formação profissional em odontologia: revisão de literatura
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75 FORMAÇÃO PROFISSIONAL EM ODONTOLOGIA: REVISÃO DE LITERATURA Fabiane Alves Farias Guimarães1 Ana Lucia Schaefer Ferreira de Mello2 Rodrigo Otávio Moretti Pires3 RESUMO O objetivo deste estudo é discutir as questões relativas à formação profissional em Odontologia a partir de trabalhos publicados sobre o tema. Realizou-se a pesquisa nas bases de dados Lilacs e SciELO, utilizando os descritores Odontologia, Educação, Ensino e Formação. Após a busca, leitura dos títulos e resumos, e aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, foram selecionados 23 artigos. De forma a sistematizar a análise, os artigos foram organizados em três categorias temáticas elaboradas após a leitura dos textos na íntegra: A formação ética (4 artigos), A integração ensinoserviço (9 artigos) e O ensino em consonância com as Diretrizes Curriculares Nacionais (10 artigos). O contexto de mudanças curriculares está em um momento de transitoriedade, evidenciando alguns avanços como a incorporação dos valores éticos à formação profissional dos cirurgiões-dentistas e a criação de novos cenários de prática para os estudantes, por meio da integração ensino-serviço. Alguns problemas enfrentados foram percebidos tais como deficiências quanto a conteúdos relacionados à formação cultural, humanística e política; o professor universitário privilegiando os saberes técnicos; grande força do modelo biomédico de ensino; os acadêmicos têm dificuldades em demonstrar sensibilidade social e preocupação com os problemas da população, dificuldades para atuação em Saúde Coletiva e deficiência no conhecimento das atribuições dos membros da equipe de Saúde da Família. Palavras-chave: Educação Profissionalizante. Estudantes de Odontologia. Recursos Humanos em Odontologia. 1 Graduada em Odontologia- Universidade Federal de Pelotas. Especialista em Saúde Coletiva- Universidade Federal de Santa Catarina. Mestranda Programa de Pós Graduação em Odontologia- Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: [email protected]. 2 Graduada em Odontologia- Universidade Federal de Santa Catarina (1998), mestrado em Odontologia - Saúde Bucal Coletiva pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2001), doutorado em Enfermagem pela Universidade Federal de Santa Catarina (2005) e Doutorado em Odontologia em Saúde Coletiva também pela UFSC (2009). Pós-Doutorado no Grupo de Estudos e Pesquisas em Administração e Gerência do Cuidado em Enfermagem e Saúde (GEPADES/ PEN/UFSC). É professora do Departamento de Odontologia UFSC. E-mail: [email protected]. 3 Graduado em Odontologia- Universidade de São Paulo. Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da UFSC (2012-2015). Editor Chefe do Periódico Saúde & Transformação Social/Health & Social Change" (ISSN 2178-7085). Docente do quadro permanente do Departamento de Saúde Pública da Universidade Federal de Santa Catarina. Especializado em Saúde da Família- USP. Mestre em Saúde Pública pelo Departamento de Medicina Social- USP. Doutor em Enfermagem Psiquiátrica pela EERP/USP. PósDoutorado em pesquisa na temática do uso de Álcool e Drogas pela CICAD/Organização dos Estados Americanos. E-mail:[email protected]. Rev. Saúde Públ. Santa Cat., Florianópolis, v. 7, n. 3, p. 75-87, set./dez. 2014. 76 1 INTRODUÇÃO Vivendo a pós-modernidade, um momento histórico de tensão paradigmática decorrente dos desdobramentos de um mundo globalizado, o contexto educacional atual se caracteriza por movimentos de mudança, nos quais a concepção tradicional se torna obsoleta frente aos desafios instalados no campo da educação. O panorama atual da educação impõe novos rumos a serem trilhados na construção do conhecimento que, certamente, torna fácil dimensionar o problema e difícil solucioná-lo a contento (SCORZONI; BUENO; COSCRATO, 2013). As universidades também vivem um momento especial, em busca de ampliar sua relevância social. Estas não ocupam o mesmo lugar do passado na produção do conhecimento, nem em sua difusão. Entretanto, a produção de conhecimento e a formação profissional ainda seguem marcadas pela especialização, pela