Sapateado, jazz, hip-hop Sapateado

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Sapateado, jazz, hip-hop Sapateado
Sapateado, jazz, hip-hop
A dança contemporânea americana evoluiu para vários estilos divergentes.
Cada um deles é único como as línguas o são entre si, no entanto, tal como as
línguas românicas partilham as suas raízes no Latim, estes estilos também
partilham o mesmo ADN. Os géneros do sapateado, jazz, e hip-hop são distintos
entre si, no entanto todos dão um ênfase à música: seja ilustrando ritmicamente
a música de acompanhamento ou, no caso do sapateado, por vezes criando
mesmo a música. Estes três estilos também colocam a ênfase no
entretenimento, seja num sentido mais tradicional de envolver o público numa
base individual ou organizando competições com outros bailarinos, como é
comum no sapateado e no hip-hop. No entanto, os três apresentam o melhor do
espírito do "melting pot" da Américaem estilos de dança vivos, altamente
interpretativos, físicos e expressivos.
Os três estilos foram em grande parte fundados pelos americanos de
ascendência africana, com vertentes das Ilhas Britânicas. Mas enquanto o
hip-hop é uma forma jovem, com início nos anos 70, o sapateado é
relativamente antigo, tendo-se desenvolvido em paralelo com a mudança de
papéis dos afro-americanos durante a sua longa luta pelos direitos civis e
acabando por se ramificar no jazz do século XX.
Sapateado
Na América e com início em meados do século XVII, o sapateado evoluiu a partir
das danças da África Ocidental feitas pelos escravos e com influências das Ilhas
Britânicas, incluindo a dança de sapateado irlandês e a dança de socos inglesa.
As qualidades de ambas as influências geográficas misturaram-se - com ênfase
africano na dinâmica e na fluidez e ênfase britânico na técnica e no trabalho de
pés. As diferentes características predominantes de ambas ainda podem ser
detectadas na ampla variedade das abordagens actuais ao sapateado.
O crescimento do sapateado pode, em parte, ser atribuído à repressão artística.
Uma insurreição de escravos nos anos 30 do século XVIII levou os senhores
esclavagistas brancos a banir o uso de tambores, que eles consideravam ser
uma ferramenta para organizar a revolução. Daí em diante, a criatividade e a
ingenuidade levaram as pessoas a fazerem ritmos com o seu corpo e, mais
especificamente, com os seus pés. No final do século XVIII, eram realizados
concursos de danças jig em “palcos” fabricados com tábuas de madeira,
premiando as rotinas mais elaboradas e os bailarinos mais empolgantes que
mantivessem o equilíbrio.
Os espectáculos de menestréis, muitíssimo populares no início e em meados do
século XIX, apresentavam artistas caucasianos (e mais tarde descendentes de
africanos) com o rosto pintado de preto, simulando um comportamento de negro
e simultaneamente expondo elementos da cultura africana que ganharam
popularidade no Vaudeville quando as políticas dos menestréis caíram em
desuso. William Henry Lane (“Mestre Juba”) actuava em espectáculos de
menestréis, sendo na altura um raro artista negro entre brancos. O espectáculo
de menestréis, que ao mesmo tempo imitava e prestava homenagem à cultura
negra, reflecte um país tumultuoso e jovem com um norte industrial e orientado
pelo capital e com plantações e escravatura no sul. O espectáculo Vaudeville,
que teve o seu arranque na década de 80 do século XIX, incluía uma variedade
de actuações, de monólogos sérios a acrobacias e danças. Foram estabelecidos
diversos circuitos, formando uma rede de teatros nos quais actuações com êxito
podiam fazer tournées de um modo organizado.
Por volta de 1900, a forma de dança era ainda conhecida como clog (socos),
step (passos), buck ou dança buck-and-wing. A sua popularidade crescia,
embora fosse essencialmente segregada. Os teatros formaram redes de
tournées, o que catalisou a disseminação deste género. Uma organização
chamada Theater Owners’ Booking Association (TOBA) associou os teatros e
artistas Vaudeville negros. A popularidade da Broadway também estava a
aumentar, mas seria o Vaudeville a alimentar o legado do sapateado. Esta área
em constante crescimento expandir-se-ia para acolher um conhecimento mais
técnico e uma maior individualidade.
