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GABINETE DO GOVERNADOR
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A EXPERIENCIA DO ESTADO DO CEARÁ NA GESTÃO DA SAÚDE PÚBLICA
(Palestra do Sr. Governador do Ceará, Dr. Tasso Ribeiro Jereissati, no 30 Encontro do Fórum
da Gestão Pública Eficientesobre Saúde: Receitas de Sucesso, na Federação das Indústrias
do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro aos 25 de junho de 1999)
(Talking Poinfs)
Bom dia Senhoras e Senhores,
Antes de mais nada, gostaria de expressar minha enorme satisfação de estar aqui no
Rio de Janeiro e agradecer ao Dr. Eduardo Gouvêa Vieira, Presidente desta Casa da
Indústria, e seus demais dirigentes pelo honroso convite que me fizeram para vir a este
importante evento e falar sobre a nossa experiência na gestão da saúde pública no Estado do
Ceará.
I - BREVE HIST~RICODA SAÚDE PUBLICA NO ESTADO DO CEARÁ
Durante muito tempo, o descaso com a saúde pública no Ceará tornou o Estado um dos
recordistas na mortalidade infantil e materna e na má gestão dos sistema de saúde. Em
1987, antes do inicio da reviravolta trazida pela implantação de um ambicioso programa de
medicina preventiva (os agentes comunitários de saúde), os indicadores de saúde do
Ceará e o acesso aos serviços médicos estavam entre os piores da América Latina. O
índice de mortalidade infantil, de 102 para cada mil crianças nascidas vivas, era o dobro da
média registrada em todo o Brasil. A vacinação contra o sarampo e poliomielite cobria
apenas 25% da população, e só 30% dos municípios do Estado tinham enfermeira, isto
para não falar em médico ou ambulatório.
A reversão desse quadro calamitoso só foi possível a partir da implantação de uma
mudança radical na gestão do Estado ocorrida a partir do ajuste fiscal e da reforma da
administração pública em 1987, que transformou o velho Estado " clientelista" e perdulário
em um serviço público voltado para atender as necessidades da população, pautado na
busca da eficiência gerencial, no compromisso com a sociedade e no profissionalismo na
prestação de serviços de interesse coletivo. O processo foi difícil e complexo pois exigiu
uma mudança de mentalidade e uma nova forma de gerenciar a coisa pública. Porém, a
determinação política de fazer e a criação de mecanismos comunitários de participação
acabaram por remover os focos de resistência nos meios político e burocrático e permitir
atingir resultados positivos nas ações de política pública.
No tocante a saúde, os desafios eram enormes: vários meses de atraso no pagamentos da
folha dos servidores; hospitais e equipamentos médicos paralisados pela falta de
suprimentos devido a inadimplência com os fornecedores; excesso de funcionários
administrativos; cargos de gerência ocupados por critérios meramente políticos e não de
mérito ou competência técnica; ausência de informações estatísticas para orientar o
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ESTADO DO C E A R ,
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planejamento da política de saúde e completa desarticulação com o municípios. A
investidura de um Secretário da Saúde profissional da área de medicina preventiva (Dr.
Carlile Lavor) e farta experiência em organismos internacionais, com carta branca para
modernizar o sistema, foi fundamental para realizar a reviravolta na saúde pública no
Ceará. Além disso, a cooperação com organismos internacionais (como o UNICEF) foi
muito importante para proceder a uma avaliação independente da eficácia do sistema
estadual de saúde e reorientar a política pública para o setor.
I I - EVOLUÇAO RECENTE NOS INDICADORES DE SAÚDE PÚBLICA NO ESTADO
O marco da mudaoçafoiaxriação p i o m i c â m P ; i í s d ~ w g m&sagen&eom~áfios
de saúde, iniciado, em 1987, como parte de um programa emergencial de geração de
empregos para socorrer a população durante a seca que periodicamente atinge o Estado,
quase 100% inserido no semi-árido. Terminado a emergência, o programa foi tão bemsucedidoque o Estado resolveu bancá-lo permanentemente. A um custo médio de US$ 1,5
por indivíduo atendido (comparado a US$ 80 per capifa do atual sistema de saúde
brasileiro), o programa totaliza de 7 a 8 milhões de dólares por ano. Cerca de 80% dos
custos representaram pagamentos de um salário mínimo aos agentes de saúde que, a
princípio, trabalhavam com contratos temporários de trabalho, predominando a mão-deobra feminina. Com o programa, pela primeira vez no Ceara, o Estado aproximou-se do
povo de uma forma nunca imaginada no tocante ao atendimento aos cuidados básicos de
saúde.
