3 Vol XVI 2007 - Revista Nascer e Crescer
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3 Vol XVI 2007 - Revista Nascer e Crescer
NASCER E CRESCER Vol. 16, nº 3, Setembro 2007 16 3 Revista do Hospital de Crianças Maria Pia Ano | 2007 Volume | XVI Número | 03 www.hmariapia.min-saude.pt Directora | Sílvia Álvares; Directora Adjunta | Inês Moreira; Director do Hospital de Crianças Maria Pia | José Alberto Peixoto Corpo Redactorial | Amélia José; Ana Cristina Cunha; Artur Alegria; Carlos Enes; Carmen Carvalho; Conceição Mota; Esmeralda Martins; Inês Lopes; Laura Marques; Margarida Guedes; Maria do Carmo Santos; Miguel Coutinho Editores especializados | Artigo Recomendado – Maria do Carmo Santos; Tojal Monteiro. Perspectivas Actuais em Bioética – Natália Teles. Pediatria Baseada na Evidência – Luís Filipe Azevedo; Altamiro da Costa Pereira. Ciclo de Pediatria Inter-Hospitalar do Norte – Rogério Mendes; Helena Jardim; Virgílio Senra; Fernanda Manuela Costa; Jorge Sales Marques; Armando Pinto; Cidrais Rodrigues; Joaquim Cunha. Caso Endoscópico – Fernando Pereira. Caso Estomatológico – José Amorim. Genes, Crianças e Pediatras – Margarida Reis Lima. Imagens – Filipe Macedo. Pequenas Histórias – Margarida Guedes. Conselho Técnico | Cristina Soares; Gama de Sousa; Lígia Carvalho; Rui Nogueira Secretariado Administrativo | Carla Correia Publicação trimestral resumida e indexada por | EMBASE / Excerpta Médica; Catálogo LATINDEX Design gráfico | bmais comunicação Execução gráfica e paginação I Papelmunde, SMG, Lda Vila Nova de Famalicão ISSN | 0872-0754 Depósito legal | n° 4346/91, anotada no Ministério da Justiça em 92.04.24 Tiragem | 2.500 exemplares Autorização CTT | DE 0005/2005 DCN Propriedade, Edição e Administração | Hospital de Crianças Maria Pia Rua da Boavista, 827 – 4050-111 Porto; tel: 226 089 900; fax: 226 000 841; www.hmariapia.min-saude.pt Os trabalhos, a publicidade e a assinatura, devem ser dirigidos a I Coordenação da revista Nascer e Crescer Hospital de Crianças Maria Pia Rua da Boavista, 827 – 4050-111 Porto; tel: 226 089 988; email: [email protected] Condições de assinatura | Anual 2007 (4 números) - 35 euros; Número avulso - 10 euros; Estrangeiro - 70 euros Conselho Científico Nacional Conselho Científico Internacional - Adelaide Justiça; - Agustina Bessa Luís; - Alfredina Guerra e Paz; - Álvaro Aguiar; - Carlos Duarte; - Carmen Santos; - Clara Barbot; - Cidade Rodrigues; - Damião Cunha; - Eloi Pereira; - Fátima Praça; - Fernanda Teixeira; - Filomena Caldas; - Herculano Rocha; - José Carlos Areias; - José Maria Ferronha; - José Oliveira Simões; - José Pombeiro; - Lourenço Gomes; - Lucília Norton; - Lurdes Lima; - Luís Januário; - Luís Lemos; - Luzia Alves; - Manuel Dias; - Manuel Rodrigues Gomes; - Manuela Machado; - Manuel Strech Monteiro; - Marcelo Fonseca; - Margarida Medina; - Maria Augusta Areias; - Maria Salomé Gonçalves; - Morais Barbot; - Miguel Taveira; - Nuno Grande; - Octávio Cunha; - Paulo Mendo; - Raquel Alves; - Rui Carrapato; - Maximina Pinto; - Sílvia Álvares; - Sodré Borges; -Tojal Monteiro. - Allan de Broca (Amiens); - Anabelle Azancot (Paris); - D. 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Guimarães); - Reis Morais (H.Chaves); - Ricardo Costa (H.Covilhã); - Ventura Martins (H.Lamego FUNDADA EM 1882 Rua da Boavista, 713 – 4050-110 PORTO Tel. 222 081 050 [email protected] Somos a Entidade Promotora do Voluntariado e Suporte da Humanização do Hospital NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia índice ano 2007, vol XVI, n.º 3 número3.vol.XVI 119 Editorial Sílvia Álvares 120 Artigos Originais Como São os Adolescentes de 13 Anos em Ermesinde. Exame Global de Saúde numa Escola Secundária S. Lira, E. Teixeira, C. Santos Silva, C. Valente 124 Casos Clínicos A Tríade Clássica de uma Doença ainda Actual Catarina Sousa, Micaela Guardiano, Cíntia Correia, Carla Rego, Fátima Ferreira 128 Gastroenterite por Salmonela em Recém-nascido Ermelinda Ferreira, Anabela João, Leonor Ferraz 130 Artigo Recomendado Tojal Monteiro Maria do Carmo Santos 135 Pediatria Baseada na Evidência Formulação de Questões e Pesquisa Bibliográfica Luís Filipe Azevedo, Altamiro da Costa Pereira 142 Qual o seu Diagnóstico? Caso Endoscópico Fernando Pereira 144 Caso Estomatológico José M. S. Amorim 148 Imagens Filipe Macedo 150 Genes, Crianças e Pediatras Cristina Dias, Manuela Santos, Manuela Vilarinho, Rosário Santos, Ana Maria Fortuna, Margarida Reis Lima NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Reunião do Hospital de Crianças S153 XIX Maria Pia – Resumo das Intervenções S154 Hipertensão Arterial – mesa redonda Métodos de Avaliação de Tensão Arterial e Interpretação dos Resultados Conceição Mota, Cármen do Carmo, Sílvia Álvares, Elói Pereira S158 Abordagem da Criança e Adolescentes Hipertensos António Jorge M. Correia S168 Factores de Risco Cardiovascular: Prevenção desde a Infância Cármen do Carmo, Conceição Mota, Elói Pereira S173 Imagem na Avaliação do Sistema Nervoso Central: Implicações no Prognóstico – mesa Imagem na Avaliação do Sistema Nervoso Central: redonda Implicações no Prognóstico – papel da ecografia no diagnóstico pré-natal Maria do Céu Rodrigues S178 Tratamento da Diabetes – mesa redonda Diabetes Mellitus Tipo 1 e Doenças Associadas Marcelo Fonseca S179 Diabetes na Adolescência Olinda Marques S181 Toxina Botulínica: Aplicações Terapêuticas na Criança – mesa redonda Aplicações Terapêuticas da Toxina Botulínica nas Distonias Inês Carrilho S184 Toxina Botulínica na Paralisia Cerebral Rosa Amorim S186 Toxina Botulínica: Aplicações Terapêuticas na Criança com Disfunções Miccionais Miguel Silva Ramos S188 Toxina Botulínica: Aplicações Terapêuticas em Oftalmologia Pediátrica Rosário Varandas S191 Estudos Interinstitucionais – mesa redonda S193 S204 Resumo das Comunicações Orais Pneumonia Aguda da Comunidade de Evolução Complicada Ana Ramos, Isabel Guerra, Telma Barbosa, Conceição Silva, Cristina Ferreira, Guilhermina Reis Resumo dos Posters NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia summary ano 2007, vol XVI, n.º 3 number3.vol.XVI 119 Editorial Sílvia Álvares 120 Original Articles Health state of adolescents in a High School in Ermesinde – the Global Health Exam S. Lira, E. Teixeira, C. Santos Silva, C. Valente 124 Clinical Cases Classical Clinical Findings of a Still Present Disease Catarina Sousa, Micaela Guardiano, Cíntia Correia, Carla Rego, Fátima Ferreira 128 Salmonella Gastroenteritis in the Newborn Ermelinda Ferreira, Anabela João, Leonor Ferraz 130 Recommended Article Tojal Monteiro Maria do Carmo Santos 135 Evidence Based Paediatrics The Formulation of Clinical Questions and Searching for the Current Best Evidence Luís Filipe Azevedo, Altamiro da Costa Pereira 142 What is your Diagnosis? Endoscopic case Fernando Pereira 144 Oral Pathology case José M. S. Amorim 148 Images Filipe Macedo 150 Genes, Children and Paediatricians Cristina Dias, Manuela Santos, Manuela Vilarinho, Rosário Santos, Ana Maria Fortuna, Margarida Reis Lima NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Meeting of Children’s Hospital S153 XIX Maria Pia - Abstracts S154 Techniques of Blood Pressure Measurement and Interpretation of its Values Conceição Mota, Cármen do Carmo, Sílvia Álvares, Elói Pereira Arterial Hypertension in childhood and Adolescence– round table S158 Clinical Management António Jorge M. Correia S168 Cardiovascular Risk Factors – Prevention in Childhood Cármen do Carmo, Conceição Mota, Elói Pereira S173 Imaging the Central Nervous System : S178 Treatment of Diabetes – round table Role of the Echography in Prenatal Diagnosis Maria do Céu Rodrigues Implications for the Prognosis – round table Diabetes Mellitus Type 1 and Associated Diseases Marcelo Fonseca S179 Diabetes in Adolescence Olinda Marques S181 Botulínum Toxin: Therapeutic applications in childhood – round tablea In Muscular Dystony Inês Carrilho S184 In Cerebral Palsy Rosa Amorim S186 In Urinary Disfunction Miguel Silva Ramos S188 In Pediatric Ophtalmology Rosário Varandas S191 Multicentric studies – round table S193 S204 Free Papers – Abstracts Acute Community-acquired Pneumonia with a Complicated Course Ana Ramos, Isabel Guerra, Telma Barbosa, Conceição Silva, Cristina Ferreira, Guilhermina Reis Posters – Abstracts NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 editorial O Hospital de Crianças Maria Pia realiza este ano a XIX Reunião Anual, em colaboração com os Serviços de Pediatria da Região Norte do País. Neste evento pretendemos reunir todos os profissionais de Saúde que se dedicam à Criança, desde a concepção à vida adulta. O Programa Científico foi elaborado tendo em conta temas de interesse actual e que simultaneamente constituíssem avanços nas diversas áreas da Pediatria. Irão estar em discussão as “Novas Técnicas Cirúrgicas”, a ”Hipertensão Arterial”, a “Imagem na Avaliação do Sistema Nervoso Central”, o “Tratamento da Diabetes”, as “Aplicações Terapêuticas da Toxina Botulínica” e a “Resistência Bacteriana aos Antibióticos em Portugal”. Temos também uma Sessão Clínica Interactiva, que apela ao dinamismo e participação dos congressistas, com a apresentação de casos clínicos. Para além de Sessões de Comunicações Livres que irão permitir a discussão de casos clínicos complexos e a troca de experiência de vários serviços relativamente a diferentes patologias, decorrerá ainda um Curso Satélite sobre “Dor em Pediatria”, um tema de interesse crescente e que abordará também a estruturação de Unidades de Dor. Salientamos ainda a apresentação dos Estudos Interinstitucionais sobre “Diabetes Inaugural”, “Pneumonias de Evolução Complicada” e “Triagem de Manchester”, os quais demonstram bem o trabalho de equipa que estas reuniões representam. Foi nosso objectivo desenvolver o aspecto de multidisciplinaridade na Pediatria, congregando Pediatras e Especialistas de outras áreas do conhecimento para permitir um amplo debate e uma visão estratégica da doença na Criança. Esta Reunião não seria possível sem o apoio da liga de Amigos, da Associação do hospital de Crianças Maria Pia bem como das empresas farmacêuticas, o qual agradecemos reconhecidos. Do mesmo modo agradecemos o entusiasmo e empenho dos organizadores colaboradores e conferencistas, factores fundamentais para o sucesso desta reunião. Silvia Álvares editorial 119 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Como são os adolescentes de 13 anos em Ermesinde. Exame global de saúde numa escola S. Lira1, E. Teixeira2, C. Santos Silva2, C. Valente2 RESUMO Introdução e objectivo: As idades que compreendem a adolescência são as mais ausentes dos cuidados pediátricos. A Direcção Geral de Saúde prevê a realização de um Exame Global de Saúde entre os 11 e os 13 anos, que raras vezes é realizado no Centro de Saúde. Material e métodos: Os autores deslocaram-se à Escola Secundária de Ermesinde para a realização de um exame global de saúde aos alunos entre os 11 e 13 anos. Analisaram-se os seguintes parâmetros: estado de saúde, índice de massa corporal, tensão arterial, incidência de cáries dentárias e défice da acuidade visual. Posteriormente os alunos responderam a questões relacionadas com hábitos de vida saudáveis. Resultados: Dos jovens avaliados, 58% eram do sexo feminino e 42% do sexo masculino. O índice de massa corporal médio para as raparigas foi de 21,2 e para os rapazes foi de 19,9. Cerca de 20% dos rapazes e 20,6% das raparigas tinham excesso de peso, perfazendo 20,5% do total da amostra. Como obesos consideraram-se 6,6% dos rapazes e 7,9% das raparigas, num total de 7,5% da população estudada. A média da tensão arterial sistólica foi semelhante para os dois sexos, situando-se no P75 para a idade. No exame da dentição 33% tinham cáries ainda não tratadas. Quanto às questões sobre hábitos de vida, 48% afirmam praticar regularmente desporto, 83% têm bons hábitos de higiene oral e 32% já experimentaram fumar. O tempo médio dispendido diaria- __________ ¹ Interna Complementar de Pediatria do Hospital Padre Américo - Vale do Sousa; 2 Centro de Saúde de Ermesinde 120 artigos originais mente frente ao computador foi de 1,25 h e frente à televisão foi de 2,6 h. Comentários: A caracterização desta população permite uma intervenção orientada da Saúde Escolar de educação para estilos de vida saudáveis. Palavras-chave: adolescência, exame global saúde, saúde escolar Nascer e Crescer 2007; 16(3): 120-123 INTRODUÇÃO As idades que compreendem a adolescência são as mais ausentes dos cuidados pediátricos, quer pela menor incidência de morbilidade de causa intrínseca, quer pela dificuldade que existe em levar o adolescente ao médico, principalmente se este for “médico de crianças”. No entanto, será talvez esta a última oportunidade de modelar uma consciência para a Saúde, criando e incentivando estilos de vida saudáveis. Muita da patologia do adulto pode ser identificada e orientada, sendo assim prevenida, nesta altura. É também neste período que se torna fundamental oferecer um espaço, no qual possam ser respondidas as questões e esclarecidas as dúvidas que caracterizam esta idade. A Direcção Geral de Saúde prevê para este momento a realização do segundo Exame Global de Saúde, entre os 11 e os 13 anos, sendo o primeiro efectuado entre os 5-6 anos e obrigatório para o ingresso da criança no 1º ano de escolaridade. Pelos motivos já expostos, a taxa de cobertura da população inscrita no Centro de Saúde, nesta faixa etária, é sempre inferior à desejada. Assim pretende-se com este trabalho, levar o médico até ao adolescente e avaliar as características de uma amostra de alunos da Escola Secundária de Ermesinde, pela realização do Exame Global de Saúde na própria escola e em horário integrado nas actividades curriculares. OBJECTIVOS Aumentar a percentagem de alunos entre os 11 e 13 anos, inscritos no Centro de Saúde de Ermesinde, com Exame Global de Saúde (um dos objectivos da Saúde Escolar exposto no Plano de Acção 2003 do Centro de Saúde). Avaliar e caracterizar uma amostra da população da Escola Secundária de Ermesinde quanto a: índice de massa corporal, tensão arterial, incidência de cáries dentárias e défice da acuidade visual. Foi também objectivo dos autores, identificar alterações no exame físico e orientar problemas para consultas a realizar posteriormente no Centro de Saúde após informação aos pais. Conhecer a percentagem de alunos vacinados com as vacinas extra calendário vacinal, ou seja, sujeitas a prescrição médica. Finalmente, pretendeu-se caracterizar os hábitos dos adolescentes desta faixa etária, pela formulação de algumas questões baseadas nos cuidados antecipatórios, previstos pela Direcção Geral de Saúde aquando da realização do Exame Global de Saúde. DESCRIÇÃO DO ESTUDO Realizou-se um estudo descritivo e transversal. MATERIAL E MÉTODOS Foram convidadas a participar neste trabalho algumas turmas do 7º ano de escolaridade da Escola Secundária de Ermesinde, escolhidas por conveniência de horário: turmas que estivessem na aula de Educação Física ou na Área Escola, durante o período de funciona- NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 mento do Gabinete de Saúde que era assegurado pelo Centro de Saúde de Ermesinde. Foi realizado o Exame Global de Saúde a 107 alunos de 13 anos, sendo elaborada uma folha de registo individual. Posteriormente cada consulta foi validada no sistema informático do Centro de Saúde. Após a consulta, os alunos foram convidados a responder a um questionário anónimo de resposta rápida, que pretendia conhecer hábitos que correspondiam aos cuidados antecipatórios previstos aquando da realização do Exame Global de Saúde. Para avaliação antropométrica foi utilizada uma fita métrica com escala em centímetros e uma balança com aproximação a 100g. A avaliação da acuidade visual foi efectuada utilizando uma escala decimal. A tensão arterial foi medida no membro superior direito e confirmada no membro superior esquerdo, sempre que se ofereciam dúvidas, utilizando o método oscilométrico. O cumprimento do Plano Nacional de Vacinação e as restantes vacinas efectuadas foram avaliados pela observação do Boletim de Vacinas, trazido pelos alunos. Sempre que foi identificado qualquer problema a necessitar de orientação, foi feita uma marcação de consulta no Centro de Saúde e comunicada aos pais, bem como o motivo desta, através de um impresso de que os alunos eram portadores. RESULTADOS Dos jovens avaliados, 58% eram do sexo feminino e 42% do sexo masculino. O índice de massa corporal (IMC) médio para as raparigas foi de 21,16 e para os rapazes foi de 19,88 ou seja, respectivamente P75 e P50-75 para a idade. Considerando como excesso ponderal um IMC > P85, encontraram-se nestas condições 20% dos rapazes e 20,6% das raparigas, perfazendo 20,5% do total da amostra. Como obesos consideraram-se os que ultrapassavam o P95, cumprindo este critério 6,6% dos rapazes e 7,9% das raparigas, num total de 7,5% da população estudada. A média da tensão arterial sistólica (TAS) foi semelhante para os dois sexos, situando-se no P75 para a idade (116 mmHg). A média da tensão arterial diastólica (TAD) foi de 70 mmHg para os rapazes e de 68 mmHg para as raparigas (P50-75). Foram identificados 15 alunos com TAS > P95 (14%), correspondendo provavelmente à denominada “hipertensão da bata branca”. Foi considerado défice da acuidade visual uma avaliação menor ou igual a 6/10. Para além dos alunos que usam habitualmente correcção (26%), foram identificados e referenciados 6 (6%). No exame da dentição, 33% da população observada apresentava cáries ainda não tratadas, sendo de salientar que 13% usavam qualquer tipo de prótese para correcção. Após a realização do exame objectivo, foram identificados outros problemas a necessitarem de orientação, para além dos supra mencionados, em 2 situações (1,87%) – sopro cardíaco e obesidade (IMC 33). Da análise do boletim de vacinas, apenas foi identificado 1 aluno cujo PNV não se encontrava actualizado. No que diz respeito às vacinas administradas por prescrição médica, apenas 16% tinham feito a imunização contra o meningococo C e 6,5% contra o vírus da hepatite A. A ausência de alunos com vacina anti-pneumocócica justifica-se pela faixa etária analisada e pela ausência de adolescentes pertencentes a grupos de risco nos quais a vacina estaria indicada. O inquérito aplicado posteriormente ao exame objectivo, foi baseado nos cuidados antecipatórios previstos pela Direcção Geral de Saúde neste momento de consulta. Em relação à prática de desporto, foram consideradas como afirmativas as respostas que indicavam um período semanal igual ou superior a 2 horas. Apenas 48% respondeu nestas condições. Questionados quanto aos hábitos de higiene oral, 46% afirmaram lavar os dentes 2 vezes por dia, 37% lavam 3 ou mais vezes por dia e os restantes apenas 1 vez. Às perguntas relacionadas com os afectos, 88% responderam que gostam de frequentar a escola, embora apenas 43% afirmem gostar de estudar. Dos inquiridos, apenas 6% dizem não se sentirem apoiados pelas famílias e todos consideram ter amigos com “A” grande (sendo explicado que com esta expressão, pretendia-se que nomeassem apenas os amigos com uma relação mais estreita), embora 30% indicarem ter mais de 5 amigos nessas condições. Os hábitos potencialmente nocivos foram avaliados com questões sobre o tempo diário dispendido em frente ao computador, cuja média foi de 1 hora e um quarto, e em frente à televisão, em média 2,6 horas. Finalmente a questão foi se já alguma vez tinham experimentado fumar, ao que 32% responderam afirmativamente (37% das raparigas e 24% dos rapazes). A abordagem do contacto com bebidas alcoólicas e drogas de abuso não foi possível pela escassez de tempo para responder às questões e pelo facto de os alunos estarem em grupo, embora fossem dados importantes na orientação de eventuais intervenções. DISCUSSÃO A adolescência é o período de maior ausência nos cuidados de saúde primários. Apesar de elevada morbilidade, esta é principalmente de causa externa nestas idades, e não existe ainda a preocupação com o estado de saúde individual, que motivem os jovens à realização de exames periódicos. No entanto, é essencial perceber que será esta a última oportunidade de modelar uma consciência para a saúde, promovendo estilos de vida saudáveis, muito condicionados pelas opções que se fazem nesta altura (1). É também neste período que se torna fundamental oferecer um espaço, no qual possam ser respondidas as questões e esclarecidas as dúvidas que caracterizam esta idade. O Gabinete de Saúde da Escola Secundária de Ermesinde pretende ser esse espaço e a realização de Exames Globais de Saúde num ambiente informal mas privado, pretendeu aproximar artigos originais 121 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 os jovens dos cuidados de saúde, desmistificando a personagem do médico como autoritário, disciplinador e inacessível. A obesidade infantil é consensualmente considerada uma epidemia fora de controle quer na Europa quer nos Estados Unidos(2,3,4). Calcula-se que cerca de 50 a 80% dos adolescentes obesos serão adultos obesos(3), sendo por isso muito importante avaliar esta faixa etária para poder intervir. Portugal foi considerado um dos países com maior prevalência de excesso ponderal, juntamente com a Grécia, Irlanda e Estados Unidos, num estudo que envolveu mais 10 países europeus e que avaliou adolescentes de 13 e de 15 anos(3). A nossa amostra apresenta valores de prevalência de excesso ponderal de 20% vs 12,5 % no sexo masculino e 20,6% vs 22,8% no sexo feminino. A prevalência da obesidade foi de 6,6% vs 3,5% para os rapazes e 7,9% vs 8,3% para as raparigas. Em relação a outros estudos realizados na área do Grande Porto(5,6), da nossa amostra resultou uma prevalência de excesso ponderal/obesidade de 20,5%, ligeiramente inferior (22,9% e 23,6%), predominando neste caso no sexo feminino, tanto o excesso ponderal como a obesidade. Nos estudos referidos os valores mais elevados do IMC eram para o sexo masculino, mas as diferenças são sempre discretas. Os riscos a longo prazo na saúde das crianças e adolescentes hipertensos obriga a que estas situações sejam identificadas e orientadas(7). O rastreio sistemático da hipertensão nas consultas de Saúde Infantil a partir dos 4 anos, de acordo com o plano proposto pela Direcção Geral de Saúde, permanece ainda uma lacuna na prática clínica diária. Na população que estudamos os valores tensionais correlacionaram-se com os encontrados num estudo realizado em crianças entre os 8 e os 13 anos do grande Porto(6), tendo sido apenas identificado um caso de hipertensão arterial enquadrado numa obesidade mórbida, referenciado a uma consulta específica. As alterações da acuidade visual foram encontradas em 32% dos alunos observados: 26% já orientados e a usarem 122 artigos originais próteses oculares e 6% identificados durante o exame e referenciados a consulta de Oftalmologia. Esta prevalência é difícil de valorizar pela escassez de dados disponíveis, nomeadamente em relação à população portuguesa. Quanto aos hábitos nocivos, foi encontrada uma percentagem significativa de alunos que já tinham experimentado fumar (31%), particularmente se forem tidos em consideração os dados divulgados pela OMS que revelam que 99% dos adolescentes que experimentam fumar tornam-se fumadores(8). Sabe-se ainda que quem começa a fumar na adolescência terá mais dificuldade em abandonar o cigarro no futuro, facto que parece relacionar-se com a dependência da nicotina, a que os jovens serão mais sensíveis (8,9). De referir um estudo brasileiro que concluiu serem os 13 anos a idade em que os jovens começam a fumar, em média. Em Portugal, num estudo que incluía alunos da escola Básica e Secundária, concluiuse que 21% dos adolescentes fumavam frequentemente (7% dos mais novos e 35% dos mais velhos) e que a faixa etária de início foi entre os 11 e os 16 anos(10). De acordo com os dados recentes a criança ou o adolescente americano vê em média 3 horas de televisão por dia, ou seja, 21 horas por semana(11). Em Portugal, um estudo realizado com crianças do 1º, 2º e 3º ciclos, revelou que o tempo de visionamento televisivo diário era em média de 2 horas durante a semana e 3,5 horas no fim-de-semana(12). Assim, a criança quando termina o ensino secundário passou 3 anos a ver televisão. Na nossa amostra encontramos um tempo intermédio de 2,6 horas, que poderá ainda ser considerado excessivo, se considerarmos as recomendações da Associação Americana de Pediatria que preconizam uma limitação do tempo dispendido a ver televisão a um máximo de 1-2 horas por dia(13). A realização dos Exames Globais de Saúde permitiu uma aproximação individual dos alunos aos cuidados de saúde, que possibilitou o diálogo, nomeadamente com esclarecimento de dúvidas e novas questões. A caracterização desta população permite, por sua vez, uma intervenção orientada da Saúde Escolar para a promoção de estilos de vida saudáveis. HOW ARE THE TEENAGERS OF THIRTEEN YEARS IN ERMESINDE ? ABSTRACT Objective: Adolescents are poor attendants of pediatric health care. The National Health Department recomemends a global health examination between the ages of 11 and 13 years, but this is rarely done on the primary care setting. The aim of this study was to characterize adolescents regarding their state of health and life styles. Population and methods: The medical team visited Ermesinde High School for a global health examination and characterized students regarding body mass index, blood pressure, dental caries incidence, visual acuity deficit, vaccine status. The students were also asked to fulfill a questionnaire regarding healthy lifestyles. Results: One hundred and seven children were evaluated (58% female and 42% male). Mean body mass index was 21.2 in girls and 19.9 in boys. About 20% of boys and 20.6% of girls were overweight, that is 20.5% of the total. Obesity affected 6.6% of the boys and 7.9% of the girls, (7.5% of the whole population studied). Mean systolic blood pressure was similar in both genders, at P75 for the age. On the dental examination 33% had untreated caries. As for the questions about lifestyles, 48% stated that they practiced sport regularly, 83% had good oral hygiene habits and 32% had already experienced smoking. Mean time spent at the computer was 1.25 hours and 2.6 hours in front of the television set. Comments: This study offers strong support for an intervention to increase clinician’s delivery of preventive services to adolescents in order to promote healthy life styles. Key-words: adolescence, global health examination, school health, life styles Nascer e Crescer 2007; 16(3): 120-123 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 BIBLIOGRAFIA 1. Ozer E M, Adams S H, Lustig J L, Gee S, Garber A K, Gardner L R et al. Increasing the screening and counseling of adolescents for risky health behaviors: a primary care intervention. Pediatrics, 2005; 115: 960-96 2. 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AGRADECIMENTOS: Às coordenadoras do Gabinete de Saúde da Escola Secundária de Ermesinde, pela colaboração imprescindível e disponibilidade constante. CORRESPONDÊNCIA: Sónia Lira Serviço de Pediatria Hospital Padre Américo -Vale do Sousa Lugar de Tapadinha 4560-162 Penafiel Tel. 255 714 000 artigos originais 123 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 A Tríade Clássica de uma Doença ainda Actual Catarina Sousa¹, Micaela Guardiano2, Cíntia Correia2, Carla Rego3, Fátima Ferreira4 RESUMO A doença de Kala-azar é uma patologia actualmente rara que regista, na ausência de tratamento adequado, uma elevada taxa de mortalidade. Apresenta-se um caso clínico de doença de Kala-azar numa lactente de 10 meses com a tríade clínica clássica de febre, palidez e esplenomegalia. A propósito deste caso, os autores reforçam a importância do diagnóstico de suspeição, apresentam as opções terapêuticas disponíveis e abordam aspectos epidemiológicos da doença. Palavras-chave: Kala-azar, Leishmania donovani, Leishmaníase visceral, Anfotericina B lipossómica. Nascer e Crescer 2007; 16(3): 124-127 INTRODUÇÃO A Leishmaníase visceral ou Kalaazar é uma infecção do sistema reticulohistiocitário provocada pela Leishmania donovani, parasita intra-celular obrigatório cujo reservatório habitual é o cão. A infecção é transmitida ao homem através da picada do Phlebotomus ou mosca da areia, sendo o grupo etário mais atingido o de um aos três anos(1,2). Em Portugal considera-se a existência de três focos endémicos: a região do Alto Douro, a região metropolitana de Lisboa e o Algarve.(²) No entanto, segundo os dados disponíveis da Direcção Geral de Saúde relativos ao período entre 2000 e 2004 inclusivé, existe um claro predo__________ ¹ Interna Complementar de Pediatria – Serviço de Pediatria 2 Assistente Hospitalar Eventual – Serviço de Pediatria 3 Assistente Hospitalar Graduada – Serviço de Pediatria 4 Assistente Hospitalar Graduada - Serviço de Hematologia Clínica Hospital S. João 124 casos clínicos mínio da doença na zona de Lisboa e Vale do Tejo, com um total de 64% dos casos, comparativamente com 15% na zona Norte e, ao contrário do que seria de esperar, nenhum caso declarado na região do Algarve. Os restantes casos correspondem aos 10 casos (17%) declarados na zona Centro e aos 6 casos (10%) no Alentejo (Quadro I)(3). A infecção é assintomática ou subclínica em muitos doentes e quando há tradução clínica pode apresentar-se de forma aguda, subaguda ou crónica. A tríade clássica de apresentação com febre, palidez e esplenomegalia surge semanas a meses após a picada e estão mesmo descritos casos raros de anos de incubação(4). O espectro clínico é no entanto amplo, desde sintomas constitucionais inespecíficos até febre intermitente, hepatomegalia, esplenomegalia, icterícia, edemas, associado a alterações analí- Quadro I - Dados da Direcção Geral de Saúde relativamente aos casos declarados de Leismaníase de 2000 a 2004 (adaptado de www.dgsaúde.pt) REGIÕES E SUB-REGIÕES NORTE Braga Bragança Porto Viana do Castelo Vila Real CENTRO Aveiro Castelo Branco Coimbra Guarda Leiria Viseu LISBOA E VALE DO TEJO Lisboa Santarém Setúbal ALENTEJO Beja Évora Portalegre ALGARVE/Faro RA AÇORES RA MADEIRA PORTUGAL 2000 1 1 3 2 1 3 1 2 7 2001 2 2 2 1 1 9 7 2 13 2002 2 1 1 10 7 3 1 1 13 2003 2 1 1 2 1 1 5 2 2 1 9 2004 2 1 1 3 1 1 1 11 6 5 5 1 1 3 21 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 ticas compatíveis com citólise hepática, hipoalbuminemia, hipergamaglobulinemia (sobretudo elevação da Imunoglobulina G devido à activação das células B), pancitopenia (anemia, trombocitopenia e leucopenia com neutropenia, marcada eosinopenia e linfocitose e monocitose relativas) e infecções bacterianas secundárias que são frequentemente a causa de morte. A evolução é fatal em mais de 90% dos doentes sem tratamento(4). CASO CLÍNICO MACF, lactente do sexo feminino, dez meses de idade, etnia cigana, residência na cidade de Mirandela, Distrito de Bragança, sem seguimento médico regular. Aparentemente sem antecedentes patológicos de relevo embora fosse muito irregular o seguimento médico anterior e escassa a informação registada no Boletim Individual de Saúde. Aos nove meses iniciou deterioração progressiva do estado geral, emagrecimento significativo (não quantificado com precisão por desconhecimento do peso anterior) e episódios febris de repetição interpretados num contexto de prováveis infecções das vias aéreas superiores. Na admissão no Serviço de Urgência apresentava aspecto emagrecido [Peso-7430g (percentil 5-10), Comprimento-71cm (percentil 25-50), Perímetro Cefálico-42,5cm (percentil 25-50)], pali- dez de pele e mucosas e hepato-esplenomegalia (fígado palpável a cinco centímetros do cruzamento do rebordo costal direito com a linha medioclavicular e baço palpável a quatro centímetros do rebordo costal esquerdo). O estudo analítico revelava pancitopenia, com maior atingimento das séries rubra e plaquetária (Quadro II) e o esfre- Seta grande – célula do sistema monocítico-macrofágico Seta pequena – inclusão citoplasmática em célula do sistema monocítico-macrofágico compatível com infestação por Leishmania donovani Figura 1 - Imagem da lâmina do aspirado de medula óssea (microscopia de luz). gaço sanguíneo evidenciava alterações morfológicas, como anisopoiquilocitose com hipocromia predominante, alguns linfócitos com hiperbasofilia citoplasmática, anisocitose plaquetária e alguns megatrombócitos. Não foram evidenciadas alterações analíticas compatíveis com citólise hepática. QUADRO II - Estudo analítico – evolução da admissão à data da alta hospitalar D1 de Internamento Hb(g/dL) VG(%) VGM(fL) GR(x109) GB(x1012) Neut(%) Linf(%) Mon (%) Eos (%) Plaq(x109) PCR(mg/L) 7.00 24.30 65.00 3.74 4.70 18.0 75.0 5.70 0.00 35.00 198.00 D2 de Tratamento 7.60 23.30 58.00 3.99 5.20 29.70 61.80 6.00 0.10 56.00 106.50 Foi realizada ecografia abdominal que evidenciava hepato-esplenomegalia homogénea. Foi efectuado mielograma (Figura 1) que revelava aspirado e densidade normais, adequada representação das séries megacariocítica e mielóide, hipoplasia relativa da série eritróide e células do sistema monocítico-macrofágico com D7 de Tratamento 8.70 27.90 69.60 4.01 6.26 28.40 65.00 6.10 0.20 27.00 63.00 inclusões citoplasmáticas compatíveis com infestação por Leishmania donovani, o que permitiu o diagnóstico de doença de Kala-azar. A imunofenotipagem do sangue periférico foi normal (Quadro III). De referir que a serologia para o vírus de imunodeficiência humana adquiriQuadro III - Imunofenotipagem do sangue periférico D14 de Tratamento Imunofenotipagem Linfócitos (%) 9.40 29.70 77.50 4.91 13.13 34.90 59.10 5.60 0.10 199.00 5.40 CD3 CD3 – CD8 + CD3 – CD56 + CD3 + CD3 + CD4 + CD3 + CD8 + CD3 + CD 56 + CD4 + CD8 + Relação CD4/CD8 CD19 + CD56 + 0.50 6.20 69.40 39.60 23.20 0.60 39.70 23.70 1.70 20.90 6.80 D-dia; Eos-eosinófilos; GB-glóbulos brancos; GR-glóbulos rubros; Hb-hemoglobina; Linf-linfócitos; Mon- monócitos; Neut-neutrófilos; PCR-proteína C reactiva; Plaq-plaquetas; VG-volume globular; VGM-volume globular médio; CD- cluster of differentiation - grupo de diferenciação casos clínicos 125 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 da foi negativa e entre as serologias para o grupo TORCH foi positiva a do vírus herpes 1 (IgM) e duvidosa a do vírus herpes 2. A hemocultura revelou-se estéril. Foi iniciada terapêutica com anfotericina B lipossómica, na dose de 20 mg/ Kg/dose total, nos dias um a cinco e dia dez após o diagnóstico. A resposta clínica e analítica foi favorável com apirexia ao quinto dia de terapêutica, diminuição progressiva das organomegalias até à resolução após o tratamento, e normalização das linhagens celulares (Quadro II). Seis meses após conclusão do tratamento, a lactente mantinha-se assintomática e com exame físico normal. DISCUSSÃO O diagnóstico de suspeição de doença de Kala-azar é de grande importância sobretudo em lactentes, nos quais a clínica sugestiva de febre, palidez e esplenomegalia pode não ser evidente. O diagnóstico definitivo é possível pela demonstração do parasita nos tecidos ou em exames culturais de material de biópsia ou aspirado. A aspiração de material esplénico tem maior sensibilidade (98%) mas raramente é feita devido ao risco de complicações hemorrágicas. Geralmente opta-se pela realização de aspirado de outros órgãos, nomeadamente a medula óssea com uma sensibilidade de aproximadamente 90%, motivo pelo que foi efectuado na nossa doente.(4) No entanto, se estes forem negativos mas permanecer um elevado índice de suspeição, devem ser realizados testes serológicos, que embora não permitam a mesma rapidez de diagnóstico, apresentam sensibilidade e especificidade próximos dos 100%. No que respeita às serologias da doente apresentada, realçamos que a positividade para o vírus herpes foi interpretada como reacção cruzada e, por isso, desvalorizada, atendendo ao quadro clínico não compatível. A identificação da Leishmania donovani por polymerase chain reaction a partir de amostras de sangue periférico é também possível e constitui um bom método de monitorização de recaídas em doentes imunocomprometidos(5). Estão ainda descritos outros métodos de diag- 126 casos clínicos nóstico como a pesquisa de antigénios na urina, com 96% de sensibilidade e 100% de especificidade, que permite ultrapassar o inconveniente do estudo serológico de não determinar a existência de doença activa, e o teste imunocromatográfico, que consiste num teste serodiagnóstico rápido em que fitas de nitrocelulose impregnadas de antigénios de Leishmania permitem uma sensibilidade de diagnóstico de 100% e especificidade de 98%. São, no entanto, métodos ainda em investigação(5, 6). O diagnóstico diferencial coloca-se com outras situações infecciosas como a malária, a febre tifóide, a tuberculose miliar, a schistosomíase, a brucelose e a mononucleose infecciosa entre outras. No caso descrito a identificação da Leishmania donovani no aspirado de medula óssea permitiu excluir, à partida, estes diagnósticos. As doenças do foro neoplásico - leucemia, linfoma – obrigatoriamente incluídas nos diagnósticos diferenciais, foram também excluídas após a obtenção do resultado do mielograma e da imunofenotipagem do sangue periférico. Uma das opções terapêuticas no tratamento da doença de Kala-azar é o estibiogluconato de sódio ou o antimoniato de meglumina – antimoniais pentavalentes com eficácia semelhante. O tratamento deve ser efectuado durante 20-40 dias e pode eventualmente ser necessária a sua repetição. Geralmente ocorre resposta na primeira semana, embora sejam necessárias semanas a meses, após completar a terapêutica, para ocorrer regressão da esplenomegalia e normalização das citopenias. A taxa de cura é de 80-100%. Estas opções terapêuticas têm, além do tempo prolongado de tratamento, o inconveniente de recaídas e resistências comuns, sobretudo nos doentes com imunidade celular comprometida. De referir ainda os frequentes efeitos laterais: fadiga, artralgias/mialgias (50%), desconforto abdominal (30%), elevação das transamínases (30-80%), elevação da lípase e da amílase (aproximadamente 100%), pancitopenia (10-30%), alterações electrocardiográficas (30%) e morte súbita por toxicidade cardíaca(5, 7). Outra das opções terapêuticas é a anfotericina B, muito útil no caso de re- caída, resistência ou intolerância aos antimoniais pentavalentes. O recurso às formulações lipídicas permite maior concentração no sistema reticulo-endotelial e menor nefrotoxicidade. Alguns efeitos laterais descritos incluem aqueles relacionados com a infusão (febre, arrepios, dores ósseas, tromboflebite) e anemia. A eficácia terapêutica é de 90-100%(8). O efeito terapêutico explica-se pelo facto de, tal como os fungos, a Leishmania conter ergosterol nas suas células, e não colesterol, contra o qual a anfotericina actua(5,9). Estão descritos outros fármacos que incluem a paromicina, com sucesso terapêutico que não é superior aos anteriores, o interferão gama recombinante, com interesse em conjunto com os antimoniais pentavalentes em caso de refractariedade ao tratamento, a miltefosina e a sitamaquina para administração por via oral, ainda em fase de ensaio clínico e a pentamidina, menos atractiva, uma vez que são necessárias altas doses e tratamento prolongado, além da toxicidade e resitências que exibe(5, 8). A opção terapêutica no caso clínico descrito da anfotericina B lipossómica justificou-se pela elevada eficácia descrita, curto tempo de tratamento, baixa taxa de recaídas e de efeitos laterais. A dose efectuada foi a de 3 mg/Kg durante cinco dias e ao décimo dia, esquema que tem apresentado resposta semelhante ao tratamento durante dez dias consecutivos(7). Nos doentes imunocomprometidos a dose diária é idêntica mas deve ser prolongada por mais quatro dias (dias 17, 24, 31 e 38)(9). Ssyriopoulou V. e colaboradores descreveram idêntica eficácia no tratamento durante 2 dias na dose de 10 mg/kg/dia, em crianças com idade superior a 14 anos(10). Por outro lado Sundar S e colegas constataram também eficácia no tratamento com 5 mg/Kg/dose total, numa infusão única, num estudo com 91 adultos e crianças(11). O critério de cura é a normalização clínica e a negativação do exame parasitológico. A monitorização deve ser clínica e considera-se haver sucesso terapêutico quando não existem recaídas no espaço de seis meses(5, 8). Os factores de risco para o desenvolvimento da doença incluem malnutri- NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 ção, uso de drogas imunossupressoras e, especialmente, co-infecção pelo vírus de imunodeficiência humana adquirida, pelo que esta foi investigada na nossa doente(5). Nas áreas endémicas são fundamentais as medidas preventivas como o uso de repelentes, insecticidas e roupas que cubram uma grande superfície corporal, a evicção de saídas nocturnas, altura em que o insecto transmite a doença por picada e a eliminação dos reservatórios. Está já em investigação em animais uma vacina para a leishmaníase embora ainda não se encontre disponível(5). Os autores alertam para a importância do diagnóstico de suspeição desta patologia, sobretudo numa zona não endémica como a nossa. É importante referir que o número de internamentos por doença de Kala-azar tem diminuído no nosso Serviço de Pediatria, com registo de 15 internamentos por este diagnóstico no período compreendido entre 1994 e 1999, e apenas 6 nos seguintes anos, de 2000 a 2005 inclusivé, o que não significa que o número de casos tenha diminuído na zona Norte do País. Pelo contrário, segundo dados da Direcção Geral de Saúde(3), a prevalência da doença nesta região tem-se mantido constante, o que se poderá eventualmente explicar por internamentos noutras Unidades Hospitalares, nomeadamente em Hospitais periféricos. De referir a importância da declaração da doença de Kala-azar de forma a que possamos conhecer a realidade epidemiológica do nosso País. De facto, se considerarmos a possibilidade de que muitos casos possam não estar a ser declarados, hipótese a considerar no caso da Região Algarvia, poderemos conhecer apenas a “ponta do iceberg” desta entidade clínica. Curioso é notar o número de casos declarados na Zona Centro do País, no período de 2000 a 2004. Estará a alterar-se a epidemiologia desta doença? CLASSICAL CLINICAL FINDINGS OF STILL PRESENT DISEASE ABSTRACT Kala-azar is nowadays an uncommon disease that presents a high mortality rate in the absence of adequate treatment. The authors present the case of a ten months infant with the common clinical findings of fever, pallor and splenomegaly. The importance of the diagnosis suspicion is reinforced and the treatment choices and epidemiologic aspects of the disease are discussed. Key-words: Kala-azar, Leishmania donovani, Visceral Leishmaniasis, lipossomal Anphotericin B. Nascer e Crescer 2007; 16(3): 124-127 BIBLIOGRAFIA 1. Oliveira A, Noites P, Guerra A. KalaAzar – revisão casuística dos últimos 10 anos. Nascer e Crescer 1997; 6: 103-105. 2. Gonçalves A, Silva H, Antunes H. Kala-Azar sem febre não é Kala-Azar. Nascer e Crescer 2000; 9 (4): 252253. 3. www.dgsaude.pt. 4. Herwaldt B. Leishmaniasis. Lancet 1999; 354:1191-1199. 5. Guerin P, Olliaro P, Sundar S, Boelaert M, Croft S, Desjeux P e col. Visceral leishmaniasis: current status of control, diagnosis, and treatment, and a proposed research and developement agenda. Lancet Infectious diseases 2002; 2: 494-501. 6. 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Os autores descrevem o caso clínico de um recém-nascido, fruto de uma gestação de 40 semanas, complicada por uma gastroenterite materna 24 horas antes do parto, que apresentou fezes mucosanguinolentas nas 1ªs horas de vida. Na coprocultura da mãe e do RN foi isolada uma Salmonella enteritidis. Os autores chamam a atenção para a necessidade de um diagnóstico precoce a fim de evitar as complicações bacteriémicas e a contaminação de outros recém nascidos na enfermaria Palavras-chave: Gastroenterite; Salmonella; Recém-nascido Nascer e Crescer 2007; 16(3): 128-129 INTRODUÇÃO A Salmonella é um bacilo Gramnegativo, da família Enterobacteriaceae. Pode manifestar-se como bacteriémia, ou infecção focal, embora a gastroenterite seja a mais importante causa de doença associada a salmonella não typhi(1). Estima-se que seja responsável por cerca de 80% das intoxicações alimentares, constituindo um verdadeiro problema de saúde pública. __________ ¹ Serviço de Neonatalogia Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia 128 casos clínicos A infecção pode ocorrer por contágio inter-humano (mãos contaminadas) ou ser veiculada por água e alimentos contaminados. É tipicamente transmitida através de mãos contaminadas As infecções perinatais precoces adquirem-se antes ou durante o parto por transmissão vertical. Estas têm a maioria das vezes graves consequências para o recém-nascido, podendo cursar com sépsis e/ou meningite, sendo por isso importante o rápido reconhecimento e tratamento precoce. CASO CLÍNICO Recém-nascido do sexo masculino, fruto de uma gestação vigiada, de termo, complicada por febre e diarreia 24 horas antes do parto. O parto foi eutócico, tendo a rotura de membranas ocorrido 5 horas antes do nascimento. O recém-nascido teve choro imediato e somatometria adequada. Foi transferido às 18 horas de vida para a Unidade de Cuidados Intensivos por apresentar gemido e dejecções líquidas muco-sanguinolentas. Apresentava-se irritado, subfebril, com o abdómen distendido e doloroso à palpação. Dos exames laboratoriais, salientou-se leucopenia 4700 x10³/ul e uma relação neutrófilos não segmentados / neutrófilos totais significativamente aumentada. A proteína C reactiva foi negativa.; a gasimetria e o ionograma também não mostraram alterações ; A radiografia abdominal abdominal simples era normal, bem como o estudo citoquimico do líquido céfaloraquidiano (LCR). Foi instituída fluidoterapia e antibioticoterapia com ampicilina e gentamicina. A diarreia resolveu ao 3º dia de vida, não se tendo verificado qualquer complicação. A hemocultura, urocultura e cultura de LCR foram estéreis. Na coprocultura foi isolada uma Salmonella enteritidis. A análise cultural às fezes da mãe revelou também a presença de Salmonella enteritidis. O estudo virulógico de fezes foi negativo. Efectuou ainda uma cintigrafia óssea, que foi normal. Cumpriu 10 dias de antibioticoterapia. As coproculturas de controlo, aquando da suspensão de antibioterapia, e após um e 6 meses, foram negativas. DISCUSSÃO As infecções neonatais por Salmonella ocorrem geralmente durante ou após a primeira semana de vida(2,3). No presente caso, o quadro clínico ocorreu no primeiro dia de vida, com dejecções muco-sanguinolentas, o que poderá estar relacionado com inóculo maciço e/ou com grande virulência do agente. A ruptura prolongada de membranas, que também tem sido implicada no aparecimento de manifestações precoces, não se verificou. É consensual que todas as gestantes com diarreia devem ser cuidadosamente avaliadas e tratadas, a fim de evitar a bacteriémia, aborto séptico e infecções neonatais. Perante uma gestante com quadro de gastroenterite no final da gravidez é mandatória a realização de coprocultura à mãe e ao recém-nascido, devido ao risco de transmissão vertical, como verificado no presente caso. Nos recém-nascidos é também importante o diagnóstico precoce para prevenir complicações bacteriémicas, e contaminação de outros recém-nascidos(4), mães, funcionários da instituição bem NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 como aparelhos e instrumentos da sala de parto e enfermaria. O seguimento destes recém-nascidos ao mês e 6 meses após a alta é fundamental na detecção do estado de portador, o qual pode ocorrer em 50% de recém-nascidos infectados(5). both the mother and the newborn. The prompt diagnosis is important to prevent bacteraemia and eventual contamination of other newborns host in the nursery. Key-words: Gastroenteritis; Salmonella; Newborn Nascer e Crescer 2007; 16(3): 128-129 SALMONELLA GASTROENTERITIS IN THE NEWBORN BIBLIOGRAFIA ABSTRACT Salmonella infection is a common worldwide agent of acute gastroenteritis. The frequence of occurrence depends mainly on geographic localization, sanitary conditions, age of the child and his immunity stage. Salmonella is a frequent agent in infancy. In the newborn, the infection starts usually after the first week of life. The authors describe the case of a term newborn whose mother was affected by gastroenteritis 24 hours before delivery, who developed bloody and mucous stools in the first hours of life. The stool culture revealed Salmonella enteritidis in 1. Campderá JAG, Fernandez RR, Sachez MIG. Protocolos de Infectologia 2002. Gastroenteritis por Salmonella, Shigella Y Campylobacter. Disponivel em http://www.aeped.es/protocolos/ infectologia.pdf 2. Chhabra RS, Glaser JH. 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The objective of this intima-media thickness by B-mode ultra- lipoprotein cholesterol increased signifi- study was to analyze the changes of inti- sound with a 14-MHz linear transducer. cantly. In the 32 obese children without ma-media thickness in obese children with Substantial weight loss was defined by substantial weight loss, there were no sig- weight loss. a reduction of overweight of at least 0.5 nificant changes apart from an increase of standard division scores in BMI. insulin and insulin index. Methods: We analyzed the changes of intima-media thickness and, as Results: Obese children demons- Conclusions: Because obese chil- markers of cardiovascular risk factor pro- trated a significantly thicker intima-media dren demonstrated a thicker intima-media, file, systolic and diastolic blood pressu- compared with the control group. Further- vascular changes seemed to occur already re, triglycerides, high-density lipoprotein more, blood pressure, triglycerides, insu- in childhood obesity. Paralleling the impro- cholesterol, glucose, insulin, and insulin lin, and insulin resistance index were signi- vement of the cardiovascular risk factor resistance index (homeostasis model ficantly higher in obese children, whereas profile, intima-media thickness decreased analysis) in 56 prepubertal obese chil- high-density lipoprotein cholesterol was in obese children with substantial weight dren (median: 9 years old) before and significantly lower. In the 24 obese children loss, suggesting the reversibility of early after a 1-year outpatient intervention with substantial weight loss, intima-media atherosclerotic changes. COMENTÁRIOS Assistimos nos dias de hoje a uma pandemia de obesidade em crianças e adultos, em que Portugal também está incluído. Há mais de um bilião de pessoas obesas e 22 milhões de crianças de idade inferior a 5 anos têm excesso de peso, IMC (Índice de Massa Corporal) > ao P 85 ou obesidade, IMC> ao P95. Nos últimos 30 anos triplicou o número de crianças com excesso de peso. Adultos obesos vivem menos 5 a 20 anos, mas têm sucessores garantidos, pois mais de dois terços de crianças obesas virão a ser adultos obesos E assim neste século estamos em risco de se perder o aumento da longevidade alcançado no século passado. Os custos da obesidade infantil são enormes: 2,5 biliões anuais de £ no Reino Unido e $127 milhões nos Estados Unidos(1,2,3,4,5). As consequências da obesidade nas idades pediátricas são muitas. Ve- 130 artigo recomendado jamos algumas. Respiratórias: ressonar, apneias do sono e asma; Ortopédicas: deslizamento da cabeça do fémur e doença de Blount; Gastrointestinais: esteatose hepática e doenças vesiculares; Cardiovasculares: dislipidémia, hipertensão arterial e ateroesclerose; Neurológicas: pseudo tumor cerebral; Endocrinológicas: resistência à insulina, hiperinsulinismo, alteração da tolerância à glicose, diabetes tipo 1 e 2, síndrome do ovário poliquístico e irregularidades menstruias; Psico/emocionais: depressão, isolamento e perturbações alimentares; Outras: inflamação crónica(6,7,8). De todas as complicações, as mais importantes são as cardiovasculares e as endocrinológicas, que reunidas constituem a síndroma metabólica, definida no adulto pela existência de 3 dos 5 critérios seguintes, obesidade troncular (perímetro abdominal > a 102 cm no homem e a 88 na mulher), triglicerídeos > 150 mg/dl, HDL colesterol < a 40mg/dl no homem e < a 50 na mulher, hipertensão arterial (≥ 130/85 mm Hg) e glicemia em jejum ≥ 110mg/dl. Os critérios de diagnóstico da Organização Mundial da Saúde são ligeiramente diferentes e aplicáveis em pediatria: disglicemia (diabetes tipo 2, alteração da glicemia em jejum ou alteração do teste de tolerância à glucose) e mais dois critérios seguintes dos seguintes, obesidade, dislipidémia, hipertensão e microalbuminúria(9). Registe – se que se recomendou recentemente que o valor máximo da glicemia em jejum seja de 100mg/dl.(10). A síndroma metabólica tem importância epidemiológica. Nos Estados Unidos atinge 4 % de todos os adolescentes e 30% dos que têm peso a mais(11). Há outros factores, que não a obesidade, que podem contribuir, independentemente uns dos outros, para o aparecimento NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 desta síndroma, como maior quantidade de massa gorda corporal total e no tronco, menor aptidão física, menor actividade física intensa, maior aporte energético ao longo dos anos e menor consumo de bebidas alcoólicas(12). Também as crianças com valores normais da tensão arterial sistólica, mas superiores ao percentil 50, tendo em conta a idade e o sexo, têm maior risco de virem a desenvolver, quando adultos, a síndroma metabólica com ou sem hipertensão arterial(13). A intervenção precoce em cada um destes factores poderá contribuir para prevenir a síndroma. Sessenta a 80 % de crianças obesas virão a ser adultos obesos(8, 14, 15) e à morbilidade que têm tido, juntar-se-á a inerente à idade adulta, como doença coronária, insuficiência cardíaca, osteoarterite dos joelhos, hiperuricemia e gota, complicações da gravidez, como eclâmpsia e malformações fetais, neoplasias da mama e próstata, infertilidade e riscos anestésicos acrescidos(16). Temos então fortes razões para estarmos preocupados com a obesidade. O seu tratamento assenta em três pilares: modificações alimentares, aumento da actividade física e alterações comportamentais da criança, da família e da sociedade. Deve ser longo (a obesidade é uma doença crónica) e multidisciplinar. Tal como nos adultos, não é fácil comer menos e diferente, iniciar e manter uma actividade física moderada/intensa e modificar o estilo de vida. Os medicamentos que reduzem o apetite ou levam a perda de peso como o orlistat, sibutramina, metformina e tupiramato não estão recomendados em crianças, bem como as terapêuticas cirúrgicas(6,7, 8, 9). Tratar a obesidade infantil não é fácil, e por isso os resultados não são animadores. O tratamento adequado da obesidade do adulto também não é fácil e por isso os resultados também não são animadores e daqui a proliferação de propostas terapêuticas de duvidosa qualidade, ainda que com resultados aparentemente bons, rápidos e assim atractivos. O pior será quando aparecer a factura… Controlar a obesidade infantil, emagrecendo quem precisa ou bastando muitas vezes manter o peso, é uma ta- refa difícil, mas não impossível, e é pelas razões que já vimos, urgente. Como sempre, o mais importante é prevenir. Mas como? Não basta dizer que se deve em comer adequadamente, praticar exercício regularmente e mudar o estilo de vida. Estas medidas ambientais são importantes, mas não podemos subestimar o factor mais poderoso, a genética, que é responsável por 40 a 70% da massa gorda que adquirimos. Os genes da obesidade ofereciam vantagem biológica nos tempos remotos. Quem podia viver com pouca energia e ainda armazenar nos períodos de maior abundância alimentar, sobrevivia aos períodos de fome. Os que não tinham esta capacidade iam morrendo. É a teoria do genótipo económico, frugal (thrifty genotype)(9). Como somos os sobreviventes dos mais capazes, como agora não há fome e a comida ainda é mais saborosa e energética (gordura) e como não há “necessidade” (nem facilidade) de praticar exercício, os nossos genes tem a sua tarefa bem facilitada e armazenam, armazenam…Mais recentemente desenvolveu-se o conceito do “thrifty phenotype”. Tem a ver com a má nutrição fetal. Havendo pouca energia, é preciso poupar para assegurar a energia ao grande utilizador, o cérebro, e então nada melhor que tornar os outros tecidos e órgãos resistentes à insulina, o começo da síndroma metabólica …(17). Quais os factores de risco de obesidade infantil, para a podermos prevenir? Alguns estão identificados: obesidade dos pais, elevado peso ao nascer, demasiado aumento de peso no primeiro ano de vida, elevado índice de massa corporal pelos 3 / 4 anos, passar mais de 8 horas por semana a ver televisão e dormir pouco (<10.5 h) pelos 3 anos(18). O trabalho de Cristina Padez e colaboradores mostrou que são factores de risco ver televisão, obesidade paterna e materna, peso ao nascer e redução do sono e factores protectores a educação dos pais e número de irmãos(19). Uma hipótese curiosa sobre o risco de obesidade será o mamar a pedido. Diz-se que actualmente as mães são aconselhadas a esta prática e então há crianças amamentadas 15 vezes por dia. Ora muitas destas refeições são lanches e então estaremos a habi- tuar as crianças a maus hábitos alimentares, a habitua-las a querer continuar a lanchar frequentemente, o que favorece a obesidade(20). Deveremos recomendar horários, com regra? Um caminho interessante de prevenção da obesidade pode ser o sono. Dormir pouco ou mal favorece a obesidade infantil, como já vimos. Adultos que dormem pouco também podem ser mais obesos, diabéticos e portadores da síndrome metabólica(21, 22, 23,24). A razão está na desregulação endócrina da privação do sono, traduzida pela diminuição dos níveis de leptina, aumento dos da grelina e o consequente aumento do apetite e diminuição da saciedade. O mecanismo da desregulação induzido pelo sono parece estar relacionado com o desequilíbrio do sistema nervoso vegetativo induzido pelas alterações do sono(25). A falta de sono parece então completar a receita da obesidade: Tome-se um indivíduo portador de um genótipo frugal e reduza-se-lhe o sono; espere aumento de apetite, redução da saciedade, mais oportunidades para comer e verá o aporte energético a aumentar; conte com menor actividade física devido ao cansaço; terá um fenótipo com um “óptimo” índice de massa corporal e uma segura síndroma metabólica (26,27) . A relação obesidade e ateroesclerose está bem demonstrada no artigo que escolhemos para comentar. O trabalho vem confirmar outros estudos na mesma linha(28). De novo e encorajador, a reversibilidade das primeiras lesões conseguidas com o controle da obesidade. Tojal Monteiro1 Nascer e Crescer 2007; 16(3): 130-132 BIBLIOGRAFIA 1. Ferraz C, Oliveira G, Soares S, Marques E, Costa M, Neto T. Perfil lipídico, prevalência de obesidade e hábitos alimentares de uma população de adolescentes. Nascer e crescer 2006; 15(2): 71-76. __________ 1 Professor de Pediatria do ICBAS/HGSA artigo recomendado 131 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 2. Murtagh J, Dixey R, Rudolf M. A qualitative investigation into the levers and barriers to weight loss in children: opinions of obese children. Arch Dis Chil 2006; 91:920-923. 