3 Vol XVI 2007 - Revista Nascer e Crescer

Transcrição

3 Vol XVI 2007 - Revista Nascer e Crescer
NASCER E CRESCER
Vol. 16, nº 3, Setembro 2007
16
3
Revista do Hospital de Crianças Maria Pia
Ano | 2007 Volume | XVI Número | 03
www.hmariapia.min-saude.pt
Directora | Sílvia Álvares; Directora Adjunta | Inês Moreira;
Director do Hospital de Crianças Maria Pia | José Alberto Peixoto
Corpo Redactorial | Amélia José; Ana Cristina Cunha;
Artur Alegria; Carlos Enes; Carmen Carvalho; Conceição Mota;
Esmeralda Martins; Inês Lopes; Laura Marques; Margarida Guedes;
Maria do Carmo Santos; Miguel Coutinho
Editores especializados | Artigo Recomendado – Maria do Carmo
Santos; Tojal Monteiro. Perspectivas Actuais em Bioética – Natália Teles.
Pediatria Baseada na Evidência – Luís Filipe Azevedo; Altamiro da Costa
Pereira. Ciclo de Pediatria Inter-Hospitalar do Norte – Rogério Mendes;
Helena Jardim; Virgílio Senra; Fernanda Manuela Costa; Jorge Sales
Marques; Armando Pinto; Cidrais Rodrigues; Joaquim Cunha. Caso
Endoscópico – Fernando Pereira. Caso Estomatológico – José Amorim.
Genes, Crianças e Pediatras – Margarida Reis Lima. Imagens – Filipe
Macedo. Pequenas Histórias – Margarida Guedes.
Conselho Técnico | Cristina Soares; Gama de Sousa; Lígia Carvalho;
Rui Nogueira
Secretariado Administrativo | Carla Correia
Publicação trimestral resumida e indexada por | EMBASE /
Excerpta Médica; Catálogo LATINDEX
Design gráfico | bmais comunicação
Execução gráfica e paginação I Papelmunde, SMG, Lda
Vila Nova de Famalicão
ISSN | 0872-0754
Depósito legal | n° 4346/91, anotada no Ministério da Justiça em
92.04.24
Tiragem | 2.500 exemplares
Autorização CTT | DE 0005/2005 DCN
Propriedade, Edição e Administração |
Hospital de Crianças Maria Pia
Rua da Boavista, 827 – 4050-111 Porto;
tel: 226 089 900; fax: 226 000 841; www.hmariapia.min-saude.pt
Os trabalhos, a publicidade e a assinatura, devem ser dirigidos a I
Coordenação da revista Nascer e Crescer
Hospital de Crianças Maria Pia
Rua da Boavista, 827 – 4050-111 Porto;
tel: 226 089 988; email: [email protected]
Condições de assinatura | Anual 2007 (4 números) - 35 euros;
Número avulso - 10 euros; Estrangeiro - 70 euros
Conselho Científico Nacional
Conselho Científico Internacional
- Adelaide Justiça;
- Agustina Bessa Luís;
- Alfredina Guerra e Paz;
- Álvaro Aguiar;
- Carlos Duarte;
- Carmen Santos;
- Clara Barbot;
- Cidade Rodrigues;
- Damião Cunha;
- Eloi Pereira;
- Fátima Praça;
- Fernanda Teixeira;
- Filomena Caldas;
- Herculano Rocha;
- José Carlos Areias;
- José Maria Ferronha;
- José Oliveira Simões;
- José Pombeiro;
- Lourenço Gomes;
- Lucília Norton;
- Lurdes Lima;
- Luís Januário;
- Luís Lemos;
- Luzia Alves;
- Manuel Dias;
- Manuel Rodrigues Gomes;
- Manuela Machado;
- Manuel Strech Monteiro;
- Marcelo Fonseca;
- Margarida Medina;
- Maria Augusta Areias;
- Maria Salomé Gonçalves;
- Morais Barbot;
- Miguel Taveira;
- Nuno Grande;
- Octávio Cunha;
- Paulo Mendo;
- Raquel Alves;
- Rui Carrapato;
- Maximina Pinto;
- Sílvia Álvares;
- Sodré Borges;
-Tojal Monteiro.
- Allan de Broca (Amiens);
- Anabelle Azancot (Paris);
- D. L. Callís (Barcelona);
- F. Ruza Tarrio (Madrid);
- Francisco Alvarado Ortega (Madrid);
- George R. Sutherland (Edinburgh);
- Harold R. Gamsu (Londres);
- J. Bois Oxoa (Barcelona);
- Jean François Chateil (Bordeaux);
- José Quero (Madrid);
- Juan Tovar Larrucea (Madrid);
- Juan Utrilla (Madrid);
- Peter M. Dunn (Bristol)
Correspondentes
- Almerinda Pereira (H.Braga)
- António Lima (H.0. Azeméis);
- Arelo Manso (H.Vila Real);
- Arlindo Oliveira (H.Ovar);
- Dílio Alves (H.P.Hispano);
- Ferreira da Silva (H.Régua);
- Gama Brandão (Guimarães);
- Gonçalves Oliveira (H.Famalicão)
- Gualdino Silva (H.Barcelos);
- Guimarães Dinis (H.S.Tirso);
- Henedina Antunes (H.Braga);
- Joana Moura (H.Viana do Castelo);
- Jorge Moreira (C.H.Póvoa Varzim/ Vila do
Conde);
- José Carlos Sarmento (C.H.Vale Sousa);
- José Castanheira (H.Viseu);
- Lopes dos Santos (H.P.Hispano);
- Manuel Reis (H.Amarante);
- Óscar Vaz (H.Mirandela);
- Pedro Freitas (H. Guimarães);
- Reis Morais (H.Chaves);
- Ricardo Costa (H.Covilhã);
- Ventura Martins (H.Lamego
FUNDADA EM 1882
Rua da Boavista, 713 – 4050-110 PORTO
Tel. 222 081 050
[email protected]
Somos a Entidade Promotora do Voluntariado
e Suporte da Humanização do Hospital
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
índice
ano 2007, vol XVI, n.º 3
número3.vol.XVI
119 Editorial
Sílvia Álvares
120 Artigos Originais
Como São os Adolescentes de 13 Anos em Ermesinde.
Exame Global de Saúde numa Escola Secundária
S. Lira, E. Teixeira, C. Santos Silva, C. Valente
124 Casos Clínicos
A Tríade Clássica de uma Doença ainda Actual
Catarina Sousa, Micaela Guardiano, Cíntia Correia, Carla Rego, Fátima Ferreira
128
Gastroenterite por Salmonela em Recém-nascido
Ermelinda Ferreira, Anabela João, Leonor Ferraz
130 Artigo Recomendado
Tojal Monteiro
Maria do Carmo Santos
135 Pediatria Baseada na Evidência
Formulação de Questões e Pesquisa Bibliográfica
Luís Filipe Azevedo, Altamiro da Costa Pereira
142 Qual o seu Diagnóstico?
Caso Endoscópico
Fernando Pereira
144
Caso Estomatológico
José M. S. Amorim
148
Imagens
Filipe Macedo
150
Genes, Crianças e Pediatras
Cristina Dias, Manuela Santos, Manuela Vilarinho,
Rosário Santos, Ana Maria Fortuna, Margarida Reis Lima
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Reunião do Hospital de Crianças
S153 XIX
Maria Pia – Resumo das Intervenções
S154
Hipertensão Arterial – mesa redonda
Métodos de Avaliação de Tensão Arterial e Interpretação dos Resultados
Conceição Mota, Cármen do Carmo, Sílvia Álvares, Elói Pereira
S158
Abordagem da Criança e Adolescentes Hipertensos
António Jorge M. Correia
S168
Factores de Risco Cardiovascular: Prevenção desde a Infância
Cármen do Carmo, Conceição Mota, Elói Pereira
S173
Imagem na Avaliação do Sistema Nervoso
Central: Implicações no Prognóstico – mesa
Imagem na Avaliação do Sistema Nervoso Central:
redonda
Implicações no Prognóstico – papel da ecografia no diagnóstico pré-natal
Maria do Céu Rodrigues
S178
Tratamento da Diabetes – mesa redonda
Diabetes Mellitus Tipo 1 e Doenças Associadas
Marcelo Fonseca
S179
Diabetes na Adolescência
Olinda Marques
S181
Toxina Botulínica: Aplicações Terapêuticas na
Criança – mesa redonda
Aplicações Terapêuticas da Toxina Botulínica nas Distonias
Inês Carrilho
S184
Toxina Botulínica na Paralisia Cerebral
Rosa Amorim
S186
Toxina Botulínica: Aplicações Terapêuticas na Criança com
Disfunções Miccionais
Miguel Silva Ramos
S188
Toxina Botulínica: Aplicações Terapêuticas em Oftalmologia Pediátrica
Rosário Varandas
S191
Estudos Interinstitucionais – mesa redonda
S193
S204
Resumo das Comunicações Orais
Pneumonia Aguda da Comunidade de Evolução Complicada
Ana Ramos, Isabel Guerra, Telma Barbosa, Conceição Silva,
Cristina Ferreira, Guilhermina Reis
Resumo dos Posters
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
summary
ano 2007, vol XVI, n.º 3
number3.vol.XVI
119 Editorial
Sílvia Álvares
120 Original Articles
Health state of adolescents in a High School in Ermesinde
– the Global Health Exam
S. Lira, E. Teixeira, C. Santos Silva, C. Valente
124 Clinical Cases
Classical Clinical Findings of a Still Present Disease
Catarina Sousa, Micaela Guardiano, Cíntia Correia, Carla Rego, Fátima Ferreira
128
Salmonella Gastroenteritis in the Newborn
Ermelinda Ferreira, Anabela João, Leonor Ferraz
130 Recommended Article
Tojal Monteiro
Maria do Carmo Santos
135 Evidence Based Paediatrics
The Formulation of Clinical Questions and Searching for the Current Best Evidence
Luís Filipe Azevedo, Altamiro da Costa Pereira
142 What is your Diagnosis?
Endoscopic case
Fernando Pereira
144
Oral Pathology case
José M. S. Amorim
148
Images
Filipe Macedo
150
Genes, Children and Paediatricians
Cristina Dias, Manuela Santos, Manuela Vilarinho,
Rosário Santos, Ana Maria Fortuna, Margarida Reis Lima
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Meeting of Children’s Hospital
S153 XIX
Maria Pia - Abstracts
S154
Techniques of Blood Pressure Measurement and Interpretation of its Values
Conceição Mota, Cármen do Carmo, Sílvia Álvares, Elói Pereira
Arterial Hypertension in childhood and
Adolescence– round table
S158
Clinical Management
António Jorge M. Correia
S168
Cardiovascular Risk Factors – Prevention in Childhood
Cármen do Carmo, Conceição Mota, Elói Pereira
S173
Imaging the Central Nervous System :
S178
Treatment of Diabetes – round table
Role of the Echography in Prenatal Diagnosis
Maria do Céu Rodrigues
Implications for the Prognosis – round table
Diabetes Mellitus Type 1 and Associated Diseases
Marcelo Fonseca
S179
Diabetes in Adolescence
Olinda Marques
S181
Botulínum Toxin: Therapeutic applications in
childhood – round tablea
In Muscular Dystony
Inês Carrilho
S184
In Cerebral Palsy
Rosa Amorim
S186
In Urinary Disfunction
Miguel Silva Ramos
S188
In Pediatric Ophtalmology
Rosário Varandas
S191
Multicentric studies – round table
S193
S204
Free Papers – Abstracts
Acute Community-acquired Pneumonia with a Complicated Course
Ana Ramos, Isabel Guerra, Telma Barbosa, Conceição Silva,
Cristina Ferreira, Guilhermina Reis
Posters – Abstracts
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
editorial
O Hospital de Crianças Maria Pia realiza este ano a XIX Reunião Anual, em
colaboração com os Serviços de Pediatria da Região Norte do País. Neste evento
pretendemos reunir todos os profissionais de Saúde que se dedicam à Criança,
desde a concepção à vida adulta.
O Programa Científico foi elaborado tendo em conta temas de interesse actual
e que simultaneamente constituíssem avanços nas diversas áreas da Pediatria.
Irão estar em discussão as “Novas Técnicas Cirúrgicas”, a ”Hipertensão Arterial”, a “Imagem na Avaliação do Sistema Nervoso Central”, o “Tratamento da
Diabetes”, as “Aplicações Terapêuticas da Toxina Botulínica” e a “Resistência Bacteriana aos Antibióticos em Portugal”.
Temos também uma Sessão Clínica Interactiva, que apela ao dinamismo e
participação dos congressistas, com a apresentação de casos clínicos.
Para além de Sessões de Comunicações Livres que irão permitir a discussão
de casos clínicos complexos e a troca de experiência de vários serviços relativamente a diferentes patologias, decorrerá ainda um Curso Satélite sobre “Dor em
Pediatria”, um tema de interesse crescente e que abordará também a estruturação
de Unidades de Dor.
Salientamos ainda a apresentação dos Estudos Interinstitucionais sobre
“Diabetes Inaugural”, “Pneumonias de Evolução Complicada” e “Triagem de Manchester”, os quais demonstram bem o trabalho de equipa que estas reuniões
representam.
Foi nosso objectivo desenvolver o aspecto de multidisciplinaridade na Pediatria, congregando Pediatras e Especialistas de outras áreas do conhecimento para
permitir um amplo debate e uma visão estratégica da doença na Criança.
Esta Reunião não seria possível sem o apoio da liga de Amigos, da Associação do hospital de Crianças Maria Pia bem como das empresas farmacêuticas, o
qual agradecemos reconhecidos.
Do mesmo modo agradecemos o entusiasmo e empenho dos organizadores colaboradores e conferencistas, factores fundamentais para o sucesso desta
reunião.
Silvia Álvares
editorial
119
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Como são os adolescentes de 13 anos em
Ermesinde. Exame global de saúde numa escola
S. Lira1, E. Teixeira2, C. Santos Silva2, C. Valente2
RESUMO
Introdução e objectivo: As idades
que compreendem a adolescência são as
mais ausentes dos cuidados pediátricos.
A Direcção Geral de Saúde prevê a realização de um Exame Global de Saúde
entre os 11 e os 13 anos, que raras vezes
é realizado no Centro de Saúde.
Material e métodos: Os autores
deslocaram-se à Escola Secundária de
Ermesinde para a realização de um exame global de saúde aos alunos entre os
11 e 13 anos. Analisaram-se os seguintes
parâmetros: estado de saúde, índice de
massa corporal, tensão arterial, incidência de cáries dentárias e défice da acuidade visual. Posteriormente os alunos
responderam a questões relacionadas
com hábitos de vida saudáveis.
Resultados: Dos jovens avaliados,
58% eram do sexo feminino e 42% do
sexo masculino. O índice de massa corporal médio para as raparigas foi de 21,2
e para os rapazes foi de 19,9. Cerca de
20% dos rapazes e 20,6% das raparigas
tinham excesso de peso, perfazendo
20,5% do total da amostra. Como obesos consideraram-se 6,6% dos rapazes
e 7,9% das raparigas, num total de 7,5%
da população estudada. A média da tensão arterial sistólica foi semelhante para
os dois sexos, situando-se no P75 para a
idade. No exame da dentição 33% tinham
cáries ainda não tratadas.
Quanto às questões sobre hábitos
de vida, 48% afirmam praticar regularmente desporto, 83% têm bons hábitos
de higiene oral e 32% já experimentaram
fumar. O tempo médio dispendido diaria-
__________
¹ Interna Complementar de Pediatria do Hospital Padre Américo - Vale do Sousa;
2
Centro de Saúde de Ermesinde
120
artigos originais
mente frente ao computador foi de 1,25 h
e frente à televisão foi de 2,6 h.
Comentários: A caracterização
desta população permite uma intervenção orientada da Saúde Escolar de educação para estilos de vida saudáveis.
Palavras-chave: adolescência,
exame global saúde, saúde escolar
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 120-123
INTRODUÇÃO
As idades que compreendem a adolescência são as mais ausentes dos cuidados pediátricos, quer pela menor incidência de morbilidade de causa intrínseca,
quer pela dificuldade que existe em levar o
adolescente ao médico, principalmente se
este for “médico de crianças”. No entanto,
será talvez esta a última oportunidade de
modelar uma consciência para a Saúde,
criando e incentivando estilos de vida saudáveis. Muita da patologia do adulto pode
ser identificada e orientada, sendo assim
prevenida, nesta altura. É também neste
período que se torna fundamental oferecer um espaço, no qual possam ser respondidas as questões e esclarecidas as
dúvidas que caracterizam esta idade.
A Direcção Geral de Saúde prevê
para este momento a realização do segundo Exame Global de Saúde, entre os
11 e os 13 anos, sendo o primeiro efectuado entre os 5-6 anos e obrigatório para
o ingresso da criança no 1º ano de escolaridade. Pelos motivos já expostos, a
taxa de cobertura da população inscrita
no Centro de Saúde, nesta faixa etária,
é sempre inferior à desejada. Assim pretende-se com este trabalho, levar o médico até ao adolescente e avaliar as características de uma amostra de alunos da
Escola Secundária de Ermesinde, pela
realização do Exame Global de Saúde na
própria escola e em horário integrado nas
actividades curriculares.
OBJECTIVOS
Aumentar a percentagem de alunos
entre os 11 e 13 anos, inscritos no Centro de Saúde de Ermesinde, com Exame
Global de Saúde (um dos objectivos da
Saúde Escolar exposto no Plano de Acção 2003 do Centro de Saúde).
Avaliar e caracterizar uma amostra
da população da Escola Secundária de
Ermesinde quanto a: índice de massa
corporal, tensão arterial, incidência de
cáries dentárias e défice da acuidade visual. Foi também objectivo dos autores,
identificar alterações no exame físico e
orientar problemas para consultas a realizar posteriormente no Centro de Saúde
após informação aos pais.
Conhecer a percentagem de alunos
vacinados com as vacinas extra calendário vacinal, ou seja, sujeitas a prescrição
médica.
Finalmente, pretendeu-se caracterizar os hábitos dos adolescentes desta
faixa etária, pela formulação de algumas
questões baseadas nos cuidados antecipatórios, previstos pela Direcção Geral
de Saúde aquando da realização do Exame Global de Saúde.
DESCRIÇÃO DO ESTUDO
Realizou-se um estudo descritivo e
transversal.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram convidadas a participar neste trabalho algumas turmas do 7º ano de
escolaridade da Escola Secundária de
Ermesinde, escolhidas por conveniência de horário: turmas que estivessem
na aula de Educação Física ou na Área
Escola, durante o período de funciona-
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
mento do Gabinete de Saúde que era
assegurado pelo Centro de Saúde de
Ermesinde.
Foi realizado o Exame Global de
Saúde a 107 alunos de 13 anos, sendo
elaborada uma folha de registo individual.
Posteriormente cada consulta foi validada no sistema informático do Centro de
Saúde.
Após a consulta, os alunos foram
convidados a responder a um questionário anónimo de resposta rápida, que
pretendia conhecer hábitos que correspondiam aos cuidados antecipatórios
previstos aquando da realização do Exame Global de Saúde.
Para avaliação antropométrica foi
utilizada uma fita métrica com escala em
centímetros e uma balança com aproximação a 100g. A avaliação da acuidade
visual foi efectuada utilizando uma escala
decimal. A tensão arterial foi medida no
membro superior direito e confirmada no
membro superior esquerdo, sempre que
se ofereciam dúvidas, utilizando o método oscilométrico.
O cumprimento do Plano Nacional
de Vacinação e as restantes vacinas
efectuadas foram avaliados pela observação do Boletim de Vacinas, trazido pelos alunos.
Sempre que foi identificado qualquer problema a necessitar de orientação, foi feita uma marcação de consulta
no Centro de Saúde e comunicada aos
pais, bem como o motivo desta, através
de um impresso de que os alunos eram
portadores.
RESULTADOS
Dos jovens avaliados, 58% eram do
sexo feminino e 42% do sexo masculino.
O índice de massa corporal (IMC) médio
para as raparigas foi de 21,16 e para os
rapazes foi de 19,88 ou seja, respectivamente P75 e P50-75 para a idade. Considerando como excesso ponderal um IMC
> P85, encontraram-se nestas condições
20% dos rapazes e 20,6% das raparigas,
perfazendo 20,5% do total da amostra.
Como obesos consideraram-se os que
ultrapassavam o P95, cumprindo este
critério 6,6% dos rapazes e 7,9% das raparigas, num total de 7,5% da população
estudada.
A média da tensão arterial sistólica (TAS) foi semelhante para os dois
sexos, situando-se no P75 para a idade
(116 mmHg). A média da tensão arterial
diastólica (TAD) foi de 70 mmHg para os
rapazes e de 68 mmHg para as raparigas
(P50-75). Foram identificados 15 alunos
com TAS > P95 (14%), correspondendo
provavelmente à denominada “hipertensão da bata branca”.
Foi considerado défice da acuidade visual uma avaliação menor ou igual
a 6/10. Para além dos alunos que usam
habitualmente correcção (26%), foram
identificados e referenciados 6 (6%).
No exame da dentição, 33% da população observada apresentava cáries
ainda não tratadas, sendo de salientar
que 13% usavam qualquer tipo de prótese para correcção.
Após a realização do exame objectivo, foram identificados outros problemas
a necessitarem de orientação, para além
dos supra mencionados, em 2 situações
(1,87%) – sopro cardíaco e obesidade
(IMC 33).
Da análise do boletim de vacinas,
apenas foi identificado 1 aluno cujo PNV
não se encontrava actualizado. No que
diz respeito às vacinas administradas
por prescrição médica, apenas 16%
tinham feito a imunização contra o meningococo C e 6,5% contra o vírus da
hepatite A. A ausência de alunos com
vacina anti-pneumocócica justifica-se
pela faixa etária analisada e pela ausência de adolescentes pertencentes
a grupos de risco nos quais a vacina
estaria indicada.
O inquérito aplicado posteriormente ao exame objectivo, foi baseado nos
cuidados antecipatórios previstos pela
Direcção Geral de Saúde neste momento
de consulta.
Em relação à prática de desporto,
foram consideradas como afirmativas
as respostas que indicavam um período semanal igual ou superior a 2 horas.
Apenas 48% respondeu nestas condições.
Questionados quanto aos hábitos
de higiene oral, 46% afirmaram lavar os
dentes 2 vezes por dia, 37% lavam 3 ou
mais vezes por dia e os restantes apenas
1 vez.
Às perguntas relacionadas com os
afectos, 88% responderam que gostam
de frequentar a escola, embora apenas
43% afirmem gostar de estudar. Dos inquiridos, apenas 6% dizem não se sentirem apoiados pelas famílias e todos
consideram ter amigos com “A” grande
(sendo explicado que com esta expressão, pretendia-se que nomeassem apenas os amigos com uma relação mais
estreita), embora 30% indicarem ter mais
de 5 amigos nessas condições.
Os hábitos potencialmente nocivos
foram avaliados com questões sobre
o tempo diário dispendido em frente ao
computador, cuja média foi de 1 hora e
um quarto, e em frente à televisão, em
média 2,6 horas.
Finalmente a questão foi se já alguma vez tinham experimentado fumar, ao
que 32% responderam afirmativamente
(37% das raparigas e 24% dos rapazes).
A abordagem do contacto com bebidas
alcoólicas e drogas de abuso não foi
possível pela escassez de tempo para
responder às questões e pelo facto de os
alunos estarem em grupo, embora fossem dados importantes na orientação de
eventuais intervenções.
DISCUSSÃO
A adolescência é o período de
maior ausência nos cuidados de saúde
primários. Apesar de elevada morbilidade, esta é principalmente de causa externa nestas idades, e não existe ainda
a preocupação com o estado de saúde individual, que motivem os jovens à
realização de exames periódicos. No
entanto, é essencial perceber que será
esta a última oportunidade de modelar
uma consciência para a saúde, promovendo estilos de vida saudáveis, muito
condicionados pelas opções que se
fazem nesta altura (1). É também neste
período que se torna fundamental oferecer um espaço, no qual possam ser
respondidas as questões e esclarecidas as dúvidas que caracterizam esta
idade.
O Gabinete de Saúde da Escola
Secundária de Ermesinde pretende ser
esse espaço e a realização de Exames
Globais de Saúde num ambiente informal mas privado, pretendeu aproximar
artigos originais
121
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
os jovens dos cuidados de saúde, desmistificando a personagem do médico
como autoritário, disciplinador e inacessível.
A obesidade infantil é consensualmente considerada uma epidemia fora
de controle quer na Europa quer nos Estados Unidos(2,3,4). Calcula-se que cerca
de 50 a 80% dos adolescentes obesos
serão adultos obesos(3), sendo por isso
muito importante avaliar esta faixa etária
para poder intervir. Portugal foi considerado um dos países com maior prevalência de excesso ponderal, juntamente
com a Grécia, Irlanda e Estados Unidos,
num estudo que envolveu mais 10 países
europeus e que avaliou adolescentes de
13 e de 15 anos(3). A nossa amostra apresenta valores de prevalência de excesso
ponderal de 20% vs 12,5 % no sexo masculino e 20,6% vs 22,8% no sexo feminino. A prevalência da obesidade foi de
6,6% vs 3,5% para os rapazes e 7,9% vs
8,3% para as raparigas.
Em relação a outros estudos realizados na área do Grande Porto(5,6), da
nossa amostra resultou uma prevalência de excesso ponderal/obesidade de
20,5%, ligeiramente inferior (22,9% e
23,6%), predominando neste caso no
sexo feminino, tanto o excesso ponderal
como a obesidade. Nos estudos referidos
os valores mais elevados do IMC eram
para o sexo masculino, mas as diferenças são sempre discretas.
Os riscos a longo prazo na saúde das
crianças e adolescentes hipertensos obriga a que estas situações sejam identificadas e orientadas(7). O rastreio sistemático
da hipertensão nas consultas de Saúde
Infantil a partir dos 4 anos, de acordo com
o plano proposto pela Direcção Geral de
Saúde, permanece ainda uma lacuna na
prática clínica diária. Na população que
estudamos os valores tensionais correlacionaram-se com os encontrados num
estudo realizado em crianças entre os 8 e
os 13 anos do grande Porto(6), tendo sido
apenas identificado um caso de hipertensão arterial enquadrado numa obesidade
mórbida, referenciado a uma consulta
específica.
As alterações da acuidade visual foram encontradas em 32% dos alunos observados: 26% já orientados e a usarem
122
artigos originais
próteses oculares e 6% identificados durante o exame e referenciados a consulta
de Oftalmologia. Esta prevalência é difícil
de valorizar pela escassez de dados disponíveis, nomeadamente em relação à
população portuguesa.
Quanto aos hábitos nocivos, foi encontrada uma percentagem significativa
de alunos que já tinham experimentado
fumar (31%), particularmente se forem
tidos em consideração os dados divulgados pela OMS que revelam que 99% dos
adolescentes que experimentam fumar
tornam-se fumadores(8). Sabe-se ainda
que quem começa a fumar na adolescência terá mais dificuldade em abandonar o
cigarro no futuro, facto que parece relacionar-se com a dependência da nicotina,
a que os jovens serão mais sensíveis (8,9).
De referir um estudo brasileiro que concluiu serem os 13 anos a idade em que os
jovens começam a fumar, em média. Em
Portugal, num estudo que incluía alunos
da escola Básica e Secundária, concluiuse que 21% dos adolescentes fumavam
frequentemente (7% dos mais novos e
35% dos mais velhos) e que a faixa etária
de início foi entre os 11 e os 16 anos(10).
De acordo com os dados recentes a
criança ou o adolescente americano vê em
média 3 horas de televisão por dia, ou seja,
21 horas por semana(11). Em Portugal, um
estudo realizado com crianças do 1º, 2º
e 3º ciclos, revelou que o tempo de visionamento televisivo diário era em média de
2 horas durante a semana e 3,5 horas no
fim-de-semana(12). Assim, a criança quando termina o ensino secundário passou 3
anos a ver televisão. Na nossa amostra
encontramos um tempo intermédio de 2,6
horas, que poderá ainda ser considerado
excessivo, se considerarmos as recomendações da Associação Americana de
Pediatria que preconizam uma limitação
do tempo dispendido a ver televisão a um
máximo de 1-2 horas por dia(13).
A realização dos Exames Globais de
Saúde permitiu uma aproximação individual dos alunos aos cuidados de saúde,
que possibilitou o diálogo, nomeadamente
com esclarecimento de dúvidas e novas
questões. A caracterização desta população permite, por sua vez, uma intervenção
orientada da Saúde Escolar para a promoção de estilos de vida saudáveis.
HOW ARE THE TEENAGERS OF THIRTEEN YEARS IN ERMESINDE ?
ABSTRACT
Objective: Adolescents are poor attendants of pediatric health care. The National Health Department recomemends
a global health examination between the
ages of 11 and 13 years, but this is rarely
done on the primary care setting. The aim
of this study was to characterize adolescents regarding their state of health and
life styles.
Population and methods: The
medical team visited Ermesinde High
School for a global health examination
and characterized students regarding
body mass index, blood pressure, dental caries incidence, visual acuity deficit,
vaccine status. The students were also
asked to fulfill a questionnaire regarding
healthy lifestyles.
Results: One hundred and seven
children were evaluated (58% female and
42% male). Mean body mass index was
21.2 in girls and 19.9 in boys. About 20%
of boys and 20.6% of girls were overweight, that is 20.5% of the total. Obesity
affected 6.6% of the boys and 7.9% of the
girls, (7.5% of the whole population studied). Mean systolic blood pressure was
similar in both genders, at P75 for the
age. On the dental examination 33% had
untreated caries.
As for the questions about lifestyles,
48% stated that they practiced sport regularly, 83% had good oral hygiene habits
and 32% had already experienced smoking. Mean time spent at the computer was
1.25 hours and 2.6 hours in front of the
television set.
Comments: This study offers strong
support for an intervention to increase clinician’s delivery of preventive services to
adolescents in order to promote healthy
life styles.
Key-words: adolescence, global
health examination, school health, life
styles
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 120-123
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
BIBLIOGRAFIA
1. Ozer E M, Adams S H, Lustig J L,
Gee S, Garber A K, Gardner L R
et al. Increasing the screening and
counseling of adolescents for risky
health behaviors: a primary care
intervention. Pediatrics, 2005; 115:
960-96
2. Flodmark C E, Lissau I, Moreno L A,
Pietrobelli A, Widhalm. New insights
into the field of children and adolescents’ obesity: the European perspective. Int J Obes 2004 ; 28: 1189-1196
3. Lissau I, Overpeck M D, Ruan W J,
Due P, Holstein B E, Hediger M L et
al. Body mass index and overweight in
adolescents in 13 european countries,
Israel and the United States. Arch Pediatr Adolesc Med, 2004; 158: 27-33
4. International Obesity Task Force.
Childhood Obesity Report May 2004.
Disponível em: www.ioft.org/chilhood
5. Ribeiro J, Guerra S, Pinto A T, Duarte
J, Mota J. Prevalência de excesso de
peso e de obesidade numa população escolar da área do grande Porto,
de acordo com diferentes pontos de
corte do índice de massa corporal.
Acta Pediatr. Port., 2003; 34: 21-4
6. Guerra S, Ribeiro J, Duarte J, Mota J.
Obesidade e hipertensão arterial em
idades pediátricas na área do grande
Porto. Acta Pediatr Port, 2003; 34:
395-400
7. National High Blood Pressure Education Program Working Group on High
Blood Pressure in Children and Adolescents. The fourth report on the diagnosis, evaluation and treatment of high
blood pressure in children and adolescents. Pediatrics, 2004; 114: 555-576
8. Organização Mundial de Saúde, Adolescent Friendly Health Services – An
agenda for change, 2002
9. Pbert L, Moolchan E T, Muramoto M,
Winickoff, Curry S, Lando H et al. The
state of office-based interventions for
youth tobacco use. Pediatrics, 2003;
111: 650-6604
10. Bento C, Lopes J C, Milheiro C. Estudo dos hábitos de risco dos adolescentes. Acta Pediatr Port 2003; 34:
245-249
11. Mendes P, Fernandes A. A criança e a
televisão. Acta Pediatr Port 2003; 34:
101-1045
12. Almeida R, Garrido C, Guedes M,
Bravo L, Nóvoa C. Obesidade e televisão: qual a sua relação real? Acta
Pediatr Port 2002; 33: 323-27
13. American Academy of Pediatrics:
Policy Statement. Children, Adolescents and Television. Pediatrics 2001,
107(2): 423-67.
AGRADECIMENTOS:
Às coordenadoras do Gabinete de
Saúde da Escola Secundária de Ermesinde, pela colaboração imprescindível e disponibilidade constante.
CORRESPONDÊNCIA:
Sónia Lira
Serviço de Pediatria
Hospital Padre Américo -Vale do Sousa
Lugar de Tapadinha
4560-162 Penafiel
Tel. 255 714 000
artigos originais
123
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
A Tríade Clássica de uma Doença
ainda Actual
Catarina Sousa¹, Micaela Guardiano2, Cíntia Correia2, Carla Rego3, Fátima Ferreira4
RESUMO
A doença de Kala-azar é uma patologia actualmente rara que regista, na ausência de tratamento adequado, uma elevada taxa de mortalidade. Apresenta-se
um caso clínico de doença de Kala-azar
numa lactente de 10 meses com a tríade
clínica clássica de febre, palidez e esplenomegalia. A propósito deste caso, os
autores reforçam a importância do diagnóstico de suspeição, apresentam as opções terapêuticas disponíveis e abordam
aspectos epidemiológicos da doença.
Palavras-chave: Kala-azar, Leishmania donovani, Leishmaníase visceral,
Anfotericina B lipossómica.
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 124-127
INTRODUÇÃO
A Leishmaníase visceral ou Kalaazar é uma infecção do sistema reticulohistiocitário provocada pela Leishmania
donovani, parasita intra-celular obrigatório cujo reservatório habitual é o cão. A
infecção é transmitida ao homem através
da picada do Phlebotomus ou mosca da
areia, sendo o grupo etário mais atingido
o de um aos três anos(1,2).
Em Portugal considera-se a existência de três focos endémicos: a região do
Alto Douro, a região metropolitana de Lisboa e o Algarve.(²) No entanto, segundo
os dados disponíveis da Direcção Geral
de Saúde relativos ao período entre 2000
e 2004 inclusivé, existe um claro predo__________
¹ Interna Complementar de Pediatria – Serviço
de Pediatria
2
Assistente Hospitalar Eventual – Serviço de
Pediatria
3
Assistente Hospitalar Graduada – Serviço de
Pediatria
4
Assistente Hospitalar Graduada - Serviço de
Hematologia Clínica Hospital S. João
124
casos clínicos
mínio da doença na zona de Lisboa e
Vale do Tejo, com um total de 64% dos
casos, comparativamente com 15% na
zona Norte e, ao contrário do que seria
de esperar, nenhum caso declarado na
região do Algarve.
Os restantes casos correspondem
aos 10 casos (17%) declarados na zona
Centro e aos 6 casos (10%) no Alentejo
(Quadro I)(3).
A infecção é assintomática ou subclínica em muitos doentes e quando há
tradução clínica pode apresentar-se de
forma aguda, subaguda ou crónica. A
tríade clássica de apresentação com febre, palidez e esplenomegalia surge semanas a meses após a picada e estão
mesmo descritos casos raros de anos
de incubação(4).
O espectro clínico é no entanto
amplo, desde sintomas constitucionais
inespecíficos até febre intermitente, hepatomegalia, esplenomegalia, icterícia,
edemas, associado a alterações analí-
Quadro I - Dados da Direcção Geral de Saúde relativamente aos casos declarados
de Leismaníase de 2000 a 2004 (adaptado de www.dgsaúde.pt)
REGIÕES E SUB-REGIÕES
NORTE
Braga
Bragança
Porto
Viana do Castelo
Vila Real
CENTRO
Aveiro
Castelo Branco
Coimbra
Guarda
Leiria
Viseu
LISBOA E VALE DO TEJO
Lisboa
Santarém
Setúbal
ALENTEJO
Beja
Évora
Portalegre
ALGARVE/Faro
RA AÇORES
RA MADEIRA
PORTUGAL
2000
1
1
3
2
1
3
1
2
7
2001
2
2
2
1
1
9
7
2
13
2002
2
1
1
10
7
3
1
1
13
2003
2
1
1
2
1
1
5
2
2
1
9
2004
2
1
1
3
1
1
1
11
6
5
5
1
1
3
21
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
ticas compatíveis com citólise hepática,
hipoalbuminemia, hipergamaglobulinemia (sobretudo elevação da Imunoglobulina G devido à activação das células
B), pancitopenia (anemia, trombocitopenia e leucopenia com neutropenia, marcada eosinopenia e linfocitose e monocitose relativas) e infecções bacterianas
secundárias que são frequentemente
a causa de morte. A evolução é fatal
em mais de 90% dos doentes sem tratamento(4).
CASO CLÍNICO
MACF, lactente do sexo feminino,
dez meses de idade, etnia cigana, residência na cidade de Mirandela, Distrito
de Bragança, sem seguimento médico
regular. Aparentemente sem antecedentes patológicos de relevo embora fosse
muito irregular o seguimento médico
anterior e escassa a informação registada no Boletim Individual de Saúde.
Aos nove meses iniciou deterioração
progressiva do estado geral, emagrecimento significativo (não quantificado
com precisão por desconhecimento do
peso anterior) e episódios febris de repetição interpretados num contexto de
prováveis infecções das vias aéreas superiores.
Na admissão no Serviço de Urgência apresentava aspecto emagrecido
[Peso-7430g (percentil 5-10), Comprimento-71cm (percentil 25-50), Perímetro
Cefálico-42,5cm (percentil 25-50)], pali-
dez de pele e mucosas e hepato-esplenomegalia (fígado palpável a cinco centímetros do cruzamento do rebordo costal
direito com a linha medioclavicular e baço
palpável a quatro centímetros do rebordo
costal esquerdo).
O estudo analítico revelava pancitopenia, com maior atingimento das séries
rubra e plaquetária (Quadro II) e o esfre-
Seta grande – célula do sistema monocítico-macrofágico
Seta pequena – inclusão citoplasmática em célula do sistema monocítico-macrofágico compatível com infestação por Leishmania donovani
Figura 1 - Imagem da lâmina do aspirado de medula óssea (microscopia de luz).
gaço sanguíneo evidenciava alterações
morfológicas, como anisopoiquilocitose
com hipocromia predominante, alguns
linfócitos com hiperbasofilia citoplasmática, anisocitose plaquetária e alguns megatrombócitos. Não foram evidenciadas
alterações analíticas compatíveis com
citólise hepática.
QUADRO II - Estudo analítico – evolução da admissão à data da alta hospitalar
D1 de
Internamento
Hb(g/dL)
VG(%)
VGM(fL)
GR(x109)
GB(x1012)
Neut(%)
Linf(%)
Mon (%)
Eos (%)
Plaq(x109)
PCR(mg/L)
7.00
24.30
65.00
3.74
4.70
18.0
75.0
5.70
0.00
35.00
198.00
D2 de
Tratamento
7.60
23.30
58.00
3.99
5.20
29.70
61.80
6.00
0.10
56.00
106.50
Foi realizada ecografia abdominal
que evidenciava hepato-esplenomegalia
homogénea.
Foi efectuado mielograma (Figura
1) que revelava aspirado e densidade
normais, adequada representação das
séries megacariocítica e mielóide, hipoplasia relativa da série eritróide e células
do sistema monocítico-macrofágico com
D7 de
Tratamento
8.70
27.90
69.60
4.01
6.26
28.40
65.00
6.10
0.20
27.00
63.00
inclusões citoplasmáticas compatíveis
com infestação por Leishmania donovani,
o que permitiu o diagnóstico de doença
de Kala-azar.
A imunofenotipagem do sangue periférico foi normal (Quadro III).
De referir que a serologia para o vírus de imunodeficiência humana adquiriQuadro III - Imunofenotipagem
do sangue periférico
D14 de
Tratamento
Imunofenotipagem
Linfócitos (%)
9.40
29.70
77.50
4.91
13.13
34.90
59.10
5.60
0.10
199.00
5.40
CD3
CD3 – CD8 +
CD3 – CD56 +
CD3 +
CD3 + CD4 +
CD3 + CD8 +
CD3 + CD 56 +
CD4 +
CD8 +
Relação CD4/CD8
CD19 +
CD56 +
0.50
6.20
69.40
39.60
23.20
0.60
39.70
23.70
1.70
20.90
6.80
D-dia; Eos-eosinófilos; GB-glóbulos brancos; GR-glóbulos rubros; Hb-hemoglobina; Linf-linfócitos; Mon- monócitos;
Neut-neutrófilos; PCR-proteína C reactiva; Plaq-plaquetas; VG-volume globular; VGM-volume globular médio;
CD- cluster of differentiation - grupo de diferenciação
casos clínicos
125
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
da foi negativa e entre as serologias para
o grupo TORCH foi positiva a do vírus
herpes 1 (IgM) e duvidosa a do vírus herpes 2. A hemocultura revelou-se estéril.
Foi iniciada terapêutica com anfotericina B lipossómica, na dose de 20 mg/
Kg/dose total, nos dias um a cinco e dia
dez após o diagnóstico.
A resposta clínica e analítica foi
favorável com apirexia ao quinto dia de
terapêutica, diminuição progressiva das
organomegalias até à resolução após o
tratamento, e normalização das linhagens celulares (Quadro II).
Seis meses após conclusão do tratamento, a lactente mantinha-se assintomática e com exame físico normal.
DISCUSSÃO
O diagnóstico de suspeição de doença de Kala-azar é de grande importância sobretudo em lactentes, nos quais a
clínica sugestiva de febre, palidez e esplenomegalia pode não ser evidente. O
diagnóstico definitivo é possível pela demonstração do parasita nos tecidos ou
em exames culturais de material de biópsia ou aspirado. A aspiração de material
esplénico tem maior sensibilidade (98%)
mas raramente é feita devido ao risco de
complicações hemorrágicas. Geralmente
opta-se pela realização de aspirado de
outros órgãos, nomeadamente a medula
óssea com uma sensibilidade de aproximadamente 90%, motivo pelo que foi
efectuado na nossa doente.(4) No entanto,
se estes forem negativos mas permanecer um elevado índice de suspeição, devem ser realizados testes serológicos, que
embora não permitam a mesma rapidez
de diagnóstico, apresentam sensibilidade
e especificidade próximos dos 100%.
No que respeita às serologias da
doente apresentada, realçamos que a
positividade para o vírus herpes foi interpretada como reacção cruzada e, por
isso, desvalorizada, atendendo ao quadro clínico não compatível.
A identificação da Leishmania donovani por polymerase chain reaction a
partir de amostras de sangue periférico
é também possível e constitui um bom
método de monitorização de recaídas em
doentes imunocomprometidos(5). Estão
ainda descritos outros métodos de diag-
126
casos clínicos
nóstico como a pesquisa de antigénios na
urina, com 96% de sensibilidade e 100%
de especificidade, que permite ultrapassar o inconveniente do estudo serológico
de não determinar a existência de doença activa, e o teste imunocromatográfico,
que consiste num teste serodiagnóstico
rápido em que fitas de nitrocelulose impregnadas de antigénios de Leishmania
permitem uma sensibilidade de diagnóstico de 100% e especificidade de 98%.
São, no entanto, métodos ainda em investigação(5, 6).
O diagnóstico diferencial coloca-se
com outras situações infecciosas como
a malária, a febre tifóide, a tuberculose
miliar, a schistosomíase, a brucelose e
a mononucleose infecciosa entre outras.
No caso descrito a identificação da Leishmania donovani no aspirado de medula
óssea permitiu excluir, à partida, estes
diagnósticos. As doenças do foro neoplásico - leucemia, linfoma – obrigatoriamente incluídas nos diagnósticos diferenciais,
foram também excluídas após a obtenção
do resultado do mielograma e da imunofenotipagem do sangue periférico.
Uma das opções terapêuticas no
tratamento da doença de Kala-azar é o
estibiogluconato de sódio ou o antimoniato de meglumina – antimoniais pentavalentes com eficácia semelhante. O tratamento deve ser efectuado durante 20-40
dias e pode eventualmente ser necessária a sua repetição. Geralmente ocorre
resposta na primeira semana, embora
sejam necessárias semanas a meses,
após completar a terapêutica, para ocorrer regressão da esplenomegalia e normalização das citopenias. A taxa de cura
é de 80-100%. Estas opções terapêuticas
têm, além do tempo prolongado de tratamento, o inconveniente de recaídas e
resistências comuns, sobretudo nos doentes com imunidade celular comprometida. De referir ainda os frequentes efeitos
laterais: fadiga, artralgias/mialgias (50%),
desconforto abdominal (30%), elevação
das transamínases (30-80%), elevação
da lípase e da amílase (aproximadamente 100%), pancitopenia (10-30%), alterações electrocardiográficas (30%) e morte
súbita por toxicidade cardíaca(5, 7).
Outra das opções terapêuticas é a
anfotericina B, muito útil no caso de re-
caída, resistência ou intolerância aos
antimoniais pentavalentes. O recurso às
formulações lipídicas permite maior concentração no sistema reticulo-endotelial
e menor nefrotoxicidade. Alguns efeitos
laterais descritos incluem aqueles relacionados com a infusão (febre, arrepios,
dores ósseas, tromboflebite) e anemia.
A eficácia terapêutica é de 90-100%(8).
O efeito terapêutico explica-se pelo facto de, tal como os fungos, a Leishmania
conter ergosterol nas suas células, e não
colesterol, contra o qual a anfotericina
actua(5,9).
Estão descritos outros fármacos
que incluem a paromicina, com sucesso
terapêutico que não é superior aos anteriores, o interferão gama recombinante,
com interesse em conjunto com os antimoniais pentavalentes em caso de refractariedade ao tratamento, a miltefosina
e a sitamaquina para administração por
via oral, ainda em fase de ensaio clínico e
a pentamidina, menos atractiva, uma vez
que são necessárias altas doses e tratamento prolongado, além da toxicidade e
resitências que exibe(5, 8).
A opção terapêutica no caso clínico descrito da anfotericina B lipossómica
justificou-se pela elevada eficácia descrita, curto tempo de tratamento, baixa taxa
de recaídas e de efeitos laterais. A dose
efectuada foi a de 3 mg/Kg durante cinco dias e ao décimo dia, esquema que
tem apresentado resposta semelhante
ao tratamento durante dez dias consecutivos(7). Nos doentes imunocomprometidos a dose diária é idêntica mas deve ser
prolongada por mais quatro dias (dias 17,
24, 31 e 38)(9). Ssyriopoulou V. e colaboradores descreveram idêntica eficácia no
tratamento durante 2 dias na dose de 10
mg/kg/dia, em crianças com idade superior a 14 anos(10). Por outro lado Sundar S
e colegas constataram também eficácia
no tratamento com 5 mg/Kg/dose total,
numa infusão única, num estudo com 91
adultos e crianças(11). O critério de cura é
a normalização clínica e a negativação
do exame parasitológico. A monitorização deve ser clínica e considera-se haver
sucesso terapêutico quando não existem
recaídas no espaço de seis meses(5, 8).
Os factores de risco para o desenvolvimento da doença incluem malnutri-
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
ção, uso de drogas imunossupressoras
e, especialmente, co-infecção pelo vírus
de imunodeficiência humana adquirida,
pelo que esta foi investigada na nossa
doente(5).
Nas áreas endémicas são fundamentais as medidas preventivas como o
uso de repelentes, insecticidas e roupas
que cubram uma grande superfície corporal, a evicção de saídas nocturnas, altura em que o insecto transmite a doença
por picada e a eliminação dos reservatórios. Está já em investigação em animais
uma vacina para a leishmaníase embora
ainda não se encontre disponível(5).
Os autores alertam para a importância do diagnóstico de suspeição desta
patologia, sobretudo numa zona não endémica como a nossa. É importante referir que o número de internamentos por
doença de Kala-azar tem diminuído no
nosso Serviço de Pediatria, com registo
de 15 internamentos por este diagnóstico
no período compreendido entre 1994 e
1999, e apenas 6 nos seguintes anos, de
2000 a 2005 inclusivé, o que não significa
que o número de casos tenha diminuído
na zona Norte do País. Pelo contrário,
segundo dados da Direcção Geral de
Saúde(3), a prevalência da doença nesta
região tem-se mantido constante, o que
se poderá eventualmente explicar por
internamentos noutras Unidades Hospitalares, nomeadamente em Hospitais
periféricos.
De referir a importância da declaração da doença de Kala-azar de forma
a que possamos conhecer a realidade
epidemiológica do nosso País. De facto,
se considerarmos a possibilidade de que
muitos casos possam não estar a ser declarados, hipótese a considerar no caso
da Região Algarvia, poderemos conhecer
apenas a “ponta do iceberg” desta entidade clínica. Curioso é notar o número
de casos declarados na Zona Centro do
País, no período de 2000 a 2004.
Estará a alterar-se a epidemiologia
desta doença?
CLASSICAL CLINICAL FINDINGS OF
STILL PRESENT DISEASE
ABSTRACT
Kala-azar is nowadays an uncommon disease that presents a high mortality rate in the absence of adequate treatment. The authors present the case of a
ten months infant with the common clinical findings of fever, pallor and splenomegaly. The importance of the diagnosis
suspicion is reinforced and the treatment
choices and epidemiologic aspects of the
disease are discussed.
Key-words: Kala-azar, Leishmania
donovani, Visceral Leishmaniasis, lipossomal Anphotericin B.
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 124-127
BIBLIOGRAFIA
1. Oliveira A, Noites P, Guerra A. KalaAzar – revisão casuística dos últimos
10 anos. Nascer e Crescer 1997; 6:
103-105.
2. Gonçalves A, Silva H, Antunes H.
Kala-Azar sem febre não é Kala-Azar.
Nascer e Crescer 2000; 9 (4): 252253.
3. www.dgsaude.pt.
4. Herwaldt B. Leishmaniasis. Lancet
1999; 354:1191-1199.
5. Guerin P, Olliaro P, Sundar S, Boelaert M, Croft S, Desjeux P e col. Visceral leishmaniasis: current status of
control, diagnosis, and treatment, and
a proposed research and developement agenda. Lancet Infectious diseases 2002; 2: 494-501.
6. Sundar S, Agrawal S, Rai K, Chance
M, Hommel M. Detection of leishman-
ial antigen in the urine of patients with
visceral leishmaniasis by a latex agglutination test. Am J Trop Med Hyg
2005; 73(2): 269-271.
7. Alvar J, Cañavate C, Solar B, Jiménez
M, Laguna F, Vélez R e col; Leishmania and Human Immunodeficiency
Virus Coinfection: the first 10 years.
Clinical Microbiology Rewies 1997;
298-319.
8. Berman J, Badaro R, Thakur C, Wassuna K, BehdehaniK, Davidson R e
col. Efficacy and safety of liposomal
amphotericin B for visceral leishmaniasis in endemic developing counties.
Bulletin of the World Health Organization 1998; 76 (1): 25-32.
9. Berman J. Editorial response: U.S.
FDA approval of liposomal amphotericin B for treatement of visceral leishmaniasis. Clin Infect Dis 1999; 28: 4951.
10. Syriopoulou V, Daikos G, Theodoridou M, Pavlopoulou I, Manolaki A,
Sereti E e col. Two doses of a lipid
formulation of amphotericin B for the
treatment of mediterranean visceral
leishmaniasis. Clin Infect Dis 2003;
36: 560-566.
11. Sundar S, Agrawal G, Rai M, Makharia , Murray H. Treatment of Indian
visceral leishmaniasis with single or
daily infusions of low dose liposomal
amphotericin B: randomised trial. BMJ
2001; 323: 419-422.
CORRESPONDÊNCIA
Catarina Sousa
Serviço de Pediatria - Unidade
Autónoma de Gestão da Mulher e da
Criança - Hospital de S. João
Alameda Prof. Hernani Monteiro
4202-251 Porto
Tel: 225 512 100 / Fax: 225 512 273
E-mail: [email protected]
casos clínicos
127
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Gastroenterite por Salmonella em Recém-nascido
Ermelinda Ferreira1, Anabela João1, Leonor Ferraz1
RESUMO
A Salmonella é um agente implicado na gastroenterite aguda em todo o
Mundo. A frequência das infecções depende da localização geográfica, condições sanitárias, idade do doente, estado
imunitário etc. É um agente comum nas
infecções do lactente. No recém-nascido
a infecção surge geralmente após a 1ª
semana de vida.
Os autores descrevem o caso clínico de um recém-nascido, fruto de uma
gestação de 40 semanas, complicada por
uma gastroenterite materna 24 horas antes do parto, que apresentou fezes mucosanguinolentas nas 1ªs horas de vida. Na
coprocultura da mãe e do RN foi isolada
uma Salmonella enteritidis. Os autores
chamam a atenção para a necessidade
de um diagnóstico precoce a fim de evitar
as complicações bacteriémicas e a contaminação de outros recém nascidos na
enfermaria
Palavras-chave: Gastroenterite;
Salmonella; Recém-nascido
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 128-129
INTRODUÇÃO
A Salmonella é um bacilo Gramnegativo, da família Enterobacteriaceae.
Pode manifestar-se como bacteriémia,
ou infecção focal, embora a gastroenterite seja a mais importante causa de doença associada a salmonella não typhi(1).
Estima-se que seja responsável por cerca de 80% das intoxicações alimentares,
constituindo um verdadeiro problema de
saúde pública.
__________
¹ Serviço de Neonatalogia
Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia
128
casos clínicos
A infecção pode ocorrer por contágio inter-humano (mãos contaminadas)
ou ser veiculada por água e alimentos
contaminados.
É tipicamente transmitida através
de mãos contaminadas
As infecções perinatais precoces
adquirem-se antes ou durante o parto por
transmissão vertical. Estas têm a maioria
das vezes graves consequências para
o recém-nascido, podendo cursar com
sépsis e/ou meningite, sendo por isso
importante o rápido reconhecimento e
tratamento precoce.
CASO CLÍNICO
Recém-nascido do sexo masculino,
fruto de uma gestação vigiada, de termo,
complicada por febre e diarreia 24 horas
antes do parto.
O parto foi eutócico, tendo a rotura
de membranas ocorrido 5 horas antes do
nascimento. O recém-nascido teve choro imediato e somatometria adequada.
Foi transferido às 18 horas de vida para
a Unidade de Cuidados Intensivos por
apresentar gemido e dejecções líquidas
muco-sanguinolentas.
Apresentava-se irritado, subfebril,
com o abdómen distendido e doloroso à
palpação.
Dos exames laboratoriais, salientou-se leucopenia 4700 x10³/ul e uma
relação neutrófilos não segmentados /
neutrófilos totais significativamente aumentada. A proteína C reactiva foi negativa.; a gasimetria e o ionograma também
não mostraram alterações ; A radiografia
abdominal abdominal simples era normal, bem como o estudo citoquimico do
líquido céfaloraquidiano (LCR).
Foi instituída fluidoterapia e antibioticoterapia com ampicilina e gentamicina. A diarreia resolveu ao 3º dia de
vida, não se tendo verificado qualquer
complicação.
A hemocultura, urocultura e cultura
de LCR foram estéreis. Na coprocultura
foi isolada uma Salmonella enteritidis. A
análise cultural às fezes da mãe revelou
também a presença de Salmonella enteritidis.
O estudo virulógico de fezes foi negativo. Efectuou ainda uma cintigrafia óssea, que foi normal.
Cumpriu 10 dias de antibioticoterapia. As coproculturas de controlo, aquando da suspensão de antibioterapia, e
após um e 6 meses, foram negativas.
DISCUSSÃO
As infecções neonatais por Salmonella ocorrem geralmente durante ou
após a primeira semana de vida(2,3).
No presente caso, o quadro clínico
ocorreu no primeiro dia de vida, com dejecções muco-sanguinolentas, o que poderá estar relacionado com inóculo maciço e/ou com grande virulência do agente.
A ruptura prolongada de membranas, que
também tem sido implicada no aparecimento de manifestações precoces, não
se verificou.
É consensual que todas as gestantes com diarreia devem ser cuidadosamente avaliadas e tratadas, a fim de
evitar a bacteriémia, aborto séptico e infecções neonatais. Perante uma gestante
com quadro de gastroenterite no final da
gravidez é mandatória a realização de
coprocultura à mãe e ao recém-nascido,
devido ao risco de transmissão vertical,
como verificado no presente caso.
Nos recém-nascidos é também importante o diagnóstico precoce para prevenir complicações bacteriémicas, e contaminação de outros recém-nascidos(4),
mães, funcionários da instituição bem
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
como aparelhos e instrumentos da sala
de parto e enfermaria.
O seguimento destes recém-nascidos ao mês e 6 meses após a alta é
fundamental na detecção do estado de
portador, o qual pode ocorrer em 50% de
recém-nascidos infectados(5).
both the mother and the newborn. The
prompt diagnosis is important to prevent
bacteraemia and eventual contamination
of other newborns host in the nursery.
Key-words: Gastroenteritis; Salmonella; Newborn
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 128-129
SALMONELLA GASTROENTERITIS IN
THE NEWBORN
BIBLIOGRAFIA
ABSTRACT
Salmonella infection is a common
worldwide agent of acute gastroenteritis.
The frequence of occurrence depends
mainly on geographic localization, sanitary conditions, age of the child and his
immunity stage. Salmonella is a frequent
agent in infancy. In the newborn, the infection starts usually after the first week
of life. The authors describe the case of
a term newborn whose mother was affected by gastroenteritis 24 hours before delivery, who developed bloody and mucous
stools in the first hours of life. The stool
culture revealed Salmonella enteritidis in
1. Campderá JAG, Fernandez RR, Sachez MIG. Protocolos de Infectologia
2002. Gastroenteritis por Salmonella,
Shigella Y Campylobacter. Disponivel
em http://www.aeped.es/protocolos/
infectologia.pdf
2. Chhabra RS, Glaser JH. Salmonella
infection presenting as hematoquésia on the first day of life. Pediactrics
1994; 94:641- 2
3. Gusman CJ, Ibana RL, Munoz VL.
Tratado UNInet.Principios de Urgencias, Emergencias y Cuidados Críticos Neonative Intensive cares; Sep-
sis in newborn. Edición Electrónica
Disponivel em: http://tratado.uninet.
edu/indice.html
4. St. Geme JW III, Hodes HL, Michael
M. Consensus: management of salmonella infection in the first year of
life. Pediatr Infect Dis J 1988; 7:61521
5. Klooster JM, Roelofs HJM. Management of salmonella infections during
pregnancy and puerperium. Netherlands Journal of Medicine. Elsevier
Ed 1997; 51: 83-6
6. Remington J, Kein J. Infectious Diseases of the Fetus and Newborn Infant. 6th WB Saunders; 2006; 443-56
CORRESPONDÊNCIA
Anabela João
Centro Hospitalar de Vila Nova de
Gaia – Serviço de Neonatologia
Rua Francisco Sá Carneiro
4430 – Vila Nova de Gaia
Tel. 227 865 100
casos clínicos
129
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Intima-media thickness in obese children before
and after weight loss
Wunsch R, Sousa G, Toschke AM, Reinerhr T
Pediatrics 2006; 118:2334-2340
Objective: Obesity in childhood is
program. The control group consisted of
thickness, blood pressure, triglycerides,
related to increased intima-media thick-
10 non obese children of the same age
insulin, and insulin resistance index de-
ness, a noninvasive marker for early athe-
and gender. We determined the carotid
creases significantly, whereas high-density
rosclerotic changes. The objective of this
intima-media thickness by B-mode ultra-
lipoprotein cholesterol increased signifi-
study was to analyze the changes of inti-
sound with a 14-MHz linear transducer.
cantly. In the 32 obese children without
ma-media thickness in obese children with
Substantial weight loss was defined by
substantial weight loss, there were no sig-
weight loss.
a reduction of overweight of at least 0.5
nificant changes apart from an increase of
standard division scores in BMI.
insulin and insulin index.
Methods: We analyzed the changes of intima-media thickness and, as
Results: Obese children demons-
Conclusions: Because obese chil-
markers of cardiovascular risk factor pro-
trated a significantly thicker intima-media
dren demonstrated a thicker intima-media,
file, systolic and diastolic blood pressu-
compared with the control group. Further-
vascular changes seemed to occur already
re, triglycerides, high-density lipoprotein
more, blood pressure, triglycerides, insu-
in childhood obesity. Paralleling the impro-
cholesterol, glucose, insulin, and insulin
lin, and insulin resistance index were signi-
vement of the cardiovascular risk factor
resistance index (homeostasis model
ficantly higher in obese children, whereas
profile, intima-media thickness decreased
analysis) in 56 prepubertal obese chil-
high-density lipoprotein cholesterol was
in obese children with substantial weight
dren (median: 9 years old) before and
significantly lower. In the 24 obese children
loss, suggesting the reversibility of early
after a 1-year outpatient intervention
with substantial weight loss, intima-media
atherosclerotic changes.
COMENTÁRIOS
Assistimos nos dias de hoje a uma
pandemia de obesidade em crianças e
adultos, em que Portugal também está incluído. Há mais de um bilião de pessoas
obesas e 22 milhões de crianças de idade inferior a 5 anos têm excesso de peso,
IMC (Índice de Massa Corporal) > ao P 85
ou obesidade, IMC> ao P95. Nos últimos
30 anos triplicou o número de crianças
com excesso de peso. Adultos obesos vivem menos 5 a 20 anos, mas têm sucessores garantidos, pois mais de dois terços
de crianças obesas virão a ser adultos
obesos E assim neste século estamos em
risco de se perder o aumento da longevidade alcançado no século passado. Os
custos da obesidade infantil são enormes:
2,5 biliões anuais de £ no Reino Unido e
$127 milhões nos Estados Unidos(1,2,3,4,5).
As consequências da obesidade
nas idades pediátricas são muitas. Ve-
130
artigo recomendado
jamos algumas. Respiratórias: ressonar,
apneias do sono e asma; Ortopédicas:
deslizamento da cabeça do fémur e doença de Blount; Gastrointestinais: esteatose
hepática e doenças vesiculares; Cardiovasculares: dislipidémia, hipertensão
arterial e ateroesclerose; Neurológicas:
pseudo tumor cerebral; Endocrinológicas:
resistência à insulina, hiperinsulinismo, alteração da tolerância à glicose, diabetes
tipo 1 e 2, síndrome do ovário poliquístico
e irregularidades menstruias; Psico/emocionais: depressão, isolamento e perturbações alimentares; Outras: inflamação
crónica(6,7,8). De todas as complicações,
as mais importantes são as cardiovasculares e as endocrinológicas, que reunidas
constituem a síndroma metabólica, definida no adulto pela existência de 3 dos
5 critérios seguintes, obesidade troncular
(perímetro abdominal > a 102 cm no homem e a 88 na mulher), triglicerídeos >
150 mg/dl, HDL colesterol < a 40mg/dl no
homem e < a 50 na mulher, hipertensão
arterial (≥ 130/85 mm Hg) e glicemia em
jejum ≥ 110mg/dl.
