VSCP100 capa sust.indd
Transcrição
VSCP100 capa sust.indd
EDIÇÃO SUSTENTABILIDADE: P A R A Q U E M Q U E R V I V E R M A I S E EDIÇÃO M E L H O R SUSTENTABILIDADE ESPECIAL 100 P R O I B I D A V E N D A 2010 ESTE EXEMPLAR É ESPECIAL PARA VOCÊ DEZEMBRO ASSINANTE • WWW.REVISTAVIDASIMPLES.COM.BR IDEIAS, AÇÕES, INICIATIVAS E PESSOAS QUE FAZEM NOSSO MUNDO MELHOR ideias, ações, iniciativas e pessoas que fazem nosso mundo melhor DEZEMBRO 2010 O BAIRRO IDEAL • O PODER DO MICROCRÉDITO • RUAS MAIS ACESSÍVEIS TREM NO SERTÃO • BANCO COMUNITÁRIO • O LIXO QUE VIRA ENERGIA FINANCIAMENTO ONLINE • TEATRO NA PALESTINA • BARCO EM SÃO PAULO A PÉ NA AMAZÔNIA • CASA DE TERRA • INCUBADORAS • MÁQUINA DE ÁGUA MINICASAS • SKATE NO AFEGANISTÃO • E MAIS 85 IDEIAS REVOLUCIONÁRIAS [ ] SUMÁRIO [22 a 33] cocô e energia limpa, painéis solares na áfrica, água em zonas de conflito, cisternas rurais, hortas urbanas... COMUNIDADE [34 a 47] o bairro ideal, microcrédito, teatro na palestina, skate no afeganistão, financiamento online, incubadoras sociais... DESIGN [48 a 60] embalagens ecoeficientes, design sem desperdício, biomimética, concreto verde, minicasas, casa de barro, casa movida a algas... MOBILIDADE [62 a 73] o bicicletário perfeito, trens no ceará, trem-bala, ruas acessíveis, car sharing, teleférico na favela, barco em são paulo... CORPO [74 a 82 ] sustentabilidade no prato, upcycling, poluição e saúde, viajar de bike, a pé na amazônia, vida sem carne, moda verde, objetos esportivos ecológicos... FALE COM A GENTE Se você quer fazer comentários, sugestões, críticas, tirar dúvidas ou participar da seção Cartas, entre em contato com a gente. Telefone: 0800-7011341. De 2ª a 6ª feira, das 9h às 12h e das 14h às 18h. Fax: (11) 3037-8308. Cartas: av. das Nações Unidas, 7221, 14º andar, CEP 05425-902, São Paulo, SP. Internet: www.revistavidasimples.com.br. E-mail: [email protected]. ASSINATURAS Internet: www.assineabril.com.br. Ligue grátis: 0800-7752828. Grande São Paulo: (11) 3347-2121 De 2ª a 6ª feira, das 8h às 22h. Sábado, das 9h às 16h. SERVIÇO DE ATENDIMENTO AO CLIENTE (SAC) Consultar dados sobre sua assinatura, comunicar mudança de endereço, tirar dúvidas sobre pagamento ou entrega, renovação e outros serviços Internet: www.abrilsac.com. Ligue grátis: 0800-7752112. Grande São Paulo: (11) 5087-2112. De 2ª a 6ª feira, das 8h às 22h. EDIÇÕES ANTERIORES Solicite ao seu jornaleiro ou à banca mais próxima de sua residência. O valor cobrado será o da última edição em banca. PARA ANUNCIAR Telefone: (11) 3037-5000/5756. De 2ª a 6ª feira, das 9h às 12h e das 14h às 18h. Fax: (11) 3037-5609. Internet: www.publiabril.com.br. OUTROS PRODUTOS Para comprar CD-ROMs, CDs, almanaques, guias, livros e outros lançamentos da Editora Abril. Internet: www.lojaabril.com.br. E-mail: [email protected]. Telefone: (11) 4003-8893. De 2ª a 6ª feira, das 8h às 20h. TRABALHE CONOSCO www.abril.com.br/trabalheconosco © Foto capa: Marcelo Zocchio; ilustração capa: Adriana C. Wolff | Ilustração ícones: Bruno Algarve P L A N E TA C A R TA A O L E I T O R Fundador: VICTOR CIVITA (1907 - 1990) Editor: Roberto Civita Presidente Executivo: Jairo Mendes Leal S ão dias de muito orgulho aqui na redação de VIDA SIMPLES. E de muito trabalho. Quando nossa diretora de arte, a suave Adriana Wolff, percebeu a dimensão real da encrenca – eleger 100 ideias, ações, iniciativas e pessoas que estão transformando nosso mundo e converter tudo isso em material jornalístico de alta qualidade –, ela abraçou a proposta no primeiro segundo e já começou a arregaçar as mangas. Porque parecia muito texto para diagramar, muita foto para escolher, muita ilustração para encomendar. E era mesmo. Mas foi bastante graças ao trabalho de coordenação dela das muitas instâncias que fazem parte de uma edição com projeto gráfico diferente das nossas edições habituais que esta edição de VIDA SIMPLES pôde ficar de pé. A Adriana e nossa equipe estão com um baita orgulho. Merecidíssimo. Porque não é em qualquer esquina que você encontra uma revista que tenha atingido a formidável marca de 100 edições. E VIDA SIMPLES chegou lá, enchendo-nos de alegria e aumentando ainda mais a responsabilidade de entregar todo mês um cardápio variado de assuntos sobre meio ambiente, sabedoria, artes, inteligência. Sim, 100 edições e um tema essencial: sustentabilidade. Pois esta VIDA SIMPLES, produzida com o apoio do Planeta Sustentável, oferece a você um elenco formidável de ideias para um mundo melhor. São histórias de gente que conseguiu mudar a realidade, planos quase mirabolantes, grandes sacadas a favor de uma vida melhor. Tudo isso não seria possível sem a inteligência, o trabalho e o apoio de Marcia Neder, nossa publisher, e de nossa equipe atual: Adriana Wolff, Rafael Tonon, Rita Carvalho, Jeanne Callegari, Kareen Sayuri, Adriana Baldin e Marcio Fujii. Esperamos que você goste – e sinta-se cada vez mais com vontade de se engajar na causa de um mundo melhor, mais humano, mais verde e inteligente. Conselho Editorial: Roberto Civita (Presidente), Thomaz Souto Corrêa (Vice-Presidente), Giancarlo Civita, Jairo Mendes Leal, José Roberto Guzzo, Victor Civita Diretor de Assinaturas: Fernando Costa Diretor Digital: Manoel Lemos Diretor Financeiro e Administrativo: Fábio d’Avila Carvalho Diretora Geral de Publicidade: Thais Chede Soares Diretor Geral de Publicidade Adjunto: Rogerio Gabriel Comprido Diretor de Serviços Editoriais: Alfredo Ogawa Diretora Superintendente: Brenda Fucuta Diretora de Núcleo: Marcia Villela Neder Redator-chefe: Leandro André Hauly, Erika Nakamura, Edvania Silva, Juarez Macedo, Leandro Marcinari, Zeca França, Leo Ferreira, Rodrigo Lemes, Regina Sano,Vanessa Dalberto VIDA SIMPLES ONLINE Editores: Milton Strassacappa e Fernanda Fontes Designer: Ileine dos Santos www.revistavidasimples.com.br SERVIÇOS EDITORIAIS Apoio Editorial: Carlos Grassetti (Arte), Luiz Iria (Infografia) Dedoc e Abril Press: Grace de Souza Treinamento Editorial: Edward Pimenta PUBLICIDADE CENTRALIZADA Diretores: Marcos Peregrina Gomez, Mariane Ortiz, Robson Monte, Sandra Sampaio Executivos de Negócio: Ana Paula Moreno, Ana Paula Leandro Sarmatz Foto: Cinthia Sanchez; produção: Mario Mantovani; Ilustração: Juliana Russo [email protected] P.S.: Para celebrar esse número de respeito, colaboramos com o plantio de 100 mudas de espécies nativas brasileiras em uma área verde nos arredores de São Paulo. Você também pode colaborar. Saiba mais em nosso site: www.vidasimples.com.br. Sarmatz Diretora de Arte: Adriana Dellamagna C. Wolff Editor: Rafael Tonon Repórter: Jeanne Callegari Designers: Kareen Sayuri e Rita Carvalho Estagiário: Márcio Fujii Atendimento ao Leitor: Adriana Baldin Assistente de Coordenação: Cida Prado Assistente de Redação: Sueli Anselmo CTI: Alvaro Zeni (supervisor), Teixeira, Ana Paula Viegas, Caio Souza, Camila Folhas, Carla Andrade, Cidinha Castro, Claudia Galdino, Cleide Gomes, Daniela Serafim, Eliane Pinho, Emiliano Hansenn, Fabio Santos, Jary Guimarães, Juliana Vicedomini, Karine Thomaz Marcelo Cavalheiro, Marcio Bezerra, Maria Lucia Strotbek, Marcello Almeida, Marcus Vinicius, Nilo Bastos, Regina Maurano, Renata Miolli, Rodrigo Toledo, Tati Mendes, Virginia Any, Selma Costa, Susana Vieira PUBLICIDADE DIGITAL Diretor: André Almeida Gerente: Luciano Almeida Executivos de negócios: Alexandra Mendonça, André Bortolai, André Machado, Bruno Fabrin Guerra, Camila Barcellos, Carlos Sampaio, Daniela Alexandra Batistela, Elaine Collaço, Fabíola Granja, Guilherme Bruno de Luca, Guilherme Oliveira, Herbert Fernandes, Laura Assis, Luciana Menezes, Rafael de Camargo Moreira, Renata Carvalho, Renata Simões, Rodrigo Scolaro, Veronica Souza PUBLICIDADE REGIONAL Diretor: Alex Foronda, Paulo Renato Simões Gerentes: Andrea Veiga, Cristiano Rygaard, Edson Melo, Francisco Barbeiro Neto, Ivan Rizental, João Paulo Pizarro, Ricardo Mariani, Sonia Paula, Vania Passolongo Executivos de Negócios: Adriano Freire, Ailze Cunha, Beatriz Ottino, Caroline Platilha, Celia Pyramo, Clea Chies, Daniel Empinotti, Gabriel Souto, Henri Marques, Ítalo Raimundo, José Castilho, José Rocha, Josi Lopes, Juliana Erthal, Leda Costa, Luciene Lima, Maribel Fank, Paola Dornelles, Ricardo Menin, Samara Sampaio de O. Reijnders PUBLICIDADE NÚCLEO BEM-ESTAR Diretor: Alberto Simões de Faria Gerentes: Fernando Sabadin, Sandra Fernandes Executivos de Negócio: Ana Carolina Kanj, Analucia Bertola, Alessandra Calissi, Alice Ventura, Cinthia Curty, David Padula, Eduardo Chedid, Flavia Magalhães, João Eduardo Dias, Juliana Compagnoni, Leila Raso, Luis