Os artistas mais conhecidos do século XX incluem os Nicholas Brothers (Harold
e Fayard Thomas), cujas acrobacias arrojadas — saltando para palcos divididos
e entre plataformas sobre a banda — deixavam o público sem fôlego. Os pares
de bailarinos surgiram em parte como resultado de uma regra que proibia os
negros de actuarem sozinhos. “Buck and Bubbles,” John “Bubbles” Sublett e
Ford “Buck” Washington distinguiram-se pelos fraques elegantes e pelo
acompanhamento ao piano e eram frequentadores habituais do Harlem’s
Hoofers’ Club, onde tinham lugar danças informais, mas competitivas. Bill
“Bojangles” Robinson era exemplo de um polimento suave e fresco; as suas
danças em escadarias tornaram-se a sua assinatura singular.
Nos anos 30, o Vaudeville estava em declínio, mas a Broadway e os filmes
ganhavam popularidade. Tal significou que números de produção elaborada e
exuberante, criados ao gosto de Busby Berkeley, passaram a ser um gosto
avidamente adquirido pelas audiências, enquanto apresentações de
improvisação mais íntimas foram afastadas do olhar do público. Artistas que
surgiram nessa era continuam a ser ícones do género —Ann Miller, Ray Bolger,
Donald O’Connor, Gene Kelly e, mais indelevelmente, Fred Astaire e a sua
parceira frequente Ginger Rogers.
Kelly e Astaire representaram duas faces do sapateado muito diferentes e
ambas atraentes. Kelly usava vestuário desportivo justo e misturava o sapateado
com os expressivos movimentos do jazz, com os seus pliés profundos e braços
flectidos afastados do tronco. Movia-se com uma atitude confiante que parecia
personificar os EUA, como se viu no filme épico a cores, Um Americano em
Paris. As notas de jazz encontradas nas rotinas de Kelly cresceram rapidamente
na Broadway e em filme. Astaire, por sua vez, exibia elegância e graça.
Frequentemente envergando um fraque com uma cartola ou uma bengala, era
uma estrela do grande ecrã que evoluiu com facilidade do preto e branco para a
cor. Ginger Rogers era sua parceira frequente; juntos personificavam o romance,
o humor, o optimismo americano e a ingenuidade coreográfica.
O sapateado pode ter-se afastado do olhar do público em meados do século XX,
mas encontrou muitos defensores nas salas de aula e nos festivais. Embora os
passos do sapateado sejam, até certo ponto, codificados e o seu vocabulário
padronizado, sempre foi uma forma de dança individualista, evoluindo
continuamente com cada novo intérprete. Assim, a forma artística foi mantida
viva por praticantes como Jimmy Slyde, Charles “Honi” Coles e John Bubbles. A
geração seguinte incluiu muitas mulheres, como Dianne Walker, Brenda
Bufalino, Lynn Dally e Jane Goldberg, que, através da sua organização Word of
Foot, organizava conferências e mantinha vivas as tradições do género desde o
início dos anos 80.
Pouco tempo depois, uma nova geração de aficionados veria o dançarino de
sapateado americano Gregory Hines confrontar a estrela do ballet russo Mikhail
Baryshnikov no filme Noites Brancas. Os respectivos géneros de dança podiam
ser vistos como indicativos das características das suas nações. Hines
apresentava atletismo, virtuosismo e grande carisma no ecrã. Participou no filme
Jelly’s Last Jam (1992) com o jovem Savion Glover, que inúmeras pessoas
consideram estar entre os melhores bailarinos de sapateado de sempre. Glover
salienta a estrutura musical e o contraponto, desempenhando ritmos cada vez
mais complexos numa grande variedade musical, incluindo a música clássica.
Ganhou um Prémio Tony pela melhor coreografia para o show da Broadway de
1996, Bring in ‘Da Noise, Bring in ‘Da Funk e inspirou outra nova geração.
São organizados festivais em todos os EUA, em especial em cidades como St.