Por seus méritos de concepção e gestão, o programa de agentes de saúde do Ceara
representou a primeira iniciativa importante na descentralização da saúde, cuja
responsabilidade de execução passou do Estado para os municípios. Assim, antes da
edição da Constituição Federal de 1988, que descentralizou recursos e competências para
os prefeitos municipais, o Governo do Ceará saiu na frente em termos de municipalização
das ações de saúde, transferindo recursos mas sem abrir mão de uma efetiva
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requisitos de cobertura e qualidade fossem atingidos.
O numero de agentes de saúde cresceu de apenas 150, em 1987, para 1628, em 1989,
atingindo 4947 em 1992 ate alcançar os 8874 no presente ano. Com o objetivo de garantir
o acesso das famílias as informações e aos serviços básicos de saúde, o programa cobre
atualmente cerca de 90% das famílias no interior do Estado. Recrutados e contratados por
critérios de mérito, os agentes de saúde devem atuar na comunidade em que residem e
realizar visitas mensais aos domicílios com tarefas definidas: oferecem assistência e
orientação sobre tratamento via re-hidratação oral, vacinação, cuidados pré-natais,
amamentação e monitoramento do crescimento das crianças, além de colher dados
preciosos para as estatísticas de saúde em base municipal e com freqüência mensal. A
supervisão fica a cargo de cada município que contrata um profissional de enfermagem
para cada 30 agentes de saúde. A capacitação do agentes é continuada por meio de
frequentes treinamentos locais.
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O sucesso do programa foi bastante notado em todo o Brasil e até mesmo no exterior e
vários governos estaduais se interessaram em copiá-lo, até mesmo o Governo Federal.
Por todas essas realizações, o Ceará ganhou, em 1993, o prêmio Maurice Pate, do
UNICEF, dado a programas de assistência a infância, tendo sido o único governo latinoamericano até então a ser premiado desde a sua criação em 1966. Hoje o programa se
difundiu de tal sorte que existem em todo o Brasil cerca de 100 mil agentes de saúde. A
propósito, cabe mencionar que a parceria com o UNICEF contribuiu bastante para o
sucesso do programa no Ceará e gostaria de destacar a importância da ajuda daquela
Agência das Nações Unidas no suporte técnico e institucional a saúde pública no nosso
Estado.
Os índices de mortalidade infantil declinaram de forma quase continua no Ceará, tendo
atingido a marca de 38,9 por mil nascidos vivos em 1998, superando a meta
estabelecida em 1995 de 40 por mil e registrando um percentual ligeiramente inferior a
média brasileira. Mas os avanços não ficaram apenas na mortalidade infantil: o
coeficiente de maternidade materna caiu fortemente, situando-se atualmente em 69,2
por 100 mil crianças nascidas vivas; a amamentação exclusiva até quatro meses
atinge hoje 50% das crianças; o percentual de gestantes com pré-natal em dia já
supera 80%; a incidência de casos de sarampo e poliomielite é quase zero com
coberturas vacinais de 100%. Sem dúvida foram grandes avanços, mas os indicadores
ainda precisam ser continuamente melhorados e muito esforço tem de ser feito para atingir
os níveis de saúde alcançados nas áreas mais desenvolvidas do mundo.
