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Biblioteca da
História Geral da Arte I
Apontamentos de: Alda Oliveira Delicado
E-mail: [email protected]
Data: 30/10/06
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HISTÓRIA DA ARTE I
I – O MUNDO ANTIGO
1 – A magia e o rito – a arte do homem pré-histórico
1
A Idade da Pedra Lascada
- a origem da arte é um questão complexa – embora saibamos que os nossos antepassados
começaram a servir-se dos pés há mais de 4 milhões de anos, não sabemos quando
começaram efectivamente a usar as mãos
- há dois milhões de anos encontramos os primeiros utensílios produzidos pelo homem
- a associação entre forma e função levou ao desenvolvimento destes utensílios
- os primeiros utensílios de que temos registo são de pedra e por isso a primeira fase do
desenvolvimento humano ficou conhecida por Paleolítico ou Idade da Pedra Lascada
1
A Arte das Cavernas
- no Paleolítico Final que começou há 35 mil anos surgiram as primeiras obras de arte mas
acreditamos que tenham sido fruto de um lento amadurecimento
- no final do último período glaciário na Europa o clima das regiões entre os Alpes e a
Escandinávia era semelhante ao actual da Sibéria – manadas de renas e grandes herbívoros
percorriam os vales e planícies atacados pelos antepassados dos tigres e leões actuais
- os homens também eram atacados por estas feras e por isso procuravam protecção e
habitação em caverna rochosas das quais sobraram muitos exemplares no Norte de
Espanha e Sul de França
- os instrumentos e outros achados possuíam diferenças significativas entre as várias regiões
levando a que fossem criadas designações diferentes para os utensílios criados em cada
uma dela – os principais conhecidos são os Aurinhacenses (de Aurignac) e os Madalenenses
(de La Madeleine)
- as obras mais impressionantes da arte paleolítica são figuras de animais pintadas, gravadas
ou esculpidas nas cavernas
- Gruta de Altamira – Bisão Ferido
- Lascaux (Dordogne – França) – bisões, cavalos, veados e touros
- a conservação desta arte intacta deveu-se a as pinturas serem realizadas nos recants mais
profundos das cavernas longe das entradas
- estas pinturas terão sido executadas para a elaboração de ritos mágicos destinados a
assegurar o sucesso na caça, o que é apontado pelas suas características
- a situação oculta dentro das cavernas
- linhas apontadas para os animais presentes nas imagens (dardos e azagaias)
- forma desordenada de sobrepor as figuras
- o homem paleolítico não estabelecia grandes diferenças entre imagem e realidade – ao
matar os animais das imagens estava a matar o seu sopro de vida
- estas práticas mágicas poderiam dar mais coragem aos caçadores para enfrentarem
animais perigosos com armas tão simples
- a pintura madalenense foi o epílogo da magia com o objectivo de conseguir uma boa caça
- o clima da Europa foi aquecendo e os animais começaram a escassear – os ritos podiam
agora representar a criação de manadas e não a sua destruição
- surgem ainda imagens de plantas nestas pinturas que fazem pensar que os ritos podiam
ainda tratar-se de ritos de fertilidade
- a origem destas pinturas é discutida deveria ter sido sugerida pelas formas das rochas
nas cavernas salientadas por traços a carvão e mais tarde pinturas:
- Mulher Nua de Madeleine – raro caso de representação humana em que as pernas e
o tronco foram talhados nas saliências da rocha e a cabeça e braço direito
praticamente não aparecem
- Dança ritual em Addaura (Palermo) – traços rápidos e finos mostrm figuras humanas
e animais dançando e em várias camadas de imagens
2
1.1.2 Objectos esculpidos e objectos pintados
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os homens do Paleolítico faziam também pequenas gravuras e esculturas em osso,
chifre ou pedra talhados com o auxílio de ferramentas de sílex
as mais antigas encontradas até hoje são estatuetas de marfim de mamute encontradas
numa caverna no Sudoeste da Alemanha datadas de há 30 mil anos – imagem de cavalo
finamente esculpida
Vénus de Willendorf na Áustria – estatueta feminina da fecundidade com as formas
arredondadas e bulbosas como um seixo
Bisão feito haste de rena deve as suas formas em parte ao pedaço de chifre onde foi
talhado
a arte do Paleolítico estava moldada ao período em que surgiu – com o fim da Era
Glaciária teve que evoluir e transformar-se
1.2 Da caça à agricultura: a Idade da Pedra Polida
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a Idade da Pedra Lascada finalizou com a Revolução Neolítica que teve o seu início no
Médio Oriente cerca 8.000 aC – homem levou a cabo as primeiras tentativas bem
sucedidas de domesticação de animais e cultivo de alguns cereais
durante o Paleolítico a sua sobrevivência dependia da caça mas agora podia assegurar a
sua alimentação com o seu próprio trabalho, coexistindo não em comunidades nómadas
mas sim em aldeias
a nível de utensílios continua a ser utilizada a pedra como matéria-prima
antes do aparecimento dos metais começam a surgir um conjunto de novas actividades
artesanais: a cerâmica, a fiação, a tecelagem e a arquitectura em madeira, tijolo e pedra
os restos dos povoados neolíticos dão-nos indicações sobre a sua população mas não
sobre a sua evolução espiritual: surgiram instrumentos de pedra cada vez mais
aperfeiçoados e vasos de barro com decoração geométrica, mas nada semelhante à
pintura ou escultura paleolítica.
1.2.1 Jericó
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povoação de Jericó foi escavada recentemente tendo sido encontradas cabeças
modeladas de cerca de 7.000 aC – caveiras humanas com as caras reconstruídas em
gesso colorido e pedaços de conchas nos olhos
estas cabeças antecipam a arte mesopotâmica e os retratos do período romano
apresentando fisionomias específicas
estas cabeças têm sido interpretadas como os antepassados dos habitantes da cidade o
que indica que o homem neolítico acreditava num espírito ou alma localizado no crânio
que sobrevivia à morte e que devia ser honrado e apaziguado
Jericó era constituída por casas de pedra com pavimentos de gesso dentro de uma
cidade fortificada protegida por muralhas e torres de alvenaria
a comunidade de Jericó apesar destas demonstrações de evolução não conhecia a
cerâmica
1.2.2 Çatal Hüyük
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Çatal Hüyük situada na Anatólia foi uma cidade neolítica importante 1.000 anos mais
recente que Jericó
os seus habitantes viviam em casas de adobe agrupadas em torno de pátios abertos não
existindo ruas já que as casas não tinham portas sendo a entrada feita pelos telhados
foram encontrados ainda santuários com paredes estucadas e pinturas parietais de
cenas de caça que lembram as imagens do Paleolítico mas noutro contexto já que as
caçadas são rituais em honra da divindade
os animais estão em repouso e apenas os caçadores estão em movimento sendo que os
animais que representam divindades femininas têm ainda uma rigidez maior
a pintura mural mais surpreendente é a da própria cidade com crateras de vulcão em
actividade – as casas são vistas de cima mas a montanha é apresentada de perfil
a irrupção do vulcão deve ter marcado a vida da comunidade levando a esta
representação religiosa do acontecimento
3
1.2.3 A Europa Neolítica
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o Próximo Oriente seria o berço das primeiras civilização enquanto na Europa a
Revolução neolítica progredia mais devagar chegando às costas setentrionais do
Mediterrâneo cerca de 5.000 aC
pequenas estatuetas em terracota encontradas em Cernavoda na Roménia lembram
outras obras da Ásia Menor – simplificação dos traços mantendo os traços essenciais do
corpo feminino
a Norte dos Alpes a influência do Próximo Oriente chegou mais tarde – as pequenas
povoações tribais mantiveram as suas formas de vida mesmo na época do bronze e do
ferro nunca atingindo o nível de organização social que deu origem a Jericó e Catal
Hüyük
no entanto encontramos na Europa monumentos chamados megalíticos por serem
constituídos por grandes lajes de pedra erguidos e sobreposto sem argamassa
tinham cunho religioso e não político já que só a autoridade de uma crença religiosa
poderia inspirar o tipo de esforço necessário para a sua construção
existiam vários tipos de monumentos:
- dólmenes – túmulos de paredes constituídas por grandes lajes sobre as quais
assentava outra a servir de telhado
- cromeleques – recintos destinados a cerimónias religiosas sendo um dos mais
famosos Stonehenge no Sul de Inglaterra – círculo de pedras erguidas a intervalos
regulares que sustentam traves horizontais rodeando dois círculos e no interior do
mais central está um bloco semelhante a uma ara – o conjunto está orientado para o
ponto do horizonte onde nasce o sol no dia do solstício de Verão, uma indicação da
sua função religiosa
este tipo de construções podem ser incluídas na arquitectura pois apesar de construídas
a céu aberto, já queé a arte de conformar o esaço às necessidades e aspirações
humanas – a raíz da palavra indica que a arquitectura é uma edificação superior às que
possuíam simplesmente um carácter prático e comum pela sua escala, ordem,
permanência e solenidade
1.2.4 A América Neolítica
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os índios da América do Norte desenvolveram a chamada “arte da terra” que construíram
colinas com diferentes formas
as elevações variam muito em formato e em data indo desde 2000 aC até à chegada dos
primeiros europeus
as mais interessantes são as colinas em forma de animais que se supõe terem sido
totens como a Colina da Grande Serpente no Ohio – uma cobra com 460 metros de
comprimento que ondula ao longo de uma colina – o ponto mais alto está na cabeça da
cobra onde existia também um altar
1.3 A Arte primitiva
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algumas populações actuais ainda mantêm as formas de vida Paleolíticas mas há ainda
mais representantes de uma influência neolítica – primitivos da África tropical, das
Américas e das ilhas do sul do Pacífico
as sociedades primitivas são de natureza predominantemente rural autónomas sendo as
suas unidades políticas a aldeia e a tribo
são fortemente isolacionistas e hostis a estranhos mantendo um equilíbrio estável mas
precário entre o Homem e o ambiente local não estando preparadas para o contacto com
civilizações urbanas
as semelhanças entre estas comunidades e as antigas levaram-nos a conhecer melhor
os hábitos de povos já desaparecidos – por exemplo no rio Sepik na Nova Guiné
persisteu até tarde o hábito de construção de crânios gessados semelhantes aos
encontrados em Jericó
outras esculturas representam o culto dos antepassados como um pássaro de asas
abertas do rio Sepik que representa o espírito vital
o culto dos antepassados é o traço mais persistente das sociedades primitivas e a sua
força de coesão embora as formas de culto sejam muito diversificadas
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na Ilha da Páscoa as figuras ancestrais são representadas por grandes blocos de pedra
talhados na rocha vulcânica e alinhadas em plataformas artificiais
as tribos do Gabão têm por hábito acumular as caveiras dos antepassados em depósitos
protegidos por uma estatueta de um guardião dos quais sobreviveram vários exemplares:
- um exemplar notável pela sua abstracção geométrica é o de um guardião composto
por formas geométricas no qual impera a harmonia e disciplina mas também a
serenidade – a abstracção da arte primitiva poderá representar o mundo anímico que
terá de ser diferente do mundo real
- o segundo espécime é muito semelhante na estrutura geométrica mas o rosto tem
um maior realismo e foi construída para inspirar terror bastante adequada à sua
função
a arte primitiva e a arte neolítica possuem uma característica de abstracção por
endogamia em que a abstracção é obtida pelo cruzamento de formas aparentadas
a endogamia pode ser alterada de duas formas: por cruzamento de migração ou
conquista ou por se terem verificado condições favoráveis ao desenvolvimento do
realismo como por exemplo em certas regiões africanas em que se formaram reinos
embora de curta duração
os vestígios mais interessantes desses reinos são as cabeças de Ife, autênticos retratos
em bronze construídos com a técnica da cera perdida importada do Mediterrâneo –
realismo subtil e firme dos rostos com traços perfeitamente individuais – século XII
no reino do Benim para além destes retratos surgiram ainda estatuetas com o objectivo
de glorificar o chefe tribal
as crenças primitivas são animistas porque assentam na suposta existência de espíritos
em todas as coisas vivas o que levavam a complexos rituais em diversas circunstâncias
que terão levado ao surgimento de esculturas como a da mulher ajoelhada do Congo cuja
posição sugere tratar-se de um ritual mágico
na relação com o mundo dos espíritos, o homem necessitava de exteriorizar a relação
com esse mundo através de rituais e cerimónias em que ele desempenhava o papel de
espírito encarnado graças à utilização de uma máscara
as máscaras que sobreviveram dão dos mais variados tipos mas as africanas
distinguem-se pela sua simetria e pela precisão e firmeza do trabalho
outras obras como o capacete do Alasca impressiona pelo seu realismo e ferocidade
o papel da pintura nas sociedades primitivas foi sempre secundário embora a sua técnica
fosse largamente conhecida – surge individualizada apenas em determinados contextos
rituais como na decoração parietal das casas dos índios Nootka em Vancouver
a pintura na areia desenvolveu-se no Sudoeste dos Estados Unidos e a sua técnica
consistia em deitar pó de pedra ou de terra de várias cores sobre um plano de areia
as composições na areia são como receitas passadas pelo curandeiro destinadas a
práticas curativas
a associação entre o sacerdote, o médico e o artista representa a necessidade do
homem de sujeitar a Natureza às suas necessidades sendo considerados aspectos
diferentes de um mesmo processo.
2 – A arte egípcia
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a revolução neolítica persistiu em alguns locais mas noutros o equilíbrio alcançado com
as novas técnicas foi colocado em xeque pelos homens
as muralhas de Jericó apontam para as rivalidades entre comunidades que
eventualmente disputariam os recursos e melhores regiões de cultivo – o sucesso do
período neolítico levou a um crescimento populacional que a produção de alimentos não
podia comportar
os conflitos que surgiram no vale do Nilo, do Tigre e do Eufrates geraram tensões que
provocaram o surgimento de um novo tipo de sociedade
com o desenvolvimento da escrita surgiu a possibilidade de registo dos grandes
acontecimentos da História e dos seus protagonistas de uma forma sem precedentes
2.1 A monarquia antiga
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a sociedade egípcia é considerada uma das mais rígidas e conservadoras por ter
mantido os meus príncipes e características num período de quase 3.000 anos
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apesar destas observações, a arte nesse período nunca foi estática e as suas realizações
exerceram uma influência decisiva na arte grega e romana
a história egípcia está dividida em dinastias tendo a primeira surgido em cerca de 3.000
aC depois do período pré-dinástico – a monarquia antiga inaugurada com a primeira
dinastia terminou em cerca de 2.155 aC com o fim da sexta dinastia
esta forma de contabilização do tempo revela a importância do faraó que além de ser um
monarca soberano era ainda um deus
desconhecemos o processo que levou ao surgimento do faraó mas conhecemos os feitos
que fizeram dele uma personagem fundamental: a união dos dois reinos desde a primeira
catarata (Assuão) até ao Delta e a melhoria da fertilidade do solo através da
regularização das cheias com barragens e canais
das vastas obras dos faraós praticamente nada sobrou e por isso o nosso conhecimento
da civilização egípcia baseia-se essencialmente nos seus túmulos e espólio
a importância do além túmulo entre os egípcios tinha um carácter diferente do que
acontecia com as sociedades neolíticas uma vez que o temor inspirado pelos
antepassados é substituído pela crença numa vida feliz além túmulo assegurado pela
existência de um local onde o ka de cada pessoa vivia num receptáculo geralmente uma
estátua presente no túmulo
como o ka continuaria a gozar dos mesmos prazeres da vida, o túmulo era decorado com
cenas da via quotidiana e o espólio presente era constituído por muitos dos objectos do
dia-a-dia do defunto
o medo da morte só surge entre os egípcios quando é introduzido um julgamento após a
morte que avalia os feitos de cada vida e decide se o morto tem direito a penetrar nos
Campos Elísios ou se deverá permanecer no limbo
uma pintura mural de um túmulo pré-dinástico em Hierakonpolis é de carácter
marcadamente primitivo mas aponta para uma direcção interessante: as imagens
estilizam-se cada vez mais como se estivessem em pleno movimento de conversão em
hieroglifos
2.1.1 O estilo egípcio e a paleta do rei Narmer
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na época pré-dinástica o Egipto estava a começar a utilizar o bronze e era governado por
vários soberanos locais
a rivalidade entre os dois principais reinos, os do Baixo e Alto Egipto terminou quando o
rei Narmer conquistou o Baixo Egipto unindo todo o vale do Nilo, acontecimento
celebrado numa famosa paleta que apesar de ter surgido em Hierakonpolis mostra já
uma grande evolução face à pintura mural
esta é a mais antiga obra de arte histórica descrevendo de um lado a vitória de Narmer
que segura um inimigo pelos cabelos rodeado dos símbolos da supremacia do Alto
Egipto enquanto do outro lado surge uma procissão solene – esta paleta é importante
pelo traçado ordenado e racional do conjunto
o estilo é uma forma de escolher e combinar as formas que permite ao historiador de arte
saber quem executou a obra de arte e determinar as razões da sua elaboração
a paleta de Narmer apresenta muitas das características do estilo egípcio:
- acentuado sentido de ordem – superfície dividida em bandas horizontais e cada
figura colocada um local específico com a excepção dos hieróglifos, do elemento
ornamental e dos inimigos mortos
- os inimigos são retratados de cima enquanto as outras figuras aparecem de perfil – o
artista procurou o aspecto mais revelador de cada um dos elementos
- existem apenas 3 pontos de vista: frontal, de perfil e vertical numa perspectiva
rigorosamente cúbica
- o corpo humano para ser retratado com mais clareza apresenta mais do que uma
perspectiva: os olhos e ombros de frente e a cabeça e as pernas de perfil – esta
forma de representação rígida é adequada à natureza divina do faraó que não
executa nenhum movimento mas que se limita a existir
- a representação de outras figuras que executam vários movimentos é mais simples
apenas de perfil
2.1.2 A terceira dinastia
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a beleza da paleta de Narmer só será compreendida alguns anos mais tarde no reinado
de Djoser, a maior figura da 3ª dinastia
um exemplo é o relevo de madeira do túmulo de Hesy-ra um dos grandes dignitários do
faraó representado da mesma forma que Narmer mas com algumas diferenças: as
proporções são mais equilibradas e harmoniosas e o recorte dos pormenores mostra
uma aguda observação e uma delicadeza de elaboração
os sepulcros dos grandes funcionários situam-se à volta dos monumentos funerários dos
faraós
a forma típica dos túmulos particulares era a mastaba – um montículo de forma
quadrangular ou de pirâmide truncada coberto de tijolos ou pedra erguido por cima de
uma câmara funerária profunda – dentro da mastaba há ainda uma capela funerária e um
cubículo para a estátua do defunto
as mastabas reais caracterizavam-se pelas suas dimensões e na 3ª dinastia
transformaram-se em pirâmides de degraus – a mais conhecida é a do rei Djoser e
embora mantenha a estrutura da mastaba tem proporções muito superiores
as pirâmides faziam parte de vastas necrópoles com templos e outros edifícios onde se
realizavam grandes celebrações religiosas durante a vida e depois da morte do faraó – as
construções junto da pirâmide de Djoser para além do próprio monumento devem-se a
Imhotep, o primeiro artista registado na história
a arquitectura egípcia começou por ser constituída por edifícios de adobe de terra,
madeira, canas e outros materiais ligeiros – Imhotep utilizou pela primeira vez cantaria
mas o seu reportório ainda reflecte os antigos materiais
encontramos colunas de várias espécies mas sempre embebidas nas paredes que são
réplicas de feixes de juncos e de esteios de madeira – estas colunas não têm apenas a
função de suporte das estruturas mas têm também um carácter expressivo transmitindo
sentimentos de força e solidez mas também as alianças políticas já que as colunas de
edifícios no Baixo Egipto aparecem num formato papiriforme, a planta típica dessa região
2.1.3 A quarta dinastia
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as pirâmides atingem o seu apogeu na 4ª dinastia com as 3 pirâmides de Gizé que
apesar de ligeiras diferenças apresentam a mesma estrutura
- a câmara sepulcral está perto do centro da construção
- pequenas construções e mastabas à volta para membros da família real e altos
dignitários
- do lado oriental de cada pirâmide fica um templo funerário do qual desce uma
calçada até a um segundo templo no vale do Nilo
junto ao templo da pirâmide de Quefren surge a Esfinge, uma personificação da realeza
divina com 20 metros de altura
este tipo de empreendimentos marcaram o zénite do poder faraónico – as pirâmides
continuaram a ser construídas mas nunca com esta dimensão
para além dos monumentos fúnebres a arte egípcia caracterizou-se pelas estátuas
retratos
- Quefren em diorite, pedra negra de extrema dureza que mostra o rei sentado num
trono com o falcão de Hórus a rodear-lhe a cabeça – exemplo típico da visão cúbica
da forma humana – o corpo bem proporcionado e robusto é totalmente impessoal e
apenas o rosto apresenta traços individuais
- a estátua de Miquerinos e da sua mulher de pé com a perna esquerda avançada é
outro exemplo impressionante especialmente pelo modelamento do corpo da rainha
sob as suas roupas
- principie Rahotep e sua mulher Nofret – este conjunto tem um grande realismos
devido à coloração viva das estátuas, com o corpo masculino mais escuro do que o
feminino, um condicionalismo da arte egípcia
as figuras de pé ou sentadas eram os retratos utilizados nos períodos mais antigos mas a
partir do final da quarta dinastia surge uma nova posição, a do escriba acocorado como a
estátua encontrada em Sacará no túmulo de um alto funcionário
outra criação da monarquia antiga foi o busto retrato embora o seu propósito seja
desconhecido e tenham sobrado poucos exemplares
a pintura egípcia presente nas paredes dos túmulos retratava essencialmente cenas da
vida quotidiana como as pinturas do túmulo de Ti:
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A Caçada ao Hipopótamo tem um especial interesse devido ao tratamento da
paisagem e ao realismo da acção; o defunto ocupava sempre um papel estático e
superior na imagem
- Bovinos a assar o rio a vau – um dos pastores leva um vitelo às costas e o animal
assustado vira a cabeça para a mãe que está atrás – é uma representação plena de
simpatia e emoção inesperada neste período
as imagens dos túmulos não correspondem aos passatempos favoritos dos defuntos
mas sim a um ordenamento que obedece às estações do ano numa espécie de
calendário das actividades humanas para que o espírito do defunto as recorde ao longo
dos anos
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2.2 A monarquia média
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no final da sexta dinastia o poder faraónico cai e o Egipto entra num período de
perturbações que dura cerca de 700 anos
a autoridade efectiva estava nas mãos de senhores locais que fizeram reviver a antiga
rivalidade entre Norte e Sul – sucederam-se várias dinastias de curta duração até se
entrar num período de relativa estabilidade durante a 11ª e a 12ª
no final desta última dinastia, o pís foi conquistado pelos Hicsos, um povo da Ásia
Ocidental que se apoderou do Delta e governou por 150 anos até ser expulso pelos
príncipes e Tebas
o espírito inquieto desse tempo está bem expresso nos retratos como o de Sesóstris III
que possui uma nítida expressão sombria e perturbada que denuncia a nova
auto-consciência e que constitui uma evolução no sentido do realismo
na pintura também se assistiu a um afrouxamento das regras estabelecidas por exemplo
nas decorações do túmulo dos príncipes de Beni Hasan – fresco Alimentando os Órix do
túmulo de Khnum-hotep – segundo as regras antigas, as figuras deviam estar no mesmo
plano ou o segundo órix e o seu tratador acima dos primeiros – o pintor introduziu em vez
disso uma segunda linha de fundo um pouco mais elevada mas que associa os dois
grupos de uma forma mais realista
2.3 A monarquia nova
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os 500 anos depois da expulsão dos Hicsos correspondentes às dinastias 18ª, 19ª e 20ª
constituem a terceira idade de ouro do Egipto
o país unificado conseguiu alargar as suas fronteiras até à Palestina e Síria
durante esse período foram construídos edifícios e monumentos sem precedentes na
nova capital de Tebas em especialmente ao nível dos sepulcros reais
a realeza divina dos faraós assentava agora na associação com o deus Amon cuja
identidade se fundira com a do deus sol Rá tornando-se a divindade suprema
esta reestruturação religiosa levou a um crescimento do poder dos sacerdotes de Amon
que confirmavam mesmo a realeza aprovando a eleição dos faraós
Amenófis ou Amenhotep IV decidiu afrontar os sacerdotes proclamando a sua fé no deus
único Aton, mudando o seu nome para Akhenaton e transferindo a capital para o centro
do Egipto para Tel-el-Amarna
a tentativa de mudar o culto religioso foi gorada e o poder dos sacerdotes de Amon voltou
depois da morte de Akhenaton e manteve-se no Egipto até à conquista grega e posterior
conquista romana do território
a arte deste período é muito variada e inclui tanto obras do mais rígido conservadorismo
como da mais brilhante inovação
2.3.1 A arquitectura
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o templo funerário da rainha Hatshepsut é uma das obras mais importantes do período,
de cerca de 1480 aC tendo sido construído nas falésias de Deir el-Bahari e dedicado a
Amon e outras divindades
o santuário é uma pequena câmara rasgada na rocha ao qual se acede depois de passar
por 3 pátios unidos por rampas ladeadas por colunatas
este santuário é particularmente interessante por ter utilizado a envolvente natural dando
uma aparência de grande monumentalidade
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os monarcas seguintes continuaram a construir grandes templos funerários mas
consagraram os seus esforços aos templos imperiais de Amon
o templo de Luxor construído na margem do Nilo oposta a Tebas pr Amenhotep III tem
uma planta característica do modelo geral dos templos egípcios tardios:
- duas paredes maciças de faces inclinadas enquadram a porta - pilão
- o primeiro pátio é um paralelogramo porque Ramsés II ao acrescentá-lo teve que
tomar em consideração a inclinação da margem do rio
- segue-se uma grande sala de colunas, hipóstila e a segui o segundo pátio ao fundo
da qual se encontra outra sala colunada
- depois começa o templo com várias salas e capelas dispostas simetricamente
todo o conjunto ficava rodeado de altos muros que o isolavam do exterior – este edifício
foi projectado para ser visto do interior – os fiéis ficavam confinados aos pátios onde se
encontravam as colunas muito juntas e grossas para suportarem o peso dos lintéis
para além da construção em pedra geralmente reservada para edifícios que se queriam
eternos, os egípcios utilizavam também os adobes cozidos ao sol um material mais
conveniente e económico
sobraram poucos edifícios construídos com esta técnica mas os armazéns do templo
funerário de Ramsés II atestam bem a mestria das técnicas de construção como as
abóbadas de berço com um vão de 4 metros
2.3.2 Akhenaton
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raros são os vestígios das construções de Akhenaton mas nos seus gostos artísticos
certamente é revelado o novo estilo e o novo ideal de beleza
o novo estilo marca vincadamente a individualidade dos rostos com traços ondulantes e
realistas
