3 - Revista Brasileira de Terapia Intensiva
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3 - Revista Brasileira de Terapia Intensiva
Volume 15 • nº 3 Julho/Setembro 2003 ISSN 0103-507X NESTA EDIÇÃO EDITORIAIS O balanço inicial e o “Bem Vindo” Programas de aplicação médica para palmtops – Uma ferramenta poderosa no manejo do paciente grave. ARTIGOS ORIGINAIS Análise comparativa do gasto energético entre as equações de Harris-Benedict e de Long e a calorimetria indireta em pacientes sépticos. Gasto energético em pacientes sépticos: Correlação entre a calorimetria indireta e as equações preditivas derivadas a partir de dados hemodinâmicos. Traqueostomia Percutânea à Beira do Leito: Estudo de 52 Casos. Comparação entre dois Métodos de Retirada do Suporte Ventilatório Mecânico no Pós-operatório de Cirurgia Cardíaca. Complicações da Esofagectomia Transmediastinal. RELATO DE CASO Broncoespasmo refratário por Strongyloides stercoralis. Volume 15 - Número 3 - Julho/Setembro 2003 Fundada em 1980 SUMÁRIO Diretoria para o Biênio 2002-2003 Presidente Dr. Jairo C. Bitencourt Othero Vice-Presidente Dr. Jefferson Pedro Piva 1º Secretário Dr. Luiz Alexandre A. Borges 2º Secretário Dr. José Maria da Costa Orlando 1º Tesoureiro Dr. Marcelo Moock 2º Tesoureiro Dr. Odin Barbosa da Silva Associação de Medicina Intensiva Brasileira Rua Domingos de Moraes, 814 Bloco 2 – Conj. 23 Vila Mariana – CEP 04010-100 São Paulo – SP Tel.: (11) 5575-3832 [email protected] Indexada na base de dados Lilacs A REVISTA BRASILEIRA DE TERAPIA INTENSIVA reserva-se todos os direitos, inclusive os de tradução, em todos os países signatários da Convenção Pan-Americana e da Convenção Internacional sobre os Direitos Autorais. Os trabalhos publicados terão seus direitos autorais resguardados pela AMIB, que em qualquer situação agirá como detentora dos mesmos. Editorial O balanço inicial e o “Bem Vindo” 47 Gilberto Friedman Editorial 48 Programas de aplicação médica para palmtops – Uma ferramenta poderosa no manejo do paciente grave Marcelo Freire de Oliveira*, Werther Brunow de Carvalho** Artigo Original 49 Análise comparativa do gasto energético entre as equações de Harris-Benedict e de Long e a calorimetria indireta em pacientes sépticos. Comparative analysis of energy expenditure between Harris-Benedict and Long’s equations and indirect calorimetry in septic patients. Francisco Antonio Coletto*, Flávio Marson*, Antonio Dorival Campos**, Júlio Sérgio Marchini***, Anibal Basile-Filho**** Artigo Original 57 Gasto energético em pacientes sépticos: Correlação entre a calorimetria indireta e as equações preditivas derivadas a partir de dados hemodinâmicos*. Energy expenditure in septic patients: Correlation between indirect calorimetry and predictive equations derivated from hemodynamic data*. Anibal Basile-Filho*, Maria Auxiliadora Martins**, Maria Tereza Batiston***, Paula Pileggi Vinha**** Artigo Original Traqueostomia Percutânea à Beira do Leito: Estudo de 52 Casos. Bedside Percutaneous Tracheostomy: a report of 52 cases. 64 Pedro Miguel Mattos Nogueira*, Luis Antônio Bustamante Monteiro**, Alcides Mariano de Souza Jr.***, Marcos Rey Madeira****, Sérgio Sardinha Artigo Original 70 Comparação entre dois Métodos de Retirada do Suporte Ventilatório Mecânico no Pós-operatório de Cirurgia Cardíaca Comparison of two Methods of Weaning From Mechanical Ventilation After Cardiac Surgery Luciana Castilho de Figueirêdo*, Sebastião Araújo**, Carolina Kosour*, Cristina Aparecida Veloso*, Orlando Petrucci Júnior*** Artigo Original Complicações da Esofagectomia Transmediastinal Complications of transmediastinal esophagectomy 77 Luciani Bassan*, Silvia M.T.P.Soares**,Desanka Dragosavac***, Sebastião Araújo****, Luiz Roberto Lopes ****, Nelson Adami Andreollo***** RELATO DE CASO Broncoespasmo refratário por Strongyloides stercoralis Refractory bronchospasm by Strongyloides stercoralis Marilene da Silva Moura¹, Sérgio da Cunha², Gustavo Vaz³, Saturnino de Campos Sarat Júnior³, Maria Cláudia Mattos Simão³ 82 NORMAS PARA PUBLICAÇÃO NESTA REVISTA RBTI REVISTA BRASILEIRA DE TERAPIA INTENSIVA Editor Gilberto Friedman (RS) Secretário Thiago Lisboa Editor Associado Werther Brunow de Carvalho (SP) Conselho Editorial Álvaro Réa Neto (PR) Antonio Nuno da Conceição (BA) Cid Marcos Nascimento David (RJ) Edson Stefanini (SP) Eliezer Silva (SP) Fernando Osni Machado (SC) Flávio de Barros Maciel (SP) Gilberto Friedman (RS) José Luiz Comes do Amaral (SP) José Raimundo de A. Azevedo (MA) Odin Barbosa da Silva (PE) Paulo César Ribeiro (SP) Paulo Gabriel Bastos (RJ) Paulo Sérgio S. Beraldo (DF) Rosane Goldweisser (RJ) Sayonara de Fátima F. Barbosa (SC) Vera Regina Fernandes (SC) Jornalista Responsável Marcelo Sassine - Mtb 22.869 Diretora de Arte Anete Salviano Capa MWS Design Projeto Gráfico e Produção Editorial MWS Design Fone: (11) 3399-3028 www.amws.com.br 90 A Revista Brasileira de Terapia Intensiva é publicada trimestralmente (março, junho, setembro a dezembro) em um único volume anual, editada pela Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) e destina-se fundamentalmente a publicar artigos originais. Eventualmente, em casos excepcionais, serão aceitos relatos de caso. Revisão de literatura será considerada quando de autoria de especialistas de reconhecido saber, ou a convite. Resumos de congresso ficarão a critério do editor, bem como outras matérias de interesse da medicina intensiva e especialidades correlatas. Tanto o Abstract (resenha condensada) como o resumo, deverão ser escritos de maneira estruturada na forma do “Annals of International Medicine”. Os textos devem ser escritos preferencialmente em português. Serão aceitos os trabalhos escritos em inglês ou em espanhol, quando os mesmos forem realizados em serviços estrangeiros de língua inglesa ou espanhola, ou quando forem escritos por experts convidados. Todos os trabalhos deverão ser acompanhados de um Abstract (resenha condensada), necessariamente em inglês, seguindo o exemplo mostrado abaixo. O texto deve se fazer seguir de um resumo na língua em que foi escrito (resumo, summary, resumen). O texto deve ser digitado em espaço duplo e apresentado na seguinte ordem: Página de rosto, Título em inglês, Abstract, Key Words, Introdução (deve ser feita, mas o título “Introdução” deve ser omitido), Material e Métodos, Resultados, Discussão, Resumo, Unitermos, Agradecimentos, Referências, Tabelas, Figuras, Legendas das Tabelas e das Figuras. A Página de Rosto deve ocorrer: Título de artigo; Nome(s) do(s) autor(es) e respectivos títulos; Nome do Serviço ou Instituição em que foi realizado o trabalho; Nome e endereço do autor principal para correspondência (a sair publicado); Telefone e e-mail do autor para contato com o editor de texto; Fonte de patrocínio (bolsas, subvenções, ofertas de produtos). Abaixo do resumo na língua em que foi escrito, enumerar, até um máximo de cinco, as palavras ou expressões indicativas do conteúdo do artigo (Unitermos), de preferência com base no Index Medicus, para maior facilidade na indexação. Os trabalhos deverão ser enviados em três vias e em disquete (sendo o texto salvo em Word, letra Times New Roman, tamanho 12 e espaço 1,5). Não deverão ultrapassar 15 páginas digitadas, salvo casos autorizados pelo Conselho Editorial. Esses trabalhos serão apreciados pelo Conselho Editorial que se reserva o direito de recusá-los e de fazer sugestões quanto à sua estrutura ou à sua redação. As ilustrações (gráficos, tabelas, fotografias e desenhos) devem ser apresentadas em páginas separadas, contendo suas respectivas legendas e assinalando sua exata localização no texto. Deverão, preferencialmente, serem enviadas em forma original e/ou em disquete. Somente serão aceitas as ilustrações que permitirem boa reprodução. As Referências devem incluir o material estritamente necessário, realmente citado no texto. As revistas devem ser referidas de forma abreviada, segundo critérios internacionais. As citações no texto devem ser feitas por números índices (sobrescritos e entre parentêses), correspondendo às respectivas referências listadas por ordem cronológica, não-alfabética. Os livros devem ser referidos pelo autor, título, cidade-sede da casa editora, nome da casa editora, número da edição (a partir da 2ª), volume, ano da impressão, e páginas inicial e final citadas. Se se tratar de capítulo de livro, fazer constar: autor do capítulo, título do capítulo, a palavra In (grifada), dois pontos, nome dos editores indicando com a abreviação eds., título do livro (grifado), cidade da editora, nome da editora, nº da edição (a partir da 2ª), volume, ano da publicação, páginas citadas. Quando o artigo tiver mais de três autores deverão ser citados os três primeiros seguidos de et al. EXEMPLO DE ABSTRACT: Background: Cardiovascular disease is a common cause of morbidity and death in persons with renal insufficiency. Although 3-hydroxy-3methylglutaryl coenzyme A reductase inhibitors (statins) are effective for secondary prevention of cardiovascular events in the general population, they have not been specifically studied in chronic renal insufficiency. Objective: To determine whether pravastatin is effective and safe for secondary prevention of cardiovascular events in persons with chronic renal insufficiency. Design: Post hoc subgroup analysis of a randomized, double-blind, placebo-controlled trial. Setting: The Cholesterol and Recurrent Events (CARE) study, a randomized trial of pravastatin versus placebo in 4159 participants with previous myocardial infarction and total plasma cholesterol levels less than 6.21 mmol/L (<240 mg/dL). Participants: 1711 participants with chronic renal insufficiency defined by creatinine clearance less than or equal to 75 mL/min, using the Cockcroft-Gault equation. Measurements: The primary outcome was death from coronary disease or symptomatic nonfatal myocardial infarction. Results: After a median follow-up of 58.9 months, the incidence of the primary end point was lower in participants receiving pravastatin than in those receiving placebo (adjusted hazard ratio, 0.72 [95% CI, 0.55 to 0.95]; P = 0.02). Pravastatin was associated with lower adjusted hazard ratios for major coronary events (0.72 [CI, 0.59 to 0.88]; P = 0.001) and coronary revascularization (0.65 [CI, 0.50 to 0.83]; P = 0.001), but not total mortality (0.81 [CI, 0.61 to 1.08]; P = 0.14) or stroke (0.62 [CI, 0.39 to 1.00]; P = 0.051). Tests for interaction suggested that the observed benefit was independent of the presence and severity of renal insufficiency. Incidence of side effects was similar in persons receiving pravastatin and those receiving placebo. Conclusions: These data suggest that pravastatin is effective and appears safe for secondary prevention of cardiovascular events in persons with mild chronic renal insufficiency. Since statins may be underused in this setting, physicians should consider prescribing them for patients with chronic renal insufficiency and known coronary disease. EXEMPLO DE REFERÊNCIAS 1. Leppänieme A,Haapiainen R,Kiviluoto T, et al. Pancreatic trauma: acute and late manifastations. Br J Surg 1988; 75: 165-7. 2. Carter DC. Pancreatitis and the biliary tree: the continuing problem. Am J Surg 1988; 155: 10-7. 3. Buchler M, Malfertheiner P, Berger HG. Correlation of imaging procedures, biochemical parameters and clinical stage in acute pancreatitis. ln: Malfertheiner P, Ditschuneir H. eds. Diagnostic procedures in pancreatic disease. Berlin: Springer-Verlag 1986; 123-9. 4. Crystal RG. Interstitial lung disease. In: Wyngaarden JB, Smith LH. eds. Cecil textbook of medicine. Philadelphia: WB Saunders & Co., 18th ed., 1988; 421-35. Para fim desta Revista, tabelas e quadros correspondem à mesma coisa e são convencionados sob o nome Tabelas, numeradas em arábicos. Figuras, também em arábicos, incluem desenhos, fotografias, esquemas e gráficos. À margem de cada Tabela ou Figura, ou no verso, devem ser grafados a lápis sua numeração, título do trabalho e nome do autor, ou outras indicações que facilitem sua absoluta clareza. Cada Tabela e cada Figura devem estar montadas ou feitas em folhas separadas (uma para cada elemento) e também em disquetes. As legendas das Tabelas e das Figuras devem ser digitadas com claras indicações a que se referem. Esta Revista deve ser referida com as seguintes abreviações: Rev Bras Terap Intens. A correspondência para publicação deve ser endereçada para: RBTI - Revista Brasileira de Terapia Intensiva AMIB Rua Domingos de Moraes, 814 – Bloco 2 – Conj. 23 Vila Mariana – CEP 04010-100 – São Paulo – SP Tel.: (11) 5575-3832 E-mail:[email protected] RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / EDITORIAL O balanço inicial e o “Bem Vindo” Gilberto Friedman sta é a primeira edição sob a nossa responsabilidade. O editor anterior, o nosso amigo Cleovaldo, saiu com um sentimento que o trabalho dele foi bom, mas que muito ainda poderia ser feito. A tarefa do Cleovaldo foi exemplar naquilo que ele se comprometeu inicialmente. A RBTI foi regular e o número de artigos originais e de pesquisa cresceu. Parabéns Cleovaldo! Contudo, eu sou otimista e entendo que existe produção científica em quantidade e qualidade para sustentar uma RBTI grande. Produção brasileira, sem dúvida! Produção internacional, por que não! A medicina intensiva brasileira é de longe a que mais apresenta trabalhos em congressos e publica estudos em revistas internacionais entre todos os países de terceiro mundo. Em tempo, será que a nossa produção científica é de terceiro mundo? Ela existe e é majoritariamente desperdiçada em bancos de dados no computador ou em teses de mestrado ou doutorado que jamais são publicadas e mofam em bibliotecas universitárias. A nossa tarefa é, portanto, captar esta produção científica para ser publicada na RBTI. Quais as nossas estratégias? A primeira estratégia já foi aplicada: todos os artigos aqui publicados foram revisados por até três revisores. Os revisores convida- E Volume 15 - Número 3 - Julho/Setembro 2003 dos são necessariamente envolvidos em atividades acadêmicas. O corpo editorial será renovado e os critérios de seleção serão baseados na qualificação acadêmica e científica. Assim como nós queremos um “especialista” cuidando do nosso paciente na UTI, tu leitor deves querer um “especialista” cuidando das publicações. Tanto os membros do corpo editorial, bem como vários revisores estão sendo buscados em centros acadêmicos nacionais e internacionais (Argentina, Chile, Espanha, Uruguai). Por fim, demos início a um processo de indexação no Sistema SCIELO-BIREME que é referência para a CAPES e fator decisivo para atrair a produção das nossas universidades que só assim é reconhecida pelos órgãos oficiais. Provavelmente, o leitor não vai ainda notar grandes diferenças. A diagramação é a mesma, o corpo editorial não foi reformado e o número de artigos é o usual. Caro leitor, eu o convido a ler a RBTI, ela já está sendo modificada para melhor há várias edições e está melhor ainda. Se gostares, quem sabe a tua próxima peça de estudo não seja enviada para ser publicada na RBTI? Agradecemos aos que nos confiaram esta tarefa, aos antigos e aos novos colaboradores. Um “bemvindo” a todos os leitores! 91 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / EDITORIAL Programas de aplicação médica para palmtops – Uma ferramenta poderosa no manejo do paciente grave Marcelo Freire de Oliveira*, Werther Brunow de Carvalho** a última década, temos acompanhado a utilização de palmtops para se agilizar a velocidade de informação para profissionais de saúde, visando o diagnóstico e a decisão terapêutica. A utilização dessa ferramenta não envolve nenhum conhecimento sofisticado, ao contrário do que se possa pensar em um primeiro momento. Atualmente, mais de um quarto dos médicos canadenses possui um palmtop e esse número deverá dobrar nos próximos dois anos1,2. Esse crescimento se deve, em maior parte, pelos variados programas de aplicação médica desenvolvidos para esse tipo de equipamento 3. Há um grande número de títulos disponíveis, e novos aplicativos surgem em velocidade crescente. A maioria dos programas médicos está disponível através da Internet. Sua obtenção (download) pode ser gratuita ou paga. Alguns fornecedores permitem o uso por tempo limitado de determinados programas – o usuário, ao final desse período, deve pagar uma taxa de registro para continuar utilizando o software. Ao avaliar um programa, assim como qualquer outra fonte de informação médica, o usuário deve estar atento para certas características do software, especialmente a credibilidade dos autores, se a informação é atual e, tratando-se desse tipo de equipamento, se os dados serão atualizados no decorrer do tempo, à medida em que novas evidências sejam incorporadas ao assunto em questão. Outros itens a serem avaliados são a abrangência das informações, a quantidade de memória do palmtop ocupada pelo programa e como as informações são apresentadas ao usuário, ou seja, quão “amigável” (userfriendly) é o software. Finalmente, deve-se considerar o preço, a existência de suporte técnico e o custo das atualizações ao escolher os programas que se adequem às necessidades particulares de cada médico. Atualmente, estão disponíveis programas de referência médica como o Harrison´s Principals of Internal Medicine, Merck Manual, The Harriet Lane N *Preceptor da Residência Médica em Pediatria da Universidade Federal de São Paulo - EPM ** Livre-Docente do Departamento de Pediatria da Universidade Federal de São Paulo – EPM 92 Handbook of Pediatrics, Washington Manual of Medical Therapeutics, Dorland´s Medical Dictionary, 5-Minute Consult Series, entre outros, cujos preços variam entre vinte e cem dólares por programa. Farmocopéias , fontes de informação extremamente populares entre profissionais médicos, estão também disponíveis, destacando-se, entre elas, ePocrates, Drdrugs, A2zDrugs, MosbyDrugs e o Lexi-Drugs Platinum, sendo apenas a primeira delas gratuita. Outras categorias disponíveis são seleções de publicações científicas, calculadoras médicas, programas para registro de pacientes e aplicativos de uso geral, como processadores de textos, planilhas eletrônicas e softwares para realização de apresentações. O avanço tecnológico dos palmtops tem acontecido de forma muita rápida. Atualmente, estão disponíveis máquinas com altos recursos e poder de computação. Além das poderosas funções de computador, esse tipo de equipamento está caminhando para reunir, em um só aparelho, funções de envio de mensagens e dados, telefone celular e pager, o que tornará o gerenciamento de informações cada vez mais flexível, dinâmico e passível de atualizações instantâneas. Os programas disponíveis no mercado são inúmeros, e muitos deles de grande utilidade no dia-a-dia no médico. A imensa maioria dos títulos, no entanto, é disponibilizada em língua inglesa, e muitos aspectos da prática médica em nosso país não são contemplados. Resta aguardar que, à medida em que esses equipamentos se popularizem entre médicos brasileiros, programas de qualidade comparável aos produzidos no exterior surjam em nosso meio, sintonizando a nossa prática com o que já é realidade em outros países. REFERÊNCIAS 1. 2. 3. Adatia F, Bedard P L:”Palm reading”: 2. Handheld software for physicians. CMAJ 2003;18:727-34. Physician´s use of handheld personal computing devices increases from 15% in 1999 to 26% in 2001. Harris Interactive. 