fragmentação e pelos interesses econômicos hegemônicos. Encontra-se assim limitada a potência das respostas produzidas pela academia em relação a temas complexos e contemporâneos, como os do campo da educação. Há, portanto, a necessidade de redefinir referenciais e relações com os distintos segmentos da sociedade no sentido de as universidades ocuparem um novo lugar social, mais relevante e comprometido com a superação das desigualdades (FEUERWERKER, 2003). O ensino superior em saúde tem sido palco de muitas discussões acerca das demandas por novas formas de trabalhar o conhecimento dentro de uma perspectiva crítica e reflexiva, centrada na integralidade. Nas últimas décadas, referenciais inovadores, dentro de uma concepção crítica da Educação, vêm mudando de cenário, para a adesão pedagógica progressista, evidenciando o ser humano sob o prisma da qualidade de vida e promoção da saúde, acompanhando as políticas públicas da Educação e da Saúde. Partindo desses pressupostos, entende-se como fundamental a superação da tendência pedagógica tradicional, que se torna inadequada frente aos novos desafios de formação/atuação profissional que se instalam no campo da educação e da saúde (SCORZONI; BUENO; COSCRATO, 2013). Na área da Odontologia, até alguns anos, a prática privada predominava de maneira absoluta como alternativa de ocupação para os cirurgiões-dentistas e sua inserção no sistema público de saúde era limitada. Mais recentemente, entretanto, perceberam-se os limites do mercado privado: o cirurgião-dentista, racional e maximizador de lucros relacionados com os modelos de economia capitalista voltado para o mercado e a comunidade odontológica integrada pela competição desenfreada, como também pela necessidade de sobrevivência individual. Diante da concorrência acirrada, as estratégias para conseguir vantagens dentro do Rev. Saúde Públ. Santa Cat., Florianópolis, v. 7, n. 3, p. 75-87, set./dez. 2014. 77 mercado têm sido baseadas na especialização e na incorporação tecnológica. Essas estratégias, no entanto acarretam aumento de custos, que levam por sua vez a uma progressiva institucionalização das práticas profissionais, em decorrência da existência de um segmento social ainda mais restrito que segue com capacidade de compra privada dos serviços. Coexiste, nessa arena, a outra face do mercado, da saúde pública no Brasil, que se consolidou com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS) nos anos 1990, revelando o desafio da formação de um profissional apto para trabalhar na área da saúde bucal coletiva (EMMERICH; CASTIEL, 2009). Existem alguns desafios a serem enfrentados para pensar e construir as mudanças na formação e, consequentemente, no perfil dos egressos, pois durante um longo tempo a formação em Odontologia, privilegiou a especialização, o uso intensivo de tecnologias e os procedimentos de alto custo, enquanto acumulavam-se as necessidades básicas de saúde de grande parte da população brasileira (REGO; SIQUEIRA-BATISTA, 2007). As Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para os cursos de graduação em Odontologia definiram princípios, fundamentos, condições e procedimentos da formação de cirurgiões-dentistas. Constituem atualmente a referência em âmbito nacional na organização, desenvolvimento e avaliação dos projetos pedagógicos dos Cursos de Graduação em Odontologia das Instituições do Sistema de Ensino Superior (BRASIL, 2002). Essas diretrizes substituíram o antigo currículo mínimo, de 1982, a partir de uma necessidade apontada e emanada da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de 1996. As DCN para os cursos de graduação em Odontologia assinalaram um perfil generalista do profissional a ser formado no Brasil, enunciando habilidades e competências a serem desenvolvidas pelo cirurgião-dentista. Assim, novos caminhos foram almejados para responder ao desafio proposto, incluindo a construção de novos projetos pedagógicos nos cursos e mudanças curriculares (TOASSI et al, 2012). Diante do exposto, o objetivo deste estudo é discutir as questões relativas à formação profissional em odontologia a partir de trabalhos publicados nacionalmente sobre o tema. 2 MÉTODO Trata de uma revisão de literatura de publicações que proporcionam uma análise da literatura recente, abrangendo o assunto com base na análise dos resultados das pesquisas incluídas. Para tanto, realizou-se a pesquisa nas bases de dados Lilacs e SciELO, cruzando os descritores odontologia com educação, ensino e formação. A busca foi delimitada pela Rev. Saúde Públ. Santa Cat., Florianópolis, v. 7, n. 3, p. 75-87, set./dez. 2014. 