Miguel Reale Jr. - Associação Paulista do Ministério Público

Transcrição

Miguel Reale Jr. - Associação Paulista do Ministério Público
Ano II # 15
Miguel Reale Jr.
Da indignação à ação
Defesa do Consumidor
O papel do MP nessa luta
Eleições PGJ
Rodrigo Pinho, o mais
votado, é nomeado
Palavra do Presidente
Eleições para a PGJ
A APMP sempre buscou o melhor para o MP de São Paulo
— e muito contribuiu para seu engrandecimento. Em todos
os momentos institucionais relevantes, é importante uma
profunda reflexão, para que sejam encontrados os melhores
caminhos a trilhar.
Sempre acreditei na idéia de que o promotor de justiça
deve “sair dos gabinetes”, que nossa Instituição deve valorizar o corpo técnico de funcionários e que os membros do MP
devem atuar para fazer valer plenamente os direitos, deveres,
prerrogativas e atribuições insertas na Carta Magna.
Lembro que coube à APMP um dos primeiros reconhecimentos públicos aos brilhantes trabalhos dos promotores de
Santana e Santo Amaro na aproximação com a comunidade,
objeto de divulgação nesta revista (edição n. 10) e em nosso
programa de TV. Agora essas destacadas iniciativas são também elogiadas pelos órgãos da Administração Superior, como
registrado na reunião do Conselho Superior de 21/03/06.
Bem por isso, nossas críticas, que sempre buscaram o que
imaginávamos o melhor para a Instituição, centravam-se no
campo das idéias e nunca em face de pessoas.
Vemos que o projeto para o próximo biênio mostrado à
Classe pelo Procurador-Geral de Justiça foi aprovado por folgada maioria.
Como democrata, não há outra atitude exceto a de aceitar a decisão das urnas. Seja ela a que desejamos ou não. Esta
é a essência do processo democrático.
Deste modo, tão logo apurado o último voto, iniciamos o trabalho junto ao Governador do Estado para
que o mais votado fosse nomeado, conforme o ofício
APMP nº 26/06 (veja matéria nesta edição).
Trata-se de questão de princípios, maior patrimônio da APMP e do MP de São Paulo. Nunca aceitamos
Revista APMP EM REFLEXÃO
Veículo mensal de comunicação
da Associação Paulista do
Ministério Público.
Ano II, Número 15 (2006).
Tiragem: 4.000 exemplares.
- e jamais o faremos – ingerência externa no processo
eleitoral interno.
Acredito que o caminho escolhido pela maioria deva ser
o trilhado pela Instituição e, nesse sentido, os projetos do PGJ
reeleito se revestem de indefectível legitimidade.
Porque a democracia tem de ser assim. Discutem-se
idéias, debatem-se propostas, apresentam-se os candidatos, que se submetem à escolha de todos. Depois, apurados os votos, o projeto escolhido deve ser implementado
pelo eleito.
Gostaria, em nome de toda a Diretoria da APMP e de todos os associados, saudar a vitória de Rodrigo César Rebello
Pinho como Procurador-Geral de Justiça legitimamente eleito pelos promotores e procuradores de justiça de São Paulo.
Mais ainda.
Como sempre estiveram desde o início de nossa gestão,
permanecem abertas as portas de nossa entidade para que o
recém eleito PGJ dela possa se valer para o engrandecimento
da Instituição, aliás, missão primeira de nossa APMP.
Parabéns aos promotores e procuradores de São Paulo
pelo espírito de civilidade demonstrado ao longo do processo
eleitoral, prova da maturidade da Instituição.
Elogios ao governador Geraldo Alckmin pelo acatamento
à vontade dos membros do MP de São Paulo.
Nesta edição trazemos entrevista exclusiva com o jurista
Miguel Reale Júnior, artigo do associado Gilberto Nonaka
sobre o exercício abusivo do dever nas relações de consumo e
as seções a que já se acostumaram nossos fiéis leitores.
Boa leitura.
Conselho Editorial
João Antonio Garreta Prats
Cláudia Jeck Garcia de Souza
Paulo Roberto Dias Júnior
Sérgio de Araújo Prado Júnior
Coordenação Geral
Luciano Ayres
João Antonio Garreta Prats
Presidente
Jornalista Responsável
Adriana Brunelli – MTB 33.183
Redação
Ayres.PP – Comunicação
e MKT Estratégico
(19) 3242-1180
Assessoria de Imprensa
ReDe Comunicação
(11) 3061-3353
Fotos
Ayres.PP – Comunicação
e MKT Estratégico
Leandro Irmão
Contraponto |
Miguel Reale Jr. 06
Em defesa da Sociedade | Da indignação à ação
Maxima Venia | O exercício abusivo do dever no
Código de Defesa do Consumidor
MP em foco | Futuro do MP X MP do Futuro
Eleições | Rodrigo Pinho é de novo
Procurador-Geral de Justiça
Cultura e Lazer |
18
28
32
Portinari
36
Um novo velho mundo
40
Arte pincelada com maestria
APMP Destinos|
14
Gastronomia |
Sabor e
Harmonia
no país do
Sol Nascente
44
Contraponto
Muito se fala sobre o
antagonismo que separa, no mais
das vezes, advogados e promotores
de justiça.
Se isso é verdadeiro quando
pensamos nas posições ocupadas
nos feitos judiciais, o conflito
desaparece quando o interesse é
a ética na política e o combate à
corrupção estatal.
Quando a APMP aderiu ao
movimento “Da indignação à
ação”, encontrou companheiros
dos mais variados matizes. Dentre
esses parceiros de luta estão a
APAMAGIS e a OAB-SP.
O entrevistado deste mês,
que participa ativamente do
movimento, tem mais de uma
faceta. Representa a advocacia, da
qual é um expoente, a Academia,
pelo respeitável currículo como
professor universitário e autor
de obras jurídicas, e o ativismo
político, cuja dignidade se pretende
resgatar.
Ser filho de um dos maiores
juristas vivos não foi decisivo na
escolha da carreira de operador do
Direito. Segundo Miguel Reale
Júnior, “havia no meu âmago, no
meu modo de ser, uma tendência
para trabalhar no âmbito da
justiça e em busca dela”.
A APMP em Reflexão tem a
honra de oferecer a seus leitores
entrevista exclusiva com o advogado
e jurista Miguel Reale Júnior.
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Miguel
Reale
Júnior
APMP em Reflexão: Até que ponto a influência paterna moldou seu caminho em direção ao Direito?
Miguel Reale Júnior: Na verdade foi uma escolha minha, independente de qualquer influência. Tanto que
fiz concomitantemente a Faculdade de Direito e a de
Filosofia. Permaneci no curso de filosofia pura durante 2 anos. Depois descobri o interesse pela advocacia
criminal e fui trilhar o meu próprio caminho. Evidentemente que sofri influências da figura paterna no cotidiano. Muitos valores me foram transferidos. Mas creio
que havia realmente no meu âmago, no meu modo de
ser, uma tendência para trabalhar no âmbito da justiça
e em busca dela.
APMP: A APMP participa do movimento “Da indignação à ação”. Qual o objetivo desse movimento?
MRJ: Estamos num momento em que há uma degenerescência das instituições. Sentimos por isso uma responsabilidade de contribuir para que o presente melhore
e que no futuro se garantam condições para o livre exercício da democracia no país. Isso porque jamais houve na
vida política brasileira tamanho comprometimento ético
e moral das instituições. Se a política sempre trouxe a
busca de vantagens ou a troca de favores, o que ocorre
agora é extremamente grave, porque a política virou negócio, com decisões tomadas não em função de interesses de políticas estabelecidas ou de compartilhamento
de poder, mas por intermédio do negócio puro e simples.
E isso compromete integralmente a democracia.
Como os formadores de opinião enxergam o MP
Estamos num momento em
que há uma degenerescência
das instituições. Sentimos por
isso uma responsabilidade
de contribuir para que o
presente melhore e que no
futuro se garantam condições
melhores de exercício da
democracia no país.
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Contraponto
Se a política sempre trouxe
a busca de vantagens ou a
troca de favores, o que ocorre
agora é extremamente grave,
porque a política virou negócio,
com decisões tomadas não
em função de interesses de
políticas estabelecidas ou
de compartilhamento de
poder, mas por intermédio do
negócio puro e simples. E isso
compromete integralmente a
democracia.
APMP: Quais frutos já foram colhidos?
MRJ: Houve reunião de inúmeras entidades, do
âmbito jurídico, empresariais, de bairro etc., que
produziram um manifesto em sessão emocionante
no Centro Acadêmico XI de Agosto. Os temas eram,
e são ainda hoje, a exigência das apurações e das
respectivas punições daqueles que estão envolvidos
no “mensalão” e na corrupção de órgãos públicos.
Ao mesmo tempo, pregava-se a promoção de ações
em favor de uma reforma política para garantir a
transparência e a dignidade das eleições de 2006.
APMP: O aparente “perdão” da opinião pública ao
presidente Lula, como pesquisas eleitorais recentes
poderiam sugerir, arrefece de algum modo esse movimento?
MRJ: Primeiro, eu não acho que tenha havido perdão.
O que houve foi um esquecimento dos fatos que estavam sendo veiculados pelo rádio e pela televisão todos
os dias, mas do final do ano até o mês de março não
foram noticiados com a mesma intensidade. E grande
parte da população, especialmente das classes D e E,
estão muito envolvidas com sua sobrevivência e, portanto, esses fatos saem da memória. Mas quando voltarem... Ou seja, a questão ética não está superada.
APMP: Mas os índices econômicos aparentemente
favoráveis não podem obscurecer o debate?
MRJ: Imaginar que a eleição vai se disputar exclusivamente no campo da economia é tolice de alguns
“marqueteiros”.
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A questão ética preocupa, e muito, a população em
geral, especialmente o povo sofrido, que leva uma
vida digna e que se revolta quando vê a desonestidade imperar na vida política brasileira. Basta constatar
que no mês de março os fatos voltaram à tona de
forma bastante grave e a recente pesquisa do Datafolha (N.R: pesquisa publicada na edição de 19.3.06
do jornal Folha de S.Paulo) mostra uma queda muito
acentuada do prestígio do presidente Lula.
APMP: Depois de mais uma crise assolando o regime
presidencialista, ainda tem esperanças de implantação do parlamentarismo no Brasil?
MRJ: É difícil ter uma posição de expectativa, dizendo
que ainda tenho esperança. Eu lutaria por um regime
parlamentarista e respondo aos que condicionam o
parlamentarismo à existência de partidos fortes, que
jamais teremos partidos fortes sem o parlamentarismo.
Esse regime vai condicionar a formação de maioria e
minoria em torno de projetos de ação governamental.
Mas é fundamental que no parlamentarismo se estabeleça uma reforma do sistema eleitoral.
APMP: Como assim?
MRJ: O sistema eleitoral, tal como adotado no Brasil há muitas décadas, esfacela os partidos políticos.
Então, mais importante que o parlamentarismo para
fortalecer os partidos políticos é uma mudança no sistema eleitoral. Mas não é possível pensarmos em parlamentarismo com um sistema proporcional como o
que adotamos. É necessário um sistema proporcional,
mas com voto distrital misto ou com o sistema de listas
partidárias.
APMP: A segurança pública ocupa cada vez mais o
debate eleitoral, inclusive no plano federal. Quais,
de fato, são as principais contribuições e funções da
União na Segurança Pública?
MRJ: A União, que foi absolutamente omissa nesse campo durante o governo Lula, tem a obrigatoriedade de fixar uma política nacional de Segu-
A questão ética preocupa, e
muito, a população em geral,
especialmente o povo sofrido,
que leva uma vida digna e que se
revolta quando vê a desonestidade
imperar na vida política brasileira.
Quem é
Miguel Reale
Júnior
Advogado, é professor titular de
Direito Penal da Faculdade de Direito
da Universidade de São Paulo. Foi
Secretário Estadual da Administração
(governo Covas), Secretário Estadual
da Segurança Pública (governo
Montoro) e Ministro da Justiça de
3 de abril a 10 de julho de 2002 (2º
governo de FHC).
Autor de diversas obras jurídicas,
aventurou-se com sucesso na ficção,
com “Dez Mulheres” e “Avessos”,
ambos pela Editora Manole. O
terceiro livro, segundo nosso
entrevistado, está “no forno”.
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Contraponto
Miguel Reale:
Um espelho para
o jurista
rança Pública. Não se ouviu, em momento nenhum,
o Ministério da Justiça falar sobre isso ou sobre
a fixação de projetos de cunho social no campo
da segurança pública. Nem mesmo as verbas dos
convênios decorrentes da lei que criou o fundo nacional de segurança pública estão sendo distribuídas. A distribuição não chegou a 10% das verbas
previstas no orçamento.
APMP: Em relação à Polícia Federal, como tem visto
a nova política de atuação?
MRJ: A Polícia Federal teve um pequeno aumento
de efetivo, muito aquém do necessário. Nós tínhamos proposto a criação de uma Guarda Nacional, com
exigência de curso médio, e não universitário, para
realizar tarefas que permitissem retirar os policiais
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federais de funções como controle de aeroportos e de
passaportes, mas houve uma oposição até do PT na
aprovação dessa medida provisória.
APMP: Mas as mega-operações da Polícia Federal dão a
impressão de que tem havido grandes investimentos...
