Música romântica. - História da Cultura e das Artes
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Música romântica. - História da Cultura e das Artes
Ano letivo: 2012/2013 História da Cultura e das Artes – História da música Antiguidade e Idade Média Até 1400 Renascimento 1400-1600 Barroco 1600-1750 Classicismo 1750-1830 Romantismo 1830-1914 Modernismo 1914-1945 Atualidade A partir de 1945 1 Ano letivo: 2012/2013 Índice 1) Características gerais da Música Romântica....................................................................... 4 2) Fases do Movimento Musical Romântico .......................................................................... 6 3) O Lied Romântico ............................................................................................................. 8 4) Música Coral ................................................................................................................... 10 5) Música de Câmara ........................................................................................................... 11 6) Música para Piano ........................................................................................................... 11 7) Principais compositores ................................................................................................... 13 8) Música Orquestral ........................................................................................................... 17 9) A Ópera do século XIX e o drama musical de Richard Wagner ........................................ 21 9.1 A ópera em Itália ........................................................................................................... 21 9.2 A ópera em França ........................................................................................................ 25 9.3 Richard Wagner e o Drama Musical .............................................................................. 26 10) O Nacionalismo........................................................................................................... 30 2 Ano letivo: 2012/2013 ROMANTISMO: 1750-1830 1830 – Nova onda de revoluções liberais por toda a Europa (França, Bélgica, Holanda, Portugal, etc.), embora no início do século XIX já muito compositores estivessem a cultivar um novo estilo (como Beethoven, por exemplo) 1914 - Início da I Guerra Mundial, mas ocorre também a passagem de Schoenberg para o atonalismo O termo “romântico”: o adjetivo romântico deriva de romance, cujo sentido literário original era o de uma narrativa ou poema medieval, escrito numa das línguas românticas (derivadas do latim). Quando a palavra começou a ser utilizada em meados do século XVIII (Iluminismo) associava-se a algo distante, lendário, fictício, fantástico, maravilhoso, um mundo imaginário ou ideal, por oposição ao mundo real. Apesar de no Romantismo não haver uma rutura da linguagem musical, dos géneros e da harmonia do Classicismo, ocorre uma distorção do equilíbrio entre a razão e o sentimento. Predomina agora a expressão do eu, o subjetivismo, a emoção e o dinamismo. Este termo inicialmente designou um movimento literário, sendo aplicado à música quando E. T. A. Hoffman (1776-1822), em 1810, designou Beethoven como sendo um compositor “romântico”, nos seus ensaios em torno da 5ª Sinfonia de Beethoven. De facto, dentro da esfera sinfónica, será Beethoven quem irá nortear os compositores românticos. Viajante Sobre Mar de Nevoeiro, Gaspar David Friedrich O Romantismo visto pelos seus protagonistas O sentimento do artista é a sua lei. O sentir puro nunca pode ser contrário à natureza, sempre será adequado à natureza. Nunca deve impor-se o sentimento de outrem como lei. A única fonte verdadeira da arte é o nosso coração, a linguagem de um ânimo infantil puro. (...) Toda a obra de arte autêntica se percebe em hora solene e nasce em feliz hora, muitas vezes sem que o artista esteja consciente, partindo de um impulso interior do coração. Caspar David Friedrich 3 Ano letivo: 2012/2013 A arte é uma linguagem totalmente distinta da natureza; mas também dispõe de um poder maravilhoso sobre o coração do homem por semelhantes caminhos secretos e obscuros. (...) Molda o espiritual e o insensível nas figuras visíveis de um mundo, tão admirável e comovente, que todo o nosso ser e tudo o que está em nós volta a agitar-se e treme desde o fundo. Wilhelm Heinrich Wackenroder Quando, indiferente a tudo o que é alheio, ignorando-o, a arte atua segundo esse sentimento interior, próprio, único, independente, então, quer nasça do estado selvagem, quer de uma culta sensibilidade, será vital, íntegra. E acontece em diferentes graus em nações e indivíduos isolados. Quanto mais a alma se elevar ao sentimento das proporções, belas e eternas por si mesmas, cujos acordes básicos podemos definir, cujos segredos só podem ser sentidos, no seio onde se agasalha em venturosas melodias a solitária vida do génio; quanto mais penetre, acrescento, esta beleza na essência do se espírito, de modo que pareça haver surgido com ela, até que nada a contente mais, tanto mais feliz será, e mais firmemente inclinados estaremos nós, orando ao Ungido de Deus. Johann Wolfgang von Goethe Mas em nenhum lugar nos apercebemos melhor do que na música que é aquele espírito que torna poéticos os objetos, as alterações da matéria, e que o belo, o objeto da arte, não nos é dado nem se encontra no imediato. Todos os sons que a natureza nos oferece são brutos - e carentes de espírito - e se por vezes parecem melódicos e com sentido o sussurro dos bosques, o assobio do vento, o canto do rouxinol, o chapinhar do arroio, apenas o são para a alma musical. A natureza possui instinto artístico - daí que toda a tentativa de diferenciar arte e natureza seja mero palavrório. Para o poeta serão diferentes, em todo o caso, uma vez que tem uma conceção racional e não apaixonada, diferenciando-se daquelas pessoas - que, por afeto, convertem a natureza e a arte em representações involuntariamente musicais, poéticas ou, em si, interessantes. Novalis Quando digo que amo Shakespeare, Goethe, as histórias antigas, isso significa que creio que todo o dom benéfico provém de cima, de Deus, de um céu amoroso, claro, azul, e é recebido por benditas mãos agradecidas, ornadas com as flores da Terra, enviado de novo para cima como uma ação de graças de crianças boas. Raramente, porém, inocente e inconsciente, como cresce a pérola na ostra; muitas vezes afogado e desfigurado, ou envenenado por aquilo que, na noite, semeia ervas daninhas sob o trigo. Clemens Brentano É belo e necessário entregar-se totalmente à impressão de um poema, deixar que o artista faça connosco o que quiser, e apenas em pormenores confirmar o sentimento pela reflexão e elevá-lo a pensamento, e determinar e acrescentar onde fosse possível duvidar ou revelar-se. Isto é o primordial e fundamental. Friedrich Schlegel 1) Características gerais da Música Romântica Predomínio de uma burguesia culta, que faz com que o consumo da música aumente. Cultiva-se nesta época a música doméstica, de salão, para além das grandes salas de concerto, dos teatros de ópera e das Igrejas. Diletantismo musical: a partir do início do século XIX a música doméstica (piano, guitarra, flauta), difunde-se rapidamente junto da burguesia. Nesta difusão o piano (símbolo do individualismo romântico) desempenhou um papel importante, devido à sua possibilidade de ser usado tanto como solista ou como instrumento de acompanhamento do canto ou de outros instrumentos, mas também funcionou como apoio à orquestra nas transcrições a duas ou quatro mãos. Por toda a Europa se assistiu a um crescimento extraordinário da produção de pianos, do mercado das lições particulares e da edição musical. Surgem peças para piano ligeiras, sentimentais e não muito difíceis, de forma a acompanhar este consumo. 4 Ano letivo: 2012/2013 Passagem de um público musical relativamente pequeno, homogéneo e culto para um público burguês, numeroso e diversificado. Deixam de existir mecenas, por isso, os compositores tanto compõem obras grandiosas para as massas como obras mais intimistas. A Alemanha desempenha um papel importante na promoção da música instrumental, enquanto a vida musical francesa e italiana giram em torno da ópera. A música instrumental como a mais romântica de todas as artes – a música instrumental (música pura, livre do peso das palavras), desligada do mundo concreto, consegue comunicar de forma perfeita impressões, emoções, pensamentos (Schopenhauer). Logo, é a arte romântica ideal, que consegue expressar o que é negado à linguagem. Quando alguém fala da música como arte autónoma, deve circunscrever-se somente à música instrumental, a qual, recusando toda a ajuda, toda a intromissão de outra arte, expressa com pureza e essência da arte, que lhe é própria e só nela se pode reconhecer. É a mais romântica de todas as artes… A música faz aceder o homem a um reino desconhecido; um mundo… no qual abandona todos os sentimentos determináveis por conceitos para se entregar ao inexprimível (E. T. A. Hoffmann) Afirmação do virtuosismo e de uma técnica instrumental perfeita, em que os grandes executantes se tornam verdadeiros heróis (Nicolo Paganini e Franz Liszt). Eram solistas instrumentais, por oposição aos cantores de ópera do século XVIII, que fascinavam o público e cujo estatuto de peritos (kenner) os diferenciava dos amadores (liebhaber). Este virtuosismo tornou-os famosos internacionais e através das suas interpretações e das suas composições, ou das obras de compositores com que colaboraram proximamente, foram responsáveis pelo lugar central dei concerto instrumental. Nicolo Pagagini: importante para a evolução da técnica dos instrumentos de cordas; é a imagem do artista romântico, fortemente expressivo e com uma técnica fascinante (mudanças de posição, golpes de arco, cordas duplas, harmónicos artificiais, etc.). Papel do músico: a função social do músico é alterada, pois recusa totalmente o papel subordinado que lhe era indicado pela corte ou pela Igreja, para reivindicar uma completa autonomia nas escolhas artísticas, as quais muitas vezes se tornam imcompreendidas pelo público. O afastamento da racionalidade, a valorização do inconsciente, do sobrenatural e do misterioso traduziu-se musicalmente num alargamento do vocabulário harmónico e melódico, mas também na exploração do colorido orquestral (timbre). Na estética romântica, o elemento mais cultivado é o timbre, ao qual se juntam a harmonia, a estrutura tonal, o ritmo, etc. Historicismo: estudiosos e músicos dedicaram-se ao estudo da música do passado. De destacar a predileção dos românticos por Bach e Palestrina. Por exemplo, o interesse por Bach pode ser visto pelo lançamento da primeira edição das suas obras completas, em 1850, mas sobretudo pela apresentação da sua Paixão segundo S. Mateus num concerto em Berlim, em 1829, sob a direção de Mendelssohn. Combinação de tendências conservadoras e revolucionárias: se por um lado certos compositores revolucionaram a linguagem musical clássica, outros ainda continuam a compor nas formas clássicas da sonata, da sinfonia e do quarteto de cordas, embora introduzindo algumas alterações, de acordo com o ideal musical do romantismo. 