o busto da rainha Nefertiti destaca-se não só pelo maior realismo mas também pelo novo
sentido da forma que quebra a rigidez da imobilidade tradicional com um formato mais
flexível e descontraído anti-geométricos
a pintura mural que representa as filhas de Akhenaton também demonstra este estilo
com os seus gestos joviais e a naturalidade das suas atitudes
apesar da velha ordem ter sido restaurada após a morte de Akhenaton, o gosto do
realismo e da flexibilidade manteve os seus ecos na arte egípcia como no fresco do
túmulo de Horemheb em Sacará onde está representada uma imagem de operários
transportando uma trave que possui uma grande expressão e liberdade
2.3.3 Tutankhamon
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Tutankhamon é o único faraó cujo túmulo permaneceu intacto até ser descoberto nos
anos 20 do século XX deixando-nos um exemplo marcante do que seria um túmulo real
o que mais impressiona na sua máscara funerária é o requinte do jogo de incrustações
de cores variadas sobre a superfície de ouro polido
a arca proveniente do seu túmulo é também única pela pintura do rei caçando numa
paisagem que evolui e se transforma à sua frente com um nível de detalhe
impressionante e com várias representações de animais e plantas realísticas
esta imagem tem uma nítida semelhança com as miniaturas islâmicas executadas 2 mil
anos depois
3 – O Próximo Oriente Antigo
3.1 A arte suméria
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enquanto a civilização egípcia florescia no vale do Nilo, entre o Tigre e o Eufrates, na
Mesopotâmia desenvolvia-se também uma nova civilização
apesar de manterem contactos as duas civilizações mantiveram caracteres muito
diferentes embora as pressões que as forçaram possam ter sido as mesmas
as diferenças começam logo na geografia pois em vez de uma estreita faixa fértil nas
margens do rio protegida por desertos de ambos os lados, encontramos uma bacia larga
e pouco profunda com raras defesas naturais e facilmente acessível de todos os lados
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a unificação política só surge na Mesopotâmia depois de mil anos terem passado o
surgimento da civilização e mesmo assim durante breves períodos e mantidas por um
espírito guerreiro
a história política da Mesopotâmia foi por isso pautada pelas rivalidades locais, incursões
estrangeiras e pelo repentino aparecimento do poder militar que durava apenas alguns
anos
apesar deste fundo agitado as tradições culturais e artísticas registaram uma notória
continuidade e essa herança comum deve-se aos pioneiros dessa civilização, os
sumérios, habitantes da região perto da confluência entre os dois rios
a origem dos sumérios permanece obscura já que a sua língua não está aparentada com
mais nenhuma conhecida – um pouco antes do quarto milénio aC chegaram à
Mesopotâmia vindos da Pérsia e nos mil anos seguintes fundaram várias cidades-estado
e desenvolveram uma escrita cuneiforme gravada em tabuletas de barro – esta fase é
correspondente ao período pré-dinástico egípcio e é designada por protoliterário
os vestígios da civilização suméria são mais escassos do que os da civilização egípcia
pois a sua arquitectura era exclusivamente de adobe e madeiras e a sua preocupação
pelo além túmulo era bem menor, embora tenham sobrevivido alguns túmulos
abobadados em Ur
o que sabemos sobre a Suméria provém dos vestígios arqueológicos nomeadamente
textos gravados em placas de argila
cada cidade-estado tinha um deus local considerado seu rei e senhor mas possuía
também um chefe humano para a governar, o intendente do soberano divino – o deus era
proprietário do território da cidade e do trabalho e produção dos habitantes – socialismo
teocrático – uma sociedade planificada cujo centro era o templo
o templo ficava responsável por assegurar os recursos e a mão-de-obra necessários para
as grandes obras públicas como os diques e vales de irrigação e guardava nos seus
armazéns as colheitas para garantir a sua distribuição
para manter este sistema era necessária a escrita o que explica que quase todos os
textos que sobreviveram foram de índole económica e administrativa
as plantas das cidades representavam esta importância do templo uma vez que as casas
se aglomeravam em torno da área sagrada, um vasto conjunto que incluia templos,
oficinas, armazéns e residencias dos escribas
a meio sobre um terraço alto ficava o templo do deus – estes terraços, os zigurates,
foram crescendo em altura atingindo alturas comparáveis com colinas e lembrando as
pirâmides egípcias pelo esforço exigido para a sua construção e pela sua
monumentalidade
a mítica Torre de Babel foi o mais conhecido mas subsiste outro construído em 3.000 aC
mais antigo erguido em Warka na cidade de Uruk com rampas conduzindo ao Templo
Branco, assim chamado pelas suas fachadas de tijolo caiado – a entrada do templo não
era na fachada fronteira à escadaria de acesso mas sim a sudoeste criando uma via
sacra em espiral angulosa – acesso de eixo quebrado é típico da arquitectura religiosa
mesopotâmica
os zigurates foram crescendo em altura e em cerca de 2.500 aC foi mandado construir
um templo pelo rei Urnammu de Ur com 3 pisos só tendo sobrevivido o inferior com 16
metros de altura
esta construção em altura é explicada pela crença que nas montanhas residem os
deuses, uma ideia da mitologia grega
a imagem do deus a quem foi dedicado o Templo Branco perdeu-se mas sobraram
outros exemplares da escultura em pedra
a Cabeça Feminina de mármore encontrada em Uruk deve ter pertencido a uma estátua
religiosa e os lhos e sobrancelhas eram cobertas com materiais preciosos e a cabeça
seria coberta com uma cabeleira de ouro ou cobre
esta cabeça lembra a escultura egípcia da Monarquia Antiga com a suavidade das faces,
a delicada curva dos lábios e a fixidez dos olhos a contribuir para lhe dar uma expressão
sensual e severa
a evolução da escultura sumério levou a uma permanência dos elementos geométricos e
não os elementos expressivos – um conjunto de estátuas recuperadas em Tell Asmar
possuem um carácter geométrico com as suas roupagens cilindricas e os seus enormes
olhos redondos – este conjunto deveria estar na cella do templo de Abu representando
dois deuses e um grupo de sacerdotes e fiéis
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os corpos e as cabeças são totalmente esquemáticos sem preocupação com qualquer
tipo de semelhança com o objectivo de manter a atenção de fiéis nos olhos das imagens,
consideradas as janelas da alma
se na escultura egípcia era o cubo que predominava, na Suméria era o colindro o cone os
elementos fundamentais da escultura
o estilo da escultura em bronze era mais flexível e realista – este tipo de esculturas
utilizava não uma técnica de desbaste como a pedra mas sim de acrescentamento de
elementos
algumas peças características desta técnica foram encontradas em túmulos em Ur como
o suporte de oferendas em forma de bode de pé que possuí uma expressão quase
considerada demoníaca
a associação entre animais e divindades vinha dos tempos pré-históricos mas o que
distingue a presença dos animais na mitologia suméria é a parte activa que
desempenhavam como na caixa a harpa onde se encontram um lobo e um leão a
transportar comida ou um urso um burro e um cervo a tocar música
o artista que esboçou estes desenhos estava pouco preso às convenções egípcias não
receando a sobreposição das figuras nem o escorço dos ombros – a presença de
animais nas imagens teve algum historial como por exemplo nas fábulas de La Fontaine
3.1.1 Os Acadianos
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no final do período dinástico arcaico em 2.340 aC o socialismo teocrático entra em
ruptura e os intendentes tornam-se monarcas de facto procurando alargar as fronteiras
dos seus domínios
as populações semíticas da Mesopotâmia setentrional caminham para o Sul e em alguns
lugares começam a ganhar ascendente sobre os sumérios
o semita Sargão da Acádia os seus sucessores foram os primeiros chefes
mesopotâmicos que se proclamaram reis
a arte suméria adaptou-se então á nova função de glorificação do soberano
- cabeça de bronze encontrada em Ninive com uma comovedora humanidade apesar
do seu ar majestoso – a barba e o cabelo foram traçados com realismo e pormenor
revelando um domínio quase perfeito das técnicas da fundição e da cinzelagem
- o neto de Sargão, Naram-Sin imortalizou os seus feitos no baixo-relevo de uma
estela que chegou até nós – não há linhas rígidas de horizonte com as tropas de
Naram-Sin a subirem uma montanha e acima delas encontra-se o monarca que só é
suplantado pelas estrelas e que possui na cabeça a coroa de chifres exclusiva dos
deuses
3.1.2 Ur
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as tribos do Nordeste colocaram fim ao domínio dos reis da Acádia tendo sido expulsas
apenas em 2.125 aC pelos reis de Ur que estabeleceram um monarquia unificada
durante cerca de 100 anos
no período de ocupação estrangeira, uma das cidades-estado menores, Lagash
conseguiu manter a sua independência e o seu chefe Gudea manteve o cuidado de
preservar o título de rei para o deus local e não para si
apesar disto são inúmeras as estátuas que conhecemos deste governante colocadas nos
santuários da cidade e todas do mesmo tipo:
- realizadas em diorite a pedra rígida preferida pelos egípcios
- o seu rosto aparece muito menos individualizado do que o do chefe acadiano mas
ainda assim também afastado da simplicidade geométrica das esculturas de
Tell-Asmar
- a pedra foi trabalhada para garantir um jogo de luz subtil sobre os traços da
fisionomia
- a estátua sentada exibe Gudea com um mapa de um templo muito parecido com o
Templo Branco no colo
- os ângulos da estátua foram arredondados para acentuar a propriedade cilíndrica das
formas
- os braços e ombros estão em tensão em contraste com a posição descontraída dos
braços das esculturas egípcias
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3.1.3 A Babilónia
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o segundo milénio foi um período de agitação quase permanente na Mesopotâmia só
tendo estado sob domínio indígena entre 170 e 1600 aC quando a Babilónia assumiu o
papel preponderante
Hamurabi foi fundador da dinastia babilónica e assumiu o papel de protector do passado
sumério com a missão de fazer reinar a justiça a partir da sua principal cidade, a
Babilónia
a mais notável realização de Hamurabi foi o seu célebre código famoso por ter sido a
primeira unificação de um corpo de leis de concepção racional e humana - a estela onde
está gravado tem uma imagem que representa a apresentação do código à divindade e
tem algumas semelhanças com as estátuas de Gudea:
- relevos são tão salientes que parecem estátuas cortadas ao meio
- reprodução dos olhos em relevo levando a que as duas estátuas se encarem
directamente e com grande intensidade
3.2 A arte assíria
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na primeira metade do segundo milénio a Ásia Menor foi invadida por povos de língua
indo-europeia: os mitanianos na Síria e na Mesopotâmia Setentrional incluindo Assur e o
hititas no Norte no planalto da Anatólia em Bogazköy
em cerca de 1.360 aC os hititas atacaram os mitinianos levando Assur a reconquistar a
sua independência, alastrando gradualmente a sua soberania sobre a Mesopotâmia
atingindo no auge do seu poder (de 1000 a 612 aC) uma região desde a península do
Sinai à Arménia
3.2.1 Os palácios e a sua decoração
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a civilização assíria inspirou-se nas realizações sumérias e dando-lhes carácter próprio –
construíram templos e zigurates inspirados nos modelos sumérios mas os palácios reais
atingiram dimensões e magnitude sem precedentes
o palácio de Sargão II Dur Sharrukin foi um dos mais impressionantes construído na
segunda metade do século VIII aC:
- isolado do centro urbano numa cidadela de muralhas torreadas apenas com 2 portas
- utilizavam o tijolo como os sumérios mas revestiam as passagens e a parte inferior
das paredes com grandes placas de pedra onde esculpiam baixos-relevos
- nas entradas estavam os típicos demónios guardiões que se destinavam a
impressionar os visitantes e representavam o poder e majestade reais
- dentro do palácio a impressão de majestade era reforçada com longas séries de
relevos ilustrando as conquistas militares – estas imagens não têm drama nem
heroísmo representando apenas a inexorabilidade da vitória assíria e tornando-se um
pouco monótonas mas representam também a primeira tentativa de narrativa
plástica de grandes dimensões
em Ninive no palácio de Asurbanípal há também alguns relevos de destaque como o
saque da cidade elamita de Hamanu nos quais os soldados assírios destroem as
fortificações depois da cidade ser pasto das chamas enquanto um grupo de soldados se
afasta da cidade – a forma como a perspectiva foi tratada nestes dois planos de uma
forma diferente
a glorificação pessoal do monarca nestes relevos não aparece nas descrições das
vitórias mas sim nas caçadas aos leões que são representadas como combates
cerimoniais
nestas imagens os artistas demonstraram a sua mestria representando os leões como o
verdadeiro herói com toda a nobreza e coragem que está ausente das descrições das
vitórias – os corpos transmitem uma maior sensação de peso e volume graças às
gradações da superfície
3.2.2 Os Neobabilónios
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o império assirio terminou com a queda de Ninive face á ofensiva dos Medos e dos Citas
vindos do Oriente
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o comandante do exército assírio na Mesopotâmia Meridional anunciou-se como rei da
Babilónia levando a um período de florescimento da cidade entre 612 e 539 aC até ser
conquistada pelos persas
o mais célebre dos seus monarcas foi Nabucodonosor o construtor da torre de Babel que
fazia parte de um enorme conjunto arquitectural comparável à cidadela de Sargão II
os Neobabilónios, sem pedreiras por perto recorreram aos tijolos cozidos e vidrados já
conhecidos na Assíria mas utilizados agora para decorar superfícies e como relevos
arquitecturais
o efeito desta técnica está patente na porta de Ishtar no recinto sagrado de
Nabucodonosor – a procissão de touros, dragões e outros animais dispostos em bandas
horizontais de cores vivas tem uma graça e leveza completamente distintas dos pesados
monstros guardiões assírios
3.3 A arte persa
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a Pérsia recebeu o nome do povo que ocupou a Babilónia em 539 aC e que se tornou
herdeiro do império assírio – era uma região de confluência das tribos migratórias das
estepes asiáticas e da Índia que influenciaram a arte praticada na região
os vestígios desta comunidade nómada são limitados uma vez que se limitam ao espólio
dos túmulos e que eram artefactos de madeira, osso ou de metal: fivelas, arreios de
cavalos, fíbulas, outros artigos de adereço, taças e vasos
estes vestígios tinham em comum o estilo animalista, ou seja os elementos decorativos
são animais com uma forma abstracta e imaginativa
- num vaso de cerâmica pré-histórica encontrado no Irão aparece um cabrito estilizado
com os chifres enrolados em volta de um desenho geométrico – na borda do vaso o
que parece à primeira vista meros traços verticais são na realidade aves pernaltas
- outro exemplo encontra-se num par de bronzes do Luristão, um ornamento de uma
vara que representa dois bodes com as patas erguidas – este exemplar faz lembrar
os trabalhos de metal das estepes asiáticas
- cervo de ouro com um aspecto mais realista mas os chifres são representados como
um complexo ornamento abstracto
3.3.1 Os Aqueménidas
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Ciro o Grande conquistou a Babilónia em 539 aC assumindo o título de rei da Babilónia e
as ambições dos monarcas assírios
o império fundado por ele continuou a expandir-se com os seus sucessores sendo
apenas derrotado por Alexandre Magno em 331 aC
numa única geração os persas dominaram o maquinismo da administração imperial e
desenvolveram uma arte monumental de grande originalidade
os persas mantiveram-se fiéis às suas crenças religiosas tradicionais baseadas no
dualismo do bem e do mal, incarnados em Ahuramazda (Luz) e Ahrima (Trevas) e
porque o culto se fazia em altares ao ar livre não construíram templos mas os seus
palácios eram edifícios enormes e impressionantes
o palácio de Persepólis foi começado por Dário I em 518 aC – o seu traçado geral lembra
os grandes palácios assírios mas possui elementos de outras culturas
- as colunas são usadas em grande escala para suportar uma altura impressionante
como na sala do trono de Dário com 12 metros de altura – esta acumulação de
colunas e a sua decoração das bases e capitéis é um eco egípcio
- sem qualquer precedente é o topo das colunas onde assentam as traves composto
pelas partes frontais de dois bovídeos de origem assíria mas com um formato perto
dos bronzes do Luristão
- a escadaria de acesso à sala do trono está decorada com relevos d elongas filas de
personagens em solene marcha
o estilo das esculturas parece um eco da tradição mesopotâmica mas tem também
algumas inovações como a sobreposição de roupagens e o jogo de pragueados
finamente enrolados
a arte aqueménida é uma síntese de elementos diversos mas sem capacidade para os
desenvolver e um dos motivos dessa falta de evolução pode ser a preocupação com os
efeitos decorativos sem ter em conta a escala – os mesmos elementos podem ser
aplicados numa coluna ou numa peça de joalharia
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3.3.2 Os Sassânidas
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a tradição da arte móvel sobreviveu ao domínio romano reafirmando-se quando a Pérsia
ganhou a sua independência e isso foi devido à dinastia Sassânida
Shapur I comemorou as suas vitórias com um relevo na necrópole de Naksh-i-Rustam de
uma procissão que lembra os triunfos romanos mas o fraco relevos dos personagens e a
elaboração das roupagens lembra as obras persas
o palácio de Shapur em Ctesifonte revela esta influência dupla: as arcadas cegas da
fachada revelam a importância do aspecto decorativo das paredes
a arte monumental mais uma vez não evoluiu ao contrário das artes do metal e dos
têxteis
a glória da arte sassânida vem das sedas tecidas que foram exportadas para
Constantinopla e para o Ocidente cristão onde exerceram influência decisiva na arte
medieval com a sua riqueza de cores e padrões
4 – A arte Egeia
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à volta do mar Egeu desenvolveram-se 3 civilizações ligadas mas diferentes:
- a de Creta designada por minóica segundo o nome do lendário rei Minos
- a das Ciclades, um grupo de pequenas ilhas dispersas
- a Heládica que se desenvolveu no continente grego
cada um destas civilizações foi dividida em 3 fases: arcaica, média e final que
correspondem de uma maneira geral às 3 monarquias egípcias
os achados mais importantes reportam-se à última parte da fase média e a toda a final
cerca de 2.000 aC desenvolveu-se em Creta um sistema de escrita sendo a sua forma
tardia conhecida por Linear B em uso 600 anos mais tarde em Creta e na Grécia – é um
grego primitivo diferente das inscrições minóicas anteriores ao século XV aC
os textos de Linear B são essencialmente inventários de palácios e documentos
administrativos que pouco revelam destas civilizações
os elementos destas civilizações não são apenas uma etapa entre a arte egípcia e a arte
grega mas possuem elementos originais e únicos
4.1 A arte cicládica
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do povo que habitou as ilhas Cíclades entre 2.600 e 1.100 aC sobraram apenas os seus
simples túmulos em pedra e os seus espólios
apareceram inúmeros ídolos de mármore semelhantes: representam uma mulher nua de
pé e com os braços cruzados com as qualidades abstractas e angulosas da arte
primitiva: o corpo aplanado e cuneiforme, o forte pescoço em forma de coluna e o rosto
oval cujos traços se limitam a um longo nariz aquilino
estas obras possuem uma elegância e sofisticação apesar da sua simplicidade pelas
curvas que sugerem os contornos e as concavidades dos joelhos e do ventre
4.2 A arte minóica
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a civilização cretense é a mais rica e a mais estranha do mundo Egeu
o que a distingue é a sua falta de continuidade entre épocas – as obras aparecem e
desaparecem tão repentinamente que esses movimentos só podem ser explicados por
forças externas que exerceram violentas mudanças – no entanto, o carácter alegre e
jocoso desta arte não faz adivinhar estas convulsões
4.2.1 A arquitectura
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a primeira das mudanças bruscas aconteceu em 2.000 aC – até lá, durante o período
minóico arcaico os cretenses pouco tinham evoluído para além da aldeia neolítica
foi criado nesse momento um sistema próprio de escrita e uma civilização representada
por impressionantes palácios em Cnossos, Festos e Malia, mas todos foram destruídos
em cerca de 1.700 aC
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cem anos mais tarde outros edifícios surgiram tendo sido destruídos em 1.500 aC e os
vestígios desses palácios chegaram até nós especialmente o famoso Palácio de Minos
que cobria uma vasta área e que ficou conhecido como o Labirinto do Minotauro
o aspecto exterior dos palácios era completamente diferente dos edifícios assírios e
persas já que não revelam qualquer preocupação monumental com tectos baixos e
poucos ornamentos embora com um aspecto aberto e arejado
os construtores destes palácios não eram guerreiros já que não possuem fortificações e
os temas militares estão praticamente ausentes
os numerosos armazéns, oficinas e escritórios indicam que o palácio era um grande
centro administrativo e comercial e com os complexos portos somos levados a concluir
que se trataria de uma aristocracia mercantil
4.2.2 A escultura
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a vida religiosa destas comunidades ainda é mais fácil de definir já que as divindades
eram cultuadas em lugares sacros como as grutas ou bosques
a divindade principal era feminina aparentada com as deusas da fertilidade e
maternidade
não surgiram estátuas de culto de grande porte mas duas estatuetas de terracota
parecem representar a divindade: uma delas tem 3 serpentes a envolver-lhe os braços, o
tronco e o toucado
só o estilo da estatueta faz admitir uma possível fonte estrangeira com a sua forma
acentuadamente cónica, os olhos enormes e as espessas sobrancelhas sugerem um
parentesco com as esculturas da arte mesopotâmica
4.2.3 A pintura, a cerâmica e os baixos relevos
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na época dos palácios antigos (2.000 a 1.700 aC), Creta desenvolveu um tipo de
cerâmica célebre pela sua perfeição técnica e pelos motivos decorativos em espiral
nos novos palácios surgiram pinturas murais naturalistas que apareceram sem
precedentes e dos quais sobram apenas alguns restos
muitas pinturas representam cenas da natureza, aves e outros animais com uma
vegetação luxuriante ou seres marinhos
as formas planas destacadas em silhueta recordam a pintura do Egipto assim como a
aguda observação das plantas e animais
em lugar da paixão pelo hieratismo egípcia, nas pinturas minóicas está patente o
movimento rítmico e ondulatório e as figuras parecem flutuar num mundo sem gravidade
a vida marinha era um dos temas favoritos e a sua influência sente-se em todas as obras
o Fresco do Toureiro é um dos mais famosos retratando um jogo ritual em que o atleta
dá um salto mortal por cima do touro
na cerâmica pintada os antigos temas geométricos deram lugar a um repertório baseado
na vida animal muito perto do estilo dos frescos
Vaso dos Ceifeiros – procissão de homens musculosos de tronco nú com instrumentos e
o relevo é único pelo esforço muscular, pela irrequieta e ruidosa alegria e pela fina
observação
4.3 A arte micénica
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ao longo da costa sudoeste da Grécia no período heládico final (1.600 a 1.100 aC) surgiu
um conjunto de núcleos populacionais semelhantes aos cretenses
os habitantes eram os Micénios, nome derivado do centro mais importante em Micenas
mas não derivaram de qualquer influência minóica mas sim das tribos gregas que
entraram na região em 2.000 aC
durante mais de 4 séculos os micénicos levaram uma existência simples e pastoril o que
ficou demonstrado pelos seus simples túmulos
em 1.600 aC surgiram fundos poços sepulcrais e mais tarde câmaras cónicas
conhecidos como túmulos de cortiço que atingiram o seu apogeu em 1.300 aC
o Tesouro de Atreu é uma das mais impressionantes pela sua complexa estrutura de
fiadas concêntricas de blocos talhados de pedra embora tenha sido encontrada já sem o
seu espólio
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outros túmulos foram descobertos intactos e junto dos cadáveres reais forma
encontradas máscaras de ouro o prata para além de outros vasos e peças de joalharia
com grande valor expressivos
Taças de Vaphio – duas taças de ouro produzidas em cerca de 1.500 aC com relevos
exteriores que lembravam a cerâmica cretense em especial no vaso dos ceifeiros
n século XVI aC surge assim um quadro singular: a influência egípcia das tradições
funerárias vem juntar-se a um forte influxo artístico de Creta num período de riqueza
material
parece existir uma ligação entre as 3 regiões mas continuamos apenas a especular sobre
elas
as relações entre Micenas e Creta persistiram por muito tempo e o poder de Micenas
cresceu à medida que declinava o dos cretenses já que os grandes monumentos
micénicos foram construídos entre 1.400 e 1.200 aC
com a excepção da forma das colunas e de alguns motivos decorativos, a arquitectura de
Micenas pouco deve à tradição minóica
os palácios do continente eram erigidos sobre colinas e rodeados de muralhas
defensivas sobrevivendo ainda o Portal dos Leões – duas feras ladeando uma coluna
cretense simbólica com a majestade severa e heráldica dos rhytons em forma de cabeça
de leão – a função de guardioes da porta, os seus corpos tensos e musculados e a
simetria do traçado remetem-nos para o Próximo Oriente
o centro do palácio em Micenas era a sala de audiências ou megaron, uma sala grande
rectangular com uma lareira ao centro e quatro colunas à sua volta que suportavam o
tecto
não há qualquer vestígio de arquitectura religiosa em Micenas devendo os seus ritos
possuir elementos micénicos, gregos e asiáticos
sobreviveram algumas peças como a pequena escultura de marfim que representa duas
mulheres e uma criança e embora não exista nenhum exemplo anterior que possa ter
servido de influência, obras posteriores cristãs utilizam este tipo de enquadramento
esta estatueta tem uma maior proximidade e uma visão íntima e familiar dos seres
divinos que se afasta da deusa minóica das serpentes
5 – A arte grega
a arte grega é mais próxima da nossa realidade o que náo significa que seja mais fácil
estudá-la
- a história da arte grega é feita com 3 tipos de fontes:
- os próprios monumentos que sobreviveram ao passar dos tempos mas que podem
ser insuficientes para entender as tendências
- as várias cópias feitas na época romana mas cuja fidelidade ao modelo é discutível
podendo não representar perfeitamente os originais
- fontes literárias – os gregos foram os primeiros a redigir extensos textos sobre
artistas que foram mais tarde copiados pelos romanos e dessa forma preservados
- as tribos fe fala helénica penetraram na península pelo norte em cerca de 1.100 aC
dominando a população e expandido-se depois pelas ilhas do mar Egeu
- não sabemos muito sobre essas tribos, mas apenas que existiram dois grupos
importantes:
- Dórios que se estabeleceram essencialmente no continente
- Jónios disseminados pelas ilhas e pela costa da Ásia Menor em contacto com as
civilizações do Próximo Oriente
- alguns séculos mais tarde os gregos também se encaminharam para o ocidente onde
fundaram cidades importantes na Sicília e na Itália do Sul
- apesar de uma forte proximidade cultural reforçada pela língua comum, os gregos
sempre se mantiveram separados em muitas cidades-estado independentes, sendo essa
situação devido às raízes tribais, às heranças micénicas ou então à topografia da Grécia
com vastas cadeias montanhosas, vales apertados e costas recortadas
- as rivalidades entre as várias cidades-estado levaram a Grécia a pagar um alto preço
dado que a região dificilmente conseguiu recuperar da Guerra do Peloponeso entre
