JAMAiCA - Fundação AIS

Transcrição

JAMAiCA - Fundação AIS
Fundação Ajuda à Igreja que Sofre
Relatório 2010
Liberdade Religiosa no Mundo
Relatório 2010
Liberdade Religiosa
no Mundo
Relatório 2010
Liberdade Religiosa no Mundo
Título original
Rapporto 2010 sulla Libertà Religiosa nel Mondo
Edição
Fundação Ajuda à Igreja que Sofre
Redactores
Marc Fromager (França)
Francesco Meloni (Itália)
Javier Menendez-Ros (Espanha)
Berthold Pelster (Alemanha)
John Pontifex (Reino Unido)
Roberto Simona (Suiça)
Coordenação editorial
Benedikt Steinschulte, Attilio Tamburrini, Marek Zurowski
Secretariado editorial
Ursula Müllerleile
Colaboradores
Marta Allevato, Pierluigi Baccarini, Daniela Bricca, Centro
de Libertad Religiosa (CELIR UC) de la Pontificia Universidad
Católica de Chile Rodolfo Casadei, padre Bernardo Cervellera,
Camille Eid, Vincenzo Faccioli Pintozzi, Annie Laurent,
Caterina Maniaci, Andrea Morigi, José Louis Orella, Giovanna
Parravicini, Franco Pisano, Oscar Sanguinetti, Chiara Verna
Tradução para Português
Maria de Fátima Dias
Capa
© JS Design
Mapas
© GEOnext - De Agostini, 2010
Concepção gráfica
SerSilito – Empresa Gráfica Lda.
Data
Setembro de 2010
Depósito legal
233198/05
ISBN
978-972-8991-24-1
© Fundação Ajuda à Igreja que Sofre
Rua Prof. Orlando Ribeiro, 5 D
1600-796 Lisboa
Tel. 217 544 000
www.fundacao-ais.pt
É autorizada a publicação parcial ou integral dos
textos desde que se cite a fonte. Todas as informações
disponibilizadas neste livro dizem respeito, por norma,
ao ano de 2007, excepto os acontecimentos que foram
considerados muito relevantes e tiveram lugar muito perto
da data de entrada do livro na gráfica.
Ín di c e
Apresentação
Guia de consulta
pág.
Europa
América
Ásia
Í
n d i c e
África
Oceânia
Fontes consultadas
Índice analítico de países
Liberdade Religiosa no Mundo
Endereços e outros Secretariados
História da Ajuda à Igreja que Sofre
Como ajudar
9
13
15
123
173
381
497
517
521
525
531
535
539
p r e s e n t a ç ã o
Apresentação
A
“Eu não tenho consciência; a minha consciência é Adolf Hitler”. Com estas palavras, Hermann Goering, o Comandante-Chefe da Luftwaffe, colocou a nu, de modo brutal, a sua pervertida maneira de pensar. Toda a selvajaria que se seguiu foi simplesmente a consequência
desta rejeição diabólica daquela irrevogável responsabilidade humana. Os crânios das crianças judias, espezinhados no chão, a procissão silenciosa por entre as cercas de arame farpado
dos que caminhavam para a morte nas câmaras de gás de Auschwitz eram, depois uma tal
declaração, apenas uma questão de eficiência na indústria de liquidação de vidas humanas,
e mesmo de povos inteiros.
A mesma lógica distorcida está igualmente presente, em essência, sempre que as pessoas
espezinham a esfera mais íntima da consciência religiosa do indivíduo. Fazê-lo é violar uma
convicção fundamental: a convicção de que devemos a nossa existência a um Ser, que nos
chama, sussurrando à nossa consciência, convidando-nos a uma amizade que toca as profundezas da nossa alma. A religião, de acordo com uma simples abordagem etimológica,
significa ‘re-ligare’, ligar e religar-nos a nós mesmos àquela presença secreta que é Deus, de
quem podemos aprender a resposta que nenhum outro ser consegue dar às nossas perguntas... Porque existe sofrimento? De onde vem a alegria? A clemência e a ternura têm a última
palavra? Os meios podem ser diferentes, as raízes fundamentadas em culturas diferentes,
com maior ou menor profundidade, mas todas as intenções de todas as tradições religiosas
partilham esta mesma aspiração, do homem que está insatisfeito com o que vê ao seu redor,
de um coração que intuitivamente apreende que o derradeiro significado de todas as coisas
deriva de um Ser que transcende o meramente físico e passageiro. Goering não tinha consciência própria, mas ainda assim precisava de um ponto de referência maior do que ele. E
então escolheu o pior - o despótico Hitler viria a ser a sua norma. Nascera um outro inferno.
A pessoa religiosa é o exacto oposto. Ela não se absolve das suas obrigações enquanto única
pessoa que no final de contas é responsável pelas suas próprias acções. A religião é a quintessência da consciência. O Catecismo da Igreja Católica cita o Concílio Vaticano II: “A consciência é o centro mais secreto e o santuário do homem, no qual se encontra a sós com Deus,
cuja voz se faz ouvir na intimidade do seu ser” (CCC 1776).
Esta qualidade humana nunca pode invocar qualquer Deus para justificar o comportamento
de Caim. Qualquer um que mata, prende, ameaça ou discrimina injustamente em nome de
Deus, na realidade blasfema e escolheu tornar-se um idólatra, adorando um ídolo criado
pelas suas próprias mãos.
Qualquer um que se afirme como agnóstico ou ateu deveria ponderar cuidadosamente.
Deverá conseguir distinguir entre alguém que é pseudo-religioso, que se limita a adular
a religião, e aquela conduta histórica que é autenticamente religiosa. Pode acontecer que
uma pessoa não consiga aceitar Deus como um ser real, que existe e actua. Mas, indubitavelmente, todos deveriam poder dar-se conta que uma religião genuína terá a capacidade
de autocrítica, implicando portanto uma constante vontade de conversão e de aperfeiçoamento. O Cristianismo, que vem de Cristo e é consolidado pelos Evangelhos é, pela sua
própria natureza, uma fé com esta qualidade humana. Nele convergem as realidades de ser
filho e de ser irmão e de ser livremente responsável pelo que cada um vive e faz no tempo.
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Nele, a pessoa humana possui dignidade, é única, e contudo sempre incompleta e à procura
de paz.
Visto de tal posição estratégica, este Relatório da Liberdade Religiosa, compilado por colegas
de trabalho da Ajuda à Igreja que Sofre, proporciona uma ampla perspectiva que é imensamente útil e oportuna. Neste mesmo ano de 2010, uma organização internacional de grande
importância para a verdade e a justiça no mundo publicou um documento fundamental.
No fim de Junho, a Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE) realizou
uma conferência de alto nível em Astana, a capital do Cazaquistão. Esta é a maior organização regional, depois das Nações Unidas, e entre os seus membros contam-se cinquenta e seis
países da Europa, Ásia Central e América do Norte. O líder da delegação da Santa Sé, o Bispo
Mario Toso, resumiu assim a sua opinião sobre as conclusões alcançadas durante as sessões
de trabalho: “Em relação à Igreja e às comunidades cristãs, e também em relação a outras
comunidades religiosas e aos respectivos membros, ainda existem leis que são intolerantes
e mesmo discriminatórias, e decisões e comportamentos, tanto activos como por omissão,
que negam tal liberdade”, declarou ele. Nos dias que se seguiram, o Bispo Toso afirmou que
“mais de 200 milhões de cristãos, por todo o mundo, sofrem alguma forma de ódio, violência,
ameaças, confiscação de propriedade e outros abusos, por causa da sua religião, tornando-os
deste modo o grupo religioso que sofre maior discriminação” (relatado na publicação Vida
Nueva, Madrid, Espanha, Agosto de 2010, Nº 2718).
A inquietante declaração de Goering deixou um impacto profundo e duradouro na consciência do jovem Joseph Ratzinger. Todo o seu pensamento subsequente, enquanto filósofo,
teólogo e professor, foi em oposição a Goering e àqueles como ele. Ser um ser humano é
ser conscientemente responsável, esforçar-se por alcançar e procurar a verdade de modo a
partilhá-la e cumpri-la. O Cristianismo é uma oferta feita à liberdade dos outros; a coexistência humana é diálogo, conduzido com respeito e com a maior claridade possível. Por esta
razão, durante a sua visita a Inglaterra, disse aos políticos: “A religião não é um problema, mas
um contribuinte vital para a conversação nacional”. Porém, Bento XVI não é nenhum teórico
abstracto, mas procura também despertar-nos para uma realidade alarmante. No Hyde Park,
em Londres, instou-nos a sermos mais vigilantes, advertindo-nos de que “No nosso tempo, o
preço a pagar pela fidelidade ao Evangelho já não é ser enforcado, arrastado e esquartejado,
mas implica com frequência ser excluído, ridicularizado ou parodiado.” Deixemos que cada
um de nós se aperceba disto mesmo.
Os meus agradecimentos, não apenas aos autores dos artigos, mas também à equipa editorial internacional, que trabalhou com grande empenho a fim de superar os inevitáveis problemas associados a esta publicação e, assim, contribuiu significativamente para a realização
do presente relatório.
Padre Joaquín Alliende
Presidente Internacional
Ajuda à Igreja que Sofre
10
u i a
d e
c o n s u l t a
Guia de consulta
G
Objectivos e metodologia
Este relatório foi compilado com o apoio de um grupo de investigadores, académicos e jornalistas que agregaram e tornaram disponível informação derivada principalmente de fontes
internacionais, de relatórios de vários grupos religiosos diferentes e de depoimentos de testemunhas oculares nos locais. O objectivo foi o de proporcionar uma imagem abrangente,
que fosse contudo detalhada, da liberdade religiosa no mundo e com a maior objectividade
possível. O relatório tenta permitir às diferentes religiões, crenças e agrupamentos religiosos
que falem por si próprios, evitando quaisquer juízos de valor sobre os credos ou convicções
que estão na base das suas práticas e dos ensinamentos religiosos.
O objectivo e a utilidade deste relatório consistem principalmente, acreditamos nós, em tornar disponível, dentro do contexto de um todo organizado, notícias, factos, situações e testemunhos pessoais que de um outro modo correriam o risco de ficarem no silêncio ou perdidos
entre a avalanche de informação diária. Esperamos que proporcione um entendimento mais
completo dos direitos e deveres relativos à liberdade religiosa, e dos direitos humanos de
modo mais geral, os enfoques específicos deste relatório.
Estrutura e formato
As entradas dos países registam e descrevem a situação actual e os acontecimentos mais
recentes no que diz respeito à liberdade religiosa nos respectivos países. Elas encontram-se
organizadas de acordo com o seguinte formato:
– uma descrição resumida do enquadramento jurídico e institucional em relação ao
direito à liberdade religiosa;
– o relato de qualquer melhoria ou deterioração na situação durante o período sob análise;
– o relato de episódios de intolerância ou de perseguição cometidos pelas autoridades ou
por grupos religiosos contra outros grupos.
Fontes jurídicas e factuais consultadas
A informação sobre o enquadramento legal e institucional dos vários países, e sobre a situação jurídica e social no que diz respeito ao direito à liberdade religiosa, foi obtida principalmente a partir do trabalho de referência básico da série Biblioteca Comares de Ciencia
Jurídica, coordenado pela Professora Ana Maria Vega Gutierrez, da Universidade de Rioja, em
Espanha, e publicada em 2003, em Granada, Espanha, pela Editorial Comares. A informação
foi actualizada e conferida usando os sítios da Internet Political Resources on the Net e Religion and Law Consortium.
No que diz respeito às fontes de informação em termos gerais, estas estão listadas no apêndice, depois da secção pertinente. Estas fontes são provenientes, como pode ser visto pelas
fontes religiosas citadas, de uma variedade de crenças e confissões religiosas diferentes; para
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o resto, os relatórios são fornecidos por organizações e agências internacionais que estão
ligadas à questão dos direitos humanos e, mais especificamente, à liberdade religiosa. Para
outra informação obtida localmente as fontes por vezes não são citadas, por razões de segurança pessoal.
Um agradecimento especial é devido aos funcionários do Departamento de Projectos da
sede internacional da Ajuda à Igreja que Sofre, cuja dedicação na verificação da informação
dada e, em muitos casos, o conhecimento directo dos problemas envolvidos, contribuíram
grandemente para o êxito na realização deste projecto.
Estatísticas
As estatísticas indicadas são obtidas a partir de uma variedade de fontes que foram escolhidas com base na sua credibilidade e integridade.
Os dados mais básicos, como o número de habitantes, são, para muitos países, o resultado de
estimativas e não são baseados em relatórios de censos genuínos, os quais, ou não existem
nestes países, ou são cientificamente dúbios. Os dados reportados são obtidos a partir do
Anuário Estatístico da Igreja Católica (2008), e foram comparados com os dados fornecidos
pela ONU.
A composição religiosa dos vários países é o aspecto mais complexo e difícil de verificar,
como os estudiosos deste campo muito bem sabem. Para alguns países existem estudos
cientificamente credíveis, mas para outros é preciso, por vezes, confiar em números fornecidos pelas partes directamente interessadas, o que claramente não nos proporciona uma
imagem passível de verificação.
Dada a necessidade de fazer uma escolha, decidimos, para o número de católicos, adoptar os
dados fornecidos pelo Anuário Estatístico da Igreja Católica (2008), enquanto para os cristãos
em geral, e para as outras religiões e movimentos, baseámos os nossos números sobretudo
em dados reportados e estimativas proporcionadas pela World Christian Database (Base de
Dados Cristã Mundial), considerada pelos académicos da sociologia das religiões uma das
fontes mais seguras. Em alguns casos, que estão adequadamente indicados, foram usadas
estimativas de especialistas que julgámos serem dignos de confiança. Fomos buscar as estatísticas sobre refugiados e pessoas em situação de deslocação interna aos sítios da Internet
do ACNUR (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados) e do Centro de Monitorização dos Deslocados Internos (IDMC) do Conselho Norueguês de Refugiados.
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EUROPA
C
o n t i n e n t e
ALbÂniA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos61,9%
Cristãos31,8%
Agnósticos6,3%
Cristãos
1.122.180
Católicos
507.000
Circunscrições
eclesiásticas
6
SUPERFÍCIE
28.748km2
POPULAÇÃO
3.169.000
REFUGIADOS
70
DESALOJADOS
---
17
ALbÂniA
Durante o período de tempo considerado, não ocorreram mudanças
significativas no país relativamente à liberdade religiosa.
O Governo albanês concede apoio financeiro à Igreja Católica, chegando mesmo a proporcionar um subsídio aos membros do clero, de
acordo com a lei do financiamento das comunidades religiosas, adoptada no dia 5 de Junho de 2009.
A Igreja Ortodoxa Autocéfala da Albânia está a construir uma nova
catedral em Tirana, em terrenos recebidos como indemnização pelas
expropriações sofridas sob o anterior regime comunista.
A comunidade muçulmana solicitou igualmente uma licença para
construir uma nova mesquita em terrenos que também recebeu
como indemnização pelas expropriações que sofreu sob o regime
comunista. O pedido encontra-se neste momento em fase de apreciação por parte da Câmara Municipal de Tirana.
ALEMAnHA
ALEMAnHA
O Artigo 4º da Constituição alemã refere que as liberdades de credo,
consciência, confissão religiosa e ideologia, são invioláveis e que a
liberdade de culto está garantida. Além disso, o Artigo 7º estabelece
o direito à instrução religiosa, enquanto o Artigo 33º garante a igualdade dos cidadãos qualquer que seja a sua confissão religiosa. No
Apêndice, que cita os artigos da Constituição de Weimar, datada de
11 de Agosto de 1919, referentes às relações entre o Estado e a Igreja,
existem medidas adicionais que protegem o livre exercício das convicções religiosas sem coerção. O mesmo apêndice define também
que não existe nenhuma religião de Estado.
As relações com a Igreja Católica e as Igrejas protestantes (Luterana
e Reformada) são reguladas por acordos tanto ao nível federal como
com os estados individuais, ou Länder. A Concordata de 1933 governa
as relações com a Igreja Católica. O reconhecimento dos grupos religiosos é regulado pelas leis federais gerais.
Todas as organizações religiosas podem requerer o estatuto jurídico
de “empresa sob direito público”. Este reconhecimento proporciona,
entre outras coisas, o direito para designar os capelães em hospitais,
prisões e nas forças armadas. As Igrejas cristãs estão também envolvidas na assistência social e nos cuidados de saúde. Muitos jardins-deinfância, escolas, hospitais e lares são geridos por paróquias, ordens
religiosas ou outras organizações relacionadas com a Igreja.
O Estado arrecada um imposto especial (o “Kirchensteuer” ou “Imposto
das Igrejas”) que é de aproximadamente 9% dos rendimentos dos
membros da “empresa” e em seguida redistribui estes rendimentos à
própria organização. A qualificação para este estatuto jurídico implica
o cumprimento de certas condições, como a dimensão da organização, a sua estabilidade com o passar do tempo e uma declaração clara
de que a organização não vai contra os princípios constitucionais e
os direitos fundamentais. Cerca de 180 organizações religiosas desfrutam deste estatuto, entre elas, por exemplo, a Igreja Católica, as
comunidades protestantes, a comunidade judaica, os Mórmones, os
Menonitas, os Metodistas e os Baptistas. Depois de uma longa batalha legal que durou dez anos, as Testemunhas de Jeová obtiveram
também agora o reconhecimento.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos70,7%
Agnósticos24,2%
Muçulmanos4,6%
Outros0,5%
Cristãos
62.436.460
Católicos
25.240.000
Circunscrições
eclesiásticas
31
SUPERFÍCIE
357.022km2
POPULAÇÃO
82.057.000
REFUGIADOS
593.799
DESALOJADOS
---
Hostilidade anti-cristã
A postura de oposição cultural para com os princípios expressos pelas
comunidades cristãs, em particular pela Igreja Católica, em questões
como a família, a moralidade sexual e a defesa da vida humana, como
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é transmitida pela maior parte da imprensa e dos meios de comunicação social, é frequentemente apresentada como uma atitude de hostilidade preconcebida para com o Cristianismo.
Em pessoas com tendências extremistas, tal tem conduzido a violência contra símbolos e
edifícios religiosos.
ALEMAnHA
Em Março de 2010, um inquérito feito pelo jornal diário Frankfurter Allgemeine Zeitung enumerou uma série de actos de vandalismo em igrejas e capelas – como roubos ou destruição
de estátuas – actos que aumentaram em número durante o ano em questão. Não são mencionados as razões ou os fundamentos para estes incidentes. Em Abril de 2010, foram pintados graffiti ofensivos na casa onde Joseph Ratzinger (o Papa Bento XVI) nasceu.
Fortes controvérsias foram causadas por um congresso de juventude chamado “Christival”
que teve lugar em Bremen, em Abril de 2008. Este congresso, com cerca de 16.000 participantes, foi o quinto desde 1976 e tem como base os princípios bíblicos. Algumas fontes mediáticas influentes criticaram o congresso como sendo “fundamentalista”, em especial alguns
dos seus workshops, por exemplo sobre homossexualidade e a “possibilidade de mudar” ou
“de curar”. A crítica veio também de partidos políticos como os Verdes (Bündnis ’90 / Die
Grünen), enquanto os conservadores da CDU (União Democrata Cristã) e a Igreja Protestante
apoiaram o congresso. Vários membros da denominada “Aliança Anti-sexista” tentaram no
entanto impedir a realização deste evento, causando distúrbios durante a sua inauguração.
Em Novembro de 2008, apareceu também um artigo sobre o “Christival” na revista “Q-rage”
(“coragem”) que faz parte de uma iniciativa escolar de âmbito nacional contra a discriminação denominada “Escola sem racismo – Escola com coragem”. Esta revista escolar, com
uma circulação de um milhão de exemplares, é apoiada por agências do Governo e outras
instituições. O artigo sobre o congresso “Christival” fora escrito por dois estudantes de 18
anos de idade, que descreveram as posições dos participantes como “ultra-conservadores”
e “hostis à Constituição alemã”. O tópico principal daquele número da revista era, porém,
o Islão e o fundamentalismo islâmico. Num artigo de opinião, Thomas Krüger, presidente
da Bundeszentrale für politische Bildung (Agência Federal Central para a Educação Política)
que também subsidia a revista, definiu um paralelo entre os grupos islâmicos e evangélicos,
descrevendo-os a ambos como uma ameaça à liberdade. No seguimento de protestos, Krüger pediu desculpa pelo artigo e o Bundeszentrale für politische Bildung descreveu o artigo
sobre o “Christival” na “Q-rage” como “completamente inaceitável” devido a ser “parcial” e
“confuso”.
Em Maio de 2008, a Universidade Ludwig Maximilians (LMU) de Munique retirou o seu reconhecimento a um Seminário sobre Ética para a Gestão com base Cristã, reivindicando que os
conteúdos cristãos alegadamente violam o politicamente correcto. O curso, que foi retirado
do currículo, tinha sido leccionado durante alguns de anos pelo Professor Friedrich Hanssmann, em conjunto com o curso sobre os valores cristãos na economia e na sociedade, e
tinha por base os Dez Mandamentos, o amor pelo próximo e pela criação, e a relação do indivíduo com Deus, tudo isto aplicado ao trabalho e à vida económica de cada um.
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ALEMAnHA
Em muitos estados da federação (Länder) os estudantes que não desejem assistir às aulas de
educação religiosa têm permissão para escolher um curso sobre ética. Em Berlim e no Brandeburgo, os cursos de ética são obrigatórios para todos os estudantes, enquanto a educação
religiosa é opcional. Foi realizado um referendo no dia 26 de Abril de 2009 em Berlim, sobre
uma proposta de lei que pretendia permitir aos alunos frequentarem a educação religiosa
em vez do curso obrigatório sobre ética. A proposta foi no entanto rejeitada.
Por fim, ocorreram alguns casos de hostilidade para com padres, cujo episódio mais significativo de todos aconteceu em Outubro de 2009 contra o padre ortodoxo Aleksejs Ribakovs, que
foi espancado e obrigado a mudar-se de modo a proteger a sua família. Os atacantes tinhamno insultado especificamente por ele ser cristão. No mês seguinte uma capela protestante
foi incendiada na noite de 15 para 16 de Novembro, em Over, perto de Hamburgo, depois de já
ter sido alvo de dois ataques incendiários.
Os problemas colocados pela imigração islâmica
A presença de uma grande comunidade islâmica de origens étnicas e religiosas diferentes
causa problemas na regulação das relações entre o Estado e os Muçulmanos. Com o objectivo de obter o estatuto jurídico de “empresa sob direito público” e no seguimento de um
pedido por parte das autoridades estatais para negociarem apenas com uma só organização, no dia 9 de Abril de 2007, as quatro maiores organizações islâmicas criaram uma única
organização religiosa que alegadamente representa todos os muçulmanos no país. Porém,
muitos observadores, entre os quais o ministro do Interior, sustentaram que a organização
apenas representa entre 10 a 15% da totalidade da população muçulmana. Por outro lado,
o reconhecimento do estatuto jurídico de “empresa sob direito público” coloca potenciais
problemas à comunidade islâmica, por exemplo no modo como são enterrados os mortos
em cemitérios permanentes, meramente embrulhados numa mortalha, um método que, em
termos gerais, está em conflito com as leis alemãs sobre funerais.
Muitos estados federais (Länder) (de facto, 11 de entre os 16) adaptaram a sua legislação
para responder às exigências muçulmanas. Os esforços feitos pelo Governo para integrar
a comunidade muçulmana, como as iniciativas levadas a cabo pelas “Conferências para a
Integração”, com uma realizada no dia 25 de Junho de 2009, por exemplo, foram obstruídos
pela insistência dos grupos islâmicos na separação de raparigas e rapazes nas actividades
desportivas escolares assim como na imposição do uso do lenço de cabeça. O ensino da religião islâmica, autorizado em muitos estados federais (Länder), também causa problemas
devido às divisões, por exemplo, entre sunitas, xiitas e alevis. Em 2007, em Baden-Württemberg, foram autorizados cursos específicos baseados nas diferentes tradições, mas devido a
dificuldades encontradas em organizar cursos aprovados pelos vários imãs, neste momento
apenas dez escolas estatais de entre cerca de 4.700 conseguiram dar início a estes cursos. Em
alguns estados federais, não é permitido às professoras muçulmanas usar lenços de cabeça
nas escolas estatais. A nova legislação foi expressa de modo abrangente de forma a poder
20
ALEMANHA
ser aplicada a qualquer símbolo religioso ou outro usado para expressar desaprovação dos
valores constitucionais.
Em anos recentes, algumas universidades criaram faculdades de religião islâmica. Em alguns
casos, porém, como na Universidade de Münster, um professor acusado por grupos extremistas de ensinar uma forma do Islão que não está conforme com a sua própria interpretação
foi colocado sob protecção policial e obrigado a continuar o curso num local mantido em
segredo e apenas revelado aos seus alunos.
As escolas para a formação de imãs estão também a espalhar-se, quer como iniciativas privadas quer organizadas pelas autoridades estatais como é o caso do Ministério do Interior
da Baixa Saxónia.
21
AnDORRA
AnDORRA
A Constituição de 1993 garante a liberdade religiosa, embora reconhecendo a relação particular do país com a Igreja Católica Romana, de
acordo com as tradições de Andorra, um principado governado pelo
chefe de Estado francês e pelo Bispo da Diocese católica espanhola
de Urgell.
No dia 17 de Março de 2008, a Santa Sé representada pelo secretário
de Estado, sua Eminência o Cardeal Tarcísio Bertone, e o Principado
de Andorra, representado pelo líder do Governo, o primeiro-ministro Albert Pintat, assinaram um acordo que foi ratificado no dia 12
de Dezembro de 2008. O acordo diz respeito à nomeação do Bispo
de Urgell, ao estatuto da Igreja Católica em Andorra, ao matrimónio canónico e à instrução religiosa. Os dezasseis artigos do acordo
reconhecem as prerrogativas da Igreja de liberdade e autonomia das
autoridades civis conforme o declarado na Constituição de Andorra.
Estabelecem ainda o calendário para os feriados religiosos reconhecidos pelo Principado.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos92,4%
Agnósticos5,8%
Outros1,8%
Cristãos
72.852
Católicos
74.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
468km2
POPULAÇÃO
86.700
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
---
22
ÁUSTRiA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos79%
Agnósticos15,4%
Muçulmanos4,5%
Outros1,1%
Cristãos
7.444.420
Católicos
6.063.000
Circunscrições
eclesiásticas
12
SUPERFICIE
83.859km2
POPULAÇÃO
8.387.000
REFUGIADOS
38.906
DESALOJADOS
---
23
ÁUSTRiA
A Constituição Federal declara, no Artigo 7º, que “todos os nacionais
da Federação são iguais perante a lei. Os privilégios baseados no nascimento, no sexo, nas propriedades detidas, na classe ou na religião
estão excluídos”. O Artigo 10º estabelece ainda que “o direito de associação e de reunião” e “os assuntos religiosos” são questões relativas
à legislação federal. Muitas leis possuem o estatuto de leis constitucionais, para as quais não existe, porém, um texto único sobre determinados assuntos importantes.
Além da Concordata com a Igreja Católica, em vigor desde 1933, o
estatuto das restantes confissões religiosas é orientado pela lei de
1874 e pela emenda legislativa de 1998, relativas às “comunidades
confessionais”.
Esta lei define três níveis de reconhecimento, cada um com direitos e
deveres diferentes:
O estatuto de uma “sociedade reconhecida” (sociedades reconhecidas – estatuto de sociedade religiosa), o qual pressupõe um mínimo
de vinte anos de existência no país e um número total de membros
equivalente a 2% da população (cerca de dezasseis mil membros).
O estatuto de uma “comunidade confessional”, com um mínimo de
300 membros. Estas são obrigadas a submeter os seus estatutos, os
seus objectivos e os meios de financiamento ao Ministério da Educação, o qual decide sobre a sua adequação.
O estatuto de “associações” simples. Estas são governadas pela Lei
das Associações.
De um modo geral, os grupos religiosos minoritários conseguem
obter reconhecimento enquanto “associações” sem muita dificuldade, e podem assim dar início ao processo de avançar para o nível de
“comunidades confessionais”, o qual confere vantagens fiscais assim
como organizacionais, embora ainda assim inferiores às concedidas
às “sociedades religiosas reconhecidas” que desfrutam, além disso, de
direitos no campo da educação e na obtenção de fundos estatais.
Durante o período de tempo considerado, não ocorreram mudanças
significativas no país relativamente à liberdade religiosa.
bÉLGiCA
bÉLGiCA
Legislação
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Desde Dezembro de 2009, a Comissão para a Reforma Institucional
do Senado Belga tem vindo a estudar pormenorizadamente um projecto de lei apresentado pelo senador socialista Philippe Mahoux e
apoiado pelos colegas Paul Wille, Jean-Jacques De Gucht, Christine
Defraigne, Josy Dubié e Olga Zrihen, propondo uma proibição aplicável a todos os funcionários públicos de usarem o véu ou qualquer
outro sinal de convicção religiosa ou filosófica, e proibindo membros
da Administração Pública de expressarem as suas opiniões religiosas
ou orientações ideológicas. O projecto de lei estabelece além disso
que seria obrigatório remover todos os símbolos ou objectos religiosos de áreas públicas.
O debate na sociedade belga tem, porém, envolvido principalmente
algumas práticas islâmicas e a secularidade das instituições, no seguimento de decisões em tribunais civis e deliberações do Conselho de
Estado, bem como a necessidade de regulamentar as muitas normativas administrativas adoptadas por autoridades locais e educativas
relativamente à legitimidade do uso do véu em locais públicos. Com
um voto quase unânime, a Câmara Baixa aprovou, no dia 22 de Abril
de 2010, uma primeira versão de uma lei que proíbe o uso do véu total
em todos os locais públicos. Se também o Senado Belga confirmar
esta disposição, aqueles que comparecerem “num local público com o
rosto parcial ou totalmente coberto com uma peça de vestuário que
resulte na impossibilidade de ser identificado” será multado e detido
por um período de um a sete dias.
No seguimento de um estudo publicado por La Libre Belgique e Le
Figaro (21 de Março de 2008) relativo ao futuro da população muçulmana em Bruxelas, a conclusão a que se chegou foi que, daqui a vinte
anos, a capital belga terá uma maioria muçulmana.
Cristãos81,5%
Agnósticos14,1%
Muçulmanos3,7%
Outros0,7%
Cristãos
9.306.820
Católicos
7.713.000
Circunscrições
eclesiásticas
9
SUPERFÍCIE
30.528km2
POPULAÇÃO
10.698.000
REFUGIADOS
15.545
A Igreja Católica
Uma resolução aprovada em Abril de 2009 pela Câmara Baixa expressou, com uma vasta maioria, a condenação do Papa Bento XVI depois
da sua declaração durante a viagem que realizou aos Camarões em
Março de 2009. Segundo os deputados, o Papa foi responsável por um
“crime contra a humanidade” por ter afirmado que a distribuição de
preservativos não ajuda a prevenir a propagação do vírus VIH/SIDA.
Fazendo um comentário sobre o ataque contra a Santa Sé, o director
do Gabinete de Imprensa do Vaticano, P. Federico Lombardi, descre-
DESALOJADOS
---
24
bÉlgICA
veu-a como “surpreendente” e reiterou que o Santo Padre é “livre de expressar as suas próprias opiniões”, lembrando também a todos a existência de estudos realizados por vários
investigadores e agências internacionais, incluindo a Organização Mundial de Saúde, que
provam que as melhores campanhas de prevenção da SIDA são precisamente aquelas que
promovem a castidade e a fidelidade nas relações sexuais. Sem a obtenção de consenso por
entre os membros do Senado sobre esta resolução, ela acabaria por ser retirada no dia 28 de
Abril de 2009.
No entanto, os ataques contra a Igreja continuaram em alguns dos jornais nacionais, atingindo com particular persistência os sacramentos, e de um modo ofensivo para os católicos,
causando assim a indignação de Hans Geybels, porta-voz do Cardeal Godfried Danneels.
Outras circunstâncias e contexto: na noite de 11 para 12 de Dezembro de 2008, a Igreja Melquita Grega de S. João Crisóstomo, em Bruxelas, foi incendiada. Tal ocorrência foi reconhecida
como tendo sido um acto criminoso.
No dia 24 de Junho de 2010, a polícia revistou a sede da Conferência Episcopal Belga e a Catedral de Malines como parte de investigações sobre crimes relacionados com a pedofilia, apoderando-se de toda a documentação detida pela Comissão Conjunta que estava a investigar
casos que envolvem o abuso sexual de menores. Nessa ocasião, os bispos belgas ficaram proibidos de sair do local durante nove horas, o que deu origem a uma reacção por parte da Santa
Sé, a qual descreveu o incidente como “inadmissível.” No dia 2 de Julho de 2010, a Conferência
Episcopal Belga emitiu uma declaração reiterando que os bispos não desafiam o direito das
autoridades judiciais para revistar propriedades, desde que este direito seja exercido dentro do enquadramento legal prescrito e seja baseado em evidências legítimas e específicas,
utilizando meios proporcionais. Os bispos rejeitam o modo como a busca foi levada a cabo
na sede da Comissão que lida com as acusações de abuso sexual. “Ao apropriar-se de todos
os ficheiros sobre as vítimas”, observou a Conferência Episcopal, “é óbvio que a Comissão foi
impedida de continuar a sua missão delicada.” Os bispos já tinham mencionado a questão
em três declarações oficiais, todas datadas de 25 de Junho. Na primeira declaração observaram que, ao revistar a sede da Conferência Episcopal, “o sistema judicial tinha mostrado uma
falta de confiança no trabalho da Comissão.” Como é do conhecimento geral, a intervenção
por parte da polícia judicial aconteceu enquanto os bispos estavam reunidos. Tratava-se de
uma reunião durante a qual o Arcebispo de Malines-Bruxelas, André-Joseph Léonard, presidente da Conferência Episcopal Belga, tinha uma vez mais reiterado a necessidade de uma
política de “tolerância zero” em matéria de abuso sexual de menores.
25
biELORÚSSiA
biELORÚSSiA
A difícil relação entre as autoridades políticas em Minsk e os grupos
religiosos está profundamente enraizada na história deste país, onde
existe ainda um legado cultural soviético.
Embora a Constituição reconheça o direito à liberdade religiosa, a legislação sobre esta questão acaba por, de facto, limitar significativamente
a sua implementação concreta. A lei de 2002 sobre religião reconhece
o papel determinante da Igreja Ortodoxa no desenvolvimento das tradições do povo Bielorrusso; do mesmo modo, também a Igreja Católica,
o Judaísmo, o Islão e a comunidade Luterana são reconhecidos como
tendo um papel especial enquanto “crenças tradicionais”.
O trabalho dos missionários estrangeiros depara-se com muitos
obstáculos administrativos, especialmente em relação à emissão de
autorizações de residência, e todas as actividades de proselitismo
são duramente controladas e restringidas pelas forças de segurança.
Aos prisioneiros políticos e àqueles que estão presos por questões
de consciência, é-lhes frequentemente negado o direito ao culto. Por
razões que estão aparentemente ligadas à burocracia, os membros
de comunidades religiosas que aqueles que se encontram no poder
desaprovam são punidos com multas e sanções financeiras. A veneração de mártires do período soviético, cuja memória está ainda muito
viva nas comunidades ortodoxas, é também desincentivada.
As questões relativas a propriedades que são posse de minorias religiosas permanecem por solucionar. Embora cerca de 95% das igrejas
ortodoxas históricas tenham sido devolvidas, quase todas as sinagogas judaicas permanecem propriedade do Estado e os cristãos calvinistas e luteranos têm alcançado pouco sucesso com as suas reivindicações.
As licenças para a construção de novos edifícios religiosos são também concedidas com muita dificuldade, mesmo se as entidades religiosas tiverem disponíveis terrenos apropriados para a construção.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos73,8%
Agnósticos25,6%
Outros0,6%
Cristãos
7.218.404
Católicos
1.422.222
Circunscrições
eclesiásticas
4
SUPERFÍCIE
207.600km2
POPULAÇÃO
9.588.000
REFUGIADOS
580
A Igreja Católica
DESALOJADOS
---
Desde 2008, uma petição assinada por dezenas de milhares de pessoas tem tentado lembrar às autoridades a necessidade de respeitar
a promessa feita de devolver o complexo de edifícios do anterior Mosteiro Bernardino em Minsk (incluindo a Igreja de São José). Trata-se
de um complexo barroco do séc. XVII que agora se arrisca a ser transformado num hotel de turismo ou, na melhor das hipóteses, num
museu, por via do desejo do Estado de transformar em hotéis vários
locais de culto que são posse legal da Igreja Católica.
26
bÓSniA HERZEGOVinA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos55,4%
Cristãos41%
Agnósticos3,6%
Cristãos
1.351.000
Católicos
464.000
Circunscrições
eclesiásticas
3
SUPERFÍCIE
51.197km2
POPULAÇÃO
3.760.000
REFUGIADOS
7.132
DESALOJADOS
114.000
27
bÓSniA HERZEGOVinA
A liberdade religiosa é, em termos gerais, respeitada no país. Têm sido
efectuadas queixas sobre as restrições impostas pelas autoridades
bósnias a certos grupos minoritários. A violência e os abusos continuam a ocorrer em algumas zonas do país.
Em Sarajevo, Banja Luka e Mostar, os líderes religiosos de grupos
minoritários continuam a queixar-se de discriminação perpetrada
por funcionários dos Governos locais, especialmente em relação ao
uso das suas próprias propriedades para fins religiosos. Também não
lhes é dada protecção adequada contra actos de vandalismo ou de
provocação.
No mês de Janeiro de 2009, o ministro da educação da Republica Sérvia (Republika Srpska) introduziu um curso de Cultura das Religiões
enquanto disciplina experimental para todos os alunos do primeiro
ano do ensino secundário, e com início no segundo semestre.
A comunidade Baptista continua a queixar-se dos problemas que
enfrenta quando tenta registar a Aliança das Igrejas Protestantes e
Evangélicas na Bósnia e Herzegovina. O ministro da Justiça afirmou
que o problema reside no facto de a lei não reconhecer formalmente
o termo “aliança”.
Continua a existir o problema da construção ilegal de edifícios religiosos. Uma igreja ortodoxa sérvia não autorizada continuava aberta
na cidade de Konjevic Polje, apesar da decisão de mandar destruir ou
remover o edifício, decisão esta datada de 2004 e oriunda do Ministério do Planeamento Urbano. Em 2007, funcionários ortodoxos sérvios
concordaram, em princípio, em mudar a localização da igreja, mas tal
ainda não aconteceu.
No dia 20 de Fevereiro, um tribunal em Banja Luka ordenou ao Governo
da Republica Sérvia (Republika Srpska) e à cidade de Banja Luka que
pagasse aproximadamente 34,6 milhões de euros de indemnização
pela destruição de dezasseis mesquitas durante a guerra de 1992-95.
No dia 17 de Março de 2009, o Governo apresentou um recurso contra
esta decisão.
Nos finais de Abril de 2009, uma igreja ortodoxa sérvia construída no
local de uma mesquita destruída na aldeia oriental de Divic foi removida sem problemas.
Felizmente, o número de ataques contra símbolos religiosos, clérigos
e propriedades nas três zonas de maiorias étnicas diminuiu. Não obstante, os Ortodoxos sérvios ainda são alvo de vandalismo.
Por exemplo, no dia 6 de Janeiro, a véspera do Natal Ortodoxo, indivíduos não identificados queimaram a bandeira nacional na catedral
bÓSniA HERZEGOVinA
ortodoxa na cidade de Tuzla. A partir de então, a igreja dispõe de protecção policial para o
edifício durante as vinte e quatro horas do dia.
Alguns vândalos também actuaram sobre locais católicos. Durante a semana de 23 de Março
de 2009, as janelas da Igreja Católica de São Lucas, no município de Novi Grad (Cidade de
Sarajevo), foram danificadas por três vezes. Tratou-se do décimo-sexto ataque desde 2005.
Foram também vandalizadas propriedades de judeus. No dia 15 de Fevereiro de 2009, apareceram em Sarajevo graffiti que associavam a suástica à Estrela de David. Nos dias 7 e 8
de Janeiro de 2009, durante uma das muitas crises na faixa de Gaza, graffiti anti-semitas
apareceram em Mostar.
A discriminação continua a ser um problema grave, em especial contra os não sérvios na
entidade predominantemente sérvia, contra os não croatas na Herzegovina ocidental, e contra os não bósnios na Bósnia central.
28
bULGÁRiA
Embora a Constituição reconheça o direito à liberdade religiosa, na
prática as leis que dizem respeito a este assunto continuam a ser bastante ambíguas e isto resulta frequentemente em decisões arbitrárias
tomadas pelas autoridades locais em relação à situação de grupos
religiosos e, em especial, daqueles que não se encontram registados.
Em Março de 2009, o Governo socialista aprovou uma proposta de
lei com o objectivo de reformar o ensino primário e secundário, o que
incluía uma medida que resultaria na proibição nas escolas de muitos símbolos religiosos, desde o crucifixo cristão até os adereços de
cabeça muçulmanos.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Violações do direito à liberdade religiosa
Cristãos
6.220.800
As principais confissões religiosas (Ortodoxos, Católicos, Muçulmanos,
Judeus e muitos grupos protestantes) continuaram o seu protesto
sobre a recuperação das muitas propriedades confiscadas durante o
período comunista.
Os pedidos de registo apresentados por alguns grupos são por vezes
rejeitados, principalmente devido a razões burocráticas. Por exemplo,
no dia 22 de Janeiro, os tribunais na cidade de Sofia rejeitaram um
pedido apresentado pelo Centro Judaico Chabad Lubavitch, declarando que este não satisfazia os padrões legais requeridos e teria violado o Artigo 27º da lei sobre as confissões religiosas ao ter aberto
uma sinagoga e um jardim-de-infância.
Os grupos protestantes continuam a relatar restrições às suas actividades em zonas nas quais existe uma maioria muçulmana e de etnia
turca.
Os mórmones, em particular, relataram uma série de incidentes em
vários locais, quando os seus missionários foram proibidos de discutir assuntos religiosos e de distribuir material informativo em locais
públicos. No dia 28 de Junho de 2009, missionários mórmones foram
mesmo atacados e espancados por um grupo de jovens demasiado
empolgados que saíam de um campo de futebol. A polícia abriu uma
investigação em relação a este “incidente”.
Em Janeiro, a Agência para as Confissões Religiosas emitiu uma
advertência às Testemunhas de Jeová em relação a repetidas reclamações recebidas sobre o seu costume de envolver menores em conversas religiosas sem permissão dos respectivos pais. As Testemunhas
de Jeová defenderam-se afirmando que os seus missionários tinham
Cristãos83,8%
Muçulmanos12,1%
Agnósticos4,1%
Católicos
73.000
Circunscrições
eclesiásticas
3
SUPERFÍCIE
110.912km2
POPULAÇÃO
7.497.000
REFUGIADOS
5.393
DESALOJADOS
---
29
bULGÁRiA
Legislação
BULGÁRIA
sido enganados. Porém, o grupo emitiu directrizes para uso interno, explicando aos seus
seguidores a proibição legal sobre tais actividades.
No dia 26 de Fevereiro de 2010, o Bispo Ortodoxo de Veliko Tornovo liderou uma manifestação de protesto e apresentou uma petição assinada por cinco mil cidadãos ao presidente da
Câmara de Gabrovo, opondo-se à construção de um centro de oração para as Testemunhas
de Jeová. A construção tinha sido inicialmente autorizada pelas autoridades locais, tendo
sido depois interrompida porque um muro fora construído ilegalmente em redor do local.
Este muro foi na realidade demolido no dia 24 de Março, mas as Testemunhas de Jeová continuam neste momento à espera da autorização para retomar a construção do centro de
oração.
No dia 19 de Março, a Câmara Municipal de Burgas mandou interromper a construção de
uma mesquita por razões que envolvem a ordem pública. A autorização tinha sido originalmente concedida depois de um pedido ser apresentado pela comunidade islâmica local em
Dezembro de 2008, quando uma mesquita ilegalmente construída fora demolida.
Nesta mesma cidade, a Universidade Livre expulsou uma estudante muçulmana depois de
ela se ter recusado a fazer um exame com a cabeça descoberta.
No dia 3 de Março, foram lançados dois coquetéis Molotov contra uma mesquita em Varna
que já tinha sido sujeita a vandalismo em Maio de 2008.
30
CHiPRE
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos71,9%
Muçulmanos21,9%
Agnósticos4,4%
Outros1,2%
Cristãos
744.331
Católicos
25.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
9.251km2
POPULAÇÃO
880.000
REFUGIADOS
2.888
DESALOJADOS
201.000
31
CHiPRE
No Norte desta ilha mediterrânica, zona denominada República Turca
do Chipre do Norte (RTCN), autoproclamada depois da intervenção
militar turca em 1974, a maioria dos bens patrimoniais culturais
agora danificados ou em ruínas pertence à Igreja Ortodoxa do Chipre, uma das Igrejas Ortodoxas mais antigas no mundo. Outros bens
em perigo pertencem à Igreja Ortodoxa Arménia, à Igreja Maronita, à
Igreja Católica e a várias comunidades judaicas.
A posterior ocupação de 37% da ilha resultou no equivalente a “uma limpeza étnica forçada” como declarou William Mallinson num ensaio publicado muito recentemente pela Universidade do Minnesota. O Governo
turco patrocina o que Mallinson descreve como “uma política de colonização sistemática” dos antigos territórios gregos no Norte do Chipre. Em
1973, contavam-se 120.000 cipriotas turcos; desde então mais de 160.000
cidadãos da República da Turquia instalaram-se nestes territórios.
De acordo com dados do relatório Destruction of Cultural Property in the
Northern Part of Cyprus and Violation of International Law (Destruição
de Propriedade Cultural na Zona Norte do Chipre e a Violação do Direito
Internacional), resultado do trabalho de muitos peritos internacionais
em arte e apresentado à Organização para a Segurança e a Cooperação
na Europa, foram saqueadas, demolidas ou vandalizadas cerca de 500
igrejas ou capelas ortodoxas; 133 igrejas, capelas e mosteiros foram profanados; mais de 15.000 quadros desapareceram; setenta e sete igrejas
foram transformadas em mesquitas, enquanto vinte e oito foram por
sua vez usadas pelo exército turco como hospitais ou acampamentos
e treze foram transformadas em armazéns. O relatório realça também
que, nas setenta e sete igrejas transformadas em mesquitas, passagens
do Alcorão substituíram as áreas anteriormente reservadas aos ícones
cristãos. O Mosteiro de Santa Anastácia foi transformado num hotel;
frescos e pinturas do Mosteiro bizantino de Antífona foram removidos
para serem vendidos a negociantes de arte.
Em sua defesa, os representantes da RTCN declararam que também
houve roubos de arte sacra na parte Sul da ilha. Porém, de acordo
com dados fornecidos pelo Governo em Nicósia, foram gastos mais
de 460.000 euros para restaurar dezassete mesquitas históricas no
Sul da ilha. Jerome Bowers, professor de história na Universidade do
Norte de Illinois, pôde averiguar que a maioria das obras de arte religiosas roubadas no Norte da ilha é depois ilegalmente vendida no Sul.
Representantes das duas comunidades cipriotas encontram-se actualmente num processo de negociações de modo a criar um comité
conjunto para a protecção do seu património cultural.
CROÁCiA
CROÁCiA
Desde Agosto de 2009, muito do debate sociopolítico no país concentrou-se numa questão levantada pelo presidente croata Stjepan
Mesić, numa entrevista dada à Rádio Nacional Croata (RH).
Nesta entrevista, ele afirmou que “Os símbolos religiosos não deveriam estar presentes nos ministérios, nos quartéis, nos hospitais, nas
escolas [pois] tal é contra os princípios de um Estado secular [. . .] e o
[princípio da] igualdade de todos os cidadãos independentemente da
sua religião”. De acordo com Mesić, apenas o brasão da República e,
onde for pertinente, a bandeira nacional, deveriam ser exibidos nas
paredes.
De igual modo, o presidente afirmou que a Igreja Católica desfruta
de uma posição privilegiada no país, uma visão firmemente criticada
pelo semanário católico Glas Koncila.
Com a sua posição, o presidente incomodou também os bispos croatas, incluindo o Arcebispo de Zagreb, Monsenhor Josip Bozanić. Em
declarações separadas, ambos atacaram as palavras do presidente,
expressando a sua discórdia em relação às posições por ele assumidas.
Em todo o caso, nunca foi aprovada nenhuma lei que lide explicitamente com símbolos religiosos e assim, em termos formais, não existe
nenhuma base legal para os remover, tal como Mesić pretendia.
A maioria dos croatas, inclusive os não católicos, opõe-se à posição do
presidente.
No dia 31 de Março de 2009, o Parlamento emitiu uma emenda ao
regulamento sobre o estatuto dos estrangeiros, acrescentando os
sacerdotes à lista de grupos que desfrutam de certos privilégios ao
nível burocrático e outorgando-lhes o direito a residência temporária para poderem executar os seus deveres religiosos, e diminuindo a
burocracia na renovação das suas autorizações de residência.
No entanto, encontram-se pendentes há muitos anos pedidos de
registo de dezoito grupos porque as autoridades afirmam que estes
não cumpriam todos os critérios legais.
A Igreja Ortodoxa sérvia declarou estar satisfeita com o acesso aos
hospitais e às prisões para proporcionar apoio pastoral, mas continuou a queixar-se das dificuldades de fazer o mesmo tanto nas estruturas militares como nas policiais.
Funcionários ortodoxos sérvios relataram também um aumento nos
abusos verbais contra o clero ortodoxo, particularmente em Šibenik,
o lugar da sua eparquia na Dalmácia. No dia 18 de Abril de 2009, indi-
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos91,4%
Agnósticos6,3%
Muçulmanos2,3%
Cristãos
4.301.136
Católicos
3.987.000
Circunscrições
eclesiásticas
15
SUPERFÍCIE
56.538km2
POPULAÇÃO
4.410.000
REFUGIADOS
1.238
DESALOJADOS
2.400
32
CROÁCIA
víduos não identificados quebraram o vidro da porta e a janela da frente da Sociedade Cultural Sérvia em Knin.
Islão
A comunidade muçulmana continua a queixar-se das dificuldades que algumas mulheres
muçulmanas têm de superar quando tentam obter os seus cartões de identidade com fotografias nas quais estão a usar um lenço de cabeça.
Os planos para construir uma mesquita em Rijeka, inicialmente projectada para começar a
ser construída em meados de 2008, foram adiados para Outubro de 2009.
Os planos para construir uma mesquita em Osijek foram, por enquanto, igualmente bloqueados através de barreiras administrativas. Em Sisak, a comunidade muçulmana solicitou uma
licença para construir uma mesquita mas também aqui foi confrontada com várias barreiras
administrativas.
Em Rijeka, e de modo geral na Istria, os muçulmanos queixaram-se também de dificuldades
com as autoridades locais relativamente à atribuição de espaço para sepulturas muçulmanas nos cemitérios da cidade.
Judeus
A comunidade judaica continua à espera da restituição de várias propriedades confiscadas
pelos anteriores governos.
À excepção da destruição de um cemitério judeu em Vrbovic, ocorreram muito poucas acções
claramente anti-semitas. No entanto, os líderes da comunidade queixaram-se de acções com
implicações nitidamente anti-semitas.
Por exemplo, no dia 30 de Janeiro de 2009, os meios de comunicação social locais relataram que uma lista com os nomes de alguns dos judeus mais proeminentes da Croácia foi
divulgada num sítio da Internet da ala direita ultranacionalista, numa aparente tentativa de
demonstrar como os Judeus se encontravam em posições a partir das quais podem exercer
pressão económica e política no país.
33
DinAMARCA
DinAMARCA
O debate sobre a liberdade religiosa na Dinamarca é dominado pela
questão muçulmana e em particular pela questão do vestuário, que
algumas mulheres consideram ser uma marca das suas convicções
religiosas. Como consequência, durante um julgamento no dia 7 de
Agosto de 2009, em Copenhaga, uma muçulmana chamada a testemunhar recusou, mesmo que temporariamente, remover em público
o véu que lhe cobria completamente o rosto, pedindo para ser identificada apenas pela sua carta de condução. O presidente do Tribunal
de Apelo da capital anunciou que tinha aceitado as condições impostas pela testemunha apenas porque uma juíza tinha conseguido
anteriormente identificar a testemunha erguendo discretamente o
véu que lhe ocultava o rosto.
Confrontado com tais abusos ao direito à liberdade religiosa, o primeiroministro dinamarquês, Lars Loekke Rasmussen, foi muito explícito ao falar
numa conferência de imprensa no início de 2010: “Não há lugar na nossa
sociedade para burqas e niqabs”, porque se trata de “símbolos de um conceito de mulheres e de humanidade a que nós fundamentalmente nos
opomos e contra a qual pretendemos lutar”. A sociedade dinamarquesa,
explicou, “é uma sociedade aberta, na qual olhamos para a pessoa com a
qual estamos a falar, tanto na escola como no local de trabalho”.
Uma sondagem do Ministério dos Assuntos Sociais, confiada à Universidade de Copenhaga em Agosto de 2009 e publicada no dia 18
de Janeiro de 2010, determinou que no Reino da Dinamarca existem
supostamente apenas entre uma a duas centenas de mulheres que
usam o niqab, o véu completo com apenas uma pequena abertura
horizontal para os olhos. Isto significa que esta questão apenas diz
respeito a cerca de 0,15% das mulheres muçulmanas (ao todo cerca
de cem mil) e portanto a 1,9% da população total do país de cerca
de cinco milhões e meio de habitantes. O estudo releva que tal não
significa que aquelas que usam o véu completo não sofram restrições
graves no acesso à educação e ao trabalho.
Para evitar a propagação deste fenómeno, no dia 28 de Janeiro de 2010,
o Governo decidiu restringir o uso do véu completo sem, no entanto,
o proibir completamente, confiando a regulamentação do seu uso às
escolas, às administrações públicas e às empresas. O Governo está,
em simultâneo, a estudar uma alteração ao Artigo 260º do Código
Penal que pune actualmente a coerção com uma pena de prisão de
dois anos. A pena de prisão aumentaria para até quatro anos no caso
de a pessoa declarada como culpada ter obrigado uma mulher a usar
a burqa ou o niqab.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos85%
Agnósticos10,5%
Muçulmanos3,7%
Outros0,8%
Cristãos
4.912.508
Católicos
37.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
43.094km2
POPULAÇÃO
5.481.000
REFUGIADOS
20.355
DESALOJADOS
---
34
ESLOVÁQUiA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos85,6%
Agnósticos14,3%
Cristãos
4.657.496
Católicos
3.940.000
Circunscrições
eclesiásticas
12
SUPERFÍCIE
49.012km2
POPULAÇÃO
5.412.000
REFUGIADOS
401
DESALOJADOS
---
35
ESLOVÁQUiA
Existe neste momento um recurso pendente no Tribunal Constitucional relativo à constitucionalidade de uma emenda à lei sobre o registo
de grupos religiosos. Esta lei fez aumentar os requisitos necessários à
obtenção do registo.
Esta nova emenda requer que um grupo religioso tenha pelo menos
vinte mil membros adultos residentes no país, um número que penaliza claramente muitos grupos minoritários, fazendo com que seja
impossível a estes obterem o reconhecimento legal. O registo, no
entanto, não é obrigatório, embora os grupos que se registam desfrutem de inegáveis vantagens, ao ponto de todos os movimentos religiosos aspirarem a obter o reconhecimento. Se o conseguirem, recebem subsídios financeiros, o direito a visitar e a providenciar apoio
espiritual aos seus membros que se encontrem em prisões e em
hospitais, o direito a celebrar casamentos religiosos de acordo com os
seus ritos, e o acesso aos canais de televisão estatais.
No último ano, não houve nenhuma mudança significativa no que diz
respeito à liberdade religiosa, e os exemplos de discriminação social
por razões religiosas são também muito pouco frequentes.
Em Março, o Supremo Tribunal deliberou a favor de um grupo religioso, a Irmandade Cristã, que tinha apresentado um recurso contra a
rejeição por parte do Ministério da Cultura do seu pedido de registo,
submetido em 2007. O tribunal considerou que o Ministério não
tinha apresentado argumentos suficientemente convincentes para
justificar a sua recusa. No dia 20 de Maio, o Ministro da Cultura aceitou a decisão do Supremo Tribunal e concordou em rever o pedido,
informando a Irmandade Cristã deste facto.
Igualmente por resolver encontram-se numerosos casos relativos à
restituição de propriedades confiscadas às comunidades religiosas
durante o regime comunista. Mesmo quando devolvidos aos seus
proprietários originais, as igrejas, sinagogas e respectivos cemitérios
encontram-se frequentemente num tal estado de negligência que
não são passíveis de utilização. Em muitos casos, permanecem nesse
estado porque as comunidades envolvidas não possuem os recursos
financeiros necessários para os restaurar. A lei não prevê, na realidade,
qualquer indemnização ou reembolso pelos danos sofridos por estas
propriedades, pois o próprio Governo tem falta de fundos.
ESLOVÉniA
ESLOVÉniA
Foi pedida pelo Conselho de Estado uma revisão relativa à constitucionalidade da lei sobre a liberdade religiosa, que entrou em vigor no
dia 3 de Março de 2007 e se encontra actualmente em apreciação por
parte do Tribunal Constitucional.
No último ano, não houve relatos de mudanças significativas no que
diz respeito ao direito à liberdade religiosa.
Porém, a comunidade muçulmana continua a queixar-se da falta de
um representante religioso apropriado à fé islâmica no interior dos
hospitais. No final de Outubro de 2007, o Ministério da Saúde não
tinha ainda aprovado os cinco candidatos apresentados pela própria
comunidade islâmica para providenciarem serviços religiosos e apoio
aos crentes da sua fé que se encontrem hospitalizados.
Por outro lado, a comunidade muçulmana e as autoridades municipais em Liubliana fizeram progressos no que respeita à construção de
uma mesquita e de um centro cultural islâmico na cidade. Os Muçulmanos finalizaram a aquisição de um local no dia 31 de Dezembro de
2008 e, em Abril de 2009, o presidente da câmara prometeu custear
metade dos custos do planeamento dos edifícios. Em Janeiro, o presidente da câmara rejeitou a proposta de um membro do Conselho
Municipal de realizar um referendo para averiguar a posição dos habitantes no que diz respeito à construção de uma mesquita na cidade.
Porém, nenhum progresso foi feito durante o último ano em relação
à questão há muito existente relativa à restituição das propriedades
confiscadas aos membros da comunidade judaica durante e depois
da Segunda Guerra Mundial.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos94,4%
Agnósticos5,6%
Cristãos
1.852.131
Católicos
1.594.000
Circunscrições
eclesiásticas
6
SUPERFÍCIE
20.266km2
POPULAÇÃO
2.025.000
REFUGIADOS
289
DESALOJADOS
---
36
ESPAnHA
Objecção de consciência
O Parlamento Autónomo da Andaluzia aprovou, a 17 de Março de
2010, a Lei dos Direitos e Garantias da Dignidade do Indivíduo no Processo de Morte. É a primeira lei autónoma em Espanha que regula
os direitos dos pacientes terminais, assim como as obrigações dos
médicos, tanto em centros públicos como privados, quando se encontram perante esta situação. A Lei, que regula a limitação do esforço
terapêutico, proíbe a crueldade terapêutica e permite aos pacientes
rejeitar um tratamento que prolongue a sua vida de um modo artificial, mas não regula a objecção de consciência do pessoal médico. De
acordo com o Conselho Consultivo da Andaluzia, a objecção de consciência deve ser regulada por uma lei de carácter nacional.
A objecção de consciência encontra-se mencionada na Lei Orgânica
2/2010, de 3 de Março, sobre a Saúde Sexual e Reprodutiva e a Interrupção Voluntária da Gravidez. A lei declara que “os profissionais de
saúde directamente implicados na interrupção voluntária da gravidez
têm o direito de exercer a objecção de consciência desde que o acesso
e a qualidade da prestação de serviços não sejam prejudicados”.
O Supremo Tribunal espanhol rejeitou a objecção de consciência
como fundamento para a recusa de frequência da disciplina Educação para a Cidadania (EpC), numa decisão conhecida a 28 de Janeiro
de 2009. A EpC, aprovada pelo Decreto Real 1631/2006, é uma disciplina obrigatória cujos conteúdos se repartem pelo último ciclo da
Educação Primária e pelo Ensino Secundário, em todo o território
nacional. Segundo o decreto, os conteúdos da EpC encontram-se ajustados ao regulamento jurídico e são por isso obrigatórios. De acordo
com a sentença, “os decretos examinados (...) não têm como objec-
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos94%
Agnósticos4,4%
Outros1,6%
Cristãos
41.277.600
Católicos
42.416.000
Circunscrições
eclesiásticas
75
SUPERFÍCIE
505.992km2
POPULAÇÃO
45.317.000
REFUGIADOS
3.970
DESALOJADOS
---
37
ESPAnHA
A Espanha é um país no qual a liberdade religiosa está garantida.
Porém, nos últimos meses aconteceram alguns factos concretos que
merecem a atenção deste relatório: a presença de símbolos religiosos
em edifícios e locais públicos, o assunto da Educação para a Cidadania, a Lei de Cultos aprovada no Parlamento Regional da Catalunha,
assim como o exercício da objecção de consciência, entre outros.
Neste relatório, também se assinalam algumas situações às quais
será necessário prestar uma especial atenção no futuro, sendo que
entre essas há que realçar a reforma da Lei Orgânica da Liberdade
Religiosa. De qualquer maneira, as relações jurídicas entre a Igreja
Católica e o Estado espanhol baseiam-se nos acordos com a Santa Sé,
vigentes desde 1979.
ESPANHA
tivo prejudicar o direito fundamental dos pais de que os seus filhos recebam uma formação
religiosa e moral que está de acordo com as suas próprias convicções”. A sentença declara
também que esta disciplina não pode ser usada pela Administração ou pelos docentes para
doutrinar os alunos.
O Parlamento espanhol rejeitou uma “moção de reprovação do Papa Bento XVI”, apresentada
na Câmara Baixa pelo grupo parlamentar do ERC-IU-ICV, moção essa originada pelas palavras
do Papa sobre o uso do preservativo, proferidas durante a viagem apostólica aos Camarões e
a Angola, quando declarou que “não se pode resolver o flagelo da SIDA distribuindo preservativos”. O grupo parlamentar apresentou esta moção embora o Congresso dos Deputados não
tenha poderes para condenar um chefe de estado estrangeiro.
Novas leis
A 15 de Julho de 2009, o Parlamento da Catalunha aprovou a Lei dos Centros de Culto. Um das
questões mais relevantes no planeamento urbano e regional é a reserva de terrenos públicos
para os dedicar a centros de culto. De acordo com a nova lei (Artigo 4º), quando os municípios
providenciam terrenos para equipamento comunitário, devem autorizar que sejam admitidos os usos de carácter religioso de nova implantação, ou dedicar terrenos especificamente a
esta utilização. No seu Artigo 10º, é especificado que será necessária uma licença municipal
de utilização de centros de culto ou de reunião com fins religiosos, o que deixa nas mãos dos
conselhos municipais, e portanto de decisões políticas, a concessão ou não destas licenças.
O Conselho de Ministros aprovou, a 12 de Dezembro de 2008, o Plano dos Direitos Humanos,
que inclui a modificação da Lei Orgânica da Liberdade Religiosa aprovada em 1980. A reforma,
pendente de aprovação no momento da elaboração deste relatório, abordará de um modo
especial a presença de símbolos religiosos em actos públicos. De acordo com os conteúdos
do projecto que foram divulgados pelos meios de comunicação social nos últimos meses, e
de acordo com a Lei Orgânica da Liberdade de Consciência e Religiosa, não se poderão exibir
símbolos religiosos em edifícios públicos, e os actos oficiais não poderão incluir celebrações
religiosas, entre outras medidas.
Esta Lei, de acordo com o projecto mencionado por vários meios de comunicação social,
dedica ainda um capítulo à ‘Laicidade do Estado’. O projecto do texto jurídico prevê também
a equiparação dos Mórmones, das Testemunhas de Jeová, dos Budistas e dos Ortodoxos, às
confissões que já assinaram acordos com o Estado: a Igreja Católica (1979), os Muçulmanos,
os Protestantes e os Judeus (1992).
Outro dos aspectos que a lei abordará é o da objecção de consciência. Pelas informações
que se conhecem até agora, o projecto declara que “as convicções ou crenças não isentam
do cumprimento das leis, nem exoneram do seu cumprimento. A objecção de consciência é
reconhecida nas disposições especificamente previstas na Constituição e nas leis aprovadas
pelas Cortes Gerais”.
38
ESTÓniA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos70,8%
Agnósticos28,6%
Outros0,6%
Cristãos
869.950
Católicos
6.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
45.100km2
POPULAÇÃO
1.339.000
REFUGIADOS
24
DESALOJADOS
---
39
ESTÓniA
Aprovada no dia 28 de Junho de 1992 através de voto popular, a Constituição da República da Estónia garante que “Todos têm direito à
liberdade de consciência, de religião e de pensamento” (Artigo 40º),
que “não haverá nenhuma Igreja de Estado”, e que “Todos têm a liberdade, seja sozinhos ou em comunidade com outros, e em público ou
privado, de praticar a sua religião”.
As actividades de grupos religiosos são reguladas pela “Lei das Igrejas e Congregações”. A “Lei das Igrejas e Congregações” decreta que o
oficial de cada unidade militar deve garantir aos membros das forças
de defesa a oportunidade de praticarem a sua religião. Os serviços
do capelão estendem-se a membros em serviço de todos os grupos
religiosos. A lei decreta também que os directores das prisões assegurarão aos reclusos a oportunidade de praticar as suas convicções
religiosas.
Além dos estatutos do grupo, o pedido de registo, que é possível para
grupos de pelo menos doze adultos, tem que incluir uma lista dos
membros da administração do grupo para ser submetida ao tribunal da cidade. Nas escolas particulares podem ser ensinados cursos
de religião. Em escolas públicas podem frequentar-se cursos ecuménicos. Estudos religiosos comparados encontram-se disponíveis nas
escolas públicas e particulares enquanto disciplinas opcionais.
Nenhum episódio significativo de discriminação religiosa ou intolerância religiosa foi relatado durante o período desta análise.
FinLÂnDiA
FinLÂnDiA
A Constituição, no Artigo 11º, salvaguarda a igualdade de todos os
cidadãos perante a lei e exclui todas as formas de discriminação baseadas no género, na idade, na origem, na língua, na religião, nos gostos pessoais, nas opiniões, no estado de saúde, numa deficiência ou
em qualquer outra razão ligada ao indivíduo. Em particular, garante
a liberdade religiosa e de consciência para todos, incluindo o direito
a professar e a praticar uma religião, a expressar as convicções pessoais e a pertencer ou não a uma comunidade religiosa. Consequentemente, ninguém pode ser obrigado a participar, contra a própria
consciência, nas práticas de uma religião.
A Igreja Luterana Evangélica e a Igreja Ortodoxa são reconhecidas
como Igrejas do Estado e todos os que estiverem registados como
seus membros têm de pagar um imposto anual a estas instituições.
As regras para o registo das comunidades religiosas encontram-se na
lei sobre a liberdade religiosa de 2003. Os cinquenta e três grupos
religiosos não-tradicionais que são reconhecidos oficialmente têm o
direito de professar livremente e difundir a sua fé. O procedimento
de reconhecimento, feito ao abrigo do Ministério da Educação, está
aberto a comunidades religiosas com pelo menos vinte membros
que desejem praticar a sua religião publicamente e cujas actividades
estão em conformidade com os estatutos da referida instituição.
Durante os anos de 2006 e 2007, não há conhecimento de nenhum
relato de mudanças institucionais significativas ou de eventos importantes relativos à questão da liberdade religiosa.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos90,2%
Agnósticos9,1%
Outros0,7%
Cristãos
4.897.056
Católicos
10.000
Circunscrições
eclesiásticas
2
SUPERFÍCIE
338.145km2
POPULAÇÃO
5.346.000
REFUGIADOS
7.447
DESALOJADOS
---
40
FRAnÇA
Actos de violência
O fenómeno do vandalismo contra locais de culto, a profanação de
cemitérios e o sacrilégio cometido nas igrejas e com objectos sagrados parece ser preocupante em França e parece ter sido particularmente virulento desde 2009. Quando o alvo é a Igreja Católica, a razão
é muitas vezes o conflito sobre as questões morais, ligado a batalhas
levadas a cabo por grupos de defesa da vida que se opõem ao aborto,
ou a campanhas para a afirmação das famílias tradicionais. Em Fevereiro de 2010, coincidindo com o Dia de São Valentim (Dia dos Namorados), vários activistas gay organizaram um evento de protesto no
exterior da Catedral de Notre Dame, em Paris, organizando um beijo
homossexual em massa como protesto contra a alegada homofobia
da Igreja Católica. No seguimento de protestos por parte da população, o evento foi transferido para a Praça Saint-Michel, adjacente à
Catedral.
Durante 2009, e num contexto no qual houve um aumento generalizado nos protestos, manifestações e actos racistas e xenófobos,
os ataques dirigidos contra a comunidade judaica e locais de culto
islâmicos aumentaram. Várias iniciativas envolvendo diálogo interreligioso foram levadas a cabo como oposição à propagação deste
fenómeno. Os que as apoiam, como é o caso do Imã Hassan Chalgoumi, que decidiu apoiar uma lei que proíbe o véu completo, foram
ameaçados por grupos extremistas.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos77,7%
Agnósticos11,9%
Muçulmanos8,5%
Outros1,9%
Cristãos
43.360.310
Católicos
46.621.000
Circunscrições
eclesiásticas
98
SUPERFÍCIE
551.500km2
POPULAÇÃO
62.637.000
REFUGIADOS
196.364
DESALOJADOS
---
41
FRAnÇA
No dia 18 de Dezembro de 2008, foi alcançado um acordo entre a
República Francesa e a Santa Sé que estabelece o reconhecimento
mútuo de graus e diplomas obtidos no ensino superior, acordo esse
que se aplica ao sistema educacional do Estado francês e às universidades católicas, às faculdades eclesiais, assim como às instituições
educacionais da Santa Sé.
Em Fevereiro de 2009, uma sondagem levada a cabo pela Fondation
de Service Politique e que recaiu sobre cerca de três mil pais católicos,
obteve como resultado que aproximadamente 67% dos entrevistados
acredita que a liberdade de consciência dos seus filhos não é respeitada nas escolas públicas. Além disso, 20% da amostra respondeu sim
à pergunta: “Os seus filhos foram criticados nas escolas públicas por
causa da sua religião?”, enquanto 91% dos pais querem que a Igreja
Católica crie iniciativas para remover os obstáculos à liberdade da
educação.
FRAnÇA
O problema do Islamismo
No dia 18 de Fevereiro de 2010, ao opor-se a uma tentativa para impor regras de alimentação
islâmicas à população não-muçulmana, o presidente da Câmara de Roubaix apresentou no
Tribunal de Lille uma queixa sobre discriminação com base no Artigo 225º-1 do Código Penal
francês, sobre a escolha feita por vários restaurantes de comida rápida locais de disponibilizar aos seus clientes apenas carne abatida de acordo com o método halal. O gabinete do
promotor público em Lille anunciou que vai abrir uma investigação sobre este assunto.
No seguimento de várias controvérsias judiciais relativas ao código de vestuário islâmico, um
debate longo e complexo desenvolveu-se nos meios de comunicação social e nas salas de
tribunal. Depois de alguma controvérsia, no dia 4 de Dezembro de 2008, o Tribunal Europeu
dos Direitos Humanos decidiu que a proibição francesa do uso do véu nas escolas estatais
não viola o respeito pelos direitos humanos.
Depois de pedir a uma comissão parlamentar, presidida pelo deputado comunista André
Gerin, que preparasse um relatório sobre o uso da burqa em França, o Governo apoiou fortemente uma proposta de lei que proíbe o uso do véu completo em lugares públicos, adoptando a fórmula seguinte: “Ninguém pode usar, em lugares públicos, artigos de vestuário
destinados a esconder a face” e definindo penas leves para quem usar o véu completo e
outras mais severas, incluindo a prisão, para aqueles que forcem outros a usá-lo. Depois de
ser aprovada pela Assembleia Nacional na sua primeira leitura no dia 13 de Julho de 2010, a
lei terá agora de ser aprovada pelo Senado.
42
GRÉCiA
Durante o período analisado, não foram feitas alterações significativas à legislação que regula o exercício da liberdade religiosa. A Constituição define, para todos os cidadãos, o direito de professar a religião escolhida, mas declara também que a religião principal é a Igreja
Ortodoxa Grega. Existem apenas três confissões religiosas importantes no que diz respeito à legislação, e estas são a Igreja Ortodoxa
Grega, o Judaísmo e o Islão. As outras comunidades religiosas, entre
elas a Igreja Católica, os Metodistas e os Mórmones, são descritas
como “religiões conhecidas”, o que significa que possuem um núcleo
doutrinal e público definido, assim como rituais e sessões de oração
abertas a todos, e per se têm uma natureza sem fins lucrativos e uma
hierarquia bem definida.
Tanto a Constituição como a lei proíbem as actividades missionárias
no país e os líderes de muitos grupos religiosos têm-se queixado da
continuidade da existência desta lei.
Grupos cristãos não ortodoxos têm relatado, por vezes, obstáculos
administrativos ou restrições legais impostas às suas práticas religiosas. Relataram além disso que são tratados de modo suspeito pelos
seus compatriotas ou acusados de não serem “verdadeiros gregos”
devido às suas opções religiosas.
A nível económico, o Governo grego apoia fortemente a Igreja Ortodoxa Grega, pagando salários aos membros do clero e a manutenção das suas propriedades. Além disso, os salários e as despesas são
pagos aos três mais importantes Muftis muçulmanos e a 183 Imãs da
região da Trácia. Outros Imãs na mesma zona recebem um pequeno
subsídio. Desde 2007, o Governo tem vindo a implementar um projecto que também estenderá este apoio financeiro às figuras espiritualmente mais importantes da comunidade muçulmana e, desde o
início de Março de 2009, foram pagos salários a outros 240 Imãs.
Nenhum outro grupo religioso recebe apoio financeiro e muitas
comunidades têm-se queixado de tal situação, incluindo a comunidade judaica, pedindo direitos iguais neste sentido.
Estes líderes religiosos relataram também que são alvo de discriminação fiscal quando comparando com as regras fiscais aplicadas à Igreja
Ortodoxa Grega.
Com um recurso apresentado pelo Bispo de Syros, Monsenhor Frangkiskos Papamanolis, a Igreja Católica pediu ajuda para pôr fim aos
ataques feitos por vândalos no cemitério de Chania em Creta. O cemi-
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos91,8%
Muçulmanos4,2%
Agnosticos3,6%
Outros0,4%
Cristãos
10.549.580
Católicos
134.000
Circunscrições
eclesiásticas
11
SUPERFÍCIE
131.957km2
POPULAÇÃO
11.183.000
REFUGIADOS
1.695
DESALOJADOS
---
43
GRÉCiA
Legislação
GRÉCiA
tério foi profanado por quatro vezes e, confrontado com tais eventos, o bispo pediu ao Ministério da Justiça e da Ordem Pública para proteger a Igreja Católica do número crescente de
ataques de que tem sido alvo.
Outras comunidades têm também relatado problemas nas suas relações com as autoridades ao tentarem resolver problemas administrativos. Também neste caso, é preciso realçar a
posição privilegiada detida pela Igreja Ortodoxa Grega, cujas hierarquias desfrutam de uma
relação exclusiva e institucionalizada com o Ministério da Educação e da Religião para tratar
de todo o tipo de questões administrativas.
A disputa entre o Mosteiro de Esphigmenou e o Patriarcado Ortodoxo Grego continua. O
Mosteiro deixou de reconhecer a autoridade do Patriarcado em 1972, enquanto o Patriarcado
reivindica o direito de o controlar, devido ao seu papel enquanto administrador da região
desde 1924, tal como autorizado pelo Capítulo do Monte Atos.
O Patriarcado, cuja autoridade sobre as actividades do mosteiro já foi reconhecida pelas
autoridades, pediu o despejo dos monges que depois de várias controvérsias jurídicas, ainda
continuam a ocupar o mosteiro embora não possam aceder legalmente a contas bancárias e
a outros bens possuídos por este.
A Igreja Ortodoxa Grega é também objecto de acusações por parte de várias confissões religiosas minoritárias, pois supostamente tem uma atitude discriminatória para com elas. Na
realidade, estas confissões religiosas relataram que vários bispos ortodoxos pediram aos seus
seguidores para não manterem relações com membros de grupos religiosos mais pequenos,
e pediram também à polícia para prender missionários pertencentes a outras confissões religiosas que tenham estado envolvidos em actividades de proselitismo.
A Igreja Ortodoxa Grega publica também no seu sítio oficial da Internet uma lista de setenta
e quatro organizações e práticas religiosas que considera sacrílegas.
No entanto, a nível pessoal, e de acordo com muitas organizações, as relações entre os líderes
ortodoxos e os de outras confissões religiosas melhoraram.
No dia 15 de Novembro de 2009, o Osservatore Romano publicou as palavras do Arcebispo
de Atenas, Hieronymus II, Primado da Igreja Autocéfala Ortodoxa Grega, que se pronunciou
sobre a sentença emitida pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos que decretou que a
exibição do crucifixo nas escolas é prejudicial aos direitos educacionais dos pais e restringe a
liberdade de pensamento e de religião dos alunos.
O Bispo expressou o seu receio de que esta sentença possa criar também um precedente no
que diz respeito à situação na Grécia e apelou aos Católicos para formarem uma frente unida
para se oporem a esta decisão. O Bispo Ortodoxo de Tessalónica, Anthimos, expressou por sua
vez a esperança de que o Governo recorresse contra todas as sentenças deste tipo.
Islão
Os Muçulmanos da cidade de Atenas, devido à sua composição demográfica, distinta da
minoria oficialmente reconhecida da Trácia, a qual consiste principalmente em migrantes
das regiões asiáticas Centro-Orientais e do Sul, exprimiram através dos seus líderes o seu
44
pesar sobre a não existência de uma mesquita oficial e a ausência de um cemitério muçulmano. Foi aprovado há nove anos um projecto para uma mesquita oficial no distrito de Votanikos, no centro de Atenas, para ser construída em lotes ocupados pelo Ministério da Defesa
e onde existem vários edifícios que pertencem à Marinha.
A construção desta mesquita ainda não começou e, em Maio de 2009, respondendo a uma
pergunta no Parlamento, o Ministério da Defesa declarou que não tinha ainda procedido à
limpeza da área escolhida para a construção da mesquita, afirmando que a operação completa que envolve a demolição dos edifícios existentes teria um custo de 91,25 milhões de
euros, fundos de que o Ministério não pode dispor.
Em Maio de 2009, um elevado número de ministros, uma vez mais respondendo a uma
pergunta no Parlamento, emitiu relatórios contraditórios relativos à falta de um cemitério
muçulmano em Atenas. O problema para os Muçulmanos é que as regras para os cemitérios
municipais definem a exumação de corpos depois de três anos, uma disposição que viola a
lei corânica. Em 2005, a Igreja Ortodoxa Grega anunciou que iria providenciar três hectares
de terreno oferecidos aos Muçulmanos para serem usados como cemitério, mas uma vez
mais a construção nunca foi iniciada.
O problema que emergiu destes relatórios dos ministros continua a ser o de identificar um
local satisfatório.
Judeus
grÉcia
Durante o período analisado, assistiu-se a um aumento dos incidentes anti-semitas, especialmente depois do ataque militar israelita em Gaza, em Dezembro de 2008.
O cemitério judeu em Ioannina foi, por exemplo, objecto de ataques por parte de vândalos
em Janeiro, Março e Junho de 2009. Os Judeus também se queixaram do estado de abandono dos cemitérios judeus por todo o país, pois a lei estabelece que eles devem ser mantidos de uma maneira digna.
A comunidade judaica relatou também que passagens que eles consideram anti-semitas
foram incluídas na liturgia Ortodoxa Grega durante a Semana Santa, apesar de também ter
realçado a existência de um diálogo que pode conduzir à remoção destas passagens.
A controvérsia entre o Estado e a comunidade judaica sobre a restituição do cemitério judeu
em Tessalónica continua. O cemitério foi expropriado em 1944 e a Universidade Aristóteles,
pertencente ao Estado, foi construída nos seus terrenos. Um comité de especialistas, criado
pelo Ministério das Finanças para encontrar uma solução adequada para o problema, reuniu uma vez mais no início de Março. Entre o fim de Março e o começo de Abril, o Ministro
Plenipotenciário do Departamento de Estado responsável por todos os assuntos relativos ao
Holocausto, encontrou-se com os Ministros das Finanças e dos Negócios Estrangeiros para
tentar resolver o problema.
45
HOLAnDA
HOLAnDA
Logo o primeiro artigo da Constituição estabelece que “todas as pessoas na Holanda serão tratadas de modo igual em circunstâncias
iguais” e que “a discriminação com base na religião, na convicção, na
opinião política, na raça ou no sexo, ou com qualquer outro fundamento, não será permitida”. O Artigo 6º garante que “todos terão o
direito de professar livremente a sua religião ou convicção, seja individualmente, seja em comunidade com outros, sem prejuízo para com
a sua responsabilidade ao abrigo da lei”, embora o Parlamento possa
estabelecer “regras relativas ao exercício deste direito, quando este
não seja em edifícios ou locais fechados... para a protecção da saúde,
no interesse da fluência do tráfego e para combater ou prevenir distúrbios”.
Durante o período de tempo considerado, não ocorreram mudanças
significativas no país relativamente à liberdade religiosa.
Embora com reacções nos resultados eleitorais, a pressão cultural
causada pelo relativismo resulta em problemas de discriminação jurídica dos cristãos. Por exemplo, um indivíduo cristão que se candidate
a uma função médica e declare não estar disponível para assistir em
situações de aborto ou de eutanásia não será admitido. E também
não será permitido a uma pessoa que trabalhe na administração civil
recusar-se a registar um casal homossexual num casamento civil.
Continuou a pressão social aplicada pelos movimentos islâmicos,
como reacção por parte dos partidos políticos que reivindicam uma
intervenção a fim de proteger a identidade histórica e cultural do país.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos64%
Agnósticos27,5%
Muçulmanos6,2%
Outros2,3%
Cristãos
13.790.960
Católicos
4.603.000
Circunscrições
eclesiásticas
7
SUPERFÍCIE
41.526km2
POPULAÇÃO
16.653.000
REFUGIADOS
76.008
DESALOJADOS
---
46
HUnGRiA
A Igreja Católica
Os bispos católicos deram o alarme relativamente à difusão de um
clima de neo-paganismo e de sincretismo na Hungria.
Numa circular sobre a salvaguarda da fé católica, os bispos húngaros
declararam que “[...] está a crescer uma nova forma de paganismo. Tal
como aconteceu depois da morte de Santo Estêvão, está mais uma vez
a atacar o Cristianismo. Há alguns anos, acreditávamos que o secularismo era o único perigo. Mesmo se o consumismo, o ídolo do hedo-
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos86,7%
Agnósticos12%
Outros1,3%
Cristãos
8.791.110
Católicos
5.914.000
Circunscrições
eclesiásticas
17
SUPERFÍCIE
93.032km2
POPULAÇÃO
9.973.000
REFUGIADOS
6.044
DESALOJADOS
---
47
HUnGRiA
O número de situações relativas a intolerância religiosa aumentou
durante o período em questão, incluindo um aumento do clima de
anti-semitismo despoletado por fricções políticas e pela incerteza
económica.
Os grupos extremistas parecem ter aumentado, tanto em quantidade como em número de membros, conduzindo a um aumento no
número de eventos públicos de natureza anti-católica e anti-semita.
Durante o último ano, foram registados cinco novos grupos religiosos:
a Igreja do Círculo de Merlim, a Missão Comunitária, a Igreja Cristã
Carismática “Fala a Vida”, a filial húngara da Igreja Húngara Cristã
Restaurada na Croácia e a Igreja do Templo de Maria.
Existem actualmente 366 grupos religiosos registados no país.
As várias denominações são geralmente críticas no que concerne à
abordagem do Governo em relação à administração e distribuição de
fundos europeus destinados à reconstrução de escolas e ao desenvolvimento de novas infra-estruturas. Eles reivindicam que existe aqui
uma discriminação nos critérios de selecção, dado que existem muito
menos escolas confessionais que recebem estes subsídios, em comparação com um número muito maior de escolas estatais ou municipais.
Por outro lado, de acordo com estas mesmas comunidades religiosas,
o Governo está a trabalhar activamente para facilitar a restituição das
propriedades confiscadas durante o regime comunista e está a garantir igual oportunidade a todos os grupos religiosos de recuperarem o
controlo das suas propriedades.
No final de Outubro de 2009, tinham já sido devolvidas 2576 propriedades e cerca de 276 milhões de euros pagos em indemnizações.
Não obstante, os Protestantes e os Luteranos têm ainda, entre ambos,
101 reivindicações pendentes.
O Governo está muito empenhado em desencorajar qualquer sinal de
anti-semitismo.
HUnGRiA
nismo, continua a manifestar-se no nosso povo, actualmente o espírito do neo-paganismo está
também a reafirmar-se”.
O fenómeno do denominado “antigo sincretismo húngaro” foi também atacado pelos bispos
húngaros, que o vêem como perigoso principalmente porque utiliza uma maneira aparentemente cristã de falar e como tal induz muitas pessoas em erro. Os bispos advertiram igualmente contra o ocultismo, o espiritismo e a idolatria. De igual modo, o relativismo imposto
pela margem liberal extrema é perigoso porque, “ [...] espalha a cultura da morte em lugar do
respeito pela vida. Nega ou relativiza as diferenças entre os homens e as mulheres, e igualmente
o matrimónio e a família. E de novo... a visão geral mundial normalmente expressa em algumas
fórmulas como ‘eu sou religioso à minha própria maneira’ ” pode igualmente minar a fé Católica, de acordo com os bispos húngaros.
Expressões de Anti-semitismo
Apesar dos esforços do Governo, continuam a ocorrer actos anti-semitas.
No dia 18 de Abril de 2009, um dia antes da manifestação da comemoração do holocausto
húngaro, alguns extremistas promoveram uma manifestação perto da Embaixada da Alemanha em Budapeste para negar a existência do holocausto e para protestar contra o que foi
descrito como o “papel mundial do Sionismo”. Cerca de 250 pessoas transportavam cartazes
e envergavam camisolas onde se podiam ler mensagens anti-semitas. A polícia intentou uma
acção contra o Capitão Istvan Dosa, que pertence à organização nacionalista MGA, contra a
Associação Garda Magyar e contra outros oradores, sob acusações de negação do holocausto
e de incitação ao ódio contra uma comunidade. O caso encontra-se pendente em tribunal.
O semanário Magyar Demokrata continua a publicar artigos anti-judaicos, como o faz também o ainda mais radical semanário Magyar Forum.
Islão
Em Agosto de 2009, foi dada a autorização para a construção do primeiro centro islâmico
em Budapeste. Os Muçulmanos são actualmente obrigados a utilizar casas privadas para a
oração ou para a organização de eventos religiosos.
Para que esta decisão fosse tomada foi necessário, em primeiro lugar, emendar a legislação
local.
48
Liberdade religiosa na República da Irlanda em 2009
A Constituição irlandesa garante a liberdade religiosa, e a existência
de outras leis e políticas contribui para que, no geral, a prática religiosa seja livre. A Constituição proíbe a promoção de um grupo religioso em favor de outro e a discriminação baseada na religião ou nas
convicções, e o Governo não restringe o ensino ou a prática de qualquer fé. Não existe nenhuma religião de Estado.
O artigo 44º, intitulado “Religião”, reconhece que “a reverência da
prática pública é devida a Deus todo-poderoso” cujo nome será venerado, respeitando e honrando a religião”. A acrescentar a tal estão as
garantias de “liberdade de consciência e a liberdade de cada indivíduo
poder professar e praticar a sua religião”, contanto que sejam respeitadas a ordem pública e a moral. Todas as denominações religiosas
têm o direito de gerir os seus próprios negócios e propriedades, assim
como o de comprar e manter institutos educacionais e sem fins lucrativos. O texto não faz qualquer menção a uma religião estatal e a promoção de uma religião em favor de outra é proibida, tal como o é a
discriminação religiosa nas escolas.
Educação Religiosa nas Escolas
O Governo autoriza, mas não requer, a instrução religiosa nas escolas públicas. A maior parte das escolas primárias e secundárias é
confessional e os seus conselhos de administração são dirigidos em
parte por administradores que são membros da Igreja Católica ou, em
menor número de casos, da Igreja da Irlanda ou de outras denominações religiosas. Ao abrigo dos termos da Constituição, o Ministério da
Educação deverá providenciar um financiamento igual a escolas das
diferentes denominações religiosas, incluindo as escolas islâmicas e
judaicas, o que de facto ocorre. Embora a educação religiosa seja uma
parte integrante do currículo da maioria das escolas, os pais podem
isentar os seus filhos de tal instrução. A Lei da Educação datada de
1998 indica que devem ser disponibilizadas cerca de duas horas de
educação religiosa por semana. A Lei refere que todas as escolas na
República da Irlanda devem ter como preocupação central o bemestar moral e espiritual de todos os seus alunos.
Em 2003, a Autoridade da Igualdade declarou que as escolas com
ligações a Igrejas possuem autorização legal para se recusarem a
admitir um aluno que não faça parte desse grupo religioso se a
escola conseguir provar que essa recusa é essencial à manutenção
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos94,2%
Agnósticos4,8%
Outros1%
Cristãos
6.526.980
Católicos
4.134.000
Circunscrições
eclesiásticas
26
SUPERFÍCIE
84.405km2
POPULAÇÃO
4.589.000
REFUGIADOS
9.571
DESALOJADOS
---
49
iRLAnDA
iRLAnDA
iRLAnDA
do “ethos” da escola (por exemplo, a existência de muitos católicos numa escola muçulmana
poderia impedir a escola de ter um “ethos” muçulmano). Porém, não existe nenhum relato
de a qualquer criança ter sido recusada admissão em qualquer escola por esta razão. Por lei,
uma escola religiosa pode seleccionar o seu pessoal com base nas suas convicções religiosas.
Algumas tensões
Islão: Embora as relações entre as instituições e as comunidades de imigrantes tenham como
base o respeito e a igualdade de direitos, o número crescente de pedidos apresentado pelas
organizações islâmicas conduziu a problemas na interpretação da lei. Os que desejam obter
a cidadania têm de jurar que não irão contrair matrimónio com mais de uma mulher, para
evitar a propagação da poligamia, proibida pelo Direito Penal irlandês mas permitida pela Lei
Corânica.
Siques: No fórum de consulta anual em Garda, em 20 de Novembro de 2009, o Dr. Jasbir Singh
Puri, um membro proeminente da forte comunidade irlandesa de cerca de 2.500 siques,
declarou que a proibição do uso de turbantes por parte dos seus membros afectou não apenas os siques naturalizados que vieram de outros países, mas também as crianças siques
nascidas na República da Irlanda. O Comissário-Adjunto N. Rice afirmou que a experiência
de outros países tinha sido tomada em consideração ao ser decidido não permitir o uso de
vestuário religioso e declarou que “eu não posso dar qualquer garantia de que haverá uma
mudança num futuro muito próximo”.
No dia 12 de Março de 2009, o jornal Metro Eireann relatou que alguns restaurantes se recusaram a empregar siques com barba. Citou também um caso de um estudante sique do
sexo masculino e adolescente ao qual foi pedido que cortasse a barba. O jornal não publicou
detalhes adicionais.
Secularidade
O primeiro-ministro Bertie Ahern, no dia 26 de Fevereiro de 2007, aquando da inauguração
do “Diálogo Organizado com as Igrejas, as Comunidades Religiosas e as Instituições Nãoconfessionais” falou contra a secularidade agressiva, que ignora a importância da dimensão
religiosa e deseja confinar a religião à esfera privada. Afirmou que acredita que “se a República da Irlanda moderna fosse desprovida do seu contexto de convicções religiosas, a nossa
cultura e a nossa sociedade seriam separadas das suas raízes profundas e de uma das fontes
mais nutritivas para o seu crescimento e o seu rumo em direcção ao futuro”.
Numa palestra proferida no dia 11 de Maio de 2010, o Arcebispo de Dublin, Diarmuid Martin,
declarou: “A Igreja Católica na República da Irlanda terá, no futuro, de encontrar o seu lugar
no seio de uma cultura muito diferente e muito mais secularizada, por vezes até mesmo no
seio de uma cultura hostil. A Igreja Católica tem de voltar a olhar para o papel dominante
que assumiu na sociedade irlandesa, enquanto, ao mesmo tempo, não deve renunciar ao
50
seu papel profético na sociedade e na formação das consciências através da abertura aos
ensinamentos de Jesus Cristo”.
Determinadas Pressões sobre a Liberdade Religiosa
Social
A sociedade consumista moderna denigre e escarnece da cultura eclesiástica. Assiste-se a um
sequestro das imaginações religiosas dos indivíduos, e os modos de vida religiosos estão a
ser substituídos por um individualismo secularista e materialista, insípido e pernicioso, o que
permite que os mecanismos da sociedade de consumo surjam como naturais, inexoráveis e
correctos. Muitos no Tigre Celta abraçaram e celebraram o consumismo, o materialismo e a
ganância. Tudo isto tem um preço, fazendo com que as liberdades comunitárias irlandesas
tradicionais de extensão familiar, de comunidade, de dar boas-vindas aos estranhos e de cuidar dos idosos e dos doentes, sejam grandemente diminuídas.
Existem evidências anedóticas de debates / controvérsias em redor do uso de símbolos religiosos em lugares públicos – por exemplo, crucifixos retirados das escolas e dos hospitais;
presépios e imagens que desaparecem de lugares públicos.
A Lei da Radiodifusão de 2009
O Projecto-de-Lei sobre Difamação passou a lei no dia 23 de Julho de 2009
iRLAnDA
Esta lei mantém a proibição da radiodifusão de publicidade na República da Irlanda dirigida
a qualquer fim religioso. O editor do jornal The Irish Catholic, Garry O’Sullivan, relatou que
vários anúncios do The Irish Catholic tinham sido banidos das estações de rádio. A Veritas, um
estabelecimento gerido pelos bispos católicos, foi sumariamente impedida pela Comissão
de Radiodifusão da República da Irlanda (BCI) de difundir um anúncio radiofónico na RTÉ,
em Novembro de 2009, que teria permitido ao estabelecimento anunciar a sua existência e
vender os seus produtos no mercado do Natal.
As organizações religiosas regozijaram-se com o anúncio feito pelo ministro para as Comunicações, Eamon Ryan, de que planeia abrandar as restrições sobre a propaganda religiosa na
televisão e na rádio.
Neste Projecto-de-Lei, “um assunto blasfemo” é definido como um assunto “que é gravemente abusivo ou insultuoso em relação a questões consideradas como sagradas por qualquer religião, sendo por isso visto como uma afronta por parte de um número significativo
dos partidários daquela religião; e ele ou ela pretendem, pela publicação do assunto em
questão, causar tal afronta”. Alguns consideram esta lei como sendo contrária às garantias
de igualdade consagradas pela lei no Artigo 40º.1 da Constituição irlandesa, e de liberdade
de consciência e de religião consagradas no Artigo 44º.2, e no Artigo 44º.2.3 da Constituição Irlandesa, que declara que o Estado não poderá impor qualquer inaptidão ou fazer qual51
iRLAnDA
quer discriminação com base na confissão, credo ou estatuto religioso. O Governo está neste
momento a ponderar a realização de um referendo sobre o assunto.
O Projecto de Lei nº 44 de 2009 sobre a Parceria Civil
Esta lei teve o seu início no dia 24 de Junho de 2009. Alguns consideram que, na delineação
desta lei, o Governo não respeitou adequadamente a liberdade de consciência e de religião.
Esta lei continuará a ser debatida no seio da sociedade irlandesa durante o próximo ano.
52
iSLÂnDiA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos95,8%
Agnósticos2,9%
Outros1,3%
Cristãos
298.404
Católicos
9.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
103.000km2
POPULAÇÃO
329.000
REFUGIADOS
62
DESALOJADOS
---
53
iSLÂnDiA
O Artigo 62º da Constituição define a Igreja Evangélica Luterana
como a Igreja estatal e como tal é apoiada e protegida pelas instituições. Sobre este assunto, a lei estabelece que a Igreja do Estado deve
receber um imposto anual por parte de todos os cidadãos com mais
de 16 anos de idade.
O Artigo 63º garante a todos o direito de “fundar comunidades para
culto divino conforme as suas convicções individuais, contanto que
não preguem ou pratiquem algo prejudicial à boa moral e à ordem
pública”. Durante o período considerado, um grupo, o Centro Cultural
Islâmico da Islândia (Menningarsetur muslima a Islandi), apresentou
a candidatura de registo como organização religiosa. As autoridades
aprovaram a candidatura em Março de 2009.
Os cidadãos que pertencem a confissões religiosas registadas podem
pagar o imposto à sua confissão religiosa preferida, ou, se não pertencerem a qualquer grupo religioso, podem pagar o imposto à Universidade da Islândia.
Os direitos civis e nacionais não podem ser perdidos devido à religião
de cada indivíduo, como especifica o Artigo 64º, embora ninguém se
possa recusar a empreender qualquer dever cívico por razões religiosas.
Durante o período considerado não houve relato de qualquer
mudança institucional significativa, nem ocorreram episódios expressivos relacionados com a liberdade religiosa.
iTÁLiA
iTÁLiA
A situação da liberdade religiosa na Itália de hoje
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Durante o período analisado neste relatório (de Janeiro de 2009 a
Março de 2010), não foram reportados eventos significativos nem
nenhuma mudança jurídico-institucional importante, especificamente relativos a problemas, impedimentos ou restrições à liberdade
religiosa ou de culto.
Algumas situações ou eventos problemáticos que ocorreram dizem
respeito a protestos (a presença / remoção de crucifixos e/ou símbolos religiosos em locais públicos, a construção de mesquitas, a autorização ou proibição do uso do véu por parte das mulheres muçulmanas, etc.) frequentemente ligados ao impacto do fenómeno das
migrações e suas “consequências”, em especial no que diz respeito ao
confronto cultural, ao diálogo ecuménico e ao complexo e multi-confessional panorama de crenças, convicções e/ou cultos não-católicos
hoje em dia presentes na Itália.
Torna-se necessário especificar e enfatizar vivamente que estes protestos foram frequentemente acompanhados e explorados por uma
secularidade extrema, em particular expressa contra o Catolicismo e
a fé católica, centrada acima de tudo em assuntos e aspectos particulares (princípios éticos não-negociáveis, casamento e família, educação e escolas oficiais e particulares) e assuntos fiscais e financeiros (financiamentos directos e indirectos, “facilidades” em termos de
doações isentas de impostos, etc.).
No entanto, a fé católica e os seus valores, independentemente dos
aspectos estritamente jurídicos e institucionais, continua a ser a
indisputada religião da maioria da população, estando profundamente arraigada nos italianos e difundida por todo o país. Porém, os
protestos e a oposição encontram-se geralmente ausentes ou não
possuem qualquer influência jurídica no que diz respeito às outras
comunidades cristãs não-católicas presentes na Itália.
Não podem deixar de ser mencionadas algumas atitudes e posições
intolerantes, de carácter sociopolítico, cultural e “ideológico” mais do
que religioso, relativamente a outras crenças ou religiões. De acordo
com alguns observadores, estas encontram-se envolvidas e contaminadas por formas de racismo e/ou de xenofobia, em especial em relação a imigrantes ou grupos de indivíduos muçulmanos. O mesmo se
aplica, ainda que numa escala mais reduzida, à comunidade judaica,
bem como a “outros” elementos, grupos comunitários ou convicções
religiosas.
Cristãos97,1%
Muçulmanos2,5%
Outros0,4%
Cristãos
48.340.480
Católicos
57.223.000
Circunscrições
eclesiásticas
229
SUPERFÍCIE
301.318km2
POPULAÇÃO
60.098.000
REFUGIADOS
54.965
DESALOJADOS
---
54
LETÓniA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos68,9%
Agnósticos30,4%
Outros0,7%
Cristãos
1.537.362
Católicos
443.000
Circunscrições
eclesiásticas
4
SUPERFÍCIE
64.600km2
POPULAÇÃO
2.240.000
REFUGIADOS
43
DESALOJADOS
---
55
LETÓniA
A Constituição de 1992 foi emendada significativamente em 1998
com a introdução do Capítulo VIII sobre direitos humanos fundamentais. O Artigo 99º reconhece que todos têm direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião. Declara também a separação
entre a Igreja e o Estado.
Em termos práticos, os princípios incluídos neste artigo são implementados pela legislação apropriada. A noção de “religiões tradicionais” está incorporada na lei, habilitando os grupos assim definidos
a desfrutar de certas vantagens administrativas e tributárias. Outros
grupos que solicitem o registo (que não é obrigatório) podem beneficiar de outras vantagens fiscais incluindo, em alguns casos, o acesso
a fundos públicos.
Todos os assuntos relativos às relações entre o Estado e a Igreja são
regulados através do Conselho Eclesiástico, o qual inclui representantes das religiões tradicionais, nomeadamente católicos, ortodoxos,
luteranos, baptistas, metodistas, adventistas, antigos crentes e judeus.
Durante o período de tempo considerado não foi relatado nenhum
caso de violação dos princípios da liberdade religiosa.
LiECHTEnSTEin
LiECHTEnSTEin
De acordo com a Constituição do Principado, a Igreja Católica é a
Igreja nacional (Artigo 37.2) e, como tal, beneficia da protecção total
do Estado. No entanto, todas as comunidades religiosas beneficiam
de total liberdade de organização e acção (Artigo 37.1 e 2).
Não ocorreram mudanças institucionais significativas ou incidentes
expressivos relativamente à questão da liberdade religiosa durante o
período de tempo considerado.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos84,9%
Muçulmanos6,3%
Agnósticos4,2%
Outros4,6%
Cristãos
31.620
Católicos
27.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
160km2
POPULAÇÃO
36.200
REFUGIADOS
91
DESALOJADOS
---
56
A Constituição da República da Lituânia, datada de 1992, garante a
total liberdade religiosa (Artigo 26º) de uma maneira muito detalhada, indo até ao ponto de garantir aos pais e guardiões o direito
constitucional de se encarregarem da educação religiosa dos seus
filhos e crianças a cargo do modo que acharem melhor.
O Artigo 43º reconhece as “Igrejas e organizações religiosas que são
tradicionais na Lituânia”, as quais “possuem os direitos de uma entidade legal”. Elas podem receber fundos públicos para as suas actividades e são livres de ensinar e de criar as suas próprias escolas. O
mesmo artigo define que “não haverá uma religião de Estado”.
As Igrejas e os grupos religiosos presentes na Lituânia há pelo menos
300 anos encontram-se definidos enquanto “religiões lituanas tradicionais” para efeitos de implementação dos princípios constitucionais.
A prática religiosa também é protegida por lei de todas as formas de
discriminação, do incitamento ao ódio religioso e de interferência em
cerimónias religiosas. Todas as formas de discriminação com base em
convicções religiosas são penalizadas.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos88,8%
Agnósticos10,8%
Outros0,4%
Cristãos
3.096.660
Católicos
2.726.000
Circunscrições
eclesiásticas
8
SUPERFÍCIE
65.200km2
POPULAÇÃO
3.255.000
REFUGIADOS
793
DESALOJADOS
---
57
LiTUÂniA
LiTUÂniA
LUXEMbURGO
LUXEMbURGO
A Constituição de 1868, no seu Artigo 19º, garante tanto a liberdade
religiosa como a de culto público, e por conseguinte também o direito
a expressar as opiniões religiosas pessoais, excepto quando são
cometidas ofensas no exercício de tal liberdade. Ao mesmo tempo,
ninguém pode ser forçado a tomar parte, seja de que forma for, nos
actos e cerimónias de uma religião ou a respeitar os seus dias de descanso.
O casamento religioso não tem nenhum estatuto legal e deve,
segundo a lei, ser celebrado depois da cerimónia civil.
A Concordata Napoleónica com a Santa Sé, datada de 1801, ainda se
encontra em vigor, embora complementada e alterada por disposições constitucionais e outras emendas posteriores. Além da Igreja
Católica, três outras religiões são reconhecidas pelo Estado: a religião
judaica, as Igrejas protestantes e a Igreja Ortodoxa Russa, sendo os
seus ministros apoiados pelo Estado.
O Artigo 22º, que regula as relações entre o Estado e a Igreja, estabelece que “a intervenção do Estado na designação e instalação dos líderes religiosos, o modo de nomeação e de demissão de outros ministros da religião, o direito de qualquer um deles a se corresponder com
os seus superiores e a publicar os seus actos e decisões, assim como
as relações da Igreja com o Estado devem ser o objecto de convenções
a serem submetidas à Câmara de Deputados para as disposições que
governam a sua intervenção”.
Nas escolas estatais existe a opção de escolher entre a instrução religiosa católica ou aulas sobre ética.
Não há nenhum relato de mudanças institucionais significativas ou
incidentes relativos à questão da liberdade religiosa durante o período sob análise.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos95,5%
Agnósticos3%
Outros1,5%
Cristãos
431.940
Católicos
455.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
2.586km2
POPULAÇÃO
492.000
REFUGIADOS
3.230
DESALOJADOS
---
58
KOSOVO
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos65,3%
Agnósticos8,7%
Muçulmanos24,5%
Outros1,5%
Cristãos
7.205.548
Católicos
523.000
Circunscrições
eclesiásticas
7
SUPERFÍCIE
88.361km2
POPULAÇÃO
9.856.000
REFUGIADOS
86.351
KOSOVO
Durante 2009, não ocorreu no país nenhuma mudança significativa
em relação ao direito à liberdade religiosa.
No que concerne à Igreja Católica, foram retomados os trabalhos de
construção da Catedral dedicada à Beata Madre Teresa. Espera-se que
a igreja seja inaugurada em 2010, pela ocasião do centésimo aniversário do nascimento da Madre Teresa.
No entanto, as relações entre as comunidades religiosas no país permanecem muito tensas, especialmente após a proclamação da independência em Fevereiro de 2008.
Os confrontos estão de facto enraizados na etnicidade, mas a religião
está tão fortemente enredada com esta que se torna um factor de
exacerbação para a situação. Deste modo as causas subjacentes são
mais difíceis de entender.
No conjunto, os líderes religiosos queixam-se de serem tratados de
maneira diferente pela lei em comparação com organizações nãogovernamentais, algo que eles consideram como sendo obviamente
uma desvantagem. Em particular, os líderes das comunidades muçulmanas e protestantes lamentam a ausência de qualquer estatuto
legal para os seus grupos religiosos.
Os Protestantes apontam em especial actos de discriminação perpetrados por autoridades locais e nacionais. Citam, por exemplo, a
impossibilidade de terem os seus próprios cemitérios. A situação é tal
que foram forçados a realizar funerais em cemitérios muçulmanos,
com prejuízo óbvio para os seus direitos.
Grupos protestantes declararam também que a Câmara Municipal de
Deçan-Dečani continua a negar-lhes uma licença para a construção
de uma igreja num terreno por eles adquirido. O caso ainda se encontra pendente nos tribunais.
Por outro lado, o caso de um estudante muçulmano que foi expulso
da escola em Setembro de 2008, por se recusar a remover um adorno
de cabeça muçulmano tradicional, foi resolvido quando a escola lhe
concedeu autorização para o uso e o readmitiu.
Continuam a ser relatados ataques contra os membros e propriedades da Igreja Ortodoxa sérvia, incluindo ameaças, roubos e actos de
vandalismo.
As áreas de tensão onde surge este tipo de problemas são municípios
na zona Ocidental do país, incluindo Pejë-Peč, Deçan-Dečani, GjakovëDjakovica e Burim-Istok, mas também no Sul, em Mitrovicë-Mitrovica.
Nestas áreas, o clero ortodoxo sérvio pediu e obteve a protecção das
forças de paz da NATO.
DESALOJADOS
225.000-230.000
(plusKosovo:19.700)
59
KOSOVO
É inegável que têm ocorrido vários incidentes de apedrejamento e outro tipo de violência
contra membros do clero ortodoxo quando se encontram fora dos seus mosteiros. Em alguns
casos, crianças lançaram pedras a carros que transportavam peregrinos sérvios que se dirigiam para o mosteiro de Visoki Dečani.
Em vários locais, considerações de segurança forçaram monges e religiosas a manterem-se
longe do perímetro exterior dos seus mosteiros, especialmente os terrenos que se encontram
da parte de fora das secções muradas ou na zona envolvente.
Em Junho, o presidente da Câmara e as autoridades de Klinë-Klina condenaram a profanação
de dez túmulos no cemitério sérvio de Videjë-Vidanje. Foram também eles que pagaram os
danos.
Durante o ano, os Protestantes relataram ainda um aumento nos actos de violência de que
foram alvo. Por exemplo, uma lista com os nomes de sacerdotes, missionários e os membros
das suas famílias, com os respectivos endereços e números de telefone dos seus escritórios e
organizações, foi publicada e disponibilizada em cerca de uma centena de sítios da Internet.
60
MACEDÓniA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos64,6%
Muçulmanos29%
Agnósticos6,4%
Cristãos
1.496.950
Católicos
30.000
Circunscrições
eclesiásticas
2
SUPERFÍCIE
25.713km2
POPULAÇÃO
2.043.000
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
650
61
MACEDÓniA
Legislação
Em termos gerais, o Estado respeita o direito à liberdade religiosa,
pese embora o facto de que a parte relativa ao registo dos grupos religiosos contida na lei de 2007 sobre o seu estatuto legal nunca tenha
sido completada. Tal impede efectivamente os grupos que pedem o
registo de satisfazer os requisitos legais necessários para o obter.
O Ministério da Educação inaugurou um programa para instrução
religiosa no sexto ano do ensino primário durante o ano escolar de
2008-2009, pedindo aos pais dos alunos que escolhessem entre um
curso doutrinal ligado a uma denominação religiosa específica e um
curso sobre a história das religiões.
Porém, no dia 15 de Abril de 2009, o Tribunal Constitucional emitiu um
acórdão, declarando que os cursos sobre confissões religiosas individuais eram incompatíveis com o princípio constitucional da separação entre o Estado e a Igreja. O Ministério da Educação respeitou a
decisão e suspendeu os cursos. A decisão do Tribunal Constitucional
não diz respeito aos cursos genéricos sobre a história das religiões, os
quais foram leccionados até ao final do ano escolar.
No final de Outubro de 2009, o ministério anunciou um plano para
criar um curso intitulado “A Ética da Religião” para o ano escolar de
2009-2010, como alternativa ao curso sobre história das religiões.
O Estado apoia a construção de locais de culto e de outros edifícios
religiosos para serem utilizados pela comunidade ortodoxa dominante.
Na realidade as igrejas e mesquitas são frequentemente construídas
sem autorização, mas normalmente o Governo não actua juridicamente contra os grupos religiosos que convertem edifícios existentes
em edifícios para actividades religiosas.
O problema que diz respeito à restituição de propriedades pertencentes a grupos religiosos e confiscadas sob o regime comunista ainda
não foi completamente resolvido.
Em Janeiro de 2009, o Ministério da Cultura completou a construção
de um memorial em honra da Madre Teresa, construído em Skopje, a
cidade onde nasceu. Membros das várias comunidades religiosas, em
conjunto com funcionários do Governo e representantes da comunidade internacional, assistiram à cerimónia de inauguração no dia 30
de Janeiro.
No decurso de 2009, dois novos grupos religiosos obtiveram o registo.
Tratou-se da Igreja Cristã Palavra de Esperança e o Movimento Reformista dos Adventistas do Sétimo Dia. Os pedidos de outras onze
macedÓnia
comunidades religiosas foram rejeitados ou não foram concluídos; entre estes conta-se o da
Igreja Baptista Evangélica.
Devido à inexistência de registo, várias restrições são aplicadas ao grupo religioso denominado Arcebispado Ortodoxo de Ohrid que nega a auto-declarada autocefalia da Igreja Ortodoxa da Macedónia. O líder deste grupo, Jovan Vranisbovski, libertado depois de ter estado
detido em Abril de 2007, permanece em liberdade, embora os funcionários do Governo continuem a recusar-se a devolver o seu passaporte, restringindo deste modo os seus movimentos.
62
MALTA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos98%
Outros2%
Cristãos
424.656
Católicos
418.000
Circunscrições
eclesiásticas
2
SUPERFÍCIE
316km2
POPULAÇÃO
443.000
REFUGIADOS
58.955
DESALOJADOS
---
63
MALTA
O Artigo 2º da Constituição estabelece que a religião Católica Apostólica Romana é a religião oficial em Malta. As autoridades da Igreja
Católica, de acordo com o Artigo 3º, têm, por conseguinte, “o dever e
o direito de ensinar quais os princípios que estão certos e quais estão
errados”, e o Artigo 4º afirma que o ensino da religião Católica Apostólica Romana terá de se encontrar disponível em todas as escolas
públicas como parte do currículo obrigatório, embora seja possível
optar por não o ter.
O Artigo 32º garante a todos os cidadãos as liberdades e os direitos
individuais básicos, independentemente da raça, da origem, da opinião política, da cor da pele ou do sexo, contanto que o interesse
público seja respeitado. Estes direitos incluem especificamente o
direito “à vida, à liberdade, à segurança, ao gozo da propriedade e à
protecção da lei, à liberdade de consciência, à liberdade de expressão
e à liberdade de se reunir em grupo, bem como também à associação
pacífica e ao respeito pela vida privada e pela vida familiar.”
Não houve relatos de mudanças institucionais significativas ou de
qualquer incidente expressivo relativamente à questão da liberdade
religiosa.
MOLDÁViA
MOLDÁViA
Legislação
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
A legislação actual, em vigor desde 2007, permite, por vezes, restrições
à liberdade religiosa de certas comunidades. Na realidade, em teoria, a lei deveria simplificar os procedimentos requeridos para obter o
registo legal mas, na prática, os líderes das várias comunidades relatam uma situação muito diferente.
É preciso ter em atenção que a religião principal do país é a Igreja
Ortodoxa e, na lei sobre as organizações religiosas, o Estado reconhece o importante papel histórico desempenhado por esta confissão religiosa na vida da Moldávia.
Os procedimentos de registo exigidos são iguais para todos os grupos e, no decurso do ano, um novo grupo religioso denominado Culto
Cristão Apostólico Arménio obteve o registo, estando previamente
afiliado a um outro grupo que já fora reconhecido.
Por todo o país é agora aplicado um novo código de multas, uma
espécie de código para crimes administrativos; foi aprovado no dia
24 de Outubro de 2008 e implementado no dia 31 de Maio de 2009.
O Artigo 54º destas disposições prevê multas que variam de 700 até
4.000 lei (um valor equivalente a entre 50 e 283 euros) para crimes
que envolvem a violação da legislação sobre a liberdade religiosa. Este
artigo define também a expulsão de crentes estrangeiros que levem
a cabo actividades religiosas ou proselitismo sem terem informado
previamente o gabinete do presidente da câmara dos locais nos quais
tais actividades vão ter lugar. Esta parte do artigo está de facto em
conflito com os princípios do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
e consequentemente, em Fevereiro, o Ministério da Justiça bloqueou
o Artigo 54º, o qual se encontra agora numa espécie de limbo, pois
não está claro se pode ou não ser aplicado.
Várias comunidades religiosas relataram casos de restrições à liberdade religiosa e de consciência, justificadas pelas autoridades como
sendo necessárias devido a razões que envolvem a ordem e a segurança públicas.
No dia 12 de Maio de 2009, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
decidiu a favor do cidadão moldavo Talgat Masaev, que tinha apelado
para este tribunal depois de ser acusado em 2004, por um tribunal
local, de praticar uma religião não reconhecida pelo Estado. A polícia
entrara na sua residência, onde ele e outros muçulmanos se encontravam a rezar, e dispersou o grupo.
Cristãos95,9%
Agnósticos2,9%
Outros1,2%
Cristãos
2.469.920
Católicos
20.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
33.831km2
POPULAÇÃO
3.576.000
REFUGIADOS
141
DESALOJADOS
---
64
Muitas comunidades relataram também problemas burocráticos na obtenção de vistos de residência para cidadãos estrangeiros que desejam viver no país e levar a cabo actividades religiosas.
O problema das propriedades confiscadas
Embora a lei estabeleça que as propriedades confiscadas, sob os regimes Nazi e Soviético,
àqueles que se encontravam no exílio ou que foram politicamente perseguidos, deverão ser
devolvidas aos seus legítimos proprietários, esta disposição não é aplicada.
Também entre as comunidades religiosas existem problemas relativos a propriedades, como
por exemplo entre a Igreja Ortodoxa Moldava e a Igreja Ortodoxa da Bessarábia.
No dia 19 de Março de 2009, o Gabinete do Conselho da Europa definiu, porém, que o Governo
da Moldávia tinha cumprido todas as suas obrigações no que diz respeito ao pagamento de
indemnização à Igreja Ortodoxa da Bessarábia.
Os Luteranos estão também a exigir a restituição de propriedades confiscadas durante a
Segunda Guerra Mundial, muitas das quais foram destruídas. Em Chisinau, por exemplo,
num local agora ocupado pela Presidência da República para usos que não são de carácter
religioso, houve em tempos uma igreja luterana do século XV, a qual foi destruída pelos soviéticos durante os anos sessenta do século passado. Os Luteranos estão a pedir uma indemnização pela destruição, ou pelo menos a devolução do local, mas as autoridades usam de
argumentos legais para negar estes pedidos, declarando que o local não lhes pode ser devolvido porque a comunidade luterana não concorda relativamente ao uso que lhe seria dado.
Transnístria
MOLDÁVIA
Nesta região separatista que não é controlada pelo Governo central, as autoridades respeitam geralmente o direito à liberdade religiosa de grupos registados. No entanto, também
nesta área é negado o estatuto legal a um certo número de grupos religiosos minoritários
que vêem assim as suas actividades serem prejudicadas.
No dia 19 de Novembro de 2008, uma nova lei sobre a liberdade de consciência e organizações religiosas foi aprovada nesta região pelo Soviete Supremo. O líder desta zona, Igor Smirnov, tinha porém vetado a sua aplicação, um veto mais tarde retirado pelo próprio Soviete no
dia 4 de Fevereiro de 2009. Pela primeira vez, a lei da Transnístria contempla o registo legal
para as organizações religiosas. A responsabilidade por estes procedimentos foi transferida
do agora abolido Gabinete do Comissário para os Assuntos Religiosos para o auto-designado
ministro da Justiça para esta região.
As Testemunhas de Jeová reclamaram sobre os muitos episódios que envolvem restrições
aplicadas às suas actividades, relatando vinte e quatro incidentes deste tipo. As autoridades
locais rejeitam, em particular, o seu estatuto jurídico, e atacam-nas em várias frentes como,
por exemplo, privando-as do seu número de contribuinte (necessário para todas as transacções financeiras), perturbando as suas missas e os seus encontros de oração, confiscando
livros sobre assuntos religiosos, perturbando os crentes e até mesmo aqueles que são objectores de consciência para o serviço militar.
65
MÓnACO
MÓnACO
O Artigo 9º da Constituição do Principado estabelece que a Religião Católica Apostólica Romana é a religião do Estado. O Artigo 17º
garante que os monegascos – os cidadãos do Mónaco – são iguais aos
olhos da lei e não existem quaisquer privilégios individuais entre eles.
O Artigo 23º garante “a liberdade religiosa, o seu exercício público,
como também a liberdade para expressar as opiniões pessoais sobre
todos os assuntos”, com a excepção da “repressão de crimes cometidos durante o exercício desta liberdade”, garantindo também que
“ninguém será obrigado a participar nas actividades e cerimónias de
uma religião ou a observar os seus dias de descanso”.
Não houve relatos de mudanças institucionais significativas ou de
qualquer incidente expressivo relativamente à questão da liberdade
religiosa.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos92,7%
Agnósticos4,9%
Outros2,4%
Cristãos
29.824
Católicos
29.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
1km2
POPULAÇÃO
32.900
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
---
66
MOnTEnEGRO
Os problemas da Igreja Ortodoxa
A tensão permanece extremamente elevada entre os dois ramos da
Igreja Ortodoxa, as Igrejas Sérvia e Montenegrina, com ambas a exigirem o estatuto de “verdadeira” Igreja Ortodoxa do país.
A propriedade de igrejas por todo o país e especialmente na zona de
Cetinje é também objecto de disputa frequente.
Em Janeiro de 2009, a Igreja Ortodoxa Montenegrina anunciou a sua
intenção de tomar posse de todos os mosteiros e igrejas construídos
antes de 1918, o que resultou em numerosos casos de tribunal.
Por exemplo, em Janeiro de 2009, os tribunais administrativos revogaram a decisão tomada pelo Ministério das Finanças de devolver
vinte igrejas e dois mosteiros em Cetinje à Igreja Ortodoxa Sérvia, tal
como fora pedido pela Igreja Ortodoxa Montenegrina, e ordenaram
ao Ministério que tomasse uma nova decisão. A Igreja Sérvia comentou, dizendo que se tratava de uma decisão política sem fundamentos na legislação actual.
No dia 20 de Janeiro, a polícia proibiu dois padres pertencentes às
duas Igrejas Ortodoxas rivais de entrarem na Igreja de São João Baptista, em Bajice, perto de Cetinje, que é disputada desde Outubro de
2008, quando ambos se estavam a preparar para celebrar a liturgia no
mesmo dia. De acordo com a imprensa, a polícia isolou a área usando
um cordão de agentes e usou da força para impedir que os crentes de
ambas as confissões religiosas entrassem na igreja.
No dia 6 de Fevereiro de 2009, o advogado que representa a Igreja
Ortodoxa Sérvia, Dalibor Kavaric, apresentou queixa contra Miras
Dedejic, Milan Martinovic, Dusan Martinovic e Bojan Bojovic, todos
membros da Igreja Ortodoxa Montenegrina, por terem mudado a
fechadura da igreja no dia 28 de Janeiro, violando assim os direitos
dos crentes ortodoxos sérvios de realizar serviços religiosos naquele
edifício sagrado.
O juiz em Cetinje, Luka Martinovic, indeferiu o caso e, por seu turno,
abriu um inquérito sobre as acusações feitas contra dois padres ortodoxos sérvios, Gojko Perovic e Obren Jovanovic, ambos acusados de
entrarem ilegalmente numa igreja para celebrar serviços religiosos.
No dia 14 de Abril de 2009, em Niksic, fiéis da Igreja Ortodoxa Sérvia
tentaram impedir o líder da Igreja Montenegrina, Miras Dedejic, de
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos77,7%
Muçulmanos16,5%
Agnósticos5,8%
Cristãos
9.794.400
Católicos
22.000
Circunscrições
eclesiásticas
21
SUPERFÍCIE
14.480km2
POPULAÇÃO
626.000
REFUGIADOS
24.019
DESALOJADOS
---
67
MOnTEnEGRO
Não existem relatos de mudanças significativas na legislação ou no
respeito pela liberdade religiosa no país.
Montenegro
entrar na cidade. A polícia prendeu sessenta e cinco pessoas, dez das quais foram multadas
por terem bloqueado as ruas.
Os dois grupos confrontaram-se nos meios de comunicação social com uma gama diversa
de acusações recíprocas sobre a legalidade da posse da Igreja de São Nicolau, em Cevo, também na zona de Cetinje. A Igreja Sérvia ameaçou processar a Igreja Montenegrina por ter
removido objectos da igreja no dia 12 de Abril. Naquele mesmo dia a Igreja Montenegrina
queixou-se sobre a “(...) destruição do legado cultural montenegrino levada a cabo pela Igreja
Ortodoxa Sérvia”.
Ao contrário de anos anteriores, não houve nenhum relato sobre restrições ou problemas no
que diz respeito às viagens do Bispo sérvio Filarete ao Montenegro, o qual em três ocasiões
em 2007 foi proibido de viajar pelo país para cumprir os seus deveres religiosos.
Em Outubro, o Ministério do Desenvolvimento Económico não tinha ainda tomado uma
decisão sobre a intenção expressa pelo anterior ministro do Planeamento Urbano de remover uma igreja ortodoxa sérvia do topo do Monte Rumija, no Sul do país. A Igreja Ortodoxa
Montenegrina ameaça processar o Governo no Tribunal Europeu dos Direitos humanos caso
o ministério abandone a sua decisão de a remover.
A lei sobre a restituição de propriedades confiscadas às comunidades religiosas pelo Governo
jugoslavo depois da Segunda Guerra Mundial, estabelece que todos os assuntos devem ser
resolvidos caso a caso e com legislação separada. De momento, porém, nenhuma legislação
foi ainda adoptada.
No fim do ano, vários grupos religiosos apresentaram pedidos para a devolução, mas não foi
feito nenhum progresso significativo para resolver o problema.
A Igreja Ortodoxa Sérvia acusou o Governo de atrasar a restituição das suas propriedades e
apresentou um recurso no Tribunal Europeu de Direitos Humanos.
A Igreja Católica e a comunidade islâmica estão também a pedir a restituição de bens em
vários locais.
Reis Rifat Fejzic, líder da comunidade islâmica, expressou o seu descontentamento sobre o
facto de que a lei só se refere às reclamações de propriedades confiscadas depois de 1945,
sendo que a maior parte das propriedades muçulmanas foi expropriada antes dessa data.
Existem ainda relatos de casos envolvendo discriminação social com base religiosa mas, tal
como acontece nos outros países dos Balcãs, também aqui as razões étnicas e religiosas
estão tão fortemente interligadas que é difícil compreender a verdadeira razão que despoleta estes incidentes.
68
nORUEGA
Islão
No entanto, também no seio das instituições se denotam actualmente muitos sinais de preocupação e tentativas para conter aquilo
que é entendido como uma invasão islâmica, num país que tem
pouco mais de 4,5 milhões de habitantes. Assim, embora as jovens
não estejam proibidas de usar o véu islâmico nas escolas, tentativas
de proibir roupas que cubram completamente o corpo, como é o caso
da burqa e do niqab, sofrem lentos avanços.
O pedido feito pela Associação das Mulheres Muçulmanas, para que
fosse permitido que as muçulmanas que trabalham na polícia pudessem usar o hijab juntamente com o uniforme, aceite em Fevereiro de
2009 pela Directoria da Polícia, foi mais tarde rejeitado pelo Ministério da Justiça.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos91,3%
Agnósticos4,7%
Muçulmanos3%
Outros1%
Cristãos
4.384.950
Católicos
76.000
Circunscrições
eclesiásticas
4
SUPERFÍCIE
323.877km2
POPULAÇÃO
4.855.000
REFUGIADOS
37.826
DESALOJADOS
---
69
nORUEGA
A liberdade religiosa é garantida pelo Artigo 2º da Constituição, o qual
também estabelece que a Igreja Evangélica Luterana é a religião estatal e obriga aqueles que a professam a “educar os seus filhos segundo
a mesma”. O próprio rei é obrigado a pertencer a esta religião, a protegê-la e a preservá-la.
A discussão sobre a separação entre o Estado e a Igreja Luterana
teve como resultado um relatório elaborado por uma Comissão Parlamentar que decidiu introduzir gradualmente medidas e alterações
legislativas à Constituição. Embora não abolindo a religião do Estado,
as alterações irão garantir durante alguns anos maior autonomia à
Igreja Evangélica Luterana, por exemplo na nomeação de bispos, que
actualmente é competência do Parlamento.
Todas as outras comunidades religiosas registadas recebem subsídios estatais em proporção ao número dos seus membros e não
existe qualquer restrição relativamente a autorizações de residência
para missionários estrangeiros.
POLÓniA
POLÓniA
No Artigo 53º, a Constituição da República da Polónia, datada de 1997,
garante a todas as organizações religiosas registadas total liberdade
para implementar as suas actividades pastorais, culturais e editoriais.
Existem quinze grupos religiosos cuja relação com o Estado é regulada por legislação específica que define a estrutura interna dos grupos religiosos, as suas actividades e os procedimentos para a restituição de propriedades. Existem outros 149 grupos religiosos registados
que não têm uma relação estatutariamente definida com o Estado.
Todos os grupos religiosos registados, incluindo os quinze originais,
beneficiam de igual protecção perante a lei.
O sistema judicial regula esta questão em pormenor e, na realidade,
não têm existido problemas relacionados com as livres actividades
das várias religiões e comunidades religiosas.
O Código Penal estipula que a ofensa do sentimento religioso através
de discursos públicos é punível com uma multa ou sentença até três
anos de prisão.
A lei coloca a comunidade católica, judaica, ortodoxa e protestante no
mesmo patamar legal, e o Governo procura resolver os problemas que
os grupos religiosos minoritários possam enfrentar.
As organizações religiosas e os missionários estrangeiros não têm de
se registar no país e podem operar livremente sem esse registo.
Em termos gerais, é possível declarar que não existem sinais indicando possíveis obstáculos às actividades de Igrejas e associações
religiosas na Polónia.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos97%
Agnósticos3%
Cristãos
37.148.360
Católicos
36.639.000
Circunscrições
eclesiásticas
46
SUPERFÍCIE
323.950km2
POPULAÇÃO
38.038.000
REFUGIADOS
15.320
DESALOJADOS
---
70
PORTUGAL
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos89,7%
Agnósticos9,2%
Outros1,1%
Cristãos
9.794.400
Católicos
9.368.000
Circunscrições
eclesiásticas
21
SUPERFÍCIE
91.982km2
POPULAÇÃO
10.732.000
REFUGIADOS
389
DESALOJADOS
---
71
PORTUGAL
A Constituição garante o direito à liberdade religiosa em dois artigos, que
asseguram a igualdade de todos os cidadãos perante a lei e a inviolabilidade da “liberdade de consciência, de religião e de culto”. Ninguém pode
ser “perseguido, privado de direitos” mas também não pode ser “isento
de obrigações ou deveres cívicos por causa das suas convicções ou prática religiosa”, embora a objecção de consciência seja garantida, de acordo
com a lei. Também ninguém pode ser “perguntado por qualquer autoridade acerca das suas convicções ou prática religiosa, salvo para recolha de
dados estatísticos” que não pode, contudo, permitir a identificação do indivíduo; nem ninguém pode ser prejudicado por se “recusar a responder”.
Na lei portuguesa, “as igrejas e outras comunidades religiosas estão
separadas do Estado e são livres na sua organização e no exercício
das suas funções e do culto”. É garantida “a liberdade de ensino de
qualquer religião praticado no âmbito da respectiva confissão”, “bem
como a utilização de meios de comunicação social próprios para o
prosseguimento das suas actividades”.
As relações com a Igreja Católica são reguladas pela Concordata de 2004.
Com as restantes confissões religiosas, a Lei da Liberdade Religiosa, de
2001, prevê a possibilidade de o Estado celebrar acordos diferenciados.
Até agora, no entanto, isso ainda não aconteceu, apesar de, até Julho
de 2010, ter sido atribuído o estatuto de “confissão religiosa radicada” a
quarenta e oito Igrejas ou grupos religiosos diferentes. Nenhuma Igreja
ou religião é financiada pelo Estado, embora este apoie a construção de
igrejas (e, em casos esporádicos, templos não-católicos).
Ao abrigo da mesma Lei (16/2001), foi criada uma Comissão de Liberdade Religiosa, com a missão de dar pareceres e aconselhar o Governo
nesta matéria. A lei prevê ainda algumas isenções fiscais e a possibilidade de aulas confessionais na escola pública, bem como o acesso a
um tempo de emissão religioso na rádio e na televisão públicas. No
campo fiscal, estabeleceu-se um mecanismo segundo o qual cada
contribuinte pode atribuir 0,5% do imposto sobre o rendimento a uma
entidade religiosa ou a qualquer associação não-lucrativa que entenda.
No entanto, a lista de entidades religiosas que tem beneficiado desta
possibilidade é ainda muito reduzida: conta-se por poucas dezenas.
A partir da lei de 2001, as confissões minoritárias podem, à semelhança da Igreja Católica, celebrar casamentos religiosos com efeitos
civis e prestar assistência espiritual nas forças armadas e nas prisões,
entre outros actos. As condições concretas do exercício dessa assistência foram reguladas em 2009, abrindo as portas à assistência
espiritual de qualquer confissão nesses âmbitos de actividade.
REinO UniDO
REinO UniDO
Nos últimos anos, a sociedade britânica adquiriu um carácter cada
vez mais multi-cultural, multi-étnico e multi-confessional. A diversidade e o respeito pela diferença tornaram-se palavras-chave na vida
pública, especialmente nos meios de comunicação social e nas instituições governamentais. Mas, na prática, tais mudanças estão ligadas
a uma crescente discriminação contra a maioria da população que é,
pelo menos nominalmente, cristã.
Embora existam vinte e seis bispos anglicanos na Câmara dos Lordes,
e a Igreja de Inglaterra seja a Igreja maioritária, as mudanças introduzidas em nome da igualdade religiosa têm corroído o lugar do Cristianismo na vida cívica.