3. Kimm SY, Obarzanek E. Childhood obesity: a new pandemic of the new millennium. Pediatrics 2002; 110:1003-1007. 4. Wang G, Dietz WH. Economic burden of obesity in youths aged 6 to 17 years: 1979-1999. Pediatrics 2002; 109 e81. 5. Ogden CL, Flegal KM, Carrol MD, Johnson CL. Prevalence and trends in overweight among U.S. children and adolescences, 1999-2000. JAMA 2002; 288:1728-1732. 6. Schneider MB, Brill SR. Obesity in children and adolescents. Pediatrics in Review 2005; 25:115-161. 7. Rudolf MCJ. The obese child. Arch Dis Child Educ Prat Ed 2004; 89: ep57-ep62. 8. Reilly JJ, Wilson D. ABC of obesity. Childhood obesity. BMJ 2006; 333:1207-1210. 9. Miller J, Rosenbloom A, Silverstein J. Childhood obesity. J Clin Endocrinol Metab 2004; 89:4211-4218. 10. Kahn R. Follow-up report on the diagnosis of diabetes mellitus: the Expert Committee on the Diagnosis and Classification of Diabetes Mellitus. Diabetes care 2003; 26:3160-3167. 11. Cook S, Weitzman M, Auinger P, Nguyen M, Dietz WH. Prevalence of a metabolic syndrome phenotype in adolescents: finding from the third National Health and Nutrition Examination Survey, 1988-1994. Arch Pediatr Adolesc Med 2003; 157:821827. 132 artigo recomendado 12. Ferreira I, Twisk JWR, van Mechelen W, Kemper H CG, Stehouwer CDA. Development of fatness, fitness, and lifestyle from adolescence to age of 36 years. Determinants of the metabolic syndrome in young adults: the Amsterdam growth and heath longitudinal study. Arch Inter Med. 2005; 165:42-48. 13. Sun SS, Grave GD, Siervogel RM, Pickoff AA, Arslanian S, Daniels SR. Systolic blood pressure in childhood predicts hypertension and metabolic syndrome later in life. Pediatrics 2007; 119:237-246. 14. Mossberg HO. 40 year follow up of overweight children. Lancet 1989; 2:491-493. 15. Belay B, Belamarich P, Racine AD. Pediatric precursors of adult atherosclerosis. Pediatrics in Review 2004; 25:4-13. 16. Haslan D, Sattar N, Lean M. ABC of obesity. Obesity-time to wake up. BMJ 2006; 333:640-642. 17. Barker DPJ. The developmental origins of chronic adult disease. Acta Paeddiatr 2004; Suppl 446:26-33. 18. Reilly JJ, Armstrong J, Dorosty A R, Emmett PM, Ness A, Rogers I et al. Early life risk factors for obesity in childhood: cohort study. BMJ 2005; 330:1357-1359. 19. Padez C, Mourão I, Moreira P, Rosado V. Prevalence and risk factors for overweight and obesity in Portuguese children. Acta Paediatr 2005; 94:1550-1557. 20. Erlanson-Albertsson C, Zetterstrom R. The global obesity epidemic: snacking and obesity may start with free meals during infant feeding. Acta Paediatr 2005, 94:1523-1531. 21. Vorona R D, Winn M, Babineau T, Eng BP, Feldman HR, Ware C. Overweight and obese patients in a primary care population report less sleep than patients with a normal body mass index. Arch Intern Med 2005; 165:25-30. 22. Gottileb Dj, Punjabi NM, Newman A, Resnick H, Redline S, Baldwin CM, Nieto FJ. Association of sleep time with diabetes mellitus and impaired glucose tolerance. Arch Intern Med 2005; 165:863-868. 23. Kohatsu N, Tsai R, Young T, VanGilder R, Burmeister LF, Stronquist AM, Merchant JM. Sleep duration and body mass index in rural population. Arch Inter Med. 2006; 166:1701-1705. 24. Druce M, Bloom SR. The regulation of appetite. Arch Dis Child 2006; 91:183187. 25. Spiegel K, Leproult R, Cauter EV. Impact of sleep debt on metabolic and endocrine function. The Lancet 1999; 354:1435-1439. 26. Bas J, Turek FW. Sleepless in America. A pathway to obesity and the metabolic syndrome? Arch Intern Med 2005; 165:13-16. 27. Taheri S. Sleep and obesity. The link between short sleep duration and obesity: we should recommend more sleep to prevent obesity. Arch Dis Chil 2006; 91:881-884. 28. Meyer AM, Kundt G, Streiner M, Schuff-Werner P, Keinast W. Impaired floow-mediated vasodilatation, carotid artery intima-media thickening, and elevated endothelial plasma markers in obese children: the impact of cardiovascular risk factors. Pediatrics 2006; 117:1560-1567. NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Are sibling relationships protective? A longitudinal study Krista Gass, Jennifer Jenkins, Judy Dunn J Child Psychol Psychiatry 2007; 48:167-175 Background: Although the protective effects of familial and parental support have been studied extensively in the child psychopathology literature, few studies have explored the protective quality of positive sibling relationships. Methods: A two-wave longitudinal design was used to examine the protective effect of positive sibling relationships COMENTÁRIOS As relações pais-filhos, nomeadamente as relações precoces entre a mãe e o bebé, têm sido largamente estudadas, conhecendo-se bem a importância da vinculação, e os efeitos adversos no desenvolvimento psicológico na criança, quando as mesmas não são de boa qualidade. Menos investigadas têm sido as relações entre irmãos. O presente estudo vem clarificar um aspecto potencialmente útil: o relacionamento positivo entre irmãos pode ser um factor de protecção, quando as famílias experimentam níveis elevados de stress. Desde os trabalhos de Bowlby, que é reconhecida aos pais a capacidade de proporcionar segurança e conforto quando as crianças sentem medo ou mal-estar. Também se sabe que os acontecimentos de vida geradores de stress (life events), podem ser um factor de risco para o desenvolvimento de perturbações emocionais futuras nas crianças. No entanto, sabe-se que certas crianças são resilientes, e daí existir um grande interesse em conhecer-se os factores que podem proporcionar um desenvolvimento saudável, mesmo que em condições adversas. Sabe-se já que certos factores on child adjustment for children experiencing stressful life events. Mothers reported on stressful life events and child adjustment. Older siblings assessed the quality of relationship between themselves and target children. Results: Sibling affection moderated the relationship between stressful life events and internalizing symptomatology but not the relationship between têm um papel protector: grande suporte familiar, relações pais-filhos positivas e disciplina parental consistente. Aos irmãos é reconhecido um papel importante na socialização, através das interacções e brincadeiras, no entanto, alguns autores têm constatado que os irmãos podem também ser fonte de apoio como por exemplo em famílias com grande conflitualidade. O presente estudo é desenhado para fazer uma análise longitudinal de 192 famílias, seleccionadas de uma pesquisa em Pais e Crianças de Avon, em Inglaterra; as crianças em estudo nasceram entre Abril de 1991 e Dezembro de1992. A primeira fase de recolha de dados começou em 1996, com uma segunda fase dois anos após a visita da família. A média da diferença de idades entre os irmãos era de 5,6 anos. As mães foram entrevistadas e responderam a questionários sobre a vida familiar e os filhos; a qualidade da relação mãe-criança era avaliada. Se o filho mais velho tinha mais que 7 anos, era também entrevistado e respondia a um questionário sobre a sua percepção da relação com o irmão mais novo (SRI, Sibling Relationship Inventory, de Stocker). Eram avaliados os eventos stressful life events and externalizing symptomatology. Notably, the protective effect of sibling affection was evident regardless of mother–child relationship quality. Conclusions: Positive sibling relationships are an important source of support for children experiencing stressful life events. Implications for intervention are discussed. de stress na família no último ano como acidentes, doenças, problemas legais, familiares, etc, bem como o seu impacto. O estado emocional e perfil comportamental da criança em estudo era avaliado pelo questionário CBCL (Child Behavior Checklist ) de Achenbach. Os resultados confirmaram a hipótese colocada: nas famílias em que tinha ocorrido um elevado número de acontecimentos de stress, as relações positivas entre irmãos tinham tido um papel de protecção em relação ao desenvolvimento de problemas emocionais de tipo internalizador (como medos, tristeza, queixas somáticas, etc). Estes resultados têm uma enorme importância para todos os profissionais que lidam com crianças e famílias multi-problemáticas. A existência de um relacionamento amistoso entre irmãos, pode por si só constituir um factor que poderá minorar as consequências nefastas na criança mais nova. Este conhecimento deveria ser considerado quando se separam irmãos em medidas de protecção a crianças em risco: separam-se crianças de pais considerados como perigosos ou incompetentes, e, não raramente, dispersam-se crianças por várias instituições, artigo recomendado 133 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 segundo parâmetros de género e idade. Desta forma, para além das consequências negativas do abuso ou negligência a que foram sujeitas, estarão a sofrer também a ruptura de vínculos significativos com irmãos, talvez os únicos disponíveis para uma criança proveniente de meios desfavorecidos. Mas as relações entre irmãos nem sempre são positivas e saudáveis. Embora esteja identificado um quadro patológico nos manuais de classificação das perturbações mentais - quadro designado por Perturbação de Rivalidade entre Irmãos – este raramente é utilizado. Ora esta categoria significa que o relacionamento entre irmãos pode ser patológico, isto é, ter um carácter doentio, perturbando as relações dentro da família.A classificação da Organização Mundial de Saúde refere que “ a maior parte das crianças pequenas fica perturbada pelo nascimento de um irmão ou de uma irmã. Na Perturbação de Rivalidade entre Irmãos, a reacção emocional é evidentemente excessiva e acompanha-se de uma perturbação do funcionamento social.”(1) Embora exista um continuum na intensidade das queixas formuladas pelos pais, a rivalidade entre irmãos é uma queixa bastante comum, quer ao nível de consultas dos cuidados primários e de pediatria, quer em consultas de serviços de saúde mental. É de facto uma experiência universal e inerente às famílias que optaram por não ter filhos únicos. A chegada de um irmão pode ser preparada para minorar as dificuldades emocionais na criança; as boas práticas dos pais podem ser fundamentais para promover um relacionamento sadio entre os filhos, prevenindo o desenvolvimento de interacções patológicas. Algumas dessas boas práticas são divulgadas pela Associação Americana de Pediatria(2), que se podem aqui sintetizar: Crianças dos 2-4 anos • Informar a criança sem demasiada antecedência • Ser honesto: as coisas não vão ser iguais, mais vão continuar a gostar dela • Envolver a criança nos preparativos • Não fazer grandes mudanças na altura do nascimento (exe: mudar de berço) • Tolerar que a criança possa regredir um pouco • Prepará-la para os dias a passar no hospital • Assegurar um tempo especial para estar com ela • Incentivar as visitas a dar atenção à criança • Passar tempo com o pai. Quando as queixas persistem, é frequente existir ansiedade parental com indulgência excessiva, ou os pais fomentar a rivalidade entre irmãos. Pode ser útil ajudar os pais a reconhecer eventuais alianças com algum dos filhos, a perceber como por vezes o seu comportamento favorece o ciúme; identificar reacções comuns como responsabilizar sistematicamente a criança mais velha, não reconhecendo as suas necessidades, por exemplo, de um espaço e tempo próprios para brincar, para estudar, etc. Ajudar a compreender que a forma como a criança vai lidar com a frustração, o ter que partilhar e negociar com outro, ou mesmo competir – são experiências valiosas de aprendizagem de competências sociais fundamentais para a vida. Maria do Carmo Santos1 Nascer e Crescer 2007; 16(3): 133-134 BIBLIOGRAFIA Crianças em idade escolar • Tornar a criança parte do processo, explicando as mudanças, mas em que continuará a ter o seu lugar. • Assegurar-se de que a criança sente que é ouvida e que é importante para os pais. 1. Classificação Internacional das Doenças, 10ª revisão, 1989, OMS. 2. http//www.aap.org/publiced/BR_Siblings_NewBaby.htm __________ 1 134 artigo recomendado Pedopsiquiatra do HCECMP NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Pediatria Baseada na Evidência Formulação de Questões e Pesquisa Bibliográfica Luís Filipe Azevedo1, Altamiro da Costa Pereira1 RESUMO A Medicina Baseada na Evidência (MBE) é genericamente definida como a aplicação consciente, explícita e criteriosa da melhor evidência científica disponível na tomada de decisões sobre o cuidado individual dos doentes. Nesta rubrica de Pediatria Baseada na Evidência será apresentado um conjunto de artigos abordando aspectos conceptuais, metodológicos e operacionais relativos à prática da MBE no âmbito específico da Pediatria. Neste artigo desenvolvem-se questões teóricas e práticas relacionadas com a adequada e oportuna formulação de questões clínicas e com a realização de uma eficaz pesquisa da evidência científica de maior qualidade na resposta à questão formulada. Na primeira parte é recomendado um processo de formalização das questões ou lacunas de conhecimento identificadas na prática clínica diária, de forma a garantir a sua adequada formulação no plano metodológico e facilitar o processo de pesquisa da evidência científica que permita responder-lhes. Na segunda parte são discutidos factores associados a uma eficaz pesquisa da evidência científica, é aconselhada a adequada preparação duma estratégia de pesquisa e são recomendados e apresentados vários sítios e recursos especialmente úteis ao sucesso desta tarefa. Na última parte deste artigo é apresentado e desenvolvido um exemplo prático de aplicação dos conceitos e recursos abordados. Nascer e Crescer 2007; 16(3): 135-140 No primeiro artigo desta série(1) foram abordados aspectos relacionados com a definição, enquadramento, evolução e importância da medicina baseada na evidência (MBE), com especial ênfase na área da Pediatria. A MBE foi genericamente definida como a aplicação consciente, explícita e criteriosa da melhor evidência científica disponível na tomada de decisões sobre o cuidado individual dos doentes(2-4). Adicionalmente foi proposto um processo faseado que facilita a sua implementação na prática clínica diária e que é constituído por cinco fases(3): 1) Aproveitar as oportunidades que surgem diariamente e que apelam à adequada e oportuna formulação de questões clinicamente relevantes; 2) Realização de uma eficaz pesquisa da evidência científica de maior qualidade na resposta à questão formulada; 3) Realização de uma adequada análise crítica da evidência encontrada, relativamente à sua validade, impacto e aplicabilidade na prática clínica; 4) A integração da evidência científica encontrada com a experiência clínica individual, com o contexto específico da prática clínica e com as características individuais (biológicas, psicológicas e sociais) de cada doente; 5) A avaliação deste processo com o objectivo de maximizar a sua eficácia e eficiência, tornando-o mais facilmente aplicável na prática clínica diária, minimizando o tempo e esforço dispendidos e maximizando o ganho em termos de qualidade de serviços prestados e formação do próprio profissional de saúde. __________ ¹ Serviço de Bioestatística e Informática Médica, Faculdade de Medicina da Universidade do Porto. Neste segundo artigo desta série serão desenvolvidos em maior detalhe os aspectos relacionados com as duas primeiras fases deste processo, nomeadamente, a adequada e oportuna formulação de questões clínicas e a eficaz pesquisa da evidência científica mais relevante, com especial ênfase na área da Pediatria. A ADEQUADA E OPORTUNA FORMULAÇÃO DE QUESTÕES CLÍNICAS Qualquer profissional de saúde verifica diariamente que, desde o gesto clínico mais simples até à aplicação das mais complexas intervenções terapêuticas, a prática clínica está recheada de importantes lacunas de conhecimento. Basta que o clínico esteja atento à sua rotina diária para que as questões e a necessidade de informação e conhecimento surjam naturalmente, por vezes, nos momentos, locais e situações mais insuspeitos. Na verdade, alguns autores que avaliaram com mais cuidado as necessidades de informação e conhecimento do clínico no seu dia-a-dia concluíram que estas lacunas são muito frequentes, e que a procura de evidência científica beneficiaria a qualidade dos serviços prestados, em média, três vezes por cada doente internado e duas vezes por cada três doentes de ambulatório(5, 6). A prática da Pediatria baseada na evidência implica, então, em primeiro lugar, a adequada e oportuna formulação de questões clínicas relevantes e, de preferência, passíveis de serem respondidas. Neste contexto, é recomendado um processo de formalização das questões ou lacunas de conhecimento identificadas, de forma a garantir a sua adequada formulação no plano metodológico e facilitar o processo de pesquisa da evidência científica que permita responder-lhes(2-4,7-10). pediatria baseada na evidência 135 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Assim, ao pensar na formulação de determinada questão clínica, dever-se-á ter em atenção quatro elementos essenciais: 1) população ou problema; 2) intervenção; 3) intervenção alternativa; 4) variável de resultado clínico. Na língua inglesa a tarefa de enumeração destes quatro elementos está facilitada pela correspondência com a mnemónica PICO (Patient or problem, Intervention, Comparison intervention and Outcomes)(2, 3). POPULAÇÃO OU PROBLEMA Em primeiro lugar, dever-se-á definir o âmbito da questão clínica, através da identificação da população (doente ou não doente) ou do problema clínico específicos que irão ser focados. Esta definição deverá ser detalhada tendo em conta todas as características clínicas importantes para a questão em causa, com implicações na prática clínica local ou que afectem a relevância da evidência científica passível de ser encontrada no contexto. Dever-se-á ter em atenção que o grau de detalhe irá afectar directamente a pesquisa da evidência subsequente, pelo que, muitas vezes, surge a necessidade de diminuir o detalhe para facilitar o processo de pesquisa de evidência. INTERVENÇÃO Em seguida, dever-se-á identificar a intervenção em causa na questão clínica de interesse. Quando pretendemos responder a questões relacionadas com a eficácia de intervenções terapêuticas, torna-se simples a identificação da intervenção em análise, mas quando pensamos noutro tipo de questões esta identificação poderá não ser tão imediata. No entanto, dever-se-á estabelecer a analogia adequada. Assim, numa questão sobre etiologia da doença a intervenção poderá, por exemplo, ser a exposição a um determinado agente ambiental; enquanto que numa questão sobre diagnóstico a intervenção poderá, por exemplo, corresponder ao teste diagnóstico em estudo. 136 pediatria baseada na evidência INTERVENÇÃO ALTERNATIVA A identificação da intervenção alternativa (caso esta exista) decorre naturalmente da definição da intervenção em estudo, tratando-se assim de identificar a intervenção que serve de comparação com esta. No exemplo específico das questões sobre eficácia terapêutica, a intervenção alternativa poderá corresponder à ausência de intervenção, aplicação de um placebo, o tratamento habitual ou uma intervenção alternativa propriamente dita. VARIÁVEIS DE RESULTADO CLÍNICO Por último, importa definir a variável de resultado clínico que é relevante no contexto da questão clínica colocada. Assim sendo, importa ter em atenção as variáveis de resultado importantes para o clínico e para o doente e o período temporal aplicável. Variáveis de resultado típicas dizem respeito, por exemplo, à mortalidade, morbilidade ou à qualidade de vida. TIPOS DE QUESTÕES Uma vez formulada, importa decidir qual o tipo de questão que se pretende ver respondida. Esta classificação vai ter consequências directas sobre o tipo de evidência ou tipologia de estudos mais adequados na resposta às questões. Assim, é possível enumerar os tipos de questões mais importantes e que surgem mais frequentemente na prática clínica diária: (a) diagnóstico; (b) tratamento; (c) prognóstico; (d) risco e etiologia; (e) prevenção e (f) frequência de fenómenos. Em função do tipo de questão a responder será possível identificar as abordagens metodológicas mais adequadas à sua resposta e, desta forma, as características que deverão ser tidas em conta na avaliação crítica da evidência. A identificação do tipo de questão poderá também auxiliar na definição da estratégia de pesquisa da evidência. PRIORIDADE DAS QUESTÕES Após a adequada formulação das questões dever-se-á ponderar os seguintes aspectos: Quais as questões mais importantes para o bem-estar do doente? Quais as questões cuja resposta é mais fácil do ponto de vista prático? Quais as questões cuja resposta poderá trazer maiores benefícios para a prática clínica? Quais as questões mais interessantes para o profissional de saúde? A EFICAZ PESQUISA DA EVIDÊNCIA MAIS ADEQUADA Após a adequada e oportuna formulação da questão clínica, será necessário encontrar de forma eficaz a evidência científica que permitirá responder-lhe. A eficácia da pesquisa da evidência estará dependente da qualidade e preparação duma estratégia adequada de pesquisa(11-15). Para a definição da estratégia de pesquisa contribuem directamente os elementos identificados anteriormente (população ou problema; intervenção; intervenção alternativa e variável de resultado clínico) e a identificação do tipo de questão (que estabelece o tipo de estudos mais apropriados à sua resposta). Após a estruturação da estratégia de pesquisa será importante decidir quais os recursos ou fontes de evidência mais adequados(11-16). Numa primeira abordagem, é importante verificar se existem sítios ou recursos específicos da área (ver tabela 1) que já tenham feito o trabalho de pesquisa, avaliação e sistematização da evidência científica disponível para a resposta à questão em causa. Em segundo lugar, poderá ser de grande utilidade a procura de revisões sistemáticas e estudos meta-análise disponíveis para a resposta à questão em causa (ver, por exemplo, recursos da Cochrane Collaboration indicados na tabela 1). Por último, poderá ser necessária a utilização de bases de dados bibliográficas (ver recursos recomendados na tabela 1) para apoiar a pesquisa da evidência mais relevante na resposta à questão em causa. A eficaz pesquisa da evidência, fazendo uso das bases de dados bibliográficas, esta intimamente relacionada com a formação específica na área e a experiência na utilização das mesmas. Apesar disso, vale a pena destacar alguns aspectos importantes que podem auxiliar, especialmente, os utilizadores menos experientes. NASCER E CRESCER NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Existem muitas bases de dados disponíveis para a efectivação de uma pesquisa bibliográfica (ver tabela 1), no entanto, é de conhecimento geral que a mais utilizada na área biomédica é a MEDLINE. Esta é a principal base de dados bibliográfica da National Library of Medicine (EUA) e tem mais de 15 milhões de artigos indexados, e cerca de 500 mil novas referências adicionadas por ano. Esta base de dados é disponibilizada gratuitamente através do serviço PubMed (ver Quadro I)(17). Após uma adequada definição da questão e da estratégia de pesquisa, a utilização da MEDLINE pode ser feita através da aplicação de ferramentas genéricas disponíveis no serviço PubMed (ex: pesquisa por texto livre, uso de operadores booleanos, aspas, filtros com limites específicos, etc.) ou através da aplicação de algumas ferramentas mais específicas, cuja utilização é recomendada. Destas ferramentas mais específicas, destacam-se a utilização dos termos MeSH (medical subject headings)(18), para a especificação da chave de pesquisa (ver tutorial disponível através da página da PubMed – www.nlm.nih.gov/bsd/ viewlet/mesh/searching/mesh1.html) e a utilização da funcionalidade Clinical Queries, que aplica automaticamente um conjunto de filtros metodológicos em função do tipo de questão (que foram especificamente estudados quanto à sensibilidade e especificidade)(19), de forma a aumentar a eficácia da chave de pesquisa (ver tutorial disponível através da página da PubMed – www.nlm.nih.gov/bsd/disted/ pubmedtutorial/). Naturalmente, a pesquisa bibliográfica poderá ser complementada através da utilização de vários outros recursos disponíveis (ver recursos e sítios recomendados no Quadro I)(11-16). Uma dificuldade prática frequente diz respeito à necessidade de pagamento para a utilização de alguns dos recursos recomendados e para o acesso às versões integrais de artigos científicos. Nas instituições de ensino (por exemplo, na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto) o problema está a ser parcialmente ultrapassado através da utilização de assinaturas institucionais de muitos ano 2007, vol XVI, n.º 3 Quadro I: Sítios e recursos relacionados com a prática da Pediatria baseada na evidência. Bases de Dados Bibliográficas MEDLINE – Pubmed www.ncbi.nlm.nih.gov/sites/entrez The Cochrane database www.cochrane.org EBSCO Research Database search.ebscohost.com/ Scopus www.scopus.com/scopus/home.url ISI - Web of Knowledge portal.isiknowledge.com/ Sítios e Recursos sobre Pediatria Baseada na Evidência The Cochrane Child Health Group www.cochranechildhealth.ualberta.ca/ Centre for Evidence-Based Child Health www.ich.ucl.ac.uk/ich/academicunits/Centre_for_evidence_based_child_health Pediatrics Critical Care Medicine pedsccm.org/EBJournal_Resources.php University of Michigan – Evidence-Based Pediatrics Web Site www.med.umich.edu/pediatrics/ebm Sítios e Recursos sobre Medicina Baseada na Evidência The U.K. Centre for EBM www.cebm.net/ The McMaster EBM Project hsl.mcmaster.ca/education/medicine/ebp.htm Netting the Evidence, the largest database of EBM-related Web sites www.shef.ac.uk/scharr/ir/netting/ Evidence based medicine – University of Washington School of Medicine www.mebi.washington.edu/ebm-uwsom/ Revistas Científicas sobre Pediatria Baseada na Evidência ou que têm secções sobre esta temática Evidence based Child Health: A Cochrane Review Journal www3.interscience.wiley.com/cgi-bin/jhome/112100413 The Pediatrics Critical Care Medicine evidence-based journal club pedsccm.org/EBJournal_Club_intro.php The Journal of Pediatrics journals.elsevierhealth.com/periodicals/ympd Pediatrics pediatrics.aappublications.org/ Archives of Pediatrics and Adolescent Medicine archpedi.ama-assn.org/ Infectious Diseases in Children www.idinchildren.com/Default.asp Revistas e Journal Clubs sobre Medicina Baseada na Evidência Evidence-based Medicine ebm.bmj.com/ Evidence-based Practice www.ebponline.net/ Journal club on the Web www.journalclub.org/index.php Journal of Family Practice journal club www.jfponline.com/ Sítios e Recursos sobre Avaliação Crítica da Evidência User’s Guides to the Medical Literature www.cche.net/usersguides/main.asp Critically Appraised Topics www.ebmny.org/cats.html The Critical Care Database of Critically Appraised Evidence pedsccm.org/EBJournal_Club_intro.php The CATbank www.minervation.com/cebm2/cats/allcats.html Guidelines Clínicas de Entidades Oficiais National Guideline Clearinghouse – Agency for Healthcare Research and Quality www.ngc.gov/ CDC Prevention Guidelines wonder.cdc.gov/wonder/prevguid/prevguid.html Forums e Mailing lists Pediatric Talk mailing list http://www.pcc.com/lists/pedtalk/ International Pediatric Chat www.pedschat.org/ pediatria baseada na evidência 137 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Figura 1: Utilização da funcionalidade Clinical Queries do PubMed (recurso para acesso gratuito à MEDLINE), na pesquisa bibliográfica efectuada. Figura 2: Resultados da pesquisa bibliográfica efectuada através da aplicação da funcionalidade Clinical Queries e dos Limits para artigos relativos a crianças entre os 0 e os 23 meses. 138 pediatria baseada na evidência NASCER E CRESCER NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 destes recursos. A importância da utilização destes recursos mereceria, sem dúvida e especialmente na presente conjuntura, que o próprio Ministério da Saúde garantisse a sua disponibilização gratuita em todas as instituições do Sistema Nacional de Saúde. EXEMPLO PRÁTICO CENÁRIO Um lactente de 4 meses do sexo masculino apresenta febre (38,9ºC) e não tem foco identificável ao exame clínico. O seu estado geral não é séptico e a análise da urina não apresenta alterações relevantes. Não tem sintomas respiratórios e não tem quaisquer sinais clínicos de meningite. O clínico conclui que esta criança tem um baixo risco de apresentar uma doença infecciosa séria de etiologia bacteriana. Neste contexto, e tendo em atenção uma apresentação num congresso a que assistiu recentemente, o clínico questiona-se sobre o papel que o doseamento da procalcitonina poderia ter, neste caso, na exclusão de uma patologia bacteriana importante que necessite de tratamento antibiótico imediato(20). FORMULAÇÃO ESTRUTURADA DA QUESTÃO CLÍNICA Em lactentes com febre e sem foco de infecção clinicamente identificável (população ou problema), será o doseamento sérico da procalcitonina (intervenção) um teste diagnóstico útil na exclusão de patologia bacteriana importante (variável de resultado clínico)? Dada a questão que foi colocada é fácil de concluir que se trata de uma questão sobre diagnóstico. Neste caso particular, sobre a utilidade de um determinado teste diagnóstico na exclusão de patologia bacteriana importante. PESQUISA DA EVIDÊNCIA Para a realização da pesquisa bibliográfica utilizou-se a base de dados MEDLINE através do serviço PubMed (os resultados em seguida apresentados dizem respeito a uma pesquisa feita em Setembro de 2007). De forma a facilitar o processo de pesquisa, utilizou-se inicialmente a funcionalidade Clinical Que- ano 2007, vol XVI, n.º 3 ries (ver figura 1). Na caixa de texto livre da página de acesso à Clinical Queries colocou-se uma chave de procura muito simples: Procalcitonin AND “bacterial infection”. Em seguida, seleccionou-se o tipo de questão adequado a este caso “diagnosis”, e optou-se por uma estratégia de pesquisa mais sensível (de forma a tentar identificar a maior quantidade possível de evidência potencialmente relevante). Os resultados desta pesquisa são 119 artigos potencialmente relevantes, dos quais 29 são revisões bibliográficas. O passo seguinte será, através da utilização da funcionalidade Limits da PubMed, limitar os resultados da pesquisa a artigos respeitantes ao grupo etário que nos interessa. Para isto, utilizando a página da funcionalidade Limits serão seleccionados artigos respeitantes unicamente ao grupo etário “All Infant: birth-23 months”. O resultado desta estratégia de pesquisa é uma lista de 34 artigos potencialmente relevantes dos quais 8 são revisões bibliográficas (ver figura 2). A análise dos resumos destes artigos permitiu identificar rapidamente 5 artigos altamente relevantes na resposta à questão colocada(20). Em alternativa, poderia tentar-se a pesquisa de revisões sistemáticas ou estudos de meta-análise sobre a questão em análise. De uma forma também muito simples, e utilizando ainda a página da funcionalidade Clinical Queries, poderse-ia aplicar a mesma chave de pesquisa Procalcitonin AND “bacterial infection” no local específico “Find Systematic Reviews”. O resultado desta estratégia de pesquisa alternativa é uma lista de 3 artigos, dos quais só um deles é, de facto, uma revisão sistemática e estudo de meta-análise. O artigo tem por título “Serum procalcitonin and C-reactive protein levels as markers of bacterial infection: a systematic review and meta-analysis”(21) e é, na verdade, uma revisão sistemática sobre a questão em análise, no entanto, não apresenta resultados específicos para idades pediátricas. Naturalmente, as estratégias e recursos apresentados são exemplificativos e privilegiaram a utilização de metodologias de pesquisa de evidência muito simples. Vários outros recursos, funcionalidades e métodos mais complexos poderiam ter sido utilizados para obter os mesmos resultados, no entanto, este exemplo demonstra que mesmo com métodos muito simples é possível obter resultados muito bons. Após a identificação eficaz da evidência, será necessário que o clínico seja capaz de rapidamente avaliar as características metodológicas mais relevantes dos artigos, em função do tipo de questão analisada, de forma a fazer uma adequada selecção da evidência mais relevante, sendo necessário depois avaliar de forma mais detalhada a qualidade desses artigos. No próximo número desta série será abordada genericamente a metodologia de avaliação da qualidade da evidência e sua implementação prática. Depois destes artigos de natureza mais metodológica serão publicados alguns exemplos de aplicação prática destes conceitos, focando os tipos de questões mais frequentes e importantes nesta área. THE FORMULATION OF CLINICAL QUESTIONS AND SEARCHING FOR THE CURRENT BEST EVIDENCE ABSTRACT Evidence Based Medicine (EBM) is generically defined as the conscientious, explicit and judicious use of current best evidence in making decisions about the care of individual patients. In this section of Evidence Based Paediatrics a series of articles about the conceptual, methodological and operational issues linked to the practice of EBM in the field of Paediatrics will be published in the following issues of this journal. In the present article theoretical and practical issues related to the adequate formulation of clinical questions and the effective search of the current best evidence will be presented. In the first part, a structured process for the formulation of answerable clinical questions, methodologically adequate and helpful in the search for evidence, is presented and recommended. In the second part, factors related to the effective search for the best evidence are dis- pediatria baseada na evidência 139 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 cussed, the previous preparation of an adequate search strategy is suggested and several sites, tools and resources, especially helpful in finding the current best evidence, are described and recommended. In the last part of the article a practical example is presented and discussed. Nascer e Crescer 2007; 16(3): 135-140 BIBLIOGRAFIA 1. LF Azevedo, A Costa Pereira: Pediatria Baseada na Evidência. Nascer e Crescer. Revista do Hospital de Crianças Maria Pia 2007, vol 16:29-31. 2. E-BMW Group: Evidence-based medicine. A new approach to teaching the practice of medicine. Evidence-Based Medicine Working Group. Jama 1992, 268:2420-5. 3. DL Sackett, Richardson, W.S., Rosenberg, W., Haynes, R.B.: Evidence Based Medicine. London, U.K.: Churchill-Livingstone; 1997. 4. DL Sackett, WM Rosenberg, JA Gray, RB Haynes, WS Richardson: Evidence based medicine: what it is and what it isn’t. Bmj 1996, 312:71-2. 5. ML Green, MA Ciampi, PJ Ellis: Residents’ medical information needs in clinic: are they being met? Am J Med 2000, 109:218-23. 140 pediatria baseada na evidência 6. JA Osheroff, DE Forsythe, BG Buchanan, RA Bankowitz, BH Blumenfeld, RA Miller: Physicians’ information needs: analysis of questions posed during clinical teaching. Ann Intern Med 1991, 114:576-81. 7. JG Frohna, SM Park: Promoting the use of evidence-based medicine in pediatrics. J Pediatr 2002, 141:599600. 8. WE Gerhardt, PJ Schoettker, EF Donovan, UR Kotagal, SE Muething: Putting evidence-based clinical practice guidelines into practice: an academic pediatric center’s experience. Jt Comm J Qual Patient Saf 2007, 33:226-35. 9. D Lockwood, M Armstrong, A Grant: Integrating evidence based medicine into routine clinical practice: seven years’ experience at the Hospital for Tropical Diseases, London. Bmj 2004, 329:1020-3. 10. HS Williams: Toward consistent evidence-based pediatric practice: developing a reliable process for narrowing variation. Pediatr Rev 2006, 27:e66-70. 11. GS Doig, F Simpson: Efficient literature searching: a core skill for the practice of evidence-based medicine. Intensive Care Med 2003, 29:211927. 12. E Fineout-Overholt, S Hofstetter, L Shell, L Johnston: Teaching EBP: getting to the gold: how to search for the best evidence. Worldviews Evid Based Nurs 2005, 2:207-11. 13. E Fineout-Overholt, L Johnston: Teaching EBP: asking searchable, answerable clinical questions. Worldviews Evid Based Nurs 2005, 2:15760. 14. S Sanders, C Del Mar: Clever searching for evidence. Bmj 2005, 330:1162-3. 15. RL Smyth: Evidence-based medicine. Paediatr Respir Rev 2000, 1:287-93. 16. GR Kim, CU Lehmann: The impact of the Internet on pediatric medicine. Paediatr Drugs 2003, 5:433-41. 17. T Greenhalgh: How to read a paper. The Medline database. Bmj 1997, 315:180-3. 18. M Clarke, L Greaves, S James: MeSH terms must be used in Medline searches. Bmj 1997, 314:1203. 19. RB Haynes, N Wilczynski: Finding the gold in MEDLINE: clinical queries. ACP J Club 2005, 142:A8-9. 20. D Herd: In children under age three does procalcitonin help exclude serious bacterial infection in fever without focus? Arch Dis Child 2007, 92:362-4. 21. L Simon, F Gauvin, DK Amre, P SaintLouis, J Lacroix: Serum procalcitonin and C-reactive protein levels as markers of bacterial infection: a systematic review and meta-analysis. Clin Infect Dis 2004, 39:206-17. NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Caso Endoscópico Fernando Pereira1 O caso de hoje refere-se a um ado- de 54gr/l com 43,5% de albumina. A fun- segundas, intenso infiltrado inflamatório, lescente de 15 anos, de raça caucasiana, ção renal e hepática eram normais bem constituído por polimorfonucleares neu- autista e invisual, filho de pais saudáveis como o estudo da coagulação. O exame trófilos, linfócitos e plasmócitos, atrofia do e não consanguíneos, residente no Minho bacteriológico e o parasitológico de fezes epitélio das criptas glandulares e múlti- e que foi enviado à consulta de Gastren- foram negativos. O exame radiológico do plos microabcessos crípticos. Não foram terologia por apresentar rectorragias. tórax era normal. observados granulomas. O doente, com passado de obsti- O doente foi submetido a obser- pação funcional, começou a apresentar vação proctológica e colonoscopia sob sangue nas fezes em pequena quantida- anestesia geral, verificando-se ausência de, cerca de um mês antes da consulta. de lesões anais ou perianais e apresen- A quantidade de sangue foi aumentando tando as alterações da mucosa do cólon 1 - Enterocolite necrosante progressivamente e na última semana que mostramos na figura. Foram efectua- 2 - Colite ulcerosa aguda instalou-se quadro de diarreia abundante das múltiplas biópsias para exame micro- 3 - Colite amibiana com muco e sangue. biológico e anatomo-patológico, sendo 4 - Colite alérgica. Apesar das dificuldades de comunicação não parecia haver outros sintomas para além de acentuada perda de apetite referida pelos pais. Era um adolescente com bom desenvolvimento estaturo-ponderal, com ligeira palidez das mucosas e da pele, sem outras alterações ao exame objectivo, embora não tenha sido possível efectuar o exame proctológico por não colaboração do doente. Os sinais vitais eram normais. Efectuou estudo analítico que evidenciou a presença de anemia (Hg-9,8gr/ dl) hipocrómica e microcítica com ferro sérico diminuído e ferritina elevada (150gr/ l), leucocitose (17500 mmc) com fórmula leucocitária equilibrada, VSG 50mm na 1ªh, PCR-11,3mg/dl e Orosomucoide 248mg/dl. As proteínas tinham um valor __________ 1 Serviço de Gastroenterologia Hospital de Crianças Maria Pia 142 qual o seu diagnóstico as primeiras negativas e mostrando as Em face deste quadro qual lhe parece ser o diagnóstico mais adequado: NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 COMENTÁRIOS A imagem endoscópica que mostramos na figura foi obtida no cólon sigmoide mas é representativa do aspecto de todo o cólon do nosso doente. Nela observamos intenso processo inflamatório do intestino grosso, com edema acentuado, congestão intensa, ulceração superficial e focos hemorrágicos. Estas lesões atingiam de forma difusa o recto e cólon. Estes aspectos endoscópicos são muito sugestivos de quadro de colite ulcerosa aguda. A enterocolite necrosante é em geral uma doença com atingimento segmentar do intestino e mais frequente no período neonatal e não neste grupo etário. A colite amibiana, é uma doença inflamatória geralmente segmentar com úlceras de maiores dimensões e associada à permanência em zonas endémicas da doença o que não é o caso do nosso doente. A colite alérgica é também uma doença de idades mais jovens, tem geralmente carácter mais segmentar, geralmente distal e atinge especialmente as áreas de implantação dos folículos linfoides do colon e recto. Se ao aspecto endoscópico acrescentarmos a negatividade dos exames microbiológicos e as características histológicas observadas nas biópsias o diagnóstico mais provável é o de colite ulcerosa aguda. Com este diagnóstico o doente iniciou tratamento com prednisolona 40mg/ dia oral, dieta hiperproteica, ferro oral e polivitamínico, verificando-se melhoria progressiva do seu quadro clínico e laboratorial com total normalização ao fim de seis semanas. O tratamento de manutenção foi feito com ácido 5-aminosalicílico. Nascer e Crescer 2007; 16(3): 142-143 BIBLIOGRAFIA 1. Inflammatory Bowel Disease Working Group of ESPGHAN. “Inflammatory bowel disease in children and Adolescents: recommendations for diagnosis – the Porto criteria. JPGN 2005; 41:1-7 2. Working Group of The North American Society for Pediatric Gastroenterology, Hepatology, and Nutrition and Crohn and Cilitis Foundation of America. Differentiating Ulcerative Cilitis from Crohn Disease in Children and Young Adults. JPGN 2007; 44:653-674 qual o seu diagnóstico 143 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Caso Estomatológico José M. S. Amorim1 Criança de 7 anos de idade que foi enviada à consulta de Estomatologia devido a dor a nível do 1º quadrante (maxilar superior direito) exacerbada com a variação de temperaturas e com a ingestão de alimentos doces. Ao exame objectivo a criança apresenta bom desenvolvimento estato-ponderal. A nível dentário apresenta sulcos do 1º molar superior direito escurecidos e com pequena cárie de esmalte a nível da fosseta distal do referido dente. Antecedentes pessoais e familiares irrelevantes. Face ao descrito: Qual o seu diagnóstico? Qual a sua atitude? Figura 1 __________ 1 Serviço de Estomatologia Hospital de Crianças Maria Pia - Porto 144 qual o seu diagnóstico NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 O presente quadro clínico insere-se nas alterações dos tecidos duros dentários e dentro deste nas cáries de esmalte. Estas cáries instalam-se insidiosamente. A fisiopatologia da cárie já foi abordada em número anterior e será novamente abordada em números seguintes, mas neste momento serve o presente caso para abordar a temática da aplicação de selantes de fossetas e fissuras em dentes sãos e/ou em dentes com cáries de esmalte. A aplicação de selantes de fossetas e fissuras é um acto de fácil execução técnica, altamente conservador, com excelente eficácia clínica e de baixos custos, mas que deve ser tomado com bastante senso, uma vez que deve estar baseado numa filosofia de promoção de saúde oral e ser somente usado em situações bem seleccionadas. A aplicação de selantes em pacientes com má higiene oral está contra-indicada, pois por vezes ocorre fractura do selante e esse local torna--se mais retentivo de restos alimentares facilitando o aparecimento e evolução de cárie por baixo do resto do selante remanescente. Neste caso foi removido o tecido cariado e afundados os sulcos dentários, afim de que o selante ficasse com maior retenção e obturada toda a superfície oclusal com selante. Nascer e Crescer 2007; 16(3): 144-145 BIBLIOGRAFIA Caderno de Odontopediatria “Cariologia: Diagnóstico, Controle e Tratamento”, Giselle Rodrigues de Sant´ana, 1ª edição - 2001, Livraria Santos Editora, - Pag.52-55 qual o seu diagnóstico 145 RCM em anexo. PT-22-07-009 Serono Portugal, Lda, An affiliate of Merck Serono S.A. • Rua Alfredo da Silva, 3C - 1300-040 Lisboa • Tel: 213 613 500 - Fax: 213 613 662 • Cont.: 501 749 284 - Capital Social: € 523.739,00 - C.R.C.L. n.º 66229 RESUMO DAS CARACTERÍSTICAS DO MEDICAMENTO. DENOMINAÇÃO DO MEDICAMENTO. SAIZEN 8 mg click.easy, pó e solvente para solução injectável. COMPOSIÇÃO QUALITATIVA E QUANTITATIVA. Cada frasco para injectáveis de SAIZEN 8 mg click.easy contém Somatropina* (hormona do crescimento humana recombinante). *produzida pela tecnologia do ADN recombinante em células de mamífero. A reconstituição com o solvente bacteriostático contido no cartucho apresenta uma concentração de 5,83 mg por ml. Excipientes, ver secção “Lista de Excipientes”. FORMA FARMACÊUTICA: Pó e solvente para solução injectável. Pó branco liofilizado e solvente límpido e incolor. INFORMAÇÕES CLÍNICAS: Indicações terapêuticas - SAIZEN está indicado no tratamento de: - atraso do crescimento em crianças causado por secreção insuficiente ou inexistente da hormona do crescimento endógena; - atraso do crescimento em raparigas com disgenésia gonadal (Síndroma de Turner) confirmada por análise do cariotipo; - atraso do crescimento em crianças pré-pubertárias devido a insuficiência renal crónica (IRC). - atraso do crescimento (estatura actual < -2,5 Desvio Padrão (DP) e estatura ajustada à dos progenitores < -1 DP) em crianças pequenas com baixa estatura para a idade gestacional (SGA “Small for Gestational Age”), com um peso e/ou comprimento à nascença inferior a –2 DP, que não conseguiram uma recuperação do crescimento (DP da velocidade de crescimento <0 durante o último ano) até aos 4 ou mais anos de idade. Terapêutica de substituição em adultos com deficiência pronunciada de hormona do crescimento, diagnosticada por um único teste dinâmico para deficiência de hormona do crescimento. Os doentes deverão também satisfazer os seguintes critérios: Início na infância: Os doentes com deficiência de hormona do crescimento diagnosticada na infância, deverão ser reavaliados, para confirmação da deficiência em hormona do crescimento, antes de iniciar o tratamento com SAIZEN. Início na idade adulta: A deficiência de hormona do crescimento no adulto deverá ser resultante de doença hipotalâmica ou hipofisária, e o doente deve apresentar pelo menos outra deficiência hormonal (excepto a prolactina), a qual deverá ser adequadamente tratada com terapêutica de substituição, antes do início do tratamento com hormona do crescimento. POSOLOGIA E MODO DE ADMINISTRAÇÃO: SAIZEN 8 mg click.easy destina-se a administração multidose. A posologia do SAIZEN deve ser individualizada para cada doente com base na superfície corporal ou no peso corporal. É recomendada a administração de SAIZEN ao deitar, nas doses seguintes: Atraso do crescimento devido a secreção insuficiente da hormona do crescimento endógena: 0,7-1,0 mg/m2 de superfície corporal, por dia, ou 0,025-0,035 mg/kg de peso corporal, por dia, por administração subcutânea. Atraso do crescimento em raparigas devido a disgenésia gonadal (Síndroma de Turner): 1,4 mg/m2 de superfície corporal ou 0,045 – 0,050 mg/kg de peso corporal, por dia, por administração subcutânea. A terapêutica concomitante com esteróides anabólicos não-androgénicos em doentes com Síndroma de Turner pode aumentar a resposta do crescimento. Atraso do crescimento em crianças pré-pubertárias devido a insuficiência renal crónica (IRC): 1,4 mg/m2 de superfície corporal, aproximadamente igual a 0,045-0,050 mg/kg de peso corporal, por dia, por administração subcutânea. Atraso do crescimento em crianças pequenas com SGA: A dose diária recomendada é 0,035 mg/kg de peso corporal por dia (ou 1 mg/m2/dia, igual a 0,1 UI/kg/dia ou 3 UI/m2/dia), por administração subcutânea. Duração do tratamento: O tratamento deve ser interrompido quando o doente tiver atingido uma estatura adulta satisfatória, ou quando as epífises estiverem fechadas. No atraso do crescimento em crianças pequenas com SGA, o tratamento é habitualmente recomendado até que se atinja a estatura final. O tratamento deve ser suspenso após o primeiro ano, se o desvio padrão da velocidade de crescimento for inferior a +1. O tratamento deve ser suspenso quando se atinge a estatura final (definida como velocidade do crescimento < 2 cm/ano) e, no caso de ser necessária a confirmação, a idade óssea seja >14 anos nas raparigas ou > 16 anos nos rapazes, o que corresponde ao encerramento epifisário. Deficiência de hormona do crescimento no adulto: No início do tratamento com somatropina, recomendam-se doses baixas, de 0,15 a 0,3 mg, administradas diariamente por injecção subcutânea. A dose deverá ser gradualmente aumentada, mediante controlo dos valores do Factor de Crescimento Insulin-like (IGF-1). A dose final recomendada de hormona do crescimento raramente excede 1,0 mg/dia. De modo geral deverá ser administrada a dose mínima eficaz. Nos doentes com mais idade ou com excesso de peso, poderão estar indicadas doses mais baixas. MODO DE ADMINISTRAÇÃO: Para a administração da solução reconstituída para injecção de SAIZEN 8 mg click.easy, consulte as instruções do folheto informativo e do manual de instruções fornecido com o auto-injector seleccionado: o auto-injector one.click, o auto-injector sem agulha cool.click ou o auto-injector easypod. Consulte também a secção “Instruções de utilização/ manuseamento”. CONTRA-INDICAÇÕES: SAIZEN não deve ser utilizado em crianças em que tenha ocorrido a fusão das epífises. SAIZEN está contra-indicado em doentes com hipersensibilidade à Somatropina ou a qualquer um dos excipientes do pó para solução injectável ou do solvente. SAIZEN está contra-indicado em doentes com neoplasia activa. A terapêutica anti-tumoral deverá estar terminada antes do início do tratamento com Somatropina. SAIZEN não deve ser utilizado em casos com evidência de qualquer progressão ou recorrência de uma lesão intracraniana subjacente. Doentes com patologia aguda crítica, apresentando complicações pós cirurgia de coração aberto, cirurgia abdominal, politraumatizados, insuficiência respiratória aguda ou situações similares não devem ser tratados com Somatropina. (Relativamente aos doentes, em tratamento com Somatropina, que desenvolvam uma situação clinicamente crítica, ver “Advertências e precauções especiais de utilização”.). ADVERTÊNCIAS E PRECAUÇÕES ESPECIAIS DE UTILIZAÇÃO: O tratamento deve ser efectuado sob a vigilância regular de um médico com experiência no diagnóstico e tratamento de doentes com deficiência de hormona do crescimento. Os doentes com neoplasia intra ou extracraniana em remissão, e em tratamento com hormona do crescimento, devem ser cuidadosamente observados pelo médico em intervalos regulares. Os doentes com deficiência de hormona do crescimento secundária a um tumor intracraniano, devem ser examinados frequentemente para avaliação da progressão ou recorrência da patologia subjacente. Foram registados alguns casos de leucemia em crianças com deficiência de hormona do crescimento, tratadas ou não com esta hormona, podendo eventualmente representar um ligeiro aumento da incidência desta patologia, quando comparado com crianças sem esta deficiência. Não se encontra estabelecida uma relação causal com o tratamento com hormona do crescimento. Após a administração de hormona do crescimento observa-se uma hipoglicémia transitória de aproximadamente 2 horas e, nas 2-4 horas seguintes verifica-se uma elevação dos níveis de glucose no sangue, apesar da existência de uma concentração elevada de insulina. A Somatropina pode induzir um estado de resistência à insulina, o qual pode resultar em hiperinsulinismo e, em alguns casos, hiperglicémia. Para detectar uma resistência à insulina, os doentes deverão ser monitorizados para evidência de intolerância à glucose. SAIZEN deve ser utilizado com precaução em doentes com diabetes mellitus ou com história familiar de diabetes mellitus. Os doentes com diabetes mellitus podem necessitar de um ajuste da sua terapêutica anti-diabética. Uma retinopatia estável não deve levar à suspensão da terapêutica de substituição com Somatropina. No caso de surgirem alterações pré-proliferativas e na presença de retinopatia proliferativa deve ser suspensa a terapêutica de substituição com Somatropina. Durante o tratamento com Somatropina, verificou-se um aumento da conversão de T4 para T3, o qual pode resultar a nível do soro numa redução das concentrações de T4 e num aumento das concentrações de T3. Em geral, os níveis periféricos da hormona tiroideia permaneceram dentro dos limites de referência para indivíduos saudáveis. O efeito da Somatropina nos níveis da hormona tiroideia pode ter relevância clínica em doentes com hipotiroidismo central subclínico, nos quais, em teoria, se pode desenvolver hipotiroidismo manifesto. Inversamente, em doentes a receber terapêutica de substituição com tiroxina, pode ocorrer hipertiroidismo ligeiro. Portanto, é aconselhável a avaliação da função tiroideia após o início do tratamento com Somatropina e sempre que se proceda a ajustes da dose. Pode verificar-se retenção de líquidos durante a terapêutica de substituição com hormona do crescimento no adulto. No caso de edema persistente ou parestesia grave, a dosagem deverá ser reduzida de modo a evitar o desenvolvimento da síndroma do canal cárpico. No caso de cefaleia grave ou recorrente, problemas visuais, náuseas e/ou vómitos, recomenda-se uma fundoscopia para verificar se existe papiloedema. Se se confirmar o papiloedema, deve considerar-se o diagnóstico de hipertensão intracraniana benigna (ou pseudotumor cerebral) e interromper o tratamento com SAIZEN. Actualmente, não existe evidência suficiente para levar a uma decisão clínica em doentes com hipertensão intracraniana resolvida. Se se reiniciar o tratamento com hormona do crescimento, é necessária uma monitorização cuidadosa para detecção de sintomas de hipertensão intracraniana e o tratamento deve ser suspenso se se verificar recorrência da hipertensão intracraniana. O deslizamento da epífise femural é frequentemente associado a perturbações endócrinas, tais como deficiência de hormona do crescimento e hipotiroidismo, e períodos de maior velocidade de crescimento. Em crianças tratadas com hormona do crescimento, o deslizamento da epífise femural pode ser devido quer a perturbações endócrinas subjacentes ou à maior velocidade do crescimento causada pelo tratamento. Os períodos de maior velocidade de crescimento podem aumentar o risco de alterações articulares, especialmente a articulação coxo-femural está sob particular pressão durante o surto de crescimento pré-pubertário. O médico e os pais devem estar alerta no caso de a criança tratada com SAIZEN apresentar claudicação ou queixas articulares localizadas à coxo-femural ou joelho. As crianças com atraso do crescimento devido a insuficiência renal crónica, devem ser