3. Relatório Parcial do Eixo Temático Mobilização e

Transcrição

3. Relatório Parcial do Eixo Temático Mobilização e
1
RELATÓRIO PARCIAL SÓCIO-ANTROPOLÓGICO E JURÍDICO SOBRE
COMUNIDADES RURAIS DO MUNICÍPIO DE VIÇOSA/MG, REFERENTE À
MOBILIZAÇÃO, ORGANIZAÇÃO SOCIAL E OCUPAÇÃO DO ESPAÇO URBANO
Relatório parcial do Projeto Internacional de
Pesquisa Cidade e Alteridade, iniciativa
conjunta da UFMG, da UFV, da UI e do
CES/UC, sob a Coordenação Geral da
Professora Dra. Miracy Barbosa de Sousa
Gustin e do Prof. Dr. Boaventura de Sousa
Santos, apresentado à Coordenação de
Inclusão e Mobilização Sociais do MPMG.
Núcleo temático Mobilização e Organização
Social. Pesquisadores: Prof. Rennan Lanna
Martins Mafra; Carla Beatriz Marques Rocha
e Mucci; Ana Carolina Rodrigues; Raíssa de
Oliveira Murta; Gislaine Gomes Rodrigues;
Patrícia Dias de Sousa; Creiciano Garcia
Paiva; Juliana da Silva Rosa; Regiane
Valentim Leite.
BELO HORIZONTE, 2013
2
PROJETO INTERNACIONAL DE PESQUISA CIDADE E ALTERIDADE
Convivência Multicultural e Justiça Urbana
Coordenação Geral
Profa. Dra. Miracy Barbosa de Sousa Gustin
Prof. Dr. Boaventura de Sousa Santos
Pesquisadores - Equipe brasileira
Aderval Costa Filho
Gabriela de Freitas Figueiredo Rocha
Adriana Goulart de Sena Orsini
Gregório Assagra de Almeida
Aline Rose Barbosa Pereira
Iara Menezes Lima
Ana Beatriz Vianna Mendes
Juliano Napoleão Barros
Ana Carolina Rodrigues
Lívia Mara de Resende
Ana Paula Santos Diniz
Luana Xavier Pinto Coelho
Ananda Martins Carvalho
Márcia Helena Batista Corrêa da Costa
Boaventura de Sousa Santos
Mila Batista Leite Corrêa da Costa
Carla Beatriz Marques Rocha e Mucci Miracy Barbosa de Sousa Gustin
Carla Ribeiro Volpini Silva
Oyama Karyna Barbosa Andrade
Cintia Garabini Lages
Raíssa de Oliveira Murta
Eloy Pereira Lemos Junior
Raquel Portugal Nunes
Fernanda de Lazari Cardoso Mundim
Renata Mantovani de Lima
Flávia Vigatti Coelho de Almeida
Rennan Lanna Martins Mafra
Francys Gomes Freitas
Ricardo Alexandre Pereira de Oliveira
Estudantes
Ana Flávia Brugnara
Humberto Francisco Ferreira Campos
Morato Filpi
Ana Flávia Nogueira Silva
Isabella Goncalves Miranda
Ana Luiza Rocha de Melo Santos
João Pedro Lima de Guimarães Vargas
Bárbara de Moraes Rezende
Luísa de Cardoso Oliveira
3
Clenio de Sousa Resende
Marcela Müller
Creiciano Garcia Paiva
Marcos Tofani Baer Bahia
Daniel Geraldo Oliveira Santos
Maria Antonieta Gonçalves dos Santos
dilson Antonio do Nascimento
Patrícia Dias de Sousa
Evandro Alair Camargos Alves
Paula Oliveira Mascarenhas Cançado
Fábio André Diniz Merladet
Pedro de Aguiar Marques
Gislaine Gomes Rodrigues
Thais Lopes Santana Isaias
Grasielly de Oliveira Spínola
Juliana da Silva Rosa
Regiane Valentim Leite
4
SUMÁRIO
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ............................................................................
05
2 COMPOSIÇÃO METODOLÓGICA DA PESQUISA .........................................
13
3 A RELAÇÃO DAS COMUNIDADES RURAIS DE VIÇOSA COM AS POLÍTICAS
PÚBLICAS ............................................................................................................... 17
4 ASPECTOS JURÍDICOS SOBRE A MOBILIZAÇÃO, A ORGANIZAÇÃO SOCIAL
E A OCUPAÇÃO DO ESPAÇO DA CIDADE REFERENTES ÀS COMUNIDADES
RURAIS DE VIÇOSA ............................................................................................... 20
5
ASPECTOS
ORGANIZAÇÃO
SÓCIO-ANTROPOLÓGICOS
SOCIAL
E
A
SOBRE
OCUPAÇÃO
DO
A
MOBILIZAÇÃO,
ESPAÇO
DA
A
CIDADE
REFERENTES ÀS COMUNIDADES RURAIS DE VIÇOSA .................................... 27
5.1 DADOS PARCIAIS SOBRE A PARTICIPAÇÃO DOS REPRESENTANTES DAS
COMUNIDADES RURAIS NO CMDRS .................................................................. 29
5.2 RELATOS DE INSPIRAÇÃO SÓCIO- ETNOGRÁFICA COM DADOS PARCIAIS
SOBRE VISITAS NAS COMUNIDADES RURAIS ................................................... 36
5.3 REFLEXÕES ACERCA DAS PRODUÇÕES EM ANDAMENTO BASEADAS NOS
DADOS LEVANTADOS PELAS ENTREVISTAS...................................................... 55
5.4
DADOS
SOBRE
SEMINÁRIO
PARA
FORMAÇÃO
POLÍTICA
DE
CONSELHEIROS MUNICIPAIS DO CMDRS........................................................... 58
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................... 63
7 REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 65
8 ANEXOS ............................................................................................................... 69
5
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Este documento relata parcialmente as atividades desenvolvidas pelo projeto Cidade
e Alteridade: Convivência Multicultural e Justiça Urbana junto a comunidades rurais do
município de Viçosa/MG, no que se refere à mobilização, à organização social e à ocupação
do espaço da cidade, tendo em vista aspectos sócio-antropológicos e jurídicos.
De modo particular, as ações de pesquisa ora descritas organizam-se em torno do
subprojeto Democracia e Desenvolvimento em dinâmicas campo-cidade: meios de vida de
comunidades rurais junto à política pública de desenvolvimento rural sustentável de
Viçosa/MG, que integra o Núcleo Temático Mobilização e organização social, vinculando-se
à linha de pesquisa Regulação e efetivação de experiências de justiça urbana. O objetivo
geral tem buscado identificar como se constrói a relação dos moradores de comunidades
rurais de Viçosa/MG com a política pública de desenvolvimento rural sustentável
implementada no Município – seja em âmbitos formais de deliberação pública, seja em
âmbitos informais de convivência social, em dinâmicas campo-cidade. De modo específico,
tal objetivo tem se desmembrado em três grandes frentes:
• Analisar como se constituem as formas associativas e organizativas nos contextos das
comunidades rurais de Viçosa/MG, buscando ponderar em que medida meios de vida
que se constituem nesses espaços fazem coro a valores, a práticas e a estratégias
democráticas (sob um ponto de vista político) e/ou sustentáveis (sob um ponto de vista
do desenvolvimento rural);
• Investigar como se conforma a participação política de representantes das comunidades
rurais de Viçosa/MG na principal arena deliberativa formal de produção da política pública
de desenvolvimento rural sustentável do Município – o Conselho Municipal de
Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDRS). O objetivo é verificar como tais
representantes, a partir dos meios de vida de suas comunidades, compreendem e
operacionalizam sua participação no CMDRS;
• Problematizar como se conforma a convivência dos moradores dessas comunidades
rurais no Município – seja em espaços coletivos no meio rural, seja em espaços de
sociabilidade na cidade –, de modo a compreender em que medida tais sujeitos se veem
em
relação
às
dinâmicas
campo-cidade
estabelecidas
(percebem-se
como
marginalizados? Incluídos? Compreendem-se enquanto sujeitos de direito e do
desenvolvimento pretendido, ou como objetos de tutela?).
6
É em meio a esse cenário instigante e complexo que localizamos a justificativa desta
proposta a partir de três dimensões inter-relacionadas: (A) uma dimensão conceitual; (B)
uma dimensão empírico-analítica; e (C) uma dimensão de desenvolvimento regional.
(A) Dimensão conceitual: aproximações entre teoria democrática e desenvolvimento
rural sustentável
Como primeira dimensão de justificativa da pesquisa em Viçosa, destaca-se que o
escopo conceitual que tem sido mobilizado com estudos e com trabalhos bibliográficos
busca se valer de justaposições epistêmicas acerca de duas tradições teóricas, nem sempre
congruentes (IPEA, 2011): a teoria democrática e a teoria do desenvolvimento. Sendo assim
e adotando explicitamente uma vertente deliberativa, participativa e discursiva (HENDRIKS,
2006; BOHMAN, 2000; DRYZEK, 2004; AVRITZER, 2000; COELHO E NOBRE, 2004;
MAIA, 2008) – no caso da teoria democrática –, bem como uma vertente cultural, local e
territorial (DIAS, 2011; ABRAMOVAY, 2000; SEN, 2000; LEFF, 2001; SINGER, 2004;
FAVARETO, 2007) – no caso da teoria do desenvolvimento, temos nos esforçado por
desvendar nuances e aproximações entre as duas tradições, no intuito de buscar um
conjunto explicativo capaz de lançar problemas, de revelar aspectos e de instituir
possibilidades investigativas junto à política pública de desenvolvimento rural sustentável de
Viçosa/MG.
Muitos estudos se debruçam a investigar aspectos políticos da participação em
desenhos institucionalizados (TATABIGA, 2002; DAGNINO, 2002; CUNHA, 2004; 2008;
CUNHA, 2007; SANTOS, 2008, FUNG, 2004; 2004b); outras pesquisas caminham no
sentido de problematizar efeitos e características de modelos e de paradigmas do
desenvolvimento (FAVARETO, 2007; SINGER, 2004; BECKER, 2004; SIEDENBERG, 2003,
2004). Em tais trabalhos, não há dúvidas de que o desenvolvimento torna-se uma temática e
um objeto de extrema relevância nos processos democráticos contemporâneos, bem como
as questões ligadas ao desenvolvimento carregam aspectos políticos – evidenciando que
modelos
democráticos
são
fontes
de
inspiração
a
processos
participativos
de
desenvolvimento. Entretanto, no contexto de nossa proposta, estamos diante de uma
realidade que nos solicita um olhar rigoroso para ambas as tradições, propondo não
somente uma simples
explicitação de possíveis
interseções
entre ambas, mas
problematizando aspectos teóricos constitutivos que sirvam à compreensão dos fenômenos
participativos e sustentáveis de comunidades rurais, junto à política pública de
desenvolvimento rural sustentável de Viçosa/MG. A própria participação engendrada por tais
comunidades – seja no espaço do CMDRS, seja em outros âmbitos informais de
convivência social – nos convida a pensar: como problematizar os processos de
7
participação desses sujeitos sem apartá-los de suas formas produtivas e de seus meios de
vida (PERONDI, 2007; HEBINK e LENT, 2007)? Como dar conta de que a participação
política é um processo que também pode ser explicado quando são problematizadas as
formas produtivas e as estratégias de sobrevivência instituídas por tais sujeitos (SCOONES,
1998)?
Junto a esse campo de questões, um movimento conceitual decorrente também se
mostra relevante: em que medida é possível levantar peculiaridades da teoria democrática
em contextos cunhados por uma inter-relação inseparável entre campo e cidade? Como
levantar problemas e buscar explicações diante de desenhos participativos e democráticos,
instituídos em universos notadamente marcados por uma dinâmica entre rural e urbano? A
necessidade de se produzir estudos sobre democracia que problematizem conceitualmente
o rural – tomando-o como muito além de um simples tema e/ou objeto investigativo – tornase um inevitável imperativo, em nossa proposta de pesquisa: como compreender a
implementação de políticas democráticas no meio rural, para além de uma visão
etnocêntrica e desenvolvimentista (DIAS, 2011; GOLDSMITH, 2009), esta que toma o rural
como a esfera do atraso e da distância simbólico-geográfica de qualquer linguagem
moderna, instituída pelo Estado e pelo mercado? Como problematizar a democracia em
meio a um emaranhado complexo de relações rururbanas (CAMPANHOLA e GRAZIANO,
2000), em cenários marcados por modificações profundas no universo rural brasileiro –
urbanização do campo, diversificação econômica, migração, dentre outras (VEIGA, 2005a,
2005b; SPOSITO, 2010; WANDERLEY, 2009; SABOURIN, 2009)?
Com relação a isso, um registro de extrema importância também merece ser
explicitado. Ao propor um conceito que leve em conta problemas da teoria democrática, da
teoria do desenvolvimento e da compreensão contemporânea do rural, desejamos ir além do
desvendamento de uma realidade rural brasileira múltipla, conflituosa e desigual,
notadamente marcada pela presença de movimentos sociais e pela história de luta das
organizações civis em torno das questões agrárias (SCHERER-WARREN, 1999; 2007;
SAUER, 2010). Sem desconsiderar a importância e a contribuição desses estudos para a
compreensão da realidade política que constitui o rural contemporâneo, o caminho que
escolhemos lança luz sobre outro conjunto de questões – particularmente aquele que
problematiza as peculiaridades de desenhos institucionais participativos entre Estado e
Sociedade Civil (CUNHA, 2004; 2008; FARIA, 2006; CUNHA, 2007), quando dispostos em
meio a contextos ruralizados. Esse movimento ganha relevância na medida em que pensar
a democracia e o desenvolvimento a partir da dinâmica campo-cidade é um gesto solicitado
pela realidade que escolhemos para investigação: as relações entre comunidades rurais e a
8
política pública de desenvolvimento rural sustentável de Viçosa/MG, em seus aspectos
formais e informais.
(B) Dimensão empírico-analítica: por uma sociologia das ausências e por uma
abordagem dos meios de vida
Outro aspecto que justifica a realização desta proposta refere-se a instigantes
particularidades do universo empírico-analítico eleito para a pesquisa. Nesse sentido, é
válido destacar que dos 28 (vinte e oito) representantes que tomam assento no CMDRS, 14
(catorze) correspondem a conselheiros que representam comunidades rurais. E a natureza
de tais comunidades é múltipla e diversa: há comunidades mais próximas geograficamente
da cidade de Viçosa, cujos moradores, em grande parte, trabalham na cidade; há
comunidades mais afastadas, com pouquíssimo contato diário e cotidiano com o ambiente
citadino e com formas de trabalho essencialmente ligadas ao cultivo da terra e/ou à criação
de animais. Sendo assim, pensar em particularidades da participação política e das formas
produtivas dessas comunidades é também buscar características explicativas existentes
naqueles contextos, de modo a fazê-los presentes em nossas análises. Como compreender
os processos participativos e organizativos de tais comunidades junto à política pública, sem
cair em comparações evolucionistas com processos participativos engendrados em
realidades tipicamente urbanas (o que não seria justo e muito menos desejável), como
também sem mirarmos na premissa de que há um suposto atraso ou um distanciamento
democrático e organizativo em tais comunidades (GAMSON, 2011), no que se refere a uma
compreensão e a uma lida cotidiana com a linguagem e com os protocolos modernos da
política formal contemporânea, do Estado e do direito?
Duas abordagens conceituais e analíticas têm se mostrado extremamente profícuas
para que não caiamos em falácias epistêmicas dessa natureza: a abordagem da sociologia
das ausências (SANTOS, 2007) e a abordagem dos meios de vida (PERONDI, 2007;
HEBINK e LENT, 2007; CHAMBERS e CONWAY, 1992; SCOONES, 1998). A primeira
delas nos ajuda a problematizar a democracia e o desenvolvimento no contexto dessas
comunidades rurais abandonando uma espécie de lógica de classificação social – “de
acordo com esta lógica, a não-existência é produzida sob a forma de inferioridade
insuperável (...). Quem é inferior, porque é insuperavelmente inferior, não pode ser uma
alternativa credível a quem é superior” (SANTOS 2007, p. 13) –, bem como um tipo de
lógica dominante – “nos termos dessa lógica, a escala adotada como primordial determina a
irrelevância de todas as outras possíveis escalas” (SANTOS, 2007, p. 14). A abordagem da
sociologia das ausências nos ajuda, portanto, a questionar dicotomias clássicas, produzidas
pelo que Santos (2007) chama de “razão metonímica”, que sempre geraram pólos opostos
9
em desigualdade e em comparação linear-evolucionista. Nesse sentido, uma sociologia das
ausências busca se valer de um gesto epistemológico que tenta tornar presentes as
ausências de uma relação desigual, na contra-mão de atributos e de métodos cunhados por
uma racionalidade ocidental, moderna e desenvolvimentista:
O objetivo da sociologia das ausências é transformar objetos impossíveis
em possíveis e com base neles transformar as ausências em presenças.
Fá-lo centrando-se nos fragmentos da experiência social não socializados
pela totalidade metonímica. O que é que existe no Sul que escapa à
dicotomia Norte/Sul? O que é que existe na medicina tradicional que escapa
à dicotomia medicina moderna/medicina tradicional? O que é que existe na
mulher que é independente da sua relação com o homem? E possível ver o
que é subalterno sem olhar à relação de subalternidade? (SANTOS, 2007,
p.12)
A proposta de Santos (2007) nos instiga a pensar a democracia e o
desenvolvimento nos contextos dessas comunidades rurais de Viçosa de modo a abandonar
a opressora dicotomia entre rural e urbano, para que as ausências desse rural se precipitem
sobre o campo problemático de nossa pesquisa. É necessário esclarecer que a sociologia
das ausências não nos convida simplesmente a deixar de lado as dinâmicas campo-cidade
e as inter-relações existentes entre contextos rurais e urbanos. Esse modo de tomar o
universo empírico nos ajuda a abandonar uma díade historicamente desigual, instituída pela
modernidade, que problematiza o rural sempre em comparação subalterna – nunca numa
relação de complementaridade ou de interdependência – com o urbano. Permanecer nessa
comparação é um gesto que poderia nos impedir de capturar aspectos obscurecidos e
reveladores de um rural contemporâneo, quando tomado por uma política pública
participativa, democrática e voltada ao desenvolvimento sustentável.
É nesse sentido que também buscamos uma forma de analisar os contextos das
comunidades rurais de Viçosa tendo em vista uma abordagem que não acolhesse aspectos
participativos em detrimento de aspectos ligados às formas produtivas (ou vice-versa). Dito
por outras palavras, imbuídos da necessidade de problematizar o universo empírico a partir
da democracia e do desenvolvimento, buscamos aceitar uma realidade política de
participação que se constitui também por dimensões econômicas, produtivas, simbólicas e
valorativas – no que se refere tanto à arena formal de participação (o CMDRS) quanto a
inúmeros espaços informais nos quais se institui a convivência social dos sujeitos. Sendo
assim, a abordagem dos meios de vida (PERONDI, 2007; HEBINK e LENT, 2007;
CHAMBERS e CONWAY, 1992; SCOONES, 1998) se mostrou robusta e suficientemente
adequada ao objeto investigativo aqui proposto: a compreensão de um cenário de
participação política em que as formas de se viver, de se produzir e de conviver socialmente
não aparecem dissociadas.
10
Que meios individuais ou coletivos são empregados pelos sujeitos para lidar com
suas próprias sobrevivências em tais contextos rurais (HEBINK e LENT, 2007; PERONDI,
2007)? Que estratégias utilizam para produzir economicamente e para viver em sociedade?
Que meios os moradores dessas comunidades aproveitam para resolver seus problemas e
para continuar o decurso de suas vidas? Como se organizam coletivamente diante das
questões políticas e produtivas? Optam por estratégias familiares, pessoalizadas, grupais,
comunitárias? Que argumentos, quais valores e quais circunstâncias servem de ancoragem
para que os sujeitos estabeleçam as escolhas que guiam suas vidas? Os meios de vida
relacionados à diversificação das atividades no campo tendem a individualizar a renda e as
decisões instituídas por um grupo (SCHINEIDER et all., 2009)? Colaboram para fortalecer
aspectos participativos? Os meios de vida empregados pelos sujeitos dão conta de produzir
um desenvolvimento que seja sustentável, em seus aspectos ambientais, sociais e
econômicos
(SACHS,
1993)?
