ética: três dilemas de valores - Administração: Ensino e Pesquisa

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ética: três dilemas de valores - Administração: Ensino e Pesquisa
ÉTICA: TRÊS DILEMAS DE VALORES
João Mandim de Oliveira
Mestrado em Administração e Desenvolvimento Empresarial
Universidade Estácio de Sá
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Solange Coelho de Azevedo
Profa. do Curso de Graduação em Administração nas
Faculdades Integras de Jacarepaguá e Universidade Estácio de Sá
Mestrado Profissional em Sistema de Gestão - UFF
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Resumo
Esse estudo pretende analisar três dilemas éticos, pois ainda que o tema
Valores ocupe lugar de destaque em debates e, seja preocupação constante nos
ambientes profissionais, pouco se publicou sobre o assunto. A concepção do que
é certo ou errado está mais distorcida do que já esteve nos dias passados.
Assiste-se a falcatruas, corrupção, desonestidade que, assustadoramente,
tornaram-se banais. Atualmente, o que surpreende e provoca certa desconfiança
e mal estar é a atitude clara, honesta, despretensiosa. Após a percepção de que
os problemas do mundo atingem os meios profissionais, constata-se que esse
ambiente não necessita apenas de instruções de ordem tecnológica e que a Ética
merece atenção especial e abrangente. Trataremos, em especial, de três dilemas
éticos: dos Valores, dos Destinatários e dos Meios. Este trabalho não é a palavra
final sobre o assunto, mas uma extensiva pesquisa com o propósito de alertar as
pessoas que se interessam por um tema tão relevante em nossa época.
Palavras-Chave: Ética; Dilemas Éticos; Valores Éticos.
Abstract
This study intends to analyze three ethical dilemmas, though the theme
Values occupy prominence place in debates and, be a constant concern in the
professional atmospheres, few was published on the subject. The conception of
what is right or wrong is more distorted that it was already in the past. We see
frauds, corruption, dishonesty that, astonishing, became banal. Nowadays, what
surprises and provokes suspicion and discomfort is an clear, honest,
unpretentious attitude. After the perception that the problems of the world reach
the professional means, it is verified that the atmosphere does not need only
instructions of technological order and that the Ethics deserves special and
extending attention. We will discuss, especially, three ethical dilemmas: Values,
Addressees and Means. This work is not the final word on the subject, but an
extensive research with the purpose of alerting the people who are interested in
such a relevant theme in our time.
Key words: Ethical; Ethical Dilemmas; Ethical Values
Introdução
O avanço da liberdade individual e das conquistas inalienáveis do
homem trouxe uma geração muito preocupada com os seus direitos em
detrimento dos seus deveres.
Araújo (2002) define valores como sendo as qualidades presentes nas
coisas e que pode ser essencial para a existência dessas coisas. Podem ser
acidentais, secundárias, e muitas vezes, as próprias coisas em si. São valores,
uma vez que são essenciais para a existência, não só do homem, mas para a
existência do universo.
Arrais e Ebling (2002) assim abordam o tema: “Tudo o que impulsiona o
homem a viver melhor em qualquer dimensão (moral, religiosa, psicológica e
biológica) é um valor. Valor, portanto, se relaciona com a maneira do ser humano
viver. A maneira como vemos e entendemos o mundo é crucial na busca de
valores que darão significado à existência humana.”
Axiologia é a ciência que estuda os valores. A raiz da palavra vem do
grego áksios, ‘precioso, valioso’, e -logia, ‘tratado, ciência’. Esse estudo
desenvolveu-se especialmente na Alemanha do século passado. Obviamente, a
concepção do termo e muito do seu significado vem desde a antigüidade, mas
um estudo científico sobre o tema e as especulações filosóficas em torno dele
surgiram mais recentemente.
Enquanto Max Scheler (2002) situava a questão dos valores no nível
apenas da consciência (são percebidos não por uma introspeção simples, mas
por uma intuição emocional), R. H. Lotze (2002) caracterizava e situava os
valores apenas como uma questão filosófica. De uma perspectiva mais lógica,
Albrecht Ritschl (2002) estudou os valores como sendo uma emissão de juízos
de valor e juízos de fato.
Mas, foi Nietzche (2002) quem deu ao termo o caráter filosófico
considerado nos dias de hoje (antes dele, o sentido era apenas de mais-valia,
valor de troca, enfim valor de consumo).
