Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da Vara da Infância e da Juventude da

Transcrição

Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da Vara da Infância e da Juventude da
Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da Vara da Infância e da Juventude
da Comarca de Porto Alegre-RS
O MINISTÉRIO PÚBLICO, por seu
agente no fim assinado, com base no
que foi apurado no Inquérito Civil
Público número 001/2005, vem à
presença de V. Exa. propor, como
por proposta tem a presente AÇÃO
CIVIL PÚBLICA (art. 201, inc. VI,
combinado com os arts. 4o, e 81,
todos do Estatuto da Criança e do
Adolescente) contra
SONY
BMG
MUSIC
INTERTENAIMENT,
empresa
situada na praia do Botafogo,
número, 300, 12o Andar, Rio de
Janeiro Capital, CNPJ número
4322003520000104, e
ACIT COMERCIAL FONOGRÁFICA,
empresa situada na Rua Vico Costa,
número 150, Bairro Desvio Rizzo,
Caxias/RS,
CNPJ
número
e 88424361/0002-97
BANDA BIDÊ OU BALDE, conjunto
musical
representado
pelo
compositor Carlos de Mascaranhas
Carneiro, residente na Travessa
Ferreira de Abreu, número 22,
apartamento 02, nesta Capital, tendo
em vista os fatos e fundamentos
jurídicos a seguir expostos
DOS FATOS:
1)Que, através de Representação
oferecida pelo Movimento pelo Fim da Violência e Exploração
Sexual de Crianças e Adolescentes, tomou conhecimento o
Ministério Público que a Banda de Rock Bidê ou Balde estaria
divulgando através do Rádio um CD, do qual constaria a faixa “E
Por Que Não ?” (fls. 23 a 26);
2)Que tal CD seria o “Acústico MTV
Bandas Gaúchas”, gravado pela Sony BMG Music Interteinement,
material do qual consta a música referida (material em anexo);
3)Investigando, verificou o Ministério
Público que a música já constara de outro CD da Banda,
chamado “Se Sexo é o Que Importa, Só o Rock é Sobre Amor”,
que fora gravado anteriormente pela Acit Comercial Fonográfica,
de Caxias do Sul 2000 (fls. 14 e 15, bem como 61 e 62 e 77).
Portanto, existem
mercado, dos quais constam a mesma música;
dois
CDs
4)Ocorre que a música
referida contém letra que faz apologia à pedofilia;
no
acima
5)Efetivamente, segundo a letra da
música constam, dentre outros, os seguintes termos:
“Estou amando, a minha menina.
E como eu adoro, suas pernas
fininhas.
Eu estou cantando, pra minha
menina.
Pra ver se eu convenço ela a
entrar na minha.
E por que não?
Teu sangue é igual ao meu.
Teu nome fui eu quem deu,
Te conheço desde que nasceu!
E por que não?” (fl. 08)
6)Ora é curial que o conteúdo da
letra acima transcrita é ofensivo, faz alusão expressa à pedofilia e
faz apologia à prática de crime;
7)Tal música e a referida letra têm
sido veiculadas na mídia e executadas em shows da banda, o
que contraria de maneira frontal o espírito da Lei (Estatuto da
Criança e do Adolescente) que preconiza o zelo pela proteção
dos interesses dos jovens e das crianças;
8)É sabido o quanto os meios de
comunicação de massa influenciam a forma de agir das pessoas,
fazendo com que assumam atitudes e comportamentos;
Neste sentido o posicionamento
assumido pela Ilustre Desembargadora Maria Berenice Dias, o
qual reconheceu que a letra acima exposta faz apologia do
incesto e banaliza um crime hediondo (fls. 127 e 128);
Naquele
texto
a
Ilustre
Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e
Vice-Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de
Família observa que:
“Não é admissível que seja
divulgada a cantada para minha menina, para ver se ela entra
na minha.
Não pode ser outra pessoa que
não o pai quem tem o mesmo sangue, quem conhece desde
pequena, quem dá o nome.
Não há como não ver que, quem
ama as perna fininhas de sua menina e adora vê-la com suas
colegas na escolinha é um pedófilo” ;
9)Observe-se
que
o
próprio
compositor/requerido, Carlos de Mascaranhas Carneiro, em seu
depoimento de fls. 63 a 65, menciona que o CD “Se Sexo é O
Que Importa, Só O Rock é Sobre Amor” continua nas lojas (fls. 63
e 64).