2001 Aug 15. Disponível em www. Harrisinteractive.com/news/allnewsbydate.asp?NewsID=345 (acessado 2003 Maio) Martin S. MDs’ computer, PDA use on the upswing. CMAJ 2002; 167(7):794. RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL Análise comparativa do gasto energético entre as equações de Harris-Benedict e de Long e a calorimetria indireta em pacientes sépticos. Comparative analysis of energy expenditure between Harris-Benedict and Long’s equations and indirect calorimetry in septic patients. Francisco Antonio Coletto*, Flávio Marson*, Antonio Dorival Campos**, Júlio Sérgio Marchini***, Anibal Basile-Filho**** ABSTRACT The measurement of accurate resting energy expenditure (REE) in critically ill patients is important to assess nutritional needs. The purpose of this study is to compare Harris-Benedict equation (H-B) and its correction for injury factors (CALC) and the indirect calorimetry (IC), in septic patients. A total of 28 patients were enrolled in the study (15 males and 13 females), ranging from 46.6 ± 19.5 years old. The APACHE II was 23.7 ± 7.8 with a risk of death of 48.5 ± 27.5. The sepsis score was 22 ± 7.7. The REE was obtained by IC at four different times (T1, T2, T3 and T4) in a steady patient for at least 30 minutes. The patients were divided in two groups; GI – n=19 – with four hourly measurements and GII – n=9 – with one measurement. The REECI mean values to GI, from T1 to T4 were 1625, 1660, 1685 and 1705 kcal.d-1, respectively and 1351 kcal.d-1 to GII. The REEH-B means were 1507.5 ± 208.1 (GI) and 1317.1 ± 240.7 kcal.d-1 (GII). When Long’s injury correction factors were introduced, and the REE values increased in both groups (GI = 2894.5 ± 399, 6; GII = 2528.8 ± 462.1 kcal.d1 ). As expected, the REEH-B shown a difference from REECI (p=0.02). However, with the correction factors, we observed a statistical difference in both groups. For all patients, there was a variation of only 7.6% between REECI and REEH-B, and an increase as much as 50% in energy requirements, when the REE was corrected. Keywords: Sepsis, resting energy expenditure, indirect calorimetry. atenção na determinação das necessidades energéticas deve estar incluída entre os primeiros cuidados ao paciente em estado grave, uma vez que as alterações metabólicas provocadas pela doença aguda tornam a avaliação nutricional um difícil exercício clínico. Estes pacientes são caracterizados pelo aumento do gasto energético de repouso e pelo balanço nitrogenado negativo, ambos correlacionados com a gravidade da doença ou extensão do trauma(1,2). Historicamente, observa-se que pacientes febris e gravemente enfermos têm catabolismo protéico aumentado, sendo que este conceito foi a base do fornecimento alimentar superestimado aos pacientes graves nas décadas de 70 e 80, particularmente por meio da terapia nutricional parenteral (3). A Atualmente, sabemos que há poucas vantagens e muitos riscos potenciais na hiperalimentação e nos últimos quinze anos um conceito de suporte nutricional mais moderado tem se desenvolvido(4,5,6). Em contrapartida, há várias décadas a má nutrição tem sido descrita com alta prevalência hospitalar. Em ambiente de terapia intensiva, segundo diversos critérios de avaliação, pode ocorrer em 30% a 50% dos pacientes internados (7,8). Diante dessas situações, a determinação apropriada das reais necessidades energéticas do paciente em estado crítico deve ser realizada. Este processo é usualmente determinado por equações preditivas ou calorimetria indireta. Sendo assim, particular ênfase deve ser dada à mensuração do gasto energético total *Médicos Assistentes e Pós-Graduandos da Disciplina de Terapia Intensiva do Departamento de Cirurgia e Anatomia da ------Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo **Professor Associado do Departamento de Medicina Social (Estatística Médica) da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto Universidade de São Paulo ***Professor Associado e Chefe do Laboratório de Espectrometria de Massa do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo ****Professor Associado e Chefe da Disciplina de Terapia Intensiva do Departamento de Cirurgia e Anatomia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo Dissertação de Mestrado realizada na Disciplina de Terapia Intensiva (Centro de Terapia Intensiva da Unidade de Emergência e Campus – Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto) do Departamento de Cirurgia e Anatomia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Projeto de pesquisa financiado pela FAPESP (99/07266-7). Av. Bandeirantes, 3900 – Ribeirão Preto – SP – CEP 14049-900 – E-mail: [email protected] – Tel.: (16) 602-2439 Volume 15 - Número 3 - Julho/Setembro 2003 93 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL ou real objetivando a administração adequada do suporte nutricional. Na ausência da calorimetria indireta, fórmulas presuntivas são rotineiramente utilizadas, como as tradicionais equações de HarrisBenedict(9), para o cálculo do gasto energético. Essa equação pode subestimar ou superestimar o gasto energético real em até 10% dependendo do paciente e do tipo de doença(10). Muitos estudos encontraram significativas diferenças entre os valores do gasto energético medidos através da calorimetria indireta com os resultantes de várias equações presuntivas (11,12). Fórmulas ou tabelas, como as de HarrisBenedict e Talbot(13) têm sido empregadas aos pacientes em estado grave para estimar o gasto energético. É freqüente a utilização de fatores de correção específicos para os diversos tipos de injúria, visando atenuar as diferenças. Estes fatores variam de 1,0 a 2,7, como relatado por muitos autores(12,14,15), embasados nos achados de LONG et al. de 1979(16). O objetivo do presente estudo é comparar as medidas do gasto energético obtidas pela calorimetria indireta e pelas equações de Harris-Benedict e com os fatores de correção para injúria e atividade nos pacientes em estado grave, vítimas de sepse de qualquer origem e sob ventilação mecânica. CASUÍSTICA E MÉTODOS O estudo foi realizado no Centro de Terapia Intensiva (CTI) – Unidade de Emergência e Campus – do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, tendo sido aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do referido Hospital (Processo HCRP nº 4989/99). A análise clínica prospectiva envolveu 28 pacientes de ambos os sexos (15 do sexo masculino e 13 do sexo feminino), sedados, vítimas de sepse de qualquer origem, com necessidade de ventilação mecânica, após restauração volêmica, estabilização hemodinâmica e respiratória em até cinco dias da internação no CTI e terapia nutricional padronizada em 25-30 kcal.kg-1.d-1 (1kcal.mL-1). Os pacientes foram estudados do 1º ao 5º dia do início do quadro clínico de sepse. Os critérios utilizados para o diagnóstico de sepse e choque séptico foram estabelecidos pela conferência de consenso realizada pelo American College of Chest Physicians/Society of Critical Care Medicine(17) e todos os pacientes foram estratificados, à admissão no Centro de Terapia Intensiva, de acordo com o índice de gravidade APACHE II(18) e pelo sistema de graduação de sepse SS – Sepsis Score(19), tanto para os casos de sepse isoladamente como para os com 94 trauma associados à infecção. Os pacientes com trauma apresentavam-se com pneumonia e sépticos. Os critérios de exclusão foram: idade > 85 e < 15 anos, necessidade de FiO2 (fração de oxigênio no ar inspirado) > 0,6, PAM (pressão arterial média) < 50mmHg, FC (freqüência cardíaca) <50 ou >140 bpm, presença de fístula aérea bronco-pleural, choque circulatório irreversível, diurese horária < 50 mL.h-1, morte encefálica e recusa do paciente ou de seu representante em participar do estudo. O peso dos pacientes foi obtido por medida direta através de balança portátil (Slingscale 2002, Instrucom/Hill-Rom series, Hillembrand Industries, EUA). O protocolo teve duração média de cinco horas por paciente, onde foram realizadas, em 19 pacientes, quatro medidas de calorimetria indireta em séries de 30 minutos, intercaladas por aproximadamente 45 minutos. O intervalo de tempo entre as séries de medidas contou com 15 minutos destinados a procedimentos e cuidados rotineiros do serviço e 30 minutos para estabilização das novas medidas, cujas técnicas e equipamentos foram demonstrados com detalhes, anteriormente(20,21). Em 09 pacientes foram realizadas medidas únicas com período de monitorização variando de 30 a 60 minutos. Esta variação no delineamento do protocolo ocorreu em decorrência de questões como: agitação (01 paciente), necessidade de realização de procedimentos e exames complementares que não poderiam aguardar todo o período do protocolo (02 paciente), necessidade de aspiração endotraqueal freqüente (04 pacientes) e problemas técnicos com o calorímetro (02 pacientes). Com a finalidade de uniformização da análise, os pacientes foram separados em dois grupos: grupo I (19 pacientes com quatro séries de medidas de 30 minutos de calorimetria) e grupo II (09 pacientes com as medidas isoladas). Para fins de padronização de nomenclatura, considerou-se como gasto energético de repouso (GERH-B) o calculado através da equação de HarrisBenedict, de acordo com as equações abaixo: Homens: GEB = 66,4730 + (13,7516 x Peso) + (5,0033 x Altura) – (6,7550 x Idade) Mulheres: GEB = 655,0955 + (9,5634 x Peso) + (1,8496 x Altura) – (4,6756 x Idade) Além disso, utilizou-se o termo gasto energético real (GERCI), quando este foi obtido por calorimetria indireta. Foi designado pela terminologia de gasto energético total (GER CALC), o calculado através da multiplicação dos valores obtidos no gasto energético RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL Tabela 1. Cálculo do gasto energético com os fatores de correção específicos (GERCALC) para atividade e injúria propostos por LONG et al., 1979(16). FA = Fator Atividade: FI = Fator de injúria: Acamado = 1,2 Cirurgia = 1,20 Trauma = 1,35 Deambulando = 1,3 Sepse = 1,6 Queimadura grave = 2,10 de repouso (GER H-B ) pelos fatores de correção de Long específicos para injúria e para atividade (Tabela 1). Todos os pacientes encontravam-se acamados (fator de correção para atividade de 1,2) e sépticos. Apesar de seis deles apresentarem trauma concomitantemente ao quadro infeccioso, todos foram considerados como pertencentes à mesma classe de injúria, sepse, com o fator de correção de 1,6, conforme a equação abaixo: GERCALC = GERH-B x 1,6 A análise estatística levou em consideração as médias dos valores obtidos para o gasto energético de todos os pacientes, através dos dois métodos (calorimetria indireta e equação de Harris-Benedict com e sem a utilização do fator de injúria para sepse e atividade). Os dados foram comparados empregando-se o teste não paramétrico para duas amostras independentes de Mann Whitney, baseadas na hipótese nula de inexistência de diferenças entre os gastos energéticos obtidos pelo calorímetro e o calculado pela equação de Harris-Benedict corrigida ou não. Foram consideradas estatisticamente significativas as comparações para valor de p < 0,05. RESULTADOS Foram estudados 28 pacientes (15 homens e 13 mulheres), com idade média de 46,6 ± 19,5 anos. Os dados referentes aos pacientes encontram-se na Tabelas 2. Os pacientes com o diagnóstico isolado de sepse de várias etiologias (n = 22) representaram Tabela 2: Diagnósticos clínicos e dados demográficos dos pacientes estudados. Pacientes de número 1 a 19 com quatro medidas de calorimetria indireta durante 30 minutos e de 20 a 28, com uma medida de 30 a 60 minutos. PACIENTES 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 Média Desvio Padrão Mediana Diagnóstico infeccioso Pneumonia Pneumonia Pneumonia Pneumonia Pneumonia Pneumonia Celulite MID Pneumonia Pneumonia + Trauma Pneumonia + Trauma Pneumonia + Trauma Pneumonia + Trauma Pneumonia + Trauma Pneumonia Pneumonia Pneumonia Pneumonia Abscesso Abdominal Peritonite Peritonite Pneumonia Pneumonia e Celulite Pneumonia Pneumonia Doença de Chron e peritonite Pneumonia Pneumonia Pneumonia e Trauma Volume 15 - Número 3 - Julho/Setembro 2003 Sexo F F M F M M M M M M M M M M M M M F F F F F F F F F F M Temperatura(°C) 37,3 36,4 38,2 36,9 35,3 37,0 37,8 38,6 37,4 37,1 37,8 38,3 38,1 36,6 36,1 37,0 36,3 37,2 38,4 36,0 37,4 37,5 37,2 37,5 36,4 38,5 36,5 36,6 37,19 0,84 37,2 Idade 39 38 32 78 67 72 22 51 28 35 19 16 31 69 48 68 55 41 23 69 57 42 45 81 59 65 38 18 46,64 19,49 43,5 Peso(kg) 53 62 63 70 77 62 70 57 67 74 67 65 70 60 80 58 80 88 62 60 70 45 47 63 75 54 44 78 65,04 10,90 64 Altura(cm) 150 162 167 163 170 160 170 160 173 177 177 174 176 160 177 160 170 162 160 170 165 160 165 165 168 165 165 180 166,82 7,05 165 95 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL 78,6% do total, onde 09 (40,9%) eram do sexo masculino. Nos pacientes com trauma associado a sepse (n = 6), todos eram do sexo masculino, representando 21,4% do total de pacientes. O SS médio de toda a casuística foi de 20,7 ± 7,7. O peso corporal médio foi de 65,0 ± 10,9 kg e a altura de 166,8 ± 7,0 cm. O índice de APACHE II de todos os pacientes, no primeiro dia de internação na UTI foi de 23,7 ± 7,8 e o risco de óbito geral calculado a partir do APACHE II, de 48,5 ± 27,5%. A mortalidade geral da casuística situou-se em 50% (n=14). As médias dos valores das medidas do quociente respiratório (RQ), consumo de oxigênio (VO2) e produção de gás carbônico (VCO2) para cada paciente são detalhados na Tabela 3. Ao total, foram realizadas 85 medidas de calorimetria indireta nos 28 pacientes. Os valores médios das medidas do gasto energético obtidos pela calorimetria indireta (GERCI) para os 19 pacientes do grupo I nos tempos T 1 a T 4, bem como os valores médios do gasto energético dos 09 pacientes do grupo II com apenas uma medida (T 1), são mostrados na Tabela 4. O valor médio do gasto energético basal Tabela 4: Valores médios das medidas do gasto energético real obtidas por calorimetria indireta (GERCI), nos tempos T1 a T4, para os pacientes do grupo I e média das medidas do GERCI dos pacientes do grupo II (DP = desvio padrão). 19 pacientes (grupo I) Tabela 3. Média dos dados colhidos dos pacientes. Quociente respiratório = RQ, Consumo de oxigênio = VO2, Produção de gás carbônico = VCO2, Índice prognóstico APACHE II = AP II, Risco de óbito calculado pelo APACHE II = AP II (%), Sepsis Score (Graduação de sepse) = SS. Pacientes RQ VO2 VCO2 APII APII (%) SS 1 0,77 223 171 31 73 21 2 0,89 170 151 11 14 12 3 0,82 294 242 28 72 11 4 0,9 196 175 28 66 10 5 0,99 225 222 16 24 19 6 0,94 193 182 28 78 28 7 0,81 286 232 26 73 25 8 0,92 268 246 24 43 23 9 0,96 202 195 20 28 27 10 0,75 284 212 12 11 26 11 0,80 306 244 17 11 45 12 0,89 241 214 26 55 9 13 0,85 292 238 15 16 17 14 0,90 208 186 33 88 26 15 0,76 211 160 24 52 15 16 0,75 264 179 27 63 16 17 0,76 252 191 27 58 17 18 0,80 256 207 14 11 28 19 0,74 279 203 16 23 27 20 0,80 185 148 20 38 21 0,82 215 177 31 68 22 0,80 209 168 17 16 17 23 0,93 152 143 33 84 10 24 0,78 195 152 38 83 17 25 0,89 213 188 10 13 28 26 0,95 177 167 27 75 19 27 0,92 144 132 36 85 24 28 0,87 280 243 28 38 17 Média 0,85 229,29 191,71 23,7 48,5 20,7 DP 0,07 45,89 34,04 7,8 27,5 7,7 Mediana 0,84 219 187 26,0 53,5 19,5 96 09 pacientes (grupo II) Tempo 2 Tempo 3 Tempo 4 Única medida Média 1625,32* 1660,05 1685,32 1705,37 1351,21 Tempo 1 DP 272,38 279,93 279,13 254,73 275,30 * Resultados expressos em kcal.d-1. (GEBH-B) foi de 1507,5 ± 208,1 kcal.d-1 para os pacientes avaliados no grupo I e 1317,1 ± 240,7 kcal.d -1 para os do grupo II; valores obtidos através da equação de Harris-Benedict. Quando utilizados os fatores de correção para injúria e atividade (GET CALC), os valores do gasto energético total calculado representaram 2894,5 ± 399,6 kcal.d -1 e 2528,82 ± 462,15 kcal.d -1 , para os grupos I e II, respectivamente (Tabela 5). Tabela 5: Valores médios e desvios-padrão dos gastos energéticos obtidos pela equação de HarrisBenedict (GERH-B) e pela utilização dos fatores de correção específicos para injúria e atividade (GERCALC) e calorimetria indireta (GERCI), em kcal.d-1, dos dois grupos de pacientes. Procedimento Grupos I (n = 19) II (n = 09) GER CI 1669,00 ± 266,00* 1351,22 ± 275,34 20 GER H-B 1507,50 ± 208,10 1317,10 ± 240,70 25 GERCALC 2894,50 ± 399,60 2528,82 ± 462,15 *média ± desvio padrão. O valor médio do gasto energético real (GER) obtido através da calorimetria indireta foi de 1669,0 ± 266,0 kcal.d-1 para o grupo I (19 pacientes) e de 1351,22 ± 275,34 kcal.d-1 para os demais (grupo II 09 pacientes). A Figura 1 ilustra os valores médios correspondentes a toda a casuística, segundo os procedimentos GEBH-B, GER e GETCALC. Os resultados RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL Figura 1: Comparação entre o gasto energético calculado pela equação de Harris-Benedict (GERH-B), com os fatores de correção para injúria e atividade (GERCALC) e com o gasto energético real obtido por calorimetria indireta (GERCI). evidenciaram diferença estatisticamente significante entre o gasto energético médio resultante da equação de Harris-Benedict (GEBHB = 1507,5 ± 208 kcal.d-1) e o valor médio obtido pela calorimetria indireta (GER = 1669,0 ± 266,0 kcal.d-1) no grupo I (p = 0,02). No grupo II, não foi observada diferença estatisticamente significante entre o GEBH-B (1317,1 ± 240,70 kcal.d-1) e o GER (1351,22 ± 275,34 kcal.d-1) (p = 0,41). Para ambos os grupos, quando aplicados os fatores específicos de correção propostos, houve diferença estatística. Para toda a casuística, houve uma variação global de 7,6 %, em média, entre o GER e o GEBH-B, bem como diferença estatisticamente significante entre eles, com p = 0,007. DISCUSSÃO O objetivo deste estudo foi comparar o uso da equação de Harris-Benedict, com os fatores de correção específicos para injúria e atividade propostos por Long e com os valores obtidos através da calorimetria indireta para o cálculo do gasto energético em pacientes adultos vítimas de sepse, sob ventilação mecânica. Classicamente, os pacientes em estado crítico são caracterizados pelo aumento do gasto energético basal e pelo balanço nitrogenado negativo, ambos correlacionados com a gravidade da doença ou a extensão do trauma(1,2). A maneira mais rotineira de se medir o gasto energético, nessa população de pacientes, é através da equação de Harris-Benedict, acrescendo-se fatores de correção para cada estado patológico. No entanto, esta prática tem sido muito questionada por vários autores, há algum tempo, pelo fato do emprego desta metodologia sub ou superestimar as reais necessidades energéticas de cada paciente em até 50%(22,23,24,25). Uma obervação muito interessante foi efetuada, recentemente, Volume 15 - Número 3 - Julho/Setembro 2003 por Zauner et al.