examinadas periodicamente para evidência ou progressão de osteodistrofia renal. Em crianças com osteodistrofia renal avançada pode verificar-se episiolístese ou necrose avascular da cabeça do femural, sendo incerto se estes problemas são afectados pelo tratamento com hormona do crescimento. Antes de se iniciar o tratamento deverá ser efectuado um radiograma das articulações coxo-femurais. Nas crianças com insuficiência renal crónica, a função renal deve apresentar um decréscimo de 50% relativamente ao padrão normal, antes de se instituir o tratamento. O crescimento deve ser monitorizado durante um ano antes de se instituir a terapêutica, de modo a verificar alterações no crescimento. O tratamento convencional da insuficiência renal (o qual inclui o controlo da acidose, do hiperparatiroidismo e do estado nutricional durante o ano anterior ao tratamento) deve ter sido estabelecido e mantido durante o tratamento. O tratamento deve ser interrompido na altura do transplante renal. Antes de se iniciar o tratamento em crianças pequenas com SGA, devem ser excluídas outras razões clínicas ou tratamentos que possam explicar o atraso do crescimento. Em crianças pequenas com SGA, recomenda-se a determinação da insulina e da glicémia em jejum, antes do início do tratamento e anualmente. Em doentes com risco aumentado para diabetes mellitus (por exemplo, história familiar de diabetes, obesidade, índice aumentado de massa corporal, resistência grave à insulina, acanthosis nigricans) deve ser realizado o teste da tolerância à glucose oral. Em caso de diagnóstico de diabetes, não deve ser administrada hormona do crescimento. Em crianças pequenas com SGA, recomenda-se a determinação do nível de IGF-I antes do início do tratamento e depois, duas vezes por ano. Caso se detectem, em determinações sucessivas, níveis de IGF-1 que excedam +2 DP em relação à referência para a idade, a razão IGF-I/IGFBP-3 pode ser considerada para o ajuste da dose. Existe experiência limitada no início do tratamento em doentes com SGA e que estejam próximos do início da puberdade. Não se recomenda portanto o início do tratamento em doentes com idade próxima do início da puberdade. A experiência em doentes com SGA, com a síndroma de Silver-Russel é limitada. Em crianças com SGA, parte do ganho em estatura obtido com o tratamento com Somatropina pode perder-se, caso este seja suspenso antes de se atingir a estatura final. Deve mudar-se o local da injecção para evitar lipoatrofia. A deficiência em hormona do crescimento no adulto é uma situação vitalícia, pelo que deverá ser tratada adequadamente. No entanto, é limitada a experiência em doentes com mais de 60 anos ou em tratamentos prolongados. Em todos os doentes que apresentem uma patologia aguda crítica, o possível benefício do tratamento com Somatropina deverá ser avaliado relativamente ao potencial risco envolvido. Foram relatados casos de apneia do sono e morte súbita em doentes com Síndroma de Prader-Willi em tratamento com Somatropina. SAIZEN não está indicado no tratamento de doentes com Síndroma de Prader-Willi. INTERACÇÕES MEDICAMENTOSAS E OUTRAS FORMAS DE INTERACÇÃO: A terapêutica concomitante com corticosteróides pode inibir a resposta ao SAIZEN. Verificou-se que a Somatropina induz uma redução ligeira dos níveis de cortisol sérico em doentes com deficiência de hormona do crescimento recebendo terapêutica de substituição das suprarrenais. Consequentemente, nos doentes em terapêutica de substituição com corticosteróides, que iniciam terapêutica com Somatropina, recomenda-se a monitorização dos níveis de cortisol sérico e o eventual ajuste da dose dos corticosteróides. Dados in vitro publicados indicam que a hormona do crescimento pode ser um indutor do citocromo P450 3A4. Desconhece-se o significado clínico desta observação. No entanto, quando a Somatropina é administrada em combinação com medicamentos que se sabe serem metabolizados pelas enzimas hepáticas do CYP P450 3A4, é aconselhável monitorizar a efectividade clínica de tais medicamentos. GRAVIDEZ E ALEITAMENTO: Gravidez: No que respeita a SAIZEN, não existem dados clínicos sobre as gravidezes a ele expostas. Assim, desconhece-se o risco para o ser humano. Embora os estudos em animais não indiquem um risco potencial durante a gravidez, o tratamento com SAIZEN deve ser interrompido no caso de ocorrer uma gravidez. Aleitamento: Desconhece-se se as hormonas peptídicas exógenas são excretadas no leite, mas a absorção da proteína intacta pelo tracto gastrintestinal da criança é improvável. EFEITOS SOBRE A CAPACIDADE DE CONDUZIR E UTILIZAR MÁQUINAS: SAIZEN não interfere com a capacidade de conduzir ou operar com máquinas. EFEITOS INDESEJÁVEIS: Até 10% dos doentes podem apresentar vermelhidão e prurido no local da injecção, particularmente quando se utiliza a via de administração subcutânea. Espera-se que ocorra retenção de fluidos durante a terapêutica de substituição com hormona do crescimento no adulto. Edema, edema articular, artralgias, mialgias e parestesias podem ser manifestações clínicas desta retenção de fluidos. No entanto estes sintomas são geralmente transitórios e dependem da dose. Os adultos com deficiência de hormona do crescimento, em consequência do diagnóstico deste défice na infância, apresentam uma menor frequência de efeitos secundários do que os que iniciam a terapêutica na idade adulta. Podem formar-se anticorpos à somatropina em alguns doentes; desconhece-se o seu significado clínico, e até à data estes anticorpos têm apresentado baixa capacidade de ligação e não têm sido associados a atenuação do crescimento, excepto em doentes com deleções de genes. Em casos muito raros, em que a baixa estatura é devida à deleção do gene da hormona do crescimento, o tratamento com esta hormona pode induzir anticorpos atenuantes do crescimento. As reacções adversas reportadas a seguir encontram-se classificadas de acordo com a frequência de ocorrência, conforme se segue: Muito frequentes: ≥ 1/10; Frequentes: > 1/100 - < 1/10; Pouco frequentes: > 1.000 -< 1/100. Raros: > 1/10.000 - < 1/1.000; Muito raros: ≤ 1/ 10.000. Reacções no local de administração - Frequentes. Reacções no local da injecção: Lipoatrofia localizada, que pode ser evitada variando o local da injecção. Distúrbios do estado geral - Frequentes (no adulto) Pouco frequentes (na criança). Retenção de fluídos: edema periférico, entumescimento, artralgia, mialgia, parestesia - Pouco frequentes: Síndroma do canal cárpico. Sistema Nervoso Central. Pouco frequentes - Hipertensão intracraniana idiopática (hipertensão intracraniana benigna). Doenças endócrinas. Muito raros - Hipotiroidismo. Afecções musculosqueléticas. Muito raros - Deslizamento da epífise da cabeça femural (Epiphysiolysis capitis femoris), ou necrose avascular da cabeça femural. Doenças do metabolismo. A resistência à insulina pode resultar em hiperinsulinismo e, em casos raros, em hiperglicémia. SOBREDOSAGEM: Não foram relatados casos de sobredosagem aguda. Porém, exceder as doses recomendadas pode causar efeitos indesejáveis. Uma sobredosagem pode levar a hipoglicémia e, subsequentemente, a hiperglicémia. Além disso, uma sobredosagem com Somatropina pode causar manifestações de retenção de fluidos. PROPRIEDADES FARMACOLÓGICAS. Propriedades farmacodinâmicas: Grupo farmacoterapêutico: 8.1.1 Hormonas do lobo anterior da hipófise. Código ATC: HO1A. SAIZEN contém hormona do crescimento humana recombinante, produzida por células de mamífero geneticamente modificadas. É um péptido de 191 aminoácidos idêntico à hormona do crescimento humana hipofisária, no que respeita à sequência e composição de aminoácidos assim como ao mapa peptídico, ponto isoeléctrico, peso molecular, estrutura isomérica e bioactividade. A hormona do crescimento é sintetizada numa linha celular murina transformada, modificada através da adição do gene da hormona do crescimento hipofisária. SAIZEN é um agente anabólico e anticatabólico que produz efeito não só no crescimento, mas também na composição e metabolismo do organismo. Interactua com receptores específicos numa variedade de tipos de células incluindo miócitos, hepatócitos, adipócitos, linfócitos e células hematopoiéticas. Alguns, mas não todos os seus efeitos são mediados por uma outra classe de hormonas conhecidas por somatomedinas (IGF-1 e IGF-2). Dependendo da dose, a administração de SAIZEN produz um aumento na IGF-1, IGFBP-3, ácidos gordos nãoesterificados e glicerol, uma diminuição da ureia sanguínea, e diminuição nas excreções urinárias do azoto, do sódio e do potássio. A duração do aumento nos níveis de GH pode desempenhar um papel na determinação da magnitude dos efeitos. É provável uma saturação relativa dos efeitos do SAIZEN com doses altas. Não é este o caso da glicémia e excreção urinária do peptido-C, que só aumentam significativamente após doses elevadas (20 mg). Num ensaio clínico randomizado, crianças pré-pubertárias pequenas com SGA, foram tratadas durante três anos com uma dose de 0,067 mg/kg/dia, e verificou-se um ganho médio de +1,8 DP-estatura. Nas crianças que não receberam tratamento adicional para além dos três anos, perdeu-se parte do benefício, mas as crianças mantiveram um aumento significativo de +0,7 DP-estatura, na estatura final (p<0,01 comparado com o valor basal). Os doentes que receberam um segundo tratamento após um período variável de observação, apresentaram um aumento total de +1,3 DP-estatura (p=0,001 comparado com o valor basal), na estatura final. (A duração de tratamento cumulativa média no último grupo foi de 6,1 anos). O aumento na DP-estatura (+ 1,3 ± 1,1) na estatura final neste grupo foi significativamente (p<0,05) diferente do aumento em DP-estatura obtido no primeiro grupo (+0,7 ± 0,8), o qual recebeu apenas 3,0 anos de tratamento em média. Um segundo ensaio clínico, investigou dois regimes posológicos diferentes durante quatro anos. Um grupo foi tratado com 0,067 mg/kg/dia durante 2 anos e observado durante os 2 anos posteriores sem tratamento. O segundo grupo recebeu 0,067 mg/kg/dia no primeiro e terceiro anos e nenhum tratamento no segundo e quarto anos. Qualquer dos regimes de tratamento resultou numa dose administrada cumulativa de 0,033 mg/kg/dia durante o período de quatro anos do estudo. Ambos os grupos revelaram uma aceleração do crescimento comparável e uma melhoria significativa de +1,55 (p<0,0001) e +1,43 (p<0,0001) DP-estatura respectivamente no final do período de quatro anos do estudo. Os dados sobre a segurança a longo prazo continuam a ser limitados. Propriedades farmacocinéticas: A farmacocinética do SAIZEN é linear pelo menos com doses até 8 UI (2,67 mg). Com doses mais elevadas (60 UI/20 mg) não pode ser excluído um certo grau de não-linearidade, porém sem relevância clínica. Após administração IV a voluntários saudáveis, o volume de distribuição em estado estacionário é de cerca de 7 L, a “clearance” metabólica total é de cerca de 15 L/h, enquanto que a “clearance” renal é insignificante, e o fármaco exibe uma semi-vida de eliminação de 20 a 35 minutos. Após a administração de doses únicas de SAIZEN por via SC e IM, a semi-vida terminal aparente é muito mais prolongada, cerca de 2 a 4 horas. Isto é devido a uma taxa limitada do processo de absorção. As concentrações séricas máximas de hormona do crescimento (GH) são atingidas após aproximadamente 4 horas e os níveis séricos de GH voltam ao valor basal dentro de 24 horas, indicando que não ocorre acumulação de GH durante as administrações repetidas. A biodisponibilidade absoluta de ambas as vias é de 70-90%. INFORMAÇÕES FARMACÊUTICAS: Lista de excipientes: Pó para solução injectável. Sacarose, Ácido Fosfórico, Hidróxido de sódio. Solvente para utilização parentérica. Metacresol a 0,3% (p/v) em água para preparações injectáveis. Incompatibilidades: Não se conhecem presentemente incompatibilidades de SAIZEN com outras preparações farmacêuticas. Prazo de validade: 3 anos. Após reconstituição, o produto deve ser conservado durante um período máximo de 28 dias no frigorífico (2ºC – 8ºC). Os auto-injectores easypod e one.click, quando contendo o cartucho reconstituído de SAIZEN, têm de ser conservados no frigorífico (2ºC – 8ºC). Quando se utilizar o auto-injector sem agulha cool.click, unicamente o cartucho da solução reconstituída de SAIZEN, deverá ser conservado no frigorífico (2ºC-8ºC). Precauções especiais de conservação: Não conservar acima de 25ºC. Não congelar. Conservar na embalagem de origem. Para a conservação do produto reconstituído, ver secção “Prazo de Validade”. Natureza e conteúdo do recipiente. Os frascos para injectáveis DIN 2R de 3 ml contendo 8 mg de pó e os cartuchos de 3 ml contendo 1,37 ml de solvente são de vidro neutro (Tipo 1). Os frascos para injectáveis e os cartuchos são fechados com tampa de borracha. SAIZEN 8 mg click.easy está disponível em embalagens com: 1 frasco para injectáveis de SAIZEN 8 mg e 1 cartucho de solvente bacteriostático pré-incluídos num dispositivo de reconstituição (click.easy) composto pelo corpo do dispositivo com cânula de transferência estéril. Instruçôes de utilização / manuseamento: O cartucho contendo a solução reconstituída de SAIZEN 8 mg click.easy destina-se exclusivamente a ser utilizado com o auto-injector one.click, com o auto-injector sem agulha cool.click, ou com o auto-injector easypod. Para conservação dos auto-injectores contendo o cartucho, ver secção “Prazo de Validade”. Para a administração do SAIZEN 8 mg click.easy, consulte as instruções do folheto informativo e do manual de instruções fornecido com o auto-injector apropriado. Os utilizadores do easypod são principalmente crianças desde os 7 anos até à idade adulta. A utilização de dispositivos médicos por crianças, deverá ser sempre feita sob a supervisão de um adulto. O pó para a solução injectável tem de ser reconstituído com o solvente bacteriostático que o acompanha (metacresol a 0,3% (p/v) em água para preparações injectáveis) para administração parentérica, utilizando o dispositivo de reconstituição click.easy. A solução injectável reconstituída deve ser límpida, sem partículas. Se a solução contiver partículas, não deve ser injectada. Qualquer produto não utilizado ou o material usado deve ser deitado fora de acordo com as exigências locais. TITULAR DA AUTORIZAÇÃO DE INTRODUÇÃO NO MERCADO: Serono Portugal, Lda. R. Tierno Galvan, 16 – B, Amoreiras, Torre 3, 16 º, Esc. 1 - 1070-274 LISBOA. NÚMEROS DA AUTORIZAÇÃO DE INTRODUÇÃO NO MERCADO 3505484- Frasco para injectável – 1 unidade. DATA DA PRIMEIRA AUTORIZAÇÃO/RENOVAÇÃO DA AUTORIZAÇÃO DE INTRODUÇÃO NO MERCADO: Data da Primeira Autorização de Introdução no Mercado: 26/01/2001. Data da Renovação da Autorização de Introdução no Mercado: 03/04/2004. DATA DA REVISÃO (PARCIAL) DO TEXTO: 23 de Fevereiro de 2007. Medicamento sujeito a receita médica. Fornecimento exclusivo hospitalar (CompartIcipado 100% nos estabelecimentos saúde especiais). NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Imagens Filipe Macedo1 Criança do sexo masculino, 3,5 anos de idade com gonalgia bilateral esporádica e varismo acentuado dos joelhos Faz RX dos joelhos. Qual é o seu diagnóstico? Figura 1 - RX dos joelhos (face) __________ 1 Especialista em Radiodiagnóstico – SMIC Porto 148 qual o seu diagnóstico NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 O Rx mostra deformidade em varo das tíbias, com depressão e irregularidade da vertente interna das suas metáfises e redução da altura da vertente interna das suas epífises. Os achados são mais acentuados do lado direito. É um quadro compatível com doença de Blount bilateral. apresenta habitualmente redução da sua altura do lado interno. Pode haver subluxação da tíbia. Com a progressão da doença a vertente interna de fise pode tornar-se estreita, podendo ocorrer fusão prematura e alargamento compensatório da sua vertente lateral. DISCUSSÃO A doença de Blount é a causa mais frequente de tíbia vara, sendo provavelmente causada por um distúrbio da ossificação endocondral devido à transmissão anormal de carga na vertente interna da metáfise tibial(1). Há duas formas: - infantil: a mais frequente. Ocorre entre os 2 e os 3 anos de idade sendo mais frequente na criança obesa(2). É geralmente bilateral, podendo ser assimétrica. - adolescente: ocorre entre os 6 e os 15 anos. É geralmente unilateral. Pode ser ideopática ou secundária a traumatismo ou infecção. Nas fases iniciais da doença pode ser difícil o diagnóstico diferencial com varismo fisiológico das tíbias. Utiliza-se geralmente o ângulo metáfise-diáfise; é o ângulo formado entre uma linha que passa ao longo da metáfise proximal da tíbia e uma linha perpendicular ao maior eixo da diáfise tibial. Ângulos superiores a 11 graus são a favor de doença de Blount(3). IMAGIOLOGIA 1- RX convencional. Faz habitualmente o diagnóstico. Observa-se varismo tibial por angulação da metáfise. Há geralmente deformidade das epífises e metáfises, com irregularidade, angulação interna e formação de bico no seu bordo interno. Este bico pode fragmentar-se. A epífise 2- RMN Pode ser útil para avaliar o estado da fise nomeadamente quanto à existência de pontes fibrosas ou ósseas. Pode ser também útil para avaliar alterações degenerativas meniscais associadas(4). Nascer e Crescer 2007; 16(3): 148-149 BIBLIOGRAFIA 1. Ozonoff MB. Pediatric orthopedic radiology. 2nd Ed, Philadelphia: WB Saunders 1992 2. Dietz WH Jr, Gross WL, Kirkpatrick JA Jr. Blount disease (tibia vara): another skeletal disorder associated with childhood obesity. JPediatr 1982;101:735-737 3. Levine A, Drennan JC. Phisiological bowing and tibia vara. The metaphyseal-diaphyseal angle in the measurement of bowleg deformities.J Bone Surg Am 1982;64:1158-1163 4. Ducou le Pointe H, Mousselard H, Rudelli A, Montagne JP, Filipe G. Blount`s disease: magnetic resonance imaging. Pediatr Radiol 1995;25 :1214 DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL - varismo fisiológico - raquitismo - osteogénese imperfeita e outras displasias TRATAMENTO Conservador Cirúrgico qual o seu diagnóstico 149 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Genes, Crianças e Pediatras Cristina Dias1, Manuela Santos2, Manuela Vilarinho3, Rosário Santos3, Ana Maria Fortuna1, Margarida Reis Lima1 Criança do sexo masculino, enviado à Consulta de Genética aos 9 anos de idade por dificuldades de aprendizagem. Trata-se do 1º filho de casal não consanguíneo, com outra filha saudável. A mãe queixava-se de ter por vezes dificuldade nos movimentos das mãos. A avó materna faleceu aos 45 anos de “patologia cardíaca”. Sem história familiar conhecida de doença genética ou malformações congénitas. O doente nasceu após uma gestação sem intercorrências, parto eutócico às 39 semanas e antropometria adequada ao nascimento. Sem malformações congénitas. No período neonatal, a sucção era fraca; sem hipotonia neonatal descrita. Figura 1 __________ 1 2 3 Unidade de Consulta, Instituto de Genética Médica Jacinto Magalhães Serviço de Neuropediatra, Hospital Especializado de Crianças Maria Pia Unidade de Genética Molecular, Instituto de Genética Médica Jacinto Magalhães 150 qual o seu diagnóstico Relativamente ao desenvolvimento, teve controlo cervical aos 4 meses; sentou sem apoio aos 8,5 meses; marcha autónoma aos 13 meses, insegura, com quedas fáceis. Era considerado como tendo uma descoordenação nos movimentos das mãos. Avaliação do QI Global aos 9 anos:73. Ao exame objectivo aos 9 anos e 3 meses (Figs. 1 e 2): Peso e estatura: Perc 5, PC: Perc 25-50. Face inexpressiva, palato alto e estreito, comissuras labiais inclinadas para baixo, fendas oculares ligeiramente inclinadas para baixo (com distâncias interoculares normais). Pavilhões auriculares descolados. Auscultação cardíaca: reforço de S2. Ligeira dificuldade na extensão das Figura 2 mãos após um movimento sustentado das mesmas em flexão. Alterações de comportamento: irritabilidade, comportamento opositivo e défice de atenção. Restante exame dismorfológico, físico e neurológico sem alterações. Em resumo: criança do sexo masculino com 9 anos e 3 meses referenciado a consulta de genética por dificuldades de aprendizagem, com atraso psicomotor ligeiro, face inexpressiva, alterações do comportamento, palato alto e dificuldades no movimento das mãos. Qual é o seu diagnóstico? NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 O estudo molecular corroborou a hipótese clínica de Distrofia Miotónica 1 (DM1, Doença de Steinert, OMIM #160900). Trata-se de doença de etiologia genética de transmissão autossómica dominante provocada por expansão patogénica de uma região repetitiva CTG na região 3’UTR do gene DMPK localizado em 19q13. A DM1 é das doenças neuromusculares mais frequentes, com uma prevalência estimada de 1/20000. Pode ter um envolvimento multiorgânico: neuromuscular (miotonia, diminuição da força muscular), ocular (cataratas), cardíaco (arritmia), endócrino (hipogonadismo, resistência periférica à insulina), insuficiência respiratória e do SNC (alterações cognitivas, alterações do comportamento). Classicamente divide-se em 4 subtipos de acordo com a idade de início e primeiros sintomas: 1) forma congénita; 2) forma infantil/juvenil; 3) forma (início em idade) adulta; 4) forma (início) tardia/assintomática. Embora haja alguma correlação proporcional entre o tamanho da expansão CTG e a gravidade da doença e idade de início dos sintomas, existe grande variabilidade intra e interfamiliar. Uma expansão superior a 35 é considerada anormal. Este doente tem uma expansão de cerca de 1000 repetições. Um indivíduo afectado tem um risco de 50% de ter um filho afectado. A expansão CTG no gene DMPK é instável na meiose, pelo que o alelo afectado pode sofrer uma expansão, resultando na transmissão de um alelo com uma expansão maior e consequente antecipação (início mais precoce e maior gravidade na geração subsequente). Praticamente 100% dos doentes tem uma expansão detectável por técnicas de genética molecular (PCR e Southern Blot). O diagnóstico pré-natal é possível por amniocentese. Na forma juvenil/infantil da DM1 as dificuldades escolares e face inexpressiva podem ser os primeiros e únicos sinais da doença em idade jovem. As crianças apresentam-se com dificuldades de aprendizagem em idade escolar e frequentemente com alterações do comportamento e dificuldades de socialização. Posteriormente podem surgir a diminuição da força distal e miotonia. Por esse motivo a DM1 é muitas vezes reconhecida tardiamente, principalmente quando não existe uma história familiar confirmada. A cuidadosa observação dos progenitores, assim como a referenciação a consulta de Doenças Neuromsculares e Genética são fundamentais. Foi oferecida Consulta de Genética aos pais deste doente para observação clínica e eventual teste genético molecular e aconselhamento genético. Ao diagnóstico recomenda-se a avaliação cardiológica (ECG, Holter e ecocardiograma), oftalmológica e analítica (nomeadamente endocrinológica) e avaliação com provas funcionais respiratórias. Não existe tratamento específico para a DM1. O seguimento destes doentes é multidisciplinar. Envolve Especialidades como a Neuropediatria e Neurolo- gia, Cardiologia, Fisiatria, Ortopedia, Genética e frequentemente Endocrinologia e Pedopsiquiatria. Nascer e Crescer 2007; 16(3): 150-151 BIBLIOGRAFIA 1. Bouhour F, Bost M, Vial C. Maladie de Steinert. Encyclopédie Orphanet. Avril 2007. Available at www.orpha. net/data/patho/Pro/fr/Steinert-FRfrPro77v01.pdf 2. Marchini C, Lonigro R, Verriello L, Pellizzari L, Bergonzi P, Damante G. Correlations between individual clinical manifestations and CTG repeat amplification in myotonic dystrophy. Clin Genet. 2000; 57: 74-82. 3. Machucha-Tzili M, Brook D, Hilton-Jones D. Clinical and molecular aspects of the nyotonic dystrophies: a review. Muscle Nerve, 2005; 32:1-18. 4. Angeard N, Gargiulo M, Jacquete A, Radvanyi H, Eymard B, Héron D. Cognitive profile in childhood myotonic dystrophy type 1: is there a global impairment? Neuromuscul Disord. 2007;17(6):451-8. 5. Bird, TD. Updated 22 November 2005. Myotonic Dystrophy Type 1. In: GeneReviews at GeneTests: Medical Genetics Information Resource (database online). Copyright, University of Washington, Seattle. 1997-2007. Available at http://www.genetests.org. Accessed 01 October 2007. qual o seu diagnóstico 151 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 XIX reunião do hospital de crianças maria pia S 153 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Métodos de avaliação da tensão arterial e interpretação dos respectivos valores Conceição Mota1, Carmen do Carmo1, Silvia Álvares2, Elói Pereira1 RESUMO A hipertensão arterial (HTA) continua a ser um dos maiores factores de risco para o desenvolvimento de aterosclerose e subsequente doença cérebro e cardiovascular. O papel do pediatra inclui não só a avaliação e terapêutica dos doentes com HTA estabelecida, mas também, a identificação de crianças em risco de HTA e início de medidas de prevenção adequadas. Foi feita a revisão das mais recentes recomendações para a avaliação da tensão arterial e diagnóstico de HTA nas crianças e adolescentes. Foi também abordada a utilização crescente da monitorização ambulatória da pressão arterial (MAPA), a qual permite uma melhor caracterização dos valores da tensão arterial e tem uma boa correlação com as lesões dos órgãos alvo. A interpretação da tensão arterial ambulatória durante o período de 24 horas foi também realçada, assim como a utilidade e limitações do MAPA. Palavras Chave: Hipertensão arterial na criança; monitorização ambulatória da pressão arterial (MAPA) Nascer e Crescer 2007; 16(3): 154-157 A hipertensão arterial (HTA) é um factor de risco cardiovascular bem conhecido nos adultos(1). Apesar da incidência de HTA ser baixa na infância, existe uma evidência crescente de que a HTA essencial tem os seus antecedentes durante a infância e adolescência e a monitorização da tensão arterial (TA) __________ ¹ Serviço de Nefrologia Pediátrica do H. Crianças Maria Pia 2 Serviço de Cardiologia Pediátrica do H. Crianças Maria Pia neste grupo etário poderá ter um impacto importante na doença cardiovascular a longo prazo(2). O aumento progressivo da obesidade na nossa sociedade está a induzir um aumento dos valores da TA e consequentemente de HTA, bem como outros factores de risco cardiovascular, nomeadamente a dislipidémia, a insulinoresistência e o síndrome metabólico(3-5). Neste contexto a perspectiva clínica da TA em idade pediátrica tem-se alterado nos últimos anos com a sistematização da avaliação da TA introduzida na Fourth Task Force Report de 2004, a qual estabelece as mais recentes guias de orientação para a detecção, avaliação e tratamento da HTA das crianças e adolescentes(4). De acordo com essas recomendações deve ser avaliada a TA, nos exames de saúde infantil, a todas as crianças com idade superior a 3 anos. Nas crianças com idade inferior a essa idade deverá ser avaliada a TA, se tiverem história de complicações neonatais requerendo cuidados intensivos, doença cardíaca congénita, infecções do tracto urinário, hematúria, proteinúria, doença renal ou urológica conhecida, história familiar de doença renal congénita, transplante de órgãos sólidos ou medula óssea, malignidade, tratamento com fármacos conhecidos por aumentar a TA, outras doenças sistémicas associadas a HTA ou evidência de hipertensão intracraniana(4). DEFINIÇÂO DE HTA A National High Blood Pressure Education Program Working Group criou tabelas de Percentis para TA na criança em 1987(6) e em 2004 estas tabelas foram actualizadas, tendo sido estabelecido os Percentis de TA de acordo com a idade, o sexo e a altura(4). hipertensão arterial – mesa redonda S 154 XIX reunião do hospital de crianças maria pia A definição de HTA na criança foi estatisticamente definida baseando-se na distribuição normativa da TA de uma larga série de crianças saudáveis, ao contrário à dos adultos em que a HTA foi definida clinicamente como o valor de TA acima do qual foi demonstrado haver benefício clínico com administração de terapêutica anti-hipertensora(1). A definição clínica não pode ser aplicada a crianças, uma vez que as alterações/eventos cardiovasculares tipicamente só ocorrem na vida adulta, com a excepção da hipertrofia ventricular esquerda(1,2,4). A definição de TA normal, prehipertensão e HTA na criança e adolescente estão definidas no quadro 1 de acordo com as últimas orientações da Fourth Task Force Report(4). Foi também estabelecido que TA sistólica e TA diastólica têm igual importância; se houver disparidade, o valor mais alto é o que determina a gravidade da HTA(1,4). TÉCNICA DA MEDIÇÂO DA TA A importância da técnica da avaliação da TA foi bem demonstrada num estudo que fez a comparação da avaliação de TA, em crianças saudáveis, realizada por 10 investigadores(6). Foi verificada uma significativa variação dos valores registados de TA entre os investigadores e os principais factores responsabilizados por esta discrepância foram: o tamanho da braçadeira, número de avaliações efectuadas, tipo de instrumento utilizado, posição do doente (deitado ou sentado) e a escolha do 4º ou 5º som de Korotoff para a determinação da TA diastólica(7). TAMANHO DA BRAÇADEIRA A correcta escolha da braçadeira é importante para se obterem avaliações NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 adequadas. Se é usada uma braçadeira demasiado pequena, os valores obtidos são geralmente superiores à pressão arterial real, levando a uma inflação da TA sistólica. Por outro lado, braçadeiras demasiado grandes condicionam valores mais baixos que as leituras intraarteriais(4,6,7). A 2004 Fourth Task Force Report (4) recomenda que a largura da braçadeira deve ser aproximadamente 40% da circunferência do braço, medida no ponto médio entre o olecrâneo e o acrómio (figura 1). Quando comparadas, as avaliações da TA segundo estas directrizes, com as previamente dadas (2/3 a 3/4 do comprimento da parte superior do braço) foram obtidos valores de TA significativamente mais baixos, o que leva a deduzir que estavam a ser usadas braçadeiras demasiado pequenas com as anteriores recomendações(8). Também está definido(4), que o balão que está dentro da braçadeira deverá ter de comprimento pelo menos 80% da circunferência do braço e esse balão deve ter a razão largura: comprimento de 1:2 (figura 2). APARELHO DE AVALIAÇÃO DA TA O método preferido de avaliação da TA é o método auscultatório, usando um esfingmomanómetro convencional, de mercúrio ou aneróide(4). Actualmente foram retirados da prática clínica os de mercúrio (em virtude do risco de intoxicação) estando só disponíveis os aparelhos aneróides, os quais deverão ser calibrados numa base semestral(4). Os aparelhos oscilométricos ou electrónicos detectam vibrações que se convertem em impulsos eléctricos, os quais são enviados para um transdutor e transformados em sinais digitais(7). Estes aparelhos podem ser usados quando a auscultação é difícil tal como em recém nascidos e crianças pequenas e/ou nos cuidados intensivos quando a monitorização da TA é necessária. Tem duas grandes vantagens: uma utilização fácil e o “erro do medidor” dos métodos auscultatórios ser ultrapassado. Embora essas vantagens tenham levado a uma cada vez maior utilização de aparelhos oscilométricos, não podemos esquecer que os aparelhos oscilométricos medem a TA média e a TA sistólica, sendo a TA diastólica calculada através de um algoritmo, enquanto no método auscultatório as pressões sistólica e diastólica são sempre determinadas pela audição do 1º e 5º som de Korotoff, respectivamente(4). O algoritmo utilizado nos aparelhos oscilométricos é diferente nas várias marcas de aparelhos e a comparação de diferentes aparelhos tem mostrado uma grande variação de valores de TA. Por esse motivo as mais recentes orientações recomendam que as avaliações de TA que excedam o percentil 90, nos aparelhos oscilométricos deverão ser confirmadas pela auscultação(4). Figura 1 - Determinação da largura da braçadeira. AVALIAÇÃO DA TA: PREPARAÇÃO DA CRIANÇA A preparação da criança é fundamental para se obter valores fidedignos. Como é do conhecimento geral as avaliações da TA em crianças ansiosas e/ou agitadas dão geralmente valores enganadores ou falsamente altos. A avaliação de TA ideal é efectuada num ambiente aquecido, calmo e silencioso após 5 minutos de repouso. No lactente a avaliação é efectuada com a criança deitada e na criança e adolescente, se possível, é efectuada sentada, com os pés apoiados no chão e com o braço apoiado de forma que a fossa cubital esteja ao nível do coração(4). NÚMERO DE AVALIAÇÕES A TA altera-se de batimento para batimento em resposta a uma grande variedade de estímulos fisiológicos e ambientais. Embora a média de dois ou três valores de TA durante a consulta tenha demonstrado um significativo valor prognóstico como factor de risco cardiovascular, é claro que uma melhor caracterização dos valores de TA e da sua variabilidade pode levar a uma estratificação do risco mais precisa. Foram-se introduzindo vários métodos para ultrapassar a limitação da avaliação clínica. O primeiro foi a repetição de avaliações de TA, dentro de dias a semanas, de forma a minimizar o risco de falsos positivos. Assim, a Fourth Task Force Report recomenda que, antes de se diagnosticar uma criança assintomá- Figura 2 - Representação esquemática de braçadeira. O balão que está dentro da braçadeira deverá ter um comprimento igual ou superior a 80% da circunferência do braço e esse balão deve ter a razão largura: comprimento de 1:2 hipertensão arterial – mesa redonda XIX reunião do hospital de crianças maria pia S 155 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 tica como hipertensa, dever-se-á repetir a avaliação de TA pelo menos em 3 visitas no mesmo consultório, separadas por dias ou semanas, a não ser que os valores de TA estejam acima do percentil 99 mais 5 mmHg(4). Neste caso, é diagnosticada HTA grave, estadio 2, devendo a criança ser orientada rapidamente para um Centro de Referência. Embora o conceito de pré-hipertensão arterial (quadro I) seja alvo de alguma controvérsia é aconselhável, nestes casos, a vigilância de TA num prazo de 6 meses e o aconselhamento de mudança de estilo de vida, tal como alteração do regime alimentar (emagrecer se necessário) e exercício regular. A persistência destes valores limite antevê o desenvolvimento posterior de hipertensão arterial (2,4). normais no domicílio), sendo a base dos métodos de auto-avaliação (indivíduo /família ) e da monitorização ambulatória da pressão arterial (MAPA). Na MAPA é utilizado um equipamento portátil programado para fazer múltiplas avaliações geralmente durante o período de 24 horas. Durante o dia, são geralmente programadas leituras de 20 em 20 minutos e durante o período repouso nocturno de 30 em 30 minutos ou de 60 em 60 minutos. Além de ser feita a média tensional durante o período de 24 Horas, é também efectuada a média tensional do período diurno e repouso nocturno. Os valores obtidos são habitualmente comparados, na maioria dos estudos, com os valores de TA no ambulatório publicado por Sorger e al(9). MONITORIZAÇÃO AMBULATÓRIA DA PRESSÃO ARTERIAL A realização de várias avaliações da TA, não em presença do clínico/enfermeiro, mas no domicílio, permite ultrapassar a denominada “HTA da bata branca” (TA ≥ percentil 95 no consultório e valores CONCEITO DE “DIPPING” E “BPLOAD” Normalmente, a TA tem um ritmo circadiano, sendo mais alta 13 a 20% durante o dia do que no repouso nocturno. O decréscimo da TA nocturna é chamado o “dipping” nocturno. Doentes que não apre- Quadro I - Definição de Hipertensão arterial e Pré-hipertensão segundo a Fourth Task Force Report (4) • Hipertensão arterial: TA sistólica e/ou diastólica ≥ ao Percentil 95 para o sexo, idade e altura, pelo menos em 3 visitas, separadas por dias ou semanas. - Estadio 1- TA entre o Percentil 95 e o Percentil 99 mais 5 mmHg - Estadio 2- TA > Percentil 99 mais 5 mmHg, • Pré-hipertensão: TA sistólica e/ou diastólica ≥ Percentil 90 mas < Percentil 95, ou se TA> 120/80 mmHg mesmo se inferior ao Percentil 90. • TA normal: TA sistólice e diastólica < Percentil 90. Quadro II - Diagnóstico de “HTA de bata branca” e graus de gravidade da HTA através da MAPA em crianças, segundo Lurbe E. et al(10). Classificação TA clínica* TA sistólica média em ambulatório ** “BP load” sistólico ** TA normal < Percentil 95 < Percentil 95 <25 % “HTA da bata branca” > Percentil 95 < Percentil 95 <25 % HTA estadio 1 > Percentil 95 < Percentil 95 25-50 % HTA estadio 2 > Percentil 95 > Percentil 95 25-50 % HTA estadio 3 (em risco de lesão de orgão alvo) > Percentil 95 > Percentil 95 >50 % * Baseado nos valores publicados pela Fourth Task Force Report. (4) ** Baseado nos valores publicados por Sorger e al. (9) hipertensão arterial – mesa redonda S 156 XIX reunião do hospital de crianças maria pia sentem uma descida de pelo menos 10% da TA média sistólica no período nocturno são rotulados como “não-dippers”(10). O “BP load” ou carga tensional é definido pela percentagem de leituras de TA com o percentil ≥ 95(10). Os doentes com um alto “BP load” e/ou ausência de “dipping” nocturno têm maior risco cardiovascular e lesões nos órgãos alvo(10-17). Lurbe E. et al(10), recomendam que na interpretação da MAPA seja usado simultaneamente a TA média e o “BP load” para o diagnóstico de HTA de “bata branca” e a determinação da gravidade de HTA (ver quadro 2). UTILIDADE DA MAPA Além da MAPA dar uma ajuda importante no diagnóstico de “HTA da bata branca” poderá ser útil na monitorização do doente hipertenso, com aparente resistência a drogas anti-hipertensoras ou com sintomas hipotensivos(10,11). A MAPA poderá dar também uma importante informação no padrão de TA em alguns grupos de doentes, tais como na doença renal crónica, disautonomia e diabetes mellitus(12-14). Foram descritas associações entre a TA ambulatória e o índice de massa ventricular(15), a depuração renal e a presença de cicatrizes renais(16). Alguns dados na literatura mencionam que a MAPA poderá identificar adolescentes e adultos com diabetes mellitus em risco de doença renal(13,14) . Seeman T et al sugerem que a MAPA poderá também ser útil na diferenciação de HTA primária e secundária, em virtude de terem encontrado, mais frequentemente, nas crianças (não medicadas) com HTA secundária uma TA elevada durante a noite de forma sustentada e a ausência de “dipping” nocturno, do que nas crianças com HTA primária(17). Como é óbvio, pelo descrito anteriormente, a MAPA tem tido uma crescente utilização na Pediatria. Deverá contudo ter-se em atenção que o pedido deste exame deverá ser efectuado para uma Unidade de Saúde que disponha de aparelhos validados para este grupo etário e que sejam interpretados por clínicos experientes na leitura de MAPA em crianças e adolescentes(4,18). NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 TECHNIQUES OF BLOOD PRESSURE MEASUREMENT AND INTERPRETATION OF ITS VALUES ABSTRACT Systemic hypertension (HTN) remains one of the major risk factors for the development of atherosclerosis and subsequent cerebrovascular and cardiovascular disease. The role of the pediatrician includes not only the management of patients with established high blood pressure, but also the identification of children at risk of HTN and the initiation of preventive measures when indicated. We review the current recommendations of evaluation of the blood pressure and diagnosis of HTN in children and adolescents. We also approach the increasing use of the ambulatory blood pressure monitoring (ABPM), witch improves the accuracy of blood pressure measurement and is well correlated with end organ injury. The interpretation of the ambulatory blood pressures during a 24-hour period was also emphasized, as well as the utility and limitations of the ABPM. Key words: Hypertension in children; ambulatory blood pressure monitoring (ABPM) Nascer e Crescer 2007; 16(3): 154-157 BIBLIOGRAFIA 1. Chobanian AV, Bakris GL, Black HR, Cushman WC, The Seventh Report of the Joint National Committee on Prevention, Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood Pressure: the JNC 7 report. JAMA. 2003; 289(19):2560-72. 2. Sun SS, Grave GD, Siervogel RM, Pickoff AA, Arslanian SS, Daniels SR. Systolic blood pressure in childhood predicts hypertension and metabolic syndrome later in life. Pediatrics. 2007; 119(2):237-46 3. Lurbe E, Rodicio JL. Hypertension in children and adolescents. J Hypertens. 2004; 22(7):1423-5. 4. The fourth report on the diagnosis, evaluation, and treatment of high blood pressure in children and adolescents. Pediatrics. 2004; 114(2 Suppl 4th Report):555-76 5. Flynn JT, Alderman MH. 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A HTA severa não tratada na criança tem um risco elevado de morbilidade e mortalidade. A prevalência da HTA severa é mais baixa, cerca de 0,1%. Os benefícios de diagnosticar e identificar a HTA ligeira ou valores de tensão arterial (TA) no limite superior do normal são actualmente considerados importantes, porque a predisposição para a hipertensão essencial no adulto pode iniciar-se na idade pediátrica. A HTA primária ou essencial é mais frequente nos adolescentes, está associada a múltiplos factores de risco incluindo obesidade e história familiar de hipertensão. Tem sido verificada uma maior incidência da HTA em idade pediátrica, devido ao aumento da HTA primária ou essencial. Esta hipertensão arterial está associada ao excesso de peso e obesidade e a uma complexa interacção de factores genéticos e ambientais, sendo o seu rastreio de extrema importância. A epidemia de obesidade em pediatria, o risco de HTA e desenvolvimento de hipertrofia ventricular esquerda, a evidência do início precoce da arteriosclerose na criança, implicam uma detecção precoce e intervenção na HTA na criança de modo a reduzir os riscos a longo prazo. Nos últimos anos a determinação da TA tem sido colocada em evidência como uma componente importante do exame físico em pediatria, que conduz ao __________ ¹ Unidade de Nefrologia Pediátrica – Hospital Pediátrico de Coimbra diagnóstico precoce de HTA na criança. A HTA na fase inicial tem geralmente sido considerada uma situação assintomática; no entanto dados recentes demonstram que muitas crianças com HTA têm evidência de lesões de órgão alvo. Na avaliação da criança com HTA, a confirmação de TA persistentemente elevada é da maior importância. A avaliação inicia-se por uma história clínica bem detalhada e orientada para os factores que levam à HTA e um exame físico completo. Depois uma investigação apropriada com exames laboratoriais e estudos especializados, que deve ter em atenção a idade da criança e a severidade da HTA. A investigação deve preocupar-se não só com a etiologia da hipertensão, mas também com os seus efeitos em órgãos alvo. A HTA essencial do adulto inicia-se na infância. A determinação adequada da TA nas consultas pelo pediatra deve fazer parte do exame. Quando descoberta HTA deve ser investigada para ser adequadamente tratada. Todas as crianças com HTA confirmada necessitam de uma vigilância prolongada. O tratamento não farmacológico inclui redução de peso, exercício e modificações na dieta. As recomendações para o tratamento farmacológico são a hipertensão sintomática, evidência de lesão de órgão alvo, hipertensão no estádio 2, hipertensão no estádio 1 não controlada com modificações do estilo de vida, e hipertensão com diabetes mellitus. A HTA e a obesidade são um problema de saúde pública em todo o mundo. Coincidente com o agravamento da epidemia de obesidade, uma recente avaliação indica que a incidência da TA nas crianças de todas as raças tem aumentado na última década(1). Vários estudos demonstram que a lesão de órgão alvo hipertensão arterial – mesa redonda S 158 XIX reunião do hospital de crianças maria pia está com frequência presente na criança com HTA e no adulto jovem, incluindo aumento da arteriosclerose, espessamento da íntima da carótida, hipertrofia ventricular esquerda, proteinúria e alteração moderada da função cognitiva(2,3,4). Nascer e Crescer 2007; 16(3): 158-167 INTRODUÇÃO A hipertensão arterial (HTA) é um factor de risco reconhecido de doença cardiovascular no adulto(5). Na idade pediátrica a HTA é uma patologia rara e habitualmente secundária. Na criança a hipertensão severa não tratada, acompanha-se de elevado risco de morbilidade e mortalidade. A prevalência de HTA na criança é em geral assumida ser 1 a 3%. A prevalência da hipertensão severa é talvez mais baixa, à volta de 0,1%. Do grupo de crianças afectadas por HTA severa, mais de dois terços dos casos têm origem renal(6). Os benefícios de diagnosticar e identificar a HTA ligeira ou valores de TA no limite superior do normal são actualmente considerados importantes, porque a predisposição para a hipertensão essencial no adulto pode iniciar-se na idade pediátrica. Diversos estudos longitudinais demonstram que crianças com níveis de tensão arterial mais elevados, mesmo que dentro de limites considerados normais, apresentam maior probabilidade de vir a ser adultos hipertensos. Tem sido verificada uma maior incidência da HTA em idade pediátrica, devido ao aumento da HTA primária ou essencial. Esta está associada ao excesso de peso e obesidade e a uma complexa interacção de factores genéticos e ambientais e o seu rastreio é de grande importância. NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Há evidência que a hipertensão essencial tem antecedentes durante a infância, e assim a HTA na criança prognostica HTA no adulto(7). A HTA nos adultos está associada a aumento da massa ventricular esquerda, que é um factor de risco de doença cardiovascular(5,8,9). Baseado nestas observações, identificar crianças em risco de hipertensão pode ter um importante impacto nas consequências a longo termo, as doenças cardiovasculares, porque permite ao pediatra identificar crianças com risco aumentado de ser adultos hipertensos, e iniciar assim medidas preventivas em idade precoce. A prevalência da HTA aumenta progressivamente com a idade(10). A prevalência da HTA persistente em pediatria é mais baixa que nos adultos, mas está a aumentar nos últimos 10 anos nos adolescentes (a grande maioria tem HTA essencial) devido à maior incidência de obesidade(11,12). A HTA na criança pré-adolescente geralmente tem uma causa identificável (HTA secundária), enquanto a HTA primária ou essencial é mais frequente nos adolescentes(13). Os doentes com HTA severa em criança têm maior risco de encefalopatia hipertensiva, convulsões, acidentes vasculares cerebrais e insuficiência cardíaca congestiva. O diagnóstico precoce e intervenção na criança com hipertensão são potencialmente benéficos na prevenção das complicações da HTA a longo prazo(14). DEFINIÇÃO DE HTA Um dos factores mais importantes nos estudos da HTA em Pediatria é a definição dos valores de referência a adoptar. Para a população adulta, a definição de HTA é epidemiológica. Ao contrário, para crianças e adolescentes, a definição é estatística(15). As tabelas de percentis da TA são baseadas no sexo, idade e estatura em avaliações em três ocasiões separadas. Nas últimas décadas, as referências mais frequentemente adoptadas na prática clínica foram os relatórios norteamericanos, conhecidos por Relatórios da Task Force, indicados pelo National Heart, Lung and Blood Institute e pela Academia Americana de Pediatria. O primeiro destes relatórios (um conjunto de tabelas e gráficos) foi publicado em 1977(16). Um segundo relatório foi publicado em 1987(17). Em 1996, foi publicada a actualização do relatório da Task Force de 1987, que conseguiu corrigir um importante factor de erro nos valores de referência, o tamanho da criança (com valores limites específicos para cada faixa de percentil de estatura e separados para idade e sexo)(18). Outra mudança adoptada por esta actualização foi quanto à determinação da tensão diastólica. A fase dos tons de Korotkoff que define a pressão diastólica em crianças é controversa. Na criança e particularmente na adolescência, diferenças de alguns milímetros de mercúrio (mmHg) são frequentes entre o 4° e o 5° tom de Korotkoff. Em algumas crianças, os sons podem ser ouvidos até o zero. A actualização de 1996 recomenda utilizar o 5° tom de Korotkoff para definir a tensão diastólica, uniformizando-se assim a sua determinação para todas as idades. Estas guidelines da Task Force foram adaptadas em 2004(19,.20). As tabelas de percentis da TA são baseadas no sexo, idade e estatura em avaliações em três ocasiões separadas. Hipertensão Estádio 2: TA sistólica e diastólica > 5 mmHg do percentil 99. A TA sistólica e diastólica tem igual importância. Se existir uma disparidade valor mais elevado entre ambas determina a severidade da HTA. A MEDIÇÃO DA TENSÃO ARTERIAL Uma técnica correcta da medição da TA é importante. Os factores que podem levar a erros incluem: tamanho da braçadeira, número de medições, tipo de método utilizado, posição da criança (pé ou sentada), e escolha do tom de Korotkoff (quarto ou quinto som) utilizado para determinar a TA diastólica(21,22). A correcta escolha do tamanho da braçadeira é importante. Se é usada uma braçadeira pequena a TA sistólica será mais elevada. Por outro lado uma braçadeira grande dá valores mais baixos da TA. Este é um dos principais factores de erro na medição da tensão arterial. O comprimento braçadeira ideal, adequada ao tamanho do membro superior, deve envolver 80 a 100% da circunferência do braço e a largura da bolsa de borracha do manguito deve corresponder a 40% da circunferência do braço, entre o olecranon e o acromion(23). Tabela I - Dimensões recomendadas das braçadeiras Idade RN Lactente Criança Adolescente Adulto Coxa Largura (cm) 4 6 9 10 13 20 Considera-se: Normal: TA sistólica e diastólica < percentil 90 (para idade, sexo e estatura). Pré-hipertensão: TA sistólica e diastólica percentil 90 mas < percentil 95 (idade, sexo e estatura), ou TA ≥ 120/80 mmHg, mesmo se < percentil 90 (frequente nos adolescentes). Hipertensão Estádio 1: TA sistólica e diastólica ≥ percentil 95 e ≤ 5 mmHg do percentil 99. Comprimento Circunferência (cm) do braço (cm) 8 10 12 15 18 22 24 26 30 34 42 52 Antes de determinar a TA, estimulantes devem ser evitados. A TA deve ser medida preferencialmente com a criança calma e tranquila, em ambiente agradável, após 5 minutos de repouso, na posição sentada e com o braço direito apoiado e ao nível do coração. Se valor> percentil 90, a tensão arterial deve ser avaliada duas vezes com um intervalo de 1 a 2 minutos no mesmo gabinete(24). hipertensão arterial – mesa redonda XIX reunião do hospital de crianças maria pia S 159 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 A TA deve ser determinada 2 vezes em cada observação. Se segundo valor diferente e maior que 5 mmHg do primeiro, medições subsequentes devem ser efectuadas até que um valor estável seja atingido. Confirmar valores elevados de TA com avaliações em três ocasiões separadas por dias ou semanas, antes de diagnosticar HTA(22,23). Medir TA em crianças não cooperantes ou agitadas dá resultados falsos. O método preferido e ideal de determinar a TA é o auscultatório (esfigmomanómetro standard), com o estetoscópio colocado em cima do pulso da artéria braquial na fossa cubital. Embora o esfigmomanómetro de mercúrio seja o mais preciso, a sua acessibilidade está restringida pelo potencial risco de intoxicação pelo mercúrio. Na auscultação dos tons de Korotkoff, padronizou-se o primeiro tom (aparecimento do som) como tensão sistólica e o quinto (desaparecimento dos sons) como a tensão diastólica(23). Nas crianças acima dos três anos de idade, deve sempre ser medida a tensão arterial quando observadas em consulta. Abaixo dos 3 anos deve ser avaliada a TA quando: história de prematuridade, ACIU, história de complicações neonatais com necessidade internamento em UCI, cardiopatias congénitas, história familiar de doença renal congénita, infecções urinárias de repetição, hematúria, proteinúria, doença renal ou urológica conhecida, transplantação, doenças malignas, ou outra doença sistémica associada a HTA, evidência de aumento da pressão intracraneana, tratamento com drogas que elevem a TA. Utilizando métodos oscilométricos, se TA > percentil 90, deve confirmar-se com método auscultatório. Outro motivo de preocupação é que os aparelhos oscilométricos requerem manutenção e calibrações frequentes (semi-annual), mas devem ser utilizados na impossibilidade de usar manómetros de mercúrio, devendo haver cuidado na interpretação dos valores de TA. Os métodos automáticos são usados para medir a tensão arterial em pediatria, quando é difícil usar método auscultatório como nos recém-nascidos e lactentes ou em cuidados intensivos quando são necessárias avaliações frequentes da TA(24). Os aparelhos automáticos medem a tensão arterial media e calculam a sistólica e diastólica a partir desses valores(24). A Coarctação da aorta é uma causa frequente de HTA na criança jovem. A TA deve ser medida em ambos os braços e pernas na primeira visita, particularmente se os pulsos femorais são fracos ou ausentes. Monitorização ambulatória da pressão arterial (MAPA) na criança: A TA tem alterações contínuas em resposta a estímulos fisiológicos e ambientais. No adulto, a MAPA tem melhor correlação com o risco de complicações cardiovasculares e lesões de órgãos alvo, que a determinação da TA no gabinete do consultório(25). A MAPA requer que o doente use um monitor portátil, baseia-se no princípio que repetidas medidas da TA durante as 24 horas promovem melhor aproximação ao verdadeiro nível da TA, que uma medida isolada. A taxa de sucesso da MAPA em crianças é influenciada pela idade, sendo a idade escolar e adolescência as mais receptivas ao exame. Na prática clínica, as indicações da MAPA são: diagnóstico de “hipertensão arterial da bata branca” (criança com TA normal, mas que na consulta fica ansiosa e com TA ≥ percentil 95, que não é confirmada através da MAPA), HTA com resistência à terapêutica ou quando sintomas de hipotensão, para estabelecer padrão de HTA nos doentes com doença crónica renal ou diabetes tipo 1(26) A MAPA tem também um papel na distinção de HTA primária e secundária e na identificação de doentes em risco de HTA com lesão de órgão alvo(27). É possível que a HTA da bata branca na criança represente duas populações: uma com risco de desenvolver HTA essencial e outra que mantêm HTA da bata branca persistente ou regride para tensão normal. DETERMINANTES DA TA A estatura é essencial na determinação da TA na criança, sendo necessário incluir o percentil da estatura para determinar se a TA da criança é normal. hipertensão arterial – mesa redonda S 160 XIX reunião do hospital de crianças maria pia A HTA caracteriza-se como uma doença poligénica. A pressão arterial é determinada pela interacção entre factores genéticos e ambientais. A relação entre estes factores inicia-se ainda no período pré-natal. Há evidência que bebés com baixo peso ao nascer, e crescimento mais lento no primeiro ano de vida, têm maior incidência de HTA e morte por acidentes cardiovasculares quando adultos. Esse conceito ficou conhecido como hipótese de Barker(28). O aumento da prevalência da HTA é em parte originado pelo aumento da prevalência da obesidade. A incidência de HTA nos adultos está relacionada com a raça, com evidência TA significativamente mais alta nos AfroAmericanos(29). Uma história familiar de HTA está presente em cerca de 70 to 80 % de todos os doentes com HTA essencial (comparado com 40 % ou menos nos doentes com HTA secundária). A hereditariedade da HTA essencial é provável que seja poligénica(30). Há evidência que o aleitamento materno pode estar associado com TA mais baixa na criança. ETIOLOGIA DA HTA A HTA secundária é mais frequente na criança pré-adolescente e a principal etiologia são as doenças do parênquima renal (60 a 70 %)(31). Os adolescentes geralmente têm HTA primária ou essencial. Principais causas de hipertensão arterial secundária: Renal (60-70%): Pielonefrite, Doença parênquima renal, Anomalias congénitas, Nefropatia de RVU, Púrpura de Henoch Schonlein, Traumatismo, Hidronefrose, Litiase, Síndrome hemolítico urémico, Tumor de Wilms, Hipoplasia renal, Doença Poliquística Renal. Renovascular (10%): Anomalias da artéria renal (hipoplasia, estenose), Trombose veia renal. Endócrina (<5%): Hipertiroidismo, Hiperplasia congénita da Supra-renal, Cushing, Hiperaldosteronismo e Hiperparatiroidismo primários, Feocromocitoma, Hipercalcemia. Cardiovascular (2%): Coarctação da aorta, Persistência do canal arterial, Insuficiência aórtica. NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Neurológica: Hipertensão intracraniana, Síndrome Guillian-Barré Neurológica: Simpaticomiméticos, Corticoides, Intoxicação por chumbo. Outras: Neurofibromatose, Esclerose tuberosa, Neuroblastoma, Imobilização prolongada. Hipertensão primária ou essencial (2-10%) As principais causas de hipertensão arterial, de acordo com o grupo etário, são(31): Recém-nascido: trombose de artéria renal, estenose de artéria renal, trombose venosa renal, anormalidades renais congénitas, coarctação da aorta, displasia broncopulmonar (menos comum), PCA (menos comum), hemorragia intraventricular (menos comum). Primeiro ano de vida: coarctação da aorta, doença renovascular, doença do parênquima renal. De 1 a 6 anos: doença do parênquima renal, doença renovascular, coarctação da aorta, hipertensão essencial, causas endócrinas (menos comum). De 6 a 12 anos: doença do parênquima renal, doença renovascular, hipertensão essencial, coarctação da aorta, causas endócrinas (menos comum), iatrogénicas (menos comum). De 12 a 18 anos: hipertensão essencial, iatrogénicas, doença do parênquima renal, doença renovascular (menos comum), causas endócrinas (menos comum), coarctação da aorta (menos comum). A HTA secundária é mais frequente na criança que no adulto. Quanto mais severa a HTA e mais jovem a criança, mais provável é a HTA ser secundária. As doenças renais são a principal causa de HTA secundária na criança (cerca de 60-70%). O mecanismo mais comum da hipertensão é a expansão do volume plasmático (como na glomerulonefrite aguda pós-estreptocócica) e a activação do sistema renina-angiotensina. Antecedentes de infecções urinárias de repetição devem fazer suspeitar de nefropatia de refluxo (nefropatia cicatricial). Um rim cicatricial unilateral pode ser a causa da HTA. O rim displásico multiquístico sem função geralmente sofre involução e só raramente é causa de HTA. HTA é muito frequente após transplante renal. A HTA de causa renovascular na criança é causada por um grupo diverso de lesões, e quase metade dos casos resulta de displasia fibromuscular. Outras etiologias incluem hipoplasia da artéria renal, arterite e neurofibromatose tipo 1 (32). Suspeitar de HTA renovascular no lactente com antecedentes de colocação de cateter arterial umbilical. HTA após história de traumatismo renal pode ser originada por compromisso renovascular directo ou por compressão de vasos ou do parênquima renal pelo hematoma. A Coarctação da aorta é uma das principais causas de HTA na criança jovem. Outras causas incluem: doenças endócrinas (feocromocitoma, hipertiroidismo), medicamentos (contraceptivos orais, simpaticomiméticos, suplementos dietéticos…). No S. de Turner foram descritas anomalias vasculares. A cafeína, ansiedade, stress podem originar HTA transitória, que pode ser confundida com HTA. A intoxicação com mercúrio está associada a hipertensão, pode ser severa e simular algumas características do feocromocitoma. Hipokaliemia e alcalose metabólica com perda urinária de potássio indicam excesso primário mineralocorticoides, sendo a causa mais comum na criança o aumento de secreção de desoxicorticoesterona na hiperplasia congénita da suprarenal devida a défice 11-beta hidroxilase e 17 alfa hidroxilase. Os tumores secretores de aldosterona são raros na criança, mas o hiperaldosteronismo primária pode ter uma causa genética. A Hipertensão primária ou essencial é rara na criança abaixo dos 10 anos e é um diagnóstico de exclusão. Mais frequente na idade pós-pubertária, quando há história familiar de HTA, obesidade e com valores de TA cerca do percentil 95 ou ligeiramente acima (Pré-hipertensão ou no Estádio 1). Factores de risco significativos incluem, síndroma metabólica, obesidade, sindroma de apneia do sono e raça negra. Os factores de risco de sin- droma metabólico incluem lipoproteinas de alta densidade (HDL) baixas, triglicerídeos elevados, obesidade abdominal e hiperinsulinemia/resistência à insulina. O índice de massa corporal (peso em Kg / estatura em m2) deve ser calculado. Valores: normal (< 25); excesso de peso (30 a 39,9) e obesidade marcada (> 40). A obesidade e HTA estão associadas com sindroma metabólica, que é um factor de risco importante para o futuro desenvolvimento de diabetes tipo 2 e doença cardiovascular(33). O QUE FAZER SE TA ELEVADA? 