MRJ: A Polícia Federal concentra suas atividades em Brasília, com aproximadamente 200 policiais federais que
fazem grandes operações de repercussão na mídia, cujos
gastos são muito elevados. Esse aparato de deslocamento
para grandes apreensões é absolutamente desnecessário. Enquanto isso, as superintendências estaduais estão
à míngua, sem recursos para pagar contas de luz e nem
agentes para fazer intimações. Então, a Polícia Federal
tem sido apenas vitrine para expor através da mídia eficiência com relação a fatos que teriam repercussão.
Filho de um dos mais renomados juristas do país, Miguel Reale Júnior teve uma fonte de inspiração em sua
própria família. Seu pai, Miguel Reale, cujos atributos e
qualificações podem listar inúmeras páginas, apresenta
um vasto currículo de vida acadêmica, empresarial, jurídica e também méritos e condecorações muito merecidas.
Miguel Reale, advogado, jurista, professor, filósofo e
poeta, nasceu em São Bento da Sapucaí - SP, em 6 de novembro de 1910. Formou-se em Direito pela Universidade
de São Paulo em 1934. Dedicou-se desde cedo a intensa
atividade no jornalismo, na política e
no ensino. Iniciou
sua carreira no
magistério quando ainda estudante, lecionando
Latim e Psicologia
em um curso préjurídico de 1933
a 1935. A bibliografia fundamental de Miguel Reale compreende obras de
Filosofia, Filosofia Jurídica, Teoria Geral do Direito, Teoria
Geral do Estado, além de monografias e estudos em quase
todos os ramos do Direito Público e Privado.
Conquistou, por concurso, a cátedra de Filosofia do
Direito na Faculdade de Direito da Universidade de São
Paulo, em 1941, apresentando a tese “Os fundamentos
do Direito”, com a qual tem início nova fase na doutrina
jurídica nacional. Seu livro “Teoria do Direito e do Estado”
(1940) é considerado uma referência nesse campo do conhecimento jurídico-político.
Fez parte do Conselho Administrativo do Estado de São
Paulo, de 1942 a 1945, tendo sido autor de várias refor-
mas fundamentais na legislação paulista, principalmente
no plano da educação e da cultura. Em 1947 foi Secretário
da Justiça do Estado de São Paulo, instituindo o Departamento Jurídico do Estado e criando a primeira “Assessoria
Técnico-Legislativa” do País, que serviu de modelo para
outros Estados e ao próprio Governo Federal.
Em 1962, após intensa atividade no Partido Social Progressista, do qual foi Vice-Presidente, foi novamente Secretário da Justiça de São Paulo em 1964, notabilizando-se
pela corajosa defesa da autonomia do Estado contra ilícitas
interferências do Governo Federal, além de criação de importantes órgãos na área da Justiça, como as primeiras Varas
Distritais da Capital, e de plano de reforma agrária mediante
a utilização das terras devolutas estaduais.
Miguel Reale fundou as revistas Panorama, em 1936,
e a Revista Brasileira de Filosofia, em 1951 - a mais antiga
revista filosófica da América Latina, já com quase meio
século de contínua publicação trimestral. É presidente do
Instituto Brasileiro de Filosofia, tendo presidido por duas
vezes a Sociedade Interamericana de Filosofia.
Com cerca de 60 livros e centenas de artigos em jornais e revistas do País e do estrangeiro, nos últimos anos
firmou seu nome também como poeta e memorialista,
sendo membro efetivo das Academias Brasileira e Paulista
de Letras, bem como da Academia Brasileira de Letras Jurídicas e de várias entidades culturais internacionais.
Possui diversos títulos honoríficos. Em 1980, recebeu o
título de Professor Emérito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Foi membro do Conselho Federal de
Cultura, de 1974 a 1989.
Costuma-se dizer que Miguel Reale, em toda a sua
vida, soube manter-se fiel ao lema escrito no primeiro livro de sua juventude: teorizar a vida e viver a teoria na
unidade indissolúvel do pensamento e da ação.
APMP: Como advogado, qual sua opinião sobre as operações da Polícia Federal que atingiram diversos escritórios de advocacia?
MRJ: A responsabilidade, nesses casos, não é totalmente
da Polícia Federal, mas também de alguns juízes federais
que passaram a determinar, de forma indiscriminada, a
busca e apreensão de papéis que eventualmente pudessem ser importantes. Muitas vezes o advogado é co-réu
e deve ser investigado, mas querer acessar documentos
que o advogado recebe em confiança do cliente para
análise, isto, com certeza, fere o direito de defesa.
Miguel Reale, em toda a sua
vida, soube manter-se fiel
ao lema escrito no primeiro
livro de sua juventude:
teorizar a vida e viver a teoria
na unidade indissolúvel do
pensamento e da ação.
Eu lutaria por um regime
parlamentarista e respondo aos que
condicionam o parlamentarismo
à existência de partidos fortes, que
jamais teremos partidos fortes sem
o parlamentarismo.
APMP: E a participação do Exército na Segurança
Pública, tal como ocorreu na recente ocupação de
morros no Rio de Janeiro em busca de armamento
roubado?
MRJ: No caso do Rio de Janeiro é a terceira vez que o
Exército atua. A primeira foi em 1994, depois em 2003.
Já é a segunda vez no governo Lula, com resultados extremamente danosos de confronto com a população e de
tiros perdidos. Os recrutas, evidentemente, não estão pre-
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Contraponto
parados para a tarefa de policiamento urbano e sim para
atacar o inimigo. Porém, fazer o policiamento de rua não é
se confrontar com o inimigo. O Exército é importante em
operações de forças-tarefas, quando se estabelece uma
cooperação, e especialmente para trabalhar no campo da
inteligência, do planejamento em conjunto com as forças
policiais. Por exemplo, fazer o policiamento de fronteira
no Rio de Janeiro, em operações conjuntas com a Marinha no controle da Baía de Guanabara.
APMP: O problema da Segurança Pública é mais de
polícia, de legislação ou de políticas públicas?
MRJ: Há um problema de omissão do Estado na
atenção aos bairros mais desprotegidos das grandes
cidades. Nós, evidentemente, não somos uma China,
mas temos um número elevadíssimo de grandes cidades e quando um conglomerado humano passa de
500 mil habitantes os problemas da criminalidade
surgem. É necessário que o Estado esteja presente
por via da Justiça, do Ministério Público, da Procuradoria, da Defensoria Pública. Isso é fundamental
e, para que ocorra, é preciso possibilitar o acesso à
Justiça através dos Centros Integrados de Cidadania,
dos Plantões Sociais, das Ouvidorias Populares. São
vários projetos de viabilização do acesso à Justiça
pela população mais pobre que iniciamos no Ministério da Justiça e que, infelizmente, foram paralisados.
APMP: Qual sua opinião sobre a proposta da Secretaria de Administração Penitenciária de que o próprio Estado possa autorizar a progressão de regime
se o Judiciário não o fizer em até 30 dias?
MRJ: A proposta parte de secretários com uma visão pragmática e sem nenhum fundamento jurídico
e teó­rico. E a Constituição, onde fica nesse processo
esdrúxulo? O juiz não decidiu, então passa para a administração?! É possível apresentar um projeto dessa
natureza? É só analisar um pouco e tentar imaginar o
processo com um juiz parcial. É ridículo.
APMP: Sobre a atuação do Ministério Público, sobretudo no combate à corrupção estatal, qual a sua
avaliação?
MRJ: Acho muito importante a atuação do Ministério
Público, especialmente na condução de ações de improbidade administrativa e ações civis públicas. Também acho importante que ele se dedique efetivamente
a fazer apurações, junto com a polícia, de atos lesivos
ao patrimônio público. Mas, infelizmente, o Ministério Público Federal tem sido absolutamente omisso.
A recente exibição do extrato da conta bancária do
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Acho muito importante a
atuação do Ministério Público,
especialmente na condução
de ações de improbidade
administrativa e ações civis
públicas. Também acho
importante que ele se dedique
efetivamente a fazer apurações,
junto com a polícia, de atos
lesivos ao patrimônio público.
Mas, infelizmente, o Ministério
Público Federal tem sido
absolutamente omisso.
caseiro Francenildo é, a meu ver, crime de responsabilidade do Ministro da Fazenda. Porque, evidentemente, ele é o responsável pelo fato de uma instituição
financeira, que está sob seu comando, violar o sigilo
bancário de um depoente que traz a público fatos que
lhe são desairosos. E onde está o Ministério Público
Federal? (NR. Quando da concessão dessa entrevista,
o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci ainda não
havia sido indiciado pela Polícia Federal).
APMP: O maior problema do Poder Judiciário é a
falta de recursos ou a forma de gestão desses recursos?
MRJ: As duas coisas. Acho que falta gestão pela ausência de pessoas especializadas na administração pública. E esta é uma das grandes lutas e inovações do
Ministro Jobim, que realizou um trabalho importante
de levantamento da situação da Justiça no Brasil. Ao
mesmo tempo, ele propôs a adoção de medidas de ordem administrativa e que pessoas formadas em Administração Pública gerenciem essa grande empresa de
prestação de serviços que é a Justiça. E faltam verbas
também.
APMP: A função primordial dos Conselhos Nacionais não seria justamente avaliar a gestão dessas
“empresas” chamadas Poder Judiciário e Ministério
Público?
MRJ: Acho que o Ministro Jobim já iniciou essa tarefa
e é necessário dar continuidade a isso para que não
haja apenas mudanças na legislação. Mas não acredi-
to em alterações no campo efetivo da administração e
que o Judiciário abra mão do poder de se autogerir.
APMP: Em quais juristas se espelhou?
MRJ: Na vida brasileira, unindo política e direito, sem
dúvida alguma Rui Barbosa. Especialmente nos discursos em sua segunda campanha presidencial, quando
ele levanta os problemas sociais do país. Eu diria que,
no campo do direito penal, o professor que me marcou
pelo seu rigor teórico e pela atenção que dava à história do direito brasileiro foi Basileu Garcia.
APMP: Depois de se consagrar como autor de obras
jurídicas, o que o levou à ficção?
MRJ: Tenho dois livros de contos. O primeiro foi
“Dez Mulheres” e o segundo “Avessos”. Neste segundo livro são cinco pares de contos e “contracontos”.
São situações existenciais similares que os personagens enfrentam de maneira diferente, mostrando
que as decisões sempre residem em nós mesmos. É
o sentido da responsabilidade do homem pelo seu
próprio destino e, muitas vezes, a constatação de
que qualquer que seja a nossa decisão, ela sempre
será insatisfatória.
Acho que falta gestão
pela ausência de pessoas
especializadas na
administração pública. E esta
é uma das grandes lutas e
inovações do Ministro Jobim,
que realizou um trabalho
importante de levantamento
da situação da Justiça no
Brasil. Ao mesmo tempo, ele
propôs a adoção de medidas
de ordem administrativa
e que pessoas formadas
em Administração Pública
gerenciem essa grande
empresa de prestação de
serviços que é a Justiça.
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D
Em defesa da Sociedade
a Indignação
à Ação
Indignado com a grave crise política no país, um
grupo formado por advogados, promotores e procuradores de justiça, militantes de defesa dos direitos
humanos, empresários e cidadãos inconformados com
a situação decidiu não ficar de braços cruzados. Assim
surgiu o movimento “Da Indignação à Ação”, sendo um
de seus idealizadores o jurista e ex-ministro da Justiça
Miguel Reale Júnior.
O movimento, que ganhou força nacional, atua
em diversos setores do vida política brasileira. O
apoio ao trabalho das CPIs, a defesa do fortalecimento da Justiça Eleitoral e a cobrança da apuração das denúncias de corrupção, bem como a punição dos responsáveis, são algumas das bandeiras
defendidas pelo movimento. E é desta filosofia que
a APMP, juntamente com a sociedade, compartilha.
Veja a repercussão dos fatos...
OAB-SP oferece tribuna ao
caseiro Francenildo
O caseiro Francenildo Santos Costa, que teve o seu sigilo
bancário quebrado de forma ilegal após revelar que o ex-ministro da Fazenda, Antonio Palocci, freqüentava uma casa alugada em Brasília por Vladimir Poleto (ex-assessor de Palocci em
Ribeirão Preto), foi convidado pela Ordem dos Advogados do
Brasil, seção São Paulo, para uma homenagem simbólica.
Costa terá a tribuna da casa para expor mais uma vez a sua
versão dos fatos. O convite partiu do ex-ministro da Justiça,
Miguel Reale Júnior, e do deputado federal Fernando Gabeira
(PV-RJ).
A OAB é uma das idealizadoras do movimento “Da indignação à ação”, enquanto o deputado é um dos líderes do Grupo
Pró-Congresso.