Entende-se que valores são um conjunto de procedimentos, atitudes, e
até mesmo visão de mundo (influenciados ou não pela cultura, herança familiar e
meio) que nos faz agir e interagir com o mundo em que vivemos.
Valores Morais
São aqueles ligados à natureza do comportamento moral dos homens.
Um comportamento moralmente aceitável é definido por um código de conduta
de grupo. Esse código muitas vezes está implicitamente gravado na memória
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coletiva em função da cultura, do meio e da história de um povo. Outras vezes
este código de comportamento está também estabelecido nas leis de uma nação.
Kohlberg (1969) acredita que o desenvolvimento moral é baseado
primariamente num raciocínio moral e segue uma série de estágios. Suas
conclusões são resultados de mais de vinte anos de pesquisas envolvendo
entrevistas com indivíduos de diferentes idades.
Nessas entrevistas eram apresentadas aos entrevistados uma série de
histórias com dilemas morais. Uma das mais famosas era a seguinte:
Na Europa, uma mulher estava perto da morte com um tipo especial de
câncer. Havia uma droga que os médicos pensavam que podia salvá-la. Era uma
forma de rádio que um farmacêutico (químico) na mesma cidade havia
descoberto recentemente. O preparo da droga era muito caro e dispendioso, mas
o farmacêutico (químico) cobrava dez vezes mais do que a droga custava para
ele. Ele pagava duzentos dólares pelo rádio e cobrava dois mil dólares por uma
pequena dose da droga. O marido da mulher enferma, Heinz, foi a cada pessoa
que ele conhecia e pediu emprestado, mas ele conseguiu juntar somente a
quantia de mil dólares, que era a metade do custo da droga. Ele falou para o
farmacêutico que a mulher dele estava quase morrendo e que ele vendesse a
droga para ele mais barato ou então que permitisse a ele pagar a diferença
depois, mas o farmacêutico disse: “Não, eu descobri esta droga e eu vou ganhar
dinheiro com ela”. Então Heinz ficou desesperado e quebrou a loja do homem
para roubar a droga para a sua esposa”.
Depois de ler a história, as entrevistas de Kohlberg tinham uma série de
perguntas sobre questões morais: Heinz poderia ter roubado a droga? Este roubo
era certo ou errado? Por quê? Era um dever roubar a droga para a sua esposa
se não havia outra maneira? Poderia um bom marido roubar? Tinha o
farmacêutico o direito de cobrar o quanto quisesse já que não havia uma lei
estabelecendo limites no preço? Por quê?
Esta é apenas uma das onze principais histórias de Kohlberg para
investigar a natureza do desenvolvimento moral. Para ele, o conceito- chave para
a compreensão moral é a internalização do desenvolvimento da mudança de
comportamento que é externa e domina o comportamento que é controlado por
padrões e princípios internos.
Um Caso de Indulto
Quando Luís tinha 18 anos, estava envolvido com drogas e, em
companhia de outros jovens de sua idade, assaltaram a casa de uma mulher
viúva e mãe de dois filhos pequenos.
Roubaram cem mil pesetas que a mulher possuía para pagar o colégio
de um de seus filhos, e mais alguns objetos avaliados em trezentas mil pesetas e
de valor sentimental.
A sentença do Tribunal de Granada condenou-o, em 1985, a mais de dois anos
de prisão. A sentença foi recorrida e o Supremo Tribunal ratificou a condenação
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somente sete anos depois do ocorrido. Neste tempo, Luís casou-se, teve um filho
e trabalha em Jaém como peão em uma empresa de construção. Agora tem que
cumprir o tempo de cárcere que sentenciaram. Seu advogado fez um pedido de
indulto para Luís, alegando que já está reintegrado à sociedade.
Pergunta-se:
Luís deve ser absolvido? Seria justo tirá-lo de sua família e de seu
trabalho para ser punido com um fato ocorrido há sete anos atrás? A mulher que
sofreu o assalto não deveria ser ressarcida de alguma forma?
A Prevalência dos Valores Morais
Hoje em dia , a ética se detém, sobretudo, na pesquisa e no estudo dos
valores morais. Estes determinam o impulso moral e impelem os indivíduos à
ação. Somente aquelas atitudes e coisas que levam ao aperfeiçoamento e ao
bem comum do grupo é que possuem valor moral. Todas as vezes que o homem
se encontra num dilema – se deve ou não fazer isto ou aquilo – são valores pró
ou contra o bem comum do grupo que determinam a sua escolha.