No final de 2007, o deputado Mark Pritchard reportou que 80% das
escolas (primárias) não iriam preparar uma peça de Natal. E disse
mais, convidando “aqueles que desejam ver a Igreja Cristã reduzida às
margens da nossa nação a terem a coragem de o dizerem, em lugar de
usarem os direitos das outras religiões como uma desculpa”. Preocupações levantadas pelos exponentes da igualdade de oportunidades,
em como os grupos minoritários se sentem ofendidos por exibições
de práticas cristãs, mostraram-se frequentemente infundadas. Isto é
evidente em declarações como as que se seguem, feitas pelo Conselho Muçulmano da Grã-Bretanha: “Nós não vemos nenhuma razão
pela qual qualquer muçulmano se deva sentir indignado ou ofendido
pelas celebrações de Natal ou por qualquer outra celebração religiosa
de todas as outras confissões”.
Vários não-crentes, como o poeta laureado Andrew Motion, queixaram-se de que as crianças no Reino Unido foram privadas da sua
herança cultural, indicando que o currículo neste momento omite a
Bíblia e a história cristã. Iniciativas com o objectivo de obter a igualdade para todos - incluindo a maior comunidade religiosa – foram
comprometidas por uma ênfase exagerada colocada nos direitos dos
grupos minoritários. Por exemplo, em 2008, foram emitidas directrizes para os museus, bibliotecas e arquivos britânicos, que aconselham
que a Bíblia, o Alcorão e outros livros sagrados sejam colocados na
estante mais alta para evitar ofender os muçulmanos.
Uma sondagem levada a cabo de 21 de Abril a 1 de Maio de 2009
pela ComRes, uma empresa especializada em pesquisa estatística,
demonstra como os cristãos que respeitam as práticas e os preceitos religiosos se sentem discriminados por causa da sua fé. Vinte por
cento dos 512 crentes cristãos entrevistados pela ComRes para esta
sondagem declararam que tinham surgido mal-entendidos e obstá-
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos80%
Agnósticos14,4%
Muçulmanos2,7%
Outros2,9%
Cristãos
48.002.990
Católicos
5.186.000
Circunscrições
eclesiásticas
32
SUPERFÍCIE
230.762km2
POPULAÇÃO
61.899.000
REFUGIADOS
269.363
DESALOJADOS
---
72
REINO UNIDO
culos no local de trabalho devido às suas convicções religiosas. Cinco por cento dos entrevistados declararam que a discriminação contra os cristãos praticantes tinha tido um impacto
negativo nas suas carreiras. Três em cada quatro dos entrevistados pela ComRes declararam
que a frequência dos actos de discriminação os levou a sentir que havia, neste momento,
menos liberdade religiosa no Reino Unido do que há vinte anos. Um em cada cinco indivíduos na amostra da sondagem declarou que a discriminação contra os Cristãos era mais
aparente no Reino Unido do que noutros países da Europa Ocidental.
O Reverendíssimo Dr. John Sentamu, Arcebispo anglicano de York, foi alvo de uma cobertura
massiva em Fevereiro de 2009, quando declarou que a maioria silenciosa dos cristãos precisava de se insurgir para defender o seu património. Citou vários incidentes com preconceitos
anti-cristãos visíveis, que foram relatados nos meios de comunicação social. Uma das envolvidas nestas situações foi Jennie Caim, recepcionista numa escola primária que foi suspensa
por ter usado o correio electrónico do emprego para pedir aos amigos para rezarem por ela.
Tal seguiu-se a um incidente no qual a sua filha de 5 anos foi repreendida por evangelizar os
colegas de turma.
Em particular, os problemas têm origem em várias directrizes e mudanças jurídicas relativas
aos direitos humanos recentemente introduzidas pelo Governo em cooperação com a Associação Humanista Britânica (AHB) e a Comissão para a Igualdade e os Direitos Humanos
(CIDH). Neste momento, de acordo com a legislação actual, se um funcionário manifestar a
sua fé religiosa no local de trabalho, ele ou ela pode ser acusado de coacção.
Até mesmo o apoio ao conceito tradicional de casamento pode resultar em exclusão na atribuição de fundos públicos. Desde Abril de 2007, as organizações sem fins lucrativos britânicas têm operado conforme os Regulamentos da Lei da Igualdade (Orientação Sexual). Isto
significa que são obrigadas a cooperarem com empregados homossexuais que fazem parte
de parcerias civis. As organizações também são obrigadas a ajudar os seus funcionários
homossexuais em casos de adopção e de famílias de acolhimento.
Preocupações semelhantes sobre a erosão da moral e dos valores cristãos tradicionais, erosão
essa que é vista como sendo apoiada pelo Estado, emergiram num programa de rádio da BBC
no dia de Páscoa de 2010. Nicky Campbell, apresentador de um programa sobre a questão
“Estão os Cristãos a ser perseguidos?”, causou um alvoroço ao acusar as instituições estatais
de não respeitarem a liberdade de consciência dos Cristãos por os obrigar a respeitar a nova
legislação relativa aos direitos dos homossexuais.
Um caso conhecido envolveu o Pastor protestante Dale McAlpine que foi preso no dia 20
de Abril de 2010 em Workington, Cumbria, no seguimento de um sermão de rua no qual
condenou a homossexualidade. Depois de estar preso numa esquadra da polícia durante
sete horas, o pastor cristão foi formalmente acusado. Foi acusado de estar a violar as leis da
ordem pública que foram aprovadas originalmente em 1986 numa tentativa para controlar
a violência relacionada com o futebol e o comportamento anti-social. Agora estas leis são
amplamente vistas como um meio de restringir a liberdade de expressão. O polícia que o
denunciou identificou-se como sendo o oficial de ligação para a comunidade lésbica, homos73
REinO UniDO
sexual, bissexual e transexual. Depois de ser libertado sob fiança, o Senhor McAlpine foi proibido de pregar em público.
As denominadas leis anti-discriminação podem por vezes resultar em discriminação contra funcionários públicos, os quais, no seu local de trabalho, podem estar sujeitos a acções
disciplinares e, em alguns casos, acabaram mesmo por ser despedidos. Embora, em teoria, os Regulamentos sobre a Igualdade no Emprego (Religião ou Credo), datados de 2003,
declarem que a discriminação religiosa é ilegal, na prática tal legislação provou conduzir a
infracções dos direitos humanos. Uma investigação publicada em Fevereiro de 2009 pelo
Chartered Management Institute revelou que entre Abril de 2007 e Abril de 2008 houve 600
casos de tribunal envolvendo discriminação religiosa no local de trabalho, um aumento de
114 em relação aos doze meses anteriores. Os Cristãos não são as únicas vítimas. Há uma
preocupação geral sobre as consequências das directrizes definidas no documento Religion
or Belief: A Practical Guide to the National Health Service (Religião Ou Credo: Guia Prático para
o Serviço Nacional de Saúde) onde se lê, “Espera-se que os membros de algumas religiões [...]
rezem e tentem converter outras pessoas. Num ambiente de local de trabalho, esta situação
pode fazer com que as pessoas não-religiosas e as que professam outras religiões se sintam
importunadas e intimidadas”. Consequentemente, para “evitar mal-entendidos e reclamações sobre este assunto, deve ser tornado claro a todos no primeiro dia de [...] trabalho, e
regularmente relembrado, que tal comportamento pode ser interpretado como comportamento abusivo...” Entre os punidos por tal “comportamento abusivo” encontra-se Caroline
Petrie, uma enfermeira cristã baptista, de Weston-super-Mare, no Somerset. Ela foi suspensa
do Serviço Nacional de Saúde por “empenho insuficiente em termos da igualdade e da diversidade”, depois de se ter oferecido para rezar por um paciente em Dezembro de 2008. Regressaria mais tarde ao seu posto de trabalho.
Ao regular as relações entre os crentes de religiões diferentes, as novas leis e directrizes do
Governo criaram confusão, um problema que levou a tensão adicional. Ocorreram diversos episódios esclarecedores, como é o caso dos eventos no bairro de Alum Rock, em Birmingham, em Junho de 2008, quando a polícia aconselhou Arthur Cunningham e Joseph
Abraham, dois cristãos americanos, a pararem com o proselitismo na rua pois os habitantes
do bairro eram principalmente muçulmanos. De acordo com um funcionário policial designado para a comunidade muçulmana local, os cristãos arriscaram-se a cometer um crime de
intolerância ao tentar conseguir conversões distribuindo extractos da Bíblia. Por esta razão,
os cristãos foram advertidos de possíveis riscos à sua integridade física se continuassem com
o proselitismo. Outro polícia disse-lhes que não voltassem àquela zona. Encontram-se neste
momento no processo de pedir indemnizações à Polícia das West Midlands, declarando que
o seu direito à liberdade de expressão religiosa foi violado. Em Fevereiro de 2008, o Bispo
anglicano de Rochester da altura, Dr. Michael Nazir-Ali, descreveu problemas experimentados
por cristãos que vivem e trabalham em zonas nas quais vários pastores islâmicos fundamentalistas tentam impor a sua própria hegemonia.
74
REinO UniDO
Este tipo de tensão inter-confessional pode resultar em actos de violência graves. O Cónego
Michael Ainsworth, um pároco, foi agredido ao pontapé e espancado no dia 5 de Março de
2008 por dois jovens asiáticos que exigiam que a sua igreja, situada em Saint George-inthe-East, em Wapping, na zona Oriental de Londres, se tornasse uma mesquita. De acordo
com o Reverendo Alan Green, deão do bairro de Tower Hamlets, este é apenas um de muitos
episódios de intolerância contra os Cristãos e os seus locais de culto, cometidos por jovens
habitantes locais. Porém, a pressão parece ser aplicada a todos os habitantes desta área. Shiria Khatun, uma trabalhista conselheira municipal em Tower Hamlets e muçulmana laica,
sofre repetidamente ataques verbais sobre o seu vestuário, que é considerado impróprio para
a sua afiliação religiosa.
Em Abril de 2008, novamente em Londres, foi pedido a um pai e ao seu filho que saíssem da
piscina pública do Clissold Leisure Centre, em Stoke Newington, porque não eram muçulmanos. De acordo com os gerentes do centro desportivo, eles tinham aparecido numa manhã
de domingo reservada para grupos e que “tem regras particularmente rígidas sobre segregação”, apesar do facto de que os funcionários não têm autorização para indagar sobre as
convicções religiosas dos utilizadores da piscina.
Existe também uma falta de protecção da polícia, como foi relatado por Nizar Hussein, que se
converteu do Islão ao Cristianismo em 1996 em conjunto com a sua esposa. O casal, que vive
em Bradford, no West Yorkshire, tem sido alvo de ameaças por parte de vizinhos, mas a polícia
local aconselhou simplesmente as vítimas a “deixarem de se comportar como cruzados” e
“mudarem-se para outro sítio qualquer”.
Como os casos de intolerância contra “apóstatas” (aqueles que abandonam a sua fé) se multiplicaram, a Christian Solidarity Worldwide (CSW), uma organização britânica de direitos
humanos, apelou às Nações Unidas e à comunidade internacional, pedindo que sejam tomadas medidas contra as nações e as comunidades que castigam a apostasia. Num relatório
intitulado No Place to Call Home (Sem Lugar ao Qual Chamar Casa), a CSW fala das condições
experimentadas por aqueles que abandonam o Islão e são frequentemente vítimas de violações de direitos humanos, mesmo em países como o Reino Unido.
75
REPÚbLiCA CHECA
REPÚbLiCA CHECA
Não ocorreu nenhuma mudança significativa no que diz respeito à
liberdade religiosa. Têm sido ocasionalmente relatados alguns incidentes de discriminação social assim como acções anti-semitas.
O Estado checo e a Igreja Católica permanecem enredados numa
disputa legal sobre a propriedade da Catedral de São Vito em Praga
e dos edifícios em seu redor. Em Março, o Supremo Tribunal rejeitou
um apelo feito pela Igreja contra uma decisão de 2008 do Tribunal
Superior de Praga, a qual atribuiu a propriedade ao Estado. Em Maio,
o Tribunal Católico apelou para o Tribunal Constitucional, o qual ainda
não emitiu um veredicto sobre o assunto.
O Papa Bento XVI realizou uma visita apostólica à República Checa de
26 a 28 de Setembro de 2009. O caloroso acolhimento de que foi alvo
por parte das autoridades e do povo é testemunho das boas relações
que existem entre o Estado checo e a Igreja Católica.
O Governo continua, ao mesmo tempo, a envidar esforços para solucionar a questão das propriedades que pertenceram a comunidades
religiosas mas que foram confiscadas pelos regimes nazi e comunista. Em particular, a comunidade judaica está a tentar recuperar
propriedades espoliadas durante a ocupação nacional-socialista do
país durante a Segunda Guerra Mundial. Os Católicos estão a reivindicar propriedades confiscadas sob o regime comunista. Espera-se que
o Parlamento realize uma votação sobre o assunto.
Em Maio de 2009, o Governo aprovou uma estratégia delineada pelo
Ministério do Interior para combater todas as formas de extremismo.
Esta estratégia concentra-se nas medidas preventivas, em especial no
campo da educação.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos55,9%
Agnósticos43,8%
Outros0,3%
Cristãos
6.483.330
Católicos
3.290.000
Circunscrições
eclesiásticas
9
SUPERFÍCIE
78.866km2
POPULAÇÃO
10.411.000
REFUGIADOS
2.323
DESALOJADOS
---
76
ROMÉniA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos98,5%
Outros1,5%
Cristãos
18.990.400
Católicos
1.807.000
Circunscrições
eclesiásticas
13
SUPERFÍCIE
238.391km2
POPULAÇÃO
21.190.000
REFUGIADOS
1.069
DESALOJADOS
---
77
ROMÉniA
Durante o último ano, ocorreram relatos de várias restrições às liberdades religiosas de alguns grupos minoritários, os quais reclamaram
sobre a intervenção por parte de funcionários do Governo para impedirem os seus esforços de proselitismo e interferirem no seu culto
religioso.
O Governo continua, na realidade, a tratar de maneira muito diferente
os grupos que estão legalmente reconhecidos e os que o não estão, e
os requisitos para obter o registo e o reconhecimento do seu estatuto
legal continuam a criar problemas aos grupos numericamente mais
pequenos.
É por esta razão que várias organizações internacionais, ONGs e grupos religiosos minoritários, criticaram a lei sobre a liberdade religiosa,
aprovada em Dezembro de 2006 e que entrou em vigor em Janeiro de
2007, pois afirmam que tende a “institucionalizar” tal discriminação.
Existem somente dezoito grupos religiosos oficialmente reconhecidos, embora ainda não exista um registo oficial.
Ainda por resolver está o problema da recuperação das propriedades
que pertencem à Igreja do Rito Oriental (Greco-Católica), confiscadas
em 1948 pelo regime comunista e transferidas para a Igreja Ortodoxa
Romana que hoje em dia se recusa a devolvê-las. A Igreja Greco-Católica foi a única Igreja a ser sujeita a confiscações deste tipo durante
aquele período.
Surgiram também relatórios de episódios envolvendo a Igreja Ortodoxa por demonstrar hostilidade para com denominações cristãs não
ortodoxas e por criticar o proselitismo dos Protestantes e de outros
grupos religiosos.
As Testemunhas de Jeová também se queixaram de discriminação em
Sighisoara onde, sem que tenham oferecido qualquer razão válida, as
autoridades os estão a impedir de construir edifícios para uso religioso. A Igreja Greco-Católica relatou um incidente semelhante em
Sapinta.
Por outro lado, de acordo com as comunidades religiosas, várias questões burocráticas apresentaram melhorias no decurso do ano. Por
exemplo, alguns grupos minoritários relataram não ter encontrado
nenhuma dificuldade na obtenção da autorização para usar lugares
públicos para as suas reuniões.
As Testemunhas de Jeová e a Igreja Baptista declararam igualmente
não terem tido nenhum problema em obter vistos para os seus missionários, em contraste com o que se passou no período anterior.
ROMÉniA
A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias relatou, no entanto, ter encontrado problemas deste tipo.
Outra questão não solucionada é a do pastor para as forças armadas. Os únicos capelães
actualmente existentes são pastores Ortodoxos, à excepção de um representante da Igreja
Católica e de um da Aliança Evangélica (Igreja Baptista). Esta situação é entendida como discriminatória pelas Igrejas Greco-Católica e Reformada. Os Greco-Católicos declararam que o
seu pedido para terem um representante entre o clero militar foi rejeitado pelo Ministério da
Defesa em Março de 2008.
No dia 12 de Fevereiro de 2009, o L’Osservatore Romano publicou uma entrevista com o Arcebispo de Bucareste, Ioan Robu, Presidente da Conferência Episcopal Romena, na qual descreveu as condições enfrentadas pela Igreja Católica na Roménia.
O Bispo Robu falou com orgulho da situação de coexistência harmoniosa entre as diferentes
comunidades católicas, as quais, apesar de falarem uma grande diversidade de idiomas “
[...] partilham a comunhão católica, experimentando-a no seguimento de uma pluralidade de
tradições eclesiais, bizantinas, latinas e arménias. Experimentamos realmente o Catolicismo na
sua pluralidade”.
O Bispo Ioan Robu relevou também a urgência do diálogo ecuménico, evitando todas as polémicas e manifestando, ao invés, a necessidade de transmitir aos crentes esses elementos de
comunhão entre Católicos e Ortodoxos ao nível da doutrina, da espiritualidade e da vida do
dia-a-dia.
Recordou em seguida a quantidade de mártires da Igreja Católica na Roménia, ressalvando
que foi em parte graças ao derrame do seu sangue que, até mesmo nos anos mais negros do
regime comunista, a fé nunca desapareceu completamente da sociedade romena.
Por fim, referiu o papel fundamental desempenhado pelos padres romenos chamados a
serem missionários junto dos seus compatriotas por toda a Europa.
Nos dias 24 e 25 de Agosto de 2009, o L’Osservatore Romano relatou um pedido feito pelo
Patriarca Ortodoxo Daniel ao presidente romeno, Traian Basescu. Numa carta aberta, o bispo
pediu que a educação religiosa fosse considerada disciplina obrigatória nas escolas secundárias romenas. Relevou que o livre acesso à educação religiosa está explicitamente previsto
pela Constituição, em contraste com o que foi descrito numa proposta da Comissão Presidencial para a análise e formulação de políticas educativas, que afirma que a religião não é
uma disciplina obrigatória e não tem estatuto oficial.
78
RÚSSiA
A Constituição da Federação Russa, aprovada no dia 12 de Dezembro
de 1993, define a Rússia como um estado laico (Artigo 14º) e garante
a total liberdade religiosa para os cidadãos de toda a Federação, conforme os padrões internacionais (Artigo 28º). Além disso, o Artigo 4º
da Constituição define a supremacia da Constituição e das leis federais por todo o território da Federação.
A implementação destas providências gerais é confiada à Lei Federal
nº. 125-FZ, datada de 26 de Setembro de 1997. Esta lei, embora confirmando o carácter secular do Estado, outorga à Igreja Ortodoxa um
papel particular na formação e desenvolvimento da espiritualidade
e cultura na Rússia, e declara que o respeito pelo Cristianismo, pelo
Islão, pelo Budismo, pelo Judaísmo e por outras religiões é parte integrante do legado histórico do povo Russo. Esta lei regula as organizações religiosas, introduzindo três categorias, cada uma com diferentes direitos legais:
A categoria básica de organização é um “grupo religioso”. Esta categoria não tem registo legal, os seus seguidores são reconhecidos como
tendo o direito de praticar a sua religião livremente, mas o grupo, não
tendo nenhum estatuto legal, não pode, por exemplo, possuir propriedades ou abrir uma conta bancária.
O nível seguinte é o registo enquanto “organização religiosa local”.
Para obter este reconhecimento, a organização tem de ter pelo menos
dez membros, existir há pelo menos quinze anos no local ou pertencer a uma “organização religiosa centralizada”. A uma organização
local é permitido possuir propriedades, abrir contas bancárias, publicar material, desfrutar de benefícios fiscais e providenciar apoio espiritual em prisões, hospitais e nas forças armadas.
O terceiro tipo é o de “organização religiosa centralizada”. Pode pedir
o registo se tiver, pelo menos, três organizações locais. Além dos direitos desfrutados pelas organizações locais, podem abrir centros locais
sem ter de respeitar a restrição dos quinze anos. Se conseguirem provar que estão presentes no país há pelo menos cinquenta anos, é-lhes
permitido usar a palavra “Rússia” ou “Russo” na sua designação oficial.
A Lei das ONGs de 2006 contém disposições que também se aplicam
a organizações religiosas, como, por exemplo, a obrigação de fornecer os nomes, os endereços e os números de passaporte de todos os
membros do seu corpo directivo. Em Abril de 2009, o presidente Medvedev anunciou a criação de um grupo de trabalho para simplificar as
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos81,3%
Agnósticos7,1%
Muçulmanos10,4%
Outros1,2%
Cristãos
81.783.520
Católicos
421.000
Circunscrições
eclesiásticas
9
SUPERFÍCIE
17.075.400km2
POPULAÇÃO
140.367.000
REFUGIADOS
4.880
DESALOJADOS
80.000
79
RÚSSiA
Situação jurídica
RÚSSiA
disposições contidas na lei de 2006. Estas simplificações foram introduzidas em Julho de
2009.
No dia 31 de Março de 2009, uma disposição estabelecida pela Lei Federal 160-FZ, datada de
Julho de 2008, entrou em vigor, transferindo a competência e o controlo sobre as organizações religiosas para o Ministério da Justiça, criando também um Conselho de Peritos designado para supervisionar as organizações religiosas, controlar os procedimentos de registo e
avaliar, analisando as convicções, o comportamento dos membros e a veracidade das declarações prestadas para obter o registo, se os grupos se qualificam como “religiosos”.
Várias pessoas referiram que estes poderes são extensos e dizem respeito a questões sobre
as quais é difícil garantir a imparcialidade.
No dia 1 de Janeiro de 2009, o Ministério da Justiça declarou que existiam 23.078 grupos
religiosos registados a operar na Rússia. Em 2005, existiam 3.526 organizações registadas.
O problema da educação religiosa nas escolas
O problema da educação, e mais especificamente o problema da educação religiosa dentro do
sistema estatal, continua a ser amplamente debatido pela opinião pública, com posições fortes
assumidas pelos líderes das organizações religiosas e representantes do mundo secular.
As questões são muitas. Em primeiro lugar, se é apropriado introduzir o estudo das religiões em geral ou apenas da ortodoxia, ou se se deve seguir uma abordagem cultural e não
confessional (substituindo-a com o estudo do Islão em regiões onde existe uma maioria
muçulmana); em segundo lugar, em relação aos professores e materiais pedagógicos a
serem usados (Em 2002, um manual foi preparado e escrito por Alla Borodina e foi recebido
principalmente de modo negativo devido à sua agressividade e falta de profissionalismo. Em
Fevereiro de 2007, foi publicado um novo manual, que foi preparado pelo Instituto de História
da Academia das Ciências e foi também revisto por consultores das várias religiões, e que
apresenta uma visão geral das principais religiões do mundo e tem uma abordagem mais
científica e objectiva).
A Igreja Ortodoxa tem defendido fortemente há já algum tempo a introdução nas escolas
de um curso opcional sobre “Os Fundamentos da Cultura Ortodoxa”, o qual em anos recentes tem sido ensinado a título experimental em algumas províncias dentro do contexto das
disciplinas de “interesse local”. O Ministério da Educação preferiu um curso sobre a “História
das Religiões”.
Por fim, no dia 24 de Julho de 2009, durante uma reunião com os líderes das religiões tradicionais presentes no país, o presidente Dmitry Medvedev anunciou que em Setembro iria
iniciar-se um projecto-piloto envolvendo dezoito regiões e doze mil escolas. O ano escolar de
2010-2011 será o segundo ano ad experimentum, depois do qual será tomada a decisão sobre
se, em 2012, todos os estudantes irão frequentar um curso sobre “Desenvolvimento Espiritual e Moral”, escolhendo entre as quatro religiões tradicionais: Cristianismo Ortodoxo, Islão,
Judaísmo e Budismo. As aulas seriam organizadas seguindo três elementos educacionais, os
80
fundamentos da cultura religiosa, os fundamentos de uma das religiões tradicionais (escolhida pelo aluno) e os fundamentos da ética pública.
A presença de capelães
Ocorreram também desenvolvimentos positivos na difícil questão relativa à presença de
capelães nas forças armadas e nas prisões.
A última informação obtida, datada de Abril de 2008, relatou a presença de 950 padres ortodoxos como capelães a tempo inteiro nas forças armadas e designados para um destacamento militar, e mais de mil a trabalhar como voluntários. Em Fevereiro de 2008, existiam
403 capelas ortodoxas, vinte e três mesquitas, sete locais de culto budistas e três capelas
católicas nas prisões.
Desenvolvimentos positivos nas relações entre os Católicos e os Ortodoxos
Rússia
No dia 3 de Dezembro de 2009, o Papa Bento XVI recebeu em audiência Dmitri Medvedev,
presidente da Federação Russa, e discutiu com ele “assuntos culturais e sociais de interesse
conjunto, como a importância da família e a contribuição para a vida na Rússia proporcionada pelos crentes”. O Santo Padre ofereceu também ao presidente Medvedev uma edição
russa da Encíclica “Caritas in veritate”.
Naquela ocasião, foi feito o anúncio de que tinha sido decidido elevar as relações diplomáticas entre a Santa Sé e a Federação Russa. Elas foram elevadas ao nível de Embaixada do
lado da Federação Russa e ao de Nunciatura Apostólica por parte da Santa Sé. Como Natalia
Timakova, a porta-voz do presidente russo, sublinhou, tal decisão foi o resultado de um diálogo de alto nível alcançado entre a Federação Russa e a Santa Sé, assim como entre a Santa
Sé e a Igreja Ortodoxa Russa.
No dia 9 de Dezembro de 2009, esta decisão foi formalizada pelo intercâmbio de Credenciais
Diplomáticas.
As actuais boas relações, de acordo com declarações feitas por representantes católicos, irão
também facilitar a solução de problemas pendentes relativos à restituição da propriedade
confiscada durante o anterior regime comunista.
Porém, não é apenas com as autoridades estatais russas que a Igreja Católica detém, neste
momento, relações descritas por ambos os lados como “amistosas”. Uma nova era parece
também ter sido introduzida nas relações com a Igreja Ortodoxa de Moscovo. A eleição do
novo Patriarca de Moscovo e de Toda a Rússia, Kirill I, no dia 27 de Janeiro de 2009, marcou
o começo de uma época de intensas relações entre as duas Igrejas e abriu caminho para a
possibilidade de um encontro entre o Patriarca e Bento XVI.
Um sinal importante aconteceu precisamente durante a altura da visita de Medvedev a Itália. No dia 2 de Dezembro, teve lugar uma apresentação em Roma de um livro editado pelo
Patriarcado de Moscovo contendo os mais importantes discursos feitos nos últimos dez anos
sobre a Europa por Joseph Ratzinger, enquanto Cardeal e enquanto Papa.
81
Rússia
O livro é totalmente bilingue, publicado em italiano e russo. O título cita uma expressão
usada por Bento XVI em Praga, “Europa, uma pátria espiritual”. A prolongada introdução é
assinada pelo extremamente respeitado presidente do Departamento para as Relações Eclesiásticas Externas do Patriarcado, Arcebispo Hilarion de Volokolamsk.
Além disso, no dia 17 de Maio de 2010, alguns meses depois da publicação dos discursos de
Bento XVI na Europa, um livro publicado pela Editora do Vaticano foi apresentado na Universidade Católica do Sagrado Coração em Milão, consistindo numa selecção de discursos
feitos pelo Patriarca Ortodoxo Kirill. O livro intitulava-se, “Liberdade e Responsabilidade: à
Procura da Harmonia”. “A Dignidade do Homem e os Direitos do Indivíduo” é uma colecção
dos mais importantes discursos sobre os direitos humanos feitos pelo Metropolitano Kirill,
actualmente o Patriarca de Moscovo e de Toda a Rússia. “Com o Papa, temos uma visão partilhada da protecção da dignidade humana na Europa”, escreve Kirill, que acredita que “hoje
em dia as Igrejas católica e ortodoxa são as únicas naturalmente aliadas na difícil batalha”
contra “as ideologias liberalistas e secularistas”.
No dia 20 de Maio de 2010, no salão Paulo VI no Vaticano, teve lugar um concerto de música
sacra russa. Este concerto realizou-se em honra do Papa Bento XVI no âmbito do Festival de
Cultura e Espiritualidade Russas no Vaticano, promovido pelo Patriarca Kirill de Moscovo e
de Toda a Rússia e organizado pelo Departamento de Relações Externas do Patriarcado de
Moscovo, em cooperação com o Conselho Pontifício para a Promoção da Unidade entre os
Cristãos e o Conselho Pontifício para a Cultura.
Ao concerto assistiram o Papa, o colégio de Cardeais, o Corpo Diplomático acreditado na
Santa Sé e mais de 7.000 espectadores do mundo inteiro.
Outras organizações
Não existiu nenhum relato significativamente grave durante o período analisado relativamente à situação das outras religiões que são reconhecidas como religiões tradicionais.
Foram apresentadas reclamações relativas ao comportamento de algumas autoridades
locais ao gabinete do Provedor dos Direitos humanos mas, em 2009, apenas 5% de todos os
relatos diziam respeito a problemas sentidos por grupos religiosos.
A maioria destas reclamações diz respeito ao comportamento das autoridades locais que,
por vezes, não respeitam a legislação federal sobre as organizações religiosas. Houve também reclamações em como as autoridades federais raramente intervieram para acabar com
estes abusos.
Houve uma tentativa por parte das várias associações islâmicas da Federação Russa para
criar uma frente unida de modo a acabar com o extremismo de grupos islamistas radicais.
Esta decisão, tomada durante uma sessão realizada pelo grupo comum das associações islâmicas, em Fevereiro de 2010, foi calorosamente acolhida por analistas e pelas autoridades,
que vêem nesta situação uma oportunidade para controlar e conter os marginais extremistas, acima de tudo no Cáucaso.
82
S. MARinHO
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos96%
Agnósticos4%
Cristãos
28.582
Católicos
30.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
61km2
POPULAÇÃO
31.500
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
---
83
S. MARinHO
A liberdade religiosa é garantida pela Constituição. As relações com a
Igreja Católica são reguladas pela Concordata de Abril de 1992. Com
base neste acordo, os cidadãos podem requerer que 3‰ dos seus
impostos sejam doados à Igreja Católica ou a outras instituições caritativas.
Não houve relatos de mudanças institucionais significativas ou de
qualquer incidente expressivo relativamente à questão da liberdade
religiosa.
SÉRViA
SÉRViA
Legislação
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos65,3%
Agnósticos8,7%
Muçulmanos24,5%
Outros1,5%
Cristãos
7.205.548
Católicos
523.000
Circunscrições
eclesiásticas
7
SUPERFÍCIE
88.361km2
POPULAÇÃO
9.856.000
REFUGIADOS
86.351
DESALOJADOS
225.000-230.000
84
Embora a Constituição preveja a liberdade religiosa total, na prática
a lei restringe-a discriminando entre comunidades e negando o estatuto legal a alguns grupos.
A lei é na realidade e em alguns casos interpretada de uma forma
arbitrária e aplicada pelos representantes locais das instituições.
Os mais discriminados são os grupos minoritários, penalizados por
longos e invasivos procedimentos de registo que atrasam o reconhecimento do estatuto legal.
Durante uma visita ao país em Abril, a Relatora Especial das Nações
Unidas sobre a Liberdade Religiosa, Asma Jahangir, recomendou que
tais procedimentos sejam reestruturados e simplificados. O Ministério para a Religião declarou que a lei reflecte pura e simplesmente
uma sociedade em transição e que o Governo concentra os seus
esforços na monitorização da efectiva aplicação da lei.
O registo permanece não obrigatório e não vinculativo para os grupos religiosos, embora as comunidades não registadas encontrem
problemas significativos no desempenho dos vários procedimentos
necessários, como sejam a abertura de uma conta bancária, a compra e venda de propriedades ou a publicação de textos. A lei sobre a
propriedade e os impostos garante na realidade a isenção do imposto
sobre propriedades e de IVA apenas para as comunidades registadas.
Um recurso para a modificação desta lei fiscal encontra-se pendente
no Tribunal Constitucional do país.
O Ministério da Religião continua a negar o estatuto legal a várias
comunidades que apresentaram pedidos, entre eles a Liga dos Baptistas, as Testemunhas de Jeová, o movimento Hare Krishna, a Igreja
Pentecostal e a Igreja Ortodoxa Montenegrina. Seis destas comunidades religiosas apresentaram um recurso ao Supremo Tribunal para
que este se pronuncie contra estes registos negados. As Testemunhas
de Jeová recorreram também ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.
A comunidade islâmica reportou também problemas envolvendo discriminação.
Durante uma visita a Sandzak, de 18 a 20 de Maio, Mustafa Ceric, o
líder dos muçulmanos bósnios, declarou que os direitos dos Muçulmanos não são respeitados na Sérvia, referindo-se ao exemplo de
estes não poderem indicar endereços de locais públicos para as suas
iniciativas religiosas e enfatizando também a forte presença policial
durante a sua visita a várias localidades. Vários representantes ofi-
ciais, incluindo o ministro para as Minorias e os Direitos Humanos, Svetozar Ciplic, rejeitaram
estas acusações e esclareceram que dois muçulmanos bósnios de Sandzak faziam parte do
Governo e detinham funções ministeriais.
Acontece por vezes que funcionários governamentais criticam grupos religiosos minoritários, descrevendo-os usando termos negativos, com palavras como “seitas”, “satanistas” e
“depravados”.
Por exemplo, as Testemunhas de Jeová foram descritas como uma “seita fechada” (porque
supostamente eles não permitem aos seus seguidores encontrarem-se livremente com as
suas famílias) num artigo escrito no dia 27 de Março por Zoran Lukovic, um funcionário da
polícia e também membro da Comissão Inter-Ministerial criada para a monitorização e oposição à depravação no seio de cultos religiosos.
As Testemunhas de Jeová apresentaram um recurso ao Primeiro Tribunal Municipal em Belgrado o qual, porém, rejeitou este recurso, declarando que não tinham sido apresentadas as
evidências necessárias para provar que era a intenção de Lukovic insultar este grupo religioso.
As Testemunhas de Jeová recorreram de seguida para o Tribunal de Distrito em Belgrado e o
caso encontra-se ainda pendente.
Restituição de propriedade
Continuam, no entanto, a registar-se progressos sobre a restituição por parte do Governo de
propriedades confiscadas às comunidades religiosas em 1945 ou posteriormente.
Durante o ano de 2009, várias propriedades foram devolvidas à Igreja Ortodoxa Sérvia nas
Dioceses de Backa, Zica e Srem, enquanto a Igreja Católica recuperou a posse de propriedades
em Pancevo e Sremska Mitrovica, e a comunidade judaica recuperou a posse de apartamentos e de actividades comerciais em Belgrado.
Vandalismo
sÉRVia
Ao contrário das ONG’s que, pelo contrário, relataram uma queda nas acções de vandalismo,
um número de grupos religiosos mais pequenos relataram uma quantidade de ataques adicionais feitos por vândalos a pessoas e bens pertencentes às suas comunidades.
As motivações religiosas e étnicas estão frequentemente de tal maneira interligadas que é
difícil identificar as verdadeiras razões para estes ataques.
Por exemplo, no dia 31 de Maio, foram profanados 713 túmulos no cemitério ortodoxo sérvio
na aldeia de Stapar, perto de Sombor. No dia 6 de Junho, a polícia prendeu um homem suspeito de ser o culpado da destruição, enquanto os residentes da aldeia expressaram as suas
dúvidas em como um homem sozinho pudesse ter infligido tão extensos danos.
No dia 1 de Junho, homens não identificados destruíram onze lápides no cemitério judeu
em Subotica. No dia 6 de Junho, foram danificadas outras seis lápides datadas do século XIX.
85
SUÉCiA
SUÉCiA
“A liberdade religiosa ou, por outras palavras, o direito de praticar, isolada ou juntamente com outros, a nossa própria religião” é declarada
no Artigo 1º do Capítulo II sobre as “Liberdades Fundamentais” da
Constituição promulgada em 1974. No entanto, embora os artigos que
declaram a Igreja Luterana da Suécia como sendo a Igreja do Estado
tenham sido abolidos, o Artigo 2º da Constituição de 1809 ainda se
encontra em vigor e especifica que “o Rei deverá sempre professar a
pura doutrina evangélica adoptada e explicada na Confissão de Augsburgo, na sua versão original, e pelo Decreto do Sínodo de Uppsala de
1593, e os Príncipes e as Princesas da Casa Real deverão também ser
educados de acordo com esta mesma fé e no seio do Reino. Qualquer
membro da Família Real que não professe esta fé será excluído de
todos os direitos de sucessão.”
No seguimento da separação entre a Igreja e o Estado, oito outras confissões religiosas viriam também a receber financiamento do Estado,
de acordo com o número de crentes, os quais também podem contribuir com doações, sendo estas dedutíveis em termos de impostos.
Estas outras Igrejas são: a Igreja Missionária Sueca, a Igreja Católica,
a Aliança Missionária Sueca, a União Baptista da Suécia, o Exército de
Salvação, a Igreja Metodista, a Igreja Pentecostal e a Igreja Evangélica.
Ao todo, são trinta e nove os grupos religiosos que têm o direito de
receber financiamento estatal.
No sector da educação, embora não façam parte do sistema estatal,
existem sessenta e sete escolas primárias sectárias, e seis escolas
secundárias, principalmente cristãs, que também seguem o currículo
das escolas públicas. A atitude das instituições estatais face à liberdade de educação é conflituosa e tende para uma forma de controlo
ideológico de índole secularista.
Durante o período de tempo considerado, não ocorreram alterações
legislativas ou incidentes significativos relativamente à liberdade religiosa por parte do Governo.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos64,8%
Agnósticos31,2%
Muçulmanos2,8%
Outros1,2%
Cristãos
6.175.110
Católicos
140.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
449.964km2
POPULAÇÃO
9.293.000
REFUGIADOS
81.356
DESALOJADOS
---
86
SUiÇA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos82,6%
Agnósticos12,2%
Muçulmanos4,3%
Outros0,9%
Cristãos
6.612.320
Católicos
3.380.000
Circunscrições
eclesiásticas
8
SUPERFÍCIE
41.284km2
POPULAÇÃO
7.595.000
REFUGIADOS
46.203
DESALOJADOS
---
87
SUiÇA
Com o referendo realizado a 19 de Novembro de 2009, 57,5% dos eleitores suíços rejeitaram a construção de minaretes junto às mesquitas
em todo o país. A questão colocada pelo referendo, apresentado pela
União Democrática Federal e com o apoio da União Democrática do
Centro, não se opôs à construção de mesquitas, mas apenas dos minaretes, considerados “o símbolo óbvio de uma reivindicação de poder
de carácter religioso e político que põe em causa direitos fundamentais.” Em Setembro, a Conferência Episcopal Suiça tinha-se pronunciado contra a proibição, reiterando a sua opinião negativa depois dos
resultados do referendo serem publicados, juntando-se aos protestos
por parte das Nações Unidas e daqueles de países islâmicos onde não
reina a democracia, pedindo à Suiça que “considerasse os meios constitucionais ou jurídicos para invalidar este referendo.”
No dia 3 de Janeiro de 2010, o Grande Conselho do Cantão de Zurique
rejeitou, com 104 votos contra e 65 a favor, uma moção patrocinada
pela UDC dirigida a banir o uso do véu e a proibir a isenção das aulas
de educação física durante o Ramadão para alunas muçulmanas, a
fim de “garantir o respeito dos valores suíços nas escolas.”
TURQUiA
TURQUiA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos0,3%
Agnósticos2%
Muçulmanos97,4%
Outros0,3%
Cristãos
437.820
Católicos
37.000
Circunscrições
eclesiásticas
7
SUPERFÍCIE
774.815km2
No dia 15 de Agosto de 2009, o primeiro-ministro turco Recep Tayyip
Erdoğ an, acompanhado por quatro ministros, encontrou-se na Ilha de
Büyükada (nas Ilhas Príncipe, situadas no Mar de Mármara) com os
líderes de várias comunidades cristãs presentes no país (o Patriarca
Ecuménico Bartolomeu I, o Bispo Apostólico Arménio Aram Ateshian,
o Vigário Patriarcal Siríaco Mor Filiksinos Yusuf Çetin) e também com
o Rabino Principal da Turquia, Ishak Haleva.
Durante a reunião, os dignitários religiosos entregaram ao primeiroministro Erdoğan um relatório contendo oitenta e oito casos problemáticos envolvendo as relações com o Estado. O primeiro-ministro
disse aos presentes que as “reformas democráticas” iriam assegurar
os direitos das minorias religiosas. “Ele deu-nos muita esperança e
nós estamos optimistas”, afirmou Bartolomeu I no final da reunião.
No entanto, desde a publicação do Relatório Liberdade Religiosa no
Mundo 2008, a situação dos Cristãos não mudou, apesar das expectativas de que o Ano Paulino (Junho de 2008 - Junho de 2009) poderia
conduzir a algumas melhorias. Na realidade, para os Turcos ainda não
é possível converterem-se abertamente ao Cristianismo devido à discriminação sofrida pelos que o fazem.
Durante uma reunião em Veneza, em Março de 2010, a Comissão de
Liberdade Religiosa do Conselho da Europa adoptou uma resolução
pedindo à Turquia para conceder estatuto legal a minorias religiosas
não reconhecidas, como a Igreja Católica Romana, e combater vigorosamente a discriminação que elas têm de suportar.
Igreja Ortodoxa Grega
POPULAÇÃO
75.705.000
REFUGIADOS
10.350
DESALOJADOS
954.000-1.201.000
88
No século XX, os Ortodoxos Gregos foram as vítimas principais de uma
República Turca hostil face aos não-muçulmanos. Hoje em dia, apenas 2.500 continuam a viver na Turquia. O Governo turco em Ancara
continua a negar o carácter ecuménico do Patriarcado de Constantinopla, reconhecendo apenas a sua autoridade local. Este estatuto foi
confirmado por um tribunal local, o qual designou que a Turquia não
pode conceder um “estatuto especial” a um grupo minoritário.
Apesar de alguns sinais de abertura, não houve nenhum progresso na
questão da reabertura do seminário de Halki, na Ilha de Heybeli (Mar
de Mármara). Propriedade do Patriarcado Ecuménico, a estrutura foi
encerrada em 1971 (ver Relatório Liberdade Religiosa no Mundo 2008).
Isto impediu a Igreja Ortodoxa de renovar o seu pessoal. Na realidade,
a Constituição turca requer que o patriarca e os metropolitanos ortodoxos gregos sejam cidadãos turcos, nascidos e formados na Turquia.
TURQUiA
De momento, aqueles que desejam ser sacerdotes têm de ir para a Grécia ou para a Bulgária
para obter formação, mas as Igrejas locais são altamente nacionalistas, algo que o Patriarcado de Constantinopla deseja evitar para preservar a sua vocação ecuménica.
Durante a sua visita à Turquia em Abril de 2009, o presidente dos EUA, Barak Obama, num
discurso proferido no Parlamento turco, pediu a reabertura do Seminário de Halki. O ministro da Cultura turco, Ertuğ rul Günay, afirmou pouco depois que “Não há nenhum problema
político” relativo ao assunto. Mais tarde, numa declaração ao diário turco Taraf, o presidente
do Diyanet, Ali Bardakoğlu, falando sobre Halki, afirmou que era “inaceitável que uma minoria
religiosa tivesse alguma dificuldade, ainda que pequena, em formar os seus clérigos e educar
os seus filhos.” Apesar de tais declarações, em meados de 2010 o seminário ainda se encontra
fechado.
Na Ilha de Büyükada, o Patriarcado Ecuménico possui também um orfanato do qual o Estado
se apropriou em 1960. No dia 11 de Junho de 2010, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, com sede em Estrasburgo, decretou que o Estado turco tem de devolver a propriedade
ao Patriarcado. Em 2005, este entregara uma queixa no Tribunal contra a ocupação ilegal
do edifício. Num primeiro julgamento, que teve lugar em Julho de 2008, o Tribunal declarou “que as autoridades turcas não tinham o direito de retirar a propriedade à Igreja sem
a devida indemnização.” Num julgamento mais recente, o Tribunal deliberou que, uma vez
que o Patriarcado Ecuménico não recebera qualquer indemnização, este último tinha “tido
de suportar um fardo individual e excessivo, o que implica uma violação do Artigo 1º do Protocolo Nº 1 (protecção da propriedade).” Consequentemente, “deliberou que a Turquia teria
de voltar a registar a propriedade em questão no registo cadastral em nome do queixoso” e
pagar ao queixoso por danos não-pecuniários bem como custos e despesas.
Apoiado pelo Sínodo de Bispos, Bartolomeu I anunciou a sua intenção de recorrer ao Tribunal
Europeu dos Direitos Humanos contra a Direcção-Geral das Fundações, uma agência governamental com sede em Ancara, por danos à congregação da Igreja Paroquial de São Jorge,
em Istambul. Aquela Direcção-Geral, que supervisiona todas as actividades religiosas nãomuçulmanas, retirou à paróquia o direito de administrar as propriedades da Igreja Ortodoxa.
Como resultado, uma das suas escolas foi transformada em sala de jogos, gerida por um
particular.
Numa entrevista ao canal de televisão norte-americano CBS, difundida no dia 20 de Dezembro de 2009, Bartolomeu I afirmou que os Cristãos Ortodoxos na Turquia são tratados como
cidadãos de segunda classe. “Nós não sentimos que desfrutamos dos nossos direitos plenos
enquanto cidadãos turcos”, afirmou. Ainda assim, “preferimos ficar aqui, mesmo [se somos]
por vezes crucificados”, o que é algo, afirmou, que ele conhece muito bem. Na Turquia, a sua
declaração despoletou uma tempestade de protestos nos círculos governamentais.
Igreja Arménia
O Governo turco comunicou à Igreja Arménia que não pode celebrar as suas liturgias na
Igreja de Santa Cruz, na Ilha de Aghtamar, na Anatólia oriental. Abandonada em 1915 pelos
89
turquia
arménios quando estes foram forçados ao exílio, a igreja foi restaurada pelas autoridades
turcas que o transformaram num museu. Na Primavera de 2007, o Patriarca Arménio Apostólico de Istambul, Mesrob II Mutafyan, solicitou o direito de celebrar missa na igreja uma vez
por ano. Em Janeiro de 2010, o Ministério da Cultura turco rejeitou o pedido, dizendo que a
igreja não “se encontrava na lista de locais abertos a serviços religiosos cristãos.”
Igreja Siríaca
Desde 2008, a Igreja Siríaca tem-se oposto ao Estado turco relativamente a terrenos pertencentes ao Mosteiro Mor Gabriel, no Planalto Tur Abdin (Sudeste da Turquia, perto da fronteira
com a Síria), um local que alberga um metropolitano, três monges e treze religiosas. Construído no século IV d.C., este mosteiro é o centro espiritual da comunidade ortodoxa siríaca.
Outrora solidamente cristã, a região viu a sua população cristã diminuir cada vez mais, passando de 250.000 em 1923 para 70.000 na década de 1970, e para apenas 2.500 actualmente.
Sob pretexto de actualizar o registo cadastral, o Estado turco tentou apoderar-se de 250 hectares de terrenos pertencentes ao mosteiro e situados ao redor de Mor Gabril. Com este propósito, a terra foi reclassificada como floresta e registada no domínio público. Por seu lado,
pastores muçulmanos locais apropriaram-se de terrenos para servirem de pasto para os seus
rebanhos.
A Fundação Mor Gabriel, criada para defender os direitos da Igreja, apresentou uma queixa
contra a apropriação das terras. No dia 24 de Junho de 2009, um tribunal em Midyat decretou que a apropriação de 27 hectares por parte do Departamento das Florestas era legal.
Para a Aliança Universal Siríaca, uma ONG na diáspora fundada nos Países Baixos, estes problemas jurídicos encontram-se no topo de uma longa lista “de actos de perseguição contra
cristãos, actos esses que duram há várias décadas.”
Igreja Católica Romana
Durante o Ano Paulino, no decorrer do qual muitos peregrinos viajaram até Tarso, local de
nascimento do Apóstolo, a igreja da cidade foi parcialmente aberta ao culto católico. O Estado
apropriara-se desta igreja em 1943, transformando-a num museu.
Para o Monsenhor Luigi Padovese, na altura vigário apostólico na Anatólia, e que possui jurisdição sobre Tarso, havia alguma esperança de que esta igreja pudesse vir a recuperar a sua
vocação original enquanto local de peregrinação. No entanto, as autoridades declararam que
os cristãos podiam vir rezar na igreja e aí celebrar missas, com a condição de que eles reservem com antecedência, paguem uma taxa e não interfiram com as actividades do museu.
Ao mesmo tempo, representantes da Igreja Católica Romana foram alvo de actos de violência
anti-cristã. No dia 17 de Dezembro, um padre capuchinho italiano, Adriano Franchini, superior
da Custódia da Turquia, foi apunhalado no final da missa em Bayrakli (Diocese de Esmirna).
Conseguiu sobreviver. A polícia afirmou que o indivíduo que o tentou assassinar, Ramazan
90
Bay, de apenas 16 anos de idade, era um psicopata. Quando se entregou à polícia, afirmou que
agiu em protesto contra a actividade missionária cristã.
No dia 3 de Junho de 2010, o Monsenhor Luigi Padovese, presidente da Conferência Episcopal
da Turquia, foi assassinado na sua residência em Iskenderun (Alexandretta) pelo seu próprio
motorista, Murat Altun. Preparava-se para partir para o Chipre, onde iria acompanhar o Papa
Bento XVI na sua visita à ilha, entre 4 e 6 de Junho. Rapidamente, o governador da província,
Mehmet Celalettin, afirmou que o assassino estava a ser tratado por problemas psicológicos.
Os primeiros indícios recolhidos pelos investigadores indicam que o assassino o apunhalou
cerca de vinte vezes. O prelado foi depois decapitado, talvez por outra pessoa, porque, aparentemente, Altun, que usava na altura um colete à prova de balas, não terá agido sozinho.
Depois do crime, o assassino afirmou alegadamente que “eu matei o grande Satanás. Alá é
grande.”
Numa entrevista ao jornal diário italiano Il Foglio no dia 12 de Junho, o Monsenhor Ruggero
Franceschini, Arcebispo de Esmirna, afirmou que o assassinato “foi motivado apenas pela
religião. Existem na realidade algumas características explicitamente islâmicas neste assassinato. Não há nenhum motivo pessoal; o Islão é a única causa.”
Protestantes
No dia 12 de Fevereiro de 2009, na cidade de Adana, no Sul da Turquia, um grupo de jovens
muçulmanos destruiu uma loja, propriedade da Sociedade Bíblica. Os proprietários cristãos
tinham recebido anteriormente ameaças anónimas, acusando-os de trabalharem para os
serviços secretos norte-americanos.
Alevis
TURQUiA
Os Alevis são uma minoria sincretista que mistura convicções pre-islâmicas com o Islão xiita.
São o segundo maior grupo religioso na Turquia (cerca de 20% da população) logo após o
Islão Sunita, mas não são reconhecidos pelo Estado como sendo uma religião separada. As
autoridades vêem-nos simplesmente como uma variante do Islão Sunita ou como um fenómeno puramente cultural e folclórico. Realizam as suas cerimónias religiosas em locais de
reunião denominados cemevi que não são reconhecidos enquanto locais de culto, exceptuando em alguns municípios onde as comunidades de Alevis são substancialmente alargadas.
Como são considerados Sunitas, é-lhes exigido o financiamento do Diyanet, a Presidência
dos Assuntos Religiosos, um órgão sob a jurisdição do Gabinete do primeiro-ministro. Sendo
assim, têm de apoiar mesquitas e clero sunitas sem qualquer benefício para as suas próprias
comunidades. Além disso, as crianças Alevis são forçadas a seguir uma educação religiosa
sunita. Alguns Alevis levaram o caso ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos a fim de
obterem o direito de possuírem a sua própria identidade religiosa e a verem mencionada nos
documentos de identificação em vez da indicação de ‘Muçulmano’ que lhes é automaticamente atribuída.
91
UCRÂniA
UCRÂniA
A instabilidade institucional causada pelo antagonismo entre as forças políticas e sociais pró-ocidentais e pró-russas levou o candidato
presidencial pró-russo, Viktor Yanukovich, ao poder no dia 7 de Fevereiro de 2010, depois da segunda volta das eleições presidenciais.
Quatro dias depois da sua eleição, recebeu felicitações dos presidentes da França, da Alemanha, da Estónia, da Letónia, dos EUA e da Rússia. A sua adversária derrotada, Julia Tymoshenko, recusou-se a aceitar
a derrota e o seu partido prometeu contestar os resultados, mas tal
não teve quaisquer resultados.
Este volte-face político não teve, por agora, qualquer repercussão fundamental no exercício da liberdade religiosa no país.
Porém, um incidente negativo ocorreu na Universidade Católica Ucraniana em Lviv. Esta universidade é a única universidade católica existente no que foi a antiga União Soviética e foi destacada pelo Papa
Bento XVI como sendo “um valioso apoio para a acção ecuménica”.
No dia 18 de Maio de 2010, agentes do Serviço de Segurança Ucraniano, o SBU, sucessor do notório KGB, visitaram o reitor da universidade, P. Borys Gudziak, e exigiram que ele assinasse uma carta da qual
ele não pôde ficar com uma cópia. Gudziak trouxe a público o facto de
ter sido intimidado e, no dia 26 de Maio, as autoridades declararam
que tudo não passara de um mal-entendido.
Este incidente sugere que o novo Governo está ansioso por colocar
pressão sobre as liberdades civis e antevê-se um potencial perigo
para a Igreja Católica à medida que Viktor Yanukovich consolida o
poder. Na verdade, o medo tem vindo a aumentar entre muitas Igrejas na Ucrânia multi-confessional de que o novo Governo de Yanukovich irá dar um tratamento preferencial exclusivo à Igreja Ortodoxa
Ucraniana, leal ao Patriarcado de Moscovo. Tendo expressado estes
receios pelo futuro, deve ser dito que, em relação ao período em análise, todas as confissões religiosas no país desfrutaram das protecções
e exerceram os direitos a elas atribuídos pela Constituição e pelas leis
sobre a liberdade religiosa.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos82,8%
Agnósticos14,6%
Muçulmanos2,2%
Outros0,4%
Cristãos
38.810.800
Católicos
4.922.000
Circunscrições
eclesiásticas
20
SUPERFÍCIE
603.700km2
POPULAÇÃO
45.433.000
REFUGIADOS
7.334
DESALOJADOS
---
Desenvolvimentos legislativos positivos
Em Abril de 2009, e em cooperação com todas as principais organizações religiosas, o Ministro da Defesa criou um Conselho de Apoio
Pastoral para apoiar as actividades religiosas nas Forças Armadas.
Outro importante desenvolvimento alcançado foi a entrada em vigor
das alterações ao Código Penal. Entre os direitos atribuídos aos deti92
dos em prisões está o direito a uma maior liberdade religiosa. Nas novas disposições, aprovadas pelo Parlamento no dia 21 de Janeiro de 2010 e promulgadas pelo presidente, está a
adição ao Artigo 7º que proíbe a discriminação de prisioneiros com base na “raça, na cor de
pele, nas convicções políticas ou religiosas, no género, no estatuto ou no local de residência”.
Uma outra emenda declara que “as associações religiosas, sociais e humanitárias” podem
prestar apoio “às autoridades penais e prisionais para reabilitar os detidos, e proporcionar
actividades de reeducação social” e é-lhes permitido oferecer ajuda “dentro dos limites do
Código Penal e das leis da Ucrânia”. Um novo parágrafo deste artigo, que regula a realização da liturgia e de cerimónias religiosas na prisão, declara que a administração da prisão
não pode “expressar nenhuma opinião relativamente à religião”. Em Junho de 2009, em Kiev,
a Igreja Greco-Católica Ucraniana (ICGU), em cooperação com o Departamento Estatal da
Ucrânia para a Execução de Penas, participou na conferência internacional “Directrizes Jurídicas para a Actividade Pastoral nas Prisões” organizada pela Comissão Internacional para
a Pastoral Católica nas Prisões (CIPCP) e pela Missão Inter-Confessional Cristã para a Actividade Pastoral nas Prisões. O objectivo da iniciativa foi o de assegurar uma humanização das
políticas prisionais do país.
A educação religiosa nas escolas estatais não é permitida pela legislação actual. A partir de
20 de Outubro de 2008, foi criado pelo Ministério da Ciência e Educação um conselho civil,
em cooperação com as Igrejas e as organizações religiosas, para estudar e propor projectos e
modificações à legislação que possam remediar esta situação. As reuniões do conselho têm,
até agora, ocorrido com regularidade.
O problema das propriedades confiscadas pelo regime comunista
ucrÂNIA
A devolução das propriedades confiscadas continua a ser um assunto por resolver, provocado pela lentidão das autoridades em proceder à esperada restituição das propriedades. Tal
situação é frequentemente devida a impedimentos burocráticos, criados por cidadãos que
ocupam actualmente estas propriedades, e a problemas ligados às dificuldades económicas
enfrentadas pelo país que, por seu turno, causam dificuldades para encontrar soluções alternativas.
Não obstante, por vezes ocorrem progressos em relação a todas as comunidades religiosas
que têm estes direitos. Por exemplo, a capela do antigo Seminário Teológico Católico Romano
em Lviv foi devolvida à Arquidiocese Latina de Lviv em Junho de 2009.
93
o n t I n e n t e
AMERiCA
c
AnTÍGUA E bARbUDA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos93%
Espiritistas3,6%
Outros3,4%
Cristãos
60.006
Católicos
8.000
Circunscrições
eclesiásticas
--SUPERFICIE
442km2
POPULAÇÃO
88.600
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
---
97
AnTÍGUA E bARbUDA
O direito de exercer a total liberdade religiosa encontra-se consagrado no Artigo 11º da Constituição de 1981, que também garante o
direito de mudar de religião e o direito de a ensinar livremente. Os
grupos religiosos não são obrigados a registar-se, mas o registo dálhes o direito a isenções tributárias com a finalidade de construir ou
de restaurar locais de culto.
Na prática não foi relatada nenhuma violação de tais direitos.
ARGEnTinA
ARGEnTinA
Variações relativas à legislação
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Em Agosto de 2009, iniciou-se o debate parlamentar na Comissão
de Relações Externas e Assuntos Religiosos da Câmara de Deputados,
sobre uma iniciativa legal que procura substituir a normativa actual
sobre a liberdade religiosa que data de 1977, promulgada nos tempos da ditadura militar. O “Projecto de Lei da Liberdade Religiosa” foi
apresentado no final de 2008 pela deputada Cynthia Hotton, representante das Igrejas Evangélicas, que assegurou que tinha sido elaborada usando como base os numerosos projectos de lei preparados
nos últimos anos por diferentes sectores religiosos, bem como uma
iniciativa em que trabalhou durante seis anos a Secretaria de Estado
dos Assuntos Religiosos da Nação. No debate participaram autoridades de diferentes instituições religiosas do país, juntamente com académicos importantes.
O objectivo do projecto é igualar todas as religiões legalmente reconhecidas no país e conceder-lhes a igualdade de direitos e de obrigações. Relativamente à Igreja Católica, reconhecem-se todos os tratados assinados com a Santa Sé bem como todos os direitos adquiridos
pela Igreja. Na realidade, o Monsenhor Jorge Bergoglio, Arcebispo de
Buenos Aires, expressou “a sua satisfação com a abrangência da iniciativa.” Para este efeito, encontra-se a ser considerada a criação de
um Registo Nacional de Confissões Religiosas, do qual deverão vir a
fazer parte as igrejas, comunidades e confissões religiosas que desenvolvem as suas actividades dentro do território da República Argentina.
Dado que o debate não chegou a resultados conclusivos, o presidente
da Comissão de Relações Externas e Assuntos Religiosos da Câmara
de Deputados, juntamente com a deputada Cynthia Hotton, voltou a
apresentar o Projecto de Lei da Liberdade Religiosa em Abril de 2010.
Em Março de 2010, o Ministério da Defesa argentino ditou uma resolução que suprime a Educação Católica Religiosa em todas as escolas
militares que pertencem às Forças Armandas Argentinas, eliminando
de todos os planos curriculares as disciplinas de religião, catequese,
formação ética e espiritual, como também os conteúdos curriculares
nela contidos. A razão dada para esta resolução é “actualizar aspectos
relativos às Escolas Militares com o objectivo de aperfeiçoar a operação das instituições educativas deste Ministério, de acordo com a
estrutura nacional educacional e no seio de uma sociedade democrática.”
Cristãos92,1%
Agnósticos4%
Mulçumanos2%
Outros1,9%
Cristãos
33.203.130
Católicos
37.003.000
Circunscrições
eclesiásticas
71
SUPERFÍCIE
2.780.400km2
POPULAÇÃO
40.666.000
REFUGIADOS
3.230
DESALOJADOS
---
98
Relações entre a Igreja Católica e o Estado
argentina
Em relação aos índices de pobreza, enquanto organismos do Governo afirmam que se situam
nos 15%, a Igreja mostrou que os números são bastante diferentes e preocupantes. De acordo
com o estudo “Barómetro da dívida social”, mais de 12 milhões de argentinos encontram-se
abaixo da linha de pobreza e, neste segmento, 12% vivem em extrema pobreza. A Universidade Católica da Argentina levou a cabo um estudo que coloca 37% da população abaixo da
linha de pobreza. Confrontada com as preocupações do Papa Bento XVI face a tal situação, o
presidente da Argentina respondeu que o Papa diz o mesmo de todos os países do mundo e
que há uma premeditação política nas suas declarações.
Durante o mês de Novembro, tiveram lugar várias actividades comemorativas do 25º aniversário do Tratado de Paz e Amizade entre o Chile e a Argentina. Este Tratado foi celebrado
graças à mediação papal, pedida por ambas as partes e levada a cabo pela Santa Sé. Neste
contexto, os presidentes de ambas as nações visitaram o actual pontífice e renderam homenagem ao mediador na cripta da Basílica de São Pedro, onde repousam os restos mortais do
Papa João Paulo II.
O momento mais tenso nas relações entre a Igreja e o Estado aconteceu durante o debate na
Câmara de Deputados sobre vários projectos para modificar o Código Civil de modo a permitir o casamento homossexual em termos legais, procurando substituir as palavras “homem e
mulher” por “as partes contratantes.” Actualmente, em algumas cidades da Argentina existe
já a possibilidade de casais homossexuais entrarem numa união civil reconhecida pelas leis
do respectivo estado. Ao nível do Governo, o ministro da Justiça, Segurança e Direitos Humanos da Argentina, Aníbal Fernández, revelou-se, há alguns meses, a favor deste debate e de
“tudo aquilo que tem a ver com evitar a discriminação”, apoiando uma eventual legislação
neste sentido. Enquanto isso, em Novembro, através de uma deliberação de um tribunal de
primeira instância na Cidade de Buenos Aires, foi declarada a inconstitucionalidade das normas civis que estabelecem actualmente o requisito da heterossexualidade das partes contratantes no casamento. Alguns dias mais tarde, foi entregue uma moção para dar como
nula a deliberação anterior, impedindo provisoriamente a celebração da cerimónia pedida.
A este respeito, o Conselho de Administração da Sociedade Argentina de Direito Canónico
considerou esta decisão como sendo “um acto chocante de irresponsabilidade institucional”;
a Arquidiocese de Buenos Aires qualificou a deliberação de “absolutamente ilegal”; enquanto
o Cardeal Bergoglio afirmou que o chefe do Governo de Buenos Aires “não cumpriu o seu
dever” ao não recorrer da sentença.
A 5 de Maio de 2010, a Câmara de Deputados aprovou o projecto, passando-o ao Senado. Em
resposta, tanto a Associação de Bispos Católicos, como a Associação de Médicos Católicos da
Argentina, emitiram declarações rejeitando a decisão do Parlamento.
99
ARGEnTinA
Comunidades Cristãs Não-Católicas / Outras Religiões
Em Novembro de 2009, surgiram notícias sobre a criação da Organização Judaica para o Diálogo Inter-confessional (OJDI) cujo objectivo será, de acordo com o que seu presidente declarou à agência Zenit, “estabelecer contactos com indivíduos, grupos de diálogo inter-religioso
e, fundamentalmente, com os sectores mais abrangentes na sociedade; difundir as bases
do que caracteriza o Judaísmo; e promover um conhecimento melhor entre as diferentes
comunidades de fé e os seus membros, tanto a nível individual como colectivo, pondo em
relevo as características positivas que as unem, entre as diferentes comunidades religiosas
que pertencem à tradição monoteísta.”
100
bAAMAS
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos92%
Agnósticos5,6%
Outros2,4%
Cristãos
291.375
Católicos
49.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
13.878km2
POPULAÇÃO
346.000
REFUGIADOS
---
DESALOJADOS
---
101
bAAMAS
A Constituição da Comunidade das Baamas, datada de 1973, garante
a total liberdade religiosa (Artigo 12º), protegendo tanto os direitos
individuais como os direitos dos grupos religiosos. Também proíbe o
Estado de interferir nos assuntos internos dos grupos religiosos.
A herança cristã do país é destacada e é-lhe concedido um reconhecimento especial na vida social e na educação, incluindo a educação
pós-secundária.
Ao mesmo tempo, as minorias cristãs não são sujeitas a qualquer tipo
de descriminação.
Apenas algumas práticas com origem no Vudu (Obeah) trazidas por
imigrantes haitianos foram proibidas, por motivos de ordem pública
e porque envolvem formas de intimidação e a prática ilegal da medicina.
bARbADOS
bARbADOS
O Artigo 19º da Constituição de 1966, emendada em 1974, 1981 e 1984,
garante em pormenor a total liberdade religiosa, o que também se
aplica ao sector educacional. Quase toda a população é cristã e pertence principalmente à fé anglicana.
Os grupos religiosos registados desfrutam de benefícios fiscais.
Os missionários estrangeiros têm de ter um visto, o qual é fácil de
obter.
Não há relatos de eventos que estejam em conflito, na prática, com
tudo aquilo que está garantido pela Constituição.
A pequena minoria muçulmana (aproximadamente 4000 membros),
que é resultado da imigração, possui três mesquitas e um centro cultural islâmico.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos95,2%
Muçulmanos1%
Outros3,8%
Cristãos
265.780
Católicos
11.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
430km2
POPULAÇÃO
257.000
REFUGIADOS
---
DESALOJADOS
---
102
bELiZE
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos91,1%
Baha’i2,5%
Hindus2%
Outros4,4%
Cristãos
266.044
Católicos
154.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
22.965km2
POPULAÇÃO
313.000
REFUGIADOS
230
DESALOJADOS
---
103
bELiZE
O Artigo 11º da Constituição de 1981 define em pormenor os direitos
à liberdade religiosa, incluindo o de professar publicamente a fé de
cada pessoa, tanto individualmente como em associação com outros,
a liberdade para proporcionar a instrução religiosa e deter as suas
próprias escolas e a liberdade para mudar de religião.
Estes direitos são também respeitados na prática e não há relatos de
eventos que estejam em conflito com a legislação constitucional.
A maioria da população é cristã e predominantemente católica. Existem pequenas minorias de seguidores de outras religiões não cristãs,
mas não há relatos de eventos ou comportamentos opressivos a eles
dirigidos.
bOLÍViA
bOLÍViA
Variações relativas à legislação
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos91,8%
Animistas3,8%
Baha’i2,2%
Outros2,2%
Cristãos
9.061.830
Católicos
8.386.000
Circunscrições
eclesiásticas
18
SUPERFÍCIE
1.098.581km2
POPULAÇÃO
10.031.000
REFUGIADOS
679
DESALOJADOS
---
Ao nível constitucional, a Nova Carta Fundamental, aprovada a 25 de
Janeiro de 2009, por referendo, eliminou o Artigo 3º, que reconhecia e
aprovava a religião Católica Apostólica Romana, garantindo também
o exercício público de todas as outras religiões. O Artigo 4º da nova
Constituição afirma que: “O Estado respeita e garante a liberdade de
religião e as crenças espirituais, de acordo com a sua visão do mundo.
O Estado é independente da religião.” Também se procurou reconhecer a importância das crenças dos povos nativos, por exemplo no preâmbulo da nova Constituição, onde se refere que a Bolívia foi re-fundada “com a força da nossa Pachamama (Mãe Terra) e graças a Deus.”
O Artigo 86º refere-se à liberdade de ensino: “Nas instituições de ensino
será reconhecida e garantida a liberdade de consciência e de fé, e o ensino
da religião, bem como a espiritualidade das nações e povos indígenas,
originários e agricultores, e serão encorajados o respeito e a coexistência
mútuos entre as pessoas com opções religiosas diferentes, sem imposição dogmática.” Em Maio de 2010, o Governo e a Conferência Episcopal
Boliviana concordaram em respeitar a liberdade religiosa, as crenças e
as espiritualidades, e que a disciplina de religião continuará a existir nas
escolas do país e será apoio para uma educação com base na liberdade.
Destaca-se a resolução de Fevereiro de 2010 por parte da Prefeitura de
La Paz que declara como Património Cultural Não-material do Departamento a celebração religiosa de Sexta-Feira Santa e as imagens do
Senhor do Santo Sepulcro, de Nossa Senhora das Dores, de El Señor de
las Caidas (representação de Cristo caindo a caminho do Calvário), de
Cristo Crucificado e de El Señor de la Sentencia (Nosso Senhor condenado por Pilatos) – uma versão do Ecce Homo), as quais se encontram
na Igreja de La Merced. O secretário do Turismo e da Cultura da Prefeitura, David Jiménez Paz, assegurou que este acto não vai contra a Constituição, que define a Bolívia como um Estado laico, uma vez que “a
Constituição Política do Estado fala de liberdade de religião e isto não
provocará quaisquer problemas, porque a referência aos patrimónios
declarados é precisamente uma demonstração de plurinacionalidade.”
Relações entre a Igreja Católica e o Estado
O Governo fez declarações, no âmbito da celebração do 200º aniversário
da cidade de La Paz, assinalando que alguns líderes da Igreja Católica
tinham tentado dominar o povo através da oração, da lei ou das armas.
Contudo, os principais problemas da Igreja Católica foram originados
pelos conflitos violentos com grupos de bolivianos, tais como os que
104
BOLÍVIA
tiveram lugar em Maio de 2009 em Villa Ingenio e em Julho em Apolo. Os habitantes destas
cidades decidiram apropriar-se das propriedades onde se localizava a capela, na Villa Ingenio, e
o Mosteiro de Nossa Senhora de Nazaré, em Apolo, defendendo que estes lugares não tinham
uma função social importante. Na Villa Ingenio os vizinhos começaram a gritar insultos contra
a Igreja, ameaçando o pároco para que ele lhes entregasse o terreno e demolindo em seguida
a capela, com a maquinaria do presidente da Câmara, e saqueando o seu interior. A demolição
terá tido motivações políticas, uma vez que o presidente da Câmara e os habitantes decidiram
construir uma clínica na referida propriedade, embora já existisse uma a dois quarteirões de
distância. Após este incidente, houve mais apreensões de propriedades da Igreja na mesma
área. No caso de Apolo, os vizinhos ocuparam as propriedades. As autoridades municipais
estavam dispostas a consolidar esta ocupação, deixando a congregação religiosa do Mosteiro
apenas com o recurso legal e o apoio da limitada protecção policial da zona. Devido aos acontecimentos anteriores, o Cardeal Terrazas, presidente da Conferência Episcopal Boliviana, afirmou que se se defende que existe liberdade religiosa na Bolívia, também se deveria respeitar a
forma como os Católicos adoram a Deus.
Para além destes ataques à propriedade da Igreja, também houve ataques pessoais, como
aquele que o Bispo Tito Solari sofreu, tendo sido agredido na praça de Cochabamba por ser
sacerdote. Ameaçaram linchá-lo, fazendo referência ao seu estatuto de cidadão estrangeiro
e gritavam, exigindo que devolvesse o ouro que a Igreja lhes roubara há 500 anos. Houve
também um atentado à casa do Cardeal Julio Terrazas, que pertence à Arquidiocese de Santa
Cruz, onde um grupo terrorista separatista colocou uma bomba. Ninguém ficou ferido e o
cardeal não estava em casa nessa altura.
Neste ambiente de violência, em Agosto, foi assinado o Acordo Quadro de Cooperação Interinstitucional entre a Chancelaria da Bolívia e o representante da Conferência Episcopal. Neste
documento é reconhecido o direito de propriedade da Igreja sobre os seus bens e a capacidade
de os administrar no âmbito do contexto da obra que realiza no país. Da mesma forma, estabelece que a Igreja manterá todos os seus programas educativos, de saúde, de protecção social
e na área da comunicação social. Actualmente, a Igreja tem 1.500 projectos de educação, 600
projectos de saúde, 300 projectos de protecção social, 200 projectos na área da comunicação
social e cinquenta projectos de produção na Bolívia, de acordo com os dados da Conferência
Episcopal. O ministro dos Negócios Estrangeiros, Choquehuanca, sublinhou que com este documento se honra o respeito pela liberdade religiosa e, de forma privilegiada, o sistema educativo.
Relativamente ao acordo, em Abril de 2010, Limberth Ayarde, secretário executivo do Departamento de Educação da Conferência Episcopal Boliviana, indicou que os bispos tinham
manifestado preocupação relativamente aos problemas causados por permitir que a Igreja
elegesse as autoridades educativas dos centros de convenção: “É um ponto em que não
podemos ceder, pois o director de uma unidade de ensino católica é uma autoridade não só
administrativa e pedagógica mas também pastoral, e como tal tem de garantir a identidade
católica de um centro de ensino. Tem de ser o líder de toda a equipa de educadores. A convenção faz sentido na medida em que a Igreja pode escolher e designar os seus directores.”
105
bRASiL
bRASiL
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos91%
Espiritistas4,8%
Outros4,2%
Cristãos
170.707.780
Católicos
162.200.000
Circunscrições
eclesiásticas
268
SUPERFÍCIE
8.514.215km2
POPULAÇÃO
195.423.000
REFUGIADOS
4.232
DESALOJADOS
---
106
Variações relativas à legislação
O Congresso brasileiro ratificou o acordo assinado em Novembro de
2008 entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a Santa Sé. Nele
está definido o estatuto jurídico da Igreja Católica no Brasil e incorpora, entre outras coisas, a educação religiosa nas escolas públicas.
Isenta também a Igreja e as instituições religiosas do pagamento de
impostos. Reconhece o segredo da confissão; estabelece que a actividade dos padres, dos religiosos e dos colaboradores pastorais não
implica uma relação do tipo empregador – empregado com a Igreja;
e permite o livre acesso a estabelecimentos prisionais e militares a
padres de todas as religiões. Em relação aos missionários estrangeiros, estes têm de obter um visto de modo a permanecerem no Brasil
e não têm livre acesso às áreas indígenas. Reconhece também a validade civil dos casamentos religiosos, reconhece as decisões da igreja
em questões de casamento e os graus académicos eclesiásticos; e foi
acordado que as igrejas ou as obras de arte religiosas são património
do Brasil e que o Governo as deve preservar.
Como resultado da ratificação do acordo, surgiram várias críticas, considerando que este é uma ameaça à natureza secular do Estado e que
estabelece privilégios para a Igreja Católica no que diz respeito ao
tratamento de que outras entidades religiosas desfrutam. As autoridades políticas e da Igreja responderam, declarando que o texto ratificado formaliza uma situação já existente na prática e reconhece a
relevância actual e histórica da Igreja Católica no Brasil.
De modo a melhor garantir esta igualdade entre as diferentes confissões,
foi apresentada quase em simultâneo uma “Lei Geral das Religiões”, na
qual estão garantidas condições semelhantes para os outros credos religiosos. Esta iniciativa foi aprovada pela Câmara de Representantes e pelo
Senado, e consequentemente espera-se que, em resultado disso, se chegue
eventualmente a um acordo. Não obstante, as outras confissões criticaram
severamente o projecto, dado que “cai nos mesmos erros de inconstitucionalidade e desdém em relação à natureza laica do Estado brasileiro”.
Em Julho de 2009, foi apresentada nos órgãos federais do Estado de
São Paulo uma iniciativa civil pública que propôs a remoção de todos
os símbolos religiosos de lugares de elevada visibilidade e onde muitas pessoas convergem. Os fundamentos da iniciativa seriam baseados na natureza laica do Estado, confrontando a presença destes símbolos religiosos com a Constituição. O Arcebispo de São Paulo, Cardeal
Odilo Scherer, afirmou que a secularidade do Estado não autoriza a
repressão de manifestações religiosas.
O Governo Federal, no dia 21 de Dezembro, apresentou novamente esta proposta incluída no
terceiro Programa Nacional para os Direitos humanos (PNDH-3), propondo o impedimento
do uso de símbolos religiosos nos estabelecimentos públicos de todo o país. A medida seria
tomada com o objectivo de assegurar o livre exercício das diferentes práticas religiosas, eliminando manifestações de intolerância religiosa. Não obstante, por meio de um decreto datado
de Maio de 2010, o presidente eliminou estas restrições do PNDH-3.
Relações entre o Estado e a Igreja Católica
BRASIL
O Bispo Luiz Soares Vieira afirmou que, durante 2009, alguns sacerdotes e religiosas tinham
sido atacados por criminosos, como o que acontecera no patronato de Santa Teresinha, no
centro de Manaus, que foi invadido por criminosos armados que assaltaram as religiosas.
Além disso, foram assaltadas cinco igrejas, um sacerdote recebeu uma ameaça de morte e
outro foi vítima de um rapto muito rápido.
Em 2009, foram assassinados seis sacerdotes no Brasil: o P. Ruggero Ruvoletto foi morto na
sua paróquia, em Santa Evelina, nos arredores de Manaus; o P. Hidalberto Henrique Guimarães,
pároco da Igreja de Nossa Senhora da Graça, na municipalidade de Murici, nos arredores de
Maceió; o P. Gisley Azevedo Gomes, consultor da Secção de Juventude da Conferência Nacional
dos Bispos do Brasil, em Brazlândia, uma cidade satélite de Brasília; o P. Evaldo Martiolo, pertencente à Diocese de Caçador; o P. Ramiro Ludeña e um amigo, que se dedicavam à assistência
social a crianças e adolescentes, em Pernambuco; e o P. Alvino Broering, padre diocesano de
Santa Catarina. Além destes, um outro padre, o P. Dejair Gonçalves de Almeida, coordenador
dos cuidados pastorais no distrito de Santa Cruz, foi assassinado em Março de 2010.
O Conselho Episcopal dos Cuidados Pastorais da Conferência de Bispos do Brasil, no término
da sua última reunião do ano, publicou uma declaração onde expressa a preocupação relativamente à crescente onda de violência contra sacerdotes no país: “a Igreja Católica no Brasil
sente-se profundamente desgastada e enfurecida face à violência infligida aos seus filhos
cujas vidas foram cerceadas. Reafirmamos que nada justifica a violência!”
Em relação ao Programa Nacional para os Direitos Humanos, aprovado pelo Governo em
Dezembro de 2009, mais de sessenta bispos e a Conferência de Bispos pronunciaram-se contra alguns assuntos muito controversos: a proposta de legalização do aborto; a união civil
de pessoas do mesmo sexo; a sua capacidade para a adopção; o reconhecimento enquanto
famílias de uniões homossexuais, bissexuais, de travestis e de transexuais, e a proibição de
exibir símbolos religiosos em estabelecimentos públicos. Depois de uma longa discussão, o
Governo Federal recuou nos pontos relativos ao aborto e à proibição de símbolos religiosos.
Surgiu uma nova controvérsia no que diz respeito ao aborto, devido à existência de um debate
na Câmara dos Representantes sobre um projecto conhecido como “O Estatuto do Nascituro”
que garante explicitamente a protecção da vida a partir do momento da concepção, o que
impediria qualquer tentativa para legalizar o aborto. Foi indicado que o ramo executivo exerceu pressões para que o processo desta proposta fosse abandonado.
107
CAnADÁ
CAnADÁ
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos74,5%
Agnósticos15,3%
Muçulmanos2,3%
Outros7,9%
Cristãos
31.784.100
Católicos
14.461.000
Circunscrições
eclesiásticas
72
SUPERFÍCIE
9.970.610kmq
POPULAÇÃO
33.890.000
REFUGIADOS
169.434
DESALOJADOS
---
108
A liberdade religiosa esteve sempre garantida no Canadá e é respeitada pelas autoridades governamentais. Está garantida pela Carta
dos Direitos e Liberdades contida na Constituição Canadiana de 1982
e é descrita como se segue no artigo 2º A: “Todas as pessoas têm
direito às seguintes liberdades fundamentais: (a) liberdade de consciência e de religião”.
De acordo com o artigo 52º da Lei Constitucional de 1982, “qualquer lei
que seja inconsistente com a Constituição é, na medida da inconsistência, inaplicável e sem efeito” tal como está descrito na The Canadian Encyclopedia.
A mesma enciclopédia on-line declara que “O objectivo de uma Carta
de Direitos é o de proteger o cidadão face ao Estado e de proteger
as minorias contra as maiorias parlamentares. A Carta Canadiana é
abrangente e cobre vários campos: direitos fundamentais, direitos
democráticos, direitos de mobilidade, direitos jurídicos, direitos de
igualdade e direitos linguísticos. A igualdade entre homens e mulheres é também expressamente protegida por uma secção particular da
Carta. Os direitos e liberdades aborígenes não são afectados”.
No Canadá, a Carta é regularmente referenciada por aqueles que se
sentem lesados por palavras que consideram ofensivas ou que vão
contra tudo o que consideram como não estando de acordo com
o modo como a sociedade deveria ser. Neste contexto, as questões
morais são frequentemente o centro do debate, seja relativamente à
questão do aborto, às uniões do mesmo sexo ou à liberdade de instrução religiosa.
No Canadá, os vários tribunais regionais ouvem regularmente casos
relativos a assuntos religiosos, variando desde o uso do véu em locais
públicos até aos direitos dos pais em conseguirem a isenção para os
seus filhos relativamente a aulas obrigatórias no Quebeque sobre
Ética e Cultura Religiosa (ECR), entre muitos outros casos. Uma associação judaica relatou um aumento nos ataques anti-semitas no
Canadá. Têm também ocorrido actos de vandalismo e profanação de
propriedade pública pertencente a muçulmanos e a cristãos, como
cemitérios, mesquitas e igrejas.
“Houve alguns relatos de abusos sociais ou de discriminação baseados na filiação, no credo ou na prática religiosa”, de acordo com o Relatório de 2009 do Departamento de Estado Americano sobre a Liberdade
Religiosa Internacional. Existem medidas na lei canadiana que permitem a acusação criminal de qualquer indivíduo que seja culpado de
actos intoleráveis ou de propaganda contra qualquer grupo religioso.
Três exemplos da vida religiosa na sociedade canadiana
Quebeque: a Comissão Bouchard Taylor sobre ‘acomodação razoável’
Em Maio de 2008, os comissários Gérard Bouchard e Charles Taylor tornaram finalmente
públicos os resultados da sua Comissão de Consulta sobre o que eles descreveram como
“acomodação razoável”. Este relatório, que permitiu consultas com o público em geral assim
como também com os peritos, recomendou que, para preservar a neutralidade do Estado,
“todos os funcionários públicos que representam a autoridade e a neutralidade do Estado e
das suas instituições, como os juízes, os promotores da Coroa, os polícias, os guardas prisionais e o presidente e o vice-presidente da Assembleia Nacional do Quebeque, sejam proibidos de usar qualquer símbolo religioso (hijab, crucifixo, etc.)”.
O relatório recomendou também que seriam autorizados a fazê-lo os “professores, os funcionários públicos, os profissionais de saúde e todos os outros funcionários do Governo”. Em
2009, ainda nenhuma lei tinha sido aprovada como resultado das recomendações emitidas
por esta comissão.
Quebeque: Curso sobre Ética e Cultura Religiosa (ECR)
CAnADÁ
Com início em Setembro de 2008, a nova disciplina obrigatória não recebeu a aprovação
unânime. Uma família em Drummondville foi até ao Supremo Tribunal do Quebeque para
se assegurar de que os seus filhos estariam isentos. Em 2009, o caso chegou ao Tribunal de
Apelo do Quebeque e eles agora pretendem levar o caso até ao Supremo Tribunal do Canadá,
a mais alta instância judicial no país (Abril de 2010).
Além disso, com uma sentença emitida no dia 24 de Fevereiro de 2010, o Tribunal de Apelo
do Quebeque reconheceu, relativamente às escolas particulares, o direito de isenção da disciplina obrigatória de Ética e Cultura Religiosa, uma decisão que “marcou uma mudança”, de
acordo com o CLÉ, a Coligação para a Liberdade na Educação, uma associação não religiosa
criada depois da introdução do curso obrigatório de ECR.
No dia 15 de Setembro de 2009, os bispos católicos do Quebeque expressaram reservas sobre
esta mesma disciplina que deveria privilegiar o estudo do Cristianismo. Numa carta, os bispos indicaram que “os livros escolares iriam expor os alunos à diversidade religiosa em vez de
os levar a conhecer de uma forma significativa a tradição cristã do Quebeque”. A actual abordagem foi frequentemente considerada como sendo pouco aprofundada, “especialmente em
relação a certas narrações de base da tradição cristã… sem ajudar os jovens a descobrir o seu
significado” e, por esta razão, “seria possível que os preconceitos se enraizassem no espírito
dos alunos em relação a qualquer determinada convicção ou práticas religiosas”. Tudo isso
vai contra o espírito pretendido pelos criadores deste curso.
Também os crentes de outras tradições religiosas, e até mesmo os ateus, têm ao longo do
ano expressado significativas reservas, temendo que os alunos, especialmente os das esco-
109
CAnADÁ
las primárias, pudessem ter uma propensão para relativizar todas as convicções e colocá-las
todas ao mesmo nível.
Relatórios de incidentes anti-semitas
De acordo com a associação B’naï Brith, os incidentes anti-semitas estão a aumentar, com 413
incidentes relatados à polícia, e com apenas dezassete casos com acusações formais. “Comparando com os números de 2008, o aumento de 11,4% descrito neste relatório confirma a
tendência de um aumento de 280 incidentes em 2000 para um pico de 1.264 em 2009, quase
cinco vezes mais num período de dez anos. Deputados de todos os partidos políticos consideraram o problema suficientemente urgente para criar a Coligação Parlamentar Canadiana
para o Combate ao Anti-Semitismo (CPCCA) e decidiram abrir um inquérito oficial”.
110
CHiLE
Em Fevereiro de 2010, o presidente Michelle Bachelet enviou um projecto de lei ao Congresso Nacional, projecto esse que reforma a lei
actual sobre o estatuto jurídico das Igrejas e das Organizações Religiosas (Lei 19.638), mas esta iniciativa (ainda) não foi apresentada
no Congresso Nacional. Quando acabar por ser debatida, irá proporcionar uma oportunidade para avaliar a aplicação da lei acima referida, dez anos depois de ter sido publicada, sobre assuntos de grande
importância relativamente à liberdade religiosa.
O projecto de lei propõe, entre outras medidas, que as entidades
mencionadas deverão ser consideradas Igrejas, confissões ou entidades religiosas, as quais, embora baseadas numa determinada crença
religiosa, detenham principalmente objectivos de caridade social,
de investigação e estudos filosóficos, ou constituam sociedades ou
comunidades mútuas que procurem ou tenham como objectivo
alcançar a saúde física ou espiritual. Relativamente à assistência pastoral, propõe que o pessoal das forças armadas, serviços de polícia
e de segurança pública, os que se encontrem em hospitais públicos
ou outras instituições semelhantes, bem como os que se encontram
em prisões, sejam ou não membros destas instituições, deverão ter o
direito de receber assistência religiosa da capelania nacional da sua
confissão, ou da organização eclesiástica equivalente, sujeito às limitações e regulamentos exigidos pela sua situação particular.
Em relação ao sistema de reconhecimento civil do matrimónio religioso, aplicado desde a Lei sobre o Casamento Civil datada de 2004,
aqueles que se preocupam com o cumprimento da lei sobre a liberdade religiosa pronunciaram-se sobre a necessidade de aumentar as
oportunidades para o registo e permitir que os documentos sejam
apresentados por outra pessoa em vez de apenas pelo próprio casal.
Relativamente a outras leis relacionadas com a liberdade religiosa, a
nacionalidade chilena honorária foi concedida a seis padres (Joseph
Alfred León Sirvin, Michel Marie Edouard Bourguignat Girard, John
Joseph O’Reilly LC, Herbert Albert Becker Rawn SVD, Gerard Ouisse e
Frederick Joseph Hegarty Keane). Este benefício também foi concedido a Christiane Raczynski Von Oppen, presidente da AIS Chile.
Foi permitido erigir uma série de monumentos em memória de João
Paulo II, nas principais vias fronteiriças do país, em Los Andes, na
região de Valparaíso, e na comuna de Puyehue, na região de Los Lagos.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos87,5%
Agnósticos10,1%
Animistas1,6%
Outros0,8%
Cristãos
14.655.560
Católicos
12.410.000
Circunscrições
eclesiásticas
27
SUPERFÍCIE
756.626km2
POPULAÇÃO
17.135.000
REFUGIADOS
1.539
DESALOJADOS
---
111
CHiLE
Variações relativas à legislação
CHiLE
Vale a pena realçar que o regulamento de Maio de 2008, sobre a provisão de assistência
pastoral em estabelecimentos das forças armadas e dos serviços de segurança pública, foi já
implementado, com a nomeação de um capelão nacional evangélico.
Relativamente ao património religioso (material e cultural) do Chile, vale a pena salientar a
declaração por parte da Câmara Municipal de Petorca, na província com o mesmo nome, das
Festas de la Merced (24 de Setembro) e da Virgem do Rosário (7 de Outubro) como festivais
que fazem parte do património cultural e religioso do Chile. É também de realçar o anúncio por parte do Conselho de Monumentos Nacionais do Ministério de Educação, feito em
Dezembro último, em como alguns bens culturais que pertencem a comunidades religiosas
seriam devolvidos a estas, como é o caso da devolução da Igreja de la Viñita (comunidade
de Recoleta, Santiago) e da imagem da Virgem do Loreto da Paróquia de Achao (província
de Chiloé). Um caso à parte foi a rejeição do pedido para a instalação de um monumento
erguido em honra do Papa João Paulo II em memória da sua visita ao Chile, rejeição que deu
origem a um debate interessante a nível social, não por razões religiosas, mas sim por razões
arquitectónicas e estéticas relacionadas com o impacto urbanístico do monumento.
Em duas ocasiões ocorreram cerimónias com condecorações conjuntas em honra de uma
imagem da Virgen de la Carmen, uma delas na Academia Militar, juntamente com a “Cruz de
la Victoria”, e a outra na basílica do Santuário Nacional de Maipú, onde ela recebeu a honra e
o distintivo de “Presidente de la República.”
Entre as consequências inesperadas da chamada “gripe humana de origem suína”, esteve a
adopção de medidas administrativas por parte das autoridades civis que envolveram a suspensão de algumas celebrações religiosas católicas, decisões que tiveram a colaboração das
autoridades religiosas envolvidas. Assim, por exemplo em Julho de 2009, o festival em honra
da Virgen de la Carmen, em Tirana, no Sul do Chile, foi suspensa como medida preventiva; e,
em Agosto, o mesmo aconteceu em relação à celebração da festa de San Lorenzo. Em ambas
as ocasiões proibiram acampamentos, tendas ou outros abrigos cobertos semelhantes, tanto
nos espaços públicos como nos privados destas cidades, bem como a realização de toda e
qualquer actividade comercial. Além disso, as medidas administrativas restringiram as licenças transitórias municipais para instalar estabelecimentos temporários, e as autorizações
especiais para o transporte de passageiros para essas cidades e, com a colaboração dos Carabineros chilenos, impediram a entrada de veículos de não-residentes e outro tráfego, excepto
para os serviços essenciais municipais ou de emergência.
Relações entre a Igreja Católica e o Estado
Em Janeiro de 2009, foi apresentado um recurso (sem êxito) no Tribunal de Apelo de Santiago, procurando obter uma forma de acção inibitória para impedir a realização de um desfile de moda denominado “Virgens”, no qual as modelos e um travesti desfilaram em trajes
imitando ou evocando imagens da Virgem Maria (usando mesmo terços e auréolas) e desenhados para serem provocantes. A Conferência Episcopal Chilena considerou que se tratava
de uma falta de respeito à veneração que os chilenos professam à Virgem Maria.
112
Durante o mês de Novembro, tiveram lugar várias actividades comemorativas do 25º Aniversário do Tratado de Paz e Amizade entre o Chile e a Argentina. O tratado original de 1984
aconteceu graças à mediação papal, a pedido de ambas as partes e sob os auspícios da Santa
Sé. Neste contexto, os presidentes de ambas as nações visitaram o Papa Bento XVI e renderam homenagem a João Paulo II, depositando um ramo de flores na sua sepultura.
Uma fonte de conflito permanente entre a Igreja Católica e o Governo durante o ano de 2009
foi a aprovação de um projecto de lei, e agora lei, sobre informação, orientação e assistência financeira para medidas de controlo de natalidade, incluindo a provisão da denominada
“pílula do dia seguinte” enquanto “método anticoncepcional de emergência”, contrariamente
ao postulado pelo Tribunal Constitucional que não autorizou a distribuição desta pílula em
estabelecimentos de saúde públicos. Segundo essa lei, menores com 14 anos de idade terão
agora acesso à pílula, após o aconselhamento por parte de um adulto responsável.
Do mesmo modo, durante o ano de 2009 e início de 2010, foi apresentada uma série de iniciativas legais relativamente às uniões de facto, tanto heterossexuais como homossexuais.
Em resposta, a Igreja reiterou a importância do matrimónio e da família, emitindo mesmo
uma declaração no mês de Novembro, pelo Comité Permanente da Conferência Episcopal do
Chile, intitulada “Vamos dar Valor ao Casamento, um Bem para o Chile.”
Comunidades Cristãs Não-Católicas / Outras Religiões
CHiLE
Relativamente aos crentes cristãos não-católicos, os esforços por parte dos candidatos presidenciais para atrair o voto do denominado “mundo evangélico” foram notórios. Para este
efeito, entre esses esforços contaram-se numerosas propostas e compromissos.
Entre as propostas do presidente eleito, Sebastian Piñera, salientam-se as seguintes: assegurar a igualdade plena entre as diferentes crenças; igualdade de culto nas forças armadas;
igualdade de oportunidades entre as diferentes crenças no acesso aos donativos e benefícios
fiscais; facilitar a instalação de meios de comunicação que permitam transmitir a mensagem
evangélica; e permitir o ensino da religião evangélica aos alunos que o requererem em todos
os estabelecimentos não-confessionais que recebam contribuições do Estado.
Vale a pena realçar que, no mês de Dezembro e pela primeira vez no Chile, o dia do Hanukkah
foi celebrado no Palácio Presidencial (La Moneda) com a presença do secretário-geral da
República e representantes da comunidade judaica no Chile.
Em Abril de 2010, por determinação do Primeiro Tribunal do Trabalho de Santiago, o empregador de uma muçulmana foi condenado por discriminação religiosa e por violar “o direito à
não-discriminação com base na religião.”
A situação após o terramoto
No seguimento do terramoto que o Chile sofreu no mês de Fevereiro, e relativamente ao
património cultural e religioso, surgiram iniciativas de restauro e conservação.
113
CHILE
De acordo com os dados da Conferência Episcopal, 47% das igrejas do Chile sofreram danos
em consequência do terramoto e do maremoto de 27 de Fevereiro, de acordo com o relatório
sobre os danos a instalações religiosas tornado público pelo Instituto Nacional de Estatística
Chileno. Doze das vinte e sete dioceses existentes no país foram afectadas, com danos em
545 edifícios religiosos católicos, 440 dos quais eram igrejas. Destes, 19% sofreram danos graves conducentes ao colapso total e demolição; 24% danos graves, sendo que provavelmente
ainda será possível recuperar as igrejas em questão; 25% danos consideráveis, mas recuperáveis; e 32% danos reparáveis.
A Ajuda à Igreja que Sofre no Chile lançou uma campanha intitulada “Capelas de Emergência:
Não há Novo Chile sem Cristo”, de modo a construir capelas de emergência como resposta
para as comunidades que ficaram sem igreja devido aos danos causados pelo terramoto.
Por outro lado, o Conselho Nacional da Cultura e das Artes do Governo do Chile levou a cabo
um estudo sobre o “património imaterial cultural” afectado pelo terramoto. Dada a associação indissolúvel entre tal património “imaterial” (ou seja, espiritual) e os edifícios propriamente ditos, como as igrejas, as capelas e os santuários que foram afectados, estima-se que
pelo menos 190 festas religiosas se encontrem em risco de serem canceladas.
114
COLÔMbiA
Alterações relativas à legislação
Em Agosto de 2009, através de um acto protocolar, foi criado o Comité
Consultivo Inter-religioso no seio do Ministério do Interior e da Justiça, cujo objectivo é fiscalizar os trâmites em matérias de liberdade e
igualdade religiosas, de consciência e de culto.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Relações entre a Igreja Católica e o Estado
Cristãos95,7%
Outros4,3%
Cristãos
45.226.590
Católicos
41.897.000
Circunscrições
eclesiásticas
75
SUPERFÍCIE
1.138.914km2
POPULAÇÃO
46.300.000
REFUGIADOS
196
DESALOJADOS
3.300.000-4.900.000
115
COLÔMbiA
A situação social vigente no país sofre a influência da violência exercida pelos grupos de guerrilheiros, violência essa que abrange os
sacerdotes e os fiéis. Em Junho de 2009, um grupo de guerrilheiros
cercou uma povoação no município de Arauquita e invadiu o lugar
onde se celebrava uma reunião pastoral social, tendo raptado o catequista leigo e agente pastoral Jorge Humberto Echeverri sem qualquer explicação, assassinando-o mais tarde.
Face a tal violência, o Governo autorizou a Igreja e a Cruz Vermelha
Internacional como sendo os únicos organismos competentes para
dialogar directamente com as Forças Armadas Revolucionárias da
Colômbia (FARC). A Igreja ofereceu-se reiteradamente para agir como
mediadora, no seu papel de terceiro interveniente sem interesses
políticos. Durante o ano, o Cardeal Darío Castrillón tinha-se afirmado
como mediador entre as FARC e o Governo, mantendo contactos telefónicos com Guillermo Sáenz, pseudónimo de “Alfonso Cano”, chefe
das FARC. Devido a esta possibilidade de ser um terceiro interveniente
imparcial e de confiança, em Setembro o Governo permitiu que a
Igreja conduzisse e coordenasse a negociação para a libertação de
vinte e quatro reféns (polícias e militares), alguns dos quais estiveram em poder das FARC durante mais de doze anos. A Igreja propôs
que as FARC fizessem a entrega de reféns em cinco etapas mensais,
com a última entrega a realizar-se em Fevereiro de 2010. O principal
conflito entre as partes é o de que as FARC acederam a liberar alguns
dos reféns, mas pretendem trocar os outros por guerrilheiros que se
encontram actualmente presos. Pela sua parte, o Governo de Álvaro
Uribe aceitou a possibilidade da entrega por fases, com um outro país
a servir como garantia, mas exige que as FARC libertem todos os prisioneiros de um modo unilateral, sem obter nada em troca. A Igreja
pediu ao Governo e às FARC que cedam nas suas pretensões de modo
a superarem o impasse nas negociações e alcançarem finalmente a
libertação dos reféns.
COLÔMBIA
Durante o ano de 2009, foram assassinados cinco padres: Juan Gonzalo Aristizabal Isaza, de
Medellín; Gabriel Montoya Tamayo e Jesús Ariel Jiménez, ambos de Vichada; Óscar Cardozo
Ossa, de Villavicencio; e Jaramillo Cárdenas, de Santa Rosa de Osos. Dezenas de padres colombianos prestam o seu serviço sob ameaças de grupos armados. O que inclui os dezassete
bispos que recebem actualmente protecção da polícia.
Na Paróquia de Nuestra Señora de la Anunciación, na cidade de Armenia, um desconhecido
entrou na igreja à noite, forçou a abertura do sacrário e atirou-o ao chão, juntamente com um
cálice e as hóstias consagradas que este continha. Como não foi roubado qualquer objecto
de valor da igreja, pareceu tratar-se de um ataque directo contra a sagrada eucaristia.
Comunidades cristãs não-católicas / Outras Religiões
Actualmente, quase 10% do Senado da Colômbia é composto por pastores evangélicos que
decidiram tentar uma carreira política, embora alguns não tenham sido directamente eleitos, tendo a saída de outros senadores tido como resultado que certos lugares lhes fossem
destinados. Em geral, têm-se manifestado como fortes defensores do casamento e contrários
a todas as causas que procuram tentar consagrar direitos patrimoniais ou as uniões civis
para os homossexuais. São conhecidos como “O Partido de Deus”.
116
COSTA RiCA
Actualmente, o Artigo 75º da Carta Fundadora define o seguinte: “A
Religião Católica, Apostólica, Romana, é a religião do Estado, o qual
contribui para a sua manutenção, sem intervir no livre exercício, no
seio da República, de outras religiões, contanto que elas não vão contra a moralidade ou os bons costumes universais”. Não obstante, no
decurso deste ano, houve uma tentativa para substituir este texto
pelo seguinte: “Todas as pessoas são livres de adoptar e professar uma
religião que respeite os direitos humanos ou então de não adoptarem
nenhuma. O Estado será neutro em assuntos religiosos, mas garantirá o exercício desta liberdade”. Os congressistas que apresentaram
a proposta de lei ressalvaram que a existência de uma religião oficial implica uma discriminação contra aqueles que professam outros
credos, e que para manter a liberdade religiosa é necessário rever a
Constituição.
Entre as alterações constitucionais propostas pelo grupo de organizações civis, académicas e religiosas conhecido como o “Movimento
por um estado laico na Costa Rica”, existia uma tentativa de modificação do juramento oficial definido no Artigo 194º, de modo a que
se pudesse fazer um juramento (no caso de crentes) ou então, por
pedido, se pudesse escolher prometer levar a cabo a sua tarefa de
forma adequada, declarando que deste modo se respeitaria a liberdade religiosa dos funcionários. O Bispo de Cartago, Monsenhor
Ulloa, declarou que eliminar Deus de todas as instituições públicas é
um acto de profanação através do qual os deputados, erroneamente,
pensam que podem matar Deus. A Conferência Episcopal referiu que
a liberdade religiosa já está garantida pela actual Constituição e que
eliminar Deus do juramento realça, pelo contrário, uma secularidade
que tem a presunção de limitar Deus ao sector privado.
No caso de as reformas serem aprovadas no corrente período legislativo, mesmo assim é requerida a aprovação do Congresso eleito no
seguinte mandato. Deste modo, a lei pode ser adiada durante anos.
Relações entre a Igreja Católica e o Estado
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos97%
Outros3%
Cristãos
4.202.100
Católicos
3.748.000
Circunscrições
eclesiásticas
8
SUPERFÍCIE
51.100km2
POPULAÇÃO
4.640.000
REFUGIADOS
19.116
DESALOJADOS
---
Gerou-se um apaixonado debate por causa da decisão da Câmara
Constitucional do Supremo Tribunal que declarou inconstitucional o
Artigo 34º, parágrafo 2, do Regulamento para a Lei da Profissão Pedagógica (“para a selecção do pessoal dedicado à educação religiosa, a
autorização prévia por parte da Conferência Episcopal Nacional será
117
COSTA RiCA
Alterações no que diz respeito à legislação
COSTA RiCA
um pré-requisito indispensável”), anulando a autoridade dada aos bispos para discernirem
sobre a conveniência de dispensarem a missio canonica ou Missão Apostólica dos Professore
de Educação Religiosa enquanto agentes pastorais, à luz do ensino destas matérias nas escolas estatais.
Os conselheiros regionais de educação religiosa denunciaram a tentativa de eliminar o
ensino da fé católica das escolas estatais, no seguimento da decisão da Câmara Constitucional, e alegam que existe um ambiente “anti-religioso e secularista” no seio do Ministério da
Educação Pública.
Em face desta situação, a Igreja expressou a sua intenção de negociar um tratado ou um
acordo para regulamentar a sua relação com o Estado, principalmente no que diz respeito à
administração de propriedades, de isenções, de serviços educativos ou sociais. A ideia é preparar um esboço de acordo para ser assinado pela Santa Sé.
Outro ponto de conflito entre a Igreja e o Governo surge como resultado das declarações
públicas feitas em Abril de 2010 pelo presidente da República, Oscar Arias Sánchez, que declarou que “o voto de celibato é um erro da Igreja Católica”. O porta-voz da Conferência Episcopal da Costa Rica afirmou que a declaração do líder “só pode ser considerada uma opinião
pessoal e no contexto de uma sociedade democrática”. Do mesmo modo, o presidente declarou-se a favor da criação de leis para uniões homossexuais; isto em relação a uma proposta
de lei sobre “sociedades coabitantes” onde um grupo a favor da causa gay apresentou 12.000
assinaturas, exigindo que fosse a sociedade a votar sobre a iniciativa e não o Parlamento.
118
CUbA
Em Cuba, além de algumas indicações positivas, o panorama da liberdade religiosa no país continua a ser negativo. No período sob observação não ocorreu nenhuma alteração à legislação anteriormente
existente.
As principais restrições à liberdade religiosa são cumpridas usando
a vigilância, a infiltração, o assédio a homens e mulheres religiosos e
a leigos, e com a utilização abusiva de mecanismos administrativos.
O Governo cubano exige que as Igrejas e os grupos religiosos se
registem junto do Registo de Associações do Ministério da Justiça de
modo a poderem receber visitantes estrangeiros, importar material
religioso, reunir em lugares aprovados para o culto religioso e, em
certos casos, viajar por motivos religiosos. Existem cinquenta grupos
religiosos registados mas, nos últimos anos, o Governo não reconheceu nenhum novo grupo religioso. Muitos dos cinquenta grupos reconhecidos estão ligados ao Conselho de Igrejas de Cuba (CIC), entidade
reconhecida pelo Governo.
Os que não fazem parte do dito Conselho ou que provaram ser críticos para com o Governo, foram alvo de vigilância, ameaça ou prisão.
De acordo com a organização Christian Solidarity Worldwide, mais de
trinta pessoas foram presas por esta razão. Tal é o caso do Reverendo
Robert Rodríguez, presidente da Confraternidade dos Ministros e Pastores Evangélicos, que foi preso depois de se queixar da interferência
do Governo no CIC. O Pastor Omar Gude Pérez foi, por sua vez, condenado a seis anos de prisão e à confiscação da sua residência. Antes
da sua detenção, funcionários do Governo aconselharam o pastor e a
família a pôr de parte as suas actividades religiosas. O Pastor Bernardo
de Quesada Saloman e a sua esposa, Damaris Marín, foram também
presos. Mesmo os dedicados à tradição sincretista da Santeria foram
pressionados para se juntaram à Associação Cultural Yoruba, a qual é
oficialmente reconhecida.
Apesar deste facto, notou-se que o Governo não interferiu com as actividades de outros grupos não registados, como os Baha’is, a Igreja de
Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias (Mórmones), ou os Judeus.
Além disso, as Testemunhas de Jeová e os Adventistas do Sétimo Dia
relataram uma menor perseguição e discriminação no emprego do
que em anos anteriores.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos69,9%
Agnósticos14,8%
Animistas15,3%
Cristãos
5.037.400
Católicos
6.721.000
Circunscrições
eclesiásticas
11
SUPERFÍCIE
110.861km2
POPULAÇÃO
11.204.000
REFUGIADOS
454
DESALOJADOS
---
CUbA
Variações relativas à legislação
119
CUBA
Restrições à liberdade religiosa
A perseguição não é limitada aos pastores pois, de acordo com o relatório da Comissão de Liberdade Religiosa, membros das congregações de outras igrejas não registadas têm sido abordados por funcionários do Governo que os ameaçaram com a perda dos seus empregos se não
abandonassem os seus grupos religiosos. Na realidade, outros métodos para restringir a liberdade religiosa manifestam-se nas dificuldades administrativas encontradas na obtenção de
licenças de construção para novos locais de culto ou para reparar ou ampliar os existentes. Isto
levou à criação das “igrejas residenciais”, isto é, casas especiais onde alguns grupos realizam
os seus serviços religiosos. Não obstante, desde Setembro de 2005, a lei requer que as igrejas
residenciais se registem e informem sobre as suas actividades. Não se pode levar a cabo mais
de três reuniões por semana nestas igrejas residenciais, e os cidadãos estrangeiros não podem
participar nelas sem a autorização do Governo, e não podem existir duas igrejas residenciais
da mesma confissão religiosa num raio de 2 km. Se existirem quaisquer reclamações relativas
às reuniões nestas igrejas residenciais, os presentes podem ser detidos. Por conseguinte, desde
2005, várias igrejas residenciais foram confiscadas ou destruídas. Existem também relatos de
igrejas residenciais que foram forçadas a pagar elevadas multas.
De modo semelhante, a liberdade religiosa está limitada pela definição de que todas as
publicações devem ser registadas junto do Ministério da Cultura. Não obstante, a Conferência Episcopal recusou-se a efectuar o registo, declarando que perderia o controlo sobre o
conteúdo e o formato dos textos. O aumento da pressão exercida pelo Governo através de
interrogatórios feitos por agentes estatais ou bloqueando a distribuição de materiais, resulta
no encerramento de muitas publicações. Um outro método de controlar os materiais consiste no facto de que apenas algumas empresas com autorização específica podem vender
computadores, fotocopiadoras e outro equipamento a Igrejas, e apenas ao preço oficial, o
qual é extremamente elevado. O Estado mantém o monopólio das gráficas e, em geral, as
organizações religiosas estão proibidas de aceder à Internet.
Em Novembro de 2009, o Arcebispo Claudio María Celli, presidente do Conselho Pontifício
para as Comunicações Sociais, visitou Cuba e pediu ao Governo de Raúl Castro que fosse
permitido à Igreja o acesso “normal” e não “esporádico” aos meios de comunicação, de modo
a poder levar a cabo o seu papel “de forma cabal”.
Em relação aos prisioneiros políticos, eles não têm acesso à prática da sua religião e são-lhes
frequentemente negadas as visitas por parte do clero do seu credo. As Bíblias e os rosários
são-lhes confiscados e é-lhes negado o acesso a serviços religiosos com os outros prisioneiros.
Subsiste também a discriminação no emprego contra indivíduos de religiões específicas:
não são contratados, são-lhes negadas promoções ou aumentos de salário e são convidados
a demitirem-se dos seus empregos. São especialmente excluídos de cargos no jornalismo,
na diplomacia, na polícia, no exército e nas forças de segurança. Ocorreram também desistências escolares de estudantes, membros das Testemunhas de Jeová e dos Adventistas do
Sétimo Dia, que se recusam a participar em actividades patrióticas obrigatórias aos sábados,
120
a saudar a bandeira ou a cantar o hino nacional. Como as escolas religiosas privadas são proibidas, estes estudantes não têm nenhuma outra alternativa educacional.
Em Janeiro, as “Mulheres de Branco”, as esposas dos activistas, jornalistas e figuras políticas
da oposição presos durante a “Primavera negra” de 2003, não tiveram autorização para participar numa missa na qual Cristina Kirchner iria também estar presente.
Avanços modestos
CUbA
Não obstante, houve alguns avanços modestos no que diz respeito à Igreja Católica em Cuba.
Por exemplo, em Agosto de 2009, três bispos e dois padres dos EUA fizeram, como no ano
anterior, uma visita a Cuba para promover as relações entre os dois episcopados e para canalizar ajuda depois dos furacões.
Foi autorizada a realização de um peditório nacional para o restauro do santuário de Nossa
Senhora da Caridade de El Cobre, padroeira da ilha. Os peditórios são muito pouco usuais em
Cuba, mais ainda se os fundos se destinam a edifícios religiosos.
Depois de cinquenta anos, foi levantada em Setembro a proibição de celebrar a missa nas
prisões cubanas. Até agora, a missa só podia ser celebrada em ocasiões especiais, como a
Semana Santa ou o Natal. De agora em diante, pelo contrário, a Eucaristia pode ser celebrada
uma vez por semana e numa base regular, em prisões por todo o país. Esta medida não só
beneficiará os Católicos, como irá também permitir o culto aos Evangélicos.
Tal como em 2008, a celebração da festa de Nossa Senhora da Caridade de El Cobre foi levada
a cabo em vários locais por todo o país. Além disso, foi criado para a celebração um sítio de
Internet especial, administrado pela Arquidiocese de Santiago de Cuba. O sítio ainda está
activo e estão a reunir documentos pontifícios e episódios relativos à história da celebração.
Trata-se de uma situação relevante, em primeiro lugar porque o acesso à Internet é muito
limitado em Cuba e, em segundo lugar, porque a celebração da festa de Nossa Senhora da
Caridade de El Cobre esteve proibida até 1997. Os grupos religiosos têm de ter autorização
prévia do partido Comunista para levar a cabo procissões e actividades fora dos edifícios religiosos e estas licenças não estão dependentes de nenhuma lei, mas apenas da opinião dos
funcionários envolvidos.
Pelo segundo ano consecutivo, o Arcebispo de Havana, Cardeal Jaime Ortega, teve permissão
para emitir uma mensagem na véspera de Natal através da televisão nacional cubana.
Nos arredores de Havana, está a ser construído um novo seminário, financiado pelos Caballeros de Colón (Cavaleiros de Colombo), apesar das dificuldades envolvidas na obtenção de uma
licença de construção para edifícios religiosos em Cuba. É o primeiro projecto de construção
significativo levado a cabo pela Igreja Católica nos últimos cinquenta anos.
Graças à intervenção da Conferência Episcopal, em Maio de 2010 foi aprovada uma manifestação das “Mulheres de Branco”, a qual decorreu sem incidentes nem detenções.
Face a estes avanços, em Dezembro, o Papa Bento XVI expressou a esperança de que “estes
sinais concretos de abertura para o exercício da liberdade religiosa se continuarão a multiplicar como tem acontecido nos últimos anos”.
121
DOMÍniCA
DOMÍniCA
A pequena República da Domínica (Comunidade da Domínica), no
arquipélago das Pequenas Antilhas, garante a total liberdade religiosa, especificando-a em detalhe no Artigo 9º da Constituição de
1978.
A população é quase inteiramente cristã e a maioria professa a fé
católica.
Todas as organizações religiosas têm de se registar para assim obter
benefícios fiscais e autorizações para a construção de locais de culto
e de escolas.
Os currículos das escolas públicas incluem a instrução religiosa cristã,
mas os não cristãos não são obrigados a assistir a essas aulas.
Não houve relatos relativos a violações da liberdade religiosa.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos94,4%
Outros5,6%
Cristãos
70.152
Católicos
43.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
751km2
POPULAÇÃO
76.500
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
---
122
EL SALVADOR
Alterações relativas à legislação
No período sujeito a observação, não se registou nenhuma alteração
relativamente à anterior legislação sobre a liberdade religiosa.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Relações entre a Igreja Católica e o Estado
Cristãos96,5%
Outros3,5%
Cristãos
6.833.952
Católicos
5.767.000
Circunscrições
eclesiásticas
9
SUPERFÍCIE
21.041km2
POPULAÇÃO
6.194.000
REFUGIADOS
30
DESALOJADOS
---
123
EL SALVADOR
A Igreja referiu-se, em diversas oportunidades, à possibilidade de que
se legisle sobre o casamento homossexual em El Salvador. No ano de
2009, não foi aprovada a alteração apresentada em 2006 para estabelecer constitucionalmente que o casamento é uma união entre
um homem e uma mulher, para impedir que, através de uma simples
reforma jurídica, possam ser aprovados os casamentos entre pessoas
do mesmo sexo. Por outro lado, também não foi aceite abrir o debate
sobre a criação do casamento homossexual.
Persistem as dúvidas relativamente a um decreto emitido pelo
Governo que proíbe à administração pública toda a discriminação
por motivos de orientação sexual e identidade de género, pois alguns
grupos sustentam que através desta norma se poderia consentir o
casamento homossexual. Perante isto, Vanda Pignato, primeira-dama
e secretária de Estado para a Inclusão Social, declarou que as duas
coisas nada têm que ver uma com a outra e que “Não estamos a promover nenhuma conduta, não estamos a promover o aborto. Isso não
é obrigação do Estado. A obrigação do Estado é a de defender todos os
seus cidadãos e os seus direitos contra a discriminação”.
EQUADOR
EQUADOR
Variações relativas à legislação
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Em Março de 2010, a Sub-Secretaria para os Assuntos Jurídicos do
Ministério do Governo, Polícia e Assuntos Religiosos apresentou um
projecto de lei sobre “Igualdade e Liberdade Religiosa”, no qual participaram cerca de 2.400 organizações religiosas registadas no país.
A intenção do Ministério é actualizar a normativa vigente (datada de
1973) para regulamentar as relações entre o Estado e as várias entidades religiosas, mas de uma forma consentânea com a realidade das
mesmas. O projecto de lei começou a ser debatido em Junho de 2009
e inclui quarenta e seis artigos, contidos em seis capítulos, que fazem
referência a normas gerais, princípios e direitos, regimes jurídicos e
tributários, infracções, sanções e procedimentos, incluindo ainda as
causas para a sua dissolução, liquidação e extinção. Na altura da sua
apresentação, contava com o apoio de mais de cinquenta legisladores.
Cristãos97%
Outros3%
Cristãos
13.088.160
Católicos
12.615.000
Relações entre a Igreja Católica e o Estado
Em Novembro, o ex-presidente da Conferência Episcopal do Equador, Mario Ruiz, teve de se insurgir em defesa da Igreja, bem como
do papel social que ela desempenha, quando, numa conferência de
imprensa dada em Londres pelo presidente da República, Rafael Correa, sob o título “A minha experiência enquanto cristão de esquerda
num mundo laico”, ele declarou que a Igreja na América “coloca maior
ênfase em questões de moralidade individual e de ritual” e “não pode
permanecer indiferente face às tremendas injustiças sociais que se
vivem na América Latina.”
Circunscrições
eclesiásticas
24
SUPERFÍCIE
283.561km2
POPULAÇÃO
13.775.000
REFUGIADOS
116.557
DESALOJADOS
---
124
Em relação à liberdade religiosa, nos EUA, paradoxalmente, são as leis
fiscais federais que colocam um obstáculo ao direito à liberdade de
expressão, porque elas implicam restrições às intervenções nas actividades políticas por parte de comunidades que beneficiam de isenções fiscais.
A denominada “lei do casamento gay”, aprovada em Dezembro de
2009 pela Assembleia Municipal de Washington DC, fez com que no
dia 1 de Fevereiro de 2010 a Arquidiocese de Washington DC encerrasse as suas actividades de apoio à adopção e a famílias de acolhimento, para não se ver forçada a entregar crianças para adopção a
casais homossexuais.
Por detrás de tudo isto, e gravemente prejudicial a uma interpretação correcta da lei, estão os contínuos abusos de poder por parte dos
tribunais que tendem a distorcer o texto constitucional e a contradizer a doutrina jurídica (aceite) que originalmente via a Constituição como estabelecedora de uma barreira protectora em redor da
liberdade americana, vista como uma liberdade positiva, baseada na
responsabilidade do indivíduo humano, na sua autonomia e na sua
capacidade para criar as condições para o bem-estar e para a liberdade de todos.
A opinião pública esteve também indubitavelmente dividida, durante
o debate de 2009 sobre a reforma dos serviços de saúde, sobre a
questão da objecção de consciência, tanto por parte de cientistas em
relação à investigação sobre as células estaminais e a sua utilização,
como por parte dos médicos e pessoal médico em relação a cirurgias
que envolvam abortos a pedido.
Esta necessidade foi representada em particular pelos bispos católicos americanos, que pediram com veemência que o aborto não fosse
financiado usando fundos públicos. Tal oposição inflexível e a firme
obediência aos ensinamentos da Igreja em relação a questões morais
podem estar na origem dos repetidos ataques dirigidos ao mundo
católico pelos meios de comunicação social, que deram ênfase a
casos de abuso sexual perpetrados no passado por vários padres na
América.
Muitas controvérsias privadas relativas à religião terminaram em
tribunal, principalmente casos que envolvem discriminação contra
minorias. Porém, um número crescente destes casos teve recentemente que ver com reclamações por parte de pais que protestam
contra a não existência da instrução religiosa no sistema educativo
público. No estado de Massachusetts, várias famílias levaram escolas
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos81,2%
Agnósticos12,6%
Outros6,2%
Cristãos
253.503.712
Católicos
68.621.000
Circunscrições
eclesiásticas
194
SUPERFÍCIE
9.372.614km2
POPULAÇÃO
317.641.000
REFUGIADOS
275.461
DESALOJADOS
---
125
ESTADOS UniDOS DA AMÉRiCA
ESTADOS UniDOS DA AMÉRiCA
ESTADOS UniDOS DA AMÉRiCA
a tribunal, por acreditarem que elas estavam a ensinar os seus filhos a seguirem estilos de
vida que eles, como cristãos, consideram imorais.
Militantes do movimento gay invadem ocasionalmente igrejas cristãs para, de uma forma
provocante e violenta, impor os seus pontos de vista. Um destes incidentes aconteceu em
Novembro de 2008 em Lansing, no Michigan, durante uma missa protestante evangélica,
quando um grupo de cerca de trinta pessoas, descrevendo-se como anarquistas homossexuais, começou a gritar blasfémias. Em Janeiro de 2009, uma igreja católica em São Francisco
foi danificada depois de um referendo estadual ter rejeitado uma lei que permitiria o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
126
GRAnADA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos96,6%
Outros3,4%
Cristãos
97.000
Católicos
46.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
344km2
POPULAÇÃO
104.000
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
---
127
GRAnADA
O Artigo 9º da Constituição de 1973, a qual se encontra em vigor
desde 7 de Fevereiro de 1974, tendo sido emendada em 1989, garante
completamente o respeito pela liberdade de consciência e de culto.
As autoridades não interferem de nenhuma forma com a vida religiosa dos cidadãos.
Não é obrigatório aos grupos religiosos registarem-se; no entanto, os
grupos que o fazem desfrutam de isenções tributárias relativamente
às suas propriedades e actividades.
Não existe nenhum relato de violações dos direitos garantidos pela
Constituição e protegidos pela lei.
GUATEMALA
GUATEMALA
Alterações relativas à legislação
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
No período sujeito a observação, não se registou nenhuma alteração
em relação à anterior legislação.
Relações entre a Igreja Católica e o Estado
Em Novembro de 2009, o Arcebispo da Guatemala, Cardeal Rodolfo
Quezada Toruño, anunciou que iria apresentar perante o Tribunal
Constitucional um recurso contra o “Regulamento da Lei de Acesso
Universal e Equitativo aos serviços de planeamento familiar e da sua
integração no programa de saúde reprodutiva”, porque viola o direito
dos pais a educar. A norma, que força as escolas, a partir de Junho de
2010, a proporcionar educação sexual, sofre de irregularidades conceituais, inconstitucionalidades evidentes e ilegalidades de procedimento, isto de acordo com a Comissão Pastoral Educacional da Conferência Episcopal da Guatemala.
O Padre Lorenzo Rosebaugh foi assassinado em Maio de 2009, depois
de ser assaltado por alguns indivíduos que dispararam sobre ele,
tendo ficado ferido também um outro sacerdote.
Cristãos97,4%
Outros2,6%
Cristãos
12.720.540
Católicos
11.104.000
Circunscrições
eclesiásticas
15
SUPERFÍCIE
108.889km2
POPULAÇÃO
14,377.000
REFUGIADOS
131
DESALOJADOS
---
128
HAiTi
Alterações no que respeita à legislação
No período de tempo considerado não houve alterações relativamente à legislação anterior.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Situação após o terramoto
Cristãos95,3%
Espiritistas2,1%
Outros2,6%
Cristãos
8.276.162
Católicos
7.097.000
Circunscrições
eclesiásticas
11
SUPERFÍCIE
27.750km2
POPULAÇÃO
10.188.000
REFUGIADOS
3
DESALOJADOS
---
129
HAiTi
Destaca-se a ajuda prestada pelos fiéis, que participaram intensamente através das organizações religiosas existentes na ilha e no
estrangeiro. Além de contributos económicos, prestou-se serviço através das paróquias católicas locais ou de instituições como a Ajuda à
Igreja que Sofre, a Caritas e a América Solidária. Além disso, constitui
uma oportunidade de colaboração conjunta na prestação da chamada ajuda humanitária, proveniente de organizações religiosas,
como aconteceu entre mórmones e muçulmanos (respectivamente:
Humanitarian Services Emergency Response e Islamic Relief USA).
Em Fevereiro de 2010, contavam-se entre as vítimas um total de quarenta e sete religiosos, bem como inúmeros seminaristas feridos e
edifícios destruídos.
HOnDURAS
HOnDURAS
Alterações relativas à legislação
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
No período sujeito a observação, não se registaram quaisquer alterações no que diz respeito à legislação anterior.
Relações entre a Igreja Católica e o Estado
Cristãos96,7%
Outros3,3%
Cristãos
7.015.040
Católicos
6.187.000
Circunscrições
eclesiásticas
8
SUPERFÍCIE
112.088km2
POPULAÇÃO
7.616.000
REFUGIADOS
19
DESALOJADOS
---
130
A situação política das Honduras durante o ano de 2009 e a situação de incerteza no seguimento da deposição do presidente Manuel
Zelaya e da realização de novas eleições, atraíram a atenção internacional para o país.
Nesta conjuntura, a Igreja constituiu-se como intermediária para
tentar garantir que a crise política não se tornasse mais violenta.
Deste modo, num comunicado da Conferência Episcopal, o Arcebispo de Tegucigalpa, Cardeal Oscar Rodríguez Maradiaga, solicitou
inicialmente a Manuel Zelaya que não regressasse ao país para evitar o derramamento de sangue. Este pedido valeu-lhe críticas, por
uma suposta aliança com o novo Governo de Micheletti, e o apelido
de “cardeal golpista”. Apesar de a autoridade eclesiástica ter manifestado que considera razoáveis as considerações jurídicas que levaram ao fim do Governo do presidente Zelaya, reprova a sua expulsão
para a Costa Rica, reiterando que a Igreja não pode tomar partido por
ninguém. Os partidários de Manuel Zelaya associaram a Igreja a um
poder defensor do Governo do anterior presidente do Senado. A Conferência Episcopal das Honduras emitiu um comunicado onde manifesta o seu apoio a um possível acordo político que daria ao país as
condições institucionais para enfrentar os seus problemas.
Entretanto, o Padre Víctor Ruiz, sacerdote da igreja onde se encontra a
estátua da Virgem de Suyapa (padroeira das Honduras), recebeu quatro ameaças de morte, e por isso a imagem foi retirada do templo.
Neste período, registaram-se disparos contra um seminário em Tegucigalpa, feitos a partir de um carro em movimento, disparos esses que
atingiram as paredes sem ferir qualquer pessoa.
Em Novembro, foi sequestrado e assassinado o Padre guatemalteco
Miguel Ángel Hernández.
JAMAiCA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Religious adherents
Cristãos84,6%
Agnósticos4,2%
Espiritistas10,2%
Outros1%
Cristãos
2.242.800
Católicos
116.000
Circunscrições
eclesiásticas
3
SUPERFÍCIE
10.991km2
POPULAÇÃO
2.730.000
REFUGIADOS
26
DESALOJADOS
---
131
JAMAiCA
As garantias da liberdade religiosa encontram-se definidas no Artigo
21º da Constituição de 1962, emendada em 1994. Este artigo descreve
claramente e em pormenor o direito à liberdade de consciência e de
culto, tanto para indivíduos como para associações. A Constituição
garante também o direito à instrução religiosa e à formação do pessoal religioso.
O registo não é obrigatório para os grupos religiosos. No entanto,
depois da verificação por parte das autoridades estatais, o registo
proporciona isenções tributárias para as propriedades e actividades
de um grupo.
Os missionários estrangeiros são livres de entrar neste país.
As condições práticas para exercer a liberdade religiosa obedecem a
tudo o que está estabelecido pela Constituição e não há relatos de
violações deste direito por parte das autoridades ou de indivíduos.
MÉXiCO
MÉXiCO
Alterações relativas à legislação
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos95,9%
Agnósticos2,7%
Outros1,4%
Cristãos
100.989.810
Católicos
98.033.000
Circunscrições
eclesiásticas
89
SUPERFÍCIE
1.958.201km2
POPULAÇÃO
110.645.000
REFUGIADOS
1.235
DESALOJADOS
5.500-8.000
132
No mês de Fevereiro de 2010, a Câmara de Deputados aprovou, quase
por unanimidade, a emenda à Constituição, que eleva à escala constitucional o carácter secular do estado mexicano e garante a ordem
política, com a liberdade para elaborar normas colectivas, sem que
alguma religião ou convicção particular domine o poder civil e as instituições públicas. A proposta modifica os Artigos 40º, 108º e 130º da
Constituição, que tratam das características do Estado mexicano, das
responsabilidades dos funcionários públicos e da diferença das jurisdições para os ministros religiosos.
De acordo com os promotores da iniciativa, procura-se “abrandar o
activismo político da hierarquia católica”; e até Porfirio Muñoz Lêdo,
um deputado de esquerda, declarou que esta acção “é apenas uma
primeira resposta à insolência com que se comportou a hierarquia
eclesiástica católica”, ao envolver-se em política e subordinando o
poder do Estado.
O ex-ministro do Supremo Tribunal de Justiça, Juventino Castro e Castro, declarou que “em pleno século XXI, é necessário que o México siga
três princípios constitucionais: respeito pela liberdade de consciência,
a autonomia da esfera política em relação às normas religiosas, e a
não discriminação directa ou indirecta dos seres humanos”.
A Igreja Católica advertiu que esta reforma, além de desnecessária,
cria uma atmosfera de suspeita e de perseguição à liberdade religiosa.
O Arcebispo de León, Monsenhor José Guadalupe Martin Rábago,
sublinhou que “a Igreja Católica não teme a laicidade do Estado, mais
ainda, se bem se entende, a Igreja promove o carácter laico do Estado
enquanto o correcto caminho jurídico para o reconhecimento em plenitude do direito humano à liberdade religiosa”. Por seu turno, o Arcebispo de Guadalajara, Cardeal Juan Sandoval Íñiguez, declarou que a
reforma é “muito lamentável, porque vai contra o princípio democrático da igualdade de todos os mexicanos e porque é um retrocesso;
remove liberdades e igualdades”.
O secretário executivo das relações institucionais da Conferência
Episcopal Mexicana, Padre Manuel Corral, afirmou que “quanto mais
laico é o Estado, melhor é para a sociedade”; portanto, se a reforma
“não tem a intenção de limitar a liberdade e os direitos do indivíduo,
(...) ela é bem-vinda; mas se procura amordaçar, tal seria lamentável e
triste, seria o voltar a tempos antigos”.
Depois da sua aprovação na Câmara de Deputados, encontra-se pendente a aguardar a aprovação por parte da Câmara de Senadores.
Relações entre a Igreja Católica e o Estado
MÉXICO
A luta contra o tráfico de droga custou a vida a vários polícias e, com o intento de capturar os
traficantes, aconteceram episódios reprováveis, como a irrupção, sem mandato e sem advertência prévia, de cerca de 200 polícias em plena missa numa igreja de Apatzingán (Michoacán). Depois de fecharem as portas, as mulheres e as crianças foram libertadas, para de
imediato deterem e registarem os homens, esperando capturar o chefe máximo do Cartel “La
Familia”. A Conferência Episcopal Mexicana considerou tal acção uma violenta falta de respeito e declarou que não se pode interromper um acto sagrado com base na eventualidade
de deter por essa via os narcotraficantes.
A mesma Igreja Católica tem sofrido a violência dos cartéis: assassinaram o sacerdote Habacuc Hernández Benítez e os seminaristas Eduardo Oregon Benítez e Silvestre González Cambrón, em Arcelia, ficando o seu veículo cravado com pelo menos vinte balas. Em Fevereiro de
2010, o sacerdote do templo da Assunção do Sacrário Metropolitano, José Luis Parra Puerto,
morreu assassinado depois de lhe ter sido roubada uma camioneta na qual viajava numa das
zonas residenciais na parte Oeste da Cidade do México.
A tudo isto acrescentam-se as ameaças de morte recebidas pelas autoridades eclesiásticas
ou os sequestros de que foram vítimas. No seguimento destes eventos de violência perpetrados contra os sacerdotes, um estudo do Centro Multimédia Católico, dependente do episcopado mexicano, revelou que o México seria o segundo lugar mais perigoso para exercer o
sacerdócio na América Latina, logo a seguir à Colômbia.
A juntar a tudo isto, são ainda de registar os actos de delinquência comum, já que, de acordo
com dados da Interpol, os templos e as obras de arte sacra no México são os mais saqueados
na América Latina. Mas aconteceram também outras intervenções que limitam a liberdade
da Igreja Católica, como sucedeu em San Sebastián Tutla. Um grupo de cerca de cinquenta
pessoas entrou na catedral enquanto se celebrava a missa de domingo, interrompendo a
cerimónia com faixas e posters. O grupo era liderado pelas autoridades municipais que querem administrar a igreja, o que levou o bispo a denunciar que, daquele modo, não é respeitada a separação entre a Igreja e o Estado, e que o cuidado do templo paroquial é da responsabilidade da Igreja.