Caldas, Luis Fernando Lopes, Mara Marques, Reinaldo Murino, Shirlene Pinheiro, Thaira Ferro, Vera Reis Assistente: Miriam Moya Manzano DESENVOLVIMENTO COMERCIAL Diretor: Jacques Baisi Ricardo MARKETING E CIRCULAÇÃO Diretora de Marketing: Louise Faleiros Gerente de Publicações: Barbara Miklasevicius Gerente de Marketing Publicitário: Danielle Oliveira Analistas de Marketing: Carolina Pfulg, Juliana Fidalgo Estagiária Glaucia Carbonari Gerente de Eventos: Mônica Romano Agostinho Analistas Adriana Paolini, Carolina Fioresi, Luciana Balieiro Estagiária Mariana Camargo Gerente de Circulação Avulsas: Magali Superbi Gerente de Circulação Assinaturas: Alessandra Pallis PLANEJAMENTO, CONTROLE E OPERAÇÕES Gerente: André Vasconcelos Consultor: Adriana Favilla Processos: Alexandre Toledo, Rosângela Garcia ASSINATURAS Operações de Atendimento ao Consumidor: Malvina Galatovic Recursos Humanos Diretora: Claudia Ribeiro Consultora: Marizete Ambran Redação e Correspondência: Av. das Nações Unidas, 7221, 14º andar, Pinheiros, São Paulo, SP, CEP 05425-902, tel. (11) 3037-2000 Publicidade São Paulo e informações sobre representantes de publicidade no Brasil e no Exterior www.publiabril.com.br PUBLICAÇÕES DA EDITORA ABRIL: Alfa, Almanaque Abril, Ana Maria, Arquitetura & Construção, Aventuras na História, Boa Forma, Bons Fluidos, Bravo! , Capricho, Casa Claudia, Claudia, Contigo!, Delícias da Calu, Publicações Disney, Elle, Estilo, Exame, Exame PME, Gloss, Guia do Estudante, Guias Quatro Rodas, Info, Lola, Loveteen, Manequim, Máxima, Men’s Health, Minha Casa, Minha Novela, Mundo Estranho, National Geographic, Nova, Placar, Playboy, Quatro Rodas, Recreio, Revista A, Runner’s World, Saúde!, Sou Mais Eu!, Superinteressante, Tititi, Veja, Veja Rio, Veja São Paulo, Vejas Regionais, Viagem e Turismo, Vida Simples, Vip, Viva! Mais, Você RH, Você S/A, Women’s Health Fundação Victor Civita: Gestão Escolar, Nova Escola VIDA SIMPLES edição 100 (ISSN 977167876000), ano 8, nº 13, é uma publicação mensal da Editora Abril S.A. Edições anteriores: Venda exclusiva em bancas, pelo preço da última edição em banca. Solicite ao seu jornaleiro. Distribuída em todo o país pela Dinap S.A. Distribuidora Nacional de Publicações, São Paulo. VIDA SIMPLES não admite publicidade redacional. Serviço ao Assinante: Grande São Paulo: (11) 5087-2112 Demais localidades: 0800-775-2112 www.abrilsac.com Para assinar: Grande São Paulo: (11) 3347-2121 Demais localidades: 0800-775-2828 www.assineabril.com.br IMPRESSA NA DIVISÃO GRÁFICA DA EDITORA ABRIL S.A. Av. Otaviano Alves de Lima, 4400, Freguesia do Ó, CEP 02909-900, São Paulo, SP INSTITUTO VERIFICADOR DE CIRCULAÇÃO Presidente do Conselho de Administração: Roberto Civita Presidente Executivo: Giancarlo Civita Vice-Presidentes: Arnaldo Tibyriçá, Douglas Duran, Marcio Ogliara, Sidnei Basile www.abril.com.br [ 100 ] IDEIAS PARA UMA VIDA SUSTENTÁVEL Este não é um ranking. É uma seleção, feita pela redação de VIDA SIMPLES e com o auxílio de alguns de nossos colaboradores, de iniciativas a favor de um mundo melhor. De 1 a 100, estabelecemos um elenco variado de assuntos divididos em cinco grandes seções: Planeta, Comunidade, Design, Mobilidade e Corpo. • A seção Planeta fala de meio ambiente e sustentabilidade. • A seção Comunidade planta novas ideias para o convívio de todos. • A seção Design esquadrinha soluções mais funcionais para o nosso mundo. • A seção Mobilidade trata da circulação em nossas cidades. • A seção Corpo fecha o foco sobre nosso bem-estar. Um cardápio variado, como se vê. Há ideias de vanguarda, ações contundentes, planos feéricos, sonhos que mobilizam. A roda gira, o mundo se transforma: não há dúvida de que estamos vivendo um momento especial, depois de décadas esgotando nossos recursos naturais e produzindo o caos, a desordem e a violência. São 100 motivos para você repensar o tempo em que vivemos. E para ir além. Os textos identificados com o símbolo oferecem material adicional em nosso site: www.vidasimples.com.br Bem-vindo ao mundo das ideias. Esta edição de VIDA SIMPLES faz a sua parte e vem impressa em papel cuja madeira provém de florestas plantadas apenas para esse fim. Na tinta utilizada nesta e nas demais páginas, um dos componentes petroquímicos foi substituído por substância vegetal à base de soja. Além disso, os exemplares de assinantes são entregues em saco plástico biodegradável feito à base de milho. Ótimas ideias para um mundo mais verde! P L A N E TA Nem só de sol e vento é possível produzir energia – até o que você deixa no banheiro pode manter a luz acesa ou a casa mais quentinha Por Rafael Tonon | Ilustração Bruno Algarve Todo o sistema de esgoto das 200 casas teve de ser adaptado, levando os resíduos para uma estação de tratamento construída especialmente para tratá-lo. Bactérias anaeróbias levam até três semanas para decompor o cocô e transformar os resíduos em gás metano. Do cocô ao calor Mais de 200 casas da cidade de Didcot, no Reino Unido, mantêm seu sistema de calefação funcionando graças ao que vai para a privada. É isso mesmo: todo o cocô dos moradores é direcionado para uma estação de tratamento onde ele é separado e convertido em gás (sem odor, claro!) para poder alimentar os radiadores de calefação instalados nas residências. Utilizar nossos próprios resíduos como combustível não é algo novo, é verdade – há indícios de mais de um século de que chineses e outros povos usavam o “número 2” para produzir energia. Mas o projeto de Didcot (que custou 4 milhões de dólares) é uma prova de que é possível construir um sistema integrado de geração de gás e energia em grande escala através do cocô – uma energia limpa, sim, e totalmente renovável, já que a gente não para nunca de fazer as necessidades fisiológicas, né?! Luz nas praças Uma praça cuja iluminação é toda mantida graças aos detritos que os cães deixam por ali. Projetada pelo designer Matthew Mazzotta e batizada de Park Spark, essa praça existe e fica na cidade de Cambridge, nos EUA. Pensando numa forma de dar um fim sustentável aos resíduos animais, Mazzotta desenvolveu um sistema com um grande tambor de ferro onde o cocô dos bichos é jogado e misturado, permitindo que as bactérias possam fazer a decomposição dos resíduos e liberar gás metano. Esse gás, que depois é canalizado, é distribuído por todo o parque, onde é usado para manter a chama dos postes acesas, permitindo que as pessoas possam passear com seus cãezinhos durante a noite em segurança. O projeto foi desenvolvido através do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) e a ideia é espalhar parques que tenham a energia gerada pelo cocô da bicharada por todo o país. TRONO MAIS VERDE As privadas estão ficando mais sustentáveis. Pudera: para cada descarga, cerca de 20 litros de água vão esgoto abaixo. Pensando nisso, os fabricantes estão criando privadas mais verdes. Conheça ao lado duas tendências que devem estar em breve num banheiro próximo de você. ÁGUA FERTILIZANTES O metano é distribuído pelos mais de 20 postes instalados, mantendo as chamas sempre acesas. O mesmo gás pode ser canalizado também para fogões colocados na praça para piqueniques e barraquinhas de vendedores de comida. O cocô é recolhido em um saco de plástico biodegradável e, depois, jogado no tambor. O dono do animal precisa girar a manivela para misturar os resíduos e permitir que as bactérias possam agir, liberando gás metano. Uma forma de evitar o desperdício é substituir a água pelo fogo. Os novos modelos vão incinerar o xixi e o cocô. Ao apertar a “descarga”, os excrementos são queimados – sem deixar cheiro, claro. Assim que o gás é produzido, ele é coletado e distribuído para as residências para manter funcionando os radiadores de calefação. METANO energia limpa METANO [01] COCÔ: Do processo de tratamento, além do metano, produzem-se fertilizantes que são usados em lavouras e plantações da cidade. Um sistema a vácuo suga os detritos e os jogá no esgoto – praticamente a seco. Por isso, consome apenas 0,8 litro de água a cada uso, 10 vezes menos que um vaso comum. A energia para produzir o vácuo vem de painéis solares. P L A N E TA [02] Com passagens pelo Afeganistão, Darfur e Paquistão, o italiano Michele Ungaro zela pelo abastecimento de água em zonas de conflito pelo mundo [03] Já imaginou quantas garrafas plásticas de água vão parar diariamente no lixo de um restaurante? E de milhares deles? Incomodadas com o alto consumo de um material que demora tanto para se decompor, as amigas Letycia Janot e Maria Fernanda Franco chamaram atenção para uma alternativa