Atenas e Esparta
5.1.1 O Estilo Geométrico
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o período formativo do território grego durou de 1.100 a 700 aC e mas dos primeiros 200
anos há poucas informações
apenas a partir de 776 aC, ano da instituição dos Jogos Olímpicos que ficou marcado
como o ponto de partida da cronologia grega
é deste período o mais antigo estilo caracteristicamente grego, o estilo geométrico
conhecido apenas pela cerâmica pintada e pela pequena escultura
de início a decoração cerâmica era de traçado abstracto mas por volta do ano 800 aC
começam a aparecer figuras humanas e animais inseridas no traçado geométrico
o vaso de Dyplon pertende a um conjunto de grandes vasos que serviam de urnas
funerárias – no corpo do vaso vemos o defunto em câmara ardente ladeado de
carpideiras e a procissão do enterro com guerreiros de pé e no carro
nestas cenas é de realçar a ausência de qualquer alusão a uma via além-túmulo já que a
intenção das obras é simplesmente comemorativa – apesar disto os gregos cuidavam
das sepulturas e nelas faziam libações por piedosa lembrança
o estilo geométrico não foi um prolongamento da tradição micénica mas sim um ponto de
partida para um estilo completamente novo
apesar do repertório limitado, o artista conseguiu alguns efeitos interessantes como a
relação entre as imagens e o formato do vaso o que faz das representações meros
ornamentos
na cena o naufrágio de outro vaso deste período há um enorme contraste com a vida
marinha minóica pois os elementos pouco mais parecem que ornamentos e apenas o
barco virado ao contrário e o corpo do homem indicam a cena da tragédia marítima
a cerâmica geométrica tem aparecido não apenas na Grécia mas também na Itália e no
próximo oriente, uma clara indicação da sua exportação e as inscrições presentes nas
obras utilizando o alfabeto fenício dizem-nos que já era regularmente utilizado neste
período
no século VIII aC foram produzidas as obras-primas da literatura grega, a Ilíada e a
Odisseia o que nos leva a pensar que esta sociedade seria mais sofisticada do que estas
obras nos fazem pensar e que não nos surpreende a rápida evolução que sofreram com
a criação de um novo estilo, o orientalizante
5.1.2 O estilo orientalizante
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o novo estilo reflecte fortes influências do Egipto e do Próximo Oriente avivadas pelo forte
comércio com estas regiões
entre 725 e 650 aC a arte grega absorve ideias e temas orientais como está marcado na
ânfora de Eleusis
a ornamentação geométrica não desapareceu totalmente mas foi relegada para o pé, as
asas e o rebordo aparecendo também novos elementos decorativos como as espirais, as
bandas entrelaçadas, as palmetas e as rosetas
as superfícies maiores são agora dedicadas à narrativa baseada em lendas e mitos
gregos que representam a mistura de divindades e heróis dóricos com os deuses do
Olimpo e as sagas de Homero
os gregos viam os acontecimentos como o destinados e não como acidentes históricos
acreditando nos heróis míticos e nas suas tarefas o que explicava a atracção que
sentiam pelos leões e monstros orientais sempre presentes nessa mitologia
nestas pinturas o interesse pela representação das acções está patente nos gestos e
expressões das figuras que servem mais do que simples propósitos decorativos
a ânfora de Eleusis faz parte o grupo proto-ático percursor da grande actividade de
pintura de vasos que se iria desenvolver na região Ática à volta de Atenas
existia ainda uma segunda família de vasilhas orientalizantes chamada proto-coríntia que
se caracterizavam pelos vivos temas animalísticos como o frasco de perfume em forma
de coruja de um realismos e naturalidade espantosos
5.2 A pintura cerâmica arcaica
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a fase orientalizante foi um período de experimentação e transição que deu origem ao
estilo arcaico que imperou entre os finais do século VII até 480 aC, altura das vitórias
gregas sobre os Persas
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neste período assistimos ao desenvolvimento das técnicas artísticas gregas na intura de
vasos e na arquitectura monumental e embora não possua equilíbrio e sentido da
perfeição do estilo clássico, possuí já uma grande frescura e inovação
a arquitectura e a escultura deviam existir antes deste período mas como seriam de
madeira pouco sobrou – o período orientalizante introduziu as preocupações com a
durabilidade que deram origem à utilização de materiais mais duradouros o que levou a
uma mudança de estilo, o que não aconteceu com a pintura de vasos que demonstrou
bastante continuidade
as peças arcaicas parecem ter sido obras individuais longe de padrões e séries mas
dados os restos que chegaram até nós é impossível comprovar essa teoria
as cenas de mitologia e da vida quotidiana representadas têm uma grande variedade e a
qualidade artística de alguns exemplares é muito elevada
a apreciação dos gregos por este tipo de arte é demonstrada pela decoração de um vaso
na qual Atena coloca coroas de louro num pintor que teria ganho um concurso
a partir de meados do século VI os melhores vasos ostentava a assinatura do artista que
os tinha elaborado indício do orgulho dos artistas pelas suas obras
sobreviveram séries de obras assinadas pelo mesmo artista o que nos permitiu detectar
a sua evolução
sabemos que existiu também pintura mural mas não sobraram quaisquer vestígios,
pensando-se que seria semelhante à pintura em vasos
com a descoberta do modelado e da profundidade espacial a pintura mural evoluiu mas a
pintura de vasos estagnou por o suporte não lhe permitir esse tipo de evolução
no estilo orientalizante, mas figuras são representadas como silhuetas maciças com
simples contornos – no período arcaico esta simplificação foi resolvida com a adopção do
estilo de figuras negras traçadas sobre o barro avermelhado – os pormenores internos
eram riscados com um estilete sobre a tinta lisa podendo ainda aplicar-se outras cores
como o branco e roxo para realçar certas zonas
um bom exemplo do novo tipo de pintura é o kylix pintado por Exéquias com a imagem
de Dioniso reclinado no seu barco que apesar da sua evolução mantém ainda algum
espírito da olaria geométrica
o vaso de Psíax que representa Hércules matando o leão está mais próximo do estilo
orientalizante mostrando o horror e violência da cena – as linhas gravadas e as cores
subsidiárias foram usadas com a máxima sobriedade para não interromper a extensa
faixa negra mas as figuras possuem uma extraordinária tridimensionalidade
a técnica das figuras negras tinha no entanto algumas dificuldades ao desenho dos
escorços o que levou ao aparecimento de uma técnica nova em cerca de 500 aC, que
era basicamente o inverso: pintava o fundo de negro deixando à vista a superfície
avermelhada do barro reservada para as figuras
as vantagens desta nova técnica eram notórias já que as figuras eram desenhadas a
pincel em vez de gravadas o que libertava o artista da sujeição à perspectiva lateral –
permitia então ousados escorços, sobreposição de membros, minuciosos pormenores no
trajo e expressões faciais
no Eos e Memnon de Douris a deusa da aurora segura o corpo do filho morto e sem
armadura – esta comovedora expressão de dor lembra a Pietà cristã sendo também
notável a liberdade expressiva do desenho com linhas flexíveis e contraste vincados
entre os perfis vigorosos e dinâmicos e toques mais finos e delicados – este vaso possui
ainda uma inscrição curiosa com as assinaturas do pintor e do oleiro e uma dedicatória
5.3 A escultura arcaica
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os novos temas que distinguem o estilo orientalizante, as lutas de animais, os monstros
alados e as cenas de combate, entraram na Grécia através de de relevos de marfim e de
trabalhos de metal importados da Fenícia e Síria onde se reflectiam as influências da
Mesopotâmia e o Egipto
estes objectos encontrados em solo grego não contribuem para explicar surgimento da
escultura monumental que vai buscar muita da sua inspiração a obras egípcias
5.3.1 Kouroi e Korai
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as duas estátuas gregas mais antigas datam de cerca de 650-625 aC (a feminina) e de
cerca de 600 aC (a masculina) e têm flagrantes semelhantes com as esculturas egípcias:
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carácter maciço e cúbico das estátuas
silhueta delgada de ombros largos
punhos cerrados
a perna esquerda adiantada
a rótula acentuada
tratamento formalista do cabelo como se fosse uma cabeleira postiça
vestido cingido ao corpo e braço erguido
apesar destas semelhanças estas estátuas parecem primitivas, rígidas, simplificadas e
pouco naturais se comparadas com algumas das mais belas obras egípcias
no entanto estas estátuas têm também as suas características particulares – são as mais
antigas estátuas de vulto redondo em tamanho natural e em pedra, realizadas de pé e
sem qualquer apoio ao contrário das figuras egípcias nunca totalmente libertas do bloco
que as constitui
a libertação das estátuas gregas dotou-as de um novo espírito revelando tensão e
espírito interior
as estátuas femininas são designadas de Kore (ou no plural koroi) e estão sempre
totalmente vestidas e as masculinas são Kouros (ou no plural Kouroi) e estão nuas
estas estátuas foram produzidas em grandes quantidades no período arcaico existindo
muito poucas diferenças entre elas sendo difícil identificar se se trata de homens, deuses
ou heróis
existiu no entanto evolução neste tipo de esculturas como se pode observar na estátua
funerária de Kroisos – os planos abstractos e os contornos pontiagudos dão origem a
curvas pronunciadas revelando uma preocupação pelos volumes e uma nova
elasticidade
outras estátuas do século VI aC maram esta transição:
- Moscophoro ou o Homem com o Vitelo com as formas vigorosas e compactas
dissimuladas e reveladas pela capa que o envolve, mas mais importante, as suas
feições suavizam-se e os seus lábios abrem-se num sorriso que irá caracterizar
todas as esculturas gregas até 500 aC
- cabeça de Rampin – nota-se uma evolução na representação do cabelo e barba
parecendo um rico bordado de pérolas e salientando os planos do rosto
os estilos de Korai são um pouco mais variados e têm que vencer um desafio diferente: a
sobreposição das roupas sobre o corpo reflectindo no entanto a evolução dos trajes
- Hera de Samos – parece uma coluna que ganhou vida humana – em vez da cintura
estrangulada encontramos um contínuo fluir de linhas a unir o tronco e as roupagens
envolvem o corpo e revelam as suas formas em vez de o esconderem
- Kore com Peplos Dórico – aproxima-se mais de um bloco com a sua cintura muito
acentuada mas a simplicidade do vestuário é nova e sofisticada e a posição dos
braços com a mão esquerda estendida aparece agora com uma nova dimensão – os
cabelos são também tratados de uma forma mais orgânica que caem sobre os
ombros em madeixas suaves – o seu rosto é cheio e o seu sorriso mais natural e
doce do que os das suas acntecessoras
- Kore de Chios – esta representação aproxima-se da Hera de Samos mas tem uma
maior grandiosidade aparecendo um jogo complexo de pregas e dobras nas suas
roupagens complexificando a obra – a cor desta obra é também de destaque
contribuindo para a impressão geral de luxo e excesso
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5.3.2 A escultura arquitectural
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quando os gregos começaram a erigir os seus edifícios em pedra herdaram também a
tradição da escultura monumental egípcia, assíria, babilónica e persa dos baixos relevos
de talhe pouco saliente que não interrompiam a continuidade da superfície mural
no próximo oriente antigo existia ainda outro tipo de escultura monumental: os monstros
guardiões que emolduravam as portas dos palácios e fortalezas como na porta dos
Leões em Micenas – há no entanto um aspecto particular dessas obras: sempre foram
talhadas em pedras mais leves e delgadas do que os blocos pesados que constituíam a
muralha
as esculturas do velho templo arcaico de Artemisa na ilha de Corfu erigido em cerca de
600 aC são descendentes dos leões de Micenas – a escultura está confinada a uma zona
emoldurada por elementos estruturais mas que se destina apenas a proteger o
travejamento contra a chuva, através de finas placas de pedra onde foram colocadas as
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imagens em alto-relevo embora os corpos estejam fortemente recortados para se
destacarem do fundo – as imagens representam uma Górgona e dois leões cuja função é
proteger o templo e a deusa das forças do mal e mais algumas pequenas figuras
narrativas – esta composição revela duas preocupações: a narrativa e a heráldica
para além do frontão não havia muitos locais para a colocação de estátuas nos templos
surgindo por vezes nos ângulos do telhado em terracota
nos templos dóricos o friso era constituído por tríglifos e metópas, placas rectuangulares
com relevos
nos templo jónicos os triglifos foram suprimidos e o friso tornou-se uma banda contínua
de decoração pintada ou esculpida
o tesouro de Siphos em Delfos foi reconstruído recentemente a partir dos vestígios que
chegaram até nós – o frontão possui uma decoração que representa a batalha dos
deuses contra os gigantes – o escultor soube utilizar melhor o espaço surgindo as
personagens com mais profundidade no primeiro plano e no segundo e terceiro vão-se
esbatendo na superfície formando um espaço limitao e concentrado onde se nota bem a
relação dramática entre as personagens
no templo de Égina os altos-relevos foram abandonados nos tímpanos e foram
esculpidas estátuas justapostas em posições dramáticas que se integravam no espaço
triangular com Atena no centro e os combatentes nos seus lados em posições com altura
cada vez menor
o traçado é equilibrado e ordenado por estas figuras com uma expressão extraordinária
como o guerreiro moribundo ou o Hércules ajoelhado que demonstram bem a sua
nobreza de espírito na posição de quem morre e de quem mata
5.4 A arquitectura
5.4.1 As ordens e as plantas
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a arquitectura grega caracteriza-se pela existência de 3 ordens:
- a dórica é a ordem fundamental criada no território continental
- a jónica desenvolvida nas ilhas do Egeu e na costa asiática
- a coríntia que é uma simples variação da jónica
no traçado dos templos dóricos encontramos 3 partes principais:
- o envasamento ou plataforma escalonada
- as colunas compostas pelo fuste e pelo capitel formado pelo coxim, pelo éqeuino e
pelo ábaco
- o entablamento que compreende a arquitrave, o friso, cm os tríglifos e as metopas e
a cornija
todo o edifício é construído em blocos de pedra justapostos sem argamassa mas
colocados com extrema precisão e ligados por cavilhas de metal
as colunas eram formadas por segmentos designados de tambores e o telhado era
constituído por uma armação de madeira e por uma cobertura com telhas de barro
as plantas embora possam variar com as dimensões e preferências regionais são muito
parecidas:
- o núcleo é a cella ou naos local onde está a estátua da divindade e o pórtico com
duas colunas ladeadas por pilastras
- por vezes acrescenta-se um segundo pórtico por detrás da cella para dar mais
simetria ao conjunto
- este espaço é envolvido por uma colunata chamada peristilo e o edifício diz-se
períptero
5.4.2 Os templos dóricos
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os primeiros construtores de edifícios na Grécia inspiraram-se em 3 estilos:
- Micenas – o corpo central do templo deriva claramente do megaron, a decoração dos
frontões deriva dos altos relevos como o da porta dos leões e o capitel saliente em
forma de almofadão está muito próximo da coluna dórica
- Egipto – as colunas dóricas na sua robustez fazem lembrar as colunas de Sacará
embebidas nas paredes mas há outras influências desta região: o emprego da pedra
como material de construção, as técnicas de cantaria, a ornamentação arquitectural
e os conhecimentos de geometria – a estrutura do templo em si é o oposto do
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egipcio, em vez de ser feito par ser visto por dentro, estes templos são feitos para ser
apreciados exteriormente
- influência da arquitectura grega pré-arcaica de madeira – alguns elementos
arquitectónicos poderiam ter derivado de uma função específica como os triglifos que
serviriam para esconder as terminações do travejamento do tecto ou como as
caneluras das colunas que lembrariam os troncos de madeira - esses elementos
surgiram por se tratarem de edifícios religiosos em que todos os detalhes tinham um
significado
o templo dórico mais bem conservado encontra-se em Paestum na Itália Meridional, é
chamado de a Basílica e encontra-se em frente ao templo de Poseidon cem anos mais
recente – a basílica parece baixa e achaparrada enquanto o templo de Poseidon se
apresenta alto e compacto – este efeito surge pela diferença nas colunas mais afuniladas
e com capitéis mais largos no segundo caso
o templo de Poseidon é um dos santuários dóricos mais bem conservados começado em
475 aC reflectindo a planta do templo de Égina – os suportes interiores do tecto exigiram
duas alçadas de colunas uma das quais mais pequena em cima para aguentarem uma
altura cada vez maior da cella
em 480 aC os persas destruiriam os templos e as estátuas da Acrópole de Atenas e a
sua reconstrução foi um dos mais ambiciosos planos arquitectónicos da antiguidade
o maior dos templos construídos foi o Parthenon consagrado a Atena a padroeira da
cidade – de mármore branco e reluzente ocupava o ponto mais alto da Acrópole e fi
desenhado pelos arquitecto Ictinos e Calícrates
apesar de ser muito maior do que o templo de Poseidon tem um aspecto muito mais leve
e dá uma impressão de harmonia e equilíbrio dentro dos limites austeros da ordem que é
dado por o entablamento ter descido em relação à largura e altura das colunas que são
mais finas e com a entasis menos pronunciada, os capitéis diminuíram de tamanho, a
cornija ficou menos saliente e o espaço entre colunas foi alargado
o estilóbato e o entablamento não são rectos mas sim curvos e as colunas inclinam-se
para dentro e o entrecolúnio diminui nos ângulos da colunata
quando o Parthenon ficou concluído Péricles encomendou outra obra: a entrada da
Acrópole ou Propileus pelo arquitecto Mnesicles – o mais admirável desta obra foi a
adaptação das normas dóricas a um terreno irregular e abrupto; no pórtico ocidental
existiam duas alas e a do norte possuía a primeira galeria de pintura da história – ao
longo do caminho central há duas filas de colunas que parecem mais jónicas que dóricas
e que representam a evolução para esse estilo.
5.4.3 Os templos jónicos
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Atenas apenas sentiu a atracção do estilo arquitectónico das ilhas do mar Egeu a partir
de meados do século V aC por isso os monumentos mais belos desta ordem situam-se
na Acrópole
o repertório de formas foi bastante fluido registando influências do Próximo Oriente
o seu elemento principal é a coluna: o fuste assenta numa base emoldurada de perfil
alternadamente convexo e côncavo, é mais delgado, tem menor entasis e no capitel há
um elemento novo, as volutas que se projectam para fora dos dois lados como um rolo
duplo – é mais delicada e esbelta lembrando uma planta a crescer
na época pré-clássica os únicos edifícios jónicos na Grécia continental eram os tesouros
construídos em Delfos o que levou a que a ordem jónica ofsse utilizada apenas para
templos de pequena dimensão como o de Atena Nike
mais vasto e complexo é o Erectheion erigido de 421 a 405 aC talvez por Mnesicles e
tinha várias funções religiosas – possui 2 pórtico no Norte e no Sul, este último virado
para o Parthenon é o célebre Pórtico ou Varandim das Cariátides cujo tlhado assenta em
6 colunas com a forma de mulheres – a nível de decoração escultórica, ea limitava-se ao
friso tendo o tímpano sido deixado vazio
a importância dada à parte ornamental parece ter sido característica do final do século V
aC quando foi inventado o capitel coríntio, uma versão mais decorativa do jónico em que
o capitel tem a forma de sino invertido e está coberto de rebentos e folhas de acanto –
utilizado inicialmente para a decoração de interiores, só um século mais tarde aparecem
a decorar o exterior dos edifícios como no Monumento a Lisícrates de 334 aC, uma
pequena construção cilindrica assente num ato envasamento e cm as colunas
emebebidas nas paredes para tornar o monumento mais compacto
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desde o fim da Guerra do Peloponeso até à conquista romana, a arquitectura grega
mantém-se estacionário com a excepção das cidades da Ásia Menor que desenvolveram
obras como o Mausoléu de Halicarnasso ou o Altar de Zeus em Pergamo
os planos urbanísticos ganham no entanto grande importância com o desenvolvimento
dos pórticos municipais (stoa) que delimitavam as praças de mercado, centro da vida
cívida e comercial das cidades gregas
também as casas de habitação se tornam maiores e mais sumptuosas
o repertório formal só ganhou com um novo tipo de edifício, o teatro ao ar livre deixou de
ser representado em encostas onde eram colocados bancos de pedra – a vertente foi
escava em hemiciclo e dotadas de filas concêntricas de bancadas e coxias a intervalos
regulares – no centro estava a orquestra onde decorria a representação e por detrás dela
uma sala que servia de pano de fundo e suporte do cenário
5.4.4 As limitações
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o imobilismo arquitectónico grego parece particularmente estranho tendo em conta que a
vida intelectual e a escultura continuaram a produzir obras de grande qualidade
as potencialidades do templo dórico encontravam-se esgotadas o que levava a que os
arquitectos perdem-se cada vez mais esforços com decorações dispendiosas
a arquitectura não evoluiu porque o modelo era excessivamente rígido assim como os
materiais de construção – a flexibilidade do tijolo e do cimento seriam aplicados muito
mais tarde
5.5 A escultura clássica
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Efebo de Kritios – é a primeira estátua que está verdadeiramente de pé pois encontra-se
numa posição que sugere movimento com o peso do corpo repartido pelas duas pernas
este efeito foi conseguido através de uma assimetria claculada: o joelho esquerdo está
mais alto que o direito, a anca direita projecta-se para baixo e para dentro enquanto a
esquerda parece projectada para cima e para fora
a estátua está de pé numa pose descontraída de equilibrada assimetria – contrapposto –
a perna onde cai o maior peso do corpo designa-se perna apoiada e a outra é a perna
livre
o sorriso arcaico desapareceu nesta obra e foi substituído por uma expressão séria e
pensativa característica da primeira fase da escultura clássica conhecido por estilo
severo
na época de Pericles o novo estilo do contrapposto atinge o seu apogeu numa estátua
que foi considerada o novo canon: o Doríforo de Policleto que só é conhecida pelas
cópias romanas
outra obra deste período inicial é o Auriga de Delfos, uma estátua de bronze que deverá
ser um ex-voto erigido para agradecer a vitória numa corrida de carros – apesar da
simplicidade do traje, as pregas são suaves e flexíveis – o rosto tem a característica
expressão pensativa mas os olhos coloridos e os lábio entreabertos dão uma nova vida à
estátua
o maior conjunto escultórico do estilo severo encontra-se nos dois tímpanos do templo de
Zeus em Olímpia esculpidos em 460 aC - vitória dos Lápidas sobre os centauros
observada por Apolo – as esculturas exprimem uma violência que agora não se limita
aos gestos mas que surge nas emoções estampadas nos rostos
todas as estátuas até esta fase tinham sido construídas unicamente para serem vistas de
frente e num espaço limitado – com o contrapposto surge também o movimento na
estatuária monumental
o melhor exemplo desta técnica é a estátua de bronze de Poseidon ou Zeus numa
posição de lançador de dardo – o que impressiona na estátua não é o movimento mas a
expressão do poder do deus que representa
alguns anos depois Míron criou a sua famosa estátua de bronze, o Discóbolo, do qual
apenas sobreviveram cópias em mármore romanas e que condensa todo um ciclo de
movimentos numa única posição sem a tornar rígida, o que é difícil devido à violenta
torsão do tronco para colocar o movimento dos braços e das pernas no mesmo plano
o desenvolvimento do movimento nas estátuas de vulto redondo veio libertar também as
esculturas monumentais como aconteceu com a Nióbida Moribunda , o mais antigo nú
feminino, uma estátua tão tridimensional que poderia ter sido construída não para um
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tímpano mas para ser apresentada sozinha – no rosto da estátua vemos uma exibição de
dor tã eloquente como a transmitida por todo o corpo – a Nióbida transmite pathos
sofrimento que é suportado com dignidade e estoicismo
os restos da decoração do Parthenon formam o mais belo conjunto de escultura clássica
– os tímpanos possuem esculturas de divindades reclinadas assistindo ao nascimento de
Atena – amplitude e naturalidade do movimento destas estátuas
o friso do Parthenon é uma faixa com 160 metros de comprimento que mostra a
procissão das Grandes Panateneias, uma festa em honra de Atena – a sua pricipal
qualidade é a graça rítmica do traçado particularmente impressionante no movimento dos
cavaleiros
a mais famosa estátua do Parthenon era a estátua de Atena atribuída a Fídias tenso
apenas sobrevivido algumas cópias de reduzidas dimensões – a admiração que causou
deve ter sido em parte pela suas dimensões e pelos materiais de que era feita
a expressão estilo de Fídias que serve para descrever o estilo das esculturas do
Parthenon é uma designação genérica já que um trabalho da dimensão do Parthenon
exigiu certamente muitos artistas cada um com o seu cunho próprio
apesar disto o estilo de Fídias dominou a escultura grega até ao final do século V embora
as obras produzidas tivessem sido muito menos
uma das últimas esculturas monumentais foi o parapeito do templo de Atena Nike que
representava uma procissão mas de vitórias aladas – as pregas das roupagens são
impressionantes aderindo ao corpo das vitórias como se estivessem molhadas
outra obra fidiana é a Estela Funerária de Hegeso que representa uma senhora com a
sua criada que lhe estende um colar para o qual olha com melancolia – a delicadeza do
trabalho pode ver-se nos detalhes que estão num plano mais afastado que se diluem no
fundo que deixa de ter uma aparência sólida para ganhar um pouco da transparência do
espaço vazio
5.6 A pintura clássica
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não sobreviveram pinturas murais nem painéis que exemplifiquem a criação de imagens
com profundidade
o entanto sobreviveram pequenos vasos para azeite usados para oferendas, os lekythoi
que possuíam um revestimento branco onde os melhores artistas como o Pintor de
Aquiles podiam dar largas às novas técnicas fazendo emergir as figuras
o tema da estela de Hegeso aparece num destes vasos com uma qulidade magistral –
com poucos traços seguros, vivos e fluídos o pintor criou uma figura a 3 dimensões e
revela o corpo da mulher sob o vestido
a partir de meados do século V aC a pintura monumental transformou a pintura de vasos
numa arte satélite que procurava reproduzir em pequenas dimensões os mesmos temas
mas o resultado foi na maioria dos casos uma acumulação de figuras mal definidas
no vaso do Pintor da Aurora de cerca de 400 aC mostra Tétis prestes a ser raptada por
Peleus – para sugerir o quadro espacial da imagem, colocou 3 das figuras numa encosta
rochosa e uma quarta suspensa no ar – devido ao fundo negro o efeito é no entanto de
silhueta não dado a noção de profundidade devido à ausência de sombreados e
modelados
um século mais tarde a pintura de vasos desaparecia totalmente
5.7 A escultura do século IV aC
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a terceira fase da arte grega não tem qualquer designação e durou de 400 aC até ao
século I aC sendo usualmente dividido no Clássico Final ou Tardio até Alexandre Magno
e a partir daí Helenístico
a história política nem sempre seguiu a história da arte e neste período não existiu uma
quebra decisiva na tradição no final do século IV aC
o monumento mais impressionante do período foi o túmulo de Mausolo em Halicarnasso
