(Aula 11 e 12 - Segunda Lei da Termodinâmica)

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(Aula 11 e 12 - Segunda Lei da Termodinâmica)
Aulas 11 e 12 – Segunda e Terceira Lei da Termodinâmica
1 – Introdução
De forma geral podemos afirmar que na natureza “algumas coisas acontecem e
outras não”. Por exemplo: um gás se expande ocupando inteiramente o recipiente que o
contém, mas um gás não se contrai, de repente, para um volume menor. Assim,
observações cotidianas sugerem que as transformações podem ser divididas em duas
classes:
(i)
Transformações espontâneas: aquelas que podem ocorrer sem que seja
feito trabalho para provocá-la (ou seja, tem uma tendência natural a
ocorrer)
(ii)
Transformações não-espontâneas: aquelas que só podem ser provocadas
fazendo-se trabalho.
Ao longo deste capítulo usaremos os termos: “espontâneo” e “não-espontâneo” no
sentido termodinâmico. Ou seja, eles serão usados para indicar se uma transformação tem
ou não uma tendência natural a ocorrer.
É importante frisar que em termodinâmica o termo espontâneo não tem nada
haver com velocidade. Algumas transformações espontâneas são muito rápidas como, por
exemplo, a reação de precipitação que ocorre quando se misturam soluções de cloreto de
sódio e nitrato de prata. Entretanto, algumas transformações espontâneas são tão lentas
que não se observa nenhuma mudança, mesmo depois de milhões de anos. Podemos citar
como exemplo a decomposição do benzeno em carbono e hidrogênio.
2 – O sentido da mudança espontânea
A razão pela qual algumas transformações não são espontâneas e outras são não é
a tendência do sistema a se deslocar para um estado de menor energia. A força que é
responsável pela mudança espontânea é a tendência da energia e da matéria a se tornar
desordenadas.
102
Por exemplo, inicialmente todas as moléculas de um gás podem estar numa região
de um recipiente, mas o movimento aleatório e incessante dessas moléculas assegura que
elas se espalharão rapidamente por todo o volume do recipiente (ver figura 1).
Figura 1
Como o movimento é desordenado, há uma pequeníssima probabilidade
(inteiramente desprezível) de que todas as moléculas se movimentarão simultaneamente
de volta para a região do recipiente que elas ocuparam inicialmente. Neste exemplo, o
sentido natural da mudança corresponde à dispersão mais desordenada da matéria.
Uma explicação semelhante pode ser dada para o resfriamento espontâneo, mas
agora precisamos considerar a dispersão da energia em vez da dispersão da matéria. Em
um bloco de metal quente os átomos estão oscilando intensamente e quanto mais quente o
bloco mais intenso o seu movimento. As vizinhanças mais frias também consistem em
átomos que estão oscilando, mas o seu movimento é menos intenso. Os átomos do bloco
quente, oscilando intensamente, “empurram” os átomos das vizinhanças e a energia dos
átomos do bloco quente é transferida para os átomos das vizinhanças (ver figura 2).
103
Figura 2
O processo continua até que a intensidade com que os átomos do sistema estão
oscilando diminua e se torne igual à dos átomos nas vizinhanças. O fluxo oposto de
energia é muito improvável. É altamente improvável que haja um fluxo líquido de
energia para o sistema como resultado dos átomos do sistema serem “empurrados” pelos
átomos das vizinhanças, que estão oscilando menos intensamente. Neste caso, o sentido
natural da mudança corresponde à dispersão da energia.
Em resumo, identificamos dois tipos básicos de processo físico espontâneo: (i) A
matéria tende a se tornar desordenada; (ii) A energia tende a se tornar desordenada.
3 – Entropia e a Segunda lei da termodinâmica
A medida da desordem da matéria e da energia usada na termodinâmica é
chamada de entropia, S. Neste momento, tudo o que precisamos saber é que, quando a
matéria e a energia tornam-se desordenadas, a entropia aumenta. Assim podemos definir
a segunda lei da termodinâmica através da seguinte sentença: A entropia do universo
tende a aumentar. A característica notável dessa lei é que ela se aplica às mudanças em
todas as suas formas – tanto para reações químicas como para as mudanças físicas que
nós já consideramos.