bem menos poluente e simpática – servir água na jarra. A iniciativa tem como objetivo mudar o hábito de restaurantes e empresas. “Nós não bebemos água de filtro fora de casa, o que não faz o menor sentido se levarmos em conta que nossa água é de excelente qualidade e que a usamos constantemente na preparação de comida, para fazer sucos, gelo etc.”, afirma Letycia. Para saber como estão economizando em plástico, os adeptos anotam a quantidade de jarras de água vendidas por dia (uma jarra equivale a uma garrafinha). Para aderir ao projeto, o estabelecimento deve usar um ponto de água tratada, instalar um purificador certificado pelo Inmetro e se comprometer a só utilizar garrafas se o cliente não quiser beber água na jarra. Por Nana Tucci pois, com uma entidade francesa, foi à República Democrática do Congo. E há mais de dois anos trabalha para a Cruz Vermelha Internacional, com a qual passou 16 meses em Darfur, no Sudão, e voltou ao Paquistão para uma nova missão. “Trabalhamos com abastecimento e estrutura sanitária em campos de refugiados, que deixaram suas casas por causa dos combates entre o exército paquistanês e os talibãs. Também me dedico a recuperar aquedutos, cisternas e canais de irrigação para a agricultura nos povoados no norte do Paquistão”, conta. “Me sinto satisfeito por fazer algo importante para os outros, dando apoio aos civis em zonas de conflito, prevenindo problemas ou aliviando o sofrimento da população.” Por Maria Fernanda Vomero © Ilustração: O Silva; Foto Michele Ungaro: Arquivo pessoal | Foto cisterna: Cia de Foto; Foto jarra: Cintia Sanches; Produção: Mario Mantovani; Foto máquina de água: Divulgação Q uando o italiano Michele Ungaro terminou o curso de geologia, em Ferrara, tinha apenas duas certezas: queria lidar com recursos hídricos e encontrar um trabalho que lhe permitisse viajar e desenvolver projetos em diferentes lugares do mundo. Logo foi contratado por uma companhia petrolífera francesa para fazer geologia de campo e gestão dos dados que orientavam as perfurações. Esteve na Líbia, na Tunísia, na Argélia e no Iêmen. Depois, passou a trabalhar para uma companhia norte-americana, nos Estados Unidos e no Golfo do México, desenvolvendo pesquisas geológicas para um software inovador. “No início, o trabalho me agradava”, lembra. “Porém, fui me dando conta de que lidar com petróleo significava trabalhar para grandes companhias. E eu sabia que muitas delas não contribuíam para o desenvolvimento da população local, serviam apenas ao interesse do grande capital, o que me incomodava.” O momento decisivo veio quando Michele foi designado a ir à Nigéria. Ele estava a par dos conflitos que envolviam a exploração de petróleo no delta do Níger, das questões ambientais às demandas da população pobre da região. “Também sabia que o governo nigeriano e as petrolíferas faziam tudo ilegalmente para não ter de pagar nada às pessoas que moravam lá”, diz. A sorte, contudo, esteve a seu lado: com a guerra do Iraque, em março de 2003, o contrato foi suspenso e a ida à Nigéria, cancelada. Surgiu, então, o convite para trabalhar com recursos hídricos em uma ONG italiana. Michele não pestanejou: “A água envolve uma temática política e social complexa e muito interessante. Em zonas de conflito, trata-se da primeira necessidade”. Esteve no Afeganistão, na Etiópia e no Paquistão. De- Água na jarra: o fim das garrafinhas plásticas www.aguanajarra.com.br 04 4 Solução para o semiárido: coletar água da chuva Iniciado em 2003, o programa Um Milhão de Cisternas Rurais já construiu mais de 294 mil cisternas na região, beneficiando mais de 313 mil famílias. O projeto é tocado pela Articulação no Semi-Árido Brasileiro (Asa Brasil), um fórum que reúne ONGs e entidades da sociedade civil preocupadas com o desenvolvimento dessa parte do país. As cisternas são construídas por pedreiros capacitados pelo programa, o que ajuda a gerar empregos na região, e pelas próprias famílias que serão beneficiadas. Cada cisterna tem capacidade para armazenar 16 mil litros de água da chuva, captada por meio de calhas no telhado das casas. O programa tem a intenção de construir um milhão de cisternas e assim beneficiar 5 milhões de pessoas que sofrem com a seca na região. [05] E se solucionar o problema da falta de água potável fosse tão simples como apertar um botão em uma máquina? Isso já é possível – e com tecnologia brasileira. A H2O Pure é uma máquina de água que produz o líquido por meio de condensação da umidade do ar. A água já sai livre de impurezas para beber. A empresa fabricante (HNF Water) já vende o modelo de 60 litros para estabelecimentos como escolas, onde é usado como bebedouro. O de 5 mil litros é ideal para a agricultura. Já o projeto do chinês Chao Gao é uma máquina que usa a evaporação do solo pelo calor do sol para fazer água potável. P L A N E TA T odo dia que o Sol dá as caras na zona rural do sudeste africano é um indício de que vai haver aula nas escolas da região. Foi graças à energia solar que milhares de jovens puderam retomar (ou até iniciar, em alguns casos) os estudos. Como muitas regiões da África sofrem com a falta de energia elétrica, um grupo de voluntários criou uma força-tarefa para instalar painéis solares nas escolas, possibilitando que os alunos pudessem aprender também a noite, quando os colégios costumavam ficar fechados por falta de eletricidade. Com a energia limpa vinda dos raios de sol, foi possível retomar as aulas em 108 escolas da região. A captação de ener- gia solar também permitiu que os estudantes tivessem acesso ao computador e à internet, buscando conteúdos na rede e aprendendo de uma maneira diferente daquela a que estavam acostumados. Essa é apenas uma das ações da SolarAid, ONG que trabalha para gerar energia para as comunidades africanas. Com atuação em países como Quênia, Tanzânia, Maláui e Zâmbia, a instituição já conseguiu levar energia para mais de 10 mil residências e mais 19 clínicas, além de hospitais e comércios. Com base em Londres, a SolarAid capacita voluntários para ensinarem os próprios moradores dessas comunidades a instalarem as placas fotovoltaicas (que transformam raios de sol absorvidos em energia elétrica) e ainda incentiva o empreendedorismo, à medida que possibilita que os habitantes capacitados passem a vender (por preços justos, claro) os produtos criados pela ONG com o selo SunnyMoney, que vão desde luminárias para as casas a carregadores de celulares e outros equipamentos. Com um investimento de menos de 1,5 milhão de libras até agora, a instituição conseguiu gerar empregos, resolver o problema de falta de energia em 45% das comunidades carentes do sudeste africano, aumentar a incidência de crianças e adolescentes nas escolas e ainda promover o uso de uma energia limpa e renovável que, além de tudo, faz bem aos próprios moradores – que, assim, deixaram de consumir cerca de 2,3 milhões litros de querosene tóxico à saúde. Por Rafael Tonon Placa solar instalada em escola infantil no interior do Quênia: luz do sol possibilitou dobrar a quantidade de alunos nos colégios [07] Quanto mais quente, melhor Ar-condicionado movido a energia solar ajuda a acabar com o calor nos ambientes A energia solar pode até, quem diria, amenizar as altas temperaturas nos dias muito quentes. Pode parecer um contrassenso para a maioria, mas não para os cientistas chineses que desenvolveram o primeiro arcondicionado alimentado pelos raios de sol. Desenvolvido pela empresa Shandong Vicot Air Conditioning, o projeto é uma parceria com a Academia Chinesa de Ciência para resolver uma questão primordial nos dias de hoje: a quantidade de energia gasta para manter os aparelhos de arcondicionado ligados nos escritórios, casas e comércios do mundo todo, que gera grandes quantidades de CO2 na atmosfera, aumentando o acirramento do efeito estufa e, consequentemente, do aquecimento global. O protótipo possui 85% a mais de eficiência em conversão de energia do que os condicionadores comuns. E ainda ajuda a amenizar as altas temperaturas que fazem transpirar – nosso corpo e o planeta. © Foto: Solar Aid: Divulgação | Ilustração ar-condicionado: Catarina Bessel; Ilustração metano: Márcio Fujii; Foto ecosfera: Divulgação [06] Lá vem o sol No sudeste africano, a energia solar permitiu transformar a vida de diversas comunidades carentes Transformar montes de lixo em algo produtivo, que diminui a quantidade de gases tóxicos lançados na atmosfera e ainda gera energia: essa é a ideia por trás das usinas de metano em funcionamento na cidade de São Paulo. Até 2007, cerca de 