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li1 ORGANIZAÇÃO E GESTÃO DO ATUAL SISTEMA DE SAÚDE PÚBLICA E SUA
REESTRUTURAÇAO
Para alcançar os resultados referidos, além da atenção primária (programas de agentes de
saúde e saúde da família), o Ceará-teve: i) de investir fortemente em saneamento básico
(abastecimento d'água e esgotamento sanitário); ii) avançar no processo de
municipalização do Sistema Único de Saúde (SUS); iii) reorganizar os serviços de atenção
secundária; e iv) fortalecer a atenção terciária. O objetivo maior do sistema estadual de
saúde é ofertar ações e serviços de saúde de forma universal, acessível e resolutiva em
cada nível de atenção, garantindo a integralidade da atenção e a satisfação dos usuários.
Dentre os princípios organizativos da atenção primária a saúde no Ceará, podem-se
destacar: a) universaliração da cobertura (do acesso aos serviços de saúde) ; b)
integralidade (ações promocionais, preventivas, curativas e de reabilitação); c)
hierarquização (dos níveis diferenciados de atenção envolvendo a suficiência tecnologica
de resolução das doenças, sistema de referência e intercomplementariedade(com outros
níveis do sistema de saúde); d) economias de escala; e) intersetorialidade (que exige
articulação com outros setores fora-do âmbito da saúde); f) planejamento e programação
locais com a ,participação das comunidades e municípios; e g) orientação por
problemas (e não a tradicional orientação por sintoma).
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As bases operacionais da atenção primária a saúde no Ceará estão assentadas no
Programa Saúde da Família (PSF). O programa é composto por uma unidade física e
uma equipe padrão (1 médico generalista, 1 enfermeiro, 1 assistente social, 2 auxiliares de
enfermagem, um técnico de higiene bucal e 6 agentes de saúde, sendo cada equipe
responsável por, no máximo, mil famílias ou 4500 habitantes de um território delimitado e
com obrigatoriedadede visitas domiciliares. O atendimento pelas equipes do PSF obedece
aos protocolos já preparados (guias para prestação de serviços médicos do SUS).
Atualmente, o programa já atua em 165 municípios do Ceará (90% do total), envolvendo
686 equipes e atendendo a cerca de 2,88 milhões de pessoas.
Os municipios que se encontram já no nível de gestão plena da atenção básica ou plena
do sistema municipal assumem a administração do PSF no seu território, garantindo a
universalização na forma proposta. Os primeiros municipios que entram nos níveis de
gestão referidos recebem incentivos oferecidos pelo Ministério da Saúde. O Estado se
esforça para obter os recursos necessários a cobertura da PSF nos demais municípios.
Com relação ao processo de municipalização no Ceará (em que o Estado foi pioneiro no
Brasil), os avanços têm sido grandes: 179 (de 184) municipios já gerenciam o sistema de
saúde, sendo 152 (85%) em nível de gestão plena de atenção básica e 27 (15%) em
gestão plena do sistema municipal de saúde.
IV - METAS DE GOVERNO PARA A SAÚDE.PÚBLCA NO PER~ODO1999-2002
Para o período 1999-2002, na área da saúde, o Governo do Ceará tem as seguintes
metas: i) reduzir a mortalidade infantil para 25 por mil nascidos vivos; ii) reduzir a
mortalidade materna para 50 por 100.000 nascidos vivos; iii) eliminar elou controlar as
doenças transmissíveis com prioridade para TÉTANO NEONATAL, SARAMPO,
HANSEN~ASE, RAIVA, DENGUE, AIDS, TUBERCULOSE, C ~ L E R A e OUTRAS
DOENÇAS DIARRÉICAS.; iii) reduzir as mortes por doenças cardio-vasculares,
enfermidades neoplásticas e acidentes de trânsito e homicídios (ações preventivas de
segurança pública na linha dos Distritos-Modelo e do policiamento comunitário).