5 Ano letivo: 2012/2013 2) Fases do Movimento Musical Romântico E.T.A. Hofmann (1776-1822) Lieder de Schubert Carl Maria von Weber (1786-1826) – Der Freischutz (1821) 1ª Fase Início do Movimento Romântico (c.1800-1830) Destaque inicial sobretudo para a Alemanha. O Romantismo torna-se num movimento europeu. Paris surge como centro (em vez de Viena) 2ª Fase Romantismo Pleno (1830-1850) França: Hector Berlioz (1803-1869), Nicolò Paganini (1782-1840), Franz Liszt (1811-1886), Frédéric Chopin (1810-1849), Giacomo Meyerbeer (1791-1864) Alemanha: Felix Mendelssohn (1809-1847), Robert Schumann (18191856), Richard Wagner (1813-1883) Itália: Guiseppe Verdi (1813-1901) – primeira fase 3ª Fase Romantismo Tardio (1850-1890) Após a morte de Mendelssohn, Chopin e Schumann surge uma nova fase. Movimentos: nacionalismo, verismo Compositores anteriores: Franz Liszt (poemas sinfónicos), Richard Wagner (Drama Musical), G. Verdi (duas fases seguintes) Nova geração: Johannes Brahms (1833-1897), Anton Bruckner (1814-1896), Camille Saint-Saens (1835-1921) 4ª Fase Viragem do século (1890-1914) Estalar da Primeira Guerra Mundial (1914) marca o fim. As várias tendências são elevadas ao extremo. Ultra-Romantismo, Impressionismo A tonalidade é colocada em causa (atonalismo). Compositores: Gustav Mahler (1860-1911), Richard Strauss (1864-1949), Arnold Schoenberg (1874-1951), Giacomo Puccini (1858-1924), Claude Debussy (1862-1918), Maurice Ravel (1875-1937) 6 Ano letivo: 2012/2013 Compositores Românticos 7 Ano letivo: 2012/2013 3) O Lied Romântico Este género já tinha adquirido importância no Classicismo. Pensa-se que a sua origem remonta à Idade Média, período em que designava os cânticos profanos por oposição às formas da lírica religiosa, mas só em finais do século XVIII é que reaparece. Nessa época, influenciado pelo estilo da ópera, o lied orienta-se, por um lado, para um estilo galante e sofisticado, mas por outro lado, insere-se num movimento a favor da simplicidade e da naturalidade, no contexto da canção popular (volkslied). São realizadas coleções de canções populares (Herder), que juntamente com os poemas de Goethe e Schiller começam a estimular o interesse de muitos compositores pelo lied, como uma canção em alemão que se baseia num poema (forma poéticomusical). O interesse por este género remonta assim ao Classicismo, nomeadamente a Berlim (Schulz, Reichardt, Zelter) e a Viena (Haydn, Mozart e Beethoven), numa época em que a corrente Sturm und Drang (“Tempestade e Impeto”), reagindo contra o racionalismo do Classicismo, valoriza as paixões e os sentimentos (pré-romantismo). Nesta época, a forma, o conteúdo e o número de intervenientes no lied era diversificado. Contudo, tratava-se normalmente de uma canção estrófica, breve, idílica, cantada em casa, com acompanhamento de piano ou guitarra, entre amigos e conhecidos e raramente em salas de concerto. Começa já a existir um certo cuidado na escolha dos textos e dos poetas, pois a intenção no lied é que o poema se converta totalmente em música. O piano, que começa por ser um simples acompanhamento, passa gradualmente a desempenhar um papel tão importante como o da voz, apoiando, ilustrando e intensificando o sentido do poema. Uma recém-emergente classe média instruída prontamente se identificou com a natureza intensamente pessoal das composições e os lieder encontraram um espaço na esfera crescente da composição musical doméstica. Contudo, é no século XIX que o lied adquire um papel central. Partindo da natureza do artista romântico e com uma grande influência de elementos populares (inspiração popular), os temas estão normalmente relacionados com a natureza, a tristeza, a melancolia, a morte, o amor, a viagem, etc. Focam-se muitas vezes em termos poéticos e musicais elementos como o vento, a água, a tempestade, a violência dos elementos, etc. Mas de forma geral, os textos poéticos dos lieder concentram-se frequentemente nas batalhas emocionais do indivíduo (o “eu”). Formas: Lied Estrófico – cada estrofe tem sempre a própria melodia Lied Estrófico Variado – consiste na repetição da primeira estrofe modificada nas estrofes seguintes Lied Desenvolvido – cada estrofe tem a sua própria melodia Lied Ternário (ou forma lied) – ABA, a estrofe central contrasta com a primeira e terceira estrofe 8 Ano letivo: 2012/2013 COMPOSITORES 1ª Metade do Século XIX 2ª Metade do Século XIX Lieder Romântico Lieder Pós-Romântico Franz Schubert Robert Schumann Félix Mendelssohn Karl Loewe Franz Liszt Richard Wagner Johannes Brahms Robert Franz Hugo Wolf Mas Reger Gustav Mahler Richard Strauss Arnold Schoenberg Alban Berg 3.1 Franz Schubert Foi Franz Schubert (1797-1828) quem começou por consagrar o género. Destaca-se pela riqueza melódica na expressão do conteúdo do texto, assim como pela versatilidade da harmonia, cujas modulações, muitas vezes extensas e complexas, sublinham as características dramáticas do texto. De realçar também o acompanhamento, em que muitas vezes a figuração do piano é sugerida por uma imagem pictórica do texto. Por exemplo, em Gretchen am Spinnrad (1814, texto de Goethe), o acompanhamento evoca não apenas o zumbido da roda de fiar, mas também a agitação dos pensamentos de Gretchen, ao falar do seu amado. Já em Erlkonig (1815, texto de Goethe) a repetição de oitavas em tercinas ilustra o galope do cavalo, mas também a ansiedade do pai. Schubert compôs mais de 600 lieder, entre eles Lieder isolados, como Gretchen am Spinnrad (Margarida na Roca, 1814, texto de Goethe), Erlkonig (O Rei dos Álamos, 1815, texto de Goethe), a Der Wanderer (O Viandante, 1816, texto de G. Ph. Schmidt), a Truta (1817) ou a Jovem Mulher e a Morte (1817). Mas é de destacar sobretudo os dois ciclos de lieder (conjunto de lieder unificados pelos mesmo poema ou ciclo de poemas) sobre poemas de W. Müller: Die schöne Mülerin (A Bela Moleira, 1823), com vinte canções, e Die Winterreise (A Viagem de Inverno, 1827), com 24 canções. Postumamente foi publicado o ciclo Schwanengesang (Canto do Cisne, 1828), sobre 7 poemas de Rellstab e 6 poemas de Heine. No que diz respeito à forma, Schubert adotou soluções formais bastante variadas: lieder estróficos simples (como em Heidenröslein, 1815), lieder estróficos variados (como em Der Lindenbaum em Die Winterreise) e lieder desenvolvidos (como em Rastlose Liebe, 1815). Em termos da escolha dos textos, Schubert preocupou-se em escolher textos ideais para uma abordagem musical, embora muito desiguais em termos de qualidade literária. Contudo, Schubert conseguiu transfigurar musicalmente mesmo os textos menos válidos. 3.2 Robert Schumann O primeiro sucessor de Schubert foi Robert Schumann (1810-1856), que começou a compor lieder a partir de 1840, ano em que casou, após longos anos de espera, com Clara Wieck. Tratam-se essencialmente de canções de amor, reflexo do artista romântico sofredor. De 9 Ano letivo: 2012/2013 destacar os seus dois ciclos, ambos de 1840: Dichterliebe (O amor do poeta), sobre poemas de Heine, e Frauenliebe und Leben (Amor e vida de uma mulher), sobre poemas de A. von Chamisso. Os lieder de Schumann são mais densos harmonicamente, através do cromatismo, da utilização frequente de notas pedal, de modulações a tons afastados, de um grande número de tonicizações, etc. O piano e a voz transformam-se num só elemento. Schumann atribui a este instrumento um triplo papel: como solista, como reforço de expressão e como sustentação eficaz do cantor. Para além de Schumann, destacam-se Mendelssohn e Brahms. Mais tarde, com Wolf, Mahler, Reger e Strauss, o lied entra numa dimensão pós-romântica. De facto, na segunda metade do século XIX, o lied está associado, por um lado, a uma via mais conservadora (por exemplo, Brahms, que cultivou o lied estrófico, baseado na contenção, na simplicidade e na qualidade melódica, uma vez que a melodia não deve ser prejudicada por um acompanhamento complicado ou harmonicamente inadequado, o que reflete a influência da canção popular), por outro lado, a uma via mais moderna, com lieder mais ricos em termos musicais e psicológicos, em que o acompanhamento se torna cada vez mais independente da parte vocal. 4) Música Coral Ao nível da música sacra, continuou-se a cultivar a oratória, como são exemplo Paulus (1836) e Elias (1846) de Mendelssohn, Das Paradies un die Peri (1843) e Der Rose Pilgerfahrt (1851) de Schumann, Christus (1862-67) de Liszt ou L´enfance du Christ de Berlioz; a cantata, sacra ou profana (como Erste Walpurgissnacht de Mendelssohn ou Peri e o Paraíso de Schumann), o motete e a missa – Beethoven compôs uma Missa Solemnis, Schubert escreveu quatro pequenas missas e duas missas solenes e Liszt compôs duas missas (Graner Festmesse, 1856, e Ungarische Kronungsmesse, 1867). De destacar ainda o Stabat Mater de Rossini e o Requiem de Verdi. Na segunda metade do século XIXI, Dvorak compôs três obras importantes – Stabat Mater, Requiem e Te Deum – e Bruckner escreveu missas sinfónicas, com coro e grande orquestra sinfónica, assim como um Te Deum, também para coro e grande orquestra sinfónica; de destacar ainda a famosa missa do compositor parisiense Charles Gounod, Missa de Santa Cecília (1885). Estas composições sacras surgem de decisões pessoais ou de encomendas específicas, uma vez que os grandes compositores do século XIX já não estão ao serviço da Igreja, como aconteceu com Bach ou com Mozart em Salzburgo. De referir ainda obras Corais-Sinfónicas, influenciadas pelas possibilidades de grandes massas corais, como o Requiem (ou Grande Messe des Morts, 1937) e o Te Deum (1855) de H. Berlioz (2ª fase da sua obra). Berlioz escreveu também Sinfonias com intervenção coral (o compositor que instituiu o modelo foi Beethoven, na 9ª Sinfonia), como a Sinfonia Fúnebre e Triunfal e Romeu e Julieta (1839). No contexto protestante, menos importante no século XIX, é de destacar o Requiem Alemão (1868) de Brahms. Por outro lado, é de destacar a canção coral, com acompanhamento ou a cappella, para coros femininos, masculino ou mistos. A preferência recai sobre a canção coral estrófica com melodias populares a quatro vozes e a cappella. Entre os compositores é de referir Schubert, Schumann, Liszt, Gounod e Brahms. 10 Ano letivo: 2012/2013 5) Música de Câmara De forma genérica designa música instrumental (mas também vocal) para um solista (muitas vezes com piano) ou para um conjunto de solistas. A música de câmara ocupa um lugar importante na vida diária da burguesia, em concertos privados e em audições públicas. Destaque para os instrumentos de cordas, com quartetos, quintetos e sextetos (Schumann, Brahms, Schubert, Mendelssohn, Bruckner, Dvořák), mas nesta época os compositores apresentam um interesse especial pelos instrumentos de cordas com piano (Mendelssohn, Schumann, Brahms, C. Frank, C. Saint-Saëns). Surge também para os instrumentos de sopro uma música de câmara concertante, com um carácter mais “sério” e não tanto de divertimento, como no século XVIII. Para tal contribuiu a evolução técnica (chaves, válvulas, sistema Bohm, etc.) destes instrumentos, que possibilitou uma maior flexibilidade e diversidade de efeitos. De notar a formação de duos, trios, quartetos, quintetos, etc. (Rossini, A. Reicha, G. Onslow, Spohr, Weber, Schubert, Rubinstein, Tchaikovsky, Rimsky-Korsakov, Saint-Saëns, Strauss). No entanto, nem todos os compositores românticos deram um contributo ao reportório de câmara, talvez por não constituir o veículo de expressão mais adequado ou pelo facto de estas formações não possuírem o brilho individualista do piano ou de uma grande orquestra. 