104
Para que possamos tornar a Segunda Lei numa sentença quantitativamente útil,
precisamos definir precisamente a entropia. Vamos usar a seguinte definição para a
variação de entropia:
=
(1)
De acordo com essa equação, a variação de entropia de uma substância é igual a
energia transferida reversivelmente como calor, dividida pela temperatura na qual a
transferência ocorre. A dedução formal dessa expressão está baseada num tipo especial
de processo, chamado de “ciclo de Carnot”, que foi proposto originalmente, para avaliar a
eficiência das máquinas a vapor.
Existem três pontos que precisamos entender sobre a definição da equação 1: (i) o
significado do termo “reversível”; (ii) porque o calor (e não o trabalho) aparece na
definição e (iii) por que a variação de entropia depende da temperatura na qual a
transferência ocorre.
Como já vimos anteriormente, o termo reversibilidade se refere a possibilidade de
que uma variação infinitesimal de uma variável possa mudar a direção de um processo. A
reversibilidade mecânica refere-se à igualdade das pressões que atuam em qualquer um
dos lados de uma parede móvel. A reversibilidade térmica, aquela envolvida na equação
1, refere-se a igualdade das temperaturas em ambos os lados de uma parede que é
condutora térmica. A transferência reversível de calor é uma transferência entre dois
corpos à mesma temperatura e que ocorre de modo uniforme, cuidadoso e controlado.
Fazendo a transferência reversível asseguramos não haver formação de áreas quentes no
objeto, que eventualmente se dispersariam espontaneamente, e conseqüentemente
aumentaria a entropia.
Consideremos agora por que o calor e não o trabalho aparece na equação 1. Como
vimos no inicio desse capítulo, para transferir energia como calor fazemos uso do
movimento desordenado das moléculas, enquanto para transferir energia como trabalho
fazemos uso do movimento ordenado. É razoável que a variação de entropia, ou seja, a
variação do grau da desordem seja proporcional à transferência de energia que ocorre
fazendo uso do movimento desordenado e não do movimento ordenado.
105
Por fim, a presença da temperatura no denominador na equação 1 leva em conta a
desordem que já está presente. Se uma determinada quantidade de energia é transferida
como calor para um objeto quente (um no qual os átomos têm um grande movimento
térmico desordenado), então a desordem adicional gerada é menos significativa do que se
a mesma quantidade de energia fosse transferida como calor a um objeto frio, no qual o
movimento térmico dos átomos é menor.
Exemplo 1: A transferência de 100 kJ de calor para uma massa grande de água, a 273 K,
resulta numa variação de entalpia igual a?
=
=
×
= +366 .
enquanto a mesma transferência a 100 ͦ C (373 K) resulta em:
=
=
×
= +268 .
A variação de entropia é maior na temperatura menor. Observe que as unidades de
entropia são joules por kelvin (J.K-1). A entropia é uma propriedade extensiva. Quando
trabalhamos com a entropia molar, que é uma propriedade intensiva, as unidades são
joules por kelvin por mol (J.K-1.mol-1).
A entropia é uma função de estado, uma propriedade cujo valor só depende do
estado presente no sistema. A entropia é uma medida do estado atual da desordem do
sistema. Como essa desordem foi alcançada não é importante para o seu valor.
A conseqüência de a entropia ser uma função de estado é que uma mudança em
seu valor, quando um sistema sofre uma mudança de estado, é independente de como a
mudança de estado foi realizada.
106
4 – Variação de entropia em alguns processos
Freqüentemente podemos confiar na intuição para julgar se a entropia aumenta ou
diminui quando uma substância sofre uma mudança física. Por exemplo, a entropia de
uma amostra de gás aumenta quando ele se expande porque as moléculas passam a se
deslocar num volume maior, e assim têm um grau de desordem maior. Entretanto, a
vantagem da equação 1 é que através dela podemos expressar o aumento
quantitativamente.
Podemos usá-la para calcular a variação da entropia quando um gás perfeito se
expande isotermicamente de um volume Vi até um volume Vf. Para tanto precisamos
conhecer o qrev, a energia transferida como calor no decorrer de uma transformação
reversível, na temperatura T.