Os critérios de diagnóstico da Organização Mundial da Saúde são ligeiramente diferentes e aplicáveis em
pediatria: disglicemia (diabetes tipo 2,
alteração da glicemia em jejum ou alteração do teste de tolerância à glucose) e
mais dois critérios seguintes dos seguintes, obesidade, dislipidémia, hipertensão
e microalbuminúria(9). Registe – se que
se recomendou recentemente que o valor máximo da glicemia em jejum seja de
100mg/dl.(10). A síndroma metabólica tem
importância epidemiológica. Nos Estados
Unidos atinge 4 % de todos os adolescentes e 30% dos que têm peso a mais(11).
Há outros factores, que não a obesidade,
que podem contribuir, independentemente uns dos outros, para o aparecimento
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
desta síndroma, como maior quantidade
de massa gorda corporal total e no tronco, menor aptidão física, menor actividade física intensa, maior aporte energético
ao longo dos anos e menor consumo de
bebidas alcoólicas(12). Também as crianças com valores normais da tensão arterial sistólica, mas superiores ao percentil
50, tendo em conta a idade e o sexo,
têm maior risco de virem a desenvolver,
quando adultos, a síndroma metabólica
com ou sem hipertensão arterial(13). A intervenção precoce em cada um destes
factores poderá contribuir para prevenir
a síndroma.
Sessenta a 80 % de crianças obesas virão a ser adultos obesos(8, 14, 15) e
à morbilidade que têm tido, juntar-se-á
a inerente à idade adulta, como doença
coronária, insuficiência cardíaca, osteoarterite dos joelhos, hiperuricemia e gota,
complicações da gravidez, como eclâmpsia e malformações fetais, neoplasias da
mama e próstata, infertilidade e riscos
anestésicos acrescidos(16).
Temos então fortes razões para estarmos preocupados com a obesidade. O
seu tratamento assenta em três pilares:
modificações alimentares, aumento da
actividade física e alterações comportamentais da criança, da família e da sociedade. Deve ser longo (a obesidade é
uma doença crónica) e multidisciplinar.
Tal como nos adultos, não é fácil comer
menos e diferente, iniciar e manter uma
actividade física moderada/intensa e modificar o estilo de vida. Os medicamentos
que reduzem o apetite ou levam a perda de peso como o orlistat, sibutramina,
metformina e tupiramato não estão recomendados em crianças, bem como as terapêuticas cirúrgicas(6,7, 8, 9). Tratar a obesidade infantil não é fácil, e por isso os
resultados não são animadores. O tratamento adequado da obesidade do adulto
também não é fácil e por isso os resultados também não são animadores e daqui
a proliferação de propostas terapêuticas
de duvidosa qualidade, ainda que com
resultados aparentemente bons, rápidos
e assim atractivos. O pior será quando
aparecer a factura…
Controlar a obesidade infantil, emagrecendo quem precisa ou bastando
muitas vezes manter o peso, é uma ta-
refa difícil, mas não impossível, e é pelas razões que já vimos, urgente. Como
sempre, o mais importante é prevenir.
Mas como? Não basta dizer que se deve
em comer adequadamente, praticar exercício regularmente e mudar o estilo de
vida. Estas medidas ambientais são importantes, mas não podemos subestimar
o factor mais poderoso, a genética, que
é responsável por 40 a 70% da massa
gorda que adquirimos. Os genes da obesidade ofereciam vantagem biológica nos
tempos remotos. Quem podia viver com
pouca energia e ainda armazenar nos
períodos de maior abundância alimentar,
sobrevivia aos períodos de fome. Os que
não tinham esta capacidade iam morrendo. É a teoria do genótipo económico, frugal (thrifty genotype)(9). Como somos os
sobreviventes dos mais capazes, como
agora não há fome e a comida ainda é
mais saborosa e energética (gordura) e
como não há “necessidade” (nem facilidade) de praticar exercício, os nossos
genes tem a sua tarefa bem facilitada e
armazenam, armazenam…Mais recentemente desenvolveu-se o conceito do
“thrifty phenotype”. Tem a ver com a má
nutrição fetal. Havendo pouca energia, é
preciso poupar para assegurar a energia
ao grande utilizador, o cérebro, e então
nada melhor que tornar os outros tecidos
e órgãos resistentes à insulina, o começo
da síndroma metabólica …(17).
Quais os factores de risco de obesidade infantil, para a podermos prevenir?
Alguns estão identificados: obesidade
dos pais, elevado peso ao nascer, demasiado aumento de peso no primeiro
ano de vida, elevado índice de massa
corporal pelos 3 / 4 anos, passar mais
de 8 horas por semana a ver televisão e
dormir pouco (<10.5 h) pelos 3 anos(18).
O trabalho de Cristina Padez e colaboradores mostrou que são factores de risco
ver televisão, obesidade paterna e materna, peso ao nascer e redução do sono e
factores protectores a educação dos pais
e número de irmãos(19). Uma hipótese
curiosa sobre o risco de obesidade será o
mamar a pedido. Diz-se que actualmente
as mães são aconselhadas a esta prática
e então há crianças amamentadas 15 vezes por dia. Ora muitas destas refeições
são lanches e então estaremos a habi-
tuar as crianças a maus hábitos alimentares, a habitua-las a querer continuar a
lanchar frequentemente, o que favorece
a obesidade(20). Deveremos recomendar
horários, com regra?
Um caminho interessante de prevenção da obesidade pode ser o sono.
Dormir pouco ou mal favorece a obesidade infantil, como já vimos. Adultos que
dormem pouco também podem ser mais
obesos, diabéticos e portadores da síndrome metabólica(21, 22, 23,24). A razão está
na desregulação endócrina da privação
do sono, traduzida pela diminuição dos
níveis de leptina, aumento dos da grelina
e o consequente aumento do apetite e diminuição da saciedade. O mecanismo da
desregulação induzido pelo sono parece
estar relacionado com o desequilíbrio do
sistema nervoso vegetativo induzido pelas alterações do sono(25). A falta de sono
parece então completar a receita da obesidade: Tome-se um indivíduo portador
de um genótipo frugal e reduza-se-lhe o
sono; espere aumento de apetite, redução da saciedade, mais oportunidades
para comer e verá o aporte energético a
aumentar; conte com menor actividade
física devido ao cansaço; terá um fenótipo com um “óptimo” índice de massa corporal e uma segura síndroma metabólica
(26,27)
.
A relação obesidade e ateroesclerose está bem demonstrada no artigo que
escolhemos para comentar. O trabalho
vem confirmar outros estudos na mesma
linha(28). De novo e encorajador, a reversibilidade das primeiras lesões conseguidas com o controle da obesidade.
Tojal Monteiro1
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 130-132
BIBLIOGRAFIA
1. Ferraz C, Oliveira G, Soares S,
Marques E, Costa M, Neto T. Perfil
lipídico, prevalência de obesidade e
hábitos alimentares de uma população de adolescentes. Nascer e crescer 2006; 15(2): 71-76.
__________
1
Professor de Pediatria do ICBAS/HGSA
artigo recomendado
131
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
2. Murtagh J, Dixey R, Rudolf M. A qualitative investigation into the levers and
barriers to weight loss in children:
opinions of obese children. Arch Dis
Chil 2006; 91:920-923.
3. Kimm SY, Obarzanek E. Childhood
obesity: a new pandemic of the
new millennium. Pediatrics 2002;
110:1003-1007.
4. Wang G, Dietz WH. Economic burden of obesity in youths aged 6 to 17
years: 1979-1999. Pediatrics 2002;
109 e81.
5. Ogden CL, Flegal KM, Carrol MD,
Johnson CL. Prevalence and trends
in overweight among U.S. children
and adolescences, 1999-2000. JAMA
2002; 288:1728-1732.
6. Schneider MB, Brill SR. Obesity in
children and adolescents. Pediatrics
in Review 2005; 25:115-161.
7. Rudolf MCJ. The obese child. Arch
Dis Child Educ Prat Ed 2004; 89:
ep57-ep62.
8. Reilly JJ, Wilson D. ABC of obesity. Childhood obesity. BMJ 2006;
333:1207-1210.
9. Miller J, Rosenbloom A, Silverstein J.
Childhood obesity. J Clin Endocrinol
Metab 2004; 89:4211-4218.
10. Kahn R. Follow-up report on the diagnosis of diabetes mellitus: the Expert Committee on the Diagnosis and
Classification of Diabetes Mellitus.
Diabetes care 2003; 26:3160-3167.
11. Cook S, Weitzman M, Auinger P,
Nguyen M, Dietz WH. Prevalence of
a metabolic syndrome phenotype in
adolescents: finding from the third
National Health and Nutrition Examination Survey, 1988-1994. Arch
Pediatr Adolesc Med 2003; 157:821827.
132
artigo recomendado
12. Ferreira I, Twisk JWR, van Mechelen
W, Kemper H CG, Stehouwer CDA.
Development of fatness, fitness, and
lifestyle from adolescence to age of
36 years. Determinants of the metabolic syndrome in young adults: the
Amsterdam growth and heath longitudinal study. Arch Inter Med. 2005;
165:42-48.
13. Sun SS, Grave GD, Siervogel RM,
Pickoff AA, Arslanian S, Daniels SR.
Systolic blood pressure in childhood
predicts hypertension and metabolic
syndrome later in life. Pediatrics 2007;
119:237-246.
14. Mossberg HO. 40 year follow up of
overweight children. Lancet 1989;
2:491-493.
15. Belay B, Belamarich P, Racine AD.
Pediatric precursors of adult atherosclerosis. Pediatrics in Review 2004;
25:4-13.
16. Haslan D, Sattar N, Lean M. ABC
of obesity. Obesity-time to wake up.
BMJ 2006; 333:640-642.
17. Barker DPJ. The developmental origins of chronic adult disease. Acta
Paeddiatr 2004; Suppl 446:26-33.
18. Reilly JJ, Armstrong J, Dorosty A R,
Emmett PM, Ness A, Rogers I et al.
Early life risk factors for obesity in
childhood: cohort study. BMJ 2005;
330:1357-1359.
19. Padez C, Mourão I, Moreira P, Rosado V. Prevalence and risk factors
for overweight and obesity in Portuguese children. Acta Paediatr 2005;
94:1550-1557.
20. Erlanson-Albertsson C, Zetterstrom
R. The global obesity epidemic:
snacking and obesity may start with
free meals during infant feeding. Acta
Paediatr 2005, 94:1523-1531.
21. Vorona R D, Winn M, Babineau T, Eng
BP, Feldman HR, Ware C. Overweight
and obese patients in a primary care
population report less sleep than patients with a normal body mass index.
Arch Intern Med 2005; 165:25-30.
22. Gottileb Dj, Punjabi NM, Newman A,
Resnick H, Redline S, Baldwin CM,
Nieto FJ. Association of sleep time
with diabetes mellitus and impaired
glucose tolerance. Arch Intern Med
2005; 165:863-868.
23. Kohatsu N, Tsai R, Young T, VanGilder
R, Burmeister LF, Stronquist AM, Merchant JM. Sleep duration and body
mass index in rural population. Arch
Inter Med. 2006; 166:1701-1705.
24. Druce M, Bloom SR. The regulation of
appetite. Arch Dis Child 2006; 91:183187.
25. Spiegel K, Leproult R, Cauter EV. Impact of sleep debt on metabolic and
endocrine function. The Lancet 1999;
354:1435-1439.
26. Bas J, Turek FW. Sleepless in America. A pathway to obesity and the metabolic syndrome? Arch Intern Med
2005; 165:13-16.
27. Taheri S. Sleep and obesity. The link
between short sleep duration and
obesity: we should recommend more
sleep to prevent obesity. Arch Dis Chil
2006; 91:881-884.
28. Meyer AM, Kundt G, Streiner M,
Schuff-Werner P, Keinast W. Impaired
floow-mediated vasodilatation, carotid artery intima-media thickening, and
elevated endothelial plasma markers
in obese children: the impact of cardiovascular risk factors. Pediatrics
2006; 117:1560-1567.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Are sibling relationships protective?
A longitudinal study
Krista Gass, Jennifer Jenkins, Judy Dunn
J Child Psychol Psychiatry 2007; 48:167-175
Background: Although the protective effects of familial and parental
support have been studied extensively
in the child psychopathology literature,
few studies have explored the protective quality of positive sibling relationships.
Methods: A two-wave longitudinal
design was used to examine the protective effect of positive sibling relationships
COMENTÁRIOS
As relações pais-filhos, nomeadamente as relações precoces entre a mãe
e o bebé, têm sido largamente estudadas, conhecendo-se bem a importância
da vinculação, e os efeitos adversos no
desenvolvimento psicológico na criança,
quando as mesmas não são de boa qualidade. Menos investigadas têm sido as
relações entre irmãos. O presente estudo
vem clarificar um aspecto potencialmente
útil: o relacionamento positivo entre irmãos pode ser um factor de protecção,
quando as famílias experimentam níveis
elevados de stress.
Desde os trabalhos de Bowlby, que
é reconhecida aos pais a capacidade
de proporcionar segurança e conforto
quando as crianças sentem medo ou
mal-estar. Também se sabe que os acontecimentos de vida geradores de stress
(life events), podem ser um factor de
risco para o desenvolvimento de perturbações emocionais futuras nas crianças.
No entanto, sabe-se que certas crianças
são resilientes, e daí existir um grande interesse em conhecer-se os factores que
podem proporcionar um desenvolvimento saudável, mesmo que em condições
adversas. Sabe-se já que certos factores
on child adjustment for children experiencing stressful life events. Mothers reported on stressful life events and child
adjustment. Older siblings assessed the
quality of relationship between themselves and target children.
Results: Sibling affection moderated the relationship between stressful
life events and internalizing symptomatology but not the relationship between
têm um papel protector: grande suporte
familiar, relações pais-filhos positivas e
disciplina parental consistente.
Aos irmãos é reconhecido um papel
importante na socialização, através das
interacções e brincadeiras, no entanto,
alguns autores têm constatado que os irmãos podem também ser fonte de apoio
como por exemplo em famílias com grande conflitualidade.
O presente estudo é desenhado
para fazer uma análise longitudinal de
192 famílias, seleccionadas de uma pesquisa em Pais e Crianças de Avon, em
Inglaterra; as crianças em estudo nasceram entre Abril de 1991 e Dezembro
de1992. A primeira fase de recolha de dados começou em 1996, com uma segunda fase dois anos após a visita da família.
A média da diferença de idades entre os
irmãos era de 5,6 anos. As mães foram
entrevistadas e responderam a questionários sobre a vida familiar e os filhos;
a qualidade da relação mãe-criança era
avaliada. Se o filho mais velho tinha mais
que 7 anos, era também entrevistado e
respondia a um questionário sobre a sua
percepção da relação com o irmão mais
novo (SRI, Sibling Relationship Inventory,
de Stocker). Eram avaliados os eventos
stressful life events and externalizing
symptomatology. Notably, the protective
effect of sibling affection was evident
regardless of mother–child relationship
quality.
Conclusions: Positive sibling relationships are an important source of
support for children experiencing stressful life events. Implications for intervention are discussed.
de stress na família no último ano como
acidentes, doenças, problemas legais, familiares, etc, bem como o seu impacto. O
estado emocional e perfil comportamental da criança em estudo era avaliado
pelo questionário CBCL (Child Behavior
Checklist ) de Achenbach.
Os resultados confirmaram a hipótese colocada: nas famílias em que tinha
ocorrido um elevado número de acontecimentos de stress, as relações positivas
entre irmãos tinham tido um papel de
protecção em relação ao desenvolvimento de problemas emocionais de tipo internalizador (como medos, tristeza, queixas
somáticas, etc).
Estes resultados têm uma enorme
importância para todos os profissionais
que lidam com crianças e famílias multi-problemáticas. A existência de um relacionamento amistoso entre irmãos, pode
por si só constituir um factor que poderá
minorar as consequências nefastas na
criança mais nova. Este conhecimento
deveria ser considerado quando se separam irmãos em medidas de protecção a
crianças em risco: separam-se crianças
de pais considerados como perigosos ou
incompetentes, e, não raramente, dispersam-se crianças por várias instituições,
artigo recomendado
133
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
segundo parâmetros de género e idade.
Desta forma, para além das consequências negativas do abuso ou negligência a
que foram sujeitas, estarão a sofrer também a ruptura de vínculos significativos
com irmãos, talvez os únicos disponíveis
para uma criança proveniente de meios
desfavorecidos.
Mas as relações entre irmãos nem
sempre são positivas e saudáveis. Embora esteja identificado um quadro patológico nos manuais de classificação das
perturbações mentais - quadro designado por Perturbação de Rivalidade entre
Irmãos – este raramente é utilizado. Ora
esta categoria significa que o relacionamento entre irmãos pode ser patológico,
isto é, ter um carácter doentio, perturbando as relações dentro da família.A classificação da Organização Mundial de Saúde refere que “ a maior parte das crianças
pequenas fica perturbada pelo nascimento de um irmão ou de uma irmã. Na Perturbação de Rivalidade entre Irmãos, a
reacção emocional é evidentemente excessiva e acompanha-se de uma perturbação do funcionamento social.”(1)
Embora exista um continuum na
intensidade das queixas formuladas pelos pais, a rivalidade entre irmãos é uma
queixa bastante comum, quer ao nível de
consultas dos cuidados primários e de
pediatria, quer em consultas de serviços
de saúde mental. É de facto uma experiência universal e inerente às famílias que
optaram por não ter filhos únicos. A chegada de um irmão pode ser preparada
para minorar as dificuldades emocionais
na criança; as boas práticas dos pais podem ser fundamentais para promover um
relacionamento sadio entre os filhos, prevenindo o desenvolvimento de interacções patológicas. Algumas dessas boas
práticas são divulgadas pela Associação
Americana de Pediatria(2), que se podem
aqui sintetizar:
Crianças dos 2-4 anos
• Informar a criança sem demasiada
antecedência
• Ser honesto: as coisas não vão ser
iguais, mais vão continuar a gostar
dela
• Envolver a criança nos preparativos
• Não fazer grandes mudanças na altura do nascimento (exe: mudar de
berço)
• Tolerar que a criança possa regredir
um pouco
• Prepará-la para os dias a passar no
hospital
• Assegurar um tempo especial para
estar com ela
• Incentivar as visitas a dar atenção à
criança
• Passar tempo com o pai.
Quando as queixas persistem, é
frequente existir ansiedade parental com
indulgência excessiva, ou os pais fomentar a rivalidade entre irmãos. Pode ser útil
ajudar os pais a reconhecer eventuais
alianças com algum dos filhos, a perceber como por vezes o seu comportamento favorece o ciúme; identificar reacções
comuns como responsabilizar sistematicamente a criança mais velha, não reconhecendo as suas necessidades, por
exemplo, de um espaço e tempo próprios
para brincar, para estudar, etc. Ajudar a
compreender que a forma como a criança vai lidar com a frustração, o ter que
partilhar e negociar com outro, ou mesmo
competir – são experiências valiosas de
aprendizagem de competências sociais
fundamentais para a vida.
Maria do Carmo Santos1
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 133-134
BIBLIOGRAFIA
Crianças em idade escolar
• Tornar a criança parte do processo,
explicando as mudanças, mas em
que continuará a ter o seu lugar.
• Assegurar-se de que a criança sente
que é ouvida e que é importante para
os pais.
1. Classificação Internacional das Doenças, 10ª revisão, 1989, OMS.
2. http//www.aap.org/publiced/BR_Siblings_NewBaby.htm
__________
1
134
artigo recomendado
Pedopsiquiatra do HCECMP
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Pediatria Baseada na Evidência
Formulação de Questões e Pesquisa Bibliográfica
Luís Filipe Azevedo1, Altamiro da Costa Pereira1
RESUMO
A Medicina Baseada na Evidência
(MBE) é genericamente definida como
a aplicação consciente, explícita e criteriosa da melhor evidência científica disponível na tomada de decisões sobre o
cuidado individual dos doentes. Nesta
rubrica de Pediatria Baseada na Evidência será apresentado um conjunto de artigos abordando aspectos conceptuais,
metodológicos e operacionais relativos à
prática da MBE no âmbito específico da
Pediatria. Neste artigo desenvolvem-se
questões teóricas e práticas relacionadas
com a adequada e oportuna formulação
de questões clínicas e com a realização
de uma eficaz pesquisa da evidência
científica de maior qualidade na resposta à questão formulada. Na primeira
parte é recomendado um processo de
formalização das questões ou lacunas
de conhecimento identificadas na prática clínica diária, de forma a garantir a
sua adequada formulação no plano metodológico e facilitar o processo de pesquisa da evidência científica que permita
responder-lhes. Na segunda parte são
discutidos factores associados a uma
eficaz pesquisa da evidência científica,
é aconselhada a adequada preparação
duma estratégia de pesquisa e são recomendados e apresentados vários sítios e
recursos especialmente úteis ao sucesso
desta tarefa. Na última parte deste artigo
é apresentado e desenvolvido um exemplo prático de aplicação dos conceitos e
recursos abordados.
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 135-140
No primeiro artigo desta série(1) foram abordados aspectos relacionados
com a definição, enquadramento, evolução e importância da medicina baseada na evidência (MBE), com especial
ênfase na área da Pediatria. A MBE foi
genericamente definida como a aplicação consciente, explícita e criteriosa da
melhor evidência científica disponível na
tomada de decisões sobre o cuidado individual dos doentes(2-4). Adicionalmente
foi proposto um processo faseado que
facilita a sua implementação na prática
clínica diária e que é constituído por cinco fases(3):
1) Aproveitar as oportunidades que
surgem diariamente e que apelam à
adequada e oportuna formulação de
questões clinicamente relevantes;
2) Realização de uma eficaz pesquisa da
evidência científica de maior qualidade na resposta à questão formulada;
3) Realização de uma adequada análise
crítica da evidência encontrada, relativamente à sua validade, impacto e
aplicabilidade na prática clínica;
4) A integração da evidência científica
encontrada com a experiência clínica
individual, com o contexto específico
da prática clínica e com as características individuais (biológicas, psicológicas e sociais) de cada doente;
5) A avaliação deste processo com o
objectivo de maximizar a sua eficácia
e eficiência, tornando-o mais facilmente aplicável na prática clínica diária, minimizando o tempo e esforço
dispendidos e maximizando o ganho
em termos de qualidade de serviços
prestados e formação do próprio profissional de saúde.
__________
¹ Serviço de Bioestatística e Informática Médica, Faculdade de Medicina da Universidade
do Porto.
Neste segundo artigo desta série
serão desenvolvidos em maior detalhe
os aspectos relacionados com as duas
primeiras fases deste processo, nomeadamente, a adequada e oportuna formulação de questões clínicas e a eficaz
pesquisa da evidência científica mais relevante, com especial ênfase na área da
Pediatria.
A ADEQUADA E OPORTUNA FORMULAÇÃO DE QUESTÕES CLÍNICAS
Qualquer profissional de saúde verifica diariamente que, desde o gesto clínico mais simples até à aplicação das mais
complexas intervenções terapêuticas, a
prática clínica está recheada de importantes lacunas de conhecimento. Basta
que o clínico esteja atento à sua rotina diária para que as questões e a necessidade de informação e conhecimento surjam
naturalmente, por vezes, nos momentos,
locais e situações mais insuspeitos. Na
verdade, alguns autores que avaliaram
com mais cuidado as necessidades de
informação e conhecimento do clínico no
seu dia-a-dia concluíram que estas lacunas são muito frequentes, e que a procura de evidência científica beneficiaria
a qualidade dos serviços prestados, em
média, três vezes por cada doente internado e duas vezes por cada três doentes
de ambulatório(5, 6).
A prática da Pediatria baseada na
evidência implica, então, em primeiro
lugar, a adequada e oportuna formulação de questões clínicas relevantes e,
de preferência, passíveis de serem respondidas. Neste contexto, é recomendado um processo de formalização das
questões ou lacunas de conhecimento
identificadas, de forma a garantir a sua
adequada formulação no plano metodológico e facilitar o processo de pesquisa
da evidência científica que permita responder-lhes(2-4,7-10).
pediatria baseada na evidência
135
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Assim, ao pensar na formulação de
determinada questão clínica, dever-se-á
ter em atenção quatro elementos essenciais:
1) população ou problema;
2) intervenção;
3) intervenção alternativa;
4) variável de resultado clínico.
Na língua inglesa a tarefa de enumeração destes quatro elementos está
facilitada pela correspondência com a
mnemónica PICO (Patient or problem, Intervention, Comparison intervention and
Outcomes)(2, 3).
POPULAÇÃO OU PROBLEMA
Em primeiro lugar, dever-se-á definir o âmbito da questão clínica, através
da identificação da população (doente
ou não doente) ou do problema clínico
específicos que irão ser focados. Esta
definição deverá ser detalhada tendo em
conta todas as características clínicas
importantes para a questão em causa,
com implicações na prática clínica local
ou que afectem a relevância da evidência científica passível de ser encontrada
no contexto. Dever-se-á ter em atenção
que o grau de detalhe irá afectar directamente a pesquisa da evidência subsequente, pelo que, muitas vezes, surge a
necessidade de diminuir o detalhe para
facilitar o processo de pesquisa de evidência.
INTERVENÇÃO
Em seguida, dever-se-á identificar
a intervenção em causa na questão clínica de interesse. Quando pretendemos
responder a questões relacionadas com
a eficácia de intervenções terapêuticas,
torna-se simples a identificação da intervenção em análise, mas quando pensamos noutro tipo de questões esta identificação poderá não ser tão imediata. No
entanto, dever-se-á estabelecer a analogia adequada. Assim, numa questão
sobre etiologia da doença a intervenção
poderá, por exemplo, ser a exposição a
um determinado agente ambiental; enquanto que numa questão sobre diagnóstico a intervenção poderá, por exemplo, corresponder ao teste diagnóstico
em estudo.
136
pediatria baseada na evidência
INTERVENÇÃO ALTERNATIVA
A identificação da intervenção alternativa (caso esta exista) decorre naturalmente da definição da intervenção em
estudo, tratando-se assim de identificar
a intervenção que serve de comparação
com esta. No exemplo específico das
questões sobre eficácia terapêutica, a intervenção alternativa poderá corresponder à ausência de intervenção, aplicação
de um placebo, o tratamento habitual ou
uma intervenção alternativa propriamente dita.
VARIÁVEIS DE RESULTADO CLÍNICO
Por último, importa definir a variável de resultado clínico que é relevante
no contexto da questão clínica colocada.
Assim sendo, importa ter em atenção as
variáveis de resultado importantes para o
clínico e para o doente e o período temporal aplicável. Variáveis de resultado
típicas dizem respeito, por exemplo, à
mortalidade, morbilidade ou à qualidade
de vida.
TIPOS DE QUESTÕES
Uma vez formulada, importa decidir
qual o tipo de questão que se pretende
ver respondida. Esta classificação vai ter
consequências directas sobre o tipo de
evidência ou tipologia de estudos mais
adequados na resposta às questões.
Assim, é possível enumerar os tipos de
questões mais importantes e que surgem
mais frequentemente na prática clínica
diária: (a) diagnóstico; (b) tratamento; (c)
prognóstico; (d) risco e etiologia; (e) prevenção e (f) frequência de fenómenos.
Em função do tipo de questão a responder será possível identificar as abordagens metodológicas mais adequadas à
sua resposta e, desta forma, as características que deverão ser tidas em conta
na avaliação crítica da evidência. A identificação do tipo de questão poderá também auxiliar na definição da estratégia de
pesquisa da evidência.
PRIORIDADE DAS QUESTÕES
Após a adequada formulação das
questões dever-se-á ponderar os seguintes aspectos: Quais as questões mais
importantes para o bem-estar do doente?
Quais as questões cuja resposta é mais
fácil do ponto de vista prático? Quais as
questões cuja resposta poderá trazer
maiores benefícios para a prática clínica?
Quais as questões mais interessantes
para o profissional de saúde?
A EFICAZ PESQUISA DA EVIDÊNCIA
MAIS ADEQUADA
Após a adequada e oportuna formulação da questão clínica, será necessário encontrar de forma eficaz a evidência
científica que permitirá responder-lhe.
A eficácia da pesquisa da evidência estará dependente da qualidade e
preparação duma estratégia adequada
de pesquisa(11-15). Para a definição da
estratégia de pesquisa contribuem directamente os elementos identificados
anteriormente (população ou problema;
intervenção; intervenção alternativa e
variável de resultado clínico) e a identificação do tipo de questão (que estabelece o tipo de estudos mais apropriados à
sua resposta).
Após a estruturação da estratégia
de pesquisa será importante decidir
quais os recursos ou fontes de evidência mais adequados(11-16). Numa primeira abordagem, é importante verificar se
existem sítios ou recursos específicos
da área (ver tabela 1) que já tenham
feito o trabalho de pesquisa, avaliação
e sistematização da evidência científica
disponível para a resposta à questão em
causa. Em segundo lugar, poderá ser de
grande utilidade a procura de revisões
sistemáticas e estudos meta-análise
disponíveis para a resposta à questão
em causa (ver, por exemplo, recursos
da Cochrane Collaboration indicados
na tabela 1). Por último, poderá ser necessária a utilização de bases de dados
bibliográficas (ver recursos recomendados na tabela 1) para apoiar a pesquisa
da evidência mais relevante na resposta
à questão em causa.
A eficaz pesquisa da evidência,
fazendo uso das bases de dados bibliográficas, esta intimamente relacionada
com a formação específica na área e a
experiência na utilização das mesmas.
Apesar disso, vale a pena destacar alguns aspectos importantes que podem
auxiliar, especialmente, os utilizadores
menos experientes.
NASCER E CRESCER
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Existem muitas bases de dados
disponíveis para a efectivação de uma
pesquisa bibliográfica (ver tabela 1), no
entanto, é de conhecimento geral que a
mais utilizada na área biomédica é a MEDLINE. Esta é a principal base de dados
bibliográfica da National Library of Medicine (EUA) e tem mais de 15 milhões
de artigos indexados, e cerca de 500 mil
novas referências adicionadas por ano.
Esta base de dados é disponibilizada gratuitamente através do serviço PubMed
(ver Quadro I)(17).
Após uma adequada definição da
questão e da estratégia de pesquisa,
a utilização da MEDLINE pode ser feita
através da aplicação de ferramentas genéricas disponíveis no serviço PubMed
(ex: pesquisa por texto livre, uso de operadores booleanos, aspas, filtros com
limites específicos, etc.) ou através da
aplicação de algumas ferramentas mais
específicas, cuja utilização é recomendada. Destas ferramentas mais específicas, destacam-se a utilização dos termos
MeSH (medical subject headings)(18),
para a especificação da chave de pesquisa (ver tutorial disponível através da página da PubMed – www.nlm.nih.gov/bsd/
viewlet/mesh/searching/mesh1.html) e a
utilização da funcionalidade Clinical Queries, que aplica automaticamente um conjunto de filtros metodológicos em função
do tipo de questão (que foram especificamente estudados quanto à sensibilidade
e especificidade)(19), de forma a aumentar a eficácia da chave de pesquisa (ver
tutorial disponível através da página da
PubMed – www.nlm.nih.gov/bsd/disted/
pubmedtutorial/).
Naturalmente, a pesquisa bibliográfica poderá ser complementada através
da utilização de vários outros recursos
disponíveis (ver recursos e sítios recomendados no Quadro I)(11-16).
Uma dificuldade prática frequente diz
respeito à necessidade de pagamento
para a utilização de alguns dos recursos
recomendados e para o acesso às versões integrais de artigos científicos. Nas
instituições de ensino (por exemplo, na
Faculdade de Medicina da Universidade
do Porto) o problema está a ser parcialmente ultrapassado através da utilização
de assinaturas institucionais de muitos
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Quadro I: Sítios e recursos relacionados com a prática da Pediatria baseada na evidência.
Bases de Dados Bibliográficas
MEDLINE – Pubmed
www.ncbi.nlm.nih.gov/sites/entrez
The Cochrane database
www.cochrane.org
EBSCO Research Database
search.ebscohost.com/
Scopus
www.scopus.com/scopus/home.url
ISI - Web of Knowledge
portal.isiknowledge.com/
Sítios e Recursos sobre Pediatria Baseada na Evidência
The Cochrane Child Health Group
www.cochranechildhealth.ualberta.ca/
Centre for Evidence-Based Child Health
www.ich.ucl.ac.uk/ich/academicunits/Centre_for_evidence_based_child_health
Pediatrics Critical Care Medicine
pedsccm.org/EBJournal_Resources.php
University of Michigan – Evidence-Based Pediatrics Web Site
www.med.umich.edu/pediatrics/ebm
Sítios e Recursos sobre Medicina Baseada na Evidência
The U.K. Centre for EBM
www.cebm.net/
The McMaster EBM Project
hsl.mcmaster.ca/education/medicine/ebp.htm
Netting the Evidence, the largest database of EBM-related Web sites
www.shef.ac.uk/scharr/ir/netting/
Evidence based medicine – University of Washington School of Medicine
www.mebi.washington.edu/ebm-uwsom/
Revistas Científicas sobre Pediatria Baseada na Evidência ou que têm secções sobre esta temática
Evidence based Child Health: A Cochrane Review Journal
www3.interscience.wiley.com/cgi-bin/jhome/112100413
The Pediatrics Critical Care Medicine evidence-based journal club
pedsccm.org/EBJournal_Club_intro.php
The Journal of Pediatrics
journals.elsevierhealth.com/periodicals/ympd
Pediatrics
pediatrics.aappublications.org/
Archives of Pediatrics and Adolescent Medicine
archpedi.ama-assn.org/
Infectious Diseases in Children
www.idinchildren.com/Default.asp
Revistas e Journal Clubs sobre Medicina Baseada na Evidência
Evidence-based Medicine
ebm.bmj.com/
Evidence-based Practice
www.ebponline.net/
Journal club on the Web
www.journalclub.org/index.php
Journal of Family Practice journal club
www.jfponline.com/
Sítios e Recursos sobre Avaliação Crítica da Evidência
User’s Guides to the Medical Literature
www.cche.net/usersguides/main.asp
Critically Appraised Topics
www.ebmny.org/cats.html
The Critical Care Database of Critically Appraised Evidence
pedsccm.org/EBJournal_Club_intro.php
The CATbank
www.minervation.com/cebm2/cats/allcats.html
Guidelines Clínicas de Entidades Oficiais
National Guideline Clearinghouse – Agency for Healthcare Research and Quality
www.ngc.gov/
CDC Prevention Guidelines
wonder.cdc.gov/wonder/prevguid/prevguid.html
Forums e Mailing lists
Pediatric Talk mailing list
http://www.pcc.com/lists/pedtalk/
International Pediatric Chat
www.pedschat.org/
pediatria baseada na evidência
137
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Figura 1: Utilização da funcionalidade Clinical Queries do PubMed (recurso para acesso gratuito à MEDLINE), na pesquisa bibliográfica efectuada.
Figura 2: Resultados da pesquisa bibliográfica efectuada através da aplicação da funcionalidade Clinical Queries e dos Limits para artigos relativos a
crianças entre os 0 e os 23 meses.
138
pediatria baseada na evidência
NASCER E CRESCER
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
destes recursos. A importância da utilização destes recursos mereceria, sem dúvida e especialmente na presente conjuntura, que o próprio Ministério da Saúde
garantisse a sua disponibilização gratuita
em todas as instituições do Sistema Nacional de Saúde.
EXEMPLO PRÁTICO
CENÁRIO
Um lactente de 4 meses do sexo
masculino apresenta febre (38,9ºC) e
não tem foco identificável ao exame clínico. O seu estado geral não é séptico
e a análise da urina não apresenta alterações relevantes. Não tem sintomas
respiratórios e não tem quaisquer sinais
clínicos de meningite. O clínico conclui
que esta criança tem um baixo risco de
apresentar uma doença infecciosa séria
de etiologia bacteriana. Neste contexto,
e tendo em atenção uma apresentação
num congresso a que assistiu recentemente, o clínico questiona-se sobre o
papel que o doseamento da procalcitonina poderia ter, neste caso, na exclusão
de uma patologia bacteriana importante
que necessite de tratamento antibiótico
imediato(20).
FORMULAÇÃO ESTRUTURADA DA
QUESTÃO CLÍNICA
Em lactentes com febre e sem foco
de infecção clinicamente identificável (população ou problema), será o doseamento sérico da procalcitonina (intervenção)
um teste diagnóstico útil na exclusão de
patologia bacteriana importante (variável
de resultado clínico)?
Dada a questão que foi colocada
é fácil de concluir que se trata de uma
questão sobre diagnóstico. Neste caso
particular, sobre a utilidade de um determinado teste diagnóstico na exclusão de
patologia bacteriana importante.
PESQUISA DA EVIDÊNCIA
Para a realização da pesquisa bibliográfica utilizou-se a base de dados
MEDLINE através do serviço PubMed
(os resultados em seguida apresentados
dizem respeito a uma pesquisa feita em
Setembro de 2007). De forma a facilitar
o processo de pesquisa, utilizou-se inicialmente a funcionalidade Clinical Que-
ano 2007, vol XVI, n.º 3
ries (ver figura 1). Na caixa de texto livre
da página de acesso à Clinical Queries
colocou-se uma chave de procura muito
simples: Procalcitonin AND “bacterial infection”. Em seguida, seleccionou-se o
tipo de questão adequado a este caso
“diagnosis”, e optou-se por uma estratégia de pesquisa mais sensível (de forma
a tentar identificar a maior quantidade
possível de evidência potencialmente
relevante).
Os resultados desta pesquisa são
119 artigos potencialmente relevantes,
dos quais 29 são revisões bibliográficas.
O passo seguinte será, através da utilização da funcionalidade Limits da PubMed, limitar os resultados da pesquisa
a artigos respeitantes ao grupo etário
que nos interessa. Para isto, utilizando
a página da funcionalidade Limits serão seleccionados artigos respeitantes
unicamente ao grupo etário “All Infant:
birth-23 months”. O resultado desta estratégia de pesquisa é uma lista de 34
artigos potencialmente relevantes dos
quais 8 são revisões bibliográficas (ver
figura 2). A análise dos resumos destes
artigos permitiu identificar rapidamente 5
artigos altamente relevantes na resposta
à questão colocada(20).
Em alternativa, poderia tentar-se
a pesquisa de revisões sistemáticas ou
estudos de meta-análise sobre a questão
em análise. De uma forma também muito
simples, e utilizando ainda a página da
funcionalidade Clinical Queries, poderse-ia aplicar a mesma chave de pesquisa Procalcitonin AND “bacterial infection”
no local específico “Find Systematic
Reviews”. O resultado desta estratégia
de pesquisa alternativa é uma lista de 3
artigos, dos quais só um deles é, de facto, uma revisão sistemática e estudo de
meta-análise. O artigo tem por título “Serum procalcitonin and C-reactive protein
levels as markers of bacterial infection: a
systematic review and meta-analysis”(21)
e é, na verdade, uma revisão sistemática
sobre a questão em análise, no entanto,
não apresenta resultados específicos
para idades pediátricas.
Naturalmente, as estratégias e recursos apresentados são exemplificativos e privilegiaram a utilização de metodologias de pesquisa de evidência muito
simples. Vários outros recursos, funcionalidades e métodos mais complexos
poderiam ter sido utilizados para obter
os mesmos resultados, no entanto, este
exemplo demonstra que mesmo com
métodos muito simples é possível obter
resultados muito bons.
Após a identificação eficaz da evidência, será necessário que o clínico
seja capaz de rapidamente avaliar as
características metodológicas mais relevantes dos artigos, em função do tipo de
questão analisada, de forma a fazer uma
adequada selecção da evidência mais
relevante, sendo necessário depois avaliar de forma mais detalhada a qualidade
desses artigos. No próximo número desta série será abordada genericamente a
metodologia de avaliação da qualidade
da evidência e sua implementação prática. Depois destes artigos de natureza
mais metodológica serão publicados
alguns exemplos de aplicação prática
destes conceitos, focando os tipos de
questões mais frequentes e importantes
nesta área.
THE FORMULATION OF CLINICAL
QUESTIONS AND SEARCHING FOR
THE CURRENT BEST EVIDENCE
ABSTRACT
Evidence Based Medicine (EBM) is
generically defined as the conscientious,
explicit and judicious use of current best
evidence in making decisions about the
care of individual patients. In this section
of Evidence Based Paediatrics a series
of articles about the conceptual, methodological and operational issues linked
to the practice of EBM in the field of Paediatrics will be published in the following
issues of this journal. In the present article theoretical and practical issues related to the adequate formulation of clinical
questions and the effective search of the
current best evidence will be presented.
In the first part, a structured process for
the formulation of answerable clinical
questions, methodologically adequate
and helpful in the search for evidence,
is presented and recommended. In the
second part, factors related to the effective search for the best evidence are dis-
pediatria baseada na evidência
139
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
cussed, the previous preparation of an
adequate search strategy is suggested
and several sites, tools and resources,
especially helpful in finding the current
best evidence, are described and recommended. In the last part of the article a
practical example is presented and discussed.
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 135-140
BIBLIOGRAFIA
1. LF Azevedo, A Costa Pereira: Pediatria Baseada na Evidência. Nascer e
Crescer. Revista do Hospital de Crianças Maria Pia 2007, vol 16:29-31.
2. E-BMW Group: Evidence-based medicine. A new approach to teaching the
practice of medicine. Evidence-Based
Medicine Working Group. Jama 1992,
268:2420-5.
3. DL Sackett, Richardson, W.S.,
Rosenberg, W., Haynes, R.B.: Evidence Based Medicine. London, U.K.:
Churchill-Livingstone; 1997.
4. DL Sackett, WM Rosenberg, JA Gray,
RB Haynes, WS Richardson: Evidence based medicine: what it is and
what it isn’t. Bmj 1996, 312:71-2.
5. ML Green, MA Ciampi, PJ Ellis: Residents’ medical information needs in
clinic: are they being met? Am J Med
2000, 109:218-23.
140
pediatria baseada na evidência
6. JA Osheroff, DE Forsythe, BG Buchanan, RA Bankowitz, BH Blumenfeld, RA Miller: Physicians’ information needs: analysis of questions
posed during clinical teaching. Ann
Intern Med 1991, 114:576-81.
7. JG Frohna, SM Park: Promoting the
use of evidence-based medicine in
pediatrics. J Pediatr 2002, 141:599600.
8. WE Gerhardt, PJ Schoettker, EF
Donovan, UR Kotagal, SE Muething:
Putting evidence-based clinical practice guidelines into practice: an academic pediatric center’s experience.
Jt Comm J Qual Patient Saf 2007,
33:226-35.
9. D Lockwood, M Armstrong, A Grant:
Integrating evidence based medicine
into routine clinical practice: seven
years’ experience at the Hospital for
Tropical Diseases, London. Bmj 2004,
329:1020-3.
10. HS Williams: Toward consistent evidence-based pediatric practice: developing a reliable process for narrowing variation. Pediatr Rev 2006,
27:e66-70.
11. GS Doig, F Simpson: Efficient literature searching: a core skill for the
practice of evidence-based medicine.
Intensive Care Med 2003, 29:211927.
12. E Fineout-Overholt, S Hofstetter, L
Shell, L Johnston: Teaching EBP:
getting to the gold: how to search for
the best evidence. Worldviews Evid
Based Nurs 2005, 2:207-11.
13. E Fineout-Overholt, L Johnston:
Teaching EBP: asking searchable,
answerable clinical questions. Worldviews Evid Based Nurs 2005, 2:15760.
14. S Sanders, C Del Mar: Clever
searching for evidence. Bmj 2005,
330:1162-3.
15. RL Smyth: Evidence-based medicine.
Paediatr Respir Rev 2000, 1:287-93.
16. GR Kim, CU Lehmann: The impact
of the Internet on pediatric medicine.
Paediatr Drugs 2003, 5:433-41.
17. T Greenhalgh: How to read a paper.
The Medline database. Bmj 1997,
315:180-3.
18. M Clarke, L Greaves, S James:
MeSH terms must be used in Medline
searches. Bmj 1997, 314:1203.
19. RB Haynes, N Wilczynski: Finding
the gold in MEDLINE: clinical queries.
ACP J Club 2005, 142:A8-9.
20. D Herd: In children under age three
does procalcitonin help exclude serious bacterial infection in fever without
focus? Arch Dis Child 2007, 92:362-4.
21. L Simon, F Gauvin, DK Amre, P SaintLouis, J Lacroix: Serum procalcitonin
and C-reactive protein levels as markers of bacterial infection: a systematic
review and meta-analysis. Clin Infect
Dis 2004, 39:206-17.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Caso Endoscópico
Fernando Pereira1
O caso de hoje refere-se a um ado-
de 54gr/l com 43,5% de albumina. A fun-
segundas, intenso infiltrado inflamatório,
lescente de 15 anos, de raça caucasiana,
ção renal e hepática eram normais bem
constituído por polimorfonucleares neu-
autista e invisual, filho de pais saudáveis
como o estudo da coagulação. O exame
trófilos, linfócitos e plasmócitos, atrofia do
e não consanguíneos, residente no Minho
bacteriológico e o parasitológico de fezes
epitélio das criptas glandulares e múlti-
e que foi enviado à consulta de Gastren-
foram negativos. O exame radiológico do
plos microabcessos crípticos. Não foram
terologia por apresentar rectorragias.
tórax era normal.
observados granulomas.
O doente, com passado de obsti-
O doente foi submetido a obser-
pação funcional, começou a apresentar
vação proctológica e colonoscopia sob
sangue nas fezes em pequena quantida-
anestesia geral, verificando-se ausência
de, cerca de um mês antes da consulta.
de lesões anais ou perianais e apresen-
A quantidade de sangue foi aumentando
tando as alterações da mucosa do cólon
1 - Enterocolite necrosante
progressivamente e na última semana
que mostramos na figura. Foram efectua-
2 - Colite ulcerosa aguda
instalou-se quadro de diarreia abundante
das múltiplas biópsias para exame micro-
3 - Colite amibiana
com muco e sangue.
biológico e anatomo-patológico, sendo
4 - Colite alérgica.
Apesar das dificuldades de comunicação não parecia haver outros sintomas
para além de acentuada perda de apetite
referida pelos pais.
Era um adolescente com bom desenvolvimento estaturo-ponderal, com
ligeira palidez das mucosas e da pele,
sem outras alterações ao exame objectivo, embora não tenha sido possível
efectuar o exame proctológico por não
colaboração do doente. Os sinais vitais
eram normais.
Efectuou estudo analítico que evidenciou a presença de anemia (Hg-9,8gr/
dl) hipocrómica e microcítica com ferro sérico diminuído e ferritina elevada (150gr/
l), leucocitose (17500 mmc) com fórmula leucocitária equilibrada, VSG 50mm
na 1ªh, PCR-11,3mg/dl e Orosomucoide
248mg/dl. As proteínas tinham um valor
__________
1
Serviço de Gastroenterologia
Hospital de Crianças Maria Pia
142
qual o seu diagnóstico
as primeiras negativas e mostrando as
Em face deste quadro qual lhe parece ser o diagnóstico mais adequado:
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
COMENTÁRIOS
A imagem endoscópica que mostramos na figura foi obtida no cólon sigmoide mas é representativa do aspecto
de todo o cólon do nosso doente. Nela
observamos intenso processo inflamatório do intestino grosso, com edema
acentuado, congestão intensa, ulceração superficial e focos hemorrágicos.
Estas lesões atingiam de forma difusa o
recto e cólon.
Estes aspectos endoscópicos são
muito sugestivos de quadro de colite ulcerosa aguda. A enterocolite necrosante
é em geral uma doença com atingimento
segmentar do intestino e mais frequente
no período neonatal e não neste grupo
etário. A colite amibiana, é uma doença
inflamatória geralmente segmentar com
úlceras de maiores dimensões e associada à permanência em zonas endémicas
da doença o que não é o caso do nosso
doente. A colite alérgica é também uma
doença de idades mais jovens, tem geralmente carácter mais segmentar, geralmente distal e atinge especialmente as
áreas de implantação dos folículos linfoides do colon e recto.
Se ao aspecto endoscópico acrescentarmos a negatividade dos exames
microbiológicos e as características
histológicas observadas nas biópsias o
diagnóstico mais provável é o de colite
ulcerosa aguda.
Com este diagnóstico o doente iniciou tratamento com prednisolona 40mg/
dia oral, dieta hiperproteica, ferro oral e
polivitamínico, verificando-se melhoria
progressiva do seu quadro clínico e laboratorial com total normalização ao fim de
seis semanas. O tratamento de manutenção foi feito com ácido 5-aminosalicílico.
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 142-143
BIBLIOGRAFIA
1. Inflammatory Bowel Disease Working
Group of ESPGHAN. “Inflammatory
bowel disease in children and Adolescents: recommendations for diagnosis – the Porto criteria.
JPGN 2005; 41:1-7
2. Working Group of The North American Society for Pediatric Gastroenterology, Hepatology, and Nutrition and
Crohn and Cilitis Foundation of America.
Differentiating Ulcerative Cilitis from
Crohn Disease in Children and Young
Adults.
JPGN 2007; 44:653-674
qual o seu diagnóstico
143
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Caso Estomatológico
José M. S. Amorim1
Criança de 7 anos de idade que foi
enviada à consulta de Estomatologia devido a dor a nível do 1º quadrante (maxilar superior direito) exacerbada com a variação de temperaturas e com a ingestão
de alimentos doces.
Ao exame objectivo a criança apresenta bom desenvolvimento estato-ponderal.
A nível dentário apresenta sulcos
do 1º molar superior direito escurecidos e
com pequena cárie de esmalte a nível da
fosseta distal do referido dente.
Antecedentes pessoais e familiares
irrelevantes.
Face ao descrito:
Qual o seu diagnóstico?
Qual a sua atitude?
Figura 1
__________
1
Serviço de Estomatologia Hospital de Crianças Maria Pia - Porto
144
qual o seu diagnóstico
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
O presente quadro clínico insere-se
nas alterações dos tecidos duros dentários e dentro deste nas cáries de esmalte.
Estas cáries instalam-se insidiosamente.
A fisiopatologia da cárie já foi abordada em número anterior e será novamente abordada em números seguintes,
mas neste momento serve o presente
caso para abordar a temática da aplicação de selantes de fossetas e fissuras em
dentes sãos e/ou em dentes com cáries
de esmalte.
A aplicação de selantes de fossetas e fissuras é um acto de fácil execução técnica, altamente conservador, com
excelente eficácia clínica e de baixos
custos, mas que deve ser tomado com
bastante senso, uma vez que deve estar
baseado numa filosofia de promoção de
saúde oral e ser somente usado em situações bem seleccionadas.
A aplicação de selantes em pacientes com má higiene oral está contra-indicada, pois por vezes ocorre fractura do
selante e esse local torna--se mais retentivo de restos alimentares facilitando
o aparecimento e evolução de cárie por
baixo do resto do selante remanescente.
Neste caso foi removido o tecido
cariado e afundados os sulcos dentários,
afim de que o selante ficasse com maior
retenção e obturada toda a superfície
oclusal com selante.
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 144-145
BIBLIOGRAFIA
Caderno de Odontopediatria “Cariologia:
Diagnóstico, Controle e Tratamento”,
Giselle Rodrigues de Sant´ana, 1ª
edição - 2001, Livraria Santos Editora, - Pag.52-55
qual o seu diagnóstico
145
RCM em anexo.
PT-22-07-009 Serono Portugal, Lda, An affiliate of Merck Serono S.A. • Rua Alfredo da Silva, 3C - 1300-040 Lisboa • Tel: 213 613 500 - Fax: 213 613 662 • Cont.: 501 749 284 - Capital Social: € 523.739,00 - C.R.C.L. n.º 66229
RESUMO DAS CARACTERÍSTICAS DO MEDICAMENTO. DENOMINAÇÃO DO MEDICAMENTO. SAIZEN 8 mg click.easy, pó e solvente para solução injectável. COMPOSIÇÃO QUALITATIVA
E QUANTITATIVA. Cada frasco para injectáveis de SAIZEN 8 mg click.easy contém Somatropina* (hormona do crescimento humana recombinante). *produzida pela tecnologia do ADN recombinante
em células de mamífero. A reconstituição com o solvente bacteriostático contido no cartucho apresenta uma concentração de 5,83 mg por ml. Excipientes, ver secção “Lista de Excipientes”. FORMA
FARMACÊUTICA: Pó e solvente para solução injectável. Pó branco liofilizado e solvente límpido e incolor. INFORMAÇÕES CLÍNICAS: Indicações terapêuticas - SAIZEN está indicado no
tratamento de: - atraso do crescimento em crianças causado por secreção insuficiente ou inexistente da hormona do crescimento endógena; - atraso do crescimento em raparigas com disgenésia
gonadal (Síndroma de Turner) confirmada por análise do cariotipo; - atraso do crescimento em crianças pré-pubertárias devido a insuficiência renal crónica (IRC). - atraso do crescimento (estatura
actual < -2,5 Desvio Padrão (DP) e estatura ajustada à dos progenitores < -1 DP) em crianças pequenas com baixa estatura para a idade gestacional (SGA “Small for Gestational Age”), com um
peso e/ou comprimento à nascença inferior a –2 DP, que não conseguiram uma recuperação do crescimento (DP da velocidade de crescimento <0 durante o último ano) até aos 4 ou mais anos de
idade. Terapêutica de substituição em adultos com deficiência pronunciada de hormona do crescimento, diagnosticada por um único teste dinâmico para deficiência de hormona do crescimento.
Os doentes deverão também satisfazer os seguintes critérios: Início na infância: Os doentes com deficiência de hormona do crescimento diagnosticada na infância, deverão ser reavaliados, para
confirmação da deficiência em hormona do crescimento, antes de iniciar o tratamento com SAIZEN. Início na idade adulta: A deficiência de hormona do crescimento no adulto deverá ser resultante
de doença hipotalâmica ou hipofisária, e o doente deve apresentar pelo menos outra deficiência hormonal (excepto a prolactina), a qual deverá ser adequadamente tratada com terapêutica de
substituição, antes do início do tratamento com hormona do crescimento. POSOLOGIA E MODO DE ADMINISTRAÇÃO: SAIZEN 8 mg click.easy destina-se a administração multidose. A posologia
do SAIZEN deve ser individualizada para cada doente com base na superfície corporal ou no peso corporal. É recomendada a administração de SAIZEN ao deitar, nas doses seguintes: Atraso do
crescimento devido a secreção insuficiente da hormona do crescimento endógena: 0,7-1,0 mg/m2 de superfície corporal, por dia, ou 0,025-0,035 mg/kg de peso corporal, por dia, por
administração subcutânea. Atraso do crescimento em raparigas devido a disgenésia gonadal (Síndroma de Turner): 1,4 mg/m2 de superfície corporal ou 0,045 – 0,050 mg/kg de peso corporal,
por dia, por administração subcutânea. A terapêutica concomitante com esteróides anabólicos não-androgénicos em doentes com Síndroma de Turner pode aumentar a resposta do crescimento.
Atraso do crescimento em crianças pré-pubertárias devido a insuficiência renal crónica (IRC): 1,4 mg/m2 de superfície corporal, aproximadamente igual a 0,045-0,050 mg/kg de peso
corporal, por dia, por administração subcutânea. Atraso do crescimento em crianças pequenas com SGA: A dose diária recomendada é 0,035 mg/kg de peso corporal por dia (ou 1 mg/m2/dia,
igual a 0,1 UI/kg/dia ou 3 UI/m2/dia), por administração subcutânea. Duração do tratamento: O tratamento deve ser interrompido quando o doente tiver atingido uma estatura adulta satisfatória,
ou quando as epífises estiverem fechadas. No atraso do crescimento em crianças pequenas com SGA, o tratamento é habitualmente recomendado até que se atinja a estatura final. O tratamento
deve ser suspenso após o primeiro ano, se o desvio padrão da velocidade de crescimento for inferior a +1. O tratamento deve ser suspenso quando se atinge a estatura final (definida como
velocidade do crescimento < 2 cm/ano) e, no caso de ser necessária a confirmação, a idade óssea seja >14 anos nas raparigas ou > 16 anos nos rapazes, o que corresponde ao encerramento
epifisário. Deficiência de hormona do crescimento no adulto: No início do tratamento com somatropina, recomendam-se doses baixas, de 0,15 a 0,3 mg, administradas diariamente por injecção
subcutânea. A dose deverá ser gradualmente aumentada, mediante controlo dos valores do Factor de Crescimento Insulin-like (IGF-1). A dose final recomendada de hormona do crescimento
raramente excede 1,0 mg/dia. De modo geral deverá ser administrada a dose mínima eficaz. Nos doentes com mais idade ou com excesso de peso, poderão estar indicadas doses mais baixas.
MODO DE ADMINISTRAÇÃO: Para a administração da solução reconstituída para injecção de SAIZEN 8 mg click.easy, consulte as instruções do folheto informativo e do manual de instruções
fornecido com o auto-injector seleccionado: o auto-injector one.click, o auto-injector sem agulha cool.click ou o auto-injector easypod. Consulte também a secção “Instruções de utilização/
manuseamento”. CONTRA-INDICAÇÕES: SAIZEN não deve ser utilizado em crianças em que tenha ocorrido a fusão das epífises. SAIZEN está contra-indicado em doentes com hipersensibilidade
à Somatropina ou a qualquer um dos excipientes do pó para solução injectável ou do solvente. SAIZEN está contra-indicado em doentes com neoplasia activa. A terapêutica anti-tumoral deverá
estar terminada antes do início do tratamento com Somatropina. SAIZEN não deve ser utilizado em casos com evidência de qualquer progressão ou recorrência de uma lesão intracraniana
subjacente. Doentes com patologia aguda crítica, apresentando complicações pós cirurgia de coração aberto, cirurgia abdominal, politraumatizados, insuficiência respiratória aguda ou situações
similares não devem ser tratados com Somatropina. (Relativamente aos doentes, em tratamento com Somatropina, que desenvolvam uma situação clinicamente crítica, ver “Advertências e
precauções especiais de utilização”.). ADVERTÊNCIAS E PRECAUÇÕES ESPECIAIS DE UTILIZAÇÃO: O tratamento deve ser efectuado sob a vigilância regular de um médico com experiência
no diagnóstico e tratamento de doentes com deficiência de hormona do crescimento. Os doentes com neoplasia intra ou extracraniana em remissão, e em tratamento com hormona do crescimento,
devem ser cuidadosamente observados pelo médico em intervalos regulares. Os doentes com deficiência de hormona do crescimento secundária a um tumor intracraniano, devem ser examinados
frequentemente para avaliação da progressão ou recorrência da patologia subjacente. Foram registados alguns casos de leucemia em crianças com deficiência de hormona do crescimento,
tratadas ou não com esta hormona, podendo eventualmente representar um ligeiro aumento da incidência desta patologia, quando comparado com crianças sem esta deficiência. Não se encontra
estabelecida uma relação causal com o tratamento com hormona do crescimento. Após a administração de hormona do crescimento observa-se uma hipoglicémia transitória de aproximadamente
2 horas e, nas 2-4 horas seguintes verifica-se uma elevação dos níveis de glucose no sangue, apesar da existência de uma concentração elevada de insulina. A Somatropina pode induzir um estado
de resistência à insulina, o qual pode resultar em hiperinsulinismo e, em alguns casos, hiperglicémia. Para detectar uma resistência à insulina, os doentes deverão ser monitorizados para evidência
de intolerância à glucose. SAIZEN deve ser utilizado com precaução em doentes com diabetes mellitus ou com história familiar de diabetes mellitus. Os doentes com diabetes mellitus podem
necessitar de um ajuste da sua terapêutica anti-diabética. Uma retinopatia estável não deve levar à suspensão da terapêutica de substituição com Somatropina. No caso de surgirem alterações
pré-proliferativas e na presença de retinopatia proliferativa deve ser suspensa a terapêutica de substituição com Somatropina. Durante o tratamento com Somatropina, verificou-se um aumento da
conversão de T4 para T3, o qual pode resultar a nível do soro numa redução das concentrações de T4 e num aumento das concentrações de T3. Em geral, os níveis periféricos da hormona tiroideia
permaneceram dentro dos limites de referência para indivíduos saudáveis. O efeito da Somatropina nos níveis da hormona tiroideia pode ter relevância clínica em doentes com hipotiroidismo central
subclínico, nos quais, em teoria, se pode desenvolver hipotiroidismo manifesto. Inversamente, em doentes a receber terapêutica de substituição com tiroxina, pode ocorrer hipertiroidismo ligeiro.
Portanto, é aconselhável a avaliação da função tiroideia após o início do tratamento com Somatropina e sempre que se proceda a ajustes da dose. Pode verificar-se retenção de líquidos durante
a terapêutica de substituição com hormona do crescimento no adulto. No caso de edema persistente ou parestesia grave, a dosagem deverá ser reduzida de modo a evitar o desenvolvimento da
síndroma do canal cárpico. No caso de cefaleia grave ou recorrente, problemas visuais, náuseas e/ou vómitos, recomenda-se uma fundoscopia para verificar se existe papiloedema. Se se confirmar
o papiloedema, deve considerar-se o diagnóstico de hipertensão intracraniana benigna (ou pseudotumor cerebral) e interromper o tratamento com SAIZEN. Actualmente, não existe evidência
suficiente para levar a uma decisão clínica em doentes com hipertensão intracraniana resolvida. Se se reiniciar o tratamento com hormona do crescimento, é necessária uma monitorização
cuidadosa para detecção de sintomas de hipertensão intracraniana e o tratamento deve ser suspenso se se verificar recorrência da hipertensão intracraniana. O deslizamento da epífise femural é
frequentemente associado a perturbações endócrinas, tais como deficiência de hormona do crescimento e hipotiroidismo, e períodos de maior velocidade de crescimento. Em crianças tratadas com
hormona do crescimento, o deslizamento da epífise femural pode ser devido quer a perturbações endócrinas subjacentes ou à maior velocidade do crescimento causada pelo tratamento. Os
períodos de maior velocidade de crescimento podem aumentar o risco de alterações articulares, especialmente a articulação coxo-femural está sob particular pressão durante o surto de crescimento
pré-pubertário. O médico e os pais devem estar alerta no caso de a criança tratada com SAIZEN apresentar claudicação ou queixas articulares localizadas à coxo-femural ou joelho. As crianças
com atraso do crescimento devido a insuficiência renal crónica, devem ser examinadas periodicamente para evidência ou progressão de osteodistrofia renal. Em crianças com osteodistrofia renal
avançada pode verificar-se episiolístese ou necrose avascular da cabeça do femural, sendo incerto se estes problemas são afectados pelo tratamento com hormona do crescimento. Antes de se
iniciar o tratamento deverá ser efectuado um radiograma das articulações coxo-femurais. Nas crianças com insuficiência renal crónica, a função renal deve apresentar um decréscimo de 50%
relativamente ao padrão normal, antes de se instituir o tratamento. O crescimento deve ser monitorizado durante um ano antes de se instituir a terapêutica, de modo a verificar alterações no
crescimento. O tratamento convencional da insuficiência renal (o qual inclui o controlo da acidose, do hiperparatiroidismo e do estado nutricional durante o ano anterior ao tratamento) deve ter sido
estabelecido e mantido durante o tratamento. O tratamento deve ser interrompido na altura do transplante renal. Antes de se iniciar o tratamento em crianças pequenas com SGA, devem ser
excluídas outras razões clínicas ou tratamentos que possam explicar o atraso do crescimento. Em crianças pequenas com SGA, recomenda-se a determinação da insulina e da glicémia em jejum,
antes do início do tratamento e anualmente. Em doentes com risco aumentado para diabetes mellitus (por exemplo, história familiar de diabetes, obesidade, índice aumentado de massa corporal,
resistência grave à insulina, acanthosis nigricans) deve ser realizado o teste da tolerância à glucose oral. Em caso de diagnóstico de diabetes, não deve ser administrada hormona do crescimento.