Quais
processos
institucionais
e
que
estruturas
organizacionais (SCOONES, 1998) constituem os meios de vida desses sujeitos, e em que
medida tais elementos instituem práticas participativas e democráticas? A partir dos meios
de vida empregados, como os moradores das comunidades rurais se vêem em relação às
dinâmicas
campo-cidade
estabelecidas:
percebem-se
como
marginalizados?
Compreendem-se enquanto sujeitos de direito ou como objetos de tutela do Estado?
Esses questionamentos – e inúmeros outros – os quais a abordagem dos meios de
vida levanta tem nos permitido operacionalizar os conjuntos de questões propostas tanto
pela teoria democrática quanto pela teoria do desenvolvimento. É por tudo isso que tal
abordagem se mostra extremamente profícua para o universo empírico-analítico que
aceitamos para a pesquisa da política pública de desenvolvimento rural sustentável de
Viçosa: ela possibilita que tomemos as dimensões democrático-participativas em total
correlação com as dimensões produtivas, com os valores e com as práticas culturalmente
estabelecidas, nos contextos das comunidades rurais, e em suas dinâmicas campo-cidade.
(C) Dimensão de desenvolvimento regional: UFV, Viçosa e ampliação de oportunidades
de diálogo.
Nas palavras de Santos (1989), uma ciência que deseja provocar rupturas com um
modo-de-fazer distante e arrogante deve ser sensível aos contextos nos quais se insere, e
buscar a elaboração de um conhecimento que não se imponha como a verdade sobre o
senso comum, mas que se coloque em tensionamento como uma verdade – pondo em
evidência novas leituras e diferentes aspectos de um cenário social livremente interpretado
e vivido por variados sujeitos e instituições. Ao levantar tais ponderações, Santos (1989)
critica duramente o paradigma clássico da ciência moderna, que se propõe a encontrar
11
verdades absolutas, a partir de uma separação total entre sujeito-pesquisador e objetopesquisado, e que toma o método como um recurso privilegiado de busca da verdade.
Grande parte da proposição conceitual do autor vislumbra uma modificação no lugar dessa
ciência clássica na contemporaneidade (SANTOS, 2003), a partir da noção de uma ciência
pós-moderna – que se utiliza do rigor e do método não como mecanismos privilegiados de
busca de verdades, mas como instância produtora de conhecimento, em diálogo com o
senso comum. O autor ilustra essa concepção em frase conhecida, que intitula um de seus
livros: Conhecimento prudente para uma vida decente (SANTOS, 2006).
É nesse olhar teórico de Santos (2006) que nos inspiramos para pensar a dimensão
de desenvolvimento regional que justificaria a proposta desta pesquisa. Nesse sentido, duas
questões se mostraram proeminentes: o lugar do conhecimento produzido e o compromisso
da universidade com os contextos circunvizinhos que a acolhem. Em relação à primeira
questão, compartilhamos inteiramente da premissa de que o saber produzido pela ciência
deve se valer de uma disposição de diálogo com o saber produzido pelas realidades de
investigação ora propostas. Tal premissa nos faz compreender, desde já, que a nossa
relação com as comunidades rurais que participam da política pública de desenvolvimento
rural sustentável de Viçosa/MG se constitui por uma dupla investida de sujeitos sociais: nós,
pesquisadores, somos sujeitos que se dirigem a dialogar com outros sujeitos investigados
pelo conjunto de métodos e de regras do conhecimento científico. Tal constatação não
diminui nossa responsabilidade diante do rigor de um método, muito menos destitui nossa
identidade de pesquisadores.
A principal contribuição que ela faz surgir é a de que o conhecimento que
produzirmos deve se dirigir, antes de tudo, aos sujeitos que forem investigados, de modo a
lhes oferecer uma visão da realidade em que se inserem, cunhada pelo fazer acadêmico. Na
mesma direção, nós, sujeitos sociais da academia, devemos nos predispor ao diálogo e ao
aprendizado com outras formas de conhecimento e com outros saberes, produzidos pelos
sujeitos das comunidades rurais pesquisadas, no sentido de gerar o que Santos (2007, p.
16) chama de ecologia de saberes:
(...) a lógica da monocultura do saber e do rigor científicos tem de ser
questionada pela identificação de outros saberes e de outros critérios de
rigor que operam credivelmente em contextos e práticas sociais declarados
não-existentes pela razão metonímica. Essa credibilidade contextual deve
ser considerada suficiente para que o saber em causa tenha legitimidade
para participar de debates epistemológicos com outros saberes,
nomeadamente com o saber científico. A ideia central da sociologia das
ausências neste domínio é que não há ignorância em geral nem saber em
geral. Toda a ignorância é ignorante de um certo saber e todo o saber é a
superação de uma ignorância particular.
12
Esse lugar dialógico do conhecimento, inspirador dos conceitos, dos métodos e dos
resultados desta proposta de pesquisa, se dirige, também, a sugerir o compromisso da
universidade com os contextos circunvizinhos que a acolhem. Nesse sentido, essa pesquisa
se justifica na medida em que toma como realidade investigativa o cenário de uma política
de desenvolvimento rural sustentável que afeta, sobremaneira, os contextos em que se
insere a Universidade Federal de Viçosa (UFV). Com relação a isso, uma particularidade
merece ser destacada: a UFV tem assento formal no CMDRS, a partir de um docente que
lhe representa nas deliberações. Em que medida tal universidade pode colaborar no sentido
de compreender aspectos ligados a tal política, na região de Viçosa? Como pode contribuir
a esclarecer um cenário democrático, em que as questões ligadas ao desenvolvimento rural
sustentável mostram-se como a garantia mínima para que comunidades rurais, constituídas
por cenários de pobreza e de exclusão, ampliem suas capacidades, suas oportunidades
(SEN, 2008) e seus meios de vida?
Sendo assim, investigar a política pública de desenvolvimento rural sustentável de
Viçosa tem nos ajudado a lançar luz sobre uma série de aspectos, o que contribuiu junto a
uma proposta mais ampla de desenvolvimento regional, da qual a UFV também poderá
fazer parte. Desse modo, partilhando de um paradigma científico que propõe a ciência como
um saber (e não como o saber) (SANTOS, 1989; 1995), temos a certeza de que nosso lugar
também é o de interpretar, de provocar estranhamentos, produzindo uma leitura da
experiência a partir de determinados caminhos de pesquisa. Tais caminhos, embora
rigorosos, não buscam se legitimar por tentativas de esconder nossa subjetividade e nossa
interpretação – mesmo porque, constitui-se uma ilusão a conformação de um campo
científico neutro, isento de escolhas e de afecções, que carrega compreensões
supostamente mais totalizantes e precisas acerca dos fenômenos. Motivados pela proposta
de um fazer científico pós-moderno (SANTOS, 1989; 1995), reconhecemos o potencial de
leitura de nossa pesquisa, mas também sabemos que nosso principal movimento será o de
provocar diálogos com outros saberes da sociedade, trazendo contribuições que não se
impõem como verdades únicas. Aqui, não nos referimos apenas a um saber que seja
pertinente a um determinado campo de produção científica, mas, acima de tudo, à
relevância social de pesquisas passíveis de serem realizadas no ambiente de uma
universidade pública. Por meio de estudos e de trabalhos científicos, a equipe da UFV,
nesta pesquisa, poderá problematizar o contexto social no qual se inscreve e dialogar com
as práticas vivenciadas fora de seus domínios, reafirmando seu compromisso público e ético
com a sociedade que a mantém e a torna possível.
13
2 QUADRO METODOLÓGICO DA PESQUISA
As ações de pesquisa aqui propostas têm se estruturado em dois âmbitos
metodológicos, cada um deles constituído por eixos estruturadores, de forte inspiração
qualitativa:
• Âmbito metodológico 1: Composição e constituição da pesquisa
Esse primeiro âmbito metodológico constitui-se por esforços de aprofundamento
conceitual e de delimitação empírica para o campo de pesquisa, que se constitui por dois
eixos estruturadores:
a) Eixo estruturador 1: Pesquisa bibliográfica e documental
A partir desse eixo, tem-se: (1) dado continuidade ao estudo e à pesquisa dos
aportes bibliográficos já indicados (dinâmicas campo-cidade, convivência multicultural e
justiça urbana, alteridade, teoria democrática, desenhos participativos e deliberativos,
sociologia do desenvolvimento, meios de vida, políticas públicas); (2) realizado uma ampla
pesquisa documental que tem elucidado os dados socioeconômicos acerca das
comunidades rurais de Viçosa, bem como sobre aspectos jurídicos relativos à mobilização, à
organização social e à ocupação do espaço da cidade pelos moradores das comunidades
rurais – tanto nas atas das reuniões do CMDRS como em outras fontes documentais. Além
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a Prefeitura Municipal de Viçosa e a
Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (EMATER)
têm se mostrado como fontes profícuas.
Procedimentos: (i) análise documental para busca de dados secundários e (ii) análise
bibliográfica.
b) Eixo estruturador 2: Pesquisa exploratória com as comunidades rurais e com o CMDRS
A partir desse eixo, já foi realizada uma pesquisa exploratória com: (1) O CMDRS –
a partir de uma observação e de um acompanhamento das reuniões mensais do Conselho,
com base na realização de intervenções e de dinâmicas junto aos Conselheiros; e (2) as 14
(catorze) comunidades rurais de Viçosa que têm assento no CMDRS, com vistas ao
reconhecimento geral do universo empírico a ser pesquisado, de modo a buscar condições
para realização de aprofundamentos de coleta em momento posterior. A pesquisa levantou
peculiaridades que nos inspirou a escolher quatro comunidades para serem pesquisadas em
profundidade. Como critério, estabelecemos a distância territorial das comunidades em
14
relação à cidade, de modo que foram escolhidas duas comunidades mais próximas e duas
comunidades mais distantes do centro urbano de Viçosa. Entendemos que a hipótese da
distância entre campo e cidade poderia revelar aspectos relevantes tanto com relação aos
meios de vida dos moradores quanto com relação a características de seus envolvimentos
políticos e organizativos. Além disso, foi realizado, no dia 07 de novembro de 2012, o
Seminário para Formação Política de Conselheiros Municipais do CMDRS de Viçosa, que
gerou discussões com os conselheiros num espaço específico, quebrando a formalidade
das reuniões mensais e produzindo diálogos acerca da representação política, da
participação e de aspectos formais ligados aos direitos e deveres dos conselheiros.
Procedimentos: (i) observação participante nas reuniões do CMDRS; (ii) realização de
dinâmicas junto aos conselheiros, no próprio âmbito formal da reunião; (iv) observação
participante com inspiração sócio-etnográfica nas visitas às comunidades; (ii) realização de
entrevistas qualitativas,
mediante roteiro semi-estruturado de pesquisa,
junto às
comunidades.
• Âmbito metodológico 2: Processos participativos e meios de vida
Nesse segundo âmbito metodológico (em andamento), as equipes têm se esforçado
por realizar uma imersão no recorte empírico proposto, com vistas à organização e à
classificação dos principais resultados esperados, de acordo com os objetivos elencados no
projeto: a investigação dos processos participativos e dos meios de vida de comunidades
rurais junto à política pública de desenvolvimento rural de Viçosa. Esse âmbito se constitui
por dois eixos estruturadores:
a) Eixo estruturador 1: A produção da política pública no espaço do CMDRS
Esse eixo tem por objetivo identificar aspectos ligados à produção da política pública
de desenvolvimento rural sustentável de Viçosa na arena deliberativa formal do CMDRS. A
partir de uma criteriosa observação participante, de inspiração etnográfica, pretendemos
levantar: (a) quais representantes protagonizam posicionamentos? Quais são as regras para
o diálogo deliberativo formal? Como os sujeitos lançam mão de seus meios de vida junto à
justificação de proferimentos lançados em público? Como são definidas as pautas das
reuniões? Como ocorre o encaminhamento das decisões? Qual o coeficiente controverso
das discussões no espaço do CMDRS (os representantes discordam uns dos outros, e
constroem seus argumentos com base em quais critérios)?
Procedimentos: (i) observação participante em tais espaços, mediante roteiro de pesquisa
fundamentado em método etnográfico; nesse sentido, a pesquisa atentará não somente às
15
falas e aos discursos, mas aos comportamentos, às reações e aos arranjos organizativos
dos sujeitos no espaço do CMDRS.
b) Eixo estruturador 2: Detalhamento dos meios de vida de quatro comunidades rurais de
Viçosa
Esse eixo tem por objetivo identificar os meios de vida de quatro comunidades rurais de
Viçosa, com o intuito de tentar captar as dinâmicas campo-cidade estabelecidas em torno da
política pública de desenvolvimento rural do Município. As questões a seguir motivaram a
produção dos procedimentos da pesquisa: (1) que meios os sujeitos, individual e/ou
coletivamente, empregam para sobreviver? (2) Que estratégias utilizam para produzir
economicamente e para viver em sociedade? (3) Que meios os moradores dessas
comunidades aproveitam para resolver seus problemas e para continuar suas vidas? (4)
Como se organizam coletivamente diante das questões políticas e produtivas? (5) Como os
moradores das comunidades rurais se vêem em relação às dinâmicas campo-cidade
estabelecidas: percebem-se como marginalizados? (6) Compreendem-se enquanto sujeitos
de direito ou como objetos de tutela do Estado?
Procedimentos: (i) entrevistas semi-estruturadas com representantes do CMDRS e com
outros sujeitos das quatro comunidades rurais escolhidas, mediante roteiros semiestruturados de pesquisa; e (ii) realização de grupos focais nas comunidades. Quanto a este
último procedimento, vale considerar que grupos focais se constituem enquanto um
instrumento adotado para fomentar a produção coletiva de sentidos, sendo que o fato de os
próprios participantes poderem colocar-se questões pode gerar algumas surpresas
(Marques & Rocha, 2006). Grupos focais contam, em geral, com um número de
participantes que varia entre seis e dez, configurando-se como “entrevistas em grupo
realizadas para descobrir como as pessoas sentem em relação a algum produto, serviço ou
assunto” (Berger, 1998, p. 89). Sugere-se a realização de um ou dois grupos focais por
comunidade escolhida, estruturados em torno de discursos-problemas apontados nas
entrevistas semi-estruturadas. Os participantes desses grupos poderão ser pessoas
previamente entrevistadas ou pessoas ainda não ouvidas; (iii) realização de levantamento
socioeconômico: busca de dados primários acerca de aspectos sociais, econômicos e
políticos de todo o universo das quatro comunidades escolhidas; tais dados serão
levantados a partir de critérios objetivos, tais como: renda, transporte, acesso às políticas
públicas (como saúde, educação, segurança, lazer), convivência na cidade, etc.
No atual momento, já foram produzidos e têm sido aplicados os seguintes
instrumentos metodológicos:
16
• Roteiro semi-estruturado para realização de entrevistas com representantes das 14
(catorze) comunidades rurais de Viçosa/MG (Anexo 1);
•
Formulário para observação participante das reuniões do CMDRS (Anexo 2);
• Atas das reuniões do CMDRS – está sendo feito um levantamento dos registros formais
da reunião do CMDRS, com vistas à investigação dos principais proferimentos dos
conselheiros, bem como de seus posicionamentos publicamente assumidos e
registrados, durante a reunião.
A equipe, além disso, passou por uma capacitação sobre etnografia, juntamente
com todos os pesquisadores do Cidade e Alteridade. Tal iniciativa voltou-se a sensibilizar o
olhar de pesquisa sobre as diversas realidades investigativas postas sob horizonte empírico
delimitado, e, particularmente, inspirou a equipe de Viçosa na produção de relatos de
campo, pautados fortemente por uma concepção sócio-etnográfica. Como a pesquisa
encontra-se em andamento, ressalta-se que, nas considerações finais deste relatório, os
outros instrumentos, que estão em processo de estruturação, serão identificados.
17
3 A RELAÇÃO DAS COMUNIDADES RURAIS DE VIÇOSA COM AS POLÍTICAS
PÚBLICAS
A população rural de Viçosa, estimada pelo IBGE (2010), constitui-se de 4915
habitantes, em meio a uma população total de 72.220. De modo geral, seguindo as
tendências implementadas pelo Governo Fernando Henrique Cardoso, sobretudo a partir de
1996 (CAMPANHOLA E GRAZIANO, 2000), a relação do Estado com a população do meio
rural brasileiro tem sido conformada mediante políticas públicas notadamente centradas em
torno da noção de agricultura familiar. Tal noção, que surgiu em meio aos embates políticos
e econômicos da população rural do Rio Grande do Sul, desde o início dos anos 90
(NAVARRO E PEDROSO, 2011), foi absorvida como linha de ação pelo Estado Brasileiro
para a inspiração dos processos que estruturaram políticas públicas para o campo,
estendendo-se por todo o território nacional. Em linhas gerais, a noção de agricultura
familiar – definida, inclusive, por critérios objetivos, tais como: módulo fiscal, natureza da
mão de obra, renda, etc...
– aposta na ideia de que a organização de membros
consangüíneos, ligados a núcleos familiares semelhantes, apresenta-se como forma efetiva
para a inclusão econômica, política e social, junto a esforços de desenvolvimento rural.
Além disso, incentiva-se a organização entre as famílias, de modo que o associativismo no
campo tem se tornado um dos principais estímulos governamentais dos últimos anos, como
critério para implementação de políticas públicas para o meio rural.
A relação da população rural de Viçosa com as políticas públicas no âmbito do
Município tem se constituído, também, em conformidade com tal cenário. Além da
Secretaria Municipal de Agricultura, que destina parte do orçamento municipal para a
realização de uma série de ações voltadas ao estímulo para o desenvolvimento rural, a
principal instituição em Viçosa que tem gerenciado as políticas públicas dirigidas ao campo
é a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais
(EMATER). Os principais programas públicos do Estado (como PRONAF – Programa
Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (política federal); Programa Luz para
Todos (política estadual); Minas Sem Fome (política estadual), Certifica Minas Café (política
estadual); , Programa de Alimentação Escolar-PAE (política federal), Programa de Aquisição
de Alimentos – PAA (política eu todosfederal), Mecanização Agrícola (política federal),
Produção de Mudas de Café (política federal), Compra Conjunta de Calcário e Adubo
(política federal)) têm sido conduzidos localmente pela EMATER, instituição que também
18
tem cumprido suas atribuições rotineiras ligadas a ações de assistência técnica e de
extensão rural.
Como principal protagonista local do desenvolvimento rural em Viçosa, a EMATER
propôs uma organização da população rural da região em 14 comunidades rurais,
subdivididas a partir de microbacias que compõem o Município. São elas: Cristais, Paula,
Silêncio, Córrego do Engenho, Pau de Cedro, Córrego Fundo, Piúna, Córrego São João,
Paiol, São Francisco, Nobres, Cascalho, Santa Tereza e Macena. Não existem dados que
especifiquem informações sobre a população rural de tais comunidades (informações tais
como: renda, número total de habitantes por comunidade, educação, saúde, número de
domicílios, etc...) – uma das razões que motiva, inclusive, a realização desse projeto de
pesquisa. Mas, em linhas gerais, a partir de estimativas realizadas pela EMATER, é possível
consolidar parcialmente alguns números que dizem respeito à distância física de algumas
comunidades rurais do centro urbano viçosense, conforme o Quadro 1:
Comunidade
Distância
Cristais
3 Km
Paula
7 Km
Silêncio
6 Km
Córrego do Engenho
5 Km
Pau de Cedro
18 Km
Córrego Fundo
16 Km
Piúna e Setores
12 Km
Córrego São João (Estiva e Setores)
8 Km
Paiol
17 Km
São Francisco
11 Km
Nobres
12 Km
Cascalho
9 km
Santa Tereza
8 km
Macena
7 km
Quadro 1: Distância aproximada das comunidades rurais do centro urbano de Viçosa
Fonte: EMATER, 2012.
Das 14 (quatorze) comunidades, 8 (oito) delas possuem distâncias de até 9 (nove)
quilômetros do centro urbano, enquanto 6 (seis) possuem distâncias a partir de 11 (onze)
quilômetros. Certamente, tal dado tem nos instigado a pensar no complexo conjunto de
elementos que permeiam as relações de tais moradores com a cidade: em que medida a
19
distância geográfica pode ser correlacionada com aspectos ligados: à renda e à economia
familiar? Às formas produtivas e ao tipo de atividade empreendida (agrícola e/ou outras)?