Notícia publicada pelo site Terra em 27/03/2006
14
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Movimento Pró-Congresso
pedirá impeachment de Lula
ael Guerra
SÃO PAULO - O deputado federal Raf
eira, na OAB-SP,
(PSDB-MG) anunciou nesta quinta-f
qual é um dos
que o Movimento Pró-Congresso, do
semana com um
integrantes, deve entrar na próxima
eachment conpedido de abertura de processo de imp
Silva, por crime
tra o presidente Luiz Inácio Lula da
violação do sigilo
de responsabilidade no episódio de
tos Costa.
bancário do caseiro Francenildo San
público em hoO anúncio foi feito durante o ato
OAB-SP, com a
menagem ao caseiro promovido pela
stas. Para Guerra, o
presença de parlamentares e juri
da operação que
presidente teria tido conhecimento
eiro.
resultou na quebra de sigilo do cas
, Miguel Reale Jútiça
Jus
O jurista e ex-ministro da
à Ação, disse que se
nior, do Movimento da Indignação
vio da iniciativa da
o presidente teve conhecimento pré
de impeachment é cabíCaixa Econômica Federal, o pedido
ar o grau de um possível
vel, mas antes é necessário investig
o.
envolvimento do Chefe do Govern
O Estado de S. Paulo em
pelo
Trecho de matéria publicada
30/03/2006
Gabeira particip
a de ato em Sã
O Movimento da
o Paulo
Indign
ação à Ação, a O
hoje, na Faculdad
AB-SP e o Grupo
e de Direito da
Pró-Congresso re
USP, no Largo Sã
alizam
Paulo), ato públic
o Francisco (cen
o em apoio às CP
tr
o
de
Is
São
dos Correios e do
fortalecimento da
s Bingos e pelo
Justiça Eleitoral.
Além do presiden
da CPI dos Corr
te e do relator
eios, senador Del
cidio Amaral (PTOsmar Serraglio
MS) e deputado
(PMDB-PR), resp
ectivamente, co
na manifestação
nfirmaram presen
o coordenador
ça
do Grupo Pró-Co
Rafael Guerra (P
ngresso, deputa
SDB-MG), e o de
do
putado Fernando
Os participantes
Gabeira (PV-RJ).
do ato vão defe
nder medidas qu
zação da lisura
e visem à fiscalinas eleições de
2006 e o incent
crimes eleitorais
iv
o
ao
projeto de lei do
, encaminhado ao
s
Congresso pelo
toral (TSE).
Tribunal Superio
r EleiDe acordo com o
advogado e ex-m
inistro da Justiça
dos articuladores
Miguel Reale Jr.,
do movimento,
um
“há necessidade
CPIs para que as
de
apoiar o trabalho
investigações se
ja
das
m
ap
do Executivo, e
rofundadas, sem
indicados todos
ob
st
ác
ul
os
po
r
parte
os responsáveis
dos recursos”.
pelos atos ilícito
s e a origem
Trecho da report
agem publicada
pela Folha Onlin
e em 10/12/2005
www.apmp.com.br
15
O
Em defesa da Sociedade
caseiro
que derrubou
o Ministro
Davi X Golias. Impossível não lembrar desta histórica
luta quando lembramos do embate Francenildo X Palocci.
Um simples caseiro contra o superministro, braço direito do presidente Lula e último pilar do “núcleo duro”
do governo federal, depois da queda de José Dirceu, José
Genoino e Luiz Gushiken. A disputa ganhou ares ainda
mais épicos, se levarmos em consideração o aparato mobilizado para tentar desmoralizar o humilde nordestino.
De um lado, sigilo bancário quebrado e pesadas acusações lançadas por vários senadores e deputados federais.
Do outro, a única arma do pacato cidadão: a sua palavra.
Francenildo percorreu o caminho do purgatório, inferno e agora, assustado, se vê lançado à categoria de
personalidade pública.
Uma vez mais Davi venceu Golias.
16
www.apmp.com.br
Para entender o caso:
Dia 16/03
Dia 16/03
Dia 17/03
Dia 23/03
Dia 30/03
Dia 27/03
Dia 04/04
O caseiro presta as primeiras declarações
Sessão da CPI dos Bingos é suspensa por
liminar do STF
O sigilo bancário do caseiro é quebrado e
veiculado na revista Época
PF afirma que COAF solicitou investigações
contra Francenildo ao argumento de
lavagem de dinheiro
Ministro Palocci e o presidente da Caixa
Federal são acusados de quebra do sigilo
bancário do caseiro.
Palocci renuncia ao cargo de ministro da
Fazenda.
Palocci é indiciado pela Polícia Federal
pelo crime de violação de sigilo funcional.
Maxima Venia
O objetivo principal desta tese é demonstrar que
não apenas o descumprimento das obrigações impostas pelo CDC ao fornecedor de produtos e serviços deve ser objeto de repressão, mas também o
seu cumprimento de forma abusiva, principalmente
quando esta conduta não se encontra expressamente
prevista na legislação vigente.
A previsão do exercício abusivo do dever como
prática abusiva servirá para solucionar os casos mais
difíceis.
Não se confunde com o exercício abusivo do direito, porque o titular do direito possui a faculdade de
exercê-lo, opção inexistente em se tratando de dever.
O
exercício abusivo
do dever no
Código de Defesa
do Consumidor
1. Introdução
O legislador constituinte, atento à realidade social,
ao tratar “dos direitos e deveres individuais e coletivos”, no inc. XXXII do art. 5° da CF estabeleceu que o
Estado deveria promover, na forma da lei, a defesa do
consumidor. Além disso, incluiu a defesa do consumidor entre os princípios gerais da atividade econômica
(art. 170, inc. V). E se não bastasse, no art. 48 do
ADCT determinou ao Congresso Nacional que, no prazo de cento e vinte dias, elaborasse o Código de Defesa
do Consumidor (CDC).
E em cumprimento à norma constitucional transitória, em 11 de setembro de 1990 foi publicada a
Lei n° 8.078.
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Também não se compara com o exercício abusivo do
poder, porque partimos do pressuposto de que o CDC
trouxe a igualdade entre fornecedor e consumidor,
determinando um tratamento desigual entre desiguais. Além disso, o exercício abusivo do dever poderia ocorrer não apenas em atividades públicas, onde
há o poder estatal, ainda que exercido por empresas
privadas, mas também em atividades tipicamente
privadas.
Enfim, o reconhecimento do exercício abusivo do
dever como prática abusiva seria mais um instrumental posto à disposição para a proteção do vulnerável consumidor.
Gilberto Nonaka
Promotor de Justiça em São Paulo
Mestre em Direito das Relações Sociais
Assim, restou criado o microssistema de proteção do
consumidor, autônomo, que é lei de natureza principiológica e que, em matéria de relação de consumo, como
regra geral, prevalece sobre qualquer outra legislação
(Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery,
“Código Civil anotado”, RT, 2a. ed., 2003, p. 906).
E o CDC assegurou ao consumidor final inúmeros direitos, impondo, por conseqüência, deveres para serem
exercidos pelos fornecedores de produtos e serviços.
Segundo Paulo Dourado de Gusmão, o direito subjetivo é um reflexo da bilateralidade da norma iuris, a qual
confere a uma pessoa um direito e a outra um dever.
Desta forma, o conceito de direito subjetivo está intimamente ligado ao de dever jurídico (“O abuso do direito”,
Contribuição de nossos associados para a Sociedade
A Revista APMP em Reflexão abre espaço para os seus associados divulgarem artigos de interesse
da comunidade e com isso aproximar nossa Instituição do destinatário final de nossas ações:
o cidadão. As condições para a publicação estão disponíveis na página: www.apmp.com.br/
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sugestões de matérias ou artigos.
Os artigos da seção Maxima Venia são assinados, não refletindo necessariamente a opinião do Conselho Editorial da Revista APMP em Reflexão
Rev. Forense, vol. CXVIII, fascículo 541, 1948, p. 361).
É certo, porém, que mesmo com a existência do
aludido microssistema de proteção do consumidor,
não podemos deixar de manter o controle da atividade comercial porque, segundo Mario Bessone, controlar a empresa significa colocar-lhe limite: na medida
em que o controle é mais acentuado, nesta mesma
medida se presume que maior será a tutela dos prejudicados (“Profili della responsabilità del produttore
nell´esperienza italiana”).
Assim, os interesses protegidos pela lei fundamental e em leis extravagantes devem ser aperfeiçoados
continuamente, de modo a não deixá-los enrijecer-se
em fórmulas solenes e vazias, mas visando mantê-los
vivos e fazendo-os crescer. Pois não é suficiente a sua
promoção ou controle, sendo necessária a efetiva garantia destes direitos.
Não basta o Código do Consumidor para impedir as
violações nas relações de consumo: o direito é fruto da
cultura humana, não é apenas um dado da natureza,
mas um construído pela ação humana em sua incessante comunicação social, de forma que somente com a
efetiva e quotidiana participação do jurista em atividades de apoio social, conciliatórias e de fiscalização das
atividades públicas, em conjunto com uma interpretação jurídica do caso concreto que leve em consideração
as condições sociais, econômicas, políticas e culturais
do país, estaremos construindo a história dos direitos do
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Maxima Venia
homem enquanto consumidor (cf. Heron José Santana,
em “Responsabilidade civil por dano moral ao consumidor”, Ed. Nova Alvorada, 1997, p. 103).
Ocorre que, ao impor inúmeros deveres aos fornecedores no CDC, o legislador, na maioria dos casos, não
preestabeleceu quaisquer limitações ao seu exercício,
ensejando o surgimento do abuso.
Não se tratam dos abusos expressamente mencionados pelo CDC e descritos como práticas abusivas, cláusulas abusivas, ofertas enganosas, publicidades abusivas, etc.
O abuso a que nos referimos é aquele
encontrado
no exercício do dever imposto pelo CDC ao fornecedor,
mas de forma anormal, irregular, com o objetivo de
obter alguma vantagem adicional, causar prejuízo desnecessário ao consumidor ou praticar ato anti-social.
Como se vê, há estreita relação entre os exercícios
abusivos do dever e do direito. A diferença básica está
no fato de que, no caso do direito, este pode ou não
ser exercido pelo fornecedor, ao passo que o dever imposto pelo CDC deve sempre ser cumprido por ele. É o
caso da oferta de produtos ou serviços por meio de publicidades, que é um direito do fornecedor. Mas, uma
vez optado por veicular a publicidade, o fornecedor
passa a ter o dever, v.g., de levar ao consumidor a
informação verdadeira sobre o produto ou serviço oferecido (CDC, art. 37, § 1°).
Segundo Luiz da Cunha Gonçalves, o exercício
do direito não é obrigatório; o seu titular ou sujeito
pode realizá-lo, ou não, ou exercê-lo só em parte ou
do modo que lhe aprouver. Excetuam-se os direitos
que são também deveres, como o pátrio poder, a tutela
etc (“Tratado de direito civil: em comentário do código
civil português”, Ed. Max Limonad, vol. I, tomo I, 2a.
ed. portuguesa e 1a. ed. brasileira, p. 475). Já os deveres impostos pelo CDC aos fornecedores
são também direitos, mas dos consumidores.
Assim, nota-se existir liberdade de escolha no exercício do direito, ao passo que o dever imposto pelo CDC
é um ônus, uma obrigação, que não tolera a opção do
fornecedor de produtos e serviços em cumpri-lo ou não.
Paulo Dourado de Gusmão ensina que ao direito subjetivo contrapõe-se ao dever jurídico, diferenciando-se
daquele por não ser renunciável, constituindo uma subordinação, uma restrição à liberdade ou ao patrimônio
do homem. Daí a necessidade de ter o dever jurídico
também um conteúdo social, de se conformar aos limites impostos pela moral e pelo direito, não podendo ser
assim um meio de restrição dos direitos fundamentais
do homem. O dever jurídico pode constituir obrigação
positiva ou negativa de dar ou de fazer, podendo tanto
ter um sujeito determinado como ser dirigida erga omnes, como o dever de não impedir o exercício regular do
direito pelo titular (ob. cit., p. 362).
Desta forma, sob o argumento de que está cumprindo o dever imposto pelo CDC, o fornecedor
não pode prejudicar o consumidor, ou um terceiro, ou mesmo infringir a lei.
É o caso, e.g., da tolerância de erro
permitida para determinados produtos, em que o fornecedor, conscientemente, se utiliza dela em prejuízo do
consumidor. Imaginemos que para
um determinado produto, comer-
Assinala
Norberto Bobbio
que enquanto os
direitos de liberdade
nascem contra o superpoder
do Estado – e, portanto, com
o objetivo de limitar o poder -,
os direitos sociais exigem, para sua
realização prática, ou seja, para a passagem
da declaração puramente verbal à sua proteção
efetiva, precisamente o contrário, isto é, a
ampliação dos poderes do Estado.
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cializado em pacotes de 5 kg, a norma técnica oficial
respectiva permita uma tolerância de erro, em prejuízo
do consumidor, de até 100g. Então o fornecedor, propositadamente, comercializa os pacotes com 4,9 kg.
Não haveria, in casu, descumprimento do CDC, haja
vista que este considera como prática abusiva à colocação, no mercado de consumo, de qualquer produto
ou serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes (inc. VIII do art. 39).
E nem se poderia falar em exercício abusivo do direito, porque a aludida tolerância de erro em prejuízo
do consumidor, admitida pela norma técnica, não se
apresenta como um direito do fornecedor, haja vista
que a informação do peso do produto é um dever imposto (CDC, art. 31).
Embora sustentável que no caso mencionado o fornecedor tenha abusado de seu poder econômico, preferimos
entender que o microssistema de proteção do consumidor trouxe uma igualdade entre os desiguais, fornecedor
e consumidor, em razão de tratá-los desigualmente.
2. Da igualdade consagrada
pelo CDC
Segundo Konrad Hesse, o princípio da igualdade
geral “proíbe tratar o essencialmente igual desigualmente (e o essencialmente desigual igualmente). Ele
põe, como elemento fundamental do estado de direito
social, aos poderes estatais, nomeadamente ao legislador, a tarefa de tomar por base para uma equiparação
ou diferenciação, cada vez, critérios justos para, assim,
no sentido do princípio da justiça clássico, conceder a
cada um o seu” (“Elementos de direito constitucional
da República Federal da Alemanha”, Sérgio Antonio
Fabris Editor, 1998, p. 335).
