Irmão Coadjutor Angelino Esperidião da Luz

Transcrição

Irmão Coadjutor Angelino Esperidião da Luz
ANGELINO ESPERIDIÃO DA LUZ, SDB
Irmão Coadjutor
* 15 de fevereiro/1906 (Juiz de Fora, MG)
+ 13 de julho/1994 (São Carlos, SP)
"Eu vos dou graças, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultastes estas coisas
aos sábios e aos prudentes e as revelastes aos pequenos".
(Mt 11,25)
- Da Liturgia do dia 13-07-94
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PREZADOS IRMÃOS,
Diz São Boaventura: "Basta amar a Deus se quisermos ir para o céu. Uma
simples velhinha analfabeta pode amar mais o Pai do céu do que um professor de
Teologia".
E com emoção que me ponho a escrever esta carta mortuária... não, não
'mortuária', porem, "carta-viva" que foi o IRMÃO COADJUTOR ANGELINO
ESPIRIDIÃO DA LUZ, SDB. Foi chamado por Deus no dia 13 de julho/1994, quarta
feira, no Noviciado Salesiano de São Carlos (SP), às 09h00.
Sua última "Refeição" foi a Eucaristia: Participara do Ofício da Manhã.
Meditação e Missa com os Noviços. Quando estávamos para iniciar o café... o
desenlace rápido. Dez minutos... Não houve agonia! Inúmeras vezes me dissera: "P.
Diretor, peço muito a Jesus Crucificado e ao Divino Espirito Santo que não gostaria de
dar nenhum trabalho para ninguém quando chegar a hora da minha morte..." Deus
ouviu a sua singela prece. Os reflexos de uns dias de inverno rigoroso se fizeram
sentir nos seus 88 anos. Às 9h15, ja estávamos na Santa Casa de São Carlos. Em
menos de um minuto estava na sala de emergência. Era irreversível... um enfarte do
coração fizera-o nascer para Deus em poucos instantes.
A Missa de Corpo Presente não foi despedida do Sr. ANGELINO, e, sim,
celebração de sua vida que começava em totalidade: Era o céu! Os concelebrantes
simbolizaram a "festa-de-céu" com os paramentos litúrgicos de cor branca para o
Irmão Salesiano que na sua Eucaristia-da-vida, como horticultor exímio que era, em
vida "fez da terra, o altar; da enxada, o cálice" - homilia do Sr. P. Antonio Carlos
Galhardo, até então, Vice-Inspetor da Inspetoria de São Paulo. O Sr. ANGELINO foi um
contemplativo no trabalho... "extraordinário no ordinário do dia-a-dia".
1. QUEM FOI O "SEU ANGELIM"
Em maio de 1984, a Revista "SALESIANO COADJUTOR", Caderno nº 6, traz
ENTREVISTA COM O SR ANGELINO. Transcrevo-a para que o conheçamos em suas
próprias palavras.
Entrevistador: Sr. ANGELINO, onde e quando o Senhor nasceu?
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Sr. Angelino: Nasci numa pequena cidade de Minas Gerais, chamada Coronel
Pacheco, a 15 de fevereiro/ 1906, em Juiz de Fora (MG). (N.B.: Nascera em Coronel
Pacheco, MG, e, fora registrado em Juiz de Fora.)
Entrevistador: Diga-me alguma coisa sobre a sua íamilia.
Sr. Angelino: Sou de uma família modesta. Meu Pai, João Basílio da Luz e minha mãe
Deolinda Maria Eugênia tinham 10 filhos: 3 homens e 7 mulheres. Sou o segundo da
família. Agora apenas cinco estão vivos. Papai e nós trabalhávamos num satio na
lavoura. No dia 2 de novembro de 1920 saíramos de Coronel Pacheco e nos mudamos
para um lugarejo perto de Bauru, onde trabalhei com meu pai como colonos. Mais
tarde arranjei um trabalho numa fábrica de toldo. Moramos em Marília e Presidente
Alves. Voltamos novamente para Marília, onde a família se dispersou.
Entrevistador: Como o Senhor conheceu os salesianos?
Sr. Angelino: Fui para São Paulo. Trabalhei como ajudante de caminhão, ajudante de
serraria. Morava na Rua dos Gusmões e logo procurei uma igreja para continuar meu
apostolado como mariano. Ainda me lembro do dia quando levei a carta de
apresentação do meu ex-pároco. Fui direto ao Liceu Coração de Jesus (SP) e conversei
com o Diretor.
Entrevistador: Como surgiu a sua vocação salesiana?
Sr. Angelino: Durante 5 anos frequentava a Paróquia do Coração de Jesus e me
alimentava do ideal religioso. Em 1943 durante o Congresso Eucarístico rezei muito.
