sensacional sobre
combate AMA. Era sobre um jovem praticante que estava ganhando todos os torneios com
um SUPER TIGRE G 21/35, mas com uma asa desenhada por ele que era completamente
diferente das VOO DOO e BIG IRON. O nome do jovem era Terry Prather e da asa,
WINDER (creio que algo como “Ventania”).
O Athayde Lopes era assinante da Flying e quando viu a reportagem pediu uma planta via
“Colis Posteaux”, e quando ela chegou me deu de presente, acreditem eu tenho a planta até
hoje. Era difícil acreditar que algo tão estranho, e tão diferente de tudo que se conhecia,
voasse. Para quem está lendo e nunca viu uma WINDER, eu vou dar aqui algumas
medidas:
Comprimento : 107 cm.
Largura da asa : 17,5 cm.
Espessura de nervura : 2,5 cm. (com chapeado e entelagem)
E isso pra voar com um baita SUPER TIGRE G 21/35!!!
Então, por ser muito estreita, comprida, e fina de perfil, ela só se portava bem a altíssimas
velocidades. Após construir umas três eu consegui ganhar provas com ela, aliás, não tenho
notícia de mais ninguém ter vencido uma prova com ela, o conjunto que usei era:
Motor : SUPER TIGRE G 21/35
Entelagem : Papel Silkspan
Tanque : Latão, de 110 ml. de volume
Combustível : 4X1 com 20% de nitrometano
Hélice : 9X8 de madeira da REV-UP
Vela : Fireball Azul
O pessoal acabou desistindo dessa asa por vários motivos, mas os principais eram:
-Fazer seu tanque era complicadíssimo, inclusive no lugar onde era instalado as
nervuras eram mais grossas, senão seria impossível de se voar pelo menos 4 minutos,
devido ao volume ficar muito pequeno para o “beberrão” G 21/35.
-Sua construção era muito complexa para uma asa de combate, até cap-strip nas
nervuras se fazia necessário, os garfos de suporte do profundor eram três, sua ponteira era
toda emendada, enfim, parecia uma construção de um modelo de acrobacia.
-Se descarburasse, não havia como mantê-la voando.
Mesmo assim ela voou um bom tempo com as VOO DOO.
Capítulo 07 – “Não há mal que sempre dure,nem bem que nunca se acabe”
Grandes provas foram realizadas no eixo São Paulo – Santos que duraram até agosto de
1977 com o último Torneio de Verão.
Esses Torneios foram criados por mim em janeiro/fevereiro de 1976,e levou o nome de
Torneio de Verão o sucesso foi tão grande que fizemos então o Torneio de Inverno em
julho/agosto,depois em janeiro/fevereiro de 1977 o II Torneio de Verão.
O Torneio era composto de quatro provas,uma a cada quinze dias, intercaladas, duas de
combate AMA e duas de Rat Racing, e somava-se pontos do 1º ao 4º lugar,quando no Rat a
dupla de piloto/mecânico recebia uma única pontuação,quando no combate ambos os
componentes da dupla podiam competir e somar os pontos pró dupla.Ficava assim então,em
janeiro fazíamos uma prova de combate num fim de semana e a segunda prova de Rat
quinze dias após, em fevereiro a mesma coisa, e no Torneio de Inverno a mesma coisa.
Foi um grande sucesso.
O primeiro torneio de verão foi ganho por mim em dupla com o Cezar Roberto Delamonica
com 46 pontos,em segundo lugar ficaram dois irmãos da capital que estavam começando a
fazer parte do circo, Celso e Carlos Barbosa,com 35 pontos, eles chegaram no fim do
AMA, mas continuariam ainda um certo tempo no FAI,em terceiro lugar ficou a dupla
Paschoal Del Boni e Alexandre Torres (olha o Alexandre chegando no pedaço)com 28
pontos,em quarto lugar Pablito e Lubliner de Santos com 23 pontos.
O segundo torneio, o de inverno, foi vencido por mim, novamente em dupla com o Cézar
Roberto Delamonica, totalizamos 41 pontos,em segundo lugar ficaram Pablito e Lubliner
com 37 pontos, em terceiro a dupla da capital Eduardo e Ruiz com 21 pontos e em quarto
os irmãos Martinez com 14 pontos.
O terceiro e último, no verão de 1977 foi vencido pelos irmãos Barbosa da capital com 27
pontos,em segundo lugar ficou a dupla Pablito e Lubliner com 24 pontos,em terceiro ficou
a dupla Célio Pinho e Jorge Arakelian com 20 pontos,e em quarto lugar ficaram os irmãos
Martinez com 12 pontos.
Com esse último torneio de verão, chegava ao fim a era AMA no Brasil, vários fatores
levaram as provas AMA serem substituídas pelas FAI, com o regulamento FAI adotado de
vez pela ABA, não fazia mais sentido os praticantes gastarem dinheiro com asas e modelos
de corrida do regulamento AMA pois os clubes fiéis a ABA não colocavam mais em seus
calendários as provas AMA.O pessoal que viajava pro exterior voltava fascinado com a
idéia de competir num Mundial, principalmente em F2B,F2D e F2C.
O combate AMA pode ter acabado aqui em nosso país, mas jamais deixou de morar em
meu coração, é impossível esquecer aqueles dias, já fui chamado pelo Mauricio Serafim de
“saudosista” ele que é fã incondicional do combate FAI, mas se ele tivesse participado
daquela “engrenagem”, certamente hoje seria mais um saudosista.
Aqui vai meu eterno agradecimento às pessoas que fizeram parte do “circo” e que tornaram
minha vida mais feliz:
De SANTOS:
Gianpaolo Ângelo Eugênio Canepa
Cézar Roberto Delamonica
Marcus Lubliner
Pablito
Mario Augusto Martinez
Mauricio Martinez (in memoriam)
Luiz Carlos Martinez
Fernando Nunes Cunha
Antonio de Barros Mello Neto
Fernando Fonseca
Jairo Macedo
Nelson Gama
Floriano Peixoto Borges dos Santos
De SÃO PAULO:
José Célio Malheiro Pinho
Assunpto Iaconelli
Francisco Iaconelli
Michel Peregny
Ernest Peregny
José Arakelian
Jorge Arakelian
Paschoal Del Boni
José Ruiz Vilalba
E em especial ao saudoso JÕAO JAIME MÔNACO.
FIM DA PRIMEIRA PARTE