(25). Estes autores estudaram 25 pacientes submetidos à terapia nutricional parenteral, admitidos numa unidade de terapia intensiva, cuja objetivo foi comparar o gasto energético total de pacientes sépticos (n=14) e não sépticos (n=11), no primeiro (D1), no 2o (D2) e 7o (D7) dia de admissão. Curiosamente, estes autores não observaram diferenças significativas entre o grupo de pacientes sépticos e não sépticos em D1, D2 e D7 (2,65±0,49 e 2,36±0,56 kJ.min -1 .m 2; 0,68±0,4 e 0,74±0,6 kJ.min-1.m2; 0,65±0,3 e 0,78±0,5 kJ.min-1.m2, respectivamente). É muito razoável supor que o paciente criticamente enfermo apresenta uma série enorme de nuances que prejudicam a aplicação destas equações teóricas, em virtude, sobretudo, de sua labilidade e inconstância fisiológica. Dentre os principais aspectos observados, pode-se incluir: - sedação e/ ou bloqueadores neuromusculares, catecolaminas vasoativas, instablilidade hemodinâmica, terapia nutricional (efeito termogênico), episódios de bacteremias, temperatura corpórea (hipo ou hipertermia), procedimentos terapêuticos. Estas razões são suficientes para explicar por que as predições do gasto energético diários são de difícil precisão nesses pacientes, ocorrendo, às vezes, o mesmo com o uso da calorimetria indireta. Em outras palavras, é muito difícil atingir um steady state no paciente em estado crítico, conseguindo-se medidas repetidas e constantes, em função do tempo(26). No presente estudo, nós observamos um valor diferença de RQ constante durante o protocolo, refletindo a obtenção de um verdadeiro steady state para os nossos pacientes. É importante, contudo, salientar que quando estas equações teóricas são utilizadas, pode ocorrer uma adminstração de nutrientes inadequada conduzindo-se à sub ou superalimentação, cujos efeitos deletérios já foram bem documentados, dependentes ainda da via de administração desses nutrientes (parenteral ou enteral)(27). A inacurácia das equações teóricas tornase, particularmente, importante nos pacientes graves de longa duração de doença. Estes pacientes são mais susceptíveis de evoluir para a síndrome de disfunção de múltiplos órgãos e, conseqüentemente, de apresentar uma deterioração do estado nutricional em virtude da persistência do estado hipermetabólico. Neste grupo de pacientes, a calorimetria indireta oferece a possibilidade de se observar a variabilidade do gasto energético diário e proceder às correções necessárias, a fim de se manter o balanço energético, durante todo o período de internação. Nesse contexto, Vermeij et al.(28), utilizando a calorimetria indireta em pacientes graves, investigaram se apenas uma medida diária do gasto energético poderia ser extrapolada para todo o tempo de perma97 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL nência na unidade de terapia intensiva. Estes autores observaram que apesar da média diária ser próxima da média de 7 dias de estudo, ocorreram variações de até 31% para o mesmo paciente. No presente estudo, a média do gasto energético medido pela calorimetria indireta (GERCI) para toda a casuística foi de 1566,9 ± 304,1 kcal.d-1 e através da equação de Harris-Benedict (GERH-B) de 1446,3 ± 232,9 kcal.d-1; 7,6% abaixo das medidas obtidas pelo calorímetro (média de 120 kcal.d-1), enquanto que as correções efetuadas sobre os valores do GERH-B superestimam o gasto energético em mais de 50%. De acordo com as considerações tecidas acima, quais as conseqüências para o paciente criticamente enfermo de uma sub ou superalimentação? Sabe-se que a administração insuficiente de energia, no paciente grave, é caracterizada por perda da massa muscular magra e eliminação importante de nitrogênio, via urina, conduzindo-o rapidamente a um estado de deterioração e desnutrição. Sob estas circunstâncias, os efeitos da desnutrição estão associados à redução da força da musculatura envolvida na respiração, levando a dependência do paciente ao respirador, além de aumentar a sua predisposição às infecções, cujas conseqüências incluem, de maneira direta, o aumento da morbimortalidade do mesmo. Por outro lado, a administração excessiva de nutrientes causa um estresse adicional, tendo como conseqüências as complicações cardiopulmonares (hipercapnia e dificuldades no desmame do respirador), hepáticas e metabólicas(29,30,31,32,33). Qual o papel da calorimetria indireta sobre a individualização da oferta de nutrientes nestes pacientes? O uso da calorimetria pode evitar esses erros de oferta? Embora exista uma vasta literatura sobre o assunto, poucos estudos bem controlados, no entanto, foram conduzidos para responder a estas perguntas. Por exemplo, Vo et al.(4) analisaram o impacto de infusões de altas concentrações de glicose parenteral (61 a 77% da proporção calórica diária) sobre a morbi-mortalidade de pacientes nas primeiras 24 horas de pós-operatório. Estes autores observaram o comportamento do coeficiente respiratório (QR) de um grupo de pacientes que recebeu 1,5 vezes o gasto energético basal (RQ>0,95) e outro que recebeu 1,0 vez o gasto energético basal (RQ<0,95). Foram observadas, no grupo que recebeu a maior oferta glucídica, episódios sépticos com maior freqüência e uma mortalidade maior quando comparados ao outro grupo que recebia os nutrientes apenas para cobrir o gasto energético basal. Em um outro estudo clínico prospectivo e randomizado, foi comparado o uso da calorimetria indireta e o uso de equações teóricas, durante a terapia nutricional enteral (21 dias) em 98 um grupo de pacientes jovens (média de idade de 33 anos) com queimaduras graves. Os autores concluíram que havia uma diferença de apenas 20% entre os dois métodos(34). A exata extensão pela qual a sub ou superalimentação podem ser prejudiciais para o paciente em estado crítico permanece obscura, uma vez que por razões éticas é muito pouco provável que estudos controlados provocando essas condições, nessa população de pacientes, sejam conduzidos. Contudo, o consenso atual é o de que a energia fornecida esteja em equilíbrio com o gasto energético medido. Além do que se verifica nos estados hipercatabólicos, um gasto energético medido abaixo do calculado, através da equação de Harris-Benedict, pode sugerir uma resposta hipometabólica. Realmente, diferentes estudos demonstraram que 15 a 20% dos pacientes em estado críticos são hipometabólicos(22,24,35). No entanto, antes do paciente ser classificado como tal, devem ser verificados inúmeros erros técnicos durante a medição do gasto energético pelo calorímetro, a saber: - a simples colocação do paciente sob ventilação mecânica reduz o gasto energético em 15 a 20%(36); - erro de calibração do aparelho; -vazamentos nas conexões com o respirador e/ou tubo endotraqueal ou torácico, que podem causar perdas de volume expiratório (VE), importantíssimo nos cálculos do gasto energético, efetuados pelo microprocessador do calorímetro; - uso do peso do paciente utilizado na equação de Harris-Benedict, pois o peso medido pode ser diferente do peso habitual (ou pré-hospitalar), por influência da intensa mobilização do compartimento hídrico(37). Além disso, a formulação da dieta deve ser levada em consideração, por ocasião da interpretação dos dados fornecidos pelo calorímetro. Em outras palavras, um regime misto (carboidratos e lipídeos) está associado a um gasto energético menor do que um regime apenas rico em carboidratos. Foi demonstrado que quando a oferta está em equilíbrio com a necessidade energética, os pacientes apresentam um gasto energético muito menor do que aqueles que são hiperalimentados(38). Os fatores mais importantes que podem causar o hipometabolismo são a sepse e a síndrome de disfunção de múltiplos órgãos. Nesses casos, existe uma perturbação do metabolismo oxidativo celular, cuja tendência é a diminuição do gasto energético. Nesse particular, Kreymann et al.(39) observaram a evolução temporal do gasto energético em um grupo de pacientes em estado crítico dividindo-os em 3 subgrupos: sepse, síndrome séptica e choque séptico. Foi demonstrado que quanto maior a gravidade do quadro infeccioso (choque séptico) menor é o gasto energético, porém maior é a mortalidade. Estes autores notaram, também, que na fase de RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL convalescença estes valores retornam rapidamente a normalidade. Estes achados sugerem que um certo grau de hipermetabolismo deve fazer parte da defesa orgânica contra uma agressão e que a identificação do hipometabolismo pode ser um fator prognóstico importante para indicar o resultado final da doença. Existem evidências de que as complicações das doenças de base (pós-operatório complicado, sepse/choque séptico, trauma, queimaduras), como a síndrome do desconforto respiratório agudo (SARA), acentuam ainda mais o quadro clínico inicial de desnutrição e perda nitrogenada urinária. Conforme foi salientado anteriormente, vários estudos mostraram claramente que as equações teóricas não são precisas e nem acuradas, quando utilizadas neste tipo de complicação. Em um estudo conduzido com 112 pacientes em estado crítico sob ventilação mecânica, a energia medida foi 34% maior do que o gasto energético basal com uma enorme variação de 11% abaixo a 82% acima dos valores teóricos(22). Além do mais, é importante notar que o hipermetabolismo é um fator denominador comum dos pacientes graves com SARA, onde este tipo de paciente apresenta um grau interindividual muito variado de gasto energético e variações intraindividuais diárias(40,41), cujo objetivo da terapia nutricional é evitar ao mesmo tempo a superalimentação e uma desnutrição profunda, reduzindo as chances de fadiga muscular e o desmame do respirador(42). O hipermetabolismo observado nos pacientes com SARA aumenta a produção de gás carbônico (VCO2), agravando uma condição pré-existente de remoção de gás carbônico (CO2)(38). A taxa de VCO2 depende do grau de hipermetabolismo e do tipo e da quantidade de nutrientes administrado(43). Assim, a quantidade de CO2 produzida por unidade de energia (kcal) é significantemente menor durante a oxidação dos lipídeos (0,15 L.kcal-1) do que para os carboidratos (0,20 L.kcal-1). Mais uma vez, deve ser enfatizado que quando a terapia nutricional é isoenergética (energia administrada é equivalente à energia gasta), com teores de carboidratos abaixo de 60%, o impacto sobre a VCO2 é muito pequeno. Por outro lado, existem evidências de que a administração de quantidades crescentes de calorias, mesmo com o teor de carboidratos abaixo de 60%, existe um aumento proporcional da VCO2, da ordem de 20 (1,5 vezes o gasto energético real) a 50% (2 vezes o gasto energético real)(33). Achados similares concuíram que o hipermetabolismo que acompanha a SARA é o principal determinante do aumento da demanda ventilatória (VE demand)(44). No entanto, um aumento na demanda ventilatória não prejudica a interpretação dos dados calorimétricos obtidos à beira do leito, Volume 15 - Número 3 - Julho/Setembro 2003 sobretudo se esses resultados forem expressos como a média de diversos tempos, pois existem dados na literatura que mostram que mudanças no VE somente produzirão alterações na leitura do aparelho depois de, ao menos, 120 minutos(45). Finalmente, face ao exposto, o risco de um aumento adicional da VCO2 provocado pela terapia nutricional no paciente grave com SARA é melhor controlado através da medição da energia gasta, da VCO2 e da manutenção do RQ entre 0,8 e 0,95 com a calorimetria indireta e não através do uso de equações teóricas acrescidas dos fatores de injúria, onde o risco de superestimação desse gasto, com conseqüente superalimentação, é quase certo. Em conclusão, estes resultados sugerem que a equação de Harris-Benedict, sem os fatores de correção para injúria e atividade, aproximou-se mais do gasto energético medido por calorimetria indireta nos pacientes em estado grave. Além disso, o uso rotineiro da calorimetria indireta para guiar a suplementação calórica nos pacientes sépticos parece ser a técnica mais adequada na avaliação do gasto energético real neste grupo de pacientes. Além disso, o desenvolvimento de estratégias portáteis, não invasivas e exatas para a medida do VO2, à beira do leito, permite individualizar o planejamento nutricional de qualquer paciente grave. Nesse particular, o uso da calorimetria indireta a fim de se estimar o gasto energético pode permitir uma monitorização mais acurada das necessidades energéticas dos pacientes e diminuir os riscos relacionados com hiper ou hipo alimentação. RESUMO A determinação precisa das necessidades energéticas está incluída nos cuidados ao paciente em estado grave. O objetivo deste estudo foi comparar o gasto energético (GER) entre as equações de Harris-Benedict (H-B), os fatores de correção específicos para injúria de Long (CALC) e o a calorimetria indireta (CI), em pacientes sépticos. Foram estudados 28 pacientes com sepse (15 homens e 13 mulheres), com idade de 46,6 ± 19,5 anos. O APACHE II foi de 23,7 ± 7,8 e o risco de óbito de 48,5 ± 27,5. O escore de sepse foi de 22 ± 7,7. Os pacientes foram divididos em dois grupos (I – n=19 – com quatro séries de medidas de CI durante 30 minutos e II – n=9 – uma medida com período de 30 a 60 minutos). Os valores médios do GERCI no grupo I, nos tempos T1 a T4, foram de 1625 kcal.d-1 (T1), 1660 kcal.d-1 (T2), 1685 kcal.d-1 (T3) e 1705 kcal.d-1 (T4), respectivamente. No grupo II, com apenas única medida (T1), de 1351 kcal.d-1. O valor médio GERH-B foi de 1507,5 ± 208,1 kcal.d-1 99 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL no grupo I e 1317,1 ± 240,7 kcal.d-1 no grupo II. Quando utilizados os fatores de correção de Long (GERCALC), esses valores aumentaram nos dois grupos (I = 2894,5 ± 399,6 kcal.d-1 e II = 2528,8 ± 462,1 kcal.d-1). Em média, o GEBH-B foi estatisticamente diferente (p=0,02) dos valores obtidos pela CI, apenas no grupo I. No entanto, quando aplicados os fatores específicos de correção, foram observadas diferenças nos dois grupos. Para toda a casuística, houve uma variação de 7,6% entre o GERCI e o GERH-B (p=0,007). Em conclusão, nossos dados demonstraram pequenas diferenças entre o GER medido através da CI e o calculado pela equação de H-B, com pouca importância clínica. No entanto, os valores obtidos quando a equação é corrigida pelos fatores de injúria, superestima o GER em mais que 50%. Unitermos: Sepse, gasto energético, calorimetria indireta. AGRADECIMENTOS Ao apoio financeiro complementar para a execução deste projeto de pesquisa fornecido pela Fundação de Apoio ao Ensino e Pesquisa (FAEPA) do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto e Pró-Reitoria de Pesquisa da Universidade de São Paulo. REFERÊNCIAS 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. Hwang TL, Huang SL, Chen MF. The use of indirect calorimetry in critically ill patients. The relationship of measured energy expenditure to injury severity score, septic severity score, and APACHE II score. J Trauma 1993; 34:247. Frankenfield DC, Wiles CE, Bagley S, Siegel JH. Relationship between resting and total energy expenditure in injured and septic patients. Crit Care Med 1994; 22:1796. Giovannini I, Chiarla C, Boldrini G, et al. Bases Fisiológicas da Monitorização Cardiorrespiratória. 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RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL Gasto energético em pacientes sépticos: Correlação entre a calorimetria indireta e as equações preditivas derivadas a partir de dados hemodinâmicos*. Energy expenditure in septic patients: Correlation between indirect calorimetry and predictive equations derivated from hemodynamic data*. Anibal Basile-Filho*, Maria Auxiliadora Martins**, Maria Tereza Batiston***, Paula Pileggi Vinha**** ABSTRACT The objective of the present study is to compare the resting energy expenditure (REE) obtained by indirect calorimetry (DELTA) to the REE calculated by the predictive equations (Brandi and Liggett) using the oxygen consumption (VO2) obtained by indirect calorimetry or Fick’s method in septic patients. Fifteen adult patients (11 men and 4 women) were studied. The APACHE II at admission was 22.6±7.2, with a mortality risk of 46.1±27.7%. Forty-five VO2 measurements were made using a portable metabolic cart connected to a respirator and a pulmonary artery catheter. The mean REEs obtained by indirect calorimetry and by Brandi and Liggett equations were 1699±271, 1815±355 and 1361±277 kcal.day-1, respectively. There were no statistically significant differences between the two methods, with the two means showing a difference of 8.7%. REE values were close for DELTA x BRANDI (r=0.80), but the correlation between DELTA x LIGGETT was only 0.58. Usually, in the intensive care setting predictive equation is used to estimate the energy expenditure. The direct method most frequently used to calculate REE is indirect calorimetry, although it can be obtained with a Swan-Ganz catheter. The results suggest that REE can be easily calculated by obtaining VO2 with the Swan-Ganz catheter using the Brandi equation even for septic patients under mechanical ventilation. KEYWORDS: Oxygen consumption, resting energy expenditure, indirect calorimetry, sepsis. doença aguda e o seu tratamento alteram, invariavelmente, o metabolismo do paciente em estado crítico, acarretando num aumento ou diminuição de seu gasto energético. Por esta razão, a determinação precisa do gasto energético destes pacientes é obrigatória, sobretudo naqueles recebendo terapia nutricional. Asseguram-se, assim, suas necessidades energéticas, evitando-se as complicações associadas à hiper ou subnutrição, cujas conseqüências deletérias têm sido bem documentadas (1,2) . Muitos métodos de avaliação do gasto energético no paciente grave foram descritos, porém todos têm limitações. A calorimetria indireta, embora seja, atualmente, considerada um A “padrão ouro” possui limitações técnicas bem conhecidas, tais como: exigência de pessoal treinado com disponibilidade de tempo, necessidade de uma fração de oxigênio inspirado menor do que 0,6 e custo elevado do equipamento (3,4,5) . Por outro lado, os outros métodos existentes referemse às equações preditivas, tal como a clássica equação de Harris & Benedict (6) , acrescida de vários fatores de estresse, cuja finalidade é predizer o custo energético das alterações metabólicas, nessa população de pacientes (7) . Estas equações são largamente utilizadas, pela sua facilidade de execução e a um custo zero. No entanto, estas se mostraram imprecisas numa extensa variedade de situações clínicas bem defi- *Professor Associado e Chefe da Disciplina de Terapia Intensiva do Departamento de Cirurgia e Anatomia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo. **Supervisora de Equipe Médica do Centro de Terapia Intensiva - Campus do Departamento de Cirurgia e Anatomia -da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo. ***Médica Residente do Centro de Terapia Intensiva - Campus do Departamento de Cirurgia e Anatomia -da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo. ****Médica Adida (Research Fellowship) da Disciplina de Terapia Intensiva do Departamento de Cirurgia e Anatomia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo. Trabalho apresentado no 32nd Critical Care Congress, San Antonio, EUA, 2003. Projeto de pesquisa financiado pela FAPESP 99/07266-7. Centro de Terapia Intensiva – Campus, Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto. Av. Bandeirantes, 3900 – Ribeirão Preto – SP – CEP 14049-900 E-mail: [email protected] ( (16) 602-2439 Volume 15 - Número 3 - Julho/Setembro 2003 101 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL nidas, apresentando variações importantes inter e intra-individuais (8,9,10,11,12) . Outros métodos, muito empregados para calcular o gasto energético, desenvolvidos há algum tempo, baseiam-se na equação de Fick, que utiliza dados hemodinâmicos, como o débito cardíaco, a concentração sérica de hemoglobina, as saturações arterial e venosa mista de oxigênio, obtidas através de um cateter triluminal inserido na artéria pulmonar (13,14,15,16) . Com base nessas informações, o objetivo do presente estudo é avaliar o gasto energético em pacientes sépticos, através da correlação entre a calorimetria indireta e duas equações preditivas, obtidas a partir de dados hemodinâmicos. CASUÍSTICA E MÉTODOS Este estudo clínico prospectivo foi realizado no Centro de Terapia Intensiva do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, tendo sido obtido o termo de consentimento livre e esclarecido em todos os casos (4989/99 – HCRP). A investigação envolveu 15 pacientes adultos de ambos os sexos (11 do sexo masculino e quatro do sexo feminino), com choque séptico, após restauração volêmica e estabilização hemodinâmica. Os critérios utilizados para o diagnóstico de choque séptico foram os estabelecidos pela conferência de consenso realizada pelo American College