na Ásia Menor – o edifício foi completamente destruído mas persistem as descrições
pormenorizadas e alguns fragmentos
numa base rectangular elevada assentava um pórtico de colunas jónicas com 12 metros
de altura – por cima erguia-se uma pirâmide rematada por um carro comas estátuas dos
dois cônjuges - as esculturas decoravam um friso com o dobro do friso do Parthenon e
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também se encontravam numa fila de leões sentinelas e um número desconhecido de
estátuas
as dimensões do sepulcro derivavam do antigo Egipto e implicam a exaltação
sobre-humana do soberano e para marcar o seu parentesco com os deuses
segundo as fontes antigas cada um dos quatro lados do monumento foi esculpido por um
artista diferente sendo que a fachada principal foi esculpida por Escopas – para além da
tradição do Parthenon manifesta-se uma violência física e emocional na tensão dos
movimentos e nas expressões faciais – a fluidez, continuidade e harmonia foram
sacrificados para que cada imagem tenha mais espaço para expressar as suas
actividades
na estátua de Mausolo o cariz pré-helenístico é ainda mais marcado por ser um retrato
individual que reflecte a personalidade do soberano e por as suas formas maciças serem
ainda acentuadas pelos pragueados de arestas vivas e de firme textura que parecem
encerrar o corpo
estátua de Deméter do Templo de Cnido – obra posterior mas cujos panejamentos
parecem também transmitir um volume próprio, os olhos muito fundos lembram Escopas
mas o modelado suave da cabeça apontam para Praxíteles
a estátua mais célebre de Praxíteles foi Afrodito também para um templo em Cnido e
alcançou tal fama que é citada na literatura antiga como um sinónimo de perfeição
outro exemplo deste tipo de beleza é a estátua de Hermes com Dioniso menino
característico pelas suas formas esbeltas, pela sinuosa curva do torso e pela atitude
serenamente descontraída
idênticas qualidades se encontram em muitas cópias romanas como no Apolo Belvedere
considerada pelos historiadores no século XVIII e XIX como perfeito exemplo da beleza
clássica
na escultura pré-helenística há ainda outro nome importante – Lísipo – as obras antigas
louvavam-no por ter substituído o canon de Policleto por outro de menores proporções
com um corpo mais esbelto e uma cabeça mais pequena mais próximo da realidade
Apoxiomenos é a estátua mais ligada a Lísipo representando um jovem a limpar-se após
o exercício – a sua principal distinção é ter os braços estendidos para a frente criando um
novo horizonte espacial e um movimento tridimensional – o realismo está ainda patente
nos cabelos emaranhados reflectindo espontaneidade
5.8 A escultura helenística
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sabemos pouco dos primeiros anos deste novo estilo mas sobraram algumas obras
como o grupo de bronzes dedicados por Átalo I de Pérgamo à sua vitória sobre os
gauleses – os romanos reproduziram estas obras em mármore existindo algumas delas
o Gaulês Moribundo é uma das mais impressionantes pelo seu realismo ao exprimir a
agonia do gaulês perfeitamente identificado pelo seu cabelo hirsuto e pelo torques que
lhe enfeita o pescoço
a morte do inimigo é retratada com toda a veracidade e como um processo físico que se
exprime em todo o seu corpo
no Fauno Barberini encontramos mais um corpo que se exprime com naturalidade –
representa um sátiro bêbado adormecido num torpor que o coloca numa posição agitada
cerca de 180 aC o filho e sucessor de Átalo I fez erigir um grande altar numa colina para
comemorar as vitórias do seu pai – o altar ocupa o centro de um pátio rectangular
envolvido por uma colunata jónica que se eleva sobre uma base alta
o aspecto mais ousado é o friso com 120 metros de comprimento e 2 metros de altura
talhado em relevo tão alto que as figuras parecem desligadas – o seu tema é a luta entre
os gigantes e os deuses, um tema jónico tradicional que associa Átalo aos deuses
o grande monumento triunfal dos primeiros anos o século II aC é a Vitória de Samotrácia
no qual a deusa está com as asas abertas e semi-sustentada pelo vento que modela as
suas roupas estabelecendo uma interdependência entre a figura e o espaço que ela
ocupa
o grupo que representa a morte de Lacoonte e dos seus dois filhos era a obra mais
admirada deste período mas o pathos do grupo parece ser um pouco rebuscado e
retórico inspirando-se no altar de Pérgamo
os retratos continuaram a florescer n época helenística e entre os poucos originais que
chegaram até nós inclui-se um busto de bronze encontrado em Delos datada do século I
aC mas que possuí uma clara individualidade: o modelado fluido das feições um tanto
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flácidas, a boca indecisa e queixosa e os olhos tristes sob as sobrancelhas carregadas
revelam um individuo carregado de dúvidas e ansiedades com uma personalidade
humana sem heroísmo
um outro aspecto da escultura tardia grega são as estatuetas que eram produzidas em
grande número para coleccionadores e que representavam para além das figuras da
mitologia personalidades do dia a dia como mendigos, camponeses, saltimbancos,
jovens elegantes
o grotesco, o humorístico e o pitoresco representam nestas estatuetas um papel
preponderante nas quais a liberdade de concepção é patente
5.9 As moedas
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as moedas gregas são consideradas obras de arte não só pela sua antiguidade mas
também pelo seu desenvolvimento e variedade, motivados pela organização política do
território dividido em cidades-estado independentes
a procura constante de novos desenhos levou à especialização de artificies que
chegaram a assinar as suas obras
os melhores exemplos da Grécia arcaica e clássica foram cunhados pelas cidades da
periferia e não pelos estados mais poderosos
análise de seis exemplares:
- Peparethus – cunho quadrado profundamente impresso numa placa quase informe
semelhante à marca de um sinete no lacre – o deus alado com a torsão do corpo
adaptada à moldura envolvente é um exemplo perfeito da arte arcaica não faltando o
típico sorriso
- Naxos – um sileno a beber que se adapta ao ao círculo é uma figura monumental
apesar do tamanho que apresenta a articulação e a vitalidade do estilo severo
- Catânia – assinada por Herakleidas representa uma cabeça vista de frente e em
baixo-relevo típica do estilo clássico
- Alexandre foi o primeiro monarca a parecer retratado em moedas aparecendo com
símbolos que o associam aos deuses e com uma expressão inspirada característica
da emotividade helenística – imagem idealizada do conquistador e não parecida com
a fisionomia de Alexandre
- Bactriana – moeda de Antímaco tem os traços mais expressivos do soberano, um
homem de inteligência e espírito e sem desejos de glorificação pessoal – este retrato
é um percursos da cabeça encontrada em Delos que surgiu um século mais tarde
6 – A arte etrusca
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a península itálica tardou a entrar na história – a Idade do Bronze só terminou em VIII aC
quando os gregos instalavam as suas colónias no Sul
os Etruscos já tinham chegado ao território vindos da Lídia na Ásia Menor e
estabeleceram-se na região entre Florença e Roma chamada Toscana
os etruscos recorreram ao alfabeto grego para formar o seu mas a sua língua não tem
parentesco com nenhuma conhecida embora estivessem ligados à Ásia Menor e ao
Próximo oriente cultural e artisticamente
os únicos documentos escritos que deixaram são curtas inscrições funerárias e alguns
textos mais longos sobre os seus ritos religiosos mas os autores romanos referem-se à
literatura etrusca
o que conhecemos dos etruscos deve-se em grande medida aos cuidados jazigos que os
romanos não danificaram nem destruiriam quando reconstruíram as cidades etruscas
as sepulturas italianas da Idade do Bronze eram modestas com os restos mortais
encerrados num vaso ou urna e depositados numa cova com outro espólio simples:
armas para os homens e jóias ou utensílios domésticos para as mulheres
cerca de 700 aC as sepulturas etruscas começaram a imitar os interiores em pedra das
casas e cobertos com montículos cónicos de terra – as urnas funerárias por seu lado
começaram a assumir formas humanas: a tampa converte-se em cabeça e alguns
pormenores anatómicos começaram a ser modelados no bojo da urna por vezes
colocada num pedestal pra simbolizar o estatuto social
juntos destas urnas começaram a surgir artefactos cada vez mais ricos com peças de
ourivesaria que utilizavam os motivos orientalizantes então em voga na Grécia
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os séculos VII e VI aC viram os etruscos no auge do seu poder e as suas cidades
rivalizavam com as gregas, a sua esquadra dominava uma parte do Mediterrânico
protegendo as rotas comerciais
Roma foi governada por reis etruscos durante cerca de um século até à implantação da
república em 510 aC sendo responsáveis por feitos como a primeira muralha defensiva e
o primeiro templo no Capitólio
os etruscos nunca foram uma nação unificada apenas construindo confederações
instáveis de cidades-estado
durante os séculos V e IV aC as cidades-estado foram caindo uma a uma nas mãos dos
romanos e no final do século III aC todas tinham perdido a independência embora
algumas continuassem prósperas
6.1 Os túmulos e sua decoração
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foi no século VI e princípios do século V que a arte etrusca atingiu o seu apogeu – a
influência grega afastou as tendências orientalizantes mas os artistas etruscos não se
limitaram a imitar
as sepulturas e os seus interiores são cada vez mais esmerados até que os defuntos são
representados em tamanho natural e com o típico sorriso arcaico em cima dos
sarcófagos que agora apresenta a forma de um leito – as obras eram de terractoa e
pintadas de cores vivas
as efígies representam os defuntos como vivos e felizes sugerindo que o sepulcro era
uma morada para o corpo e para a alma - só isso justificava as pinturas murais que
poderiam ser inspiradas nas gregas das quais não restou qualquer vestígio
a mais surpreendente é a panorâmica marinha no Túmulo da Caça e da Pesca que
reproduz uma cena em que as figuras humanas são acessórias aos animais que circulam
livremente lembrando a pintura minóica
uma obra mais tardia representa um par de bailarinos e a energia dos seus movimentos
parece mais etrusca do que grega – a roupagem transparente da mulher deixa o corpo à
vista, uma tendência que apareceu na Grécia no final do período arcaico
durante o século V aC a concepção etrusca do Além tornou-se mais complicada e menos
festiva - diferença nota-se no sarcófago que tem um conjunto de figuras mas desta vez a
mulher está sentada no fundo do leito e tem duas asas o que indica tratar-se do demónio
da morte e o rolo que tem na mão indica o destino do falecido – o ar pensativo e
melancólico revela a influência do estilo grego clássico
em túmulos posteriores os demónios são ainda mais assustadores batendo-se por vezes
pela alma do defunto com génios bem-fazejos
6.2 Os templos e a sua decoração
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dos templos etruscos apenas ficaram os alicerces de pedra porque os edifícios eram de
madeira embora fossem mestres da alvenaria rejeitaram a pedra por motivos religiosos
o traçado tem grandes semelhanças com os templos gregos:
- alto envasamento não superior à cella com degraus apenas no lado Sul
- pórtico profundo sustentado por duas filas de quatro colunas que dá acesso à cella
- a cella é dividida em 3 compartimentos destinados a uma tríade de deuses
antecessores dos romanos Juno, Júpiter e Minerva
- a de coração plástica era cnstituída por placas de terracota revestindo a rquitrave e
os beirais do telhado
- o Templo de Apolo em Veios era um templo típico com 4 estátuas de terracota de
tamanho natural no espigão do telhado formando um conjunto narrativo semelhante
aos encontrados nos tímpanos dos templos gregos a estátua mais bem conservada é
uma de Apolo com uma força expressiva muito superior a qualquer estátua grega
- Veios era um centro escultórico etrusco como o demonstra a imagem da Loba que
amamentou Rómulo e Remo e que ainda existe e que marca ainda os visitantes com
a ferocidade do seu rosto, com o vigor latente no seu corpo e que tem a mesma
qualidade impressionante do Apolo de Veios
6.3 O retrato e o trabalho do metal
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as feições das imagens funerárias eram inteiramente impessoais e foi apenas em 300 aC
sob a influência grega que começou a aparecer o retrato na arte etrusca como o
comprova o retrato e um rapaz
a fundição e o acabamento que dão fama aos etruscos era totalmente merecido pois a
riqueza dos etruscos derivava desde cedo da exploração dos jazigos de ferro e cobre
a partir do século VI aC surgiram grandes quantidades de estatuetas de bronze, espelhos
e outros exemplos tanto para exportação como para consumo interno
a adivinhação, a consulta dos augures e a interpretação dos presságios era uma prática
corrente entre os etruscos embora viesse dá dos mesopotâmios
a prática divinatória mais usada era a análise do fígado de animais sacrificados que era
considerado um microcosmos dividido em secções que correspondiam a regiões do céu
6.4 As cidades
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segundo as fontes romanas, os etruscos foram mestres da engenharia arquitectónica, do
urbanismo e topografia
o atrium, o pátio fundamental em todas as casas romanas teve origem na Etrúria
a Toscana era demasiado acidentada para cidades geométricas mas as terras chãs ao
sul de Roma eram ideais para esse tipo de cidades: intersecção de duas vias principais, o
cardo de Norte para Sul e o decumanus (de Leste para Oeste) – esta estrutura aplicada
pelos romanos mais tarde pode ter derivado dos acampamentos militares etruscos
os etruscos ensinaram os romanos a construir fortificações, pontes, sistemas de
drenagem e aquedutos
a única obra arquitectónica etrusca que sobreviveu ao tempo foi a Porta Augusta de
Perúgia, uma entrada fortificada do século II aC encaixada entre duas torres maciças
os arcos são verdadeiros, construídos de blocos talhados em cunha ao contrário dos
falsos arcos em tijolo ou lajes de pedra horizontais
o arco autêntico e a abóbada de berço já tinham sido descobertos no Egipto mas estes
usaram estas técnicas para a construção subterrânea e nunca nos edifícios de carácter
utilitário nem nos templo
a Porta Augusta é o mais antigo exemplo em que o arco verdadeiro se encontra inserido
numa construção que utiliza as ordens gregas
7 – A arte romana
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a história romana pode ser acompanhada com um elevado grau de pormenores devido à
vasta herança literária que nos deixaram e aos abundantes monumentos em todos os
territórios ocupados pelo seu império
a definição de arte romana é mais problemática já que os romanos admiraram a cultura
grega copiando todo o tipo de estátuas desse país em prejuízo da criação de novas obras
as obras originais romanas inspiravam-se nas fontes gregas e os próprios artistas eram
na sua maioria de origem grega
como os romanos nunca cultivaram uma literatura consagrada à história da arte ao
contrário do que tinha acontecido com os gregos não temos informações como os nomes
e tendências dos principais artistas
os romanos consideravam a arte do seu tempo decadente em relação ao passado grego
a sociedade romana foi sempre muito tolerante face às tradições das populações que
conquistou só tendo imposto a lei, a ordem e o respeito pelos símbolos do poder romano
e aceitando os seus deuses e sábios com toda a facilidade
assim a arte romana apesar de ter uma marcante influência grega, também contou com
elementos inspirados por outras regiões como o Egipto ou o Próximo Oriente
a sociedade romana era complexa, aberta e simultâneamente homogénea e diversa
o desenvolvimento da arte romana fez-se com a harmonização de tendências divergentes
susceptíveis de coexistir até num mesmo monumento sem que nenhuma sobressaia e
eclipse as outras
7.1 A arquitectura
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o desenvolvimento da arquitectura romana reflecte um modo de vida público e particular
especificamente romano que os elementos etruscos e gregos nunca conseguiram
esconder
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os vínculos com outras culturas e com o passado estão mais marcadas nos templos
edificados no período republicano (510-60 aC)
7.1.1 A arquitectura religiosa
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o templo da Fortuna Virilis é o mais antigo exemplar da sua espécie bem conservado:
- construído durante os últimos anos do século II aC
- elegantes colunas jónicas e entablamento são elementos gregos
- o alto podium, o profundo pórtico e a larga cella onde estão embebidas as colunas do
peristilo são elementos etruscos
- a cella única é uma evolução face aos templos etruscos mas também uma
necessidade já que os romanos utilizavam os templos para as estátuas da divindade
mas também para guardar tesouros e troféus dos povos conquistados
este templo representa um novo tipo de edifício religioso delineado de acordo com as
exigências romanas e não apenas um arranjo fortuito de elemetnos mais antigos tendo
servido como modelo para vários exemplares em Itália e nas províncias
o templo da Sibila erigido em Tivoli já representa um tipo diferente:
- o seu antecessor foi um edifício no centro da cidade de Roma onde se mantinha a
chama sagrada da cidade e que assumiu as configurações das cabanas tradicionais
dos camponeses do Lácio
- encontramos novamente o podium elevado etrusco e um gracioso exterior de
inspiração grega
- na cella as vergas, ombreiras, soleiras e peitoris das portas e janelas são de pedra
talhada mas as paredes foram construídas com um novo material, o betão, com
nítidas vantagens: resistência, economia e flexibilidade
- para melhorar o aspecto externo deste material eram colocadas placas de calcário
ou mármore ou estuque mas hoje em dia o revestimento desapareceu da maioria dos
edifícios que não têm a imponência das obras gregas
o mais antigo santuário onde as potencialidades deste tipo de construção estão mais
patentes é o santuário da Fortuna Primigenia em Palestrina
- o santuário romano data do século I aC
- uma série de rampas e terraços conduzia a um grande pátio ladeado de pórticos
subindo até à colunata que coroa o edifício
- os arcos das aberturas enquadradas por colunas adossadas e entablamentos
desempenham um importante papel no traçado assim como os recessos que
ostentam abóbadas de berço
a imponência do santuário deve-se aos elementos arquitectónicos e dimensão mas
também à forma como foi adaptado ao local modelando-se à colina
- o santuário data da ditadura de Sila que marcou a transição para o governo de Júlio
César e dos imperadores que lhe seguiram
- Júlio César comemorou o seu novo cargo com a construção de um edifício marcante
no centro de Roma, o Fórum, ampla praça enquadrada por edifícios monumentais
perto do Templo de Vénus Genitrix, antepassada mística de Júlio César – patente a
fusão entre o culto dos deuses e a glória pessoal
- este fórum serviu de inspiração para todos os outros da época imperial ligados entre
si por um eixo comum e formando um magnífico conjunto arquitectural hoje em
ruínas
7.1.2 A arquitectura secular
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o arco e a abóbada que encontrámos no santuário de Palestrina foram utilizados noutros
projectos como nos esgotos, pontes e aquedutos
as primeiras obras deste género foram construídas para servir Roma no final do século IV
aC e pouco sobra delas – no entanto sobreviveram muitos exemplos nas províncias
como o aqueduto e Nîmes conhecido como Pont du Gard
as mesmas qualidades de solidez, ordem e permanência inspiraram um dos mais bem
conservados exemplos da arquitectura secular em Roma: o Coliseu
- acabado em 80 aC tem capacidade para 50 mil espectadores
- é uma obra-prima de engenharia pela capacidade de escoar a enorme corrente
humana que frequentava os espectáculos
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aparece ao lado da abóbada de berço a abóbada de aresta formada pela intersecção
em ângulo recto de duas abóbadas de berço com a mesma altura
o exterior reflecte a articulação interior da estrutura reforçando-a com o revestimento
de cantaria
as três ordens clássicas estão representadas de baixo par cima: no rés-do-chão a
severa ordem dórica, a jónica no primeiro andar e no segundo a coríntia
7.1.3 Os interiores
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os arcos, as abóbadas e o betão permitiram a construção de grandes espaços interiores
como nas termas, importantes centros da vida social romana
o mais surpreendente exemplo deste processo evolutivo é o Panteão:
- vasto templo redondo construído no século II dC cujo interior é impressionante
- a cella do Pantheon é um tambor cilíndrico sem decoração fechado por uma cúpula
suavemente encurvada
- realçando a entrada está um pórtico profundo semelhante ao que se encontra
noutros templos romanos
- o interior da cella é intimidante e harmonioso em contraste com o severo aspecto
exterior – um abertura ao centro dá passagem a um jorro de luz que cria um efeito
etéreo
- no interior encontramos ainda sete nichos que nos indicam que o peso da cúpula não
se distribui uniformemente pelas paredes mas que se apoia em 8 colunas
- as colunas, o revestimento parietal colorido e o pavimento permanecem semelhantes
ao que eram no tempo romano assim como os caixotões da cúpula embora o
dourado celestial tenha desaparecido
a basílica de Constantino do primeiro quartel do século IV dC também é um exemplo
interessante de interior:
- a sua configuração deriva das salas principais das termas públicas de Caracala e
Diocleciano, vastas áreas cobertas
- 3 imensas abóbadas de berço e a nave central coberta com uma abóbada de aresta
ainda mais alta permitindo largas janelas nas paredes tornando o interior da Basílica
amplamente iluminado e arejado
- as basílicas eram grandes salas para vários usos cívicos que vinham já dos tempos
gregos e sob os romanos tornaram-se obrigatórias em qualquer cidade
- as mais bem conservadas encontram-se nas províncias em especial a de Leptis
Magna no Norte de África
- os tectos eram geralmente de armação de madeira e não de alvenaria mais por
comodidade e tradição do que por necessidade técnica
- as basílicas cristãs vêm seguir o estilo de madeiramento tradicional e só 700 anos
mais tarde é que se voltam a construir abóbadas de pedra
7.1.4 A arquitectura civil
a arquitectura civil possui exemplares desde os palácios imperiais até às mais simples
residências privadas
a domus é uma casa independente para uma só família cuja planta obedece à velha
tradição itálica sendo o seu traço mais comum o atrium, uma sala central quadrada ou
oblonga iluminada por uma abertura no tecto
foram encontradas muitas residências deste tipo em Herculano e Pompeia
na Casa das Bodas de Prata o atrium é imponente com as suas 4 colunas coríntias que
suportam a abertura do atrium
ao fundo do atrium existia uma outra dependência importante, o tablinum e por detrás
dele o jardim ladeado por uma colunata, o peristilo
o edifício ficava totalmente isolado do exterior por paredes sem janelas
menos elegante e mais urbana era a insula, blocos habitacionais encontrados
essencialmente em Roma e Óstia e é a antepassada do moderno bloco de apartamentos
– grande edifício de betão e tijolo com um pátio central – lojas e casas de pasto
abriam-se para a rua no rés-do-chão e nos andares superiores encontravam-se as
habitações com varandas a partir do segundo andar
7.5 A arquitectura tardo-romana
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apesar das inovações romanas, os arquitectos conservaram-se sempre fiéis às regras
clássicas do pilar e do lintel
a partir do século dC começam a surgir cada vez mais edifícios que não respeitam tão
profundamente estas regras em especial nas províncias africanas e asiáticas
Porta do Mercado de Mileto de 160 dC – a sua fachada com elementos recuados e
outros adiantados deriva das paredes dos fundos dos teatros romanos – este ritmo
apanhou o próprio frontão que se divide em 3 partes
o pequeno templo de Vénus em Baalbek construído provavelmente no século II dC
apresenta características curvas compensadas pelos nichos côncavos e pelo
encurvamento da base e do entablamento
no peristilo do Palácio de Diocleciano em Split a arquitrave encurva-se no centro entre as
duas colunas como que reflectindo o arco da porta e possui ainda outro elemento mais
revolucionário: arcos repousando directamente sobre colunas
7.2 A escultura
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a reputação dos romanos como imitadores parece confirmada pelas grandes
quantidades de obras que são adaptações ou variantes de modelos gregos ou mesmo
egípcios
mas não há dúvida que alguns géneros de escultura tiveram sérias e importantes
funções na Roma Antiga, nomeadamente o retrato e o baixo-relevo narrativo ou histórico
7.2.1 O período republicano
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pelas fontes literárias sabemos que a glorificação dos chefes políticos e militares era
prática comum através de estátuas comemorativas
as origens desta prática têm raízes na Grécia onde os atletas vencedores eram
celebrados com estátuas em Delfos e Olímpia
infelizmente deste primeiro período sobraram muito poucos retratos e nenhum dos quais
mais antigo do que o século I aC
a mais antiga é a estátua de bronze do orador que veio da Etrúria Meridional e que tem
uma inscrição etrusca onde aparece o nome de Aule Metele, provavelmente o indivíduo
representado – a execução é etrusca mas o gesto de saudação ou de discurso é
tipicamente romano e encontramo-lo em muitas estátuas posteriores, assim como o traje
é um tipo antigo de toga
o que é mais notável nesta obra é o requite dos detalhes que vão ao pormenor de
representar os atilhos das sandálias
os bustos romanos de cerca de 75 aC também revelam este carácter de detalhe e
pormenor da topografia do rosto mas sem mostrar a psicologia do modelo talcomo
acontecia nos retratos helenísticos tardios
os detalhes do rosto do romano desconhecido revelam-nos um pater familias de terrível
autoridade e os pormenores do rosto minuciosamente observados são como dados
biográficos inconfundíveis
os bustos dos ancestrais eram preservados e exibidos nos cortejos fúnebres para
recordar a nobre estirpe do falecido e é por isso que sobreviveram até aos nossos dias
outra escultura de corpo inteiro representa um nobre romano com os bustos do pai e do
avô paterno e nela sente-se a monumentalidade e o carácter de permanência das
imagens que existiu apenas quando os bustos se fizeram de mármore dado que os
antigos eram de cera, um material facilmente perecível
7.2.2 O período imperial
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no reinado de Augusto assistimos a uma nova tendência na arte do retrato que culmina
nas estátuas do imperador, por exemplo a de Primaporta
pela primeira vez surge um retrato que pretende representar simultaneamente um
homem e um deus
apesar da estátua possuir o corpo idealizado de um herói, o carácter romano está
patente no gesto semelhante ao da estátua do orador e no trajo que é composto por uma
couraça decorada com elementos alegóricos e cuja precisão e detalhe dá a impressão de
se tratar de tecido, couro e metal e não de mármore
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a cabeça aparece também helenizada, com a supressão de pequenos detalhes
fisionómicos e realce dado aos olhos para lhe dar uma expressão inspirada
o rosto apesar disso está perfeitamente individualizado para que qualquer cidadão
facilmente reconhecesse o seu retrato – as estátuas do imperador cedo ganharam a
qualidade de emblemas nacionais sendo erigidas por todo o império
os imperadores também comemoraram os fetos mais notáveis em baixos relevo
narrativos em altares monumentais, arcos de triunfo e colunas
estes relevos eram utilizados no Próximo Oriente mas não na Grécia que preferia utilizar
temas da mitologia para simbolizar vitórias actuais
os pintores gregos, pelo contrário tinham começado a elaborar frescos que
representavam narrativas reais como a batalha de Salamina ou a batalha de Issus que
deu origem ao famoso mosaico de Pompeia
em Roma os acontecimentos também eram representados em painéis pintados que