1- Confirmar ser HTA verdadeira: Repetir as medições da TA até confirmar elevação persistente; Excluir cuidadosamente erros nas determinações da TA; Utilizar as condições adequadas e o mesmo método de confiança; Correcta interpretação dos valores de TA. 2- Excluir causas reactivas de TA elevada: É importante que as causas transitórias de HTA sejam excluídas (dor, ansiedade, stress, …). Mas devemos ter a certeza que a elevação da TA não é um fenómeno protector ou epifenómeno antes de se iniciar um tratamento. A HTA transitória também pode reflectir um aumento da actividade simpática por exemplo em situações de hipovolémia ou insuficiência cardíaca. A HTA reactiva pode ser um mecanismo protector e reflexo nas situações cerebrovasculares com aumento da pressão intracraneana e diminuição da perfusão cerebral. Baixar a TA nesta situação pode precipitar enfartes cerebrais. Não confundir esta situação com a encefalopatia hipertensiva. A história clínica e o exame clínico cuidadosos são a chave do diagnóstico. 3- Reconhecer aumento transitório da TA: Há situações frequentes como as nefrites agudas ou raras como sindroma de Guillain-Barré, hipercalcemia, intoxicação pelo chumbo, disautonomia familiar, medicamentos (corticoides…), excesso na administração de soros, plasma ou sangue que podem associar-se a HTA. hipertensão arterial – mesa redonda XIX reunião do hospital de crianças maria pia S 161 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 ABORDAGEM DA CRIANÇA COM HTA As crianças com HTA severa podem apresentar evidência de lesões de órgão alvo como cardiomegalia, retinopatia, lesão renal e encefalopatia. Nestas situações é necessário tratamento de emergência da HTA. São em regra crianças pré-adolescentes com HTA secundária, com complicações e que estão em risco de ter lesões de órgão alvo, que necessitam de tratamento de emergência. Todas as investigações básicas devem ser efectuadas. Se a criança está sintomática deve iniciar-se tratamento intravenoso, baixar a TA de forma lenta, monitorização (TA invasiva se possível) e vigilância em cuidados intensivos(34). Num segundo grupo com HTA elevada (estádio 2), sem evidência de lesões em órgão alvo, devem antecipar-se as previsíveis complicações ou lesões de órgãos alvo. São geralmente adolescentes com HTA essencial. Estas crianças devem ter uma investigação básica e é essencial uma vigilância a longo prazo. Um terceiro grupo com HTA no estádio 1 ou Pré-hipertensão (TA sistólica e diastólica percentil 90 mas < percentil 95) e nos adolescentes TA ≥ 120/80 mmHg, mesmo se < percentil 90, são indicação de factor de risco cardiovascular e modificação do estilo de vida. O tratamento só deve ser considerado após um período de seguimento. O objectivo do tratamento da HTA é a prevenção das complicações e das lesões de órgãos alvo. A HTA associada a complicações a curto prazo é severa, habitualmente apresenta-se na criança jovem, é sintomática (irritabilidade, alterações do comportamento, atraso de crescimento, paralisia facial, cefaleias, convulsões…) e de etiologia secundária. Ao contrário a HTA associada a complicações a longo prazo (vários anos ou décadas), apresenta-se na puberdade, com valores de TA Pré-hipertensão ou Estádio 1, assintomática, etiologia primária ou essencial e sem lesões de órgão alvo. A evidência de lesão de órgão alvo na HTA não tratada na criança pode ocorrer após muitos anos (complicações a longo prazo). Marcadores potenciais de lesões de órgão alvo foram identificados: cérebro (alterações detectadas pela TAC e RMN), olhos (retinopatia), rim (microalbuminuria, alteração da filtração glomerular, baixa da reserva funcional renal) e coração (hipertrofia ventricular esquerda, disfunção diastolica). A ecocardiografia é recomendada como instrumento principal na avaliação da criança com HTA. Se a determinação de TA ≥ P90 e < P 95 e/ou TA 120/80 mmHg: deve repetir-se a medição na mesma consulta. Se confirmada reavaliar dentro de 3 - 6 meses. Não iniciar terapêutica, excepto se doença crónica renal, diabetes mellitus, insuficiência cardíaca ou hipertrofia ventricular esquerda Se a determinação de TA ≥ P95 deve fazer-se o estadiamento: No Estádio 1 deve ser repetida medição em duas ocasiões separadas, com intervalos de 1 semana, ou antes se sintomático. No Estádio 2 deve avaliar-se imediatamente, investigar e iniciar terapêutica. AVALIAÇÂO DIAGNÓSTICA (HISTÓRIA E EXAME FÍSICO) Quando confirmado o diagnóstico de HTA, uma história e exame clínico adequados são essenciais na avaliação da criança com HTA, para identificar etiologia da HTA, detectar lesão em órgão alvo e evitar exames complementares desnecessários e dispendiosos. Quanto menor a idade e mais elevada a TA, maior a probabilidade da hipertensão arterial ser secundária, por este motivo, mais minuciosa deve ser a investigação(13). A investigação inicia-se pela história clínica detalhada e orientada para factores de risco de HTA. Alguns pontos importantes são: História pré-natal e do parto (sofrimento fetal, oligoamnios, anóxia perinatal, peso de nascimento, cateterismo umbilical, etc.). Sintomas específicos da hipertensão (cefaleias, vómitos, epistáxis, vertigens, escotomas, etc.); outros sintomas como dor abdominal, perda de peso, fraqueza muscular, palpitações, suores, febre, episódios de rubor facial. Doenças renais e urológicas actuais ou pregressas (ex. infecções urinárias); disúria, poliúria, noctúria, hematúria, dores articulares, edemas. hipertensão arterial – mesa redonda S 162 XIX reunião do hospital de crianças maria pia Medicação que podem elevar TA (vasoconstritor nasal, corticóides, anticoncepcionais…); Sintomas sugestivos de causa endócrina (ex. perda de peso, sudorese, taquicardia, palpitação, febre, caimbras e fraqueza muscular). História familiar de hipertensão essencial, doenças cardiovasculares, diabetes, obesidade, dislipidemia, distúrbios de sono, doenças hereditárias renais ou endócrinas ou doença genética associada à hipertensão secundária (ex. doença poliquística, etc.). Há uma associação de apnea do sono a obesidade e HTA. Antecedentes pessoais de hábitos alimentares, actividade física, consumo de bebidas alcoólicas, fumar, anticonceptivos orais. O exame físico é muito importante e deve procurar-se sinais sugestivos de HTA secundária e evidência de factores de risco adicionais (ex: obesidade abdominal) e lesão de órgãos alvo. Algumas das alterações que são citadas abaixo podem auxiliar no diagnóstico de hipertensão secundária: Determinar peso, estatura e índice de massa corporal, porque há uma associação entre obesidade e HTA. O exame deve incluir: avaliar sinais como palidez, edemas palpebrais e pré-tibiais, sudorese, alterações da pele. A palpação do abdómen e tiróide, auscultação de sopro nos grandes vasos e um exame cardíaco e neurológico completo (paralisia facial…). Medir TA nos membros superiores e inferiores e a palpação cuidadosa de pulsos, para excluir Coarctação da Aorta. Ambiguidade genital é sugestiva de hiperplasia congénita de supra-renal. Sinais físicos sugestivos de doenças genéticas (ex.: neurofibromas e manchas café-com-leite na neurofibromatose); Sinais clínicos sugestivos de síndromes associados a HTA (S. de Turner, S. Williams, Neurofibromatose, Esclerose tuberosa, S. de Cushing); Sinais sugestivos de causa endócrina como obesidade central, fácies de lua cheia, hirsutismo, aumento da tiróide. O exame do fundo ocular é parte importante do exame físico. Pensar em HTA secundária se: HTA em crianças < 10 anos, HTA no estádio 2 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 ou no estádio 1 associando sinais clínicos de doença sistémica. A HTA renovascular afecta 5 – 25% das crianças com HTA secundária,e a displasia fibromuscular a causa mais comum (35). Um sopro abdominal pode ser auscultado em cerca de 40% dos doentes. Sinais de doença renal ou renovascular como massa renal, edema, sopro abdominal, sopros e massas abdominais. A HTA Primária tem muitas vezes uma história de HTA ou doença cardiovascular. INVESTIGAÇÂO DA HTA Quando investigar? Todas as crianças com TA ≥ P95, em avaliações repetidas. Todas as criança com TA entre P90 e 95 e com co-morbilidades associadas (obesidade, diabetes mellitus, história familiar HTA). Todas as crianças com suspeita de HTA da “bata branca” (MAPA de TA) Investigação de 1ª linha: deve ser realizada na criança hipertensa. Com ela avaliam-se algumas das principais causas de HTA secundária (renal 60-70%), lesões em órgãos alvo e factores de risco associados de doença cardiovascular. Estes exames também devem ser efectuados, na criança com pré-hipertensão, que é obesa e tem história de HTA ou doença cardiovascular ou doença renal crónica. A investigação inicial da criança com HTA persistente deve incluir: Hemograma completo (se evidenciar anemia pode reflectir uma doença crónica como uma vasculite ou doença renal crónica); Ureia, creatinina, ionograma, cálcio, fósforo, ácido úrico, proteínas totais, albumina. Glicemia em jejum e ficha lipídica. Gasimetria (permitem uma avaliação rápida da função renal e anomalias da homeostase); Doseamento de renina e aldosterona; Análise de urina tipo II com doseamento de proteínas e creatinina; urocultura; Radiografia do tórax; Ecografia renal (cicatrizes, anomalias congénitas, dimensões renais, massas renais ou da supra-renal); Ecografia cardíaca (cardiopatia ou sinais indirectos de HTA: hipertrofia ventricular esquerda ou disfunção diastólica). Para avaliar a hipertrofia ventricular esquerda (HVE), que é evidência clínica major na criança de lesão de órgão alvo pela HTA. É uma indicação para se iniciar ou intensificar o tratamento da HTA. Elevações severas da TA, independentemente da idade, necessitam investigação mais agressiva. A HTA leve, ao contrário, usualmente não está associada com doença secundária. Tem sido proposto que, para adolescentes assintomáticos, com HTA leve, só estudos mínimos são necessários (1ª linha). Baseado na história clínica, exame físico e exames laboratoriais iniciais, o Pediatra deve ser capaz de estabelecer quando a HTA é essencial (primária) ou secundária. Esta distinção determinará as avaliações seguintes das possíveis causas da HTA. Investigação de 2ª linha: é mais agressiva e realizada nas crianças com níveis de TA mais elevados, com menor idade ou que apresentem lesão em órgão alvo na avaliação da fase 1 (ex. hipertrofia ventricular esquerda). Os exames devem ser realizados de acordo com a clínica de cada doente. Se há suspeita de doença renal crónica: Cintigrama DMSA (o exame mais sensível para detectar cicatrizes renais); Eventual biopsia renal. Se há suspeita de HTA renovascular: Ecografia doppler renal; Cintigrama com DMSA basal e após administração IECA; AngioTAC, angioRMN; Dosear renina nas veias renais; Angiografia renal convencional (diagnóstica e terapêutica). Se suspeita de feocromocitoma: Catecolaminas (ácido vanilmandélico) na urina de 24 h; Cintigrafia com meta-iodo-benzil-guanidina (MIBG). Outras suspeitas: TAC abdominal; Hormonas: T3, T4, TSH, 17-cetoesteriodes urinários Teste de supressão com dexametasona. Tóxicos na urina. Por exemplo, se história de HTA em picos, associada a palpitação, taquicardia e sudorese, começar a investigação pela dosagem de catecolaminas; enquanto que um doente, com história de infecção urinária de repetição, iniciar com a cintigrafia renal e uretrocistografia miccional (cicatriz renal? Refluxo vésico-ureteral?). A doença renovascular é uma das causas mais frequentes de HTA secundária na infância. É uma doença grave, cerca de 5% a 25% das crianças com HTA secundária têm causa renovascular (35). As crianças jovens com elevações severas da TA são as mais propensas a ter doença renovascular. A displasia fibromuscular é a causa mais comum de hipertensão renovascular na infância. O diagnóstico de HTA renovascular é a parte mais problemática da investigação, pois pode necessitar de métodos invasivos para confirmação diagnóstica (arteriografia renal e colheita para dosear renina na veia renal). Com a Ecografia renal com Doppler de cor é possível detectar estenose da artéria renal, mas está muito dependente da experiência do operador. É em regra, o primeiro exame efectuado, porque não é invasivo e não é caro. A actividade da renina plasmática está elevada na criança com HTA renovascular, mas tal como no adulto, é um teste relativamente insensível. Cerca de 15% das crianças com estenose da artéria renal evidente na arteriografia têm níveis normais de renina. O cintigrama renal DMSA sem e com inibidores da enzima de conversão da angiotensina (IECA) demonstrou ser útil como um teste de screening inicial. A angiorressonancia magnética tem vindo a tornar-se mais fiável na avaliação da doença renovascular, requer imobilização (anestesia nas crianças pequenas). As reconstruções tridimensionais com AngioTAC ou AngioTAC espiral com contraste parecem promissoras. O doseamento de renina na veia renal, é um método invasivo que necessita cateterização e têm limitações inerentes. No entanto, a avaliação “golden standard” da doença renovascular na criança continua a ser a angiografia renal standard ou a angiografia de subtracção hipertensão arterial – mesa redonda XIX reunião do hospital de crianças maria pia S 163 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 digital. Com um radiologista de intervenção experiente a dilatação da artéria renal estenosada pode ser efectuada na mesma sessão(36). O tratamento médico é o método de preferido para controlar a HTA. A reparação cirúrgica ou angioplastia percutânea transluminal (incluindo stent) pode ser necessário se o tratamento médico não controla a HTA, a medicação não é adequadamente cumprida, ou a tentativa de cura definitiva é desejada pela criança/família. Se a doença renovascular é diagnosticada num rim com função muito diminuída, neste caso a nefrectomia pode ser a melhor opção. A causa mais comum de HTA cardiovascular é a Coarctação da aorta, que ocorre de forma esporádica, mas também é comum na criança com S. de Turner. O diagnóstico é usualmente evidente no exame físico, porque o pulso femoral é fraco ou ausente e pelo diferencial na TA entre os membros superiores e inferiores. Um sopro sistólico está frequentemente presente. O diagnóstico não invasivo é efectuado por Ecocardiograma. Excluir sempre HTA secundária a medicamentos (contraceptivos orais, corticoesteroides, anti-inflamatórios, cocaína, anfetaminas, eritropoietina e ciclosporinas. Outras causas raras de HTA incluem as doenças endócrinas, como hipertiroidismo, sindroma de Cushing, hiperaldosteronismo primário, e alguns tumores endócrinos incluindo o feocromocitoma e neuroblastoma. Os feocromocitomas são responsáveis por cerca de 1% de HTA secundária na criança e podem surgir de forma esporádica ou em associação com S. de von Hippel-Landau, S. neoplásicos endócrinos múltiplos, neurofibromatose e S. paragangliomas. A criança pode apresentar-se com cefaleias, palidez com rubor, taquicardia, febre, suores e náuseas ou perda de peso, apesar de apetite. Estes sintomas são geralmente associados a HTA que é mais persistente que paroxística. O diagnóstico é efectuado pela determinação das catecolaminas na urina de 24 h, e localização do tumor pela cintigrafia com meta-iodo-benzil-guanidina (MIBG) ou imagiologia TAC ou Ressonância magnetica (RM). Causas raras de HTA hereditária têm sido identificáveis, nomeadamente, S. Liddle’s, Excesso aparent de mineralocorticoides, Aldosteronismo e Hiperplasia suprarrenal congénita causada por mutações do gene 11b-hydroxylase. Uma hipokalemia inexplicável e alcalose metabólica com perda de potássio urinário é muito sugestivo de excesso primário de mineralocorticóides. Estes doentes não apresentam edemas. Tumores secretores de aldosterona, são raros na criança mas comuns nos adultos. A causa mais frequente nas crianças é o excesso de desoxicorticoesterona. Este último é caracterizado por ambiguidade genital. Os níveis de renina estão baixos. A HTA essencial é uma doença multifactorial na origem, e resulta de uma combinação de genética e factores ambientais. É uma doença de carácter poligénico. Nos anos recentes, a HTA essencial, tem aumentado na criança e adolescente e a HTA essencial tem aumentado nos anos recentes, e está associado com um aumento da prevalência da obesidade(37). TRATAMENTO O objectivo do tratamento é reduzir a TA abaixo do percentil 90, prevenir as complicações tardias da HTA e deve incluir medidas não farmacológicas e farmacológicas. Tratamento não farmacológico Reduzir o peso na criança obesa: A obesidade é um factor de risco independente para o desenvolvimento de HTA e doenças cardiovasculares. A redução de peso baixa a TA sistólica e diastólica na criança e adolescente obeso. Dieta pobre em sal: A redução da ingestão de sal baixa a TA nos adultos hipertensos. Na criança não há estudos a longo prazo no efeito da restrição de sódio na TA. No entanto, geralmente a ingestão de sódio é elevada, a redução na dieta pode ser benéfica. É benéfico em etiologias de HTA em que há retenção de sal (glomerulonefrite, hiperaldosteronismo, HTA com renina elevada). Do ponto de vista prático, não adicionar sal aos alimentos cozinhados em casa, evitar a ingestão de alimentos processados industrialmente, tais como enlatados, con- hipertensão arterial – mesa redonda S 164 XIX reunião do hospital de crianças maria pia servas, enchidos e fumados, aumentar o consumo de fruta e vegetais frescos. Exercício físico regular: O exercício físico aeróbio dinâmico (andar, correr, bicicleta), auxilia na redução de peso e é recomendado porque diminui a resistência vascular periférica e a TA sistólica e diastólca. Ao contrário do exercício dinâmico, durante o exercício estático as resistências periféricas não se modificam e a TA sistólica e diastólica aumenta. As crianças com HTA podem praticar desportos se a sua TA está bem controlada. A combinação das medidas não farmacológicas, modificando hábitos de vida (perder peso, exercício, dieta pobre em sal e gorduras), resulta na baixa da TA. As medidas não farmacológicas devem continuar após se iniciar tratamento farmacológico, porque são de baixo custo e risco mínimo, aumentam a eficácia do tratamento medicamentoso e reduzem o risco cardiovascular. Tratamento farmacológico O tratamento farmacológico da HTA deve ser iniciado na criança e adolescente nos seguintes casos: HTA significativa e persistente sem resposta às medidas não farmacológicas; HTA severa na apresentação; HTA com lesão de órgão alvo ou HTA sintomática e Secundária. Muitos dos medicamentos anti-hipertensores usados no adulto são também usados na criança. Apenas alguns foram testadas especificamente em crianças, na maioria as dosagens são extrapoladas de dados farmacocinéticos obtidos de estudos em adultos. Nos Estados Unidos a Food and Drug Administration (FDA), diversos medicamentos estão a ser actualmente estudadas na população pediátrica. Há 6 classes de medicamentos anti-hipertensores que são usados no tratamento a longo prazo: diuréticos, beta-bloqueantes, inibidores da ECA e antagonistas da angiotensina II, bloqueadores de canal de cálcio e bloqueador alfa. Diuréticos: são de preferência utilizados em crianças com retenção de sal e retenção de água. Nas crianças com redução da filtração glomerular (<50%) as tiazidas são ineficazes e os diuréticos de NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 ansa (furosemida) devem ser preferidos. Nos doentes com hiperaldosteronismo beneficiam de inibidores da aldosterona. Efeitos secundários: Hidroclorotiazida (hipokaliemia, hiperglicemia, hiperuricemia); Furosemida (hipokaliemia, hiperglicemia, hiperuricemia, hipercalciúria). Bumetanida: (hipokaliemia, hiperglicemia, hiperuricemia. Espironolactona: Antagonista da aldosterona). β bloqueantes: são medicamentos de 1ª escolha na criança HTA hipercinetica como o feocromocitoma ou adolescentes com HTA primária e frequência cardíaca elevada em repouso. Devem ser usados com muito cuidado na criança com história de asma, dislipidémia ou bloqueio cardíaco. Propranolol: Proibido em pacientes com asma e ICC, hiperglicemia. Bloqueadores do canal de cálcio: muito se tem discutido sobre o uso da nifedipina de acção curta, tendo sido muito utilizada em crianças, principalmente por sua acção rápida. Hipotensão não controlada, associada a eventos cardíacos em adultos, tem levado à recomendação para abandonar o seu uso. Nifedipina retard: aumenta a frequência cardíaca, cefaleias, vertigens. Anlodipina: Bloqueador canal de cálcio, bem tolerado, efectiva em pacientes com IRC. Isradipina: Bloqueador canal de cálcio. Inibidores da enzima de conversão da Angiotensina (IECA): O primeiro a receber aprovação do FDA foi o enalapril, que é bem tolerado, apesar de poder provocar tosse. Outros medicamentos, como ramipril, já se mostraram eficazes. Efeitos secundários: Captopril provoca hiperkaliemia, trombocitopenia, neutropenia, tosse, cautela na estenose de artéria renal, baixa filtração glomerular. Enalapril: hiperkaliemia, trombocitopenia, leucopenia, tosse, baixa filtração glomerular. Alguns bloqueadores do receptor da angiotensina foram aprovados para uso em adultos (losartan e irbesartan), mas nenhum destes foi bem estudado em crianças. Dos fármacos vasodilatadores: Efeitos colaterais: Hidralazina aumenta a frequência cardíaca, cefaleias, síndrome lupus like (raro em pediatria). Minoxidil provoca retenção de sal e água, hirsutismo. TERAPÊUTICA FARMACOLÓGICA Crianças com idades entre 1 e 17 anos: tratamento ambulatório (per os) Classe IECA Fármaco Dose inicial Dose máxima Captopril 0,3-0,5 mg/kg/ dose (3 id) 6 mg/kg/dia Enalapril 0,08 mg/kg/dia até 5mg/dia (id-2id) 0,6mg/kg/dia até 40 mg/dia Lisinopril 0,07 mg/kg/dia até 5mg/dia (id) 0,6 mg/kg/dia até 40 mg/dia Quinapril 5-10 mg/dia (id) 80 mg/dia Benazapril 0,2 mg/Kg/dia até 10 mg/dia (id) 0,6 mg/kg/dia até 40 mg/dia 6-12 anos: 75-150 mg/dia (id) ≥ 13 anos: 150-300 mg/dia Boqueador Ibersatran receptor de angiotensina (ARA) Losartan 0,7 mg/kg/dia até 50 mg/dia (id) 1,4 mg/kg/dia até 100 mg/dia Bloqueador α e β 1-3 mg/kg/dia (id) 12mg/kg/dia até 1200 mg/dia Labetolol Atenolol 0,5-1mg/kg/dia (id-2id) 2mg/kg/dia até 100 mg/dia Propanolol 1-2 mg/kg/dia (2id-3id) 4mg/kg/dia até 640 mg/dia Metoprolol 1-2 mg/kg/dia (2id) 6 mg/kg/dia até 200 mg/dia Bloqueadores canais de cálcio Amlodipina 6-17 anos: 2,5-5 mg (id) Isradipina 0,15-0,2mg/kg/dia (3id-4id) 0,8 mg/kg/dia até 20 mg/dia Nifedipina retard 0,25-0,5 mg/kg/dia (id-2id) 3mg/kg/dia até 120 mg/dia Agonista alfa Clonidina ≥ 12 anos: 0,2 mg/dia (2id) 2,4 mg/dia Furosemide 0,5-2 mg/kg/dose (id-2id) 6mg/kg/dia Espirolonactona 1mg/kg/dia (id-2id) 3,3 mg/kg/dia até 100 mg/dia Amiloride 0,4-0,625 mg/kg/dia (id) 20 mg/dia Hidralazina 0,75 mg/kg/dia 7,5 mg/kg/dia até 200 mg/dia < 12 anos: 0,2 mg/kg/dia (id-4id) 50mg/dia ≥ 12 anos: 5mg/dia (id-4id) 100 mg/dia Bloqueador β Diurético Vasodilatador Minoxidil TERAPÊUTICA FARMACOLÓGICA HTA SEVERA Crianças com idades entre 1 e 17 anos Classe Bloqueador Beta Bloqueador alfa –beta Vasodilatador Vasodilatador Bloqueadores canais de cálcio Fármaco Dose inicial Mais úteis 100-500 μg/kg/min (EV) Esmolol tempo acção muito curto. pode causar bradicardia bólus: 0,2-1mg/kg/dose até 40 mg/dose Labetalol Perfusão: 0,25-3 mg/kg/H CI: asma eInsuficiência cardiaca 0,53-10 μg/kg/min (perfusão) Nitruprussiato de sódio monitorizar níveis de cianido se > 72H 0,2-0,6 mg/kg/dose (IV;IM) Hidralazina (bólus de 4-4h) Minoxidil Isradipina Nicardipina IECA Enalaprilato Alfa –agonista Clonidina Ocasionalmente úteis 0,1-0,2 mg/kg/dose (per os) de 12-24 horas vasodilatador oral potente e acção longa 0,05-0,1 mg/kg/dose (per os) 12-12 horas 1-3 μg/kg/min (perfusão) pode causar taquicardia reflexa 0,05-0,1 mg/kg/dose até 1,25 mg/dose e.v. (bólus) cada 6 horas 0,05-0,1mg/dose, podendo repetir até 0,8 mg da dose total de 8-12 horas (per os) hipertensão arterial – mesa redonda XIX reunião do hospital de crianças maria pia S 165 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 A escolha do anti-hipertensor deve ser adaptada individualmente dependendo da causa de HTA, do nível da TA, da presença concomitante de doenças ou lesões de órgão alvo e dos antecedentes na história clínica do doente. Iniciar todos os fármacos com dose mais baixa recomendada. Quando a dose mais elevada recomendada for atingida pode-se associar um segundo fármaco. Adaptar fármacos à patologia subjacente. Exemplos: Glomerulonefrite: diurético, vasodilatador. Alto débito cardíaco, migraine associada: β- bloqueante. Diabetes, microalbuminúria, doenças renais e proteinúria: IECA, ARA. Os princípios do tratamento farmacológico da HTA são: baixar a TA < percentil 90, mínimos efeitos colaterais, reduzir TA nas 24 h com medicamentos de longa acção com uma toma diária, aumento gradual da dose se dose inicial ou associação de medicamentos de diferentes classes (associações preferíveis: diuréticos+β bloqueantes; diuréticos+IECA; bloqueadores de canal de cálcio+ β bloqueantes; bloqueadores de canal de cálcio+IECA). Terapêutica Farmacológica na HTA severa: Indicada na HTA severa (estádio 2 e > 5 mmHg P 99) sintomática e nas Emergências hipertensivas (encefalopatia hipertensiva) O objectivo deve ser baixar TA para um valor inferior a 25% do seu valor inicial, durante as primeiras 8 horas e gradualmente ir normalizando TA nas próximas 26-48 horas. Preferencialmente fármacos em perfusão, cujo efeito desapareça rapidamente após suspensão. Monitorização contínua de TA e Internamento em Cuidados Intensivos. Vigilância da criança com HTA. Consequências da hipertensão na infância Todas as crianças com HTA confirmada necessitam de follow-up regular e prolongado. Ter uma atenção particular à presença de sinais clínicos que sugiram evidência incipiente de lesão de órgão alvo, indicando uma causa secundária de HTA numa criança previamente classificada como tendo HTA essencial. Na criança em tratamento devem ser avalia- dos os efeitos colaterais da medicação. A explicação da doença, necessidade do tratamento e de um estilo de vida saudável é importante, assim como a educação dos doentes e dos seus pais. A determinação adequada da TA nas consultas pelo pediatra deve fazer parte do exame. Quando descoberta HTA deve ser investigada e adequadamente tratada. Há evidência de que a HTA na criança se associa de forma mais precoce com morbilidade e mortalidade cardiovascular no adulto. Pequenas reduções na TA podem diminuir o risco de doença cardiovascular a longo termo. A aterosclerose (alteração patológica que usualmente é tida como problema típico do adulto) pode iniciar-se precocemente na criança. Outra consequência da HTA em pediatria é a hipertrofia ventricular esquerda (HVE). Existe uma relação directa entre a TA e o tamanho do ventrículo esquerdo e o tratamento da HTA consegue regredir esta hipertrofia (demonstrado em estudos em adultos). O diagnóstico precoce e intervenção na criança com hipertensão são potencialmente benéficos na prevenção das complicações da HTA a longo prazo. Por este motivo, o pediatra deve preocuparse com o diagnóstico e o tratamento da hipertensão arterial e dos outros factores de risco cardiovasculares precocemente na criança. Nascer e Crescer 2007; 16(3): 158-167 BIBLIOGRAFIA 1. Sorof JM, Lai D, Turner J, Poffenbarger T, Portman RJ. Overweight, ethnicity, and the prevalence of hypertension in school-aged children. Pediatrics 2004; 113:475–482 2. Bartosh SM, Aronson AJ. 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Os autores abordam os diversos factores de risco vascular, caracterizando-os do ponto de vista epidemiológico e fisiopatológico, e definem as medidas preventivas a tomar na infância e na adolescência. Nos doentes pediátricos de alto risco, apresentam a estratificação do risco vascular em três grupos, e para cada grupo objectivos terapêuticos. Palavras-chave: Aterosclerose; risco vascular; prevenção; infância; adolescência. Nascer e Crescer 2007; 16(3): 168-172 INTRODUÇÃO A aterosclerose é uma doença sistémica, que afecta múltiplos leitos vasculares e que consiste na resposta inflamatória fibroproliferativa da parede arterial a diversas formas de agressão do endotélio(1). As lesões têm início na infância, mas na maioria das crianças o envolvimento vascular é mínimo e a doença permanece numa forma subclínica durante as primeiras décadas de vida. A intensidade das lesões e o seu grau de progressão são influenciados pelo número e gravidade dos diversos factores de risco vascular associados(2). __________ ¹ Assistente Hospitalar de Nefrologia 2 Assistente Graduada de Nefrologia do Hospital Especializado de Crianças Maria Pia 3 Chefe de Serviço de Nefrologia do Hospital Especializado de Crianças Maria Pia A prevenção da doença vascular aterosclerótica depende da modificação dos hábitos comportamentais (nutrição, exercício físico e tabagismo) e da identificação e tratamento dos factores de risco (obesidade, dislipidémia, diabetes mellitus e hipertensão arterial), que deverão ter inicio o mais precocemente possível, de preferência na infância(3). NUTRIÇÃO A ingestão dos nutrientes essenciais, associada a um aporte calórico adequado ao consumo de energia diário, é fundamental para prevenir o aparecimento ou agravamento dos factores de risco vascular. Assim, para melhorar o padrão alimentar das crianças, as famílias devem adquirir conhecimentos acerca dos benefícios de uma alimentação saudável e modificar os seus hábitos alimentares em conformidade. Devem promover-se as refeições em família, estabelecendo horários e evitando o consumo de alimentos nos intervalos. As refeições devem conter nutrientes dos diferentes grupos alimentares, de forma a garantir um aporte nutricional completo. O número de refeições e a quantidade devem ser adequados ao tipo de actividade diária, de forma a não exceder as necessidades calóricas necessárias. Segundo as recomendações da American Heart Association, a alimentação das crianças com mais de dois anos, deve basear-se na ingestão diária de frutas, legumes, cereais integrais, leguminosas, produtos lácteos magros ou pobres em gordura, peixes e carnes magras. A ingestão de sumos de fruta deve ser limitada. Os óleos e margarinas devem ser de origem vegetal, com baixo teor em gorduras saturadas e áci- hipertensão arterial – mesa redonda S 168 XIX reunião do hospital de crianças maria pia dos gordos-trans. O consumo de açúcar, sal e farinhas refinadas deve ser reduzido(4). EXERCÍCIO FÍSICO O sedentarismo é um importante factor de risco independente para a doença vascular, assim como para a obesidade, a dislipidemia, a hipertensão arterial e a diabetes mellitus. A prática do exercício físico quando iniciada na infância, para além de trazer beneficios nesta idade, tem uma maior probabilidade de se manter na vida adulta, contribuindo dessa forma para a diminuição do risco vascular ao longo da vida. No entanto, o que se observa é o aumento do tempo dedicado a actividades sedentárias como o uso excessivo do computador, vídeo-games e televisão, pelas crianças e adolescentes(5). Nas consultas de rotina deve ser avaliado o grau de actividade física, de forma a fomentar a sua prática. O exercício físico não deve ser limitado apenas às aulas de educação física e ao desporto de competição, devendo incentivar-se outras formas de exercício, integradas na actividade diária, como andar a pé ou de bicicleta. As actividades devem ser divertidas e com uma duração mínima de uma hora, e a utilização da televisão e do computador deve ser limitada, no máximo, a duas horas por dia(4). TABAGISMO A infância e a adolescência são períodos críticos para a adesão a comportamentos de risco. Nos EUA, começam a fumar, diariamente, mais de três mil adolescentes, com uma idade média de dez ponto sete anos, no sexo masculino, e de onze ponto quatro anos, no sexo feminino(6). NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Os principais factores de risco para o tabagismo são a idade, o sexo, o nível socio-económico, a história de hábitos tabágicos nos pais, irmãos ou amigos e a ausência de informação acerca dos efeitos do tabaco enquanto causa de doença(6). A redução da prevalência dos hábitos tabágicos, é um objectivo que necessita de um conjunto de medidas, a implementar a vários níveis, tais como, informar as crianças e os adolescentes para dissuadir o consumo, reduzir a exposição involuntária ao fumo e apoiar os programas de desabituação. Nas consultas, todas as crianças com idade superior a dez anos, devem ser questionadas acerca do consumo de tabaco e devem ser advertidas dos riscos que esse hábito tem para a saúde(3). OBESIDADE A OMS define a obesidade como uma doença, em que o excesso de gordura corporal pode atingir níveis capazes de afectar a saúde. A obesidade é um importante factor de risco para o aparecimento de outras doenças, como a dislipidémia, a diabetes mellitus e a hipertensão arterial. Outras patologias que lhe estão, frequentemente, associadas são a asma, a apneia do sono, a esteatohepatite não alcoólica, a depressão e a amenorreia(5). Nos EUA e em outros países desenvolvidos, a prevalência em crianças e adolescentes duplicou nos últimos vinte anos. Quinze ponto três por cento das crianças, com idades compreendidas entre os seis e os onze anos e, quinze ponto cinco por cento dos adolescentes, com idades compreendidas entre os doze e os dezanove anos, têm o IMC superior ao percentil noventa e cinco. Dados recentes, também, apontam para um aumento da prevalência em crianças com menos de cinco anos(7). A interacção entre os factores genéticos e ambientais é determinante para o aparecimento da obesidade. As causas genéticas podem ser monogénicas, tendo sido identificadas várias mutações envolvidas na sinalização da melanocortina e relacionadas com a obesidade grave, ou poligénicas, mais frequentes que as primeiras, e que conferem ao indivíduo uma maior susceptibilidade para aumentar de peso em resposta a factores ambientais. Durante o desenvolvimento da criança existem períodos em que o risco de desenvolver obesidade é maior, um deles é o período de amamentação, que se for reduzido predispõe à obesidade e o outro é a adolescência, em que se verifica maior insulinoresistência. É sabido que as profundas mudanças que ocorreram nas sociedades modernas têm contribuído para o aumento da obesidade. No entanto, o excessivo controlo da alimentação pelos pais, também, pode ter efeitos paradoxais, levando as crianças e adolescentes a cometer excessos alimentares. O primeiro passo no controlo da obesidade é a identificação das crianças em risco, conhecendo os antecedentes familiares e os factores ambientais que as rodeiam e avaliando o IMC, anualmente, para identificar excessos de ganho ponderal relativamente à estatura. A promoção de hábitos alimentares saudáveis é fundamental. As crianças devem ser incentivadas a comer com moderação, a realizar escolhas saudáveis e a ter uma atitude de auto-controlo na ingestão dos alimentos. As actividades sedentárias devem ser restringidas e deve-se promover a prática de exercício físico, em casa ou na escola. As crianças com excesso de peso ou obesas, devem iniciar um plano alimentar e de exercício físico, com o objectivo de diminuir o IMC para um valor inferior ao percentil noventa e cinco, e vigiar o aparecimento de complicações(3,5). DISLIPIDÉMIA As dislipidémias são alterações do metabolismo das lipoproteínas, que resultam num aumento ou diminuição dos seus níveis séricos. As que constituem factor de risco vascular caracterizamse por aumento do colesterol total (CT), do colesterol das lipoproteínas de baixa densidade (LDL-C) ou dos triglicerídeos (TG) ou, por uma diminuição do colesterol das lipoproteínas de alta densidade (HDL-C)(8). As dislipidémias classificam-se quanto à etiologia em primárias ou secundárias. As primárias, podem ser monogénicas (hipercolesterolémia familiar, hiperlipidémia mista familiar, défice familiar de apoproteína-B, hipertrigliceridémia familiar) ou poligénicas, (hipercolesterolémia e hipertrigliceridémia comum) que são mais frequentes. As secundárias surgem no contexto de doenças como a diabetes mellitus, a obesidade, a síndroma nefrótica, o hipotiroidismo, o alcoolismo crónico, a insuficiência renal crónica ou estão associadas a fármacos como por exemplo, os diuréticos, os inibidores da calcineurina ou os corticóides(8). As evidências indicam, que o grau de progressão das lesões de aterosclerose na infância está correlacionado com a dislipidémia e com a sua gravidade. Embora não existam estudos longitudinais que relacionem a dislipidémia na infância e adolescência com a ocorrência de eventos cardiovasculares na vida adulta, esta relação pode ser inferida através de estudos epidemiológicos realizados(8). O diagnóstico precoce da dislipidémia em pacientes de risco e o seu tratamento, é assim essencial para prevenir ou diminuir o ritmo de progressão do processo aterosclerótico. Deve ser realizado em crianças com história familiar de doença vascular precoce (pais ou avós com menos de cinquenta e cinco anos, com doença coronária, cerebrovascular ou vascular periférica conhecida, enfarte agudo do miocárdio ou morte súbita de causa cardíaca); em crianças com pai ou mãe com CT sérico superior ou igual a 240mg/dl; em crianças com pais sem doença coronária mas com factores de risco vascular associados; e em crianças que apresentem os seguintes factores de risco: hipertensão arterial, obesidade, tabagismo, alcoolismo, sedentarismo ou causas de dislipidémia secundária. Nestes quatro grupos de risco deve ser realizado um perfil lipidico em jejum que inclua o doseamento do CT, LDL-C, HDLC e TG. Deve utilizar-se a média de três determinações, devido à variabilidade intraindividual, como base para o tratamento. McCrindle et al, recomendam que nas crianças em que um dos pais tenha hipercolesterolémia, deve ser feita uma hipertensão arterial – mesa redonda XIX reunião do hospital de crianças maria pia S 169 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 determinação inicial do CT, e se este for superior a 200 mg/dl então deve ser pedido um perfil lipidico completo em jejum; se os valores de CT determinados forem borderline (170-199 mg/dl), então esse doseamento deve ser confirmado e calculada a média dos dois valores. Caso se obtenha um valor de colesterol borderline, o perfil lipidico em jejum deve ser efectuado(9). O tratamento da hipercolestorolémia, em crianças com idades compreendidas entre os dois e os dezanove anos, baseia-se nos valores do CT e LDL-C, recomendados pelo National Cholesterol Education Program (NCEP), que os classifica em aceitáveis (CT <170 mg/dl, LDL-C <110 mg/dl), borderline (170 mg/ dl≤CT≤199mg/dl e 110 mg/dl≤LDL-C≤129 mg/dl) e elevados (CT≥200 mg/dl e LDLC ≥130 mg/dl)(9). A instituição de uma dieta pobre em gorduras saturadas (menos de 7% das calorias diárias) e em colesterol (200 mg/dia), e a promoção do exercício físico, são as primeiras medidas a instituir se o LDL-C for elevado. A terapêutica farmacológica (estatinas e quelantes dos ácidos biliares) está aprovada para crianças com idade igual ou superior a dez anos, que tenham valores persistentemente elevados de LDL-C, após seis a doze meses de uma dieta adequada. Os valores de LDL-C considerados para início de terapêutica são 190 mg/dl em crianças sem factores de risco e 160 mg/dl em crianças com dois ou mais factores de risco cardiovascular ou com história familiar de doença cardiovascular prematura(9). As guidelines actuais do NCEP para crianças e adolescentes não fazem recomendações especiais para rastreio e tratamento das dislipidémias não LDL, particularmente as relacionadas com o aumento dos TG e a diminuição do HDLC. Recomenda-se, no entanto, uma dieta pobre em gorduras e hidratos de carbono simples, a prática regular de exercício físico e a diminuição do peso corporal. Indivíduos com valores séricos persistentemente elevados de TG, superiores a 350 mg/dl ou com uma determinação aleatória superior a 700 mg/dl, devem iniciar terapêutica com fibratos ou ácido nicotínico devido ao risco de pancreatite aguda(9). DIABETES MELLITUS A diabetes mellitus é um grupo de doenças metabólicas caracterizadas por hiperglicémia, que resulta de defeitos na secreção (DMT 1) ou na acção da insulina (DMT 2) ou de ambos e que está associada a um desenvolvimento acelerado de doença vascular. Na criança, a doença vascular é sobretudo microangiopática, com envolvimento renal e ocular. No adulto, esta microangiopatia persiste e é responsável pela elevada incidência de insuficiência renal crónica. No entanto, a principal causa de morbilidade e mortalidade no adulto, é a doença macrovascular (cardiovascular, cerebrovascular e vascular periférica)(2). A prevalência da DMT 1 na adolescência é de 1.7/1000, sendo vinte e cinco por cento dos diagnósticos efectuados entre os cinco e os dez anos de idade e quarenta por cento efectuados entre os dez e os quinze anos de idade. A DMT 2, que era até há uma década considerada uma doença dos adultos, é responsável actualmente, por oito a cinquenta por cento dos diagnósticos de diabetes na adolescência, sendo a prevalência actual de 4.1/1000, neste grupo etário. Este aumento coincide com o aumento da prevalência da obesidade e do sedentarismo na infância e na adolescência(2). A aterosclerose na infância é um processo lento e silencioso, mas no contexto da diabetes ocorre de uma forma acelerada sendo responsável pela ocorrência de uma morbilidade cardiovascular precoce. O processo aterosclerótico é complexo sendo a hiperglicémia e a resistência periférica à insulina responsáveis pela disfunção do endotélio. A hiperglicémia causa um aumento da glicosilação dos produtos finais do metabolismo (aminoácidos, ácidos gordos e ácidos nucleicos), que formam pontes com as proteínas vasculares e acumulam-se no sub-endotélio, condicionando espessamento e ruptura da parede dos vasos. Verifica-se também, um aumento da expressão dos receptores endoteliais dos produtos glicosilados, que ao serem activados aumentam a resposta inflamatória e protrombótica. Para além destes mecanismos fisiopatológicos, a hipergli- hipertensão arterial – mesa redonda S 170 XIX reunião do hospital de crianças maria pia cémia leva à activação da proteína C quinase nas células endoteliais e à activação da via dos polióis, que desencadeiam alterações a nível osmótico e iónico(2). O excesso de ácidos gordos isolado ou em conjunto com a hiperglicémia aumentam a resistência periférica à insulina e o stress oxidativo, com formação de radicais livres de oxigénio e lesão directa dos tecidos(2). A resistência periférica à insulina é responsável pelo aumento da dislipidémia (aumento dos TG e LDL-C, diminuição da HDL-C, diminuição da actividade da lipoproteína lipase), elevação da pressão arterial (aumento da retenção de sódio, estimulação da actividade simpática e proliferação do musculo liso vascular) e formação directa da placa aterogénica (depósito de LDL-C, proliferação de colagénio e musculo liso)(2). Considera-se que há uma redução efectiva do risco vascular, na DMT 1, se forem atingidos os seguintes objectivos: um IMC inferior ao percentil oitenta e cinco, uma pressão arterial inferior ao percentil noventa, um LDL-C inferior a 100 mg/dl e uma glicémia inferior a 100 mg/dl com uma HbA1c menor que 7%. Na DMT 2 considera-se que o risco vascular é elevado, quando dois ou mais factores de risco vascular estão associados, e neste caso os objectivos terapêuticos são iguais aos da DMT 1. Quando só está presente um factor de risco vascular, o objectivo é obter um IMC inferior ao percentil noventa, uma pressão arterial inferior ao percentil noventa e cinco e um LDL-C inferior a 130 mg/dl. Os valores da glicémia e HbA1c recomendados são idênticos aos da DMT 1(2). HIPERTENSÃO ARTERIAL (HTA) A HTA era, até há alguns anos, considerada como uma doença pouco frequente na infância, com uma prevalência de cerca de dois por cento. Esta realidade tem se modificado, sobretudo devido ao aumento da obesidade. Trabalhos mais recentes mostram uma prevalência de HTA de quatro ponto cinco por cento, em crianças obesas, valores esses mais altos que os anteriormente descritos(10). A sua importância como factor de risco vascular é bem conhecida e em- NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 bora não hajam trabalhos prospectivos a longo prazo que demonstrem claramente a associação da HTA na infância com a morbilidade e mortalidade cardiovascular na vida adulta, sabe-se que as crianças hipertensas desenvolvem lesões vasculares, como o espessamento da íntima e da média carotídeas e aumento da rigidez da parede arterial. A HTA nas crianças com idade inferior a dez anos, é frequentemente de causa secundária (70-85% dos casos) e, na maioria dos casos, é devida a doença renal (60-70%). A HTA essencial predomina nas crianças com idade superior a dez anos (85-95% dos casos) e, habitualmente, os níveis da pressão arterial não são muito elevados (estadio 1)(10). Um dos factores de risco mais importantes para o desenvolvimento de HTA é a obesidade, tendo-se verificado que com o aumento da sua prevalência, a média da pressão arterial da população infantil nos EUA, aumentou de 1.4 para 3.3 mmHg, desde 1990(10). As crianças que nascem com baixo peso e que têm um rápido ganho ponderal no período pós-natal, têm maior probabilidade de desenvolver obesidade, insulinoresistência e HTA. Outros factores que condicionam o aparecimento de HTA são as alterações genéticas, nomeadamente, alguns polimorfismos que podem ser responsáveis pelo seu aparecimento, em certas famílias. Na infância, o factor racial não parece influenciar os valores de pressão arterial, ao contrário do que se verifica nos adultos. Os factores dietéticos, também, podem influenciar os valores da pressão arterial, nomeadamente, a ingestão de sódio parece estar relacionada com o seu aumento e a ingestão de alimentos ricos em potássio com a sua diminuição. Outros factores, como o tabagismo, a cafeína e o sedentarismo, também podem aumentar a pressão arterial e contribuir para o aparecimento de HTA. No doente hipertenso devem ser instituídas várias medidas para reduzir o risco vascular, tais como, a redução do peso corporal, o aumento da actividade física, a redução das actividades seden- tárias, uma alimentação com baixo teor de gorduras, açúcar e sal (1.2 g/dia em crianças com menos de oito anos e 1.5 g/dia em crianças com mais de oito anos) e a abstinência tabágica. A terapêutica farmacológica está indicada na HTA sintomática, na HTA secundária, quando existe lesão de órgãos alvo, associação de factores de risco ou ainda quando as medidas não farmacológicas são ineficazes (3). Os objectivos terapêuticos são, a obtenção de uma pressão arterial inferior ao percentil noventa e cinco, na HTA essencial, e inferior ao percentil noventa, na doença renal crónica, diabetes ou na presença de lesões em órgãos alvo(3,11). ATEROSCLEROSE ACELERADA. ESTRATIFICAÇÃO DO RISCO VASCULAR A aterosclerose na infância é de uma forma geral um processo lento e silencioso. No entanto, em algumas doenças da idade pediátrica, este processo é mais acelerado traduzindo-se pelo aparecimento precoce de doença cardiovascular, ainda na infância, na adolescência ou no início da vida adulta. Estas doenças são divididas em três grupos de acordo com o grau de risco vascular. No Grupo I, considerado de elevado risco, há evidência clínica ou patológica de doença coronária antes dos trinta anos de idade, no Grupo II, considerado de risco intermédio, há evidência fisiopatológica de disfunção arterial causada por aterosclerose acelerada, antes dos trinta anos de idade, e no Grupo III, considerado de risco, há evidência epidemiológica de doença coronária só depois dos trinta anos de idade(2). Estão incluídas no Grupo I a hipercolesterolémia familiar (homozigotos), a DMT 1, a doença renal crónica, o póstransplante cardíaco e a doença de Kawasaki com aneurismas coronários. No Grupo II, a hipercolesterolémia familiar (heterozigotos), a DMT 2, a doença de Kawasaki com aneurismas coronários em regressão e a doença inflamatória crónica. No Grupo III, a doença cardíaca congénita, a doença de Kawasaki sem envolvimento coronário e os antecedentes neoplásicos. Em cada um dos grupos devem identificar-se os factores de risco vascu- lar (tabagismo, sedentarismo, obesidade, HTA, dislipidémia, hiperglicémia, história familiar de doença coronária precoce). No caso dos doentes dos grupos II e III, se tiverem dois ou mais factores de risco devem ser tratados como sendo do grupo de risco mais elevado, I e II respectivamente. Nos doentes do grupo I, considerase que há uma redução do risco vascular com um IMC inferior ao percentil oitenta e cinco, a pressão arterial inferior ao percentil noventa, o LDL-C inferior a 100 mg/dl, a glicémia em jejum inferior a 100 mg/dl e a HbA1c inferior a 7%. Nos do grupo II, o IMC deve ser inferior ao percentil noventa, a pressão arterial inferior ao percentil noventa e cinco, o LDL-C inferior a 130 mg/dl e os restantes valores iguais aos do grupo I. Os objectivos terapêuticos do grupo III são um IMC inferior ao percentil noventa e cinco, uma pressão arterial inferior ao percentil noventa e cinco mais 5 mmHg, o LDL-C inferior a 160 mg/dl, com restantes valores iguais aos do grupo I(2). Em todos os grupos devem ser instituídas medidas para modificar o estilo de vida (redução do peso, aumento da actividade física, redução das actividades sedentárias, abstinência tabágica) e modificação da dieta (ingestão de gorduras inferior a 30% das calorias/dia, gorduras saturadas inferior a 10% das calorias/dia e colesterol inferior a 300 mg/dia). Nos doentes dos grupos II e III a terapêutica farmacologia só deve der iniciada se não se atingirem os objectivos pretendidos com a modificação do estilo de vida durante um período de seis meses. Nos doentes do grupo I, o início da terapêutica farmacológica dos factores de risco é ajustado à patologia subjacente(2). CARDIOVASCULAR RISK FACTORS – PREVENTION IN CHILDHOOD ABSTRACT Atherosclerosis is a systemic disease which remains in a sub clinical form during the first decades of life. Its prevention begins in the early childhood with the promotion of healthy lifestyles and the identification and treatment of the hipertensão arterial – mesa redonda XIX reunião do hospital de crianças maria pia S 171 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 risk factors. The authors present the different vascular risk factors describing its epidemiologic and physiopathologic characteristics and recommend the preventive measures for the infancy and adolescence. In the high risk paediatric patients they show the risk vascular stratification in three groups and for each its therapeutic endpoints. Key-words: Atherosclerosis; vascular risk; prevention; infancy; adolescence; life style Nascer e Crescer 2007; 16(3): 168-172 4. 5. 6. BIBLIOGRAFIA 1. Sousa JC. Aterosclerose e Aterotrombose. In: Sousa JC, ed. Aterotrombose. Lisboa: Colprinter, 2000: 1324. 2. Kavey REW, Allada V, Daniels SR et al. 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Haney EM, Huffman LH, Bougatsos C, Freeman M, Nelson HD, Steiner RD, Screening and treatment for lipid disorders in children and adolescents: systematic evidence review for the hipertensão arterial – mesa redonda S 172 XIX reunião do hospital de crianças maria pia US preventive services task force. Pediatrics 2007; 120: e189-e214. 9. McCrindle BW, Urbina EM, Dennison BA et al. Drug therapy of high-risk lipid abnormalities in children and adolescents. Circulation 2007;115: 1948-1967. 10. Flynn JT. Hypertension in childhood and adolescence. In: Kaplan NM, ed. Kaplan’s Clinical Hypertension. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins, 2006: 465-488. 11. National High Blood Pressure Education Program Working Group on high blood pressure in children and adolescents. The fourth report on the diagnosis, evaluation, and treatment of high blood pressure in children and adolescents. Pediatrics 2004; 114: 555-576. CORRESPONDÊNCIA Dr.