of Chest Physicians/Society of Critical Care Medicine (17) . Os critérios de inclusão foram pacientes vítimas de choque séptico do 1º ao 5º dia de evolução, com indicação de monitorização hemodinâmica invasiva. Os critérios de exclusão incluíam: idade > 85 e < 15 anos, necessidade de FiO 2 (fração de oxigênio no ar inspirado) > 0,6, PAM (pressão arterial média) < 50 mmHg, diurese horária < 50 mL.h -1 . Todos os pacientes foram estratificados na admissão na Unidade de Terapia Intensiva de acordo com o índice de gravidade APACHE II (18) e pelo sistema de graduação de sepse (19). Em todos os casos foram realizados monitorização hemodinâmica invasiva e não invasiva, restauração volêmica, ventilação mecânica (Servo 900C, Siemens, Suécia), antibioticoterapia, drogas vasoativas e terapia nutricional de acordo com o 102 gasto energético real calculado pela calorimetria indireta. Os pacientes foram sedados com benzodiazepínicos e/ou opiáceos e bloqueador neuromuscular foi utilizado quando necessário. O peso atual dos pacientes foi obtido através de balança portátil eletrônica (Slingscale 2002, HillRom, Hillenbrand Industries, EUA). O protocolo teve duração média de três horas, onde foram realizadas três séries de medidas horárias e simultâneas do VO 2 e do gasto energético de repouso (GER) pelo método de termodiluição e pela calorimetria indireta. Todos os pacientes foram submetidos a monitorização hemodinâmica invasiva e a calorimetria indireta à beira do leito, com calorímetro portátil cujos equipamentos e procedimentos foram descritos, em detalhes, anteriormente (20,21) . Paralelamente, foram colhidas amostras de sangue venoso do orifício proximal do cateter de Swan-Ganz (átrio direito), distal (artéria pulmonar) do cateter de Swan-Ganz e sangue arterial (artéria radial) para análise dos gases sangüíneos que nos permitiu avaliar a concentração de hemoglobina (Hb), a saturação de oxigênio no sangue arterial (SaO 2) e venoso (SvO 2) e a pressão parcial de oxigênio no sangue arterial (PaO 2) e venoso (PvO 2). Após a obtenção do VO 2 (mL.min -1) pelo método de Fick e dos valores dos conteúdos de oxigênio no sangue arterial e venoso, foi possível calcular o GER (kcal.dia -1 ) de acordo com as seguintes equações: [1] GER = VO 2 x 4,838 x 1,44 GER = VO 2 x 6,996 onde 4,838 kcal.L -1 (20,2 kJ.L -1 ) é o valor calórico do oxigênio para um coeficiente respiratório (RQ) de, aproximadamente, 0,824 (este valor é a média obtida para a população do presente estudo, medido pela calorimetria indireta), assumindo-se uma excreção nitrogenada entre 13 e 15g.dia -1 e 1,44 é o fator de conversão para kcal.dia -1 (14,15) . [2] VO2 = DC x (CaO2-CvO2) x 10 Onde: DC = Débito Cardíaco (L.min -1 ) CaO 2 = Conteúdo arterial de O 2 (1,38 x Hb x SaO2) + (0,00301 x PaO2) CvO 2 = Conteúdo venoso de O 2 (1,38 x Hb x SvO2) + (0,00301 x PvO2) RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL cada um dos 15 pacientes, totalizando 45 medidas. As técnicas de realização desse procedimento foram descritas minuciosamente em publicações anteriores (5,20,21) . O teste estatístico utilizado para comparação entre os dois métodos de avaliação foi o teste não paramétrico dos sinais de Wilcoxon para duas amostras correlacionadas. Para amostras seriadas foi utilizado o fator de correção de Bonferroni. Consideramos como estatisticamente significativas, as comparações com valor de p < 0,05. Foi realizado também o coeficiente de correlação de Pearson entre a variável (GER) obtida nos três métodos. Substituindo-se os valores acima na equação [2] , obtém-se: [3] VO2 = DC x [((1,38 x Hb x (SaO2 – SvO2)) + ((0,00301 x (PaO2- PvO2))] x 10 Assim, substituindo os valores da equação [3] na equação [1], chega-se ao seguinte: [4] GER = 6,996 {DC x [(13,8 x Hb x (SaO2 - SvO2) + 0,00301 x (PaO2 - PvO2)]} GER = DC x [96,54 x Hb x (SaO2 - SvO2) + 0,211 x (PaO2 - PvO2)] Porém, a adição do valor, da equação acima, de 0,211 x (PaO 2- PvO 2) representa menos de 1% do resultado final do cálculo. Assim sendo, a equação final e resumida para efeitos práticos é a que se segue abaixo: RESULTADOS Foram avaliados 15 pacientes (11 do sexo masculino e quatro do sexo feminino) com diagnóstico de choque séptico, em estabilidade hemodinâmica, admitidos na unidade de terapia intensiva entre o 3 o e 5 o dia de evolução. A idade média variou de 41,3 ± 18,9 anos. O índice prognóstico APACHE II médio foi de 22,6 ± 7,2 com risco de óbito calculado de 46,1 ± 27,7%. O SS (Sepsis Score) médio foi de 20,3 ± 9,5. A mortalidade geral da população estudada foi de 20% (n = 3). Os principais dados clínicos e demográficos dos pacientes estão demonstrados na [5] GER = DC x [ 96,54 x Hb x (SaO2 – SvO2)] A calorimetria indireta foi realizada em todos os pacientes com o calorímetro portátil DELTATRAC II Metabolic Monitor (Datex-Ohmeda, Finlândia). A calibração de pressão barométrica e de gases foi realizada antes de cada protocolo. Foram realizadas três séries horárias de medidas consecutivas, com duração de 30 minutos, do VO 2 para Tabela 1 - Diagnósticos clínicos e dados demográficos da população estudada. Idade = anos, Peso = kg, Altura = cm, AP II = Índice prognóstico APACHE II, Risco Óbito = Risco de óbito calculado pelo AP II (%), SS = Sepsis Score (Graduação de sepse). Paciente Idade Sexo Altura Peso AP II %RO SS Óbito 1 TCE +Pneumonia Diagnóstico 28 M 173 67 20 28 27 Não 2 Pneumonia 39 F 150 53 31 73 21 Sim 3 TCE + Trauma de esterno 35 M 177 74 12 11 26 Não 4 Pneumonia 38 F 162 62 11 14 12 Não 5 TCE + Trauma de esterno 19 M 177 67 17 11 45 Não 6 Amputação de Membro Superior 16 M 174 65 26 55 9 Não 7 Pneumonia 78 F 163 70 28 66 10 Não 8 Pneumonia 32 M 167 63 28 72 11 Não 9 TCE + Trauma de esterno 31 M 176 70 15 16 17 Não Não 10 Celulite de Membro Inferior E 22 M 170 70 26 73 25 11 Megacólon Chagásico 69 M 160 60 33 88 26 Sim 12 Pneumonia 48 M 177 80 24 52 15 Não 13 Pneumonia 68 M 160 58 27 63 16 Não 14 PO Neurocirurgia +Pneumonia 55 M 170 80 27 58 17 Sim 15 Politraumatismo + Pneumonia 41 F 162 88 14 11 28 Não Média 41,3 167,9 68,5 22,6 46,1 20,3 DP 18,9 8,1 9,2 7,2 27,7 9,5 Volume 15 - Número 3 - Julho/Setembro 2003 103 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL Tabela 1. A maioria dos pacientes (60%; n = 9) foi vítima de pneumonia com insuficiência respiratória aguda. Não houve qualquer complicação inerente aos procedimentos realizados durante o estudo (cateterização venosa, punção arterial e calorimetria indireta). A média dos GERs, para a população estudada, obtidos pela calorimetria indireta (DELTA) foi de 1669 ± 271 kcal.dia -1 e calculados pelas equações de BRANDI e LIGGETT foram de 1815 ± 355 e 1361 ± 277, respectivamente (Tabela 2). A diferença dos valores observados entre a calorimetria indireta e as equações preditivas situou-se em +8,7% (DELTA x BRANDI) (p<0,5) e – 22,7% (DELTA x LIGGETT) (p>0,5). O coeficiente de correlação entre a calorimetria indireta e a equação de BRANDI foi de 0,80 (Figura 1), enquanto que este coeficiente foi de 0,58 quando a calorimetria indireta foi correlacionada com a equação de LIGGETT (Figura 2). DISCUSSÃO O objetivo desse estudo foi comparar o gasto energético real obtido pela calorimetria indireta com o GER calculado pelas equações preditivas de Brandi e de Liggett, utilizando dados hemodinâmicos e o VO 2 obtido pelo método de Fick em pacientes com choque séptico. Na realidade, Tabela 2 – Gasto energético real (GER) obtido através da calorimetria indireta (Delta), das equações de Brandi (GER = VO2 x 6,996) e de Liggett (GER = DC x [96,54 x Hb x (SaO2 – SvO2)]), em kcal.dia-1. Os valores do VO2 (em mL.min-1) e do coeficiente respiratório (RQ), para cada paciente, representam a médias das três medidas horárias seriadas. Paciente DELTA BRANDI LIGGETT RQ 1 1881 1958 1473 1,06 2 1150 1443 955 0,73 3 1494 1413 1293 0,71 4 1717 1605 1309 0,97 5 1867 1693 1372 0,76 6 2229 1755 1783 0,82 7 1919 1419 1389 0,96 8 1923 1913 1249 0,81 9 1505 1499 1325 0,81 10 2383 1988 1475 0,81 11 1271 1229 898 0,90 12 2222 2089 1348 0,70 13 1891 1678 1191 0,74 14 1651 1371 1331 0,75 15 2118 1989 2021 0,83 Média 1669 1815 1361 0,824 DP 271 355 277 0,106 Figura 1. Correlação entre as médias dos valores seriados dos gastos energéticos reais obtidos pela calorimetria indireta (DELTA) e pela equação de Brandi (BRANDI) (n = 15; r = 0,80). Valores expressos em kcal.dia-1. 104 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL Figura 2. Correlação entre as médias dos valores seriados dos gastos energéticos reais obtidos pela calorimetria indireta (DELTA) e pela equação de Liggett (LIGGETT) (n = 15; r = 0,58). Valores expressos em kcal.dia-1. o gasto energético de pacientes graves pode ser estimado por uma variedade muito grande de métodos. A maioria das fórmulas, propostas na literatura, constitui-se em derivações da equação de Harris & Benedict, desenvolvida, a princípio, para indivíduos normais. Desde que, por definição, o gasto energético basal é a necessidade de energia mínima de indivíduos saudáveis em repouso, um problema aparece quando esta energia deve ser calculada para os pacientes em situações especiais, como a sepse, o trauma e as queimaduras extensas. Os esforços de alguns autores em melhorar a precisão da equação de Harris & Benedict para estas situações, adicionando fatores de estresse à equação original (7) , introduziu uma causa de erro e, talvez de custo, ainda maior, no planejamento da terapia nutricional. Acurácia na administração da terapia nutricional é importante nesta população de pacientes, visto que é por demais conhecido o fato de que a administração insuficiente de nutrientes deprime o “drive” ventilatório (22), diminui a força dos músculos respiratórios (23) e gera imunodepressão (24) . Por outro lado, a hipernutrição causa hiperglicemia, infiltração gordurosa do fígado e pode favorecer o aparecimento de acidose respiratória e dificuldades de desmame do respirador (25) . Sendo assim, pelo fato da hiper ou subnutrição serem deletérias, a calorimetria indireta ficou em voga, tornando-se, atualmente, o padrão ouro, para o cálculo das necessidades energéticas. Contudo, em virtude da calorimetria indireta Volume 15 - Número 3 - Julho/Setembro 2003 ser pouco praticada em nosso meio, a tentativa do presente estudo foi avaliar duas equações baseadas em dados hemodinâmicos e correlacionálas com a calorimetria, sobretudo pela razão de que a maioria das unidades de terapia intensiva tem a rotina de introduzir um cateter triluminal na artéria pulmonar, para fins de exploração hemodinâmica. Nós optamos por avaliar o comportamento das duas equações mais difundidas, a de Brandi e a de Liggett. Originalmente, Liggett e cols. (13) , em 1987, sugeriram um novo método de obtenção do gasto energético em 19 pacientes com cateter posicionado na artéria pulmonar. Estes autores desenvolveram uma equação baseada em dados hemodinâmicos e correlacionaram com a calorimetria clássica. De acordo com este estudo inicial, houve uma boa correlação entre os dois métodos (r = 0,90, p<0,0001). A partir desses achados, inúmeros estudos foram delineados, com a finalidade de confirmar estes achados. Tentativas foram feitas, em nosso meio, de correlacionar a calorimetria indireta com a equação de Liggett. Rocha e cols. (26) realizaram um estudo prospectivo em 30 pacientes graves sob ventilação ventilação mecânica. Estes autores encontraram uma correlação de 0,66 entre os dois métodos, subindo para 0,86 quando um fator de correção, deduzido a partir da regressão linear obtida na casuística, foi adicionado aos dados para o cálculo do gasto energético. Por outro lado, Flancbaum e cols. (10) , em 1999, estudaram 36 pacientes em estado crítico sob ventilação mecâni105 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL ca e encontraram uma fraca correlação entre o gasto energético medido pela calorimetria indireta e pela equação de Liggett (r = 0,28). Os autores atribuem estes achados ao fato de que qualquer variação num dos componentes da equação de Fick pode introduzir erros no cálculo do gasto energético. De acordo com os autores a SvO 2 pode flutuar durante o período de estudo, pois uma queda de seu valor abaixo de 60% pode ser indicativo de um aumento do consumo tecidual de oxigênio ou o comprometimento de uma das variáveis ligadas ao transporte de oxigênio (27). Embora estas informações tenham uma certa lógica, a casuística do nosso estudo apresentou uma SvO 2 e SaO 2 dentro dos limites da normalidade (SvO 2 = 80 ± 5%, com variação de 65 a 88%; SaO 2 = 99 ± 1%, com variação de 96 a 100%), sendo improvável que a correlação encontrada (r = 0,58) deva ser responsabilizada apenas pelas pequenas variações dessas variáveis. Outra explicação em potencial para a fraca correlação entre os dois métodos pode ser devida à alteração da relação entre a oferta e a demanda de oxigênio, situação descrita para a sepse (28) . Porém, a razão mais provável, que inclusive foi o principal desafio para a validação deste conceito inicial, está ligada ao acoplamento matemático das diversas variáveis hemodinâmicas envolvidas no cálculo (29) (equações de 1-6). Os pacientes do presente estudo apresentaram um consumo de energia de 1669 ± 271 kcal e um APACHE II de 22,6 ± 7,2. Estes dados são indicativos de doença grave e, conseqüentemente, de estresse metabólico. Interessantemente, os escores de gravidade da doença foram utilizados para predizer o gasto energético de pacientes em estado crítico. Swinamer e cols. (30) demonstraram que pacientes com um APACHE II > 20 apresentam uma correlação muito ruim entre os dados calorimétricos e os dados obtidos pelo método de Fick, onde diferenças individuais, entre os dois métodos, de até 50%, foram encontradas. Ainda, erros técnicos ou de interpretação dos resultados podem ser introduzidos, em ambos os métodos, na obtenção do VO 2. É sempre bom lembrar que no cálculo do VO 2 obtido pelo método de Fick há uma limitação inerente à sua utilização, que é o fato deste procedimento não levar em conta o consumo pulmonar de O 2. O consumo total de O2 pode ser subestimado em até 25% na vigência de infecções pulmonares, em pacientes sob ventilação mecânica (31) . Em relação à proposta de se calcular o gasto 106 energético pela equação GER = VO 2 x 6,996, empregando o VO 2 obtido pelo método de Fick, Brandi e cols. (14) compararam a obtenção do gasto energético pelo método de Fick e pela calorimetria indireta em um grupo de 26 pacientes na fase de pós-operatório de traumas diversos, ventilando espontaneamente. Estes autores encontraram uma excelente correlação entre os dois métodos (r = 0,96, p<0,001). Deve ser enfatizado que em nosso estudo todos os pacientes foram submetidos à ventilação mecânica e, mesmo assim, a correlação entre os dois métodos foi de 0,80. Nós nos permitimos utilizar a mesma equação pois a variável 6,996 (equação 1) foi obtida a partir de um RQ médio de 0,827, extremamente próximo à média de 0,824 encontrado na presente casuística (Tabela 2). Nesse particular, deve ser enfatizado que nessa equação a introdução de um valor fixo de RQ (0,824) e uma excreção nitrogenada entre 13 e 15g.dia -1 , introduz um erro de, aproximadamente, 3,6% em virtude do valor calórico do oxigênio se situar entre 4,686 a 5,047, para um RQ com variação fisiológica de 0,70 a 1,00, respectivamente. Esta margem de erro, para fins de cálculo de gasto energético pode ser negligenciada. Finalmente, embora a calorimetria indireta seja o método mais confiável para medir as necessidades de energia de um determinado paciente, a correlação satisfatória encontrada entre a calorimetria e a equação de Brandi, e a pequena diferença, de apenas 8,7% entre os dois métodos, permite a proposta de utilização desta equação, mesmo para pacientes sépticos sob ventilação mecânica. O presente estudo sugere que a predição do gasto energético realizado por este simples procedimento pode ser empregada para fins clínicos, sobretudo nas unidades de terapia intensiva que dispõem somente da técnica de inserção de cateter triluminal na artéria pulmonar. Além disso, a equação emprega apenas o VO 2 , como variável a ser estimada, que gira em torno de 75% do cálculo do gasto energético total (15) . RESUMO O objetivo do estudo foi comparar o gasto energético real (GER) obtido pela calorimetria indireta com o GER calculado pelas equações preditivas de Brandi e de Liggett, utilizando dados hemodinâmicos e o consumo de oxigênio VO 2 obtido pelo método de Fick em pacientes com choRBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL que séptico. Foram estudados 15 pacientes adultos (11 homens e 4 mulheres). O APACHE II de admissão foi de 22,6±7,2, com risco de mortalidade global da casuística de 46,1±27,7%. Foram obtidas 45 medidas do VO 2 em três medidas seriadas horárias, através de um calorímetro portátil (DELTA) conectado a um respirador e através de um cateter triluminal inserido na artéria pulmonar. Os GERs médios obtidos pela calorimetria indireta e estimados pelas equações de Brandi e Liggett foram de 1669±271, 1815±355 e 1361±277 kcal.dia -1 , respectivamente. Não houve diferenças estatísticas entre os dois primeiros métodos (DELTA x BRANDI), sendo que as duas médias apresentam uma diferença de 8,7%. Foram observados GERs próximos entre esses dois métodos (r = 0,80), porém com uma correlação entre DELTA x LIGGET de apenas 0,58. Ainda é rotineiro, nas unidades de terapia intensiva o uso de equações preditivas para o cálculo do GER. O método mais direto para a obtenção do GER é a calorimetria indireta, embora este dado possa ser obtido através do cateter triluminal. Pelo fato da calorimetria indireta não ser muito utilizada, em nosso meio, os resultados obtidos apontam para o fato de se poder obter facilmente o GER, através da obtenção do VO 2 pelo método de Fick, inclusive para doentes sépticos sob ventilação mecânica. UNITERMOS: Consumo de oxigênio, gasto energético, calorimetria indireta, sepse. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. 20. 21. AGRADECIMENTOS 22. Ao apoio financeiro complementar para a execução deste projeto de pesquisa fornecido pela Fundação de Apoio ao Ensino e Pesquisa (FAEPA) do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto e PróReitoria de Pesquisa da Universidade de São Paulo. 23. 24. 25. REFERÊNCIAS 1. 2. 3. 4. 5. 6. Kiney JM. Metabolic responses of the critically ill patient. Crit Care Clin 1995; 11: 569-586. Hill AG, Hill GL. Metabolic response to severe injury. 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Design: Longitudinal sudy of 52 consecutives bedside percutaneous tracheostomies performed in a ICU. Setting: ICU of Military State Police Hospital, Rio de Janeiro Material and Methods: From January 2001 to February 2003, 52 percutaneous tracheostomy were performed in the ICU and were prospectivelly followed. The performance time and the frequency and kind of complications related to it were assessed. Results: In the 52 percutaneous tracheostomy performed, 67,3% of patients were male. The mean age was 59,4± 15,8 years. They have been intubaded for a mean time of 11,8 ± 4,6 days by the time they were submitted to percutaneous tracheostomy. The procedure took a mean time of 7± 2,6 minutes long to be performed. There were 11% of complications, which were mainly minor bleedings. Patients with higher creatinine levels, previous tracheostomy, and with spinal cord trauma, had a higher incidence of complications (p=0,02). Infection of stoma, pnemothorax, or death related to the procedure were not observed. Conclusions: Percutaneous tracheostomy is a safe method and should be evaluated as the one of choice when providing a tracheostomy in the setting of an ICU, once it takes few time to be performed and has a low incidence rate of serious complications. Keywords:Percutaneous dilatational tracheostomy, critically ill patients, airway management. esde a descrição da técnica da traqueostomia em 1909 por Jackson, ela vem sendo utilizada ao longo de todo o século passado(1), sendo considerado o procedimento cirúrgico mais freqüentemente realizado em Unidades de Terapia Intensiva (UTI)(2). Apesar da entubação oro traqueal ser o procedimento inicial de escolha para o manuseio da via aérea, a traqueostomia é considerada o método ideal nos pacientes com perspectiva de permanecerem em assistência ventilatória a longo prazo(3). Seldinger introduziu em 1953, a técnica de cateterização vascular percutânea com o auxílio de um guia(4). Esta técnica foi adaptada para vários pro- D cedimentos, inclusive para a traqueostomia percutânea (5). A primeira traqueostomia percutânea foi descrita por Shelden e cols em 1955, com alto índice de complicações(6). Em 1969, Toy and Weinstein aperfeiçoaram o método (7) e, finalmente, em 1985, a técnica de traqueostomia percutânea com o uso de dilatadores seqüenciais sobre um fio guia foi desenvolvida por Ciaglia e cols.