6) Música para Piano O piano adquire no século XIX enorme popularidade. Associa-se perfeitamente ao individualismo e à expressão dos sentimentos pessoais do artista romântico. O piano invade as casas burguesas como acessório indispensável e por vezes ornamental, e torna-se um elemento integrante da educação das filhas da burguesia. É nesta época que o piano adquire a configuração atual. No entanto, a literatura para piano já começa anteriormente. As primeiras peças conhecidas datam do classicismo, nomeadamente com Muzio Clementi, Car Ph. Emannuel Bach, assim como Haydn, Mozart e Beethoven. Entre os compositores românticos destacam-se: Carl Maria von Weber (1786-1826): 2 concertos, 4 sonatas, Concertstück para piano e orquestra (1821), várias peças (como Convite à Valsa, 1816). Franz Schubert (1797-1828): 11 sonatas completas, Wanderer-Fantasie, 6 Moments Musicaux, 8 impromptus, pequenas peças, peças para piano a 4 mãos, numerosas danças, marchas, valsas, etc. Felix Mendelssohn (1809-1847): 48 Canções Sem Palavras, 6 Prelúdios e Fugas, Variações Sérias (1841), etc. Robert Schumann (1810-1856): Papillons, Davidsbundlertanze, Carnaval, 6 Estudos de Concerto, Peças Fantásticas, Cenas Infantis, Fantasia em Dóm, Kreisleriaha, Carnaval de Viena, Cenas da Floresta, Álbum para os Jovens, etc. 11 Ano letivo: 2012/2013 Frédéric Chopin (1810-1849): concertos, 4 Baladas, 4 scherzos, 3 Improvisos, 24 Prelúdios, 21 Noturnos, 16 Polonaises, Polonaise-Fantasie, 58 Mazurkas, Fantasia em Fá menor, 3 sonatas, 27 estudos (12 op.10 e 12 op.25), Barcarola, 13 Valsas, etc. Franz Liszt (1811-1886): Harmonias Poéticas e Religiosas, 6 Estudos de Execução Transcendente, 6 estudos transcritos dos “Caprichos de Paganini para Violino Solo”, Rapsódias Húngaras, uma Dança dos Mortos, Anos de Peregrinação (Suiça, Itália), Sonata em Sim, 2 Lendas, Jogos de àgua na Villa d 'Este, Bagatela sem tonalidade, etc. Johannes Brahms (1833-1897): Variações sobre um tema de Schumann, Variações sobre um tema de Haendel, 8 Klavierstucke, 2 Rapsódias, 3 Intermezzi, Danças Húngaras, etc. Cada compositor acaba por desenvolver um estilo próprio de composição. É de destacar o virtuosismo expressivo e sensível (sobretudo em Chopin e Liszt) ou a rejeição desse virtuosismo através de uma escrita mais polifónica (Mendelssohn e Schumann, este último muito influenciado por J. S. Bach), ou ainda a exploração de uma escrita musical densa, de carácter orquestral (como em Brahms), contraposta a uma escrita em que ao movimento regular da mão esquerda se sobrepõe uma linha melódica de perfeita elegância (influência do bel canto italiano em Chopin), ou então compor uma peça lírica para piano com canto (Schumann). Contudo, todos eles exploram toda a extensão do piano e recorrem a uma vasta variedade de recursos para variar a sonoridade e a dinâmica: extensão dos acordes, intervalos maiores, passagens em notas duplas, glissandos, trilos, escalas em duplas oitavas, etc. Quanto aos géneros, compõem-se baladas (de origem literária, obra musical com qualidades narrativas e líricas, por exemplo, as Baladas de Chopin), estudos (desenvolvem um problema técnico de forma mais melódica e sensível do que um simples exercício; a forma é simples, normalmente binária), fantasias (forma livre, arbitrária, a partir de variações e desenvolvimentos temáticos, um género essencialmente virtuosístico), prelúdios, variações, noturnos, danças (sobretudo com Chopin e Brahms), etc. Muito cultivadas foram também as chamadas peças de carácter, maioritariamente para piano mas também para piano com outro instrumento, que expressam um estado de espírito característico ou uma ideia programática. De referir as Bagatelas para piano de Beethoven, os Impromptus (“Improvisos”) e Momentos Musicais de Schubert, as Canções Sem Palavras e as Peças Infantis de Mendelssohn, os Noturnos, Prelúdios e Improvisos de Chopin, as Cenas Infantis de Schumann, as baladas, rapsódias e caprichos de Brahms, etc. De destacar ainda os concertos para piano. Ao contrário do período anterior, o concerto torna-se numa forma de o executante exibir essencialmente as suas proezas técnicas (virtuosismo), em contraposição a uma orquestra de grandes dimensões. Os dois principais instrumentos solistas são o piano (F. Mendelssohn, F. Chopin, R. Schumann, numa primeira fase, e F. Liszt e J. Brahms na segunda metade do século, o primeiro adotando uma forma mais livre e o segundo uma forma mais rigorosa, embora inovadora) e o violino (N. Paganini, F. Mendelssohn, Max Bruch, J. Brahms). 12 Ano letivo: 2012/2013 7) Principais compositores Franz Schubert (1797-1828): Schubert pertencia a uma família pobre. O seu pai era mestreescola em Viena, severo, mas bondoso e honrado. Schubert revela dotes musicais desde muito cedo. Começa por estudar em casa, com o maestro do coro, Holzer, que lhe ensina canto, piano, órgão e violino, mas em 1808, pela sua bela voz entra como moço de coro para a capela imperial, estudando gratuitamente num seminário, onde tem lições de órgão e de piano, com o organista imperial Ruzicka, e de baixo-contínuo e contraponto com Antonio Salieri, mestre-decapela da corte. Começa a escrever pequenas peças para piano, a partir dos doze anos, mas estas primeiras obras perderam-se. A composição torna-se cada vez mais importante na sua vida e, em 1818, deixa de lecionar na escola do seu pai, onde até então tinha exercido funções de professor auxiliar, para se dedicar inteiramente à composição. A partir deste momento, muda constantemente de residência e, completamente sem recursos, vive da caridade de alguns amigos. Em 1822, contrai sífilis e adoece com gravidade. Embora consiga curar-se no ano seguinte, fica muito deprimido e mergulha numa profunda melancolia. Morre em Novembro de 1828, vítima de tifo. A sua vida tristemente curta ilustra, tal como a de Mozart, a tragédia de um génio esmagado pelas necessidades e pelos problemas da vida quotidiana. É também de referir que Soubera não compôs para um público anónimo, mas para o seu pequeno círculo de amigos (os pintores Moritz von Schwind e L. Kupelwieser, o poeta Franz Grillparzer, entre outros), que se reuniam regularmente à noite nas chamadas schubertíadas. Apesar dos seus escassos 31 anos de vida, Schubert componha rápido e totalmente de memória. Foi o primeiro compositor a consagrar o Lied como um dos principais géneros artísticos do século XIX. Schubert compôs quinze óperas, nove sinfonias, sonatas, missas, dezasseis quartetos, peças para piano e mais de seiscentos lieder. Robert Schumann (1810-1856): filho de um escritor, livreiro e editor, Schumann demonstrou desde cedo dotes de pianista e grande interesse pela arte da composição. Mas foi também um bon-vivant, que gostava de mulheres, literatura e champanhe, gostos que manteve até ao fim da vida. Inicia os seus estudos no Lyceum de Zwickau e, em 1828, matricula-se na Universidade de Leipzig, onde o pai exige que estude direito, mas, à socapa, dedica-se em exclusivo à sua formação musical. Tem aulas de piano com o excelente professor Friedrich Wieck e participa num grupo de música de câmara: as suas primeiras obras datam deste período. Em 1830, passa para a Universidade de Heidelberga para estudar direito, mas dedica-se ao estudo intenso do piano, conseguindo um bom nível de proficiência no instrumento. Nesta altura, abandona os estudos e dedica-se por inteiro à sua carreira de virtuoso (tinha assistido em 1830 a um concerto de Paganini em Frankfurt), mas rapidamente perde o uso de uma das mãos, vítima de um acidente com uma maquineta, segundo alguns autores, ou da sífilis contraída, segundo outros. Continuou, no entanto, a compor e intensifica os seus estudos de contraponto e da obra de Bach. Em 1840, Robert casa com Clara Wieck, filha do seu antigo professor de piano. A fim de divulgar a sua música e de elevar a cultura da burguesia ascendente, funda, em 1834, o “Novo Jornal para a Música” (Neue Zeitschrift für Musik) e permanece como editor ativo durante 10 anos. Nas páginas da sua publicação, Schumann elevou consideravelmente o nível da crítica musical e fez muito pela promoção de novos talentos, entre os quais se contam compositores 13 Ano letivo: 2012/2013 como Frédéric Chopin, Hector Berlioz e, especialmente, Johannes Brahms, de quem era amigo pessoal. A partir de 1841, Schumann dedica-se à música sinfónica, de câmara e à oratória. Depois, vai para Dresden e de 1850-1854 permanece na cidade alemã de Düsseldorf, onde como Diretor Musical dirige a Orquestra Sinfónica e a Associação de Cantores não Profissionais. Durante toda a sua vida, Schumann demonstrou dualidade de carácter, e a sua personalidade, próxima da esquizofrenia, fê-lo temer sempre a insanidade. Depois de depressões, atira-se ao Reno (1854) e é internado numa casa de saúde em Endenich, perto de Bona, onde acaba por morrer. Da sua obra destaca-se um concerto para piano e orquestra, quatro sinfonias, uma sonata (em Sol Menor), vários quartetos e cerca de trezentos lieder, incluindo os ciclos Frauenliebe und leben e Dichterliebe, ambos de 1840. Frédéric Chopin (1810-1849): Chopin nasceu na Polónia. O seu pai era um francês emigrado e a sua mãe polaca. Criança adoentada e anémica, Chopin só começou a ter lições de piano aos nove anos, com um velho músico boémio, Wojciech Zywny. É com este humilde mestre que Chopin desenvolve a sua fabulosa técnica pianística. Em 1826, inscreve-se na classe de Józef Antoni Elsner, reitor do Conservatório de Varsóvia. No piano já era um mestre e a técnica do instrumento era-lhe inata. A reputação do jovem músico em breve ultrapassou os círculos sociais da capital polaca, que muito o apreciava. Dirige-se a Viena, em 1829, numa digressão, onde faz dois concertos triunfais: o seu sucesso é tal que consegue publicar várias obras nessa cidade. Em 1830, Chopin deixa definitivamente a Polónia, sob o pretexto da necessidade de fazer “uma viagem de estudo” para alargar os seus horizontes culturais. Vai para Paris, vivendo entre artistas que o inspiram (Berlioz, Liszt, Paganini, etc.). Por intermédio de Franz Liszt, de quem se havia tornado amigo na capital do império austro-húngaro, trava conhecimento com a baronesa Aurore Dudevant, mais conhecida pelo pseudónimo literário de George Sand. De início esta é-lhe antipática e incomoda-o o seu desprezo pelas convenções sociais; mas com o tempo ela consegue diverti-lo e fazer-lhe esquecer uma profunda deceção sentimental, transformando a curiosidade inicial, em paixão: é o começo de uma ligação em que o amor e o ódio andam a par. Incomodados pela maledicência da sociedade parisiense, decidem passar o Inverno de 1838 em Palma de Maiorca, na Cartuxa de Valdemosa; o clima marítimo da estância turística, muito húmido, afeta terrivelmente a saúde de Chopin que começa a apresentar sintomas de tuberculose. Em 1847, sob pressão das respetivas famílias, o casal separa-se. De novo só e definitivamente instalado em Paris, Chopin viaja pouco. Em 1848, dá o seu último concerto na capital francesa. Ainda nesse ano, faz uma digressão em Inglaterra, que uma das suas alunas, Jane Stirling (que estava apaixonada por ele) lhe tinha organizado. No ano seguinte, atacado pela fase terminal da terrível doença, morre no seu apartamento de Paris, Place Vendôme. O seu funeral só se realizou a 30 de Outubro, pois, consoante o seu desejo expresso, este deveria ser acompanhado pela audição do Requiem de Mozart. Foi sepultado no cemitério parisiense do Pére-Lachaise mas o seu coração foi levado para Varsóvia, onde ainda se encontra à guarda da igreja da Santa Cruz. Toda a obra de Chopin é dedicada ao seu instrumento favorito: o piano. As cerca de duzentas composições incluem dois conjuntos de estudos, duas sonatas, quatro baladas e peças soltas que ele intitulou de prelúdios, impromptus ou scherzos, e um grande número de danças (valsas, mazurcas, polacas). 