Aos vínculos de sociabilidade com a cidade? Às manifestações culturais constituídas em
cada comunidade? À capacidade de mobilização e de organização social frente ao
descumprimento de políticas públicas previstas em lei (tais como saúde, educação,
transportes, segurança, etc...)? Enfim, tais questões têm feito parte do universo investigativo
previsto nos instrumentos metodológicos para coleta de dados.
Sendo assim, é relevante destacar que, de um ponto de vista institucionalizado, a
principal relação da população rural de Viçosa com as políticas públicas geridas no
Município tem se dado, sobretudo, por meio do conjunto de ações vinculadas ao que,
genericamente, denomina-se Política Pública de Desenvolvimento Rural Sustentável. Como
será detalhado adiante, a origem de tal nomenclatura localiza-se em meio à consolidação do
Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), em 1996, quando,
ao mesmo, imputou-se a finalidade de promover o desenvolvimento sustentável no meio
rural brasileiro. Quanto a isso, é válido ressaltar que a EMATER, juntamente com outras
instituições locais, tem apostado num caráter intersetorial para a condução de tal política.
Isto se dá com base no entendimento de que é possível produzir um tipo de
desenvolvimento para o campo pautado no diálogo público com outros setores da
administração municipal (tais como os setores da educação, da saúde, dos transportes e
das obras, etc.), bem como com os próprios concernidos de tal política – os moradores das
comunidades rurais. Com isso, as ações de mobilização social, organização e ocupação do
espaço da cidade vinculadas a tais comunidades, têm, por sua vez, se aglutinado também
em torno das lógicas de operacionalização de tal política, notadamente marcadas por
esforços formalizados para interlocução pública entre sujeitos e instituições, bem como por
estímulos voltados a um desenvolvimento rural pautado por ações coletivas.
A partir do descortinamento inicial de tal cenário, os dados parciais desse relatório
subdividem-se em dois principais eixos de sentido: um, que descreve aspectos jurídicos e
outro, que descreve aspectos sócio-antropológicos sobre a mobilização, a organização
social e a ocupação do espaço da cidade referentes às comunidades rurais de Viçosa. Cabe
lembrar que, ao final do documento, serão descritos os próximos passos da pesquisa, bem
como o horizonte de coleta de dados que será produzido durante todo o ano de 2013.
20
4 ASPECTOS JURÍDICOS SOBRE A MOBILIZAÇÃO, A ORGANIZAÇÃO SOCIAL
E A OCUPAÇÃO DO ESPAÇO DA CIDADE REFERENTES ÀS COMUNIDADES
RURAIS DE VIÇOSA
Nesta seção, pretende-se descrever, parcialmente, alguns dos principais aspectos
jurídicos implicados junto aos processos de mobilização, de organização social e de
ocupação do espaço da cidade, empreendidos por moradores de comunidades rurais de
Viçosa, junto à política pública de desenvolvimento rural sustentável implementada no
Município. De modo mais específico, tais aspectos se instituem por princípios participativos,
operacionalizados junto a uma peculiar arena deliberativa formal: o Conselho Municipal de
Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDRS), que se constitui como um órgão gestor de
caráter consultivo e deliberativo, vinculado ao poder público municipal. Dessa forma, o
CMDRS foi criado em 2004 – e reformulado em 2010 e em 2011 – para se constituir
enquanto espaço de gestão do desenvolvimento rural sustentável de Viçosa, assegurando
tanto a participação de órgãos municipais, estaduais e federais do poder público, de
representantes de entidades da sociedade civil organizada e de organizações paragovernamentais afins à temática, quanto particularmente de comunidades rurais e de
entidades representativas dos agricultores familiares e de trabalhadores assalariados rurais.
Tomando como base a legislação que regulamenta o CMDRS (Lei nº 1.591/04, Lei nº
2.081/2010 e Lei 2.137/2011), é possível identificar três principais âmbitos de atuação do
Conselho: (1) fomento à participação e à discussão da política pública de desenvolvimento
rural sustentável do município: nesse âmbito, pode-se citar como exemplos a elaboração do
Plano Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável e a identificação e a quantificação
das necessidades de crédito rural e de assistência técnica para os agricultores familiares;
(2) estímulo à articulação intersetorial e à organização da sociedade civil: como exemplos,
encontram-se o apoio e o fortalecimento de associações comunitárias rurais e a articulação
entre municípios vizinhos e entre setores distintos no enfrentamento dos mais variados
problemas relacionados ao desenvolvimento rural sustentável; e (3) incentivo à
representação e à manifestação da cultura local: nesse âmbito, pode-se citar o estímulo à
diversidade cultural na região e a busca pela representação de diferentes atores sociais no
Plenário do Conselho (tais como jovens, indígenas e descendentes de quilombos). Com tais
âmbitos, fica explícita a proposta do CMDRS de produzir as políticas públicas de
desenvolvimento rural em Viçosa tanto de modo sustentável – fazendo coro às discussões
contemporâneas que aproximam as políticas de desenvolvimento à temática da
sustentabilidade (CHAMBERS e CONWAY, 1992; HEBINK e LENT, 2007; SCOONES,
21
1998) – quanto de modo dialogado e participativo – produzindo-se enquanto prática
institucional pautada por recentes experiências democráticas, que apostam na participação
dos cidadãos como caminho relevante para produção de políticas públicas mais justas e
legítimas (HABERMAS, 1997, 2006; MANSBRIDGE, 1999; DRYZEK, 2004; BENHABIB,
1996; COELHO E NOBRE, 2004; MARQUES, 2009).
Em meio a uma série de especificidades, dois aspectos jurídicos são singulares junto
ao processo de implementação da política pública de desenvolvimento rural sustentável por
meio do CMDRS. O primeiro deles se refere a uma particularidade presente na iniciativa
para constituição de tal Conselho: a criação dos CMDRS’s refere-se a uma recomendação
prevista desde as primeiras experiências do Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar (PRONAF), este que, em Viçosa, materializa-se, sobretudo, pela gestão
da EMATER.
Quanto a isso, é válido ressaltar que o PRONAF foi criado pelo Decreto nº 1.946 de
28 de junho de 1996, com o objetivo de atender os trabalhadores rurais de menor poder
aquisitivo, oferecendo, aos mesmos, uma espécie de facilitação de acesso às políticas
agrícolas. Dessa maneira, é sua finalidade “promover o desenvolvimento sustentável do
segmento rural constituído pelos agricultores familiares, de modo a propiciar-lhes o aumento
da capacidade produtiva, a geração de empregos e a melhoria de renda” (BRASIL, Pronaf,
art. 1). No Art. 4º do Decreto nº 1.946, inciso I, encontram-se definidos os critérios para fazer
parte da estrutura do PRONAF, no âmbito municipal, mediante a adesão voluntária:
a) a Prefeitura Municipal, cabendo-lhe:
1. instituir, em seu âmbito, o Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural
- CMDR e o Plano Municipal de Desenvolvimento Rural - PMDR;
2. participar do CMDR e da execução, acompanhamento e fiscalização das
ações do PMDR;
3. celebrar acordos, convênios e contratos no âmbito do PRONAF;
4. aportar às contrapartidas de sua competência;
5. promover a divulgação e articular o apoio político-institucional ao
PRONAF;
b) o Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural - CMDR, o qual terá
como membros, representantes do poder público, dos agricultores familiares
e das entidades parceiras, inclusive das vinculadas à proteção do meio
ambiente, cabendo-lhe:
1. analisar a viabilidade técnica e financeira do PMDR e o seu grau de
representatividade das necessidades e prioridades dos agricultores
familiares;
2. aprovar em primeira instância o apoio do PRONAF a projetos contidos no
PMDR, relatando o Plano à Secretaria Executiva Estadual do PRONAF;
3. negociar as contrapartidas dos agricultores familiares, da Prefeitura
Municipal, do Estado e dos demais parceiros envolvidos na execução do
PMDR;
4. fiscalizar a aplicação dos recursos do PRONAF no município;
22
5. articular-se com as unidades locais dos agentes financeiros com vistas a
solucionar eventuais dificuldades na concessão de financiamentos aos
agricultores familiares, relatando ao Conselho Estadual do PRONAF sobre
os casos não solucionados;
6. elaborar e encaminhar à Secretaria Executiva Estadual do PRONAF
pareceres e relatórios periódicos sobre a regularidade da execução físicofinanceira do PMDR;
7. promover a divulgação e articular o apoio político-institucional ao
PRONAF;
c) os agricultores familiares, aos quais cabe:
1. apresentar e priorizar suas demandas;
2. participar da execução do PRONAF;
3. aportar as contrapartidas de sua competência;
d) as organizações de agricultores familiares, cabendo-lhes:
1. formular propostas de ação compatibilizadas com as demandas dos
agricultores;
2. participar da elaboração e da execução do PMDR e do acompanhamento
e fiscalização das ações do PRONAF;
3. celebrar e executar acordos, convênios e contratos com orgãos da
administração pública e entidades parceiras privadas;
4. aportar as contrapartidas de sua competência;
e) as entidades parceiras, públicas e privadas, que direta ou indiretamente
desenvolvam ações relacionadas com o desenvolvimento rural e a proteção
ambiental, cabendo-lhes:
1. participar da elaboração e da execução do PMDR, dentro de suas áreas
de atuação específica;
2. aportar as contrapartidas de sua competência;
3. colaborar na elaboração de relatórios de execução físico-financeira do
PRONAF.
(BRASIL, Pronaf, 1996, artigo 4º)
Uma particularidade que merece destaque refere-se ao fato de que, em 2010, o
CMDRS de Viçosa foi reformulado – através da Lei Municipal nº 2.081 – com o intuito de
determinar, de acordo com os critérios definidos pelo PRONAF, os requisitos necessários
para o enquadramento na categoria de agricultor familiar, entendido como aquele que:
I - não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos
fiscais;
II - utilize predominantemente mão-de-obra da própria família nas atividades
econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento;
III - tenha renda familiar originada, predominantemente, de atividades
econômicas vinculadas ao próprio estabelecimento ou empreendimento,
nos termos estabelecidos pelo Plano Safra do PRONAF;
IV - dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família;
V - resida no próprio estabelecimento ou em suas proximidades.
Parágrafo único - São também beneficiários desta Lei:
I - agricultores familiares na condição de posseiros, arrendatários, parceiros
ou assentados da Reforma Agrária;
II - indígenas e remanescentes de quilombos;
III - pescadores artesanais que se dediquem à pesca artesanal, com fins
comerciais, explorem a atividade como autônomos, com meios de produção
próprios ou em parceria com outros pescadores artesanais;
IV - extrativistas que se dediquem à exploração extrativista ecologicamente
sustentável;
23
V - silvicultores que cultivam florestas nativas ou exóticas, com manejo
sustentável;
VI - agricultores que se dediquem ao cultivo de organismos cujo meio
normal ou mais frequente de vida seja a água.
(VIÇOSA, Lei Municipal nº 2.081, 2010)
A explicitação desse cenário é capaz de revelar que, apesar de a recomendação
para constituição dos CMDRS não ser obrigatória, os municípios que optam pela criação e
pela manutenção de tais conselhos (como é o caso de Viçosa) acabam por seguir as
tendências participativas que aparecem junto aos recentes desenhos institucionais
vinculados a inúmeras políticas públicas contemporâneas. – Nesse sentido, as arenas
deliberativas propostas pelos conselhos gestores de políticas públicas mostram-se como
espaços proeminentes, dentre tais desenhos. Sendo a EMATER a instituição gestora dos
recursos do Pronaf no âmbito de Viçosa, é curioso notar que a própria concepção do
CMDRS carrega uma vinculação com a realidade técnica e com a finalidade política da
EMATER, questão essa que certamente traz particularidades ao processo deliberativo, em
última análise.
O segundo aspecto jurídico singular se refere à presença institucionalizada de atores
tradicionalmente excluídos da formulação e da deliberação de políticas públicas de
desenvolvimento rural: moradores de comunidades rurais, de naturezas múltiplas e diversas,
tomam assento junto ao CMDRS, envolvidos por uma relação jurídico-política de
representação (YOUNG, 2006). Como se já não bastasse tal evidência, um dado instigante
também se apresenta: a legislação que rege o CMDRS prevê a participação de
comunidades sem a obrigatoriedade do vínculo jurídico de associativismo. Dito por outras
palavras, não é necessário que tais comunidades se constituam enquanto associações,
organizações não-governamentais ou organizações cooperativistas para que as mesmas se
façam representadas na plenária do CMDRS. Basta que a comunidade (por votação ou por
indicação em reunião coletiva) escolha seu representante e o encaminhe formalmente junto
à Prefeitura Municipal e à EMATER – movimento esse que credencia formalmente a
participação da comunidade e lhe imputa o direito à voz e a voto na arena deliberativa e
consultiva do Conselho.
Apesar de toda a aposta positiva em tal processo participativo, foi possível levantar
alguns dados parciais que podem indicar certa precarização da arena formal do CMDRS, no
que se refere à sua legitimidade e à sua efetividade democrática na condução da política
pública de desenvolvimento rural sustentável de Viçosa. De modo peculiar, é possível
identificar que o CMDRS tem sido palco de algumas situações que interferem diretamente
no caráter consultivo e deliberativo que lhe é próprio. De modo mais específico, é possível
24
dizer que o diálogo entre os representantes de instituições (como a UFV, a Empresa de
Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais (EMATER), algumas secretarias da
Prefeitura Municipal de Viçosa, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR), dentre outras)
e os representantes de comunidades rurais (como as comunidades de Cristais, Macena,
Paula, Cascalho, dentre outras) é perpassado por uma série de contradições:
a)
Prevalece, ainda que de modo subjacente, uma ideia de que os discursos técnicos
teriam, em relação à questão do desenvolvimento rural sustentável, supostamente
melhores condições de apresentar soluções e de diagnosticar problemas de
sustentabilidade do que os discursos da experiência e da vivência;
b)
Tal quadro tende a produzir, desde o início, um cenário de desigualdades deliberativas
entre os participantes – assim, os sujeitos que possuem formações técnicas tendem a
se posicionar (mesmo que não propositadamente) como se obtivessem mais vantagem
para deliberar sobre os temas em discussão no CMDRS em relação aos sujeitos que
não possuem formação semelhante;
c)
Ainda com relação às desigualdades deliberativas, é válido ressaltar que as diferenças
entre os participantes, que poderiam gerar oportunidades iguais de participação a
grupos diferentes, são ironicamente também capazes de ocasionar desigualdades na
discussão e nas decisões; de modo concreto, tais desigualdades tem se manifestado
por uma série de constrangimentos, vivenciados particularmente por parte de
representantes analfabetos e/ou de baixa escolaridade: ações simples – como assinar a
lista de presença – e atuações mais complexas – como fazer uso da palavra – são
ambas perpassadas por acanhamentos que acabam, de modo mais amplo, por trazer
prejuízos ao processo deliberativo no âmbito do CMDRS;
d)
Há uma forte suspeita de que muitos conselheiros não se reconhecem no desempenho
da função de representação política de suas instituições/suas comunidades de origem.
Tal situação tem gerado debates improdutivos no âmbito do CMDRS – muitos
participantes, quando tomam a palavra, restringem-se apenas à comunicação de
experiências particulares ao invés de tentarem também levantar aspectos que poderiam
afetar ao grupo representado. Apesar de a troca de experiências privadas ser
importante como forma de expressão de problemas públicos, quando não retomada
para se pensar em aspectos mais gerais, tal troca, por si mesma, tende a não contribuir
para o amadurecimento de questões no diálogo público (BOHMAN, 2000), diminuindo
as potencialidades político-democráticas de participação no CMDRS;
e)
A ausência de regras claras para a condução do diálogo deliberativo formal, no
momento das reuniões do CMDRS, é um aspecto fundamental que interfere nas
25
matérias em pauta discutidas pelo grupo: quais são as regras para discussão? Qual o
tempo mínimo e o tempo máximo para o diálogo de cada assunto? Quem pode/deve se
posicionar? Como são recuperados os registros da reunião do CMDRS? Existem
comissões temáticas responsáveis por acompanhar/avaliar a política pública de
desenvolvimento rural sustentável no Município? Quando o público presente no Plenário
do CMDRS pode se posicionar? Quando as decisões do CMDRS podem ser revistas?
Como são produzidas inter-relações entre o CMDRS e o Comitê Estadual de
Desenvolvimento Rural Sustentável?
f)
Por fim, tanto as desigualdades deliberativas quanto a ausência de regras claras para a
condução do diálogo formal podem dar voz e vez a atores que se utilizem do espaço
público do CMDRS para projetarem interesses eminentemente particulares. Sendo
assim, usando da legitimidade pública posta formalmente na esfera do CMDRS,
determinados representantes podem conseguir o apoio a projetos a partir de uma
reflexão não (re) elaborada pelos participantes e ainda cujos resultados podem fazer
coro apenas aos interesses de alguns (aspectos que tendem a ficar obscurecidos
quando as decisões vêm acompanhadas de discussões apressadas, impostas pelo
argumento técnico e marcadas por superficialidade argumentativa).
Tal situação parece anunciar um quadro participativo equivocado bem como indicar
uma perda de uso das potencialidades do CMDRS enquanto desenho político-democrático
fundamental à produção da política pública de desenvolvimento rural sustentável do
município de Viçosa. Diante do descortinamento parcial desse cenário, algumas propostas
de pesquisa-ação, no que se refere aos aspectos jurídicos relacionados à mobilização, à
organização social e à ocupação do espaço da cidade pelas comunidades rurais de Viçosa
têm sido postas no horizonte de trabalho para 2013. Como seria possível ao CMDRS
fomentar a participação e a discussão da política pública de desenvolvimento rural
sustentável no município, tendo a presença de sujeitos que sequer precisam apresentar um
histórico jurídico de organização e de associação para ter assento na arena formal do
CMDRS? Como tal arena poderia estimular a articulação intersetorial e a organização da
sociedade civil em torno de sua temática principal? Em que medida seria capaz de
incentivar a representação e a manifestação cultural local?
Sendo assim, pretende-se, no ano de 2013, uma imersão no que se refere ao
aprimoramento dos aspectos jurídicos, com vistas ao desenvolvimento, à implementação e
ao acompanhamento das ações voltadas à produção de inovações organizacionais no
contexto do CMDRS e ao aprimoramento da representação nos âmbitos das comunidades
rurais representadas. Particularmente nesse âmbito, pretende-se pesquisar e desenvolver
26
dispositivos formais e instrumentos organizacionais voltados ao atendimento de quatro
aspectos envoltos à reunião do CMDRS: (1) produção das decisões (definição sobre pautas,
sobre debates e reflexões, sobre votações e quórum, sobre registro em ata dos
proferimentos, dentre outros); (2) presença nas reuniões (definição sobre ausências e
justificativas, sobre compartilhamento de informações relativas à comunidade de cada
conselheiro, sobre as ações desenvolvidas no período entre-reuniões, etc..); (3)
encaminhamentos formais (definição de instrumentos formais – tais como ofício, denúncia
formal, memorando, processo– bem como definição das principais instituições em que
problemas devem ser encaminhados – como Ministério Público, Polícia Militar, Câmara dos
Vereadores, Conselho Estadual, etc...); e (4) prestação pública de contas (definição de
instrumentos, com periodicidade definida, para dar visibilidade e divulgação ao trabalho do
CMDRS, tanto para o público em geral quanto para públicos dirigidos – como Prefeito,
vereadores, associações e organizações da sociedade civil, dentre outros). É preciso que
responsáveis sejam também definidos para dar conta de implementar as rotinas e os
instrumentos propostos.