78 abrangência temporal entre os anos de 2010 e 2013, publicados na América Latina, com idioma em português, a fim de oferecer um panorama das pesquisas realizadas recentemente. Para a presente revisão, foram selecionados apenas artigos inéditos de pesquisa empírica, sendo excluídos, então, artigos de revisão de literatura e reflexão teórica, dissertações, teses, resenhas, livros e capítulos. Seguindo esses critérios, foram encontrados 73 trabalhos na base de dados Lilacs e 59 no SciELO. Desses documentos foram selecionados, a partir do título e leitura dos resumos, um conjunto de 18 publicações da base de dados Lilacs e 19 publicações da base de dados SciELO. Excluindo os artigos que se repetiam nas duas bases de dados, foram analisadas, neste trabalho, 23 publicações (Figura 1). Figura 1: Esquema metodológico da revisão de literatura Fonte: Dos autores (2014) 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO A maioria dos 23 artigos foram publicados durante os anos de 2011 e 2012 (35% em cada ano) e o menor número de publicações ocorreu no ano de 2013 (13%), provavelmente em conseqüência da busca dos artigos ter sido realizada em setembro de 2013, antes do término do referido ano. Rev. Saúde Públ. Santa Cat., Florianópolis, v. 7, n. 3, p. 75-87, set./dez. 2014. 79 De forma a sistematizar os resultados encontrados, a discussão e análise dos artigos, apresentada a seguir, organiza-se a partir de três categorias temáticas que foram elaboradas após a leitura dos textos na íntegra: A formação ética, A integração ensino-serviço e O ensino em consonância com as novas Diretrizes Curriculares Nacionais. 3.1 FORMAÇÃO ÉTICA Dentre os artigos selecionados, quatro tinham como objetivo avaliar diretamente a formação ética na graduação em Odontologia. O artigo de Finkler et al (2011) objetiva delinear, por meio de uma metodologia qualitativa, um panorama da formação ética dos cursos de graduação em odontologia, apresentando-se como principais resultados a existência de um comprometimento pontual dos cursos com a dimensão ética na formação profissional, avanços em relação à capacitação docente, ao perfil do egresso e ao processo de integração curricular; foram identificadas deficiências quanto aos conteúdos relacionados à formação cultural, humanística e política, em relação à orientação didática, ao processo avaliativo e aos cenários de ensino-apredizagem e à incipiente presença da bioética como disciplina. Este estudo traz como conclusões que o contexto de mudanças curriculares indica a transitoriedade das situações reveladas, os principais avanços foram em relação à capacitação docente e os atrasos mais evidentes foram identificados em relação aos conteúdos. Junqueira et al (2012) buscam verificar qual a percepção dos alunos acerca da proposta de visitas supervisionadas às atividades realizadas na clínica para seu processo de aprendizagem do estudo de bioética. Por meio da avaliação dos registros dos alunos feitos nos fóruns de discussão da plataforma Moodle, os autores apontam que a incorporação dos conteúdos de bioética nos currículos dos cursos de Odontologia atende aos pressupostos das Diretrizes Curriculares Nacionais e que a atividade de visita supervisionada à clínica realizada como estratégia pedagógica adotada pela disciplina de bioética foi bem avaliada pelos alunos. Os autores concluíram que a percepção dos alunos sobre essas atividades clínicas permite aos docentes aprimorá-la como estratégia pedagógica para as turmas futuras e servir de modelo para outras instituições. O artigo de Matos e Tenório (2010) tem por objetivo analisar a percepção que alunos, professores e usuários dos ambulatórios têm acerca da formação profissional em sua dimensão ética por meio de uma metodologia qualitativa, realizando a aplicação de questionários, entrevistas e observação participante. Para Matos e Tenório, a maioria dos alunos percebe que o seu curso estimula a dimensão ética, entretanto, alguns deles se remetem Rev. Saúde Públ. Santa Cat., Florianópolis, v. 7, n. 3, p. 75-87, set./dez. 2014. 