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Revisão de Literatura
FOLICULOGÊNESE EM OVELHAS: FATORES DE ESTÍMULO E INIBIÇÃO
DO CRESCIMENTO FOLICULAR
Márcio Gianordoli Teixeira GOMES1*, Fernando Andrade SOUZA2,
Deborah Alves FERREIRA1, Marc Roger Jean Marie HENRY3, Iran BORGES3,
Leonardo Costa Tavares COELHO4, Karina Almeida MACIEL1
RESUMO - Os mecanismos de regulação da reprodução de fêmeas são de importância fundamental para o sucesso da reprodução convencional ou assistida. O
folículo é a unidade funcional do ovário de fêmeas das espécies mamíferas, tendo
como principais funções o crescimento e a maturação dos oócitos, bem como a
produção de hormônios esteróides. Vários fatores agem de forma conjunta na
regulação destas atividades por meio de mecanismos endócrinos, autócrinos e
parácrinos, estimulando a atividade mitogênica de oócitos quiescentes e, atividade esteroidogênica de células da teca e da granulosa. Entre os fatores regulatórios existem alguns que agem de forma estimulante, tais como o receptor da
proteína ligante (c-KITL), o sistema de fatores de crescimento ligados à insulina
(IGF’s), o complexo ativina e folistatina e a superfamília do fator transformador de
crescimento-β (TGF-β). Outros fatores agem de forma inibitória, tais como a inibina, a proteína retinoblastoma, expressa em oócitos, igualmente ao gene de Wilms
(WTI). No presente trabalho, objetivou-se abordar os mecanismos regulatórios da
foliculogênese e sua importância na fisiologia reprodutiva de ovelhas.
Termos para indexação: c-KITL, endocrinologia, fisiologia, IGF, TGF
FOLLICULOGENESIS IN EWES: ESTIMULATION AND INHIBITION FACTORS
OF FOLLICULAR GROWTH
ABSTRACT - The regulatory mechanisms of females´ reproduction are crucial to
the success of conventional or assisted breeding. The follicle is the functional unit of
the ovary of the female mammal species, being its major functions the growth and
maturation of oocytes, as well as the production of steroid hormones. Several factors
act jointly on the regulation of these activities through endocrine, autocrine and paracrine mechanisms stimulating the mitogenic activity of quiescent oocytes and also
steroidogenic activity of the theca cells and of the granulosa. Among the regulatory
factors, there are some that act in a stimulant way, such as the receptor of the binding
protein (c-KITL), the system of growth factors related to insulin (IGF’s), the activin
and follistatin complex, and the super family of growth-β transforming factor (TGF-β).
Other agents are inhibitory, such as inhibin, the retinoblastoma protein, expressed in
oocytes, as the Wilms’ gene (WTI). This paper aims to review the regulatory mechanisms of folliculogenesis and its importance in the reproductive physiology of ewes.
Index terms: c-KITL, endocrinology, physiology, IGF, TGF
Escola de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade Federal do Tocantins, Araguaína – TO. Centro de Ciência
Animal (EMVZ), BR-153, Km 112, s/n. Caixa Postal 132 – CEP: 77-804-970 - E-mail: [email protected] * Autor
para correspondência
2
Escola de Veterinária da Universidade Estadual do Maranhão, São Luis-MA
3
Escola de Veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte-MG.
4
Universidade Presidente Antônio Carlos – Campus Bom Despacho, Bom Despacho-MG
1
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 1 - 10 - janeiro/dezembro, 2012
2
M.G.T. GOMES. et al.
INTRODUÇÃO
A ovinocultura apresenta um expressivo
crescimento mundial, que tem demonstrado
maior intensificação nas últimas décadas,
ocorrendo, principalmente, nos países em
desenvolvimento, detentores dos maiores
rebanhos (FONSECA, 2005). O Brasil ocupa o oitavo lugar em contingente ovino no
mundo e um desenvolvimento significativo
em sua produção (ANUALPEC, 2008).
A compreensão dos mecanismos que
regulam a foliculogênese é o pré-requisito
básico da eficiência reprodutiva e do melhoramento genético de animais de interesse
zootécnico (FORTUNE, 2003), e, dessa
forma, avanços nas técnicas de reprodução assistida requerem melhor entendimento da fisiologia ovariana. A regulação
do desenvolvimento folicular é complexa,
envolvendo fatores endócrinos, parácrinos e autócrinos, direcionados de maneira
estágio-dependente a fim de controlar
vários processos, tais como, a proliferação
e diferenciação de células foliculares, a
esteroidogênese, angiogênese/vascularização, e atresia/apoptose (WEBB et al.,
2003; FORTUNE et al., 2004).
Neste contexto, de posse das informações reveladas acerca da expressão
diferencial para fatores de crescimento e/
ou hormonais, relacionados direta ou indiretamente com a foliculogênese podem-se
elaborar estratégias de intervenção para o
desenvolvimento de oócitos, visando melhorar as taxas de viabilidade, crescimento
e maturação dos mesmos (ALMEIDA et
al., 2010). Diante do exposto, esta revisão
almeja apresentar conceitos sobre a foliculogênese que possam auxiliar técnicos
na elucidação da fisiologia reprodutiva
de ovelhas, proporcionando uma melhor
elaboração de biotécnicas da reprodução
nesta espécie.
CLASSIFICAÇÃO DOS FOLÍCULOS
OVARIANOS
Aos processos de formação, crescimento e maturação folicular dá-se o nome
de foliculogênese, que tem início com a
formação do folículo primordial, culminando
com a formação do folículo pré-ovulatório
(VAN DEN HURK e ZHAO, 2005).
A população folicular ovariana é bastante heterogênea. Segundo o estádio de
desenvolvimento, os folículos podem ser
divididos em: a) folículos pré-antrais ou
não cavitários, abrangendo os folículos
primordiais, primários e secundários e b)
folículos antrais ou cavitários, compreendendo os folículos terciários e de Graaf ou
pré-ovulatórios (HULSHOF et al., 1994).
Dentro deste contexto, a foliculogênese
pode então ser dividida em duas fases: 1)
Fase pré-antral, subdividida em ativação
dos folículos primordiais e crescimento dos
folículos primários e secundários; 2) Fase
antral, subdividida nas fases de crescimento inicial e terminal dos folículos terciários
(FIGUEIREDO et al., 2008).
Os folículos primordiais in vivo são
rodeados por um ambiente extra-folicular
complexo, incluindo o estroma ovariano,
células da teca em várias fases de diferenciação, ramos do sistema circulatório,
sistema nervoso e outros tipos celulares
(e.g., macrófagos). A influência que estes
diferentes tipos celulares exercem nos
eventos intrafoliculares ao longo da foliculogênese vem sendo estudada, porém os
mecanismos envolvidos ainda permanecem
obscuros (McNATTY et al., 1999).
Os folículos em crescimento se encontram na porção córtico-medular, que
é ricamente vascularizada, sugerindo que
a ativação e o crescimento dos folículos
primordiais dependem de nutrientes, hormônios e fatores de crescimento. Porém,
nem todos os folículos primordiais iniciam
seu crescimento ao mesmo tempo, devido
a alguns fatores que podem estar retendo
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Foliculogênese em ovelhas: fatores de ...
alguns desses folículos na fase de quiescência, para serem ativados posteriormente
ao longo dos anos (VAN WEZEL e RODGERS, 1996).
CRESCIMENTO FOLICULAR
O hipotálamo produz o hormônio liberador de gonadotropinas (GnRH) no sistema
porta hipotalâmico-hipofisário, a fim de estimular a síntese e a liberação de gonadotropinas: hormônio folículo estimulante (FSH)
e hormônio luteinizante (LH), responsáveis
pela maturação folicular, produção de estrógeno, ovulação e luteinização do corpo
lúteo (CL) (ALJARRAH, 2004).
As gonadotrofinas aumentam a atividade esteroidogênica nas células da granulosa e células da teca, resultando em aumento na síntese e acúmulo de esteróides,
especialmente o estradiol, na circulação
geral e no fluído folicular onde o estradiol
é elemento essencial à foliculogênese e
aos eventos fisiológicos necessários à reprodução. Neste período do crescimento
folicular, mudanças funcionais podem ser
observadas, como por exemplo: a) aumento
de sensibilidade nas células da granulosa
ao FSH; b) aparecimento dos receptores de
LH nas células da granulosa em folículos
acima de 3mm e c) aumento da atividade
da aromatase nas células da granulosa
(MONNIAUX et al., 1997).
Os folículos, ao atingirem o diâmetro no
qual são considerados pré-antrais, tornam-se responsivos a hormônios endócrinos.
Esta fase tem início quando o folículo atinge
um diâmetro de 0,216mm a 0,220mm e
termina quando apresenta diâmetro acima
de 2mm. O crescimento dos folículos, nesta
fase, pode ser atribuído a um aumento no
tamanho do ovócito, ao número de células
da granulosa e, consequentemente, a um
aumento no número de camadas de células e a um pequeno aumento do antro
(DUFOUR et al., 1979).
O crescimento dos folículos ovarianos
3
ao atingirem até 2mm de diâmetro é pouco
sensível às variações de gonadotrofinas
cíclicas. Suas necessidades em FSH e LH
são baixas (DRIANCOURT et al., 1991),
significando que os hormônios gonadotróficos não são absolutamente necessários
à proliferação das células da granulosa e
da teca (HIRSHFIELD, 1991).
Nos folículos apresentando diâmetro
superior a 2mm, designados antrais, o
crescimento folicular parece resultar do
desenvolvimento do antro (LUSSIER et
al., 1987), essencialmente dependente de
gonadotrofinas hipofisárias (MONNIAUX et
al., 1997), sendo esta fase de crescimento conhecida como foliculogênese tônica
(DRIANCOURT et al., 1991).
Os avanços no estudo da endocrinologia reprodutiva demonstraram que o FSH
tem relação temporal com os eventos reprodutivos e está associado ao padrão de
crescimento folicular em ondas. Estima-se
que, na ovelha, após formação de um pool
de reserva, o folículo levaria aproximadamente 180 dias para atingir o estádio
pré-ovulatório, sendo 135 dias até o aparecimento do antro, e, mais de 45 dias até a
ovulação (CAHILL et al., 1979). A secreção
pulsátil de FSH ocorre a cada 5-6 dias, o
que resulta em três pulsos de gonadotrofina durante o ciclo estral de 17 dias, que
de acordo com Bister e Paquay (1983),
resultam em três ondas de crescimento na
maioria das ovelhas e estão relacionados
à emergência folicular.
INIBIDORES DO CRESCIMENTO FOLICULAR
A inibina ou foliculostatina é composta
por dímeros α-β, levando a formação da
inibina-A (α-βA) e inibina B (α-βB) (PANGAS e WOODRUFF, 2000). O folículo dominante produz a inibina na granulosa, que
interrompe o crescimento folicular devido a
progressiva inibição da síntese e liberação
do FSH provocando feedback negativo
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na hipófise, juntamente com estradiol no
hipotálamo impedindo o desenvolvimento
de novos folículos. Todavia, o folículo dominante só se tornará ovulatório, se os níveis
de progesterona (P4) estiverem baixos,
pois a progesterona bloqueia a liberação
de LH e a ovulação (STABENFELDT e
EDQVIST, 1996).
Apesar dos efeitos de estimulação no
início do crescimento folicular primordial, a
presença de pulsos de inibidores de crescimento pode ajudar a manter a quiescência
do pool de folículos primordiais. Após a ativação do crescimento do folículo primordial,
ocorre um aumento da proteína retinoblastoma (pRb) pela proliferação das células da
granulosa. Por outro lado, o aumento no
tamanho do oócito provoca uma depleção
dessa proteína (BUKOVSKY et al., 1995).
A expressão da pRb no nucléolo do oócito pode estar associada com a produção
de um inibidor autócrino de proliferação,
que pode prevenir a proliferação das células
da granulosa. Como a pRb, o gene supressor de tumor de Wilms (WTl) pode ser um
inibidor genético envolvido na diferenciação
folicular agindo em células da granulosa
de folículos primordiais, primários e secundários, como por exemplo, a supressão
do receptor para o fator de crescimento
semelhante à insulina do tipo I, IGF-I-R
(WERNER et al., 1993). Foi demonstrado
que a expressão do WTl no ovário pode
ser controlada da mesma forma que a pRb
(HSU et al., 1995).
ESTIMULADORES DO CRESCIMENTO
FOLICULAR
O início do desenvolvimento folicular,
incluindo a transição dos folículos primordiais para primários, é independente de
gonadotropinas e é regulado principalmente
por fatores intraovarianos (VAN DEN HURK
e ZHAO, 2005).
A zona pelúcida (ZP) é uma matriz extracelular que cerca o oócito e promove um
tipo de junção especializada para dentro da
camada interna das células da granulosa
(células do cumulus). Embora nos folículos
primordiais ainda não exista a ZP, o início
do crescimento dos folículos primordiais
está associado à expressão genética coordenada da ZP-1 oócito-específico, ZP-2
e ZP-3, formando a ZP em folículos jovens.
Durante este crescimento inicial, as células da granulosa se dividem e tornam-se
metabolicamente unidas entre si, além de
formarem junções gap heterólogas com o
oócito chegando até eles através da ZP
(GREEN, 1997).
As projeções transzonais da zona
pelúcida (TZPs) são extensões de células
foliculares que atravessam a zona pelúcida
e terminam na superfície celular do oócito e
estão presentes em maior número durante
o desenvolvimento folicular. As TZPs estão
ligadas à captura e ao transporte transcitótico de fatores, assim como a secreção
entre os oócitos, a granulosa e as células
da teca (ALBERTINI et al., 2001).
A ativação dos folículos primordiais
é regulada pelo balanço entre os fatores
inibitórios e estimulatórios de origem local. Alguns estudos, especialmente com
roedores, demonstraram que dentre os
fatores estimulatórios para ativação dos
folículos está o sistema KIT ligante (KIT-L)
ou fator de crescimento de células tronco
(PARROTT e SKINNER, 1999).
O fator de crescimento mastocitário
(MGF), codifica a proteína ligante (KL) que
possui duas formas presentes nas membranas (KL-1 e KL-2), as quais podem estar
dissociadas, produzindo uma forma solúvel
do KIT-L (DRIANCOURT et al., 2000). O
gene KIT codifica o receptor de tirosina
kinase (c-KIT,) pertencente à família de
receptores transmembrana tirosina quinase
do tipo III, família que inclui o receptor para
o fator estimulante de colônia tipo 1 e os
fatores de crescimento a e b derivados das
plaquetas, e sua transcrição codifica uma
proteína de 975 aminoácidos, que pode ser
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Foliculogênese em ovelhas: fatores de ...
glicosilada (FLEISCHMAN, 1993).
Culturas in vitro de folículos e de oócitos
retirados de gônadas fetais têm identificado
objetivos específicos para interação c-KIT/
KL. Na gônada fetal, tem-se demonstrado
um efeito anti-apoptótico da interação entre
esse receptor e sua proteína ligadora sobre
as células germinativas, oogônias e oócitos.
Em ovários, na vida pós-natal, a iniciação
do crescimento folicular do grupo primordial
e sua progressão além do estádio de folículo primário parecem envolver a interação
do c-KIT/KL. Durante o início da foliculogênese o c-KIT junto com o KL controlam
o crescimento do oócito e a diferenciação
das células da teca, além de proteger os
folículos pré-antrais da apoptose. A formação da cavidade antral requer um sistema
c-KIT/KL funcional. Em grandes folículos
antrais, a interação do c-KIT/KL modula a
habilidade do oócito em sofrer maturação
citoplasmática e ajuda a maximizar a produção de andrógeno. Consequentemente,
muitos passos da oogênese e da foliculogênese parecem ser, em parte, controlados
pela interação parácrina entre essas duas
proteínas (DRIANCOURT et al., 2000).
Em ovelhas, Tisdall et al. (1999) relataram a expressão do gene KIT no início dos
estádios da oogênese e mostraram que seu
mensageiro é expresso no embrião de 24
dias. A expressão apresenta-se alta no embrião até o dia 55, e para, quando a meiose
se inicia. Esses resultados estão de acordo
com relatos de Clark et al. (1996) que usaram hibridização in situ para demonstrar
que as células meióticas não expressam
KIT, enquanto oócitos que tem alcançado
o estádio de diplóteno da meiose e estão
inclusos nos folículos primordiais reiniciam
a expressão do mesmo.
Em embriões de 90 dias, a KL é expressa nas células mesenquimais do córtex ovariano e, em embriões de 100 dias, áreas de
expressão são vistas em grupos de células
isoladas em volta dos oócitos e nos folículos
primordiais. Desta forma, pode-se concluir
5
que, em ovário fetal ovino, tão cedo quanto
90-100 dias de vida embrionária, as células
germinativas e somáticas expressam KIT e
MGF, respectivamente. Contudo, a expressão no oócito parece acontecer através da
oogênese e foliculogênese (DRIANCOURT
et al., 2000).
Os mecanismos que envolvem a ação
dessas proteínas ainda não foram esclarecidos, permanecendo a pergunta: por
que a expressão do KIT cessa quando as
células germinativas entram em meiose,
e recomeçam após o bloqueio diplóteno?
Uma hipótese é a de que a cessação de
sua expressão pode envolver a produção
de proteínas da família ativina-inibina pelas
gônadas fetais nesta fase, já que há evidências de que outras linhagens celulares
(mastócitos, células hematopoiéticas) possam reduzir a expressão do KIT (JOYCE
et al., 1999).
A expressão de KIT nas células da
teca parece ser iniciada quando as formas
da teca e sua regulação envolverem o LH,
visto que, a gonadotrofina coriônica humana (hCG) ou o pico de LH ovulatório têm a
capacidade de diminuir a expressão de KIT
nestas células. Além disso, o FSH também
tem a capacidade de estimular a expressão
de KL-1 e KL-2 de forma dose-dependente.
Nos folículos antrais finais, um efeito inibitório parácrino dos oócitos completamente
crescidos, provavelmente, explica por que
nenhuma expressão da KL é detectada nas
células do cumulus (JOYCE et al.,1999).
Um possível mediador desse efeito é o
fator de crescimento e diferenciação recombinante-9 (GDF-9), presente em grandes
quantidades em oócitos grandes e que são
inversamente proporcionais à quantidade
de KL (ELVIN et al., 1999).
A observação de que a expressão da
KL é restrita às células murais da granulosa nesses folículos, pode ser atribuída à
testosterona, que estimula a expressão do
KL-1 e KL-2 (JOYCE et al., 1999), produzida por células circunvizinhas da teca. Alter-
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nativamente, o FSH pode estar envolvido,
uma vez que as células próximas à lâmina
basal expressam mais receptores para FSH
do que as células mais interiores, podendo
este hormônio regular a expressão da KL-1
e KL-2 (MONNIAUX e De REVIERS, 1989).
Vários estudos têm contribuído para
a elucidação do padrão de sinalização do
c-KIT/KL, destacando-se a via da fosfatidilinositol 3-quinase (PI3K)-Akt-FKHRL1,
sendo esta via um caminho de sinalização
fundamental para a regulação da proliferação celular, sobrevivência, migração e
metabolismo, e desempenhar papel importante na regulação da ativação de folículos
primordiais (CELESTINO et al., 2009).
Estudos de Reddy et al. (2005), utilizando ovários de camundongos e ratos na
vida pós-natal, revelaram que a via da PI3K
no oócito é regulada pela KL das células da
granulosa, sendo de grande importância
para o início do desenvolvimento folicular.
Este estudo sugeriu que a ação do KL sobre
a transição de folículos primordiais para primários, e o subsequente desenvolvimento
folicular, pode envolver a fosforilação Akt
quinase serina/treonina.
A Akt é uma molécula sinalizadora, que
aumenta a proliferação celular, sobrevivência e síntese de glicogênio, de proteína
(BLUME-JENSEN e HUNTER, 2001) e a
transcrição do fator FKHRL1, sendo esta
última, membro da subfamília de fatores de
transcrição FOXO forkhead, que consiste
em Foxo3a, Foxo1 e Foxo4, todos, efetores
da via PTEN/PI3K/Akt (TRAN et al ., 2003),
responsáveis por ações que provavelmente
provocam o gatilho da Akt e inibe as atividades do FKHRL1 nos oócitos. O FKHRL1 é
um substrato da proteína Akt, assim como
um fator de transcrição que leva a apoptose
e parada do ciclo celular. Portanto, sugere-se que Akt estimule o desenvolvimento do
oócito, enquanto FKHRL1 inibe (CELESTINO et al., 2009), esclarecendo, em parte, a
via de sinalização do c-KIT/KL.
Silva et al. (2009) citaram que a família
desses fatores de crescimento é composta por mais de 40 membros, agrupados
de acordo com sua homologia estrutural,
sendo que diversos estudos demonstraram
que várias proteínas pertencentes à família
TGF-β são expressas em oócitos, células
da granulosa e da teca e funcionam como
reguladores intraovarianos dos processos
de ativação de folículos primordiais, proliferação de células da granulosa e da teca, esteroidogênese e maturação oocitária, bem
como no processo de atresia. Os principais
fatores desta família, que exercem funções
no controle dos processos reprodutivos,
são as proteínas morfogenéticas ósseas
dos tipos 2 (BMP-2), 4 (BMP-4), 6 (BMP-6),
7 (BMP-7), 15 (BMP-15), o fator de diferenciação do crescimento-9 (GDF-9), a ativina-A, a inibina, o hormônio anti-Mulleriano
(AMH) e o própiro fator transformandor-β
de crescimento (TGF-β).
Deve-se ainda lembrar, que o processo
de seleção do folículo, também é dependente de sinais endócrinos, devidamente
sincronizados, oriundos das gonadotrofinas
hipofisárias e dos hormônios metabólicos.
Contudo, estes hormônios agem sobre os
receptores dos dois tipos de células somáticas e interagem com uma miríade de
fatores produzidos localmente, operando de
forma parácrina/autócrina para coordenar
e controlar a função celular, demonstrando
que os membros da superfamília TGF-β
destacam-se entre os fatores produzidos
localmente (KNIGHT e GLISTER, 2003).
A multiplicidade de fatores de crescimento pertencentes à superfamília TGF-β é
expressa pelas células somáticas ovarianas
e oócitos em desenvolvimento, de forma
estágio-relacionada, funcionando como
regulador intraovariano da foliculogênese
(GILCHRIST et al., 2004).
Fatores como as proteínas ósseas
morfogenéticas, bone morphogenetic protein 4 e 7 (BMP-4 e BMP-7) são expressas
pelas células do estroma ovariano e/ou
pelas células da teca e foram recentemen-
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Foliculogênese em ovelhas: fatores de ...
te implicadas como reguladoras positivas
da transição de folículos primordiais para
folículos primários (GLISTER et al., 2005).
Em contraste, evidências indicam um papel
negativo para o hormônio anti-mülleriano
(AMH), também conhecido como substância inibidora Mülleriana, com origem nas
células pré-granulosa/granulosa neste
evento-chave e posterior progressão para
a fase antral (DURLINGER et al., 2002).