(8). Hoje, dispomos de “kits” com um único dilatador, que substitui os múltiplos dilatadores, facilitando a realização do procedimento (1) . A traqueostomia percutânea utilizando a técnica de Seldinger, é um método alternativo para o estabelecimento de via aérea de longa duração nos doentes *Chefe de Clínica do CTI do HCPM Rio de Janeiro - Coordenador Clínico da UTI Cirúrgica do Hospital Pró Cardíaco R.J. - Intensivista pela AMIB - Presidente do Dept. de Emerg. e Terapia Intensiva da SOCERJ **Chefe do CTI HCPM Rio de Janeiro - Intensivista pela AMIB - Mestre em Cardiologia pela UERJ ***Residente do Serviço de Pneumologia do HCPM Rio de Janeiro ****Cirurgião de Tórax do HCPM Rio de Janeiro *****Chefe do Serviço de Cirurgia de Tórax do HCPM Rio de Janeiro Trabalho realizado no Centro de Tratamento Intensivo do Hospital Central da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro. Autor Principal: Pedro Miguel Mattos Nogueira Endereço: Rua Pinto Guedes n.140 apt. 501 Tijuca Rio de Janeiro cep 20.511-320 Tels. Res. (21) 2268-6414/2288-2772 cel. (21) 9617-5422 Comerc. (21)2528-1536 / HCPM CTI (21) 3399-2469. Email:[email protected]./ [email protected] 108 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL em UTI. Em vários estudos(1,5,8,9,15) mostrou ser uma opção segura, com baixas taxas de morbi-mortalidade, e menor incidência de complicações tardias quando comparada à cirúrgica(5), além do fato de poder ser realizada sem a necessidade de submeter o paciente a um transporte de risco até o centro cirúrgico, ou de se ocupar uma sala de cirurgia para a realização do procedimento (9). Alguns serviços já utilizam esta técnica como método de eleição nos pacientes críticos (9), tendo este fato nos motivado à realização deste estudo que tem como objetivo principal a avaliação da reprodutibilidade do procedimento e como objetivo secundário avaliar as suas complicações a fim de torná-lo o método de escolha diante da indicação de uma traqueostomia em pacientes críticos internados na UTI do Hospital Central da Polícia Militar do Rio de Janeiro (HCPM-RJ). MATERIAL E MÉTODOS Estudo longitudinal realizado na UTI do HCPMRJ no período de janeiro de 2001 a fevereiro de 2003. O serviço possui 10 leitos e atende a pacientes adultos críticos, oriundos de todos os setores do hospital. Critérios de inclusão: foram incluídos de forma consecutiva, todos os pacientes com indicação de traqueostomia segundo critérios estabelecidos pelo consenso do American College of Chest Physicians de 1989 (3) . Critérios de exclusão: foram excluídos pacientes com distúrbios de coagulação diagnosticado através de contagem de plaquetas inferior a 40.000, tempo de ativação de protrombina (TAP) inferior a 40% ou tempo parcial de tromboplastina (PTT) superior a 2 vezes o padrão, pacientes com grave instabilidade hemodinâmica caracterizada por hipotensão refratária ao uso de aminas vasoativas, grave injúria pulmonar, caracterizado pelo uso de pressão positiva expiratória final (PEEP) igual ou superior a 20 mmHg, presença de infecção sobre o sítio de punção, necessidade de acesso à via aérea de urgência e vaso sanguíneo visível no sítio de punção. TÉCNICA Utilizamos o “kit” de único dilatador (Blue Rhino, Cook-USA.) , em todos os casos. Em todos os pacientes foi realizada a traqueostomia sob visualização direta com auxílio de Volume 15 - Número 3 - Julho/Setembro 2003 broncoscópio flexível, realizada por um broncoscopista cirurgião de tórax. Os pacientes, todos em ventilação mecânica, eram adequadamente posicionados em decúbito dorsal com hiper extensão do pescoço e sedados. A sedação padronizada foi de fentanil 250mcg, associado a midazolan 15mg, e posteriormente, curarização com pancurônio ou antracúrio. Eram realizados ajustes na prótese ventilatória, com fornecimento de fração inspirada de oxigênio (FiO2) de 100% , diminuição do fluxo inspiratório visando redução das pressões de via aérea e aumento do limite do valor do alarme da pressão de via aérea até 60 mmHg, para permitir adequado volume corrente a despeito da presença do broncoscópio na luz do tubo oro traqueal. Os pacientes foram adequadamente monitorados quanto à pressão arterial e oximetria de pulso. Utilizando-se da transluminação proporcionada pelo broncoscópio, a região eleita, após adequada degermação, era anestesiada topicamente e posteriormente puncionada, preferencialmente entre o primeiro e segundo anel traqueal ou entre o segundo e terceiro. Seguia-se os passos descritos da técnica inicialmente descrita por Ciaglia e cols. (8) , que sofreu pequenas modificações ao longo dos anos(1). Em nossa casuística, o único momento em que se incisava a pele era após a passagem do guia, quando se realizava uma incisão longitudinal a partir do sítio de inserção do mesmo, em sentido superior, nunca maior que 5 mm. Em algumas ocasiões, para facilitar a passagem do dilatador, a pele era cuidadosamente divulsionada com uma pinça cirúrgica. As seguintes variáveis foram avaliadas: idade dos pacientes; sexo; diagnóstico de base; número de dias de entubação no momento da traqueostomia; duração do procedimento, estabelecida como a partir do momento da infiltração do anestésico local até o adequado posicionamento da cânula de traqueostomia; contagem de plaquetas (superior a 100.000 mm³); creatinina sérica superior a 1,5 mg/ dL; complicações durante o procedimento, tais como sangramento superior a 10 ml; falso trajeto durante o posicionamento da cânula; desaturações (avaliada pela oximetria de pulso <90%) ou hipotensão (pressão sistólica<90 mmhg) prolongadas (maiores de 60 segundos), óbito relacionado ao procedimento; características sugestivas de dificuldade, tais como pescoço curto, obesidade, traqueostomias prévias e se o procedimento foi considerado de difícil realização pelo operador. 109 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL ANÁLISE ESTATÍSTICA Para a análise estatística, utilizou-se o programa SPSS versão 10.0 para Windows. As variáveis numéricas foram expressas por média, desvio-padrão e mediana, quando recomendado. As variáveis categóricas foram expressas como freqüência absoluta e relativa. Na análise estatística de variáveis categóricas foram realizados os testes de Qui-quadrado e exato de Fisher, quando necessário. Foi adotado o nível de significância de 0,05. RESULTADOS No período de janeiro de 2001 a fevereiro de 2003, foram realizadas 52 traqueostomias percutâneas em pacientes internados em uma UTI, todas com o auxílio de broncoscopia. O sexo masculino foi o predominante, com 35 casos (67,3%). A média de idade dos pacientes foi de 59,4 ± 15,8 anos. O tempo médio de entubação foi de 11,8 ± 4,6 dias, (figura 1). Houve grande variabilidade do tempo de entubação na ocasião da traqueostomia em função da precocidade das mesmas em doentes com grave comprometimento do sistema nervoso central. Tabela 1: Diagnósticos dos pacientes submetidos a traqueostomia percutânea. (n= 52). Diagnóstico N. de pacientes Percentual Acidente vascular encefálico 15 28,8% Trauma crânio encefálico 7 13,4% D. P.O.C. 6 11,5% Trauma por arma de fogo 4 7,7% Peritonite 4 7,7% Pneumonia 3 5,7% Cardiopatia isquêmica 3 5,7% Sepsis/Sara 2 3,8% Obesidade Mórbida 2 3,8% Trauma raqui-medular 2 3,8% Meningite 1 1,9% Pós op.cir. vascular 1 1,9% Pós op.cir. cardíaca 1 1,9% Trauma de face 1 1,9% A duração média do procedimento, foi de 7,0 ± 2,6minutos (figura 2). Figura 2:Tempo de duração (minutos) das 52 traqueostomias percutâneas realizadas. Figura 1: Tempo em dias de intubação oro traqueal nos 52 pacientes ao ser realizada a traqueostomia percutânea. As patologias de base mais freqüentes foram Acidente Vascular Cerebral (28,8%), trauma crânio encefálico (13,4%) e D.P.O.C. (11,5%) além de outras, como descrito na tabela 1. 110 Treze pacientes (25%) entre os 52 estudados preenchiam critérios que sinalizavam para a maior possibilidade de complicações, a saber: elevação da creatinina acima de 1,5mg/dl, obesidade mórbida, traqueostomia prévia, trauma raqui-medular cervical, grave mediastinite. Dois pacientes tinham mais de um critério. O número de complicações neste grupo foi de 4 (30,7%). No grupo sem estas características, o percentual de complicações foi de 5,1% (p=0,02). Somente um paciente (1,9%) apresentava no momento do procedimento, contagem de plaquetas inferior a 100.000 e neste não se observou sangramento considerado como maior que 10ml. RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL Quarenta e cinco pacientes apresentavam, no momento do procedimento, nível sérico de creatinina inferior a 1,5mg/dl; neste grupo ocorreram sangramentos maiores que 10ml em 3 casos (6,6%). Creatinina igual ou superior a 1,5mg/dl, foi observada em 7 pacientes e um deles apresentou sangramento maior que 10ml (14,2%) (p=0,45) (tabela 2). Desta forma, no grupo total de 52 pacientes ocorreu em 4 (7,6%) sangramento superior a 10ml. Todo o sangramento considerado como superior a 10 ml foi contornado à beira do leito, sem necessidade de transfusão de hemoderivados. Tabela 2: Complicações ocorridas em 52 traqueostomias percutâneas classificadas por grupos. Grupos N. de N. de pacientes complicações Percentual Total 52 6 11,5% Creatinina<1,5 45 3 sangramentos 6,6% Creatinina>1,5 7 1 sangramentos 14,2% sem critérios de dificuldade 39 2 5,1% com critérios de dificuldade 13 4 30,7% Casos iniciais 26 4 15,3% Casos subsequentes 26 2 7,6% “p” 0,45 0,02* 0,66 Ocorreram duas outras complicações relacionadas ao procedimento, 3,8% do total de casos, a extubação acidental com hipoxemia associada, corrigida com a pronta reintubação e prosseguimento da técnica e mau posicionamento da cânula, acarretando maior sangramento e maior tempo de execução da traqueostomia, além de hipoxemia. Considerando em conjunto os sangramentos maiores que 10ml com as outras duas complicações descritas, temos um total de 6 complicações (11,5%) dos 52 procedimentos. Complicações menores como hipotensão ou desaturação passageiras, com duração menor que 60 segundos e sem repercussão, não foram consideradas. Outro aspecto fundamental, é o da curva de aprendizado. Quatro complicações ocorreram nos primeiros 26 casos (15,3%), comparadas à duas (7,6%) nos 26 subseqüentes (p=0,66). A tabela 2 resume e analisa estes dados. Não ocorreram mortes relacionadas ao procedimento, e em nenhum caso foi necessária revisão cirúrgica , seja por sangramento ou por qualquer outro motivo. Em 40 pacientes (77%) acompanhados por 3 semanas, não foram observadas complicações relaVolume 15 - Número 3 - Julho/Setembro 2003 cionadas ao método. Doze pacientes (23%) não completaram este tempo de acompanhamento, uma vez que evoluíram para óbito antes do final deste período. DISCUSSÃO: O advento da traqueostomia dilatacional percutânea, representou um avanço para o intensivista, que passa a deter a autonomia da realização de traqueostomias em seus pacientes críticos. Há ainda a vantagem da mesma poder ser realizada à beira do leito, sem a necessidade de transporte dos pacientes para o centro cirúrgico, além do fato de não se ocupar uma sala de cirurgia, o que acarreta transtornos no agendamento de outros procedimentos. Em relação aos custos, o preço estimado de um “kit” de 350 a 400 dólares americanos, mais o custo da broncoscopia poderiam ser equivalentes, em instituições privadas, ao custo do aluguel da sala do centro cirúrgico, mais equipe cirúrgica e anestesista. Os resultados desta série com 52 pacientes submetidos a traqueostomia percutânea realizada em nosso serviço, estão completamente inseridos dentro daqueles previamente divulgados na literatura no que tange à incidência de complicações, duração do procedimento exeqüibilidade do mesmo em pacientes críticos. Esta série inicial estudada de 52 pacientes, embora pequena para uma plena análise de alguns aspectos, está incluída nos casos publicados na literatura internacional que varia de 26 a 356 casos(5,11). No entanto, é importante ressaltar que no que se refere à literatura nacional, não há casuística publicada até então, o que aumenta a relevância deste estudo. Ocorreram em nossos pacientes um total de 6 complicações (11,5%) e 4 sangramentos (7,6%). Não houve em nenhum caso pneumotórax, infecção de estoma, ou óbito relacionado ao procedimento. Marx e cols.(10), numa série de 254 casos, relataram mortalidade de 0,39% , sangramento de 1,2%, pneumotórax de 0,4% e infecção de 1,2%. Hill e cols. (11) descreveram uma taxa de mortalidade de 0,3% e um total de complicações de 19% em um estudo com 356 pacientes. Friedman e Mayer (12), em 46 pacientes, observaram 8% de complicações, 5% de sangramento, e 3% de infecção de estoma. Platz(16), Torre(9), e Polderman(14), publicaram respectivamente (5%), (5,7%), e (5,2%) de sangramentos A duração média do procedimento foi de apenas 7 minutos, com uma duração máxima de 15 minutos (figura 2). Nas séries pesquisadas a duração média do procedimento variou de 6,7 a 15 minutos(12,5,9,11). 111 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL Tabela 3: Resultados de séries de traqueostomia percutânea e da atual. Autor Ano “n” Idade Dias tot Comp. (%) Sang. (%) 8 5 Friedman 1993 46 Toursarkissian 1994 141 Friedman 1996 26 Marx 1996 254 Platz 1996 40 Hill 1996 356 Torre 2002 35 48,9 8,4 5,7 5,7 Polderman 2003 174 52,3 11,8 6,3 5,2 0 0,6 Série atual 2003 52 59,4 11,8 11,5 7,6 0 0 11 56 53,6 17,2 15,9 34,6 12,5 Mortal. (%) Infec. estoma (%) Pneum (%) 3 D proc. (min) Ref 6,7 12 0,7 15 11,5 0 0 0 1,2 0,39 1,2 0,4 8,2 5 19 5 10 16 0,3 15 14,3 11 9 14 0 7,0 Dias “tot”:dias de entubação; comp:complicações; sang:sangramentos; mortal:mortalidade, ifec estoma:infecção de estoma; pneum:pneumotórax: Dproc:dias do procedimento; Ref:referência. Cabe ressaltar a maior média de idade de nossos pacientes quando comparado às séries relacionadas na tabela 3. Embora este dado pudesse prever uma maior incidência de complicações , tal fato não ocorreu sugerindo o aspecto da segurança do método mesmo em doentes mais idosos. A tabela 3 compara os resultados de algumas publicações com a atual. Tivemos 4 (7,6%) pacientes com sangramento maior que 10 ml. Neste aspecto fomos rigorosos em relação à quantificação do sangramento e em nenhum destes 4 casos considerados como perdas sanguíneas superiores a 10 ml, houve a necessidade de hemotransfusão, ou foram os sangramentos responsáveis por instabilidade hemodinâmica sendo todos contornados com medidas conservadoras de hemostasia. Somente um paciente tinha no momento do procedimento contagem de plaquetas inferior a 100.000 e este não apresentou sangramento maior que 10 ml. Por outro lado, nos pacientes com creatinina maior que 1,5mg/dl tivemos 14,2% de sangramentos maiores que 10ml, contra 6,6% nos pacientes com creatinina menor que 1,5 mg/dl (p= 0,45), sem significado estatístico, talvez em função do pequeno número amostral. Quando conhecemos as limitações do método, devemos respeitá-las. Treze de nossos pacientes apresentavam características que sinalizavam para maior incidência de complicações, nestes o percentual de complicações foi de 30,7% quando comparados aos 39 que não apresentavam estas características, e que tiveram percentual de complicações de 5,1% (p =0,02) (tabela 2). Outro aspecto de grande relevância, é o da curva de aprendizado, que como em outros procedimentos, neste também revela sua importância. Nesta série 112 tivemos nos primeiros 26 casos, um percentual de complicações de 15,3%, contra 7,6% nos 26 subseqüentes (p =0,66), apesar de não haver significado estatístico, houve uma diminuição do número de complicações ao longo do tempo. O percentual de complicações, dos 26 casos subseqüentes após a curva de aprendizado inicial, 7,6%, seria o terceiro menor entre aqueles especificados na tabela 3. Embora os critérios dos diversos autores quando avaliaram as complicações não tenham sido uniformes (5,9-12,14-16), acreditamos que nossos critérios foram bem estabelecidos. Interessante ainda, foi que realizamos 2 traqueostomias percutâneas em obesos mórbidos, e estes não apresentaram dificuldades, nem complicações. Corroborando tal fato Mansharamani (13), publicou uma série de 13 pacientes obesos, com apenas uma complicação. O cuidado na realização do procedimento, desde a separação de todo o material necessário, passando pelo correto posicionamento do paciente no leito, a adequada sedação e monitorização do mesmo, e a realização do ato por pessoal experiente, com a presença de broncoscopia em todos os casos, é sem dúvida fundamental para o sucesso do mesmo, minimizando os riscos. Polderman e cols.(14), ratificam estes aspectos em recente trabalho. Baseado nos resultados descritos de nossa série, podemos concluir, que a traqueostomia percutânea é um método de fácil reprodutibilidade, e uma vez seguidas de maneira correta as etapas para a execução do procedimento e conquistado o treinamento adequado da equipe, as complicações são pequenas, tornando-o método de escolha diante da indicação de uma traqueostomia em pacientes críticos internados em unidades de terapia intensiva. RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL RESUMO: Fundamentos: A traqueostomia percutânea dilatacional em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) é atualmente uma ferramenta alternativa e segura para prover o manuseio da via aérea a longo prazo. Objetivo: Verificar a reprodutibilidade, as complicações, e a segurança do procedimento em uma UTI, a fim de torná-lo método de eleição frente a um paciente em que se faz necessária a realização de uma traqueostomia. Desenho: Estudo longitudinal realizado com 52 pacientes consecutivos, internados em uma unidade de terapia intensiva. Local: Centro de Terapia Intensiva do Hospital Central da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro. Casuística e Métodos: No período entre janeiro de 2001 a fevereiro de 2003, foram realizadas 52 traqueostomias percutâneas à beira do leito. Foram avaliados o tempo de duração do procedimento, a incidência e o tipo de complicações ocorridas. Resultados: Na série de 52 traqueostomias percutâneas realizadas, houve predomínio do sexo masculino (67,3%). A média de idade dos pacientes foi de 59,4 ± 15,8 anos, entubados em média há 11,8± 4,6 dias, quando da realização da traqueostomia. O tempo médio de duração do procedimento foi de 7± 2,6 minutos O índice de complicações foi de 11%, principalmente hemorragias menores contornadas sem repercussões. O grupo de pacientes com creatinina maior que 1,5mg/dl, traqueostomia prévia e trauma raqui medular, teve 30,7% de complicações enquanto que no grupo sem estas características a incidência de complicações foi de 5,1% (p=0,02). Infecção de estoma, pneumotórax ou óbito relacionado ao procedimento não foram observados. Conclusão: A traqueostomia percutânea é um Volume 15 - Número 3 - Julho/Setembro 2003 método seguro e deve ser avaliado como o método de escolha quando se faz necessária uma traqueostomia em uma UTI, uma vez que seu tempo de realização é menor e possui uma baixo índice de complicações graves. Unitermos: traqueostomia percutânea , pacientes críticos, manejo de via aérea, unidade de tratamento intensivo, ventilação mecânica. Agradecimentos: A Prof. Cristiane A. Villela Nogueira, pelas críticas, sugestões, e auxílio durante a análise estatística. REFERÊNCIAS 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. Irawan S. Percutaneous tracheostomy in the ICU. Am College of Chest Physicians, www.chestnet.org 1999 (13):Lesson 22. Heffner JE, Miller KS, Sahn SA. Tracheostomy in the intensive care unit: part 1.Indications, technique, management.Chest 1986;90:269-74. Plummer AL, Gracey DR. Consensus conference on artificial airways in patients receiving mechanical ventilation. Chest1989;96:178-80. Seldinger SI. Catheter replacement of the needle in percutaneous arteriography.Acta Radiol. 