80 a comportamentos não éticos de colegas e professores; a maioria dos professores considera que tem trabalhado a dimensão ética na formação dos alunos e essa valorização, para alguns deles, é mais comum na prática docente atual do que no passado e ainda que os professores relatem estarem trabalhando a dimensão ética no cotidiano dos ambulatórios, muitos revelam as dificuldades e tentativas frustrantes para concretizar a intenção de formar profissionais com valores éticos. Concluem que mesmo tendo ficado evidente, em muitos momentos, um distanciamento entre o ideal dos discursos e o real do cotidiano dos ambulatórios e de algumas percepções e experiências relatadas pelos sujeitos envolvidos, os valores éticos têm sido incorporados à formação profissional, mostrando queo discurso já não é o mesmo do passado, e essa mudança é um avanço a ser registrado. 3.2 INTEGRAÇÃO ENSINO-SERVIÇO Com base na leitura sistematizada dos nove artigos que compõem o conjunto de trabalhos que versavam sobre a integração ensino-serviço, alguns dados foram extraídos e detalhados no Quadro 2. A metodologia qualitativa foi a mais utilizada pelos autores ao realizarem seus estudos, ainda que alguns autores tenham utilizado a metodologia qualitativa e quantitativa concomitantemente. A população estudada pelos trabalhos que compõem esta categoria incluem: acadêmicos de Odontologia, Gestores, Preceptores Cirurgiões-Dentistas, cursos de graduação em Odontologia e egressos dos cursos de Odontologia. Souza e Carcereri (2011) evidenciam que a população estudada compreende a integração ensino-serviço como potencial auxiliar no processo de mudança de práticas na formação em saúde, que se desenvolveu ativamente a partir da reestruturação curricular, apesar de existir grupos resistentes a essa integração. Toassi; Davogli; Lemos (2012) corroboram com essa ideia, apontando que a presença de estudantes nos serviços é decisivo para o avanço da proposta curricular, aproximando a universidade, o serviço e a comunidade. Contudo, segundo Finkler; Caetano; Ramos (2011), para que as novas mudanças curriculares sejam, de fato, capazes de favorecer o aperfeiçoamento do SUS, os cursos necessitam de um grande avanço nas alianças e ações estratégicas com base na educação permanente em saúde. Rev. Saúde Públ. Santa Cat., Florianópolis, v. 7, n. 3, p. 75-87, set./dez. 2014. 81 Quadro 2: Informações sobre autores, objetivos e principais conclusões das publicações da Temática: Integração ensino-serviço. Florianópolis, 2013. Autores Objetivo Identificar o perfil dos pacientes e os tipos Reis; Santos; de procedimentos odontológicos realizados Leles (2011) na Clínica Integrada da FO. Investigar o desempenho clínico de Ferreira et al. estudantes na perspectiva da integralidade (2012) de uma clínica integrada. Souza; Carcereri (2011) Investigar a integração ensino-serviço entre uma universidade pública do sul do Brasil e os serviços públicos de saúde. Finkler; Caetano; Ramos (2011) Analisar como ocorre a integração dos cursos de Odontologia com a rede pública de saúde. Compreender sobre a percepção do estudante da graduação em Odontologia em relação à vivência da prática em saúde nos serviços de Atenção Básica. Analisar o papel do ensino nos serviços de Toassi et al. atenção primária do SUS para a formação (2012) do cirurgião-dentista em uma universidade pública no sul do Brasil. Toassi; Davoglio; Lemos (2012) Silva et (2012) Conhecer a situação dos cursos de Odontologia no Brasil envolvidos com o a1. Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde, em relação aos diferentes espaços de aprendizagem. Badan; Marcelo; Rocha (2010) Conhecer a percepção e utilização dos conteúdos de saúde coletiva na prática dos egressos de 2000 a 2002, do curso de odontologia da UFG. Apresentar a experiência de um grupo PETRodrigues A et Saúde da UEFS, na Bahia, em Unidades de al. (2012) Saúde, em uma perspectiva crítico-reflexiva da interação ensino-serviço-comunidade. Principais conclusões A combinação de especialidades odontológicas em muitos casos não é recomendada, o que sugere maior aprimoramento no processo de triagem de pacientes. Os estudantes da nova matriz curricular apresentaram maior produtividade de atividades preventivas, enquanto os estudantes do currículo antigo apresentaram caráter curativo. Apontaram a formação científica e o processo organizacional como os principais fatores relacionados aos seus desempenhos. O processo de mudança de práticas se desenvolveu ativamente a partir da reestruturação curricular. A integração ensino serviço é um dos eixos que busca solidificar a proposta curricular, por meio de ações diversas na interface do ensino com o serviço. Os cursos precisam avançar em muito nas alianças e ações estratégicas com base na educação permanente em saúde, a fim de que as novas mudanças curriculares sejam efetivamente capazes de colaborar com o aperfeiçoamento do SUS. A presença de estudantes nos serviços tem sido determinante para o avanço da proposta curricular, aproximando a Universidade do serviço e da comunidade. Há necessidade da problematização permanente sobre as práticas e que se assegure infraestrutura e profissionais qualificados para o ensino nos serviços. Mostra a disposição dos cursos em formarem melhor seus graduandos, preparando-os para responderem às demandas da população; carecendo, avançar na diversificação dos cenários de prática centrados nos cuidados primários de saúde, distanciando-se da prática mutiladora do ambiente hospitalar, e, na escala de complexidade da atenção à saúde, diminuir as necessidades secundárias e terciárias pela resolução dos problemas primários. Há necessidade de maior clareza, durante a graduação, sobre o que sejam práticas em saúde coletiva e maior integração curricular na graduação em odontologia. A experiência dos diferentes atores no PET caracterizou-se como uma vivência inovadora, desafiadora e complexa, uma vez que exigiu articulação entre instituição de ensino, serviços de saúde, profissionais e comunidade. Fonte: Dos autores (2014) Rev. Saúde Públ. Santa Cat., Florianópolis, v. 7, n. 3, p. 75-87, set./dez. 2014. 82 3.3 ENSINO EM CONSONÂNCIA COM AS NOVAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS O conjunto de publicações categorizadas na temática de Ensino em consonância com as novas Diretrizes Curriculares Nacionais é composto por 10 artigos. São detalhados no quadro 2 os dados extraídos a partir da leitura dos trabalhos (Quadro 3). Em relação à metodologia utilizada pelos pesquisadores, não houve grande diferença entre a abordagem qualitativa e quantitativa, sendo ambas utilizadas amplamente. Dentre as populações estudadas, os acadêmicos de odontologia foram incluídos na maioria dos estudos. Quadro 3: Informações sobre autores, objetivos e principais conclusões das publicações da Temática: Ensino em consonância com as novas Diretrizes Curriculares Nacionais. Florianópolis, 2013. Autores Objetivo Sanchez et al (2012) Avaliar concepções relacionadas à APS. de dimensões Cavaca et al (2010) Analisar a relação professor-aluno no curso de Odontologia e discutir os possíveis reflexos dessa relação no processo ensino-aprendizagem. Toassi et al (2012) Analisar o processo de mudança curricular no curso de Odontologia. Avaliar as representações sociais de estudantes dos cursos de odontologia e Torres; Carvalho; ciências sociais no processo saúdeMartins (2011) doença e o papel do profissional de saúde na sociedade para a formação social dos estudantes de odontologia. Caracterização do lugar da pesquisa na organização curricular em instituições de Maltagliati; ensino superior de Odontologia na cidade Goldenberg de São Paulo, com vistas à identificação (2011) de tendências de reformulações no contexto imediato à aprovação das Diretrizes Curriculares Nacionais. Lazzarin; Nakama; Cordoni Júnior (2010) Principais conclusões Os alunos pesquisados apresentam algumas posturas adequadas para o trabalho em APS. Por outro lado, demonstram que o modelo biomédico de ensino possui força significativa na sua formação