Dois outros membros da superfamília
TGF-β, fator de crescimento e diferenciação-9 e BMP-15 (também conhecida como
GDF-9B) que são expressos de uma forma
específica em oócitos a partir de uma fase
muito precoce e desempenham um papel
fundamental na promoção do crescimento
do folículo, além do estádio primário. Ratos
com mutações nulas no gene GDF-9 ou
ovelhas com mutações inativadoras nos
genes GDF-9 e BMP-15 são inférteis, com
desenvolvimento folicular estacionado no
estágio primário (HAYASHI et al., 1999).
Estudos sobre as fases posteriores do
desenvolvimento folicular indicam papéis
positivos para a ativina derivada das células
da granulosa, as BMP-2, BMF-5 e BMF-6,
e derivadas das células da teca, BMF-4 e
BMF-7, na proliferação das próprias células
da granulosa, sobrevivência do folículo e da
prevenção da luteinização prematura e/ou
atresia. Concomitantemente, ativina, TGF-β
e os vários BMPs podem exercer diversas
ações parácrina sobre as células da teca
para atenuar a produção de andrógenos,
LH-dependente, nos pequenos e médios
folículos antrais (GLISTER et al., 2005).
A ativina também pode desempenhar
um papel positivo na maturação dos oócitos e na aquisição da sua competência de
desenvolvimento (KNIGHT e GLISTER,
2003). Quatro tipos de receptores de ativina
têm sido identificados nos folículos, sendo
denominados de receptores de ativina tipo
IA, IB, IIA e IIB. A ativina-A liga-se primeiro
aos receptores de ativina IIA (ActR-IIA) ou
IIB (ActR-IIB) e depois então, ao IB (ActR-
7
-IB). O complexo ativado da ativina e seus
receptores estimulam as moléculas de sinalização intracelular que são deslocadas
para o núcleo de regulação da transcrição
gênica (PANGAS e WOODRUFF, 2000).
A folistatina, outro hormônio protéico
encontrado no fluido folicular, não somente
inibe a secreção de FSH, mas também se
liga as ativinas e neutraliza sua atividade
biológica. É, portanto, um modulador da
secreção de FSH. Existem duas formas de
folistatina (folistatina-315 e folistatina-288),
e diferem estruturalmente no aminoácido
27 adicional, na extremidade terminal carboxila da folistatina-315. A folistatina não
é relacionada estruturalmente a ativina e
inibina, mas se liga com alta afinidade à
subunidade-β, capaz de neutralizar a atividade da inibina, e mais particularmente, as
formas da ativina (LIN et al., 2003).
Vários estudos têm demonstrado a
importância do sistema ativina-folistatina
no controle da função ovariana (VAN DEN
HURK e ZHAO, 2005). In vitro, a ativina-A estimula a proliferação das células da
granulosa nos folículos pré-antrais e início
do antro nestes folículos, além de regular
os receptores de FSH e a atividade da
aromatase induzida por este hormônio. Em
adição, a ativina-A retarda a luteinização e a
atresia nos grandes folículos antrais elevando a maturação do oócito. Por outro lado,
a folistatina atenua as ações da ativina-A
e pode promover a luteinização e atresia
dos grandes folículos antrais. A expressão
da ativina-A e folistatina é, dependente da
espécie, sendo encontrada em oócitos, nas
células da granulosa e/ou teca (KNIGHT e
GLISTER, 2003).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A compreensão dos mecanismos de
regulação da foliculogênese em ovelhas
envolve fatores estimuladores e inibidores
do crescimento folicular. Portanto, torna-se
indispensável o estudo e acompanhamento
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da fisiologia e do desenvolvimento da biologia celular e molecular para atualização
e melhor entendimento da regulação endócrina e modulação da foliculogênese na
reprodução desta espécie.
Os mecanismos que regulam a foliculogênese torna-se pré-requisito básico
na promoção da eficiência reprodutiva e
do melhoramento genético de animais
de interesse zootécnico, e, dessa forma,
avanços nas biotécnicas de reprodução
assistida requerem melhor entendimento
da fisiologia ovariana. Neste contexto, os
estudos relativos à expressão de fatores de
crescimento e/ou hormonais, relacionados
direta ou indiretamente com a foliculogênese e sua modulação, bem como aqueles
envolvendo fatores endócrinos, parácrinos
e/ou autócrinos, que possam contribuir na
elaboração de estratégias de intervenção
para o desenvolvimento dos oócitos, visando melhorar as taxas de viabilidade,
crescimento e maturação dos mesmos
tornam-se imprescindíveis.
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Revisão de Literatura
INSETOS-PRAGA EM ALIMENTO INDUSTRIALIZADO PARA ANIMAIS
DE ESTIMAÇÃO
Eduardo Henrique Leite MACHADO1*; Erilane de Castro Lima MACHADO2;
Leucio Câmara ALVES3; Maria Aparecida da Gloria FAUSTINO3
RESUMO - Insetos-praga, principalmente das ordens Coleoptera e Lepidoptera,
assumem um papel importante em grãos e ração animal causando sérios danos
qualitativos e quantitativos a estes alimentos e trazendo prejuízos financeiros por
inviabilizar sua comercialização. Devido à carência de informações sobre estas
pragas no Nordeste brasileiro, esta revisão de literatura visa contribuir para um
melhor conhecimento deste problema, apresentando aspectos relacionados ao
mercado de alimentos industrializados, susceptíveis aos insetos, distribuição geográfica dos coleópteros, perdas nutricionais e econômicas, bem como aos diversos
métodos de controle.
Termos para indexação: Coleópteros, Lepidópteros, ração, nutrição animal.
PEST INSECTS IN INDUSTRIALIZED PET FOOD
ABSTRACT - Insect pests, particularly the orders Coleoptera and Lepidoptera,
play an important role in grain and animal feed causing serious damage to these
qualitative and quantitative food and bringing financial losses derail your marketing.
Due to lack of information about these pests in the Brazilian Northeast, this literature review aims to contribute to a better understanding of this problem, presenting
aspects related to market foods, susceptible to insects, geographic distribution of
beetles, nutritional and economic losses, as well as control methods.
Index Terms: Coleoptera, Lepidóptera, feed, animal nutrition.
INTRODUÇÃO
Entende-se por alimento industrializado para cães os compostos orgânicos
formados principalmente por proteínas, carboidratos, gorduras, minerais, vitaminas e
água, sendo sua deterioração dependente
de fatores físicos e químicos e de fontes
externas, como por exemplo, a presença
de insetos (FARONI, 2002). Para isso,
tornam-se essenciais os cuidados com o
armazenamento, período de estocagem,
limpeza das instalações e um efetivo manejo voltado para a prevenção de pragas
(LORINI, 1998; PETRI, 2002; BELLAVER,
2004), pois, segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Alimentos para
Animais de Estimação-ANFALPET (2011), a
qualidade deste alimento é de fundamental
importância para atender as necessidades
nutricionais dos animais, além das exigências do mercado que preza pelo constante
monitoramento da presença de insetos-praga nos produtos armazenados em
embalagem fechada ou naqueles expostos
e comercializados a granel, nos pontos de
vendas, como forma de minimizar os graves
prejuízos provocados pela infestação.
Mestre em Ciências Veterinárias, Total Alimentos, Rua. Mal Manoel Luis Osório, 85, Ap.502, Várzea, CEP 51021-040,
Recife, Pernambuco, Brasil, [email protected] * Autor para correspondência
2
Professor Adjunto da Universidade Federal Rural de Pernambuco
3
Médica Veterinária pela Universidade Federal Rural de Pernambuco
1
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 11 - 20 - janeiro/dezembro, 2012
12
E.H.L. MACHADO et al.
Com uma população de 32 milhões de
cães e 16 milhões de gatos, o Brasil ocupa
a segunda colocação no mercado mundial
de alimentos industrializados para animais
de estimação, movimentando 7,2 bilhões
de reais por ano. A comercialização abrange todo o país. Entretanto, a maior concentração ocorre na região Sudeste que
representa 43% do consumo, seguida pela
região Nordeste com 28%, e pelas regiões
Sul, Centro-Oeste e Norte, com 15%, 7% e
7%, respectivamente (ANFALPET, 2011).
Dessa forma, salientando-se a importância da alimentação oferecida aos animais
de companhia, objetiva-se com esta revisão de literatura, apresentar aspectos
relacionados ao mercado de alimentos
industrializados e sua susceptibilidade a
duas classes de insetos (Coleoptera e
Lepidoptera), como também os prejuízos
econômicos e biológicos que possam
causar aos proprietários, à indústria, aos
vendedores e aos próprios animais.
A
B
INSETOS-PRAGA
Estes insetos são assim denominados quando competem com o homem por
alimento e abrigo (MORAES e ZANETTI,1999). Quanto ao hábito alimentar, os
insetos podem ser classificados em: primários, capazes de romper o grão para atingir
o endosperma; e os secundários, que geralmente vivem associados aos insetos primários, alimentando-se de grãos quebrados ou
danificados (FARONI e BERBERT,1999).
Segundo Faroni (1997) os principais
insetos que infestam grãos e produtos
armazenados são pertencentes às ordens
Coleoptera (Figura 1) e Lepidoptera (Figura
2). De acordo com Pacheco e Paula (2002),
aqueles que fazem parte da primeira ordem
(Coleoptera), caracterizam-se por apresentar o primeiro par de asas cobrindo parte ou
todo o abdômen, enquanto o segundo par
de asas são membranosas, e geralmente
são utilizadas para o voo.
C
D
FIGURA 1-Coleopteros das espécies Rhyzopertha dominica (A); Lasioderma serricorne (B); Oryzaephilus
surinamensis (C); Tribolium castaneum (D).
Fonte: acervo próprio.
Com relação à ordem Lepidoptera, esta
compreende as borboletas e mariposas,
sendo sua principal característica morfológica, a presença de olhos compostos,
ocelos, probóscide e quatro asas membranosas cobertas por escamas, que podem
ter ou refletir diferentes cores (GALLO et
al., 2002). Estes insetos são de grande
importância em armazenamento de grãos
e em produtos estocados e as famílias de
maior importância no Brasil são Pyralidae e
Gelechiidae. O ciclo de vida de Lepdoptera
compreende uma metamorfose completa
com as fases de ovo, larva (lagarta), pupa
(crisálida) e adulto, o qual possui o corpo
frágil. (PACHECO e PAULA, 2002).
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 11 - 20 - janeiro/dezembro, 2012
Insetos-praga em alimento industrializado ...
13
FIGURA 2 - Lepdóptero da família Gelechiida
Fonte: www.ent.uga.edu/pubs/homeipm.htm
Dentre as espécies da ordem Coleoptera de interesse agrícola, os insetos pertencentes à família Anobiidae compreende
mais de 1000 espécies, a maioria das quais
se encontram em países tropicais, sendo
os espécimes identificados pelo formato
do protórax, o qual envolve parcialmente a
cabeça, e, pela antena de 11 segmentos,
apresentando, ainda, corpo cilíndrico, oval
ou alongado (PACHECO e PAULA, 2002).
Com dimensões variando de 2 a 2,5 milímetros, o gênero Lasioderma é representante
típico desta família, o qual ocorre nas regiões tropicais, subtropicais e temperadas do
mundo, desenvolvendo-se em condições
climáticas próximas a 32ºC e umidade relativa (UR) de 70%, completando seu ciclo
biológico em aproximadamente 25 dias
(ARBOGAST, 1991; FARONI, 1997).
Os representantes da família Silvanidae são insetos que: apresentam 2 a 4
mm de comprimento, corpo geralmente
estreito e dorso-ventralmente achatado,
antena com 11 segmentos com uma clava
compacta; élitros (asas anteriores) cobrindo
completamente o abdômen, e ainda possuem cinco segmentos abdominais visíveis
ventralmente (PACHECO e PAULA, 2002).
O gênero Oryzaephilus destaca-se como
principal gênero presente nesta pequena
família, sendo considerada praga secundária, que ataca grãos, cereais e farinhas,
mas que, no entanto é incapaz de atacar
grãos inteiros e sadios (HOWE, 1965). Em
condições de temperaturas ótimas, este
inseto realiza seu ciclo biológico em torno
de 22 dias (EVANS, 1981).
Por outro lado, os coleópteros da família Tenebrionidae são comumente encontrados nas regiões tropicais e temperadas,
podendo sua ocorrência em alimentos
armazenados estar atribuída às condições
inadequadas de estocagem (PACHECO e
PAULA, 2002). Insetos do gênero Tribolium, pertencentes a esta família, podem
infestar grãos, farinhas, farelos e ração
animal (EVANS, 1981). O período de desenvolvimento desta praga varia bastante.
Entretanto, com temperaturas próximas a
37ºC e umidade relativa acima de 70%, seu
ciclo de ovo a adulto pode ser completado
em 22 dias (HOWE, 1965).
De acordo com Pacheco e Paula (2002)
os representantes da família Bostrichidae
apresentam características morfológicas
como corpo cilíndrico, pronoto com saliências dorsais semelhantes a dentes, cabeça
geralmente escondida sob o pronoto, an-
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 11 - 20 - janeiro/dezembro, 2012
14
E.H.L. MACHADO et al.
tena com clava composta de três a quatro
segmentos, tarsos com cinco segmentos
delgados e fortes mandíbulas. Segundo
Galo et al. (2002), incluem-se nesta família
coleópteros do gênero Rhyzopertha, que
presentes em regiões tropicais e subtropicais, têm preferência por alimentos como o
milho, sorgo, cevada, centeio, trigo e outros
produtos armazenados. Seu ciclo biológico, de acordo com Evans (1981), pode
ser realizado em 25 dias em temperaturas
variando de 20ºC a 38ºC, com umidade
relativa de 70%.
DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA DOS
INSETOS-PRAGA
A frequência de insetos-praga em
produtos armazenados tem sido verificada
em vários países do mundo (LOSCHIAVO
e OKUMURA, 1979; HAINES e PRONATA, 1982). No Reino Unido e na Itália, as
espécies de Oryzaephilus surinamensis,
Tribolium castaneum e Rhyzopertha dominica tem sido relatadas infestando grãos
armazenados à granel e em produtos
acondicionados em embalagens fechadas
(SOLOMON e ADAMSON, 1995; TREMATERRA et al., 2000; COX e COLLINS,
2002).
Em Portugal, Carvalho et al. (2006)
chamam a atenção para os riscos que correm os alimentos como a farinha de trigo,
o milho e a aveia, já que neste país, o coleóptero Lasioderma serricorne é encontrado
frequentemente em fábricas que utilizam
estes cereais como matéria-prima. Segundo Papadopoulou e Buchelos, (2002),
esta espécie também assume grande
importância na região de Thessaloniki na
Grécia, por infestar produtos como o fumo
e os alimentos processados estocados em
varejos.
Relatos sobre a presença de Tribolium
castaneum e Rhyzopertha dominica na
Austrália são frequentes, principalmente
em fazendas onde predominam o cultivo
de cereais como aveia e trigo (SINCLAIR,
1982).
No Japão, Shibuya e Yamada (1935)
mencionaram a presença de Lasioderma
serricorne infestando farelos e farinha de
trigo, ervadoce, cominho e gengibre desidratado. No Egito, Zacher (1948), relatou
que este inseto também tem sido registrado, com frequência, em arroz e temperos
comercializados em varejos. Pacheco e
Paula (2002) relataram a presença do
lepidóptero Sitotroga cerealella na África,
bem como, nas principais regiões tropicais,
subtropicais e em regiões temperadas
quentes, infestando grãos e cereais como
trigo, milho, arroz, cevada, sorgo e centeio.
Outros achados da presença de insetos-praga em ração animal e cereais estocados foram mencionados em armazéns,
na Arábia Saudita (ROSTOM, 1994).
Nos Estados Unidos e México vários
trabalhos relataram a presença de coleópteros e lepidópteros como T. castaneum,
R. dominica, O. surinamensis, L. serricorne e Plodia interpunctella, infestando
amostras de trigo, milho, sorgo, arroz com
casca, soja e alimentos para animais de
estimação (PEREZ-MENDOZA et al., 1999;
HAGSTRUM, 2001; NANSEN et al., 2004;
ARTHUR, 2006; ARTHUR et al., 2013).
Relatos sobre a presença destes insetos-praga em grãos armazenados no Brasil
são descritos principalmente nos Estado de
Minas Gerais (MORAES e ZANETTI, 1999;
PACHECO e PAULA, 2002; FARONI, et al.,
2004), Paraná (MATIOLI e ALMEIDA, 1979;
CANEPPELE et al., 2003), Rio Grande
do Sul (BRACKMANN e GUEDES, 1995;
GUEDES et al., 1996), Goiás (VITAL et
al., 2004) e São Paulo (VALENTINI et al.,
1997).
Trabalhos que citam casos de infestações em alimentos industrializados para
cães são raros no Brasil. Entretanto, Gredilha et al. (2005), relataram a presença de
O. surinamensis em ração industrializada
para cães e gatos, no Rio de Janeiro.
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 11 - 20 - janeiro/dezembro, 2012
Insetos-praga em alimento industrializado ...
Em Pernambuco, Sousa et al. (2005)
mencionaram à presença de coleópteros
como Tribolium sp e O. surinamensis em
alimentos para cães e gatos, milho e feijão
que eram comercializados em feiras livres
e supermercados na cidade de Recife.
Em estudo semelhante, Machado et al.
(2005) observaram os gêneros Tribolium,
Rhyzopertha, Oryzaephilus e Lasioderma
infestando estes alimentos em lojas agropecuárias localizadas na região metropolitana
do Recife.
PERDAS NUTRICIONAIS E ECÔNÔMICAS
A infestação por insetos-praga pode
causar sérios problemas, desde a colheita
até o armazenamento, causando prejuízos
como perdas nutricionais, mudanças de
cor, textura, sabor e odor dos produtos
(FARONI, 2002). Stweart-Jones et al.
(2009) relataram que coleópteros dos gêneros Tribolium e Rhyzopertha alteraram,
significativamente, os níveis dos ácidos
graxos palmítico, esteárico, oleico, linoleico e linolênico em alimentos estocados no
Reino Unido.
Já Pacheco e Paula (2002) observaram
que as espécies de Lepidoptera causam
danos consideráveis ao alimento, devido
ao consumo pelas lagartas, a presença de
teias, excrementos nos produtos armazenados, bem como, em grãos em estado de
maturação no campo.
Dentre os vários estudos envolvendo
perdas nutricionais em grãos, Matioli e
Almeida (1979) citaram que o teor de lipídeos do milho diminuiu com o aumento
da população de insetos, devido a este
substrato servir como principal fonte de
alimentação para estes coleópteros. Corroborando com este achado, Sinclair (1982)
relatou a importância do ácido linoleico
na fisiologia do inseto-praga, principalmente nas fases de larva e pupa, onde se
constatou maior armazenamento desse
15
composto pelas pragas, pois, assim como
os lipídeos, os carboidratos são utilizados
para a produção de energia, sendo essenciais para o desenvolvimento dos insetos.
Neste contexto, Hall (1971) afirmou que os
gorgulhos alimentam-se principalmente de
carboidratos, consumindo, assim, parte do
valor energético dos grãos.
Estudando amplamente sobre perdas
nutricionais, Perez-Mendoza et al. (1999)
afirmaram que, durante o processo de infestação por insetos-praga, a maioria dos
alimentos perdem lipídeos, carboidratos
e proteínas, pois estes compostos são
utilizados pelos coleópteros como fonte
de energia.
De acordo com Wehling et al. (1984),
vários fatores podem afetar a qualidade
da farinha de trigo, dentre eles, pode-se
destacar a infestação por insetos, que além
de reduzir o nível de proteínas dos cereais,
aumenta a quantidade de ácido úrico depreciando o produto. Em estudo semelhante,
Samuels e Modgil (1999) assinalaram que
a farinha obtida de grãos infestados com
insetos-praga apresenta mudança de cor
e diminuição da digestibilidade, em razão
da perda de proteína.
A Organização das Nações Unidas
para a Agricultura (FAO) estimou, na década de 70, uma perda de produção na
ordem de 14%, em consequência do ataque de insetos na agricultura mundial. Já
no Brasil as perdas médias com grãos são
de aproximadamente 10% do total do que
é produzido anualmente, o que representa
um prejuízo aproximadamente de 8,5 a
9 milhões de toneladas ao ano (BENTO,
1999).
Em alimentos industrializados para
animais de estimação, não se têm dados
concretos sobre os prejuízos causados. Entretanto, sabe-se que os danos provocados
pelos insetos, diminui o valor nutricional,
levando, na maioria das vezes, à inviabilidade do consumo ou da comercialização
(FARONI, 2002).
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 11 - 20 - janeiro/dezembro, 2012
16
E.H.L. MACHADO et al.
No âmbito dos alimentos industrializados para cães, os prejuízos registrados,
vão desde danos nutricionais provocados
pela ação direta dos insetos, até prejuízos
financeiros, ocasionados pela alteração
da aparência do alimento e perda de
confiança por parte da clientela, gerando
ainda maior custo com a reposição de
produtos e/ou compensações financeiras
aos compradores dos produtos (FARONI,
2002; BELLAVER, 2004).
Na Figura 3 pode ser visualizado um
alimento industrializado para cães após
infestação.
FIGURA 3 - Aparência de diferentes tipos de alimentos para cães (A e B), após infestação por coleópteros.
Fonte: acervo próprio.
CONTROLE DE INSETOS-PRAGA
A maioria dos programas de controle
de insetos-praga tem sido realizada no
sentido de diminuir ou eliminar a população dos insetos presentes no ambiente de
armazenamento. Desta forma, os métodos
de controle físico (temperatura, pressão,
sanitização e pó inertes), químico (fosfina
e brometo de metila) e o biológico, com
a utilização de parasitas ou predadores,
são utilizados frequentemente, no sentido
de diminuir os prejuízos causados pelos
coleópteros e lepdopteros (FARONI, 1997;
SHI et al., 2012).
Várias pesquisas têm revelado que a
utilização de altas temperaturas no controle de insetos-praga vem apresentando
resultados satisfatórios, principalmente
por ser efetiva e não agredir o meio ambiente (EVANS, 1987; FIELDS, 1992;
CANEPPELE et al., 2003; MAHROOF et
al., 2003; ROESLI et al., 2003; ARTHUR,
2006). Nesta mesma linha, Riudavets et al.
(2010) conseguiram controlar rapidamente
os estágios de: ovo, larva, pupa e adultos
de Oryzaephilus, Lasioderma, Sitophilus e
Rhyzopertha, utilizando dióxido de carbono
(CO2) em alta pressão.
Rajendran e Sriranjini (2008) utilizaram óleos essenciais de plantas das
famílias Apiaceae, Lamiaceae, Lauraceae
e Myrtaceae no controle do lepdóptero
Sitotroga cerealella e observaram que
estes, possuem ação comparável com a
do inseticida químico brometo de metila e
cloropicrina.
Alternativas promissoras no controle
de pragas têm sido observadas através da
utilização de terra diatomácea e do inseticida Saccharopolyspora spinosa (WHITE e
JAYAS, 1991; TOWES e SUBRAMANYAM,
2004; COLLINS e COOK, 2006).