A prevalência dos valores difundidos pela Revolução Francesa revela o
quanto o Brasil permanece dilacerado por suas desigualdades e pelo desrespeito
a direitos civis básicos, e o quanto a população anseia por uma sociedade
solidária, numa clara influência católica.
É interessante fazer-se uma reflexão sobre a fala de Stevenson (2002):
“Muitas vezes é mais fácil lutar por princípios do que cumpri-los.”
Então, será que o mundo está em crise? Uma crise que perneia toda a
sociedade - uma crise de valores. Corrupção, falsidade, desonestidade,
falcatruas, citando apenas o exemplo do contexto político, são tão freqüentes que
não causam mais admiração.
3. Dilema de Destinatário
O indivíduo tem deveres para com o grupo no qual vive, este por sua vez
tem deveres para com o indivíduo. Ora, é preciso não esquecer que as
sociedades não reconhecem relações apenas individuais, mas também entre
grupos, as quais não podem ficar excluídas do âmbito da moral e que têm
consequentemente, de ser reguladas por normas éticas.
Pode-se observar um fenômeno hoje marcante: o homem é um ser que
trabalha, que produz e que, por isso, deve ser preparado para produzir cada vez
mais e com qualidade. O homem é um ser concreto (em oposição ao cidadão
abstrato), o operário, o homem do cotidiano, como assinala Burdeau (2002) em
sua obra “A Democracia”, o homem identifica-se ao trabalho, visto que, sem
trabalho, deixa de existir.
Sendo assim, no âmbito da ética geral não deve o indivíduo esquecer de
sua situação profissional, pois quanto mais importante e elevada for a atividade
desempenhada, tanto mais ela se projetará, eticamente sobre o profissional,
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impondo-lhe uma conduta que não o prejudique como trabalhador, nem
prejudique a profissão que exerce.
Vale lembrar que quanto mais transcendente e influente for a profissão,
tanto mais exigente será do ponto de vista ético, e maiores deveres imporá.
Assim, pode-se destacar que na sua prática, o professor evidência seus
próprios valores, crenças e ideologias. Nota-se que o verdadeiro ensino tem uma
conexão com a vida das pessoas. O professor em seu ministério, educa de
forma positiva, para a verdade, para o puro e para o belo, guiado-se pela
consciência de que a ele compete ajudar o aluno a buscar a plenitude de sua
natureza.
3.1 A Ética na Vida Real
Tragédias como a dos pneus Firestone nos carros da Ford, que
provocaram a morte de pessoas, causam arrepios às empresas e aos seus
executivos, tanto pela questão humana como por arranharem a marca, a
reputação e pelo prejuízo potencialmente negativo que podem acarretar.
Mas tragédias podem ser iminentes para todas as companhias que não
criam e implementam no dia-a-dia um código de ética, que funcione como um
“guia de comportamento” – e isso pode ser ainda mais verdade no Brasil, onde o
debate da ética empresarial dá os primeiros passos, até porque o fantasma dos
processos movidos pelos consumidores não é – por enquanto – assustador.
Os códigos de ética podem ser reforçados com programas formais de
treinamento, com os canais de comunicação interno da organização (como email, caixinhas de “entrada e saída” de correspondência, linha telefônica) para
que os funcionários possam questionar e externar suas preocupações e até
mesmo com profissionais de ética.
Uma forma de enfrentar um dilema ético é a organização fazer
funcionários refletirem sobre questões do tipo:
A medida a ser tomada é legal? É correta? Quem será afetado? Está de
acordo com os valores da empresa? Como você se sentirá em seguida? Como a
medida apareceria na imprensa? Terá reflexos negativos para a empresa?
Níveis altos de comprometimento dos funcionários, com boas avaliações
de lisura e integridade, são um fator importante para o sucesso na economia de
hoje, as organizações realmente comprometidas têm que incluir seu alto escalão
em todos os programas ligados à ética. Do contrário, tudo não passará de
“perfumaria”.