Como já foi demonstrado em aulas anteriores, o calor transferido pêra um gás
perfeito quando ele sofre uma expansão isotérmica reversível de um volume Vi para um
volume Vf a uma temperatura T, é dado por:
= !"#
=
=
= !#
$%
$&
'( )'
$%
$&
*%
*&
(2)
Analisando a equação 2, podemos observar claramente que a variação de entropia
é independente da temperatura na qual a expansão ocorre. A explicação para isso reside
no fato de que quanto maior for a temperatura mais trabalho terá que ser feito (quanto
maior a temperatura, maior a pressão do gás e, conseqüentemente, maior deve ser a
pressão externa que se iguala à pressão do gás), então mais calor deve ser fornecido para
manter a temperatura constante.
107
O segundo tipo de mudança que nós consideramos é a elevação da temperatura.
Devemos esperar que a entropia de uma amostra aumente quando a temperatura cresce,
pois a desordem térmica do sistema é maior quando a temperatura é mais alta, ou seja,
quando as moléculas se movem mais intensamente.
Mais uma vez, para calcularmos o valor da variação de entropia vamos utilizar a
equação 1 que refere-se à transferência de calor para um sistema numa temperatura T.
Em geral, a temperatura muda quando aquecemos um sistema, logo não podemos utilizar
a equação 1 diretamente. Após uma dedução detalhada utilizando algumas noções de
deriva da e integral (dedução completa na ultima página) chegamos a seguinte equação:
=+ #
%
&
(3)
Devemos observar que a equação 3 mostra algo que é pouco óbvio, mostra que
quanto maior a capacidade calorífica da substância maior a variação de entropia para uma
determinada variação de temperatura. Se refletirmos um pouco sobre isso veremos que
faz sentido. Uma capacidade calorífica alta implica que muito calor é necessário para
produzir uma determinada alteração da temperatura.
O terceiro processo comum a ser considerado é uma transição de fase, como a
fusão ou a ebulição. Podemos suspeitar que a entropia de uma substância aumenta
quando ela funde e quando ela ferve, pois as suas moléculas se tornam mais desordenadas
quando ela passa de sólido para líquido e de líquido para vapor.
Vamos supor que um sólido está na sua temperatura de fusão e que a transferência
de energia, na forma de calor, ocorre reversivelmente. Se a temperatura das vizinhanças é
infinitesimalmente menor do que a do sistema, então o fluxo de calor é para fora do
sistema e a substância congela. Se a temperatura é infinitesimalmente maior, então o
fluxo de calor é para dentro do sistema e a substância funde. Além disso, como a
transição ocorre a pressão constante, podemos identificar o calor transferido por mol de
substância como sendo a entalpia de fusão. Portanto, a entropia de fusão, ∆fusS
(variação de entropia por mol de substância, na temperatura de fusão, Tf) é:
108
1234 5
Δ-./ S =
62
(4)
Todas as entalpias de fusão são positivas (a fusão é endotérmica, ou seja,
necessita de calor), assim todas as entropias de fusão também são positivas: a desordem
aumenta na fusão. Por exemplo, a entropia da água aumenta quando ela funde, pois a
estrutura ordenada do gelo é destruída quando se forma o líquido (ver figura 3).
A entropia de outros tipos de transição podem ser discutidas semelhantemente.
Assim, a entropia de vaporização, ∆vapS, na temperatura de ebulição, Teb, de um líquido
está relacionada com a sua entalpia de vaporização, nessa temperatura por:
Δ789 S =
1:;< 5
6=>
(5)
Como a vaporização é endotérmica, para todas as substâncias, todas as entropias
de vaporização são positivas. O aumento na entropia de vaporização está de acordo com
o que esperamos quando um líquido compacto se transforma em um gás.
As entropias de vaporização permitem esclarecer uma relação empírica conhecida
como a regra de Trouton. Trouton observou que a ∆vapH /Teb é, aproximadamente, a
mesma (cerca de 85 J.K-1.mol-1) para todos os líquidos, exceto quando a ligação de
hidrogênio ou algum outro tipo de ligação específica está presente (ver tabela 1).