Vale salientar que, embora as modernas técnicas de controle isoladas ou
comumente utilizadas sejam de alguma
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 11 - 20 - janeiro/dezembro, 2012
Insetos-praga em alimento industrializado ...
forma efetivas, as condições higiênicas se
destacam como principais fatores a serem
observados. Para tanto, torna-se essencial
a remoção de grãos quebrados e resíduos de alimentos presentes nos locais de
armazenamento evitando-se a infestação
por esses insetos (NANSEN et al., 2004;
DAGLISH, 2006).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os insetos-praga representam uma
ameaça constante à qualidade dos alimentos oferecidos pelas indústrias alimentícias
animal, e podem estar presentes desde a
colheita dos grãos, nos silos de armazenamento, e, no produto final acabado, que
é vendido pelos estabelecimentos comerciais. Registros da presença destas pragas
nos alimentos ofertados para o consumo
humano/animal são observados há vários
anos, e os danos, apesar das tecnologias
empregadas, ainda são consideráveis. O
estudo da ocorrência/frequência de insetos
como os coleópteros e lepidópteros, sua
biologia e desenvolvimento em alimentos
industrializados para cães, constitui-se
um importante instrumento para a avaliação dos prejuízos, auxiliando na seleção/
adoção de estratégias efetivas de controle,
principalmente nos produtos comercializados a granel, que, por estarem mais
expostos ao ambiente, necessitam de
maiores cuidados. Fatores relacionados
à embalagem, rotatividade do produto
no ponto de venda, bem como, as condições ambientais onde os alimentos são
armazenados, requerem monitoramento
frequentes, como forma de prevenir altas
taxas de infestação. O desafio ao controle
desses insetos indica que, os esforços
constantes dos pesquisadores ainda não
foram suficientemente esgotados, merecendo atenção especial e pesquisas mais
efetivas, para que se evitem as perdas
nutricionais e econômicas.
17
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Revisão de Literatura
ERLIQUIOSE TRANSMITIDA AOS CÃES PELO CARRAPATO MARROM
(Rhipicephalus sanguineus)
Daniela Maria Bastos de SOUZA¹, Zoraide Fernandes COLETO²*,
Andreia Fernandes de SOUZA¹, Sildivane Valcácia SILVA3,
Jeyce Kelle de ANDRADE4, George Chaves GIMENEZ¹
RESUMO – Os animais da espécie canina representam aqueles que estão mais
ligados ao homem, seja pelo apelo sentimental quando utilizados como animais de
companhia, ou quando são empregados para serviço e/ou pesquisa. Entretanto, as
doenças transmitidas pelos carrapatos, como a erliquiose, vêm causando grandes
prejuízos econômicos e na saúde desses animais. Além destas questões, o protocolo
estabelecido, o uso indiscriminado de medicamentos por parte dos proprietários que
os utilizam como método preventivo provoca resistência às substâncias, gerando
dificuldades no tratamento dessa patologia. Ao discorrer sobre o assunto, objetivou-se
abordar o tema como forma de contribuir para um melhor conhecimento da biologia
dessa doença, bem como a tomada de decisão na adoção de medidas de controle,
prevenção e cura.
Termos para indexação: hemoparasitose, medidas de controle, cura.
EHRLICHIOSIS TRANSMITTED TO DOGS BY TICK BROWN
(Rhipicephalus sanguineus)
ABSTRACT – The canine species represent those who are more connected to the
man, either by the sentimental appeal when used as pets or when they are employed to service and/or research. However, diseases transmitted by ticks such as
ehrlichiosis is causing a great economic loss and to the health of these animals. In
addition to these issues, the established protocol, the indiscriminate use of drugs
by the owners who use them as a preventive method, causes resistance to these
substances, implying in difficulties in the treatment of this pathology. To discuss the
subject, the objective of addressing the theme is a way of contributing to a better
knowledge of the biology of this disease, as well as the decision on the adoption of
control, prevention and cure measures.
Index terms: hemoparasitosis, control measures, cure.
INTRODUÇÃO
Mundialmente, são reconhecidas várias doenças transmitidas aos indivíduos
da espécie animal por diversas espécies
de carrapatos. Dentre essas doenças, a
erliquiose é uma enfermidade parasitária
transmitida por carrapatos aos cães de
todas as raças, sexo e idade, e foi descrita
pela primeira vez no Brasil por Costa et al.
(1973). Oyafuso et al. (2002), no norte do
Paraná, caracterizaram a espécie Rhipicephalus sanguineus parasitando 96% de
71 cães, enquanto 4% eram da espécie
Amblyomma cajenense, enquanto Torres
Professor Adjunto da Universidade Federal Rural de Pernambuco
Doutora pela Universidade Federal Rural de Pernambuco *Autor para correspondência: Av: Bernardo Vieira de Melo,
2366, Apto 1801, Ed. Maria Odile [email protected]
3
Professor Adjunto da Universidade Federal da Paraiba
4
Doutoranda de Inovação Terapêutica da Universidade Federal de Pernambuco
1
2
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 21 - 31 - janeiro/dezembro, 2012
22
D.M.B SOUZA et al.
et al. (2004), no estado de Pernambuco,
encontraram somente carrapatos Rhipicephalus sanguineus parasitando 82,77%
de 325 cães avaliados. Medeiros e Lima
(2004) avaliaram 198 cães e constataram
que 13 (6,56%) desses animais tiveram
o diagnóstico clinico/parasitológico confirmado para a doença. Benigno et al.
(2011) estudaram 744 cães suspeitos para
erliquiose, oriundos de duas populações
diferentes: população A, localizada em
região de alto padrão econômico; população B, localizada em região de periferia e
baixo poder aquisitivo, determinando que,
independente da localização, os animais
da raça Podle foram os mais propensos à
infecção (15 de 48 animais de raça definida
avaliados).
A erliquiose é uma doença de ocorrência frequente no verão brasileiro, visto que,
os carrapatos necessitam de condições
ideais como o calor e a umidade para se
reproduzirem. É transmitida de um cão
contaminado para um cão sadio através da
picada do carrapato. O principal vetor é o
carrapato marrom (Rhipicephalus sanguineus), que irá infectar células sanguíneas
da série branca, ou seja, as células de
defesa do cão, com formas contaminantes
do agente causador da doença (HOSKINS,
1991). A sintomatologia é ampla e devem-se levar em conta outras enfermidades
como, por exemplo, a doença viral cinomose, que pode confundir o diagnóstico,
pela similaridade dos aspectos clínicos
(HARVEY, 1978; CHIARI, 2010).
Com esta revisão de literatura, objetivou-se auxiliar os profissionais envolvidos
com a criação e cuidados dispensados
aos cães no entendimento e no combate
à erliquiose.
TRANSMISSOR DA ERLIQUIOSE
O carrapato Rhipicephalus sanguineus
(Figura 1), tem grande importância epidemiológica por ser cosmopolita e um reservatório da doença. É um típico parasita de
três hospedeiros, isto é, durante as fases
de sua evolução (larva, ninfa e adulto), ele
pode parasitar três animais diferentes e, as
mudas de fase, ocorrem fora do corpo do
hospedeiro, facilitando a transmissão da
doença. O carrapato é contaminado quando
o cão se alimenta do sangue de um cão portador de Ehrlichia sp, e este agente se multiplica no interior do carrapato mantendo-se
vivo por até 5 meses. O carrapato passa a
FIGURA 1 - Carrapatos do gênero Rhipicephalus sanguineus, transmissor da erliquiose em cães. Em A fêmea ingurgitada, após espoliação do animal; B – macho adulto, apresentando exoesqueleto
muito resistente, característico da espécie.
(Fonte: Viviane Dubal http//bullblogingles.files.wordpress.com, 2011)
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 21 - 31 - janeiro/dezembro, 2012
Erliquiose transmitida aos cães pelo ...
transmitir a Ehrlichia em 3 a 5 dias após a
sua contaminação. A transmissão ocorre
por inoculação no sangue, resultado da
espoliação parasitária, quando o carrapato
infectado pica um animal sadio, liberando
no local da picada secreções salivares que
contêm a Ehrlichia sp, infectando o animal,
ou no momento de transfusões sanguíneas,
através de agulhas ou instrumentais contaminados e pela via transplacentária. O
mesmo carrapato pode transmitir outras enfermidades, como a babesiose e anaplasmose, que podem ocorrer conjuntamente à
erliquiose. O período de incubação varia de
7 a 21 dias, e no prazo de 14 a 28 dias, o
animal manifesta a fase aguda da doença
(ALMOSNY e MASSARD, 2002).
CICLO DA EHRLIQUIOSE
O agente se multiplica nos órgãos do
sistema mononuclear fagocítico (fígado,
baço e linfonodos) dos indivíduos. Os
monócitos ligam-se às células endoteliais,
iniciando uma vasculite. A destruição das
plaquetas e a persistente trombocitopenia
tende a provocar hemorragias em membranas, mucosas, ou em outros sistemas orgânicos. A anemia ocorre devido à leucopenia
na fase aguda e à hipoplasia da medula
óssea na fase crônica (CHIARI, 2010).
O GÊNERO Ehrlichia sp.
A classificação do gênero Ehrlichia
apresenta-se controversa, sendo designado inicialmente como Rickettsia, e compreende as famílias E. canis, E. chaffeensis,
E. equi, E. ewingi (que acomete mais os
humanos), E. platys e E. risticii. Estes
parasitos sanguíneos intraleucocitários e
plaquetários transmitidos aos cães pelos
carrapatos acometem vários hospedeiros
mamíferos. Harvey et al. (1978) descreveram um microrganismo semelhante a
E.sp, causador de trombocitopenia clínica
induzida em cães, infectando plaquetas,
23
enquanto French e Harvey (1983) descreveram organismos arredondados, ovoides
ou achatados, corados pelo Giemsa em
plaquetas de cães enfermos.
São organismos não móveis, de morfologia cocóide a elipsoidais que podem
ocorrer de maneira isolada ou formando
colônias arredondadas, de vários tamanhos, visualizadas em vacúolos no citoplasma de monócitos, corados em azul escuro pelo Giemsa. É um parasito aeróbico,
ou seja, não utiliza a glicose como fonte
de energia, e, sim os aminoácidos como a
glutamina e o glutamato, preferencialmente nesta ordem, para o seu metabolismo
(CHIARI, 2010).
Os cães, comumente, contraem a
espécie E. canis, com os indivíduos apresentando sintomatologia bem definida e
específica ou quadro menos agressivos.
Entretanto, Oliveira (2008), avaliando uma
população de 100 cães, detectou 32 cães
infectados por E. canis e 5 cães infectados
por E. ewingii.
Os caninos também podem ser infectados por E. equi que geralmente apresenta
infecção leve. Na infecção em humanos, as
espécies E. ewingii, E. platys, E. risticii e E.
chaffeensis foram suficientemente investigadas e determinadas, apesar de existirem
controvérsias quanto a classificação zoológica (DUMLER et al., 2001).
As plaquetas voltam a valores normais
após 2 a 3 semanas. Na fase aguda da
doença observa-se hiperplasia megacariocítica regenerativa na medula óssea, uveíte
bilateral, e ainda anemia arregenerativa
pode ser observada (GLAZE e STEPHEN,
1986; GAUNT et al., 1990).
Hoskins (1991) relata que E. platys
(ou Anaplasma plays/Dumler et al., 2001)
parasita somente plaquetas provocando
parasitemia cíclica das plaquetas, trombocitopenia e linfadenopatia generalizada. Com
o agravamento do quadro, a diminuição da
ciclicidade e o aumento da trombocitopenia,
a fase crônica é estabelecida.
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 21 - 31 - janeiro/dezembro, 2012
24
D.M.B SOUZA et al.
SINTOMATOLOGIA E FASES DA DOENÇA EM CÃES
Os sintomas apresentados pelo animal,
principalmente no estágio inicial, podem ser
muito semelhantes aos de outros tipos de
enfermidades, aliado ao fato de que os animais podem ainda se apresentar sem sinais
e/ou sintomas aparentes da doença (forma
subclínica), dificultando o diagnóstico. De
maneira geral, os sinais clínicos comumente observados no paciente com erliquiose
são: letargia, onde o cão se apresenta
apático, ou seja, sem vontade de brincar
ou correr; perda de apetite (anorexia) e de
peso; febre; sangramentos nas gengivas
e demais mucosas sem lesão mecânica
aparente; palidez das mucosas (anemia);
alterações respiratórias com aumento da
frequência, como se estivesse permanentemente cansado; alterações na forma de
caminhar, como se o paciente perdesse o
equilíbrio e apresentasse dificuldade para
deambular; e/ou inchaço nos membros.
Entretanto, esses sinais clínicos corriqueiramente podem ser divididos em três fases:
aguda (início da infecção); subclínica (geralmente assintomática) e crônica (nas infecções persistentes) (GAUNT et al., 1990).
Na fase aguda, o animal infectado
pode transmitir a doença, sendo possível
se encontrar os carrapatos parasitas. São
observados, falta de apetite, febre, perda
de peso e apatia, que podem surgir entre
uma e três semanas após a infecção. O
cão pode apresentar sangramento nasal,
urinário, vômitos, manchas avermelhadas
na pele e dificuldades respiratórias; fase
subclínica, que pode perdurar de 6 a 10
semanas, ou por um período maior em
alguns animais. O canino não apresenta
sintomas clínicos, apenas alterações nos
exames de sangue. Somente em alguns
casos, o cão pode apresentar sintomas
como inchaço nas patas, perda de apetite,
mucosas pálidas, sangramentos, cegueira, etc. Entretanto, a maioria dos animais
acometidos ingressa na fase subclínica, ou
seja, assintomática (SMITH et al., 1975).
Caso o sistema imune do animal não
seja capaz de eliminar a bactéria, o animal
poderá desenvolver a fase crônica da doença. Durante a fase crônica os sintomas
como perda de peso, abdômen sensível
e dolorido, aumento do baço, do fígado e
dos linfonodos, depressão, pequenas hemorragias, edemas nos membros e maior
propensão em adquirir outras infecções
são percebidos mais facilmente. A doença
começa a comprometer o sistema imunológico e a assumir características de uma
doença autoimune. Geralmente o animal
apresenta os mesmos sinais da fase aguda,
porém, atenuados, com a ocorrência de
infecções secundárias como pneumonias,
diarreias, problemas de pele etc. Pode
ainda apresentar sangramentos crônicos
devido ao baixo número de plaquetas
(células responsáveis pela coagulação do
sangue), ou cansaço e apatia devidos à
anemia (ALMOSNY e MASSARD, 2002).
Em áreas endêmicas, observa-se,
frequentemente, a fase aguda da doença
caracterizada por: febre (39,5 – 41,5 °C),
perda de apetite e de peso, fraqueza muscular. Em menor frequência observam-se
secreção nasal, perda total do apetite,
depressão, sangramentos na pele, nariz
e urina, vômitos, dificuldade respiratória
ou ainda edema nos membros. Este estágio pode perdurar por até 4 semanas e,
dependendo da severidade, pode não ser
percebido pelo proprietário (SMITH et al.,
1975).
A fase subclínica geralmente é assintomática, podendo, no entanto, ocorrer
algumas complicações, tais como depressão, hemorragias, edema de membros,
perda de apetite e palidez de mucosas.
O animal apresenta os mesmos sinais da
fase aguda, porém, na maioria das vezes,
bastante atenuados e concomitantes com
os das infecções secundárias tais como
pneumonias, diarreias e problemas de pele,
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 21 - 31 - janeiro/dezembro, 2012
Erliquiose transmitida aos cães pelo ...
dentre outras. O animal pode também apresentar sangramentos crônicos devido ao
baixo número de plaquetas, responsáveis
pela coagulação sanguínea, ou cansaço
e apatia devidos à anemia. Nessa fase, já
se observa o comprometimento do sistema
imunológico, com a doença assumindo
características de uma doença autoimune,
podendo evoluir para a fase crônica (ALMOSNY e MASSARD, 2002).
A fase persistente ou crônica da doença pode ser observada quando o sistema
imunológico do animal torna-se incapaz
de combater e eliminar a bactéria do organismo. Nestes indivíduos, as defesas
imunológicas para esta e outras infecções
ficam comprometidas e o animal pode
ser acometido por infecções secundárias
oportunistas, apresentando pneumonia,
diarreia, lesões na pele, dentre outros sintomas. Nessa fase, ao exame de sangue,
percebe-se uma queda do número de plaquetas, responsáveis pela coagulação sanguínea, causando sangramentos crônicos
(sangramento nasal, no aparelho digestivo,
etc.), influenciando dessa forma, o estado
geral do animal (WANER et al., 1997).
MÉTODOS DIAGNÓSTICOS
Diagnóstico Clínico
O diagnóstico clínico da enfermidade
é difícil no início da infecção, pois os sintomas são semelhantes aos de várias outras
doenças. Entretanto, a presença do carrapato e a ocorrência de casos da doença
na região de domicílio, laser ou trabalho
do animal são importantes para a confirmação da suspeita clínica. Além do quadro
clínico constatado, é de grande relevância
a observação dos sinais antecedentes e
prevalentes, relativos ao animal, quando do
atendimento. A presença do carrapato no
animal ou no ambiente e a ocorrência da
enfermidade em outros cães, ou em outros
animais como o gato, na região, podem
auxiliar no diagnóstico (SILVA, 2009).
25
Diagnóstico Laboratorial
Geralmente, se coleta sangue para
hemograma completo, esfregaços ou
acondicionamento de material para testes
bioquímico-sorológicos, ou avaliações
genéticas do DNA/RNA que determinam a
detecção do problema.
Um diagnóstico laboratorial é comumente realizado pela visualização de
granulações basofílicas em esfregaços de
sangue periférico (orelha), de mórulas e/
ou granulações (corpúsculos iniciais de
E. canis) intracitoplasmáticas (monócitos/
linfócitos), observados em lâminas coradas, que poderá concluir o diagnóstico
(MYLONAKIS et al., 2003). Esfregaços
corados pelo corante de Wright, Giemsa,
kit Panótico Rápido ou a ainda a combinação Giemsa/kit Panótico Rápido em uma
mesma amostra, aumenta a confiabilidade
dos resultados como relatado por Olicheski
(2003). A observação das três formas de
E. canis nas lâminas: colônia arredondada
com grânulos coradas em azul pelo Giemsa; estruturas amorfas arredondadas de
vários tamanhos presentes em vacúolos
no citoplasma de monócitos (corpúsculos
elementares); forma granular (corpúsculos
iniciais), composta de múltiplos grânulos,
que, porém, necessitam ser diferenciados
das granulações azurófilas de cães sadios.
Apesar de essa técnica/método ser amplamente recomendada, sua limitação se
refere ao ciclo do agente transmissor, aos
órgãos aonde os mesmos se encontram
e a sua disponibilidade no sangue periférico, mesmo em animais que apresentem
quadro agudo (ELIAS, 1992; LIBERATI et
al., 2009).
Diagnóstico Sorológico
A avaliação das características hematológicas e bioquímicas do sangue pode ser
utilizada para o estabelecimento do diagnóstico. A presença de hipoalbuminemia
e hiperglobulinemia, geralmente aliados à
trombocitopenia de ocorrência cíclica, auxi-
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D.M.B SOUZA et al.
lia no diagnóstico. Saito (2009), alerta que
a redução na porcentagem de linfócitos T
CD4 na fase inicial da doença, parece estar
relacionada à virulência e letalidade da erlíquia e pela constatação do aumento, ainda
que mais discreto, dos linfócitos T CD8.
O diagnóstico sorológico é importante
na fase subclínica e através de testes sorológicos realizados em laboratórios especializados pode-se estabelecer a ocorrência
da doença. A Reação de Imunofluorescência Indireta é muito utilizada, embora, de
acordo com Isola et al. (2012), a associação
do resultado do hemograma onde o animal apresente trombocitopenia e anemia
aliados à sintomatologia clínica sejam os
mais utilizados. Sousa e Almeida (2008)
realizaram estudo com kit comercial, considerando positivas, amostras observadas
em microscópio de epifluorescência que
apresentaram fluorescência na diluição de
1:40. Entretanto, segundo CHIARI (2010),
para maior confiabilidade, devem-se levar
em conta as reações cruzadas, os falso/
positivos e falso/negativos, que podem
resultar em um diagnóstico equivocado.
Na fase aguda da doença pode-se realizar ainda a punção aspirativa da medula
óssea, que, de acordo com Tenório et al.
(2007), podem ser encontradas mórulas em
granulócitos, atestando que o mielograma
pode ser utilizado como método diagnóstico
para erliquiose.
Diagnóstico pela Técnica Molecular
Estudos genéticos tem-se tornado
confiáveis e imprescindíveis na determinação do patrimônio dos indivíduos, das
condições de higidez, ou na detecção de
doenças em seres vivos utilizando-se materiais biológicos como o DNA, RNA, plasmídeos, etc. através de várias metodologias.
Reforçando esta afirmação, Iqbal et al.
(1994) relataram que a Reação em Cadeia
da Polimerase (PCR) é um teste altamente
sensível e específico para a determinação
de níveis muito baixos de E. canis.
De acordo com Ramos et al. (2009),
a técnica nPCR é uma ferramenta que
apresenta maior precisão diagnóstica da
erliquiose canina. Por meio dessa técnica
(nPCR), estes pesquisadores confirmaram
a infecção por E. canis em cães da cidade
de Cuiabá.
A utilização da técnica de PCR do
sangue periférico deve ser usada criteriosamente, pois, de acordo com Harrus et al.
(1998), na fase assintomática ou subclínica
da doença, os cães podem se apresentar
negativos à técnica, em virtude de o agente
encontrar-se em órgãos, como por exemplo
no baço, e ausentes na circulação sanguínea, dificultando o diagnóstico.
Na técnica de LAMP (Loop-Mediated
Isothermal Amplification, Notomi et al,
2000), utilizaram sequências específicas do
gene dsb (disulfide bond) de E. canis como
alvo, os quais mostraram-se altamente
específicos para a detecção de E. canis,
por apresentar-se divergente, até mesmo
em relação às bactérias filogeneticamente
próximas. A técnica de diagnóstico por
LAMP é mais sensível do que a da PCR,
empregando-se a enzima PHUSIONTM
FLASH DNA polimerase, demonstrando
alta especificidade, não sendo necessária
a extração do DNA para a sua amplificação.
Além disso, o diagnóstico obtido através
da metodologia LAMP possibilita a identificação específica e alta sensibilidade em
animais infectados, com uma estrutura
laboratorial mínima, viabilizando sua utilização em clínicas veterinárias, laboratórios e
instituições de ensino, por minimizar custos
pela não utilização de gel de agarose, e
otimizar o tempo de confirmação da enfermidade (CHIARI, 2010).