Num outro âmbito, surgiu uma controvérsia por via da distribuição obrigatória nas escolas
de folhetos nacionais de saúde elaborados pelo Governo, com informação sexual para educar
os alunos entre os 10 e os 19 anos de idade, sem qualquer distinção relativamente à idade. Na
sua elaboração, os pais não foram consultados em relação ao conteúdo e questiona-se que
um dos motos seja “Se tiveste uma relação sexual não protegida e já passaram mais de 72
horas, podes pedir contracepção de emergência. Protege-te, é o teu direito!”. A Conferência
Episcopal Mexicana pediu ao Ministério da Saúde que retire o folheto entregue, e que se faça
um novo, num processo em que participem as associações de pais.
Por último, houve uma grande polémica em torno da reforma do Código Civil da Cidade do
México, que aprovou o casamento homossexual, ratificado em Dezembro pela Assembleia
133
MÉXICO
Legislativa da Cidade do México (com trinta e nove votos a favor, vinte contra e cinco abstenções). A definição de casamento foi alterada para “união livre de duas pessoas que desejam
criar uma vida em comum, onde ambos procuram respeito, igualdade e ajuda mútua”. A nova
lei concede aos casais em coabitação direitos e obrigações recíprocas se têm um filho ou ao
cumprir dois anos de vida em comum; e permite a adopção por parte de cônjuges ou coabitantes, heterossexuais ou homossexuais. Representantes da Igreja Católica qualificaram a
modificação de “contrária à moral e aos direitos das crianças”. A Igreja já tinha dado o alerta
em relação ao partido da esquerda, Partido Revolucionário Democrático (PRD) que governa a
Cidade do México, depois da legalização do aborto até às doze semanas de gestação.
No mesmo sentido, uma deputada do PRD de Jalisco está a preparar uma iniciativa semelhante para apresentar ao Plenário do Congresso Local a 28 de Maio de 2010. A proposta
exclui a possibilidade de adopção e não usa a palavra “casamento”. Esta deputada reuniu-se
com o Cardeal Juan Sandoval Íñiguez para o informar sobre o projecto.
Comunidades Cristãs não Católicas / Outras Religiões
A violência contra os sacerdotes não se circunscreve apenas aos Católicos. Em Julho de 2009,
membros da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias foram assassinados por um
traficante de droga, chefe do cartel de Juárez.
134
niCARÁGUA
Os limites à liberdade religiosa manifestaram-se no ambiente político, com a ocorrência de actos hostis para com sacerdotes.
No seguimento das eleições autárquicas de Novembro de 2008, foram
lançadas diversas acusações de fraude eleitoral, a respeito das quais o
Arcebispo de Manágua, Monsenhor Leopoldo José Brenes, declarou que
muitos sacerdotes não tinham podido votar porque as mesas de voto
fecharam cerca de seis horas antes do que está estabelecido na lei, facto
que teria deteriorado as relações entre a Igreja e a Frente Sandinista.
Além disso, durante o último ano, alguns bispos receberam ameaças,
como as que foram feitas através de correio electrónico para uma estação de rádio católica, contra o vice-presidente da Conferência Episcopal, Monsenhor Juan Abelardo Mata, que tem sido um crítico da Frente
Sandinista. Foram também ameaçados o Bispo de Granada, Monsenhor Bernardo Hombach, e o Bispo de Chontales, Monsenhor René Sándigo, os quais criticaram publicamente as acções violentas de repressão
contra opositores políticos da Frente Sandinista. Foram mesmo feitas
acusações contra as autoridades eclesiásticas, como quando o Provedor
dos Direitos Humanos, Omar Cabezas, acusou os bispos Monsenhor
Mata e Monsenhor Hombach, de serem agentes da CIA.
Alguns sacerdotes foram também alvo de calúnias, como aquando da
difusão de um documento assinado pelo assessor do presidente Ortega,
Orlando Núñez, onde se transcrevia uma conversa entre Ortega e o sacerdote espanhol Padre Gregorio Raya. No documento, o sacerdote teria criticado os bispos e padres nicaraguenses e teria declarado que o Vaticano
consideraria a Igreja Nicaraguense como uma das mais corruptas, e que
as autoridades eclesiásticas haviam desviado, para a organização de festas sumptuosas, dezenas de milhares de dólares recebidos em donativos.
De acordo com o documento, cujo conteúdo foi negado pelo Padre Gregorio Raya, o sacerdote teria supostamente admitido ter estado numa
discoteca privada na Semana Santa juntamente com outros dezassete
padres. O documento teria sido enviado do correio electrónico do Governo
pelo que a Conferência Episcopal exigiu explicações. Tal pedido foi recusado com o argumento de que terá ocorrido sabotagem no sistema de
segurança do correio electrónico do Governo, frustrando assim as tentativas de organização de um encontro entre representantes da Conferência
Episcopal e do Governo nicaraguense para tratar deste assunto.
Recentemente foram atribuídas as concessões necessárias para a radiodifusão no país, tendo sido preferidos os familiares do presidente em
prejuízo de organizações religiosas que também as tinham solicitado.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos96,2%
Outros3,8%
Cristãos
5.325.390
Católicos
5.052.000
Circunscrições
eclesiásticas
8
SUPERFÍCIE
130.000km2
POPULAÇÃO
5.822.000
REFUGIADOS
120
DESALOJADOS
---
135
niCARÁGUA
Relações entre a Igreja Católica e o Estado
PAnAMÁ
PAnAMÁ
O Artigo 35º da Constituição de 1972, várias vezes emendado até 2004,
reconhece a total liberdade religiosa, contanto que sejam respeitadas
a moralidade cristã e a ordem pública. Este mesmo artigo reconhece
o Catolicismo como a religião professada pela maioria dos cidadãos,
embora a ela não sejam associados privilégios específicos.
A liberdade religiosa é efectivamente respeitada. As associações religiosas possuem estatuto jurídico e por conseguinte são autónomas e
podem possuir património.
A permanência de missionários estrangeiros no país é permitida com
um visto que é válido durante três meses, mas que pode, no entanto,
ser renovado.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos90,5%
Agnósticos4,3%
Outros5,2%
Cristãos
2.892.960
Católicos
2.878.000
Circunscrições
eclesiásticas
8
SUPERFÍCIE
75.517km2
POPULAÇÃO
3.508.000
REFUGIADOS
16.923
DESALOJADOS
---
136
PARAGUAi
Comunidades Cristianas não-Católicas / Outras Religiões
Em Outubro, o presidente do Paraguai, Fernando Lugo, referiu-se à
importância da liberdade religiosa, ao dar início às obras do Centro
Cultural Islâmico sem fins lucrativos em Assunção. Nessa ocasião,
manifestou a sua admiração pelo mundo islâmico “sobretudo pela
sua perseverança desde há catorze séculos na difusão da doutrina
que professa e que hoje se estabelece oficialmente no Paraguai com
a construção de um centro cultural”.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos95,5%
Animistas2%
Outros2,5%
Cristãos
5.990.964
Católicos
5.821.000
Circunscrições
eclesiásticas
15
SUPERFÍCIE
406.752km2
POPULAÇÃO
6.460.000
REFUGIADOS
89
DESALOJADOS
---
137
PARAGUAi
No período de tempo considerado não houve alterações relativamente à legislação anterior.
PERU
PERU
Variações relativas à legislação
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos96,5%
Outros3,5%
Cristãos
27.536.760
Católicos
25.337.000
Circunscrições
eclesiásticas
45
SUPERFÍCIE
1.285.216km2
POPULAÇÃO
29.496.000
REFUGIADOS
1.108
DESALOJADOS
150.000
138
A Constituição peruana assegura a liberdade religiosa e reconhece a
Igreja Católica como um elemento importante na formação histórica,
cultural e moral do Peru (Artigo 50º). Além disso, o Acordo entre a
República do Peru e a Santa Sé (1980) sancionou o ensino da religião
católica enquanto disciplina regular nas escolas estatais, a manutenção de capelães para ajuda espiritual nos hospitais, prisões e instalações da polícia e militares, e um regime de isenções fiscais e de
subsídios pessoais pagos pelo Estado. As minorias religiosas, em particular os evangélicos, consideram-se discriminadas por causa destas
diferenças, e inventaram o slogan “Iguais perante Deus e perante a
lei”. Além disso, embora eles continuem a constituir uma minoria em
termos de percentagem, existem no Peru 2.600.000 de pessoas que
se identificam actualmente como protestantes ou evangélicos, representando 12,5% da população com mais de 12 anos de idade.
Decorre actualmente um debate no Congresso da República relativo
à “Lei da Liberdade Religiosa e da Igualdade”, com origem em duas
propostas que procuram ampliar o direito à liberdade religiosa estabelecida no Artigo 2º, Parágrafo 3º, da Constituição, assim como modificar o Artigo 50º, relativo às formas de cooperação do Estado com as
entidades religiosas que não a Igreja Católica.
Em relação ao referido texto, o Presidente da Conferência Episcopal,
Arcebispo Héctor Miguel Cabrejos Vidarte, OFM, fez uma observação interessante: “Em relação à pretensão de usar o termo igualdade
nos assuntos religiosos, isto antes da elaboração de qualquer regulamento, é importante sublinhar o facto de que as religiões não são
iguais. O Cristianismo, o Judaísmo, o Islão, não são iguais. O que não
significa atribuir um menor valor a qualquer uma delas, mas antes
definir objectivamente a natureza de cada religião. As raízes sociais
de uma confissão de fé são importantes. A Igreja Católica conta com
mais de 2000 anos de existência e, no Peru, a sua participação na
formação histórica, cultural e moral da sociedade actual é inquestionável, algo que necessariamente a diferencia na sua relação com o
Estado, em comparação com as relações que este pode estabelecer
com outras confissões. Mais ainda, no estabelecimento de relações
entre o Estado e as outras confissões religiosas, é preciso levar em
conta a estabilidade jurídica de cada uma delas, lidando ao mesmo
tempo com a grande diversidade entre as religiões”.
Além disso, a proposta de lei propõe que as crianças em idade escolar que professam outra
religião possam ser isentas de frequentarem as aulas de educação religiosa católica, algo que
é actualmente obrigatório, e que todas as pessoas possam receber ajuda espiritual por parte
de representantes da sua própria fé em instalações de assistência médica, das forças armadas e da polícia, e centros penitenciários. Além disso, as isenções fiscais seriam alargadas a
todas as entidades religiosas.
Em Dezembro de 2009, a Comissão da Constituição e Regulação aprovou unanimemente a
iniciativa (que partiu de seis dos seus dezasseis membros), passando o debate para o nível
Plenário do Congresso. Em Fevereiro de 2010, foi colocada na agenda da Comissão Permanente, a qual pela primeira vez discutiu assuntos como a objecção de consciência e o âmbito
da lei e, como consequência, um congressista apresentou um texto alternativo. Agora o
debate irá decorrer perante a comissão plenária.
Relações entre o Estado e a Igreja Católica
PERu
Além do debate sobre a proposta de lei sobre a “Liberdade Religiosa e a Igualdade”, outro
assunto que incitou a controvérsia diz respeito à descriminalização do aborto. A Comissão
de Revisão do Código Penal decidiu em Outubro modificar os artigos que punem o aborto e
fundir o Artigo 119º, sobre o aborto terapêutico, já em vigor, com o Artigo 120º, sobre o aborto
eugénico e o aborto no seguimento de violação. Não obstante, o aborto terapêutico não é
aplicável porque não há nenhum protocolo médico ou procedimento que permita a sua prática. Uma das medidas que estão a ser debatidas é precisamente a publicação deste regulamento. A Igreja Católica pronunciou-se abertamente contra a descriminalização do aborto
em qualquer circunstância e expressou esta opinião em conferências de imprensa, pedindo
aos políticos e ao povo em geral para protestarem publicamente contra esta emenda ao
Código Penal e para defenderem a vida, sempre e em qualquer circunstância. O Ministério da
Justiça peruano, pela sua parte, pediu também à comissão para reconsiderar a sua decisão. O
ministro da Justiça, Aurélio Pastor, enfatizou que a posição do Ministério é a favor da vida e
embora os argumentos médicos do Ministério da Saúde a favor da descriminalização sejam
razoáveis, estão em conflito com a lei.
Um dos casos de aborto eugénico mais citados na imprensa é o da Karen Llantoy que deu à
luz em 2001, apesar do facto de ter querido terminar a gravidez de uma menina com anencefalia (ausência parcial do encéfalo e da calota craniana) que morreu alguns dias após o
nascimento. Em 2005, este protesto chegou ao mais alto nível, à Comissão de Direitos Humanos da ONU, que se pronunciou a favor da queixosa e declarou que negar o acesso ao aborto
legal era uma violação dos direitos humanos da mulher e que o Estado peruano a deveria
indemnizar.
Também na área do direito à vida, o Tribunal Constitucional, numa decisão do dia 16 de Outubro de 2009, recebeu um requerimento contra a política de distribuição gratuita e pública da
denominada pílula do dia seguinte. Além disso, ordenou aos laboratórios que informassem
os consumidores de que esta pílula pode inibir a implantação do ovo fertilizado.
139
PERu
Não obstante, o Ministério da Saúde, por meio de uma resolução de 2010, continuou com a
distribuição da pílula, indicando que não haveria nenhum problema em vendê-la. A Conferência Episcopal, que se opôs fortemente à medida, através da declaração “O Peru defende
a vida!”, denunciou que a distribuição da pílula é inconstitucional e acusou o Ministério da
Saúde de desrespeito pelo processo legal.
Em relação a este mesmo assunto, existe um debate actualmente sobre a “Lei Geral da Saúde
Sexual e Reprodutiva”, que se propõe incorporar um parágrafo no Artigo 4º da Lei Geral da
Saúde, autorizando aos adolescentes o acesso aos serviços de saúde com o objectivo de receberem a atenção total sobre saúde sexual e reprodutiva, com ênfase na SIDA e noutras doenças sexualmente transmitidas.
A defesa do ambiente por parte da Igreja Católica nem sempre foi bem recebida. Por exemplo, de acordo com um estudo realizado pelo Instituto Blacksmith, a cidade peruana de Oroya
é o sexto lugar mais poluído no mundo, estimando-se que 99% das crianças que ali vivem
possuem elevados níveis de chumbo no sangue. O nível de poluição é atribuído à fábrica
mineira que funciona perto da cidade desde 1922. O Monsenhor Pedro Barretto Jimeno, Arcebispo de Huancayo, tem referido continuamente que a empresa não está a obedecer às exigências ambientais definidas no Plano de Aperfeiçoamento e Administração Ambiental e
criou uma obra pastoral relacionada com o direito dos indivíduos viverem num ambiente
saudável. Como resultado, os sindicatos da empresa mineira ameaçaram-no em várias ocasiões; emitiram um comunicado oficial no qual advertem o Monsenhor Barreto de que ele
“sofrerá as consequências”; queimaram um caixão com o seu nome no pátio da fundação; e
contactaram o arcebispo pelo telefone, advertindo-o de uma suposta ameaça à sua vida que
iria ter lugar no dia seguinte, durante a celebração da Eucaristia. Apesar de tudo isto, o Plano
de Gestão da Empresa foi prolongado pelo Congresso por mais trinta meses.
O P. Marco Arana, adepto da teologia da libertação, aspira a ser um candidato nas eleições
presidenciais de 2010. Para este fim, ele fundou o partido esquerdista “Terra e Liberdade”. O
Cardeal Juan Luis Cipriani, Arcebispo de Lima, pediu-lhe que deixasse o sacerdócio se decidir
dedicar-se à política. Arana declarou que apenas responde perante o Bispo de Cajamarca.
140
REPÚbLiCA DOMiniCAnA
Em Outubro de 2008, o Supremo Tribunal de Justiça declarou que a
Concordata de 1954 entre o Estado Dominicano e a Santa Sé está em
conformidade com a Constituição e rejeitou um pedido de inconstitucionalidade. Entre outros temas, a resolução defende que a disposição constitucional que estabelece que “A religião Católica, Apostólica,
Romana, continua a ser a religião da Nação Dominicana”, não impede
o exercício de outras religiões no país, nem tornam o Estado confessional e, desta forma, não restringe a liberdade religiosa dos outros
crentes.
Posteriormente, foi apresentada uma proposta à Assembleia Nacional
(Constituinte) a fim de incluir que todas as Igrejas registadas no país
poderiam celebrar casamentos com efeitos civis semelhantes à Igreja
Católica. Essa proposta foi rejeitada em Junho de 2009 pela Assembleia Revisora. Como consequência, membros de organizações evangélicas denunciaram que esta situação era uma prova de tratamento
desigual contrário à Constituição, indicando que iriam apresentar o
assunto a organizações internacionais e acusar a Igreja Católica de
interferir nas decisões parlamentares.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos95%
Espiritistas2,2%
Outros2,8%
Cristãos
8.967.840
Católicos
8.490.000
Circunscrições
eclesiásticas
12
SUPERFÍCIE
48.511km2
POPULAÇÃO
10.225.000
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
---
141
REPÚbLiCA DOMiniCAnA
Variações relativas à legislação
STA. LÚCiA
STA. LÚCiA
Esta ilha das Pequenas Antilhas é membro da Comunidade Britânica
(Commonwealth). A sua Constituição data de 1979, ano no qual o país
se tornou independente, e garante a total liberdade religiosa no seu
Artigo 9º.
A religião dominante é o Cristianismo, principalmente na vertente
do Catolicismo. As religiões não cristãs, como o Islamismo e o Rastafarianismo, têm muito poucos seguidores e estes são derivados da
imigração.
Não existe nenhum relato de violação da liberdade religiosa ou de
eventos que envolvam intolerância.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos95,9%
Outros4,1%
Cristãos
152.799
Católicos
106.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
616km2
POPULAÇÃO
174.000
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
---
142
SURinAME
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos51%
Agnósticos4,8%
Muçulmanos15,9%
Hindus20,4%
Animistas2,1%
Espiritistas3%
Outros2,8%
Cristãos
255.024
Católicos
128.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
163.820km2
POPULAÇÃO
524.000
REFUGIADOS
1
DESALOJADOS
---
143
SURinAME
Esta ex-colónia holandesa, conhecida então como Guiana Holandesa,
reflecte a sua anterior condição da sua composição étnica e religiosa.
De facto, existem no Suriname grupos étnicos originários de várias
áreas das anteriores colónias holandesas, tais como indianos, indonésios, etc.
O Artigo 18º da Constituição da República do Suriname, datada de
1987, declara que cada indivíduo tem o direito à liberdade de culto e
de convicção religiosa, sem providenciar detalhes adicionais.
Não há relatos que indiquem eventos particulares relacionados com
o livre exercício da liberdade religiosa.
Os feriados nacionais respeitam o tecido social variado e multiétnico.
Na realidade, entre os feriados religiosos contam-se as datas cristãs
Sexta-feira Santa, Segunda-feira de Páscoa e o Natal, assim como o
aniversário islâmico do nascimento do profeta Maomé e a festividade
hindu da Primavera, Holi (ou Phagwa).
S. KiTTS E nEViS
S. KiTTS E nEViS
Este pequeno estado, que faz parte da Comunidade Britânica (Commonwealth), consiste em três pequenas ilhas das Pequenas Antilhas.
A Constituição de 1993 garante a total liberdade religiosa no seu
Artigo 11º e define em detalhe tanto os direitos dos indivíduos como
os dos grupos religiosos.
Não existe nenhum relato respeitante à interferência pelas autoridades na vida dos grupos religiosos, ou sobre qualquer episódio de
intolerância.
O registo não é obrigatório.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos94,6%
Outros5,4%
Cristãos
43.608
Católicos
5.000
Circunscrições
eclesiásticas
--SUPERFÍCIE
261km2
POPULAÇÃO
52.400
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
---
144
S. VinCEnT E GREnADinES
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos88,7%
Agnósticos2,5%
Hindus3,4%
Outros5,4%
Cristãos
105.138
Católicos
15.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
388km2
POPULAÇÃO
109.000
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
---
145
S. VinCEnT E GREnADinES
O grupo de ilhas nas Pequenas Antilhas que forma o estado de S.
Vicente e Granadinas faz parte da Comunidade Britânica (Commonwealth). O Artigo 9º da Constituição, que foi aprovada quando o
país se tornou independente, em 1979, define em pormenor os direitos individuais e associativos que derivam da total liberdade religiosa.
As escolas do Estado providenciam instrução moral baseada nos princípios do Cristianismo, mas a frequência destas aulas não é obrigatória.
Não há relatos de eventos envolvendo intolerância ou violações da
liberdade religiosa.
TRiniDAD E TObAGO
TRiniDAD E TObAGO
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos62,7%
Agnósticos2,3%
Muçulmanos7,2%
Hindus24,3%
Outros3,5%
Cristãos
863.056
Católicos
343.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
5.130km2
POPULAÇÃO
1.344.000
REFUGIADOS
37
DESALOJADOS
---
146
A Constituição da República de Trindade e Tobago, datada de 1976
e várias vezes emendada até ao ano 2000, lista no seu Artigo 4º
uma série de direitos fundamentais dos cidadãos e, entre eles, no
parágrafo H, a liberdade de consciência, de convicção religiosa e de
observância religiosa.
A religião principal é o Cristianismo nas suas várias confissões,
mas existem também minorias islâmicas e hindus.
A vida religiosa das várias comunidades decorre sem problemas e
é totalmente autónoma das autoridades governamentais. Representantes do Governo tomam parte nas várias festividades religiosas, o que contribui para o bom desenvolvimento das relações
inter-religiosas.
Não há relatos de eventos envolvendo intolerância ou de violações
dos direitos individuais ou associativos à liberdade religiosa.
URUGUAi
Além do regulamento da união civil de casais homossexuais (Lei
18.246, efectiva desde Dezembro de 2007), foi feita a reforma do
Código da Infância e da Adolescência (através da Lei 18.590, de 16 de
Outubro de 2009) que permite a adopção a casais em uniões livres
ou concubinato e a casais homossexuais se se tratar de uniões com
pelo menos quatro anos de existência. Nas reformas aprovadas, estabelece-se que o único órgão competente para a selecção e atribuição de famílias adoptivas é o Instituto da Criança e do Adolescente
do Uruguai, através de equipas especializadas e do Registo Geral de
Adopções. Deste modo, o Movimento Familiar Cristão, que vinha colaborando com estes processos, estará excluído do sistema.
Em Outubro de 2009, foi promulgada a Lei 18.620, a qual permite a
mudança de nome e de sexo a partir dos 18 anos de idade, declarando
que “Todas as pessoas têm direito ao livre desenvolvimento da sua
personalidade de acordo com a própria identidade de género, independentemente de qual seja o seu sexo biológico, genético, anatómico, morfológico, hormonal, de atribuição ou outro”.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos78%
Agnósticos20,8%
Outros1,2%
Cristãos
2.161.430
Católicos
2.565.000
Circunscrições
eclesiásticas
10
SUPERFÍCIE
175.016km2
POPULAÇÃO
3.372.000
REFUGIADOS
168
DESALOJADOS
---
147
URUGUAi
Relações entre a Igreja Católica e o Estado
VEnEZUELA
VEnEZUELA
Variações relativas à legislação
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos94,3%
Agnósticos2,6%
Outros3,1%
Cristãos
25.624.440
Católicos
24.403.000
Circunscrições
eclesiásticas
39
SUPERFÍCIE
912.050km2
POPULAÇÃO
29.044.000
REFUGIADOS
201.313
DESALOJADOS
---
148
No dia 15 de Agosto de 2009, entrou em vigor a nova Lei da Educação,
o que resultou na limitação do exercício da liberdade religiosa, revogando a possibilidade de existência da educação religiosa nas escolas
estatais e ignorando completamente a educação religiosa nos seus
artigos. A norma estabelece que a tarefa de educar é responsabilidade primordial do Estado e que a educação religiosa está limitada ao
ambiente familiar. De acordo com esta nova lei, entre os responsáveis
pela educação contam-se as famílias, as organizações comunitárias
do denominado Poder Popular, o Estado, e a “comunidade educativa”,
uma entidade difusa que inclui os pais, os alunos, os professores e os
funcionários de centros educativos e representantes das diferentes
organizações comunitárias.
A lei estabelece sanções no caso do não cumprimento e proíbe a
instilação de conteúdos que poderiam ser considerados contrários à
soberania nacional, um conceito vago, que deixa uma vasta margem
discricionária para possíveis sanções. Mesmo nas disposições transitórias, concede ao Ministério do Poder do Povo para a Educação a possibilidade de encerrar ou reorganizar as instituições educativas privadas que ameacem os princípios estabelecidos na mesma lei. Aos que
forem considerados culpados não lhes será permitido exercer funções
de professor ou de administradores nas escolas por um período de
dez anos.
Embora a lei não proíba abertamente a educação religiosa, existe o
receio de que este possa ser um dos objectivos a alcançar com esta
norma, pois não define nem desenvolve o papel de indivíduos privados e a sua capacidade para criar e manter estruturas educacionais; apenas menciona a educação religiosa no ambiente familiar
e elimina a possibilidade de o Estado financiar escolas particulares
que oferecem um ensino de qualidade e gratuito. As anteriores leis
e governos apoiavam as instituições católicas que oferecem ensino
gratuito, como a Fe y Alegria.
Além disso, através do Ministério da Administração Interna e da Justiça, eram habitualmente concedidos subsídios a grupos religiosos
(preferencialmente aos católicos) para levar a cabo programas educacionais e sociais. Não obstante, nos últimos anos estes subsídios
diminuíram e, pelo contrário, os recursos destinados aos programas
sociais operados pelo Estado aumentaram.
Em Novembro de 2009, com base em fontes próximas dos bispos venezuelanos, a Ajuda à
Igreja que Sofre advertiu sobre a possibilidade de o Governo de Hugo Chavez vir a confiscar
igrejas, escolas ou propriedades da igreja com a intenção de “eliminar o trabalho da Igreja”.
Na realidade, um líder distrital anunciou planos para expropriar várias escolas geridas pela
Igreja, com o objectivo de proteger edifícios de importância nacional, mas “alguns representantes da Igreja receiam que este possa ser o primeiro passo de um programa de confiscação
geral que afectaria as propriedades da Igreja por todo o país”.
Tudo isto contribuiu provavelmente para o Relatório Anual da Comissão Norte-americana
sobre a Liberdade Religiosa Internacional, que classifica o país, pelo segundo ano, na “lista de
observação”.
Relações entre o Estado e a Igreja Católica
VEnEZUELA
Existiram fortes diferenças de opinião entre a Igreja Católica e o Governo em relação a actos
hostis sofridos por ministros religiosos. Por exemplo, em Setembro de 2009, um artigo circulado no El Diario de Caracas intitulado “O engano administrativo do Cardeal”, no qual se
divulgava uma mensagem de correio electrónico atribuída ao Cardeal Jorge Urosa Savino,
Arcebispo de Caracas, contendo expressões que endossavam distinções de classe e exclusão
na educação. O cardeal negou ser o autor dessa mensagem.
Representantes do Governo acusaram a Conferência Episcopal de se tornar um partido político que defende interesses de grupos contrários aos “do povo”. Houve também a reacção
negativa por parte de autoridades governamentais perante declarações feitas pelo presidente da Conferência Episcopal, Monsenhor Ubaldo Santana, por ocasião do “ad limina apostolorum” no qual ele expressou ao Papa Bento XVI a sua preocupação pela crescente polarização política no país, a qual fez aumentar a violência, a insegurança e o ódio, colocando a
coexistência democrática da Venezuela em sério risco. A Igreja Católica foi também acusada
de conspirar com os EUA contra o Governo.
Actos hostis para com ministros religiosos foram patenteados em ataques à Igreja, sem a
devida diligência por parte do Governo em identificar os responsáveis. Em Janeiro de 2009,
membros da organização “La Piedrita” lançaram gás lacrimogéneo contra a residência do
Núncio Apostólico, no que constitui o sexto ataque em dois anos. Os assaltantes deixaram
folhetos a insultar os padres que tinham criticado o Governo. Acredita-se que o ataque foi o
resultado do facto de a Nunciatura ter concedido asilo a membros da oposição e a um activista estudante.
O património religioso e símbolos cristãos sofreram também afrontas durante este período.
Na realidade, em Maio de 2010, na cidade de Caracas, surgiu a notícia da profanação de imagens de Jesus e de Nossa Senhora de Coromoto, tendo sido pintadas armas de guerra nestas imagens. O vice-presidente da Conferência Episcopal, Monsenhor Baltazar Porras, indicou
que a deturpação destas imagens é uma “maneira de semear o ódio e a morte” por entre a
população.
149
VEnEZUELA
Comunidades religiosas cristãs não católicas / Outras religiões
A actividade missionária no país diminuiu, no seguimento de um aumento na percentagem
de vistos rejeitados pelo Governo, especialmente entre os missionários protestantes cujos
grupos religiosos têm sede nos EUA.
O Governo enfrentou graves problemas com a comunidade judaica, em resultado de declarações anti-semitas nos meios de comunicação social locais, assim como por vários actos de
hostilidade contra esta comunidade, como os que aconteceram no dia 30 de Janeiro de 2009,
quando homens mascarados atacaram a sinagoga de Tiferet, em Caracas, violando símbolos religiosos e pintando grafitis anti-semitas. A polícia capturou os responsáveis e determinou que se tratava de facto de um roubo de computadores, disfarçado de anti-semitismo. O
Governo condenou o incidente, mas não foi capaz de restabelecer o sentimento de segurança
junto da comunidade judaica, provavelmente porque, apenas um mês depois deste incidente,
a sinagoga de Beth Shmuel foi também atacada. Além disso, alguns rabinos foram atacados,
ameaçados ou acossados, e os judeus sofreram ataques e ameaças às suas lojas. Esta situação resultou num declínio do número de judeus que vivem actualmente na Venezuela, de
cerca de 22.000 em 1998, para uma estimativa de entre 10.000 a 15.000 actualmente.
As hostilidades para com as religiões atingiram também a comunidade muçulmana, a qual,
em Março de 2009, sofreu um ataque na Mesquita Ibrahim al-Ibrahim.
150
ÁSIA
C
o n t i n e n t e
AFEGAniSTÃO
Apesar da pressão internacional, o Governo afegão não parece capaz
de implementar políticas que respeitem os princípios fundamentais
que garantem a verdadeira liberdade religiosa. O fardo da tradição,
os condicionamentos por parte de facções islâmicas radicais e o conflito armado em muitas províncias, resultam numa situação extremamente difícil, não apenas em relação à liberdade religiosa mas também no que diz respeito aos direitos humanos fundamentais.
A própria Constituição, aprovada em Janeiro de 2004, contém elementos de ambiguidade que permitem às autoridades locais aplicar interpretações mais ou menos restritivas dos direitos nela proclamados.
Enquanto, por um lado, há referências à Declaração Universal dos
Direitos do Homem (Artigo 7º), declarando que as religiões que não
o Islão são “livres de exercer a sua fé e executar os respectivos rituais
religiosos dentro dos limites das providências da lei”, por outro lado o
Islão é declarado como sendo a religião de Estado e o Artigo 3º afirma
que “nenhuma lei pode estar contra as convicções e providências da
sagrada religião do Islão”.
Na vida quotidiana, esta contradição confia aos tribunais que aplicam
a Sharia a interpretação e o julgamento de casos individuais em relação a, por exemplo, blasfémia ou apostasia, crimes que, por sua vez,
não são referidos pelo Código Penal. O Artigo 130º da Constituição
declara que, onde exista um vazio legislativo sobre uma determinada
questão, a lei Hanafi deve ser aplicada, a escola jurídica sunita ortodoxa seguida na Ásia Central e no Sul da Ásia. A difamação do Islão
(blasfémia) ou a sua retratação (apostasia) são portanto crimes que
podem ser julgados com base na lei islâmica, a qual, para estes crimes,
aplica a pena de morte. As conversões são efectivamente proibidas e
os que abandonam o Islão para abraçar outra religião são obrigados a
praticar a sua fé em segredo.
O presidente e vice-presidente têm de ser muçulmanos, embora a
Constituição não especifique se eles têm de ser sunitas ou xiitas.
A influência dos mulás e imãs locais é muito poderosa, especialmente
em áreas longe dos centros das cidades, e, por conseguinte, o quotidiano dos afegãos comuns é regulado e administrado conforme as
regras tradicionais, sendo os efeitos mais dramáticos visíveis nas condições de vida das mulheres.
Por isso, apesar da tentativa de efectuar reformas no país, a liberdade
religiosa permanece ainda um assunto extremamente difícil e tudo
indica que levará bastante tempo até que sejam alcançadas condições toleráveis de acordo com os padrões internacionais.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos99,9%
Cristãos0,1%
Cristãos
????????
Católicos
300
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
652.090km2
POPULAÇÃO
29.117.000
REFUGIADOS
37
DESALOJADOS
297.000
153
ARÁbiA SAUDiTA
ARÁbiA SAUDiTA
Em Janeiro de 2009, o Departamento de Estado Norte-Americano
incluiu, uma vez mais, a Arábia Saudita na lista dos “CPC” (Country
of Particular Concern), um País de Particular Preocupação, devido à
persistência de graves violações da liberdade religiosa. Em Fevereiro
do mesmo ano, a Comissão Norte-Americana sobre a Liberdade Religiosa Internacional recomendou que deveriam ser colocadas perguntas incisivas em reuniões específicas nas Nações Unidas em relação à
situação dos direitos humanos na Arábia Saudita.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos93%
Cristãos4,9%
Outros2,1%
Cristãos
Cristãos
923.520
Católicos
1.250.000
Circunscrições
eclesiásticas
--SUPERFÍCIE
2.149.690km2
POPULAÇÃO
26.246.000
REFUGIADOS
575
DESALOJADOS
---
Em 2009, os funcionários sauditas reiteraram a posição do Governo
sobre a possibilidade de os não-muçulmanos terem autorização para
orar em privado. A noção de “privado” permanece, porém, vaga e bastante obscura. O Governo saudita declara que contanto que os encontros entre não muçulmanos tenham lugar em grupos pequenos e em
residências privadas, nenhuma força de segurança irá intervir. Esta
posição oficial é porém violada, pois continuam a existir casos nos
quais a polícia religiosa invadiu tais reuniões de oração, embora o
número destas “invasões” tenha diminuído em comparação com os
anos anteriores. Vários jornais publicaram notícias sobre alegadas
negociações entre representantes do Vaticano e o Governo saudita
relativas à construção da primeira igreja na Arábia Saudita, mas estes
relatos foram negados por vários bispos que vivem no Médio Oriente.
Muitos cristãos foram presos no decurso do ano. Em alguns casos, a
notícia não foi dada nos seus países de origem para garantir o resultado positivo das negociações para a sua libertação. Em Janeiro de
2009, um pastor eritreu, Yemane Gebriel, foi obrigado a deixar o país
para um destino não divulgado depois de receber numerosas ameaças da polícia religiosa. Gebriel era há dez anos o líder de uma Igreja
Cristã clandestina com mais de 300 crentes.
Em Março de 2009, três cristãos indianos encontrados a rezar em
conjunto foram presos pela polícia religiosa na província oriental. A
polícia confiscou material religioso do apartamento onde se encontravam. Os cristãos foram libertados alguns dias depois.
Xiitas
Os xiitas representam entre 10% a 15% da população saudita, mas não
há nenhum ministro xiita no Governo e só cinco dos 150 membros
da Shura (conselho consultivo) pertencem a esta comunidade. Muito
154
ARÁbiA SAUDiTA
poucos xiitas ocupam posições importantes nas instituições do Estado, em particular em
agências de segurança. Apesar de pequenas melhorias relatadas em 2007 (como a permissão para celebrar o Ashura na cidade de Qatif), em outras zonas com uma maioria xiita, como
Ahsa e Dammam, a celebração de festividades xiitas continua proibida. Os pedidos para ser
permitido ensinar a doutrina xiita às crianças nas escolas e reabrir várias mesquitas xiitas
(Hussainiya) fechadas pelo Governo, permanecem pendentes. Outras mesquitas xiitas foram
encerradas em 2009 na província oriental, das quais duas foram fechadas, em Al-Khobar, em
Agosto e mais duas em Novembro. As autoridades justificaram o encerramento das mesquitas com a ausência de licenças. Em Dezembro de 2009, o uso de lápides (um costume
exclusivamente xiita na Arábia Saudita) foi proibido oficialmente na zona administrativa de
Medina e todas as lápides existentes foram removidas.
Em Fevereiro de 2009, membros da polícia religiosa saudita filmaram mulheres xiitas
durante uma peregrinação a Medina às sepulturas daqueles que são venerados pelos xiitas.
Este ritual é considerado “ofensivo” pela escola de pensamento Wahabi. Quando foi apresentado um pedido para obter o filme, considerado como uma invasão da privacidade feminina, a polícia reagiu prendendo aproximadamente vinte xiitas que foram libertados uma
semana depois. Ainda ligado a estes protestos, outros dez xiitas foram presos em Março na
província oriental. Novamente em Março, as autoridades sauditas emitiram um mandato de
captura para Nimer Al-Nimer. O líder xiita declarara que os muçulmanos xiitas poderiam um
dia separar-se do país se as autoridades continuarem a discriminá-los.
Em Novembro de 2009, o activista xiita Munir Jassas foi detido e colocado em prisão solitária durante quatro meses sem qualquer acusação formal. Ele foi considerado culpado de ter
escrito no fórum Tahira, o qual supervisiona, que os xiitas deveriam “juntar-se a outros xiitas
porque, se permanecermos calados, a opressão irá continuar”. As autoridades tinham ordenado que ele parasse com as suas actividades on-line e passados dois meses prenderam-no.
Em Março de 2010, três líderes religiosos xiitas foram detidos e condenados a um mês de prisão por terem celebrado serviços religiosos e alegadamente terem organizado as cerimónias
do Ashura em Dezembro de 2009, em Al-Khobar, na província oriental.
Ismaelitas
Existem cerca de 700.000 muçulmanos Ismaelitas na Arábia Saudita que continuam a
sofrer graves discriminações e abusos por parte das autoridades sauditas, especialmente
em relação às suas práticas religiosas, no emprego na função pública, no sistema judicial
e na educação. Nos últimos anos, o Governo encerrou vários locais de culto ismaelitas.
Em Agosto de 2009, o Rei Abdullah ordenou a libertação “antecipada” de dezassete ismaelitas. Eles faziam parte do último grupo de 100 crentes presos no ano 2000 depois dos acontecimentos de Najran. Foram libertados alguns meses antes do final da sua sentença de dez
anos.
Em Setembro de 2009, o activista ismaelita Ahmad Turki al-Saab foi libertado depois de cumprir uma pena de prisão de dezoito meses. Al-Saab tinha sido preso por ter organizado uma
155
ARÁBIA SAUDITA
petição que pedia a destituição do governador da província de Najran, Príncipe Mishaal bin
Saud, por alegada discriminação contra os Ismaelitas. O Príncipe Mishaal acabaria por ser
afastado do seu cargo, em Novembro de 2008, através de decreto real, mas o rei substituiu-o
pelo seu filho Abdullah.
Outros muçulmanos
Em Janeiro de 2009, as autoridades sauditas prenderam Hamoud Saleh Al-Amri, um bloguista saudita que descrevera a sua conversão do Islão ao Cristianismo no seu sítio da Internet. Foi libertado em Março, depois de mais de dois meses em prisão, com a condição de que
não deixaria o país nem falaria com os meios de comunicação social.
Vários muçulmanos sunitas continuam presos acusados de “feitiçaria” ou de “magia negra”.
Em Novembro de 2009, um juiz em Medina condenou à morte o cidadão libanês Ali Sabat
por praticar feitiçaria. A acusação foi baseada num programa de televisão no qual Sabat ofereceu conselhos e também previu o futuro.
Desenvolvimentos positivos
Em relação à confiscação de material religioso não islâmico, esta prática parece ter diminuído nos aeroportos sauditas, onde as autoridades alfandegárias não costumavam permitir
que nada passasse, fosse uma Bíblia pessoal ou um terço. Além disso, funcionários superiores
do Governo saudita, entre os quais o Rei Abdullah e o Grande Mufti, fizeram muitas declarações a favor da tolerância para com as outras religiões.
Um elemento importante nas novas políticas implementadas pelo Rei Abdullah consiste nas
novas nomeações anunciadas em Fevereiro de 2009. Em primeiro lugar, na composição do
Conselho dos Grandes Ulemas, o Grande Mufti, Xeique Abdul-Aziz bin Abdullah Al Sheik, foi
confirmado nas suas funções. Porém, pela primeira vez na história do reino, representantes dos ritos muçulmanos sunitas diferentes do rito Hanbalita que inspira a doutrina oficial
Wahabi, foram admitidos entre os vinte e um membros do Conselho. As novas nomeações
incluíram a de um novo chefe da Polícia Religiosa (a Comissão para a Promoção da Virtude e
a Prevenção do Vício), um novo ministro da Educação Pública e da Justiça, um novo líder do
Conselho Judicial Supremo, e uma nova vice-ministra para a Educação, a primeira mulher
com um cargo ministerial. Os observadores acreditam que muitos dos indivíduos recentemente designados são conhecidos por serem reformistas e substituíram vários dos membros
mais conservadores. É muito cedo para declarar que eles serão capazes de mudar as políticas
mais restritivas do regime em relação à liberdade religiosa.
No campo da educação pública, começando em Dezembro de 2009, o Centro para o Diálogo Nacional Rei Abdul Aziz realizou quase 2.700 programas educacionais, frequentados por
mais de 150.000 pessoas, tendo por objectivos incrementar a tolerância e incentivar a moderação. O Governo saudita continuou a observar professores que adoptam opiniões religiosas
extremistas. No entanto, houve relatórios de professores que, ignorando as novas políticas,
156
ARÁBIA SAUDITA
continuam a promover opiniões intolerantes nas escolas. Numa sondagem levada a cabo em
2009 por um académico saudita, observou-se que os livros escolares sauditas não só ensinam a intolerância para com os não muçulmanos, mas também espalham o ódio entre as
várias comunidades muçulmanas.
A nível internacional, o monarca saudita patrocinou, através da Liga Muçulmana Mundial
(LMM), uma Conferência sobre Diálogo Inter-Religioso realizada em Genebra entre o final de
Setembro e o começo de Outubro de 2009. Estiveram presentes na conferência 166 líderes
religiosos, académicos e personalidades do mundo inteiro. Alguns dias antes, no dia 23 de
Setembro, o rei tinha inaugurado em Thwal, a 80 km de Jeddah, a Universidade de Ciência e
Tecnologia Rei Abdullah, a qual ele descreveu como “a casa da sabedoria” e “o farol da tolerância”. O estatuto não permite à polícia religiosa entrar no campus, onde também será permitido às estudantes e às professoras conduzirem sem irem parar a tribunal como acontece nas
ruas e estradas do reino. Nesta nova universidade, e pela primeira vez na história da Arábia
Saudita, homens e mulheres sentar-se-ão nas mesmas salas de aula.
157
ARMÉniA
ARMÉniA
O Artigo 23º da Constituição de 1995 estabelece o direito à liberdade
de ideias, de consciência e de convicções religiosas.
A maioria da população pertence à Igreja Apostólica Arménia. A presença de católicos está dividida entre os que seguem o rito arménio
e se encontram sob a jurisdição do Ordinariato para os Católicos
Arménios, com sede em Gyumri, o qual, por sua vez, depende da Sé
Patriarcal da Igreja Católica Arménia, situada no Líbano; e os católicos
romanos que estão sob a jurisdição da Administração Apostólica dos
Latinos do Cáucaso, com sede em Tbilisi (Geórgia). Existe ainda uma
pequena minoria de cristãos evangélicos protestantes. Existem curdos e azeris que seguem o Islão, mas muitos partiram em resultado
do conflito da Arménia com o Azerbaijão. Do mesmo modo, muitos
arménios que viviam no Azerbaijão foram forçados a deixar aquele
país e a procurar refúgio na Arménia.
Uma proposta de lei muito debatida sobre a liberdade de consciência e as organizações religiosas, aprovada pelo Parlamento arménio,
numa primeira leitura, no dia 19 de Março de 2009, resultou em reacções negativas por parte de muitas organizações internacionais. As
disposições contidas na proposta de lei prevêem restrições às manifestações públicas de fé, e duras sanções, também de índole penal,
atribuindo condenações de dois anos de prisão aos que empreendem
o denominado “proselitismo impróprio”, como também uma série de
obrigações administrativas, como é o caso do registo obrigatório para
os que pretendem levar a cabo actividades religiosas.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos84,9%
Agnósticos12,7%
Muçulmanos2,4%
Cristãos
2.704.800
Católicos
180.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
29.800km2
POPULAÇÃO
3.090.000
REFUGIADOS
3.607
DESALOJADOS
8.400
158
AZERbAiJÃO
Nova legislação sobre a liberdade de consciência
Em 2009, foram introduzidas leis novas sob a forma de mudanças
constitucionais e através de emendas à Lei da Liberdade de Consciência, inspiradas, de acordo com algumas fontes do Governo, por um
desejo de controlar e limitar a actividade de grupos extremistas ou de
algum modo “perigosos”.
No dia 18 de Março, um referendo de âmbito nacional aprovou várias
mudanças à Constituição, incluindo o Artigo 18º.2, o qual bane “A propagação e a propaganda de religiões que humilhem a dignidade dos
indivíduos e contradigam os princípios do humanismo.” Uma quinta
secção foi acrescentada ao Artigo 48º, segundo a qual “ninguém será
forçado a expressar (demonstrar) a sua fé ou convicção religiosa, a
executar rituais religiosos ou a participar em cerimónias religiosas.”
No seguimento da aprovação de tais mudanças constitucionais, uma
nova versão da Lei sobre a Liberdade de Consciência entrou em vigor
no dia 31 de Maio. Dado o seu conteúdo, poderá impor limites adicionais aos grupos religiosos ao aumentar a censura e ao tornar o
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos88%
Agnósticos8,9%
Cristãos3,1%
Cristãos
390.080
Católicos
400
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
86.600km2
POPULAÇÃO
8.934.000
REFUGIADOS
1.624
DESALOJADOS
586.00
159
AZERbAiJÃO
Até recentemente, o Azerbaijão era um país caracterizado pela tolerância e pela justiça. Porém, certos eventos no último ano elevaram
as preocupações sobre uma possível deterioração da liberdade de religião. Vários factores fazem com que seja agora difícil para os grupos
minoritários expressarem livremente a sua fé; entre esses factores
contam-se mudanças na lei, um processo de registo mais difícil e frequentes apreensões de material religioso. De notar também o facto
de o Governo local e as polícias se terem tornado mais desconfiados,
se não mesmo violentamente agressivos, para com os azerbaijanos
que se convertem a religiões não-tradicionais.
Apesar de tais dificuldades, ao abrir a Cimeira Mundial de Líderes Religiosos, em Baku, no dia 26 de Abril de 2010, o presidente Ilham Aliyev
afirmou que “No Azerbaijão, onde existem todas as liberdades, a liberdade religiosa encontra-se totalmente garantida.” Naquela ocasião,
Aliyev afirmou esperar que o seu país pudesse tornar-se “um centro
para o diálogo entre as religiões.” E acrescentou que o “Azerbaijão é
uma ponte natural entre a Europa e a Ásia. Representantes de várias
religiões e nacionalidades vivem juntos no Azerbaijão há já vários
séculos. Eu espero ver chegar o dia em que Baku seja escolhida como
Capital Europeia da Cultura. Tal irá contribuir para o desenvolvimento
dos laços do Azerbaijão com os mundos cristão e muçulmano.”
AZERBaIJÃO
registo mais difícil de obter, além de também aumentar os controlos sobre a publicação e a
difusão de literatura religiosa.
O Artigo 1º proíbe que “se ocupem de propaganda religiosa, usando ou ameaçando com o
uso de violência, ou com a finalidade de criar hostilidade ou inimizade racial, nacional, religiosa ou social. É proibido difundir e promover religiões ou movimentos religiosos que sejam
contrários aos princípios da dignidade humana.”
O Artigo 6º.2 acrescenta uma disposição segundo a qual a educação religiosa de crianças ou
adultos “só pode acontecer se tal for especificado nos estatutos da organização.”
O Artigo 12º torna o registo obrigatório para todas as organizações religiosas (assim tornando
automaticamente ilegais todas as actividade religiosas não registadas). Além da informação
habitual sobre a cidadania, a residência e a data de nascimento dos fundadores de uma organização, o artigo requer que as candidaturas ao registo incluam as bases da sua doutrina
religiosa, informação sobre quando foram fundados o movimento religioso e a organização
religiosa, a sua natureza, métodos, tradições, atitudes face à família, ao casamento e à educação, bem como informação sobre as limitações que impõe aos direitos e deveres dos seus
membros. O Artigo 12º também exige que as comunidades religiosas operem apenas a partir
do endereço legal incluído na sua candidatura ao registo.
O Artigo 29º requer a aprovação por parte do Comité Estatal para os Assuntos Religiosos para
a construção ou reconstrução de locais de culto.
A nova lei concede aos funcionários do Governo o poder de banir organizações religiosas se
estas violarem a ordem social, se não cumprirem as regras sociais ou incitarem as pessoas a
não cumprirem os seus deveres perante a lei. As organizações religiosas também podem ser
banidas se não proporcionarem às autoridades a informação sobre qualquer alteração que
façam à sua estrutura.
A nova lei também requereu que todas as organizações religiosas no Azerbaijão efectuem
um novo registo até 1 de Janeiro de 2010. Tratou-se da terceira vez que tiveram de o fazer
desde que o país se tornou independente, há cerca de vinte anos.
As alterações na Lei sobre a Liberdade de Consciência também conduziram a mudanças nos
Códigos Administrativo e Criminal.
Os Artigos 299º e 300º do Código Administrativo incluem novas ofensas como, por exemplo, levar a cabo actividades religiosas em locais diferentes do endereço legal indicado no
formulário de registo; propaganda religiosa; produzir, importar, exportar, circular ou vender
literatura religiosa sem a autorização do Comité Estatal para os Assuntos Religiosos; e envolver-se em actividades religiosas diferentes do que se encontra especificamente indicado nos
estatutos da organização.
Um artigo novo foi também acrescentado ao Código Criminal, o Artigo 167º.1, que castiga
todo o indivíduo que force outros, inclusive crianças, a tomar parte em actividades religiosas
ou a receber educação religiosa.
No dia 30 de Junho, o Parlamento azerbaijano aprovou outras mudanças à Lei da Liberdade
de Consciência que se aplicam apenas a comunidades muçulmanas. Durante a fase de
160
implementação, porém, o presidente Aliyev emendou a legislação aprovada pelo Parlamento,
pondo de lado algumas das exigências originais mais onerosas (nomeadamente, a nomeação directa por parte do Estado dos clérigos muçulmanos). Consequentemente, o Conselho
Muçulmano do Cáucaso é agora o responsável pela nomeação dos imãs para as mesquitas.
Porém, o presidente reteve a proibição, sob o Artigo 21º da lei, que impede todos os clérigos
formados no estrangeiro, quer sejam ou não azerbaijanos, de conduzir cerimónias e serviços
religiosos muçulmanos.
Também no dia 30 de Junho, o Parlamento abordou o assunto da reforma das organizações
não-governamentais (ONGs). Também neste caso, as mudanças propostas foram muito restritivas, conduzindo a preocupações na sociedade civil e em organizações internacionais. As
emendas acabariam por ser modificadas pouco antes da aprovação. Algumas das disposições mais rígidas foram eliminadas (como a proibição de estrangeiros poderem criar uma
ONG ou o tecto de 50% nos fundos provenientes de fontes estrangeiras).
Dificuldades na obtenção do registo
AZERBaIJÃO
Para as comunidades religiosas, registar-se junto da autoridade estatal apropriada não é
tarefa fácil; muitas aguardam há anos para obter o reconhecimento estatal.
A Igreja Baptista em Aliabad tem visto ser-lhe recusado o registo há mais de quinze anos. O
comissário estatal responsável recusou-se repetidamente a validar as dez assinaturas requeridas para a emissão do documento fundador, fazendo com que seja impossível a comunidade levar a bom fim a sua candidatura.
A Igreja Baptista em Neftchala também não pôde solicitar o registo porque as autoridades
locais nunca lhes entregaram a documentação técnica relativa ao edifício que ocupa desde
1966 e o qual deseja designar como local de culto.
Tendo de enfrentar todas estas formalidades burocráticas, é compreensível que muitos
grupos religiosos se mostrem críticos e preocupados com a obrigação de realizar um novo
registo, agora sob condições ainda mais difíceis.
Cinco meses depois do prazo final para realizar um novo registo (1 de Janeiro de 2010), apenas
365 das 534 comunidades anteriormente registadas (502 das quais eram islâmicas) foram
novamente reconhecidas pelo Estado. Mais de 600 candidaturas estão a aguardar análise.
Muitas comunidades religiosas também estão preocupadas com o facto de o Comité Estatal para os Assuntos Religiosos ter imposto um tipo de estatuto que reforça as restrições
contidas na nova Lei da Liberdade de Consciência, ao mesmo tempo incluindo linguagem
ambígua que poderia ser usada para sancionar actividades religiosas pacíficas. O novo formato reafirma os limites geográficos estipulados pela lei, declarando que “as comunidades
religiosas só podem operar na localidade que foi designada como o seu endereço legal”. O
estatuto proposto procura também ditar o modo como as comunidades religiosas tomam
as suas decisões internas, especificando que estas devem ser tomadas em reuniões formais
dos dez membros fundadores, reuniões essas que devem ter lugar pelo menos uma vez por
mês. A medida proposta acrescenta ainda, numa linguagem um pouco vaga, que as relações
161
AZERBaIJÃO
entre as comunidades religiosas devem ser baseadas na tolerância e no respeito, evitando o
conflito.
As candidaturas apresentadas pela Mesquita Fatima Zahra e a Mesquita sunita Gyanja estão
entre aquelas que não foram aprovadas. Como o Comité Estatal para os Assuntos Religiosos
rejeitou ambas as candidaturas, encontram-se pendentes uma ordem de demolição do primeiro edifício e uma ordem de encerramento para o segundo. As comunidades muçulmanas
podem candidatar-se a um novo registo apenas se forem afiliadas do Conselho Muçulmano
do Cáucaso.
O Associação Internacional de Baku, uma comunidade protestante de língua inglesa, viu
também a sua candidatura ser rejeitada sem explicação, embora se tivesse registado com
êxito no ano de 2003. O efeito da recusa foi imediato, já que o Departamento de Imigração do Azerbaijão recusou posteriormente a atribuição dos vistos para o pessoal estrangeiro
daquela associação.
Por agora, a Congregação Baptista de Baku não foi autorizada a registar-se de novo porque
os nomes de alguns dos membros fundadores não são os mesmos no formulário de registo
novo e no antigo. Porém, em nenhum momento foi indicado que os membros fundadores
teriam de ser os mesmos nas duas candidaturas. Em Março de 2010, a polícia invadiu a sede
da comunidade e disse aos que se encontravam presentes que a reunião era ilegal, uma vez
que não se encontravam registados.
As formalidades burocráticas foram também a razão pela qual as candidaturas apresentadas pela Igreja Adventista de Baku e pelas Testemunhas de Jeová da mesma cidade foram
recusadas.
A candidatura apresentada pela Paróquia católica de Baku também não teve êxito; no
entanto, funcionários do Comité Estatal forneceram aos líderes católicos informação adicional sobre “como ter os seus estatutos conformes à lei.”
Limitações à liberdade religiosa
Houve vários episódios de violência contra os membros de grupos religiosos minoritários,
perpetrados sobretudo pela polícia.
Existe uma forte suspeita de que indivíduos que escolhem uma religião diferente daquelas consideradas tradicionais poderá vir a enfrentar interrogatórios hostis, ameaças contra
si próprios e contra os membros das suas famílias, deportação e por vezes mesmo a prisão.
Em algumas regiões, este é claramente o caso. Por exemplo, em Zaqatala, no Noroeste do
Azerbaijão, há relatos de muitos episódios de repressão e abusos contra comunidades que
não são consideradas bem-vindas.
Em Aliabad, uma aldeia naquela região, Zaur Balaev e Hamid Shabanov, dois pastores que
pertencem à Igreja Baptista (a qual, como vimos antes, está à espera do registo há mais de
quinze anos), foram presos sob acusações falsas, preparadas para os castigar pela sua actividade religiosa.
162
AZERbAiJÃO
Balaev, que foi libertado em Março de 2008 no seguimento de uma amnistia para comemorar o Novruz (o Ano Novo persa), ainda se encontra sob vigilância policial. Em várias ocasiões,
mais recentemente no dia 30 de Abril de 2010, foi ameaçado com mais tempo de prisão, se
não desistisse das suas actividades religiosas.
Em Junho de 2008, três meses depois da libertação de Balaev, outro clérigo baptista, o Reverendo Hamid Shabanov, foi preso sob acusações de posse ilegal de armas de fogo depois
de a polícia alegar ter encontrado uma arma no seu apartamento, uma arma que o pastor
negou alguma vez possuir. Shabanov, que já tinha passado sete meses na prisão a aguardar
julgamento, foi condenado e sentenciado a passar algum tempo num campo de trabalhos,
um veredicto que acabaria por ser alterado para prisão domiciliária.
Também em Aliabad, as autoridades civis recusam-se mesmo a emitir uma certidão de nascimento (necessária para os hospitais, para as creches ou para viajar para o estrangeiro) a
crianças com um nome cristão. O último caso foi o da neta de Hamid Shabanov, Esteri Shabanova, que nasceu no dia 25 de Dezembro de 2009. Nesta aldeia, informou ele, existem várias
crianças, algumas com 5 anos de idade, que ainda não possuem certidão de nascimento.
Na mesma região, em Zaqatala, no dia 22 de Agosto, a polícia deportou uma cidadã russa,
Imamzade Mamedova, uma testemunha de Jeová, depois de esta ter sido acusada de propaganda religiosa ilegal por ter falado sobre assuntos religiosos com os seus vizinhos.
No Azerbaijão, este tipo de acção não é um incidente isolado. Em Julho, duas testemunhas de
Jeová, Elguja Khutsishvili e Temur Aliyev, foram deportadas por propaganda religiosa ilegal.
Ambos são de nacionalidade georgiana, mas residentes no Azerbaijão. Elguja Khutsishvili
nasceu e cresceu em Gakh, uma cidade na fronteira com a Geórgia, onde vivia com a esposa,
grávida de oito meses, e os seus dois filhos. Depois de verem o seu apartamento invadido por
oito polícias, que apreenderam 1400 documentos, um tribunal emitiu uma ordem de deportação contra ele por se envolver em acções de “propaganda religiosa”. Desde que foi condenado, não pôde ver a sua esposa nem falar com um advogado. A esposa, Tarana Khutsishvili,
também foi sujeita a uma pressão policial por vezes brutal. Por exemplo, no dia 12 de Agosto,
nove agentes policiais invadiram o seu apartamento onde quinze pessoas se tinham reunido
para uma reunião. A polícia efectuou uma busca na casa, insultou os que se encontravam
presentes e ameaçou-os com sanções graves. Tarana também foi ameaçada com detenção.
Mais tarde, interrogaram cinco pessoas na esquadra da polícia, que só foram libertadas nessa
noite.
Javid Shingarov, nascido no Azerbaijão mas detentor de passaporte russo, também foi deportado para a Rússia no dia 30 de Setembro acusado de propaganda religiosa ilegal por ter
organizado algumas reuniões no seu apartamento. Shingarov morava em Yalama com a sua
mulher, os dois filhos e o pai já idoso. A polícia apreendeu mais de 300 dos seus livros e DVDs.
Na noite da invasão, Eldar Eldarov, um baptista que vive perto de Shingarov, viu também o
seu apartamento ser invadido pela polícia. Depois disso, foi forçado a demitir-se do seu cargo
de director da escola primária da aldeia.
163
AZERBaIJÃO
A polícia invade frequentemente apartamentos onde a maioria das reuniões religiosas tem
lugar, procedendo depois a interrogatórios extensos aos presentes bem como à apreensão
de materiais religiosos. Frequentemente, no entanto, não há qualquer sanção administrativa
imposta àqueles que são detidos. Nalguns casos, os raides são violentos e abusivos, com os
crentes a serem fisicamente maltratados pela polícia. Em certos casos, os crentes apresentaram queixa contra a polícia junto Gabinete do Procurador Geral.
No dia 2 de Junho, duas testemunhas de Jeová, Makhluga Akhmedova e Kaklik Muradova,
apresentaram queixa por causa das pressões, insultos e tratamento brutal que receberam na
sede da Polícia em Garadag. Tinham sido detidas por falarem sobre a sua fé na rua.
Lydia Suleimanova, de 71 anos, apresentou uma queixa no dia 7 de Dezembro de 2009 por
maus tratos, depois de ter sido agredida durante um interrogatório extenso na esquadra da
Polícia de Zaqatala. Fora detida por tomar parte numa reunião de testemunhas de Jeová e
por posse de panfletos religiosos.
Noutros casos, a polícia contou aos meios de comunicação social sobre as invasões que levaram a cabo, incluindo o endereço exacto das pessoas envolvidas, pondo-as assim em risco.
Foi o que aconteceu no dia 25 de Março de 2009, quando a polícia invadiu violentamente
o apartamento de Vera Zhuchaeva, uma mulher baptista de 68 anos que vive em Agdash e
que estava a contar histórias da Bíblia a doze crianças, com a autorização de todos os pais.
Dois operadores de câmara que vieram com a polícia gravaram tudo. A estação de televisão
onde trabalham acabou por transmitir as imagens por várias vezes, dando todos os detalhes
sobre como encontrar o apartamento. A polícia, que apreendeu 500 livros e quarenta filmes,
bem como um leitor de cassetes, multou as três pessoas presentes na reunião, ou seja, Lilia
Hudaverdieva, Sara Babaeva e Ofelia Yakulova, em cerca de 9 euros cada uma por envolverem
ilegalmente as crianças numa actividade religiosa.
Durante um raide contra a comunidade das Testemunhas de Jeová, a polícia de Gyanja entrou
no apartamento de Yegyana Gahramanova e deu o seu nome e morada à imprensa, embora
não fosse condenada por nenhum crime.
Apreensões de literatura e material religiosos são muito frequentes; mas a sua devolução
não o é. Isto torna cada vez mais difícil para os crentes importarem literatura religiosa num
país onde o Comité Estatal para os Assuntos Religiosos leva a cabo censura preventiva, decidindo quantos exemplares de qualquer determinado texto podem ser trazidos para o país.
Qualquer pessoa que esteja em posse de literatura “ilegal” pode contar ser multada. Isto
aconteceu por exemplo em Março e Maio de 2010 a cinco testemunhas de Jeová (Salatyn
Iskenderova, Shafiga Mamedova e Gulnaz Hasanova, no distrito de Agstafa, e Famil Nasirov
e Amina Mammadova, no distrito de Khatai). Cada uma foi multada no equivalente a cerca
de 180 euros por violar o Artigo 300º.0.2 do Código Administrativo que sanciona a posse e
distribuição de literatura religiosa sem autorização.
O controlo estatal sobre as actividades religiosas é ainda mais forte no caso de comunidades
muçulmanas que só podem operar sem muitas dificuldades se se colocarem sob a supervi-
164
AZERBaIJÃO
são do Conselho Muçulmano do Cáucaso. Noutros casos, as actividades estão estritamente
limitadas e, em muitos casos, são alvo de processos jurídicos.
Os seguidores do teólogo turco Said Nursi foram particularmente atingidos no último ano.
As agências de segurança levaram a cabo raides em residências onde indivíduos se reuniram para ler os textos de Nursi (embora aparentemente estes nunca tenham sido proibidos
oficialmente). Nalguns casos, os muçulmanos foram sancionados com penalidades administrativas, incluindo algumas sentenças de prisão curtas, especialmente por violarem o Artigo
299º que sanciona as actividades religiosas não registadas. Foi o que aconteceu em Agosto
na cidade de Yevlakh a Hasil Memedov, Yusif Mamedov e Arif Yunusov, que foram condenados a entre cinco e sete dias de prisão por pregarem “a orientação religiosa de Nursi.”
Em Fevereiro de 2010, a polícia invadiu sete apartamentos na cidade nortenha de Sheki,
alegadamente a residência de seguidores de Nursi. Apreenderam mais de 1700 documentos impressos e 100 cassetes áudio e vídeo. Os sete proprietários dos apartamentos foram
interrogados e multados por violarem o Artigo 298º do Código Administrativo (violação do
procedimento para a organização de reuniões). Um tribunal condenou dois deles, Kuliev e
Salamov, a uma multa e dois dias de prisão por violarem o Artigo 310º do Código Criminal
que sanciona as pessoas que não respondem às perguntas da polícia.
Segundo Arif Yunusof, do Instituto para a Paz e a Democracia, em Baku, os ataques por parte das
autoridades contra seguidores de Nursi ou outros movimentos muçulmanos representam uma
tentativa para eliminar os últimos espaços na sociedade que não estão sob o controlo estatal, já
que todas as outras organizações independentes outrora existentes no país foram já eliminadas. “Desde 2007, o Islão preencheu o vazio e as mesquitas tornaram-se alvos políticos”, afirmou
Yunusof. Para ele, esta é a razão para o encerramento, e por vezes a demolição, sob vários pretextos, de um grande número de mesquitas, especialmente se são sunitas, pelo Estado.
Em Abril, por exemplo, a Mesquita do Profeta Muhammad, no bairro de Yasamal, em Baku, foi
demolida depois de os funcionários estatais terem determinado, por razões vagas e obscuras,
que tinha sido construída ilegalmente. Outra mesquita foi demolida em Oily Rocks, uma ilha
artificial no Mar Cáspio, depois de ser considerada insegura. Na cidade de Delimmedli, a Mesquita de Hazrat Ali foi colocada também numa lista de mesquitas destinadas a demolição
apenas um ano depois de ter sido construída, alegadamente por causa de um oleoduto de
metano que passa perto da mesquita.
A mesquita sunita em Gyanja, activa há mais de doze anos, foi encerrada em Setembro de
2009, quatro dias antes do final do mês santo do Ramadão.
A Mesquita Abu-Bakr, no bairro de Narimanov, em Baku, ainda se encontra encerrada depois
de as suas actividades serem suspensas em Agosto de 2008 por causa de uma investigação
sobre uma explosão que matou duas pessoas. Depois do incidente, autoridades governamentais emitiram uma proibição de âmbito nacional sobre orações fora das mesquitas. Esta
ainda se encontra em vigor.
Em Maio de 2010, o presidente Ilham Aliyev, provavelmente em resposta às pressões internacionais, rescindiu a ordem para demolir a Mesquita Fatima Zahra, no bairro de Yeni Guneshli,
165
AZERbAiJÃO
em Baku, a única que serve uma área residencial de cerca de 70.000 pessoas, aberta desde o
ano 2000. A polícia tinha-a encerrado no Verão de 2009, despoletando fortes protestos por
parte de membros da comunidade.
Duas outras mesquitas, construídas com dinheiro turco, estiveram temporariamente fechadas. A primeira, a Mesquita de Ilahiyyat, no campus da Universidade Estatal de Baku, esteve
suspensa porque não se encontrava registada; a segunda, Shahidlyar, também em Baku, foi
encerrada para “obras”. Alguns especularam que foi encerrada como retaliação pelo clima de
diálogo desenvolvido entre a Turquia e Arménia.
Em algumas regiões, o ambiente para alguns grupos religiosos é particularmente tenso. É o
caso de Nakhchivan, um enclave situado entre a Arménia, o Irão e a Turquia.
Aqui, em Novembro, três pessoas que se encontravam na mesquita sunita na capital da
região foram detidas durante quinze dias, sendo-lhes indicado que frequentassem a mesquita xiita local.
Em Dezembro de 2009, autoridades locais impediram os trabalhadores de serviços públicos
e estudantes de celebrar a festa xiita da Ashura que calhou nos dias 26 e 27 de Dezembro. No
dia depois da festividade, a polícia invadiu a aldeia de Bananyar onde aquele dia de festa é
amplamente celebrado. Detiveram vários residentes, muitos dos quais durante vários dias e
em sanatórios. Na noite de 4 para 5 de Janeiro, a polícia regressou à aldeia e prendeu cerca de
150 pessoas. As mulheres detidas foram libertadas após dois ou três dias; os homens alguns
dias mais tarde.
Nagorno-Karabakh
No dia 9 de Janeiro de 2009, uma nova Lei da Liberdade de Consciência entrou em vigor
na região separatista e independente (embora não reconhecida internacionalmente) de
Nagorno-Karabakh, região sobre a qual o Azerbaijão perdeu o controlo numa guerra com a
Arménia nos anos noventa. A nova legislação, baseada em grande medida numa lei semelhante da vizinha Arménia, impõe novas restrições aos grupos religiosos. Em particular, impõe
a obrigação a todos os grupos religiosos de se registarem ou voltarem a registar-se no prazo
de seis meses após a lei entrar em vigor (proibindo implicitamente todas as actividades religiosas que não estejam registadas). Também requer um número de membros de pelo menos
100 adultos, um texto sagrado para a comunidade, o controlo estatal sobre a literatura e os
materiais religiosos (embora o artigo não especifique a natureza exacta desse controlo) e
uma proibição de qualquer actividade de proselitismo, com excepção da Igreja Apostólica
Arménia, reconhecida como sendo a Igreja nacional.
Além da Igreja Apostólica Arménia, quatro outras comunidades religiosas foram registadas
em 2009; são elas a Igreja Católica Arménia, a Igreja Ortodoxa Russa, a Igreja Evangélica
Arménia e o Movimento de Fraternidade que está associado à Igreja Apostólica.
A Igreja Evangélica do Fogo Revivalista e as Testemunhas de Jeová viram ser-lhes recusado
o registo, com base em “opiniões de especialistas” que acusaram os dois grupos de usarem
pressão psicológica sobre os seus membros.
166
bAHREin
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos83,8%
Cristãos8,9%
Hindus6,5%
Outros0,8%
Cristãos
79.485
Católicos
65.000
Circunscrições
eclesiásticas
--SUPERFÍCIE
678km2
POPULAÇÃO
807.000
REFUGIADOS
139
DESALOJADOS
---
167
bAHREin
A Constituição estabelece que a religião estatal é o Islão e que a Sharia constitui a fonte para a lei. Embora exista um determinado grau
de liberdade religiosa para os não- muçulmanos, o proselitismo é
desencorajado, os livros anti-islâmicos são proibidos e a conversão
do Islamismo para outras religiões, embora não seja punida por lei, é
extremamente difícil devido à discriminação social. O Estado exerce
também um rígido controlo sobre o culto das comunidades islâmicas
no país, tanto a xiita como a sunita. Embora exista uma maioria xiita,
o poder político encontra-se firmemente nas mãos de uma família
sunita.
Existem várias congregações cristãs ainda por registar. No dia 14 de
Maio de 2009, o Ministério para o Desenvolvimento Social ordenou
a seis congregações, às quais tinha sido exigido em 2008 que legalizassem a sua situação, que cessassem todas as suas actividades. O
ministério também negou o registo a outras dez congregações.
A 13 de Janeiro de 2009, o Governo apresentou uma lei para uniformizar sentenças de carácter pessoal aprovada pelos tribunais sunita
e xiita. Em resposta às objecções dos Xiitas (Xiitas Jaafari) relativamente ao que lhes dizia respeito, o Governo retirou o projecto e apresentou apenas a parte sunita da lei (Sunitas Malaquitas). No dia 27 de
Maio de 2009, o rei ratificou a parte sunita da lei.
A 18 de Janeiro de 2009, o Ministério da Cultura deu ordem para que
todos os sítios da Internet que incitam o sectarismo fossem encerrados, bem como outros sítios da Internet “anti-islâmicos”
BANGLADESH
BANGLADESH
Aspectos judiciais e constitucionais
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos 88,8%
Hindus 9,5%
Cristãos 0,5%
Outros 1,2%
Cristãos
983.682
O Islão é a religião de Estado no Bangladesh. A Constituição estabelece o direito de cada cidadão a professar, praticar e propagar a religião que escolheu. Relativamente ao ano anterior, não se registaram
alterações à Constituição ou aos direitos dos crentes.
No dia 29 de Dezembro de 2008, a Liga Awami subiu ao poder, conquistando 263 dos 300 assentos disponíveis no Parlamento. A Liga
Awami é o partido político laico, fundado em 1949, que conduziu o
Bangladesh a alcançar a independência do Paquistão sob a liderança
do Xeique Mujibur Rahman.
Religiões presentes no país
O clima social no país denota alguma tensão. O activista dos direitos humanos Dipal Barua afirmou que os “ataques contra minorias”
no Bangladesh “estão a aumentar a uma velocidade assustadora.”
Embora no Bangladesh a liberdade de culto esteja formalmente
garantida, há registo de casos que envolvem perseguição e discriminação com base nas convicções religiosas e nas minorias étnicas. Na
maior parte dos casos, a polícia não interveio para defender as minorias dos abusos infligidos por muçulmanos fundamentalistas.
Católicos
322.000
Circunscrições
eclesiásticas
6
Católicos
SUPERFÍCIE
143.998 km2
POPULAÇÃO
164.425.000
REFUGIADOS
228.586
DESALOJADOS
60.000-500.000
168
Em 2009, ocorreram vários ataques e acções demonstrativas contra
católicos por parte de muçulmanos fundamentalistas. Não é coincidência que durante as celebrações da Páscoa, as quais, só em Daca,
contaram com a presença de 300 mil pessoas, os serviços religiosos
tenham sido realizados sob um controlo policial apertado. Um polícia,
Abu Sayed, afirmou que “o mesmo se está a repetir por todo o país:
as pessoas reúnem-se em igrejas protegidas pela polícia” e durante
períodos de festividades religiosas, os controlos aumentam para evitar ataques. “Nós não conseguimos garantir a segurança das pessoas
na sua vida do dia a dia.”
Em Agosto de 2009, a família muçulmana de Rashidul Amin Khandaker, que se converteu ao Cristianismo em 2008, foi totalmente marginalizada pelos outros muçulmanos, e a sua casa destruída. Ruhil, o
pai de Rashidul, foi impedido de entrar numa mesquita para rezar e,
no dia 1 de Agosto, foi ameaçado pelo grupo extremista Allahr Dal
que chegou mesmo ao ponto de lhe ordenar que matasse o seu filho.
bAnGLADESH
No dia 25 de Setembro, William Gomes, que se converteu do Islão ao Catolicismo, fugiu de
casa para escapar a um ataque por parte de um grupo de militantes muçulmanos que o
queriam matar assim como à sua família (a esposa e o filho) depois de pegarem fogo à casa
onde residiam. Este activista dos direitos humanos tentou obter protecção policial, mas na
esquadra da polícia de Jatrabri limitaram-se a aceitar a queixa que ele apresentou. Gomes
afirmou que o oficial de serviço apenas garantiu intervenção policial depois do os eventos
terem ocorrido e fez um comentário sobre as ameaças, afirmando que não deveria ficar surpreendido com o facto de os muçulmanos estarem furiosos com a sua conversão.
Tinham-se registado avisos anteriores no dia 23 de Setembro, quando Mohammed Mijan
Bandari, o líder local do Partido Nacionalista do Bangladesh (PNB), atacou um dos primos de
Gomes, Mohammed Faruk, o qual, juntamente com a sua esposa, se preparava para visitar o
parente e a família. O activista dos direitos humanos interviera para defender o primo com a
ajuda da mãe e do pai, recebendo ameaças de morte por parte de Bandari e de um grupo de
cerca de 100 islamistas. Só a chegada da polícia dispersou a multidão e acalmou os ânimos.
No dia 27 de Setembro, vários membros do movimento islâmico Hizbut Tawhid atacaram um
estudante cristão em Daca, acusando-o de ter criticado Maomé. Anup Rodrigues, de 25 anos
de idade, afirmou que quatro indivíduos não identificados, vestidos da forma muçulmana
tradicional, o atacaram pelas costas. Um dos atacantes começou a acusá-lo de ter insultado o
Profeta, enquanto descrevia os cristãos como sendo “a maldição da nação” que “quer converter os muçulmanos.” “Sem me dar sequer tempo para falar”, disse o estudante, “começaram a
bater-me com pedaços de ferro e paus de bambú. Enquanto me batiam, rezei à Virgem Maria
para me salvar. Assim que me foi dada uma oportunidade, fugi dali para fora.”
A polícia não faz o suficiente para cessar a violência, tanto assim que a mãe de Anup não
notificou as autoridades porque não sabia se poderia confiar nos polícias.
Por vezes a violência surge também por razões económicas.
No dia 22 de Outubro, um grupo de muçulmanos disparou sobre a residência da família de
Sunil Gomes. Trata-se de um católico que pertence à Paróquia de São Lourenço, em Daca.
No dia 8 de Outubro, 150 muçulmanos tinham ocupado a casa e tinham-se apropriado de
parte do jardim. Além disso, o grupo muçulmano removeu a placa com o nome da família
Gomes e um crucifixo pequeno, substituindo-os por uma placa com as palavras “Allah Akbar.”
A Senhora Gomes contou à AsiaNews que os seus vizinhos muçulmanos os tinham “andado
a incentivar a vender a casa há muito tempo.” No entanto, a família também inclui os pais de
Sunil Gomes, ambos muito idosos e doentes e que não aguentariam uma mudança forçada.
“Uma vez que somos cristãos”, afirmou a Senhora Gomes, “ninguém está pronto para nos
ajudar. Os muçulmanos são ricos e politicamente muito poderosos. Têm ligações fortes com
o partido no poder, a Liga Awami.”
Entre o final de Agosto e o início de Setembro, a comunidade católica em Solepur foi objecto
de vários ataques violentos por parte de muçulmanos que, através de roubos e de ameaças,
tentou forçá-los a partir para que assim se pudessem apropriar dos seus terrenos.
169
bAnGLADESH
Protestantes
Em 2009, ocorreram também vários ataques violentos contra membros da Igreja Protestante.
Quando Kazi Quamrunnessa Luna, que se mudou para os EUA depois de se formar em Bangladesh, decidiu converter-se ao Cristianismo, recebendo o sacramento do Baptismo na United Bengali Lutheran Church of America, a sua família no Bangladesh começou a ser marginalizada e ameaçada pela comunidade islâmica.
“O meu irmão”, disse Kazi, “nem sequer pode ir à mesquita. Estamos rodeados por uma
atmosfera de ostracismo e se a Luna voltar ao Bangladesh, provavelmente teríamos uma
fatwa pronunciada contra ela, e a vida dela estaria em perigo.” A mãe de Luna acrescentou
que “já não consegue aguentar a pressão por parte das pessoas” causada por uma decisão
“que apenas diz respeito à minha filha”, e reportou uma atmosfera geral de “insegurança.”
Em Junho, depois de descobrir que o seu filho Jahirul se convertera ao Cristianismo, Aminul
Islam começou a bater na esposa e a maltratá-la regularmente por ter permitido que o filho
fosse estudar no estrangeiro. Jahirul sugeriu que a mãe recorresse ao Reverendo Alex Khan
e, em Setembro, ela anunciou ao marido que se tinha convertido ao Cristianismo. Quando
ouviu as notícias, Aminul Islam queimou a Bíblia da mulher, amarrou-a e à filha, e espancouas brutalmente. As duas mulheres informaram que “tinham medo mas que iam buscar conforto às orações.”
Hindus
Os hindus também sofrem discriminação e perseguição. Os ataques perpetrados em 2009
foram ditados não apenas por ódio étnico-religioso, mas também por razões económicas.
Na noite de 25 de Julho, em Charsindhu, a 50 km de Daca, um grupo armado de indivíduos da
comunidade islâmica local atacou quatro casas de hindus e pilhou o templo da comunidade.
Durante a primeira semana de Agosto, vinte famílias que pertencem à minoria hindu nas
aldeias de Kalibari, Kajir Hat e Keramotia, no Sul do Bangladesh, foram vítimas de extorsão e
de chantagem por parte da maioria muçulmana. Inicialmente, os muçulmanos recolheram
45 mil taka (cerca de 470 euros) da família de Nitia Das e, quando as outras famílias protestaram, os muçulmanos começaram a persegui-las. Duas jovens foram raptadas e só foram
libertadas depois do pagamento de um resgate. Um dos assaltantes exigiu casar-se com
uma das jovens sem o consentimento dela ou da sua família e, de acordo com o representante da minoria hindu, Boloram Das, “nem os habitantes das aldeias nem a polícia fizeram
alguma coisa para nos ajudar.” Pelo menos vinte famílias hindus naquela zona não podem
voltar para as suas casas devido a ameaças por parte de grupos muçulmanos.
170
bRUnEi
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos55,9%
Cristãos13,7%
Animistas11,2%
Budistas9,7%
Religiõestradicionais
chinesas5,3%
Outros4,2%
Cristãos
27.797
Católicos
19.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
5.765km2
POPULAÇÃO
407.000
REFUGIADOS
---
DESALOJADOS
---
171
bRUnEi
Segundo a Constituição de 1959, o Islão Salafi é a religião do Estado.
A liberdade religiosa é reconhecida mas as leis restringem a prática
de outras religiões que não o Islamismo Salafi. O proselitismo não é
permitido para religiões não muçulmanas e é proibido importar qualquer material de índole religiosa. Os artigos e as imagens de outras
crenças são censurados na imprensa. Os grupos religiosos que não
sejam Salafi têm de se registar e indicar os nomes de todos os seus
membros. A participação em grupos não registados é também punível com tempo de prisão. Sejam de natureza religiosa ou não, todas
as reuniões públicas que envolvam cinco ou mais pessoas devem ser
previamente autorizadas. O uso de habitações privadas para reuniões
religiosas é proibido. A existência de escolas cristãs é permitida, mas
não o ensino do Cristianismo. Do mesmo modo, os cursos sobre a religião islâmica são obrigatórios para todos os alunos.
Os casamentos entre muçulmanos e não muçulmanos não são permitidos e todos os indivíduos não muçulmanos que se queiram casar
com mulheres muçulmanas têm obrigatoriamente de se converter.
Os muçulmanos que queiram mudar de religião têm de obter uma
autorização pública, mas as pressões sociais são de tal ordem que é
virtualmente impossível fazê-lo.
Em termos gerais, o Governo impede os clérigos não muçulmanos de
entrar no país e não permite a construção ou a realização de obras em
edifícios religiosos não muçulmanos.
Não houve relatos de mudanças institucionais significativas ou de
qualquer incidente expressivo relativamente à liberdade religiosa
durante o período de tempo considerado.
bUTÃO
bUTÃO
No período decorrido entre o último Relatório sobre a Liberdade Religiosa e o presente relatório, foram feitos progressos significativos no
que diz respeito à liberdade religiosa.
Em 2008, realizaram-se as primeiras eleições democráticas após um
século de governação por uma monarquia absoluta. Em Janeiro de
2008, os eleitores votaram para a Câmara Alta e, nos meses que se
seguiram, para a Câmara Baixa. Estas eleições marcaram uma passagem fundamental para uma monarquia parlamentar.
A nova Constituição reconhece a liberdade religiosa, e o Budismo
Mahayana, anteriormente a religião de Estado, é descrito como o
“legado espiritual do Butão”. O rei é responsável por ser o “protector
de todas as religiões”.
A liberdade religiosa total é garantida para todos os cidadãos e todas
as formas de coerção nas escolhas religiosas estão proibidas.
A grande comunidade hindu é respeitada e, finalmente, as pequenas
minorias cristãs desfrutam de liberdade suficiente no seu trabalho
caritativo e no seu apostolado.
As restrições relativas à entrada no país de pessoal religioso foram
abolidas e não existe nenhuma regra específica relativamente à
publicação de material religioso.
A instrução religiosa só é permitida em escolas geridas por comunidades religiosas, não o sendo nas escolas públicas.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Budistas84%
Hindus11,4%
Animistas3,4%
Cristãos0,3%
Outros0,9%
Cristãos
12.255
Católicos
1.000
Circunscrições
eclesiásticas
--SUPERFÍCIE
47.000km2
POPULAÇÃO
708.000
REFUGIADOS
---
DESALOJADOS
---
172
CAMbOJA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Budistas85,4%
Animistas4,6%
Agnosticos2,5%
Muçulmanos2%
Cristãos2%
Outros3,5%
Cristãos
157.057
Católicos
20.000
Circunscrições
eclesiásticas
3
SUPERFÍCIE
181.035km2
POPULAÇÃO
15.053.000
REFUGIADOS
135
DESALOJADOS
---
173
CAMbOJA
Relativamente à liberdade religiosa não houve mudanças durante o
período de tempo considerado, nem relatos de violação, por parte das
autoridades, dos princípios sancionados pela Constituição de 1993,
que no Artigo 43º garante a liberdade religiosa e proíbe todas as formas de discriminação com base na convicção religiosa. No entanto, o
mesmo artigo reconhece o Budismo como a religião do Estado.
Todos os grupos religiosos têm de se registar, inclusive os grupos
budistas, para poderem conduzir as suas actividades ou construir os
seus lugares de culto, mas se não se registarem não são penalizados
por isso. Os grupos missionários cristãos podem funcionar livremente,
embora uma directiva emitida a 26 de Junho de 2007 proíba o proselitismo “porta à porta”, a distribuição de literatura cristã no exterior das igrejas e outras práticas consideradas como intrusivas, tais
como o uso de altifalantes. O mesmo regulamento também proíbe
“fazer uso do dinheiro ou de incentivos materiais” para conseguir
obter conversões, uma regra que não se aplica aos budistas mas que
é dirigida em primeiro lugar aos cristãos evangélicos, que são acusados frequentemente de oferecer alimentos, roupas e aulas de inglês
gratuitas para persuadir as pessoas a converter-se. Além disso, é também requerida uma autorização especial para a construção de igrejas.
O consentimento do Estado é também requerido para a construção
de locais de culto e escolas religiosas, que devem ser construídos a
pelo menos 2 km de distância de qualquer outro. No entanto, esta
exigência não é estipulada para os escritórios administrativos destes
grupos religiosos.
As aulas de doutrina budista são obrigatórias nas escolas públicas,
mas não nas escolas dirigidas por grupos não-budistas.
CATAR
CATAR
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos83,5%
Cristãos9,6%
Hindus2,5%
Agnósticos2,3%
Outros2,1%
Cristãos
70.616
Católicos
110.000
A Constituição de 1972 define o Islão como a religião estatal e a lei
islâmica como a principal fonte da legislação. O Artigo 7º na alínea b)
declara que “o Estado faz todos os esforços para incutir na sociedade
os bons princípios da religião islâmica e para a purgar de todas as
formas de degeneração moral.” Até alguns anos atrás, praticar qualquer religião diferente do Islamismo Wahabi era formalmente proibido, mas, mais recentemente, o Governo concedeu estatuto legal
aos Católicos, aos Anglicanos, aos Ortodoxos, aos Coptas e às Igrejas
Indianas. O reconhecimento oficial requer a presença de pelo menos
1500 crentes no país.
Em Maio de 2009, o Governo emitiu uma série de ordens de expulsão para um grupo multinacional de cristãos expatriados, devido ao
seu envolvimento em actividades de ONG’s em zonas industriais, sem
autorização. Estas ordens foram posteriormente revogadas, permitindo que os interessados continuassem a viver no país se assim o
desejassem.
Durante o mês de Maio, funcionários dos Negócios Estrangeiros notificaram que as celebrações de grupo das Igrejas e congregações nãoregistadas têm de se realizar sob a égide de uma das seis Igrejas reconhecidas legalmente e registadas, como sub-grupo dessa Igreja.
Circunscrições
eclesiásticas
---
SUPERFÍCIE
11.000km2
POPULAÇÃO
1.508.000
REFUGIADOS
29
DESALOJADOS
---
174
CAZAQUiSTÃO
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos51,6%
Agnósticos34,4%
Cristãos13,5%
Outros0,5%
Cristãos
2.650.624
Católicos
161.000
Circunscrições
eclesiásticas
4
SUPERFÍCIE
2.724.900km2
POPULAÇÃO
15.753.000
REFUGIADOS
4.340
DESALOJADOS
---
175
CAZAQUiSTÃO
A 1 de Janeiro de 2010, o Cazaquistão, liderado desde 1989 pelo presidente Nursultan Nazarbayev, tornou-se o primeiro país islâmico, e
primeiro estado que fazia anteriormente parte da União Soviética, a
assumir a liderança anual da Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa, a OSCE. Em 2009, e pelo terceiro ano consecutivo, acolheu o Congresso de Líderes de Religiões Mundiais e Tradicionais. Contudo, e apesar desta imagem de tolerância religiosa que o
Governo promove internacionalmente, o país continua a violar o seu
próprio compromisso de permitir a liberdade de culto ou de crença.
Nos anos que se sucederam ao colapso da União Soviética, o Cazaquistão foi amplamente considerado um modelo a imitar no que toca
à adopção da democracia e ao nível do respeito pelos direitos humanos e pela liberdade religiosa.
Nos últimos anos, contudo, o Governo tem demonstrado uma predisposição progressivamente maior para o reforço do controlo estatal
sobre todas as actividades religiosas. O último passo neste sentido
foi tentado em finais de 2008, com a aprovação parlamentar de uma
nova lei contendo pesadas restrições à liberdade religiosa. Contudo,
o Tribunal Constitucional rejeitou a Proposta de Lei “Para emendas e
adições a alguns actos legislativos da República do Cazaquistão no
que toca à Liberdade de Crença e Organizações Religiosas”, a qual
teria alterado a maioria da legislação existente sobre estes temas. O
presidente havia enviado a proposta de lei ao tribunal para obter uma
deliberação.
Uma nova disposição administrativa está ainda por aprovar, tendo o
Parlamento planeado examinar as modificações à “Lei das Organizações Não-Governamentais” em Dezembro de 2011. Os detalhes são
escassos, mas isto poderá afectar também as organizações religiosas.
Na sua análise à liberdade de consciência no Cazaquistão, a agência informativa Forum 18 documentou várias violações graves da
liberdade religiosa em todos os níveis do Governo, tanto a nível
local quanto nacional. As violações incluem a censura de literatura
religiosa, o patrocínio estatal da intolerância religiosa nos meios de
comunicação social, restrições legais à liberdade de religião e crença,
buscas, interrogatórios, ameaças e multas a comunidades religiosas
registadas e não-registadas e a indivíduos, julgamentos injustos, restrições às actividades sociais e aos trabalhos caritativos por parte das
comunidades religiosas, vigilância apertada não apenas por parte da
polícia comum mas também da polícia secreta do Comité de Segu-
CAZAQUISTÃO
rança Nacional, o KNB, e tentativas de confiscação de propriedades pertencentes a organizações religiosas.
Por todos estes motivos, a nomeação do Cazaquistão para a presidência da OSCE gerou
grande surpresa e críticas por parte de grupos ocidentais e especialistas preocupados com
a protecção dos direitos humanos, os quais contestaram a escolha, já que esta colide evidentemente com o apoio aos direitos humanos e à democracia, valores que estão no cerne
dos princípios pelos quais se rege a OSCE. A decisão foi também criticada porque, apesar
dos compromissos assumidos pelo país quando foi informado da sua nomeação, o Governo
cazaque não avançou com quaisquer reformas no sentido de uma maior protecção dos direitos em áreas chave como a liberdade de expressão, de assembleia, de religião e de acesso a
aconselhamento jurídico.
As leis sobre a Liberdade de Religião foram afastadas ou meramente suspensas?
Os receios do aumento da influência de grupos promotores do fundamentalismo islâmico
na Ásia Central levaram a que o Parlamento cazaque definisse uma nova legislação sobre a
liberdade de consciência, à imagem do sucedido em países vizinhos. A legislação, aprovada
a 24 de Setembro de 2008 pela Câmara baixa do Parlamento, a Majilis, transformou-se, na
realidade, numa fortíssima disposição restritiva da liberdade religiosa.
As disposições contidas nesta proposta de lei provocaram críticas internas e internacionais.
Antes de promulgar a lei, o presidente Nazarbayev enviou a mesma ao Tribunal Constitucional para um parecer – mormente pela importância do papel que aquele país havia assumido
após a nomeação para a presidência da OSCE. A 11 de Fevereiro de 2009, Igor Rogov, presidente do Conselho Constitucional, declarou a lei inconstitucional, particularmente porque,
como o mesmo explicou, a nova lei violava as disposições contidas no Artigo 39º, Parágrafo
3, da Constituição, o qual prevê que, “Qualquer tipo de restrição aos direitos e liberdades dos
cidadãos por razões políticas não será permitida.” O Artigo 14º também exclui a discriminação baseada em motivações religiosas e o Artigo 19º afirma que “Todos terão o direito a
determinar e mencionar, ou não mencionar, a sua afiliação nacional, partidária ou religiosa.”
Entre as novas restrições, a lei teria, pela primeira vez, proibido explicitamente as actividades religiosas não-registadas, obrigando todas as organizações religiosas do país a voltarem
a registar-se, com um mínimo de cinquenta cidadãos adultos como membros fundadores,
ao contrário dos dez previstos pela legislação actual. Teria também tornado obrigatória a
obtenção de autorização para a prática de actividades missionárias. A lei teria criado ainda
três tipos de comunidades religiosas, cada qual com um distinto nível de reconhecimento
estatal e distintos direitos e deveres. Os pequenos “grupos religiosos”, o nível mais básico
das comunidades registadas pelo Estado, passariam a ser autorizados apenas à realização
de actividades entre os seus presentes membros, não podendo envolver estranhos ao grupo.
Teriam sido também proibidos de possuir propriedades ou alugar espaços públicos para a
realização de eventos, de receber fundos do estrangeiro ou de dadores anónimos, e de levar a
cabo actividades missionárias. Para além de algumas excepções relativas a objectos pessoais,
176
CAZAQUISTÃO
toda a literatura religiosa trazida para o país teria de ser aprovada por meio de uma “opinião
religiosa” (proporcionada por um especialista). A ocorrência de mais de uma “violação” resultaria na proibição da comunidade religiosa.
Esta legislação foi amplamente criticada, em parte porque as medidas propostas não pareciam ir ter qualquer efeito nas comunidades fundamentalistas islâmicas, antes construindo
obstáculos àqueles que, como, por exemplo, os Cristãos, tentam agir nos limites da lei.
Janez Lenarcic, responsável do departamento das Instituições Democráticas e dos Direitos
Humanos na OSCE, expressou o seu “desapontamento” pelo facto da lei ter sido aprovada
“sem consultas adequadas à sociedade civil e a peritos internacionais.”
Apesar de não ter exprimido uma opinião relativamente à nova lei, Sua Santidade o Papa
Bento XVI referiu-se de forma indirecta à mesma. Dirigindo-se ao novo embaixador cazaque na Santa Sé, Amanzhol Zhankuliyev, aquando da apresentação das credenciais deste em
Dezembro de 2008, o Santo Padre, apesar de elogiar as iniciativas do Governo cazaque no
que toca a promover o diálogo entre culturas e religiões, não deixou de notar que, por forma
a verdadeiramente respeitar a liberdade religiosa, o Estado deve evitar “interferir em matérias de fé ou de consciência dos seus cidadãos”. Um ano depois, o Santo Padre, na recepção ao
embaixador cazaque, Mukhtar B. Tileuberdi, reiterou a importância “do respeito dos Estados
pelos direitos humanos fundamentais, estando entre estes a liberdade de religião. As religiões”, relevou, “têm muito a oferecer em termos de desenvolvimento humano, especialmente
quando se reconhece o papel de Deus na esfera pública, e especificamente no que concerne
às dimensões política, cultural, social e económica.”
Num discurso aos bispos do Cazaquistão, Uzbequistão, Quirguistão e Turquemenistão, quase
uma semana após a promulgação da lei pelo Parlamento cazaque, o Papa, apesar de reconhecer o direito à oposição à “praga de violência e terrorismo e à difusão do extremismo e
fundamentalismo” através de medidas adequadas, não deixou de acrescentar que “a força da
lei pode ela mesma ser transformada em algo de injusto”, não devendo limitar “o livre exercício da religião, visto que professar livremente a fé é um dos direitos humanos fundamentais
e universalmente reconhecidos.”
Não obstante a deliberação do Conselho Constitucional, persiste o receio, entre alguns defensores dos direitos humanos, de que a lei seja reintroduzida logo após o país finalizar o período de presidência da OSCE, em finais de 2010.
Entre os motivos que justificam tais receios, está a aprovação do Plano de Acção Nacional
para os Direitos Humanos para 2009-2010, preparado pela Comissão Cazaque para os Direitos Humanos e ratificado pelo Presidente Nazarbayev em Junho de 2009. Entre as recomendações incluídas no plano, está uma proposta no sentido de que, em 2011, o ministro da
Justiça apresente ao Parlamento uma proposta de lei “Sobre a introdução de modificações
e integrações nos documentos legislativos, para assegurar a liberdade de pensamento, de
consciência e de religião”, um título muito similar à proposta de lei rejeitada pelo Conselho
Constitucional em 2009.
177
CAZAQUISTÃO
Propostas para a modificação do código para os crimes administrativos
Em finais de 2009, o Governo apresentou ao Parlamento uma proposta de modificação do
Código Administrativo, a qual pretende defender as sanções já aprovadas contra indivíduos
ou comunidades religiosas que operem sem obter o reconhecimento oficial, isto apesar dos
variados apelos no sentido da abolição de tais sanções.
Dois artigos em particular foram confirmados, com modificações mínimas que os mantêm
substancialmente inalterados, nomeadamente o Artigo 374º.1 (o qual castiga a liderança,
envolvimento ou financiamento de qualquer comunidade religiosa ou organização social
não registada) e o Artigo 375º (uma lei de ampla latitude, a qual sanciona “violações da Lei
das religiões”, incluindo-se nestas a actividade missionária sem autorização estatal especial).
Estes, em particular, são obstáculos ao livre e pacífico exercício da religião. Uma nova ofensa
– a de incitamento a uma pouco claramente definida “superioridade religiosa” (novo Artigo
405º) – está a ser incluída na proposta de lei governamental.
Dificuldades no exercício da liberdade religiosa
As maiores dificuldades no que toca ao livre exercício das práticas religiosas durante 2009
foram comunicadas maioritariamente por grupos cristãos.
A Igreja Católica do Cazaquistão, uma pequena minoria com menos de 200.000 membros,
menos de 2% da população, não está no topo da lista de comunidades religiosas observadas de perto pelo Governo de Nazarbayev, conseguindo operar discretamente. Permanecem
algumas dificuldades no campo do trabalho pastoral, o qual é muitas vezes considerado com
suspeição e interpretado como actividade missionária.
No Nordeste do Cazaquistão, a um paciente numa instituição psiquiátrica em Michurino foi
negada a oportunidade de receber o sacramento da confissão por parte de um padre católico. Quando acompanhava a visita de um grupo de homens de negócios alemães àquela
instituição em Maio, um padre católico, Josef Schmidtlein, foi interpelado por um paciente
que lhe pediu a confissão. Quando o padre tentou cumprir o seu dever espiritual, o director
da instituição, Sapardek Abdulin, informou o sacerdote de que não o poderia autorizar a fazêlo, dado que o indivíduo em questão era muçulmano, não sendo na altura responsável pelos
seus actos.
Comentando o episódio, o P. Schmidtlein falou das dificuldades e obstáculos burocráticos
colocados aos sacerdotes católicos no que toca ao acesso a instituições fechadas, entre as
quais prisões.
Um problema amplamente generalizado em muitas organizações religiosas é o do registo, o
qual é obrigatório por lei, mas bastas vezes difícil de obter (grupos pertencentes ao Conselho
das Igrejas Baptistas recusam-se, por princípio, a registar-se, considerando que tal obrigação
é uma interferência estatal não justificada em assuntos religiosos). Uma perita em assuntos de minorias das Nações Unidas, Gay McDougall, que visitou o Cazaquistão em Julho de
2009, ecoou os pedidos de comunidades religiosas locais e activistas dos direitos humanos,
178
CAZAQUISTÃO
no sentido da abolição dos numerosos requisitos legais para o registo. Após a sua visita ao
país, a mesma escreveu que “A presente lei de registo de organizações e actividades religiosas
deve ser forçada a respeitar a Constituição da República e os padrões legais internacionais.
A lei não deverá jamais restringir as actividades legítimas por parte de indivíduos ou grupos
religiosos. As medidas repressivas contra grupos religiosos e os seus membros devem cessar
imediatamente.”
As sanções mais severas e mais frequentemente impostas aos fiéis passam pela violação dos
Artigos 374º.1 e 375º do Código Administrativo, os quais punem a actividade religiosa numa
comunidade religiosa não registada, e a realização de actividade missionária sem autorização oficial, respectivamente.
Por exemplo, em Agosto, quatro baptistas na cidade de Jambeyt, distrito de Syrym - Sergei
Krasnov, K. Batimov, Ivan Isayev e N. Maksina -, os quais visitavam amigos, foram multados
em 64.000 Tenge (o equivalente a 290 euros e cerca de cinquenta vezes o ordenado mínimo)
por violação do Artigo 374º.1. Este mesmo artigo foi usado em Janeiro de 2009 para justificar
a imposição de uma multa de 326 euros a Yuri Shlyapkin, um baptista de Kyzylorda, no Sul do
país. No ano seguinte, e na mesma região, na aldeia de Ayteke Bi, uma outra cristã baptista,
Zhanna-Tereza Raudovich, (desempregada e mãe de seis filhos) foi punida com uma pesada
multa (equivalente a 700 euros) após a polícia ter efectuado buscas ao seu apartamento
quando a mesma acolhia um encontro de oração para mulheres e crianças.
Multas por saldar podem levar a consequências de monta. A 8 de Junho, o Pastor Vasily Kliver foi enviado para a prisão por cinco dias, após se ter recusado a pagar uma multa a ele
imposta por liderar uma congregação não registada na cidade de Aktobe. Antes de ser detido,
o apartamento do pastor foi revistado, tendo sido confiscado um frigorífico. Dado não existirem mais objectos de valor que pudessem ser confiscados em substituição da multa, o
pastor acabou detido. Semelhante destino teve Yuri Radenko, pastor baptista da região de
Almaty, em Janeiro de 2009, sendo detido e aprisionado durante três dias por se recusar a
pagar multas impostas após a realização de serviços religiosos numa comunidade não registada. Em Março, as autoridades revistaram o seu apartamento para confiscar bens de valor
equivalente à multa por pagar. Em Abril, o Pastor Pavel Leonov foi sentenciado a um dia de
prisão após ser multado em várias ocasiões por levar a cabo cerimónias religiosas não autorizadas. Em Janeiro de 2009, um outro membro da Igreja Baptista, Aleksandr Kerker, com seis
filhos, perdeu o emprego após polícias terem visitado o seu patrão no sentido de garantir que
o seu ordenado seria pago directamente às autoridades, para assim saldar uma multa por
pagar. O empregador recusou-se a colaborar, mas, temendo possíveis complicações, optou
por despedir Kerker.
A ambiguidade legal no que toca à actividade missionária leva frequentemente as autoridades a incluir na mesma classificação quaisquer actividades religiosas levadas a cabo por
estrangeiros. Para além de multas pesadas, as sanções podem incluir a expulsão daqueles
acusados de levar a cabo actividades missionárias não autorizadas.
179
CAZAQUISTÃO
Foi o que sucedeu ao Pastor Baptista Viktor Leven, nascido no Cazaquistão mas cidadão alemão, e que arrisca a deportação e consequente separação da sua mulher e seis filhos. Leven,
residente legal no país, limitou-se a assistir a um evento religioso levado a cabo numa congregação pertencente ao Conselho de Igrejas Baptistas na região de Akmola, mas, dado ser
cidadão alemão, acabou sendo acusado de actividade missionária sem a necessária autorização estatal. Inicialmente, em Outubro, Leven ganhou o recurso contra sentença mas, a 26 de
Novembro, o tribunal regional de Akmola voltou a reafirmar a ordem de deportação. Assim,
Leven pode ver-se obrigado a deixar o país a qualquer momento. O seu caso é mais delicado
tendo em conta que, de forma a ver atribuída a cidadania cazaque, renunciou à cidadania
alemã, a pedido das autoridades cazaques. A sua nova cidadania, contudo, nunca foi aprovada, devido à ordem de deportação emitida pelos tribunais. De momento, Leven não tem
qualquer cidadania, estando assim impossibilitado de procurar emprego. Dois dos irmãos
de Viktor Leven foram também alvo de perseguição estatal. O seu irmão Didrikh foi multado
no equivalente a 575 euros, por violar o Artigo 374º.1 do Código Administrativo. Outro irmão,
David, fora anteriormente vítima de uma acicatada campanha mediática por parte de alguns
jornais locais, os quais publicaram um artigo escrito pela activista anti-seitas, Gulnara Orazbaeva, no qual esta o acusava de contribuir para a morte de um dos seus próprios filhos
devido à sua fé baptista, impedindo que a sua mulher se deslocasse ao hospital quando se
encontrava em trabalho de parto. No mesmo artigo, Orazbaeva criticou os Baptistas por se
recusarem a ler jornais, a ver televisão, ou a interessarem-se pela situação política e social. “É
sabido”, escreveu, “que uma das características que distinguem as seitas destrutivas é o seu
isolamento relativamente à sociedade.” Orazbaeva concluiu o artigo apelando ao Estado no
sentido de que este “implemente todas as medidas possíveis para combater as consequências físicas, psicológicas e socialmente negativas de tais seitas destrutivas.”
A 5 de Novembro de 2009, Feruza Utegenova, membro da Igreja da Nova Vida, em Aktau,
foi deportada para o Uzbequistão. Uteganova, cidadã uzbeque que vivia no Cazaquistão há
mais de dez anos, havia sido julgada e multada em Junho por violação do Artigo 375º, após
oferecer um jornal infantil de cariz cristão a uma rapariga de 12 anos de idade que vivia no
apartamento ao lado do dela. A deportação separou-a dos seus quatro filhos, os quais ainda
vivem em Aktau. O mesmo tribunal havia já sentenciado outro membro da mesma comunidade, Vera Alibekova, ao pagamento de uma multa equivalente a 60 euros, por semelhante
violação. Alibekova, a qual trabalhava como técnica numa escola local, foi despedida imediatamente após a sentença. Em Junho de 2009, um tribunal impôs uma paralisação de seis
meses às actividades da Igreja da Nova Vida, em Aktau, na sequência da multa equivalente
a 60 euros atribuída ao Pastor Maksim Tashenov por estar presente num serviço religioso
realizado numa região distinta daquela na qual a sua Igreja está registada.
As inspecções a grupos religiosos por parte das autoridades locais são bastante frequentes,
sendo por vezes levadas a cabo com a violência de um raide policial. Um destes raides foi
realizado em 26 de Agosto contra a congregação baptista de Rudny, na região de Kostanai,
quando elementos do Departamento de Polícia Criminal filmaram uma missa, identificando
180
CAZAQUISTÃO
todos os presentes. Depois, os membros da Igreja foram interrogados individualmente e
questionados sobre a organização da Igreja, quais os dias em que se reunia, quantas pessoas
assistiam às cerimónias, e quanto dinheiro era angariado através das colectas. Alguns dias
após o raide, as filmagens foram exibidas num canal televisivo regional, acompanhadas de
comentário negativo. O pastor da igreja foi multado no equivalente a 295 euros.
Ainda durante esse mês e em Pavlodar, no Nordeste do Cazaquistão, a polícia invadiu um
apartamento no qual se encontravam reunidos quatro membros da Igreja Presbiteriana da
Graça. Uma das presentes, Safura Mil, foi fisicamente forçada a assinar uma declaração na
qual afirmava ter sido obrigada a submeter-se a um “ritual religioso”. Dois membros deste
grupo, Kayrat Zhgangozhin e Ramil Imankulov, foram acusados em tribunal de “forçarem
indivíduos a realizar serviços religiosos ou a tomar parte em outras actividades religiosas.”
A comunidade Muçulmana Ahmadi em Semey tem, de igual forma, e em numerosas ocasiões,
sido objecto da atenção e controlo policiais. O cidadão paquistanês Tahir Hayat, no país desde
Junho de 2009, viu ser-lhe recusada a renovação da autorização de residência por mais um
ano, a qual lhe permitiria prosseguir a actividade de missionário da comunidade Ahmadi.Na
região oriental de Beskaraga, o Centro Espiritual para a Reabilitação de Toxicodependentes e
Alcoólicos, fundado e dirigido pelo cristão protestante Sergei Mironov, foi forçado a encerrar.
Uma primeira suspensão de actividades, durante seis meses, havia sido imposta em Janeiro,
altura em que o Centro, registado desde 2006 como associação pública, foi acusado de levar a
cabo actividades religiosas não autorizadas, e de converter indivíduos ao Cristianismo. O centro seria assim encerrado, e Mironov multado no equivalente a 163 euros, por violar o Artigo
374º do Código Administrativo. Mironov havia deliberadamente recusado registar o centro
como organização religiosa, primeiro porque o tratamento era providenciado a todos, crentes
ou não-crentes, e também porque, caso o mesmo fosse encarado como organização religiosa,
muitos não se teriam aí dirigido em busca de tratamento. Após novas buscas realizadas a
22 de Agosto, durante as quais a polícia alegou ter encontrado um dos pacientes algemado
num quarto, Mironov foi acusado de “privar uma pessoa da sua liberdade, aproveitando-se
do estado de dependência da vítima”. Apesar de Mironov, apoiado pelos testemunhos de
outros hóspedes do centro, afirmar que as provas haviam sido fabricadas, o tribunal distrital
de Beskaraga decidiu encerrar o centro permanentemente, impondo a Mironov uma multa
esmagadora equivalente a cerca de 1.165 euros.
Diálogo inter-religioso
Em Julho de 2009, e por iniciativa do presidente Nursultan Nazarbayev, Astana acolheu o 3º
Congresso dos Líderes de Religiões Mundiais e Tradicionais. O Congresso teve por objectivo a
reflexão em torno do papel desempenhado pelas religiões na criação de um mundo de tolerância, respeito recíproco e cooperação. No encontro estiveram presentes delegações representativas de variadas religiões mundiais, importantes personalidades do mundo da política
e da cultura, e representantes de organizações internacionais. A delegação do Vaticano foi
liderada pelo Cardeal Jean-Louis Tauran, presidente do Conselho Pontifício para o Diálogo
181
CAZAQUISTÃO
Inter-religioso, o qual relevou a necessidade de identificar valores úteis na formulação de
uma ética universal, partilhando um património moral e, simultaneamente, respeitando a
diversidade de tradições.
O Cardeal Tauran apelou ainda aos legisladores no sentido de que estes ajam “de forma eticamente responsável, visto que os políticos não podem ignorar a ética, assim como o direito
civil e a ordem jurídica não podem menosprezar uma lei moral superior.” A assembleia de
líderes redigiu uma declaração comum na qual foi abordada a liberdade de religião, particularmente o direito a praticar a própria fé em público ou em privado, enfatizando o facto de
que as religiões são elementos de paz e não de conflito, e reiterando a necessidade de evitar
a manipulação da religião por motivos políticos. A importância do diálogo inter-religioso foi
também destacada, assim como o facto de que a cooperação na defesa e promoção de valores espirituais e humanos partilhados é a base sobre a qual poderá ser construído um entendimento e conhecimento recíprocos e efectivos, permitindo-nos ultrapassar os preconceitos
que estão na origem das divisões e dos conflitos.
O diálogo inter-religioso foi também discutido no encontro de Novembro de 2009 entre o
Papa Bento XVI e o presidente Nazarbayev. O Papa recebeu Nazarbayev na véspera do dia em
que o Cazaquistão assumiu a presidência da OSCE.
182
CHinA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Agnósticos39,5%
Religiõestradicionais
chinesas32,1%
Budistas13,5%
Cristãos8,6%
Animistas4,3%
Muçulmanos1,6%
Outros0,4%
Cristãos
94.451.087
Católicos
8.000.000(*)
Circunscrições
eclesiásticas
290
SUPERFÍCIE
2.663.610km2
POPULAÇÃO
1.338.202.000
REFUGIADOS
301.081
DESALOJADOS
--(*) estimativa
183
CHinA
O destaque de 2009 foi a celebração dos sessenta anos da República Popular da China (RPC). O espectáculo deslumbrante do poder
da China que foi exibido na parada militar de 1 de Outubro na Praça
Tiananmen e ao longo da Avenida Chang’an (Rua da Paz Eterna) foi
projectado para mostrar sessenta anos de um progresso constante e
sem entraves sob a liderança unida e forte do Partido Comunista Chinês (PCC). O presidente Hu Jintao usou um fato idêntico aos que Mao
usava, sendo a sua fotografia colocada ao lado das de Mao Tsé-tung,
Deng Xiaoping e Jiang Zemin. Nem uma palavra foi dita sobre os problemas que o Partido causou no passado ou está a causar no presente
(purgas, perseguições, campos de trabalhos, fome, etc.).
No entusiasmo do momento, todas as religiões oficiais (aquelas que
são reconhecidas e registadas pelo Estado) foram instruídas no sentido de celebrar o 60º aniversário com cerimónia, orações e eventos
de boa sorte.
O ano de 2009 também marcou o 20º aniversário do massacre da
Praça Tiananmen. Temendo manifestações e distúrbios, o Governo
prendeu mais pessoas e reforçou a sua censura às organizações que
tendem a escapar ao seu controlo.
Na realidade, a liberdade religiosa continua a ser desrespeitada. Por
ocasião dos Jogos Olímpicos de 2008, houve um reforço das restrições,
o qual continuou ainda em 2009, e parece claro que as autoridades
querem manter o controlo total sobre todas as actividades religiosas.
Apesar de ostentarem a autonomia dos grupos religiosos, as autoridades continuam a interferir bastante na vida interna dos mesmos em
nome do patriotismo (baseando-se no princípio de aiguo, aijiao, “ama
a pátria, ama a Igreja”). As detenções continuaram a ocorrer ao longo
do ano à medida que o Estado tentava eliminar grupos não-oficiais
ou clandestinos. De igual modo, o Governo tentou classificar de forma
idêntica todas as confissões religiosas protestantes e escolas budistas, elogiando a forma “democrática” de organização religiosa, embora
coloque os grupos religiosos sob o controlo de associações patrióticas.
Com a economia numa crise profunda, foi pedido aos grupos religiosos que tivessem um papel activo no desenvolvimento económico do
país, atraindo investimentos estrangeiros ou agindo como agências
de solidariedade social em todas as áreas que o Estado não cobre
(idosos, deficientes, órfãos, etc.) ou quando ocorrem desastres naturais e outros (terramotos, inundações, danos urbanos ou ambientais).
Ao mesmo tempo, os ataques contra as “relações” entre os grupos chineses e “os poderes estrangeiros que interferem nos assuntos inter-
CHinA
nos” da China continuaram a existir como dantes. Entre estes “poderes estrangeiros” contam-se, alegadamente, o Vaticano, os muçulmanos (em Xingjian), os tibetanos (no Tibete), os
mongóis (na Mongólia Interior).
Nenhuma lei foi aprovada no campo da liberdade religiosa, embora as propostas tenham
sido feitas há já vinte anos. Ao invés, o Governo continua a confiar em regulamentos locais
ou provincianos, que estão abertos a interpretações locais, independentes de qualquer legislação nacional.
Uma lei nacional iria permitir a todas as religiões que se encontram presentes na China,
incluindo aquelas que não são reconhecidas ao abrigo das leis existentes, como o Hinduísmo, o Cristianismo Ortodoxo, o Judaísmo, etc., escapar ao jugo da ilegalidade. Actualmente,
o Governo apenas reconhece o Budismo, o Taoísmo, o Islão, o Cristianismo Protestante e o
Catolicismo.
China – Os Católicos
Em 2009, o PCC fez o possível e o impossível para manter afastadas as comunidades oficiais
das clandestinas, dando ênfase aos “deveres” das primeiras (amar a pátria, evitar influências
estrangeiras, e mais) e detendo cada vez mais pastores e padres das últimas, que se recusam
a submeter ao controlo total da Associação Católica Patriótica da China (ACPC).
Detenção de bispos e padres clandestinos
A detenção mais proeminente foi a do Monsenhor Jia Zhiguo, bispo clandestino de Zhengding (Hebei) que teve lugar às 16h no dia 30 Março. Cinco polícias com dois carros foram à
residência do bispo e levaram-no para um local secreto. O Monsenhor Jia, de 74 anos, sofre
dos efeitos de anteriores detenções e da velhice. Os crentes da sua diocese temem que a sua
vida possa ser posta em risco se passar mais tempo na prisão.
A Polícia já tinha detido o Monsenhor Jia várias vezes, mantendo-o em isolamento, longe
da comunidade durante meses a fio. Durante estes períodos, tentaram conquistá-lo para as
posições do Partido relativamente à religião e tentaram que ele se juntasse à ACPC.
A sua detenção parece ser a última tentativa para impedir a pressão do Vaticano para uma
reconciliação entre a Igreja oficial e a clandestina em Hebei, a região com o maior número
de católicos.
Meses antes, o Monsenhor Jang Taoran, Bispo de Shijiazhuang (Hebei), a diocese da Igreja
oficial, reconciliou-se com a Santa Sé e aceitou, por sugestão do Vaticano, trabalhar com o
Bispo Jia Zhiguo, tornando-se seu bispo auxiliar. O Monsenhor Jia seria por seu turno o bispo
ordinário da diocese, embora continuasse a pertencer à Igreja clandestina não reconhecida
pelo Governo.
Os dois bispos encontraram-se frequentemente e começaram a desenvolver um plano pastoral em comum. Porém, assim que a ACPC descobriu, forçou os dois bispos a deixarem de se
encontrar e colocou-os sob custódia policial 24 horas por dia. De acordo com os paroquianos
184
locais, a polícia disse ao Monsenhor Jia Zhiguo que “trabalhar em conjunto era uma má ideia
porque um poder estrangeiro como o Vaticano estava por detrás. Se eles [os dois prelados]
quisessem cooperar, deveriam fazê-lo através do Governo e da ACPC.”
Dada a oposição do Monsenhor Jia à ACPC, a polícia tentou enganá-lo, dizendo que o Governo
ia nomear outra pessoa para o seu lugar, e que “estava na hora dele se aposentar porque
estava doente.”
Foi preso enquanto a Comissão Plenária sobre a Igreja na China reunia, no Vaticano (30 de
Março a 1 de Abril), com a participação de membros da Cúria e de bispos de Hong Kong,
Macau e Taiwan. A Comissão emitiu uma declaração final, expressando o seu “pesar mais
profundo” relativamente à última detenção do Monsenhor Julius Jia Zhiguo e a situação
enfrentada por outros bispos e padres “privados de liberdade”.
O Monsenhor Jia foi libertado no início de Julho de 2010, mas dois outros bispos ainda se
encontram sob custódia policial em locais desconhecidos. O primeiro é o Monsenhor James
Su Zhimin (Diocese de Baoding, Hebei), de 75 anos, que foi preso em 1996, sendo que nunca
mais se ouviu falar dele. Em Novembro de 2003, foi visto num hospital de Baoding, sob
guarda policial, onde obteve tratamento para os olhos e para o coração. Alguns dias depois,
voltou a desaparecer. O outro bispo é o Monsenhor Cosma Shi Enxiang (Diocese de Yixian,
Hebei), de 86 anos, cujo paradeiro permanece desconhecido desde a sua detenção no dia 13
de Abril de 2001. Ordenado bispo em 1982, o Monsenhor Shi passou trinta anos na prisão.
A sua anterior detenção ocorreu em Dezembro de 1990. Libertado em 1993, viveu em isolamento forçado até à sua detenção em 2001.
De acordo com algumas fontes, dezenas de padres clandestinos encontram-se detidos em
prisão ou campos de trabalhos forçados e cerca de dez bispos clandestinos são mantidos em
isolamento.
Em Março, um sacerdote em Dung Lü (Hebei), o P. Paul Ma, de 55 anos, celebrou a Eucaristia
com alguns crentes clandestinos. Por essa razão foi preso e levado para um local desconhecido. Os cristãos locais estão preocupados com o seu destino porque sofre de problemas cardíacos e duvidam que tenha acesso a cuidados médicos durante a detenção.
Em Julho, a polícia prendeu o P. Chen Hezhao, de 40 anos, padre clandestino em Aoxin (Baoding), e levou-o para um local secreto. Ele acabara de regressar de França onde fora realizar
alguns estudos.
CHinA
Perseguição aos mortos
Os bispos clandestinos não são deixados em paz nem sequer quando estão mortos. Habitualmente, o Governo faz o possível para impedir os crentes de participar em cerimónias
comemorativas que a eles digam respeito ou mesmo nos seus funerais ou até mesmo que se
refiram a eles como “bispos”.
No dia 30 de Dezembro de 2009, o Monsenhor Leo Yao Liang, Bispo coadjutor de Xiwanzi
(Hebei), morreu no hospital com a idade de 86 anos, um ano depois de ter sido libertado
da prisão, onde cumpriu uma sentença de três anos. No seu funeral, a polícia fez questão
185
CHinA
de estar presente para manter afastados os membros da sua diocese (clandestina). Apesar
dos controlos policiais e do frio intenso (com o nevão mais prolongado dos últimos sessenta
anos), pelo menos 5000 pessoas compareceram no serviço religioso em memória do bispo.
Uma vez que o bispo pertencia à Igreja clandestina, e não era assim reconhecido pelo
Governo, as autoridades locais forçaram os organizadores do funeral a não usar nenhuma
insígnia que indicasse o seu estatuto episcopal durante o serviço religioso e que se referissem
a ele enquanto “Pastor Yao” em lugar de “Bispo Yao”. No entanto, nos dias que antecederam
o funeral e durante o enterro no cemitério de Xiwanzi, os crentes rezaram abertamente pelo
“Bispo Yao”. De acordo com testemunhas oculares, alguns dos crentes colocaram as insígnias
episcopais dentro do caixão no momento do enterro.
O Monsenhor James Lin Xili, Bispo não-oficial de Wenzhou (Zhejiang), faleceu no dia 4 de Outubro com a idade de 91 anos, depois de passar muitos anos em campos de trabalhos forçados
e em prisão domiciliária. Também ele foi perseguido em morte. As autoridades, que nunca o
reconheceram, não permitiram aos presentes no seu funeral que se referissem a ele enquanto
bispo (zhujiao) nem permitiram aos seus parentes e paroquianos que exibissem a sua fotografia com a mitra e cruz peitoral, ou que fosse enterrado vestindo o hábito eclesiástico. Permitiram, porém, que usassem o termo pastor (mu) e, de acordo com fontes locais e apesar da
proibição oficial, os familiares colocaram-lhe o solidéu antes do seu corpo ser cremado.
O Monsenhor Lin era uma figura famosa e bem respeitada na diocese, por entre os católicos
oficiais e clandestinos, cujo número ascende a cerca de 120.000, com alguns a viverem noutras regiões do país.
Preso em 1999, foi colocado em prisão domiciliária em 2003. A sua doença aproximou as
comunidades clandestinas e oficiais depois das fortes tensões do passado.
Temendo que as duas comunidades se pudessem juntar, cerca de 1000 agentes policiais
foram destacados para a igreja e zonas circundantes onde o seu funeral teve lugar. Pelo
menos 20.000 pessoas assistiram ao serviço religioso.
Humilhar os bispos e dividir os crentes; as funções da Associação Católica Patriótica da China
Para poder executar os seus deveres e falar em público, os bispos católicos têm de ser membros da Associação Católica Patriótica da China ou ACPC e exaltar o seu propósito, ou seja,
o de criar uma Igreja que seja independente da Santa Sé, ainda que tal seja contrário à fé
católica.
O caso mais sensacionalista envolveu o Monsenhor Francis An Shuxin, Bispo clandestino
(coadjutor) de Baoding que se juntou à ACPC em 2009, depois de dez anos na prisão.
O Monsenhor An Shuxin foi libertado no dia 24 de Agosto de 2006 quando a sua ordem de
residência obrigatória foi rescindida. Fontes em Baoding afirmaram que aparentemente ele
tornou-se membro da ACPC devido às ameaças de que seria colocado em isolamento e que
iria ser substituído por outro bispo. Isto foi causa de grande desânimo na comunidade clandestina.
186
CHinA
A sua escolha, segundo o que disse à AsiaNews numa entrevista, pareceu originar de um
desejo de preservar a comunidade e desfrutar um pouco do seu ministério pastoral, mesmo
se isso significasse submeter-se ao controlo da ACPC.
Dois padres clandestinos encarcerados, Padres Pang Guangzhao e Jiang Yanli, também decidiram juntar-se à ACPC, talvez pelas mesmas razões, e foram assim libertados de imediato.
Outros padres em Baoding escolheram por seu turno permanecer na prisão.
Uma chantagem por parte da ACPC contra o Bispo An Shuxin dividiu os católicos em Baoding,
cidade que conta com uma das maiores comunidades clandestinas na China. A sua decisão
semeou a confusão e deixou muitos crentes e padres magoados, os quais vêem agora o bispo
como um “traidor”.
Não obstante, segundo várias fontes, a ACPC não ia arriscar com o seu membro mais recente
e manteve-o e aos seus movimentos sob escrutínio apertado, enviando-o a conferências e a
reuniões para ostentar a vitória da ACPC e gabar-se da política religiosa do Governo.
O mesmo aconteceu aparentemente ao Monsenhor Joseph Li Shan, Arcebispo de Pequim,
que foi forçado a elogiar a ACPC. Isto minou a sua autoridade e a sua reputação e dividiu a
comunidade católica.
O Monsenhor Joseph Li Shan, de 45 anos, foi consagrado arcebispo de Pequim no dia 21 de
Setembro de 2007. Embora tenha recebido a bênção da Santa Sé, ele tornou-se cada vez mais
um peão nas mãos da ACPC nos últimos meses à medida que esta associação tenta manter
a Igreja sob o controlo do Partido.
Por ocasião do 50º aniversário da ACPC e das primeiras ordenações episcopais independentes (ou seja, sem a aprovação do Vaticano), o prelado passou semanas sem fim a fazer discursos em defesa da ACPC e das suas políticas que “içam a bandeira do amor pelo país e do amor
pela igreja”, apoiando “os princípios de independência, de autonomia e da auto-governação
da Igreja.”
Por muito que a primeira noção seja algo de muito agrado de Bento XVI (bons católicos
enquanto bons cidadãos), a segunda, que realça o princípio há muito defendido pela ACPC, o
da separação entre a Igreja Chinesa e a Santa Sé, levou Bento XVI no passado a declarar que
os ideais da ACPC são incompatíveis com os ensinamentos católicos (ver Carta de Bento XVI
aos Católicos Chineses, n.7 e nota 36).
De acordo com vários católicos em Pequim, parece que o bispo delegou a sua missão pastoral
no director da ACPC, um leigo chamado Anthony Liu Bainian.
O Monsenhor Li Shan, para marcar o fim do Ano Paulino e o começo do Ano Sacerdotal, limitou-se a enviar saudações aos padres chamados Pedro ou Paulo e convidou o seu clero para
almoçar. Por seu lado, Liu Bainian usou a ocasião para proferir um longo discurso dirigido aos
homens e mulheres religiosos no qual os incitava a “imitar o Apóstolo Paulo, promover estudos teológicos e construir uma Igreja inculturada que é chinesa em carácter”. Numa elegante
elocução, disponível no sítio da Internet da Diocese de Pequim (http://www.tianguangbao.
org/09.7.1/1.htm), insistiu que a Igreja na China é um exemplo vivo do espírito e do pensamento de São Paulo, que resumiu em quatro pontos: a) um espírito de adaptabilidade, b)
187
CHinA
uma capacidade para superar a tensão entre a religião e a política, obedecendo ao regime
governante; c) um espírito de solidariedade; e d) o poder para viver a evangelização.
“Como São Paulo”, ele derrubou “divisões”, especialmente aquelas entre a Igreja oficial e a
clandestina que, na sua opinião, foram criadas exclusivamente por alguns “poderes ocidentais anti-chineses, o que fere a evangelização.” Normalmente em documentos do Partido, o
Vaticano é tratado como um “poder ocidental (ou estrangeiro) “ que tenta, por (falsas) razões
religiosas, intrometer-se nos assuntos da China.
Entre 10 e 12 de Junho, a 9ª Reunião de Representantes da Igreja Católica em Pequim teve lugar
na capital com a participação de cerca de 230 padres, religiosas, seminaristas e leigos. O Monsenhor Li Shan fez uma comunicação sobre um relatório intitulado “Içar a bandeira do amor pelo
país e do amor pela igreja, promovendo a evangelização da Igreja Católica em Pequim”.
No relatório, de três partes distintas, ele esboçou a história da Igreja na capital, a experiência
dos últimos cinco anos, e a sua missão futura. Na primeira parte, ele realçou a importância
de “fortalecer a ACPC” bem como o papel da “administração democrática da Igreja” e a “Igreja
ao serviço da capital segundo a perspectiva geral da sociedade”. Entre os ideais mais importantes, realçou a “perseverança nos princípios de independência, de autonomia e de autogovernação da Igreja, serviço à sociedade e a administração democrática da Igreja”.
Para entendermos a situação, temos que recordar que em anos recentes quase todos os bispos oficiais foram reconciliados (secretamente) com a Santa Sé. A Carta aos Católicos Chineses de Bento XVI (27 de Maio de 2007) deu ânimo a esta relação, levando muitos bispos
reconhecidos pelo Governo a cooperar com bispos clandestinos.
No entanto, a carta do Papa e a nova unidade entre os bispos da China deram azo a uma
Frente Unida, e a ACPC lançou, durante os últimos meses, uma série de iniciativas para levar
os bispos oficiais a ceder. Um fluxo constante de convocações por parte da Frente Unida e da
ACPC forçaram os prelados a participar de conferências, reuniões, grupos de trabalho, sessões
de definição de políticas, para minar o seu trabalho pastoral. De modo algum é permitido
aos bispos encontrarem-se a sós. Assim, muitos passaram de uma vida de isolamento total, à
mercê dos secretários da ACPC, a reuniões de grupo sob a supervisão rígida da Frente Unida
e da Administração Estatal para os Assuntos Religiosos, vulneráveis à acção de lavagem ao
cérebro desta última.
De acordo com o Cardeal Joseph Zen, Bispo emérito de Hong Kong, isto permitiu ao regime
chinês perseguir a Igreja oficial.
Dia Mundial de Oração e Peregrinação a Sheshan
Com a sua Carta aos Católicos Chineses de Maio de 2007, Bento XVI lançou a ideia de um Dia
Mundial de Oração pela Igreja na China, a ser festejado no dia 24 de Maio, Dia da Festa de
Maria Auxiliadora dos Cristãos, a qual é venerada no Santuário Mariano de Sheshan, a alguns
quilómetros de Shanghai. A intenção do Papa era ajudar à unidade da Igreja na China através
da oração e fortalecer o seu laço com o sucessor de São Pedro.
188
Local de peregrinação há mais de um século, o Santuário de Sheshan é um excelente local
porque atrai os católicos de ambas as Igrejas, oficial e clandestina. Porém, desde que o Papa
instituiu o dia de oração, tornou-se cada vez mais difícil para os católicos visitarem Sheshan.
Como no ano passado, a polícia este ano impôs regras de circulação de tráfego rígidas
durante todo o mês de Maio. Por esta razão, a diocese desaconselhou os crentes de fazerem
a peregrinação a Sheshan. Este ano, até mesmo a Diocese de Shanghai, a única autorizada a
organizar uma peregrinação, suspendeu a sua actividade de promoção para a peregrinação
no dia 23 Maio. Na realidade, não fez nenhuma acção de publicidade ao evento. No passado,
cerca de 20.000 peregrinos visitavam o santuário no mês de Maio. Em 2009, apenas alguns
milhares fizeram a viagem.
Outras dioceses decidiram organizar peregrinações aos santuários marianos mais próximos.
Em Hebei, a região com o maior número de católicos, muitas comunidades clandestinas não
realizaram nenhuma missa por falta de padres devido aos controlos mais rígidos na região
que desincentivam os ajuntamentos públicos.
Amordaçar a Internet
CHinA
No Dia Mundial de Oração pela Igreja na China, o Vaticano colocou o Compêndio da Carta do
Santo Padre Papa Bento XVI no seu sítio da Internet em língua chinesa. O documento apresenta as questões levantadas na Carta num formato de pergunta e resposta, para melhor
compreensão (ver http://www.vatican.va/chinese/pdf/1Compendium_zh-s_en.pdf) tanto em
Inglês como em Chinês (simplificado e tradicional). No entanto, na China, o sítio da Internet
foi bloqueado para impedir as pessoas de lerem e descarregarem a Carta do Papa em Chinês.
O sítio da Internet do Vaticano (www.vatican.va) inclui um serviço em língua chinesa desde
19 de Março de 2009, Dia de São José, em Chinês tradicional (usado em Taiwan e Hong Kong)
e Chinês simplificado (usado no continente). Notícias sobre o Pontífice, os seus escritos dirigidos a jovens e as catequeses de quarta-feira encontram-se acessíveis na China, mas a sua
Carta aos Católicos Chineses, disponibilizada em Maio de 2007, não. Desde que foi publicada,
a Carta foi proibida no continente, impedida de circular livremente, e os sítios da Internet que
a disponibilizaram foram forçados a retirá-la. No entanto, a censura falhou, já que a Carta
chegou a todas as comunidades católicas por canais clandestinos.