27
5
ASPECTOS
ORGANIZAÇÃO
SÓCIO-ANTROPOLÓGICOS
SOCIAL
E
A
SOBRE
OCUPAÇÃO
DO
A
MOBILIZAÇÃO,
ESPAÇO
DA
A
CIDADE
REFERENTES ÀS COMUNIDADES RURAIS DE VIÇOSA
Nesta seção, pretende-se apresentar, de modo parcial, alguns dentre os variados
aspectos sócio-antropológicos implicados em torno dos processos de mobilização, de
organização social e de ocupação do espaço da cidade, empreendidos por moradores de
comunidades rurais de Viçosa, junto à política pública de desenvolvimento rural sustentável
implementada no Município. Tais aspectos foram levantados, no ano de 2012, tendo como
referências principais dois âmbitos sociais nos quais os moradores das comunidades rurais
tomam como referências primordiais no estabelecimento de vínculos formais e/ou informais
de convivência coletiva: 1) O próprio CMDRS – vislumbrado não apenas em seus aspectos
jurídicos, mas também em seus aspectos sociais; nesse sentido, tal conselho é tomado
enquanto âmbito de produção da vida social, em que processos participativos são capazes
de revelar dinâmicas mais amplas relativas ao próprio cenário rural contemporâneo; 2) As
comunidades rurais de Viçosa – apreendidas enquanto espaços de trabalho, de moradia, de
potencial organização política e de produção de uma sociabilidade coletiva, capazes de
insinuar nuances acerca das dinâmicas campo-cidade empreendidas no Município,
sobretudo sob o ponto de vista da alteridade.
De modo mais específico, a ida a campo para o levantamento desses dados
preliminares – responsáveis por indicar caminhos mais precisos de pesquisa, que serão
desdobrados em 2013 – focou-se, sobretudo, na busca pela compreensão da participação
dos conselheiros do CMDRS (com vistas a compreender algumas de suas características
enquanto atores sociais no engajamento político de representação), bem como na busca
pela construção de um olhar de pesquisa, capaz de processar dados iniciais sobre as
comunidades rurais de Viçosa sob a lente de inspiração sócio-etnográfica. Tais motivações
têm se desdobrado, particularmente, na análise de:
a) Atas das reuniões do CMDRS – está sendo feito um levantamento dos registros formais
da reunião do CMDRS, com vistas à investigação dos principais proferimentos dos
conselheiros, bem como de seus posicionamentos publicamente assumidos e
registrados, durante a reunião;
b) Falas dos conselheiros durante as reuniões – a equipe do projeto em Viçosa acompanha
cuidadosamente todas as reuniões ordinárias do CMDRS, com vistas a analisar as falas,
a presença, o comportamento e as manifestações dos conselheiros durante a reunião
(vide anexo 2);
28
c) Dinâmicas realizadas na reunião do CMDRS – a equipe do projeto não apenas tem se
preocupado em levantar dados por meio de ações de observação participante, como
também tem provocado a emergência de dados a partir da realização de dinâmicas
lúdicas e informativas com os conselheiros, durante os 15 minutos iniciais da reunião
ordinária mensal do conselho. Dito por outras palavras, em concordância com os
conselheiros, a participação da equipe do Cidade e Alteridade durante todo o ano de
2012 junto às reuniões ordinárias do CMDRS girou não apenas em torno da observação
da reunião mas, sobretudo, da produção de dinâmicas de grupo, voltadas não apenas a
estimular a participação entre os conselheiros, mas, principalmente, estruturadas com
vistas a também produzir familiaridade e proximidade entre a equipe de pesquisa e os
agricultores familiares pesquisados;
d) Relatos de inspiração sócio-etnográfica – a equipe do projeto realizou um dia de visita às
comunidades rurais de Viçosa, e foi desafiada a fazer um relato livre, de inspiração sócioetnográfica, no qual fosse possível superar uma mera descrição da comunidade – tendo
como base uma dimensão sensível da experiência, conformada durante as idas dos
pesquisadores ao meio rural;
e) Entrevistas semi-estruturadas realizadas – a equipe do projeto, no mesmo dia da visita às
comunidades, coletou dados a partir de um roteiro semi-estruturado de entrevistas, com
foco preliminar na relação da comunidade rural com o CMDRS, com vistas a ganhar
afinidade e aproximação com o universo empírico pesquisado, como também para buscar
inspirações para o aprofundamento da pesquisa em 2013.
Além da análise desses dados, é importante destacar que a equipe do projeto
realizou, no dia 07 de novembro de 2012, o Seminário para Formação Política de
Conselheiros do CMDRS de Viçosa, um evento de um dia, no qual foi possível estabelecer,
com os conselheiros, discussões voltadas às temáticas da representação, da participação,
dos direitos e das obrigações que constituem o vínculo formal dos mesmos junto ao
CMDRS.
Os aspectos sócio-antropológicos sobre a mobilização, a organização social e a
ocupação do espaço da cidade referentes às comunidades rurais de Viçosa serão assim
subdivididos em quatro tópicos:
a) O primeiro apresentará dados parciais sobre a participação dos representantes, com foco
em seus perfis e com descrição de todas as dinâmicas realizadas durante as reuniões do
CMDRS pela equipe do projeto;
b) O segundo apresentará os relatos de inspiração sócio-etnográfica na íntegra, elaborados,
essencialmente, por alunos de graduação, em formação acadêmica e cidadã, por meio
29
de um processo de sensibilização do olhar de pesquisa – tendo como norte um olhar
sócio-antropológico;
c) O terceiro apresentará uma reflexão sobre as produções acadêmicas em andamento
baseadas nos dados levantados pelas entrevistas realizadas nas primeiras visitas às
comunidades;
d) O quarto apresentará os dados sobre o Seminário para Formação Política de
Conselheiros Municipais do CMDRS, realizado em 07/11/2012, no Departamento de
Economia Rural da UFV.
5.1 DADOS PARCIAIS SOBRE A PARTICIPAÇÃO DOS REPRESENTANTES DAS
COMUNIDADES RURAIS NO CMDRS
A motivação que orientou a primeira coleta de dados sobre os aspectos sócioantropológicos em relação à mobilização, à organização social e à ocupação do espaço da
cidade
referentes
às
comunidades
rurais
de
Viçosa
voltou-se
a
compreender,
primeiramente, características dos próprios conselheiros do CMDRS. Sendo assim, os
dados podem ser observados conforme disposição no Quadro 2:
Ocupação por
Representante
setor de
atividade
Fontes de
rendimento
Propriedade Moradia
Rede de
Solidariedade
Associação/Trab.
A
Agricultura
Aposentadoria
Rural
Urbano
B
Agricultura
Aposentadoria
Rural
Rural
Religião
C
Agricultura
Aposentadoria
Rural/Urbano
Urbano
Associação
D
Agricultura
Agricultura
Rural
Rural
E
Agricultura
Aposentadoria
Rural
Rural
Associação
F
Agricultura
Agricultura
Rural
Rural
Associação
G
Comunicação
Aposentadoria
Rural
Rural
-
Aposentadoria
Rural
Rural
Religião
H
Serviços
domésticos
Comunitário
Religião/
Associação
I
Agricultura
Agricultura
Rural
Rural
Associação
J
Agricultura
Aposentadoria
Rural/Urbano
Rural
Parceria/ Religião
K
Agricultura
Aposentadoria
Rural
Rural
Quadro 2: Perfil dos representantes do CMRS de Viçosa
Fonte: Dados da pesquisa, 2012.
Religião/Trab.
Comunitário
30
Figura 1: Ocupação dos represenantes por setor de atividades
Fonte: Dados da pesquisa, 2012.
Figura 2: Fontes de rendimento dos representantes
Fonte: Dados da pesquisa, 2012.
31
Figura 3: Propriedades dos representantes
Fonte: Dados da pesquisa, 2012.
Figura 4: Local de residência dos representantes do CMDRS
Fonte: Dados da pesquisa, 2012.
Figura 5: Participação dos representantes em redes de solidariedades
Fonte: Dados da pesquisa, 2012.
32
Tais dados, que ainda se encontram em processamento e em análise, podem indicar
um conjunto complexo de questões, particularmente inspiradas pela abordagem dos meios
de vida, conforme apresentado no início deste relatório. Ainda que a maior parte dos
conselheiros viva da agricultura e resida no meio rural, outras atividades econômicas
parecem conviver com o cultivo da terra; além disso, o instigante dado de que alguns
conselheiros residem na cidade indica que é preciso tomar o rural para muito além do
agrário ou do agrícola. Trata-se de um cenário em que complexas dinâmicas campo-cidade
se precipitam, convivendo com um forte envolvimento com a religião, ao mesmo tempo em
que uma prática de associativismo parece começar a despontar.
Paralelo a esse cenário, as equipes do projeto propuseram a realização de algumas
dinâmicas lúdicas, no início da reunião ordinária mensal do CMDRS, de modo a estimular a
emergência de dados sobre as realidades rurais que acolhem os conselheiros, bem como
para gerar uma certa familiaridade das equipes com os sujeitos sociais pesquisados, e viceversa. Em linhas gerais, as dinâmicas podem ser descritas conforme o Quadro 3:
Fevereiro: Dinâmica “Liberdade de Expressão”: os conselheiros receberam uma figura de
pessoas impedidas de falar; pedimos a eles para dizerem o que a figura representava e
travamos uma discussão sobre liberdade de expressão;
Março: Dinâmica “Construtor”: utilizamos o brinquedo “Pequeno Construtor” (com peças
em madeira) e pedimos aos conselheiros para construir uma casa, de modo coletivo;
relacionamos o processo de construção da casa com a ampliação democrática e as
possibilidades de construção coletiva que um conselho abre à sociedade;
Abril: Dinâmica “Do plantio à comercialização na feira”: pedimos aos conselheiros que
organizassem, a partir de tarjetas, o processo de plantio de laranja até a sua
comercialização na feira; recuperamos a dinâmica relacionando o cumprimento de passos
para a comercialização da laranja com a necessidade de cumprimento de passos para a
formalização de questões no âmbito do CMDRS;
Maio: Dinâmica “Telefone sem fio”: dispusemos os conselheiros em duas filas e pedimos
ao primeiro da fila que passasse uma informação dirigida ao último da fila (tal informação se
relacionava à quebra de uma ponte e à necessidade de cascalhar as estradas); o último da
fila deveria levar a informação, simbolicamente, ao CMDRS, da forma como chegasse (a
33
dinâmica foi mesmo inspirada na brincadeira telefone sem fio); recuperamos a dinâmica
problematizando as questões ligadas à representação, de modo a estimular a construção de
um diálogo com aqueles que são representados, para tentar fazer com que informações
mais precisas possam chegar ao CMDRS;
Junho: Dinâmica “Balões no ar”: com o apoio de balões de soprar, pedimos aos
conselheiros que compusessem um círculo e ficassem, cada um, de posse de apenas um
balão; a proposta era que o balão fosse mantido no ar, com as mãos, e que não caísse no
chão. Aos poucos, fomos retirando um a um dos conselheiros e pedindo aos outros que
restavam para tentar segurar todas as bolas que estavam inicialmente na dinâmica. Ao final,
fizemos uma correlação do balão de soprar com os problemas de cada comunidade,
tentando ressaltar a importância da presença do conselheiro nas reuniões para que os
problemas de suas comunidades pudessem ser sustentados e não caíssem no
esquecimento.
Julho: Dinâmica “Diagnóstico dos problemas”: pedimos aos conselheiros que
pensassem em 1) problemas de participação no conselho, 2)sentimentos pelo fato de serem
representantes e 3)entraves que percebiam na relação com suas comunidades. Produzimos
um quadro e dispusemos os problemas para que todos pudessem visualizar e interferir;
nosso objetivo foi o de diagnosticar as principais questões que o grupo reuniu para trabalhar
no momento de formação política que foi feito em novembro.
Agosto: Não foi possível realizar dinâmica nesse dia devido à presença dos representantes
do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e do Banco do Brasil para tirar as duvidas
dos conselheiros em relação ao acesso ao Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar (Pronaf).
Setembro: Embora tivéssemos preparado uma dinâmica para tal reunião, não foi possível
realiza-la uma vez que houve apresentação de propostas politicas dos candidatos à
Prefeitura de Viçosa/MG.
Outubro: Dinâmica “Desenvolvimento x Progresso”: foi feita uma rápida problematização
sobre desenvolvimento rural e sustentável além de ter sido mencionada a diferença entre
progresso e sustentabilidade. No local, foi escolhida uma parede, de modo que os
conselheiros, em círculo, se posicionaram de frente para a mesma; após dividir tal parede
34
ao meio, foram afixadas, por meio de duas tarjetas, de um lado, a palavra progresso; e, de
outro, a palavra desenvolvimento; foram espalhadas, ao chão, diversas figuras (como, por
exemplo, fotos de irrigação, uso de agrotóxicos, trânsito caótico, telhado verde, telefonia
celular, torneira com água pingando, energia eólica, etc...) e foi solicitado, aos conselheiros
que: 1) diante das imagens, cada um deles, de modo subsequente, escolhesse uma imagem
para fixar em um dos lados, justificando suas escolhas de acordo com os seus
conhecimentos sobre a temática da dinâmica; 2) após a fixação das imagens na parede e
após a justificativa emitida publicamente pelos conselheiros, foi feita uma reflexão sobre as
imagens e as tarjetas da dinâmica, em relação ao conceito de sustentabilidade e ao trabalho
do CMDRS; após a reflexão, os conselheiros poderiam alterar o local em que fixaram
inicialmente suas imagens ou também deixá-las aonde inicialmente as afixaram; a
conclusão da dinâmica girou em torno da ideia de que a origem do Conselho se deu
justamente em torno do que foi tratado durante a atividade: a busca por uma visão de
desenvolvimento não baseada em progresso e em crescimento, mas numa proposta nova
de sustentabilidade.
Novembro: Não houve dinâmica porque os conselheiros utilizaram o tempo da reunião para
o início da produção do Plano Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável. Na ocasião,
foram passados diversos avisos sobre o Seminário para Formação Política, que ocorreu no
dia 07 de novembro, na UFV.
Dezembro: Foi pedido aos integrantes do CMDRS (conselheiros, instituições e demais
participantes) que avaliassem a participação do presente projeto no âmbito do conselho. A
avaliação foi positiva, pois todos alegaram ter tido fortalecimento politico, sobretudo com o
desenvolvimento das dinâmicas e do curso de formação politica. Além disso, foi feita uma
espécie de celebração do ano de 2012, com uma apresentação em Power Point com
algumas fotos sobre a trajetória desse projeto no CMDRS.
Quadro 3: Dinâmicas realizadas no início da reunião mensal do CMDRS em 2012.
Fonte: Dados da pesquisa, 2012.
No intuito de avaliar a participação das equipes no protagonismo de tais dinâmicas,
algumas reflexões foram condensadas a seguir, de modo a explicitar que alguns resultados
começam a se despontar:
35
1)
Aumento significativo da fala de cada conselheiro durante as reuniões: notamos que as
dinâmicas deixaram os conselheiros mais à vontade, estimulando-os a levarem seus
problemas para discussão na arena do CMDRS;
2)
O tempo de participação de nossa equipe nas reuniões era de 15 minutos e, como
iniciativa dos próprios conselheiros (que votaram e registraram em ata), nosso tempo foi
alargado para 30 minutos;
3)
Abertura dos representantes institucionais, principalmente a Emater, para diálogo com a
equipe do projeto sobre problemas ligados à participação;
4)
Os conselheiros passaram a ter amplo conhecimento sobre seus direitos e seus
deveres; com isso, notamos que houve uma sensibilização positiva quanto ao
desempenho de seus papeis, após tal conhecimento;
5)
Forte diminuição de desigualdades deliberativas, no que se refere à relação entre
discursos técnicos e discursos da vivência nas discussões sobre a política de
desenvolvimento rural sustentável de Viçosa, durante as reuniões;
6)
Início de um fortalecimento da percepção dos conselheiros sobre desenvolvimento
sustentável e sobre democracia; tudo isso pode contribuir, em última análise, para a
eliminação do uso do espaço do CMDRS para fins interesseiros e não-sustentáveis;
7)
Abertura do espaço do CMDRS à manifestação dos representantes, sempre que
alguma questão em discussão os envolvia direta ou indiretamente;
8)
Contribuição para a visibilidade pública das decisões do CMDRS, permitindo aos
representados o acompanhamento e a verificação de sua condução; inclusive, quanto a
isso, o presidente do CMDRS tomou a iniciativa de divulgar o conselho nos jornais
locais (anexo 3), bem como de marcar sua presença, sempre que possível, nas
reuniões da Câmara Municipal de Viçosa;
9)
Estímulo inicial para criação de canais de comunicação e de interação entre os
conselheiros e os seus representados;
10) Fortalecimento da representação política dos conselheiros e o papel do CMDRS;
11) Contribuição para o aperfeiçoamento democrático da política de desenvolvimento rural
sustentável do município de Viçosa.
36
5.2 RELATOS DE INSPIRAÇÃO SÓCIO-ETNOGRÁFICA COM DADOS PARCIAIS
SOBRE VISITAS NAS COMUNIDADES RURAIS
Com o intuito de dar prosseguimento à pesquisa exploratória, foram realizadas
visitas às comunidades rurais de Viçosa, de modo que, das 14 comunidades que têm
assento no CMDRS, apenas três não foram visitadas – mesmo após insistentes tentativas
de contato por parte das equipes do Cidade e Alteridade. Após cada visita, os
pesquisadores eram desafiados a produzir relatórios específicos. Tais relatórios se
constituíam de duas partes: a) uma, com a transcrição literal das entrevistas; b) outra, com
uma espécie de relato de forte inspiração sócio-etnográfica, no qual eram descritos
percepções sobre o local, a cultura, as formas de tratamento, as impressões dos trajetos,
etc.. Tais relatórios eram produzidos individualmente; entretanto, a equipe se reunia antes
da redação para discutir e aprimorar a metodologia de escrita, de modo coletivo. As
transcrições das entrevistas têm orientado a produção de três artigos, conforme será
descrito adiante. Os relatos, que também já inspiram o levantamento de problemas de
pesquisa, bem como a oferta de substrato empírico de relevância, podem ser observados na
íntegra, conforme descrição a seguir. Quanto a isso, vale citar que, com fins de resguardar a
identidade dos conselheiros, foram retirados dos textos de tais relatos os nomes e demais
detalhes pessoais acerca dos representantes.
Relatório Córrego do Engenho
A entrevista foi realizada no dia 05 de maio de 2012, às 9h, sábado na
Comunidade do Paraíso, tendo como entrevistados a conselheira suplente e o seu
marido, que se propôs a contribuir com a entrevista por participar das reuniões do
conselho junto com a sua esposa. No conselho, representa a comunidade do Córrego do
Engenho que abrange a comunidade do Paraíso, onde localiza sua residência. O meio de
transporte utilizado pelos integrantes da equipe foi o carro.
A visita à comunidade estava prevista para realizar no horário indicado, mas esta
foi concretizada com o atraso de 15 minutos, por confundirmos a residência da
conselheira suplente com a da atual conselheira. Destacamos esse atraso, por ter
encontrado a representante já de saída quando chegamos. Além disso, a conselheira
comentou que considerou a possibilidade da nossa equipe não comparecer ao encontro,
pelo motivo de anteriormente termos marcado uma visita e por problemas técnicos do
projeto tivemos que cancelá-la.
Devido a uma aparente pressa, a conselheira não mostrou a sua propriedade
37
assim que chegamos e fomos convidados a realizar a entrevista em sua residência.
Algumas características da paisagem urbana foram percebidas, como o acesso a
internet, a pressa para sair, a forma como nos receberam e nas suas falas referentes à
cidade, como algo que eles têm grande contato e precisam da mesma com bastante
frequência. Assim, percebemos que a dinâmica de tempo das pessoas que vivem da
agricultura difere das pessoas que só fazem do local uma moradia mais calma e longe da
turbulência da cidade.
A distância do centro de Viçosa e da comunidade do Paraíso pode ser
considerada pequena, este é um dos fatores que pode influenciar a aparente
dependência que a conselheira apresentou dos recursos oferecidos da urbanização.
Outro fator que evidencia essa dependência é em relação à religião, pois as atividades
religiosas da comunidade são ligadas à Paróquia de Fátima, que se localiza na cidade. A
ligação entre a comunidade e a igreja de Fátima é percebida, através do comentário da
entrevistada sobre as festividades que ocorre no mês de maio. A comunidade é
responsável por organizar um dos dias da festa na igreja. Também podemos destacar
que, a religião no local, de acordo com a conselheira, tem grande importância para a
maioria dos moradores e esse é o principal motivo de reunião da comunidade.
Houve uma conversa sobre o mineroduto que irá passar perto da residência da
conselheira, o interessante destacar é que ela fez referência ao padre da igreja da
comunidade como sendo o maior provedor de informações sobre o mineroduto e também
ao programa da rádio do Paulinho Brasília onde várias pessoas das comunidades rurais
ouvem e fazem pedidos no mesmo programa.