NECROPSIA EM CÃES
A realização de avaliações necroscópicas é de grande valia, principalmente no
que se refere à detecção da doença em
uma região. É comum observar-se no cor-
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Erliquiose transmitida aos cães pelo ...
po do animal a ocorrência de escoriações
(escaras) de decúbito com áreas de alopecia, decorrentes da emaciação, carência
proteica e pela compressão prolongada
e persistente de saliências ósseas sobre
a pele e tecido muscular contra o solo ou
cama, assim como, sinais de hemorragias
petequiais, difusas e/ou equimoses que
também são observadas nas superfícies
serosas e mucosas em tecidos subcutâneos e de vários órgãos. Edema de membros
também é observado. Dentro da cavidade
corporal podem ser observados: edema
pulmonar, secreção gastrintestinal mucosa,
ascite, hidrotórax, ulcerações e erosões
bucais. Vísceras (pulmões) com distúrbio
congestivo hemorrágico (HILDEBRAND et
al., 1973; MYLONAKIS et al., 2003).
TRATAMENTO
O objetivo do tratamento é curar os
animais doentes e prevenir a manutenção e
a transmissão da doença pelos portadores
assintomáticos (fase subclínica e crônica).
A Erliquiose é tratável em qualquer fase.
Por vezes, é necessária a complementação do tratamento com aporte de soro
ou transfusão de sangue, dependendo do
estado do animal. Os critérios adotados
para o tratamento variam de acordo com
a precocidade do diagnóstico, dos sintomas clínicos, da severidade do caso, e/ou
da fase da doença na qual o paciente se
encontra. A doença é tratada com o uso
de antibiótico (tetraciclina, oxitetraciclina,
doxiciclina, minociclina, dipropionato de
imidocarb e cloranfenicol), em qualquer de
suas fases. O paciente é monitorado com
contagem plaquetária semanal e, em casos
graves, esse prazo de acompanhamento
pode ser reduzido. Após o tratamento, os
testes sorológicos devem ser repetidos (± 9
meses) (KONTOS e ATHANASIOU, 1998;
ALMOSNY e MASSARD, 2002).
Dentre os protocolos existentes para o
tratamento da erliquiose canina, o antibióti-
27
co de eleição é a Doxiciclina, um antibiótico
bacteriostático da família das Tetraciclinas
que atua em todos os estágios da Erliquiose
canina. O tempo de tratamento pode variar de acordo com a fase da doença, dos
sintomas e do estado em que o animal se
encontra e na precocidade do diagnóstico,
que aumenta as chances de cura. A dose
recomendada pode variar de 5 a 11 mg/
kg de peso corporal, duas vezes ao dia,
observando-se melhora do quadro clínico
após 24 a 48 horas do início do tratamento,
sendo recomendado o mínimo de 14 a 21
dias de tratamento na fase crônica e até
56 dias, durante a fase aguda (VIGNARD-ROSEZ et al., 2001).
O Cloranfenicol tem sido utilizado no
tratamento de filhotes de cães com menos
de 5 meses de idade, apesar de alguns
profissionais da área considerá-lo um tratamento de suporte (TROY e FORRESTER,
1990; HOSKINS, 1991). O tratamento de
suporte pode ser realizado com base na fluidoterapia principalmente em casos crônicos
e com corticóides para animais em quadros
de trombocitopenia. Em alguns casos,
faz-se necessária a transfusão sanguínea
quando o animal apresenta variações severas nos aspectos hematológico-sorológicos.
Alguns autores recomendam prolongar o
tratamento por mais de 6 semanas nos
casos de erliquiose subclínica (HARRUS et
al., 1998; VIGNARD-ROSEZ et al., 2001).
É importante lembrar que um cão
infectado anteriormente, não adquire imunidade e, assim, ao entrar em contato com
carrapatos contaminados, o animal pode
novamente adquirir a erliquiose. Os riscos
de reinfecção e de transmissão a outros animais sadios são minimizados pela adoção
de medidas profiláticas (RIKIHISA, 1991;
ALMOSNY e MASSARD, 2002).
PROGNÓSTICO
O prognóstico em caninos depende da
fase na qual a doença foi diagnosticada e,
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D.M.B SOUZA et al.
do início, eficiência e eficácia da terapia. A
precocidade no diagnóstico e tratamento
melhoram sobremaneira as chances de
cura. Em cães nas fases iniciais da doença, observa-se melhora do quadro clínico
após 24 a 48 horas do início do tratamento.
O prognóstico geralmente é favorável na
maioria dos casos (fase aguda), mas em
cães com erliquiose crônica, com comprometimento de medula óssea, o prognóstico
é reservado para aqueles que estejam
na fase crônica, pois nesta fase o animal
poderá apresentar supressão da medula
óssea e consequente diminuição das células sanguíneas, não respondendo satisfatoriamente ao tratamento. Ao se suspeitar
de erliquiose canina, a prática corriqueira
é a de iniciar o tratamento imediatamente
e repetir o hemograma durante e após o
tratamento. Manter o animal em repouso e
bem alimentado, com fornecimento de água
à vontade. Pode ser feita uma suplementação vitamínico-mineral caso seja necessário e efetuar um bom controle de carrapato
no ambiente e no animal. (ALMOSNY e
MASSARD, 2002; CHIARI, 2010).
PREVENÇÃO
Devido à inexistência de vacina contra
esta enfermidade e apesar dos esforços em
combater a erliquiose, a prevenção é realizada através do tratamento dos animais
doentes e do controle da infestação pelo
vetor da doença (carrapatos) nos canis e
em locais de grande concentração de animais, utilizando-se produtos carrapaticidas
ambientais e de uso tópico nos animais, que
se mostraram bastantes eficaz. A aplicação
de produtos anticarrapatos na pele, ou em
coleiras impregnadas, deve ser utilizada
regularmente, para que garantam a segurança do cão (SILVA, 2009).
Vários estudos foram efetivados para
o desenvolvimento de métodos que conferissem imunidade aos animais acometidos
pela doença. Or et al. (2009) e Rudoler et
al. (2012), relataram que após a infecção
experimental de cães com amostra atenuada de Ehrlichia canis (# 611 A) verificaram
um alto potencial de seu emprego como
vacina, sendo recomendado por Rudoler
et al. (2012) a utilização futura do próprio
agente (carrapato) para inoculação da cepa
atenuada.
Entretanto, não é suficiente verificar a
presença de carrapato no cão com frequência. Desinfetar periodicamente o ambiente
onde o animal vive é imprescindível, pois as
larvas de carrapatos são encontradas, com
frequência, no ambiente, como no percurso
de trilhas ecológicas, nas proximidades de
coleções hídricas, em locais com pastagens
mistas próximas a residências e condomínios, em escolas e indústrias que possuem
canteiros com vegetação de crescimento
excessivo e em outros locais de utilização
de humanos aonde é constatada a circulação de cães errantes e gatos, oferecendo
riscos de infestações (SILVA, 2009).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A prevenção, assim como o diagnóstico
precoce de doenças é fundamental para a
recuperação e/ou cura dos pacientes. As
medidas de higienização do animal e do
ambiente contribuem para o controle de
parasitos e a promoção de saúde sendo
importantes: a adoção de banhos regulares,
com a utilização de produtos veterinários
carrapaticidas como sabonetes, xampus,
coleiras, etc., Esta é uma ocasião que
propicia uma melhor inspeção do corpo do
animal. A tosa de animais de pelos longos
em períodos de muito calor pode facilitar o
controle de parasitas.
Entretanto, transfusões sanguíneas,
através de agulhas ou instrumentais contaminados, podem contribuir para a disseminação da doença. É importante lembrar
que, antes de procedimentos cirúrgicos,
deve-se fazer uma avaliação sanguínea
a fim de se detectar problemas como a
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 21 - 31 - janeiro/dezembro, 2012
Erliquiose transmitida aos cães pelo ...
erliquiose, e evitar hemorragias durante
os procedimentos. Animais submetidos
ao contato com outros cães em áreas de
convivência (domicílios, hotéis, parques,
exposições, etc.), visitas ao veterinário ou
a pet shopping devem passar por uma inspeção criteriosa em locais preferidos pelos
carrapatos no corpo do animal, tais como,
a região das orelhas, entre os dedos das
patas, próximo aos olhos, nuca e pescoço.
Portanto, deve-se manter a grama do jardim
sempre curta e estar atento aos hotéis para
cães, pois, se houver algum cão infectado,
o mesmo poderá transmitir a doença através de outro carrapato do local.
É observado na clinica veterinária,
através de relatos dos proprietários, que
ao encontrar um carrapato no corpo do
animal, o primeiro impulso é o de arrancá-lo. Entretanto este procedimento não é
recomendado, pois, nessa retirada, uma
parte do carrapato pode continuar aderida
à pele do cão, representando uma porta de
entrada para diversas infecções, e para o
risco de contaminação. É recomendável a
aplicação de algumas gotas de vaselina
ou parafina na pele, ao redor do parasita,
esfregando-a, até que seja possível sua
retirada, suave e completamente. Depois,
coloca-se o carrapato em recipiente com
álcool para exterminá-lo, dificultando o
escape de ovos ou larvas para o ambiente,
no caso da fêmea ingurgitada. A prática de
lavar e desinfetar as mãos após manipulação do paciente e/ou do carrapato pode
dificultar a proliferação do parasito.
Deve-se considerar ainda, que por
apresentar um diagnóstico difícil, no que se
refere à sintomatologia nas diversas fases,
que pode ser confundida com outras doenças, e, tendo em vista o aumento do número
de casos da patologia, é importante que os
profissionais e pesquisadores desenvolvam
trabalhos, no sentido de um maior e mais
efetivo controle da erliquiose, principalmente, no que se refere ao vetor transmissor
e ao diagnóstico precoce, assim como na
29
descoberta de um método de imunização,
objetivando facilitar a promoção da saúde
animal.
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Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 21 - 31 - janeiro/dezembro, 2012
Artigo Científico
EFEITO DO TRATAMENTO HEMODIALÍTICO SOBRE AS CONCENTRAÇÕES
DE URÉIA E CREATININA EM CÃES COM SÍNDROME DE INSUFICIÊNCIA
RENAL CRÔNICA
Telga Lucena Alves Craveiro de ALMEIDA1*, Karine Kleine Figueiredo dos SANTOS1,
Simone Gutman VAZ1, Renata de Barros Pereira da SILVA2, Mirian Nogueira TEXEIRA3,
Eneida Willcox RÊGO3, Helio Cordeiro MANSO FILHO4.
RESUMO – A perda da função renal pode ser produzida por diferentes enfermidades, incluindo doenças em outros sistemas corporais, que causam patologias
secundárias da função renal. A hemodiálise é um importante tratamento artificial
utilizado em humanos e animais, que objetiva restaurar o balanço normal dos fluídos e eletrólitos e remover alguns metabólitos tóxicos. Nesse trabalho objetivou-se
descrever os resultados do tratamento de hemodiálise sobre as concentrações de
ureia e creatinina em caninos com síndrome de insuficiência renal crônica. Foram
descritos os resultados de 45 caninos, que apresentavam concentrações elevadas
de ureia e creatinina e que haviam sido submetidos a quatro seções de hemodiálise.
Após três seções, as concentrações de ureia e creatinina foram reduzidas (P<0,05)
a valores fisiológicos. Não houve reduções entre a terceira e quarta seção e o grupo
etário não influenciou o resultado da hemodiálise.
Termos para indexação: doença renal, rins, caninos.
EFFECT OF HEMODIALYSIS TREATMENT OVER UREA AND CREATININE
CONCENTRATIONS IN DOGS WITH CHRONIC RENAL FAILURE SYNDROM
ABSTRACT – The loss of the renal function may be produced by different diseases,
including diseases in other body systems that produce secondary pathologies of the
renal function. The hemodialysis is an important artificial treatment regularly used in
humans and animals, which has the objective to restore the normal balance of fluids
and electrolytes and remove some toxic metabolites. The objective of this paper is to
describe the results of hemodialysis treatment over urea and creatinine concentrations
in dogs with chronic renal failure syndrome. Results from 45 dogs were described,
which presented elevated urea and creatinine concentrations which were submitted
to 4 hemodialysis sessions. The results showed that after 3 hemodialysis sessions,
urea and creatinine concentrations were reduced (P<0.05) to physiological values.
However, there was no reduction between the third and fourth section. Also, differences
between age groups did not influence the result of the hemodyalisis.
Index terms: renal disease, kidneys, canine.
Aluna, Programa de Pós-Graduação em Ciência Veterinária, Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Rua
Dom Manoel de Medeiros,s/n, CEP 52171-900 – Recife/PE.- *Autora para correspondência/Corresponding author
([email protected]).
2
Médico Veterinário, Clinica Renal Vet, R. República do Peru, 444 - Copacabana - Rio de Janeiro - RJ, 22021-040, Brasil.
3
Professora, Laboratório de Patologia Clínica, DMV/UFRPE.
4
Professor, Laboratório de Biologia Molecular Aplicada à Produção Animal, DZ/UFRPE.
1
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 32 - 40 - janeiro/dezembro, 2012
Efeito do tratamento hemodialítico sobre ...
INTRODUÇÃO
O bom funcionamento renal é crucial
para a manutenção do equilíbrio homeostático dos indivíduos. Quando os rins estão
comprometidos, a ponto de não realizar
suas atribuições fisiológicas regulatórias e
excretórias, pode ocorrer uma elevação na
concentração de compostos na corrente
sanguínea. A perda da integridade do sistema excretório pode ser ocasionada por uma
variedade de fatores, inclusive de ocorrência
em outros sistemas corporais, afetando os
rins de forma secundária, eventualmente
com perdas irreversíveis, podendo provocar
a morte.
A doença renal crônica é uma afecção
comum na clínica humana e na de pequenos
animais como cães e gatos idosos (ELLIOT,
2000), apresentando-se geralmente de maneira progressiva, podendo ser secundaria a
algumas enfermidades como doença infecciosa, imunomediada, congênita, metabólica, neoplásica, traumática e obstrutiva. Algumas formas como, por exemplo, a obstrução
do trato urinário pode ser revertida se tratada
precocemente. As causas mais comuns de
lesão renal incluem isquemia ou exposição
à nefrotoxinas, aonde os néfrons vão-se
tornando afuncionais e os sinais clínicos da
insuficiência aparecem (McGROTTY, 2008).
O teste de clearance de creatinina ou
depuração de creatinina é um indicador
diagnóstico da função renal que determina
a eficiência com a qual os rins eliminam a
creatinina do sangue. É um procedimento
que visa avaliar a velocidade e eficiência
da função renal e auxilia na adoção do tratamento hemodialítico, sendo utilizado em
pacientes que apresentem doença renal ou
insuficiência cardíaca congestiva, ou quando
a sintomatologia sugere doenças nesses
órgãos (PINHEIRO, 2009).
A partir do final de 2010 nos Estados
Unidos da América, verificou-se a adoção
de uma nova metodologia analítica, onde
os laboratórios clínicos passaram a usar
33
um novo padrão de diluição isotópica com
método de espectrometria de massa (IDMS)
para medir a creatinina sérica. Este novo
método (IDMS) parece dar valores mais
baixos em comparação com métodos mais
antigos, quando os valores de creatinina
sérica são relativamente baixos, como por
exemplo, 0,7 mg/dl. O método IDMS resulta
em uma superestimação comparativa da
taxa de filtração glomerular calculada correspondente (GFR) em alguns pacientes
com função renal normal. As mudanças
ocasionadas pela IDMS, implica em novas
diretrizes da FDA, relacionadas com as
doses de alguns medicamentos prescritos
em pacientes com função renal normal e
acometidos de patologias.
Estudo japonês recente, sugere que,
um nível de creatinina sérica inferior está
associada com um risco aumentado para
o desenvolvimento de diabetes tipo 2 em
homens japoneses (HARITA et al., 2008).
A hemodiálise (HD) é indicada em casos de Insuficiência Renal (IR) quando se
observa níveis elevados de ureia e creatinina, hiperpotassemia, acidose metabólica,
hipervolemia e uremia. É um procedimento
terapêutico que objetiva manter o balanço
dos fluidos e eletrólitos corporais dentro
da normalidade, promovendo a remoção
de metabólitos tóxicos, como a ureia e a
creatinina, de forma artificial. Neste contexto, a uremia corresponde ao conjunto de
sintomas clínicos associados à perda da
função renal e não apenas ao acúmulo de
compostos nitrogenados, onde a uréia e a
creatinina constituem-se elementos tóxicos
que contribuem para a toxicidade na IR
(PINHEIRO, 2012).
Em humanos, um indivíduo acometido
por problemas renais fica dependente de
uma máquina, submetendo-se ao tratamento várias vezes por semana e permanecendo por diversas horas, conectado a
um equipamento. Este procedimento vem
sendo utilizado em Medicina Veterinária
e tem demonstrado resultados favoráveis
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 32 - 40 - janeiro/dezembro, 2012
34
T.L.A.C. ALMEIDA et al.
à sua aplicação (VEADO, 2003). Porém,
em Medicina Veterinária, o animal não fica
dependente da HD (BERNSTEIN e KLEINE,
2007), pois esta é indicada para estabilizar
concentrações elevadas de uréia e creatinina que, ao final do tratamento deverão
sofrer redução em torno de 60%. Os compostos como fósforo e potássio em excesso,
também poderão ser removidos durante o
procedimento (VEADO, 2003).
A HD está disponível para caninos, felinos e equinos, tanto em casos agudos como
nos casos crônicos. Nos casos agudos, os
pacientes têm a possibilidade de recuperação do parênquima renal lesado (KLEINE,
2007; LUCENA, 2007). Para isto, 1, 2 ou 3
sessões de hemodiálise, em geral, já seriam
suficientes para uma melhora das condições
do paciente (VEADO, 2003). Por se tratar
de uma técnica de tratamento adjuvante, a
hemodiálise deve ser sempre associada ao
tratamento conservador e fazer parte de um
protocolo, para que seu efeito possa atingir
o resultado esperado (VEADO, 2003). Por
representar um procedimento que contribui
para a redução dos níveis de toxinas no organismo, a HD deve ser auxiliada por uma
nutrição terapêutica para insuficiência renal,
até que se alcance a estabilização e o animal
possa se recuperar.
A diálise mecânica substitui a capacidade natural de filtração renal, porém não
desempenha todas as funções renais, sendo
necessária a manutenção dos pacientes
em um tratamento intensivo, denominado
tratamento pós-dialítico. Em Medicina Veterinária, esse tratamento inclui fluidoterapia
específica, antibióticos, bloqueadores H2
e outros medicamentos, de acordo com a
necessidade de cada caso (BERNSTEIN e
KLEINE, 2007).
Após uma sessão de hemodiálise, o animal deve ser clinicamente avaliado. Exames
complementares (hemograma, e dosagens
de ureia, creatinina, fósforo e potássio séricos) são importantes para se determinar
a necessidade de diálises suplementares
(QUINTANILLA e LAMPREABE, 2004).
Sendo uma patologia que apresenta alta
prevalência em cães e que provoca extrema
debilidade, objetivou-se com esse estudo
determinar os efeitos de um programa de
hemodiálise sobre a concentração de ureia
e de creatinina em cães com diagnóstico de
Síndrome de Insuficiência Renal Crônica-SIRC.
MATERIAL E MÉTODOS
Animais
Foram selecionados 45 cães, de ambos
os sexos e com média de idade entre 4 e
15 anos, todos com diagnóstico de SIRC,
baseado nas elevadas concentrações de
uréia [UREIA] (>100mg/dL) e creatinina
[CREAT] (>4,0 mg/dL), conforme Bernstein
e Kleine (2007), que foram encaminhados
por Médicos Veterinários para a Renal Vet,
na cidade do Rio de Janeiro-RJ, para serem
submetidos a HD.
Programa e Técnica de Hemodiálise
O programa de hemodiálise foi instituído pela facilidade em executá-lo, pela
disponibilidade do equipamento, e consistiu,
inicialmente, da avaliação e detecção da
SIRC através das análises dos seguintes parâmetros: ureia, creatinina, sódio, potássio,
fósforo e albumina. Em seguida, os animais
foram cateterizados (duplo lúmen), através
da veia jugular, por onde o sangue saia do
corpo do animal, passava pela máquina de
hemodiálise, para retornar ao corpo pela
veia femoral. Quando o acesso periférico
não suportava a pressão com a qual o sangue retornava, era utilizado o acesso central
na veia jugular para o retorno sanguíneo.
O equipamento empregado na hemodiálise foi o da linha Baby (Fresenius), que
possui um sistema mecânico responsável
pela circulação do sangue e do dialisado, em
um sistema eletrônico que controla parâmetros como pressão sanguínea, temperatura,
pH e coagulação, dentre outros. Utilizou-se
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 32 - 40 - janeiro/dezembro, 2012
Efeito do tratamento hemodialítico sobre ...
a hemodiálise clássica, onde os solutos são
removidos diretamente da corrente sanguínea por um sistema de troca entre meios,
cujo princípio fisiológico é o da osmose. O
dialisador possui uma estrutura composta
de dezenas de tubos ocos que apresentam
membranas semipermeáveis. O dialisado,
cuja constituição é semelhante a do plasma normal, passa para o tubo onde está o
sangue, e o plasma, por sua vez, vai ao que
continha o dialisado. Essa troca ocorre por
um principio simples de difusão através de
uma membrana semipermeável, funcionando como um rim artificial, permitindo a troca
entre o plasma e o dialisado, eliminando,
desta maneira, as toxinas ou impurezas do
plasma (VEADO, 2003).
Durante o processo, os animais foram
submetidos a quatro sessões de hemodiálise, em dias consecutivos, com duração
de 2 a 4 horas, sendo acompanhados por
um médico veterinário, monitorando-se os
seguintes parâmetros: pressão sistólica, temperatura corporal, nível de desidratação, pH
sanguíneo, avaliando-se ainda, a frequência
cardíaca e efetuando-se auscultação pulmonar. Todos os animais foram tratados com
heparina de baixo peso molecular (HBPM),
procedimento realizado antes das seções de
HD, a fim de evitar a coagulação sanguínea
no sistema extracorpóreo.
Antes e após cada sessão de HD foi
coletado sangue de cada animal para a
avaliação da concentração sérica de ureia
e de creatinina. Ao final de cada sessão,
os animais receberam antibióticoterapia e
foram mantidos em fluidoterapia. Ao termino do tratamento, cada animal recebia alta,
adotando-se então, o tratamento higiênico-dietético, onde foi prescrita alimentação
lipoproteica para pacientes renal, e fluidoterapia. Os animais foram avaliados a cada
20 dias durante 1 ano para averiguação da
[UREIA] e [CREAT], frente ao tratamento
conservador estabelecido pelo clínico veterinário. Todos os animais permaneceram
internados durante o período de procedi-
35
mentos. Só receberam alta uma hora após
o término da última sessão de hemodiálise.
Análises Bioquímicas
A determinação das concentrações
de Uréia (UREIA), Creatinina (CREAT),
Alanina Aminotransferase (ALT), aspartato
aminotransferase (AST), Fósforo, Cálcio e
Albumina foram realizadas no equipamento
bioplus Bio-2000 com kits comerciais (Labtest), seguindo a orientação do fabricante.
As análises de sódio e potássio foram obtidas utilizando-se um espectrofotômetro de
chama, modelo 7000 Tecnow.