ª Carmen do Carmo E-mail: [email protected] NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Imagem na avaliação do SNC: implicações no prognóstico – papel da ecografia no diagnóstico pré-natal Maria do Céu Rodrigues1 A aplicação clínica dos ultrasons tem uma história de cerca de 50 anos, começando por ser unidimensional (modoA), posteriormente a duas dimensões (modo-B) e actualmente também, a três dimensões em tempo real (3D /4D). A ecografia revolucionou a prática obstétrica, tornando possível o diagnóstico precoce de situações graves, sem tratamento curativo ou até incompatíveis com a vida e nestes casos, em muitos países, a interrupção da gravidez. A observação e vigilância do desenvolvimento intrauterino do feto, através da janela ecográfica, desviou progressivamente a atenção para os eventos anteparto com reconhecidas ou supostas implicações no período pós natal. A neurosonografia fetal, com recurso à ecografia 2D e à tecnologia 3D nos seus diferentes modos – superfície, imagem multiplanar, Doppler, cálculos de volume – e às sondas transabdominal e transvaginal, representa uma parte importante da ecografia obstétrica permitindo a avaliação estrutural e abrindo novas perspectivas na avaliação funcional do SNC do feto. Ao avaliar ecograficamente o SNC do feto há que ter presente as mudanças que ocorrem ao longo da gestação; como exemplo, o encéfalo é monoventricular até às 10 semanas, a ossificação da calote craneana está concluída cerca das 12 semanas e o desenvolvimento do vérmis do cerebelo só se completa às 19 semanas. A avaliação ecográfica habitual do SNC, em ecografia 2D, inclui três planos da cabeça fetal – transtalâmico, transventricular e transcerebeloso – e três pla- nos da coluna vertebral – axial, coronal e sagital. Se as estruturas visualizadas nestes diferentes cortes são normais, podemos concluir pela normalidade do SNC do feto. Se, pelo contrário, anormalidades são encontradas, há que prosseguir o estudo com recurso a planos adicionais e à sonda transvaginal (na apresentação cefálica) e à tecnologia 3D. Por vezes, a ecografia não nos permite ainda a defi- nição completa das lesões, havendo necessidade de recorrer à ressonância magnética. Assim, quando o exame ecográfico do SNC do feto não é normal, há que fazer o diagnóstico das alterações encontradas, pesquisar lesões associadas e estabelecer um prognóstico, que deverá ser comunicado, de maneira clara, aos progenitores. A – Plano transtalâmico B – Plano transventricular C - Plano transcerebeloso Plano transtalâmico: CSP – cavum do septo pelúcido; TV - 3º ventrículo T – tálamo; SF – incisura de Sílvius Plano transventricular: CP – plexo coróideu; VA – atrium ventricular; MW e LW – paredes medial e lateral do ventrículo lateral Plano transcerebeloso: CSP – cavum do septo pelúcido; CH – hemisférios cerebelosos; CV – vérmis do cerebelo; CM – cisterna magna __________ ¹ Maternidade Júlio Dinis – Porto imagem na avaliação do sistema nervoso central: implicações no prognóstico – mesa redonda XIX reunião do hospital de crianças maria pia S 173 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Existem situações em que o diagnóstico ecográfico é claro e o prognóstico isento de dúvidas; neste grupo podem incluir-se, entre outros, os defeitos do tubo neural – anencefalia, encefalocelo, iniencefalia e espinha bífida - a holoprosencefalia e a hidranencefalia. Noutros casos, como na agenesia isolada do corpo caloso ou na ventriculomegalia isolada, tudo o que podemos oferecer aos pais, em termos de prognóstico, são percentagens de normalidade ou desvios desta. A anencefalia, incompatível com a vida, é a forma mais grave de defeito do tubo neural, resultando da falência de encerramento da extremidade anterior do tubo neural. No 2º trimestre da gravidez, o diagnóstico ecográfico de anencefalia é feito quando a calote craneana e os hemisférios cerebrais não são visualizados; no 1º trimestre, o diagnóstico só pode ser feito depois das 11 semanas, quando a ossificação do crâneo deverá estar completa, pela presença de acrania; nesta fase, o tecido cerebral pode ainda estar presente, uma vez que há progressão de acrania, para exencefalia – ausência da calote craneana com tecido cerebral presente - e finalmente anencefalia, por dissolução secundária do encéfalo. O encefalocelo é caracterizado por um defeito no crâneo e dura, através do qual as meninges herniam; o saco meningeo pode conter, ou não, tecido cerebral. Na sua maioria, são recobertos por pele e em 85% dos casos ocorrem na linha média, particularmente na região occipital. Ecograficamente pode ser diagnosticado a partir das 13 semanas, como uma solução de continuidade no crâneo, através da qual se visualiza um cisto herniado, contendo tecido cerebral ou apenas liquido. O encefalocelo pode ser um componente de um síndrome genético – Meckel-Gruber, Walker-Warburg – associando-se a anomalias estruturais em 60 a 80 % dos casos. Deve ser feita uma procura exaustiva de malformações associadas e oferecida a realização de estudo citogenético. O prognóstico no encefalocelo é inversamente relacionado com a quanti- dade de tecido cerebral herniado. A mortalidade global é cerca de 40% e mais de 80% dos sobreviventes não são neurologicamente e intelectualmente normais. A presença de anomalias associadas piora obviamente o prognóstico. A iniencefalia é uma exencefalia, mas em que o defeito ósseo é restrito à região occipital do crâneo, com ausência parcial ou total das vértebras cervicais e toráxicas, encerramento incompleto dos arcos e corpos vertebrais e retroflexão fixa da cabeça. O diagnóstico é feito pela extrema flexão dorsal da cabeça, com a coluna cervical e toráxica anormalmente curta e deformada. Associa-se a outras malformações graves, cerebrais e de outros orgãos e é fatal. A visualização ecográfica da coluna vertebral normal no plano sagital mostra uma imagem em “carril duplo” com os dois centros de ossificação posteriores das vértebras paralelos e a integridade dos tecidos moles; no plano coronal, os três centros de ossificação de cada vértebra formam três linhas regulares; no plano axial, o arco neural normal aparece como um círculo fechado, com a pele suprajacente intacta. Na espinha bífida há um afastamento dos centros de ossificação posteriores, visíveis nos três planos de observação, assumindo as vértebras atingidas, uma forma de “U” ou “V” no plano axial, com perda da integridade da pele suprajacente e uma associada protrusão sacular – meningocelo ou mielomeningocelo. Em 95% dos casos existem sinais craneanos associados: ventriculomegalia, biconcavidade dos ossos frontais - sinal do limão - , obliteração da cisterna magna com cerebelo “ausente”ou com curvatura anterior dos hemisférios cerebelosos – sinal da banana. Perante o diagnóstico de espinha bífida deve ser feiro um exame detalhado do feto e o estudo do cariótipo deve ser proposto, sobretudo se existem lesões associadas. De um modo geral, o prognóstico é pior quanto mais alta e maior é a lesão e na presença de lesões associadas; lesões sagradas baixas podem ter um pro- gnóstico melhor em termos de mobilidade, mas quase sempre têm incontinência; movimentos normais dos membros inferiores do feto e aparelho urinário intacto, têm pouco valor prognóstico; a inteligência depende da presença ou ausência de hidrocefalia. A paralisia dos membros inferiores e a dupla incontinência, são a regra nas crianças sobreviventes. A holoprosencefalia é uma anomalia cerebral grave que resulta da divisão incompleta do prosencéfalo, com falência do desenvolvimento das estruturas da linha média. Há três formas, dependendo do grau de separação dos hemisférios cerebrais.A forma alobar, a mais grave, caracteriza-se pela presença de uma cavidade monoventricular e fusão dos tálamos; não existe 3º ventrículo, foice do cérebro e corpo caloso. Na forma semilobar há segmentação parcial dos ventriculos e hemisférios cerebrais posteriormente, com fusão incompleta dos tálamos. Estas duas formas associam-se frequentemente a anomalias faciais graves – etmocefalia (proboscis), ciclopia (órbita mediana única com proboscis acima da órbita) e a microcefalia. Na forma lobar, a menos grave, há desenvolvimento parcial da foice do cérebro, não há corpo caloso, há comunicação entre os cornos frontais dos ventrículos laterais, mas o tálamo e o 3º ventrículo são normais. O diagnóstico ecográfico que pode ser feito a partir do fim do 1º trimestre, tem como principal sinal, a presença de um ventrículo único dilatado na linha média. Pode associar-se a cromossomopatias, em particular a trissomia 13 e a doenças genéticas. As formas alobar e semilobar são letais; a forma lobar associa-se a atraso mental. A hidranencefalia é uma lesão destrutiva na qual os hemisférios cerebrais estão ausentes, sendo substituídos por sacos de leptomeninges e uma representação rudimentar do córtex cerebral, cheios de liquido cefaloraquidiano. Pode resultar da oclusão vascular disseminada no território da artéria carótida interna, da infecção por toxoplasma ou citomegalovirus, por vasculite e ocorre depois das 12 imagem na avaliação do sistema nervoso central: implicações no prognóstico – mesa redonda S 174 XIX reunião do hospital de crianças maria pia NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 semanas, no 2º ou 3º trimestres da gravidez, podendo ainda acontecer durante o primeiro ano de vida. O tálamo, gânglios da base, tronco cerebral e cerebelo são preservados, já que dependem da irrigação da artéria basilar. Na avaliação ecográfica visualizase uma grande massa cística enchendo o crâneo, com ausência ou descontinuidade do córtex cerebral e dos ecos da linha média. O tálamo e tronco cerebral sobressaem na cavidade cística; na hidranencefalia, estas estruturas não estão rodeadas por um rim de córtex cerebral, ao contrário do que acontece na holoprosencefalia alobar e na hidrocefalia grave. A sobrevida de uma criança com hidranencefalia não ultrapassa um ano. A agenesia do corpo caloso é uma relativamente comum malformação do SNC, na qual a faixa da substância branca, constituída pelas fibras que ligam os dois hemisférios cerebrais, está ausente. A agenesia pode ser primária ou resultar de uma lesão destrutiva secundária, podendo associar-se a cromossomopatias (trissomia 18,13, 8), síndromes genéticos ou a teratogéneos, como no síndrome alcoólico fetal ou com o valproato de sódio e a cocaína. O corpo caloso surge tardiamente na gestação, entre as 12 e as 18 semanas, desenvolvendo-se de frente para trás, podendo a agenesia ser total ou parcial, dependendo do momento da gestação em que ocorreu o insulto. Há uma elevada incidência de outras anomalias cerebrais associadas, sendo a mais comum a malformação de Dandy-Walker e também os lipomas Corno frontal Corno occipital Imagem em lágrima - colpocefalia intracraneanos. A incidência de malformações extracraneanas está também aumentada. O diagnóstico ecográfico é difícil e muitas vezes só é feito no 3º trimestre da gestação. O corpo caloso não é visualizado nos corte habituais da cabeça fetal, mas a sua agenesia pode ser suspeitada na presença de sinais indirectos, nomeadamente a ausência do cavum do septo pelúcido e a ventriculomegalia, com alargamento predominante dos cornos occipitais dos ventrículos laterais e com cornos frontais de diâmetro normal, mas mais separados que o habitual – imagem em lágrima -. A agenesia do corpo caloso é demonstrada com cortes médio-coronais e médio-sagitais da cabeça fetal, usando imagem multiplanar e quando possível, a sonda vaginal. Com Doppler a cores pode demonstrar-se a ausência da artéria pericalosal e em seu lugar os ramos da artéria cerebral anterior, com uma configuração radiada. Nesta situação, deve ser efectuada ressonância magnética para pesquisar anomalias associadas nomeadamente desordens da migração neuronal e heterotopias. Na presença de aneuploidias ou outras anomalias intra ou extra craneanas o prognóstico é mau. Na agenesia isolada, o prognóstico é melhor, com um desenvolvimento normal em cerca de 85% dos casos; os pais devem, contudo, ser informados que a agenesia do corpo caloso pode associar-se a síndromes genéticos, que podem não ser identificados na vida fetal. O Complexo de Dandy-Walker refere-se a um espectro de anomalias da fossa posterior. Engloba: a malformação de Dandy-Walker – agenesia completa ou parcial do vérmis do cerebelo e alargamento do 4º ventriculo; a variante de Dandy-Walker – agenesia parcial do vérmis (geralmente a porção inferior) sem alargamento da fossa posterior; e a mega cisterna magna – cisterna magna aumentada, com integridade do vérmis e 4º ventrículo. O Complexo de Dandy-Walker pode associar-se a cromossomopatias (trissomia 18, 13, 21, triploidia, S. Turner), a vários síndromes genéticos (Meckel-Gruber, Joubert...), a infecções congénitas, a teratogéneos como a warfarina, podendo no entanto ser um achado isolado. O diagnóstico ecográfico da malformação de Dandy-Walker, baseia-se na visualização no plano transcerebeloso, de dilatação do 4º ventrículo e separação dos hemisférios cerebelosos com comunicação entre a cisterna magna e 4º ventrículo; ventriculomegalia está presente em cerca de 2/3 dos casos, podendo surgir até aos 6 meses de vida. Associase muitas vezes a outras malformações cerebrais graves. O diagnóstico pré natal de variante de Dandy-Walker é difícil e só pode ser feito depois das 18-19 semanas, altura em que o desenvolvimento do vérmis do cerebelo está completo. A cisterna magna está aumentada quando mede mais de 10 mm; o diagnóstico de mega cisterna magna é de exclusão. Perante o diagnóstico de complexo de Dandy-Walker, deve ser feita a pesquisa de malformações adicionais, oferecido o cariótipo, devendo também efectuar-se ressonância magnética para despiste de anomalias da migração neuronal; quando outras anomalias são encontradas, o prognóstico é mau. Mesmo nos casos com aparentemente isolada malformação/ variante de Dandy-Walker, o prognóstico é mau, com uma mortalidade pós natal alta ( cerca de 20%) e atraso de desenvolvimento em mais de 50% dos casos. O Cisto Porencefálico é uma cavidade contendo liquido cefaloraquidiano dentro dos hemisférios cerebrais, que pode ou não comunicar com o espaço subaracnóideu e/ou sistema ventricular. Resulta da destruição do córtex cerebral, com reabsorção dos tecidos necróticos e formação da cavidade cística. Pode ocorrer na sequência de: hemorragia secundária a infecção, trombocitopenia aloimune fetal ou trauma directo (iatrogénica); síndrome de transfusão feto-fetal ou morte de um gémeo; exposição a drogas vasoactivas como cocaína ou heroína; evento hipóxico-isquémico como na pré-eclampsia ou descolamento prematuro de placenta. imagem na avaliação do sistema nervoso central: implicações no prognóstico – mesa redonda XIX reunião do hospital de crianças maria pia S 175 NASCER E CRESCER NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Uma hemorragia recente traduz-se ecograficamente por lesões hiperecogénicas irregulares, no parênquima cerebral e/ou sistema ventricular, que distorsem as estruturas normais. Progressivamente, as lesões liquefazem-se, tornando-se hipoecogénicas, visualizando-se no córtex cerebral, uma ou mais imagens císticas, que habitualmente comunicam com o sistema ventricular; não produzem efeito de massa, mas associam-se frequentemente a ventriculomegalia unilateral. O prognóstico relaciona-se com o tamanho e localização das lesões, mas cerca de 80% dos casos associam-se a paralisia cerebral e 20% a défice cognitivo, moderado ou grave. O aneurisma da veia de galeno é uma malformação arteriovenosa, que resulta da presença de fistulas arteriovenosas entre uma ou mais artérias cerebrais e o sistema venoso cerebral, sem a interposição de capilares, com dilatação aneurismática da veia de galeno, na linha média. O aspecto ecográfico é de uma área cística, na linha média, oval ou tubular, não pulsátil; com Doppler a cores demonstra-se um fluxo turbulento no seu interior. Sendo uma malformação que aparece tardiamente na gravidez, a maioria no 3º trimestre, a atitude é expectante, com vigilância regular, no sentido de despistar precocemente sinais de insuficiência cardíaca de alto débito, manifestada por cardiomegalia, hepatomegalia e hidrópsia. O local e o momento do parto deve ser programado em conjunto com a equipe de neurocirurgia e neonatologia. Embora não havendo consenso relativamente ao tipo de parto, parece razoável que na presença de anomalias associadas, como porencefalia grave ou cardiomegalia com hidrópsia, o parto por cesariana não esteja indicado, já que a mortalidade neonatal é muito elevada ( > 90%); na ausência de anomalias associadas, a cesariana deverá ser a opção. Cistos aracnóides são lesões avasculares, que no feto se localizam habitualmente na linha média, na fissura inter hemisférica ou posterior ao vérmis, na fossa posterior. Em séries pediátricas, a sua localização é, com mais ano 2007, vol XVI, n.º 3 frequência excêntrica, em relação com a fissura de Sílvius. A maioria são diagnosticados entre as 20 e as 30 semanas de gestação. O aspecto ecográfico é de uma massa anecogénica, de parede fina, bem circunscrita, uni ou multilocular, que não comunica com o sistema ventricular; se localizado na linha média, o diagnóstico diferencial com aneurisma da veia de Galeno, é feito com o Doppler a cores; quando se localiza na fossa posterior, o diagnóstico diferencial é com a malformação de Dandy-Walker. Ao tentar definir o prognóstico há que ter em atenção a presença de anomalias associadas, como a agenesia parcial ou completa do corpo caloso, que pode associar-se aos cistos da linha média e a presença de hidrocefalia obstrutiva, mais frequente nos cistos da fossa posterior. A amniocentese está indicada se houver anomalias associadas. Cistos isolados diagnosticados no 3º trimestre têm habitualmente bom prognóstico; as manifestações clínicas pós natais são habitualmente subtis e 60 a 80% das crianças são assintomáticas. O tamanho do cisto deve ser avaliado seriadamente ao longo da gravidez; o seu aumento, faz prever o aparecimento de hidrocefalia obstrutiva. O aumento rápido do diâmetro dos ventrículos ou do perímetro cefálico pode tornar necessário o parto prematuro. O momento e a via do parto são discutidos em equipe multidisciplinar com a neonatologia e a neurocirurgia. Os tumores intracraneanos fetais, muito raros, são quase sempre supra tentoriais. O tipo histológico mais frequente é o teratoma. O aspecto ecográfico é variável de cístico a sólido e misto, podendo o seu aspecto alterar-se ao longo do tempo; frequentemente têm áreas de calcificação. Crescem rapidamente, distorcendo a anatomia normal. A hidrocefalia obstrutiva é comum; a macrocefalia pode ser causa de distocia. Os gliomas aparecem como massas ecogénicas unilaterais que desviam a foice. Os papilomas ou carcinomas dos plexos coróideus aparecem como plexos coróideus volumosos, de ecoestrutura heterogénea e hiperecogénea, nos ventrículos laterais ou no 3º ventrículo, com hidrocefalia. Os lipomas são massas ecogénicas bem definidas, usualmente na linha média e frequentemente associados a agenesia do corpo caloso. São diagnosticados no 2º ou 3º trimestres. Com excepção dos lipomas, o prognóstico no conjunto dos tumores fetais, é muito mau, com sobrevivência pós natal muito curta. Ocorre muitas vezes morte fetal. Ventriculomegalia define-se como um diâmetro do atrium dos ventrículos laterais superior a 10mm, a partir das 14 semanas e até ao termo; pode ser ligeira (10 – 12 mm), moderada (>12 – 15 mm) ou grave (>15mm). Normalmente, o plexo coróideu preenche o ventrículo lateral; plexo coróideu pendente, é um sinal de ventriculomegalia. 1% dos fetos entre 18 e as 23 semanas, apresentam ventriculomegalia. Hidrocefalia é uma ventriculomegalia grave, com aumento de pressão, que pode envolver também o 3º e o 4º ventrículos. A prevalência é de 2 por 1000 nados vivos. Pelos números, conclui-se que a maioria dos fetos com ventriculomegalia não desenvolve hidrocefalia. Na presença de ventriculomegalia / hidrocefalia, anomalias ecográficas craneanas e extracraneanas adicionais, devem ser pesquisadas. O estudo citogenético deve ser oferecido em todos os casos, particularmente na presença de anomalias associadas e nas ventriculomegalias ligeiras e moderadas. Devem ser feitas as serologias maternas para pesquisa de infecções – toxoplasmose, CMV, rubéola, herpes e parvovirus – com PCR e em alguns casos cultura, no liquido amniótico, no caso de evidência serológica de infecção na gravidez. Assimetria dos ventriculos, sangue nos ventrículos ou no parênquima cerebral, aumento da ecogenicidade da parede dos ventrículos – ventriculite – e os cistos porencefálicos, são sinais sugestivos de infecção fetal. A gravidade das lesões associadas e das anomalias cromossómicas definem o prognóstico. Infecções congénitas com alterações cerebrais têm mau prognósti- imagem na avaliação do sistema nervoso central: implicações no prognóstico – mesa redonda S 176 XIX reunião do hospital de crianças maria pia NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 co, com taxas de mortalidade muito altas e atraso de desenvolvimento nos sobreviventes. Quando toda a investigação é negativa e estamos perante uma ventriculomegalia isolada, moderada ou grave, advogamos ainda a realização de ressonância magnética, no sentido de despistar anomalias cerebrais não diagnosticadas na ecografia. A definição do prognóstico na ventriculomegalia “verdadeiramente” isolada, não é fácil. São indicadores de pior prognóstico, um atrium ventricular > 12 mm, a bilateralidade ou assimetria ventricular e o aumento dos ventrículos ao longo da gravidez. As ventriculomegalias, sobretudo as ligeiras, podem regredir ao longo da gravidez. Este é o grupo com melhor prognóstico,mas mesmo neste grupo recomenda-se a vigilância do desenvolvimento, em pós natal. Nas ventriculomegalias ligeiras ou moderadas que persistem, em cerca de 90% dos casos há um desenvolvimento normal; nos restantes, há um defice neurológico ou um atraso do desenvolvimento psicomotor. O diagnóstico ecográfico de microcefalia é baseado na medida do perímetro cefálico e na sua relação com as outras medidas fetais. Assim um perímetro cefálico < 5 SD (Desvio Padrão), uma relação perímetro cefálico / perímetro abdominal < 3 SD e uma relação comprimento do fémur / perímetro cefálico > 3 SD para a idade gestacional, permite o diagnóstico de microcefalia. Há disproporção entre o tamanho da face e da cabeça. Pode associar-se a outras malformações cerebrais (porencefalia, holoprosencefalia, agenesia do corpo caloso...), a infecções congénitas, a cromossomopatias, a síndromes genéticos, exposição a teratogéneos (warfarina). O prognóstico depende da causa subjacente, mas em mais de 50% dos casos há atraso mental grave. Nascer e Crescer 2007; 16(3): 173-177 BIBLIOGRAFIA Levene MI, Chervenak FA, Whittle M, Bennett MJ, Punt J. Fetal and Neonatal Neurology and Neurosurgery. London. Churchill Livingstone. 2001; 39–55; 89– 97; 199–315; 323–337; 776–787. Russel SA, Cranial abnormalities. In. Twining P, Mc Hugo J, Pilling DW. eds. Textbook of Fetal Abnormalities. London. Churchill Livingstone. 2000; 89–138. 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Desta associação resultará a activação de mecanismos imunológicos que irão levar a uma lesão progressiva das células β dos ilhéus pancreáticos, o que ocorre em mais de 90% dos casos. Numa percentagem elevada de doentes com diabetes mellitus tipo 1 de causa auto-imune existe a associação de outras doenças com um desenvolvimento comum, como a doença de Graves, tiróidite de Hashimoto, doença de Addison, doença Celíaca, anemia Perniciosa, etc. A participação genética nas doenças auto-imunes é cada vez maior, havendo uma associação entre estas doenças e o sistema de histocompatibilidade humana. Embora o sistema HLA esteja envolvido na patogenia de muitas dessas doenças, outros factores devem estar presentes para haver o desenvolvimento da endocrinopatia. __________ ¹ Hospital Pedro Hispano tratamento da diabetes – mesa redonda S 178 XIX reunião do hospital de crianças maria pia Considera-se a diabetes mellitus tipo 1 a doença endocrinometabólica mais frequente na idade pediátrica, e a hiperglicemia crónica o principal responsável pelo aparecimento das complicações vasculares e neurológicas que os doentes podem desenvolver a longo prazo. Está demonstrado que a melhor prevenção das complicações é a optimização do controlo metabólico mesmo em idades pré-pubertárias (desde o diagnóstico) bem como uma detecção seriada das possíveis doenças que lhe possam estar associadas. NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Diabetes na adolescência Olinda Marques1 A adolescência é claramente um período de rápida mudança. Caracteriza-se por um aumento do desenvolvimento cognitivo, do pensamento abstracto e capacidade crítica, pela aquisição da sua própria identidade e estilo de vida, pela menor receptividade à autoridade e grande dependência em relação ao grupo de amigos, pela aquisição progressiva de autonomia mas também pelo medo e insegurança em relação ao futuro. Esta fase é, por isso, potencialmente geradora de conflitos. A adolescência é um período particularmente crítico para os jovens com Diabetes. Esta distingue-se das outras doenças crónicas pelas adaptações permanentes exigidas aos doentes e familiares para o seu controlo e responsabilidades nas decisões a tomar para esse fim, ou seja, grandes alterações no estilo de vida. Do ponto de vista fisiológico o aumento da secreção dos esteróides sexuais que caracterizam a puberdade e das catecolaminas associadas aos conflitos psicológicos conduz a um aumento da insulinorresistência e da glicemia e grandes dificuldades no controlo metabólico. A tendência é a intensificação do esquema terapêutico, mas o receio de ser considerado “anormal” no grupo de amigos, dificulta ainda mais as atitudes perante a doença. São frequentes comportamentos de dissimulação da mesma (omissão da autovigilância e de administrações de insulina, não são evitados alimentos desaconselhados ou álcool,…) com grande risco de descompensações agudas. A negação da doença e a atracção pelo risco são pertinentes nesta fase. Para outros, o isolamento e afastamento do grupo é a atitude preferida. A equipa terapêutica tem que estar preparada para a detecção e avaliação destas situações, esclarecendo os riscos, reforçando a autoconfiança e ensinando a evitar as complicações agudas. É fundamental que estes problemas sejam prioritários e que a avaliação do controlo seja considerada em segundo plano. A doença deverá ser integrada na “vida” do adolescente e não condicionála. Os objectivos terapêuticos terão de ser realistas e atingíveis. Temas como o álcool, contracepção ou orientação profissional devem constituir tema de debate. Em relação a este último o diabético deverá conhecer os direitos legais e profissões que lhe são desaconselhadas. A insatisfação com a imagem corporal é frequente entre os adolescentes sobretudo no sexo feminino. Daí que o tema peso não deverá ser abordado de forma muito enfática pela sua estreita e negativa relação com o controlo metabólico. Distúrbios do comportamento alimentar são mais graves e difíceis de tratar nos diabéticos. Nunca se deve assumir que o adolescente tem as capacidades e conhecimentos para resolver sozinho os problemas. Embora seja conveniente que os tenha, não há garantias de que os use. Não se deve partir do princípio que os pais foram transmitindo aos filhos todos os conhecimentos aprendidos, independentemente do tempo de evolução da diabetes. Há pois necessidade de uma nova abordagem da doença. Deve-se ensinar e ajudar a resolver sozinho os problemas. Não contestar mas convencer. Negociar a responsabilidade no tratamento e não impor. Os objectivos do tratamento são: 1. Prevenção das complicações agudas. 2. Ausência sustentada dos sintomas de hiperglicemia 3. Promover a sensação de bem-estar físico e psíquico 4. Manutenção de um crescimento e desenvolvimento sexual normais assim como de um peso ideal 5. Prevenção, identificação e tratamento dos distúrbios emocionais associados, com apoio psicossocial contínuo e motivação do doente e familiares. 6. Tentar o melhor controlo metabólico possível de modo a prevenir/atrasar o aparecimento de complicações crónicas. __________ ¹ Hospital de S. Marcos (Braga) tratamento da diabetes – mesa redonda XIX reunião do hospital de crianças maria pia S 179 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Aplicações Terapêuticas da Toxina Botulínica nas Distonias Inês Carrilho1 INTRODUÇÃO A toxina botulínica (TXB) é uma neurotoxina produzida pela bactéria Clostridium botulinum, sendo uma das substâncias mais potentes que se conhece(1). O seu efeito clínico resulta da sua ligação irreversível aos receptores da terminação nervosa pré-sinaptica. O efeito clínico é transitório, esta reversibilidade é explicada pela capacidade que as terminações nervosas têm de gerar novos terminais nervosos, conduzindo a um restabelecimento do contacto com o músculo(2). A primeira referência na literatura à possibilidade de poder utilizar toxina botulinica como agente terapêutico, remonta a 1817 (Christian Andreas Justinus Kerner), mas só em 1980 foi publicada a primeira aplicação da TXB no tratamento do estrabismo(3). Posteriormente foi sendo demonstrada a sua utilidade no tratamento de outras situações como no blefarospasmo e hemispasmo facial(4), nas distonias cranio-cervicais(5), na espasticidade (Paralisia Cerebral) e na hiperhidrose focal(6). Todos os anos vão surgindo novas aplicações e em várias especialidades médicas (exemplos: na hipersialorreia, hiperlacrimejo, hiersecrecção nasal, no bruxismo, em alguns problemas urológicos e gastrointestinais, no tremor, nas mioclonias, nos tiques, nas cefaleias, aplicações cosméticas etc.(7) Há 7 serotipos de TXB antigenicamente diferentes designados pelas letras de A a G. Estão comercializados 2 serotipos, tipo A e tipo B e cinco produtos com toxina botulinica, sendo os três mais utilizados a BOTOX (TXB A), a DYSPORT (TXB A) e a MYOBLOC (TXB B). __________ ¹ Consulta de Doenças do Movimento Serviço de Neuropediatria do H.Maria Pia A toxina tipo A é a que produz no ser humano uma paralisia mais prolongada (4 -6 meses). Na criança a utilização mais frequente da TXB tem sido na paralisia cerebral para controlo da espasticidade e da distonia(8). Apresentam-se de seguida algumas das principais aplicações da TXB nos casos de distonia. Nascer e Crescer 2007; 16(3): 181-183 APLICAÇÕES DA TXB NA DISTONIA A distonia define-se como contracções musculares involuntárias, mantidas e repetidas de músculos opostos originando movimentos e posturas anómalas. Apesar dos grandes avanços no estudo das distonias, a sua fisiopatologia não está completamente esclarecida e o tratamento para a maioria dos casos é sintomático. O uso da TXB é o tratamento de escolha nas distonias focais. O sucesso do tratamento com TXB depende da identificação correcta dos músculos alvo a injectar, conhecer a anatomia das áreas a infiltrar, escolher a dose em função do tipo de toxina e dos músculos a infiltrar. Nalguns casos será fácil a sua selecção como no caso do blefarospasmo e espasmo hemifacial. Noutras situações poderá ser necessário efectuar a injecção com controlo electromiografico ou ecográfico e há casos de hemidistonia em que a complexidade dos movimentos é de tal ordem e pode ser tão variável que torna pouco provável o controlo completo dos movimentos. Descrevem-se de forma resumida alguns tipos de distonia em que a TXB é uma opção de tratamento, sendo por vezes essa a primeira opção terapêutica. Blefarospasmo é um tipo de distonia focal devido ao encerramento involuntário das pálpebras, geralmente bilateral. Resulta geralmente do espasmo do músculo orbicularis oculi mas pode ser acompanhado de distonia de outros músculos da face e região cervical. A forma ideopática denominada blefarospasmo benigno essencial é característica dos adultos, tem um início entre a 5ª e 7ª década. As formas secundárias representam apenas 10% dos casos. Quando falha o tratamento conservador (uso de óculos de sol, benzodiazepinas ou anticolinérgicos) deve utilizar-se a TXB. A taxa de sucesso com este tipo de tratamento ronda os 90%(9). O principal músculo infiltrado é o orbicularis oculi. Os principais efeitos secundários são a secura ocular, ptose, lagoftalmia e diplopia. Estes efeitos são transitórios. Espasmo hemifacial – Define-se como movimentos irregulares tónicos ou clónicos dos músculos enervados pelo VII nervo craniano num dos lados da face. A contracção muscular geralmente começa na região periocular e pode posteriormente atingir a região perioral e bochecha. Esta é também uma patologia típica da idade adulta, mais prevalente no sexo feminino e resulta frequentemente da compressão vascular do nervo facial. Medicações como o baclofeno, clonazepam, fenitoina, gabapentina e levetiracetam podem originar uma melhoria transitória. Outra hipótese de tratamento é a descompressão microcirúrgica. O tratamento com TXB permite obter bons resultados sem os efeitos secundários da intervenção neurocirúrgica. Os músculos injectados podem ser: orbicularis oculi, frontal, zigomático, bucinador, depressor do ângulo da boca, dependendo quais os toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda XIX reunião do hospital de crianças maria pia S 181 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 músculos mais atingidos(10). Alguns dos efeitos secundários que podem surgir são: equimose no local da injecção, secura ocular, desvio da comissura labial, ptose, edema palpebral e fraqueza dos músculos da face. Distonia cervical – é uma distonia focal que resulta da contracção involuntária e assimétrica dos músculos do pescoço e ombros, originando movimentos de rotação, inclinação, flexão ou extensão da cabeça, por vezes associada a elevação ou desvio anterior do ombro. A classificação da distonia cervical depende da posição primária da cabeça: torcicollis (desvio horizontal), laterocollis (inclinada sobre o ombro), anterocollis (flexão anterior) ou retrocollis (hiperextensão). A distonia cervical primária surge tipicamente na idade adulta. O inicio antes dos 28 anos é raro. O tratamento com TXB é o mais eficaz, com melhoria em 85% dos doentes. Não parece haver diferenças significativas nos resultados obtidos usando BotoxR ou DysportR (11). Um estudo recente sobre distonia cervical de inicio antes dos 28 anos (idades variaram entre 3 -28 anos), demonstrou uma resposta favorável com o tratamento com TXB em 74% dos casos(12). O sucesso do tratamento depende da correcta selecção dos músculos a injectar, o que exige um correcto conhecimento dos principais músculos do pescoço e das suas acções primárias e secundárias. Outro factor importante para uma boa resposta terapêutica é a escolha da dose mais correcta em função dos músculos a injectar. Os principais efeitos secundários a curto prazo e que estão relacionados com as doses usadas e músculos injectado são: disfagia, fraqueza do pescoço, astenia. Distonia oromandibular (OMD) – é uma distonia focal que envolve os músculos da mastigação, da face inferior, labiais e linguais. O envolvimento dos músculos da mastigação pode originar encerramento ou abertura da mandíbula, desvio lateral, protusão, retração ou combinação de vários movimentos. Estes movimentos interferem com a alimentação, com a fala, podem originar traumatismo da língua e dos lábios. Este tipo de distonia pode ser ideopática ou estar associada a outras patologias (paralisia cerebral, doenças neurodegenerativas…). O tratamento deve ser individualizado de acordo com as necessidades do doente. A toxina botulinica é actualmente o tratamento de escolha e há vários estudos que demonstram a sua eficácia especialmente nos casos OMD com encerramento da mandíbula. Disfonia espasmódica – é também uma forma de distonia focal que envolve as cordas vocais originando dificuldades na fala. Na criança com paralisia cerebral pode estar presente esta forma de distonia e interferir de forma significativa com a capacidade de comunicação. A primeira aplicação de toxina no tratamento da disfonia espasmódica foi em 1986(13) e desde essa altura múltiplos estudos têm sido efectuados demonstrando a sua eficácia. Diferentes protocolos tem sido propostos para a injecção da TXB nos músculos tiroaritnoideus uni ou bilateralmente, usando diferentes técnicas que não vão aqui ser abordadas. Distonia do escrivão – é uma distonia focal desencadeada especificamente pela acção de escrever. Têm sido tentados vários tratamentos farmacológicos mas sem grande resposta e desde 1989(14) tem vindo a ser usada a TXB com melhoria em alguns doentes(15). Hemidistonia – Distonia do hemicorpo geralmente secundária a lesão cerebral envolvendo os gânglios da base (ex: malformação vascular, calcificações, lesão isquémica). A injecção de toxina é aplicada nos grupos musculares mais atingidos. A TXB tem também sido utilizada em algumas distonias focais secundárias (distonia da língua, distonia oromandibular, distonia cervical, distonia do membro superior) no contexto de doenças neurológicas, como a forma distónica da Paralisia Cerebral, no sindrome de Lesch-Nyhan e outras doenças neurodegenerativas com grande componente distónico. A distonia da língua com protusão é um desses exemplos. Esta situação pode pôr em risco a vida do doente e responde mal às drogas por via oral, mas pode beneficiar com as injecções de TXB a nível do músculo genioglosso(16). A terapêutica com TXB na disto- toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda S 182 XIX reunião do hospital de crianças maria pia nia do membro superior nas crianças com paralisia cerebral tem sido alvo de alguns estudos que demonstram a sua eficácia(17). O torcicolo muscular congénito é a forma de torcicolo mais frequente da criança, há inclinação da cabeça para o lado em que o músculo esternocleidomastoideu está alterado (mais espesso ou mesmo uma tumefacção palpável). Nos casos mais resistentes, que não melhoram com o tratamento conservador, tem sido usado o tratamento com TXB, associado à fisioterapia, com bons resultados, podendo evitar a necessidade de intervenção cirúrgica(18,19,20,21). CONCLUSÃO O uso da toxina botulinica alterou de forma significativa a abordagem terapêutica das distonias focais. É já a primeira linha de tratamento em algumas situações. O seu uso clínico há mais de duas décadas permitiu conhecer os seus principais efeitos secundários. Há indicações terapêuticas já bem definidas no adulto e na criança. São necessários ainda mais estudos controlados na criança para aumentar as indicações do seu uso em alguns quadros mais específicos da criança. Nascer e Crescer 2007; 16(3): 181-183 BIBLIOGRAFIA 1. Jancovic et al. Therapeutic uses of botulinum toxin. N Eng J Med 1991; 324(7):1186-94 2. De Paiva A et al. Functional repair of motor endplates after boyulinum neurotoxin type A poisoning: biphasic switch of synaptic activity between nerve sprouts and their parent terminals.Proc Natl Acad Sci USA 1999;96:3200-3205) 3. Scott AB. Ophalmology 1980;87:10441049 4. Frueh BR, Felt DP, Wojno TH, Musch DC. Arch Ophthalmol 1984 5. Jankovic J, Orman J. Neurology 1987; 37:616-623) 6. Schnider P, Binder M, Berger T, Auff E. British Journal of Dermatology 1996), NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 7. Jost W H. Other indications of botulinum toxin therapy. 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As injecções de toxina botulinica (TXB) no detrusor e no esfíncter foram recentemente introduzidas no tratamento destes casos refractários ao tratamento conservador. Realizamos uma revisão da literatura focada no tratamento da disfunção vesico-uretral com TXB na criança Observações: Encontramos apenas 14 artigos publicados sobre o uso de TXB especificamente na disfunção vesico-uretral pediátrica. Sendo estes referentes a 10 diferentes séries de pacientes. Sete séries incluíam apenas doentes com disfunção neurogénica e apenas dois contemplavam a aplicação de toxina no esfíncter. A aplicação de TXB no detrusor aumentou significativamente a capacidade vesical e diminuiu a pressão máxima do detrusor na grande maioria dos doentes, tornando-os continentes. A injecção de TXB no esfíncter diminuiu significativamente o resíduo pós-miccional, a pressão do detrusor que provoca perdas e aumentou o fluxo urinário, embora seja por vezes necessário injecções mensais até atingir o resultado pretendido. Conclusões: A TXB parece ser uma boa alternativa ao tratamento cirúrgico da hiperactividade do detrusor __________ ¹ Serviço de Urologia, HGSA na população pediátrica. O uso de TXB no esfíncter em doentes com disfunção miccional parece promissor, no entanto mais estudos são necessários para avaliar qual o melhor método de administração, dose e a sua eficácia a longo prazo. Nascer e Crescer 2007; 16(3): 184-185 INTRODUÇÃO A toxina botulínica A (TXB-A) é uma neurotoxina potente que bloqueia a libertação de neurotransmissores nos terminais nervosos colinergicos, nomeadamente da acetilcolina, a qual é responsável pela contracção muscular. A injecção intramuscular de TXB-A bloqueia a junção neuromuscular no sítio da injecção até novos terminais sinápticos se desenvolverem. Inicialmente usada no tratamento de hiperactividade muscular estriada, existe actualmente evidência da sua eficácia ao nível do musculo liso e que os seus efeitos parecem ser mais longos. Em Urologia a TXB tem sido usada em adultos para tratamento da hiperactividade do detrusor neurogénica e idiopatica , na dissinergia vesicoesfincteriana, na hiperplasia benigna da próstata, e mais recentemente na cistite intersticial e na prostatite crónica tipo III. A primeira criança a receber TXBA por uma patologia neuro-urológica foi uma menina de 7 anos com dilatação uretral associada a micção disfuncional(1). Desde então a aplicação de TXB em crianças tem-se centrado no tratamento da hiperactividade do detrusor neurogénica e só mais recentemente no tratamento da hiperactividade não neurogénica e da micção disfuncional. toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda S 184 XIX reunião do hospital de crianças maria pia TOXINA BOTULINICA NO TRATAMENTO DA HIPERACTIVIDADE DO DETRUSOR NEUROGÉNICA Crianças com bexiga neurogénica são classicamente tratadas com anticolinergicos e cateterização vesical intermitente várias vezes por dia. Para além dos efeitos adversos associados a esta terapêutica ela é muitas vezes ineficaz, não evitando episódios de incontinência e sobretudo colocando as crianças em risco de grandes pressões intravesicais, refluxo vesicoureteral e de lesão da função renal. A TXB tem sido usada com o objectivo de controlar a hiperactividade do detrusor nestes casos. Schulte-Baukloh e colaboradores(2) injectaram 20 crianças com hiperactiviade do detrusor neurogénica, a maioria com mielomeningocelo, com 12U/kg de Botox (Allergan Inc, Irvine, Califórnia). O seguimento urodinãmico 2 a 4 semanas após o tratamento revelou um aumento significativo da capacidade vesical e diminuição da pressão máxima do detrusor. Estudos mais recentes(3,4,5) confirmam estes resultados mostrando também uma redução muito significativa de incontinência e de refluxo vesicoureteral. O efeito clínico da toxina durou entre 6 e 12 meses e manteve-se após injecções repetidas(6,7). De notar que cerca de 90% dos doentes apresentam resposta à terapêutica, no entanto doentes com baixa acomodação vesical e com deficit esfincteriano apresentam melhorias sintomáticas ligeiras. TOXINA BOTULINICA NO TRATAMENTO DA HIPERACTIVIDADE DO DETRUSOR NÃO NEUROGÉNICA O termo disfunção vesical não neurogénica baseia-se unicamente no facto de não ser possível identificar lesão neurológica que explique a disfunção miccio- NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 nal em causa. É portanto possível que muitas vezes exista um a causa neurológica mas que a lesão neuroanatomica não é identificável. Isto significa que as diferenças entre hiperactividade neurogénica e não-neurogénica, não sejam muito claras e que o seu tratamento seja semelhante. Recentemente Hoebeke e col(8), publicou a primeira série de crianças com hiperactividade do detrusor sem causa neurológica identificável e sem micção disfuncional tratadas com 100U de Botox®. Oito raparigas e 7 rapazes com idades compreendidas entre 8 e 14 anos, concluíram o estudo. Nove apresentaram resposta completa, 3 apresentaram melhoria e 3 ficaram na mesma. Todos os doentes conseguiram urinar voluntariamente após o tratamento, embora uma menina apresentasse volumes residuais significativos. TOXINA BOTULINICA NO TRATAMENTO DA MICÇÃO DISFUNCIONAL A micção disfuncional em crianças anatomicamente e neurologicamente normais, é caracterizada pelo relaxamento incompleto ou hiperactividade dos músculos do pavimento pélvico ou do esfíncter externo durante a micção. È causa de incontinência, dificuldade em urinar, infecções, resíduo pós-miccional e deterioração do aparelho urinário alto. O tratamento baseia-se em bloqueadores alfa-adrenergicos, fisioterapia, psicoterapia e cateterismos intermitentes. Recentemente 2 estudos avaliaram a injecção de 50 a 100U de Botox® no esfíncter e musculatura do pavimento pélvico por via endoscópica(9) e transperineal(10) neste grupo de pacientes. Oitenta e cinco a 90% dos pacientes mostraram melhoria clínica e urodinâmica com diminuição do resíduo pós-miccional, da pressão de detrusor durante a micção e aumento do fluxo máximo. O efeito manteve-se até cerca de 6 meses após a injecção. REACÇÕES ADVERSAS Os efeitos adversos causados pela injecção de TXB, estão associados a sua difusão para fora do local de administração. Estes são a fadiga muscular generalizada, disfagia, aspiração, diplopia e visão turva. Assim esta terapêutica está contra-indicada em doentes com insuficiência respiratória ou distúrbios da transmissão neuromuscular como doentes com miastenia gravis ou tratados com aminoglicosídeos. Não estão habitualmente descritos estes efeitos adversos nos estudos sobre o uso de TXB nas disfunções vesicais(11). O bloqueio da placa neuromuscular no detrusor, pode obviamente causar retenção urinária. Embora isto não seja habitualmente um problema em doentes com disfunção neurogénica que fazem cateterismos intermitentes pode sê-lo em doentes capazes de contrair voluntariamente o detrusor. Assim nestes doentes usamos cerca de metade da dose, com o objectivo de conseguir inibir a hiperactividade sem interferir na contracção voluntária. CONCLUSÕES A eficácia terapêutica da TXB-A nas disfunções vesicais está bem documentada, embora careça de ensaios clínicos controlados, randomizados para melhor quantificar a essa eficácia. Nas crianças o uso de TXB tem tendência a expandirse à semelhança do que acontece nos adultos. Contudo é importante não esquecer que a hiperactividade do detrusor é uma patologia dinâmica na criança, ao contrário do que acontece nos adultos, e isto deve ser levado em conta quando decidimos por esta terapêutica. Nascer e Crescer 2007; 16(3): 184-185 BIBLIOGRAFIA 1. Steinhardt GF, Naseer s anf Cruz AO: Botulinum toxin: novel treatment for dramatic ureteral dilatation associated with dysfunctional voiding. J Urol, 1997; 158: 190 2. Schulte-Baukloh H, Michael T, Sturzebecher B, Knispel H: Botulinum-A Toxin detrusor injection as a novel approach in the treatment of bladder spasticity in children with neurogenic bladder. Eur Urol, 2003; 44:139 3. Riccabona M, Koen M, Schindler M, Goedele B, Pycha A, Lusuardi L, Bauer SB: Botulinum-A toxin injection into the detrusor: a safe alternative in the treatment of children with myelomeningocele with detrusor hyperreflexia. J Urol 2004;171:845. 4. Marte A, Vessella A, Cautiero P e col: Efficacy of toxin-A Botulinum for treating intractable bladder hyperactivity in children affected by neuropathic bladder secondary to myelomeningocele: an alternative to enterocystoplasty Minerva Pediatr. 2005;57:35 5. Kajbafzadeh A, Moosavi S, Tajik P e col: Intravesical injection of botulinum toxin type A: management of neuropathic bladder and bowel dysfunction in children with myelomeningocele. Urology 2006;68:1091. 6. Altaweel W, Jednack R, Bilodeau C, Corços J: Repeated intradetrusor Botulinum Toxin Type A in children with neurogenic bladder due to myelomeningocele, J Urol 2006;175:1102. 7. Akbar M, Abel R, Seyler T, Gerner H, Mohring K: Repeated botulinum_A toxin injections in the treatment of myelodysplastic children and patients with spinal cord injuries with neurogenic bladder dysfunction:BJU Int, 2007; 100:639. 8. Hoebeke P, DeCaestecker K, Vande Walle J, Dehoorne J, Raes A, Verleyen P, Van Laecke E: The effect of Botulinum-A Toxin in incontinent children with therapy resistant overactive detrusor. J Urol 2006;176:328. 9. Mokhless I, Gaafar S, Fouda K, Shafik M, Assem A: Botulinum A toxin urethral sphincter injection in children with nonneurogenic neurogenic bladder. J Urol 2006; 176:1767. 10. Radojicic Z, Perovic S, Milic N: Is it reasonable to treat refractory voiding dysfunction in children with botulinum-A toxin? J Urol;176:332. 11. Schurch B, Corcos J: Botulinum toxin injectionsfor paediatric incontinence. Curr Opin Urol 2005;15:264. toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda XIX reunião do hospital de crianças maria pia S 185 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Toxina Botulínica na Paralisia Cerebral Rosa Amorim1 INTRODUÇÃO A Paralisia Cerebral é a principal causa de incapacidade na criança. Define-se como uma lesão não progressiva no cérebro imaturo, causando anomalias na postura e no movimento. Apesar de a lesão neurológica ser estática (não evolutiva), as suas manifestações podem alterar-se ao longo do tempo, à medida que a criança vai crescendo, pelo que é necessário manter o acompanhamento e intervenção terapêutica ao longo de toda a vida. A espasticidade é o distúrbio mais frequente na Paralisia Cerebral, podendo encontrar-se isoladamente ou em combinação com distonia, atetose ou ataxia. Trata-se de um fenómeno complexo caracterizado por um aumento do tónus muscular velocidade-dependente, por hiperactividade do reflexo tónico de estiramento, com co-contracção (agonista/antagonista), hiperreflexia e clónus. Os seus principais efeitos na criança são: • inibição do movimento • limitação do crescimento muscular • desenvolvimento de deformidades músculo-esqueléticas • dor Estes métodos incidem na melhoria da função e na prevenção das deformidades, de modo a atrasar a necessidade de cirurgia, mas nenhum deles actua de forma mantida e sustentada na eliminação ou redução da espasticidade. Tradicionalmente, o tratamento da espasticidade na Paralisia Cerebral é constituído por: • medicação (diazepan, dantroleno, baclofeno) • fisioterapia • ortóteses • cirurgia Quando usar Toxina Botulínica? Em idade precoce. É hoje consensual que a administração de Toxina Botulínica deve ser efectuada preferencialmente entre os 2 e os 6 anos, principalmente a nível dos membros inferiores, de modo a optimizar as aquisições motoras e a evitar a instalação de retracções e contracturas. __________ ¹ Serviço de Medicina Física e de Reabi- litação - Hospital Maria Pia Nascer e Crescer 2007; 16(3): 186-187 APLICAÇÃO DE TOXINA BOTULÍNICA A Toxina Botulínica tipo A reduz temporariamente a espasticidade focal. A sua utilização em crianças com Paralisia Cerebral iniciou-se há pouco mais de uma década (apesar de ser usada há mais de vinte anos noutras situações). Os primeiros estudos publicados datam de 1994 (Cosgrove et al, Koman et al), e desde então têm surgido inúmeras publicações sobre este assunto que demonstram a sua eficácia na Paralisia Cerebral. A Toxina Botulínica produz fraqueza ou paralisia no músculo porque impede a libertação de acetilcolina na terminação nervosa. O grau de paralisia vai depender da dose e do número de sinapses afectadas. A redução da espasticidade mantém-se cerca de 12 a 16 semanas, mas a melhoria funcional pode durar mais de 6 meses. Em que condições? Após avaliação e selecção dos doentes por uma equipa multidisciplinar e de identificação dos objectivos pretendidos. toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda S 186 XIX reunião do hospital de crianças maria pia A definição de um objectivo específico para cada criança e em determinado momento é fundamental na decisão de quais os grupos musculares a infiltrar. Pode ser desde melhorar o padrão de marcha, permitir a verticalização, melhorar a postura sentada, melhorar a funcionalidade dos membros superiores, facilitar os cuidados de higiene ou diminuir a dor. Quais os principais efeitos na Paralisia Cerebral? A redução da espasticidade focal vai melhorar a funcionalidade, permitindo a acção dos músculos antagonistas e a eliminação dos movimentos anormais. De acordo com vários autores, a Toxina Botulínica vai maximizar o comprimento das fibras musculares, melhorando a mobilidade articular e facilitando o crescimento dos músculos, prevenindo a assimetria dos membros inferiores, por exemplo, nas situações de hemiplegia. A redução do número de cirurgias ou o seu adiamento para idades mais tardias estão também documentados na literatura, o que está de acordo com a diminuição das retracções músculo-esqueléticas, já referida. O efeito analgésico, principalmente nos casos de anca dolorosa pela espasticidade dos adutores, e a facilitação dos cuidados de higiene justificam a utilização desta droga. Quais os efeitos laterais? São pouco frequentes, ligeiros e transitórios. Estão descritos casos de incontinência urinária (1%), quedas (0,5%), fraqueza generalizada (0,5%), fadiga, febre e um quadro influenza-like em < 1%. Estes efeitos estão correlacionados com doses elevadas. NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Membro inferior Deformidades mais frequentes Músculos infiltrados Pé equino espástico (mais comum) Deformidade em varo Gastrocnémios Solear Tibial posterior Padrão em aducção (diplegia) Adutores Ísquiotibial interno Limitação da extensão da anca (flexo da anca) Iliopsoas Recto femoral Membro superior Deformidades mais frequentes Músculos infiltrados Flexo do cotovelo Braquiorradial bíceps Pronação pronador quadrado pronador teres Flexão punho e dedos (hemiplegia) Flexor radial do carpo Flexor cubital do carpo Flexor sup. e prof. dos dedos Polegar palmar Longo flexor do polegar Adutor do polegar Curto flexor do polegar Na criança, ao contrário do adulto, não foram descritos casos de síndrome botulínico. GRUPOS MUSCULARES MAIS FREQUENTEMENTE INFILTRADOS Os movimentos dos membros superiores são mais complexos e dependem de um grande número de pequenos músculos, pelo que são infiltrados menos frequentemente, e com objectivos muito precisos. No membro inferior os grupos musculares são maiores e de mais fácil identificação. Os objectivos são mais simples e mais evidentes. TRATAMENTOS ASSOCIADOS O tratamento com Toxina Botulínica não pode ser utilizado isoladamente, mas sim em conjunto com os outros meios terapêuticos como a Fisioterapia, a colocação de Ortóteses para posicionamento correcto (talas ou gessos), e eventualmente medicação. A cirurgia é sempre de ponderar se não forem atingidos os objectivos pretendidos. CONCLUSÃO Está hoje reconhecido o interesse da Toxina Botulínica no tratamento da Paralisia Cerebral. No entanto, a sua utilização requer a definição criteriosa dos objectivos a atingir em cada criança e a avaliação seriada por equipa multidisciplinar de forma a potenciar todos os benefícios desta terapêutica. Nascer e Crescer 2007; 16(3): 186-187 BIBLIOGRAFIA 1. Kristie Bjornson, PhD, Ross Hays,MD, Cathy Graubert, Robert Price et al. Botulinum Toxin for spasticity in children with Cerebral Palsy: a comprehensive evaluation. Pediatrics 2007; 120(1): 49-58. 2. S. I. Pascual-Pascual. Tratamiento preventivo y paliativo con toxina botulínica de la cadera en el niño com parálisis cerebral infantil. Rev Neurol 2003; 37(1): 80-82 3. Nolan KW, Cole LL, Liptak GS. Use of Botulinum Toxin type A in children with Cerebral Palsy. Phys Ther 2006; 86: 573-584. 4. Guy Monnier, Bernard Parratte, Spasticity in children with Cerebral Palsy. In: Danièle Ranoux, Charles Gury eds. Pratical Handbook on Botulinum Toxin. Marseille, Solal Publisher 2007; 79- 98. 5. Klemens Fheodoroff, Brigitte Schurch, Gudrun Heck (Ed.). Treatment of spasticity with Botulinum Toxin- pocket atlas. Scherzingen, Switzerland, Saentis Verlag 2005; 1-14. 6. Koman LA, Paterson Smith B, Balkrishnan R. Spasticity associated with cerebral palsy in children: guidelines for the use of botulinun A toxin. Paediatr Drugs 2003; 5(1):11-23. 7. Deleplanque B, Lagueny A, Flurin V, Arnaud C, et al. Botulinum Toxin in the management of spastic hip adductors in non-ambulatory cerebral palsy children. Rev Chir Orthop Reparatrice Appar Mot. 2002; 88(3):279-85. 8. EI O, Peker O, Kosay C, Iyilikci L, Bozan O, Berk H. Botulinum toxin A injection for spasticity in diplegic –type cerebral palsy. J Child Neurol. 2006; 21(12):1009-12. 9. Remo N. Russo, Maria Crotty, Michelle D. Miller, Sonya Murchland, Peter Flett and Eric Haan. Upperlimb Botulinum Toxin A injection and Occupational Therapy in children with hemiplegic Cerebral Palsy identified from a population register: a single-blind, randomized, controlled trial. Pediatrcs 2007; 119:11491158. 10. Florian Heinen, Guy Molenaers, Charlie Fairhurst, et al. European consensus table 2006 on botulinum toxin for children with cerebral palsy. European Journal of Paediatric Neurology 2006; 10:215-225. 