Durante anos, Pequim tem tentado controlar a informação que os sítios estrangeiros da
Internet detêm sobre a China através de bloqueios totais ou parciais. Entre os sítios que
foram bloqueados, encontramos o sítio da Internet da Diocese de Hong Kong que contém
muitos dos discursos do Cardeal Joseph Zen, um verdadeiro defensor da liberdade religiosa
na China, bem como o sítio da Internet da AsiaNews e os da Igreja Católica da Coreia e de
Singapura, entre outros.
Conflitos sobre bens da Igreja
Em partes diferentes da China, padres, religiosas e crentes continuam a estar em conflito
com os governos locais sobre propriedades da Igreja, apreendidas pelas autoridades em vio189
CHinA
lação das próprias leis da China para tirar proveito da forte expansão no mercado imobiliário
na China.
No dia 16 de Março de 2009, o P. Francis Gao Jianli, de 40 anos de idade, sacerdote na Diocese
de Fengxiang (Shaanxi), foi agredido quando debatia com o presidente da Câmara da cidade
a devolução de propriedade confiscada à Igreja. O presidente da Câmara convidara o P. Gao a
vir à Câmara para falar sobre um terreno na Paróquia de Xiangong que a Igreja tinha vindo a
reivindicar há já algum tempo. Depois de terem trocado palavras exaltadas, o presidente da
Câmara chamou dois seguranças que agrediram o padre de tal modo que ele teve de ser conduzido a um hospital de Baoji. Em anos anteriores, religiosas em Xian e religiosas e padres em
Tianjin tinham sido alvo de um tratamento semelhante e pelas mesmas razões.
O terreno em questão fora retirado à Paróquia de Xiangong durante a Revolução Cultural
(1966 – 1976) para construir uma fábrica. A fábrica acabaria por encerrar alguns anos depois,
deixando a zona desocupada. Segundo a lei chinesa, aqueles que possuem o título legítimo
da propriedade podem reivindicar a mesma. Porém, nesta ocasião, o presidente da Câmara
recusou.
A Igreja e o Gabinete de Administração de Propriedades do Governo do distrito concordaram pôr de lado a questão do terreno até se encontrar uma solução. Porém, sem advertência
nem o acordo da Igreja, o presidente da Câmara decidiu tomar posse do terreno de qualquer maneira e enviou trabalhadores para o limparem a fim de aí construir um “jardim” para
embelezar a área, nos arredores de Xiangong.
O P. Gao e algumas centenas de crentes fizeram um protesto passivo no local em questão
para impedir os trabalhos. O presidente da Câmara convidou-o então para o seu gabinete
para discutir o assunto, ocasião em que foi agredido. De acordo com testemunhas oculares, o
presidente da Câmara ajudou os atacantes a fugir num carro da polícia.
Quando as notícias da violência chegaram aos crentes, um grande número juntou-se em
frente ao gabinete do presidente da Câmara para uma manifestação, mas não o conseguiram localizar. No dia seguinte, deslocaram-se ao Gabinete Central de Petições de Baoji para
submeter uma petição na qual pediram:
– que o P. Gao receba cuidados médicos totais com todos os custos pagos pelas autoridades
de Baoji;
– que os seus atacantes sejam processados;
– que o terreno seja devolvido à paróquia;
– que o presidente da Câmara apresente publicamente um pedido de desculpas pelas suas
acções.
O Gabinete afirmou que iria tentar responder no prazo de alguns dias, mas não o fez.
De acordo com o Centro de Estudos do Espírito Santo, em Hong Kong, o valor das propriedades da Igreja apreendidas por membros do Partido ou por autoridades locais atinge aproximadamente 130 biliões de yuan (cerca de 13 biliões de euros). Trata-se, no entanto, de uma
estimativa conservadora, porque o valor total pode ser mais elevado à medida que velhos
190
títulos de propriedade vão surgindo nos arquivos que sobreviveram à fúria da Revolução Cultural.
Num outro caso, em meados de Novembro, cerca de vinte Irmãs da Caridade de Tianjin entraram em greve de fome e sede para recuperar a posse de um edifício propriedade da Igreja,
mas vendido pelo Governo a um promotor imobiliário. Devido à desidratação e falta de alimento, sete religiosas tiveram de ser hospitalizadas.
O edifício em questão fica situado no centro da cidade de Tianjin e é uma das estruturas
mais antigas da cidade. Denominada “Casa da Caridade”, foi em tempos um orfanato. O
Governo comunista apreendeu-o em 1950 mas, segundo a lei chinesa, se não for usado para
propósitos socialmente pertinentes, tem de ser devolvido aos seus proprietários legítimos.
Dividir para Reinar
CHinA
A política do Governo de separar os católicos oficiais dos clandestinos para melhor controlar
ambos não conheceu fim em 2009 e em 2010.
No dia 8 de Abril, o Monsenhor Matthias Du Jiang foi nomeado Bispo de Bameng (Mongólia
Interior); no entanto, a ACPC tomou conta da cerimónia, forçando o novo bispo a concelebrar
o serviço religioso com um bispo ilegal, o Monsenhor Joseph Ma Yinglin que tinha sido excomungado latae sententiae.
O Bispo Du foi secretamente ordenado com a bênção da Santa Sé em 2004. Uma vez que não
foi reconhecido pelo Governo, o seu ministério enfrentou vários obstáculos. A sua cerimónia
de entronização, no dia 8 de Abril, deveria ter assinalado o seu reconhecimento enquanto
bispo por parte das autoridades do Governo.
Vários padres e o Bispo Du disseram à AsiaNews que “lamentavam a concelebração forçada
com o Bispo Ma Yinglin, de Kunming, ordenado ilegalmente em 2006. Ma Yinglin é também
o vice-presidente da ACPC, bem como o secretário-geral do Conselho dos Bispos Chineses, o
equivalente para a Igreja oficial a uma possível Conferência Episcopal Católica aprovada pelo
Vaticano.
O Monsenhor Du e vários padres conseguiram resistir durante vários dias à pressão da ACPC
para concelebrar com Ma Yinglin, mas tiveram de acabar por ceder se quisessem que o Monsenhor Du fosse reconhecido pelo Governo.
Fontes locais disseram que antes e durante a cerimónia de entronização, muitas equipas
de segurança foram destacadas para o evento, e que a liturgia, até ao mais ínfimo pormenor, incluindo a hora da missa e a lista de participantes, foi preparada por autoridades do
Governo.
Apenas 300 pessoas foram autorizadas a assistir à cerimónia, embora a igreja tivesse capacidade para pelo menos 1000 pessoas. Entre os convidados, 100 eram representantes do
Governo, além de quarenta religiosas e padres, e 180 fiéis.
No início da missa, um padre do Conselho de Bispos e representantes da ACPC leram o
anúncio da nomeação do Monsenhor Du pelo Conselho. No entanto, o Bispo Du conseguiu
impedir o Bispo Ma Yinglin de presidir à missa; ao invés, o último, nas suas vestes episcopais,
191
CHinA
sentou-se entre os padres. Na sua homilia, o Monsenhor Du agradeceu abertamente ao Papa
por tê-lo nomeado para a Diocese de Bameng.
Protestantes Chineses
Na China, as comunidades protestantes clandestinas têm sido particularmente sujeitas a
perseguição. Isto deve-se em grande parte ao seu número. De acordo com fontes protestantes, as comunidades protestantes clandestinas contam com cerca de 50 milhões de membros
e opõem-se firmemente contra qualquer controlo por parte do Governo segundo o Movimento das Três Autonomias (o qual classifica oficialmente de igual modo todas as confissões
religiosas protestantes). Outra razão é que muitas comunidades protestantes estão envolvidas em obras de carácter cultural e social, o que os aproxima de intelectuais e activistas que,
em nome de princípios de direitos humanos inspirados na Bíblia, são críticos das políticas do
Partido Comunista.
Desde 2007, isto foi sinónimo de uma campanha violenta contra comunidades protestantes clandestinas de modo a fazê-las juntarem-se de forma forçada ao Movimento das Três
Autonomias ou a deixarem de existir (ver “Documento Secreto do Partido quer ‘normalizar’
os Protestantes Chineses”). Ainda assim, muitos protestantes queixaram-se de que, mesmo
quando querem registar as suas comunidades, vêem os seus esforços contrariados pela polícia e pelo Gabinete de Assuntos Religiosos, sendo que estes preferem que elas permaneçam
clandestinas para poderem continuar a persegui-las.
Detenções, destruição e encerramento de igrejas
Em Março de 2009, a Igreja Missionária de Wanbang, em Shanghai, foi forçada a fechar. A
Igreja, com 1200 membros, alugara um auditório na cidade para organizar as suas reuniões.
A polícia forçou o proprietário do edifício a cancelar o contrato de arrendamento.
A Igreja Missionária de Wanbang já há algum tempo que se encontrava sob vigilância. Em
10 de Fevereiro, a polícia e membros da Administração Estatal para os Assuntos Religiosos
ordenaram ao Reverendo Cui Quan que impedisse a realização de uma reunião de líderes de
evangelização em Shanghai. Normalmente, esta reunião anual reúne apenas um pequeno
número de clérigos para estudar os modos para tornar a evangelização pertinente nos centros urbanos.
O Reverendo Cui tentou ganhar tempo, dizendo que todos os convidados já tinham chegado;
porém, a polícia conseguiu que ele cancelasse a reunião através de pressões e ameaças. Dias
depois, a sua Igreja recebeu uma notificação de despejo.
Para o Reverendo Liu Tongsu, que assistiu a tudo isto, “usar a polícia para pôr fim a um acordo
privado que é legal, é em si mesmo uma violação da lei chinesa”.
No dia 19 de Março, Shi Weihan, de 38 anos, foi preso em Pequim por imprimir e distribuir
Bíblias e literatura cristã religiosa sem uma licença do Governo. Em sua defesa, Shi afirmou
que uma vez que ele oferecia as Bíblias, não podia ser acusado de práticas comerciais ilegais.”
192
CHinA
Na confissão escrita que a polícia conseguiu extrair dele, afirmou que ler a Bíblia pode transformar as pessoas em melhores cidadãos.
Acabaria por receber uma sentença de três anos no dia 10 de Junho por “práticas comerciais
ilegais”, sendo ainda multado em 150.000 yuan (cerca de 17.000 euros).
Shi, que é proprietário de uma livraria, é também o pastor de uma Igreja que não é reconhecida pelo Governo. Dois outros cristãos, ambos sócios de Shi no negócio de publicação de
Bíblias, foram também condenados.
Durante o julgamento, o advogado de defesa demonstrou que as acusações eram infundadas. “O réu Shi Weihan”, afirmou o seu advogado de defesa, “não tentou fazer lucros ilegais
quando imprimiu a Bíblia e outros livros religiosos.” Pelo contrário, “ao disseminar o Evangelho de Cristo”, o réu procurou “purificar as almas das pessoas, aumentar os seus recursos
espirituais e promover o comportamento conducente à harmonia social e ao desenvolvimento estável”, afirmou o advogado.
A publicação de Bíblias encontra-se sob a jurisdição da Administração Estatal para os Assuntos Religiosos. Vender Bíblias está estritamente reservado a Igrejas autorizadas pelo Governo.
Muitas comunidades protestantes, porém, com a ajuda de comunidades estrangeiras, imprimiram e importaram milhões de exemplares para a China como parte do seu trabalho de
evangelização.
No dia 21 Março, o Reverendo “Bike” Zhang Mingxuan foi preso. Ele lidera a Aliança das Igrejas
Domésticas Chinesas que reivindica representar mais de 250.000 pessoas. Zhang, que acabaria por ser libertado, falou sobre a sua detenção em Yanjiao (Hebei) onde parara durante a
noite depois de celebrar um baptismo.
“Às 6h da manhã do dia 21 de Março, mais de uma dezena de polícias e líderes locais chegaram da cidade de Yongle, distrito de Tongzhou. [. . .] Prenderam-me e interrogaram-me
e confiscaram os meus três telemóveis e os meus cartões bancários. Interrogaram-me de
forma muito dura e forçaram-me [a segui-los] até às instalações deles na cidade de Yongle. [.
. .] Revistaram-me cuidadosamente” e “ameaçaram matar-me.”
Acabaria por ser levado para a cidade de Nanyang (Henan), chegando ao amanhecer do dia
seguinte, e sendo libertado ao final da tarde do mesmo dia. Na tarde do dia seguinte, recuperou os
seus bens, com excepção do cartão de crédito, o qual revelou um levantamento de 150.000 yuan.
Porque se trata de um líder influente no movimento das Igrejas Domésticas, Zhang tem
vindo a ser alvo de perseguição há vários anos, ameaçado pela polícia enquanto as autoridades tentam isolá-lo da sua comunidade mais vasta. De facto, foi detido várias vezes durante
os Jogos Olímpicos de 2008 e afastado de Pequim. As autoridades tinham-lhe prometido que
lhe seria permitido, juntamente com a sua família, regressar à capital depois de os Jogos de
Beijing terminarem. Até agora, tal não aconteceu.
No dia 13 Setembro às 15h, em Linfeng, Município de Fushan (Shanxi), centenas de polícias
destruíram uma igreja protestante e agrediram dezenas dos seus membros. Muitos foram
hospitalizados, mas recusaram a ajuda médica sob ordens policiais. Para o Governo local, o
edifício não era uma igreja, mas sim uma estrutura ilegal.
193
CHinA
Durante a noite, pelo menos 400 polícias e indivíduos com braçadeiras vermelhas entraram
no edifício usado como capela dentro da fábrica de calçado Good News Cloth. Usando dois
bulldozers, começaram a demolir o edifício à medida que a polícia, usando tijolos e outras
ferramentas, atacaram os crentes que tinham acampado no local do edifício em construção para impedir a sua destruição. Numa hora, pelo menos dez pessoas ficaram gravemente
feridas; outras perderam os sentidos e foram levadas para um hospital. De acordo com testemunhas, as autoridades ordenaram aos médicos no serviço de urgência que retardassem o
tratamento e impediram-nos de realizar transfusões de sangue.
A violência durou horas. A polícia abandonou a zona pouco antes de amanhecer, deixando
atrás de si pelo menos 100 feridos. O edifício da capela e outras estruturas da fábrica ficaram em ruínas. Mobília, Bíblias, telemóveis e dinheiro foram destruídos ou roubados. Um dos
crentes afirmou que o cenário era “pior que o terramoto em Sichuan”.
Durante a noite, dezenas das pessoas foram detidas. A maioria foi mais tarde libertada, mas
cinco, considerados os líderes da comunidade, ficaram detidos.
Um tribunal em Linfen (Shanxi) condenou-os a penas de prisão que variam entre três e sete
anos. Os cinco pregadores – Yang Rongli, Wang Xiaoguang, Cui Jiaxing, Zhang Huamei e Yang
Xuan – foram condenados por “ocupação ilegal de terras” e por “reunirem uma multidão para
perturbarem a ordem pública”.
Dois deles, Yang Rongli e Zhang Huamei, são mulheres e foram-lhes atribuídas penas de,
respectivamente, sete e quatro anos de prisão. Os outros três, incluindo o Reverendo Wang
Xiaoguang, ficaram com três e quatro anos. A Igreja doméstica tem uma congregação de
cerca de 60.000 membros.
Em Novembro, a Igreja Protestante Shouwang, com sede em Pequim, foi forçada a fechar
por causa da censura do Governo. Forçados a sair do edifício da sua igreja, os 700 membros
encontraram-se num parque para o culto, apesar de uma tempestade de neve que se desenvolvia em seu redor.
Em Xinjiang, uma onda de perseguição desabou sobre cristãos Han e uigur entre o Natal
de 2009 e o Ano Novo. No Dia de Natal, a polícia irrompeu pela casa de Wang Qiyue, uma
viúva de 71 anos, e interrompeu o serviço religioso que aí estava a ter lugar. No mesmo dia, a
polícia irrompeu pela casa de He Cuiying, um hemiplégico de 69 anos, onde vários cristãos se
tinham juntado para rezar. Cinco cristãos idosos foram presos e cada um multado em 5000
yuan antes de serem libertados. A polícia apreendeu também mais de trinta Bíblias.
No dia 7 de Janeiro, a polícia de Xinjiang deteve catorze cristãos no Distrito de Aksu. “Foram
interrogados porque se estavam a encontrar de forma ilegal”, afirmou Chen Xiaolong, o chefe
da polícia de Nongwushi. “Aconselhámo-los a que fossem antes para uma Igreja registada”,
explicou Chen. Do grupo de catorze, onze ficaram detidos durante mais de doze horas. “Mas
todos já foram entretanto libertados”, apressou-se o chefe da polícia a acrescentar.
No dia 8 de Janeiro de 2010, a polícia em Handan (Hebei) cercou um edifício onde um grupo
de estudo da Bíblia estava reunido. Acompanhados por funcionários governamentais locais,
os polícias prenderam cerca de trinta cristãos, incluindo um pastor e um presbítero.
194
Suprimir a fé, a cultura e os direitos humanos
CHinA
Inspirados pela sua fé, muitos cristãos encontram-se envolvidos na promoção de direitos
humanos e religiosos. Ao mesmo tempo, muitos dissidentes e activistas encontram na fé
cristã as bases humanas e filosóficas para lutar pelos direitos humanos na China. Esta é uma
preocupação para o Governo, que tem medo de uma “aliança” entre acção social e religião e
assim continua a suprimir ambos.
A declaração emitida por um grupo de oitenta líderes protestantes chineses (da China continental e do estrangeiro) no 20º aniversário do Massacre de Tiananmen, ocorrido em 4 Junho
de 1989, é um exemplo da relação entre fé e direitos humanos. Nela, os signatários exortaram o Governo chinês para que este se arrependa do que fez e revele a verdade sobre o que
aconteceu.
Os líderes protestantes – intelectuais, estudantes e membros do clero na China, em Hong
Kong, em Taiwan, nos EUA, no Canadá, na Austrália, na França e no Japão – afirmaram que a
fé “faz com que seja impossível esquecer a tragédia que ocorreu no dia 4 de Junho de 1989. [. .
.] Até agora, a verdade desta tragédia continua escondida por desígnio do Governo” e muitas
“vítimas continuam a sofrer repressão.”
De acordo com aqueles que assinaram a declaração, embora o véu de silêncio que envolveu
a tragédia permitisse ao país desenvolver o seu poder económico, também levou as pessoas a esquecerem o crime. “Seguiram-se a apatia, a indiferença e o entorpecimento face à
moralidade” como também a “corrupção que grassa entre os funcionários do Governo” e as
“desigualdades sociais”.
Estes líderes estão especialmente preocupados com os jovens chineses que, por causa de
“mentiras criadas por uma estrutura autoritária”, não conhecem os valores morais e sabem
muito pouco sobre o que aconteceu no dia 4 de Junho.
No que diz respeito a uma interpretação cristã do massacre de Tiananmen, os signatários
reconhecem que muitos deles, devido ao sofrimento causado pelo massacre, se tornaram
cristãos. Na realidade, muitos dissidentes exilados voltaram-se para o Cristianismo depois
dos eventos de 4 de Junho, de modo a aí encontrar a justiça e o respeito pelos direitos humanos.
Uma vez que passaram a ver esta página da história através de olhos cristãos, também compreenderam que “Independentemente de como algumas ideologias possam parecer boas,
se elas forem construídas apenas com base na natureza humana, esquecendo totalmente
a Deus, elas podem brilhar como ouro mas ser, na realidade, podres até ao seu cerne.” Do
mesmo modo, perceberam que também eles não “são fundamentalmente diferentes daqueles que ordenaram, conduziram e executaram o massacre.”
Por esta razão, os oitenta líderes exortaram as Igrejas cristãs a arrependerem-se do seu silêncio relativamente ao massacre. Também pediram às autoridades que se arrependessem do
que fizeram, descobrissem quem foi responsável, recordassem o acontecimento, indemnizassem as famílias das vítimas e permitissem que os exilados pudessem regressar a casa.
195
CHinA
No dia 3 de Novembro de 2009, um investigador no Instituto de Direito da Academia Chinesa
de Ciências Sociais, Fan Yafeng, foi despedido por “razões políticas”. Sendo protestante, disse
que foi convocado pelos seus superiores, o director do instituto e o secretário do Partido, os
quais lhe disseram que o seu contrato tinha terminado. Ambos confirmaram que ele estava
a ser despedido “por razões políticas”.
De acordo com a ONG CHRD (Defensores dos Direitos Humanos Chineses), o despedimento
de Fan Yafeng foi outro elemento importante numa política projectada para eliminar as Igrejas protestantes clandestinas da capital. O próprio Fan lidera uma Igreja doméstica local, mas
era também um investigador modelo na Academia. Escreveu extensivamente sobre lei constitucional e reformas políticas e defendeu frequentemente os direitos dos Protestantes.
Nascido em Anhui, Fan Yafeng, de 40 anos de idade, formou-se na Universidade Anhui Normal em 1992 com o curso superior em Educação. Em 1995, terminou o mestrado em Direito
da Faculdade de Direito da Universidade de Pequim. Em 2003, completou o doutoramento
em Direito na Academia Chinesa de Ciências Sociais.
Liu Xiaobo, um intelectual cristão, foi condenado a onze anos de prisão por “estímulo à subversão do poder estatal” no dia 25 de Dezembro de 2009. Liu, que completou 54 anos no dia
28 de Dezembro, dia em que se festejam os Santos Inocentes, é um dos autores da Carta 08,
um apelo ao Governo para respeitar as necessidades democráticas da população, assegurar
a separação dos poderes do Estado, pôr fim ao monopólio de poder do Partido Comunista, e
garantir totalmente a liberdade religiosa, sem qualquer distinção entre actividades religiosas
registadas e não registadas (ou oficiais e clandestinas).
No seu veredicto, o tribunal declarou que Liu tentou subverter “a ditadura democrática popular e o sistema socialista do nosso país”. Na China, as decisões do tribunal nunca podem ser
independentes dos interesses do Partido; o crime de “incitamento à subversão contra o poder
do Estado” foi incluído no Código Criminal chinês em 1997. É usado de forma regular contra
indivíduos que apenas desejam expressar-se livremente.
Liu fora preso no dia 8 de Dezembro de 2008 por fazer circular a Carta 08, que fora divulgada para marcar o 60º aniversário da Declaração Universal dos Direitos do Homem. Para
a polícia, Liu era o autor do documento, o qual acabou por ser assinado por mais de 9000
pessoas. Seria mais tarde censurado online e muitos daqueles que o assinaram, alguns deles
membros do Partido, foram detidos pela polícia para interrogatório e controlos, e colocados
em prisão domiciliária.
No seu julgamento, Liu viu ser-lhe negada a escolha de advogado e não lhe foi permitido
defender-se a si próprio. A sua mulher, Xia, afirmou que apenas lhe foram concedidos dez
minutos para estar com o seu marido. Ele disse-lhe que iria recorrer apesar das fracas hipóteses de ser bem sucedido.
Para as autoridades chinesas, Liu Xiaobo é “uma figura emblemática”, alguém que eles pensam que podem usar para “assustar outros para que fiquem em silêncio em vista de uma
sentença de tal modo dura”, afirmou o activista cristão Yu Jie, “mas eu penso que o caso dele
irá incentivar outros, ao invés de os assustar.”
196
Realmente, na véspera do veredicto, cerca de 300 personalidades chinesas proeminentes
pediram para serem julgadas ao lado de Liu porque compartilhavam das suas ideias. Bao
Tong, um ex-funcionário de topo do Governo, estava entre elas.
No primeiro dia do julgamento de Liu, no dia 23 de Dezembro, dezenas dos seus amigos e
camaradas manifestaram-se, empunharam bandeiras e gritaram palavras de ordem contra o
sistema jurídico injusto da China.
China – Tibetanos
Para os tibetanos, 2009 foi um ano durante o qual a sua liberdade religiosa foi violentamente
suprimida. Em particular, qualquer acção que elogiasse ou mostrasse reverência para com o
Dalai Lama esteve sujeita a medidas coercivas. Aos olhos de Pequim, o líder espiritual tibetano permanece um inimigo forte, uma figura política que anda a conspirar para separar
o Tibete da China. Por seu turno, os tibetanos vêem o domínio chinês como uma forma de
genocídio cultural e religioso. O seu sonho é ver o Tibete tornar-se independente, fazendo
com que o seu desenvolvimento, bem como o da sua fé, possa ser garantido.
Por seu lado, o Dalai Lama ainda está aberto ao diálogo com Pequim. Por esta razão, prescindiu da independência total da sua nação dos Himalaias, mas insiste na sua autonomia
cultural e religiosa. Para Pequim, trata-se de uma mentira que esconde outros motivos.
Porque religião e política se encontram de tal forma enlaçadas no Tibete, a repressão religiosa contra os tibetanos assume frequentemente um véu político (nunca são acusados ou
condenados à morte por razões religiosas, apenas por razões políticas).
Em todo o caso, Pequim continua inflexível em não se envolver em qualquer diálogo com o
Dalai Lama, que é visto como uma incarnação do diabo, embora ele pudesse ser a chave para
resolver a questão do Tibete.
Conflito de interpretações
CHinA
A liberdade religiosa foi particularmente alvo de agressões em 2009, ano que marcou o 50º
aniversário da insurreição tibetana falhada de 10 de Março de 1959, que terminou na fuga do
Dalai Lama para o exílio.
As recordações dolorosas deixadas pelo aniversário levaram o Governo chinês a fazer planos
para as obviar. Logo em Janeiro de 2009, as autoridades lançaram a ideia, adoptada pela
legislatura da Região Autónoma do Tibete, de celebrar 28 de Março como “Dia da Emancipação do Servo”. Neste dia, “os servos e escravos tibetanos, que correspondem a mais de 90% da
população da região, foram libertados depois de o Governo central ter anulado uma rebelião
armada organizada pelo Dalai Lama e os seus apoiantes” (Xinhua, 19 de Janeiro de 2009).
De acordo com Pequim, em 1950 os chineses intervieram militarmente para libertarem o país
de uma teocracia budista na qual uma elite religiosa tinha escravizado a população. Para
os tibetanos, passa-se exactamente o contrário. Ao contrário da versão dos acontecimentos
197
CHinA
dada por Pequim, a China invadiu o país com força e esmagou a resistência local com derrame de sangue, o que continua a fazer até ao presente.
No dia 10 de Março de 2009, falando em Dharamsala, a sua residência no exílio, o Dalai Lama
acusou a China de matar “centenas de milhares de tibetanos” e de transformar a sua pátria
nos Himalaias num “inferno na terra”. O líder espiritual budista renovou o seu pedido de
“uma autonomia legítima e significativa” para o Tibete, mesmo se sob a soberania de Pequim.
Losar, o Ano Novo tibetano também conduziu a um conflito de interpretações. No ano passado, calhou no dia 25 de Fevereiro e os tibetanos decidiram não o celebrar para protestar
contra a repressão sangrenta da China em 2008. Num movimento contrário, as autoridades
chinesas decidiram organizar grandes celebrações. Durante a noite no dia 24 de Fevereiro, um
espectáculo de fogo-de-artifício imponente iluminou o céu nocturno de Lhasa, mostrando as
ruas desertas quando os residentes decidiram ficar fechados em casa em lugar de se juntarem às festividades. No dia seguinte, um grande contingente de polícia de intervenção, com
carros e armas de gás lacrimogéneo, patrulhou as mesmas ruas. As autoridades fecharam o
Palácio de Potala, a residência histórica do Dalai Lama, e forçaram lojas e negócios a permanecerem encerrados para demonstrar que se tratava de um dia feriado.
Na mensagem do Losar, o Dalai Lama afirmou que “No ano passado, vimos centenas de tibetanos perderem a vida no Tibete e vários milhares foram confrontados com a prisão e a tortura, em resposta ao descontentamento com as políticas das autoridades chinesas que os
tibetanos não se coíbem de mostrar por todo o Tibete.”
Por seu lado, a agência de notícias estatal da China, Xinhua, disse que a população celebrou,
como o fez todos os outros anos, com diversões e comida. Como prova, publicou entrevistas
inspiradoras com pessoas a descrever a harmonia e a serenidade locais. A televisão mostrou
fogos de artifício e danças tradicionais, entre multidões muito animadas. Ainda assim, os
turistas estrangeiros não puderam entrar na região, e um novo contingente de dezenas de
milhares de soldados foi destacado para o Tibete. O acesso à Internet foi bloqueado durante
as celebrações.
De manhã cedo, no dia 25 de Fevereiro, monges do Mosteiro de Lutsang, no Município de
Mangra (Guinan, em chinês) marcharam numa longa fila, cada um segurando uma vela,
durante cerca de 1,5 km até chegarem ao centro da cidade onde apresentaram uma lista
aos funcionários locais contendo aquilo que desejavam ver realizado. Também advertiram as
autoridades chinesas de que o boicote do Losar de 2009 seria mais extenso que os protestos
de rua registados em 2008.
De acordo com a Radio Free Asia, a polícia, depois de uma surpresa inicial, cercou o Mosteiro
e ordenou aos líderes da marcha que se rendessem às autoridades. Caso contrário, seriam
todos tratados de forma “dura”.
Em Lithang, Município de Garzê (Sichuan), uma semana antes do Ano Novo, 24 tibetanos
foram presos na rua por elogiarem o Dalai Lama e apoiarem o “boicote” do Ano Novo. A polícia, usando equipamento de intervenção, montou postos de controlo em Yajiang, uma cidade
na estrada para Lithang.
198
No dia 27 de Fevereiro, um monge tibetano foi morto pela polícia chinesa depois de ter ateado fogo a si próprio em Ngaba (em chinês: Aba) no Tibete Oriental. De acordo com testemunhas oculares, Tapey, que tinha entre 25 e 30 anos de idade e pertencia ao Mosteiro de Kirti,
morreu enquanto cantava slogans e tendo na mão uma fotografia do Dalai Lama. A polícia
disparou sobre ele três vezes; pelo menos uma das balas atingiu-o.
Relatos recebidos do Mosteiro de Kirti afirmaram que a acção de Tapey aconteceu depois de
ele e pelo menos 1000 outros monges serem impedidos de entrar no auditório principal do
Mosteiro para rezar no terceiro dia do Losar. Os monges mais jovens decidiram permanecer
nas imediações do Mosteiro para rezar, embora os monges mais velhos lhes dissessem que
dispersassem. A dada altura, Tapey saiu trazendo consigo uma fotografia grande do Dalai
Lama e a bandeira tibetana, com as roupas encharcadas em gasolina e ateou fogo a si mesmo
assim que chegou à estrada principal. Ouviram-se de imediato três tiros e o jovem monge
caiu por terra. O seu corpo foi recolhido por alguns homens, colocado num veículo e levado.
Detenções e mortes na prisão
CHinA
Para prevenir possíveis distúrbios ligados ao aniversário dos distúrbios de Março de 2008,
a polícia em Lhasa iniciou uma acção preventiva no dia 18 de Janeiro “contra o crime”, indo
de casa em casa, vasculhando hotéis e quartos alugados, bem como cafés e bares, detendo
cerca de 6000 pessoas. Mais para o fim do mês, prendeu pelo menos oitenta e uma pessoas,
acusando-as de porem em risco a segurança da região. No dia 24 de Janeiro, cinquenta e uma
pessoas foram presas por ofensas não especificadas e, no dia seguinte, outras trinta foram
detidas por roubo, assalto e prostituição. Pelo menos duas foram acusadas de estarem em
posse de “música reaccionária”, ou seja, canções que elogiavam o Dalai Lama.
No dia 23 de Janeiro, Pema Tsepak morreu devido a danos “sofridos” enquanto se encontrava
detido. No dia 20 de Janeiro, Pema, juntamente com Thinley Ngodrub e o irmão Thargyal,
transportara um cartaz que dizia “Independência para o Tibete”. Também tinham distribuído
panfletos e cantado slogans, tudo isso no Município de Dzogang, Prefeitura de Chamdo. A
polícia prendeu-os. Pema seria mais tarde levado para um hospital, sofrendo de danos internos graves (incluindo nos intestinos e nos rins), local onde acabaria por falecer.
Na noite de 21 de Março, quase 2000 monges e cidadãos comuns reuniram-see em frente à
esquadra da polícia em Lajong, Município de Machu (Qinghai), para protestar contra a morte
de Tashi Sangpo, um monge que poderá ter cometido suicídio para evitar a captura. A polícia
chinesa prendeu cerca de 100 dos monges que protestavam.
Tashi Sangpo, de 28 anos, do Mosteiro de Raja, e seis outros monges do mesmo mosteiro,
tinham sido presos pela polícia no dia 20 de Março. Testemunhas oculares viram-no a sair a
correr da esquadra da polícia e saltar para dentro da água do rio Machu (em chinês, rio Amarelo). A corrente forte arrastou-o imediatamente e ele nunca mais foi visto.
De acordo com o grupo “Libertem o Tibete” ou Free Tibet, as tensões estavam a subir na zona
depois de os sete monges de Raja terem içado uma bandeira tibetana no topo do auditório
de oração no dia 9 de Março. No dia seguinte, a polícia removeu-a à força. Dez dias mais
199
CHinA
tarde, prenderam os monges, acusando-os de içarem uma bandeira “separatista”. Os protestos iniciaram-se no dia seguinte.
Os manifestantes disseram que Sangpo morreu durante a fuga por causa das agressões e
tortura a que estava a ser sujeito na prisão. Durante o seu protesto, lançaram pedras e agrediram pelo menos um polícia. Depois disso, a polícia prendeu pelo menos noventa e cinco
monges envolvidos na ocorrência, e partiu em busca de outros, segundo reportou a agência
de notícias Xinhua.
No dia 25 de Março, Phuntsok Rabten, de vinte e sete anos, de um mosteiro no Município de
Drango, Garzê (em chinês: Ganzi), estava a distribuir panfletos incitando os camponeses a
pousarem as suas ferramentas de trabalho como forma de protesto contra a perseguição
chinesa e a rezarem pelos tibetanos mortos nas manifestações de 2008. Quando a polícia
chegou, ele fugiu, mas acabou por ser detido, agredido e morto naquele mesmo lugar. Os
colegas monges recolheram o corpo e levaram-no para a esquadra da polícia local para fazer
uma queixa, mas a polícia recusou-se a tomar nota do ocorrido. Em vez disso, as autoridades
disseram que o monge se tinha suicidado ou caído de uma motocicleta.
Também no dia 25 de Março, a polícia prendeu dois outros monges do Mosteiro de Minyak,
no Município de Drango. Também eles tinham incitado os camponeses a pararem de trabalhar em sinal de protesto.
Dois dias mais tarde, a polícia prendeu cerca de vinte camponeses em protesto, e agrediu
onze deles de tal modo que tiveram de ser hospitalizados.
No dia 22 de Maio, Tsayul Kelsang Gyatso, monge do Mosteiro de Labrang, no Município de
Sangchu (em chinês: Xiahe Xian), foi levado, com um capuz a cobrir a cabeça, durante uma
invasão policial súbita que envolveu um grande número de agentes. Nada se sabe sobre o
seu paradeiro ou o seu estado de saúde desde que ele desapareceu. Não foi acusado formalmente de nada, mas crê-se que tenha participado em protestos em Labrang, em 2008. Antes
da sua detenção, ele encontrava-se sob apertada vigilância policial.
No dia 24 de Maio, a polícia chinesa abriu fogo sobre um grupo de tibetanos no Município
de Tawu, Prefeitura de Garzê (Sichuan), que estavam a protestar de forma pacífica contra a
construção de uma barragem. Seis mulheres ficaram gravemente feridas.
Aqui, na zona entre os Municípios de Nyagchu e de Tawu, as autoridades querem construir
uma grande barragem hidroeléctrica. Isto requer a remoção de dezenas de milhares de residentes, mas os habitantes locais recusam-se a abandonar a sua terra ancestral, queixando-se
do facto de terem sido coagidos a concordar em abandonar as suas propriedades no início
de 2008.
Para lidarem com os opositores à barragem, as autoridades destacaram, no dia 5 de Maio, um
grande contingente de agentes policiais, os quais destruíram algumas casas.
Na manhã de 24 de Maio, funcionários do Governo organizaram uma reunião com residentes, ostensivamente para falar com eles sobre a barragem. Em vez disso, limitaram-se a notificar os residentes de que eles teriam de se mudar para outra área. Isto levou a protestos
espontâneos e furiosos, com as pessoas a gritarem a sua recusa em abandonar o local. De
200
CHinA
imediato, a polícia abriu fogo sobre os pacíficos e desarmados protestantes. Seis mulheres,
Tsering Lhamo, Rigzin Lhamo, Dolma, Kelsang, Dolkar e Khaying, ficaram feridas e foram levadas pela polícia. A sua situação actual permanece desconhecida.
No dia 3 Julho, um tribunal em Garzê (Sichuan) condenou o monge tibetano Jamyang Tenzin
a três anos de prisão por protestar contra a “campanha patriótica” lançada no município de
Lithang, em 2007.
Jamyang fora preso no dia 3 de Outubro de 2007 porque se tinha oposto de forma pacífica à
campanha de “educação” no Mosteiro de Yonru, em Lithang. Ficou detido na prisão durante
dois anos depois disso, mas a sua família nunca foi notificada da detenção. Ninguém o pôde
visitar e não se sabe se ele teve um advogado de defesa no seu julgamento.
Em Setembro de 2007, as autoridades chinesas conduziram campanhas de doutrinamento
nos Mosteiros de Lithang. Como parte das actividades, os “instrutores” da campanha queriam que os monges escrevessem reclamações contra o Dalai Lama para provarem a sua
lealdade ao Governo chinês. Janyang protestou contra esta exigência, gritando slogans como
“Que o Dalai Lama viva milhares de anos.” Uma noite, no final da campanha de educação, ele
foi levado.
No dia 27 de Junho, funcionários do Gabinete de Assuntos Religiosos em Bayen (em chinês:
Hualong) expulsaram o monge Lobsang Tsultrim do seu mosteiro e proibiram-no de ir para
qualquer outro mosteiro. Os agentes do Gabinete de Assuntos Religiosos e a polícia chegaram aos Mosteiros de Amdo Jaqung para uma sessão de “educação jurídica”, o novo nome
dado à “educação patriótica”. Trata-se de cursos de doutrinamento para convencer os monges a serem leais a Pequim em lugar de ao Dalai Lama. Funcionários ordenaram Lobsang,
que regia a disciplina, que convocasse todos os 400 monges para a sessão de doutrinamento.
Nenhum apareceu.
Em Agosto, um monge tibetano do Mosteiro de Drepung morreu por causa da tortura infligida durante a detenção. O clérigo budista fora preso durante as revoltas de Lhasa de Março
de 2008, quando foram mortos centenas de tibetanos e detidos milhares. O Centro Tibetano para os Direitos Humanos e a Democracia (TCHRD) anunciou, no dia 19 de Setembro,
que recebeu relatórios de fontes seguras em como o monge Phuntsok Lhundup (nome leigo:
Kalden), morreu na prisão devido à tortura. O indivíduo, de 32 anos de idade, era oriundo da
aldeia Nº 8, em Tos-doe, Município de Phenpo Lhundup, perto de Lhasa, e a sua morte ocorreu
provavelmente em meados de Agosto. A família do monge recebeu o seu corpo inanimado
no final de Agosto.
Em 10 de Março de 2008, Phuntsok e outros 300 monges do Mosteiro de Drepung juntaramse numa marcha pacífica para protestarem contra a política da China em relação ao Tibete.
Forças de segurança prenderam-no bem como a dezenas de outros monges. Depois disso,
nada se soube. Ninguém, nem mesmo os colegas monges ou a sua família, recebeu qualquer
informação sobre a sua detenção.
De acordo com fontes do TCHRD, Phuntsok morreu na prisão em meados de Agosto, de tortura, maus tratos e encarceramento. As mesmas fontes disseram que o irmão de Phuntsok
201
CHINA
Lhundup, Samdup, também do Mosteiro de Drepung, foi também preso no dia 10 de Março
de 2008. Nada se sabe sobre o seu destino.
No dia 5 Dezembro, o Governo chinês prendeu cerca de sessenta tibetanos no Município de
Nyagchuka. Eles exigiam a liberação de Tenzin Delek Rinpoche, um importante líder budista
local, que se encontrava preso há anos sob acusações de subversão. Foi sentenciado a prisão
perpétua em 2005 por vários ataques levados a cabo em 2002 na província de Sichuan, isto
apesar do facto de o Ministério Público não apresentar quaisquer provas contra ele.
No dia 6 de Dezembro, surgiram notícias de que uma religiosa tibetana, detida meses antes
em consequência de um protesto em Garzê (Sichuan), tinha morrido em circunstâncias suspeitas quando se encontrava em detenção. A família não conseguiu recuperar o seu corpo
para que fosse efectuada uma autópsia.
Yangkyi Dolma, de 33 anos, religiosa tibetana em Garzê (em chinês: Ganzi), fora presa no dia
24 de Março de 2009. Acabaria por morrer num hospital em Chengdu (Sichuan). De acordo
com fontes citadas pelo Centro Tibetano para os Direitos humanos e a Democracia (TCHRD),
o corpo de Dolma não foi devolvido à família e não ficou claro se foi feita uma autópsia para
determinar a causa da morte.
No dia 3 de Dezembro, antes da sua morte, a segurança pública em Garzê tinha informado a
família da religiosa do seu estado de saúde débil. Depois de viajar durante a noite, a família
chegou a Chengdu às 6h horas da manhã, mas foi informada que ela já tinha morrido.
Em 24 de Março, Yangkyi Dolma e Sonam Yangchen, do Mosteiro de Lamdrag (em Garzê,
Prefeitura Autónoma Tibetana, província de Sichuan), tinham protestado pacificamente na
praça do mercado de Garzê, pedindo “um regresso rápido do Dalai Lama ao Tibete” e “direitos
humanos e liberdade religiosa para os tibetanos”. Pelo menos cinquenta polícias e pessoal
de segurança cercaram as duas religiosas. Depois de as agredirem com paus e bastões eléctricos, arrastaram-nas para a prisão. No dia seguinte, a polícia revistou a casa da família de
Yangkyi Dolma e interrogou os seus familiares.
Neste momento, nada se sabe sobre o destino de Sonam Yangchen, a outra religiosa que foi
presa.
No dia 23 de Dezembro, o Governo central condenou o abade tibetano Phurbu Tsering Rinpoche a oito anos e seis meses de prisão sob a acusação de “se apropriar de terrenos públicos e
posse ilegal de munições”. Na realidade, a sua condenação está relacionada com as revoltas
anti-chinesas que aconteceram no Tibete no Verão de 2008.
Bem respeitado pela população, o líder budista foi preso no dia 18 de Maio de 2008. Alguns
dias antes, cerca de oitenta religiosas tinham protestado contra a imposição da “reeducação
patriótica” (lavagem ao cérebro) por parte da China em locais de culto tibetanos.
Rinpoche, que conta 53 anos, supostamente confessou, mas os seus advogados afirmaram
que a sua confissão foi conseguida sob tortura.
O Lama já passou quinze anos na prisão.
202
Penas capitais
No dia 20 de Outubro, o Tribunal Popular Intermediário, em Lhasa, a capital do Tibete, sentenciou à morte quatro tibetanos condenados no dia 8 de Abril por alegadamente terem
participado em protestos massivos que abalaram a cidade no ano anterior. A sentença foi
executada imediatamente no caso de Lobsang Gyaltsen, Loyak, Penkyi e uma quarta vítima
desconhecida. A execução foi aprovada pela Câmara Municipal e levada a cabo sob a sua
supervisão. Os meios de comunicação social chineses não noticiaram o evento, o qual seria
porém tornado público pelo Centro Tibetano para os Direitos Humanos e a Democracia
(TCHRD).
De acordo com o TCHRD, Lobsang Gyaltsen era originário de um lugar nos arredores de Lhasa.
O corpo dele foi entregue à família e mais tarde imergido no rio Kyichu. Não está claro se o
recurso formal que os advogados de defesa dos quatro homens apresentaram ao Supremo
Tribunal alguma vez foi examinado.
De acordo com fontes oficiais, o Tribunal Popular Intermédio, no dia 8 de Abril, determinou
uma pena de morte para apenas dois dos acusados, Lobsang Gyaltsen e Loyak. A dois outros,
Thenzin Phuntsok e Kangtsuk, foi atribuída uma pena suspensa, enquanto um quinto, Dawa
Sangpo, foi condenado a prisão perpétua. Todos os cinco tinham sido acusados de pegar fogo
a algumas lojas em Lhasa durante as revoltas de 14 de Março, causando a morte de sete
pessoas.
No dia 21 de Abril, o Tribunal condenou mais três tibetanos à morte: Chime, Penkyi, do Município de Nyemo, e um outro, também Penkyi de seu nome, mas oriundo de Sakye. A sua sentença foi suspensa durante dois anos e poderia ser substituída por tempo de prisão. Dois
outros acusados foram condenados, respectivamente, a dez anos de encarceramento e prisão
perpétua.
A religião e o ambiente
CHinA
Em Maio, centenas de tibetanos confrontaram a polícia durante vários dias em Ser Ngol Lo,
sub-distrito de Tsangshul, aldeia de Lhara (Município de Markham, Prefeitura de Chamdo),
para deixarem de extrair minério numa montanha que eles consideram sagrada.
Em língua tibetana, Ser Ngol Lo significa “Ano Dourado e Prateado”, e é um lugar onde são
tradicionalmente realizados rituais propiciatórios contra a ameaça de seca. Porém, as autoridades chinesas acreditam que é rico em ouro e outros metais preciosos e por isso autorizaram a empresa Zhongkai a explorar naquela zona.
Para deter a empresa, os tibetanos ocuparam a zona pacificamente. As autoridades responderam chamando o exército. De acordo com a Radio Free Asia, pelo menos 300 soldados
foram destacados para a zona a partir de 24 de Maio.
O protesto tem durado meses, com os residentes a recusarem-se a abandonar o local e as
autoridades a insistirem que a montanha tem de ser explorada. Fontes locais afirmaram que,
no início de Abril, Pema Thimley, vice-presidente do Partido Comunista do Tibete, veio até à
203
CHinA
zona para tentar convencer os residentes a não se oporem às escavações. A situação piorou
no dia 16 de Maio, com a chegada da polícia. Mais de 500 residentes entraram em acção de
imediato e bloquearam as estradas que conduzem à mina. Ali permaneceram dia e noite,
enquanto a polícia chinesa se apropriou de uma escola próxima.
Um residente disse que os soldados e a empresa mineira ameaçaram abrir a “estrada à força”.
Outros disseram que o exército cercou os manifestantes, isolaram a área, e bloquearam todos
os telefones e telemóveis. Outro residente disse que os budistas tibetanos quiseram “resistir
à custa do sacrifício das suas próprias vidas para proteger as colinas sagradas.”
No dia 12 de Novembro, um tribunal chinês condenou Kunga Tsayang, um monge tibetano
que também é escritor e fotógrafo, a cinco anos de prisão. Ele fora preso no dia 7 de Março,
acusado de revelar “segredos de Estado” relacionados com a degradação ambiental na região
tibetana.
O seu julgamento teve lugar à porta fechada, no Tribunal Popular em Kanlho, Prefeitura Tibetana Autónoma de Gannan (província de Gansu). Uma das acusações levantadas contra ele
foi a de colocar ensaios políticos sobre o Tibete no sítio da Internet Jottings. No mesmo dia,
Kunchok Tsephel, um funcionário do Governo tibetano que também era escritor na Internet e
fundador do Chomei, um sítio da Internet em língua tibetana dedicado à literatura tibetana,
foi condenado a quinze anos de prisão por “revelar segredos de Estado”.
Kunga Tsayang, um monge do Mosteiro Amdo Labrang Tashikyil, escreveu vários ensaios sob
o pseudónimo Gangnyi (“Sol da Neve”). Oriundo do Município de Chigdril, Prefeitura Autónoma Tibetana de Golog (província de Qinghai), Kunga era um viajante ávido, um amante
de literatura e de fotografia, e publicara muitas fotografias nas quais revelava a degradação
ambiental do planalto tibetano e seu impacto na população.
Funcionários de segurança pública chineses prenderam-no no dia 17 de Março, durante um
raide nocturno na sua casa. A família e os amigos ficaram sem notícias dele até à audiência
no tribunal.
Campanha internacional contra o Dalai Lama e o Tibete
A China nunca perdeu uma oportunidade para ameaçar os países e os líderes que ousam
receber ou encontrar-se com o Dalai Lama. Para Pequim, o Dalai Lama é apenas uma figura
política, um “terrorista” que conspira contra a China. Graças à sua influência económica,
Pequim conseguiu ganhar apoio para o seu ponto de vista, pondo a questão tibetana muito
longe da linha da frente da política internacional.
No entanto, nem sempre a China consegue o que pretende. No dia 10 de Fevereiro, a China
ficou particularmente enraivecida. Um dia antes, a Cidade de Roma tinha concedido ao Dalai
Lama cidadania honorária. “Isto fere gravemente os sentimentos dos chineses. [. . .] Expressamos o nosso forte descontentamento e a nossa oposição”, afirmou a porta-voz do Ministério
dos Negócios Estrangeiros chinês, Jiang Yu. “Esperamos que a Itália preste atenção às preocupações profundas da China e tome medidas imediatas e efectivas para remover o impacto
negativo e manter o desenvolvimento saudável e estável de laços bilaterais”, acrescentou ela.
204
CHinA
Na sua declaração, Jiang reiterou a reivindicação da China em como o Dalai Lama “não é
apenas uma figura religiosa”, e que ele se encontra envolvido “em actividades separatistas”
a favor da independência do Tibete. Apenas alguns meses antes, Pequim cancelara abruptamente uma cimeira entre a China e a União Europeia, zangada devido a uma reunião havida
entre o então presidente da UE, presidente Nicolas Sarkozy, da França, e o Dalai Lama.
No dia 9 de Fevereiro, quando concederam ao Dalai Lama a cidadania honorária, o presidente
da Câmara de Roma, Gianni Alemanno, afirmou, no Auditório Júlio César completamente
repleto, na sede do Governo de Roma situada na Colina Capitolina, que o prémio era um símbolo da “nossa rejeição moral da injustiça, da violência e da opressão”, da “revolta moral da
cidade em defesa da identidade das nações”. Por esta razão, “Estamos consigo e exigimos de
forma veemente o total reconhecimento da autonomia da nação tibetana”, embora dentro
das fronteiras actuais da China e respeitando a sua “integridade territorial”.
Numa nota muito conciliatória, o Dalai Lama deu novamente ênfase à sua opção por uma
“acção não violenta” que ele continuaria a defender “até morrer”. No seu discurso, disse ao
público que muitos tibetanos enfrentam uma situação dramática e que estão prontos a
explodir. Ainda assim, incitou-os a permanecer pacientes e a optar pela paz.
Em forma de resposta, começando no dia 18 de Janeiro, a China lançou outra dura campanha de repressão anti-tibetana. Cerca de 6000 pessoas foram presas, de acordo com alguns
relatórios.
Veneza, cidade natal de Marco Polo, também concedeu ao Dalai Lama a cidadania honorária.
No Nepal, um enorme destacamento de polícia impediu, no dia 10 de Março, os manifestantes de comemorarem o 50º aniversário da insurreição tibetana contra o domínio chinês.
Na capital, Kathmandu, muitos monges e religiosas tibetanos reuniram-se nos templos ao
amanhecer para rezar. Assim que alguns jovens começaram a gritar slogans anti-chineses no
exterior do Mosteiro de Buda, a polícia procedeu à sua detenção sob a acusação de instigarem
actividades anti-chinesas e levou-os dali em camiões, libertando-os alguns minutos depois.
O Governo maoísta do Nepal garantiu à China que iria impedir os protestos naquele dia. Para
este fim, montou um anel de polícia em uniformes de intervenção ao redor da Embaixada da
China no bairro de Baluwatar, na capital, e em volta do seu gabinete de vistos em Hattisar. O
tráfego em redor das duas zonas foi restringido com início em 9 de Março.
Pelo menos 14.000 refugiados tibetanos vivem no Nepal. Em 2008, foram aí organizadas
várias grandes manifestações contra a repressão chinesa no Tibete, com a polícia a prender
centenas de manifestantes pacíficos.
No dia 9 de Março, mais de 140 tibetanos foram presos na fronteira entre o Nepal e a China,
enquanto tentavam atravessá-la de forma clandestina.
O Segundo Fórum Mundial Budista começou no dia 28 de Março, com grande pompa, em
Wuxi, Jiangsu (China), no imponente novo Palácio de Buda, por entre espectáculos cuidadosamente coreografados e música de orquestra. Mais de 1700 monges e peritos de quarenta
e seis países participaram, mas nem o Dalai Lama nem nenhum dos seus representantes
foram convidados.
205
CHINA
Intitulado “Um Mundo Harmonioso, uma Sinergia de Condições”, o fórum terminou a sua
etapa no continente, no dia 30 de Março, e retomou os trabalhos no dia seguinte em Taipei,
por mais dois dias.
Jia Qinglin, presidente da Conferência Consultiva Política Popular da China, disse a um grupo
de cerca de 100 delegados que esperava que os budistas chineses pudessem fazer uma cada
vez maior contribuição para o desenvolvimento económico da China, para a harmonia social
no país e para o desenvolvimento pacífico das relações com Taiwan.
Naquele mesmo dia, Ming Sheng, porta-voz da Associação Budista da China, uma organização gerida pelo Estado, explicou que o Dalai Lama, o líder espiritual do Budismo tibetano, não
foi convidado por ser considerado um líder político.
Em vez do Dalai Lama, participou no evento Gyancain Norbu, o Lama Panchen reconhecido
por Pequim mas não pelos tibetanos. Num discurso proferido em bom inglês, o Lama escolhido pela China elogiou o Governo chinês por aumentar “a harmonia social, a estabilidade
e a liberdade religiosa” no país. Por contraste, para os tibetanos, o Lama Panchen legítimo
é Gedhun Choekyi Nyima, que desapareceu em 1995, com a idade de 6 anos, não se conhecendo o seu destino. No Budismo tibetano, o Lama Panchen é o segundo lama mais elevado
na hierarquia da religião.
Em Abril, a China expressou objecções às candidaturas para acreditação por parte de grupos
tibetanos como o Centro Tibetano para os Direitos humanos e a Democracia (TCHRD) na
Conferência das Nações Unidas sobre o Racismo, que teve lugar em Genebra (comummente
designada por “Durban 2”), embora a sua posição em fóruns internacionais, incluindo reuniões da ONU, tenha sido aceite no passado. Por seu lado, o Comité de Nações Unidas não falou
no assunto nesta ocasião e tem de facto excluído grupos tibetanos.
Os tibetanos acusaram a China de genocídio cultural. Eles são especialmente críticos face
à política de Pequim de encorajar a colonização em massa por parte de chineses de etnia
Han no seu país. Os colonos da China detêm agora uma posição muito forte no comércio e
monopolizam posições de poder. A língua e a cultura tibetanas foram, para todos os efeitos,
banidas dos espaços públicos. O resultado é que, à medida que o número de colonos chineses
que chegam ao Tibete cresce, a população indígena é cada vez mais marginalizada no seu
próprio país.
Entre 29 de Agosto e 2 de Setembro, o Dalai Lama visitou áreas no Sul de Taiwan atingidas
pelo tufão Morakot, que provocou mais de 600 mortos e desferiu um rude golpe na economia do país. A China opôs-se à visita e mostrou o seu desagrado ao anular várias reuniões
importantes com autoridades de Taiwan.
Por seu lado, o Dalai Lama afirmou repetidamente que não havia nada de político na sua
visita. “Eu sou um monge”, disse ele à chegada a Taiwan. “Não há nada de político” nesta
viagem; “a minha visita é de natureza humanitária. [. . .] Pediram-me que rezasse pela paz.”
Na realidade, durante a visita de cinco dias, ele conduziu orações em massa. Em Kaohsiung,
a zona mais atingida, o Dalai Lama e o Cardeal Paul Shan Kuohsi tomaram parte num fórum
sobre religião e humanidade.
206
CHINA
Imediatamente antes da sua chegada, Pequim advertiu que “a visita do Dalai Lama a Taiwan
vai com certeza ter uma influência negativa nas relações entre o continente e Taiwan.”
Líderes proeminentes do Partido Progressivo Democrático, na oposição em Taiwan, tinham
convidado o líder tibetano. O Kuomintang governante não ficou muito contente com o
assunto, mas o presidente de Taiwan, Ma Yingjeou, acabaria por aprovar a visita.
No passado, o Governo de Kuomintang, que defende laços mais próximos com Pequim, tinha-lhe
negado a oportunidade para visitar o país. Porém, desta vez não o pôde fazer já que o Dalai Lama
disse que queria visitar Taiwan para levar conforto às pessoas afectadas pelo tufão devastador.
Mas havia mais conotações associadas à visita. A resposta lenta e inadequada do Governo de
Taiwan face ao desastre natural gerou muita raiva pública. Se tivesse agido mais depressa,
poderia ter salvado mais pessoas e muitos ministros e funcionários públicos de topo demitiram-se por causa desta questão. Assim, a visita do Dalai Lama teve um efeito positivo para
as autoridades: desviou a atenção pública do fraco desempenho do Governo face ao desastre.
Em Novembro, temendo as reacções da China, o Governo de Arunachal Pradesh (Índia) colocou
pressões sobre o Dalai Lama, que ia visitar aquele estado da Índia. Também impediu de entrar
no estado os jornalistas que acompanhavam o líder espiritual tibetano. O Dalai Lama visita
frequentemente o Arunachal Pradesh, onde passou a juventude, mas desta vez as críticas chinesas foram particularmente fortes, tendo chamado à visita uma “provocação”. O Governo da
Índia tentou defender a visita, dizendo que era de carácter religioso. O problema é que o estado
de Arunachal Pradesh, que era originalmente tibetano, é disputado pela Índia e pela China.
Temendo reacções mais severas por parte de Pequim, o Governo de Arunachal Pradesh pediu
ao Dalai Lama que o seu encontro com o público em Tawang fosse considerado um “encontro
religioso”.
No dia 12 de Novembro, o líder tibetano no exílio partiu para Dirang e Bomdi, no Kameng
Ocidental, também em Arunachal Pradesh, mas o Governo recusou-se a prolongar o visto de
viagem dos jornalistas (estrangeiros), o qual era originalmente válido apenas para Tawang.
Parte do problema, de acordo com testemunhas oculares, reside no facto de que os jornalistas tendem a fazer ao Dalai Lama perguntas sobre a China, e este, por seu turno, tende a
transformar as suas viagens em campanhas políticas anti-chinesas.
Um porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês expressou o seu “descontentamento” com a situação e acusou o Dalai Lama de acabar sempre por expressar opiniões
“anti-chinesas”.
China – Muçulmanos
Que 2009 seria um ano difícil para os Muçulmanos estava claro desde o início. Durante a
sessão anual do Congresso Nacional Popular, no início de Março, Nur Bekri, governador de
Xinjiang, a região tradicionalmente muçulmana da China e a mais ocidental do país, afirmou
que “na região, a tarefa da segurança será mais árdua e a luta mais feroz este ano. [. . .] É
tempo de celebração para o povo de Xinjiang, mas as forças hostis não irão deixar passar tal
oportunidade para o destruir.”
207
CHinA
De facto, o ano não só marcou os sessenta anos da República Popular da China, mas também
foi o 60º aniversário da “libertação pacífica” de Xinjiang, com a entrada do exército chinês na
região, o que, para os uigures indígenas representa o começo da invasão pelo Exército Popular de Libertação e os chineses de etnia Han. Durante as últimas seis décadas, a população
uigur tem sido social e economicamente marginalizada.
De cada vez que os Uigures exigiram maior autonomia, Pequim respondeu rotulando tais
exigências como ataques “terroristas”. Há muito tempo, alguns grupos optaram pela luta
armada e envolveram-se em vários incidentes terroristas. Grupos fundamentalistas do Afeganistão e do Paquistão também tentaram infiltrar a região. Porém, como um todo, a população uigur concentrou-se em grande medida em exigir um maior desenvolvimento económico bem como mais liberdade cultural e religiosa.
De forma a evitar o “terrorismo”, os soldados chineses prendem e matam à vontade. Em
2008, pelo menos 100 uigures foram presos e detidos em prisão preventiva para evitar “ataques terroristas”.
Na realidade, muitas figuras de proa deste grupo étnico muçulmano acusam o Governo chinês de negar aos Uigures os meios para satisfazer até mesmo as suas necessidades económicas básicas. Por exemplo, Ilham Tohti, professor de economia na Universidade Minzu
da China (anteriormente designada Universidade das Nacionalidades Centrais) em Pequim,
afirmou que a falta de emprego é o problema principal para os Uigures, e que tal é devido à
marginalização por parte das instituições estatais e das indústrias detidas pelo Estado. Outro
factor é a política de colonização do Governo central, a qual está a trazer milhares de chineses
de etnia Han para a região. Numa entrevista com a Radio Free Asia, ele acusou o governador
de Xinjiang, Nur Bekri, de insensibilidade para com os Uigures. “Ele não se preocupa com os
Uigures. Sempre deu ênfase à estabilidade e à segurança de Xinjiang e ameaçou os Uigures.
Xinjiang desenvolveu-se, mas as pessoas estão a viver na pobreza, especialmente os Uigures.”
Controles mais apertados sobre os indivíduos para combater o “terrorismo” também foram
sinónimo de controlos mais apertados sobre a vida religiosa dos Uigures. Por exemplo, todas
as manhãs de sexta-feira, os imãs têm de visitar o Gabinete para os Assuntos Religiosos local
para receber instruções de carácter geral e explicar o conteúdo do sermão que pretendem
fazer naquele particular dia de oração muçulmano.
Cada grupo religioso tem de estar registado junto do Comité Religioso Nacional e os líderes
religiosos têm de ser aprovados pelas autoridades.
Os pais não podem dar aos seus filhos uma educação religiosa. Ninguém abaixo da idade
de 18 anos pode ir a uma mesquita. Durante o mês de jejum do Ramadão, as autoridades
escolares forçam os alunos e professores muçulmanos a quebrar o jejum. Em muitas cidades,
sob pressões de modernização, as escolas corânicas e as mesquitas estão a ser expropriadas
e destruídas para dar lugar a bancos, bem como a áreas residenciais e edifícios de escritórios.
Protegidos pelo Governo central, os chineses de etnia Han estão em posições dominantes
em quase todos os campos, quer se trate da economia, dos meios académicos ou da admi-
208
nistração. Os uigures, que chamam Turquestão Oriental à sua pátria, pediram algum grau de
autonomia (pelo menos no campo cultural) da China.
As sanções violentas formaram a base para os confrontos inter-étnicos que irromperam no
dia 5 de Julho.
Guerrilha inter-étnica
CHinA
De acordo com testemunhas oculares locais, os confrontos eclodiram ao início da noite de 5
de Julho de 2009, quando 2000-3000 uigures se reuniram no centro da cidade de Urumqi,
a capital de Xinjiang, onde confrontaram pelo menos 1000 agentes policiais. Depois de a
polícia ter atacado e disparado sobre os manifestantes, as pessoas dispersaram. Alguns decidiram quebrar montras de lojas e incendiar carros e autocarros. Em breve as autoridades
tinham já imposto um recolher obrigatório na cidade.
Os manifestantes deram como razão do protesto a marginalização de que se sentem alvo
por parte dos chineses Han que controlam a economia e a administração na província, bem
como no resto da China. Mais especificamente, eles explicaram o seu protesto com a morte
de dois indivíduos de etnia uigur, mortos em confrontos entre trabalhadores chineses uigures e Han no Sul da China. A agência de notícias Xinhua reportara tais confrontos em Shaoguan (Guangdon), dizendo que eles tinham sido provocados por acusações falsas de violação
dirigidas a trabalhadores de Xinjiang.
Também é digno de nota que por causa da escassez de mão-de-obra no Sul da China, as
autoridades chinesas tinham encorajado os trabalhadores uigures a mudarem-se para a
costa sul do país. No entanto, quando as empresas chinesas começaram a despedir os seus
trabalhadores em resposta ao abrandamento da economia, a competição pelos empregos
conduziu a confrontos étnicos.
No primeiro dia de protestos em Urumqi, foram mortas 156 pessoas, mais de 1000 ficaram
feridas e foram presos 1434 suspeitos, relatou a Xinhua.
No dia seguinte, centenas de pessoas, principalmente mulheres de várias idades, desafiaram
a polícia, protestando contra a repressão chinesa e exigiram a libertação dos seus familiares presos no dia anterior. Depois de cercar os manifestantes, a polícia dispersou-os. Porém,
alguns voltaram a encontrar-se noutras partes da cidade. As manifestações acabariam por se
espalhar a outras cidades de Xinjiang. Em Kashgar, mais de 200 pessoas tentaram reunir-se
na Mesquita Id Kah, mas foram dispersadas pela polícia. As forças da lei também prenderam
indivíduos em Yili, Dawan e Tianshun.
Alguns uigures afirmaram que, durante a noite de 7 de Julho, quando o recolher obrigatório
estava em vigor, grupos de chineses Han atacaram casas de uigures, agredindo os moradores.
Um restaurante foi incendiado.
No dia seguinte, os uigures voltaram para as ruas para se manifestarem, tentando penetrar
nas linhas de polícia para perseguir os chineses Han. Milhares de soldados e mais polícias
foram trazidos de outras partes da China para restabelecer a ordem. O presidente Hu Jintao,
209
CHINA
que se encontrava na Itália para a Cimeira do G8, abandonou a reunião para monitorizar
directamente a situação no seu país.
Na sexta-feira seguinte, 10 de Julho, o Governo de Xinjiang ordenou o encerramento de todas
as mesquitas para as orações de sexta-feira, oficialmente para assegurar a segurança dos
residentes, que poderiam ser apanhados nos confrontos entre os chineses Han e os uigures
belicosos. Na realidade, as autoridades suspeitavam que as mesquitas pudessem ser usadas
para instigar os distúrbios.
Em Urumqi, os soldados assumiram o controlo das mesquitas; colocaram tabuletas nos edifícios dizendo aos crentes para irem rezar em casa. No entanto, um porta-voz do Governo de
Xinjiang afirmou que “Todas as actividades religiosas deveriam continuar de forma normal.”
Enquanto grupos da sociedade civil por todo o mundo criticaram fortemente a China pela
violência, poucas vozes se ergueram no mundo muçulmano. Como regra, os Governos muçulmanos não se têm pronunciado sobre o que diz respeito aos massacres em Xinjiang de modo
a proteger as suas relações comerciais com a China. Apenas o primeiro-ministro da Turquia,
Recep Tayyip Erdogan, apelidou de uma “espécie de genocídio” ao que estava a acontecer
na China. Os Turcos e os Uigures estão relacionados em termos de língua, de cultura e de
religião.
A China culpou os grupos de exilados e líderes uigures dos distúrbios, em particular Rebiya
Kadeer, uma líder uigur que vive agora nos EUA depois de passar cinco anos numa prisão
chinesa por exigir uma maior autonomia para o seu povo.
De acordo com a Xinhua, as manifestações em Urumqi foram “um crime organizado, violento
e premeditado” projectado para subverter o poder chinês.
Atribuindo uma qualidade ominosamente terrorista aos distúrbios, um grupo argelino, a alQaeda no Magrebe islâmico, emitiu ameaças contra os chineses que trabalham no Norte de
África face às mortes e à opressão de que são alvo os uigures em Xinjiang.
“Vamos manter-nos atentos aos desenvolvimentos e faremos esforços em conjunto com países relevantes para tomar todas as medidas necessárias para assegurar a segurança das instituições e dos indivíduos chineses que se encontram no estrangeiro”, afirmou o porta-voz do
Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, Qin Gang, em resposta às ameaças. O “Governo
chinês opõe-se ao terrorismo sob qualquer forma e gostaríamos de aumentar a nossa cooperação com países relacionados com o problema para combater o terrorismo, oferecendo
segurança” aos cidadãos chineses, acrescentou.
Num apelo ao mundo muçulmano, Pequim incitou os países muçulmanos a mostrarem que
compreendem as suas políticas e acções em Xinjiang. Não obstante, tratar o movimento dos
Uigures como sendo terrorista continua a ser uma batalha duramente travada por Pequim.
De facto, numa declaração colocada no sítio da Internet do Congresso Mundial uigur, Rebiya
Kadeer afirmou que não acredita que a violência seja a solução para nenhum problema”.
Falando sobre as ameaças feitas pelo ramo argelino da al-Qaeda, ela referiu que “os terroristas globais não deveriam tirar proveito das aspirações legítimas do povo Uigur e da tragédia
210
actual no Turquestão Oriental para cometer actos de terrorismo que têm como alvo missões
diplomáticas ou civis chinesas.”
A guerra com Rebiya Kadeer
CHinA
Para Pequim, uma declaração como a de Rabiya Kadeer, professando a não-violência, não é o
suficiente. As autoridades chinesas continuam de facto a acusá-la de ser a “mão negra” que
causou os distúrbios que precederam as revoltas. Para eles, ela está em conluio com as “três
forças” do separatismo, do extremismo e do terrorismo. Por esta razão, a China não abrandou
a campanha para arruinar a credibilidade de Rebyia Kadeer em todo o mundo.
Esta campanha assemelha-se àquela que a China produziu contra o Dalai Lama no período
que antecedeu os Jogos Olímpicos de Pequim em 2008, quando funcionários do Governo
descreverem o líder espiritual tibetano como um “diabo disfarçado de anjo” e “um lobo com
pele de cordeiro”.
Rebiya Kadeer, de 63 anos, era uma mulher de negócios de sucesso e membro do Partido
Comunista Chinês. Ela caiu em desgraça quando começou a exigir mais direitos e autonomia
para o povo Uigur, criticando a política de colonização do Governo em Xinjiang. Por causa das
suas batalhas, passou cinco anos na prisão. Libertada em 2005, no seguimento de pressões
internacionais, entrou em exílio e mudou-se para os EUA onde se juntou ao Congresso Mundial Uigur.
Depois dos distúrbios de Julho em Xinjiang, foi ao Japão, depois viajou até à Austrália para
assistir ao Festival Internacional de Cinema de Melbourne onde um documentário sobre a
sua vida iria ser exibido.
Inicialmente, a China tentou que o filme fosse retirado do programa do festival. Quando isso
falhou, retirou todos os seus filmes.
Antes disso, Pequim criticou o Japão por conceder a Rebiya Kadeer um visto para visitar o país
e reprovou a Turquia por ter vindo em defesa dos Uigures.
“A China”, afirmou Rebiya Kadeer, “também pressionou os EUA no sentido de restringirem as
minhas actividades. Eu penso que por causa de mim o Governo chinês está a tentar, na prática, impor o seu autoritarismo por todo o mundo.”
Frustrada com os seus fracassos, Pequim divulgou uma carta, alegadamente escrita por três
dos filhos de Rebiya Kadeer que ainda se encontram em Xinjiang. Nela, eles acusam a mãe de
ser responsável pelos confrontos em Xinjiang e de conspirar contra a China.
De acordo com meios de comunicação social chineses, que deram ao caso uma cobertura
extensa, a falsa carta foi assinada por dois dos filhos de Rebiya Kadeer, Khara e Memet, e
uma filha, Roxingul. “Por causa de si, muitas pessoas inocentes de todos os grupos étnicos
perderam a vida em Urumqi em 5 de Julho, com danos enormes em propriedades, em lojas
e em veículos.”
A líder uigur, que tem onze filhos, teve de os deixar todos para trás em Xinjiang quando
fugiu para os EUA, sendo que dois se encontram na prisão. Um deles é Ablikim Abdiriyim, que
foi condenado a nove anos de prisão em 2007 por um tribunal de Urumqi. De acordo com
211
CHinA
o Ministério Público, ele tinha colocado artigos a favor da independência na Internet, instigando as pessoas a agirem contra o Governo, distorcendo a situação dos direitos humanos e
das políticas étnicas da China. A sentença também inclui a perda dos seus direitos políticos
durante três anos. O outro filho preso é Alim Abdiriyim, que cumpre uma pena de prisão de
sete anos, com início em Setembro de 2006, por evasão fiscal. Um terceiro filho também foi
preso sob acusações de evasão fiscal, mas apenas foi multado. Uma filha está há anos em
prisão domiciliária.
“Eu conheço as autoridades chinesas e os seus métodos, velhos e novos, para criticar os seus
inimigos”, afirmou Rebiya Kadeer em sua defesa. “A China tem poder. Eles conseguem controlar o que os meus filhos dizem e distorcem-no contra mim, mas eles não conseguem controlar o amor criado por Deus que existe entre mim e os meus filhos. [. . .] Eu conheço os meus
filhos”, acrescentou. “Ninguém critica a mãe desta forma, mesmo que ela tenha feito alguma
coisa de errado.”
Ao início da noite de 4 de Agosto, os filhos de Kadeer e o seu irmão apareceram nas notícias
nacionais. “O caminho que a minha mãe escolheu conduz a um buraco sem fundo”, disse o
seu filho Alim, de 33 anos, o que se encontra na prisão por evasão fiscal. “Com uma nação de
tal maneira forte [a China], o seu projecto de separatismo nunca poderá ser bem sucedido.”
Em resposta, Rebiya Kadeer notou que a prática de envolver os familiares na denúncia dos
membros da família é um legado da Revolução Cultural quando Mao incitou os jovens a
denunciarem os pais contra-revolucionários.
Falando com um jornalista no dia 6 de Agosto, a líder uigur afirmou que a filha Roxingul e
o filho Alim foram forçados a fazer o que Pequim lhes disse. “O método usado pelo Governo
chinês é talvez o pior tipo de violência contra os meus filhos, forçando-os a falarem contra
mim. [. . .] Acho que se trata de uma forma de ditadura que lhes é imposta.”
“É muito difícil para mim imaginar o tipo de tortura psicológica a que eles estão agora a ser
sujeitos”, acrescentou. “Quando eu estava na prisão, também eu fui forçada pelo Governo chinês a dizer coisas contra a minha vontade, num vídeo que foi colocado num sítio da Internet.”
Pena de morte
Nos meses que se seguiram às revoltas de Julho, as tensões não baixaram. Xinjiang continuou isolada, sob o controlo de milhares de tropas. Para acalmar a situação, o Partido ordenou 7000 funcionários do Governo a irem de casa em casa para explicar às pessoas o valor
de uma “sociedade harmoniosa” (o projecto pessoal do presidente Hu Jintao para o futuro da
China, baseado na unidade e na diversidade). Ao mesmo tempo, as autoridades começaram
a levar a julgamento as pessoas alegadamente envolvidas nos confrontos violentos, impondo
frequentemente a pena de prisão perpétua e a pena de morte.
No dia 12 de Outubro, os primeiros uigures acusados nos confrontos de 5 de Julho foram
condenados à morte. No dia 15 de Outubro, seis outros indivíduos tiveram a pena de morte
como sentença depois de terem sido condenados pelo seu papel nos confrontos. No entanto,
o Tribunal Popular em Urumqi ordenou um prazo de dois anos para levar a cabo as sentenças.
212
CHinA
O julgamento, que começara no dia anterior, viu catorze pessoas a comparecerem perante os
juízes. Três foram condenadas a prisão perpétua e cinco a penas de prisão mais curtas.
No dia 3 de Dezembro, um Tribunal Popular em Xinjiang condenou cinco indivíduos de etnia
uigur à morte e outros dois a prisão perpétua pelo seu papel em várias mortes ocorridas
durante os confrontos de Julho. Seis outros foram alvo de sentenças de prisão de duração
variada.
“Ao todo, vinte e dois réus em cinco casos foram a julgamento nos dias 22 e 23 de Dezembro”,
afirmou Hou Hanmin, director do Gabinete de Informação Governamental de Xinjiang, no
dia 29 de Dezembro.
Ma Xinchun, um representante do Governo municipal de Urumqi, confirmou que cinco pessoas tiveram como sentença a pena de morte (com uma suspensão de dois anos). Oito acusados tiveram a prisão perpétua como sentença, enquanto outros quatro ficaram com dez
anos ou mais de prisão.
Enquanto isso, Rebiya Kadeer continuou a sua campanha, incitando a comunidade internacional a intervir, mas até agora com pouco sucesso. Ela pediu às autoridades chinesas para
iniciarem um diálogo com os Uigures. De acordo com a dissidente, o Congresso Mundial
Uigur, a organização que lidera, “quer falar com o Governo chinês. Pequim tem de aceitar
a nossa autonomia, porque o seu modo de actuação está a destruir a nossa nação, a nossa
educação, a nossa religião e a nossa liberdade de expressão.”
Falando no Japão, no dia 21 de Outubro, ela disse que “de acordo com a informação em nossa
posse, mais de 10.000 pessoas de nacionalidade uigur foram detidas e passaram algum
tempo na prisão entre 5 de Julho e 1 de Outubro. Muitos desapareceram e pensamos que
tenham sido mortos.”
Num relatório também divulgado no dia 21 de Outubro, a Human Rights Watch (HRW) confirmou as declarações de Rebiya Kadeer, dizendo que “milhares de manifestantes desapareceram sem deixar rasto logo após os protestos” e que “as evidências em primeira mão daquele
problema dizem respeito a mais de quarenta casos individuais de homicídios disfarçados
como desaparecimentos. Mas trata-se apenas da ponta do icebergue.”
O relatório da organização de direitos humanos sedeada em Nova Iorque também mencionou “como a polícia chinesa tentou impedir os protestos no passado Julho. As ruas estavam
fortemente protegidas por polícias em uniforme de intervenção, que tomaram parte na violência, detendo os suspeitos para interrogatório através do uso da tortura. Em alguns casos,
a polícia pegou fogo a casas e escritórios, levando as pessoas sem acusações ou explicações.”
No entanto, só para mostrar como a China se tornou importante na comunidade internacional, o Cambodja anunciou, em meados de Dezembro, que iria repatriar vinte uigures
que tinham fugido de Xinjiang depois dos protestos. Ao chegar a Phnom Penh, eles tinham
pedido ao representante das Nações Unidas local o estatuto de refugiados. A decisão do
Cambodja para os fazer regressar veio depois de Pequim ter feito exigências insistentes para
o retorno dos refugiados. Alguns dias antes, o vice-presidente chinês, Xi Jinping, numa visita
ao Cambodja, assinara vários acordos com aquela nação do Sudeste asiático, proporcionando
213
CHinA
ajuda financeira e outra no valor de cerca de 1,2 milhões de euros, incluindo a construção de
estradas e o restauro de templos budistas.
Instalação militar substitui cemitério muçulmano
Os uigures de Xinjiang não são o único grupo muçulmano a ter problemas com o Governo
chinês. Por causa do desenvolvimento económico desenfreado e da procura incessante de
terrenos, as comunidades muçulmanas Hui começaram também a sofrer. Os Hui são chineses Han que se converteram ao Islão quando comerciantes árabes viajaram para a China na
era da dinastia Tang.
Em Março de 2009, a aldeia inteira de Huixin (perto da cidade de Fenghuang, Municipalidade
de Sanya, Ilha de Hainan) insurgiu-se contra a Marinha Chinesa quando esta anunciou a sua
intenção de alterar a localização do cemitério local para construir instalações militares.
Durante meses, dezenas de residentes mantiveram uma vigília contínua junto do seu cemitério, temendo que as sepulturas pudessem ser removidas secretamente. Os habitantes
locais, em número de 8000, disseram que vivem naquela zona desde os tempos da dinastia
Tang, que governou a China entre 618 e 907 d.C.
Hai Shihao, sub-secretário do Partido Comunista em Huixin, declarou à Radio Free Asia que
a Marinha requer cerca de 6,67 hectares de terrenos para criar uma área de treino para os
pára-quedistas estacionados na base naval perto do aeroporto de Sanya.
A certa altura, a Marinha iniciou os trabalhos no local sem notificar os residentes, que apenas
souberam o que estava a acontecer em Dezembro, quando muitas das sepulturas já tinham
sido profanadas. Os habitantes saíram à rua, danificaram propriedades militares, e impediram que os trabalhos continuassem. A Marinha voltou a ocupar a área no final de Fevereiro
e no início de Março retomaram os trabalhos. Mais uma vez, várias sepulturas foram danificadas. Mais de 2000 pessoas saíram à rua e os trabalhos foram interrompidos novamente.
Neste momento, o exército está a pagar uma indemnização.
Hai Shihao disse que a Marinha “estava preparada para encontrar um novo local para onde
as sepulturas poderiam ser mudadas. Também estavam preparados para pagar 6000-7000
yuan (cerca de 600-700 euros) por sepultura.”
“Nós definitivamente não podemos aceitar isto”, disseram os habitantes. “Não podemos
aceitar isto. As sepulturas dos nossos antepassados muçulmanos não podem ser mudadas
de local. Os túmulos antigos deveriam ser protegidos. Ninguém deveria ser autorizado a
mexer neles ou a desenterrá-los.”
Fontes do Governo local afirmaram que as autoridades estão a tentar resolver o assunto de forma
pacífica através do diálogo, mas advertem que a Marinha não vai ser paciente para sempre.
Um residente de Hui chamado Ma afirmou que a violação das sepulturas “é inconcebível. [. . .]
Nem sequer os japoneses teriam desenterrado os ossos dos mortos durante a sua ocupação
da China”.
214
Falun Gong
A Falun Gong é uma seita inspirada por práticas de meditação e exercícios físicos baseados
nas tradições budista e taoísta. Através de treino físico e exercícios respiratórios, os curandeiros procuram a saúde, a imortalidade, a paz e a harmonia. No entanto, o grupo encontra-se
no centro de uma perseguição sem precedentes depois de as autoridades o terem descrito
como sendo “um culto malvado e pernicioso” que ameaça a “estabilidade social e política” da
China.
De acordo com o fundador da seita, Li Hongzhi, que vive nos EUA desde 1998, o seu grupo
conta com 100 milhões de membros. Muitos deles são pobres que, porque não têm dinheiro
para pagar os tratamentos médicos (que não são gratuitos na China), encontram na Falun
Gong as técnicas e um modo para melhorarem a sua saúde e aumentar a esperança de vida.
O grupo afirma que tem membros no Exército Popular de Libertação, bem como na administração do Partido. Isto levou os líderes Comunistas a temerem que por detrás da sua ênfase
em actividades espirituais e de meditação poderiam estar objectivos subversivos.
A perseguição à Falun Gong começou no dia 25 de Abril de 1999, quando 10.000 membros
se manifestaram pacificamente em Pequim contra a violação dos seus direitos e pediram o
reconhecimento público das suas convicções. Desde então, a repressão contra o movimento
tem sido inexorável e especialmente perversa, incluindo propaganda negativa, encarceramento e tortura (mais de 38.000 casos documentados, segundo a Falun Gong) bem como
alguns “suicídios” na prisão (cerca de 2000, de acordo com a seita).
Detenções e tortura
De acordo com a Falun Gong, o Partido Comunista lançou uma campanha de repressão contra ela em 2009 para marcar o décimo aniversário do início da perseguição. A acção foi denominada “Projecto 6521”, um plano para eliminar a sua influência nas cidades e na Internet.
A base de dados do Centro de Informação Falun Dafa documentou 2513 detenções de membros da Falun Gong na segunda metade de 2009, bem como a morte de mais de uma centena devido a tortura na prisão, e ainda a condenação de 878 membros até três anos em
campos de concentração.
Falta de protecção jurídica
CHinA
As autoridades também perseguem os membros da Falun Gong ao negar-lhes o devido aconselhamento jurídico. Apesar disso, cerca de trinta advogados, alguns deles membros do movimento, tentaram representar alguns seguidores, dando ênfase à importância da liberdade
religiosa, um direito que está garantido na Constituição da China. Pelos seus cuidados, foram
atacados.
Entre 2 e 8 de Julho, as autoridades chinesas prenderam três advogados, Liu Ruping, Wang
Yonghang e Wang Ping, no Nordeste da China.
215
CHinA
Liu Ruping foi preso no dia 2 de Julho. Exercia a sua profissão em Jinan, uma cidade na província de Shandong. Já tinha sido condenado em 2005 a um ano num campo de laogai (reforma
através do trabalho) por causa do seu trabalho em nome de membros da Falun Gong. Os
agentes de segurança pública detiveram-no próximo da sua casa e revistaram-na. De acordo
com fontes locais, ele encontra-se detido numa das prisões da cidade especialmente designadas para os membros e activistas da Falun Gong.
Em 4 de Julho, vinte agentes de segurança pública e membros da polícia de Dalian (Liaoning)
à paisana irromperam pela casa de Wang Yonghang. Apesar de não deterem um mandado de
busca, revistaram o seu apartamento, e maltrataram a esposa e a mãe de 80 anos de idade.
Wang e a sua esposa foram depois levados para a prisão. Ela foi libertada no dia seguinte,
mas ele não. Actualmente, pensa-se que esteja na prisão de Dalian, sujeito a agressões e a
tortura. A sua esposa afirmou que, no dia 11 de Agosto, foi operado ao tornozelo, quebrado
durante uma agressão. No mesmo dia, ele foi acusado de praticar “um culto que procura prejudicar o sistema jurídico e social”.
A terceira detenção aconteceu no dia 8 de Julho. Wang Ping, advogado em Pingdu, Shandong,
foi detido por agentes da polícia local.
Ao longo dos anos, a seita Falun Gong tem acusado o Governo chinês de recolher os corpos
dos seus membros mortos para o comércio ilegal de órgãos sem o consentimento dos familiares.
China – Hong Kong
Hong Kong desfruta de maior liberdade religiosa que o continente graças ao princípio de
Deng Xiaoping de “Um País, Dois Sistemas”. Com base nisso, a ex-colónia da coroa britânica
permanece responsável pelos seus assuntos internos e gere a sua própria economia, embora
seguindo as directivas de política externa de Pequim. Assim, Hong Kong não assistiu a qualquer violação evidente da liberdade religiosa como aconteceu no continente (como detenções, violência, destruições, encarceramento, pena de morte, etc.). Porém, a influência de
Pequim está a aumentar ao ponto de o Governo local ter de fazer o que o continente ordena,
em lugar de cumprir a sua própria lei e respeitar a vontade dos seus habitantes.
Na realidade, em várias ocasiões, a liberdade religiosa foi violada implicitamente em Hong
Kong quando as autoridades não agiram de certos modos ou não satisfizeram as exigências
dos habitantes de Hong Kong.
Por exemplo, quando o dissidente protestante Liu Xiaobo foi encarcerado por onze anos pelo
seu papel na elaboração do apelo da Carta 08 (Carta 08, centenas), centenas de cristãos,
católicos e protestantes, pediram ao Conselho Legislativo de Hong Kong (LegCo) a fim de
pressionar Pequim “para libertar Liu Xiaobo”.
Ao invés, quando teve uma oportunidade para se expressar sobre o assunto, no dia 13 de
Janeiro de 2010, o LegCo rejeitou uma moção a favor da libertação de Liu. A moção tinha sido
apresentada por um legislador católico, Fred Li Wah-ming, do Partido Democrático de Hong
Kong e apoiado por outros membros do LegCo que são pró-democracia.
216
CHinA
Numa declaração emitida nesse dia, o Governo de Hong Kong afirmou que, com base no
princípio “Um País, Dois Sistemas”, seria impróprio comentar uma decisão tomada pelo sistema jurídico da China.
Outro exemplo deste fracasso para responder a exigências locais envolveu directamente o
Monsenhor John Tong, o novo Bispo de Hong Kong desde Abril de 2009. Como outras figuras
proeminentes, ele foi convidado a assistir às celebrações do 60º aniversário da República
Popular da China (1 de Outubro de 2009). Quando pediu para conhecer o Bispo de Pequim,
não teve resposta e não viu o seu colega da capital chinesa.
Por último, um outro e mesmo mais notório fracasso por parte das autoridades de Hong
Kong é a indisponibilidade do Governo para debater com a Diocese católica de Hong Kong
o futuro das escolas católicas. Há vários anos que a diocese se tem vindo a preocupar com
o futuro das suas escolas. Ao abrigo da Portaria da Educação (Emenda) de 2004, as escolas financiadas pelo Estado têm de nomear um comité de administração escolar (CAE) que
esteja juridicamente separado das entidades patrocinadoras.
O Governo defende que isto irá favorecer uma maior transparência e democracia. Os defensores das escolas particulares acreditam por seu turno que esta acção é simplesmente um
modo de interferir nos assuntos internos das escolas e que tal iria distorcer a sua orientação
ao ponto de as escolas perderem o seu enfoque educacional especificamente católico.
O Cardeal Zen Ze-kiun, actualmente Bispo emérito de Hong Kong, expressou a sua preocupação em várias ocasiões, defendendo que a medida do Governo não reconhece a contribuição
das escolas católicas para a sociedade de Hong Kong.
No dia 23 de Março, a revista semanal da diocese, Sunday Examiner, voltou a dar o alarme,
perguntando se as escolas católicas irão ainda continuar a desfrutar da isenção que a Portaria proporciona até 2012.
De acordo com a revista, o modelo proposto pelo Governo para melhorar a qualidade do
ensino e da administração escolar poderá eventualmente provar ser contraproducente para
as escolas católicas, cujo valor e prestígio são bem reconhecidos na sociedade de Hong Kong.
A promoção dos valores religiosos, éticos e espirituais ocupa um lugar importante no programa educacional das escolas diocesanas. Se as cerca de 200 instalações educacionais que
estão ligadas à Igreja Católica não forem livres de escolher a sua orientação, a sua missão
seria distorcida e tal iria prejudicar a sociedade de Hong Kong no seu todo.
O Governo de Hong Kong não respondeu a nenhuma das questões levantadas.
217
COREiA DO nORTE
COREiA DO nORTE
Situação política e jurídica
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Agnósticos71,3%
Novareligião12,9%
Animistas12,3%
Cristãos2%
Outros1,5%
Cristãos
502.152
Católicos
---(*)
Circunscrições
eclesiásticas
---
SUPERFÍCIE
120.538km2
POPULAÇÃO
23.991.000
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
--(*) dados não disponíveis
A Coreia do Norte nega a liberdade religiosa como uma questão de
princípio. Existem na capital, Pyongyang, vários locais de culto cristãos (uma igreja católica e duas igrejas protestantes), assim como
quatro templos budistas, mas nada se sabe sobre outras partes do
país. Os números variam, dependendo dos relatos feitos por pessoas
que conseguiram visitar o país.
A razão para negar a liberdade religiosa é inerente à origem da própria Coreia do Norte. O actual regime é a expressão do Partido dos
Trabalhadores da Coreia (PTC) cuja ideologia política é baseada no
princípio da auto-suficiência ou Juche. O PTC é um derivado do Partido Comunista da Coreia, cuja história foi moldada por lutas internas
e purgas sangrentas envolvendo as facções pro-soviética e chinesa.
O Juche, a base sobre a qual o sistema político e económico da Coreia
do Norte assenta, é uma ideologia sincretista que combina rigidamente o Neo-Confucionismo, o nacional Maoísmo e o Estalinismo.
Com o passar do tempo, conduziu ao isolamento do país do resto da
comunidade internacional e ao desenvolvimento do culto da personalidade sob a regência autocrática do “Pai da Nação” Kim Il-sung.
Este chegou ao poder em 1948 e morreu em 1994, sucedendo-lhe o
seu filho Kim Jong-il que recebeu o título oficial de “Querido Líder”.
Com ambos os Kims, pai e filho, tratados como divindades, o culto da
personalidade tornou-se a única forma de religião permitida no país.
Agora um terceiro Kim apareceu, o terceiro filho de Kim Jong-il, Kim
Jung-un. Todos eles são glorificados na literatura, na música popular,
no teatro e no cinema norte-coreanos.
Uma versão Juche do calendário gregoriano foi também criada. Identifica o ano de 1912, o ano no qual nasceu Kim Il-sung, como o Ano
1. Entretanto, o cadáver embalsamado do falecido ditador encontrase em permanente câmara ardente num mausoléu megalomaníaco
construído em Pyongyang. Kim Il-sung e Kim Jong-il são venerados
em muitas actividades públicas. A linguagem usada para os descrever é enfática e mística, em tudo análoga ao culto religioso. De certo
modo, a religião oficial da Coreia do Norte é uma forma de idolatria
do partido e do Estado, associada com a dinastia governante.
Perseguição generalizada
Em 2009, muitos norte-coreanos exilados deram o seu testemunho
sobre a existência de campos de internamento ou de reeducação,
embora o Governo tenha negado a sua existência em várias ocasiões.
218
COREiA DO nORTE
De momento, acredita-se que tais campos contenham entre 150.000 e 200.000 prisioneiros,
sujeitos a tortura, assassinato, violação, experiências médicas, trabalhos forçados e aborto,
assim como execuções secretas. Dentro dos campos, as pessoas presas por razões religiosas
são separadas das outras para receberem um tratamento ainda mais duro.
O nacionalismo da Coreia do Norte é baseado no Chondogyo, um movimento sincretista que
mistura o Budismo, o Taoísmo, o Confucionismo, o Xamanismo e o Cristianismo. A religião emergiu no século XIX em oposição às actividades dos missionários cristãos (ocidentais). Oficialmente
ateu, o Estado norte-coreano opõe-se fortemente a qualquer actividade religiosa por parte de
qualquer outro grupo, especialmente o Protestantismo, que é associado de perto com os EUA.
A repressão anti-religiosa tornou-se uma característica permanente da política do Governo
no seguimento da divisão da península em 1953. Os católicos norte-coreanos acabariam por
desaparecer sem deixar rasto, especialmente se fossem prelados. Pela sua parte, o Vaticano
ainda os considera como “desaparecidos”. Como indicado no Anuário Pontifício, foram mantidos formalmente como líderes titulares das dioceses locais. Ao mesmo tempo, as autoridades norte-coreanas trataram-nos como “desconhecidos” e, desde os anos oitenta, começaram a recusar-se a responder a perguntas sobre o seu destino.
Em termos administrativos, a Coreia do Norte está dividida em três dioceses católicas, Pyongyang, Ch’unch’on e Hamhung, mais uma abadia territorial, em Tomwok, que se encontra
directamente sob a jurisdição da Santa Sé.
Quando a Guerra da Coreia terminou (em 1953, de facto mas não de jure) e a península foi
dividida, o Vaticano atribuiu as administrações apostólicas das três dioceses norte-coreanas
a três bispos do Sul. De acordo com o Anuário Pontifício, os bispos titulares são os mesmos.
Por exemplo, o registo da Diocese de Pyongyang ainda lista Francis Hong Yong-ho (nascido
em 1906 e oficialmente dado como desaparecido) como o bispo local. O registo da Diocese
de Hamhung está por sua vez vazio. No caso da Diocese de Ch’unch’on, em que a maior parte
desta fica situada a Sul, com uma secção que se estende ao Norte, John Chang-yik é referido
como bispo (porém, a sé é considerada desocupada para os católicos do Norte).
O destino dos bispos da Coreia do Norte espelha o da Igreja norte-coreana como um todo. Em
meados do século XX, 30% da população da capital, Pyongyang, era católica contra 1% no resto
do país. Durante a Guerra da Coreia (1950 -1953), tropas comunistas invadiram o Sul, detendo os
missionários e os religiosos estrangeiros, assim como os cristãos coreanos, com o objectivo de
eliminar qualquer traço de uma presença cristã. No Norte, foram destruídos mosteiros e igrejas e
os monges e padres foram presos e condenados à morte. Até mesmo o delegado apostólico para
a Coreia, Monsenhor Patrick James Byrne, foi preso durante a guerra. Cidadão dos EUA, o bispo
foi julgado e condenado à morte. Embora a sentença nunca tenha sido levada a cabo, ele morreu
anos mais tarde num campo de concentração por via do sofrimento e das privações sofridas.
No essencial, pouco se sabe sobre o que aconteceu aos cristãos da Coreia do Norte nos anos
depois da guerra. O destino dos 166 padres e religiosos que se encontravam no Norte no final
da guerra permanece também um mistério. Até aos anos oitenta, quando questionados sobre
eles, os funcionários norte-coreanos respondiam simplesmente que “Eles são desconhecidos”.
219
COREiA DO nORTE
Hoje em dia, a Igreja não tem clero no Norte e o culto é impossível. De acordo com os números
oficiais do Governo, existem aproximadamente 4000 católicos assim como cerca de 11.000
protestantes no país. Porém, fontes declararam à AsiaNews que o número real de católicos
não excede as 200 pessoas, muito idosas na sua maior parte. No Norte, só são autorizados
três locais de culto cristãos, dois protestantes e um católico. A Igreja Católica de Changchung
(ver foto) fica situada na capital, Pyongyang, e, para muitos analistas, o regime apenas a usa
como mostruário.
Desde que o regime chegou ao poder, os cristãos tiveram de suportar a sua cruel repressão.
No geral, eles são tão odiados pela sua alegada infidelidade ao regime como pela sua suspeita ligação com o Ocidente. A maioria dos católicos tem na realidade de praticar a sua fé
em segredo. Nesta nação comunista, ser descoberto a assistir à missa num local sem autorização pode significar prisão, ou ainda pior, tortura e mesmo morte. O mero facto de se possuir uma Bíblia pode resultar na pena de morte. No dia 16 de Junho de 2009, um cristão de
33 anos, Ri Hyon-ok, foi condenado à morte e executado “por colocar Bíblias em circulação”.
Membros da sua família foram depois transportados para um campo de prisioneiros.
O Monsenhor Francis Hong Yong-ho simboliza a realidade da Coreia do Norte. Ordenado
padre no dia 25 de Maio de 1933, foi designado vigário apostólico de Pyongyang e Bispo titular de Auzia no dia 24 de Março de 1944 pelo Papa Pio XII. A 29 de Junho seguinte, foi consagrado pelo Arcebispo Bonifatius Sauer, com o Bispo Hayasaka Irenæus e o Arcebispo Paul
Marie Kinama-ro como co-consagrantes.
No dia 10 de Março de 1962, o Papa João XXIII elevou o vigariado de Pyongyang ao estatuto
de diocese, em parte como protesto contra as políticas do regime norte-coreano. O Santo
Padre designou também o Monsenhor Hong Yong-ho como o seu primeiro bispo, fazendo
dele deste modo um símbolo da perseguição anti-católica na Coreia do Norte e, de uma
forma mais geral, nas nações comunistas. Embora ele tivesse mais de 100 anos se ainda hoje
estivesse vivo, o Vaticano não excluiu a possibilidade de que “ele ainda possa ser prisioneiro
em algum campo de reeducação”.
Refugiados na Coreia do Sul
Apesar de tudo, a Igreja coreana não perdeu toda a esperança. Com a reunificação da península a ser ainda uma possibilidade, os católicos do Sul continuam a organizar seminários e
grupos de acção para ajudar os seus irmãos do Norte. Para tal, os refugiados norte-coreanos
que vivem no Sul da península podem desempenhar um papel fundamental como “agentes
de evangelização, membros sob todos os aspectos da nossa sociedade e amigos para construir o futuro em conjunto”, declarou o Monsenhor Lucas Kim Woon-hoe, Bispo auxiliar de
Seul, durante a 12ª reunião da Rede Episcopal para a Reconciliação do Povo Coreano, à qual ele
preside. O tema da reunião, que foi realizada no dia 22 de Novembro, no Centro Hanmaum,
em Seul, era “Saeteomin, agentes do Evangelho”.
Em coreano, Saeteomin significa literalmente “povo numa terra nova ou num lugar novo”
ou “povo novo num lugar”. Os sul-coreanos habituaram-se a aplicar o termo aos refugiados
220
COREiA DO nORTE
norte-coreanos que fugiram para o Sul para escapar ao regime de Pyongyang. Com o passar
do tempo, o fracasso de muitos cidadãos oriundos da Coreia do Norte em se integrarem fez
com que muitos sul-coreanos começassem a usar tal expressão com um sentido pejorativo.
Quando falou na reunião acima mencionada, o Monsenhor Kim começou o seu discurso com
este ponto em mente. “Temos de ser verdadeiras testemunhas do que se passa no Norte”,
declarou. “Nada pode ajudar mais a esta tarefa do que os nossos irmãos Saeteomin que têm
a mesma dignidade que nós”. Os seus modos de vida, assim como as suas histórias, “ajudarnos-ão a expor e a superar cada vez mais o preconceito social que os afecta, e o sentimento
de alienação com que são recebidos na Coreia do Sul. Ao ouvir o que eles têm para dizer,
podemos aprender a conhecê-los e a dar-lhes as boas-vindas, também devido ao seu papel
de evangelizadores, quando a Coreia do Norte voltar a ser um país livre”.
Além de participantes leigos, aproximadamente noventa padres, religiosos e Saeteomin estiveram presentes no evento. Um deles, Dong Young-soo, conseguiu chegar à Coreia do Sul em
2003. Ele falou logo a seguir ao Monsenhor Kim. “Tudo o que posso fazer é tomar nota de
muitas coisas injustas. Por exemplo, eu não compreendo como é possível que os Saeteomin
sejam considerados cidadãos de terceira classe na sociedade coreana, quando mesmo os chineses de origem coreana vivem em melhores condições do que nós”.
O que à primeira vista poderia parecer ser uma reclamação de um membro da sociedade
com espírito de classe é, pelo contrário, um claro reflexo da moderna Coreia do Sul. A classe
social é um factor determinante no acesso às várias formas de educação ou de emprego. Por
exemplo, Kang Seon-hee, uma mulher Saeteomin, falou precisamente sobre este ponto. “Aqui,
tudo o que eu consegui encontrar foi um trabalho humilde, embora eu gostasse de fazer
uma verdadeira contribuição para o mundo no qual eu vivo. [Em vez disso,] ganho apenas o
suficiente para sobreviver. Se pudesse, faria mais”.
Na realidade, a comunidade Saeteomin é marginalizada pelo resto do país, os seus membros
são considerados, no Norte, como traidores em quem não se pode confiar, e como eternos
mendigos no Sul.
De acordo com o Professor Ko Kyeong-bin, que ensina na Universidade de Seul, “A agonia
dos vinte milhares de Saeteomin que vivem aqui é de grande preocupação. Mas, de qualquer modo, eles são apenas a imagem dos vinte milhões de norte-coreanos que viriam até
nós depois da reunificação das duas Coreias. Temos um longo caminho a percorrer antes de
estarmos prontos a recebê-los da maneira correcta”.
Para o académico, que foi por muitos anos responsável pelo Departamento de Reunificação do
Governo, “O preconceito e a discriminação contra eles tornaram a união entre os dois países
uma questão mais difícil”. Pelo contrário, “Nós temos de mudar a maneira como agimos, para
que eles se possam tornar agentes da unidade”, e eventualmente, “agentes de evangelização”.
Antes de terminar o encontro, o Monsenhor Kim declarou, “Este dia ajudou-me a perceber a
importante missão que todos temos de desempenhar, o mais rápido que for possível. Escutei
as histórias dos Saeteomin e fiquei muito impressionado. Rezarei a Deus para que surja rapidamente o dia em que possamos todos viver a reconciliação das duas Coreias com um só coração”.
221
COREiA DO SUL
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos43,1%
Budistas15,1%
Novareligião14,2%
Animistas14,7%
Outros12,9%
Cristãos
19.788.000
COREiA DO SUL
Católicos
4.914.000
Circunscrições
eclesiásticas
16
SUPERFÍCIE
99.268km2
POPULAÇÃO
48.501.000
REFUGIADOS
268
DESALOJADOS
---
222
A Constituição de 1948 (emendada várias vezes até 1988) garante a
liberdade de consciência (Artigo 19º) e a liberdade religiosa (Artigo
20º) para todos os cidadãos. Não reconhece nenhuma religião estatal
e defende oficialmente o princípio da separação entre o Estado e a
Igreja.
A lei não exige o registo às organizações religiosas; de um ponto de
vista organizativo, elas são completamente autónomas.
A religião não pode ser ensinada nas escolas públicas, mas há liberdade total nas escolas particulares para o fazer.
Os únicos feriados religiosos estatutários são o Natal e o aniversário
de Buda.
Neste país, os Cristãos (Católicos e Protestantes) excedem em número
os Budistas. Encontram-se ainda presentes pequenos grupos pertencentes a outras religiões.
Não se registam nenhuns problemas relativamente à liberdade religiosa, seja por parte das autoridades, seja em casos individuais.
EMiRADOS ÁRAbES UniDOS
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos76,2%
Cristãos12,6%
Hindus6,6%
Outros4,6%
Cristãos
464.696
Católicos
580.000
Circunscrições
eclesiásticas
--SUPERFÍCIE
83.600km2
POPULAÇÃO
4.707.000
REFUGIADOS
279
DESALOJADOS
---
223
EMiRADOS ÁRAbES UniDOS
O Islão é a religião oficial de todos os sete emirados da federação e
igualmente a religião que consta na Constituição Federal. A carta fundamental do Estado garante a liberdade religiosa para os não muçulmanos na condição de que estes não transgridam a lei ou ofendam
a moralidade pública. O Artigo 75º dos provimentos relativos ao Conselho Supremo Federal especifica que “as regras da Sharia islâmica
aplicar-se-ão, assim como as leis federais e outras em vigor nos emirados membros da federação e que estejam em harmonia com as
providências da Sharia. Mais ainda, as regras habituais e princípios de
direito natural e comparado serão aplicados quando não estejam em
contradição com as regras da Sharia”.
No dia 11 Dezembro de 2009, a Igreja de Mar Thoma, em al-Ain, do
rito siro-malabar, foi inaugurada num terreno cedido pelo Governo.
Na cerimónia esteve presente Ali al-Hashimi, o assessor da presidência para os Assuntos Religiosos, e Mohammed Matar al-Kaabi, Director Geral dos Assuntos Islâmicos. “Assistir à inauguração desta igreja”,
afirmou Kaabi, “manifesta concretamente a importância da tolerância entre os fiéis das diversas religiões presentes nos Emirados (…). O
Islão dá a todos a liberdade de abraçar a fé da sua escolha.” A comunidade siro-malabar local é constituída por cerca de 150 famílias. No dia
25 de Dezembro de 2009, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Sheik
Abdullah bin Zayed, juntou-se aos fiéis e aos peregrinos reunidos na
Igreja da Natividade, em Belém, para celebrar a Missa do Galo.
A 20 de Maio de 2010, foi acreditado o primeiro embaixador dos Emirados Árabes Unidos junto da Santa Sé.
FiLiPinAS
FiLiPinAS
Aspectos jurídicos e institucionais
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
A Secção 5 do Artigo 3º da Constituição filipina de 1986 declara que
“Nenhuma lei será elaborada relativamente à criação de uma religião,
ou proibindo o livre exercício da mesma. O livre exercício e o desfrutar
da profissão religiosa e do culto, sem discriminação ou preferência,
serão para sempre permitidos”. Estes princípios são respeitados e não
existiram nenhuns relatos de violações por parte das autoridades
durante o período a que se refere este relatório.
Cristãos88,7%
Muçulmanos6,6%
Animistas3,3%
Outros1,4%
Cristãos
78.012.090
Católicos
73.726.000
Circunscrições
eclesiásticas
86
SUPERFÍCIE
300.000km2
POPULAÇÃO
93.617.000
REFUGIADOS
95
DESALOJADOS
125.000-188.000
224
O problema colocado por Mindanau
Há mais de quarenta anos, a região de Mindanau, de maioria muçulmana, tem sido palco de confrontos entre o exército filipino e os grupos extremistas islâmicos que pertencem à Frente Moro de Libertação Islâmica (MILF) e ao Abu Sayyaf, um grupo terrorista ligado à alQaeda. Durante séculos eles reivindicaram a supremacia sobre a ilha
e têm lutado para criar um estado islâmico independente, levando a
cabo ataques contra cristãos para os expulsar dos “territórios muçulmanos”. Em 1987, o Governo central reconheceu a autonomia de uma
vasta parte da ilha, criando a “Região Autónoma Islâmica de Mindanau”. O acto do Governo não foi considerado suficiente e os ataques e
os confrontos entre o exército e a MILF nunca cessaram efectivamente.
Então, numa tentativa para derrotar os rebeldes, a então presidente
Gloria Arroyo lançou uma forte ofensiva em Agosto de 2008, usando
também artilharia pesada. Em menos de nove meses, o conflito causou quase 100 mortes e criou mais de 750.000 refugiados cristãos e
muçulmanos.
Em Setembro de 2009, a MILF e o Governo filipino reabriram as negociações em Kuala Lumpur, na Malásia, para pôr um fim ao conflito,
encontro onde estiveram também presentes representantes da Organização da Conferência Islâmica (OCI) e das Nações Unidas.
Apesar dos acordos entre o Governo e os líderes da MILF que decidiram cooperar, terroristas liderados pelo Abu Sayyaf e vários representantes Moro que se opuseram às decisões dos seus líderes, continuam
a ofensiva. Porém, de acordo com os peritos, a atmosfera anárquica e
o grande número de tropas enviadas para os territórios onde existe
uma maioria muçulmana têm, ao longo dos anos, resultado num tipo
de acordo tácito entre os rebeldes e o exército. A “estratégia de tensão” é útil ao ajudar a MILF a elevar a parada nas suas negociações
com o Governo, e útil ao exército, pois assegura que este recebe todos os anos os fundos
necessários para combater os guerrilheiros.
É a comunidade cristã que paga o preço e que em 2009 continuou a ser alvo de ataques e de
sequestros.
Outro problema frequentemente ligado ao extremismo religioso é o poder excessivo dos clãs
muçulmanos e das suas milícias privadas. A anarquia na ilha e, acima de tudo, o contínuo
tráfico de armas, permitiram aos líderes políticos recrutar exércitos privados para manterem
o poder nas províncias sob o seu controlo.
Em Maguindanau, no dia 23 de Novembro, um grupo de cerca de 100 homens armados pertencentes ao clã liderado por Andal Ampatuan, governador da Região Autónoma Islâmica
de Mindanau, atacou uma caravana na qual viajavam cinquenta e sete pessoas, membros
do clã liderado por Ishmael “Toto” Mangudadatu, vice-presidente da Câmara de Buluan e o
principal oponente de Ampatuan nas eleições de Maio de 2010, para o lugar de governador
da província. Todos os que seguiam na caravana morreram neste ataque, incluindo a esposa
de Mangudadatu.
Este evento, considerado um dos piores massacres na história das Filipinas, abalou a opinião
pública e, no dia 5 de Dezembro, o Governo proclamou a lei marcial na região autónoma.
Tanto a Igreja como os políticos acusaram esta disposição de ser inconstitucional, culpando
o Governo, o qual eles consideram ser incapaz de gerir a situação.
A lei marcial terminou no dia 12 de Dezembro de 2009. Durante os sete dias em que a lei marcial foi aplicada, o exército prendeu 523 pessoas. Operações levadas a cabo pelos soldados e
pela polícia nacional desvendaram também três outros assassinatos múltiplos que tinham
acontecido no passado, por entre um total de 247 relatórios de violência apresentados ao
Ministério da Justiça. Todos estes relatórios tinham sido anteriormente arquivados pelas
polícias locais em conluio com os clãs que controlam esta região.
Ataques contra cristãos e sequestros
FILIPINAS
No dia 5 de Julho de 2009, em Cotabato, uma bomba explodiu no exterior da Catedral da
Imaculada Conceição enquanto estava a ser celebrada missa pelo Monsenhor Orlando Quevedo. A explosão matou cinco pessoas, entre as quais uma criança de 3 anos, e feriu outras
quarenta e cinco. Entrevistado depois do ataque, o Monsenhor Quevedo descreveu-o como
“não só um crime, mas também um sacrilégio”, convidando todos os católicos a rezar pela
conversão dos atacantes. Ninguém reivindicou a responsabilidade por este ataque, embora
desde o início o exército tenha culpado a MILF, a qual negou qualquer envolvimento.
No dia 27 de Outubro, em Jolo, a capital da província de Sulu, uma granada danificou a Catedral de Nossa Senhora do Monte Carmelo. Ninguém morreu neste ataque, mas devido ao
medo de mais ataques, o Monsenhor Angelito Lampon, vigário apostólico da diocese, cancelou as missas planeadas para o Dia de Todos os Santos e o Dia de Finados (1 e 2 de Novembro).
Também neste caso ninguém reivindicou oficialmente a responsabilidade pelo ataque mas
225
FILIPINAS
a suspeita recaiu sobre o grupo terrorista liderado por Abu Sayyaf, que é muito activo no
arquipélago de Sulu.
Em 2009, além dos ataques à bomba, houve também uma série de sequestros levados a cabo
por gangues criminosos para obtenção de resgates, explorando o cada vez maior receio do
extremismo islâmico de modo a aumentar as somas exigidas. Entre os raptados contam-se
o italiano Eugenio Vanni que trabalhava para a Cruz Vermelha Internacional e o P. Michael
Sinnott, um missionário irlandês que pertence à Sociedade Missionária de São Columbano.
No dia 15 de Janeiro de 2009, um grupo de homens armados em Jolo (Sulu) raptou três trabalhadores da Cruz Vermelha Internacional: o italiano Eugenio Vagni, de 39 anos, o cidadão
suíço Andreas Notter, também de 39 anos, e o filipino de 37 anos, Jean Lacaba. Durante três
meses, os sequestradores, ligados ao Abu Sayyaf de acordo com fontes militares, ameaçaram
decapitar os reféns, exigindo a retirada das tropas enviadas por Manila para tentar descobrir
o esconderijo dos sequestradores. Por razões de segurança, as autoridades declararam um
estado de emergência em todo o arquipélago de Sulu. Notter e Lacaba foram libertados em
Abril, enquanto o cidadão italiano Vagni teve de esperar até 11 de Julho. Fontes oficiais negam
que um resgate tenha sido pago mas, de acordo com os meios de comunicação social locais,
eles foram libertados depois de o exército ter concordado em libertar as duas esposas e os
filhos de um dos líderes de topo do Abu Sayyaf na ilha de Jolo, que tinham sido presos alguns
dias antes de os reféns serem libertados.
O P. Michael Sinnott, um missionário ancião da Sociedade Missionária de São Columbano, foi
raptado no dia 11 de Outubro de 2009 da sua casa em Pagadian (cidade de Zamboanga) por
um grupo de sete homens não identificados. Para fugirem do exército filipino, que assumiu
as investigações apenas alguns dias depois do sequestro, os raptores obrigaram o P. Sinnott
a caminhar durante um mês através da selva na província de Lanao do Norte, a 150 km de
Zamboanga.
Nos dias que se seguiram ao sequestro, os habitantes de Pagadian e de Zamboanga, tanto
católicos como muçulmanos, organizaram uma série de vigílias de oração pela libertação do
sacerdote. A Conferência dos Ulemas Filipinos também trabalhou em prol da sua libertação,
condenando o rapto que eles descreveram como “contrário aos princípios do Islão, do Cristianismo e de todas as outras religiões”. Os líderes religiosos denunciaram também a exploração do Islão por parte dos meios de comunicação social como “servindo apenas para separar
os muçulmanos dos seus irmãos cristãos”.
O P. Sinnott foi libertado no dia 12 de Novembro depois de uma operação conjunta que
envolveu o exército filipino e membros da MILF, inicialmente considerados responsáveis pelo
sequestro. “Imediatamente depois de me terem levado”, declarou o P. Sinnott numa entrevista
depois da sua libertação, “os sete sequestradores colocaram-me num barco e levaram-me
para Lanao onde me entregaram a dois guardas. Depois de atravessar os pântanos, levaramme para a floresta”. Ele declarou também que, na selva, o seu único abrigo era uma barraca
feita com ramos e uma rede a servir de cama, mas que foi bem tratado pelos sequestradores.
226
“O resgate foi a razão para eu ser sequestrado”, disse o P. Sinnott, “Eles sempre me prometeram que não me iriam matar”. As identidades dos homens permanecem desconhecidas.
Sinais de esperança: a Conferência de Bispos e os Ulemas
Depois de quarenta anos de guerra, a população civil em Mindanau, tanto cristã como muçulmana, tem, nos anos mais recentes, organizado uma série de iniciativas com o objectivo de
trazer a paz para a região através do diálogo inter-religioso. Um exemplo deste esforço é a
Conferência dos Bispos e Ulemas (CBU), criada em 1996 pela Conferência Episcopal Filipina.
Composta por vinte e quatro bispos católicos, dezoito líderes protestantes e vinte e quatro
ulemas, todos os anos organiza “A semana para a paz em Mindanau”, pedindo “em nome de
Deus” que esta guerra possa terminar.
Com o reacender do estado de guerra entre o exército e a MILF, entre Abril e Maio de 2009,
membros do CBU organizaram cerca de 300 grupos de debate nas várias cidades da ilha,
reunindo mais de 6000 pessoas de vários grupos étnicos e sociais. Estes encontros foram
úteis para sensibilizar o Governo e os rebeldes sobre as reais necessidades dos habitantes, e
transformaram o CBU numa das entidades mais importantes no debate do processo de paz. Execuções extrajudiciais e a morte do P. Cecílio Lucero
FILIPINAS
Durante os anos do Governo da presidente Gloria Arroyo, houve um aumento significativo
no número de execuções extrajudiciais nas Filipinas. As vítimas foram frequentemente activistas dos direitos humanos e sacerdotes que defendiam os que cultivavam a terra. Os crimes concentraram-se acima de tudo em áreas nas quais existe um conflito entre o exército
filipino e o Novo Exército Popular (NPA), o braço armado do Partido Comunista das Filipinas.
Com a desculpa de combater os rebeldes, o exército comete abusos de poder contra a população civil e mata ou prende aqueles que criticam o exército. A maioria destas execuções
permanece impune.
No dia 7 de Setembro de 2009, na região de Samar do Norte (uma ilha a Sudeste de Manila),
um grupo de trinta homens armados matou o P. Cecílio Lucero, director do centro para os
direitos humanos, o Centro de Acção Social (CAS). Imediatamente antes de ter sido morto,
ele tinha sido ameaçado pelos militares, a quem tinha acusado de abusos repetidos contra
a população. A morte deste padre seguiu-se a uma série de assassinatos, ainda não solucionados pelas forças policiais, os quais, em 2009, envolveram pelo menos dezoito pessoas. O
Monsenhor Emmanuel Trance, Bispo de Catarman, declarou que o P. Lucero, “devido ao seu
trabalho em defesa dos direitos humanos e por ter investigado mortes suspeitas que ocorreram entre Janeiro e Setembro de 2009, tinha feito com que os soldados e os rebeldes comunistas se voltassem contra ele”. O sacerdote não exclui que o assassinato possa também ter
envolvido razões políticas. No momento da sua morte, dois dos irmãos do P. Lucero estavam
envolvidos na política regional. De acordo com Flor Chantal Eco, secretária da associação de
direitos humanos Katungod Sinirangang Bisaya, é óbvio que o P. Lucero foi morto por causa
227
FILIPINAS
do seu envolvimento na defesa dos direitos humanos. Ela declarou que, “Muitos agricultores
vinham pedir a sua ajuda de cada vez que os soldados ou os rebeldes violavam os seus direitos”. Flor Chantal Eco declarou também que, “devido ao seu trabalho de ajuda à população,
ele tinha recebido muitas ameaças dos soldados, ao ponto de se ver obrigado a viajar com
uma escolta”.
No dia 8 de Setembro, a organização ecuménica para os direitos humanos, Promoção da Resposta Popular (PCPR), da qual o P. Lucero fora presidente entre 2001 e 2003, organizou um
grande evento para protestar contra a sua morte e exigir justiça ao Governo. De acordo com
os participantes no protesto, o sacerdote, conhecido como “o defensor dos pobres e dos oprimidos”, é mais uma vítima dos muitos assassinatos que aconteceram na ilha, ocorrências
que o próprio P. Lucero se encontrava a investigar.
228
GEÓRGiA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos85,1%
Muçulmanos105%
Agnósticos4,1%
Outros0,3%
Cristãos
2.736.800
Católicos
102.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
69.700km2
POPULAÇÃO
4.219.000
REFUGIADOS
870
DESALOJADOS
230.000
229
GEÓRGiA
Os graves problemas políticos que, em 2008, resultaram em confrontos armados com tropas russas não influenciaram, em termos gerais,
a liberdade religiosa no país.
Apesar da situação dramática, os princípios estabelecidos pelo Artigo
9º, ponto 1, da Constituição, onde se pode ler que “O Estado declarará
a total liberdade de convicção e de religião, assim como reconhecerá
o papel especial do Igreja Ortodoxa Apostólica Autocéfala da Geórgia
na história da Geórgia, e a sua independência do Estado”, têm sido
geralmente respeitados.
Não houve nenhuma mudança no estatuto jurídico de outras organizações, tais como a Igreja Católica, que apenas desfruta de reconhecimento enquanto organização privada sem fins lucrativos. Esta situação, que sofre a oposição dos interessados, que desejam o reconhecimento enquanto associações religiosas publicamente reconhecidas,
não prejudica, no entanto, as suas actividades normais.
Os privilégios acordados na Concordata de 2002, e desfrutados pela
Igreja Ortodoxa Apostólica Autocéfala, que incluem, por exemplo, o
direito a vetar a construção de locais de culto de outras comunidades
religiosas, permanecem inalterados.
Outras comunidades religiosas têm, além disso, feito queixas sobre
dificuldades nas relações com a Igreja Ortodoxa Apostólica Autocéfala, acima de tudo por causa das atitudes assumidas pelo seu clero,
que exprime frequentemente nas escolas opiniões desdenhosas
sobre outras religiões, como, por exemplo, descrever o sinal da cruz,
tal como é executado pela Igreja Católica e pelas comunidades protestantes, como o “sinal de Satanás”.
Tais excessos verbais não incentivam obviamente as boas relações
ecuménicas.
Apesar de tudo isto, não existem relatos de violações relativas ao livre
exercício dos direitos, mesmo os das minorias religiosas. Estas violações são também desincentivadas por legislação muito rígida relativa
a ataques a estes direitos. No gabinete do procurador-geral existe
um departamento para a protecção dos direitos humanos que tem
também a tarefa de verificar o respeito dos direitos das organizações
religiosas. O trabalho desempenhado por este gabinete foi recentemente elogiado pela sua imparcialidade, inclusive pelas Testemunhas
de Jeová.
iÉMEn
iÉMEn
A Constituição de 1991 declara que o Islão é a religião estatal. O Artigo
3º da Constituição do Iémen determina que “a Sharia islâmica é a
fonte de toda a legislação”. A apostasia é mencionada entre os Hudud
(crimes corânicos) no Artigo 12º do Código Penal de 1994 e é punível
com a morte. Os outros hudud são a rebelião, o assalto, o roubo, o
adultério, falsas acusações de adultério e o consumo de vinho.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos
Muçulmanos99,1%
Cristãos0,2%
Outros0,7%
Cristãos
44.564
Católicos
4.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
A 12 de Junho de 2009, nove estrangeiros que trabalhavam num hospital em Saada foram raptados por homens armados durante uma
excursão ao Noshour Valley. Três dos reféns (duas alemãs, Rita Stumpp
e Anita Gruenwald, e um coreano, Eom Young-sun) foram mortos de
imediato. Os outros seis (um médico alemão, a mulher e os três filhos,
e um engenheiro inglês) ainda estavam à mercê dos raptores no início de 2010. No dia 20 de Maio de 2010, as forças especiais sauditas e
iemenitas encontraram duas das crianças, Lydia e Anna, de 6 e 4 anos,
ainda vivas. Não havia sinais do restante grupo. O grupo trabalhava
para a Worldwide Services, que estava ligada à organização Worldwide
Evangelization for Christ. Nos últimos anos houve vários ataques por
parte de extremistas a estrangeiros suspeitos de praticar actividades
de proselitismo no Iémen.
Judeus
SUPERFÍCIE
527.968km2
POPULAÇÃO
24.256.000
REFUGIADOS
170.854
DESALOJADOS
175.000
230
Em Janeiro de 2009, o aumento de violência contra os membros da
comunidade judaica teve como consequência o encerramento de
duas sinagogas na província de Amran. Nesta região, e em particular
em Saada, há vários anos que o exército iemenita está envolvido em
violentos confrontos com os rebeldes pertencentes à comunidade zaidita, liderada pelo clã Houthi. Alguns judeus deixaram o país durante
este ano, também encorajados pela política do Governo americano
que favorece a imigração dos judeus iemenitas.
ÍnDiA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Hindus73,1%
Muçulmanos13,7%
Cristãos4,7%
Animistas4,1%
Outros4,4%
Cristãos
69.299.260
Católicos
18.813.000
Circunscrições
eclesiásticas
165
SUPERFÍCIE
3.287.263km2
POPULAÇÃO
1.214.464.000
REFUGIADOS
185.323
DESALOJADOS
500.000
231
ÍnDiA
O ano de 2009 voltou a providenciar provas do crescente aumento
da violência baseada em motivos religiosos. De acordo com o relatório que o ministro dos Assuntos Internos, Ajay Maken, apresentou à
Rajya Sabha (a Câmara alta do Parlamento indiano), nos últimos cinco
anos registaram-se mais de 3.800 ataques extremistas. Este relatório apenas menciona ataques registados pelas autoridades, podendo
o número real ser ainda mais elevado. Num aumento contínuo, o
número de ataques relatados cresceu de 677 em 2004 para 943 em
2008. O relatório afirma que onze estados da União não sofreram qualquer ataque em 2009, mas, não obstante, o país assiste a uma média
de dois ataques por dia. Os estados que lideram esta infame tabela
são Maharashtra (681), Madhya Pradesh (654) e Uttar Pradesh (613). O
relatório sobre a violência religiosa e étnica radical foi apresentado à
Rajya Sabha na sequência de uma revisão da lei especial, apelidada de
Lei da Violência Comunal e datada de 2005, a qual voltou a dominar
o debate político na sequência dos recentes ataques contra minorias
religiosas, particularmente muçulmanos em Gujarate e cristãos em
Orissa. Enquanto o Governo de Nova Deli estuda novas medidas judiciais e policiais para combater o fenómeno – sendo o empenho em
tal sentido significativo, à imagem do que tem feito o Departamento
de Estado dos EUA -, as vítimas da violência queixam-se da invisibilidade das autoridades e da crescente insegurança, mormente a nível
local. Orissa é o exemplo mais pungente. Num encontro organizado
a 7 de Dezembro de 2009 em Berhampur, líderes cristãos, activistas
dos direitos humanos e habitantes do distrito de Kandhamal, descreveram a situação, na sequência dos distúrbios anti-cristãos do Verão
de 2008, levados a cabo por grupos radicais hindus. Nessa ocasião,
cerca de 5000 residências foram incendiadas ou saqueadas, cerca de
300 igrejas foram destruídas, mais de 50.000 pessoas foram forçadas
a refugiar-se, e foram apresentadas quase 2.500 queixas, das quais
apenas 823 foram registadas pelas autoridades policiais.
As vítimas de tais distúrbios duvidam que o processo judicial traga
resultados concretos, não acreditando ainda que as indemnizações
prometidas pelas autoridades sejam pagas por inteiro (as indemnizações pelos violentos ataques de 2007 não foram, ainda, totalmente
saldadas). Por estes motivos, criaram a Sampradayik Hinsa Prapidita Sangathana, a Associação das Vítimas de Violência Extremista,
apoiada pelos bispos católicos de Bhubaneswar e Berhampur, pelo
Bispo Evangélico de Bardhan e por organizações como o Conselho
Cristão da Índia e a Human Rights Law Network. Subsistem vários
ÍnDiA
problemas não sanados, que oscilam entre o ritmo lento a que residências e igrejas têm
sido reconstruídas e a insegurança que continua a afectar os cristãos que habitam naquela
região. O Sampradayik Hinsa Prapidita Sangathana pretende monitorizar as necessidades
específicas das vítimas, promover projectos de apoio, especialmente os destinados a mulheres e crianças, e agir de forma solidária, para assim pressionar as autoridades civis.
Uma atmosfera de insegurança e impunidade generalizada tem também atormentado a
comunidade muçulmana, uma das maiores do mundo, assim como a dos Siques, vítimas
de uma feroz campanha de violência em 1984, pela qual os reais autores da mesma jamais
tiveram de responder à justiça. A Comissão Norte-Americana sobre Liberdade Religiosa Internacional (CNALRI) acrescentou a Índia à sua “lista de enfoque”, a qual inclui países nos quais
minorias étnicas e religiosas sofram discriminações graves. As relações entre a Índia e os EUA
no âmbito da liberdade religiosa têm sido tensas há já algum tempo. O relatório anual sobre
a liberdade religiosa elaborado pela CNALRI e apresentado em Washington, a 1 de Maio, menciona “sinais positivos” por parte da Índia. Em Julho, contudo, a Comissão requereu uma visita
a Orissa para aí verificar as dificuldades atravessadas pelos refugiados cristãos naquela zona
e as suas condições na sequência dos distúrbios de 2008. As autoridades indianas, contudo,
recusaram-lhe vistos de entrada, facto que degenerou em controvérsia.
A situação política
“Estou orgulhoso do meu país; o povo forneceu à classe política um claro mandato em prol
da liberdade religiosa.” Foi desta forma que o Cardeal Oswald Gracias, Arcebispo de Mumbai e presidente da Conferência Episcopal Indiana (CEI), comentou os resultados das eleições
gerais que, em Maio de 2009, redundaram na vitória da Aliança Progressiva Unida (APU) – a
coligação liderada por Sonia Gandhi e Manmohan Singh, do Partido do Congresso – e nos
desaires do partido nacionalista hindu, o Bharatiya Janata (PBJ), e da Third Front, esta última
conotada com a esquerda. Em 2009, e pela primeira vez na história da Índia, uma mulher,
Meira Kumar, de 64 anos, a qual é também uma Dalit, foi eleita como líder da Câmara Baixa
(Lok Sabha).
Cinco Dalits fazem parte do Governo, incluíndo-se nove mulheres entre os ministros nomeados, e entre estas a muito jovem Agatha Sangma, a qual cumpre já o seu segundo mandato
no Parlamento. Filha de Shri Sangma, líder do Partido Nacional do Congresso, é católica e
uma de quatro cristãos nomeados ministros no novo Governo. Os outros são o ministro da
Defesa A. K. Antony, e os ministros de Estado K. V. Thomas e Vincent Pala. A Agatha Sangma
foi confiado o Ministério do Desenvolvimento Rural, o qual lidera em colaboração com Pradeep Jain, do Partido do Congresso Nacional Indiano.
As eleições, contudo, não foram pacíficas e justas em toda a parte. Em Orissa, por exemplo, e
nas aldeias de Kandhamal violentamente atacadas em 2008 por extremistas hindus, apoiantes do PBJ reuniram-se junto às secções de voto, ameaçando cristãos no sentido de que estes
votassem em partidos nacionalistas. Sajan George, presidente do Conselho Global dos Cristãos Indianos, afirmou que, “no exterior das secções de voto, os extremistas ordenavam aos
232
cristãos que votassem no ‘lótus’ (Nota do Editor: símbolo do PBJ) se quisessem evitar sérias
ameaças às suas vidas” e, apesar de não se terem registado incidentes de violência real, “não
se pode certamente falar de eleições pacíficas e tranquilas.”
Face à tensão entre o povo, o P. Ajay Singh – director do Jan Vikas, o departamento social da
Diocese de Bubhaneswar – decidou empreender um périplo por numerosas aldeias e vilas do
distrito. “Nas aldeias de Kattingia e Lingagada, aqueles que se apresentaram para votar foram
alvo de ameaças. Em Nilungia (Nota do Editor: onde um cristão tribal havia sido assassinado
nos meses que antecederam a eleição), as pessoas disseram-me que pelo menos quarenta
cristãos não votaram por recearem ser agredidos.” O P. Singh refere que há muitos refugiados
ainda demasiado assustados para regressarem às suas aldeias. Cita o exemplo de alguns
cristãos de Betticola, aldeia na qual extremistas hindus tentaram construir um templo sobre
as ruínas da igreja paroquial católica, incendiada durante os distúrbios do passado Agosto.
“Nem uma das trinta e oito famílias daquela aldeia moram hoje nas suas próprias casas”,
afirma o P. Singh, “e sete cristãos, de entre aqueles que se apresentaram nas secções de voto,
foram impedidos de votar por não possuírem documentos. As suas explicações foram ignoradas. Recordaram aos responsáveis eleitorais que os seus bilhetes de identidade e certificados
haviam sido destruídos no decorrer da violência. A resposta que receberam foi que “as regras
são iguais para todos. Sem bilhete de identidade não se pode votar!’”
A derrota dos partidos nacionalistas hindus e dos partidos de extrema esquerda
ÍnDiA
De acordo com alguns analistas indianos, uma das explicações para a pesada derrota do PBJ
foi a decisão do partido nacionalista em explorar, como fizera no passado, os conflitos interétnicos e religiosos como plataforma para a chegada ao poder. Assistiu-se a um aumento
percentual de 4 a 5% na abstenção, comparativamente às anteriores eleições parlamentares
(para a Lok Sabha, em 2004). Um dos jornais diários mais lidos, o The Times of India, publicou
um editorial no qual afirmara peremptoriamente que, “o velho subterfúgio de causar distúrbios entre as comunidades religiosas para assim polarizar os eleitores, fórmula a que o PBJ
pareceu recorrer até, pelo menos, aos ataques de 2008 contra cristãos em Orissa, irá causar
uma diminuição na participação eleitoral.” Os dois restantes motivos apresentados pelos jornais como causas da derrota do PBJ foram, em primeiro lugar, o facto de ter apoiado Narendra
Modi (Nota do Editor: ministro-chefe de Gujarate), cuja reputação ficara manchada pelos ataques a muçulmanos em Gujarate em 2002, como candidato ao cargo de primeiro-ministro.