Com operário as vezez tinha que trabalhar até aos domingos, e isso me desagradava.
Porque eu queria rezar muito e se fosse possível fazer um "retiro perpetuo".
Neste ano, durante o retiro espiritual, apareceu um padre, cujo nome era
Orlando Chaves e nos dizia: "Estou precisando de um moço piedoso, que gosta de
trabalhar com os meninos. Nós temos duas escolas agrícolas: Uma em Lorena, outra
em Lavrinhas. Quem estiver interessado, venha comigo". Levou-nos para uma sala,
onde Dom João Resende fez um palestra para todos os interessados. Eu tinha 36 anos.
Entrevistador: C o m o foi aceito?
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Sr. Angelino: Bem, depois da palestra, fiquei mais animado ainda. Fui conversar com
o Pe. Orlando, acompanhado por um colega, manifestei-lhe meu desejo de consagrar
meus trabalhos a Deus, santificando minha vida em beneficio dos meus irmãos mais
nessitados, viver numa espécie de "retiro perpetuo". O Pe. Orlando me deu um abraço
e fez-me umas perguntas. Depois mandou-me ficar de joelhos e deu-me a bênção de
Nossa Senhora Auxiliadora. Era dia 7 de março de 1943.
Entrevistador: Como foram os primeiros anos?
Sr. Angelino: Logo em seguida fui para Lorena (SP), como aspirante e lá me preparei
durante dois anos. O noviciado fiz em Pindamonhangaha (SP), tendo como Mestre o
P. Luiz Garcia e o P. José Del Mônaco era assistente. P Alfredo Bartolini, meu Diretor.
No dia 31 de janeiro de 1946, festa de Dom Bosco, fiz a primeira profissão
religiosa. Voltei para Lorena onde trabalhei 7 anos com os meninos pobres. Fui depois
transferido pra a Escola São José de Campinas (SP) até 1955. Dai até 59 fui mandado
para a Fazenda São José. perto de Itupeva. De '59' até '65' voltei para Lorena. Em '66'
vim para I.avrinhas, onde trabalho como hortelão.
Entrevistador: O Senhor quer deixar uma mensagem aqui?
Sr. Angelino: GRAÇAS A DEUS EU ESTOU SATISFEITÍSSIMO. EM TODA A MINHA VIDA
PROCUREI SANTIFICAR-ME NO TRABALHO COM DOM BOSCO. ENCONTREI O QUE EU
QUERIA DESDE O COMEÇO: ‘RETIRO PERPÉTUO'. ESPERO QUE MUITA GENTE VENHA
E EXPERIMENTE O MESMO.
Conclusão final do Entrevistador:
Senhor Angelino, exemplo de coadjutor salesiano, homem de ciência infusa.
Quando fala demonstra alta espiritualidade. Não sabe falar sem se referir a Deus e a
Nossa Senhora. Levanta-se às três-e-meia e já faz suas primeiras orações. Acende o
fogão, faz o café e vai direto para a capelinha esperando os demais salesianos. O
resto do dia passa na horta e na capela. Com sua enxada e seu terço vai se
santificando e santificando os aspirantes. Deus queira que isso continue atraindo
muitos jovens generosos para esta vocação maravilhosa e difícil: Fortalecendo o
segundo pulmão de Dom Bosco. "
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2. PERSONALIDADE FORTE
Quem o via superficialmente, em atitude constante de recolhimento, de
concentração sobre si mesmo, não fazia idéia da sua personalidade forte, de um
caráter primário, porém, que dificilmente aflorava. Sua espiritualidade simples e
profunda, tinha a força de lhe proporcionar a "graça da unidade" de sua pessoa:
Personalidade, temperamento, caráter, vida de fé...
A sua, era uma santidade ' ativa ', não ' passiva ': Foi dócil à Graça que lhe
"trabalhou" todo o ser.
Para ilustrar... um acontecimento:
Com os seus 87 anos chegou a São Carlos (1993) e pôs mãos à obra para
plantar um bananal, mamão, e, a conservação do ajardinamento do Noviciado. Os
pés de mamão cresciam viçosos. Um dia, o Sr. ANGELINO vem ao meu escritório e me
chama. Silencioso me mostrou quatro pés de mamão quebrados. Com voz
entrecortada me disse: "Se meu trabalho aqui não serve ... posso ir para outra
casa!..." O que poderia eu responder a este ancião?... E, arrematei: "Sr. ANGELINO,
preparemo-nos. Quem fez esta violência às plantinhas e a nós, ao Senhor
especialmente, parece dizer que voltara para quebrar as outras... (No dia seguinte...
os outros pés também estavam quebrados!) Mas, e, se esta violência fizer com que a
pessoa se arrependa, e se aproxime de Deus..."