Dúvidas não restam de que o
“Acústico MTV Bandas Gaúchas” está no mercado e que a
música “E Por Que Não ?” vem sendo reproduzida na mídia;
10)Frise-se por oportuno que a
situação de reprodução e execução da música indigitada foi
objeto de tratativas pelo Ministério Público com a Sony Music,
companhia que reproduziu o material da Banda Bidê ou Balde
“Acústico Bandas Gaúchas”, quando esta 8a Promotoria entregou
ao Procurador daquela empresa esboço de Termo de Ajuste de
Conduta no qual se tentava compor com a gravadora no sentido
de se estabelecer limites em relação à divulgação do material (fl.
67 a 69);
11)Também o compositor que
representa a
Banda foi chamado junto à 8a Promotoria,
juntamente com o Empresário da Banda, quando recebeu cópia
do mesmo material (fls. 73 a 75);
12)Em ambas as ocasiões foi
proporcionado às partes que apresentassem ao Ministério Público
uma contraproposta ao Termo de Ajuste de Conduta (mesmas
folhas);
13)Ocorre que, em que pesem tais
iniciativas no sentido de compor com as partes contrárias, não foi
possível proceder-se qualquer entendimento, pois a Banda não
se manifestou no prazo que lhe foi deferido – dez dias – e a
contra-proposta apresentada pela casa gravadora Sony Music se
mostra imprestável para proteger o interesse tutelado
integridade moral de crianças e adolescentes e iniciativa na não
divulgação de material criminoso -, pois deixa a descoberto a
possibilidade de livre comercialização e divulgação do material
junto à mídia, bem como propicia a execução da música e da
letra em evento televisado (fls. 117 e 118);
14)É interessante mencionar que
cópia do presente Inquérito Civil Público foi encaminhado pela 8a
Promotoria para o Juizado Especial Criminal, a fim de que
fossem apuradas as condutas praticadas pelos requeridos
(fl.126);
15)Vale referir que ambos os CDs
continuam no mercado e que a reprodução da faixa em questão
tem gerado séria inconformidade pelos cidadãos que postulam no
sentido de que o Ministério Público tome uma providência no
sentido de coibir a comercialização e divulgação do material (fls.
127 a 133);
16)Por derradeiro, cabe dizer que a
atuação do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul foi
respaldada pelo posicionamento do CONANDA – Conselho
Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente, pois aquele
conselho vislumbra na letra da música “violação a preceitos
legais”, como consta do documento de fl. 119;
Diante do exposto, esgotados os
meios para resolver a questão na via administrativa e visando
zelar pelas integridades físicas e morais das crianças e
adolescentes que estarão expostas à execução da referida
música e os comportamentos nefastos que de suas reproduções
poderão decorrer, lança mão o Ministério Público do presente
remédio jurídico, dizendo e postulando como segue.
DO DIREITO:
1)Dispõe a Constituição Federal em
seu art. 227, “caput”:
“É dever da família, da sociedade e do
Estado assegurar à criança e ao
adolescente, com absoluta prioridade, o
direito à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao lazer, à profissionalização,
à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo
de
toda a forma de negligência,
discriminação, violência, crueldade e
opressão”;
2)A Legislação Ordinária Federal (lei
8069/90, Conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente)
confirmou a prioridade estabelecida no preceito constitucional,
determinando em seu art. 4º, cabeça:
“É dever da família, da sociedade
em geral e do Poder Público
assegurar,
com
absoluta
prioridade, a efetivação dos
direitos referentes à vida, à saúde,
à alimentação, à educação, ao
esporte,
ao
lazer,
à
profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade
e à convivência familiar e
comunitária.”
3)Diz o art. 98 do Estatuto da
Criança e do adolescente:
“As medidas de proteção à criança
e ao adolescente são aplicáveis
sempre
que
os
direitos
reconhecidos nesta lei forem
ameaçados ou violados:
I-
por ação ou omissão da
sociedade ou do Estado;
4)Por outro lado, o disposto no art.