Análise Estatística
Os dados foram avaliados pelo ANOVA,
com P estabelecido em 1% e o teste post hoc
utilizado foi o Holm-Sidak, para comparação
entre as médias e com P estabelecido em
5%. Foi utilizado o programa de estatística
SigmaStat® 3.0 para todos as análises.
Todos os resultados foram expressos em
média + erro padrão médio.
RESULTADOS
Inicialmente, observou-se que as médias dos parâmetros bioquímicos analisados
nos pacientes na primeira consulta estiveram bem acima dos valores normais para
a espécie canina, como o valor da [UREIA]
(~300mg/dL) e [CREAT] (~8,5 mg/dL), que
esses valores foram compatíveis com o
diagnóstico de SIRC, e que a media de idade
dos animais com essa enfermidade foi de
8,73 anos (Tabela 1). Também, observou-se
que, quando os animais foram agrupados
por faixas etárias, não houve diferenças nas
concentrações dos parâmetros analisados
para o diagnóstico da SIRC (Tabela 2).
Observou-se que a [UREIA] e a [CREAT], após as quatro sessões de hemodiálise,
se reduziram significativamente (P<0,05), e
que, já na terceira seção, as concentrações
médias de Ureia e de Creatinina apresentaram-se em níveis próximos da normalidade.
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T.L.A.C. ALMEIDA et al.
As [URÉIA] e [CREAT], que antes da primeira seção de HD se apresentavam em ~
300mg/dL e ~ 9,0mg/dL, respectivamente,
passaram para ~ 148mg/dL e ~ 5,5mg/dL,
após a quarta seção de HD. Entretanto não
houve diferenças significativas entre as médias da [CREAT], quando foram comparadas
entre a terceira e quarta sessões de hemodiálise, mas foi observado uma elevação
da [UREIA] após a quarta seção (Figura 1).
TABELA 1 - Resultados das análises bioquímicas de 45 caninos de idades variadas com
síndrome de insuficiência renal crônica (SIRC), antes do início das sessões
de hemodiálise
Parâmetros analisados Resultados
Idade (anos)
Uréia (mg/dL)
Creatinina (mg/dL)
Sódio (mEq/L)
Potássio (mEq/L)
Fósforo (mEq/L)
Albumina (mg/dL)
8,73 ± 0,52
292,73 ± 18,10
8,53 ± 0,74
145,12 ± 0,88
4,76 ± 0,23
16,73 ± 1,15
2,59 ± 0,10
Obs: Todos os resultados são expressos em média + erro padrão médio.
A média de idade encontrada (8,73
anos) para a ocorrência da doença apresentou-se de acordo com aquelas relatadas por Elliot (2000), que caracterizaram
animais idosos. Após o diagnóstico de
doença renal, foram realizados exames
de bioquímica sérica, para determinar a
necessidade do procedimento dialítico.
Conforme observado na Tabela 1, foi
constatada a indicação do procedimento, pois os níveis de ureia e creatinina
apresentaram-se bem acima dos valores
fisiológicos normais indicados por Bernstein e Kleine (2007).
TABELA 2 – Resultados das avaliações bioquímicas da concentração de Ureia, Creatinina, Sódio, Potássio, Fósforo e Albumina em 45 caninos com síndrome de
insuficiência renal crônica durante a primeira visita à clínica veterinária, de
acordo com o grupo etário
Metabólito sanguíneo
Uréia (mg/dL)
Creatinina (mg/dL)
Sódio (mEq/L)
Potássio (mEq/L)
Fósforo (mEq/L)
Albumina (mg/dL)
Grupo Etário
Grupo I
Grupo II
Grupo III
(n=6)
(n=21)
(n=18)
304,83 ±
28,24a
8,56 ±
1,62a
146,16 ±
2,57a
4,85 ± 0,41a
20,93 ±
1,36a
2,21 ± 0,19a
275,74 ± 24,17a
7,94 ± 1,02a
144,84 ± 1,45a
4,61 ± 0,29a
15,24 ± 1,26a
2,65 ± 0,13a
308,55 ± 34,66a
9,20 ± 1,35a
145,05 ± 1,20a
4,90 ± 0,44a
16,91 ± 2,43a
2,65 ± 0,16a
Obs.: Numa mesma linha, valores seguidos de letras iguais, indicam que P>0,05, pelo teste de Holm-Sidak.
Grupo I: menos de 5 anos, Grupo II: dos 5 a 10 anos, Grupo III: mais de 10 anos. Todos os resultados
foram expressos em média + erro padrão médio.
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 32 - 40 - janeiro/dezembro, 2012
Efeito do tratamento hemodialítico sobre ...
37
Com base na Tabela 2, pode-se observar que o grau de lesão não sofreu influencia
da idade, pois uma vez instalada a enfermidade, o comprometimento renal é semelhante
em qualquer idade do animal.
FIGURA 1 - Concentração sérica de Ureia e Creatinina antes e após um programa de
quatro secções de hemodiálises em caninos com síndrome de insuficiência
renal crônica.
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 32 - 40 - janeiro/dezembro, 2012
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T.L.A.C. ALMEIDA et al.
A Figura 1 revela o comportamento dos
níveis da concentração sérica de ureia e
creatinina nos animais durante o procedimento de hemodiálise, onde é possível se
observar que, entre o primeiro pré (exame
realizado antes do procedimento dialítico)
e o último pós (exame realizado após o
procedimento dialítico) as concentrações
desses metabólitos se reduziram consideravelmente, porém constatando-se uma
maior redução nos níveis de ureia.
DISCUSSÃO
Avaliação dos Metabólitos por Grupo
Etário
A Síndrome de Insuficiência Renal
Crônica (SlRC) é uma afecção irreversível,
caracterizada pela incapacidade dos rins
funcionarem adequadamente, devido à
perda da função progressiva dos néfrons,
dentro de um período que pode corresponder a meses ou anos (LESS, 2003). Quando
um rim perde de 66 a 75% dos néfrons,
comprometendo a manutenção do equilíbrio
hidroeletrolítico, ácido–básico e a capacidade de excreção de produtos resultantes do
metabolismo, além de interferir na síntese de
várias substâncias, a afecção é considerada
uma síndrome (SIRC) progressiva e irreversível (OSBORNE et. al., 1999; LESS, 2003).
Em cães e gatos idosos a SIRC é a
enfermidade renal mais comum (ELLIOT,
2000) e os resultados encontrados nesse
trabalho, assemelharam-se aos descritos
na literatura, visto que a média de idade dos
animais submetidos a HD estava próxima a
9 anos (8,7 anos), o que configura animais
adultos/idosos (Tabela1). Todavia, quando
os animais foram agrupados por faixas etárias (jovem, adulto e idoso) não foram encontradas diferenças significativas (P>0,05),
podendo ser explicado pelo fato de a SIRC
ser uma enfermidade crônica e muitas vezes secundária, e que quando instalada,
revela-se de diagnóstico preciso através das
avaliações bioquímicas (Tabela 2).
Nesse trabalho só foram descritos
animais que se enquadraram dentro do
diagnóstico de SIRC e que apresentaram
níveis de [UREIA] e [CREAT] acima de
100mg/dL e 4,0 mg/dL, respectivamente
(BERNSTEIN e KLEINE, 2007), quando
a SIRC já estava instalada, justificando-se os resultados descritos nesse trabalho
para a indicação dos animais submetidos
a quatro seções HD. A creatinina produzida
pela ingestão em excesso é rapidamente
excretada pelos rins normais. Creatinina
elevada é causada por problemas renais,
que podem ser congênito ou adquirido.
Problemas autoimunes, infecções, tumores, diabetes, pressão alta, doenças dos
vasos sanguíneos, toxinas, certas drogas,
traumas ou problemas metabólicos podem
danificar os rins e aumentar metabólitos da
creatina.
Avaliação da Concentração da Ureia e
Creatinina antes e após as seções de
Hemodiálise
A média geral encontrada para os parâmetros analisados estavam alterados em
relação aos valores de referência. A ureia,
a creatinina e o fósforo encontravam-se
acima dos valores indicados para a espécie
em questão (Tabela 1) (KANEKO et al.,
1997).
Com a adoção da hemodiálise a
[UREIA] e a [CREAT] reduziram-se em
aproximadamente 50% e 20% respectivamente, nos animais enfermos, todavia
essas concentrações, mesmo após quatro
seções, se mantiveram acima do valor
mínimo descrito em outros experimentos
(NELSON e COUTO, 1998; McGROTTY,
2008). Observou-se que os resultados
encontrados para [UREIA] na fase pós-HD
da terceira (~148mg/dL) e quarta (~148mg/
dL) seções foram diferentes (P<0,05), mas
o mesmo não ocorreu com a [CREAT]
(P>0,05), que estava em ~4,4mg/dL e ficou
em ~5,5mg/dL. Esses resultados podem
ser utilizados para o estabelecimento e
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 32 - 40 - janeiro/dezembro, 2012
Efeito do tratamento hemodialítico sobre ...
acompanhamento dos tratamentos pós-HD.
Também os resultados indicaram que a
[UREIA] e [CREAT] na fase pós-HD foram
sempre inferiores (P<0,05) aos observados
na fase pré-HD, demonstrando que a HD
foi efetuada com eficiência.
Nem todos os animais acompanhados
tiveram a causa primária da SIRC detectada, apesar de Nelson e Couto (1998)
terem afirmado que para um tratamento
eficaz, nesses casos, é necessário que
se encontrem as causas subjacentes para
que possam ser tratadas. No entanto, nem
sempre isso é possível, pois mesmo sem
ter havido a possibilidade de identificação
da causa primária em alguns animais, os
resultados encontrados foram satisfatórios,
com a [UREIA] e a [CREAT] retornando a
valores próximos da normalidade e contribuindo para o bem estar dos animais,
mesmo sem o diagnóstico da enfermidade
primária. Todavia, deve-se observar que
nenhum dos animais deste experimento
foi submetido a mais de quatro sessões
de hemodiálise, o que está de acordo com
Veado (2003) e Bernstein e Kleine (2007)
ao afirmarem que, ao contrário do que
acontece com os humanos, os animais não
ficam dependentes da hemodiálise.
Os resultados descritos nesse trabalho
podem servir de alerta para os clínicos veterinários no sentido de se estabelecer o
diagnóstico precoce da SIRC em caninos,
pois, com isso, poderia ser melhorada a
eficiência do tratamento hemodialítico e
evitar que o procedimento de indicação
da HD em animais seja utilizado apenas
quando a SIRC já estiver instalada e os
animais apresentem as consequências
dessa enfermidade.
De acordo com Bernstein e Kleine
(2007) os animais podem ser liberados
quando forem capazes de se alimentarem
normalmente e estiverem com o cateter
venoso implantado e protegido por uma
bandagem. Entretanto, este procedimento
não foi adotado neste experimento em fun-
39
ção de não haver disponibilidade de tempo
do proprietário em promover os cuidados e
vigilância necessários ao animal enfermo,
que poderia apresentar complicações.
CONCLUSÕES
A função renal normal nos animais tem
o objetivo de equilibrar líquidos e eletrólitos
essenciais à boa condição de saúde. Na
espécie canina os problemas renais são
corriqueiramente observados. A hemodiálise, com aplicabilidade em humanos, foi
levada aos cães para promover a cura e/ou
amenizar os casos de insuficiência renal.
Em caninos, a HD deve ser recomendada quando do diagnóstico de lesão renal
compatível com a SIRC, por reduzir as
concentrações dos metabólitos no sangue
de animais com esta síndrome, já a partir
da terceira seção. Todavia, por ser um
tratamento de suporte, a HD necessita ser
associada a condutas terapêuticas adequadas, mormente aos aspectos nutricionais,
para que os animais sadios não adoeçam e
os enfermos possam usufruir da qualidade
de vida proporcionada pela utilização desse
tratamento de suporte.
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Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 32 - 40 - janeiro/dezembro, 2012
Artigo Científico
AVALIAÇÃO DA FREQUÊNCIA CARDÍACA E DO ESFORÇO FÍSICO EM
CAVALOS ATLETAS PELO USO DO FREQUENCÍMETRO
Hélio Cordeiro MANSO FILHO1*, Helena Emília Cavalcanti da Costa Cordeiro MANSO2,
Emanuel de Albuquerque CARDOSO3, Roberta Espínola de MELO3,
Flávia de Souza e SILVA4, José Mário Girão ABREU5
RESUMO – A determinação da frequência cardíaca (FC) pelo uso do frequencímetro
ajuda no entendimento das adaptações fisiológicas aos exercícios. Nesse trabalho,
objetivou-se avaliar o nível do esforço através da determinação da FC pelo uso do
frequencímetro. Foram utilizados 18 cavalos adultos, divididos em três tratamentos:
vaquejada (n=6), marcha (n=6), cavalgada (n=6), aonde se avaliou a FC à montada,
FC máxima no terço inicial do exercício, FC máxima no terço final do exercício, número
das avaliações da FC abaixo de 170 bpm e acima de 180 bpm e a FC média no exercício de cada um dos cavalos. ANOVA, teste T e Holm-Sidak foram utilizados quando
necessário com P<0,05. Cavalos de vaquejada apresentam maiores FC máximas
(~200 bpm) durante os exercícios, seguidos pelos de cavalgadas (~180 bpm) e depois os de marcha (~140 bpm) (P<0,05). Cavalos de vaquejada apresentaram maior
número de FC acima de 180 bpm quando comparados com os de outros esportes
(P<0,05). Ainda foram observadas diferenças na FC média (P<0,05). Conclui-se,
então, que os diferentes esportes equestres avaliados apresentaram variações significativas na frequência cardíaca durante a simulação, quando analisados através
do uso do frequencímetro. Ainda com base no gasto energético, observa-se que os
animais de vaquejada desenvolvem grande esforço físico em um curto intervalo de
tempo, com contraste com os animais de marcha e cavalgada.
Palavras-chave: equino, atividade física, treinamento.
EVALUATION OF HEART RATE AND PHYSICAL EFFORT IN ATHLETE
HORSES BY THE USE OF A FREQUENCY METER
ABSTRACT – Determination of the heart rate (HR) by the use of frequency meters
helps to understand the physiological adaptations to exercises. The aim of this
research was to evaluate the level of effort through the determination of HR using
a frequency meter. A total of 18 adults horses were used and divided into three
treatments: rodeo (n=6), march (n=6), and riding (n=6) where the HR was analyzed
at mounting, maximum HR at first third of the ride, maximum HR at the final third of
the ride, the number of HR evaluations below 170 bpm and above 180 bpm, and the
average HR in the exercise of each horse. ANOVA, T test and the Holm-Sidak test
were used when necessary with P<0,05. Rodeo horses showed higher maximum HR
(~200 bpm) during exercises, followed by the rides (~180 bpm) and then by horse
march (~140 bpm) (P<0.05). Rodeo horses showed a greater number of HR above
180 bpm when compared to other sports (P<0.05). Differences were still observed in
Professor do Núcleo de Pesquisa Equina, Universidade Federal Rural de Pernambuco *Autor para correspondência/
corresponding author: [email protected]
2
Professora do BIOPA - Laboratório de Biologia Molecular Aplicada à Produção Animal, Universidade Federal Rural de
Pernambuco
3
Médico Veterinário Autônomo
4
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciência Veterinária, Universidade Federal Rural de Pernambuco
5
Professor da Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade Estadual do Ceará
1
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 41 - 48 - janeiro/dezembro, 2012
42
H.C. MANSO FILHO et al.
the average HR (P<0.05). It is concluded that the different equestrian sports evaluated
showed significant differences in the HR during the simulation, when analyzed with a
frequency meter. Based on the energy expenditure, it is reported that rodeo horses
develop a large exercise effort in a short period of time, in contrast with the marching
and riding horses.
Key-word: Equine, physical activity, training.
INTRODUÇÃO
No Brasil os esportes equestres e as
avaliações dos animais em campanha
esportiva desenvolveram-se rapidamente
nas últimas décadas, contribuindo para o
aumento do conhecimento da fisiopatologia do exercício equino. Todavia, devido a
grande variedade de esportes e das raças
de cavalos, torna-se importante a avaliação
dos animais praticando as suas atividades
físicas em condições de campo para que
se possa estabelecer programas de nutrição e condicionamento físico (SLOET Van
OLDRUITENBORGH-OOSTERBAAN et
al., 1987; SCHOTT II et al., 2006), e com
isso contribuir para o bem-estar desse
grupo de atletas.
Um dos métodos mais importantes para
se avaliar o condicionamento físico e os
gastos energéticos dos cavalos é a determinação da frequência cardíaca (FC) durante
o esforço físico (WILLIAMS et al., 2009).
Em laboratórios utilizam-se equipamentos
como os eletrocardiógrafos, que fornecem
dados bastante precisos, mas que apresentam baixa aplicabilidade em condições
de campo (EVANS, 1994). Recentemente,
com o uso de frequencímetros desenvolvidos especificamente para equinos, as
avaliações de animais em condições de
competição ou campo tornaram-se bastante eficientes (WILLIAMS et al., 2009). Esses
aparelhos colhem informações com os
animais montados e durante o treinamento,
podendo ser utilizados para se estimar o
gasto de energia e também a evolução física dos animais durante o condicionamento.
De acordo com Evans (1994) e Serrano et
al. (2002), existe correlação positiva entre
a FC, consumo de oxigênio e gasto ener-
gético possibilitando avaliar os exercícios e
o nível de esforço físico, caracterizando-os
com base na variação da FC de forma bem
precisa (NRC, 2007).
Em várias regiões do Brasil as cavalgadas e as vaquejadas representam importantes segmentos dos esportes equestres.
Nas cavalgadas pode-se encontrar a presença de cavalos das raças marchadoras,
Campolina e Mangalarga-Marchador, e, por
isso, muitos dos animais que participam
das provas de marcha são utilizados para
as cavalgadas. Já os animais de vaquejada
raramente são utilizados nas cavalgadas,
mas, com certa frequência, podem ser
utilizados em festas de pega de boi, nas
regiões centrais do Nordeste.
Para melhor entender os gastos energéticos e o esforço físico a partir das variações na FC nos cavalos de vaquejada,
de prova de marcha e de cavalgada, foi
desenvolvido um experimento no qual se
objetivou realizar a caracterização da variação da frequência cardíaca de cavalos
atletas, de três modalidades esportivas,
durante o exercício através do uso do frequencímetro, e, por conseguinte, o nível de
esforço físico.
MATERIAL E MÉTODOS
Animais e Condições de Avaliação
Foram utilizados 18 equinos, adultos,
escolhidos aleatoriamente e divididos em
três tratamentos: vaquejada (n=6; ~8 anos),
prova de marcha (n=6, ~7 anos) e cavalgadas (n=6, ~9 anos), e que participavam regularmente do tipo de exercício que estava
sendo analisado. Só foram utilizados equinos que estivessem sendo condicionados
por período de mais de 3 meses para o tipo
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 41 - 48 - janeiro/dezembro, 2012
Avaliação da frequência cardíaca e ...
de esporte que praticavam regularmente e
as técnicas empregadas nos animais estão
aprovadas no comitê de ética em pesquisa
com animais (62/2007-CTA/DZ/UFRPE).
Os animais das provas de marcha e de
cavalgada eram das raças Mangalarga
Marchador (~400 kg; n=6 (3/3) e Campolina (~500 kg; n=6 (3/3)), e os de vaquejada
eram animais de puxar da raça Quarto-de-Milha (~500 kg). A massa da carga, em
todos os casos, foi de aproximadamente
100 kg, e correspondia a massa do cavaleiro, acrescido da massa dos arreios de
montada e de condução mensurados em
uma balança eletrônica. Tanto para o teste
padrão de simulação de prova de marcha,
com duração de 30 minutos, como para o
teste padrão de simulação de vaquejada,
com 10 minutos de duração, foi utilizado
o modelo já descrito na literatura (MANSO FILHO et al, 2012; SANTIAGO et al.,
2013; WANDERLEY et al., 2010) e para as
avaliações dos cavalos de cavalgada, com
duração de 3 até 5 horas, foram utilizadas
cavalgadas em condições de campo.
Determinação da Frequência Cardíaca
A aferição da frequência cardíaca
(FC) foi realizada com o frequencímetro
Polar 800CX® GPS-G36. Os transdutores
do frequencímetro foram colocados conforme a indicação do fabricante, em duas
localizações, sendo uma abaixo da manta
da sela, no costado direito, e a outra sob
a cilha, na região do cilhadouro esquerdo,
sendo todos em contato direto com a pele
dos animais. Em seguida, o receptor de
sistema de posicionamento global (GPS) e
o frequencímetro foram colocados no braço
do cavaleiro. Após a montada do cavaleiro,
os equipamentos foram acionados, e só
foram desligados ao final de período de
recuperação. Todas as medições foram
realizadas com os animais montados e sem
43
o afrouxamento da cilha.
O frequencímetro utilizado determinou
a FC ao longo do exercício físico e todos
os animais foram avaliados em pistas de
treinamento semelhantes as encontradas
nos locais de competições, mas de tamanhos variados, ou em trilhas de cavalgada.
Após a finalização das avaliações, os
dados armazenados no frequencímetro
foram transferidos para um computador
MacBook Pro®7, aonde foram visualizados
pelo programa Polar Protrainer® 5 Equine
Edition8. Os seguintes parâmetros para
comparação entre os três tipos de esportes
foram avaliados: FC à montada do cavaleiro
(FCSELA), FC máxima durante o terço inicial do exercício (FCMAX1), FC máxima durante o terço final do exercício (FCMAX3),
número das medições da FC abaixo de 170
batimentos/minutos (FC<170) e acima de
180 batimentos/minutos (FC>180), FC média durante o exercício (FCMÉDIA). Como
as simulações de vaquejada são bastante
rápidas, foi assumido que o primeiro boi
corrido corresponderia ao primeiro terço da
simulação e o terceiro boi corrido ao terço
final da simulação, sendo que os cavalos
correm os três bois, um em seguida do
outro.
Determinação do Gasto Energético
O gasto energético (GE) foi estimado
através da fórmula descrita por Coenen
(2005), que tem como base a determinação do consumo de oxigênio com base
no peso do animal, frequência cardíaca
durante o esforço e o tempo de esforço
(oxigênio utilizado mL/massa corporal kg/
minuto = 0,0019x(FC)2,0653, (R2 = 0,9)).
A frequência cardíaca média de cada tipo
de exercício, durante o exercício físico,
foi utilizada na fórmula para se estimar o
consumo de oxigênio.
Análise Estatística
Polar 800CX® GPS-G3, Polar Sport Tester, Kempele, Finland.
MacBook Pro, Apple Computers Inc., Cupertino, CA, USA.
8
Polar Protrainer® 5 Equine Edition, Polar Sport Tester, Kempele, Finland.
9
SigmaStat 3.0, SPCC Inc., Jandel Scientific, San Rafael, CA, USA.
6
7
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44
H.C. MANSO FILHO et al.
