Efeitos da ubiquinona (coenzima Q10)
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Efeitos da ubiquinona (coenzima Q10)
Efeitos da ubiquinona (coenzima Q10) em miopatia em usuários de estatinas Carel F. Schaars and Anton F.H. Stalenhoef Department of Internal Medicine, Radboud University Nijmegen Medical Centre, Nijmegen, The Netherlands Propósito da revisão Estatinas são associadas a reclamações musculares, inclusive miosite. O mecanismo pelo qual o uso de estatinas causa toxicidade muscular é desconhecido. Uma das teorias é que a terapia com estatinas reduz o nível de coenzima Q10 nas mitocôndrias musculares conduzindo a dano muscular e miopatia. O alvo do presente artigo é revisar dados publicados da associação entre coenzima Q10 e miopatia associada às estatinas. Achados recentes Os estudos têm mostrado constantemente que as estatinas reduzem o nível de coenzima Q10 no soro e que a suplementação com coenzima Q10 aumenta estes níveis. Porém, o efeito da terapia com estatinas no nível da coenzima Q10 no músculo é conflitante. Recentemente foram publicados dois estudos piloto da suplementação com coenzima Q10 em miopatia induzida por estatinas e um estudo do efeito da suplementação com coenzima Q10 nos níveis das enzimas musculares no soro. Estes três estudos foram os primeiros trabalhos randomizados com suplementação com coenzima Q10 em pacientes hipercolesterolêmicos tratados com estatinas. Os resultados destes trabalhos foram contraditórios; considerando que um parece apoiar a suplementação com coenzima Q10, e os outros dois não. Resumo Esta revisão resume a atual evidência da suplementação com coenzima Q10 em miopatia induzida por estatinas. Nós concluímos que a presente evidência não apóia a suplementação com coenzima Q10 em miopatia induzida por estatinas. Current Opinion in Lipidology 2008, 19:553-557. Palavras chave coenzyme Q10, hypercholesterolemia, myopathy, statin therapy, ubiquinone Introdução Atualmente, são dispensadas milhões de prescrições de estatinas por ano [1]. Estatinas ou inibidores da enzima 3-hidroxi-3-metilglutaril redutase coenzima A (HMG-CoA) geralmente são bem toleradas. Porém, a complacência para o uso de estatinas pode ser influenciada negativamente pelos efeitos adversos. Reclamações musculares são um sintoma bem conhecido com o início do tratamento com estatinas. Em dois grandes estudos observacionais, 10-15% dos pacientes não selecionados tiveram reclamações de miopatia [2,3]. A ocorrência de uma forma extrema de miopatia, rabdomiólise, é informada em um a três casos por 100.000 pacientes ano [4,5]. Conhece-se pouco sobre o mecanismo pelo qual o uso de estatinas conduz à toxicidade muscular. Várias teorias foram propostas, como o bloqueio da síntese de colesterol pelas estatinas, causando uma redução no conteúdo de colesterol das membranas celulares do músculo esquelético, tornando-as instáveis. Uma outra é a diminuição de farnesil pirofosfato e geranilgeranil pirofosfato, que normalmente ativam proteínas regulatórias ligantes ao trifosfato de guanosina (GTP) - que promovem a manutenção e o crescimento da célula, e ao mesmo tempo diminuem a apoptose. Finalmente, a depleção da coenzima Q10 (CoQ10) na mitocôndria muscular possivelmente pode causar miopatia [6]. Neste artigo nós proveremos uma avaliação do conhecimento atual e da evidência da CoQ10 em relação a miopatia associada às estatinas com um foco em estudos humanos. Metabolismo e função da coenzima Q10 Correspondence to Professor Anton F.H. Stalenhoef, MD, PhD, FRCP, Department of Internal Medicine, 463, Radboud University Nijmegen Medical Centre, P.O. Box 9101, 6500 HB Nijmegen, The Netherlands Tel: +31 243618819; fax: +31 243541734; e-mail: [email protected] Current Opinion in Lipidology - 2008. CoQ10 ou ubiquinona é um produto final do caminho do mevalonato. Inibidores da HMG-CoA, ou estatinas, bloqueiam a produção de mevalonato da HMG-CoA (Fig. 1). Mevalonato é utilizado para sintetizar isoprenóides esteróis, como colesterol, e isoprenóides não-esteróis, como a ubiquinona ou CoQ10. 