Em crianças pequenas com SGA, recomenda-se a determinação do nível de IGF-I antes do início do tratamento e depois, duas vezes por ano. Caso se detectem, em determinações sucessivas,
níveis de IGF-1 que excedam +2 DP em relação à referência para a idade, a razão IGF-I/IGFBP-3 pode ser considerada para o ajuste da dose. Existe experiência limitada no início do tratamento
em doentes com SGA e que estejam próximos do início da puberdade. Não se recomenda portanto o início do tratamento em doentes com idade próxima do início da puberdade. A experiência em
doentes com SGA, com a síndroma de Silver-Russel é limitada. Em crianças com SGA, parte do ganho em estatura obtido com o tratamento com Somatropina pode perder-se, caso este seja
suspenso antes de se atingir a estatura final. Deve mudar-se o local da injecção para evitar lipoatrofia. A deficiência em hormona do crescimento no adulto é uma situação vitalícia, pelo que deverá
ser tratada adequadamente. No entanto, é limitada a experiência em doentes com mais de 60 anos ou em tratamentos prolongados. Em todos os doentes que apresentem uma patologia aguda
crítica, o possível benefício do tratamento com Somatropina deverá ser avaliado relativamente ao potencial risco envolvido. Foram relatados casos de apneia do sono e morte súbita em doentes
com Síndroma de Prader-Willi em tratamento com Somatropina. SAIZEN não está indicado no tratamento de doentes com Síndroma de Prader-Willi. INTERACÇÕES MEDICAMENTOSAS E
OUTRAS FORMAS DE INTERACÇÃO: A terapêutica concomitante com corticosteróides pode inibir a resposta ao SAIZEN. Verificou-se que a Somatropina induz uma redução ligeira dos níveis de
cortisol sérico em doentes com deficiência de hormona do crescimento recebendo terapêutica de substituição das suprarrenais. Consequentemente, nos doentes em terapêutica de substituição
com corticosteróides, que iniciam terapêutica com Somatropina, recomenda-se a monitorização dos níveis de cortisol sérico e o eventual ajuste da dose dos corticosteróides. Dados in vitro
publicados indicam que a hormona do crescimento pode ser um indutor do citocromo P450 3A4. Desconhece-se o significado clínico desta observação. No entanto, quando a Somatropina é
administrada em combinação com medicamentos que se sabe serem metabolizados pelas enzimas hepáticas do CYP P450 3A4, é aconselhável monitorizar a efectividade clínica de tais
medicamentos. GRAVIDEZ E ALEITAMENTO: Gravidez: No que respeita a SAIZEN, não existem dados clínicos sobre as gravidezes a ele expostas. Assim, desconhece-se o risco para o ser
humano. Embora os estudos em animais não indiquem um risco potencial durante a gravidez, o tratamento com SAIZEN deve ser interrompido no caso de ocorrer uma gravidez. Aleitamento:
Desconhece-se se as hormonas peptídicas exógenas são excretadas no leite, mas a absorção da proteína intacta pelo tracto gastrintestinal da criança é improvável. EFEITOS SOBRE A
CAPACIDADE DE CONDUZIR E UTILIZAR MÁQUINAS: SAIZEN não interfere com a capacidade de conduzir ou operar com máquinas. EFEITOS INDESEJÁVEIS: Até 10% dos doentes podem
apresentar vermelhidão e prurido no local da injecção, particularmente quando se utiliza a via de administração subcutânea. Espera-se que ocorra retenção de fluidos durante a terapêutica de
substituição com hormona do crescimento no adulto. Edema, edema articular, artralgias, mialgias e parestesias podem ser manifestações clínicas desta retenção de fluidos. No entanto estes
sintomas são geralmente transitórios e dependem da dose. Os adultos com deficiência de hormona do crescimento, em consequência do diagnóstico deste défice na infância, apresentam uma
menor frequência de efeitos secundários do que os que iniciam a terapêutica na idade adulta. Podem formar-se anticorpos à somatropina em alguns doentes; desconhece-se o seu significado
clínico, e até à data estes anticorpos têm apresentado baixa capacidade de ligação e não têm sido associados a atenuação do crescimento, excepto em doentes com deleções de genes. Em casos
muito raros, em que a baixa estatura é devida à deleção do gene da hormona do crescimento, o tratamento com esta hormona pode induzir anticorpos atenuantes do crescimento. As reacções
adversas reportadas a seguir encontram-se classificadas de acordo com a frequência de ocorrência, conforme se segue: Muito frequentes: ≥ 1/10; Frequentes: > 1/100 - < 1/10; Pouco frequentes:
> 1.000 -< 1/100. Raros: > 1/10.000 - < 1/1.000; Muito raros: ≤ 1/ 10.000. Reacções no local de administração - Frequentes. Reacções no local da injecção: Lipoatrofia localizada, que pode ser
evitada variando o local da injecção. Distúrbios do estado geral - Frequentes (no adulto) Pouco frequentes (na criança). Retenção de fluídos: edema periférico, entumescimento, artralgia, mialgia,
parestesia - Pouco frequentes: Síndroma do canal cárpico. Sistema Nervoso Central. Pouco frequentes - Hipertensão intracraniana idiopática (hipertensão intracraniana benigna). Doenças
endócrinas. Muito raros - Hipotiroidismo. Afecções musculosqueléticas. Muito raros - Deslizamento da epífise da cabeça femural (Epiphysiolysis capitis femoris), ou necrose avascular da cabeça
femural. Doenças do metabolismo. A resistência à insulina pode resultar em hiperinsulinismo e, em casos raros, em hiperglicémia. SOBREDOSAGEM: Não foram relatados casos de sobredosagem
aguda. Porém, exceder as doses recomendadas pode causar efeitos indesejáveis. Uma sobredosagem pode levar a hipoglicémia e, subsequentemente, a hiperglicémia. Além disso, uma
sobredosagem com Somatropina pode causar manifestações de retenção de fluidos. PROPRIEDADES FARMACOLÓGICAS. Propriedades farmacodinâmicas: Grupo farmacoterapêutico: 8.1.1
Hormonas do lobo anterior da hipófise. Código ATC: HO1A. SAIZEN contém hormona do crescimento humana recombinante, produzida por células de mamífero geneticamente modificadas. É um
péptido de 191 aminoácidos idêntico à hormona do crescimento humana hipofisária, no que respeita à sequência e composição de aminoácidos assim como ao mapa peptídico, ponto isoeléctrico,
peso molecular, estrutura isomérica e bioactividade. A hormona do crescimento é sintetizada numa linha celular murina transformada, modificada através da adição do gene da hormona do
crescimento hipofisária. SAIZEN é um agente anabólico e anticatabólico que produz efeito não só no crescimento, mas também na composição e metabolismo do organismo. Interactua com
receptores específicos numa variedade de tipos de células incluindo miócitos, hepatócitos, adipócitos, linfócitos e células hematopoiéticas. Alguns, mas não todos os seus efeitos são mediados por
uma outra classe de hormonas conhecidas por somatomedinas (IGF-1 e IGF-2). Dependendo da dose, a administração de SAIZEN produz um aumento na IGF-1, IGFBP-3, ácidos gordos nãoesterificados e glicerol, uma diminuição da ureia sanguínea, e diminuição nas excreções urinárias do azoto, do sódio e do potássio. A duração do aumento nos níveis de GH pode desempenhar um
papel na determinação da magnitude dos efeitos. É provável uma saturação relativa dos efeitos do SAIZEN com doses altas. Não é este o caso da glicémia e excreção urinária do peptido-C, que
só aumentam significativamente após doses elevadas (20 mg). Num ensaio clínico randomizado, crianças pré-pubertárias pequenas com SGA, foram tratadas durante três anos com uma dose de
0,067 mg/kg/dia, e verificou-se um ganho médio de +1,8 DP-estatura. Nas crianças que não receberam tratamento adicional para além dos três anos, perdeu-se parte do benefício, mas as crianças
mantiveram um aumento significativo de +0,7 DP-estatura, na estatura final (p<0,01 comparado com o valor basal). Os doentes que receberam um segundo tratamento após um período variável
de observação, apresentaram um aumento total de +1,3 DP-estatura (p=0,001 comparado com o valor basal), na estatura final. (A duração de tratamento cumulativa média no último grupo foi de
6,1 anos). O aumento na DP-estatura (+ 1,3 ± 1,1) na estatura final neste grupo foi significativamente (p<0,05) diferente do aumento em DP-estatura obtido no primeiro grupo (+0,7 ± 0,8), o qual
recebeu apenas 3,0 anos de tratamento em média. Um segundo ensaio clínico, investigou dois regimes posológicos diferentes durante quatro anos. Um grupo foi tratado com 0,067 mg/kg/dia
durante 2 anos e observado durante os 2 anos posteriores sem tratamento. O segundo grupo recebeu 0,067 mg/kg/dia no primeiro e terceiro anos e nenhum tratamento no segundo e quarto anos.
Qualquer dos regimes de tratamento resultou numa dose administrada cumulativa de 0,033 mg/kg/dia durante o período de quatro anos do estudo. Ambos os grupos revelaram uma aceleração do
crescimento comparável e uma melhoria significativa de +1,55 (p<0,0001) e +1,43 (p<0,0001) DP-estatura respectivamente no final do período de quatro anos do estudo. Os dados sobre a
segurança a longo prazo continuam a ser limitados. Propriedades farmacocinéticas: A farmacocinética do SAIZEN é linear pelo menos com doses até 8 UI (2,67 mg). Com doses mais elevadas
(60 UI/20 mg) não pode ser excluído um certo grau de não-linearidade, porém sem relevância clínica. Após administração IV a voluntários saudáveis, o volume de distribuição em estado estacionário
é de cerca de 7 L, a “clearance” metabólica total é de cerca de 15 L/h, enquanto que a “clearance” renal é insignificante, e o fármaco exibe uma semi-vida de eliminação de 20 a 35 minutos. Após
a administração de doses únicas de SAIZEN por via SC e IM, a semi-vida terminal aparente é muito mais prolongada, cerca de 2 a 4 horas. Isto é devido a uma taxa limitada do processo de
absorção. As concentrações séricas máximas de hormona do crescimento (GH) são atingidas após aproximadamente 4 horas e os níveis séricos de GH voltam ao valor basal dentro de 24 horas,
indicando que não ocorre acumulação de GH durante as administrações repetidas. A biodisponibilidade absoluta de ambas as vias é de 70-90%. INFORMAÇÕES FARMACÊUTICAS: Lista de
excipientes: Pó para solução injectável. Sacarose, Ácido Fosfórico, Hidróxido de sódio. Solvente para utilização parentérica. Metacresol a 0,3% (p/v) em água para preparações injectáveis.
Incompatibilidades: Não se conhecem presentemente incompatibilidades de SAIZEN com outras preparações farmacêuticas. Prazo de validade: 3 anos. Após reconstituição, o produto deve ser
conservado durante um período máximo de 28 dias no frigorífico (2ºC – 8ºC). Os auto-injectores easypod e one.click, quando contendo o cartucho reconstituído de SAIZEN, têm de ser conservados
no frigorífico (2ºC – 8ºC). Quando se utilizar o auto-injector sem agulha cool.click, unicamente o cartucho da solução reconstituída de SAIZEN, deverá ser conservado no frigorífico (2ºC-8ºC).
Precauções especiais de conservação: Não conservar acima de 25ºC. Não congelar. Conservar na embalagem de origem. Para a conservação do produto reconstituído, ver secção “Prazo de
Validade”. Natureza e conteúdo do recipiente. Os frascos para injectáveis DIN 2R de 3 ml contendo 8 mg de pó e os cartuchos de 3 ml contendo 1,37 ml de solvente são de vidro neutro (Tipo 1).
Os frascos para injectáveis e os cartuchos são fechados com tampa de borracha. SAIZEN 8 mg click.easy está disponível em embalagens com: 1 frasco para injectáveis de SAIZEN 8 mg e 1
cartucho de solvente bacteriostático pré-incluídos num dispositivo de reconstituição (click.easy) composto pelo corpo do dispositivo com cânula de transferência estéril. Instruçôes de utilização /
manuseamento: O cartucho contendo a solução reconstituída de SAIZEN 8 mg click.easy destina-se exclusivamente a ser utilizado com o auto-injector one.click, com o auto-injector sem agulha
cool.click, ou com o auto-injector easypod. Para conservação dos auto-injectores contendo o cartucho, ver secção “Prazo de Validade”. Para a administração do SAIZEN 8 mg click.easy, consulte
as instruções do folheto informativo e do manual de instruções fornecido com o auto-injector apropriado. Os utilizadores do easypod são principalmente crianças desde os 7 anos até à idade adulta.
A utilização de dispositivos médicos por crianças, deverá ser sempre feita sob a supervisão de um adulto. O pó para a solução injectável tem de ser reconstituído com o solvente bacteriostático que
o acompanha (metacresol a 0,3% (p/v) em água para preparações injectáveis) para administração parentérica, utilizando o dispositivo de reconstituição click.easy. A solução injectável reconstituída
deve ser límpida, sem partículas. Se a solução contiver partículas, não deve ser injectada. Qualquer produto não utilizado ou o material usado deve ser deitado fora de acordo com as exigências
locais. TITULAR DA AUTORIZAÇÃO DE INTRODUÇÃO NO MERCADO: Serono Portugal, Lda. R. Tierno Galvan, 16 – B, Amoreiras, Torre 3, 16 º, Esc. 1 - 1070-274 LISBOA. NÚMEROS DA
AUTORIZAÇÃO DE INTRODUÇÃO NO MERCADO 3505484- Frasco para injectável – 1 unidade. DATA DA PRIMEIRA AUTORIZAÇÃO/RENOVAÇÃO DA AUTORIZAÇÃO DE INTRODUÇÃO
NO MERCADO: Data da Primeira Autorização de Introdução no Mercado: 26/01/2001. Data da Renovação da Autorização de Introdução no Mercado: 03/04/2004. DATA DA REVISÃO (PARCIAL)
DO TEXTO: 23 de Fevereiro de 2007. Medicamento sujeito a receita médica. Fornecimento exclusivo hospitalar (CompartIcipado 100% nos estabelecimentos saúde especiais).
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Imagens
Filipe Macedo1
Criança do sexo masculino,
3,5 anos de idade com gonalgia
bilateral esporádica e varismo acentuado
dos joelhos
Faz RX dos joelhos.
Qual é o seu diagnóstico?
Figura 1 - RX dos joelhos (face)
__________
1
Especialista em Radiodiagnóstico – SMIC
Porto
148
qual o seu diagnóstico
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
O Rx mostra deformidade em varo
das tíbias, com depressão e irregularidade da vertente interna das suas metáfises e redução da altura da vertente
interna das suas epífises. Os achados
são mais acentuados do lado direito. É
um quadro compatível com doença de
Blount bilateral.
apresenta habitualmente redução da sua
altura do lado interno. Pode haver subluxação da tíbia.
Com a progressão da doença a
vertente interna de fise pode tornar-se
estreita, podendo ocorrer fusão prematura e alargamento compensatório da sua
vertente lateral.
DISCUSSÃO
A doença de Blount é a causa mais
frequente de tíbia vara, sendo provavelmente causada por um distúrbio da ossificação endocondral devido à transmissão
anormal de carga na vertente interna da
metáfise tibial(1).
Há duas formas:
- infantil: a mais frequente. Ocorre
entre os 2 e os 3 anos de idade
sendo mais frequente na criança
obesa(2). É geralmente bilateral,
podendo ser assimétrica.
- adolescente: ocorre entre os 6 e
os 15 anos. É geralmente unilateral. Pode ser ideopática ou secundária a traumatismo ou infecção.
Nas fases iniciais da doença pode
ser difícil o diagnóstico diferencial com
varismo fisiológico das tíbias. Utiliza-se
geralmente o ângulo metáfise-diáfise; é
o ângulo formado entre uma linha que
passa ao longo da metáfise proximal da
tíbia e uma linha perpendicular ao maior
eixo da diáfise tibial. Ângulos superiores
a 11 graus são a favor de doença de
Blount(3).
IMAGIOLOGIA
1- RX convencional.
Faz habitualmente o diagnóstico.
Observa-se varismo tibial por angulação da metáfise. Há geralmente
deformidade das epífises e metáfises,
com irregularidade, angulação interna e
formação de bico no seu bordo interno.
Este bico pode fragmentar-se. A epífise
2- RMN
Pode ser útil para avaliar o estado
da fise nomeadamente quanto à existência de pontes fibrosas ou ósseas. Pode
ser também útil para avaliar alterações
degenerativas meniscais associadas(4).
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 148-149
BIBLIOGRAFIA
1. Ozonoff MB. Pediatric orthopedic
radiology. 2nd Ed, Philadelphia: WB
Saunders 1992
2. Dietz WH Jr, Gross WL, Kirkpatrick
JA Jr. Blount disease (tibia vara):
another skeletal disorder associated with childhood obesity. JPediatr
1982;101:735-737
3. Levine A, Drennan JC. Phisiological
bowing and tibia vara. The metaphyseal-diaphyseal angle in the measurement of bowleg deformities.J Bone
Surg Am 1982;64:1158-1163
4. Ducou le Pointe H, Mousselard H,
Rudelli A, Montagne JP, Filipe G.
Blount`s disease: magnetic resonance
imaging. Pediatr Radiol 1995;25 :1214
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
- varismo fisiológico
- raquitismo
- osteogénese imperfeita e outras
displasias
TRATAMENTO
Conservador
Cirúrgico
qual o seu diagnóstico
149
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Genes, Crianças e Pediatras
Cristina Dias1, Manuela Santos2, Manuela Vilarinho3, Rosário Santos3, Ana Maria Fortuna1, Margarida Reis Lima1
Criança do sexo masculino, enviado à Consulta de Genética aos 9 anos
de idade por dificuldades de aprendizagem. Trata-se do 1º filho de casal não
consanguíneo, com outra filha saudável. A mãe queixava-se de ter por vezes
dificuldade nos movimentos das mãos.
A avó materna faleceu aos 45 anos de
“patologia cardíaca”. Sem história familiar conhecida de doença genética ou
malformações congénitas.
O doente nasceu após uma gestação sem intercorrências, parto eutócico
às 39 semanas e antropometria adequada ao nascimento. Sem malformações congénitas. No período neonatal,
a sucção era fraca; sem hipotonia neonatal descrita.
Figura 1
__________
1
2
3
Unidade de Consulta, Instituto de Genética Médica Jacinto Magalhães
Serviço de Neuropediatra, Hospital Especializado de Crianças Maria Pia
Unidade de Genética Molecular, Instituto
de Genética Médica Jacinto Magalhães
150
qual o seu diagnóstico
Relativamente ao desenvolvimento, teve controlo cervical aos 4 meses;
sentou sem apoio aos 8,5 meses; marcha autónoma aos 13 meses, insegura,
com quedas fáceis. Era considerado
como tendo uma descoordenação nos
movimentos das mãos. Avaliação do QI
Global aos 9 anos:73.
Ao exame objectivo aos 9 anos e
3 meses (Figs. 1 e 2): Peso e estatura:
Perc 5, PC: Perc 25-50. Face inexpressiva, palato alto e estreito, comissuras
labiais inclinadas para baixo, fendas
oculares ligeiramente inclinadas para
baixo (com distâncias interoculares
normais). Pavilhões auriculares descolados. Auscultação cardíaca: reforço de
S2. Ligeira dificuldade na extensão das
Figura 2
mãos após um movimento sustentado
das mesmas em flexão. Alterações de
comportamento: irritabilidade, comportamento opositivo e défice de atenção.
Restante exame dismorfológico, físico
e neurológico sem alterações.
Em resumo: criança do sexo
masculino com 9 anos e 3 meses referenciado a consulta de genética por dificuldades de aprendizagem, com atraso
psicomotor ligeiro, face inexpressiva,
alterações do comportamento, palato
alto e dificuldades no movimento das
mãos.
Qual é o seu diagnóstico?
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
O estudo molecular corroborou a
hipótese clínica de Distrofia Miotónica 1 (DM1, Doença de Steinert, OMIM
#160900). Trata-se de doença de etiologia genética de transmissão autossómica
dominante provocada por expansão patogénica de uma região repetitiva CTG
na região 3’UTR do gene DMPK localizado em 19q13. A DM1 é das doenças
neuromusculares mais frequentes, com
uma prevalência estimada de 1/20000.
Pode ter um envolvimento multiorgânico: neuromuscular (miotonia, diminuição
da força muscular), ocular (cataratas),
cardíaco (arritmia), endócrino (hipogonadismo, resistência periférica à insulina),
insuficiência respiratória e do SNC (alterações cognitivas, alterações do comportamento). Classicamente divide-se em 4
subtipos de acordo com a idade de início
e primeiros sintomas:
1) forma congénita;
2) forma infantil/juvenil;
3) forma (início em idade) adulta;
4) forma (início) tardia/assintomática.
Embora haja alguma correlação proporcional entre o tamanho da expansão
CTG e a gravidade da doença e idade de
início dos sintomas, existe grande variabilidade intra e interfamiliar. Uma expansão superior a 35 é considerada anormal.
Este doente tem uma expansão de cerca
de 1000 repetições.
Um indivíduo afectado tem um risco de 50% de ter um filho afectado. A
expansão CTG no gene DMPK é instável na meiose, pelo que o alelo afectado
pode sofrer uma expansão, resultando na
transmissão de um alelo com uma expansão maior e consequente antecipação
(início mais precoce e maior gravidade
na geração subsequente). Praticamente
100% dos doentes tem uma expansão
detectável por técnicas de genética molecular (PCR e Southern Blot). O diagnóstico pré-natal é possível por amniocentese.
Na forma juvenil/infantil da DM1
as dificuldades escolares e face inexpressiva podem ser os primeiros e
únicos sinais da doença em idade jovem. As crianças apresentam-se com
dificuldades de aprendizagem em idade
escolar e frequentemente com alterações
do comportamento e dificuldades de socialização. Posteriormente podem surgir
a diminuição da força distal e miotonia.
Por esse motivo a DM1 é muitas vezes
reconhecida tardiamente, principalmente
quando não existe uma história familiar
confirmada. A cuidadosa observação dos
progenitores, assim como a referenciação a consulta de Doenças Neuromsculares e Genética são fundamentais.
Foi oferecida Consulta de Genética
aos pais deste doente para observação
clínica e eventual teste genético molecular e aconselhamento genético.
Ao diagnóstico recomenda-se a
avaliação cardiológica (ECG, Holter e
ecocardiograma), oftalmológica e analítica (nomeadamente endocrinológica) e
avaliação com provas funcionais respiratórias. Não existe tratamento específico
para a DM1. O seguimento destes doentes é multidisciplinar. Envolve Especialidades como a Neuropediatria e Neurolo-
gia, Cardiologia, Fisiatria, Ortopedia, Genética e frequentemente Endocrinologia
e Pedopsiquiatria.
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 150-151
BIBLIOGRAFIA
1. Bouhour F, Bost M, Vial C. Maladie
de Steinert. Encyclopédie Orphanet.
Avril 2007. Available at www.orpha.
net/data/patho/Pro/fr/Steinert-FRfrPro77v01.pdf
2. Marchini C, Lonigro R, Verriello L,
Pellizzari L, Bergonzi P, Damante G.
Correlations between individual clinical manifestations and CTG repeat
amplification in myotonic dystrophy.
Clin Genet. 2000; 57: 74-82.
3. Machucha-Tzili M, Brook D, Hilton-Jones D. Clinical and molecular aspects
of the nyotonic dystrophies: a review.
Muscle Nerve, 2005; 32:1-18.
4. Angeard N, Gargiulo M, Jacquete
A, Radvanyi H, Eymard B, Héron D.
Cognitive profile in childhood myotonic dystrophy type 1: is there a global
impairment? Neuromuscul Disord.
2007;17(6):451-8.
5. Bird, TD. Updated 22 November
2005. Myotonic Dystrophy Type 1. In:
GeneReviews at GeneTests: Medical
Genetics Information Resource (database online). Copyright, University
of Washington, Seattle. 1997-2007.
Available at http://www.genetests.org.
Accessed 01 October 2007.
qual o seu diagnóstico
151
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 153
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Métodos de avaliação da tensão arterial e
interpretação dos respectivos valores
Conceição Mota1, Carmen do Carmo1, Silvia Álvares2, Elói Pereira1
RESUMO
A hipertensão arterial (HTA) continua a ser um dos maiores factores de
risco para o desenvolvimento de aterosclerose e subsequente doença cérebro e
cardiovascular. O papel do pediatra inclui
não só a avaliação e terapêutica dos doentes com HTA estabelecida, mas também, a identificação de crianças em risco
de HTA e início de medidas de prevenção
adequadas.
Foi feita a revisão das mais recentes recomendações para a avaliação da
tensão arterial e diagnóstico de HTA nas
crianças e adolescentes.
Foi também abordada a utilização
crescente da monitorização ambulatória
da pressão arterial (MAPA), a qual permite uma melhor caracterização dos valores da tensão arterial e tem uma boa correlação com as lesões dos órgãos alvo.
A interpretação da tensão arterial ambulatória durante o período de 24 horas foi
também realçada, assim como a utilidade
e limitações do MAPA.
Palavras Chave: Hipertensão arterial na criança; monitorização ambulatória da pressão arterial (MAPA)
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 154-157
A hipertensão arterial (HTA) é um
factor de risco cardiovascular bem conhecido nos adultos(1). Apesar da incidência de HTA ser baixa na infância,
existe uma evidência crescente de que
a HTA essencial tem os seus antecedentes durante a infância e adolescência e
a monitorização da tensão arterial (TA)
__________
¹ Serviço de Nefrologia Pediátrica do H. Crianças Maria Pia
2
Serviço de Cardiologia Pediátrica do H.
Crianças Maria Pia
neste grupo etário poderá ter um impacto importante na doença cardiovascular
a longo prazo(2).
O aumento progressivo da obesidade na nossa sociedade está a induzir
um aumento dos valores da TA e consequentemente de HTA, bem como outros
factores de risco cardiovascular, nomeadamente a dislipidémia, a insulinoresistência e o síndrome metabólico(3-5). Neste
contexto a perspectiva clínica da TA em
idade pediátrica tem-se alterado nos últimos anos com a sistematização da avaliação da TA introduzida na Fourth Task Force Report de 2004, a qual estabelece as
mais recentes guias de orientação para a
detecção, avaliação e tratamento da HTA
das crianças e adolescentes(4). De acordo
com essas recomendações deve ser avaliada a TA, nos exames de saúde infantil,
a todas as crianças com idade superior a
3 anos. Nas crianças com idade inferior
a essa idade deverá ser avaliada a TA,
se tiverem história de complicações neonatais requerendo cuidados intensivos,
doença cardíaca congénita, infecções
do tracto urinário, hematúria, proteinúria,
doença renal ou urológica conhecida, história familiar de doença renal congénita,
transplante de órgãos sólidos ou medula
óssea, malignidade, tratamento com fármacos conhecidos por aumentar a TA,
outras doenças sistémicas associadas
a HTA ou evidência de hipertensão intracraniana(4).
DEFINIÇÂO DE HTA
A National High Blood Pressure
Education Program Working Group criou
tabelas de Percentis para TA na criança
em 1987(6) e em 2004 estas tabelas foram
actualizadas, tendo sido estabelecido os
Percentis de TA de acordo com a idade, o
sexo e a altura(4).
hipertensão arterial – mesa redonda
S 154
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
A definição de HTA na criança foi
estatisticamente definida baseando-se
na distribuição normativa da TA de uma
larga série de crianças saudáveis, ao
contrário à dos adultos em que a HTA foi
definida clinicamente como o valor de TA
acima do qual foi demonstrado haver benefício clínico com administração de terapêutica anti-hipertensora(1). A definição
clínica não pode ser aplicada a crianças,
uma vez que as alterações/eventos cardiovasculares tipicamente só ocorrem na
vida adulta, com a excepção da hipertrofia ventricular esquerda(1,2,4).
A definição de TA normal, prehipertensão e HTA na criança e adolescente
estão definidas no quadro 1 de acordo
com as últimas orientações da Fourth
Task Force Report(4).
Foi também estabelecido que TA
sistólica e TA diastólica têm igual importância; se houver disparidade, o valor
mais alto é o que determina a gravidade
da HTA(1,4).
TÉCNICA DA MEDIÇÂO DA TA
A importância da técnica da avaliação da TA foi bem demonstrada num estudo que fez a comparação da avaliação
de TA, em crianças saudáveis, realizada
por 10 investigadores(6). Foi verificada
uma significativa variação dos valores registados de TA entre os investigadores e
os principais factores responsabilizados
por esta discrepância foram: o tamanho
da braçadeira, número de avaliações
efectuadas, tipo de instrumento utilizado,
posição do doente (deitado ou sentado)
e a escolha do 4º ou 5º som de Korotoff
para a determinação da TA diastólica(7).
TAMANHO DA BRAÇADEIRA
A correcta escolha da braçadeira é
importante para se obterem avaliações
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
adequadas. Se é usada uma braçadeira
demasiado pequena, os valores obtidos
são geralmente superiores à pressão
arterial real, levando a uma inflação da
TA sistólica. Por outro lado, braçadeiras
demasiado grandes condicionam valores mais baixos que as leituras intraarteriais(4,6,7).
A 2004 Fourth Task Force Report (4)
recomenda que a largura da braçadeira
deve ser aproximadamente 40% da circunferência do braço, medida no ponto
médio entre o olecrâneo e o acrómio
(figura 1). Quando comparadas, as avaliações da TA segundo estas directrizes,
com as previamente dadas (2/3 a 3/4 do
comprimento da parte superior do braço)
foram obtidos valores de TA significativamente mais baixos, o que leva a deduzir
que estavam a ser usadas braçadeiras
demasiado pequenas com as anteriores
recomendações(8).
Também está definido(4), que o balão que está dentro da braçadeira deverá ter de comprimento pelo menos 80%
da circunferência do braço e esse balão
deve ter a razão largura: comprimento de
1:2 (figura 2).
APARELHO DE AVALIAÇÃO DA TA
O método preferido de avaliação
da TA é o método auscultatório, usando
um esfingmomanómetro convencional,
de mercúrio ou aneróide(4). Actualmente
foram retirados da prática clínica os de
mercúrio (em virtude do risco de intoxicação) estando só disponíveis os aparelhos
aneróides, os quais deverão ser calibrados numa base semestral(4).
Os aparelhos oscilométricos ou
electrónicos detectam vibrações que
se convertem em impulsos eléctricos,
os quais são enviados para um transdutor e transformados em sinais digitais(7). Estes aparelhos podem ser usados quando a auscultação é difícil tal
como em recém nascidos e crianças
pequenas e/ou nos cuidados intensivos
quando a monitorização da TA é necessária. Tem duas grandes vantagens:
uma utilização fácil e o “erro do medidor” dos métodos auscultatórios ser
ultrapassado.
Embora essas vantagens tenham
levado a uma cada vez maior utilização
de aparelhos oscilométricos, não podemos esquecer que os aparelhos oscilométricos medem a TA média e a TA
sistólica, sendo a TA diastólica calculada
através de um algoritmo, enquanto no
método auscultatório as pressões sistólica e diastólica são sempre determinadas
pela audição do 1º e 5º som de Korotoff,
respectivamente(4). O algoritmo utilizado
nos aparelhos oscilométricos é diferente nas várias marcas de aparelhos e a
comparação de diferentes aparelhos
tem mostrado uma grande variação de
valores de TA. Por esse motivo as mais
recentes orientações recomendam que
as avaliações de TA que excedam o percentil 90, nos aparelhos oscilométricos
deverão ser confirmadas pela auscultação(4).
Figura 1 - Determinação da largura da braçadeira.
AVALIAÇÃO DA TA: PREPARAÇÃO DA
CRIANÇA
A preparação da criança é fundamental para se obter valores fidedignos. Como
é do conhecimento geral as avaliações da
TA em crianças ansiosas e/ou agitadas
dão geralmente valores enganadores ou
falsamente altos. A avaliação de TA ideal é
efectuada num ambiente aquecido, calmo
e silencioso após 5 minutos de repouso.
No lactente a avaliação é efectuada com a
criança deitada e na criança e adolescente, se possível, é efectuada sentada, com
os pés apoiados no chão e com o braço
apoiado de forma que a fossa cubital esteja ao nível do coração(4).
NÚMERO DE AVALIAÇÕES
A TA altera-se de batimento para
batimento em resposta a uma grande
variedade de estímulos fisiológicos e ambientais. Embora a média de dois ou três
valores de TA durante a consulta tenha
demonstrado um significativo valor prognóstico como factor de risco cardiovascular, é claro que uma melhor caracterização
dos valores de TA e da sua variabilidade
pode levar a uma estratificação do risco
mais precisa.
Foram-se introduzindo vários métodos para ultrapassar a limitação da avaliação clínica. O primeiro foi a repetição
de avaliações de TA, dentro de dias a
semanas, de forma a minimizar o risco
de falsos positivos. Assim, a Fourth Task
Force Report recomenda que, antes de
se diagnosticar uma criança assintomá-
Figura 2 - Representação esquemática de braçadeira. O
balão que está dentro da braçadeira deverá ter um comprimento igual ou superior a 80% da circunferência do braço e
esse balão deve ter a razão largura: comprimento de 1:2
hipertensão arterial – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 155
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
tica como hipertensa, dever-se-á repetir
a avaliação de TA pelo menos em 3 visitas no mesmo consultório, separadas
por dias ou semanas, a não ser que os
valores de TA estejam acima do percentil
99 mais 5 mmHg(4). Neste caso, é diagnosticada HTA grave, estadio 2, devendo
a criança ser orientada rapidamente para
um Centro de Referência.
Embora o conceito de pré-hipertensão arterial (quadro I) seja alvo de alguma controvérsia é aconselhável, nestes
casos, a vigilância de TA num prazo de 6
meses e o aconselhamento de mudança
de estilo de vida, tal como alteração do regime alimentar (emagrecer se necessário)
e exercício regular. A persistência destes
valores limite antevê o desenvolvimento
posterior de hipertensão arterial (2,4).
normais no domicílio), sendo a base dos
métodos de auto-avaliação (indivíduo /família ) e da monitorização ambulatória da
pressão arterial (MAPA).
Na MAPA é utilizado um equipamento portátil programado para fazer
múltiplas avaliações geralmente durante
o período de 24 horas. Durante o dia, são
geralmente programadas leituras de 20
em 20 minutos e durante o período repouso nocturno de 30 em 30 minutos ou
de 60 em 60 minutos. Além de ser feita
a média tensional durante o período de
24 Horas, é também efectuada a média
tensional do período diurno e repouso
nocturno. Os valores obtidos são habitualmente comparados, na maioria dos
estudos, com os valores de TA no ambulatório publicado por Sorger e al(9).
MONITORIZAÇÃO AMBULATÓRIA DA
PRESSÃO ARTERIAL
A realização de várias avaliações da
TA, não em presença do clínico/enfermeiro, mas no domicílio, permite ultrapassar
a denominada “HTA da bata branca” (TA
≥ percentil 95 no consultório e valores
CONCEITO DE “DIPPING” E “BPLOAD”
Normalmente, a TA tem um ritmo
circadiano, sendo mais alta 13 a 20% durante o dia do que no repouso nocturno. O
decréscimo da TA nocturna é chamado o
“dipping” nocturno. Doentes que não apre-
Quadro I - Definição de Hipertensão arterial e Pré-hipertensão
segundo a Fourth Task Force Report (4)
• Hipertensão arterial: TA sistólica e/ou diastólica ≥ ao Percentil 95 para o sexo, idade e altura,
pelo menos em 3 visitas, separadas por dias ou semanas.
- Estadio 1- TA entre o Percentil 95 e o Percentil 99 mais 5 mmHg
- Estadio 2- TA > Percentil 99 mais 5 mmHg,
• Pré-hipertensão: TA sistólica e/ou diastólica ≥ Percentil 90 mas < Percentil 95,
ou se TA> 120/80 mmHg mesmo se inferior ao Percentil 90.
• TA normal: TA sistólice e diastólica < Percentil 90.
Quadro II - Diagnóstico de “HTA de bata branca” e graus de gravidade da HTA
através da MAPA em crianças, segundo Lurbe E. et al(10).
Classificação
TA clínica*
TA sistólica média
em ambulatório **
“BP load” sistólico **
TA normal
< Percentil 95
< Percentil 95
<25 %
“HTA da bata branca”
> Percentil 95
< Percentil 95
<25 %
HTA estadio 1
> Percentil 95
< Percentil 95
25-50 %
HTA estadio 2
> Percentil 95
> Percentil 95
25-50 %
HTA estadio 3
(em risco de lesão de orgão alvo)
> Percentil 95
> Percentil 95
>50 %
* Baseado nos valores publicados pela Fourth Task Force Report. (4)
** Baseado nos valores publicados por Sorger e al. (9)
hipertensão arterial – mesa redonda
S 156
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
sentem uma descida de pelo menos 10%
da TA média sistólica no período nocturno
são rotulados como “não-dippers”(10).
O “BP load” ou carga tensional é definido pela percentagem de leituras de TA
com o percentil ≥ 95(10).
Os doentes com um alto “BP load”
e/ou ausência de “dipping” nocturno têm
maior risco cardiovascular e lesões nos
órgãos alvo(10-17).
Lurbe E. et al(10), recomendam que
na interpretação da MAPA seja usado simultaneamente a TA média e o “BP load”
para o diagnóstico de HTA de “bata branca” e a determinação da gravidade de
HTA (ver quadro 2).
UTILIDADE DA MAPA
Além da MAPA dar uma ajuda importante no diagnóstico de “HTA da bata
branca” poderá ser útil na monitorização
do doente hipertenso, com aparente resistência a drogas anti-hipertensoras ou
com sintomas hipotensivos(10,11). A MAPA
poderá dar também uma importante informação no padrão de TA em alguns
grupos de doentes, tais como na doença
renal crónica, disautonomia e diabetes
mellitus(12-14). Foram descritas associações entre a TA ambulatória e o índice de
massa ventricular(15), a depuração renal
e a presença de cicatrizes renais(16). Alguns dados na literatura mencionam que
a MAPA poderá identificar adolescentes e
adultos com diabetes mellitus em risco de
doença renal(13,14) .
Seeman T et al sugerem que a
MAPA poderá também ser útil na diferenciação de HTA primária e secundária, em
virtude de terem encontrado, mais frequentemente, nas crianças (não medicadas) com HTA secundária uma TA elevada durante a noite de forma sustentada e
a ausência de “dipping” nocturno, do que
nas crianças com HTA primária(17).
Como é óbvio, pelo descrito anteriormente, a MAPA tem tido uma crescente utilização na Pediatria. Deverá
contudo ter-se em atenção que o pedido
deste exame deverá ser efectuado para
uma Unidade de Saúde que disponha de
aparelhos validados para este grupo etário e que sejam interpretados por clínicos
experientes na leitura de MAPA em crianças e adolescentes(4,18).
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
TECHNIQUES OF BLOOD PRESSURE
MEASUREMENT AND INTERPRETATION OF ITS VALUES
ABSTRACT
Systemic hypertension (HTN) remains one of the major risk factors for
the development of atherosclerosis and
subsequent cerebrovascular and cardiovascular disease. The role of the pediatrician includes not only the management of
patients with established high blood pressure, but also the identification of children
at risk of HTN and the initiation of preventive measures when indicated.
We review the current recommendations of evaluation of the blood pressure and diagnosis of HTN in children and
adolescents.
We also approach the increasing
use of the ambulatory blood pressure
monitoring (ABPM), witch improves the
accuracy of blood pressure measurement
and is well correlated with end organ injury. The interpretation of the ambulatory
blood pressures during a 24-hour period
was also emphasized, as well as the
utility and limitations of the ABPM.
Key words: Hypertension in children; ambulatory blood pressure monitoring (ABPM)
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 154-157
BIBLIOGRAFIA
1. Chobanian AV, Bakris GL, Black HR,
Cushman WC, The Seventh Report
of the Joint National Committee on
Prevention, Detection, Evaluation,
and Treatment of High Blood Pressure: the JNC 7 report. JAMA. 2003;
289(19):2560-72.
2. Sun SS, Grave GD, Siervogel RM,
Pickoff AA, Arslanian SS, Daniels SR.
Systolic blood pressure in childhood
predicts hypertension and metabolic
syndrome later in life. Pediatrics.
2007; 119(2):237-46
3. Lurbe E, Rodicio JL. Hypertension in
children and adolescents. J Hypertens. 2004; 22(7):1423-5.
4. The fourth report on the diagnosis,
evaluation, and treatment of high
blood pressure in children and adolescents. Pediatrics. 2004; 114(2 Suppl
4th Report):555-76
5. Flynn JT, Alderman MH. Characteristics of children with primary hypertension seen at a referral center. Pediatr
Nephrol. 2005; 20(7):961
6. Report of the Second Task Force on
Blood Pressure Control in Children.
Pediatrics. 1987; 79(1):1-25.
7. Park MK, Troxler RG. Systemic hypertension. In: Pediatric Cardiology for
Practitioners, 4th ed, Park, MK (Ed),
Mosby, St. Louis 2002; 408.
8. Lieh-Lai MW, Sarnaik A, Mattoo TK
Discrepancies between direct and indirect blood pressure measurements
using various recommendations for
arm cuff selection. Pediatrics. 2002;
110(5):920-3
9. Soergel M, Kirschstein M, Busch
C, Danne T, Gellermann J, Holl R,
Krull F, Reichert H, Reusz GS, Rascher W. Oscillometric twenty-fourhour ambulatory blood pressure
values in healthy children and adolescents: a multicenter trial including 1141 subjects. J Pediatr. 1997;
130(2):178-84.
10. Lurbe E, Sorof JM, Daniels SR.
Clinical and research aspects of
ambulatory blood pressure monitoring in children. J Pediatr. 2004;
144(1):7-16.
11. Evaluation of white coat hypertension
in children: importance of the defini-
tions of normal ambulatory blood
pressure and the severity of casual
hypertension. Am J Hypertens. 2001;
14(9 Pt 1):855-60
12. Mitsnefes MM, Kimball TR, Daniels
SR Office and ambulatory blood pressure elevation in children with chronic
renal failure. Pediatr Nephrol. 2003;
18(2):145-9.
13. Lurbe E, Redon J, Kesani A, Pascual
JM, Tacons J, Alvarez V, Batlle D. Increase in nocturnal blood pressure
and progression to microalbuminuria
in type 1 diabetes. N Engl J Med.
2002; 347(11):797-805
14. Ettinger LM, Freeman K, DiMartinoNardi JR, Flynn JT. Microalbuminuria and abnormal ambulatory blood
pressure in adolescents with type 2
diabetes mellitus. J Pediatr. 2005;
147(1):67-73.
15. Sorof JM, Cardwell G, Franco K,
Portman RJ..Ambulatory blood pressure and left ventricular mass index in
hypertensive children. Hypertension.
2002;39(4):903-8.
16. Patzer L, Seeman T, Luck C, Wühl
E, Janda J, Misselwitz J. Day- and
night-time blood pressure elevation in children with higher grades
of renal scarring. J Pediatr. 2003;
142(2):117-22
17. Seeman T, Palyzová D, Dusek J,
Janda J. Reduced nocturnal blood
pressure dip and sustained nighttime
hypertension are specific markers of
secondary hypertension. J Pediatr.
2005; 147(3):366-71
18. Kennedy SE, Mackie FE, Rosenberg
AR, Craig E, Kainer G. Agreement on
reporting of ambulatory blood pressure monitoring in children. Pediatr
Nephrol 2005; 20(12):1766-8
hipertensão arterial – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 157
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Abordagem da Criança e Adolescentes
Hipertensos
António Jorge M. Correia1
RESUMO
A hipertensão arterial (HTA) na
criança tem uma prevalência estimada
entre 1% e 3%, embora seja com frequência sub diagnosticada. A HTA secundária
é mais frequente na criança pré-adolescente e a principal etiologia são as causas
renais. A HTA severa não tratada na criança tem um risco elevado de morbilidade e
mortalidade. A prevalência da HTA severa
é mais baixa, cerca de 0,1%.
Os benefícios de diagnosticar e
identificar a HTA ligeira ou valores de
tensão arterial (TA) no limite superior do
normal são actualmente considerados
importantes, porque a predisposição para
a hipertensão essencial no adulto pode
iniciar-se na idade pediátrica. A HTA primária ou essencial é mais frequente nos
adolescentes, está associada a múltiplos
factores de risco incluindo obesidade e
história familiar de hipertensão. Tem sido
verificada uma maior incidência da HTA
em idade pediátrica, devido ao aumento da HTA primária ou essencial. Esta
hipertensão arterial está associada ao
excesso de peso e obesidade e a uma
complexa interacção de factores genéticos e ambientais, sendo o seu rastreio de
extrema importância. A epidemia de obesidade em pediatria, o risco de HTA e desenvolvimento de hipertrofia ventricular
esquerda, a evidência do início precoce
da arteriosclerose na criança, implicam
uma detecção precoce e intervenção na
HTA na criança de modo a reduzir os riscos a longo prazo.
Nos últimos anos a determinação
da TA tem sido colocada em evidência
como uma componente importante do
exame físico em pediatria, que conduz ao
__________
¹ Unidade de Nefrologia Pediátrica – Hospital
Pediátrico de Coimbra
diagnóstico precoce de HTA na criança. A
HTA na fase inicial tem geralmente sido
considerada uma situação assintomática;
no entanto dados recentes demonstram
que muitas crianças com HTA têm evidência de lesões de órgão alvo.
Na avaliação da criança com HTA, a
confirmação de TA persistentemente elevada é da maior importância. A avaliação
inicia-se por uma história clínica bem detalhada e orientada para os factores que
levam à HTA e um exame físico completo.
Depois uma investigação apropriada com
exames laboratoriais e estudos especializados, que deve ter em atenção a idade da criança e a severidade da HTA. A
investigação deve preocupar-se não só
com a etiologia da hipertensão, mas também com os seus efeitos em órgãos alvo.
A HTA essencial do adulto inicia-se
na infância. A determinação adequada da
TA nas consultas pelo pediatra deve fazer
parte do exame. Quando descoberta HTA
deve ser investigada para ser adequadamente tratada.
Todas as crianças com HTA confirmada necessitam de uma vigilância prolongada. O tratamento não farmacológico
inclui redução de peso, exercício e modificações na dieta. As recomendações
para o tratamento farmacológico são a
hipertensão sintomática, evidência de lesão de órgão alvo, hipertensão no estádio
2, hipertensão no estádio 1 não controlada com modificações do estilo de vida, e
hipertensão com diabetes mellitus.
A HTA e a obesidade são um problema de saúde pública em todo o mundo.
Coincidente com o agravamento da epidemia de obesidade, uma recente avaliação indica que a incidência da TA nas
crianças de todas as raças tem aumentado na última década(1). Vários estudos
demonstram que a lesão de órgão alvo
hipertensão arterial – mesa redonda
S 158
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
está com frequência presente na criança
com HTA e no adulto jovem, incluindo aumento da arteriosclerose, espessamento
da íntima da carótida, hipertrofia ventricular esquerda, proteinúria e alteração
moderada da função cognitiva(2,3,4).
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 158-167
INTRODUÇÃO
A hipertensão arterial (HTA) é um
factor de risco reconhecido de doença cardiovascular no adulto(5). Na idade
pediátrica a HTA é uma patologia rara e
habitualmente secundária. Na criança a
hipertensão severa não tratada, acompanha-se de elevado risco de morbilidade e
mortalidade.
A prevalência de HTA na criança é
em geral assumida ser 1 a 3%. A prevalência da hipertensão severa é talvez
mais baixa, à volta de 0,1%. Do grupo
de crianças afectadas por HTA severa,
mais de dois terços dos casos têm origem renal(6).
Os benefícios de diagnosticar e
identificar a HTA ligeira ou valores de TA
no limite superior do normal são actualmente considerados importantes, porque
a predisposição para a hipertensão essencial no adulto pode iniciar-se na idade
pediátrica. Diversos estudos longitudinais
demonstram que crianças com níveis de
tensão arterial mais elevados, mesmo
que dentro de limites considerados normais, apresentam maior probabilidade de
vir a ser adultos hipertensos. Tem sido
verificada uma maior incidência da HTA
em idade pediátrica, devido ao aumento
da HTA primária ou essencial. Esta está
associada ao excesso de peso e obesidade e a uma complexa interacção de
factores genéticos e ambientais e o seu
rastreio é de grande importância.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Há evidência que a hipertensão essencial tem antecedentes durante a infância, e assim a HTA na criança prognostica
HTA no adulto(7). A HTA nos adultos está
associada a aumento da massa ventricular esquerda, que é um factor de risco
de doença cardiovascular(5,8,9). Baseado
nestas observações, identificar crianças
em risco de hipertensão pode ter um importante impacto nas consequências a
longo termo, as doenças cardiovasculares, porque permite ao pediatra identificar crianças com risco aumentado de ser
adultos hipertensos, e iniciar assim medidas preventivas em idade precoce.
A prevalência da HTA aumenta progressivamente com a idade(10). A prevalência da HTA persistente em pediatria é
mais baixa que nos adultos, mas está a
aumentar nos últimos 10 anos nos adolescentes (a grande maioria tem HTA
essencial) devido à maior incidência de
obesidade(11,12).
A HTA na criança pré-adolescente
geralmente tem uma causa identificável
(HTA secundária), enquanto a HTA primária ou essencial é mais frequente nos
adolescentes(13).
Os doentes com HTA severa em
criança têm maior risco de encefalopatia
hipertensiva, convulsões, acidentes vasculares cerebrais e insuficiência cardíaca congestiva. O diagnóstico precoce e
intervenção na criança com hipertensão
são potencialmente benéficos na prevenção das complicações da HTA a longo
prazo(14).
DEFINIÇÃO DE HTA
Um dos factores mais importantes
nos estudos da HTA em Pediatria é a definição dos valores de referência a adoptar. Para a população adulta, a definição
de HTA é epidemiológica. Ao contrário,
para crianças e adolescentes, a definição
é estatística(15). As tabelas de percentis
da TA são baseadas no sexo, idade e
estatura em avaliações em três ocasiões
separadas.
Nas últimas décadas, as referências mais frequentemente adoptadas na
prática clínica foram os relatórios norteamericanos, conhecidos por Relatórios
da Task Force, indicados pelo National
Heart, Lung and Blood Institute e pela
Academia Americana de Pediatria. O
primeiro destes relatórios (um conjunto
de tabelas e gráficos) foi publicado em
1977(16). Um segundo relatório foi publicado em 1987(17).
Em 1996, foi publicada a actualização do relatório da Task Force de 1987,
que conseguiu corrigir um importante factor de erro nos valores de referência, o
tamanho da criança (com valores limites
específicos para cada faixa de percentil
de estatura e separados para idade e
sexo)(18). Outra mudança adoptada por
esta actualização foi quanto à determinação da tensão diastólica. A fase dos
tons de Korotkoff que define a pressão
diastólica em crianças é controversa. Na
criança e particularmente na adolescência, diferenças de alguns milímetros de
mercúrio (mmHg) são frequentes entre o
4° e o 5° tom de Korotkoff. Em algumas
crianças, os sons podem ser ouvidos até
o zero. A actualização de 1996 recomenda utilizar o 5° tom de Korotkoff para definir a tensão diastólica, uniformizando-se
assim a sua determinação para todas as
idades. Estas guidelines da Task Force
foram adaptadas em 2004(19,.20). As tabelas de percentis da TA são baseadas no
sexo, idade e estatura em avaliações em
três ocasiões separadas.
Hipertensão Estádio 2: TA sistólica e
diastólica > 5 mmHg do percentil 99.
A TA sistólica e diastólica tem igual
importância. Se existir uma disparidade
valor mais elevado entre ambas determina a severidade da HTA.
A MEDIÇÃO DA TENSÃO ARTERIAL
Uma técnica correcta da medição
da TA é importante. Os factores que podem levar a erros incluem: tamanho da
braçadeira, número de medições, tipo de
método utilizado, posição da criança (pé
ou sentada), e escolha do tom de Korotkoff (quarto ou quinto som) utilizado para
determinar a TA diastólica(21,22).
A correcta escolha do tamanho da
braçadeira é importante. Se é usada uma
braçadeira pequena a TA sistólica será
mais elevada. Por outro lado uma braçadeira grande dá valores mais baixos
da TA. Este é um dos principais factores
de erro na medição da tensão arterial. O
comprimento braçadeira ideal, adequada
ao tamanho do membro superior, deve
envolver 80 a 100% da circunferência do
braço e a largura da bolsa de borracha
do manguito deve corresponder a 40%
da circunferência do braço, entre o olecranon e o acromion(23).
Tabela I - Dimensões recomendadas das braçadeiras
Idade
RN
Lactente
Criança
Adolescente
Adulto
Coxa
Largura
(cm)
4
6
9
10
13
20
Considera-se:
Normal: TA sistólica e diastólica < percentil 90 (para idade, sexo e estatura).
Pré-hipertensão: TA sistólica e diastólica
percentil 90 mas < percentil 95 (idade, sexo e estatura), ou TA ≥ 120/80
mmHg, mesmo se < percentil 90 (frequente nos adolescentes).
Hipertensão Estádio 1: TA sistólica e
diastólica ≥ percentil 95 e ≤ 5 mmHg
do percentil 99.
Comprimento Circunferência
(cm)
do braço (cm)
8
10
12
15
18
22
24
26
30
34
42
52
Antes de determinar a TA, estimulantes devem ser evitados. A TA deve
ser medida preferencialmente com a
criança calma e tranquila, em ambiente
agradável, após 5 minutos de repouso, na posição sentada e com o braço
direito apoiado e ao nível do coração.
Se valor> percentil 90, a tensão arterial
deve ser avaliada duas vezes com um
intervalo de 1 a 2 minutos no mesmo
gabinete(24).
hipertensão arterial – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 159
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
A TA deve ser determinada 2 vezes em cada observação. Se segundo
valor diferente e maior que 5 mmHg do
primeiro, medições subsequentes devem
ser efectuadas até que um valor estável
seja atingido. Confirmar valores elevados
de TA com avaliações em três ocasiões
separadas por dias ou semanas, antes
de diagnosticar HTA(22,23). Medir TA em
crianças não cooperantes ou agitadas dá
resultados falsos.
O método preferido e ideal de determinar a TA é o auscultatório (esfigmomanómetro standard), com o estetoscópio
colocado em cima do pulso da artéria
braquial na fossa cubital. Embora o esfigmomanómetro de mercúrio seja o mais
preciso, a sua acessibilidade está restringida pelo potencial risco de intoxicação
pelo mercúrio. Na auscultação dos tons
de Korotkoff, padronizou-se o primeiro
tom (aparecimento do som) como tensão
sistólica e o quinto (desaparecimento dos
sons) como a tensão diastólica(23).
Nas crianças acima dos três anos de
idade, deve sempre ser medida a tensão
arterial quando observadas em consulta.
Abaixo dos 3 anos deve ser avaliada a TA
quando: história de prematuridade, ACIU,
história de complicações neonatais com
necessidade internamento em UCI, cardiopatias congénitas, história familiar de
doença renal congénita, infecções urinárias de repetição, hematúria, proteinúria,
doença renal ou urológica conhecida,
transplantação, doenças malignas, ou
outra doença sistémica associada a HTA,
evidência de aumento da pressão intracraneana, tratamento com drogas que
elevem a TA.
Utilizando métodos oscilométricos,
se TA > percentil 90, deve confirmar-se
com método auscultatório. Outro motivo
de preocupação é que os aparelhos oscilométricos requerem manutenção e calibrações frequentes (semi-annual), mas
devem ser utilizados na impossibilidade
de usar manómetros de mercúrio, devendo haver cuidado na interpretação dos
valores de TA.
Os métodos automáticos são usados para medir a tensão arterial em
pediatria, quando é difícil usar método
auscultatório como nos recém-nascidos
e lactentes ou em cuidados intensivos
quando são necessárias avaliações frequentes da TA(24). Os aparelhos automáticos medem a tensão arterial media e
calculam a sistólica e diastólica a partir
desses valores(24).
A Coarctação da aorta é uma causa
frequente de HTA na criança jovem. A TA
deve ser medida em ambos os braços e
pernas na primeira visita, particularmente
se os pulsos femorais são fracos ou ausentes.
Monitorização ambulatória da
pressão arterial (MAPA) na criança: A
TA tem alterações contínuas em resposta
a estímulos fisiológicos e ambientais. No
adulto, a MAPA tem melhor correlação
com o risco de complicações cardiovasculares e lesões de órgãos alvo, que a
determinação da TA no gabinete do consultório(25).
A MAPA requer que o doente use
um monitor portátil, baseia-se no princípio
que repetidas medidas da TA durante as
24 horas promovem melhor aproximação
ao verdadeiro nível da TA, que uma medida isolada. A taxa de sucesso da MAPA
em crianças é influenciada pela idade,
sendo a idade escolar e adolescência as
mais receptivas ao exame.
Na prática clínica, as indicações da
MAPA são: diagnóstico de “hipertensão
arterial da bata branca” (criança com TA
normal, mas que na consulta fica ansiosa
e com TA ≥ percentil 95, que não é confirmada através da MAPA), HTA com resistência à terapêutica ou quando sintomas
de hipotensão, para estabelecer padrão
de HTA nos doentes com doença crónica
renal ou diabetes tipo 1(26) A MAPA tem
também um papel na distinção de HTA
primária e secundária e na identificação
de doentes em risco de HTA com lesão
de órgão alvo(27).
É possível que a HTA da bata branca na criança represente duas populações: uma com risco de desenvolver HTA
essencial e outra que mantêm HTA da
bata branca persistente ou regride para
tensão normal.
DETERMINANTES DA TA
A estatura é essencial na determinação da TA na criança, sendo necessário
incluir o percentil da estatura para determinar se a TA da criança é normal.
hipertensão arterial – mesa redonda
S 160
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
A HTA caracteriza-se como uma doença poligénica. A pressão arterial é determinada pela interacção entre factores
genéticos e ambientais. A relação entre
estes factores inicia-se ainda no período pré-natal. Há evidência que bebés
com baixo peso ao nascer, e crescimento mais lento no primeiro ano de vida,
têm maior incidência de HTA e morte
por acidentes cardiovasculares quando
adultos. Esse conceito ficou conhecido
como hipótese de Barker(28). O aumento
da prevalência da HTA é em parte originado pelo aumento da prevalência da
obesidade.
A incidência de HTA nos adultos está
relacionada com a raça, com evidência
TA significativamente mais alta nos AfroAmericanos(29). Uma história familiar de
HTA está presente em cerca de 70 to 80
% de todos os doentes com HTA essencial (comparado com 40 % ou menos nos
doentes com HTA secundária). A hereditariedade da HTA essencial é provável
que seja poligénica(30). Há evidência que
o aleitamento materno pode estar associado com TA mais baixa na criança.
ETIOLOGIA DA HTA
A HTA secundária é mais frequente
na criança pré-adolescente e a principal
etiologia são as doenças do parênquima
renal (60 a 70 %)(31). Os adolescentes geralmente têm HTA primária ou essencial.
Principais causas de hipertensão
arterial secundária:
Renal (60-70%): Pielonefrite, Doença
parênquima renal, Anomalias congénitas, Nefropatia de RVU, Púrpura
de Henoch Schonlein, Traumatismo,
Hidronefrose, Litiase, Síndrome hemolítico urémico, Tumor de Wilms,
Hipoplasia renal, Doença Poliquística
Renal.
Renovascular (10%): Anomalias da artéria renal (hipoplasia, estenose),
Trombose veia renal.
Endócrina (<5%): Hipertiroidismo, Hiperplasia congénita da Supra-renal,
Cushing, Hiperaldosteronismo e Hiperparatiroidismo primários, Feocromocitoma, Hipercalcemia.
Cardiovascular (2%): Coarctação da
aorta, Persistência do canal arterial,
Insuficiência aórtica.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Neurológica: Hipertensão intracraniana,
Síndrome Guillian-Barré
Neurológica: Simpaticomiméticos, Corticoides, Intoxicação por chumbo.
Outras: Neurofibromatose, Esclerose tuberosa, Neuroblastoma, Imobilização
prolongada.
Hipertensão primária ou essencial
(2-10%)
As principais causas de hipertensão
arterial, de acordo com o grupo etário,
são(31):
Recém-nascido: trombose de artéria renal, estenose de artéria renal, trombose venosa renal, anormalidades
renais congénitas, coarctação da
aorta, displasia broncopulmonar (menos comum), PCA (menos comum),
hemorragia intraventricular (menos
comum).
Primeiro ano de vida: coarctação da
aorta, doença renovascular, doença
do parênquima renal.
De 1 a 6 anos: doença do parênquima
renal, doença renovascular, coarctação da aorta, hipertensão essencial,
causas endócrinas (menos comum).
De 6 a 12 anos: doença do parênquima
renal, doença renovascular, hipertensão essencial, coarctação da aorta,
causas endócrinas (menos comum),
iatrogénicas (menos comum).
De 12 a 18 anos: hipertensão essencial,
iatrogénicas, doença do parênquima
renal, doença renovascular (menos
comum), causas endócrinas (menos
comum), coarctação da aorta (menos
comum).
A HTA secundária é mais frequente na criança que no adulto. Quanto mais
severa a HTA e mais jovem a criança,
mais provável é a HTA ser secundária.