Não há dúvida de que o poder econômico, o conhecimento das técnicas de fabricação, produção,
construção, importação e comercialização de produtos
e serviços etc. colocam o fornecedor em condição de
superioridade em relação ao consumidor.
Mas será que o Estado (Poder Público) poderia
intervir na relação privada de consumo, visando
equilibrar a desigualdade existente?
Assinala Norberto Bobbio que enquanto os
direitos de liberdade nascem contra o superpoder do Estado – e, portanto, com o objetivo de limitar o poder -, os direitos sociais
exigem, para sua realização prática, ou seja,
para a passagem da declaração puramente verbal
à sua proteção efetiva, precisamente o contrário, isto
é, a ampliação dos poderes do Estado.
Também “poder” – como, de resto, qualquer outro
termo da linguagem política, a começar por “liberdade” – tem, conforme o contexto, uma conotação positiva e outra negativa. O exercício do poder pode ser
considerado benéfico ou maléfico segundo os contextos históricos e segundo os diversos pontos de vista a
partir dos quais esses contextos são considerados. Não
é verdade que o aumento da liberdade seja sempre um
bem ou o aumento do poder seja sempre um mal (“A
era dos direitos”, Ed. Campus Ltda., 1996, p. 72).
In casu, houve legítima interferência na iniciativa privada, vindo o CDC a considerar o consumidor final como o
mais vulnerável no mercado de consumo (art. 4°, inc. I).
É com os olhos postos nesta vulnerabilidade do
consumidor que se funda o CDC, sendo certo que sua
fragilidade é multifária, decorrendo ora da atuação
dos monopólios e oligopólios, ora da carência de informação sobre qualidade, preço, crédito e outras características dos produtos e serviços. Não bastasse, o
consumidor ainda é cercado por uma publicidade crescente, não estando, ademais, tão organizado quanto
os fornecedores (Ada Pellegrini Grinover e Antônio
Herman de Vasconcellos Benjamin, “Código brasileiro
de defesa do consumidor, comentado pelos autores do
anteprojeto”, Forense Universitária, 6a. ed., p. 7).
Toda e qualquer legislação de proteção ao consumidor tem, portanto, a mesma ratio, vale dizer, reequilibrar a relação de consumo, seja reforçando, quando
possível, a posição do consumidor, seja proibindo ou
limitando certas práticas de mercado (Ada P. Grinover
e Antonio H. de V. Benjamin, ob. cit., p. 7).
Assim sendo, o CDC trouxe para a relação de con-
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Maxima Venia
sumo a igualdade entre fornecedor e consumidor, considerando este como o mais vulnerável (art. 4°, inc.
I); obrigando aquele a observar princípios como o da
transparência, da boa-fé, da eqüidade (art. 4°, caput
e inc. IIII) etc.
E é com base nesta igualdade que podemos afirmar
que determinados deveres, impostos pelo CDC ao fornecedor, podem ser cumpridos de forma abusiva.
3. Da boa-fé objetiva
A idéia de boa-fé objetiva é uma regra ética de
conduta. Tem um caráter normativo e se relaciona
com o dever de guardar fidelidade à palavra dada. É a
boa-fé lealdade (Treu und Glauben). É a idéia de não
defraudar a confiança ou abusar da confiança alheia
(José Fernando Simão, no artigo “A boa-fé e o novo
código civil”).
No sistema brasileiro das relações de consumo houve
opção explícita do legislador pelo primado da boa-fé.
Com a menção expressa do art. 4°, inc. III, do CDC à
“boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e
fornecedores”, como princípios básicos das relações de
consumo – além da proibição das cláusulas que sejam
incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade (art. 51, inc.
IV) -, o microssistema do Direito das Relações de Consumo está informado pelo princípio geral da boa-fé, que
deve reger toda e qualquer espécie de relação de consumo, seja pela forma de ato de consumo, de negócio jurídico de consumo, de contrato de consumo etc (Nelson
Nery Júnior, “Código brasileiro de defesa do consumidor,
comentando pelos autores do anteprojeto”, p. 438).
Também o novo CC de 2002, v.g., ao tratar “do
negócio jurídico”, no art. 113, e “dos contratos em
geral”, em seu art. 422, passou a exigir a observância
da boa-fé objetiva.
Os princípios gerais de direito são regras que norteiam o juiz na interpretação da relação jurídica discutida em juízo. Os conceitos legais indeterminados e as
cláusulas gerais são enunciações abstratas feitas pela
lei, que exigem valoração para que o juiz possa preencher o seu conteúdo. Preenchido o conteúdo valorativo
por obra do juiz, este decidirá de acordo com a conseqüência previamente estabelecida pela lei (conceito legal
indeterminado) ou construirá solução que lhe parecer a
mais adequada para o caso concreto (cláusula geral).
Portanto, a mesma expressão abstrata, dependendo da funcionalidade de que ela se reveste dentro do
sistema jurídico, pode ser tomada como princípio geral
de direito (v.g. princípio da boa-fé, não positivado),
conceito legal indeterminado (v.g. boa-fé para aquisição da propriedade pela usucapião extraordinária
– CC, arts. 1238 e 1260) ou cláusula geral (boa-fé
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objetiva nos contratos – CC, art. 420).
Nota-se, assim, a necessidade de valoração da conduta, pelo juiz, para saber se o fornecedor observou o
princípio geral, o conceito geral ou a cláusula geral da
boa-fé objetiva.
É bem verdade que, diante do exercício abusivo do
dever, haveria inobservância de tal cláusula ou princípio.
Mas na prática, por ser a boa-fé objetiva uma enunciação abstrata, nem sempre ela é interpretada corretamente para se avaliar a conduta do fornecedor.
Ao analisar, em 24/09/2004, a ação civil pública
proposta em face da Adria Alimentos do Brasil Ltda.,
o Juízo da 31ª Vara Cível Central da Capital, depois de
afirmar que não havia “quem pudesse deixar de ver
uma violência disfarçada nas práticas mercadológicas,
consistente em reduzir a quantidade e os ingredientes dos produtos, sem a respectiva redução do preço
de venda ao consumidor, que é mantido para aqueles
produtos com menor quantidade volumétrica nas embalagens e com menos ingredientes em sua composição” e que “a prática é velha conhecida em países
do chamado terceiro mundo”, julgou a demanda improcedente, por entender que “o arcabouço legislativo
ainda se mostra incompleto, deixando de exigir que as
empresas que modificam as embalagens, a quantidade delas e a composição de seus produtos informem
durante tempo razoável essas modificações, de modo
a manter o consumidor informado a respeito dessas
modificações”.
Assim, embora reconhecendo o abuso, consistente
na maquiagem dos produtos, com redução de peso e
ingredientes, para majorar, disfarçadamente, o preço
deles, o magistrado acabou entendendo que não havia afronta ao princípio geral ou à cláusula geral da
boa-fé objetiva. Daí a necessidade de se considerar o
exercício abusivo do dever como prática abusiva.
Com isso, a sentença mencionada jamais poderia
ser julgada improcedente, exatamente porque o juiz
reconheceu, implicitamente, que o dever de informar
o peso e os ingredientes na embalagem foi cumprido
pelo fornecedor, mas de forma abusiva.
4. Da abusividade
A noção de abuso, em princípio, está intimamente
ligada ao conceito de direito, pois abusar significa exercer de maneira desproporcional e contrária aos critérios
de igualdade determinada conduta reconhecida, em
princípio, como lícita (Cláudio Bonatto e Paulo Valério
Dal Pai, “Questões controvertidas no código de defesa
do consumidor”, Livraria do Advogado, 4a. ed., p. 47).
O abuso do direito, na medida em que ele sanciona
o comportamento de uma pessoa que escolhe, sem uti-
lidade para ela, o modo de exercício de seus direitos o
mais prejudicial a outrem, ou que causa um prejuízo desproporcionado com a vantagem obtida com o exercício
de seu direito, poderá igualmente servir de fundamento
a uma ação do consumidor que, no âmbito de um contrato de adesão, sofreu um prejuízo desproporcionado
resultante, diretamente, de um desequilíbrio flagrante
entre os direitos e os deveres recíprocos dos parceiros
da relação (“As tendências atuais do direito contratual
no domínio da regulamentação das cláusulas abusivas”,
Rev. de Dir. do Consumidor, n. 12, RT, p. 18).
Isto significa que o abuso pode se dar no exercício do direito, no exercício do poder e, até mesmo, no
exercício do dever.
A problemática do abuso reflete, pois, o profundo
sentido unitário do real e da norma, do direito e da
vida. E, ao mesmo tempo, permite compreender como
opções que à primeira vista se diriam extremamente teóricas ou, quando muito, respeitantes ao mero
enquadramento jurídico-formal do problema, poderão
levar afinal a resultados práticos por vezes bem diferenciados, mormente no que diz respeito à exata reação da ordem jurídica contra os atos abusivos (Fernando Augusto Cunha de Sá, “Abuso do Direito”, Livraria
Almedina, 1997, p. 21).
A esse respeito, San Tiago Dantas esclarece que
aqueles que preferem a teoria do equilíbrio afirmam que a idéia do abuso do direito se coloca,
principalmente, quando alguém, para exercer
o seu direito, é obrigado a prejudicar o direito de outrem. Tem-se, então, um conflito
entre os dois direitos, e esse conflito, que tem de ser resolvido juridicamente, precisa de um critério,
critério esse que deve ser o de um
equilíbrio (Programas de direito ci-
vil, vol. 1, Ed. Rio, fev. de 1979, p. 371).
E onde está o equilíbrio? Para que haja conflito
é necessário que o direito da outra pessoa corresponda a um dever jurídico e se infrinja este dever
jurídico, porque se está exercendo um direito que
se tinha. A título de exemplo, verificamos que entre
vizinhos se tem o dever de respeitar a propriedade alheia, mas se tem também, o de gozar da propriedade. O que acontece é que, muitas vezes, para
esse gozo da propriedade, praticam-se certos atos
que redundam em infringir o dever de respeitar a
propriedade alheia como, v.g., se resolve aprender
canto e, pelo exercício do direito, desrespeita o dever de não perturbar o sossego do vizinho. O abuso
do direito se configura, então, quando, para exercer um direito, se viola um dever jurídico de muito
maior importância (San Tiago Dantas, ob. cit.,
pp. 371/372).
No caso em análise, o abuso se
dá quando o
forneced o r,
O exercício
do poder pode ser
considerado benéfico ou
maléfico segundo os contextos
históricos e segundo os diversos
pontos de vista a partir dos quais
esses contextos são considerados. Não é
verdade que o aumento da liberdade seja
sempre um bem ou o aumento do poder
seja sempre um mal.
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Maxima Venia
para exercer o seu dever imposto pelo CDC, viola
direito(s) assegurado(s) aos consumidores ou a terceiros, ou mesmo infringe a lei.
Mas não se confundem os exercícios abusivos do
dever e do poder, porque o fornecedor não possui poder ou autoridade sobre o consumidor, tendo em vista que, como já explicitado, o CDC visou assegurar a
igualdade real entre os atores que participam da relação de consumo. Nem o fornecedor possui ascensão
sobre o consumidor e nem este sobre aquele, exatamente porque a intenção é a de manter o equilíbrio
entre eles. Daí porque o exercício abusivo do dever não
poderia ser substituído pelo abuso ou desvio do poder,
ou mesmo pelo abuso de autoridade.
Segundo François Houtart, “o fenômeno da globalização é processo econômico atual que provoca o
deslocamento do foco de Poder, do Estado para a empresa, em virtude da diminuição da parte do Estado
como redistribuidor de riquezas e árbitro social, o que
se fez pelas ondas de privatização, não somente dos
setores econômicos, mas também dos serviços públicos, estratégia que pode levar à destruição política da
sociedade em virtude da limitação do poder que emana da organização política parlamentar”.
Entendemos, com a devida vênia, que tal posicionamento não se aplica no caso vertente, porque o Estado (Poder Público), em matéria de relação de consumo,
acabou intervindo na economia privada com a edição do
CDC, visando assegurar tratamento desigual entre fornecedor e consumidor, que são desiguais, considerando este
o mais vulnerável, como já anteriormente explicitado.
Ao criticar a teoria da absolutividade do direito
subjetivo, Fernando Augusto Cunha de Sá afirma que
a absoluta identidade que Planiol estabelece entre ato
ilícito e ato abusivo (este apenas uma das espécies daquele, sem qualquer sinal distintivo) prescinde da diferença de sentidos que a expressão “contraditoriedade
ao direito” assume quando referida ao ato ilícito e ao
ato abusivo (ob. cit., pp. 331/332).
É evidente, por claramente lógico, que um mesmo
ato não pode ser simultaneamente lícito e ilícito e que
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o ato abusivo não é um ato lícito. Mas sendo um ato
não-lícito, o problema que se coloca não é o de concluir, apressadamente, dando um salto de raciocínio,
que é um ato ilícito, mas sim o de saber se a sua nãolicitude é tecnicamente configurável como ilicitude.