Sabemos, no entanto, que a quantidade ∆vapH /Teb é a entropia de vaporização do líquido
na sua temperatura de ebulição, assim a regra de Trouton é válida se todos os líquidos
tiverem, aproximadamente, a mesma entropia de vaporização. Essa igualdade aproximada
109
é esperada porque quando um líquido vaporiza, a fase densa compacta muda para uma
fase gasosa altamente dispersa que ocupa, aproximadamente, o mesmo volume, qualquer
que seja a sua natureza. Conseqüentemente, é uma boa aproximação que o aumento da
desordem, portanto, da entropia de vaporização, seja quase que o mesmo para todos os
líquidos nas suas temperaturas de ebulição.
Tabela 1. Entropias de vaporização a 1 atm,
e na temperatura normal de ebulição
∆vapS (J.K-1.mol-1)
Bromo, Br2
88,6
Benzeno, C6H6
87,2
Tetracloreto de carbono
85,9
Cicloexano, C6H12
85,1
Sulfeto de hidrogênio
87,9
Amônia, NH3
97,4
Água, H2O
109,1
Mercúrio
94,2
As exceções para a regra de Trouton incluem os líquidos nos quais as interações
entre as moléculas fazem com que o líquido seja menos desordenado do que se existisse
uma mistura ao acaso de moléculas. Por exemplo, o valor elevado da entropia de
vaporização para a água indica que as moléculas de H2O se mantêm unidas por ligação de
hidrogênio, formando um tipo de estrutura ordenada. Dessa forma, quando esse líquido,
relativamente ordenado, forma um gás desordenado, a variação de entropia é maior do
que seria de se esperar caso a ligação de hidrogênio não estivesse presente. O alto valor
da entropia de vaporização para o mercúrio tem uma explicação semelhante, mas, nesse
caso, é a presença de ligações metálicas no líquido que organizam os átomos em
estruturas mais definidas do que quando tais ligações não existem.
110
5 - Variação da entropia nas vizinhanças
Utilizando a equação 1, também é possível calcular a variação da entropia nas
vizinhanças em contato com o sistema na temperatura T:
?@
=
&A
(6)
As vizinhanças são tão extensas que, até que o calor fornecido tenha se dispersado ao
longo delas, a transferência de calor é efetivamente reversível, assim podemos escrever:
?@
=
&A
(7)
Assim, podemos utilizar a equação 7 para calcular a variação de entropia das vizinhanças
independente se a transformação no sistema é reversível ou não.
A equação 2 é expressa em termos de calor fornecido às vizinhanças, qviz.
Normalmente, temos informação sobre o calor fornecido ou liberado pelo sistema, q. As
duas quantidades estão relacionadas por qviz = - q. Portanto, neste estágio, podemos
escrever:
?@
=−
(8)
Esta expressão está em função das propriedades do sistema. Além disso, ela se aplica seja
o processo, que esteja ocorrendo no sistema, reversível ou não.
Como uma ilustração, suponha que um gás perfeito se expande isotérmica e
reversivelmente de Vi até Vf. A variação de entropia do gás (o sistema) é determinada
através da equação 2. Para calcular a variação de entropia nas vizinhanças temos que:
?@
=−
"
= − . !. #
CD
C?
A variação da entropia nas vizinhanças é, portanto, o negativo da variação de entropia no
sistema e a variação da entropia total é zero: ∆STotal = ∆S + ∆Sviz = 0
Vamos admitir agora, que o gás se expanda isotermicamente, mas livremente
(pex = 0), entre os mesmos dois volumes que haviam anteriormente. A variação de
entropia do sistema é a mesma, pois a entropia é uma função de estado. Entretanto, como
não foi realizado nenhum trabalho e nenhum calor foi transferido das vizinhanças, como
q = 0, segue-se da equação 8 (que pode ser utilizada tanto para transferência de calor
reversível ou irreversível) que ∆Sviz = 0. A variação total de entropia é então igual a
variação de entropia do sistema, que é positiva.
111
Por fim, suponha que o processo ocorrendo no sistema seja a pressão constante,
como uma reação química ou uma transição de fase. Então podemos identificar q como
sendo a variação de entalpia do sistema, e obtemos:
para um processo a pressão constante:
?@
=−
EF
(9)
Essa expressão tem uma grande importância e será o centro de nossa discussão sobre
equilíbrio químico. Vemos que ela é consistente com o senso comum: se o processo for
exotérmico, ∆H é negativa e então ∆Sviz é positiva. A entropia das vizinhanças aumenta
se o calor é transferido para elas. Se o processo é endotérmico (∆H > 0), então a entropia
das vizinhanças diminui.