14 Ano letivo: 2012/2013 Félix Mendelssohn (1809-1847): o pai, um banqueiro judeu, possuía uma fortuna considerável e em 1816 converteu-se, de má vontade, ao cristianismo com a ideia de facilitar a carreira dos filhos: foi então que anexou ao seu nome o do seu cunhado Bartholdy, para distinguir a sua família da dos parentes que tinham permanecido hebreus. A partir de 1811, sob a égide da mãe de Felix, senhora culta e de grande sensibilidade artística, a casa da família converteu-se num dos mais prestigiados círculos intelectuais de Berlim. É neste ambiente privilegiado que os dotes para a música do pequeno Mendelssohn se revelam excecionais. Os pais, lisonjeados com a sua precocidade, proporcionam-lhe os melhores professores: estuda piano com L. Berger e composição com Karl Friedrich Zelter, escrevendo a sua primeira peça aos onze anos. Muito aplicado e criativo, expressava-se através da composição, surgindo já na juventude dezenas de sonatas, quartetos e até sinfonias, revelando todas elas um crescente domínio das técnicas composicionais. Nesta fase da sua vida, as suas maiores referências estéticas são o poeta Goethe e Shakespeare, a cuja obra tem acesso através de traduções alemãs. Em 1821, a família Mendelssohn muda-se para Paris e nesta cidade mantém o hábito de conviver com os mais destacados artistas da época. Dentre as personalidades que frequentavam os salões do banqueiro contavam-se Rossini, Meyerbeer e Cherubini. No princípio de 1829, Mendelssohn faz uma audição triunfal da Paixão Segundo São Mateus, de Bach, primeira depois da morte do grande artista, relançando o culto que ainda hoje se lhe presta. Segue-se um período de viagens por toda a Europa, onde dá inúmeros concertos, todos com grande êxito. Entre as principais obras deste período contam-se As Hébridas e a Sinfonia Italiana. É nomeado, desde muito novo, para os lugares mais prestigiantes: entre as inúmeras prebendas que usufruía, é maestro da Gewandhaus Orchestra, em Leipzig, directorgeral da música da Prússia e Kapellmeister do rei, posições que aproveita, para continuar a divulgar a música de Bach e de Haendel, bem como a dos seus coetâneos. Ajuda Leipzig, cidade que foi sempre a sua preferida, a manter a liderança mundial no domínio da música, favorecendo a fundação de um conservatório cuja direção entrega a Robert Schumann. Em 1846, sobrecarregado de trabalho e emocionalmente abatido pela morte da irmã Fanny, a quem muito queria, entra em depressão e começa a sofrer de crises de neurastenia. o seu estado de saúde agrava-se e, cerca de um ano mais tarde, morre de congestão cerebral, aos trinta e nove anos. Mendelssohn escreveu cinco sinfonias, das quais se destaca a quarta, dita Italiana, pois reflete as suas experiências durante o Grand Tour (uma espécie de viagem iniciática que todos os jovens ricos faziam pelos países mediterrânicos para completar a sua educação), concertos, sobretudo para piano e orquestra, música de câmara (um octeto de cordas, um sexteto e dois quintetos), um largo número de obras litúrgicas conhecidas como Hear My Prayer e, pelo menos, seis cantatas seculares, destacando-se dentre estas Die erste Walpurgisnacht. Franz Liszt (1811-1886): O seu pai, que era um excelente músico amador, deu-lhe as primeiras lições de piano. Aos 11 anos, instala-se em Viena e é aluno, durante um breve período, de Carl Czerny e de Antonio Salieri. Em 1823, já um consumado pianista com vários concertos, vai para Paris a fim de se matricular no Conservatório. Cherubini, que então era reitor da escola, recusa-lhe a matrícula por ser estrangeiro e Liszt vê-se obrigado a ter aulas particulares com o célebre professor Anton-Joseph Reicha. Ao mesmo tempo, continua a sua carreira de virtuoso, espantando Paris e Londres com a sua extraordinária proficiência na arte de tocar piano. Aos 14 anos, le petit Liszt, locução familiar e ternurenta pela qual era conhecido, apresenta ao público a opereta D. Sancho, mas esta é recebida com pouco entusiasmo; deve-se, talvez, a este primeiro 15 Ano letivo: 2012/2013 insucesso o facto de Liszt não ter escrito, em toda a sua brilhante carreira, mais nenhuma ópera. Vive em Paris entre 1823 e 1835, e torna-se amigo dos maiores artistas do seu tempo, seja no domínio da literatura, da pintura ou da música. Assiste a um dos primeiros concertos de Frédéric Chopin e fica galvanizado com o seu estilo; este, juntamente com Paganini, serão as suas principais referências estéticas. Entretanto, por intermédio de Chopin, de quem era amigo pessoal, conhece Daniel Stern (pseudónimo literário de Marie de Flavigny, condessa d'Agoult), por quem se apaixona. A sua ligação com uma mulher casada, que nem um nem outro esconderam, escandaliza a sociedade parisiense. A partir de 1840, Liszt empreende uma digressão gigantesca e a sua fama cresce: toda a Europa o aclama como o maior virtuoso de todos os tempos. De 1847 a 1861, instala-se em Weimar, como Kapellmeister da corte. Nesta altura, decide dedicar-se quase inteiramente à composição e, salvo raras exceções, não volta a exibir-se em concertos públicos. Com uma atividade de promoção cultural incessante e inteligente, consegue fazer de Weimar um dos mais prestigiosos centros musicais da Europa. Aproveita o ensejo e o poder que a sua fama universal lhe concede para, generosamente, divulgar a música de Wagner, que havia conhecido em 1841, organizar festivais dedicados inteiramente à música de Berlioz, a quem muito admirava e promover a música dramática de Saint-Sãens, num tempo em que este ainda era um perfeito desconhecido. Com a possibilidade de fazer experiências com uma orquestra própria para ópera e concertos, Liszt aproveita também para rever várias das suas obras, mas também para concretizar as suas novas ideias sobre o poema sinfónico e a música programática. Entretanto, depois da separação tempestuosa da condessa d'Agoult, inicia uma ligação com a princesa Sayn von Wittgenstein. Em 1861, farto da maledicência de detratores que não lhe perdoavam o facto de se ter relacionado apenas com mulheres casadas, fixa-se em Roma, onde entra para um convento e recebe ordens menores de “abade”. A partir de 1869, viaja incessantemente de Roma para Weimar, e desta para Bayreuth, Paris e Budapeste. Continua neste ritmo trepidante até ao final da sua vida, morrendo em 1886, de um pequeno resfriado, quatro anos após o falecimento do genro, Richard Wagner. Franz Liszt destacou-se nas suas composições para piano, com grandes inovações técnicas (como o encadeamento de acordes, por exemplo). A Franz Liszt deve-se, também, a paternidade intelectual do sinfonische Dichtung (poema sinfónico), que muitos autores subsequentes, de Richard Strauss a Camille Saint-Saens, viriam a abordar. Os compositores contemporâneos continuam a encarar o poema sinfónico como uma das formas mais dúcteis e adaptáveis à estética moderna. Liszt deixou-nos uma obra extensa com mais de setecentas peças no seu total, da qual constam arranjos de todos os tipos, revisões de obras clássicas para edição e cerca de sete volumes de escritos com a sua correspondência e críticas. De destacar as suas obras para piano e orquestra (dois concertos, uma fantasia húngara e Totentanz, paráfrase do cantochão Dies irae), os seus doze Études d´exécution transcendante, as seis transcrições dos caprichos de Paganini para violino solista, os três Études de concert (1848), as coletâneas Annés de pélerinage (três livros, os dois primeiros compostos por volta de 1850 e o terceiro em 1867-1877), Consolations (1850) e Harmonies poétiques et religieuses (1852), a peça Nuages gris, a Sinfonia Fausto (1857), bem como os seus treze poemas sinfónicos. Johannnes Brahms (1833-1897): Brahms era filho de uma família disfuncional. O pai, um modesto contrabaixista de banda, ensinou-lhe o pouco que sabia, encaminhando-o, mais tarde, para a tutela do professor Eduard Marxsen. Sem rendimentos, o rapaz teve que financiar os 16 Ano letivo: 2012/2013 próprios estudos, trabalhando enquanto se aperfeiçoava nas técnicas de composição. Até 1853, a vida foi-lhe bem difícil. Nesta altura, tem a sorte de conhecer o violinista húngaro Joseph Joachim, que o recomenda a Robert Schumann. Este fica entusiasmado com o talento do seu jovem colega, escrevendo um artigo elegíaco na revista de crítica musical, a Neuezeitschrift für Musíc, que lhe dá reputação. Entretanto, Brahms apaixonara-se por Clara Schumann, catorze anos mais velha, amor platónico que será uma constante na sua vida. A partir de 1860, fixa residência em Viena e multiplica-se em conferências, concertos, recitais e cargos. Mantém este ritmo de vida imparável durante dez anos, altura em que decide dedicar-se por inteiro à composição. Em 1870, e tendo até aí apenas escrito música de câmara, concertos, música de piano e peças corais, Brahms decidiu, finalmente, escrever uma sinfonia: esta seria tão prodigiosa, tão magistral e intensa, que o maestro que dirigiu a sua primeira apresentação, não sabendo quem era o autor, pensou tratar-se da décima sinfonia de Beethoven. Brahms conseguiu aliar na sua música a forma clássica com a harmonia romântica. As composições do último período apresentam uma grande qualidade, entre elas as Quatro canções sérias, o Quinteto para Clarinete e Cordas em Si Menor, o German Requiem e duas sinfonias, em Dó Menor e Ré Maior, respetivamente. 8) Música Orquestral No século XIX, ocorre o aparecimento da profissão de maestro (Carl Maria van Weber, Ludwig Sphor, Félix Mendelssohn), dirigindo com uma batuta. Aumentam os centros de Concertos Sinfónicos (Paris, Londres, Berlim, Leipzig, Viena, Lisboa) e surgindo os primeiros Conservatórios. A edição das partituras desenvolve-se e surgem tratados e manuais de orquestração, como é o caso do “Tratado de Orquestração” (1844) de H. Berlioz. SINFONIA: tendo como ponto de partida Beethoven, a sinfonia romântica adquire duas vertentes. A primeira procura ampliar o conceito clássico de sinfonia através de processos românticos (dentro da chamada “música pura” – compositores que rejeitam tudo o que parte de inspiração extra-musical), sendo muito influenciada pela tradição sinfónica de Haydn, Mozart e Beethoven – é o caso das duas sinfonias em DóM de C. M. von Weber, das dez sinfonias de L. Spohr, das oito sinfonias de Schubert (entre as quais se destacam a Sinfonia Incompleta, 1822, e a Grande Sinfonia em DóM, 1828), das doze sinfonias para orquestra de cordas de Mendelssohn, seguidas pelas suas cinco grandes sinfonias (entre elas a Sinfonia Italiana, 1833, e a Sinfonia Escocesa, 1842), ou das quatro sinfonias de Schumann (entre elas a Sinfonia da Primavera, 1841). Contudo, na segunda metade do século, esta vertente adquire novos impulsos, mas sempre dentro de um “classicismo romântico”, nomeadamente com A. Bruckner (nove sinfonias, que refletem um espirito barroco em pleno romantismo e que seguem a convenção clássica da sinfonia) e J. Brahms (quatro sinfonias, que evidenciam uma nítida influência de Beethoven, seguindo a estrutura clássica dos quatro andamentos, utilizando as técnicas clássicas do contraponto e do desenvolvimento motívivo, não tendo também um programa específico, embora o vocabulário harmónico e a sonoridade orquestral densa sejam nitidamente reflexos do gosto romântico), mas também com C. Franck, C. Saint-Saëns, A. Dvořák, A. Borodin, N. Rimski-Korsakov, Tchaikovsky, entre outros. A segunda vertente, a da música programática (obra de inspiração extra-musical, de conteúdo literário, descritivo ou mesmo narrativo), está associada à sinfonia programática e ao 17 Ano letivo: 2012/2013 poema sinfónico, que conduzem a linguagem orquestral de Beethoven a uma nova direção, tipicamente romântica. O elemento extramusical, especialmente o poético, vai ao encontro da cultura e da arte romântica. A) Sinfonia programática: sinfonia inspirada por um elemento extra-musical, portanto, uma obra condicionada por um programa, de conteúdo literários, descritivo ou narrativo. Formalmente, adota o modelo de 4 andamentos: 1) Vivo, forma-sonata; 2) Lento, forma ternária; 3) Scherzo; 4) Vivo, forma-sonata ou Rondó Sonata (embora existam sinfonias com cinco andamentos). Neste género destaca-se o compositor francês Hector Berlioz (1803-1869), com a sua Symphonie fantastique (1830), com o subtítulo Épisode de la vie d´un artiste, um programa que é uma autêntica autobiografia amorosa, pois baseia-se numa vivência pessoal do compositor: o seu amor pela atriz inglesa Harriet Smithson, que interpretava os papéis de Julieta e Ofélia numa companhia shakespeariana, em 1827. Trata-se de uma música bastante descritiva (um drama musical sem palavras), pelo que Berlioz considerava o primado da música absoluta sobre o programa extramusical. Como refere no prefácio da obra: “a sinfonia pode oferecer por si só um interesse musical independente de todas as intenções dramáticas”. Uma importante inovação nesta obra é a idée fixe como motivo de recordação, uma imagem obsessiva da amada (“a própria amada converte-se para o artista em melodia, quase uma ideia fixa que encontra em toda a parte e que ouve em todos os sítios”, prefácio). Deste modo, o tema inicial do primeiro allegro aparece em todos os outros andamentos. O primeiro andamento (desvaneios e paixões) contém uma introdução, seguida de um allegro em formasonata com modificações; o segundo andamento (um baile) é uma valsa; o terceiro andamento (cena campestre) é um adagio numa ampla forma tripartida; segue-se um quarto andamento, marcha para o cadafalso, onde o herói toma ópio e mata a sua amada; por fim, o final (sonho de uma noite de Sabbat), retrata um sabat das bruxas e contém uma introdução e um allegro, que possui uma versão modificada da idée fixe e dois outros temas (um deles é a melodia do Dies irae), primeiro apresentados isoladamente e depois combinados entre si. Para além do tema recorrente, é de destacar as descrições realistas, a articulação perfeita entre as melodias, as harmonias, os ritmos e a estrutura das frases, mas sobretudo a sua originalidade na orquestração (dois timbales, cornetins em Sib, introdução do cor anglais na orquestra sinfónica). Berlioz traçou assim a direção futura da sinfonia. A sombra de Beethoven pairava pesada sobre os compositores de sinfonias do século XIX, dado que era comummente aceite que a forma tinha alcançado a perfeição nas suas mãos, não era suscetível de ser mais desenvolvida. Foi Berlioz quem quebrou este impasse. Berlioz compôs outras sinfonias programáticas, entre elas Harold en Italie (1874), Roméo et Juliette (1839) e a Grande symphonie funèbre et triomphale (1840). De destacar também Fraz Liszt com as suas duas sinfonias programáticas: a Sinfonia Fausto (1854-1857), composta por três andamentos (Fausto, um allegro em forma-sonata com introdução; Gretchen, um andante em forma tripartida; e Mefistófeles, um scherzo com forma tripartida, seguida de um desenvolvimento suplementar e de uma coda), mais um final acrescentado posteriormente, inspirada na obra Fausto de Goethe e dedicada a Berlioz, e a Sinfonia Dante (1855-1856), uma obra menor em dois andamentos (Inferno e Purgatório), inspirada na Divina Comédia de Dante. 