Na saída nos ofereceram carona, pois tínhamos deixado o carro na beira do
asfalto e os mesmos acharam que tínhamos ido de transporte coletivo. Agradecemos,
despedimo-nos e fomos embora. Quando já estávamos seguindo para o centro da
cidade, percebemos que eles estavam logo atrás em seu carro, fazendo o mesmo
caminho. Chegamos à conclusão que, mesmo com a aparente pressa do casal em nos
receber, a entrevista e a conversa nos proporcionou informações muito proveitosas para
a nossa pesquisa.
Relatório Córrego Fundo
A conselheira representa a Associação Comunitária de Desenvolvimento Rural do
Córrego Fundo no município de Viçosa, e sua residência se encontra em um local com o
38
nome de Pedreira e fica a 18 km do centro do município. Há três formas diferentes de
chegar e a equipe foi pelo caminho mais longo por não ter conhecimento dos outros.
Foi combinado com a conselheira às 9 horas do sábado, 21/04/2012, em sua
residência, onde seria realizada a entrevista. O encontro com a equipe foi no centro da
cidade, em frente à prefeitura, e de lá fomos para a comunidade rural em questão. Como
esperado, não achamos o local na primeira tentativa e nos perdemos por várias vezes,
mas perguntando sempre por informação sobre a conselheira, percebemos que as
pessoas não a conheciam pelo mesmo nome que a chamávamos, o que nos levou a
suspeitar se estávamos na direção correta. Quase chegando à residência paramos para
perguntar para um senhor e justificou não saber, pois as “pessoas mais novas no local,
nós aqui não conhecemos muito, pessoas que moram aqui há muito tempo nos sabemos
de todos”, talvez querendo dizer que havia “sítios” e pessoas que moram no local há
pouco tempo e não produz ou algo semelhante. Foi perguntada essa questão do tempo
de moradia para a conselheira e ela nos informou que mora no local há mais de 10 anos,
então ela supõe que o desconhecimento das pessoas com relação a ela possa ter sido
ocasionado pela forma como pedimos a informação: talvez por não sabermos que ela era
conhecida por outro nome, ou por não perguntar pelo nome do marido, e quem sabe, por
não termos perguntado, logo de cara, pela representante da associação. Ao chegar
fomos muito bem recebidos, porém percebemos, em um primeiro momento, que ela e
sua família são bem humildes e talvez tenham ficado com “vergonha” pela equipe ser de
pessoas que estudam na UFV. Ao ligar para a conselheira ela perguntou a quantidade de
pessoas que iriam e se deveria preparar um almoço. Agradecemos e alertamos que não
seria necessário, pois a entrevista não seria demorada. Ela falou pouco e não sentamos
em uma mesa para conversar, foi em um sofá no primeiro cômodo da casa. A conselheira
fala muito pouco e seu marido só participou da entrevista ao final, assim tivemos que
fazer diversas perguntas para que as respostas que esperávamos saíssem em forma de
conversa, pelo diálogo, uma coisa natural, coisa que no começo não ocorreu.
No meio da entrevista a conselheira ficou um pouco mais solta, de modo que a
entrevista se tornou quase que uma “conversa”. Notamos que em sua fala não houve
contradição, e que ela sentia a vontade ao falar sobre o conselho, mas não queria estar
tomando frente do mesmo. Ao final fomos convidados para um café com queijo, momento
em que todos ficamos mais a vontade e conversamos melhor sobre a propriedade, frutas,
comida, entre outros. O marido da conselheira nos apresentou um pedaço da
propriedade, e, ainda nesse momento aparentemente mais descontraído, notamos que o
protagonismo da conversa deveria estar conosco, pois ela pareciam realmente muito
39
quietos e taciturnos.
Relatório Córrego São Francisco
A entrevista foi realizada no dia 31/05/12m às 14h, quinta-feira, com o conselheiro
e representante da Associação de Moradores do Córrego São Francisco. Sua residência
está localizada na comunidade do Córrego Mariano, que é representada pela associação.
Combinamos com o conselheiro para nos encontrar na Praça do Bairro de Fátima, e de lá
prosseguimos de motocicleta. Ele disse preferir esse meio de transporte porque os
horários de ônibus são bem reduzidos, além de ter que percorrer uma distância
significativa a pé, pois o ônibus não passa próximo à sua propriedade. Percebemos
quando nos distanciávamos do centro de Viçosa, sobretudo pela distância entre as casas
e pelas configurações de algumas, que a paisagem modificara-se sobremaneira: a
poucos quilômetros da cidade, estávamos diante de um cenário notadamente diferente,
com fortes características ruralizadas – ainda que apenas do ponto de vista territorial.
A propriedade do conselheiro fica no Córrego Mariano, e a Associação no Córrego
São Francisco. O conselheiro nos perguntou se ele deveria nos apresentar à comunidade
onde está a associação, mas esclarecemos que o objetivo era conhecer sua casa e sua
comunidade, onde ele tem residência e tem suas interações com a terra e com a
comunidade. A estrada estava em bom estado, e o entrevistado comentou que foi
arrumada há pouco tempo, mas que se chover muito fica difícil chegar. A sua
comunidade, saindo do Bairro de Fátima, passa pelo Bairro da Conceição e perto do
Bairro Nova Viçosa, este último que é um dos bairros mais violentos da cidade. No
caminho, foi observado um bar e uma igreja bem nova, com 2 anos de existência, como
destacou o conselheiro. Segundo ele, a distância do Bairro de Fátima até sua
propriedade é de 8 km.
A comunidade se chama Mariano, como destacou o conselheiro, pois seu avô
tinha esse sobrenome e foi um dos primeiros moradores, além de possuir grande parte
das terras do local, e era costume em locais rurais essa homenagem. O local faz divisa
com Airões e nos foi relatado que várias crianças estudam no colégio da comunidade até
a oitava série. O conselheiro fez parceria com um trabalhador rural – que mora com sua
família em sua propriedade de sete hectares e ajuda a cuidar das plantações – e o lucro
do plantio é dividido em 50% para cada. Eles plantam feijão, café, moranga, mandioca e
hortaliças, sendo o café principal produto. Porém, o conselheiro reclamou da falta de
mão-de-obra na comunidade, pois existe uma dificuldade encontrar pessoas parar ajudar
40
na plantação. Relata ainda que a mulher do senhor que tem parceria com ele se recusa a
ajudar, pois quer ir morar na cidade.
O conselheiro nos apresentou toda a propriedade, mostrou o local onde irá passar
o mineroduto, relatando que terá que derrubar dois galpões e que já foi indenizado com
setenta e seis mil reais pela empresa Ferrous, responsável pela construção do
mineroduto. Ele nos disse também que foi informado de que o mineroduto não irá
prejudicar a água e não irá causar nenhum problema ao meio ambiente e afirmou que
não tem nada contra a construção do mesmo, porque já recebeu a sua indenização.
Fomos convidados a fazer a entrevista debaixo de uma coberta, devido à
ausência dos moradores da casa. Durante a entrevista o conselheiro deixou bem claro
que entende a importância do nosso trabalho e se disponibilizou em contribuir com o
nosso projeto, ficando bem à vontade para responder as nossas perguntas.
As questões postas pelo conselheiro foram em relação à falta de união e
interesse da comunidade Córrego Mariano em prol de melhorar o bem estar de todos.
Isso foi percebido pelo fato de não ter nenhum representante da comunidade no
conselho, pois o conselheiro em questão representa a comunidade do Corrégo São
Francisco. Ressaltou o fato de não ter um ônibus de linha para ir para a cidade, sendo
um ônibus clandestino que faz o serviço de transporte de pessoas.
Relatório Cristais
A entrevista realizou-se no dia 29/05/12, às 15h, em uma terça-feira. O
conselheiro mora na comunidade Cristais com sua esposa e tem uma das filhas como
vizinha, sendo que alguns moradores ao redor também são parentes do conselheiro.
Combinamos que nos encontraríamos às 14h30min na UFV, pois iríamos pela
rota UFV/Cristais, sendo possível chegar ao destino também por outras estradas, além
do caminho que leva a Cajuri. Conforme combinado com o conselheiro, anteriormente,
chegamos em sua residência às 14h55min e fomos recebidos por ele. A estrada de
acesso pela UFV estava em boas condições, notou-se que, em caso de chuva, ficaria
difícil o acesso. No caminho passamos pela fábrica da Haskell, empresa de cosméticos, e
também por um pequeno bairro residencial de nome “Cidade Jardim”, composto por
casas aparentemente bem construídas, relativamente próximas à comunidade Cristais,
mas que mostram uma realidade diferente, pois na comunidade as residências eram mais
simples. Em suma, a paisagem que, ao sair da UFV, era constituída predominantemente
por vegetação, transformou-se em residencial (com forte presença de vegetação), e
41
tornou-se, praticamente, um vilarejo, com características rurais (sobretudo pela distância
territorial entre as casas). Notamos então que tínhamos chegado à comunidade dos
Cristais. Importante destacar que, desde a saída do campus da UFV, a estrada se
manteve “de chão”.
O caminho em si era bem simples. Uma integrante da equipe destacou que sabia
como chegar até a igreja (ponto de referência), e que depois era necessário virar à
esquerda. Ao passarmos pela igreja decidimos perguntar à primeira pessoa onde era a
casa do conselheiro. Perguntamos em um bar e um homem nos respondeu que
estávamos bem perto. Tempo depois, descobrimos que esse homem era sobrinho do
entrevistado. Apesar das características ruralizadas, notamos que as casas eram bem
coladas umas às outras, o que dá certo caráter de zona urbana, talvez pelo fato de ser
um local bem próximo ao centro de Viçosa.
Quando questionamos sobre como as
pessoas ali tiram seu sustento, notamos que boa parte dos moradores locais trabalham
na cidade e moram na comunidade, sendo ele um dos poucos que trabalha “com a terra”
e, talvez, o único que tem dela seu único sustento.
Sua casa se localiza bem ao lado de sua plantação de hortaliças. Um pouco mais
afastado, o conselheiro planta milho e outros produtos. Ele até destacou que planta
algumas coisas “depois do asfalto”, uma estrada que corta a comunidade Cristais. O
entrevistado também trabalha com plantio de produtos orgânicos e tem seu diferencial no
tratamento destinado aos clientes e o produto vendido a eles. Também destacou que
“não ganhava muita coisa se vendesse nos mercados, pois atravessadores lucrariam a
maior parcela”. Segundo ele “o produto é vendido por R$ 1,20 pelos mercados e apenas
R$ 0,40 são repassados”. O preço que gostaria que pagassem é o de, pelo menos, R$
0,80 para não haver prejuízo. Por esse motivo ele prefere a venda direta para seus
clientes, que também podem ir à sua propriedade e ver o produto ser colhido na hora. Ele
limpa e ensaca tudo o que vende, desse modo, é perceptível que gasta muitas sacolas
plásticas. A mesma coisa com os animais: ele abate galinhas, porcos, patos, dentre
outros, e os entrega em domicílios para consumo dos seus clientes. O conselheiro tem
uma diversificação grande de produtos. Planta produtos diferenciados e aceita pedidos
de novas culturas. Destaca que aprendeu com “tentativa e erro” e que “vai plantando e
observando as preferências de cada planta para melhorar sua técnica de plantio”.
Relatório Paiol
A entrevista com o representante do CMDRS foi marcada, em sua residência, na
42
quarta-feira do dia 20/06/2012, às 10h. O meio de transporte utilizado para chegarmos ao
local foi o carro. Dessa forma, por volta das nove horas da manhã, dois integrantes da
equipe saíram de Viçosa pela estrada que vai para Porto Firme. A entrada para a
comunidade se dá no “meio” de tal estrada, e essa era uma das poucas informações que
tínhamos. Além disso, um dos integrantes já havia feito entrevistas em comunidades
próximas ao Paiol. Mas, somente essas indicações não foram suficientes para
encontrarmos o local com facilidade. Perdemos-nos no caminho e fizemos o trajeto pela
“BR”, algumas vezes, até encontrarmos a entrada correta.
Para alguém que conhece o caminho e esteja de carro, o trajeto até o Paiol dura
cerca de 30 minutos. Com relação às paisagens observadas, podemos classificá-las em
dois momentos da viagem. Antes de chegarmos à porteira que separa a rodovia da
estrada de chão que leva ao Paiol, a paisagem apresentava vegetação de ambos os
lados e o asfalto estava em boa condição. Após passarmos pela porteira, entramos em
uma estrada de chão esburacada, na qual permanecemos até a casa do entrevistado.
Destacamos não apenas a condição precária da estrada de chão, como também a
imaginamos em períodos de chuva e chegamos à conclusão da impossibilidade de
tráfego nesses períodos em tal estrada.
Algo curioso que nos chamou a atenção no percurso sem asfalto foi a presença
de montes de cascalho em intervalos regulares na estrada. Muitos deles atrapalhavam o
trânsito de veículos e até mesmo de pedestres. Como de costume, o caminho tinha
várias bifurcações, e por diversas vezes ficamos na dúvida sobre qual direção seguir. Por
vezes achávamos melhor pedir informações aos moradores locais. Algo nos chamou a
atenção na distribuição das residências: observamos que as casas eram relativamente
afastadas uma das outras, mas, de tempos em tempos, víamos propriedades mais
próximas umas das outras – o que nos deu a impressão de que passávamos por vários
“vilarejos” diferentes, aglomerados dentro da mesma comunidade do Paiol. Essa
característica, pelo que pudemos notar, foi bastante peculiar nessa região, ao contrário
das comunidades rurais até então visitadas: tais vilarejos pareciam manter certa unidade
de organização territorial, de estilo de residência, de meios de vida. Ademais, os
moradores eram solícitos e respondiam com simpatia as perguntas que fazíamos.
Ao chegarmos ao “Pesque e Pague Paiol”, seguimos o roteiro, pois sabíamos que
o caminho correto passava por ali. Paramos em um bar e perguntamos pela residência
do conselheiro. O dono nos respondeu que havíamos passado pelo local correto. Nesse
intervalo, encontramos com o conselheiro em uma moto. Cumprimentamo-nos, pedimos
desculpas pelo atraso, e a partir daquele momento o seguimos até sua casa. Lá, fomos
43
formalmente recebidos por ele e sua esposa. A residência é de boa aparência. Contém
um quintal na frente e um nos fundos. Não entramos na casa em si. Tanto a conversa,
quanto a entrevista ocorreram na varanda de fora, local da cozinha.
Não reconhecemos o conselheiro de nenhuma das reuniões oficiais do CMDRS.
Ele também não nos reconheceu, além de ter alegado não se lembrar da equipe do
projeto em nenhum momento. Quando indagado de sua presença, ele foi enfático em
dizer que possui participação assídua nas reuniões da EMATER. Provavelmente o
entrevistado confunde as reuniões da EMATER com as reuniões do CMDRS. Prevendo a
impossibilidade de esclarecer tal confusão, começamos a entrevista. Durante todo o
tempo, sua esposa permaneceu calada e na cozinha. Não opinou, nem mesmo quando
perguntada.
O representante se mostrou calmo e consciente do que respondia. Não revelou
nervosismo, situação de embaraço, muito menos se recusou a responder a nenhuma das
perguntas, seja por vontade própria, ou por não saber o que dizer. Quando questionado
sobre a razão dos cascalhos nas estradas, ainda não espalhados, sua resposta pode ser
considerada o ponto alto da entrevista: o entrevistado nos relatou que tal cascalho foi
comprado por um grupo de pessoas da comunidade por iniciativa privada, na troca de um
garrote. Há um tempo, os moradores fizeram um protesto na câmara de vereadores
reivindicando melhoria das condições das estradas. Por não terem sido atendidos,
resolveram, eles mesmos, comprarem o cascalho por conta própria. O entrevistado
depois revelou que o caminhão que puxará o cascalho e o espalhará nas estradas será
da Prefeitura Municipal de Viçosa (é instigante perceber que o custeio de um material,
como o cascalho, que deveria ser público, foi arcado por moradores locais). O cascalho
cobrirá a estrada principal de modo a beneficiar toda a comunidade, inclusive as estradas
secundárias que levam às residências e propriedades daqueles que pagaram por ele.
Depois de encerrada a entrevista, ele nos contou alguns relatos pessoais, como o
do filho que foi premiado em olimpíadas de matemática, do desejo do mesmo filho de
estudar na universidade, das indagações sobre o futuro das gerações no meio rural,
dentre tantos outros. Sua esposa nos ofereceu algo de beber e comer. Não houve
problemas no caminho de volta.
Relatório Córrego São João (Estiva e Setores)
O Conselheiro entrevistado que representa a comunidade rural do Córrego São
João (Estiva e Setores) é o atual presidente do CMDRS e também integra a Associação
44
de Agricultores Familiares do Córrego São João no Município de Viçosa (Estiva e
Setores). Ele nos informou a localização de sua residência rural especificando que
iriamos passar por uma igreja e um campo antes de por lá chegar, e combinou de
receber nossa equipe às 15h do dia 14/04/2012. Indagamos, previamente, sobre a
localização do Córrego São João. Encontreamos com a outra integrante da equipe na
rodoviária de Viçosa e de lá fomos para a comunidade procurar a residência rural do
conselheiro. Ao chegar à estrada de chão, paramos no primeiro barzinho e nos
informamos sobre a casa do conselheiro e sobre a comunidade Estiva, bem como sobre
uma tal que também recebe o nome de Estiva. Um dos rapazes que tentou nos ajudar
informou que a Estiva era em direção a Porto Firme (outra cidade perto de Viçosa),
porém pensamos que ele estava confundindo algo. Quando comentamos sobre isso com
o conselheiro ele disse que nessa cidade também tem um lugar chamado Estiva. O outro
rapaz que se encontrava perto nos informou que estava correto o caminho em que
estávamos. Informou-nos que deveríamos subir um morro e passar por uma igreja e por
uma escola. Percebemos que a estrada não era ruim. Havia uma ponte, que nos pareceu
em ótimo estado.
Percebemos, em seguida,
que havia uma igreja
bem atrás uma escola. O
conselheiro nos informou, depois, que funcionava ali até a 4ª série do fundamental.
Notamos que numa parte da comunidade as casas eram diferentes, no sentindo de terem
mais de um andar e com formatos de construção também distintos. Nesse mesmo local
em que se dispunham as casas, o calçamento era de pedra, e nos pareceu mais
urbanizado, lembrando algumas ruas próximas ao centro urbano da Viçosa.
Deparamo-nos com um pedreiro arrumando algo no chão, talvez fazendo “massa”,
e “pedimos informação” sobre a casa do conselheiro; o trabalhador nos disse que o
endereço que procurávamos era bem em frente. Ao chegarmos, o conselheiro estava
perto ao portão e logo após nos cumprimentar foi mostrar sua construção (um terreno ao
lado da casa, ainda por terminar), pois ele mora de aluguel na cidade, mas esta querendo
se mudar o quanto antes para a residência rural. Ele ajuda a tomar conta, junto com a
mulher, de uma propriedade rural que é herança de família, dividida entre doze mulheres
e dois homens. Ele demonstra ansiedade, pois reforça que deseja, o quanto antes, sair
da “cidade” e se mudar para sua propriedade em construção. Ao mostrar a sua
construção, ele pareceu muito satisfeito, comentou que era seu sonho, ao se aposentar,
morar em um lugar tranquilo, sem muitas preocupações e nesse local ele já havia
começado a plantar varias coisas, porém estava tudo no começo ainda porque havia
apenas dois anos que ele se mudara de São Paulo para Viçosa. O conselheiro relatou
45
que já colheu milho em sua propriedade (a parte que ele comprou e não a parte herdada
da mulher) e que agora está com uma plantação de feijão. Mostrou uma égua e
comentou que adora cavalgar, assim como também ressaltou que aprecia muito tocar em
uma banda. Após mostrar o galinheiro de que já dispõe, fez menção ao rio que passa
perto de sua propriedade, e destacou que não usava as margens de tal rio para o plantio
de modo a “não dar problema de alargamento da mesma”, e comentou ainda que “planta
capim braquiária perto para ajudar”. Destacamos que o conselheiro demonstra possuir
uma preocupação, ainda que não verificada à exaustão, com relação à questão
ambiental, e parece se valer de conhecimentos empíricos e/ou científicos para realizar
suas ações de cultivo na sua propriedade, com respeito ao ambiente natural. Ao mostrar
sua propriedade, ele também destacou que fez uma fossa, desenvolvida por seu genro, e
apresentou-nos, em seguida, sua casa por dentro, relatando em detalhes o processo de
construção e de acabamento. Bom, destacamos todos esses detalhes porque realmente
a entrevista custou a começar, já que o conselheiro demonstrou ter uma preocupação
enorme em receber bem a nossa equipe, e aparentava também expressar muita alegria
na apresentação de todos os detalhes relativos à sua propriedade – indício que evidencia
um grande amor pela terra e pelo meio rural.