1953; 39: 368-76. Friedman Y, Fields J, Mizock B, et al.Comparison of percutaneous and surgical tracheostomy. Chest 1996;110:480-85. Shelden CH, Pudenz RH, Freshwater DB, et al. New method for tracheostomy. J Neurosurg1955;12:428-31. Toy FJ, Weinstein JD. A percutaneous tracheostomy device.Surgery 1969;65:384-89. Ciaglia P, Firshing R, Syniec C. Eletive percutaneous dilational tracheostomy: a new simple bedside procedure. Chest 1985;87:715-19. Torre GM, Villafanã JA, Wada FT. Traqueostomia dilatacional percutánea como modalidad de manejo de la via aérea em la unidad de terapia intensiva de um hospital militar.Rev Asoc Mex Med Crit y Ter Int. 2002;16(2):48-52. Marx WH, Ciaglia P, Graniero KD. Some important details in the technique of percutaneous dilatational tracheostomy via the modified Seldinger technique. Chest1996;110;762-66. Hill BB, Zweng TN, Maley RH,et al. Percutaneous dilational tracheostomy:report of 356 cases.J Trauma1996;41:238-43. Friedman Y, Mayer AD.Bedside percutaneous tracheostomy in critically ill patients.Chest1993;104:532-35. Mansharami NG, Koziel H,Garland R,et al.Safety of bedside percutaneous dilatational tracheostomy in obese patients in the ICU. Chest2000;117:1426-29. Polderman KH, Spijkstra JJ, Bree R,et al. Percutaneous dilatational tracheostomy in the ICU,optimal organization, low complication rates, and description of a new complication.Chest2003;123:1595-02. Toursarkissian B,Zweng TN,Kearney PA,et al.Percutaneous dilational tracheostomy: report of 141 cases.Ann Thorac Surg1994;57:862-67. Platz A, Kleinstuck F, Kohler A,et al.Percutaneous tracheostomy:a minimally invasive procedureon the intensive care unit.Swiss Surg1996;2:42-5. 113 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL Comparação entre dois Métodos de Retirada do Suporte Ventilatório Mecânico no Pós-operatório de Cirurgia Cardíaca Comparison of two Methods of Weaning From Mechanical Ventilation After Cardiac Surgery Luciana Castilho de Figueirêdo*, Sebastião Araújo**, Carolina Kosour*, Cristina Aparecida Veloso*, Orlando Petrucci Júnior*** ABSTRACT Objective. To compare two methods of weaning from mechanical ventilation in uncomplicated coronary artery bypass grafting (CABG) post-operative (PO) patients. Methods. Forty eight adult, both sexes, PO-CABG patients were included in this trial, and randomly divided in: 1) study-group (n = 24): patients were submitted to direct extubation; and 2) control-group (n = 24): patients were extubated after a 30 min breathing period on a “T” piece. Ventilatory and pulmonary gas exchange parameters were measured and registered at the end of the weaning process (initial values) and 30 min after extubation (final values). Results. Time-to-wean was 6.8 ± 1.9 h in the study-group and 7.3 ± 2.5h in the control-group (p = NS). In relation to ventilatory and pulmonary gas exchange parameters, both groups were comparable, without differences between them (p = NS). However, in the controlgroup (“T” piece) some kind of statistically significant worsening were observed in PaO2 (112.3 ± 30.5 vs 103.3 ± 33.1 mmHg; p = 0.03); PaO2/FiO2 (280.8 ± 76.2 vs 258.3 ± 82.7 mmHg; p = 0.04); and in Respiratory Index [P(A-a)O 2/ PaO 2 ; 1.28 ± 0.65 vs 1.54 ± 0.82; p = 0.02), when initial and final values were compared. Conclusion. Although comparable in relation to time-to-wean, the “T” piece method had shown some decrease of pulmonary gas exchange valuables. Thus, our data suggest that uncomplicated PO-CABG patients may be directly extubated accordingly to a step-by-step weaning protocol, without the need to spent a time in a “T” piece. Key-words: mechanical ventilation; weaning; cardiac surgery. aplicação de protocolos de desmame da ventilação mecânica (VM) tem se mostrado segura, diminuindo o tempo de utilização da prótese ventilatória quando comparado com uma retirada baseada na experiência individual de quem está assistindo ao paciente1, com conseqüente diminuição nos dias de internação em unidade de terapia intensiva (UTI), redução dos custos e das complicações pulmonares, bem como da incidência de reintubação2. Desde há alguns anos, a extubação precoce de pacientes em pós-operatório (PO) de cirurgia cardíaca tem sido proposto por alguns autores, com tempos que variam de sete a 11 horas após o término da mesma3,4,5, com o objetivo de diminuir o tempo de permanência nas unidades de tratamento intensivo, reduzir os índices de infecção pulmonar e A os custos globais da internação hospitalar. No entanto, ainda não existe consenso quanto ao momento ideal para se iniciar o processo de retirada do suporte ventilatório mecânico, assim como em relação à melhor técnica para se implementá-lo 4,5. Pacientes no PO de cirurgia cardíaca de revascularização do miocárdio que foram extubados em menos de 12 horas após a admissão na UTI obtiveram um período menor de internação hospitalar, com redução nos custos globais e no uso de recursos hospitalares 6. Também a recuperação clínica de pacientes no PO de cirurgia cardíaca que foram extubados num período de quatro horas após a admissão na UTI mostrouse substancialmente acelerada em relação a pacientes que foram extubados num período superior a este7. Muito embora na grande maioria dos pacientes que *Fisioterapeutas – Unidade de Terapia Intensiva do Hospital das Clínicas da Universidade Estadual de Campinas (UTI-HC-UNICAMP) **Diretor Médico - Unidade de Terapia Intensiva do Hospital das Clínicas da Universidade Estadual de Campinas (UTI-HC-UNICAMP) e Disciplina de Fisiologia e Metabologia Cirúrgica do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP. ***Médico Assistente – Departamento de Cirurgia Cardíaca do Hospital das Clínicas da Universidade Estadual de Campinas (UTIHC-UNICAMP) Autor principal: Luciana Castilho de Figueirêdo Endereço: R. João Passos da Silva, 285 Jd. Independência, B. Geraldo - Campinas, SP CEP: 13084-484 Telefones: 19-2389.6744 e 19-9700.4866 114 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL são submetidos à cirurgia eletiva de revascularização do miocárdio o desmame ventilatório possa ser feito de forma rápida e satisfatória, é motivo de preocupação o grande aumento da mortalidade observado naqueles pacientes que permanecem em VM por mais de sete dias8. É importante ressaltar que a retirada do suporte ventilatório em pacientes no PO imediato de cirurgia cardíaca pode ser conduzida eficientemente por um fisioterapeuta respiratório treinado9. Ainda não existe um consenso quanto ao melhor momento e a melhor técnica para a extubação traqueal de pacientes que sob ventilação mecânica, principalmente pacientes que foram submetidos à cirurgia de revascularização do miocárdio. No entanto, considerando-se que as taxas de complicações decorrentes da VM, como atelectasias, barotraumas e PN, estão diretamente relacionadas ao tempo de permanência do tubo endotraqueal e suporte ventilatório, inferese que também esse grupo de pacientes deva ser extubado o mais precocemente possível 10,11,12,13,14. A padronização de um protocolo de desmame numa unidade de cuidados pós-operatórios pode propiciar um atendimento de melhor qualidade, favorecendo a evolução e diminuindo a incidência de complicações em pacientes submetidos à cirurgia cardíaca. Dessa forma, o presente trabalho teve como objetivo comparar dois métodos de retirada do suporte ventilatório mecânico em pacientes no pós-operatório imediato de cirurgia cardíaca de revascularização do miocárdio. MÉTODOS A realização do presente estudo foi aprovada pelo Comitê Institucional de Ética em Pesquisa sob parecer nº 25/2000. Um termo de consentimento livre e esclarecido, por escrito, foi obtido de todos os pacientes antes da cirurgia, os quais receberam orientações sobre todos os procedimentos a que seriam submetidos, assim como sobre os riscos e potenciais benefícios decorrentes da participação na pesquisa. No período compreendido entre agosto de 2000 e maio de 2001 foram estudados 48 pacientes adultos, não consecutivos, de ambos os sexos, em recuperação pós-operatória imediata de cirurgia cardíaca eletiva de revascularização do miocárdio não complicada. Todos os pacientes foram assistidos pelas mesmas equipes anestésicas e cirúrgicas, não tendo havido quaisquer modificações nos protocolos básicos de tratamento intra-operatório nesse período. Também, em decorrência da implementação do presente protocolo de pesquisa, nenhuma modificação foi sugerida ou realizada nas condutas rotineiras intraVolume 15 - Número 3 - Julho/Setembro 2003 ou pós-operatória na UTI. Os pacientes foram randomizados através de sorteio prévio para a composição de um ou outro grupo. Uma ficha de coleta de dados foi elaborada para registrar os valores das variáveis de interesse. O protocolo foi aplicado e supervisionado em todos os pacientes sempre pela mesma pessoa (LCF). Após a admissão na UTI, a assistência ventilatória (ventilador microprocessado – EVITA – DRÄGER, LÜBECK, GERMANYR) dos pacientes foi padronizada de acordo com os seguintes parâmetros: modalidade ventilação mandatória intermitente sincronizada (VMIS); freqüência respiratória (FR) da máquina = 12ipm; volume corrente (VC) = 8-10ml/kg; fração inspirada de oxigênio (FiO2)= 0,6; pressão expiratória positiva final (PEPF) = 5cmH2O e ventilação com pressão de suporte (VPS) = 20cmH2O. Uma vez atingidos os parâmetros de mecânica ventilatória mínimos necessários para a retirada do suporte ventilatório (modalidade VPS; FR espontânea entre 10 e 20ipm; VC espontâneo ³ 4ml/kg; FiO2 = 0,4; PEPF = 5cmH 2O e VPS = 10cmH 2O), uma amostra de sangue arterial foi colhida para análise gasométrica (RADIOMETER ABL 700 SERIESR) e realização dos cálculos de alguns parâmetros de troca gasosa pulmonar, como o índice de oxigenação (PaO2/ FiO2) e o índice respiratório [P(A-a)O2/PaO2]. Com esses valores dentro da normalidade, foram mensurados a FR, o VC, a pressão de oclusão nas vias aéreas (P 0,1 ), o índice de Tobin (FR/VC), a pressão inspiratória máxima (PImáx) e a pressão expiratória máxima (PEmáx), aplicando-se, então, os protocolos evolutivos de retirada do suporte ventilatório dos grupos estudo e controle, segundo randomização prévia à internação dos pacientes na UTI. Foram considerados critérios de exclusão pósrandomização o desenvolvimento de instabilidade hemodinâmica após o início do protocolo e a impossibilidade de serem alcançados os parâmetros de mecânica ventilatória mínimos necessários para a retirada da VM num tempo menor que 12h após a admissão na UTI. Durante a implementação do protocolo de pesquisa foram excluídos dois pacientes que apresentaram instabilidade hemodinâmica decorrente de choque hipovolêmico. Assim, dois grupos de pacientes compuseram a população final do presente estudo: • Grupo-estudo: 24 pacientes que foram submetidos à retirada da VM diretamente, ou seja, sem o uso do tubo em “T”. • Grupo-controle: 24 pacientes que foram submetidos à retirada da VM com o uso do tubo em “T”. 115 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL Evolução do protocolo de desmame no grupoestudo: Realizou-se a extubação direta. Os pacientes foram extubados e adaptados em máscara VENTURI R facial de oxigenoterapia, com FiO2 = 0,4 por 30min. Ao final deste tempo, uma amostra de sangue arterial foi colhida para mensuração e cálculo de parâmetros de troca gasosa pulmonar. Evolução do protocolo de desmame no grupocontrole: Os pacientes foram adaptados ao tubo em “T” com FiO 2 de 0,4 por 30min, e, em seguida, extubados e adaptados em máscara VENTURIR facial de oxigenoterapia, com FiO2 = 0,4 por 30min. Ao final deste tempo, uma amostra de sangue arterial foi colhida para mensuração e cálculo de parâmetros de troca gasosa pulmonar. A oferta de oxigênio de 0,4 com máscara de VENTURIR foi garantida, em todos os pacientes, pela aferição da mesma através de interposição de um oxímetro de rede na interface paciente-máscara. Um fluxograma do estudo encontra-se representado na figura 1. Figura 1. Fluxograma do estudo. 116 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL ANÁLISE ESTATÍSTICA Para descrever o perfil da amostra foram feitas tabelas de freqüência das variáveis categóricas e estatísticas descritivas das variáveis contínuas. Para analisar a distribuição de uma variável categórica entre os grupos foi utilizado o teste qui-quadrado, ou o teste exato de Fisher. Para comparar a distribuição de uma variável contínua medida em um único momento entre os dois grupos, utilizou-se o teste não paramétrico de MannWhitney. Para comparação das variáveis medidas nos momentos inicial e final nos dois grupos foi utilizada a análise da variância (ANOVA), fazendo-se duas comparações ao mesmo tempo: uma em que se compara os grupos em cada momento e a outra em que se compara a evolução entre os momentos em cada grupo. Caso o efeito da interação tenha sido significativo, utilizou-se o teste de contrastes de perfil para analisar a evolução entre os momentos em cada grupo. O nível de significância adotado foi de 5% (p < 0,05). RESULTADOS A maioria da população estudada foi constituída de indivíduos do sexo masculino, sendo 70,8% no grupo estudo e 66,7% no grupo controle, com idade média abaixo dos 60 anos. A distribuição dos valores de hemoglobina, lactato sérico, tempo de circulação extracorpórea (CEC), parâmetros gasométricos e parâmetros de mecânica ventilatória mensurados ao final do período de desmame foram semelhantes em ambos os grupos, sem diferenças estatisticamente significativas entre eles (tabela 1). O tempo para a retirada do suporte ventilatório foi de 6,8 ± 1,9 horas para o grupo estudo e de 7,3 ± 2,5 horas para o grupo controle (p = NS) . Quanto aos parâmetros de avaliação da troca gasosa pulmonar, como a PaO 2, saturação da hemoglobina arterial pelo oxigênio (SaO 2), PaO 2/FiO 2 e [P(A-a)O 2/PaO 2], não foram observadas diferenças estatisticamente significativas entre os grupos em nenhum dos momentos protocolados para suas determinações. No entanto, no grupo-controle (tubo em “T”) foram observadas diminuições dos valores da PaO2, da SaO2 e da PaO2/FiO2, quando comparados os momentos final com o inicial. Também, neste mesmo grupo, a evolução do índice respiratório [P(Aa)O2/PaO2] apontou para a mesma direção, como os Tabela 1. Dados demográficos e distribuição dos valores de hemoglobina, lactato sérico, tempo de CEC, parâmetros hemogasométricos arteriais e parâmetros de mecânica ventilatória ao final do desmame na amostra. Variável Grupo estudoN = 24 Grupo controleN = 24 p valor Sexo M = 17 F = 7 M = 18 F = 8 0,7555 Idade (anos) 56,7 ± 8,8 58,6 ± 10,7 0,4091 Hemoglobina (g/dL) 12,02 ± 1,63 11,40 ± 1,35 0,4032 Lactato sérico (mmol/L) 4,17 ± 2,78 5,16 ± 2,51 0,1638 Tempo de CEC (min) 92,12 ± 19,60 84 ± 6,86 0,3902 pH 7,36 ± 0,05 7,38 ± 0,05 0,1789 PaO 2 (mmHg) 101,1 ± 18,3 112,3 ± 30,5 0,5273 PaCO 2 (mmHg) 40,1 ± 5,3 37,9 ± 4,8 0,0922 HCO 3 (mmol/L) 22,5 ± 3,1 22,3 ± 3,3 0,7471 BE (mmol/L) -2,3 ± 3,3 -2,1 ± 3,4 0,9876 SaO2 (%) 96,7 ± 1,6 97,8 ± 1,6 0,8000 P0,1 (cmH2O) 3,0 ± 1,3 2,7 ±1,0 0,5676 Índice de Tobin 31,4 ± 10,6 36,5 ± 12,9 0,2118 FR (ipm) 15,4 ± 3,3 16,9 ± 3,6 0,2436 – VC (ml) 529,2 ± 146,6 502,1 ± 147,1 0,5051 PImáx (cmH2O) -34,4 ± 12,9 -31,8 ± 10,2 0,5752 PEmáx (cmH 2O) 34,6 ± 12,4 34,6 ± 9,2 0,5779 – CEC = circulação extracorpórea; PaO2 = pressão parcial de oxigênio arterial; PaCO2 = pressão parcial de gás carbônico arterial; HCO3 = bicarbonato; BE = excesso de base; SaO2 = saturação arterial de oxigênio; P0,1 = pressão de oclusão nas vias aéreas; FR = freqüência respiratória; VC = volume corrente; PImáx = pressão inspiratória máxima; PEmáx = pressão expiratória máxima Volume 15 - Número 3 - Julho/Setembro 2003 117 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL Tabela 2. Parâmetros de troca gasosa pulmonar ao final do desmame (valores iniciais) e 30min após a extubação (valores finais) na amostra. Variável Grupo estudo N = 24 PaO2 (mmHg) Grupo controle N = 24 p valor inicial final inicial final pG pT * 101,1 ± 18,3 99,9 ± 17,4 112,3 ± 30,5 103,3 ± 33,0 0,53 0,03 SaO2 (%) 97,7 ± 1,6 97,4 ± 1,3 97,8 ± 1,6 97,0 ± 2,3 0,80 0,01 PaO2/ FiO2 (mmHg) 252,8 ± 45,7 249,8 ± 43,6 280,8 ± 76,2 258,3 ± 82,7 0,30 0,04 P(A-a)O2/PaO2 (mmHg) 1,40 ± 0,45 1,40 ± 0,38 1,27 ± 0,65 1,53 ± 0,81 0,97 0,02 PaO2 = pressão parcial de oxigênio arterial; SaO2 = saturação arterial de oxigênio; PaO2/ FiO2 = índice de oxigenação; P(A-a)O2/PaO2 = índice respiratório; pG = comparação entre os grupos, pT* = comparação entre tempos referentes ao grupo controle. demais parâmetros de oxigenação descritos acima (tabela 2). DISCUSSÃO As populações de ambos os grupos mostraramse homogêneas com relação às variáveis idade, sexo, tempo de circulação extracorpórea, hemoglobina, parâmetros hemogasométricos e parâmetros de mecânica ventilatória. Dessa forma, uma vez que as populações foram totalmente comparáveis em suas características basais, os resultados obtidos a partir da implementação dos distintos protocolos de desmame da VM puderam ser avaliados com segurança. A maioria da população estudada foi constituída de indivíduos do sexo masculino, com idade média abaixo dos 60 anos. Esses dados estão de acordo com as estatísticas que mostram a predominância da doença isquêmica miocárdica nos indivíduos com idade, em geral, abaixo dos 65 anos de idade e do sexo masculino, como é o caso do Brasil 15 e dos países desenvolvidos 16 . O tempo para a retirada da VM foi de 6,8 ± 1,9 horas para o grupo estudo e de 7,3 ± 2,5 horas para o grupo controle (p = NS). Embora esses tempos não tenham diferido significativamente entre si, nota-se que o tempo de retirada no grupo controle (tubo em “T”) foi cerca de meia hora maior do que no grupo estudo (extubação direta). Isto deveu-se provavelmente ao acréscimo de 30 minutos entre a desconexão da prótese ventilatória e a extubação traqueal, período em que os pacientes desse grupo permaneceram em ventilação espontânea com o tubo em “T”. De qualquer forma, os grupos foram comparáveis entre si. Ainda não existe um consenso quanto ao melhor momento para a extubação traqueal após 118 cirurgia de revascularização do miocárdio. No entanto, considerando-se que as taxas de complicações decorrentes da VM, como atelectasias, barotraumas e pneumonias, estão diretamente relacionadas ao tempo de permanência do tubo endotraqueal e suporte ventilatório 17,18, infere-se que também esse grupo de pacientes deva ser extubado o mais precocemente