25% das emissões de gases de efeito estufa de São Paulo vinham dos aterros Bandeirantes, ativo entre 1979 e 2006 e o maior da América Latina, e São João, que funcionou entre 1992 e 2007. Hoje, o metano (gás 21 vezes mais nocivo que o CO2) liberado pelos lixões é usado para gerar energia elétrica. Um acordo feito com a prefeitura permitiu que os dois lixões fossem explorados para produzir energia. As empresas responsáveis por eles (Loga e EcoUrbis – que cuidam do Bandeirantes e do São João, respectivamente) fecharam uma parceira com a Biogás para que o metano captado seja queimado e transformado em eletricidade. Os dois locais acumularam juntos 64 milhões de toneladas de lixo. O produto gerado por essa biomassa abastece 800 mil pessoas e reduz em 20% as emissões na cidade. Por Ainá Vietro 08 [09] Não, não se trata de um aquário, mas de uma ecosfera em miniatura que funciona de forma totalmente autossustentável. Baseada em estudos feitos durante anos pela Nasa para pesquisar formas de vida em equilíbrio por longos períodos, essa bola de vidro guarda um ecossistema que vive totalmente em harmonia. Ali dentro, minúsculos camarões se alimentam de bactérias, que metabolizam resíduos orgânicos que servem de alimento para as algas que, por sua vez, fazem a fotossíntese e liberam o oxigênio necessário para os pequenos crustáceos. Uma minicomunidade autossuficiente para ter na mesa da sala (à venda só nos EUA). hammacher.com P L A N E TA A ciência forense ajudando a flagrar crimes ambientais. Essa é a rotina de Ken Goddard, do US Fish and Wildlife Service (Serviço de Proteção a Peixes e Vida Selvagem dos EUA). Bioquímico de formação, ele se especializou em criminalística e técnicas forenses (basicamente, coleta e exame de provas físicas), e trabalhou 12 anos analisando cenas de crime. Então se cansou dos dramas humanos e resolveu usar o que sabia em outra área – a ambiental. Desde 1979, trabalha como uma espécie de CSI da natureza, desvendando crimes sobre peixes e vida selvagem. Por Jeanne Callegari Como a ciência forense pode ajudar a proteger o meio ambiente? Respondendo a seis questões básicas: quem, o quê, quando, onde, como e por quê. Por exemplo, podemos determinar quem cometeu um crime específico contra o meio ambiente, onde aconteceu, quando, e quais os acontecimentos específicos do crime. Isso é feito examinando e comparando evidências físicas para ligar o suspeito, a vida e a cena do crime. Podemos identificar a vítima (por exemplo, um réptil cuja pele foi usada para fazer uma bolsa), como ela morreu (fazer uma necrópsia em um puma), ou determinar que tipo de veneno ou munição foi usada para matar uma vítima, ligando essas provas aos suspeitos. Com quais crimes e ocorrências vocês têm de lidar com maior frequência no US Fish and Wildlife Service? Os crimes mais comuns são violações da Lei para Espécies Ameaçadas de Extinção, o Tratado-Lei para Aves Migratórias e muitas violações envolvendo o contrabando ilícito de animais ou de suas partes e produtos pelo país. É uma tendência usar a ciência forense para desvendar crimes ambientais? Estamos apenas começando a expandir as técnicas de investigação de cenas de crime relacionadas à vida selvagem para outros crimes ambientais, como resíduos perigosos, destruição de habitats, destruição de recifes de coral. Se conseguirmos desenvolver a expertise e as equipes de laboratório para trabalhar nesses casos, creio que conseguiremos ser bem-sucedidos em identificar os violadores de leis ambientais e levá-los a julgamento em tribunais nacionais e internacionais. Programas de TV como CSI: Las Vegas ou CSI: Miami são parecidos com a vida real de um CSI? [Rindo alto] Os programas de TV da série CSI são bom entretenimento, e ajudam a educar o público. Mas, para contar uma boa história, foi necessário fazer várias coisas erradas intencionalmente. Por exemplo, na vida real, investigadores de cena de crime raramente são cientistas forenses e quase nunca oficiais juramentados. Se estão armados, não é boa ideia, pois resíduos de pólvora podem contaminar facilmente as provas coletadas. Eles dificilmente confrontam suspeitos e vítimas – essa é a função do detetive. Os CSIs podem passar muitas horas – grande parte delas ajoelhados – em cenas sangrentas e sujas, fotografando e coletando provas, como impressões digitais. O trabalho não é nada glamouroso, e o uniforme normal é um par de aventais. © Ilustração CSI Ambiental: Márcio Fujii; Foto Ken Goddard: USFWS photo | Ilustrações Hastes ao vento: Atelier DNA | Ilustração Catavento: Catarina Bessel [10] CSI ambiental: como usar as técnicas da ciência forense para desvendar os crimes contra a natureza 11 Hastes ao vento Conheça novas formas de obter energia eólica, além das turbinas em terra Um parque de energia eólica offshore, ou seja, aproveitando os ventos dos mares e oceanos: essa é a aposta do Google no quesito energias alternativas. A companhia entrou como sócia no projeto Atlantic Wind Connection, que liga usinas de energia eólica ao longo do oceano Atlântico. A capacidade do parque é de 6 mil MW de energia, um pouco menos de meia Itaipu (14 mil MW) e o suficiente para atender 1,9 milhão de residências. Outro projeto que pretende aproveitar o enorme potencial dos ventos para gerar energia é o das Windstalks, hastes que balançam ao vento e produzem a mesma energia que as tradicionais turbinas. Criadas pela empresa nova-iorquina de design Atelier DNA para a cidade projetada de Masdar, perto de Abu Dhabi, nos Emirados Árabes, as hastes são silenciosas, ocupam menos espaço e não oferecem riscos aos pássaros. O projeto ganhou o segundo prêmio Land Art Generator, promovido por Masdar para identificar os melhores projetos capazes de gerar energia renovável. 12 Energia eólica não é só para locais distantes, com turbinas enormes. Você mesmo pode aproveitar os ventos do lugar onde mora para construir uma miniturbina, que servirá para carregar aparelhos como celulares e notebooks. Conheça alguns sites que dão o passo a passo de como construir turbinas eólicas dos mais variados tamanhos e jeitos – e de forma descomplicada: Otherpower.com – Site americano, feito por entusiastas da energia alternativa, com dicas no estilo faça você mesmo. Scoraigwind.com – Página do britânico Hugh Piggotts, que sabe tudo de energia eólica e renovável e escreveu alguns livros sobre o tema. Gotwind.org – O site fornece planos de construção para turbinas eólicas e um fórum para os entusiastas do tema. P L A N E TA 13 [15] Cultivo se aprende na escola Colégio de Nova York cria uma “minifazenda” para alunos plantarem o próprio alimento Horta nas alturas Para dividir espaço com os arranha-céus, os ambientes verdes seguem a tendência da verticalização C A horta utiliza água reaproveitada da chuva e adubo gerado através da compostagem feita pelas crianças 14 Plantio pela web: Dois sites para quem quer se inspirar e embarcar na ideia de plantar nas cidades. We Patch (wepatch.org / EUA) Reúne pessoas que buscam por lugares para plantar com aquelas que possuem espaço para oferecer. Basta se cadastrar (como “plantador” ou “parceiro”) no site e procurar onde há interessados em promover a colheita de alimentos na sua região. Landshare (landshare.net / Inglaterra) O site propõe uma revolução que vai ser, segundo seu criador – o ativista Hugh Fearnley-Whittingstall –, a nova grande tendência na forma de nos relacionarmos com nosso alimento (inclusive nas redes sociais): pessoas interessadas no cultivo que buscam locais nas grandes cidades para isso. © Ilustração horta escola: Divulgação/Work AC | Ilustração horta nas alturas: Juliana Russo Não se trata de ter aulas de culinária nem de manter perto do pátio uma pequena hortinha. Um colégio público do Brooklyn, em Nova York, leva além a tendência das escolas de fazer com que as crianças tenham contato com o alimento (e as formas de produzi-lo). O projeto, elaborado pelo escritório Work AC em parceria com a Fundação Chez Panisse, propõe um manifesto em prol das hortas comunitárias dentro dos espaços urbanos e permite que os alunos sejam capazes de cultivar sua própria comida (de verduras e legumes a ovos) em uma minifazenda orgânica totalmente integrada ao ambiente escolar – tanto no currículo de aulas quanto na produção da merenda. “O cultivo da terra é capaz de unir as crianças e fazê-las trabalhar juntas numa conexão mais profunda do que o contato na aula”, diz a diretora da escola, Célia Kaplinsky. Mais que isso, os alunos são envolvidos em todos os aspectos: tanto na hora de plantar, como na de