11. M Gough, C. Fairhust, A P Shortland. Botulinum toxin and Cerebral Palsy: time for reflexion? Developmental Medicine and Chid Neurology 2005; 47:709-712. toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda XIX reunião do hospital de crianças maria pia S 187 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Toxina Botulínica: Aplicações Terapêuticas em Oftalmologia Pediátrica Rosário Varandas1 RESUMO: Descrição das aplicações terapêuticas da toxina botulínica em oftalmologia pediátrica. Descrição da técnica, material necessário, complicações e efeitos secundários . Comparação de resultados com a cirurgia clássica. Breve apresentação de alguns casos clínicos da consulta de Oftalmologia Pediátrica do CHVNG. Palavras-Chave: Toxina Botulínica, estrabismo, nistagmo, blefaroespasmo Nascer e Crescer 2007; 16(3): 188-190 INTRODUÇÃO A toxina botulínica é uma neurotoxina que ao impedir a libertação de acetilcolina nas terminações nervosas da placa motora enfraquece a contracção muscular sendo por este motivo usada em oftalmologia desde 1980, para a correcção de estrabismo. Posteriormente alargou-se a sua aplicação a outras patologias oculares mas na criança é essencialmente no estrabismo que é utilizada com uma alta taxa de sucesso.O efeito da toxina botulínica inicia-se após alguns dias da injecção observando-se inicialmente uma hipercorrecção (critério de sucesso) e mantém-se cerca de seis meses. Após esse período pode haver retorno ao estrabismo mas quase sempre de magnitude inferior ao desvio inicial. Pensa-se que as fibras musculares sugeitas à acção da toxina sofrem alongamento com reorganização dos sarcómeros justificando a diminuição do estrabismo mesmo após terminar o efeito da toxina 1. TÉCNICA Faz-se a reconstituição da forma liofilizada da toxina com uma solução salina a 0,9%, habitualmente 2ml de forma a que 0,1cc contém 5 U. Esta solução deve ser preparada pouco tempo antes da sua utilização e sem agitar visto que é facilmente deteriorável. Anestesia-se a conjuntiva com várias gotas de anestesia tópica (proparacaína) ou mais raramente efectua-se uma injecção subconjuntival de lidocaina. Em crianças mais pequena efectua-se sedação com ketamina intravenosa ou inalação com sevoflurano. Usamos o audioelectromiógrafo com agulha revestida de teflon 27 gauge para obter a localização precisa do musculo. Adapta-se a agulha a uma seringa de tuberculina e aspiram-se 0.2 ml de solução. Coloca-se o paciente em decúbito dorsal, procede-se á desinfecção com Betadine da área periocular, após ter colocado o audioEMG (Figura 1) em posição. Com o auxílio de um blefarostato obtémse a abertura ocular necessária para introduzir a agulha através da conjuntiva a cerca de 8 mm do limbo (Figura 2). A agulha é introduzida paralelamente ao limbo e após rotação do músculo na direcção em que actua, a agulha é introduzida em direcção ao ápice da órbita. Após ouvir o sinal que nos indica que estamos no interior do músculo injecta-se lentamente a solução(1). A dose habitualmente usada é de 5 unidades para desvios superiores a 25 dioptrias prismáticas e 2.5 u para desvios menores ou para crianças de idade inferior a 1ano. Figura 1 Figura 2 __________ ¹ Serviço de Oftalmologia do CHVNG toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda S 188 XIX reunião do hospital de crianças maria pia NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 COMPLICAÇÕES A maior parte das complicações da injecção de toxina botulínica são pouco graves e transitórias, raramente impedindo a continuação do tratamento. As mais frequentes são devidas á difusão da toxina para músculos adjacentes como ptose por efeito da toxina no levantador da pálpebra superior e hipoacção do recto superior. Habitualmente há resolução rápida destes efeitos secundários. Alterações sensoriais tais como diplopia, torcicolos e desorientação espacial também podem ocorrer pelo mesmo motivo, ocorrendo muito raramente em crianças. As complicações relacionadas com a injeccção, como hemorragia local e ardência podem ocorrer em cerca de 1% das injecções. A perfuração escleral e hemorragia intraocular complicações mais graves relacionadas com a injeccção estão descrita em menos de 1/1000. Complicações sistémicas: devido às baixas doses usadas em oftalmologia não são conhecidas reacções adversas. INDICAÇÕES TERAPÊUTICAS Na esotropia congénita ou infantil a toxina botulínica é um procedimento alternativo à cirurgia, permitindo que seja efectuada precocemente com o objectivo de obter alguma visão binocular. Nos estrabismos paréticos, sobretudo na parésia do VI par é possivel efectuar a injecção de toxina no músculo antagonista impedindo a hipercontractura deste evitando ou facilitando se vier a ser necessário a cirurgia posterior. Nos estrabismos divergentes os resultados são inferiores aos da cirurgia clássica e a técnica de aplicação é mais complicada devido a proximidade da mácula, sendo por esse motivo menos usada. Contudo alguns autores descrevem uma taxa de sucesso de 60%, semelhante à da cirurgia clássica(2). Na cirurgia de estrabismo em crianças com complicações neurológicas tal como na paralisia cerebral o uso de toxina é muito útil pois os riscos anestésicos são muito menores e devido á inconstância dos desvios e dificuldade em ter colaboração para obter as medidas objectivas, a toxina é um procedimento com uma taxa de hipercorrecção muito mais baixa do que a cirurgia. Recentemente, a toxina é usada no músculo pequeno oblíquo como adjuvante da cirurgia nas paresias do IV par e nas endotropias acompanhadas de desvios verticais. No nistagmo congénito alguns estudos advogam a injecção de toxina nos quatro rectos horizontais, obtendo-se diminuição da amplitude do nistagmo e melhoria da acuidade visual em 40-50% dos pacientes.É também possível trata os nistagmos com injecção retrobulbar de toxina, nesta técnica são mais frequentes os efeitos laterais de diplopia e ptose. O blefaroespasmo é uma contracção involuntária do músculo orbicular provocando aumento da frequência e amplitude do pestanejar. Pode ser tão frequente e repetitivo que chega a impedir a actividade normal da criança, em casos mais moderados é muitas vezes descrito como tique nervosos. A toxina botulínica é usada no blefarespasmo desde 1983 e tornou-se o tratamento de escolha. Injecta-se habitualmente uma dose de 12.50 a 25 unidades por olho evitando a parte central do orbicular para minimizar o risco de ptose. É quase sempre necessário repetir este tratamento inúmeras vezes, a remissão total do blefaroespasmo apenas está descrita em cerca de 2% dos casos. Durante o período em que a toxina está activa os resultados são muito satisfatórios para o doente(3,4). Apresentação de 3 casos clínicos da consulta do Oftalmologia Pediátrica como exemplo da terapêutica com toxina botulínica. CASO CLÍNICO 1 Criança do sexo feminino, 3 anos de idade, enviada à consulta de Oftalmologia Pediátrica por estrabismo do olho esquerdo. Apresentava como antecedente sistémico de relevo parésia do membro superior direito. Na RMN encefálica era evidente marcada redução da substância branca da corona radiata esquerda como sequela de lesão encefaloclástica , resultando desta lesão degenerescência axonal da via piramidal. No exame ocular observava-se endotropia de 20º do olho esquerdo com limitação da abdução do mesmo lado. Trata-se pois de uma parésia do VI par esquerdo. Efectuou toxina botulínica em ambos os rectos mediais na dose de 5 unidades. No 3º dia de tratamento apresentava ptose discreta e exotropia para longe. Ao mês de tratamento não apresentava desvio e o movimento de abdução do olho esquerdo era maior, ainda que com limitação nas posições extremas. Actualmente, após 6 meses de tratamento, apresenta exame ocular sobreponível. CASO CLÍNICO 2 Criança do sexo masculino com 2 anos de idade. Apresenta estrabismo convergente, alternante, de grande ângulo desde os 9 meses. Trata-se de uma endotropia infantil. Efectuou toxina botulínica nos dois rectos mediais na dose de 5 unidades. No 3º dia de tratamento apresentava ptose discreta que teve resolução rápida e exotropia para perto e longe. Actualmente no 2º mês de tratamento ainda apresenta exotropia intermitente. CASO CLÍNICO 3 Doente do sexo feminino, 23 anos, seguida na consulta de estrabismo por paresia do III par esquerdo, que ocorreu aos 3 anos de idade pós meningite. Efectuou diversas cirurgias incluindo transposição muscular sem resultado. Pode observar-se ausência total de adução e hipercontactura do recto lateral motivo pelo qual se decidiu efectuar injecção de toxina neste músculo. Não foi possível obter paralisia total do recto lateral com alinhamento ocular, contudo houve diminuição do desvio tornando-se esteticamente mais aceitável. CONCLUSÃO O uso da toxina botulínica em Oftalmologia alterou a maneira de lidar com alguns problemas oculares tais como os desvios residuais, os estrabismos paréticos e os desvios em pacientes com contraindicação para anestesia geral sendo toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda XIX reunião do hospital de crianças maria pia S 189 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 o seu uso nestas situações uma primeira escolha Apesar do preço da toxina e da necessidade por vezes de reaplicações, os resultados obtidos no tratamento de outros tipos de estrabismo são comparáveis aos da cirurgia clássica com riscos pequenos e efeitos laterais facilmente toleráveis, sendo portanto, o seu uso uma boa alternativa terapêutica. ophthalmology, the procedure, technic injection, complications and side effects. Comparison of the success rate of classical surgery and the application of BTX Short review of some clinical cases from the service of Pediatric Ophthalmology of CHVNG. Nascer e Crescer 2007; 16(3): 188-190 BOTULINUM TOXIN: THERAPEUTIC APPLICATIONS IN PEDIATRIC OPHTALMOLOGY ABSTRACT Description of the therapeutic indications of botulinum toxin in pediatric BIBLIOGRAFIA Edward G. Buckley. Chemodenervations of Extraocular Muscles. In: Thomas D. Duane. Clinical Ophthalmology, Lippincott Company, Vol. 6, Chap.89, p1-14. toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda S 190 XIX reunião do hospital de crianças maria pia Emma Dawson, Ashwin Sainani and John Lee. Does Botulinium toxin have a Role in the Treatment of Secundary Strabismus. Strabismus, 13, 2005, p71-73. Keith W. McNeer, Elbert H. Magoon and Allan B. Scott. Chemodenervation Therapy: Technic and Indications. In: A. Rosenbaum and A.Santiago. 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NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Pneumonia Aguda da Comunidade de Evolução Complicada Grupo Coordenador: Ana Ramos, Isabel Guerra, Telma Barbosa (HCMPia), Conceição Silva (CHPVarzim/VConde), Cristina Ferreira (HSOliveira), Guilhermina Reis (HGSAntónio) Colaboradores: Hugo Rodrigues, Cristiana Ribeiro (CHAMinho), Silvia Saraiva, Ana Aguiar (CHPVarzim/VConde), Maria João Sampaio, Sandra Teixeira (CHVSousa), Ana Luisa Leite, Ana Isabel Pais, Lúcia Rodrgues (CHVNGaia), Nilza Ferreira, Arelo Manso (CHVReal/PRégua), Rosa Barbosa, Lucília Vieira, Amélia Fernandes, Manuel Reis (HAmarante), Augusta Gonçalves, Nicole Silva Liliana Pinheiro (HBraga), Carla Dias (HFamalicão), Cristina Ferreira (HGuimarães), Arménia Oliveira, Mafalda Sampaio, Otília Cunha (HOAzeméis), Fátima Madruga (HOvar), Ana Paula Aguiar, Marco Pereira, Ana Castro, Sofia Aroso (HPHispano), Marta Rios, Maria João Oliveira, Tiago Correia (HGSAntónio), Álvaro Sousa, Sara Figueiredo, Guimarães Dinis, Sofia Fernandes (HSTirso) RESUMO Introdução: A Pneumonia Adquirida na Comunidade (PAC) é uma das causas principais de morbilidade e mortalidade em Pediatria, bem como um motivo frequente de admissão hospitalar desta faixa etária. A evolução complicada, nomeadamente com desenvolvimento de derrame pleural, empiema, pneumotórax, pneumatocelo e/ou atelectasia, ocorre numa pequena minoria dos casos. De forma a minimizar a morbilidade e mortalidade neste subgrupo de doentes, a abordagem deverá ser direccionada e reformulada em função das novas modalidades terapêuticas, médicas ou cirúrgicas. O objectivo principal deste estudo foi correlacionar a presença de factores de risco, apresentação clínica e alterações laboratoriais associadas à evolução complicada. Metodologia: Foi realizado um estudo inter-hospitalar com análise dos processos clínicos das crianças com idades compreendidas entre 1 mês e 16 anos, internadas com o diagnóstico de PAC complicada nos hospitais de Amarante, Braga, Pedro Hispano, Póvoa Varzim/Vila do Conde, Famalicão, Maria Pia, Oliveira de Azeméis, Ovar, Padre Américo, Santo António, Santo Tirso, Viana do Castelo, Vila Nova de Gaia e Vila Real, entre 1 de Janeiro de 2000 e 31 de Dezembro de 2006. Definiu-se como PAC complicada aquela que se apresentava e/ou cursava com derrame pleural, em- piema, pneumotórax, atelectasia, pneumatocelos ou abcesso pulmonar. Consideraram-se como critérios de exclusão a presença de doença pulmonar crónica e/ou internamento nos 30 dias prévios. Cada hospital assegurou o preenchimento de um questionário, que incluía dados relativos aos seguintes parâmetros: identificação, antecedentes pessoais, sintomas iniciais, exame físico à admissão, exames complementares realizados, tratamento médico e/ou cirúrgico efectuados, evolução e sequelas. A análise estatística dos resultados foi efectuada através do programa SPSS 13.0. Resultados: De acordo com os critérios de inclusão obteve-se uma amostra final de 228 casos, com ligeiro predomínio do sexo masculino (53%) e idade média de 5 anos e 4 meses (mínimo de 2 meses e máximo de 16 anos). Em relação aos factores de risco relevantes, 22% das crianças frequentavam o infantário, 8% apresentavam pneumonias de repetição, 6% prematuridade e igualmente 6% más condições sócio-económicas. O Plano Nacional de Vacinação estava actualizado na maioria das crianças (82%), com vacina conjugada anti-pneumocócica completa em 24%. A sintomatologia de apresentação mais frequente foi: febre (95%), tosse (83%), dispneia (33%), dor torácica (30%), vómitos (26%) e dor abdominal (23%). Metade das crianças (49%) foram submetidas a antibioticoterapia prévia (amoxilina/clavulanato e amoxicilina na sua maioria). À admissão, a temperatura média foi de 38.7ºC (mínimo 36 e máximo 41), a frequência respiratória média 40 cpm (mínimo 18 e máximo 76) e a saturação de oxigénio em ar ambiente média de 95% (mínimo 78 e máximo 100). Ao exame físico registou-se predominantemente: alteração do estado geral (37%); tiragem (24% ligeira, 21% moderada e 5% grave); sons respiratórios diminuídos (79%); crepitações (41%); alterações das vibrações vocais (17%); broncospasmo (10%). Os resultados analíticos revelaram leucocitose superior a 15.000/mm3 na maioria dos casos (59%), anemia em 37% e proteína C reactiva (PCR) média de 17 mg/ dl. Não se verificou relação estatisticamente significativa entre febre elevada (superior a 39ºC), leucocitose superior a 15.000 e valor elevado de PCR. Ocorreu positividade na hemocultura em 8% das crianças, sendo o pneumococus o agente mais frequentemente isolado. As alterações radiográficas que se verificaram à admissão foram: condensação (78%), derrame (58%), infiltrado intersticial (11%), atelectasia (10%) e pneumatocelos (2%). A ecografia torácica foi realizada na maioria dos casos (76%), verificando-se derrame não septado em 55%, septado em 15% e ausência de derrame em 6%. Efectuou-se TC torácica em 33% dos casos e as alterações mais frequentemente encontradas foram derrame não septado, derrame septado estudos interinstitucionais – mesa redonda XIX reunião do hospital de crianças maria pia S 191 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 e atelectasia. Oitenta e uma crianças (36%) foram submetidas a toracocentese, constatando-se líquido pleural com características de exsudado na sua maioria e microbiológico positivo em 4% das crianças (identificação do pneumococus em metade destas). A antibioterapia inicial mais frequentemente utilizada foi amoxicilina/ácido clavulânico (36%), seguida das cefalosporinas de 3ª geração (22%) e ampicilina (13%) e cefalosporinas de 2ª geração (13%). A duração média do tratamento endovenoso foi de 12 dias. Houve necessidade de mudança de antibiótico em 53% dos casos, em média ao 6º dia de internamento. As ra- zões mais apontadas para tal foram clínicas e imagiológicas (15%) e unicamente clínicas (12%). Vinte e cinco (11%) crianças foram submetidas a cirurgia, a maioria das quais toracotomia. Apenas 5% das crianças foram submetidas a broncoscopia e 4% realizaram provas de função respiratória. A maioria das crianças (75%) evoluiu para a cura, enquanto 9% apresentaram sequelas. Ocorreu um desfecho fatal em 1%. Conclusões: 1) No período analisado verificou-se uma cobertura antipneumocócica conjugada relativamente elevada; 2) Não se verificou relação estatisticamente significativa entre alguns estudos interinstitucionais – mesa redonda S 192 XIX reunião do hospital de crianças maria pia dos sintomas chave, como febre elevada e valor elevado de leucócitos ou PCR. 3) Cerca de metade das crianças haviam sido previamente submetidas a antibioticoterapia, aumentando assim a preocupação acerca das resistências crescentes aos antibióticos e atitudes a adoptar no sentido de as minorar; 4) A positividade da hemocultura na casuística apresentada é sobreponível à da literatura de referência; 5) Apesar de ter sido impossível analisar a serotipagem, o agente mais frequentemente identificado é o pneumococus, que provavelmente será o agente responsável pelo aparente crescendo de PAC complicadas. NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 Resumo das Comunicações Orais LESÕES CUTÂNEAS EM RECÉM-NASCIDO Anabela Bandeira, Susana Tavares, Paula Ferreira, Margarida Guedes Serviço de Pediatria - Hospital Geral de Santo António Introdução: O lúpus neonatal é uma doença auto-imune rara, que se manifesta principalmente por lesões cutâneas e/ou bloqueio cardíaco congénito. Apenas cerca de 1% dos recémnascidos de mulheres com autoanticorpos contra a família Ro/La apresentarão sintomas, sendo estes, provavelmente, os anticorpos implicados na patogénese da doença. A maioria das manifestações são transitórias mas, a lesão cardíaca é irreversível, podendo causar morte in utero. Caso Clínico: Recém-nascido do sexo feminino, filha de mãe com lúpus eritematoso sistémico e anticorpos antiSSA positivos. Gravidez vigiada, sem intercorrências. Ecocardiogramas fetais sem alterações. Parto eutócico às 38 semanas. Somatometria adequada à idade gestacional. Índice de Apgar 9/10. Ao nascimento apresentava lesões cutâneas maculares anulares na face, principalmente nas regiões periocular, perioral e couro cabeludo. Restante exame físico sem alterações. O ecocardiograma e ECG foram normais. O estudo analítico realizado não revelou citopenias, hiperbilirrubinemia ou aumento das transaminases. Medicada com hidrocortisona tópica em creme e pasta de zinco. Orientada para as consultas de Cardiologia Pediátrica e Imunologia. Durante o período de 5 meses de seguimento, verificou-se regressão das lesões cutâneas e ausência de aparecimento de outras manifestações da doença. Discussão: O lúpus neonatal representa um desafio na identificação das gravidezes em risco de desenvolver doença fetal. A morbilidade e mortalidade dependem sobretudo do atingimento cardíaco. A intervenção precoce e o tratamento da doença já estabelecida permitem melhorar o prognóstico, pelo que o seu reconhecimento atempado é fundamental. O prognóstico a longo prazo é uma incógnita, sabendo-se, no entanto, que algumas crianças poderão vir a desenvolver doença autoimune. DOENÇA DE CROHN: APRESENTAÇÃO CLÍNICA ATÍPICA S. Saraiva, A. Aguiar, R. Martins, C. Silva, C. Fernandes Departamento de Pediatria - Centro Hospitalar da Póvoa de Varzim e Vila do Conde Departamento de Pediatria, Hospital Pedro Hispano, Matosinhos Introdução: A Doença de Crohn é uma doença inflamatória crónica, segmentar, idiopática, que atinge qualquer região do tubo digestivo desde a boca até ao ânus. A idade de aparecimento é bimodal, ocorrendo entre o fim da adolescência e os 20 anos de idade e depois dos 40 anos. Sendo rara antes dos 2 anos de idade, o pico de incidência máxima na pediatria é entre os 10-14 anos. A incidência é de 0.8-1.8/100000. As manifestações clínicas dependem da região afectada, grau de inflamação e presença de complicações. O quadro clínico mais frequente engloba dor abdominal, diarreia por vezes sanguinolenta, emagrecimento, atraso de crescimento e sintomas/sinais sistémicos. O diagnóstico resulta de achados clínicos/endoscópicos e histológicos. Caso Clínico: Apresentamos o caso de um adolescente de 12 anos, sem antecedentes familiares ou pessoais patológicos, referenciado pelo seu médico assistente para estudo de febre prolongada de origem desconhecida. O quadro clínico caracteriza-se por febre moderada, vespertina, com um mês de evolução associada a astenia, anorexia e emagrecimento de 4 kg. Negava sintomas respiratórios, dor abdominal, diarreia ou perdas hemáticas. Ao exame físico objectivou-se palidez mucocutânea, sem foco infeccioso identificado, sem manifestações articulares, exantemáticas, hepatobiliares ou nefrourológicas. Não apresentava atraso de crescimento. Analiticamente destaca-se uma anemia microcítica e hipocrómica, trombocitose, aumento da velocidade de sedimentação e proteína C reactiva, hipoalbuminemia e pesquisa negativa de sangue oculto nas fezes. Realizou vários exames complementares de diagnóstico no contexto de febre prolongada de origem desconhecida, com resultados positivos para Anticorpo Anti-Saccharomyces C. (ASCA), assim como na endoscopia baixa e alta, demonstrando ulcerações duodenais e lesões aftóides cólicas e ileíte, respectivamente. Estes achados são fortemente sugestivos de Doença de Crohn pelo que iniciou tratamento com prednisolona, mezalazina e azatioprina, com desaparecimento posterior da febre. Conclusões: A Doença de Crohn deve constar no diagnóstico etiológico diferencial da febre prolongada de origem desconhecida. Esta deve-se mais frequentemente a uma apresentação rara de uma doença comum do que uma apresentação comum de uma doença rara. Atendendo à cronicidade da doença, com potenciais repercussões mul- resumo das comunicações orais XVIII reunião do hospital de crianças maria pia S 193 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 tissistêmicas, o diagnóstico atempado deste caso poderá permitir um melhor alívio sintomático, prevenção das complicações e manutenção da remissão da doença. Palavras-chave: Doença de Crohn, febre prolongada de origem desconhecida A EXPERIÊNCIA DO SERVIÇO EM CIRURGIA LAPAROSCÓPICA Osório A.; Bonet B.; Pinto J.; Cidade-Rodrigues J.; Sousa J.;Enes C.; Castro J.; Leitão J.; Oliveira M.; Carvalho M.; Récaman M. Serviço de Cirurgia Pediátrica do Hospital de Crianças Maria Pia Introdução: O impacto da laparoscopia em todos os tipos de cirurgia tem sido revolucionário sobretudo no que diz respeito à população adulta. No entanto, o desenvolvimento de tecnologias adequadas, tornou este tipo de cirurgia uma realidade bem presente no contexto da cirurgia pediátrica. Objectivo: Apresentar a experiência do Serviço de Cirurgia Pediátrica do Hospital Central Especializado de Crianças Maria Pia na prática de cirurgia por via laparoscópica. Método: Revisão retrospectiva dos casos operados por via laparoscópica através da consulta do livro de Registos Operatórios, entre Novembro de 1998 e Abril de 2007. Resultados: Foi realizado um total de 320 cirurgias por via laparoscópica. Os principais subgrupos corresponderam a: exploração de testículo impalpável (n=119); fundoplicatura de Nissen (n=40); colecistectomia (n=38); laqueação de vasos espermáticos (n=21); esplenectomia (n=15); gonadectomia/biópsia gonadal (n=14); ooforectomia/cistectomia (n=13); laparoscopia exploradora (n=11); gastrobandoplastia (n=10); “outros” (n=35). 70% dos procedimentos foram realizados em doentes do sexo feminino e 30% em doentes do sexo masculino. A idade média dos doentes operados por via laparoscópica foi 7 anos e a mediana 6 anos. Foi necessária conversão para via aberta em 9 casos (taxa de conversão de 0,03%). Conclusões: A cirurgia laparoscópica é actualmente também uma realidade bem patente no nosso Serviço o que vai de encontro com a tendência verificada noutros estudos. Apresentam-se subgrupos de patologias bem definidos que são preferencialmente abordados por esta via enquanto que emergem outros aos quais se vai recorrendo cada vez mais à intervenção laparoscópica. PEDIATRIA DE AMBULATÓRIO – AVALIAÇÃO DA FUNÇÃO VISUAL DOS 0 AOS 5 ANOS Isabel Guerra, Lara Lourenço, Carla Teixeira, Suzana Figueiredo, Fátima Pinto. Unidade de Imunoalergologia do Hospital de Crianças Maria Pia Introdução: A ambliopia, principal causa de défice visual irreversível entre os 20 e os 70 anos, instala-se exclusivamente na infância, durante o período crítico do desenvolvimento visual (do nascimento até aos 6 anos). A precocidade do diagnóstico constitui o principal determinante do sucesso terapêutico, que pode atingir 100% dos casos. A avaliação da função visual é o único método eficaz de rastreio, devendo ser iniciada o mais precocemente possível. Os testes a utilizar dependem não só da faixa etária, mas também do estadio de desenvolvimento de cada criança. Objectivo: Os autores pretendem avaliar a função visual de uma população pediátrica. Metodologia: Estudo transversal, com base no protocolo de Rastreio Oftalmológico Infantil (ROI) em vigor na Consulta de Pediatria de um Centro de Saúde Urbano, aplicado às crianças com idades entre os 0 e os 5 anos de idade, no período compreendido entre Fevereiro de 2006 e Agosto de 2007. Foram excluídas as crianças com antecedentes de prematuridade, doença sistémica com manifestação ocular e seguimento em consulta especializada de Oftalmologia. Foram analisados os seguintes parâmetros: sexo e idade da criança; colaboração na avaliação da função visual; testes utilizados e respectivos resultados. resumo das comunicações orais S 194 XVIII reunião do hospital de crianças maria pia Resultados: Foram estudadas 541 crianças, com idades compreendidas entre 1 mês e 5 anos e 11 meses (mediana de 4 anos), pertencendo 292 (54,0%) ao sexo masculino. Vinte e oito crianças (5,2%) não colaboraram no exame. Relativamente às 513 crianças que colaboraram na avaliação da função visual, foi conseguido um resultado qualitativo (fixação/seguimento) em 58 (10,7%), sendo que todas apresentavam idade inferior a 2 anos, e quantitativo em 455 (84,1%). Neste último grupo, em 105 (19,4%) foi utilizado um teste de olhar preferencial – teste de Cardiff (realizado em binocularidade em 18 e em monocularidade em 87 crianças); nas restantes 350 foram aplicadas escalas para avaliação da acuidade visual de perto (teste Revised Sheridam Gardiner em 220, teste de Rossano Weiss em 98 e teste de Símbolos de Lea em 32 crianças) e de longe (teste de Revised Sheridam Gardiner em 213, teste de Pigassou em 102, teste de Símbolos de Lea em 32 e teste de E em 3 crianças). Das 513 crianças submetidas a rastreio da função visual, 12,8% (66 crianças) apresentaram suspeita de alteração: 23 com diminuição da acuidade visual de longe; 15 com diminuição da acuidade visual de perto; 9 com diminuição da acuidade visual avaliada com teste de Cardiff; 31 com diferença de acuidade visual igual ou superior a duas décimas entre os dois olhos com escalas para longe, 16 com escalas para perto e 12 com teste de Cardiff; e 2 com fixação/seguimento inadequado. Conclusão: Nesta faixa etária, quando a função visual é avaliada a prevalência de alterações situa-se ente 11 e 15%, tal como neste estudo. Actualmente, em Portugal as crianças são submetidas a rastreio visual apenas na idade escolar. Neste é testada somente a acuidade visual de longe, com recurso a teste de E a 6 metros de distância. Uma vez que esta avaliação é realizada fora do período crítico do desenvolvimento visual não tem qualquer benefício na prevenção da ambliopia. Este estudo demonstra que é possível e necessária uma avaliação mais precoce. NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 QUISTO ARACNÓIDE – CASO CLÍNICO Pinto AR; Soares P; Pinto F; Ribeiro I; Teixeira J; Ramos C; Rodrigues MC. Centro de Diagnóstico Pré-Natal e Serviço de Neonatologia – Maternidade Júlio Dinis Serviço de Neurocirurgia e Serviço de Neurorradiologia – Hospital Geral Santo António Introdução: Os quistos aracnóides são formações quísticas contendo líquido céfalo-raquidiano (LCR), localizadas no espaço aracnóide ou subaracnóide. Correspondem a 1% das lesões intracranianas ocupando espaço e na sua maioria são congénitas. Podem localizar-se na linha média e podem ser unilaterais, bilaterais ou múltiplos. Quase todos são supra-tentoriais. Ocorrem com mais frequência no sexo masculino (2:1). O prognóstico do recém-nascido é dependente da localização dos quistos. Apesar de poderem atingir grandes dimensões, as manifestações clínicas podem ser subtis e 60 a 80% das crianças são assintomáticas. Caso clínico: 16 anos, primigesta, antecedentes pessoais irrelevantes, gravidez não vigiada até às 26 semanas. A ecografia efectuada às 30 semanas mostrou imagem compatível com quisto cerebral à direita com 50x24 mm que desviava a linha média, aparentemente sem comunicação com o sistema ventricular. A RMN às 30 semanas revelou provável quisto aracnóide associado a hipoplasia da porção posterior do corpo caloso ou estiramento da mesma provocado pelo quisto. Permaneceram dúvidas sobre a existência de displasia cortical parieto-occipital medial direita ou compressão parenquimatosa provocada pelo quisto. As serologias para infecções víricas revelaram presença de anticorpos IgG e IgM anti HSV-1. Sem outras alterações. Foi efectuada amniocentese, que revelou cariótipo normal (46, XY). A ecocardiografia fetal foi normal. A ventriculomegalia direita progrediu de ligeira (12 mm) para grave (16 mm) pelo que o parto foi realizado às 37 semanas, por cesariana. A RMN pós-natal revelou formação quística inter-hemisférica para-sagital direita supra-tentorial, septada, provável quisto aracnóide, com 60x40 mm, que afastava os lobos frontais e os tálamos, empurrava para baixo o III ventrículo e determinava dilatação obstrutiva do ventrículo lateral direito. Dúvida sobre a existência de agenesia ou hipoplasia parcial do corpo caloso. Sem anomalias do desenvolvimento cortical ou displasias associadas. A criança tem actualmente 5 meses, tem tido um desenvolvimento normal e perímetro cefálico estável. Discussão: O aspecto ecográfico dos quistos aracnóides é o de uma tumefacção bem circunscrita, anecogénica, uni ou multilocular. Quando localizados na periferia do cérebro podem ser confundidos com quistos porencefálicos, mas ao contrário destes, não comunicam com o sistema ventricular. Se estiverem localizados na linha média, é necessário fazer o diagnóstico diferencial com malformação artério-venosa. Podem apresentar-se com ventriculomegalia, devido ao efeito de massa. A RMN é sobretudo importante no diagnóstico de lesões associadas. Como habitualmente o diagnóstico ecográfico é tardio, a conduta é na maior parte das vezes expectante, com vigilância da progressão da ventriculomegalia. HÁBITOS DE EXPOSIÇÃO AO ECRÃ DE UMA POPULAÇÃO PEDIÁTRICA / ADOLESCENTE DE UMA ÀREA URBANA Margarida Figueiredo, Catarina Sousa, Carla Teixeira, Fátima Pinto Centro de Saúde da Carvalhosa e Foz do Douro Introdução: Durante os últimos anos a preocupação com o excesso de televisão e outros meios audiovisuais tem sido crescente. A Associação Americana de Pediatria recomenda, às crianças com mais de 2 anos, menos de 2 horas diárias de exposição ao ecrã (televisão, DVD, consolas, computador) com programação de qualidade. Objectivos: Avaliação dos hábitos de exposição ao ecrã (televisão, consolas, computador e DVD) de uma popula- ção saudável de crianças e adolescentes residentes num centro urbano. Material e métodos: Aplicação de um questionário a pais de crianças e adolescentes seguidos na consulta de Pediatria do Centro de Saúde da Carvalhosa de Outubro de 2006 a Abril de 2007. Foram avaliados os seguintes parâmetros: sexo, grupo etário, idade com que começaram a ver televisão, número de televisões existentes em casa e os seus locais, existência de televisão no local das refeições, horário, número de horas e tipo de programas que viam, existência de TV por cabo, computador e internet, consolas e DVD, tempo utilizado na realização de trabalhos de casa, prática de desporto e leitura. Foi ainda avaliada a existência de regras de utilização destes meios audiovisuais. Resultados: Foram realizados 106 inquéritos (51% do sexo masculino), 13,2% tinham menos de 6 anos, 57,5% entre 6 a 10 anos, 21,7% entre 11 e 13 anos e 7,5% mais de 14 anos. Relativamente à idade com que começaram a ver televisão apenas 22,6% tinha mais de 2 anos. Cerca de 7% tinha uma televisão em casa e os restantes tinham duas ou mais. Mais de metade (57,5%) das crianças tinha televisão no quarto, aproximadamente 64% tinha televisão no local onde habitualmente eram feitas as refeições e destes 88% afirmava ter a televisão ligada durante as refeições. Apenas 28% via menos de uma hora diária de televisão durante a semana e durante o fim de semana esta percentagem diminuiu para 4,7%. O tempo total de exposição ao ecrã era igual ou superior a 2 horas em 54% dos inquiridos. O tipo de programas mais visto era desenhos animados e telenovelas. Cinquenta por cento dos inquiridos gastava menos de uma hora por dia a ler e cerca de 34% não tinha hábitos de leitura, 24,5% não fazia desporto e 49% dedicava menos de uma hora a fazer os trabalhos de casa ou a estudar. Em 40% das familias não existiam regras de utilização de televisão, consolas, computador e DVD. Conclusões: A televisão e outros meio audiovisuais quando em excesso podem estar relacionados com mau aproveitamento escolar, dificuldade de resumo das comunicações orais XVIII reunião do hospital de crianças maria pia S 195 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 interacção com os pares, défice de atenção, obesidade, início precoce da actividade sexual, alterações do padrão de sono, comportamentos agressivos, entre outros. O tempo que as crianças e adolescentes “perdem” em frente ao ecrã deveria ser alvo das preocupações de pais e pediatras. Na população estudada verificou-se excesso de tempo gasto em frente ao ecrã em detrimento de outras actividades como leitura, desporto ou estudo. O conhecimento dos hábitos da nossa população permite um reajuste da informação, com especial reforço dos aspectos em falta. ANEMIA FERROPÉNICA GRAVE: PROBLEMA DO PASSADO OU UMA REALIDADE ACTUAL? Márcia Gonçalves, Susana Soares, Manuel Oliveira, Ana Fernandes, Marika Antunes, José Barbot. Serviço de Pediatria, Centro Hospitalar do Alto Ave, E.P.E., Guimarães Serviço de Hematologia, Hospital de Crianças Maria Pia, Porto Nas sociedades industrializadas a melhoria dos cuidados primários de saúde assim como das condições de vida da população vieram a reduzir de forma drástica a incidência de anemia ferropénica nos lactentes e 1ª infância, nomeadamente no que se refere às formas graves. No entanto, a associação de um conjunto de factores como relação precária com o sistema de saúde, carências sociais ou susceptibilidade individual, continua a condicionar o aparecimento de formas graves de anemia num grupo de crianças cuja identificação se torna fundamental. Os autores relatam o caso clínico de dois irmãos gémeos de 9 meses, com antecedentes de prematuridade de 36 semanas, oriundos de meio rural e com difícil acesso aos cuidados de saúde primários. Aleitamento materno exclusivo até aos 6 meses, sem suplementação de ferro, com diversificação alimentar incompleta e excesso de leite na dieta. Admitidos no Serviço de Urgência por febre de duração difícil de precisar, tosse escassa, recusa alimentar e gemido nos dois dias anteriores à observação. Na admissão apresentavam sinais de dificuldade respiratória marcada com instabilidade hemodinâmica, com tensão arterial imensurável. Os exames efectuados revelaram anemia arregenerativa microcítica hipocrómica grave (Hgb 3.9 / 4.9 g/dl; VGM 52.2 / 50.9 fl; HCM 12.5 / 12.8 pg; RDW 23.2 / 21.1%; reticulócitos 1.37 / 1.01%) com indicadores bioquímicos de ferropenia (Saturação da transferrina 0.32 / 0.36%; ferritina <18.60 ng/ml). No restante quadro hematológico de salientar trombocitose (413000 / 439000 plaq/ uL) e leucocitose ligeiras com predomínio de neutrófilos (11700 / 12300 N/uL). No esfregaço de sangue periférico observada anisocitose, anisocromia e alguns eritrócitos fragmentados. Considerando a gravidade do quadro hematológico foram excluídas outras etiologias, nomeadamente síndromes talassémicos. A PCR era de 20.4 / 37.8 mg/L; na radiografia do tórax observado infiltrado para-hilar bilateral e hipotransparência no vértice direito. Foi isolado Haemophilus influenzae na hemocultura do 1º gémeo, apresentando também IgM e IgG positivas para VHH6 e apenas IgM para o HSV 1 e 2. Ambos foram transfundidos de urgência com concentrado eritrocitário em simultâneo com instituição de terapêutica antibiótica (ceftriaxone) e oxigenoterapia. Verificada evolução favorável, com alta do internamento ao 10ºdia, medicados com ferro oral (2 mg/kg/dia). Seis meses após, recuperação franca com hemoglobina 12.0 / 12.2 g/dl, VGM 68.1 / 71 fl, CHM 23.1 /24.2 pg, saturação da transferrina 15.7 / 4.1%, ferritina 33.2 / 42.7 ng/ml. Com o caso descrito pretende-se alertar para o facto de ainda ocorrerem anemias ferropénicas graves nos lactentes e 1ª infância, susceptíveis não só de causar sequelas importantes como de colocar em risco a própria vida, em intercorrências infecciosas concomitantes. Esta é pois uma problemática que perdura em crianças com factores de risco, sendo essencial a sua detecção e correcção precoces. Palavras-chave: Ferropenia, anemia, microcitose, hipocromia. resumo das comunicações orais S 196 XVIII reunião do hospital de crianças maria pia DEFEITOS CONGÉNITOS DA N-GLICOSILAÇÃO – ESTUDO RETROSPECTIVO DE 7 DOENTES Patrícia Nascimento, Clara Barbot, Dulce Quelhas, Esmeralda Martins Serviço de Pediatria e Serviço de Neurologia do Hospital de Crianças Maria Pia Introdução: Os Defeitos Congénitos da Glicosilação (CDG’s) são um grupo de doenças genéticas, caracterizado por alterações na ligação ou processamento dos oligossacaridos, N e O glicanos, que são substâncias fundamentais no metabolismo, estrutura e função das glicoproteinas. As glicoproteinas desempenham um papel essencial no reconhecimento, adesão e migração celular, na defesa do organismo e no metabolismo energético a sua alteração leva ao aparecimento de doenças de atingimento multissistémico com clínica heterogénia. A maioria das doenças descritas no ser humano são defeitos na N-glicosilação. O marcador utilizado no diagnóstico neste grupo de patologias é o doseamento da transferrina do paciente em carbonidratos (CDT). Objectivos: Caracterização clínica, bioquímica e neurorradiológica dos doentes com defeitos congénitos da Nglicosilação em seguimento na consulta de Doenças Metabólicas do Hospital Maria Pia. Material e Métodos: Para realização do trabalho os autores procederam à consulta dos processos clínicos de doentes com defeitos congénitos da N-glicosilação. Em todos os doentes foi avaliada a história familiar, idade de início dos sintomas, forma de apresentação, idade de diagnóstico e evolução. Foi também feito um registo das alterações bioquímicas e imagiológicas registadas. Resultados: Sete doentes, 3 do sexo masculino, com idades compreendidas entre os 2 e 20 anos de idade. Cinco casos tem CDG I (3 tipo Ia e 2 tipo Ix) e 2 tem CDG tipo II. Em todos os casos a história familiar é irrelevante e todos apresentam sintomas desde os primeiros meses de vida embora o diagnóstico só tenha sido efectuado entre os 5 meses e os 13 anos de idade. Todos apresentam manifestações com envolvimento do neu- NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 rológico, 5/7 apresentam má progressão estaturo-ponderal, microcefalia e alterações esqueléticas. Metade possui sinais de envolvimento hepático e em 2/7 foi constatado envolvimento cardíaco. 5/7 apresentam alterações características na RMN cerebral, sendo que estas alterações estão presentes em todas as crianças com CDG Ia. Todos se mantiveram estáveis durante a evolução. Conclusões: Registamos um predomínio de doentes com o tipo I (5/7) o que está de acordo com o referido na literatura. As alterações no exame neurológico e na RMN cerebral são também mais específicas neste grupo. Nesta série todos os doentes apresentação um envolvimento multissistémico embora de gravidade variável. Devemos pensar neste grupo de patologias em situações de clínica não explicada, sobretudo se houver doença neurológica associada. HIPOGLICEMIAS NEONATAIS Gisela Silva, Teresa Guimarães, Alzira Sarmento, Carlos Duarte, Esmeralda Martins Serviço de Pediatria e UCI do Hospital de Crianças Maria Pia Introdução: A hipoglicemia neonatal representa um defeito numa ou mais das complexas interacções que normalmente integram a homeostasia da glicose. Este processo é particularmente importante no recém-nascido, no qual se verifica uma transição abrupta da vida fetal, caracterizada pela dependência do transporte transplacentário de glicose, para o meio extra-uterino, em que a normoglicemia é mantida através de mecanismos na dependência do Sistema Nervoso Autónomo. Objectivo: O presente trabalho consiste num estudo retrospectivo sobre a etiologia da hipoglicemia no período neonatal. Material e Métodos: Foram revistos um total 22 casos de recém-nascidos, admitidos na UCI do Hospital Maria Pia no período compreendido entre 1 de Janeiro de 2000 e 31 de Dezembro de 2006, com diagnóstico de hipoglicemia (glicemia <45mg/dl ou <2.6mmol/L). Dos 22 casos foram excluídos 2 por inexistência de documentação clínica disponível e ainda os recém-nascidos com baixo peso, prematuros, com critérios de sépsis, asfixia perinatal e hipogalactia materna, correspondendo a um total de 10 casos. Os parâmetros de avaliação considerados foram: sexo, idade de detecção e valor da hipoglicemia, história obstétrica e pré-natal relevante, sintomas de apresentação, dados dos exames objectivo (hepatomegalia, hiperpigmentação e hipogonadismo), investigação efectuada, aporte de glicose e diagnóstico definitivo. Resultados: Dos 10 casos que preenchiam os critérios de inclusão, 50% eram do sexo feminino. A idade de detecção de hipoglicemia variou entre o 1º e 21º dia de vida, com valores de glicemia compreendidos entre 0 e 39mg/dl. No que se refere aos sintomas de apresentação, 4 dos casos foram assintomáticos, 5 apresentaram-se com hipotonia e/ou hiporreactividade, 2 com recusa alimentar e um outro com convulsão. Em termos de exame objectivo, nenhum dos lactentes apresentava hepatomegalia, hiperpigmentação ou hipogonadismo. Relativamente aos exames complementares de diagnóstico efectuados, em todos os casos foi realizado hemograma, bioquímica, análises de função hepática, gasimetria e tira-teste de urina; procedeu-se aos doseamentos de insulina em 6/10; de cortisol, ACTH e hormona do crescimento em metade dos casos; 6/10 efectuaram ecografia abdominal e em 9/10 procedeu-se ao estudo metabólico. Para cada caso foi calculado o aporte de glicose ev necessário para reverter a hipoglicemia. Foram estabelecidos como diagnósticos definitivos: hiperinsulinismo congénito (5/10) 2 na forma transitória (um dos quais correspondendo ao Síndrome de Beckwith-Wiedmann) e 3 na forma persistente; hipogliemia transitória (2/10) e doenças do metabolismo (3/10). Conclusões: A hipoglicemia é um problema comum no período neonatal. Trata-se de uma situação grave, cuja detecção e correcção precoces são fundamentais a fim de evitar eventuais seque- las neurológicas. O prognóstico a longo prazo dependerá do respectivo diagnóstico etiológico e da terapêutica adequada. No nosso estudo, à semelhança do que é descrito na literatura, a maioria dos casos de hipoglicemia correspondem a hiperinsulinismos congénitos. O facto de 2º diagnóstico mais frequente serem as alterações metabólicas poderá ser explicado por este ser um Centro de referência neste tipo de patologia. SÍNDROME DE OPITZ-FRIAS: CASO CLÍNICO Gisela Silva, Teresa Guimarães, Sizenando Cunha, Céu Rocha Mota, Ana Ramos Serviço de Pediatria do Hospital de Crianças Maria Pia O Síndrome de Opitz-Frias é um síndrome polimalformativo caracterizado por anomalias funcionais, crânio-faciais e genitais, com a maioria dos defeitos localizados em estruturas da linha média. As duas formas de hereditariedade são ligadas ao Cr. X ou de modo autossómico dominante ligado ao Cr.22. Apresenta-se o caso clínico de um lactente do sexo masculino, com 2 meses de idade, admitido neste hospital, para correcção de fenda bilateral do palato primária e secundária completa. Antecedentes familiares: Mãe com fácies dismórfica (hipertelorismo) e outros familiares com defeitos da linha média. Ao exame objectivo, apresentava fácies dismórfica com hipertelorismo, fenda do palato bilateral e pavilhões auriculares malformados, sopro cardíaco, hérnia umbilical, hipospádia peniana e sem alterações ao exame neurológico. Foi submetido a queiloplastia bilateral, com necessidade de traqueostomia urgente no pós-operatório por edema exuberante das pregas ariepiglóticas e da região das cordas vocais. O estudo endoscópico posterior da árvore traqueobrônquica revelou: “Fenda palatina completa; aritenóides e pregas ariepiglóticas com boa mobilidade; sem evidência de estenose subglótica”. Foram constatadas dificuldades na alimentação com repercussão na evolução estatoponderal, com necessidade resumo das comunicações orais XVIII reunião do hospital de crianças maria pia S 197 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 transitória de alimentação por sonda nasogástrica. Teve alta hospitalar aos ≈ 6 meses, com traqueostomia, apresentando boa evolução estatoponderal. Este caso reflecte a importância da história familiar na orientação e aconselhamento genético. PANENCEFALITE ESCLEROSANTE SUBAGUDA: UMA DOENÇA RARA AINDA ACTUAL Miguel Fonte, Gabriel JP, Cândido C; Trindade A; Silva MR; Chorão R; Dias F Serviços Pediatria e Neurologia, Centro Hospitalar de Trás-os-Montes/Alto Douro Serviço Neurologia, Hospital de Crianças Maria Pia Introdução: A panencefalite esclerosante subaguda (PEES) é uma doença degenerativa do SNC devido a infecção persistente por uma forma mutante do vírus do sarampo. É mais frequente em doentes que contraíram sarampo antes dos 2 anos de idade. A doença manifesta-se na maioria dos casos na adolescência e os primeiros sinais são alterações cognitivas e do comportamento, com diminuição do rendimento escolar; segue-se um comprometimento neurológico progressivo, com demência e atingimento multifocal do SNC. O tratamento é decepcionante e o prognóstico fatal dentro de 1-3 anos em 95% dos casos. Caso Clínico: Apresenta-se o caso de um adolescente de 13 anos, com antecedentes pessoais de sarampo aos 7 meses de idade. Aos 12 anos iniciou deterioração cognitiva, com perturbações mnésicas ligeiras e mau aproveitamento escolar. Posteriormente, surgiram abalos corporais, desequilíbrio com quedas bruscas e adopção de posturas anómalas sustentadas, que se foram agravando nos três meses anteriores à admissão. Ao exame objectivo apresentava deterioração mental, disartria espástica, síndrome piramidal irritativo bilateral e deficitário à esquerda, ataxia cerebelosa, mioclonias segmentares das mãos e axiais (com perda do tónus) e distonia generalizada de predomínio nos membros inferiores; a marcha era impossível sem apoio. Foram realizados os seguintes exames: TAC e RMN cerebral, que não evidenciaram alterações; EEG, sendo que num único registo de vídeo-EEG se verificaram alterações patognomónicas: surtos generalizados de ondas lentas delta com duração de 0,5 a 2 segundos, periódicas (repetidas a intervalos de 1,5 a 5 segundos), com registo concomitante de abalos mioclónicos; exame LCR, que demonstrou anticorpos IgG anti-sarampo positivos e presença de bandas oligoclonais. Os resultados obtidos confirmaram o diagnóstico de PEES; iniciou isoprinosina oral e discute-se o tratamento com interferão alfa intratecal ou alternativas a esta terapêutica. Conclusão: A PEES é uma entidade ainda não erradicada, mesmo nos países em que a vacinação anti-sarampo é universal. Deve ter-se em conta esta possibilidade no diagnóstico diferencial da criança ou adolescente com alterações de comportamento e declínio cognitivo. CORNELIA DE LANGE – A PROPÓSITO DE UM CASO Ana Luísa Leite, Vinhas da Silva, Marta Vila Real, Fátima Santos Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia Introdução: O Síndrome Cornelia de Lange (SCL) é um síndrome polimalformativo raro, de etiologia indeterminada, caracterizado por uma aparência facial peculiar, atraso de crescimento pré ou pós-natal, atraso psicomotor grave, alterações de comportamento e malformações major associadas (cardíacas, gastrointestinais e musculoesqueléticas). A maioria dos casos são esporádicos, estando descritas situações de transmissão autossómica dominante. O seu diagnóstico é fundamentalmente clínico. No SCL foram relatadas alterações cerebrais do tipo hipóxico-isquémico e alterações por disgenesia congénita cerebral, ajudando a compreender o atraso psicomotor característico. O diagnóstico precoce mantém-se o grande desafio, possibilitando uma intervenção multidisciplinar eficaz. resumo das comunicações orais S 198 XVIII reunião do hospital de crianças maria pia Caso Clínico: Lactente do sexo feminino, com antecedentes de consanguinidade, hidrâmnios e internamento no 1º dia de vida por episódio de cianose com alimentação. Orientada para a consulta de Neuropediatria aos 6 meses por atraso de desenvolvimento psicomotor. À data da consulta foi constatado fácies sindrómico, microcefalia, movimentos erráticos do olhar, hipotonia axial marcada sem controlo cefálico e com postura em batráquio, movimentos descoordenados dos membros superiores e verificada má evolução estaturo-ponderal, alterações das extremidades e hirsutismo. Do estudo efectuado salienta-se RMN cerebral que evidenciou “…atrofia do tronco, sobretudo da protuberância e pedúnculos cerebelosos médios, sendo o IV ventrículo algo proeminente, associada a atraso da mielinização supratentorial”. O estudo analítico não revelou alterações significativas. Efectuou estudo metabólico com hiperlactacidémia ligeira, aguardando biópsia muscular. Os CDT´s e cariótipo foram normais. Ecografia abdominal, renopélvica e ecocardiograma sem alterações. A avaliação gastrointestinal evidenciou refluxo gastroesofágico. O exame oftalmológico foi normal e aguarda consulta de ORL. Pensamos tratar-se de um síndrome polimalformativo, compatível com Cornélia de Lange do tipo I (clássico), com evidências de disgenesia cerebral congénita grave. Conclusão: O diagnóstico de SCL é essencialmente clínico, sendo importante o seu reconhecimento precoce pelo pediatra, para melhor orientação médica e suporte interdisciplinar, bem como para intervir a nível do aconselhamento familiar. Nestes doentes além do fenótipo muito sugestivo, a presença de refluxo gastroesofágico exuberante e refractário às medidas terapêuticas deve alertar para o diagnóstico. A existência de alterações morfológicas a nível central pode sentenciar o grave atraso desenvolvimento e anomalias neurológicas que pode surgir nestas crianças. NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 SÍNDROME LINFOPROLIFERATIVO AUTO-IMUNE: DA SUSPEITA CLÍNICA AO DIAGNÓSTICO MOLECULAR Iris Maia, Ana Espirito Santo, Joana Rios, Marika Bini-Antunes, Julia Vasconcelos, Margarida Lima, José Barbot Serviço de Hematologia – Hospital de Crianças Maria Pia Serviço de Pediatria – Centro Hospitalar do Alto Minho Serviço de Imunologia e Serviço de Hematologia – Hospital Geral Santo António O Síndrome Linfoproliferativo Autoimune (SLAI) é uma entidade clínica rara de descrição recente. A sua hereditariedade é dominante e a evolução crónica. Apoptose linfocitária anormal, linfoproliferação não maligna e fenómenos de auto-imunidade constituem as vertentes principais da doença. Criança com 3 anos de idade referenciada por pancitopenia grave e flutuante (Hb 7.7 g/dL, reticulócitos 411000/ uL, neutrófilos 200/uL, plaquetas 46000/ uL) associada a esplenomegalia maciça desde os primeiros meses de vida. Nos antecedentes familiares havia referência a casos sobreponíveis em 3 gerações, alguns dos quais objecto de esplenectomia sem esclarecimento diagnóstico. O estudo analítico (sangue periférico e medula óssea) revelava de forma inequívoca o carácter periférico das citopenias. Apenas a nível dos neutrófilos foi possível documentar uma etiologia auto-imune. De salientar hipergamaglobulinemia acentuada e doseamento de vitamina B12 elevado. O esclarecimento diagnóstico foi possível mediante a imunofenotipagem de sangue periférico que revelou a presença de uma população de 6% de linfócitos T αβ+CD3+CD4-CD8-. O doseamento elevado do Fas-ligando conduziu ao estudo do gene Fas onde foi documentada uma mutação missense no exão 9 (R234L). A mesma mutação foi encontrada na mãe esplenectomizada aos 15 anos de idade. Em contraste com a gravidade das citopenias e da esplenomegalia, a criança apresenta um bom desenvolvimento estaturo-ponderal e psicomotor, na ausência de morbilidade significativa. SÍNDROME DE WILLIAMS: REVISÃO DA CASUÍSTICA DA UNIDADE DE CONSULTA DO IGM Mafalda Barbosa, Cristina Dias, Adriana Sampaio, Sílvia Álvares, Marília Loureiro, Óscar Gonçalves, Jorge Pinto-Basto, Margarida Reis-Lima. Unidade de Consulta - Instituto de Genética Médica, Serviço de Cardiologia Pediátrica Hospital Maria Pia e Centro de Investigação em Psicologia - Universidade do Minho Introdução e Objectivos: O Síndrome de Williams (SW; OMIM: #194050, prevalência: 13,3/100.000) caracteriza-se por face dismórfica, doença cardiovascular, atraso mental, comportamento característico, alterações do tecido conjuntivo, atraso do crescimento e anomalias endócrinas. Em 99% dos doentes resulta da deleção submicroscópica da região 7q11.23, que pode ser evidenciada por técnica de FISH de citogenética molecular. Esta alteração é habitualmente de novo, embora já tenham sido descritos casos de indivíduos afectados com descendência. Este trabalho tem como objectivo a caracterização clínica dos doentes com SW seguidos na Unidade de Consulta do IGM e comparação com a taxa de complicações descrita na literatura. Material e Métodos: Foi efectuada a auditoria retrospectiva de 26 processos médicos de doentes cujo diagnóstico clínico foi confirmado por citogenética molecular, seguidos em consulta de Genética Médica no IGM. Analisaram-se as seguintes variáveis: motivo de referenciação à consulta de Genética; sexo; idade na primeira consulta de Genética e ao diagnóstico de SW; dismorfia facial; desenvolvimento psicomotor; alteração do tecido conjuntivo; cardiopatia; alterações oftalmológicas; anomalias dentárias; crescimento estaturo-ponderal; perímetro cefálico; anomalias do foro ORL; anomalias ortopédicas; alterações do comportamento; função tiroidea: metabolismo do cálcio e atingimento de outros aparelhos/sistemas. Foi também revista a realização de Diagnóstico Pré-Natal (DPN) em gestações subsequentes dos progenitores do caso índex. Resultados: O estudo incluiu 26 doentes (13 sexo masculino e 13 do sexo feminino). O motivo de referenciação mais comum foi a suspeita de SW. A idade média na primeira consulta de Genética foi de 6 anos e a idade ao diagnóstico foi de 7 anos e 2 meses. Todos os indivíduos afectados eram casos esporádicos na família. Todos os doentes apresentavam dismorfia facial e atraso mental. As outras manifestações clínicas incluíam: alteração do tecido conjuntivo: 17 (65,4%); cardiopatia: 16 (61,5%); problemas oftalmológicos: 13 (50,0%), anomalias dentárias: 9 (34,6%); atraso do crescimento: 9 (34,6%); microcefalia: 6 (23.1%); doença do foro ORL: 6 (23,1%); doença ortopédica: 6 (23,1%); alterações do comportamento: 5 (19,2%); hipertiroidismo: 1 (3,8%); hipocalcemia: 1 (3,8%); outras: 7 (26,9%). Globalmente estes resultados são comparáveis com os descritos na literatura. Foram realizados 3 DPN sendo que, em nenhum deles o feto era afectado de SW. Conclusões: O SW é uma doença multissistémica que necessita de uma abordagem multidisciplinar para intervenção. Salienta-se a elevada prevalência de atraso mental, cardiopatia, alterações do tecido conjuntivo e problemas oftalmológicos. A maior morbilidade verificou-se nos doentes com obstáculo ao coração esquerdo. Ao contrário do que é habitualmente descrito na literatura, a taxa de alterações da homeostasia do cálcio e da função tiroidea é rara. Esta série de doentes irá ser estudada no futuro a nível molecular para caracterização da deleção e melhor esclarecimento da correlação genótipo-fenótipo. De destacar a importância de aconselhamento genético adequado e a possibilidade de se oferecer DPN específico. Palavras-chave: Síndrome de Williams, FISH 7, cardiopatia, atraso mental resumo das comunicações orais XVIII reunião do hospital de crianças maria pia S 199 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 TOXINA BOTULÍNICA NA CRIANÇA: 5 ANOS DE EXPERIÊNCIA Joana Damásio, Helena Reis Costa, Marina Magalhães. Serviço de Neurologia e Serviço de Medicina Física e de Reabilitação do Hospital Geral de Santo António A Toxina Botulínica (BoNT) é uma neurotoxina utilizada, desde há mais de 20 anos, com finalidades clínicas; apesar disso, a sua utilização na criança está longe de estar estandardizada. As dificuldades encontradas no estabelecimento de consensos e “guidelines” são explicadas, pelo menos em parte, pela grande heterogeneidade da patologia envolvida, da