As doenças renais são a principal
causa de HTA secundária na criança
(cerca de 60-70%). O mecanismo mais
comum da hipertensão é a expansão do
volume plasmático (como na glomerulonefrite aguda pós-estreptocócica) e a
activação do sistema renina-angiotensina. Antecedentes de infecções urinárias
de repetição devem fazer suspeitar de
nefropatia de refluxo (nefropatia cicatricial). Um rim cicatricial unilateral pode
ser a causa da HTA. O rim displásico
multiquístico sem função geralmente sofre involução e só raramente é causa de
HTA. HTA é muito frequente após transplante renal.
A HTA de causa renovascular na
criança é causada por um grupo diverso de lesões, e quase metade dos casos resulta de displasia fibromuscular.
Outras etiologias incluem hipoplasia da
artéria renal, arterite e neurofibromatose
tipo 1 (32). Suspeitar de HTA renovascular
no lactente com antecedentes de colocação de cateter arterial umbilical. HTA
após história de traumatismo renal pode
ser originada por compromisso renovascular directo ou por compressão de
vasos ou do parênquima renal pelo hematoma. A Coarctação da aorta é uma
das principais causas de HTA na criança
jovem.
Outras causas incluem: doenças
endócrinas (feocromocitoma, hipertiroidismo), medicamentos (contraceptivos
orais, simpaticomiméticos, suplementos
dietéticos…). No S. de Turner foram descritas anomalias vasculares. A cafeína,
ansiedade, stress podem originar HTA
transitória, que pode ser confundida com
HTA. A intoxicação com mercúrio está associada a hipertensão, pode ser severa
e simular algumas características do feocromocitoma.
Hipokaliemia e alcalose metabólica
com perda urinária de potássio indicam
excesso primário mineralocorticoides,
sendo a causa mais comum na criança o
aumento de secreção de desoxicorticoesterona na hiperplasia congénita da suprarenal devida a défice 11-beta hidroxilase
e 17 alfa hidroxilase. Os tumores secretores de aldosterona são raros na criança,
mas o hiperaldosteronismo primária pode
ter uma causa genética.
A Hipertensão primária ou essencial é rara na criança abaixo dos 10 anos
e é um diagnóstico de exclusão. Mais frequente na idade pós-pubertária, quando
há história familiar de HTA, obesidade e
com valores de TA cerca do percentil 95
ou ligeiramente acima (Pré-hipertensão
ou no Estádio 1). Factores de risco significativos incluem, síndroma metabólica,
obesidade, sindroma de apneia do sono
e raça negra. Os factores de risco de sin-
droma metabólico incluem lipoproteinas
de alta densidade (HDL) baixas, triglicerídeos elevados, obesidade abdominal e
hiperinsulinemia/resistência à insulina. O
índice de massa corporal (peso em Kg /
estatura em m2) deve ser calculado. Valores: normal (< 25); excesso de peso (30
a 39,9) e obesidade marcada (> 40). A
obesidade e HTA estão associadas com
sindroma metabólica, que é um factor de
risco importante para o futuro desenvolvimento de diabetes tipo 2 e doença cardiovascular(33).
O QUE FAZER SE TA ELEVADA?
1- Confirmar ser HTA verdadeira: Repetir as medições da TA até confirmar
elevação persistente; Excluir cuidadosamente erros nas determinações
da TA; Utilizar as condições adequadas e o mesmo método de confiança; Correcta interpretação dos valores de TA.
2- Excluir causas reactivas de TA elevada: É importante que as causas transitórias de HTA sejam excluídas (dor,
ansiedade, stress, …).
Mas devemos ter a certeza que a
elevação da TA não é um fenómeno protector ou epifenómeno antes
de se iniciar um tratamento. A HTA
transitória também pode reflectir um
aumento da actividade simpática
por exemplo em situações de hipovolémia ou insuficiência cardíaca. A
HTA reactiva pode ser um mecanismo protector e reflexo nas situações
cerebrovasculares com aumento da
pressão intracraneana e diminuição
da perfusão cerebral. Baixar a TA
nesta situação pode precipitar enfartes cerebrais. Não confundir esta
situação com a encefalopatia hipertensiva. A história clínica e o exame
clínico cuidadosos são a chave do
diagnóstico.
3- Reconhecer aumento transitório da
TA: Há situações frequentes como as
nefrites agudas ou raras como sindroma de Guillain-Barré, hipercalcemia,
intoxicação pelo chumbo, disautonomia familiar, medicamentos (corticoides…), excesso na administração de
soros, plasma ou sangue que podem
associar-se a HTA.
hipertensão arterial – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 161
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
ABORDAGEM DA CRIANÇA COM HTA
As crianças com HTA severa podem
apresentar evidência de lesões de órgão
alvo como cardiomegalia, retinopatia,
lesão renal e encefalopatia. Nestas situações é necessário tratamento de emergência da HTA. São em regra crianças
pré-adolescentes com HTA secundária,
com complicações e que estão em risco
de ter lesões de órgão alvo, que necessitam de tratamento de emergência. Todas as investigações básicas devem ser
efectuadas. Se a criança está sintomática
deve iniciar-se tratamento intravenoso,
baixar a TA de forma lenta, monitorização
(TA invasiva se possível) e vigilância em
cuidados intensivos(34).
Num segundo grupo com HTA elevada (estádio 2), sem evidência de lesões em órgão alvo, devem antecipar-se
as previsíveis complicações ou lesões de
órgãos alvo. São geralmente adolescentes com HTA essencial. Estas crianças
devem ter uma investigação básica e é
essencial uma vigilância a longo prazo.
Um terceiro grupo com HTA no estádio 1 ou Pré-hipertensão (TA sistólica e
diastólica percentil 90 mas < percentil 95)
e nos adolescentes TA ≥ 120/80 mmHg,
mesmo se < percentil 90, são indicação
de factor de risco cardiovascular e modificação do estilo de vida. O tratamento só
deve ser considerado após um período
de seguimento.
O objectivo do tratamento da HTA
é a prevenção das complicações e das
lesões de órgãos alvo. A HTA associada
a complicações a curto prazo é severa,
habitualmente apresenta-se na criança
jovem, é sintomática (irritabilidade, alterações do comportamento, atraso de
crescimento, paralisia facial, cefaleias,
convulsões…) e de etiologia secundária.
Ao contrário a HTA associada a
complicações a longo prazo (vários anos
ou décadas), apresenta-se na puberdade, com valores de TA Pré-hipertensão
ou Estádio 1, assintomática, etiologia
primária ou essencial e sem lesões de
órgão alvo.
A evidência de lesão de órgão alvo
na HTA não tratada na criança pode
ocorrer após muitos anos (complicações
a longo prazo). Marcadores potenciais de
lesões de órgão alvo foram identificados:
cérebro (alterações detectadas pela TAC
e RMN), olhos (retinopatia), rim (microalbuminuria, alteração da filtração glomerular, baixa da reserva funcional renal) e
coração (hipertrofia ventricular esquerda,
disfunção diastolica). A ecocardiografia é
recomendada como instrumento principal
na avaliação da criança com HTA.
Se a determinação de TA ≥ P90 e
< P 95 e/ou TA 120/80 mmHg: deve repetir-se a medição na mesma consulta.
Se confirmada reavaliar dentro de 3 - 6
meses. Não iniciar terapêutica, excepto
se doença crónica renal, diabetes mellitus, insuficiência cardíaca ou hipertrofia
ventricular esquerda
Se a determinação de TA ≥ P95 deve
fazer-se o estadiamento: No Estádio
1 deve ser repetida medição em duas
ocasiões separadas, com intervalos de
1 semana, ou antes se sintomático. No
Estádio 2 deve avaliar-se imediatamente,
investigar e iniciar terapêutica.
AVALIAÇÂO DIAGNÓSTICA (HISTÓRIA
E EXAME FÍSICO)
Quando confirmado o diagnóstico
de HTA, uma história e exame clínico
adequados são essenciais na avaliação
da criança com HTA, para identificar etiologia da HTA, detectar lesão em órgão
alvo e evitar exames complementares
desnecessários e dispendiosos.
Quanto menor a idade e mais elevada a TA, maior a probabilidade da hipertensão arterial ser secundária, por
este motivo, mais minuciosa deve ser a
investigação(13). A investigação inicia-se
pela história clínica detalhada e orientada para factores de risco de HTA. Alguns
pontos importantes são:
História pré-natal e do parto (sofrimento fetal, oligoamnios, anóxia perinatal, peso de nascimento, cateterismo
umbilical, etc.).
Sintomas específicos da hipertensão (cefaleias, vómitos, epistáxis, vertigens, escotomas, etc.); outros sintomas
como dor abdominal, perda de peso,
fraqueza muscular, palpitações, suores,
febre, episódios de rubor facial.
Doenças renais e urológicas actuais
ou pregressas (ex. infecções urinárias);
disúria, poliúria, noctúria, hematúria, dores articulares, edemas.
hipertensão arterial – mesa redonda
S 162
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
Medicação que podem elevar TA
(vasoconstritor nasal, corticóides, anticoncepcionais…);
Sintomas sugestivos de causa endócrina (ex. perda de peso, sudorese,
taquicardia, palpitação, febre, caimbras e
fraqueza muscular).
História familiar de hipertensão essencial, doenças cardiovasculares, diabetes, obesidade, dislipidemia, distúrbios
de sono, doenças hereditárias renais ou
endócrinas ou doença genética associada à hipertensão secundária (ex. doença
poliquística, etc.). Há uma associação de
apnea do sono a obesidade e HTA.
Antecedentes pessoais de hábitos
alimentares, actividade física, consumo
de bebidas alcoólicas, fumar, anticonceptivos orais.
O exame físico é muito importante
e deve procurar-se sinais sugestivos de
HTA secundária e evidência de factores
de risco adicionais (ex: obesidade abdominal) e lesão de órgãos alvo. Algumas
das alterações que são citadas abaixo
podem auxiliar no diagnóstico de hipertensão secundária:
Determinar peso, estatura e índice
de massa corporal, porque há uma associação entre obesidade e HTA. O exame
deve incluir: avaliar sinais como palidez,
edemas palpebrais e pré-tibiais, sudorese, alterações da pele. A palpação do
abdómen e tiróide, auscultação de sopro
nos grandes vasos e um exame cardíaco e neurológico completo (paralisia facial…). Medir TA nos membros superiores e inferiores e a palpação cuidadosa
de pulsos, para excluir Coarctação da
Aorta. Ambiguidade genital é sugestiva
de hiperplasia congénita de supra-renal.
Sinais físicos sugestivos de doenças genéticas (ex.: neurofibromas e manchas
café-com-leite na neurofibromatose);
Sinais clínicos sugestivos de síndromes
associados a HTA (S. de Turner, S. Williams, Neurofibromatose, Esclerose tuberosa, S. de Cushing); Sinais sugestivos de
causa endócrina como obesidade central,
fácies de lua cheia, hirsutismo, aumento
da tiróide.
O exame do fundo ocular é parte importante do exame físico.
Pensar em HTA secundária se: HTA
em crianças < 10 anos, HTA no estádio 2
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
ou no estádio 1 associando sinais clínicos de doença sistémica.
A HTA renovascular afecta 5 – 25%
das crianças com HTA secundária,e a displasia fibromuscular a causa mais comum
(35). Um sopro abdominal pode ser auscultado em cerca de 40% dos doentes.
Sinais de doença renal ou renovascular
como massa renal, edema, sopro abdominal, sopros e massas abdominais.
A HTA Primária tem muitas vezes
uma história de HTA ou doença cardiovascular.
INVESTIGAÇÂO DA HTA
Quando investigar? Todas as crianças com TA ≥ P95, em avaliações repetidas.
Todas as criança com TA entre P90 e 95 e
com co-morbilidades associadas (obesidade, diabetes mellitus, história familiar HTA).
Todas as crianças com suspeita de HTA da
“bata branca” (MAPA de TA)
Investigação de 1ª linha: deve ser
realizada na criança hipertensa. Com ela
avaliam-se algumas das principais causas de HTA secundária (renal 60-70%),
lesões em órgãos alvo e factores de risco
associados de doença cardiovascular.
Estes exames também devem ser efectuados, na criança com pré-hipertensão,
que é obesa e tem história de HTA ou
doença cardiovascular ou doença renal
crónica. A investigação inicial da criança
com HTA persistente deve incluir:
Hemograma completo (se evidenciar
anemia pode reflectir uma doença
crónica como uma vasculite ou doença renal crónica);
Ureia, creatinina, ionograma, cálcio,
fósforo, ácido úrico, proteínas totais,
albumina. Glicemia em jejum e ficha
lipídica. Gasimetria (permitem uma
avaliação rápida da função renal e
anomalias da homeostase);
Doseamento de renina e aldosterona;
Análise de urina tipo II com doseamento
de proteínas e creatinina; urocultura;
Radiografia do tórax;
Ecografia renal (cicatrizes, anomalias
congénitas, dimensões renais, massas renais ou da supra-renal);
Ecografia cardíaca (cardiopatia ou sinais indirectos de HTA: hipertrofia
ventricular esquerda ou disfunção
diastólica). Para avaliar a hipertrofia
ventricular esquerda (HVE), que é
evidência clínica major na criança de
lesão de órgão alvo pela HTA. É uma
indicação para se iniciar ou intensificar o tratamento da HTA.
Elevações severas da TA, independentemente da idade, necessitam
investigação mais agressiva. A HTA leve,
ao contrário, usualmente não está associada com doença secundária. Tem sido
proposto que, para adolescentes assintomáticos, com HTA leve, só estudos mínimos são necessários (1ª linha). Baseado
na história clínica, exame físico e exames
laboratoriais iniciais, o Pediatra deve ser
capaz de estabelecer quando a HTA é
essencial (primária) ou secundária. Esta
distinção determinará as avaliações seguintes das possíveis causas da HTA.
Investigação de 2ª linha: é mais
agressiva e realizada nas crianças com
níveis de TA mais elevados, com menor
idade ou que apresentem lesão em órgão
alvo na avaliação da fase 1 (ex. hipertrofia
ventricular esquerda). Os exames devem
ser realizados de acordo com a clínica de
cada doente.
Se há suspeita de doença renal crónica:
Cintigrama DMSA (o exame mais sensível para detectar cicatrizes renais);
Eventual biopsia renal.
Se há suspeita de HTA renovascular:
Ecografia doppler renal;
Cintigrama com DMSA basal e após
administração IECA;
AngioTAC, angioRMN;
Dosear renina nas veias renais;
Angiografia renal convencional (diagnóstica e terapêutica).
Se suspeita de feocromocitoma:
Catecolaminas (ácido vanilmandélico)
na urina de 24 h;
Cintigrafia com meta-iodo-benzil-guanidina (MIBG).
Outras suspeitas:
TAC abdominal;
Hormonas: T3, T4, TSH, 17-cetoesteriodes urinários
Teste de supressão com dexametasona. Tóxicos na urina.
Por exemplo, se história de HTA em
picos, associada a palpitação, taquicardia
e sudorese, começar a investigação pela
dosagem de catecolaminas; enquanto
que um doente, com história de infecção
urinária de repetição, iniciar com a cintigrafia renal e uretrocistografia miccional
(cicatriz renal? Refluxo vésico-ureteral?).
A doença renovascular é uma das
causas mais frequentes de HTA secundária na infância. É uma doença grave,
cerca de 5% a 25% das crianças com
HTA secundária têm causa renovascular
(35). As crianças jovens com elevações
severas da TA são as mais propensas a
ter doença renovascular. A displasia fibromuscular é a causa mais comum de
hipertensão renovascular na infância.
O diagnóstico de HTA renovascular é a
parte mais problemática da investigação, pois pode necessitar de métodos
invasivos para confirmação diagnóstica
(arteriografia renal e colheita para dosear
renina na veia renal).
Com a Ecografia renal com Doppler
de cor é possível detectar estenose da
artéria renal, mas está muito dependente
da experiência do operador. É em regra,
o primeiro exame efectuado, porque não
é invasivo e não é caro. A actividade da
renina plasmática está elevada na criança com HTA renovascular, mas tal como
no adulto, é um teste relativamente insensível. Cerca de 15% das crianças
com estenose da artéria renal evidente
na arteriografia têm níveis normais de
renina.
O cintigrama renal DMSA sem e
com inibidores da enzima de conversão
da angiotensina (IECA) demonstrou ser
útil como um teste de screening inicial.
A angiorressonancia magnética tem
vindo a tornar-se mais fiável na avaliação
da doença renovascular, requer imobilização (anestesia nas crianças pequenas). As reconstruções tridimensionais
com AngioTAC ou AngioTAC espiral com
contraste parecem promissoras.
O doseamento de renina na veia renal, é um método invasivo que necessita
cateterização e têm limitações inerentes.
No entanto, a avaliação “golden
standard” da doença renovascular na
criança continua a ser a angiografia renal
standard ou a angiografia de subtracção
hipertensão arterial – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 163
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
digital. Com um radiologista de intervenção experiente a dilatação da artéria renal estenosada pode ser efectuada na
mesma sessão(36).
O tratamento médico é o método de
preferido para controlar a HTA. A reparação cirúrgica ou angioplastia percutânea
transluminal (incluindo stent) pode ser
necessário se o tratamento médico não
controla a HTA, a medicação não é adequadamente cumprida, ou a tentativa de
cura definitiva é desejada pela criança/família. Se a doença renovascular é diagnosticada num rim com função muito diminuída, neste caso a nefrectomia pode
ser a melhor opção.
A causa mais comum de HTA cardiovascular é a Coarctação da aorta, que
ocorre de forma esporádica, mas também é comum na criança com S. de Turner. O diagnóstico é usualmente evidente
no exame físico, porque o pulso femoral é
fraco ou ausente e pelo diferencial na TA
entre os membros superiores e inferiores.
Um sopro sistólico está frequentemente
presente. O diagnóstico não invasivo é
efectuado por Ecocardiograma.
Excluir sempre HTA secundária a
medicamentos (contraceptivos orais, corticoesteroides, anti-inflamatórios, cocaína, anfetaminas, eritropoietina e ciclosporinas.
Outras causas raras de HTA incluem
as doenças endócrinas, como hipertiroidismo, sindroma de Cushing, hiperaldosteronismo primário, e alguns tumores
endócrinos incluindo o feocromocitoma e
neuroblastoma. Os feocromocitomas são
responsáveis por cerca de 1% de HTA
secundária na criança e podem surgir de
forma esporádica ou em associação com
S. de von Hippel-Landau, S. neoplásicos
endócrinos múltiplos, neurofibromatose e S. paragangliomas. A criança pode
apresentar-se com cefaleias, palidez com
rubor, taquicardia, febre, suores e náuseas ou perda de peso, apesar de apetite.
Estes sintomas são geralmente associados a HTA que é mais persistente que
paroxística. O diagnóstico é efectuado
pela determinação das catecolaminas na
urina de 24 h, e localização do tumor pela
cintigrafia com meta-iodo-benzil-guanidina (MIBG) ou imagiologia TAC ou Ressonância magnetica (RM).
Causas raras de HTA hereditária
têm sido identificáveis, nomeadamente,
S. Liddle’s, Excesso aparent de mineralocorticoides, Aldosteronismo e Hiperplasia
suprarrenal congénita causada por mutações do gene 11b-hydroxylase.
Uma hipokalemia inexplicável e alcalose metabólica com perda de potássio
urinário é muito sugestivo de excesso primário de mineralocorticóides. Estes doentes não apresentam edemas. Tumores
secretores de aldosterona, são raros na
criança mas comuns nos adultos. A causa
mais frequente nas crianças é o excesso
de desoxicorticoesterona. Este último é
caracterizado por ambiguidade genital.
Os níveis de renina estão baixos.
A HTA essencial é uma doença
multifactorial na origem, e resulta de
uma combinação de genética e factores
ambientais. É uma doença de carácter
poligénico. Nos anos recentes, a HTA
essencial, tem aumentado na criança e
adolescente e a HTA essencial tem aumentado nos anos recentes, e está associado com um aumento da prevalência da
obesidade(37).
TRATAMENTO
O objectivo do tratamento é reduzir
a TA abaixo do percentil 90, prevenir as
complicações tardias da HTA e deve incluir medidas não farmacológicas e farmacológicas.
Tratamento não farmacológico
Reduzir o peso na criança obesa: A
obesidade é um factor de risco independente para o desenvolvimento de HTA e
doenças cardiovasculares. A redução de
peso baixa a TA sistólica e diastólica na
criança e adolescente obeso.
Dieta pobre em sal: A redução da
ingestão de sal baixa a TA nos adultos
hipertensos. Na criança não há estudos
a longo prazo no efeito da restrição de
sódio na TA. No entanto, geralmente a ingestão de sódio é elevada, a redução na
dieta pode ser benéfica. É benéfico em
etiologias de HTA em que há retenção de
sal (glomerulonefrite, hiperaldosteronismo, HTA com renina elevada). Do ponto de vista prático, não adicionar sal aos
alimentos cozinhados em casa, evitar a
ingestão de alimentos processados industrialmente, tais como enlatados, con-
hipertensão arterial – mesa redonda
S 164
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
servas, enchidos e fumados, aumentar o
consumo de fruta e vegetais frescos.
Exercício físico regular: O exercício
físico aeróbio dinâmico (andar, correr,
bicicleta), auxilia na redução de peso e
é recomendado porque diminui a resistência vascular periférica e a TA sistólica e diastólca. Ao contrário do exercício
dinâmico, durante o exercício estático as
resistências periféricas não se modificam
e a TA sistólica e diastólica aumenta. As
crianças com HTA podem praticar desportos se a sua TA está bem controlada.
A combinação das medidas não
farmacológicas, modificando hábitos de
vida (perder peso, exercício, dieta pobre
em sal e gorduras), resulta na baixa da
TA. As medidas não farmacológicas devem continuar após se iniciar tratamento
farmacológico, porque são de baixo custo
e risco mínimo, aumentam a eficácia do
tratamento medicamentoso e reduzem o
risco cardiovascular.
Tratamento farmacológico
O tratamento farmacológico da HTA
deve ser iniciado na criança e adolescente nos seguintes casos: HTA significativa
e persistente sem resposta às medidas
não farmacológicas; HTA severa na apresentação; HTA com lesão de órgão alvo
ou HTA sintomática e Secundária.
Muitos dos medicamentos anti-hipertensores usados no adulto são também usados na criança. Apenas alguns
foram testadas especificamente em
crianças, na maioria as dosagens são
extrapoladas de dados farmacocinéticos
obtidos de estudos em adultos. Nos Estados Unidos a Food and Drug Administration (FDA), diversos medicamentos estão
a ser actualmente estudadas na população pediátrica.
Há 6 classes de medicamentos
anti-hipertensores que são usados no
tratamento a longo prazo: diuréticos,
beta-bloqueantes, inibidores da ECA e
antagonistas da angiotensina II, bloqueadores de canal de cálcio e bloqueador
alfa.
Diuréticos: são de preferência utilizados em crianças com retenção de sal e
retenção de água. Nas crianças com redução da filtração glomerular (<50%) as
tiazidas são ineficazes e os diuréticos de
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
ansa (furosemida) devem ser preferidos.
Nos doentes com hiperaldosteronismo
beneficiam de inibidores da aldosterona.
Efeitos secundários: Hidroclorotiazida (hipokaliemia, hiperglicemia, hiperuricemia);
Furosemida (hipokaliemia, hiperglicemia,
hiperuricemia, hipercalciúria). Bumetanida: (hipokaliemia, hiperglicemia, hiperuricemia. Espironolactona: Antagonista da
aldosterona).
β bloqueantes: são medicamentos
de 1ª escolha na criança HTA hipercinetica
como o feocromocitoma ou adolescentes
com HTA primária e frequência cardíaca
elevada em repouso. Devem ser usados
com muito cuidado na criança com história de asma, dislipidémia ou bloqueio cardíaco. Propranolol: Proibido em pacientes
com asma e ICC, hiperglicemia.
Bloqueadores do canal de cálcio:
muito se tem discutido sobre o uso da nifedipina de acção curta, tendo sido muito
utilizada em crianças, principalmente por
sua acção rápida. Hipotensão não controlada, associada a eventos cardíacos
em adultos, tem levado à recomendação
para abandonar o seu uso. Nifedipina retard: aumenta a frequência cardíaca, cefaleias, vertigens. Anlodipina: Bloqueador
canal de cálcio, bem tolerado, efectiva
em pacientes com IRC. Isradipina: Bloqueador canal de cálcio.
Inibidores da enzima de conversão
da Angiotensina (IECA): O primeiro a receber aprovação do FDA foi o enalapril,
que é bem tolerado, apesar de poder provocar tosse. Outros medicamentos, como
ramipril, já se mostraram eficazes. Efeitos
secundários: Captopril provoca hiperkaliemia, trombocitopenia, neutropenia,
tosse, cautela na estenose de artéria renal, baixa filtração glomerular. Enalapril:
hiperkaliemia, trombocitopenia, leucopenia, tosse, baixa filtração glomerular.
Alguns bloqueadores do receptor da
angiotensina foram aprovados para uso
em adultos (losartan e irbesartan), mas
nenhum destes foi bem estudado em
crianças.
Dos fármacos vasodilatadores:
Efeitos colaterais: Hidralazina aumenta
a frequência cardíaca, cefaleias, síndrome lupus like (raro em pediatria). Minoxidil provoca retenção de sal e água,
hirsutismo.
TERAPÊUTICA FARMACOLÓGICA
Crianças com idades entre 1 e 17 anos: tratamento ambulatório (per os)
Classe
IECA
Fármaco
Dose inicial
Dose máxima
Captopril
0,3-0,5 mg/kg/ dose (3 id)
6 mg/kg/dia
Enalapril
0,08 mg/kg/dia até 5mg/dia (id-2id) 0,6mg/kg/dia até 40 mg/dia
Lisinopril
0,07 mg/kg/dia até 5mg/dia (id)
0,6 mg/kg/dia até 40 mg/dia
Quinapril
5-10 mg/dia (id)
80 mg/dia
Benazapril
0,2 mg/Kg/dia até 10 mg/dia (id)
0,6 mg/kg/dia até 40 mg/dia
6-12 anos: 75-150 mg/dia (id)
≥ 13 anos: 150-300 mg/dia
Boqueador
Ibersatran
receptor de
angiotensina (ARA) Losartan
0,7 mg/kg/dia até 50 mg/dia (id)
1,4 mg/kg/dia até 100 mg/dia
Bloqueador α e β
1-3 mg/kg/dia (id)
12mg/kg/dia até 1200 mg/dia
Labetolol
Atenolol
0,5-1mg/kg/dia (id-2id)
2mg/kg/dia até 100 mg/dia
Propanolol
1-2 mg/kg/dia (2id-3id)
4mg/kg/dia até 640 mg/dia
Metoprolol
1-2 mg/kg/dia (2id)
6 mg/kg/dia até 200 mg/dia
Bloqueadores
canais de
cálcio
Amlodipina
6-17 anos: 2,5-5 mg (id)
Isradipina
0,15-0,2mg/kg/dia (3id-4id)
0,8 mg/kg/dia até 20 mg/dia
Nifedipina retard
0,25-0,5 mg/kg/dia (id-2id)
3mg/kg/dia até 120 mg/dia
Agonista alfa
Clonidina
≥ 12 anos: 0,2 mg/dia (2id)
2,4 mg/dia
Furosemide
0,5-2 mg/kg/dose (id-2id)
6mg/kg/dia
Espirolonactona
1mg/kg/dia (id-2id)
3,3 mg/kg/dia até 100 mg/dia
Amiloride
0,4-0,625 mg/kg/dia (id)
20 mg/dia
Hidralazina
0,75 mg/kg/dia
7,5 mg/kg/dia até 200 mg/dia
< 12 anos: 0,2 mg/kg/dia (id-4id)
50mg/dia
≥ 12 anos: 5mg/dia (id-4id)
100 mg/dia
Bloqueador β
Diurético
Vasodilatador
Minoxidil
TERAPÊUTICA FARMACOLÓGICA HTA SEVERA
Crianças com idades entre 1 e 17 anos
Classe
Bloqueador Beta
Bloqueador alfa –beta
Vasodilatador
Vasodilatador
Bloqueadores canais
de cálcio
Fármaco
Dose inicial
Mais úteis
100-500 μg/kg/min (EV)
Esmolol
tempo acção muito curto.
pode causar bradicardia
bólus: 0,2-1mg/kg/dose até 40 mg/dose
Labetalol
Perfusão: 0,25-3 mg/kg/H
CI: asma eInsuficiência cardiaca
0,53-10
μg/kg/min (perfusão)
Nitruprussiato de sódio
monitorizar níveis de cianido se > 72H
0,2-0,6 mg/kg/dose (IV;IM)
Hidralazina
(bólus de 4-4h)
Minoxidil
Isradipina
Nicardipina
IECA
Enalaprilato
Alfa –agonista
Clonidina
Ocasionalmente úteis
0,1-0,2 mg/kg/dose (per os) de 12-24 horas
vasodilatador oral potente e acção longa
0,05-0,1 mg/kg/dose (per os) 12-12 horas
1-3 μg/kg/min (perfusão)
pode causar taquicardia reflexa
0,05-0,1 mg/kg/dose até 1,25 mg/dose e.v. (bólus)
cada 6 horas
0,05-0,1mg/dose, podendo repetir até 0,8 mg da dose
total de 8-12 horas (per os)
hipertensão arterial – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 165
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
A escolha do anti-hipertensor deve
ser adaptada individualmente dependendo da causa de HTA, do nível da TA, da
presença concomitante de doenças ou
lesões de órgão alvo e dos antecedentes na história clínica do doente. Iniciar
todos os fármacos com dose mais baixa
recomendada. Quando a dose mais elevada recomendada for atingida pode-se
associar um segundo fármaco. Adaptar
fármacos à patologia subjacente. Exemplos: Glomerulonefrite: diurético, vasodilatador. Alto débito cardíaco, migraine
associada: β- bloqueante. Diabetes, microalbuminúria, doenças renais e proteinúria: IECA, ARA.
Os princípios do tratamento farmacológico da HTA são: baixar a TA <
percentil 90, mínimos efeitos colaterais,
reduzir TA nas 24 h com medicamentos de longa acção com uma toma diária, aumento gradual da dose se dose
inicial ou associação de medicamentos de diferentes classes (associações
preferíveis: diuréticos+β bloqueantes;
diuréticos+IECA; bloqueadores de canal
de cálcio+ β bloqueantes; bloqueadores
de canal de cálcio+IECA).
Terapêutica Farmacológica na
HTA severa: Indicada na HTA severa
(estádio 2 e > 5 mmHg P 99) sintomática
e nas Emergências hipertensivas (encefalopatia hipertensiva)
O objectivo deve ser baixar TA para
um valor inferior a 25% do seu valor inicial, durante as primeiras 8 horas e gradualmente ir normalizando TA nas próximas
26-48 horas. Preferencialmente fármacos
em perfusão, cujo efeito desapareça rapidamente após suspensão. Monitorização
contínua de TA e Internamento em Cuidados Intensivos.
Vigilância da criança com HTA.
Consequências da hipertensão na infância
Todas as crianças com HTA confirmada necessitam de follow-up regular e
prolongado. Ter uma atenção particular à
presença de sinais clínicos que sugiram
evidência incipiente de lesão de órgão
alvo, indicando uma causa secundária
de HTA numa criança previamente classificada como tendo HTA essencial. Na
criança em tratamento devem ser avalia-
dos os efeitos colaterais da medicação.
A explicação da doença, necessidade do
tratamento e de um estilo de vida saudável é importante, assim como a educação
dos doentes e dos seus pais.
A determinação adequada da TA
nas consultas pelo pediatra deve fazer
parte do exame. Quando descoberta HTA
deve ser investigada e adequadamente
tratada. Há evidência de que a HTA na
criança se associa de forma mais precoce com morbilidade e mortalidade
cardiovascular no adulto. Pequenas reduções na TA podem diminuir o risco de
doença cardiovascular a longo termo. A
aterosclerose (alteração patológica que
usualmente é tida como problema típico
do adulto) pode iniciar-se precocemente
na criança.
Outra consequência da HTA em pediatria é a hipertrofia ventricular esquerda
(HVE). Existe uma relação directa entre a
TA e o tamanho do ventrículo esquerdo e
o tratamento da HTA consegue regredir
esta hipertrofia (demonstrado em estudos em adultos).
O diagnóstico precoce e intervenção na criança com hipertensão são potencialmente benéficos na prevenção das
complicações da HTA a longo prazo. Por
este motivo, o pediatra deve preocuparse com o diagnóstico e o tratamento da
hipertensão arterial e dos outros factores
de risco cardiovasculares precocemente
na criança.
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 158-167
BIBLIOGRAFIA
1. Sorof JM, Lai D, Turner J, Poffenbarger T, Portman RJ. Overweight,
ethnicity, and the prevalence of hypertension in school-aged children.
Pediatrics 2004; 113:475–482
2. Bartosh SM, Aronson AJ. Childhood
hypertension: an update on etiology,
diagnosis and treatment. Pediatr Clin
North Am 1999; 46:235-52.
3. Kay JD, Sanaiko AE, Stephen RD.
Pediatric hypertension. Am Heart J
2001; 143:422-32.
4. Daniels, SR, Witt, SA, Glascock, B,
et al. Left atrial size in children with
hipertensão arterial – mesa redonda
S 166
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
hypertension: the influence of obesity,
blood pressure, and left ventricular
mass. J Pediatr 2002; 141:186.
5. Burt VL, Whelton P, Roccella EJ,
Brown C, Cutler JA, Higgins M, et
al. Prevalence of hypertension in the
US adult population: results from the
Third National Health and Nutrition
Examination Survey, 1988-1991. Hypertension 1995; 25:305-13.
6. Kay JD, Sanaiko AE, Stephen RD.
Pediatric hypertension. Am Heart J
2001; 143:422-32.
7. Lauer, RM, Clarke, WR. Childhood
risk factors for high adult blood pressure: The Muscatine Study. Pediatrics
1989; 84:633.
8. Chobanian, AV, Bakris, GL, Black,
HR, Cushman, WC. The Seventh Report of the Joint National Committee
on Prevention, Detection, Evaluation,
and Treatment of High Blood Pressure: The JNC 7 Report. JAMA 2003;
289:2560.
9. Daniels, SR, Loggie, JM, Khoury, P,
Kimball, TR. Left ventricular geometry
and severe left ventricular hypertrophy in children and adolescents with
essential hypertension. Circulation
1998; 97:1907
10. Muntner, P, He, J, Cutler, JA, et al.
Trends in blood pressure among children and adolescents. JAMA 2004;
291:2107
11. Sorof, J, Daniels, S. Obesity hypertension in children: a problem of
epidemic proportions. Hypertension
2002; 40:441.
12. Rosner, B, Prineas, RJ, Loggie, JM,
Daniels, SR. Blood pressure nomograms for children and adolescents,
by height, sex, and age, in the United
States. J Pediatr 1993; 123:871
13. Nehal US, Ingelfinger JR. Pediatric
hypertension: recent literature. Curr
Opin Pediatr 2002; 14:189-96.
14. Gueyffier F, Froment A, Gouton M.
New meta-analysis of treatment trials
of hypertension: improving the estimate of therapeutic benefit. J Hypertens 1996; 10:1-8.
15. Goonasekera CDA, Dillon MJ. Measurement and interpretation of blood
pressure. Arch Dis Child 2000;
82:261–265
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
16. National Heart, Lung And Blood Institute. Task force on the blood pressure
control in children: recommendations
of the Task Force on the Blood Pressure Control in Children. Pediatrics
1977; 59:797S-820S.
17. National Heart, Lung and Blood Institute. Report of the Second Task
Force on Blood Pressure Control in
Children – 1987: Task Force on the
Blood Pressure Control in Children.
Pediatrics 1987; 79:1-25.
18. National High Blood Pressure Education Program. Working Group on
Hypertension Control in Children and
Adolescents. Update on the 1987 Task
Force Report on high blood pressure
in children and adolescents: a working
group report from the National High
Blood Pressure Education Program.
Pediatrics 1996; 98:649-57.
19. The fourth report on the diagnosis,
evaluation, and treatment of high
blood pressure in children and adolescents. Pediatrics 2004; 114:555.
20. National High Blood Pressure Education Program Working Group on High
Blood Pressure in Children and Adolescents.The Fourth Report on the Diagnosis, Evaluation, and Treatment of
High Blood Pressure in Children and
Adolescents. Pediatrics 2004; 144
[Suppl]:555–576.
21. Clark, JA, Lieh-Lai, MW, Sarnaik, A,
Mattoo, TK. Discrepancies between
direct and indirect blood pressure
measurements using various recom-
mendations for arm cuff selection.
Pediatrics 2002; 110:920
22. Arafat, M, Mattoo, TK. Measurement
of blood pressure in children: recommendations and perceptions on cuff
selection. Pediatrics 1999; 104:30
23. Beevers, G, Lip, GY, O’Brien, E.
ABC of hypertension. Blood pressure
measurement. Part II – Conventional
sphygmomanometry: Technique of
auscultatory blood pressure measurement. BMJ 2001; 322:1043.
24. Recommendations for routine blood
pressure measurement by indirect
cuff sphygmomanometry. American
Society of Hypertension. Am J Hypertens 1992; 5:207
25. Lurbe E, Redon J. Reproducibility
and validity of ambulatory blood pressure monitoring in children. Am J Hypertens 2002; 15:69S–73S
26. Rucki, Feber J. Repeated ambulatory
blood pressure monitoring in adolescents with mild hypertension. Pediatr
Nephrol 2001; 16:911–915
27. Flynn JT. Differentiation between primary and secondary hypertension
in children using ambulatory blood
pressure monitoring. Pediatrics 2002;
110:89–93
28. Moore VM, Miller AG, Boulton TJ,
Carey RM. Placental weight, birth
measurements and blood pressure
at age 8 years. Ach Dis Child 1996;
74:538-41.
29. Sorof, JM, Lai, D, Turner, J, et al.
Overweight, ethnicity, and the preva-
lence of hypertension in school-aged
children. Pediatrics 2004; 113:475
30. Pratt RE, Dzau VJ. Genomics and
hypertension: concepts, potential and
opportunities. Hypertension 1999;
33:238-47.
31. Bartosh SM, Aronson AJ. Childhood
hypertension. An update on etiology,
diagnosis and treatment. Pediatr Clin
N Am 1999; 46:235–252
32. Fossali, E, Signorini, E, Intermite, RC,
Casalini, E. Renovascular disease
and hypertension in children with neurofibromatosis. Pediatr Nephrol 2000;
14:806
33. Falkner, B, Gidding, SS, RamirezGarnica, G, et al. The relationship of
body mass index and blood pressure
in primary care pediatric patients. J
Pediatr 2006; 148:195
34. Adelman RD, Coppo R, Dillon MJ.
The emergency management of severe hypertension. Pediatr Nephrol
2000; 14:422– 427
35. Dillon MJ. The diagnosis of renovascular disease. Pediatr Nephrol 1997;
11:366–372
36. Shroff, R, Roebuck, DJ, Gordon, I, et
al. Angioplasty for renovascular hypertension in children: 20-year experience. Pediatrics 2006; 118:268
37. Feig DI, Nakagawa, T, Karumanchi,
SA, et al.Hypothesis: Uric acid, nephron number, and the pathogenesis
of essential hypertension. Kidney Int
2004; 66:281.
hipertensão arterial – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 167
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Factores de Risco Cardiovascular:
Prevenção desde a Infância
Carmen do Carmo(1), Conceição Mota(2), Elói Pereira(3)
RESUMO
A aterosclerose é uma doença sistémica, que permanece numa forma
subclínica durante as primeiras décadas
de vida. A sua prevenção faz-se desde a
infância, com a modificação dos hábitos
de vida e a identificação e tratamento dos
factores de risco. Os autores abordam os
diversos factores de risco vascular, caracterizando-os do ponto de vista epidemiológico e fisiopatológico, e definem as
medidas preventivas a tomar na infância
e na adolescência. Nos doentes pediátricos de alto risco, apresentam a estratificação do risco vascular em três grupos, e
para cada grupo objectivos terapêuticos.
Palavras-chave:
Aterosclerose;
risco vascular; prevenção; infância; adolescência.
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 168-172
INTRODUÇÃO
A aterosclerose é uma doença
sistémica, que afecta múltiplos leitos
vasculares e que consiste na resposta
inflamatória fibroproliferativa da parede
arterial a diversas formas de agressão do
endotélio(1).
As lesões têm início na infância,
mas na maioria das crianças o envolvimento vascular é mínimo e a doença permanece numa forma subclínica durante
as primeiras décadas de vida. A intensidade das lesões e o seu grau de progressão são influenciados pelo número e
gravidade dos diversos factores de risco
vascular associados(2).
__________
¹ Assistente Hospitalar de Nefrologia
2
Assistente Graduada de Nefrologia do Hospital Especializado de Crianças Maria Pia
3
Chefe de Serviço de Nefrologia do Hospital
Especializado de Crianças Maria Pia
A prevenção da doença vascular
aterosclerótica depende da modificação
dos hábitos comportamentais (nutrição,
exercício físico e tabagismo) e da identificação e tratamento dos factores de risco
(obesidade, dislipidémia, diabetes mellitus e hipertensão arterial), que deverão
ter inicio o mais precocemente possível,
de preferência na infância(3).
NUTRIÇÃO
A ingestão dos nutrientes essenciais, associada a um aporte calórico adequado ao consumo de energia diário, é
fundamental para prevenir o aparecimento ou agravamento dos factores de risco
vascular. Assim, para melhorar o padrão
alimentar das crianças, as famílias devem adquirir conhecimentos acerca dos
benefícios de uma alimentação saudável
e modificar os seus hábitos alimentares
em conformidade.
Devem promover-se as refeições
em família, estabelecendo horários e
evitando o consumo de alimentos nos
intervalos. As refeições devem conter
nutrientes dos diferentes grupos alimentares, de forma a garantir um aporte nutricional completo. O número de refeições
e a quantidade devem ser adequados ao
tipo de actividade diária, de forma a não
exceder as necessidades calóricas necessárias.
Segundo as recomendações da
American Heart Association, a alimentação das crianças com mais de dois
anos, deve basear-se na ingestão diária de frutas, legumes, cereais integrais,
leguminosas, produtos lácteos magros
ou pobres em gordura, peixes e carnes
magras. A ingestão de sumos de fruta
deve ser limitada. Os óleos e margarinas devem ser de origem vegetal, com
baixo teor em gorduras saturadas e áci-
hipertensão arterial – mesa redonda
S 168
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
dos gordos-trans. O consumo de açúcar,
sal e farinhas refinadas deve ser reduzido(4).
EXERCÍCIO FÍSICO
O sedentarismo é um importante
factor de risco independente para a doença vascular, assim como para a obesidade, a dislipidemia, a hipertensão arterial e a diabetes mellitus.
A prática do exercício físico quando
iniciada na infância, para além de trazer
beneficios nesta idade, tem uma maior
probabilidade de se manter na vida adulta, contribuindo dessa forma para a diminuição do risco vascular ao longo da
vida. No entanto, o que se observa é o
aumento do tempo dedicado a actividades sedentárias como o uso excessivo
do computador, vídeo-games e televisão,
pelas crianças e adolescentes(5).
Nas consultas de rotina deve ser
avaliado o grau de actividade física, de
forma a fomentar a sua prática. O exercício físico não deve ser limitado apenas
às aulas de educação física e ao desporto de competição, devendo incentivar-se
outras formas de exercício, integradas na
actividade diária, como andar a pé ou de
bicicleta. As actividades devem ser divertidas e com uma duração mínima de
uma hora, e a utilização da televisão e do
computador deve ser limitada, no máximo, a duas horas por dia(4).
TABAGISMO
A infância e a adolescência são períodos críticos para a adesão a comportamentos de risco. Nos EUA, começam
a fumar, diariamente, mais de três mil
adolescentes, com uma idade média de
dez ponto sete anos, no sexo masculino,
e de onze ponto quatro anos, no sexo feminino(6).
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Os principais factores de risco para
o tabagismo são a idade, o sexo, o nível
socio-económico, a história de hábitos
tabágicos nos pais, irmãos ou amigos
e a ausência de informação acerca dos
efeitos do tabaco enquanto causa de doença(6).
A redução da prevalência dos hábitos tabágicos, é um objectivo que necessita de um conjunto de medidas, a
implementar a vários níveis, tais como,
informar as crianças e os adolescentes
para dissuadir o consumo, reduzir a exposição involuntária ao fumo e apoiar os
programas de desabituação. Nas consultas, todas as crianças com idade superior a dez anos, devem ser questionadas
acerca do consumo de tabaco e devem
ser advertidas dos riscos que esse hábito
tem para a saúde(3).
OBESIDADE
A OMS define a obesidade como
uma doença, em que o excesso de gordura corporal pode atingir níveis capazes
de afectar a saúde.
A obesidade é um importante factor
de risco para o aparecimento de outras
doenças, como a dislipidémia, a diabetes
mellitus e a hipertensão arterial. Outras
patologias que lhe estão, frequentemente, associadas são a asma, a apneia do
sono, a esteatohepatite não alcoólica, a
depressão e a amenorreia(5).
Nos EUA e em outros países desenvolvidos, a prevalência em crianças e
adolescentes duplicou nos últimos vinte
anos. Quinze ponto três por cento das
crianças, com idades compreendidas entre os seis e os onze anos e, quinze ponto cinco por cento dos adolescentes, com
idades compreendidas entre os doze e os
dezanove anos, têm o IMC superior ao
percentil noventa e cinco. Dados recentes, também, apontam para um aumento
da prevalência em crianças com menos
de cinco anos(7).
A interacção entre os factores genéticos e ambientais é determinante para o
aparecimento da obesidade. As causas
genéticas podem ser monogénicas, tendo sido identificadas várias mutações envolvidas na sinalização da melanocortina
e relacionadas com a obesidade grave,
ou poligénicas, mais frequentes que as
primeiras, e que conferem ao indivíduo
uma maior susceptibilidade para aumentar de peso em resposta a factores ambientais.
Durante o desenvolvimento da
criança existem períodos em que o risco
de desenvolver obesidade é maior, um
deles é o período de amamentação, que
se for reduzido predispõe à obesidade e
o outro é a adolescência, em que se verifica maior insulinoresistência.
É sabido que as profundas mudanças que ocorreram nas sociedades modernas têm contribuído para o aumento
da obesidade. No entanto, o excessivo
controlo da alimentação pelos pais, também, pode ter efeitos paradoxais, levando as crianças e adolescentes a cometer
excessos alimentares.
O primeiro passo no controlo da
obesidade é a identificação das crianças
em risco, conhecendo os antecedentes
familiares e os factores ambientais que
as rodeiam e avaliando o IMC, anualmente, para identificar excessos de ganho
ponderal relativamente à estatura.
A promoção de hábitos alimentares
saudáveis é fundamental. As crianças
devem ser incentivadas a comer com moderação, a realizar escolhas saudáveis e
a ter uma atitude de auto-controlo na ingestão dos alimentos.
As actividades sedentárias devem
ser restringidas e deve-se promover a
prática de exercício físico, em casa ou na
escola.
As crianças com excesso de peso
ou obesas, devem iniciar um plano alimentar e de exercício físico, com o objectivo de diminuir o IMC para um valor inferior ao percentil noventa e cinco, e vigiar
o aparecimento de complicações(3,5).
DISLIPIDÉMIA
As dislipidémias são alterações do
metabolismo das lipoproteínas, que resultam num aumento ou diminuição dos
seus níveis séricos. As que constituem
factor de risco vascular caracterizamse por aumento do colesterol total (CT),
do colesterol das lipoproteínas de baixa
densidade (LDL-C) ou dos triglicerídeos
(TG) ou, por uma diminuição do colesterol das lipoproteínas de alta densidade
(HDL-C)(8).
As dislipidémias classificam-se
quanto à etiologia em primárias ou secundárias. As primárias, podem ser monogénicas (hipercolesterolémia familiar,
hiperlipidémia mista familiar, défice familiar de apoproteína-B, hipertrigliceridémia
familiar) ou poligénicas, (hipercolesterolémia e hipertrigliceridémia comum) que
são mais frequentes. As secundárias surgem no contexto de doenças como a diabetes mellitus, a obesidade, a síndroma
nefrótica, o hipotiroidismo, o alcoolismo
crónico, a insuficiência renal crónica ou
estão associadas a fármacos como por
exemplo, os diuréticos, os inibidores da
calcineurina ou os corticóides(8).
As evidências indicam, que o grau
de progressão das lesões de aterosclerose na infância está correlacionado com a
dislipidémia e com a sua gravidade. Embora não existam estudos longitudinais
que relacionem a dislipidémia na infância e adolescência com a ocorrência de
eventos cardiovasculares na vida adulta,
esta relação pode ser inferida através de
estudos epidemiológicos realizados(8).
O diagnóstico precoce da dislipidémia em pacientes de risco e o seu tratamento, é assim essencial para prevenir
ou diminuir o ritmo de progressão do processo aterosclerótico. Deve ser realizado em crianças com história familiar de
doença vascular precoce (pais ou avós
com menos de cinquenta e cinco anos,
com doença coronária, cerebrovascular
ou vascular periférica conhecida, enfarte
agudo do miocárdio ou morte súbita de
causa cardíaca); em crianças com pai
ou mãe com CT sérico superior ou igual
a 240mg/dl; em crianças com pais sem
doença coronária mas com factores de
risco vascular associados; e em crianças
que apresentem os seguintes factores
de risco: hipertensão arterial, obesidade, tabagismo, alcoolismo, sedentarismo
ou causas de dislipidémia secundária.
Nestes quatro grupos de risco deve ser
realizado um perfil lipidico em jejum que
inclua o doseamento do CT, LDL-C, HDLC e TG. Deve utilizar-se a média de três
determinações, devido à variabilidade
intraindividual, como base para o tratamento. McCrindle et al, recomendam que
nas crianças em que um dos pais tenha
hipercolesterolémia, deve ser feita uma
hipertensão arterial – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 169
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
determinação inicial do CT, e se este
for superior a 200 mg/dl então deve ser
pedido um perfil lipidico completo em jejum; se os valores de CT determinados
forem borderline (170-199 mg/dl), então
esse doseamento deve ser confirmado
e calculada a média dos dois valores.
Caso se obtenha um valor de colesterol
borderline, o perfil lipidico em jejum deve
ser efectuado(9).
O tratamento da hipercolestorolémia, em crianças com idades compreendidas entre os dois e os dezanove anos,
baseia-se nos valores do CT e LDL-C,
recomendados pelo National Cholesterol Education Program (NCEP), que os
classifica em aceitáveis (CT <170 mg/dl,
LDL-C <110 mg/dl), borderline (170 mg/
dl≤CT≤199mg/dl e 110 mg/dl≤LDL-C≤129
mg/dl) e elevados (CT≥200 mg/dl e LDLC ≥130 mg/dl)(9).
A instituição de uma dieta pobre
em gorduras saturadas (menos de 7%
das calorias diárias) e em colesterol (200
mg/dia), e a promoção do exercício físico,
são as primeiras medidas a instituir se o
LDL-C for elevado. A terapêutica farmacológica (estatinas e quelantes dos ácidos biliares) está aprovada para crianças
com idade igual ou superior a dez anos,
que tenham valores persistentemente
elevados de LDL-C, após seis a doze meses de uma dieta adequada. Os valores
de LDL-C considerados para início de terapêutica são 190 mg/dl em crianças sem
factores de risco e 160 mg/dl em crianças com dois ou mais factores de risco
cardiovascular ou com história familiar de
doença cardiovascular prematura(9).
As guidelines actuais do NCEP
para crianças e adolescentes não fazem
recomendações especiais para rastreio
e tratamento das dislipidémias não LDL,
particularmente as relacionadas com o
aumento dos TG e a diminuição do HDLC. Recomenda-se, no entanto, uma dieta
pobre em gorduras e hidratos de carbono
simples, a prática regular de exercício físico e a diminuição do peso corporal. Indivíduos com valores séricos persistentemente elevados de TG, superiores a 350
mg/dl ou com uma determinação aleatória
superior a 700 mg/dl, devem iniciar terapêutica com fibratos ou ácido nicotínico
devido ao risco de pancreatite aguda(9).
DIABETES MELLITUS
A diabetes mellitus é um grupo de
doenças metabólicas caracterizadas por
hiperglicémia, que resulta de defeitos na
secreção (DMT 1) ou na acção da insulina (DMT 2) ou de ambos e que está associada a um desenvolvimento acelerado
de doença vascular. Na criança, a doença vascular é sobretudo microangiopática, com envolvimento renal e ocular. No
adulto, esta microangiopatia persiste e é
responsável pela elevada incidência de
insuficiência renal crónica. No entanto, a
principal causa de morbilidade e mortalidade no adulto, é a doença macrovascular (cardiovascular, cerebrovascular e
vascular periférica)(2).
A prevalência da DMT 1 na adolescência é de 1.7/1000, sendo vinte e cinco
por cento dos diagnósticos efectuados
entre os cinco e os dez anos de idade e
quarenta por cento efectuados entre os
dez e os quinze anos de idade. A DMT 2,
que era até há uma década considerada
uma doença dos adultos, é responsável
actualmente, por oito a cinquenta por
cento dos diagnósticos de diabetes na
adolescência, sendo a prevalência actual de 4.1/1000, neste grupo etário. Este
aumento coincide com o aumento da prevalência da obesidade e do sedentarismo
na infância e na adolescência(2).
A aterosclerose na infância é um
processo lento e silencioso, mas no contexto da diabetes ocorre de uma forma
acelerada sendo responsável pela ocorrência de uma morbilidade cardiovascular precoce.
O processo aterosclerótico é complexo sendo a hiperglicémia e a resistência periférica à insulina responsáveis pela
disfunção do endotélio.
A hiperglicémia causa um aumento
da glicosilação dos produtos finais do metabolismo (aminoácidos, ácidos gordos e
ácidos nucleicos), que formam pontes
com as proteínas vasculares e acumulam-se no sub-endotélio, condicionando
espessamento e ruptura da parede dos
vasos. Verifica-se também, um aumento
da expressão dos receptores endoteliais
dos produtos glicosilados, que ao serem
activados aumentam a resposta inflamatória e protrombótica. Para além destes
mecanismos fisiopatológicos, a hipergli-
hipertensão arterial – mesa redonda
S 170
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
cémia leva à activação da proteína C quinase nas células endoteliais e à activação da via dos polióis, que desencadeiam
alterações a nível osmótico e iónico(2).
O excesso de ácidos gordos isolado
ou em conjunto com a hiperglicémia aumentam a resistência periférica à insulina
e o stress oxidativo, com formação de radicais livres de oxigénio e lesão directa
dos tecidos(2).
A resistência periférica à insulina é
responsável pelo aumento da dislipidémia (aumento dos TG e LDL-C, diminuição da HDL-C, diminuição da actividade
da lipoproteína lipase), elevação da pressão arterial (aumento da retenção de sódio, estimulação da actividade simpática
e proliferação do musculo liso vascular)
e formação directa da placa aterogénica
(depósito de LDL-C, proliferação de colagénio e musculo liso)(2).
Considera-se que há uma redução
efectiva do risco vascular, na DMT 1,
se forem atingidos os seguintes objectivos: um IMC inferior ao percentil oitenta
e cinco, uma pressão arterial inferior ao
percentil noventa, um LDL-C inferior a
100 mg/dl e uma glicémia inferior a 100
mg/dl com uma HbA1c menor que 7%.
Na DMT 2 considera-se que o risco vascular é elevado, quando dois ou mais factores de risco vascular estão associados,
e neste caso os objectivos terapêuticos
são iguais aos da DMT 1. Quando só
está presente um factor de risco vascular, o objectivo é obter um IMC inferior ao
percentil noventa, uma pressão arterial
inferior ao percentil noventa e cinco e um
LDL-C inferior a 130 mg/dl. Os valores
da glicémia e HbA1c recomendados são
idênticos aos da DMT 1(2).
HIPERTENSÃO ARTERIAL (HTA)
A HTA era, até há alguns anos, considerada como uma doença pouco frequente na infância, com uma prevalência
de cerca de dois por cento. Esta realidade tem se modificado, sobretudo devido
ao aumento da obesidade. Trabalhos
mais recentes mostram uma prevalência
de HTA de quatro ponto cinco por cento,
em crianças obesas, valores esses mais
altos que os anteriormente descritos(10).
A sua importância como factor de
risco vascular é bem conhecida e em-
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
bora não hajam trabalhos prospectivos a
longo prazo que demonstrem claramente
a associação da HTA na infância com a
morbilidade e mortalidade cardiovascular
na vida adulta, sabe-se que as crianças
hipertensas desenvolvem lesões vasculares, como o espessamento da íntima e
da média carotídeas e aumento da rigidez da parede arterial.
A HTA nas crianças com idade inferior a dez anos, é frequentemente de
causa secundária (70-85% dos casos) e,
na maioria dos casos, é devida a doença
renal (60-70%). A HTA essencial predomina nas crianças com idade superior a
dez anos (85-95% dos casos) e, habitualmente, os níveis da pressão arterial não
são muito elevados (estadio 1)(10).
Um dos factores de risco mais importantes para o desenvolvimento de
HTA é a obesidade, tendo-se verificado
que com o aumento da sua prevalência,
a média da pressão arterial da população
infantil nos EUA, aumentou de 1.4 para
3.3 mmHg, desde 1990(10).
As crianças que nascem com baixo
peso e que têm um rápido ganho ponderal no período pós-natal, têm maior
probabilidade de desenvolver obesidade,
insulinoresistência e HTA.
Outros factores que condicionam o aparecimento de HTA são as
alterações genéticas, nomeadamente,
alguns polimorfismos que podem ser
responsáveis pelo seu aparecimento,
em certas famílias.
Na infância, o factor racial não parece influenciar os valores de pressão arterial, ao contrário do que se verifica nos
adultos.
Os factores dietéticos, também,
podem influenciar os valores da pressão
arterial, nomeadamente, a ingestão de
sódio parece estar relacionada com o
seu aumento e a ingestão de alimentos
ricos em potássio com a sua diminuição.
Outros factores, como o tabagismo, a cafeína e o sedentarismo, também podem
aumentar a pressão arterial e contribuir
para o aparecimento de HTA.
No doente hipertenso devem ser
instituídas várias medidas para reduzir o
risco vascular, tais como, a redução do
peso corporal, o aumento da actividade
física, a redução das actividades seden-
tárias, uma alimentação com baixo teor
de gorduras, açúcar e sal (1.2 g/dia em
crianças com menos de oito anos e 1.5
g/dia em crianças com mais de oito anos)
e a abstinência tabágica. A terapêutica
farmacológica está indicada na HTA sintomática, na HTA secundária, quando
existe lesão de órgãos alvo, associação
de factores de risco ou ainda quando as
medidas não farmacológicas são ineficazes (3). Os objectivos terapêuticos são, a
obtenção de uma pressão arterial inferior
ao percentil noventa e cinco, na HTA essencial, e inferior ao percentil noventa, na
doença renal crónica, diabetes ou na presença de lesões em órgãos alvo(3,11).
ATEROSCLEROSE ACELERADA. ESTRATIFICAÇÃO DO RISCO VASCULAR
A aterosclerose na infância é de
uma forma geral um processo lento e
silencioso. No entanto, em algumas doenças da idade pediátrica, este processo
é mais acelerado traduzindo-se pelo aparecimento precoce de doença cardiovascular, ainda na infância, na adolescência
ou no início da vida adulta.
Estas doenças são divididas em três
grupos de acordo com o grau de risco
vascular. No Grupo I, considerado de elevado risco, há evidência clínica ou patológica de doença coronária antes dos trinta
anos de idade, no Grupo II, considerado
de risco intermédio, há evidência fisiopatológica de disfunção arterial causada por
aterosclerose acelerada, antes dos trinta
anos de idade, e no Grupo III, considerado de risco, há evidência epidemiológica
de doença coronária só depois dos trinta
anos de idade(2).
Estão incluídas no Grupo I a hipercolesterolémia familiar (homozigotos), a
DMT 1, a doença renal crónica, o póstransplante cardíaco e a doença de Kawasaki com aneurismas coronários. No
Grupo II, a hipercolesterolémia familiar
(heterozigotos), a DMT 2, a doença de
Kawasaki com aneurismas coronários
em regressão e a doença inflamatória
crónica. No Grupo III, a doença cardíaca
congénita, a doença de Kawasaki sem
envolvimento coronário e os antecedentes neoplásicos.
Em cada um dos grupos devem
identificar-se os factores de risco vascu-
lar (tabagismo, sedentarismo, obesidade,
HTA, dislipidémia, hiperglicémia, história
familiar de doença coronária precoce).
No caso dos doentes dos grupos II e III,
se tiverem dois ou mais factores de risco
devem ser tratados como sendo do grupo
de risco mais elevado, I e II respectivamente.
Nos doentes do grupo I, considerase que há uma redução do risco vascular
com um IMC inferior ao percentil oitenta e cinco, a pressão arterial inferior ao
percentil noventa, o LDL-C inferior a 100
mg/dl, a glicémia em jejum inferior a 100
mg/dl e a HbA1c inferior a 7%. Nos do
grupo II, o IMC deve ser inferior ao percentil noventa, a pressão arterial inferior
ao percentil noventa e cinco, o LDL-C inferior a 130 mg/dl e os restantes valores
iguais aos do grupo I. Os objectivos terapêuticos do grupo III são um IMC inferior
ao percentil noventa e cinco, uma pressão arterial inferior ao percentil noventa
e cinco mais 5 mmHg, o LDL-C inferior a
160 mg/dl, com restantes valores iguais
aos do grupo I(2).
Em todos os grupos devem ser instituídas medidas para modificar o estilo de
vida (redução do peso, aumento da actividade física, redução das actividades
sedentárias, abstinência tabágica) e modificação da dieta (ingestão de gorduras
inferior a 30% das calorias/dia, gorduras
saturadas inferior a 10% das calorias/dia
e colesterol inferior a 300 mg/dia). Nos
doentes dos grupos II e III a terapêutica farmacologia só deve der iniciada se
não se atingirem os objectivos pretendidos com a modificação do estilo de vida
durante um período de seis meses. Nos
doentes do grupo I, o início da terapêutica farmacológica dos factores de risco é
ajustado à patologia subjacente(2).
CARDIOVASCULAR RISK FACTORS
– PREVENTION IN CHILDHOOD
ABSTRACT
Atherosclerosis is a systemic disease which remains in a sub clinical
form during the first decades of life. Its
prevention begins in the early childhood
with the promotion of healthy lifestyles
and the identification and treatment of the
hipertensão arterial – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 171
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
risk factors. The authors present the different vascular risk factors describing its
epidemiologic and physiopathologic characteristics and recommend the preventive measures for the infancy and adolescence. In the high risk paediatric patients
they show the risk vascular stratification
in three groups and for each its therapeutic endpoints.