254, referindo-se a uma das infrações administrativas elencadas
no mesmo Diploma legal (ECA), menciona textualmente:
“Transmitir, através de rádio ou de
televisão, espetáculo em horário
diverso do autorizado ou sem
aviso de classificação
Pena – multa de vinte a cem
salários de referência; duplicada
em caso de reincidência a
autoridade
judiciária
poderá
determinar
a
suspensão
da
programação da emissora até por
dois dias”;
5)Por fim, cabe referir que o Código
Penal Brasileiro considera crime no seu art. 286:
“Incitar, publicamente à prática de
crime:
Pena – detenção, de 3 (três) a 6 (seis)
meses, ou multa.”
6)Quanto ao remédio jurídico ora
utilizado e a legitimidade ativa do Ministério Público para propor a
presente medida, estão estampados no art. 20l, inc. V, o qual
menciona:
“Compete ao Ministério Público:
...
V- promover o inquérito civil a ação civil
pública para a proteção dos interesses
individuais,
difusos
ou
coletivos
relativos á infância e à adolescência,
inclusive os definidos no art. 220, § 3º.
Inciso II, da Constituição Federal”;
DO REQUERIMENTO:
Em
face
do
antes
exposto,
o
Ministério Público requer:
a)Seja deferida liminar no sentido de
determinar que todos os veículos de comunicação falados ou
televisados do Estado do Rio Grande do Sul não procedam a
divulgação do material acima referido, proibindo a execução do
CD “Acústico MTV Bandas Gaúchas” e a execução do CD “Se
Sexo é o Que Importa, Só o Rock é Sobre Amor”, ou de DVD
referente a faixa “E Por Que Não ?”, da banda Bidê ou Balde,
sob pena, no caso do seu descumprimento, de cominação de
multa diária no valor do equivalente a cem salários mínimos por
dia de descumprimento, valor a ser depositado junto ao Fundo
Estadual de Direitos da Criança e do Adolescente.
Para tanto sejam as gravadoras
requeridas e a Banda de Rock (através de seu
compositor/representante) notificadas para que publiquem na
imprensa local nota cientificando os meios de comunicação a
respeito do que foi determinado, reproduzindo na íntegra a
Decisão Judicial;
b)Também, em sede de liminar, seja
determinada que as gravadoras requeridas e a Banda Bidê ou
Balde procedam o recolhimento de todos os CDs e DVDs que
contenham o material acima referido, junto aos Estabelecimentos
Comerciais da Capital e do interior do Estado, visando impedir a
sua comercialização, o que deverá ser feito, de imediato, sob
pena da cominação da mesma multa diária acima referida.
Tomada
tal
providência
seja
procedida diligência junto a alguns estabelecimentos comerciais
designados por V. Exa., para que, por amostragem, se verifique
se foi operado o recolhimento;
c)Seja determinado as gravadoras
requeridas e a Banda de Rock Bide ou Balde, liminarmente, que
se abstenham de proceder nova edição do material CD “Acústico
Bandas Gaúchas” e do CD “Se Sexo é o Que Importa, Só o
Rock é Sobre Amor”, bem como seus similares em DVD, com a
inclusão da faixa “E Por que Não?”, da Banda Bidê ou Balde, sob
pena da mesma multa diária mencionada nas alíneas “a” e “b”;
d)Sejam citadas
as Gravadoras
referidas no cabeçalho, bem como o representante da Banda
Bidê ou Balde para que apresentem defesa, no prazo de lei;
e)Seja designada audiência para a
oitiva da testemunha abaixo nominada, franqueando-se ao
“Parquet” a produção de todos os meios de prova em Direito
Admitidos;
f)Seja, por fim, julgada procedente a
presente ação, confirmando-se a liminar condenando-se as
requeridas à obrigação de não fazer consistente em não
comercialização e não divulgação do material referido, bem como
à não edição de novo material com a inclusão da faixa já referida,
sob pena, no caso do seu descumprimento, de cominação de
multa diária no valor do equivalente a cem salários mínimos por
dia de descumprimento, valor a ser depositado junto ao Fundo
Estadual de Direitos da Criança e do Adolescente.
Tendo em vista a natureza do direito
tutelado, tem-se o valor da causa como inestimável.
Porto Alegre,
28 de setembro de
2005.
Luciano Dipp Muratt
Promotor de Justiça
Testemunha:
Maria de Fátima Pranke, brasileira, casada, Assessora
Administrativo Financeiro, residente na Rua Felipe Uebel, número
1270, Bairro Santo André, São Leopoldo/RS (em que pese residir
em outra Comarca a Testemunha se compromete a comparecer
junto ao Forum Central desta Capital, para prestar depoimento).