Os resultados dos três tipos de exercícios (tratamentos) foram analisados pela
ANOVA e, caso observado diferenças entre
eles, foi utilizado o teste Holm-Sidak. Também foi utilizado o teste T na comparação
das médias na distribuição da FC abaixo
de 170bpm e acima de 180bpm. Em todos
os casos utilizou-se o nível de significância
estabelecido em 5% e o programa SigmaStat 3.09 foi utilizado para as análises
estatísticas. Os resultados da FC foram
expressos em média ± erro padrão médio
e em batimentos por minuto (bpm).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Nesse trabalho observaram-se variações na frequência cardíaca (FC) em
equinos durante diferentes tipos de exercício físico desenvolvidos em condições
tropicais com o uso do frequencímetro
em tempo real. Com a ajuda do equipamento foi constatado que os cavalos
de vaquejada desenvolvem exercícios,
majoritariamente, anaeróbicos e com FC
máximas de ~200 bpm, em contraste com
os exercícios majoritariamente aeróbicos
observados nos cavalos de prova de
marcha e de cavalgada, com FC máximas
~140 bpm e ~180 bpm, respectivamente,
(Tabela 1). Esses resultados confirmam
indicações anteriores que tinham como
base a composição corporal desses atletas equinos (MANSO FILHO et al., 2010).
Os resultados permitem inferir que os animais de vaquejada apresentam maiores
FC>180 e FCMÉDIA quando comparados
com os outros dois tipos de exercícios
(P<0,05) (Tabela 1 e 2). Em contraste,
a simulação da prova de marcha e as
cavalgadas apresentaram FC<170 e FCMÉDIA similares (P>0,05), mesmo tendo
a cavalgada duração superior à prova de
marcha (Tabela 1 e 2).
Ainda analisando-se os animais, nos
diferentes esportes, foi observado que todos terminaram as provas sem demonstrar
sinais de fadiga periférica, que podem ser
caracterizados pela sudorese excessiva,
perda da qualidade do andamento e movimentos excessivos do conjunto cabeça/
pescoço, e/ou uso frequente das ajudas
pelo cavaleiro (EVANS, 1994). Finalmente,
não foi observada a presença de sangue
nas partes do corpo do animal que estiveram em contato permanente com os
arreios ou com as ajudas. Também, não
foram observados animais com claudicação após as simulações.
As avaliações sobre a variação da FC
TABELA 1 - Frequência cardíaca obtida durante a simulação em cavalos atletas de
vaquejada, prova de marcha e cavalgada em diferentes fases do evento
esportivo, avaliadas com o frequencímetro
Evento esportivo
À montada
Vaquejada
Prova de Marcha
Cavalgada
54,0±3,6 cA
57,3±4,8 cA
60,0±4,5 cA
Frequência cardíaca (FC/bpm)
Média
Máxima 1
Máxima 3
140,3±5,8 bA 196,0±3,5 aA 207,7±3,0 aA
119,7±4,2 bB 139,8±6,7 abB 147,7±8,2 aC
116,5±4,1 bB 184,5±7,2 aA 185,2±8,9 aB
Observações: diferentes letras minúsculas na mesma linha, ou letras maiúsculas na mesma coluna são
diferentes (P<0,05) pelo teste de Holm-Sidak. FC: frequência cardíaca, bpm: batimentos por
minuto.
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Avaliação da frequência cardíaca e ...
TABELA 2 -Distribuição das frequências cardíacas, obtidas durante a simulação em
diferentes tipos de eventos equestres com equinos atletas, pelo frequencímetro
Eventos equestres
Vaquejada
Prova de Marcha
Cavalgada
Distribuição da frequência cardíaca
FC<170
FC>180
88,3±3,4 aA
99,7±0,3 aB
98,2±0,5 aB
11,7±3,4 bA
0,3±0,2 bB
1,8±0,5 bB
Observações: diferentes letras minúsculas na mesma linha indicam que P<0,05 pelo teste T; diferentes letras
maiúsculas na mesma coluna indicam que P<0,05 pelo teste de Holm-Sidak; FC: frequência
cardíaca; bpm: batimentos por minuto; FC<170: número das avaliações da FC abaixo de 170
bpm; FC>180: número das avaliações da FC acima de 180 bpm.
nos esportes equestres nacionais e em
condições de campo ainda são escassas.
A ação do cavaleiro e do tipo de pista pode
influenciar bastante o desempenho do animal, podendo causar-lhe sérios problemas,
como também ao cavaleiro. Recentemente,
alguns autores demonstraram a importância das avaliações em condições de
campo (SLOET van OLDRUITENBORGH-OOSTERBAAN et al., 1987) pois elas
fornecem informações importantes de
como os animais estão utilizando as suas
reservas energéticas e, com isso, pode-se
estabelecer programas de reposição energética. Nos animais de enduro equestre,
concurso completo de equitação (CCE)
e de corrida as pesquisas de campo são
frequentes e ajudam no desenvolvimento
do esporte, identificando como os cavalos
utilizam os seus metabólicos energéticos
através da caracterização da frequência
cardíaca (SERRANO et al., 2002; COTTIN
et al., 2006; SCHOTT II et al., 2006) e, com
isso, contribuindo para o bem-estar dos
atletas equinos.
Durante a simulação da vaquejada
observou-se que a FC>180 é significativamente maior do que os resultados dos
animais de prova de marcha e de cavalgada
(P<0,05) (Tabela 2). Interessantemente,
foi observado que as médias da FCMAX1
e FCMAX3 na vaquejada foi de ~197 e
~207bpm, respectivamente assemelhando-
-se aos valores observados em cavalos de
corrida de trote (~205 bpm) (COTTIN et al.,
2006) e nas fases mais velozes do CCE
(~200 bpm) (SERRANO et al., 2002), todavia ainda são pouco inferiores as médias
observadas em cavalos de corrida (~230
bpm) (MUKAI et al., 2006). Dessa forma,
fica facilitado a caracterização do esforço
físico dos cavalos de vaquejada como de
elevada intensidade, mas, não dentro da
categoria descrita no NRC (2007) como
muito intenso, como são as corridas e determinadas provas de elite de enduro e de
CCE. Outro estudo com cavalos de puxar
demonstrou que ocorria elevado acúmulo
de lactato ao final das corridas de vaquejada (SANTIAGO et al, 2013), compatível
com FC elevada observada nos esportes
de alta intensidade (EVANS, 1994), corroborando os resultados encontrados com o
uso do frequencímetro nesse experimento.
Entretanto, deve-se observar que o trabalho de Santiago et al (2013) determina
a FC através do estetoscópio, que limita
o reconhecimento da FCMAX, por conta
de a FC retornar rapidamente aos valores
submáximos rapidamente após a parada
dos exercícios (EVANS, 1994).
Nas simulações efetuadas no presente experimento, os cavalos correram
três bois, um em seguida ao outro, o que
normalmente não ocorre na vaquejada.
Todavia, deve-se observar que cavalos de
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 41 - 48 - janeiro/dezembro, 2012
46
H.C. MANSO FILHO et al.
vaquejada correm até cinco bois em uma
única rodada de 10-15 minutos, e até dez
vezes, caso estejam na disputa final, já que
não há limites de corridas nessa fase do
evento. Por conseguinte, esse tipo de esforço físico pode comprometer o bem-estar
dos animais, quando estes não estão bem
condicionados.
Ainda, com base nos resultados,
observou-se que os cavalos de prova de
marcha e de cavalgada desenvolviam
outro tipo de atividade física, quando
comparado com aqueles utilizados no
exercício de vaquejada. No grupo de prova
de marcha observou-se que quando os
animais estão em condições controladas,
como no teste de simulação de prova
de marcha adotado nesse experimento,
as FCMÉDIA permaneceram abaixo dos
valores indicados como limites máximos
para os exercícios aeróbicos, que se situa
entre 150 e 170 bpm (PERSSON, 1983).
Recentemente foi demonstrado por Prates
el al. (2009) que a FCMAX encontrada em
cavalos marchadores durante uma competição foi de ~185 bpm, mas não há relato
da FCMÉDIA desses animais. Cardoso
et al. (2010) e Manso Filho et al. (2012)
demonstraram FCMAX de ~180 bpm durante a simulação de prova de marcha.,
corroborando como o atual estudo. Os
resultados desse experimento, quando
analisados em conjunto, permitem concluir
que esse grupo de cavalos de prova de
marcha realizaram exercícios abaixo do
limiar tipicamente aeróbicos, com pouca
elevação na concentração de lactato, na
dependência de suas reservas corporais
de gordura (MANSO FILHO et al., 2010;
WANDERLEY et al., 2010).
Diferentemente das vaquejadas, observa-se que nas cavalgadas os cavalos
apresentam FCMAX1 e FCMAX3 próximas
a 190 bpm e com elevado FC<170. Durante
as cavalgadas os andamentos vão do passo e da marcha até o galope ordinário, por
isso deve-se esperar que a FCMAX1 e FC-
MAX3 sejam elevadas, a FCMÉDIA baixa
e a FC<170 elevada, já que nesse esporte
equestre é permitido ao cavaleiro modificar
a velocidade de deslocamento do conjunto,
inclusive podendo parar e dar descanso ao
cavalo. Devido a essas características, na
cavalgada (~116bpm), a FCMÉDIA não foi
diferente daquelas observadas nos cavalos
de prova de marcha (~119bpm) (P>0,05),
mesmo com os animais competindo em
condições tão díspares de pista/terreno e
de tempo de esforço.
Em poucos esportes equestres a duração da competição é tão longa quanto
à das cavalgadas, e, entre eles temos as
provas de enduro equestre e o concurso
completo de equitação. Nesses esportes,
os cavalos apresentam FC acima de 180
bpm e deslocam-se ao galope de corrida
(SCHOTT II et al., 2006; SERRANO et al.,
2002), o que não ocorre nas cavalgadas.
Baseando-se nos resultados obtidos nos
animais de cavalgada podemos supor que
cavalos de prova de marcha poderiam
participar de cavalgadas, quando bem
condicionados. Finalmente, e com base
nas avaliações da FC desses cavalos
nessas provas, pode-se caracterizá-las
como um esporte de média intensidade,
mas diferentemente dos animais da prova
de marcha, de longa duração, quando observadas as condições de avaliação desse
experimento.
O conhecimento da FCMÉDIA e do
tempo gasto durante o esforço podem
ser utilizados para se estimar o consumo
de energia durante o exercício e com isso
obter-se um indicativo do grau do esforço
físico de um cavalo ou esporte equestre.
Com isso, aceitando-se a hipótese de que
FCMÉDIA pode representar, em parte, um
bom indicativo do esforço físico durante
um teste de exercício, calcularam-se os
valores médios do oxigênio consumido
nos esportes durante o experimento. Ficou
determinado que os animais de vaquejada
consumiram ~51,42mL de O2/kg/minuto
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 41 - 48 - janeiro/dezembro, 2012
Avaliação da frequência cardíaca e ...
e os de prova de marcha e de cavalgada,
~37,40mL e ~34,90mL de O2/kg/minuto,
respectivamente. Esses resultados, obtidos pela utilização da fórmula descrita
por Coenen (2005), representam bem
os gastos aeróbicos, mas não os anaeróbicos, e ressalta que, para se calcular
o consumo total de oxigênio, durante o
esforço físico, deve-se somar a massa do
cavalo e a massa da carga. Entretanto,
as informações obtidas a partir do uso
dessa fórmula poderão contribuir para
um melhor entendimento dos esportes
avaliados, facilitando a implementação
de programas de treinamento e contribuindo para o bem-estar desses grupos
de cavalos atletas.
CONCLUSÕES
Os diferentes esportes equestres representam um forte traço cultural no Nordeste
brasileiro. Várias provas utilizando-se equídeos são efetivadas, sem, entretanto, ser
demonstrado preocupação com os animais
que delas participam. O conhecimento
dos gastos energéticos, das variações
significativas na frequência cardíaca, e das
consequências do grande esforço físico
dispendidos pelos animais em um curto intervalo de tempo, podem auxiliar na adoção
de medidas que visem minimizar os efeitos
maléficos e proporcionar competições que
proporcionem benefícios à saúde e permitam maior longevidade a esses animais.
AGRADECIMENTOS
Aos criadores (Haras Abreu [Tracunhaém-Pe], Engenho Salgado [Nazaré da
Mata-PE], Haras Cascatinha [Camaragibe-PE], Centro de Treinamento “Rui Guerra”
[Limoeiro-PE]) e a seus cavaleiros que se
prontificaram em ceder seus cavalos atletas
bem condicionados, e ainda, disponibilizarem o uso do frequencímetro.
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Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 41 - 48 - janeiro/dezembro, 2012
RELATO DE CASO
PLATINOSOMÍASE EM CUXIÚ (CHIROPOTES SATANAS UTAHICKI)
Luana Célia Stunitz da SILVA1*, Klena Sarges Marruaz SILVA2,
Frederico Ozanan Barros MONTEIRO3, José Augusto Pereira Carneiro MUNIZ2,
Paulo Henrique Gomes CASTRO2
RESUMO – No presente trabalho relata-se a ocorrência do Platynosomum illiciens
em um primata não humano da espécie Chiropotes satanas utahicki mantido em
cativeiro pelo Centro Nacional de Primatas (CENP) em Ananindeua-PA. O animal
foi submetido a uma avaliação clínica, sanguínea, parasitológica e ultrassonográfica
nas quais foi constatada a presença de diarreia e discreta inapetência, alterações
significativas nas amostras séricas hepáticas, observação de ovos compatíveis com
Platynosomum illiciens ao exame de sedimentação e a presença de massa vegetativa no interior da vesícula biliar, bem como espessamento e dilatação da parede
da mesma. Deste modo, sugere-se a inclusão da platinosomíase como diagnóstico diferencial em casos de doenças hepáticas, principalmente quando aliadas a
condições favoráveis como regiões tropicais e recintos em torno de matas nativas,
ressaltando-se a importância de se investigar a epidemiologia e a relevância desta
enfermidade na conservação e medicina de primatas.
Termos para indexação: alterações hepáticas, Platynosomum illiciens, primatas
não humanos.
PLATINOSOMIASIS IN CUXIÚ (CHIROPOTES SATANAS UTAHICKI)
ABSTRACT – This work reports the occurrence of Platynosomum illiciens in a
nonhuman Chiropotes utahicki primate species held captive by the National Center
of Primates (CENP) in Ananindeua-PA. The animal underwent a clinical, blood,
parasitological and ultrasound evaluation in which there was presence of diarrhea
and discrete lack of appetite, significant changes in the hepatic serum samples, the
observation of eggs consistent with the Platynosomum illiciens sedimentation exam
and the presence of vegetative mass inside the biliary vesicle as well as the dilatation
and thickening of its wall. Thus, the inclusion of platinosomiasis as a differential
diagnosis in cases of hepatic diseases is suggested, especially when coupled with
favorable conditions such as tropical regions and environments around native forests,
emphasizing the importance of investigating the epidemiology and the relevance of
this disease for the conservation and care of primates.
Index terms: hepatic changes, nonhuman primates, Platynosomum illiciens.
Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (USP), Pós-Graduação em Anatomia dos
Animais Domésticos e Silvestres, Av. Prof. Dr. Orlando Marques de Paiva, 87 CEP 05508 270 - Cidade Universitária São Paulo/SP – Brasil, 11 3091-3016 *Autor para correspondência: [email protected]
2
Centro Nacional de Primatas, CENP-SVS/MS, Ananindeua, Pará.
3
Universidade Federal Rural da Amazônia, Instituto de Saúde e Produção Animal, UFRA, Belém, Pará.
1
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 49 - 56 - janeiro/dezembro, 2012
50
L.C.S. SILVA
INTRODUÇÃO
O Gênero Platynosomum é pertencente
ao Filo Plathelminthes, Classe Trematoda,
Super-Família Dicrocoelidea e Família
Dicrocoellidae (URQUHART et al., 1998)
possuindo diversas espécies descritas e
com hospedeiros vertebrados distintos,
acomete principalmente os felinos através
da espécie Platynosomum fastosum, identificada também em indivíduos primatas
do Velho Mundo (WARREN et al., 1998).
Esses parasitos habitam o sistema biliar
de hospedeiros definitivos, como aves e
mamíferos, e podem acarretar diversas
alterações biliares e hepáticas, caracterizadas como uma enfermidade de cunho
tropical que necessita de dois hospedeiros
intermediários no seu ciclo. Para outras
espécies do Platynosomum sp. existem
relatos, por exemplo, de P. illiciens identificados em aves como galos-da-campina
(CARVALHO et al., 2007) e falconiformes
(FERRER et al., 2004) e a espécie P.
proxillicens em cacatua (KASAKOS et
al, 1980). No entanto, muitas vezes se
apresentam de forma assintomática, dificultando o seu diagnóstico e tornando-se
mais um achado de necropsia.
Com relação especificamente aos
primatas, tem-se notificação de casos
envolvendo P. amazonensis em Callimico
goeldii, Saguinus nigricollis (KINGSTON
e COSGROVE, 1967) e Callithrix jacchus
(PORTER, 1972; POTKAY, 1992); P. marmoseti e P. fastosum em Saguinus nigricollis (KINGSTON e COSGROVE, 1967);
P. minutum acometendo Saguinus mistax
e Callithrix geoffroyi (KIFUNE e UYEMA,
1982).
A platinosomíase ocorre principalmente
em regiões tropicais por permitir as condições ideais para o desenvolvimento de seus
hospedeiros intermediários, bem como a
sobrevivência do gênero Platynosomum
(AZEVEDO, 2008), apresentando relatos
em áreas como a Malásia, Papua Nova
Guiné, Austrália, Havaí, Bahamas, Porto
Rico, Cuba, Brasil, Guiana Britânica e Flórida (BARRIGA et al., 1981; GOLDERG e
BURSEY, 2000).
O ciclo dos parasitos do gênero Platynosomum ainda não está totalmente elucidado (SALOMÃO et al., 2005), existindo
diversas controvérsias quanto ao número
exato de hospedeiros intermediários. No
entanto, vários autores relataram que, se
fazem necessários dois hospedeiros intermediários para a total evolução do parasito,
como um caramujo terrestre e, por final,
um anfíbio ou lacertílio, como as lagartixas
(FOLEY, 1994; SALOMÃO et al., 2005).
Os ovos são eliminados ao ambiente
externo juntamente com a bile, nas fezes
dos hospedeiros definitivos, apresentando
os miracídios, primeiro estádio da fase de
desenvolvimento. Quando se completa o
primeiro estádio, ocorre penetração ativa, através do tegumento dos primeiros
hospedeiros intermediários, aonde haverá
uma maturação até esporocistos e de esporocistos de segunda geração, os quais
darão origem às cercárias. Estas, por sua
vez, abandonam o hospedeiro ativamente,
podendo infectar os segundos hospedeiros
intermediários por meio de sua ingestão
ou por penetração ativa, ocorrendo então
a liberação de metacercárias, as quais se
encistam nos tecidos desse hospedeiro.
Quando mamíferos ou aves ingerem os
lacertílios ou anfíbios infectados, as metacercárias são liberadas, migrando até o
ducto biliar pela papila duodenal maior onde
permanecem até a fase adulta, sendo raramente encontradas no intestino delgado
(FOLEY, 1994; LEAL, 2003; SALOMÃO et
al., 2005; AZEVEDO, 2008).
No presente trabalho é relatada a ocorrência do Platynosomum illiciens em um
indivíduo da espécie Chiropotes satanas
utahicki de cativeiro e são apresentados os
aspectos clínicos, parasitológicos, hematológicos, bioquímicos e ultrassonográficos
relacionados à parasitose neste primata.
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 49 - 56 - janeiro/dezembro, 2012
51
Platinosomíase em Chiropotes satanas ...
RELATO DO CASO
No período de julho de 2008, um primata não humano da espécie Chiropotes
satanas utahicki (Cuxiú), fêmea, adulta,
cativa do Centro Nacional de Primatas
(CENP) na cidade de Ananindeua-PA,
apresentou histórico de diarreia e discreta inapetência. O animal foi anestesiado
com o protocolo de Cetamina (10mg/kg)
associado à Xilazina (0,5mg/kg), por via
intramuscular, para avaliação clínica, sanguínea, parasitológica e ultrassonográfica.
Após a contenção química, ao exame
físico, observou-se que o animal não apresentava outros sinais dignos de nota. Foi
realizada colheita de amostra sanguínea
por punção da veia femoral para a realização de hemograma e perfil bioquímico com
a determinação da atividade sérica das
enzimas hepáticas alanina aminotransferase (ALT), aspartato aminotransferase
(AST), fosfatase alcalina (FA) e gama
glutamil-transferase (GGT), efetuadas no
Instituto Evandro Chagas-Ananindeua.
Efetuou-se, ainda, a coleta de amostra
fecal por retirada diretamente do reto, que
foi imediatamente remetida para o Setor
de Laboratório (SELAB) do CENP, onde
se realizou os exames: direto, de flutuação
ou Willis-Mollay e o de sedimentação ou
Hoffmann.
DISCUSSÃO
Animais apresentando platinosomíase,
geralmente demonstram ausência de sinais clínicos (BIELSA e GREINER, 1985).
Entretanto, os animais infectados por Platynosomum podem exibir outros sinais, tais
como: anorexia, letargia, vômitos, icterícia,
colangite, colângio-hepatite e obstrução
extra-hepática, além de inapetência e diarreia (BARRIGA et al., 1981; SALOMÃO, et
al., 2005; AZEVEDO, 2008). O aumento na
gravidade sintomatológica acompanha o
aumento no número de parasitos presentes
no sistema biliar (FOLEY, 1994). No caso
relatado, durante a avaliação clínica inicial
do animal, foram observadas apenas uma
discreta inapetência e diarreia.
As alterações encontradas no exame
bioquímico foram significativas como demonstrado na Tabela 1. Entretanto, ressalta-se que não existem valores de referência
disponíveis na literatura para a espécie
citada, adotando-se, assim, indicadores
já descritos para a espécie Cebus apella
(macaco-prego), para a comparação dos
valores bioquímicos e de hemograma.
TABELA 1 - Perfil hematológico e bioquímico de uma fêmea da espécie Chiropotes satanas utahicki cativa do Centro Nacional de Primatas (CENP) da cidade de
Ananindeua-PA, infectada pelo Platynosomum illiciens
Parâmetros
Hemácias (x106/uL)
Hemoglobina (g/dL)
Hematócrito (%)
Volume Corpuscular Médio (u3)
Leucócitos Totais (x103/uL)
Bastonetes (%)
Segmentados (%)
Eosinófilos (%)
Basófilos (%)
Linfócitos (%)
Monócitos (%)
Resultados
Indicadores (a)
7,27
16
53
72,9
12,6
0
71
3
0
22
4
6
14-17
45-53
–
5-24
–
55
1,6
<1
41
1,8
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 49 - 56 - janeiro/dezembro, 2012
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L.C.S. SILVA
Uréia (mg/dL)
Proteínas Totais (g/dL)
Albumina (g/dL)
Alanina-aminotransferase (UI/L)
Aspartato aminotransferase (UI/L)
Fosfatase alcalina (UI/L)
Gama-glutamiltransferase (UI/L)
Bilirrubina Total (mg/dL)
Amônia (mmol/L)
28
6,8
4,6
119
219
743
297
1,0
388
13-90
6,1-10,1
3,4-5,4
1-19
4-40
36-293
15-97
0,04-0,81
–
(a) Indicadores hematológico e bioquímico para a espécie Cebus apella (macaco-prego).