Quer dizer: a contraditoriedade ao direito de tais
casos não permite logicamente a qualificação do respectivo comportamento como lícito (ou seja, como
conforme ao direito, para utilizar a expressão de Planiol) – e nisto tem este autor absoluta razão e, até
aqui, é sério o seu argumento; mas onde ele falha, tornando-se então um verdadeiro puzzle (quebra-cabeça)
dialético, é por esconder o salto de raciocínio apontado, é por fazer esquecer que não pode admitir-se sem
mais que a não conformidade ao direito (ou seja, que
a não-licitude do comportamento) seja forçosamente
e sempre ilicitude.
Pelo contrário, é o próprio abuso do direito que
nos vem mostrar que entre licitude e ilicitude tertium
datur : que entre a conformidade ao direito ou licitude e aquela específica desconformidade ou contraditoriedade a que se usa dar o nome de ilicitude, tem
lugar uma outra espécie de contraditoriedade que é
tecnicamente qualificada como abuso de direito. O ato
abusivo não é, pois, tecnicamente nem um ato lícito,
nem um ato ilícito, mas sim, pura e simplesmente ...
um ato abusivo.
Assim sendo, poderíamos agir em conformidade
com o direito (licitude); em desconformidade com o
direito (ilicitude); ou, ainda, de forma abusiva, o que
viria a configurar o abuso do direito.
O mesmo raciocínio poderia ser utilizado no caso
do dever. O fornecedor poderia cumpri-lo em conformidade e dentro dos limites impostos pelo CDC (cumprimento); não atender à obrigação imposta a ele pelo
referido CDC (descumprimento); ou, ainda, cumprir a
obrigação de forma abusiva, o que tipificaria o exercício abusivo do dever.
Destarte, o exercício imoderado, anormal ou irregular do dever pelo fornecedor de produtos e serviços,
causando ato anti-social ou prejuízo ao consumidor
implicaria o reconhecimento do exercício abusivo do
dever como prática abusiva.
Importante observar que o exercício abusivo do dever pelo fornecedor pode se dar por ação ou omissão,
ensejando o desenvolvimento de conduta que extrapola a execução normal imposta pela lei, acarretando
desnecessária violação de direitos do consumidor, de
outro fornecedor ou mesmo de terceiros, ou, ainda,
infringindo a própria lei.
Mas o reconhecimento do exercício abusivo do dever
somente se mostra viável quando a norma não prevê, de
forma expressa, os limites para o seu exercício. Se houver a previsão, o que poderá ocorrer é a violação de tais
limites, pois como enfatiza Paulo Dourado de Gusmão
(ob. cit., p. 367), o abuso do direito constitui transgressão de limites, porém não se trata de limites estabelecidos expressamente pelo direito, pois se o fosse não
haveria direito do qual se abusava, mas sim de limites
existentes no espírito, nos princípios gerais do direito,
sentidos pela consciência nacional historicamente.
Assim, a abusividade do dever se apresenta como
um desrespeito aos limites existentes para o seu exercício, que não se encontram delineados, expressamente, pelo ordenamento jurídico.
O dever, que ensejaria o exercício abusivo por parte do fornecedor, poderia ser dividido em: dever de
proteção; dever de informação; dever de reparar os
danos; dever de manutenção; dever de prova; e dever
de respeito.
Mas a aludida divisão seria feita apenas para fins
didáticos, porque a mesma conduta pode representar
o exercício abusivo do dever de proteção e do dever de
informação.
4.1. Dever de Proteção
A civilização industrial, se por um lado deu ao homem instrumentos decisivos de domínio sobre as forças naturais, por outro suscitou um sem-número de
riscos insuspeitados de dano à saúde ou à incolumidade públicas (Fábio Konder Comparato, “Proteção do
consumidor: importante capítulo do direito econômico”, RDP n. 80, out. a dez. de 1986, p. 191).
E a sociedade de consumo se cruza com a sociedade
de risco, uma vez que a primeira é organizada para a
satisfação das necessidades da oferta e da procura por
produtos, ao passo que a segunda representa um estágio avançado da sociedade industrial decorrente do
processo de modernização e se conscientiza de seus
efeitos catastróficos secundários a longo prazo (Fabiana Maria Martins Gomes de Castro,
“Sociedade de risco e o futuro do consumidor”, Rev. Dir. Cons. n. 44, RT, pp. 123/124).
Nesta categoria de dever estariam incluídas todas
as estipulações de proteção à vida, à segurança, à integridade física e à saúde que o produto ou serviço, ou
mesmo a atividade comercial desenvolvida, pudessem
expor a perigo.
Assim, v.g., seria dever do fornecedor garantir a
proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos
provocados por práticas no fornecimento de produtos
e serviços considerados perigosos ou nocivos, a teor do
disposto no inc. I do art. 6º do CDC.
E tal a importância deste dever que “deixar de comunicar à autoridade competente e aos consumidores
a nocividade ou periculosidade de produtos cujo conhecimento seja posterior à sua colocação no mercado” configura ilícito penal (CDC, art. 64).
Seria exemplo de exercício abusivo do dever de proteção o recall desnecessário, onde o dever estaria sendo
exercido pelo fornecedor, mas de forma abusiva, pois a
sua intenção aparente seria a de garantir a segurança
do consumidor, como determina a legislação, ao passo
que a real seria a de levar o referido consumidor até o
showroom de seus concessionários, visando oferecer-lhe
a troca de seu automóvel usado por um novo.
4.2. Dever de Informação
A informação e o dever de informar tornam realizável o direito de escolha e autonomia do consumidor,
fortemente reduzida pelos modos contemporâneos de
atividade econômica massificada, despersonalizada e
mundializada. Nessa direção, recupera parte da humanização dissolvida no mercado e reencontra a trajetória
da modernidade, que prossegue o sonho mais alto do
iluminismo, a capacidade de pensar e agir livremente,
sem submissão a vontades alheias, cada vez mais difícil
na economia globalizada de Estados e direitos nacionais enfraquecidos, em que as principais decisões econômicas
são tomadas por conselhos de administração de
O exercício
imoderado, anormal
ou irregular do dever
pelo fornecedor de produtos
e serviços, causando ato antisocial ou prejuízo ao consumidor
implicaria o reconhecimento do
exercício abusivo do dever como
prática abusiva.
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Maxima Venia
empresas transnacionais (Paulo Luiz Lôbo Netto, “A
informação como direito fundamental do consumidor”, Rev. do Dir. do Cons. n. 37, RT, p. 76).
O exercício abusivo do dever de informação poderia
ocorrer, v.g., na hipótese já mencionada, envolvendo a
denominada maquiagem de produtos.
É o caso em que o fornecedor informa na embalagem, de forma singela, a quantidade, a metragem ou
o peso dos produtos comercializados, mas sem esclarecer ao consumidor final a redução proporcionada, que
acarretou o aumento disfarçado do preço.
In casu, o dever de informar foi exercido, mas de
forma abusiva.
4.3. Dever de Reparar o Dano
O CDC impõe ao fornecedor o dever de reparar
os danos patrimoniais e morais que vier a causar
(CDC, art. 6°, inc. VI), que pode ser exercido de forma abusiva.
Imaginemos o caso de determinada empresa de
seguro, pertencente a uma holding company envolvendo bancos e operadoras de cartões de crédito,
que simplesmente passa a impor obstáculos para
o pagamento das indenizações, alegando supostas
ocorrências de fraudes e obrigando a que o segurado procure pelo Poder Judiciário.
Enquanto a controvérsia é resolvida definitivamente, o que exige o transcurso de vários anos, tal
empresa passa a empregar o valor das aludidas indenizações no financiamento de cartões de crédito e
cheque especial, auferindo exorbitante rendimento.
Ao final da contenda, caso venha a ser condenada, o valor das indenizações devidas será atuali-
zado pelos índices da caderneta de poupança, que
é extremamente inferior ao que é cobrado para os
débitos de cartões de crédito e cheque especial.
Destarte, no caso mencionado, se houver simples recusa de pagamento da indenização do
dano suportado pelo consumidor, isto representaria descumprimento do contrato e, por
conseguinte, do dever de reparar o dano.
Mas se a recusa estiver motivada em
fraude que não existiu, ou em descumprimento de cláusula contratual que não ocorreu,
então estaríamos diante
do exercício abusivo do
dever de reparar o dano.
4.4. Dever de
Manutenção
Com este dever,
o CDC visou garantir a funcionalidade dos produtos e
serviços colocados
no mercado de consumo, ainda que deixassem de ser produzidos, evitando
que o consumidor viesse a suportar
prejuízo.
Assim, e.g., o art. 32 do referido CDC
estabelece que “os fabricantes e importadores deverão assegurar a oferta de componentes
e peças de reposição enquanto não cessar a fabricação ou importação do produto”, ao passo que seu
parágrafo único previu que “cessadas a produção ou
importação, a oferta deverá ser mantida por período
razoável de tempo, na forma da lei”.
Mas o exercício dessa obrigação pode se dar de
forma abusiva, v.g., com a demora na obtenção da
peça de reposição, a tal ponto que o consumidor
desista e acabe adquirindo um produto novo. Aliás,
isto é muito comum de ocorrer, principalmente em
se tratando de produto de pequeno valor aquisitivo,
como as lâminas do aparelho de barbear elétrico.
O exercício
abusivo do dever de
informação poderia ocorrer
na (...) denominada maquiagem
de produtos (...), em que o
fornecedor informa na embalagem, de
forma singela, a quantidade, a metragem
ou o peso dos produtos comercializados,
mas sem esclarecer ao consumidor final a
redução proporcionada, que acarretou o
aumento disfarçado do preço.
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4.5. Dever de Prova
Este dever obriga a que o fornecedor mantenha em seu poder os dados fáticos, técnicos e científicos das
promessas feitas, ainda que implicitamente, com relação ao produto exposto à venda. O parágrafo único
do art. 36 do CDC estabelece que “o fornecedor, na
publicidade de seus produtos ou serviços, manterá,
em seu poder, para informação dos legítimos interessados, os dados fáticos, técnicos e científicos que
d ã o sustentação à mensagem”.
E se o fornecedor não possuir em seu
poder os dados fáticos, técnicos e
científicos que dão sustentação, não à
mensagem publicitária, mas sim,
v.g., à afirmação
inserida na bula,
no rótulo ou no
manual de instrução de determinado
produto?
Os dispositivos legais
que tratam da mensagem
publicitária não seriam
suficientes para responsabilizá-lo, sendo
certo que o dever de informação correta estaria sendo
violado.
Não se trata, a nosso ver, de descumprimento do dever, mas sim, de
abuso do dever. Isto porque, o dever de
prova estaria sendo cumprido, mas de forma abusiva. É que o fornecedor, sabedor de
que, para veicular publicidade sobre seu produto
ou serviço, deve manter em seu poder, para informação dos legítimos interessados, os dados fáticos,
técnicos e científicos que dão sustentação à mensagem, insere tal afirmação, que não possui prova de
sua veracidade, não na publicidade, mas na bula, no
manual de instrução ou no rótulo.
Assim agindo, ele cumpre com o dever de prova,
mas de forma abusiva, pois sabe que o consumidor, ao
ler aquela afirmação, automaticamente vai imaginar
que o fornecedor possui prova de sua veracidade.
4.6. Dever de Respeito
O dever de respeito ao consumidor é residual
e mais amplo, envolvendo todos os casos que não
possam ser contemplados, de forma explícita ou implícita, pelos deveres anteriormente mencionados.
Exemplo de seu exercício abusivo seria o caso do
posto de combustível que, possuindo vinte bombas,
mandasse regular todas elas no percentual máximo
de tolerância de erro, em prejuízo do consumidor,
que é permitido pela norma técnica do IPEM, ou
seja, 100 ml em cada 20 litros. Jamais haveria autuação por isso e, com base na legislação vigente, dificilmente se conseguiria taxar de abusiva a conduta
do fornecedor, mas que representa, sem sombra de
dúvida, o exercício abusivo do dever de respeito.
5. Conclusão
O reconhecimento do exercício abusivo do dever como prática abusiva acabará por auxiliar na
proteção do vulnerável consumidor, nos casos mais
difíceis de serem solucionados.
Com base na teoria do equilíbrio, utilizada para explicar o exercício abusivo do direito, é possível constatar se o dever foi cumprido de maneira abusiva, pois
da mesma forma que ocorre com os direitos, também
para os deveres, na generalidade dos casos, o legislador
não preestabelece quaisquer limitações ao seu exercício, ensejando o surgimento do aludido abuso.
E como no abuso do direito, também o dever imposto pelo CDC pode ser exercido de forma anormal
ou irregular pelo fornecedor, que acaba obtendo
alguma vantagem adicional ou causando prejuízo
desnecessário ao consumidor.
Ressalte-se que a diferença básica está no fato
de que, no caso do direito, este pode ou não ser
exercido pelo fornecedor, tratando-se, pois, de uma
faculdade, ao passo que o dever imposto pelo CDC é
uma obrigação que precisa ser cumprida por este.
O não cumprimento, total ou parcial, de um dever implicaria, via de regra, o seu descumprimento.
Então, a princípio, não poderia haver abuso do dever.
Mas existem situações em que o fornecedor de
produtos ou serviços, mesmo se locupletando, e.g.,
em prejuízo do consumidor, estaria cumprindo com
o seu dever, diante da legislação vigente, como no
caso citado, da utilização irregular, pelo fornecedor,
da tolerância de erro permitida para determinados
produtos.