Louis, Chicago e Boston. O Tap Extravaganza, que teve início em 1989, celebra
o Dia Nacional do Sapateado e selecciona um bailarino para receber um prémio
anual de conquistas ao longo da vida. Os últimos anos viram surgir uma nova
geração diversificada de bailarinos de sapateado, com floreados estilísticos cada
vez mais individualizados. Nestes incluem-se Max Pollack, Roxanne Butterfly,
Tamango, Dormeshia Sumbry-Edwards, Michelle Dorrance e Jason Samuels
Smith, que aparece ao lado do ícone do sapateado Arthur Duncan na curtametragem Tap Heat. [na versão web ao clicar em Tap Heat obtém a
hiperligação, mas o título não está sublinhado indicando que se trata de uma
hiperligação]
Na cultura pop mais ampla, o sapateado tem uma eterna presença na
Broadway, como se viu em recentes espectáculos revivalistas como 42nd Street
e Anything Goes. Os espectáculos de sapateado irlandês, encabeçados por
Riverdance, revelaram-se muitíssimo populares e podem ser encontradas na
Broadway produções teatrais que apresentam sapateado irlandês. E ambas as
formas podem ocasionalmente ser vistas em alguns dos populares programas
de competição de dança e de talentos da televisão. Na área dos concertos de
dança, companhias como a Jazz Tap Ensemble de Lynn Dally, uma companhia
da 2012 DanceMotion USA, fazem espectáculos por todo o país e
internacionalmente. O género evoluiu de modo a acomodar tanto as danças
rigorosamente coreografadas como o tipo de improvisação engenhosa que
encontra um paralelismo nos "jams" musicais.
Jazz
De entre o sapateado, o jazz e a dança hip-hop, o jazz é o género mais
abrangente em termos de técnica. Tal como a música que lhe deu o nome,
assenta fortemente em interpretações pessoais de ritmo e dinâmica. A árvore
genealógica do jazz partilha o seu tronco com o sapateado, que teve início cedo
na história da América, quando os escravos usavam o seu corpo e os pés como
instrumentos de percussão, à medida que os tambores eram banidos por serem
considerados instrumentos de revolução. As danças africanas misturaram-se
com as das Ilhas Britânicas e tinham lugar competições informais. Com algumas
excepções, inicialmente não era permitido aos negros participarem, mas a
popularidade da cultura africana arrancou em finais do século XIX através da
forma dominante de entretenimento, o espectáculo de menestréis.
No início do século XX, ao som de música ragtime, de orquestras de salão e de
grandes bandas, a dança firmou o passo na imaginação, através de revistas
(Darktown Follies, Ziegfeld Follies), clubes (Hoofers Club, Cotton Club, Savoy
Ballroom) e do teatro musical. A revista de 1921 Shuffle Along incluía no seu
elenco Josephine Baker, a qual se tornou uma das maiores estrelas da época.
Danças sociais como o Lindy Hop (mais tarde chamada jitterbug) eram uma
forma de a população ter acesso a este estilo de dança mais livre descoberto
recentemente — de certa forma, para muitos foi uma porta de entrada nas
influências culturais africanas.
O jazz e o sapateado eram frequentemente apresentados em filmes, espalhando
a sua popularidade através de estrelas como Bill “Bojangles” Robinson, Fred
Astaire & Ginger Rogers e Gene Kelly. Na Broadway, coreógrafos que
trabalhavam principalmente no ballet clássico e moderno começaram a
coreografar espectáculos, como Agnes De Mille, Donald McKayle, George
Balanchine e Jerome Robbins. Fortes influências do jazz continuavam a vir à
superfície em todo o repertório de ballet clássico destes coreógrafos, por
exemplo, posições paralelas e mãos e pés flectidos.
O West Side Story de Robbins foi um sucesso tanto na Broadway (1957) como
no grande ecrã (1961); ganhou 10 Óscares, incluindo o de melhor fotografia e
melhor realização para Robbins e Robert Wise. Em 1995, as suas danças foram
condensadas no West Side Story Suite , para o New York City Ballet, que
continua a apresentá-lo. A companhia tem muitos ballets de Robbins no seu
repertório, incluindo o New York Export, de 1958: Opus Jazz, relançado em
2005. Foi adaptado como filme aclamado pela crítica em 2010, com danças
filmadas em vários locais da cidade de Nova Iorque.
Jack Cole coreografou muitos filmes num estilo marcante que revelava
descontracção, com os seus joelhos profundamente flectidos, mãos moles de
“cachorrinho” e movimentos de braços de ponteiro de bússola. Partilhou ideias
com o movimento de Bob Fosse, que acrescentou detalhes dramáticos —
ombros sensuais e floreados com as ancas e chapéu de coco e bengala. Matt
Mattox, um dos bailarinos de Cole que participou em muito filmes, desenvolveu
uma aula de jazz padronizada, segundo a estrutura de uma aula de ballet, e
tornou-se um professor altamente respeitado e influente e um proponente do
estilo.