servir e comer. “Isso lhes oferece valores de nutrição, comunidade e relação com a terra”, defende. E ainda educa as crianças a perceberem a importância de uma alimentação saudável, o que ajuda a combater desde o princípio a obesidade infantil, um problema sério nos EUA. O projeto ainda está em teste, mas a ideia é implantá-lo, também, em outras escolas de NY – e, por que não, do mundo. om cada vez menos espaço nas grandes cidades, o céu é o limite para a construção de prédios residenciais e comerciais que precisam abrigar tanta gente no menor ambiente possível. Arranha-céus cada vez mais altos tentam dar conta do recado. Partindo dessa “perspectiva vertical”, arquitetos, urbanistas e designers têm partido da mesma lógica para repensar os espaços verdes, a fim de integrá-los às metrópoles. Uma forma de trazer para perto dos moradores jardins, hortas e até – pasmem! – fazendas. Um grupo de arquitetas espanholas, por exemplo, desenvolveu o Spiral Garden, um espaço público verde em que as pessoas podem plantar e colher de forma comunitária, permitindo maior proximidade com os alimentos e com a comunidade. A ser instalado no meio da cidade, segue a tendência de fazendas verticais, de levar a roça para as estruturas urbanas. Uma boa saída para esses tempos em que a população está aumentando mais do que a capacidade atual de produção de alimentos no planeta. Autossuficientes, muitas dessas fazendas verticais são capazes de reutilizar água e resíduos para produzir as plantas e vegetais, como é o caso do SkyFarm, um projeto proposto para Toronto, no Canadá. Ainda usariam menos água e terra do que as fazendas e sítios instalados nas regiões rurais. E com a vantagem de estarem ao nosso pronto alcance. Fazendas urbanas construídas em meio aos prédios residenciais nas cidades do futuro – nem tão distante assim P L A N E TA 17 Biodiversidade ao seu dispor: para aprender a preservar as riquezas do meio ambiente, é preciso conhecê-las de perto E de elefante, Z de zebra. No Brasil ainda se usam animais africanos para soletrar, apesar da diversidade de nossa fauna. L de laranja, M de maçã. No Brasil também as frutas de origem estrangeira são mais conhecidas do que nossa rica flora. Esse desconhecimento não é indiferente. Ninguém conserva o que não conhece ou não considera útil. Por isso, a efetiva proteção à nossa rica biodiversidade depende de informação. Depende de sabermos identificar e valorizar, em nosso cotidiano, tecnologias e produtos originários de nossos ecossistemas, que já facilitam nossa vida, produzem riqueza e não são apenas uma promessa para o futuro. Tome a iniciativa de conhecer nossas espécies. Prove sorvete de araticum do cerrado ou geleia de uvaia da mata atlântica. Ponha biodiesel de pinhão-manso no tanque e pare no semáforo aceso com óleo de buriti. Saiba como o picão-preto age contra a malária e como o fio das teias de aranha foi parar na sua roupa. Conservação também se pratica na cidade, com conhecimento e boas escolhas de consumo. A imensa biodiversidade brasileira está ao seu dispor, mas também sob sua proteção! No apartamento em que você mora, um painel controla os gastos de luz e água e a temperatura. Os dados são transferidos para os sensores do edifício e depois enviados para um cérebro eletrônico que estabelece o consumo de toda a população em tempo real. Essa cidade está inteiramente integrada por sistemas de transporte coletivo e ciclovias e quase toda a energia provém de painéis solares, moinhos de vento e outras fontes renováveis. Resposta para os tempos atribulados das grandes urbes, onde é necessário poupar o planeta, a cidade inteligente já saiu do papel e começou a ser erguida em outubro nas cercanias de Paredes, região norte de Portugal. Os primeiros moradores chegaram e não são gente qualquer, mas funcionários de empresas como Cisco, McLaren, Siemens, Microsoft, Intel e IBM – o que dá uma ideia do que será o futuro Silicon Valley lusitano. “Essa será a primeira cidade em que a tecnologia estará presente desde a construção dos edifícios e dos espaços, o que cria novas oportunidades de uso de energia, inovação e interação entre as pessoas”, diz Steve Lewis, coordenador da PlanIT Valley, empresa que lidera a empreitada. “Acredito que a obra seja concluída em 2015, mas a cidade estará em constante desenvolvimento” afirma. O desejo dele, no entanto, é que esse crescimento seja sustentável. “Não queremos algo gigante, como as novas cidades da China. Terá que ser um bom espaço para viver, com locais de trabalho e pesquisa, mas também infraestruturas de educação, saúde e lazer, sempre preservando o meio ambiente”, acrescenta Lewis. Por Edu Petta living-planit.com Liana John é jornalista ambiental e autora do blog Biodiversa, do site Planeta Sustentável. Mulungu, uvaia e ora-pro-nobis. Exemplos da riqueza da biodiversidade brasileira © Fotos biodiversidade: Liana John | Foto Brasil diverso: Luciano Candisani 16 [18] BRASIL DIVERSO O fotógrafo e biólogo Luciano Candisani percorreu o território brasileiro com a máquina em punho disposto a registrar toda a riqueza dos nossos ecossistemas. Para o projeto Megadiversidade, clicou as tartarugas-verdes no atol das Rocas, mergulhou para fotografar piraputangas no Pantanal e partiu para alto-mar em Abrolhos para flagrar a baleia jubarte. A foto desta página mostra o muriqui, macaco da nossa fauna que é um dos primatas mais ameaçados do mundo e que foi conservado graças a uma convivência sustentável com o homem. “A espécie só não desapareceu graças a um fazen- deiro que, em plena década de 1940, resolveu preservar as matas em torno de seus cafezais, que serviam de morada aos muriquis”, conta ele, que integra a Liga Internacional de Fotógrafos da Conservação, instituição que agrupa os principais fotógrafos de natureza do mundo. candisani.com.br OM MUUNNIIDDAADDEE CCO A cidade de COPENHAGUE possui 340 km de ciclovias e até as estradas têm corredores para ciclistas. As ruas ganharam estacionamentos públicos para as bikes e é possível carregá-las no trem ou metrô. Em MILÃO, uma das linhas de metrô (vermelha) funciona graças à energia solar – são 23 mil m2 de placas capazes de gerar 1,4 milhão de quilowatts de energia por ano. Ao sul de LONDRES, uma ecovila reúne 100 casas com emissão zero em plena cidade. Tudo é ecoeficiente: das grandes janelas para iluminação natural (que evita gastos com eletricidade) até placas solares e “cata-ventos” coletores de energia eólica. [19] O BAIRRO IDEAL Para imaginar como ele seria, selecionamos projetos e ideias sustentáveis implantadas em cidades do mundo todo e colocamos tudo em volta do mesmo quarteirão. Com horta comunitária, baixa emissão de gases, produção de energia limpa e comércio local, seria o metro quadrado mais acolhedor da cidade. Por Rafael Tonon | Ilustração Heitor Yida Em BUNDANOON, Austrália, as garrafas de água descartáveis foram abolidas, já que no país o consumo anual é de 600 milhões de litros – o que gera cerca de 60 mil toneladas de emissões de CO2. Todas as ruas foram abastecidas com bebedouros com água filtrada, onde é possível beber e encher garrafões para usar em casa. Toda a água da chuva que cai sobre a fonte da praça Potsdamer Platz, em BERLIM, é colhida e utilizada na irrigação de plantas e hortas, além de ser usada para limpar os vasos sanitários e na extinção de incêndios das construções da região, em um projeto que alia um espaço público ao planejamento urbano sustentável. Na cidade de DACA, em Bangladesh, todos os resíduos sólidos orgânicos são separados e então utilizados para compostagem, que depois é vendida para empresas de fertilizantes. Com isso, foi possível reduzir 1270 toneladas de CO2 em um ano (evitando a queima desses resíduos). Em SANTANA DO PARNAÍBA, uma cooperativa de reciclagem criou projeto que visa a coleta seletiva por meio de conscientização da população. Todo o lixo da comunidade é reciclado, o que gera emprego a 69 catadores. Em SYDNEY, Austrália, um projeto da prefeitura garante que todos os moradores tenham acesso ao centro da cidade em até 30 minutos utilizando transporte público. Para isso, foram criadas linhas integradas de metrô e ônibus. A cidade de CINCINNATI, nos EUA, aprovou uma medida que fornece até 100% de isenção fiscal para imóveis recémconstruídos ou reabilitados, comerciais ou residenciais, que seguem preceitos mínimos de construção verde (como matérias-primas sustentáveis, uso racional de energia, iluminação natural etc.). COMUNIDADE O Freedom Theatre (Teatro da Liberdade, na tradução literal) está situado no campo de