O mesmo raciocínio utilizado para diferenciar o ato
ilícito do ato abusivo serviria para demonstrar que o
dever poderia ser cumprido pelo fornecedor em conformidade e dentro dos limites impostos pelo CDC
(cumprimento); não atender à obrigação imposta a ele
pelo referido CDC (descumprimento); ou, ainda, cumprir a obrigação, mas de forma abusiva, o que tipificaria o exercício abusivo do dever.
Assim sendo, o exercício imoderado, anormal ou
irregular do dever imposto pelo CDC ao fornecedor de
produtos e serviços, causando ato anti-social ou prejuízo ao consumidor implicaria no reconhecimento do
exercício abusivo do dever como prática abusiva.
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MP em Foco
X
Futuro do MP
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MP do Futuro
Discussão sobre fatos que repercutirão nos rumos de nossa Instituição.
Invertendo a ordem ilógica
Chegamos ao final da proposta inicial desta seção,
ou seja, demonstrar as diversas conseqüências positivas para o Ministério Público de São Paulo com a adoção de um novo modelo de gestão institucional.
O último tema arrolado em nossa primeira edição
(pág. 37) se refere à modernização da estrutura de apoio
ao trabalho dos promotores e procuradores de justiça.
Falar em distribuição de estrutura de apoio a um
agente político significa comentar uma lógica equivocada, comum à maioria das instituições e organismos
públicos, mas que se torna mais aguda quando afeta o
Ministério Público.
A maior parte dos órgãos públicos, quando investe em prédios próprios, equipamentos e funcionários,
privilegia os centros mais desenvolvidos e, dentro das
maiores cidades, as regiões mais nobres.
Quando deveria acontecer justamente o contrário. Se um administrador público constata que determinadas cidades ou regiões têm carências e problemas
sociais graves, seria natural grande concentração de
recursos e investimentos naqueles locais.
Esse paradoxo tem razões antigas e, para reverter
essa lógica, é preciso entendê-las.
As regiões mais pobres, em regra, são carentes tam-
A moderna gestão das
empresas públicas exige que
se prevejam vantagens reais
e compensadoras aos que se
propõem a trabalhar em locais
menos “atraentes”
A maior parte dos órgãos
públicos, quando investe em
prédios próprios, equipamentos
e funcionários, privilegia os
centros mais desenvolvidos e,
dentro das maiores cidades, as
regiões mais nobres
bém em infra-estrutura de educação, saúde, habitação
e lazer. Assim, é normal, por ser humano, que os agentes públicos, de todos os níveis, prefiram as cidades
e regiões que ofereçam a si e às respectivas famílias
melhores condições de vida.
Basta ver a dificuldade de preenchimento de vagas
de estagiários do Ministério Público em cidades menores do Interior. Óbvio que os candidatos ao estágio
preferem a metrópole regional, onde em geral vivem,
estudam e têm laços familiares.
Um novo modelo de gestão pressupõe a existência de
mecanismos para atenuar essas dificuldades de alocação de recursos humanos. Muitos anos atrás a legislação
estadual previu, para juízes e promotores, a gratificação
por exercício em Comarca de difícil provimento. Mas
igualou, nesse particular, regiões díspares como o paupérrimo Vale do Ribeira e o pujante Grande ABC.
A moderna gestão das empresas públicas exige que
se prevejam vantagens reais e compensadoras aos que
se propõem a trabalhar em locais menos “atraentes”.
Do contrário, as disparidades sociais desses lugares só
tendem a se aprofundar.
E isso só depende de vontade política do administrador.
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MP em Foco
Uma comparação útil
Quando se observa a evolução do Ministério Público
Federal, que até 1988 era um arremedo de instituição,
muitas lições importantes podem ser extraídas.
Esqueçamos a rivalidade que começa a se formar,
principalmente por conta do avanço do MPF sobre atribuições nobres dos Ministérios Públicos Estaduais.
Concentremo-nos nas razões que levaram o Ministério Público Federal, inegavelmente, a se tornar uma instituição forte, sem se burocratizar ou agigantar de modo
perigoso seus quadros de procuradores da república.
Além de exercer de modo mais firme certa discricionariedade na eleição dos casos em que atuará, uma
explicação para o “sucesso” do MPF foi a opção, corre-
Quanto tempo um promotor espera
por um laudo pericial importante para
concluir um inquérito civil?
Dependendo da complexidade da
matéria, terá o promotor à sua disposição um profissional de capacidade
técnica semelhante à dos peritos contratados pela parte adversária na fase
judicial?
(vide edição nº. 3, pág. 33)
Não é rara a
situação em que
um promotor de
justiça – agente
político, em tese – é
obrigado a redigir,
ele próprio, ofícios
e cotas de ínfima
complexidade
ta a nosso juízo, de investir pesadamente em estrutura
de apoio aos procuradores da república.
Chamamos o testemunho dos promotores de justiça
que trabalham na área de interesses difusos e coletivos. Chega a ser humilhante a comparação entre o
nosso reduzido corpo de peritos, que atende a centenas de promotores espalhados por todo o Estado, e a
equipe técnica à disposição de um único procurador da
república.
Nos casos mais complexos envolvendo interesses
difusos e coletivos, sabe-se que qualquer medida judicial ou extrajudicial depende de um consistente laudo
técnico. Se uma instituição não é capaz de produzi-lo
com certa brevidade, sua eficiência estará irremediavelmente comprometida.
Cabe aqui repetir duas indagações feitas há mais de
um ano, neste mesmo espaço:
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Se pensarmos nas Promotorias instaladas nas menores Comarcas do Estado, cujos integrantes têm atuação cumulativa, a situação é dramática. Em geral, nem
estagiários e oficiais de Promotoria qualificados possuem. Não é rara a situação em que um promotor de
justiça – agente político, em tese – é obrigado a redigir,
ele próprio, ofícios e cotas de ínfima complexidade.
Nas apresentações que o Departamento de Estudos
Institucionais da APMP fez por todo o Brasil apresentando o projeto de um novo modelo de gestão, dois mapas
sempre chamaram a atenção. Os que comparam o nível
de desenvolvimento das cidades paulistas (por meio do
IDH) e o investimento em pessoal correspondente à alocação, pelo MP, de oficiais e auxiliares de Promotoria.
A quase ausência de oficiais de Promotoria nas macro-regiões comprovadamente mais pobres do Estado
(Vale do Ribeira e a que engloba, por exemplo, Itapeva,
Apiaí, Itararé e Capão
Bonito) é elucidativa quanto à falta de
lógica nos investimentos, principalmente
na instituição que, por definição
constitucional, é a encarregada
de defender o regime democrático. Isso significa a implantação de
uma democracia real, e não apenas formal, com a erradicação da
pobreza e da marginalização e a redução
das desigualdades sociais e regionais
(art. 3º, III, da Constituição Federal).
Aqui a receita é relativamente simples: emprego de critérios
técnicos e objetivos, exata compreensão da missão constitucional do MP e vontade política de inverter
essa lógica desigual, que
aprofunda o fosso social
em nosso país.
Comissão Mista começa os trabalhos
Nos dias 14 e 21 de março últimos foram realizadas as duas primeiras reuniões da comissão de
estudos constituída pelo Ato Normativo nº. 402PGJ/CPJ/CSMP/CGMP, de 27 de julho de 2005, para
implantar o banco de dados institucional do MP,
cujos integrantes foram nominados na edição anterior (pág. 37).
Louve-se a iniciativa do Procurador-Geral de Jus-
tiça interino, Fernando José Marques, de convocar a
reunião inaugural dos trabalhos da comissão.
Por acreditar no potencial do trabalho a ser desenvolvido por essa comissão, que pode, inclusive, ser o
embrião do órgão de planejamento e análise inerente
ao novo modelo de gestão, a APMP em Reflexão noticiará o quanto possível o desenrolar das reuniões e os
resultados delas gerados.
A APMP agradece a colaboração de todos os associados com críticas e sugestões. Aproveite, também,
para sanar eventuais dúvidas sobre o novo modelo de gestão: [email protected]
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Eleições PGJ-SP
R
od
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rigo Pinho,
mais votado, é nomeado
Procurador-Geral
de Justiça
Pela segunda vez Rodrigo César Rebello Pinho
comandará o Ministério Público de São Paulo. Pinho foi nomeado para o cargo de Procurador-Geral
de Justiçapelo então governador do Estado, Geraldo
Alckmin.
A eleição, ocorrida no dia 25 de março último, contou com um total de 1.615 promotores e procuradores
de justiça. Rodrigo Pinho obteve a maioria dos votos,
998 ao todo, correspondendo a 61,8% do total. O segundo lugar ficou com Luís Daniel Pereira Cintra, com
600 votos (37,2%). Em terceiro, Carlos Henrique Mund,
com 413 votos (25,6%). Em último lugar, e portanto
fora da lista tríplice encaminhada ao Palácio dos Bandeirantes, ficou o candidato René Pereira de Carvalho,
com 255 (15,8%).
O número de votos que Pinho recebeu representou a maior votação para o cargo de ProcuradorGeral de Justiça de São Paulo desde 1988. Pinho
atribuiu sua nova vitória às realizações do primeiro
mandato e às “profundas modificações positivas na
carreira de Promotor, que melhoraram as condições
de trabalho da classe”.
Suas principais propostas de campanha foram a
modernização do MP paulista, a defesa das prerrogativas da instituição, o combate às organizações criminosas e aos atos de improbidade administrativa, o planejamento estratégico como instrumento para atuação
de promotores e procuradores e a eleição direta para
escolha de todos os membros do Conselho Superior.
Afirma que, para o próximo biênio, as principais metas são a busca pela aproximação do MP com a sociedade, a minimização das divergências políticas internas e a
melhoria na estrutura de trabalho dos promotores.
Em determinados aspectos, todos os candidatos apresentaram propostas semelhantes. Entre os
pontos comuns destacaram-se a posição contrária
à possibilidade de progressão de regime para condenados por crimes hediondos e a defesa do poder
investigatório do MP.
Entretanto, as diferenças apareceram quando se
tratou de analisar questões administrativas referentes
ao Ministério Publico, como orçamento, disponibilidade de recursos humanos, salário dos servidores, entre
outros assuntos .
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Eleições PGJ-SP
Com experiência de dois anos à frente da Instituição, o atual
PGJ Rodrigo Pinho foi quem
menos reclamou do orçamento. Para ele, a verba é
suficiente para as demandas
da casa. “De 2005 para 2006,
a verba para o MP teve um
aumento de 18,70%”, comemora. “Os recursos que temos
são compatíveis com as necessidades da instituição.” Quanto
à informatização, ele concorda
que ainda não é a adequada. Para
ele, a rede de informática tem de
ser estendida para todo o estado.
Um dos principais pontos da
campanha de Rodrigo Pinho foi
a democratização interna do MP.
Sua proposta é permitir que todos os nove membros eleitos do Conselho Superior do
Ministério Público o sejam por todos os promotores e
procuradores. Pelas regras em vigor, apenas seis são
eleitos pela classe, enquanto três são escolhidos pelos
integrantes do Órgão Especial.
Pretende, ainda, que qualquer membro do MP, promotor ou procurador, com mais de 35 anos de idade e
pelo menos 10 de carreira, possa concorrer ao cargo de
Procurador-Geral de Justiça. Hoje, apenas os procuradores podem se candidatar.
O governador Geraldo Alckmin anunciou a decisão de nomear Rodrigo Pinho no dia 27 de março.
Em suas palavras, “vou
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nomear o Procurador-Geral do Ministério Público, Rodrigo Pinho, primeiro pela sua
qualidade, pela qualidade do seu trabalho no Ministério Público. Pela seriedade desse trabalho. Segundo, em respeito à própria escolha da instituição. A
lei é muito clara, estabelecendo uma regra de peso e
Quem é Rodrigo
César Rebello Pinho
Rodrigo César Rebello Pinho, 49 anos, casado
há 26 com a advogada Maria Cecília Rebello Pinho,
entrou para o Ministério Público em setembro de
1980. Atuou como secretário da 5ª Promotoria de
Justiça Criminal da Capital e, em abril de 1992, foi
promovido a Procurador de Justiça.
Foi eleito em 1993 para
compor o Órgão Especial
do Colégio de Procuradores
e, nos biênios 1994/1995 e
1998/1999 integrou o Conselho Superior do Ministério
Público. Foi diretor da Escola
Superior do MP, ocupou a chefia de gabinete do ProcuradorGeral de Justiça (2002 e 2003)
e é Professor de Direito Constitucional. Desde abril de 2004, é
Procurador-Geral de Justiça do
estado de São Paulo, cargo para
o qual foi renomeado também
para o biênio 2006/2008.
contra-peso. A instituição escolhe. Ela
elege três. Quem nomeia é o governador do Estado. Então, o governador
não é obrigado a nomear o primeiro.
Pode nomear o segundo, pode nomear o terceiro. (...) Mas em razão
do trabalho que o doutor Rodrigo
Pinho já fez e em respeito também
ao resultado da escolha por parte
dos membros da instituição, ainda hoje eu vou nomear o doutor
Rodrigo Pinho e amanhã estará
publicado no Diário Oficial”, finalizou Alckmin.
A APMP em Reflexão parabeniza o novo Procurador-Geral
de Justiça de São Paulo, Rodrigo
César Rebello Pinho. Boa sorte
nesta nova jornada em prol do
MP paulista!
APMP luta pela democracia. Sempre!
O presidente da APMP, João Antonio Garreta
Prats, enviou ofício ao governador de São Paulo,
Geraldo Alckmin, solicitando a nomeação do candidato mais votado pela Classe.