possível 3,5,6,7 . Evidentemente, considerando-se o aprimoramento ocorrido nas técnicas anestésicas e cirúrgicas, além do desenvolvimento de aparelhos de suporte ventilatório cada vez mais sofisticados, seguros e confiáveis, e também levando-se em conta a necessidade de uma contenção cada vez maior dos custos hospitalares, a retirada da VM em pacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos de alto custo, como a cirurgia cardíaca, tornou-se uma necessidade médica e social 8,19 . Os pacientes que foram extubados com menos de 12 horas após a admissão na UTI apresentaram menor tempo total de internação, com redução concomitante nos custos gerais e no uso de recursos hospitalares 6. Dessa forma, no presente estudo, em que foram avaliados pacientes submetidos à cirurgia cardíaca de revascularização do miocárdio, o tempo de desmame até a extubação traqueal, em ambos os grupos, ficou em média abaixo de oito horas. Estes valores encontram-se dentro daqueles recomendados na literatura. Também não foram observadas falhas na retirada de VM neste grupo de indivíduos e nenhum deles necessitou reintubação. Evidentemente, o número de pacientes estudados foi pequeno, e uma vez que foram selecionados para inclusão no protocolo apenas aqueles sem complicações cirúrgicas peri-operatórias, isto seguramente favoreceu os resultados obtidos. Quanto ao tempo de desmame, houve semelhança entre os grupos, indicando que, em pacientes RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL submetidos a cirurgia eletiva de revascularização do miocárdio, sem complicações peri-operatórias, ambos os métodos (extubação direta versus tubo em “T”) podem ser igualmente eficazes na condução da retirada da prótese ventilatória. De fato, não existe um consenso sobre a melhor técnica de desmame do suporte ventilatório14. No entanto, o tubo em “T” apresenta algumas desvantagens, sendo bem documentado o aumento do trabalho resistivo da respiração, pois o paciente ainda respira na presença de um tubo endotraqueal 14, além do colapso alveolar devido a perda da pressão positiva final residual 20,21 . Muito embora não haja um consenso na literatura quanto ao melhor método a ser utilizado para a retirada da VM, desde que se disponha de equipamentos apropriados, a extubação direta após ventilação temporária com pressão de suporte parece prescindir do tradicional período adicional de 30 a 60 minutos de tubo em “T”, levando-se em conta que esse último método pode induzir transtornos na troca gasosa pulmonar 22 . No presente estudo, variáveis de troca gasosa pulmonar foram mensuradas e avaliadas em ambos os grupos de pacientes, ao final do período da retirada do suporte ventilatório (valores iniciais) e 30 minutos após a extubação (valores finais), ressaltando-se que após a extubação traqueal os pacientes de ambos os grupos permaneceram sob ventilação espontânea com FiO 2 de 0,4 através do uso de uma máscara de VENTURIR. Quando foram analisados os parâmetros da avaliação da troca gasosa pulmonar, como a PaO 2, SaO 2, PaO 2/FiO 2 e [P(A-a)O 2/PaO 2], pôde-se observar que não houve diferenças estatisticamente significativas entre ambos os grupos em nenhum dos momentos protocolados para suas determinações. No entanto, em relação ao grupo controle (uso do tubo em “T”), foram observadas diminuições nos valores da PaO2 (p = 0,03), da SaO2 (p = 0,01) e da PaO2/ FiO2 (p = 0,04), quando comparados os momentos final com o inicial. Também, nesse mesmo grupo, a evolução do índice respiratório [P(A-a)O 2/PaO 2] apontou na mesma direção que os demais parâmetros de oxigenação descritos acima (p = 0,02). Esses dados indicam, em acordo com os achados da literatura, que o uso do tubo em “T” pode levar à deterioração dos parâmetros de oxigenação durante o processo de desmame ventilatório 23 . Por outro lado, especificamente nestes pacientes do grupo controle ( tubo em “T”), não se pode afastar a influência do tempo interferindo nos parâmetros de troca gasosa pulmonar, uma vez que Volume 15 - Número 3 - Julho/Setembro 2003 entre a desconexão do ventilador e a coleta das amostras hemogasométricas , eles permaneceram um tempo adicional de 30 minutos em respiração espontânea, quando comparados ao grupo estudo (extubados diretamente). Deve-se ressaltar que neste grupo (controle), muito embora tenha havido uma piora estatisticamente significativa dos valores numéricos de alguns parâmetros de troca gasosa, é pouco provável que eles tenham representado algum significado clínico de importância na evolução dos mesmos, já que em nenhum momento estiveram abaixo dos valores normais de referência.. Annest et al23, citam que a glote parece exercer uma função de “retardo expiratório”, funcionando como um mecanismo de pressão expiratória final positiva natural, impedindo ou minimizando o colapso alveolar. Os autores recomendaram que todos os pacientes em processo de retirada da VM devem ser extubados diretamente de baixos níveis de pressão positiva contínua nas vias aéreas e que os testes de respiração intermitente em tubo em “T” com essa finalidade deveriam ser completamente abandonados, por terem se mostrado desnecessários, ou mesmo potencialmente deletérios 23. Em conclusão, o presente estudo não mostrou diferenças significativas nos tempos necessários para a extubação em pacientes no PO de cirurgia cardíaca eletiva de revascularização do miocárdio, não complicado, conduzidos ao desmame da VM pela técnica “direta” versus o tubo em “T”. Dessa forma, recomenda-se que nos pacientes submetidos a cirurgia de revascularização do miocárdio sem complicações peri-operatórias, e que de acordo com um protocolo pré-estabelecido tenham atingido os parâmetros mínimos necessários para o desmame, sejam extubados diretamente, sem a necessidade do tradicional período de permanência no tubo em “T”. RESUMO Objetivo. Comparar dois métodos de retirada da ventilação mecânica (VM) em pacientes no pósoperatório (PO) de cirurgia cardíaca eletiva de revascularização do miocárdio (RM). Métodos. Foram estudados prospectivamente 48 pacientes em PO imediato de cirurgia cardíaca, divididos aleatoriamente em grupo-estudo (n = 24), em que os pacientes foram extubados diretamente, e grupocontrole (n = 24), em que os pacientes foram extubados após um período de respiração com o 119 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL uso de um tubo em “T” por 30min. Parâmetros de mecânica respiratória e de troca gasosa pulmonar foram mensurados ao final do processo de desmame (valores iniciais) e após 30min da extubação (valores finais). Resultados. O tempo de desmame foi de 6,8 ± 1,9h no grupo-estudo e de 7,3 ± 2,5h no grupo-controle (p = NS). Quanto aos parâmetros de mecânica respiratória e de troca gasosa pulmonar, não foram observadas diferenças estatisticamente significativas entre os grupos em nenhum momento. Porém, no grupo-controle (tubo em “T”) observou-se uma queda estatisticamente significativa nos valores da PaO 2 (112,3 ± 30,5 vs 103,3 ± 33,1mmHg; p = 0,03) e da PaO 2/ FiO 2 (280,8 ± 76,2 vs 258,3 ± 82,7mmHg; p = 0,04), assim como uma piora do Índice Respiratório [P(A-a)O2/ PaO2 ; 1,28 ± 0,65 vs 1,54 ± 0,82; p = 0,02), quando comparados os momentos final com o inicial. Conclusão. Apesar de comparáveis em relação ao tempo de desmame, o método do tubo em “T” diminuiu os valores que dizem respeito aos parâmetros de oxigenação sangüínea. Dessa forma, em se dispondo de recursos, recomenda-se que nos pacientes em PO de cirurgia cardíaca eletiva de RM a retirada da VM seja realizada diretamente, sem o uso do tubo em “T”. Palavras-chave: ventilação mecânica; desmame; cirurgia cardíaca. AGRADECIMENTOS Aos Prof. Dr. Reinaldo W. Vieira e Dr. Pedro P. M. de Oliveira (Equipe de Cirurgia Cardíaca HCUNICAMP); Profs. Drs. Renato G. G. Terzi, Desanka Dragosavac, Alípio B. Balthazar, Venâncio P. Dantas Filho, Ivan F. C. Toro e André L. B. Nunes (Equipe Médica da UTI-HCUNICAMP); Fts. Augusto C. Roquejani, Rosana A. S. Thiesen e Rosmari A. R. A. de Oliveira (UTIHC-UNICAMP); Enfas. Claudinéia M. Logato, Eliane A. Cintra e Valéria A. de Almeida (UTIHC-UNICAMP), pela colaboração e assistência técnica na realização do presente estudo. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS 1. Kollef MH, Shapiro SD, Silver P et al. A randomized, controlled trial of protocol–directed versus physician–directed weaning from mechanical ventilation. Crit Care Med 1997; 25:567-74. 2. Saura P, Blanch L, Mestre J et al. Clinical consequences of the implementation of a weaning protocol. Intensive Care Med 1996; 22:1052-6. 120 3. Reyes A, Vega G, Blancas R et al. Early versus conventional extubation after cardiac surgery with cardiopulmonary bypass. Chest 1997; 112:193-201. 4. Wood G, MacLeod B, Moffatt S. Weaning from mechanical ventilation: physician-directed versus a respiratory therapist-directed protocol. 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RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL Complicações da Esofagectomia Transmediastinal Complications of transmediastinal esophagectomy Luciani Bassan*, Silvia M.T.P.Soares**,Desanka Dragosavac***, Sebastião Araújo****, Luiz Roberto Lopes ****, Nelson Adami Andreollo***** ABSTRACT Transmediastinal esophagectomy by cervicoabdominal approach causes less functional compromise of pulmonary mechanics than classical thoracotomy, but it’s not free of serious complications. In this study, all patients submitted to transmediastinal esophagectomy, in the gross twenty two patients, and addmitted at the ICU-HCUNICAMP between January 2000 and November 2001, were retrospectively evaluated. Twenty patients were male and two female, aging around 56 years. The primary diagnosis were malignancies (epidermoid carcinoma) in nine patients, adenocarcinoma of the cardia in nine and advanced megaesophagus in four. Esophageal transit was reconstructed by gastric transposition using a gastric tube with cervical esophagogastric anastomosis. Twenty patients needed a chest tube positioning. The following complications were observed in the postoperative period: cervical esophagogastric anastomosis leakage (9 cases), pulmonary infection (5 cases), sistemic respost inflamatory syndrome (4 cases), sepsis (3 cases), empiema (3 cases), atrial fibrillation (2 cases) and atelectasis (1 case). Twenty patients survived to hospital discharge and two died. Thus, despite the fact that transmediastinal esophagectomy causes less functional pulmonary mechanics compromise than classical thoracotomy, it carries a high postoperative morbi-mortality risk, with high rates of severe complications, such as esophagogastric anastomosis leakage and pulmonary ones. KEY WORDS: esophagectomy, postoperative, complications. A esofagectomia transmediastinal, em que a ressecção do esôfago é feita sem toracotomia, efetuando a reconstrução do trânsito gastrointestinal com transposição do estômago na forma de um tubo gástrico, com anastomose esofagogástrica cervical pelo mediastino posterior ou anterior, vem sendo realizada com maior freqüência, tanto em afecções benignas, sobretudo no megaesôfago avançado, como também nos casos de carcinoma de esôfago e cárdia. Esta cirurgia tem proporcionado a volta da possibilidade de alimentação por via oral para a maioria dos pacientes1,2. A esofagectomia transmediastinal sem toracotomia apresenta a vantagem de evitar o comprometimento da dinâmica pulmonar, porém não é isenta de complicações 3. São descritas complicações no período intra e pós-operatório como lesão da traquéia na região da carina durante o ato cirúrgico4, complicações pulmonares como hidropneumotórax e hemotórax 3, quilotórax5, infecção pulmonar 3, fístula cervical no S local da anastomose esofagogástrica 6,7,8 e também complicações mais graves, como síndrome da disfunção de múltiplos órgãos e falência cardíaca9. O objetivo deste trabalho foi analisar as complicações de todos os pacientes submetidos à esofagectomia transmediastinal e que foram admitidos na UTI do Hospital das Clínicas da UNICAMP, no período de janeiro de 2.000 a novembro de 2.001. SUJEITOS E MÉTODOS No período de janeiro de 2.000 a novembro de 2.001, foram avaliados retrospectivamente todos os pacientes internados na Unidade de Terapia Intensiva do Hospital de Clínicas da UNICAMP que realizaram esofagectomia transmediastinal, totalizando vinte e dois pacientes sendo vinte homens e duas mulheres, com idade média de 56 anos. Neste estudo foram analisadas as complicações apresentadas com essa cirurgia, sendo assim Trabalho realizado na Unidade de Terapia Intensiva do Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas/ UNICAMP - SP. * Fisioterapeuta, Aprimoranda em Fisioterapia Respiratória em UTI - UNICAMP ** Fisioterapeuta da UTI Hospital Clínicas da UTI - HC/UNICAMP. *** Médica , Prof. Dra. Colaboradora do Departamento de Cirurgia-FCM - UNICAMP. **** Médico, Prof. Assistente Doutor do Departamento de Cirurgia-FCM - UNICAMP. ***** Médico, Prof. Doutor Associado da Disciplina de Moléstias do Aparelho Digestivo do Departamento de Cirurgia-FCM UNICAMP. Autora Principal: Luciani Bassan Endereço: Av. Antonio Carvalho Miranda 173 – Jd Miranda CEP 13034-030 - Campinas / SP Telefone (0XX19): 3242-2674 Volume 15 - Número 3 - Julho/Setembro 2003 121 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL verificadas: lesão pleural com drenagem pleural unilateral ou bilateral, fístula da anastomose, síndrome de resposta inflamatória sistêmica (SIRS), sepse, pneumonia, empiema pleural, fibrilação atrial e atelectasia. A presença de líquido na cavidade pleural em quantidade anormal, chamada de derrame pleural, é a mais freqüente e significativa das alterações do tórax10. A drenagem pleural fechada, também chamada de contínua ou sob selo d’água, está indicada em grande parte do pacientes com derrame pleural, com pneumotórax e em quase todos os pacientes que foram submetidos à cirurgia torácica com abertura do espaço pleural. Em todas as situações clínicas o objetivo é restaurar e manter a fisiologia do espaço pleural 11. A fístula ocorre quando há o rompimento da anastomose entre o esôfago e o estômago, realizada cirurgicamente na região cervical 6,7,8. A síndrome de resposta inflamatória sistêmica (SIRS) representa sinais de uma resposta inflamatória generalizada, atestada por três sinais obrigatórios: taquipnéia, taquicardia e alterações da temperatura, não resulta obrigatoriamente de quadro infeccioso12. Sepse representa a evidência de infecção associada a uma síndrome de resposta inflamatória sistêmica 12 . A pneumonia representa uma inflamação aguda de qualquer natureza, localizada no parênquima pulmonar, seja causada por processos bacterianos, viróticos, fúngicos ou de outra natureza13. Empiema pleural significa coleção de pus limitada a qualquer cavidade do organismo. Todavia, o empiema pode representar a presença de pus na cavidade pleural14. Os empiemas também podem ser descritos como derrames pleurais com aspecto purulento 10 . Na fibrilação atrial ocorre uma desorganização elétrica nos átrios de tal forma que as despolarizações atriais passam a ocorrer de maneira desordenada e irregular, levando a contrações atriais inefetivas15. A atelectasia representa o colabamento de um segmento ou lobo pulmonar, ou mesmo de um pulmão completo, e normalmente é secundária a outras patologias e situações clínicas como: pneumotórax, derrame pleural, processo inflamatório do parênquima pulmonar com aumento na produção de secreção. As atelectasias pulmonares segmentares ou lobares podem por vezes produzir imagens de difícil interpretação pela radiologia convencional, como por exemplo, a denominada atelectasia arredondada ou pseudotumor atelectásico 16. 122 RESULTADOS Dentre os vinte e dois pacientes analisados, em nove pacientes o diagnóstico foi de carcinoma epidermóide, nove adenocarcinoma de cárdia e quatro megaesôfago avançado. Vinte pacientes foram submetidos à drenagem pleural fechada uni ou bilateral, no intra-operatório (tabela 1). No período pós-operatório foram observadas as seguintes complicações: síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SIRS) em quatro pacientes, fibrilação atrial em dois e fístula da anastomose esôfagogástrica cervical em um paciente. O tempo de internação na UTI variou de um a cinco dias. Após a alta da UTI, até o período de alta hospitalar, foram observadas as seguintes complicações: fístula da anastomose esofagogástrica em oito pacientes, pneumonia em cinco, empiema em três, sepse em três e atelectasia em um paciente (tabela 1). O tempo total de internação hospitalar foi de 12 a 36 dias, em média 18 dias (tabela 2). Dos vinte e dois pacientes, vinte tiveram alta hospitalar e dois evoluíram para óbito no pós-operatório. As causas que levaram ao óbito foram pneumonia, empiema de tórax e sepse (tabela 2). DISCUSSÃO A esofagectomia transmediastinal via cervicoabdominal tem a vantagem de evitar a toracotomia 17 , além de não comprometer a dinâmica pulmonar 3. Porém mesmo com essa vantagem, essa cirurgia não está isenta de complicações. Foi evidente nesse estudo a incidência de complicações respiratórias. No intra-operatório, a drenagem pleural fechada unilateral ou bilateral foi necessária em vinte, dos vinte e dois pacientes estudados. As lesões pleurais são decorrentes do intenso processo de periesofagite, predispondo a firme adesão da pleura ao esôfago. Por esse motivo, a dissecção do esôfago ao nível mediastinal pode resultar na abertura da pleura3. Essa abertura resulta em drenagem pleural, podendo ter como conseqüência outras complicações como hemotórax, derrame pleural e empiema. Também houve complicações respiratórias no período pós-operatório, como infecção do parênquima (5 casos) e atelectasia (1 caso). Kolh et al. 6 analisaram 130 pacientes submetidos a esofagectomia por câncer de esôfago. Destes 130 pacientes, 29 desenvolveram complicações resRBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL Tabela 1. Dados dos pacientes submetidos a esofagectomia transmediastinal Paciente Idade (anos) Sexo pré-operatório Diagnóstico Complicações internação (dias) Tempo Evolução 1 39 M Carcinoma Epidermóide 1/3 médio LPU* Empiema 33 Alta 2 50 M Carcinoma Epidermóide 1/3 médio LPB** 20 Alta 3 61 M Carcinoma Epidermóide 1/3 médio Empiema Pneumonia LPB** Fístula da anastomose 36 óbito 4 44 M Carcinoma Epidermóide 1/3 médio LPB** Fístula da anastomose 34 Alta 5 70 M Carcinoma Epidermóide 1/3 médio LPU* 15 Alta 6 51 M Carcinoma Epidermóide 1/3 médio LPU* 12 Alta 7 56 M Carcinoma Epidermóide 1/3 inferior SIRS LPU* Fístula da anastomose 24 Alta 8 39 M Carcinoma Epidermóide 1/3 inferior LPB** 26 Alta 9 47 M Carcinoma Epidermóide 1/3 inferior LPB** Fístula da anastomose 19 Alta 10 73 F Adecarcinoma de cárdia Sepse 29 Óbito 11 68 M Adecarcinoma de cárdia LPB** SIRS 32 Alta 12 66 M Adecarcinoma de cárdia LPB** FA*** 18 Alta 13 55 M Adecarcinoma de cárdia LPU* 16 Alta 14 49 M Adecarcinoma de cárdia Pneumonia Sepse LPB** Fístula da anastomose 16 Alta 15 63 M Adecarcinoma de cárdia SIRS LPU* Fístula da anastomose 32 Alta 16 43 M Adecarcinoma de cárdia LPB** 16 Alta 17 43 M Adecarcinoma de cárdia LPB** Fístula da anastomose 18 Alta 18 45 M Adecarcinoma de cárdia - 13 Alta 19 52 M Megaesôfago grau IV LPB** 15 Alta 20 48 M Megaesôfago grau IV LPB** Fístula da anastomose SIRS Sepse FA*** Empiema Atelectasia 29 Alta 21 57 F Megaesôfago grau IV LPB** 20 Alta 22 41 M Megaesôfago grau IV LPB** Fístula da anastomose 16 Alta * LPU: lesão pleural unilateral ** LPB: lesão pleural bìlateral *** FA: fibrilação atrial piratórias, como infecção pulmonar e insuficiência respiratória. Mesmo evitando-se a toracotomia, durante o procedimento são realizadas grandes manipulações das Volume 15 - Número 3 - Julho/Setembro 2003 regiões cervical, abdominal e do mediastino posterior, sendo, portanto, um procedimento cirúrgico complexo e que acarreta alto risco de resposta inflamatória e até mesmo processos infecciosos. 