O cine teatro Odeon foi construído da rua da Consolação, 40

Transcrição

O cine teatro Odeon foi construído da rua da Consolação, 40
Inventário dos espaços de sociabilidade cinematográfica
da cidade de São Paulo (1895-1929)
José Inácio de Melo Souza
Parceria AHMWL /DPH/ SMC/ PMSP e Cinemateca Brasileira
Programa de Pós-Doutorado – Bolsista do CNPq-Brasil
http://www.arquivohistorico.sp.gov.br
http://www.cinemateca.org.br
Código:
Denominação padrão:
00387
ODEON - rua da Consolação, 40-42
O cine teatro Odeon foi construído da rua da Consolação, 40-42, em parte se
adaptando para isso uma antiga agência de automóveis, o Coliseu Palácio e, de
outro lado, construindo-se um prédio de quatro pavimentos. Entre os dois imóveis,
abria-se a entrada do Odeon. O Coliseu Palácio (número 42) foi projetado pelo
engenheiro arquiteto Júlio de Abreu Júnior para o conde Sílvio Álvares Penteado,
dando-se entradas nas plantas em 14/9/1925. O memorial descritivo especificava a
edificação em três pavimentos, servindo o térreo para a garagem construída no
interior do lote, e dois andares para “pequenos apartamentos” dando para a rua da
Consolação, que foram recusados pelo engenheiro A. Marchini por se encontrarem
fora do padrão municipal. As plantas foram retiradas em 23 de outubro, voltando
corrigidas em 4 de novembro. Pela avaliação de Regino Aragão, o primeiro
pavimento para a Consolação tinha 160 m2 e os dois seguintes 130 m2 cada (alvará
nº. 8845 de 13/11/1925).
O mesmo Escritório Técnico Júlio de Abreu Júnior, instalado na rua Barão de
Itapetininga, 65, ficou encarregado da obra de adaptação para o cinema. O prédio
do número 40 seria de quatro pavimentos (térreo mais três andares) sobre sete
colunas de cimento armado de 30 x 30 cm. O de número 42 seria aumentado em
um pavimento, adaptando-se o Coliseu Palácio para dois cines teatros, que mais
tarde levaram o nome de Odeon Sala Vermelha e Odeon Sala Azul (Lícia de Oliveira
engana-se ao apontar que este seria o primeiro cinema com duas salas de
projeção, já que o Scala, de 1911, e o Central, de 1916, também tinham duas
salas). O cinema teria 16 metros de frente, contando com três portas de entrada,
por 30 metros de fundo, sendo ladrilhado e coberto por uma estrutura de ferro
sustentada por oito colunas de cimento armado, criando para cada um dos palcos
vãos livres. Cada sala teria plateia, camarotes e três escadas de acesso aos
camarotes. Nesse piso, janelas em arcos se abriam para a rua. Nos dois últimos
pavimentos seriam construídos apartamentos.
Mandado para análise de Benjamin Egas em 15 de março, este informou que era
proibida a construção de cinemas com pavimentos superiores (art. 167 do Ato
1.235), estando em desacordo com a legislação o piso da plateia e as portas de
acesso à plateia obstaculizadas por cadeiras. O engenheiro Júlio Pacheco, do
escritório técnico, foi convocado para dar explicações suplementares. Ele anotou no
processo que os dois cines teatros tinham “[...] entradas amplas e independentes
por meio de largos planos inclinados, sem nenhum degrau, e saídas para as ruas
Consolação e Epitácio Pessoa. É bom notar que esta grande segurança dada pelas
amplas e fáceis saídas é ainda aumentada por ser toda a construção de concreto
armado e se acharem as cabines dos operadores cinematográficos [projecionistas]
externas às salas de espetáculos”. Sobre o art. 167 nenhuma palavra. Dito isto, o
escritório de engenharia entrou com um pedido de reconsideração do despacho. Em
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Inventário dos espaços de sociabilidade cinematográfica
da cidade de São Paulo (1895-1929)
José Inácio de Melo Souza
Parceria AHMWL /DPH/ SMC/ PMSP e Cinemateca Brasileira
Programa de Pós-Doutorado – Bolsista do CNPq-Brasil
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23 de março, provavelmente Arthur Saboya e o diretor de Obras e Viação foram em
vistoria ao prédio. Ambos declararam ter ficado “bem impressionados” com o
projeto de adaptação, “[...] verificando que os diversos planos terão acesso
inteiramente independentes. Quanto à superposição de pavimentos [os destinados
a apartamentos], tratando-se de destinos equivalentes – Cinema e Teatro – não é o
caso previsto na lei”. A administração municipal já era bem flexível quanto à
construção de apartamentos ou escritórios sobre cinemas doze anos depois do ato
normativo municipal para a construção de prédios.
O alvará de construção foi concedido em 11/4/1928 (nº. 875, série 1), pagando-se
custas em 19 de abril (nº. 718, série 8), no valor de Rs 1:405$100 (um conto e
quatrocentos e cinco mil e cem réis).
O Odeon foi arrendado para a Sociedade Anônima Empresa Serrador, sendo
inaugurado em 11/10/1928 com os filmes Lírio de Granada, dirigido por Robert
Wiene, com Lily Damita (distribuição do Programa Serrador), na Sala Vermelha, e
Quarteto de amor, com Florence Vidor, na Sala Azul (distribuição da Paramount).