Em seqüência, fomos levados à sua residência, é herança da sua esposa; fomos
apresentados a todos que lá estavam. Notamos que os presentes aguardavam a
presença do “professor” que coordena nosso projeto. Descobrimos que a filha do
conselheiro é nossa conhecida no curso de Gestão de Cooperativas, da UFV, e já
fizemos algumas disciplinas juntos. O conselheiro nos recebeu muito bem, já nos
oferecendo água e suco natural, provavelmente com frutas da propriedade. A casa é bem
antiga, e ele destacou que a base da casa foi feita há quase 300 anos e disse o nome da
madeira que foi construída e também comentou que ela foi esculpida toda com machado
pois não havia maquinas na época. Ao final ele mostrou toda a casa e destacou que no
chão da sala havia furos de guarda-chuva, comentando que o sanfoneiro ficava sentado
em um local e as pessoas ouvindo em outra e batiam o guarda-chuva e como
conseqüência tais batidas de entusiasmo deixavam algumas marcas.
Ao começar a entrevista, foi interessante notar a abrupta mudança na postura e
na forma de falar do conselheiro, que abandonou a espontaneidade e se apresentou de
modo muito formal. Seu discurso se mostrou bem politizado, já que o representante veio
de uma longa experiência de sindicato na região metalúrgica do ABC Paulista. Ele
parecia se expressar apenas depois de refletir sobre as perguntas que eram feitas a ele.
Ao final da entrevista, notamos que ele demonstrava mais informalidade.
46
Relatório Nobres
A entrevista foi marcada em uma das reuniões do Conselho Municipal de
Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDRS), para o dia 08/06/12, quarta-feira, às 14h.
O representante nos esperava em seu local de trabalho, TV Viçosa, que se localiza no
campus da UFV. A entrevista não foi realizada na comunidade, devido à
pouca
disponibilidade de horários dados pelo entrevistado, que demonstra ser muito ocupado.
Apesar de estar sempre disposto a nos dar carona para sua residência, sempre éramos
desviados por algum imprevisto que nos impedia de comparecer à comunidade rural. Por
esse motivo, marcamos com o conselheiro de entrevista-lo na TV VIÇOSA.
Fomos recebidos em seu local de trabalho e logo fez questão de mostrar vários
funcionários trabalhando no momento e os locais onde acontece a retransmissão,
dizendo não vermos as coisas acontecerem por trás das câmeras, vários processos
acontecem e que sem o trabalho dele nada iria funcionar. Apresentou-nos e explicou
detalhadamente todo o processo de transmissão de televisão no qual o conselheiro se
disse responsável pela maior parte técnica da mesma. O representante nos mostrou o
estúdio e explicou como é feita a elaboração do jornal. Depois fomos levados ao
camarim, local no qual se encontram diversas roupas à disposição dos apresentadores.
Também nos mostrou e explicou a função de todos os equipamentos das salas de áudio,
de vídeo e de controle da programação.
Durante a apresentação da estrutura da rede Viçosa, conversamos um pouco
sobre a trajetória de vida do conselheiro. O mesmo relatou que nasceu na comunidade
dos Nobres, mas com o passar do tempo formou no curso de engenharia elétrica e foi
trabalhar em São Paulo com instalações de antenas de televisão. Durante esse período o
representante participava de conselhos e de sindicatos. Depois que se aposentou, voltou
para sua terra natal e atualmente trabalha na rede Viçosa, pois relatou que não consegue
ficar parado. Também nos contou a história de sua família. Esta teve influencia na
nomeação e origem da comunidade dos Nobres, por conter muitos escravos em sua
propriedade, ser tradicional e rica. Relatou que foi a primeira comunidade de Viçosa a ter
escravos e depois, quando não se podia mais ter escravos, sua família dividiu as terras
para os escravos, porém os mesmos só podiam nelas residirem e delas tirarem seu
sustento, sem poder vender ou negociar a posse da terra. Diante desse relato,
percebemos que o conselheiro se sentia bem e mais valorizado por ser de uma família
que anos atrás tinha o poder de ditar as regras na comunidade. Pareceu-nos que se
vangloriava dessa terra e, na sua fala, se as pessoas vivem lá é porque devem favores a
47
ele.
A entrevista foi realizada na sala de recepção da empresa. Este ambiente possui
grande circulação de funcionários, por esse motivo, a entrevista foi interrompida diversas
vezes. Durante a entrevista o representante criticou os tipos de perguntas que as
pessoas elaboram para as entrevistas e de forma sutil elogiou algumas perguntas
elaboradas pela nossa equipe.
Na saída o representante nos levou até a porta e nos convidou para visitarmos a
sua casa em outra oportunidade. Importante destacar, a visita dos integrantes à
comunidade dos Nobres, quando realizaram a entrevista com o representante da
comunidade de Caratinga, ocasião onde o conselheiro marcava com a equipe, mas não
deixava certo que podia nos atender e sempre dizia que ligaria depois. No caso referido,
passamos pela sua residência para ver se o mesmo se encontrava e assim já
realizaríamos a entrevista, pois já estávamos bem próximos e economizaríamos nas
viagens. Chegamos à conclusão de que, apesar de a entrevista não ter sido realizada na
comunidade, conseguimos obter informações proveitosas para a pesquisa.
Relatório Pau de Cedro
A entrevista foi marcada em uma das reuniões do Conselho Municipal de
Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDRS), para o dia 06/06/12, quarta-feira, às 14h.
O representante nos esperava em sua residência rural. Tínhamos a informação de que tal
residência se situava um pouco depois da comunidade rural do Córrego São João (Estiva
e Setores). Entretanto, percebemos que o local era bem mais distante do que o descrito.
Para realizar a entrevista, três integrantes foram de carro. No caminho, perdidos,
pedimos informações muitas vezes e nos deparamos com uma realidade rural nunca
vista antes em outras entrevistas.
Choveu no dia anterior, de leve e com pouca precipitação. Por esse motivo,
tentamos ligar para o conselheiro, a fim de saber se a estrada estava em boas condições
de rodagem. Tentativas sem sucesso, fomos ao local mesmo assim, e, ao chegarmos à
comunidade do Córrego São João, pouco antes de Pau de Cedro, nos deparamos com
uma estrada com muita lama e de difícil acesso. Pensamos em parar para perguntar se
as pessoas estavam conseguindo transitar pelo local. Optamos por pedir informações a
um motoqueiro que disse que o trecho ruim terminava um pouco mais a frente e que o
restante do percurso estava em boas condições. Em suma, passamos com um pouco de
dificuldade, fato que nos fez lembrar o insistente pedido que o representante de tal
48
comunidade leva às reuniões do conselho com relação a melhorias das estradas. O
caminho até à residência do conselheiro é, em si, de difícil acesso e tem matas fechadas
com casas próximas umas das outras e de número reduzido, prova de que as pessoas,
na maioria das vezes, plantam e dependem da terra para sobrevivência.
Durante o percurso, percebemos um contraste de realidades, pois as
comunidades que antecedem à comunidade que iríamos visitar possuíam várias casas
novas e pessoas que pareciam viver de trabalhos na cidade (ou eram apenas sitiantes) –
já que não havia, ao redor das casas, nenhum quintal aparente, voltado ao cultivo e/ou à
criação. Contudo, adentrando o caminho que leva a Pau de Cedro, notamos a existência
de casas de barro e de pessoas carentes que, visivelmente, vivem de trabalhos rurais e
do que plantam. Em uma das casas em que paramos para pedir informações,
encontramos crianças que foram deixadas com os avós porque os pais haviam ido
trabalhar na colheita de café para outras pessoas. Vimos, também, pessoas trabalhando
em suas propriedades e encontramos uma escola ao lado de uma igreja. Essa escola
tem até a quinta série do ensino fundamental. As crianças, após isso, são obrigadas a
estudar no centro de Viçosa. No verão, período no qual as chuvas são fortes, fica
praticamente impossível a locomoção, o que resulta em perda de aulas e prejuízo no
desenvolvimento escolar. O entrevistado disse que o governo quer acabar com as
escolas rurais, mas não dá acesso, ou seja, estradas boas para as crianças irem até a
cidade a fim de estudar.
Após transitar um pouco pela comunidade e de buscar informações sobre a casa
do representante, conseguimos chegar ao local pretendido e fomos recebidos pelo
próprio conselheiro, que nos levou para uma mesa para que a entrevista fosse realizada.
Ao término, sua mulher e filha estavam na sala, local onde conversamos um pouco. Foi
servido café, queijo e bolo que, segundo ele, foram feitos com produtos de sua
propriedade. Logo após, ele nos mostrou um pouco mais do local. Comentou que a
propriedade foi recebida por herança do pai e que a energia elétrica havia chegado há
vinte anos. Notamos que o conselheiro tem um trator em sua residência e comentou que
o comprou de forma dividida com o vizinho para auxiliá-lo nas plantações. Ele também
nos mostrou uma serpentina usada em sua residência, ou seja, um sistema de aquecer a
água do chuveiro com lenha. Na saída nos deparamos com animais na parte de frente da
casa, milho seco próximo à porteira, pés frutíferos em pequeno número. Importante
destacar que a casa estava limpa e arrumada. O chão era de cimento batido e apenas o
banheiro possuía cerâmica, mesmo assim, pela metade. Despedimo-nos da família
depois de um bom período de conversas e fomos embora. O conselheiro fez questão que
49
saíssemos pela porta da frente, seguindo tradições antigas que são preservadas pela
família. Chegamos à conclusão de que, mesmo com as dificuldades para se chegar ao
local, tanto a entrevista, quanto a visita, foram proveitosas e satisfatórias.
Relatório Paula
A entrevista foi realizada no dia 09 de maio de 2012, sábado, às 9h, na
Comunidade de Paula. A visita na comunidade estava prevista para as 15h, porém,
devido à deficiência de informação por parte da entrevistada perdemos o ônibus e houve
um atraso. O ônibus, segundo a conselheira, tinha sua saída em frente à prefeitura,
porém fomos informados de que houve mudança no local de acesso ao transporte. Em
seguida, procuramos por uma alternativa, e a encontrada, foi a de ir de ônibus, no
entanto com outro destino, sendo este para o município de Guaraciaba, pois passa
próximo ao local desejado. A conselheira se propôs a nos buscar no ponto de ônibus e,
ao chegarmos por lá, encontramos duas pessoas do outro lado da rodovia. Dirigimo-nos
a elas e indagamos sobre a localização da comunidade; fomos informados de que
estávamos no local correto Em seguida, a conselheira chegou. Durante a visita
percebemos que o imprevisto ocorreu devido à conselheira não depender do transporte
coletivo, pois se locomove para a cidade através de carro próprio, o que nos leva a inferir
que esta conselheira aparenta possuir uma condição de vida com maior estabilidade
econômica em relação a outros moradores da comunidade da Paula.
Durante o caminho percorrido até sua propriedade, ela foi mostrando as outras
propriedades, que contém casas recém construídas e um condomínio que está em fase
de constituição. Pode-se destacar uma propriedade que pertence ao atual prefeito da
cidade de Viçosa, MG, pois a conselheira relatou que a estrada até à propriedade do
prefeito apresenta um aspecto bom, mas seguindo para dentro da comunidade a mesma
está com problemas. Segundo a conselheira, a comunidade apresenta diversos
problemas no âmbito do transporte, da educação e da saúde. No âmbito da segurança, o
único fato a relatar é que na propriedade do prefeito ocorrem diversos danos devido a
rivalidades políticas.
Chegando à sua propriedade, ela nos convidou a conhecê-la. Fomos até o ponto
mais alto com o intuito de percebemos a estrutura da comunidade. Neste ponto foi
proporcionada a visão da sede da antiga fazenda e a capela da comunidade, referências
para as pessoas que moraram no local há mais tempo. Andamos por toda sua
50
propriedade e percebemos que o local apresenta uma diversificação na produção (milho,
pimenta, goiaba, maracujá, feijão, hortaliças, mexerica, jabuticaba, amora, uva, café; e a
conselheira ainda pretende plantar cupuaçu). A cultura de pimenta é feita por meio de
parceria com um produtor vizinho que reside na comunidade há anos. Uma parte da
produção de sua propriedade é destinada para a comercialização e a outra para doações
(hortaliças), efetivando a primeira por meio de outra parceria com uma produtora da
comunidade através da divisão de uma barraca na feira da cidade e a segunda é
destinada a duas creches localizadas na cidade.
Os métodos corretos de plantio
utilizados foram aderidos através de orientações dadas pelo seu vizinho e hoje parceiro.
A solidariedade é explícita dentre ruralistas da localidade, o que demonstra a constituição
de uma comunidade rural em termos estritos. Outra fonte de informação usada pela
conselheira é a internet. A forma de aprendizado citada ocorreu em razão da
necessidade do conhecimento das técnicas agrícolas, podendo notar que não houve
aprendizado de geração para geração, mas sim um conhecimento adquirido por
conversas com o vizinho e por meio de tecnologias de informação.
Durante a apresentação da propriedade, relatou sobre a sua história em relação à
comunidade. Mudou-se para a comunidade há três anos. Antes morava na cidade de
Timóteo, onde seu marido era funcionário de uma indústria de aço e tinha o objetivo de,
quando se aposentasse, se mudar para a zona rural. A conselheira não tem nenhum
vínculo familiar na cidade de Viçosa, mas teve a oportunidade de conhecê-la através de
um de seus filhos que cursou administração na UFV. Sua mudança para Viçosa e o
trabalho no meio rural ocorreu, portanto, após a aposentadoria do seu marido. A cidade
de Viçosa foi escolhida devido à permanência após a graduação de seu filho na cidade. A
escolha de sua residência na comunidade de Paula se deu pela quantidade e qualidade
das bacias hidrográficas que, segundo ela, encontram-se dispostas na região (uma
escolha baseada numa racionalidade ambiental e, ao mesmo tempo econômica, diferente
de uma racionalidade cultural ou tradicional).
Fomos convidados a realizar a entrevista na cozinha de sua casa, que se
encontra em construção. As características a se destacar nesse local são algumas
pimentas desenhadas na parede, podendo aferir que a cultura de pimenta representa a
maior expectativa de resultado. Mostrou-nos o doce de goiaba que estava preparando
para a venda na feira e preparou a mesa para um café da tarde, relatando que a recusa
do café de uma dona de casa é uma ofensa. Outro fator a destacar é a questão da
religião, pois a comunidade se reúne, frequentemente, num espaço próprio, destinado a
práticas religiosas. As reuniões da comunidade geralmente são realizadas na capela e a
51
conselheira relatou que, apesar de ser evangélica, não tem resistência a participar das
reuniões nesse local, mas expôs que já ocorreram problemas por esse motivo com o
conselheiro anterior. Durante a entrevista, demonstrou disponibilidade para contribuir com
o projeto e mesmo ocorrendo o imprevisto do gravador não ter funcionado a mesma se
propôs a responder novamente as perguntas de forma mais compacta
Relatório Piúna
A entrevista foi realizada no dia 12 de maio de 2012, sábado, às 9h, na
comunidade de Caratinga. O entrevistado representa a Associação de Produtores
Familiares da Piuna e Setores. Por questões de localização, a visita foi programada para
se realizar após uma visita na comunidade dos Nobres. O representante da comunidade
dos Nobres se propôs a nos buscar no centro de Viçosa e nos levar até a sua
comunidade, para apresentá-la e realizar a entrevista. Em seguida, nos levaria até a
comunidade de Caratinga, no entanto, devido a um imprevisto de trabalho, desmarcou a
entrevista. Como já tínhamos marcado com o conselheiro representante de Piúna, e o
mesmo não possui telefone de contato, mantivemos a visita na comunidade de Caratinga.
Não tínhamos muitas informações sobre a comunidade de destino, pois
contaríamos inicialmente com o representante da comunidade dos Nobres para nos
guiar. No caminho, notamos a existência de alguns vilarejos localizados à na beira
estrada que liga Viçosa-MG a Porto Firme-MG e, em uma destas, paramos para buscar
por informação. Apesar de ser complicado chegar até a residência do Conselheiro, foi
possível contar com a sua popularidade na região, pois buscamos informações num local,
relativamente distante de sua casa, e obtivemos informações precisas de onde se
localizava sua residência. No bar do seu filho, próximo a sua casa, lá o representante
estava à nossa espera e se encontrava bebendo uma cerveja com um grupo de amigos.
Fomos recebidos muito bem pelo conselheiro e notamos que o lugar era bem simples. As
casas eram pequenas, a estrada se mostrava muito estreita e não cascalhada e o bar
onde o conselheiro nos esperava, possuía um banheiro de madeira, sem canalização,
construído em cima de um córrego.
Fomos convidados para conhecer sua propriedade. No primeiro momento, o
conselheiro nos mostrou os cultivos que eram destinados para as escolas através do
Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), sendo estes hortaliças (alface e couve),
tomate e cenoura. Sua produção de tomate se encontrava próxima a de hortaliças e
relatou que usa “remédio” nessa cultura, pois alegou a impossibilidade do tomate nascer
52
de acordo com as exigências do mercado sem a sua aplicação. Outro fato a destacar é a
sua decisão por plantar pouca quantidade, devido à escassez de mão de obra e a
dificuldade de conseguir vender toda a produção. Assim, podemos perceber que, além do
êxodo rural, o entrevistado também enfrenta a dificuldade no momento do escoamento
dos seus produtos. Esse problema pode ser consequência das péssimas condições da
estrada, pois não estávamos no período de chuvas e a região já apresentava visíveis
sinais de degradação e de deficiência do solo acentuadas pelas chuvas.
A seguir, o representante nos mostrou o restante de sua propriedade, na qual
planta diversos produtos (feijão, mexerica, laranja, mandioca, etc) e cria galinhas e
suínos, todos destinados ao consumo da família. Relatou que já houve um período que
conseguia plantar tudo aquilo que era necessário para sua subsistência, mas atualmente
não faz isso, devido à dificuldade de plantar certos produtos como, por exemplo, o arroz.
Assim, para complementar a alimentação da família, o conselheiro compra no centro de
Viçosa aquilo que não consegue produzir em sua propriedade. Geralmente, vai ao centro
de Viçosa às segundas-feiras. O transporte coletivo não faz linha em sua comunidade,
tendo que se deslocar até a parada de ônibus que se localiza na beira da rodovia. O
representante vai até o ponto com o seu veículo próprio (moto), deixa-a estacionada por
perto e segue de ônibus para o centro. Isso ocorre, na maioria das vezes, para resolver
pequenos problemas (falta de algum suprimento ou remédio) e para participar das
reuniões do conselho. Percebe-se que o seu cotidiano é mais voltado para as atividades
de sua propriedade.
Antes de realizarmos a entrevista, o representante fez questão de deixar claro, por
várias vezes, que é analfabeto e isso poderia afetar na sua contribuição com a pesquisa.
Enfatizamos que a sua experiência na terra era um fator muito importante e a questão de
ser analfabeto não interferiria em nada no andamento da pesquisa. Por esse motivo não
foi solicitado ao representante que assinasse o termo de consentimento, mas explicamos
sobre o objetivo da gravação e deixamos que o representante decidisse se a entrevista
poderia ser gravada ou não. A entrevista foi conduzida em um local ao ar livre, pois não
fomos convidados para conhecer a casa do representante. Nossa consideração em
relação a esse fato foi a de que o conselheiro, por ser uma pessoa extremamente
simples, talvez tenha se sentido constrangido com a nossa presença em sua residência.
Assim, deixamo-lo à vontade com a escolha do local para a entrevista. O conselheiro
preferiu que a realização da entrevista pudesse ser perto do bar do seu filho, num banco
que se encontrava à beira da estrada. Apesar de não ter havido o convite para irmos até
a sua casa, ressaltamos que o representante nos acolheu muito bem. O seu filho
53
preparou peixe frito e nos ofereceu durante a entrevista.