eram transportados em cortejos triunfais ou expostos em lugares públicos
Augusto preferiu sempre ser considerado o Príncipe da Paz e não o general vitorioso –
assim decidiu erigir a Ara Pacis da qual existe hoje em dia uma cópia que deve ser muito
parecida com o original lembrando ainda o Altar de Pergamo
na parede que abriga o altar está representada uma procissão solene dirigida elo
imperador – lembra a decoração do Parthenon mas a diferença reside essencialmente
nos detalhes retratados já que se pretendia que os membros da família imperial fossem
facilmente identificáveis mas também no melhor senso de profundidade presente nos
vários planos apresentados
a Ara Pacis possui ainda outras representações como o painel com a Deusa-Mãe Terra
como personificação da fecundidade humana e da fertilidade animal e vegetal ladeada
por duas personificações de ventos – nota-se o carácter helenístico das personificações
mas a ornamentação de acanto sobre as pilastras e na parte inferior da parece não tem
equivalente na arte grega e estabelece um nítido contraste com a parte da representação
que adquire uma profundidade espacial acentuada
a profundidade espacial também se regista por exemplo na decoração parietal de casas
da época de Augusto – o modelado é delicado e ligeiro mas as superfícies lisas que
servem de fundo têm um papel que varia conforme as partes da decoração – nas partes
mais ornamentais a profundidade é evitada e nas partes de representação de cenas o
paisagens ela é explorada para permitir um maior realismo
as qualidades da Ara Pacis atingiram o seu desenvolvimento em dois grandes relevos do
arco de triunfo erigido em 81 dC para comemorar as vitórias de Tito
- cortejo depois da conquista de Jerusalém representa o espólio trazido da cidade e
apresenta uma noção de profundidade bem conseguida já que a fila de soldados no
lado direito se afasta para passar sob um arco de triunfo colocado obliquamente face
ao pano de fundo par fazer sobressair as figuras mais próximas
- o outro relevo apresenta uma o mesmo cortejo mas estático em que o imperador é
coroado pela Vitória – este artifício foi usado para dar mais destaque a esta cena –
as próprias figuras encontram-se de frente e não de perfil como deveriam estar para
respeitar o movimento do cortejo
a Coluna de Trajano foi erigida entre 106 e 113 dC para comemorar a vitória do
imperador sobre os Dácios – esta coluna tem paralelo em alguns monumentos erigidos
no Egipto mas distingue-se pela sua altura de 37,5 metros e também pela faixa contínua
em espiral de baixos relevos que lhe revestem a superfície
a coluna era coroada por uma estátua do imperador destruída na Idade Média e a sua
base servia de receptáculo das suas cinzas
a coluna estava colocada numa praça rodeada por edifícios públicos que não nos indica
a quem seria destinada esta obra que teve um êxito assinalável já que serviu de modelo
para outros monumentos semelhantes
as cenas representadas na coluna são também interessantes pois em mais de 150
cenas, poucas representam combates sendo a maioria destinada a apresentar a logística
e os aspectos geográficos e políticos da campanha
enquadramento novo para o relevo histórico adaptado a algumas limitações: a descrição
visual tinha de ser explicita já que não havia inscrições, a continuidade da narrativa tinha
que ser mantida sem destruir a coerência de cada cena e a profundidade do talhe tinha
que ser limitada já que relevos mais profundos dificultariam a visibilidade das cenas
superiores
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o artista conseguiu solucionar quase todos os problemas mas à custa da profundidade
espacial que tínhamos encontrado em obras anteriores deixando a arquitectura e a
paisagem como meros cenários, lembrando os relevos assírios e deixando de lado a
tradição helenística da perspectiva
a produção de retratos continuou a desenvolver-se na época imperial e a sua produção
abundante e a diversidade de estilos e tipos reflecte o carácter cada vez mais complexo
da sociedade romana
- a cabeça do imperador Vespasiano, o primeiro dos Flávios representa com total
realismo a sua origem humilde e gostos simples assim como o seu cepticismo sobre
o seu papel de deus – no entanto a qualidade do talhe e o destaque dado á textura
da pele e do cabelo fazem lembras as mais belas obras de Praxíteles
- no retrato de uma senhora da nobreza romana encontramos a mesma beleza e
suavidade da escultura, mas a graciosa inclinação da cabeça e os grandes olhos
revelam ainda uma certa melancolia – os cabelos encaracolados fazem ressaltar a
sedosa macieza da pele e dos lábios
a cabeça de Trajano de cerca de 100 dC tem traços firmes e arredondados e um
olhar imperioso emoldurado pelas grossas sobrancelhas fazendo lembrar os retratos
de Augusto – o rosto irradia uma estranha intensidade emocional, uma espécie de
pathos grego transformado em nobreza romana
- a Estátua Equestre de Marco Aurélio em bronze é a única sobrevivente deste tipo de
monumentos e esteve sempre à vista durante todo o período medieval – o carácter
marcial está representado pelo cavalo que possui extraordinária fogosidade mas o
imperador em si sem armas nem armadura apresenta-se mais como um mensageiro
da paz e não como um herói militar
- no século III dC assiste-se à crise e os imperadores seguiam-se uns aos outros
rapidamente assumindo o poder pela força – a estátua de Filipe o árabe demonstra
bem este período em que ao realismo das figuras se junta uma intenção de
expressão nova: o medo, a suspeita, a violência e a crueldade surgem com uma
grande franqueza; esses sentimentos são transmitidos com uma concentração da
expressão no olhar, com o contorno cinzelado da íris e as pupilas escavadas que
ajudam a fixar a direcção do olhar mas também pelo cabelo que deixa o realismo
clássico para se assemelhar a um gorro informe e a barba substituída por um efeito
de barba por fazer marcado a cinzel
- o retrato provável do filósofo Plotino vem aprofundar ainda mais esta tendência
apresentando o pensamento abstracto, especulativo e fortemente místico que o
caracterizava nas feições ascéticas, na fronte alta e no olhar intenso
- o retrato de Constantino o grande, o primeiro imperador cristão vai ainda mais longe
nesta representação espiritual aparecendo com os seus grandes olhos brilhantes, as
feições carregadas e imóveis mais como o cargo que representava do que com o
homem em si
O arco de Constantino erigido entre 312 e 315 dC também nos mostra a concepção da
sua missão – uma parte dos relevos escultóricos monumentais que exibe não foram
criados na altura mas sim reaproveitados de outras obras de Marco Aurélio, Trajano e
Adriano sendo o rosto dos imperadores representados transformados em rostos de
Consantino
o arco contém ainda algumas esculturas originais que demonstram o novo estilo:
- ausência dos artifícios para criar profundidade espacial
- apenas existe uma sugestão de movimento
- as figuras têm a aparência de marionetas com cabeças demasiado grandes e corpos
atarracados e desprovidos de articulação
- a cena preenche toda a superfície mas a acção está limitada à moldura que envolve
a cena não sugerindo a sua continuação
- o artista deu ainda uma ordem abstracta ao mundo aparente organizando as figuras
de uma forma simétrica para dar mais realce ao papel do imperador que é única
figura que aparece de frente e maior que todas as outras – este seria um efieto
amplamente desenvolvido pela arte cristã
7.3 A pintura
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as obras de pintura mural são das poucas obras deste género que sobreviveram à
Antiguidade para além das representações nos túmulos etruscos
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sobreviveram essencialmente em Pompeia e Herculano sepultadas na erupção do
Vesúvio e só conhecidas e exploradas a partir do século XVIII
no entanto, a circunstância da sua conservação levaram a que conhecessemos apenas a
pintura de um curto período de tempo, desde o final do século I aC até ao final do século i
dC
como não conhecemos nenhuma obra do período helenístico é difícil encontrar os
elementos gregos na pintura romana
7.3.1 As fontes gregas
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o mosaico da batalha de Issus encontrado em Pompeia é certamente uma cópia de uma
pintura grega mas a falta de dados não nos permite saber o período em que foi realizada
mas representa um grau de desenvolvimento assinalável dado pela aglomeração das
figuras, a atmosfera de excitação quase frenética, pela formas poderosamente
modeladas e escorçadas e as sombras nítidas
o outro exemplo que possuímos de uma provável pintura grega é um painel de mármore
de Herculano num estilo linear delicado que representa um grupo de 5 mulheres, duas
delas a jogar cucarne – uma inscrição atribui a sua autoria a Alexandros de Atenas e o
estilo lembra o lekythos do século V aC mas a sua execução é fraca o que pode apontar
tratar-se de uma cópia de uma obra tardia grega
7.3.2 Os efeitos ilusionísticos romanos
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a primeira fase da pintura mural romana conhecida por alguns exemplos do século II aC
demonstra uma clara influência helenística
cerca de 100 aC o primeiro estilo caracterizado para essa influência foi dando lugar a um
outro mais ambicioso e trabalhado que procurava abrir a superfície plana da parede
através de perspectivas arquitecturais e pelos efeitos de janela distinguindo-se 3 estilos
(o segundo, terceiro e quarto)
o quarto estilo em voga em Pompeia aquando da erupção do Vesúvio, e era o mais
complexo – imitações de apainelados de mármore, cenas mitológicas emolduradas e
perspectivas arquitectónicas de paisagens
é uma arquitectura irreal e pitoresca que se aproxima das paredes dos fundos dos
teatros antecipando obras como a da Porta do Mercado de Mileto
as panorâmicas arquitectónicas do segundo estilo têm mais substância revelando a
mestria no modelado e no tratamento das superfícies – apesar disso não domina de
forma sistemática a profundidade espacial e a perspectiva não tem coerência interna
Paisagens da Odisseia – série contínua de paisagens divididas em 8 compartimentos por
enquadramentos de pilastras e cada secção representa um episódio das aventuras de
Ulisses – as tonalidades etéreas, azuladas criam um efeito de espaço atmosférico
luminoso que envolve todas as formas mas a ilusão de coerência é frágil
numa das salas da casa de Lívia em Primaporta surge um outro conceito de
interpretação da Natureza – a parede parece estar aberta para um delicioso jardim e
depois da vedação no primeiro plano há uma estreita faixa de relva e um pequeno muro
antes de entrarmos no jardim sem que no entanto haja possibilidade de entrar nele já que
as árvores e flores formam uma massa opaca de verdura que tapa a vista – esta
limitação da profundidade espacial dá coerência à pintura
este efeito também acontece em algumas naturezas mortas que são regra geral nichos
ou armários fingidos possuindo um rigor de pormenores cortado por uma falta de
coerência entre os elementos já que as sombras projectadas por cada um dos elementos
não coincidem na direcção umas com as outras – apesar do seu realismo, falta um
elemento unificador básico
embora esta pintura deva muita da sua vivacidade e atenção ao pormenor dos pintores
gregos, perspectiva e os efeitos iusionísticos são tipicamente romanos
existe no entanto um monumento cuja ousadia e grandiosidade de traçado e coerência
estilística fazem dele um caso isolado na pintura romana: o grande friso de uma das alas
da Vila dos Mistérios nos arredores de Pompeia que exibe muita da profundidade e
continuidade rítmica da pintura da casa de Lívia
as figuras encontram-se sobre uma estreita faixa verde contra painéis de fundo vermelho
separadas por bandas negras numa espécie de palco continuo onde se desenrola a
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acção – apesar de manter alguns mistérios, a cena representa vários aspectos dos
mistérios dionisíacos, um culto semi-secreto importado da Grécia
as figuras possuem a dignidade de porte e de expressão dos clássicos mas o artista
dotou-os de uma nova vida
a arte do retrato pintado era segundo Plínio importante na sociedade romana como forma
de culto dos antepassados assim como os bustos
o único conjunto homogéneo de retratos pintados foi recuperado em Faium no Egito e os
mais antigos aprecem datar do século II dC e devem-se ao costume egípcio de
representar o rosto do falecido junto do seu corpo mumificado
a frescura das cores deve-se à técnica utilizada de encáustica na qual os pigmentos de
cor são misturados com cera derretida dando uma mistura opaca e espessa como na
pintura a óleo ou translúcida e fluída – plica-se a quente sendo de grande duração
os exemplares que sobraram têm muitos elementos comuns como acentuação dos
olhos, a distribuição das sombras e das luzes e o ângulo de pose, certamente derivados
da produção em massa que era efectuada – o individualismo das figuras torna-se muito
acentuada em algumas obras fazendo lembrar o retrato de Filipe o árabe
7.3.3 As religiões orientais
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no século III dC a crise do império romano deu lugar a uma mudança de espírito religioso
com a proliferação dos cultos orientais de origem egípcia, persa ou semita
apesar dos diferentes nomes, todas essas religiões tinham elementos em comum como
a importância da verdade revelada, a esperança da salvação, a existência de um profeta,
a dicotomia do bem e do mal, ritos de purificação ou iniciação e o dever de procurar
converter os infiéis
apesar de não conhecermos bem a proliferação destas regiões, sabemos que elas
criaram um estilo artístico próprio embora os artificies responsáveis por esse novo estilo
eram provincianos, de ambições modestas e que adaptaram uma profusão de elementos
diferentes adaptando-os às suas necessidades
os exemplos mais eloquentes deste novo estilo encontram-se na pequena cidade de
Dura-Europos, uma praça fronteiriça romana junto ao Eufrates abandonada depois da
coqnuista pelos persas e que nas suas ruínas possui vários templos com decoração
parietal
os restos mais bem conservados encontram-se numa sinagoga e forma pintadas em
cerca de 250 dC
a Consagração do Tabernáculo é um produto característico dessa fusão de culturas:
- inscrições das pinturas são em grego
- não há acção nem narrativa e apenas uma acumulação de figuras
- o artista tinha que representar um acontecimento histórico e dotá-lo de uma natureza
intemporal
- o tabernáculo parece um templo clássico e não como a descrição bíblica o refere
como uma tenda de estacas e peles de cabra
- o acólito e a bezerra vermelha deriva de cenas romanas de sacrifícios o que justifica
os restos de escorço que não se encontram nas outras figuras
- a vista de perspectiva do altar também é um eco romano assim como alguns
modelados e em algumas sombras projectadas pelas figuras
- o tamanho dos objectos e das figuras é dada não pela sua posição na cena mas sim
pela sua importância na narrativa
- o traje de Araão está representado em pormenor e o seu corpo desaparece atrás
dele num rigidismo que as outros personagens não apresentam
- as roupagens dos acólitos ainda possuem alguma tridimensionalidade e as suas
roupagens são persas
esta imagem combina uma considerável variedade de elementos tendo como único
denominador comum a mensagem religiosa do conjunto
8 – A arte paleocristã e a arte bizantina
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em 323 dC Constantino mudou a capital do império para Bizâncio que a partir daí se
passou a chamar Constantinopla
a nova capital simbolizava a nova base cristão d Estado romano porque se encontrava no
coração das regiões mais cristianizadas do império
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a deslocação da capital provocou a cisão do império pressionado pelas tribos germânicas
que conquistaram os territórios do ocidente – nos fins do século VI já tinam desaparecido
os últimos traços do poder centralizado
o império do oriente ou bizantino sobreviveu e Justiniano fundou mais uma época de
prosperidade e força
o avanço do Islão foi ameaçando as possessões do império embora a capital tenha
resistido até 1453 quando os Turcos conquistaram finalmente Constantinopla
a divisão do império levou também a um cisma religioso com diferenças profundas entre
as duas igrejas:
- o catolicismo romano manteve a sua independência do poder politico, internacional
ou outro tornando-se uma instituição internacional
- a Igreja Ortodoxa fundava-se na união dos poderes espiritual e secular a pessoa do
imperador – adaptação cristã de uma herança de realeza divina do Egipto e do
Próximo Oriente – com a queda de Constantinopla Moscovo tornou-se a capital desta
Igreja e a Igreja Ortodoxa Russa ficou ligada ao seu governo
é a separação religiosa mais do que a política que leva a uma arte significativamente
diferente e a uma divisão entre paleocristão e bizantino
Paleocristão designa qualquer obra de arte executada por ou para cristãos durante a
época que precedeu o cisma religiosos (primeiros 5 séculos)
arte bizantina refere-se às obras produzidas no império romano do oriente mas
caracteriza também um estilo que estava muito próximo do paleocristão
as influências que moldaram as duas correntes artísticas são diferentes:
- na Europa Ocidental os povos celtas e germânicos tornaram-se os herdeiros da
tradição tardo-romana e transformaram-na na arte da Idade Média
- no oriente não houve qualquer ruptura e a antiguidade final persistiu embora os
elementos gregos e orientais tornaram-se cada vez mais importantes à medida que a
herança romana diminuia
8.1 A arte paleocristã
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ainda estão em disputa a datação dos primeiros artefactos paleocristãos, mas nenhuma
obra até agora encontrada é anterior ao ano 200 dC
até ao reinado de Constantino não temos muitas informações sobre arte paleocristã com
a excepção das decorações parietais das catacumbas, os cemitérios subterrâneos
cristãos
antes de Constantino Roma não era o centro da fé cristã existindo comunidades maiores
e mais antigas nas grandes cidades do Norte de África e do Próximo Oriente – as
pinturas de Dura-Europos fazem crer que existiriam outras obras do mesmo período
nestas cidades
8.1.1 A catacumbas
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O ritual funerário e a protecção das sepulturas eram de fundamental importância para os
cristãos primitivos cuja fé assentava na esperança de uma vida eterna
a iconografia as catacumbas exprime claramente essa perspectiva embora as formas
continuem a ser muito semelhantes às da decoração parietal pré-cristã.
Por exemplo a divisão das pinturas do tecto da catacumba de SS é um eco tardio dos
motivos arquitectónicos em trompe-l'oeil de Pompeia presente também nos modelados
das figuras e nas cenas paisagísticas; no entanto os vários elementos como a própria
disposição das molduras evoca a cruz e a cúpula celeste – as imagens retratam a
história de Jesus e a composição apesar de pequena e mal executada possui uma
coerência e clareza que a distinguem das suas predecessoras pagãs e das pinturas de
Dura-Europos
8.1.2 A arquitectura
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a decisão de Constantino de promulgar o Édito de Milão em 313 concedendo a liberdade
do culto aos cristãos teve profundas consequências na arquitectura
as cerimónias deixaram de ser realizadas às escondidas nas casas dos fiéis e novos
templos foram construídos
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Constantino dedicou muitos recursos a esse empreendimento e rapidamente surgiram
inúmeras igrejas tanto em Constantinopla como em Roma
eram edifícios de um tipo novo que se designa actualmente de basílica paleocristã e que
se tornou o modelo base em toda a Europa
a igreja de S. Pedro em Roma teria originalmente este formato que foi replicado na Igreja
de S. Paulo Extramuros mas tardia mas com a mesma estrutura:
- é uma síntese de uma sala e audiências de templo e de casa particular
- a nave central é flanqueada por duas naves laterais e iluminada pelas janelas dos
clerestório
- a abside e o travejamento de madeira vinham já das basílicas romanas
- aliava um interior espaçoso à grandiosidade que advinha da situação privilegiada do
Cristianismo como religião oficial do estado
- a expressão da igreja como a casa de Deus levou a que fosse criado um novo ponto
de convergência, o altar colocado à frente da abside no extremo oriental da nave
ficando as entradas no lado ocidental e todo o edifício seguia um eixo longitudinal
com reminiscências na planta dos templos egípcios
- a igreja era precedida por um pátio ladeado de pórticos, o atrium cujo lado oriental
ligado á igreja formava o narthex
- o ritmo uniforme das arcadas da nave impele-nos para o grande arco do fundo que
serve de moldura à abside e ao altar
contraste entre o interior e o exterior presente por exemplo na igreja de San Apollinare in
Classe em Ravena construída no século VI e que conserva a maioria dos seus traços
originais:
- o exterior de tijolo simples foi deixado sem ornatos, o oposto do templo clássico
- no interior temos a mais extrema riqueza um resplandecente domínio de cor e luz
com os mármores e mosaicos coloridos a evocar o esplendor do reino de deus
surgem ainda ouro tipo de edifícios neste período: os edifícios de planta redonda ou
poligonal e cúpula já desenvolvidos na época romana por exemplo nas termas ou no
famoso Panteão
no século IV dC surgem os primeiros baptistérios e capelas funerárias ligadas a igrejas
basilicais de planta centrada
um bom exemplo é o mausoléu da filha de Constantino e que hoje é conhecido como Sta
Constanza:
- clara articulação do espaço interior num núcleo cilíndrico fechado por uma cúpula e
iluminado por janelas (clerestório)
- possui um deambulatório anelar coberto por uma abóbada de berço
- a decoração à base de mosaicos tem um papel importante na criação do ambiente
interior
8.1.3 A pintura e o mosaico
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o rápido desenvolvimento da arquitectura cristã colocou um problema devido à
necessidade de decoração de vastos espaços parietais
os humildes artistas que tinham decorado as catacumbas terão de ser substituídos por
grandes artistas que trazem a arte do passado e a adaptam para a nova religião e para
os novos efeitos de monumentalidade
o mosaico parietal paleocristão substitui a técnica mais antiga e barata da pintura
os mosaicos já tinham sido utilizados pelos sumérios em paredes, colunas e pilares – os
gregos helenísticos e os romanos aperfeiçoaram a técnica mas utilizaram-na
essencialmente em pavimentos e com poucas cores já que utilizavam apenas a gama de
mármores coloridos
os artistas paleocristãos utilizam um novo material: as tesselas de pasta de vidro de cor –
permitiam tonalidades mais variadas e intensas que os mármores mas faltavam os
matizes delicados que existiam nas pinturas
as faces irregulares das tesselas de vidro actuavam como minúsculos refractores da luz
o que dava um efeito de conjunto de uma cintilante tela imaterial em vez de uma
superfícies sólida e contínua
estas qualidades faziam do mosaico o complemento ideal dos templos paleocristãos
o princípio chave da arquitectura greco-romana era a expressão do equilíbrio de formas
contrárias mas a arquitectura paleocristã assume um carácter completamente diferente
quase anti-monumental e inexpressivo
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o mosaico cristão também negou a parede lisa mas com o intuito de realizar uma ilusão
de irrealidade, um reino luminoso povoado por seres e símbolos celestiais
a influência romana continua a surgir mas o efeito é completamente diferente pois em
vez de dar uma ilusão da realidade a construção já não parece física e a estrutura dos
edifícios utilizam a mesma cor do fundo confundindo-se ambos os planos
nas cenas narrativas podemos também ver como a tradição ilusionistica foi transformada
com o novo conceito: longas sequências bíblicas ornavam as paredes das basílicas a
tarefa dos artistas consistia em condensar acções complexas numa forma visual que
permita a sua leitura à distância, utilizando muitos dos artifícios da coluna de Trajano
os mosaicos de Santa Maria Maggiore contam a história da redenção contada nas
Sagradas Escrituras que é uma realidade presente e não um acontecimento histórico
o artista necessitava de representar os pormenores da narrativa mas os olhares e os
gestos tornaram-se mais importantes do que o movimento dramático ou a
tridimensionalidade
a composição simétrica torna evidente o significado da imagem da separação de Lot e
Abraão e a sorte dos dois irmãos está marcada pela sua separação assim como o papel
posterior dos seus filhos
8.1.4 Os rolos, os livros e as iluminuras
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os modelos dos mosaicos poderão ter sido as pinturas das catacumbas mas os modelos
mais importantes deverão ter sido as iluminuras de manuscritos
a Igreja primitiva fomentou a reprodução do texto sagrado em grande escala e cada
exemplar era tratado com muito respeito
os primeiros exemplares devem ter sido realizados em papiro e algumas ilustrações
traem essa origem já que são feitos para serem vistos na horizontal como um rolo que se
desenrola
na época helenística surgiu um novo suporte, o pergaminho feito de pele branqueada e
curtida que era muito mais duradoura do que o papiro e que permitia fazer livros
encadernados e brochados que possuíam o nome técnico de codex
entre os séculos I e IV dC o pergaminho substitui o papiro e as iluminuras podem ser
mais coloridas e ricas com a utilização de ouro
há poucas dúvidas de que as antigas iluminuras foram executadas num estilo
influenciado pelo ilusionismo pompeiano
um dos documentos mais antigos é o Virgílio da Vaticana e reflecte essa tradição embora
a sua qualidade deixe a desejar: a pintura está separada do resto da página por uma
moldura e na paisagem nota-se a tentativa de obter profundidade e os jogos de sombra e
luz
a obra principal do período é o Génesis de Viena escrito com tinta de prata em
pergaminho púrpura e ilustrado com miniaturas brilhantemente coloridas lembrando os
mosaicos das basílicas
a iluminura da História de Jacob mostra uma narrativa continuada, uma indicação de que
se trataria da cópia de um documento mais antigo num rolo mas também porque o
método contínuo tinha a vantagem de poupar espaço
8.1.5 A escultura
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a escultura teve um papel secundário na arte paleocristã porque se entendia que a
proibição das estátuas se estendia às imagens de culto dos templos pagãos
a escultura cristão, para fugir às acusações de idolatria deixou de produzir imagens
humanas de tamanho natural
os primeiros trabalhos de escultura paleocristão foram os sarcófago de mármore
executados a partir do século III para membros proeminentes da Igreja
o sarcófago de Junius Bassus é um bom exemplo:
- na face anterior dividida em 10 espaços rectangulares por duas colunatas
sobrepostas misturam-se cenas do Velho e do Novo Testamento
- as imagens representam as cenas discretamente e sem violência
- o sarcófago parece estar muito mais perto do classicismo do que o arco de
Constantino – as figuras nos seus nichos profundos denuncia o esforço para
recuperar a dignidade da tradição grega – apesar disto encontramos o mesmo tipo
de figuras de grandes cabeças e corpos atarracados
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o classicismo parece ser recorrente na escultura paleocristã desde os meados do século
IV até ao início do século VI – as causas deste movimento foram explicadas pelo
conservadorismo face aos valores do passado e à aproximação entre os chefes da Igreja
com a Antiguidade Clássica
o classicismo foi particularmente importante nas placas de marfim e outros relevos de
pequenas dimensões em metais preciosos
estas pequenas obras eram destinadas a coleccionadores que tinham uma sensibilidade
estética superior à dos oficiais da Igreja
um díptico representando uma sacerdotisa de Baco e um bom exemplo pelo tema pagão
assim como pelo estilo que volta à beleza e perfeição do período de Augusto mas
algumas incongruências espaciais como o pé que sai fora da moldura que estamos
perante uma cópia cujo sentido se perdeu há algum tempo
outro pequeno marfim surge já como um veículo cristão com a imagem do Arcanjo S.