Compromisso inabalável da APMP com a democracia interna. Veja o ofício:
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35
P
Cultura & Lazer
ortinari
Arte pincelada com maestria
“A arte é o espelho da pátria.
O país que não preserva os seus valores culturais
jamais verá a imagem de sua própria alma.”
Chopin
Das proféticas palavras do músico Frederick Chopin
podemos extrair o verdadeiro significado do que a arte
deve representar para um povo. E, no Brasil, ninguém
melhor que Candido Portinari para captar a essência de
tão vasto patrimônio cultural. Ele e suas telas magníficas e pinturas peculiares.
Considerado o maior expoente da pintura modernista brasileira, aos 9 anos já fazia sucesso com seus
desenhos. Este artista nato deixou para admiradores de
sua obra um dos legados mais incríveis da história da
arte brasileira. São quase cinco mil telas, de pequenos
a gigantescos murais, que revelam uma ampla síntese
crítica de todos os aspectos da vida brasileira. Sua obra
já foi celebrada pelos mais notáveis nomes de sua geração, no Brasil e no exterior.
E não é à toa que se tira o chapéu para este artista.
Portinari foi o pintor brasileiro a alcançar maior projeção
internacional, quando em 1935 recebeu o prêmio Carnegie, nos EUA.
A partir de então, seguiram-se os três grandes painéis para a Feira Mundial de Nova York (1939), os quatro
painéis para a Biblioteca do Congresso (1942), em Washington, a publicação, pela Universidade de Chicago,
do primeiro livro sobre sua obra (1941), o impacto da
exposição na Galerie Charpentier, em Paris (1946), a exposição itinerante em Israel e, finalmente, os monumentais painéis Guerra e Paz para a sede da ONU, em Nova
York (1956).
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Candido Portinari
foi um dos poucos brasileiros
que conseguiram
viver de arte. “Arte verdadeira”, fazia
questão de ressaltar.
Sua trajetória de sucesso começou em 1929 e depois
ganhou o mundo. Portinari viaja pela Itália, Inglaterra, Espanha e se fixa em Paris. Lá, conhece Maria Martinelli,
com quem mais tarde se casa, regressando ao Rio de Janeiro em 1931, quando passa
a trabalhar num ritmo intenso,
além de participar da
comissão destinada a
promover a reforma
do Salão Nacional de
Belas-Artes.
A pedido de Assis
Chateaubriand, em
1943 Portinari pinta
uma série de murais
para a Rádio Tupi do
Rio de Janeiro, inspirados na música popular brasileira. No
mesmo ano, ilustra
Memórias Póstumas
de Brás Cubas, de Machado de Assis.
Além de pintor, Portinari também tinha grande afinidade com a política. Em 1944 filia-se ao
Partido Comunista e se candidata a deputado federal por São Paulo. Portinari nunca se desligou
do “Partidão”, embora tenha se afastado da política em seus últimos anos de vida.
Em reconhecimento ao seu trabalho, em
1955 o International Fine Art Council, de
Nova York, confere-lhe uma medalha como o
melhor pintor do ano.
Defendia sua liberdade de
criação com unhas e dentes,
mas sem jamais abandonar o
compromisso com a seriedade
no pintar.
Tamanha era sua auto-exigência, que alguns quadros
nunca eram dados como terminados. Portinari era quase
um compulsivo pela pintura, a
ponto de obrigar a esposa a tirar algumas telas da frente do
pintor, conforme relato de seu
filho João Candido Portinari.
Cuidadoso e excêntrico
Entre 29 de dezembro de 1903 e 6 de fevereiro de 1962 viveu o mais reconhecido de
nossos artistas plásticos.
Filho de italianos, nascido em Brodowski,
interior de São Paulo, Candido Portinari foi um
dos poucos brasileiros que conseguiram viver
de arte. “Arte verdadeira”, fazia questão de
ressaltar.
As premissas éticas vão pautar o rico caminho de
intensa e incansável busca pictórica de Portinari. E o
que encontra no final da jornada? Uma obra que o faz
“a nossa expressão mais universal”, como escreveu
Carlos Drummond de Andrade em carta ao pintor por
ocasião de sua exposição em Paris, em 1946.
Candido Portinari era realmente singular. Ou como definir alguém que, em certas oportunidades, vestia smoking
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Cultura & Lazer
enquanto trabalhava. Sua justificativa: se tinha uma festa à
noite, para que perder tempo vestindo-se duas vezes. Mais
curioso é o fato de nunca ter manchado uma roupa com
tinta. Nem mesmo o chão do ateliê!
Para entender melhor a trajetória de Portinari, vale
recorrer ao livro de Antonio Callado, “Retrato de Portinari”. Apenas um grande escritor poderia descrever
com precisão a profundidade e coerência da obra
do nosso maior pintor.
Vida e obra de um mestre
modernista
Para muitos o nome mais popular da arte plástica
brasileira, em 40 anos de trabalho Portinari produziu
aproximadamente 4 500 obras, o que por si só já seria
capaz de impor algum respeito. Quando essas obras são
em sua maioria absolutamente magníficas, você está
diante de um verdadeiro gênio.
E o talento foi precoce. Aos nove anos pintou o teto
da igreja de sua cidade natal.
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À época, a pequena Brodowski era pouco mais do que
uma parada para o trem carregar o café. Ninguém melhor do
que seu filho mais ilustre para descrevê-la: “…pequenininha,
duzentas casas brancas de um andar, no alto de um morro
espiando para todos os lugares… lugar arenoso no meio da
terra roxa cafeeira. Imenso céu azul circula o areal. Milhares
de brancas nuvens viajam”.
Segundo de doze irmãos, Portinari era filho de Dominga e Baptista, italianos que, crianças ainda, emigraram com suas famílias para trabalhar nas lavouras
cafeeiras do Brasil. História comum a tantos outros imigrantes,
exceto pelo fato de conceberem
o maior pintor brasileiro.
Para Candinho, apelido
carinhoso dado pela mãe, a
profissão chegou quase como
brincadeira. O que mais gostava era de misturar as tintas. Às
vésperas de partir para o Rio de
Janeiro, Portinari já se decidira pela pintura. Detalhe: tinha
pouco mais de 15 anos.
A arte foi se esmerando, as
pinceladas construindo toda a genialidade de sua essência. Passa pela Escola de Belas Artes, recebe o prêmio do
Salão Nacional de Belas Artes. E, a partir daí, começa a
retratar a fisionomia de sua terra e de seu povo.
Além de temas líricos, a obra de Portinari captou a
realidade social do país. Essa a razão de ser considerado um dos maiores retratistas da situação do trabalhador brasileiro.
Como um diário, seus desenhos são marcos presentes durante toda a sua vida e servem como registro
histórico de sua evolução como artista, mesmo no longo período em que esteve impedido de fazer uso das
tintas, por questões de saúde.
Mais de 95% da obra do maior pintor brasileiro
contemporâneo está hoje inacessível ao público, guardada em coleções particulares.
E o epílogo de sua vida como ser humano só poderia
vir de forma tragicamente poética: em 6 de fevereiro de
1962, morre Portinari, intoxicado pelas tintas. A partir
daí, sobreviveria pela eternidade o mito, o gênio.
O Centenário
Em comemoração ao Centenário de Portinari (19032003), o Museu Nacional de Belas Artes exibiu algumas
das obras mais importantes do artista na exposição
“Presença de Portinari”.
A tela “O café”, por exemplo, foi o primeiro trabalho
de Portinari premiado internacionalmente, recebendo
a segunda Menção Honrosa do Instituto Carnegie de
Pittsburgh, nos Estados Unidos.
A obra, de 1935, retrata uma colheita de café, cena
presenciada inúmeras vezes em sua infância. O trabalho na lavoura e a vastidão das terras cultivadas, que
marcaram a memória do menino, também são parte da
história do País, expostos em todo seu vigor e beleza
na tela do artista.
A inclinação muralista de Portinari também esteve
presente na exposição, nos painéis realizados para decorar o salão principal do Monumento Rodoviário, na Via
Presidente Dutra, em 1936. Esses trabalhos, assim como
os afrescos produzidos entre 1936 e 1944 para o edifício
do antigo Ministério da Educação e Saúde, hoje o Palácio Gustavo Capanema, no Rio de Janeiro, representam
um marco na evolução da arte de Portinari e afirmam a
opção pela temática social, que será o fio condutor de
toda a sua obra a partir de então.
Os quatro painéis que integram a obra “Construção de
Rodovia” são telas de
grandes proporções
e beleza impressionante. Celebração
do progresso, do
trabalho e da interação do homem com
a máquina, a obra
permaneceu no Monumento Rodoviário
mesmo depois de
sua desativação, em
1978. Esquecida e
abandonada por mais
de 20 anos, a pintura
foi trazida para o Museu Nacional de Belas
Artes pela Fundação
Projeto Portinari.
As obras que se encontravam
na Capela Mayrink, na Floresta da
Tijuca, também pertencem agora
ao MNBA e integraram a exposição. Composto pelas telas “São Simão”, “São Jorge”, “Nossa Senhora
do Carmo da Cruz” e “Purgatório”,
o conjunto de pinturas havia sido
roubado. Ao invés de serem devolvidas à capela, as obras foram para
o museu por iniciativa do filho do
pintor, João Portinari. Réplicas foram produzidas para ocupar o lugar das originais.
Candido Portinari nos
engrandeceu com sua
obra de pintor. Foi um dos
homens mais importantes
do nosso tempo, pois de
suas mãos nasceram a cor
e a poesia, o drama e a
esperança de nossa gente.
Com seus pincéis, ele tocou
fundo em nossa realidade.
A terra e o povo brasileiros
- camponeses, retirantes,
crianças, santos e artistas
de circo, os animais e a
paisagem - são a matéria
com que trabalhou
e construiu sua obra
imorredoura.
Jorge Amado
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APMP Destinos
O Velho Mundo foi o termo utilizado para designar os continentes conhecidos até o século XV - Ásia,
África e, especialmente, Europa. Com a descoberta das
Américas, passamos a ter como oposição a expressão
Novo Mundo, que trezentos anos mais tarde ganhou a
companhia da Oceania.
E Europa sempre significou sedução e beleza. Segundo a mitologia grega, Europa foi uma formosa mulher que despertou os amores de Zeus, o grande deus
do Olimpo. Se realmente é esta a origem do nome do
velho continente, ninguém sabe. Entretanto, inegavelmente se trata de palco dos maiores romances e
U
m novo
Um continente
paixões da civilização ocidental. Exemplos? Que tal a
esplendorosa Itália? Ou a “Cidade Luz”, Paris? Quiçá a
magnífica Londres ou ainda a calorosa Madrid?
Durante muito tempo, a Europa comandou as atividades econômicas do mundo. Como lugar em que
nasceu a ciência moderna e a Revolução Industrial,
adquiriu também uma superioridade
tecnológica sobre o resto do planeta, o
que lhe proporcionou um incontestável domínio até o século XIX.
Continente em constante transformação pelos conflitos políticos
e bélicos que sempre a assolaram (basta lembrar das duas
Grandes Guerras Mundiais),
a Europa teve suas fronteiras
internas várias vezes redesenhadas, mantendo-se, porém,
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como berço da civilização ocidental.
Considerações históricas à parte, a verdade é que viajar pela Europa é uma das maiores experiências da vida.
Aliado à vasta cultura, diversidade de costumes e monumentos esplendorosos, encontramos importantes pólos
difusores de tecnologia, uma simbiose perfeita que revela
o modo de vida europeu: tradição e modernidade.
Para se conhecer a Europa de uma maneira mais
confortável e cômoda, não saia dos trilhos. O trem é,
de longe, a melhor opção. Salvo se você estiver em um
grupo com quatro ou mais pessoas. Ai vale a pena alugar um automóvel. Além de redução de custo, você
tem como vantagens a mobilidade, economia de tempo e a possibildade de apreciar de perto a cultura de
cada país.
Velho Mundo
em constante evolução
Esplendor da arte e da história
Por suas características naturais e pela riqueza do
patrimônio histórico, artístico e cultural, a Itália representa uma das mecas do turismo internacional. Roma,
Florença, Veneza e tantas outras são cidades que constituem etapas obrigatórias de todo roteiro turístico
pelo país.
Célebre por seus restaurantes, cafés e mais de 300
fontes iluminadas, Roma conserva sua grandiosidade e
reputação como um dos maiores centros culturais do
mundo.
Outra maravilha é Florença, a cidade das flores,
como foi denominada originalmente no século I a.C.
Não deixe de visitar a Ponte Vecchio, mais antiga ponte
remanescente do século 14, e o Uffizi, maior museu de
arte da Itália, que abriga obras famosas de Botticelli,
Michelangelo, Rafael e da Vinci.
Com a segunda maior população do país, Milão
é um dos principais centros industriais, financeiros e
comerciais do norte da Itália. Cidade que hospeda a
maior bolsa de valores, é também centro da efervescência intelectual e artística do país. Famosa no mundo da moda e da alta costura, Milão encanta o mundo
com museus, catedrais e, claro, belíssimas (e “carésimas”) lojas.
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APMP Destinos
A grandiosidade da Basílica de São Pedro, no Vaticano - menor país do mundo -, deixará emocionados até
os mais fervorosos ateus. A maior e mais importante
Igreja Católica do mundo é, para muitos,
a mais linda de todas também.
possuíam bandeiras negras, como as dos antigos corsários
e, por isso, ganharam o nome “rádio pirata”. A idéia era burlar a lei e fugir dos impostos do governo.