Key-words: Atherosclerosis; vascular risk; prevention; infancy; adolescence;
life style
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 168-172
4.
5.
6.
BIBLIOGRAFIA
1. Sousa JC. Aterosclerose e Aterotrombose. In: Sousa JC, ed. Aterotrombose. Lisboa: Colprinter, 2000: 1324.
2. Kavey REW, Allada V, Daniels SR et
al. Cardiovascular risk reduction in
high-risk pediatric patients. Circulation 2006; 114: 2710-2738.
3. Kavey REW, Daniels SR, Lauer RM,
Atkins DL, Hayman LL, Taubert K.
7.
8.
American Heart Association guidelines for primary prevention of atherosclerotic cardiovascular disease
beginning in childhood. Circulation
2003; 107:1562-1566.
AHA, Gidding SS, Dennison BA et al.
Dietary recommendations for children
and adolescents: A guide for practitioners. Pediatrics 2006; 117: 544-559.
American Academy of Pediatrics.
Prevention of pediatric overweight
and obesity. Pediatrics 2003; 112:
424-430.
Washington R. Interventions to reduce
cardiovascular risk factors in children
and adolescents. American Family
Physician 1999; 59: 2211-2223.
Ogden CL, Flegal KM, Carroll MD,
Johnson CL. Prevalence and trends
in overweight among US children
and adolescents, 1999–2000. JAMA
2002; 288:1728 –1732.
Haney EM, Huffman LH, Bougatsos
C, Freeman M, Nelson HD, Steiner
RD, Screening and treatment for lipid
disorders in children and adolescents:
systematic evidence review for the
hipertensão arterial – mesa redonda
S 172
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
US preventive services task force.
Pediatrics 2007; 120: e189-e214.
9. McCrindle BW, Urbina EM, Dennison
BA et al. Drug therapy of high-risk
lipid abnormalities in children and
adolescents. Circulation 2007;115:
1948-1967.
10. Flynn JT. Hypertension in childhood
and adolescence. In: Kaplan NM, ed.
Kaplan’s Clinical Hypertension. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins,
2006: 465-488.
11. National High Blood Pressure Education Program Working Group on
high blood pressure in children and
adolescents. The fourth report on the
diagnosis, evaluation, and treatment
of high blood pressure in children and
adolescents. Pediatrics 2004; 114:
555-576.
CORRESPONDÊNCIA
Dr.ª Carmen do Carmo
E-mail: [email protected]
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Imagem na avaliação do SNC: implicações no prognóstico
– papel da ecografia no diagnóstico pré-natal
Maria do Céu Rodrigues1
A aplicação clínica dos ultrasons
tem uma história de cerca de 50 anos, começando por ser unidimensional (modoA), posteriormente a duas dimensões
(modo-B) e actualmente também, a três
dimensões em tempo real (3D /4D).
A ecografia revolucionou a prática
obstétrica, tornando possível o diagnóstico precoce de situações graves, sem
tratamento curativo ou até incompatíveis
com a vida e nestes casos, em muitos
países, a interrupção da gravidez.
A observação e vigilância do desenvolvimento intrauterino do feto, através
da janela ecográfica, desviou progressivamente a atenção para os eventos
anteparto com reconhecidas ou supostas
implicações no período pós natal.
A neurosonografia fetal, com recurso à ecografia 2D e à tecnologia 3D
nos seus diferentes modos – superfície,
imagem multiplanar, Doppler, cálculos de
volume – e às sondas transabdominal e
transvaginal, representa uma parte importante da ecografia obstétrica permitindo a avaliação estrutural e abrindo novas
perspectivas na avaliação funcional do
SNC do feto.
Ao avaliar ecograficamente o SNC
do feto há que ter presente as mudanças
que ocorrem ao longo da gestação; como
exemplo, o encéfalo é monoventricular até às 10 semanas, a ossificação da
calote craneana está concluída cerca
das 12 semanas e o desenvolvimento do
vérmis do cerebelo só se completa às 19
semanas.
A avaliação ecográfica habitual do
SNC, em ecografia 2D, inclui três planos
da cabeça fetal – transtalâmico, transventricular e transcerebeloso – e três pla-
nos da coluna vertebral – axial, coronal
e sagital. Se as estruturas visualizadas
nestes diferentes cortes são normais, podemos concluir pela normalidade do SNC
do feto. Se, pelo contrário, anormalidades são encontradas, há que prosseguir
o estudo com recurso a planos adicionais
e à sonda transvaginal (na apresentação
cefálica) e à tecnologia 3D. Por vezes, a
ecografia não nos permite ainda a defi-
nição completa das lesões, havendo
necessidade de recorrer à ressonância
magnética.
Assim, quando o exame ecográfico
do SNC do feto não é normal, há que fazer o diagnóstico das alterações encontradas, pesquisar lesões associadas e
estabelecer um prognóstico, que deverá
ser comunicado, de maneira clara, aos
progenitores.
A – Plano transtalâmico
B – Plano transventricular
C - Plano transcerebeloso
Plano transtalâmico:
CSP – cavum do septo pelúcido;
TV - 3º ventrículo
T – tálamo;
SF – incisura de Sílvius
Plano transventricular:
CP – plexo coróideu;
VA – atrium ventricular;
MW e LW – paredes medial e lateral do
ventrículo lateral
Plano transcerebeloso:
CSP – cavum do septo pelúcido;
CH – hemisférios cerebelosos;
CV – vérmis do cerebelo;
CM – cisterna magna
__________
¹ Maternidade Júlio Dinis – Porto
imagem na avaliação do sistema nervoso central: implicações no prognóstico – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 173
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Existem situações em que o diagnóstico ecográfico é claro e o prognóstico
isento de dúvidas; neste grupo podem
incluir-se, entre outros, os defeitos do
tubo neural – anencefalia, encefalocelo,
iniencefalia e espinha bífida - a holoprosencefalia e a hidranencefalia.
Noutros casos, como na agenesia
isolada do corpo caloso ou na ventriculomegalia isolada, tudo o que podemos
oferecer aos pais, em termos de prognóstico, são percentagens de normalidade ou desvios desta.
A anencefalia, incompatível com
a vida, é a forma mais grave de defeito
do tubo neural, resultando da falência de
encerramento da extremidade anterior do
tubo neural.
No 2º trimestre da gravidez, o diagnóstico ecográfico de anencefalia é feito
quando a calote craneana e os hemisférios cerebrais não são visualizados; no
1º trimestre, o diagnóstico só pode ser
feito depois das 11 semanas, quando a
ossificação do crâneo deverá estar completa, pela presença de acrania; nesta
fase, o tecido cerebral pode ainda estar
presente, uma vez que há progressão
de acrania, para exencefalia – ausência
da calote craneana com tecido cerebral
presente - e finalmente anencefalia, por
dissolução secundária do encéfalo.
O encefalocelo é caracterizado por
um defeito no crâneo e dura, através do
qual as meninges herniam; o saco meningeo pode conter, ou não, tecido cerebral.
Na sua maioria, são recobertos por pele e
em 85% dos casos ocorrem na linha média, particularmente na região occipital.
Ecograficamente pode ser diagnosticado a partir das 13 semanas, como
uma solução de continuidade no crâneo,
através da qual se visualiza um cisto herniado, contendo tecido cerebral ou apenas liquido.
O encefalocelo pode ser um componente de um síndrome genético – Meckel-Gruber, Walker-Warburg – associando-se a anomalias estruturais em 60 a 80
% dos casos. Deve ser feita uma procura
exaustiva de malformações associadas e
oferecida a realização de estudo citogenético.
O prognóstico no encefalocelo é
inversamente relacionado com a quanti-
dade de tecido cerebral herniado. A mortalidade global é cerca de 40% e mais de
80% dos sobreviventes não são neurologicamente e intelectualmente normais. A
presença de anomalias associadas piora
obviamente o prognóstico.
A iniencefalia é uma exencefalia,
mas em que o defeito ósseo é restrito à
região occipital do crâneo, com ausência
parcial ou total das vértebras cervicais e
toráxicas, encerramento incompleto dos
arcos e corpos vertebrais e retroflexão
fixa da cabeça.
O diagnóstico é feito pela extrema
flexão dorsal da cabeça, com a coluna
cervical e toráxica anormalmente curta e
deformada.
Associa-se a outras malformações
graves, cerebrais e de outros orgãos e é
fatal.
A visualização ecográfica da coluna
vertebral normal no plano sagital mostra
uma imagem em “carril duplo” com os
dois centros de ossificação posteriores
das vértebras paralelos e a integridade
dos tecidos moles; no plano coronal, os
três centros de ossificação de cada vértebra formam três linhas regulares; no
plano axial, o arco neural normal aparece
como um círculo fechado, com a pele suprajacente intacta.
Na espinha bífida há um afastamento dos centros de ossificação posteriores, visíveis nos três planos de observação, assumindo as vértebras atingidas,
uma forma de “U” ou “V” no plano axial,
com perda da integridade da pele suprajacente e uma associada protrusão sacular – meningocelo ou mielomeningocelo.
Em 95% dos casos existem sinais craneanos associados: ventriculomegalia,
biconcavidade dos ossos frontais - sinal
do limão - , obliteração da cisterna magna
com cerebelo “ausente”ou com curvatura
anterior dos hemisférios cerebelosos – sinal da banana.
Perante o diagnóstico de espinha
bífida deve ser feiro um exame detalhado
do feto e o estudo do cariótipo deve ser
proposto, sobretudo se existem lesões
associadas.
De um modo geral, o prognóstico é
pior quanto mais alta e maior é a lesão
e na presença de lesões associadas; lesões sagradas baixas podem ter um pro-
gnóstico melhor em termos de mobilidade, mas quase sempre têm incontinência;
movimentos normais dos membros inferiores do feto e aparelho urinário intacto,
têm pouco valor prognóstico; a inteligência depende da presença ou ausência
de hidrocefalia. A paralisia dos membros
inferiores e a dupla incontinência, são a
regra nas crianças sobreviventes.
A holoprosencefalia é uma anomalia cerebral grave que resulta da divisão
incompleta do prosencéfalo, com falência
do desenvolvimento das estruturas da linha média. Há três formas, dependendo
do grau de separação dos hemisférios
cerebrais.A forma alobar, a mais grave,
caracteriza-se pela presença de uma cavidade monoventricular e fusão dos tálamos; não existe 3º ventrículo, foice do
cérebro e corpo caloso.
Na forma semilobar há segmentação parcial dos ventriculos e hemisférios
cerebrais posteriormente, com fusão
incompleta dos tálamos. Estas duas
formas associam-se frequentemente a
anomalias faciais graves – etmocefalia (proboscis), ciclopia (órbita mediana
única com proboscis acima da órbita) e
a microcefalia. Na forma lobar, a menos
grave, há desenvolvimento parcial da foice do cérebro, não há corpo caloso, há
comunicação entre os cornos frontais dos
ventrículos laterais, mas o tálamo e o 3º
ventrículo são normais.
O diagnóstico ecográfico que pode
ser feito a partir do fim do 1º trimestre,
tem como principal sinal, a presença de
um ventrículo único dilatado na linha média.
Pode associar-se a cromossomopatias, em particular a trissomia 13 e a
doenças genéticas.
As formas alobar e semilobar são
letais; a forma lobar associa-se a atraso
mental.
A hidranencefalia é uma lesão destrutiva na qual os hemisférios cerebrais
estão ausentes, sendo substituídos por
sacos de leptomeninges e uma representação rudimentar do córtex cerebral,
cheios de liquido cefaloraquidiano. Pode
resultar da oclusão vascular disseminada
no território da artéria carótida interna, da
infecção por toxoplasma ou citomegalovirus, por vasculite e ocorre depois das 12
imagem na avaliação do sistema nervoso central: implicações no prognóstico – mesa redonda
S 174
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
semanas, no 2º ou 3º trimestres da gravidez, podendo ainda acontecer durante o
primeiro ano de vida.
O tálamo, gânglios da base, tronco
cerebral e cerebelo são preservados, já
que dependem da irrigação da artéria
basilar.
Na avaliação ecográfica visualizase uma grande massa cística enchendo
o crâneo, com ausência ou descontinuidade do córtex cerebral e dos ecos da
linha média. O tálamo e tronco cerebral
sobressaem na cavidade cística; na hidranencefalia, estas estruturas não estão
rodeadas por um rim de córtex cerebral,
ao contrário do que acontece na holoprosencefalia alobar e na hidrocefalia grave.
A sobrevida de uma criança com hidranencefalia não ultrapassa um ano.
A agenesia do corpo caloso é uma
relativamente comum malformação do
SNC, na qual a faixa da substância branca, constituída pelas fibras que ligam os
dois hemisférios cerebrais, está ausente.
A agenesia pode ser primária ou resultar
de uma lesão destrutiva secundária, podendo associar-se a cromossomopatias
(trissomia 18,13, 8), síndromes genéticos
ou a teratogéneos, como no síndrome alcoólico fetal ou com o valproato de sódio
e a cocaína.
O corpo caloso surge tardiamente
na gestação, entre as 12 e as 18 semanas, desenvolvendo-se de frente para
trás, podendo a agenesia ser total ou parcial, dependendo do momento da gestação em que ocorreu o insulto.
Há uma elevada incidência de outras anomalias cerebrais associadas,
sendo a mais comum a malformação
de Dandy-Walker e também os lipomas
Corno frontal
Corno occipital
Imagem em lágrima - colpocefalia
intracraneanos. A incidência de malformações extracraneanas está também
aumentada.
O diagnóstico ecográfico é difícil e
muitas vezes só é feito no 3º trimestre da
gestação.
O corpo caloso não é visualizado
nos corte habituais da cabeça fetal, mas
a sua agenesia pode ser suspeitada na
presença de sinais indirectos, nomeadamente a ausência do cavum do septo pelúcido e a ventriculomegalia, com
alargamento predominante dos cornos
occipitais dos ventrículos laterais e com
cornos frontais de diâmetro normal, mas
mais separados que o habitual – imagem em lágrima -. A agenesia do corpo
caloso é demonstrada com cortes médio-coronais e médio-sagitais da cabeça fetal, usando imagem multiplanar
e quando possível, a sonda vaginal.
Com Doppler a cores pode demonstrar-se a ausência da artéria pericalosal e
em seu lugar os ramos da artéria cerebral
anterior, com uma configuração radiada.
Nesta situação, deve ser efectuada
ressonância magnética para pesquisar
anomalias associadas nomeadamente
desordens da migração neuronal e heterotopias.
Na presença de aneuploidias ou outras anomalias intra ou extra craneanas o
prognóstico é mau. Na agenesia isolada,
o prognóstico é melhor, com um desenvolvimento normal em cerca de 85% dos
casos; os pais devem, contudo, ser informados que a agenesia do corpo caloso
pode associar-se a síndromes genéticos,
que podem não ser identificados na vida
fetal.
O Complexo de Dandy-Walker refere-se a um espectro de anomalias da
fossa posterior. Engloba: a malformação de Dandy-Walker – agenesia completa ou parcial do vérmis do cerebelo e
alargamento do 4º ventriculo; a variante
de Dandy-Walker – agenesia parcial do
vérmis (geralmente a porção inferior)
sem alargamento da fossa posterior; e a
mega cisterna magna – cisterna magna
aumentada, com integridade do vérmis e
4º ventrículo.
O Complexo de Dandy-Walker pode
associar-se a cromossomopatias (trissomia 18, 13, 21, triploidia, S. Turner), a
vários síndromes genéticos (Meckel-Gruber, Joubert...), a infecções congénitas, a
teratogéneos como a warfarina, podendo
no entanto ser um achado isolado.
O diagnóstico ecográfico da malformação de Dandy-Walker, baseia-se na
visualização no plano transcerebeloso,
de dilatação do 4º ventrículo e separação
dos hemisférios cerebelosos com comunicação entre a cisterna magna e 4º ventrículo; ventriculomegalia está presente
em cerca de 2/3 dos casos, podendo
surgir até aos 6 meses de vida. Associase muitas vezes a outras malformações
cerebrais graves.
O diagnóstico pré natal de variante
de Dandy-Walker é difícil e só pode ser
feito depois das 18-19 semanas, altura
em que o desenvolvimento do vérmis do
cerebelo está completo.
A cisterna magna está aumentada
quando mede mais de 10 mm; o diagnóstico de mega cisterna magna é de
exclusão.
Perante o diagnóstico de complexo
de Dandy-Walker, deve ser feita a pesquisa de malformações adicionais, oferecido
o cariótipo, devendo também efectuar-se
ressonância magnética para despiste de
anomalias da migração neuronal; quando outras anomalias são encontradas, o
prognóstico é mau.
Mesmo nos casos com aparentemente isolada malformação/ variante de
Dandy-Walker, o prognóstico é mau, com
uma mortalidade pós natal alta ( cerca de
20%) e atraso de desenvolvimento em
mais de 50% dos casos.
O Cisto Porencefálico é uma cavidade contendo liquido cefaloraquidiano
dentro dos hemisférios cerebrais, que
pode ou não comunicar com o espaço
subaracnóideu e/ou sistema ventricular.
Resulta da destruição do córtex cerebral,
com reabsorção dos tecidos necróticos e
formação da cavidade cística.
Pode ocorrer na sequência de: hemorragia secundária a infecção, trombocitopenia aloimune fetal ou trauma directo (iatrogénica); síndrome de transfusão
feto-fetal ou morte de um gémeo; exposição a drogas vasoactivas como cocaína
ou heroína; evento hipóxico-isquémico
como na pré-eclampsia ou descolamento
prematuro de placenta.
imagem na avaliação do sistema nervoso central: implicações no prognóstico – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 175
NASCER E CRESCER
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Uma hemorragia recente traduz-se
ecograficamente por lesões hiperecogénicas irregulares, no parênquima cerebral
e/ou sistema ventricular, que distorsem as
estruturas normais. Progressivamente,
as lesões liquefazem-se, tornando-se hipoecogénicas, visualizando-se no córtex
cerebral, uma ou mais imagens císticas,
que habitualmente comunicam com o sistema ventricular; não produzem efeito de
massa, mas associam-se frequentemente a ventriculomegalia unilateral.
O prognóstico relaciona-se com o
tamanho e localização das lesões, mas
cerca de 80% dos casos associam-se a
paralisia cerebral e 20% a défice cognitivo, moderado ou grave.
O aneurisma da veia de galeno
é uma malformação arteriovenosa, que
resulta da presença de fistulas arteriovenosas entre uma ou mais artérias cerebrais e o sistema venoso cerebral, sem a
interposição de capilares, com dilatação
aneurismática da veia de galeno, na linha
média.
O aspecto ecográfico é de uma
área cística, na linha média, oval ou tubular, não pulsátil; com Doppler a cores
demonstra-se um fluxo turbulento no seu
interior.
Sendo uma malformação que aparece tardiamente na gravidez, a maioria no
3º trimestre, a atitude é expectante, com
vigilância regular, no sentido de despistar
precocemente sinais de insuficiência cardíaca de alto débito, manifestada por cardiomegalia, hepatomegalia e hidrópsia.
O local e o momento do parto deve
ser programado em conjunto com a equipe de neurocirurgia e neonatologia.
Embora não havendo consenso
relativamente ao tipo de parto, parece
razoável que na presença de anomalias
associadas, como porencefalia grave ou
cardiomegalia com hidrópsia, o parto por
cesariana não esteja indicado, já que a
mortalidade neonatal é muito elevada ( >
90%); na ausência de anomalias associadas, a cesariana deverá ser a opção.
Cistos aracnóides são lesões
avasculares, que no feto se localizam
habitualmente na linha média, na fissura inter hemisférica ou posterior ao vérmis, na fossa posterior. Em séries pediátricas, a sua localização é, com mais
ano 2007, vol XVI, n.º 3
frequência excêntrica, em relação com
a fissura de Sílvius. A maioria são diagnosticados entre as 20 e as 30 semanas
de gestação.
O aspecto ecográfico é de uma
massa anecogénica, de parede fina, bem
circunscrita, uni ou multilocular, que não
comunica com o sistema ventricular; se
localizado na linha média, o diagnóstico
diferencial com aneurisma da veia de
Galeno, é feito com o Doppler a cores;
quando se localiza na fossa posterior, o
diagnóstico diferencial é com a malformação de Dandy-Walker.
Ao tentar definir o prognóstico há
que ter em atenção a presença de anomalias associadas, como a agenesia
parcial ou completa do corpo caloso, que
pode associar-se aos cistos da linha média e a presença de hidrocefalia obstrutiva, mais frequente nos cistos da fossa
posterior. A amniocentese está indicada
se houver anomalias associadas.
Cistos isolados diagnosticados no
3º trimestre têm habitualmente bom prognóstico; as manifestações clínicas pós
natais são habitualmente subtis e 60 a
80% das crianças são assintomáticas.
O tamanho do cisto deve ser avaliado seriadamente ao longo da gravidez; o
seu aumento, faz prever o aparecimento de hidrocefalia obstrutiva. O aumento
rápido do diâmetro dos ventrículos ou do
perímetro cefálico pode tornar necessário
o parto prematuro. O momento e a via do
parto são discutidos em equipe multidisciplinar com a neonatologia e a neurocirurgia.
Os tumores intracraneanos fetais,
muito raros, são quase sempre supra tentoriais. O tipo histológico mais frequente
é o teratoma. O aspecto ecográfico é variável de cístico a sólido e misto, podendo o seu aspecto alterar-se ao longo do
tempo; frequentemente têm áreas de calcificação. Crescem rapidamente, distorcendo a anatomia normal. A hidrocefalia
obstrutiva é comum; a macrocefalia pode
ser causa de distocia.
Os gliomas aparecem como massas ecogénicas unilaterais que desviam
a foice.
Os papilomas ou carcinomas dos
plexos coróideus aparecem como plexos
coróideus volumosos, de ecoestrutura
heterogénea e hiperecogénea, nos ventrículos laterais ou no 3º ventrículo, com
hidrocefalia.
Os lipomas são massas ecogénicas
bem definidas, usualmente na linha média e frequentemente associados a agenesia do corpo caloso.
São diagnosticados no 2º ou 3º trimestres. Com excepção dos lipomas, o
prognóstico no conjunto dos tumores fetais, é muito mau, com sobrevivência pós
natal muito curta. Ocorre muitas vezes
morte fetal.
Ventriculomegalia define-se como
um diâmetro do atrium dos ventrículos
laterais superior a 10mm, a partir das 14
semanas e até ao termo; pode ser ligeira
(10 – 12 mm), moderada (>12 – 15 mm)
ou grave (>15mm). Normalmente, o plexo coróideu preenche o ventrículo lateral;
plexo coróideu pendente, é um sinal de
ventriculomegalia.
1% dos fetos entre 18 e as 23 semanas, apresentam ventriculomegalia.
Hidrocefalia é uma ventriculomegalia grave, com aumento de pressão, que
pode envolver também o 3º e o 4º ventrículos. A prevalência é de 2 por 1000 nados vivos. Pelos números, conclui-se que
a maioria dos fetos com ventriculomegalia não desenvolve hidrocefalia.
Na presença de ventriculomegalia / hidrocefalia, anomalias ecográficas
craneanas e extracraneanas adicionais,
devem ser pesquisadas. O estudo citogenético deve ser oferecido em todos os
casos, particularmente na presença de
anomalias associadas e nas ventriculomegalias ligeiras e moderadas. Devem
ser feitas as serologias maternas para
pesquisa de infecções – toxoplasmose,
CMV, rubéola, herpes e parvovirus – com
PCR e em alguns casos cultura, no liquido amniótico, no caso de evidência serológica de infecção na gravidez.
Assimetria dos ventriculos, sangue
nos ventrículos ou no parênquima cerebral, aumento da ecogenicidade da parede dos ventrículos – ventriculite – e os
cistos porencefálicos, são sinais sugestivos de infecção fetal.
A gravidade das lesões associadas
e das anomalias cromossómicas definem
o prognóstico. Infecções congénitas com
alterações cerebrais têm mau prognósti-
imagem na avaliação do sistema nervoso central: implicações no prognóstico – mesa redonda
S 176
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
co, com taxas de mortalidade muito altas
e atraso de desenvolvimento nos sobreviventes.
Quando toda a investigação é negativa e estamos perante uma ventriculomegalia isolada, moderada ou grave,
advogamos ainda a realização de ressonância magnética, no sentido de despistar anomalias cerebrais não diagnosticadas na ecografia.
A definição do prognóstico na ventriculomegalia “verdadeiramente” isolada,
não é fácil. São indicadores de pior prognóstico, um atrium ventricular > 12 mm,
a bilateralidade ou assimetria ventricular
e o aumento dos ventrículos ao longo da
gravidez.
As ventriculomegalias, sobretudo
as ligeiras, podem regredir ao longo da
gravidez. Este é o grupo com melhor
prognóstico,mas mesmo neste grupo
recomenda-se a vigilância do desenvolvimento, em pós natal. Nas ventriculomegalias ligeiras ou moderadas que persistem, em cerca de 90% dos casos há um
desenvolvimento normal; nos restantes,
há um defice neurológico ou um atraso
do desenvolvimento psicomotor.
O diagnóstico ecográfico de microcefalia é baseado na medida do perímetro
cefálico e na sua relação com as outras
medidas fetais. Assim um perímetro cefálico < 5 SD (Desvio Padrão), uma relação
perímetro cefálico / perímetro abdominal
< 3 SD e uma relação comprimento do
fémur / perímetro cefálico > 3 SD para a
idade gestacional, permite o diagnóstico
de microcefalia. Há disproporção entre o
tamanho da face e da cabeça.
Pode associar-se a outras malformações cerebrais (porencefalia, holoprosencefalia, agenesia do corpo caloso...),
a infecções congénitas, a cromossomopatias, a síndromes genéticos, exposição
a teratogéneos (warfarina).
O prognóstico depende da causa
subjacente, mas em mais de 50% dos
casos há atraso mental grave.
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 173-177
BIBLIOGRAFIA
Levene MI, Chervenak FA, Whittle M,
Bennett MJ, Punt J. Fetal and Neonatal
Neurology and Neurosurgery. London.
Churchill Livingstone. 2001; 39–55; 89–
97; 199–315; 323–337; 776–787.
Russel SA, Cranial abnormalities. In.
Twining P, Mc Hugo J, Pilling DW. eds.
Textbook of Fetal Abnormalities. London.
Churchill Livingstone. 2000; 89–138.
Weston MJ, Spinal abnormalities. In.
Twining P, Mc Hugo J, Pilling DW. eds.
Textbook of Fetal Abnormalities. London.
Churchill Livingstone. 2000; 139–166.
Breeze AC, Alexander PM, Murdoch EM
et al. Obstetric and neonatal outcomes
in severe fetal ventriculomegaly. Prenat
Diagn. 2007; 27(2): 124–129.
Cohen-Sacher B, Lerman-Sagie T, Ley D
et al. Sonographic developmental milestones of the fetal cerebral cortex: a longitudinal study. Ultrasound Obstet Gynecol.
2006; 27(5): 494–502.
Pilu G, Segata M, Ghi T, et al. Diagnosis of midline anomalies of the fetal
brain with the three-dimensional median
view. Ultrasound Obstet Gynecol. 2006;
28(5):742 -743.
Simonazzi G, Segata M, Ghi T, et al. Accurate neurosonographic prediction of brain
injury in the surviving fetus after the death
of a monochorionic cotwin. Ultrasound
Obstet Gynecol. 2006; 27(5): 517–521.
Ouahba J, Luton D, Vuillard E, et al. Prenatal isolated mild ventriculomegaly: outcome in 167 cases. BJOG. 2006; 113(9):
1072–1079.
Volpe P, Paladini D, Resta M, et al. Characteristics, associations and outcome of
parcial agenesis of corpus callosum in the
fetus. Ultrasound Obstet Gynecol. 2006;
27(5): 509–516.
imagem na avaliação do sistema nervoso central: implicações no prognóstico – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 177
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Diabetes Mellitus Tipo 1 e Doenças Associadas
Marcelo da Fonseca1
A Diabetes Mellitus Tipo 1 é uma
das doenças crónicas mais frequentes
na criança. Nas últimas décadas a sua
incidência tem vindo a aumentar a nível
mundial e na Europa tem-se assistido a
um maior número de casos, sobretudo
abaixo dos cinco anos de idade.
Considera-se que existe uma predisposição genética e a actuação de um
factor precipitante, suspeitando-se de
um factor ambiental. Desta associação
resultará a activação de mecanismos
imunológicos que irão levar a uma lesão
progressiva das células β dos ilhéus pancreáticos, o que ocorre em mais de 90%
dos casos.
Numa percentagem elevada de
doentes com diabetes mellitus tipo 1 de
causa auto-imune existe a associação de
outras doenças com um desenvolvimento
comum, como a doença de Graves, tiróidite de Hashimoto, doença de Addison,
doença Celíaca, anemia Perniciosa, etc.
A participação genética nas doenças
auto-imunes é cada vez maior, havendo
uma associação entre estas doenças e o
sistema de histocompatibilidade humana.
Embora o sistema HLA esteja envolvido
na patogenia de muitas dessas doenças,
outros factores devem estar presentes
para haver o desenvolvimento da endocrinopatia.
__________
¹ Hospital Pedro Hispano
tratamento da diabetes – mesa redonda
S 178
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
Considera-se a diabetes mellitus
tipo 1 a doença endocrinometabólica
mais frequente na idade pediátrica, e
a hiperglicemia crónica o principal responsável pelo aparecimento das complicações vasculares e neurológicas que
os doentes podem desenvolver a longo
prazo. Está demonstrado que a melhor
prevenção das complicações é a optimização do controlo metabólico mesmo em
idades pré-pubertárias (desde o diagnóstico) bem como uma detecção seriada
das possíveis doenças que lhe possam
estar associadas.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Diabetes na adolescência
Olinda Marques1
A adolescência é claramente um período de rápida mudança.
Caracteriza-se por um aumento do desenvolvimento cognitivo, do
pensamento abstracto e capacidade
crítica, pela aquisição da sua própria
identidade e estilo de vida, pela menor
receptividade à autoridade e grande
dependência em relação ao grupo de
amigos, pela aquisição progressiva de
autonomia mas também pelo medo e
insegurança em relação ao futuro. Esta
fase é, por isso, potencialmente geradora de conflitos.
A adolescência é um período particularmente crítico para os jovens com Diabetes. Esta distingue-se das outras doenças
crónicas pelas adaptações permanentes
exigidas aos doentes e familiares para
o seu controlo e responsabilidades nas
decisões a tomar para esse fim, ou seja,
grandes alterações no estilo de vida.
Do ponto de vista fisiológico o aumento da secreção dos esteróides sexuais que caracterizam a puberdade e das
catecolaminas associadas aos conflitos
psicológicos conduz a um aumento da
insulinorresistência e da glicemia e grandes dificuldades no controlo metabólico.
A tendência é a intensificação do
esquema terapêutico, mas o receio de
ser considerado “anormal” no grupo de
amigos, dificulta ainda mais as atitudes
perante a doença. São frequentes comportamentos de dissimulação da mesma
(omissão da autovigilância e de administrações de insulina, não são evitados
alimentos desaconselhados ou álcool,…)
com grande risco de descompensações
agudas. A negação da doença e a atracção pelo risco são pertinentes nesta fase.
Para outros, o isolamento e afastamento
do grupo é a atitude preferida.
A equipa terapêutica tem que estar
preparada para a detecção e avaliação
destas situações, esclarecendo os riscos,
reforçando a autoconfiança e ensinando
a evitar as complicações agudas.
É fundamental que estes problemas
sejam prioritários e que a avaliação do
controlo seja considerada em segundo
plano. A doença deverá ser integrada na
“vida” do adolescente e não condicionála. Os objectivos terapêuticos terão de
ser realistas e atingíveis.
Temas como o álcool, contracepção
ou orientação profissional devem constituir tema de debate. Em relação a este
último o diabético deverá conhecer os
direitos legais e profissões que lhe são
desaconselhadas.
A insatisfação com a imagem corporal é frequente entre os adolescentes sobretudo no sexo feminino. Daí que o tema
peso não deverá ser abordado de forma
muito enfática pela sua estreita e negativa relação com o controlo metabólico.
Distúrbios do comportamento alimentar
são mais graves e difíceis de tratar nos
diabéticos.
Nunca se deve assumir que o adolescente tem as capacidades e conhecimentos para resolver sozinho os problemas. Embora seja conveniente que os
tenha, não há garantias de que os use.
Não se deve partir do princípio que os
pais foram transmitindo aos filhos todos
os conhecimentos aprendidos, independentemente do tempo de evolução da
diabetes. Há pois necessidade de uma
nova abordagem da doença.
Deve-se ensinar e ajudar a resolver sozinho os problemas. Não contestar
mas convencer. Negociar a responsabilidade no tratamento e não impor.
Os objectivos do tratamento são:
1. Prevenção das complicações agudas.
2. Ausência sustentada dos sintomas
de hiperglicemia
3. Promover a sensação de bem-estar
físico e psíquico
4. Manutenção de um crescimento e desenvolvimento sexual normais assim
como de um peso ideal
5. Prevenção, identificação e tratamento dos distúrbios emocionais associados, com apoio psicossocial contínuo
e motivação do doente e familiares.
6. Tentar o melhor controlo metabólico
possível de modo a prevenir/atrasar
o aparecimento de complicações crónicas.
__________
¹ Hospital de S. Marcos (Braga)
tratamento da diabetes – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 179
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Aplicações Terapêuticas da Toxina Botulínica
nas Distonias
Inês Carrilho1
INTRODUÇÃO
A toxina botulínica (TXB) é uma neurotoxina produzida pela bactéria Clostridium botulinum, sendo uma das substâncias mais potentes que se conhece(1). O
seu efeito clínico resulta da sua ligação
irreversível aos receptores da terminação
nervosa pré-sinaptica. O efeito clínico é
transitório, esta reversibilidade é explicada pela capacidade que as terminações
nervosas têm de gerar novos terminais
nervosos, conduzindo a um restabelecimento do contacto com o músculo(2).
A primeira referência na literatura à
possibilidade de poder utilizar toxina botulinica como agente terapêutico, remonta a 1817 (Christian Andreas Justinus
Kerner), mas só em 1980 foi publicada a
primeira aplicação da TXB no tratamento
do estrabismo(3). Posteriormente foi sendo demonstrada a sua utilidade no tratamento de outras situações como no blefarospasmo e hemispasmo facial(4), nas
distonias cranio-cervicais(5), na espasticidade (Paralisia Cerebral) e na hiperhidrose focal(6). Todos os anos vão surgindo
novas aplicações e em várias especialidades médicas (exemplos: na hipersialorreia, hiperlacrimejo, hiersecrecção nasal, no bruxismo, em alguns problemas
urológicos e gastrointestinais, no tremor,
nas mioclonias, nos tiques, nas cefaleias,
aplicações cosméticas etc.(7)
Há 7 serotipos de TXB antigenicamente diferentes designados pelas letras
de A a G. Estão comercializados 2 serotipos, tipo A e tipo B e cinco produtos com
toxina botulinica, sendo os três mais utilizados a BOTOX (TXB A), a DYSPORT
(TXB A) e a MYOBLOC (TXB B).
__________
¹ Consulta de Doenças do Movimento
Serviço de Neuropediatria do H.Maria Pia
A toxina tipo A é a que produz no ser
humano uma paralisia mais prolongada
(4 -6 meses).
Na criança a utilização mais frequente da TXB tem sido na paralisia cerebral para controlo da espasticidade e
da distonia(8).
Apresentam-se de seguida algumas
das principais aplicações da TXB nos casos de distonia.
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 181-183
APLICAÇÕES DA TXB NA DISTONIA
A distonia define-se como contracções musculares involuntárias, mantidas
e repetidas de músculos opostos originando movimentos e posturas anómalas.
Apesar dos grandes avanços no estudo
das distonias, a sua fisiopatologia não
está completamente esclarecida e o tratamento para a maioria dos casos é sintomático. O uso da TXB é o tratamento de
escolha nas distonias focais.
O sucesso do tratamento com TXB
depende da identificação correcta dos
músculos alvo a injectar, conhecer a anatomia das áreas a infiltrar, escolher a dose
em função do tipo de toxina e dos músculos a infiltrar. Nalguns casos será fácil
a sua selecção como no caso do blefarospasmo e espasmo hemifacial. Noutras
situações poderá ser necessário efectuar
a injecção com controlo electromiografico
ou ecográfico e há casos de hemidistonia
em que a complexidade dos movimentos
é de tal ordem e pode ser tão variável que
torna pouco provável o controlo completo
dos movimentos.
Descrevem-se de forma resumida
alguns tipos de distonia em que a TXB é
uma opção de tratamento, sendo por vezes essa a primeira opção terapêutica.
Blefarospasmo é um tipo de distonia
focal devido ao encerramento involuntário das pálpebras, geralmente bilateral.
Resulta geralmente do espasmo do músculo orbicularis oculi mas pode ser acompanhado de distonia de outros músculos
da face e região cervical. A forma ideopática denominada blefarospasmo benigno
essencial é característica dos adultos,
tem um início entre a 5ª e 7ª década. As
formas secundárias representam apenas
10% dos casos.
Quando falha o tratamento conservador (uso de óculos de sol, benzodiazepinas ou anticolinérgicos) deve utilizar-se
a TXB. A taxa de sucesso com este tipo
de tratamento ronda os 90%(9). O principal
músculo infiltrado é o orbicularis oculi. Os
principais efeitos secundários são a secura ocular, ptose, lagoftalmia e diplopia.
Estes efeitos são transitórios.
Espasmo hemifacial – Define-se
como movimentos irregulares tónicos
ou clónicos dos músculos enervados
pelo VII nervo craniano num dos lados
da face. A contracção muscular geralmente começa na região periocular e
pode posteriormente atingir a região perioral e bochecha. Esta é também uma
patologia típica da idade adulta, mais
prevalente no sexo feminino e resulta
frequentemente da compressão vascular do nervo facial. Medicações como o
baclofeno, clonazepam, fenitoina, gabapentina e levetiracetam podem originar
uma melhoria transitória. Outra hipótese de tratamento é a descompressão
microcirúrgica. O tratamento com TXB
permite obter bons resultados sem os
efeitos secundários da intervenção
neurocirúrgica. Os músculos injectados
podem ser: orbicularis oculi, frontal,
zigomático, bucinador, depressor do
ângulo da boca, dependendo quais os
toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 181
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
músculos mais atingidos(10). Alguns dos
efeitos secundários que podem surgir
são: equimose no local da injecção, secura ocular, desvio da comissura labial,
ptose, edema palpebral e fraqueza dos
músculos da face.
Distonia cervical – é uma distonia
focal que resulta da contracção involuntária e assimétrica dos músculos do pescoço e ombros, originando movimentos
de rotação, inclinação, flexão ou extensão da cabeça, por vezes associada a
elevação ou desvio anterior do ombro.
A classificação da distonia cervical depende da posição primária da cabeça:
torcicollis (desvio horizontal), laterocollis
(inclinada sobre o ombro), anterocollis
(flexão anterior) ou retrocollis (hiperextensão). A distonia cervical primária surge tipicamente na idade adulta. O inicio
antes dos 28 anos é raro. O tratamento
com TXB é o mais eficaz, com melhoria
em 85% dos doentes. Não parece haver
diferenças significativas nos resultados
obtidos usando BotoxR ou DysportR (11).
Um estudo recente sobre distonia cervical de inicio antes dos 28 anos (idades
variaram entre 3 -28 anos), demonstrou
uma resposta favorável com o tratamento com TXB em 74% dos casos(12). O
sucesso do tratamento depende da correcta selecção dos músculos a injectar,
o que exige um correcto conhecimento
dos principais músculos do pescoço e
das suas acções primárias e secundárias. Outro factor importante para uma
boa resposta terapêutica é a escolha
da dose mais correcta em função dos
músculos a injectar. Os principais efeitos secundários a curto prazo e que estão relacionados com as doses usadas
e músculos injectado são: disfagia, fraqueza do pescoço, astenia.
Distonia oromandibular (OMD) – é
uma distonia focal que envolve os músculos da mastigação, da face inferior, labiais
e linguais. O envolvimento dos músculos
da mastigação pode originar encerramento ou abertura da mandíbula, desvio
lateral, protusão, retração ou combinação
de vários movimentos. Estes movimentos interferem com a alimentação, com
a fala, podem originar traumatismo da
língua e dos lábios. Este tipo de distonia
pode ser ideopática ou estar associada
a outras patologias (paralisia cerebral,
doenças neurodegenerativas…). O tratamento deve ser individualizado de acordo
com as necessidades do doente. A toxina botulinica é actualmente o tratamento
de escolha e há vários estudos que demonstram a sua eficácia especialmente
nos casos OMD com encerramento da
mandíbula.
Disfonia espasmódica – é também
uma forma de distonia focal que envolve
as cordas vocais originando dificuldades
na fala. Na criança com paralisia cerebral
pode estar presente esta forma de distonia e interferir de forma significativa com
a capacidade de comunicação. A primeira
aplicação de toxina no tratamento da disfonia espasmódica foi em 1986(13) e desde essa altura múltiplos estudos têm sido
efectuados demonstrando a sua eficácia.
Diferentes protocolos tem sido propostos
para a injecção da TXB nos músculos tiroaritnoideus uni ou bilateralmente, usando diferentes técnicas que não vão aqui
ser abordadas.
Distonia do escrivão – é uma distonia focal desencadeada especificamente
pela acção de escrever. Têm sido tentados vários tratamentos farmacológicos mas sem grande resposta e desde
1989(14) tem vindo a ser usada a TXB com
melhoria em alguns doentes(15).
Hemidistonia – Distonia do hemicorpo geralmente secundária a lesão
cerebral envolvendo os gânglios da base
(ex: malformação vascular, calcificações,
lesão isquémica). A injecção de toxina
é aplicada nos grupos musculares mais
atingidos.
A TXB tem também sido utilizada
em algumas distonias focais secundárias (distonia da língua, distonia oromandibular, distonia cervical, distonia do
membro superior) no contexto de doenças neurológicas, como a forma distónica da Paralisia Cerebral, no sindrome de
Lesch-Nyhan e outras doenças neurodegenerativas com grande componente
distónico. A distonia da língua com protusão é um desses exemplos. Esta situação pode pôr em risco a vida do doente
e responde mal às drogas por via oral,
mas pode beneficiar com as injecções
de TXB a nível do músculo genioglosso(16). A terapêutica com TXB na disto-
toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda
S 182
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
nia do membro superior nas crianças
com paralisia cerebral tem sido alvo de
alguns estudos que demonstram a sua
eficácia(17).
O torcicolo muscular congénito é
a forma de torcicolo mais frequente da
criança, há inclinação da cabeça para o
lado em que o músculo esternocleidomastoideu está alterado (mais espesso
ou mesmo uma tumefacção palpável).
Nos casos mais resistentes, que não melhoram com o tratamento conservador,
tem sido usado o tratamento com TXB,
associado à fisioterapia, com bons resultados, podendo evitar a necessidade de
intervenção cirúrgica(18,19,20,21).
CONCLUSÃO
O uso da toxina botulinica alterou
de forma significativa a abordagem terapêutica das distonias focais. É já a primeira linha de tratamento em algumas
situações. O seu uso clínico há mais de
duas décadas permitiu conhecer os seus
principais efeitos secundários. Há indicações terapêuticas já bem definidas no
adulto e na criança. São necessários ainda mais estudos controlados na criança
para aumentar as indicações do seu uso
em alguns quadros mais específicos da
criança.
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 181-183
BIBLIOGRAFIA
1. Jancovic et al. Therapeutic uses of
botulinum toxin. N Eng J Med 1991;
324(7):1186-94
2. De Paiva A et al. Functional repair
of motor endplates after boyulinum
neurotoxin type A poisoning: biphasic switch of synaptic activity between nerve sprouts and their parent
terminals.Proc Natl Acad Sci USA
1999;96:3200-3205)
3. Scott AB. Ophalmology 1980;87:10441049
4. Frueh BR, Felt DP, Wojno TH, Musch
DC. Arch Ophthalmol 1984
5. Jankovic J, Orman J. Neurology 1987;
37:616-623)
6. Schnider P, Binder M, Berger T, Auff
E. British Journal of Dermatology
1996),
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
7. Jost W H. Other indications of botulinum toxin therapy. European Journal
of Neurology 2006,13(Suppl.1):65-69.
8. Florian Heinen e tal. European consensus table 2006 on botulinum toxin
for children with cerebral palsy. European Journal of Paediatric Neurology
2006;10: 215-225.
9. Jost WH, Kohl A. Botulinum toxin: evidence-based medicine criteria in blepharospasm and hemifacial spasm.
Journal of Neurology 2001;248(suppl.
1):21-24
10. Frei K, Truong D, and Dressler D.
Botulinum toxin therapy of Hemifacialspasm. Eur Journ of Neurol
2006,13(Suppl. 1):30-35)
11. Comella CL, Thompson. Treatment
of cervical dystonia with botulinum toxins. Eur Journ of Neurol 2006,13(Suppl. 1):30-35)
12. Koukouni V, Martino D, Arábia G e tal.
The entity of young onset primary cer-
vical dystonia. Mov Disord 2007 Apr
30;22 (6):843-7
13. Blitzer A, Brin MF, Fahn S et el. Botulinum toxin (BOTOX) for the treatment
of “spastic dysphonia” as par of a trial
of toxin injections for the treatment of
other cranial dystonia. Laryngoscope
1986; 96:1300-1301)
14. Cohen LG et al. Journal of Neurology
Neurosurgery and Psychiatry 1989;
52: 355-363)
15. Das C.P, Dressler D. and Hallett M. Botulinum toxin therapy of
writer`s cramp. Eur Journ of Neurol
2006,13(Suppl. 1):55-59)
16. Schneider SA, Aggarwal A, Bhatt M,
Dupont E, Tisch S, Limousin P, Lee
P, Quinn N, Bhatia KP.Severe tongue
protrusion dystonia: clinical syndromes and possible treatment. Neurology 2006 Sep 26;67 (6):940-3 )
17. Sanger TD, Kukke SN, Sherman-Levine S. Botulinum toxin type B impro-
ves the speed of reaching in children
with cerebral palsy and arm dystonia: an open-label, dose-escalation
pilot study. J Child Neurol.2007 Jan;
22(1):116-22
18. Oleszek JL, Chang N, Apkon SD, Wilson PE. Botulinum toxin type a in the
treatment of children with congenital
muscular torticollis. Am J Phys Med
Rehabil. 11: 2005 Oct;84(10):813-6
19. Do TT. Congenital muscular torticollis:
current concepts and review of treatment. Curr Opin Pediatr.2006 Feb;18
(1):26-9
20. Joyce MB, de Chalain TM. Treatment
of recalcitrant ideopatic muscular torcicollis in infants with botulinum toxin
type a. J Craniofac Surg. 2005 Mar;
16(2):321-7
21. Collins A, Jankovic J. Botulinum toxin
injection for congenital muscular torticollis presenting in children and adults.
Neurology 2006 Sep26;67(6):1083-5
toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 183
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Toxina Botulínica: Aplicações Terapêuticas na
Criança com Disfunções Miccionais
Miguel Silva-Ramos1
RESUMO
Introdução e objectivo da revisão: Classicamente o tratamento das
disfunções vesico-uretrais em crianças
baseia-se nos antimuscarínicos, alfabloqueantes e no cateterismo vesical
intermitente. Quando esta terapêutica
falha, ou por pouca eficácia ou por efeitos adversos, é necessário recorrer a
cirurgias agressivas como a enterocistoplastia de aumento. As injecções de toxina botulinica (TXB) no detrusor e no esfíncter foram recentemente introduzidas
no tratamento destes casos refractários
ao tratamento conservador. Realizamos
uma revisão da literatura focada no tratamento da disfunção vesico-uretral com
TXB na criança
Observações: Encontramos apenas 14 artigos publicados sobre o uso
de TXB especificamente na disfunção
vesico-uretral pediátrica. Sendo estes
referentes a 10 diferentes séries de
pacientes. Sete séries incluíam apenas
doentes com disfunção neurogénica e
apenas dois contemplavam a aplicação
de toxina no esfíncter. A aplicação de
TXB no detrusor aumentou significativamente a capacidade vesical e diminuiu a
pressão máxima do detrusor na grande
maioria dos doentes, tornando-os continentes. A injecção de TXB no esfíncter
diminuiu significativamente o resíduo
pós-miccional, a pressão do detrusor
que provoca perdas e aumentou o fluxo
urinário, embora seja por vezes necessário injecções mensais até atingir o resultado pretendido.
Conclusões: A TXB parece ser
uma boa alternativa ao tratamento cirúrgico da hiperactividade do detrusor
__________
¹ Serviço de Urologia, HGSA
na população pediátrica. O uso de TXB
no esfíncter em doentes com disfunção
miccional parece promissor, no entanto mais estudos são necessários para
avaliar qual o melhor método de administração, dose e a sua eficácia a longo
prazo.
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 184-185
INTRODUÇÃO
A toxina botulínica A (TXB-A) é
uma neurotoxina potente que bloqueia
a libertação de neurotransmissores nos
terminais nervosos colinergicos, nomeadamente da acetilcolina, a qual é
responsável pela contracção muscular.
A injecção intramuscular de TXB-A bloqueia a junção neuromuscular no sítio da
injecção até novos terminais sinápticos
se desenvolverem. Inicialmente usada no
tratamento de hiperactividade muscular
estriada, existe actualmente evidência
da sua eficácia ao nível do musculo liso
e que os seus efeitos parecem ser mais
longos.
Em Urologia a TXB tem sido usada
em adultos para tratamento da hiperactividade do detrusor neurogénica e idiopatica , na dissinergia vesicoesfincteriana,
na hiperplasia benigna da próstata, e
mais recentemente na cistite intersticial e
na prostatite crónica tipo III.
A primeira criança a receber TXBA por uma patologia neuro-urológica foi
uma menina de 7 anos com dilatação
uretral associada a micção disfuncional(1).
Desde então a aplicação de TXB em
crianças tem-se centrado no tratamento
da hiperactividade do detrusor neurogénica e só mais recentemente no tratamento
da hiperactividade não neurogénica e da
micção disfuncional.
toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda
S 184
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
TOXINA BOTULINICA NO
TRATAMENTO DA HIPERACTIVIDADE
DO DETRUSOR NEUROGÉNICA
Crianças com bexiga neurogénica
são classicamente tratadas com anticolinergicos e cateterização vesical intermitente várias vezes por dia. Para além
dos efeitos adversos associados a esta
terapêutica ela é muitas vezes ineficaz,
não evitando episódios de incontinência
e sobretudo colocando as crianças em
risco de grandes pressões intravesicais,
refluxo vesicoureteral e de lesão da função renal. A TXB tem sido usada com o
objectivo de controlar a hiperactividade
do detrusor nestes casos.
Schulte-Baukloh e colaboradores(2)
injectaram 20 crianças com hiperactiviade
do detrusor neurogénica, a maioria com
mielomeningocelo, com 12U/kg de Botox
(Allergan Inc, Irvine, Califórnia). O seguimento urodinãmico 2 a 4 semanas após o
tratamento revelou um aumento significativo da capacidade vesical e diminuição
da pressão máxima do detrusor. Estudos
mais recentes(3,4,5) confirmam estes resultados mostrando também uma redução
muito significativa de incontinência e de
refluxo vesicoureteral. O efeito clínico
da toxina durou entre 6 e 12 meses e
manteve-se após injecções repetidas(6,7).
De notar que cerca de 90% dos doentes
apresentam resposta à terapêutica, no
entanto doentes com baixa acomodação
vesical e com deficit esfincteriano apresentam melhorias sintomáticas ligeiras.
TOXINA BOTULINICA NO
TRATAMENTO DA HIPERACTIVIDADE
DO DETRUSOR NÃO NEUROGÉNICA
O termo disfunção vesical não neurogénica baseia-se unicamente no facto
de não ser possível identificar lesão neurológica que explique a disfunção miccio-
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
nal em causa. É portanto possível que
muitas vezes exista um a causa neurológica mas que a lesão neuroanatomica
não é identificável. Isto significa que as
diferenças entre hiperactividade neurogénica e não-neurogénica, não sejam
muito claras e que o seu tratamento seja
semelhante.
Recentemente Hoebeke e col(8), publicou a primeira série de crianças com
hiperactividade do detrusor sem causa
neurológica identificável e sem micção
disfuncional tratadas com 100U de Botox®. Oito raparigas e 7 rapazes com
idades compreendidas entre 8 e 14 anos,
concluíram o estudo. Nove apresentaram
resposta completa, 3 apresentaram melhoria e 3 ficaram na mesma. Todos os
doentes conseguiram urinar voluntariamente após o tratamento, embora uma
menina apresentasse volumes residuais
significativos.
TOXINA BOTULINICA NO
TRATAMENTO DA MICÇÃO
DISFUNCIONAL
A micção disfuncional em crianças
anatomicamente e neurologicamente
normais, é caracterizada pelo relaxamento incompleto ou hiperactividade
dos músculos do pavimento pélvico ou
do esfíncter externo durante a micção.
È causa de incontinência, dificuldade em
urinar, infecções, resíduo pós-miccional e
deterioração do aparelho urinário alto. O
tratamento baseia-se em bloqueadores
alfa-adrenergicos, fisioterapia, psicoterapia e cateterismos intermitentes. Recentemente 2 estudos avaliaram a injecção
de 50 a 100U de Botox® no esfíncter e
musculatura do pavimento pélvico por
via endoscópica(9) e transperineal(10) neste grupo de pacientes. Oitenta e cinco a
90% dos pacientes mostraram melhoria
clínica e urodinâmica com diminuição do
resíduo pós-miccional, da pressão de
detrusor durante a micção e aumento do
fluxo máximo. O efeito manteve-se até
cerca de 6 meses após a injecção.
REACÇÕES ADVERSAS
Os efeitos adversos causados pela
injecção de TXB, estão associados a sua
difusão para fora do local de administração. Estes são a fadiga muscular generalizada, disfagia, aspiração, diplopia e
visão turva. Assim esta terapêutica está
contra-indicada em doentes com insuficiência respiratória ou distúrbios da transmissão neuromuscular como doentes
com miastenia gravis ou tratados com
aminoglicosídeos. Não estão habitualmente descritos estes efeitos adversos
nos estudos sobre o uso de TXB nas disfunções vesicais(11).
O bloqueio da placa neuromuscular no detrusor, pode obviamente causar
retenção urinária. Embora isto não seja
habitualmente um problema em doentes
com disfunção neurogénica que fazem
cateterismos intermitentes pode sê-lo em
doentes capazes de contrair voluntariamente o detrusor. Assim nestes doentes
usamos cerca de metade da dose, com
o objectivo de conseguir inibir a hiperactividade sem interferir na contracção voluntária.
CONCLUSÕES
A eficácia terapêutica da TXB-A nas
disfunções vesicais está bem documentada, embora careça de ensaios clínicos
controlados, randomizados para melhor
quantificar a essa eficácia. Nas crianças
o uso de TXB tem tendência a expandirse à semelhança do que acontece nos
adultos. Contudo é importante não esquecer que a hiperactividade do detrusor
é uma patologia dinâmica na criança, ao
contrário do que acontece nos adultos, e
isto deve ser levado em conta quando decidimos por esta terapêutica.
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 184-185
BIBLIOGRAFIA
1. Steinhardt GF, Naseer s anf Cruz AO:
Botulinum toxin: novel treatment for
dramatic ureteral dilatation associated with dysfunctional voiding. J Urol,
1997; 158: 190
2. Schulte-Baukloh H, Michael T, Sturzebecher B, Knispel H: Botulinum-A
Toxin detrusor injection as a novel
approach in the treatment of bladder
spasticity in children with neurogenic
bladder. Eur Urol, 2003; 44:139
3. Riccabona M, Koen M, Schindler
M, Goedele B, Pycha A, Lusuardi L,
Bauer SB: Botulinum-A toxin injection
into the detrusor: a safe alternative in
the treatment of children with myelomeningocele with detrusor hyperreflexia. J Urol 2004;171:845.
4. Marte A, Vessella A, Cautiero P e col:
Efficacy of toxin-A Botulinum for treating intractable bladder hyperactivity
in children affected by neuropathic
bladder secondary to myelomeningocele: an alternative to enterocystoplasty Minerva Pediatr. 2005;57:35
5. Kajbafzadeh A, Moosavi S, Tajik P e
col: Intravesical injection of botulinum
toxin type A: management of neuropathic bladder and bowel dysfunction
in children with myelomeningocele.
Urology 2006;68:1091.
6. Altaweel W, Jednack R, Bilodeau C,
Corços J: Repeated intradetrusor Botulinum Toxin Type A in children with
neurogenic bladder due to myelomeningocele, J Urol 2006;175:1102.
7. Akbar M, Abel R, Seyler T, Gerner H,
Mohring K: Repeated botulinum_A toxin injections in the treatment of myelodysplastic children and patients with
spinal cord injuries with neurogenic
bladder dysfunction:BJU Int, 2007;
100:639.
8. Hoebeke P, DeCaestecker K, Vande
Walle J, Dehoorne J, Raes A, Verleyen P, Van Laecke E: The effect of
Botulinum-A Toxin in incontinent children with therapy resistant overactive
detrusor. J Urol 2006;176:328.
9. Mokhless I, Gaafar S, Fouda K, Shafik M, Assem A: Botulinum A toxin
urethral sphincter injection in children
with nonneurogenic neurogenic bladder. J Urol 2006; 176:1767.
10. Radojicic Z, Perovic S, Milic N: Is it
reasonable to treat refractory voiding
dysfunction in children with botulinum-A toxin? J Urol;176:332.
11. Schurch B, Corcos J: Botulinum toxin
injectionsfor paediatric incontinence.
Curr Opin Urol 2005;15:264.
toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 185
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Toxina Botulínica na Paralisia Cerebral
Rosa Amorim1
INTRODUÇÃO
A Paralisia Cerebral é a principal
causa de incapacidade na criança.
Define-se como uma lesão não progressiva no cérebro imaturo, causando
anomalias na postura e no movimento.
Apesar de a lesão neurológica ser estática (não evolutiva), as suas manifestações
podem alterar-se ao longo do tempo, à
medida que a criança vai crescendo, pelo
que é necessário manter o acompanhamento e intervenção terapêutica ao longo
de toda a vida.
A espasticidade é o distúrbio mais
frequente na Paralisia Cerebral, podendo
encontrar-se isoladamente ou em combinação com distonia, atetose ou ataxia.
Trata-se de um fenómeno complexo
caracterizado por um aumento do tónus
muscular velocidade-dependente, por hiperactividade do reflexo tónico de estiramento, com co-contracção (agonista/antagonista), hiperreflexia e clónus.
Os seus principais efeitos na criança são:
• inibição do movimento
• limitação do crescimento muscular
• desenvolvimento de deformidades
músculo-esqueléticas
• dor
Estes métodos incidem na melhoria
da função e na prevenção das deformidades, de modo a atrasar a necessidade de
cirurgia, mas nenhum deles actua de forma mantida e sustentada na eliminação
ou redução da espasticidade.
Tradicionalmente, o tratamento da
espasticidade na Paralisia Cerebral é
constituído por:
• medicação (diazepan, dantroleno,
baclofeno)
• fisioterapia
• ortóteses
• cirurgia
Quando usar Toxina Botulínica?
Em idade precoce. É hoje consensual que a administração de Toxina Botulínica deve ser efectuada preferencialmente
entre os 2 e os 6 anos, principalmente a
nível dos membros inferiores, de modo a
optimizar as aquisições motoras e a evitar
a instalação de retracções e contracturas.
__________
¹ Serviço de Medicina Física e de Reabi-
litação - Hospital Maria Pia
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 186-187
APLICAÇÃO DE TOXINA BOTULÍNICA
A Toxina Botulínica tipo A reduz temporariamente a espasticidade focal.
A sua utilização em crianças com Paralisia Cerebral iniciou-se há pouco mais
de uma década (apesar de ser usada há
mais de vinte anos noutras situações). Os
primeiros estudos publicados datam de
1994 (Cosgrove et al, Koman et al), e desde então têm surgido inúmeras publicações sobre este assunto que demonstram
a sua eficácia na Paralisia Cerebral.
A Toxina Botulínica produz fraqueza
ou paralisia no músculo porque impede a
libertação de acetilcolina na terminação
nervosa. O grau de paralisia vai depender
da dose e do número de sinapses afectadas. A redução da espasticidade mantém-se cerca de 12 a 16 semanas, mas
a melhoria funcional pode durar mais de
6 meses.
Em que condições?
Após avaliação e selecção dos doentes por uma equipa multidisciplinar e de
identificação dos objectivos pretendidos.
toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda
S 186
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
A definição de um objectivo específico para cada criança e em determinado
momento é fundamental na decisão de
quais os grupos musculares a infiltrar.
Pode ser desde melhorar o padrão de
marcha, permitir a verticalização, melhorar a postura sentada, melhorar a funcionalidade dos membros superiores, facilitar os cuidados de higiene ou diminuir
a dor.
Quais os principais efeitos na Paralisia Cerebral?
A redução da espasticidade focal
vai melhorar a funcionalidade, permitindo
a acção dos músculos antagonistas e a
eliminação dos movimentos anormais.
De acordo com vários autores, a
Toxina Botulínica vai maximizar o comprimento das fibras musculares, melhorando a mobilidade articular e facilitando
o crescimento dos músculos, prevenindo
a assimetria dos membros inferiores, por
exemplo, nas situações de hemiplegia.
A redução do número de cirurgias
ou o seu adiamento para idades mais
tardias estão também documentados na
literatura, o que está de acordo com a diminuição das retracções músculo-esqueléticas, já referida.
O efeito analgésico, principalmente
nos casos de anca dolorosa pela espasticidade dos adutores, e a facilitação dos
cuidados de higiene justificam a utilização desta droga.
Quais os efeitos laterais?
São pouco frequentes, ligeiros e
transitórios. Estão descritos casos de incontinência urinária (1%), quedas (0,5%),
fraqueza generalizada (0,5%), fadiga, febre e um quadro influenza-like em < 1%.
Estes efeitos estão correlacionados com
doses elevadas.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Membro inferior
Deformidades mais frequentes
Músculos infiltrados
Pé equino espástico (mais comum)
Deformidade em varo
Gastrocnémios
Solear
Tibial posterior
Padrão em aducção (diplegia)
Adutores
Ísquiotibial interno
Limitação da extensão da anca
(flexo da anca)
Iliopsoas
Recto femoral
Membro superior
Deformidades mais frequentes
Músculos infiltrados
Flexo do cotovelo
Braquiorradial
bíceps
Pronação
pronador quadrado
pronador teres
Flexão punho e dedos (hemiplegia)
Flexor radial do carpo
Flexor cubital do carpo
Flexor sup. e prof. dos dedos
Polegar palmar
Longo flexor do polegar
Adutor do polegar
Curto flexor do polegar
Na criança, ao contrário do adulto,
não foram descritos casos de síndrome
botulínico.