Um exemplo sobre o que acabamos de citar é o filme “Todos os Homens
do Presidente”, que na ficção, mostra um caso em que os jornalistas têm que
escolher entre a ética profissional e a ética moral. Com relação a este caso,
Jefferson Puff, estudante de jornalismo, faz um resumo sobre o que este filme
significa para a ética jornalística e o que faria se estivesse no lugar das
personagens.
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O caso Watergate
Todos os Homens do Presidente conta a história da brilhante
investigação que os jornalistas Bob Woodward e Carl Bernstein conduziram para
o jornal The Washington Post, no começo da década de 70. Tudo começa
quando cinco homens são presos tentando instalar escutas na sede do Partido
Democrata, no Edifício Watergate, na capital norte-americana.
A dupla inicia as reportagens sem saber o que a espera, até que os
bastidores do esquema de corrupção e manipulação, coordenado pelo Partido
Republicano com o objetivo de reeleger o então presidente Richard Nixon,
começam a ser revelados. Muitos interesses estão envolvidos, mas um fato muito
decisivo é o apoio, mesmo que crítico e exigente, que recebem dos editores do
jornal, que sabiam que ali estava uma grande reportagem, que se tornaria
histórica.
De uma forma geral, pode-se dizer que o dilema ético inicialmente
apresentado é do tipo mais “simples”. Deve-se escolher entre atuar de forma
correta segundo a ética, porém correndo riscos, ou priorizar a segurança e
reputação, deixando os princípios éticos para trás.
Analisando estas duas formas de realizar a cobertura dos fatos, vê-se
como o filme demonstra algumas das diretrizes mais elementares da ética
jornalística. Escrever de forma mais superficial, divulgando somente versões da
Casa Branca seria mais seguro e menos trabalhoso. No entanto, a pluralidade de
versões, a divulgação de informação de interesse público e a publicação da
verdade estariam comprometidas.
Woodward e Bernstein optam por conduzir a matéria de forma
investigativa, céptica e incansável. Seguem pistas, conseguem informações,
pesquisam valendo-se das fontes mais variadas possíveis. Num conflito como
este, Jefferson Puff escolheria o mesmo caminho. Mesmo assim, observando a
competição que existia entre os dois e com outros jornais, perguntou-se se o que
pesou mais foi a consciência do papel social que eles tinham como jornalistas ou
a busca por fama, dinheiro e reconhecimento profissional.
Independente do motivo, é claro que o mérito e a certeza de que foi a
escolha mais íntegra não seriam de todo diminuídos. Não se pode dizer o mesmo
de todas as decisões tomadas pela dupla.
Com o progresso da investigação e as publicações diárias no jornal, as
possíveis fontes de informação diminuem as contribuições devido às ameaças do
Partido Republicano. Nas cenas onde Bob e Carl interrogam as pessoas cujos
nomes estavam na lista do Comitê para a reeleição de Nixon, os conflitos são tão
aparentes que a discussão ética está implícita aos olhos de qualquer espectador.
As críticas que são dirigidas a eles e os apelos de alguns interrogados
para que eles os deixem em paz são um tanto dramáticos, mas reais. Dessa vez,
o dilema está em optar por uma das duas formas de jornalismo possíveis,
igualmente defensáveis, mas sob diferentes pontos de vista.
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Até que ponto se pode utilizar os contatos, interrogar, colocar pessoas
simples em situações de perigo?
A maneira com que os jornalistas pressionam as pessoas para que elas
falem é muito questionável. Conforme o artigo 9 º do Código de Ética do
Jornalista Brasileiro, é dever do jornalista respeitar o direito à privacidade do
cidadão. Logo, bater à porta de uma pessoa, pressioná-la a divulgar informações
sabendo que ela está sob ameaças, seria reprovável. Em contrapartida, o Código
de Ética da Associação Nacional dos Jornais defende que o direito de cada
indivíduo e sua privacidade devem ser respeitados: “salvo quando esse direito
constituir obstáculo à informação de interesse público”.
Assim, a decisão é complicada. No filme, eles escolheram obter
informações confidenciais e importantes que poderiam desmascarar toda a
campanha e principalmente mostrar a uma nação a verdadeira face de seu
presidente. Sabendo, é claro, que estavam colocando em segundo plano a
privacidade e a vida de algumas fontes utilizadas.
Diante da mesma situação, Jefferson Puff optaria por interrogar pessoas
comuns e as colocariam em perigo, somente se fosse a última alternativa.