refugiados de Jenin, cidade ao norte da Cisjordânia. O embrião do atual Freedom Theatre começou em 1987 com o belo projeto da judia Arna Mer-Khamis. Arna, nascida antes da criação do Estado de Israel, militava no Palmach, grupo de combate criado em 1941 e braço de elite do exército judeu na época do Mandato Britânico da Palestina. Depois da guerra de 1948, casou-se com o árabe Saliba Khamis, um dos líderes do Partido Comunista de Israel. Defensora dos direitos humanos, ela estabeleceu no campo de refugiados de Jenin um centro de atividades teatrais para as crianças. Ali, elas descobriam seus talentos, um novo jeito de encarar a vida – a despeito de todas as privações socioeconômicas e das constantes e agressivas incursões do exército israelense –, sentiam-se cuidadas e desenvolviam autoestima. O grande mérito do Freedom Theatre talvez seja ensinar as crianças e os jovens a sonhar e a expressar-se com liberdade, de um modo que não seja nem violento nem vingativo. E ainda permitir que possam acreditar num mundo diferente para além das fronteiras do campo de refugiados, dos check-points, dos conflitos. Aos poucos, seus modelos não são mais os “mártires” mortos em confronto com o exército israelense ou em atentados suicidas, mas sim atores, cineastas, fotógrafos, professores e amigos, outras lideranças. O grupo teatral fez diversas apresentações na Europa e nos Estados Unidos. Tantas outras crianças começaram a participar das atividades da instituição. E, agora, uma nova sede – maior que a primeira – está sendo construída, na própria cidade de Jenin. Ainda me lembro de minha despedida, quando o taxista veio me bus- [21] O Kibbutz Lotan, ao sul de Israel: assentamento mistura vida comunitária com muita sustentabilidade F oi no ano de 1983 que um grupo de jovens dos Estados Unidos, Austrália e Israel resolveu se juntar para fundar um kibbutz moderno no meio do deserto. A vida não é fácil numa região conhecida pela aridez. Para completar, o assentamento comunitário está localizado no corredor entre a Jordânia e a Faixa de Gaza, umas das áreas mais conturbadas do Oriente Médio. O princípio básico de todo kibbutz é simples: uma comunidade em que seus membros têm acesso a recursos iguais, independentemente do tipo de trabalho que realizam. O Lotan é inovador porque dispõe do Centro de Ecologia Criativa e Aprendizagem Ambiental, com foco em Permacultura e Design de Ecovilas, que oferece uma infinidade de experiências na área de sustentabilidade e ecologia. “A proposta é diminuir o impacto que o ser humano vem causando no ambiente”, diz Mark Naveh, um dos fundadores. Em 2006, o kibbutz foi reconhecido pela Global Ecovillage Network. Pudera: até as casas são car de madrugada a fim de me levar até a fronteira com a Jordânia. As mesquitas estavam silenciosas, os palcos do Freedom Theatre também. As luzes, apagadas. Olhei para o letreiro em vermelho e amarelo. “Ah, a liberdade que permite o teatro. Ah, Teatro da Liberdade”, pensei. E as cortinas se abriram. Por Maria Fernanda Vomero. thefreedomtheatre.org Kibbutz “verde”: o forno solar (abaixo) usado pelos moradores e as inusitadas casas de barro (ao lado) Atores em cena: a ficção como uma forma de lidar com a realidade © Foto Freedom Theatre: Divulgação | Foto: Kibbutz: Alex Fisberg [20] Teatro transforma a realidade de crianças e jovens palestinos de um campo de refugiados em Jenin através da arte feitas de lama, argila e palha, mas nem por isso são menos resistentes que as construídas com alvenaria convencional. Todas as casas estão interligadas a um sistema de reaproveitamento de água, reciclagem de sólidos, além de utilizarem painéis solares para geração de energia. Ambientes comunitários têm lixos separados para reciclagem, e todo o lixo orgânico passa por um processo de compostagem que vira adubo para utilização nas plantações. A água utilizada em chuveiros e torneiras é reaproveitada para irrigação de toda a região. Toda essa inovação vem atraindo bastante atenção de estudantes ao redor do mundo. “Acabei de terminar minha graduação em engenharia ambiental e tenho certeza de que essa experimentação está sendo fundamental para os próximos passos da minha carreira”, afirma Marcus Adjon, jovem norte-americano integrante do curso de Aprendizado Ecológico, com duração de quatro meses. Por Alex Fisberg. kibbutzlotan.com COMUNIDADE A Gente Transforma é um projeto colaborativo. Como se dá a interação entre os diversos profissionais envolvidos? Participaram a equipe do projeto, os moradores da comunidade, universitários do Brasil e do exterior, empresas e voluntários. O A Gente Transforma faz uso das cores para despertar a criatividade e realizar mudanças dentro de uma comunidade, elevando sua autoestima e colocando o poder de transformação nas mãos dos moradores. zes culturais têm lugar de destaque, como uma forma de incluir a própria história no ambiente. No caso do A Gente Transforma, as cores, o curso de capacitação em pintura, a participação efetiva dos moradores no processo de transformação do único espaço de lazer que desfrutavam são parte de um movimento inclusivo. Nossa expectativa é que esse projeto seja um despertar. Queremos estimular as pessoas para sua capacidade de realizar e articular juntas, através da colaboração. Como o design pode despertar o sentimento de autoestima em populações menos favorecidas? Morar é algo realmente importante quando falamos de valores como identidade cultural, autoestima, cultura popular, memória e inclusão. Em nossos projetos, buscamos enxergar a casa como um elemento capaz de elevar a autoestima do brasileiro, onde a memória pessoal e as raí- [23] O estudante de artes Daniel Scandurra é o autor de uma bela intervenção nos relógios – abandonados – de São Paulo. Enquanto os artefatos “dormem” (à espera de uma solução da prefeitura e da iniciativa privada), Daniel adesivou mensagens inspiradas na arte concretista. Uma intervenção pacífica, poética e que promete um respiro no meio da urbe. [24] A França tem vivido dias de polêmica graças ao debate sobre a proibição do uso do véu islâmico. E é na capital francesa que a artista Princess Hijab, armada apenas de caneta preta, pinta véus em cartazes expostos no sistema de metrô parisiense. São intervenções bem-humoradas, com um sabor infantil, mas que não escondem seu potencial transgressor. 25 © Foto A Gente Transforma: Divulgação; Foto Intervenções nos relógios: Camila Picolo | Foto Skateistan: Rhianon Bader; Foto faixa de pedestre esqueda: Alice Rodrigues ; direita: Antonio Komiyama [22] Um dos nomes à frente do projeto A Gente Transforma, o arquiteto e designer Marcelo Rosenbaum acredita que a arte pode mudar uma comunidade para melhor Manobras radicais contra o radicalismo: projeto une skate e cidadania em meio às regiões de conflito no Afeganistão O horror da guerra não é um só, são vários: doenças, problemas de infraestrutura, amizades separadas por trincheiras, famílias destruídas. O que dizer então do Afeganistão, encravado no centro da Ásia e no olho do furacão da guerra contra o terror? Ali, tudo é uma aridez só. E para os jovens, então, parece não haver saída. Parecia. Uma iniciativa chamada Skateistan (trocadilho com skate e com o nome do país) está ajudando a restituir um pouco de sanidade a jovens sem família ou destino. Trata-se de uma escola de skate que, para muito além das manobras radicais, educa, qualifica e traz de volta a esperança pela paz a milhares de jovens. Iniciativa dos skatistas australianos Oliver Percovich e Sharna Nolan, a escola hoje conta com diversos colaboradores e está fazendo história em Cabul, a conflagrada capital do país. Troca a desesperança e a revolta da guerra pela alegria do esporte e a qualificação em ofícios como informática, artes e espírito comunitário. skateistan.org 26 Em Curitiba, um consórcio de artistas e designers utiliza a faixa de pedestres como suporte artístico. A ação, batizada de Arte na Faixa, foi realizada por 20 artistas da capital paranaense. São ilustrações, grafites e pinturas que buscam a paisagem urbana como “tela” – e o melhor, tudo com o apoio da própria prefeitura. artenafaixa.com.br COMUNIDADE Não é preciso muito dinheiro para transformar a vida de uma pessoa, ou até de uma comunidade. Essa é a ideia por trás do microcrédito, termo cunhado nos anos 1970 por Muhammad Yunus, fundador do Grameen Bank, de Bangladesh, para designar o crédito concedido a pessoas de baixa renda, que não teriam acesso às formas tradicionais de financiamento. A ideia em si é antiga – os primeiros registros são de 