GRUPOS MUSCULARES MAIS
FREQUENTEMENTE INFILTRADOS
Os movimentos dos membros superiores são mais complexos e dependem de
um grande número de pequenos músculos,
pelo que são infiltrados menos frequentemente, e com objectivos muito precisos.
No membro inferior os grupos musculares são maiores e de mais fácil identificação. Os objectivos são mais simples
e mais evidentes.
TRATAMENTOS ASSOCIADOS
O tratamento com Toxina Botulínica
não pode ser utilizado isoladamente, mas
sim em conjunto com os outros meios terapêuticos como a Fisioterapia, a colocação de Ortóteses para posicionamento
correcto (talas ou gessos), e eventualmente medicação.
A cirurgia é sempre de ponderar se
não forem atingidos os objectivos pretendidos.
CONCLUSÃO
Está hoje reconhecido o interesse
da Toxina Botulínica no tratamento da
Paralisia Cerebral. No entanto, a sua utilização requer a definição criteriosa dos
objectivos a atingir em cada criança e a
avaliação seriada por equipa multidisciplinar de forma a potenciar todos os benefícios desta terapêutica.
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 186-187
BIBLIOGRAFIA
1. Kristie Bjornson, PhD, Ross Hays,MD,
Cathy Graubert, Robert Price et al. Botulinum Toxin for spasticity in children
with Cerebral Palsy: a comprehensive
evaluation. Pediatrics 2007; 120(1):
49-58.
2. S. I. Pascual-Pascual. Tratamiento
preventivo y paliativo con toxina botulínica de la cadera en el niño com
parálisis cerebral infantil. Rev Neurol
2003; 37(1): 80-82
3. Nolan KW, Cole LL, Liptak GS. Use
of Botulinum Toxin type A in children
with Cerebral Palsy. Phys Ther 2006;
86: 573-584.
4. Guy Monnier, Bernard Parratte, Spasticity in children with Cerebral Palsy.
In: Danièle Ranoux, Charles Gury
eds. Pratical Handbook on Botulinum Toxin. Marseille, Solal Publisher
2007; 79- 98.
5. Klemens Fheodoroff, Brigitte Schurch, Gudrun Heck (Ed.). Treatment of
spasticity with Botulinum Toxin- pocket atlas. Scherzingen, Switzerland,
Saentis Verlag 2005; 1-14.
6. Koman LA, Paterson Smith B,
Balkrishnan R. Spasticity associated
with cerebral palsy in children: guidelines for the use of botulinun A toxin.
Paediatr Drugs 2003; 5(1):11-23.
7. Deleplanque B, Lagueny A, Flurin
V, Arnaud C, et al. Botulinum Toxin
in the management of spastic hip
adductors in non-ambulatory cerebral palsy children. Rev Chir Orthop Reparatrice Appar Mot. 2002;
88(3):279-85.
8. EI O, Peker O, Kosay C, Iyilikci L, Bozan O, Berk H. Botulinum toxin A injection for spasticity in diplegic –type
cerebral palsy. J Child Neurol. 2006;
21(12):1009-12.
9. Remo N. Russo, Maria Crotty, Michelle D. Miller, Sonya Murchland,
Peter Flett and Eric Haan. Upperlimb Botulinum Toxin A injection and
Occupational Therapy in children
with hemiplegic Cerebral Palsy
identified from a population register:
a single-blind, randomized, controlled trial. Pediatrcs 2007; 119:11491158.
10. Florian Heinen, Guy Molenaers,
Charlie Fairhurst, et al. European
consensus table 2006 on botulinum
toxin for children with cerebral palsy.
European Journal of Paediatric Neurology 2006; 10:215-225.
11. M Gough, C. Fairhust, A P Shortland.
Botulinum toxin and Cerebral Palsy:
time for reflexion? Developmental
Medicine and Chid Neurology 2005;
47:709-712.
toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 187
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Toxina Botulínica: Aplicações Terapêuticas em
Oftalmologia Pediátrica
Rosário Varandas1
RESUMO:
Descrição das aplicações terapêuticas da toxina botulínica em oftalmologia
pediátrica. Descrição da técnica, material
necessário, complicações e efeitos secundários .
Comparação de resultados com a
cirurgia clássica. Breve apresentação de
alguns casos clínicos da consulta de Oftalmologia Pediátrica do CHVNG.
Palavras-Chave: Toxina Botulínica,
estrabismo, nistagmo, blefaroespasmo
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 188-190
INTRODUÇÃO
A toxina botulínica é uma neurotoxina que ao impedir a libertação de acetilcolina nas terminações nervosas da
placa motora enfraquece a contracção
muscular sendo por este motivo usada
em oftalmologia desde 1980, para a correcção de estrabismo.
Posteriormente alargou-se a sua
aplicação a outras patologias oculares
mas na criança é essencialmente no estrabismo que é utilizada com uma alta
taxa de sucesso.O efeito da toxina botulínica inicia-se após alguns dias da injecção observando-se inicialmente uma
hipercorrecção (critério de sucesso) e
mantém-se cerca de seis meses. Após
esse período pode haver retorno ao estrabismo mas quase sempre de magnitude inferior ao desvio inicial. Pensa-se que
as fibras musculares sugeitas à acção da
toxina sofrem alongamento com reorganização dos sarcómeros justificando a
diminuição do estrabismo mesmo após
terminar o efeito da toxina 1.
TÉCNICA
Faz-se a reconstituição da forma liofilizada da toxina com uma solução salina
a 0,9%, habitualmente 2ml de forma a
que 0,1cc contém 5 U. Esta solução deve
ser preparada pouco tempo antes da sua
utilização e sem agitar visto que é facilmente deteriorável.
Anestesia-se a conjuntiva com várias gotas de anestesia tópica (proparacaína) ou mais raramente efectua-se
uma injecção subconjuntival de lidocaina.
Em crianças mais pequena efectua-se
sedação com ketamina intravenosa ou
inalação com sevoflurano. Usamos o
audioelectromiógrafo com agulha revestida de teflon 27 gauge para obter a localização precisa do musculo. Adapta-se
a agulha a uma seringa de tuberculina e
aspiram-se 0.2 ml de solução.
Coloca-se o paciente em decúbito
dorsal, procede-se á desinfecção com
Betadine da área periocular, após ter colocado o audioEMG (Figura 1) em posição.
Com o auxílio de um blefarostato obtémse a abertura ocular necessária para introduzir a agulha através da conjuntiva a
cerca de 8 mm do limbo (Figura 2). A agulha é introduzida paralelamente ao limbo
e após rotação do músculo na direcção
em que actua, a agulha é introduzida em
direcção ao ápice da órbita. Após ouvir o
sinal que nos indica que estamos no interior do músculo injecta-se lentamente a
solução(1).
A dose habitualmente usada é de 5
unidades para desvios superiores a 25
dioptrias prismáticas e 2.5 u para desvios
menores ou para crianças de idade inferior a 1ano.
Figura 1
Figura 2
__________
¹ Serviço de Oftalmologia do CHVNG
toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda
S 188
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
COMPLICAÇÕES
A maior parte das complicações da
injecção de toxina botulínica são pouco
graves e transitórias, raramente impedindo a continuação do tratamento.
As mais frequentes são devidas á
difusão da toxina para músculos adjacentes como ptose por efeito da toxina no
levantador da pálpebra superior e hipoacção do recto superior. Habitualmente há
resolução rápida destes efeitos secundários. Alterações sensoriais tais como
diplopia, torcicolos e desorientação espacial também podem ocorrer pelo mesmo
motivo, ocorrendo muito raramente em
crianças.
As complicações relacionadas com
a injeccção, como hemorragia local e ardência podem ocorrer em cerca de 1%
das injecções. A perfuração escleral e hemorragia intraocular complicações mais
graves relacionadas com a injeccção estão descrita em menos de 1/1000.
Complicações sistémicas: devido
às baixas doses usadas em oftalmologia
não são conhecidas reacções adversas.
INDICAÇÕES TERAPÊUTICAS
Na esotropia congénita ou infantil a
toxina botulínica é um procedimento alternativo à cirurgia, permitindo que seja
efectuada precocemente com o objectivo
de obter alguma visão binocular.
Nos estrabismos paréticos, sobretudo na parésia do VI par é possivel
efectuar a injecção de toxina no músculo
antagonista impedindo a hipercontractura
deste evitando ou facilitando se vier a ser
necessário a cirurgia posterior.
Nos estrabismos divergentes os
resultados são inferiores aos da cirurgia
clássica e a técnica de aplicação é mais
complicada devido a proximidade da mácula, sendo por esse motivo menos usada. Contudo alguns autores descrevem
uma taxa de sucesso de 60%, semelhante à da cirurgia clássica(2).
Na cirurgia de estrabismo em crianças com complicações neurológicas tal
como na paralisia cerebral o uso de toxina é muito útil pois os riscos anestésicos
são muito menores e devido á inconstância dos desvios e dificuldade em ter colaboração para obter as medidas objectivas, a toxina é um procedimento com
uma taxa de hipercorrecção muito mais
baixa do que a cirurgia.
Recentemente, a toxina é usada no
músculo pequeno oblíquo como adjuvante da cirurgia nas paresias do IV par e
nas endotropias acompanhadas de desvios verticais.
No nistagmo congénito alguns estudos advogam a injecção de toxina nos
quatro rectos horizontais, obtendo-se
diminuição da amplitude do nistagmo e
melhoria da acuidade visual em 40-50%
dos pacientes.É também possível trata
os nistagmos com injecção retrobulbar
de toxina, nesta técnica são mais frequentes os efeitos laterais de diplopia e
ptose.
O blefaroespasmo é uma contracção involuntária do músculo orbicular
provocando aumento da frequência e
amplitude do pestanejar. Pode ser tão frequente e repetitivo que chega a impedir a
actividade normal da criança, em casos
mais moderados é muitas vezes descrito
como tique nervosos. A toxina botulínica
é usada no blefarespasmo desde 1983 e
tornou-se o tratamento de escolha. Injecta-se habitualmente uma dose de 12.50
a 25 unidades por olho evitando a parte
central do orbicular para minimizar o risco de ptose. É quase sempre necessário
repetir este tratamento inúmeras vezes, a
remissão total do blefaroespasmo apenas
está descrita em cerca de 2% dos casos.
Durante o período em que a toxina está
activa os resultados são muito satisfatórios para o doente(3,4).
Apresentação de 3 casos clínicos
da consulta do Oftalmologia Pediátrica
como exemplo da terapêutica com toxina
botulínica.
CASO CLÍNICO 1
Criança do sexo feminino, 3 anos
de idade, enviada à consulta de Oftalmologia Pediátrica por estrabismo do olho
esquerdo.
Apresentava como antecedente
sistémico de relevo parésia do membro
superior direito. Na RMN encefálica era
evidente marcada redução da substância
branca da corona radiata esquerda como
sequela de lesão encefaloclástica , resultando desta lesão degenerescência axonal da via piramidal.
No exame ocular observava-se endotropia de 20º do olho esquerdo com
limitação da abdução do mesmo lado.
Trata-se pois de uma parésia do VI par
esquerdo.
Efectuou toxina botulínica em ambos
os rectos mediais na dose de 5 unidades.
No 3º dia de tratamento apresentava ptose discreta e exotropia para longe.
Ao mês de tratamento não apresentava desvio e o movimento de abdução do olho esquerdo era maior,
ainda que com limitação nas posições
extremas. Actualmente, após 6 meses
de tratamento, apresenta exame ocular
sobreponível.
CASO CLÍNICO 2
Criança do sexo masculino com 2
anos de idade. Apresenta estrabismo
convergente, alternante, de grande ângulo desde os 9 meses. Trata-se de uma
endotropia infantil.
Efectuou toxina botulínica nos dois
rectos mediais na dose de 5 unidades.
No 3º dia de tratamento apresentava ptose discreta que teve resolução rápida e exotropia para perto e longe.
Actualmente no 2º mês de tratamento ainda apresenta exotropia intermitente.
CASO CLÍNICO 3
Doente do sexo feminino, 23 anos,
seguida na consulta de estrabismo por
paresia do III par esquerdo, que ocorreu
aos 3 anos de idade pós meningite. Efectuou diversas cirurgias incluindo transposição muscular sem resultado. Pode
observar-se ausência total de adução e
hipercontactura do recto lateral motivo
pelo qual se decidiu efectuar injecção de
toxina neste músculo.
Não foi possível obter paralisia total
do recto lateral com alinhamento ocular,
contudo houve diminuição do desvio tornando-se esteticamente mais aceitável.
CONCLUSÃO
O uso da toxina botulínica em Oftalmologia alterou a maneira de lidar com
alguns problemas oculares tais como os
desvios residuais, os estrabismos paréticos e os desvios em pacientes com contraindicação para anestesia geral sendo
toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 189
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
o seu uso nestas situações uma primeira
escolha
Apesar do preço da toxina e da
necessidade por vezes de reaplicações,
os resultados obtidos no tratamento de
outros tipos de estrabismo são comparáveis aos da cirurgia clássica com riscos
pequenos e efeitos laterais facilmente toleráveis, sendo portanto, o seu uso uma
boa alternativa terapêutica.
ophthalmology, the procedure, technic
injection, complications and side effects.
Comparison of the success rate of
classical surgery and the application of
BTX
Short review of some clinical cases
from the service of Pediatric Ophthalmology of CHVNG.
Nascer e Crescer 2007; 16(3): 188-190
BOTULINUM TOXIN: THERAPEUTIC APPLICATIONS IN PEDIATRIC
OPHTALMOLOGY
ABSTRACT
Description of the therapeutic indications of botulinum toxin in pediatric
BIBLIOGRAFIA
Edward G. Buckley. Chemodenervations
of Extraocular Muscles. In: Thomas D.
Duane. Clinical Ophthalmology, Lippincott Company, Vol. 6, Chap.89, p1-14.
toxina botulínica: aplicações terapêuticas na criança – mesa redonda
S 190
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
Emma Dawson, Ashwin Sainani and John
Lee. Does Botulinium toxin have a Role in
the Treatment of Secundary Strabismus.
Strabismus, 13, 2005, p71-73.
Keith W. McNeer, Elbert H. Magoon
and Allan B. Scott. Chemodenervation
Therapy: Technic and Indications. In:
A. Rosenbaum and A.Santiago. Clinical
Strabismus Management principles and
Surgical Technics, Saunders Company
1999, p423-432.
Jonhatan J. Dutton and Amy M. Fowler
Botulinium Toxin In Ophthalmology. Survey of Ophthalmology, 52, nº 1 Jan-Fev
2007, p13-27.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Pneumonia Aguda da Comunidade
de Evolução Complicada
Grupo Coordenador: Ana Ramos, Isabel Guerra, Telma Barbosa (HCMPia), Conceição Silva (CHPVarzim/VConde), Cristina Ferreira
(HSOliveira), Guilhermina Reis (HGSAntónio)
Colaboradores: Hugo Rodrigues, Cristiana Ribeiro (CHAMinho), Silvia Saraiva, Ana Aguiar (CHPVarzim/VConde), Maria João
Sampaio, Sandra Teixeira (CHVSousa), Ana Luisa Leite, Ana Isabel Pais, Lúcia Rodrgues (CHVNGaia), Nilza Ferreira, Arelo Manso
(CHVReal/PRégua), Rosa Barbosa, Lucília Vieira, Amélia Fernandes, Manuel Reis (HAmarante), Augusta Gonçalves, Nicole Silva
Liliana Pinheiro (HBraga), Carla Dias (HFamalicão), Cristina Ferreira (HGuimarães), Arménia Oliveira, Mafalda Sampaio, Otília Cunha
(HOAzeméis), Fátima Madruga (HOvar), Ana Paula Aguiar, Marco Pereira, Ana Castro, Sofia Aroso (HPHispano), Marta Rios, Maria
João Oliveira, Tiago Correia (HGSAntónio), Álvaro Sousa, Sara Figueiredo, Guimarães Dinis, Sofia Fernandes (HSTirso)
RESUMO
Introdução: A Pneumonia Adquirida na Comunidade (PAC) é uma das
causas principais de morbilidade e mortalidade em Pediatria, bem como um
motivo frequente de admissão hospitalar
desta faixa etária. A evolução complicada, nomeadamente com desenvolvimento de derrame pleural, empiema, pneumotórax, pneumatocelo e/ou atelectasia,
ocorre numa pequena minoria dos casos. De forma a minimizar a morbilidade
e mortalidade neste subgrupo de doentes, a abordagem deverá ser direccionada e reformulada em função das novas
modalidades terapêuticas, médicas ou
cirúrgicas.
O objectivo principal deste estudo
foi correlacionar a presença de factores
de risco, apresentação clínica e alterações laboratoriais associadas à evolução
complicada. Metodologia: Foi realizado
um estudo inter-hospitalar com análise
dos processos clínicos das crianças com
idades compreendidas entre 1 mês e 16
anos, internadas com o diagnóstico de
PAC complicada nos hospitais de Amarante, Braga, Pedro Hispano, Póvoa Varzim/Vila do Conde, Famalicão, Maria Pia,
Oliveira de Azeméis, Ovar, Padre Américo, Santo António, Santo Tirso, Viana do
Castelo, Vila Nova de Gaia e Vila Real,
entre 1 de Janeiro de 2000 e 31 de Dezembro de 2006. Definiu-se como PAC
complicada aquela que se apresentava
e/ou cursava com derrame pleural, em-
piema, pneumotórax, atelectasia, pneumatocelos ou abcesso pulmonar. Consideraram-se como critérios de exclusão
a presença de doença pulmonar crónica
e/ou internamento nos 30 dias prévios.
Cada hospital assegurou o preenchimento de um questionário, que incluía dados
relativos aos seguintes parâmetros: identificação, antecedentes pessoais, sintomas iniciais, exame físico à admissão,
exames complementares realizados,
tratamento médico e/ou cirúrgico efectuados, evolução e sequelas. A análise
estatística dos resultados foi efectuada
através do programa SPSS 13.0.
Resultados: De acordo com os critérios de inclusão obteve-se uma amostra final de 228 casos, com ligeiro predomínio do sexo masculino (53%) e idade
média de 5 anos e 4 meses (mínimo de
2 meses e máximo de 16 anos). Em relação aos factores de risco relevantes, 22%
das crianças frequentavam o infantário,
8% apresentavam pneumonias de repetição, 6% prematuridade e igualmente
6% más condições sócio-económicas. O
Plano Nacional de Vacinação estava actualizado na maioria das crianças (82%),
com vacina conjugada anti-pneumocócica completa em 24%. A sintomatologia
de apresentação mais frequente foi: febre (95%), tosse (83%), dispneia (33%),
dor torácica (30%), vómitos (26%) e dor
abdominal (23%). Metade das crianças
(49%) foram submetidas a antibioticoterapia prévia (amoxilina/clavulanato e
amoxicilina na sua maioria). À admissão, a temperatura média foi de 38.7ºC
(mínimo 36 e máximo 41), a frequência
respiratória média 40 cpm (mínimo 18 e
máximo 76) e a saturação de oxigénio
em ar ambiente média de 95% (mínimo
78 e máximo 100). Ao exame físico registou-se predominantemente: alteração do
estado geral (37%); tiragem (24% ligeira,
21% moderada e 5% grave); sons respiratórios diminuídos (79%); crepitações
(41%); alterações das vibrações vocais
(17%); broncospasmo (10%). Os resultados analíticos revelaram leucocitose
superior a 15.000/mm3 na maioria dos
casos (59%), anemia em 37% e proteína C reactiva (PCR) média de 17 mg/
dl. Não se verificou relação estatisticamente significativa entre febre elevada
(superior a 39ºC), leucocitose superior
a 15.000 e valor elevado de PCR. Ocorreu positividade na hemocultura em 8%
das crianças, sendo o pneumococus o
agente mais frequentemente isolado.
As alterações radiográficas que se verificaram à admissão foram: condensação
(78%), derrame (58%), infiltrado intersticial (11%), atelectasia (10%) e pneumatocelos (2%). A ecografia torácica foi
realizada na maioria dos casos (76%),
verificando-se derrame não septado em
55%, septado em 15% e ausência de
derrame em 6%. Efectuou-se TC torácica em 33% dos casos e as alterações
mais frequentemente encontradas foram
derrame não septado, derrame septado
estudos interinstitucionais – mesa redonda
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
S 191
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
e atelectasia. Oitenta e uma crianças
(36%) foram submetidas a toracocentese, constatando-se líquido pleural com
características de exsudado na sua
maioria e microbiológico positivo em 4%
das crianças (identificação do pneumococus em metade destas). A antibioterapia inicial mais frequentemente utilizada
foi amoxicilina/ácido clavulânico (36%),
seguida das cefalosporinas de 3ª geração (22%) e ampicilina (13%) e cefalosporinas de 2ª geração (13%). A duração
média do tratamento endovenoso foi de
12 dias. Houve necessidade de mudança de antibiótico em 53% dos casos, em
média ao 6º dia de internamento. As ra-
zões mais apontadas para tal foram clínicas e imagiológicas (15%) e unicamente clínicas (12%). Vinte e cinco (11%)
crianças foram submetidas a cirurgia, a
maioria das quais toracotomia. Apenas
5% das crianças foram submetidas a
broncoscopia e 4% realizaram provas de
função respiratória. A maioria das crianças (75%) evoluiu para a cura, enquanto
9% apresentaram sequelas. Ocorreu um
desfecho fatal em 1%.
Conclusões: 1) No período analisado verificou-se uma cobertura antipneumocócica conjugada relativamente
elevada; 2) Não se verificou relação estatisticamente significativa entre alguns
estudos interinstitucionais – mesa redonda
S 192
XIX reunião do hospital de crianças maria pia
dos sintomas chave, como febre elevada
e valor elevado de leucócitos ou PCR. 3)
Cerca de metade das crianças haviam
sido previamente submetidas a antibioticoterapia, aumentando assim a preocupação acerca das resistências crescentes
aos antibióticos e atitudes a adoptar no
sentido de as minorar; 4) A positividade
da hemocultura na casuística apresentada é sobreponível à da literatura de referência; 5) Apesar de ter sido impossível
analisar a serotipagem, o agente mais
frequentemente identificado é o pneumococus, que provavelmente será o agente
responsável pelo aparente crescendo de
PAC complicadas.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
Resumo das Comunicações Orais
LESÕES CUTÂNEAS EM RECÉM-NASCIDO
Anabela Bandeira, Susana Tavares, Paula Ferreira, Margarida Guedes
Serviço de Pediatria - Hospital Geral de Santo
António
Introdução: O lúpus neonatal é
uma doença auto-imune rara, que se
manifesta principalmente por lesões
cutâneas e/ou bloqueio cardíaco congénito. Apenas cerca de 1% dos recémnascidos de mulheres com autoanticorpos contra a família Ro/La apresentarão
sintomas, sendo estes, provavelmente,
os anticorpos implicados na patogénese
da doença. A maioria das manifestações
são transitórias mas, a lesão cardíaca
é irreversível, podendo causar morte in
utero.
Caso Clínico: Recém-nascido do
sexo feminino, filha de mãe com lúpus
eritematoso sistémico e anticorpos antiSSA positivos. Gravidez vigiada, sem
intercorrências. Ecocardiogramas fetais
sem alterações. Parto eutócico às 38
semanas. Somatometria adequada à
idade gestacional. Índice de Apgar 9/10.
Ao nascimento apresentava lesões cutâneas maculares anulares na face, principalmente nas regiões periocular, perioral
e couro cabeludo. Restante exame físico
sem alterações. O ecocardiograma e
ECG foram normais. O estudo analítico
realizado não revelou citopenias, hiperbilirrubinemia ou aumento das transaminases. Medicada com hidrocortisona tópica
em creme e pasta de zinco.
Orientada para as consultas de Cardiologia Pediátrica e Imunologia. Durante
o período de 5 meses de seguimento, verificou-se regressão das lesões cutâneas
e ausência de aparecimento de outras
manifestações da doença.
Discussão: O lúpus neonatal representa um desafio na identificação
das gravidezes em risco de desenvolver
doença fetal. A morbilidade e mortalidade dependem sobretudo do atingimento
cardíaco. A intervenção precoce e o tratamento da doença já estabelecida permitem melhorar o prognóstico, pelo que
o seu reconhecimento atempado é fundamental. O prognóstico a longo prazo é
uma incógnita, sabendo-se, no entanto,
que algumas crianças poderão vir a desenvolver doença autoimune.
DOENÇA DE CROHN: APRESENTAÇÃO CLÍNICA ATÍPICA
S. Saraiva, A. Aguiar, R. Martins, C. Silva,
C. Fernandes
Departamento de Pediatria - Centro Hospitalar
da Póvoa de Varzim e Vila do Conde
Departamento de Pediatria, Hospital Pedro
Hispano, Matosinhos
Introdução: A Doença de Crohn é
uma doença inflamatória crónica, segmentar, idiopática, que atinge qualquer
região do tubo digestivo desde a boca
até ao ânus. A idade de aparecimento é bimodal, ocorrendo entre o fim da
adolescência e os 20 anos de idade e
depois dos 40 anos. Sendo rara antes
dos 2 anos de idade, o pico de incidência máxima na pediatria é entre os 10-14
anos. A incidência é de 0.8-1.8/100000.
As manifestações clínicas dependem
da região afectada, grau de inflamação
e presença de complicações. O quadro
clínico mais frequente engloba dor abdominal, diarreia por vezes sanguinolenta,
emagrecimento, atraso de crescimento e
sintomas/sinais sistémicos. O diagnóstico resulta de achados clínicos/endoscópicos e histológicos.
Caso Clínico: Apresentamos o
caso de um adolescente de 12 anos,
sem antecedentes familiares ou pessoais patológicos, referenciado pelo seu
médico assistente para estudo de febre
prolongada de origem desconhecida. O
quadro clínico caracteriza-se por febre
moderada, vespertina, com um mês de
evolução associada a astenia, anorexia
e emagrecimento de 4 kg. Negava sintomas respiratórios, dor abdominal, diarreia ou perdas hemáticas. Ao exame físico objectivou-se palidez mucocutânea,
sem foco infeccioso identificado, sem
manifestações articulares, exantemáticas, hepatobiliares ou nefrourológicas.
Não apresentava atraso de crescimento.
Analiticamente destaca-se uma anemia
microcítica e hipocrómica, trombocitose,
aumento da velocidade de sedimentação
e proteína C reactiva, hipoalbuminemia e
pesquisa negativa de sangue oculto nas
fezes. Realizou vários exames complementares de diagnóstico no contexto de
febre prolongada de origem desconhecida, com resultados positivos para Anticorpo Anti-Saccharomyces C. (ASCA),
assim como na endoscopia baixa e alta,
demonstrando ulcerações duodenais e
lesões aftóides cólicas e ileíte, respectivamente. Estes achados são fortemente
sugestivos de Doença de Crohn pelo que
iniciou tratamento com prednisolona,
mezalazina e azatioprina, com desaparecimento posterior da febre.
Conclusões: A Doença de Crohn
deve constar no diagnóstico etiológico diferencial da febre prolongada de origem
desconhecida. Esta deve-se mais frequentemente a uma apresentação rara
de uma doença comum do que uma apresentação comum de uma doença rara.
Atendendo à cronicidade da doença, com potenciais repercussões mul-
resumo das comunicações orais
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
S 193
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
tissistêmicas, o diagnóstico atempado
deste caso poderá permitir um melhor
alívio sintomático, prevenção das complicações e manutenção da remissão da
doença.
Palavras-chave: Doença de Crohn, febre prolongada de origem desconhecida
A EXPERIÊNCIA DO SERVIÇO EM CIRURGIA LAPAROSCÓPICA
Osório A.; Bonet B.; Pinto J.; Cidade-Rodrigues J.; Sousa J.;Enes C.; Castro J.;
Leitão J.; Oliveira M.; Carvalho M.; Récaman M.
Serviço de Cirurgia Pediátrica do Hospital de
Crianças Maria Pia
Introdução: O impacto da laparoscopia em todos os tipos de cirurgia tem
sido revolucionário sobretudo no que diz
respeito à população adulta. No entanto,
o desenvolvimento de tecnologias adequadas, tornou este tipo de cirurgia uma
realidade bem presente no contexto da
cirurgia pediátrica.
Objectivo: Apresentar a experiência do Serviço de Cirurgia Pediátrica do
Hospital Central Especializado de Crianças Maria Pia na prática de cirurgia por
via laparoscópica.
Método: Revisão retrospectiva dos
casos operados por via laparoscópica
através da consulta do livro de Registos
Operatórios, entre Novembro de 1998 e
Abril de 2007.
Resultados: Foi realizado um total
de 320 cirurgias por via laparoscópica.
Os principais subgrupos corresponderam a: exploração de testículo impalpável
(n=119); fundoplicatura de Nissen (n=40);
colecistectomia (n=38); laqueação de vasos espermáticos (n=21); esplenectomia
(n=15); gonadectomia/biópsia gonadal
(n=14); ooforectomia/cistectomia (n=13);
laparoscopia exploradora (n=11); gastrobandoplastia (n=10); “outros” (n=35). 70%
dos procedimentos foram realizados em
doentes do sexo feminino e 30% em doentes do sexo masculino. A idade média
dos doentes operados por via laparoscópica foi 7 anos e a mediana 6 anos. Foi
necessária conversão para via aberta em
9 casos (taxa de conversão de 0,03%).
Conclusões: A cirurgia laparoscópica é actualmente também uma realidade
bem patente no nosso Serviço o que vai
de encontro com a tendência verificada
noutros estudos. Apresentam-se subgrupos de patologias bem definidos que são
preferencialmente abordados por esta via
enquanto que emergem outros aos quais
se vai recorrendo cada vez mais à intervenção laparoscópica.
PEDIATRIA DE AMBULATÓRIO – AVALIAÇÃO DA FUNÇÃO VISUAL DOS 0
AOS 5 ANOS
Isabel Guerra, Lara Lourenço, Carla Teixeira, Suzana Figueiredo, Fátima Pinto.
Unidade de Imunoalergologia do Hospital de
Crianças Maria Pia
Introdução: A ambliopia, principal
causa de défice visual irreversível entre
os 20 e os 70 anos, instala-se exclusivamente na infância, durante o período crítico do desenvolvimento visual (do nascimento até aos 6 anos). A precocidade do
diagnóstico constitui o principal determinante do sucesso terapêutico, que pode
atingir 100% dos casos. A avaliação da
função visual é o único método eficaz de
rastreio, devendo ser iniciada o mais precocemente possível. Os testes a utilizar
dependem não só da faixa etária, mas
também do estadio de desenvolvimento
de cada criança.
Objectivo: Os autores pretendem
avaliar a função visual de uma população
pediátrica.
Metodologia: Estudo transversal,
com base no protocolo de Rastreio Oftalmológico Infantil (ROI) em vigor na
Consulta de Pediatria de um Centro de
Saúde Urbano, aplicado às crianças
com idades entre os 0 e os 5 anos de
idade, no período compreendido entre
Fevereiro de 2006 e Agosto de 2007.
Foram excluídas as crianças com antecedentes de prematuridade, doença
sistémica com manifestação ocular e
seguimento em consulta especializada
de Oftalmologia. Foram analisados os
seguintes parâmetros: sexo e idade da
criança; colaboração na avaliação da
função visual; testes utilizados e respectivos resultados.
resumo das comunicações orais
S 194
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
Resultados: Foram estudadas 541
crianças, com idades compreendidas entre 1 mês e 5 anos e 11 meses (mediana de 4 anos), pertencendo 292 (54,0%)
ao sexo masculino. Vinte e oito crianças
(5,2%) não colaboraram no exame. Relativamente às 513 crianças que colaboraram na avaliação da função visual, foi
conseguido um resultado qualitativo (fixação/seguimento) em 58 (10,7%), sendo que todas apresentavam idade inferior
a 2 anos, e quantitativo em 455 (84,1%).
Neste último grupo, em 105 (19,4%) foi
utilizado um teste de olhar preferencial
– teste de Cardiff (realizado em binocularidade em 18 e em monocularidade
em 87 crianças); nas restantes 350 foram aplicadas escalas para avaliação da
acuidade visual de perto (teste Revised
Sheridam Gardiner em 220, teste de Rossano Weiss em 98 e teste de Símbolos
de Lea em 32 crianças) e de longe (teste
de Revised Sheridam Gardiner em 213,
teste de Pigassou em 102, teste de Símbolos de Lea em 32 e teste de E em 3
crianças).
Das 513 crianças submetidas a rastreio da função visual, 12,8% (66 crianças) apresentaram suspeita de alteração:
23 com diminuição da acuidade visual de
longe; 15 com diminuição da acuidade visual de perto; 9 com diminuição da acuidade visual avaliada com teste de Cardiff; 31 com diferença de acuidade visual
igual ou superior a duas décimas entre
os dois olhos com escalas para longe, 16
com escalas para perto e 12 com teste
de Cardiff; e 2 com fixação/seguimento
inadequado.
Conclusão: Nesta faixa etária,
quando a função visual é avaliada a prevalência de alterações situa-se ente 11 e
15%, tal como neste estudo. Actualmente, em Portugal as crianças são submetidas a rastreio visual apenas na idade
escolar. Neste é testada somente a acuidade visual de longe, com recurso a teste
de E a 6 metros de distância. Uma vez
que esta avaliação é realizada fora do
período crítico do desenvolvimento visual
não tem qualquer benefício na prevenção
da ambliopia. Este estudo demonstra que
é possível e necessária uma avaliação
mais precoce.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
QUISTO ARACNÓIDE – CASO CLÍNICO
Pinto AR; Soares P; Pinto F; Ribeiro I;
Teixeira J; Ramos C; Rodrigues MC.
Centro de Diagnóstico Pré-Natal e Serviço de
Neonatologia – Maternidade Júlio Dinis
Serviço de Neurocirurgia e Serviço de Neurorradiologia – Hospital Geral Santo António
Introdução: Os quistos aracnóides
são formações quísticas contendo líquido céfalo-raquidiano (LCR), localizadas
no espaço aracnóide ou subaracnóide.
Correspondem a 1% das lesões intracranianas ocupando espaço e na sua maioria são congénitas. Podem localizar-se
na linha média e podem ser unilaterais,
bilaterais ou múltiplos. Quase todos são
supra-tentoriais. Ocorrem com mais frequência no sexo masculino (2:1).
O prognóstico do recém-nascido é
dependente da localização dos quistos.
Apesar de poderem atingir grandes dimensões, as manifestações clínicas podem ser subtis e 60 a 80% das crianças
são assintomáticas.
Caso clínico: 16 anos, primigesta,
antecedentes pessoais irrelevantes, gravidez não vigiada até às 26 semanas.
A ecografia efectuada às 30 semanas mostrou imagem compatível com
quisto cerebral à direita com 50x24 mm
que desviava a linha média, aparentemente sem comunicação com o sistema
ventricular.
A RMN às 30 semanas revelou
provável quisto aracnóide associado a
hipoplasia da porção posterior do corpo
caloso ou estiramento da mesma provocado pelo quisto. Permaneceram dúvidas
sobre a existência de displasia cortical
parieto-occipital medial direita ou compressão parenquimatosa provocada pelo
quisto.
As serologias para infecções víricas
revelaram presença de anticorpos IgG e
IgM anti HSV-1. Sem outras alterações.
Foi efectuada amniocentese, que
revelou cariótipo normal (46, XY).
A ecocardiografia fetal foi normal.
A ventriculomegalia direita progrediu de ligeira (12 mm) para grave (16
mm) pelo que o parto foi realizado às 37
semanas, por cesariana.
A RMN pós-natal revelou formação
quística inter-hemisférica para-sagital
direita supra-tentorial, septada, provável
quisto aracnóide, com 60x40 mm, que
afastava os lobos frontais e os tálamos,
empurrava para baixo o III ventrículo
e determinava dilatação obstrutiva do
ventrículo lateral direito. Dúvida sobre
a existência de agenesia ou hipoplasia
parcial do corpo caloso. Sem anomalias
do desenvolvimento cortical ou displasias
associadas.
A criança tem actualmente 5 meses,
tem tido um desenvolvimento normal e
perímetro cefálico estável.
Discussão: O aspecto ecográfico
dos quistos aracnóides é o de uma tumefacção bem circunscrita, anecogénica,
uni ou multilocular.
Quando localizados na periferia
do cérebro podem ser confundidos com
quistos porencefálicos, mas ao contrário
destes, não comunicam com o sistema
ventricular. Se estiverem localizados na
linha média, é necessário fazer o diagnóstico diferencial com malformação artério-venosa. Podem apresentar-se com
ventriculomegalia, devido ao efeito de
massa.
A RMN é sobretudo importante no
diagnóstico de lesões associadas. Como
habitualmente o diagnóstico ecográfico
é tardio, a conduta é na maior parte das
vezes expectante, com vigilância da progressão da ventriculomegalia.
HÁBITOS DE EXPOSIÇÃO AO ECRÃ
DE UMA POPULAÇÃO PEDIÁTRICA /
ADOLESCENTE DE UMA ÀREA URBANA
Margarida Figueiredo, Catarina Sousa,
Carla Teixeira, Fátima Pinto
Centro de Saúde da Carvalhosa e Foz do Douro
Introdução: Durante os últimos
anos a preocupação com o excesso de
televisão e outros meios audiovisuais tem
sido crescente. A Associação Americana
de Pediatria recomenda, às crianças com
mais de 2 anos, menos de 2 horas diárias
de exposição ao ecrã (televisão, DVD,
consolas, computador) com programação de qualidade.
Objectivos: Avaliação dos hábitos
de exposição ao ecrã (televisão, consolas, computador e DVD) de uma popula-
ção saudável de crianças e adolescentes
residentes num centro urbano.
Material e métodos: Aplicação de
um questionário a pais de crianças e adolescentes seguidos na consulta de Pediatria do Centro de Saúde da Carvalhosa
de Outubro de 2006 a Abril de 2007.
Foram avaliados os seguintes parâmetros: sexo, grupo etário, idade com que
começaram a ver televisão, número de
televisões existentes em casa e os seus
locais, existência de televisão no local
das refeições, horário, número de horas
e tipo de programas que viam, existência
de TV por cabo, computador e internet,
consolas e DVD, tempo utilizado na realização de trabalhos de casa, prática de
desporto e leitura. Foi ainda avaliada a
existência de regras de utilização destes
meios audiovisuais.
Resultados: Foram realizados 106
inquéritos (51% do sexo masculino),
13,2% tinham menos de 6 anos, 57,5%
entre 6 a 10 anos, 21,7% entre 11 e 13
anos e 7,5% mais de 14 anos. Relativamente à idade com que começaram a ver
televisão apenas 22,6% tinha mais de 2
anos. Cerca de 7% tinha uma televisão
em casa e os restantes tinham duas ou
mais. Mais de metade (57,5%) das crianças tinha televisão no quarto, aproximadamente 64% tinha televisão no local
onde habitualmente eram feitas as refeições e destes 88% afirmava ter a televisão ligada durante as refeições. Apenas
28% via menos de uma hora diária de televisão durante a semana e durante o fim
de semana esta percentagem diminuiu
para 4,7%. O tempo total de exposição
ao ecrã era igual ou superior a 2 horas
em 54% dos inquiridos. O tipo de programas mais visto era desenhos animados
e telenovelas. Cinquenta por cento dos
inquiridos gastava menos de uma hora
por dia a ler e cerca de 34% não tinha hábitos de leitura, 24,5% não fazia desporto
e 49% dedicava menos de uma hora a
fazer os trabalhos de casa ou a estudar.
Em 40% das familias não existiam regras
de utilização de televisão, consolas, computador e DVD.
Conclusões: A televisão e outros
meio audiovisuais quando em excesso podem estar relacionados com mau
aproveitamento escolar, dificuldade de
resumo das comunicações orais
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
S 195
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
interacção com os pares, défice de atenção, obesidade, início precoce da actividade sexual, alterações do padrão de
sono, comportamentos agressivos, entre
outros. O tempo que as crianças e adolescentes “perdem” em frente ao ecrã
deveria ser alvo das preocupações de
pais e pediatras. Na população estudada
verificou-se excesso de tempo gasto em
frente ao ecrã em detrimento de outras
actividades como leitura, desporto ou
estudo. O conhecimento dos hábitos da
nossa população permite um reajuste da
informação, com especial reforço dos aspectos em falta.
ANEMIA FERROPÉNICA GRAVE: PROBLEMA DO PASSADO OU UMA REALIDADE ACTUAL?
Márcia Gonçalves, Susana Soares, Manuel Oliveira, Ana Fernandes, Marika Antunes, José Barbot.
Serviço de Pediatria, Centro Hospitalar do Alto
Ave, E.P.E., Guimarães
Serviço de Hematologia, Hospital de Crianças
Maria Pia, Porto
Nas sociedades industrializadas a
melhoria dos cuidados primários de saúde assim como das condições de vida
da população vieram a reduzir de forma
drástica a incidência de anemia ferropénica nos lactentes e 1ª infância, nomeadamente no que se refere às formas
graves. No entanto, a associação de um
conjunto de factores como relação precária com o sistema de saúde, carências
sociais ou susceptibilidade individual,
continua a condicionar o aparecimento
de formas graves de anemia num grupo
de crianças cuja identificação se torna
fundamental.
Os autores relatam o caso clínico
de dois irmãos gémeos de 9 meses, com
antecedentes de prematuridade de 36
semanas, oriundos de meio rural e com
difícil acesso aos cuidados de saúde primários. Aleitamento materno exclusivo
até aos 6 meses, sem suplementação
de ferro, com diversificação alimentar
incompleta e excesso de leite na dieta.
Admitidos no Serviço de Urgência por febre de duração difícil de precisar, tosse
escassa, recusa alimentar e gemido nos
dois dias anteriores à observação. Na
admissão apresentavam sinais de dificuldade respiratória marcada com instabilidade hemodinâmica, com tensão arterial
imensurável. Os exames efectuados revelaram anemia arregenerativa microcítica hipocrómica grave (Hgb 3.9 / 4.9
g/dl; VGM 52.2 / 50.9 fl; HCM 12.5 / 12.8
pg; RDW 23.2 / 21.1%; reticulócitos 1.37
/ 1.01%) com indicadores bioquímicos
de ferropenia (Saturação da transferrina
0.32 / 0.36%; ferritina <18.60 ng/ml). No
restante quadro hematológico de salientar trombocitose (413000 / 439000 plaq/
uL) e leucocitose ligeiras com predomínio
de neutrófilos (11700 / 12300 N/uL). No
esfregaço de sangue periférico observada anisocitose, anisocromia e alguns
eritrócitos fragmentados. Considerando a
gravidade do quadro hematológico foram
excluídas outras etiologias, nomeadamente síndromes talassémicos. A PCR
era de 20.4 / 37.8 mg/L; na radiografia do
tórax observado infiltrado para-hilar bilateral e hipotransparência no vértice direito. Foi isolado Haemophilus influenzae na
hemocultura do 1º gémeo, apresentando
também IgM e IgG positivas para VHH6
e apenas IgM para o HSV 1 e 2. Ambos
foram transfundidos de urgência com
concentrado eritrocitário em simultâneo
com instituição de terapêutica antibiótica
(ceftriaxone) e oxigenoterapia. Verificada
evolução favorável, com alta do internamento ao 10ºdia, medicados com ferro
oral (2 mg/kg/dia). Seis meses após, recuperação franca com hemoglobina 12.0
/ 12.2 g/dl, VGM 68.1 / 71 fl, CHM 23.1
/24.2 pg, saturação da transferrina 15.7 /
4.1%, ferritina 33.2 / 42.7 ng/ml.
Com o caso descrito pretende-se
alertar para o facto de ainda ocorrerem
anemias ferropénicas graves nos lactentes e 1ª infância, susceptíveis não só de
causar sequelas importantes como de
colocar em risco a própria vida, em intercorrências infecciosas concomitantes.
Esta é pois uma problemática que perdura em crianças com factores de risco,
sendo essencial a sua detecção e correcção precoces.
Palavras-chave: Ferropenia, anemia, microcitose, hipocromia.
resumo das comunicações orais
S 196
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
DEFEITOS CONGÉNITOS DA N-GLICOSILAÇÃO – ESTUDO RETROSPECTIVO DE 7 DOENTES
Patrícia Nascimento, Clara Barbot, Dulce
Quelhas, Esmeralda Martins
Serviço de Pediatria e Serviço de Neurologia
do Hospital de Crianças Maria Pia
Introdução: Os Defeitos Congénitos da Glicosilação (CDG’s) são um grupo de doenças genéticas, caracterizado
por alterações na ligação ou processamento dos oligossacaridos, N e O glicanos, que são substâncias fundamentais
no metabolismo, estrutura e função das
glicoproteinas.
As glicoproteinas desempenham
um papel essencial no reconhecimento,
adesão e migração celular, na defesa do
organismo e no metabolismo energético
a sua alteração leva ao aparecimento de
doenças de atingimento multissistémico
com clínica heterogénia. A maioria das
doenças descritas no ser humano são
defeitos na N-glicosilação. O marcador
utilizado no diagnóstico neste grupo de
patologias é o doseamento da transferrina do paciente em carbonidratos (CDT).
Objectivos: Caracterização clínica, bioquímica e neurorradiológica dos
doentes com defeitos congénitos da Nglicosilação em seguimento na consulta de Doenças Metabólicas do Hospital
Maria Pia.
Material e Métodos: Para realização do trabalho os autores procederam à
consulta dos processos clínicos de doentes com defeitos congénitos da N-glicosilação. Em todos os doentes foi avaliada
a história familiar, idade de início dos sintomas, forma de apresentação, idade de
diagnóstico e evolução. Foi também feito
um registo das alterações bioquímicas e
imagiológicas registadas.
Resultados: Sete doentes, 3 do
sexo masculino, com idades compreendidas entre os 2 e 20 anos de idade. Cinco
casos tem CDG I (3 tipo Ia e 2 tipo Ix)
e 2 tem CDG tipo II. Em todos os casos
a história familiar é irrelevante e todos
apresentam sintomas desde os primeiros
meses de vida embora o diagnóstico só
tenha sido efectuado entre os 5 meses e
os 13 anos de idade. Todos apresentam
manifestações com envolvimento do neu-
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
rológico, 5/7 apresentam má progressão
estaturo-ponderal, microcefalia e alterações esqueléticas. Metade possui sinais
de envolvimento hepático e em 2/7 foi
constatado envolvimento cardíaco. 5/7
apresentam alterações características na
RMN cerebral, sendo que estas alterações estão presentes em todas as crianças com CDG Ia. Todos se mantiveram
estáveis durante a evolução.
Conclusões: Registamos um predomínio de doentes com o tipo I (5/7) o
que está de acordo com o referido na
literatura. As alterações no exame neurológico e na RMN cerebral são também
mais específicas neste grupo.
Nesta série todos os doentes apresentação um envolvimento multissistémico embora de gravidade variável.
Devemos pensar neste grupo de
patologias em situações de clínica não
explicada, sobretudo se houver doença
neurológica associada.
HIPOGLICEMIAS NEONATAIS
Gisela Silva, Teresa Guimarães, Alzira
Sarmento, Carlos Duarte, Esmeralda
Martins
Serviço de Pediatria e UCI do Hospital de
Crianças Maria Pia
Introdução: A hipoglicemia neonatal representa um defeito numa ou
mais das complexas interacções que
normalmente integram a homeostasia da
glicose. Este processo é particularmente
importante no recém-nascido, no qual se
verifica uma transição abrupta da vida
fetal, caracterizada pela dependência
do transporte transplacentário de glicose, para o meio extra-uterino, em que
a normoglicemia é mantida através de
mecanismos na dependência do Sistema
Nervoso Autónomo.
Objectivo: O presente trabalho
consiste num estudo retrospectivo sobre
a etiologia da hipoglicemia no período
neonatal.
Material e Métodos: Foram revistos
um total 22 casos de recém-nascidos, admitidos na UCI do Hospital Maria Pia no
período compreendido entre 1 de Janeiro
de 2000 e 31 de Dezembro de 2006, com
diagnóstico de hipoglicemia (glicemia
<45mg/dl ou <2.6mmol/L). Dos 22 casos
foram excluídos 2 por inexistência de
documentação clínica disponível e ainda
os recém-nascidos com baixo peso, prematuros, com critérios de sépsis, asfixia
perinatal e hipogalactia materna, correspondendo a um total de 10 casos.
Os parâmetros de avaliação considerados foram: sexo, idade de detecção
e valor da hipoglicemia, história obstétrica e pré-natal relevante, sintomas de
apresentação, dados dos exames objectivo (hepatomegalia, hiperpigmentação
e hipogonadismo), investigação efectuada, aporte de glicose e diagnóstico
definitivo.
Resultados: Dos 10 casos que
preenchiam os critérios de inclusão, 50%
eram do sexo feminino. A idade de detecção de hipoglicemia variou entre o 1º e
21º dia de vida, com valores de glicemia
compreendidos entre 0 e 39mg/dl. No
que se refere aos sintomas de apresentação, 4 dos casos foram assintomáticos,
5 apresentaram-se com hipotonia e/ou hiporreactividade, 2 com recusa alimentar
e um outro com convulsão. Em termos de
exame objectivo, nenhum dos lactentes
apresentava hepatomegalia, hiperpigmentação ou hipogonadismo.
Relativamente aos exames complementares de diagnóstico efectuados, em
todos os casos foi realizado hemograma,
bioquímica, análises de função hepática,
gasimetria e tira-teste de urina; procedeu-se aos doseamentos de insulina em
6/10; de cortisol, ACTH e hormona do
crescimento em metade dos casos; 6/10
efectuaram ecografia abdominal e em
9/10 procedeu-se ao estudo metabólico.
Para cada caso foi calculado o aporte de glicose ev necessário para reverter
a hipoglicemia.
Foram estabelecidos como diagnósticos definitivos: hiperinsulinismo congénito (5/10) 2 na forma transitória (um
dos quais correspondendo ao Síndrome
de Beckwith-Wiedmann) e 3 na forma
persistente; hipogliemia transitória (2/10)
e doenças do metabolismo (3/10).
Conclusões: A hipoglicemia é um
problema comum no período neonatal.
Trata-se de uma situação grave, cuja detecção e correcção precoces são fundamentais a fim de evitar eventuais seque-
las neurológicas. O prognóstico a longo
prazo dependerá do respectivo diagnóstico etiológico e da terapêutica adequada.
No nosso estudo, à semelhança do
que é descrito na literatura, a maioria dos
casos de hipoglicemia correspondem a
hiperinsulinismos congénitos. O facto de
2º diagnóstico mais frequente serem as
alterações metabólicas poderá ser explicado por este ser um Centro de referência neste tipo de patologia.
SÍNDROME DE OPITZ-FRIAS: CASO
CLÍNICO
Gisela Silva, Teresa Guimarães, Sizenando Cunha, Céu Rocha Mota, Ana Ramos
Serviço de Pediatria do Hospital de Crianças
Maria Pia
O Síndrome de Opitz-Frias é um
síndrome polimalformativo caracterizado
por anomalias funcionais, crânio-faciais e
genitais, com a maioria dos defeitos localizados em estruturas da linha média.
As duas formas de hereditariedade são
ligadas ao Cr. X ou de modo autossómico
dominante ligado ao Cr.22.
Apresenta-se o caso clínico de um
lactente do sexo masculino, com 2 meses
de idade, admitido neste hospital, para
correcção de fenda bilateral do palato primária e secundária completa.
Antecedentes familiares: Mãe com
fácies dismórfica (hipertelorismo) e outros
familiares com defeitos da linha média.
Ao exame objectivo, apresentava fácies dismórfica com hipertelorismo, fenda
do palato bilateral e pavilhões auriculares
malformados, sopro cardíaco, hérnia umbilical, hipospádia peniana e sem alterações ao exame neurológico.
Foi submetido a queiloplastia bilateral, com necessidade de traqueostomia
urgente no pós-operatório por edema
exuberante das pregas ariepiglóticas e
da região das cordas vocais. O estudo
endoscópico posterior da árvore traqueobrônquica revelou: “Fenda palatina completa; aritenóides e pregas ariepiglóticas
com boa mobilidade; sem evidência de
estenose subglótica”.
Foram constatadas dificuldades na
alimentação com repercussão na evolução estatoponderal, com necessidade
resumo das comunicações orais
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
S 197
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
transitória de alimentação por sonda nasogástrica.
Teve alta hospitalar aos ≈ 6 meses,
com traqueostomia, apresentando boa
evolução estatoponderal.
Este caso reflecte a importância da
história familiar na orientação e aconselhamento genético.
PANENCEFALITE
ESCLEROSANTE
SUBAGUDA: UMA DOENÇA RARA
AINDA ACTUAL
Miguel Fonte, Gabriel JP, Cândido C;
Trindade A; Silva MR; Chorão R; Dias F
Serviços Pediatria e Neurologia, Centro Hospitalar de Trás-os-Montes/Alto Douro
Serviço Neurologia, Hospital de Crianças Maria Pia
Introdução: A panencefalite esclerosante subaguda (PEES) é uma doença
degenerativa do SNC devido a infecção
persistente por uma forma mutante do vírus do sarampo. É mais frequente em doentes que contraíram sarampo antes dos
2 anos de idade. A doença manifesta-se
na maioria dos casos na adolescência e
os primeiros sinais são alterações cognitivas e do comportamento, com diminuição do rendimento escolar; segue-se um
comprometimento neurológico progressivo, com demência e atingimento multifocal do SNC. O tratamento é decepcionante e o prognóstico fatal dentro de 1-3
anos em 95% dos casos.
Caso Clínico: Apresenta-se o caso
de um adolescente de 13 anos, com antecedentes pessoais de sarampo aos
7 meses de idade. Aos 12 anos iniciou
deterioração cognitiva, com perturbações mnésicas ligeiras e mau aproveitamento escolar. Posteriormente, surgiram abalos corporais, desequilíbrio com
quedas bruscas e adopção de posturas
anómalas sustentadas, que se foram
agravando nos três meses anteriores
à admissão. Ao exame objectivo apresentava deterioração mental, disartria
espástica, síndrome piramidal irritativo
bilateral e deficitário à esquerda, ataxia
cerebelosa, mioclonias segmentares
das mãos e axiais (com perda do tónus)
e distonia generalizada de predomínio
nos membros inferiores; a marcha era
impossível sem apoio. Foram realizados
os seguintes exames: TAC e RMN cerebral, que não evidenciaram alterações;
EEG, sendo que num único registo de
vídeo-EEG se verificaram alterações
patognomónicas: surtos generalizados
de ondas lentas delta com duração de
0,5 a 2 segundos, periódicas (repetidas
a intervalos de 1,5 a 5 segundos), com
registo concomitante de abalos mioclónicos; exame LCR, que demonstrou
anticorpos IgG anti-sarampo positivos e
presença de bandas oligoclonais. Os resultados obtidos confirmaram o diagnóstico de PEES; iniciou isoprinosina oral e
discute-se o tratamento com interferão
alfa intratecal ou alternativas a esta terapêutica.
Conclusão: A PEES é uma entidade ainda não erradicada, mesmo nos países em que a vacinação anti-sarampo é
universal. Deve ter-se em conta esta possibilidade no diagnóstico diferencial da
criança ou adolescente com alterações
de comportamento e declínio cognitivo.
CORNELIA DE LANGE – A PROPÓSITO DE UM CASO
Ana Luísa Leite, Vinhas da Silva, Marta
Vila Real, Fátima Santos
Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia
Introdução: O Síndrome Cornelia
de Lange (SCL) é um síndrome polimalformativo raro, de etiologia indeterminada, caracterizado por uma aparência
facial peculiar, atraso de crescimento pré
ou pós-natal, atraso psicomotor grave,
alterações de comportamento e malformações major associadas (cardíacas,
gastrointestinais e musculoesqueléticas).
A maioria dos casos são esporádicos, estando descritas situações de
transmissão autossómica dominante.
O seu diagnóstico é fundamentalmente clínico.
No SCL foram relatadas alterações
cerebrais do tipo hipóxico-isquémico e
alterações por disgenesia congénita cerebral, ajudando a compreender o atraso
psicomotor característico.
O diagnóstico precoce mantém-se o
grande desafio, possibilitando uma intervenção multidisciplinar eficaz.
resumo das comunicações orais
S 198
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
Caso Clínico: Lactente do sexo feminino, com antecedentes de consanguinidade, hidrâmnios e internamento no 1º
dia de vida por episódio de cianose com
alimentação.
Orientada para a consulta de Neuropediatria aos 6 meses por atraso de
desenvolvimento psicomotor. À data da
consulta foi constatado fácies sindrómico, microcefalia, movimentos erráticos
do olhar, hipotonia axial marcada sem
controlo cefálico e com postura em batráquio, movimentos descoordenados dos
membros superiores e verificada má evolução estaturo-ponderal, alterações das
extremidades e hirsutismo.
Do estudo efectuado salienta-se
RMN cerebral que evidenciou “…atrofia
do tronco, sobretudo da protuberância e
pedúnculos cerebelosos médios, sendo
o IV ventrículo algo proeminente, associada a atraso da mielinização supratentorial”. O estudo analítico não revelou
alterações significativas. Efectuou estudo
metabólico com hiperlactacidémia ligeira,
aguardando biópsia muscular. Os CDT´s
e cariótipo foram normais. Ecografia abdominal, renopélvica e ecocardiograma
sem alterações. A avaliação gastrointestinal evidenciou refluxo gastroesofágico. O
exame oftalmológico foi normal e aguarda consulta de ORL.
Pensamos tratar-se de um síndrome polimalformativo, compatível com
Cornélia de Lange do tipo I (clássico),
com evidências de disgenesia cerebral
congénita grave.
Conclusão: O diagnóstico de SCL
é essencialmente clínico, sendo importante o seu reconhecimento precoce pelo
pediatra, para melhor orientação médica e suporte interdisciplinar, bem como
para intervir a nível do aconselhamento
familiar. Nestes doentes além do fenótipo
muito sugestivo, a presença de refluxo
gastroesofágico exuberante e refractário
às medidas terapêuticas deve alertar para
o diagnóstico. A existência de alterações
morfológicas a nível central pode sentenciar o grave atraso desenvolvimento e
anomalias neurológicas que pode surgir
nestas crianças.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
SÍNDROME
LINFOPROLIFERATIVO
AUTO-IMUNE: DA SUSPEITA CLÍNICA
AO DIAGNÓSTICO MOLECULAR
Iris Maia, Ana Espirito Santo, Joana Rios,
Marika Bini-Antunes, Julia Vasconcelos,
Margarida Lima, José Barbot
Serviço de Hematologia – Hospital de Crianças Maria Pia
Serviço de Pediatria – Centro Hospitalar do
Alto Minho
Serviço de Imunologia e Serviço de Hematologia – Hospital Geral Santo António
O Síndrome Linfoproliferativo Autoimune (SLAI) é uma entidade clínica rara
de descrição recente. A sua hereditariedade é dominante e a evolução crónica.
Apoptose linfocitária anormal, linfoproliferação não maligna e fenómenos de
auto-imunidade constituem as vertentes
principais da doença.
Criança com 3 anos de idade referenciada por pancitopenia grave e flutuante (Hb 7.7 g/dL, reticulócitos 411000/
uL, neutrófilos 200/uL, plaquetas 46000/
uL) associada a esplenomegalia maciça
desde os primeiros meses de vida. Nos
antecedentes familiares havia referência
a casos sobreponíveis em 3 gerações, alguns dos quais objecto de esplenectomia
sem esclarecimento diagnóstico. O estudo analítico (sangue periférico e medula
óssea) revelava de forma inequívoca o
carácter periférico das citopenias. Apenas
a nível dos neutrófilos foi possível documentar uma etiologia auto-imune. De salientar hipergamaglobulinemia acentuada
e doseamento de vitamina B12 elevado.
O esclarecimento diagnóstico foi possível
mediante a imunofenotipagem de sangue periférico que revelou a presença
de uma população de 6% de linfócitos T
αβ+CD3+CD4-CD8-. O doseamento elevado do Fas-ligando conduziu ao estudo
do gene Fas onde foi documentada uma
mutação missense no exão 9 (R234L). A
mesma mutação foi encontrada na mãe
esplenectomizada aos 15 anos de idade.
Em contraste com a gravidade das citopenias e da esplenomegalia, a criança
apresenta um bom desenvolvimento estaturo-ponderal e psicomotor, na ausência de morbilidade significativa.
SÍNDROME DE WILLIAMS: REVISÃO
DA CASUÍSTICA DA UNIDADE DE
CONSULTA DO IGM
Mafalda Barbosa, Cristina Dias, Adriana
Sampaio, Sílvia Álvares, Marília Loureiro, Óscar Gonçalves, Jorge Pinto-Basto,
Margarida Reis-Lima.
Unidade de Consulta - Instituto de Genética
Médica, Serviço de Cardiologia Pediátrica Hospital Maria Pia e Centro de Investigação
em Psicologia - Universidade do Minho
Introdução e Objectivos: O Síndrome de Williams (SW; OMIM: #194050,
prevalência: 13,3/100.000) caracteriza-se
por face dismórfica, doença cardiovascular, atraso mental, comportamento característico, alterações do tecido conjuntivo,
atraso do crescimento e anomalias endócrinas. Em 99% dos doentes resulta
da deleção submicroscópica da região
7q11.23, que pode ser evidenciada por
técnica de FISH de citogenética molecular. Esta alteração é habitualmente de
novo, embora já tenham sido descritos
casos de indivíduos afectados com descendência.
Este trabalho tem como objectivo a
caracterização clínica dos doentes com
SW seguidos na Unidade de Consulta do
IGM e comparação com a taxa de complicações descrita na literatura.
Material e Métodos: Foi efectuada a auditoria retrospectiva de 26
processos médicos de doentes cujo
diagnóstico clínico foi confirmado por
citogenética molecular, seguidos em
consulta de Genética Médica no IGM.
Analisaram-se as seguintes variáveis:
motivo de referenciação à consulta de
Genética; sexo; idade na primeira consulta de Genética e ao diagnóstico de
SW; dismorfia facial; desenvolvimento
psicomotor; alteração do tecido conjuntivo; cardiopatia; alterações oftalmológicas; anomalias dentárias; crescimento
estaturo-ponderal; perímetro cefálico;
anomalias do foro ORL; anomalias ortopédicas; alterações do comportamento;
função tiroidea: metabolismo do cálcio
e atingimento de outros aparelhos/sistemas. Foi também revista a realização de
Diagnóstico Pré-Natal (DPN) em gestações subsequentes dos progenitores do
caso índex.