Tentaria usar apenas algumas técnicas que eles usaram mais tarde, quando
“jogavam um verde”, afirmando certas partes da informação somente para que a
pessoa confirmasse. Fica claro que se eles tivessem desistido, o resultado seria
muito pior, pois talvez até hoje não se saberia a verdade.
Quando os freios morais e religiosos se mostravam robustos, os
preceitos éticos profissionais eram, sem dúvida, mais respeitados. Porém, no
momento em que os bons costumes passaram a ser descumpridos, a regressão
não castigou apenas a vida social, mas o próprio exercício das profissões:
indisciplina, ambição desmedida, febre de poder tornaram-se, infelizmente, as
metas de muitos. Por outro lado, é de se observar que, quando os meios de
comunicação eram limitados e de alcance relativo, as más sementes não eram
difundidas com a extraordinária rapidez de hoje, não havendo, nem de longe, a
divulgação do luxo e do consumismo desenfreados que se observam atualmente.
Paralelamente, o avanço tecnológico da produção alterou radicalmente a
economia, passando pela concorrência – às vezes, desleal – e pela publicidade,
em muitos casos, inescrupulosa. Mais: a lamentável confusão que se faz entre
democratização e massificação do ensino golpeou as profissões mais nobres.
Estas, quando contavam com quadros reduzidos de praticantes, tinham seus
quadros muito mais selecionados do ponto de vista da aptidão e do intelecto,
porém, na medida em que as profissões foram sendo massificadas, multidões de
novos “profissionais” congestionaram o campo de trabalho, e, o que é pior,
ocasionaram um brutal rebaixamento do quilate intelectual de seus praticantes,
para não dizer moral.
E o que isso significa? Que decisões e ações, ainda que consideradas
morais e legítimas por alguns, não o são necessariamente por outros, porque
ferem interesses alheios; porque põem em litígio coletividades diferentes; porque
despertam velhos rancores, estereótipos e preconceitos. Aliás, quanto menor for
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a coletividade beneficiada, em detrimento das demais coletividades, mais
acirradas serão as divergências e maiores serão as distâncias que as separam.
4. Dilema dos Meios
Outro dilema ético, cuja natureza é também bastante perturbadora, é o
dilema dos meios. Para cumprir prescrições (leis morais e ideais) ou para levar
adiante propósitos (fins e conseqüências) é preciso lançar mão de meios. Estes
podem ser legítimos e aceitos por todos, principalmente por aqueles a quem se
aplicam, ou podem ser meios ilegítimos, controversos, rejeitados principalmente
por aqueles a quem se aplicam. Imaginemos a violência física ou a violência
simbólica, a fraude ou a manipulação, o sacrifício de alguns para salvar muitos
ou a mentira deliberada. É fácil ver que o problema não se resume a meios
“lícitos” ou “ilícitos”, meios apenas submetidos à legalidade.
Porque as implicações não se cingem ao caráter jurídico-político dos
meios, mas, também, à validação moral – de caráter simbólico – que o uso
desses meios supõe.
Aparentemente, a ética da convicção não autoriza o uso de meios
ilegítimos, porquanto não aceita que se cometa um mal para evitar outro mal,
ainda que maior. A abjeção dos meios demonstraria a abjeção dos fins.
4.1 O Dilema Médico
Quando um usuário de heroína deu entrada na emergência alegando
uma grave insuficiência respiratória – foi numa madrugada fria de dezembro –
tinha os dias contados.
O Hospital de Madrid diagnosticou tuberculose multirresistente, uma
grave doença pulmonar altamente contagiosa, que é muito sensível aos
antibióticos, deriva em morte certa num prazo médio de dois anos. Acudido por
um rapaz, o paciente, de 34 anos, só escapou do centro do NA – Narcóticos
Anônimos para fazer uso de heroína, depois retornando ao centro para continuar
o tratamento. Dois dias depois, voltou a fugir. Na madrugada seguinte foi
recolhido, em fase praticamente agônica, por uma UTI – Unidade de Tratamento
Intensivo móvel. Com paradas respiratórias contínuas, os médicos se
prontificaram a fazer a entubação e a ventilação mecânica. Estavam sem
paradeiro, quando consultaram uma UTI do hospital. Eles responderam que só
havia uma cama desocupada e que não poderiam utilizá-la, pois havia reserva
obrigatória para uma palestra em Madrid da Conferência de Chefes de Estado
Europeus e, além disso, nenhum dos pacientes que ali estavam, poderiam ser
removidos. A doença do toxicômano não iria melhorar somente com o tratamento
intensivo, parecia terminal. Decidiram não interná-lo na UTI e, o paciente faleceu
poucas horas depois.