Em segundo lugar, o discurso eleitoral proferido em Março de 2009 pelo candidato do PBJ,
Varun Gandhi - neto do fundador da Índia, o secular Jawarhalal Nehru - gerou controvérsia,
pois ele prometeu aos seus apoiantes que “cortaria as mãos dos muçulmanos que ameacem
hindus.” A incitação ao ódio custou ao jovem Gandhi duas semanas na prisão sendo posteriormente libertado sob fiança. Varun Gandhi foi eleito posteriormente para a câmara inferior do
Parlamento nas eleições de Abril-Maio de 2009, mas o seu lugar poderá ser invalidado devido
a estas declarações. A verificação legal ainda estava a decorrer em Agosto de 2010. “Este é
um novo século, no qual a destruição de uma mesquita para aí construir um templo dificil233
ÍnDiA
mente fará parte da agenda política de um partido”, adianta o redactor-chefe do The Times of
India. De acordo com analistas, de forma a poder sobreviver, o PBJ necessita de “cortar todos os
laços com a extrema direita”, por outras palavras, com o Rashtriya Swayamsevak Sangh (RSS), o
Vishwa Hindu Parishad (VHP), o Bajarang Dal (BD) e a assim denominada Sangh Parivar (família), associações de militantes hindus que estão por trás da violência contra cristãos e muçulmanos. Enquanto o partido recrutar “os seus líderes de entre os pregadores (pracharak) do RSS,
será impossível cercear este cordão umbilical”, conclui o editorial.
As eleições implicaram ainda a derrocada dos bastiões comunistas de Kerala e Bengala Ocidental. Os dois estados, liderados por partidos de esquerda, assistiram a um avassalador
sucesso do Partido do Congresso. Em Kerala, o Partido Comunista Marxista (PCM) passou da
vitória há cinco anos para uma derrota total. Kerala é o estado no qual os cristãos, apesar de
minoritários, representam quase 20% dos seus 31 milhões de habitantes.
Uma petição apresentada ao Supremo Tribunal de Kerala requereu que organizações de
inspiração religiosa fossem impedidas de participar na campanha eleitoral e de nomear ou
apoiar candidatos. Há já algum tempo que o Partido Comunista em Kerala tem estado em
conflito aberto com a hierarquia católica. Especificamente, os políticos Marxistas opõem-se
ao trabalho social e educacional daquela Igreja. Já os bispos e os fiéis reclamam o direito de
operar livremente na vida social da nação, e de promover actividades sociais a todos os níveis.
Os conflitos entre a Igreja e militantes comunistas estão fortemente enraízados na história
de Kerala. Em 2009, foi celebrado o 50º aniversário do Vimochana Samaram. Tratou-se do
conflito pela liberdade contra o Governo estadual Marxista-Comunista, levado a cabo pela
Igreja Católica em 1959, juntamente com a comunidade Hindu Nair.
O apelo dos líderes cristãos
Tendo em conta as eleições de Abril-Maio de 2009, os líderes de organizações ou órgãos cristãos, como a União Católica Indiana, o Conselho Nacional de Igrejas da Índia, e o Conselho
Cristão da Índia (CCI), redigiram um memorando dirigido a todos os partidos políticos.
Neste memorando, relembraram aos políticos que a pobreza e o desemprego “preocupam
todos os cidadãos, independentemente da sua religião, casta ou género”, e que a crise que
afecta as regiões rurais “é monumental e exige uma intervenção urgente”. À crise económica,
agravada pela recessão global, juntou-se “uma não menos grave crise social que se manifesta através da intolerância religiosa, de casta e género.” As comunidades cristãs esperam
que a liderança do país “fortaleça o poder da lei”, assim pondo fim à impunidade de que
gozam aqueles responsáveis pelos ataques a minorias. Os autores do memorando lamentam a imunidade atribuída a “administradores locais, polícia e criminosos” que, graças às
suas acções, colocaram em perigo a liberdade religiosa. O documento recorda aos partidos
políticos que a Constituição de 1950 garante a todos os Dalits os mesmos direitos e privilégios até então apenas outorgados a Siques e Budistas, mas não a cristãos. Mencionam ainda
a urgente necessidade de colocar um ponto final na discriminação contra as mulheres, de
desmascarar a “campanha de desinformação” implementada pelos partidos políticos e pelos
234
meios de comunicação social, para garantir “um nível de vida adequado” aos cristãos refugiados em campos no distrito de Kandhamal e de “assegurar que os campos permaneçam
operacionais até que as condições adequadas estejam criadas para o regresso dos refugiados
às suas casas”, assim como “providenciar posteriores indemnizações” àqueles que perderam
as suas casas, propriedades e empregos devido à violência.
A situação legislativa
Leis anti-conversão
ÍnDiA
Apesar da Constituição indiana garantir a liberdade religiosa, a qual inclui também o direito
à mudança de religião e ao proselitismo, a nível local as chamadas leis “anti-conversão” resultantes da actuação de políticos ultra-nacionalistas hindus, continuam presentes. O Governo
central, tradicionalmente secular, rejeita a ideologia “hindutva”, segundo a qual o Hinduísmo e as suas regras culturais e religiosas têm prevalência relativamente a todas as outras
religiões do país. Apesar deste facto, os princípios da “hindutva” continuam a influenciar as
agendas políticas de alguns estados e administrações locais. As leis anti-conversão foram
ostensivamente criadas para defender a liberdade de consciência. Na realidade, resultaram
na discriminação contra cristãos e membros de outras crenças, e numa vantagem para o
Hinduísmo. Proíbem e punem a conversão do Hinduísmo para outras crenças, mas não o
contrário, visto que o Hinduísmo é considerado a religião “natural” do povo Indiano e, assim,
cristãos e muçulmanos não se estão a submeter a uma “conversão”, mas simplesmente a
reabraçar a religião dos seus antepassados. De certa forma, tais leis são usadas como desculpa para ataques, por vezes violentos, durante cerimónias de baptismo ou contra aqueles
acusados de proselitismo, assim como para “justificar” a intervenção policial contra padres e
crentes, a qual implica detenções e acusações criminais.
Caso um hindu pretenda tornar-se cristão, tem primeiro de informar o magistrado distrital e obter permissão para tal. Caso não o faça, a sua conversão será anulada. Seis estados
indianos contam com uma lei anti-conversão nos seus Códigos Penais: Arunachal Pradesh,
Gujarate, Madhya Pradesh, Chhattisgarh, Himachal Pradesh e Rajastão.
O óbvio carácter discriminatório desta lei é demonstrado, caso tal fosse necessário, pela
“reconversão” ao Hinduísmo de milhares de cristãos, a qual é amplamente publicitada em
opulentas cerimónias, bastas vezes relatadas pelos órgãos de comunicação locais.
O Governo central mantém actualizada uma lista de livros proibidos pela possibilidade de
causarem “tensões religiosas ou interétnicas”. O Governo do Rajastão também proibiu livros
considerados “blasfemos” para com divindades hindus.
A lei não é igual para todos...
A discriminação de castas é ilegal na Índia, mas apenas no papel. Na realidade, e especialmente nas áreas rurais, as castas mais baixas, que incluem muçulmanos, cristãos, hindus,
budistas e siques Dalits, são confrontadas com variados obstáculos à progressão social.
235
ÍnDiA
Em Dezembro de 2009, a Comissão Nacional para as Minorias Religiosas e Linguísticas
(CNMRL) apresentou à Lok Sabha uma proposta para uma amenda à lei que durante cinquenta e nove anos tem dividido os membros das Castas Reconhecidas, tendo por base as
suas crenças religiosas. Foi a primeira vez que o Parlamento indiano debateu um pedido
para a atribuição aos Dalits cristãos e muçulmanos dos mesmos direitos até então apenas
garantidos a Hindus e Budistas pertencentes às Castas Reconhecidas. O relatório, elaborado
por Rangnath Mishra, antigo presidente do Supremo Tribunal, sugere “que o Parágrafo 3 da
Ordem Constitucional (Castas Reconhecidas) datada de 1950 e originalmente destinada a
Dalits hindus, e mais tarde alargada a siques e budistas, mas que ainda exclui muçulmanos, cristãos, jainitas, parsis, etc., deveria ser totalmente eliminada, através de uma medida
apropriada, por forma a separar totalmente o estatuto de Dalit da religião e assim garantir
completa neutralidade à categoria social das Castas Reconhecidas, no que toca à religião, tal
como sucede já com as Tribos Reconhecidas”.
O relatório da CNMRL antecipa a aprovação de uma nova lei que estabeleça quotas garantidas para todas as Castas Reconhecidas no que toca ao emprego estatal e representação
política. A posição daqueles nas Castas Reconhecidas que se converteram ao Islão ou ao Cristianismo é ainda tema de debate, dado que, de momento, ao mudarem de religião, perdem
todos os direitos de que gozavam previamente. De acordo com Asha Das, membro do Secretariado da Comissão, deveria ser-lhes atribuído o estatuto de Outras Classes Atrasadas e não
o estatuto de Castas Reconhecidas.
A CNMRL afirma que a Ordem Constitucional (Castas Reconhecidas) colide com os Artigos
14º, 15º e 25º da Constituição. O problema levantado pelo relatório de Rangnath havia já sido
analisado pelo Supremo Tribunal, o qual expressara a esperança de que a lei fosse revista. Em
2000, os parlamentos dos estados de Bihar, Uttar Pradesh e Andra Pradesh aprovaram leis
para o tratamento equalitário de todos os Dalits. A questão nunca antes havia chegado à Lok
Sabha, contudo, e isto apesar das promessas feitas por sucessivos primeiros-ministros e dos
protestos locais e nacionais por parte de muçulmanos e de cristãos Dalits.
A chegada do relatório da CNMRL à Lok Sabha deu-se na sequência de uma infindável série
de iniciativas por parte de Dalits cristãos e muçulmanos no sentido de verem os seus direitos
reconhecidos. A 18 de Novembro, em Nova Deli, milhares de cristãos e muçulmanos Dalits de
toda a Índia protestaram em conjunto, exigindo direitos semelhantes aos dos Dalits hindus.
Em resposta a esta mobilização, o Partido Bharatiya Janata e a organização dos Dalits hindus
organizaram um protesto nacional durante dois meses, o qual teve início em Novembro de
2009, em defesa da lei de 1950. O PBJ acusou o Governo de trair a Constituição e de conspirar
em prol das minorias.
Não é fácil recorrer no caso de uma minoria
Em Dezembro de 2009, o Governo Singh anunciou emendas ao Código Penal. Mudanças na
Secção 372 permitem agora que cidadãos individuais recorram de uma sentença em tribunal, sem a autorização (como requerido anteriormente) de um agente da autoridade. Tais
236
emendas foram levadas a cabo para tornar mais fácil que vítimas de perseguições religiosas
recorram contra sentenças desfavoráveis.
O Governo central atribuiu 279 milhões de dólares ao Ministério das Minorias para 20092010, um aumento de 74% relativamente ao ano anterior.
Uma nova lei da educação – uma ameaça à autonomia das escolas cristãs
ÍnDiA
Em Agosto de 2009, o Governo central aprovou uma nova lei sobre “educação gratuita e
obrigatória”, obrigando a que todas as escolas privadas criassem comités de supervisão que
deverão incluir representantes dos governos locais. De acordo com a Igreja Católica da Índia,
tal lei é (em alguns aspectos) “um passo na direcção certa”, mas a imposição de políticos
arrisca minar a liberdade de educação, levando à interferência política na administração de
escolas privadas. O P. Babu Joseph, porta-voz da Conferência Episcopal Indiana (CEI), explica
que “o Governo fez uma escolha importante que é um passo na direcção certa” e que remedeia “o grave atraso na garantia de educação para todas as crianças [Nota do Editor: com
idades compreendidas entre os 6 e 14 anos].” A nova lei, contudo, também inclui a Cláusula 21,
a qual afirma que todas as escolas que receberem subsídios estatais devem criar um comité
administrativo de supervisão composto por representantes eleitos pelas autoridades locais,
pais de educandos e professores. O objectivo de tais comités é desenvolver um forte laço
entre as comunidades locais e as escolas. A Igreja, contudo, expressou sérias preocupações
relativamente à liberdade e independência das mais de 10.000 escolas católicas do país.
A CEI já afirmou desejar discutir o problema com o ministro para o Desenvolvimento dos
Recursos Humanos, por forma a salvaguardar a liberdade e direitos garantidos pela Constituição às minorias e “continuar a cooperar com o Governo para proporcionar educação de
qualidade às crianças da Índia.”
As escolas católicas, assim como as protestantes, fazem uma importante contribuição para o
sistema educacional do país, o qual é maioritariamente confiado a escolas privadas. O P. Babu
observa que “60% das nossas escolas situam-se em zonas rurais e providenciam educação às
crianças mais pobres e marginalizadas da sociedade, as quais representam 55% de todos os
alunos. As raparigas [Nota do Editor: muitas vezes excluídas da escola] estudam nas nossas
escolas e apenas alguns alunos são cristãos. A maioria é hindu, muçulmana, ou pertence a
outras religiões.” A nível local, e no afamado Gujarate, uma circular enviada em Outubro pelo
Governo do extremista hindu Narendra Modi, e confirmada pelo Supremo Tribunal do estado,
ordenou, por seu turno, que as escolas que recebessem subsídios estatais apresentassem às
autoridades públicas os nomes de candidatos a novos postos de trabalho, antes de os contratar. A razão oficial para tal medida passa por garantir que todo o pessoal de ensino detenha
um adequado nível de educação e também para evitar redundâncias. As minorias receiam
que tal permita a interferência na administração das escolas. Em Kerala, em Jammu e em
Caxemira, assim como em Gujarate, são frequentes episódios de interferência política.
237
ÍnDiA
As escolas privadas são também habitualmente alvo de ataques violentos. A 6 de Julho de
2009, um grupo de desconhecidos irrompeu na Escola Secundária de Santo Estevão, em
Dahod, no Gujarate Oriental, atacando os padres que geriam a mesma. Aparentemente, a
razão para o ataque foi um pedido feito por alguns professores no sentido de que as raparigas removessem as suas tradicionais tatuagens henna. Apesar da escola autorizar as alunas a utilizarem tatuagens, os professores achavam que as decorações que ocupassem o
braço inteiro eram excessivas. A Irmã Archana, professora naquela escola, afirmou à AsiaNews: “Num instante, como se de um plano premeditado se tratasse, um grupo de pessoas
irrompeu na escola, acompanhado por jornalistas. Primeiro, perguntaram por que razão as
autoridades escolares estavam a pedir às raparigas que lavassem as suas tatuagens; depois,
dirigiram-se ao director, o P. C. Rayappan, insultaram-no e agrediram-no.” O director da escola
suspeita que o episódio “foi uma vingança por parte das famílias cujas crianças não haviam
sido admitidas no jardim de infância.” No final, antes de deixarem a escola, os invasores apedrejaram o local dedicado à Virgem Maria, quebrando o vidro e danificando a estátua.
Violência contra a comunidade cristã
A violência anti-cristã não conheceu fim durante 2009. Karnataka, Orissa e Tamil Nadu continuam a ser estados infames por ataques a comunidades minoritárias. De acordo com a “Lista
Parcial dos Mais Graves Incidentes Anti-Cristãos na Índia”, elaborada pela Irmandade Evangélica da Índia, tem ocorrido uma média de três ataques violentos por semana; pelo menos
152 no decorrer do ano. As mais frequentes formas de perseguição oscilam entre ameaças
pessoais e ataques a igrejas, acusações falsas de conversão forçada, e mesmo o assassinato
de sacerdotes. Em Novembro de 2009, três igrejas foram atacadas em outros tantos dias
em Tamil Nadu. A 1 de Dezembro, um grupo de extremistas hindus atacou a Igreja do Sul da
Índia, em Sulur, um bairro suburbano de Coimbatore. Os extremistas haviam previamente
atacado a igreja a 30 de Novembro quando, após partirem vidros, arremessaram pedras para
o interior da igreja. Imediatamente após os confrontos, foi encontrado um saco perto da
igreja, contendo gasolina, gasóleo e pedaços de algodão. A intenção óbvia era a de incendiar
o recinto de oração. Líderes cristãos locais acreditam que o objectivo era causar o pânico
entre os habitantes não-hindus. Anteriormente, a 29 de Novembro, uma bomba destruíra as
paredes da igreja de Thammathukonam. Nesse mesmo dia, extremistas atacaram a igreja
de Konamkade, onde profanaram a estátua de São Francisco Xavier quando as congregações
locais se reuniram para uma procissão do Advento.
O Conselho Global dos Cristãos Indianos (CGCI) revelou que a intolerância religiosa está a
aumentar em Karnataka e em outros estados governados pelo Partido Bharatiya Janata.
Durante a noite de 17 de Novembro, um grupo de indivíduos não-identificados atacou a Igreja
Beersheba de Deus, em Humanabad, no distrito de Bidar, em Karnataka. Às 3 horas da madrugada, um grupo de indivíduos irrompeu na igreja, arrancou as portas pelas dobradiças, destruíu janelas e mobiliário, e removeu o crucifixo do topo do edifício. A comunidade cristã que
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frequenta a Igreja Beersheba de Deus, cerca de oitenta fiéis liderados pelo Pastor Devadas
Chandrapa, de 32 anos, informou a polícia em Humanabad e os meios de comunicação social
locais. Tratou-se do enésimo acto de vandalismo contra um local de culto cristão relatado nas
últimas semanas do ano neste estado indiano. A 12 de Novembro, um grupo de radicais hindus pertencentes ao Vishva Hindu Parishad (VHP) havia interrompido a construção de uma
igreja em Bhadravati, no distrito de Shimoga. Os extremistas apresentaram queixa do pastor
da comunidade local junto das autoridades, acusando-o de ter efectuado conversões forçadas. A Autoridade para o Desenvolvimento de Shimoga investigou o sacerdote e pediu-lhe
que respondesse às acusações contra ele feitas pelo VHP. Em finais de Dezembro, haviam-se
já registado sessenta e seis ataques a igrejas cristãs em Karnataka. A 14 de Dezembro, atiraram pedras ao altar de Santo António na Igreja do Sagrado Coração, em Kolaigiri (Udupi). O
Comissário Distrital de Polícia, Pravin Madhukar Pawar, inspeccionou o local do incidente e
assegurou que as forças de segurança “estavam a dedicar toda a necessária atenção a estes
eventos” perpetrados por pessoas “que pretendem arruinar a atmosfera pacífica do distrito
de Udupi.” A 12 de Dezembro, membros do coro da Igreja Metodista de São Paulo foram atacados por extremistas. Novamente a 14 de Dezembro, onze fiéis foram detidos por algumas
horas numa esquadra da polícia em Virapt, após serem acusados de levar a cabo conversões
forçadas. Por este mesmo motivo e no mesmo dia, um pastor protestante e a sua mulher
foram agredidos por membros de grupos extremistas. O Conselho Global dos Cristãos Indianos culpou o Governo e o “inexplicável atraso no aumento da segurança, apesar do crescente
número de incidentes”, algo que não sucede por coincidência, precisamente no período que
antecede as festividades natalícias.
Reconversões
ÍnDiA
As igrejas são muitas vezes atacadas também como retaliação por alegadas “conversões forçadas”. A 19 de Abril, por exemplo, um grupo de fanáticos hindus atacou e danificou uma
igreja protestante na aldeia de Saoner, a 40 km de Nagpur, no estado de Maharashtra. A
violência chegou também à Igreja Memorial Douglas, onde cristãos se encontravam a orar
durante uma celebração dominical. Duas mulheres ficaram feridas quando tentavam deter
os intrusos, os quais estavam a destruir o mobiliário da igreja ao mesmo tempo que cantavam Jai Shree Ram e Jay Bajrang (“Victória para Rama, nosso Senhor!” e “Victória para Hanuman”). Duas organizações nacionalistas hindus, a VHP (Vishwa Hindu Parishad) e a Bajrang
Dal, negaram ter desempenhado qualquer papel nos ataques, afirmando, contudo, que a violência havia sido infligida por “hindus que estavam zangados com as conversões religiosas”
na região. No dia do ataque, no entanto, a polícia havia detido três líderes do VHP, Uddhav
Choudhary, Vinod Bagde e Umesh Athavankar. Outras quatro pessoas, membros do Bajrang
Dal, foram detidas no dia seguinte. Os vândalos destruiram livros de oração e uma Bíblia,
abriram armários à força, danificaram instrumentos musicais e o altar. Dez minutos antes do
ataque, alguns membros do VHP levaram uma carta às esquadras da polícia, pedindo a sua
239
ÍnDiA
intervenção nas conversões em Saoner e ameaçando com “acção vigorosa” contra a Igreja
devido ao trabalho caritativo desta, destinado sobretudo aos mais pobres.
O tema das conversões forçadas emerge ciclicamente no debate político local e nacional. O
primeiro-ministro Singh destacou-se em inúmeras ocasiões por pedir ao Governo que alargasse ao país inteiro as leis anti-conversão em vigor em cinco estados, mas não incluídas na
Constituição, a qual, pelo contrário, reconhece a liberdade religiosa. O medo de uma distorção
da cultura indiana e a traição das tradições hindus são argumentos muitas vezes utilizados
pelos políticos mais radicais e por variados swamis, os líderes religiosos hindus.Têm ocorrido
diversos episódios nos quais os grupos marginais mais extremos dos movimentos nacionalistas acusam predominantemente cristãos, mas também muçulmanos, de levarem a cabo
conversões forçadas, mormente junto de povos tribais e das classes mais desfavorecidas. Os
cristãos, e principalmente a Igreja Católica, são “culpados” de promover a igualdade social, o
que colide com o milenar sistema de castas.
A 7 de Maio de 2009, as autoridades detiveram cinco cristãos em Narsinghpur, Madhya Pradesh, acusando-os de conversões forçadas, após extremistas hindus terem irrompido num
encontro de oração promovido por um grupo evangélico, atacando e ferindo vários participantes, como noticiou a Compass News Direct. O relatório da polícia não menciona se os
extremistas hindus foram também detidos. A 5 de Abril de 2009, em Bilaspur, em Chhattisgarh, a polícia deteve o cristão Gyan Singh. Quatro hindus, que afirmaram ter sido convidados pelo mesmo para um encontro de oração, acusaram-no de conversão forçada. As autoridades libertaram-no posteriormente, após pagamento de fiança. A 17 de Fevereiro de 2009,
no distrito de Surguja, também em Chhattisgarh, onze pastores da Igreja dos Crentes foram
detidos com base na lei anti-conversão, após alguns extremistas hindus terem interrompido
um encontro de oração autorizado, destruíndo Bíblias e atacando os líderes da comunidade.
Os pastores foram libertados sob fiança no dia seguinte.
Apesar de tal raramente ocorrer, também siques atacam comunidades cristãs sob a desculpa
de conversões forçadas. A 20 de Abril de 2009, no distrito de Durg, Chhattisgarh, um grupo
de siques atacou alguns pastores cristãos que aí se haviam deslocado oriundos de Nova Deli.
Os líderes cristãos eram siques convertidos, e os siques ficaram irritados pelo facto de os pastores ainda terem o cabelo comprido e a barba que são símbolos da religião Sique. Os siques
acusaram os pastores de causar divisões interconfessionais e pediram que eles fossem presos. A polícia enviou os pastores de volta a Nova Deli, mas não tomou quaisquer medidas
contra os agressores.
Igualmente frequentes são as demonstrações públicas durante as quais os swamis (líderes
espirituais hindus) mais radicais provovem “reconversões” forçadas de volta ao Hinduísmo,
como propaganda contra a alegada invasão da Índia por culturas estrangeiras. De acordo
com Rajnath Singh, presidente do PBJ, “é necessário controlar o fenómeno alargado das conversões, as quais são alegadamente patrocinadas por poderes estrangeiros.” O líder do partido hindu, discursando a 31 de Outubro em Bhopal, acusou os “missionários estrangeiros de
usarem a religião para se infiltrarem na Índia e corromperem a sua cultura.” Singh descreveu
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ÍnDiA
as “conversões ilegais em massa” como “uma ameaça à segurança interna do país” e citou
estatísticas segundo as quais “30% das populações tribais em Chhattisgarh e Jharkhand
mudaram de religião.”
O que realmente sucede são “reconversões forçadas” em massa ao Hinduísmo, como aconteceu a 26 de Outubro de 2009, em Thane, a cerca de 50 km de Mumbai (Maharashtra). Pelo
menos 6000 cristãos foram reconvertidos ao Hinduísmo pelo Swami Narendra Maharaj. A
reconversão ao Hinduísmo é a missão específica de um grupo liderado pelo guru Narendra
Maharaj. Duas vezes por ano, organizam-se opulentas cerimónias para celebrar o retorno à
religião tradicional indiana. O porta-voz do grupo afirmou que, com os últimos 6000 casos,
o número total daqueles que se reconverteram chegou aos 94.000, e previu que “nos próximos dois anos iremos chegar aos 100.000.” Este fenómeno está amplamente implantado
nas áreas suburbanas de Mumbai, e os seguidores de Narendra Maharaj recebem o auxílio
de várias organizações no sentido de identificar aqueles que pretendem reconverter-se. O
porta-voz adianta ainda que estes são “homens infelizes que foram convertidos ao Cristianismo à força” e que regressam ao Hinduísmo “sem coacção ou garantias.”
Sajan George, presidente do Conselho Global dos Cristãos Indianos, afirma que “os cristãos
também são detidos quando se reúnem para rezar na privacidade das suas próprias casas,
ou mesmo quando se limitam a distribuir literatura religiosa, apesar de tais direitos estarem
garantidos pela Constituição.” A polícia age com base nos Artigos 153º A e 295º A 1 do Código
Penal indiano. O primeiro pune “aqueles que promovam ou procurem promover o ódio ou a
má-vontade entre os diferentes grupos, castas ou comunidades religiosas, raciais, regionais
ou linguísticas. Ou “qualquer acto prejudicial à manutenção da harmonia.” O segundo artigo,
por seu turno, debruça-se sobre “actos deliberados e maliciosos, os quais pretendem ofender
os sentimentos religiosos.” Sajan George afirma que apenas uma intenção discriminatória
pode explicar o comportamento das autoridades estatais, as quais são escrupulosas na aplicação destas leis contra os cristãos, mas são “espectadores silenciosos quando se trata da
reconversão de 6000 pessoas de volta ao Hinduísmo.”
Em Novembro, H. T. Sangliana, anterior membro da Lok Sabha e patrono da Rede de Missões
de Karnataka, anunciou que extremistas hindus haviam infiltrado membros nas comunidades cristãs para depois construir falsas acusações de conversões forçadas. Este político cristão eleito pelo PBJ em 2004 e agora membro do Congresso Nacional Indiano, afirma que este
expediente é agora amplamente utilizado pelos marginais hindus mais radicais, para criar
uma “psicose” entre os cristãos e “envenenar” a opinião pública.
As acusações de conversões forçadas têm-se tornado um hábito em Karnataka. Em Novembro, um caso envolvendo duas estudantes alojadas no Bethel Boarding Hostel em Udyavara,
terminou sem consequências. As raparigas declararam terem sido forçadas pela responsável
do recinto a ler a Bíblia e disseram ter visto os responsáveis a levar cerca de trinta crianças à igreja de Ajjarkad com o intuito de as converter. A polícia não encontrou provas que
suportassem as alegações e as sessenta e três pessoas acusadas foram ilibadas de todas as
acusações. Sangliana, também antigo oficial do Serviço da Polícia Indiana, adianta que foram
241
ÍnDiA
apresentadas na esquadra da polícia setenta e quatro queixas referentes a conversões, não
tendo sido também encontrada qualquer prova das mesmas.
Ataques físicos e assassinatos de padres e pastores
A violência, contudo, não se limita aos locais de culto, envolvendo também indivíduos e
implicando agressões físicas e assassinatos. A 11 de Março de 2009, um grupo entre trinta a
quarenta pessoas atacou o Pastor Erra Krupanamdam, da Igreja Bethel, quando este regressava do mercado. O pastor, que sofreu danos permanentes na coluna vertebral, participou o
ataque à polícia e foi detida uma pessoa. A 16 de Janeiro de 2009, extremistas hindus atacaram o Pastor Yakobu no distrito de Karimnagar. Entraram na sua residência na alvorada e
atacaram-no, gritando “nenhum pastor irá viver nesta aldeia.”
O Conselho Global dos Cristãos Indianos (CGCI) noticiou o caso que envolveu um jovem deficiente cristão atacado a 6 de Novembro no distrito de Shimoga. O CGCI divulgou ainda a
discriminação contra cristãos na distribuição de auxílio às vítimas das inundações em Karnataka. Sajan K. George, presidente do CGCI, afirmou que, nos distritos de Raichur, Bellary,
Bijapur e Gulbarga, cristãos e Dalits nem sequer eram tomados em conta na distribuição de
bens “necessários à sobrevivência.”
A 25 de Outubro, no Madhya Pradesh, um pastor protestante foi atacado por onze extremistas armados com sticks de hóquei, imediatamente após a missa de Domingo. Em Julho, um
padre da diocese siro-malabar de Belthangady (em Karnataka, Sul da Índia) foi encontrado
assassinado e despido numa rua da aldeia de Thottathady. O chanceler da diocese, P. Tomy
Mattom, afirma ter sido “uma execução planeada.”
De acordo com a primeira reconstrução, o P. James, de 39 anos, morreu quando regressava à
sua paróquia, após ter oficiado um funeral na aldeia de Thottathady. O P. Tomy afirmou que
o corpo apresentava ferimentos e que havia indicações de que o sacerdote poderia ter sido
estrangulado. O Monsenhor Mukkuzhy adiantou que uma autópsia havia já sido efectuada.
“Não conseguimos compreender”, prosseguiu, “como alguém o poderia querer matar. Uma
coisa é certa, não se tratou de um roubo.”
A 30 de Março de 2009, um cristão de 23 anos, Gunjan Digal, foi atropelado e morto por
um tractor quando caminhava à beira da estrada de Gungibadi, aldeia do infame distrito de
Kandhamal. A polícia tratou o caso como um “acidente” trivial, mas alguns grupos de defesa
dos direitos dos cidadãos, como o CGCI, descreveram o ocorrido como “um assassinato planeado.” A religião da vítima era amplamente conhecida na aldeia, onde apenas se contam
vinte e uma famílias cristãs. Testemunhas oculares, presentes na cena do incidente, confirmaram ter-se tratado de um “assassinato premeditado.” Gunjan Digal caminhava ao lado da
estrada, existindo espaço mais que suficiente para o tractor se desviar. O condutor, cuja identidade permanece desconhecida, dirigiu o tractor directamente contra o jovem, matando-o
de forma instantânea.
Um mês antes, uma vez mais em Orissa, na aldeia de Rudanja, um outro cristão, Hrudananda
Nayak, de 40 anos de idade, foi morto por extremistas hindus.
242
Orissa
A frustração e o medo sentidos pelas vítimas
ÍnDiA
“Enquanto 2007 e 2008 vão entrar na história como os anos mais sangrentos para o Cristianismo moderno na Índia”, explica John Dayal, activista para os direitos dos cristãos e membro do Conselho Estatal para a Integração Nacional, “2009 foi certamente o ano das frustrações em torno da ausência de justiça para as vítimas da violência inter-religiosa.” Apesar das
detenções que se sucederam aos tumultos anti-cristãos de 2008, o calvário dos cristãos em
Orissa é infindável. As vítimas da violência continuam a enfrentar problemas na apresentação de queixas, nos testemunhos e na obtenção de indemnização. Muitos dos refugiados
criados pelos conflitos ainda não podem regressar a casa, numa altura em que as autoridades ordenaram o encerramento dos campos de refugiados.
Na área mais afectada pelos conflitos, o distrito de Kandhamal, grupos de radicais hindus
mataram, incendiaram igrejas e residências, e destruíram colheitas. O debate em torno do
número real de vítimas mortais prossegue entre o Governo de Orissa e os grupos cristãos.
As autoridades afirmam que, no máximo, foram mortas algumas dezenas de pessoas, mas
um representante do Partido Comunista-Marxista-Leninista local, e membro do Governo do
estado, estima que 500 pessoas tenham morrido e que ele próprio deu autorização para a
cremação de pelo menos 200 cadáveres.
Das 50.000 que fugiram ao massacre, cerca de 20.000 encontraram refúgio em campos
organizados pelo Governo. O P. Nithiya, secretário-executivo para a Justiça e a Paz, visitou
alguns dos sobreviventes na aldeia de Gobalpur. “Os campos de refugiados governamentais
estão a ser encerrados”, adiantou à AsiaNews, “e as pessoas estão a ser mandadas embora
com pequenas indemnizações de cerca de 10 mil rupias (cerca de 153 euros). As pessoas têm
medo e procuram imigrar para outros distritos ou estados. A segurança é melhor em cidades
maiores, mas em aldeias longínquas não há segurança para os cristãos.”
As vítimas recebem ainda cinquenta quilos de arroz e rolos de polietileno para tentarem reparar as suas habitações danificadas. Após regressarem às suas aldeias, muitos vivem entre ruínas. Tiras de plástico são usadas como telhados e pedaços de madeira ou plantas utilizadas
como paredes. Não há, contudo, nenhuma segurança. No início de 2009, grupos extremistas
hindus seguiram cristãos que regressavam de campos de refugiados, acordaram-nos a meio
da noite e ameaçaram-nos. Confrontados com tais incidentes, aqueles que regressaram não
procuram sequer reparar as suas habitações, receando que os radicais hindus as voltem a
destruir. São igualmente pressionados no sentido de assegurar que retirem acusações relativamente a agressões violentas cometidas pelos seus vizinhos.
Em Janeiro, o Supremo Tribunal indiano convidou o Governo de Orissa a demitir-se caso se
prove ser incapaz de proteger as minorias. De facto, o Governo local havia utilizado os denominados “comités de paz”, extremamente hostis relativamente às minorias religiosas, para
impor a retirada de queixas apresentadas por cristãos contra aqueles responsáveis pela des243
ÍnDiA
truição das suas residências durante a primeira fase da violência hindu, perpetrada entre 24
e 27 de Dezembro de 2007. Pelo menos 107 igrejas e cerca de um milhar de residências cristãs
foram incineradas, assim como diversas habitações hindus (na aldeia de Brahminigaon). O
instigador desta violência anti-cristã foi Laxamananda Saraswati, vice-presidente do Vishwa
Hindu Parishad (VHP), cujo assassinato por grupos maoistas a 23 de Agosto de 2008 resultou
numa segunda onda de violência.
Uma nova dimensão de terror em Kandhamal surgiu com a emergência de dois novos grupos
aparentemente trabalhando em uníssono. Um destes é uma milícia civil, patrocinada pelo
Governo e paga com fundos estatais. Oitocentos homens irão ser destacados em Kandhamal. O segundo é um grupo de cerca de oitenta jovens, que viajaram em 2008 para Gujarate,
tendo agora regressado bem-treinados e armados. Tal grupo anunciou ir matar cristãos no
dia 23 de cada mês, em memória do assassinato de Saraswati. O Governo de Orissa permanece em silêncio quanto a esta questão, ao passo que os meios de comunicação social procuram apresentar tal grupo como um braço separatista dos Maoístas responsáveis pela morte
de Saraswati no Agosto transacto.
Os meios de comunicação social têm auxiliado no envenenamento da atmosfera com informações falsas e partidárias. Os jornais e canais televisivos de língua Oriya continuam a atacar políticos, líderes religiosos e cristãos activistas dos direitos humanos.
No que toca à situação humanitária, o Governo estadual afirmou não ter a certeza daquilo
que irá ocorrer após a retirada da Polícia Federal. Entretanto, a situação permanece complicada para os refugiados. Uma delegação da Comissão Europeia visitou campos de refugiados
na área de Kandhamal, assim como em Andhra Pradesh, antes do Natal. Peritos médicos que
têm trabalhado com os refugiados nos campos de Raikia e G Udayagiri referem casos de anemia generalizada entre grávidas e mães recentes. A saúde das crianças nascidas nos campos
desde Agosto de 2008 deixa muito a desejar no que toca a cuidados neo-natais e de nutrição.
Os riscos de segurança são ainda significativos se tomarmos em conta a bomba que, a 27
de Setembro, explodiu no campo de refugiados Nandamaha, em Betticola, matando um
homem e ferindo quatro outros, de entre as trinta e duas famílias que habitam no local. As
investigações demonstraram que a vítima foi o próprio bombista, que estava a preparar a
bomba quando esta explodiu. Tinha chegado ao campo cinco dias antes, não sendo, contudo
e ao contrário dos restantes refugiados, oriundo da aldeia de Batticola. A polícia de Udayagiri,
à qual compete esta região, encontrou ainda quatro revólveres e uma bomba caseira junto ao
campo. Praveen Kumar, comissário da polícia de Kandhamal e responsável pela investigação,
afirmou que o ataque pode ter sido obra de militantes maoístas. Sajan K. George, director do
Conselho Global dos Cristãos Indianos, rejeita tal hipótese e acredita que os responsáveis são
extremistas hindus.
Investigações e detenções
Em Abril de 2009, o Governo indiano criou dois tribunais de acção rápida com o objectivo
de ouvir os casos das vítimas de Kandhamal. Apesar disso, os julgamentos são lentos e mui244
tos dos casos são rejeitados devido ao facto de existirem “provas insuficientes.” A eficiência
de tais julgamentos tem sido limitada pelo facto de os promotores públicos não falarem
Oriya, a língua local usada nestes casos. Têm ocorrido também vários incidentes envolvendo
a intimidação de testemunhas e a discriminação contra as suas famílias. Fontes da AsiaNews
revelaram que Kantan Nayak, uma das principais testemunhas no julgamento daqueles que
violaram a Irmã Meena Barwa, foi sujeito e intimidação por parte de indivíduos não-identificados que o instaram a não testemunhar no caso, a não ser que quisesse ser assassinado.
Foi preciso esperar por Novembro de 2009 para que, pela primeira vez, o Governo admitisse
que foram movimentos hindus os culpados pelos conflitos do Verão anterior. O ministrochefe de Orissa, Naveen Patnaik, reconheceu oficialmente o envolvimento directo de organizações radicais hindus na violência anti-cristã em Kandhamal, após ser interrogado por
Adikand Sethy, deputado pelo Partido Comunista da Índia (PCI). Patnaik, o que nas eleições
de Abril-Maio de 2009 abandonou o PBJ, afirmou que “as investigações aos distúrbios em
Kandhamal revelaram que o Rastriya Swayam Sevak (RSS), o Viswa Hindu Parishad (VHP) e o
Bajarand Dal (BD), estiveram envolvidos na violência. Militantes destas organizações foram
detidos.” As declarações oficiais de Patnaik representam um passo em frente decisivo nos
incidentes envolvendo violência contra cristãos. Até então, o Governo de Orissa havia sempre
evitado as questões envolvendo a origem hindu da violência, descrevendo os eventos de Kandhamal como conflitos étnicos tribais.
De acordo com o Arcebispo Raphael Cheenath, de Cuttack-Bhubaneswar, “agora que o
Governo de Orissa reconheceu que organizações radicais hindus estão por detrás dos massacres de cristãos inocentes, esperamos que estes sejam chamados a tribunal para responder
pelos mesmos.” O advogado Dibakar Parichha, que aconselha e representa as vítimas dos
tumultos, relembra que “foram denunciados à polícia 837 casos e feitas mais de 3000 queixas, relativamente a 415 aldeias. Apesar disso, apenas vinte e sete indivíduos foram presentes
a tribunal, ao passo que os restantes continuam em liberdade. Como se pode falar de paz e
justiça quando os homens responsáveis pelos incêndios, raptos e assassinatos, caminham
impunes pelas ruas?”
ÍnDiA
No entanto, se por um lado as autoridades reconhecem agora a responsabilidade de extremistas hindus, por outro fazem o possível para negar as suas próprias responsabilidades
no ocorrido. Durante o trabalho da Comissão de Inquérito à violência de Agosto de 2008, o
antigo presidente da Câmara de Kandhamal, Gangadhar Singh, culpou as “conversões ilegais”
ao Cristianismo, ao passo que o inspector-geral da polícia se desculpou, afirmando não estar
consciente das ameaças maoístas contra hindus. De acordo com o Bispo de Bhubaneswar,
todos haviam acordado a expulsão da minoria cristã daquela região.
A 19 de Novembro, o tribunal especial de Orissa para os conflitos de 2008, sentenciou nove
pessoas a quatro anos de prisão e multa de 3.500 rupias, cerca de 50 euros. Apesar disso,
têm ocorrido mais absolvições que condenações, mesmo na presença de provas irrefutáveis
contra os acusados.
245
ÍnDiA
O advogado Rasmi Ranjan Jena listou os elementos que tornam tão problemática a obtenção
de justiça em Kandhamal. “Os métodos de investigação são fracos e faccionados; as menções
de detenções nos registos da polícia e a sua apresentação nos tribunais enfraquece os julgamentos; as vítimas e testemunhas sofrem com a ausência de segurança física e social, tanto
dentro como fora das salas de audiência; as testemunhas são ameaçadas; a falta de partidos
democráticos e de direita, capazes de contrabalançar a supremacia do PBJ e do RSS, ajuda os
culpados e contamina a atmosfera nos tribunais.”
Para os cristãos que habitam em Orissa, há sempre a possibilidade do pesadelo de encontrar os seus atacantes de há mais de um ano nas ruas da aldeia. O clima de impunidade de
que disfrutam, acima de tudo, as personalidades mais importantes dos movimentos hindus,
aumenta o receio de que a paz e a justiça jamais sejam possíveis. A série de absolvições
assegurada por Manoj Pradhan, político do PBJ e deputado ao Parlamento de Bhubaneswar,
é disto um flagrante exemplo. Em Outubro de 2009, de facto, o Tribunal Superior de Orissa
libertou sob fiança este deputado do Parlamento local, pertencente ao PBJ e acusado de ser
um dos cabecilhas da violência em Kandhamal. A decisão do tribunal aplicou-se a todas as
catorze acusações apresentadas contra Pradhan, absolvido em duas anteriores ocasiões por
“falta de provas” em dois casos de assassinato de que havia sido acusado.
A 18 de Outubro de 2009, as forças policiais de Orissa detiveram Madhu Baba, do Jalespeta
Ashram, a 310 km de Bhubaneswar, levando-o para a prisão de Baliguda, onde permanece
detido. As autoridades judiciais recusaram-se a autorizar uma fiança. Fontes na esquadra
da polícia de Baliguda afirmaram que a detenção nada tem a ver com os ataques extremistas em Kandhamal e que os agentes policiais tinham recebido informações sobre possíveis
ataques de minorias contra Madhu Baba. O líder hindu é uma das figuras mais controversas
do VHP em Orissa, bastas vezes criticado pelas suas posições extremistas. Braço-direito de
Laxmananda Saraswati e seu sucessor na liderança do Jalespeta Ashram, Madhu Baba estava
presente aquando do assassinato do swami a 23 de Agosto de 2008, e é uma das testemunhas mais importantes. Ele próprio foi o primeiro a comunicar o crime, assim contribuindo
para os rumores de que os assassinos do líder hindu eram cristãos e não militantes maoístas
como revelado pelas investigações posteriores.
Em Julho de 2009, quase um ano após os violentos confrontos, o Governo central indiano e o
do estado de Orissa, decidiram alocar fundos para as vítimas e para a reconstrução das igrejas destruídas pelos extremistas hindus. O Governo local vai contribuir para a reconstrução
dos edifícios, providenciando 4,23 milhões de rupias, o equivalente a cerca de 62 mil euros.
É a primeira vez que o Estado providencia fundos para a reconstrução de locais de culto e
edifícios religiosos. O dinheiro vai ser usado para a reconstrução de 196 edifícios, igrejas e
locais de culto pertencentes a várias denominações cristãs, maioritariamente do distrito de
Kandhamal. O Governo central, por sua vez, destinou 10,5 milhões de rupias (154 mil euros)
para trinta e cinco famílias que perderam familiares durante os ataques de Agosto.
246
Em finais de 2009, das mais de 4.640 casas incendiadas durante os ataques de 2008, apenas
200 haviam sido totalmente reparadas. De acordo com estimativas optimistas de organizações cristãs, até finais de 2010 outras 2.500 serão reparadas, mas outras 2000 permanecerão
em ruínas.
O destino da igreja em Betticola, no distrito de Kandhamal, destruída por extremistas hindus
em 2008, é igualmente deprimente. Após se ter cancelado a construção de um templo hindu
sobre as suas ruínas, o Governo local recusou autorização para a reconstrução da igreja,
devido ao facto de a comunidade católica não possuir documentos de propriedade. A Igreja
de Betticola foi construída num terreno comprado em nome de um padre católico tribal, que
entretanto faleceu. Dado não existirem provas de que a propriedade tenha sido legada a
outros, o Governo questiona a legalidade do próprio edifício.
A motivação política
Camufladas pela violência anti-cristã em Orissa continuam a estar as motivações políticas.
Quarenta por cento da população deste estado é formada por povos tribais ou Dalits. Tal
implica que seja um dos estados mais sub-desenvolvidos da Índia. O distrito de Kandhamal,
o qual tem sofrido violência anti-cristã nos últimos dez anos, é também uma área que tem
registado um maior número de conversões ao Cristianismo. A sua conversão tem implicado
que muitos Dalits alcancem evidentes melhorias em termos sociais e económicos. Recentemente, muitos povos tribais têm decidido seguir o exemplo dos Dalits e tornar-se cristãos.
Assim, enquanto em toda a Orissa os cristãos são apenas 2% da população, nos últimos dez
anos este número cresceu para 5% no distrito de Kandhamal. Outro factor pode ajudar a
explicar a hostilidade relativamente aos cristãos: graças à educação que recebem, os povos
tribais e os Dalits não são já susceptíveis de ser utilizados como mão-de-obra agrícola barata.
O seu sentido de dignidade e a educação dão-lhes agora a coragem para protestar contra a
exploração e a opressão.
Esforços em prol do diálogo
ÍnDiA
Em Junho, uma delegação católica, liderada pelo Cardeal Jean Louis Tauran, presidente do
Conselho Pontifício para o Diálogo Inter-religioso, encontrou-se com doze líderes espirituais
hindus em Mumbai. “Falei dos muitos episódios de violência que têm tido lugar na Índia
recentemente, tentando comprender as razões para tal. Sabemos que esta não é a face real
da Índia, um país magnífico, rico em tolerância, religião e cultura”, afirmou o cardeal no final
do encontro.
A delegação católica liderada pelo cardeal consistia em sete pessoas, entre elas o Cardeal
Oswald Gracias, Arcebispo da Arquidiocese de Mumbai, o qual foi o anfitrião; o Monsenhor
Pedro Lopez Quintana, Núncio Apostólico na Índia; o Monsenhor Felix Machado, Arcebispo
de Nashik; e o Monsenhor Thomas Dabre, recentemente nomeado Bispo de Pune. Os hindus estiveram representados por doze líderes espirituais da comunidade indiana, liderados
247
ÍnDiA
pelo Swami Sankaracharya Kanchi Kamakoti Mutt. O encontro de Mumbai resultou de uma
iniciativa liderada pelo Cardeal Gracias, o qual encorajou estas discussões, parcialmente em
resposta ao desejo de diálogo e debate entre representantes das duas comunidades religiosas expressas pelo Swami Sankaracharya. O caminho iniciado na sequência do diálogo de
Mumbai é o do entendimento mútuo e da contribuição de hindus e cristãos para a sociedade
indiana. “O diálogo inter-religioso tem resultados muito práticos”, afirmou o Cardeal Tauran,
“como a paz e o desenvolvimento para todos.”
A 16 de Outubro, por ocasião do Festival Hindu de Diwali, o Festival da Luz, a mensagem do
Conselho Pontifício para o Diálogo Inter-religioso mencionou que o verdadeiro desenvolvimento humano é alcançado quando há respeito pelas liberdades de cada indivíduo, incluindo
a vontade política para trabalhar e garantir uma maior protecção dos direitos humanos e um
clima de co-existência pacífica.
Terrorismo e tensão entre hindus e muçulmanos
A ameaça e o medo do terrorismo, quer perpetrado por activistas locais, como os Maoístas, ou por activistas estrangeiros ou regionais, como os grupos paquistaneses ou oriundos
do Bangladesh, permanecem muito elevados na Índia e continuam a fomentar um clima
de suspeita generalizada relativamente à comunidade muçulmana. Em Fevereiro de 2010,
uma bomba explodiu na German Bakery (Padaria Alemã) em Pune, Maharashtra, matando
dezassete pessoas e ferindo outras cinquenta. A Bakery é um popular ponto de encontro
para turistas e locais, tendo as suspeitas recaído imediatamente sobre o grupo extremista
Lashkar-e-Taiba, o qual combate pela independência de Caxemira. Não se registaram represálias contra a comunidade muçulmana após este massacre mas, de acordo com os analistas,
isto deve-se mais ao nível de educação e integração do povo de Pune do que aos esforços
governamentais para suster quaisquer tensões inter-religiosas. O nível de violência rebelde
no estado de Jammu e Caxemira caiu em 2009, apesar de elementos ligados ao Governo e
mesmo civis continuarem a ser mortos. Em Dezembro de 2009, cerca de quarenta pessoas
ficaram feridas quando a polícia decidiu usar gás lacrimogéneo e bastões para dispersar uma
procissão durante a festividade xiita do Muharram, em Jammu e Caxemira. Encontros de tal
tipo estão proibidos nesta região desde 1989, e as autoridades apenas autorizam pequenos
encontros e procissões nas áreas maioritariamente xiitas.
Subsistem também receios em torno de alguns episódios que indicam uma tendência para
“talibanizar” o extremismo hindu. A 24 de Janeiro de 2009, o grupo extremista hindu Sri Ram
Sena atacou um bar em Mangalore, agredindo as mulheres aí presentes por considerar as
mesmas “indecentes”. A 7 de Fevereiro de 2009, membros do Sri Ram Sena raptaram a filha
de um deputado de Kerala e de uma jovem muçulmana, por estes falarem um com o outro
enquanto viajavam num transporte público. Os atacantes foram detidos e imediatamente
libertados sem qualquer acusação.
A 11 de Julho de 2009, e no início do seu primeiro ano escolar no Colégio Sri Venkatarama
Swamy em Bantwal, perto de Mangalore, no estado de Karnataka, uma jovem estudante
248
ÍnDiA
muçulmana, Aysha Asmin, chegou à aula usando o véu, de acordo com as tradiçoes islâmicas.
As regras escolares proíbem que as raparigas usem os dhotis negros, como é habitual para os
devotos hindus de Ayappan, mas não há qualquer proibição relativamente ao uso do hijab,
o qual é utilizado por muitas mulheres muçulmanas para cobrir a cabeça. Contudo, alguns
colegas apresentaram objecções; afirmavam que o véu de Aysha era um símbolo religioso
provocatório, e pediram que a escola proibisse a rapariga de utilizar o véu na sala de aula. A
6 de Agosto, as autoridades escolares proibiram Aysha de usar o véu. Um encontro entre os
pais da rapariga e o director da escola, Sitaram Mayya, não produziu quaisquer resultados.
Este último afirmou que a aluna não estava a utilizar um véu, mas antes uma “meia-burqa”,
e que proibir o uso do véu foi a única maneira de evitar criar tensão entre os alunos.
O incidente no colégio em Bantwal atraiu a atenção da opinião pública do estado de Karnataka, onde as relações entre muçulmanos e hindus são bastas vezes marcadas por conflitos
e controvérsias. Em muitas cidades e aldeias há uma lei não-escrita que proíbe jovens de
distintas religiões de falarem uns com os outros em público. As consequências de uma tal
atmosfera são acima de tudo arcadas pelas mulheres, as quais são vítimas habituais de violência e discriminação, infligida pelas margens mais extremistas de ambas as religiões.
Muitas vezes as consequências desta desconfiança reflectem-se no quotidiano das comunidades. Em muitas cidades, um muro inultrapassável de preconceito, suspeição e ignorância impede que muçulmanos encontrem habitação. Em Mumbai, pouco depois de proceder
ao pagamento da entrada para um apartamento num bairro da moda, um famoso actor
de Bollywood viu o seu contrato ser rescindido, logo após o administrador da propriedade
ter descoberto que se tratava de um muçulmano. O actor, Emrann Hashmi, denunciou este
facto à Comissão Estatal para a Protecção das Minorias, a qual tem o dever constitucional
de defender tais direitos. Contudo, alguns partidos políticos culparam Hashmi. Sanjay Bedia,
membro do Partido Bharatiya Janata, acusou Hashmi de preconceito, e denunciou o mesmo
à polícia por proferir declarações ofensivas contra a comunidade.
A comunidade muçulmana de Nova Deli, contudo, afirma que o que sucedeu com Hashmi
em Mumbai ocorre diariamente na capital, uma cidade que ainda assim é uma mistura de
variadas identidades regionais e religiosas. Isto afecta não apenas os muçulmanos comuns,
mas também aqueles com níveis superiores de educação, como quadros, engenheiros, médicos e jornalistas, os quais não conseguem encontrar propriedades nas melhores zonas residenciais de Deli. A Velha Deli, por seu turno, permanece um bastião da comunidade muçulmana. Também aqui, no entanto, se começa a assistir à mudança. A vontade de viver na sua
própria comunidade é também evidente na Cidade Murada, onde comerciantes hindus têm
vivido desde há séculos ao lado de muçulmanos. Muitos estão agora a vender as suas casas
a muçulmanos e a partir para outros locais.
O mais recente relatório sobre o estatuto social e económico dos muçulmanos na Índia, o
Relatório Sachar de 2006, condenou as condições discriminatórias experimentadas pela
comunidade no acesso à educação, ao crédito, e na compra ou aluguer de propriedades, comparativamente ao que sucede com a maioria hindu.
249
ÍnDiA
A violência de 2002 em Gujarate – ainda uma ferida em aberto
Em Abril de 2009, o Supremo Tribunal indiano nomeou uma Comissão de Inquérito especial
para analisar o papel desempenhado pelo governador de Gujarate, Narendra Modi – membro
do PBJ – e por cinquenta outros indivíduos, nos massacres que devastaram este estado em
2002, causando a morte de mais de um milhar de pessoas, a maioria das quais muçulmanas.
Os confrontos étnico-religiosos de 2002 causaram um número indeterminado de mortes
em Gujarate – algumas fontes falam de 2.000 vítimas mortais – e 150.000 refugiados. A
violência deflagrou após a morte de sessenta hindus durante um ataque a um comboio na
cidade de Godhra, alegadamente levado a cabo por um grupo islâmico. Modi, líder do Partido Bharatiya Janata (PBJ), e na altura já governador daquele estado, é mormente acusado
de ter estado envolvido no assassinato de um deputado. Contudo, uma considerável secção
da opinião pública considera que este importante membro do partido nacionalista hindu
deve também ser levado perante a justiça para responder pela aprovação tácita dada aos
revoltosos, e pela inércia demonstrada pelas autoridades na prestação de auxílio às vítimas
do massacre. De acordo com Lenin Raghuvanshi, director do Comité Popular para a Supervisão dos Direitos Humanos, a criação de uma Comissão “prova que o genocídio de minorias
muçulmanas em Gujarate está ligado ao Governo do estado.”
Persistem, contudo, alguns sinais de esperança. A 21 de Dezembro de 2009, o Estádio Supari
Talao, no município de Bandra, Mumbai, foi palco de um concerto de Natal que contou com
a presença de cristãos, hindus e muçulmanos. O evento, organizado pela ONG Atmawishwas,
foi patrocinado por Ashish Shelar, o novo rosto do PBJ. O advogado de 36 anos, e líder daquele
partido hindu no Conselho Administrativo do estado de Maharashtra, escolheu “Vamos celebrar juntos o nascimento de Jesus” como designação para o evento. O Festival de Natal, como
foi nomeado por aqueles que no mesmo participaram, reuniu cerca de 4000 pessoas, que
escutaram canções e hinos, alguns dos quais escritos por não-cristãos, como “Noite Santa”
e “Hoje é Natal”, compostos e interpretados pelo cantor muçulmano Bashir Sheikh. Ashish
Shelar explicou que o Festival de Natal é uma iniciativa organizada “como sinal de expressão
cultural” e baseada “nos valores exibidos há séculos pela Constituição indiana.” Shelar afirmou ainda que “enquanto advogado, há muito que estou empenhado na defesa dos direitos
da comunidade cristã, e é admirável o facto desta nunca ter protestado contra a lei, sendo
reconhecida pela predisposição para o diálogo, para a tolerância e para a paz.”
250
inDOnÉSiA
O processo de democratização da Indonésia, que se iniciou em 1998,
contribuiu de um modo determinante para a melhoria dos direitos
humanos no país. A maioria das comunidades religiosas locais é
reconhecida e opera livremente, isto apesar de algumas violações,
algumas das quais significativas, do princípio da liberdade de culto.
Líderes políticos e religiosos, bem como membros da sociedade civil,
referiram-se frequentemente à questão do lugar da religião na vida
política do país. A administração do presidente Susilo Bambang
Yudhoyono, o qual foi reeleito em 2009, deu passos importantes na
luta contra o terrorismo e a intolerância religiosa, especialmente nas
regiões mais sensíveis como Ambon e Sulawesi Central, promovendo
a paz na província de Aceh. Acima de tudo, esforçou-se por construir
um consenso abrangente para conduzir a Indonésia por um caminho democrático, ajudado em parte por um crescimento económico
numa altura de crise global.
Os grupos muçulmanos radicais e extremistas não têm ganho muito
apoio junto da população, como foi evidenciado pelas eleições parlamentares de Junho último que deram ao presidente cessante uma
vitória esmagadora. Pressões por parte de grupos marginais islâmicos
tiveram, no entanto, um impacto na agenda pública e nas políticas
do Governo, influenciando o comportamento e as actuações de juízes, magistrados do Ministério Público e políticos. Tal influência tem
sido exercida através de grupos de pressão privados, manifestações
de rua, ameaças e distúrbios populares que envolvem centenas, se
não mesmo milhares, de pessoas. Em 2008, isto produziu vários éditos ministeriais contra a comunidade Ahmadiyyah e a uma lei contra
a pornografia, lei essa inspirada na Sharia.
Grupos muçulmanos moderados, cristãos, hindus, budistas e outros
grupos religiosos e da sociedade civil tentaram opor-se à legislação
inspirada na Sharia, quer no Parlamento, quer nas ruas. Ao mesmo
tempo, o Governo nunca clarificou se planeia alterar as leis que interferem nos direitos dos denominados grupos heréticos ou rever regulamentos que de facto violam a liberdade religiosa.
Apesar dos melhores esforços por parte das autoridades, os ataques
e os actos de intimidação contra minorias religiosas, principalmente
por parte de movimentos e grupos muçulmanos radicais, continuaram a ocorrer. Na realidade, no país muçulmano mais populoso do
mundo, tanto os cristãos como alguns muçulmanos como, por exem-
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos79%
Cristãos11,8%
Animistas2,6%
Outros6,6%
Cristãos
29.085.930
Católicos
6.881.000
Circunscrições
eclesiásticas
38
SUPERFÍCIE
1.904.569km2
POPULAÇÃO
232.517.000
REFUGIADOS
798
DESALOJADOS
70.000-120.000
251
inDOnÉSiA
Enquadramento político e institucional
inDOnÉSiA
plo, os Ahmadiyyah, foram alvo de violência, os últimos porque são considerados heréticos
pelas principais correntes muçulmanas. Embora a Constituição reconheça a liberdade de
culto como um direito básico, algumas leis nacionais e das províncias, como a lei sobre a
blasfémia e as autorizações de construção que são requeridas para a edificação de igrejas,
foram usadas contra minorias.
Este clima de tensão foi confirmado num estudo elaborado pelo Instituto Setara para a
Democracia e a Paz, um grupo activista que conduziu a luta pela tolerância religiosa e pelos
direitos humanos. O P. Antonius Benny Susetyo, secretário executivo da Comissão Episcopal
para os Assuntos Inter-religiosos, é membro do Instituto. No ano passado, registaram-se mais
de 200 incidentes nos quais a liberdade religiosa foi violada. Agências estatais estiveram
envolvidas em 139 casos, sendo que em 101 destes os funcionários públicos tiveram um papel
‘activo’. Os outros trinta e oito foram casos de omissão. De igual modo, o Instituto encontrou
quarenta e oito casos de conspiração envolvendo a polícia. Outros casos envolveram o Ministério de Assuntos Religiosos (catorze casos), presidentes de câmara locais (oito casos), líderes
de Regência (distrito) (seis casos) e de tribunais (seis casos). Membros do Conselho dos Ulamas da Indonésia (MUI) estiveram envolvidos em vinte e nove casos nos quais a liberdade
religiosa foi violada; extremistas da Frente de Defensores Islâmicos (FPI) estiveram envolvidos em nove casos; e o Fórum da Comunidade Islâmica esteve envolvido em seis casos.
Com trinta e três ataques, os Ahmadiyyah voltaram a ser o grupo mais perseguido em 2009.
Os cristãos viram a sua liberdade religiosa ser violada em doze casos, seguidos de perto por
membros de uma seita, Satria Piningit Weteng Buwono, que foi alvo de dez ataques. Porém,
o número global de ataques decresceu em comparação a 2008, quando o Instituto Setara
registou 256 incidentes.
O Instituto Wahid, cujo nome vem de Abdurrahman Wahid, ex-presidente indonésio e antigo
dirigente do Nahdlatul Ulama (NU), uma organização islâmica com cerca de vinte milhões
de membros, também se concentrou no fundamentalismo existente no país. Para o NU, a
intolerância religiosa é, em grande medida, uma função de grupos muçulmanos extremistas
como o FPI e o MUI. Não obstante, a Indonésia conta com um número importante de crentes, intelectuais e líderes religiosos muçulmanos moderados, que consideram inaceitável o
crescimento do fanatismo religioso, o que se relaciona directamente com as campanhas de
islamização elaboradas por grupos extremistas.
Ataques anti-católicos
Nos primeiros seis meses de 2009, apesar da ausência de casos graves de perseguição contra
católicos indonésios, uma atmosfera de desconfiança continuou a envolver as organizações
e institutos católicos, tornando difícil levarem a cabo o seu trabalho em nome dos deficientes e dos marginalizados. No início de Julho, por exemplo, grupos muçulmanos impediram a
continuação da construção de uma casa para crianças deficientes em Java Oriental, ostensivamente por medo de que pudesse ser usada para proselitismo cristão. A construção decorria
em Junrejo, nos arredores de Batu (Malang, Java Oriental) e estava quase pronta a receber
252
inDOnÉSiA
crianças com autismo, problemas mentais e outras inaptidões. O projecto fora ideia da Fundação Bakti Luthur (FBL), uma organização sem fins lucrativos gerida pelo Instituto Sekulir
Alma, uma instituição feminina laica. No dia 19 de Junho, o presidente da Câmara da cidade,
Eddy Rumpoko, revogou a sua licença de construção no seguimento de protestos por parte
de mais de 1000 muçulmanos locais. A Irmã Chatarina Sulasti, que é membro do Instituto,
rejeitou as alegações de proselitismo. Falando para a AsiaNews, ela afirmou que “ao tratar
dos nossos doentes, não mostramos nenhuma preferência, seja qual for a sua religião.” O P.
Heru Susanto, pároco em Batu, concordou com a religiosa. Segundo ele, o projecto era bom.
“Não há nenhum outro propósito”, insistiu, além do de proporcionar “cuidados carinhosos a
crianças com necessidades especiais.”
Apesar da oposição por parte de um grupo marginal da população muçulmana da Indonésia, a Igreja Católica lançou várias iniciativas a favor dos mais necessitados e nunca deixa de
ajudar em situações de emergência, como terramotos, que são uma ocorrência frequente no
arquipélago indonésio. Setembro foi um desses casos. Quando um terramoto de 7.3 atingiu
Tasikmalaya (província de Java Ocidental) em 1 Setembro, matando mais de setenta pessoas
e ferindo quase um milhar, os católicos agiram depressa, mostrando a sua solidariedade para
com as vítimas. Recolheram todos os tipos de bens básicos, tendas, artigos domésticos, e
enviaram-nos para o local, juntamente com o dinheiro que conseguiram angariar para ajudar
as vítimas. Além disso, essa acção foi impulsionada através de intensas trocas por e-mail e na
rede social Facebook. De igual modo, não só os crentes na diocese do Monsenhor Johannes
Pujasumarta, Bispo de Bandung, responderam “com entusiasmo” ao seu apelo, como inúmeros católicos fizeram o mesmo por toda a Indonésia. Em Jacarta e Lampung, todas as
paróquias recolheram dinheiro, roupas, produtos alimentares não perecíveis e ferramentas.
No dia 30 de Setembro, outro terramoto devastou Padang Pariam, uma região em Sumatra
Ocidental, semeando a morte e a destruição, provocando milhares de vítimas. Também aqui,
a Igreja pôs em movimento o seu próprio mecanismo de ajuda, alcançando aldeias nalgumas das zonas mais remotas do país para impedir surtos de doenças infecciosas. A Caritas
Indonésia providenciou apoio ao pessoal médico e coordenou as actividades de salvamento
e a distribuição de alimentos “sem distinções baseadas na afiliação étnica ou na convicção
religiosa.”
No dia 19 de Outubro, a AsiaNews informou que, em Purwakarta (província de Java Ocidental), a Igreja Católica de Santa Maria tornou-se o centro de uma controvérsia. As autoridades
locais revogaram a licença de construção que tinham concedido dois anos antes, o que constituiu um choque para os católicos locais que já tinham preenchido todos os documentos
necessários e obtido todas as autorizações exigidas. Os funcionários indicaram que havia
algumas “irregularidades” no processo de candidatura inicial quando a licença de construção
foi concedida. No entanto, para os cristãos locais, isto foi tudo um “pretexto” para parar o
projecto.
Construir uma igreja na Indonésia, quer católica quer protestante, é um processo longo e
complicado que pode levar cinco, ou até mesmo dez anos. Tudo começa com a concessão de
253
inDOnÉSiA
licença de construção (um Izin Mendirikan Bangunan ou IMB em língua [Bahasa] indonésia)
por parte das autoridades locais. Porém, as coisas são mais complicadas quando se trata
de locais de culto cristãos. Além do IMB, os cristãos precisam do apoio de alguns residentes
locais na zona onde querem construir uma igreja, bem como do apoio do Fórum de Diálogo
Inter-religioso. Mesmo assim, os funcionários podem bloquear os planos, citando “outras”
razões inexplicadas. Normalmente, estas outras razões são pressões por parte de residentes
muçulmanos locais ou de grupos radicais muçulmanos que agem por fanatismo religioso.
A certa altura, o jornal diário indonésio Tempo informou que o chefe do Distrito de Purwakarta,
Dedi Mulyadi, revogara uma licença que tinha sido concedida a residentes cristãos na aldeia
de Cinangka, sub-distrito de Bungur Sari, porque a candidatura apenas conseguira angariar
o apoio de quarenta e cinco residentes muçulmanos, em vez dos sessenta que são requeridos
por lei para um local de culto cristão, tanto católico como protestante. Face a esta recusa,
o Bispo de Bandung, na província de Java Ocidental, Monsenhor Johannes Pujasumarta Pr,
pediu a ambas as partes que se envolvessem num “diálogo entre pessoas de boa vontade”, o
que deveria ser “o modo para lidar com todos os assuntos de carácter social” incluindo o caso
da Igreja Católica de Santa Maria. Ainda assim, o prelado insistiu que neste caso particular
“fossem respeitados todos os regulamentos”, e que ele usaria de “todos os meios legais” ao
seu alcance para proteger os direitos dos católicos.
Na Ilha de Sumatra, uma capela católica foi finalmente inaugurada apesar de protestos por
parte da comunidade muçulmana local. Uma petição contra a estrutura circulou, arrastando
o Fórum para o Diálogo Inter-religioso local para o seio da controvérsia, embora este seja
normalmente usado enquanto jurisdição para reduzir as tensões.
Neste caso particular, o chefe do distrito local ordenara mesmo que o edifício fosse removido.
No entanto, a tenacidade de milhares de católicos em Pangkalan Kerinci, distrito de Pelalawan, Sumatra, foi suficientemente forte para superar a oposição. Assim, a capela foi inaugurada sem incidentes no dia 18 de Outubro. O Monsenhor Martinus Situmorang, Bispo de
Padang, conduziu a cerimónia de abertura oficial da Sala de Oração da Paróquia do Sagrado
Coração, em Pangkalan. No seu discurso, incentivou os católicos a serem pacientes e a manterem a sua fé, acentuando o modo como “o trabalho misericordioso de Deus acaba sempre
por vencer”.
Quando as obras da capela se iniciaram em 2002, os muçulmanos não se mostraram preocupados com a sua construção. No entanto, alguns dias antes da inauguração, espalharam-se
rumores de que os cristãos estavam a planear construir uma igreja. Isto enfureceu os muçulmanos locais que lançaram uma petição e começaram a distribuir panfletos anti-cristãos
com um conteúdo provocatório. Apesar de pressões por parte das autoridades locais e ameaças de muçulmanos radicais, o bispo decidiu ainda assim inaugurar a capela. Agora os católicos possuem um local onde podem rezar.
No caso da Igreja Católica de Santa Maria, os crentes em Java Ocidental tiveram de recorrer
aos tribunais em busca de justiça. Liona M. Supriatna, a advogada que, no dia 13 de Novembro,
entregou o caso no tribunal administrativo local (PTUN) em nome da comunidade católica,
254
INDONÉSIA
afirmou que as acusações eram “totalmente infundadas”, reafirmando que a diocese tinha
satisfeito todas as exigências, preenchido toda a documentação necessária para a construção, e obtivera ainda o “apoio de residentes locais.”
À medida que se aproximava o Natal, a violência contra a minoria católica escalou. Na noite
de 18 de Dezembro, uma multidão enfurecida de cerca de 1000 muçulmanos, incluindo
mulheres e crianças, entrou de forma violenta na Igreja Católica de Santo Alberto, na Regência de Bekasi, cerca de 30 km a Leste da capital do país, Jacarta. “Um grupo de motoqueiros
invadiu a área onde a igreja fica situada”, afirmou uma testemunha ocular. Alguns transportavam bandeiras e latas de querosene. Uma mulher confirmou que se encontravam mulheres e crianças entre os atacantes.
O incidente ocorreu poucos dias antes do Natal, por coincidência, no primeiro dia do Ano
Novo islâmico que também é o primeiro dia do mês de Muharram, um dia tradicionalmente
marcado por corridas de motocicletas e de automóveis.
A Igreja Católica de Santo Alberto, uma capela que se encontra sob a jurisdição da Igreja
Católica de Santo Arnaldo, em Bekasi, estava quase terminada. Autorizadas por uma licença
de construção devidamente emitida, as obras no edifício tinham começado no dia 11 de Maio
de 2008 e estavam já completas a cerca de 80%. Os trabalhadores tinham terminado há
pouco as paredes e o telhado, e preparavam-se para colocar os ladrilhos no chão. Embora
incompleto, o edifício preparava-se para ser palco da Missa de Natal para a comunidade católica local.
Ainda assim, apesar de toda a perseguição e intolerância que tiveram de suportar, os católicos nunca deixaram de intervir em acções que beneficiam toda a população indonésia, quer
se trate de lidar com desastres naturais ou passos mais abrangentes empreendidos em favor
do desenvolvimento.
Em Novembro, depois de auxiliarem os habitantes deslocados pelo tremor de terra em
Padang (Sumatra Ocidental), os activistas cristãos do Grupo Humanitário e de Caridade
(KBKK) lançaram um plano para a reconstrução e desenvolvimento da área devastada pelo
tremor de terra de 30 de Setembro. Aberto ao clero e aos leigos, o grupo de 400 pessoas
tem estado activo na Indonésia durante os últimos dez anos em zonas onde a necessidade é
maior. A fundadora da associação, Irene Setiadi, explicou que o KBKK foi criado para reunir os
crentes que desejam “servir a Igreja colocando-se a si próprios, as suas capacidades, as suas
experiências profissionais e os seus fundos à disposição das pessoas em necessidade, independentemente da sua fé ou do seu credo religioso.”
Do mesmo modo, os católicos tentaram ajudar os agricultores e operários, que frequentemente se encontram nas margens da sociedade indonésia por causa da falta de “influência
política”. De facto, ao longo dos anos, os agricultores assistiram à redução contínua das terras cultiváveis devido à ampla industrialização e viram-se confrontados com o aumento dos
custos das matérias-primas. Num local, Salatiga, uma cidade na Java Central, uma associação, presidida pelo P. John Wartaya Winangun SJ, director da KPTT, juntou cerca de quarenta
e cinco agricultores e operários numa série de reuniões e debates. O clérigo afirmou que é
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inDOnÉSiA
importante, não só partilhar os problemas, mas também desenvolver soluções comuns para
“melhorar a qualidade de vida.” Uma transmissão de conhecimentos em rede em defesa dos
trabalhadores é uma parte essencial, porque permite aos membros da rede a “promoção dos
seus produtos” e a “troca de ideias e de opiniões”.
O Cardeal Jean-Louis Tauran, presidente do Conselho Pontifício para o Diálogo Inter-Religioso,
também deu ênfase à importância da cooperação bem como do diálogo inter-religioso entre
os Cristãos e os Muçulmanos durante uma visita à Indonésia no final de Novembro. De facto,
“construir pontes para o diálogo não é uma opção, mas sim uma necessidade”, afirmou,
depois de conhecer figuras políticas de proa, bem como os líderes muçulmanos e católicos.
Durante a visita, o prelado visitou a Mesquita de Istiqlal, em Jacarta, o maior local de culto
muçulmano no Sudeste da Ásia, que se situa em frente da catedral católica da cidade.
O trabalho realizado pelos católicos é muito apreciado e amplamente reconhecido. Por exemplo, no início de Dezembro, o P. Johannes Jonga Pr, um padre indonésio de 51 anos de idade,
ganhou o Prémio Yam Thiam Hien de 2009. Este prémio é atribuído ao indivíduo que mais
se distinguiu a nível nacional na promoção da paz e do respeito pelos direitos humanos e da
dignidade humana. Pároco desde 2001 em Wairs, uma pequena cidade no Distrito de Keerom,
na fronteira com a Papua-Nova Guiné, conseguiu lidar com as tensões geradas por rebeldes
separatistas que operam naquela área, ao mesmo tempo que ajudava os necessitados. Também apoiou as reivindicações da população local que têm sido vítimas de abusos por parte
dos militares e de grandes empresas multinacionais.
Os cristãos, uma minoria perseguida
A Indonésia assistiu a um incremento do fundamentalismo islâmico desde os primeiros
meses de 2009. Isto aconteceu sobre um pano de fundo de iniciativas fortes por parte do
Governo do presidente Yudhoyono, o qual destacou unidades do exército e esquadrões antiterrorismo especiais para capturar os criminosos mais perigosos. Na véspera das eleições
nacionais e regionais do dia 9 de Abril, a comunidade cristã expressou grande preocupação
sobre o apoio crescente aos partidos islamistas, como o Partai Bulan Bintang (PBB) e o Partai
Keadilan Sejahtera (PKS), sendo que ambos querem impor a Sharia (lei islâmica) no país.
“Os receios católicos são justificados”, afirmou J. Kristiadi, analista político católico no Centro
de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS) de Jacarta, porque a discriminação e a violência anti-cristãs estão a aumentar. Para Kristiadi, os partidos islamistas estão a ganhar terreno
por causa do declínio relativo da Pancasila, a filosofia estatal baseada em cinco princípios
que inspiraram o nacionalismo laico da Indonésia e moldaram o processo de construção da
nação depois da independência. Na realidade, “uma pesquisa feita por alguns partidos nacionalistas pretendeu demonstrar que 80% dos estudantes universitários desejam ver a Sharia
substituir a Pancasila”, afirmou Kristiadi.
O aumento das tensões conduziu a actos de violência. No dia 27 de Abril, a polícia encontrou
duas pessoas assassinadas, mortas com uma catana; foram elas o Reverendo Frans Koagow,
clérigo protestante de 64 anos, e a sua esposa, Femy Kumendong, de 73 anos. O casal vivia
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em Manado, capital da província de Sulawesi do Norte, uma zona predominantemente cristã
protestante. Depois do crime, a polícia “procurou dois homens que tinham chegado à casa de
Reverendo Koagow numa motocicleta”, reportou o jornal do Vaticano L’Osservatore Romano.
Significativamente, “Nada foi roubado às duas vítimas de assassinato, pelo que o roubo ou
a extorsão podem ser afastados enquanto possíveis motivos”, reportou a AsiaNews, citando
fontes policiais. Aparentemente, o Reverendo Koagow jantara com os dois assassinos num
quiosque situado perto de sua casa. Mais tarde, eles acompanharam-no a casa onde o assassinaram juntamente com a sua esposa.
Na maioria dos casos, a liberdade religiosa é violada, forçando o encerramento de locais de
culto e conseguindo que as autoridades revoguem licenças de construção que já tinham sido
emitidas. As autoridades normalmente acabam por ceder por medo de represálias por parte
de muçulmanos radicais que não hesitam, frequentemente, em importunar e chantagear.
No dia 23 de Julho, uma comunidade protestante em Parung, Regência de Bogor (Província de
Java Ocidental), queixou-se de que uma igreja local foi destruída depois de os funcionários
locais terem dito que “faltava a necessária licença de construção.” Em sua defesa, os paroquianos locais fizeram notar que tinham obtido o acordo por parte de comunidades muçulmanas locais e tinham solicitado várias vezes a licença, mas não tinham recebido nenhuma
resposta. O edifício foi assim destruído no dia 21 de Julho porque não possuía a licença (IMB)
requerida em tais casos.
Em meados de Agosto, o Jacarta Post publicou algumas histórias relativas à discriminação
que a comunidade cristã em Banten tem de enfrentar “todos os domingos”. De acordo com
um líder cristão local, Bedali Hulu, os crentes tinham andado “cheios de medo” durante os
dois meses anteriores por causa de ataques constantes por parte de “dezenas de membros
de organizações muçulmanas” durante as missas de domingo. Cerca de quarenta membros
da Igreja Baptista Cristã de Jacarta (GKBJ) “viviam sob pressão constante” e sujeitos a ameaças intermináveis por parte de homens armados com paus. “Como podemos nós rezar correctamente se temos um grupo das pessoas a gritar palavras ameaçadoras contra nós à porta
da nossa igreja?” perguntou Bedali.
No final de Outubro, porém, foi a polícia que esteve por detrás de um ataque contra estudantes da Escola Evangélica de Teologia Arastamar (SETIA), que se encontrava temporariamente
instalada no antigo edifício da Câmara Municipal, na parte Ocidental de Jacarta. A escola
tinha estado a utilizar aquelas instalações depois de se ver forçada, em Julho de 2008, a
abandonar o seu próprio campus em Kampung Makassar, a Leste da capital. Também aqui foi
expulsa, mas desta vez pela polícia. Além de tudo o mais, três dias depois do raide do dia 26
de Outubro, vários estudantes e professores foram acusados de resistir a um agente policial.
Tudo começara no Verão de 2008, quando uma multidão muçulmana atacou o campus original da SETIA na zona Leste de Jacarta, incitados por falsas acusações de que um estudante
cristão roubara a motocicleta a um muçulmano e de que os cristãos tinham erigido edifícios
ilegais. Forçados a abandonar a sua escola original, os estudantes e professores da SETIA
estabeleceram-se no antigo edifício municipal de Jacarta Ocidental.
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Defendendo a sua instituição, o reitor da SETIA, Sukowaluyo Mintorahardjo, rejeitou as acusações em como a sua escola tinha falsificado documentos para poder construir determinadas instalações, como alegaram alguns líderes muçulmanos.
Imediatamente antes do Natal, os ataques contra os locais de culto cristãos aumentaram,
alguns deles com o objectivo claro de impedir as celebrações do Natal. O International Christian Concern (ICC) informou sobre um ataque levado a cabo no domingo, dia 6 de Dezembro,
em Temanggung, Java Central. Fontes contaram ao Kristiani Pos, um jornal local, que uma
multidão “destruiu azulejos, retirou as janelas e as portas e depois incendiou” a igreja, porque
os muçulmanos locais se opunham à existência de um local de culto cristão na sua zona.
Um outro incidente ocorreu no complexo habitacional de Harapah Indah, em Bekasi. O
Jacarta Post relatou no dia 18 de Dezembro que os residentes tinham atacado uma igreja
em construção. Ninguém ficou ferido durante o caos, mas os danos na igreja e nos edifícios
circundantes foram enormes. Cerca de 1000 pessoas lançaram pedras à estrutura; “alguns
invadiram violentamente o edifício, pegando-lhe fogo”, afirmou o director do comité de construção de igreja. Nem sequer a intervenção da polícia local acalmou a situação. Apenas a
chegada de 100 polícias de Bekasi convenceu os extremistas a parar o ataque. Um indivíduo
foi preso por roubar “artigos da igreja durante o ataque”.
No dia 24 de Dezembro, algumas horas antes do início das cerimónias de Natal, forças de
segurança indonésias incrementaram medidas de segurança por todo o país, estendendoas das províncias mais em risco, como Java central e Java Ocidental, até abrangerem o país
inteiro. Em Java Ocidental, as autoridades destacaram mais de 10.000 agentes policiais, além
das tropas regulares. “O destacamento massivo da polícia e exército” foi realizado para prevenir “potenciais ataques terroristas”, afirmou Timur Pradopo, chefe da polícia de Java Ocidental. Alex Bambang Riatmodjo, chefe de segurança em Java Central, tomou medidas semelhantes. Mais de 11.000 agentes foram destacados, apoiados pelo exército.
Ainda assim, tais medidas provaram ser inadequadas para impedir ataques em Java Ocidental, onde uma igreja protestante foi forçada a fechar. Em Bekasi, centenas de manifestantes
saíram à rua na Véspera de Natal para impedir a realização dos serviços religiosos na Igreja
Protestante Filadelfia Huria Kristen Batak (HBKP). Na ocasião, encontravam-se dentro do edifício 279 pessoas.
O Compass Direct News relatou que durante os dias que se seguiram, os protestos continuaram, forçando as autoridades a agir. No dia 31 de Dezembro, um funcionário do distrito emitiu
uma ordem de encerramento da igreja, impedindo quaisquer cerimónias religiosas e pondo
fim aos trabalhos de renovação.
Minorias religiosas, vítimas de violência
A maior parte da violência de carácter confessional na Indonésia acontece por instigação de
grupos extremistas como a Frente de Defensores Islâmicos (FPI), o Movimento Aliança AntiApostasia (AGAP) e o Conselho de Mujahedeen da Indonésia (MMI). Nem sequer os juízes e
os funcionários locais têm sido poupados à sua fúria.
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Atacaram e destruíram edifícios propriedade de minorias, entre os quais igrejas cristãs, templos hindus, bem como mesquitas xiitas e Ahmadiyyah. Ameaçaram os muçulmanos “moderados” e todos aqueles que, na sua perspectiva, expressam as denominadas opiniões anticonvencionais ou heréticas sobre a fé islâmica. Forçaram lojas e negócios a fechar durante
o Ramadão. Além disso, não são os únicos. A Entidade Coordenadora da Supervisão das Fés
Públicas (Bakor Pakem) e o Conselho dos Ulamas da Indonésia (MUI) também são grupos
extremistas muito activos. Na sua lista de prioridades tem estado a tentativa de banir as
actividades dos Ahmadiyyah, a restrição dos casamentos mistos, a limitação do pluralismo
religioso e da liberdade de culto, bem como o reforço da legislação relativa à blasfémia.
No seu Relatório sobre a Liberdade Religiosa Internacional de 2008, o Departamento de Estado
Norte-Americano considerou que, com início em 2008, trinta e cinco mesquitas de Ahmadiyyah foram vandalizadas e vinte e um outros centros ou locais de culto religiosos foram
forçados a encerrar.
No dia 2 de Junho de 2009, uma mesquita Ahmadiyyah no Sul de Jacarta foi incendiada por
indivíduos não identificados durante as orações matinais. Ninguém ficou ferido durante o
incidente, mas também não foi efectuada nenhuma apreensão. Em Agosto de 2009, membros do Fórum Comunitário Muçulmano de Ciputat (FMCC) vedaram o acesso a uma mesquita Ahmadiyyah na cidade de Tangerang do Sul, na Província de Banten, acusando os seus
membros de proselitismo. Também em Agosto de 2009, uma multidão enfurecida vandalizou uma mesquita Ahmadiyyah em Sukabumi e encerrou uma outra em Cianjur, Java Ocidental. Em Outubro de 2009, uma multidão destruiu a Mesquita de Mubarak, na aldeia de
Medan, província de Riau, depois da celebração do Eid al-Fitr.
A seita é discriminada porque é considerada herética pelos muçulmanos regulares uma vez
que não considera Maomé como sendo o último profeta. A situação incitou o Jacarta Post,
o jornal principal do país, a publicar uma série de artigos sobre o assunto. Num deles, intitulado “Nenhuma hajj para os seguidores Ahmadiyyah” que surgiu no dia 25 de Agosto de
2009, o jornal entrevistou seguidores Ahmadiyyah em Nusa Tenggara Ocidental que se queixaram de ser impedidos pelas autoridades locais de realizar a hajj a Meca.
No entanto, “O Gabinete de Assuntos Religiosos local negou a acusação”, disse um funcionário, Suhaimi Ismi, que explicou que “Não existe nenhuma lei que proíba os membros Ahmadiyyah de efectuar a hajj. Se o Governo da Arábia Saudita os tivesse proibido, isso seria um
outro problema”, mas “Nós certamente que não emitimos tal proibição”, insistiu.
O jornal também informou que, em Dezembro, a polícia deteve seis Ahmadiyyah no Sul de
Jacarta por causa de pressões por parte de grupos fundamentalistas, que tinham invadido
violentamente as suas casas e denunciado as suas práticas religiosas não ortodoxas. De
acordo com a polícia, membros da seita tinham organizado orações de sexta-feira numa residência privada e foram confrontados por um grupo de extremistas quando se preparavam
para partir.
A comunidade Ahmadiyyah da Indonésia tem cerca de 200.000 membros. Mesmo se a sua
existência não vai contra a lei, ela é vista como herética, uma situação que partilha com
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inDOnÉSiA
outros grupos muçulmanos. Um destes é o chamado Qiyadah al-Islamiyah, mas os líderes de
outros grupos pequenos foram também acusados de heresia.
Em Maio de 2009, Agus Imam Solhin, o líder de uma seita chamada Satria Piningit Weteng
Buwono, foi acusado por um tribunal no Sul de Jacarta, ao abrigo do Artigo 156º do Código
Penal indonésio de, entre outras coisas, reivindicar ser um profeta e receber orientação espiritual do primeiro presidente do país, Sukarno. Ele também foi acusado de conduzir orgias
rituais e de impedir os seus seguidores de cumprir o ritual das orações muçulmanas.
Alguns meses antes, em Fevereiro, o capítulo de Java Ocidental do Conselho dos Ulamas da
Indonésia (MUI) classificou de heréticos os ensinamentos de outro líder de uma seita, Noto
Ati, por alegadamente violar os ensinamentos do Alcorão e os hadith do Profeta Maomé.
Em ocasiões anteriores, as “sentenças” ditadas pelo MUI contra certos muçulmanos tinham
levado o Governo a prender, multar e deter esses mesmos muçulmanos.
Os refugiados birmaneses, os Rohingya, também não foram alvo de melhor tratamento na
Indonésia. Em final de Janeiro, a Indonésia recusou-se a conceder asilo político a 193 muçulmanos vindos de Mianmar, acusando-os se serem “migrantes por motivos económicos”. Os
refugiados eram de etnia Rohingya, uma minoria muçulmana birmanesa que tinha fugido
da sua pátria por causa da discriminação e da pobreza. Os refugiados que chegaram à costa
indonésia no dia 7 de Janeiro faziam parte de um grupo maior de 580 Rohingya que tinha
chegado à Tailândia primeiro, mas que tinha sido forçado a partir pelo exército tailandês e
a ir novamente para o mar sem alimentos nem água. Mesmo com a discriminação e violência que tinham de suportar em casa, os muçulmanos da Birmânia não obtiveram qualquer
ajuda por parte dos muçulmanos seus “irmãos” na Indonésia, quer cidadãos comuns, quer
funcionários do Governo.
Receios de “Islamização”; do terrorismo à Sharia
O Governo indonésio conduziu a luta contra os grupos que tentaram destabilizar o país e
arruinar a sua imagem internacional. O presidente Yudhoyono e a sua administração procuraram prender (ou eliminar) os terroristas internos, bem como aqueles que são afiliados de
grupos criminosos internacionais como a al-Qaeda.
Em 2009, a polícia levou a cabo várias operações que conduziram à captura ou morte de
fugitivos muito procurados. Porém, isto não foi o bastante para impedir os ataques, entre os
quais se conta um massacre sangrento em dois dos hotéis mais prestigiosos de Jacarta. No
dia 17 de Julho de 2009, bombistas suicidas fizeram-se explodir no Hotel Marriott e no Ritz
Carlton, matando nove e ferindo quase cinquenta pessoas. Nas horas que se seguiram ao
duplo ataque, o chefe da polícia da Indonésia, General Bambang Hendarso Danuri, confirmou
que matar o presidente Yudhoyono era um dos objectivos. A suspeita caiu imediatamente
sobre o Jemaah Islamiyah, um grupo afiliado da al-Qaeda, dirigido pelo terrorista nascido na
Malásia, Noordin Mohammed Top, que alguns dias mais tarde viria a reivindicar a responsabilidade pelo ataque.
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inDOnÉSiA
As forças de segurança indonésias acabariam por encontrar o esconderijo de Noordin, perto
de Mojosongo, um subúrbio de Surakarta, uma cidade na Java Central. A operação para o
capturar teve lugar no dia 17 de Setembro e foi conduzida pelo esquadrão anti-terrorismo de
elite do país, o Destacamento Especial 88. Terminou num tiroteio que durou dez horas e no
qual o líder do Jemaah Islamiyah e cinco outros terroristas foram mortos.
Algumas semanas mais tarde, os investigadores afirmaram que encontraram evidências de
que Noordin estava a criar uma célula da al-Qaeda na zona onde acabaria por ser morto, e
que estava a planear um ataque “ainda mais catastrófico que o ataque de 11 de Setembro”
em Nova Iorque. A informação estava contida em ficheiros encontrados no computador do
terrorista malaio, na sua casa em Solo (Java Central), que também revelaram que ele já tinha
recrutado várias pessoas entre os fundamentalistas locais e estava a tentar angariar fundos
para financiar a sua campanha de terror.
Nos dias que precederam a morte de Noordin, o Governo já tinha emitido advertências sobre
possíveis ataques por parte do terrorista malaio contra aviões civis, notando que ele poderia
contar com uma rede de bombistas suicidas dispostos a fazerem-se explodir.
Tentativas por parte de muçulmanos radicais, incluindo o infame Conselho dos Ulamas da
Indonésia (MUI), para forçar o Governo a adoptar leis mais duras sobre moralidade e comportamento conduziram a uma forte reacção por parte dos muçulmanos moderados.
Quando, depois de uma reunião em Padang Panjang, uma cidade na província de Sumatra
Ocidental, um grupo de 700 Ulamas emitiu uma fatwa contra o ioga, o vício de fumar e a
abstenção ao voto, afirmando que estas actividades eram “contrárias aos preceitos do Islão”,
um grupo de líderes religiosos muçulmanos moderados e representantes de grupos da sociedade civil reagiu negativamente. No dia 27 de Janeiro, dois dias depois de a fatwa ser emitida,
criticaram fortemente o MUI pelos seus éditos religiosos, apelidando-os de “inconstitucionais e desnecessários”.
De modo semelhante, a posição adoptada pelos Ulamas conduziu a uma onda de protestos
por topo o país. Para muitos indonésios, tal fatwa era equivalente a uma interferência em
actividades que deverão ser deixadas à esfera pessoal e à escolha individual, muito para além
do âmbito de aplicação dos éditos religiosos.
No final de Janeiro, esta hostilidade encontrou eco num grupo de imãs de Jacarta que expressaram oposição aos bombistas suicidas e à sua visão radical do Islão. Um estudo efectuado
pelo Centro para o Estudo da Religião e da Cultura (CSRC) da Universidade Estatal Islâmica
de Syarif Hidayatullah, conduzido entre Novembro de 2008 e Janeiro de 2009 e com a participação de 250 imãs, revelou que a maioria estava contra os ataques suicidas. Os resultados,
publicados no Jacarta Post, também indicaram que a maioria destes clérigos estava a favor
de uma unidade nacional e consideravam a democracia como a melhor forma de Governo.
E, no entanto, tais opiniões por parte de imãs estão longe de resolver as contradições do país.
No dia 3 de Fevereiro, a AsiaNews relatou que o Fórum dos Ulamas e dos Muçulmanos (FUUI)
quis banir os Clubes Lions e Rotary e acusou-os de “secretamente conceder fundos a Israel”,
261
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afirmando que estes clubes não “são organizações de carácter social mas fazem parte da
Maçonaria e dos movimentos Sionistas” e poderiam “pôr em perigo o Islão”.
De modo semelhante, no início de Março, alguns dias depois de assumir funções, o chefe
de polícia de Java Oriental ordenou que as suas funcionárias usassem o véu islâmico e que
todos os polícias deveriam orar cinco vezes por dia, como todo o bom muçulmano.
Também em Março, os serviços secretos da Indonésia fizeram soar o alarme após a publicação do livro intitulado Martyrs’ Trylogy (Triologia dos Mártires), contendo escritos e notas
autobiográficas de e sobre Amrozi, Ali Gufron e Imam Samudra. Todos os três foram condenados pelo seu papel nos bombardeamentos de Bali, em 2002, que mataram mais de 200
pessoas, e executados por um pelotão de fuzilamento no dia 9 de Novembro de 2008.
Em Maio, peritos jurídicos islâmicos insurgiram-se contra o Facebook, a popular rede social
que conta com milhões de membros em todo o mundo, afirmando que favorece “sonhos
ilegais” entre a juventude, e proporciona às pessoas do sexo oposto uma oportunidade
de namorar e de ter “relações proibidas” com pessoas casadas. Enquanto decisão, é muito
parecida com o édito emitido contra o vício de fumar, o ioga e a abstenção ao voto, e vem
no seguimento de uma proibição emitida na véspera do Ramadão contra dar esmolas aos
pobres e aos mendigos.
No dia 7 de Setembro, os Ulamas indonésios emitiram um édito contra os mendigos que são
particularmente numerosos em Jacarta durante o mês sagrado do jejum e da oração. Como
seria de esperar, a decisão do MUI provou ser muito controversa. Alguns grupos acharam boa
ideia; outros pensaram que, em termos morais, “impedir as pessoas de dar esmola durante o
mês santo do Ramadão não é boa ideia.”
Mas isto não foi o pior. O episódio que despoletou o debate mais amargo e mais duro que o
país alguma vez experimentou foi a decisão, por parte da legislatura de Aceh, de fazer com
que as mulheres adúlteras fossem apedrejadas até à morte. A nova lei provou ser tão controversa que, apesar de ser aprovada pela assembleia da província no dia 14 de Setembro, foi
suspensa pelo Governo da província alguns dias mais tarde porque “as entidades executivas
e legislativas” não conseguiam “resolver as suas diferenças na aplicação de [pena de morte
por] apedrejamento.” Como se isso não fosse o bastante, a legislação de anti-adultério de
Aceh deu origem a uma reacção por parte do Governo central que afirmou ter o direito para
suspender ou revogar o projecto de lei devido a “falhas jurídicas”.
Apesar da oposição, a legislatura da província de Aceh não ficou por aqui. Na realidade, adoptou uma série de regulamentos que impuseram “castigos corporais severos” a pessoas cujo
comportamento fosse julgado contrário à moralidade islâmica, como a homossexualidade, a
violência sexual, o jogo e o consumo de álcool.
No final de Outubro, outra lei proposta pelas autoridades de Aceh gerou repugnância e desprezo no resto do país, quando a província decidiu proibir as calças de ganga “justas” para
as mulheres e os calções para os homens. Ao abrigo da proposta, os indivíduos apanhados
em violação flagrante desde código de vestuário seriam forçados a usar artigos de vestuário
especiais fornecidos pelo Governo.
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Em Dezembro, o Gabinete dos Assuntos Religiosos local proibiu uma dança chinesa tradicional, o popular barongsai (ou dança do leão), durante as comemorações do quinto aniversário do tsunami, enfurecendo a comunidade chinesa local. As autoridades afirmaram que a
dança era estrangeira face à cultura local, enquanto os sino-indonésios apelidaram a decisão
de “ridícula”, considerando-a uma violação clara dos princípios da Pancasila.
Em Novembro, quando o filme de grande sucesso 2012, de ficção científica e do realizador
Roland Emmerich, chegou aos cinemas indonésios, o Conselho dos Ulamas da Indonésia apelidou-o de blasfemo, acusando-o de conter cenas contrárias aos princípios do Islão.
Amidhan, chefe nacional do Conselho dos Ulamas, criticou severamente a Comissão de
Censura da Indonésia (LSF) por não ter mostrado a “precaução necessária” e por aprovar
cenas sensíveis, inclusive imagens do “dia do juízo final” no qual uma mesquita é destruída, enquanto uma igreja cristã sobrevive intacta. “Todas as cenas que defendam a fé [cristã]
deveriam ter sido cortadas”, afirmou.
Em Outubro, depois do Parlamento da Indonésia adoptar um pacote de reformas do sistema
de saúde que acrescentou as razões válidas para o aborto, todas as religiões reconhecidas na
Indonésia, ou seja, os Muçulmanos, os Católicos, os Protestantes, os Budistas, os Hindus e os
Confucianos, bem como as mulheres activistas, uniram forças para se oporem à nova lei. Sem
excepção, todos os líderes religiosos se insurgiram em defesa da vida.
263
iRÃO
iRÃO
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos98,6%
Cristãos0,5%
Outros0,9%
Cristãos
353.000
Católicos
19.000
Circunscrições
eclesiásticas
6
SUPERFÍCIE
1.648.195km2
POPULAÇÃO
77.078.000
REFUGIADOS
1.070.488
DESALOJADOS
---
No Irão, a religião de Estado continua a ser o Islão xiita na sua forma
mais radical, e o respeito do mesmo é garantido pelas autoridades religiosas. Isto resulta em discriminação e violência contra as outras religiões e mesmo contra o Islão sunita. A obtenção de autorização para
construir uma mesquita sunita parece por vezes ser tão difícil como
obter uma autorização para construir uma igreja. Entre as minorias
religiosas, apenas três são reconhecidas pelo Estado islâmico: os Cristãos, os Judeus e os Zoroastrianos. Outras minorias, Sunitas, Baha’is,
Ahmadis, etc., são efectivamente perseguidas. Também não são reconhecidos os Budistas e os Hindus, mas estes não são objecto de violência embora o seu estatuto legal seja totalmente precário.
Perseguição político-religiosa
As minorias reconhecidas vivem como “povos protegidos”, com os seus
seguidores a serem considerados “dhimmis”, cidadãos de segunda
classe. Não podem difundir as suas convicções ou praticá-las fora das
suas comunidades ou locais de culto; são frequentemente obrigados
a expressarem apoio às políticas do Governo “islâmico”. Os ataques
aos EUA e ao Estado de Israel, embora políticos na sua intenção, são
sempre expressos usando a terminologia religiosa (“O Grande Satanás” e o “Pequeno Satanás”).
A mistura entre a política e a religião permite ao Irão perseguir as
minorias religiosas indirectamente, usando desculpas políticas ou
étnicas. Os Sunitas são perseguidos (no Curdistão e no Baluchistão)
porque são influenciados pela Grã-Bretanha e pelos EUA; os Baha’is
porque são explorados por Israel; os Ahmadis porque são “marionetas” nas mãos dos poderes estrangeiros, etc.
Esta perseguição político-religiosa tornou-se ainda mais aguda antes
e depois das eleições de Junho de 2009, ganhas por Mahmoud Ahmadinejad, uma vitória que, porém, foi contestada por outros candidatos e muitos sectores da população, o que deu vida ao movimento de
oposição conhecido como Green Wave (Onda Verde). Por todo o lado
assistiu-se a purgas e prisões de opositores, envolvendo principalmente cristãos protestantes, baha’is e ahmadis.
O crime da apostasia
A proibição da apostasia, ou seja, o abandono do Islão por outra religião ou o ateísmo, é muito forte tanto no seio da família como nas
atitudes do Governo. Em Setembro de 2008, o Parlamento iraniano
aprovara um novo Código Penal que impôs a pena de morte para o
264
crime da apostasia. Porém, esta lei estava à espera para ser estudada mais a fundo por uma
comissão parlamentar, sendo depois debatida e avaliada pelo Conselho de Guardiães da
Constituição.
Um evento positivo aconteceu em Junho de 2009, quando um membro da Comissão Parlamentar para a Lei e o Julgamento relatou à BBC (no dia 23 de Junho) que esta Comissão tinha
decidido eliminar a emenda sobre a pena de morte. Esta notícia foi relatada também pela
organização Christian Solidarity Worldwide.
O facto é que a apostasia é também condenada dentro do círculo familiar, ao ponto de, frequentemente, qualquer parente apóstata ser assassinado.
É preciso enfatizar também que muito frequentemente notícias muito sensacionalistas e
empoladas sobre conversões em massa do Islão resultam numa onda de prisões entre as
comunidades cristãs.
A Compass Direct News advertiu, no dia 9 de Fevereiro, sobre as “estimativas exageradas de
conversões, proclamadas fora do Irão por padres que são bem-intencionados” porque contribuem para o aumento da supervisão das Igrejas. “Um pastor na América”, declarou a agência
de notícias, “reivindicou que, só em 2008, 800.000 iranianos se tinham convertido a Cristo…
O Governo considera estes elevados números de convertidos como uma real ameaça para a
sua governação e começou a atacar as Igrejas”.
Cristãos
iRÃO
No dia 21 de Janeiro, três cristãos foram presos em Teerão. Tratou-se de Jamal Ghalishorani,
de 49 anos, e da sua esposa Nadereh Jamali, indivíduos que se tinham convertido do Islão
há respectivamente trinta e quinze anos, e o arménio Hamik Khachikian. As autoridades não
informaram as famílias sobre as acusações nem lhes disseram onde eles se encontravam
detidos. Os três eram membros da Igreja da Assembleia de Deus na capital do país. Esta
Igreja está oficialmente registada, mas todos os três tinham realizado cursos sobre a Bíblia
nas suas residências.
No início de Fevereiro, os três foram libertados sob fiança, mas irá ter lugar um julgamento,
embora não existam acusações explícitas contra eles.
No dia 5 de Março, em Teerão, duas mulheres cristãs convertidas do Islão foram presas e
acusadas de “agir contra a segurança do Estado” e de “terem participado em assembleias
ilegais”. Os nomes delas são: Maryam Rostampour, de 27 anos, e Marzieh Amirizadeh Esmaeilabad, de 30 anos de idade. Ambas estavam activamente empenhadas na distribuição de
Bíblias nas respectivas igrejas e na missão. De acordo com a Amnistia Internacional, elas são
prisioneiras de consciência. Uma das mulheres tinha sido advertida pelo Ministério da Segurança (e Espionagem). Seriam mais tarde presas pelas razões acima mencionadas, embora
ainda não tenham sido feitas acusações formais.
No dia 18 de Março, apareceram perante um Tribunal Islâmico em Teerão e foram levadas
para a prisão de Evin. É-lhes negado qualquer cuidado médico embora ambas sofram de
infecções e de febre.
265
iRÃO
No dia 9 de Agosto, apresentaram-se perante um juiz que lhes ordenou que renunciassem
à sua apostasia e que voltassem ao Islão, ameaçando-as com uma longa pena de prisão a
menos que elas decidissem abandonar a fé cristã.
No dia 10 de Março, um Tribunal Islâmico em Shiraz condenou três cristãos convertidos,
Seyed Allaedin Hussein, Homayoon Shokouhi e Seyed Amir Hussein Bob-Annari, a oito meses
de prisão (uma pena suspensa) e a cinco anos de “bom comportamento” (em liberdade condicional). Eles foram acusados de “cooperar com movimentos antigovernamentais”. Durante
os cinco anos de “bom comportamento” estão proibidos de continuar as suas actividades
cristãs, de propagar a sua fé e de entrar em contacto uns com os outros. O juiz ameaçou que
os faria cumprir a pena e que os iria julgar por apostasia se os três não obedecessem a estas
ordens. Os “movimentos antigovernamentais” referidos na sentença referem-se a assistir e a
difundir canais de televisão como a Love Television e a Salvation TV.
No dia 19 de Março, Yonathan Betkolia, um deputado cristão assírio, anunciou a decisão do
Tribunal Islâmico de encerrar a Igreja Pentecostal Assíria em Shahrara (um subúrbio de Teerão) porque esta tinha realizado serviços religiosos em persa, a que assistiram crentes que
se tinham convertido do Islão. Betkolia já anteriormente protestara contra a comunidade em
Shahrara que permitia aos “não-assírios” (ou seja, muçulmanos) tomar parte nos serviços
religiosos.
O pastor de Shahrara afirmou que eliminar a liturgia em persa lhe teria permitido continuar
a manter a igreja aberta. Temendo que fossem fechadas, várias comunidades protestantes
tinham já cancelado as missas em Farsi (Persa).
No dia 14 de Maio, os tribunais em Urumiyeh negaram uma pensão a Fatemeh Pauki, uma
professora reformada de uma escola cristã da província do Azerbaijão Ocidental. Fatemeh
Pauki tinha estado detida em várias ocasiões e fora obrigada pelas autoridades a prometer
não voltar a fazer qualquer contacto com os grupos cristãos. O seu marido tinha também
sofrido a violência infligida pelas autoridades e acabaria por morrer em circunstâncias misteriosas em 2005.
Ainda no dia 14 de Maio, na cidade de Bandar Mahshar, um pensionista de 62 anos, Abdul
Zahra Vashahi, foi preso. A razão para a sua prisão foi a de o forçar a impedir as actividades
empreendidas pelo seu filho, que se converteu ao Cristianismo e vive na Grã-Bretanha desde
2003. John Reza Vashahi, de 30 anos, converteu-se ao Cristianismo enquanto estava na Inglaterra. Em 2008, fundou a Organização Iraniana dos Direitos Humanos das Minorias (IMHRO).
Meses antes, em Fevereiro, o pai de Vashahi recebeu um telefonema das autoridades locais
que ameaçaram prendê-lo se o filho não acabasse com as suas actividades. Vashahi Júnior é
também um membro da Amnistia Internacional e faz relatos de notícias relativas à perseguição de minorias e em particular de cristãos. Ele é também o autor de um blogue intitulado
“Jesus para árabes”.
Vashahi Sénior, que é muçulmano, foi libertado depois de estar detido e de ser interrogado
durante seis dias.
266
No dia 31 de Julho, em Fashan (Norte de Teerão) a polícia invadiu uma assembleia de cristãos
em que todos eram convertidos do Islão. Todos os vinte e quatro participantes foram presos
e os objectos de oração e outro material foram confiscados. A maioria dos cristãos foi libertada no dia seguinte. Sete, porém, ficaram detidos. Foram eles Shahnam Behjatollah e seis
outros, conhecidos apenas pelo primeiro nome: Shaheen, Maryam, Mobinaa, Mehdi, Ashraf
e Nariman.
Dois dias antes, nos dias 29 e 30 de Julho, outros oito cristãos que pertencem ao mesmo
grupo, como o de Fasham, foram presos em Rasht. Sete foram libertados e apenas um, cujo
nome não é conhecido, foi levado para um local desconhecido.
De acordo com cristãos locais, a onda de detenções intensificou-se depois das disputadas eleições presidenciais. Os crentes foram presos por alegada conspiração com “poderes
estrangeiros” que estavam supostamente por detrás das manifestações criticas à liderança
(Green Wave).
Baha’is
iRÃO
A minoria mais violentamente perseguida é a dos Baha’is. Eles são também a maior minoria
religiosa no Irão com aproximadamente 300.000 crentes. Esta fé foi fundada por volta de
1860 pelo nobre persa Baha’u’llah, que se auto-designou como o novo profeta e o continuador do trabalho de Moisés, de Jesus e de Maomé. Em conflito, por isso, com a convicção
islâmica, que vê Maomé como sendo o último profeta. Permitido nos dias do Xá, o culto foi
considerado como herético e encontra-se proibido desde a Revolução Islâmica de 1979. Desde
essa data, foram executados ou assassinados mais de 200 seguidores, centenas foram presos, dezenas de milhares foram privados dos seus empregos, pensões e actividades comerciais. Todas as instituições Baha’i são proibidas e os seus lugares sagrados, cemitérios e propriedades foram confiscados pelo Governo ou destruídos. Muitos Baha’is foram condenados
apenas por terem proporcionado instrução religiosa aos seus filhos. Os jovens não têm autorização para se inscrever nas universidades a menos que declarem que são muçulmanos.
No dia 14 de Janeiro, durante uma invasão da polícia à residência de onze baha’is, seis foram
presos. Entre eles havia uma mulher, Jinous Sobhani, que trabalhou com a Prémio Nobel da
Paz, Shirin Ebadi, actualmente no exílio. A Sra. Sobhani era a secretária da Organização para
a Defesa das Vítimas das Minas e do Centro dos Defensores dos Direitos Humanos, ambos
fundados por Ebadi e encerrados em Dezembro de 2008 sob ordens policiais. As outras pessoas presas foram: Shahrokh Taef, Didar Raoufi, Payam Aghsani, Aziz Samandari e Golshan
Sobhani.
Em Janeiro, o cemitério em Khavaran (Sudeste de Teerão) foi destruído para abrir espaço para
um parque público. Pelo menos cinquenta Baha’is encontravam-se ali sepultados. O cemitério em Khavaran era conhecido como o cemitério dos “infiéis” e centenas de vítimas das
primeiras purgas do regime islâmico foram ali enterradas durante a década de oitenta do
séc. XX.
267
iRÃO
De acordo com organizações internacionais, a destruição do cemitério teve lugar para evitar
investigações independentes e imparciais sobre assassinatos em massa ocorridos no começo
dos anos oitenta e em 1988.
Os membros da comunidade Baha’i dizem que pelo menos quinze dos seus crestes estão
enterrados naquele cemitério, todos vítimas da campanha sistemática do Governo no princípio dos anos oitenta para destruir os Baha’is e as suas convicções. A maioria das sepulturas
não tem marca e apenas tem atribuído um número.
Ao longo de 2009, o julgamento dos sete líderes Baha’i presos em Março e Maio de 2008 foi
adiado repetidamente. Todos os sete estão detidos na prisão de Evin e os seus advogados
nunca foram notificados de que são afinal acusados. A agência de notícias semi-oficial ISNA
informou que os sete acusados seriam julgados por “espiarem para Israel, insultarem objectos religiosos, e por propaganda contra a República Islâmica”. Eles foram também acusados
de “difundir a corrupção na Terra”.
As sete pessoas são: Fariba Kamalabadi, Jamaloddin Khanjani, Afif Naeimi, Saeid Rezaie,
Mahvash Sabet, Behrouz Tavakkoli e Vahid Tizfahm.
Sunitas
Em 2009, a luta contra os Sunitas ocorreu principalmente na província do Sistão-Baluchistão,
situada no Leste do país, perto do Afeganistão e do Paquistão. Existem 1,4 milhões de Baluchis, principalmente sunitas que pertencem à escola Hanafita. Nesta zona, o Jundallah, um
grupo extremista sunita, leva a cabo regularmente acções terroristas e ameaça também as
autoridades religiosas sunitas as quais acusam de cooperação excessiva com o Estado.
Eles vivem perto das fronteiras de países que estão em guerra e onde existe muito tráfico de
drogas alimentado pela violência e pela pobreza. Nestas zonas distantes, os investimentos
estatais são raros, o desemprego é mais alto do que em qualquer outro lugar, assim como a
iliteracia e outros problemas sociais.
No dia 28 de Maio, um ataque suicida à Mesquita Amir al-Momenin, em Zahedan, matou
dezanove pessoas e feriu mais 125. O ataque foi levado a cabo durante as orações do princípio da noite por um grupo de “terroristas” que também tinha planeado um outro ataque.
Naquele dia, por todo o país, os muçulmanos estavam a comemorar o dia em que a filha do
profeta Maomé, Fátima, morrera.
As autoridades culparam imediatamente o Jundallah e, no dia 30 de Maio, condenaram à
morte três homens que tinham sido presos dias antes do ataque. De acordo com a agência
de notícias oficial IRNA, os três tinham confessado ter “introduzido explosivos ilegalmente
no Irão, e tinham-nos dado à pessoa responsável pela explosão [em Zahedan]”. O tribunal da
província condenou-os porque eles eram “mohareb” (inimigos de Deus) e “os corrompidos da
Terra”, e por “estarem empenhados em quebrar a segurança nacional”.
A velocidade com que as execuções foram levadas a cabo deveu-se ao aproximar das eleições presidenciais (no dia 12 de Junho) e ao receio de que o ataque fizesse reduzir o apoio a
Ahmadinejad.
268
IRÃO
Imediatamente depois das eleições, no dia 14 de Julho, outros doze “rebeldes sunitas” foram
condenados à morte por enforcamento, culpados de uma série de ataques, incluindo o da
mesquita em Zahedan.
De acordo com a Amnistia Internacional, os treze acusados não tiveram um julgamento
justo. Inicialmente as execuções estavam previstas para ocorrer numa praça pública, mas por
razões de segurança foram realizadas na prisão.
Abdulhamid Righi, irmão de Abdulmalik Righi, líder do Jundallah, foi também condenado à
morte neste julgamento. Foi executado no dia 24 de Maio de 2010.
Abdulmalik, por sua vez, foi preso no dia 23 de Fevereiro de 2010 e condenado à morte no dia
20 de Junho de 2010.
A agência de notícias semi-oficial do regime islâmico ISNA informou que Righi foi condenado
à morte com base na Lei islâmica, como sendo um “inimigo de Deus” e um “corrompido da
Terra” por ter sido considerado culpado de “setenta e nove actos criminosos”.
Os meios de comunicação social iranianos relataram que no dia anterior ao da execução,
Righi se encontrou com as famílias dos que morreram nos ataques organizadas pelo Jundullah e pediu o seu perdão. A agência de notícias ISNA acrescentou que, antes de morrer,
Righi apelou ao grupo sunita pedindo-lhes que “não deveriam continuar com os seus erros”.
269
iRAQUE
iRAQUE
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos97,3%
Cristãos1,8%
Outros0,9%
Cristãos
921.920
Católicos
301.000
Circunscrições
eclesiásticas
17
SUPERFÍCIE
438.317km2
A violência anti-cristã não parou em 2009 e na primeira metade de
2010, mas assistiu-se a períodos de relativa acalmia, alternando com
momentos de real perseguição.
“Grupos armados entram em bairros onde vivem os cristãos e matam
indiscriminadamente toda a gente que se atravessa no seu caminho”,
declarou o Monsenhor Philip Najim, representante da Igreja Caldeia
na Santa Sé. “Trata-se de assassinatos a sangue frio e em pleno dia,
perante dezenas de testemunhas, como se estes grupos quisessem
mostrar que podem agir com impunidade, que detêm o controlo da
cidade”, acrescentou.
“Nós somos o alvo de uma campanha de violência e de aniquilação
que tem objectivos políticos”, declarou o Monsenhor Louis Sako, Arcebispo Caldeu de Kirkuk.
Para o seu colega católico siríaco, Monsenhor Georges Casmoussa,
os islamistas por detrás dos ataques querem que o Parlamento iraquiano suprima a representação obrigatória das minorias nos conselhos municipais.
Na verdade, para os cristãos, não só a violência é de registar, mas também as alterações à primeira proposta da lei eleitoral das províncias.
O Artigo 50º, que foi removido, garantia a representação das minorias
nos conselhos das províncias.
Ainda assim, as minorias (incluindo os cristãos) têm garantidos oito
assentos dos 325 do Parlamento nacional.
Mossul
POPULAÇÃO
31.467.000
REFUGIADOS
35.218
DESALOJADOS
2.764.000
270
Foi em Mossul que a maioria dos ataques teve lugar. Nesta cidade
predominantemente sunita, os cristãos vivem ao abrigo da Sharia (lei
islâmica). As mulheres cristãs têm de cobrir a cabeça quando estiverem em público e o sistema de transporte público já não é misto.
Sob um reinado de terror, 1694 famílias cristãs fugiram da cidade. Tal
representa mais de 12.000 pessoas.
No início de Novembro de 2008, um gangue armado matou duas
religiosas cristãs, Lamia e Walaa Sabih, no bairro central de Alkahira.
Lamia foi assassinada a tiro em frente à casa da família, enquanto
esperava pelo autocarro para ir trabalhar. Walaa foi apunhalada dentro de casa. A sua mãe ficou ferida durante o ataque. Os assassinatos
ocorreram numa altura em que as famílias cristãs estavam a regressar a Mossul depois de terem fugido, após uma série de assassinatos
em Setembro e Outubro.
IRAQUE
No começo de Julho de 2009, uma bomba explodiu num carro perto da Igreja de Nossa
Senhora, ferindo três crianças.
No dia 26 de Novembro de 2009, outra bomba destruiu uma secção do Convento de Santa
Teresa, residência de seis religiosas dominicanas. No mesmo dia, uma outra bomba explodiu
perto da Igreja Caldeia de Santo Efrém, causando graves danos ao edifício.
No dia 9 de Dezembro, foram assassinados dois irmãos cristãos, com tiros na cabeça,
enquanto reparavam a sua carrinha numa via pública.
No dia 15 de Dezembro, um ataque à bomba foi perpetrado contra a Igreja Católica Siríaca da
Anunciação. Simultaneamente, uma bomba explodiu num automóvel perto da Igreja Ortodoxa Siríaca da Imaculada e perto de numa escola cristã, matando cinco cristãos, incluindo
um bebé recém-nascido. Cerca de quarenta pessoas ficaram feridas.
No dia 23 de Dezembro, uma carrinha armadilhada explodiu perto da Igreja Ortodoxa Siríaca
de São Tomás, matando duas pessoas e ferindo cinco. Uma bomba foi lançada contra a Igreja
Caldeia de São Jorge. Três pessoas foram mortas: um cristão e dois muçulmanos,
No dia de Natal de 2009, uma bomba foi lançada contra um autocarro que transportava passageiros cristãos. Pelo menos onze morreram. No dia 30 de Dezembro de 2009, um diácono
foi assassinado a tiro.
Nos dias 12, 15 e 17 de Janeiro de 2010, três lojistas cristãos, Hikmat Sleiman, Amjad Hamid
Abdulhallah e Saadallah Youssif Jorjis, foram assassinados. O segundo foi morto a tiro na rua
durante a entronização do Monsenhor Emile Shimoun Nona como novo arcebispo caldeu,
em substituição do Monsenhor Rahho.
Num período de apenas dez dias, entre 14 e 25 de Fevereiro de 2010, foram assassinados mais
nove cristãos. Dois comerciantes, Rayan Salem Elias e Mounir Fatoukhi; dois estudantes, Ziya
Toma e Ramsen Shmael, que eram primos; e um quinto cristão, Wissam George, foram mortos a tiro na rua. Um sexto foi sequestrado.
No dia 21 de Fevereiro, Adnan al-Dahan, um cristão ortodoxo, foi encontrado morto. Fora
sequestrado uma semana antes.
Um pai católico siríaco e os seus dois filhos foram assassinados em casa perante o olhar da
mãe e da irmã dos rapazes.
Finalmente, um outro crime dizimou a família Mazen, que incluía um filho que era padre.
Três jovens muçulmanos assassinaram o clérigo e dois dos seus irmãos na sua residência. O
P. Mazen fora sequestrado em 2008, tendo sido mais tarde libertado após o pagamento de
um resgate.
No dia 2 de Maio de 2010, foram assassinadas quatro pessoas e 171 ficaram feridas num ataque à bomba contra uma coluna de autocarros que transportava estudantes de uma zona
predominantemente cristã, Qaraqosh, para a Universidade de Mossul. Alguns acreditam que
o ataque possa ter sido uma resposta ao facto de ter sido erigida na cidade vizinha de alHamdaniya, no dia 10 de Abril, uma estátua com quatro metros de altura do Cristo Redentor,
inspirada pela do Rio de Janeiro (Brasil).
271
IRAQUE
Os três bispos de Mossul, Gregorios Saliba (ortodoxo siríaco), Georges Casmoussa (católico
siríaco) e Emile Nona (caldeu), apelaram às autoridades locais, denunciando “um plano premeditado para pressionar as Igrejas”. Para eles, “Estes ataques repetidos levam-nos a acreditar que não nos querem na cidade que ainda é a nossa casa”.
Mar Ignace Joseph III Younan, o Patriarca Católico Siríaco, apelou ao primeiro-ministro Noury
al-Maliki, afirmando que “Ninguém em Mossul pode conscientemente aceitar esta falta de
segurança, onde se tornou legal matar pessoas inocentes e indefesas. Estamos surpreendidos com as razões citadas pelos funcionários do Governo e pelo seu fracasso. Apenas podemos deduzir que eles são cúmplices no processo de esvaziar Mossul dos seus residentes cristãos, que habitam na cidade há séculos”.
Bagdade
No dia 6 de Janeiro de 2008, vários edifícios religiosos ficaram sob ataque: a Igreja Caldeia de
São Jorge, no bairro de Ghadir, onde o Cardeal Emmanuel III Delly tinha acabado de celebrar
missa; uma igreja graco-católica; e o Convento das Irmãs Caldeias, no bairro de Zaafraniya.
No dia 5 de Abril de 2008, o P. Youssef Adel Aboudi, padre na Igreja Ortodoxa Siríaca, que era
responsável pela Igreja de São Pedro, foi assassinado por homens armados. Foi morto perante
a sua mulher e filhos. Director de uma escola mista com alunos cristãos e muçulmanos, tinha
recebido ameaças e passara por actos de intimidação que pretendiam forçá-lo a desistir, o
que nunca fez. Na semana anterior, três cristãs foram assassinadas.
Em meados de Julho de 2009, uma série de ataques à bomba atingiu simultaneamente seis
igrejas em Bagdade, matando quatro cristãos e deixando trinta e duas pessoas feridas. Um
destes ataques teve como alvo a Igreja de Nossa Senhora onde o Monsenhor Shimoun Wardouni, Bispo Auxiliar do Patriarca Caldeu, tinha acabado de celebrar missa.
No dia 15 de Dezembro de 2009, uma bomba explodiu em frente a uma igreja católica siríaca,
matando quatro cristãos.
Os membros de outras minorias não-muçulmanas foram também violentamente atacados.
Em Agosto de 2009, alguns muçulmanos assassinaram a tiro Wael Lazim Qarar, um joalheiro
mandeísta cuja comunidade venera João Baptista.
Nos últimos anos, o número de mandeístas no Iraque caiu de aproximadamente 100.000
para menos de 5000 por causa da emigração.
Vários bairros na capital foram abandonados pelos seus habitantes cristãos. Este é o caso
de Dora, uma área predominantemente sunita de Bagdade. De acordo com o Monsenhor
Wardouni, “de quase 20.000 caldeus que viviam aqui antes da guerra, apenas restam 2500”.
O mesmo se passa na predominantemente xiita Bagdade Jadidat. De acordo com um chefe
de família, Issa, “neste momento, 75% dos cristãos deixaram o bairro. Alguns vendiam álcool,
mas foram impedidos de o fazer”.
Joseph Yacoub, professor universitário em Lyon (França) e um especialista no Iraque, condenou o Governo iraquiano pela sua incapacidade absoluta de proteger os cristãos. “De cada
vez que deputados cristãos tentaram levantar a questão, os seus esforços tiveram vida curta.
272
Deveria ser criada uma comissão internacional de inquérito; caso contrário, o país poderá
acabar por perder a sua população cristã”.
Os Cristãos são também vítimas crescentes de discriminação, especialmente nos campos
da educação, da administração e do emprego. O Monsenhor Casmoussa denunciou certas
formas de injustiça. “A lei não deveria forçar o cônjuge e os filhos de um cristão que se converte ao Islão a fazer o mesmo. Os estudantes cristãos em escolas públicas não deveriam ser
obrigados a assistir a cursos sobre o Islão”.
Curdistão
IRAQUE
Muitos cristãos encontraram refúgio no Curdistão iraquiano, uma região autónoma cujo
Governo mostrou maior abertura para com o seu dilema. O anterior ministro das Finanças
local, Sarkis Aghajan Mamando, é cristão; ele encarregou-se do realojamento das pessoas
deslocadas. Mandou construir 150 aldeias com cerca de 10.000 casas assim como também
muitas igrejas. Os Dominicanos de Mossul encontraram aqui uma nova casa. Criou também
“comités de autodefesa cristãos” armados, pagos pelo erário público.
Os curdos parecem estar a tentar atrair tantos cristãos quanto possível para o seu território
e para a planície de Nineve, que separa o território curdo de Mossul, apresentando-se como
seus protectores.
Porém, alguns dos que sobreviveram a episódios de violência em Mossul acusaram “alguns
elementos curdos” de organizar os massacres de Outubro de 2008 para forçar os cristãos
já instalados no Curdistão, ou que habitem perto, a manifestarem solidariedade para com
os curdos e a juntarem-se a partidos políticos curdos cujo objectivo é criar uma zona cristã
autónoma na Planície de Nineve ou aumentar o território que eles controlam.
Ao mesmo tempo que agradece o tratamento que os Cristãos receberam no Curdistão, o
Monsenhor Shimoun Wardouni declarou que “Não deveria haver nenhuma condição política
associada a esta ajuda”. Além disso, para ele, a ideia de incorporar os Cristãos no Curdistão
é algo “muito perigoso” para estes últimos. “A nossa história é nacional; não podemos viver
num gueto. Queremos depender, como todos os iraquianos, do Governo central em Bagdade.”
Os cristãos que vêm para o Curdistão enfrentam também uma barreira de idioma (a maioria fala árabe, não curdo) e têm dificuldade em arranjar trabalho. Do mesmo modo, os cristãos ainda não receberam do Governo curdo os terrenos confiscados pelo regime de Saddam
Hussein durante a campanha de 1998 contra os curdos que se tinham revoltado contra o
Governo central. Naquela altura, foram destruídas cerca de 400 aldeias cristãs.
Dito isto, existe uma completa liberdade religiosa no Curdistão onde qualquer um pode
mudar de religião sem medo das consequências. Os Cristãos não estão porém totalmente
seguros.
273
iRAQUE
Kirkuk
No dia 9 de Janeiro de 2008, duas igrejas foram alvos de carros armadilhados: a Catedral
Caldeia do Sagrado Coração e a Igreja Católica Siríaca de Santo Efrém.
No dia 18 de Agosto de 2008, um pediatra, Sameer Georges Youssif, foi sequestrado em Kirkuk.
A família recebeu um pedido de resgate no valor de 500.000 dólares norte-americanos. Foi
libertado após vinte e nove dias de tortura.
Nineve
No dia 26 de Setembro de 2008, uma médica cristã foi sequestrada na aldeia de Bartella,
tendo sido depois libertada. Outra médica cristã, uma ginecologista, Mahasin Bashir, foi
sequestrada em Bashiqa, perto de Bartella.
Bassorá
O Sul do Iraque não assistiu a violência anti-cristã. Porém, mesmo antes do Natal de 2009, o
Monsenhor Iman el-Banan, o Bispo Caldeu de Bassorá, onde residem 5000 cristãos, pediu a
todos os crentes para “não celebrarem publicamente a Festa da Natividade, nem receberem
convidados em casa”.
É uma questão, declarou o bispo num comunicado oficial, “de mostrar respeito pelos muçulmanos, especialmente os xiitas, por ocasião do Muharram”. Este dia comemora o assassinato
do Imã Hussein, filho de Ali e pai do Islão xiita, que foi morto na Mesopotâmia no ano de 680.
Dada a existência de tantos actos de injustiça, o Monsenhor Jean-Benjamim Sleiman, Arcebispo Católico Romano de Bagdade, declarou que “A situação da população cristã do Iraque
é a de uma comunidade que perdeu a fé no seu próprio país. Esta é a razão pela qual a emigração se transformou num êxodo, numa fuga. O medo domina todos os aspectos da vida e
qualquer episódio de violência transforma-se numa ameaça mortal”.
274
iSRAEL
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Judeus72,5%
Muçulmanos19,3%
Cristãos2,4%
Agnósticos4,8%
Outros1%
Cristãos
408.900
Católicos
133.000
Circunscrições
eclesiásticas
9
SUPERFÍCIE
20.770km2
POPULAÇÃO
7.285.000
REFUGIADOS
17.736
DESALOJADOS
---
275
iSRAEL
Vários meses após a visita do Papa Bento XVI à Terra Santa, em
Maio de 2009, o Monsenhor Fouad Twal, Patriarca Latino de Jerusalém, declarou, numa reunião organizada pela AIS em Londres, que a
peregrinação do pontífice não reduziu o número de actos de opressão contra as minorias. “A discriminação, sempre presente em Israel,
ameaça tanto os cristãos como os muçulmanos”, disse ele. Mais, “Se
somarmos as restrições às suas deslocações, a falta de consideração
por onde eles vivem, os impostos e as violações dos seus direitos de
residência”, percebe-se então a razão pela qual “os cristãos palestinianos não sabem o que fazer. [. . .] Temos uma nova geração de cristãos
que não podem visitar os lugares santos da sua fé, os quais se situam
a apenas alguns quilómetros do local onde vivem”, declarou.
Nesta mesma ocasião, o Monsenhor Fouad Twal expressou preocupação pelo futuro do Cristianismo na Terra Santa, dado o declínio no
número de cristãos.
Para Rafik Koury, padre do Patriarcado Latino de Jerusalém, os cristãos israelitas também enfrentam um grave problema de identidade.
Questionam, cada vez mais, a sua cidadania num estado que “se vira
cada vez mais para o exclusivismo, ou seja, um estado para judeus” no
qual “Israel trata os não judeus como entidades separadas, sem uma
identidade nacional específica”.
Em Israel, as Igrejas e os Cristãos têm de enfrentar uma cada vez
maior burocracia por parte das autoridades. O Governo, e especialmente o Ministério do Interior, torna a aquisição de um visto cada vez
mais difícil para os padres e os religiosos estrangeiros. Embora o problema sempre tenha existido, ele piorou como a chegada à liderança
do ministério de Eli Yishai, líder do Partido Shas, predominantemente
religioso e Sefardita-Mizrahim. Agora um visto só é válido durante um
ano em vez de dois.
“É difícil debater esta situação dado que alguns vistos são emitidos,
enquanto outros o não são ou o seu pedido ainda se encontra pendente”, declarou o P. Pierbattista Pizzaballa, Custódio Franciscano da
Terra Santa. “Há um pouco de confusão. Não sabemos se reflecte a
política ministerial ou se é devida ao facto de determinados funcionários serem muito lentos. Se calhar, trata-se de uma ambiguidade
propositada”.
Para o Custódio, assim como para o P. António Franco, Núncio Apostólico em Israel, tais restrições são prejudiciais ao trabalho pastoral
iSRAEL
regular da Igreja. “É difícil para as Igrejas planearem o seu trabalho, não sabendo se as religiosas ou os padres podem vir ou não”, explicou o P. Pizzaballa.
No caso da Custódia, “Este ano, tivemos vistos emitidos para religiosos que vêm de países
árabes, mas não de África. Dois irmãos do Congo não obtiveram os vistos. Dantes era ao
contrário”, explicou ele. “Vivemos, assim, na incerteza, e a burocracia ficou mais complexa”.
“É claro que a Igreja reconhece o direito do Estado em assegurar a segurança dos seus cidadãos, e que tal significa, no contexto presente, que o Estado pode, de boa fé, recusar-se a permitir a entrada de indivíduos que poderiam colocar a segurança pública em risco”. Porém, “o
Estado não pode, por outro lado, substituir o seu bom senso pelo da Igreja, isto em relação ao
pessoal que a Igreja deseja distribuir a partir de um qualquer lugar no mundo para as suas
próprias instituições, para os seus próprios propósitos”, declarou o P. franciscano David Jaeger,
perito na relação entre o Estado e a Igreja em Israel, à agência AsiaNews.
O problema dos vistos é ainda pior em relação a futuros padres que estão a ser formados
para o patriarcado latino, cuja jurisdição se estende a Israel, aos Territórios Palestinianos, à
Jordânia e ao Chipre. Os futuros padres estudam no Seminário Beit Jala, perto de Belém. Estão
sujeitos às decisões arbitrárias do Ministério do Interior de Israel, que decide sobre todos os
assuntos que afectam os não-palestinianos nos Territórios Ocupados. Neste momento, as
restrições estão a aumentar, especialmente para os jordanos, os quais constituem dois terços dos seminaristas. O seu visto é muito frequentemente válido apenas para uma única
entrada, quando costumava ser válido para entradas múltiplas, o que lhes permitia visitar a
família três ou quatro vezes por ano. Tal medida é sentida como ainda mais injusta uma vez
que a Jordânia e Israel assinaram um tratado de paz em 1994.
No dia 17 de Fevereiro de 2009, o “Canal 10” de Israel difundiu um programa que atacava a
fé cristã, em especial Cristo e a Virgem Maria. Num comunicado à imprensa datado de 19 de
Fevereiro, os bispos católicos da Terra Santa criticaram fortemente o programa, que “dirigiu
os seus ataques” contra “as figuras mais sagradas da nossa fé cristã, numa tentativa, como
declarou especificamente o próprio realizador do programa, de destruir” o Cristianismo. “Ao
fazê-lo, o ‘Canal 10’” profanou “as figuras mais sagradas do” Cristianismo “ofendendo centenas de milhares de cidadãos israelitas cristãos” assim como “milhões de cristãos no mundo
inteiro”.