6 - Entropias absolutas
A entropia da Terceira Lei, em qualquer temperatura, S(T), é igual à área sob a
curva no gráfico de Cv/T versus T, entre T = 0 e a temperatura T. (Ver figura abaixo)
Figura 4 - A entropia absoluta (ou entropia da Terceira Lei) de uma substância é
calculada estendendo-se as medidas das capacidades caloríficas até T = 0 (ou o mais
perto possível desse valor) e determinando-se a área sob o gráfico de Cv/T versus T até a
temperatura de interesse. A área é igual à entropia absoluta na temperatura T.
Seu valor, que geralmente é chamado de “entropia” de uma substância, depende da
pressão. Por exemplo, uma pressão alta limitaria um gás a um volume menor e assim
reduziria sua entropia. Selecionamos, portanto, uma pressão padrão e registramos a
112
H
G,
entropia molar padrão,
a entropia molar de uma substância no seu estado padrão, na
temperatura de interesse.
Tabela 2. Entropias molares padrão de algumas substâncias a 25ºC.
IKJ (J.K-1.mol-1)
Substância
Gases:
Amônia, NH3
192,5
Dióxido de Carbono, CO2
213,7
Hélio, He
126,2
Hidrogênio, H2
130,7
Neônio, Ne
146,3
Nitrogênio, N2
191,6
Oxigênio, O2
205,1
Vapor de água, H2O
188,8
Líquidos:
Água, H2O
69,9
Benzeno, C6H6
173,3
Etanol, CH3CH2OH
160,7
Sólidos:
Carbonato de Cálcio, CaCO3
92,9
Carbonato de Magnésio, MgCO3
65,7
Chumbo, Pb
64,8
Cloreto de sódio, NaCl
72,1
Cobre, Cu
33,2
Diamante, C
2,4
Estanho, Sn (branco)
51,6
44,1
Sn (cinza)
Grafita, C
5,7
Óxido de Cálcio, CaO
39,8
Óxido de Magnésio, MgO
26,9
Sacarose, C12H22O11
360,2
113
Na tabela 2 apresentamos alguns valores a 25ºC. Vale a pena nos determos um
instante nos valores apresentados na tabela 1verificando se eles são consistentes com a
nossa compreensão de entropia. Todas as entropias molares padrão são positivas, pois a
elevação da temperatura de uma amostra acima de T = 0 invariavelmente aumenta a sua
entropia do valor S(0) = 0. Outra característica é que a entropia molar padrão do
diamante (2,4 J.K-1.mol-1) é menor que a da grafita (5,70 J.K-1.mol-1). Essa diferença é
consistente com o fato de que os átomos estão unidos menos rigidamente na grafita que
no diamante e, por isso, a sua desordem térmica é maior.
Outra observação interessante diz respeito a água. As entropias molares padrão do
gelo, da água e do vapor de água, a 25ºC, são respectivamente: 45, 70 e 189 J.K-1.mol-1.
Esse aumento corresponde à desordem crescente em ir do estado sólido para o líquido e,
deste, para pó gasoso.
Entretanto, somente com muita dificuldade é que as capacidades caloríficas
podem ser medidas em temperaturas muito baixas, particularmente perto de T = 0.
Porém, sabe-se que muitas substâncias não-metálicas têm uma capacidade calorífica que
obedece a lei T3 de Debye:
Em temperaturas perto de T = 0, CV,m = aT3
(1)
onde a é uma constante empírica que depende da substância e que é determinada
ajustando-se a equação 1 a uma série de medidas perto de T = 0. Conhecendo-se o valor
de a, fica fácil calcular a entropia molar a baixas temperaturas.
1
S m (T ) − S m (0) = Cv ,m .T
3
(2)
7. A Entropia Padrão de Reações
Quando há a formação de um gás numa reação, como numa combustão, podemos
prever que normalmente a entropia aumenta. Quando há um consumo de gás, como na
fotossíntese, é normalmente seguro prever que a entropia diminui. Entretanto, para
estimarmos um valor quantitativo da variação de entropia e para prever o sinal da
variação quando nenhum gás estiver envolvido, precisamos realizar um cálculo explícito.