1 Figura 1 Caminho da biossíntese do colesterol Dolichol Esqualeno sintetase HMG-CoA redutase Acetil CoA HMGCoA Mevalonato Farnesil pirofosfato Esqualeno Colesterol Proteínas geranilgeraniladas Geranilgeranil pirofosfato Ubiquinona HMG-CoA, 3-hidroxi-3-metilglutaril coenzima A. Ubiquinona é um componente do sistema de transporte mitocondrial de elétrons. Participa do transporte de elétrons durante a fosforilação oxidativa na mitocôndria. Uma redução na CoQ10 poderia causar uma função respiratória mitocondrial anormal e poderia resultar em disfunção mitocondrial [7 ]. É sugerido que 50% da ubiquinona somos obtidas por ingestão de lipídios e os outros 50% por síntese endógena [8]. músculo, e foi iniciada suplementação com 250 mg/dia de CoQ10. Os níveis musculares de CoQ10 aumentaram e os sintomas diminuíram neste paciente. Foi teorizado que o tratamento a longo prazo com simvastatina revelou uma desordem mitocondrial subclínica [12]. No final dos anos 80, surgiu a teoria de que a deficiência de ubiquinona induzida pelas estatinas estava envolvida na patogênese da miopatia induzida pelas estatinas [9,10]. Esta teoria foi apoiada por alguns relatos de casos publicados durante aquele tempo. Um deles descreve um paciente hipercolesterolêmico de 48 anos tratado com lovastatina que desenvolveu miopatia muscular e um aumento da creatina quinase. Os sintomas musculares continuaram após a lovastatina ter sido descontinuada, e as reclamações diminuíram apenas após a suplementação diária com CoQ10. Foi sugerido que a CoQ10 poderia ter potencial para aliviar a miopatia em usuários de estatinas [10]. Outro artigo daquele tempo relatou uma família com acidose lática, miopatia mitocondrial e encefalopatia. Foram encontrados níveis muito baixos de CoQ10 na mitocôndria muscular desta família com níveis séricos normais de CoQ10. Os autores concluíram que a causa da citopatia mitocondrial foi a depleção de CoQ10. O encorajador desta teoria foi que a suplementação com CoQ10 pareceu diminuir os sintomas nesta família [11]. Depois, outro relato de caso descreveu um paciente com tratamento com simvastatina a longo prazo que apresentou rabdomiólise aguda, que no final, resultou em miopatia mitocondrial, encefalopatia, acidose láctica e episódios tipo acidente vascular (MELAS). Foram encontradas concentrações baixas de CoQ10 no Evidências extensas mostram que as estatinas diminuem os níveis séricos de CoQ10 [8,9,1328,29 ,30 ,31-34,35 ,36]. Apenas alguns estudos pequenos não mostraram qualquer mudança significativa na CoQ10 no soro após tratamento com estatinas [37-39]. Isto pode ser explicado em parte pelo pequeno número de participantes e a baixa dose de estatinas utilizada nestes estudos. A maior parte da redução da CoQ10 no soro pelas estatinas é causada pela diminuição do colesterol LDL. CoQ10 no soro é carreada pelas lipoproteínas, principalmente LDL e alguma quantidade por HDL, VLDL e IDL [40]. Current Opinion in Lipidology - 2008. Estatinas e coenzima Q10 no soro, músculos e mitocôndria Vários estudos informaram uma discrepância entre o nível de CoQ10 no soro e músculo após tratamento com estatinas [17,21,26]. Em 20 pacientes hipercolesterolêmicos, antes e após o tratamento com simvastatina 20 mg/dia durante 4 semanas, foi encontrada uma diminuição significativa na CoQ10 sérica e um aumento significativo na CoQ10 no músculo [17]. Estes achados foram reproduzidos em um estudo com 19 pacientes com 20 mg/dia de simvastatina com um acompanhamento maior que 6 meses [21]. Outro artigo de tratamento com atorvastatina em alta dose não informou uma mudança no nível de CoQ10 nos músculos [26]. De modo contraditório aos estudos mais precoces, encontrou uma diminuição significativa da CoQ10 2 muscular nos pacientes tratados com simvastatina 80 mg/dia. efeito colateral do tratamento com simvastatina e discutiram que a disfunção mitocondrial é a causa. Em outro estudo, os níveis de Q10 foram dosados em biópsias musculares de 18 pacientes com sintomas musculares associados a estatinas