18 Ano letivo: 2012/2013 Hector Berlioz (1803-1869): Berlioz nasceu na Côte-Saint-Anfré, próximo de Grenoble, e a educação inicial que recebeu por parte do pai, um médico, foi ampla e eclética. Cedo descobriu a música e começou a aprender flauta, ao mesmo tempo que se inicia a estudar sozinho o Traité de l´harmonie de Rameau. Quase toda a experiência musical prática de Berlioz vinha de tocar flauta e guitarra e não do teclado, como era habitual. Foi enviado para Paris para estudar medicina em 1821, mas cedo deu por si a despender mais tempo na Ópera de Paris e a estudar música com o compositor Jean-François Le Sueur (1760-1837). Muito contra a vontade da sua família, abandonou medicina em 1824 resolvido a tornar-se num grande compositor, mas deu por si sem ajuda financeira e foi forçado a aceitar trabalho onde o encontrasse, ensinando ou escrevendo recensões críticas para jornais. Por esta altura começa a compor (a primeira interpretação de sucesso de uma das suas obras, a Messe solenelle, teve lugar em 1825) e em 1826 entrou no Conservatório de Paris para estudar composição, contraponto e fuga. Em 1830, depois de três insucessos consecutivos, ganha o Prémio de Roma. Porém, antes de partir para a Vila Médicis, o jovem premiado apresenta ao público do Conservatório a Sinfonia Fantástica, op. 14. Quando regressa de Roma, casa com a atriz Harriet Smithson, por quem, desde 1827, nutria uma paixão avassaladora. Foi, no entanto, um casamento infeliz que pouco durou. Esta sinfonia, com um programa explícito Episode de la vie d'un artiste, representa o amor do artista por Harriet Smithson. Berlioz passou apenas um ano em Itália, embora pareça ter ficado extraordinariamente impressionado com as suas paisagens, e regressou a Paris, cidade que afirmou odiar mas que continuou a ser a sua residência até ao fim dos seus dias. A sua reputação foi crescendo e chegou mesmo a receber duas encomendas do governo, a monumental Grande messe des morts (1837) e a Grande symphonie (1840). Contudo, apesar do esforço de viver apenas da composição, Berlioz foi forçado a regressar à crítica musical. Na década de 1840 começou a viajar imenso, especialmente à medida que a sua reputação europeia se disseminava, embora enfrentasse s oposição e a incompreensão dos parisienses. Por esta altura havia conhece Franz Liszt (1811-1886) e Richard Wagner (1813-1883), que inicial mente apoiavam muito a sua música. Na verdade, Berlioz dedicou a sua grande obra coral La Damnation de Faust (1845-6) a Liszt, que por seu turno dedicou a sua Faust Symphonie (1854-61) a Berlioz. Já tinha sido interpretada uma ópera de Berlioz na Ópera de Paris, em 1838, Benvenuto Cellini (1836-1838),mas só em 1858 é que a sua ópera monumental Les Troyens, em cinco atos, foi completada. Baseada na Eneida de Virgílio, era tão grande que foi interpretada pela primeira vez em duas partes, os atos 1 e 2 sob o título de La Prise de Troie os atos 3 a 5 com o nome Les Troyensà Carthage, e esmo nessa altura apenas a segunda parte subiu ao palco na Ópera de Paris, em 1863. Embora a receção tenha sido boa, Berlioz sentia-se amargurado com a experiência de tentar fazer com que a sua música fosse aceite e tocada de acordo com a sua vontade. Para além disto, Harriet Smithson tinha morrido em 1854, assim como s sua segunda esposa, a cantora Maria Recio (1862). Morre também o filho do primeiro casamento, Louis, em 1867. A perda de entes queridos, tal como a frustração nos seus intentos musicais, faz com que os últimos anos da sua vida sejam solitários. Isola-se, torna-se triste e sombrio. Acaba por morrer em Nice, em 1869, sem o reconhecimento que mais tarde as suas obras viriam a receber. Agora considerado a principal figura do romantismo francês, Berlioz era na sua época, nos círculos musicais parisienses, visto como um arrivista amigo de bizarrias e as suas obras, por sistema, eram mal recebidas. Destacam-se como as suas óperas mais importantes Béatrice e Bénedict, Benvenuto Celline, Lélio (sequela da Sinfonia Fantástica), La damnation de Faust, Les troyens e Romeo et Juliette. 19 Ano letivo: 2012/2013 Sinfonia F. Schubert F. Mendelssohn Escola AlemãAustríaca Escola Francesa R. Schumann J. Brahms A. Bruckner G. Mahler R. Strauss C. Saint-Saens 8 Sinfonias (4ª “Trágica”, 8ª “Inacabada”) 5 Sinfonias (3ª “Escocesa”, 4ª “Italiana”, 5ª “Reformulação”) 4 Sinfonias 4 Sinfonias 9 Sinfonias 9 Sinfonias (1ª “Titan”, 2ª “Rressureição”, 6ª “Trágica”, 8ª “Mil”, 9ª “Canto da Terra”; esboços de uma 10ª sinfonia “Sinfonia Doméstica”, “Sinfonia Alpina” 6 Sinfonias B) Poema sinfónico: é atribuído a Liszt a invenção do termo sinfonische Dichtung – obras de carácter sinfónico, breves, que não se dividem em andamentos distintos e não seguem uma ordem convencional. Pelo contrário, estas obras dividem-se em secções contrastantes, com temas que vão sendo repetidos, variados ou transformados, de acordo com a estrutura própria de cada obra. O conteúdo é extramusical (daí talvez a palavra poema: algo que é feito ou inventado), por exemplo, um quadro, um poema, uma peça de teatro, um cenário, uma pessoa, um pensamento, uma impressão, etc. (por exemplo, o poema sinfónico A Batalha dos Hunos está ligado a um quadro, Mazeppa a um poema, Hamlet ao herói de Shakespeare, Prometeu ao mito de Prometeu, etc.). Este conteúdo é identificado pelo título dado pelo compositor ou eventualmente por uma nota introdutória. Contudo, a música e o programa desenvolvem-se de forma paralela, pois a música é uma evocação do programa, serve apenas de inspiração para o compositor compor uma determinada obra. Por isso, dificilmente se consegue demonstrar, em pormenor, o grau de influência do texto ou do conteúdo sobre a forma musical, uma vez que os poemas sinfónicos são retratos sinfónicos, cujo conteúdo tem diferentes níveis de clareza e podem abranger desde uma caracterização geral até descrições mais pormenorizadas. Liszt compôs treze poemas sinfónicos: Les Préludes (1848), Ce qu´on entend sur la montagne (1848-1850), Tasso (1849), Héroid funèbre (1849-1850), Prometheus (1850), Mezeppa (1851), Festklange (1853), Orpheus (1853-1854), Hunnenschlacht (1857), Die Ideale (1857), Hamlet (1858), Von der Wiege bis zum Grabe (1881-1882). Este género foi depois cultivado em França por César Franck (Ce qu´on entend sur la montagne, 1845-1847, Psyché, 1887-1888), Camile Saint-Saëns (Le rouet d´Omphale, 1872, La danse macabre, 1874) e Gabriel Fauré (Les Djinns, 1875), na Rússia por Balakirev (Rússia, 1864-1884), Borodin (Nas estepes da Ásia Central, 1880), Mussorgski (A Noite de São João no Monte Pelado, 1867) e Rimski-Korsakov (Sadko, 1867-1892, Capriccio espanhol, 1887, Sheherazade, 1888), na Boémia por Bedrich Smetana (Richard III, 1857-1858, o ciclo Ma vlast, 1872-1879) e Antonin Dvořák (o ciclo O duende aquático, A bruxa do meio-dia, A roca de ouro, A pomba selvagem, 1896, Canto heróico, 1897), na Escandinávia por Jan Sibelius (Kullervo, 1892, En saga, 1892, Finlandia, 1899), na Alemanha e Áustria por Hugo Wolf 20 Ano letivo: 2012/2013 (Penthesilea, 1883-1885) e Richard Strauss (Till Eulenspiegels lustige Streiche, 1894-1895), entre outros. Relativamente à música orquestral é ainda de referir as aberturas. Quando associadas a uma ópera, passaram a ser programáticas no sentido de utilizarem material associado à ópera. Contudo, surgem as aberturas de concerto (como o Sonho de uma Noite de Verão, de Shakespeare, escrita por Mendelssohn, Manfred de Schumann, Faust de Wagner) peças relativamente curtas, utilizadas em acontecimentos especiais, como inaugurações de edifícios ou monumentos, mas sobretudo em concerto. É comum basearem-se em temas gerais, como imagens da natureza, quadros, ambientes ou ideias (conteúdo extra-musical). Também se compõem-se nesta época suites orquestrais (Camile Saint-Saëns, Edvard Grieg, Fauré), assim como música de bailado (Rússia: Tchaikovsky, O Lago dos Cisnes, 1877, A Bela Adormecida, 1890, e o Quebra-Nozes, 1892). 9) A Ópera do século XIX e o drama musical de Richard Wagner 9.1 A ópera em Itália A ópera italiana apresentava no início do século XIX uma tradição sólida, bem enraizada. As cortes tinham deixado de ser os focos principais da vida musical e as cidades, como Nápoles, Milão, Veneza, Roma ou Bolonha, tornaram os seus teatros de ópera verdadeiros centros da vida cultural e social. As últimas décadas do século XVIIII tinham sido o ponto culminante da ópera buffa (as três óperas buffas de Mozart) e Gluck tinha procedido à reforma de ópera séria. Para além disto, o Romantismo foi sentido de forma ténue em Itália, pois os compositores italianos sentiram-se menos atraídos a fazer experiências novas e radicais. Os elementos românticos só gradualmente foram impregnando a ópera italiana e nunca no mesmo grau na Alemanha e na França. A distinção entre ópera séria e ópera buffa manteve-se até ao início do século. Contudo, a ópera buffa tende a desvanecer-se, surgindo na ópera séria os sinais de mudança: influência da Ópera Francesa, expansão da orquestra e utilização frequente do coro. A primeira metade do século XIX em Itália é inteiramente dominada pela produção operística de Rossini, Bellini e Donizetti, sendo a segunda metade dominada pela obra de Verdi. G. Rossini (1792-1868) – É o principal compositor italiano do início do século XIX. Compôs 39 óperas em duas décadas (1810-1829), dominando pelo seu estilo inconfundível os seus contemporâneos. Foi o primeiro a abandonar o recitativo seco a favor do recitativo com acompanhamento orquestral, dando à ópera uma continuidade musical; foi também o primeiro a escrever integralmente as ornamentações e as cadenzas, limitando os excessos dos ornamentos improvisados. Mas destacou-se sobretudo pelo seu melodismo, pelo equilíbrio do fraseado, por uma orquestração clara que respeita a individualidade de cada instrumento, por uma estrutura harmónica que, embora não sendo complexa, é muitas vezes original. Foi um mestre da ópera cómica: La scala di seta (A escada de Sesa, 1812), L´italiana in Algieri (A Italiana em Argel, 1813), La generentola (A Gata Borralheira, 1817), La Pega Ladra, 1817), mas sobretudo a sua obra-prima Il Barbiere di Siviglia (O Barbeiro de Sevilha, 21 Ano letivo: 2012/2013 1816). Mas destacou-se também na ópera séria: Tancredi (1813), Otello (1816), La dona del lago (1819), Semerinade (1823), Guillaume Tell (1829), entre outras. O Romantismo surge na geração seguinte e mesmo assim de forma bastante hesitante: G. Donizetti (1797-1848) – Donizetti fez os seus estudos musicais em Bolonha com o professor que já havia ensinado Rossini, o Padre Stanislao Mattei. Teve o primeiro êxito em 1822, com a ópera La zingara, iniciando com esta obra uma bem-sucedida carreira de maestro. Em 