114
A diferença da entropia molar entre os produtos e os reagentes, nos seus
respectivos estados padrões, é chamada de entropia padrão de reação, ∆
H
. Ela pode
ser expressa em termos de entropias molares das substâncias do mesmo modo que
usamos para entalpia padrão de reação:
∆
H
= ∑N
H
G
OPQRSTURVW − ∑ N
H
G
OQXYZX UXVW
(3)
onde N são os coeficientes estequiométricos na equação química.
Exemplo 2: Para a reação 2H2(g) + O2(g) → 2H2O(l) esperamos uma entropia de reação
negativa, tendo em vista que os gases são consumidos na reação. Para determinar o valor
explicitamente, usamos os valores obtidos na tabela 1:
OPQRSTURVW − [ N
∆
H
= [N
∆
H
=2
∆
H
= 2 × O70 .
∆
H
= −327 .
H
G
H
G O\
], # W − _2
H
G O\
H
G
, ZW +
OQXYZX UXVW
H
G O]
, ZW`
. cR# W − d2 × O131 .
. cR#
W +× O205 .
. cR# Wg
. cR#
8. A Espontaneidade das Reações Químicas
O resultado do cálculo mostrado no exemplo 1 é, a primeira vista, bastante
surpreendente. Sabemos que a reação entre o hidrogênio e o oxigênio é espontânea e que,
uma vez iniciada, avança explosivamente. Não obstante, a variação de entropia que a
acompanha é negativa: a reação resulta em menos desordem e ainda assim é espontânea?
A resolução desse paradoxo aparente realça uma característica da entropia e
ocorre sistematicamente ao longo da química: é essencial considerar a entropia tanto do
115
sistema como das suas vizinhanças ao decidir se um processo é espontâneo ou não. A
redução da entropia de 327 J.K-1.mol-1 só está relacionada com o sistema, a mistura
reacional. Para aplicar a Segunda Lei corretamente, precisamos calcular a entropia total, a
soma das variações de entropia no sistema e nas vizinhanças. Pode ser que a entropia do
sistema diminua quando ocorrer uma transformação, mas pode haver um aumento mais
do que compensador na entropia das vizinhanças, de modo que a variação global da
entropia seja positiva. O oposto também pode ocorrer. Neste caso, portanto, estaríamos
errados em concluir que uma mudança seria espontânea somente nos baseando no
aumento da entropia do sistema. Quando consideramos as implicações da variação da
entropia, é necessário que levemos em conta, sempre, a sua variação total: no sistema e
nas vizinhanças.
Para calcular a variação de entropia nas vizinhanças, quando uma reação ocorre à
pressão constante, usamos a equação:
?@
=−
EF
interpretando o ∆H como a entalpia
da reação.
Exemplo 3: Para a reação de formação da água no exemplo 3, com:
∆ \ H = - 572 kJ.mol-1
a variação de entropia das vizinhanças (que são mantidas em 25ºC, a mesma temperatura
que a mistura reacional) é:
?@
?@
=−
EF
=−
h
= +1,92 × 10 .
i .Gj)kl
mn
. cR#
Podemos ver agora que a variação de entropia é positiva:
pjpq)
= O−327 .
. cR# W + r1,92 × 10 .
pjpq)
= +1,59 × 10 .
. cR# s
. cR#
Esse cálculo confirma, como sabemos da experiência, que a reação é fortemente
espontânea. Desse modo, a espontaneidade é um resultado da desordem considerável que
116
a reação gera nas vizinhanças: a água existe, embora a H2O (l) tenha uma entropia menor
que os reagentes gasosos, pela tendência da energia para se dispersar nas vizinhanças.
ANEXO 1
117
Exercícios – Lista 8
1º) Um peixinho de aquário nada numa tigela de água, a 20oC. Durante um certo período
de tempo, o peixe transfere 120J para a água, como resultado do seu metabolismo. Qual é
a variação da entropia da água?