ou creatina quinase sérica alta ou a ambos. Nenhuma diferença foi encontrada entre o nível intramuscular de CoQ10 no grupo do estudo e 118 controles [41]. Suplementação oral com coenzima Q10 e miopatia associada a estatinas Um relato de quatro pacientes com reclamações de miopatia durante o tratamento com estatina, com níveis de creatina quinase sérica normal encontrou aumento dos estoques de lipídios, miofibras negativas em citocromo oxidase e fibras vermelhas rotas na biópsia muscular [42]. Todas estas características foram informadas anteriormente em pacientes com deficiência de CoQ10 [11], e todos estes são sugestivos de um defeito na função da cadeia respiratória mitocondrial, na qual a CoQ10 possui uma função [42]. Em um estudo realizado por de Pinieux et al. foram encontrados outros argumentos para a disfunção mitocondrial [22]. Foi encontrado um aumento na relação lactato/piruvato após tratamento com estatinas em pacientes hipercolesterolêmicos tratados com estatinas, comparado a pacientes hipercolesterolêmicos sem estatinas e controles. Esta relação às vezes é utilizada para mostrar uma mudança para o metabolismo anaeróbico e poderia ser um marcador de possível prejuízo da função mitocondrial [22]. Goli et al. [43] relataram sobre um paciente que desenvolveu acidose lática como um Vários estudos informaram que a suplementação oral com CoQ10 reverte a diminuição no nível sérico de CoQ10 pelas estatinas [9,14,28,29 ,32,34,37]. De nosso conhecimento, até o momento, não foi publicado nenhum relatório relatando o nível de CoQ10 no músculo após a suplementação com CoQ10. Um trabalho aberto fase I em pacientes com câncer avaliou o efeito de doses muito altas de lovastatina (até 35 mg/kg) com ou sem suplementação com CoQ10 240 mg/dia [28]. A suplementação com CoQ10 não diminuiu a incidência de toxicidade no músculo esquelético, porém, reduziu significativamente sua severidade. Estudos recentes de suplementação com coenzima Q10 e o efeito em miopatia por estatinas Recentemente foram publicados três artigos de miopatia associada a estatinas (Tabela 1) [29 ,30 ,35 ]. Dois estudos piloto investigaram a suplementação com CoQ10 e seu efeito nos sintomas musculares em pacientes tratados com estatinas. Young et al. [30 ] relataram um trabalho duplo-cego, controlado por placebo em pacientes com miopatia prévia associada a estatinas. No total, 44 pacientes foram randomizados a CoQ10 (200 mg/dia) ou placebo durante 12 semanas em combinação com simvastatina. A dose de simvastatina foi titulada para cima a cada 4 semanas, de 10 a 40 mg/dia. Tabela 1 Estudos recentes de miopatia associada a estatina e suplementação de coenzima Q10 Estudo Intervenção Duração Estudo grupo Resultado CoQ10 200 12 44 pacientes Nenhuma diferença na mudança da Young et al. [30 ] mg/dia vs. semanas hipercolesterolêmicos com contagem de miopatia ou no placebo miopatia tratados com número de pacientes que toleram simvastatina 40 mg/dia de simvastatina ou no número de pacientes que permanecem em terapia CoQ10 100 30 dias 32 pacientes Diminuição da severidade da dor Caso et al. [35 ] mg/dia vs. hipercolesterolêmicos com em 40% (P < 0.001) e interferência vitamina E 400 miopatia tomando várias da dor nas atividades diárias em UI/dia estatinas diferentes 38% (P < 0.02) no grupo com CoQ10. No grupo com vitamina E, nenhuma severidade da dor nem interferência da dor nas atividades diárias mostrou qualquer mudança significativa 16 49 pacientes Nenhuma diferença significativa na Mabuchi et al. [29 ] CoQ10 100 mg/dia vs. semanas hipercolesterolêmicos AST, ALT e creatina quinase entre placebo tratados com atorvastatina 10 os grupos mg/dia ALT, alanina aminotransferase; AST, aspartato aminotransferase; CoQ10, coenzima Q10. No grupo placebo o nível sérico de CoQ10 diminuiu em contraste com o grupo suplementado com CoQ10, no qual os níveis séricos de CoQ10 aumentaram. Porém, nenhuma diferença foi encontrada na contagem de mialgia entre os dois Current Opinion in Lipidology - 2008. grupos [30 ]. Por volta do mesmo tempo foi