As mais belas capitais imperiais
Praga permanece praticamente intocada em sua atmosfera melancólica, tão característica dos antigos países comunistas e talvez por isso mesmo seja uma das
cidades mais fascinantes do continente.
Ela sobreviveu às duas grandes guerras do século passado. E, ainda hoje, quase duas décadas após a
queda do comunismo, celebra-se uma espécie de renascimento cultural. Por toda parte, artistas de rua
dividem a atenção com a beleza da cidade,
representada pela arquitetura das
catedrais góticas, palácios barrocos e edifícios art nouveau.
Imponente,
a basílica é extremamente
rica, com muitos detalhes folheados
a ouro. Outra curiosidade: os restos
mortais de vários papas, inclusive
do primeiro deles, São Pedro, estão ali abrigados.
No estilo inglês
A Inglaterra é cheia de contrastes. Com seus 49 milhões de habitantes é a nação com a maior e mais diversificada população do Reino Unido, que ainda inclui
Escócia, Irlanda do Norte e País de Gales. Para qualquer
direção que se viaje, haverá larga gama de paisagens e
culturas a explorar.
Os ingleses são amáveis, francos, tradicionais e extremamente pontuais, daí a expressão “pontualidade
britânica”. A poesia e a canção fazem parte da sua vida.
A história e o folclore espreitam em cada canto.
Em Londres há muito o que fazer. Museus, teatros,
parques, pubs, restaurantes, shoppings e, porque não,
a interessante vida noturna. Uma das maneiras de se
familiarizar com esta cidade é comprar um bilhete do
famoso ônibus vermelho de dois andares e descer nos
principais pontos turísticos.
Piratas à vista!
Você sabia que as rádios piratas surgiram na Inglaterra
em 1958? As emissoras eram montadas em barcos, fora das
águas territoriais do Reino Unido. Detalhe: as embarcações
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Na virada do século, Praga foi escolhida a Cidade
Européia de Cultura do Ano. E a capital da República
Tcheca não deixou por menos. Organizou 400 eventos
sob o título Praga-2000. Com isso cresceu o fluxo de
turistas que rumam, todos os anos, para esse recanto,
que mantém um charme todo próprio, fruto de sua atmosfera medieval.
Outro grande orgulho europeu é Budapeste.
Há mil e uma maneiras de se conhecer a cidade, que,
por conta da planificação organizada, parece convergir
sempre para o Danúbio, o rio que separa Buda de Peste e
que de azul só tem o título da famosa valsa de Strauss.
O Parlamento de Budapeste, inspirado no de Londres,
é o edifício público mais belo da cidade. Por mais obrigatórias que sejam as visitas à Basílica de Santo Estevão
ou ao Teatro Nacional de Budapeste, um edifício moderno cuja construção no distante bairro de Ferencváros
dividiu a opinião pública, o olhar acaba invariavelmente
as estações do ano. Fartamente servida pelo metrô e
com táxis e ônibus em profusão, a capital francesa
convida a uma jornada histórica.
Palco de importantes acontecimentos mundiais,
como a Guerra dos Cem Anos, a Revolução Francesa
e o clímax da II Guerra Mundial, a França já tem lugar
cativo na história da humanidade.
O melhor é conhecer a cidade a pé. Há grandes galerias, como a Laffayette; catedrais, como Notre Dame
e Amien; museus, como o Louvre; lojas de grife a bom
preço (Boulevard de Poissonière); e, claro, seu mais conhecido símbolo, a Torre Eiffel.
Sobre Paris, leia mais na APMP em Reflexão nº 12.
redirecionado para o Parlamento. Além de espantoso por fora, a beleza
interior do edifício é
igualmente impressionante.
Viena é outra
cidade
encantadora. Cidade mais
musical da Europa e talvez do
mundo, sua atmosfera remonta ao tempo
em que era a capital de um império gigantesco, o austro-húngaro, cujo hino era cantado em treze diferentes
línguas.
As atrações da capital da Áustria ficam próximas umas
das outras. Assim, vale a pena gastar a sola dos sapatos
para conhecer seu impressionante acervo de monumentos, palácios e museus que abrigam importantes coleções
de objetos de arte de todo o mundo e de diversas épocas
da História.
Para quem gosta de arquitetura, Viena é um museu
a céu aberto, que inclui de obras clássicas a modernas,
como o Hundertwasser Haus, um prédio onde cada apartamento tem uma fachada diferente, com janelas irregulares, jardim no teto e tintas coloridas nas paredes.
No entanto, mesmo obras que são patrimônios da
humanidade, como a Figaro Haus, onde Mozart morava, e a Sala Terrena, onde o compositor tocava para os
amigos, não são mantidas em uma redoma. A casa está
habitada e normalmente há concertos na Sala Terrena.
A Europa
te espera!
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Famosa por embalar grandes amores, pela culinária,
pela moda, pelos perfumes e conhecida como importante centro irradiador de cultura, a França é um dos países
mais visitados do mundo.
A inebriante Paris atrai milhões de turistas em todas
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Gastronomia
Aji e Heiwa...
Sabor e Harmonia...
no País do Sol Nascente!
País-arquipélago de costumes exóticos e cultura
milenar, pátria mãe dos guerreiros samurais, o Japão
é uma das poucas nações que encantam o mundo com
sua arte e harmonia, não somente na cultura de seu
povo, mas incrivelmente difundida na culinária.
Detalhistas ao extremo, os japoneses primam
pelas inflexíveis regras também no preparo dos alimentos. Criadas pelos samurais por volta do século
XVI, as normas de conduta se popularizaram entre
os japoneses e um dos clássicos exemplos está na
maneira de servir as pessoas: a mão di-
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reita significa que se trata de um aliado, a esquerda
um inimigo.
Entretanto, os rituais e costumes não param por aí.
Desde a entrada nas residências, os japoneses preservam um culto à tradição. Inicia-se pela retirada dos
calçados antes de entrar, guardando-os no Genkan,
um local reservado para eles. O motivo? Não levar as
impurezas para dentro do lar. É costume também dos
japoneses agradecer ao término das refeições com a
expressão “Gochisou sama deshita”, uma forma de dizer que estava saborosa.
De fato, a cozinha japonesa é especialmente cativante por seu preparo, seus sabores e sua apresentação. Cercado de mar e cortado por rios, o
Japão tem em seus pratos forte presença de pescados.
O elemento básico da alimentação é o arroz, tão
importante que na Idade Média era utilizado como
moeda de pagamento de impostos. O molho (shoyu) e
a pasta de soja (missô) dão um sabor especial à cozinha
de todo o país.
Outra característica marcante do povo japonês é a
cerimônia do chá - o chanoyu. Trata-se de um ritual
existente há sete séculos, no qual os convidados usam
vestes especiais e cumprem vários procedimentos que
sugerem paz e despojamento.
Essa cerimônia simboliza tudo o que, na cozinha
japonesa, se opõe ao modo fast food: apressado e
desatento.
Os pratos e ingredientes japoneses são plenos de
simbolismos. Para os nipônicos, a comida não é somente uma forma de sustentar o corpo, mas, principalmente, de alimentar o espírito.
Curiosidades da gastronomia
oriental
Pelo sim, pelo não, muitos ocidentais não se arriscariam em ir a um restaurante fugu, ainda que nos
últimos 40 anos nenhum cliente tenha morrido envenenado. Para quem não sabe, o fugu é um peixe utilizado na culinária japonesa e que possui veneno letal,
se consumido sem o preparo adequado.
Outro fato bastante curioso diz respeito ao número de unidades servidas dos nigiri-sushi. Tais peixes
nunca são servidos por unidade, sempre aos pares.
Qualquer cozinheiro evitará levar à mesa um prato
com uma ou três fatias de peixe. A razão: a pala-
O fugu é um peixe utilizado
na culinária japonesa e
que possui veneno letal, se
consumido sem o preparo
adequado
vra japonesa para “uma fatia” (hito
kire) é um trocadilho para “matar alguém”, e “três fatias” (mi kire) também pode significar “matar-se”.
Outro ritual peculiar é dedicado
ao saquê.
Inicia-se levantando o copo para receber a bebida servida sempre pelo companheiro ao lado, apoiando-o com a mão
esquerda e segurando-o com a direita.
É imprescindível que você o sirva ao seu
vizinho de mesa, pois se considera falta de respeito
servir-se primeiro.
Um dos itens mais importantes na etiqueta japonesa à mesa é a utilização correta do hashi (palitinhos).
No Japão é comum cada membro da família possuir
seu próprio hashi e nas refeições fora de casa são utilizados os waribashi (palitinhos descartáveis).
Importante: jamais, nunca, em hipótese alguma,
você deve cravar um hashi em um alimento, pouco importa se num restaurante ou em casa, atitude só permitida nos oratórios, templos budistas ou shintoístas,
em respeito aos mortos.
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Gastronomia
Pratos Típicos
Tempura
Assim como o sushi, o tempura também é outro símbolo da cozinha japonesa.
Influência dos portugueses, um dos raros povos estrangeiros aceitos no Japão do século XVI, é feito à base
de peixes, moluscos e vegetais. Trata-se de um dos pratos mais consumidos fora do Japão.
Sashimi
Preparados e servidos com extrema sensibilidade,
os pratos da cozinha japonesa encantam até os mais
desatentos. Cores e formas são combinadas de maneira a expressar a harmonia contida em cada um de seus
elementos, dos utensílios aos ingredientes.
Segundo a tradição nipônica, a comida deve ser degustada com os olhos, a boca e, especialmente, com o coração.
Os peixes, as algas e os frutos do mar estão presentes em praticamente todos os pratos, que preservaram os nomes das receitas mais tradicionais:
sushi, sashimi, missoshiro, tempura e outras tantas
iguarias. Confira algumas:
Sushi
Originário da China, é a combinação do arroz com os
pescados crus.
Antigamente os peixes transportados para outros lugares eram conservados no arroz cozido, criando-se assim
o sushi prensado. No século XVIII um cozinheiro
chamado Yohei parou de utilizar o peixe fermentado e passou a oferecer algo parecido com o
que conhecemos por sushi.
Segundo a tradição
nipônica, a comida
deve ser degustada
com os olhos, a boca
e, principalmente, com o
coração.
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Preparado com pedaços de alimentos crus
e servido com guarnições, o sashimi é considerado pelos ocidentais um alimento saudável
e com poucas calorias.
Os peixes mais utilizados para seu preparo
são o atum e o salmão. O mais raro - e por isso
mais caro - é o sashimi de baiacu, que só deve
ser preparado por profissional com certificação.
Explica-se: o baiacu é o nosso conhecido fugu, aquele mesmo capaz de matar uma pessoa, se preparado de
forma inadequada. Basta dizer que uma só gota de seu
veneno é fatal. Ou seja, se a glândula venenosa do baiacu
não for removida por sushimen especialistas, a refeição
pode se tornar bastante indigesta.
Missoshiro
Um caldinho quente, revigorante, que prepara o estômago para receber a comida. Assim é o missoshiro, uma
sopa feita de pasta de soja (missô) e caldo de peixe.
Na tradição japonesa, o missoshiro é sinônimo de
saúde e longevidade. Reza a lenda que uma tigela
equivale a um dia a mais de vida.
Cultura
nipônica na
paisagem
paulistana
São Paulo é o exemplo mais eloqüente do peso
da cultura japonesa que cativa os brasileiros, inclusive pelo estômago.
Prova disso é a Liberdade, importante bairro japonês na cidade A região não é freqüentada apenas
por japoneses e seus descendentes. Não são poucos
os brasileiros dispostos a apreciar os segredos desses sutis sabores trazidos de tão longe.
A culinária japonesa ocupa lugar nobre no cenário da gastronomia nacional. A cidade de São
Paulo concentra o maior número de restaurantes japoneses. Cerca de 250 endereços disponíveis, que oferecem mais de
40 pratos diferentes.
Sinônimos de bom gosto e qualidade de vida,
os restaurantes japoneses tornaram-se o endereço
perfeito para quem busca refeições saudáveis em
lugares sofisticados.
No lobby do premiado Gran Meliá WTC está um
dos melhores restaurantes japoneses da cidade, o
Sumirê, que se destaca por sua modernidade. Um
dos pratos mais apreciados é o conhecido combinado de sushi e sashimi.
Outro destaque no cenário paulistano é o Jun
Sakamoto, no bairro de Pinheiros. Conhecido
por seu preciosismo, é referência por suas
especialidades culinárias, sobretudo os notáveis sushis.
Famoso por sua moderna arquitetura,
com a entrada por um túnel com cristais, o
Akassaka Sushi, também localizado em Pinheiros, é uma excelente opção para quem pretende desfrutar de um ambiente agradável. Nossa dica
é uma iguaria rara e um tanto exótica: sushi de
camarão e peixes feitos por uma dupla de habilidosos sushimen.
Primeiro a se estabelecer fora da Liberdade, o
Komazushi também decretou outro modismo: o de
apenas preparar sushi. A fama se estendeu a ponto
de se tornar referência. Atualmente, o restaurante
serve também refeições completas. O dogma, porém, persiste no jantar: sushi e mais sushi.
Há, em cada esquina da Liberdade, um ponto
capaz de transportá-lo para o exótico mundo do
Sol Nascente. Não perca!
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