Após a entrevista, o representante nos convidou para almoçar em sua casa.
Porém, não aceitamos por causa da impressão que tivemos em relação ao seu
constrangimento. Além desse convite, também comentou sobre o batizado de seu neto
que iria se realizar no dia 24 de maio e que ficaria muito satisfeito com a nossa presença,
pois seria servido “pato com macarrão” como almoço. Segundo o conselheiro, na zona
rural da região, esse prato simboliza que a família tem um motivo para festejar e,
geralmente, é servido em ocasiões como casamento e/ou batizado.
Relatório Silêncio
A entrevista foi marcada para acontecer na residência da conselheira, como de
costume, na segunda-feira do dia 21/05/2012, às 8h. O meio de transporte indicado pela
própria entrevistada para se chegar ao local foi o ônibus “União”, que parte em dias da
semana da rodoviária de Viçosa até o local. No horário indicado, quatro integrantes do
grupo estavam na rodoviária à espera do ônibus, e partiram rumo à comunidade do
Silêncio. O preço pago pela ida e volta totalizou R$ 3,60 por pessoa. Reparou-se que as
condições do ônibus eram as mesmas encontradas nos demais coletivos da cidade, ou
seja, o ônibus não é mais “precário” por se tratar de um carro que enfrenta estradas ruins,
poeira, distâncias maiores e menos habitadas.
A paisagem urbana começou a se modificar a partir do momento em que o ônibus
deixou a cidade, momento em que se detectou tendência às paisagens rurais, com
árvores, estrada de chão, mas ainda com bastante construções, como casas e até
mesmo edifícios. Após cerca de 10 minutos, já estávamos imersos em zonas rurais. A
presença da natureza era vista por todos os lados. O percurso até a casa da Conselheira
durou cerca de 20 minutos. Não sabíamos exatamente onde descer, tínhamos apenas a
referência do “campo do Condé”. Graças a um senhor que estava no ônibus, descemos
um pouco após do citado campo, caminhamos cerca de 100 metros na direção oposta e
avistamos a entrevistada nos esperando em frente à sua casa.
A casa se localiza na estrada principal da comunidade, lugar de maior movimento
de carros e ônibus, dispondo-se em frente a um campo de futebol e a um bar que,
aparentemente, só funciona em dias de jogo nesse campo. A casa é rodeada por uma
cerca que não impede a visão da propriedade, possui quintal de chão de cimento, e, no
dia da entrevista, havia café espalhado nesse quintal para secar. Ela nos cumprimentou,
comentou sobre o fato de termos passado direto dentro do ônibus e nos convidou para
54
entrar. Fomos para a sala composta por dois sofás, uma estante, e algumas molduras na
parede. Sentamos, conversamos um pouco, e sugerimos a possibilidade de conhecer um
pouco dos arredores da comunidade e, inclusive, a sua propriedade. Cordialmente, ela
nos levou para apresentar tais lugares. Enquanto mostrava sua propriedade, falou um
pouco de sua vida. Revelou que já morou em São Paulo, possui parentes nas
comunidades rurais próximas ao Silêncio, é divorciada, porém vive com o ex-marido na
mesma casa, e que é ele quem arca com as despesas do lar (ou parte delas); relatou
também que não possui Bolsa Família devido à renda do ex-marido. Levou-nos para sua
plantação de café. O espaço é grande, situado em um morro há poucos metros de sua
casa. Contou que, na hora do trabalho, conta com o apoio dos outros agricultores, que se
revezam e, dessa forma, todos se ajudam na colheita do café. O tempo de conversa tido
na plantação de café serviu para deixar a entrevistada descontraída e bem à vontade,
comportamento percebido por unanimidade da equipe.
Após o tempo no cafezal, voltamos para dar início à entrevista. Ela leu
rigorosamente o termo de aceitação, o assinou, e começou a responder as perguntas.
Notamos que ela não se sentiu desconfortável em responder a qualquer uma delas e o
seu comportamento durante a entrevista também foi normal. A representante mostrou
gestos sutis, não demonstrou nervosismo, tampouco caiu em contradição em suas
respostas. Sorriu várias vezes durante a entrevista. Não fomos atrapalhados por nenhum
fator externo e o tempo de gravação ficou em torno de 20 minutos. Após o término da
gravação, agradecemos pela receptividade e fomos convidados para tomar café na
cozinha da casa. Passamos por um pequeno corredor e pudemos perceber que a casa
estava limpa, as camas arrumadas, a cozinha limpa da mesma forma. Na pia havia uma
garrafa de café e fomos convidados a beber. Além disso, nos ofereceu bolachas. Foi
nesse ambiente que surgiu o assunto sobre o posto de saúde, o acesso a remédios, e a
conselheira revelou que toma medicamentos controlados para depressão.
Saímos da casa e fomos instruídos a pegar ônibus de volta na comunidade do
Buieié. O caminho até essa comunidade foi feito a pé, cerca de 30 minutos de caminhada
até chegar ao local. Enquanto aguardávamos o ônibus, nos encontramos com algumas
crianças da comunidade do Buieié que nos pediram dinheiro. Pegamos o ônibus de volta
e mais uma vez pudemos reparar na paisagem, composta por mato, estradas ruins,
alguns bois e vacas esporadicamente na estrada. Entretanto, na volta, o ônibus fez um
trajeto diferente da ida. O percurso passou por localidades as quais não sabemos
identificar quais foram. Retornamos na rodoviária, descemos do ônibus, e declaramos a
entrevista e as observações como encerradas.
55
5.3 REFLEXÕES ACERCA DAS PRODUÇÕES EM ANDAMENTO BASEADAS NOS
DADOS LEVANTADOS PELAS ENTREVISTAS
Ainda que os relatos de inspiração sócio-etnográfica mereçam aperfeiçoamentos –
especialmente no que se refere à sensibilização do olhar de pesquisa –, os dados descritos
evidenciam uma enorme riqueza acerca de indagações acerca das relacionados às relações
campo-cidade estabelecidas pelas comunidades rurais de Viçosa, tanto no que se refere
aos seus aspectos formais, quanto às suas dimensões de sociabilidade e de convivência
social. Pudemos notar conselheiros que moram recentemente na zona rural de Viçosa, após
longas experiências de vida em cidades, ao passo que outros conselheiros não possuem
experiências migratórias. Observamos paisagens diversas, desde espaços rurais com
características tipicamente urbanizadas (como em comunidades em que há moradias
voltadas ao lazer nos finais de semana e/ou ao retorno do trabalho na cidade, apenas à
noite), até locais em que há uma grande distância geográfica e simbólica das formas de vida
urbanas. Deparamo-nos com cenários de pobreza rural, como também de agricultores que
apresentam uma certa estabilidade econômica. Há diversificação das formas de renda em
alguns locais – com a forte presença de aposentados – como também há localidades em
que os moradores dependem de atividades agrícolas. Em alguns contextos, nota-se
vínculos de solidariedade, formais e informais, seja do ponto de vista da reunião para
colheita, seja do ponto de vista da organização em associações; já em outras comunidades,
percebe-se dificuldades de organização coletiva, tanto para o trabalho quanto para a luta
política. Alguns conselheiros também aparentam ter trajetórias relevantes em movimentos
sindicais; já outros, passam pela primeira experiência de representação de suas vidas.
Ampliando as possibilidades de levantamento de reflexões, utilizando, para isso, os
dados transcritos nas entrevistas, a primeira fase da pesquisa já foi capaz de inspirar a
formulação de três artigos científicos, cuja produção encontra-se em andamento. De modo
específico, o resumo de tais artigos pode ser conferido a seguir.
• Artigo 1: Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável e participação
na cidade: que rural é esse?
Este artigo tem como objetivo central compreender em que medida a construção de um
processo deliberativo e participativo em torno das políticas públicas municipais de
desenvolvimento rural sustentável é capaz de reunir um conjunto de características sociais,
econômicas e culturais que revelam importantes aspectos relacionados à complexidade
56
política do cenário rural contemporâneo. Para isso, toma-se como realidade investigativa as
interações instituídas junto ao Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável
(CMDRS) de Viçosa, MG – órgão colegiado de caráter consultivo e deliberativo, que aposta
no diálogo público e formalizado entre representantes de instituições (órgãos do poder
público e entidades representativas dos agricultores familiares e de trabalhadores
assalariados rurais) e de comunidades rurais de Viçosa, como um desenho institucional
válido para produção de uma efetiva e democrática política pública de desenvolvimento rural
sustentável. A partir de entrevistas feitas, particularmente com representantes das
comunidades rurais, e de observações participantes realizadas nas reuniões mensais do
CMDRS, buscou-se interrogar como os meios de vida de tais representantes são capazes
de evidenciar um conjunto complexo de dinâmicas campo-cidade, estas que, além de
tomarem parte nos processos representativos engendrados, revelam nuances mais amplas
sobre o próprio cenário rural que as acolhe. A análise ressalta como a explicitação desse
processo representativo corrobora para a necessidade cognitiva das políticas públicas
darem conta de tais complexidades, de modo a permitir que importantes aspectos da
realidade rural contemporânea sejam incluídos qualitativamente no processo deliberativo do
conselho e da própria política, em última instância.
• Artigo 2: Meios de vida e construção da representação política do rural:
participação e trajetórias de vida de agricultores familiares junto à política pública
de desenvolvimento rural sustentável de Viçosa/MG
A proposta nuclear desse artigo é investigar em que medida a construção da representação
política do rural, realizada junto a desenhos institucionais participativos, encontra-se
intimamente correlacionada a elementos materiais e simbólicos que constituem os meios de
vida dos sujeitos aos quais se imputa uma relação de representação. Nesse sentido, muito
antes do que esfera homogênea ou afônica, o rural é cenário de múltiplas dinâmicas sociais,
políticas, econômicas e culturais, como também de estratégias plurais de sobrevivência às
quais os sujeitos lançam mão para guiar suas vidas no campo. Como foco empírico, buscouse analisar a construção da representação política de agricultores familiares no Conselho
Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDRS), do município de Viçosa/MG –
órgão colegiado gestor que, de modo participativo e dialogado, constitui-se como o principal
espaço de gestão da política pública de desenvolvimento rural sustentável do município. A
partir da análise de trajetórias de vida de agricultores – coletadas a partir de entrevistas –,
de ações de observação participante realizadas junto às reuniões mensais do CMDRS e da
análise documental das atas de tais reuniões, buscou-se correlacionar em que medida os
57
meios de vida de tais agricultores são capazes de conformar um peculiar cenário de
representação política do rural. Pretende-se, dessa forma, explicitar elementos que sejam
significativos, capazes de contribuir junto ao debate sobre a relação entre democracia
participativa, deliberação pública e produção de políticas públicas para o campo.
• Artigo 3: Associativismo e políticas públicas rurais: meios de vida e percepção da
participação
de
agricultores
familiares
junto
ao
Conselho
Municipal
de
Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDRS) de Viçosa/MG
O foco central deste artigo voltou-se a investigar em que medida a presença de vínculos e
formas de associativismo, constituídos por sujeitos que vivem em comunidades rurais, são
capazes de instituir uma percepção democrática dos processos representativos e
participativos que constituem a política pública de desenvolvimento rural sustentável de
Viçosa/MG. De modo mais específico, tal política se organiza, particularmente, em torno do
Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDRS) – instância consultiva
e deliberativa, que assegura a participação de representantes de instituições (órgãos do
poder público e entidades representativas dos agricultores familiares e de trabalhadores
assalariados rurais) e de comunidades rurais de Viçosa para a produção de um processo
deliberativo formal e dialogado, em torno dos inúmeros aspectos que afetam o
desenvolvimento rural do município. A partir de dados obtidos em entrevistas realizadas com
agricultores familiares de comunidades rurais que têm assento no CMDRS, buscou-se
examinar como os vínculos associativos que tais representantes possuem em outras
instâncias sociais (associações de bairro, Igrejas, organizações produtivas, etc..) afetam as
percepções que os mesmos demonstram possuir tanto acerca de seus papeis de
representação, quanto acerca do próprio processo participativo engendrado pelo CMDRS.
Sendo assim, espera-se analisar, em que medida tal percepção pode ser relacionada ao
caráter das formas associativas que tais sujeitos já tomam parte, em outros âmbitos
coletivos, vivenciados no campo.
58
5.4
DADOS
SOBRE
SEMINÁRIO
PARA
FORMAÇÃO
POLÍTICA
DE
CONSELHEIROS MUNICIPAIS DO CMDRS
Por fim, em relação aos aspectos sócio-antropológicos sobre a mobilização, a
organização social e a ocupação do espaço da cidade referentes às comunidades rurais de
Viçosa, serão apresentados alguns dados acerca do Seminário para Formação Política de
Conselheiros Municipais do CMDRS, realizado em 07/11/2012, no Departamento de
Economia Rural da UFV.
SEMINÁRIO PARA A FORMAÇÃO POLÍTICA DE CONSELHEIROS DO CONSELHO
MUNICIPAL DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL, VIÇOSA - MG
1. OBJETIVOS DO SEMINÁRIO
• Promover diálogos direcionados para a formação político-temática em democracia,
participação, representação política e desenvolvimento rural sustentável, a partir de
estratégias didático-pedagógicas dinâmicas, interativas e participativas;
• Lançar aos conselheiros as regras para participação no âmbito do CMDRS, a fim de
que sejam entendidas e aceitas coletivamente;
• Expor problemas enfrentados pelos conselheiros, bem como o estimular a proposição
de soluções;
• Avaliação parcial do Cidade e Alteridade e do seminário por parte dos próprios
conselheiros, tanto a partir de diálogos no grupo quanto por meio da possibilidade de
se formar um espaço para atendimentos individualizados.
2. ESTRATÉGIAS DE DIVULGAÇÃO
• Avisos nas reuniões do CMDRS que ocorreram ao longo do ano e reforço e
confirmação do seminário nas reuniões de outubro e novembro;
• Os conselheiros foram estimulados a divulgar o seminário em suas comunidades;
• Divulgação pela EMATER durante as visitas às comunidades rurais;
• Contato por telefone com o objetivo de divulgação e organização do curso. Nas
ligações, informamos o dia, horário e local da realização do curso; e aproveitamos
para estimar o número de presentes.
59
3. APOIO
• Fundação Arthur Bernardes (FUNARBE): patrocinou o coffee break;
• Editora UFV: doou 3 livros para sorteio;
• CAMPIC (Empresa Júnior do Curso de Cooperativismo da UFV): colaborou com a
doação de blocos para anotações, tarjetas coloridas, papéis para impressão de
panfletos e crachás, barbante para crachás, bandejas e jarras para coffee break;
• EMATER: vem possibilitando a participação e desenvolvimento do projeto no CMDRS,
além de ter contribuído com a divulgação do evento e ter transportado alguns
conselheiros no dia do seminário;
• Departamento de Economia Rural: possibilitou o acesso à cantina, às salas e aos
equipamentos, como data-show, para realização do evento;
• Centro de Ciências Agrárias: almoço para todos que participaram no seminário.
4. PROGRAMAÇÃO
• 08:30 – Café de boas vindas: a recepção dos participantes, distribuição dos kits e
coffee break ocorreram dentro dos conformes;
• 09:00 – Abertura: as atividades se iniciaram com a dinâmica da bola que ocorreu
dentro do horário planejado e realmente possibilitou criar uma clima de familiarização
entre os participantes. As expectativas dos conselheiros se mostraram bastante
parecidas, como: aprendizado, fortalecimento, cultivo, ajuda, crescimento, entre
outros;
• 09:15 – Primeiro Tema – O que é o Conselho? : a exposição dialogada sobre o
panorama histórico de surgimento dos Conselhos no Brasil contou com boa
participação dos presentes, pois os mesmos relataram experiências próprias durante a
apresentação das figuras pertinentes ao tema no data-show. Esse momento também
permitiu analisar o que os conselheiros entendiam sobre o assunto. Embora essa
atividade tenha tido início um pouco depois das 09h e 15min, ela se encerrou dentro
do horário planejado;
• 09:45 – Palestra – Representação Política/ Institucionalização: através de
inúmeras figuras e de exposição dialogada foi possível compreender e reforçar o papel
dos conselheiros, bem como fortalecer a importância da representatividade de cada
60
membro do Conselho. Esse momento também contou com boa participação dos
presentes;
• 11:00 – Almoço: a refeição ocorreu dentro dos conformes, porém deveria ter sido
reservada meia hora a mais para este momento;
• 12:00 – Segundo Tema – Direitos e Deveres dos Conselheiros: através de uma
dinâmica bem agitada, os conselheiros foram estimulados à identificarem seus direitos
e deveres frente ao CMDRS de Viçosa, além de exporem dificuldades encontradas no
exercício da representatividade;
• 12:45 – Socialização e Avaliação das Expectativas: nesse momento foram
socializados e debatidos publicamente os dilemas enfrentados pelos conselheiros na
sua rotina enquanto representantes. Também foram resgatadas questões abordadas
na parte da manhã e de acordo com o que foi falado, as expectativas foram bem
avaliadas e atendidas. Finalizamos com os agradecimentos e orações e
• 14:00 – Coffe Break: despedida dos participantes.
5. NÚMERO DE CONVIDADOS E NÚMERO DE PRESENTES
• Estiveram presentes 19 conselheiros, sendo que, houve mais de um participante por
comunidade. As comunidades que tiveram os conselheiros presentes foram Silêncio,
Córrego São Francisco, Estiva e Setores, Córrego Fundo, Paula, Córrego do Engenho,
Paiol e Cristais. Já no que e refere às instituições compareceram somente os
conselheiros do Sindicato Rural e EMATER.
6. AVALIAÇÃO
a) Da infraestrutura: Apesar dos recursos escassos e da simplicidade com que foram
montados os kits e coffee-breaks, pode-se considerar que a infraestrutura do evento
foi suficiente para atender o público-alvo e os objetivos do seminário, pois também
contamos com salas amplas e bem equipadas.
b) Da divulgação: Como o público-alvo desse evento era restrito (participantes do
CMDRS), a divulgação feita foi adequada uma vez que se realizou, principalmente, em
momentos onde todos os interessados estavam presentes: nas reuniões do Conselho.
c) Da programação: Embora tenham ocorrido alguns ajustes bem próximos ao evento, a
61
programação foi seguida corretamente, sem atrasos ou ausências. É certo que a carga
horária foi restrita, mas pode-se pensar em um horário de almoço um pouco mais
longo em eventos futuros. Além disso, é interessante realizar simulações das
atividades com antecedência nos próximos eventos.
d) Da presença: A presença dos conselheiros e da EMATER garantiu entusiasmo e
muita participação dos presentes. Entretanto, 6 comunidades estiveram ausentes. A
ausência pode estar ligada ao dia escolhido para o curso, quarta-feira, dia no qual
alguns conselheiros não teriam como abandonar o trabalho no campo; ou ainda, à
falta interesse dos representantes ausentes em relação ao CMDRS.
e) Da participação dos conselheiros: Além da presença física, pode-se considerar que
a participação, o diálogo e o interesse dos conselheiros foram extremamente
satisfatórios. Ao longo do dia de atividades foi possível perceber que os conselheiros
se identificaram com os assuntos abordados no evento e trouxeram questões muito
importantes ao projeto, como: a valorização dos conselheiros (ou a falta dela) dentro
das comunidades rurais e dentro dos próprios órgãos municipais; a importância de
priorizar demandas mais urgentes, mas não se esquecer de discutir e solucionar
também problemas pequenos; o reconhecimento de que a conquista de direitos é fruto
da boa realização dos deveres e vice-versa; dificuldades em relação à comunicação
com os moradores das comunidades (estabelecimento de vínculos e ajuda mútua),
entre outros.
f) Dos conselheiros: Após a fala das expectativas no início do evento e a recuperação
das mesmas ao final ficou claro que foi possível contribuir para o fortalecimento cívico
e para o esclarecimento dos conselheiros quanto ao seu papel político frente ao
CMDRS. Da mesma forma, o diálogo realizado durante o seminário permitiu ao grupo
do projeto identificar novas faces da atuação dos conselheiros, das suas rotinas e de
seus dilemas, indicando, assim, novos passos a serem tomados.