Miguel que surge como um descendente das vitórias aladas gregas até na riqueza dos
pragueados – é a qualidade incorpórea transmitida pela harmonia clássica das formas
que lhe dá a sua imponência
a protecção do estado aos retratos levou a que perdurassem durante mais algum tempo
nomeadamente através de estátuas de imperadores, cônsules e altos funcionários
a partir do ano 450 a semelhança externa dos retratos dá lugar à imagem de um ideal
espiritual por vezes intensamente expressivo mas cada vez mais impessoal
esta evolução encontra-se na cabeça de Eutropios de Efeso que faz lembrar as feições
de Plotino e na cabeça de Constantino mas que parece mais um espectro do que um
homem de carne e osso e as suas feições estão marcadas por leves rugas ou linhas
superficialmente gravadas acentuando o carácter abstracto e ultraterreno
8.2 A arte bizantina
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não há uma fronteira nítida entre a arte paleocristã e a bizantina já que ambas as regiões
do império foram contribuindo para o desenvolvimento do estilo paleocristão
com o reinado de Justiniano Constantinopla reforçou o seu papel de capital do império e
tornou-se a capital artística – o imperador foium grande protector das artes patrocinando
ou promovendo obras com uma grandeza imperial que levaram a que o seu reinado
fosse considerado uma Idade de Ouro
8.2.1 A primeira Idade de Ouro: a arquitectura e as artes decorativas
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o mais rico conjunto de edifícios deste período não se encontra em Constantinopla mas
sim em Ravena, capital dos imperadores do ocidente em 402 e no fina do século de
Teodorico, rei dos Ostrogodos
a principal igreja desse período é San Vitale construída entre 526 e 547:
- planta octogonal com o corpo central coberto por uma cúpula, deriva de Sta
Constanza
- bastante maior e com um efeito espacial mais rico
- abaixo das janelas altas a parede da nave octogonal abre-se em nichos semicircular
- a colateral recebeu um segundo andar o das tribunas reservado às mulheres
- abóbadas mais leves favorecem a multiplicação de janelas que inundam de luz o
interior
- o eixo longitudinal ficou reduzido á capela-mot com abóbada de aresta e ábside e no
lado oposto a um narthex
as igrejas de planta centrada e cúpula iriam dominar o mundo cristão ortodoxo a partir de
Justiniano
S. Vitale possuía ainda dois mosaicos que ladeavam o altar-mor cujo traçado vem
directamente da oficina imperial – representam o imperador e a imperatriz Teodora
acompanhados pelos dignitários, elementos do clero e damas de honor
nestes painéis encontramos um ideal de beleza muito diferente das figuras atarracadas e
de grandes cabeças da arte dos séculos IV e V
as figuras são altas e delgadas de pés pequenos, rostos ovais com olhos imensos e
fixos e corpos que parecem apenas capazes de gestos cerimoniais e de ostentar
sumptuosos trajes
toa a sugestão de movimento é evitada e as dimensões de espaço e tempo dão lugar a
um eterno presente na transparência do Céu
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união da autoridade política e espiritual reflecte a realeza divina do imperador
representada pelo bordado nas vestes de Teodora onde aparecem os reis Magos e pelos
companheiros do imperador, 12 como os apóstolos
no espaço exterior da igreja encontramos a mesma leveza imaterial e sublime que dá às
figuras o seu ar de exaltação
entre os monumentos mais impressionantes do reinado de Justiniano encontra-se a
igreja de Santa Sofia edificada entre 532 e 537 pelos arquitectos Anthemius de Tralles e
Isidorus de Mileto
- o traçado de Santa Sofia inclui uma cmbinação única de elementos: tem o eixo
longitudinal de uma basílica paleocristã, mas a nave forma ao centro um quadrilátero
coroado por uma imensa cúpula apoiada nos extremos em semi-cúpulas
- ligados às semi-cúpulas há nichos semi-circulares com arcadas abertas semelhantes
às de S. Vitale
- a cúpula assenta em 4 arcos que que transmitem o empuxo aos grandes pilares do
quadrilátero central levando a que as paredes sob os arcos não têm funções de
suporte
- a transição do quadrado formado por estes arcos para o arco circular é realizada por
triângulos esféricos, os pendentes – o emprego deste elemento permite cúpulas mais
leves e mais altas
- a planta, o escoramento dos pilares e as enormes dimensões lembram a basílica de
Constantino
Santa Sofia une numa síntese impressionante o ocidente e o oriente, o passado e o
futuro
no interior a noção de peso desaparece abrindo-se um espaço amplo iluminado por um
anel de janelas que dá a ideia que a cúpula flutua no ar
o cintilar dos mosaicos devia reforçar esta ideia de ilusão de irrealidade
a nova estética nota-se até nos pormenores ornamentais: os motivos derivam da
escultura clássica mas o seu efeito é totalmente diferente: em vez de amortecerem a
carga os capitéis tornam-se um espécie de cesto rendilhado cuja superfície lavrada
dissimula a força e solidez da pedra
8.2.2 A segunda idade de ouro: a arquitectura e as artes decorativas
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as igrejas da segunda Idade de Ouro (desde o final do século IX até ao século XI) eram
de modestas dimensões e de espírito monástico mais do que imperial
a planta é geralmente de cruz grega inserida num quadrado com narthex a um lado e
ábside no outro – ao centro ergue-se a cúpula sobre base quadrada por vezes sobre o
resto do edifício com nas duas igrejas do mosteiro de Hosios Loukas na Grécia
estas igrejas apresentam ainda duas tendências da arquitectura bizantina: fachadas mais
ornamentadas e uma preferência pelas proporções alongadas – o pleno impacto da
verticalidade só se sente no entanto no interior quando se olha para a cúpula
na igreja de Daphnê também na Grécia, a pintura da cúpula está em melhor estado
representando um Cristo Pantocrator sobre um fundo de ouro
a maior e mais sumptuosa igreja deste período é a S. Marcos em Veneza começada em
1063 – a influência bizantina está patente em vários aspectos:
- planta de cruz grega inscrita num quadrilátero mas cada braço da cruz possuí ainda
uma cúpula própria
- as cúpulas foram encaixadas em calotes bulbosas de madeira forradas a folha de
cobre dourado e rematadas com lanternins decorativos para as tornar mais visíveis à
distância
a arquitectura bizantina também se propagou pela Rússia acompanhando a doutrina
ortodoxa – o mais célebre exemplo é a catedral de S. Basílio junto do Kremlin em
Moscovo: as cúpulas profusamente multiplicadas transformaram-se numa espécie de
torres fantásticas cujos telhados parecem cogumelos e bagas ou turbantes orientais
o desenvolvimento as pinturas e esculturas bizantinas foram perturbadas pela questão
inconoclasta que começou com o édito imperial de 726 que proibia as imagens religiosas
e que foi interpretado de forma diferente pelas várias facções:
- os iconoclastas chefiados pelo imperador e apoiados pelas províncias orientais
interpretavam à letra a proibição pretendendo reduzir as decorações a símbolos
abstractos ou a signos vegetais e animais
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os iconófilos representados pelos monges e concentrados nas províncias ocidentais
defendiam o uso de imagens religiosas e nunca cumpriram o édito
- as lutas entre as duas facções simbolizavam a luta de poder entre estado e Igreja e levou
a uma grande redução das obras religiosas até 843 quando os iconófilos venceram a
questão
- assistiu-se durante este período a um ressurgimento dos motivos clássicos como em
algumas iluminuras que possuem elementos do período tardo-romano como por exemplo
várias imagens no Saltério de Paris
- outro reflexo destas fontes antigas encontra-se no mosaico do Génesis em S. Marcos de
Veneza com cenas que poderão ter sido adaptadas de um manuscrito – as imagens
atarracadas e Cristo representado como um jovem filósofo são típicas das obras do
século IV
- estas obras demonstram um interesse de arqueólogo pela antiguidade já que as obras
mais belas da segunda Idade de Ouro mostram um classicismo harmoniosamente
combinado com o ideal espiritual de beleza característico do reinado de Justiniano
- o mosaico da crucificação de Daphnê tem particular fama que possui uma clareza e
simetria clássicas assim como a dignidade majestosa das figuras que parecem graciosas
e orgânicas e o suave pathos emanado nos gestos e expressões fisionómicas em
sofrimento contido e cheio de nobreza
- o sentimento de compaixão presente nas obras da Segunda Idade do Ouro foi uma das
suas maiores conquistas embora só se tenha desenvolvido plenamente no ocidente
medieval
- Cristo foi representado não com severidade mas sim com doce melancolia, junto a uma
subtileza do modelado de cor
8.2.3 A pintura bizantina final
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em 1204 Bizâncio sofreu uma derrota quase fatal quando os exércitos do Cruzados
saquearam Constantinopla
em 1261 recuperou a soberania e o século XIV assistiu a um ressurgir da intura bizantina
antes da conquista turca
devido ao empobrecimento do império, a pintura mural começou a ocupar o lugar dos
mosaicos como na decoração da capela funerária contigua a Kariye Cmii –
representação da Anastasis que impressiona com a sua força dramática ausente da
maioria das obras bizantinas e prova de que a capacidade criadora permaneceu
um dos principais argumentos a favor das imagens religiosas durante a questão
iconoclástica era que Cristo teria dado autorização a S. Lucas para o representar criando
um conjunto de imagens sacras verdadeiras e originais que depois foram usadas como
fonte de inspiração
estas imagens ou ícones foram elaboradas segundo os retratos greco-romanos de
madeira
o mais importante dos encontrados até agora foi o da Madonna de Sta francesca
Romana e o seu parentesco com a pintura romana é evidente não apenas pelo emprego
da técnica na encáustica mas também pelas finas gradações de luz e sombra – no
entanto as formas do rosto reflectem um ideal de beleza humana espiritualizada como a
presente nos mosaicos de S. Vitale mas com mais tridimensionalidade
os ícones tinham que obedecer a estritas regas formais com padrões fixos repetidos
incessantemente
a virgem no trono reflecte um tipo vários séculos anterior: as reminiscências do
classicismo abundam na atitude graciosa, no rico jogo das pregas do tecido, na doce
melancolia do rosto e na cuidada perspectiva arquitectural do trono – mas estes
elementos são estranhamente abstractos
em vez de ter uma aparência espacial a imagem tem uma transparência dada pela forma
como foi pintada sobre uma superfície brilhante que ressalva os pontos luminosos
resultando num esplendor celestial
estes painéis são representações em miniatura de mosaicos
a pintura de ícones alastrou por toda a zona dos Balcãs e Rússia – o melhor pintor russo
e ícones foi Andrei Rublev – Trindade do Velho Testamento – a pintura revela um
harmoniosa beleza de traçado e uma profundidade de sentimentos que rivaliza com as
produções clássicas da segunda Idade de Ouro
o elemento mais pessoal e mais russo da composição é a escala cromática mais
brilhante, mais complexa e de um registo diferente de qualquer obra bizantina
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8.2.4 A escultura
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a estatuária monumental desapareceu com os últimos retratos imperiais
a escultura de pedra ficou praticamente limitada à escultura monumental mas os
pequenos relevos de marfim e metais preciosos continuaram a ser produzidos
os exemplos que chegaram até nós têm uma extraordinária variedade de temas, estilo e
intenção:
- o tríptico de Harbaville tem motivos religiosos e o requinte das imagens lembra a
crucificação de Daphnê
- o Sacrifício de Ifigénia é já uma obra diferente pertencendo a uma arqueta de
casamento e com temas da mitologia grega e embora sem a emoção trágica, as
figuras roliças lembram as obras clássicas permitindo que a herança greco-romana
permanecesse
II - A Idade Média
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as obras mais emblemáticas da Idade Média são as catedrais góticas – embora existam
vários exemplos impressionantes, todas elas se situam acima dos Alpes embora em
território do império romano
o centro de gravidade da civilização europeia deslocou-se para as fronteiras setentrionais
do império substituindo as zonas mediterrânicas
as tribos germânicas instaladas na metade ocidental do império adoptaram o quadro da
civilização cristã tardo-romana
a recuperação das províncias ocidentais foi sempre acarinhada pelos imperadores em
Constantinopla mas o crescimento do poderio islâmico deitou por terra definitivamente
essas ambições
o império teve que concentrar as suas forças para travar o avanço do Islão no oriente
permitindo a sua expansão pelos territórios ocidentais
a Europa Ocidental teve que encontrar os seus próprios recursos para resistir ao invasor
e o papa procurou o apoio do reino dos francos que com Carlos Magno iniciaram uma
fase de predomínio na região confirmada elo chefe religioso ao coroar o imperador
Carlos Magno construiu a sua capital em Aix-la-Chapelle, ponto de encontro da frança,
Alemanha e Holanda na actualidade
o Islão foi criando uma nova civilização que se estendia até à Península Ibérica e at+Z+é
ao Vale do Indo com capital em Bagdad
a arte, o saber e o artesanato islâmicos iriam ter uma influência determinante na Idade
Média europeia desde a ornamentação de arabescos, a fabricação do papel e os
algarismos árabes até à transmissão da filosofia e da ciência gregas
1 – Arte muçulmana
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em duas gerações apenas a nova fé islâmica conquistou um território mais vasto e um
número de crentes maior que o Cristianismo em 3 séculos
esta rápida expansão pode ser explicada pelas condições favoráveis que encontraram
mas o que começou com uma vitória da força terminou como uma vitória espiritual dados
os milhões de convertidos que conquistaram
a nova religião parece ter ido ao encontro dos anseios da grande multidão apesar dos
seus mandamentos éticos serem semelhantes aos do Cristianismo e do Judaísmo, mas
também há diferenças assinaláveis:
- os ritos não exigem o sacerdócio, qualquer muçulmano tem igual acesso a deus
- as obrigações religiosas são simples: a oração a certas horas do dia, a esmola, o
jejum e uma peregrinação a Meca
- todos os verdadeiros crentes são irmãos membros de uma verdadeira comunidade
Maomé legou uma crença que formou um novo tipo de sociedade deixando o costume da
chefia religiosa e militar nas mãos dos califas
a característica ímpar do Islão é a fusão de elementos étnicos e universais – aberto a
todos os homens acentuando a fraternidade dos crentes perante deus sem distinção de
raças ou culturas
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apesar disso era uma religião muito marcada pelo seu centro na Arábia já que todos os
muçulmanos tinham que conhecer a língua arábe para lerem o Corão mas também par
se integrarem no quadro social, jurídico e político da comunidade islâmica
1.1 A arquitectura
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na arte herdaram o estilo paleocristão bizantino com as reminiscências gregas, romanas
e da Pérsia
a contribuição da Arábia limitou-se à bela escrita ornamental já que estas tribos nómadas
não tinham tradições arquitectónicas e a s imagens esculpidas dos deuses eram
interditas pela proibição da idolatria
nos primeiros tempos qualquer local servia para organizar o culto religioso desde que
possuísse a marcação da qibla ou seja a direcção de Meca para onde os orantes se
devem dirigir enquanto rezam
no final do século VII os soberanos islamitas firmemente estabelecidos nas terras
conquistadas começaram a erigir mesquitas e palácios em grande escala como símbolos
do seu poder
esses primeiros monumentos revelam mais das influências dos artistas que as realizaram
do que um estilo islâmico próprio que só se desenvolveu no século VIII
1.1.1 A arte muçulmana do Oriente
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a grande mesquita de Damasco foi construída de 706 a 715 e tinha as paredes cobertas
por mosaicos de vidro de origem bizantina
o se estilo reflecte o ilusionismo de Pompeia confirmando que as tradições mais antigas
se mantiveram nas províncias do Próximo Oriente
o califa al-Walid aceitou bem os motivos helenísticos por serem tão diferentes do
conteúdo simbólicos e narrativo dos mosaicos cristãos
a data d construção do palácio de Mshatta tem sido muito disputada pela variedade de
elementos que possui:
- o estilo da decoração da fachada insira-se em fontes pré-islâmicas
- a decoração rendilhada e os motivos vegetais recordam a ornamentação
arquitectural bizantina
- há também a influência persa nos leões alados e outros animais míticos semelhantes
à ourivesaria e tapeçaria sassanida
- o enquadramento geométrico de ziguezagues e rosetas repetido uniformemente na
fachada sugere um gosto pelos motivos abstractos simétricos característicos da arte
islâmica
a mesquita de Samarra é m dos exemplos mais impressionantes do novo estilo:
- a planta é um rectângulo com o eixo principal orientado a Meca encerrando um pátio
rodeado por naves ou galerias laterais que conduzem à qibla cujo centro está
marcado por um pequeno nicho, o mihrab
- do lado oposto encontra-se o minarete onde o muezzin chamava os fiéis à oração
- a superfície ultrapassa os 38 mil metros quadrados e mais de metade desta área
estava coberta por um telhado de madeira
- o mais espectacular do conjunto é o inarete ligado à mesquita por uma rampa e
reminiscente dos zigurates da Mesopotâmia
1.1.2 A arte hispano-mourisca
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a mesquita de Córdova foi começada em 286
- a sua planta inicialmente era semelhante à de Samarra mas mais pequena e com
naves apenas do lado da qibla
- mais tarde a mesquita seria acrescentada pelo alongamento das naves e construção
de outras novas a Leste porque a Sul o rio impedia o crescimento do edifício
- estes acrescentamentos sucessivos demonstram a flexibilidade deste tipo de plantas
- na entrada encontramos uma floresta de colunas e só a direcção das naves nos guia
até à qibla
- o santuário era coberto por um telhado de madeira assentado sobre arcadas duplas
com os arcos inferiores em ferradura uma forma que aparece em edifícios
pré-islâmicos mas que foram adoptados pela arte muçulmana
42
uma elaboração mais tardia do mesmo dispositivo de arcos surgiu na Capela de
Villaviciosa, uma câmara abobadada a Norte do mihrab – encontramos aqui arcos
lobulados em três filas sobrepostas, entrecruzados de modo a formar grilhagens ou
bandeiras ornamentais complexas
- a abóbada possui 8 arcos ou nervuras que se cruzam em várias direcções formando
uma rede de alvéolos no espaço quadrado
o máximo requinte do estilo mourisco é atingido na Alhambra de Granada
parte mais rica é o Pátio dos Leões e os aposentos em redor
- as colunas tornaram-se esguias como caules de flores suportando arcos de
configuração complexa em paredes que parecem reduzidas a uma trama ornamental
semelhante a uma teia de aranha
- nas superfícies interiores encontramos a mesma renda de arabescos decorativos
realizada em estuque ou em azulejos
- a abóbada mourisca também se tornou mais complexa desaparecendo as nervuras
por detrás de favos formados por um sem número de alvéolos emoldurados por
arcos minúsculos que pendem do tecto como estalactites
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1.1.3 A arte turca
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a partir do século X os turcos seldjúcidas avançaram pelo Médio Oriente onde se
convertem ao islamismo dominando grande parte da Pérsia, Mesopotâmia, Síria e Terra
Santa
foram seguidos no século XIII pelos mongóis de Genghis Khan e pelos turcos otomanos
estes últimos tornaram-se a maior potência do mundo islâmico influenciando a arte dessa
região e período
surge um novo tipo de mesquita, a madrasah criada na Pérsia no século XI
um dos exemplares mais importantes é a Madrasah do sultão Hasan no Cairo – a sua
principal característica é um pátio quadrado com uma fonte ao centro e a cada lado do
pátio abre-se uma sala servindo a da qibla como santuário
a escala monumental do recinto parece reflectir a arquitectura palaciana da Pérsia
sassanida enquanto a clareza geométrica do traçado acentuada pelas severas
superfícies murais é uma contribuição turca
contígua à qibla da mesquita encontra-se o mausoléu do sultão, um grande edifício
cúbico coroado por uma cúpula de ascendência bizantina
o Taj Mahal em Agra é o mais famoso mausoléu da arquitectura islâmica erguido por um
dos mais famosos soberanos muçulmanos da Índia em memória da sua mulher – o
soberano pertencia à dinastia mongol vinda da Pérsia e por isso a semelhança com o
mausoléu do sultão Hasan não é surpreendente
o aspecto maciço do mausoléu do Cairo de cornija saliente e cúpula solidamente
implantada deu lugar a uma elegância imponderável que faz lembrar a Alhambra – as
paredes de mármore branco quebradas por fundas reentrâncias como nicho de sombra
lembram folhas de papel quase translúcidas e o edifício dá aimpressão de mal tocar o
solo parecendo suspensa da cúpula
os turcos otomanos quando se estabeleceram na Ásia Menor elaboraram um terceiro tipo
de mesquita pelo cruzamento do modelo da madrasah seldjúcida com a igreja bizantina
de cúpula – uma dos primeiros exemplares é a cúpula de madeira da mesquita Ulu em
Erzurum
ao chegarem a Constantinopla a beleza de Santa Sofia levou a que servisse de
inspiração a outras mesquitas construídas em Istambul e noutras partes como a do
sultão Ahmed I que adaptou a planta de Santa Sofia num quadrado com a cúpula central
escorada por 4 meias-cúpulas e quatro cúpulas menores próximo dos minaretes dos
cantos
1.2 Representação figurativa
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a atitude islâmica perante as representações figurativas era um pouco ambígua: Maomé
condenou a idolatria mas em relação à pintura era bem mais tolerante dizendo-se que
embora tenha mandado destruir as pinturas religiosas numa igreja manteve uma imagem
da Virgem com o Menino
não existindo nenhuma tradição pictural árabe, a pintura religiosa inspirou-se em fontes
estrangeiras
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rejeitaram todas as estátuas mas paisagens helenísticas decoram as suas mesquitas e
os animais sassânidas aparecem em várias decorações d fachada da Mshatta
só a partir de cerca de 800 é que aparecem condenações explícitas à figuração já que ao
representar seres vivos o artista usurpa um acto criador reservado a deus
as imagens de animais ou humanas eram em princípio proibidas mas desenvolveu-se a
convicção que a proibição não se aplicava a obras que não projectassem sombras, de
pequenas dimensões ou reproduzidas em artefactos de uso corrente
a tendência para elaborar objectos portáteis ricamente decorados vinha dos árabes,
turcos, persas e mongóis, herança do seu passado nómada
sobraram alguns exemplos sumptuosos destas representações:
- o manto bordado de Coroação dos Imperadores Germânicos apresenta uma
decoração com animais simétricos é um motivo que remonta ao Próximo Oriente
- queimador de incenso na figura de uma estranha criatura de bronze com quase um
metro de altura e de vulto redondo
quanto à pintura islâmica sobraram apenas alguns exemplares em especial em
ilustrações de textos científicos como o livro De Materia Medica de Dioscórides
os escribas foram desenvolvendo a arte da iluminação que ficou restringida aos
calígrafos mais hábeis já que não poderiam existir pintores
mesmo a literatura árabe profana exibe representações desenhadas como no Maqamat
de Hariri
1.2.1 A Pérsia
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os comerciantes árabes tinham estado em contacto com o Extremo Oriente antes do
advento do Islão e algumas alusões a pintores chineses indicam um conhecimento da
arte da China
mas foi só após a invasão mongol do século XIII que a influência chinesa penetrou mais
profundamente na arte islâmica como por exemplo na Paisagem de Verão onde se
encontram os temas típicos chineses: montanhas envolvidas em brumas e torrentes
caudalosas representando a Natureza selvagem
outro resultado da influência do Extremo Oriente foi a aparição de temas religiosos em
miniaturas persas que seguiam a tradição das representações budistas
o resultado dessa influência foram obras que misturavam elementos frequentemente mal
assimilados como na Ascensão de Maomé:
- a gravura representa Maomé montado num animal com uma cabeça humana que
provém dos monstros alados da Mesopotâmia antiga
- os elementos etremo-orientais revelam-se na visão poética da cena – nos halos
dourados chamejantes r na estilização ondulada das vestes, das nuvens e nos tipos
fisionómicos dos anjos
- o movimento agitado dos anjos lembram fortemente a arte cristã
- a cara do profeta está em branco por se entender que não poderá ser representado,
um traço islâmico
o Corão não foi decorado devido ao seu carácter religioso mas os caligrafistas
elaboraram caracteres árabes cada vez mais ornamentais surgindo combinações
geométricas e curvilíneas cada vez mais complexas
2 – A arte da Alta Idade Média
2.1 A Idade das Trevas
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a ideia do obscurantismo medieval foi-se tornando cada vez mais limitada com o passar
dos tempos, sendo apenas reservada para os primeiros anos desse período
hoje em dia é apenas considerado o período entre a morte de Justiniano e o reinado de
Carlos Magno
2.1.1 O estilo celto-germânico
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as tribos germânicas que tinham penetrado na Europa durante os anos de declínio do
império romano traziam consigo a tradição do estilo animalista de que são exemplos os
bronzes do Luristão e os adornos citas de ouro
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este estilo combina formas abstractas e orgânicas com disciplina formal e liberdade
imaginativa e tornou-se um elemento fundamental da arte celto-germânica da Alta Idade
Média
- um tampo de bolsa encontrado em Sutton Hoo possui uma decoração típica desta
inspiração: 4 pares de motivos distribuídos simetricamente pela superfície cada um com
um carácter próprio apontando uma origem diversificada;
- o homem de pé entre dois animais tem as suas raízes na Suméria
- as águias lançando-se sobre a sua presa fazem lembrar os bronzes do Luristão
- o desenho central superior de animais em luta aparece nas obras paleocristãs e
romanas
- os trabalhos de metal foram os principais veículos desta arte muitas vezes de execução
requintada
- as obras de madeira apenas subsistiram em pequenas quantidades e na Escandinávia
devido ao clima mais húmido – a cabeça de animal é o remate de um barco viking do
início do século IX e denota um carácter particularmente compósito – a cabeça é de
particular realismo acentuado em alguns pormenores mas a superfície parece bordada
de entrlaços e outros padrões que denunciam a a sua origem no trabalho do metal
2.1.2 O estilo hibérnico-saxão
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o período entre 600 e 800 foi a Idade de Ouro da Irlanda – nunca tendo sido dominados
pelos romanos, receberam bem o Cristianismo e ao entrar em contacto com a Europa
sem ter sido romanizada a Irlanda adaptou com espírito de independência as influências
que recebeu
os irlandeses preferiram segui o exemplo dos santos eremitas do Egipto e do Próximo
Oriente já que a igreja era adaptada às regiões urbanas e a vida irlandesa era
essencialmente rural
no século V foram fundados os primeiros mosteiros na Irlanda que rapidamente se
tornaram centros de cultura e criação artística
nesses mosteiros cresceu o fervor missionário que levou os seus monges a pregar aos
pagãos e a fundar conventos no norte das ilhas Britânicas e no continente
as fundações conventuais entre os séculos VII e VIII foram beneditinas mas a influência
irlandesa fez-se sentir
para a difusão do Evangelho foram executadas numerosas cópias da Bíblia realizadas
em scriptoria que se tornaram centros de produção artística já que o manuscrito com a a
palavra de Deus é um objecto agrado cuja beleza deve reflectir a importância do
conteúdo
apesar de conhecerem os manuscritos paleocristãos, surgiu uma nova forma de
iluminação mais preocupada com o embelezamento decorativo
o mais belo destes documentos é o Evangelho de Lindisfarne – a página da cruz é uma
das páginas mais interessantes já que o artista com a precisão de um joalheiro inseriu
nos compartimentos do seu esquema geométrico um entrelaçado zoomórfico riquíssimo
mas de movimentos disciplinados, seguindo regras muito rígidas de separaçã das formas
orgânicas e geométricas mas também quanto à simetria e às repetições de formas e
cores
das imagens figurativas dos manuscritos paleocristãos, permaneceram apenas os
símblos dos 4 evangelistas transpostos facilmente para o seu idioma ornamental – por
exemplo no leão de S. Marcos dos Evangelhos de Echternach
a figura humana esteve longo tempo fora do alcance dos artistas célticos ou germânicos
– a placa de bronze sobre o Calvário mostra a incapacidade de conceber o corpo
humano como uma unidade orgânica sendo os vários elementos do corpo de Cristo
desincarnados existindo um grande fosso entre as tradições céltico-germânicas que o
artista desta obra não conseguiu transpor
uma situação análoga existiu por toda a Europa Ocidental e até entre os Lombardos do
Norte de Itália – o escultor germânico que talhou o baixo relevo do baptistério da catedral
de Cividale teve os mesmo problemas com a representação da figura humana – os
símbolos dos 4 evangelistas são estranhos – parecem ter patas de aranha e os corpos
ficaram reduzidos à cabeça, às asas e à cauda em espiral – apesar desta falta de
realismo, a obra denota bem o seu carácter decorativo lembrando um pano bordado
2.2 A arte carolíngia
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o império de Carlos Magno não durou muito já que os seus netos dividiram-no em 3
partes e não conseguiram governá-lo passando o poder para as mãos da nobreza local
as realizações culturais do reinado de Carlos Magno foram no entanto, mais duradouras
como o demonstra a adopção dos caracteres ditos romanos mas na realidade carolíngios
– a designação de romanos provém da cópia de muitas das obras da literatura romana
que permitiram que chegassem até nós
o cuidado na preservação dos clássicos vinha do desejo de restaurar a antiga civilização
romana juntamente com o título imperial
o renascimento carolíngio é uma primeira fase de uma fusão genuína da mentalidade