O crescimento da dança moderna complementou algumas das estirpes mais
líricas do jazz. Alvin Ailey estudou e depois participou em espectáculos com
Lester Horton, um professor e coreógrafo muito conhecido, antes de estabelecer
a sua própria companhia em 1958. Ailey combinou alguns dos elementos mais
formais do jazz com o ballet, danças africanas e dança moderna para criar um
repertório para a sua companhia, agora de renome internacional, cuja assinatura
é Revelations.
Por volta dessa altura, os estúdios e as escolas de jazz estavam em
crescimento. Luigi, sedeado em Nova Iorque, possuía um estilo pulsante e
suave como seda desenvolvido, em parte, como resposta terapêutica a um
grave acidente; as suas aulas atraíam grandes multidões, ainda que o estilo não
se impusesse muito em palco. O estúdio de Phil Black, localizado imediatamente
a norte da Times Square na Broadway, era um ponto de encontro de estudantes
de jazz. Gus Giordano, em Chicago, foi um forte defensor do género jazz, tendo
escrito a Antologia da Dança Jazz Americana e organizado o Congresso Mundial
de Dança Jazz. Em 1983, Lynn Simonson co-fundou o Dance Space Center em
Nova Iorque, onde o seu estilo de jazz fluído e enérgico se tornou popular (o
centro evoluiu para o actualmente denominado Dance New Amsterdam).
O repertório de Twyla Tharp é tão variado e profundo que escapa a
classificações, embora tenha ganhado seguidores durante o tempo dos pósmodernistas do Judson Church. Algumas das suas danças podem ser descritas
como típicas do jazz, com ancas reboladas, atitude duvidosa de beatnik e
síncope musical lúdica. Também criou ballets de grande escala para casas de
ópera e musicais da Broadway de grande sucesso, tais como Movin’ Out.
Lou Conte fundou a Hubbard Street Dance Chicago em 1977; esta tornou-se
uma força respeitada na interpretação de um repertório contemporâneo, com
uma tendência jazz e técnica forte. Além das contribuições coreográficas iniciais
de Conte, actualmente exibe um repertório dos principais coreógrafos
internacionais. A Broadway continua a ser um grande repositório de jazz de
teatro musical, bem ao gosto de Lynne Taylor-Corbett, Rob Marshall, Graciela
Daniele e Susan Stroman, muitos dos quais realizam e também coreografam.
Muitos coreógrafos contemporâneos incorporam elementos de jazz em parte do
seu repertório, como Lar Lubovitch e Trey McIntyre, um artista do 2012
DanceMotion USA.
Michael Jackson era uma estrela pop desde criança, mas quando a MTV
finalmente acedeu a mostrar os seus vídeos (antes não apresentavam artistas
negros), o género arrancou. Os seus vídeos musicais de "Beat It," "Billie Jean," e
"Thriller" foram sucessos gigantescos, em parte graças à sua dança magnética,
com inspirações em Bob Fosse e outros artistas de jazz. Com a recente
explosão de dança nos "reality shows" da televisão, tais como So You Think You
Can Dance (Achas que Sabes Dançar), a dança "contemporânea” tornou-se um
subgénero do jazz. Consiste mais ou menos numa mistura de estilos modernos
e de jazz — líricos, com dificuldade técnica, com grandes saltos e múltiplos giros
e infundidos com emoção dramática, realizados por coreógrafos como Mia
Michaels. Estúdios de dança como o Broadway Dance Center acrescentaram
este género às suas ofertas de classes, lado a lado com os estilos já
estabelecidos.
A Broadway tem sido um local habitual para os coreógrafos de jazz, mas vários
coreógrafos conhecidos de outros géneros tiveram grande sucesso
recentemente — Bill T. Jones, que surgiu nos anos 80 como coreógrafo pósmoderno, e Karole Armitage, conhecida pelo seu ballet punk, para citar dois
deles. Aquilo que todos estes artistas partilham é o desejo de comunicar e
entreter através da dança ao som de, ou em síncope com a, música rítmica.
Hip-hop
A dança hip-hop surgiu como uma vertente de um movimento maior que era
constituído por quatro elementos: os DJ's, MC's, o breakdance e o grafiti. Teve
as suas raízes no Bronx, onde o DJ Kool Herc, usando alguns gira-discos e um
misturador, arrancava as quebras em discos de funk e repetia estes segmentos
de amostras de percussão em longo ciclos repetitivos. Os bailarinos
desenvolveram passos especiais para acompanhar estas quebras e ficaram
conhecidos como b-boys ou b-girls, sendo o “b” de break (quebra).