Resultados: O estudo incluiu 26
doentes (13 sexo masculino e 13 do sexo
feminino). O motivo de referenciação
mais comum foi a suspeita de SW. A idade média na primeira consulta de Genética foi de 6 anos e a idade ao diagnóstico
foi de 7 anos e 2 meses. Todos os indivíduos afectados eram casos esporádicos
na família.
Todos os doentes apresentavam
dismorfia facial e atraso mental. As outras manifestações clínicas incluíam: alteração do tecido conjuntivo: 17 (65,4%);
cardiopatia: 16 (61,5%); problemas oftalmológicos: 13 (50,0%), anomalias dentárias: 9 (34,6%); atraso do crescimento: 9
(34,6%); microcefalia: 6 (23.1%); doença
do foro ORL: 6 (23,1%); doença ortopédica: 6 (23,1%); alterações do comportamento: 5 (19,2%); hipertiroidismo: 1
(3,8%); hipocalcemia: 1 (3,8%); outras:
7 (26,9%). Globalmente estes resultados
são comparáveis com os descritos na literatura. Foram realizados 3 DPN sendo
que, em nenhum deles o feto era afectado de SW.
Conclusões: O SW é uma doença
multissistémica que necessita de uma
abordagem multidisciplinar para intervenção. Salienta-se a elevada prevalência
de atraso mental, cardiopatia, alterações
do tecido conjuntivo e problemas oftalmológicos. A maior morbilidade verificou-se
nos doentes com obstáculo ao coração
esquerdo. Ao contrário do que é habitualmente descrito na literatura, a taxa de
alterações da homeostasia do cálcio e
da função tiroidea é rara. Esta série de
doentes irá ser estudada no futuro a nível
molecular para caracterização da deleção e melhor esclarecimento da correlação genótipo-fenótipo. De destacar a
importância de aconselhamento genético
adequado e a possibilidade de se oferecer DPN específico.
Palavras-chave: Síndrome de
Williams, FISH 7, cardiopatia, atraso
mental
resumo das comunicações orais
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
S 199
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
TOXINA BOTULÍNICA NA CRIANÇA: 5
ANOS DE EXPERIÊNCIA
Joana Damásio, Helena Reis Costa, Marina Magalhães.
Serviço de Neurologia e Serviço de Medicina
Física e de Reabilitação do Hospital Geral de
Santo António
A Toxina Botulínica (BoNT) é uma
neurotoxina utilizada, desde há mais de
20 anos, com finalidades clínicas; apesar
disso, a sua utilização na criança está
longe de estar estandardizada. As dificuldades encontradas no estabelecimento
de consensos e “guidelines” são explicadas, pelo menos em parte, pela grande
heterogeneidade da patologia envolvida,
da etiologia, dos sinais clínicos e, pelo
envolvimento, dos diferentes segmentos
corporais.
A experiência diz respeito a um total
de 326 sessões terapêuticas efectuadas
a 77 crianças, com idades actuais inferiores a 18 anos (média 11± 4,7, extremos
4 -18 anos), tratadas com BoNT tipo A no
Serviço de Neurologia do HGSA nos últimos 5 anos. A grande maioria das crianças (71,4%) mantém-se actualmente em
tratamento.
Sessenta das 77 (78%) crianças
apresentavam uma doença do movimento espástica, sendo a Paralisia Cerebral
o diagnóstico mais frequente (90%). No
grupo das crianças espásticas todas beneficiaram com o tratamento, em 85%
delas o benefício teve repercussão funcional. O membro inferior foi o segmento mais frequentemente infiltrado neste
grupo de doentes (92% membro inferior
versus 28% membro superior). A BoNT
foi utilizada como abordagem terapêutica integrada com outras formas de intervenção nomeadamente a fisioterapia
na quase totalidade dos doentes; foram
prescritas ortóteses, gessos ou splitings
em mais de 50%; foram usados concomitantemente antiespásticos orais em 19
doentes; 13 doentes foram submetidos a
intervenções cirúrgicas (9 das quais prévias ao inicio do tratamento com toxina)
e foi colocada uma bomba de baclofeno
intra-tecal num doente.
A distonia foi em 10 dos 77 doentes o sinal motor dominante. Um padrão
misto (espástico e distónico) foi identifi-
cado em 7 doentes. A identificação da
distonia como sinal motor condicionou
o tipo de terapêuticas adjuvantes utilizadas. A fisioterapia e a cirurgia foram
preteridas a favor das terapêuticas farmacológicas tais como baclofeno oral
(n=8 doentes), levodopa (n=8 doentes)
e trihexifenidilo (n=9 doentes). Dois dos
doentes foram propostos para colocação de bomba de baclofeno intratecal.
No grupo dos doentes distónicos foram
infiltrados em praticamente igual percentagem os membros superiores e os
inferiores (47% versus 65%) e nos restantes 24% dos doentes foram infiltrados músculos cervicais. Dos 17 doentes
distónicos tratados, 16 apresentaram
benefício com a BoNT, 15 (94%) com
repercussão funcional.
No total das 326 sessões foram registados apenas efeitos laterais locais.
A fraqueza excessiva foi o efeito lateral
mais frequente tendo sido registado em
16 ocasiões diferentes.
A nossa experiência permite-nos
afirmar que o tratamento com BoNT é
uma intervenção segura e eficaz no tratamento dos diferentes tipos de doenças
do movimento das crianças. Salientamos a importância da correcta identificação do tipo de alteração do movimento,
nomeadamente da distinção entre espasticidade e distonia para programar a
integração dos diferentes tipos de terapêutica.
GASTROBANDOPLASTIA NO ADOLESCENTE COM OBESIDADE MÓRBIDA
Berta Bonet, Helena Ferreira, Fernando
Pereira, Ferreira de Sousa, Carlos Enes
Serviços de Cirurgia Pediátrica e Pediatria do
Hospital de Crianças Maria Pia
Introdução: A obesidade mórbida
atingiu proporções epidémicas e é um
dos grandes problemas de saúde nos países desenvolvidos. A intervenção precoce no adolescente com obesidade mórbida pode minimizar as comorbilidades
associadas à obesidade, evitar a mortalidade prematura, melhorar a qualidade de
vida e prevenir as doenças relacionadas
com o excesso de peso na vida adulta.
resumo das comunicações orais
S 200
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
O objectivo deste estudo foi avaliar os
resultados da cirurgia da banda gástrica
em crianças e adolescentes obesos operados no nosso centro.
Material e Métodos: Os autores
efectuaram um estudo retrospectivo de
10 adolescentes (7 do sexo feminino, 3
do sexo masculino) seguidos na consulta, com índice de massa corporal (IMC)
≥ 40 kg/m2, submetidos a gastrobandoplastia durante o período de Julho de
2001 a Setembro de 2007, após avaliação médica global, psicológica, nutricional e insucesso de perda de peso após
um período mínimo de 6 meses de terapia conservadora organizada. O estudo
a efectuar, os critérios para cirurgia, o
seguimento e os procedimentos a seguir
nas eventuais complicações estão definidos no protocolo da consulta multidisciplinar de obesidade mórbida / cirurgia
bariátrica.
Resultados: Foram submetidos a
gastrobandoplastia 10 adolescentes com
uma idade média de 16 anos. À data da
cirurgia, IMC médio de 45,5 Kg/m2 (mínimo 41,39-máximo 48,9) e média de
excesso de peso para a idade de 64,6
Kg (mínimo 50-máximo 80). As comorbilidades graves associadas: esteatose
hepática 6, dislipidemia 5, HTA 5, alterações do sono 4, hiperinsulinismo 4, hiperuricemia 4, amenorreia 3, depressão 1,
osteoartropatia 1. O tempo médio de cirurgia foi de 90 minutos, com um período
de internamento de 1 a 3 dias. Não houve
complicações no pós-operatório imediato. O tempo médio de seguimento é de
22 meses, verificando-se uma diminuição do IMC e uma melhoria significativa
das comorbilidades associadas. Apenas
1 doente necessitou de alargar completamente a banda por tosse persistente e
vómitos.
Conclusões: A gastrobandoplastia é uma boa opção para o tratamento
dos adolescentes com obesidade mórbida e suas comorbilidades associadas,
com um curto período de internamento,
com poucas complicações associadas,
com uma rápida e encorajadora perda de
peso inicial e com uma franca melhoria
das comorbilidades associadas.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
INFECÇÃO POR STAPHYLOCOCCUS
AUREUS METICILINO-RESISTENTES,
UMA AMEAÇA
Soraia Tomé, Maria João Oliveira, Helena
Ramos, Margarida Guedes.
Serviço de Pediatria e Serviço de Microbiologia do Hospital Geral de Santo António
Introdução: O Staphylococcus
aureus (SA) é um coco gram-positivo
responsável por um grande número de
infecções em idade pediátrica. A sua resistência à penicilina é há muito conhecida e desde a década de 60 a resistência à meticilina tem vindo a ser cada vez
mais frequente, nomeadamente entre as
infecções nosocomiais. Vários trabalhos
têm alertado para o Staphylococcus aureus meticilino-resistentes como agente
emergente implicado em infecções da
comunidade.
Material e Métodos: Avaliação do
padrão de resistência dos SA isolados
em doentes com idade pediátrica internados no HGSA de Jan/04 a Dez/06.
Identificação de todas as culturas com
isolamento de SA neste período, consulta
dos respectivos processos clínicos para
caracterização das infecções.
Resultados: Foram obtidos 19 isolamentos culturais (SA) no período referido. Destes, 6 em hemocultura, 3 em
exsudado do canal auditivo, 3 em pontas
de cateter, 2 em exsudado de fistulas de
osteomielite e os restantes em secreções
respiratórias, exsudado umbilical, supuração de abcesso, urina e líquor.
Nenhum dos SA isolados era resistente à meticilina. Apresentavam resistência à penicilina 95%, à eritromicina
10% e à gentamicina 5%. Todos eram
sensíveis à clindamicina, cotrimoxazol,
rifampicina, vancomicina, toberamicina e
teicoplanina.
Em 4 dos casos o agente foi considerado contaminante. Caracterizaram-se
as 15 infecções por SA correspondentes
a 13 doentes (7♂,6♀) com idades compreendidas entre 6 dias e 17 anos (média 5anos; mediana 3anos). As infecções
foram classificadas como adquiridas na
comunidade em 47% dos casos, como
nosocomiais em 47% e como colonização em 6%. Os doentes com SA resistentes à eritromicina e à gentamicina tinham
infecção nosocomial e a doente com SA
sensível à penicilina tinha uma infecção
adquirida na comunidade.
Conclusão: Ao contrário do que
esperarávamos, não encontramos SA
meticilino-resistentes. No entanto, os autores continuam a considerar importante o conhecimento da epidemiologia de
cada área para que cada centro possa
conhecer a evolução da susceptibilidade
deste agente nas infecções da sua comunidade.
Palavras-chave: Staphylococcus
aureus, meticilino-resistentes, infecções
nosocomiais/da comunidade.
ACANTOSE NIGRICANS NUMA CRIANÇA COM DÉFICE DO TRANSPORTADOR DA CREATINA. UMA ASSOCIAÇÃO BENIGNA?
Diana Moreira, Ana Garrido, Helena Santos, Susana Aires Pereira, Carla Valongo,
Jorge Sales Marques
Serviço de Pediatria do Centro Hospitalar Vila
Nova de Gaia/Espinho
Instituto de Genética Médica Jacinto de Magalhães
Introdução: A acantose nigricans
(AN) é um espessamento aveludado e difuso com hiperpigmentação acastanhada
da pele, localizada preferencialmente nas
pregas cutâneas. A sua etiologia pode
estar relacionada com factores hereditários, vários síndromes, obesidade, outros
distúrbios endócrinos, uso de fármacos e
neoplasias malignas.
O défice do transportador da creatina (DTC) é um síndrome ligado ao X
que resulta de uma mutação no gene
SLC6A8, manifestando-se habitualmente
por atraso psicomotor (moderado a grave), atraso da fala, epilepsia, alteração do
comportamento e dificuldade na aprendizagem.
Caso clínico: Criança do sexo
masculino, 11 anos de idade, com peso
adequado, seguido na consulta de pediatria por atraso mental, atraso grave
da linguagem e alterações comportamentais. Constatado ao exame físico
hiperpigmentação e espessamento da
pele inicialmente na região abdominal,
com evolução progressiva para as axilas,
joelhos e pés, compatível com AN. Antecedentes familiares: irmã com dificuldades na aprendizagem, irmão mais velho
falecido aos 5 anos de vida, apresentava
epilepsia, paralisia cerebral e atraso grave da linguagem.
A ressonância magnética cerebral
com espectroscopia do caso index revelou ausência de sinal de creatina. A
creatina na urina estava elevada: 11987
mmol/L (146-8560) com uma razão creatina/creatinina alta: 3,33 (0,04-1,07).
No DNA do caso índex foi detectada uma mutação hemizigótica no gene
SLC6A8. A mutação consiste na transversão de uma G por uma C (c1261G>C)
que resulta na substituição da glicina
pela arginina (pGlyc 421 Arg) no exão
9 do gene SLC6A8. A irmã e a mãe são
heterozigóticas para a mesma mutação.
Apesar de uma investigação exaustiva
não foi encontrada evidência de doença
endócrina ou neoplásica.
Discussão: Os autores, com este
caso clínico pretendem alertar para uma
possível associação entre a AN e a DTC,
a qual não esta ainda descrita na literatura. A AN neste caso índex parece tratarse de uma manifestação clínica benigna
da DTC.
PNEUMONIA NECROTIZANTE: UM
CASO CLÍNICO
Vinhas da Silva, Ana Leite, Isabel Carvalho, Graça Ferreira
Serviço de Pediatria do Centro Hospitalar de
Vila Nova de Gaia
Introdução: A pneumonia necrotizante (PN) é uma complicação rara,
mas complexa, da pneumonia lobar e
caracteriza-se pela necrose focal das
áreas de consolidação, devendo ser
sempre considerada em crianças com
febre prolongada e aspecto séptico. O
diagnóstico é confirmado por TC do tórax. O agente mais frequentemente envolvido é o Streptococcus pneumoniae.
O tratamento consiste em antibioterapia
de largo espectro, verificando-se, em
90% dos casos, muito boa evolução clínica. As complicações, nomeadamente
o pneumatocelo e o abcesso pulmonar,
são raras.
resumo das comunicações orais
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
S 201
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
Caso Clínico: Criança de 27 meses, sexo feminino, previamente saudável, observada na Urgência de Pediatria
por febre e tosse produtiva com 4 dias
de evolução, toracalgia e dificuldade
respiratória. Medicada previamente com
amoxicilina-ácido clavulânico, sem melhoria. Ao exame objectivo, apresentava
mau estado geral, polipneia e tiragem
subcostal. SatO2 (ar ambiente) - 94%. À
auscultação pulmonar verificou-se diminuição dos sons respiratórios no hemitórax esquerdo. Analiticamente, apresentava ligeira leucocitose com neutrofilia
e PCR de 34,22mg/dL, restante estudo
analítico sem alterações. A radiografia
do tórax revelou imagem de hipotransparência ocupando todo o pulmão esquerdo. A ecografia torácica demonstrou
a presença de colapso total do pulmão
esquerdo, com broncograma aéreo e
derrame pleural não septado. A TC do
tórax revelou condensação total do pulmão esquerdo com perda de volume do
lobo inferior por atelectasia compressiva
e área hiperdensa na vertente posterior
do lobo superior esquerdo com cerca de
4-5 cm atribuível a área de necrose. No
lobo inferior esquerdo identificaram-se
lesões cavitadas pericentimétricas compatíveis com pneumatocelos. Hemocultura e serologias víricas negativas.
Estudo imunológico sem alterações. De
acordo com os achados clínicos e imagiológicos constatou-se a existência de
pneumonia necrotizante à esquerda,
pelo que iniciou antibioterapia ev com
ceftriaxone e vancomicina e corticoterapia. Apresentou melhoria clínica, analítica e radiológica progressiva, tendo alta
ao 16º dia de internamento, orientada
para a consulta externa. Cerca de 3 meses depois, apresenta-se assintomática
e sem sequelas.
Conclusão: Com este caso clínico,
os autores alertam para uma rara complicação da pneumonia na criança, a qual
é mais frequente em crianças imunocompetentes. A PN deve ser considerada em
crianças com pneumonias complicadas
com derrame pleural ou de evolução desfavorável, sendo fundamental o diagnóstico e tratamento precoce.
TORCICOLO E VERTIGEM PAROXÍSTICA BENIGNA DA INFÂNCIA - DIAGNÓSTICO E EVOLUÇÃO CLÍNICA DE 6
PACIENTES
M. Fátima Praça, Isabel Pinto Pais, Diana
Moreira, Marta Vila Real, Fátima Santos
Serviço de Pediatria do Centro Hospitalar Vila
Nova de Gaia/Espinho
Introdução: Torcicolo paroxístico
benigno da infância (TPBI) é um distúrbio
benigno, auto-limitado, caracterizado por
episódios recorrentes de torção lateral
do pescoço, frequentemente acompanhado por sintomas vegetativos, ataxia
ou posição anómala do tronco, com início nos primeiros meses de vida. Podem
cessar espontaneamente ou evoluir para
vertigem paroxística benigna da infância
(VPBI) e/ou para a enxaqueca com aura.
Objectivo: Apresentação e discussão da experiência da consulta de neuropediatria do CHVNG/E, no diagnóstico
e seguimento de crianças com TPBI e
VPBI, e neste sentido, contribuir na caracterização da TPBI para que possa ser
reconhecida como entidade de diagnóstico a ser contemplada na Classificação
Internacional de Cefaleias (CIC).
Material e métodos: Revisão dos
processos clínicos das crianças seguidas na consulta de neuropediatria do
CHVNG/E com o diagnóstico de TPBI/
VPBI no período de Dezembro de 2002
a Maio de 2007. Foram avaliados os seguintes parâmetros: sexo, apresentação
clínica e respectiva evolução, história
familiar e exames complementares de
diagnóstico. O diagnóstico de TPBI/VPBI
foi estabelecido segundo os critérios da
CIC, código ICHD-II A1.3.5 e 1.3.3, respectivamente.
Resultados: De um total de 6 crianças, apenas uma era do sexo masculino.
Cinco crianças tiveram como diagnóstico
inicial TPBI e uma VPBI. Quatro casos
apresentavam história materna de enxaqueca.
O início dos sintomas de TPBI ocorreu entre o 1º e o 6 º mês de idade. Duas
crianças apresentavam crises paroxísticas de inclinação da cabeça com lateralidade alternada e uma das crianças com
postura distónica do tronco associada.
Todas apresentavam pelo menos uma
resumo das comunicações orais
S 202
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
crise com sintomas associados. A duração dos episódios variou de 1 minuto a
6 dias. A sua frequência inicial oscilou de
semanal a mensal. Realizaram-se exames auxiliares de diagnóstico (EAD) em
3 crianças, todas efectuaram ecografia
dos tecidos moles do pescoço e duas
delas ecografia TF, EEG, RMN cerebral
e estudo metabólico. Ao longo do tempo
observou-se uma diminuição da frequência e da duração dos episódios. Um dos
casos evoluiu para enxaqueca.
Observou-se um único caso de
VPBI, com início dos sintomas aos 2
anos, com evolução aos 3 anos para enxaqueca.
Todos os casos revistos mostravam
ao longo do tempo um desenvolvimento
psicomotor (DPM) adequado e exame
neurológico normal. Os EAD foram normais.
Conclusões: Apesar da amostra
ser reduzida para se inferir algo com significado estatístico, os autores com este
estudo retrospectivo reafirmam a adequabilidade dos critérios de diagnóstico
propostos em Apêndice na CIC.
TESTE DE METACOLINA EM CRIANÇAS: A AVALIAÇÃO DAS PEQUENAS
VIAS SERÁ IMPORTANTE?
Telma Barbosa, Sandrine Almeida, Eva
Gomes
Serviço de Imunoalergologia do Hospital de
Crianças Maria Pia
Introdução: A hiperactividade brônquica é uma das características fisiopatológicas da asma e pode ser avaliada
através de um teste de metacolina (TM).
Este exame visa induzir uma queda significativa no FEV1 após a inalação de uma
dada concentração do referido fármaco.
Estudos recentes têm vindo a evidenciar
o papel das pequenas vias na doença
asmática.
Objectivos: Avaliar o comportamento das pequenas vias aéreas
(FEF50) durante o TM nomeadamente a
sua relação com as variações do FEV1.
Relacionar as alterações do FEV1 e do
FEF50 com o aparecimento de sintomas
brônquicos perceptíveis pela criança submetida ao TM.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
Metodologia: Análise retrospectiva de uma população de crianças que
realizaram TM (método de Cock-Croft)
no Serviço de Imunoalergologia durante os anos de 2006-2007. O TM foi
considerado positivo se a queda do volume expiratório forçado no 1º segundo
(FEV1) fosse superior a 20% em relação
ao valor basal. Foram considerados os
valores do FEF50 no início, aquando da
queda significativa do FEV1, e no final
do teste. Considerou-se haver uma variação significativa do FEF50 quando
esta foi superior a 30% do valor basal.
As crianças eram questionadas acerca da existência sintomas tais como a
percepção de dispneia, pieira, tosse ou
desconforto torácico no final da prova ou
quando uma descida significativa fosse
detectada nos parâmetros espirométricos. A amostra obtida foi posteriormente
dividida em 2 grupos (TM positivo/TM
negativo) comparando-se a diminuição
dos valores de FEF50 e a percepção de
sintomas em ambos os grupos. Utilizouse o programa SPSS 12.0 para a análise
estatística dos dados.
Resultados: 52 crianças (29 do
sexo masculino), com idades compreen-
didas entre os 5,1 e os 15,9 anos (média
de 10,4), 50% das quais apresentaram
TM positivo. Em 88% (23) dos TM positivos ocorreu uma queda FEF50 significativa (> 30%). No grupo com TM negativo
verificou-se uma queda de FEF50 considerada positiva em 38% (10) dos casos.
Verificou-se uma correlação positiva entre os valores de FEV1 e FEF50 basais e
entre as diferenças entre FEV1 inicial/final e FEF50 inicial/final.
Vinte e três (44%) crianças referiram o aparecimento de sintomas respiratórios durante o teste, 15 das quais com
TM e queda de FEF50 consideradas positivas, 3 com queda positiva de FEF50,
1 somente com queda FEV1 positiva e
as restantes 4 sem queda significativa.
Existe uma diferença estatisticamente
significativa entre os grupos com queda
significativa de FEV1 (TM positivo) e sem
queda com maior percepção de sintomas
no primeiro grupo (p <0.05). O mesmo
acontece quando relacionamos a existência de sintomas com as quedas de
FEF50 (p <0.05). Parece haver uma melhor correlação entre o aparecimento de
sintomas e a variação dos FEF50 do que
dos FEV1 embora o tamanho da amos-
tra não permita tirar conclusões do ponto
de vista estatístico. Se considerássemos
ambos os parâmetros em conjunto (FEV1
e FEF50) para avaliação dos resultados
do TM poderíamos concluir pela existência de hiperactividade brônquica em 69%
das crianças contra os 50% na realidade
diagnosticados.
Conclusões: O TM é um procedimento bem padronizado para o diagnóstico de hiperactividade brônquica. Os
seus resultados baseiam-se na avaliação
dos valores de FEV1, sendo os restantes parâmetros espirométricos pouco ou
nada valorizados, não estando definidas
as variações que poderão ser significativas. Verificamos neste estudo haver
uma boa correlação entre os valores de
FEF50 e FEV1 ao longo do TM. Além
disso, os valores de FEF50 apresentam
uma correlação positiva com a indução
de sintomas respiratórios durante o TM.
Detectou-se uma queda por nós considerada significativa de FEF50 numa proporção de crianças superior aquela em que
se verificou uma queda de FEV1. Estes
achados necessitam de confirmação com
outros estudos e a sua relevância poderá
ser discutida.
resumo das comunicações orais
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
S 203
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
Resumo dos Posters
ESFEROCITOSE HEREDITÁRIA. ESPLENECTOMIA E COLECISTECTOMIA. EXPERIÊNCIA DO HOSPITAL ESPECIALIZADO DE CRIANÇAS MARIA
PIA.
Susana Soares, Catarina Sousa, Berta
Bonët, Ferreira Sousa, Carlos Enes ,Marika Antunes, José Barbot
Serviço de Hematolgia e Serviço de Cirurgia
Pediátrica, Hospital Maria Pia
A Esferocitose Hereditária (EH)
constitui a causa mais frequente de hemólise e anemia hemolítica não imune.
Trata-se de uma doença heterogénea
que pode assumir diferentes graus de
gravidade clínica, desde as formas severas dependentes de transfusões às
formas ligeiras de diagnóstico ocasional.
A anemia e a litíase vesicular constituem
as duas componentes principais da morbilidade da doença.
Tradicionalmente a esplenectomia
tem sido a opção terapêutica de eleição
no sentido de diminuir a hemólise e as
complicações associadas. No entanto, a percepção dos riscos inerentes a
este procedimento tem aumentado nos
últimos anos, facto que tem conduzido a atitudes mais conservadoras. Na
presente revisão procura-se avaliar as
indicações que conduziram a esplenectomia assim como os seus resultados e
complicações.
O número de doentes com o diagnóstico de EH seguidos entre 1992 e
2007 foi de 52, (34 M; 18 F). Destes 19
eram classificados como EH ligeira, 24
EH moderada e 9 EH grave segundo os
guidelines publicados no British Journal
of Hematology,126, 455-474, 2004.
Em 15 doentes foi efectuada esplenectomia total (ET) e em 3 doentes
esplenectomia parcial (EP). Sete doen-
tes foram esplenectomizados antes dos
6 anos, 6 com EH grave e 1 moderada.
Cinco dos dezoito realizaram esplenectomia com colecistectomia concomitante,
4/18 realizaram cirurgia por laparoscopia
e 14/18 por laparotomia. De referir que
9 doentes realizaram apenas colecistectomia sendo que 2 destes vieram a
realizar esplenectomia posteriormente e
1 já havia realizado esplenectomia total
anteriormente.
A indicação mais referida para esplenectomia foi: anemia com elevada
reticulocitose (n=14), esplenomegalia severa (n=14), dependência transfusional
(n=4), litíase vesicular (n=5) e pancreatite
litiásica (n=2).
O incremento médio de hemoglobina pós-esplenectomia foi de 4,95 g/dl
(Intervalo:1,6-10,1). A erradicação de
hemólise após esplenectomia (Retic.
<150 000/uL) verificou-se em 11 casos,
3 mantiveram reticulocitose moderada (2EP+1ET) e 2 reticulocitose severa (1ET+1EP). Não foram observadas
complicações graves pós-esplenectomia. Em seis doentes observou-se trombocitose sustentada.
Em termos gerais, as opções seguidas estão de acordo com as recomendações da literatura, ou seja, foram esplenectomizados de forma precoce a maioria
das EH graves, de forma mais tardia algumas das EH moderadas, enquanto que
nenhuma das EH ligeiras foi submetida a
este procedimento. De salientar que, em
contraste com o recomendado, em 6 casos procedeu-se a colecistectomia sem
esplenectomia. Este facto deveu-se ao
carácter bem compensado da hemólise e
a possibilidade de cirurgias laparoscópicas menos invasivas.
resumo dos posters
S 204
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
HIPERPIGMENTAÇÃO PERI-ORAL: O
QUE SUSPEITAR?
Patrícia Santos, Cláudia Neto, Susana
Machado, Inês Lobo, José Soares, Manuela Selores.
Serviço de Dermatologia e Serviço de Gastroenterologia do Hospital Geral de Santo
António
A síndroma de Peutz-Jeghers é
uma doença rara, autossómica dominante com penetrância variável.
É caracterizada pela associação
de pigmentação mucocutânea (principalmente peri-oral) e polipose gastrointestinal (hamartomas).
Os doentes com esta síndroma têm
um risco aumentado de invaginação intestinal e de neoplasia, nomeadamente
do tracto gastrointestinal, mama, ovário
e testículo pelo que o diagnóstico precoce é fundamental para a instituição
de medidas preventivas da evolução de
neoplasias.
Os autores apresentam o caso clínico duma criança de onze anos, com
máculas melanocíticas dispersas pela
região malar, dorso nariz, lábio superior, lábio inferior e mucosa jugal com
evolução desde os dois anos. Aos onze
anos foram-lhe diagnosticados pólipos
gastrointestinais e o estudo genético
revelou a mutação patogénica do gene
STK11 no exão 6 e polimorfismos dos
intrões 2,3,7.
O estudo familiar mostrou que o pai
é portador da mesma síndroma.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
PREVALÊNCIA DE FACTORES DE
RISCO CARDIOVASCULARES NUMA
POPULAÇÃO EM DIÁLISE E COM
TRANSPLANTE RENAL
Liliana Macedo, Ariana Afonso, Isabel Valente, Sameiro Faria, Teresa Costa, Conceição Mota, Eloi Pereira.
Serviço de Nefrologia Pediátrica, Hospital de
Crianças Maria Pia – Porto
As crianças com doença renal crónica iniciam precocemente a sua exposição a factores de risco cardiovasculares
(RCV).
Os autores apresentam um estudo
da prevalência de factores de RCV em
doentes em diálise e com transplante
renal (TR) que se encontravam em seguimento neste hospital em Dezembro
de 2006.
Foram avaliados os parâmetros
sexo, raça, idade no 1º tratamento substitutivo da função renal (TSFR), tempo
de seguimento pós-TR, índice de massa
corporal, tensão arterial, perfil lipídico,
diabetes mellitus, tabagismo e terapêutica imunossupressora.
Foram analisados 40 doentes, dos
quais 15 em diálise (10 em diálise peritoneal e 5 em hemodiálise) e 25 com TR,
sendo 60% do sexo masculino e um doente de raça negra.
A idade média dos doentes em diálise era 7,3 + 5,6 anos e com TR 14,3
+ 3,9 anos. O início do 1º TSFR foi em
média aos 8,7 + 4,4 anos. O tempo médio
de seguimento pós-TR foi 3,8 + 3,8 anos
e com valor médio de creatinina plasmática 1,1 + 0,4 mg/dl. Relativamente aos
inibidores da calcineurina, 17 doentes
estavam medicados com tacrolimus e
8 doentes com ciclosporina. Vinte e um
doentes encontravam-se sob corticoterapia (prednisolona), numa dose média de
0,07mg/kg/dia.
Relativamente a factores de RCV
nos doentes em diálise, registaram-se
20% de casos com excesso de peso ou
obesidade, 26,7% com hipertensão arterial (HTA), 33,3% com hipercolesterolemia e 53,3% com hipertrigliceridemia.
Dos doentes com TR, 40% apresentavam excesso de peso ou obesidade,
52% HTA, 4% hipercolesterolemia e 28%
hipertrigliceridemia. Dois doentes com
TR eram fumadores e não foram identificados casos de diabetes mellitus.
Este estudo revela a elevada prevalência de factores de RCV numa população com doença renal crónica e a
importância do seu controlo na tentativa
de actuar atempadamente nestas situações.
IMPORTÂNCIA DA AVALIAÇÃO DA
TENSÃO ARTERIAL – CASO CLÍNICO
Sílvia Saraiva, Ana Aguiar, Jorge Moreira,
Célia Madalena.
Centro Hospitalar Póvoa de Varzim/Vila do
Conde
Hospital de São João
A hipertensão arterial (HTA) é um
dos principais factores de risco cardiovascular. A avaliação da tensão arterial
no exame físico pediátrico de rotina é
fundamental para a melhoria da saúde
cardiovascular na população adulta.
Os autores apresentam o caso clínico de uma adolescente do sexo feminino,
enviada à Consulta de Pediatria aos 12
anos de idade por obstipação e encoprese. Ao exame físico foi detectada tensão
arterial acima do percentil 95 para a idade. O estudo revelou coarctação da aorta
descendente torácica, submetida a correcção cirúrgica, com normalização da
tensão arterial.
Este caso clínico ilustra bem a importância da avaliação da tensão arterial
no exame de rotina da criança e adolescente.
ANALGESIA NO PECTUS EXCAVATUM
– EXPERIÊNCIA DA UCI DO HCMP
Carla Oliveira, Dina Nunes, Manuela
Amaral, Raquel Neves
UCI do Hospital de Crianças Maria Pia
Introdução: O Pectus Excavatum
é a deformidade congénita mais comum
da parede torácica e tem implicações
psicológicas e estéticas. A correcção
cirúrgica mais recente e menos
invasiva é a descrita por NUSS. Esta é
efectuada no HCMP desde 2005. Uma
das complicações do pós-operatório é
a dor e para a minimizar fazemos uso
de analgesia epidural. Esta proporciona
uma analgesia excelente sem depressão
do estado de consciência, mediante
administração de menores doses de
analgésicos e com uma menor incidência
de efeitos secundários, tendo toda a
utilidade no tratamento da dor aguda com
origem no tórax.
Objectivos: Analisar e dar a conhecer os dados da experiência da UCI,
relativos à analgesia efectuada às crianças submetidas a cirurgia correctiva de
Pectus Excavatum, pela técnica de Nuss.
Sensibilizar para a necessidade da avaliação e registo sistemático da intensidade da dor.
Material e Métodos: Foi efectuado
um estudo retrospectivo, por consulta de
registos manuais, das crianças internadas na UCI no pós-operatório de cirurgia
de NUSS, entre Novembro de 2005 e
Julho de 2007. A pesquisa incidiu sobre
o tipo de analgesia efectuada, duração
e eficácia da mesma, efeitos colaterais
e necessidade de analgesia suplementar
de acordo com referências à dor. A amostra (n=11) é constituída pela totalidade
das crianças submetidas a esta cirurgia,
não tendo sido considerada uma situação
de reinternamento.
Resultados: Das 11 crianças/adolescentes, 6 eram do sexo feminino e 5
do sexo masculino, sendo a média de
idades de 13 anos (8 a 15 anos). A duração média do internamento na UCI foi de
5,1 dias (5 a 6 dias).
No pós-operatório, todas as crianças efectuaram analgesia epidural com
Morfina e analgesia endovenosa com
paracetamol. Destas crianças, 9 fizeram
perfusão de ropivacaína via epidural
durante 4 dias. Tiveram necessidade
de efectuar analgesia endovenosa suplementar com Toradol 4 crianças, (nº
máximo de tomas 2). Mantendo este tipo
de analgesia, verificou-se que em duas
crianças não houve registo de dor e nas
restantes (9) o nº de turnos em que esta
é registada, variou entre dois a sete. Na
altura, não era utilizada nenhuma escala
de avaliação de dor e o registo efectuado
dependia do critério de cada enfermeiro.
Os efeitos colaterais registados foram:
náuseas e vómitos em 9 crianças, hipertensão em 2, hipotensão também em
resumo dos posters
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
S 205
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
2, tonturas, prurido e cefaleias referidos
apenas uma vez. Há apenas uma criança em que não é referido qualquer efeito
colateral.
Conclusão: A não existência de
avaliação e registo sistemático da dor
não permitem concluir, através da consulta dos registos, a intensidade da dor
sentida, a hora e a antecipação da medicação prescrita a horas fixas. Como
apenas 4 crianças fizeram analgesia em
SOS, deduzimos que, apesar dos registos serem inconclusivos, a analgesia
instituída foi eficaz. Os efeitos colaterais
foram essencialmente náuseas e vómitos
e não se verificaram complicações significativas.
PSORÍASE – O SOL COMO INIMIGO
Luís Ribeiro, Mónica Tavares, Hernâni
Brito, Ana Encinas, Enrique Carro, Márcia Ferreira, Teresa Borges, Margarida
Guedes.
Serviço de Pediatria, Serviço de Anatomia Patológica e Serviço de Dermatologia do Hospital
Geral de Santo António
A psoríase é uma patologia cutânea
hereditária comum, com uma incidência
na Europa de 1.5%. Na população pediátrica corresponde a 4% das dermatoses até aos 16 anos e apresenta um
pico de início clínico aos 15-25 anos.
A susceptibilidade para desenvolver a
doença é hereditária, mas o padrão de
transmissão é desconhecido. Existem
factores desencadeantes conhecidos
capazes de precipitar ou exacerbar uma
“crise”, nomeadamente traumáticos, farmacológicos e certos tipos de infecção.
O diagnóstico é fundamentalmente clínico, mas em casos duvidosos o exame
anatomopatológico pode ser a chave do
diagnóstico.
Criança de 6 anos de idade, do
sexo masculino, com antecedentes de
quisto do septo pelúcido submetido a
correcção endoscópica aos 2 meses de
idade e sem antecedentes familiares relevantes, nomeadamente de patologia
cutânea. Cerca de 12 meses antes da
admissão, após infecção das vias aéreas superiores, desenvolveu pápulas
eritematosas inicialmente localizadas
na face, mas que após resolução das
mesmas, surgiram no tronco, cotovelos
e joelhos. Iniciou helioterapia, calcipotriol e corticóide tópico. Após os primeiros dias de praia ocorreu agravamento
clínico com aparecimento de placas
eritemodescamativas, envolvendo quase todo o tegumento cutâneo, associadas a prurido e dor cutânea. Nesta
altura é proposto internamento para
confirmação diagnostica e orientação
terapêutica.
No internamento foi realizada biopsia cutânea que evidenciou alterações
compatíveis com psoríase em estadio
inicial. Iniciou tratamento sistémico
com ciclosporina com franca melhoria
clínica.
A psoriase é uma patologia frequente na idade pediátrica sendo, no entanto,
raras as formas graves. Este caso apresenta algumas peculiaridades, nomeadamente a ausência de história familiar,
o agravamento das lesões após a exposição solar, e a exuberância do quadro
clínico.
PAN-HIPOPITUITARISMO: DIFERENTES FORMAS DE APRESENTAÇÃO
DE ACORDO COM O SEXO DO PACIENTE
Helena Santos, Ana Garrido, Diana Moreira, Hugo Tavares, Eduarda Marques,
Rosa Arménia Campos, Jorge Sales
Marques
Serviço de Pediatria - Centro Hospitalar de
Vila Nova de Gaia
Introdução: O Pan-hipopituitarismo
é uma patologia com graves consequências. Necessita de um diagnóstico precoce que permita um tratamento atempado
de forma a evitar diversos tipos de complicações, particularmente a afectação
do normal crescimento e desenvolvimento da criança afectada. A apresentação
pode ser diferente de acordo com o sexo
do paciente.
Casos Clínicos: Caso 1: Lactente
do sexo masculino, de 4 meses, observado por icterícia, hipotonia, micropénis,
hipoglicemia e má evolução estatural
desde o nascimento. O estudo realizado
revelou anemia, hipoglicemia, elevação
resumo dos posters
S 206
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
das transaminases, hiperbilirubinémia
conjugada; cortisol - 0.24 μg/dl (6.2 19.4), hormona de crescimento - 0.12
ng/ml (2 - 10), T4 - 5.0 μg/dl (6.5 - 17.5),
FSH - <0,10 mUI/ml (1.5 - 12.4), LH - <
0.10 mUL/ml (1.7 - 8.6), prolactina - 3.93
ng/ml (4.1 - 18.4 ), insulina - < 0.20 μU/
ml (3.0 - 17.0). A ACTH - 8.80 pg/ml
(0.0 - 46.0) era normal. A ressonância
magnética (RM) cerebral mostrou hipoplasia da hipófise e sela turca. O estudo
molecular não revelou mutação no gene
PROP1.
Caso 2: Criança do sexo feminino,
5 anos, observada por baixa estatura, refluxo vesicoureteral bilateral e duplicação
pielocaliceal; história de canal arterial patente. O estudo realizado revelou anemia,
cortisol - 3.66 μg/dl, T4 - 3.60, FSH - 0.45
mUI/ml, LH - < 0.10 mUL/ml; teste da colidia: a linha de base - 0.2 ng/ml, resposta
máxima aos 120 minutos - 0.4 ng /ml, L;
teste da Dopa: a linha de base - 0.2 ng/dl
e após a injecção a resposta era 0.1 ng/
ml; IGF1 - < 25 ng/ml (50 - 327), IgGBP3
ng/ml - < 0.7 (1.1 - 7.1). O cariótipo era
46XX e a idade óssea correspondia a 2
anos. A RM cerebral mostrou hipófise e
sela turca pequenas. Estudo molecular
em curso.
Ambos os pacientes iniciaram tratamento com tiroxina (10mg/Kg/dia), hidrocortisona (15mg/m2/dia) e hormona do
crescimento (0.25 mg /Kg/dia).
Discussão: No sexo masculino,
o diagnóstico do pan-hipopituitarismo
pode ser feito no período neonatal com
a associação de icterícia colestática,
hipoglicemia e micropénis. A icterícia
colestática é secundária à falta dahormona de crescimento ou do cortisol. A
função hepática normaliza após seis a
sete semanas de terapia. No sexo feminino, a baixa estatura é a principal manifestação.
Embora ambas situações tenham
tido um diagnóstico tardio, a recuperação
clinica e o crescimento de recuperação
foi excelente.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
SÍNDROME DE GILBERT NA PRÉ-PUBERDADE: UM DIAGNÓSTICO POUCO
FREQUENTE
Hugo Rodrigues, Ana Torres, Ana Rita
Araújo, Cristiana Ribeiro, Miguel Salgado, Sandrina Martins, Sofia Sousa, Idalina Maciel.
Serviço de Pediatria do Centro Hospitalar do
Alto Minho
Introdução: O Síndrome de Gilbert
é a patologia da glucuronidação da bilirribuna mais frequente. A maioria dos casos apresentam hereditariedade autossómica recessiva, mas pode ocorrer de
forma isolada. A hiperbilirrubinémia não
conjugada recorrente, com hemograma,
esfregaço e enzimas hepáticas sem alterações permite o diagnóstico presuntivo.
O diagnóstico definitivo implica uma duração destas alterações de 12 a 18 meses. Para além da icterícia, geralmente
não existem outros sinais ou sintomas.
É uma situação benigna e não requer nenhum tratamento. O diagnóstico
é importante para evitar exames complementares desnecessários e alertar para
um eventual risco de toxicidade com alguns fármacos.
Caso Clínico: Os autores apresentam o caso de uma adolescente prépúbere, de 11 anos de idade, sem antecedentes patológicos conhecidos, que
recorre ao SU por febre, icterícia das escleróticas e “urina escura” (SIC) com 24
horas de evolução. Sem queixas álgicas,
alterações GI ou outras. Sem história de
episódios anteriores semelhantes ou factores de risco conhecidos para doença
hepática. Como antecedentes familiares
de referir pai com patologia hepática não
especificada.
Ao exame físico apresentava icterícia das escleróticas, sem outras alterações relevantes.
Estudo analítico: hemograma – normal; Coombs directa negativa; PCR
– 9,15 mg/dl; Bilirrubina total – 4,49 mg/dl
(directa – 0,68 mg/dl); TGO / TGP – 26
/ 43 UI/L; FA – 168 UI/L; função renal e
ionograma – sem alterações; Combur
– sangue +. Ecografia abdominal - sem
alterações.
Perante o quadro clínico e a história de patologia hepática paterna (que só
posteriormente se soube tratar-se de esteatose hepática não alcoólica) decidiuse o internamento, onde apresentou boa
evolução clínica, sem intercorrências.
Efectuou estudo imunológico sem alterações, e serologias para HAV, HBV, HCV,
EBV e CMV, negativas, excepto anti-HBs
(vacina).
Em D3 teve alta com indicação de
vigilância e re-avaliação após 8 dias,
apresentando-se assintomática. Passados 15 dias volta ao SU por icterícia e dor
abdominal. Analiticamente não apresentava alterações, excepto ligeiro aumento
da bilirrubina (à custa da indirecta). Por
suspeita de Síndrome de Gilbert foi realizado estudo molecular, que confirmou a
homozigotia para a duplicação dinucleotídica [TA] na região promotora do gene
UGT1A1
Actualmente mantém-se assintomática, exceptuando alguns episódios ocasionais de dor abdominal e fadiga, por
vezes associados a icterícia.
Conclusão: Com este caso clínico,
os autores pretendem alertar para uma
patologia relativamente comum, mas que
se encontra bastante subdiagnosticada.
O diagbóstico é muito mais frequente
após a puberdade, devido à influência
hormonal.
Neste caso, o ligeiro aumento das
transaminases e a história paterna mal
esclerecida de patologia hepática dificultaram o diagnóstico, que acabou por ser
definido num segundo episódio de icterícia. A dor abdominal e a fadiga observadas estão de acordo com as descrições
de alguns autores, apesar de actualmente
se defender que estarão provavelmente
relacionados com intercorrências víricas
e não directamente com esta patologia.
CRIANÇAS E ADOLESCENTES – QUE
HÁBITOS ALIMENTARES?
Otília Cunha, Mafalda Sampaio, Isabel
Loureiro, Liliana Brandão, Elizabeth Marques, Miguel Costa.
Serviço de Pediatria – Hospital de São Miguel,
Oliveira de Azeméis
Introdução: A alimentação saudável é essencial para o crescimento e
desenvolvimento adequados, quer na in-
fância quer na adolescência, bem como
para a prevenção de algumas doenças
crónicas e degenerativas na idade adulta. Nas últimas décadas verifica-se uma
alteração nos hábitos alimentares das
crianças e adolescentes, com o consequente aumento da prevalência da obesidade, bem como das co-morbilidades
associadas.
Objectivo: Conhecer os hábitos
alimentares de um grupo de crianças e
adolescentes e verificar se existem diferenças de acordo com a idade, sexo e
índice de massa corporal (IMC).
Material e Métodos: Estudo observacional e transversal de um grupo de
100 crianças e adolescentes, com idades
compreendidas entre os 10 e 17 anos,
que frequentavam o Ambulatório de Pediatria, aos quais foi aplicado um questionário sobre os seus hábitos alimentares.
As variáveis analisadas foram: idade,
sexo, escolaridade, classe socio-económica, IMC, dieta das 24h e frequência de
consumo de alguns alimentos. A análise
estatística foi realizada em suporte informático (SPSS 15.0 for Windows).
Resultados: Das 100 crianças e
adolescentes, 52% eram do sexo feminino, sendo a média de idades de 12,6
anos. Observou-se excesso ponderal em
37% e obesidade em 21% dos casos.
Dos resultados salientamos: 42% efectuavam menos de 5 refeições diárias e 75%
das crianças faziam pelo menos uma refeição fora de casa. Verificou-se um consumo diário, superior a uma vez por dia,
de hortaliças, sopa, fruta e lacticínios, em
17%, 25%, 26% e 72% dos casos, respectivamente. Constatou-se uma ingestão diária de peixe em apenas 23% dos
casos. O consumo, superior a uma vez
por semana, de refrigerantes, fast-food e
guloseimas foi de 36%, 46% e 76%, respectivamente, e de álcool foi de 3%.
Não se verificaram diferenças estatisticamente significativas entre a frequência de consumo dos vários grupos
de alimentos e a idade, o sexo, a classe
socio-económica e o IMC.
Comentário: Tendo em conta as
recomendações alimentares e nutricionais actuais, constatamos que os hábitos alimentares deste grupo de crianças
e adolescentes afastam-se do conceito
resumo dos posters
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
S 207
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
de alimentação saudável: baixa ingestão
de fruta, produtos hortícolas e peixe e
consumo excessivo de alimentos hipercalóricos e de menor valor nutricional,
factos que poderão estar relacionados
com a alta incidência de excesso de
peso/obesidade encontrada neste grupo. Salienta-se o facto de não se encontrar diferenças com significado estatístico entre estes erros alimentares e o grau
de IMC.
Uma alimentação desequilibrada
conduz frequentemente à obesidade, doença crónica de difícil tratamento e cuja
prevenção é a “atitude terapêutica” mais
eficaz. Os Cuidados de Saúde Primários,
a Escola e a Comunidade devem continuar a promover medidas comportamentais
preventivas, nomeadamente em relação
aos hábitos alimentares e estilos de vida
mais saudáveis, que ainda hoje se têm
mostrado serem manifestamente insuficientes.
OBESIDADE E OBSTIPAÇÃO: QUE
RELAÇÃO?
Isabel Loureiro, Liliana Brandão, Mafalda
Sampaio, Otília Cunha, Elizabeth Marques, Miguel Costa
Serviço de Pediatria - Hospital S. Miguel
– Oliveira de Azeméis
Introdução: A obesidade pediátrica
tem sido associada a diversas co-morbilidades. Estudos recentes têm revelado
uma maior prevalência de obstipação em
crianças obesas.
Objectivo: Avaliar a prevalência de
obstipação e de encoprese num grupo de
crianças com excesso ponderal e compará-la com um grupo normoponderal.
Materiais e Métodos: Estudo retrospectivo com base em entrevista de
200 crianças com excesso ponderal/obesidade seguidas em consulta de Nutrição
Pediátrica e de 200 crianças normoponderais observadas em regime de ambulatório no nosso hospital. Foram analisadas as variáveis: sexo, idade, critérios de
obstipação (nº dejecções semanais, presença de fezes duras, sangue nas fezes,
dor na dejecção, sensação de dejecção
incompleta) e encoprese. Obstipação foi
definida como a presença de pelo menos
2 dos critérios em 25% do tempo por um
período superior 3 meses. Foram excluídos doentes com hipotiroidismo, diabetes, outras patologias endócrinas ou
genéticas, uso crónico de corticóides e
outras medicações que provoquem obstipação. Foi considerado excesso ponderal um Índice de Massa Corporal (IMC)
superior ou igual ao p85 para a idade e
sexo. A análise estatística foi realizada
em SPSS 15.0.
Resultados: Verificou-se uma prevalência de 18% de obstipação no grupo de crianças com excesso ponderal
e de 9,5% no grupo controlo (p<0,05).
Relativamente à encoprese, no grupo
de crianças com excesso ponderal e no
grupo controlo a prevalência foi de 3,5%
e de 1%, respectivamente (p>0,05). Os
dois grupos não apresentaram diferenças
com significado estatístico relativamente
ao sexo e idade.
Conclusões: A prevalência de obstipação nas crianças com excesso ponderal/obesidade encontrada no nosso estudo (18%) foi significativamente superior
à do grupo controlo. Este dado está de
acordo com alguns estudos publicados,
podendo o estilo de vida das crianças
obesas explicar, em parte, estes resultados. Em relação à encoprese não foram
encontradas diferenças com significado
estatístico, salientando-se o facto de nenhuma das crianças estar referenciada
a consulta médica por este problema.
Os autores reforçam a necessidade da
abordagem multidisciplinar da obesidade bem como da promoção contínua de
medidas alimentares e comportamentais
saudáveis.
PUBERDADE PRECOCE - CASO CLÍNICO
I. Vale, M. Almeida, T. Borges, H. Cardoso
Serviço de Pediatria do Hospital Geral de Santo António
SÍNDROME
DE GILBERT- CAUSA
RARA DE DOR ABDOMINAL
Isabel V ,Catarina S,Teresa A, Susana F,
e Idalina M.
Serviço de Pediatria - Centro Hospitalar Alto
Minho
O síndrome de Gilbert é um distúrbio benigno, caracterizado por hiperbilirrubinemia não conjugada, causado por diminuição da actividade da
UDP-Glicuroniltransferase. Pode ser
um achado laboratorial ocasional ou
resumo dos posters
S 208
surgir (por volta da segunda ou terceira décadas de vida) como uma icterícia das escleróticas habitualmente sem
qualquer outra sintomatologia associada. A actividade da enzima pode estar
mais reduzida pela ingestão de alguns
fármacos, prática de exercício físico,
stress, intercorrências infecciosas e jejum prolongado.
As autoras apresentam um caso
clínico, de uma adolescente de 14 anos
internada no serviço de pediatria do
CHAM por dor abdominal recorrente
acompanhada de náuseas e vómitos
com 3 meses de evolução e que justificaram várias vindas ao SU. Apresentava
antecedentes de rinite alérgica e asma,
medicada com fluticasona nasal e montelucaste. Na admissão salienta-se tom
ictérico das escleróticas, dor abdominal
à palpação a nível dos flancos e hipogastro sem massas ou organomegalias
palpáveis e sem sinais de irritação peritoneal. O estudo analítico realizado era
normal à excepção da bilirrubina total
aumentada à custa da bilirrubina indirecta. Os exames de imagem ecografia
e TAC abdominal não apresentavam alterações. Por suspeita de S. Gilbert realizou o estudo molecular para a análise
do número de repetições dinucleotídicas
na região promotora do gene UGT1A1
efectuado por PCR que confirmou a presença de homozigotia associada ao síndrome de Gilbert.
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
Introdução: A puberdade é um
período de transição entre a infância e
a idade adulta; no qual se desenvolvem
os caracteres sexuais secundários. Caracteriza-se por um crescimento rápido
que termina com a fusão das epifises ósseas, atingindo-se assim a estatura final.
A idade do início da puberdade varia de
zona geográfica dependendo de factores
genéticos e ambientais.
A puberdade precoce define-se
como o aparecimento de caracteres se-
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
xuais numa idade cronológica inferior em
mais de 2,5 desvios padrão da média
dessa população. Assim a nossa população considera-se nas raparigas abaixo
dos 7 anos e nos rapazes abaixo dos 9
anos. Este distúrbio pode ser classificado
como central ou periférico de acordo com
a sua etiologia.
Caso Clínico: Os autores apresentam um caso clínico de um rapaz de 8
anos de idade, enviado à consulta de endocrinologia pediátrica por aparecimento
de pelo púbico, aumento do perímetro e
comprimento dorsal do pénis; com cerca
de 2 anos de evolução (desde os 6 anos
de idade). Ao exame físico apresentava o
peso 42kg, altura 139,8cm (> P95) SDS
2,24; altura alvo-167cm (P10). Com o
seguinte estádio pubertário: pêlo púbico
III/IV, volume testicular 10ml e pénis com
comprimento dorsal de 6cm e perímetro
de 7cm.
Do estudo realizado apresentava aumento da LH, FSH, testosterona e
prolactina, com estudo hormonal da supra-renal normal. No RX do punho e mão
tinha uma idade óssea calculada de 11
anos (IC- 8 anos), com aceleração de 3
anos. A ressonância magnética cerebral
mostrava um hamartoma hipotalámico
(tuber cinereum) sem outras alterações
de relevo.
Foi orientado para a consulta de
neurocirurgia deste hospital, onde é seguido.
Dado tratar-se de uma puberdade
precoce central iniciou terapêutica com
triptorrelina (análogo de LHRH) com boa
resposta clínica e analítica.
Comentários: No rapaz a puberdade precoce central é secundária a uma
lesão orgânica em 50% dos casos; pelo
que obriga sempre à realização de neuroimagem.
Devemos estar atentos ao desenvolvimento pubertário das crianças; de
forma a identificarmos atempadamente
os casos de puberdade precoce e assim evitarmos a aceleração da idade
óssea, que poderá comprometer a estatura final.
PAMIDRONATO NA OSTEOGENESIS
IMPERFECTA : TRATAR ATÉ QUANDO?
Garrido A., Moreira D., Campos Costa R,
Sales Marques J.
Serviço de Pediatria - Centro Hospitalar de
Vila Nova de Gaia
Imagiologia Clínica Dr. Campos Costa
Introdução: A Osteogenesis imperfecta (OI) é uma doença hereditária
caracterizada por fracturas ósseas múltiplas.
Objectivo: Avaliar o tempo necessário de tratamento com pamidronato na
criança com OI.
Material e Métodos: Estudo retrospectivo de uma criança com OI tipo 3,
tratada com pamidronato dos 5 meses de
idade aos 5 anos (utilizando o protocolo
de Plotkin). Avaliação anual do número de
fracturas, evolução estatural, metabolismo
cálcio – fósforo urinário e densidade mineral óssea (BMD e T score de L1 a L4).
Resultados: Duas fracturas ósseas
após 8 meses e 2 anos de tratamento.
Estatura abaixo do percentil 3 durante
o primeiro ano de tratamento e desde
então no percentil 5. Antes do início do
tratamento o valor de cálcio era de 2,70
mg/d ( 100 - 300) , fósforo : 0, 02 g /d ( 0,4
- 1,3) , BMD : 0,000 g / cm2 e T – score :
- 9,5 . Aos 2 anos de tratamento - cálcio
: 48,50 , fósforo : 0,40 , BMD : 0,468 , T
– score : - 5,3 . Aos 5 anos de tratamento
– cálcio : 46,40 , fósforo : 0,51 , BMD :
0,486 e T – score : - 5,1
Conclusões:
1 - O tratamento com pamidronato,
reduziu o número de fracturas, melhorou
a qualidade de vida do doente e inverteu
a evolução normal da baixa estatura nestes casos graves.
2 - São suficientes 2 anos de tratamento porque, a partir dessa altura, não
há melhoria significativa do metabolismo
cálcio - fósforo urinário e da densitometria óssea.
3 – Estes resultados estão de acordo com os artigos mais recentes sobre
o tempo de tratamento, que deverá ser
reduzido para dois anos, em vez dos 5,
como inicialmente proposto, tendo em
conta a evolução clínica, analítica e radiológica verificada.
“TUMMY TIME”
Carla Teixeira, Suzana Figueiredo, Lara
Lourenço, Susana Soares, Fátima Pinto.
Centro de Saúde da Carvalhosa e Foz do Douro - Porto
O “Tummy Time”, isto é o “Tempo
da Barriga para Baixo”, consiste no posicionamento do recém-nascido e lactente
em decúbito ventral enquanto está acordado.
A deformação da cabeça, nomeadamente a plagiocefalia posicional, aumentou de incidência nos EUA desde que
foram colocadas em prática as recomendações relativamente à posição de deitar
para prevenção da Síndrome de Morte
Súbita do Lactente. O posicionamento do
recém-nascido e lactente de barriga para
baixo tem como benefícios, entre outros,
evitar a plagiocefalia posicional, e contribuir para um desenvolvimento motor
adequado.
Na consulta de Vigilância Infantil e
como parte de um conjunto de medidas
educativas e preventivas, são abordados vários temas, complementados por
folhetos educativos que são fornecidos
aos pais. Dado não existir em Portugal
nenhuma acção em curso para fomentar
o “Tummy Time”, o qual inclusivamente
não é referido no Boletim de Saúde Infantil, as autoras decidiram elaborar um
cartaz informativo para os pais, para ser
colocado na sala de espera do consultório de Pediatria. No cartaz está explicado
o que é o “Tempo da Barriga para Baixo”,
quando e como deve ser efectuado e porque é importante.
A par do cartaz foi elaborado um
folheto informativo, com a mesma informação, o qual é distribuído aos pais na
consulta, juntamente com informação
oral sobre o tema. O folheto foi posteriormente traduzido para inglês, para facilitar
a transmissão de informação, dada a elevada quantidade de famílias imigrantes
observadas no centro de saúde.
As autoras pretendem divulgar o
cartaz e o folheto informativo por elas
elaborado.
resumo dos posters
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
S 209
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
MUTISMO SELECTIVO - UM SILÊNCIO
INCÓMODO: A PROPÓSITO DE QUATRO CASOS CLÍNICOS
Otília Cunha,Mafalda Sampaio, Ana Luísa
Pinto, Virgínia Monteiro, Miguel Costa.
Serviço de Pediatria – Hospital de São Miguel,
Oliveira de Azeméis
Introdução: O mutismo selectivo
(MS) define-se como uma perturbação
da infância caracterizada por incapacidade persistente em falar em situações
sociais específicas, apesar de a criança
o fazer noutros contextos, interferindo no
seu desempenho escolar e social, com
duração mínima de um mês e que não se
explica por nenhuma outra causa orgânica ou psiquiátrica (DSM-IV TR). Trata-se
de uma entidade rara, que habitualmente surge antes dos 5 anos de idade e de
abordagem terapêutica complexa. A este
propósito, os autores apresentam quatro
casos clínicos de crianças com diagnóstico de MS.
Caso 1: Criança do sexo masculino, 11 anos de idade, referenciado aos
7 anos por recusa em falar em contexto
escolar. Diagnosticado MS associado a
défice cognitivo ligeiro, défice de atenção
e enurese nocturna primária. Submetido
a intervenção directa com psicoterapia
individual e familiar, psicomotricidade,
apoio de Ensino Especial e tratamento
farmacológico, evoluiu com melhoria do
MS em todos os contextos.
Caso 2: Criança do sexo masculino, 7 anos de idade, enviado aos 3
anos por recusa em falar no infantário.
Diagnosticado MS associado a ligeiro
atraso no desenvolvimento psicomotor. Apesar de discreta melhoria do MS
após intervenção directa com terapia
da fala e apoio de Ensino Especial,
evoluiu com marcadas dificuldades de
aprendizagem escolar e enurese nocturna primária.
Caso 3: Criança do sexo feminino,
7 anos de idade, referenciada aos 5 anos
por recusa em falar na pré-escola, cumprindo critérios para diagnóstico de MS.
Submetida a intervenção directa com
psicoterapia individual e familiar e apoio
do Ensino Especial, sem melhoria do MS,
no entanto com bom aproveitamento escolar.
Caso 4: Criança do sexo feminino,
4 anos de idade, enviada à consulta por
recusa em falar fora do seu agregado
familiar, estabelecendo-se o diagnóstico
de MS. A realizar psicoterapia individual
e familiar.
Comentários: Os autores pretendem relembrar esta entidade rara, cuja
abordagem diagnóstica e terapêutica é
multidisciplinar. A intervenção terapêutica deve ser ajustada ao grau de ansiedade e à eventual presença de outros
problemas associados, nomeadamente o
atraso de desenvolvimento. Apesar da intervenção terapêutica, as situações mais
graves podem evoluir para fobia social e
depressão.
A MARCA DO DRAGÃO: CONSEQUÊNCIA DE TATUAGEM TEMPORÁRIA.
Isabel Loureiro, Inês Lobo, Arménia Oliveira, Maria de Lurdes Pinto, Cristina
Godinho
Serviço de Pediatria - Hospital de S. Miguel
– Oliveira de Azeméis
Apresentamos o caso clínico de
A.S.P, sexo masculino, 8 anos, previamente saudável, observado no Serviço
de Urgência (SU) do Hospital de S. Miguel por aparecimento de lesão eritematosa papulovesicular pruriginosa na
região escapular direita na forma de um
dragão. Nas férias de Verão tinha aplicado nessa área uma tatuagem temporária,
tendo feito segunda aplicação de tinta
para retocar a figura quatro dias antes de
recorrer ao SU.
Iniciou terapêutica com corticóide tópico e anti-histamínico oral, aos quais foi
posteriormente associado antibiótico tópico com melhoria progressiva da lesão.
Foram efectuados testes epicutâneos
que se revelaram positivos para o fixante
PPDA e negativos para o corante henna.