1827, instala-se em Nápoles, consegue ser nomeado professor de composição do prestigiado Real Collegio di Música e mantém um ritmo de trabalho frenético, produzindo, em média, três novas óperas por ano. Com a ópera Anna Bolena, de 1830, é já um autor completo e quando, dois anos mais tarde, apresenta a comédia sentimental Elisir d'amore ganha um lugar definitivo no repertório operático romântico. As suas obras fazem um enorme sucesso e, em 1838, liberta-se da exiguidade provinciana de Nápoles para se instalar na capital musical da época, Paris. No entanto, mantém-se em constante movimento, dirigindo pessoalmente as suas óperas em Itália e Viena. Aos 44 anos, exausto, sofre um colapso nervoso que degenera numa paralisia geral. Com a saúde seriamente debilitada vê-se obrigado ao internamento hospitalar. Em 1848, a seu pedido, levam-no para Bérgamo, onde acaba por morrer sem recuperar a lucidez. Donizetti é o epítome do romantismo italiano da primeira metade do século XIX. Porém, a sua obra é considerada muitas vezes como pouco homogénea: a maior parte das óperas, escritas em curtíssimo espaço de tempo, embora sempre com um lirismo notável, são debilitadas pela vulgaridade da harmonização e por uma instrumentação incipiente. Contudo, a espontaneidade das suas melodias são fulcrais à implantação do culto do bel canto. É, por isso, o verdadeiro percursor de Verdi. De desconhecido compositor nos teatros de Veneza alcança sucesso com Ana Bolena em 1830. Seguem-se cerca de 70 ópera, entre elas as óperas sérias Lucrecia Borgia (1833), Lucia di Lammermoor (1835) e Linda di Chamounix (1842), a opéra comique La fille du régiment (A Filha do Regimento, 1840) e as óperas buffas L´elisir d´amore (O Elixir do Amor, 1832) e Don Pasquale (1843). Entre as suas contribuições destaca-se: a separação menos notória entre recitativo e ária, a definição da ária em duas partes (cabaletta com cantabile e final em stretto) ou a atribuição ao coro de uma função mais expressiva As suas óperas sérias ganharam uma nova vida a partir de meados do século XX, com o aparecimento de excelentes sopranos de coloratura tais como Maria Callas, Joan Sutherland e Leyla Gencer, capazes de interpretar com rigor e brilhantismo as suas árias mais difíceis. Donizetti deixou-nos também cerca de cento e quinze composições religiosas, como o Requiem em Ré Maior para Bellini, o Miserere e Ave Maria, assim como oratórias, treze sinfonias, cinco concertos e música de câmara. Vincenzo Bellini (1801-1835) – filho de um organista siciliano, teve no pai o primeiro professor. Aos cinco anos já era um bom pianista e aos seis um compositor incipiente. Porém, a família era muito pobre e não lhe pôde pagar a instrução universitária: só estudou no Conservatório de Nápoles graças à generosidade de um rico senhor de Catânia que o tomou sob a sua proteção. Aí, consegue fazer-se notar pelo célebre empresário Domenico Barbajo que, impressionado com o talento do jovem, lhe encomenda três óperas para o S. Carlos de Nápoles e o Scala de Milão, obtendo todas elas um estrondoso sucesso. Em 1833, faz uma digressão pela Inglaterra, onde apresenta quatro das suas óperas com grande aplauso do público, e, no mesmo 22 Ano letivo: 2012/2013 ano, instala-se definitivamente em Paris. Depressa trava amizade com Rossini e, em 1835, leva à cena a ópera I Puritani, no Théâtre-Italien. A peça alcança um êxito apoteótico, de tal forma que o nomeiam Cavaleiro da Legião de Honra. Embalado por este enorme sucesso, morre subitamente na casa de um amigo. O seu funeral realizou-se com uma cerimónia grandiosa: a Missa de Requiem foi dirigida por Rossini e cantada pelos mais famosos tenores da época. Foi sepultado em Paris, mas, em 1876, os seus restos mortais foram exumados e transladados para a sua terra natal, Catânia. Formado na tradição napolitana, no contraponto e harmonia de Vivaldi e Scarlatti, Bellini criou os mais bem elaborados exemplos do Bel Canto associado a uma arrebatada expressão romântica. Das suas dez óperas (todas sérias), destacam-se La Sonambula (1831), Norma (1831) e I Puritani e i Cavalieri (Os Puritanos e os Cavaleiros, 1835). De referir o lirismo e a expressividade das suas melodias, a delicadeza das harmonias, com um acompanhamento totalmente ao serviço do canto. Tal como as óperas de Donizetti, também as de Bellini caíram no esquecimento a partir da década de 1860 com a emergência do génio de Wagner e de Verdi, só vindo a ser recuperadas com o revivalismo do Bel Canto na década de 1950. Giuseppe Verdi (1813-1901) – na segunda metade do século XIX destaca-se G. Verdi. Filho de um estalajadeiro revelou grandes dotes musicais que a generosidade de um mecenas lhe permitiu desenvolver, estudando, primeiro com professores particulares e depois no Conservatório de Milão. Em 1839, a ópera Nabucodonosor é recebida em triunfo. A sua fama estende-se a toda a Europa com a obra seguinte, I Lombardi a la prima crociata, e as preocupações morais, patrióticas e estéticas que apresenta transformam Verdi no herói do povo, a proa do movimento político que preconizava a unificação da Itália. A sua importância simbólica era tal, que o seu nome, escrito e glorificado em todos os espaços livres, passou a ser a sigla da Revolução. O seu crescente envolvimento na política faz abrandar a atividade criadora e nos últimos trinta e cinco anos da sua vida apenas compõe sete óperas novas. Quando Verdi morreu, era admirado, reverenciado e considerado como o maior compositor italiano de todos os tempos. As suas obras tinham monopolizado quase inteiramente o meio operático italiano durante a maior parte do século XIX. Enquanto jovem, Verdi compôs óperas no estilo do bel canto, muito influenciadas pela música de Gaetano Donizetti e de Rossini. À medida que foi envelhecendo, amadurece a sua prática composicional, acabando por escrever óperas que ainda hoje continuam a ser consideradas como as melhores dentre o repertório operático italiano. Das suas trinta óperas, pelo menos quinze fazem parte do repertório normal de qualquer companhia de ópera atual. Dentro das obras deste compositor destacam-se Nabucco (1842), Rigoletto (1851), Il trovatore (1853), La Traviata (1853), La torza deI destino (1862), Aida (1871), Otello (1887) e Falstaft (1893). Tendo atingido a maturidade nos anos de 1840, encontra um contexto deveras benéfico: Rossini estava retirado, Bellini tinha morrido e Donizetti estava moribundo. Durante cinquenta anos deu à música italiana uma identidade tão forte como a dada por Wagner à música germânica e personificou o movimento de unificação italiana que conseguiu unir uma nação anteriormente dividida entre as potências europeias. Quando nos anos de 1850 se cantava nos teatros “Viva Verdi” glorificava-se o autor, a sua música mas sobretudo a ideia da unificação. Recorrendo a libretos inspirados em Shakespeare, Schiller, Byron, Vitor Hugo, escritos por Francesco-Maria Piave e Arrigo Boito (nos quais intervinha ativamente), constrói grandes obras dramáticas. Fascinavam-nos personagens apaixonadas, intensas, humanas, exigindo uma nova classe de cantores, com timbres específicos e capacidades interpretativas desconhecidas até então. Todas as subtilezas psicológicas são transmitidas, não através de uma escrita orquestral 23 Ano letivo: 2012/2013 sinfónica como em Wagner, mas sim através da alta qualidade da melodia. Ao longo da sua evolução tende a abandonar a divisão entre recitativo/ária, embora nunca abandone o ideal do bel canto italiano. Nas árias, dedica à orquestra um papel de criadora de atmosferas, servindo a música para reforçar a intriga e comentar a ação. O seu estilo evolui de uma orquestração mais percutida, com ritmos repetitivos, grandes coros marcados contrastes entre passagens declamatórias e líricas nas obras iniciais para, a partir de Rigoletto, apresentar um estilo mais fluente, em que as árias acrescentam algo ao drama e impelem a ação para diante, não sendo apenas pretexto para aplausos. A sua obra pode ser dividida em três períodos: 1º Período: 1839 – Un Giorno di Regno 1842 – Nabucco 1843 – Os Lombardos 1845 – Ernâni 2º Período: 1851 – Rigoletto 1853 – Il Trovatore, La Traviata 3º Período: 1855 – As Vésperas Sicilianas 1859 – Um Baile de Máscaras 1862 – A Força do Destino 1865 – Don Carlo, Macbeth 1871 – Aida 1874 – Requiem 1887 – Otello 1897 – Falstaff Verismo italiano: com influências francesas do Naturalismo, o Verismo surge inicialmente como um movimento literário italiano, que ocorreu aproximadamente entre 1875 e 1895. Giovanni Verga e Luigi Capuana são considerados os dois grandes expoentes deste movimento. Este último publicou a novela Giacinta, geralmente considerada como o “manifesto” do Verismo italiano. Estes escritores, em vez de se preocuparem em expressar os seus sentimentos mais íntimos e a sua visão idealizada do mundo (romantismo), retratam objetivamente a realidade, desejando ser apenas testemunhas fiéis do quotidiano. No final do século XIX, o realismo e o naturalismo da literatura influenciam a música italiana, nomeadamente a ópera. Deste modo, a ação das óperas decorre muitas vezes e, camadas sociais mais baixas, enfatizando as paixões, as emoções fortes, muitas vezes com mortes e assassínios. A música reflete estes ambientes e situações. Uma das primeiras óperas associadas ao Verismo é a Cavalleria rusticana de Pietro Mascagni, um drama com apenas um ato. Mas um dos principais compositores de ópera que reflete as características do Verismo italiano de forma mais significativa nas suas composições foi Giacomo Puccini. Entre as suas obras destaca-se La Bohéme (1896), La Tosca (1900) e Madame Butterfly (1904). 24 Ano letivo: 2012/2013 Giacomo Puccini (1858-1924): inicia a sua formação musical com um tio, Fortunato Magi, sendo depois aluno do diretor do Instituto Musicale de Pacini, Carlo Angeloni. Dá os estudos por concluídos em 1872, e coloca-se como organista na catedral de S. Martinho e de S. Miguel, em Lucca. Uma representação da Aida, de Verdi, a que assiste em Pisa, desperta-lhe a veia dramática e empurra-o para a ópera. Em 1879, a fim de completar a sua formação, matricula-se no Conservatório de Milão, onde é aluno de Bazzini e de Amilcare Ponchielli. Em 1882, concorre a uns jogos florais promovidos pela firma de edição de música Sonzogno, com a ópera Le Villí. Não ganha o concurso mas consegue chamar a atenção do editor Giulio Ricordi, que produz a ópera no Teatro dei Veme, em Milão. A ópera seguinte, Edgar, é um falhanço, cujo único mérito é a consolidação da sociedade entre Puccini e a Editora Ricordi, associação esta que se irá manter durante toda a vida do compositor. Em 1893, Puccini escreve e apresenta a ópera Manon Lescault, com um sucesso estrondoso. Nas óperas seguintes, mantém a colaboração com os mesmos libretistas, Giuseppe Giacosa e Luigi IlIica. Surgem, assim, La Bonéme, de 1896, que, embora superior às obras precedentes do compositor, foi recebida friamente em Turim, a Tosca, ópera que representa a primeira incursão de Puccini no verismo, apresentada em 1900, no Teatro Constanzi de Roma e Madame Bufterfly, obra tecnicamente muito evoluída, e que, talvez por isso, foi mal recebida no Scala de Milão na primeira apresentação. Ironicamente, alguns meses mais tarde, a mesma ópera é aclamada na cidade de Bréscia. Em Dezembro de 1910, La fanciulla deI West estreia na Metropolitan Opera House, de Nova lorque. É, sem dúvida, a obra mais original de Puccini, onde este demonstra uma mestria insuperável quer no domínio da harmonização, quer no da orquestração. A 24 de Novembro de 1924, Puccini morre, após uma intervenção cirúrgica mal sucedida. O trágico acontecimento impede-o de acabar a ópera Turandot, pelo que foi o seu amigo Alfano quem se encarregou de a completar, a partir dos apontamentos do compositor. A arte de Puccini é singularmente eficaz na veiculação do enredo dramático, ostentando uma riqueza orquestral. O seu estilo, bastante popular, não se desenvolve, porém, numa linha estética aparentada com Verdi ou com Wagner. 