Em festas de dança isso tornou-se tão popular que acabaram por se deslocar
para o exterior, para parques; as exortações de Kool Herc e as mensagens e
rimas para os bailarinos e para os frequentadores das festas foram
fundamentais para o início do rap, que evoluiu à medida que os MC's
desenvolveram estilos e assuntos temáticos próprios. Frequentemente a letra
exprimia opiniões políticas ou frustração decorrente do movimento dos direitos
civis. Mais tarde, os artistas tomaram liberdade para personalizar o rap de forma
a reflectir escolhas de estilos de vida que surgiam da obtenção de sucesso
lucrativo na indústria da música.
O DJ Afrika Bambaataa cunhou o termo “hip-hop”, que começou a surgir na
década de 70, quando a cidade de Nova Iorque, particularmente o Bronx, era
comandada pelo crime e se encontrava em degradação. O Bronx parecia e
tornara-se mesmo uma zona de guerra devido às drogas e gangues. Mas sem
uma certa atitude de ausência de lei e o abandono da cidade pelas classes
média e empresarial, as sementes que se transformaram no hip-hop poderiam
nunca ter encontrado terreno fértil. A juventude inquieta que não tinha saída
encontrou um escape expressivo e um sentido de comunidade nos diversos
géneros do hip-hop. Aquilo que poderia ter-se manifestado como violência
muitas vezes tornou-se uma competição entre artistas, embora a violência brutal
continuasse a estar presente no mundo da música.
O grafiti cobriu as carruagens do metropolitano por fora e por dentro, e os
"taggers" (autores de grafitis que consistem em assinaturas) competiam uns com
os outros para ver quem tinha mais domínio. Desenvolviam estilos individuais
que se tornaram instantaneamente reconhecíveis de longe, muitas vezes
representando letras grandes, arredondadas e coloridas e imagens de
assinatura como personagens de banda desenhada ou gráficas. Reflectia as
guerras de territórios travadas pelos gangues nas ruas, mas de um modo muito
menos sangrento, ainda que o grafiti constituísse uma forma de destruição da
propriedade. Mas em parte graças a uma galeria do Bronx com uma forma de
pensar progressista chamada Fashion Moda, o grafiti passou das carruagens do
metropolitano para as paredes das galerias. Muitos dos principais praticantes
tornaram-se celebridades, como Futura 2000, Keith Haring e Dondi. Esta
mudança — passar de manifestação visual de uma batalha de territórios travada
na rua à comodidade comercializada internacionalmente em troca de grandes
somas de dinheiro — ecoaria pelas formas mais populares de hip-hop,
particularmente a música.
As batidas agressivas e repetitivas tocadas pelos DJ's conduziam a competições
nas pistas de dança entre b-girls e b-boys, que improvisavam e tentavam
impressionar as multidões com os seus melhores passos. O estilo começou em
pé com o "top rocking", um passo básico de cruzar e saltar que dá uma
aparência de movimento, mas sem sair do lugar, como o exigiam os espaços
confinados do círculo (ou cifra). A necessidade de permanecer basicamente no
mesmo sítio forçou os bailarinos de hip-hop a usar a criatividade para fazer
parecer que está a acontecer algum movimento. Acrescentaram o "popping" e
"locking" (ou "smurfing") e movimentos de robô com paragens exageradas e
poses imóveis. Um dos primeiros grupos e mais conhecidos foi o Rock Steady
Crew, formado em 1977.
O vocabulário desceu pelo corpo para incluir passos no solo, por vezes
denominados movimentos de pés ou floor rocking, formando "freezes" (poses
imóveis suportadas pelas mãos e com os pés no ar) e giros. Os giros
começavam na cabeça com rotações simples (lápis), aumentando de velocidade
e de voltas. Os bailarinos giravam sobre o traseiro, acabando por girar sobre as
costas como tartarugas de pernas para o ar, rodando múltiplas vezes para dar
um efeito estonteante ou fazendo moinhos impressionantes em que as pernas
cortavam o ar. Outras formas de dança influenciaram o género, incluindo o
sapateado e a capoeira, a forma brasileira derivada das artes marciais em que
os praticantes usam todos os membros igualmente e estão tantas vezes em
posição invertida como em posição vertical. O contingente da costa oeste
desenvolveu os seus próprios estilos distintos como o "popping", o "strutting" e o
"krumping".