celto-germânica com o espírito do mundo mediterrâneo
2.2.1 A arquitectura
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as belas artes desempenharam um papel fundamental no programa cultural de Carlos
Magno
ao entrar em contacto com os monumentos do tempo de Constantino em Roma e do
tempo de Justiniano em Ravena decidiu edificar obras tão imponentes na sua capital de
Aix-la-Chapelle
a Capela Palatina foi inspirada em S. Vitale e as dificuldades foram várias já que as
colunas e as grades de bronze tiveram de ser transportadas desde a Itália
o plano de Otão Metz, o arquitecto da capela não era uma simples cópia de S.Vitale mas
sim uma vigorosa reinterpretação com pilares e abóbadas de maciço carácter romano e
uma clareza das unidades espaciais diferente do espaço fluído da igreja de Ravena
o exterior também é diferente com a fachada a formar um conjunto alto e compacto no
prolongamento do eixo da capela – a frontaria monumental a Ocidente (Westwerk) de
que temos aqui um dos primeiros exemplos é o embrião das frontarias de duas torres tão
comuns em igrejas medievais posteriores
St Riquier era uma westwerk ainda mais trabalhada e foi completamente destruída mas
conhecemos bem os seus traçados através de desenhos e descrições:
- a entrada conduz a um narthex abobadado que é o transepto ocidental
- o cruzeiro estava coroado por uma torre assim como no cruzeiro oriental onde se
encontram duas torres redondas de escadas interiores
- a ábside está separada do transepto por um espaço rectangular, o coro
a importância dos mosteiros deste período está demonstrada numa planta que chegou
até aos nossos dias conservada na casa do capítulo em St. Gall na Suíça que se trataria
de um modelo geral que seria adaptado às necessidades e circunstâncias de cada região
o mosteiro é um conjunto complexo, autónomo, a via prncipal de acesso a Ocidente
passa pelos estábulos e uma hospedaria e leva a um portão que dá para um pátio com
colunatas e duas torres laterais
as entradas são numerosas a Norte e a Sul e duas do lado da ábside ocidental, o que
reflectia as necessidades da comunidade monástica
contíguo à igreja a sul encontramos um claustro de arcadas em torno dos quais foram
agrupados o dormitório, o refeitório, a cozinha e a adega
os 3 grandes edifícios a Norte da igreja são uma hospedaria, uma escola e a casa do
abade
a leste ficavam a enfermaria, uma capela e os alojamentos para os noviços, o cemitério e
um jardim
2.2.2 Os manuscritos e as encadernações
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as igrejas carolíngias continham pinturas murais e baixos relevos mas hoje em dia todos
desapareceram
apesar disso conservam-se alguns manuscritos iluminados, marfins e peças de
ourivesaria que confirmam a produção artística deste período
o antigo tesouro de Viena possui um evangeliário supostamente encomendado por
Carlos Magno que parece ligado à capela palatina – uma das imagens de s.Mateus faz
lembrar vivamente as pinturas murais de Pompeia desde os detalhes da figura até à
moldura que o envolve – só mesmo o halo que ostenta é típico da iconografia cristã
noutra iluminura realizada para o Evangelário do Arcebispo Ebbo de Reims o modelo
clássico já está traduzido em linguagem carolíngia: a pintura parece animada de uma
energia vibrante que põe tudo em movimento e S.Marcos não se encontra numa reflexiva
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atitude de pensamento mas sim de recepção dos ensinamentos sagrados através da
inspiração divina
o mais extraordinário dos manuscritos carolíngios é o Saltério de Utrecht já que toda a
obra é ilustrada por desenhos à pena: existem indicações de um modelo mais antigo nas
paisagens e nas arquitecturas mas o artista imbuiu os seus desenhos de uma qualidade
rítmica que dá às imagens uma coesão emocional
o estilo da escola de Reims transparece nos relevos da capa dos Evangelhos de Lindau
que mostra como a arte da ourivesaria se adaptou ao renascimento carolíngio com
alguns detalhes no engaste das pedras preciosas que permite a sua iluminação por
baixo; por outro lado a expressão de Cristo é de calma e solenidade e não de sofrimento,
mas essa representação é um escolha do artista já que as pequenas figuras que
assistem à crucificação expressam o seu desgosto mostrando que o artista era capaz de
representar esses sentimentos
2.3 A arte otoniana
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em 870 os restos do império de Carlos Magno eram governados pelos seus netos
sobreviventes: Carlos o Calvo rei dos francos e Luís o Germânico
o poder dos seus reinos tinha enfraquecido e agora tinham de enfrentar não só o avanço
do Islão ao Sul como também dos eslavos e magiares do leste e dos Vikings no Norte e
Oeste
os nórdicos que vinham assolando as costas das ilhas britânicas conquistam também
uma região de França à qual se deu o nome de Normandia – converteram-se ao
catolicismo e adoptaram a civilização carolíngia
na Alemanha o poder politico deslocara-se para a Saxónia a Norte e os reis saxões
nomeadamente Otão I estabeleceram um poder efectivo atingindo também a maior parte
da Itália através de um pacto de casamento
o monarca foi coroado imperador pelo papa em 962 tornando-se o império uma instituião
germânica a partir de então
2.3.1 A escultura
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durante o período otoniano a Alemanha tornou-s a nação mais influente da Europa quer
politica quer artisticamente
as realizações otonianas foram marcadas pela herança carolíngia mas rapidamente
ganharam caracteres originais
no crucifixo de Gedeão encontramos uma nova imagem do Salvador: escala
monumental, talhada em formas avultadas e com um profundo sentimento pelo
sofrimento de Cristo – a posição do corpo torna insuportavelmente real a violenta
distensão dos ombros e dos braços e a cara transformou-se numa máscara de agonia
sem vida
esta obra sugere uma influência da arte bizantina mas em vez do suave pathos
encontramos um expressivo realismo que passou a ser a imagem de marca da arte
germânica
2.3.2 A arquitectura
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a cidade de Colónia possuía estreitas relações com a casa imperial que foram
concretizadas em numerosas igrejas edificadas pelo arcebispo Bruno, irmão de Otão
a abadia beneditina de S. Pantaleão é um bom exemplo embora só a westwerk se tenha
mantido – possui no entanto o carácter maciço das fachadas carolíngias
o mais ambicioso patrono da arquitectura do período foi Bernardo bispo de Hildesheim e
o principal monumento que erigiu foi a igreja de S.Miguel
- a planta com as suas cabeceiras e entradas laterais lembra St. Gall mas aqui a
simetria é levada mais longe
- o interior com a sua grande superfície parietal, conserva o majestoso sentido
espacial do seu traçado primitivo
- a reconstrução levou a que fosse elaborada uma capela semi-subterrânea dedicada
a S.Miguel
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a cripta estava coberta por abóbadas de aresta assentes em filas de colunas e as
suas paredes tinham como abertura arcos de volta perfeita que a ligavam a um
corredor em forma de U como um deambulatório
2.3.3 O trabalho do metal
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as portas de bronze do bispo Bernardo provavelmente par as entradas do deambulatório
são um bom exemplo do requinte alcançado
a inspiração terá vindo das portas de bronze romanas mas as diferenças existem na
divisão em largas bandas horizontais em vez dos painéis verticais com uma cena bíblica
em cada uma das áreas
a composição deve ter-se inspirado num manuscrito iluminado já que os troncos torcidos
e estilizados lembram os elementos decorativos irlandeses – nota-se no entanto uma
diferença na força expressiva da forma como a história é contada
2.3.4 Os manuscritos
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mesma intensidade de olhar e gesto regista-se na pintura de manuscritos no período
otoniano onde se combinam elementos carolíngios e bizantinos
o centro mais importante de produção foi o mosteiro de Reichenau numa ilha do lago
Constança e a sua mais bela realização é o Evangeliário de Otão III
encontramos reminiscências da pintura antiga nos suaves matizados azuis que lembram
a pintura ilusionistica greco-romana e na moldura arquitectural onde se insere a figura de
Cristo
as figuras passam da importância do físico para o espiritual
o artista otoniano iluminou o sentido dos ensinamentos traduzindo-os em termos visíveis,
claros e evocadores
3 – A arte românica
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a utilização da expressão românico deveu-se a muitos dos elementos utilizados em
especial na arquitectura do período (arcos de volta perfeita e construções sólidas e
pesadas) serem muito próximas do estilo romano antigo
alguns eruditos chamam pré-românica à arte antes de Carlos Magno e proto-românica ou
românica primitiva à arte dos períodos carolíngio e otoniano
existe uma significativa diferença entre essas correntes já que a arte carolíngia assim
como a otoniana foram promovidas pelos imperadores ficando limitadas às suas regiões
enquanto a arte românica surgiu por toda a Europa
apesar disso muitos são os elementos que a arte românica foi buscar às artes de corte
assim como a influências mais antigas
o que juntou estas tendências numa só corrente artística foi a força única da religião
cristã tendo-se assistido a um crescente entusiasmo que foi concretizado nas
peregrinações e nas cruzadas
também o desenvolvimento económico das cidades permitiu o surgimento de novas
obras realizadas e promovidas pelos artífices e mercadores das grandes cidades
3.1 A arquitectura
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a arquitectura românica distingue-se das séculos anteriores pelo grande número de
edificações realizadas
estes edifícios não foram apenas mais numerosos mas também maiores, de estrutur
mais complexa e mais romanas dado que as naves eram cobertas com abóbadas em vez
de vigamentos de madeira e as suas fachadas ostentavam decoração arquitectónica e
até esculturas
os edifícios românicos apresentam-se distribuídos por todo o mundo católico desde o
Norte de Espanha até à Renânia e deste a fronteira anglo-escocesa até à Itália Central
no entanto, a maior variedade de tipos regionais e de conceções mais audaciosas
encontram-se em França
3.3.1 A França do Sudoeste
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Saint-Sernin de Toulose pertence a um conjunto de igrejas de peregrinação assim
chamadas porque foram construídas ao longo das estradas que se dirigiam a Santiago
de Compostela
a planta salta logo à vista pela sua maior complexidade :
- forma uma cruz latina com o centro de gravidade na cabeceira
- foi delineada em grandes dimensões não apenas para receber uma comunidade
monástica mas também uma multidão de fiéis
- a cada lado da nave encontram-se as duas colaterais e as interiores prolongam-se
pelo transepto e pela ábside formando um deamblatório o charola em torno do
altar-mor
- a charola fora um elemento utilizado nas criptas mas que aparece agora acima do
solo e enriquecida com capelas absidais que parecem irradia da ábside (capelas
radiantes)
- as colaterais de St Sernin têm abóbadas de aresta o que impõe um grande grau de
regularidade ao conjunto pois são compostas por tramos quadrados que servem de
unidade para outras áreas da planta
- no exterior temos ainda os vários níveis dos telhados, os contrafortes de apoio às
paredes, a molduragem decorativa das janelas e a grande torre lanterna
- a nave é impressionante pelas suas altas proporções , pela elaboração arquitectural
das paredes e pela obscuridade da iluminação indirecta
- a sintaxe da arquitectura antiga romana (abóbadas, arcos, colunas embebidas e
pilastras fortemente ligadas) reaparece com todo o vigor, no entanto as forças por
detrás desta obras já não são físicas mas sim espirituais
- abobadar o tecto da igreja não era apenas uma questão prática para evitar as
consequências dos incêndios mas era também uma forma de dar grandeza e
majestade à casa do Senhor
a altura e o peso da abóbada levaram a que o clerestório fosse sacrifica e
substituído por uma tribuna sobre as colaterais para anular o impulso lateral da
abóbada das naves
3.1.2 A Borgonha e a França Ocidental
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na Catedral de Autun temos uma forma mais elegante de resolver o problema do peso da
abóbada: as tribunas foram substituídas por uma arcada cega (chamada trifório pelas 3
aberturas por tramo) e janelas altas – surge assim um alçado com 3 partes
o que tornou possível esta construção foi a abóbada de berço quebrado que produzia um
empuxo mais para baixo do que para fora
por uma questão de harmonia o arco quebrado aparece também nas arcadas da nave
em Autun os limites do possível também foram atingidos dado que a parede da nave
mostra uma ligeira inclinação para o exterior sob o impulso da abóbada como uma
advertência contra as tentativas de aumentar a altura
uma terceira solução aparece no Oeste de França em igrejas como St.
Savin-sur-Gartempe nas quais a abóbada não tem arcos torais para que oferecesse uma
superfíeice lisa para pinturas a fresco o que leva a que o peso recaia sobre arcadas de
majestosas colunas – a nave está muito bem iluminada graças às colaterais que se
abrem quase à sua altura e possuem janelas largas
as 3 naves estão cobertas por um telhado único e a fachada principal a Ocidente é
enriquecida com relevos e estátuas como a de Notre-Dame-l-Grande em Poitiers com as
arcaduras orladas abrigando grandes estátuas
3.1.3 A Normandia e a Inglaterra
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na Normandia a fachada ocidental evoluiu de uma forma completamente diferente
reduzindo a decoração ao mínimo como em St Étienne de Caen, e com 4 enormes
contrafortes que dividem a frontaria em 3 secções prosseguindo o impulso vertical em
duas esplêndidas torres
a catedral de Durham começada em 1093 é a realização mais ambiciosa da arquitectura
anglo-normanda do século XI
- de planta mais simples a largura da nave excede St Sernin e o comprimento total
coloca-a entre as mais compridas do período medieval
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a abóbada da nave representa a primeira utilização sistemática de abóbadas de
aresta com nervuras em naves de 3 andares
- os tramos das colaterais são quase quadrados com abóbada de aresta
- os tramos oblongos da nave separados por fortes arcos torais apoiados em nervuras
desenham um duplo X dividindo os tramos em 7 secções em vez das quatro
habituais
- como os tramos da nave são duas vezes mais longos que os das colaterais, os arcos
torais caem nos pilares ímpares das arcadas que são maiores e de tipo composto
alternando com pilares menores de tipo cilíndrico
- as nervuras tornaram-se necessárias para dar uma armação sólida à abóbada de
arestas para que as superfícies curvas pudessem ser preenchidas com alvenaria
com uma espessura pequena para lhe diminuir o peso
- a robustez dos pilares alternados faz um contraste interessante com os panos das
abóbadas que parecem velas de barco enfunadas numa iluminação a claro-escuro
voltando ao interior da igreja de St Etienne em Caen, parece que a nave foi projectada
inicialmente com tribunas, clerestório e travejamento de madeira mas depois da
experiência de Durham a estrutura foi adaptada para receber as abóbadas
os tramos da nave são quadrados fazendo ogivas em X único com uma nervura
suplementar transversal a produzir uma abóbada nervurada com 6 panos
estas abóbadas sexpartidas já não exigem arcos torais tão espessos economizando no
peso da estrutura e permitindo uma maior continuidade com os pilares
a graciosidade desta composição começa a fazer lembrar as catedrais etéreas do gótico
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3.1.4 A Lombardia
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na Lombardia as cidades tinham adquirido grandeza e prosperidade e procuravam
resolver os mesmos problemas das abóbadas de arestas nervadas mas agora também
com o contributo dos monumentos paleocristãos de Ravena
em S. Ambrogio de Milão encontramos estes elementos:
- as fachadas de tijolo recordam a simplicidade geométrica das fachadas das igrejas
de Ravena
- no atrium deparamos com a bela severidade das arcadas profundas da frontaria e
logo atrás as duas torres sineiras construções independentes mas adossadas às
paredes da igreja
- a maioria dos campaniles que aparecerão nas igrejas posteriores vão ser quadrados
mantendo a tradição da torre sineira afastada da estrutura da igreja
- a nave baixa e larga é formada por 4 tramos separados por grossos arcos torais
- não há transepto mas o último tramo da nave suporta uma torre lanterna
- como em Caen ou Durham volta a ser usado o artifício dos pilares alternados mas as
abóbadas são muito diferentes, feitas de tijolo e pedra miúda são muito mais
pesadas- as nervuras diagonais formam semicircunferências e a abóbada sobe
muito acima dos arcos torais produzindo o efeito de uma cúpula
- o arquitecto poderia ter aberto um clerstório em vez da tribuna mas ao fazê-lo revelou
uma preferência pelos espaços mais amplos dos templos paleocristãos em vez de
preferir maior altura e iluminação
- na Lombardia a abóbada de aresta nervada manteve-se dentro da tradição não
chegando à fase proto-gótica
3.1.5 A Germânia
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a arquitectura germânica mostrou-se igualmente conservadora mostrando a persistência
das influências carolíngio-otonianas
a catedral imperial de Espira tem uma westwerke e uma cabeceira monumental onde se
integram a torre-lanterna, a abside e duas torres
os seus pormenores arquitectónicos provêm da Lombardia mas a sua altura é nórdica; a
nave mais alta e larga que a de Durham tem um amplo clerestório pois fora planeada
para uma cobertura de madeira mas no início do século XII foi dividida em tramos
quadrados e coberta com pesadas abóbadas de aresta simples
a imponente cabeceira da catedral de Espira foi imitada em numerosas igrejas do Vale
do Reno e dos Países Baixos
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na catedral de Tournai aparece em duplicado nos dois extremos do transepto compondo
a maior concentração de torres do românico o que era já um traço constante das igrejas
medievais a norte dos Alpes desde a época de Carlos Magno
as torres tinham um valor não só decorativo e funcional mas também simbólico
representando o prestígio da igreja e da cidade
3.1.6 A Toscana
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a mais famosa das torres deve o seu nome a um acidente por defeito do terreno em que
foi implantada ou dos alicerces: a torre inclinada de Pisa
a torre pertencia a um conjunto que incluía a catedral e um baptistério redondo e de
cúpula
a Toscana manteve a plena consciência da sua herança clássica e por isso a planta da
catedral de Pisa assemelha-se às basílicas paleocristãs transformada em cruz latina pelo
acrescentamento de dois braços do transepto que parecem basílicas menores com as
suas absides próprias
o cruzeiro está marcado por uma torre lanterna de cúpula e o resto da igreja tem
vigamento de madeira com a excepção das colaterais que possuem abóbadas de aresta
o interior é um pouco mais elevado do que o das basílicas paleocristãs porque há
tribunas e um clerestório
as esplêndidas colunas clássicas suportando as arcadas da nave evocam os edifícios
romanos
a catedral de Pisa e os outros edifícios do conjunto estão cobertos de mármore branco
com embutidos de mármore verde-escuro formando bandas horizontais e motivos
decorativos
o revestimento foi combinado com arcadas cegas e galerias que dá um efeito rico de
textura e cor
em Florença a maior realização do românico foi o Baptistério fronteiro à catedral – é um
imponente prisma octogonal de cúpula em pirâmide com as fachadas revestidas de
placas de mármore em severas linhas geométricas e arcadas cegas clássicas na
proporção e nos pormenores
todo o edifício tem uma aparência tão romana que chegou a pensar-se que teria derivado
de um templo de Marte
3.2 A escultura
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o ressurgimento da escultura de pedra é mais assombroso que todas as inovações
arquitectónicas do românico porque os estilos carolíngio e otoniano não dão qualquer
indicação nesse sentido
as estátuas de vulto redondo tinham desaparecido completamente no século V e os
baixos relevos perduraram apenas como ornamentos arquitecturais com a profundidade
do talhe reduzida a um mínimo
a única tradução escultórica que permaneceu foi a da pequena escultura em reduzidos
relevos ou estatuetas de metal ou marfim
3.2.1 O sudoeste da França
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no século XI a escultura de pedra monumental voltou a surgir em local desconhecido
mas muito provavelmente no Sul de França ou Norte de Espanha, o que se relaciona
com as peregrinações já que as esculturas eram muito mais dirigidas aos peregrinantes
que aos membros das comunidades monásticas
o rápido crescimento da escultura em pedra reflecte o aumento do fervor religioso mas
décadas antes da primeira cruzada
St Sernin tem vários exemplos importantes deste renascimento em especial na imagem
do Apóstolo
- a figura foi feita para ser vista de longe como o confirma o seu volume
- surge como uma figura representada a 3 dimensões com maior realismo que foram
muito criticadas por S. Bernardo de Claraval
- a solidez das formas dá-lhe um aspecto clássico
- a solene frontalidade da figura e a sua colocação numa moldura arquitectural
leva-nos a considerar uma raíz bizantina
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outro centro importante da escultura românica foi Moissac ao norte de Toulouse em
especial o portal Sul da igreja ricamente trabalhado – as formas humanas e animais são
tratadas com incrível flexibilidade e a imagem do profeta revela ainda uma liberdade de
tratamento patente nas pernas cruzadas e na cabeça inclinada acentuadamente para o
interior da igreja
nos fustes das colunas encontramos ainda outro tipo de iconografia com leões
entrançados que lembra a arte decorativa irlandesa ou os trabalhos persas de metal –
estes elementos pretendiam no entanto representar as forças demoníacas que assim
ficam presas
o portal é antecedido por um profundo narthex de paredes profusamente esculpidas
cujas figuras variam em proporções consoante o contexto arquitectónico determinando
que a maior importância é dada à vivacidade da narrativa e não há coerência do
tratamento
3.2.2 A Borgonha
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no tímpano da catedral de Autun encontra-se uma composição com o Cristo em
majestade coroando uma visão do Apocalipse ou do Juízo final, a cena mais aterradora
da arte cristã
o tema foi tratado com singular força expressiva no tímpano de Autun procurando inspirar
a contrição aos fiéis que entravam na igreja
o mais belo dos tímpanos românicos é talvez o de Ste Madeleine em Vézelay onde é
representado o tema da Missão dos Apóstolos que tinha particular significado num
período de cruzadas visto que proclamava o dever de todo o cristão de levar o Evangelho
a todo o mundo
para além das figuras que representam a cena encontramos também os representantes
do mundo pagão na arquivolta os signos do Zodíaco que simbolizavam a
intemporalidade da fé cristã
3.2.3 O Românico Pleno na Provença e na Itália
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a escultura dos portais de Moissac, Autun e Vézelay tem numerosas qualidade sem
comum:
- intensa expressão
- fantasia desenfreada
- nervosa agilidade de forma que deve mais às iluminuras e aos trabalhos de metal do
que à tradição escultórica da Antiguidade
a influência dos monumentos clássicos é especialmente forte na Provença assim como
na Itália
na igreja de St Gilles-du-Gard encontramos no portal central uma das obras-primas da
escultura românica caracteristicamente clássico pela moldura arquitectónica com a ssuas
colunas, e os acantos dos capitéis
as duas grandes estátuas enquadradas talhadas em quase vulto redondo têm peso e
volume e apresentam a mesma riqueza de pormenor
estas duas estátuas aparentam-se com a do rei David na fachada da Catedral de Fidenza
na Lombardia de Benedetto Antelami com uma forte personalidade que marca m estilo
pessoal
o David encontra-se fisicamente livre dando indicações de que se procurou readquirir o
contrapposto clássico embora a moldura arquitectural seja imprescindível para o
equilíbrio da figura, ela aparece sem a disciplina de uma série surgindo como uma
imagem claramente autónoma
3.2.4 O vale do Mosa
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o ressurgimento da individualidade artística não ficou limitado a Itália tendo aparecido
também numa região do Norte, no vale do Mosa
surge também associada à influência da arte antiga apesar de não ter dado origem a
esculturas monumentais mas sim a um desenvolvimento d trabalho do metal
a esplêndida pia baptismal de Liège é a obra mais antiga do artista da região, Renier de
Huy – repousa sobre 12 bois que representam os apóstolos e em vez da rude força
expressiva das portas de Bernardo características da arte otoniana, encontramos um
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harmonioso equilíbrio de traçado um domínio das superfícies esculpidas e uma
compreensão da estrutura orgânica que numa linguagem medieval são
extraordinariamente clássicos
3.2.5 A Germânia
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a única estátua autónoma românica conhecida é a de um leão de bronze do Duque
Henrique da Saxónia que foi colocado em frente ao seu palácio de Brunsvique em 1166
a fera lembra-nos a loba capitolina e os gomis de bronze com a forma de leões e outros
animais que se começaram a usar na Missa a partir do século XII para o ritual da
lavagem das mãos que por sua vez eram de inspiração oriental
3.3 A pintura
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ao contrário da arquitectura e da escultura, a pintura românica não teve um
desenvolvimento súbito e revolucionário
nos século XI e XII a pintura era uma arte importante mas demonstrava uma grande
continuidade sobretudo nas iluminuras dos manuscritos
3.3.1 A França
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a partir do no ano 1000 surge um novo estilo de pintura que tem as suas raízes nos
desenvolvimentos da escultura monumental
a nova concepção é clara no Evangeliário de Corbie no Norte de França numa imagem
de S. Marcos – o movimento rodopiante e retorcido das linhas que atinge a figura do
evangelista e do leão alado lembram as iluminuras carolíngias da escola de Reims
no manuscrito de Corbie desapareceram todos os vestígios do ilusionismo clássico e em
vez do modelado aparecem contornos firmes com cores densas e brilhantes reduzindo
os aspectos tridimensionais a uma sequência de planos lisos
a iluminura de Corbie pode ser facilmente transposta para uma parede, um vitral uma
tapeçaria ou um painel em relevo sem perder nenhuma das suas qualidades essenciais
a Tapeçaria de Bayeux é um outro exemplo da mesma forma de composição desta vez
narrando a invasão da Inglaterra por Guilherme o Conquistador com o mesmo traço e
realismo da iluminura de Corbie mas também juntando elementos decorativos com
elementos da narração numa estrutura coerente e harmoniosa
a nova pintura mural também apresenta a mesma característica de contornos firmes e de
um poderoso sentido das formas
na abóbada da nave de St Savin-sur-Gartempe aparece uma imagem da construção da
torre de Babel que é uma composição intensamente dramática e cheia de vigor – os
contornos espessos e negros e a ênfase dos gestos tornam a pintura bem legível de
longe
3.3.2 A região do canal
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as mais belas composições da pintura românica surgiram nos scriptoria monásticos do
norte da França, da Bélgica e da Inglaterra Meridional
a iluminura de S. João do Evangeliário do Abade Wendricus é tanto atribuindo a Cambrai
como a Cantuária e para além dos traços lineares abstractos de Corbie, nota-se uma
influência bizantina sem perder o seu ritmo próprio assim como a fonte celto-germânica
as pregas da roupagem, os ramalhetes florais da moldura possuem uma vivacidade
impulsiva e disciplinada que é um eco dos monstros entrelaçados do estilo animalista
enquanto a folhagem de acanto deriva dos elementos clássicos e as figuras humanas se
baseiam em modelos carolíngios e bizantinos
nos meados do século XII teve origem uma importante mudança de estilo da pintura
românica em ambos os lados da Mancha:
- em vez de motivos abstractos encontramos linhas que recuperaram a capacidade de
descrever a tridimensionlidade
- os panejamentos já não possuem uma feição ornamental ma sugerem o volume
arredondado do corpo reaparecendo o interesse pelo escorço
a origem deste novo estilo poderá estar no trabalho dos metais já que tem um cunho mas
escultórico que pictural
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o seu principal especialista doi Nicholas de Verdun em cuja obra o estilo do desenho
classicizante e tridimensional chega à lena maturidade
- a humanidade da arte de Verdun teve por fundo o interesse pelo homem e pelo mundo
natural que despertara na Europa do Noroeste
- este aspecto reflecte-se na poesia lírica que canta a alegria de viver assim como os
Carmina Burana compostos no final do século XII e conservados num manuscrito
iluminado do século XIII
- é uma colecção dedicada aos deleites da natureza, do amor e da bebida iluminada com
imagens inovadoras: num poema dedicado à Primavera encontramos uma paisagem que
apesar dos elementos naturais serem abstractos estão dotados de uma estranha
vivacidade que faz recordar os aspects essenciais da realidade
4 – A arte gótica
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a arte gótica teve durações diferentes em regiões diferentes:
- em cerca de 1150 só existia na Ile-de-France junto a Paris
- um século depois já se tinha expandido à maior parte da Europa da Sicília à Islândia
e mesmo no Próximo Oriente levado pelos cruzados
- em 1450 a área do Gótico começa a diminuir em especial na Itália
- em meados do século XVI o gótico estava reduzido a quase nada
a arte gótica teve assim uma duração máxima de cerca de 400 anos em algumas regiões
enquanto noutras imperou apenas por cerca de 150 anos
a nova arte começou pela arquitectura através das grandes catedrais mantendo o seu
lugar dominante; a escultura começou por ser apenas decorativa e isolou-se apenas
entre 1220 e 1420; a pintura atingiu o seu apogeu entre 1300 e 1350na Itália Central e a
partir de 1400 a norte dos Alpes