1846, quando um pastor da Alemanha cedeu farinha para que as pessoas fabricassem pão e assim se livrassem das dívidas com agiotas. Mas foi com Yunus que a ideia ganhou corpo e passou a mudar a realidade de milhões de pessoas. Em 1976, ele começou a fazer empréstimos de pequeno valor para produtores rurais, no início, tirando o dinheiro do próprio bolso. Assim surgiu o Grameen 28 Thiago Vinicius no palco do TEDxAmazônia: aos 20 anos, ele já criou um banco comunitário que ajuda o bairro Jardim Sampaio, onde mora, a prosperar Bank. Uma característica do sistema desenvolvido por ele é o sistema de grupo solidário, em que um conjunto de pessoas pega juntas o empréstimo e cada uma é fiadora das outras. O agente de microcrédito também é importante: ele é quem irá até a casa das pessoas para conhecê-las e decidir se o crédito é liberado. Os agentes passam a conhecer bem e acabam ficando amigos das pessoas que solicitam os empréstimos. Essa relação mais próxima quebra a impessoalidade dos bancos normais e ajuda a fazer o sistema dar certo: no Grameen Bank, a taxa de pagamento dos empréstimos beira os 99%. No Brasil, um estudo feito pela Fundação Getúlio Vargas com 175 empreendedores de Heliópolis mostrou que os que tinham recebido microcrédito tiveram suas vendas aumentadas em 60%. Por Jeanne Callegari Além de grandes bancos que investem em microcrédito, existem iniciativas menores, focadas em comunidades específicas, que também praticam microfinanças e ajudam a combater a pobreza. São os bancos comunitários. Aos 20 anos, Thiago Vinicius é o fundador de um desses empreendimentos: o Banco Comunitário União Sampaio, no Jardim Maria Sampaio, periferia de São Paulo. No evento TEDxAmazônia, no mês de novembro, em Manaus, Thiago foi um dos palestrantes e contou como o banco, que tem pouco mais de um ano de vida, fornece crédito para os comerciantes da região, e do sampaio, a moeda social criada pelo banco para valorizar o comércio local. Quem tem sampaios pode trocá-los por produtos nas lojas que o aceitam. Thiago é responsável pela análise dos pedidos de empréstimo feitos ao banco, em uma relação próxima que ajuda a garantir o sucesso da iniciativa e fortalecer a comunidade. © Foto Thiago Vinicius: Rodrigo Fonseca | Ilustração microcrédito: Catarina Bessel [27] Criado em Bangladesh, nos anos 1970, o microcrédito é uma forma de gerar desenvolvimento nas comunidades e produzir riqueza, ajudando as pessoas a realizar sonhos [29] A internet abriu possibilidade para novas formas de microcrédito. São sites como o Kiva.org, que permitem que qualquer pessoa empreste dinheiro para empreendedores de baixa renda ao redor do globo. A ideia é ajudar a aliviar a pobreza. O empréstimo mínimo é de 25 dólares. Você pode emprestar tanto para uma vendedora de tecidos no Quirguistão como para um grupo de plantadores de arroz no Camboja: é só entrar no site, escolher o perfil dos candidatos e emprestar via PayPal ou cartão de crédito. Todos são selecionados por instituições de microcrédito de cada país. Um site com uma proposta parecida é o Microempowering.org, que permite doações para os empreendedores. Nesse caso, o dinheiro não é pago de volta – é uma doação, não um empréstimo. [30] O Brasil também participa do jogo do microcrédito. De instituições governamentais – como SP Confia e Banco do Nordeste, o maior do gênero no país – a empresas privadas, muita gente percebeu o potencial dessa iniciativa. Jerônimo Ramos, superintendente dessa área no Santander Microcrédito, um dos bancos privados a investir no segmento, se apaixonou pela ideia. “O microcrédito é diferente do microempréstimo: o dinheiro não vai para consumo, mas para investimento em um negócio, no sonho das pessoas”, diz. “Assim, gera-se renda e desenvolvimento. Muita gente sai da linha da pobreza por causa disso.” É a dona de um bar que comprou uma geladeira nova e assim pode ampliar o negócio, ganhando dinheiro para colocar os filhos em uma escola de música; é o dono de um salão de beleza que viu a clientela aumentar depois que reformou o local. Segundo Jerônimo, os filhos e familiares estão entre os mais beneficiados pelos empréstimo. “No microcrédito, não é o cliente que vai até o banco, mas o banco que vai até a casa do cliente”, diz. COMUNIDADE [31] [32] Ao longo de 15 anos, a muçulmana Zilka Spahic-Siljak tem visitado diferentes vilarejos na Bósnia sempre com a mesma mensagem: é possível viver em paz Q trata de tarefa fácil; a equipe encontra resistências por todos os lados, de cidadãos comuns a líderes políticos ou religiosos, todos céticos em relação às mudanças. A guerra também deixou marcas em Zilka, que engravidou durante o período. “Não foi uma decisão racional, mas estou feliz que tenha sido assim.” O conflito ainda estava em curso quando ela começou o trabalho de acolhimento e assistência aos refugiados, especialmente mulheres que foram estupradas ou sofreram algum tipo de violência. Hoje, segundo ela, a situação é diferente. Por lidar com temas relacionados à paz e ao perdão, valores em que realmente acredita, acompanha muitas histórias positivas, de reconciliação e mudança de comportamento. “A paz é um processo que não pode ser interrompido, temos de ser agentes permanentemente”, diz Zilka. Aos 42 anos, embora tenha vivido numa cidade sitiada durante a guerra e visto muitas atrocidades, ela não deixa que suas esperanças percam o frescor. Ao fim da conversa, confessa: “Sou uma romântica”. O mundo lhe agradece. M.F.V. [34] © Foto Zilka: Divulgação | Foto pintura na rua: Divulgação; Foto Williamsburg: Max Plogia (It’s Green Design). uando encontrei Zilka Spahic-Siljak, pesquisadora e professora do Centro para Estudos Interdisciplinares de Pós-Graduação da Universidade de Sarajevo, na Bósnia, o Ramadã já havia começado. Zilka, muçulmana praticante, jejuava. “Estou cansada, ainda não tive um dia de descanso”, disse, com um sorriso. Além da atividade acadêmica – ela ensina disciplinas ligadas a gênero, direitos humanos e religião –, Zilka dirige há 15 anos a Fundação Educacional, Psicossocial e Transcultural, uma entidade voltada para trabalhos práticos de reconciliação e diálogo em vilarejos marcados pela guerra que devastou a Bósnia (1992-95), durante o esfacelamento da ex-Iugoslávia. Num país formado por três etnias majoritárias frequentemente confundidas com identidade religiosa – sérvios (ortodoxos), croatas (católicos) e bosniaks (muçulmanos) – e que esteve quase 50 anos sob um regime socialista, o período pós-guerra propiciou o recrudescimento de antigos nacionalismos e de ódios latentes na sociedade. “Como é importante reunir pessoas de grupos étnicos e religiosos diferentes neste país! Temos muito trabalho”, diz. Ela e sua equipe promovem workshops, reuniões e eventos em vilarejos ortodoxos, católicos e muçulmanos sempre com a mesma mensagem: é possível conviver com o outro. “Queremos contribuir para a melhora da relação entre as pessoas, ensiná-las a perdoar, a se reconciliar, a viver juntas de novo.” Não se Unir os moradores de uma comunidade em prol de melhorar e tornar mais agradável o espaço comum. Uma série de iniciativas com esse intuito, tão antigo quanto singelo, tem cada vez mais tomado as cidades do mundo. A fundação ArtsWave promoveu, junto com o estúdio de design Higher Level Art, uma intervenção artística coletiva que fez lembrar esse tipo de prática, mas em maiores proporções. Cinco artistas, 100 organizadores e 1500 voluntários de todas as idades sujaram as mãos de tinta e transformaram 800 metros do asfalto cinza e frio do histórico bairro Over-the-Rine, em Cincinnati (Ohio), com desenhos, formas e cores alegres e vibrantes. A ação durou 12 horas e o resultado final foi ver o melancólico bairro de cara nova. Guiada pela proposta de criar comunidades através das artes, a ArtsWave se esforça para fazer da cidade um lugar melhor para viver, trabalhar e, por que não, brincar. Confira o vídeo da intervenção no link: theartswave.org. Por Mariana Del Grande 33 Uma vez por ano, a rua Bedford, em Williamsburg, no Brooklyn nova-iorquino, acorda com gramados verdes, sombra e água fresca, além de artistas, artesãos e áreas de lazer desejando bom dia a toda a comunidade local. Durante o verão, acontece ali o Williamsburg Walks, um evento destinado a repensar os espaços públicos, inspirados em eventos que acontecem em cidades do mundo todo, como Londres e Tóquio. A ideia é simples: bloquear o trânsito de uma das ruas principais, permitindo que a comunidade celebre o próprio bairro e desfrute de pequenos espaços criados no meio do