123 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL Tabela 2 - Complicações intra e pós-operatórias de pacientes submetidos a esofagectomia transmediastinal Diagnóstico Lesão pleural Fístula da anastomose Carcinoma epidermóide 9 4 SIRS/Sepse Pneumonia Empiema 1 3 2 Fibrilação atrial Atelectasia Pacientes 1 - 9 Adenocarcinoma de cárdia 7 3 4 1 - - - 9 Megaesôfago 4 2 2 1 1 1 1 4 Total 20 9 7 5 3 2 1 22 Algumas complicações sistêmicas também podem se desenvolver devido a tais riscos inflamatórios e infecciosos. Foi observado nessa revisão, a ocorrência de síndrome de resposta inflamatória sistêmica e sepse em sete dos vinte e dois pacientes estudados. Outra complicação observada nesse estudo, e também descrita por outros autores, é a fístula da anastomose esofagogástrica cervical. Kolh et al.6 verificaram a incidência de seis casos de fístula de anastomose, dentre 130 pacientes analisados, estando esta complicação em segundo lugar de ocorrência em tal estudo. Boyle et al.7 descreveram a incidência de seis casos de fístula da anastomose cervical, em um estudo que envolveu 65 pacientes submetidos a esofagectomia. E também Blewett et al.8 analisaram 74 pacientes submetidos a esofagectomia por câncer de esôfago, sendo que em 19 pacientes a anastomose esofagogástrica foi cervical e em 55 foi torácica. Nesse estudo a maior incidência de fístula foi na anastomose torácica, tendo como ocorrência nove casos, e da anastomose cervical a ocorrência foi de um caso. A realização de tal procedimento exige treino e experiência de toda uma equipe envolvendo cirurgiões, enfermagem, nutricionistas e fisioterapeutas, além de Unidade de Terapia Intensiva com condições de tratar prováveis complicações decorrentes da cirurgia. A maioria dos pacientes portadores de doenças esofágicas malignas, além de serem tabagistas e etilistas, já procura auxílio médico com suas doenças em estado avançado, tem emagrecimento e alterações nutricionais significativas. E aqueles portadores de megaesôfago avançado, também se encontram na mesma situação, em decorrência da disfagia e má ingestão alimentar de longa data. Portanto, ao serem submetidos a procedimento de grande porte, como é a esofagectomia, estão sujeitos a índices mais elevados de complicações, em comparação a outros procedimentos cirúrgicos. CONCLUSÃO A esofagectomia transmediastinal via cervicoabdominal é uma cirurgia complexa, com incidên124 cia elevada de complicações pós-operatórias e, dentre estas, destacam-se as fístulas da anastomose esofagogástrica e as complicações respiratórias. A evolução pós-operatória não depende apenas da técnica cirúrgica bem executada, mas também de cuidados intensivos pós-operatórios, principalmente os respiratórios e de profilaxia infecciosa. RESUMO A esofagectomia transmediastinal via cervicoabdominal evita o comprometimento da dinâmica pulmonar, mas não é isenta de complicações. Foram avaliados retrospectivamente todos os pacientes internados na Unidade de Terapia Intensiva do Hospital de Clínicas da UNICAMP que realizaram essa cirurgia, assim como as complicações que apresentaram no intra e pós-operatório. No período de janeiro de 2.000 a novembro de 2.001, vinte e dois pacientes foram operados, sendo vinte homens e duas mulheres, com idade média de 56 anos. O diagnóstico foi de carcinoma epidermóide em nove pacientes, adenocarcinoma de cárdia em nove e megaesôfago avançado em quatro pacientes. A reconstrução foi realizada com o estômago na forma de tubo gástrico e a anastomose esofagogástrica foi cervical em todos os casos. A drenagem pleural fechada uni ou bilateral foi necessária em vinte pacientes, no intra-operatório. No período pós-operatório, as seguintes complicações foram observadas: fístula na anastomose esofagogástrica cervical (9 casos), infecção pulmonar (5 casos), síndrome de resposta inflamatória sistêmica (4 casos), sepse (3 casos), empiema (3 casos), fibrilação atrial (2 casos), atelectasia (1 caso). Vinte pacientes tiveram alta hospitalar e dois evoluíram para óbito. Concluindo, a esofagectomia transmediastinal via cervicoabdominal, apesar de ter a vantagem de evitar a toracotomia e o comprometimento da dinâmica pulmonar, ainda apresenta um alto risco de complicações intra e pós-operatórias, com altas taxas de complicações graves, destacando-se a fístula na anastomose esofagogástrica e as complicações respiratórias. PALAVRAS-CHAVES: esofagectomia, pós-operatório, complicações. RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / ARTIGO ORIGINAL REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. Young MM, Deschamps C, Trastek VF, et al. Esophageal reconstruction for benign disease: early morbidity, mortality, and functional results. Ann Thorac Surg 2000; 70: 1651-5. Andreollo NA, Brandalise NA, Lopes LR, et al. 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Nippon Kyobu Geka Gakkai Zasshi 1991; 39: 1055-61. 125 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / RELATO DE CASO Broncoespasmo refratário por Strongyloides stercoralis Refractory bronchospasm by Strongyloides stercoralis Marilene da Silva Moura¹, Sérgio da Cunha², Gustavo Vaz³, Saturnino de Campos Sarat Júnior³, Maria Cláudia Mattos Simão³ Abstract Patients treated with high dose corticosteroids, as occurs in asthma and chronic obstructive pulmonary disease associated with bronchospasm, usually are not investigated for strongyloidiasis, a disease which manifests itself in a limited form to gastrointestinal tract. However, in the condition mentioned above, this illness may evolve to a dramatic presentation, with elevated mortality rate. Such knowledge leads many physicians to empirically treat the infection before initiate aggressive corticotherapy. The patient in this report had asthma and was using high dose methylprednisolone for a long period of time, thus potentially immunossupressed, and manifesting exacerbation of the disease with severe bronchospasm, which did not improved despite treatment for bacterial respiratory tract infections. Under suspicion, it was discovered a positive stool test for Strongyloides stercoralis, this rousing a test in lower respiratory tract secretions that was also positive. With the right treatment, the patient begun to mend, however he developed a sum of complications inherent to his condition and to the length of stay in the Intensive Care Unit, that had slow resolution although multi-professional efforts. Keywords: strongyloidiasis, corticosteroids, bronchospasm, myophaty, neuromuscular blocking agents. broncoespasmo é uma condição que resulta em diminuição do calibre da árvore brônquica, determinado clinicamente pelo sibilo respiratório. Dentre suas diversas causas, destacam-se a asma brônquica e a bronquite crônica, além de doenças infecciosas e congestão pulmonar. É tratado agudamente com medidas broncodilatadoras farmacológicas, necessitando porém para remissão, de resolução/compensação da doença de base. Neste caso apresentamos um paciente com sibilos difusos refratários, que tinha antecedentes de asma brônquica, recebendo tratamento adequado sem apresentar melhora. O RELATO DO CASO Um homem de 57 anos foi admitido no Hospital Universitário Pedro Ernesto em abril de 2003, com dispnéia de início há 40 dias, associada à tosse com expectoração clara e sibilos. Na ocasião procurou auxílio médico, tendo passado por duas internações hospitalares, onde havia relato de uso de ceftriaxona, corticoesteróide venoso, e agentes inalatórios broncodilatadores, evoluindo porém com piora progressiva. À internação, apresentava manutenção dos sintomas e mudança da expectoração para amarelada, estando hipocorado +/4, com equimoses peri-umbilicais e em antebraços, pressão arterial de 150x90mmHg, freqüência cardíaca de 100bpm e respiratória de 36rpm, sem febre. O exame cardiovascular era normal, exceto por hipofonese de bulhas, e não havia edema em membros inferiores. Tinha o murmúrio vesicular universalmente diminuído com intensos sibilos difusos, além de esforço respiratório importante. O exame de abdomen não revelou alterações. Nos exames laboratoriais, o hemograma mostrou anemia normocrômica e normocítica com hemácias 3.770.000/mm³, hemoglobina 11.1g/ dL e hematócrito 31.8%; leucocitose de 16.700/mm³ com bastões 5%, segmentados 74.6%, linfócitos 15% e eosinófilos 0.4%; plaquetas 367.000/mm³. A bioquímica revelou: glicose 152mg/dL, sódio 126mEq/L, potássio 2.9mEq/L, uréia 47mg/dL e creatinina 0.8mg/dL. Gasometria arterial: pH 7.43, pCO2 50.7mmHg, pO2 184mmHg, HCO3ˆ 32.9mEq/L, BE +7.6 e SO2 99.6%, sob macronebulização com O2 úmido a 5 L/min. A radiografia de tórax (Fig.1) mostrou infiltrado intersticial peri-hilar. 1. Médica Intensivista Titulada pela Associação de Medicina Intensiva Brasileira e Coordenadora da Unidade Docente Assistencial do Centro de Terapia Intensiva, Hospital Universitário Pedro Ernesto, Universidade do Estado do Rio de Janeiro. 2. Médico, Professor assistente e Coordenador da Disciplina de Terapia Intensiva da Faculdade de Ciências Médicas, Universidade do Estado do Rio de Janeiro. 3. Médicos Residentes de Terapia Intensiva, Centro de Terapia Intensiva, Hospital Universitário Pedro Ernesto, Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Centro de Terapia Intensiva, Hospital Universitário Pedro Ernesto, Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Endereço para correspondência e contatos: Gustavo Vaz, Hospital Universitário Pedro Ernesto, Av 28 de Setembro 77, 5o andar- CTI geral, CEP: 20551-030, Vila Isabel, Rio de Janeiro, Brasil. Tel.: (0xx21) 2587-6115, Tel. Residencial: (21) 2259-7869, Tel. Celular: (21) 9192-0564 . E-mail: [email protected] 126 RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / RELATO DE CASO Foi então iniciada antibioticoterapia empírica com ciprofloxacina e amoxicilina/clavulanato, mantendo-se corticoterapia venosa e ˜2-agonista/anticolinérgico inalatório. O paciente não apresentou melhora clínica, e houve piora do infiltrado pulmonar radiológico. No 7o dia de internação, apresentou pseudo-obstrução intestinal, quando foi submetido a clister opaco que evidenciou dilatação do ceco, com resolução espontânea, porém evoluindo com insuficiência respiratória aguda, sendo intubado e transferido para o CTI, onde foi admitido em quadro séptico com broncoespasmo grave, febre alta contínua e petéquias subconjuntivais e em flancos abdominais. Foram feitos novos exames, que mostraram piora da anemia com hemácias 2.970.000/mm³, hemoglobina 8.73g/dL e hematócrito 25.3%, e do desvio à esquerda com leucócitos 16.300/mm³, bastões 13%, segmentados 72%, linfócitos 7.8% e eosinófilos 0.02%; plaquetas 247.000/mm³. A função renal e os eletrólitos eram normais, a glicemia de 290mg/dL e amilase 55UI. A gasometria arterial revelou: pH 7.45, pCO2 33.1mmHg, pO2 104mmHg, HCO3ˆ 22.6mEq/L, BE +0.1 e SO2 98.2%, sob fração inspirada de O2 de 0.5. A radiografia de tórax evidenciava piora do infiltrado intersticial com áreas de preenchimento alveolar. O paciente tinha história pregressa de asma brônquica persistente e doença do refluxo gastroesofageano (DRGE) grave, fazendo uso de salmeterol/fluticasona e pantoprazol, sem relato de outras comorbidades, doenças prévias, tabagismo ou etilismo. Foi instalada ventilação mecânica invasiva, tendo sido necessários sedação e bloqueio neuromuscular contínuo para melhor adaptação à prótese ventilatória. Os antibióticos foram suspensos e feitas culturas de sangue, urina e mini-LBA (lavado bronco-alveolar), sem isolamento de patógenos em contagem significativa. Iniciou-se empiricamente moxifloxacina e ceftazidima sem melhora após 2 dias. A revisão do prontuário de acompanhamento ambulatorial do paciente revelou que um exame parasitológico de fezes feito 3 meses antes da atual internação era positivo para Strongiloydes stercoralis, não tendo sido feito tratamento adequado. Foi então solicitada pesquisa de S. stercoralis em material obtido por miniLBA, que foi positiva, sendo iniciado tratamento com tiabendazol na dose de 25mg/kg a cada 12 horas. Passados mais 2 dias houve controle do quadro séptico e melhora da febre, assim como do leucograma e do infiltrado pulmonar, o broncoespasmo melhorando progressivamente nos 10 dias subsequentes ao início do tiabendazol, após o que não foram mais necessários o bloqueio neuromuscular nem a sedação. O anti-HIV (1 e 2) foi negativo e a ultra-sonografia abdominal mostrou discreta hepatomegalia homogênea sem ascite. O paciente foi tratado com o anti-helmíntico por 10 Volume 15 - Número 3 - Julho/Setembro 2003 dias em dose máxima diária (3g), sem elevação significativa das aminotransferases hepáticas, continuando com dose de manutenção diária (500mg) por 20 dias. Os antibióticos foram administrados por 14 dias, reduzindo-se gradativamente o corticoesteróide e permanecendo com terapia plena para DRGE com omeprazol e procinético. Novas pesquisas para S. stercoralis, por mini-LBA e parasitológico de fezes, foram negativas ao término do tratamento, e 28 dias após. Ao final do tratamento com tiabendazol, o paciente voltou a fazer febre, com recrudescência da leucocitose e desvio à esquerda, desenvolvendo infecções sequenciais e repetidas por bactérias multi-resistentes, em sítios diversos, tendo-se administrado antibióticos de amplo espectro. Durante toda a evolução no CTI em seguida ao término da sedação e bloqueio neuromuscular, o paciente permaneceu com tetraplegia flácida de discreta melhora progressiva sendo difícil o processo de desmame ventilatório. Múltiplos fatores foram implicados: desnutrição e ventilação por tempo prolongado, sepse e acometimento polineuropático motor axonal e predominantemente miopático confirmado por eletroneuromiografia. Sob protocolo lento e gradativo de desmame em peça T alternando com períodos em ventilação com pressão de suporte (PSV) e intenso trabalho fisioterápico, o paciente pôde ter a ventilação mecânica descontinuada, recebendo alta para a enfermaria após 48h de retirada da cânula de traqueostomia. Apresentava força muscular grau IV em membros superiores e grau III em membros inferiores. Após quase 60 dias na enfermaria, o paciente recebeu alta hospitalar realizando todas as atividades cotidianas. DISCUSSÃO A estrongiloidíase humana é uma helmintíase causada pelo Strongyloides stercoralis, que apresenta duas formas: uma de vida livre e outra parasitária; ambas intercalando-se no ciclo evolutivo e determinando infecção[1]. As larvas filarióides- formas infestantes- seguem trajeto que passa pela circulação venosa até os capilares pulmonares, onde penetram nos alvéolos e são eliminadas na secreção traqueal para a faringe e deglutidas, indo instalar-se na intimidade da mucosa intestinal, principalmente duodenal, local de infecção primordial, manifestando-se clinicamente por dor epigástrica e diarréia e podendo raramente levar a íleo paralítico ou enterorragia[1]. Eventualmente, há um aumento do número de vermes nos tecidos e órgãos normalmente envolvidos no ciclo biológico, ao que se denomina hiperinfecção e em alguns casos isto evolui para doença disseminada, quando as larvas podem ser encontradas em virtualmente qualquer órgão e líquido corporal, inclusive a pele, onde determinam 127 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ RBTI / RELATO DE CASO lesões petequiais e purpúricas por penetração[1], levando a quadros graves, com sepse e infecções secundárias sob a forma de pneumonia e até Síndrome de Angústia Respiratória Aguda (SARA)[2], meningite, endocardite ou peritonite, por carreamento de enterobactérias e até fungos da luz intestinal para a corrente sanguínea[1-5], sendo o acometimento pulmonar de mais fácil suspeição mediante história clínica e achados radiológicos[6]. As formas graves da doença levam à mortalidade maior que 80%[1,3-4]. A hiperinfecção e disseminação são facilitadas por estados de imunodepressão [1,3,4,7] , aí incluindo-se principalmente a iatrogênica- por uso de corticoesteróides- e também a associada à infecção pelo HTLV1 (human T-cell leukemia virus type 1)[5,8]. O diagnóstico é feito através da identificação das larvas pelo método de Baermann[9] nas fezes, com sensibilidade próxima a 100% mediante coleta de sete espécimes consecutivos[10], assim como em qualquer fluido orgânico[4,5], inclusive por coloração de Gram em secreção traqueal[11], havendo eosinofilia em mais de 80% dos casos, exceto nas formas graves, quando ocorre em menos de 20% dos casos[1]. O agente terapêutico de escolha atualmente é o cambendazol com eficácia em torno de 95%[12], esta semelhante à do tiabendazol e com menos efeitos colaterais, sendo este entretanto o fármaco preferido em formas extra-intestinais da doença, com índice de cura entre 75% e 93%, tendo entre seus efeitos adversos a hepatotoxicidade[1]. Em pacientes sépticos a incidência de neuropatia chega a 70% e, dependendo da doença de base, pode ter recuperação ausente ou apenas parcial[12]. O acometimento miopático é também mais comum do que se imagina, especialmente em pacientes que fazem uso de corticoesteróides e agentes bloqueadores neuromusculares (ABNM) não- despolarizantes isolados ou em associação[13], mesmo na ausência de sepse grave e com funções renal e hepática normais[14]. A miopatia grave é associada à perda dos filamentos de miosina e proteínas relacionadas e do mRNA (ribonucleic acid messenger) da miosina, havendo na fase aguda a perda da excitabilidade de membrana por diversos fatores, dos quais a ação de corticoesteróides parece ser o principal, além de ABNM, imobilização e sepse[15], isto ocorrendo mesmo após curtos períodos de uso das drogas citadas. CONCLUSÃO Considerando-se a elevada prevalência de infestação parasitária intestinal na população brasileira, devemos estar atentos à possibilidade de desencadeamento de quadros respiratórios graves por estes agentes, especialmente em pacientes em uso crônico de corticoesteróides ou outras condições clínicas causadoras de imunodepressão. 128 RESUMO Pacientes tratados com altas doses de corticoesteróides, como ocorre na asma e na doença pulmonar obstrutiva crônica associadas a broncoespasmo, geralmente não são investigaddos para estrongiloidíase, uma doença que se manifesta de forma limitada ao trato gastrointestinal. Entretanto, na condição mencionada acima, esta doença pode evoluir para uma apresentação dramática, com elevada taxa de mortalidade. Tal conhecimento leva muitos médicos a tratar empiricamente a infecção antes de iniciar corticoterapia agressiva. O paciente neste relato tinha asma e estava usando metilprednisolona em alta dose por um longo período, portanto potencialmente imunossuprimido, e manifestando exacerbação da doença com broncoespasmo grave que não melhorou apesar de tratamento para infecções bacterianas do trato respiratório. Sob suspeita, foi descoberto um exame parasitológico de fezes positivo para Strongyloides stercoralis, o que suscitou o teste nas secreções de trato respiratório inferior, também positivo. Com o tratamento certo o paciente começou a melhorar, no entanto ele desenvolveu um somatório de complicações inerentes a sua condição e à longa permanência na Unidade de Terapia Intensiva, que tiveram lenta resolução apesar de esforços multi-profissionais. UNITERMOS: estrongiloidíase, corticoesteróides, broncoespasmo, miopatia, agentes bloqueadores neuromusculares. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. Neto JLA, Assef MCV: Estrongiloidíase. 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