“Facto ainda mais importante, os líderes das Igrejas inserem este recente incidente no contexto maior dos contínuos ataques contra cristãos em Israel ao longo dos anos”. Por isso, eles
“pedem que o ‘Canal 10’ reconheça a sua responsabilidade e […] oficial e publicamente apresente as suas desculpas por este incidente e nunca […] permita a sua repetição”.
Por último, os bispos pediram às autoridades que “tomassem as medidas apropriadas contra
tais ofensas inaceitáveis e aqueles que as causaram”.
Enquanto lamentava os ensinamentos odiosos encontrados em alguns livros não cristãos, o
Monsenhor Twal declarou que estava surpreendido pela falta de confiança de Israel na Igreja,
a qual é, afinal de contas, um “elemento de moderação e de reconciliação” que pode servir a
causa da paz.
276
JAPÃO
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Budistas56,1%
Novareligião25,9%
Agnósticos13,0%
Cristãos2,3%
Outros2,7%
Cristãos
4.606.020
Católicos
537.000
Circunscrições
eclesiásticas
17
SUPERFÍCIE
377.829km2
POPULAÇÃO
126.995.000
REFUGIADOS
2.332
DESALOJADOS
---
277
JAPÃO
No Artigo 20º da Constituição do Japão afirma-se que a liberdade de
religião se encontra garantida e, de facto, assim é.
Os grupos religiosos não são obrigados a registar-se ou a procurar o
reconhecimento legal, mas quase todos o fazem para assim aproveitarem determinados privilégios legais concedidos pelo Estado como,
por exemplo, o estatuto de isenção tributária.
O Japão é o país com o maior número de movimentos religiosos de
origens diversas. No total, encontram-se registados enquanto organizações religiosas cerca de 182 mil grupos.
Não houve relatos de incidentes significativos relativamente à liberdade religiosa durante o período de tempo considerado.
JORDÂniA
JORDÂniA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos93,9%
Agnósticos3,0%
Cristãos2,8%
Outros0,3%
Cristãos
229.600
Católicos
109.000
Circunscrições
eclesiásticas
3
SUPERFÍCIE
84.394km2
POPULAÇÃO
6.472.000
REFUGIADOS
450.756
DESALOJADOS
---
278
No domínio da liberdade religiosa, a Jordânia, governada por uma
monarquia islâmica cujo soberano é um dos descendentes de Maomé
e onde o Islão é a religião oficial, pôs em prática uma legislação e práticas comparáveis àquelas que prevalecem na Síria. Trata-se então de
um sistema bastante liberal, onde as Igrejas são reconhecidas pelo
Estado e beneficiam de toda a liberdade, tendo mesmo o direito a
abrir escolas aonde elas são necessárias, o que não é o caso na Síria.
Mas também na Jordânia a liberdade religiosa diz respeito só ao culto
e não à liberdade de consciência. A conversão dos muçulmanos para
outra religião é estritamente proibida.
No entanto, o reino jordano é muito activo no diálogo com as outras
religiões, em especial com o Cristianismo. O Príncipe El Hassan Bin
Talal, tio do Rei Abdallah II, preside ao Instituto Real Al-Bayt para o
Pensamento Muçulmano, com sede em Amã e com um departamento dedicado ao diálogo inter-religioso. O Príncipe Hassan recebeu,
em 2008, o Prémio Niwano para a Paz pelos seus “esforços contínuos
para construir a paz com justiça no Médio Oriente”.
Na altura da sua peregrinação à Jordânia, de 8 a 10 de Maio de 2009,
o Papa Bento XVI agradeceu às autoridades jordanas pela sua atitude,
declarando à chegada ao aeroporto de Amã: “A possibilidade que a
comunidade católica jordana tem para construir edifícios públicos de
culto é um sinal do respeito do vosso país para com a religião, e em
seu nome eu quero dizer-vos o quanto esta abertura é apreciada”.
Durante toda a sua permanência na Jordânia, o Santo Padre beneficiou de um acolhimento muito caloroso por parte dos soberanos.
“Sentimos que as autoridades políticas fizeram tudo para facilitar
esta viagem, com respeito e bondade”, comentou o P. Samir Khalil
Samir, jesuíta estabelecido no Líbano.
O rei e a rainha acompanharam o pontífice durante a sua visita às
margens do rio Jordão, apesar de a sua presença não estar prevista
pelo protocolo. No lugar onde a tradição situa o baptismo de Cristo, o
Papa abençoou a primeira pedra de duas igrejas católicas, uma latina,
outra greco-melquita. Duas outras igrejas, uma copta e uma ortodoxa
russa, foram também construídas neste local no decurso dos últimos
anos.
KUWAiT
Cristãos
De acordo com um jornal diário local (al-Watan de 30 de Outubro de
2009), Mohammad Al-Juwaihel, proprietário do novo canal de televisão por satélite Al-Sour, terá decidido dedicar três horas semanais da
programação aos cristãos que vivem no Kuwait, com o objectivo de
promover a tolerância e o amor entre os cidadãos. Se esta notícia se
confirmar, será uma estreia absoluta nos países da região do Golfo.
Numa entrevista ao Oasis, Mons. Camillo Ballin, Vigário Apostólico
no Kuwait, afirmou que o país “reconhece grande liberdade religiosa a todos. Isto significa que no interior das igrejas somos totalmente livres de praticar a nossa religião. A polícia nunca interferiu
nem entrou nas igrejas. Existem, contudo, algumas restrições. Não
se podem realizar cerimónias em casas privadas, mas apenas nas
igrejas. Só há três paróquias para cerca de 350.000 católicos e não
podemos construir mais. Se um dia houvesse uma situação de emergência numa das nossas igrejas que gerasse o pânico, morreriam centenas de pessoas devido às multidões. Apresentei um pedido de terreno onde pudéssemos construir outra igreja, mas até ao momento
ainda não recebi qualquer resposta.” Mons. Ballin acrescentou que
nas três escolas católicas do país “o ensino do Islão é obrigatório, mas
nós estamos proibidos de ensinar catequese aos cristãos. Além disso,
não há nenhum local, por muito pequeno que seja, onde os cristãos
se possam encontrar, nem podem rezar em público, antes ou depois
das aulas. No meu entender, são escolas dirigidas por católicos e não
escolas católicas.”
Na cerimónia de despedida do Núncio Apostólico do Kuwait, Mons.
Mounged Paul El-Hachem, que teve lugar em Janeiro de 2010, o portavoz da comunidade greco-católica lamentou o facto de a sua igreja
correr o risco de não poder renovar o contrato de arrendamento. O
Arquimandrita Boutros Gharib afirmou que, apesar das suas muitas
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos85,2%
Cristãos11,1%
Hindus3,5%
Outros0,2%
Cristãos
321.564
Católicos
300.000
Circunscrições
eclesiásticas
2
SUPERFÍCIE
17.818km2
POPULAÇÃO
3.051.000
REFUGIADOS
221
DESALOJADOS
---
279
KUWAiT
A Constituição proclama o Islão como a religião estatal e a Sharia
como “a fonte principal da legislação” (Artigo 2º). A Constituição
de 1962 decreta também a ausência de discriminação. O Artigo 29º
afirma que “todos os homens são iguais perante a lei na dignidade
humana e nos direitos e deveres públicos, sem distinção de raça, de
origem, de língua ou de religião”, enquanto o Artigo 35º declara: “A
liberdade de consciência é absoluta. O Estado protege a realização de
cerimónias religiosas de acordo com os costumes actuais, contanto
que estes não perturbem a ordem pública ou se oponham à moral”.
KUWAIT
advertências, não recebeu resposta por parte das autoridades e acrescentou que, embora
exista uma atmosfera de tolerância no país, “há pessoas que impedem e recusam a concessão de terreno onde poderíamos construir um local de culto.”
Xiitas
Os Xiitas têm mais dificuldades em ser nomeados para cargos importantes da administração pública. No entanto, desde 2006, o primeiro-ministro tem nomeado regularmente dois
membros xiitas para o seu Governo de catorze elementos. Os Xiitas lamentam-se de não
estarem suficientemente representados noutras instituições. Em 2008, foram eleitos apenas
cinco xiitas entre os cinquenta membros da Assembleia Nacional, em comparação com os
quatro xiitas da Assembleia anterior.
Não há agentes xiitas nas forças de segurança nem na Guarda Nacional. Uma excepção significativa foi a nomeação, a 16 de Setembro de 2009, do tenente Ali Al-Mou’min como primeiro embaixador do Kuwait junto de Bagdade após o reatar das relações diplomáticas entre
os dois países.
280
LAOS
Aspectos jurídicos e constitucionais
Grupos religiosos no país
Católicos
O Catolicismo encontra-se entre as religiões reconhecidas pelo
Governo e os membros da Igreja podem, em circunstâncias normais,
praticar a sua fé. No dia 10 de Janeiro de 2009, a Igreja Católica do
Laos celebrou a ordenação de um novo sacerdote, o P. Matthieu Somdet Kaluan, na Província de Savannakhet. Em Fevereiro, foram baptizadas 710 pessoas na província de Vientiane; algumas delas esperavam
há mais de quinze anos pela autorização para o fazerem. No dia 10 de
Fevereiro, as Irmãs da Caridade abriram uma escola com espaço para
oitenta alunos na região de Ban Simang, Vicariato de Savannakhet.
Os católicos estão concentrados nos principais centros urbanos do
Centro e do Sul do Laos, onde são geralmente livres de praticar a
sua fé. No Norte, por contraste, existem poucos católicos e nenhum
padre ordenado. Durante pelo menos vinte anos, o Governo impediu o
bispo responsável pelo Norte do Laos de assumir o seu lugar na Sé de
Luang Prabang; permitiu-lhe porém viajar até à região de forma irregular para visitar as comunidades locais de crentes. Nos últimos anos,
o Governo tem tornado a vida dos católicos habitantes no Norte do
Laos um pouco mais fácil, embora ainda não tenha devolvido várias
propriedades da Igreja, incluindo uma escola de que se apropriou
depois de 1975.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Budistas50,4%
Animistas44,6%
Cristãos2,9%
Outros2,1%
Cristãos
129.633
Católicos
46.000
Circunscrições
eclesiásticas
4
SUPERFÍCIE
236.800km2
POPULAÇÃO
6.436.000
REFUGIADOS
---
DESALOJADOS
---
Protestantes
Os Protestantes encontram-se numa situação mais crítica. Alguns
deles foram atacados e tiveram de suportar abusos durante o ano de
2009. No dia 3 de Setembro, Thao Oun, um ancião da Igreja de Bou281
LAOS
O Partido Popular Revolucionário do Laos governa o país desde 1975.
Com início nos anos noventa, o Governo começou a abrir a economia.
No entanto, para evitar o risco de protestos e distúrbios, não implementou completamente essa política e, ao invés, continuou a manter
o controlo apertado sobre as actividades religiosas dos habitantes do
Laos.
Os grupos cristãos são os mais firmemente controlados, isto porque o
Cristianismo é visto como uma religião estrangeira e, acima de tudo,
ocidental.
LAOS
kham, na aldeia de Liansai, foi preso. A polícia encostou uma arma à sua cabeça, ordenandolhe que renunciasse à “religião estrangeira”. Confrontado com a sua recusa, o chefe da polícia
do sub-distrito afirmou que este tipo de tratamento só terminaria “depois da morte de todos
os crentes da Igreja de Boukham”.
No dia 5 de Setembro, Thao Aom, um cristão que se converteu há cerca de dez meses, foi
preso. Depois da recusa em renunciar à sua religião, as autoridades baniram-no da sua aldeia.
No dia seguinte, a polícia cercou a Igreja de Boukham local, na aldeia de Lainsai, e impediu
os crentes de entrarem para rezar. Na mesma zona, as autoridades impediram os cristãos
de enviar os seus filhos para a escola; também lhes negaram água, tratamento médico e a
protecção da lei.
Na aldeia de Nomsomboon, forças de segurança destruíram a igreja local no dia 19 de Março,
enquanto os cristãos estavam em Burikan, para onde a polícia os tinha convocado para uma
reunião.
No dia 12 de Junho, treze cristãos foram presos sem explicação.
Em Katin, o chefe de aldeia disse a cinquenta e três cristãos locais, no dia 11 de Julho, que, se
não recomeçassem a adorar os espíritos locais e a seguirem a tradição do Laos, eles poderiam perder os seus direitos e propriedades. Na semana anterior, residentes e funcionários da
aldeia tinham-se apropriado de nove porcos que pertenciam a famílias cristãs, matando-os
de seguida, para forçar os seus donos a renunciar ao Cristianismo. Um porco, para um residente na província de Saravan, é o equivalente a seis semanas de salário. Matar gado propriedade de cristãos é um método regularmente usado para reduzir os Cristãos a um estado de
indigência e forçá-los a abandonar a sua fé.
Também na aldeia de Katin, quarenta e oito cristãos, adultos e crianças, foram forçados a
abandonar a aldeia. A polícia ameaçou-os com armas numa tentativa de conseguir que eles
renunciassem à sua fé. Quando eles se recusaram a fazê-lo, forçaram-nos a caminhar 6 km e
abandonaram-nos à beira da estrada sem alimentos nem meios para sobreviver. Mais tarde,
a polícia bloqueou a estrada à entrada da aldeia para impedir que as famílias cristãs voltassem a casa.
Cristãos Hmong
Os cidadãos de etnia Hmong ainda se encontram numa situação muito difícil, porque continuam a sofrer discriminação e repressão. Os que habitam no Laos são conhecidos como “os
aliados esquecidos dos EUA” porque se colocaram do lado dos americanos durante a Guerra
do Vietname.
Na aldeia de Xunya, Província de Luang Namtha, mais de 200 pessoas, na sua maioria Hmong,
foram forçadas a renunciar à sua fé depois de dois anos de pressão e de ameaças constantes
por parte da polícia.
Em Novembro, o Exército Popular do Laos (EPL) matou vinte e três cristãos Hmong desarmados na província de Xieng Khouang.
282
LAOS
No dia 3 de Abril, soldados do EPL mataram pelo menos nove crianças Hmong, juntamente
com dezenas de outras pessoas, depois de as vítimas terem tentado esconder-se na região
montanhosa de Phou Da Phao, província de Xieng Khouang, para escapar à perseguição.
Nos dias 12 e 13 de Março, uma patrulha conjunta vietnamita e do Laos abriu fogo sobre o
grupo de Jovens Chue Vang Hmong, matando dezenas de pessoas e deixando muitos outros
feridos, sem alimentos ou tratamento médico. De acordo com o serviço de distribuição de
comunicados de imprensa Media Newswire, cerca de 6500 Hmong civis poderão ter sido
mortos em Março e Abril.
Por causa da perseguição por parte do Governo do Laos, muitos Hmong fugiram para a Tailândia. Porém, uma vez passada a fronteira, muitos deles foram presos pelas autoridades
tailandesas, sob a pressão das suas congéneres do Laos.
Em Dezembro de 2009, o Governo tailandês reiterou a sua intenção de enviar de volta para o
Laos um grupo de 4506 Hmong, apesar dos protestos por parte de vários grupos de direitos
humanos.
Durante os últimos três anos, 158 Hmong, principalmente mulheres e crianças, têm padecido
em prisões tailandesas sob condições sanitárias horríveis. O grupo fugiu à perseguição no
Laos para ser encarcerado na Tailândia por causa de pressão por parte do Governo do Laos.
Ainda devido a esta pressão, o Governo tailandês não libertou nenhum dos prisioneiros nem
conseguiu transferir quaisquer refugiados para um terceiro país.
283
LÍbAnO
LÍbAnO
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos40%
Muçulmanos53,6%
Outros6,4%
Cristãos
2.023.010
Católicos
2.030.000
Circunscrições
eclesiásticas
24
SUPERFÍCIE
10.400km2
POPULAÇÃO
4.255.000
REFUGIADOS
50.413
DESALOJADOS
90.000-390.000
284
No plano institucional, não ocorreu nenhuma mudança no Líbano no
que concerne à liberdade religiosa e ao sistema político.
Porém, vários movimentos lutam pela instituição de uma total secularidade, tanto a nível político como social, o que implicaria a desconfessionalização das instituições do Estado. No entanto, algumas personalidades cristãs opõem-se a uma tal reforma sem uma mudança
real das mentalidades nas hostes do Islão, religião que não separa o
domínio temporal do espiritual. Temem uma manobra destinada a
permitir aos Muçulmanos – os quais sabem que são mais numerosos
do que os cristãos no Líbano actual – tomar conta das principais instituições do Estado e da administração.
Uma medida muito aguardada foi, porém, tomada em 2009: o ministro do Interior, Ziad Baroud, concedeu aos cidadãos libaneses o direito
de poder retirar a menção da sua religião dos ficheiros de dados pessoais. Esta menção tinha já sido retirada dos bilhetes de identidade
logo a seguir à guerra civil, a qual terminou oficialmente em 1990.
Durante a guerra, muitos libaneses foram raptados ou assassinados
porque o seu bilhete de identidade indicava a religião que professavam.
No dia 25 de Abril de 2010, teve lugar em Beirute a primeira manifestação a favor da secularidade. Participaram no evento cerca de 5.000
libaneses.
Os Cristãos continuam a ser vítimas de actos de hostilidade. Assim,
no dia 20 de Junho de 2010, enquanto o patriarca maronita, o Cardeal Nasrallah Boutros Sfeir, efectuava uma visita pastoral no Vale
de Bekaa para aí consagrar a igreja do novo bispado de Zahlé, uma
bomba explodiu no armazém de um negociante de peças de automóveis, causando um morto e dois feridos. De acordo com os investigadores, as três vítimas estavam ocupadas a armadilhar um carro
quando a bomba que manipulavam explodiu. De acordo com algumas fontes, preparavam um atentado contra o patriarca.
Alguns dias antes, alguns panfletos foram distribuídos aos cristãos de
Saïda (Sídon) e na região vizinha de Zahrani, incitando-os a evacuar as
suas casas e aldeias durante a semana seguinte se tivessem amor à
vida. Pouco tempo depois, a polícia prendeu o presumível autor desta
campanha, um indivíduo de seu nome Mahmoud Rida Bizri.
Apesar da partida da maior parte dos seus membros do Líbano depois
da criação do Estado de Israel, em 1948, e especialmente durante a
guerra civil libanesa, a comunidade judaica permanece inscrita na
lista das dezoito confissões reconhecidas pelo Estado. Sendo cerca de
LÍBANO
22.000 antes da guerra, os judeus são hoje apenas cerca de 200 e vivem frequentemente em
anonimato e sob a protecção das autoridades.
Em Agosto de 2009, a sinagoga mais antiga de Beirute, denominada Maghen Abraham, cuja
construção remonta a 1926 e que tinha sido parcialmente destruída durante a guerra, foi
restaurada com a participação do Estado. Todas os partidos libaneses, incluindo o Hezbollah,
deram o seu acordo aos trabalhos. Isaac Arazi, presidente do Conselho Comunitário Judaico,
explicou nesta ocasião que “a restauração da sinagoga é apenas um dos objectivos de um
projecto que prevê também a recuperação dos cemitérios judeus de Beirute e de Sídon e a
abertura de um gabinete de comunicação e para os registos civis”. Existem dezasseis sinagogas no Líbano.
285
MALÁSiA
MALÁSiA
Aspectos jurídicos e institucionais
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos56,6%
Religiõestradicionais
chinesas18,4%
Cristãos8,9%
Hindus6,3%
Budistas5,3%
Animistas3,5%
Outros1%
Cristãos
2.211.120
Católicos
919.000
Circunscrições
eclesiásticas
8
A situação jurídica e institucional não mudou relativamente aos anos
anteriores. A Malásia tem dois sistemas jurídicos, um baseado na lei
islâmica (Shari’a, Syariah em Bahasa Malaio) e o outro baseado no
direito comum inglês. O Islão é a religião estatal, mas a Shari’a aplicase, em princípio, apenas aos muçulmanos. No entanto, existiram
casos nos quais a Shari’a ultrapassou perigosamente os seus limites
e invadiu a esfera do direito comum, violando o direito do indivíduo a
escolher a sua religião tal como está declarado na Constituição.
O caso mais óbvio é o de, uma mulher de 27 anos que se casou com
um hindu em 2001. O Departamento de Registo Nacional recusou-se
a registar o seu casamento porque ela estava registada como muçulmana. A mulher declarou que tinha sido hindu a maior parte da sua
vida embora, aos sete anos, os funcionários da assistência social a
tenham registado como muçulmana. Banggarma Subramaniam foi
aconselhada a comparecer perante um Tribunal da Shari’a e aí apresentar um pedido para deixar a religião islâmica.
O P. Thomas Philips, presidente do Conselho Consultivo Malaio do
Budismo, Cristianismo, Hinduísmo, Siquismo e Taoísmo (MCCBCHST),
queixou-se desta situação, declarando que “Os Tribunais da Shari’a só
têm jurisdição sobre ‘pessoas que professam a religião do Islão’. Banggarma [. . .] diz professar o Hinduísmo”. Portanto, ela não pode ser
obrigada a submeter-se a tal procedimento.
Grupos religiosos no país
A Constituição da Malásia garante o direito de escolher e professar
a religião escolhida por cada indivíduo. No entanto, o Governo apoia
o Islão, inclusive economicamente, e tenta limitar a liberdade das
outras confissões religiosas.
SUPERFÍCIE
329.758km2
POPULAÇÃO
27.914.000
Católicos
REFUGIADOS
66.137
DESALOJADOS
---
286
Durante três anos, o jornal The Herald travou uma batalha com o
Governo pelo direito de usar o termo “Alá” em referência ao Deus cristão. Em 2007, o Governo proibiu o uso do termo “Alá” por não muçulmanos porque “podia fazer aumentar as tensões e criar a confusão
entre os muçulmanos no país”. O Monsenhor Murphy Pakiam, Arcebispo de Kuala Lumpur, levou o Governo a tribunal, reivindicando que
a sua arquidiocese tinha o direito de usar a palavra “Alá”, com base
nos Artigos 10º (liberdade de expressão) e 11º (liberdade de praticar
a religião individual) da Constituição. Mais ainda, os católicos argumentaram convincentemente que os cristãos usam o termo há mais de quatro séculos sem causar qualquer problema. Na realidade, os cristãos definiram Deus usando a palavra “Alá” muito tempo antes de
o estado malaio existir, para não falar no facto de que é o único termo no idioma malaio pelo
qual Deus pode ser nomeado.
Em Fevereiro, jornais muçulmanos acusaram o The Herald de tentar subverter a nação com
actividades de proselitismo. Depois de meses de tensões, o Tribunal Superior de Kuala Lumpur decidiu, no dia 31 de Dezembro, que o The Herald podia usar o termo “Alá” em Bahasa
malaio para se referir ao Deus cristão. O Governo anunciou a sua intenção de interpor um
recurso contra este veredicto, mas instou as pessoas a permanecerem calmas. Uma semana
depois da decisão do Tribunal Superior, um pequeno grupo de muçulmanos lançou um
cocktail Molotov para o interior da Igreja Católica da Assunção em Petaling Jaya. Ninguém
foi ferido e os danos foram mínimos.
No dia 8 de Julho, dois católicos apresentaram uma queixa contra a publicação mensal AlIslam por publicar um relatório sobre alegadas conversões forçadas ao Cristianismo. Dois jornalistas muçulmanos fingiram ser católicos e assistiram a duas missas. Receberam a hóstia e
profanaram-na, ao publicar uma imagem dela. Nenhum dos jornalistas conseguiu qualquer
prova de conversões forçadas, mas acusaram os católicos de usarem a palavra “Alá” para se
referirem a Deus durante as suas celebrações no idioma local. Contactado pelo AsiaNews,
o editor do The Herald, P. Lawrence Andrew declarou que a história do Al-Islam “humilhou
os católicos na Malásia e [que tal] é uma violação dos direitos dos cristãos, assim como um
desafio directo à Constituição Federal, a qual garante a liberdade religiosa”.
Protestantes
MALÁSiA
No seguimento da disputa sobre o uso do termo “Alá”, foram atacadas três igrejas protestantes uma semana depois da sentença de 31 de Dezembro. Uma explosão, em particular,
danificou os escritórios administrativos da Igreja do Tabernáculo Metropolitano, uma igreja
protestante situada em Kuala Lumpur.
Em Julho, nove cristãos foram presos depois de terem sido acusados de tentar converter
alguns estudantes muçulmanos na Universidade Putra Malásia, em Serdang. Na Malásia, o
proselitismo é proibido por lei e, na maioria dos distritos, é punido com prisão. Os nove jovens
foram acusados de distribuir panfletos e brochuras sobre o Cristianismo.
Em Outubro, a polícia malaia apreendeu mais de 15.000 Bíblias porque o termo “Alá” era
usado na referência a Deus. As Bíblias eram destinadas aos cristãos que usam o Bahasa
Malaio, tanto na Malásia Peninsular (Semenanjung Malásia) como nos estados de Sabah e
de Sarawak.
287
MALÁSiA
Hindus e budistas
Os tribunais muçulmanos nunca reconheceram as conversões dos cidadãos de etnia malaia
para outras religiões porque, por lei, todos eles são considerados muçulmanos. A Shari’a
proíbe também a conversão dos muçulmanos para outras religiões, mesmo no caso de não
malaios.
O único caso registado de uma conversão com sucesso é o de Tan Ean Huang, em 2009. Originalmente de fé budista, esta mulher apresentou o pedido para voltar à sua religião original
em 2006. Tinha deixado a fé budista para se casar com um muçulmano iraniano mas, depois
de ele a ter deixado, tentou por várias vezes regressar ao Budismo, sem sucesso. O tribunal
de recurso da Shari’a acabaria por aceitar a sua petição no dia 19 de Março de 2009, depois
de três anos de tentativas.
Em Abril, o Governo anunciou que vinte e nove templos hindus tinham de ser deslocados no
prazo de trinta dias ou arriscavam-se a ser demolidos, apesar do facto de a maioria ter sido
construída em terrenos privados.
Em Abril, Indira Gandhi, uma mulher hindu, apresentou um protesto porque o seu marido
muçulmano, de quem estava separada, tinha “convertido” os três filhos menores ao Islão sem
o seu consentimento, apresentando as certidões de nascimento dos jovens ao Departamento
Religioso Estatal. Sob a lei da Shari’a, e em casos de separação, a mulher tem a custódia dos
filhos até à idade de doze anos. Porém, se ela não for muçulmana, perde a custódia. Os filhos,
no caso de separação, têm de permanecer com o “melhor” lado da família, ou seja, o muçulmano.
Muçulmanos
Nos últimos anos, o Governo classificou cinquenta e seis interpretações do Islão como “invulgares”, incluindo as dos Ahmadis, dos Ismaelitas, dos Xiitas, e dos Baha’i, entre outros. Em
2009, limitou o número de vistos concedidos ao clero muçulmano estrangeiro para impedir
os “militantes” com interpretações “invulgares” do Islão de entrarem no país.
288
MALDiVAS
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos98,4%
Cristãos0,5%
Outros1,1%
Cristãos
317
Católicos
---
Circunscrições
eclesiásticas
---
SUPERFÍCIE
298km2
POPULAÇÃO
314.000
REFUGIADOS
---
DESALOJADOS
---
289
MALDiVAS
Tal como acontecia com a versão anterior da Constituição, em vigor
desde 1999, a Constituição aprovada em 2008 estabelece o Islão como
religião de Estado e os cidadãos estão proibidos de professar qualquer outra fé. Aos estrangeiros são proibidas todas as manifestações
públicas de outras religiões e a conversão para religiões diferentes do
Islão é estritamente proibida. Toda a legislação do país, incluindo o
Direito Civil, é subordinada à Lei Corânica. O ensino do Islão é obrigatório em todas as escolas.
Estima-se que mais de 0,1% da população seja cristã, mas esteja obrigada a praticar a sua fé em segredo para evitar a prisão ou a “reconversão” à força, ou arriscar a perda da cidadania. Os muitos turistas
estrangeiros têm de praticar a sua fé em privado e desde que não
compartilhem as suas convicções com os habitantes locais. É ilegal
trazer Bíblias ou outro material religioso não-muçulmano para o país.
MOnGÓLiA
MOnGÓLiA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Agnósticos36,3%
Animistas32,2%
Budistas24,2%
Muçulmanos5%
Cristãos1,7%
Outros0,6%
Cristãos
1.000
Católicos
300
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
1.566.500km2
POPULAÇÃO
2.701.000
REFUGIADOS
11
DESALOJADOS
---
290
Ao abrigo dos Artigos 9º, parágrafo 2, e 16º, parágrafo 15, da Constituição de 1992, a liberdade de religião é reconhecida, separando a religião organizada das actividades políticas.
A educação religiosa não é permitida nas escolas públicas, mas o
Governo permite a entrada de missionários estrangeiros no país.
Cada grupo religioso tem de se registar e apenas aqueles que se
encontram registados se podem ocupar de actividades de apostolado (embora ofertas de incentivos económicos, ou outras formas de
pressão, sejam proibidas). O Governo pode limitar o número de locais
de culto e de sacerdotes e, na realidade, assim faz, confiando na sua
autoridade reguladora para controlar estes locais.
Uma vez que o registo requer uma carta de aprovação por parte das
câmaras municipais, ou de outras autoridades locais, na prática os
governos locais detêm o poder sobre os locais de culto, já que a aprovação por parte dos Ministérios da Justiça e da Administração Interna
normalmente constitui apenas uma formalidade. Os candidatos que
desejam efectuar o registo têm de fornecer os nomes dos responsáveis pelos locais de culto, bem como os nomes dos crentes.
Não houve relatos de incidentes significativos relativamente à liberdade religiosa durante o período de tempo considerado.
MiAnMAR
Situação política
A actual junta militar tomou o poder em 1988 quando era denominada Conselho Estatal de Restauração da Lei e da Ordem ou SLORC.
Mudou mais tarde o seu nome, tornando-se Conselho Estatal para a
Paz e o Desenvolvimento (CEPD). Criou um sistema político com o qual
exerce um controlo absoluto sobre Mianmar. Um Governo no exílio, o
Governo de Coligação Nacional da União da Birmânia (GCNUB), foi
criado fora do país depois do golpe militar. Foi criado para poder agir
a nível internacional e fazer o que os líderes pro-democracia não conseguem fazer dentro do país, isto é, desenvolver laços com governos
amigos, diplomatas, grupos da sociedade civil internacional e organizadores de campanhas em redor do mundo. A sua principal área de
interesse é a Organização das Nações Unidas.
Ao longo dos anos, as Nações Unidas designaram vários enviados
a Mianmar. Entre eles contam-se enviados das Nações Unidas, dos
direitos humanos, assim como enviados especiais em representação
do secretário-geral da ONU, diplomatas como Ibrahim Gambari que
foi nomeado por Ban Ki-moon. Na sua segunda visita a Mianmar em
2008, Gambari foi duramente criticado pela oposição interna do país
porque apoiou o plano da junta de realizar eleições parlamentares em
2010 sem garantias de que elas seriam democráticas. Quando Gambari
se encontrou com o primeiro-ministro do GCNUB, declarou que teve de
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Budistas74,5%
Animistas9,7%
Cristãos7,9%
Muçulmanos3,8%
Outros4,1%
Cristãos
4.369.950
Católicos
689.000
Circunscrições
eclesiásticas
13
SUPERFÍCIE
676.578km2
POPULAÇÃO
50.496.000
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
470.000
291
MiAnMAR
Em 2009, a repressão sistemática dos direitos humanos e da liberdade religiosa continuou em Mianmar. Nenhuma comunidade foi
poupada à violência e aos abusos. Depois dos monges budistas liderarem os protestos em 2007, o lado repressivo do Estado desabou
sem restrições sobre os mosteiros e os líderes religiosos, e sobre as
minorias étnicas, como os Karen, que são principalmente cristãos,
mas também os Rohingya, que são muçulmanos. A promessa de eleições parlamentares para 2010 não trouxe nenhuma mudança positiva ao sistema político. O regime militar, que governa o país desde
1962, desrespeitando a vitória eleitoral do partido da oposição Liga
Nacional para a Democracia (LND) em 1990, continua a manter a sua
líder, Aung San Suu Kyi, em prisão domiciliária. A lei eleitoral, aprovada
sem consultar a oposição, está especificamente elaborada de forma a
manter esta laureada com o Prémio Nobel da Paz fora da corrida. Em
2009, pelo décimo ano consecutivo, o Departamento de Estado dos
EUA classificou Mianmar como um país de “preocupação particular”
no que diz respeito aos direitos humanos.
MYANMAR
recorrer ao plano da junta porque a oposição não tinha uma proposta melhor e unificada. Por
esta razão, o GCNUB tentou desenvolver um plano conjunto que incluísse todas as partes. Em
Janeiro de 2009, a União dos Deputados - Birmânia (UDB) reuniu-se num congresso na Irlanda.
O GCNUB delineou uma nova proposta para a colocar à consideração destes. Um amplo acordo
de princípios foi deste modo alcançado e a proposta acabaria por ser aceite por todos os grupos
da oposição depois de se terem encontrado no dia 26 de Janeiro de 2009.
Entretanto, desenvolvimentos políticos no seio de Mianmar levaram a um volte-face crítico.
A visita de dois dias de Ban Ki-moon ao país não trouxe nenhuma mudança, com a excepção de um novo julgamento para Aung San Suu Kyi. No dia 3 de Maio de 2009, um mórmon
americano, John William Yethaw, atravessou o Lago Inya a nado, conseguindo entrar dentro
do complexo residencial da líder da LND. No dia 14 de Maio, Aung San Suu Kyi foi presa, supostamente por violar as condições da sua prisão domiciliária. No dia 18 de Maio, foi levada a
julgamento, apenas três dias antes de expirar a data da sua prisão domiciliária anterior.
A opinião da maioria da imprensa mundial, e da Liga Nacional para a Democracia, foi de que
a junta tinha tirado proveito da iniciativa de Yethaw para neutralizar Aung San Suu Kyi antes
de submeter a sua proposta de Constituição para aprovação num referendo. Segundo a nova
isenção, o poder continuará nas mãos do exército mesmo que eles usem roupas civis. No dia
11 de Junho, Aung San Kyi foi novamente condenada, sentenciada a três anos de trabalhos
forçados, por violar regras de segurança. Esta pena acabaria por ser reduzida para dezoito
meses de prisão domiciliária, fazendo com que seja impossível que participe nas próximas
eleições parlamentares, cuja data ainda não foi decidida.
Aprovada em Março de 2010, a lei eleitoral oferece por um lado à LND a possibilidade de reabrir
os seus escritórios, que foram encerrados em Maio de 2003. No entanto, requer também que
a LND e os outros partidos se registem no prazo de sessenta dias, e apenas com a condição de
que excluam todos os candidatos actualmente detidos, entre outros Aung San Suu Kyi.
No entanto, a repressão continua. Até mesmo rezar pela premiada com o Prémio Nobel foi
proibido. No dia 22 de Junho de 2009, um tribunal em Twantay condenou Chit Pe, vice-presidente local da LND, e Aung Soe Wai, a dezoito meses de prisão por “insulto à religião”. Os dois
foram presos em Abril por participarem numa cerimónia religiosa budista, em conjunto com
outros cinquenta membros da LND, durante a qual tinham pedido a libertação de Aung San
Suu Kyi e de outros prisioneiros políticos.
Mesmo a Constituição de 2008, introduzida pelo CEPD, é uma afronta à comunidade internacional. Exclui partidos políticos birmaneses muitos importantes, incluindo os que representam grupos étnicos, que constituem a espinha dorsal da União de Mianmar. Não assegura
eleições livres e justas, e não protege os direitos humanos dos cidadãos birmaneses.
O sistema jurídico e político de Mianmar atrasa o desenvolvimento económico do país. Apesar das suas vastas riquezas em recursos naturais, milhões de pessoas quase não conseguem
sequer sobreviver. A riqueza está concentrada nas mãos da oligarquia militar. Os níveis razoáveis de desenvolvimento e de bem-estar são negados à maioria da população. Os investimentos domésticos e estrangeiros são inibidos. A actividade económica é limitada à mera
292
exploração de recursos naturais não renováveis, incluindo as florestas virgens e os minerais.
A agricultura, que é vital para o país, é ignorada.
Em Agosto de 2009, a junta lançou uma nova ofensiva contra os movimentos rebeldes, especialmente os Karen (Kayin) e os Shan, em estados onde os cristãos constituem uma parte significativa da população. O objectivo era forçar os rebeldes a renderem-se antes das eleições
de 2010 e a colaborarem com o Governo para proteger as fronteiras da nação. O plano para
transformar grupos secessionistas em guardas fronteiriços não correu de modo suave, como
inicialmente planeado. Os grupos menores cederam, mas os maiores continuam a resistir.
Por esta razão, o regime decidiu usar da mesma estratégia que usou contra os Karen, ou seja,
dividir para reinar. Na realidade, no início da década de 1990, porque o movimento Karen
politicamente mais importante, a União Nacional Karen (UNK), tinha rejeitado as propostas
de paz do Governo, a junta tentou infiltrá-lo, subornar alguns dos seus membros e então
dividir a organização a partir do interior. Teve sucesso em 1994 quando um grupo se separou
do Exército de Libertação Nacional Karen (ELNK), a facção armada do UNK, para formar o
Exército Democrático Budista Karen (EDBK).
A ofensiva empreendida no Verão passado provocou um êxodo de proporções bíblicas, com
milhares de civis birmaneses, 30.000 de acordo com fontes não governamentais, a atravessarem a fronteira com a China para fugirem ao conflito entre as forças do Governo e os rebeldes Shan. Outros 6.500 fugiram para a Tailândia.
Cristãos
MIANMAR
Uma nova lei adoptada em 2009 proibiu de facto a existência das “igrejas residenciais” independentes, muitas das quais foram forçadas à clandestinidade porque os seus pedidos para
um edifício para as actividades de culto têm sido regularmente negados. Desde há muito
tempo, a junta militar bloqueou também a libertação de títulos de propriedade de terrenos que permitiriam às organizações religiosas construir igrejas ou outros locais de culto.
Tal situação levou muitos crentes e pastores a se encontrarem em locais “alternativos”, como
residências privadas, que são muito frequentemente alugadas a terceiros.
Um relatório da Burma Campaign UK relatou que, em Janeiro, as autoridades tinham mandado encerrar pelo menos 100 igrejas em Yangon, incluindo a Igreja Wather Hope e uma
igreja da Assembleia de Deus. Foi dito aos pastores que assinassem documentos nos quais
declaravam que iriam cessar todas as cerimónias religiosas ou então enfrentariam a prisão.
Funcionários do Ministério dos Assuntos Religiosos convocaram, também em Janeiro, os
proprietários dos edifícios onde estas Igrejas se tinham reunido e ordenaram-lhes que não
arrendassem as suas propriedades a grupos religiosos. As ordens de encerramento de igrejas
são apenas uma extensão da política religiosa existente da junta para promover o Budismo
às custas das outras religiões, de modo a fortalecer a sua ideia unitária de identidade nacional.
293
MiAnMAR
De acordo com a Organização de Direitos Humanos Chin (ODHC), o exército adoptou uma
política não oficial que se resume em três palavras – Amyo, Batha, Thathana – que se traduz
como “Uma raça (birmanesa), uma língua (birmanesa), uma religião (budista).
De acordo com alguns observadores, as considerações políticas e as questões de imagem
estão por detrás da ofensiva contra os cristãos. Apesar da proibição por parte do Governo,
grupos cristãos continuaram a levar ajuda às vítimas do ciclone Nargis, que atingiu o país
em 2008. Esta situação alarmou especialmente as autoridades, que temem que a presença
de cristãos entre os trabalhadores das equipas de salvamento que ajudam os refugiados do
delta do Irrawaddy possa levar a conversões do Budismo para o Cristianismo.
Os Cristãos são também atacados porque, como todos os outros grupos organizados e especialmente desde o massivo movimento de protesto de 2008, eles são suspeitos de actividades políticas anti-estatais.
Por fim, mas não menos importante, os Cristãos encontram-se fortemente representados
por entre algumas das minorias étnicas, como os Karen e os Chin, que têm vindo a combater
o exército para obterem a independência do seu estado. Muitos deles fugiram para a Tailândia e para a Índia, onde estão a viver em campos de refugiados. No estado Chin, cruzes erguidas no topo das montanhas locais, que são expressões de fé entre os habitantes locais, têm
sido deitadas abaixo, frequentemente substituídas por pagodes. De igual modo, os Cristãos
são forçados a pagar um imposto anual para apoiar o Budismo e, se se converterem, são-lhes
concedidos privilégios como a isenção do trabalho forçado periódico para o exército.
De acordo com fontes protestantes, os Cristãos são também perseguidos sistematicamente nas
denominadas “zonas de conflito de baixa intensidade”. Na realidade, o regime militar de Mianmar é responsável pelo abuso sistemático dos habitantes da etnia Chin, que são predominantemente cristãos. Os soldados sujeitaram-nos a trabalhos forçados, a tortura e a perseguição religiosa. Num relatório que contém depoimentos de testemunhas oculares de vários indivíduos da
etnia Chin, a Human Rights Watch (HRW) declara que os membros deste grupo são vítimas de
abusos e de violação dos direitos básicos por parte do exército e sob ordens dos militares do país.
Na preparação deste estudo, a HRW realizou cerca de 140 entrevistas entre 2005 e 2008 a
membros da comunidade Chin, tanto no estado Chin como no estrangeiro. Chegou à conclusão de que os Chin são vítimas de intimidação e de ameaças por parte da junta, cujo
objectivo é o de suprimir todas as formas de dissensão. As violações principais, de acordo
com a HRW, são as restrições à movimentação, a confiscação de terrenos ou de dinheiro, a
apreensão de alimentos e de propriedades, o trabalho forçado e a perseguição religiosa.
“Nós somos como escravos”, declarou um homem da comunidade Chin. “Temos de fazer
tudo o que [o exército] nos diz para fazer”. Mesmo os que fugiram para o estrangeiro, especialmente para o estado de Mizoram, no Nordeste da Índia, na fronteira com Mianmar, são
vítimas de discriminação religiosa e de abusos. Os homens e as mulheres da etnia Chin são
frequentemente empregados como bagageiros ou usados para limpar campos minados.
“Uma vez tentei recusar-me a ir, porque estava tão cansada e as coisas que nós somos obrigados a transportar são muito pesadas”, declarou uma mulher Chin do município de Thantlang.
294
MYAnMAR
“Quando tentei recusar, bateram-me e disseram: Você vive sob a nossa autoridade. Você não
tem nenhuma escolha. Tem de fazer o que nós dizemos”.
Como a junta usa a religião para propósitos políticos, as suas políticas não afectam apenas
as minorias, mas também a maioria budista do país. A antiga Birmânia não tinha uma religião de Estado. O país possui muitos grupos étnicos que frequentemente têm a sua própria
religião distinta. Porém, desde a independência, os governos birmaneses têm tentado associar-se ao Budismo e impulsioná-lo. Uma tentativa em 1961 para tornar o Budismo a religião
estatal não foi bem sucedida devido aos protestos das minorias.
Em 1988, quando o exército esmagou brutalmente as gigantescas manifestações pro-democráticas e ab-rogou a Constituição, a liberdade religiosa perdeu a sua protecção jurídica e
foi suprimida. O Budismo Theravada praticado pela maioria da população não é a religião
estatal, mas o Governo controla-o e beneficia-o, enquanto persegue as minorias cristãs e
muçulmanas.
De acordo com informações disponibilizadas pela AIS em 2007, as autoridades birmanesas
permitem à maioria das pessoas que pertencem a grupos religiosos registados professar a
religião da sua escolha, mas impõem fortes limites às actividades religiosas e colocam frequentemente entraves à liberdade religiosa.
O Governo continua a infiltrar mais ou menos abertamente quase todas as organizações
religiosas e a monitorizar as suas reuniões e actividades. Em particular, frustra sistematicamente os esforços por parte do clero budista para promover os direitos humanos e a liberdade política, desencorajando com o uso da força (ou proibindo explicitamente) a construção
de novos locais de culto de minorias religiosas.
O regime recorreu a ameaças contra as famílias dos monges que tomaram parte em manifestações pacíficas. Retaliou também contra os que se juntaram ao movimento de protesto
antigovernamental de 2007, o qual reprimiu com derrame de sangue, e impôs restrições aos
monges, limitando a sua capacidade de viajar, assim como de realizar orações tradicionais.
Por exemplo, Ashin Thavara, secretário-geral do Comité Representativo dos Monges da Toda
a Birmânia (ABMRC), com sede na Índia, declarou ao jornal semanal The Irrawaddy, “Os meus
pais têm de se registar junto das autoridades municipais todos os meses e informá-las de
todos os seus contactos comigo. Pressionaram também o patrão dos meus pais para os despedir do emprego”.
No dia 27 de Setembro de 2007, a junta militar que governa Mianmar há sessenta anos deu
ordem para reprimir os monges por estes terem exigido o respeito dos direitos humanos e
maior democracia. Revistaram mosteiros, prenderam monges, matando ou forçando ao exílio muitos deles. Mesmo mais tarde, “Os generais não deixaram de insultar e de castigar os
monges e a religião budista. Mais de 250 religiosos estão ainda presos pelas suas alegadas
actividades políticas”, declarou Ashin Issariya, um dos fundadores da Aliança dos Monges de
Toda a Birmânia (ABMA).
O Ministério dos Assuntos Religiosos da Birmânia tentou ter sob o seu controlo as comunidades religiosas através do Comité Estatal de Coordenação dos Monges (Comité Sangha
295
MiAnMAR
Maha Nayaka), uma organização controlada pelo Estado, que tentou limitar as viagens dos
monges e restringir a dharma, a leitura pública dos ensinamentos de Buda por parte de mestres budistas. Tal aconteceu, por exemplo, a Shwe Nya War Sayardaw, o reitor da Universidade
Budista de Shwe Nya War, em Yangon. Em 2007, o regime confiscou também as propriedades
dos monges considerados revoltosos, as quais ainda não foram devolvidas.
De acordo com o depoimento de testemunha ocular do abade de um mosteiro em Mandalay,
“diariamente os agentes de segurança à paisana vigiam de perto e espiam as actividades de
todos os mosteiros”. Em Outubro de 2009, a Aliança dos Monges de Toda a Birmânia (que
promoveu as manifestações pacíficas de Yangon em 2007) excomungou o homem forte da
junta, o General Than Shwe, por não ter pedido desculpa pela violência infligida aos monges
e à religião budista.
Professando e perseguindo o Budismo
De acordo com dados oficiais, Mianmar alberga 400.000 monges e a sua Sangha ou comunidade é uma das instituições mais respeitadas no país.
Em Janeiro de 2010, a junta acusou oito activistas de tomarem parte no movimento de protesto antigovernamental de 2007, também referido como a “revolução do açafrão”. Nestes
incluem-se quatro monges. Kyaw Ho, um advogado que representa Thandar Htun e Ko Nyo,
declarou que os seus clientes foram acusados de violar o Acto das Associações Ilegais e a Lei
da Imigração, e podem ser condenados até sete anos de prisão.
Os outros activistas em julgamento são Ye Myint, U Yaywata, U Kawthita, U Withudi, U
Waryama e Kyaw Khin. O seu advogado declarou que eles são acusados de manterem “contactos com a Associação dos Monges de Toda a Birmânia e com a Generation Wave”, duas
organizações proibidas pelos generais, e de “atravessarem a fronteira ilegalmente para se
encontrarem com membros dos dois grupos”.
Cinco dos acusados não tiveram nenhum apoio jurídico durante o julgamento. O advogado
acrescentou que, desde o dia da sua prisão, as famílias dos acusados não puderam encontrarse com eles e averiguar sobre o seu estado de saúde. De acordo com a Associação de Ajuda
aos Prisioneiros Políticos (AAPP) da Birmânia, com sede na Tailândia, mais de 250 monges
estão detidos em prisões birmanesas.
Muçulmanos
Como acontece com os outros grupos minoritários, os Muçulmanos estão sujeitos a restrições, controlos apertados, assim como também a violência. Os muçulmanos no estado de
Rakhine, especialmente os Rohingya, são os mais afectados. Eles foram particularmente discriminados e viram as suas propriedades serem confiscadas, forçando muitos deles ao exílio.
De acordo com o apelo interposto em 2009 pelos Médicos pelos Direitos Humanos (PHR),
uma ONG de direitos humanos e de cuidados de saúde com sede nos EUA, milhares de Rohingya estavam a viver como refugiados no Bangladesh e em risco de morrer à fome. Numa
declaração, a PHR advertiu que o Governo local estava também a impedir que os refugiados
296
MiAnMAR
Rohingya recebessem cuidados médicos adequados. As autoridades do Bangladesh rejeitaram porém as acusações, tal como fizeram com respeito a um relatório semelhante do grupo
Médicos Sem Fronteiras (Medecins sans Frontieres ou MSF).
Os Rohingya são uma das muitas minorias étnicas de Mianmar. Eles vivem principalmente
no estado de Rakhine, no Noroeste do país. Estão também entre os grupos mais pobres e
mais perseguidos. O regime militar nem sequer os conta como cidadãos da União de Mianmar, nem lhes permite possuírem terrenos, deslocarem-se livremente ou casarem-se sem
uma “licença especial” emitida pelas autoridades. Dezenas de milhares procuraram por isso
refúgio no estrangeiro, especialmente no Bangladesh e na Malásia, ambas nações predominantemente muçulmanas. As autoridades do Bangladesh concederam o estatuto de refugiado a aproximadamente 28.000 Rohingya que vivem actualmente em campos de refugiados geridos pela ONU em Kutupalong. No entanto, eles calculam que o verdadeiro número
de refugiados seja ao redor de 200.000, podendo chegar mesmo aos 300.000, a maioria dos
quais se encontra no Bangladesh.
O exército do Bangladesh lançou uma dura repressão contra os refugiados para prevenir um êxodo em massa adicional antes das eleições políticas em Mianmar, programadas
para algures antes do final de 2010. Os activistas reclamam que o Governo está empenhado
numa campanha de “detenções arbitrárias, expulsões ilegais e de prisões forçadas” contra os
muçulmanos Rohingya, muitos dos quais padecem em “prisões ao ar livre”.
“Basicamente, a política do Governo do Bangladesh é a de que eles querem simplesmente
que (os refugiados) desapareçam”, declarou Richard Sollom, director de pesquisa e investigações (Conflitos Armados e Saúde Pública, Médicos pelos Direitos Humanos).
O Governo de Daca rejeitou as acusações, considerando-as “totalmente falsas”. Pelo contrário,
as suas acções são delineadas para terem simplesmente a certeza de que nenhuma ajuda
estava a chegar vinda de grupos terroristas, declarou Abdul Momen, representante do Bangladesh nas Nações Unidas. Na realidade, acrescentou, “nós somos as vítimas. Somos um
país pobre e, apesar disso, tentamos ajudá-los o melhor que podemos”.
Em 2008, os Rohingya foram notícia de primeira página na imprensa mundial por causa de
relatos de acções de perseguição levadas a cabo pelo exército tailandês. Apesar dos desmentidos de Banguecoque, muitos refugiados que tentavam fugir de Mianmar acabaram em
águas territoriais tailandesas onde foram detidos pela marinha tailandesa antes de serem
libertados no mar alto sem alimentos nem água. Para a Tailândia, eles não são refugiados
políticos mas sim imigrantes ilegais. Para Mianmar, eles não são sequer nativos do país, mas
sim um povo trazido para Mianmar durante o regime colonial britânico.
Em 2009, nove mesquitas foram forçadas a encerrar no estado de Rakhine. Ao mesmo tempo,
a junta permitiu a destruição de escolas e centros muçulmanos. Para o Departamento de
Estado dos EUA, o Governo em Mianmar está empenhado numa campanha para criar “zonas
livres de muçulmanos” em algumas partes daquele estado. Mais ainda, em áreas com muito
poucos budistas, o exército fechou mesquitas e madrassas (escolas corânicas) e construiu
pagodes, fazendo uso frequente do trabalho forçado.
297
nEPAL
nEPAL
Aspectos judiciais e institucionais, e implicações sociais
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Hindus67,8%
Animistas13,9%
Budistas10,5%
Muçulmanos4,2%
Cristãos3%
Outros0,6%
Cristãos
573.360
Católicos
7.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
147.181km2
POPULAÇÃO
29.853.000
REFUGIADOS
108.461
DESALOJADOS
50.000-70.000
298
No dia 28 de Dezembro de 2007, o Parlamento nepalês aprovou
uma emenda constitucional que decreta a transição da monarquia
hindu para uma república, depois de séculos de monarquia e de uma
década de guerra civil entre o exército e os guerrilheiros Maoístas. A
mudança para um regime democrático, oficializada no dia 28 de Maio
de 2008, foi um passo em frente fundamental para o Nepal. Durante
estes últimos anos, o país assistiu à abolição das castas, um legado
da religião hindu, e a uma maior liberdade para as minorias religiosas
como os Budistas, os Muçulmanos e os Cristãos. A emenda constitucional está actualmente ainda em vigor e estabelece a liberdade
religiosa e as conversões pessoais, mas proíbe o direito de efectuar
actividades missionárias e de proselitismo. Esta emenda substitui
a anterior Constituição monárquica datada de 1990, a qual, sobre a
questão da liberdade religiosa, definia uma tolerância geral para com
as minorias, isto apesar do reino nepalês ser descrito como hindu.
Nestes dois últimos anos, porém, o Nepal afastou-se do seu entusiasmo
inicial de retorno do país à democracia, para uma fase de impasse tanto
a nível político como económico, causada por um contínuo conflito
entre a aliança de sete partidos, presente desde os dias da monarquia,
e os Maoístas, que acederam ao Parlamento no dia 1 de Abril de 2007.
As disputas dizem respeito aos acordos da ONU sobre o desarmamento dos anteriores guerrilheiros e a sua integração no exército.
Esta situação teve o seu início no dia 10 de Abril de 2008, com a vitória histórica do partido dos antigos guerrilheiros Maoístas (Partido
Comunista Unificado do Nepal-Maoísta UCPN-M) nas eleições para
a assembleia constituinte encarregada de formar Governo. O novo
primeiro-ministro, Pushpa Kamal Dahal, conhecido como Prachanda,
líder dos guerrilheiros Maoístas durante os anos da guerra civil,
começou de imediato a sua batalha para reintegrar cerca de 19.000
guerrilheiros armados no exército.
Temendo que os Maoístas ganhem poder excessivo, oficiais de alta
patente do exército, uma parte do Parlamento e o presidente Ram
Baran Yadav, estão a impedir a reintegração dos antigos guerrilheiros.
No dia 4 de Maio de 2009, em sinal de protesto, Prachanda e os seus
deputados deixaram o Governo, despoletando uma grave crise política.
No dia 28 de Maio de 2009, a assembleia constituinte, agora sem o
partido da maioria, designou um Governo de coligação liderado por
Madhav Kumar Nepal, líder do Partido Comunista Nepalês (Partido
Unificado Marxista-Leninista). Esta decisão não satisfaz a oposição Maoísta que continua
a exigir a demissão do primeiro-ministro Nepal e está a destabilizar o país com protestos
contínuos e greves gerais.
Em várias ocasiões, no decurso de 2009, o país correu o risco de voltar ao abismo da guerra
civil, apenas evitado graças à intervenção das Nações Unidas e da comunidade internacional,
os quais, desde 2006, têm supervisionado o processo de paz no Nepal.
A instabilidade do modelo democrático fortaleceu também os partidos hindus extremistas
como o Exército de Defesa do Nepal (NDA), formado no seguimento da abdicação do Rei
Gyanendra. Eles combatem a secularização do Estado e todas as aberturas a religiões minoritárias.
Religiões presentes no país
No Nepal, as duas religiões tradicionais são o Hinduísmo e o Budismo. Porém, mais de 80%
da população é hindu. As minorias mais importantes são os Muçulmanos, concentrados na
região de Terai, e os Cristãos. Existe também uma pequena comunidade judaica de 1500 pessoas, na sua maioria membros de delegações diplomáticas.
Com a proclamação do Estado secular, as minorias aumentaram a presença no país e as suas
actividades no seio da sociedade nepalesa.
O Governo não requer o registo específico para grupos religiosos, o qual é por sua vez obrigatório para associações de carácter confessional como ONGs, escolas e centros culturais.
A comunidade muçulmana protestou recentemente contra esta regra que, além do registo,
envolve também a declaração do destino e da origem dos fundos e doações.
Em Fevereiro de 2009, o Governo Maoísta impôs um imposto adicional de 5% às escolas particulares numa tentativa de incentivar a população a escolher o ensino oficial. Este imposto
entra em conflito com disposições anteriores que propuseram que o Estado deveria apoiar
financeiramente as escolas particulares, com a condição de que elas usassem também livros
de estudo, mesmo se não-religiosos, em língua inglesa e nepalesa, como aconselhado pela
Comissão de Educação Estatal.
Católicos
NEPAL
A violência contra a pequena comunidade católica aumentou no Nepal entre 2008 e 2009,
vinda principalmente de movimentos extremistas hindus que ficaram mais violentos desde
que a monarquia caiu em 2007 e que o estatuto do Rei Gyanendra mudou para o de um
cidadão privado.
A onda de violência começou na noite de 30 de Junho de 2008 em Sirsiya (Nepal Oriental),
quando um grupo de quatro homens armados ligados a grupos extremistas hindus matou
o P. John Prakash, um sacerdote salesiano de origem indiana e director da Escola Dom Bosco
em Sirsiya. O seu assassinato foi o primeiro cometido por um grupo de terroristas na história
da Igreja Católica no Nepal.
299
NEPAL
Nos meses seguintes ao assassinato do P. Prakash, extremistas enviaram cartas com ameaças de morte a padres e membros da pequena comunidade católica, ordenando-lhes que
fechassem todos os institutos católicos. Foram também endereçadas ameaças ao Monsenhor Anthony Sharma, vigário apostólico do Nepal e, no fim de Julho, o prelado escreveu uma
carta ao Ministério do Interior, pedindo ao Governo que garantisse maior segurança para os
Cristãos e advertindo que pode vir a ser necessário fechar as escolas católicas existentes no
país.
O Governo respondeu enviando a polícia para vigiar as igrejas e os institutos religiosos. Esta
iniciativa, no entanto, não deteve a onda de violência.
No dia 23 de Maio de 2009, Sita Thapa Shrestha, uma mulher de 27 anos e membro do grupo
extremista hindu Exército de Defesa do Nepal, fez explodir uma bomba na Catedral da
Assunção, em Kathmandu. Duas pessoas morreram no ataque e outras treze ficaram feridas.
As notícias perturbaram seriamente também alguns líderes hindus e muçulmanos que pediram vigorosamente que os ataques a lugares santos parassem de imediato.
No dia 4 de Junho de 2009, a agressora, Sita Thapa Shrestha, foi presa. Interrogada pela polícia, a mulher justificou o ataque com o seu “ódio profundo aos cristãos e a todas as religiões
que não o Hinduísmo”. No dia 6 de Setembro de 2009, no distrito de Jhapa (no Leste do país),
a polícia prendeu Ram Prasad Mainali, instigador do ataque e líder do NDA.
Mainali ainda está na prisão e, no final de 2009, pediu aos Católicos e aos Muçulmanos perdão pelas suas acções.
A violência não fez parar o aumento dos católicos no país e, de acordo com o Monsenhor
Anthony Sharma, cerca de 300 pessoas convertem-se todos os anos.
Outras comunidades cristãs
Em 2009, os cristãos protestantes reportaram um aumento no extremismo hindu, lamentando casos contínuos envolvendo extorsão, ameaças e violência, que coincidem com os ataques contra a comunidade católica. Além da violência, eles relataram também a sua alienação da vida social do país e as restrições impostas às suas actividades religiosas.
Nayaran Sharma, líder da Igreja Protestante, declarou que, até há três anos, o Nepal teve a
única monarquia hindu do mundo e os cristãos sofreram a discriminação feita pelo Estado.
Eles foram ostracizados pela sociedade e eram colocados na prisão se fossem vistos a rezar.
“Oficialmente”, declarou ele, “o país mudou em 2006, tornando-se um regime secular democrático, mas três anos depois nada mudou.” “Há algum tempo”, prosseguiu ele, “a nossa comunidade comprou um pedaço de terra numa floresta no distrito de Gorka (Nepal Ocidental),
para poder ter um cemitério. Mas quando a comunidade local descobriu, eles pediram-nos
para que lhes devolvêssemos o terreno, declarando que não desejavam ter corpos mortos
perto deles porque estes atraíam espíritos malignos”. O líder protestante acrescentou que o
único lugar onde os cristãos podem enterrar os seus mortos é ao pé das suas casas. Segundo
Sharma, é também difícil para os cristãos construírem e manterem os seus locais de culto.
“As igrejas não podem ser registadas junto do Governo e, por conseguinte, não beneficiam
300
de fundos estatais como acontece com os templos hindus ou as mesquitas muçulmanas. Os
templos têm toda a propriedade que desejam, possuem electricidade e água; até mesmo as
madrassas islâmicas recebem fundos estatais e o Governo subsidia a peregrinação anual a
Meca”.
Os Cristãos protestam também sobre a inadequada representação nas instituições políticas. Não existe nenhum cristão entre os 601 membros da assembleia constituinte, embora o
Governo tenha o poder de nomear pelo menos um delegado para minorias sem representação política. “Embora existam cristãos no Nepal há mais de 350 anos”, declarou Sharma, “eles
são como órfãos. Não existe ninguém que possa falar por nós e somos discriminados muito
para além do imaginável”.
Muçulmanos
nEPAL
Com a proclamação do Estado secular, assistiu-se a um aumento da violência dirigida à
comunidade muçulmana, cometida por extremistas hindus. A violência, os ataques e as ameaças aumentaram com as eleições, realizadas no dia 10 de Abril de 2008, e continuaram pelos
meses seguintes.
No dia 26 de Abril de 2008, em Birantnagar, o Exército de Defesa do Nepal (NDA) detonou
uma bomba perto da mesquita local durante as orações do fim do dia de sábado. A explosão matou duas pessoas e feriu mais duas. No dia 4 de Outubro de 2008, um indivíduo não
identificado fez explodir uma poderosa bomba em frente à mesquita de Morang, ferindo
quatro pessoas. Até ao momento, ninguém reivindicou responsabilidade pelo ataque, mas a
suspeita caiu uma vez mais sobre os extremistas do NDA ou grupos afiliados que estão activos naquela zona. O presidente da Associação de Muçulmanos Nepaleses e Nasrul Hussein,
secretário do Conselho Inter-Religioso do Nepal, expressaram o seu descontentamento numa
entrevista à AsiaNews, declarando que “Não estamos de modo nenhum satisfeitos com o
modo como o Governo está a tratar estes assuntos. Aqueles que lideram o país tem de encetar acções imediatas contra estes grupos e têm o dever de garantir a segurança em todos os
locais de culto. Esta não é a primeira vez que muçulmanos foram mortos no Nepal. Aguentámos tudo isto por muito tempo, mas durante quanto mais tempo teremos de permanecer
em silêncio enquanto somos confrontados com estes ataques?!”
Em 2009, os Muçulmanos pediram ao Governo maior segurança e pediram também para
serem mencionados na proposta da nova Constituição. Eles vêem a necessidade da comunidade islâmica ser reconhecida como tendo uma identidade separada dentro do país, principalmente na região Sul de Terai, o que inclui a aplicação da lei da Sharia.
Abdul Sattar, presidente do Sangh Muçulmano Nepalês, declarou que os Muçulmanos não
podem ser considerados como “bancos de votos” e que nem o Governo nem os partidos políticos podem continuar a ignorar os pedidos apresentados pelas comunidades islâmicas, para
as quais “nenhum programa concreto tem até agora sido proposto”.
No dia 15 de Março de 2009, a liderança Maoísta assinou um acordo com os Muçulmanos
no qual lhes são proporcionadas garantias políticas, sociais e culturais, numa tentativa para
301
NEPAL
impedir qualquer possível exigência de independência. O acordo não menciona, porém, a
hipótese de uma lei corânica apenas para os Muçulmanos, como o Sangh tinha, por outro
lado, pedido que constasse na Constituição.
Os problemas experimentados pelos budistas tibetanos
A subida ao poder dos Maoístas, em 2008, marcou uma queda na influência histórica do
Governo indiano no Nepal, o qual sempre providenciara apoio para os tibetanos, favorecendo,
pelo contrário, uma aproximação ao Partido Comunista Chinês.
As restrições começaram logo em Março de 2008, quando o Governo Maoísta assegurou
a Pequim o seu desejo de prevenir qualquer protesto anti-chinês durante o aniversário da
invasão do Tibete (10 de Março de 1959). Nesses dias, milhares de tibetanos encheram as ruas
e a polícia prendeu mais de 130 pessoas, espancando e prendendo até mesmo aqueles que
protestavam de forma pacífica, resultando em fortes protestos por parte de funcionários das
Nações Unidas colocados na capital. As mesmas cenas repetiram-se em 2009, com prisões e
espancamentos arbitrários, enquanto mais de 140 tibetanos foram presos quando tentavam
atravessar secretamente a fronteira.
Hoje em dia, os mais de 20.000 refugiados tibetanos, exilados durante décadas no Nepal,
relatam um aumento na discriminação e nas restrições que afectam também a sua vida
quotidiana, incluindo a interferência policial em cerimónias religiosas, restrições essas que
frequentemente conduzem à violência e a ameaças. Estas restrições envolvem também as
autoridades locais que permitem que as celebrações sejam apenas feitas em residências privadas e não em público.
Hindus
A Constituição provisória proíbe a discriminação com base em castas, o que é considerado
ilegal pelo Governo. Desde 2007, o Ministério do Desenvolvimento Local atribuiu todos os
anos fundos para a Comissão Nacional dos Dalits, para cobrir as despesas administrativas
e criar programas de desenvolvimento em setenta e cinco distritos. A Comissão possui um
gabinete em todos os distritos do país e leva a cabo as suas actividades em cooperação com
as ONGs locais. Uma vez por ano, envia um relatório ao Ministério do Desenvolvimento no
qual descreve a situação dos dalits.
As iniciativas patrocinadas pelo Governo e pela Comissão ainda não erradicaram o sistema
de castas da sociedade hindu e, em muitas zonas do país, os dalits são frequentemente
excluídos da vida social e religiosa.
No dia 16 de Agosto de 2008, em Dailenkh (Nepal Ocidental), durante o festival de Jani Purnima, Dipak Upadhayay, um sacerdote hindu pertencente à casta Brâmane, recusou-se a permitir que o dalit Sahanta Bahadur Bishwokarma executasse o ritual de amarrar um fio ao
redor da mão. Bahadur relatou esta discriminação ao tribunal do distrito graças à ajuda dada
pelo activista Janklal Sunar. No dia 13 de Abril de 2009, o tribunal do distrito condenou o
padre a três meses de prisão e multou-o em 13 euros por discriminação de casta.
302
OMÃ
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos88,1%
Hindus5,5%
Cristãos4,4%
Outros2%
Cristãos
126.420
Católicos
120.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
212.457km2
POPULAÇÃO
2.905.000
REFUGIADOS
26
DESALOJADOS
---
OMÃ
Não há relatos de mudanças significativas em 2009.
A Lei Fundamental deste sultanato, datada de 1996, estabelece o
Islão como a religião estatal e a Sharia como a fonte da legislação. A
liberdade para praticar rituais religiosos está garantida, contanto que
os mesmos estejam conforme a tradição e não perturbem a ordem
pública. O Artigo 29º do Código Penal estabelece sentenças de prisão
para todos os que blasfemem contra Deus ou os profetas, ou ofendam
as religiões. Por vezes, este artigo é usado para restringir a liberdade
religiosa. O Sultão concedeu terra às comunidades cristã e hindu – as
quais são quase exclusivamente constituídas por imigrantes – para
que elas possam construir os seus próprios locais de culto. As comunidades religiosas não muçulmanas são livres de se manterem em
contacto com as suas correligionárias fora do país. A publicação de
material religioso não islâmico é proibida, embora as autoridades
tolerem que seja importado do estrangeiro, após uma prévia inspecção por parte das mesmas.
303
PALESTinA
PALESTinA
Gaza
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos80,6%
Judeus11,8%
Agnosticos5,7%
Cristãos1,9%
Cristãos
573.360
Católicos
25.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
??????km2
POPULAÇÃO
4.409.000
REFUGIADOS
---
DESALOJADOS
160.000
304
Desde que o Hamas tomou posse da faixa de Gaza em Junho de 2007,
os cristãos que vivem no território (cerca de 2.500, incluindo 200 católicos) ficaram sob as pressões Islamistas e tal situação afectou a sua
liberdade. As mulheres cristãs são agora forçadas a cobrir a cabeça
quando estão em público. E quanto mais a religiosidade muçulmana
aumenta, mais os cristãos se sentem cercados.
A operação israelita Cast Lead (Dezembro de 2008 a Janeiro de 2009)
piorou ainda mais a situação dos cristãos na Faixa de Gaza. Os muçulmanos olham por vezes para os cristãos como um símbolo do Ocidente, responsável pelos seus problemas. Casas e igrejas cristãs estão
quase diariamente sob ataque. Ataques à bomba foram dirigidos a
lojas que são propriedade de cristãos. Além disso, por causa das suas
famílias ou das suas igrejas, os cristãos foram forçados a colaborar
com o Hamas.
O culto católico tem agora de ter lugar longe do olhar de outrem. Na
Sexta-feira Santa de 2009, a Via Crucis (O Caminho da Cruz) foi feita
dentro da Igreja Latina da Sagrada Família; dantes, era celebrado nas
ruas do bairro.
A polícia começou também a proibir os cristãos de venderem bebidas
alcoólicas.
Ninguém foi preso pelo assassinato, em Outubro de 2007, de Rami
Ayyad, um cristão ortodoxo convertido ao Cristianismo evangélico
que foi director da Sociedade da Bíblia Sagrada (ver Relatório da Liberdade Religiosa no Mundo de 2008), apesar das garantias dadas pelo
Hamas de que encontraria os culpados.
No dia 23 de Novembro de 2008, um domingo, os católicos de Gaza
foram privados da missa. Apesar do facto de que todos os passos
burocráticos necessários tinham sido dados junto do Ministério Israelita dos Negócios Estrangeiros e junto do Alto Comando do exército
israelita, as autoridades israelitas negaram o acesso ao território ao
núncio apostólico e aos dois padres latinos designados para celebrar
a missa durante a ausência temporária do pároco.
Para o núncio, a missa da Solenidade do Cristo Rei representava uma
oportunidade para dar ênfase à proximidade da Santa Sé face aos
cristãos de Gaza. Para o patriarcado latino de Jerusalém, a atitude de
Israel constituiu uma violação do direito dos cristãos ao culto.
Margem Ocidental
PALESTinA
A situação dos cristãos não mudou na Margem Ocidental, que é governada pela Autoridade
Palestina presidida por Mahmoud Abbas. Embora não oficialmente discriminados, são sujeitos às pressões dos grupos islamistas cuja popularidade está a crescer por entre a população. Lentamente, os muçulmanos vão-se movimentando à custa dos cristãos. Pouco a pouco,
estão a comprar todas as lojas de recordações religiosas em redor da Basílica da Natividade e
a tomar conta da zona. “Nos anos cinquenta, havia apenas uma mesquita em Belém”, declarou uma mulher local. “Hoje, há muitas mais, construídas de propósito próximo dos locais de
culto cristãos”.
Os cristãos palestinos reclamam também sobre as restrições que Israel lhes impõe quando
querem viajar para Jerusalém. O Monsenhor Twal levantou a questão em várias ocasiões. “É
difícil ver a Igreja local, os cristãos locais, impossibilitados de a visitar (à cidade santa). Um
padre da Paróquia de Belém não pode levar os seus crentes numa peregrinação aos lugares
santos. O mesmo acontece em Ramallah, na Jordânia e noutras paróquias. Não é fácil para
eles viajarem devido aos muitos controlos e ao muro de separação”.
Durante as celebrações da Páscoa de 2010, as autoridades israelitas limitaram o número de
autorizações para a Margem Ocidental e para os cristãos de Gaza que quisessem viajar para
Jerusalém. O P. Raed Abousahlia, pároco católico de Taybeh (Margem Ocidental) declarou que
apenas conseguiu 200 autorizações para os membros da sua congregação, três vezes menos
do que em anos precedentes. Em Ramallah, o Bispo ortodoxo grego, Monsenhor Atallah
Hanna, declarou que a atitude de Israel mostra um desejo “de violar a liberdade religiosa”.
Para ele, “Jerusalém tem de permanecer uma cidade aberta para todos os Cristãos”. Para
Yusef Daher, um membro do Conselho Mundial de Igrejas, “os Israelitas estão a pôr em causa
a tradição da liberdade religiosa dos últimos 900 anos; estão a ridicularizar o status quo de
1852”, que regula as relações no Santo Sepulcro entre Ortodoxos, Latinos e Arménios.
Num relatório intitulado “Um momento de verdade” (Kairos Palestine), publicado no dia
11 de Dezembro de 2009 pelo Conselho Mundial de Igrejas, dezasseis teólogos palestinos,
incluindo o Monsenhor Michel Sabbah, o patriarca emérito dos Latinos, alertaram os líderes políticos palestinianos e israelitas, a comunidade internacional e os Cristãos de todo o
mundo, para a urgência de uma paz justa.
Nesse relatório defendem o direito à liberdade religiosa para todos. “Tentar fazer do Estado
um Estado religioso, judeu ou islâmico, sufoca o Estado, confina-o a estreitos limites e transforma-o num Estado que pratica a discriminação e a exclusão, dando preferência a um cidadão sobre o outro. Apelamos tanto a judeus como a muçulmanos religiosos para que deixem
o Estado ser um Estado para todos os seus cidadãos, com uma visão construída sobre o respeito pela religião, mas também sobre a igualdade, a justiça, a liberdade e o respeito pelo
pluralismo, e não sobre o domínio de uma religião ou de uma maioria numérica”.
305
PAQUiSTÃO
PAQUiSTÃO
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos96,2%
Cristãos2,2%
Outros1,6%
Cristãos
3.906.250
Católicos
1.098.000
Circunscrições
eclesiásticas
7
SUPERFÍCIE
796.095km2
POPULAÇÃO
184.753.000
REFUGIADOS
1.740.711
DESALOJADOS
1.230.000
306
A República Islâmica do Paquistão declara que é oficialmente um país
secular. A Constituição aprovada depois da partição da Índia e várias
leis recentes nacionais reiteram a igualdade dos cidadãos aos olhos
da Lei “sem distinção com base na raça ou no credo”. Com a excepção da Liga Muçulmana, de Mawaz Sharif, todos os partidos políticos proclamam a importância da imparcialidade religiosa. O Partido
Popular, conduzido por Asif Ali Zardari, o viúvo de Benazir Bhutto, e
o presidente actual do país, pediu frequentemente aos cidadãos
“tolerância religiosa” e “respeito” como tem feito a Liga Muçulmana
“Q”, dirigida pelo anterior presidente, general Parvez Musharraf. Mas
como provam os relatos de notícias e algumas leis discriminatórias,
trata-se simplesmente de uma fachada. A lei contra a blasfémia e as
Ordenações Hudood, dois instrumentos judiciais terríveis em vigor
no país há décadas, causaram e continuam a causar vítimas entre os
não muçulmanos e a minoria Ahmadi, por entre a simples indiferença
do Governo. A lei sobre a blasfémia é o pior instrumento de repressão religiosa existente no Paquistão; foi introduzida em 1986 pelo
ditador paquistanês Zia-ul-Haq para defender o Islão e o seu Profeta
Maomé de ofensas e insultos, e tornou-se agora um instrumento de
discriminação e de violência. Esta disposição está definida na Secção
295, Parágrafos B e C, do Código Penal paquistanês, e castiga com prisão perpétua todos aqueles que ofenderem o Corão. Também prevê
a pena de morte para aqueles que insultarem o Profeta Maomé. As
acusações contra os alegados blasfemos são frequentemente falsas
ou motivadas por interesses insignificantes que resultam em escândalos e incentivam multidões enfurecidas a infligir justiça por si próprios. Mesmo se um indivíduo for preso tendo por base as acusações
de uma só testemunha, o infeliz arrisca-se a ser alvo de violência e
de tortura infligidas pela polícia. Sob a pressão de multidões incitadas pelos mullahs locais, vários juízes impuseram a pena de morte
mesmo na ausência de qualquer evidência contra o acusado. Juntamente com as Ordenações Hudood, as regras rígidas do Direito Penal
que, baseadas no Corão, castigam até mesmo com açoitamentos e
apedrejamentos todo o comportamento que é incompatível com a
Lei Islâmica, como o adultério, o jogo ou a ingestão de álcool, esta lei
sobre a blasfémia constitui um exemplo de uma das formas de legislação mais sectárias e extremistas, além de preparar o caminho para
uma islamização radical do país.
De acordo com dados fornecidos pela Comissão Nacional da Igreja
Católica para a Justiça e a Paz (CNJP), entre 1986 e 2010, pelo menos
PAQUISTÃO
993 pessoas foram acusadas de ter profanado o Alcorão ou de caluniar o Profeta Maomé.
Entre elas 479 eram muçulmanos, 120 cristãos, 340 Ahmadis, catorze hindus e dez pessoas
que pertencem a outras religiões. Trata-se também de um pretexto para ataques, vingança
pessoal ou assassinatos extra-judiciais, trinta e três ao todo, perpetrados por indivíduos ou
multidões enfurecidas. De acordo com a CNJP, de 2001 até hoje, pelos menos cinquenta cristãos foram mortos usando a lei da blasfémia como pretexto. A estes temos de acrescentar
os pertencentes a outras minorias religiosas no país que foram vítimas de violência infligida
por extremistas muçulmanos, violência que, nalguns casos, também termina com ataques
a muçulmanos. A comunidade Ahmadi, uma confissão religiosa de inspiração muçulmana
que não reconhece Maomé como sendo o último profeta – e por esta razão é considerada
herética por sunitas e xiitas – declarou que, em 2009, pelo menos doze dos seus seguidores
foram mortos. Desde 1984, foram assassinados 107 Ahmadis e 719 foram presos.
O problema desta lei contra a blasfémia piorou de forma drástica em 2001, quando os sentimentos anti-Ocidente aumentarem no país, alcançando o seu ponto mais alto com a intervenção americana no Iraque e no Afeganistão. O Governo admite que falhou neste aspecto
e o ministro para os Direitos Humanos relatou no Parlamento que, nos últimos três anos,
ocorreram no Paquistão mais de onze mil casos de violações dos direitos humanos neste
contexto, sendo que oito mil de entre eles ainda se encontram pendentes e a aguardar julgamento. O ministro Syed Mumtaz Alam Gilani admitiu os resultados “desastrosos” alcançados
pelos governos das províncias em “levar os culpados perante a justiça”. Ao responder a uma
questão colocada por um deputado que pertence à Liga Muçulmana do Paquistão – Quaid
(PML-Q), o partido da oposição do país, ele explicou que “a pior situação é a que ocorre em
Sindh (província no Sudeste) onde apenas 783 pessoas consideradas culpadas foram castigadas em cerca de seis mil casos de violações dos direitos humanos.” Na província de Fronteira
do Noroeste (NWFP), uma zona que é palco de confrontos entre o exército e as milícias Talibãs, de entre duas mil violações, foram resolvidos apenas 730 casos. O Punjab reportou que
foram iniciados 2131 processos e 814 destes resultaram em acções em tribunal. Finalmente,
no Baluchistão, os tribunais resolveram 305 casos de entre as 823 queixas apresentadas
por violações dos direitos humanos. Gilani especificou que o processo tinha sido resolvido
directamente pelos juízes e não devido a uma ordem do Ministério, o qual está a atravessar
problemas financeiros e depende de ajuda por parte de ONGs nacionais e internacionais. A
Igreja Católica, as confissões religiosas protestantes, as comunidades Ahmadi e várias ONGs
têm-se oposto, há já algum tempo, à lei sobre a blasfémia e a discriminação. Graças ao empenho demonstrado pela Comissão Nacional para a Justiça e a Paz, também a União Europeia
e a Administração norte-americana se insurgiram contra esta lei. No entanto, Islamabad
parece ser escrava dos extremistas e não parece desejar mudar a situação.
Ataques contra cristãos
No dia 30 de Junho de 2009, uma multidão de cerca de 600 muçulmanos atacou cerca de
100 residências cristãs em Bahmani, uma aldeia no distrito de Kasur, na província do Pun307
PAQUiSTÃO
jab. As notícias foram reportadas pela Comissão Nacional para a Justiça e a Paz (CNJP), uma
organização que pertence à Igreja Católica paquistanesa, declarando que os ataques tinham
causado danos graves às residências de cristãos e que objectos de valor e dinheiro tinham
também sido roubados. O clero na mesquita local incitara os habitantes muçulmanos da
aldeia à violência, acusando os cristãos de blasfémia. A CNJP informou que o que realmente
se encontrava por detrás destes ataques foi um evento que teve lugar alguns dias antes.
Irfan Barkat, um membro da Comissão, disse à AsiaNews que os confrontos tinham começado na segunda-feira, 29 de Junho, depois de uma briga entre um homem cristão e um
menino muçulmano. O menino muçulmano, Muhammad Riaz, estava a andar de bicicleta
quando encontrou pela frente Sardar Mashi, um cristão de 38 anos a conduzir um tractor.
Riaz colocou-se no caminho do tractor de Mashi e, quando o homem pediu permissão para
passar, o jovem muçulmano ficou aborrecido. A briga entre os dois foi a razão para o começo
dos confrontos, de acordo com fontes locais, quando Riaz recorreu ao líder muçulmano da
aldeia, o qual sugeriu que ele deveria acusar o homem de blasfémia.
No dia 1 de Julho de 2009, Imran Masih, um jovem cristão de Hajwary (um distrito em Faisalabad) foi torturado e mais tarde considerado culpado de blasfémia. O P. Yaqub Yousaf, da
paróquia de Hajwary, confirmou à AsiaNews que as acusações “eram totalmente inventadas”
e que as razões para o confronto tiveram originalmente que ver com “negócios”. A loja propriedade da família do jovem cristão encontrava-se na realidade situada numa localização
favorável e desfrutava de um rendimento melhor que outras na zona. Com receio de ataques
adicionais por parte de extremistas, os familiares de Masih fugiram para se esconderem num
local secreto. “Imran estava a limpar a sua loja de frutas e vegetais”, disse o P. Yaqub, “e depois
recolheu o papel usado e queimou-o na rua como é o costume naquela zona”. O dono de
uma loja vizinha acusou o jovem cristão de queimar páginas do Alcorão, atraindo a atenção
de outros muçulmanos. Pouco tempo depois, uma multidão começou a agredir e a torturar o
jovem, que apenas foi salvo pela intervenção da polícia. Um testemunho proporcionado por
outro muçulmano resultou na abertura de uma investigação sobre Masih. As notícias da sua
detenção espalharam-se por muitas mesquitas na cidade. A prisão na qual o cristão estava
detido foi atacada por milhares de extremistas enfurecidos pedindo a morte do jovem. A
multidão bloqueou as principais vias de acesso e incendiou pneus. No dia 18 de Janeiro de
2010, o tribunal em Faisalabad condenou-o a prisão perpétua.
Ainda em Julho, Rao Zafar Iqbal, um activista paquistanês, hindu e advogado de direitos
humanos, recebeu ameaças de morte por causa do seu trabalho em defesa das minorias.
As cartas vieram de Jan Nisaran-e-Nabuwat e de Aqeeda-e-Tahafuz-e-Kathme Nabuwat. O
activista reportou estas ocorrências à polícia, que se recusou a abrir uma investigação. Pouco
tempo depois, foi morto a tiro por um assassino contratado. No dia 4 de Agosto, o jornal diário Daily Pavel publicou uma coluna declarando a “legitimidade” do assassinato de Rao Zafar
Iqbal porque a sua morte “era um serviço ao Islão.”
No dia 1 de Agosto de 2009, uma multidão de muçulmanos pilhou e pegou fogo a setenta e
cinco casas de cristãos e incendiou duas igrejas na aldeia de Korian, no distrito de Toba Tek
308
PAQUiSTÃO
Singh, no Punjab. Este ataque foi despoletado por uma acusação de alegada blasfémia contra
Mukhtar Masih, Talib Masih e o seu filho Imran Maseeh. Os três tinham alegadamente profanado o Alcorão durante uma cerimónia de casamento.
De acordo com fontes locais, os atacantes vieram de uma aldeia perto de Korian. No dia 30 de
Julho, atacaram as casas dos cristãos, enquanto um grupo tentou organizar uma espécie de
julgamento público para obrigar Talib Masih a pedir desculpa pelo gesto de que era acusado.
A multidão bloqueou depois a estrada que une Faisalabad a Gojra e a entrada para os quartéis do Corpo de Bombeiros, obstruindo os socorros e impedindo qualquer hipótese de apagar os fogos. No decurso destes confrontos, oito pessoas, entre as quais quatro mulheres e
uma criança de sete anos, foram queimadas vivas, e vinte outras ficaram feridas. Pelo menos
cinquenta casas de cristãos foram queimadas e destruídas e milhares de crentes fugiram
para evitar serem executados. Os familiares das vítimas recusaram-se a cuidar dos corpos
das vítimas e não irão realizar os serviços fúnebres até os culpados serem presos. Alguns
daqueles mortos foram identificados como sendo: Hamed Masih, de 50 anos; Asia Bibi, de
20 anos; Asifa Bibi, de 19 anos; Imamia Bibi, de 22 anos; Musa, de 7 anos; Akhlas Masih, de 40
anos; e Parveen, de 50 anos.
No dia 15 de Setembro de 2009, um jovem cristão, detido três dias antes numa aldeia no
Punjab e acusado de blasfémia, foi morto na prisão. Os investigadores tinham acabado de
confirmar que Fanish, de vinte anos de idade, iria permanecer na prisão até as investigações
terminarem. Pela manhã, os guardas prisionais da prisão distrital de Sialkot descobriram o
corpo inanimado do jovem, que tinha sinais evidentes de ferimentos. “Trata-se de assassínio
legalizado “, afirmou Nadeem Anthony, um membro da Comissão de Direitos Humanos do
Paquistão (HRCP). Condenando “sem margem para dúvidas” mais um caso de violência contra cristãos, de entre um número infindável, o activista explicou à AsiaNews que “a polícia
fala de suicídio, dizendo que ele se enforcou na prisão, mas isso não faz sentido nenhum.”
Nadeem acrescentou que o jovem tinha “sido torturado e como consequência morrera”. Ele
disse também que havia “sinais visíveis de agressões e feridas no corpo, como provam as
fotografias.” Fanish tinha sido preso no dia 12 de Setembro e acusado de blasfémia. No dia
anterior, uma multidão de muçulmanos reunira-se ao redor da igreja da aldeia em Jaithikey,
não muito longe da cidade de Samberial, no distrito de Sialkot (Punjab), para “dar” à comunidade cristã “uma lição”. Os extremistas começaram por danificar o edifício e depois atearam
fogo ao mesmo, pilhando também duas casas situadas perto da igreja.
No dia 22 de Janeiro de 2010, uma menina cristã de doze anos morreu devido a violência
infligida pelo seu empregador, um advogado muçulmano rico e poderoso de Lahore. A sua
morte despoletou protestos por parte da comunidade cristã, a qual organizou uma manifestação de protesto à porta do gabinete do governador da província do Punjab. As autoridades
tentaram acalmar as pessoas e prometeram que seria feita justiça. O presidente paquistanês,
Zardari, prometeu a devida indemnização à família. A ONG protestante Sharing Life Ministry
Pakistan (SLMP), informou que Shazia Bashir, de 12 anos de idade, trabalhava há oito meses
como empregada na casa de Chaudhry Muhammad Naeem, advogado e o presidente da
309
PAQUiSTÃO
Ordem dos Advogados de Lahore. Fontes cristãs acrescentaram que a menina sofrera assédio
contínuo e que tinha sido violada e torturada antes de ser morta. O patrão da menina foi
preso mas, no dia 13 de Fevereiro, o juiz adjunto do tribunal em Lahore, Shafiq-ur-Rehman,
libertou-o sob fiança. O advogado do indivíduo afirmou que a autópsia efectuada no corpo
da menina “não mostrou nenhum sinal que indicasse que ela tinha sido assassinada.” Pelo
contrário, o relatório declarou que a morte dela foi causada por uma infecção que surgiu
em feridas previamente existentes. Ele acrescentou também que não se tratava de um caso
de assassinato e que a polícia, após duas semanas de investigações, não tinha encontrado
nenhuma evidência que indicasse que Muhammad Naeem ou qualquer membro da sua
família fosse culpado. A comunidade cristã opôs-se a esta decisão, mas em vão. Durante as
duas semanas de audições, os advogados cristãos e aqueles que tentaram representar juridicamente a família da vítima, foram ameaçados e intimidados. Os activistas apontaram além
disso as semelhanças, raiando a conivência, no testemunho dos advogados, da polícia, dos
juízes e do Governo durante a tentativa (bem sucedida) para enterrar o caso.
No início de Fevereiro de 2010, Riaz Masih, um cristão de 26 anos de Kallur Kot, uma vila no
Punjab, foi brutalmente espancado pelos seus irmãos porque se recusou a converter-se ao
Islão. Os pais de Riaz Masih, ambos cristãos, morreram quando ele era pequeno. Juntamente
com os seus irmãos, ele tinha sido criado pelo imã local, Moulvi Peer Akram-Ullah. O líder
muçulmano tinha tentado frequentemente, em vão, converter o menino ao Islão. No dia 8 de
Fevereiro, indivíduos não identificados pilharam a sua casa em Kallur Kot, uma pequena vila
no Punjab, 233 km a sudoeste de Islamabad, a capital. “Eles ameaçaram-me”, disse o menino,
“dizendo que estava num ponto sem retorno: ou me convertia ao Islão ou morria.” De acordo
com o relatório do jovem, os seus irmãos pressionaram-no dizendo que “matar um infiel não
é pecado” e, pelo contrário, que tal é “completamente acertado em nome de Deus Todo-Poderoso”. Anteriormente, o Imã Akram-Ullah e os seus irmãos tinham-lhe oferecido um milhão
de rupias (cerca de 8600 euros), uma esposa à sua escolha e uma casa, se ele adoptasse o
Islão. Foi desta maneira que o imã persuadira os seus irmãos a se converterem e a adoptarem
a visão mais extremista do Islão. Mas o jovem cristão recusara-se a ceder ante a lisonja e por
isso acabou por passar seis meses no hospital.
No dia 25 de Fevereiro de 2010, Qamar David, um cristão acusado de blasfémia, foi condenado a prisão perpétua. A sentença baseou-se no facto de que o homem tinha alegadamente “ofendido os sentimentos” dos muçulmanos enquanto o seu co-acusado foi absolvido
por falta de provas. A polícia prendera o homem em 2006, embora não existisse nenhuma
evidência real contra ele. O juiz adjunto para o tribunal distrital de Karachi julgou o cristão culpado porque ele usara “palavras blasfemas” sobre o Profeta Maomé e o Alcorão. De
acordo com o jornal diário paquistanês Dawn, o juiz proferira a sentença depois de ouvir os
argumentos da defesa e a alocução final do delegado do Ministério Público. No veredicto
de culpado, pode ler-se que Qamar David possuía um cartão SIM de telemóvel, o qual utilizara para enviar mensagens de texto alegadamente consideradas ofensivas para o Islão. As
provas foram reunidas graças à cooperação da companhia de telefones que, de acordo com
310
PAQUiSTÃO
o delegado do Ministério Público, apresentou as listas relativas ao número de telefone que
pertencia ao cristão. Uma pessoa próxima do réu afirmou que os factos, a evidência e a lei
estavam, pelo contrário, todos a favor dele. As provas recolhidas, realçou, eram resultado de
boatos, e um co-réu muçulmano acusado da mesma ofensa foi completamente absolvido.
No dia 2 de Março de 2010, o tribunal em Kasur, no Punjab, condenou a vinte e cinco anos de
prisão por blasfémia o casal cristão Munir Masih e Ruqqiya Bibi. O juiz adjunto Ajmal Hussain condenou o casal porque eles alegadamente tocaram no Alcorão sem terem lavado as
mãos. No passado mês de Janeiro, Munir Masih e Ruqqiya Bibi foram libertados sob fiança
e deixaram a prisão. Algumas semanas mais tarde, a polícia voltou a prendê-los com base
na condenação do juiz. O homem encontra-se detido na prisão distrital de Kasur e a mulher
está na prisão feminina em Multan. Irão passar os próximos vinte e cinco anos atrás das
grades. Activistas da CLAAS, uma organização que luta para defender os direitos dos mais
pobres e dos mais alienados, informaram que marido e mulher foram acusados de ter “contaminado” o Alcorão depois de nele tocarem sem terem lavado as mãos. O incidente ocorreu
em Dezembro de 2008 e incitou a raiva dos extremistas, os quais exerceram pressão sobre
as forças policiais. Fontes não confirmadas acrescentaram que os extremistas alegadamente
subornaram a polícia com dinheiro para assim conseguirem descobrir “elementos novos”
para justificar a sentença. Depois de as investigações serem concluídas, o casal foi acusado
de blasfémia.
No dia 11 de Março de 2010, uma menina cristã morreu depois de ser violada e queimada
viva pelo filho do muçulmano para quem trabalhava como empregada. A jovem morreu no
hospital depois de dois dias de agonia causada pelas queimaduras que cobriam 80% do seu
corpo. Kiran George trabalhava para uma família muçulmana em Sheikhupura, uma cidade
no Punjab. A jovem morreu no Hospital de Mayo, em Lahore, onde tinha estado hospitalizada
no dia 9 de Março em estado extremamente grave. A raiva assassina do filho do seu patrão
foi despoletada pela ameaça de ser denunciado à polícia por violar a menina. Mohammad
Ahmda Raza alegadamente violara a menina cristã, a qual inicialmente apenas contara aos
amigos, uma vez que temia perder o emprego. As condições de pobreza extrema experimentadas pela família induziram a menina a permanecer em silêncio. Mas quando Kiran George
ameaçou o seu agressor de que contaria tudo à polícia, o jovem fechou-a dentro de casa para
a impedir de fugir, cobriu-a com combustível, com ajuda da sua irmã, e ateou-lhe fogo. Em
vez de levar a menina para o hospital, o patrão muçulmano telefonou aos pais dela e contoulhes que as roupas dela tinha pegado fogo enquanto ela estava a limpar a cozinha.
No dia 19 de Março de 2010, um grupo de extremistas islâmicos queimou vivo Arshed Masih,
motorista empregado por um homem de negócios muçulmano rico de Rawalpindi. A sua
esposa trabalhava como empregada na mesma propriedade, situada em frente a uma esquadra de polícia. Recentemente tinham ocorrido discussões entre o casal e o seu patrão, Xeique
Mohammad Sultan, devido à sua fé cristã. O casal tinha sido ameaçado e intimidado como
forma de ser forçado a converter-se ao Islão. Arshed Masih morreu após três dias de dor e
agonia no Holy Family Hospital em Rawalpindi, na província do Punjab. A sua mulher Martha
311
PAQUiSTÃO
Arshed foi violada pelo polícia a quem tentou informar sobre a violência infligida ao seu
marido. Os três filhos do casal, com idades compreendidas entre os 7 e os 12 anos, foram forçados a assistir à tortura infligida aos seus pais. Desde 2005 que Arshed Masih e a sua esposa
trabalhavam e viviam na propriedade do Xeique Mohammad Sultan. Nos últimos tempos, a
pressão para abandonarem o Cristianismo e converterem-se ao Islão tinha sido incessante e
o patrão tinha mesmo ameaçado com “consequências terríveis” para os persuadir a renegar
a sua fé. O casal também tinha sido acusado de um recente roubo na casa do homem e ele
prometera retirar as acusações se eles se convertessem.
Em 19 de Julho de 2010, Rashid Emmanuel e Sajid Masih Emmanuel, dois irmãos cristãos que
estavam a ser julgados depois de serem acusados de blasfémia, foram mortos a tiro à saída
do tribunal. Um grupo de assassinos não identificados atacou-os à saída do tribunal Faisalabad, no Punjab. Ambos os homens estavam algemados, uma vez que estava previsto regressarem ao tribunal no final da audiência. Nos dias que antecederam o assassinato, a comunidade cristã na cidade tinha feito soar o alarme, temendo novos ataques. Os muçulmanos
tinham organizado uma marcha de protesto exigindo a pena de morte para os dois homens.
O crime foi cometido no exterior do tribunal em Faisalabad, onde tinha acabado de decorrer
uma audiência para Rashid e Sajid Masih, ambos acusados de blasfémia, tratando-se de uma
verdadeira execução planeada. Os dois homens estavam algemados e provaram ser um alvo
fácil para os extremistas. Um polícia também ficou ferido neste ataque. Durante vários dias,
a comunidade muçulmana da cidade, incitada pelos imãs, tinha protestado e pedido que os
irmãos fossem condenados à morte. Tinham sido detidos um mês antes, depois de vários
folhetos “blasfemos”, profanando a memória de Maomé, terem sido encontrados alegadamente com os seus nomes neles escritos. De acordo com fontes locais, a polícia estava a
ponto de absolver ambos os homens das acusações de blasfémia, porque testes grafológicos
realizados às assinaturas nos folhetos revelaram que estas não correspondiam à letra dos
dois irmãos. Shahbaz Bhatti, ministro das Minorias, falou de falsas acusações contra cristãos,
cuidadosamente elaboradas por pessoas com queixas pessoais contra os dois irmãos, um
dos quais era um pastor protestante. Também a família sempre defendera a sua inocência.
Ataques contra os Ahmadis
A perseguição contra a comunidade Ahmadi continua a acontecer no Paquistão. Esta escola
de pensamento é considerada herética porque não reconhece Maomé como sendo o último
profeta. No dia 1 de Abril de 2010, três proprietários de lojas foram mortos a tiro em Faisalabad, a terceira cidade mais importante no Punjab. Os líderes das comunidades Ahmadiyya
reportaram os assassinatos, falando de uma “execução direccionada”, no seguimento da qual
os assassinos armados fugiram e desapareceram. Ashraf Pervez, de 60 anos, Masood Javed,
de 57 anos, e Asif Masood, de 24 anos, regressavam a casa no seu carro depois de fecharem a
loja. De repente os atacantes alcançaram-nos e alvejaram-nos. Os três homens morreram a
caminho do hospital. Pervez e Javed eram irmãos, enquanto Masood era filho de Javed. O jornal diário paquistanês Dawn reportou que duas semanas antes de serem mortas, as vítimas
312
PAQUiSTÃO
tinham informado a polícia de que tinham sido ameaçadas. Os polícias aconselharam-nos
a “restringir os movimentos e contratar guarda-costas” para assegurarem a sua segurança.
De acordo com relatórios dos líderes da comunidade Ahmadiyya, os homens tinham sido
recentemente sequestrados e mais tarde libertados mediante o pagamento de um avultado
resgate. Os criminosos tinham aparentemente dito às vítimas que tinham sido sequestrados
por causa das suas convicções religiosas. O comunicado oficial (da comunidade Ahmadiyya)
continua, dizendo que “é razoável partir do princípio que os criminosos, ou pelo menos os
seus cúmplices, são conhecido das autoridades, porque os grupos que estão contra os Ahmadis não fazem nenhum esforço para esconder o seu ódio.” De algum tempo para cá, Faisalabad tem sido palco de ataques dirigidos à comunidade Ahmadiyya. Foram mortas nove
pessoas nos últimos anos, sem que a polícia ou as autoridades governamentais interviessem,
isto apesar de conhecerem os responsáveis. Líderes da comunidade culpam o movimento
Khatme Nabuwwat, muçulmanos que acreditam que a profecia foi totalmente cumprida
com Maomé e que são responsáveis por perseguições contra aqueles que consideram ser
muçulmanos “heréticos”. No Punjab, os promotores da lei islâmica podem fomentar a violência contra os Ahmadis e permanecer impunes, declarando que “eles deveriam ser mortos” (Wajib ul Qatl). Os líderes do movimento reportaram a indiferença das autoridades, as
quais, além de não castigarem os responsáveis, nem sequer se pronunciam contra a violência. Desde a promulgação do Regulamento Anti-Ahmadiyya, em 1984, que sanciona perseguições contra alegados “hereges”, foram mortas 108 pessoas por causa das suas convicções
religiosas. Em muito poucos casos se assistiu à prisão dos assassinos e, na ocasião rara em
que eles compareceram em tribunal, foram absolvidos ou libertados depois de um curto período curto na prisão.
No dia 28 de Maio de 2010, um duplo ataque a mesquitas Ahmadi em Lahore, durante as orações de sexta-feira, matou pelo menos noventa e três pessoas. Um dos líderes do movimento,
Raja Ghalab Ahmad, especificou que noventa e três pessoas morreram neste massacre, no
seguimento da morte de treze pessoas que tinham sido hospitalizadas. Pelo menos uma
centena de pessoas ficou ferida e algumas de modo bastante grave. Durante as orações de
sexta-feira, um grupo de homens armados e bombistas suicidas atacara as duas mesquitas
Ahmadi. Estes locais de culto estão situados, um numa parte rica da Cidade Modelo, e o outro
na movimentada zona de Garhi Shahu. O “grupo terrorista armado e bem treinado tinha
AK-47s, pistolas, granadas e usava coletes cheios de explosivos. Abriram fogo indiscriminadamente sobre a multidão, ocupando a mesquita durante várias horas e detendo os crentes
como reféns. Quando a polícia decidiu invadir a mesquita, os extremistas fizeram-se explodir,
causando assim ainda maior carnificina. Os polícias recuperaram o controlo da zona cerca das
cinco da tarde. Por seu lado, o ataque na mesquita da Cidade Modelo foi mais rápido. Quatro
terroristas abriram fogo sobre os crentes e lançaram granadas de mão. Uma testemunha
ocular disse que “era como estar numa guerra. Tudo o que eu podia fazer era rezar para que
Deus me salvasse daquele inferno”. De acordo com os investigadores, os Talibãs tinham sido
auxiliados por “cúmplices” que conseguiram escapar entrosando-se com a multidão.
313
PAQUiSTÃO
Discriminação também contra Siques e Hindus
A violência religiosa não afecta apenas os cristãos (considerados “ocidentais”) ou os “hereges”
Ahmadis. No decurso do último ano, os Talibãs da Província de Fronteira do Noroeste (NWFP)
começaram também a ameaçar os hindus e os siques, fazendo-lhes um ultimato. Eles têm de
deixar a região ou pagar a jizya, um imposto de protecção islâmico para as minorias religiosas. Muitas famílias hindus e siques foram obrigadas a abandonar a província, procurando
refúgio em Peshawar e noutras zonas vizinhas. As ameaças contra os siques e os hindus são
apenas as últimas numa série dirigida a grupos religiosos minoritários na NWFP, entre os
quais muitos cristãos obrigados a pagar a jizya e depois a viver sob a lei da Sharia. “Vivemos
com medo” disse um líder sique a um jornalista do Daily Times, um dos jornais mais importantes do país. “Temos medo dos Talibãs, do Laskhar-e-Islam e de todos os outros grupos
armados.” Cerca de 400 famílias siques e cinquenta e sete famílias hindus já deixaram as
cidades de Bara e Tirah, onde vendiam materiais, roupas, mercearias e medicamentos tradicionais. O líder sique afirmou também que “Vários grupos militantes ameaçaram as minorias
em Orakzai e Khyber, dizendo-lhes que se convertessem ou seria melhor deixar a região. Com
efeito, eles gerem um Governo paralelo. Os hindus e os siques já não se sentem seguros em
Orakzai, em Bara ou em Tirah. Decidimos migrar; pelo menos aqui podemos experimentar
um pouco de paz e sentirmo-nos seguros.” Na região de Orakzai, os Talibãs exigem o pagamento do imposto por parte de adultos siques do sexo masculino, ocupando as suas lojas e
as suas casas. Nos últimos dois meses, este imposto espalhou-se também à zona de Khyber,
a região tribal que cria uma ligação natural com o Afeganistão. Aqui o grupo Lashkar-e-Islam,
conduzido por Manghal Bagh, anunciou que os hindus e os siques serão autorizados a viver
naquela zona apenas se pagarem a jizya. Mas as ameaças continuam a aumentar e, por esta
razão, centenas de famílias que pertencem a estas minorias religiosas fugiram para áreas
vizinhas, principalmente para Peshawar. O Lashkar-e-Islam opera de modo semelhante aos
Talibãs, agindo como uma espécie de polícia religiosa, obrigando as pessoas a rezar cinco
vezes por dia e castigando violentamente aqueles que são acusados de prostituição ou de
outros vícios. A nenhuma mulher, muçulmana ou não, é permitido sair sozinha, tendo de
ser acompanhada por um familiar do sexo masculino. Todas as mulheres, mesmo as idosas,
têm de usar a burqa. É agora obrigatório para os homens deixarem crescer uma barba e
usarem um chapéu. Os que se recusam a fazê-lo são agredidos ou obrigados a pagar uma
multa de entre 200 e 500 rupias. A lei da Sharia foi imposta à maioria da população da NWFP
(na região de Malacan) devido a um acordo entre os Talibãs e o Governo regional, apoiado
também pelo Governo central. Islamabad quebrou depois o acordo, lançando uma ofensiva
contra os Talibãs, mas o Governo regional continua a ser a favor da imposição da lei da Sharia
a toda a população. A Igreja Católica já se manifestou frequentemente contra esta obrigação
de tornar os grupos não muçulmanos sujeitos à Lei da Sharia, uma vez que se trata de uma
violência contra os grupos minoritários, cuja liberdade é defendida pela Constituição do país.
314
Os ataques também afectam os meios de comunicação
PAQUiSTÃO
No Paquistão, as acusações de blasfémia foram também dirigidas à Internet, a qual se encontra agora “sob observação” por parte das autoridades. Por entre os sítios da Internet que arriscam a censura encontram-se sítios secundários e outros mais importantes, como o Google,
o YouTube, o Yahoo!, a Amazon, o Bing, o Msn e o Hotmail, todos acusados de conter material
que ofende os povos muçulmanos e a sua religião. No seguimento de instruções recebidas do
Ministério da Informação e da Tecnologia, o porta-voz da Autoridade das Telecomunicações
paquistanesa, Khurram Mehran, anunciou, no dia 26 de Junho de 2010, que, no seguimento
de uma sentença dos tribunais em Bahawalpur, ele tinha ordenado o bloqueio do YouTube e
de oito outros sítios da Internet, respondendo assim a uma petição que se referia à presença
de materiais que vão “contra os princípios fundamentais do Islão.” “Se ligações e materiais
ofensivos para o Islão continuarem a aparecer nestes sítios da Internet, serão bloqueados
sem que tal, no entanto, perturbe o normal funcionamento dos sítios da Internet “, explicou Mehran. O Governo paquistanês declara que os sítios da Internet controlados por motivos de segurança nacional e assegura que nenhum dos principais motores de pesquisa será
censurado. Estas foram palavras que, no entanto, não sossegaram os responsáveis por estes
colossos da Internet. O porta-voz do Google, Scott Rubin, disse que, “o Google e o YouTube
são plataformas para a livre expressão e nós continuaremos a garantir a implementação das
nossas políticas tanto quanto nos for possível.” O Yahoo também reiterou que a empresa
está “assente no princípio de que o livre acesso à informação melhora a vida das pessoas.”
De momento, foram bloqueados cerca de dezassete endereços da Internet devido a “ligações
e conteúdos anti-islâmicos e blasfemos”. Entre os sítios da Internet bloqueados contam-se o
islamexposed.blogspot.com, um blogue criado através do Google que contém uma petição
anti-Islão online e um post intitulado “Islão, a derradeira hipocrisia”. No passado Maio, o Tribunal Superior ordenara que a rede social Facebook fosse encerrada durante duas semanas,
devido a publicação de uma caricatura blasfema sobre Maomé. A proibição foi levantada
depois de protestos por parte de centenas de jovens muçulmanos que usam a rede social. As
referências jurídicas citadas pelo Governo e pelo Tribunal Superior para justificar esta censura foram as das denominadas “leis sobre a blasfémia”.
315
QUiRGUiZiSTÃO
QUiRGUiZiSTÃO
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos69,6%
Agnósticos23,3%
Cristãos6,1%
Outros1%
Cristãos
539.760
Católicos
1.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
199.900km2
POPULAÇÃO
5.550.000
REFUGIADOS
423
DESALOJADOS
---
Emergindo das ruínas da União Soviética com um grande desejo de
embarcar num percurso democrático, o Quirguistão usufruiu de um
período de abertura desconhecido até esta altura pelos seus países
vizinhos, e parecia ir na direcção de um caminho reformista. Porém,
durante este último ano, este caminho foi obstruído por problemas
económicos e uma significativa instabilidade política. A necessidade
de fortalecer as rédeas do Governo, seja devido ao crescente descontentamento (que culminou, em Abril de 2010, com uma insurreição popular que conduziu à destituição do presidente Bakiyev), seja
devido ao medo da expansão do extremismo islâmico, resultou numa
tomada de posição repressiva e autoritária, em detrimento dos direitos individuais (incluindo a liberdade de culto), não muito diferente
dos eventos que ocorreram durante mais ou menos na mesma altura
no Cazaquistão.
No dia 16 de Janeiro de 2009, entrou em vigor uma nova lei sobre
“A liberdade de consciência e as organizações religiosas na República
Quirguiz”, que é significativamente mais rígida que as anteriores
providências. Além disso, uma outra lei igualmente restritiva está a
ser delineada, desta vez sobre a questão da educação religiosa e das
escolas.
No Relatório da Freedom House de 2009 sobre a “Liberdade no
Mundo”, Arch Puddington declarou que, no início dos anos noventa,
o Quirguistão era considerado uma espécie de “Suíça da Ásia Central”, enquanto agora, “em conjunto com o Tajiquistão, o Uzbequistão
e outros países na região, está entre os menos liberais do mundo”.
Segundo a classificação publicada no relatório, o Quirguistão foi
transferido da categoria de “parcialmente livre” para a de “não livre”.
Em Março de 2009, a Organização para a Segurança e a Cooperação
na Europa (OSCE) expressou também a sua preocupação relativamente à tendência seguida neste país no que diz respeito aos direitos
humanos, tanto ao nível legislativo como prático, com um incremento
da censura e do controlo do Estado sobre a liberdade religiosa e a
liberdade de expressão.
O clima político e a mudança autoritária
O ano de 2009 assistiu à reeleição do presidente Bakiyev com um consenso quase unânime (cerca de 85% dos votos) num resultado eleitoral que foi fortemente contestado, com acusações de fraude eleitoral
e de outras irregularidades, e até mesmo a existência de pressões e de
intimidação contra os apoiantes da oposição.
316
Porém, em Abril de 2010, apenas alguns dias antes do quinto aniversário da Revolução das
Tulipas de 2005 que levou Bakiyev ao poder, o povo saiu à rua, exasperado pelo aumento do
custo de vida, pelo aumento do desemprego e pela corrupção disseminada, e pediu a demissão do presidente. A reacção do Governo, envolvendo a prisão de muitos líderes da oposição
e a morte trágica de quase uma centena de pessoas, acabou por precipitar uma situação
na qual Bakiyev foi destituído e substituído por um Governo provisório, conduzido por Roza
Otunbayeva, a líder da revolta organizada cinco anos antes e uma antiga ministra dos Negócios Estrangeiros que depois se juntou à oposição.
Um dos estados mais pobres da Ásia Central, o Quirguistão prepara-se para enfrentar um
período de grande instabilidade que está a ser seguido de perto pelas super-potências como
os EUA (que possui uma base militar no país), a Rússia e a China, ambas com significativos
interesses económicos e estratégicos no país. A incerteza política no Quirguistão, a pobreza
e a crescente posição autoritária adoptada pelo Governo estão, além disso, a causar muita
preocupação, também por causa do perigo do aumento da radicalização por parte dos extremistas islâmicos, pois movimentos como o Hizb-ut-Tahrir, uma espécie de partido ‘transversal’ (ou seja, global ou pan-islâmico) cujo objectivo é unir os países islâmicos num único
estado ou confederação de estados, regido pela Lei Islâmica, parece oferecer soluções mais
imediatas à necessidade de um sentido de identidade e de pertença que está presente entre
a população.
Uma nova política sobre assuntos religiosos
QUIRGUIZISTÃO
Em Outubro de 2009, o Governo publicou o esboço da sua estratégia política estatal no campo
da religião para o período de 2009-2015, cujo objectivo é a oposição “às ameaças internas e
externas ligadas à religião, ao crescimento dos movimentos religiosos radicais e aos conflitos
entre as diferentes religiões no Quirguistão”. O documento contempla a criação de um novo
centro de análise no seio da Comissão Estatal para os Assuntos Religiosos e a preparação de
uma lista de organizações religiosas que deveriam ser proibidas. Contempla também a introdução, a nível local, de comités de assuntos religiosos. Os missionários estrangeiros, refere o
documento, serão sujeitos a controlos anuais por parte da polícia secreta NSS e por parte de
outras agências governamentais, e aqueles que preguem “crenças destruidoras” terão de ser
impedidos de o fazerem. Será criada uma comissão para fiscalizar o pessoal, os currículos e os
edifícios das instituições educativas religiosas. Os imãs e os professores das entidades educativas islâmicas terão de obter uma certificação anual emitida pela Comissão Estatal para os
Assuntos Religiosos, por parte das administrações locais e do Conselho Islâmico.
Também em Outubro, através de decreto presidencial, a Agência Estatal para os Assuntos
Religiosos, controlada pelo Governo, foi transformada na Comissão Estatal para os Assuntos Religiosos (CEAR), directamente supervisionada pelo presidente. Kanybek Osmonaliev foi
confirmado como director desta comissão.
Na segunda metade de 2009, o Conselho Inter-Agências para os Assuntos Religiosos foi
transformado no Conselho Coordenado para o Combate ao Extremismo Religioso. O decreto
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QUIRGUIZISTÃO
que criou esta nova entidade, assinado no dia 5 de Agosto pelo primeiro-ministro Igor Chudinov, declara que o objectivo desta nova organização é o de “garantir a acção combinada e
coordenar as actividades das agências estatais e dos governos locais no Quirguistão para
impedir a disseminação do extremismo religioso, do fundamentalismo e de conflitos com
base religiosa”. O Secretariado do Conselho será dirigido pelos responsáveis pelo Conselho
para os Assuntos Religiosos, o vice-ministro do Interior e o vice-director dos Serviços de Segurança Nacional. Os outros membros do Conselho serão representantes dos Ministérios dos
Negócios Estrangeiros, da Defesa, da Cultura e da Economia, os presidentes das administrações regionais e representantes do Conselho Muçulmano e da Igreja Ortodoxa Russa. O
Conselho terá poderes de âmbito alargado, pois as decisões tomadas terão necessariamente
de ser executadas pelos ministérios, pelas comissões estatais, pelas unidades administrativas e outras autoridades executivas, assim como pelas administrações estatais locais e pelas
entidades autónomas locais.
A nova lei sobre a liberdade de consciência
No dia 16 de Janeiro de 2009, entrou em vigor uma nova lei sobre “A Liberdade de Consciência
e as Organizações Religiosas na República Quirguiz”, a qual é significativamente mais rígida
do que a lei anterior.
O Governo justificou esta tomada de posição juridicamente mais rígida citando a necessidade de controlar melhor os grupos marginais radicais islâmicos e enquanto medida antiterrorista. A nova lei irá, no entanto, criar muitos obstáculos à liberdade dos cristãos, tanto
em relação à possibilidade de professarem a sua fé, como no que diz respeito à possibilidade
de evangelizarem os seus compatriotas. Por outro lado, o aumento no número de Igrejas cristãs despoletara já anteriormente preocupações no Governo. Kanybek Osmanaliev, presidente
da Comissão Estatal para os Assuntos Religiosos, tinha de facto criticado a legislação excessivamente liberal que, segundo afirmou, resultara num aumento “anormal” no número de pessoas que abandonaram a sua própria fé, em particular muitos jovens cidadãos de etnia quirguiz que se aproximaram de Igrejas cristãs. Ele acusara também “vários grupos destrutivos
e totalitários e seitas reaccionárias”, entre as quais ele inseriu as comunidades mórmones e
Hare Krishna, de se dedicarem a actividades religiosas “ilegais”, e queixara-se da construção
e da abertura “descontrolada” de mesquitas, de igrejas e de outros lugares de culto.
A nova lei proíbe todas as actividades religiosas realizadas por grupos que não se tenham
registado junto das autoridades estatais competentes. Para estar oficialmente registado e
poder então funcionar legalmente, um grupo terá de apresentar um pedido para o reconhecimento juntamente com 200 assinaturas reconhecidas em notário de cidadãos quirguizes
que tenham residência permanente no país e que, além de indicarem o seu nome, apelido e
data de nascimento, terão também de indicar outros detalhes pessoais como o número de
passaporte, a morada de residência, o local de emprego e a respectiva função. Entre as razões
pelas quais um grupo religioso pode ver negada a autorização ou ter as suas actividades
suspensas ou banidas, estão a acusação de envolvimento em actividades consideradas como
318
QUIRGUIZISTÃO
fanatismo ou extremismo religioso, dar início a acções que possam causar ódio inter-religioso, incitamento a divisões familiares ou perseguição, pôr em perigo a segurança do Estado
ou a vida e a saúde de outros por recusar prestar assistência médica quando necessário. Uma
organização religiosa pode ainda ser encerrada se não apresentar toda a informação exigida
à Comissão para os Assuntos Religiosos dentro do prazo especificado.
A nova lei impõe novos fardos burocráticos às organizações religiosas, as quais, em alguns
casos, terão de se voltar a registar e voltar a ser aprovadas – um facto que fará com que as
comunidades mais pequenas, com menos de duzentos membros locais, passem a ser consideradas ilegais e “clandestinas”.
De acordo com os novos regulamentos, a distribuição de todo e qualquer tipo de material
religioso apenas pode agora acontecer no seio de instalações que sejam propriedade legal
da organização religiosa, ou em locais designados para tais actividades pelas autoridades
locais. O trabalho missionário ilegal é igualmente proibido, assim como o são todas as acções
“agressivas” (uma palavra que não é definida de forma adequada nesta lei) com a intenção
de proselitismo. Esta última proibição poderá vir a ter impacto nas actividades de beneficência, um receio que é partilhado pelo P. Damian Wojciechowski, da Paróquia católica da Beata
Madre Teresa, em Jalalabad, no Sul do Quirguistão. Na realidade, a lei proíbe “actividades
persistentes com o objectivo de converter os seguidores de uma fé para outra”. Orkunbaev
Shailibek, secretário da Comissão Estatal para os Assuntos Religiosos em Bishkek, explicou
que por “actividades persistentes” a lei refere-se, por exemplo, ao “uso, por parte de qualquer
organização religiosa, de meios financeiros e obras de beneficência para encorajar as pessoas
a que se juntem a esta. A beneficência em geral não é proibida, mas é proibida enquanto
meio para alcançar objectivos pessoais”. Se um indivíduo que foi objecto de beneficência
decide por sua própria vontade converter-se à fé do benfeitor, “competirá aos tribunais decidirem se este indivíduo foi constrangido na sua escolha ou não”, concluiu Orkunbaev.
Além disso, a nova lei, adoptando as providências já contidas num decreto de 2008, requer
que todas as organizações educativas religiosas (universidades, escolas, madrassas, seminários, catequeses e orfanatos) solicitem registo junto do Estado. Estas instituições só podem
ser criadas através de organizações registadas e têm de ter autorização por parte das autoridades locais. Além disso, segundo a nova legislação, é indicado também que as crianças
já não podem estar activamente envolvidas em organizações religiosas, com consequências
inevitáveis para eventos como os acampamentos de Verão ou catequese, que são organizados com frequência por grupos religiosos.
A nova lei estabelece que, se uma comunidade possui centros administrativos “fora do Quirguistão, ou cidadãos estrangeiros na sua administração”, deve ser classificada como uma
“missão” com a obrigação de realizar um novo registo todos os anos, e sem nunca poder
obter o estatuto legal.
Os trabalhadores religiosos estrangeiros têm de se registar na Comissão Estatal antes de lhes
ser permitido ocuparem-se em qualquer actividade religiosa. Adicionalmente, e conforme
319
QUIRGUIZISTÃO
estabelecido pelo Artigo 12º.3, não será permitido aos missionários estrangeiros trabalhar no
país por mais de três anos.
Tanto durante a sua passagem pela legislatura, como imediatamente a seguir à sua aprovação, esta lei deu origem a muita perplexidade e críticas por parte de um grande número de
grupos religiosos e de organizações para a defesa dos direitos humanos.
A OSCE, em conjunto com a Comissão de Veneza do Conselho da Europa, apontou as várias
violações da liberdade religiosa existentes na nova lei, incluindo o carácter vago de muitas
das suas disposições, que podem dar origem a abusos e discriminação por parte das autoridades envolvidas; as exigências bastante discriminatórias para o registo; a falta de garantias
adequadas para a liberdade religiosa dos cidadãos estrangeiros e a interferência na necessária autonomia dos grupos religiosos.
De igual modo, o Papa Bento XVI, no dia 8 de Janeiro de 2009 na sua tradicional saudação de
Ano Novo aos membros do corpo diplomático credenciado na Santa Sé, instou as autoridades
civis e políticas a estarem “activamente empenhadas em pôr fim à intolerância e aos actos de
provocação contra os Cristãos”, referindo com particular preocupação as novas leis referentes
a estas questões provenientes das repúblicas da Ásia Central. A Igreja, reiterou, “não exige
privilégios, mas sim a aplicação total do princípio da liberdade religiosa. (...) As comunidades
cristãs que vivem na Ásia são frequentemente pequenas, contudo desejam contribuir, de um
modo convincente e eficaz, para o bem comum, para a estabilidade e o progresso dos seus
países, enquanto são testemunhas da primazia de Deus que define uma saudável ordem de
valores e concede uma liberdade mais poderosa do que actos de injustiça (...) Nesta perspectiva, é importante que, na Ásia Central, a legislação relativa às comunidades religiosas
garanta o exercício total deste direito fundamental, respeitando as normas internacionais”.
Falando sobre esta nova lei, o Bispo Nikolaus Messmer, administrador apostólico do Quirguistão, expressou-se de maneira descontraída. “A Igreja Católica não é afectada, pois somos já
amplamente reconhecidos e temos mais de 200 crentes. É claro que o número de católicos
continua muito pequeno. Existe menos de um milhar no país inteiro e a maioria dos crentes é
de origem polaca ou alemã. Porém, não temos nenhum problema com as autoridades civis”.
A pequena comunidade católica do país “continua no seu caminho, proporcionando acima de
tudo orientação espiritual e cuidado pastoral aos nossos crentes”. Alguns problemas foram
porém relevados pelo Bispo Messmer relativamente à aprovação de vistos para os missionários, “que têm de ser renovados de seis em seis meses”. O bispo expressou por isso a esperança de que o novo Governo fizesse as mudanças necessárias, garantindo maior liberdade
aos missionários e solucionando os problemas e dificuldades encontrados na obtenção dos
vistos. Este problema é de facto muito real para a comunidade católica, uma vez que existem
apenas dois padres quirguizes sendo todos os outros estrangeiros.
A situação é, porém, mais difícil para outros grupos religiosos menos numerosos, incluindo
algumas Igrejas protestantes e grupos de testemunhas de Jeová, para os quais é extremamente difícil, se não mesmo impossível, satisfazer a exigência mínima de 200 membros fundadores para todas as congregações.
320
QUIRGUIZISTÃO
Algumas comunidades protestantes interpuseram recursos contra esta nova lei no Tribunal
Constitucional, o qual, porém, em Julho de 2009, rejeitou os seus pedidos declarando que
“não havia nenhuma evidência de verdadeiras violações dos direitos constitucionais dos peticionários”.
Aleksandr Shumilin, da União Baptista, declarou que “todas as Igrejas Evangélicas no Quirguistão decidiram unanimemente não submeter o pedido para um novo registo e não registar novas congregações”. Tal aconteceu tanto porque estão contra a necessidade de fornecer
informação pessoal sobre 200 membros da comunidade, como devido à proibição que a nova
lei impõe às actividades evangélicas e missionárias.
Os obstáculos burocráticos criados ao registo levaram igualmente a que outras comunidades
desistissem de submeter pedidos. Alguns grupos religiosos tiveram problemas na obtenção
de uma licença de utilização para o edifício que usam para as suas reuniões, um documento
que tem de ser emitido pela Agência Estatal para a Arquitectura e os Edifícios. Para um grupo,
por exemplo, a emissão do certificado foi condicionada à instalação de um gerador eléctrico
extra, uma exigência que se revelou demasiado dispendiosa para a comunidade em questão.
Em alguns casos foi dito a comunidades religiosas que, com base nas instruções recebidas da
Comissão Estatal para os Assuntos Religiosos, um edifício será considerado apropriado se for
construído a pelo menos 1000 metros de distância de qualquer escola e a dez mil metros de
distância de qualquer mesquita.
Porém, embora o prazo final para o registo expirasse no dia 1 de Janeiro de 2010, até Abril
nenhum grupo tinha sido legalmente reconhecido pela Comissão Estatal para os Assuntos
Religiosos, porque as disposições para regular a aplicação da nova lei ainda não tinham sido
aprovadas.
O fim do Governo de Bakiyev trouxe uma nova esperança aos grupos religiosos que apelaram
ao novo Governo para a “restauração da liberdade religiosa, pelo menos para o nível que se
usufruía antes do presidente Bakiyev”.
A atenção permanece firmemente centrada nas iniciativas que o Governo provisório irá
tomar e este já expressou um grau de abertura para rever a lei, tornando-a menos restritiva.
Kanybek Imanaliyev, porta-voz do Governo interino liderado por Roza Otunbayeva, expressou
na realidade o seu desejo de se comprometer a garantir a liberdade de expressão e de religião, reformulando a constituição, as leis e, se necessário, também a lei sobre as religiões.
Além disso, depois das críticas generalizadas despoletadas pela lei depois da sua aprovação, o
próprio Bakiyev prometera mudá-la. Para o fazer, criara uma Comissão, composta por peritos
do seu gabinete, do Ministério da Justiça e da Comissão Estatal para os Assuntos Religiosos, em conjunto com representantes do Conselho Espiritual Muçulmano, da Igreja Ortodoxa
Russa, da Comunidade Judaica e da União Baptista, com o objectivo de analisar os três pontos mais controversos desta lei (o número mínimo de 200 membros exigido para criar uma
associação religiosa, a proibição do proselitismo e a proibição da distribuição de material
religioso em lugares públicos), para tentar solucionar alguns dos problemas causados por
321
QUIRGUIZISTÃO
eles, antes de implementar a própria lei. Porém, no final de 2009, o trabalho da Comissão não
produzira ainda qualquer resultado de natureza prática ou legislativa.
Embora as disposições que implementam a nova lei nova ainda não tenham entrado em
vigor, várias comunidades religiosas enfrentaram já as implicações práticas desta lei no seu
quotidiano. Polícias, membros das forças secretas de segurança e funcionários da Comissão
Estatal para os Assuntos Religiosos levaram a cabo numerosos raides e controlos de segurança durante as reuniões de organizações religiosas, em particular as de certas comunidades protestantes e grupos de testemunhas de Jeová.
Em Abril de 2009, a Igreja Protestante de Jesus Cristo, em Talas, no Noroeste do país, foi proibida de fazer uma reunião num apartamento privado. As autoridades locais afirmaram que o
registo da comunidade aprovado em Bishkek não era válido no seu território. Numa ocasião
anterior, e pela mesma razão, os seus membros foram impedidos de utilizar um cinema. Em
Talas, esta Igreja não conseguiu reunir as 200 assinaturas necessárias.
No Distrito de Kochkor (Naryn), o magistrado do Ministério Público local convocou e interrogou o Pastor Bakhyt Mukashev, da Igreja protestante El-Shaddai, em várias ocasiões, proibindo-o de fazer reuniões na sua casa. Foi-lhe dito que o registo da sua Igreja em Bishkek não
era válido noutras localidades.
Um líder estrangeiro de uma Igreja protestante na capital do país, Bishkek, foi obrigado a
deixar o país no início de Maio de 2009, depois da polícia secreta ter confiscado o seu visto
de residência. Este missionário vivia no Quirguistão há vários anos e, no início de 2009, o seu
visto tinha sido renovado por mais cinco anos. Porém, de acordo com a nova lei, não é permitido aos missionários estrangeiros trabalhar no país durante mais de três anos.
Nove membros das Testemunhas de Jeová em Maili-Suu, no Sudoeste do Quirguistão, foram
chamados para interrogatório à esquadra de polícia local no dia 20 de Abril de 2009. Seis
foram libertados depois de serem obrigados a assinar declarações escritas, enquanto os
outros três foram levados para as instalações locais da polícia secreta para um interrogatório
adicional. Depois disso, revistaram as suas casas e a literatura religiosa aí encontrada foi confiscada para ser “analisada por peritos” para se verificar se “estava conforme a lei”.
Projecto-lei sobre educação religiosa
Depois da lei sobre a liberdade de consciência entrar em vigor, a Comissão Estatal para os
Assuntos Religiosos começou também a definir a nova legislação sobre a questão das instituições educacionais. Se aplicada na sua forma actual, a proposta de lei imporia ainda mais
restrições às actividades das organizações religiosas.
O Artigo 11º, por exemplo, requer que as instituições educacionais religiosas se registem junto
da Comissão para os Assuntos Religiosos e que obtenham uma licença por parte do Ministério da Educação. O Artigo 7º estabelece que, além dos assuntos religiosos, o programa tem
de incluir também assuntos seculares. O Artigo 10º declara que a educação religiosa só pode
ser ministrada sob a forma de instrução a tempo inteiro em edifícios designados para este
propósito. Declara também que o número de alunos tem de ser estabelecido de acordo com
322
QUIRGUIZISTÃO
as leis da educação. O Artigo 12º.5 exige aos cidadãos quirguizes adultos que desejem viajar
para o estrangeiro para completar a sua educação religiosa que obtenham uma autorização
prévia por parte da autoridade estatal pertinente. A 6ª Subsecção do mesmo artigo exige que
os professores de assuntos religiosos possuam uma educação religiosa de nível secundário
ou superior. Este seria um problema para muitas comunidades que não têm professores adequadamente qualificados.
Kanybek Osmonaliev insistiu dizendo que a nova lei não pretende ser restritiva, mas tem
como objectivo somente o de trazer a ordem ao campo da educação religiosa. “Muitos cidadãos quirguizes”, acrescentou Osmonaliev, “que receberam educação religiosa no estrangeiro
voltam ao seu país com convicções religiosas que não são tradicionais na nossa terra. Alguns
estudantes promovem movimentos radicais. Isto não se aplica apenas aos muçulmanos, mas
também a algumas confissões religiosas cristãs”.
O projecto-lei foi escrito sem qualquer consulta válida às várias comunidades religiosas.
Alguns grupos (o Conselho Islâmico, reconhecido pelo Estado, a Igreja Ortodoxa Russa, a
União Baptista, representantes de seis madrassas, os directores de três escolas ortodoxas
russas e o director do Instituto Bíblico Protestante Ak-Bata) foram convidados a participar
numa mesa-redonda sobre este assunto realizada em Outubro de 2009. Porém, apenas lhes
foi dada uma semana para expressar qualquer possível comentário sobre o assunto.
Entre os participantes na mesa-redonda, Aleksandr Shumilin, presidente da União Baptista,
expressou as principais preocupações. “A educação dos nossos membros”, afirmou Shumilin,
“é um assunto interno para a nossa Igreja (...) Como podem os funcionários ministeriais avaliar os nossos professores?” Shumilin criticou também a inclusão de assuntos seculares no
programa de estudo, declarando que “os nossos alunos possuem todos, no mínimo, o ensino
secundário completo; que necessidade existe de lhes ensinar novamente os assuntos seculares?” Além disso, observou, o limiar necessário de um número mínimo de alunos, se introduzido, colocaria um problema à comunidade, que poderia não conseguir alcançar esta exigência mínima e poria assim em risco a educação de futuros líderes da comunidade religiosa.
323
SinGAPURA
SinGAPURA
O Artigo 15º da Constituição de Singapura, datada de 1963 e emendada em 1993 e 1994, protege explicitamente a liberdade religiosa,
reconhecendo que todo o indivíduo tem o direito de professar, de
praticar e de propagar a sua religião, contanto que tal não envolva
nenhum acto contra a ordem pública, a saúde ou a moralidade.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Religiõestradicionais
chinesas39,2%
Muçulmanos18,7%
Cristãos16,3%
Budistas14,1%
Hindus5%
Agnósticos4,7%
Outros2%
Todos os grupos religiosos são obrigados a registarem-se junto das
autoridades e a educação religiosa não pode ser ministrada nas escolas públicas. A presença de missionários estrangeiros é permitida,
mas a Lei sobre a Manutenção da Harmonia Religiosa proíbe os grupos religiosos de se envolverem em actividades políticas. A lei também proíbe o incitamento contra o Governo, bem como actividades
subversivas. As autoridades podem ordenar o fim de tais actividades
e qualquer indivíduo que não cumpra a lei pode ser punido até dois
anos de prisão e uma multa.