2º) Admita que você pôs um cubo de gelo, de massa igual a 100g, em um copo com água
com a temperatura pouco acima de 0oC. Após o gelo ter derretido, aproximadamente
33kJ de energia teriam sido absorvidos do ambiente como calor. Qual é a variação de
entropia (a) da amostra (o gelo), (b) das vizinhanças (o copo com água)?
3º) Uma amostra de alumínio de massa igual a 1,25 kg é resfriada, a pressão constante, de
300K para 260K. Calcule a energia que deve ser removida como calor e a variação de
entropia da amostra. A capacidade calorífica molar do alumínio é 24,35 J.K-1.mol-1.
4º) Calcule a variação de entropia molar quando dióxido de carbono se expande
isotermicamente de 1,5L para 4,5L.
5º) Uma amostra de dióxido de carbono, inicialmente ocupando 15,0L a 250K e 1,00atm,
é comprimida isotermicamente. Qual é o volume final do gás na compressão, sabendo
que a sua entropia foi reduzida de 10,0 J.K-1?
6º) Sempre que um gás se expande ele sofre um aumento de entropia. Uma amostra de
metano gasoso de massa igual a 25g, a 250K e 185KPa, se expande isotérmica e
reversivelmente até que a sua pressão seja de 2,5 kPa. Calcule a variação de entropia do
gás.
7º) Qual é a variação de entropia de 100g de água quando ela é aquecida da temperatura
ambiente (20oC) até a temperatura do nosso corpo (37oC)? Use Cp,m = 75,5 J.K-1.mol-1.
8º) Calcule a variação da entropia molar quando uma amostra de argônio for comprimida
de 2,0L para 500mL e , simultaneamente, aquecida de 300K para 400K. Considere
CV,m=(3/2)R.
9º) Um gás perfeito monoatômico, numa temperatura Ti, se expande isotermicamente até
atingir o dobro de seu volume inicial. A que temperatura ele deve ser resfriado para fazer
com que a sua entropia volte ao valor inicial? Considere CV,m=(3/2)R.
10º) A entalpia da transição de fase grafita → diamante, na pressão de 100 kbar e
temperatura 2000K, é +1,9 kJ.mol-1. Calcule a variação de entropia da transição.
118
11º) A entalpia de vaporização do clorofórmio (triclorometano), CHCl3, é 29,4 kJ.mol-1
na sua temperatura normal de ebulição, 334,88K. (a) Calcule a entropia de vaporização
do clorofórmio nesta temperatura. (b) Qual a variação de entropia nas vizinhanças?
12º) O octano é um componente típico da gasolina. Sabendo que a temperatura de
ebulição do octano é 126oC, calcule: (a) a entropia de vaporização; (b) a entalpia de
vaporização do octano.
13º) Calcule a entropia molar do cloreto de potássio a 5,0K dado que a sua capacidade
calorífica molar nessa temperatura é 1,2 mJ.K-1.mol-1.
14º) A capacidade calorífica molar, a pressão constante, de moléculas gasosas lineares é
de, aproximadamente, (7/2)R, e no caso de moléculas gasosas não lineares vale,
aproximadamente, 4R. Calcule a variação da entropia padrão de reação das duas reações,
que são apresentadas a seguir, quando a temperatura aumenta de 10K a partir de 273K, a
pressão constante:
(a) 2H2(g) + O2(g) → 2H2O(g)
(b) CH4(g) + 2O2(g) → CO2(g) + 2 H2O(g)
Respostas:
1º) 0,41 J.K-1
2º) a) 0,12 kJ.K-1 e b) - 0,12 kJ.K-1
3º) ∆S = -161,44 J.K-1; q = -45,2 kJ
4º) ∆S = +9,1 J.K-1
5º) 2,9 L
6º) 55,91 J.K-1
7º) 23,6 J.K-1
8º) -7,9 J.K-1.mol-1
9º) Tf = 0,63 Ti
10º) 0,95 J.K-1.mol-1
11º) a) +87,79 J.K-1.mol-1
b) -87,79 J.K-1.mol-1
12º) a) 85 J.K-1.mol-1
b) 33,9 kJ.mol-1
13º) 4,0 x 10-4 J.K-1.mol-1
14º) a) - 0,75 J.K-1
b) + 0,15 J.K-1
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