Na sua maioria, essas danças não eram vistas habitualmente nos teatros
tradicionais, onde a dança moderna, o ballet e o sapateado eram apresentados.
A partir da década de 80, começaram a ser vistas variações da dança de hiphop em plataformas amplas. O estilo de Michael Jackson, tremendamente
popularizado pelos seus vídeos musicais na MTV, era mais baseado no jazz,
mas abriu caminho a outros artistas negros e as suas danças em grupo foram
precursoras de algumas das "crews" de hip-hop de hoje, que realizam rotinas
elaboradas e dramáticas, as quais requerem uma sincronização precisa. Hoje
em dia, os festivais e competições vão buscar artistas a todo o mundo.
Uma versão comercial muito divulgada de hip-hop foi vista no programa de
televisão de variedades e sketchs In Living Color. O programa utilizava um grupo
regular de “fly dancers” que apresentavam sequências rápidas de dança e
incluíam futuras estrelas como Jennifer Lopez. Embora a coreografia variasse
muito e, por vezes, passasse pela dança jazz ou moderna, os números incluíam
frequentemente uma fisicalidade arrojada, trabalhos de pés saltitantes e
combinações que permaneciam no mesmo lugar, como o hip-hop. Os músicos
pop começaram a incluir danças semelhantes como atracções regulares em
concertos realizados em estádios.
Nos anos 90, formaram-se grupos que seguiam mais um padrão segundo as
linhas das companhias de dança moderna. A Rennie Harris Puremovement, uma
companhia da 2012 DanceMotion USA fundada em Filadélfia, Pensilvânia, em
1992, apresentava passos rápidos e movimentos atléticos num espaço de teatro.
Em anos recentes, Harris foi contratada pelo Alvin Ailey American Dance
Theater, levando o hip-hop a um dos mais respeitados repertórios de dança
contemporânea. Ana "Rokafella" Garcia aventurou-se num mundo
principalmente dominado pelo sexo masculino, ganhando fãs fiéis nos seus
espectáculos; fez recentemente um filme, All the Ladies Say, sobre seis
mulheres que dançavam break.
A Compagnie Kafig, uma companhia francesa fundada em 1996, foi uma das
principais apresentadoras de hip-hop em teatros tradicionais e incorporou rotinas
de dança com um contexto dramático, apoiado por um envolvimento teatral.
Vários indivíduos também se distinguiram nessa área. Danny Hoch, um artista
de espectáculos que se estabeleceu em teatros na "downtown" da cidade de
Nova Iorque, organizou um festival de dança hip-hop. Bill Shannon dança com
canadianas, acrescentando uma nova dimensão ao hip-hop. E do Brasil chega o
Grupo de Rua, que mantém a aspereza da rua nas suas produções
conceptualmente ambiciosas e elaboradas. E pode ser visto em programas
televisivos de competição, tais como o America’s Best Dance Crew e, de forma
relativamente comercial, So You Think You Can Dance (Achas que Sabes
Dançar). Como o filme Planet B-Boy documenta, o hip-hop tornou-se um
fenómeno mundial.
O hip-hop, em todas as suas manifestações, evoluiu em duas vertentes e
continua a provocar grandes debates. A sua música e rap desenvolveram-se a
ponto de se tornarem um negócio, por vezes, tremendamente lucrativo, em que
muitos artistas criticam o seu próprio sucesso, para o melhor e para o pior,
simbolizado pelo materialismo. Ainda há proponentes das suas origens, que se
concentravam nos direitos civis e na condição dos afro-americanos. O
surgimento do grafiti conheceu o seu pico há muito tempo, mas sofreu um
grande crescimento durante o qual alguns artistas beneficiaram grandemente,
enquanto outros passaram despercebidos.
Contrastantemente, a dança hip-hop teve de longe muito menos oportunidades
de capitalizar os seus artistas do que a música ou o rap. É possível que tenha
permanecido num estado mais puro, imune às tentações que as riquezas podem
trazer. E o sucesso da sua transição das ruas e clubes para o teatro de cena é
ainda discutível. No entanto, continua a ser praticado pelo povo - no
metropolitano, na Times Square, onde mantém o apelo de autenticidade com
que nasceu, em teatros, competições e clubes.
—Susan Yung
Referências
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http://www.daveyd.com/historyphysicalgrafittifabel.html
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Stearns, Marshall & Jean. Jazz Dance: The Story of American Vernacular
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Valis Hill, Constance. Tap Dancing America: A Cultural History. 2010, Oxford
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