Cristãos
551.409
De acordo com a Lei do Ensino Obrigatório de 2000, todos os alunos
devem frequentar as escolas públicas.
Católicos
181.000
Os únicos grupos que sofrem de discriminação são as Testemunhas
de Jeová (proibidas desde 1972) e a Igreja da Unificação do Reverendo
Moon (proibida desde 1982).
Circunscrições
eclesiásticas
1
Apesar da proibição, não ocorreram detenções de testemunhas de
Jeová; pelo contrário, elas estão autorizadas a reunir-se em habitações
privadas, o que o Governo de facto tolera. Mas qualquer indivíduo que
se recuse a cumprir o serviço militar pode ter de cumprir uma pena de
prisão que pode ir até aos quinze meses, uma sentença que pode ser
prolongada por vinte e quatro meses adicionais caso o sentenciado se
recuse uma segunda vez.
SUPERFÍCIE
639km2
POPULAÇÃO
4.837.000
REFUGIADOS
7
DESALOJADOS
---
324
As Testemunhas de Jeová ou qualquer grupo a elas associado, como
a Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados ou a Associação Internacional de Estudantes da Bíblia, não estão autorizados a distribuir o
seu material.
SÍRiA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos92,8%
Cristãos5,2%
Outros29%
Cristãos
1.471.860
Católicos
428.000
Circunscrições
eclesiásticas
18
SUPERFÍCIE
185.180km2
POPULAÇÃO
22.505.000
REFUGIADOS
1.054.466
DESALOJADOS
433.000
325
SÍRiA
A Síria é um dos países do Médio Oriente onde a liberdade religiosa
está relativamente bem assegurada graças à ideologia secularizante
do partido Baas no poder, o qual é dominado, além disso, pela minoria
Alauita (comunidade dissidente do Islão xiita) desde 1970. Se é necessário falar de uma secularização e não de uma ideologia secular é
porque não há nem separação nem distinção dos domínios temporal
e espiritual, à maneira da maioria dos modelos ocidentais. Quanto à
liberdade religiosa, existe na realidade a liberdade de culto mas não a
liberdade de consciência. Tal como os muçulmanos, os cristãos têm o
direito de construir os seus lugares de culto e de ensinar o catecismo
aos seus filhos, mas as Igrejas não se podem dedicar ao proselitismo
dos muçulmanos e estes não podem deixar a sua religião para escolher uma outra. Mesmo se não forem crentes, continuam a ser muçulmanos.
Não obstante a sua oposição a Israel e aos EUA, o regime sírio mantém uma relação ambígua com alguns movimentos e algumas formas de Islamismo, tanto sunita como xiita. Assim, o Hamas tem a sua
sede política em Damasco, onde reside o seu líder, Khaled Mechaal.
Por outro lado, o Hezbollah está igualmente ali instalado e mantém
laços estreitos com o Irão e a sua filial libanesa.
É necessário assinalar também que o movimento de re-islamização
que influenciou todo o mundo muçulmano repercute-se também
na Síria na sua forma mais radical já que aí se desenvolvem sinais
visíveis de Islamismo, tais como o uso do véu integral por parte das
mulheres. Além disso, durante os últimos dois anos, foram cometidos
crimes confessionais visando os Cristãos.
De acordo com o sítio da internet Elaph.com, o qual reporta tais ocorrências, as agressões são cada vez mais numerosas na Síria, em especial nas regiões orientais do país onde coabitam várias comunidades
religiosas e vários grupos étnicos, como é o caso dos Curdos.
SRi LAnKA
SRi LAnKA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Budistas68%
Hindus13,1%
Muçulmanos9,6%
Cristãos8,8%
Outros0,5%
Cristãos
1.946.270
Católicos
1.461.000
Circunscrições
eclesiásticas
11
SUPERFÍCIE
65.610km2
POPULAÇÃO
20.410.000
REFUGIADOS
251
DESALOJADOS
400.000
326
A longa guerra civil que causou milhares de mortes - de acordo com muitas fontes, 100.000 desde 1983 - terminou oficialmente no dia 18 de Maio
de 2009. Nesse dia, V. Prabhakaran foi morto numa batalha. Ele era o chefe
dos guerrilheiros do LTTE, os Tigres Tamil, que nessa altura reivindicavam
a autonomia para as zonas Norte e Oriental da ilha, habitadas por hindus Tamil. Durante trinta anos, os Tigres Tamil lutaram contra o exército
nacional do Sri Lanka, para conseguirem um território Tamil reconhecido.
Como em todas as guerras civis, muitos actos cruéis foram cometidos por
ambas as partes. Mas em Maio o LTTE foi finalmente derrotado e os últimos guerrilheiros Tamil fugiram de barco para o Canadá, onde pediram
asilo político. O Sri Lanka pode agora pôr um fim a uma era de medo.
A Igreja Católica encontra-se na linha da frente na assistência aos
refugiados e às vítimas civis deste conflito e as comunidades religiosas estão todas envolvidas no processo de reconstrução.
A maioria da população que teve de abandonar as suas casas devido
ao conflito já deixou, na sua quase totalidade, os campos de refugiados e de reintegração.
Neste momento, permanecem ainda nos campos de refugiados e de
reintegração cerca de 80.000 pessoas. O pessoal que trabalha para a
Caritas naquela zona do país relatou que as condições de vida continuam ainda muito difíceis.
“As temperaturas extremamente elevadas e a falta de água tornam a
situação muito negativa”, declarou o P. George Sigamoney, director da
Caritas no Sri Lanka.
“O fulcro das atenções está a deslocar-se para a reintegração mas é
preciso continuar a pensar nas necessidades das pessoas que permanecem nos campos. Por exemplo, os recursos educativos disponíveis
para as crianças nos campos são manifestamente inadequados”.
Na sua mensagem de Páscoa de 2010, a Conferência Episcopal Católica
manifestou o seu júbilo sobre a possibilidade de ser finalmente possível
celebrar uma Páscoa de paz. Ao mesmo tempo, os bispos do Sri Lanka
declararam que, “embora tenhamos assistido ao fim da guerra, existe
ainda uma esperança para ser cumprida: o longo e difícil caminho para
uma paz duradoura”. Entre os desafios ainda enfrentados, contam-se
“a presença de refugiados e de deslocados que voltaram para casa e
merecem o maior cuidado e atenção”; os “muitos que sentem ser difícil ganhar a vida devido ao aumento do preço dos bens de consumo”;
“as eleições gerais e as muitas promessas feitas”. Os bispos mencionaram que embora “toda a gente sinta a morte de formas diferentes no
seu quotidiano, a Páscoa representa a passagem para uma nova vida”
e pediu a toda a população que “siga o caminho das boas-vindas e da
reconciliação,” abandonando “uma vida cheia de ódio e desconfiança”.
TAiLÂnDiA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Budistas86,7%
Muçulmanos6,4%
Animistass2,3%
Cristãos1,2%
Outros3,4%
Cristãos
1.436.820
Católicos
344.000
Circunscrições
eclesiásticas
10
SUPERFICIE
513.115km2
POPULAÇÃO
68.139.000
REFUGIADOS
105.297
DESALOJADOS
---
327
TAiLÂnDiA
Apesar da instabilidade política que tem caracterizado o país nos últimos tempos, no período considerado para a elaboração deste relatório não houve acontecimentos que tenham dado origem a problemas
relativamente à liberdade religiosa. Os episódios envolvendo confrontos e detenções de monges budistas estão claramente relacionados
com questões políticas e não com o exercício da liberdade religiosa.
Com efeito, a Tailândia encontra-se entre as nações mais tolerantes
da Ásia no que diz respeito às relações entre as várias crenças. Em
2007, enquanto a nova Constituição estava a ser delineada (aprovada
por meio de referendo no dia 19 de Agosto de 2007), muitos grupos
budistas exigiam que o Budismo fosse reconhecido como a religião
de Estado. A proposta, que era apenas apoiada por uma minoria, foi
rejeitada por uma vasta margem na assembleia constituinte. Ainda
assim, qualquer insulto ou declaração difamatória sobre o Budismo
ou sobre os sacerdotes budistas é uma ofensa que pode ser punida
com prisão ou uma multa.
Aos grupos religiosos é exigido fazer o registo junto das autoridades,
mas até mesmo os grupos sem autorização podem trabalhar livremente. O número de missionários estrangeiros é limitado por via oficial, mas há muitos missionários sem autorização que levam a cabo
as suas actividades sem qualquer problema.
TAiWAn
TAiWAn
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Religiõestradicionais
chinesas43,1%
Budistas26,5%
Novasreligiões6,8%
Cristãos6%
Agnósticos4,4%
Outros13,2%
Cristãos
Católicos
290.000
Circunscrições
eclesiásticas
--SUPERFÍCIE
33.961km2
POPULAÇÃO
23.562.000
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
---
328
Todas as comunidades religiosas em Taiwan desfrutam de uma liberdade de culto total.
As relações diplomáticas com Taiwan são citadas frequentemente e
criticadas pela República
Popular da China como um dos obstáculos para melhorar as relações
diplomáticas entre
Pequim e a Santa Sé.
Desde 2007 que a Igreja Ortodoxa Russa tem mantido também relações com Taiwan, na esperança de despertar o interesse de Pequim e
obter o reconhecimento da ortodoxia como uma das religiões oficiais.
TAJiQUiSTÃO
A nova lei “Sobre a liberdade de consciência e as organizações religiosas”
Em Março de 2009, foi introduzida uma nova lei denominada “Sobre
a Liberdade de Consciência, Associações Religiosas e Outras Organizações (Religiosas)”.
Ao explicar as razões que conduziram ao delinear da nova lei, o ministro da Cultura, Mirzoshohruh Asrori, realçou que se tratara de uma
reacção necessária “ao recente radicalismo religioso, niilismo e outras
ideias religiosas que são estranhas ao nosso povo.”
A lei, cujo processo legislativo foi iniciado pelo presidente Emomali
Rahmon em 2006, aumenta o poder do Governo na supervisão das
organizações religiosas, sendo que se encontram reservadas providências e restrições especiais para os Muçulmanos.
Na sua introdução, esta lei menciona “o papel especial de que usufrui
a escola de pensamento islâmico Hanafi “ na cultura tajique.
Entre os aspectos da lei que deram origem às maiores críticas e preocupações conta-se acima de tudo a obrigação do registo, agora com
condições mais rígidas (e um novo registo para os movimentos já
existentes). Os grupos que decidam não proceder ao registo e os que
não conseguirem obter o reconhecimento por parte do Estado serão
considerados ilegais.
Os grupos religiosos poderão registar-se junto do Departamento de
Assuntos Religiosos do Ministério da Cultura enquanto “organizações
religiosas” ou “comunidades religiosas”.
Para obter o nível mais elevado de registo – o de “organização religiosa” – é necessário contar com dez membros fundadores e estar em
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos86,4%
Agnósticos11,9%
Cristãos1,4%
Outros0,3%
Cristãos
150.444
Católicos
300
SUPERFÍCIE
143.100km2
POPULAÇÃO
7.075.000
REFUGIADOS
2.679
DESALOJADOS
---
329
TAJiQUiSTÃO
Embora se encontre num estado menos crítico que em outros países
na região, a situação da liberdade religiosa no Tajiquistão deteriorouse, no entanto, no decurso do último ano, em parte devido à aprovação de uma nova lei sobre a liberdade de consciência.
Este ano o Tajiquistão introduziu um curso de instrução religiosa novo
e obrigatório sobre o “conhecimento do Islão”, sendo o primeiro entre
os estados nesta região a fazê-lo. O curso cobrirá assuntos como a
história do Islão, a vida do Profeta Maomé e os ensinamentos do Imã
Abu Hanafi. Em várias ocasiões, o Presidente tajique, Emomali Rahmon, tinha feito pressão no sentido da introdução de um curso sobre
a história islâmica no currículo educacional, tanto para aumentar os
conhecimentos gerais sobre o Islão, como também como um meio
para impedir os jovens de se juntarem a grupos extremistas.
TAJIQUISTÃO
posse de um certificado emitido pelas autoridades locais que ateste a sua fé e o facto de que
residem na zona há mais de cinco anos. Para cumprir o estabelecido no Artigo 13º, os grupos
candidatos terão ainda de proporcionar uma descrição do seu credo e das suas práticas religiosas, bem como uma descrição da sua perspectiva relativamente à educação, à família, ao
casamento e à saúde dos seus membros.
Entre as organizações religiosas às quais foi permitido registar-se com este estatuto contamse centros religiosos nacionais (dos quais dependem pelo menos três organizações religiosas registadas), mesquitas centrais, instituições educacionais religiosas, igrejas, sinagogas e
outras organizações que estão a cumprir a lei.
Outras associações religiosas, entre as quais as mesquitas centrais e aquelas onde se fazem
orações cinco vezes por dia, podem registar-se enquanto “comunidades religiosas”, definidas no Artigo 3º como associações voluntárias e independentes de cidadãos, criadas com o
objectivo de levar a cabo actividades religiosas e satisfazer necessidades espirituais. A estas
associações é permitido possuir edifícios e outras propriedades necessárias para as suas
actividades religiosas. As comunidades religiosas têm de registar-se junto do Departamento
para Assuntos Religiosos tanto a nível local como nacional, mas não terão estatuto jurídico.
Além disso, todos os grupos religiosos terão obrigatoriamente de ser liderados por cidadãos
tajiques que não sejam funcionários do Estado.
Os grupos religiosos existentes antes da lei entrar em vigor deveriam ter procedido ao registo
até 1 de Janeiro de 2009. No entanto, em meados de Dezembro, apenas metade tinha conseguido realizar o novo registo. Os cristãos têm reclamado frequentemente sobre o facto de os
funcionários locais demorarem muito tempo a providenciar a documentação que certifique
a sua presença de cinco anos no país.
Outro aspecto da nova lei que causou perplexidade diz respeito às restrições aplicadas à produção, importação, exportação, distribuição e venda de literatura religiosa, sendo que para
todas estas actividades é agora necessário obter aprovação prévia do Governo, o qual irá também decidir sobre se as quantidades envolvidas são apropriadas. Anteriormente, as comunidades religiosas experimentaram frequentemente problemas significativos na obtenção de
material religioso.
A instrução religiosa para crianças só será permitida com autorização escrita por parte de
ambos os progenitores.
A lei também estabelece que os contactos com irmãos no estrangeiro devem ser autorizados
pelo Estado. As organizações religiosas deverão possuir autorização por parte do Departamento de Assuntos Religiosos do Ministério da Cultura para poderem convidar estrangeiros
ou participar em conferências no estrangeiro.
A lei também impõe restrições sobre os serviços religiosos, os quais apenas podem ter lugar
em locais aprovados pelo Estado.
A relação ambígua entre o Estado e as comunidades religiosas, prevista por esta lei, também
foi criticada. Por um lado, a lei estabelece uma separação clara entre Estado e actividades
religiosas com, por exemplo, o Artigo 5º a proibir as associações religiosas de interferir nos
330
TAJIQUISTÃO
assuntos de instituições locais ou estatais, ou de tomar parte nas actividades empreendidas por partidos ou movimentos políticos. O Artigo 9º proíbe os funcionários do Estado e os
membros de partidos políticos de fundar associações religiosas. No entanto, em contradição
com esta separação, o Artigo 11º, por exemplo, estabelece que os imãs devem ser escolhidos
com a aprovação das entidades governamentais que são responsáveis pelos assuntos religiosos. Além disso, a lei proporciona ao Governo um poder abrangente para regular a educação religiosa, uma vez que todas as instituições ou organizações que desejam proporcionar
educação religiosa deverão possuir autorização para tal por parte das autoridades estatais,
as quais reservam o direito de, como estabelecido no Artigo 17º, levar a cabo uma análise, por
parte de especialistas, sobre os ensinamentos religiosos dados pela associação religiosa e a
veracidade da informação proporcionada, bem como sobre a literatura e material religiosos.
O Artigo 11º estabelece restrições específicas para as comunidades muçulmanas, as quais
representam mais de 90% da população. Além da aprovação estatal para a nomeação dos
imãs já mencionada, existem restrições sobre o número de mesquitas dos diferentes tipos,
dependendo do número de residentes locais. Construídas apenas com autorização por parte
do Estado, as mesquitas são divididas em três categorias: o nível mais elevado é o das mesquitas centrais (não mais do que uma em cada bairro); seguem-se as mesquitas de nível
médio (em áreas com uma população de entre 10.000 e 20.000 habitantes, com níveis mais
elevados no caso de Dushanbe); e as mesquitas “cinco vezes por dia”, ou seja, aquelas onde
os Muçulmanos se reúnem para orar cinco vezes por dia, e onde os sermões estão proibidos,
representando estas o nível mais baixo (em áreas com uma população de entre 100 e 1.000
pessoas, e com uma quota mais elevada para Dushanbe). As mesquitas que excederem as
quotas estabelecidas serão encerradas.
Sendo actualmente permitido em todas as mesquitas, a partir de agora o estudo do Alcorão
apenas será autorizado em mesquitas centrais que detenham uma licença especial por parte
do Ministério de Cultura.
O Artigo 21º estabelece que o Estado será responsável pela organização das peregrinações a
Meca.
A lei foi criticada por muitos, tanto devido ao carácter vago de algumas passagens nela contidas, como por causa das restrições que impõe à liberdade de culto.
“Todos os artigos que violem os direitos religiosos dos cidadãos”, comentou Khikmatullo Saifullozoda, líder do Partido do Revivalismo Islâmico, o principal partido da oposição, embora
sem qualquer verdadeira influência política no país. “Será mais adequado afirmar que a nova
lei não é sobre liberdade de consciência, mas sim sobre as restrições a essa mesma liberdade.”
A Comissão Norte-Americana sobre a Liberdade Religiosa Internacional descreveu esta lei
como sendo “precipitada” e “rígida”.
Todas as comunidades religiosas, inclusive a Igreja Católica, já tinham expressado as suas
preocupações relativamente à nova lei ainda na fase de preparação, mas os seus pedidos não
foram considerados.
331
TAJIQUISTÃO
Igreja Católica
Não foram reportadas quaisquer grandes dificuldades nas actividades da pequena comunidade católica. A relação com a maioria muçulmana é uma de respeito mútuo e, de momento,
a coexistência continua a ser pacífica, com uma troca de convites para festividades e cooperação mútua de boa fé no seio do Comité que junta os representantes das várias comunidades religiosas e o qual tem por objectivo a promoção da coexistência pacífica.
Comunidades Cristãs Protestantes
Muitos grupos religiosos continuam a ter problemas na obtenção ou manutenção da propriedade de locais de culto.
Em alguns casos, edifícios religiosos foram confiscados pelas autoridades estatais que não
ofereceram às comunidades religiosas qualquer forma de indemnização.
Por exemplo, foi o que aconteceu à comunidade protestante Nani Hayat, em Dushanbe, cuja
igreja foi destruída em Agosto de 2008 e que, um ano depois do ocorrido, não recebeu qualquer indemnização. A ordem de demolição fazia parte de um projecto para construir um
novo palácio presidencial e um parque. Pela mesma razão, em Junho de 2008, a sinagoga
que era propriedade da comunidade judaica, construída em 1900 e que sobrevivera ao período soviético, também foi demolida. Embora a comunidade não tenha recebido nenhuma
indemnização por esta expropriação, em breve terá uma sinagoga nova, graças a uma doação de Hasan Assadullozoda, dono do Orient-Bank e cunhado do Presidente tajique, Imomali
Rakhmon.
Em Junho de 2009, os tribunais ordenaram à Igreja da Graça, em Sunmin, que abandonasse
o seu centro de oração na capital antes de 1 de Julho. Comprado inacabado em 1997, o edifício foi nessa altura completamente reestruturado pela comunidade religiosa durante um
período de nove anos e com um custo total de cerca de 390.000 euros. A soma oferecida pelo
Estado como indemnização foi de cerca de 3.500 euros.
Grupos cristãos experimentaram outros problemas causados pela falta de registo.
Por exemplo, no dia 26 de Outubro, um tribunal em Dushanbe baniu uma congregação
baptista afiliada no Conselho de Igrejas Baptistas que, por princípio, se recusa a efectuar o
registo em países da anterior União Soviética.
A decisão do tribunal seguiu-se a uma invasão pela polícia e autoridades municipais, ocorrida no dia 9 de Outubro, num apartamento no qual os baptistas levavam a cabo uma missa
de final do dia. Além de violar a lei sobre a religião, os baptistas foram também acusados de
terem violado o Artigo 11º.2, do Código Residencial, que proibe a utilização de residências “em
detrimento dos interesses do Estado e da sociedade.”
Testemunhas de Jeová,
Igualmente difícil é a situação das Testemunhas de Jeová, banidas em 2007. Em Setembro,
em Khujand, na região de Sughd, dezassete testemunhas de Jeová foram acusadas de inci332
tarem ao ódio inter-religioso, um crime punível até nove anos de prisão. Tinham sido descobertas em Junho, enquanto estudavam a Bíblia num apartamento que pertence a um dos
membros do grupo. As investigações, que pareciam ter sido suspensas, foram reabertas em
Maio de 2010, o que foi anunciado em cartas enviadas a todos os acusados pelo departamento regional dos serviços secretos.
Islão
TAJiQUiSTÃO
O Tajiquistão possui uma história de grupos islâmicos não-extremistas que é única nesta
região, e também é o único país que tem um partido político islâmico oficialmente registado.
No entanto, em parte devido à sua posição geográfica, a preocupação principal do Governo é
restringir as tendências fundamentalistas e extremistas.
Em Janeiro de 2009, o Supremo Tribunal do Tajiquistão baniu o movimento islâmico Salafita, proibindo também a importação de publicações que a ele se referem. O porta-voz do
Supremo Tribunal, Makhmadali Ioussoupov, explicou que a decisão foi tomada para “defender a segurança do Tajiquistão e os direitos jurídicos dos seus cidadãos, como também para
prevenir os conflitos nacionais, raciais e religiosos no país.” O Salafismo, o qual no Tajiquistão
conta com cerca de 10.000 seguidores, adoptou uma interpretação rígida da doutrina islâmica, com uma devoção literal às tradições do passado, rejeitando tudo aquilo que foi acrescentado a sua prática religiosa em anos posteriores.
Entre Março e Maio de 2010, quase 100 pessoas foram condenadas por acusações de pertencer
ao movimento islâmico sunita Jamaat-ut Tabligh, cujas actividades foram proibidas em 2006,
embora muitos considerem que esta proibição nunca foi tornada pública. As acusações referemse a violações do Artigo 307º do Código Penal, que pune as actividades de organizações religiosas extremistas que tenham sido banidas. No dia 18 de Maio de 2010, um tribunal regional em
Khatlon condenou trinta e duas pessoas entre três e seis anos de prisão, enquanto outras quatro
foram multadas no equivalente a 4.330 Euros. Outras cinquenta e seis pessoas foram condenadas em Março pelo Supremo Tribunal; vinte e três foram condenadas entre três e seis anos de
prisão, enquanto os outros trinta e três réus foram multados entre 4.330 e 8.660 euros.
Desde o dia 1 de Outubro, o Ministério da Educação proibiu os professores e os académicos de
deixarem crescer a barba, e os seus alunos de vestirem calças de ganga, t-shirts ou minissaias,
considerados símbolos do Ocidente. Cidadãos com mais de 50 anos de idade são, segundo a lei,
autorizados a ter “uma barba limpa, com não mais do que três centímetros de comprimento”.
Consideradas símbolos claros de pertença ao Islão, as barbas são vistas com suspeita pelo
Governo que as interpreta muito como característica distintiva de extremistas, mais do que de
crentes comuns. Abdulkhamid Nozimov, porta-voz do Ministério de Educação, em Dushanbe,
afirmou: “Todas estas novas medidas foram introduzidas como parte de uma reforma do ensino
superior e estão de acordo com a mentalidade e os costumes do nosso povo.”
Em Junho de 2009, quatro alunas da Universidade Estatal do Tajiquistão, em Dushanbe,
foram expulsas por se terem recusado a assistir a aulas sem usar o hijab, o véu tradicional
usado pelas mulheres e outro símbolo de grande devoção ao Islão.
333
TiMOR-LESTE
TiMOR-LESTE
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos84,2%
Animistas11,2%
Muçulmanos3,8%
Outros0,8%
Cristãos
851.006
Católicos
963.000
Circunscrições
eclesiásticas
2
SUPERFÍCIE
14.374km2
POPULAÇÃO
1.171.000
REFUGIADOS
1
DESALOJADOS
400
334
O caminho para a cada vez maior estabilidade política favoreceu o
retorno da ordem social e de um Estado constitucional, sendo que
Sua Santidade o Papa Bento XVI expressara esperança de que tal
acontecesse durante uma audiência, no dia 21 de Maio de 2007, com
o primeiro embaixador de Timor Leste na Santa Sé, Doutor Justino
Maria Aparício Guterres.
A Constituição deste país, que tem uma grande maioria católica,
garante o respeito pela liberdade religiosa e a lei protege este direito
fundamental dos cidadãos a todos os níveis.
As minorias cristãs protestantes e muçulmanas desfrutam também de todos os direitos e não há relatos de discriminação política
ou social. Pelo contrário, os representantes destas comunidades são
designados para posições importantes no Governo e nas forças armadas.
Além das festividades cristãs, como o Natal, a Páscoa, o Dia de Todos
os Santos, a Sexta-feira Santa, a Assunção e a Imaculada Conceição,
os dias santos muçulmanos do Eid al-Fitr e Eid al-Adha são também
feriados nacionais.
UZbEQUiSTÃO
Restrições à liberdade religiosa
Os grupos religiosos, mesmo aqueles que se encontram registados,
têm assistido à detenção dos seus membros, sendo ainda sujeitos a
elevadas coimas, raides policiais, buscas, ameaças, confiscações e destruição de material religioso.
No que toca aos cristãos, qualquer actividade ou evento colectivo
pode ser penalizado. Várias vezes ao longo deste ano, os tribunais
consideraram ilegais simples actividades, como encontros entre crentes em almoços ou aniversários.
Entretanto, a literatura religiosa continua a ser confiscada e destruída, mesmo se esta estiver destinada ao uso pessoal, na privacidade
da residência. O impacto de tais medidas é ainda mais significativo
tendo em conta a dificuldade em encontrar artigos religiosos no
Uzbequistão, devido ao facto de a importação de literatura cristã ser
fortemente controlada e restringida.
A obrigação de registo presente no Artigo 8º da “Lei da Religião”
representa uma arma que o Estado pode utilizar contra a liberdade de
consciência. Efectivamente, qualquer actividade não registada é proi-
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos82,6%
Agnósticos15,6%
Cristãos1,3%
Outros0,5%
Cristãos
1.639.956
Católicos
4.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
Area
447.400km2
POPULAÇÃO
Population
27.794.000
REFUGIADOS
Refugees
555
DESALOJADOS
Internally displaced
3.400
335
UZbEQUiSTÃO
O Uzbequistão é considerado um dos piores países em termos de
liberdades cívicas e políticas. Possui um dos sistemas políticos mais
repressivos da Ásia, como demonstram os relatórios elaborados em
2009 pelo Departamento de Estado dos EUA, pela Comissão NorteAmericana Sobre a Liberdade Religiosa e pela associação Freedom
House (que publica o relatório anual Freedom in the World).
Tanto os indivíduos como os grupos sociais são rigorosamente controlados pelo Estado, reinando uma cultura de impunidade relativamente a violações graves dos direitos humanos, incluindo-se nestas o
recurso habitual à tortura e à violência. O Parlamento é dominado por
partidos governamentais, sendo incapaz de desempenhar o seu papel
de supervisor relativamente ao ramo executivo do Governo. A oposição política está sufocada, sendo a liberdade de imprensa altamente
restringida. O Governo uzbeque também controla rigorosamente a
Internet, censurando sítios e notícias que não considera apropriados.
A impiedade governamental relativamente aos seus cidadãos, aliada
à crescente pobreza, criaram uma atmosfera de crescente tensão. As
relações com governos ocidentais arrefeceram consideravelmente
em anos recentes; efectivamente, algumas embaixadas ocidentais no
Uzbequistão foram mesmo encerradas.
UZbEQUiSTÃO
bida por lei, podendo ser alvo de sanção judicial. Assim, uma simples reunião para oração
num apartamento pode ser considerada uma violação da lei.
Obter o registo é normalmente uma tarefa impossível para alguns grupos religiosos, especialmente se estes forem de reduzidas dimensões. Mesmo as comunidades que respeitam
os rigorosos requisitos da lei (como, por exemplo, contar com um mínimo de 100 membros),
têm normalmente de esperar vários anos até que o registo seja oficializado. O simples facto
de um grupo poder ser considerado “indesejável” pela população local pode ser utilizado tacitamente como justificação para a rejeição do registo.
Em Março deste ano, a Comissão das Nações Unidas para os Direitos Humanos demonstrou
a sua “preocupação” relativamente às “limitações e restrições à liberdade religiosa, especialmente no que toca aos grupos não-registados”, apelando ao Uzbequistão no sentido de que
este deixe de deter indivíduos por actividades religiosas não autorizadas.
A situação nas prisões e campos de trabalho uzbeques, já difícil para todos os detidos devido
ao uso sistemático de tortura, é ainda pior para os crentes, os quais enfrentam significativas restrições no que toca à liberdade de prática religiosa. Estão efectivamente proibidos de
rezar abertamente, de possuir textos religiosos e de receber visitas de carácter religioso. O
acesso aos prisioneiros é também limitado aos membros das comunidades “tradicionais”,
isto é, aquelas sob a jurisdição do Conselho Islâmico ou da Igreja Ortodoxa Russa. Aqueles
condenados por ofensas religiosas são ainda forçados a repudiar publicamente a sua fé. Caso
levem a cabo qualquer actividade religiosa no interior da prisão, são acusados de “violação
dos regulamentos prisionais”, sendo habitualmente punidos com agressões físicas brutais.
Igreja Católica
Os Católicos enfrentam semelhantes dificuldades em termos da obtenção de reconhecimento oficial. Numa entrevista ao Osservatore Romano em 2008, o Bispo Jerzy Maculewicz,
administrador apostólico do Uzbequistão, abordou as dificuldades na abertura de duas novas
paróquias, uma em Navoi e outra em Angred, as quais se somariam às cinco actualmente já
existentes. A primeira destas paróquias apresentou o pedido de registo em 2006, não tendo
até à data recebido qualquer resposta; a segunda não conta ainda com os obrigatórios 100
membros que lhe permitiriam candidatar-se ao registo. Mesmo a abertura de um ramo local
da Caritas não foi ainda conseguida. Nove Irmãs Missionárias da Caridade da Madre Teresa
de Calcutá estão encarregues de prestar apoio aos pobres e aos encarcerados. Também estas
gostariam de abrir um novo espaço, para abrigar os convalescentes após a saída destes da
prisão. Após um ano e meio, prossegue a espera por uma resposta das autoridades neste
sentido. Para o Bispo Maculewicz, a evangelização é outro tema extremamente sensível, dado
que “a lei existente proíbe todas as actividades missionárias e de proselitismo. Por esta razão,
somos forçados a limitar as nossas actividades às nossas igrejas. Acolhemos e catequizamos
aqueles que a nós se dirigem, mas não podemos proclamar o Evangelho em público.”
336
Outras Comunidades Cristãs
UZBEQUISTÃO
Outras comunidades religiosas enfrentam obstáculos no processo de registo. A União Baptista (o Conselho de Cristãos-Baptistas Evangélicos, um outro grupo baptista, rejeita, por princípio, a ideia de registo) conseguiu registar apenas vinte das suas sessenta comunidades. As
Testemunhas de Jeová registaram apenas uma comunidade, estando dez outros pedidos de
registo ainda pendentes. A actividade de grupos não-registados está especialmente sujeita a
controlos rigorosos, sendo muitas vezes punida.
Na maioria dos casos, as acusações referem-se a violações dos Artigos 240º e 241º do Código
Administrativo. O primeiro destes pune violações das “leis sobre a religião”; o segundo castiga o ensino da religião “sem autorização ou formação prévias”. As multas oscilam entre dez
a cem vezes o ordenado mínimo mensal, o qual estava fixado em 28,040 soms (cerca de 16
euros) em 16 de Novembro de 2008.
Este ano, muitos cristãos foram forçados a pagar multas pesadas por levarem a cabo actividades religiosas. Em Almalyk, treze baptistas foram multados em 800 euros em Abril de
2009, após um grupo policial do Departamento Anti-terrorismo ter irrompido na casa onde
se encontravam reunidos para rezar. O P. Igor Skorik, sacerdote ortodoxo russo, acompanhava
os elementos policiais, tendo alertado os presentes contra a presença em reuniões organizadas por Igrejas não-registadas, sugerindo que os mesmos frequentassem a sua Igreja. Os 190
textos religiosos encontrados foram confiscados. Em Maio de 2009, um tribunal de Samarcanda multou, com o equivalente a entre dez e cinquenta vezes o salário mínimo mensal,
três protestantes, Leysan Jurayeva, Khursid Umurzakov e Anzhela Daminova. Nove outros
baptistas foram condenados nesse mesmo mês num tribunal distrital em Ahangaran, região
de Tashkent, a uma multa equivalente a oitenta vezes o salário mínimo mensal, por violarem o Artigo 202º-1 do Código Administrativo, o qual pune “a propensão para participar em
actividades de organizações religiosas e sociais ilegais.” Dois outros cristãos, Said Tursunov e
Vladimir Khanyukov, foram sentenciados em Julho por um tribunal de Mubarek, na região de
Kashadarya, ao pagamento de 147 euros. Em finais de Dezembro de 2009, o Tribunal Criminal
da Cidade de Termez, na região meridional de Surkhandarya, condenou o Reverendo Bakhrom
Nazarov ao pagamento de uma multa de 1.465 euros por violação dos Artigos 240º e 241º.
Noutros casos, alguns cristãos foram confrontados com acusações de actividade religiosa
ilegal, apenas por se encontrarem presentes, ainda que não por razões directamente ligadas
à sua fé, em domicílios alvos de buscas policiais. Em Abril, a polícia irrompeu no apartamento
de Nargiza Abdurakhmonova, uma protestante de Tashkent, quando esta e cinco amigos
almoçavam. Três dias mais tarde, o tribunal distrital condenou-a e a dois dos seus convidados
ao pagamento de uma multa de quase 1.600 euros. Um quarto indivíduo, Rodion Sayfutdinov, cidadão cazaque com autorização de residência em Tashkent, foi deportado para o Cazaquistão. Na região de Surkhandarya, onze protestantes foram condenados, a 23 de Outubro
de 2009, ao pagamento de multas entre 160 e 800 euros, por terem almoçado na residência
de um amigo em comum, Zoya Kogay.
337
UZBEQUISTÃO
Até a mera celebração de um aniversário pode ser perigosa. Em Janeiro de 2009, a polícia
irrompeu num apartamento propriedade de uma cristã, Eleonora Zhumaniyazova, na região
de Karakalpakstan, quando esta festejava junto a alguns amigos. Acabaria por ser multada
em 80 euros por violar o Artigo 241º. Em Fevereiro de 2009, dezassete pessoas, entre estas
treze membros da Igreja do Evangelho Completo em Bukhara, e quatro amigos do proprietário do imóvel, foram multados no equivalente a 100 salários mínimos mensais, após a polícia invadir o apartamento de Parviza e Feruza Barakayeva, onde se haviam reunido para a
celebração de um aniversário. A 10 de Março de 2010, a polícia invadiu uma outra festa de
aniversário. Dez mulheres de uma Igreja registada foram multadas (cerca de 1.800 euros) por
violarem “os procedimentos para a organização e realização de reuniões religiosas” - uma
multa especialmente pesada, tomando em conta que oito destas pessoas subsistem graças
a uma parca pensão estatal (a mais idosa das mulheres contava 76 anos de idade).
Outros cristãos têm sido penalizados por violações do Artigo 184º do Código Administrativo,
o qual penaliza a posse ilegal de material religioso. Para além das multas, os tribunais têm
ordenado, na quase totalidade dos casos, a destruição dos materiais religiosos confiscados.
Em Kuvasai, na região de Fergana, e em Fevereiro, três baptistas, Nikolai Savinov, Galina Tolstosheeva e Olga Rustamova, foram multados entre 380 e 950 euros.
Ainda durante esse mês, dois outros baptistas, Vladimir Andoniu e Vladimir Potekhin, foram
multados em 270 e 135 euros, respectivamente. Em Junho, quatros cristãos, Lidiya Markelova,
Oksana Usmanova, Albina Akhmadieva e Vladimir Musatov, foram multados em 150 euros
em Tashkent. Na região de Karakalpaktan, Serik Kubaisinov, um protestante, foi multado em
Março de 2009 num total de 323 euros. Dois outros cristãos, Kurbangul Aveniyazova e Valeri
Adamia foram multados em 303 euros cada um. Em Janeiro de 2010, o Pastor Medetbay
Abdilbekov, líder da Igreja do Evangelho Completo, e duas crentes da sua comunidade, Alfiya
Atanazarova e Gulnaz Mambetnazarova, foram enviados para a prisão por terem sido encontrados a rezar num apartamento. O pastor foi multado em 400 euros, ao abrigo dos Artigos
184º e 241º, ao passo que as duas mulheres foram multadas em 95 euros cada uma. A 5 de
Outubro, dezassete outros protestantes na região de Urgench foram multados por posse de
material religioso ilegal, o qual havia sido apreendido em Maio no apartamento de um destes, Viktor Galaktionov. Não são claros os motivos que levaram à condenação dos dezasseis
restantes cristãos.
No ano passado, as autoridades recorreram progressivamente mais às curtas sentenças de
prisão (entre dez e quinze dias) para castigar aqueles condenados por práticas religiosas ilegais.
Um caso particularmente infame envolveu quatro membros da comunidade protestante
Donam em Tashkent – o Pastor Vladimir Tyo, o seu irmão Yuri e dois assistentes, Andrei e Dmitri Sim, os quais foram sentenciados, a 24 de Agosto, a quinze dias de prisão cada, por violação do Artigo 201º do Código Administrativo (o qual castiga as violações de procedimento na
organização e realização de encontros). Na realidade, esta comunidade legalmente registada
celebrava o seu habitual serviço de culto dominical, autorizado pelo Departamento de Jus338
UZBEQUISTÃO
tiça, e levado a cabo em instalações registadas para esse fim. Este mesmo tribunal ordenou
ainda a destruição de vinte e oito cassetes de vídeo e 181 textos cristãos apreendidos durante
o raide, o qual foi levado a cabo por vinte elementos policiais do esquadrão anti-terrorista.
Ainda em Tashkent, no mês de Março, um baptista, Roman Tsoi, oriundo da Coreia do Sul, foi
sentenciado a dez dias de prisão pela mesma ofensa, após vinte elementos de várias agências estatais o terem encontrado a celebrar uma cerimónia religiosa junto à sua comunidade
legalmente registada. O tribunal concluiu que qualquer actividade religiosa que não seja
realizada num Domingo necessita de uma autorização especial, tendo esta de ser obtida um
mínimo de dez dias antes da realização da actividade.
Dois outros protestantes, Azamat Rajapov e Abdusattor Kurbonov, foram sentenciados a
quinze dias de prisão em Termez, em Abril de 2010, por actividades religiosas não-registadas.
Em inícios de Março de 2010, os protestantes Mahmidjon Rurdiev, Mahmudjon Boynazarov
e Ravshanjon Bahramov, de Andijan, foram condenados a quinze dias de detenção, após as
autoridades terem irrompido no apartamento de Turdiev, acusando-o de tomar parte numa
reunião num domicílio privado, durante a qual haviam sido abordados assuntos religiosos.
Três cristãos presentes nessa mesma reunião, mas que não possuíam documentos de identificação, foram condenados a dez dias de detenção num centro de reabilitação para desalojados. Na altura do raide, os cinco envolvidos estavam apenas a almoçar.
A 8 de Abril de 2009, Pavel Nenno, diácono de uma Igreja Baptista oficialmente registada, foi
condenado a quinze dias de prisão sob “vigilância especial” por ensinar princípios religiosos a
crianças, devido à polícia ter encontrado crianças na sua residência quando invadiram a mesma.
O diácono alertou-os de que as crianças eram provenientes de famílias muito pobres, tendo sido
convidadas para tomarem uma refeição em sua casa. O tribunal ordenou ainda a destruição do
material religioso encontrado na residência – entre outros, setenta e sete livros e revistas, trinta e
três CDs e DVDs, vinte e oito cassetes de vídeo, um computador e material relacionado.
A presença de crianças implicou também uma multa para três membros da Igreja da Grande
Graça de Samarcanda, quando, a 2 de Fevereiro, a polícia levou a cabo um raide à residência
de dois deles, Pavel e Tatyana Posrednikov, aí encontrando cinco jovens adultos e três menores de idade. Os três membros foram multados entre 95 e 140 euros, respectivamente, por
ensinarem religião sem autorização, assim violando o Artigo 241º.
Em meados de 2009, Pavel Peichev, responsável pela União Baptista Uzbeque, e a administradora daquele grupo, Yelena Kurbatova, foram presentes a tribunal, fomentando os receios dos
Baptistas Uzbeques, os quais estavam convencidos que o julgamento tinha por único objectivo a remoção da liderança da União Baptista. Os dois líderes proeminentes foram acusados,
assim como o leigo baptista Dmitri Pitirinov, de evasão fiscal e envolvimento de crianças em
actividades religiosas sem o consentimento dos pais. Os problemas começaram quando o
seu acampamento de férias de Verão, apelidado de “Alegria”, foi alvo de um raide policial. De
acordo com os três acusados, as acusações contra os mesmos não passam de fabricações.
Algumas mães, as quais reconheceram terem assinado declarações acusatórias contra os
mesmos, afirmaram depois terem sido forçadas a fazê-lo pela polícia.
339
UZBEQUISTÃO
A 11 de Fevereiro de 2010, alguns membros da União Baptista de Tashkent, particularmente o
mesmo Pavel Peichev e os outros dois réus baptistas, foram acusados num programa televisivo apelidado de “A Dor da Alegria”, transmitido no Primeiro Canal da Televisão Estatal Uzbeque, de “transformar as pessoas em zombies”, incentivando os mesmos a venderem as suas
residências e doarem o dinheiro à Igreja. “O que é especialmente ameaçador”, afirmava o
programa, “é que se concentram grandemente em difundir as suas ideias, particularmente
entre as crianças uzbeques”. Os pais uzbeques foram aconselhados a prestar mais atenção
aos seus filhos.
Testemunhas de Jeová
Dilshod Akhmedov, Fatima Akhmedov, Ilhajman Akhmedov, Galina Fris, Ayshe Setablaeva,
Mamlakat Nabieva, Angelina Farahova e Gulchehra Tashboltaeva, todos eles testemunhas
de Jeová, acabaram na prisão por períodos de tempo entre os cinco e quinze dias. Em alguns
casos, a pena de prisão foi acrescida de multas no valor equivalente a cinquenta vezes o
ordenado mínimo mensal.
Outras testemunhas de Jeová foram condenadas a sentenças ainda mais pesadas. Olim
Turaev, médico de 34 anos com três filhos, foi condenado em Abril de 2008 por um tribunal
de Samarcanda a quatro anos num campo de trabalho, pela violação dos Artigos 216º e 229º
do Código Penal, o qual castiga os ensinamentos religiosos ilegais e a organização de encontros religiosos não-autorizados. Em Julho de 2008, Abdubannob Ahmedov e Sergei Ivanov
foram condenados sob semelhantes acusações num tribunal de Margilan, sendo sentenciados a quatro e três anos e meio, respectivamente, num campo de trabalho.
A 9 de Setembro, observadores especiais das Nações Unidas acusaram Tashkent de torturar
dois irmãos, Nigmat e Sobit Zufarov. Ambos foram detidos por praticarem a sua fé, sendo enviados para um campo de trabalho. Um observador afirmou que Nigmat, o qual fora condenado
em Abril de 2000, havia iniciado uma greve de fome em Maio de 2009, em protesto contra a
proibição de rezar no campo de trabalho. O seu protesto continuou, apesar da decisão das autoridades do centro de detenção de o alimentar à força. Isto continuou até 15 de Julho, quando
foi encontrado morto, apresentando sinais visíveis de tortura no seu corpo. As autoridades concluíram que a morte havia resultado de suicídio. O irmão de Nigmat, Sobit Zufarov, está ainda
vivo mas em precária condição física e psicológica, na sequência dos abusos sofridos na prisão,
incluindo a permanência em prisão solitária durante seis meses, como punição por rezar.
Vistos e deportações
As autoridades uzbeques impedem sistematicamente que cristãos uzbeques se encontrem
com correligionários do estrangeiro, negando vistos de entrada a cristãos estrangeiros que
pretendam visitar o país por motivos religiosos, ou expulsando estrangeiros ali residentes
que, apesar de se encontrarem munidos de vistos válidos, estão envolvidos em actividades
religiosas.
340
Para além do supra-mencionado Rodion Sayfutdinov, outros cristãos estrangeiros foram
deportados em 2009. Entre estes contavam-se Andrei Tsepurkin, um protestante russo, o
qual vivia no país com a sua esposa e dois filhos. Foi expulso do Uzbequistão após as autoridades locais e a polícia secreta o acusarem de “ser um terrorista e subverter a ordem interna
do país com as suas actividades missionárias.” Na realidade, o principal trabalho de Tsepurkin
é a prestação de auxílio a toxicodependentes. Timur Chekparbayev, membro da comunidade Baha’i, foi expulso em Agosto após quinze dias de detenção por resistir a um agente
de segurança pública durante um raide levado a cabo num encontro de jovens em Julho.
Em Setembro, um artigo foi difundido num sítio da Internet estatal, o qual afirmava que o
objectivo das suas actividades religiosas era criar um clima favorável ao Irão, com o apoio de
capitais estrangeiros (isto apesar do facto de os Baha’i e da fé destes serem perseguidos no
Irão). Sepehr Taheri, outro membro da comunidade Baha’i, com nacionalidade britânica mas
casado com uma mulher uzbeque e com filhos todos nascidos no Uzbequistão, foi deportado
em Novembro de 2009. Vivia no país desde 1990.
Em Junho, Irfan Hamidov, testemunha de Jeová, foi deportado para o Tajiquistão, o seu país
de origem, um dia depois de ser libertado da prisão onde cumprira uma pena de dois anos
imposta em 2007 por ensinamento religioso ilegal. Hamidov foi autorizado a encontrar-se,
uma só noite, com o seu filho de 2 anos, o qual nunca havia visto.
Propaganda Anti-conversão
UZBEQUISTÃO
As conversões de jovens são outra das grandes preocupações do Governo. Razão pela qual
lançou inúmeras iniciativas e organizou seminários, para manter as jovens gerações afastadas de religiões não ligadas às tradições locais. Numa escola secundária local, perto da
Universidade Estatal de Karakalpakstan, organizaram um seminário que contou com a presença de representantes da Mahalla local e do Serviço de Segurança Nacional (SSN), a polícia
secreta, para alertar os jovens contra as más influências das religiões estrangeiras, apelando
a que se mantenham vigilantes contra o perigo do extremismo religioso. Nesta ocasião, foi
exibido um filme que atacava o extremismo e as actividades missionárias. Eventos semelhantes tiveram lugar noutras partes do Uzbequistão, incluindo a região de Fergana. Estes
faziam parte de um plano governamental para 2010, apelidado de “Ano Uzbeque da Geração
Harmoniosamente Desenvolvida”, aprovado pelo presidente Karimov em Janeiro deste ano, e
que apresentava medidas destinadas a cercear a influência de religiões estrangeiras e extremistas. O sítio da Internet do Ministério da Justiça anunciou um seminário organizado em
Jizzak em torno de “como derrotar o tráfico de seres humanos, o extremismo religioso e a
actividade missionária”, durante o qual foram debatidos temas como “a actividade missionária, o proselitismo, a protecção dos jovens da influência nefasta dos movimentos extremistas,
e como todos somos responsáveis pela educação moral das jovens gerações.”
341
UZbEQUiSTÃO
A Comunidade Islâmica
O Governo exerce um controlo amplo e sistemático sobre a comunidade islâmica. Consegueo através da promoção de uma versão Halafi, moderada, do Islão, além de proporcionar fundos para o Conselho Muçulmano do Uzbequistão (Muftiat). O Muftiat é responsável pela formação, nomeação e despedimento dos líderes muçulmanos. O Estado controla o número de
mesquitas e a educação religiosa. É muito difícil registar novas mesquitas. Existem cerca de
3.000 mesquitas autorizadas num país com 26 milhões de habitantes, 90% dos quais muçulmanos. Um número limitado de mesquitas independentes opera sem registo oficial, mas sob
a supervisão de imãs oficiais locais. Os imãs estão obrigados a apresentar o texto dos seus
sermões de sexta-feira (dia de oração pública para o Islão) ao Supremo Conselho Islâmico
(o qual é controlado pelo Estado). Dez madrassas (duas das quais para mulheres) providenciam educação secundária, e um Instituto Islâmico oferece educação de nível universitário.
O Governo limita o número de pessoas que podem partir para a Hajj, a peregrinação anual a
Meca, a cerca de 5.000, ou seja, 20% da quota reservada ao Uzbequistão.
Outras restrições à actividade religiosa são impostas a nível local. Por exemplo, na região de
Namangan, e na sequência de semelhante iniciativa em Fergana, as crianças não estão autorizadas a participar nas orações vespertinas durante o mês do Ramadão. Às crianças está já
vetado o acesso a mesquitas durante o horário escolar. A agência Ferghana.ru noticiou que
as autoridades haviam informado os imãs durante as reuniões semanais que “as crianças
pertencem ao presidente, e não aos líderes religiosos.” Na região de Bukhara, as mulheres
foram proibidas de participar nas orações de sexta-feira. Semelhantes condicionamentos
foram impostos a mulheres e crianças da região de Kashkadarya.
Algumas formas do Islão, consideradas extremistas, foram banidas e os seus seguidores
punidos com longas sentenças prisionais.
Os principais delitos atribuídos a indivíduos acusados de envolvimento em actividades religiosas de grupos islâmicos não-autorizados referem-se a violações de alguns artigos do
Código Penal, particularmente os artigos 159º, 242º e 244º, os quais punem, respectivamente,
actividades anti-constitucionais, a organização de sociedades criminosas, a participação em
extremismo, separatismo, fundamentalismo religioso, ou em outras organizações anteriormente banidas. Tais delitos foram arquitectados no sentido de combater o fundamentalismo
islâmico, mas são algumas vezes utilizados para limitar os protestos de grupos religiosos não
controlados pelo Estado.
Entre os grupos mais vigorosamente combatidos pelas autoridades contam-se o Hizb-utTahrir e o Akromiylar, assim como outros grupos, denominados ‘Wahhabi’. Contudo, o Governo
suspeita de todos os muçulmanos que operem sem supervisão das instituições aprovadas
pelo Estado, ou que tenham tido formação no estrangeiro.
No último ano, um outro movimento muçulmano caiu sob o escrutínio estatal, sendo considerado um grupo ilegal banido constante de uma listagem organizada pela Comissão de
Assuntos Religiosos. As autoridades policial e judicial levaram a cabo uma operação de com342
UZbEQUiSTÃO
bate aos seguidores de Said Nursi (1878-1960), um teólogo curdo-turco. Em 2009, registaramse pelo menos quarenta e sete condenações com longas sentenças (normalmente entre cinco
a doze anos) de seguidores desta ideologia, os quais foram acusados de violações ao Artigo
244º do Código Penal. Alguns dos condenados não estavam directamente envolvidos no alegado movimento Nur, tendo apenas documentos de autoria do teólogo turco na sua posse.
Tais escritos foram publicados de forma livre e vendidos no país até ao ano 2000. Outros
seguidores do movimento Nur foram detidos enquanto aguardavam julgamento. Entre estes
estavam Shokir Koraboyev, responsável pelo Departamento de Cultura e Desporto da cidade
de Namangan, o qual foi acusado de auxiliar alguns atletas que se suspeita seriam seguidores de Nursi. Até um jornalista desportivo, Hairulla Hamidov, poderá vir a ser condenado a
vários anos de prisão, por ter violado o Artigo 244º. O seu julgamento, iniciado a 29 de Abril
de 2010, realizou-se sob apertada vigilância policial. Nem a família do jornalista, nem outros
jornalistas ou activistas dos direitos humanos foram autorizados a estar presentes no julgamento. Hamidov, renomado colunista nos jornais Interfootball e Champion, que cobria ainda
outros tópicos. Em 2004, por exemplo, deu início a um programa radiofónico, Kholislik Sari (A
Voz da Justiça), difundido pela semi-privada Navruz Radio, e que respondia às questões dos
ouvintes, oferecendo-lhes aconselhamento baseado nos valores islâmicos tradicionais. Ao
fazê-lo, Hamidov deu visibilidade aos problemas não cobertos pelos meios de comunicação
social oficiais, temas como o sistema público de saúde, a corrupção, a prostituição, as crises
sociais e morais, ou reacções da comunidade internacional. Anteriormente, e sob pressão do
Ministério da Comunicação Social e da Informação, Hamidov fora forçado a abandonar a
televisão, onde apresentava um programa semelhante, e a encerrar o seu próprio jornal, o
Odamlar Orasida.
Outros muçulmanos que operam fora da directa supervisão do Estado têm sido perseguidos
pelas autoridades policiais. Na região de Syrdarya, cerca de cinquenta e sete muçulmanos
foram detidos em Outubro de 2009 e mantidos sob custódia, por razões não especificadas,
num campo de detenção em Khovos. Em Kashkadarya, três muçulmanas da mesquita de
Karshi foram condenadas no dia 12 de Abril a seis anos e meio e sete anos num campo de
trabalhos, após serem condenadas pela violação dos Artigos 159º e 244º do Código Penal. O
julgamento contra as mulheres, as quais foram mantidas em isolamento durante a detenção, foi realizado à porta fechada e minado de flagrantes violações da lei. As três mulheres - Mekhrinisso Hamdamova, a sua irmã Zulkhumor e Shakhlo Rakhmatova (esta última
uma conhecida activista dos direitos humanos naquela região) – foram detidas em Novembro, quando doze agentes da SSN irromperam no apartamento de Hamdamova às 6h00 da
manhã. A polícia apreendeu dois filmes e um livro que Hamdamova havia recebido de uma
organização muçulmana local. Foi acusada de organizar um encontro religioso não-autorizado. Cerca de trinta mulheres muçulmanas suas amigas ou membros da sua família foram
também detidas e pressionadas no sentido de testemunharem contra Mekhrinisso Hamdamova, a qual leccionava vários cursos para mulheres na Mesquita Kuk Guymbaz, em Karshi.
343
ViETnAME
ViETnAME
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Budistas49,2%
Agnósticos19,3%
Novasreligiões11,1%
Animistas10,4%
Cristãos8,5%
Outros1,5%
Cristãos
6.981.130
Católicos
6.187.000
Circunscrições
eclesiásticas
26
SUPERFÍCIE
331.689km2
POPULAÇÃO
89.029.000
REFUGIADOS
2.357
DESALOJADOS
---
344
O ano de 2009 começou com o anúncio por parte das religiosas da
Congregação de São Paulo de Chartres, em Vinh Long, segundo o qual
estas desistiam dos protestos contra a expropriação da sua residência.
Como condição para o fim dos protestos, as autoridades deveriam, por
seu turno, reconhecer que o Governo estava envolvido numa “política
arquitectada para erradicar religiões e ordens religiosas, política essa
que justificou o tratamento a que foram sujeitas dezoito religiosas
da Congregação de São Paulo, tratadas como criminosas perigosas,
proibidas de levarem a cabo as suas actividades, detidas e expulsas
da sua casa, assim como sujeitas à confiscação das suas propriedades,
incluindo artigos religiosos, sem qualquer ordem legal ou mandato”.
No final, nada acabaria por ser reconhecido ou devolvido, nem tão
pouco qualquer dos pedidos deferido.
Como se tal fosse necessário, o Governo central providenciou ainda
apoio adicional às autoridades locais. A 6 de Janeiro, o primeiroministro Nguyen Tan Dung emitiu uma directiva (N. 1940/CT-TTg), a
qual declarava que nenhuma das 2.250 propriedades confiscadas à
Igreja Vietnamita seria devolvida. Os Cristãos que se sentissem tentados a organizar protestos contra o Governo seriam severamente punidos por causarem “distúrbios sociais”. E esta não era uma ameaça vã.
A 8 de Janeiro, um Tribunal de Recurso em Hanói aceitou ouvir um
pedido apresentado por oito membros da Paróquia de Thai Ha, os
quais protestavam contra a sua condenação por “conduta desordeira”
e “destruição de propriedade do Estado”. Os alegados transgressores faziam parte de uma multidão de alguns milhares de pessoas
que protestaram contra a decisão de confiscar terrenos à sua Igreja.
Durante o julgamento, os advogados de defesa foram impedidos de
apresentar as suas provas. Mas ainda há mais. Os órgãos de comunicação social estatais escreveram que os acusados “admitiram sinceramente a sua culpa e imploraram pelo perdão governamental”,
quando, de facto, “esta foi uma gritante distorção da verdade […] visto
que todos se consideraram inocentes”, afirmaram os católicos condenados. “Durante o julgamento”, um dos réus, Nguyen Thi Viet, afirmou
numa entrevista à Radio Free Asia que “cada um de nós refutou as
acusações […] Insistimos que não éramos culpados.”
A 15 de Janeiro, os autores do artigo no Ha Nôi Moi ou aqueles que
mencionaram a história na Vietnam Television I viram ser-lhes atribuído um prémio sob os auspícios de Pham Quang Nghi, secretário do
Partido Comunista em Hanói. O artigo vencedor intitulava-se “Luta
contra a tentativa de recuperar terras.”
VIETNAME
Em Fevereiro, seria lançada outra campanha mediática, desta vez contra Lê Tran Luât, advogado que representava os paroquianos. O seu escritório foi revistado sem qualquer explicação, sendo que o advogado não foi autorizado a encontrar-se com os seus clientes. Ao fim de
algum tempo, a Ordem dos Advogados local retirou-lhe a licença para a prática da actividade
e, a 27 de Março, o tribunal de recurso decidiria manter as condenações dos oito réus.
Eventos semelhantes ocorreram simultaneamente noutros locais. Na província de Son La, na
região Noroeste do país, junto à fronteira com o Laos, as autoridades locais lideraram uma
campanha destinada a erradicar os cristãos daquela localidade. Anteriormente motivados
pela filosofia Marxista-Leninista, combatem agora o Cristianismo como forma de promover
o renascimento das ancestrais práticas e crenças pagãs. As famílias que apresentaram resistência viram ser-lhe retirados apoios estatais, sendo ainda forçadas a obter autorização policial para receberem visitas, para além de serem tratadas como párias por parte dos restantes
habitantes da região.
As preocupações do Vaticano com o estado da liberdade de religião no país tornaram-se mais
aparentes quando uma delegação da Santa Sé visitou o Vietname em Fevereiro, sendo calorosamente recebida pelos católicos de Hanói. Num comunicado conjunto emitido a 20 de
Fevereiro, ambas as partes mencionaram uma “atmosfera de abertura”; contudo, o Monsenhor Mario Parolin, sub-secretário de Estado para as Relações Estatais e líder da delegação
do Vaticano, apesar de reconhecer que a situação tinha melhorado com o passar dos anos,
não deixou de apresentar “algumas reticências”, frase que indica a ausência de um acordo
total no que toca às explicações dadas pelo vice-ministro dos Negócios Estrangeiros, Nguyen
Quoc Cuong, sobre a “liberdade de convicção”. Por sua vez, o Vaticano assegurou às autoridades vietnamitas que a Igreja não tem por objectivo envolver-se em quaisquer actividades
políticas.
Apesar disso, nem tudo é negativo. Na cidade de Ho Chi Minh, antiga Saigão, 2.000 jovens
foram baptizados na véspera da Páscoa de 2010. Por outro lado, em Son La, uma festividade
semelhante foi proibida. As autoridades locais detiveram um sacerdote enviado pelo Bispo de
Hung Hoá para celebrar a missa dominical. No Natal, a polícia interpelou dois outros sacerdotes que tentavam deslocar-se à mesma cidade. “Não eram aí necessários”, foi a explicação
oficial para o sucedido, dado “não existirem cristãos” naquela província. De facto, documentos diocesanos demonstram a existência de pelo menos 3.000 católicos naquela província.
Estes têm, contudo, sido forçados a reunir-se em segredo desde 2004. Apenas em finais de
Outubro as autoridades recuaram, autorizando uma missa, realizada sob vigilância da polícia, tendo esta fotografado os cerca de 500 fiéis que acorreram ao serviço religioso.
Em meados de Abril, e com o ambiente da Páscoa ainda presente, os órgãos de comunicação
social estatais lançaram uma nova campanha, desta feita contra dois Redentoristas, acusados de tentativa de derrube do regime, ofensa punível com a pena capital. Os dois clérigos
haviam apoiado uma campanha de carácter abrangente que se opunha ao desenvolvimento
da exploração dos depósitos de bauxite nas Terras Altas do Vietname central, dado que a
mesma causaria danos irreversíveis no meio ambiente, para além de prejudicar os residen345
ViETnAME
tes. Líderes budistas, assim como o general Giap, lendário comandante norte-vietnamita na
guerra contra os EUA, encontravam-se também entre os críticos da exploração.
De Norte a Sul, registaram-se episódios semelhantes. Em inícios de Junho, em Long Xuyen
(Diocese de Long Xuyen), capital da província de An Gang (Sul do Vietname), bulldozers demoliram o Convento dos Irmãos da Sagrada Família, em Banam. As autoridades não apresentaram qualquer explicação para o sucedido, tendo habitantes locais sugerido que a especulação e a corrupção estavam por detrás dos ataques contra as propriedades da Igreja.
A decisão do Governo vietnamita de abrir a economia às forças do mercado elevou o perfil
do país entre os investidores estrangeiros, interessados em mão-de-obra barata e controlo
ambiental limitado, especialmente no que às indústrias da manufactura e do turismo concerne. Desde então, o crescimento económico do país tem sido desigual, tendo os preços das
propriedades aumentado consideravelmente. De acordo com a Constituição vietnamita, as
“terras” são “propriedade de todos” sendo “atribuídas pelo Estado a organizações e indivíduos, tendo em vista o uso sustentado a longo prazo”. Contudo, muitas vezes os responsáveis
consignam as terras tomando em conta as suas próprias prioridades. Não é por acaso que
o Partido Comunista refere constantemente, mas sem grande sucesso aparente, que a luta
contra a corrupção é um dos seus “objectivos”.
As Irmãs da Congregação dos Adoradores da Santa Cruz, em Thu Thiem, um subúrbio de
Ho Chi Minh, viram-se envolvidas numa disputa por terrenos. A 11 de Junho, as autoridades
do Segundo Distrito da cidade convocaram as religiosas para informar as mesmas de que
teriam de abandonar a sua residência, a qual se encontrava na posse da congregação há pelo
menos 170 anos. O edifício foi erigido num terreno com 3,5 hectares de dimensão, o qual fazia
parte de uma propriedade mais ampla, a rondar os 40.000 m2 confiscada pelas autoridades
após a reunificação. Com o passar do tempo, as religiosas construíram nesse lote uma igreja,
um convento, uma escola, uma quinta, um centro de dia, uma clínica e um jardim de infância
para cerca de 400 crianças. O terreno, contudo, está localizado próximo do rio Bach Dang,
nas imediações da Cidade de Ho Chi Minh, local onde o preço das propriedades é já elevado.
Junho foi um mês de tormentos. O primeiro caso envolveu o P. Peter Nguyen Van Phuong,
frade dominicano que trabalha na província de Dak Lak, nas Terras Altas Centrais. O Comité
Popular do Condado de Lak rejeitou um pedido apresentado pelos paroquianos no sentido
de que este fosse autorizado a continuar o seu trabalho pastoral naquela área, justificando
a decisão com o facto de que “nenhum estabelecimento religioso estava presente naquelas
regiões; assim sendo, não há necessidade de religião. Os fiéis daquelas quatro aldeias podem
praticar a sua religião em casa.”
O último caso envolveu o Padre Redentorista Joseph Le Quang Uy. Renomado activista provida, também ele se opôs aos planos governamentais para o desenvolvimento das minas de
bauxite nas Terras Altas Centrais. A 6 de Junho, foi detido no Aeroporto de Tan Son Nhat sem
motivo aparente. Seria libertado algumas horas depois, sendo contudo informado de que
deveria regressar para “sessões de trabalho”. O seu computador portátil foi também confiscado.
346
VIETNAME
Estas são, contudo, ocorrências menores quando comparadas com o sucedido na Igreja de
Tam Toa, Diocese de Vinh, a cerca de 334 quilómetros de Hanói.
A Igreja de Tam Toa ocupa um local especial nos corações dos católicos vietnamitas. Foi mencionada pela primeira vez em 1631. No século XVII, era a maior igreja daquela região, então
apelidada de Sao Bun, contando com cerca de 1.200 membros. O presente edifício, construído
em estilo português com uma grande torre com sino, foi inaugurado em 1887, sendo esta
igreja considerada uma das mais belas do país.
Durante a Guerra do Vietname, a igreja foi atingida por aviões americanos, tendo apenas a
fachada e a torre sobrevivido aos ataques. Após o final do conflito, os paroquianos estavam
demasiado empobrecidos para poderem apoiar a reconstrução do edifício, tendo, contudo,
continuado a aí levar a cabo cerimónias religiosas. Em 1996, o Comité Popular da província
de Quang Binh confiscou a propriedade de forma a transformar a mesma num “monumento
comemorativo”, “preservado e protegido para futuras gerações como prova dos crimes de
guerra dos EUA”. A Arquidiocese de Hue exigiu por sua vez a devolução da propriedade, mas
não teve sucesso.
Em Julho, rumores começaram a circular de que o “monumento” iria ser demolido para dar
lugar a um complexo turístico. Para os fiéis, contudo, aquilo que resta do edifício é ainda a
igreja na qual realizam celebrações religiosas. A 20 de Julho, polícias à paisana e activistas
partidários atacaram crentes católicos, agredindo indiscriminadamente homens, mulheres
e crianças. Dois sacerdotes, Paul Nguyen Dinh Phu e Peter Nguyen The Binh, acabaram no
hospital, o primeiro com costelas partidas e ferimentos na cabeça, e o segundo em estado
de coma em virtude das agressões. Na sequência do incidente, realizar-se-iam protestos em
Hanói e na Cidade de Ho Chi Minh.
Na manhã de 26 de Julho, o P. Paul Nguyen Dinh Phu, pároco de Du Loc, foi atacado por um
grupo de polícias à paisana quando se deslocava para Tam Toa para aí co-celebrar a missa.
Uma manifestação estava planeada para protestar contra as agressões de 20 de Julho,
durante as quais sete fiéis foram detidos. Cerca de 170 padres, 420 religiosas e 500.000 católicos de Vinh e das dioceses vizinhas juntaram-se à manifestação.
A 30 de Julho, o General Hoang Cong Tu, do Ministério da Segurança Pública, negou que qualquer acto violento tivesse sido levado a cabo contra os sacerdotes. A polícia rejeitou ainda as
acusações feitas pela Diocese de Vinh relativamente às agressões, afirmando que as mesmas
eram falsas. A diocese respondeu publicando electronicamente fotografias que mostravam
os sacerdotes e os ferimentos causados pelos activistas partidários que acompanhavam a
polícia. O General Tu anunciou que os sete católicos acusados de “conduta desordeira” seriam
presentes a tribunal. A razão para tal acusação foi baseada no facto de estes terem erigido
uma tenda nas ruínas da Igreja de Tam Toa, aí realizando celebrações religiosas.
A 8 de Agosto, as 178 paróquias da diocese realizaram vigílias de oração. Meio milhão de católicos apelaram às autoridades no sentido de que estas respeitassem a liberdade de religião
e libertassem todos aqueles que haviam sido detidos. No Dia da Festa da Assunção (15 de
347
ViETnAME
Agosto), 200.000 pessoas participaram numa missa. Outras 500.000, impedidas de participar na cerimónia, celebraram a liturgia junto a uma estrada.
A 20 de Agosto, bulldozers enviados pelas autoridades municipais demoliram aquilo que restava do edifício sagrado, deixando de pé apenas a torre.
Alguns dias antes, a 13 de Agosto, bispos católicos vietnamitas relembraram ao Governo o
bom trabalho levado a cabo pelos católicos em prol do país. Apelaram às autoridades para
que estas iniciassem um diálogo e revissem a actual legislação imobiliária, a qual coloca o
controlo total nas mãos do Estado, assim criando oportunidade para possíveis abusos de
poder ou actos de corrupção.
“A opinião pública tem estado muito preocupada com as recentes disputas em torno das
propriedades da Igreja”, afirmaram os bispos num artigo publicado no VietCatholic News.
Infelizmente, iriam assistir a retaliações jurídicas por parte do Governo, entre as quais se
incluiu a premeditada “perseguição e detenção de católicos.”
Perto do final do mês, os meios de comunicação social estatais responderam às alegações
dos prelados, distorcendo aquilo que Bento XVI havia dito aos bispos vietnamitas aquando
da visita ad limina destes ao Vaticano. Usando as palavras do Papa, bispos, padres e fiéis
foram criticados por permitirem que a Igreja rumasse à “corrupção espiritual”. Por exemplo, a
24 de Agosto, o Vietnam Net, órgão de comunicação social estatal, publicou um artigo intitulado “Um bom católico é um bom cidadão”. No mesmo, as palavras do Papa foram retiradas
do contexto para demonstrar que “Bento XVI critica fortemente os bispos” de forma a obrigálos a “lutar pela santidade, para que assim possam conduzir os seus rebanhos rumo à vida
como o Papa a deseja, nomeadamente enquanto bons católicos e bons cidadãos.”
Um jovem catecúmeno católico, que possui um blogue foi detido a 27 de Agosto. Fontes
locais afirmaram à AsiaNews que a polícia estava a preparar uma nova série de detenções de
indivíduos que haviam ousado criticar a forma distorcida como os jornais do regime apresentaram o discurso de Bento XVI aos bispos vietnamitas.
O P. Nguyen Van Khai, sacerdote redentorista de Hanói, falou à AsiaNews, confirmando “a
detenção de Biu Thanh Hieu, jovem catecúmeno da diocese, o qual se preparava para receber
o baptismo.”
“A sua detenção não será a última”, afirmou uma religiosa. “Muitos bloggers católicos criticaram a ‘vergonhosa distorção’ apresentada pelos meios de comunicação social estatais em
torno do discurso do Papa Bento XVI aos bispos ad limina. Todos correm o risco de serem
detidos.”
Em Setembro, assistir-se-ia a novos episódios de violência e à confiscação de mais propriedades da Igreja. A Paróquia de Loan Ly, em Loc Hai, Distrito de Phu Loc (Arquidiocese de Hue),
conta com 900 membros, a maioria dos quais aí se estabeleceu em 1954 após fugir do Norte
do país. A 15 de Setembro, ocorreu um “xoâ xaùt” (confronto) com a polícia, após esta última
interromper uma aula de catequese, segundo informou a AsiaNews.
A agora familiar campanha anti-católica levada a cabo pelos meios de comunicação social
do Estado recomeçou. Televisões e jornais concentraram as suas críticas no Arcebispo de Hue,
348
VIETNAME
culpado, segundo os mesmos, de criticar a confiscação da escola de Loan Ly e a brutalidade
policial.
A 21 de Outubro, centenas de agentes da polícia atacaram os fiéis e cortaram o acesso à propriedade. As linhas telefónicas e de Internet foram bloqueadas, para assim impedir que os
fiéis pudessem dar o alarme. Também aqui, os políticos locais e os empresários imobiliários
estavam aliados no sentido de se apoderarem da propriedade.
Alguns dias depois, a Diocese de Vinh voltou às notícias. A 5 de Novembro, a polícia deteve o
P. Nguyen Van Huu, pároco de Bau Sem, que ia a caminho da Residência Episcopal em Xa Doai.
Durante a detenção, dezenas de polícias anti-motim, escoltados por militantes, removeram a
estátua de Nossa Senhora do cemitério da paróquia.
Mas os problemas não ficariam por aqui. A 24 de Novembro, dia em que são relembrados os
117 mártires vietnamitas canonizados por João Paulo II, acenderam-se milhares de velas para
marcar o início do Ano Jubilar da Igreja Vietnamita. Bento XVI enviara uma mensagem para
marcar a ocasião, afirmando-se esperançoso de que o Jubileu pudesse ser uma ocasião para
a reconciliação e uma mais profunda comunhão eclesial no seio da Igreja do Vietname, para
assim construir “uma sociedade justa e leal, em conformidade com o princípio da solidariedade, através do diálogo genuíno, do respeito mútuo e da colaboração salutar.”
Seis dias mais tarde, as autoridades em Da Lat, no Sul do Vietname, começaram a demolir o
Instituto Pontifício São Pio IX, para aí construírem um “parque cultural e urbano”, isto apesar
dos repetidos pedidos por parte dos bispos do país no sentido de que este fosse novamente
utilizado como seminário. Cerca de treze bispos e 306 padres que actualmente operam no
país foram formados naquele instituto. A primeira aula realizou-se a 13 de Setembro de 1958
no instituto, originalmente sediado num edifício pertença do representante do Vaticano no
Vietname.
Apesar de tudo, o presidente do Vietname, Nguyên Minh Triêt, visitou o Vaticano a 11 de
Dezembro, sendo recebido por Bento XVI. A conversa entre ambos foi cordial, mas inusitadamente longa.
Os católicos vietnamitas esperavam que o encontro acabasse com o anúncio de que o Vietname e a Santa Sé haviam estabelecido relações diplomáticas e que o Papa seria convidado
a visitar o país.
Contudo, nenhum anúncio foi feito quanto a relações diplomáticas ou a uma visita papal.
Apesar de tudo, num comunicado à imprensa, a “Santa Sé expressa o seu agrado pela visita”,
a primeira por parte de um chefe de Estado vietnamita.
Para além disso, “expressou a esperança de que algumas questões relevantes possam ser
solucionadas quanto antes”. Esta foi uma clara referência às questões que envolvem a Igreja
Vietnamita e, de forma mais geral, à liberdade de religião.
349
ÁFRICA
C
o n t i n e n t e
ÁFRiCA DO SUL
Episódios de violência
Novamente em 2009, a crescente violência que se espalhou, especialmente nos subúrbios das grandes cidades, causou perda de vidas
preciosas, com quatro padres católicos assassinados, presumivelmente durante assaltos.
O P. Daniel Matsela Mahula, da Diocese de Klerksdorp, foi morto por
quatro homens armados no dia 27 de Fevereiro de 2009, quando conduzia perto de Bloemhof. Nascido em 1975 e ordenado em 2002, ele
servia na Igreja Católica de São Pedro, em Jouberton.
O P. Lionel Sham, de 66 anos de idade, pároco de Mohlakeng (Arquidiocese de Joanesburgo), foi assassinado no dia 7 de Março de 2009,
depois de ter sido raptado da sua casa. O corpo foi encontrado pela
polícia no dia 8 de Março, algumas horas depois de ter desaparecido.
Era conhecido por estar sempre disponível para todos e por ser generoso para com os necessitados.
O corpo do P. Ernst Plöchl, um austríaco de 78 anos de idade, missionário de Marianhill, que vivia na África do Sul há mais de quarenta
anos, foi encontrado no domingo pela manhã, dia 31 de Maio, na estação da missão isolada de Maria Zell, na província do Cabo Oriental.
O P. Louis Blondel, dos Padres Brancos, foi assassinado na noite de 6
de Dezembro por alguns jovens que entraram na casa do missionário
em Diepsloot, um município de Pretória. Cinco pessoas suspeitas de
estarem envolvidas no assassinato do P. Blondel foram presas pela
polícia sul-africana.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos81,7%
Animistas9,3%
Agnosticos3,2%
Muçulmanos2,4%
Hindus2,4%
Outros1%
Cristãos
39.381.090
Católicos
3.666.000
Circunscrições
eclesiásticas
27
SUPERFÍCIE
1.221.037km2
POPULAÇÃO
50.492.000
REFUGIADOS
47.974
DESALOJADOS
---
353
ÁFRiCA DO SUL
O Artigo 15º da Constituição estabelece a liberdade religiosa. Além
disso, a Carta de Direitos proíbe expressamente o Governo de discriminar por qualquer razão com base em motivos religiosos e enfatiza
o direito de todos a praticar a própria religião e de fazer parte de grupos religiosos. O Estado respeita essa liberdade.
Os grupos religiosos não são obrigados a registarem-se.
A instrução religiosa nas escolas estatais é permitida mas não obrigatória.
A Igreja Católica consolidou os seus direitos ao abrigo da “Liberdade
Religiosa” para ensinar a fé católica e para celebrar a missa regularmente em todas as suas escolas, até mesmo naquelas que são agora
classificadas como “Escolas Públicas em Propriedade Privada”, uma
definição que demonstra como estas servem o bem comum.
ÁFRICA DO SUL
Nos dias que antecederam as eleições presidenciais de 22 de Abril de 2009, a Conferência
Episcopal Católica da África do Sul (SACBC) escreveu na sua carta pastoral intitulada “Despertem! Despertem! Protejam a nossa democracia!” sobre o grave problema da corrupção
generalizada, “a qual resulta num sentimento de desilusão, de impotência e na falta de esperança das pessoas” e, por conseguinte, “enfraquece a sua participação e destrói o coração da
democracia”. Exortava as pessoas “a participarem e a responderem às questões que surgem
numa base contínua – e não apenas na altura das eleições”.
354
AnGOLA
Católicos
A Nunciatura Apostólica em Luanda foi alvo de um ataque à mão
armada na noite de 19 de Abril de 2010, quando três ladrões entraram
no edifício, apontaram armas e exigiram que lhes fossem entregues
dinheiro e objectos preciosos. “Graças à nossa fé, conseguimos manter a calma e convencer os ladrões de que a Nunciatura” tinha “muito
poucas coisas para roubar”, declararam fontes da Nunciatura. “Os
ladrões acabariam por ficar satisfeitos por levarem alguns objectos e
algum dinheiro, e foram-se embora”. O assalto, que durou menos de
meia hora, é considerado como tendo sido um acto criminoso normal,
um de muitos num país que saiu de uma guerra civil de vinte anos
em 2002, deixando muitas armas de guerra nas mãos da população
civil, fomentando deste modo o banditismo.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos93,8%
Animistas4,6%
Outros1,6%
Cristãos
14.108.413
Católicos
8.841.000
Circunscrições
eclesiásticas
16
SUPERFÍCIE
1.246.700km2
POPULAÇÃO
18.993.000
REFUGIADOS
14.734
DESALOJADOS
---
355
AnGOLA
A Constituição providencia a liberdade religiosa e o Estado é geralmente tolerante em relação a todos os credos religiosos e permite a
prática pública da religião. O Artigo 8º requer que o Estado não só permita a liberdade de culto, mas que também “proteja as igrejas e locais
e objectos de culto, contanto que estes cumpram as leis do Estado”.
A lei obriga cada grupo religioso a registar-se e define como prérequisitos para esse registo que cada grupo conte com pelo menos
100.000 membros em pelo menos dois terços das províncias do país.
Tal acaba por negar o reconhecimento a muitos grupos, sejam estes
os pequenos grupos muçulmanos ou as centenas de pequenas Igrejas Evangélicas, muitas das quais são originalmente do Congo ou do
Brasil e que continuam à espera do reconhecimento.
Em todo o caso, não há nenhuma evidência de que as autoridades
tenham impedido grupos religiosos não-registados de levar a cabo
as suas actividades. Porém, apenas os grupos registados podem abrir
escolas e locais de culto.
Em Março de 2009, a líder do Instituto Nacional para os Assuntos
Religiosos (INAR), Maria de Fátima Republicano Viegas, declarou que
o Governo iria investigar as actividades das mesquitas por via de preocupações de que as práticas islâmicas poderiam ir contra as leis do
Estado. O Governo receia que a expansão do Islão possa difundir práticas sociais que são contrárias às leis civis. Por esta razão, declarou
que iria assegurar que não serão promovidos estilos de vida contrários aos princípios civis da sociedade.
AnGOLA
O caso “Rádio Ecclesia”
O Governo e a Rádio Ecclesia, que é propriedade da Caritas local, permanecem em conflito,
mas há tentativas para encontrar uma solução que satisfaça ambas as partes e permita à
estação de rádio difundir para todo o país.
Recentemente, o Governo reiterou que a estação de rádio não pode difundir para todo o país
por razões técnicas e jurídicas. Ao abrigo da lei angolana actual, as estações de rádio não
estatais podem apenas difundir nas províncias onde estão fisicamente situadas, mas uma
nova lei prestes a ser aprovada deverá resolver o problema.
A Rádio Ecclesia, a funcionar desde 1954, é considerada a rádio independente com maior
alcance. Não se limita à cobertura de assuntos religiosos, mas inclui na sua programação
todos os tópicos e áreas possíveis e tem a reputação de tratar assuntos controversos como
a corrupção nas instituições públicas, o caso das crianças atacadas por cães nas lixeiras da
cidade de Luanda e o destino dos refugiados da guerra civil que ficaram sem abrigo de modo
a abrir espaço para projectos de construção financiados por interesses chineses e brasileiros.
Nas últimas décadas, tudo isto levou a conflitos com o Governo, que nacionalizou esta rádio
em 1978, só a devolvendo à Igreja em 1997.
Feitiçaria
Nalgumas partes do país, especialmente no Norte, ainda são praticados certos costumes religiosos tradicionais, incluindo, em alguns casos, sacrifícios rituais, abusos sobre menores e
actos de “magia”. Durante o período sob consideração, o Governo proibiu dezassete grupos
no enclave de Cabinda, no Norte de Angola. Estes grupos foram acusados de não estarem
formalmente registados e de realizarem funções religiosas em residências privadas sem
autorização.
De acordo com fontes das Nações Unidas em Angola, ali como em outras partes de África,
certas mulheres anciãs, mas especialmente crianças, são “vistas” como bruxas ou feiticeiras,
“culpadas de não satisfazerem os padrões tradicionais”. O resultado é que uma vez acusadas
de feitiçaria, as pessoas são forçadas a deixar as suas casas e comunidades. A UNICEF lamentou a situação que afecta milhares de crianças em Angola e noutros países na região.
“Chega de acusações de feitiçaria contra crianças”, afirmou o Monsenhor Giovanni Becciu,
Núncio Apostólico de Angola, num apelo que fez em Setembro de 2009.
356
ARGÉLiA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos98%
Agnósticos1,8%
Cristãos0,2%
Cristãos
100.350
Católicos
4.000
Circunscrições
eclesiásticas
4
SUPERFÍCIE
2.381.741km2
POPULAÇÃO
35.423.000
REFUGIADOS
94.137
DESALOJADOS
---
357
ARGÉLiA
A Constituição argelina garante a liberdade religiosa, mas o Islão é a
religião do Estado e, embora a Igreja Católica assim como os Protestantes sejam tolerados, eles não devem tentar converter os Argelinos.
Porém, desde há alguns anos, assiste-se a um número crescente de
conversões ao Cristianismo. Os novos convertidos juntaram-se sobretudo à Igreja Protestante da Argélia, composta por cerca de trinta
denominações diferentes. Deste modo, de acordo com fontes locais,
a Igreja Católica teria baptizado, no máximo, 500 pessoas nos últimos trinta anos, enquanto que tiveram lugar, desde a década de 1990,
cerca de 200 baptismos protestantes por ano.
Os sacerdotes da Igreja Católica são todos estrangeiros, enquanto
os das comunidades protestantes são cada vez mais nativos do
país. Desde 2005, o presidente da Igreja Protestante é um argelino,
enquanto antes esta função era exercida por um estrangeiro. A Igreja
Protestante é argelina e está empenhada em expressar-se e ser testemunho de fé no seu país. Porém, tal coloca problemas às autoridades do Estado. Assim, o Ministro dos Assuntos Religiosos, Bouabdellah
Ghlamallah, declarou numa entrevista ao diário argelino Liberté de 13
de Outubro de 2008: “O Islão e a pátria são uma e a mesma coisa”.
Qual é então o lugar dos argelinos que não são muçulmanos? (sítio
da Internet Notre-Dame de Kabylie, 25 de Novembro de 2008).
Os argelinos que professam o Cristianismo encontram algumas dificuldades para viverem em pleno a sua fé e fazerem respeitar a sua
identidade cristã. Por exemplo, não podem dar um nome próprio cristão aos seus filhos, pois a administração recusa-se a registar crianças
com tais nomes. Porém, todos os argelinos com um primeiro nome
muçulmano têm de ser enterrados num cemitério islâmico.
Para travar a onda de conversões, o Estado argelino fez votar no Parlamento uma lei sobre a regulamentação do culto religioso que se
encontra em vigor depois de a legislação necessária se ter tornado
efectiva a 1 de Março de 2006 (ver Relatório da Liberdade Religiosa no
Mundo de 2008). Foram tomadas várias medidas contra eclesiásticos
e responsáveis cristãos de modo a aplicar estas novas regras.
Além disso, uma campanha de imprensa sem precedentes contra os
“Cristãos Evangélicos” formou uma amálgama a partir das acções de
proselitismo dos pentecostais americanos e da missão da Igreja Católica, cujos símbolos foram reproduzidos sistematicamente à maneira
de ilustração nos jornais que publicam reportagens sobre a evangelização. Este tipo de cobertura jornalística tornou-se quase quotidiano,
em especial nos jornais de língua árabe como o Echourouk, o Ennahar
ARGÉLiA
e o El Khabar (o de maior tiragem). A campanha contra “a cristianização dos argelinos” parece
ser sustentada pelos serviços de segurança, de acordo com Akli Larbi, académico, defensor
dos direitos humanos e iniciador de uma petição assinada por várias centenas de pessoas
como protesto contra a ameaça às liberdades cívicas dos argelinos. Na sua opinião, “apenas existem benefícios para o poder em brandir o risco evangélico, a ameaça estrangeira,
a divisão interna e o particularismo cabila que está sempre pronto a ser associado a estas
situações.”
No dia 26 de Dezembro de 2009, em Tizi-Ouzou (Cabília), cerca de uma vintena de muçulmanos atacou uma igreja construída recentemente e que servia a comunidade pentecostal
Tafat (“Luz”, em berbere), durante a missa da manhã. Todos os membros desta comunidade,
cerca de 300, eram antigos muçulmanos. Dois dias depois, durante a noite, alguns dos atacantes voltaram à cena e entraram no edifício, roubaram o que puderam do seu interior e
incendiaram-no. No dia 2 de Janeiro seguinte, um outro grupo de atacantes entrou na igreja,
interrompendo a missa. Outros voltaram a 9 de Janeiro para queimar tudo o que encontraram (mobília, Bíblias, livros de cânticos e uma cruz).
Durante um colóquio sobre a liberdade de culto que teve lugar na capital em meados de
Fevereiro de 2010 sob iniciativa do Ministério dos Assuntos Religiosos, o Monsenhor Ghaleb
Bader, Arcebispo de Argel, interveio para defender firmemente os direitos da Igreja. Embora
se mostrasse satisfeito pelo facto de a legislação de 1 de Março de 2006 reconhecer a existência de outras religiões na Argélia para além do Islão, fez notar também que a presença de
padres é necessária para que o culto católico possa ser celebrado. Porém, o Governo argelino
recusa-se cada vez mais frequentemente a atribuir vistos aos padres e às religiosas que os
solicitam. No seguimento da sua intervenção, o Monsenhor Bader lamentou que os Protestantes, numerosos em Cabília, não tenham lugares de culto suficientes pois a sua presença é
recente, ao contrário da Igreja Católica. O Monsenhor Bader acrescentou ainda: “Nós queremos ser considerados 100% argelinos”.
Para o arcebispo, a situação poderia, porém, evoluir para uma maior flexibilidade. “A Argélia é
provavelmente o estado árabe muçulmano mais respeitador da liberdade dos seus cidadãos
que caminham para Cristo, embora tal desconcerte profundamente a sociedade e suscite
por vezes na população ou na imprensa reacções vivas, ou até mesmo violentas”. Mas, acrescentou ele, “as recusas de vistos impostas aos padres ou às religiosas poderiam provocar
um estrangulamento da Igreja, confrontada com um forte envelhecimento dos seus quadros,
mas o diálogo com as autoridades continua”.
358
bEnin
No período avaliado para este relatório não ocorreram eventos significativos, nem há relatos de violações da liberdade religiosa.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos43,8%
Animistas30,4%
Muçulmanos25,5%
Outros0,3%
Cristãos
2.142.000
Católicos
2.447.000
Circunscrições
eclesiásticas
10
SUPERFÍCIE
112.622km2
POPULAÇÃO
9.212.000
REFUGIADOS
7.205
DESALOJADOS
---
359
bEnin
A Constituição estabelece a liberdade religiosa e o Governo geralmente respeita este direito ao aplicar as suas políticas, tentando protegê-lo de abusos por parte de círculos governamentais ou privados,
assim contribuindo para a livre prática da religião.
Em particular, neste país, as relações geralmente amistosas entre os
diferentes grupos religiosos contribuíram para o verdadeiro desenvolvimento da liberdade religiosa.
Os Muçulmanos, em particular, encontram-se presentes no Norte e
no Sudeste do país, enquanto os Cristãos se instalaram no Sul, sobretudo na capital económica do país, Cotonou. Quase todos os muçulmanos são membros do Islão sunita. Os poucos muçulmanos xiitas
existentes são quase todos imigrantes do Médio Oriente.
Muitos cristãos e muçulmanos também praticam religiões indígenas.
No Benim, não é incomum membros da mesma família praticarem
o Cristianismo, o Islão e as religiões indígenas tradicionais, principalmente o vudu, ou mesmo uma combinação dos vários credos.
Este sincretismo religioso no seio de famílias e de comunidades levou
a uma atitude geral de tolerância religiosa a todos os níveis da sociedade e em todas as regiões do país.
bOTSWAnA
bOTSWAnA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos65,1%
Animistas33,5%
Outros1,4%
Cristãos
870.903
Católicos
90.000
Circunscrições
eclesiásticas
2
SUPERFÍCIE
581.730km2
POPULAÇÃO
1.978.000
REFUGIADOS
3.022
DESALOJADOS
---
360
A Constituição reconhece a liberdade religiosa e o Governo respeita
esta deliberação.
Esta liberdade só pode ser suspensa por importantes razões de interesse público, tais como a defesa nacional, a saúde nacional e a ordem
pública, e com a condição de que tal suspensão seja “razoavelmente
justificável numa sociedade democrática”.
Os grupos religiosos têm que se registar, tal como acontece com
todas as outras organizações ou instituições, mas os procedimentos
de registo são geralmente rápidos. Sem o registo, uma organização
não pode assinar contratos ou abrir uma conta bancária. Os responsáveis por uma organização não-registada podem ser punidos com
multas ou até mesmo anos de prisão.
Todas as comunidades religiosas são livres de construir locais de culto
às suas próprias custas.
As escolas ligadas a confissões religiosas recebem ajuda estatal mas
são forçadas a usar os livros de estudo providenciados pelo Governo.
Porém, de acordo com notícias recentes, o ensino da Educação Religiosa Cristã (ERC) será brevemente substituído pela Educação Religiosa, disciplina na qual todas as religiões são ensinadas como parte
da Educação Social. Os estudantes cristãos não poderão continuar a
frequentar a Educação Religiosa Cristã.
Além desta situação, as dificuldades para os missionários estrangeiros presentes no país aumentaram. Aos missionários cujas autorizações de residência e de trabalho expiraram, são apenas concedidas
autorizações temporárias de um ou três meses, dependendo do funcionário. Além disso, os novos regulamentos tornam difícil e quase
impossível a entrada de missionários no país, sendo estes urgentemente necessários para a evangelização. A lei diz que o posto de um
pároco tem de ser anunciado publicamente e que só se nenhum residente local se candidatar é que um missionário estrangeiro pode dar
entrada no país.
bURKinA FASO
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos51,4%
Animistas27,8%
Cristãos20,3%
Outros0,5%
Cristãos
2.359.042
Católicos
1.971.000
Circunscrições
eclesiásticas
13
SUPERFÍCIE
274.200km2
POPULAÇÃO
16.287.000
REFUGIADOS
543
DESALOJADOS
---
361
bURKinA FASO
A Constituição reconhece o direito à liberdade religiosa e o Estado
protege o direito de cada cidadão professar a religião da sua escolha.
As organizações religiosas têm de se registar e a falta desse registo
é passível de multa. Durante o período avaliado neste relatório, a
nenhum grupo religioso foi negado o registo.
As escolas públicas não proporcionam instrução religiosa, mas os
vários grupos religiosos podem criar as suas próprias escolas, com o
Governo a supervisionar a validade académica dos seus currículos. A
Igreja Católica gere trinta e oito jardins-de-infância, com 2643 alunos;
108 escolas primárias, com 23014 alunos; cinquenta e oito escolas do
segundo e terceiro ciclos, com 19876 alunos (Fides, 20 de Março de
2010, citando o Anuário Estatístico da Igreja).
Grande parte da população ainda segue as convicções e rituais tradicionais, frequentemente professados de uma forma sincretista, juntamente com outras religiões. Sobretudo em zonas rurais, os habitantes expulsam por vezes as anciãs suspeitas de serem bruxas. A Igreja
Católica financia o Centro Delwende, o qual aloja estas mulheres, acolhendo ainda pessoas sem-abrigo. O Estado, bem como outras organizações religiosas e leigas privadas, também gere e financia alguns
centros semelhantes.
bURUnDi
bURUnDi
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos92,9%
Animistas5,5%
Muçulmanos1,4%
Outros0,2%
Cristãos
6.919.682
Católicos
5.446.000
Circunscrições
eclesiásticas
7
SUPERFÍCIE
27.834km2
POPULAÇÃO
8.519.000
REFUGIADOS
24.967
DESALOJADOS
100.000
362
O Governo respeita a liberdade religiosa, a qual é reconhecida para
todos os cidadãos pela Constituição de 2005. O registo é obrigatório
para todos os grupos religiosos e o procedimento normalmente dura
algumas semanas. Os pedidos têm de incluir os estatutos do grupo,
o endereço da sua sede no país e outra informação relativa aos seus
líderes e ao representante legal. Durante o período avaliado, nenhum
pedido de registo por parte de organizações religiosas foi rejeitado.
Sem registo, os grupos religiosos não podem empreender qualquer
actividade pública e os seus escritórios e os seus locais de culto ou de
reunião são encerrados. A lei estabelece sentenças penais rígidas para
os transgressores, embora estas não sejam aplicadas há anos.
Deu-se um acontecimento violento durante o período avaliado para
este relatório que envolveu o assassinato, no dia 8 de Março de 2009,
do P. Revocat Gahimbare, responsável pela Paróquia de Karuzi. Este
assassinato, no entanto, pareceu ser um acto criminoso e não de intolerância religiosa.
CAbO VERDE
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos95,1%
Muçulmanos2,8%
Outros2,1%
Cristãos
484.000
Católicos
484.000
Circunscrições
eclesiásticas
2
SUPERFÍCIE
4.033km2
POPULAÇÃO
513.000
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
---
363
CAbO VERDE
A Constituição estabelece a liberdade religiosa e o Governo geralmente respeita este direito tentando, a todos os níveis, protegê-lo e
esforçando-se por não tolerar qualquer forma de abuso.
O Código Penal, em vigor desde 2004, define que as violações da
liberdade religiosa são crimes puníveis com sentenças que variam
entre três meses e três anos de prisão.
Não existe qualquer religião de Estado; pelo contrário, a Constituição
estabelece uma separação clara entre o Estado e a Igreja, e proíbe o
Estado de impor qualquer convicção religiosa. No entanto, a Igreja
Católica desfruta de um estatuto privilegiado na vida do país. Por
exemplo, o Governo proporciona à Igreja Católica tempo de antena
gratuito na televisão, tempo esse destinado a actividades religiosas.
Todas as associações, quer sejam religiosas, quer sejam laicas, têm
de se encontrar registadas junto do Ministério da Justiça a fim de
assim obter estatuto jurídico. Ao abrigo da Constituição e das leis
que regulam a actividade associativa, esse registo é obrigatório.
Não existem quaisquer incentivos particulares para o registo e não
existem quaisquer sanções para o não cumprimento dessa regra. A
única desvantagem consiste no facto de que os grupos não registados não podem solicitar e desfrutar, enquanto associações, de benefícios ou de empréstimos, quer estes sejam privados, quer sejam
governamentais.
Durante o período de tempo considerado, não ocorreram acontecimentos ou mudanças significativas.
CAMARÕES
CAMARÕES
A liberdade religiosa é decretada pela Constituição e respeitada pelas
autoridades. Os grupos religiosos são obrigados a obter o registo para
realizar quaisquer actividades e não podem operar sem reconhecimento, embora, com efeito, vários grupos religiosos menores continuem a fazê-lo, uma vez que os procedimentos de registo podem ser
muito prolongados.
O país goza de grande tolerância religiosa, com grupos islâmicos e
cristãos a coexistir sem grandes problemas e a organizar cerimónias
de oração em comum, embora tenha por vezes sido registada alguma
tensão a nível local. Durante a visita do Papa Bento XVI, em Março de
2009, a Conferência Episcopal da Igreja Católica dos Camarões organizou uma reunião entre o Santo Padre e os líderes islâmicos como
sinal e estímulo para a coexistência pacífica.
O Estado permite a existência de escolas particulares administradas
por grupos religiosos, tanto cristãos como muçulmanos, e também
lhes proporciona subsídios. Também existem universidades administradas por organizações religiosas.
A prática da feitiçaria é considerada um crime quando tiver por objectivo influenciar as pessoas para obtenção de fundos. As práticas religiosas tradicionais não são, no entanto, consideradas crime. Porém,
a população aplica um comportamento discriminatório, expulsando
anciãs acusadas de serem bruxas e até mesmo crianças afectadas por
deficiências físicas ou mentais, ou outras características “diferentes”.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos56,6%
Animistas22,4%
Muçulmanos20%
Outros1%
Cristãos
9.307.766
Católicos
4.916.000
Circunscrições
eclesiásticas
23
SUPERFÍCIE
475.442km2
Rádio Veritas
POPULAÇÃO
19.958.000
REFUGIADOS
99.957
DESALOJADOS
---
364
Os problemas vividos nos últimos anos pela católica Rádio Veritas
parecem ter sido finalmente ultrapassados. A estação de rádio, que
os meios de comunicação social descrevem como sendo a criação do
anterior primado do país, Cardeal Tumi, foi encerrada em Novembro
de 2003 por ser classificada como “estação de rádio pirata”, porque
estava a difundir sem a necessária autorização. A situação para as
estações de rádio privadas é difícil neste país, porque embora um
decreto datado de 2000 reconheça a liberdade de radiodifusão, na
prática é difícil obter a autorização e, mesmo depois de muitos anos,
muitas estações de rádio ainda estão a difundir com licenças temporárias. Esta estação de rádio obteve uma licença para radiodifusão em
meados de Dezembro de 2003, sob a condição de aderir ao seu “carácter de confissão religiosa”. Continuaram a registar-se problemas nos
anos seguintes, com a estação a ser ocasionalmente encerrada.
CHADE
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Religious adherents
Muçulmanos57,3%
Cristãos25,5%
Animistas16,2%
Outros1%
Cristãos
2.198.604
Católicos
962.000
Circunscrições
eclesiásticas
8
SUPERFÍCIE
1.284.000km2
POPULAÇÃO
11.506.000
REFUGIADOS
338.495
DESALOJADOS
168.000
365
CHADE
A Constituição estabelece a laicidade do Estado e garante a liberdade
religiosa. O Estado geralmente respeita este princípio, embora imponha restrições e proibições aos grupos que são considerados violentos.
À excepção da religião indígena, todos os grupos religiosos são obrigados a registar-se. O registo é uma formalidade que decorre sem
qualquer abuso de autoridade.
A instrução religiosa é permitida em escolas particulares muçulmanas e cristãs, mas proibida nas escolas públicas. Além disso, o Governo
pretende fechar as escolas corânicas que infligem abusos aos seus
alunos, ao ponto de os forçar a pedir nas ruas.
A coexistência entre Muçulmanos e Cristãos é, em geral, pacífica,
embora esporadicamente se sinta alguma tensão, especialmente
devida à presença de grupos islâmicos extremistas e a conflitos entre
muçulmanos radicais e moderados. Em termos mais gerais, a guerra
civil que há anos devasta o país, tem consequências graves em todos
os aspectos da vida social, incluindo no exercício das actividades religiosas. Apesar do destacamento das Forças de Paz das Nações Unidas
para o país, o sequestro e o assassinato de civis e de trabalhadores
de ajuda humanitária continua a acontecer (as fontes das Nações
Unidas falam em pelo menos 192 ataques a trabalhadores de ajuda
humanitária, ocorridos entre Janeiro e Outubro de 2009), bem como
a violência de todo o tipo contra as mulheres e as jovens, com crianças a serem forçadas a lutar enquanto soldados. Continuam a ocorrer
tiroteios entre o exército e grupos rebeldes, assim como com simples
criminosos.
O Governo exerce um controlo indirecto sobre as actividades dos grupos islâmicos através do Conselho Superior para os Assuntos Islâmicos, o qual, de comum acordo com o presidente da República, designa
o grande Imã, o líder espiritual muçulmano. O Conselho supervisiona
também as actividades religiosas em geral, incluindo a supervisão
das escolas e das instituições de ensino superior muçulmanas árabes.
Um representante da comunidade religiosa é membro do Revenue
Management College, uma instituição que participa na distribuição
dos rendimentos provenientes do petróleo. A ocupação deste lugar
alterna entre um líder islâmico e um cristão, mudando a cada quatro
anos.
O Governo proíbe todas as actividades que “não incentivem a [pacífica] coexistência entre as pessoas”. Além disso, em anos recentes, o
Governo proibiu os seguintes grupos muçulmanos por instigarem
CHADE
violência com fins religiosos: o Al-Mountada Al-Islami, a Assembleia Mundial da Juventude
Islâmica, a Fundação de Beneficência Mecca Al-Moukkarrama e a Fundação de Beneficência
Al-Haramain.
Para evitar o conflito social, a proibição do proselitismo em público, datada de Julho de 2007,
continua a ser aplicada. Porém, um grupo local pode pedir às autoridades uma autorização
para acções de proselitismo.
No dia 4 de Abril de 2009, um edifício em Biltine, também utilizado como local de culto
protestante, foi danificado e incendiado. Por razões que ainda não foram clarificadas, não
existe nenhum relato de que a polícia tenha investigado o assunto ou identificado qualquer
suspeito.
366
COMORES
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos98,3%
Cristãos1,1%
Outros0,6%
Cristãos
10.020
Católicos
6.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
2.235km2
POPULAÇÃO
691.000
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
---
367
COMORES
A Constituição do pequeno arquipélago das Ilhas Comores reconhece
a liberdade religiosa mas, na prática, o Governo não respeita este
direito. De acordo com o Direito Penal, o proselitismo por parte de
qualquer outra religião que não o Islão é um crime, punível com uma
sentença de prisão e uma multa. Até mesmo a simples distribuição
de Bíblias ou de outros textos religiosos cristãos é considerada uma
actividade de proselitismo. Os estrangeiros acusados de proselitismo
são expulsos do país e os que se convertem são castigados.
No dia 17 de Maio de 2009, e por uma grande maioria, os habitantes
das Ilhas Comores aprovaram o referendo constitucional que concede
mais poder ao presidente do Estado e prolonga o seu mandato (que
terminará agora em 2011 em vez de 2010). O referendo foi aprovado
por 93,9% dos votantes; no entanto, apenas 51,7% dos que detinham
o direito de votar o fizeram, uma vez que a oposição política tinha
pedido às pessoas para se absterem. Este mesmo referendo também
aprovou a declaração do Islão como religião de Estado.
Mais de 98% dos habitantes são muçulmanos sunitas. Os Cristãos são
poucos e são todos estrangeiros. Várias fontes acreditam que os cristãos
locais preferem manter a sua fé em segredo com medo de perseguições. A
discriminação contra cristãos é frequente e ocorre a quase todos os níveis.
Os grupos religiosos não são obrigados a pedir o seu reconhecimento.
No entanto, para os grupos não-muçulmanos qualquer expressão
pública da sua fé pode ser interpretada como proselitismo. O Governo
permite que os grupos religiosos criem os seus locais de culto, providenciem os seus próprios sacerdotes e se reúnam para rezar ou
realizar outras actividades pacíficas. Existem duas igrejas católicas e
uma protestante. Mas os residentes não-muçulmanos preferem não
praticar a sua fé em público devido a receios de serem acusados de
proselitismo e de isso conduzir a retaliações jurídicas.
Nos últimos anos, houve relatos de grave discriminação social contra
cidadãos não-muçulmanos, como ser excluído da escola local ou até
mesmo da aldeia e ser acusado de proselitismo entre Muçulmanos.
Não há relatos de discriminação específica durante o período analisado para este relatório.
A instrução religiosa islâmica não é obrigatória nas escolas públicas,
mas é frequentemente proporcionada. Os estrangeiros podem pedir
que os seus filhos fiquem isentos de assistir a essas aulas, mas todas as
crianças entre os quatro e os sete anos de idade frequentam disciplinas
na escola onde são ensinadas a entender e a decorar versos do Alcorão.
O Grande Mufti, designado directamente pelo presidente, é membro
do Governo e delibera sobre assuntos relativos a religião e administração religiosa.
COnGO bRAZZAViLLE
COnGO bRAZZAViLLE
Os três parágrafos do Artigo 26º da Constituição definem como
sendo invioláveis a liberdade de consciência, de religião e de convicções filosóficas, garantindo o seu livre exercício quando compatível
com a ordem e moral públicas. Estes princípios são normalmente respeitados.
Todas as organizações, tanto religiosas como as sem fins lucrativos,
têm de se registar, mas não existem relatos de casos nos quais as
autoridades tenham negado o registo.
A instrução religiosa não é facultada nas escolas estatais, mas é permitida em escolas geridas por organizações religiosas.
As principais festividades cristãs são feriados nacionais e os dias santos muçulmanos, embora não sendo feriados nacionais, são também
respeitados.
Não existem relatos de actos de intolerância religiosa perpetrados
pelas autoridades ou por membros da sociedade civil.
Durante uma reunião do Conselho Ecuménico das Igrejas Cristãs no
Congo, realizada em Janeiro de 2009, depois de um encontro de oração intitulado “Estaremos todos unidos nas Tuas mãos”, os pastores
religiosos congoleses que estavam reunidos expressaram a sua esperança pela normalização total do país, mas recordaram que “porém,
as feridas de guerra ainda estão abertas, com o regionalismo, o crime
e a especulação ilegal. Todas estas atitudes negativas” afirmaram,
“devem ser banidas da nossa maneira de gerir a sociedade”.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos89,8%
Animistas4,8%
Outros5,4%
Cristãos
4.005.504
Católicos
2.637.000
Circunscrições
eclesiásticas
7
SUPERFÍCIE
342.000km2
POPULAÇÃO
3.759.000
REFUGIADOS
111.411
DESALOJADOS
7.800
368
COSTA DO MARFiM
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Animistas35%
Cristãos33%
Muçulmanos31,4%
Outros0,6%
Cristãos
6.251.880
Católicos
4.313.000
Circunscrições
eclesiásticas
14
SUPERFÍCIE
322.463km2
POPULAÇÃO
21.571.000
REFUGIADOS
24.604
DESALOJADOS
------
369
COSTA DO MARFiM
A população deste país encontra-se mais ou menos igualmente dividida entre Cristãos, Muçulmanos (presentes especialmente na parte
Norte do país) e seguidores de religiões indígenas tradicionais, sendo
que estes últimos continuam a ser vítimas de discriminação por parte
dos membros dos outros grupos religiosos, os quais consideram que
eles são de um “estatuto social” inferior.
As associações e grupos religiosos têm de se registar junto do Ministério do Interior.
O ensino religioso é permitido nas escolas, inclusive nas escolas estatais, com a condição de que não ocorra durante o horário escolar normal.
Durante o período de tempo considerado não houve mudanças significativas institucionais relativamente à liberdade religiosa.
EGiPTO
EGiPTO
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos87,1%
Cristãos12,2%
Outros0,7%
No Egipto, os cristãos continuam a ser discriminados embora não oficialmente. Eles são excluídos de posições de topo nas forças armadas,
na polícia e nas universidades, com excepção de cargos de nomeação directa que não beneficiam necessariamente a comunidade. Tal
foi o caso em 2006, quando o presidente Hosni Mubarak designou
um copta como governador de Qena. Para os cristãos locais, a escolha
não trouxe grandes melhorias, porque um governador cristão tem de
demonstrar o seu valor constantemente aos olhos dos Muçulmanos.
Entretanto, o extremismo continua a crescer por entre a população
muçulmana.
Violência anti-cristã
Cristãos
11.402.010
Católicos
196.000
Circunscrições
eclesiásticas
15
SUPERFÍCIE
1.001.449km2
POPULAÇÃO
84.474.000
REFUGIADOS
94.406
DESALOJADOS
---
370
Em Alexandria, em Abril de 2009, centenas de muçulmanos atacaram
lojas que eram propriedade de cristãos, no seguimento de rumores
em como três irmãos cristãos tinham morto um muçulmano no edifício que lhes pertencia e onde a vítima vivia.
Em Junho de 2009, na província de Qalubiya, a Norte do Cairo, um
cristão de 60 anos foi espancado até à morte por um jovem muçulmano de 24. Existiam suspeitas de que o filho da vítima teria tido
uma relação ilegal com a irmã do assassino.
No dia 21 de Junho de 2009, muçulmanos atacaram coptas residentes na aldeia de Ezbet Bouchra Leste, destruindo as suas casas e as
colheitas. A acção foi causada pela chegada de vinte e cinco cristãos
do Cairo para visitar um padre local, o P. Isaac Castor, que vivia num
edifício propriedade da Igreja Copta. Por causa disto, os muçulmanos
deduziram que os visitantes cristãos tinham vindo para tomar parte
numa celebração religiosa. Dezanove cristãos foram depois presos e
libertados no dia seguinte.
Em Setembro de 2009, nas regiões de Assuão, Daqahlîya, Mar Vermelho e Port-Said, 150 cristãos foram presos por “quebrarem publicamente o jejum do Ramadão”, ou seja, por comerem ou fumarem
na rua antes do pôr-do-sol. A maioria foi libertada da prisão depois
de pagar uma multa de 500 libras egípcias (65 Euros). Para Samuel
Alashay, director de um movimento cristão liberal, esta acção, a primeira no Egipto, poderia ser uma resposta a uma greve realizada no
dia 11 de Setembro por um número considerável de coptas que exigiam uma lei que simplificaria a construção de igrejas. A greve ocorreu no seguimento de uma fatwa (édito religioso) emitida pelo Con-
EGIPTO
selho Islâmico do Egipto declarando que “É um pecado contra Deus um muçulmano doar
dinheiro para a construção de uma igreja”.
No final da missa da meia-noite do dia 7 de Janeiro de 2010 (de acordo com o calendário
Ortodoxo), vários coptas foram mortos a tiro quando saíam da Igreja de Mar Girgis (São
Jorge) em Nag-Hammadi (Alto Egipto), a quarenta quilómetros de Luxor. Um carro parou
em frente à igreja, três homens saíram e começaram a disparar sobre os crentes enquanto
eles saíam da igreja. Foram mortas sete pessoas, incluindo um polícia, e mais uma dezena de
pessoas ficaram feridas, incluindo dois muçulmanos.
O massacre foi supostamente um acto de vingança pela violação de uma menina muçulmana de doze anos, alegadamente cometida por um copta, em Farshout, próximo de NagHammadi, em Novembro de 2009. Um copta de 21 anos foi preso em relação àquele caso
mas a sua culpabilidade nunca foi demonstrada.
Como represália, muçulmanos pilharam e atearam fogo a lojas e casas propriedade de cristãos. Cerca de 80% das lojas atacadas foram destruídas. Alguns cristãos ficaram feridos e
foram raptadas sete cristãs. A polícia apenas actuou depois da destruição. As autoridades
locais pediram às vítimas cristãs para não apresentarem queixa e que procurassem, por
outro lado, alguma forma de acordo com os atacantes muçulmanos. Nenhum dos cristãos
recebeu qualquer indemnização.
De acordo com o Bispo ortodoxo copta de Nag-Hammadi, Monsenhor Kyrillos, nos dias que
antecederam o Natal, vários coptas receberam ameaças advertindo-os de que os Muçulmanos “se vingariam, na altura do Natal, pela violação da menina”. O bispo acrescentou que
tinha avisado a polícia local, a qual não tomou, porém, nenhuma providência para proteger
a igreja.
O tiroteio foi planeado para matar tantos cristãos quanto possível, mas a maioria dos paroquianos já tinha deixado a igreja porque o padre local tinha antecipado a hora da missa
como medida de segurança. Nas semanas que antecedem o Natal, também ele recebera
várias ameaças de morte.
A data e o lugar escolhidos indicam que a violência tem origem no crescimento do Islão
político no país. No entanto, e de modo extraordinário, Muhammad Sayyid Tantawy, o imã da
mesquita de el-Azhar do Cairo e a mais alta autoridade muçulmana sunita no Egipto, condenou a violência e transmitiu as suas condolências às famílias das vítimas.
No dia 20 de Janeiro de 2010, o Papa Shenouda III declarou que a única coisa que poderia
satisfazer os coptas hoje em dia seria que os tribunais egípcios agissem de um modo justo
e julgassem os assassinos dos cristãos. Na realidade, durante os últimos trinta anos, foram
assassinados cerca de 1800 cristãos e foram perpetrados cerca de 200 actos de vandalismo
contra propriedades cristãs, sem que ninguém fosse levado perante um tribunal, quanto
mais castigado.
Tendo sido negligentes até aqui, as autoridades, depois do massacre de Nag-Hammadi,
declararam que os responsáveis iriam ter de enfrentar uma justiça dura. Os acusados, entre
371
EGiPTO
os quais se contava um agressor reincidente, foram levados perante um Tribunal de Segurança do Estado.
De modo a demonstrar a sua determinação, um tribunal egípcio condenou, no dia 22 de
Fevereiro, cinco muçulmanos a prisão perpétua pelo assassinato de dois cristãos, em Hagaza
(Alto Egipto), em Abril de 2009.
No entanto, no princípio de Março, um tribunal em Asyut absolveu quatro muçulmanos acusados de matar um cristão em Outubro de 2009, isto apesar do facto de o assassinato ter
sido levado a cabo perante várias testemunhas e ter sido particularmente brutal. A vítima,
Atallah Farouk, não foi apenas atingida a tiro várias vezes na cabeça, tendo sido ainda decapitada e o seu corpo arrastado pelas ruas enquanto os seus assassinos gritavam vitória. Na sua
decisão, o tribunal recusou-se a levar em conta o testemunho da filha da vítima e o de um
homem ferido por tiros durante o ataque. Os meios de comunicação social locais relataram
que a maioria das outras testemunhas se recusou a testemunhar com medo de represálias.
Para o advogado da família da vítima, Peter Sarwar, “este veredicto envia a mensagem de que
o sangue de um copta é extremamente barato”. Logo depois do veredicto, ele interpôs um
recurso.
No dia 12 de Março de 2010, em Mersa Matruh, uma cidade costeira a Oeste de Alexandria,
um grupo de muçulmanos atacou o bairro cristão de Reefiya, onde habitavam 2000 coptas. No fim do episódio, vinte e quatro cristãos ficaram feridos e foram destruídos dezassete
edifícios e doze carros. Um cristão, um professor chamado Mounir Naguib, declarou que foi
pressionado a converter-se ao Islão. Este acto de agressão, que teve como alvo uma igreja,
seguiu-se às orações de sexta-feira. Numa mesquita próxima, um xeque incitou à jihad contra os cristãos.
Outras formas de violência e injustiça
Tem-se assistido a uma onda de raptos de jovens e mulheres coptas para as forçar a casaremse com muçulmanos.
Durante a Feira Internacional do Livro do Cairo, em Fevereiro de 2009, funcionários da segurança do Estado prenderam dois coptas, Mina Adil Shawki e Issam Kadees Nassif, depois de
estes terem sido vistos com Bíblias nas mãos. Foram mantidos sob custódia durante vários
dias depois de serem acusados de “difamar o Islão”.
Em 2008, a Associação Médica local, que é controlada pela Fraternidade Muçulmana, decidiu
proibir o transplante de órgãos entre pessoas de religiões diferentes. Para Naguib Gabriel,
que é cristão e líder da União dos Direitos Humanos do Egipto, tal decisão é um reflexo do
fanatismo cego. Pelo contrário, para Hamdi el-Sayed, líder da Associação Médica, a proibição é justificada. “Não se trata de tentar promover diferenças entre religiões”, declarou, “mas
apenas de minimizar o comércio de órgãos tanto quanto for possível”. Na realidade, seria
“degradante para ambas as religiões se, por exemplo, um cristão pobre tivesse de vender
um rim a um muçulmano rico, ou se um muçulmano pobre tivesse de vender um rim a um
372
EGiPTO
cristão rico”. A Associação acabaria por reverter a sua decisão no seguimento da intervenção
de vários líderes políticos.
No dia 13 de Setembro de 2008, um café em Port-Said pertencente a uma família cristã, o
Morris Ghatas, foi invadido pela polícia e saqueado por estar aberto durante o Ramadão. Os
seis filhos da família foram presos, dois deles depois de serem feridos. No dia 22 de Janeiro,
o juiz muçulmano, Mohammed Hassan el-Majmoody, condenou todos os seis a três anos
de trabalhos forçados e a uma multa de cerca de 1550 Euros. Ele declarou que a abertura do
café durante o Ramadão constituía um estímulo aos Muçulmanos para comerem e beberem,
quebrando assim o jejum antes do pôr-do-sol. No entanto, nenhuma lei egípcia proíbe restaurantes e estabelecimentos semelhantes de estarem abertos durante o Ramadão.
No dia 28 de Abril de 2009, o Governo egípcio ordenou o abate dos 300.000 porcos do país,
como uma medida preventiva contra a expansão da gripe (suína) H1N1. A decisão foi consideravelmente prejudicial aos cristãos que são os únicos a criarem porcos (um animal considerado impuro pelo Alcorão, II, 173). Esta situação não só afectou negativamente os suinicultores na província, como afectou também e muito os Zabaleen (pessoas do lixo) do Cairo, que
têm permissão para recolher, escolher e dispor dos desperdícios diários da capital e fornecêlos como alimento ao seu gado. Mais ainda, a indemnização do Governo foi inadequada. Para
os coptas, a campanha de abate foi apenas mais um exemplo de discriminação. Para a Organização Mundial de Saúde, o abate dos porcos é desnecessário porque está cientificamente
provado que o vírus não pode ser transmitido do animal para o ser humano. Significativamente, a decisão foi tomada no seguimento de um pedido feito por legisladores próximos à
Fraternidade Muçulmana.
O patriarcado copta-ortodoxo tem estado também directamente envolvido com o sistema
judicial do Egipto. No Verão de 2009, um cristão divorciado, Hani Wasfi Naguib, interpôs um
processo contra o Papa Shenouda III por este ter recusado o seu pedido para se voltar a casar.
O queixoso ganhou no tribunal de primeira instância. O patriarca recorreu para o Tribunal
Superior Administrativo, o qual, no dia 29 de Maio de 2010, confirmou a decisão do tribunal
de primeira instância, declarando: “De acordo com a lei, um cristão pode voltar a casar. A
Constituição garante-lhe o direito a constituir família. O apelo do patriarca Shenouda para
impedir os coptas de se voltarem a casar é assim rejeitado”.
Esta decisão foi baseada na Sharia (lei islâmica), a principal fonte de legislação de acordo
com o Artigo 2º da Constituição do Egipto, que permite um novo casamento em casos de
divórcio ou de repúdio. No entanto, um casamento religioso é obrigatório para uma união ser
considerada legalmente válida. Além disso, as decisões do Supremo Tribunal são irrevogáveis.
Depois do veredicto, o Monsenhor Armiya, secretário do Papa Shenouda III, emitiu uma declaração. Declarou que a Igreja faria tudo o que estivesse ao seu alcance para reverter a decisão
do tribunal e que não deixaria ninguém celebrar um segundo casamento religioso. “Nenhum
poder na Terra pode forçar a Igreja a violar os ensinamentos da Bíblia e as leis da Igreja, de
acordo com as quais nenhum homem poderá separar o que Deus uniu”.
373
EGiPTO
No entanto, no dia 7 de Julho de 2010, um veredicto subsequente do Supremo Tribunal Constitucional reverteu a decisão.
Conversão ao Cristianismo
A conversão ao Cristianismo continua a ser ilegal embora o Artigo 46º da Constituição diga
que o Estado garante a liberdade de convicção e de religião. Na realidade, os tribunais tendem a usar a Sharia. Assim, para o Gabinete de Estatísticas Vitais, um muçulmano que é baptizado continua a ser um muçulmano. Isto significa que um ex-muçulmano não pode mudar
os seus documentos de identidade de modo a reflectir uma nova religião ou um novo nome.
De facto, a falta de uma lei sobre a conversão do Islão para outra religião deixa o assunto nas
mãos dos juízes que têm de escolher entre a Sharia e o princípio da igualdade de todos os
cidadãos perante a lei.
Mohamed Hegazy, um muçulmano convertido ao Cristianismo, levou o seu caso a tribunal
para que lhe fosse reconhecida a sua nova identidade religiosa (ele escolheu o nome Bishoy,
igual ao de um monge do deserto, seguidor de São Macário, cf. Relatório da Liberdade Religiosa no Mundo de 2008). O Supremo Tribunal Administrativo não considerou o seu pedido,
apresentado em Janeiro de 2008. O reitor da Faculdade de Estudos Islâmicos na Universidade de el-Azhar emitiu uma fatwa sentenciando-o a ele e à sua esposa (que também se
converteu) à morte, o que o obrigou a entrar na clandestinidade e o impediu de assistir às
audiências do tribunal.
Em Fevereiro de 2009, Maher el-Gowhary, um muçulmano que se converteu ao Cristianismo há trinta anos, recebendo o nome de Peter Athanasius quando foi baptizado, seguiu
um caminho semelhante para si e para a sua filha de 15 anos, Dina. Convocado pelos juízes,
ele apresentou-se em tribunal, isto apesar dos perigos inerentes ao seu estatuto. Declarado
um “apóstata” por extremistas muçulmanos, tem permanecido escondido, não conseguindo
encontrar trabalho ou enviar a sua filha à escola. O tribunal recusou o seu pedido, dizendo
que constituía uma “ameaça à ordem pública”. De acordo com um dos seus advogados,
a decisão do tribunal deriva do facto de que “O Governo sabe que assim que as pessoas
tenham o direito de deixar o Islão, milhões de ex-muçulmanos forçados a esconder a sua fé
cristã e a viverem com medo de serem descobertos irão assumir em público a sua conversão,
algo que irá causar o caos”.
Falar de milhões de convertidos é obviamente um exagero, mas milhares de muçulmanos
converteram-se secretamente ao Cristianismo no Egipto e esperam ver a sua nova identidade religiosa reconhecida pelo Estado.
Gowhary interpôs um recurso contra a decisão do tribunal mas, no dia 13 de Junho de 2009,
o Tribunal de Apelo do Cairo confirmou a decisão do tribunal de primeira instância. No dia
17 de Setembro, as autoridades do Aeroporto Internacional do Cairo detiveram-no quando
embarcava num avião para a China e confiscaram o seu passaporte. Cerca de vinte peritos
legais muçulmanos, que testemunharam perante um tribunal no dia 22 de Fevereiro, reite374
EGiPTO
raram que Gowhary deveria ser condenado à morte por apostasia. Ele e a filha receberam
cartas com ameaças de morte.
Deve ser notado que, ao contrário do caso de Hegazy, que viu a Igreja copta dissociar-se do
queixoso, no caso do Sr. Gowhary, a Igreja, a pedido do tribunal, concordou em emitir um certificado “de mudança de rito”. É verdade que o Sr. Gowhary foi baptizado no Chipre de acordo
com o rito ortodoxo grego, algo que tornou a acção da Igreja Copta mais fácil porque esta
última não exige que a Igreja ateste a mudança de religião, o que recusa fazer com medo de
represálias.
Em Dezembro de 2008, uma mulher de 24 anos, Martha Samuel Makkar, que tinha sido presa
por se converter ao Cristianismo, foi detida no Aeroporto do Cairo quando se preparava para
partir para se juntar ao seu marido. Ela passou um mês na prisão e recebeu ameaças de
morte do juiz devido a ter deixado o Islão. “Se eu tivesse uma faca, matava-a imediatamente”,
disse-lhe ele depois de ela se ter recusado a dizer que era muçulmana.
No dia 13 de Abril de 2009, uma mulher de 22 anos convertida ao Cristianismo, Raheal Henen
Mussa, e o seu marido copta, Sarwat George Ryiad, foram presos por casamento ilegal. Eles
casaram-se em privado de acordo com os costumes tradicionais, sem realizar qualquer cerimónia religiosa ou registo numa igreja. A Igreja recusa-se a registar tais uniões porque, de
acordo com a Sharia, uma mulher muçulmana não tem o direito de se casar com um homem
não muçulmano. Apesar da sua conversão três anos antes, a noiva continua a ser muçulmana aos olhos da lei. Por causa de uma pequena cruz tatuada no seu braço direito, a conversão foi descoberta.
Em Julho de 2009, em Alexandria, Kamilia Medhat Ramses, mãe de dois meninos cristãos
gémeos de 15 anos de idade, Andrew e Mario, fez um pedido ao tribunal para ficar com os
seus filhos depois do marido a ter deixado e se ter convertido ao Islão. Ela ganhou o caso, mas
o tribunal ordenou que os dois meninos se convertessem ao Islão porque, como questão de
princípio, os filhos têm de seguir a religião do pai. A Sra. Ramses interpôs um recurso para
reverter a decisão.
375
ERiTREiA
ERiTREiA
Aspectos legais e institucionais
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos49,2%
Cristãos47,3%
Outros3,5%
Cristãos
2.320.475
Católicos
153.000
Circunscrições
eclesiásticas
3
SUPERFÍCIE
117.600km2
POPULAÇÃO
5.224.000
REFUGIADOS
4.751
DESALOJADOS
10.000
376
A Constituição aprovada pela Assembleia Nacional em 1997 garante
a liberdade religiosa. Porém, até ao momento, ela ainda não entrou
em vigor e o Governo continua a governar por decreto. Num decreto
promulgado em 1995, o Governo declarou que as únicas quatro confissões religiosas reconhecidas pelo estado eram a Igreja Ortodoxa
Copta da Eritreia, a Igreja Luterana Evangélica da Eritreia, a Igreja
Católica e o Islão. O Estado interfere bastante nos assuntos internos
das quatro confissões autorizadas e conseguiu na realidade regulamentar os Ortodoxos Coptas, os Luteranos e os Muçulmanos, conseguindo colocar homens que são leais ao regime no topo das respectivas hierarquias. A Igreja Católica continua a ser autónoma.
As confissões religiosas diferentes das quatro que são reconhecidas oficialmente foram toleradas até 2002, quando um decreto as obrigou a
apresentar um pedido de registo sem o qual as suas actividades seriam
consideradas ilegais. A informação necessária para o registo inclui uma
descrição da história do grupo no país, uma explicação sobre o modo
como difere de outros grupos religiosos, os nomes e dados pessoais de
todos os seus líderes, informação detalhada sobre as propriedades e
bens detidos pelo grupo, assim como sobre fundos recebidos do estrangeiro. Embora muitos grupos tenham submetido a documentação e
apresentado toda a informação requerida, desde 2002 que nenhum
obteve até agora aprovação do Governo, para a qual é necessária a assinatura do chefe de Estado. O Governo não aprovou, especificamente, o
registo da Igreja Evangélica Presbiteriana Meherte Yesus, o da Igreja dos
Adventistas do Sétimo Dia, o da Igreja Missão de Fé e o da Comunidade
Baha’i, apesar de todas terem cumprido todas as formalidades necessárias para o registo. Por conseguinte, as actividades destas Igrejas e
comunidades não registadas são activamente perseguidas pelo Estado
e centenas de crentes foram detidos, e acredita-se que estejam detidos,
principalmente em prisões militares. Desde que a perseguição começou,
pelo menos treze cristãos pertencentes a Igrejas não registadas morreram na prisão. Apenas algumas autoridades locais permitem aos grupos
não registados a prática da sua religião em residências privadas.
Os meios de comunicação social controlados pelo Governo descrevem
habitualmente os grupos cristãos não registados como sendo organizações imperialistas inspiradas pelos EUA e criadas para promover
a intolerância religiosa entre os cidadãos. As comunidades locais são
dissuadidas de permitir aos membros de tais agrupamentos a utilização de cemitérios públicos para os funerais dos seus membros.
As confissões religiosas autorizadas têm de obter autorização por parte do Gabinete dos
Assuntos Religiosos para publicar e distribuir os seus próprios documentos entre os crentes e
para celebrar missas e realizar outras actividades relacionadas com a sua religião. Os líderes
das Igrejas e os meios de comunicação social pertencentes às Igrejas estão proibidos de fazer
comentários sobre assuntos políticos. A construção de locais de culto requer a aprovação por
parte do Governo, sendo que este impõe regras rígidas às relações entre as Igrejas e os seus
patrocinadores estrangeiros, em especial no que à obtenção de fundos diz respeito.
O pessoal religioso está igualmente sujeito ao serviço militar obrigatório, o que na Eritreia
envolve, actualmente, serviço ilimitado, devido ao estado de guerra com a vizinha Etiópia.
Uma excepção parcial é feita aos padres e seminaristas da Igreja Católica, para os quais
foi acordado que o serviço militar pode ser substituído por um ano de serviço comunitário.
No entanto, em muitos casos, os seminaristas foram obrigados a permanecer mais tempo,
infringindo assim os acordos feitos com os bispos católicos.
Católicos
ERITREIA
A pequena Igreja Católica (4% da população) tem por enquanto conseguido evitar a interferência do Governo, em especial na questão da expropriação de activos eclesiásticos. Em
1995, o Governo emitiu um decreto exigindo às Igrejas que restringissem as suas actividades ao culto e que renunciassem a todas as actividades sociais (as quais, reivindicou, são da
competência do Estado), pedindo ainda a renúncia ao financiamento proveniente do estrangeiro, o qual seria substituído por fundos estatais. Dois anos depois, o Estado implementou
este decreto, mas enquanto a Igreja Luterana desistiu imediatamente do seu trabalho de
assistência social, a hierarquia católica resistiu com sucesso. Dez anos depois (em 2007), o
Governo voltou à ofensiva com um novo decreto com o objectivo de nacionalizar, num período de duas semanas, cinquenta escolas, vinte e cinco consultórios médicos e centros de
saúde, sessenta jardins-de-infância e várias outras actividades económicas desenvolvidas
pela Igreja Católica. Porém, desde então, apenas foram confiscados uma pequena quinta,
uma escola e um jardim-de-infância na cidade de Assab.
Entre 2007 e 2008, o Governo causou, em Asmara, o êxodo de dezoito missionários católicos
ao não renovar os seus vistos de residência no país. Além disso, desde 2006, não foi permitido
aos padres eritreus estudar nas Universidades Pontifícias em Roma ou partirem para serem
missionários no estrangeiro.
Em Dezembro de 2009, as autoridades ordenaram, uma vez mais, à Igreja Católica, à Igreja
Luterana e às autoridades islâmicas que não aceitassem fundos provenientes do estrangeiro
e que operassem usando apenas o financiamento do Governo.
Confissões religiosas cristãs não reconhecidas
O Governo continua a perseguir, a prender e a deter sem acusação formal ou julgamento,
membros de grupos religiosos não reconhecidos. Calcula-se que o número actual de prisio377
ERITREIA
neiros religiosos seja de aproximadamente 2.200, que foram detidos individualmente ou em
grupo em reuniões de oração (especialmente quando há mais do que cinco pessoas reunidas). Nestes incluem-se, pelo menos, quarenta líderes e sacerdotes de Igrejas pentecostais.
Todos os prisioneiros se encontram detidos em condições extremamente duras, seja em celas
subterrâneas ou em contentores expostos ao sol durante o dia e ao frio à noite, durante longos períodos de tempo, sem visitas de familiares e sem julgamento. Os centros de detenção
nos quais estes prisioneiros se encontram aprisionados situam-se dentro de centros militares em Mai Serwa, Sawa e Gelalo, assim como em esquadras de polícia na capital e em
outras cidades. O Governo abriu um campo de prisioneiros, reservado para prisioneiros religiosos, no deserto, perto de Mitire/Meiter. Existem muitas testemunhas desta e de outras
prisões que assistiram aos maus-tratos e à tortura, sendo o principal objectivo o de obrigar
os reclusos a rejeitarem a religião que professam.
Uma forma de tortura que foi relatada consiste em obrigar um prisioneiro a ajoelhar-se num
tronco de árvore, empurrando-o em seguida de modo a fazê-lo perder o equilíbrio e depois
batendo violentamente nos seus pés quando estes estão virados para cima.
Durante o interrogatório, os prisioneiros são espancados regularmente e por vezes partemlhes os ossos. Às vezes são mantidos amarrados em prisão solitária durante 48 horas seguidas. Este encarceramento em solitária pode durar muitos meses.