Foi imediata a reaçio do Sr. ANGELINO: "Ah! Se for assim, vamos plantar cem
pés de mamão... se for para a pessoa se arrepender e se aproximar de Deus!..."
E, retomou o trabalho com a dedicação de sempre. Todos os pés brotaram de
novo, e ficaram carregados de mamão.
Com os "olhos-emprestados-de-Deus" direcionava toda a sua vida para "
santificar-se no trabalho com D. Bosco", como dizia.
3. ‘SANTIDADE’ NÃO É PATRIMÔNIO DE ALGUNS...
Ouando se convive com um "santo" - o Sr. ANGELINO – experimenta-se o
'extraordinário' de maneira muito familiar, tão envolvente que, mais agora, nos
damos conta do gigante em humanidade que linhamos ao lado. Foi, deveras, uma
dádiva de Deus à Comunidade do Educandário São Carlos conviver um ano e meio
com o "Seu ANGELIM". Por onde passou encantou as pessoas por seu jeito humano
de relacionar-se. As circunstâncias da vida não lhe proporcionaram cultura humana
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escolástica. Porém, a nohreza de caráter o fazia relacionar-se com desenvoltura com
todos igualmente...
O sorriso estava sempre a brincar-lhe nos lábios.
O Sr. ANGELINO prosou que a 'santidade' não e patrimônio de alguns... está ao
alcance de todos! Não é 'grau escolar' que faz um 'santo'. E, é o presente mais
precioso que podemos fazerr à juventude, especialmente, juventude empobrecida.
São as suas palavras, na mensagem final da Entrevista acima, a transparência
de sua mistica: - "EM TODA A MINHA VIDA PROCUREI SANTIFICAR-ME NO TRABALHO
COM DOM BOSCO. ENCONTREI O QUE EU QUERIA DESDE O COMEÇO: RETIRO
PERPÉTUO. ESPERO QUE MUITA GENTE VENHA E EXPERIMENTE O MESMO".
4. ANGELINO: HOMEM DE ASCESE
O nosso Irmão Coadjutor encontrou nas diversas Obras Salesianas por onde
passou o "ambiente" propício para a sua santidade: "... logo procurei uma igreja para
continuar meu apostolado como mariano
durante 5 anos frequentava a
Paróquia do Coração de Jesus e me alimentava do ideal religioso" (Cfr. Entrevista
acima)
Ascese é esforço! É subir sempre! É não fazer as pazes com o "mais-ou-menos"
da superficialidade... que 'mata' a ação do Espírito Santo. O Sr. Angelino era
ordenado em suas coisas. Trabalhava com método, ordem... era mesmo o reflexo do
seu interior.
Dm testemunho do Diretor da Moóca - P. Benedito S. Spinosa, SDB: "Ele
cultivou, como bom filho de Dom Bosco, um sorriso fácil e franco, uma vida de oração
filial e uma maravilhosa capacidade de serviço fraterno. É com emoção que lembro
do passado, quando em l.avrinhas (1968), o "seu" Angelim nos ensinava, com o
exemplo, a arrancar tiririca dos canteiros da horta e a amar o terço da Mãe de Jesus...
Agora no futuro podemos contar com a ajuda do "seu Angelim" para encontrar
o caminho do Jardim Salesiano onde não tem tiririca e Nossa Senhora está nos
esperando”.
O Fax passado às Casas pelo Pe. Antonio C. Galhardo em 13/ julho/ 94: "Por
onde passou deixou exemplos belíssimos de um religioso feliz com a vida salesiana,
piedosíssimo, e trabalhador incansável".
O Fax (em 14/07/94) do Diretor de Sorocaba - P. Plínio Possonom: "...
estivemos ai junto ao irmão mais que todos admirado, querido e nunca
suficientemente imitado".
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Em carta enviada de Roma (Itália), Pe. Luiz Alves de Lima traz expressivos
traços do Sr. ANGELINO: "Quantas belas recordações de seus exemplos de vida
religiosa, de sua simplicidade evangélica, de seu profundo espírito de fé, de sua
alegria contagiante, de sua intensa vida de oração, de seu amor pelo trabalho a toda
prova. O Sr. ANGELINO sempre foi querido por todos; embora de pouca cultura nas
letras, empolgava a todos quando falava com a simplicidade de seu linguajar
interiorano, mas cheio de conteúdo e de comunicação vital. Quantas conversas
gostosas a gente mantinha à mesa, no pátio ou mesmo quando ia visitá-lo na horta,
envolto em seus trajes de saco de estopa, que fazia lembrar os profetas bíblicos... Foi
um grande irmão, e se a Bíblia diz que "a memória dos justos será eterna", a memória
do Sr. ANGELINO (que "anjinho"!) ficará impressa nas centenas de salesianos ou
jovens que com ele tiveram contato. ... Que o grande Sr. ANGELINO repouse na paz
dos justos e que sua memoria seja estimulo para nós, e de um modo especial para as
novas gerações."