etiologia, dos sinais clínicos e, pelo envolvimento, dos diferentes segmentos corporais. A experiência diz respeito a um total de 326 sessões terapêuticas efectuadas a 77 crianças, com idades actuais inferiores a 18 anos (média 11± 4,7, extremos 4 -18 anos), tratadas com BoNT tipo A no Serviço de Neurologia do HGSA nos últimos 5 anos. A grande maioria das crianças (71,4%) mantém-se actualmente em tratamento. Sessenta das 77 (78%) crianças apresentavam uma doença do movimento espástica, sendo a Paralisia Cerebral o diagnóstico mais frequente (90%). No grupo das crianças espásticas todas beneficiaram com o tratamento, em 85% delas o benefício teve repercussão funcional. O membro inferior foi o segmento mais frequentemente infiltrado neste grupo de doentes (92% membro inferior versus 28% membro superior). A BoNT foi utilizada como abordagem terapêutica integrada com outras formas de intervenção nomeadamente a fisioterapia na quase totalidade dos doentes; foram prescritas ortóteses, gessos ou splitings em mais de 50%; foram usados concomitantemente antiespásticos orais em 19 doentes; 13 doentes foram submetidos a intervenções cirúrgicas (9 das quais prévias ao inicio do tratamento com toxina) e foi colocada uma bomba de baclofeno intra-tecal num doente. A distonia foi em 10 dos 77 doentes o sinal motor dominante. Um padrão misto (espástico e distónico) foi identifi- cado em 7 doentes. A identificação da distonia como sinal motor condicionou o tipo de terapêuticas adjuvantes utilizadas. A fisioterapia e a cirurgia foram preteridas a favor das terapêuticas farmacológicas tais como baclofeno oral (n=8 doentes), levodopa (n=8 doentes) e trihexifenidilo (n=9 doentes). Dois dos doentes foram propostos para colocação de bomba de baclofeno intratecal. No grupo dos doentes distónicos foram infiltrados em praticamente igual percentagem os membros superiores e os inferiores (47% versus 65%) e nos restantes 24% dos doentes foram infiltrados músculos cervicais. Dos 17 doentes distónicos tratados, 16 apresentaram benefício com a BoNT, 15 (94%) com repercussão funcional. No total das 326 sessões foram registados apenas efeitos laterais locais. A fraqueza excessiva foi o efeito lateral mais frequente tendo sido registado em 16 ocasiões diferentes. A nossa experiência permite-nos afirmar que o tratamento com BoNT é uma intervenção segura e eficaz no tratamento dos diferentes tipos de doenças do movimento das crianças. Salientamos a importância da correcta identificação do tipo de alteração do movimento, nomeadamente da distinção entre espasticidade e distonia para programar a integração dos diferentes tipos de terapêutica. GASTROBANDOPLASTIA NO ADOLESCENTE COM OBESIDADE MÓRBIDA Berta Bonet, Helena Ferreira, Fernando Pereira, Ferreira de Sousa, Carlos Enes Serviços de Cirurgia Pediátrica e Pediatria do Hospital de Crianças Maria Pia Introdução: A obesidade mórbida atingiu proporções epidémicas e é um dos grandes problemas de saúde nos países desenvolvidos. A intervenção precoce no adolescente com obesidade mórbida pode minimizar as comorbilidades associadas à obesidade, evitar a mortalidade prematura, melhorar a qualidade de vida e prevenir as doenças relacionadas com o excesso de peso na vida adulta. resumo das comunicações orais S 200 XVIII reunião do hospital de crianças maria pia O objectivo deste estudo foi avaliar os resultados da cirurgia da banda gástrica em crianças e adolescentes obesos operados no nosso centro. Material e Métodos: Os autores efectuaram um estudo retrospectivo de 10 adolescentes (7 do sexo feminino, 3 do sexo masculino) seguidos na consulta, com índice de massa corporal (IMC) ≥ 40 kg/m2, submetidos a gastrobandoplastia durante o período de Julho de 2001 a Setembro de 2007, após avaliação médica global, psicológica, nutricional e insucesso de perda de peso após um período mínimo de 6 meses de terapia conservadora organizada. O estudo a efectuar, os critérios para cirurgia, o seguimento e os procedimentos a seguir nas eventuais complicações estão definidos no protocolo da consulta multidisciplinar de obesidade mórbida / cirurgia bariátrica. Resultados: Foram submetidos a gastrobandoplastia 10 adolescentes com uma idade média de 16 anos. À data da cirurgia, IMC médio de 45,5 Kg/m2 (mínimo 41,39-máximo 48,9) e média de excesso de peso para a idade de 64,6 Kg (mínimo 50-máximo 80). As comorbilidades graves associadas: esteatose hepática 6, dislipidemia 5, HTA 5, alterações do sono 4, hiperinsulinismo 4, hiperuricemia 4, amenorreia 3, depressão 1, osteoartropatia 1. O tempo médio de cirurgia foi de 90 minutos, com um período de internamento de 1 a 3 dias. Não houve complicações no pós-operatório imediato. O tempo médio de seguimento é de 22 meses, verificando-se uma diminuição do IMC e uma melhoria significativa das comorbilidades associadas. Apenas 1 doente necessitou de alargar completamente a banda por tosse persistente e vómitos. Conclusões: A gastrobandoplastia é uma boa opção para o tratamento dos adolescentes com obesidade mórbida e suas comorbilidades associadas, com um curto período de internamento, com poucas complicações associadas, com uma rápida e encorajadora perda de peso inicial e com uma franca melhoria das comorbilidades associadas. NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 INFECÇÃO POR STAPHYLOCOCCUS AUREUS METICILINO-RESISTENTES, UMA AMEAÇA Soraia Tomé, Maria João Oliveira, Helena Ramos, Margarida Guedes. Serviço de Pediatria e Serviço de Microbiologia do Hospital Geral de Santo António Introdução: O Staphylococcus aureus (SA) é um coco gram-positivo responsável por um grande número de infecções em idade pediátrica. A sua resistência à penicilina é há muito conhecida e desde a década de 60 a resistência à meticilina tem vindo a ser cada vez mais frequente, nomeadamente entre as infecções nosocomiais. Vários trabalhos têm alertado para o Staphylococcus aureus meticilino-resistentes como agente emergente implicado em infecções da comunidade. Material e Métodos: Avaliação do padrão de resistência dos SA isolados em doentes com idade pediátrica internados no HGSA de Jan/04 a Dez/06. Identificação de todas as culturas com isolamento de SA neste período, consulta dos respectivos processos clínicos para caracterização das infecções. Resultados: Foram obtidos 19 isolamentos culturais (SA) no período referido. Destes, 6 em hemocultura, 3 em exsudado do canal auditivo, 3 em pontas de cateter, 2 em exsudado de fistulas de osteomielite e os restantes em secreções respiratórias, exsudado umbilical, supuração de abcesso, urina e líquor. Nenhum dos SA isolados era resistente à meticilina. Apresentavam resistência à penicilina 95%, à eritromicina 10% e à gentamicina 5%. Todos eram sensíveis à clindamicina, cotrimoxazol, rifampicina, vancomicina, toberamicina e teicoplanina. Em 4 dos casos o agente foi considerado contaminante. Caracterizaram-se as 15 infecções por SA correspondentes a 13 doentes (7♂,6♀) com idades compreendidas entre 6 dias e 17 anos (média 5anos; mediana 3anos). As infecções foram classificadas como adquiridas na comunidade em 47% dos casos, como nosocomiais em 47% e como colonização em 6%. Os doentes com SA resistentes à eritromicina e à gentamicina tinham infecção nosocomial e a doente com SA sensível à penicilina tinha uma infecção adquirida na comunidade. Conclusão: Ao contrário do que esperarávamos, não encontramos SA meticilino-resistentes. No entanto, os autores continuam a considerar importante o conhecimento da epidemiologia de cada área para que cada centro possa conhecer a evolução da susceptibilidade deste agente nas infecções da sua comunidade. Palavras-chave: Staphylococcus aureus, meticilino-resistentes, infecções nosocomiais/da comunidade. ACANTOSE NIGRICANS NUMA CRIANÇA COM DÉFICE DO TRANSPORTADOR DA CREATINA. UMA ASSOCIAÇÃO BENIGNA? Diana Moreira, Ana Garrido, Helena Santos, Susana Aires Pereira, Carla Valongo, Jorge Sales Marques Serviço de Pediatria do Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia/Espinho Instituto de Genética Médica Jacinto de Magalhães Introdução: A acantose nigricans (AN) é um espessamento aveludado e difuso com hiperpigmentação acastanhada da pele, localizada preferencialmente nas pregas cutâneas. A sua etiologia pode estar relacionada com factores hereditários, vários síndromes, obesidade, outros distúrbios endócrinos, uso de fármacos e neoplasias malignas. O défice do transportador da creatina (DTC) é um síndrome ligado ao X que resulta de uma mutação no gene SLC6A8, manifestando-se habitualmente por atraso psicomotor (moderado a grave), atraso da fala, epilepsia, alteração do comportamento e dificuldade na aprendizagem. Caso clínico: Criança do sexo masculino, 11 anos de idade, com peso adequado, seguido na consulta de pediatria por atraso mental, atraso grave da linguagem e alterações comportamentais. Constatado ao exame físico hiperpigmentação e espessamento da pele inicialmente na região abdominal, com evolução progressiva para as axilas, joelhos e pés, compatível com AN. Antecedentes familiares: irmã com dificuldades na aprendizagem, irmão mais velho falecido aos 5 anos de vida, apresentava epilepsia, paralisia cerebral e atraso grave da linguagem. A ressonância magnética cerebral com espectroscopia do caso index revelou ausência de sinal de creatina. A creatina na urina estava elevada: 11987 mmol/L (146-8560) com uma razão creatina/creatinina alta: 3,33 (0,04-1,07). No DNA do caso índex foi detectada uma mutação hemizigótica no gene SLC6A8. A mutação consiste na transversão de uma G por uma C (c1261G>C) que resulta na substituição da glicina pela arginina (pGlyc 421 Arg) no exão 9 do gene SLC6A8. A irmã e a mãe são heterozigóticas para a mesma mutação. Apesar de uma investigação exaustiva não foi encontrada evidência de doença endócrina ou neoplásica. Discussão: Os autores, com este caso clínico pretendem alertar para uma possível associação entre a AN e a DTC, a qual não esta ainda descrita na literatura. A AN neste caso índex parece tratarse de uma manifestação clínica benigna da DTC. PNEUMONIA NECROTIZANTE: UM CASO CLÍNICO Vinhas da Silva, Ana Leite, Isabel Carvalho, Graça Ferreira Serviço de Pediatria do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia Introdução: A pneumonia necrotizante (PN) é uma complicação rara, mas complexa, da pneumonia lobar e caracteriza-se pela necrose focal das áreas de consolidação, devendo ser sempre considerada em crianças com febre prolongada e aspecto séptico. O diagnóstico é confirmado por TC do tórax. O agente mais frequentemente envolvido é o Streptococcus pneumoniae. O tratamento consiste em antibioterapia de largo espectro, verificando-se, em 90% dos casos, muito boa evolução clínica. As complicações, nomeadamente o pneumatocelo e o abcesso pulmonar, são raras. resumo das comunicações orais XVIII reunião do hospital de crianças maria pia S 201 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 Caso Clínico: Criança de 27 meses, sexo feminino, previamente saudável, observada na Urgência de Pediatria por febre e tosse produtiva com 4 dias de evolução, toracalgia e dificuldade respiratória. Medicada previamente com amoxicilina-ácido clavulânico, sem melhoria. Ao exame objectivo, apresentava mau estado geral, polipneia e tiragem subcostal. SatO2 (ar ambiente) - 94%. À auscultação pulmonar verificou-se diminuição dos sons respiratórios no hemitórax esquerdo. Analiticamente, apresentava ligeira leucocitose com neutrofilia e PCR de 34,22mg/dL, restante estudo analítico sem alterações. A radiografia do tórax revelou imagem de hipotransparência ocupando todo o pulmão esquerdo. A ecografia torácica demonstrou a presença de colapso total do pulmão esquerdo, com broncograma aéreo e derrame pleural não septado. A TC do tórax revelou condensação total do pulmão esquerdo com perda de volume do lobo inferior por atelectasia compressiva e área hiperdensa na vertente posterior do lobo superior esquerdo com cerca de 4-5 cm atribuível a área de necrose. No lobo inferior esquerdo identificaram-se lesões cavitadas pericentimétricas compatíveis com pneumatocelos. Hemocultura e serologias víricas negativas. Estudo imunológico sem alterações. De acordo com os achados clínicos e imagiológicos constatou-se a existência de pneumonia necrotizante à esquerda, pelo que iniciou antibioterapia ev com ceftriaxone e vancomicina e corticoterapia. Apresentou melhoria clínica, analítica e radiológica progressiva, tendo alta ao 16º dia de internamento, orientada para a consulta externa. Cerca de 3 meses depois, apresenta-se assintomática e sem sequelas. Conclusão: Com este caso clínico, os autores alertam para uma rara complicação da pneumonia na criança, a qual é mais frequente em crianças imunocompetentes. A PN deve ser considerada em crianças com pneumonias complicadas com derrame pleural ou de evolução desfavorável, sendo fundamental o diagnóstico e tratamento precoce. TORCICOLO E VERTIGEM PAROXÍSTICA BENIGNA DA INFÂNCIA - DIAGNÓSTICO E EVOLUÇÃO CLÍNICA DE 6 PACIENTES M. Fátima Praça, Isabel Pinto Pais, Diana Moreira, Marta Vila Real, Fátima Santos Serviço de Pediatria do Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia/Espinho Introdução: Torcicolo paroxístico benigno da infância (TPBI) é um distúrbio benigno, auto-limitado, caracterizado por episódios recorrentes de torção lateral do pescoço, frequentemente acompanhado por sintomas vegetativos, ataxia ou posição anómala do tronco, com início nos primeiros meses de vida. Podem cessar espontaneamente ou evoluir para vertigem paroxística benigna da infância (VPBI) e/ou para a enxaqueca com aura. Objectivo: Apresentação e discussão da experiência da consulta de neuropediatria do CHVNG/E, no diagnóstico e seguimento de crianças com TPBI e VPBI, e neste sentido, contribuir na caracterização da TPBI para que possa ser reconhecida como entidade de diagnóstico a ser contemplada na Classificação Internacional de Cefaleias (CIC). Material e métodos: Revisão dos processos clínicos das crianças seguidas na consulta de neuropediatria do CHVNG/E com o diagnóstico de TPBI/ VPBI no período de Dezembro de 2002 a Maio de 2007. Foram avaliados os seguintes parâmetros: sexo, apresentação clínica e respectiva evolução, história familiar e exames complementares de diagnóstico. O diagnóstico de TPBI/VPBI foi estabelecido segundo os critérios da CIC, código ICHD-II A1.3.5 e 1.3.3, respectivamente. Resultados: De um total de 6 crianças, apenas uma era do sexo masculino. Cinco crianças tiveram como diagnóstico inicial TPBI e uma VPBI. Quatro casos apresentavam história materna de enxaqueca. O início dos sintomas de TPBI ocorreu entre o 1º e o 6 º mês de idade. Duas crianças apresentavam crises paroxísticas de inclinação da cabeça com lateralidade alternada e uma das crianças com postura distónica do tronco associada. Todas apresentavam pelo menos uma resumo das comunicações orais S 202 XVIII reunião do hospital de crianças maria pia crise com sintomas associados. A duração dos episódios variou de 1 minuto a 6 dias. A sua frequência inicial oscilou de semanal a mensal. Realizaram-se exames auxiliares de diagnóstico (EAD) em 3 crianças, todas efectuaram ecografia dos tecidos moles do pescoço e duas delas ecografia TF, EEG, RMN cerebral e estudo metabólico. Ao longo do tempo observou-se uma diminuição da frequência e da duração dos episódios. Um dos casos evoluiu para enxaqueca. Observou-se um único caso de VPBI, com início dos sintomas aos 2 anos, com evolução aos 3 anos para enxaqueca. Todos os casos revistos mostravam ao longo do tempo um desenvolvimento psicomotor (DPM) adequado e exame neurológico normal. Os EAD foram normais. Conclusões: Apesar da amostra ser reduzida para se inferir algo com significado estatístico, os autores com este estudo retrospectivo reafirmam a adequabilidade dos critérios de diagnóstico propostos em Apêndice na CIC. TESTE DE METACOLINA EM CRIANÇAS: A AVALIAÇÃO DAS PEQUENAS VIAS SERÁ IMPORTANTE? Telma Barbosa, Sandrine Almeida, Eva Gomes Serviço de Imunoalergologia do Hospital de Crianças Maria Pia Introdução: A hiperactividade brônquica é uma das características fisiopatológicas da asma e pode ser avaliada através de um teste de metacolina (TM). Este exame visa induzir uma queda significativa no FEV1 após a inalação de uma dada concentração do referido fármaco. Estudos recentes têm vindo a evidenciar o papel das pequenas vias na doença asmática. Objectivos: Avaliar o comportamento das pequenas vias aéreas (FEF50) durante o TM nomeadamente a sua relação com as variações do FEV1. Relacionar as alterações do FEV1 e do FEF50 com o aparecimento de sintomas brônquicos perceptíveis pela criança submetida ao TM. NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 Metodologia: Análise retrospectiva de uma população de crianças que realizaram TM (método de Cock-Croft) no Serviço de Imunoalergologia durante os anos de 2006-2007. O TM foi considerado positivo se a queda do volume expiratório forçado no 1º segundo (FEV1) fosse superior a 20% em relação ao valor basal. Foram considerados os valores do FEF50 no início, aquando da queda significativa do FEV1, e no final do teste. Considerou-se haver uma variação significativa do FEF50 quando esta foi superior a 30% do valor basal. As crianças eram questionadas acerca da existência sintomas tais como a percepção de dispneia, pieira, tosse ou desconforto torácico no final da prova ou quando uma descida significativa fosse detectada nos parâmetros espirométricos. A amostra obtida foi posteriormente dividida em 2 grupos (TM positivo/TM negativo) comparando-se a diminuição dos valores de FEF50 e a percepção de sintomas em ambos os grupos. Utilizouse o programa SPSS 12.0 para a análise estatística dos dados. Resultados: 52 crianças (29 do sexo masculino), com idades compreen- didas entre os 5,1 e os 15,9 anos (média de 10,4), 50% das quais apresentaram TM positivo. Em 88% (23) dos TM positivos ocorreu uma queda FEF50 significativa (> 30%). No grupo com TM negativo verificou-se uma queda de FEF50 considerada positiva em 38% (10) dos casos. Verificou-se uma correlação positiva entre os valores de FEV1 e FEF50 basais e entre as diferenças entre FEV1 inicial/final e FEF50 inicial/final. Vinte e três (44%) crianças referiram o aparecimento de sintomas respiratórios durante o teste, 15 das quais com TM e queda de FEF50 consideradas positivas, 3 com queda positiva de FEF50, 1 somente com queda FEV1 positiva e as restantes 4 sem queda significativa. Existe uma diferença estatisticamente significativa entre os grupos com queda significativa de FEV1 (TM positivo) e sem queda com maior percepção de sintomas no primeiro grupo (p <0.05). O mesmo acontece quando relacionamos a existência de sintomas com as quedas de FEF50 (p <0.05). Parece haver uma melhor correlação entre o aparecimento de sintomas e a variação dos FEF50 do que dos FEV1 embora o tamanho da amos- tra não permita tirar conclusões do ponto de vista estatístico. Se considerássemos ambos os parâmetros em conjunto (FEV1 e FEF50) para avaliação dos resultados do TM poderíamos concluir pela existência de hiperactividade brônquica em 69% das crianças contra os 50% na realidade diagnosticados. Conclusões: O TM é um procedimento bem padronizado para o diagnóstico de hiperactividade brônquica. Os seus resultados baseiam-se na avaliação dos valores de FEV1, sendo os restantes parâmetros espirométricos pouco ou nada valorizados, não estando definidas as variações que poderão ser significativas. Verificamos neste estudo haver uma boa correlação entre os valores de FEF50 e FEV1 ao longo do TM. Além disso, os valores de FEF50 apresentam uma correlação positiva com a indução de sintomas respiratórios durante o TM. Detectou-se uma queda por nós considerada significativa de FEF50 numa proporção de crianças superior aquela em que se verificou uma queda de FEV1. Estes achados necessitam de confirmação com outros estudos e a sua relevância poderá ser discutida. resumo das comunicações orais XVIII reunião do hospital de crianças maria pia S 203 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 Resumo dos Posters ESFEROCITOSE HEREDITÁRIA. ESPLENECTOMIA E COLECISTECTOMIA. EXPERIÊNCIA DO HOSPITAL ESPECIALIZADO DE CRIANÇAS MARIA PIA. Susana Soares, Catarina Sousa, Berta Bonët, Ferreira Sousa, Carlos Enes ,Marika Antunes, José Barbot Serviço de Hematolgia e Serviço de Cirurgia Pediátrica, Hospital Maria Pia A Esferocitose Hereditária (EH) constitui a causa mais frequente de hemólise e anemia hemolítica não imune. Trata-se de uma doença heterogénea que pode assumir diferentes graus de gravidade clínica, desde as formas severas dependentes de transfusões às formas ligeiras de diagnóstico ocasional. A anemia e a litíase vesicular constituem as duas componentes principais da morbilidade da doença. Tradicionalmente a esplenectomia tem sido a opção terapêutica de eleição no sentido de diminuir a hemólise e as complicações associadas. No entanto, a percepção dos riscos inerentes a este procedimento tem aumentado nos últimos anos, facto que tem conduzido a atitudes mais conservadoras. Na presente revisão procura-se avaliar as indicações que conduziram a esplenectomia assim como os seus resultados e complicações. O número de doentes com o diagnóstico de EH seguidos entre 1992 e 2007 foi de 52, (34 M; 18 F). Destes 19 eram classificados como EH ligeira, 24 EH moderada e 9 EH grave segundo os guidelines publicados no British Journal of Hematology,126, 455-474, 2004. Em 15 doentes foi efectuada esplenectomia total (ET) e em 3 doentes esplenectomia parcial (EP). Sete doen- tes foram esplenectomizados antes dos 6 anos, 6 com EH grave e 1 moderada. Cinco dos dezoito realizaram esplenectomia com colecistectomia concomitante, 4/18 realizaram cirurgia por laparoscopia e 14/18 por laparotomia. De referir que 9 doentes realizaram apenas colecistectomia sendo que 2 destes vieram a realizar esplenectomia posteriormente e 1 já havia realizado esplenectomia total anteriormente. A indicação mais referida para esplenectomia foi: anemia com elevada reticulocitose (n=14), esplenomegalia severa (n=14), dependência transfusional (n=4), litíase vesicular (n=5) e pancreatite litiásica (n=2). O incremento médio de hemoglobina pós-esplenectomia foi de 4,95 g/dl (Intervalo:1,6-10,1). A erradicação de hemólise após esplenectomia (Retic. <150 000/uL) verificou-se em 11 casos, 3 mantiveram reticulocitose moderada (2EP+1ET) e 2 reticulocitose severa (1ET+1EP). Não foram observadas complicações graves pós-esplenectomia. Em seis doentes observou-se trombocitose sustentada. Em termos gerais, as opções seguidas estão de acordo com as recomendações da literatura, ou seja, foram esplenectomizados de forma precoce a maioria das EH graves, de forma mais tardia algumas das EH moderadas, enquanto que nenhuma das EH ligeiras foi submetida a este procedimento. De salientar que, em contraste com o recomendado, em 6 casos procedeu-se a colecistectomia sem esplenectomia. Este facto deveu-se ao carácter bem compensado da hemólise e a possibilidade de cirurgias laparoscópicas menos invasivas. resumo dos posters S 204 XVIII reunião do hospital de crianças maria pia HIPERPIGMENTAÇÃO PERI-ORAL: O QUE SUSPEITAR? Patrícia Santos, Cláudia Neto, Susana Machado, Inês Lobo, José Soares, Manuela Selores. Serviço de Dermatologia e Serviço de Gastroenterologia do Hospital Geral de Santo António A síndroma de Peutz-Jeghers é uma doença rara, autossómica dominante com penetrância variável. É caracterizada pela associação de pigmentação mucocutânea (principalmente peri-oral) e polipose gastrointestinal (hamartomas). Os doentes com esta síndroma têm um risco aumentado de invaginação intestinal e de neoplasia, nomeadamente do tracto gastrointestinal, mama, ovário e testículo pelo que o diagnóstico precoce é fundamental para a instituição de medidas preventivas da evolução de neoplasias. Os autores apresentam o caso clínico duma criança de onze anos, com máculas melanocíticas dispersas pela região malar, dorso nariz, lábio superior, lábio inferior e mucosa jugal com evolução desde os dois anos. Aos onze anos foram-lhe diagnosticados pólipos gastrointestinais e o estudo genético revelou a mutação patogénica do gene STK11 no exão 6 e polimorfismos dos intrões 2,3,7. O estudo familiar mostrou que o pai é portador da mesma síndroma. NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 PREVALÊNCIA DE FACTORES DE RISCO CARDIOVASCULARES NUMA POPULAÇÃO EM DIÁLISE E COM TRANSPLANTE RENAL Liliana Macedo, Ariana Afonso, Isabel Valente, Sameiro Faria, Teresa Costa, Conceição Mota, Eloi Pereira. Serviço de Nefrologia Pediátrica, Hospital de Crianças Maria Pia – Porto As crianças com doença renal crónica iniciam precocemente a sua exposição a factores de risco cardiovasculares (RCV). Os autores apresentam um estudo da prevalência de factores de RCV em doentes em diálise e com transplante renal (TR) que se encontravam em seguimento neste hospital em Dezembro de 2006. Foram avaliados os parâmetros sexo, raça, idade no 1º tratamento substitutivo da função renal (TSFR), tempo de seguimento pós-TR, índice de massa corporal, tensão arterial, perfil lipídico, diabetes mellitus, tabagismo e terapêutica imunossupressora. Foram analisados 40 doentes, dos quais 15 em diálise (10 em diálise peritoneal e 5 em hemodiálise) e 25 com TR, sendo 60% do sexo masculino e um doente de raça negra. A idade média dos doentes em diálise era 7,3 + 5,6 anos e com TR 14,3 + 3,9 anos. O início do 1º TSFR foi em média aos 8,7 + 4,4 anos. O tempo médio de seguimento pós-TR foi 3,8 + 3,8 anos e com valor médio de creatinina plasmática 1,1 + 0,4 mg/dl. Relativamente aos inibidores da calcineurina, 17 doentes estavam medicados com tacrolimus e 8 doentes com ciclosporina. Vinte e um doentes encontravam-se sob corticoterapia (prednisolona), numa dose média de 0,07mg/kg/dia. Relativamente a factores de RCV nos doentes em diálise, registaram-se 20% de casos com excesso de peso ou obesidade, 26,7% com hipertensão arterial (HTA), 33,3% com hipercolesterolemia e 53,3% com hipertrigliceridemia. Dos doentes com TR, 40% apresentavam excesso de peso ou obesidade, 52% HTA, 4% hipercolesterolemia e 28% hipertrigliceridemia. Dois doentes com TR eram fumadores e não foram identificados casos de diabetes mellitus. Este estudo revela a elevada prevalência de factores de RCV numa população com doença renal crónica e a importância do seu controlo na tentativa de actuar atempadamente nestas situações. IMPORTÂNCIA DA AVALIAÇÃO DA TENSÃO ARTERIAL – CASO CLÍNICO Sílvia Saraiva, Ana Aguiar, Jorge Moreira, Célia Madalena. Centro Hospitalar Póvoa de Varzim/Vila do Conde Hospital de São João A hipertensão arterial (HTA) é um dos principais factores de risco cardiovascular. A avaliação da tensão arterial no exame físico pediátrico de rotina é fundamental para a melhoria da saúde cardiovascular na população adulta. Os autores apresentam o caso clínico de uma adolescente do sexo feminino, enviada à Consulta de Pediatria aos 12 anos de idade por obstipação e encoprese. Ao exame físico foi detectada tensão arterial acima do percentil 95 para a idade. O estudo revelou coarctação da aorta descendente torácica, submetida a correcção cirúrgica, com normalização da tensão arterial. Este caso clínico ilustra bem a importância da avaliação da tensão arterial no exame de rotina da criança e adolescente. ANALGESIA NO PECTUS EXCAVATUM – EXPERIÊNCIA DA UCI DO HCMP Carla Oliveira, Dina Nunes, Manuela Amaral, Raquel Neves UCI do Hospital de Crianças Maria Pia Introdução: O Pectus Excavatum é a deformidade congénita mais comum da parede torácica e tem implicações psicológicas e estéticas. A correcção cirúrgica mais recente e menos invasiva é a descrita por NUSS. Esta é efectuada no HCMP desde 2005. Uma das complicações do pós-operatório é a dor e para a minimizar fazemos uso de analgesia epidural. Esta proporciona uma analgesia excelente sem depressão do estado de consciência, mediante administração de menores doses de analgésicos e com uma menor incidência de efeitos secundários, tendo toda a utilidade no tratamento da dor aguda com origem no tórax. Objectivos: Analisar e dar a conhecer os dados da experiência da UCI, relativos à analgesia efectuada às crianças submetidas a cirurgia correctiva de Pectus Excavatum, pela técnica de Nuss. Sensibilizar para a necessidade da avaliação e registo sistemático da intensidade da dor. Material e Métodos: Foi efectuado um estudo retrospectivo, por consulta de registos manuais, das crianças internadas na UCI no pós-operatório de cirurgia de NUSS, entre Novembro de 2005 e Julho de 2007. A pesquisa incidiu sobre o tipo de analgesia efectuada, duração e eficácia da mesma, efeitos colaterais e necessidade de analgesia suplementar de acordo com referências à dor. A amostra (n=11) é constituída pela totalidade das crianças submetidas a esta cirurgia, não tendo sido considerada uma situação de reinternamento. Resultados: Das 11 crianças/adolescentes, 6 eram do sexo feminino e 5 do sexo masculino, sendo a média de idades de 13 anos (8 a 15 anos). A duração média do internamento na UCI foi de 5,1 dias (5 a 6 dias). No pós-operatório, todas as crianças efectuaram analgesia epidural com Morfina e analgesia endovenosa com paracetamol. Destas crianças, 9 fizeram perfusão de ropivacaína via epidural durante 4 dias. Tiveram necessidade de efectuar analgesia endovenosa suplementar com Toradol 4 crianças, (nº máximo de tomas 2). Mantendo este tipo de analgesia, verificou-se que em duas crianças não houve registo de dor e nas restantes (9) o nº de turnos em que esta é registada, variou entre dois a sete. Na altura, não era utilizada nenhuma escala de avaliação de dor e o registo efectuado dependia do critério de cada enfermeiro. Os efeitos colaterais registados foram: náuseas e vómitos em 9 crianças, hipertensão em 2, hipotensão também em resumo dos posters XVIII reunião do hospital de crianças maria pia S 205 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 2, tonturas, prurido e cefaleias referidos apenas uma vez. Há apenas uma criança em que não é referido qualquer efeito colateral. Conclusão: A não existência de avaliação e registo sistemático da dor não permitem concluir, através da consulta dos registos, a intensidade da dor sentida, a hora e a antecipação da medicação prescrita a horas fixas. Como apenas 4 crianças fizeram analgesia em SOS, deduzimos que, apesar dos registos serem inconclusivos, a analgesia instituída foi eficaz. Os efeitos colaterais foram essencialmente náuseas e vómitos e não se verificaram complicações significativas. PSORÍASE – O SOL COMO INIMIGO Luís Ribeiro, Mónica Tavares, Hernâni Brito, Ana Encinas, Enrique Carro, Márcia Ferreira, Teresa Borges, Margarida Guedes. Serviço de Pediatria, Serviço de Anatomia Patológica e Serviço de Dermatologia do Hospital Geral de Santo António A psoríase é uma patologia cutânea hereditária comum, com uma incidência na Europa de 1.5%. Na população pediátrica corresponde a 4% das dermatoses até aos 16 anos e apresenta um pico de início clínico aos 15-25 anos. A susceptibilidade para desenvolver a doença é hereditária, mas o padrão de transmissão é desconhecido. Existem factores desencadeantes conhecidos capazes de precipitar ou exacerbar uma “crise”, nomeadamente traumáticos, farmacológicos e certos tipos de infecção. O diagnóstico é fundamentalmente clínico, mas em casos duvidosos o exame anatomopatológico pode ser a chave do diagnóstico. Criança de 6 anos de idade, do sexo masculino, com antecedentes de quisto do septo pelúcido submetido a correcção endoscópica aos 2 meses de idade e sem antecedentes familiares relevantes, nomeadamente de patologia cutânea. Cerca de 12 meses antes da admissão, após infecção das vias aéreas superiores, desenvolveu pápulas eritematosas inicialmente localizadas na face, mas que após resolução das mesmas, surgiram no tronco, cotovelos e joelhos. Iniciou helioterapia, calcipotriol e corticóide tópico. Após os primeiros dias de praia ocorreu agravamento clínico com aparecimento de placas eritemodescamativas, envolvendo quase todo o tegumento cutâneo, associadas a prurido e dor cutânea. Nesta altura é proposto internamento para confirmação diagnostica e orientação terapêutica. No internamento foi realizada biopsia cutânea que evidenciou alterações compatíveis com psoríase em estadio inicial. Iniciou tratamento sistémico com ciclosporina com franca melhoria clínica. A psoriase é uma patologia frequente na idade pediátrica sendo, no entanto, raras as formas graves. Este caso apresenta algumas peculiaridades, nomeadamente a ausência de história familiar, o agravamento das lesões após a exposição solar, e a exuberância do quadro clínico. PAN-HIPOPITUITARISMO: DIFERENTES FORMAS DE APRESENTAÇÃO DE ACORDO COM O SEXO DO PACIENTE Helena Santos, Ana Garrido, Diana Moreira, Hugo Tavares, Eduarda Marques, Rosa Arménia Campos, Jorge Sales Marques Serviço de Pediatria - Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia Introdução: O Pan-hipopituitarismo é uma patologia com graves consequências. Necessita de um diagnóstico precoce que permita um tratamento atempado de forma a evitar diversos tipos de complicações, particularmente a afectação do normal crescimento e desenvolvimento da criança afectada. A apresentação pode ser diferente de acordo com o sexo do paciente. Casos Clínicos: Caso 1: Lactente do sexo masculino, de 4 meses, observado por icterícia, hipotonia, micropénis, hipoglicemia e má evolução estatural desde o nascimento. O estudo realizado revelou anemia, hipoglicemia, elevação resumo dos posters S 206 XVIII reunião do hospital de crianças maria pia das transaminases, hiperbilirubinémia conjugada; cortisol - 0.24 μg/dl (6.2 19.4), hormona de crescimento - 0.12 ng/ml (2 - 10), T4 - 5.0 μg/dl (6.5 - 17.5), FSH - <0,10 mUI/ml (1.5 - 12.4), LH - < 0.10 mUL/ml (1.7 - 8.6), prolactina - 3.93 ng/ml (4.1 - 18.4 ), insulina - < 0.20 μU/ ml (3.0 - 17.0). A ACTH - 8.80 pg/ml (0.0 - 46.0) era normal. A ressonância magnética (RM) cerebral mostrou hipoplasia da hipófise e sela turca. O estudo molecular não revelou mutação no gene PROP1. Caso 2: Criança do sexo feminino, 5 anos, observada por baixa estatura, refluxo vesicoureteral bilateral e duplicação pielocaliceal; história de canal arterial patente. O estudo realizado revelou anemia, cortisol - 3.66 μg/dl, T4 - 3.60, FSH - 0.45 mUI/ml, LH - < 0.10 mUL/ml; teste da colidia: a linha de base - 0.2 ng/ml, resposta máxima aos 120 minutos - 0.4 ng /ml, L; teste da Dopa: a linha de base - 0.2 ng/dl e após a injecção a resposta era 0.1 ng/ ml; IGF1 - < 25 ng/ml (50 - 327), IgGBP3 ng/ml - < 0.7 (1.1 - 7.1). O cariótipo era 46XX e a idade óssea correspondia a 2 anos. A RM cerebral mostrou hipófise e sela turca pequenas. Estudo molecular em curso. Ambos os pacientes iniciaram tratamento com tiroxina (10mg/Kg/dia), hidrocortisona (15mg/m2/dia) e hormona do crescimento (0.25 mg /Kg/dia). Discussão: No sexo masculino, o diagnóstico do pan-hipopituitarismo pode ser feito no período neonatal com a associação de icterícia colestática, hipoglicemia e micropénis. A icterícia colestática é secundária à falta dahormona de crescimento ou do cortisol. A função hepática normaliza após seis a sete semanas de terapia. No sexo feminino, a baixa estatura é a principal manifestação. Embora ambas situações tenham tido um diagnóstico tardio, a recuperação clinica e o crescimento de recuperação foi excelente. NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 SÍNDROME DE GILBERT NA PRÉ-PUBERDADE: UM DIAGNÓSTICO POUCO FREQUENTE Hugo Rodrigues, Ana Torres, Ana Rita Araújo, Cristiana Ribeiro, Miguel Salgado, Sandrina Martins, Sofia Sousa, Idalina Maciel. Serviço de Pediatria do Centro Hospitalar do Alto Minho Introdução: O Síndrome de Gilbert é a patologia da glucuronidação da bilirribuna mais frequente. A maioria dos casos apresentam hereditariedade autossómica recessiva, mas pode ocorrer de forma isolada. A hiperbilirrubinémia não conjugada recorrente, com hemograma, esfregaço e enzimas hepáticas sem alterações permite o diagnóstico presuntivo. O diagnóstico definitivo implica uma duração destas alterações de 12 a 18 meses. Para além da icterícia, geralmente não existem outros sinais ou sintomas. É uma situação benigna e não requer nenhum tratamento. O diagnóstico é importante para evitar exames complementares desnecessários e alertar para um eventual risco de toxicidade com alguns fármacos. Caso Clínico: Os autores apresentam o caso de uma adolescente prépúbere, de 11 anos de idade, sem antecedentes patológicos conhecidos, que recorre ao SU por febre, icterícia das escleróticas e “urina escura” (SIC) com 24 horas de evolução. Sem queixas álgicas, alterações GI ou outras. Sem história de episódios anteriores semelhantes ou factores de risco conhecidos para doença hepática. Como antecedentes familiares de referir pai com patologia hepática não especificada. Ao exame físico apresentava icterícia das escleróticas, sem outras alterações relevantes. Estudo analítico: hemograma – normal; Coombs directa negativa; PCR – 9,15 mg/dl; Bilirrubina total – 4,49 mg/dl (directa – 0,68 mg/dl); TGO / TGP – 26 / 43 UI/L; FA – 168 UI/L; função renal e ionograma – sem alterações; Combur – sangue +. Ecografia abdominal - sem alterações. Perante o quadro clínico e a história de patologia hepática paterna (que só posteriormente se soube tratar-se de esteatose hepática não alcoólica) decidiuse o internamento, onde apresentou boa evolução clínica, sem intercorrências. Efectuou estudo imunológico sem alterações, e serologias para HAV, HBV, HCV, EBV e CMV, negativas, excepto anti-HBs (vacina). Em D3 teve alta com indicação de vigilância e re-avaliação após 8 dias, apresentando-se assintomática. Passados 15 dias volta ao SU por icterícia e dor abdominal. Analiticamente não apresentava alterações, excepto ligeiro aumento da bilirrubina (à custa da indirecta). Por suspeita de Síndrome de Gilbert foi realizado estudo molecular, que confirmou a homozigotia para a duplicação dinucleotídica [TA] na região promotora do gene UGT1A1 Actualmente mantém-se assintomática, exceptuando alguns episódios ocasionais de dor abdominal e fadiga, por vezes associados a icterícia. Conclusão: Com este caso clínico, os autores pretendem alertar para uma patologia relativamente comum, mas que se encontra bastante subdiagnosticada. O diagbóstico é muito mais frequente após a puberdade, devido à influência hormonal. Neste caso, o ligeiro aumento das transaminases e a história paterna mal esclerecida de patologia hepática dificultaram o diagnóstico, que acabou por ser definido num segundo episódio de icterícia. A dor abdominal e a fadiga observadas estão de acordo com as descrições de alguns autores, apesar de actualmente se defender que estarão provavelmente relacionados com intercorrências víricas e não directamente com esta patologia. CRIANÇAS E ADOLESCENTES – QUE HÁBITOS ALIMENTARES? Otília Cunha, Mafalda Sampaio, Isabel Loureiro, Liliana Brandão, Elizabeth Marques, Miguel Costa. Serviço de Pediatria – Hospital de São Miguel, Oliveira de Azeméis Introdução: A alimentação saudável é essencial para o crescimento e desenvolvimento adequados, quer na in- fância quer na adolescência, bem como para a prevenção de algumas doenças crónicas e degenerativas na idade adulta. Nas últimas décadas verifica-se uma alteração nos hábitos alimentares das crianças e adolescentes, com o consequente aumento da prevalência da obesidade, bem como das co-morbilidades associadas. Objectivo: Conhecer os hábitos alimentares de um grupo de crianças e adolescentes e verificar se existem diferenças de acordo com a idade, sexo e índice de massa corporal (IMC). Material e Métodos: Estudo observacional e transversal de um grupo de 100 crianças e adolescentes, com idades compreendidas entre os 10 e 17 anos, que frequentavam o Ambulatório de Pediatria, aos quais foi aplicado um questionário sobre os seus hábitos alimentares. As variáveis analisadas foram: idade, sexo, escolaridade, classe socio-económica, IMC, dieta das 24h e frequência de consumo de alguns alimentos. A análise estatística foi realizada em suporte informático (SPSS 15.0 for Windows). Resultados: Das 100 crianças e adolescentes, 52% eram do sexo feminino, sendo a média de idades de 12,6 anos. Observou-se excesso ponderal em 37% e obesidade em 21% dos casos. Dos resultados salientamos: 42% efectuavam menos de 5 refeições diárias e 75% das crianças faziam pelo menos uma refeição fora de casa. Verificou-se um consumo diário, superior a uma vez por dia, de hortaliças, sopa, fruta e lacticínios, em 17%, 25%, 26% e 72% dos casos, respectivamente. Constatou-se uma ingestão diária de peixe em apenas 23% dos casos. O consumo, superior a uma vez por semana, de refrigerantes, fast-food e guloseimas foi de 36%, 46% e 76%, respectivamente, e de álcool foi de 3%. Não se verificaram diferenças estatisticamente significativas entre a frequência de consumo dos vários grupos de alimentos e a idade, o sexo, a classe socio-económica e o IMC. Comentário: Tendo em conta as recomendações alimentares e nutricionais actuais, constatamos que os hábitos alimentares deste grupo de crianças e adolescentes afastam-se do conceito resumo dos posters XVIII reunião do hospital de crianças maria pia S 207 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 de alimentação saudável: baixa ingestão de fruta, produtos hortícolas e peixe e consumo excessivo de alimentos hipercalóricos e de menor valor nutricional, factos que poderão estar relacionados com a alta incidência de excesso de peso/obesidade encontrada neste grupo. Salienta-se o facto de não se encontrar diferenças com significado estatístico entre estes erros alimentares e o grau de IMC. Uma alimentação desequilibrada conduz frequentemente à obesidade, doença crónica de difícil tratamento e cuja prevenção é a “atitude terapêutica” mais eficaz. Os Cuidados de Saúde Primários, a Escola e a Comunidade devem continuar a promover medidas comportamentais preventivas, nomeadamente em relação aos hábitos alimentares e estilos de vida mais saudáveis, que ainda hoje se têm mostrado serem manifestamente insuficientes. OBESIDADE E OBSTIPAÇÃO: QUE RELAÇÃO? Isabel Loureiro, Liliana Brandão, Mafalda Sampaio, Otília Cunha, Elizabeth Marques, Miguel Costa Serviço de Pediatria - Hospital S. Miguel – Oliveira de Azeméis Introdução: A obesidade pediátrica tem sido associada a diversas co-morbilidades. Estudos recentes têm revelado uma maior prevalência de obstipação em crianças obesas. Objectivo: Avaliar a prevalência de obstipação e de encoprese num grupo de crianças com excesso ponderal e compará-la com um grupo normoponderal. Materiais e Métodos: Estudo retrospectivo com base em entrevista de 200 crianças com excesso ponderal/obesidade seguidas em consulta de Nutrição Pediátrica e de 200 crianças normoponderais observadas em regime de ambulatório no nosso hospital. Foram analisadas as variáveis: sexo, idade, critérios de obstipação (nº dejecções semanais, presença de fezes duras, sangue nas fezes, dor na dejecção, sensação de dejecção incompleta) e encoprese. Obstipação foi definida como a presença de pelo menos 2 dos critérios em 25% do tempo por um período superior 3 meses. Foram excluídos doentes com hipotiroidismo, diabetes, outras patologias endócrinas ou genéticas, uso crónico de corticóides e outras medicações que provoquem obstipação. Foi considerado excesso ponderal um Índice de Massa Corporal (IMC) superior ou igual ao p85 para a idade e sexo. A análise estatística foi realizada em SPSS 15.0. Resultados: Verificou-se uma prevalência de 18% de obstipação no grupo de crianças com excesso ponderal e de 9,5% no grupo controlo (p<0,05). Relativamente à encoprese, no grupo de crianças com excesso ponderal e no grupo controlo a prevalência foi de 3,5% e de 1%, respectivamente (p>0,05). Os dois grupos não apresentaram diferenças com significado estatístico relativamente ao sexo e idade. Conclusões: A prevalência de obstipação nas crianças com excesso ponderal/obesidade encontrada no nosso estudo (18%) foi significativamente superior à do grupo controlo. Este dado está de acordo com alguns estudos publicados, podendo o estilo de vida das crianças obesas explicar, em parte, estes resultados. Em relação à encoprese não foram encontradas diferenças com significado estatístico, salientando-se o facto de nenhuma das crianças estar referenciada a consulta médica por este problema. Os autores reforçam a necessidade da abordagem multidisciplinar da obesidade bem como da promoção contínua de medidas alimentares e comportamentais saudáveis. PUBERDADE PRECOCE - CASO CLÍNICO I. Vale, M. Almeida, T. Borges, H. Cardoso Serviço de Pediatria do Hospital Geral de Santo António SÍNDROME DE GILBERT- CAUSA RARA DE DOR ABDOMINAL Isabel V ,Catarina S,Teresa A, Susana F, e Idalina M. Serviço de Pediatria - Centro Hospitalar Alto Minho O síndrome de Gilbert é um distúrbio benigno, caracterizado por hiperbilirrubinemia não conjugada, causado por diminuição da actividade da UDP-Glicuroniltransferase. Pode ser um achado laboratorial ocasional ou resumo dos posters S 208 surgir (por volta da segunda ou terceira décadas de vida) como uma icterícia das escleróticas habitualmente sem qualquer outra sintomatologia associada. A actividade da enzima pode estar mais reduzida pela ingestão de alguns fármacos, prática de exercício físico, stress, intercorrências infecciosas e jejum prolongado. As autoras apresentam um caso clínico, de uma adolescente de 14 anos internada no serviço de pediatria do CHAM por dor abdominal recorrente acompanhada de náuseas e vómitos com 3 meses de evolução e que justificaram várias vindas ao SU. Apresentava antecedentes de rinite alérgica e asma, medicada com fluticasona nasal e montelucaste. Na admissão salienta-se tom ictérico das escleróticas, dor abdominal à palpação a nível dos flancos e hipogastro sem massas ou organomegalias palpáveis e sem sinais de irritação peritoneal. O estudo analítico realizado era normal à excepção da bilirrubina total aumentada à custa da bilirrubina indirecta. Os exames de imagem ecografia e TAC abdominal não apresentavam alterações. Por suspeita de S. Gilbert realizou o estudo molecular para a análise do número de repetições dinucleotídicas na região promotora do gene UGT1A1 efectuado por PCR que confirmou a presença de homozigotia associada ao síndrome de Gilbert. XVIII reunião do hospital de crianças maria pia Introdução: A puberdade é um período de transição entre a infância e a idade adulta; no qual se desenvolvem os caracteres sexuais secundários. Caracteriza-se por um crescimento rápido que termina com a fusão das epifises ósseas, atingindo-se assim a estatura final. A idade do início da puberdade varia de zona geográfica dependendo de factores genéticos e ambientais. A puberdade precoce define-se como o aparecimento de caracteres se- NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 xuais numa idade cronológica inferior em mais de 2,5 desvios padrão da média dessa população. Assim a nossa população considera-se nas raparigas abaixo dos 7 anos e nos rapazes abaixo dos 9 anos. Este distúrbio pode ser classificado como central ou periférico de acordo com a sua etiologia. Caso Clínico: Os autores apresentam um caso clínico de um rapaz de 8 anos de idade, enviado à consulta de endocrinologia pediátrica por aparecimento de pelo púbico, aumento do perímetro e comprimento dorsal do pénis; com cerca de 2 anos de evolução (desde os 6 anos de idade). Ao exame físico apresentava o peso 42kg, altura 139,8cm (> P95) SDS 2,24; altura alvo-167cm (P10). Com o seguinte estádio pubertário: pêlo púbico III/IV, volume testicular 10ml e pénis com comprimento dorsal de 6cm e perímetro de 7cm. Do estudo realizado apresentava aumento da LH, FSH, testosterona e prolactina, com estudo hormonal da supra-renal normal. No RX do punho e mão tinha uma idade óssea calculada de 11 anos (IC- 8 anos), com aceleração de 3 anos. A ressonância magnética cerebral mostrava um hamartoma hipotalámico (tuber cinereum) sem outras alterações de relevo. Foi orientado para a consulta de neurocirurgia deste hospital, onde é seguido. Dado tratar-se de uma puberdade precoce central iniciou terapêutica com triptorrelina (análogo de LHRH) com boa resposta clínica e analítica. Comentários: No rapaz a puberdade precoce central é secundária a uma lesão orgânica em 50% dos casos; pelo que obriga sempre à realização de neuroimagem. Devemos estar atentos ao desenvolvimento pubertário das crianças; de forma a identificarmos atempadamente os casos de puberdade precoce e assim evitarmos a aceleração da idade óssea, que poderá comprometer a estatura final. PAMIDRONATO NA OSTEOGENESIS IMPERFECTA : TRATAR ATÉ QUANDO? Garrido A., Moreira D., Campos Costa R, Sales Marques J. Serviço de Pediatria - Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia Imagiologia Clínica Dr. Campos Costa Introdução: A Osteogenesis imperfecta (OI) é uma doença hereditária caracterizada por fracturas ósseas múltiplas. Objectivo: Avaliar o tempo necessário de tratamento com pamidronato na criança com OI. Material e Métodos: Estudo retrospectivo de uma criança com OI tipo 3, tratada com pamidronato dos 5 meses de idade aos 5 anos (utilizando o protocolo de Plotkin). Avaliação anual do número de fracturas, evolução estatural, metabolismo cálcio – fósforo urinário e densidade mineral óssea (BMD e T score de L1 a L4). Resultados: Duas fracturas ósseas após 8 meses e 2 anos de tratamento. Estatura abaixo do percentil 3 durante o primeiro ano de tratamento e desde então no percentil 5. Antes do início do tratamento o valor de cálcio era de 2,70 mg/d ( 100 - 300) , fósforo : 0, 02 g /d ( 0,4 - 1,3) , BMD : 0,000 g / cm2 e T – score : - 9,5 . Aos 2 anos de tratamento - cálcio : 48,50 , fósforo : 0,40 , BMD : 0,468 , T – score : - 5,3 . Aos 5 anos de tratamento – cálcio : 46,40 , fósforo : 0,51 , BMD : 0,486 e T – score : - 5,1 Conclusões: 1 - O tratamento com pamidronato, reduziu o número de fracturas, melhorou a qualidade de vida do doente e inverteu a evolução normal da baixa estatura nestes casos graves. 2 - São suficientes 2 anos de tratamento porque, a partir dessa altura, não há melhoria significativa do metabolismo cálcio - fósforo urinário e da densitometria óssea. 