publicado um trabalho duplo-cego, controlado, randomizado, administrado por Caso et al. [35 ] em 32 pacientes hipercolesterolêmicos com sintomas miopáticos. Os pacientes foram tratados com 100 mg 3 de CoQ10 ou 400 UI de vitamina E. A severidade da dor foi informada no início e após 30 dias. Foi encontrada uma diminuição de 40% na severidade da dor e de 38% na interferência da dor com as atividades diárias no grupo com CoQ10 em contraste com a ausência de diferença na severidade da dor ou interferência da dor no grupo com vitamina E. Eles concluíram que a suplementação com CoQ10 poderia diminuir as dores musculares associadas ao tratamento com estatina [35 ]. Outro trabalho randomizado, controlado, duplo-cego, de placebo vs. CoQ10 100 mg/dia relatou diferenças nos níveis séricos de creatina quinase, aspartato aminotransferase (AST) e alanina aminotransferase (ALT). Foi administrado em 49 pacientes hipercolesterolêmicos tratados com atorvastatina 10 mg/dia. Foi encontrado um aumento significativo na concentração plasmática de CoQ10 no grupo tomando CoQ10, porém, nenhuma diferença entre os grupos foi achada nos níveis séricos de creatina quinase, AST ou ALT [29 ]. Discussão Muito tem sido escrito sobre estatinas e miopatia e o possível papel da CoQ10. A teoria de que as estatinas causam depleção de CoQ10 nos músculos e especificamente nas mitocôndrias musculares é plausível, pois as estatinas bloqueiam a produção de mevalonato, um dos precursores da CoQ10. Depleção de CoQ10 em mitocôndria mostrou ter um papel em alguma doença miopática mitocondrial [11,12,44]. Estatinas diminuem o nível sérico de CoQ10, mas vários estudos não puderam confirmar uma diminuição dos níveis de CoQ10 nos músculos durante a terapia com estatinas [17,21,26]. A maioria da diminuição da CoQ10 sérica pode ser explicada pela diminuição das lipoproteínas do soro, as transportadoras de CoQ10 [40]. Pesquisas iniciais no caminho do mevalonato sugeriram que a afinidade para o mevalonato talvez seja mais alta para o caminho da CoQ10 do que para outros caminhos [45]. Conforme sugerido por relatos de casos anteriores, isto poderia sugerir que as estatinas poderiam causar miopatia apenas em pacientes com um armazenamento já depletado de CoQ10 [12,43]. Os três trabalhos controlados, randomizados, administrados recentemente não puderam fornecer uma resposta clara sobre este assunto [29 ,30 ,35 ]. É possível que no presente, dois trabalhos em andamento realizados por Retterstøl na Noruega e Kondrack em Nebraska, USA, espalhem uma luz clara e definida sobre o assunto de suplementação com CoQ10 em miopatia causada por estatinas [46]. Em nossa visão, a evidência atual disponível não apóia a suplementação com CoQ10 em pacientes com miopatia por estatinas. Conclusão Current Opinion in Lipidology - 2008. A causa de miopatia associada às estatinas ainda é obscura. Três recentes trabalhos de suplementação com CoQ10 em miopatia associada às estatinas encontraram resultados contraditórios. Não há nenhuma resposta definitiva se a depleção de CoQ10 na mitocôndria muscular causa miopatia e possa ser tratada pela suplementação com CoQ10. A atual evidência disponível não apóia a suplementação com CoQ10 em pacientes com miopatia por estatinas. Reconhecimento Não há nenhum conflito de interesse. Referências e leitura indicada Papers of particular interest, published within the annual period of review, have been highlighted as: of special interest of outstanding interest Additional references related to this topic can also be found in the Current World Literature section in this issue (p. 603). 1. Jackevicius CA, Tu JV, Ross JS, et al. Use of ezetimibe in the United States and Canada. N Engl J Med 2008; 358:1819-1828. 2. Bruckert E, Hayem G, Dejager S, et al. Mild to moderate muscular symptoms with high-dosage statin therapy in hyperlipidemic patients - the PRIMO study. Cardiovasc Drugs Ther 2005; 19:403-414. 3. Scott RS, Lintott CJ, Wilson MJ. Simvastatin and side effects. 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