Muitos médicos enfrentam habitualmente dilemas como este. Um dilema
é um argumento por dois argumentos contrários entre si, de tal maneira que sua
resolução leva em si mesma a contradição e, portanto, nunca se pode resolvê-lo
por completo. Em poucos minutos, quem zela pela saúde de outras pessoas tem
que tomar decisões muito complexas, nas quais intervêm distintos fatores
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normalmente contraditórios e nunca fáceis de conciliar. O Dr. Juan Acalá Zamora
diz que 90% dos problemas éticos em seu hospital, estão relacionados com o
final da vida: “limitar o esforço terapêutico ao retirar os aparelhos de suporte vital
só irá gerar situações conflitivas”.
A ética da responsabilidade, em contraposição, não se furta a utilizar
meios ilegítimos. Sentencia que, para atingir fins preconizados, são precisos
meios reais ou que, para ser idealista nos fins, é preciso ser realista nos meios.
Max Weber (2002) assim se pronunciou:
“Não há ética alguma no mundo que possa desconsiderar isso: para
atingir fins “bons” somos obrigados, na maior parte do tempo, a contar de um
lado com meios moralmente desonestos ou pelo menos perigosos, e de outro
lado com a possibilidade ou ainda a eventualidade de conseqüências
desagradáveis. Nenhuma ética no mundo pode dizer-nos tampouco quando e em
qual medida um fim moralmente bom justifica os meios e as conseqüências
moralmente perigosas”.
5. Conclusão
Esse estudo buscou evidenciar experiências
administrador, com o processo de formação de valores.
realizadas
como
À medida que se caminhou-se na pesquisa do tema em questão, pode-se
observar uma pouca quantidade de material específico sobre como trabalhar
valores no ambiente profissional.
Assim, num contexto mais prático, é
recomendável que a educação ética nas organizações de buscar orientar os
funcionários privilegiando a integração de planejamento do negócio com a
execução dos valores. Vale ressaltar que a experiência pessoal, tanto nos
acertos, como nos erros, também contribuiu para o amadurecimento das atitudes.
Deve-se ter em mente que a educação é fator imprescindível na busca
de um mundo mais justo. De acordo com Caporali (1999), desde as primeiras
reflexões sobre ética de que se tem notícia, provavelmente na Grécia Clássica,
“pensar a ética se tornou a reflexão sobre os costumes, conceitos, valores e
critérios que levariam a uma vida boa.” Sendo assim, pode-se observar que
muitos pais e educadores vivem hoje um grande dilema: O que devem ensinar
para os seus filhos em um mundo que distorce os valores básicos?
Numa visão mais ampla temos o homem como um todo: corpo, espírito e
mente. Ampliando esta colocação, vemos no ser completo os aspectos físicos,
intelectuais, espirituais, morais, afetivos e culturais. Mas na prática, não é isso
que ocorre.
Há uma ênfase no desenvolvimento do aspecto cognitivo. Em bem menor
intensidade ainda há uma preocupação com o físico. E os demais aspectos ficam
esquecidos, quando não renegados.
O homem desenvolve sua vida, não isoladamente, mas dentro de uma
comunidade. Esta deve ser mantida e preservada para o bem do próprio
indivíduo. Essa relação de sobrevivência e bom andamento do grupo com os
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interesses do indivíduo, determina uma grande classe de valores: os éticos ou
morais.
Na medida em que as profissões foram sendo massificadas, multidões de
“novos” profissionais congestionaram o campo de trabalho, e o que é pior,
ocasionaram um brutal rebaixamento do quilate intelectual de seus praticantes,
para não dizer moral.
Os pais evidenciam seus próprios valores, crenças e ideologias. O
verdadeiro ensino tem uma conexão sensível com a vida das pessoas. Os pais
atuam guiados pela consciência de que competem ajudar os filhos a buscar a
plenitude de sua natureza humana. O ensino de valores é um desafio quando se
trata de preparar os filhos para o mundo de hoje.
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