profissional. Considera-se imprescindível a revisão da formação didática dos docentes, para que estes estejam preparados para implementar as mudanças requeridas, de forma a valorizar o papel do aluno na construção do conhecimento, tornando-o capaz de exercer sua função social como cirurgião-dentista no futuro. Há necessidade de repensar o processo de reforma curricular, reconstruindo continuamente esse currículo. É fundamental tratar, especificamente, da mudança no projeto pedagógico e nas práticas curriculares. Ao fim de seu curso, os estudantes de odontologia não demonstram sensibilidade social nem preocupação com os problemas da população, diferenciando-se dos de ciências sociais. Ao lado dos limites institucionais relacionados à prática da pesquisa nas instituições (públicas e privadas), estas disposições atestam movimentos de revisão curricular em atenção às recomendações legais, sem alcançar, entretanto, a estruturação de um currículo fundamentado no ensino pela pesquisa. Há uma necessidade de rever tanto a formação Analisar a percepção de docentes do quanto a atualização didático-pedagógica do curso de graduação em odontologia da professor universitário para que se possa buscar UEL a respeito do papel do professor no uma formação generalista, humanista, crítica e processo ensino-aprendizagem. reflexiva do estudante. Continua... Rev. Saúde Públ. Santa Cat., Florianópolis, v. 7, n. 3, p. 75-87, set./dez. 2014. 83 Continuação Autores Lima; Pereira; Drummond (2013) Noro; Torquato (2011) Moretti; Lima; Machado (2011) Araújo; Mello (2011) Objetivo Principais conclusões Verificar a percepção dos acadêmicos do Os acadêmicos de Odontologia da UNIFAL/MG último período do curso de Odontologia consideram-se aptos a atuarem Saúde da da UNIFAL, quanto a sua formação em Família. Saúde da Família. A formação em Odontologia deve aprofundar sua discussão e na perspectiva da clínica Apresentar a visão de alunos ampliada, permitindo que as conquistas do SUS concludentes de curso de Odontologia tragam benefícios concretos tanto para os sobre o aprendizado na área da Saúde profissionais de saúde, no desempenho de sua Bucal Coletiva e conhecer sua percepção função de transformador da realidade social, sobre o SUS. quanto para a população, na conquista de seus direitos constitucionais. Falta de formação no trabalho em equipe multiprofissional, existência de dificuldades Investigar a percepção de acadêmicos de para atuação em Saúde Coletiva, assim como Odontologia sobre a atuação dos ACS deficiência no conhecimento das atribuições dos junto ao trabalho de Saúde Bucal. membros da equipe de Saúde da Família, em especial sobre as atribuições dos ACS junto à Saúde Bucal. O ensino da Odontologia demonstra atenção profissional suficientemente adequada; a formação do docente privilegia os saberes Apresentar e discutir a formação do técnicos em detrimento dos pedagógicos; a odontólogo à luz do exercício da expansão deficiente do atendimento docência em seis cursos de graduação. odontológico através da rede pública se contrapõe ao aumento no número dos cursos de graduação, e a ênfase dada à prevenção e promoção da saúde é limitada. Fonte: Do autor (2014) Sanchez et al (2012) evidenciam que os acadêmicos participantes do estudo apresentam algumas posturas adequadas para o trabalho em atenção primária à saúde, porém o modelo biomédico de ensino ainda possui grande força na formação dos estudantes, podendo ser um impedimento para a conformação de novas práticas em saúde. Os acadêmicos participantes do estudo de Lima; Pereira; Drummond (2013) consideram-se preparados a atuarem em Equipes de Saúde Família. Contudo, conforme Torres; Carvalho; Martins (2011), os acadêmicos de Odontologia não demonstram sensibilidade social nem preocupação com os problemas da população. Segundo Moretti-Pires; Lima; Machado (2011), os estudantes têm deficiente formação no trabalho em equipe multiprofissional, dificuldades para atuação em Saúde Coletiva e deficiência no conhecimento das atribuições dos membros da Equipe de Saúde da Família, especialmente sobre as atribuições dos agentes comunitários de saúde junto à saúde bucal. No que concerne aos docentes, Cavaca et al (2010) e Lazzarin; Nakama; Júnior (2010) consideram importante a revisão da formação didático-pedagógica dos docentes a fim de que Rev. Saúde Públ. Santa Cat., Florianópolis, v. 7, n. 3, p. 75-87, set./dez. 2014. 