A aplicação de tatuagem temporária
é um fenómeno cada vez mais frequente em idade pediátrica não só porque se
tornou “moda” como pela segurança que
lhe é associada. Contudo as reacções
alérgicas a este tipo de produto, que têm
como principal constituinte o henna e o
agente fixante PPDA, responsável pela
maioria das alergias, podem ter conse-
resumo dos posters
S 210
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
quências futuras. As crianças com alergia
a este produto devem evitar novas tatuagens, tintas de cabelo, tintas de calçado,
cremes bronzeadores, roupas tingidas,
anestésicos locais e alguns medicamentos constituídos por sulfonamidas.
SÍNDROME DE ALPORT – UMA FORMA DE APRESENTAÇÃO HISTOLÓGICA RARA
Ariana Afonso, Liliana Macedo, Isabel Valente, Sameiro Faria, Teresa Costa, Conceição Mota, Elói Pereira.
Serviço de Nefrologia Pediátrica do Hospital
de Crianças Maria Pia.
Introdução: A Síndrome de Alport,
ou nefrite hereditária, caracteriza-se por
doença glomerular progressiva, encontrando-se frequentemente associada a
surdez neurossensorial e alterações oftalmológicas. Apesar de geneticamente
heterogénea, em cerca de 80% dos casos de síndrome de Alport, a forma de
transmissão é ligada ao X, com mutação
a nível do gene COL4A5 (Xq22). As alterações histológicas da membrana basal
glomerular são típicas. A presença de
crescentes celulares, embora descrita na
literatura, é uma situação rara.
Caso Clínico: Adolescente de 16
anos, sexo masculino, com história familiar de doença renal. Hematúria microscópica diagnosticada aos 6 meses
de vida, com evolução para hematúria
macroscópica recorrente aos 9 meses
e hematoproteinúria aos 3 anos. O estudo imunológico sumário, incluindo ANA,
ANCA e Ac anti-MBG foi negativo. Detectada surdez neurossensorial, com colocação de próteses auditivas aos 9 anos. O
rastreio oftalmológico regular não revelou
alterações. Aos 10 anos, por proteinúria
nefrótica, foi introduzida ciclosporina, que
manteve durante 4 anos. Aos 15 anos,
por apresentar deterioração progressiva
da função renal, realizou biópsia renal
percutânea, que mostrou proliferação endocapilar, com evidência de crescentes
celulares e alterações crónicas tubulointersticiais e vasculares à microscopia
óptica; o estudo ultra-estrutural evidenciou membrana basal com áreas de laminação e fragmentação, com aspecto
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
“em rede” e corpos electrodensos. Iniciou
terapêutica imunossupressora, com melhoria transitória da função renal. A evolução foi desfavorável, com necessidade
de terapêutica substitutiva da função renal (hemodiálise) 11 meses depois, em
Maio de 2007. Efectuou transplante renal
a 29/5/2007, de dador vivo, com função
imediata do órgão.
Comentários: Embora rara, a evidência de crescentes glomerulares na
síndrome de Alport já foi previamente
descrita por alguns autores. Contudo, persiste a dúvida se esta corresponde a uma
alteração morfológica que se sobrepõe
à doença de base, ou se constitui uma
nova forma de apresentação morfológica
desta síndrome, possivelmente associada a um curso clínico mais agressivo.
LARINGOTRAQUEOMALÁCIA GRAVE
– CASO CLÍNICO
Teresa Guimarães, Gisela Silva, Helena
Ferreira, Rosa Lima, Esmeralda Martins,
Miguel Coutinho, Ana Ramos.
Serviço de Pediatria e Serviço de ORL - Hospital Maria Pia
A Laringotraqueomalácia é uma
malformação com envolvimento da laringe e traqueia (atraso da maturação dos
tecidos e estruturas) na qual existe uma
incapacidade para manter a patência das
vias aéreas durante a expiração. A apresentação idiopática é a mais frequente e
a forma secundária, associa-se a compressão extrínseca por malformações em
estruturas adjacentes, nomeadamente
por anel vascular.
Apresenta-se o caso clínico de um
lactente do sexo masculino, admitido
com 1 mês e meio de idade por apneia/
insuficiência respiratória aguda, com necessidade de ventilação mecânica. Sem
antecedentes familiares e pré-natais relevantes.
Apresentava estridor desde o nascimento associado a vários episódios de
apneia e dificuldade na alimentação.
O estudo endoscópico da árvore
traqueobrônquica revelou “aspecto de
ligeira laringomalácia e compressão extrínseca do 1/3 inferior da traqueia”. A
investigação imagiológica confirmou o
diagnóstico de duplo arco aórtico, que foi
corrigido cirurgicamente.
Posteriormente, registaram-se vários episódios de estridor, cianose e broncospasmo graves, com necessidade de
traquestomia. A broncoscopia detectou
estenose subglótica em anel, com tecido
granulomatoso.
Aos 18 meses, no controlo endoscópico da árvore respiratória, tinha estenose circunferencial cricóide, traqueomalácia global e broncomalácia do brônquio
principal esquerdo.
Foi transferido para o Hospital da
área de residência, mantendo seguimento em consulta multidisciplinar neste Hospital.
Este caso reflecte a importância
dos cuidados hospitalares diferenciados
e prolongados, num doente com malformações graves que colocavam em risco
a sua vida.
O QUE A BISAVÓ DESCOBRIU…
Raquel Zenha, Daniela Pio, Maria Manuel Flores, Esmeralda Martins, Maria
Luís Cardoso
Serviços de Pediatria do Hospital Infante D.
Pedro e Hospital Maria Pia
Instituto de Genética Médica Dr. Jacinto Magalhães
Introdução: A Intolerância Hereditária à Frutose (IHF), descrita pela primeira
vez em 1956, tem actualmente uma prevalência estimada na Europa Central de
1:26100. É uma doença autossómica recessiva, produzida por uma mutação no
gene que codifica a enzima aldolase B
(gene 9q22.3), resultando na diminuição
da actividade desta enzima a nível hepático, renal e intestinal.
Tipicamente, a criança mantém-se
assintomática até ao momento da introdução de frutose na dieta. As manifestações iniciais variam desde hipoglicemia
sintomática a um quadro clínico semelhante à galactosemia (icterícia, hepatomegalia, vómitos, letargia, convulsões).
Atraso do crescimento estaturoponderal, doença hepática ou disfunção
tubular renal podem surgir com a ingestão crónica do dissacárido, quando o
diagnóstico é mais tardio.
Caso Clínico: Os autores apresentam o caso de um lactente previamente
saudável com dieta láctea exclusiva, que
é internado aos 4,5 meses por hipoglicemia sintomática, após ingestão de meio
pêssego dado pela bisavó.
A pesquisa de açúcares redutores
na urina, efectuada algumas horas depois do episódio, foi negativa. No entanto, perante a suspeita clínica de IHF foi
efectuado o estudo molecular, que identificou a presença da mutação c.449G>9
no exão 3.
Apesar da insegurança e renitência
iniciais dos pais face à doença, a diversificação alimentar com isenção de frutose
foi um sucesso, dado o apoio multidisciplinar da Consulta de Nutrição e Doenças
Metabólicas.
Aos 17 meses, tem um bom crescimento estaturo-ponderal e um desenvolvimento psico-motor adequado.
Comentários: Desde 1995, foram já
relatadas 21 mutações no locus do gene
da aldolase B. A mutação encontrada
neste caso não está descrita na literatura
mas havia sido previamente identificada
noutra família portuguesa com IHF.
O diagnóstico da patologia nesta
criança foi possível através da suspeita
clínica, associada à colaboração estreita
e sempre disponível entre as diferentes
Instituições envolvidas no caso.
PNEUMONIA POR MYCOPLASMA
PNEUMONIAE E SÍNDROME DE STEVENS-JOHNSON
Marisa Carvalho, Fonte M, Costa A, Quaresma M, Trindade A, Cândido C, Pereira
A, Dias F
Serviço de Pediatria, Centro Hospitalar de
Trás-os-Montes/Alto Douro, EPE
O Síndrome de Stevens-Johnson
caracteriza-se pela associação de lesões
cutâneas acompanhadas de atingimento
de duas ou mais superfícies mucosas. A
etiologia pode ser infecciosa (Mycoplasma pneumoniae), medicamentosa ou
idiopática e o tratamento é fundamentalmente de suporte e sintomático.
Os autores apresentam o caso
clínico de um adolescente de 12 anos,
sexo masculino, sem antecedentes pes-
resumo dos posters
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
S 211
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
soais e familiares relevantes, observado
no serviço de urgência por febre elevada, lesões de mucosite e conjuntivite bilateral com cerca de 72h de evolução.
O exame objectivo revelava hiperémia
conjuntival bilateral associada a lesões
de queilite, glossite e, cerca de 24h depois, um exantema macular eritematoso
disperso pelo tronco e membros, associado a sinais de dificuldade respiratória. Da investigação analítica efectuada
salienta-se contagem total de leucócitos
normal, elevação da velocidade de hemosedimentação e da proteína de fase
aguda, crioaglutininas positivas e serologias vírica e bacteriana negativas. Iniciou terapêutica de suporte, corticoterapia e claritromicina. Teve alta ao nono
dia de internamento ainda com lesões
de mucosite e alterações na auscultação
pulmonar, a cumprir 14 dias de terapêutica antibiótica. Actualmente seguido em
consulta externa por hiperreactividade
brônquica pós-infecciosa.
Os autores pretendem relembrar
que apesar do Mycoplasma pneumoniae
ser um agente frequente de infecção no
aparelho respiratório com um curso autolimitado, também pode atingir outros
orgãos, acarretando morbilidade significativa, assim como desencadear broncospasmo em crianças não asmáticas.
INFECÇÃO POR VIH – TRATAR NÃO É
SÓ MEDICAR
Carla Teixeira, Paula Rodrigues, Cármen
Cardoso, Angélica Morais, Fátima Sequeira, Alcinda Diz, Carmo Santos, Laura
Marques.
Serviço de Pediatria - Consulta de Imunologia;
Consulta Externa; Serviço Educativo; Serviço
Social e Departamento de Pedopsiquiatria do
Hospital de Crianças Maria Pia
Introdução: A infecção pelo Vírus
da Imunodeficiência Humana (VIH) condiciona toda a vida da criança, incluindo
a dinâmica familiar e social.
A discriminação associada dificulta
a integração social e o processo de aceitação da doença por parte destas crianças e suas famílias/educadores.
Neste contexto, são colocados novos desafios aos profissionais de saúde
que ultrapassam o tratamento hospitalar
clássico.
Objectivos: Promover a Saúde,
como bem-estar físico, mental e social
das crianças e famílias.
Promover o convívio e a partilha de
experiências entre crianças infectadas
pelo VIH e seus familiares/conviventes.
Aprofundar a formação e a informação das famílias sobre a doença e seu
tratamento.
Promover a comunicação entre doentes e equipa de saúde
Material e Métodos: Foram organizados três encontros com as crianças,
familiares e técnicos de saúde, reunindo
a acção educativa à lúdica.
Nos encontros foi utilizada a seguinte metodologia: criação de um grupo de
pais com componente formativa e de partilha de experiências, realização em paralelo de actividades lúdicas com as crianças, e por fim, um momento de convívio
e actividades conjuntas com crianças,
familiares e profissionais de saúde.
Resultados e Conclusões: Participaram 12 crianças infectadas, com
idades entre os 2 e 16 anos, e seus familiares (pais, irmãos, tios e responsáveis
institucionais).
No primeiro encontro efectuado
em Dezembro de 2005 no Hospital de
Crianças Maria Pia, foi organizada uma
reunião do grupo de pais/educadores
com partilha de experiências e vivências
relacionadas com a doença.
O segundo realizou-se em Setembro de 2006 no Parque Biológico de
Gaia, tendo sido trabalhado com o grupo
de pais o tema da revelação do diagnóstico da infecção pelo VIH. As crianças
participaram em diversas actividades
organizadas pelo Parque. O encontro
terminou com um almoço-convívio e actividades conjuntas para pais/educadores e filhos
Em Abril de 2007, foi efectuado o
terceiro, com teatro de fantoches para as
crianças e famílias. Em seguida, decorreram em espaços diferentes, actividades
de expressão plástica para as crianças e
uma reunião com os pais/educadores sobre adesão à terapêutica anti-retrovírica,
finalizando com um lanche e caçada aos
ovos de Páscoa.
resumo dos posters
S 212
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
Estas reuniões foram avaliadas
positivamente pelas crianças e famílias.
Proporcionaram à equipa de saúde um
conhecimento mais personalizado de
cada situação, ajudando a desenvolver
estratégias adequadas a cada criança.
Uma experiência a continuar!
IMUNOGLOBULINA SUBCUTÂNEA
– OS PRIMEIROS DOENTES DO
HOSPITAL DE CRIANÇAS MARIA PIA
Carla Teixeira, Patrícia Dias, Laura
Marques.
Unidade de Imunologia - Hospital de Crianças
Maria Pia – Porto
Introdução: A terapêutica substitutiva com imunoglobulina constitui a
base do tratamento de várias imunodeficiências primárias, nomeadamente da
agamaglobulinemia ligada ao X. A perfusão de imunoglobulina tem sido efectuada por via endovenosa, implicando a
deslocação das crianças ao hospital de
dia com uma periodicidade de 3 ou 4 semanas. A imunoglobulina subcutânea foi
recentemente introduzida em Portugal. A
sua administração é mais fácil e menos
invasiva, permitindo o tratamento domiciliário.
Material e Métodos: Foi iniciado um
estudo prospectivo da eficácia e tolerância da administração de imunoglobulina
subcutânea em crianças com agamaglobulinemia, de acordo com um protocolo
que contempla o ensino aos pais e crianças para auto-administração domiciliária
e a avaliação clínica e analítica seriada.
Resultados: A terapêutica com
imunoglobulina subcutânea foi instituída
em três crianças com agamaglobulinemia
ligada ao X, com 10, 2 e 3 anos. Foram
observadas uma boa adesão e boa tolerância dos pais e crianças à nova via de
administração. Ocorreu apenas um episódio de reacção local ligeira ao produto
numa criança. Os níveis pré-infusão de
IgG obtidos foram mais elevados, o que
permitiu reduzir as doses de imunoglobulina administrada. Não se registaram
intercorrências infecciosas. Foi fornecido
um manual de administração e efectuado
ensino do método aos pais no hospital de
dia, com boa aceitação. A administração
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
de imunoglobulina subcutânea foi realizada inicialmente sob supervisão da enfermeira responsável, e posteriormente de
forma independente no domicílio. A criança mais velha participou activamente na
administração e verificou-se uma melhoria na sua aceitação da terapêutica. As
famílias valorizaram o facto de poderem
escolher os dias e horários mais adequados para o tratamento, resultando em
menor absentismo escolar e laboral.
Conclusões: Os resultados nos
primeiros três doentes em que utilizamos
esta via de administração são muito positivos e muito encorajadores. A obtenção de níveis séricos de imunoglobulina
pré-administração mais elevados nestas
crianças permitiu reduzir a dose de imunoglobulina administrada. A comodidade
da administração domiciliária e a redução
do número de deslocações ao hospital
são vantagens importantes. Não se verificaram acidentes nem reacções adversas
importantes com esta via de administração. O estudo irá prosseguir com inclusão de novos doentes.
ESTUDO DO PERFIL DE SUSCEPTIBILIDADE A BETALACTÂMICOS EM
SUBCULTURAS CONSECUTIVAS DE
E. COLI
Silvia Branco Lima
Serviço de Patologia Clínica do Hospital de
Crianças Maria Pia
Introdução: No Laboratório de
Microbiologia do Serviço de Patologia
Clínica do Hospital Maria Pia são processados vários produtos biológicos
para identificar e determinar o perfil de
susceptibilidade aos antibióticos do(s)
agente(s) patogénico(s). Dos estudos
microbiológicos pretende-se que os resultados obtidos in vitro sejam o mais
próximo possível do que se passa in vivo,
não esquecendo que falta a interacção
do microrganismo com o hospedeiro que
é muito complexa e está longe de ser
completamente compreendida e não é
possível de ser simulada laboratorialmente. O que se sabe é que a interacção
entre estas duas entidades vivas desempenha um importante papel na prática do
diagnóstico microbiológico e no controlo
de doenças infecciosas. Neste trabalho
pretendeu-se comprovar ou não a veracidade desta afirmação “As bactérias mantêm as suas características só até oito
passagens” com o objectivo de garantir a
qualidade dos resultados bacteriológicos,
submetendo todas as estirpes estudadas
à pressão por ampicilina e à pressão por
subculturas consecutivas. A pressão selectiva por antibióticos é o principal factor
para explicar o aumento da resistência.
A prevalência actual da resistência deve
ser monitorizada continuadamente cada
ano. O impacto da resistência a um antibiótico e o seu mecanismo específico, incluindo a transmissão, deve ser estudado
cuidadosamente. Tais informações podem ajudar na orientação das estratégias
a seguir para maximizar o sucesso terapêutico e minimizar o aparecimento de
resistência. A importância epidemiológica
da resistência cromossómica e plasmídica é, sem dúvida, muito diferente sendo
a plasmídica a que origina maior difusão
das resistências bacterianas o que dá lugar a numerosos surtos epidémicos por
bactérias resistentes.
Material e Métodos: A Escherichia
coli é o mais comum dos Gram negativo causador de infecções nosocomiais
e adquiridas na comunidade. É o agente predominante das infecções do tracto
urinário. Assim propôs-se a estudar três
estirpes de E. coli, uma que é completamente conhecida, porque é uma estirpe
de colecção portadora de um plasmídeo
que confere resistência à ampicilina denominada por E. coli modelo e duas de
isolamentos clínicos de urinas a E. coli
12071 e a E. coli 13114. Tendo-se a noção que só é conhecido o mecanismo
de resistência aos antibióticos na estirpe modelo, procurou-se estirpes clínicas
que tivessem características fenotípicas
de resistência aos antibióticos semelhantes às do modelo observadas através
das concentrações mínimas inibitórias
obtidas no Vitek 32.
Resultados e Conclusões: Nas
estirpes clínicas apesar do comentário
feito pelo Vitek 32, relativamente ao mecanismo de resistência aos antibióticos,
ser igual para a EC12071 e a EC13114
e de ao longo do trabalho nunca se ter
alterado, achou-se que os mecanismos
de resistência aos antibióticos são diferentes.
O autor considera que a resistência
aos antibióticos na EC12071 é devida a
uma penicilinase associada a um mecanismo de impermeabilidade às penicilinas e na EC13114 é devida uma cefalosporinase intrínseca de baixo nível e/ou
penicilinase de alto nível. Muito embora
não se tenha comprovado a veracidade
da afirmação que inspirou este estudo,
manda a prudência que o trabalho se processe o mais rápido possível para que os
clínicos tirem o máximo partido dos resultados laboratoriais.
PREVALÊNCIA DA RESISTÊNCIA À
VANCOMICINA EM ENTEROCOCCUS
NO HOSPITAL DE CRIANÇAS MARIA
PIA DE 2003 A 2006.
Paula Rodrigues, Fernanda Teixeira,
Laura Marques
Comissão de Controlo de Infecção e Serviço
de Patologia Clínica do H.ospital de Crianças
Maria Pia
Introdução: Os Enterococcus fazem parte da flora comensal do aparelho
digestivo humano, com escasso poder
de invasão ou patogenicidade. Assumem particular importância em ambiente
hospitalar, nomeadamente em doentes
debilitados e sujeitos a antibioterapia
prolongada, pelo risco de emergência de
estirpes resistentes à Vancomicina.
Objectivo: Neste estudo pretendemos conhecer a taxa de Enterococcus
resistentes à Vancomicina (VRE) no Hospital de Crianças Maria Pia nos últimos 4
anos e comparar os indicadores obtidos.
Material e Métodos: Estudo retrospectivo de todos os Enterococcus isolados entre 1 de Janeiro de 2003 e 31 de
Dezembro de 2006 no Serviço de Patologia Clínica do Hospital de Crianças Maria
Pia.
Foram calculadas as taxas de resistência dos Enterococcus à Vancomicina,
as taxas de prevalência de VRE por 100
doentes internados e por 1000 dias de
internamento. Analisaram-se mais detalhadamente os doentes com VRE através
da consulta dos dados dos processos clínicos.
resumo dos posters
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
S 213
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2006, vol XV, n.º 3
Resultados: Na tabela seguinte,
apresenta-se a distribuição numérica
anual dos resultados obtidos
Doentes internados
Dias de internamento
2003
2004
2005
2006
4103
4687
4441
4382
19223 19562 17622 17462
Isolados de Enterococcus
78
79
134
102
Doentes com Enterococcus
47
48
63
57
Isolados de E. faecium
16
15
36
23
Doentes com E. faecium
9
13
14
11
Isolados de VRE
11
3
28
17
Doentes com VRE
4
3
11
7
As taxas de resistência dos Enterococcus à Vancomicina, de 2003-2006,
foram as seguintes
2003
2004
2005
2006
VRE no total de
Enterococcus
14,1% 3,8% 20,9% 16,7%
VRE no total de E.
faecium
68,8% 20,0% 77,8% 73,9%
Todos os Enterococcus faecalis isolados eram sensíveis à Vancomicina.
A prevalência de VRE nos 4 anos do
estudo foi a seguinte
2003 2004 2005 2006
Por 1000 dias de
internamento
0,57
0,15
1,59
0,97
Por 100 doentes
internados
0,10
0,06
0,25
0,16
O total de doentes com VRE, nos
isolados de 2003 a 2006, foi 23, 11 do
sexo feminino. Dezassete (74%) tinham
idade ≤1ano e 20 (87%) tinham doença
crónica, com vários internamentos prévios, nomeadamente na UCI.
Conclusões: Neste estudo encontramos taxas de resistência à vancomicina elevadas nos E. faecium isolados
neste período de tempo, registando-se
alguma variabilidade nas prevalências
anuais. Todos os E. faecalis isolados
eram sensíveis à vancomicina.
A maioria dos VRE foi isolada em
crianças com idade ≤1ano, imunodeprimidas, com patologia crónica e internamentos anteriores.
Nestes casos as medidas de controlo de infecção são fundamentais para
evitar a sua disseminação em ambiente
hospitalar, sobretudo em sectores de
maior risco.
COMPLICAÇÕES CARDIOVASCULARES DA DOENÇA DE KAWASAKI
Marta João Silva, Marília Loureiro, Cláudia Moura, Jorge Moreira, Rui Anjos,
José Carlos Areias , Sílvia Álvares, Queirós e Melo.
Serviço de Cardiologia Pediátrica do Hospital
de São João, Porto
Serviço de Cardiologia Pediátrica do Hospital
de Crianças Maria Pia, Porto
Serviço de Cardiologia Pediátrica do Hospital
Santa Cruz, Lisboa
Introdução: A doença de Kawasaki
é uma vasculite aguda de etiologia desconhecida que pode ter complicações
cardiovasculares graves sendo, nos países desenvolvidos, a doença cardíaca
adquirida mais importante da infância.
Casos Clínicos: Os autores apresentam dois casos de doença de Kawasaki que apresentaram complicações
cardiovasculares com formação de aneurismas gigantes das artérias coronárias.
Caso 1: Criança do sexo feminino,
caucasiana, 6 anos de idade, internada
aos 4 anos por doença de Kawasaki. O
ecocardiograma transtorácico executado
no 15º dia de febre, evidenciou origem
aneurismática da artéria coronária direita,
resumo dos posters
S 214
XVIII reunião do hospital de crianças maria pia
da artéria circunflexa e da descendente
anterior, confirmado por cateterismo cardíaco. Efectuou imunoglobulina e iniciou
terapêutica com Ácido Acetilsalicílico à
qual se associou, posteriormente, Clopidogrel. Manteve-se assintomática do foro
cardiovascular. A cintigrafia de perfusão
miocárdica foi normal. Repetiu, posteriormente, o cateterismo cardíaco, e por
manter aneurismas volumosos, iniciou hipocoagulação oral com Varfarina.
Caso 2: Criança do sexo masculino,
caucasiano, 10 anos de idade, internado
aos 12 meses, por doença de Kawasaki,
apresentando no ecocardiograma transtorácico, executado ao 18º dia de evolução
da doença, aneurisma da artéria coronária esquerda. Efectuou Imunoglobulina e
iniciou terapêutica com Ácido Acetilsalicílico. Manteve-se sempre assintomático
do foro cardiovascular. Efectuou cintigrafia de perfusão miocárdica, que revelou
moderado defeito de perfusão do ápex e
dos segmentos apical e médio da parede
anterior e septal após esforço. Fez cateterismo cardíaco que mostrou oclusão no
segmento médio da artéria descendente
anterior, estenose de 90% no segmento
proximal da circunflexa e aneurisma volumoso da origem da artéria coronária
direita. Iniciou Atenolol e hipocoagulação
oral com Varfarina. Foi submetido a cirurgia, com duplo by-pass aorto-coronário, e
plastia com remoção da parede do aneurisma da coronária descendente proximal. Encontra-se medicado com Ácido
Acetilsalícilico e Clopidogrel.
Conclusão: O diagnóstico tardio da
doença de Kawasaki, está associado a
um maior risco de morbilidade cardiovascular. Estes dois casos sublinham a importância da necessidade da instituição
precoce da terapêutica, numa tentativa
de redução das complicações a médio a
e longo prazo.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2007, vol XVI, n.º 3
Errata
VOL. 16 – nº 2 – ano 2007
No Vol. 16 nº 2 da revista, na página 65, no artigo “Prevalência da enurese nocturna em
crianças em idade escolar na zona Norte de Portugal”, por lapso não foram incluídos todos
os nomes dos Colegas que participaram no Estudo como colaboradores. Lamentando o
sucedido apresentamos o texto com as correcções devidas:
Prevalência da Enurese Nocturna
em Crianças em Idade Escolar
na Zona Norte de Portugal
Anabela Bandeira1, João Luís Barreira2, Paula Matos3
Grupo Coordenador: João Luís Barreira, Laura Soares, Paula Matos, Paulo Teixeira,
Teresa Costa
Grupo de Colaboradores: Teresa Costa, Eunice Moreira (HMaria Pia), Paula Matos,
Felisbela Rocha, Anabela Bandeira (HSanto António), Álvaro Sousa (HSanto Tirso),
João Luís Barreira (HSão João), Cristiana Ribeiro, Joana Rios (HViana Castelo), Paulo
Teixeira (HFamalicão), Manuel Reis (HAmarante), Susana Lira (HVale Sousa), Fátima
Dias, Miguel Fontes (HVila Real), Gorete Lobarinhas (HBarcelos), Laura Soares, Isabel
Loureiro, Virgínia Monteiro, Susana Lima (HOliveira Azeméis), Fátima Madruga (HOvar),
Paula Rocha, Sílvia Almeida, Lígia Peralta (HAveiro), Reis Morais (HChaves), Eduarda
Cruz, Sílvia Saraiva (HMatosinhos).
errata
215
RESUMO DAS CARACTERÍSTICAS DO MEDICAMENTO
1. DENOMINAÇÃO DO MEDICAMENTO
SINGULAIR® Infantil 4 mg Granulado
SINGULAIR® Infantil 4 mg comprimido para mastigar
SINGULAIR® Junior 5 mg comprimido para mastigar
2. COMPOSIÇÃO QUALITATIVA E QUANTITATIVA
SINGULAIR Infantil Granulado: Uma saqueta de granulado contém montelucaste sódico, equivalente a 4 mg de montelucaste. Comprimido para mastigar: Um comprimido
para mastigar contém montelucaste sódico, equivalente a 4 mg de montelucaste. SINGULAIR Júnior Um comprimido para mastigar contém montelucaste sódico, equivalente
a 5 mg de montelucaste. Lista completa de excipientes, ver secção 6.1. 3. FORMA FARMACÊUTICA SINGULAIR Infantil Granulado: Granulado branco Comprimido para
mastigar: Cor de rosa oval com forma bi-convexa, com SINGULAIR gravado numa face e MSD 711 na outra. SINGULAIR Júnior Comprimido para mastigar: Rosa, redondo,
biconvexo, diâmetro de 9,5 mm, com SINGULAIR gravado numa face e MSD 275 na outra. 4. INFORMAÇÕES CLÍNICAS 4.1 Indicações terapêuticas SINGULAIR Infantil e
Júnior estão indicados no tratamento da asma como terapêutica adjuvante nos doentes com asma persistente ligeira a moderada, controlados de forma inadequada com
corticosteróides inalados e nos quais os agonistas beta de actuação rápida “usados quando necessário” não proporcionam o controlo adequado da asma. SINGULAIR
Infantil e Júnior podem também ser uma alternativa ao tratamento com doses baixas de corticosteróides inalados em doentes dos 2 aos 5 anos de idade com asma persistente
ligeira sem história recente de ataques de asma graves que necessitam de utilização de corticosteróides orais, e que tenham demonstrado não serem capazes de utilizar
os corticosteróides inalados (ver secção 4.2). SINGULAIR Infantil e Júnior estão também indicados na profilaxia da asma quando a componente predominante é a broncoconstrição
induzida pelo exercício. 4.2 Posologia e modo de administração SINGULAIR Infantil Granulado: A posologia para doentes pediátricos dos 6 meses aos 5 anos de idade é de
uma saqueta de granulado de 4 mg, tomado diariamente à noite. Não são necessários acertos posológicos neste grupo etário. É limitada a experiência de utilização em
doentes pediátricos dos 6 aos 12 meses de idade. Não foram estabelecidas a segurança e eficácia para idades inferiores a 6 meses. Administração: SINGULAIR Infantil
granulado pode ser administrado directamente na boca ou numa colher misturado com alimentos moles frios ou à temperatura ambiente, por exemplo: puré de maçã, cenoura,
arroz ou gelado. A saqueta deve ser aberta somente no momento de utilizar. Após abertura da saqueta, deve administrar-se de imediato (no prazo de 15 minutos) a dose total
de granulado de SINGULAIR Infantil. Uma vez misturado com alimentos, o granulado de SINGULAIR Infantil não deve ser guardado para posterior utilização. O granulado de
SINGULAIR Infantil não se destina à dissolução em líquidos. No entanto, poderão ser ingeridos líquidos após a administração. SINGULAIR Infantil granulado pode ser tomado
independentemente do horário das refeições. Comprimidos para mastigar: A posologia para doentes pediátricos dos 2 aos 5 anos de idade é de um comprimido para mastigar
de 4 mg, tomado diariamente à noite. Se tomado com alimentos, SINGULAIR Infantil deverá ser administrado uma hora antes ou duas horas depois dos alimentos. Não são
necessários acertos posológicos neste grupo etário. Não foram estabelecidas a segurança e eficácia dos comprimidos para mastigar de 4 mg na população pediátrica com
menos de 2 anos de idade. SINGULAIR Júnior A posologia para doentes pediátricos dos 6 aos 14 anos é de um comprimido para mastigar de 5 mg, tomado diariamente à
noite. Se tomado com alimentos, SINGULAIR Júnior deverá ser administrado uma hora antes ou duas horas depois dos alimentos. Não são necessários acertos posológicos
neste grupo etário. Recomendações gerais O efeito terapêutico de SINGULAIR Infantil e Júnior nos parâmetros de controlo da asma ocorre nas 24 horas após a administração.
Os doentes devem ser advertidos para continuarem a tomar SINGULAIR Infantil ou Júnior mesmo que a asma esteja controlada, assim como nos períodos de agravamento.
Não é necessário qualquer ajuste posológico nos doentes com insuficiência renal ou insuficiência hepática ligeira a moderada. Não existem dados sobre doentes com
insuficiência hepática grave. A posologia é igual em doentes do sexo masculino e do sexo feminino. SINGULAIR Infantil e Júnior como alternativa aos corticosteróides
inalados de baixa dosagem na asma persistente ligeira: O montelucaste não é recomendado em monoterapia em doentes com asma persistente moderada. A utilização de
montelucaste como alternativa aos corticosteróides de baixa dosagem em crianças dos 2 aos 14 anos de idade com asma persistente ligeira só deve ser considerada em
doentes sem história recente de ataques de asma graves que exigiram utilização de corticosteróides orais, e que tenham demonstrado não serem capazes de utilizar os
corticosteróides inalados (Ver secção 4.1). A asma persistente ligeira é definida por sintomas asmáticos que ocorrem mais do que uma vez por semana mas menos do que
uma vez por dia, sintomas nocturnos mais do que duas vezes por mês mas menos do que uma vez por semana, função pulmonar normal entre os episódios. Se não se
alcançar o controlo satisfatório da asma na visita de acompanhamento (geralmente no prazo de um mês), deve ser avaliada a necessidade de uma terapêutica anti-inflamatória
diferente ou adicional com base no esquema terapêutico para o tratamento da asma. Os doentes devem ser periodicamente avaliados em relação ao seu controlo da asma.
Terapêutica com SINGULAIR Infantil ou Júnior relacionada com outros tratamentos da asma Quando o tratamento com SINGULAIR Infantil ou Júnior é usado como terapêutica
adjuvante aos corticosteróides inalados, o SINGULAIR Infantil ou Júnior não deve substituir de forma abrupta os corticosteróides inalados. (ver secção 4.4). Os comprimidos
de 10 mg estão disponíveis para adultos com idade igual ou superior a 15 anos. 4.3 Contra-indicações Hipersensibilidade à substância activa ou a qualquer dos excipientes.
4.4 Advertências e precauções especiais de utilização Os doentes devem ser informados de que nunca devem usar montelucaste administrado por via oral para tratar
ataques agudos de asma, e que devem manter disponíveis os habituais medicamentos de recurso apropriados. Em caso de ocorrência de um ataque agudo, deverá ser
usado um agonista beta de actuação rápida. Os doentes devem contactar o médico o mais depressa possível, caso necessitem de mais inalações deste agonista beta do
que as habituais. O montelucaste não deve substituir de forma abpruta os corticosteróides inalados ou de administração oral. Não existem dados demonstrativos de que os
corticosteróides de administração oral possam ser reduzidos com o uso concomitante com montelucaste. Em casos raros, doentes em tratamento com medicamentos antiasmáticos, incluindo o montelucaste, podem apresentar eosinofilia sistémica, por vezes com sinais clínicos de vasculite consistente com a síndrome de Churg-Strauss, uma
situação que é normalmente tratada com corticosteróides sistémicos. Este casos foram geralmente associados, embora nem sempre, a redução ou interrupção da terapêutica
com corticosteróides orais. Não pode ser excluída, nem comprovada, a possibilidade dos antagonistas receptores leucotrienos estarem associados ao aparecimento da
síndrome de Churg-Strauss. Os médicos devem estar atentos para a ocorrência nos seu doentes de eosinofilia, exantema vasculítico, agravamento dos sintomas pulmonares,
complicações cardíacas, e/ou neuropatia. Os doentes que desenvolverem estes sintomas devem ser reanalisados e os seus esquemas de tratamento avaliados. SINGULAIR
Infantil e Júnior, comprimidos para mastigar, contêm aspartamo, uma fonte de fenilalanina. Os doentes com fenilcetonúria devem ter em consideração que cada comprimido
para mastigar de 4 mg e de 5 mg contém, respectivamente, uma quantidade equivalente a 0,674 mg e 0,842 mg de fenilalanina. Não foram ainda estabelecidas a segurança
e eficácia do granulado de 4 mg na população pediátrica com menos de 6 meses de idade. Não foram estabelecidas a segurança e eficácia dos comprimidos para mastigar
de 4 mg na população pediátrica com menos de 2 anos de idade. 4.5 Interacções medicamentosas e outras formas de interacção O montelucaste pode ser administrado
com outras terapêuticas comummente usadas na profilaxia e tratamento crónico da asma. Em estudos de interacção medicamentosa, as posologias clínicas recomendadas
de montelucaste, não tiveram efeitos clinicamente importantes na farmacocinética dos seguintes medicamentos: teofilina, prednisona, prednisolona, contraceptivos orais
(etinil-estradiol/noretindrona 35/1), terfenadina, digoxina e varfarina. A área sob a curva de concentração plasmática (AUC) de montelucaste foi diminuída em aproximadamente
40% em indivíduos sob co-administração de fenobarbital. Dado que o montelucaste é metabolisado pelo CYP 3A4, dever-se-á ter precaução, particularmente nas crianças,
quando o montelucaste for co-administrado com indutores do CYP3A4, tais como fenitoína, fenobarbital e rifampicina. Estudos in vitro demonstraram que o montelucaste é
um potente inibidor do CYP 2C8. No entanto, resultados de um estudo clínico sobre interacções medicamentosas com montelucaste e rosiglitazona (um substrato específico
representativo dos fármacos primariamente metabolizados pelo CYP2C8) demonstraram que o montelucaste não inibe o CYP2C8 in vivo. Consequentemente, não se prevê
que o montelucaste altere de forma marcante o metabolismo de fármacos metabolizados por esta enzima (por ex., paclitaxel, rosiglitazona e repaglinida). 4.6 Gravidez e
aleitamento Utilização Durante a Gravidez Os estudos em animais não indicam quaisquer efeitos nefastos no que respeita à gravidez ou ao desenvolvimento embrionário/fetal.
Os dados limitados disponíveis nas bases de dados sobre gravidez não sugerem a existência de uma relação de causalidade entre SINGULAIR e malformações (i.e., defeitos
nos membros) que foram raramente relatados durante a experiência de comercialização a nível mundial. SINGULAIR não deve ser utilizado durante a gravidez, a menos que
tal seja claramente necessário. Utilização durante o aleitamento Estudos em ratos demonstraram que o montelucaste é excretado no leite (ver secção 5.3). Não se sabe se
o montelucaste é excretado no leite humano. SINGULAIR só pode ser usado em mães a amamentar se for considerado claramente necessário. 4.7 Efeitos sobre a capacidade
de conduzir e utilizar máquinas Não se espera que o montelucaste afecte a capacidade dos doentes para conduzir veículos ou utilizar máquinas. Contudo, em casos muito
raros, foi relatada sonolência. 4.8 Efeitos indesejáveis O montelucaste foi avaliado em estudos clínicos do modo a seguir descrito: • comprimidos revestidos por película de
10 mg, em aproximadamente 4.000 doentes adultos com idade igual ou superior a 15 anos. • comprimidos para mastigar de 5 mg, em aproximadamente 1.750 doentes
pediátricos dos 6 aos 14 anos de idade. • comprimidos para mastigar de 4 mg, em 851 doentes pediátricos dos 2 aos 5 anos de idade, e • granulado de 4 mg, em 175 doentes
pediátricos dos 6 meses aos 2 anos de idade. Foram frequentemente (>1/100, <1/10) relatadas em estudos clínicos as seguintes reacções adversas relacionadas com o
fármaco em doentes tratados com montelucaste, e com uma incidência superior à dos doentes tratados com placebo:
Sistema do Organismo
Corpo em geral
Doentes Adultos
15 ou mais anos
de idade
(dois estudos de
12 semanas; n=795)
Doentes Pediátricos
6 a 14 anos de idade
(um estudo de 8 semanas;
n=201)
(dois estudos de
56 semanas; n=615)
dor abdominal
Perturbações do
aparelho digestivo
Sistema nervoso /
psiquiátrico
Doentes Pediátricos
2 a 5 anos de idade
(um estudo de
12 semanas; n=461)
(um estudo de
48 semanas; n=278)
Doentes Pediátricos
6 meses até 2 anos
de idade
(um estudo de
6 semanas; n=175)
dor abdominal
sede
cefaleias
diarreia
cefaleias
hipercinésia
Doenças respiratórias
asma
Afecções dos tecidos
cutâneos e faneras
dermatite
eczematosa,
exantema
O perfil de segurança não se alterou com o tratamento prolongado, em estudos clínicos com duração até 2 anos para adultos, e até 12 meses para doentes pediátricos dos
6 aos 14 anos de idade, com um número limitado de doentes. Cumulativamente, 502 doentes pediátricos dos 2 aos 5 anos de idade foram tratados com montelucaste por um
período de pelo menos 3 meses, 338 durante 6 meses ou mais e 534 doentes durante 12 meses ou mais. O perfil de segurança nestes doentes também não se alterou com
o tratamento prolongado. O perfil de segurança em doentes pediátricos dos 6 meses aos 2 anos de idade não se alterou com o tratamento até 3 meses. Foram muito raramente
relatadas as seguintes reacções adversas na utilização pós-comercialização: Corpo em geral: astenia/fadiga, mal-estar, edema, reacções de hipersensibilidade incluindo
anafilaxia, angioedema, urticária, prurido, exantema e um caso isolado de infiltração eosinofílica hepática Sistema nervoso/psiquiátrico: tonturas, sonhos anómalos incluindo
pesadelos, alucinações, sonolência, insónia, parestesia/hipoestesia, irritabilidade, agitação incluindo comportamento agressivo, nervosismo, convulsões Afecções
musculosqueléticas: artralgia, mialgia incluindo cãibras musculares Perturbações do aparelho digestivo: diarreia, xerostomia, dispepsia, náuseas, vómitos Afecções
hepatobiliares: níveis aumentados das transaminases séricas AST e ALT, hepatite colestática Perturbações cardiovasculares: aumento da tendência hemorrágica, contusões,
palpitações. Foram relatados casos muito raros de Síndrome de Churg-Strauss (CSS) durante o tratamento com montelucaste em doentes asmáticos (ver Secção 4.4).
4.9 Sobredosagem Não está disponível informação específica sobre o tratamento da sobredosagem com montelucaste. Em estudos na asma crónica, o montelucaste foi
administrado a doentes em doses até 200 mg/dia, até 22 semanas, e em estudos de curto prazo, até 900 mg/dia, por períodos aproximados de uma semana, sem experiências
adversas de importância clínica. Houve relatos de sobredosagem aguda na experiência pós-comercialização e nos estudos clínicos com montelucaste. Estes incluem relatos
em adultos e crianças com uma dose de 1000 mg (aproximadamente 61 mg/kg numa criança de 42 meses). Os resultados clínicos e laboratoriais observados foram consistentes
com o perfil de segurança em adultos e em doentes pediátricos. Não ocorreram experiências adversas na maioria dos relatos de sobredosagem. As experiências adversas
que ocorreram mais frequentemente foram consistentes com o perfil de segurança do montelucaste e incluíram dor abdominal, sonolência, sede, cefaleias, vómitos e
hiperactividade psicomotora. Não se sabe se montelucaste é removível por hemodiálise ou diálise peritoneal. 5. PROPRIEDADES FARMACOLÓGICAS 5.1 Propriedades
PRODUTO
EMB.
PVP
%
ESTADO
DOENTE
C. UNIT.
SING. INFANT. Granulado 4mg
SING. INFANT. Granulado 4mg
SING. INFANTIL 4mg
SING. INFANTIL 4mg
SING. JUNIOR 5mg
SING. JUNIOR 5mg
20 saque.
28 saque.
14 comp.
28 comp.
14 comp.
28 comp.
€31,95
€42,94
€23,66
€42,59
€21,46
€41,56
0%
0%
0%
0%
69%
69%
€14,81
€28,67
€31,95
€42,94
€23,66
€42,59
€6.65
€12,88
€1,59
€1,53
€1,69
€1,52
€1,53
€1,48
C.M.T.D.
ESTADO
DOENTE
€1,59
€1,53
€1,69
€1,52
€1,06
€0,47
€1,02
€0,46
farmacodinâmicas Grupo farmacoterapêutico: Antiasmáticos para uso sistémico, Antagonistas dos receptores dos leucotrienos Código ATC: RO3D C03 Os cisteínil-leucotrienos
(LTC4, LTD4, LTE4) são potentes agentes inflamatórios eicosanóides, libertados por várias células, incluindo os mastócitos e os eosinófilos. Estes importantes mediadores
pró-asmáticos ligam-se a receptores dos cisteínil-leucotrienos (Cys LT) que se encontram nas vias respiratórias humanas e exercem actividade nas vias respiratórias,
incluindo broncoconstrição, secreção de muco, permeabilidade vascular e mobilização de eosinófilos. O montelucaste é um composto activo por via oral que se liga com
alta afinidade e selectividade ao receptor Cys LT1. Nos ensaios clínicos doses, tão baixas quanto 5 mg de montelucaste inibem a broncoconstrição induzida pelo LTD4 inalado.
A broncodilatação foi observada no prazo de 2 horas da administração oral. O efeito broncodilatador causado por um agonista beta foi aditivo ao causado pelo montelucaste.
O tratamento com montelucaste inibiu as fases precoce e tardia da broncoconstrição, devido a estimulação antigénica. O montelucaste diminuiu o número de eosinófilos
do sangue periférico, nos doentes adultos e pediátricos comparativamente com o placebo. Num estudo separado, o tratamento com montelucaste diminuiu significativamente
o número de eosinófilos das vias respiratórias (conforme medições da expectoração). Em doentes adultos e pediátricos de 2 a 14 anos de idade, o montelucaste, em
comparação com o placebo, diminuíu o número de eosinófilos do sangue periférico, enquanto se verificavam melhorias no controlo clínico da asma. Em estudos com adultos,
montelucaste 10 mg, uma vez por dia, demonstrou melhorias significativas no VEMS matinal (10,4% vs 2,7% em relação aos valores basais), débito expiratório máximo
instantâneo (DEMI) matinal (24,5 L/min vs 3,3 L/min em relação aos valores basais), e diminuição significativa no uso total de agonistas beta (-26,1% vs -4,6% em relação aos
valores basais), quando comparado com o placebo. Melhorou significativamente os sintomas diurnos e os despertares nocturnos por sintomas relatados pelo doente, quando
comparado com o placebo. Estudos em adultos demonstraram a capacidade aditiva de efeitos clínicos de montelucaste com os corticosteróides inalados (alteração percentual
em relação aos valores basais para a beclometasona inalada e montelucaste vs beclometasona isolada, respectivamente para VEMS: 5,43% vs 1,04%; uso de agonistas
beta: - 8,70% vs 2,64%). Comparado com a beclometasona inalada (200 μg duas vezes por dia, com câmara expansora), o montelucaste demonstrou um início de resposta
mais rápido, embora na totalidade das 12 semanas do estudo a beclometasona tivesse um efeito terapêutico global, em média, superior (alteração percentual em relação
aos valores basais para o montelucaste vs a beclometasona, respectivamente para VEMS: 7,49% vs 13,3%; uso de agonistas beta: -28,28% vs -43,89%). Contudo, comparativamente
com a beclometasona, uma alta percentagem dos doentes tratados com montelucaste teve respostas clínicas semelhantes (por exemplo, 50% dos doentes tratados com
beclometasona conseguiram uma melhoria de VEMS de aproximadamente 11% ou mais em relação ao valor basal, enquanto que cerca de 42% dos doentes tratados com
montelucaste conseguiram a mesma resposta). Num estudo em doentes pediátricos dos 6 aos 14 anos de idade com a duração de 8 semanas, 5 mg de montelucaste tomado
uma vez por dia, melhorou significativamente a função respiratória em comparação com o placebo (alterações do VEMS em relação aos valores basais: 8,71% vs 4,16%;
alterações do DEMI matinal em relação aos valores basais: 27,9 L/min vs 17,8 L/min), e promoveu uma diminuição no uso de agonistas beta “usados quando necessário”
(-11,7% vs +8,2% em relação aos valores basais). Num estudo com duração de 12 meses que comparou a eficácia do montelucaste com a da fluticasona inalada no controlo
da asma em doentes pediátricos dos 6 aos 14 anos de idade com asma persistente ligeira, o montelucaste não foi inferior à fluticasona no aumento da percentagem de dias
sem recurso a terapêutica de resgate (DSRTR). Calculando a média sobre o período de 12 meses de tratamento, a percentagem de DSRTR aumentou de 61,6 para 84,0 no
grupo do montelucaste e de 60,9 para 86,7 no grupo da fluticasona. A diferença entre grupos no aumento médio de minímos quadrados (MQ) na percentagem de DSRTR foi
de -2,8 com um IC 95% de -4,7; -0,9. Quer o montelucaste, quer a fluticasona também melhoraram o controlo da asma no que se refere a parâmetros de avaliação secundários
avaliados durante o período de 12 meses de tratamento: O VEMS aumentou de 1,83 l para 2,09 l no grupo do montelucaste e de 1,85 l para 2,14 l no grupo da fluticasona. A
diferença entre grupos no aumento médio de MQ no VEMS foi de - 0,02 l com um IC 95% de -0,06; 0,02. O aumento médio relativamente ao valor inicial em % estimada de
VEMS foi de 0,6 % no grupo de tratamento do montelucaste e de 2,7% no grupo de tratamento da fluticasona. A diferença nas médias de MQ para a variação relativamente
ao valor inicial na % estimada de VEMS foi de -2,2% com um IC 95% de -3,6; -0,7. A percentagem de dias com utilização de agonistas beta diminuiu de 38,0 para 15,4 no grupo
do montelucaste e de 38,5 para 12,8 no grupo da fluticasona. A diferença entre grupos nas médias de MQ para a percentagem de dias com utilização de agonistas beta foi
de 2,7 com um IC 95 % de 0,9; 4,5. A percentagem de doentes com um ataque de asma (sendo um ataque de asma definido por um período de agravamento da asma que
necessita de tratamento com esteróides orais, uma visita não planeada ao consultório médico, uma vista ao serviço de urgência ou hospitalização) foi de 32,2 no grupo do
montelucaste e de 25,6 no grupo da fluticasona; sendo a razão de vantagem (IC 95%) igual a 1,38 (1,04; 1,84). A percentagem de doentes com utilização de corticosteróides
sistémicos (sobretudo orais) durante o período de estudo foi de 17,8% no grupo do montelucaste e de 10,5% no grupo da fluticasona. A diferença entre grupos nas médias
de MQ foi de 7,3% com um IC 95% de 2,9; 11,7. Num estudo de 12 semanas, controlado com placebo em doentes pediátricos dos 2 aos 5 anos de idade, 4 mg de montelucaste,
uma vez por dia melhorou os parâmetros de controlo da asma, em comparação com o placebo, independentemente do uso de terapêutica de controlo concomitante
(corticosteróides inalados/nebulizados ou cromoglicato de sódio inalado/nebulizado). Sessenta por cento dos doentes não estavam sob qualquer outra terapêutica de controlo.
O montelucaste melhorou significativamente os sintomas diurnos (incluindo tosse, respiração difícil e ruidosa, dificuldades respiratórias e limitações da actividade) e os
sintomas nocturnos, em comparação com o placebo. O montelucaste também diminuíu a utilização de agonistas beta de actuação rápida “usados quando necessário” e a
necessidade de recorrer a corticosteróides devido a agravamento da asma, em comparação com o placebo. Os doentes a tomar montelucaste permaneceram mais dias
sem asma do que aqueles que tomaram placebo. Foi obtido efeito terapêutico após a primeira administração. Num estudo de 12 meses, controlado com placebo em doentes
pediátricos dos 2 aos 5 anos de idade com asma ligeira e exacerbações episódicas, o montelucaste 4 mg administrado uma vez por dia reduziu significativamente (p)0,001)
a taxa anual de episódios de exacerbação (EE) de asma, em comparação com o placebo (respectivamente 1,60 EE vs. 2,34 EE) [EE definidas por * 3 dias consecutivos com
sintomas diurnos com necessidade de utilização de agonistas beta, ou de corticosteróides (orais ou inalados), ou de hospitalização para tratamento da asma]. A percentagem
de redução na taxa anual de EE foi de 31,9% com um IC 95% de 16,9; 44,1. A eficácia do montelucaste é suportada em doentes pediátricos dos 6 meses aos 2 anos de idade
através da extrapolação da eficácia demonstrada em doentes asmáticos com idade igual ou superior a 2 anos, e com base nos semelhantes dados farmacocinéticos, assim
como no pressuposto de que a evolução da doença, a patofisiologia e o efeito do fármaco são substancialmente semelhantes nestas populações. Foi demonstrada num
estudo com adultos com a duração de 12 semanas uma redução significativa da broncoconstrição induzida pelo exercício (BIE) (queda máxima do VEMS 22,33% para o
montelucaste vs 32,40% para o placebo; tempo de recuperação dentro de 5% dos valores basais VEMS 44,22 minutos vs 60,64 minutos). Este efeito foi consistente ao longo
do período de 12 semanas do estudo. A redução do BIE foi também demonstrada num estudo de curta duração em doentes pediátricos de 6 a 14 anos (queda máxima do
VEMS 18,27% vs 26,11%; tempo de recuperação dentro de 5% dos valores basais VEMS 17,76 minutos vs 27,98 minutos). O efeito em ambos os estudos foi demonstrado no
final do intervalo da dose diária. Em doentes asmáticos sensíveis ao ácido acetilsalicílico, a fazer terapêutica concomitante com corticosteróides inalados e/ou orais, o
tratamento com montelucaste, em comparação com o placebo, resultou numa melhoria do controlo da asma (alteração do VEMS 8,55% vs -1,74% em relação aos valores
basais e diminuição do uso total de agonistas beta -27,78% vs 2,09% em relação aos valores basais). 5.2 Propriedades farmacocinéticas Absorção O montelucaste é
rapidamente absorvido após administração oral. Para o comprimido revestido de 10 mg, as concentrações plasmáticas máximas (Cmax) são em média conseguidas em
3 horas (Tmax) após administração a adultos em jejum. A biodisponibilidade oral é em média de 64%. A biodisponibilidade oral e a Cmax não são influenciadas por uma refeição
comum. A segurança e eficácia foram demonstradas em estudos clínicos em que o comprimido revestido de 10 mg foi administrado independentemente do horário de
refeições. Para o comprimido para mastigar de 5 mg, a Cmax é atingida 2 horas após a administração a adultos em jejum. A biodisponibilidade oral é, em média, de 73% e
desce para 63% com uma refeição comum. Após administração do comprimido para mastigar de 4 mg a doentes pediátricos dos 2 aos 5 anos de idade em jejum, a Cmax é
atingida 2 horas após a administração. A Cmax média é 66 % superior, enquanto que a Cmin média é inferior à dos adultos a tomar o comprimido de 10 mg. A formulação de
granulado de 4 mg é bioequivalente à do comprimido para mastigar de 4 mg, quando administrada em jejum a adultos. Em doentes pediátricos dos 6 meses aos 2 anos de
idade, a Cmáx é atingida 2 horas após a administração da formulação de granulado de 4 mg. A Cmáx é quase 2 vezes superior à dos adultos que tomam o comprimido de
10 mg. A administração do granulado com de puré de maçã ou com uma refeição normal rica em gorduras não teve qualquer efeito clinicamente significativo na farmacocinética
do montelucaste, tal como determinado pela AUC (respectivamente de 1225,7 vs 1223,1 ng.h/ml com e sem puré de maçã, e respectivamente de 1191,8 vs 1148,5 ng.h/ml com
e sem uma refeição normal rica em gorduras. Distribuição Mais de 99% do montelucaste liga-se às proteínas plasmáticas. O volume de distribuição do montelucaste é de
8 a 11 litros, no estado de equilíbrio. Estudos feitos em ratos com montelucaste radiomarcado, apontam para uma distribuição mínima além da barreira hemato-encefálica.
Por outro lado, às 24 horas após a dose, eram mínimas as concentrações de material radiomarcado em todos os outros tecidos. Biotransformação O montelucaste é largamente
metabolizado. Em estudos com doses terapêuticas, as concentrações plasmáticas de metabolitos do montelucaste são indetectáveis na fase de equilíbrio, quer em adultos,
quer em crianças. Estudos in vitro, usando microssomas de fígado humano, indicam que os citocromos P450 3A4, 2A6 e 2C9 estão envolvidos no metabolismo do montelucaste.
Com base em ulteriores resultados in vitro, obtidos com microssomas de fígado humano, conclui-se que concentrações plasmáticas terapêuticas de montelucaste não inibem
os citocromos P450 3A4, 2C9, 1A2, 2A6, 2C19 ou 2D6. A contribuição dos metabolitos para o efeito terapêutico do montelucaste é mínima. Eliminação A depuração plasmática
do montelucaste é, em média, de 45 ml/min, em adultos saudáveis. Após uma dose de montelucaste radiomarcado, 86% da radioactividade é recuperada nas fezes recolhidas
durante 5 dias e é recuperada na urina < 0,2%. Combinados com estimativas da biodisponibilidade oral, estes dados indicam que o montelucaste e os seus metabolitos são
quase exclusivamente excretados por via biliar. Características nos Doentes Não são necessários ajustes posológicos para os idosos, ou para os doentes com insuficiência
hepática ligeira a moderada. Não foram realizados estudos em doentes com insuficiência renal. Dado que o montelucaste e os seus metabolitos são eliminados pela via
biliar, não se prevê que sejam necessários acertos posológicos em doentes com insuficiência renal. Não há dados sobre a farmacocinética do montelucaste em doentes
com insuficiência hepática grave (pontuação > 9 na escala de Child-Pugh). Foi observada uma diminuição na concentração de teofilina plasmática com doses elevadas de
montelucaste (20 e 60 vezes a dose recomendada para adultos). Este efeito não foi observado com doses recomendadas de 10 mg uma vez por dia. 5.3 Dados de segurança
pré-clínica Em estudos de toxicidade animal, foram observadas ligeiras alterações de TGP (ALT), glicose, fósforo e triglicéridos, de natureza transitória. Os sinais de toxicidade
animal foram: aumento de excreção de saliva, sintomas gastro-intestinais, fezes moles e desequilíbrio iónico. Estes fenómenos ocorreram com doses >17 vezes a exposição
sistémica verificada com a dose clínica. Em macacos, os efeitos adversos apareceram com doses de 150 mg/Kg/dia (> 232 vezes a exposição sistémica verificada com a
dose clínica). Em estudos com animais, montelucaste não afectou a fertilidade nem a capacidade reprodutora com uma exposição sistémica que excedeu 24 vezes a
exposição sistémica clínica. Verificou-se uma ligeira redução no peso corporal das crias no estudo de fertilidade efectuado em ratos fêmea com doses de 200 mg/kg/dia
(>69 vezes a exposição sistémica clínica). Em estudos com coelhos, verificou-se uma maior incidência de ossificação incompleta, em comparação com os controlos dos
outros animais, com uma dose sistémica >24 vezes a exposição sistémica clínica vista com doses clínicas. Não foram verificadas anomalias em ratos. Foi demonstardo que
o montelucaste atravessa a barreira placentária e é excretado no leite mamário de animais. Não ocorreram mortes após uma administração oral única de montelucaste
sódico em doses até 5000 mg/kg, em ratinhos e ratos (15.000 mg/m2 e 30.000 mg/m2 em ratinhos e ratos, respectivamente) que corresponde à dose máxima testada. Esta dose
é equivalente a 25.000 vezes a dose diária recomendada no adulto humano (com base num peso de 50 kg do doente adulto). Foi determinado que o montelucaste não é
fototoxico em ratinhos usando UVA, UVB ou espectro de luz visível com doses até 500 mg/kg/dia (aproximadamente >200 vezes com base na exposição sistémica).
O montelucaste não foi nem mutagénico nos testes in vitro e in vivo, nem tumorigénico em várias espécies de roedores. 6. INFORMAÇÕES FARMACÊUTICAS 6.1. Lista dos
excipientes Granulado: Manitol, hidroxipropilcelulose e estearato de magnésio. Comprimidos para mastigar: Manitol, celulose microcristalina, hidroxipropilcelulose, óxido
vermelho de ferro (E172), croscarmelose sódica, aroma de cereja, aspartamo e estearato de magnésio. 6.2 Incompatibilidades Não aplicável. 6.3 Prazo de validade 3 anos.
6.4 Precauções especiais de conservação Conservar na embalagem de origem. 6.5 Natureza e conteúdo do recipiente Granulado: Embalado em saqueta de
polietileno/alumínio/poliéster em embalagens de: 7, 20, 28 e 30 saquetas. Comprimidos para mastigar: Embalado em blister de poliamida/PVC/alumínio em: Blisters (com
indicação dos dias da semana), em embalagens de: 7, 14, 28, 56, 98 e 140 comprimidos. Blisters (sem indicação dos dias da semana), em embalagens de: 10, 20, 28, 30, 50,
100 e 200 comprimidos. Blisters (doses unitárias), em embalagens de: 49, 50 e 56 comprimidos. É possível que não sejam comercializadas todas as apresentações. 6.6 Instruções
de utilização e manipulação Não existem requisitos especiais. 7. TITULAR DA AUTORIZAÇÃO DE INTRODUÇÃO NO MERCADO Merck Sharp & Dohme, Lda. Quinta da Fonte,
Edifício Vasco da Gama (19), P.O. Box 214, Porto Salvo, 2770-192 Paço de Arcos 8. NÚMERO(S) DA AUTORIZAÇÃO DE INTRODUÇÃO NO MERCADO SINGULAIR® Infantil
4 mg Granulado 4314787 - 28 saquetas; SINGULAIR® Infantil 4 mg comprimido para mastigar 3502382 - Embalagem de 14 comprimidos (com indicação dos dias da semana);
3502481 - Embalagem de 28 comprimidos (com indicação dos dias da semana) SINGULAIR® Junior 5 mg comprimido para mastigar 2639987 - Embalagem de 14 comprimidos
(com indicação dos dias da semana); 2640084 - Embalagem de 28 comprimidos (com indicação dos dias da semana)
9. DATA DA PRIMEIRA AUTORIZAÇÃO/RENOVAÇÃO DA AUTORIZAÇÃO DE INTRODUÇÃO NO MERCADO
Comprimidos para mastigar: 31 de Julho de 2002 (Renovação) Granulado: 19 de Fevereiro de 2003
10.DATA DA REVISÃO DO TEXTO
27 Novembro 2006
%
ESTADO
DOENTE
C. UNIT.
0%
0%
0%
0%
84%
84%
-
€31,95
€42,94
€23,66
€42,59
€3,43
€6,65
€1,59
€1,53
€1,69
€1,52
€1,53
€1,48
€18,03
€34,91
C.M.T.D.
ESTADO
DOENTE
€1,59
€1,53
€1,69
€1,52
€1,29
€0,24
€1,25
€0,24

Documentos relacionados

4 Vol XVI 2007 - Revista Nascer e Crescer

4 Vol XVI 2007 - Revista Nascer e Crescer Pediatria Baseada na Evidência – Luís Filipe Azevedo; Altamiro da Costa Pereira. Ciclo de Pediatria Inter-Hospitalar do Norte – Rogério Mendes; Helena Jardim; Virgílio Senra; Fernanda Manuela Costa...

Leia mais

2 Vol XVIII 2009 - Revista Nascer e Crescer

2 Vol XVIII 2009 - Revista Nascer e Crescer - F. Ruza Tarrio (Madrid), Hospital Infantil Universitario La Paz - Francisco Alvarado Ortega (Madrid), Hospital Infantil Universitario La Paz - George R. Sutherland (Edinburgh), University Hospita...

Leia mais