9.2 A ópera em França No início do século XIX, a ópera francesa assume um papel importante, com influência na produção operática dos restantes países. Para além de ser a casa das radicais inovações de Berlioz, Paris viria a tornar-se num dos mais importantes centros europeus da ópera, para compositores tanto franceses como italianos. Apesar da preeminência da Itália na ópera, nenhuma cidade italiana tinha um monopólio em termos da produção de ópera equivalente ao que Paris tinham em França. Na primeira metade do século XIX são particularmente notáveis as grandiosas produções de ópera séria (Grand Opera) produzidas, por exemplo, por Spontini (1774-1851) e Meyerbeer (1791-1864). É um género operático representativo da Monarquia de Julho de 1830-1848, expressando a burguesia. O lugar de representação era o Teatro de Ópera de Paris. Em termos musicais é de referir a alternância entre recitativos acompanhados, árias, cavatinas, baladas, a crescente importância dos números de conjunto, a utilização de grandes coros que representam o povo, assim como efeitos de palco grandiosos, a inclusão de bailados e utilização de uma grande orquestra, explorando-se os coloridos orquestrais – obras inseridas na tradição francesa que 25 Ano letivo: 2012/2013 remonta a J. B. Lully. Exemplos : La Vestale (1804) de Spontini, Les Hugenots (1836) e L'Africaine (1865) de Meyerbeer. A partir de 1850 surge em Paris um novo tipo de ópera, de temática séria, com diálogos falados e desenvolvida em torno de uma atmosfera mais intimista do que a Grand Opera. É o drame lyrique, representado no Théâtre Lyrique em Paris. De referir como exemplo o drama lírico Faust (1859) de Gounod. Paralelamente, embora a distinção de estilos nem sempre seja muito clara, cultiva-se a ópera cómica (opéra comique). Alternando texto cantado com texto falado (em substituição do recitativo), aborda temas mais leves, por vezes sérios, mas também sentimentais. As melodias são normalmente simples, não virtuosísticas. As cenas são homogéneas, havendo uma alternância entre canções, pequenas árias, conjuntos vocais e coros. Exemplos: Djamileh (1872) e Carmen (1875) de Bizet; Manon (1884) de Massenet; Lakmè de Dehbes. A ascensão da burguesia leva também à predileção por um género ligeiro e cómico herdado que se vai impor na segunda metade do século XIX – a Opereta. Baseando-se na estrutura da ópera cómica (abertura, diálogos falados, árias, conjuntos, coros) contém um enredo leve e satírico, com música fácil e natural e melodias rapidamente memorizáveis. Com um reduzido elenco, apresentava-se frequentemente no Palais Royal e no Bouffes Parisienes com produções de J. Offenbach (Orphée aux enfers, La Belle Helene, Les Contes de Hoffmann), J. Strauss (O Morcego, O Bardo Cigano). 9.3 Richard Wagner e o Drama Musical Richard Wagner (1813-1883) – Impossíveis de ignorar, as suas inovações na estrutura operática, na harmonia e no uso de motivos deixaram a sua marca nas obras de quase todos os compositores subsequentes. Figura que se envolveu na musicologia, na literatura (Arte e a Revolução, 1849, A Obra de Arte do Futuro, 1849, e Ópera e Drama, 1851), na política e na filosofia. As suas obras vão desde os grandes espetáculos operáticos de Der fliegende Holander e Tannhauser, inspirados por compositores como Meyerbeer, ao seu inovador e mitologicamente inspirado drama musical em quatro partes, Der Ring des Nibelungen, passando pelo misticismo de Parsifal. Nascido em Leipzig, a formação musical inicial de Wagner teve lugar com Christian Gottlieb Müller, após o que, em 1831, frequentou a Universidade de Leipzig para estudar música, e seguidamente teve uma formação intensiva em contraponto com Christian Weilig, que era Kantor na Thomaskirche. Wagner começou a compor a sério depois de assumir um cargo de maestro de coro para o teatro em Würzburg, no ano de 1833. A sua primeira ópera sobrevivente, Die Feen (1834), foi composta nesta altura e o próprio Wagner escreveu o libreto para esta obra, algo que viria a fazer para todas as suas óperas subsequentes. No entanto, só quando se tornou diretor musical de uma companhia itinerante é que viu uma das suas próprias obras, a sua segunda ópera, Das Liebes, a ser interpretada num palco, em 1836. Durante esse mesmo ano, casou com uma das cantoras da companhia, Minna Planer, com quem estava destinado a ter uma relação tempestuosa. Em 1837, Wagner chegou a Riga para assumir o posto de diretor musical da casa de ópera da cidade. Embora nem o seu contexto doméstico nem o seu contexto financeiro fossem confortáveis, arranjou tempo para escrever o libreto e parte da música para o seu projeto seguinte, Rienzi. Todavia, antes que este pudesse ser terminado, as dívidas de Wagner tinham-se 26 Ano letivo: 2012/2013 acumulado a tal ponto que o compositor e Minna foram forçados a fugir para o outro lado da fronteira. O casal chegou a Paris em finais de 1839 e aí Wagner recebeu apoio de Meyerbeer, que lhe deu cartas de apresentação e o encorajou a terminar Rienzi. No entanto, os dois anos e meio que se seguiram seriam miseráveis para Wagner. Nada surtiu da sua apresentação ao diretor da Ópera de Paris. Wagner viria mais tarde a culpar o Meyerbeer judeu por esta circunstância no seu ensaio notoriamente anti-semita, Das Judentum in der Musik (1850), embora não haja qualquer evidência de má vontade da parte de Meyerbeer, tendo sido, aliás, com base na recomendação deste que Rienz foi aceite para ser levada a palco em Dresden, durante ano de 1842. Os Wagner mudaram-se para Dresden em virtude da atuação e o seu sucesso abriu caminho para a produção de Der Fliegende Hollander, escrita em Paris no ano seguinte. Embora esta obra tenha sido menos bem recebida, foi oferecido a Wagner o posto de Kappelmeister na corte de Dresden. Por esta altura encontrava-se a trabalhar no seu projeto seguinte, Tannhauser, subsequentemente interpretado em 1845, mas discutivelmente mais influentes foram a sua interpretação, em 1846, da 9ª Sinfonia de Beethoven, e a sua leitura de dramaturgos gregos como Ésquilo e Sófocles, assim como dos épicos medievais Tristão, Parzival e Lohengrin e do poeta Han Sachs. Se é verdade que os autores menores gregos viriam a influenciar enormemente o seu conceito de drama musical, não é menos verdade que o seu projeto operático seguinte, Lohengrin, lançaria as bases de uma das suas maiores inovações musicais, o leitmotif. O trabalho de Wagner em torno da Lohengrin foi interrompido pelas revoluções de 1848 e o seu papel ativo na exigência da queda da aristocracia forçou-o a fugir na altura em que os revolucionários foram assolados pelas tropas prussianas. Em 1848, os Wagner mudaram-se para Zurique, onde o compositor escreveu dois importantes ensaios, Das Kunstwerk der Zukunft (1849) e Oper und Drama (1851), nos quais, baseando-se no seu estudo do drama grego, delineou a sua ideia para a Gesamtkunstwerk (obra de arte total) que unificaria todas as artes numa única forma dramática e que Wagzer entendia como sendo o drama musical. Lohengrin foi interpretada em Weimar por Liszt, em 1850, embora Wagner por esta altura estivesse ocupado com o libreto para um dos seus mais extraordinários feitos, o imenso ciclo de Der Ring des Nibelungen, baseado no poema medieval alemão Nibelungenlied e que compreendia três óperas, Die Walküre, Siegfried e Gotterdammerunq e um prelúdio, Das Rheingold. O ciclo só foi terminado em1874 e nele, veículo pelo qual mais se aproximou de concretizar o ideal da Gesamtkunstwerk, Wagner explorou inteiramente a técnica do leitmotif, produzindo uma obra composta num só movimento, em que a história é contada dentro da música bem como através da ação desempenhada no palco. Com poucos rendimentos resultantes das interpretações das suas obras, e passando a maioria do seu tempo concentrado na composição de Der Ring, Wagner estava dependente de benfeitores, e, em 1857, o compositor e Minna mudaram-se para urna casa de campo facultada por Otto von Wesendonk. Wagner envolveu-se num caso amoroso com a mulher de Otto, Mathilde, e o ardor desta paixão arrebatadora foi transposto para a composição de Tristão e Isolda. Terminada em 1859, trata-se de uma das suas mais influentes partituras, especialmente o seu acorde de abertura, cuja ambiguidade harmónica se viu identificada com o início do abandono da tonalidade. A composição cromática, com a sua modulação quase constante que serve de suporte ao turbilhão emocional da trama, não cessa até à consumação da Liebestod (“morte de amor”) de Isolda precisamente no final. Em 1860, as restrições às deslocações de Wagner diminuíram e este mudou-se primeiramente para Dresden e, seguidamente, para Viena, embora por altura de 1863 a acumulação das suas dívidas fosse de tal ordem que se viu forçado a fugir da capital austríaca. O 27 Ano letivo: 2012/2013 compositor foi salvo destes apuros desesperados pelo novo rei da Baviera, Ludovico II. Este wagneriano entusiástico saldou as dívidas do compositor e disponibilizou-lhe instalações opulentas para que pudesse terminar Der Ring. Todavia, Ludovico sentia dificuldades em suportar os custos e conseguir o reconhecimento da população, particularmente após a má receção da estreia de Tristão em 1865, sob a regência de Hans von Bülow. Por esta altura, Wagner encontrava-se irreconciliavelmente separado de Minna e tinha começado um envolvimento com a mulher de Bülow, Cosima, a filha de Liszt. O casal mudouse para Tribschen, no lago Lucerne, onde Wagner meditou sobre questões em torno do nacionalismo alemão. As conclusões não inteiramente saudáveis a que chegou viriam a enformar a composição da sua única ópera cómica, Die Meistersinger von Nürnberg (1868), bem corno o seu desejo de criar um edifício destinado à sua própria arte onde as suas próprias obras poderiam ser interpretadas longe da perniciosa influência estrangeira. Foi nesta altura que travou conhecimento com o filósofo Friedrich Nietzche, com quem construiu uma breve mas intensa amizade, terminada em 1876 por incompatibilidades filosóficas. Com a ajuda de patronos corno Ludovico II (que pôs de parte lucros do Hoftheater para pagar a o empreendimento), Wagner decidiu que a cidade de Bayreuth seria o local para o novo teatro e festival. Uma quinta, Wahnfried, também foi construída no lugar escolhido por Wagner. Juntamente com Cosima, com quem havia casado em 1870 (Minna tinha morrido em 1866 e Cosima havia-se divorciado de Hans von Bülow em 1869), Wagner mudou-se para aqui em 1874. O primeiro festival realizou-se em 1876 com a primeira interpretação integral de Der Ring des Nibelungen. A ópera Parsifal, de Wagner, baseada no poema épico medieval Parzival da autoria de Wolfram von Eschenbach, foi terminada no final do ano de 1881 e interpretada pela primeira vez no Bayreuth Festspielhaus, em 1882. O misticismo da lenda do Graal impeliu Wagner a produzir alguma da sua mais sublime música. Este viria a ser o seu último trabalho, tendo morrido em Veneza no ano seguinte. O seu corpo foi trazido de volta para Bayreuth e enterrado nos jardins da Villa Whanfried. O grandioso projeto de reforma da ópera que Wagner vem concebendo desde a década de 30 encontra-se já plenamente definida na década de 50, tendo apenas que esperar pelas décadas de 60 e 70 para encontrar o seu apogeu. Linhas gerais da Reforma Operística Wagneriana: 1) Wagner ampliou a orquestra a uma dimensão nunca antes vista. Isto não só lhe permitiu criar clímaxes sonoros arrebatadores em pontos-chave da partitura como também tratar os diferentes instrumentos como grupos distintos. Foi a invenção da chamada tuba wagneriana que causou o maior impacto, que foi entusiasticamente adotada por Bruckner e Strauss (o primeiro usou-as memoravelmente na sua 7ª Sinfonia, dedicada à memória de Wagner, e o segundo na sua ópera Elektra). 