84 estejam preparados para implementar as mudanças curriculares necessárias e valorizar o papel do aluno na construção do conhecimento, na busca de uma formação generalista, humanista, crítica e reflexiva dos futuros cirurgiões-dentistas. Araújo e Mello (2011) apontam que a formação do professor universitário privilegia os saberes técnicos em detrimento das metodologias pedagógicas e que a ênfase dada à prevenção e promoção da saúde por parte dos docentes é limitada, evidenciando a relevância da integração entre as dimensões técnicas e ético-humanísticas em consonância com as Diretrizes Curriculares Nacionais. 4 CONCLUSÕES A formação profissional em Odontologia é objeto de pesquisas realizadas recentemente, que se caracterizam pela diversidade metodológica, predominando a utilização de metodologias qualitativas. A população de estudo das pesquisas inclui acadêmicos de odontologia, docentes, equipe diretiva da Universidade, gestores, cirurgiões-dentistas, preceptores dos serviços e os próprios cursos de graduação em odontologia. Uma limitação deste estudo foi o fato de incluir artigos de um período determinado, restringindo, assim, a possibilidade de uma análise histórica, representando um recorte temporal dos fatos. Com a presente revisão pode-se observar que o contexto de mudanças curriculares está em um momento de transitoriedade, evidenciando alguns avanços como a incorporação dos valores éticos à formação profissional dos cirurgiões-dentistas e a criação de novos cenários de prática para os estudantes por meio da integração ensino-serviço. Alguns problemas enfrentados também foram percebidos, tais como: deficiências quanto aos conteúdos relacionados à formação cultural, humanística e política; o professor universitário privilegiando os saberes técnicos em detrimento dos pedagógicos, ainda com grande força do modelo biomédico de ensino; os acadêmicos de Odontologia possuem dificuldades em demonstrar sensibilidade social e preocupação com os problemas da população, dificuldades para atuação em Saúde Coletiva e deficiência no conhecimento das atribuições dos membros da equipe de Saúde da Família. Espera-se que essa revisão contribua para a produção do conhecimento, para a criação de novos espaços de discussão sobre a formação em Odontologia, corroborando com a contribuição que a Odontologia e a Saúde Coletiva podem dar à sociedade. Rev. Saúde Públ. Santa Cat., Florianópolis, v. 7, n. 3, p. 75-87, set./dez. 2014. 85 VOCATIONAL TRAINING IN DENTISTRY: LITERATURE REVIEW ABSTRACT The aim of this study is discuss issues relating to vocational training in dentistry from published works on the subject. The research was conducted in Lilacs and SciELO databases, using as descriptors the words Dentistry, Education, Teaching and Training. After the search, reading the titles and abstracts and application of inclusion and exclusion criteria, 23 articles were selected. In order to systematize the analysis of the articles were organized into three themes: Ethics (4 articles); The teaching-service integration (9 articles); and Training and teaching in line with the National Curriculum Guidelines (10 articles). The context of curricular changes are in a moment of transience, showing some advances as the incorporation of ethical values on vocational training of dentists and creating new scenarios practice for students through the teaching-service integration. Some problems were encountered such as perceived deficiencies regarding content related to humanistic, cultural and political education; the professor focusing on technical knowledge; the biomedical model of teaching; students have difficulties in demonstrating social sensitivity and concern for people's problems, difficulties to work in Public Health and lack of knowledge of the duties of the staff of Family Health. Keywords: Education Professional . Dental Students. Human resources in dentistry. 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