7. SUGESTÕES PARA OS PRÓXIMOS SEMINÁRIOS
• Talvez um desses novos passos a serem tomados seja a sensibilização nas
comunidades. Foram unânimes as queixas sobre a desvalorização dos conselheiros
em suas comunidades, o que inspira pensar algumas estratégias de maior divulgação
62
do CMDRS na zona rural e que podem acontecer durante os grupos focais. Nesse
caso é interessante ressaltar a ação conjunta, persistente e paciente, uma vez que os
resultados costumam aparecer a longo-prazo. Isso também seria uma tentativa de
diminuir a força da “cultura do curto-prazo” que tanto prejudica a formulação das
políticas públicas no país.
• Sensibilização de representantes institucionais e, principalmente, de representantes
governamentais.
• Abordar como tema a formalidade do CMDRS, por exemplo, destrinchar a Lei e
construir juntamente com os representantes as formas de dialogar com as instituições,
para assim, os mesmos terem uma relação positiva com as pessoas da comunidade.
63
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este documento teve como objetivo consolidar um relato parcial das atividades
desenvolvidas pelo projeto Cidade e Alteridade: Convivência Multicultural e Justiça Urbana
junto a comunidades rurais nos arredores do município de Viçosa/MG, no que se refere à
mobilização, à organização social e à ocupação do espaço da cidade, tendo em vista
aspectos sócio-antropológicos e jurídicos.
Em todo o ano de 2012, as equipes do projeto desenvolveram estratégias
metodológicas voltadas à busca e à sistematização de dados acerca da realidade empírica
da pesquisa, como também se voltaram ao estudo de conceitos e de teorias que pudessem
subsidiar a conformação e a leitura dos primeiros problemas a serem verificados. Sendo
assim, pode-se afirmar que as principais perguntas diante da realidade que foram
levantadas referem-se mais aos aspectos formais sobre os processos participativos e
representativos no âmbito institucional do CMDRS do que propriamente às inúmeras
questões acerca das alteridades e da convivência na cidade, implicadas na rotina dos
moradores das comunidades rurais.
Com vistas a suprir os aspectos relacionados aos vínculos de sociabilidade e aos
dados acerca da suposta exclusão material e simbólica das comunidades rurais de Viçosa
junto às políticas públicas municipais, estão previstas as seguintes ações de pesquisa para
o ano de 2013, vinculadas ao âmbito metodológico “Processos participativos e meios de
vida”:
a) Observação participante nas reuniões do CMDRS, mediante roteiro de pesquisa
inspirado por um método sócio-etnográfico: nesse âmbito, a pesquisa atentará não
somente às falas e aos discursos, mas aos comportamentos, às reações e aos arranjos
organizativos dos sujeitos no espaço do CMDRS;
b) Detalhamento dos meios de vida de quatro comunidades rurais de Viçosa: a pesquisa
buscará identificar e detalhar os meios de vida de quatro comunidades rurais de Viçosa,
com o intuito de tentar captar as dinâmicas campo-cidade estabelecidas em torno da
política pública de desenvolvimento rural do Município. Como já apresentado nas
considerações iniciais deste relatório, as seguintes questões serão inspiradoras na
produção dos procedimentos da pesquisa: (1) que meios os sujeitos, individual e/ou
coletivamente, empregam para sobreviver? (2) Que estratégias utilizam para produzir
economicamente e para viver em sociedade? (3) Que meios os moradores dessas
64
comunidades aproveitam para resolver seus problemas e para continuar o decurso de
suas vidas? (4) Como se organizam coletivamente diante das questões políticas e
produtivas? (5) Como os moradores das comunidades rurais se vêem em relação às
dinâmicas campo-cidade estabelecidas: percebem-se como marginalizados? (6)
Compreendem-se enquanto sujeitos de direito ou como objetos de tutela do Estado?
c) Como também já apontado, ressalta-se que é pretensão das equipes utilizar os seguintes
procedimentos: (i) entrevistas semi-estruturadas com representantes do CMDRS e com
outros sujeitos das quatro comunidades rurais escolhidas, mediante elaboração de
roteiros semi-estruturados de pesquisa; e (ii) realização de grupos focais nas
comunidades. (iii) realização de levantamento socioeconômico: pretende-se buscar
dados primários acerca de aspectos sociais, econômicos e políticos de todo o universo
das quatro comunidades escolhidas; tais dados serão buscados a partir de critérios
objetivos, tais como: renda, transporte, acesso às políticas públicas (como saúde,
educação, segurança, lazer), convivência na cidade, etc..
65
7 REFERÊNCIAS
ABRAMOVAY, R. O Capital Social dos Territórios: repensando o desenvolvimento rural.
Revista de Economia Aplicada, V.4, Nº2, p. 379-396, 2000.
AVRITZER, L. Teoria democrática e deliberação pública. Belo Horizonte: Lua Nova nº50,
2000. pp 25-46.
BECKER, Daniel et. all. Empowerment e avaliação participativa em um programa de
desenvolvimento local e promoção da saúde. Revista Ciência & Saúde Coletiva, 9 (3):655667, 2004.
BOHMAN, James. Public Deliberation: Pluralism, complexity and democracy.
Cambridge: MIT Press, 2000.
BUARQUE, S. C. Construindo o desenvolvimento local sustentável: metodologia e
planejamento. Rio de Janeiro: Garamond, 2002.
CAMPANHOLA, C.; GRAZIANO DA SILVA, J. (Ed.) O novo rural brasileiro: políticas
públicas. Vol. 4. Jaguariúna-SP: Embrapa Meio Ambiente, 2000.
CHAMBERS, R.; CONWAY, G. R. Sustainable rural livelihoods: pratical concepts for
the 21 centurty. IDS Discussion papper, Brighton (UK), 1992.
COELHO, France. A arte das orientações técnicas no campo. Viçosa: Editora UFV, 2005.
COELHO, Vera Schattan P.; NOBRE, Marcos. Participação e deliberação — teoria
democrática e experiências institucionais no Brasil contemporâneo. São Paulo: Editora
34, 2004. 367p.
COHEN, J. Deliberation and democractic legitimacy. In: BOHMAN, J. e REIGH, W (orgs).
Deliberative democracy. Cambridge-Mass: MIT Press, 1997. pp 67-91.
BENHABIB, Seyla. Toward a deliberative model of democratic legitimacy. In: __________.
(ed.) Democracy and difference: contesting the boundaries of the political. Princeton:
Princeton University Press, 1996. P. 67-94.
CUNHA, Edite da Penha. Participação e deliberação nas inovações institucionais pósConstituição de 1988: o Conselho Estadual de Assistência Social e a Comissão de
Participação Popular em Minas Gerais. Dissertação (mestrado) Ciência Política –
Programa de Pós-graduação em Ciência Política da Faculdade de Filosofia e Ciências
Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2007.
CUNHA, Eleonora Schettini Martins. Aprofundando a democracia: o potencial dos
Conselhos de Políticas e Orçamentos Participativos. Dissertação (mestrado) em Ciência
Política. – Programa de Pós-graduação em Ciência Política da Faculdade de Filosofia e
Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2004.
CUNHA, Eleonora Schettini Martins. Participação política e o enfrentamento da questão
social: o potencial dos conselhos de políticas e do orçamento participativo no Brasil.
Artigo apresentado no VIII Congresso Luso-Afro-Brasileiro de Ciências Socias. Coimbra,
setembro de 2004. Disponível em www.ces.uc.pt/LAB2004. Acesso em 24/10/2011.
66
DIAS, Marcelo M. Introdução aos fundamentos conceituais e teóricos da noção de
desenvolvimento: uma abordagem histórica. Viçosa, 2011.
DRYZEK, J. S. Legitimidade e economia na democracia deliberativa. IN: COELHO, V. P. S.
e NOBRE, M. (Org.) Participação e deliberação — teoria democrática e experiências
institucionais no Brasil contemporâneo. São Paulo: Editora 34, 2004, p.21-41
FARIA, Cláudia Feres. Fóruns participativos, controle democrático e a qualidade da
democracia no Rio Grande do Sul: a experiência do governo Olívio Dutra (1999-2002).
Opinião Pública, Campinas, v. 12, n. 12, p. 378-406, Novembro 2006.
FAVARETO, Arilson da Silva. Paradigmas do desenvolvimento rural em questão. São
Paulo: Editora IGLU, 2007.
FUNG, Archon; WRIGHT, Erik (eds) Deepening Democracy. Londres/NY: Verso, 2003.
FUNG, Archon. Receitas para esferas públicas: oito desenhos institucionais e suas
conseqüências. In: COELHO, Vera Shattan; NOBRE, Marcos (eds.). Participação e
deliberação: teoria democrática e experiências institucionais no Brasil
Contemporâneo. São Paulo: Ed. 34, 2004, pp. 173-209.
FUNG, Archon. Empowered Participation – Reinventing Urban Democracy. New Jersey,
Princeton University Press, 2004b.
GAMSON, William A. Falando de política. Belo Horizonte: Autêntica, 2011.
GOLDSMITH, Edward. Antes do desenvolvimento. In: Vários Autores. Desfazer o
desenvolvimento para refazer o mundo. Vargem Grande Paulista: Cidade Nova, 2009.
GUTMANN, Amy e THOMPSON, Denis. What deliberative democracy means. In: ______.
Why deliberative democracy? New Jersey: Princeton University Press, 2004. Pp. 1-63.
HABERMAS, J. O papel da sociedade civil e da esfera pública política. In: __________.
Direito e Democracia: entre faticidade e validade. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro,
1997. pp 57-123.
HABERMAS, J. Política deliberativa: um conceito procedimental de democracia. In: ____.
Direito e Democracia: entre faticidade e validade. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro,
1997. p. 9-56.
HABERMAS, J. Concluding Comments on Empirical Approaches to Deliberative
politics. Acta Política, 2005, volume 40, 384-392.
HEBINK, Paul; LENT, Peter. Livelihoods and landscapes. Leiden / Boston: Brill, 2007.
HENDRIKS, Carolyn. Integrated Deliberation: Reconciling Civil Society’s Dual Role in
Deliberative Democracy. In: Political Studies, 2006, volume 54, pp 486-508.
IPEA. República, Democracia e Desenvolvimento: contribuições da DIEST/IPEA para pensar
o Brasil contemporâneo Diretoria de Estudos e Políticas do Estado, das Instituições e da
Democracia (Diest) do Ipea. Brasília, 2011.
LEFF, E. Saber ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder.
Tradução Lúcia Mathilde Endlich Orth. Petrópolis: Vozes, 2001.
67
MAFRA, Rennan. Exercício de democracia. Belo Horizonte: Cadernos Manuelzão, nº61,
2011; pp 16-17.
MAIA, Rousiley; GOMES, Wilson. Comunicação
perspectivas. São Paulo: Paulus, 2008.
e
democracia:
problemas
&
MANSBRIDGE, Jane. Everyday Talk in Deliberative System. In: MACEDO, Stephen (ed.).
Deliberative Politics: essays on democracy and disagreement. Oxfor: Oxford University
Press, 1999.
MARQUES, Angela (org). A deliberação pública e suas dimensões sociais, políticas e
comunicativas. Belo Horizonte: Autência, 2009.
NAVARRO, Zander; PEDROSO, Maria Thereza Macedo. Agricultura Familiar: é preciso
mudar para avançar. Brasília/DF: Embrapa Informação Tecnológica, 2011.
PERONDI, Miguel Angelo. Diversificação dos meios de vida e mercantilização da
agricultura familiar. Tese de Doutorado. Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento
Rural. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2007.
SABOURIN, E. P. Camponeses do Brasil: entre a troca mercantil e a reciprocidade. Rio
de Janeiro: Garamond Universitária, 2009.
SACHS, Ignach. Estratégias de Transição para o século XXI: Desenvolvimento e Meio
Ambiente. São Paulo: Nobel/ FUNDAP, 1993.
SANTOS, Boaventura de Souza.
Introdução a uma ciência pós-moderna.
Janeiro: Rio de Janeiro: Graal, 1989.
Rio de
SANTOS, Boaventura de Souza (org). Conhecimento prudente para uma vida decente:
“Um discurso sobre as ciências” revisitado. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2006.
SANTOS, Boaventura de Souza. Renovar a teoria crítica e reinventar a emancipação
social. São Paulo: Boitempo, 2007.
SANTOS, Boaventura de Souza. Um discurso sobre as ciências. São Paulo: Cortez,
2003.
SAUER, Sérgio. Terra e modernidade. Brasília: Expressão Popular: 2010.
SCOTTO, Gabriela. CARVALHO, Isabel. C. de M; GUIMARÃES, L.B. Desenvolvimento
Sustentável: a história de um conceito. Petrópolis: Vozes, 2007.
SCOONES, I. Sustainable rural livelihoods: a framework for analysis. IDS Working
papper, Brighton, 1998.
SHERER-WARREN, I. Cidadania sem fronteiras: ações coletivas na era da
globalização. São Paulo:Hucitec, 1999.
SHERER-WARREN, I. A política dos movimentos sociais para o mundo rural. Estudos
Sociedade e Agricultura. V. 15, n. 1, abril 2007.
68
SCHINEIDER, S., SILVA, M. K. e MORUZZI MARQUES, P. E. Políticas públicas e
participação social no Brasil rural. UFRGS Editora, 2009.
SEN, A. Desenvolvimento como liberdade. Tradução Laura Teixeira Motta. São Paulo:
Companhia das Letras, 2000.
SIEDENBERG,
Dieter
R.
Indicadores
de
desenvolvimento
Desenvolvimento em Questão, Ijuí, v.1, n.1, p. 9-26, jan./jun. 2003.
socioeconômico.
SIEDENBERG, Dieter R. Desenvolvimento: ambigüidades de um conceito difuso.
Desenvolvimento em Questão, Ijuí, v.2, n.3, p. 9-26, jan./jun. 2004.
SINGER, P. É possível levar o desenvolvimento a comunidades pobres? Brasília:
Ministério do Trabalho e Emprego; Secretaria Nacional de Economia Solidária, 2004.
SPOSITO, M. Encarnação Beltrão. Cidade e campo. Relações e contradições entre
urbano e rural. São Paulo: Editora Expressão Popular, 2010.
TATAGIBA, Luciana. Os conselhos gestores e a democratização das políticas públicas no
Brasil. In: DAGNINO, Evelina. Sociedade civil e espaços públicos no Brasil. São Paulo:
Paz e Terra, 2002.
VEIGA, J. E. Desenvolvimento sustentável: o desafio do século XXI. Rio de Janeiro:
Garamond, 2005.
VEIGA, J. E. Do global ao local. Campinas: Armazém do Ipê, 2005b.
VIÇOSA. LEI Nº 2.081 de 18 de novembro de 2010. Dispõe sobre a reformulação do
Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável – CMDRS e dá outras
providências.
http://www.camaravicosa.mg.gov.br/nav/23/leis_municipais.
html?pagina=23&paginacao=1 <Acesso em 25 de outubro de 2011>.
VIÇOSA. LEI Nº 2.137 de 16 de maio de 2011. Acrescenta alíneas nos inciso I e II do
artigo 6º da Lei nº 2.081/2010, que dispõe sobre a reformulação do Conselho Municipal
de Desenvolvimento Rural Sustentável – CMDRS e dá outras providências.
http://www.camaravicosa.mg.gov.br/nav/23/leis_municipais.html?pagina=23&paginacao=1
<Acesso em 25 de outubro de 2011>.
WANDERLEY, M. N. B. O mundo rural como espaço de vida – reflexos sobre a
propriedade da terra, agricultura familiar e ruralidade. Porto Alegre: UFRGS Editora,
2009.
YOUNG, I. M. (2006). Representação política, identidade e minorias. Lua Nova. São
Paulo, Cedec, n. 67.
69
8 ANEXOS
ANEXO 1: Roteiro semi-estruturado para realização de entrevistas com
representantes das 14 (catorze) comunidades rurais de Viçosa/MG
1) Entrevistado (a):
2) Comunidade Rural:
Camada I: Quebra gelo
O que a comunidade representa para você?
Camada II: História do conselho, relação da comunidade com o conselho
Como você soube do conselho e como sua comunidade começou a participar?
Como você escolhido para representante do conselho?
Camada III: A visão do conselheiro em relação ao conselho
O que acha sobre o conselho?
Camada IV: A visão da comunidade em relação ao conselheiro, pelo conselheiro
A comunidade sabe que você participa do conselho?
Camada V: Características da comunidade
Fale um pouco sobre sua comunidade
A comunidade aqui se reúne? Normalmente, para quê?
Quais são as datas comemorativas que reúnem as pessoas?
O povo aqui vive de quê?
Recebem algum benefício do governo (ex: bolsa família, Pronaf, Pnae, Paa, etc)?
O que mais se planta ou se cria?
Tem escolas na comunidade? Se sim, até qual nível escolar?
Tem atendimento do PSF ou posto de saúde?
A partir do momento em que a comunidade teve um representante no conselho, mudou
alguma coisa na comunidade?
O que sua participação no Conselho trouxe para a comunidade?
70
ANEXO 2: Formulário para observação participante das reuniões do CMDRS
Local:
Data:
Comunidade:
Observador:
EIXO 1: PRESENÇA
( ) Sim
1.1) A “comunidade” está presente?
( ) Não
1.2) Quem é o representante? ( ) Conselheiro
( ) Suplente
( ) Representante
informal
EIXO 2: AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO DO CONSELHEIRO DURANTE A REUNIÃO
( ) Sim
2.1) Pontualidade
CONCEITO
muito ruim
ruim
( ) Não
regular
bom
muito
bom
2.2) Concentração
2.3) Permanência na
sala de reunião
2.4) Inte(g)ração com
os demais
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
conselheiros
OBS:
EIXO 3: AVALIAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DO CONSELHEIRO DURANTE O DEBATE:
( ) Sim
3.1) Posicionamento
( ) Não
crítico
3.2) Se sim, o posicionamento crítico foi:
( ) tematizado publicamente
( ) tematizado restritamente
OBS:
3.3) Quais foram as colocações do conselheiro?
3.4) As propostas dos conselheiros trazem questões de interesse:
( ) Da comunidade em geral
( ) Particular
( ) Não se pronunciou
71
3.5) As propostas foram acatadas pelos participantes da reunião?
( ) Sim
( )Não
( ) Em partes
Quais (aceitas/rejeitadas)? Por quê? Por quem?
EIXO 4: OBSERVAÇÕES SOBRE A ATA
4.1) No caso de ausência do conselheiro, houve registro em ata? (
) Sim
(
) Não
OBS:
DEMAIS OBSERVAÇÕES
PRESENÇA INSTITUCIONAL
Número total Instituições presentes:
Instituições
( ) Secretaria Municipal de Agricultura
( ) Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo
( ) Secretaria Municipal de Educação
( ) Secretaria Municipal de Saúde
( ) Secretaria Municipal de Obras e Serviços Públicos
( ) EPAMIG / CTZM
( ) IMA
( ) EMATER-MG
Representantes
( )
Titular: Lidson Lehner Ferreira
( )
Suplente: José Luiz Rosa
( )
Titular: Luiz Eugênio de Moura
( )
Suplente: Juliana Cristina Vieccelli
( )
Titular: Rosane Aparecida Parzanini de São José
( )
Suplente: Ana Maria Conzaga Vieira
( )
Titular: Zilda Aparecida Rezende da Cruz
( )
Suplente: Maria Bernadete dos Santos
( )
Titular: Lutercia Maria Ferreira
( )
Suplente: Edson Bhering Fialho
( )
Titular: Yonara Poltronieri Neves
( )
Suplente: Maria Regina Miranda de Souza
( )
Titular: Adriana Félix Iasbic
( )
Suplente: Maria José Novaes Firmo
( )
Titular: Marcelino Soares
72
( ) UFV
( ) Legislativo Municipal
( ) IEF
( )
Suplente: Karina Lopes Chequer
( )
Titular: Marcelo Mina Dias
( )
Suplente: Ivo Jucksch
( )
Titular: Cristina Fontes
( )
Suplente: Marcos Arlindo Pereira
( )
Titular: Antônio César de Oliveira
( )
Suplente: Jorge Djalma Rodrigues
EIXO 2: PARTICIPAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DURANTE O DEBATE
Qual(is) representante(s) institucional(is) se manifestou(aram):
Colocações do(s) representante(s) institucional(is):
As colocações do(s) representante(s) foram de interesse:
( ) das comunidades em geral
OBS:
( ) da Instituição
( ) particular
73
ANEXO 3 – Notícia do CMDRS na Folha da Mata (Viçosa/MG, Nov. 2012)