2) Em termo da harmonia, Wagner foi igualmente abrangente, desafiando as fronteiras da ambiguidade. As suas inovações harmónicas (o “acorde Tristão”, por exemplo), assim como o uso quase constante de uma condução da voz cromática e semitonal que permite que a música passe facilmente de uma tonalidade (ou antes, uma implicação de uma tonalidade) para outra, viriam a dar início ao colapso da tonalidade que ocorreu no século XX. 28 Ano letivo: 2012/2013 2) Conceção de uma Obra de Arte Total que fosse a fusão de gesto, poesia e música. Desta forma Wagner tenta o regresso ao teatro grego onde a poesia, a dança e a música formavam um todo. O Drama Musical wagneriano é sustentado por uma poderosa trama orquestral contínua, baseada na melodia contínua e na harmonia sem fim, carregadas de conceções filosóficas, mitológicas e até esotéricas. 3) Abandono dos libretos estranhos. Wagner intervém como poeta e músico concebendo os libretos-poema, criando todo o enredo teatral e musical conjuntamente, o que origina a grande unidade interna formal presente nas suas obras. Para alcançar esta unidade usa os elementos do Drama Musical como um elo de ligação entre a poesia e a música: Leitmotiv – motivo condutor da ação dramática, que serve para caracterizar uma personagem, objeto, local ou situação; aparece periodicamente à maneira de uma alegoria. Melodia Contínua – processo encontrado para criar a unidade formal interna; funciona como uma gigantesca e contínua modulação; gera um ritmo ondulatório que põe de parte a conceção tradicional das frases musicais e abre perspetivas para a declamação moderna de Debussy, Schoenberg e Berg; provoca uma harmonia contínua baseada no cromatismo explorado até aos limites do atonalismo – Wagner usa-o para exprimir inquietação, confusão, angústia ou maldade, optando pelo diatonismo para traduzir paz, serenidade, luz, amor, felicidade. Prelúdio - usa-o geralmente em substituição da Abertura tradicional, revestindo-o de uma forma mais livre. É uma espécie de antecedente psicológico do Drama que o segue sem interrupção. Nos prelúdios, o Wagner filósofo dirige-se ao público criando-lhe o ambiente do que surgirá em seguida. Música contínua – rejeição da divisão formal em recitativos, árias e outro tipo de secções. A década de 50 constitui a fase de lançamento das obras da maturidade. Em 1853 nasce-lhe a ideia da primeira ópera de um gigantesco fresco baseado na mitologia alemã – a Tetralogia: 1. O Ouro do Reno (1853) 2. As Valkírias (1854) 3. Siegfried (1854) 4. O Crepúsculo dos Deuses (1870) 29 Ano letivo: 2012/2013 10) O Nacionalismo A segunda metade do século XIX assistiu, na Françla, à exigência de uma reinvenção da tradição francesa, em parte uma reação contra o domínio de Wagner. Esta ação tinha tido o seu correlativo em Itália com o uso das obras de Verdi para expressar a identidade italiana. A derrota na Guerra Franco-Prussiana em 1870-1871 ocasionou uma mudança na cultura francesa assim que os compositores absorveram as consequências do estatuto alterado da França no mundo. Uma das mais importantes figuras do subsequente renascimento na música francesa foi Camille Saint-Saens (1835-1921), famoso como organista, compositor e professor. No entanto, os sentimentos nacionalistas crescentes não se restringiam a França e a Itália; a afirmação de identidades nacionais foi particularmente notória na Rússia, na Escandinávia e em áreas não-alemãs da Europa central que ainda faziam parte do Império Austro-Húngaro, com particular destaque para a Boémia. Na Rússia a mudança rumo a um estilo conscientemente nacional teve pela primeira vez lugar através das obras de Mikhail Glinka (1804-1857). As suas obras (de destacar as óperas Uma vida pelo Czar, 1842, e Russlan e Ludmilla, 1842) influenciaram a geração seguinte de compositores russos, conhecidos como Os Cinco ou Moguchaya kuchka (“Punhado Poderoso”), que se determinaram a continuar a incursão inicial de Glinka no nacionalismo musical e a criar um estilo genuinamente russo que abrangesse todos os géneros e forjasse uma linguagem musical nacional. Os cinco compositores, instalados em São Petersburgo, que viriam a alcançar isto foram: Mily Balakirev (1837-1910), líder e força motriz do grupo; César Cui (18351918); Aleksandr Borodin (1833-1887); Modest Musorgsky (1839-1881); e Nikolay Rimsky-Korsakov (1844-1908). Se é verdade que foi Balakirev quem deu o impulso político e ideológico ao movimento, não é menos verdade que seriam os três últimos compositores a alcançar o reconhecimento através da qualidade da sua música. Uma outra figura, bastante diferente das mencionadas, está associada ao surgimento de uma escola nacional russa: Pyotr Ill'yich Tchaikovsky (1840-1893). Conhecido hoje pelas suas obras orquestrais extremamente populares, especialmente as suas 4ª, 5ª e 6ª sinfonias (1878-93), e os bailados Lago dos Cisnes (1877), A Bela Adormecida (1889) e O Quebra-Nozes (1892), bem como a ópera Yevgeny Onegin (1878), Tchaikovsky transformou a música russa, que se concentrava, de modo limitado, no estabelecimento de uma tradição nacional, numa música internacional. Isto deveu-se, em parte, ao seu à-vontade em trabalhar numa linguagem que evitava as inovações modais e harmónicas dos seus contemporâneos russos, uma direção que foi adotada pelo pianista e compositor Sergei Rachmaninoff (1873-1943), que, tal como Strauss na Alemanha, viria a ser o último dos grandes compositores românticos da Rússia. Do mesmo modo que Glinka foi importante para o estabelecimento de uma escola nacional na Rússia, o seu contemporâneo Bedrich Smetana (1824-1884) viria a desempenhar o mesmo papel para o Checos. À semelhança de Glinka, também ele passou anos no estrangeiro, em Weimar, Leipzig e Gotemburgo. Entretanto, vai para Praga, onde se dedica à construção de uma música nacional checa. Um dos acontecimentos que o incitaram a assumir esta posição foi a abertura de um teatro de língua checa em Praga e a consciencialização de que a ópera podia desempenhar um papel importante na construção de uma identidade nacional. Com efeito, a maior proeza de Smetana foi a fundação de uma tradição de ópera checa. A primeira das suas óperas checas foi Os Brandenburgueses na Boémia (1862-1863), à qual rapidamente se seguiu, depois da sua estreia bem-sucedida, A Noiva Vendida (1866), apesar da sua receção inicialmente inauspiciosa, viria a tornar-se na sua obra mais popular, tendo sido alvo de mais de 100 30 Ano letivo: 2012/2013 interpretações enquanto esteve vivo. Escreveu mais cinco óperas, duas das quais sobre temas declaradamente nacionalistas: Dalibor (1867), Libuse (1872). Embora houvesse solicitações para que seguisse o exemplo musical de Wagner, Smetana continuou convencido de que não se podia alcançar um estilo nacional através da cópia de um idioma wagneriano supostamente internacional, e voltou-se antes para os ritmos de dança checos e ensaiou a tentativa adaptar a fluência da língua checa à música. Isto não se restringia à ópera, e uma das suas peças mais nacionalistas, o ciclo programático de poemas sinfónicos Má vlast, foi composta para piano a quatro mãos (1879-1880) e posteriormente arranjada para orquestra (1880-1884). O legado de Smetana foi herdado por Antonin Dvorák (1841-1904). Embora só se tenha dedicado à composição a tempo inteiro quando estava na casa dos 30, tinha sido tocador de viola-d'arco principal no Teatro Provisório, em Praga, onde participou nas interpretações das óperas de Smetana conduzidas pelo compositor; foi Smetana quem regeu a estreia de uma das primeiras obras de Dvorák, a abertura da sua ópera O Rei e o Carvoeiro (1871). Esta e uma série de outras obras iniciais são fortemente influenciadas por Wagner. Contudo, quando as dificuldades extremas desta partitura operática fizeram com que a primeira interpretação fosse abandonada, Dvorák começou a repensar o seu estilo composicional. Reteve o tipo de composição integral das obras wagnerianas mas adotou o que foi designado por “novo classicismo”, com um sentido mais claro de forma e uma simplificação de temas que incorporavam elementos da dança e da canção folclóricas. Dvorák perseguiu o objetivo de um estilo nacional claramente articulado num número surpreendentemente vasto de géneros, da ópera às canções, e dos quartetos de cordas às sinfonias. As suas obras mais declaradamente nacionalistas são as duas oratórias Os Herdeiros da Montanha Branca (1872) e Santa Ludmilla (1885-1886), ambas versando sobre acontecimentos centrais da história checa. Talvez seja mais lembrado hoje pelas suas obras sinfónicas, especialmente as últimas sinfonias (da 6ª à 9ª, 188093) que exibem a influência de Beethoven e Brahms no tratamento da forma e da técnica de desenvolvimento, porém aliado a elementos folclóricos nas suas melodias e no seu ritmo. A terceira área da Europa que assistiu à emergência de um conjunto de músicos nacionalistas durante o século XIX foi a Escandinávia. Isto seguiu diferentes caminhos em diferentes países, em larga medida através das figuras de Edvard Grieg (1843-1907) na Noruega e de Jean Sibelius (1865-1957) na Finlândia. Ambas as áreas estavam sob o controlo e influência de países vizinhos mais poderosos; no caso da Noruega, era a Suécia e a Dinamarca, e no caso da Finlândia, era a Rússia. Em ambos os casos, a música dos dois compositores tornou-se num importante símbolo nacional, usada como baluarte e ponto de encontro contra o domínio cultural dos governadores estrangeiros. Grieg esteve, até 1864, imerso nos universos culturais dinamarquês e alemão e também havia passado os anos de 1858-62 no conservatório de Leipzig, onde recebeu a sua formação musical. Contudo, dois anos após o seu regresso da Alemanha, a situação viria a mudar. Passou o Verão de 1864 com o grande violinista norueguês ale Buli, que lhe deu a conhecer a música folclórica norueguesa, e pouco tempo depois travou conhecimento com o jovem compositor nacionalista Rikard Nordraak (1842-66). Daqui em diante, Grieg dedicar-se-ia à transformação em nacionalista romântico. Muitas das obras de Grieg são música de câmara, ou para piano, ou para voz ou para quarteto cordas, embora o seu concerto para piano (1868) e a música incidental que escreveu para a Peer Gynt (1874-1875), de lbsen, se tenham tornado obras de referência no repertório orquestral. À semelhança de Smetana e Grieg, Sibelius foi criado numa família falante de suecos e só mais tarde, durante a década de 1890, começou a estudar finlandês; por essa altura, a adoção 31 Ano letivo: 2012/2013 Da língua da maioria era vista como um ato de apoio à autodeterminação e ao desenvolvimento de uma cultura nacional, designada por “Finlandização”. Inicialmente violinista, Sibelius voltou-se para a composição durante finais da década de 1880, embora os seus esforços iniciais neste sentido dessem poucos sinais da voz individual que viria a desenvolver. Foi nesta altura que conheceu Armas e Eero Jãrnefelts, com cuja irmã, Aino, se viria a casar. Estes dois irmãos eram acérrimos apoiantes da causa finlandesa e foi através deles que Sibelius se envolveu pela primeira vez nas ideias e discussões de identidade nacional que circulavam. Entretanto, Sibelius descobre o épico nacional finlandês, o Kalevala, do qual deriva os programas de muitos dos seus poemas sinfónicos. Sibelius ficou fascinado com os padrões métricos e com os esquemas rimáticos usados na recitação dos poemas. Entre as suas verdadeiramente finlandesas destaca-se poema sinfónico Kullervo (1891-2), com coro e solistas soprano e barítono, baseado na Kalevala. Escolas Nacionais Rússia M. Glinka (1804-1857) Alexander Scriabin (1872-1915) Alexander Glazunov (1865-1936) Igor Stravinsky (1882-1971) M. Balakirev (1837-1910) César Cui (1835-1918) Modest Petrovich Moussorgsky (1839-1881) Alexander Borodin (1833-1887) Nikolay Rimsky-Korsakov (1844-1908) Noruega Edward Grieg (1843-1907) Dinamarca Niels Gade (1817-1890) Carl Nielson (1859-1931) Finlândia Jan Sibelius (1865-1957) Hungria Bela Bartók (1881-1945) Zoltan Kodály (1882-1967) Inglaterra Estados Unidos Edward Elgar (1857-1934) Benjamim Britten (1913-1976) Edward MacDowell (1860-1908) Georg Gershwin (1898-1937) Aaron Copland (1900-1990) 32 Ano letivo: 2012/2013 Espanha Isaac Albéniz (1860-1909) Enrique Granados (1867-1916) Manuel de Falla (1876-1946) Brasil Heitor Villa-Lobos (1887-1959) Portugal Viana da Mota (1868-1948) Francisco de Lacerda (1869-1934) Luís de Freitas Branco (1890-1955) Joly Braga Santos (1924-1988) Fernando Lopes-Graça (1906-1994) 33