Fonte: Larsson et al., (1997), Pissinati e Verona (2006).
Com relação aos achados hematológicos, a eosinofilia é uma característica
presente em casos de infecções parasitárias (GRACZYK, 1997), o que também foi
constatado no indivíduo Chiropotes satanas
utahicki avaliado, acometido por uma significativa carga parasitária.
Em relação à presença de linfopenia,
esta ocorrência pode estar associada a
um estresse prolongado, justificando a
condição do animal deste relato, por sua
submissão ao cativeiro.
A observação de uma monocitose pode
ser indicativa de uma afecção crônica, bem
como de doenças infecciosas específicas e
necrose, relacionando-se, provavelmente,
às alterações hepáticas acarretadas pela
platinosomíase (ALMOSNY e MONTEIRO,
2006).
Nas análises bioquímicas realizadas
observou-se, ainda, aumento significativo
nos valores de ALT, AST, FA e GGT que
podem sugerir a presença de uma possível colestase devido à ocorrência de lesão
hepatocítica (CENTER et al., 1986; JOHNSON e SHERDING, 1998).
A elevação significativa na dosagem
de amônia pode estar relacionada a uma
hepatopatia crônica devido à baixa conversão de amônia em ureia, segundo Almosny
e Monteiro (2006).
A taxa elevada da amilase sérica
observada pode ser sugestiva de uma
obstrução do ducto pancreático, localizado
anatomicamente próximo ao ducto colédoco, ou mesmo pela menor depuração
da amilase pelo sangue, uma vez que o
sistema fagocítico mononuclear do fígado é
a principal via de degradação desta enzima
(THRALL, 2007). Com relação à dosagem
da creatinina sérica, não se sabe, ao certo,
sua total relevância dentro do quadro dessa
parasitose, visto que, em gatos infectados
experimentalmente com o Platynosomum
spp., não foi observada mudanças renais
macroscópicas, assim como alterações nos
valores de ureia plasmática e no balanço
iônico (TAYLOR e PERRI, 1977).
Devido à baixa presença de ovos eliminados pelos parasitos adultos do Gênero
Platynosomum nas fezes diariamente,
faz-se necessário a aplicação de uma técnica de avaliação da concentração para
o diagnóstico coproparasitológico, como
relatado por Azevedo (2008), o qual referiu que a técnica de sedimentação ou de
Hoffman se mostra mais sensível do que
o exame de flutuação ou de Willis-Mollay.
No presente caso, foi detectado o parasito
Platynosomum illiciens apenas ao exame
de sedimentação, observando-se a presença de ovos de coloração marrom, ovalados,
operculados, semelhantes aos observados
por Soulsby (1982) e Bielsa e Greiner
(1985), permitindo identificá-los como ovos
de Platynosomum illiciens (Figura 1).
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 49 - 56 - janeiro/dezembro, 2012
Platinosomíase em Chiropotes satanas ...
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FIGURA 1 - Fotomicrografia evidenciando um ovo de Platynosomum illiciens encontrado
no exame de sedimentação do espécime de Chiropotes satanas utahicki.
Notar a presença de miracídio em ambas as fotos (setas pretas). (A) Aumento
de 200x. (B) Aumento de 400x.
Além disso, a soma de fatores como a
pequena produção de ovos pelo parasito,
aliada a uma sintomatologia inespecífica,
acarretam em dificuldade no diagnóstico da
infecção ocasionada pelo Platynosomum
spp. em indivíduos vivos, sendo este, um
achado mais comum em necropsia (SEETHA e CHENG, 1997).
A presença da parasitose descrita
pode ter ocorrido devido à localização
geográfica tropical do CENP, que propicia
o pleno desenvolvimento do parasito em
seus hospedeiros intermediários, aliado ao
fato de que a área demarcada do CENP
encontra-se em uma grande extensão de
floresta primária nativa, com a presença
de espaços residenciais ao seu redor, facilitando o ingresso de insetos, lacertílios,
bem como anfíbios. Na área demarcada,
observou-se ainda o acesso de gatos errantes no período noturno, nas proximidades
das gaiolas de permanência dos animais
os quais, podem estar contaminados, e
funcionando como disseminadores (SILVA
et al., 2008). Entretanto, devido aos hábitos
alimentares dos primatas de ingestão de
pequenos lagartos e anfíbios (AURICCHIO,
1995), permite que este evento funcione
como uma considerável explicação para a
ocorrência do parasito.
Como exame complementar para a
enfermidade, a ultrassonografia, aliada aos
demais exames diagnósticos permitem a
avaliação de uma série de anormalidades
hepáticas (NEWELL et al., 2001), sendo
esta ferramenta considerada como a melhor
forma de avaliação do fígado (MAMPRIM,
2004). Contudo, são escassos os trabalhos
envolvendo esta técnica imaginológica como
forma de diagnóstico para a platinosomíase
em animais, principalmente, no que tange à
medicina de primatas não humanos. As alterações que puderam ser observadas quando
da utilização desta técnica em espécimes
afetadas, é a presença de sedimentação
na vesícula biliar, alterações no parênquima
hepático, o espessamento da parede biliar,
a dilatação da vesícula e dos ductos intra e
extra-hepáticos bem como a presença do
parasito (NORSWORTY, 2004).
Nos exames ultrassonográficos abdominais utilizou-se um transdutor de 6,6 a
12 MHz, cujas imagens evidenciaram um
aumento na ecogenicidade do parênquima
hepático, espessamento da parede biliar,
dilatação da vesícula e identificação de uma
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 49 - 56 - janeiro/dezembro, 2012
54
L.C.S. SILVA
massa vegetativa de aspecto ecogênico
hiperecóico, em diversos cortes na parede
da vesícula biliar, e ainda, a presença de
massa no interior da mesma, contrastando
com o conteúdo anecóico interno do órgão
(Figura 2).
FIGURA 2 - Imagem ultrassonográfica de uma fêmea cuxiú da espécie Chiropotes satanas utahicki observando-se espessamento da parede biliar e identificação
de uma massa vegetativa de aspecto ecogênico no lúmen da vesícula biliar.
CONSIDERAÇÕES GERAIS
As enfermidades que acometem os
animais de vida livre mantidos em cativeiro podem ser ocasionadas por fatores
de manejo que facilitem a ocorrência de
doenças, ou pela dificuldade de diagnóstico, influenciando a condição de saúde dos
animais. Patologias de pequena ocorrência
são particularmente difíceis de detectar. De
acordo com este relato, torna-se relevante
a inclusão do trematódeo do Gênero Platynosomum como diagnóstico diferencial
em casos de sintomatologia hepática em
primatas não humanos mantidos em cativeiro, principalmente quando aliadas às
condições favoráveis de desenvolvimento,
como regiões tropicais e recintos localizados próximos de matas nativas. Além
de se constituir ferramenta diagnóstica
usual, a ultrassonografia é uma técnica
relevante na detecção deste tipo de patologia. Ressalta-se, ainda, a importância da
investigação epidemiológica e da adoção
de medidas que facilitem a determinação
dessa enfermidade, no sentido de preservar
os primatas não humanos.
AGRADECIMENTOS
Ao Centro Nacional de Primatas
(CENP-SVS/MS-PA) e ao Instituto Evandro
Chagas-Ananindeua (IEC-SVS/MS-PA).
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 49 - 56 - janeiro/dezembro, 2012
Platinosomíase em Chiropotes satanas ...
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Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 49 - 56 - janeiro/dezembro, 2012
RELATO DE CASO
PERSISTÊNCIA CLÁSSICA DO DUCTO ARTERIOSO EM CADELA
Robério Silveira de SIQUEIRA FILHO1*, Edvaldo Lopes de ALMEIDA2,
Julia Maria MATERA3, Hugo Barbosa do NASCIMENTO4
RESUMO – O ducto arterioso é um vaso que durante a vida fetal conecta a aorta à
artéria pulmonar e, normalmente, se fecha algumas horas após o nascimento. A não
oclusão desse ducto é chamada de persistência do ducto arterioso (PDA) ou ducto
arterioso patente, acarretando em um defeito cardíaco congênito comum em cães,
acometendo principalmente as fêmeas, e que raramente é encontrado em gatos. O
PDA apresenta-se de duas formas: a forma clássica, que se caracteriza pelo fluxo
sanguíneo no interior do ducto ocorrendo da esquerda (artéria aorta) para a direita
(artéria pulmonar), e a PDA reversa, cujo fluxo sanguíneo apresenta a direção da
aorta, ou seja, da direita para a esquerda. O tratamento para oclusão do ducto arterial
é cirúrgico, através de um procedimento aberto, eleito como técnica padrão devido à
segurança que esse método oferece. Porém, somente os animais com persistência
de ducto arterioso clássico podem ser operados para fechamento do ducto, pois
nos casos de fluxo reverso, o ducto funciona como válvula de escape para a artéria pulmonar. Objetivou-se neste trabalho relatar um caso de persistência clássica
do ducto arterioso em cadela, bem como abordar a técnica cirúrgica utilizada para
resolução da persistência clássica do ducto arterioso.
Termos para indexação: Artéria, coração, cão.
CLASSIC PATENT DUCTUS ARTERIOSUS IN A FEMALE DOG
ABSTRACT – The ductus arteriosus is a vessel that during fetal life connects the aorta
to the pulmonary artery and usually, closes a few hours after birth. The failure to the
occlusion of the duct is called the persistence of ductus arteriosus (PDA) or patent
ductus arteriosus, resulting in a common congenital heart defect in dogs, affecting
mainly the females, and that is rarely found in cats. The PDA presents itself in two
forms: the classical PDA, characterized by blood flow within the duct occurring from
the left (aorta) to the right (pulmonary), and the reverse PDA, in which the blood flow
is towards the aorta, from right to left. The treatment is a surgical intervention for the
closure of the ductus arteriosus, through an open procedure, elected as a technical
standard due to the security that this method offers. However, only animals with
classic patent ductus arteriosus can be operated to close the duct, as in cases of
reverse flow, the duct acts as an escape valve for the pulmonary artery. The objective
of this study is report a case of classic patent ductus arteriosus in a female dog, as
well as approaching the surgical technique used for the resolution of classic patent
ductus arteriosus.
Index terms: Artery, heart, dog.
1Médico Veterinário. E-mail: [email protected] *Autor para correspondência. Rua Joana Norberto Pessoa,
943, Casa Caiada, Olinda - PE, CEP 53130-030.
2Professor Associado do Departamento de Medicina Veterinária, Universidade Federal Rural de Pernambuco. Rua Dom
Manuel de Medeiros, s/n – Dois Irmãos, Recife - PE. CEP: 52.171-900.
3 Professora Titular do Departamento de Cirurgia, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São
Paulo. Av. Prof. Orlando Marques de Paiva, 87, São Paulo – SP,CEP 05508-270.
4Médico veterinário, Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Biociência Animal, Universidade Federal Rural de
Pernambuco. Rua Dom Manuel de Medeiros, s/n – Dois Irmãos, Recife - PE. CEP: 52.171-900.
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 57 - 64 - janeiro/dezembro, 2012
58
R.S. SIQUEIRA FILHO et al.
INTRODUÇÃO
O ducto arterioso é um vaso fetal que
conecta a artéria pulmonar à aorta descendente e tem como função desviar o sangue
da artéria pulmonar para a artéria aorta
evitando, assim, o fluxo sanguíneo para os
pulmões ainda não funcionais. Este canal
presente ao nascimento fecha-se imediatamente, após algumas horas, ou nos primeiros dias de vida (VAN ISRAEL et al., 2002;
FOSSUM, 2004; WARE, 2006; EYSTER
et al.,1998). Quando ocorre a persistência
prolongada deste ducto por mais que poucos dias após o nascimento é chamada de
persistência do ducto arterioso (PDA) ou
ducto arterioso patente. Esta patologia se
constitui em um dos defeitos congênitos
mais comuns em cães (BONAGURA, 1989;
SAUNDERS et al., 1999) e, também, é de
ocorrência rara em gatos (FOSSUM, 2004;
BELERENIAN, 2003).
O diagnóstico é habitualmente executado através da detecção de um sopro
característico (sopro contínuo) à auscultação cardíaca. Este sopro é mais audível
acessando-se a axila esquerda do animal.
As radiografias de tórax ou um exame eletrocardiográfico podem revelar alterações
compatíveis com esta patologia, mas o
diagnóstico definitivo é obtido por meio de
uma ecocardiografia (STOPIGLIA, et al.,
2004).
A sintomatologia geralmente apresenta
animais com sinais que poderão ser de
cansaço, intolerância ao exercício, tosse,
dificuldade em respirar. Apesar de em alguns casos bastante leves a expectativa de
vida ser normal e nunca serem observados
sintomas, frequentemente tal anomalia
(PDA) leva a alterações cardíacas graves e
morte no primeiro ano de vida (STOPIGLIA,
et al., 2004).
Existem duas condições com características hemodinâmicas em relação à
persistência do ducto arterioso. A primeira,
e mais frequente, é caracterizada pelo fluxo
sanguíneo no interior do ducto da aorta
descendente para a artéria pulmonar, ocorrendo da esquerda para a direita, conhecida
por persistência clássica do ducto arterioso.
A segunda condição, chamada de persistência reversa do ducto é caracterizada pela
reversão do fluxo sanguíneo da direita para
a esquerda, ou seja, do tronco pulmonar
para a aorta descendente (STOPIGLIA, et
al., 2004).
É relatado o óbito de 70% dos animais
não tratados cirurgicamente, antes de 1 ano
de idade (MILLER e BONAGURA, 2003).
A principal consequência da PDA clássica é a sobrecarga do ventrículo esquerdo,
ocasionando posteriormente dilatação e
hipertrofia ventricular esquerda. De modo
geral, a persistência do ducto não vem
acompanhada de outros defeitos congênitos (FOSSUM, 2004).
O tratamento da persistência do ducto
arterioso é realizado, na maioria das vezes,
de forma cirúrgica. Entretanto, técnicas radiográficas e angiográficas intervencionais
utilizando vários dispositivos, como por
exemplo, molas, têm sido aplicadas como
um tratamento menos invasivo. Desde
quando Porstmann et al. (1967) descreveram a primeira oclusão por cateterismo do
ducto arterial, diversos tipos de próteses e
diferentes técnicas de implante auxiliado
por cateterismo para ocluir este vaso têm
sido desenvolvidas. O uso da mola intravascular (de Gianturco) para tratamento
de PDA de pequeno diâmetro em humanos
foi relatado em 1992, e sua utilização foi
efetivada para o tratamento em cães desde
1994 (GOODRICH et al., 2007).
As técnicas e procedimentos intravasculares foram desenvolvidos, para se evitar
a anestesia geral, os efeitos invasivos da toracotomia, para minimizar as complicações
e a mortalidade em humanos. No paciente
veterinário, a anestesia geral é necessária
para a adoção da técnica intravascular.
No entanto, a vantagem é a diminuição da
taxa de complicações, e os casos relatados
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 57 - 64 - janeiro/dezembro, 2012
Persistência clássica do ducto arterioso ...
demostraram que a técnica intravascular
apresenta-se segura e eficaz no tratamento
de cães com PDA clássica (GOODRICH et
al., 2007).
O dispositivo ideal para a oclusão dos
diferentes tipos de ductos deve obedecer
à seleção individualizada, levando-se em
consideração a morfologia, o diâmetro mínimo, o comprimento e os tamanhos disponíveis de cada modelo, assim como a melhor
relação custo-benefício (KRICHENKO et
al., 1989). Em geral, os dispositivos mais
utilizados para a oclusão percutânea do
canal arterial são feitos com saco de nylon,
fios de nitinol, aço inoxidável com ou sem
cerdas de dacron, retalho de poliuretano
montado em um balão e podem ser como
os coils de Gianturco e os de liberação controlada (Flipper e NitOcclud), dentre outros
(HADDAD et al., 2005).
Os coils de Gianturco, devido a seu
baixo custo e grande efetividade, são os
preferidos para a oclusão de canais arteriais pequenos. Já para os canais um
pouco mais calibrosos ou de alto fluxo, a
utilização de coils de liberação controlada
são mais vantajosos, devido à possibilidade
de reposicioná-los durante o procedimento
de oclusão, reduzindo a ocorrência de embolização e de fluxo residual significativo.
O Amplatzer Duct Occluder, devido ao seu
custo elevado em relação aos coils, fica restrito a canais de grande calibre (HADDAD
et al., 2005).
Ware (2006) referiu que a incidência em
cães é aproximadamente três vezes maior
nas fêmeas do que em machos, enquanto
Miller e Bonagura (2003) citaram que as fêmeas são mais predispostas, na proporção
de 2,2:1. O PDA é encontrado com maior
frequência em cães de raça pura, como
o Maltês, Lulu da Pomerânia, Pastor de
Shetland, Springer Spaniel Inglês, Bichon
Frise, Poodle Toy e Miniatura, Yorkshire
Terrier, Chihuahua e Collie (FOSSUM,
2004; ACKERMAN et al.,1978; BONAGURA, 1989).
59
A cirurgia, na qual uma ligadura é feita
à volta do canal é muito eficaz, apesar de
invasiva. A toracotomia com ligadura do
ducto arterioso foi o método de tratamento
escolhido nesse caso, por conta de apresentar índice de 95 % de sobrevida no
Hospital Veterinário do Departamento de
Clínica Médica (VCM), da FMVZ/USP.
Objetivou-se com esse trabalho relatar
um caso de persistência clássica do ducto
arterioso em cadela, bem como abordar a
técnica cirúrgica utilizada para resolução
da persistência dessa patologia.
RELATO DO CASO
Deu entrada no Hospital Veterinário do
Departamento de Clínica Médica (VCM),
da FMVZ/USP, para atendimento na Clínica Médica, um animal de pequeno porte,
da espécie canina, sexo feminino, raça
miniatura Pinscher, de pelagem marrom,
com 4 anos de idade e pesando 3,5 kg.
O animal compareceu no ambulatório da
FMVZ/USP, apresentando tosse frequente,
quadros de desmaios (síncope) e relutância
na realização de atividade física moderada. O paciente apresentava normorexia,
normodipsia, normoquezia, normoúria,
mucosas oral e conjuntival normocoradas,
tempo de preenchimento capilar (TPC)
de 1 segundo, turgor cutâneo dentro da
normalidade, linfonodos sem alterações
e temperatura retal de 38,8 ºC. Quando
o animal se estressou durante o exame
físico, a mucosa oral tornou-se cianótica.
O animal apresentava-se taquipnéico e na
auscultação cardíaca percebeu-se a presença de sopro, principalmente, próxima
ao foco da artéria pulmonar principal, na
base esquerda dorsal do coração, e com
120 batimentos por minuto (bpm).
Aferiu-se a pulsação através da artéria
femoral, onde a mesma apresentava-se
hipercinética e com 120 pulsações por
minuto.
Foram solicitados exames complemen-
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 57 - 64 - janeiro/dezembro, 2012
60
R.S. SIQUEIRA FILHO et al.
tares como hemograma, perfil bioquímico
renal, perfil bioquímico hepático, dosagem
de sódio e potássio, radiografia torácica,
eletrocardiograma e ecodopplercardiograma colorido. Através das alterações observadas no eletrocardiograma e radiografia
torácica, realizou-se o ecodopplercardiograma para confirmar o diagnóstico de
PDA. Foi esclarecido ao proprietário que
a cirurgia de PDA clássica é considerada
curativa e deve ser realizada logo que possível após o diagnóstico.
O tratamento clínico foi realizado com
a furosemida na dose de 3 mg/kg por via
oral a cada 12 horas, atenolol na dose de
2 mg/kg por via oral (PO) a cada 24 horas,
maleato de enalapril na dose de 0,5 mg/kg
PO a cada 12 horas e espironolactona na
dose de 2 mg/kg PO a cada 24 horas.
No dia da cirurgia, o paciente estava
em jejum alimentar de 12 horas e hídrico
de 8 horas, conforme instrução ao proprietário, e passou por uma nova avaliação
para constatação de sua condição e estado
geral, a fim de ser submetido aos procedimentos cirúrgicos, reavaliando-se seu
estado físico, aferindo-se os parâmetros
cardíaco (140 bpm), respiratório (taquipnéico) e temperatura retal (38,3ºC). Após
essa avaliação, realizou-se a medicação
pré-anestésica (MPA) de acordo com uma
nova pesagem, com o uso de meperidina
na dose de 3 mg/kg por via intramuscular;
aguardou-se o tempo de ação da droga e foi
feita a tricotomia ampla da região torácica
esquerda, além da região de seu membro
anterior direito para acesso venoso.
O animal foi encaminhado ao Bloco
Cirúrgico, onde foi colocado em venóclise
com cateter número 24 e solução ringer
com lactato gota a gota através da veia cefálica para manutenção do acesso venoso.
Posteriormente, o paciente foi submetido à
anestesia geral inalatória usando-se para
indução Propofol, na dose de 5 mg/kg por
via endovenosa, intubação oro traqueal
com sonda de número cinco e Isoflurano
para a manutenção do plano anestésico.
Iniciou-se o procedimento cirúrgico com
a identificação do quarto espaço intercostal
esquerdo, incisou-se a pele com o uso de
bisturi elétrico do tipo bipolar, depois, foi
realizada a divulsão do tecido subcutâneo
e do músculo tronco-cutâneo com uso
de tesoura de Metzembaum. Após este
procedimento, observou-se a presença do
músculo grande dorsal, o qual foi incisado
utilizando-se o bisturi elétrico. Os músculos
intercostais externo, interno e a pleura parietal também foram incisados com o auxílio
do bisturi elétrico. A incisão foi estendida
no sentido dorsal e ventral com o uso da
tesoura de Metzembaum. Para facilitar o
campo cirúrgico, foram colocados tampões
de compressas umedecidas nas bordas
expostas da incisão torácica e um afastador de Finochietto para abrir as costelas,
prosseguindo com o rebatimento caudal
dos lobos pulmonares, acompanhado de
compressa umedecida, para expor a área
referente ao ducto arterioso. Identificou-se
o nervo vago esquerdo, isolando-o por dissecação através de divulsão, utilizando-se
cotonete, passando-se uma fita cardíaca
sobre o mesmo, isolando-o dorsalmente ao
ducto. Então, realizou-se a dissecação do
ducto por meio de divulsão, no qual foram
utilizados cotonetes. Após a dissecação do
ducto passou-se uma pinça hemostática
curva de Kelly por debaixo do ducto no sentido caudo-cranial, pinçou-se o fio de seda
número zero, que foi lentamente puxado por
baixo do ducto. Posteriormente, passou-se
outro fio de sutura, utilizando-se a mesma
manobra. Primeiramente, foi executada a
ligadura do ducto na porção próxima à aorta
(Figura 1).