3 – Estes resultados estão de acordo com os artigos mais recentes sobre o tempo de tratamento, que deverá ser reduzido para dois anos, em vez dos 5, como inicialmente proposto, tendo em conta a evolução clínica, analítica e radiológica verificada. “TUMMY TIME” Carla Teixeira, Suzana Figueiredo, Lara Lourenço, Susana Soares, Fátima Pinto. Centro de Saúde da Carvalhosa e Foz do Douro - Porto O “Tummy Time”, isto é o “Tempo da Barriga para Baixo”, consiste no posicionamento do recém-nascido e lactente em decúbito ventral enquanto está acordado. A deformação da cabeça, nomeadamente a plagiocefalia posicional, aumentou de incidência nos EUA desde que foram colocadas em prática as recomendações relativamente à posição de deitar para prevenção da Síndrome de Morte Súbita do Lactente. O posicionamento do recém-nascido e lactente de barriga para baixo tem como benefícios, entre outros, evitar a plagiocefalia posicional, e contribuir para um desenvolvimento motor adequado. Na consulta de Vigilância Infantil e como parte de um conjunto de medidas educativas e preventivas, são abordados vários temas, complementados por folhetos educativos que são fornecidos aos pais. Dado não existir em Portugal nenhuma acção em curso para fomentar o “Tummy Time”, o qual inclusivamente não é referido no Boletim de Saúde Infantil, as autoras decidiram elaborar um cartaz informativo para os pais, para ser colocado na sala de espera do consultório de Pediatria. No cartaz está explicado o que é o “Tempo da Barriga para Baixo”, quando e como deve ser efectuado e porque é importante. A par do cartaz foi elaborado um folheto informativo, com a mesma informação, o qual é distribuído aos pais na consulta, juntamente com informação oral sobre o tema. O folheto foi posteriormente traduzido para inglês, para facilitar a transmissão de informação, dada a elevada quantidade de famílias imigrantes observadas no centro de saúde. As autoras pretendem divulgar o cartaz e o folheto informativo por elas elaborado. resumo dos posters XVIII reunião do hospital de crianças maria pia S 209 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 MUTISMO SELECTIVO - UM SILÊNCIO INCÓMODO: A PROPÓSITO DE QUATRO CASOS CLÍNICOS Otília Cunha,Mafalda Sampaio, Ana Luísa Pinto, Virgínia Monteiro, Miguel Costa. Serviço de Pediatria – Hospital de São Miguel, Oliveira de Azeméis Introdução: O mutismo selectivo (MS) define-se como uma perturbação da infância caracterizada por incapacidade persistente em falar em situações sociais específicas, apesar de a criança o fazer noutros contextos, interferindo no seu desempenho escolar e social, com duração mínima de um mês e que não se explica por nenhuma outra causa orgânica ou psiquiátrica (DSM-IV TR). Trata-se de uma entidade rara, que habitualmente surge antes dos 5 anos de idade e de abordagem terapêutica complexa. A este propósito, os autores apresentam quatro casos clínicos de crianças com diagnóstico de MS. Caso 1: Criança do sexo masculino, 11 anos de idade, referenciado aos 7 anos por recusa em falar em contexto escolar. Diagnosticado MS associado a défice cognitivo ligeiro, défice de atenção e enurese nocturna primária. Submetido a intervenção directa com psicoterapia individual e familiar, psicomotricidade, apoio de Ensino Especial e tratamento farmacológico, evoluiu com melhoria do MS em todos os contextos. Caso 2: Criança do sexo masculino, 7 anos de idade, enviado aos 3 anos por recusa em falar no infantário. Diagnosticado MS associado a ligeiro atraso no desenvolvimento psicomotor. Apesar de discreta melhoria do MS após intervenção directa com terapia da fala e apoio de Ensino Especial, evoluiu com marcadas dificuldades de aprendizagem escolar e enurese nocturna primária. Caso 3: Criança do sexo feminino, 7 anos de idade, referenciada aos 5 anos por recusa em falar na pré-escola, cumprindo critérios para diagnóstico de MS. Submetida a intervenção directa com psicoterapia individual e familiar e apoio do Ensino Especial, sem melhoria do MS, no entanto com bom aproveitamento escolar. Caso 4: Criança do sexo feminino, 4 anos de idade, enviada à consulta por recusa em falar fora do seu agregado familiar, estabelecendo-se o diagnóstico de MS. A realizar psicoterapia individual e familiar. Comentários: Os autores pretendem relembrar esta entidade rara, cuja abordagem diagnóstica e terapêutica é multidisciplinar. A intervenção terapêutica deve ser ajustada ao grau de ansiedade e à eventual presença de outros problemas associados, nomeadamente o atraso de desenvolvimento. Apesar da intervenção terapêutica, as situações mais graves podem evoluir para fobia social e depressão. A MARCA DO DRAGÃO: CONSEQUÊNCIA DE TATUAGEM TEMPORÁRIA. Isabel Loureiro, Inês Lobo, Arménia Oliveira, Maria de Lurdes Pinto, Cristina Godinho Serviço de Pediatria - Hospital de S. Miguel – Oliveira de Azeméis Apresentamos o caso clínico de A.S.P, sexo masculino, 8 anos, previamente saudável, observado no Serviço de Urgência (SU) do Hospital de S. Miguel por aparecimento de lesão eritematosa papulovesicular pruriginosa na região escapular direita na forma de um dragão. Nas férias de Verão tinha aplicado nessa área uma tatuagem temporária, tendo feito segunda aplicação de tinta para retocar a figura quatro dias antes de recorrer ao SU. Iniciou terapêutica com corticóide tópico e anti-histamínico oral, aos quais foi posteriormente associado antibiótico tópico com melhoria progressiva da lesão. Foram efectuados testes epicutâneos que se revelaram positivos para o fixante PPDA e negativos para o corante henna. A aplicação de tatuagem temporária é um fenómeno cada vez mais frequente em idade pediátrica não só porque se tornou “moda” como pela segurança que lhe é associada. Contudo as reacções alérgicas a este tipo de produto, que têm como principal constituinte o henna e o agente fixante PPDA, responsável pela maioria das alergias, podem ter conse- resumo dos posters S 210 XVIII reunião do hospital de crianças maria pia quências futuras. As crianças com alergia a este produto devem evitar novas tatuagens, tintas de cabelo, tintas de calçado, cremes bronzeadores, roupas tingidas, anestésicos locais e alguns medicamentos constituídos por sulfonamidas. SÍNDROME DE ALPORT – UMA FORMA DE APRESENTAÇÃO HISTOLÓGICA RARA Ariana Afonso, Liliana Macedo, Isabel Valente, Sameiro Faria, Teresa Costa, Conceição Mota, Elói Pereira. Serviço de Nefrologia Pediátrica do Hospital de Crianças Maria Pia. Introdução: A Síndrome de Alport, ou nefrite hereditária, caracteriza-se por doença glomerular progressiva, encontrando-se frequentemente associada a surdez neurossensorial e alterações oftalmológicas. Apesar de geneticamente heterogénea, em cerca de 80% dos casos de síndrome de Alport, a forma de transmissão é ligada ao X, com mutação a nível do gene COL4A5 (Xq22). As alterações histológicas da membrana basal glomerular são típicas. A presença de crescentes celulares, embora descrita na literatura, é uma situação rara. Caso Clínico: Adolescente de 16 anos, sexo masculino, com história familiar de doença renal. Hematúria microscópica diagnosticada aos 6 meses de vida, com evolução para hematúria macroscópica recorrente aos 9 meses e hematoproteinúria aos 3 anos. O estudo imunológico sumário, incluindo ANA, ANCA e Ac anti-MBG foi negativo. Detectada surdez neurossensorial, com colocação de próteses auditivas aos 9 anos. O rastreio oftalmológico regular não revelou alterações. Aos 10 anos, por proteinúria nefrótica, foi introduzida ciclosporina, que manteve durante 4 anos. Aos 15 anos, por apresentar deterioração progressiva da função renal, realizou biópsia renal percutânea, que mostrou proliferação endocapilar, com evidência de crescentes celulares e alterações crónicas tubulointersticiais e vasculares à microscopia óptica; o estudo ultra-estrutural evidenciou membrana basal com áreas de laminação e fragmentação, com aspecto NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 “em rede” e corpos electrodensos. Iniciou terapêutica imunossupressora, com melhoria transitória da função renal. A evolução foi desfavorável, com necessidade de terapêutica substitutiva da função renal (hemodiálise) 11 meses depois, em Maio de 2007. Efectuou transplante renal a 29/5/2007, de dador vivo, com função imediata do órgão. Comentários: Embora rara, a evidência de crescentes glomerulares na síndrome de Alport já foi previamente descrita por alguns autores. Contudo, persiste a dúvida se esta corresponde a uma alteração morfológica que se sobrepõe à doença de base, ou se constitui uma nova forma de apresentação morfológica desta síndrome, possivelmente associada a um curso clínico mais agressivo. LARINGOTRAQUEOMALÁCIA GRAVE – CASO CLÍNICO Teresa Guimarães, Gisela Silva, Helena Ferreira, Rosa Lima, Esmeralda Martins, Miguel Coutinho, Ana Ramos. Serviço de Pediatria e Serviço de ORL - Hospital Maria Pia A Laringotraqueomalácia é uma malformação com envolvimento da laringe e traqueia (atraso da maturação dos tecidos e estruturas) na qual existe uma incapacidade para manter a patência das vias aéreas durante a expiração. A apresentação idiopática é a mais frequente e a forma secundária, associa-se a compressão extrínseca por malformações em estruturas adjacentes, nomeadamente por anel vascular. Apresenta-se o caso clínico de um lactente do sexo masculino, admitido com 1 mês e meio de idade por apneia/ insuficiência respiratória aguda, com necessidade de ventilação mecânica. Sem antecedentes familiares e pré-natais relevantes. Apresentava estridor desde o nascimento associado a vários episódios de apneia e dificuldade na alimentação. O estudo endoscópico da árvore traqueobrônquica revelou “aspecto de ligeira laringomalácia e compressão extrínseca do 1/3 inferior da traqueia”. A investigação imagiológica confirmou o diagnóstico de duplo arco aórtico, que foi corrigido cirurgicamente. Posteriormente, registaram-se vários episódios de estridor, cianose e broncospasmo graves, com necessidade de traquestomia. A broncoscopia detectou estenose subglótica em anel, com tecido granulomatoso. Aos 18 meses, no controlo endoscópico da árvore respiratória, tinha estenose circunferencial cricóide, traqueomalácia global e broncomalácia do brônquio principal esquerdo. Foi transferido para o Hospital da área de residência, mantendo seguimento em consulta multidisciplinar neste Hospital. Este caso reflecte a importância dos cuidados hospitalares diferenciados e prolongados, num doente com malformações graves que colocavam em risco a sua vida. O QUE A BISAVÓ DESCOBRIU… Raquel Zenha, Daniela Pio, Maria Manuel Flores, Esmeralda Martins, Maria Luís Cardoso Serviços de Pediatria do Hospital Infante D. Pedro e Hospital Maria Pia Instituto de Genética Médica Dr. Jacinto Magalhães Introdução: A Intolerância Hereditária à Frutose (IHF), descrita pela primeira vez em 1956, tem actualmente uma prevalência estimada na Europa Central de 1:26100. É uma doença autossómica recessiva, produzida por uma mutação no gene que codifica a enzima aldolase B (gene 9q22.3), resultando na diminuição da actividade desta enzima a nível hepático, renal e intestinal. Tipicamente, a criança mantém-se assintomática até ao momento da introdução de frutose na dieta. As manifestações iniciais variam desde hipoglicemia sintomática a um quadro clínico semelhante à galactosemia (icterícia, hepatomegalia, vómitos, letargia, convulsões). Atraso do crescimento estaturoponderal, doença hepática ou disfunção tubular renal podem surgir com a ingestão crónica do dissacárido, quando o diagnóstico é mais tardio. Caso Clínico: Os autores apresentam o caso de um lactente previamente saudável com dieta láctea exclusiva, que é internado aos 4,5 meses por hipoglicemia sintomática, após ingestão de meio pêssego dado pela bisavó. A pesquisa de açúcares redutores na urina, efectuada algumas horas depois do episódio, foi negativa. No entanto, perante a suspeita clínica de IHF foi efectuado o estudo molecular, que identificou a presença da mutação c.449G>9 no exão 3. Apesar da insegurança e renitência iniciais dos pais face à doença, a diversificação alimentar com isenção de frutose foi um sucesso, dado o apoio multidisciplinar da Consulta de Nutrição e Doenças Metabólicas. Aos 17 meses, tem um bom crescimento estaturo-ponderal e um desenvolvimento psico-motor adequado. Comentários: Desde 1995, foram já relatadas 21 mutações no locus do gene da aldolase B. A mutação encontrada neste caso não está descrita na literatura mas havia sido previamente identificada noutra família portuguesa com IHF. O diagnóstico da patologia nesta criança foi possível através da suspeita clínica, associada à colaboração estreita e sempre disponível entre as diferentes Instituições envolvidas no caso. PNEUMONIA POR MYCOPLASMA PNEUMONIAE E SÍNDROME DE STEVENS-JOHNSON Marisa Carvalho, Fonte M, Costa A, Quaresma M, Trindade A, Cândido C, Pereira A, Dias F Serviço de Pediatria, Centro Hospitalar de Trás-os-Montes/Alto Douro, EPE O Síndrome de Stevens-Johnson caracteriza-se pela associação de lesões cutâneas acompanhadas de atingimento de duas ou mais superfícies mucosas. A etiologia pode ser infecciosa (Mycoplasma pneumoniae), medicamentosa ou idiopática e o tratamento é fundamentalmente de suporte e sintomático. Os autores apresentam o caso clínico de um adolescente de 12 anos, sexo masculino, sem antecedentes pes- resumo dos posters XVIII reunião do hospital de crianças maria pia S 211 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 soais e familiares relevantes, observado no serviço de urgência por febre elevada, lesões de mucosite e conjuntivite bilateral com cerca de 72h de evolução. O exame objectivo revelava hiperémia conjuntival bilateral associada a lesões de queilite, glossite e, cerca de 24h depois, um exantema macular eritematoso disperso pelo tronco e membros, associado a sinais de dificuldade respiratória. Da investigação analítica efectuada salienta-se contagem total de leucócitos normal, elevação da velocidade de hemosedimentação e da proteína de fase aguda, crioaglutininas positivas e serologias vírica e bacteriana negativas. Iniciou terapêutica de suporte, corticoterapia e claritromicina. Teve alta ao nono dia de internamento ainda com lesões de mucosite e alterações na auscultação pulmonar, a cumprir 14 dias de terapêutica antibiótica. Actualmente seguido em consulta externa por hiperreactividade brônquica pós-infecciosa. Os autores pretendem relembrar que apesar do Mycoplasma pneumoniae ser um agente frequente de infecção no aparelho respiratório com um curso autolimitado, também pode atingir outros orgãos, acarretando morbilidade significativa, assim como desencadear broncospasmo em crianças não asmáticas. INFECÇÃO POR VIH – TRATAR NÃO É SÓ MEDICAR Carla Teixeira, Paula Rodrigues, Cármen Cardoso, Angélica Morais, Fátima Sequeira, Alcinda Diz, Carmo Santos, Laura Marques. Serviço de Pediatria - Consulta de Imunologia; Consulta Externa; Serviço Educativo; Serviço Social e Departamento de Pedopsiquiatria do Hospital de Crianças Maria Pia Introdução: A infecção pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (VIH) condiciona toda a vida da criança, incluindo a dinâmica familiar e social. A discriminação associada dificulta a integração social e o processo de aceitação da doença por parte destas crianças e suas famílias/educadores. Neste contexto, são colocados novos desafios aos profissionais de saúde que ultrapassam o tratamento hospitalar clássico. Objectivos: Promover a Saúde, como bem-estar físico, mental e social das crianças e famílias. Promover o convívio e a partilha de experiências entre crianças infectadas pelo VIH e seus familiares/conviventes. Aprofundar a formação e a informação das famílias sobre a doença e seu tratamento. Promover a comunicação entre doentes e equipa de saúde Material e Métodos: Foram organizados três encontros com as crianças, familiares e técnicos de saúde, reunindo a acção educativa à lúdica. Nos encontros foi utilizada a seguinte metodologia: criação de um grupo de pais com componente formativa e de partilha de experiências, realização em paralelo de actividades lúdicas com as crianças, e por fim, um momento de convívio e actividades conjuntas com crianças, familiares e profissionais de saúde. Resultados e Conclusões: Participaram 12 crianças infectadas, com idades entre os 2 e 16 anos, e seus familiares (pais, irmãos, tios e responsáveis institucionais). No primeiro encontro efectuado em Dezembro de 2005 no Hospital de Crianças Maria Pia, foi organizada uma reunião do grupo de pais/educadores com partilha de experiências e vivências relacionadas com a doença. O segundo realizou-se em Setembro de 2006 no Parque Biológico de Gaia, tendo sido trabalhado com o grupo de pais o tema da revelação do diagnóstico da infecção pelo VIH. As crianças participaram em diversas actividades organizadas pelo Parque. O encontro terminou com um almoço-convívio e actividades conjuntas para pais/educadores e filhos Em Abril de 2007, foi efectuado o terceiro, com teatro de fantoches para as crianças e famílias. Em seguida, decorreram em espaços diferentes, actividades de expressão plástica para as crianças e uma reunião com os pais/educadores sobre adesão à terapêutica anti-retrovírica, finalizando com um lanche e caçada aos ovos de Páscoa. resumo dos posters S 212 XVIII reunião do hospital de crianças maria pia Estas reuniões foram avaliadas positivamente pelas crianças e famílias. Proporcionaram à equipa de saúde um conhecimento mais personalizado de cada situação, ajudando a desenvolver estratégias adequadas a cada criança. Uma experiência a continuar! IMUNOGLOBULINA SUBCUTÂNEA – OS PRIMEIROS DOENTES DO HOSPITAL DE CRIANÇAS MARIA PIA Carla Teixeira, Patrícia Dias, Laura Marques. Unidade de Imunologia - Hospital de Crianças Maria Pia – Porto Introdução: A terapêutica substitutiva com imunoglobulina constitui a base do tratamento de várias imunodeficiências primárias, nomeadamente da agamaglobulinemia ligada ao X. A perfusão de imunoglobulina tem sido efectuada por via endovenosa, implicando a deslocação das crianças ao hospital de dia com uma periodicidade de 3 ou 4 semanas. A imunoglobulina subcutânea foi recentemente introduzida em Portugal. A sua administração é mais fácil e menos invasiva, permitindo o tratamento domiciliário. Material e Métodos: Foi iniciado um estudo prospectivo da eficácia e tolerância da administração de imunoglobulina subcutânea em crianças com agamaglobulinemia, de acordo com um protocolo que contempla o ensino aos pais e crianças para auto-administração domiciliária e a avaliação clínica e analítica seriada. Resultados: A terapêutica com imunoglobulina subcutânea foi instituída em três crianças com agamaglobulinemia ligada ao X, com 10, 2 e 3 anos. Foram observadas uma boa adesão e boa tolerância dos pais e crianças à nova via de administração. Ocorreu apenas um episódio de reacção local ligeira ao produto numa criança. Os níveis pré-infusão de IgG obtidos foram mais elevados, o que permitiu reduzir as doses de imunoglobulina administrada. Não se registaram intercorrências infecciosas. Foi fornecido um manual de administração e efectuado ensino do método aos pais no hospital de dia, com boa aceitação. A administração NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 de imunoglobulina subcutânea foi realizada inicialmente sob supervisão da enfermeira responsável, e posteriormente de forma independente no domicílio. A criança mais velha participou activamente na administração e verificou-se uma melhoria na sua aceitação da terapêutica. As famílias valorizaram o facto de poderem escolher os dias e horários mais adequados para o tratamento, resultando em menor absentismo escolar e laboral. Conclusões: Os resultados nos primeiros três doentes em que utilizamos esta via de administração são muito positivos e muito encorajadores. A obtenção de níveis séricos de imunoglobulina pré-administração mais elevados nestas crianças permitiu reduzir a dose de imunoglobulina administrada. A comodidade da administração domiciliária e a redução do número de deslocações ao hospital são vantagens importantes. Não se verificaram acidentes nem reacções adversas importantes com esta via de administração. O estudo irá prosseguir com inclusão de novos doentes. ESTUDO DO PERFIL DE SUSCEPTIBILIDADE A BETALACTÂMICOS EM SUBCULTURAS CONSECUTIVAS DE E. COLI Silvia Branco Lima Serviço de Patologia Clínica do Hospital de Crianças Maria Pia Introdução: No Laboratório de Microbiologia do Serviço de Patologia Clínica do Hospital Maria Pia são processados vários produtos biológicos para identificar e determinar o perfil de susceptibilidade aos antibióticos do(s) agente(s) patogénico(s). Dos estudos microbiológicos pretende-se que os resultados obtidos in vitro sejam o mais próximo possível do que se passa in vivo, não esquecendo que falta a interacção do microrganismo com o hospedeiro que é muito complexa e está longe de ser completamente compreendida e não é possível de ser simulada laboratorialmente. O que se sabe é que a interacção entre estas duas entidades vivas desempenha um importante papel na prática do diagnóstico microbiológico e no controlo de doenças infecciosas. Neste trabalho pretendeu-se comprovar ou não a veracidade desta afirmação “As bactérias mantêm as suas características só até oito passagens” com o objectivo de garantir a qualidade dos resultados bacteriológicos, submetendo todas as estirpes estudadas à pressão por ampicilina e à pressão por subculturas consecutivas. A pressão selectiva por antibióticos é o principal factor para explicar o aumento da resistência. A prevalência actual da resistência deve ser monitorizada continuadamente cada ano. O impacto da resistência a um antibiótico e o seu mecanismo específico, incluindo a transmissão, deve ser estudado cuidadosamente. Tais informações podem ajudar na orientação das estratégias a seguir para maximizar o sucesso terapêutico e minimizar o aparecimento de resistência. A importância epidemiológica da resistência cromossómica e plasmídica é, sem dúvida, muito diferente sendo a plasmídica a que origina maior difusão das resistências bacterianas o que dá lugar a numerosos surtos epidémicos por bactérias resistentes. Material e Métodos: A Escherichia coli é o mais comum dos Gram negativo causador de infecções nosocomiais e adquiridas na comunidade. É o agente predominante das infecções do tracto urinário. Assim propôs-se a estudar três estirpes de E. coli, uma que é completamente conhecida, porque é uma estirpe de colecção portadora de um plasmídeo que confere resistência à ampicilina denominada por E. coli modelo e duas de isolamentos clínicos de urinas a E. coli 12071 e a E. coli 13114. Tendo-se a noção que só é conhecido o mecanismo de resistência aos antibióticos na estirpe modelo, procurou-se estirpes clínicas que tivessem características fenotípicas de resistência aos antibióticos semelhantes às do modelo observadas através das concentrações mínimas inibitórias obtidas no Vitek 32. Resultados e Conclusões: Nas estirpes clínicas apesar do comentário feito pelo Vitek 32, relativamente ao mecanismo de resistência aos antibióticos, ser igual para a EC12071 e a EC13114 e de ao longo do trabalho nunca se ter alterado, achou-se que os mecanismos de resistência aos antibióticos são diferentes. O autor considera que a resistência aos antibióticos na EC12071 é devida a uma penicilinase associada a um mecanismo de impermeabilidade às penicilinas e na EC13114 é devida uma cefalosporinase intrínseca de baixo nível e/ou penicilinase de alto nível. Muito embora não se tenha comprovado a veracidade da afirmação que inspirou este estudo, manda a prudência que o trabalho se processe o mais rápido possível para que os clínicos tirem o máximo partido dos resultados laboratoriais. PREVALÊNCIA DA RESISTÊNCIA À VANCOMICINA EM ENTEROCOCCUS NO HOSPITAL DE CRIANÇAS MARIA PIA DE 2003 A 2006. Paula Rodrigues, Fernanda Teixeira, Laura Marques Comissão de Controlo de Infecção e Serviço de Patologia Clínica do H.ospital de Crianças Maria Pia Introdução: Os Enterococcus fazem parte da flora comensal do aparelho digestivo humano, com escasso poder de invasão ou patogenicidade. Assumem particular importância em ambiente hospitalar, nomeadamente em doentes debilitados e sujeitos a antibioterapia prolongada, pelo risco de emergência de estirpes resistentes à Vancomicina. Objectivo: Neste estudo pretendemos conhecer a taxa de Enterococcus resistentes à Vancomicina (VRE) no Hospital de Crianças Maria Pia nos últimos 4 anos e comparar os indicadores obtidos. Material e Métodos: Estudo retrospectivo de todos os Enterococcus isolados entre 1 de Janeiro de 2003 e 31 de Dezembro de 2006 no Serviço de Patologia Clínica do Hospital de Crianças Maria Pia. Foram calculadas as taxas de resistência dos Enterococcus à Vancomicina, as taxas de prevalência de VRE por 100 doentes internados e por 1000 dias de internamento. Analisaram-se mais detalhadamente os doentes com VRE através da consulta dos dados dos processos clínicos. resumo dos posters XVIII reunião do hospital de crianças maria pia S 213 NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2006, vol XV, n.º 3 Resultados: Na tabela seguinte, apresenta-se a distribuição numérica anual dos resultados obtidos Doentes internados Dias de internamento 2003 2004 2005 2006 4103 4687 4441 4382 19223 19562 17622 17462 Isolados de Enterococcus 78 79 134 102 Doentes com Enterococcus 47 48 63 57 Isolados de E. faecium 16 15 36 23 Doentes com E. faecium 9 13 14 11 Isolados de VRE 11 3 28 17 Doentes com VRE 4 3 11 7 As taxas de resistência dos Enterococcus à Vancomicina, de 2003-2006, foram as seguintes 2003 2004 2005 2006 VRE no total de Enterococcus 14,1% 3,8% 20,9% 16,7% VRE no total de E. faecium 68,8% 20,0% 77,8% 73,9% Todos os Enterococcus faecalis isolados eram sensíveis à Vancomicina. A prevalência de VRE nos 4 anos do estudo foi a seguinte 2003 2004 2005 2006 Por 1000 dias de internamento 0,57 0,15 1,59 0,97 Por 100 doentes internados 0,10 0,06 0,25 0,16 O total de doentes com VRE, nos isolados de 2003 a 2006, foi 23, 11 do sexo feminino. Dezassete (74%) tinham idade ≤1ano e 20 (87%) tinham doença crónica, com vários internamentos prévios, nomeadamente na UCI. Conclusões: Neste estudo encontramos taxas de resistência à vancomicina elevadas nos E. faecium isolados neste período de tempo, registando-se alguma variabilidade nas prevalências anuais. Todos os E. faecalis isolados eram sensíveis à vancomicina. A maioria dos VRE foi isolada em crianças com idade ≤1ano, imunodeprimidas, com patologia crónica e internamentos anteriores. Nestes casos as medidas de controlo de infecção são fundamentais para evitar a sua disseminação em ambiente hospitalar, sobretudo em sectores de maior risco. COMPLICAÇÕES CARDIOVASCULARES DA DOENÇA DE KAWASAKI Marta João Silva, Marília Loureiro, Cláudia Moura, Jorge Moreira, Rui Anjos, José Carlos Areias , Sílvia Álvares, Queirós e Melo. Serviço de Cardiologia Pediátrica do Hospital de São João, Porto Serviço de Cardiologia Pediátrica do Hospital de Crianças Maria Pia, Porto Serviço de Cardiologia Pediátrica do Hospital Santa Cruz, Lisboa Introdução: A doença de Kawasaki é uma vasculite aguda de etiologia desconhecida que pode ter complicações cardiovasculares graves sendo, nos países desenvolvidos, a doença cardíaca adquirida mais importante da infância. Casos Clínicos: Os autores apresentam dois casos de doença de Kawasaki que apresentaram complicações cardiovasculares com formação de aneurismas gigantes das artérias coronárias. Caso 1: Criança do sexo feminino, caucasiana, 6 anos de idade, internada aos 4 anos por doença de Kawasaki. O ecocardiograma transtorácico executado no 15º dia de febre, evidenciou origem aneurismática da artéria coronária direita, resumo dos posters S 214 XVIII reunião do hospital de crianças maria pia da artéria circunflexa e da descendente anterior, confirmado por cateterismo cardíaco. Efectuou imunoglobulina e iniciou terapêutica com Ácido Acetilsalicílico à qual se associou, posteriormente, Clopidogrel. Manteve-se assintomática do foro cardiovascular. A cintigrafia de perfusão miocárdica foi normal. Repetiu, posteriormente, o cateterismo cardíaco, e por manter aneurismas volumosos, iniciou hipocoagulação oral com Varfarina. Caso 2: Criança do sexo masculino, caucasiano, 10 anos de idade, internado aos 12 meses, por doença de Kawasaki, apresentando no ecocardiograma transtorácico, executado ao 18º dia de evolução da doença, aneurisma da artéria coronária esquerda. Efectuou Imunoglobulina e iniciou terapêutica com Ácido Acetilsalicílico. Manteve-se sempre assintomático do foro cardiovascular. Efectuou cintigrafia de perfusão miocárdica, que revelou moderado defeito de perfusão do ápex e dos segmentos apical e médio da parede anterior e septal após esforço. Fez cateterismo cardíaco que mostrou oclusão no segmento médio da artéria descendente anterior, estenose de 90% no segmento proximal da circunflexa e aneurisma volumoso da origem da artéria coronária direita. Iniciou Atenolol e hipocoagulação oral com Varfarina. Foi submetido a cirurgia, com duplo by-pass aorto-coronário, e plastia com remoção da parede do aneurisma da coronária descendente proximal. Encontra-se medicado com Ácido Acetilsalícilico e Clopidogrel. Conclusão: O diagnóstico tardio da doença de Kawasaki, está associado a um maior risco de morbilidade cardiovascular. Estes dois casos sublinham a importância da necessidade da instituição precoce da terapêutica, numa tentativa de redução das complicações a médio a e longo prazo. NASCER E CRESCER revista do hospital de crianças maria pia ano 2007, vol XVI, n.º 3 Errata VOL. 16 – nº 2 – ano 2007 No Vol. 16 nº 2 da revista, na página 65, no artigo “Prevalência da enurese nocturna em crianças em idade escolar na zona Norte de Portugal”, por lapso não foram incluídos todos os nomes dos Colegas que participaram no Estudo como colaboradores. Lamentando o sucedido apresentamos o texto com as correcções devidas: Prevalência da Enurese Nocturna em Crianças em Idade Escolar na Zona Norte de Portugal Anabela Bandeira1, João Luís Barreira2, Paula Matos3 Grupo Coordenador: João Luís Barreira, Laura Soares, Paula Matos, Paulo Teixeira, Teresa Costa Grupo de Colaboradores: Teresa Costa, Eunice Moreira (HMaria Pia), Paula Matos, Felisbela Rocha, Anabela Bandeira (HSanto António), Álvaro Sousa (HSanto Tirso), João Luís Barreira (HSão João), Cristiana Ribeiro, Joana Rios (HViana Castelo), Paulo Teixeira (HFamalicão), Manuel Reis (HAmarante), Susana Lira (HVale Sousa), Fátima Dias, Miguel Fontes (HVila Real), Gorete Lobarinhas (HBarcelos), Laura Soares, Isabel Loureiro, Virgínia Monteiro, Susana Lima (HOliveira Azeméis), Fátima Madruga (HOvar), Paula Rocha, Sílvia Almeida, Lígia Peralta (HAveiro), Reis Morais (HChaves), Eduarda Cruz, Sílvia Saraiva (HMatosinhos). errata 215 RESUMO DAS CARACTERÍSTICAS DO MEDICAMENTO 1. DENOMINAÇÃO DO MEDICAMENTO SINGULAIR® Infantil 4 mg Granulado SINGULAIR® Infantil 4 mg comprimido para mastigar SINGULAIR® Junior 5 mg comprimido para mastigar 2. COMPOSIÇÃO QUALITATIVA E QUANTITATIVA SINGULAIR Infantil Granulado: Uma saqueta de granulado contém montelucaste sódico, equivalente a 4 mg de montelucaste. Comprimido para mastigar: Um comprimido para mastigar contém montelucaste sódico, equivalente a 4 mg de montelucaste. SINGULAIR Júnior Um comprimido para mastigar contém montelucaste sódico, equivalente a 5 mg de montelucaste. Lista completa de excipientes, ver secção 6.1. 3. FORMA FARMACÊUTICA SINGULAIR Infantil Granulado: Granulado branco Comprimido para mastigar: Cor de rosa oval com forma bi-convexa, com SINGULAIR gravado numa face e MSD 711 na outra. SINGULAIR Júnior Comprimido para mastigar: Rosa, redondo, biconvexo, diâmetro de 9,5 mm, com SINGULAIR gravado numa face e MSD 275 na outra. 4. INFORMAÇÕES CLÍNICAS 4.1 Indicações terapêuticas SINGULAIR Infantil e Júnior estão indicados no tratamento da asma como terapêutica adjuvante nos doentes com asma persistente ligeira a moderada, controlados de forma inadequada com corticosteróides inalados e nos quais os agonistas beta de actuação rápida “usados quando necessário” não proporcionam o controlo adequado da asma. SINGULAIR Infantil e Júnior podem também ser uma alternativa ao tratamento com doses baixas de corticosteróides inalados em doentes dos 2 aos 5 anos de idade com asma persistente ligeira sem história recente de ataques de asma graves que necessitam de utilização de corticosteróides orais, e que tenham demonstrado não serem capazes de utilizar os corticosteróides inalados (ver secção 4.2). SINGULAIR Infantil e Júnior estão também indicados na profilaxia da asma quando a componente predominante é a broncoconstrição induzida pelo exercício. 4.2 Posologia e modo de administração SINGULAIR Infantil Granulado: A posologia para doentes pediátricos dos 6 meses aos 5 anos de idade é de uma saqueta de granulado de 4 mg, tomado diariamente à noite. Não são necessários acertos posológicos neste grupo etário. É limitada a experiência de utilização em doentes pediátricos dos 6 aos 12 meses de idade. Não foram estabelecidas a segurança e eficácia para idades inferiores a 6 meses. Administração: SINGULAIR Infantil granulado pode ser administrado directamente na boca ou numa colher misturado com alimentos moles frios ou à temperatura ambiente, por exemplo: puré de maçã, cenoura, arroz ou gelado. A saqueta deve ser aberta somente no momento de utilizar. Após abertura da saqueta, deve administrar-se de imediato (no prazo de 15 minutos) a dose total de granulado de SINGULAIR Infantil. Uma vez misturado com alimentos, o granulado de SINGULAIR Infantil não deve ser guardado para posterior utilização. O granulado de SINGULAIR Infantil não se destina à dissolução em líquidos. No entanto, poderão ser ingeridos líquidos após a administração. SINGULAIR Infantil granulado pode ser tomado independentemente do horário das refeições. Comprimidos para mastigar: A posologia para doentes pediátricos dos 2 aos 5 anos de idade é de um comprimido para mastigar de 4 mg, tomado diariamente à noite. Se tomado com alimentos, SINGULAIR Infantil deverá ser administrado uma hora antes ou duas horas depois dos alimentos. Não são necessários acertos posológicos neste grupo etário. Não foram estabelecidas a segurança e eficácia dos comprimidos para mastigar de 4 mg na população pediátrica com menos de 2 anos de idade. SINGULAIR Júnior A posologia para doentes pediátricos dos 6 aos 14 anos é de um comprimido para mastigar de 5 mg, tomado diariamente à noite. Se tomado com alimentos, SINGULAIR Júnior deverá ser administrado uma hora antes ou duas horas depois dos alimentos. Não são necessários acertos posológicos neste grupo etário. Recomendações gerais O efeito terapêutico de SINGULAIR Infantil e Júnior nos parâmetros de controlo da asma ocorre nas 24 horas após a administração. Os doentes devem ser advertidos para continuarem a tomar SINGULAIR Infantil ou Júnior mesmo que a asma esteja controlada, assim como nos períodos de agravamento. Não é necessário qualquer ajuste posológico nos doentes com insuficiência renal ou insuficiência hepática ligeira a moderada. Não existem dados sobre doentes com insuficiência hepática grave. A posologia é igual em doentes do sexo masculino e do sexo feminino. SINGULAIR Infantil e Júnior como alternativa aos corticosteróides inalados de baixa dosagem na asma persistente ligeira: O montelucaste não é recomendado em monoterapia em doentes com asma persistente moderada. A utilização de montelucaste como alternativa aos corticosteróides de baixa dosagem em crianças dos 2 aos 14 anos de idade com asma persistente ligeira só deve ser considerada em doentes sem história recente de ataques de asma graves que exigiram utilização de corticosteróides orais, e que tenham demonstrado não serem capazes de utilizar os corticosteróides inalados (Ver secção 4.1). A asma persistente ligeira é definida por sintomas asmáticos que ocorrem mais do que uma vez por semana mas menos do que uma vez por dia, sintomas nocturnos mais do que duas vezes por mês mas menos do que uma vez por semana, função pulmonar normal entre os episódios. Se não se alcançar o controlo satisfatório da asma na visita de acompanhamento (geralmente no prazo de um mês), deve ser avaliada a necessidade de uma terapêutica anti-inflamatória diferente ou adicional com base no esquema terapêutico para o tratamento da asma. Os doentes devem ser periodicamente avaliados em relação ao seu controlo da asma. Terapêutica com SINGULAIR Infantil ou Júnior relacionada com outros tratamentos da asma Quando o tratamento com SINGULAIR Infantil ou Júnior é usado como terapêutica adjuvante aos corticosteróides inalados, o SINGULAIR Infantil ou Júnior não deve substituir de forma abrupta os corticosteróides inalados. (ver secção 4.4). Os comprimidos de 10 mg estão disponíveis para adultos com idade igual ou superior a 15 anos. 4.3 Contra-indicações Hipersensibilidade à substância activa ou a qualquer dos excipientes. 4.4 Advertências e precauções especiais de utilização Os doentes devem ser informados de que nunca devem usar montelucaste administrado por via oral para tratar ataques agudos de asma, e que devem manter disponíveis os habituais medicamentos de recurso apropriados. Em caso de ocorrência de um ataque agudo, deverá ser usado um agonista beta de actuação rápida. Os doentes devem contactar o médico o mais depressa possível, caso necessitem de mais inalações deste agonista beta do que as habituais. O montelucaste não deve substituir de forma abpruta os corticosteróides inalados ou de administração oral. Não existem dados demonstrativos de que os corticosteróides de administração oral possam ser reduzidos com o uso concomitante com montelucaste. Em casos raros, doentes em tratamento com medicamentos antiasmáticos, incluindo o montelucaste, podem apresentar eosinofilia sistémica, por vezes com sinais clínicos de vasculite consistente com a síndrome de Churg-Strauss, uma situação que é normalmente tratada com corticosteróides sistémicos. Este casos foram geralmente associados, embora nem sempre, a redução ou interrupção da terapêutica com corticosteróides orais. Não pode ser excluída, nem comprovada, a possibilidade dos antagonistas receptores leucotrienos estarem associados ao aparecimento da síndrome de Churg-Strauss. Os médicos devem estar atentos para a ocorrência nos seu doentes de eosinofilia, exantema vasculítico, agravamento dos sintomas pulmonares, complicações cardíacas, e/ou neuropatia. Os doentes que desenvolverem estes sintomas devem ser reanalisados e os seus esquemas de tratamento avaliados. SINGULAIR Infantil e Júnior, comprimidos para mastigar, contêm aspartamo, uma fonte de fenilalanina. Os doentes com fenilcetonúria devem ter em consideração que cada comprimido para mastigar de 4 mg e de 5 mg contém, respectivamente, uma quantidade equivalente a 0,674 mg e 0,842 mg de fenilalanina. Não foram ainda estabelecidas a segurança e eficácia do granulado de 4 mg na população pediátrica com menos de 6 meses de idade. Não foram estabelecidas a segurança e eficácia dos comprimidos para mastigar de 4 mg na população pediátrica com menos de 2 anos de idade. 4.5 Interacções medicamentosas e outras formas de interacção O montelucaste pode ser administrado com outras terapêuticas comummente usadas na profilaxia e tratamento crónico da asma. Em estudos de interacção medicamentosa, as posologias clínicas recomendadas de montelucaste, não tiveram efeitos clinicamente importantes na farmacocinética dos seguintes medicamentos: teofilina, prednisona, prednisolona, contraceptivos orais (etinil-estradiol/noretindrona 35/1), terfenadina, digoxina e varfarina. A área sob a curva de concentração plasmática (AUC) de montelucaste foi diminuída em aproximadamente 40% em indivíduos sob co-administração de fenobarbital. Dado que o montelucaste é metabolisado pelo CYP 3A4, dever-se-á ter precaução, particularmente nas crianças, quando o montelucaste for co-administrado com indutores do CYP3A4, tais como fenitoína, fenobarbital e rifampicina. Estudos in vitro demonstraram que o montelucaste é um potente inibidor do CYP 2C8. No entanto, resultados de um estudo clínico sobre interacções medicamentosas com montelucaste e rosiglitazona (um substrato específico representativo dos fármacos primariamente metabolizados pelo CYP2C8) demonstraram que o montelucaste não inibe o CYP2C8 in vivo. Consequentemente, não se prevê que o montelucaste altere de forma marcante o metabolismo de fármacos metabolizados por esta enzima (por ex., paclitaxel, rosiglitazona e repaglinida). 4.6 Gravidez e aleitamento Utilização Durante a Gravidez Os estudos em animais não indicam quaisquer efeitos nefastos no que respeita à gravidez ou ao desenvolvimento embrionário/fetal. Os dados limitados disponíveis nas bases de dados sobre gravidez não sugerem a existência de uma relação de causalidade entre SINGULAIR e malformações (i.e., defeitos nos membros) que foram raramente relatados durante a experiência de comercialização a nível mundial. SINGULAIR não deve ser utilizado durante a gravidez, a menos que tal seja claramente necessário. Utilização durante o aleitamento Estudos em ratos demonstraram que o montelucaste é excretado no leite (ver secção 5.3). Não se sabe se o montelucaste é excretado no leite humano. SINGULAIR só pode ser usado em mães a amamentar se for considerado claramente necessário. 4.7 Efeitos sobre a capacidade de conduzir e utilizar máquinas Não se espera que o montelucaste afecte a capacidade dos doentes para conduzir veículos ou utilizar máquinas. Contudo, em casos muito raros, foi relatada sonolência. 4.8 Efeitos indesejáveis O montelucaste foi avaliado em estudos clínicos do modo a seguir descrito: • comprimidos revestidos por película de 10 mg, em aproximadamente 4.000 doentes adultos com idade igual ou superior a 15 anos. • comprimidos para mastigar de 5 mg, em aproximadamente 1.750 doentes pediátricos dos 6 aos 14 anos de idade. • comprimidos para mastigar de 4 mg, em 851 doentes pediátricos dos 2 aos 5 anos de idade, e • granulado de 4 mg, em 175 doentes pediátricos dos 6 meses aos 2 anos de idade. Foram frequentemente (>1/100, <1/10) relatadas em estudos clínicos as seguintes reacções adversas relacionadas com o fármaco em doentes tratados com montelucaste, e com uma incidência superior à dos doentes tratados com placebo: Sistema do Organismo Corpo em geral Doentes Adultos 15 ou mais anos de idade (dois estudos de 12 semanas; n=795) Doentes Pediátricos 6 a 14 anos de idade (um estudo de 8 semanas; n=201) (dois estudos de 56 semanas; n=615) dor abdominal Perturbações do aparelho digestivo Sistema nervoso / psiquiátrico Doentes Pediátricos 2 a 5 anos de idade (um estudo de 12 semanas; n=461) (um estudo de 48 semanas; n=278) Doentes Pediátricos 6 meses até 2 anos de idade (um estudo de 6 semanas; n=175) dor abdominal sede cefaleias diarreia cefaleias hipercinésia Doenças respiratórias asma Afecções dos tecidos cutâneos e faneras dermatite eczematosa, exantema O perfil de segurança não se alterou com o tratamento prolongado, em estudos clínicos com duração até 2 anos para adultos, e até 12 meses para doentes pediátricos dos 6 aos 14 anos de idade, com um número limitado de doentes. Cumulativamente, 502 doentes pediátricos dos 2 aos 5 anos de idade foram tratados com montelucaste por um período de pelo menos 3 meses, 338 durante 6 meses ou mais e 534 doentes durante 12 meses ou mais. O perfil de segurança nestes doentes também não se alterou com o tratamento prolongado. O perfil de segurança em doentes pediátricos dos 6 meses aos 2 anos de idade não se alterou com o tratamento até 3 meses. Foram muito raramente relatadas as seguintes reacções adversas na utilização pós-comercialização: Corpo em geral: astenia/fadiga, mal-estar, edema, reacções de hipersensibilidade incluindo anafilaxia, angioedema, urticária, prurido, exantema e um caso isolado de infiltração eosinofílica hepática Sistema nervoso/psiquiátrico: tonturas, sonhos anómalos incluindo pesadelos, alucinações, sonolência, insónia, parestesia/hipoestesia, irritabilidade, agitação incluindo comportamento agressivo, nervosismo, convulsões Afecções musculosqueléticas: artralgia, mialgia incluindo cãibras musculares Perturbações do aparelho digestivo: diarreia, xerostomia, dispepsia, náuseas, vómitos Afecções hepatobiliares: níveis aumentados das transaminases séricas AST e ALT, hepatite colestática Perturbações cardiovasculares: aumento da tendência hemorrágica, contusões, palpitações. Foram relatados casos muito raros de Síndrome de Churg-Strauss (CSS) durante o tratamento com montelucaste em doentes asmáticos (ver Secção 4.4). 4.9 Sobredosagem Não está disponível informação específica sobre o tratamento da sobredosagem com montelucaste. Em estudos na asma crónica, o montelucaste foi administrado a doentes em doses até 200 mg/dia, até 22 semanas, e em estudos de curto prazo, até 900 mg/dia, por períodos aproximados de uma semana, sem experiências adversas de importância clínica. Houve relatos de sobredosagem aguda na experiência pós-comercialização e nos estudos clínicos com montelucaste. Estes incluem relatos em adultos e crianças com uma dose de 1000 mg (aproximadamente 61 mg/kg numa criança de 42 meses). Os resultados clínicos e laboratoriais observados foram consistentes com o perfil de segurança em adultos e em doentes pediátricos. Não ocorreram experiências adversas na maioria dos relatos de sobredosagem. As experiências adversas que ocorreram mais frequentemente foram consistentes com o perfil de segurança do montelucaste e incluíram dor abdominal, sonolência, sede, cefaleias, vómitos e hiperactividade psicomotora. Não se sabe se montelucaste é removível por hemodiálise ou diálise peritoneal. 5. PROPRIEDADES FARMACOLÓGICAS 5.1 Propriedades PRODUTO EMB. PVP % ESTADO DOENTE C. UNIT. SING. INFANT. Granulado 4mg SING. INFANT. Granulado 4mg SING. INFANTIL 4mg SING. INFANTIL 4mg SING. JUNIOR 5mg SING. JUNIOR 5mg 20 saque. 28 saque. 14 comp. 28 comp. 14 comp. 28 comp. €31,95 €42,94 €23,66 €42,59 €21,46 €41,56 0% 0% 0% 0% 69% 69% €14,81 €28,67 €31,95 €42,94 €23,66 €42,59 €6.65 €12,88 €1,59 €1,53 €1,69 €1,52 €1,53 €1,48 C.M.T.D. ESTADO DOENTE €1,59 €1,53 €1,69 €1,52 €1,06 €0,47 €1,02 €0,46 farmacodinâmicas Grupo farmacoterapêutico: Antiasmáticos para uso sistémico, Antagonistas dos receptores dos leucotrienos Código ATC: RO3D C03 Os cisteínil-leucotrienos (LTC4, LTD4, LTE4) são potentes agentes inflamatórios eicosanóides, libertados por várias células, incluindo os mastócitos e os eosinófilos. Estes importantes mediadores pró-asmáticos ligam-se a receptores dos cisteínil-leucotrienos (Cys LT) que se encontram nas vias respiratórias humanas e exercem actividade nas vias respiratórias, incluindo broncoconstrição, secreção de muco, permeabilidade vascular e mobilização de eosinófilos. O montelucaste é um composto activo por via oral que se liga com alta afinidade e selectividade ao receptor Cys LT1. Nos ensaios clínicos doses, tão baixas quanto 5 mg de montelucaste inibem a broncoconstrição induzida pelo LTD4 inalado. A broncodilatação foi observada no prazo de 2 horas da administração oral. O efeito broncodilatador causado por um agonista beta foi aditivo ao causado pelo montelucaste. O tratamento com montelucaste inibiu as fases precoce e tardia da broncoconstrição, devido a estimulação antigénica. O montelucaste diminuiu o número de eosinófilos do sangue periférico, nos doentes adultos e pediátricos comparativamente com o placebo. Num estudo separado, o tratamento com montelucaste diminuiu significativamente o número de eosinófilos das vias respiratórias (conforme medições da expectoração). Em doentes adultos e pediátricos de 2 a 14 anos de idade, o montelucaste, em comparação com o placebo, diminuíu o número de eosinófilos do sangue periférico, enquanto se verificavam melhorias no controlo clínico da asma. Em estudos com adultos, montelucaste 10 mg, uma vez por dia, demonstrou melhorias significativas no VEMS matinal (10,4% vs 2,7% em relação aos valores basais), débito expiratório máximo instantâneo (DEMI) matinal (24,5 L/min vs 3,3 L/min em relação aos valores basais), e diminuição significativa no uso total de agonistas beta (-26,1% vs -4,6% em relação aos valores basais), quando comparado com o placebo. Melhorou significativamente os sintomas diurnos e os despertares nocturnos por sintomas relatados pelo doente, quando comparado com o placebo. Estudos em adultos demonstraram a capacidade aditiva de efeitos clínicos de montelucaste com os corticosteróides inalados (alteração percentual em relação aos valores basais para a beclometasona inalada e montelucaste vs beclometasona isolada, respectivamente para VEMS: 5,43% vs 1,04%; uso de agonistas beta: - 8,70% vs 2,64%). Comparado com a beclometasona inalada (200 μg duas vezes por dia, com câmara expansora), o montelucaste demonstrou um início de resposta mais rápido, embora na totalidade das 12 semanas do estudo a beclometasona tivesse um efeito terapêutico global, em média, superior (alteração percentual em relação aos valores basais para o montelucaste vs a beclometasona, respectivamente para VEMS: 7,49% vs 13,3%; uso de agonistas beta: -28,28% vs -43,89%). Contudo, comparativamente com a beclometasona, uma alta percentagem dos doentes tratados com montelucaste teve respostas clínicas semelhantes (por exemplo, 50% dos doentes tratados com beclometasona conseguiram uma melhoria de VEMS de aproximadamente 11% ou mais em relação ao valor basal, enquanto que cerca de 42% dos doentes tratados com montelucaste conseguiram a mesma resposta). Num estudo em doentes pediátricos dos 6 aos 14 anos de idade com a duração de 8 semanas, 5 mg de montelucaste tomado uma vez por dia, melhorou significativamente a função respiratória em comparação com o placebo (alterações do VEMS em relação aos valores basais: 8,71% vs 4,16%; alterações do DEMI matinal em relação aos valores basais: 27,9 L/min vs 17,8 L/min), e promoveu uma diminuição no uso de agonistas beta “usados quando necessário” (-11,7% vs +8,2% em relação aos valores basais). Num estudo com duração de 12 meses que comparou a eficácia do montelucaste com a da fluticasona inalada no controlo da asma em doentes pediátricos dos 6 aos 14 anos de idade com asma persistente ligeira, o montelucaste não foi inferior à fluticasona no aumento da percentagem de dias sem recurso a terapêutica de resgate (DSRTR). Calculando a média sobre o período de 12 meses de tratamento, a percentagem de DSRTR aumentou de 61,6 para 84,0 no grupo do montelucaste e de 60,9 para 86,7 no grupo da fluticasona. A diferença entre grupos no aumento médio de minímos quadrados (MQ) na percentagem de DSRTR foi de -2,8 com um IC 95% de -4,7; -0,9. Quer o montelucaste, quer a fluticasona também melhoraram o controlo da asma no que se refere a parâmetros de avaliação secundários avaliados durante o período de 12 meses de tratamento: O VEMS aumentou de 1,83 l para 2,09 l no grupo do montelucaste e de 1,85 l para 2,14 l no grupo da fluticasona. A diferença entre grupos no aumento médio de MQ no VEMS foi de - 0,02 l com um IC 95% de -0,06; 0,02. O aumento médio relativamente ao valor inicial em % estimada de VEMS foi de 0,6 % no grupo de tratamento do montelucaste e de 2,7% no grupo de tratamento da fluticasona. A diferença nas médias de MQ para a variação relativamente ao valor inicial na % estimada de VEMS foi de -2,2% com um IC 95% de -3,6; -0,7. A percentagem de dias com utilização de agonistas beta diminuiu de 38,0 para 15,4 no grupo do montelucaste e de 38,5 para 12,8 no grupo da fluticasona. A diferença entre grupos nas médias de MQ para a percentagem de dias com utilização de agonistas beta foi de 2,7 com um IC 95 % de 0,9; 4,5. A percentagem de doentes com um ataque de asma (sendo um ataque de asma definido por um período de agravamento da asma que necessita de tratamento com esteróides orais, uma visita não planeada ao consultório médico, uma vista ao serviço de urgência ou hospitalização) foi de 32,2 no grupo do montelucaste e de 25,6 no grupo da fluticasona; sendo a razão de vantagem (IC 95%) igual a 1,38 (1,04; 1,84). A percentagem de doentes com utilização de corticosteróides sistémicos (sobretudo orais) durante o período de estudo foi de 17,8% no grupo do montelucaste e de 10,5% no grupo da fluticasona. A diferença entre grupos nas médias de MQ foi de 7,3% com um IC 95% de 2,9; 11,7. Num estudo de 12 semanas, controlado com placebo em doentes pediátricos dos 2 aos 5 anos de idade, 4 mg de montelucaste, uma vez por dia melhorou os parâmetros de controlo da asma, em comparação com o placebo, independentemente do uso de terapêutica de controlo concomitante (corticosteróides inalados/nebulizados ou cromoglicato de sódio inalado/nebulizado). Sessenta por cento dos doentes não estavam sob qualquer outra terapêutica de controlo. O montelucaste melhorou significativamente os sintomas diurnos (incluindo tosse, respiração difícil e ruidosa, dificuldades respiratórias e limitações da actividade) e os sintomas nocturnos, em comparação com o placebo. O montelucaste também diminuíu a utilização de agonistas beta de actuação rápida “usados quando necessário” e a necessidade de recorrer a corticosteróides devido a agravamento da asma, em comparação com o placebo. Os doentes a tomar montelucaste permaneceram mais dias sem asma do que aqueles que tomaram placebo. Foi obtido efeito terapêutico após a primeira administração. Num estudo de 12 meses, controlado com placebo em doentes pediátricos dos 2 aos 5 anos de idade com asma ligeira e exacerbações episódicas, o montelucaste 4 mg administrado uma vez por dia reduziu significativamente (p)0,001) a taxa anual de episódios de exacerbação (EE) de asma, em comparação com o placebo (respectivamente 1,60 EE vs. 2,34 EE) [EE definidas por * 3 dias consecutivos com sintomas diurnos com necessidade de utilização de agonistas beta, ou de corticosteróides (orais ou inalados), ou de hospitalização para tratamento da asma]. A percentagem de redução na taxa anual de EE foi de 31,9% com um IC 95% de 16,9; 44,1. A eficácia do montelucaste é suportada em doentes pediátricos dos 6 meses aos 2 anos de idade através da extrapolação da eficácia demonstrada em doentes asmáticos com idade igual ou superior a 2 anos, e com base nos semelhantes dados farmacocinéticos, assim como no pressuposto de que a evolução da doença, a patofisiologia e o efeito do fármaco são substancialmente semelhantes nestas populações. Foi demonstrada num estudo com adultos com a duração de 12 semanas uma redução significativa da broncoconstrição induzida pelo exercício (BIE) (queda máxima do VEMS 22,33% para o montelucaste vs 32,40% para o placebo; tempo de recuperação dentro de 5% dos valores basais VEMS 44,22 minutos vs 60,64 minutos). Este efeito foi consistente ao longo do período de 12 semanas do estudo. A redução do BIE foi também demonstrada num estudo de curta duração em doentes pediátricos de 6 a 14 anos (queda máxima do VEMS 18,27% vs 26,11%; tempo de recuperação dentro de 5% dos valores basais VEMS 17,76 minutos vs 27,98 minutos). O efeito em ambos os estudos foi demonstrado no final do intervalo da dose diária. Em doentes asmáticos sensíveis ao ácido acetilsalicílico, a fazer terapêutica concomitante com corticosteróides inalados e/ou orais, o tratamento com montelucaste, em comparação com o placebo, resultou numa melhoria do controlo da asma (alteração do VEMS 8,55% vs -1,74% em relação aos valores basais e diminuição do uso total de agonistas beta -27,78% vs 2,09% em relação aos valores basais). 5.2 Propriedades farmacocinéticas Absorção O montelucaste é rapidamente absorvido após administração oral. Para o comprimido revestido de 10 mg, as concentrações plasmáticas máximas (Cmax) são em média conseguidas em 3 horas (Tmax) após administração a adultos em jejum. A biodisponibilidade oral é em média de 64%. A biodisponibilidade oral e a Cmax não são influenciadas por uma refeição comum. A segurança e eficácia foram demonstradas em estudos clínicos em que o comprimido revestido de 10 mg foi administrado independentemente do horário de refeições. Para o comprimido para mastigar de 5 mg, a Cmax é atingida 2 horas após a administração a adultos em jejum. A biodisponibilidade oral é, em média, de 73% e desce para 63% com uma refeição comum. Após administração do comprimido para mastigar de 4 mg a doentes pediátricos dos 2 aos 5 anos de idade em jejum, a Cmax é atingida 2 horas após a administração. A Cmax média é 66 % superior, enquanto que a Cmin média é inferior à dos adultos a tomar o comprimido de 10 mg. A formulação de granulado de 4 mg é bioequivalente à do comprimido para mastigar de 4 mg, quando administrada em jejum a adultos. Em doentes pediátricos dos 6 meses aos 2 anos de idade, a Cmáx é atingida 2 horas após a administração da formulação de granulado de 4 mg. A Cmáx é quase 2 vezes superior à dos adultos que tomam o comprimido de 10 mg. A administração do granulado com de puré de maçã ou com uma refeição normal rica em gorduras não teve qualquer efeito clinicamente significativo na farmacocinética do montelucaste, tal como determinado pela AUC (respectivamente de 1225,7 vs 1223,1 ng.h/ml com e sem puré de maçã, e respectivamente de 1191,8 vs 1148,5 ng.h/ml com e sem uma refeição normal rica em gorduras. Distribuição Mais de 99% do montelucaste liga-se às proteínas plasmáticas. O volume de distribuição do montelucaste é de 8 a 11 litros, no estado de equilíbrio. Estudos feitos em ratos com montelucaste radiomarcado, apontam para uma distribuição mínima além da barreira hemato-encefálica. Por outro lado, às 24 horas após a dose, eram mínimas as concentrações de material radiomarcado em todos os outros tecidos. Biotransformação O montelucaste é largamente metabolizado. Em estudos com doses terapêuticas, as concentrações plasmáticas de metabolitos do montelucaste são indetectáveis na fase de equilíbrio, quer em adultos, quer em crianças. Estudos in vitro, usando microssomas de fígado humano, indicam que os citocromos P450 3A4, 2A6 e 2C9 estão envolvidos no metabolismo do montelucaste. Com base em ulteriores resultados in vitro, obtidos com microssomas de fígado humano, conclui-se que concentrações plasmáticas terapêuticas de montelucaste não inibem os citocromos P450 3A4, 2C9, 1A2, 2A6, 2C19 ou 2D6. A contribuição dos metabolitos para o efeito terapêutico do montelucaste é mínima. Eliminação A depuração plasmática do montelucaste é, em média, de 45 ml/min, em adultos saudáveis. Após uma dose de montelucaste radiomarcado, 86% da radioactividade é recuperada nas fezes recolhidas durante 5 dias e é recuperada na urina < 0,2%. Combinados com estimativas da biodisponibilidade oral, estes dados indicam que o montelucaste e os seus metabolitos são quase exclusivamente excretados por via biliar. Características nos Doentes Não são necessários ajustes posológicos para os idosos, ou para os doentes com insuficiência hepática ligeira a moderada. Não foram realizados estudos em doentes com insuficiência renal. Dado que o montelucaste e os seus metabolitos são eliminados pela via biliar, não se prevê que sejam necessários acertos posológicos em doentes com insuficiência renal. Não há dados sobre a farmacocinética do montelucaste em doentes com insuficiência hepática grave (pontuação > 9 na escala de Child-Pugh). Foi observada uma diminuição na concentração de teofilina plasmática com doses elevadas de montelucaste (20 e 60 vezes a dose recomendada para adultos). Este efeito não foi observado com doses recomendadas de 10 mg uma vez por dia. 5.3 Dados de segurança pré-clínica Em estudos de toxicidade animal, foram observadas ligeiras alterações de TGP (ALT), glicose, fósforo e triglicéridos, de natureza transitória. Os sinais de toxicidade animal foram: aumento de excreção de saliva, sintomas gastro-intestinais, fezes moles e desequilíbrio iónico. Estes fenómenos ocorreram com doses >17 vezes a exposição sistémica verificada com a dose clínica. Em macacos, os efeitos adversos apareceram com doses de 150 mg/Kg/dia (> 232 vezes a exposição sistémica verificada com a dose clínica). Em estudos com animais, montelucaste não afectou a fertilidade nem a capacidade reprodutora com uma exposição sistémica que excedeu 24 vezes a exposição sistémica clínica. Verificou-se uma ligeira redução no peso corporal das crias no estudo de fertilidade efectuado em ratos fêmea com doses de 200 mg/kg/dia (>69 vezes a exposição sistémica clínica). Em estudos com coelhos, verificou-se uma maior incidência de ossificação incompleta, em comparação com os controlos dos outros animais, com uma dose sistémica >24 vezes a exposição sistémica clínica vista com doses clínicas. Não foram verificadas anomalias em ratos. Foi demonstardo que o montelucaste atravessa a barreira placentária e é excretado no leite mamário de animais. Não ocorreram mortes após uma administração oral única de montelucaste sódico em doses até 5000 mg/kg, em ratinhos e ratos (15.000 mg/m2 e 30.000 mg/m2 em ratinhos e ratos, respectivamente) que corresponde à dose máxima testada. Esta dose é equivalente a 25.000 vezes a dose diária recomendada no adulto humano (com base num peso de 50 kg do doente adulto). Foi determinado que o montelucaste não é fototoxico em ratinhos usando UVA, UVB ou espectro de luz visível com doses até 500 mg/kg/dia (aproximadamente >200 vezes com base na exposição sistémica). O montelucaste não foi nem mutagénico nos testes in vitro e in vivo, nem tumorigénico em várias espécies de roedores. 6. INFORMAÇÕES FARMACÊUTICAS 6.1. Lista dos excipientes Granulado: Manitol, hidroxipropilcelulose e estearato de magnésio. Comprimidos para mastigar: Manitol, celulose microcristalina, hidroxipropilcelulose, óxido vermelho de ferro (E172), croscarmelose sódica, aroma de cereja, aspartamo e estearato de magnésio. 6.2 Incompatibilidades Não aplicável. 6.3 Prazo de validade 3 anos. 6.4 Precauções especiais de conservação Conservar na embalagem de origem. 6.5 Natureza e conteúdo do recipiente Granulado: Embalado em saqueta de polietileno/alumínio/poliéster em embalagens de: 7, 20, 28 e 30 saquetas. Comprimidos para mastigar: Embalado em blister de poliamida/PVC/alumínio em: Blisters (com indicação dos dias da semana), em embalagens de: 7, 14, 28, 56, 98 e 140 comprimidos. Blisters (sem indicação dos dias da semana), em embalagens de: 10, 20, 28, 30, 50, 100 e 200 comprimidos. Blisters (doses unitárias), em embalagens de: 49, 50 e 56 comprimidos. É possível que não sejam comercializadas todas as apresentações. 6.6 Instruções de utilização e manipulação Não existem requisitos especiais. 7. TITULAR DA AUTORIZAÇÃO DE INTRODUÇÃO NO MERCADO Merck Sharp & Dohme, Lda. Quinta da Fonte, Edifício Vasco da Gama (19), P.O. Box 214, Porto Salvo, 2770-192 Paço de Arcos 8. NÚMERO(S) DA AUTORIZAÇÃO DE INTRODUÇÃO NO MERCADO SINGULAIR® Infantil 4 mg Granulado 4314787 - 28 saquetas; SINGULAIR® Infantil 4 mg comprimido para mastigar 3502382 - Embalagem de 14 comprimidos (com indicação dos dias da semana); 3502481 - Embalagem de 28 comprimidos (com indicação dos dias da semana) SINGULAIR® Junior 5 mg comprimido para mastigar 2639987 - Embalagem de 14 comprimidos (com indicação dos dias da semana); 2640084 - Embalagem de 28 comprimidos (com indicação dos dias da semana) 9. DATA DA PRIMEIRA AUTORIZAÇÃO/RENOVAÇÃO DA AUTORIZAÇÃO DE INTRODUÇÃO NO MERCADO Comprimidos para mastigar: 31 de Julho de 2002 (Renovação) Granulado: 19 de Fevereiro de 2003 10.DATA DA REVISÃO DO TEXTO 27 Novembro 2006 % ESTADO DOENTE C. UNIT. 0% 0% 0% 0% 84% 84% - €31,95 €42,94 €23,66 €42,59 €3,43 €6,65 €1,59 €1,53 €1,69 €1,52 €1,53 €1,48 €18,03 €34,91 C.M.T.D. ESTADO DOENTE €1,59 €1,53 €1,69 €1,52 €1,29 €0,24 €1,25 €0,24
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