inicialmente o gótico desenvolveu-se como um estilo único e dominante que era
designado por opus modernum ou francigenum (trabalho moderno ou francês) mas no
decurso do século XIII começam a surgir as variantes regionais até 1400 quando surge
um Gótico Internacional extraordinariamente homogéneo mas rapidamente vai
desaparecer para dar lugar a um proto-renascentista em Itália
4.1 A arquitectura
4.1.1 A França
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o estilo gótico nasceu sob a influência do Abade Suger entre 1137 e 1144 na
reconstrução da abadia real de St Denis
a autoridade do rei francês era constantemente minada pelos nobres e foi só com Luís VI
que a monarquia francesa se começou a impor
o abade Suger era consultor do monarca e com o objectivo de conferir à monarquia uma
dignidade régia preparou os planos para a reconstrução de St Denis que tinha um duplo
significado: era o santuário do Apóstolo da França e era o principal monumento
comemorativo da dinastia Carolíngia
Suger quis fazer da abadia o centro espiritual de França, uma abadia de peregrinação
que ofuscasse o esplendor de todas as outras e fosse o centro de todo o fervor religioso
na planta encontramos elementos conhecidos de outras igrejas de peregrinação: a
capela mor abisdial, com arcadas abertas para um deambulatório e capelas radiantes
mas esses elementos forma integrados de uma forma nova, deixando as capelas da
charola de ser independentes e fundindo-se num segundo deambulatório
o conjunto foi coberto com abóbadas de nervuras quebradas
a dupla charola não aparece como uma série de compartimentos mas sim como um
espaço contínuo cuja configuração é sublinhada pela rede de esbeltos arcos, nervuras e
colunas
o que distingue este interior é a leveza das formas arquitectónicas se comparadas com a
solidez do românico e as janelas foram ampliadas para ocuparem toda a superfície
parietal
o impulso das abóbadas é contido por pesados contrafortes no exterior salientes entre as
capelas deixando a impressão de leveza para interior e a sensação de robustez para o
exterior
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nenhum dos elementos do traçado da igreja de St Denis é radicalmente novo: a planta da
cabeceira de peregrinação, o arco quebrado, a abóbada de arestas com nervuras já
existiam em várias escolas do Românico francês e anglo-normando
há dois aspectos que caracterizam o novo espírito presente em St Denis: a importância
dada ao traçado rigorosamente geométrico e a busca da luminosidade – interpretação
simbólica da luz e da harmonia numérica
o desenvolvimento da arquitectura gótica também é considerado o resultado dos
progressos técnicos da engenharia que tornaram possível a construção de abóbadas
mais eficientes e a concentração dos seus impulsos nalguns pontos críticos
cabeceira de St Denis está projectada e construída mais racionalmente que qualquer
das igrejas precedentes
o arco quebrado pode ser esticado a qualquer altura e tornou-se uma parte integrante da
abóbada de nervuras que já não ficam limitadas aos tramos quadrados ganhando uma
flexibilidade que lhes permite cobrir qualquer tipo de superfície poligonal
o arquitecto responsável por St Denis tinha que ser simultaneamente um artista
competente e sensível às ideias e instruções do Abade Suger
o futuro da arquitectura gótica não estava nas construções monásticas apesar do seu
início mas sim nas igrejas das cidades
o vigoroso ressurgimento urbano do século XI evou a um aumento da importância do
clero citadino passando as universidades e escolas catedrais a ocupar o lugar dos
mosteiros como centros do saber
a planta de eixo longitudinal bem acentuado é compacta e de forte unidade, a charola da
cabeceira prolonga-se pelas colaterais e o curo transepto mal excede a largura da
fachada
as grandes janelas do clerestório e a leveza das formas adelgaçadas criam um
inconfundível estilo gótico
em Notre-Dame de Paris os botaréus e os contrafortes não são visíveis de dentro da
igreja aparecendo na planta como blocos de cantaria ladeando o edifício como fiadas de
dentes
a fachada de maior monumentalidade da igreja é a do Ocidente na qual notamos a
persistência de alguns elementos: os contrafortes que reforçam os cunhais das torres e
dividem a fachada em 3 áreas, a colocação dos portais e o alçado de 3 andares
a fachad tem no entanto alguns pontos diferentes: nota-se a preocupação pela simetria
também evidente na escultura não permitindo o crescimento espontâneo característico
do românico, arcadas rendilhadas, grandes portais e janelões dissolvem a continuidade
das paredes
em cerca de 1145 o bispo de Chartres deu início à reconstrução da sua catedral sbo os
mesmos princípios de Suger representando a primeira obra-prima do estilo gótico na
maturidade
as tribunas foram reduzidas a uma estreita passagem aberta na espessura da parede
escondida pela arcada do trifório; as arcadas da nave são mais altas e estreitas e
meias-colunas foram embebidas nas colunas de suporte
a magia do seu espaço interior deve-se em grande parte aos seus vitrais que
sobreviveram até aos nossos dias que funcionam como filtros difusores modificando a
qualidade da luz diurna
o estilo gótico pleno culmina no interior da Catedral de Amiens onde a altura foi elevada
até aos limites – a lógica interna do sistema afirma-se com vigor na configuração das
abóbadas tensas e delgadas como membranas e no alargamento da superfície ocupada
pelas janelas altas nas quais ficou incluído o trifório
a mesma preocupação pela veticalidade e transparência nota-se na evolução da fachada
da Catedral de Reims – os portais são projectados para fora, como alpendres coroados
por gabletes, com janelões acima das portas em vez de tímpanos; a galeria das estátuas
régias foi elevada até se fundir com a arcada superior e todos os detalhes se elevam e
adelgaçam – uma floresta de pináculos acentua esse movimento para o alto
as catedrais francesas góticas foram monumentos verdadeiramente nacionais que
implicaram grandes gastos de recursos e energias – à medida que nos vamos
aproximando da segunda metade do século XIII sentimos um rrefecimento no
entusiasmo construtivo
em St Urbain de Troyes o fim do período gótico aproxima-se com a preocupação pelo
requinte dos pormenores e pouca importância dada à monumentalidade
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a última fase do gótico arqitectónico é conhecido como gótico flamejante qu derica dos
motivos ondulantes, de curvas e contracurvas que predominam nos lavores da pedra
como em St Maclou de Ruão
além destes edifícios religiosos as construções seculares reflectem as mesmas
tendências gerais mas sofrem desvios consoante as exigências dos trabalhos que vão
desde pontes e fortificações até palácios, celeiros e edifícios das comunas ou municípios
geralmente o período de aproveitamento destes edifícios é menor assim como a sua
duração sendo por isso muito limitado o número de edifícios seculares góticos que
sobreviveram e os que se mantiveram são do final desse eríodo durante os século XIV e
XV
o Louvre em Paris é um exemplo eloquente: erigido em cerca de 1200 obedecia às
regras rígidas dos castelos da altura, sndo essencialmente uma robusta torre rodeada
por muralhas; em 1360 o rei Carlos V decidiu convertê-lo numa sumptuosa residência
real disposta simetricamente em torno de um pátio quadrado tinha salas confortáveis e
ricamente decoradas
o exterior do Louvre ainda possui algumas das características ameaçadoras de uma
fortaleza as fachadas viradas par ao pátio ostentava uma grande riqueza ornamental e
escultórica
o mesmo efeito acontece na casa de Jacques Coeur em Bruges construída na década de
1440 – o pátio ladeado pelo conjunto dos telhados pontiagudos, pináculos e esculturas
decorativas lembra as formas da arquitectura religiosa flamejante
4.1.2 A Inglaterra
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a arte gótica teve um acolhimento entusiástico em todo o Ocidente adaptando-se a uma
grande variedade de condições locais e sendo adoptado mesmo como um estilo nacional
de cada uma das regiões
a rápida progressão do gótico deveu-se a um conjunto de factores:
- a perícia dos arquitectos e escultores franceses
- o enorme prestígio intelectual dos centros franceses de ensino superior
- influência da ordem monástica de Cister de S. Bernardo de Claraval
as igrejas das abadias cistercienses eram de um tipo diferente, severo e com uma
cabeceira rectangular em vez da dupla charola
apesar destes elementos diferentes foi dada muita importância à harmonia de
proporções
a Inglaterra mostrou-se particularmente receptiva ao novo estilo mas recebendo as
influências directamente da Ile-de-France e do gótico de Cister
a catedral de Salisbúria é muito diferente das suas homologas francesas: em vez da
sólida aparência compacta e da verticalidade encontramos uma construção longa baixa e
dilatada
a fachada principal converteu-se numa parede rendilhada, grelha rendilhada maior do
que o corpo da igreja e estratificada em bandas horizontais carregadas de ornamentação
e estatuária
outra característica peculiar é o encurvamento da abóbada da nave parecendo as janelas
altas encaixadas entre as abóbadas
o gótico inglês não evoluiu no sentida da verticalidade como mostra a capela-mora da
Catedral de Gloucester que se insere no chamado estilo perpendicular – a repetição dos
pequenos painéis rendilhados lembram as bandas de escultura de Salisbúria
as nervuras assumiram um papel totalmente novo multiplicando-se até formarem um
reticulado ornamental que dissimula as separações dos tramos dando à abóbada a
impressão de uma superfície contínua
o cúmulo do gótico flamejante foi atingido na abóbada de estalactites da capela de
Henrique VII na abadia de Westminster construída no século XVI
4.1.3 A Alemanha
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na Alemanha a arquitectura gótica alastrou mais devagar do que em Inglaterra e até
meados do século XIII ainda se notavam os persistentes traços otonianos
a catedral de Colónia foi uma tentativa de evolução do sistema francês mas ficou
icompleta até ao século XIX e não fez escola
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mais características da arquitectura gótica alemã foram as igrejas salão, as Hallenkirche
– com a nave central e as colaterais à mesma altura – a capela de St Sebald de
Nuremberga é um dos melhores exemplos
4.1.4 A Itália
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a arquitectura gótica em Itália evoluiu de uma forma totalmente diferente juntando
elementos mediterrânico e góticos embora a influência mais profunda tenha sido das
abadias cistercienses
uma das mais belas abadias é a de Fossanova consagrada em 1208 – a planta
assemelha-se a uma variação simplificada da de Salisbúria e o interior é semelhante a
todas as abadias cistercienses da época
as igrejas como a de Fossanova causaram grande impressão nos franciscanos uma nova
ordem que se desenvolvia em Itália e que assumiu o estilo de arquitectura cisterciense
Santa Croce de Florença é uma das principais obras franciscanas embora tenha um tecto
d emadeira em vez das características abóbadas pra evocar a simplicidade das basílicas
paelocristãs – só tem traços góticos na capela-mor com abóbada de nervuras e nas
paredes da nave com a leveza e a transparência das igrejas do Norte
a Catedral de Florença foi elaborada com objectivos de monumentalidade que se reflectia
mesmo na planta original de Arnolfo di Cambio com a sua cúpula octogonal contrafortada
por meias cúpulas, um sistema de origem tardo-romana
além dos portais e janelas nada tem de gótico e as robustas paredes com embutidos
geométricos de mármore condizem com o baptistério em frente
a abóbada de ogivas repousa directamente sobre as enormes arcadas fazendo realçar a
largura em vez da altura e os pormenores arquitectónicos possuem uma solidez maciça
de carácter mais românico que gótico
a Catedral de Orvieto foi desenhada por Lorenzo Maitani e tem muitos elementos
derivados das fachadas francesas e a sua leveza também é inconfundivelmente gótica
os traços foram apostos numa fachada de tipo basilical como a do Duomo de Florença
dando ao conjunto a impressão de ser de dimensões em menores do que o seu tamanho
real – na fachada não existe um elemento dominante, antes todos se articulam para fazer
um conjunto equilibrado que nos dá a vaga ideia de uma estrutura desmontável
a maior igreja gótica de Itália é a Catedral de Milão iniciada em 1386 e apresenta-se
como um compromisso entre as tradições meridionais e setentrionais com uma
decoração tardo-gótica excessiva e heterógenea
a arquitectura secular gótica é tão diferente das restantes como a religiosa como o
Palazzo Vechion em Florença – edifícios como este semelhante a uma fortificação
revelam a constante luta de facções características das cidades-estado italianas e a alta
torre não é apenas um símbolo de soberania mas também um posto de observação
Veneza era já uma cidade muito mais pacífica devido à próspera aristocracia mercantil
que compunha sua elite – os palazzi venezianos livres das necessidades de defesa eram
edifícios graciosos e com rica ornamentação como o Ca' d'Oro onde se regista um toque
do requinte oriental
4.2 A escultura
4.2.1 A França
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apesar de se referir pouco à decoração, certamente que o abade Suger deu bastante
importância a ela
os 3 portais da fachada eram maiores e mais ricos de escultura do que os portais das
fachadas românicas mas infelizmente estão demasiado destruídos para serem
analisados
os portais da fachada de Chartres representa o mais antigo exemplo do Gótico inicial e
impressiona-nos com o seu sentido de ordenação – o amontoamento denso e o
movimento frenético da escultura românica dão lugar a uma acentuada simetria e clareza
o novo tratamento das ombreiras é particularmente revelador com altas estátuas
adossadas nas colunas – primeiro passo para o ressurgimento das esculturas de vulto
redondo
as cabeças das estátuas já possuem a humana suavidade prenúncio da tendência
realista da escultura gótica
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o gótico parece ser uma reacção contra os aspectos demoníacos do românico
as estátuas das ombreiras aparecem numa sequência contínua ligando os 3 portais e
representando profetas, reis e rainhas da Bíblia
Cristo aparece entronizado sobre o portal principal como juíz e soberano universal
ladeado pelos símbolos dos 4 evangelistas
quando catedral de Chartres foi reconstruída em 1195 os portais reais da fachada
ocidental devem ter parecido pequenos e antiquados o que pode ter dado origem às duas
novas fachadas nos transeptos nas quais as colunas são eclipsadas pelas figuras com
dosséis salientes e com socos primorosamente lavrados
S. Teorodo já aparece à vontade numa posição que lembra o contrapposto clássico e
com um conjunto de detalhes cuidadosamente observados – a mais interessante
qualidade não é o seu realismo mas sim a imagem serena e equilibrada – esta estátua
encerra em si as tradições do Vale do Mosa
o que dá um cunho gótico a estas esculturas é a ternura que impregna toda a cena
o apogeu do classicismo gótco foi atingido em algumas estátuas da catedral de Reims
sendo as mais famosas as do grupo da Visitação , embora as vastas obras tenham
levado a utilização de artífices variados que elaboraram estátuas diferente
meio século depois todos os vestígios de classicismo tinham desaparecido da estatuária
gótica e a própria forma humana se torna estranhamente abstracta – Virgem de Paris da
Notre Dame – recuo do realismo
o realismo gótico nunca foi sistemático mas sim de pormenores concentrado em obras de
pequeno vulto como os Trabalhos dos Meses da fachada da catedral de Amiens
4.2.2 A Inglaterra
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a difusão da escultura par além de França só tece lugar de pois de 1200 mas progrediu
espantosamente depressa por exemplo em Inglaterra
a maioria das obras foram destruídas mas sobrou o exemplo de um sarcófago que
mostra o defunto não em plácido repouso mas na violência da acção – é o herói tombado
que se bate até ao último fôlego
4.2.3 A Alemanha
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na Alemanha a evolução da escultura gótica é mais fácil de seguir mas mesmo a partir de
meados do século XIII a Alemanha não conseguia rivalizar com a França – apesar disso
conseguiram dar uma maior liberdade de expressão e individualidade às suas obras
o mestre de Naumburg foi um famoso artista cuja obra mais conhecida é a série de
baixos relevos e estátuas que esculpiu na catedral de Naumburg
o sofrimento de Cristo no Calvário é uma realidade humana devido ao acentuar do peso e
volume do corpo – Maria e João apelam par ao contemplador transmitindo a sua dor com
eloquência
adossadas aos colunelos interiores da capela-mor encontramos as estátuas dos nobres
que contribuíram para a construção da catedral – embora essas mulheres não fossem do
seu tempo o artista deu a cada uma delas uma personalidade tão individual e marcada
como se as tivesse retratado em vida
no final do século XIII surgiram obras de devoção privada conhecidas como Andachtsbild
e o seu tipo mais característico foi a Mater Dolorosa ou Pietà – o exemplo que temos é
feito em madeira e pintada com cores coloridas
o realismo tornou-se um veículo de expressão com os rostos angustiados a feridas
rasgadas, coágulos de sangue, corpos e membros esquálidos como bonecos
4.2.4 O estilo Internacional (Norte)
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o apogeu desta corrente deu-se em cerca de 1400
o seu representante máximo foi Claus Sluter um escultor de origem neerlandesa
trabalhando par ao Duque de Borgonha em Dijon
o portal da Cartuxa de Champmol faz recordar a estatuária monumental mas as figuras
tornaram-se tão grandes que apagam o quadro arquitectural
as esculturas foram justapostas às pilastras e colunelos e não criada a partir deles
as outras obras de Sluter são essencialmente alfaias litúrgicas associando a grande
escultura a elementos arquitecturais de escala reduzida
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a realização mais impressionante é o Poço de Moisés, um poço simbólico rodeado de
estátuas incluindo a de Moisés que condensa as mesmas qualidades da Cartuxa:
roupagens flexíveis envolvem o corpo como uma concha e as formas entumescidas
parecem estender-se para o espaço circundante
na estátua de Isaías o que ressalta são os pormenores e a individualidade da cabeça
que nos aparece como se fosse um retrato
Sluter deixou-nos ainda dois trabalhos representando as cabeças do duque e da duqesa
no portal da Cartuxa
4.2.5 Itália
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as obras mais antigas foram provavelmente executadas nas regiões meridionais na
Apúlia e na Sicília pelas ordens do imperador germânico Frederico II
há provas que preferia um estilo clássico
Nicola Pisano veio da Itália Meridional para a Toscana e em 1260 terminou púlpito e
mármore do baptistério da Catedral de Pisa – a composição é tão clássica que apenas os
arcos, os capitéis e as figuras de pé nos cantos indicam tratar-se de uma obra do período
gótico
passado meio século, o seu filho Giovanni Pisano também elaborou um púlpito muito
semelhante ao do seu pai – as figuras esbeltas lembram agora a arte da corte de Paris
que se torna norma no gótico do século XIII
no Sul encontramos tendências escultóricas muito diferentes do Norte onde as
decorações se encontram nas estátuas das ombreiras e nos tímpanos – no Sul
sobreviveram as tradições romanas das estátuas em nichos ou os pequenos baixos
relevos revestindo as paredes
no campo do mobiliário eclesiástico a escultura italiana distinguiu-e como nos púlpitos,
cancelas, relicários e sepulcros
monumento a Can Grande della Scala o senhor de Verona – baldaquino abobadado sob
o qual se encontra o sarcófago coroado por uma pirâmide truncada que é o pedestal d
euma estátua equestre do defunto enverga armadura completa de espada na mão e com
um rasgado sorriso de auto-confiança – franca glorificação do poder
4.2.6 O estilo Internacional (Sul)
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no final do século XIV a Itália mostrou-se particularmente receptiva às influências de além
dos Alpes – tendência para um realismo mais acentuado e o interesse renovado pelo
peso e volume
um dos mais ilustres representantes desta corrente é Lorenzo Ghiberti que na sua
juventude deve ter estado em estreito contacto com França
encontramo-lo em 1401 quando ganhou um concurso para realizar uma porta de bronze
para o baptistério de Florença e distinguiu-se pela perfeição do trabalho que reflecte a
sua prática como ourives
apesar da influência francesa nota-se no seu trabalho uma admiração pelas obras
clássicas mas também um novo sentido da proporção e da perspectiva
4.3 A pintura
4.3.1 A França
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a pintura gótica desenvolveu-se com lentidão e essencialmente através dos vitrais que
iluminavam o interior das igrejas com uma luz difusa e colorida
o vitral ocupou por isso o lugar da iluminura em termos da pintura gótica
como as oficinas estavam ligadas às grandes catedrais, a influência da escultura foi cada
vez maior
o majestoso Habacuc da catedral de Burges está aparentado com as estátuas dos
portais de Chartres e de Reims
a janela não é composta de grandes vidraças mas sim por centenas de pequenos
pedaços de vidro coloridos unidos através de tiras de chumbo – o artista pintava com o
vidro deixando apenas os pormenores finos como os olhos, os cabelos ou os pragueados
da roupa pintados sobre o vidro
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para além das exigências da pintura sobre o vidro os artífices tiveram ainda que resolver
outro problema, o da escla já que por exemplo o janelão de Habacuc tem mais de 4
metros de altura
o traçado arquitectural gótico obedece a um sistema de relações geométricas e as
mesmas regas podiam ser utilizadas para traçar uma composição num vitral ou até em
figuras isoladas
os desenhos do arquitecto Villard de Honnecourt representam essa relação numa série
de esboços que utilizando círculos e triângulos representam as várias partes de cada
imagem
o período de 1200 a 1250 pode ser considerado a Idade de Ouro do vitral e depois desse
período as encomendas de vitrais tornaram-se mais raras e a iluminura voltou a ganhar a
sua importância
a mudança de estilo das iluminuras é evidente: sob um fundo bidimensional as figuras
destacam-se reveladas por um modelado discreto e hábil – as figuras apresentam ainda
todos os indícios do estilo elegante criado na corte real com gestos graciosos, posições
sinuosas, rostos sorridentes e cabelos cuidadosamente ondulados
até ao século XIII a produção de manuscritos estivera confinada aos scriptoria mas a
pouco e pouco vai-se transferindo para as oficinas urbanas organizadas por artistas
seculares
alguns membros desta arte são conhecidos como Honoré de Paris que pintou as
ilustrações do Livro de Horas de Filipe com o estilo a derivar do Saltério de S. Luís ms a
moldura já não domina a composição, o modelado acentuou-se e as figuras tornam-se
maiores o que cria um efeito de perspectiva espacial
4.3.2 A Itália
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a pintura italiana no final do século XIII teve uma explosão de energia criativa tão
importante como as catedrais francesas
a Itália medieval foi profundamente influenciada pela civilização bizantina que manteve
viva a tradição da pintura sobre madeira, do mosaico e da pintura a fresco
esse estilo neo-bizantino era chamado de maniera greca e foi da sua combinação com os
elementos góticos que surgiu o estilo revolucionário do qual Giotto foi o maior expoente
entre os pintores da maniera greca, Cimabue gozou de especial fama totalmente
justificada já que a Virgem no trono está ao nível dos melhores ícones bizantinos
distinguindo-se especialmente o rigor de traçado e expressão bem adaptados ao seu
tamanho enorme
outra Virgem no Trono pintada por Duccio de Siena demonstra o estilo regional já que
temos a doçura de Siena em destaque mas também a rapidez de evolução do estilo
os panejamentos rígidos, angulosos deram origem a uma suavidade ondulante e os
corpos, faces e mãos começam a ganhar volume e tridimensionalidade
Duccio conseguiu ainda outra mudança revolucionária – no painel da Anunciação
mostra-nos duas figuras dentro de um espaço arquitectónico, um efeito inédito já que os
artistas anteriores tinham conseguido apenas colocar as decorações arquitecturais atrás
das figuras parecendo que se encontravam num teatro ao ar livre
Giotto é um artista de tempera acentuadamente audaz e emotiva
inicialmente mostrou-se menos próximo da maneira grega herdando o sentido de escala
monumental de Cimabue o que fez dele mais um pintor de frescos do que de painéis
Duccio e Giotto elaboraram o mesmo tipo de representação de Cristo entrando em
Jerusalém mas com efeitos diferentes:
- Duccio enriqueceu o esquema tradicional com pormenores descritivos e criando um
espaço específico
- Giotto sujeitou o mesmo tema a uma ampliação radical com a acção a
desenvolver-se paralelamente ao plano do quadro sendo que as cores suaves
acentua a austeridade da obra de Giotto
- o quadro de Giotto faz-nos sentir mais perto da acção porque transmite a impressão
de tomar parte no acontecimento e não só de observá-lo
- isto deveu-se ao ponto de vista criado por Giotto que nos faz olhar para as figuras
como se estivéssemos ao mesmo nível enquanto na obra de Duccio estamos num
plano superior
- Giotto criou assim uma relação espacial entre o contemplador e o quadro
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a qualidade táctil de Giotto deve ter parecido aos seus contemporâneos um milagre e por
isso o louvaram como igual aos pintores da Antiguidade
outras obras de Giotto acentuam as suas qualidades como a Lamentção pela Morte de
Cristo:
- o centro de gravidade está muito baixo
- as figuras dobradas transmitem o ambiente sombrio
- oposição entre a rigidez das figuras e movimento agitado dos anjos
- a intensidade do drama é ainda realçada pela austera simplicidade do cenário
- a árvore nua e desolada simboliza a Natureza que se associa à morte de Cristo
a arte de Giotto é tão original que as suas fontes são muito difíceis de determinar mas
encontramos dados que apontam para a pintura bizantina e par a escultura clássica mas
a maior influência é a de Nicola e Giovanni Pisano
a Virgem em Majestade também tem alguns elementos interessantes: a austeridade
arquitectónica vem de Cimabue mas as figuras possuem o mesmo peso e volume dos
frescos da capela de Arena e o espaço pictural é convincente; nesta imagem nota-se
ainda o reaparecimento de imitações de pedras em tromp l'oeil que eram característicos
da pintura Antiga
a grandeza de Giotto inspirou uma nova geração de pintores como Simone Martini um
discípulo de Duccio
o apego à vida quotidiana surge também na obra dos irmãos Pietro e Ambrogio
Lorenzetti mas numa escala de maior monumentalidade – a superfície pictural adquire a
qualidade de uma janela transparente através da qual temosa percepção do espaço da
experiência quotidiana
os primeiros 40 anos do século XIV foram um período de estabilidade política e
expansão económica mas na década de 1340 Florença e Siena sofreram uma série de
catástrofes como más colheitas, falências e a Peste Negra
a reacção popular a esses acontecimentos foi variada pois enquanto muita gente os
encarou como sinais da cólera divina, outros pensaram que o receio da morte os devia
fazer gozar melhor a vida
o fresco de Francesco Traini revelou quando foi recuperado os desenhos a vermelho que
precediam o trabalho de pintura chamados sinopie
4.3.3 O Gótico Setentrional
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a influência da pintura italiana fez-se sentir a Norte dos Alpes durante a última metade do
século XIV
Jean Pucelle adaptou o novo espaço pictural ao carácter especial da página que se
presta menos do que uma parede a assemelhar-se a uma janela
surgiram também droleries, fantasiosas composições marginais que foram um traço
característico da iluminura gótica setentrional
o seu repertório abrange uma vasta gama de motivos como a fantasia, a fácula, o humor
grotesco e cenas da vida quotidiana misturam-se com temas religiosos
em meados do século XIV a influência italiana torna-se mais importante e em alguns
casos foi transmitida por artistas italianos a trabalhar no Norte como Simone Martini
4.3.4 O Estilo Internacional
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por volta de 1400 a fusão das tradições góticas e italiana fez surgir um estilodominante
em toda a Europa Ocidental e embora estes estilo não tivesse surgido apenas na pintura
os pintores desempenharam um papel decisivo na evolução estilística
entre os artistas mais importantes encontra-se Melchior Broederlam um flamengo que
trabalhou na corte do duque de Borgonha em Dijon
o painel que exemplifica o seu estilo possui duas pinturas causando uma sensaçãod e
profundidade muito forte devido ao subtil modelado com as formas suavemente
arredondadas, as sombras acentuadas e aveludadas criando uma atmosfera luminosa e
aérea que compensa os defeitos de escala e perspectiva
outros artistas famosos do período são os irmãos Limbourg cuja obra mais importante
são as iluminuras das Très Riches Heures du Duc de Berry
as páginas mais notáveis são as do calendário com representações minuciosas da vida
do homem e da Natureza através das estações do ano
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alguns exemplos são as páginas de Fevereiro que representa a primeira paisagem de
neve enquanto a página de Outubro representa o trabalho das sementeiras com uma
riqueza de pormenores em que se insere o contraste entre o pobre camponês e o castelo
do seu senhor
por fim a página de Janeiro é uma das poucas cenas interiores que mostra o Duque de
Berry num banquete sendo este perfeitamente reconhecível embora os seus
companheiros careçam de personalidade pois apresentam-se como manequins
aristocráticos cuja beleza lembra a beleza dos modelos
o maior pintor italiano do estilo Internacional foi Gentile da Fabriano e uma das suas
obras mais importantes é o Nascimento de Jesus
é uma obra notável pelo pormenor dos animais e dos rostos dos reis Magos que
representam a sua procedência oriental
esta obra tem ainda um tratamento da luz muito interessante já que orienta e domina o
quadro
a poética intimidade desta cena nocturna abre um mundo inteiro de novas possibilidades
artísticas
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