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 57 - 64 - janeiro/dezembro, 2012
Persistência clássica do ducto arterioso ...
61
FIGURA 1 - Ligadura do ducto na porção próxima à aorta em uma cadela da raça miniatura Pinscher de 4 anos de idade.
Em seguida, foi realizada a segunda ligadura, na porção mais próxima da artéria pulmonar, sendo esta manobra conhecida como ligadura dupla do ducto arterioso (Figura 2).
FIGURA 2 - Ligadura dupla do ducto arterioso em uma cadela da raça miniatura Pinscher
de 4 anos de idade.
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 57 - 64 - janeiro/dezembro, 2012
62
R.S. SIQUEIRA FILHO et al.
Após a ligadura do ducto, procedeu-se à manobra de síntese da toracotomia
sendo utilizado fio mononylon 3-0, para
suturar a parede torácica, passando-se os
fios craniais à costela cranial, e caudal à
costela caudal. No último ponto foi realizada a expansão pulmonar para retirada
do ar contido durante o ato cirúrgico. Para
a síntese do músculo grande dorsal foi requerido o fio mononylon 4-0, utilizado num
padrão de sutura contínua simples e abolição do subcutâneo por meio de padrão de
sutura contínua do tipo zigue zague com fio
mononylon 4-0. Na pele utilizou-se padrão
de sutura do tipo isolado simples, com fio
mononylon 4-0.
Durante o período transoperatório
executou-se por via endovenosa, cefalotina
na dose de 30 mg/kg, rocurônio na dose
de 0,4 mg/kg via endovenosa a cada 20
minutos e em bomba de infusão remifentanil
na dose 0,2 microgramas por quilo (µg/kg).
Logo após a dupla ligadura do ducto arterioso, efetuou-se por via endovenosa em
bomba de infusão, nitroprussiato de sódio
na dose de 1 µg/kg/min, já que houve um
grande aumento na pressão arterial. Na
ferida cirúrgica realizou-se bloqueio local
com cloridrato de bupivacaína na dose de
1 mg/kg.
Finalizada a cirurgia, aguardou-se o
retorno do animal do plano anestésico e
encaminhou-se o paciente para o Serviço
Intensivo de Monitoramento (SIM), a fim de
avaliar-se a função cardíaca e a analgesia.
No SIM, administrou-se ao animal cefalotina na dose de 30 mg/kg a cada 8 horas
via endovenosa, carprofeno na dose de
2,2 mg/kg a cada 12 horas via subcutânea
e dipirona na dose de 25mg/kg a cada 8
horas via subcutânea. No dia seguinte, foi
prescrito por via oral, ampicilina na dose de
30 mg/kg a cada 8 horas durante 10 dias,
cloridrato de tramadol na dose de 4mg/kg a
cada 8 horas durante 3 dias, carprofeno na
dose de 2,2 mg/kg a cada 24 horas durante 4 dias, dipirona na dose de 25 mg/kg a
cada 8 horas durante 3 dias e continuou-se
mantendo a furosemida, espironolactona,
maleato de enalapril e atenolol.
DISCUSSÃO DO CASO
Segundo Ackerman et al. (1978), Bonagura (1989), Eyster et al.(1998), Goodwin
(2002), Miller e Bonagura (2003), Fossum
(2004) e Ware (2006), as fêmeas apresentam maior risco de desenvolvimento de
PDA, permitindo reforçar estas afirmações,
pela constatação do sexo da paciente desse relato.
De acordo com Fossum (2004), as
queixas mais comuns em animais sintomáticos de PDA com desvio da esquerda para
a direita são a intolerância a exercícios,
tosse e/ou falta de fôlego. Dunn et al. (2001)
relataram que poucos animais experimentam episódios de síncope.
Ao exame clínico, os sinais apresentados pelo animal atendido no hospital,
observou-se durante a auscultação cardíaca, um sopro contínuo, predominantemente
no foco da artéria pulmonar principal na
base esquerda dorsal do coração, como
aquele relatado por Goodwin (2002). No hemograma completo, perfil bioquímico
renal, perfil bioquímico hepático, dosagem
de sódio e dosagem de potássio não foram
observadas alterações. Stopiglia et al.
(2004) e Fossum (2004), afirmaram que as
alterações laboratoriais normalmente não
são encontradas no PDA clássico.
Ao exame radiográfico do animal,
observou-se aumento global da silhueta
cardíaca, deslocamento dorsal da traqueia
torácica pré-terminal e edema pulmonar.
Esses achados radiográficos foram condizentes com os relatados por Stopiglia et
al. (2004), Ackerman et al. (1978) e Ware
(2006).
No ecodopplercardiograma colorido,
observou-se aumento de átrio esquerdo,
aumento de ventrículo esquerdo, fluxo
turbulento contínuo no interior da artéria
Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 15, no 1/2/3, p. 57 - 64 - janeiro/dezembro, 2012
Persistência clássica do ducto arterioso ...
pulmonar (desvio da esquerda para a direita) com gradiente de pressão estimado em
aproximadamente 105 mmHg, culminando
com o diagnóstico de persistência clássica
do ducto arterioso. Stopiglia et al. (2004)
afirmaram que o exame ecocardiográfico
forneceu o diagnóstico definitivo para os
casos de PDA. Moise (1989) relatou que o
exame ecocardiográfico também pode ser
útil para descartar outros defeitos cardíacos
concomitantes.
Como o animal apresentava insuficiência cardíaca congestiva esquerda (ICCE),
foi realizado tratamento com atenolol, bloqueador beta1-adrenérgico, antiarrítmico e
anti-hipertensivo e maleato de enalapril, um
vasodilatador inibidor da enzima conversora de angiotensina (ECA) e, o tratamento
para o edema pulmonar determinado, foi
realizado com furosemida, um diurético de
alça, associado à espironolactona, (diurético poupador de potássio). Foi sugerido ao
proprietário o tratamento cirúrgico, já que
Fossum (2004) e Ware, (2006), afirmaram
que a ligadura de uma PDA clássica é considerada curativa e que a cirurgia demanda
certa urgência.
Durante a cirurgia não houve intercorrência em relação à anestesia, com exceção do aumento significativo da pressão
arterial no momento da ligadura do ducto
que, de acordo com Stopiglia et al. (2004),
ocorre concomitante com a redução na
frequência cardíaca (reflexo de Branham).
Para se promover a diminuição da pressão
arterial realizou-se infusão contínua de
nitroprussiato de sódio, um vasodilatador
relaxante da musculatura lisa vascular, no
pós-operatório durante o internamento. Os
outros parâmetros como a temperatura, a
frequência respiratória, a saturação de oxigênio, o tempo de preenchimento capilar e
a mucosa oral e conjuntival, mantiveram-se
dentro da normalidade.
Para a redução da dor no local da
incisão, realizou-se o bloqueio local da
ferida cirúrgica com o uso de cloridrato
63
de bupivacaína, pois conforme Fantoni
(2002), o cloridrato de bupivacaína utilizado
intercostal ou intrapleural são usados para
analgesia suplementar.
Quinze dias após o procedimento cirúrgico, o animal retornou ao Hospital Veterinário para a retirada dos pontos. Durante
a auscultação cardíaca, o sopro cardíaco
não se fez presente, assim como o pulso
hipercinético quando foi aferida a artéria
femoral, considerando-se o paciente em
condição de alta cirúrgica.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O tratamento de eleição da PDA clássica é a correção cirúrgica, através da dupla
ligadura do ducto, sendo a técnica mais
utilizada na maioria dos casos de PDA no
paciente animal. Apesar de ser um procedimento cirúrgico aberto, mais invasivo
quando comparado às intervenções intravasculares, é corriqueiramente aplicado,
pela segurança e índice de sucesso que
oferece. Vale ressaltar que, apesar de a
correção cirúrgica ser altamente exequível
e confiável, ela deve ser realizada por equipe com experiência em cirurgia e anestesia
torácica, com a adoção de condutas adequadas e atenção especial ao estado geral
do paciente a fim de se evitar o surgimento
de consequências desastrosas à recuperação/cura do mesmo e a sua sobrevida.
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Relato de Caso
COMPLICAÇÕES EM OVÁRIO-SALPINGO-HISTERECTOMIA EM CADELA
Hugo Barbosa do NASCIMENTO1*, Robério Silveira de SIQUEIRA FILHO2,
Edvaldo Lopes de ALMEIDA3
RESUMO – Embora a ovário-salpingo-histerectomia (OSH) seja considerado um
procedimento cirúrgico tecnicamente simples, há risco de complicações. Todos os
fios de sutura são corpos estranhos ao organismo e, durante a escolha, devem ser
levadas em consideração suas características físicas e a interação biológica entre
o fio e o tecido animal, assim como o emprego de técnicas assépticas adequadas,
para que complicações pós-operatórias sejam evitadas. Nesse trabalho, objetivouse relatar um caso de hidronefrose secundária a uma cirurgia de ovário-salpingohisterectomia realizada em uma cadela, consequente à reação tecidual provocada
por fio de sutura de algodão. Após a ressecção dos granulomas direito e esquerdo
e nefrectomia direita o animal apresentou resolução clínica.
Palavras chave: fios de sutura, hidronefrose, fístula abdominal, granuloma.
COMPLICATIONS IN OVARIAN-SALPINGO-HYSTERECTOMY IN BITCH
ABSTRACT – Although ovarian salpingo-hysterectomy (OSH) is considered a
technically simple surgical procedure, there are risks of complications. All sutures are
foreign to the body and, during the selection it must be taken into consideration its
physical and biological interaction between the thread and animal tissue, as well as
the use of aseptic techniques suitable for postoperative complications are avoided.
This study aimed to report a case of secondary hydronephrosis in a ovarian salpingohysterectomy surgery performed on a dog, consequent tecidual reaction caused by
suture cotton. After the resection of right and left granulomas and right nephrectomy
the animal showed clinical resolution.
Keywords: suture, hydronephrosis, abdominal fistula, granuloma.
INTRODUÇÃO
A ovário-salpingo-histerectomia (OSH)
representa um dos procedimentos mais realizados pela clínica de pequenos animais,
tendo por finalidade o controle da natalidade, prevenção de cio e pseudogestação,
como também, tratar afecções do trato
reprodutor feminino (TROMPOWSKY et al.,
2007) e, em alguns países, adicionalmente,
o método visa reduzir o número de animais
submetidos à eutanásia, por possibilitar
uma posterior adoção dos cães tornados
inférteis (JOHNSON, 2006).
Embora a OSH seja considerado um
procedimento cirúrgico tecnicamente simples, há risco de complicações (POLLARI
et al., 1996). As mais comuns são as hemorragias, a ligadura acidental ou trauma
do ureter, a formação de fístulas, e, de gra-
Medico veterinário, Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Biociência Animal, Universidade Federal Rural de
Pernambuco. Rua Dom Manoel de Medeiros, s/n – Dois Irmãos. CEP: 52.171-900, Recife, PE. *Autor para correspondência: e-mail: [email protected]
2
Médico veterinário autônomo
3
Professor Associado do Departamento de Medicina Veterinária, Universidade Federal Rural de Pernambuco. Rua Dom
Manoel de Medeiros, s/n – Dois Irmãos. CEP: 52.171-900, Recife, PE
1
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66
H.B NASCIMENTO et al.
nulomas de coto uterino, ou seja, presença
de tecido de granulação encontrado no
pedículo ou base remanescente a excisão
do útero (SANTOS et al., 2009). O processo
inflamatório do coto uterino e a formação de
granulomas podem ser causados por ligaduras com material de sutura inabsorvível
pelo organismo animal ou à técnica contaminada. Os granulomas de ligaduras vasculares ovarianas apresentam os mesmos
fatores etiológicos, podendo envolver os
polos caudais dos rins e a região proximal
dos ureteres, tendo como consequência a
formação de hidronefrose, megaureter proximal ao rim, além de extensas aderências
(MARTINS et al., 2006).
Todos os fios de sutura são corpos
estranhos ao organismo. Assim, durante a
escolha, devem ser levadas em consideração suas características físicas e a interação biológica entre o fio e o tecido animal
(RAHAL et al., 1997). Os fios sintéticos geralmente determinam uma fase inflamatória
de curta duração. Os de origem orgânica,
como algodão e seda, constituídos de proteínas naturais, ocasionam reação tecidual
mais intensa (OKAMOTO et al., 2003). O fio
de algodão multifilamentar, constituído de
celulose com alto grau de absorção, facilita
o acúmulo de fluídos, os quais, constituem
um meio propício ao desenvolvimento microbiano e as reações inflamatórias locais
(SOARES et al., 2001). A utilização de
diversos materiais em ligaduras durante
a OSH pode levar a uma intensa reação
tecidual, sendo a omentopexia a ligadura
do coto uterino sugerida como o melhor
procedimento para se evitar a formação de
aderências em órgãos adjacentes (TROMPOWSKY et al., 2007).
A hidronefrose é uma distensão pro-
gressiva da pelve renal, seguida de atrofia
do parênquima (SILVEIRA et al., 2006),
devido a obstrução da pelve, que podem
ter como causas, os nefrólitos, ureterólitos,
as neoplasias, as doenças retroperitoneal,
o traumatismo, a ligadura acidental do
ureter, hérnia perineal, complicações de
nefrectomia parcial ou de biopsia renal e
ureter ectópico (SILVEIRA, et al., 2006;
GIORDANI et al., 2008). Os sinais clínicos
observados nos casos de hidronefrose são
a disúria, tumoração renal, fístulas externas
(TROMPOWSKY et al., 2007), peritonite
supurativa difusa e desenvolvimento de
choque séptico (OKAMOTO et al., 2003).
Como procedimento para hidronefrose,
pode-se realizar nefrectomia (SILVEIRA et
al., 2006), indicada nos casos avançados,
quando o rim apresenta-se repleto de líquido, dilatado e perdendo sua conformação
(GIORDANI et al., 2008).
Nesta perspectiva, esperando-se contribuir com o desenvolvimento dos estudos
clínicos na área de nefrologia, objetivou-se com este trabalho, relatar um caso de
hidronefrose secundária a ovário-salpingo-histerectomia, em consequência à reação
tecidual provocada por fio de sutura de
algodão.
RELATO DO CASO
Atendeu-se no Hospital Veterinário da
Universidade Federal Rural de Pernambuco, um canino, fêmea, sem raça definida,
com 5 anos de idade, pesando 14 quilogramas, castrada, apresentando como
queixa principal sinal de dor e fístulas na
região abdominal lateral direita (Figura
1) e esquerda (Figura 2), com secreção
piosanguinolenta.
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Complicações em ovário-salpingo-histerectomia ...
67
FIGURA 1 - Fístula abdominal lateral direita em cadela de 5 anos de idade, após cirurgia
de OSH (seta).
FIGURA 2 - Fístula abdominal lateral esquerda em cadela de 5 anos de idade, após
cirurgia de OSH (seta).
Na anamnese, o proprietário relatou
que o animal foi submetido à OSH, em serviço público veterinário, aproximadamente
há 2 anos e, que após quatro meses de
realizado o procedimento, o mesmo apre-
sentou fístulas com secreções na região
abdominal lateral direita e esquerda. A ultrassonografia do abdome, realizada após
o aparecimento das fístulas, evidenciou reação inflamatória e presença de aderências
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68
H.B NASCIMENTO et al.
na região dos ureteres. Posteriormente, em
clínica veterinária particular, submeteu-se
o animal a duas laparotomias exploratórias
em períodos diferentes, nas quais, se retiraram granulomas de ligaduras vasculares
ovarianas, observando-se a presença de
fio de algodão. Após os procedimentos,
observou-se uma melhora clínica do animal, permanecendo, contudo, os processos
fistulosos.
Finalizada a anamnese, realizou-se
o exame físico do animal e solicitou-se
hemograma, dosagem sérica de uréia e
creatinina, bem como, ultrassonografia do
abdome total. Ao exame clínico inicial, o
animal apresentou mucosas róseas, hidratação normal, bom estado geral, temperatura retal de 38,5ºC e frequência cardíaca e
respiratória dentro dos parâmetros normais
para a raça. Os valores hematológicos, no
pré-operatório, assim como os níveis séricos de uréia e creatinina encontravam-se
conforme parâmetros fisiológicos descritos
por Viana (2007).
No exame ultrassonográfico, o rim direito apresentava-se em topografia habitual,
aumentado de volume (7,8cm de comprimento), com contornos regulares, perda
parcial da arquitetura devido à severa dilatação da pélvica (3,3cm) e ecogenicidade
da região cortical mantida. Foi observada
perda da definição cortico-medular, pela
dilatação medular, observando-se ainda,
estenose parcial no seguimento inicial do
ureter direito, por aderência à região da
ligadura vascular ovariana direita, e, nesta,
observaram-se ainda, tecido inflamatório na
região abdominal lateral direita e esquerda
com descontinuidade da parede abdominal
(fístulas) de 2,6cm de diâmetro no esquerdo e 1,7cm no direito. A interpretação dos
resultados obtidos, tanto na avaliação
clínica quanto nos exames complementares, reforçou a necessidade de adoção da
laparotomia exploratória no animal.
No pré-operatório, procedeu-se punção
da veia cefálica com cateter intravenoso,
mantendo a venóclise com solução de Ringer com lactato. Administrou-se cloridrato
de tramadol (2mg/kg/IV) e diazepam (1mg/
kg/IV) e indução com propofol (4mg/kg/
IV). Procedeu-se intubação endotraqueal
e vaporização com oxigênio 100% e isoflurano. Procedeu-se a antissepsia da área
operatória com iodopovidona tópico a 10%
e, após colocarem-se os campos cirúrgicos,
realizou-se a laparotomia exploratória.
Visualizaram-se aderências do omento, envolvendo o coto uterino, bexiga, baço
e seguimentos intestinais. Verificando-se a
presença de granuloma caudal ao rim direito (Figura 3), procedeu-se a nefrectomia
e ressecção do granuloma. Nas ligações
venosas e arteriais e na nefrectomia direita,
utilizou-se fio categute cromado número 1.
Realizou-se dupla ligação do ureter próximo
à bexiga, com fio mononylon número 2-0.
FIGURA 3 - Presença de granuloma na
região de ligação vascular
ovariana, caudal ao rim direito
de uma cadela de 5 anos de
idade (seta).
No pós-operatório prescreveu-se antibiótico (cefalexina 25mg/kg/VO/TID por dez
dias) e antiinflamatório (meloxicam 0,1mg/
kg/VO/SID por 7 dias). Procedeu-se o
acompanhamento pós-cirúrgico e avaliação
clínica durante 7 dias. Com 20 dias de realização do procedimento cirúrgico, realizou-se a ressecção externa do granuloma, que
se encontrava aderido à musculatura e a
pele da região abdominal lateral esquerda,
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Complicações em ovário-salpingo-histerectomia ...
obedecendo-se aos mesmos protocolos
de pré-anestesia, anestesia e terapêutica
pós-operatória anteriormente empregados, assim como o acompanhamento e a
evolução clínica pós-cirúrgica. Finalizada
a cirurgia, realizaram-se incisões no granuloma (Figura 4) e no rim direito (Figura 5),
evidenciando-se fio de sutura de algodão
e perda do parênquima com dilatação da
região da pelve, respectivamente.
FIGURA 4 - Presença de fio de sutura de
algodão com formação de granuloma de ligadura vascular,
em uma cadela de 5 anos de
idade (seta)
FIGURA 5 - Rim direito de uma cadela com
5 anos de idade, com perda
de parênquima e dilatação
da pelve renal (hidronefrose)
(seta).
69
As suturas foram removidas 8 dias
após as cirurgias. O animal retornou para
avaliação 15 dias após a ressecção do
granuloma direito e nefrectomia unilateral
direita, apresentando melhora dos sinais
dolorosos e uma regressão da fístula abdominal lateral direita, não apresentando
secreções exsudativas. Após 15 dias de
realizada a ressecção externa do granuloma e pele, o animal não manifestava sinais
dolorosos. Depois de decorridos 4 meses
dos atos cirúrgicos, evidenciou-se cicatrização completa das fístulas abdominal direita
(Figura 6) e esquerda (Figura 7).
FIGURA 6 - Cadela de 5 anos de idade,
apresentando cicatrização
completa de fístula abdominal
lateral direita, 4 meses após
realização de procedimentos
cirúrgicos corretivos (seta).
FIGURA 7 - Cadela de 5 anos de idade,
apresentando cicatrização
completa de fístula abdominal lateral esquerda, 4 meses
após realização de procedimentos cirúrgicos corretivos
(seta).
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H.B NASCIMENTO et al.
DISCUSSÃO DO CASO
Joshua (1965) dissertou sobre o desenvolvimento de granulomas associando-os
à contaminação do material de sutura ou
a falhas cometidas durante a assepsia,
o que permitiria o desenvolvimento de
fístulas na região abdominal lateral e hidronefroses, culminando em nefrectomias,
obstruções intestinais, piometra de coto
e ainda complicações da ferida cirúrgica
abdominal. Posteriormente, pesquisadores (PEARSON, 1973; FINGLAND, 1998;
HEDLUND, 2005; VAN GOETHEM et al.,
2006) relacionaram a utilização de material
de sutura multifilamentar não absorvível
nas ligaduras vasculares ovarianas com o
desenvolvimento de fístulas e granulomas,
devido aos fios permitirem a aderência
bacteriana. No presente estudo, mesmo
não sendo possível assegurar que houve
contaminação dos fios de sutura e demais
materiais utilizados nos procedimentos cirúrgicos, os achados anatomopatológicos
corroboram com aqueles observados nos
trabalhos supracitados.
Os fios de algodão encontrados no
interior dos granulomas sugerem a ocorrência de reação inflamatória de maior intensidade, assim como, de reação de corpo
estranho, mais pronunciada, fato relatado
por Castro et al. (1974), que pesquisaram
algodão, nylon e poliéster como material de
sutura em ratos e observaram que o fio de
algodão provocou maior reação.
Apesar da existência de aderências em
segmentos intestinais, não foram evidenciadas quaisquer obstruções nesses órgãos,
como as descritas por Pearson (1973). A
melhora do estado clínico e do processo
cicatricial demonstrou que a remoção dos
fios e tecidos circundantes comprometidos,
conforme descrito por Pearson (1973) e
Fingland (1998), é importante para a recuperação do paciente.
O granuloma de pedículo ovariano,
de acordo com relato de Pearson (1973),
envolveram o rim e ureter proximal, promovendo a hidronefrose, sendo necessária a
realização de nefrectomia, como preconizado por Fossum (2005) e Christie e Bjorling
(1998).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A incidência de complicações pós OSH
produzem sinais clínicos inespecíficos que
surgem em poucos meses ou até em anos
após a cirurgia e variam de acordo com a
experiência do cirurgião, o tipo de material
de sutura e a assepsia aplicados durante os
procedimentos. Nessa perspectiva, faz-se
necessário o correto emprego de técnicas
cirúrgicas, a correta aplicação dos diferentes tipos de fios de sutura, assim como a
assepsia adequada, para que complicações
pós-operatórias sejam evitadas.
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