No campo organizacional as metas são: i) na atenção primária - universalizar o Programa
Saúde da Família (PSF) no Estado (estendendo a cobertura para 100% dos municipios,
ampliando de 686 equipes para 1500 equipes e capacitando os profissionais; ii) na atenção
secundária - estruturar e operacionalizar as 21 microrregiões de saúde (com a
reforma/ampliação e aquisição de equipamentos para unidades ambulatoriais e
hospitalares e treinamento de médicos nas especialidades de pediatria, ginecologia,
obstetrícia e clínica médica); iii) na atenção terciária - fortalecer as 3 macrorregiões de
saúde (reforçar os serviços ambulatoriais e hospitalares especializados e de alta
complexidade com ênfase nas doenças cardiovasculares, tratamento de
urgênciaslemergências, partos de alto risco e neurocirurgias, doenças renais, ortopedia,
AIDS e transplantes de órgãos.
No campo gerencial, a meta principal é implantar a nova estrutura do sistema de saúde
estadual com vistas a melhorar o atendimento ao cidadão nas unidades de saúde. Para tal,
com a parceria internacional (cooperação técnica do Departamento para Desenvolvimento
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Internacional-DFID da Inglaterra), uma consultoria foi contratada para propor uma nova
modelagem gerencial para a reorganização da atenção e dos serviços de saúde do
Sistema Único de Saúde Descentralizado do Ceará. A nova estrutura em fase de
implantação incluirá: i) fim da estrutura por programas e introdução da tomada de decisão
colegiada e compartilhada com apenas dois níveis hierárquicos; ii) capacitação gerencial
de todos os gerentes com incorporação de responsabilidades gerenciais e treinamento no
desenvolvimento de lideranças (PDL); iii) melhoria da comunicação interna, inclusive
através de novos meios de informação; iv) aperfeiçoamento da operação das unidades de
saúde por meio de ações como pesquisa de satisfação dos usuários, avaliação periódica
de desempenho dos profissionais, implantação de ouvidorias, sistemas de informação
sobre a utilização de recursos, capacitação de pessoal de atendimento e normatização da
utilização de recursos financeiros; v) maior articulação com os municípios e outros órgãos
da administração governamental; e vi) aprimoramento da gestão administrativo-financeira,
com novos sistemas de recursos humanos, otimização no uso de veículos e outros
equipamentos e reorganização dos fluxos financeiros.
V- Considerações Finais e Perspectiva
Cabe destacar que o Ceará conseguiu um progresso considerável na redução das
doenças de veiculação hídrica, a exemplo de cólera, cuja incidência (por cada 100 mil
habitantes) caiu de mais de 23 mil, em 1993, para quase zero em 1998, e de dengue, cujo
número de casos declinou de 47.789 em 1994 para 3.582 em 1998. Nesse resultado
auspicioso contribuiu de forma decisiva a melhoria ocorrida nas condições de saneamento
básico, além das ações específicas de saúde tomadas contra a proliferação dos insetos
que veiculam as duas doenças. Outros resultados relevantes dignas de nota são: i) a boa
organização alcançada pelo Ceará no tocante a aquisição e uso de medicamentos de alto
custo que permitiu quase quintuplicar o valor gasto (de R$ 1,7 milhão em 1994 para R$8,1
milhão em 1998) e quase multiplicar por.nove o número de pacientes atendidos (7600 em
1998 contra apenas 876 em 1994); ii) o incremento no número de cirurgias cardíacas e
neonatologia realizadas no Estado, ampliando o acesso da população menos favorecida a
intervenções cirúrgicas complexas e de alto custo.
Por fim, como decorrência dos esforços antes mencionados, o Ceará registra grandes
avanços na saúde pública, contribuindo para resgatar parte da divida social acumulada e
melhorar qualidade de vida da população. Mesmo recebendo apenas R$ 59,25 por
habitante de acordo com o teto financeiro fixado pelo SUS, contra R$ 72,75 para São
Paulo e.R$ 66,84 para.oRio de Janeiro, o sistema d e saúde do Ceará tem apresentado
resultados altamente positivos em termos de eficácia no atendimento e eficiência na
alocação dos recursos. Com os aperfeiçoamentos organizacionais e gerenciais ora em
implantação, o Ceará poderá fazer muito mais. Todavia, o esforço interno e muito grande e
os resultados poderiam ser potencializados se o Estado pudesse ter um incremento no
repasse de recursos federais para.0setor.
Muito Obrigado

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