Nesse mesmo dia a empresa exibidora pediu a licença para funcionamento, cuja
informação foi dada pelo engenheiro Antonio Ferreira. Ele se limitou a dar a
capacidade das salas: o Salão Vermelho tinha 30 frisas, 32 camarotes, 400 lugares
nos balcões e 1.680 poltronas; a Sala Azul era menor, com 18 camarotes, 240
lugares nos balcões e 1600 poltronas. O alvará foi emitido no mesmo dia. Os
ingressos para a estreia custavam Rs 2$000 (dois mil réis) e meia-entrada a Rs
1$500 (mil e quinhentos réis), somente na plateia porque as frisas e camarotes
estavam todas vendidas antecipadamente.
Segundo o site Almanack Paulistano, ele foi construído onde está hoje o
estacionamento do edifício Zarvos (rua da Consolação, 222), contando com 15 mil
m2, cinco salões (dois cinemas, um bar, uma confeitaria e sorveteria com 300
mesas, dancing e uma sala de exposições), intitulando-se o “maior centro de
diversões da América Latina”, com capacidade para 15 mil pessoas. A Sala
Vermelha seria mais requintada que a Azul, exigindo roupa de gala. Teria orquestra
com 30 “professores”, uma Electrola Ortofônica Auditorium (The Auditorium
Orthophonic Victrola) para música de discos fabricada pela Victor Talking Machines,
e apresentaria somente filmes em lançamento. Havia sessões especiais para as
senhoritas nas quintas-feiras. As duas salas de projeção davam lugar a grandes
bailes de carnaval, durante os festejos de Momo. O maestro da inauguração da Sala
Vermelha foi Antonio Giammarusti (Bari, 21/5/1895), apresentando-se no palco a
cantora Ermelinda Cichero. Um jazz-band animou o hall de entrada. O maestro da
Sala Azul foi J. Amarante, conduzindo um conjunto típico. A Electrola Auditorium
tocou a música A lenda do beijo (Sotullo y vert), interpretada pela Orchestra Victor
Concert.
A Auditorium Electrola da Victor estava em exibição pela América Latina conforme
artigo de Robert Baumbach. Na apresentação em São Paulo, o gerente da Victor
descobriu que o Odeon tinha uma acústica pobre, com reverberações pelas paredes
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do cinema, transformando o som dos violinos em guinchos. Isso foi descoberto
somente algumas horas antes da abertura. O gerente aproveitou um regimento que
passava pela rua de retorno de uma cerimônia, convencendo o capitão a dispor os
soldados ao longo das paredes para a absorção do excesso de altas frequências. No
relatório da apresentação foi declarado o sucesso do aparelho, que permaneceu
atuando na Sala Vermelha na semana seguinte, até que sumiu dos anúncios.
Os escritórios da Empresa Serrador em São Paulo também foram transferidos para
o prédio da rua da Consolação, 42, conforme pedido do gerente Júlio Llorente em
11/12/1928 (antes estavam na rua do Triunfo, 34).
A capacidade de público da Sala Vermelha em 1939 era de 2.510 espectadores
(1.740 na plateia, 315 nas frisas e 455 nos balcões); na Sala Azul cabiam 2.020
espectadores (1.675 na plateia, 90 nas frisas e 255 nos balcões).
No final de sua carreira foi exibidor da Pelmex. A Sala Azul chegou a ser usada por
companhias teatrais.
Fechado provavelmente em 1954. Em agosto de 1955 foi transformado em loja
Mappin com estacionamento no interior do prédio. O edifício foi alvo de interesse do
Instituto de Previdência do Estado de São Paulo, em 1963, mas diante do
requerimento de uma Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI sobre a sua
inadequação, ele foi demolido para ampliação da rua da Consolação.
Na década de 1930 ainda foi construída a Sala Verde no Odeon.
MEMÓRIA
Comentário do cronista Guilherme de Almeida: “Naturalmente para um cronista
cinematográfico, gostosamente forçado a ‘torcer’ dia a dia pelo cinema, a
inauguração de qualquer nova casa de exibições só pode ser motivo de júbilo. Ora,
com a inauguração hoje, do ‘Odeon’, esse júbilo é particularmente grande, enorme,
na mesma proporção da nova grande, enorme propriedade da Empresa Serrador. O
‘Odeon’ significa para o cinema e para São Paulo, um triunfo. Teatros, ‘bar’,
confeitaria, ‘dancing’, galerias para exposições... tudo aí se reúne, tudo aí se
confunde num microcosmo delicioso onde a vida correrá fácil e bonita entre as
coisas gostosas e que são as únicas que justificam o inevitável sacrifício de viver...
Ao cinema, o ‘Odeon’ dedica duas salas majestosas: a ‘Vermelha’ e a “Azul’. Aquela
mais ‘rafinée’, mais feita para o ‘grand monde’... que, por sinal, é bem
pequenininho; esta, mais ampla, mais popular, mais para todo mundo. Com duas
sessões em cada uma das salas – uma às 19,15 outra às 21,45 – exibindo-se na
‘Vermelha’, o filme “Lírio de Granada’, com Lily Damita, e, na ‘Azul’, a interessante
produção da Paramount, ‘Quarteto do Amor’, com Florence Vidor, - é que se dará,
hoje, a inauguração do grande e alegre palácio da rua Consolação” (O Estado de S.
Paulo, 11/10/1928, p.2).
José Inácio de Melo Souza
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