Num outro castigo, os prisioneiros são amarrados na “posição de helicóptero” com as mãos
amarradas às pernas que estão dobradas para atrás das costas, e deitados de barriga para
baixo. Amarrados nesta posição, os prisioneiros são por vezes suspensos por uma barra por
debaixo dos joelhos e depois os seus pés descalços são espancados.
Além dos espancamentos, os castigos podem consistir também em ser pendurados pelos
braços em árvores, ou ser amarrado em posições retorcidas e expostos ao sol durante muitas
horas ou mesmo dias, ou ainda utilizando a tortura do afogamento simulado.
Os maus-tratos relatados por alguns prisioneiros mantidos em prisão solitária incluem
o ser obrigado a caminhar descalço sobre pedras afiadas e espinhos, durante a única
hora em que lhes era permitido sair das respectivas celas. Aqueles que não caminham de forma suficientemente rápida são espancados com rijos bastões de plástico.
Um elevado número de prisioneiros pertence às Testemunhas de Jeová, sendo que estes
recusam prestar serviço militar, não lhes sendo oferecida a alternativa do serviço comunitário, enquanto outros são soldados encontrados em posse de literatura religiosa proibida
ou apanhados a rezar de acordo com os ritos de grupos religiosos não autorizados. Algumas
unidades do exército permitem aos recrutas manter e ler literatura religiosa proibida. Em
algumas unidades do exército, as sanções aplicadas a recrutas encontrados em posse de
Bíblias e de material religioso ilegal restringem-se a confiscar e destruir tal material, normalmente quando os recrutas entram nos quartéis para os quais foram nomeados.
378
O número de prisioneiros neste momento decaiu, depois de ter excedido os 3000, pois muitos prisioneiros foram libertados sob fiança e muitos recrutas do exército voltaram às suas
unidades.
Exemplos de repressão contra cristãos de confissões religiosas não reconhecidas
ERITREIA
Nos últimos três meses de 2008, ocorreu um elevado número de prisões. Em Dezembro, as
autoridades prenderam quarenta e nove líderes de Igrejas cristãs não-registadas em Asmara,
incluindo um profissional bem conhecido, um evangélico, que foi libertado em Março de
2009 com a recomendação de que deveria desistir do culto evangélico e juntar-se à Igreja
Ortodoxa Copta. Em Novembro, 110 cristãos evangélicos foram presos, na sua maior parte
membros da Igreja Kalet Hiwot, da Igreja do Evangelho Completo e da Igreja do Deus Vivo.
No dia 11 de Janeiro de 2009, a polícia prendeu quinze membros da Igreja Kalet Hiwot na
cidade de Keren. Na mesma cidade, trinta e quatro membros desta mesma congregação
cristã foram também detidos em Novembro de 2008.
No dia 25 de Janeiro de 2009, em Assab, forças de segurança prenderam vinte e sete cristãos
da Igreja de Rhema (vinte homens e sete mulheres) que participavam na missa de domingo.
Estas prisões elevaram para cerca de 300 o número de prisões feitas entre cristãos pertencentes a grupos não autorizados, durante o período compreendido entre o princípio de
Outubro de 2008 até ao quarto domingo de Janeiro de 2009. As vinte e sete pessoas presas
no dia 25 de Janeiro foram espancadas durante os primeiros dias de encarceramento.
Em Abril de 2009, a polícia de segurança revistou as casas de duas famílias pertencentes às
Testemunhas de Jeová cujos familiares se encontravam já em prisão, atacando e ameaçando
prender as mulheres destas casas, numa tentativa de obter informação sobre outras testemunhas de Jeová.
Em Maio de 2009, várias dezenas de prisioneiros por motivos religiosos (na sua maior parte
evangélicos e testemunhas de Jeová) foram transferidos das celas em esquadras de polícia
em Asmara para o centro de detenção em Mitire/Meiter. Entre eles estavam sacerdotes da
Igreja Kale-Hiwot, da Igreja do Evangelho Completo, da Igreja do Deus Vivo e da Igreja de
Filadélfia.
Em Junho de 2009, a polícia prendeu vinte e dois membros das Testemunhas de Jeová que se
tinham reunido para um serviço religioso em Asmara. Tratava-se principalmente das esposas
e dos filhos de chefes de família que se encontravam presos. No seguimento deste evento,
famílias inteiras estão neste momento detidas em vários locais por todo o país.
No dia 14 de Outubro de 2009, forças de segurança invadiram a casa do Pastor Tewelde Hailom, fundador da Igreja do Evangelho Completo, em Asmara, e prenderam três dos presentes, enquanto o pastor, gravemente doente, foi colocado em prisão domiciliária. No dia 16 de
Outubro, outras sete pessoas, relacionadas com as anteriores prisões, foram presas e levadas
para a esquadra número 7 da polícia, em Asmara. No dia 23 de Outubro, outras três pessoas
379
ERITREIA
ligadas a estas prisões foram também detidas. Os seus nomes são Amanuiel Asrese, Musie
Rezene e Yosief Admekome.
No dia 6 de Dezembro de 2009, vinte e sete idosas que pertenciam à Igreja Missão de Fé, de
origem metodista, foram presas pelas autoridades enquanto rezavam em conjunto numa
residência privada, e foram levadas para a esquadra número 1 da polícia, em Asmara.
No dia 18 de Fevereiro de 2010, sete cristãos foram alegadamente presos pela polícia na capital, Asmara, acusados de celebrar uma reunião religiosa não autorizada numa residência privada, e foram levados para um local desconhecido.
No dia 10 de Março de 2010, forças de segurança prenderam onze cristãos na cidade de
Nakfa. Havia sete homens e quatro mulheres no grupo, todos crentes de várias confissões
religiosas cristãs. Alguns deles eram empregados estatais. Os homens presos eram Asfeha
Mehari, Kiflom Gebrai, Tewelde Tsegay, Mehari Tesfazgi, Gebreab Yemane, Habtom Hagos e
Ghermay Araya. As mulheres presas foram Terhase Tsegay, Hiwet Asmerom, Aster Andemariam e Ferewini Kefela. Crê-se que os prisioneiros estejam detidos nas instalações militares
em Nakfa.
No dia 27 de Março de 2010, na cidade de Segenaite, situada no Sul da Eritreia, dezassete
jovens cristãos, pertencentes a várias Igrejas, que se tinham reunido para rezar, foram presos
e levados para celas na esquadra local da polícia. Todos eles eram recrutas a cumprir o serviço
militar obrigatório.
No dia 2 de Abril de 2010, em Asmara, foram presos vinte e cinco cristãos da Igreja do Evangelho Completo. Os detidos, entre os quais se contava pelo menos uma mulher grávida, foram
levados para as esquadras números 2 e 5 da polícia.
Desde o início de 2009, o Governo começou a confiscar veículos com números de matrícula
reservados a instituições religiosas. O número significativo de confiscações diminuiu a capacidade dos grupos religiosos de levarem a cabo as suas actividades diárias. Apenas alguns
dos veículos confiscados foram devolvidos aos seus proprietários, enquanto a maioria permanece confiscada sem que tenha sido dada qualquer justificação formal para o facto.
Libertação de prisioneiros
No dia 17 de Abril de 2009, as autoridades libertaram setenta cristãos (entre eles onze mulheres) detidos em Mitire/Meiter por razões relacionadas com o serviço militar, e enviaram-nos
para as suas cidades de origem: Asmara, Dekemhare, Keren, Massawa e Mendefera.
No dia 21 de Janeiro de 2010, foi libertado o Pastor Habtom Tewelde, da Igreja do Evangelho
Completo. Fora preso em 2008 e estivera detido em primeiro lugar na esquadra número 5 da
polícia em Asmara e depois em Mitire/Meiter. O pastor, gravemente doente com diabetes, foi
advertido para não continuar com as suas actividades religiosas não autorizadas.
No dia 5 de Fevereiro de 2010, as autoridades libertaram doze cristãos (sete homens e cinco
mulheres) sob fiança, todos membros da Igreja Kale-Hiwot que tinham estado detidos
durante dois anos numa prisão em Adi-Nefase, perto de Assab. Foram advertidos para não
retomarem actividades ligadas a formas proibidas de culto. No dia 8 de Fevereiro, foram liber380
tados também Akilu Tesfamichel e Gebru Tesfayon, ambos recrutas e membros da Igreja de
Rhema que tinham sido presos dezanove meses antes por terem falado sobre a sua fé a
outros recrutas. Os dois homens foram enviados para as respectivas unidades.
No dia 3 de Março de 2010, foram libertados vinte e nove cristãos do centro de detenção militar em Mitire/Meiter. Estes reclusos tinham estado presos entre um e quatro anos, muitos
em esquadras da polícia em Asmara. Entre eles contavam-se vários líderes cristãos como o
Padre Tesfagaber Hanibal da Igreja do Deus Vivo e o Padre Gibreab Jorjo da Igreja do Evangelho Completo. Hanibal passara quatro anos preso sem julgamento e Jorjo três. Entre os que
foram libertados estavam também membros da Igreja de Filadélfia. Todos foram libertados
sob fiança e advertidos para não tomarem parte em actividades religiosas não autorizadas.
Durante o mesmo período, Semere Zaid, professor na Faculdade de Agricultura da Universidade de Asmara e membro da Igreja do Deus Vivo, foi libertado da prisão de Sembel, em
Asmara, onde estivera detido durante cinco anos sem julgamento.
Mortes nas prisões
ERITREIA
Nos últimos anos treze cristãos morreram na prisão; todas as mortes foram causadas por
maus tratos, por falta de cuidados médicos e, em geral, pelas duras condições prisionais.
Em Junho de 2008, Azib Simon, de 37 anos, morreu de malária contraída apenas uma semana
antes da sua morte no centro de detenção militar em Wi’a. A doença não foi tratada.
Em Outubro de 2008, Teklesenbet Gebreab Kiflom, de 36 anos, preso por causa da sua fé,
morreu no centro de detenção militar de Wi’a. Diz-se que o prisioneiro morreu por não lhe ter
sido administrada a medicação para a malária que entretanto contraíra.
Em Janeiro de 2009, morreram duas pessoas presas por razões religiosas no centro de detenção de Mitire/Meiter devido ao efeito combinado de maus tratos físicos e à falta de cuidados médicos. Tratou-se de Mogos Hagos Kiflom, de 37 anos, e de Mehari Gebreneguse
Asgedom, de 42 anos. De acordo com algumas fontes, Asgedom, um membro da Igreja do
Deus Vivo (Evangélicos) em Mendefera, morreu no dia 16 de Janeiro enquanto estava em
isolamento devido a tortura infligida e a complicações com a diabetes. Alguns dias antes, em
data não especificada, um membro da Igreja de Rhema chamado Kiflom morreu também, de
acordo com algumas fontes devido à tortura infligida por se ter recusado a rejeitar a sua fé.
No dia 23 de Julho de 2009, um membro da Igreja Kale-Hiwot, em Mendefera, Yemane Kahasay Andom, de 43 anos, morreu no centro de detenção de Mitire/Meiter. O prisioneiro fora
torturado e colocado em isolamento numa cela subterrânea. Foi-lhe também negada a
medicação para um ataque de malária. Recusara-se anteriormente a assinar um documento
em que renunciava à sua fé.
No dia 24 de Janeiro de 2010, Hana Hagos Asgedom, de 41 anos, solteira, morreu de ataque cardíaco enquanto se encontrava em isolamento numa cela no aquartelamento militar de Alla. Era membro da Igreja de Rhema, em Asabe. Presa três anos antes e encerrada
na prisão militar de Wi’a, Hana tinha sido recentemente transferida para Alla depois de
se recusar em várias ocasiões a abandonar as suas convicções religiosas. Alegadamente
381
ERITREIA
foi espancada com uma barra de ferro pouco antes de morrer por ter recusado os avanços sexuais do chefe do aquartelamento, que tinha o poder de a libertar do isolamento.
No dia 2 de Março de 2010, Efrem Habtemichel Hagos, de 37 anos de idade, cristão pertencente a uma Igreja não reconhecida, morreu em isolamento no campo militar em Adi-Nefase,
perto de Assab. O prisioneiro sofria de malária e de pneumonia há três meses. Negaram-lhe
os cuidados médicos por se recusar a renunciar à sua fé cristã. Antes de ser preso, Hagos,
que era solteiro, servira durante seis anos na Unidade 31 do Exército Eritreu e provavelmente
tinha-se convertido durante o serviço militar.
No dia 23 de Abril de 2010, uma estudante universitária de 28 anos, Senait Oqbazgi Habta,
morreu de malária e de anemia grave nas instalações médicas da prisão do centro de treino
militar em Sawa. Senait fora detida dois anos antes em conjunto com quinze outros estudantes da Universidade de Mai-Nehfi por serem membros de um grupo de estudo da Bíblia.
Depois da prisão, os estudantes ficaram detidos em condições inacreditáveis, presos em contentores expostos ao sol quente durante o dia e ao frio durante a noite, sem instalações
sanitárias ou cuidados médicos. Anteriormente, Senait recusara-se a assinar um documento
renunciando à sua fé, o que lhe teria permitido receber cuidados médicos e ser libertada.
Ortodoxos Coptas
No início de 2006, por meio de um sínodo convocado de uma maneira claramente irregular,
o Patriarca Abuna Antonios foi deposto como líder da Igreja Cóptica da Eritreia. Ele era o
único líder reconhecido por todas as Igrejas Ortodoxas Coptas no mundo e em particular
pela de Alexandria, liderada pelo egípcio Patriarca Shenouda III, com o qual detinha uma ligação hierárquica. O sínodo não foi convocado nem presidido pelo patriarca, como requerido
pela lei da Igreja, mas sim por um administrador secular que o Governo forçara o Patriarca
Abuna Antonios a designar pouco tempo antes. No dia 27 de Maio de 2007, foi designado
um patriarca aprovado pelo Governo. Abuna Dioskoros, quarto Patriarca da Eritreia, não é
reconhecido pelas outras Igrejas Coptas nem pela maioria do clero e dos crentes eritreus. O
Patriarca Abuna Antonios encontra-se em prisão domiciliária desde 2005. No seguimento de
uma busca feita à sua casa em 2007 por funcionários do Governo, foi privado dos seus artigos de vestuário e insígnias patriarcais, assim como de outros objectos religiosos pessoais.
No dia 21 de Junho de 2009, forças de segurança prenderam quinze monges da Igreja Ortodoxa Copta da Eritreia, liderados pelo Padre Gebretensai Hadegu, na Capela de Santa Maria,
em Asmara. Na ocasião, estava a ser celebrada uma reunião pública no local, sobre a denúncia das interferências do Governo nos assuntos internos da Igreja Ortodoxa Copta. Os presos
foram levados para o campo de prisioneiros de Mitire/Meiter.
No dia 5 de Agosto de 2009, forças de segurança prenderam mais onze monges da Igreja
Ortodoxa Copta da Eritreia que se tinham oposto à interferência do Governo nos assuntos
internos da sua Igreja. Foram presos em Medefera e Adi Cuala. Também neste caso os monges foram levados para o centro de detenção de Mitire/Meiter. Os seus nomes são Teklesenbet Mehari, Gebru Kidane, Teklzgi Hagos, Zeremariam Gebrecristos, Kidanemariam Tesfaslasi,
382
Zerai Kiros, Hiabu Genzebu, Zerom Frezgi, Hailemariam Tefamariam, Isak Abraha e Tewodros
Efrem.
Muçulmanos
Em Janeiro de 2009, sessenta líderes religiosos muçulmanos foram presos em vários locais
no país e acusados de serem “islamistas radicais”. Em Maio, vinte e quatro destes indivíduos,
foram libertados e advertidos para não deixarem crescer barbas longas (a marca que caracteriza os Salafitas) e para não tomarem parte em qualquer actividade política. Por agora o
Governo não os acusou de nada, mas eles ainda se encontram em cativeiro.
Testemunhas de Jeová
Um decreto presidencial declara que as Testemunhas de Jeová “renunciaram à sua nacionalidade” e aos direitos associados, pois abstiveram-se de tomar parte no referendo de
1993 para a independência da Eritreia e recusam-se a votar ou a fazer o serviço militar (não
havendo nenhuma opção de serviço comunitário como alternativa). Este decreto causa dificuldades financeiras e problemas no emprego e nas deslocações dos membros deste grupo,
especialmente os que são empregados pelo Estado ou que trabalham no comércio. Muitos
foram despedidos dos seus empregos na administração pública ou perderam as suas licenças comerciais; outros foram despejados de casas concelhias, viram os seus passaportes ser
recusados, assim como os vistos para viagens ao estrangeiro, e até mesmo os bilhetes de
identidade. As autoridades civis estão proibidas de reconhecer juridicamente os seus matrimónios. Normalmente a sentença prisional para as Testemunhas de Jeová que recusam o
serviço militar é bastante mais severa do que para pessoas de outros grupos religiosos que
cometeram a mesma ofensa.
Conversões religiosas forçadas
ERITREIA
Existem relatórios contínuos sobre o facto de a polícia forçar membros de grupos religiosos
não registados a assinar declarações renunciando à sua fé e afirmando juntarem-se à Igreja
Ortodoxa Cóptica da Eritreia, como condição para serem libertados da prisão. Estes indivíduos são normalmente mantidos em prisão e brutalmente espancados até que concordem
em assinar tais documentos. Vários relatórios acrescentam que muitos destes cidadãos são
posteriormente vigiados depois da sua libertação, para se ter a certeza de que não praticam
ou realizam proselitismo a favor da religião que rejeitaram. Em alguns casos, as autoridades
pediram aos sacerdotes da Igreja Ortodoxa da Eritreia cartas que confirmem que estes indivíduos voltaram à Igreja Ortodoxa Cóptica. Do mesmo modo, a polícia obriga as pessoas que
escolheram não pertencer a qualquer grupo religioso a escolher um para serem libertadas
da prisão.
383
ETiÓPiA
ETiÓPiA
Legislação
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos56,6%
Muçulmanos34,7%
Animistas8,4%
Outros0,3%
Cristãos
43.315.390
Católicos
5815.000
Circunscrições
eclesiásticas
10
SUPERFÍCIE
1.104.300km2
POPULAÇÃO
84.976.000
REFUGIADOS
121.886
DESALOJADOS
300.000-350.000
384
A Constituição da Etiópia, um Estado tipicamente multiétnico e
multi-confessional, reconhece a liberdade religiosa a todos os seus
cidadãos, incluindo a liberdade de propagar as convicções próprias e
a conversão para outra religião. O Governo federal respeita e aplica
habitualmente todos estes direitos. Porém, a nível local e regional, as
leis constitucionais e os princípios relativos à liberdade religiosa são
violados com frequência e sem que as autoridades federais intervenham para se assegurarem de que são respeitados. Existe uma hostilidade social muito intensa nas várias regiões para com as minorias
religiosas, em particular para com as comunidades de Cristãos Evangélicos e Pentecostais que recentemente, ou relativamente recentemente, apareceram nessas regiões.
A Etiópia é uma República Democrática Federal formada por nove
regiões administrativas, criadas através da Constituição de Dezembro
de 1994 para proporcionar a representação dos interesses políticos
dos vários grupos étnicos. As religiões principais são o Cristianismo
Ortodoxo Tradicional Etíope, o Islão (oficialmente representado pelo
Conselho Supremo Etíope para os Assuntos Islâmicos) e o Protestantismo, incluindo as comunidades Evangélicas e Pentecostais recentemente formadas. Além destas, existem pequenas minorias de Católicos de rito etíope e latino (menos de 1%), as Testemunhas de Jeová,
crentes de religiões africanas tradicionais, Judeus e Mórmones. As
estatísticas sobre estes vários grupos não são inequívocas. Os Cristãos Ortodoxos são predominantes nas regiões de Amhara e Tigray, os
Muçulmanos em Somali, Afar e partes de Oromiya. Os Cristãos Pentecostais e Evangélicos são numerosos em algumas zonas de Oromiya,
na Região das Nações, Nacionalidades e Povos do Sul, em Gambela e
nas áreas urbanas.
O Governo central é chefiado pela Frente Democrática Revolucionária
Popular da Etiópia, no seio da qual os Tigrays da extinta Frente Popular para a Libertação de Tigray têm um papel hegemónico. Os Tigrays,
que se encontram em inferioridade numérica (7% da população) tentam evitar qualquer situação que possa ofender as sensibilidades da
população de maioria muçulmana e Amhárica, e comprometer o delicado equilíbrio político. É por esta razão que a intolerância, a discriminação e a violência, dirigidas a representantes de religiões minoritárias em regiões onde os muçulmanos ou os cristãos Amháricos estão
ETIÓPIA
em maioria, e ocasionalmente com a aprovação e cumplicidade das autoridades locais, raramente são contrariadas ou punidas pelas autoridades federais.
A Constituição estabelece a separação entre o Estado e a religião, e a lei proíbe a criação
de partidos políticos com base confessional. Para obter o reconhecimento do seu estatuto
legal, as Igrejas e os grupos religiosos têm de solicitar o registo junto do Ministério da Justiça e renová-lo a cada três anos. Na ausência deste registo não podem, por exemplo, abrir
uma conta bancária ou ser representados em tribunal. A Igreja Ortodoxa Etíope e o Conselho
Supremo Etíope para os Assuntos Islâmicos estão isentos de registo. Instituições baseadas
em Igrejas e organizações dedicadas a obras de beneficência e a programas de desenvolvimento têm de se registar em separado da instituição religiosa que representam e estão
sujeitas à legislação actual aplicável para todas as Organizações Não-Governamentais
(ONG), incluindo um limite de 10% de fundos provenientes do estrangeiro para inclusão no
total dos seus orçamentos se operarem em determinados sectores (como, por exemplo, os
direitos humanos).
São reconhecidos como feriados nacionais os principais dias festivos dos Cristãos Ortodoxos
e dos Muçulmanos e os trabalhadores muçulmanos têm direito a uma pausa de duas horas
para as suas orações de sexta-feira.
A lei considera um crime qualquer incitamento a conflitos religiosos feito através dos meios
de comunicação social e o mesmo se aplica à difamação de figuras religiosas. As iniciativas
do Governo e da sociedade civil têm como objectivo promover a coexistência entre as várias
confissões religiosas prevenindo e solucionando os conflitos inter-religiosos.
Na Etiópia todos os terrenos são propriedade do Estado ou das instituições que governam o
país e, tal como os cidadãos e as empresas privadas, os grupos religiosos têm de apresentar
um pedido a estas autoridades se desejarem ver-lhes atribuídos terrenos. Por conseguinte,
às Igrejas são atribuídos terrenos gratuitos para nestes construírem os seus lugares de culto,
escolas, hospitais e cemitérios; porém, os terrenos e os edifícios nesses terrenos (incluindo
escolas e hospitais) podem em qualquer altura ser expropriados pelo Estado e ser-lhes dado
um uso diferente. Muitos grupos religiosos pediram a restituição de propriedades confiscadas pelo Governo central entre 1977 e 1991, mas apenas algumas destas foram devolvidas, em
Adis-Abeba e em Oromia, propriedades essas que tinham sido colocadas sob controlo federal, enquanto que nenhumas das que ficaram sob o controlo dos governos regionais foram
devolvidas.
Vários grupos religiosos minoritários queixaram-se de injustiças e discriminação locais na
questão da atribuição de terrenos para a construção de edifícios religiosos. Os protestantes
relataram tratamento discriminatório perpetrado pelas autoridades locais relativamente a
pedidos apresentados para a atribuição de áreas para a construção de igrejas e cemitérios. Os
Muçulmanos queixam-se de que não foi concedida a autorização para construir a primeira
mesquita na cidade de Axum, no Norte da Etiópia, cidade santa para os ortodoxos etíopes
na qual nem mesmo as outras denominações cristãs têm autorização para construir qual-
385
ETIÓPIA
quer edifício. Queixam-se também de outras recusas por parte das autoridades regionais em
Tigray e em Ahmara.
O Governo não aprova vistos permanentes para pessoal religioso estrangeiro a menos que
ele faça parte de programas de desenvolvimento administrados pela ONG registada que corresponda à Igreja à qual o missionário estrangeiro pertence. Esta política não é normalmente
aplicada aos Ortodoxos etíopes ou aos Muçulmanos.
O Estado permite a existência de escolas confessionais privadas, mas a instrução religiosa
é proibida em todas as escolas de todos os níveis e tipos, inclusive as privadas e as geridas
por instituições religiosas. Só são permitidas actividades de catequese em locais contíguos a
lugares de culto e fora do horário escolar. A existência de clubes de estudantes com base na
afiliação religiosa é permitida, tanto nas escolas estatais como nas particulares.
Violência Inter-Religiosa
Entre 8 e 10 de Janeiro de 2009, um indivíduo foi assassinado e vinte outros ficaram feridos numa série de confrontos entre cristãos e muçulmanos em vários bairros na cidade de
Diredaua. A violência surgiu quando um grupo de jovens muçulmanos lançou pedras contra
jovens cristãos que estavam a entoar cânticos na rua no Dia de Natal Ortodoxo.
No dia 25 de Janeiro de 2009, um polícia foi assassinado e oito civis ficaram feridos no decurso
de confrontos entre cristãos ortodoxos e muçulmanos na cidade de Gondar. Quarenta pessoas foram presas. A violência começou quando se iniciaram os trabalhos de construção de
uma mesquita em terrenos tradicionalmente utilizados por cristãos para celebrar a Epifania
Ortodoxa.
No dia 24 de Abril de 2009, forças policiais interromperam uma manifestação de estudantes
muçulmanos da Universidade de Adis-Abeba. Quarenta pessoas foram presas e posteriormente libertadas. Os estudantes estavam a protestar para afirmar o seu direito a usar o véu
islâmico e a fazer as suas orações rituais dentro do campus universitário.
Duas pessoas foram mortas a tiro pela polícia e uma terceira morreu acidentalmente, no dia
30 de Junho de 2009, quando as autoridades na cidade de Dessié tentaram impedir a construção não autorizada de uma igreja ortodoxa em terrenos reivindicados pela comunidade
muçulmana local.
No dia 20 de Dezembro de 2009, o corpo inanimado de Markos Lagiso, um famoso representante da Igreja do Evangelho Completo em Senbet-Senkele, foi descoberto em Oromia,
coberto de feridas de catana. O subsequente julgamento conduziu à condenação de um dos
familiares deste homem, mas os protestantes locais estão convencidos de que o assassinato
esteve relacionado com as convicções religiosas do mesmo. Tratava-se do proprietário de um
restaurante, com bastantes posses, que, com os seus recursos financeiros, tinha providenciado ajuda económica para a reconstrução de uma igreja local destruída por uma multidão
de extremistas muçulmanos em Setembro de 2009.
Os restos mortais de um bebé de três meses enterrado no pátio de uma igreja evangélica
temporária em Luga, uma aldeia na Região das Nações, Nacionalidades e Povos do Sul, foram
386
desenterrados no dia 11 de Maio de 2009 por etíopes ortodoxos como gesto de desprezo
para com a comunidade evangélica local e para com a jovem e convertida mãe da criança.
Desde 2007, o distrito de Endegagne, do qual Luga é a capital regional, foi cenário repetido
de ataques por parte de ortodoxos etíopes contra protestantes evangélicos. Jovens convertidos foram rejeitados pelas suas famílias, outros foram ameaçados e nenhum terreno foi
destinado pelas autoridades locais para a construção de edifícios religiosos autorizados e de
cemitérios reconhecidos.
No dia 11 de Setembro de 2009, uma multidão de cerca de 300 muçulmanos destruiu duas
igrejas evangélicas e a casa de um sacerdote, ferindo também gravemente três cristãos na
cidade de Sinbete, na zona de Arsi, na região de Oromia. Os locais de culto atacados pertenciam às comunidades evangélicas Mulu Wongel e Kale Hiwot. Os ataques foram provocados
pela alegada profanação do Alcorão por parte de um estudante e de um fazendeiro local. Os
dois foram presos, em conjunto com seis muçulmanos acusados da violência, a qual, só na
igreja de Kale Hiwot, causou danos materiais no valor aproximado de 3.200 euros.
No dia 27 de Janeiro, uma multidão de ortodoxos atacou duas igrejas evangélicas, espancou
um membro da congregação e tentou depois atacar outros membros desta igreja, na cidade
de Olenkomi, em Oromia. Lançaram pedras contra a Igreja de Brethern, causando danos consideráveis, enquanto a Igreja Mekane Yesus foi completamente destruída através de fogo
posto. O pretexto para o fogo posto foi um incêndio acidental numa igreja ortodoxa improvisada, pelo qual os evangélicos foram acusados.
Violações da Liberdade Religiosa
ETIÓPIA
Um muçulmano de 40 anos de idade, Bashir Musa Ahmed, que se convertera ao Cristianismo
evangélico, foi preso no dia 23 de Maio de 2009, na cidade de Jijiga, e acredita-se que ainda se
encontre preso. Ahmed foi inicialmente acusado de ter distribuído exemplares da Bíblia, disfarçadas de exemplares do Alcorão, e foi detido sem acusação. Mais tarde, em Janeiro deste
ano, foi acusado pela polícia de actividades terroristas, uma vez mais sem qualquer acusação
formal por parte do gabinete do promotor local. Jijiga é a capital da região administrativa
Somali na Etiópia, em que os habitantes são etíopes pertencentes ao grupo étnico somali, e
o pedido para acusar juridicamente Ahmed veio da sua própria família e de outros membros
do seu clã. Os juízes negaram a fiança, até ao momento, porque o caso é um “assunto muito
delicado que pode potencialmente incitar a instabilidade religiosa”. As autoridades regionais
têm declarado, em reuniões com os líderes tribais e religiosos da zona, que a detenção de
Ahmed tem como objectivo “proteger a religião e a cultura somalis”.
Libertações
Dois pregadores evangélicos, um homem e uma mulher, presos no dia 19 de Julho depois de
terem sido atacados por activistas ortodoxos da organização Mahibere Kidusan, enquanto
pregavam publicamente nas ruas da cidade de Debiretabor, na região de Ahmara, foram
387
ETIÓPIA
libertados no dia 23 de Outubro de 2009. Os dois pregadores tinham sido condenados a
seis meses de prisão no dia 22 de Julho por um tribunal local depois de terem sido acusados
de tentarem subornar os crentes ortodoxos para os converterem à sua religião. Depois de
um recurso, a sentença foi comutada para uma multa equivalente a 32 euros cada mas, no
seguimento de um novo caso jurídico originado por acusações apresentadas por reclusos da
mesma prisão, foram mantidos em prisão e acusados novamente. O tribunal absolveu-os da
acusação de terem insultado a Igreja Ortodoxa Etíope durante a sua permanência na prisão
em Debiretabor e ordenou a sua libertação.
Diálogo Inter-Religioso
Actividades no sentido do diálogo inter-religioso e a prevenção e a resolução de conflitos têm
sido empreendidas pelo Ministério dos Assuntos Federais, a Iniciativa de Consolidação da Paz
entre Confissões Religiosas (que deu origem ao Conselho Nacional para a Consolidação da
Paz entre Confissões Religiosas), o Fórum para o Federalismo e a Democracia, a Agência de
Relações Públicas e Informação de Adis-Abeba, e a Administração Municipal de Adis-Abeba.
388
GAbÃO
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos90,6%
Muçulmanos4,6%
Animistas3,3%
Outros1,5%
Cristãos
1.358.094
Católicos
789.000
Circunscrições
eclesiásticas
6
SUPERFÍCIE
267.668km2
POPULAÇÃO
1.501.000
REFUGIADOS
8.845
DESALOJADOS
---
389
GAbÃO
A Constituição garante a liberdade religiosa e, na prática, ela é respeitada pelas autoridades.
Os grupos religiosos não são obrigados a registarem-se embora
o Governo os convide a fazê-lo. A falta de reconhecimento não os
impede de efectivamente levarem a cabo as suas actividades.
Muçulmanos e cristãos gerem escolas primárias e secundárias privadas, que têm de ser reconhecidas pelo Ministério da Educação após
verificação de que alcançam os mesmos padrões que as escolas
públicas.
O decreto de 1970, que proíbe a existência das Testemunhas de Jeová,
ainda se encontra em vigor, e isto porque alegadamente esta organização não proporciona a adequada protecção aos seus membros. Na
prática, as autoridades não fazem cumprir esta proibição e o culto, as
reuniões e o proselitismo são permitidos às Testemunhas de Jeová.
Continuam a ser encontrados corpos mutilados, o que leva a pensar
que ainda se realizam rituais mágicos tradicionais que incluem o
sacrifício humano. O Governo condena fortemente tais práticas, mas
não há nenhuma informação relativa às investigações que têm vindo
a decorrer há algum tempo.
GÂMbiA
GÂMbiA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos86,1%
Animistas8,1%
Cristãos4,4%
Outros1,4%
Cristãos
60.450
Católicos
41.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
11.295km2
A Constituição reconhece a liberdade religiosa e o Estado respeita
geralmente esta disposição. A Sharia (lei islâmica) é aplicada aos
muçulmanos em questões relativas a casamento, divórcio e heranças.
O registo dos grupos religiosos não é obrigatório.
A instrução religiosa é permitida, tanto em escolas do Estado como
em escolas particulares, sejam elas islâmicas ou cristãs, e sem interferência do Estado.
Nos últimos anos, foram relatados incidentes ocasionais de intolerância contra cristãos. As relações entre as autoridades islâmicas e a
Igreja Católica são boas. Em Janeiro de 2009, o Imã Ratib de Banjul,
Imã Cherno Alieu Mass Kah, o mais importante entre os imãs muçulmanos no país, visitou o Bispo de Banjul, Monsenhor Robert P. Ellison,
“retribuindo” deste modo a visita feita em 2008 pelo bispo ao Imã
Ratib por ocasião do Festival Islâmico de Tobaski (Eid al-Adha, a Festa
do Sacrifício). Os Imãs realçaram “as boas relações e a fraternidade
entre as pessoas deste país” e regozijaram sobre “a paz e a tolerância
religiosas existentes”. Por sua vez, o Monsenhor Ellison, no seu sermão para a 23ª peregrinação anual a Kukujang Mariama, em Dezembro de 2009, descreveu a Gâmbia como um país pacífico.
A entrada no país de muitos grupos cristãos pentecostais e evangélicos, com as suas actividades proselitistas agressivas, despertou fortes
preocupações por parte das autoridades, que temem que este comportamento possa conduzir a conflitos religiosos.
O caso Fulton
POPULAÇÃO
1.751.000
REFUGIADOS
10.118
DESALOJADOS
---
390
No dia 30 de Dezembro de 2008, o missionário cristão David Fulton,
de 60 anos, e a sua esposa Fiona, de 46 anos, foram condenados a um
ano de prisão e a trabalhos forçados por terem feito declarações “subversivas” sobre o presidente e o Governo. De acordo com a acusação, o
casal alegadamente enviou abaixo-assinados por correio electrónico
que eram altamente críticos do Governo.
O casal, proveniente da Grã-Bretanha, vivia na Gâmbia há doze anos,
levando a cabo actividades missionárias e tratando de doentes terminais. Fulton fora também um capelão da prisão que foi dispensado
quando foi acusado de ter tentado converter os habitantes locais.
Estes dois cristãos foram presos no dia 29 de Novembro de 2008, na
sua residência em Kerr Sering. Durante o julgamento, o casal declarou-se culpado e pediu clemência. O Pastor Martin Speed da Igreja
Pentecostal Westhoughton, em Boston, que lutou pela sua libertação,
explicou que lhes tinha sido aconselhado a declararem-se como cul-
GÂMBIA
pados para tentar obter a clemência do tribunal, e que, pelo contrário, lhes fora aplicada uma
sentença exemplar. Outras fontes relataram que, antes de ser preso, o casal tinha sido ameaçado e atacado na rua por causa da sua fé cristã.
Em Fevereiro de 2009, Fulton foi também acusado de disfarce de identidade e de se ter feito
passar por um oficial militar ao usar um uniforme. Devido a estas acusações, em Março de
2009, ele foi condenado a mais três anos de prisão.
A sua esposa Fiona já completou a sua sentença e foi libertada em Dezembro de 2009, tendo
sido imediatamente repatriada para a Grã-Bretanha, enquanto David Fulton ainda se encontra na prisão.
391
GAnA
GAnA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos61,4%
Animistas19,3%
Muçulmanos19%
Outros0,5%
Cristãos
12.685.492
Católicos
2.977.000
Circunscrições
eclesiásticas
18
SUPERFÍCIE
238.533km2
POPULAÇÃO
24.333.000
REFUGIADOS
13.658
DESALOJADOS
---
392
A liberdade religiosa está garantida pela Constituição. O registo é
obrigatório, de acordo com os estatutos para os grupos religiosos,
mas quase nenhum dos grupos parece ter obedecido a esta legislação que entrou em vigor no final da década de 80, em especial as religiões tradicionais indígenas. As actividades eclesiais, como o trabalho
caritativo e a educação, que não têm como objectivo a obtenção de
lucro, são geralmente isentas de tributação.
Não há relatos de problemas específicos entre as várias organizações
religiosas, e o Governo promove a coexistência pacífica e a cooperação.
Em termos gerais, existe o medo da feitiçaria no país e muitas pessoas,
em especial as mulheres muito idosas, são frequentemente acusadas
de serem bruxas, responsáveis por uma vasta variedade de infortúnios que vão desde as más colheitas a doenças. Em certas partes do
país, as “bruxas” são normalmente expulsas das aldeias e obrigadas a
procurar refúgio em “acampamentos especiais para bruxas”. Aquelas
que resistem a esta forma de exílio e que desejam permanecer ou voltar às suas casas arriscam-se a graves maus-tratos, chegando mesmo
ao assassinato, às mãos dos seus conterrâneos.
Além disso, algumas religiões tradicionais incluem a realização de
“rituais mágicos” que podem requerer sacrifícios físicos, mutilações
ou até mesmo sacrifícios rituais, incluindo de crianças.
Nalgumas partes do país, parece que o costume do Trokosi, que é na
realidade uma forma de servidão ritual, está ligado a rituais tradicionais, nos quais jovens raparigas são obrigadas a servir em santuários
locais. De acordo com esta tradição particular, as famílias que têm
de expiar alguma ofensa grave oferecem ao santuário uma das suas
filhas, e estas podem ser destinadas a viver o resto da sua vida como
“noivas de Deus”, e ser efectivamente escravizadas aos comandos dos
sacerdotes no santuário. As jovens enviadas para os santuários têm
por vezes apenas dezoito meses de idade.
Embora tal actividade ritual seja agora considerada um crime e condenada pelo Estado, organizações como a International Needs Ghana
(ING) estimam que, em 2009, existiam pelo menos 5000 mulheres
jovens e adultas a servir nos santuários.
Além da condenação por parte do Governo, várias ONGs estão activamente a resgatar estas mulheres, ajudando-as financeiramente e
ensinando-lhes as aptidões necessárias para que possam ter uma
nova vida. O responsável máximo da ING, o Reverendo Walter Pimpong, declarou que mais de 2000 mulheres já beneficiaram do seu
GAnA
programa de ajuda nos últimos anos. Por seu lado, os grupos religiosos tradicionais acusam
estas organizações de não entenderem as suas convicções e consideram a campanha do
Governo contra o Trokosi como sendo uma genuína “perseguição” religiosa.
Há também frequentes acusações feitas contra os denominados “campos de oração”, especialmente os organizados pelos Pentecostais, de infligirem abusos psicológicos e físicos aos
participantes com problemas mentais, chegando mesmo a durar semanas. Nestes campos, ocorrem tentativas de “curar” estas incapacidades através de “exorcismos” que podem,
porém, consistir em graves abusos, como seja privar as pessoas de alimentos e de água com o
objectivo declarado de expulsar o mal para fora do corpo. Fontes das Nações Unidas acusam
alguns líderes de Igrejas pentecostais de receber dinheiro dos parentes dos “possuídos pelo
diabo” para levar a cabo estes “exorcismos”.
393
GUiAnA
GUiAnA
Variações relativas à legislação
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Durante o período de tempo considerado, não ocorreram alterações
relativamente à legislação anterior.
Relações entre a Igreja Católica e o Estado
Cristãos51,3%
Hindus32,9%
Muçulmanos8,2%
Animistas2,4%
Outros5,2%
Cristãos
384.030
Católicos
61.000
Circunscrições
eclesiásticas
--SUPERFÍCIE
214.969km2
POPULAÇÃO
761.000
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
---
394
O ministro da Saúde deste país referiu-se às declarações do Papa
Bento XVI relativamente ao uso do preservativo para combater a SIDA,
sublinhando que “o Papa contribuiu negativamente para o combate
contra o VIH e a SIDA”. E acrescentou que, uma vez que estes desempenham um papel significativo e positivo na diminuição do VIH, a
perspectiva do Romano Pontífice levantaria obstáculos ao trabalho
que se exige para combater a doença e que a sua opinião foi “mal
assessorada, desadequada e desajustada das provas científicas”. O
Bispo de Georgetown, D. Frances Alleyne, respondeu afirmando que
é a conduta humana que contribui para a propagação da doença e
que, por essa razão, não é benéfico conformar-se com medidas de
prevenção que partem do princípio que o comportamento humano é
inalterável e que as pessoas são incapazes de aprender ou de mudar.
GUinÉ biSSAU
Católicos
Nesta situação, na manhã de 15 de Agosto de 2009, um grupo de
soldados armados invadiu a sede do Convento dos Frades Menores
de São Francisco de Assis, em Bissau. Os soldados estavam à procura
do deputado Conduto de Pina, que tinha sido preso por ter, alegadamente, tomado parte num golpe de estado, e fora libertado por
falta de provas. Assim que fora libertado, o deputado desaparecera
sem rasto e, acreditando que ele se tinha refugiado junto dos Frades
Menores, os soldados entraram no convento sem autorização.
De facto, o deputado tinha escalado o muro que cerca a comunidade
franciscana e tinha sido escondido pelos monges num dos quartos
do mosteiro. Os soldados, por sua vez, também escalaram o muro e
entraram no mosteiro com alguma violência. Mais tarde, o deputado
foi transferido para o seminário principal inter-diocesano, onde permaneceu como refugiado durante vários meses, em conjunto com
outro político que também fora acusado e era procurado pelo exército. Os soldados nunca entraram no seminário para prender os dois
homens.
No seguimento da invasão do convento, os bispos da Guiné-Bissau
enviaram uma carta aberta ao primeiro-ministro Carlos Gomes
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Animistas44,9%
Muçulmanos41,9%
Cristãos11,9%
Outros1,3%
Cristãos
184.404
Católicos
190.000
Circunscrições
eclesiásticas
2
SUPERFÍCIE
36.125km2
POPULAÇÃO
1.647.000
REFUGIADOS
7.898
DESALOJADOS
---
395
GUinÉ biSSAU
A Constituição reconhece a liberdade religiosa e as autoridades respeitam-na e protegem-na. O Artigo 4º proíbe o uso de palavras religiosas ou de denominações de grupos religiosos para indicar ou identificar partidos políticos.
Os grupos religiosos são obrigados a registarem-se, mas não existe
nenhum relato de pedidos que tivessem sido rejeitados.
No período avaliado para este relatório não existiu nenhuma informação relativa a discriminação ou intolerância entre as várias religiões.
No entanto, grupos religiosos relataram a ocorrência de uma generalização de situações de injustiça, de corrupção, de violência e de vinganças pessoais, que afectam o todo da sociedade e, por conseguinte,
também os crentes e as comunidades religiosas. O presidente João
Bernardo Vieira foi assassinado em Março de 2009, alegadamente
como vingança pela morte do líder do exército num ataque bombista.
Em Abril de 2009, líderes religiosos católicos, evangélicos e muçulmanos lançaram um apelo conjunto no qual pediam um “exame profundo de consciência” e reflexão cuidadosa por parte das autoridades
e de todo o país, para alcançar uma “mudança de rumo no comportamento pessoal e social” (L’Osservatore Romano, 8 de Abril de 2009).
GUINé BISSAU
Júnior, na qual reiteraram que a missão da Igreja é trabalhar para a promoção integral da
humanidade e defender a dignidade do ser humano, acolhendo também os que correm o
risco de serem vítimas de actos ilegais e repressivos.
Na tarde daquele mesmo dia, o chefe do Estado Maior General das Forças Armadas pediu
desculpa ao convento pelo que tinha acontecido. Nos dias que se seguiram, o procuradorgeral da República da Guiné-Bissau declarou que “o facto de alguns soldados terem invadido
propriedade da Igreja é uma fonte de preocupação e poderá complicar as nossas relações
com a Santa Sé”.
396
GUinÉ COnACRi
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos68,7%
Animistas27,3%
Cristãos3,7%
Outros0,3%
Cristãos
355.920
Católicos
234.000
Circunscrições
eclesiásticas
3
SUPERFÍCIE
245.857km2
POPULAÇÃO
10.324.000
REFUGIADOS
15.325
DESALOJADOS
---
397
GUinÉ COnACRi
A Constituição reconhece a liberdade religiosa e o Artigo 14º garante
a total autonomia e a administração autónoma das instituições
e comunidades religiosas. A junta militar que ocupou o poder em
Dezembro de 2008 suspendeu a validade da Constituição e não a restabeleceu no período considerado para este relatório. Porém, tal não
parece ter tido qualquer efeito sobre a liberdade religiosa que é também respeitada pela junta militar.
Os grupos religiosos são obrigados a registarem-se. Tal reconhecimento conduz também a vantagens e isenções fiscais. Os grupos não
registados podem ser multados e proibidos mas, na prática, operam
sem qualquer problema.
Os grupos religiosos e os partidos políticos são proibidos de possuir
estações de rádio ou de televisão, mas a proibição parece ser acima
de tudo uma formalidade, dado que é permitido aos representantes
de tais grupos possuírem estações de rádio comerciais e a estas é permitido difundir programas religiosos. Além disso, a própria televisão
estatal difunde programas muçulmanos e cristãos, como a missa de
domingo e as orações de sexta-feira a partir da mesquita central.
Pela primeira vez desde a independência, em 1958, o país tem um líder
não-muçulmano, o capitão Moussa Dadis Camara, um cristão que
se auto-proclamou presidente no seguimento do golpe de estado, o
qual vai porém deixar o poder depois das futuras eleições presidenciais de 2010. O actual Governo foi também acusado de favorecer os
Muçulmanos. Por exemplo, as universidades encontram-se encerradas à sexta-feira, o dia santo islâmico, enquanto são dadas aulas aos
domingos, o que torna complicado aos cristãos assistirem à missa.
Não existe nenhum relatório de discriminação específica baseada na
religião. Porém, em algumas zonas do país onde existe uma maioria
muçulmana, existe uma forte pressão social contra todas as formas
de proselitismo de outras crenças e contra qualquer conversão de
muçulmanos.
Os grupos missionários relataram que, embora a conversão do Cristianismo para o Islão não apresente nenhum problema, as autoridades obstruíram, por vezes, conversões de muçulmanos para outras
crenças, com proibições e perseguição contra a família da pessoa convertida e a sua nova comunidade.
GUinÉ EQUATORiAL
GUinÉ EQUATORiAL
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos88,7%
Agnósticos5%
Muçulmanos4,1%
Outros2,2%
Cristãos
472.940
Católicos
524.000
Circunscrições
eclesiásticas
3
SUPERFÍCIE
28.051km2
POPULAÇÃO
693.000
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
---
398
A Constituição reconhece a liberdade religiosa e as autoridades respeitam geralmente esta disposição. No entanto, o presidente Teodoro
Obiang Nguema, no poder desde o golpe de estado militar de 1979,
tem dito há já algum tempo que acredita que a responsabilidade das
religiões é puramente espiritual e que não tolerará grupos religiosos
que interfiram com os assuntos do Governo. Por conseguinte, os líderes religiosos evitam em geral debates e discursos que possam ser
considerados como críticas ao Governo e aos seus funcionários. Os
funcionários estatais controlam inclusive os sermões feitos durante
as cerimónias religiosas para poderem verificar que estes não criticam o Governo. Mesmo assim, as autoridades insistem que ao fazê-lo
não estão a exercer nenhum controlo sobre as actividades religiosas,
mas apenas a monitorizar quaisquer actividades “políticas”, mesmo
que indirectas.
No entanto, não existe nenhuma restrição sobre as actividades religiosas, e embora os grupos religiosos sejam obrigados a registar-se
(o registo não é requerido para a Igreja Católica nem para a Igreja
Reformada da Guiné Equatorial, por razões históricas e culturais), têm
também de pedir uma autorização específica para todas as actividades que acontecem fora dos locais de culto, embora tais actividades
sejam normalmente permitidas.
Aqueles que agem sem a devida autorização podem ser multados e
imediatamente banidos. Estas sanções são, no entanto, raramente
aplicadas e estas obrigações não obstruem efectivamente as actividades e reuniões dos grupos ou as suas actividades missionárias.
É permitido às organizações religiosas gerir escolas.
JibUTi
O caso de De Pretis
Em Março de 2009, depois de uma curta audiência, o tribunal do jibuti
condenou o P. Sandro De Pretis, vigário geral da Diocese de jibuti (na
ocasião a diocese inteira tinha três padres para cerca de 7000 fiéis),
por “posse de material pornográfico” e a três meses e quatro dias de
prisão. No dia 16 de Abril, o padre foi expulso do país no qual vivia há
dezassete anos.
No seu regresso a Itália, o padre falou abertamente destas acusações especiosas e falsas. Ele fora preso no dia 28 de Outubro de 2007
sem qualquer acusação, sendo mais tarde acusado de pedofilia. As
acusações foram alteradas seis vezes até ser condenado ao tempo
exacto que tinha passado na prisão, de 28 de Outubro de 2007 a 21 de
Fevereiro de 2008 (e depois disso esteve em prisão domiciliária). Os
meios de comunicação social nacionais falaram de acusações especiosas, baseadas, por exemplo, em fotografias de crianças nuas com
tumefacções nos braços, fotografias que tinham sido arquivadas no
computador para serem enviadas a médicos para pedir a sua opinião
médica.
O P. De Pretis declarou que não sabe a razão pela qual foi atacado,
mas ainda assim acredita que foi vítima das relações tensas que se
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos96,9%
Cristãos1,7%
Outros1,4%
Cristãos
34.200
Católicos
7.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
23.200km2
POPULAÇÃO
879.000
REFUGIADOS
12.111
DESALOJADOS
---
399
JibUTi
O Islão é a religião de Estado, mas a Constituição reconhece a liberdade de professar qualquer fé. O proselitismo e a conversão de
muçulmanos são no entanto desaconselhados, apesar de não serem
proibidos.
É obrigatório o registo dos grupos religiosos e os grupos de missionários estrangeiros necessitam de autorização do Governo para abrir
escolas.
O ministro dos Assuntos Islâmicos tem autoridade sobre todas as
questões muçulmanas, desde a construção e a administração de
mesquitas e de escolas religiosas privadas, até aos eventos religiosos.
Tribunais especiais aplicam a lei islâmica (Sharia) aos Muçulmanos
em questões de casamento, divórcio, filhos e heranças. Os não-muçulmanos, por sua vez, comparecem perante tribunais civis que aplicam
as leis do Estado.
Só são permitidos casamentos civis entre cidadãos não-muçulmanos
estrangeiros. O Artigo 23º da Lei da Família proíbe as mulheres muçulmanas de se casarem com um não-muçulmano.
Houve relatórios esporádicos de cristãos sobre alguma intolerância
social contra não-muçulmanos.
JibUTi
verificam entre o Governo local e o Governo francês, que envolveram uma prolongada campanha na imprensa nacional que incluiu ataques contra a Igreja Católica. Este pequeno país
é de importância militar estratégica para a França e para outras nações devido à sua proximidade do Canal do Suez, assim como do Corno de África e do Golfo de Áden, sendo este último
a base usada pelos piratas somalis.
O bispo, Monsenhor Giorgio Bertin, um franciscano, sempre defendeu com convicção o P. De
Pretis e durante a sua detenção falou de um julgamento político. Agora que o caso se encontra encerrado, ele apenas deseja falar sobre o trabalho feito no Jibuti. “A nossa fé” declarou o
bispo à revista Missionline, “requer que compartilhemos a nossa vida quotidiana com as pessoas comuns, em especial com os que têm mais problemas”. Esta partilha acontece também
através do trabalho de assistência social levado a cabo pela Caritas, assim como em iniciativas de criação de escolas e de promoção da educação para combater a iliteracia, a qual, de
acordo com Bertin, incentiva a pobreza e a injustiça.
400
LESOTO
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos91,8%
Animistas7%
Outros1,2%
Cristãos
2.084.810
Católicos
1.200.000
Circunscrições
eclesiásticas
4
SUPERFÍCIE
30.355km2
POPULAÇÃO
2.084.000
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
---
401
LESOTO
O direito à liberdade religiosa é completamente reconhecido pela
Constituição de 1993. O Artigo 13º dedica uma parte considerável à
liberdade de consciência e de religião, definindo em pormenor as
garantias constitucionais para o seu exercício.
Os grupos religiosos podem trabalhar sem se registarem mas, se não
o fizerem, perdem uma série de benefícios, especialmente fiscais.
A Igreja Católica gere cerca de 600 escolas, tanto primárias como
secundárias, o equivalente a um pouco menos de 40% do número
total, tornando-a assim a instituição educacional mais importante no
país, contando com mais escolas do que o próprio Estado.
Não ocorreram mudanças significativas em comparação com o Relatório da Liberdade Religiosa no Mundo de 2008.
LibÉRiA
LibÉRiA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Animistas41,7%
Cristãos40,5%
Muçulmanos16%
Outros1,8%
Cristãos
1.428.948
Católicos
310.000
A Constituição de 1985 reconhece a liberdade religiosa e o Estado respeita e protege esta disposição.
Os grupos religiosos são obrigados a registarem-se mas o procedimento é muito rotineiro e não existe nenhum relato de pedidos rejeitados ou de discriminação. O registo não é geralmente pedido aos
grupos religiosos tradicionais.
O Governo subsidia as escolas particulares, muitas das quais são geridas por grupos cristãos ou muçulmanos.
Existem ainda chacinas rituais pagãs, infligidas de modo a usar partes
do corpo da vítima em rituais tradicionais. As autoridades processam
estas chacinas enquanto assassinatos. O “desaparecimento” de pessoas e os homicídios rituais (chamadas “actividades Gboyo”) são tão
frequentes que, no início de 2010, os liberianos realizaram, em várias
cidades, manifestações de protesto pedindo uma maior intervenção
das autoridades. Em Janeiro de 2010, em Harper, uma comunidade
cristã organizou três dias de oração e de jejum pelas vítimas destes
rituais.
Cristãos
Circunscrições
eclesiásticas
3
SUPERFÍCIE
111.369km2
POPULAÇÃO
4.102.000
REFUGIADOS
6.952
DESALOJADOS
---
402
Apesar da tolerância geral e do respeito recíproco, existem ainda episódios de tensão entre as comunidades cristãs e muçulmanas. Porém,
devido ao elemento fortemente étnico na adesão às várias diferentes
religiões, nem sempre é fácil distinguir se tais episódios são motivados por intolerância religiosa ou por conflito inter-étnico.
Por exemplo, na cidade de Voinjama, no município de Lofa, no Norte
do país, ao final da tarde de 26 de Fevereiro de 2010, tiveram lugar graves confrontos nos quais pelo menos quatro pessoas foram mortas
e muitas ficaram feridas. As agências de notícias internacionais e a
imprensa local relataram imediatamente estes acontecimentos como
tratando-se de confrontos entre cristãos e muçulmanos (aparentemente despoletados pela descoberta do corpo de uma estudante de
uma escola luterana numa mesquita), e que resultaram no incendiar
de uma mesquita e a invasão, destruição e o incendiar de duas igrejas,
várias casas e uma escola cristã. As forças de paz das Nações Unidas
intervieram para separar as facções e proteger locais sensíveis como
é o caso dos locais de culto.
O Monsenhor Chris Brennan, administrador apostólico da Diocese
de Gbarnga, que inclui Voinjama, declarou à agência noticiosa Fides,
imediatamente depois dos eventos, que “não se tratou de um confronto entre Cristãos e Muçulmanos, mas sim entre dois grupos étni-
LibÉRiA
cos”. “Vou visitar a área e ainda não recolhi toda a informação necessária para ter uma ideia
precisa dos acontecimentos; no entanto, posso declarar desde já que muitas das notícias
que circulam on-line e através das agências de notícias não estão correctas. Não parece que
uma igreja tenha sido queimada, embora seja possível que uma missão católica tenha sido
pilhada”, declarou o Monsenhor Brennan. “Desejo reiterar fortemente que esta violência não
é causada por confrontos religiosos mas por tensões entre dois grupos étnicos, um com muitos muçulmanos e o outro, pelo contrário, com muitos cristãos. Tal, porém, não tem nada a
ver com um alegado confronto religioso”.
403
LÍbiA
LÍbiA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos96,6%
Cristãos2,7%
Outros0,7%
Cristãos
181.970
Católicos
155.000
Circunscrições
eclesiásticas
4
SUPERFÍCIE
1.759.540km2
POPULAÇÃO
6.546.000
REFUGIADOS
9.005
DESALOJADOS
---
404
Este país não possui Constituição e por isso não existe nenhuma disposição legal explícita que proteja a liberdade religiosa. No entanto,
uma base (Artigo 12º) para um certo grau de liberdade religiosa é
prevista no “Livro Verde dos Direitos Humanos da Era Jamahiriya” e
o Governo é tolerante em relação às religiões, com a excepção dos
grupos islâmicos extremistas que são reprimidos ou alvo de forte
oposição.
Cerca de 97% da população é muçulmana sunita. O Islão é o equivalente a uma religião estatal e, por consequência, encontra-se totalmente integrado na vida social do país. Apesar de tal situação, o
Governo controla a religião islâmica, regulando-a de forma rígida de
modo a que não interfira de forma alguma com a dimensão política
do país.
O clero católico exerce o seu ministério sobretudo nas principais cidades, onde dá assistência nos hospitais e orfanatos, e junto dos idosos
e deficientes.
Um único clérigo em Tripoli e um bispo residente no Cairo, lideram a
pequena comunidade anglicana.
Não existem locais de culto para os crentes das religiões Hindu,
Budista ou Baha’i, embora os seguidores destas religiões possam praticar a sua fé em habitações privadas e exibir os símbolos religiosos
nos mercados e nas janelas das suas casas.
MADAGÁSCAR
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Animistas48,9%
Cristãos48,5%
Muçulmanos2%
Outros0,6%
Cristãos
9.363.915
Católicos
5.926.000
Circunscrições
eclesiásticas
20
SUPERFÍCIE
587.041km2
POPULAÇÃO
20.146.000
REFUGIADOS
--DESALOJADOS
---
405
MADAGÁSCAR
A Constituição reconhece a liberdade religiosa e o Estado, no geral,
respeita esta situação.
Todos os grupos religiosos têm que se registar junto do Ministério
do Interior, mas têm de contar com pelo menos 100 membros que
sejam cidadãos malgaxes. O reconhecimento proporciona à organização o estatuto legal autónomo, permitindo-lhe possuir propriedades
e receber doações. Os grupos que não obtêm o registo do Ministério do Interior podem, no entanto, registar-se enquanto associações,
embora tal situação não lhes permita receber dádivas e doações ou
realizar actividades religiosas; apenas lhes proporciona o poder para
levar a cabo actividades de carácter social. Porém, de acordo com
dados do Governo, existem centenas de grupos religiosos que levam a
cabo as suas actividades sem nenhum reconhecimento, nem mesmo
enquanto simples associações.
Acusações de discriminação religiosa são ocasionalmente levantadas,
geralmente por muçulmanos que acreditam terem sido tratados de
modo discriminatório em escolas, hospitais ou no local de trabalho.
Durante o Governo do anterior presidente Marc Ravalomanana,
houve acusações de “favoritismo” para com a Igreja Reformista Protestante de Jesus Cristo em Madagáscar (FJKM), a qual tem cerca de
3,5 milhões de membros por entre os vinte milhões de habitantes do
país (fonte: Ekklesia), e da qual ele foi outrora o vice-presidente laico.
As acusações surgiram também por causa de comentários ocasionais
nos quais ele declarou que queria transformar o país num “estado
cristão”.
Por exemplo, o Reverendo Christian Bonnet, secretário-geral da organização da missão protestante francesa Defap, tinha comentado que
a FJKM estava demasiado perto do Governo e que Ravalomanana
estava a usar esta Igreja para fortalecer a sua posição política.
Depois do golpe de Estado de Março de 2009, que depôs Ravalomanana e o substituiu por um Governo temporário conduzido pelo líder
da oposição Andry Rajoelina, isto enquanto se aguarda por novas eleições, a FJKM expressou receios de que pudesse vir a sofrer retaliações.
No dia 17 de Março de 2009, soldados do auto-designado Governo de
transição espancaram e encarceraram o Pastor Lala Rasendrahasina,
presidente da FJKM. Este ataque pareceu ser consequência directa
da sua proximidade com o deposto presidente Ravalomanana, em
vez de ter por base razões religiosas. O pastor foi libertado no dia
seguinte, mas foi depois efectivamente mantido em prisão domiciliária durante vários meses, só reaparecendo em ocasiões oficiais no dia
MADAGÁSCAR
17 de Janeiro de 2010, para a celebração do Ano Novo. Nesta ocasião, ele declarou que a FJKM
continuava a ter problemas com o novo regime.
O novo regime não condenou o ataque ao pastor nem acusou os responsáveis.
A FJKM relatou que, no dia 8 de Janeiro de 2010, dois jornalistas da sua Rádio Fahazavana
foram presos, o editor principal Didier Ravohangiharison e o repórter Lolo Ratsimba, acusados de terem tomado parte na tentativa de revolta do exército em Dezembro de 2009. As
autoridades fechariam mais tarde a estação de rádio.
Além do caso envolvendo a FJKM, o novo regime instituído pelo exército não parece ter restringido a liberdade religiosa no país, embora tenha tido muito cuidado em restringir as actividades de grupos religiosos, com o objectivo de os manter fora da esfera política e não hesitando em intervir de forma decisiva quando este limite foi ultrapassado por personalidades
ou grupos religiosos.
Cristãos
Em Abril de 2009, foi dada autorização para reabrir a igreja que pertence à Nova Igreja Protestante de Madagáscar (FPYM), que foi encerrada em 2005. Em 2007, a FPVM foi autorizada
a reorganizar-se com um novo nome e novos líderes.
Católicos
A estação de rádio católica Rádio Don Bosco relatou que, na noite de 12 de Março de 2009,
alguns dias antes do golpe de Estado, desconhecidos tinham tentado incendiar a residência
de Monsenhor Odon Marie Arsène Razanakolona, Arcebispo de Antananarivo, e apenas foram
impedidos de o fazerem graças à intervenção da polícia. As fontes, citadas pela agência Fides,
relataram que “a situação permanece tensa, em parte também porque existem riscos de o
conflito político degenerar num confronto religioso”.
Em Julho de 2009, o sacerdote jesuíta francês, Padre Sylvain Urfer, que tinha sido deportado em 2007 pelo Ministério do Interior sem qualquer explicação, foi autorizado a voltar a
Madagáscar. Na ocasião, o presidente Ravalomanana não dera qualquer esclarecimento, nem
mesmo mais tarde, embora fosse questionado directamente por várias organizações religiosas, incluindo os bispos de Madagáscar. O Governo interino renovou agora a autorização de
residência, cancelada pelo anterior Governo, deste padre jesuíta que vive há trinta e três anos
no país.
406
MALAWi
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos79,8%
Muçulmanos13,2%
Animistas6,3%%
Outros0,7%
Cristãos
9.799.680
Católicos
4.017.000
Circunscrições
eclesiásticas
7
SUPERFÍCIE
118.484km2
POPULAÇÃO
15.692.000
REFUGIADOS
5.443
DESALOJADOS
---
407
MALAWi
A Constituição reconhece a liberdade religiosa e as autoridades respeitam e protegem, em geral, este direito. Não existe nenhum relato
de abusos ou de discriminação por razões religiosas durante o período coberto por este relatório.
Os grupos religiosos são obrigados a registarem-se, fornecendo
informação sobre a estrutura da organização e os seus objectivos.
Um sistema especial de tributação mais favorável está reservado às
organizações registadas. Para trabalhar neste país, os missionários
estrangeiros e os trabalhadores humanitários têm de ter uma autorização e pagar o imposto que lhes é exigido tal como todos os outros
profissionais estrangeiros.
As escolas do Estado providenciam instrução religiosa opcional e os
alunos podem escolher entre uma disciplina sobre “O Conhecimento
da Bíblia”, com uma orientação cristã, ou outra sobre “Educação
Moral e Religiosa”, que inclui materiais muçulmanos, cristãos, hindus
e baha’i. Todas as escolas cristãs que estão sob a alçada da Associação dos Pedagogos Cristãos do Malawi (ACEM) tornaram a disciplina
sobre a Bíblia obrigatória em todas as suas escolas, tanto primárias
como secundárias, não deixando lugar para a Educação Moral e Religiosa. Quando a ACEM fez este comunicado, os grupos islâmicos protestaram fortemente, pois as escolas cristãs são muitas e oferecem
melhor educação do que as estatais. No entanto, esta é a posição da
ACEM até à data.
Durante o período analisado, continuaram as discordâncias entre o
Governo e os rastafáris. Várias escolas continuam a proibir penteados
com cabelos longos, como os usados pelos rastafáris, nas instruções
sobre como os estudantes se devem vestir. Os rastafáris, que consideram o seu penteado como uma expressão fundamental da sua religião, protestam dizendo que não existe nenhuma lei que o proíba e
insistem em que tal proibição é discriminatória. Apresentaram, por
isso, um protesto ao ministro da Justiça com uma lista das escolas
que aplicam a proibição. No entanto, o Governo tinha respondido
anteriormente, declarando que esta proibição não pode ser considerada como prejudicial a um direito religioso, porque diz respeito, em
geral, ao cabelo longo e a roupas, e não tem como objectivo discriminar contra quem quer que seja.
MALi
MALi
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos86,8%
Animistas10,2%
Cristãos2,9%
Outros0,1%
Cristãos
283.060
Católicos
331.000
Circunscrições
eclesiásticas
6
SUPERFÍCIE
1.240.192km2
POPULAÇÃO
13.323.000
REFUGIADOS
13.538
DESALOJADOS
---
408
A Constituição reconhece a liberdade religiosa. Embora o país declare
que é laico, antes de tomar decisões importantes sobre assuntos controversos, o Governo consulta normalmente o denominado “Comité
de Sábios”, o qual é composto pelos arcebispos católicos e protestantes, assim como pelos líderes islâmicos.
As organizações religiosas são obrigadas a registarem-se do mesmo
modo que todas as outras associações. No entanto, o facto de não se
registarem não resulta em sanções.
O ministro para a Administração do Território tem o poder de proibir
publicações religiosas que desacreditem outras religiões, embora não
exista nenhum relato recente deste poder ter sido exercido.
No dia 23 de Agosto de 2009, dezenas de milhares de pessoas encheram as ruas da capital, Bamako, assim como outras áreas do país, para
protestar contra uma lei aprovada pelo Parlamento no início do mês
que pretendeu dar às esposas os mesmos direitos dos seus maridos,
tanto no casamento como sobre os filhos, assim como maiores direitos sobre heranças para as mulheres e para filhos ilegítimos. Entre
outras coisas, a lei definia também que as esposas já não eram obrigadas a obedecer aos seus maridos. A representante das associações
de mulheres muçulmanas, Hadia Sapiato Dembele, explicou que as
pessoas consideram a lei como indo contra os princípios islâmicos
que declaram que “um homem tem de proteger a sua esposa, e a
esposa tem de obedecer ao seu marido”. Esta declaração foi contestada pelos apoiantes da lei.
No seguimento dos protestos, o presidente Amadou Toumani Tuore
declarou que não assinaria e não promulgaria a lei (a qual ele tinha
fortemente apoiado) “de modo a salvaguardar a calma e a ordem
nacionais” e devolveu a lei ao Parlamento para análise aprofundada
e reconsideração.
O país tem uma longa tradição de tolerância entre muçulmanos e
os crentes de outras fés. Há anos que extremistas ligados à al-Qaeda
têm estado activos nesta região, presentes acima de tudo na zona
saariana do Norte do Mali, a partir de onde fazem incursões na Argélia, levando a cabo ataques e sequestrando cidadãos de países ocidentais. No geral, estes sequestros são planeados de modo a obter um
resgate ou outros tipos de vantagens, como a libertação de membros
da organização que se encontrem presos.
MARROCOS
Sendo “muçulmanos por defeito”, os autóctones convertidos ao Cristianismo não podem fazer parte de nenhuma Igreja oficial (Católica,
Protestante, Anglicana, Ortodoxa Grega ou Ortodoxa Russa) instalada
no país, sendo que as Igrejas estão assim apenas abertas aos cristãos
estrangeiros. Para rezar, estes marroquinos convertidos são forçados a
encontrar-se em residências privadas e a nunca ultrapassarem a vintena de pessoas para não chamarem a atenção. Alguns perderam o
emprego devido à sua fé. No essencial, estes cristãos são na realidade
condenados a uma morte social.
Ainda assim, apesar destes obstáculos, as conversões ao Cristianismo
continuam a ter lugar.
Para manter “a unidade e a segurança espirituais” dos marroquinos,
as autoridades procederam a um certo número de expulsões durante
os últimos anos, e em particular nestes últimos meses.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos98,9%
Cristãos0,1%
Outros1%
Cristãos
189.144
Católicos
27.000
Circunscrições
eclesiásticas
2
SUPERFÍCIE
446.550km2
POPULAÇÃO
32.381.000
REFUGIADOS
773
DESALOJADOS
---
409
MARROCOS
A Constituição “garante a todos o livre exercício do culto” (Artigo 6º).
Contudo, na realidade, esta liberdade apenas é concedida aos cristãos
estrangeiros e um marroquino apenas pode ser reconhecido como
muçulmano, com a excepção dos judeus, cuja identidade religiosa se
transmite de geração em geração. A mudança de religião no sentido
de uma renúncia ao Islão é assim, em princípio, um acto impossível
e punido por lei. O Artigo 220º do Código Penal marroquino prevê
penas de prisão de seis meses a três anos e uma multa de 100 a 500
dirhams para qualquer indivíduo que tente fazer vacilar a fé de um
muçulmano ou convertê-lo a outra religião, em particular os mais vulneráveis, como os pobres, as mulheres e as crianças, ou usar de meios
de sedução, quer seja explorando as fraquezas ou as necessidades,
seja utilizando para estes fins os estabelecimentos de ensino ou de
saúde, as creches ou os orfanatos.
Privados de qualquer existência legal enquanto cristãos, os marroquinos que são baptizados têm de se casar de acordo com a lei islâmica e
ser enterrados seguindo os rituais islâmicos. Esta adesão obrigatória
ao Islão não está inscrita nas leis do reino de Marrocos. Se um cristão se quiser casar com uma muçulmana marroquina, é obrigado a
converter-se ao Islão. Em contrapartida, se uma cristã se quiser casar
com um marroquino, ela pode continuar a praticar a sua fé, mas os
filhos serão forçosamente muçulmanos.
MARROCOS
No dia 29 de Março de 2009, cinco missionários evangélicos estrangeiros (quatro espanhóis
e um alemão) foram interpelados e depois expulsos, após terem organizado uma reunião
com residentes marroquinos em Casablanca.
No dia 4 de Dezembro do mesmo ano, a polícia prendeu dezassete cristãos, marroquinos e
estrangeiros, nas localidades de Saidia e Oujda. Foram acusados de terem feito evangelização, violando a lei. Entre as pessoas capturadas estava um casal suíço (este caso aconteceu
logo após o referendo sobre os minaretes na Suíça) que cuidava de crianças deficientes e
trabalhava para a organização Consulting Training and Support, um grupo de auto-ajuda,
e ainda dois nacionais da África do Sul e um da Guatemala. Todos os estrangeiros foram
expulsos.
No dia 5 de Fevereiro de 2010, um missionário evangélico americano residente em Marraquexe foi expulso depois de ter sido apanhado “em flagrante delito no acto de proselitismo
cristão”. No mês de Março seguinte, várias dezenas de cristãos de várias nacionalidades
foram por sua vez expulsas no quadro da “campanha de luta posta em marcha pelas autoridades marroquinas para impedir a difusão do credo evangélico, destinado a fazer vacilar a
fé dos Muçulmanos”. Entre eles figuravam dezasseis pedagogos cristãos que trabalhavam
na Village d’Espérance (Aldeia da Esperança), situada em Aïn-Leuh, perto de Azrou (região
central do Atlas), que foram notificados para deixarem o país até 8 de Março. De acordo com
o comunicado oficial do Ministério do Interior, “sob a cobertura de acções de beneficência,
este grupo levava a cabo actividades de proselitismo visando as crianças com menos de 10
anos de idade”.
No dia 7 de Março, um religioso católico franciscano, de nacionalidade egípcia e que residia desde há cerca de seis meses em Larache, perto de Tânger, foi igualmente objecto desta
medida e foi enviado de avião para o Cairo sem qualquer explicação. As autoridades católicas questionaram as autoridades marroquinas ao mais alto nível sobre os motivos desta
expulsão, mas não receberam nenhuma resposta.
Estas decisões seguiram-se à publicação de uma lista dos “inimigos do Islão moderado”
(xiitas, salafitas, ateus, cristãos evangélicos) ter sido publicada em Outubro de 2008 pela
instituição religiosa Dar al-Hadith al-Hassania a pedido do rei Maomé VI. Uma unidade dedicada à vigilância do proselitismo cristão foi também criada. Esta teria relatado a existência
de trinta e seis “bases evangélicas” geridas por 202 missionários, maioritariamente norteamericanos, ingleses e franceses, entre os quais figuram professores, engenheiros, médicos
e empresários.
410
MAURiTÂniA
Cristãos
Terroristas ligados à al Qaeda encontram-se presentes no país e activos no sequestro de cidadãos ocidentais para pedidos de resgate e
outras vantagens, assim como no ataque a cristãos. No dia 29 de
Junho de 2009, extremistas não identificados mataram um cidadão
americano, Christopher Leggett, um trabalhador voluntário cristão
que foi atacado pela manhã numa zona cheia de gente perto da
escola onde ensinava informática, na cidade de Nouakchott. Leggett
tentou, alegadamente, resistir a uma tentativa de sequestro e por
esta razão os dois atacantes atingiram-no a tiro por várias vezes na
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos99,1%
Cristãos0,3%
Outros0,6%
Cristãos
9.417
Católicos
5.000
Circunscrições
eclesiásticas
1
SUPERFÍCIE
102.532km2
POPULAÇÃO
3.366.000
REFUGIADOS
26.795
DESALOJADOS
---
411
MAURiTÂniA
A Constituição de 1991 reconhece o país enquanto República Islâmica
e o Artigo 5º indica o Islão como a única religião para o Estado e para
os seus cidadãos.
O Governo proíbe a impressão e distribuição de material não islâmico,
como, por exemplo, a Bíblia. A posse de livros religiosos não islâmicos
para uso privado não é, porém, proibida.
No final de Dezembro de 2008, em Ouadane, uma mulher norueguesa
que distribuía material cristão foi presa. Depois de ser libertada com
uma advertência, ela foi novamente encontrada a distribuir o mesmo
material em Afar e foi expulsa do país no dia 2 de Janeiro de 2009.
O Governo proíbe os não muçulmanos de praticarem o proselitismo,
com base numa interpretação restritiva do Artigo 5º da Constituição
que declara que “o Islão é a religião do povo e do Estado”. Existem ligações próximas entre o Governo e a religião muçulmana; a Sharia (lei
islâmica) estabelece os princípios com os quais as leis têm de concordar. O Conselho Superior do Islão, composto por seis imãs, aconselha
o Governo sobre a concordância das leis com os preceitos islâmicos.
Os tribunais aplicam a Sharia em questões familiares e o direito civil
para todos os outros sectores.
O registo não é exigido aos grupos religiosos, embora seja necessário
para todas as actividades sociais e humanitárias levadas a cabo por
grupos religiosos. Também nestas actividades o Governo proíbe todas
as formas de proselitismo.
A religião islâmica é ensinada em todas as escolas, inclusive nas privadas. A frequência destes cursos é obrigatória embora os estudantes
possam solicitar isenções por razões étnicas, religiosas ou simplesmente pessoais.
MAURITÂNIA
cabeça. O grupo norte africano da al Qaeda reivindicou a responsabilidade pelo assassinato,
enviando uma declaração áudio à estação de televisão al-Jazeera, na qual declaravam que a
vítima realizara “actividades missionárias” e tentara converter muçulmanos. Aqueles que o
conheciam declararam que, pelo contrário, ele estava envolvido na gestão de uma agência
de ajuda humanitária que ensinava informática, literatura e a ser alfaiate, assim como na
gestão de um programa de micro financiamento para pequenos empréstimos. O ministro da
Justiça mauritano declarou que “esta é uma grande perda para a Mauritânia”. Assistiu-se a
uma condenação e a um luto generalizados pelo assassinato, por entre as autoridades e os
grupos activistas de apoio humanitário.
No seguimento deste assassinato, as organizações de ajuda humanitária pediram a muitos
operadores cristãos de países ocidentais para deixarem a Mauritânia, pelo menos durante
algum tempo, e a polícia organizou cuidadosas vigilâncias.
No dia 29 de Novembro de 2009, três espanhóis, dois homens e uma mulher que eram trabalhadores voluntários de ajuda humanitária, foram sequestrados na estrada entre Nouakchott
e Nouadhibou, alegadamente pela al Qaeda do Magrebe (AQMI). A mulher, Alicia Gamez, foi
libertada em Março de 2010, no Mali.
No dia 18 de Dezembro de 2009, na região oriental de Gao, o italiano Sergio Cicala foi sequestrado, juntamente com a sua esposa Philomene Kaboure, uma vez mais pela AQMI. Eles
foram depois levados para o Mali, onde estiveram detidos até à sua libertação no dia 16 de
Abril de 2010.
412
MOÇAMbiQUE
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos52,5%
Animistas30,3%
Muçulmanos16,6%
Outros0,6%
Cristãos
7.977.216
Católicos
4.792.000
Circunscrições
eclesiásticas
12
SUPERFÍCIE
801.590km2
POPULAÇÃO
23.406.000
REFUGIADOS
3.547
DESALOJADOS
---
413
MOÇAMbiQUE
O Governo respeita a liberdade religiosa, a qual é instituída pela Constituição.
O Estado define-se como secular e não concede privilégios particulares a nenhuma religião. Os partidos políticos são proibidos de se afiliarem a qualquer convicção religiosa ou de se referirem directamente
a qualquer princípio religioso. Toda a instrução religiosa é proibida
nas escolas públicas, mas permitida nas privadas.
Os grupos religiosos e as organizações missionárias têm de solicitar
o registo, indicando também as suas fontes de financiamento e referindo os nomes de pelo menos 500 seguidores. Não há relato de as
autoridades terem negado qualquer registo. As organizações religiosas também podem possuir propriedades e gerir escolas.
A Igreja Católica dirige sessenta e seis jardins-de-infância, 310 escolas
primárias e cinquenta e três escolas secundárias, com mais de 21.000
alunos, assim como uma universidade.
Os missionários, tal como todos os outros cidadãos estrangeiros, têm
de obter autorizações de residência, mas não se conhece nenhum
relato de as autoridades obstruírem o seu trabalho. Os católicos são
muito activos no sector social, gerindo setenta hospitais, doze lares,
trinta e três orfanatos e quarenta e três creches.
A Igreja Católica e vários grupos islâmicos ainda estão em litígio
com o Governo por causa das propriedades confiscadas pelo Estado
depois da independência. Os bispos locais ainda se queixam de que
o Governo continua a ocupar vários edifícios confiscados à Igreja
nas províncias de Inhambane, Maputo, Beira, Chimoio, Pemba, Nampula, Niassa e Zambézia, e continuam a pedir que estes lhe sejam
devolvidos. Estas propriedades são actualmente usadas pelo Estado
enquanto escolas ou para outras actividades sociais.
nAMÍbiA
nAMÍbiA
A Constituição da República da Namíbia salvaguarda os direitos inalienáveis e a indispensável liberdade dos seus cidadãos. Ao referir-se
à liberdade fundamental de todas as pessoas deste país, a Constituição refere que todas as pessoas terão o direito à liberdade de praticar
qualquer religião e de manifestar tal prática.
As religiões e as organizações religiosas têm até ao momento desfrutado da liberdade delineada na Constituição.
A presença da Igreja Católica é importante, com os seus institutos
educacionais (jardins-de-infância, escolas primárias, escolas secundárias de primeiro ciclo, escolas secundárias de segundo ciclo, e albergues), serviços de saúde (hospitais privados, hospitais distritais, clínicas e hospícios), e a Catholic Aids Action. A Conferência dos Bispos
Católicos da Namíbia (NCBC) também contribui regularmente para a
promoção da justiça, da paz e da liberdade no país através da publicação de Cartas Pastorais sobre assuntos pertinentes, nos meios de
comunicação social nacionais do país.
Durante o período analisado para o relatório não tiveram lugar
nenhuns acontecimentos negativos no que diz respeito à liberdade
religiosa.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos88,9%
Animistas8,7%
Outros2,4%
Cristãos
2.156.128
Católicos
414.000
Circunscrições
eclesiásticas
3
SUPERFÍCIE
824.292km2
POPULAÇÃO
2.212.000
REFUGIADOS
7.163
DESALOJADOS
---
414
nÍGER
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Muçulmanos92,9%
Animistas6,6%
Cristãos0,4%
Outros0,1%
Cristãos
78.234
Católicos
19.000
Circunscrições
eclesiásticas
2
SUPERFÍCIE
1.267.000km2
POPULAÇÃO
15.891.000
REFUGIADOS
325
DESALOJADOS
---
415
nÍGER
A Constituição reconhece a liberdade religiosa e a sua legislação, e as
autoridades têm muito cuidado a controlar e a impedir expressões
que considerem ser uma ameaça à ordem pública e à unidade nacional. É proibido aos partidos políticos ter um programa baseado em
princípios religiosos.
Têm ocorrido numerosos golpes de estado no país. Em Fevereiro de
2010, o exército tomou o poder e prendeu o presidente Mamadou
Tandja (que governava desde 1999), suspendendo a Constituição e
dissolvendo todas as instituições do Estado.
Os grupos religiosos têm de se registar mas, em geral, trata-se de uma
formalidade e não existe nenhum relato de pedidos que fossem rejeitados por argumentos capciosos. É também necessária uma autorização por parte das autoridades para construir um local de culto. Porém,
no período analisado para este relatório, não houve nenhuma notícia
de serem negadas essas autorizações. Os missionários estrangeiros
têm de pedir o registo tal como acontece com as associações.
A instrução religiosa não é permitida nas escolas públicas.
Neste país, que detém uma maioria muçulmana muito extensa, o
Ministério dos Assuntos Religiosos (criado em 2007) promove o diálogo religioso e expressa opiniões veementes com base em princípios
religiosos no que diz respeito às políticas do Governo.
No dia 17 de Março de 2009, o ministro dos Assuntos Religiosos proibiu as estações de rádio e de televisão de difundirem actividades religiosas em directo, assim como sermões ou debates sobre assuntos
religiosos, para evitar a propagação de “sermões com conteúdos provocativos”. Apesar desta ordem, a difusão em directo de orações continuou e não existem relatos das autoridades terem tentado aplicar
esta disposição de uma maneira coerciva. Além disso, o ministro proibiu também os crentes de rezarem em “locais inapropriados” como,
por exemplo, nos mercados.
No dia 3 de Março de 2009, em Niamey, duas seitas muçulmanas (Ahli
Sunna e Kala Kato) iniciaram um animado debate sobre a interpretação da doutrina islâmica. A polícia interveio para dispersar a multidão
e prendeu vários participantes.
A pequena comunidade católica do país gere sete jardins-de-infância,
catorze escolas primárias e duas escolas secundárias, assim como dois
hospitais, seis consultórios, um hospital para leprosos e um orfanato.
As relações entre os muçulmanos e as outras fés são geralmente pacíficas, e a Igreja Católica tem sido também muito louvada pelo traba-
nÍGER
lho efectuado na distribuição de alimentos durante a grave crise de fome que há anos tem
afligido o país.
Além disso, grupos extremistas ligados à al Qaeda estão activos na região. No dia 22 de
Janeiro de 2009, foram sequestrados quatro turistas europeus no Níger, perto da fronteira
com o Mali. De acordo com algumas fontes, os raptores eram de tribos locais que venderam
depois os reféns a membros da al Qaeda no Mali. O grupo da al Qaeda no Magrebe (AQIM)
anunciou a “execução” do refém britânico Edwin Dyer, a qual aconteceu no dia 31 de Maio de
2009, com uma declaração pública publicada on-line. Como condição para a sua libertação,
os terroristas tinham pedido a libertação de Abu Qatada, antigo braço direito de Osama Bin
Laden, detido na Grã-Bretanha enquanto aguarda a extradição para a Jordânia, país onde foi
condenado a prisão perpétua por terrorismo; estas condições foram sempre rejeitadas por
Londres.
416
Aspectos jurídicos e institucionais
A Constituição da Nigéria reconhece a liberdade religiosa, incluindo
a liberdade de cada indivíduo manifestar, difundir ou alterar a sua
religião ou a sua convicção. A secção 10 (1) declara: “O Governo da
Federação ou de um Estado não adoptará qualquer religião enquanto
Religião de Estado”. No entanto, a Nigéria é também um membro da
Organização da Conferência Islâmica (OIC) e, em Outubro de 1999,
doze dos trinta e seis estados da Federação (todos no Norte: Bauchi,
Borno, Gombe, Jigawa, Kaduna, Kano, Katsina, Kebbi, Niger, Sokoto,
Yobe e Zamfara) estenderam a aplicação da Sharia (lei islâmica) do
âmbito da família (já em execução) para a lei criminal. Tal significou
a introdução da flagelação, da amputação e da pena capital (através
de apedrejamento).
Para implementar a Sharia na vida quotidiana, pelo menos quatro
estados (Zamfara, Niger, Kaduna e Kano) criaram uma polícia religiosa
(Hisbah) a qual tem sido por vezes acusada de abusos (por exemplo,
confiscação injustificada de bebidas alcoólicas).
Em princípio, a lei da Sharia não se aplica aos não muçulmanos em
assuntos civis e criminais. O mesmo é verdade para a lei islâmica em
relação à apostasia do Islão para outra religião. Porém, os não muçulmanos na Nigéria ainda são afectados de muitas formas pela observância da Sharia, especialmente em relação ao consumo e distribuição de bebidas alcoólicas, assim como à segregação e à discriminação
impostas às mulheres nos transportes públicos, nas escolas e nas instalações de cuidados de saúde.
Os estados governados pela Sharia providenciam fundos generosos
para peregrinações a Meca e para a construção de mesquitas; fazem
o mesmo, mas em muito menor extensão, para os locais de culto cristãos e para as peregrinações a Jerusalém. Muitas igrejas cristãs no
Norte, e também alguns grupos muçulmanos no Sul, queixam-se de
que as autoridades locais usam os regulamentos municipais como
pretexto para proibir a construção de novos locais de culto.
Em alguns estados governados pela Sharia, os acusados podem escolher entre serem julgados pela lei islâmica ou pela secular, mas tal
não acontece em todo o país. Por conseguinte, em pelo menos cinco
estados (Bauchi, Jigawa, Kano, Niger e Zamfara), existem casos actualmente em situação de recurso, no seguimento de sentenças de
amputação ou de morte por apedrejamento.
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos45,5%
Muçulmanos45,4%
Animistas8,8%
Outros0,3%
Cristãos
63.493.470
Católicos
21.954.000
Circunscrições
eclesiásticas
51
SUPERFÍCIE
923.768km2
POPULAÇÃO
158.259.000
REFUGIADOS
9.127
DESALOJADOS
---
417
niGÉRiA
niGÉRiA
niGÉRiA
Situação escolar
Ao abrigo da Constituição da Nigéria, a educação religiosa nas escolas estatais não é obrigatória. Porém, em muitos estados governados pela Sharia, foi imposta para os muçulmanos.
Os estudantes de outras confissões religiosas têm o direito de solicitar a educação religiosa
conforme a sua própria fé. No entanto, é frequente que professores de Conhecimentos da
Religião Cristã não se encontrem disponíveis nas escolas do Norte. De modo semelhante,
professores de Conhecimentos da Religião Islâmica não estão disponíveis em algumas escolas do Sul.
Diálogo Inter-religioso
Na Nigéria, o diálogo inter-religioso de âmbito nacional foi tornado possível por iniciativas
empreendidas pelo Conselho Inter-Religioso da Nigéria (NIREC), um grupo com cinquenta
membros (metade cristãos e metade muçulmanos), e que foi fundado em 1999. A nível local,
existe o Centro de Mediação Inter-religioso, em Kaduna, criado em 1995. A Associação Cristã
da Nigéria (CAN) é a principal associação ecuménica que representa os cristãos nigerianos.
Funciona como uma organização-quadro para defender os direitos dos cristãos e funciona
também como uma entidade parceira nas relações inter-religioso com os muçulmanos.
Intolerância e discriminação
Os actos mais generalizados de intolerância religiosa e de discriminação são os relatados
por várias comunidades cristãs nos estados mais islamizados da Nigéria (normalmente os
doze estados governados pela Sharia). Entre os exemplos, contam-se: falsas acusações de
blasfémia contra o Islão, conduzindo a que estudantes e professores cristãos sejam forçados a deixar as respectivas escolas; a recusa de autorização para que os cristãos possam
construir os seus próprios locais de culto e cemitérios; a demolição de igrejas sob o pretexto
da ilegalidade; o sequestro e a conversão forçada de adolescentes, especialmente raparigas,
terminando com o casamento com homens muçulmanos; a discriminação contra os cristãos
nos empregos do sector público e no acesso aos serviços públicos; a intimidação e ameaças
de morte contra muçulmanos que se convertem ao Cristianismo; julgamentos de cristãos
por tribunais islâmicos, apesar do seu direito à isenção; a imposição do código de vestuário
islâmico às alunas cristãs nas escolas estatais; e a manipulação dos padrões de admissão a
favor dos muçulmanos nas escolas e universidades estatais.
Em Fevereiro de 2009, Sani Kibili, de 55 anos, um cristão de Kano, condenado em 2007 por
um tribunal islâmico a três anos de prisão por blasfémia contra o Islão, foi libertado no seguimento de um recurso apresentado por falta de provas.
No relatório anual de 2009 da USCIRF, publicado no dia 1 de Maio de 2009, a Comissão dos
EUA para a Liberdade Religiosa Internacional acrescentou a Nigéria à sua lista de Países de
Especial Preocupação, ou seja, países culpados de violações particularmente graves da liberdade religiosa. Treze países encontram-se nessa lista, três em África (o Sudão e a Eritreia, e
418
também a Nigéria). A Nigéria foi incluída por causa da violência sectária generalizada que
custou a vida a 12.000 pessoas nos últimos dez anos, a expansão da Sharia e a sua aplicação
a não muçulmanos, e os relatórios de discriminação contra cristãos, elaborados por organizações cristãs.
Numa entrevista à agência noticiosa Zenit, em Março de 2010, o Arcebispo católico de Jos,
Ignatius Kaigama, declarou, em resposta a uma pergunta sobre os muçulmanos que se querem converter ao Cristianismo: “encontrei rapazes que vieram pedir a minha ajuda; trata-se
de jovens muçulmanos Hausa ou Fulani que vieram ter comigo e me disseram ‘Nós somos
muçulmanos mas sentimos que nos queremos tornar cristãos’.” Depois disso, “dizem-me [. .
.] que a sua vida foi ameaçada”.
A tribo de Maguzawa é um outro caso. Embora etnicamente Hausa, eles não são muçulmanos como as tribos Hausa e são, por isso, muito discriminados. Ao abrigo da lei nigeriana, eles
são considerados indígenas dos estados do Norte do país, mas porque professam religiões
tradicionais ou várias confissões religiosas cristãs, são excluídos de empregos nos serviços
públicos e das escolas públicas.
No dia 24 de Abril de 2010, a secção norte da CAN emitiu uma declaração na qual pediu a
demissão do general Saleh Maina, comandante do exército no estado do Planalto, por não ter
conseguido impedir a violência religiosa. No mesmo comunicado oficial, a CAN queixou-se
da discriminação anti-cristã nos empregos do sector público.
“Existe um desígnio particular”, pode ler-se na declaração da CAN, “de excluir os cristãos de
nomeações para determinados postos chave para-estatais e institucionais do Governo federal, especialmente em lugares como a Corporação Nacional de Petróleo da Nigéria (NNPC),
que constitui a base da economia nigeriana, e a Academia de Defesa da Nigéria (NDA), onde
os jovens nigerianos são treinados para servir no exército”, declara o documento.
No dia 10 de Novembro de 2009, a ala norte da CAN queixou-se de que os governadores de
alguns estados do Norte da Nigéria apenas providenciam fundos para peregrinações a Meca,
enquanto todos os anos os estados do Sul providenciam fundos para ambas as peregrinações, as dos cristãos à Terra Santa e as dos muçulmanos a Meca.
Actos de violência com motivação religiosa
niGÉRiA
Em Novembro de 2008, a Nigéria sofreu uma grande agitação religiosa na cidade de Jos.
Acusações de fraude nas eleições locais levaram os muçulmanos Hausa a realizar violentos
protestos contra cristãos que tinham apoiado o candidato do Partido Democrático do Povo.
Tudo terminou com a morte de 400 pessoas (entre elas, estavam pelo menos seis clérigos
cristãos) de acordo com números oficiais. Pelo menos quarenta igrejas e várias mesquitas
foram destruídas.
Menos de três meses depois, em Fevereiro de 2009, no vizinho estado de Bauchi, uma disputa entre cristãos e muçulmanos sobre a utilização, por parte dos muçulmanos da mesquita local, de um atalho perto de uma igreja pentecostal (depois de um acidente de carro
ter bloqueado a rua principal), descambou em violência, causando a morte de onze pessoas
419
niGÉRiA
e deixando 1500 sem casa. Ao todo, cerca de catorze igrejas, oito casas paroquiais, duas mesquitas e cerca de 150 residências e lojas foram incendiadas ou destruídas.
Em Abril de 2009, grupos muçulmanos do estado de Niger atacaram uma procissão na
Páscoa. Os atacantes feriram vinte cristãos e incendiaram três igrejas na cidade de Gwada;
tentaram fazer o mesmo a uma igreja baptista em Minna, mas foram repelidos por jovens
membros da comunidade. A Polícia acabaria por prender 104 pessoas por envolvimento no
incidente.
Em Julho de 2009, as forças de segurança esmagaram uma insurreição perpetrada pela Boko
Haram, uma seita islâmica extremista, que tentou derrubar instituições governamentais no
Norte da Nigéria para impor a sua versão violenta da Sharia e banir a “educação ocidental” que eles consideram como não islâmica. A violência subsequente provocou 700 mortos, incluindo o líder da seita, nos cinco estados de Borno, Bauchi, Gombe, Kano e Yobe. A
CAN reportou o assassinato de catorze clérigos e ataques contra vinte igrejas. No entanto, o
número total de cristãos mortos nunca foi determinado, com excepção do estado de Gombe,
onde doze cristãos foram mortos, incluindo mulheres e crianças, e no estado de Borno, onde,
além de três clérigos, foram mortos doze cristãos leigos.
No decurso da sua insurreição, a Boko Haram sequestrou dezenas de cristãos para usar como
escudos humanos ou para conversões forçadas. Um número desconhecido de reféns masculinos foi morto, incluindo alguns que se recusaram a submeter-se à conversão forçada, entre
eles os pastores Sabo Yukubu, Sylvester Akpan e George Orjih. Testemunhas oculares declararam que o Pastor Orjih foi decapitado por se recusar a renunciar à sua religião.
Em Setembro de 2009, a Ajuda à Igreja que Sofre e o vigário apostólico de Kontagora, no
estado do Niger, denunciaram a destruição, por parte de militantes islamistas, de igrejas em
construção.
Em Dezembro de 2009, a supressão pelas forças de segurança de uma insurreição da seita
islamista Kala-Kato, na cidade de Bauchi, causou setenta mortos. A Kala-Kato rejeita a modernidade, em particular a educação e medicina ocidentais. Proíbem também o uso da rádio e
da televisão assim como de todos os livros, com excepção do Alcorão.
Entre 17 e 20 Janeiro de 2010, a cidade de Jos e a sua vizinhança mais próxima foram palco
de mais violência inter-religiosa. O número de mortos foi calculado entre 200 e 492, dependendo da fonte.
A AIS reportou o assassinato de quarenta e oito cristãos, incluindo dois pastores, e ataques
a onze locais de culto cristãos. Uma primeira versão sobre a origem dos incidentes, providenciada pelo Comissário da Polícia do estado do Planalto, identificou a causa num ataque
à Igreja Católica de São Miguel, em Nasarawa Gwong, mas o Arcebispo de Jos desmentiu a
existência do ataque, dizendo que naquele dia o padre tinha celebrado três missas sem incidentes. Uma visita pelo então vice-presidente, doutor Goodluck Jonathan, confirmou que, de
facto, a Igreja de São Miguel nunca foi atacada.
Entre 20 e 25 de Janeiro, provavelmente como parte da consequência dos eventos em Jos, três
igrejas pentecostais (a Redeemed Christian Church of God, a Christian Faith Bible Church e a
420
niGÉRiA
Living Faith Foundation Chapel) foram atacadas por grupos de jovens muçulmanos em dois
lugares diferentes (Tudun Wada e Gusau) no estado de Zamfara. Ninguém foi preso.
No seguimento destes incidentes, o presidente da CAN no estado de Zamfara, Reverendo
Edwin Okpara, declarou, “É pena que não tenha havido nenhuma resposta por parte da polícia, e mesmo o governador estatal recusou-se a reunir-se connosco”. E acrescentou, “O nível
de perseguição em Zamfara é alarmante, mais do que em qualquer outro estado no país.
Nem mesmo em Sokoto ou Kano são os cristãos sujeitos ao tipo de discriminação a que nós
somos sujeitos... Estamos a comportar-nos mais ou menos como igrejas clandestinas neste
estado. O Governo actual do estado de Zamfara demonstrou ser mais anti-cristão do que o
anterior Governo... que introduziu a lei da Sharia”.
No dia 21 de Fevereiro de 2010, no seguimento de um incidente no seio da comunidade
muçulmana maioritária no qual a polícia em Kazaure (estado de Jigawa) matou um homem
que conduzia um tractor, uma multidão muçulmana atacou e incendiou oito edifícios que
pertenciam à Deeper Life Bible Church, à Igreja Apostólica, à Igreja ECWA, à Redeemed Christian Church, ao movimento Palavra da Fé, à Assembleia de Deus, à Igreja Anglicana e à Igreja
Católica.
No dia 23 de Fevereiro de 2010, a Irmandade Pentecostal da Nigéria denunciou casos de perseguição e de discriminação contra cristãos, pedindo ao Governo federal para acabar com o
problema. Declarou que foi negado um certificado de propriedade dos seus edifícios a virtualmente todas as igrejas no Norte da Nigéria.
No dia 7 de Março seguinte, muçulmanos Hausa-Fulani, gritando “Allahu Akhbar”, atacaram
três aldeias (Zot, Dogo Nahawa e Rastat), habitadas por cristãos Berom, a sul de Jos, matando
entre 300 e 500 pessoas e incendiando setenta e cinco casas.
Dois dias antes, a 5 de Março, o presidente do ramo da juventude da Irmandade Pentecostal da Nigéria queixara-se de assassinatos não relatados de cristãos perpetrados por grupos
islâmicos armados em áreas remotas do estado do Planalto. De acordo com Mark Lipdo, um
voluntário da Fundação Stefanos, uma organização cristã sem fins lucrativos, “alguns dos
sobreviventes disseram que os muçulmanos que moravam nas aldeias atingidas foram avisados pelo telefone dois dias antes do ataque e aconselhados a partir”.
No dia 17 de Março seguinte, extremistas muçulmanos vestidos como soldados atacaram
duas aldeias cristãs no estado do Planalto, queimando vinte casas e matando treze pessoas,
principalmente mulheres (incluindo uma que estava grávida) e crianças. Às vítimas foi-lhes
cortada a língua.
Extremistas islâmicos são também suspeitos do sequestro e subsequente assassinato, no dia
13 de Abril de 2010, do Reverendo Ishaku Kadah, pastor da Igreja de Cristo, na aldeia de Boto
(estado de Bauchi), e da sua esposa. No mês de Janeiro, o pastor tinha dado guarida a cristãos que tinham fugido dos distúrbios em Jos. Na ocasião, extremistas islâmicos suspeitos
tinham também incendiado a sua igreja.
421
niGÉRiA
No dia 19 de Abril de 2010, foram encontrados dois fazendeiros cristãos assassinados e dois
outros desapareceram da aldeia de Riyom (estado do Planalto). Também neste caso as suspeitas recaem sobre os militantes islamistas.
No dia 24 de Abril de 2010, dois jornalistas do The Light Bearer, uma publicação da Igreja de
Cristo, morreram apunhalados numa aldeia a norte de Jos por um grupo de jovens muçulmanos que em seguida se gabaram do seu crime nos telemóveis das vítimas.
No mesmo dia, mais quatro cristãos foram mortos por um gangue de jovens muçulmanos,
depois do corpo de um adolescente muçulmano ter sido encontrado enterrado na aldeia
cristã de Nasarawa Gwom, cenário do massacre de 7 de Março.
Controvérsia sobre os massacres em Kuru Karama e Jos
Os massacres no estado do Planalto, no dia 17 de Janeiro em Kuru Karama e em 7 de Março
em Jos, conduziram a uma controvérsia sobre quem os levou a cabo e se foram motivados
por razões religiosas ou não.
De acordo com a organização International Christian Concern (ICC), Kuru Karama não era uma
aldeia muçulmana e havia também cristãos entre as vítimas.
Numa entrevista à ICC, o Bispo anglicano de Jos, Reverendo Benjamim Kwashi, queixou-se
de que “O que os meios de comunicação social estão a relatar é como se a Igreja estivesse
a matar os muçulmanos. Algumas pessoas, em defesa dos seus lares, famílias e filhos, combateram [os atacantes]”, declarou ele. “O que se seguiu depois disso foi o caos em ambos os
lados”.
“Estamos profundamente tristes com o último ataque jihad contra cristãos indefesos na
Nigéria”, declarou o responsável regional do ICC para a África, Jonathan Racho. “Infelizmente,
os meios de comunicação social e os políticos classificaram injustamente os ataques como
violência étnica, em vez de contarem a verdade sobre o cruel ataque islâmico jihad que tem
como objectivo afastar os cristãos do Norte da Nigéria”.
Por outro lado, o Monsenhor John Olorunfemi Onaiyekan, Arcebispo católico de Abuja, declarou que a religião não era a raiz da violência. Falando à Radio Vaticano, ele declarou: “Este é
um conflito clássico entre pastores e fazendeiros” que “não se matam uns aos outros devido
à religião, mas por razões sociais, económicas, tribais, (ou) culturais”.
O Arcebispo católico de Jos, Ignatius Kaigama, recusou-se também a aceitar as acusações de
que a religião estava por detrás do conflito. Lamentavelmente, declarou ele, a religião está a
ser usada para nos desviar a atenção dos verdadeiros problemas. “Podem existir outros motivos; talvez os políticos queiram levar a sua avante e a melhor maneira de o fazerem é usar
a religião como uma arma”. E acrescenta: “É inquietante que tanto a juventude cristã como
a muçulmana tenham desenvolvido o hábito de destruir e matar. Deve ser feito um esforço
multidimensional para encontrar soluções para os problemas da juventude, quer muçulmana quer cristã, em especial porque a maioria destes jovens são inactivos, sem educação e
são facilmente influenciados por chauvinistas étnicos, políticos e religiosos”.
422
QUÉniA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos81,7%
Animistas9,3%
Muçulmanos7,1%
Outros1,9%
Cristãos
28.888.990
Católicos
9.526.000
Circunscrições
eclesiásticas
26
SUPERFÍCIE
580.367km2
POPULAÇÃO
40.8630.000
REFUGIADOS
358.928
DESALOJADOS
---
423
QUÉniA
A Constituição reconhece a liberdade religiosa e o Governo protegea. No entanto, o país experimentou uma onda de violência, como foi
notado num relatório encomendado pelo Fórum Inter-Religioso sobre
as causas de raiz e as implicações da violência pós-eleitoral de 20072008. O relatório determinou como cauda da violência os problemas
políticos e sociais não resolvidos, como também o uso instrumental
da política por parte de alguns líderes que tiraram proveito de divisões étnicas e sociais para incentivar as tensões e assim aumentar o
próprio poder.
As eleições presidenciais de 27 de Dezembro de 2007 viram o presidente cessante Mwai Kibaki e o seu concorrente, Raila Odinga, envolvidos numa luta cruel que degenerou em conflito armado. Isto conduziu a milhares de mortes na primeira metade de 2008 e forçou mais
de um milhão de pessoas a abandonar as suas casas. A crise acabaria
por ser resolvida quando um Governo de unidade nacional foi formado, com Odinga como primeiro-ministro. No entanto, a situação
permaneceu tensa. Um ano depois da violência, centenas de milhares das pessoas ainda viviam em campos de refugiados em condições
precárias.
No dia 30 de Abril de 2009, o Tribunal Superior ilibou quatro homens
que se pensava serem responsáveis por atearem fogo a uma igreja na
véspera de Ano Novo de 2008, em Eldoret, no Vale do Rift, incidente
em que morreram trinta e três pessoas durante a violência que se
seguiu às eleições presidenciais. Na sua decisão, o tribunal criticou a
polícia e a acusação pelo modo inadequado como tinham efectuado
a investigação e conduzido o julgamento.
No período coberto por este Relatório, os debates sobre a reforma
constitucional continuaram. Embora desejada por todos, gerou muita
controvérsia. Os tribunais islâmicos e a sua jurisdição foram uma
grande fonte de discórdia. Num país predominantemente cristão,
mas com uma vasta população islâmica concentrada em certas regiões, o Artigo 66º da antiga Constituição previa que tribunais Kadhi
aplicassem a lei islâmica (Sharia) em assuntos relativos a estatuto
individual, matrimónio, divórcio ou herança, sempre que todas as partes envolvidas professassem a religião muçulmana.
Os tribunais Kadhi nasceram em 1963 e eram regulamentados por
uma lei de 1967. Operam especialmente em regiões costeiras onde a
presença muçulmana é mais forte. No entanto, ao abrigo das regras
existentes, qualquer assunto jurídico significativo, incluindo decisões
tomadas por tribunais Kadhi, podem ser alvo de recurso junto do
QUÉniA
Tribunal Superior. Os muçulmanos desejam agora que a jurisdição dos tribunais Kadhi seja
estendida a todo o país e que seja exclusiva, sem direito de interposição de recurso para o
Tribunal Superior.
Os grupos cristãos opõem-se a tais alterações, pedindo uma divisão clara entre Estado e religião, defendendo que o Estado deveria reter a jurisdição em tais assuntos. Outras comunidades, incluindo a Igreja Anglicana, afirmam que as exigências muçulmanas lhes iriam conceder privilégios que são negados a outras religiões; para eles, o sistema existente de tribunais
Kadhi deveria ser abolido.
O debate tem sido muito aceso e agressivo. Os grupos cristãos, especialmente os protestantes, acusaram os Muçulmanos de tentar montar um “estado dentro do estado”. O Reverendo
Peter Karanja, secretário-geral do Conselho Nacional das Igrejas do Quénia (NCCK), escreveu
à Comissão para a Reforma Constitucional, em Fevereiro de 2010, para expressar a sua oposição ao sistema de tribunais Kadhi existente.
Os cristãos também se opõem à proposta de que a nova Constituição deve afirmar que os
seres humanos existem apenas após o nascimento. Pelo contrário, eles pedem que o direito à
vida e a total dignidade humana sejam reconhecidos a partir da concepção.
As várias questões estão ainda a ser debatidas e nenhuma decisão final foi tomada.
Os novos grupos religiosos têm de se registar para poderem desfrutar dos benefícios fiscais.
No entanto, são livres de gerir as suas próprias escolas. As escolas cristãs têm muitos alunos
muçulmanos, uma situação que conduziu a frequentes discordâncias sobre os adornos de
cabeça femininos, a alimentação e as classes mistas. O Monsenhor Boniface Lele, Arcebispo
de Mombaça, uma diocese predominantemente muçulmana, declarou que são precisas
directrizes governamentais claras e inequívocas. O Estado deve ser responsável pelos vários
calendários religiosos, orações e culto semanal para que estes não “interfiram com a aprendizagem”.
Grupos cristãos e muçulmanos gerem estações de rádio e de televisão, mas o ministro responsável rejeitou um pedido feito pela Igreja Católica para difundir a nível nacional.
No final de 2009, uma nova lei contra a “poluição sonora” entrou em vigor, proibindo o ruído
e os sons considerados como excessivos em locais públicos. Muitos grupos cristãos puseram
esta lei em causa, declarando que poderia limitar o seu direito a cantar e a entoar hinos
durante o culto.
Em Dezembro, o Bispo Mark Kariuki, da Deliverance Church of Kenya, expressou o receio de
que a lei possa negar aos cristãos o direito ao culto e limitar a sua liberdade de expressão,
impedindo-os de cantar e de expressar a sua fé ruidosamente. No final, ficou demonstrado
que tais receios eram exagerados.
Católicos
Na manhã de 16 de Janeiro de 2009, o P. Giuseppe Bertaina, reitor e administrador do Instituto Consolata de Filosofia, em Langata, Nairobi, foi morto no seu gabinete durante um
roubo.
424
QUÉniA
O P. Giuseppe Ettorri, que ensina na mesma instituição, declarou que várias pessoas tinham
entrado secretamente no edifício durante as horas normais das aulas. Os alunos e os professores estavam nas suas salas de aula mas ninguém ouviu ou viu nada de suspeito, em parte
porque o gabinete do P. Giuseppe se situa no segundo andar, por cima das salas de aula. Os
criminosos devem tê-lo apanhado de surpresa, espancaram-no, amarraram-no e amordaçaram-no. De acordo com a polícia, a mordaça causou a sua morte por asfixia.
Um seminarista deu o alarme e uma mulher foi mais tarde presa na posse de livros de cheques que pertenciam ao missionário assassinado. Ele estava no Quénia desde a década de
1960.
Na noite de 10 para 11 de Dezembro, um sacerdote irlandês, P. Jeremiah Roche, da Sociedade Missionária de São Patrício, foi também assassinado na sua casa em Kericho (a 250
km de Nairobi), simplesmente por motivos de roubo. Os seus paroquianos encontraram-no
na manhã seguinte. Preocupados por ele não ter aparecido para a missa, foram procurá-lo.
Encontraram-no amarrado à cama, com ferimentos na cabeça provocadas por uma catana.
O P. Roche era um angariador de fundos muito activo para diferentes projectos de desenvolvimento em que trabalhava. Por esta razão, o P. Cooney, da Casa da Cúria Geral da Sociedade
Missionária de São Patrício, é da opinião de que os ladrões poderiam ter pensado que ele
tivesse muito dinheiro.
Duas religiosas foram libertadas no final de Fevereiro de 2009 em Mogadíscio (Somália).
As Irmãs Maria Teresa Olivero e Caterina Girando tinham sido sequestradas no dia 10 de
Novembro de 2008 em El-Wak, no Quénia, uma cidade a 10 km da fronteira com a Somália.
Estiveram em cativeiro durante três meses no interior da Somália, enquanto eram empreendidas negociações para as libertar. A Irmã Caterina declarou: “Trataram-nos bem; eles apenas
queriam dinheiro”.
A área onde o sequestro ocorreu é constantemente percorrida por refugiados somalis que
fogem da guerra civil no seu país. Sofre também de incursões frequentes por parte de criminosos que cruzam a fronteira para roubar gado. No entanto, os sequestros são bastante
raros. As duas religiosas trabalhavam no Quénia há já trinta e cinco e vinte e cinco anos, respectivamente, na casa do seu movimento em El-Wak, onde geriam um pequeno dispensário
e abrigo, e eram queridas e estimadas pela população local, constituída principalmente por
muçulmanos.
Protestantes
Embora as relações entre os cristãos e os muçulmanos sejam normalmente pacíficas, existem, não obstante, pontos de fricção entre elas, alguns dos quais graves. Por exemplo, na
cidade de Garissa, perto da fronteira somali, o líder da Redeemed Gospel Church queixouse, em Março de 2009, de que as autoridades não tinham reconstruído a igreja que jovens
muçulmanos destruíram no dia 14 de Setembro de 2008.
As autoridades relataram à agência noticiosa Compass Direct News que se tinham coibido de
reconstruir a igreja no local original, como exigido pelos seus membros, porque os muçulma425
QUÉniA
nos veriam isso como uma provocação. Na realidade, as relações entre as duas comunidades
tinham-se deteriorado originalmente em parte porque uma mesquita foi construída a uma
distância de apenas três metros da igreja existente.
A polícia ainda não tomou medidas para identificar e prender os responsáveis pelo ataque
contra a igreja.
Muçulmanos
Os líderes muçulmanos acusam o Governo de usar o pretexto do terrorismo para prender e
deportar muçulmanos de outros países e para impedir o proselitismo.
Eles apontam a decisão tomada pelas autoridades de recusar a renovação do visto dos estudiosos muçulmanos estrangeiros Xeique Ismail Rufai e Xeique Ibrahim Shariff Atass, tendo
ambos sido deportados. Em Dezembro de 2008, o Xeique Mohammed Osman Egal, um
famoso académico Wahhabi e cidadão britânico, viu o seu pedido de renovação de visto ser
rejeitado.
Relatórios de dois grupos britânicos de direitos humanos, um publicado em Fevereiro de
2009, pela Redress and Reprieve e o outro em Setembro de 2008, pela Humans Rights Watch,
indicaram que 150 muçulmanos tinham sido presos por suspeita de terrorismo em anos
recentes, incluindo mulheres e crianças. De acordo com os relatórios, muitos destes muçulmanos estiveram detidos sem acusações formais durante semanas. Também lhes foi negado
aconselhamento legal e foram sujeitos a abusos físicos e psicológicos. No início de 2007,
entre 85 e 120 indivíduos foram deportados para a Somália e para a Etiópia. Oito deles, provenientes da Somália, acabariam por voltar para o Quénia e, em Outubro de 2008, apresentaram uma queixa ao Tribunal Superior contra o Governo queniano e a companhia aérea que
os transportou à força. Durante a sua detenção, nenhum deles foi, alguma vez, formalmente
acusado. O seu caso ainda se encontra pendente.
No entanto, o Governo ainda está preocupado com infiltrações por parte de radicais muçulmanos. Em Janeiro de 2010, a polícia esteve envolvida em violentos confrontos com manifestantes que exigiam a libertação do Imã Abdullah Al-Faisal. Uma pessoa morreu durante os
confrontos e muitas mais foram feridas, inclusive membros da polícia.
O clérigo tinha sido condenado por incitamento ao ódio racial e envolvimento em actos terroristas. Alguns acreditam que ele foi também um dos inspiradores dos ataques no metropolitano de Londres e que passara aproximadamente quatro anos numa prisão britânica, entre
2004 e 2008. Entrou no Quénia no dia 31 de Dezembro de 2008, mas foi preso por violar os
regulamentos relativos ao visto.
No dia 21 de Janeiro, al-Faisal foi expulso e mandado de volta para a sua nativa Jamaica. Os
seus seguidores protestaram contra esta acção, reivindicando que a sua detenção era ilegal.
Outros disseram que as autoridades não queriam ter no país um forte partidário de acções
violentas por parte de muçulmanos.
Crenças tradicionais e seitas
426
QUÉniA
Os confrontos entre a polícia e os seguidores da seita Mungiki continuaram em 2009. O
grupo, que se vê como herdeiro dos rebeldes Mau Mau que lutaram contra a administração
colonial britânica na década de 1950, é inspirado por rituais e convicções africanas tradicionais. Desenvolveu-se na década de 1980 e tem tido especial sucesso em atrair os jovens provenientes dos bairros mais pobres das cidades. Acabaria por ser proscrito por causa do seu
envolvimento em extorsões, violência e outras actividades criminosas.
No dia 5 de Março de 2009, dois homens armados mataram a tiro os activistas dos direitos humanos Kamau King’ara e Paul Oulu, num carro, na capital, Nairobi. As duas vítimas
eram respectivamente o presidente executivo e o promotor da Oscar Foundation Free Legal
Aid Clinic-Kenya, uma organização que tinha relatado o assassinato de pelo menos 1721 pessoas entre 2002 e 2009, quase todos jovens membros da Mungiki, assim como o desaparecimento de outros 6542 simpatizantes da seita.
Philip Alston, relator especial das Nações Unidas para o Quénia, incluiu estas alegações no
seu relatório de Fevereiro de 2009. Nele declarou que havia “esquadrões da morte” a operar
no país. Pediu também às autoridades para destituírem o chefe da polícia e o procuradorgeral.
Depois da Igreja Católica ter durante anos advertido contra o perigo para a ordem pública
representado pelas seitas, a Mungiki começou a ter como alvo as comunidades cristãs, acusando-as, entre outras coisas, de serem escravas dos valores e princípios ocidentais. Algumas
comunidades cristãs da província Central queixaram-se de terem recebido ameaças repetidas nos primeiros meses de 2009, em conjunto com exigências para que cessassem as suas
actividades.
No Quénia, a feitiçaria ou a bruxaria permanecem muito generalizadas, o mesmo acontecendo com o medo da magia. Esta situação resultou em vários crimes e mutilações rituais.
Jovens e mulheres idosas foram perseguidos depois de terem sido acusados de serem feiticeiros.
O Estado castiga as pessoas que usam a feitiçaria para proveito próprio; porém, os assassinatos rituais são o verdadeiro problema. Muitos relatórios da província de Nyanza, especialmente do distrito de Kisii e da cidade de Malindi, na província da Costa, relatam histórias de
abuso e de assassinato que se pensa estarem ligadas a práticas de magia.
No dia 6 de Maio de 2009, em Kiogoro, distrito de Kisii, nove mulheres foram acusadas do
sequestro de um menino de onze anos e de praticarem feitiçaria nele. Uma mulher confessou os actos de feitiçaria e foi condenada a um ano de prisão por este facto. Algumas das
outras mulheres estão ainda a ser julgadas.
As pessoas tomaram também as questões nas suas próprias mãos, indo atrás dos suspeitos
de feitiçaria, espancando-os, mesmo quando se tratava de antigos vizinhos. No dia 26 de
Fevereiro de 2009, quatro mulheres foram queimadas vivas depois de terem sido suspeitas
de praticar feitiçaria numa criança em Nyamataro, distrito de Kisii. Cinco suspeitos foram
julgados e condenados a um ano de prisão.
427
QUÉNIA
No dia 26 de Janeiro de 2009, em Gongoli (Malindi), um homem suspeito de feitiçaria morreu apunhalado por indivíduos desconhecidos.
No dia 8 de Fevereiro de 2009, um homem foi espancado e apedrejado até à morte em
Malindi, provavelmente pelos seus próprios familiares, depois de ser acusado de causar a
morte do seu filho através do uso de magia.
No dia 29 de Abril de 2009, alguns residentes de Malindi espancaram, amarraram e queimaram até à morte um casal com cerca de 60 anos. Eles foram considerados responsáveis pela
doença que matou o seu neto de dezoito anos de idade. Uma multidão acusou-os de lançar
uma maldição sobre o jovem depois de terem tido uma discussão com o seu outro avô.
Com a sua morte, o número global de pessoas mortas por feitiçaria chegou a vinte e dois em
menos de um ano, desde meados de 2008 até Abril de 2009.
Em Março de 2009, um homem foi preso em Bomet (Vale do Rift) por posse de amuletos. O
juiz negou-lhe a fiança, em parte com receio de vir a ser linchado por uma multidão enfurecida. Permaneceu na prisão durante vários meses.
428
REPÚbLiCA CEnTRO-AFRiCAnA
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos66%
Animistas18,4%
Muçulmanos14,7%
Outros0,9%
Cristãos
2.720.814
Católicos
991.000
Circunscrições
eclesiásticas
9
SUPERFÍCIE
622.984km2
POPULAÇÃO
4.506.000
REFUGIADOS
27.047
DESALOJADOS
162.000
429
REPÚbLiCA CEnTRO-AFRiCAnA
O Artigo 8º da Constituição promulgada em Janeiro de 1995 estabelece a liberdade de consciência, de reunião e de culto. São proibidas
todas as formas de extremismo e de intolerância.
Para poderem trabalhar, todos os grupos religiosos, com a excepção
dos indígenas, têm de obter o registo, o qual é regulado por uma lei
bastante restritiva controlada pelo Ministério do Interior. Na realidade, os grupos têm de ter pelo menos mil membros, e os responsáveis pelos grupos tem de possuir um diploma de um instituto de
estudos religiosos reconhecido pelas autoridades. O registo faculta o
acesso a uma série de benefícios fiscais.
As principais festividades cristãs são consideradas feriados nacionais
e todos os grupos religiosos têm o direito a difundir na rádio estatal
nacional uma vez por semana e num dia à sua escolha.
A instrução religiosa encontra-se disponível para todos os estudantes, mas não é obrigatória.
Não existe nenhum relato de actos de intolerância religiosa perpetrados pelas autoridades ou por membros da sociedade civil.
Os confrontos e os ataques armados que têm afectado várias áreas
do país devido a incursões de rebeldes ugandeses que pertencem
ao Exército da Resistência do Senhor (LRA), e que por vezes resultaram também na morte de membros de comunidades religiosas (por
exemplo, o ataque de Fevereiro de 2010 a uma igreja católica em
Rafai, no Sudeste do país), não têm inspiração religiosa.
REP. DEMOCRÁTiCA D0 COnGO
REPÚbLiCA DEMOCRÁTiCA DO COnGO
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos95,4%
Animistas2,6%
Outros2%
Cristãos
57.887.766
Católicos
35.904.000
Circunscrições
eclesiásticas
47
SUPERFÍCIE
2.344.858km2
POPULAÇÃO
67.827.000
REFUGIADOS
185.809
DESALOJADOS
1.900.000
430
O Artigo 26º da Constituição de 2003 não só define que a República
Democrática do Congo não tem nenhuma religião de Estado, como
garante também o respeito total pela liberdade religiosa, com todas
as suas consequências organizacionais, tais como a liberdade de instrução religiosa e a liberdade de culto, tanto em privado como em
público, desde que seja dentro do respeito da ordem e da moral
pública.
As organizações religiosas têm de se registar, seguindo procedimentos muito simples para obter a isenção de vários impostos. Mas os
grupos não registados também operam livremente.
A instrução religiosa é permitida nas escolas estatais, se ensinada
pessoalmente por membros de instituições religiosas.
Realizam-se consultas regulares entre o Governo e os líderes dos
vários grupos religiosos presentes no país.
O Natal é um feriado nacional.
Continua a existir uma situação de conflito grave, em especial no Kivu
Norte e nas outras regiões das fronteiras orientais. Nesta área ocorrem incursões de várias milícias locais e de outras que se infiltram a
partir do estrangeiro, e que resultam em chacinas e saques. A violência contra as mulheres é tão frequente que mesmo as organizações
internacionais estão alarmadas. A tragédia das mulheres violadas
esteve no centro dos discursos, não apenas do Monsenhor Monsengwo, Arcebispo de Kinshasa, mas também do Secretário-Geral do
Conselho Mundial das Igrejas (WCC), Samuel Kobia, durante uma conferência ecuménica realizada em Kinshasa em Julho de 2009. Porém,
a tragédia continua, e nem mesmo a presença das forças de paz das
Nações Unidas conseguiu acabar com esta violência.
O secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, numa declaração
feita em Kinshasa durante as celebrações do quinquagésimo aniversário da independência, no dia 30 de Junho de 2010, indicou precisamente a protecção dos civis como sendo a tarefa mais importante
atribuída às forças de paz no seu trabalho para a estabilização e a
consolidação da paz. “Temos de continuar a considerar a protecção
dos civis uma prioridade, em particular das mulheres, que suportam
um fardo desproporcionado”, declarou Ban Ki-moon, referindo-se
especificamente a incursões e violência infligida por grupos rebeldes
activos nas regiões orientais, realçando também o modo como a violência contra as mulheres continua a ser uma das práticas de guerra
mais difundidas.
REP. DEMOCRÁTICA D0 CONGO
A Igreja Católica renovou também a sua preocupação sobre a violência infligida às mulheres
congolesas.
Num relatório da Comissão para a Paz e a Justiça da Arquidiocese de Bukavu, existe uma referência a “um barbarismo inimaginável do qual é preciso falar, porque por vezes temos mais
receio do silêncio do bem do que do barbarismo do mal”. “A violência contra as mulheres é
vista como um modo de aniquilar uma comunidade inteira. É um modo de ferir o coração de
uma comunidade”.
De acordo com o relatório, a zona mais afectada por estes crimes é Walungu, no distrito de
Kaniola.
Apesar da tragédia observada nessas zonas do país, não existe nenhum relato de episódios
atribuíveis à violência ou à intolerância com motivação religiosa.
431
RUAnDA
RUAnDA
Aspectos jurídicos e institucionais
CONFISSÕES
RELIGIOSAS
Cristãos86,1%
Animistas8,8%
Muçulmanos4,8%
Outros0,3%
Cristãos
7.615.016
Católicos
4.640.000
Circunscrições
eclesiásticas
9
SUPERFÍCIE
26.338km2
POPULAÇÃO
10.277.000
REFUGIADOS
54.016
DESALOJADOS
---
A Constituição define o direito à liberdade religiosa mas, na realidade, as autoridades restringem este direito, por exemplo prendendo
testemunhas de Jeová e pentecostais que se recusam a levar a cabo
certas actividades, como as patrulhas nocturnas do cidadão. As reuniões públicas, incluindo as religiosas, têm de ser autorizadas. Porém,
a autorização não é necessária se a reunião for organizada por um
grupo religioso conhecido das autoridades.
Os grupos religiosos são obrigados a reunirem-se nos seus locais de
culto, pois as autoridades não desejam que tais reuniões ocorram em
residências privadas. É obrigatório informar imediatamente as autoridades sobre qualquer reunião realizada à noite, mesmo se de carácter
religioso e mesmo se realizada em locais privados.
Além disso, o Governo deseja estar presente nas várias cerimónias
religiosas. Por exemplo, nos casamentos, é pedido à noiva e ao noivo
que façam os seus votos enquanto tocam na bandeira nacional. As
Testemunhas de Jeová recusam-se a tal e sofrem sérias consequências. Como uma solução de compromisso, é frequente as Testemunhas de Jeová colocarem as suas mãos sobre uma Bíblia que é, por
sua vez, colocada sobre a bandeira nacional.
Quem perturbar uma cerimónia religiosa ou um ministro de religião
no exercício do seus deveres está a cometer um crime que é punível
com uma multa e/ou uma sentença de prisão de até seis meses.
São proibidas organizações políticas com bases étnicas, tribais ou religiosas, assim como o são todas as que possam resultar em discriminação.
As organizações sem fins lucrativos, inclusive as religiosas, são obrigadas a registar-se. Existe um controlo rígido sobre as organizações
religiosas. Os grupos têm de fornecer informação sobre os seus objectivos e as actividades planeadas de modo a obterem uma autorização
temporária. No entanto, alguns grupos religiosos operam sem autorização.
A instrução religiosa proporcionada nas escolas estatais e pode ser
substituída por um curso sobre moral. Existem escolas particulares
católicas e islâmicas a operar no país.
A tragédia de 1994
A guerra civil que começou em 1990 entre o grupo étnico Hutu, então
no poder, e a minoria Tutsi, culminou na chacina que, com início em
1994, teve como resultado mais de um milhão de vítimas, três milhões
432
RUANDA
de refugiados e aproximadamente 120.000 pessoas presas, a maioria das quais ainda se encontra detida e à espera de julgamento. Em cerca de 100 dias, entre Abril e Julho de 1994, extremistas Hutu massacraram entre 500.000 e 800.000 pessoas, que pertenciam principalmente ao
grupo étnico Tutsi. Os sobreviventes falaram do modo como as suas comunidades não só foram
atacadas por unidades armadas, como também por cidadãos comuns que seguiam os soldados. Mais alguns milhares foram depois massacrados durante a vingança dos Tutsi. As chacinas
continuaram até à entrada em Kigali das tropas da Frente Patriótica Ruandesa (RPF) (principalmente Tutsi) que está no poder desde então. Mais uns milhares, desta vez Hutus, foram mortos
posteriormente como vingança dos Tutsi, alguns em incursões nos campos de refugiados no
Congo (na altura, Zaire). Quando os massacres terminaram, tinha sido morta aproximadamente
10% da população, e a agricultura e as infra-estruturas do país tinham sido destruídas.
Dezenas de milhares de pessoas foram presas pelo novo Governo Tutsi por causa dos massacres
e surgiu imediatamente o grave problema de assegurar que todos seriam julgados com justiça. Em 1996, foi aprovada uma lei para punir os crimes contra a humanidade e foram criados
tribunais civis e militares para julgar os responsáveis pelos massacres. Foram definidos quatro
tipos de crimes; os primeiros dois dizem respeito àqueles que organizaram o genocídio e participaram em chacinas ou nos assassinatos individuais, enquanto os outros dois dizem respeito
a crimes como pilhagens e agressões. O sistema de justiça comum não pôde, porém, julgar um
número tão elevado de pessoas dentro de um prazo razoável, como era necessário para permitir
a reconciliação nacional, pois poderiam existir muitas pessoas inocentes entre as que foram
presos. Consequentemente, foi tomada a decisão de recorrer aos tribunais tradicionais, chamados “Gacacas” (“erva” no idioma kinyarwanda local). Trata-se dos tribunais do povo que normalmente tratam de assuntos locais. Em todas as cidades do Ruanda foi criado um “Gacaca” com a
tarefa de julgar os acusados de crimes pertencentes às últimas três categorias (os acusados de
terem organizado o genocídio seriam julgados pelos tribunais ordinários ou pelo Tribunal Penal
Internacional para o Ruanda, TPIR, instituído pela ONU e com sede em Arusha, Tanzânia).
Na realidade, estes eram indivíduos de importância secundária, ou seja, aqueles que tinham
cumprido as ordens dos seus superiores, soldados e pessoas comuns. A fórmula que envolve
os tribunais “Gacaca” previa a participação de toda a comunidade local para que a verdade pudesse ser conhecida publicamente. Tratava-se de um processo catártico onde todos
podiam tomar parte. Muitos dos que eram culpados pediram perdão às suas vítimas ou aos
seus parentes e receberam-no.
Para julgar os mais de 818.000 acusados, o Governo apressou frequentemente os procedimentos nos “Gacacas”, dando-lhes mesmo o poder de impor prisões perpétuas. Os procedimentos destes tribunais não respeitam, no entanto, os padrões internacionais para julgamentos justos. Não existe, por exemplo, nenhum advogado presente nestas audiências,
sejam eles advogados de acusação ou de defesa, e estes papéis são assumidos por aqueles que tomam parte no julgamento. Isto poderia ser satisfatório para solucionar disputas
locais, mas não para julgar crimes extremamente graves. As sentenças são proferidas pelo
júri popular, composto por nove pessoas.
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RUANDA
De acordo com os relatos dos meios de comunicação social, alguns julgamentos realizados
pelos “Gacacas” foram viciados por falsas acusações, corrupção e problemas em convocar
as testemunhas de defesa. Depois do encerramento dos “Gacacas”, novas acusações seriam
feitas nos tribunais comuns.
O Tribunal Criminal Internacional para o Ruanda, situado em Arusha, começou os julgamentos em 1996 e durante o período considerado para este relatório apenas tinha julgado metade
dos cerca de noventa casos apresentados, apesar do facto de que a maioria dos acusados
se encontra detida. Inicialmente esperava-se que o seu mandato durasse até Dezembro de
2010, um período considerado suficiente para completar todos os julgamentos. Porém, em
Dezembro de 2009, o mandato do tribunal foi prolongado até 2012, embora entre amargas
críticas, acima de tudo por causa do facto de que os que estão a ser julgados pelas chacinas
são exclusivamente da tribo Hutu.
No seguimento do genocídio, foram introduzidas leis muito severas contra ideologias com
ideais de genocídio e aqueles que as propagam. Muitos, porém, acreditam que o resultado
prático foi o de uma restrição inapropriada da liberdade de expressão e o receio generalizado
de ser assinalado com a acusação vergonhosa de instigar o genocídio, o que pode ter graves
consequências sociais e, em alguns casos, expõe as pessoas a agressões por parte dos meios
de comunicação social.
A lei aplica-se na realidade não só a acções mas também a declarações e discursos que possam ser entendidos como de incitamento ao ódio. O teor da lei é também extremamente
vago e, para se constituir como um crime, não é necessário que tais estímulos tenham causado um acto de genocídio. Por exemplo, a lei castiga com sentenças que variam entre dez a
vinte e cinco anos de prisão os responsáveis pela “desumanização” de um determinado grupo
de pessoas, a “ridicularização do infortúnio de outros” ou a “instigação de sentimentos malévolos”. A lei pode castigar crianças com sentenças de até doze meses, para serem cumpridas
num centro de reabilitação, e os jovens entre 12 e 18 anos com penas de prisão de entre cinco
a doze anos e meio. Além disso, a acusação de “negação de genocídio” é ocasionalmente
levantada contra

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