A mística da santidade para o Sr. ANGELINO imantava a sua ascese. A sua
ascese do trabalho, da alegria, da disponibilidade, da fraternidade, da vida
consagrada... alicerçou sua mística, o ideal de santidade que vivia nas 24 horas do
dia.
5. ESPÍRITO SALESIANO
O Sr. ANGELINO se conduzia por "um ardor apostólico que o fazia buscar as
almas e servir somente a Deus" (cfr. C. 10). Já se notava tal ardor no encontro com
Pe. Orlando Chaves (+ D. Orlando Chaves): "Manifestei-lhe meu desejo de consagrar
meus trabalhos a Deus, santificando minha vida em benefício dos meus irmãos mais
necessitados,..."
Sua união com Deus era contínua: A capela era a sua atração. Amava as
funções religiosas.
Sua predileção pelos jovens o fazia sempre presente nos recreios.
Seu espírito de família o fazia sempre acessível a brincadeiras, ao sorriso fácil...
No dia 24/maio p.p., com os seus 88 anos, logo se prontificou em fazer parte de um
Esquete preparado pelos Noviços na Sessão em homenagem a N. Senhora
Auxiliadora, vestindo-se de anjo.
O otimismo e a alegria eram a consequência lógica do amor a Jesus
Crucificado, a Jesus na Eucaristia, ao Divino Espírito Santo, a Nossa Senora uxiliadora,
D. Bosco...
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O trabalho era a "marca registrada" do Irmão Coadjutor ANGELINO. Trabalho
realizado com ordem. Morreu trabalhando: No dia anterior à sua morte entreteve-se
um pouco com a inseparável enxada. Dizia-se já forte o suficiente, depois de uns
vinte dias de "férias" forçadas por causa de uma gripe incômoda para a sua idade.
E, aliado ao trabalho estava a temperança que o fazia "suportar o calor e o frio,
a sede e a fome, as fadigas..." Com a temperança aliava-se a pobreza em não
desperdiçar nada. Um pedacinho de arame que guardava, ou, barbante... logo tinha a
sua utilidade.
Sentia-se verdadeiro assistente salesiano nos recreios.
6. RELIGIOSO EXEMPLAR
O Sr. ANGELINO sempre viveu exemplarmente sua vida consagrada também
nos Conselhos Evangélicos.
Sua Obediência: Pronta e alegre! Encantava-nos a todos o seu jeito alegre de
obedecer. "Quem obedece, vive em paz!", dizia. Esmerava-se em ser pontual.
A sua Castidade se retletia em toda a sua pessoa. Jamais uma palavra
maliciosa...
Na Vida Fraterna era realmente um "construtor de comunidade" |pela atenção
gentil a todos, especialmente para os de idade,ou, doentes. Participava das conversas
à mesa, nos recreios, enfim, era alguém sempre presente a quem dele precisasse.
Não se furtava às programações da Comunidade Local ou Inspetorial para
reuniões de Formação Permanente, apesar de, tantas vezes, o assunto superar sua
capacidade.
Sua limitada capacidade intelectual era sobrepujada pela ciência e sabedoria
de Deus que lhe davam eloquência espiritual.
PREZADOS IRMÃOS,
Temos certeza. O Sr. ANGELINO será junto de Deus um poderoso intercessor
com D. Bmco para que a Vocação de IRMÃO COADJUTOR SALESIANO - segundo
pulmão da Congregação - seja muito pujante, especialmente na nossa querida
Inspetoria.
Temos a certeza de estarmos em suas preces para que o Centro Profissional D.
Bosco do Edurandário São Carlos, a Paróquia de Nossa Senhora Auxiliadora e
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Noviciado, saibamos transformar a "saudade" do Irmão Coadjutor ANGELINO em
incentivo vocacional.
Nossa Senhora Auxiliadora e D. Bosco de junto de Deus nos abençoem
hoje-e-sempre:
PE. MILTON SANTOS, SDB
Diretor e Mestre dos Noviços
São Carlos, 18 de julho de 1994.
DADOS PARA O NECROLÓGIO:
ANGELINO ESPERIDIÃO DA LUZ L.
*Juiz de Fora (MG), 15 de fevereiro de 1906
†São Carlos (SP), 13 de julho de 1994 com
88 anos de idade e
47 anos de vida religiosa salesiana.
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