asfalto, priorizando os pedestres em vez dos carros. Nem que seja por alguns dias no ano... Por Max Poglia Depois do furacão Katrina ter devastado Nova Orleans, cerca de 2 mil pessoas resolveram se mudar para a cidade e auxiliar na sua reconstrução. Entre elas estava o músico-viajante Andreas Hoffmann, que pensou em uma maneira de ajudar que fosse positiva também para o meio ambiente. Foi então que ele criou o Green Light, um grupo de voluntários que percorre as ruas da cidade de bicicleta (para não emitir gases, claro) para substituir as lâmpadas comuns das casas por modelos fluorescentes, que gastam muito menos energia. A ideia foi tão bem aceita que até hoje Hoffman, sua banda e 4500 colaboradores já conseguiram trocar 230 mil lâmpadas de quase 9 mil casas, economizando 90 milhões de kW/h. “Passamos pelas casas e mudamos, também, a mentalidade das pessoas, que percebem a importância de economizar energia e diminuir a emissão de CO2”, diz ele. “Afinal, muitos estudos mostram uma relação da maior incidência dos fenômenos naturais, como os furacões, com a questão do aquecimento global. Mesmo dez anos depois da tragédia, continuamos fazendo a nossa parte.” COMUNIDADE [36] Incubadoras sociais dão um empurrão para que negócios com preocupação ambiental ou social virem realidade Negócios que, além de viabilidade econômica, tenham impacto social. Esses são os alvos das incubadoras sociais, que ajudam a botar de pé empreendimentos que vão além do lucro e pretendem mudar o mundo para melhor. Algumas são focadas em redução de pobreza, como é o caso da Artemísia, de São Paulo. Outras, como a dos holandeses da Enviu, procuram soluções para os problemas ambien- tais. Em comum, a ideia de ajudar negócios do chamado setor 2,5, que fica entre as ONGs e instituições com fins sociais, e os empreendimentos que visam lucro. Para estar numa incubadora social, o negócio precisa ser sustentável economicamente, além de para a sociedade e para o ambiente. Assim, garante-se a continuidade das ações independentemente de doações – o que é bom para todo mundo. Uma discoteca que gera energia elétrica enquanto as pessoas dançam; um carrinho do tipo riquixá híbrido, que gere renda para as populações pobres e não polua o ambiente. Esses são dois dos projetos em que a Enviu, incubadora holandesa voltada para a sustentabilidade, esteve envolvida. Seu fundador, Stef van Dogen, esteve no Brasil para a conferência TEDxAmazônia, em novembro, onde falou sobre a origem da empresa. Nascido em uma família de empreendedores, Stef tinha a ambição de ficar rico cedo. Mas, ao conhecer a realidade de famílias pesqueiras no Chile, pensou que o ecoturismo poderia ser uma solução para tirálos da pobreza e ainda acabar com a pesca predatória na região. Levou especialistas da Holanda para lá e apoiou a criação de 30 microempresas. A partir daí, criou a Enviu, que trabalha com empreendedores e inovadores jovens do mundo todo. Seus projetos mais marcantes são o Sustainable Dance Club (“Discoteca Sustentável”) e o Hybrid TukTuk (“TukTuk híbrido”). O tuktuk é um carrinho do tipo riquixá usado na Índia para transportar pessoas. Movidos a gasolina, costumam ser muito poluentes; seus motoristas são em geral das parcelas mais pobres da população. A Enviu abriu uma competição de design para que inovadores do mundo todo criassem soluções para o carrinho. Uma parceria entre a incubadora e um empreendedor indiano gerou uma empresa para fabricar o modelo vencedor e oferecê-lo a preços baixos para os motoristas da Índia, permitindo que melhorem de vida dirigindo um veículo que melhorará a qualidade do ar nas cidades e reduzirá a emissão de gás carbônico na atmosfera. O Hybrid TukTuk, projeto da Enviu: transporte sustentável para os indianos [37] Financiamento online: um novo jeito de bancar projetos criativos surge na web Financiar ações que envolvem criatividade se tornou mais fácil com o Kickstarter, site americano que une pessoas com boas ideias a gente querendo investir nelas. No site, é possível inscrever projetos como um novo documentário, um espetáculo de dança, um projeto fotográfico ou de design, a invenção de um novo objeto e até mesmo a programação de um novo software. Se aprovada, a ideia fica aberta para investimentos no site. Qualquer pessoa pode entrar e investir o quanto quiser; em troca, ganhará uma experiência única para aquele projeto, como uma cópia autografada do CD ou acesso ao palco em uma apresentação de dança, por exemplo. O dono do projeto só receberá o dinheiro se a cota definida como necessária para concluir a empreitada for arrecadada dentro do prazo (os valores conseguidos ficam à mostra, em uma barra, na página de cada projeto). Assim, garante-se que os artistas e empreendedores só começarão a criar quando tiverem grana para isso, evitando que se dediquem a projetos e tenham que parar no meio por falta de recursos. Um projeto que arrecadou mais de 200 mil dólares no Kickstarter foi o da rede social Diaspora, criado para concorrer com o Facebook. [38] © Foto Tuk Tuk: Divulgação | Foto ovos: Robert Kirk/Getty Images; Ilustração: Márcio Fujii [35] Formar pessoas que possam ser atores de transformação social, por meio de negócios que ajudem a reduzir a pobreza. Esse é um dos pilares da Artemísia, aceleradora de negócios sociais de São Paulo. A ideia da empresa é que, com equipes fortes e afinadas, os empreendimentos terão mais chance de prosperar. Por isso, um dos focos de seu trabalho acontece no Centro de Formações, em que dão treinamentos técnicos e teóri- cos para que pessoas que querem fazer a diferença no mundo se tornem futuros gestores. “O Brasil pode ser um polo de negócios que reduzem a pobreza”, diz Maure Pessanha, diretora do Centro de Formações da Artemísia. “Afinal, o país está crescendo macroeconomicamente, temos uma cultura empreendedora e muitos desafios sociais para solucionar.” Quem quiser participar e não tiver dinheiro para pagar os cursos pode oferecer uma contraproposta empreendedora, trocando serviços que beneficiem a aceleradora ou o campo de negócios sociais. A Artemísia também tem um Programa de Aceleração de Negócios, em que ajuda financeiramente empreendimentos que surgiram nos cursos de formação ou que a equipe identificou como sendo interessantes. COMUNIDADE O coletivo Demos Helsinki existe para pensar questões urbanas primordiais – como o que nos deixa felizes Demos Helsinki é um think tank (grupo de estudo e pesquisas) da Finlândia focado em discutir novos rumos para a democracia no século 21. O grupo começou as atividades em 2005, quando dois amigos que se conheceram na faculdade de filosofia decidiram trabalhar juntos. “Nosso trabalho fica no meio entre o jornalismo, a pesquisa acadêmica e uma consultoria política”, diz Roope Mokka, um dos fundadores do grupo. Junto com Simo Vassinen, também membro do Demos, veio ao Brasil para dar uma palestra no TEDxAmazônia. O trabalho do think tank é baseado em pesquisas científicas. Para escrever The Politics of Happiness – A Manifesto (“A Política da Felicidade – Um Manifesto”, que deve ter tradução para o português em breve), por exemplo, o grupo foi atrás das mais recentes pesquisas para descobrir o que torna uma pessoa feliz. Mas também tem muito de jornalismo, pois tenta divulgar as informações em um formato atraente – como o próprio manifesto. O grupo se parece com uma consultoria ao propor ações práticas de mudança com base nas informações levantadas. Em The Politics of Happiness, propõem que o foco de preocupação dos governos deve mudar da economia para a felicidade. Segundo pesquisas, a partir de uma certa faixa de renda, em que as necessidades humanas básicas estão supridas, mais dinheiro não traz felicidade. O exemplo é dos Estados Unidos e da Finlândia, que aumentaram progressivamente o nível de riqueza nas últimas décadas, mas permaneceram com níveis estáveis de bem-estar. “Estudos mostram que somos incrivelmente ruins em avaliar o que nos faz felizes. Buscamos felicidade em coisas que só nos fornecem descargas momentâneas, e que estão destruindo o bem-estar das próximas gerações”, diz o manifesto. As cinco propostas para aumentar a felicidade das pessoas seriam: mais e melhor tempo livre, lugares significativos, participação na comunidade, criação de uma cultura do bem-estar e o aprofundamento de nossos relacionamentos com amigos, vizinhos e família. “O Brasil poderia ser uma superpotência da felicidade no mundo”, disseram Roope e Simo no TEDxAmazônia. A receita para isso? “Quebrar as barreiras que separam as pessoas.” Por Jeanne Callegari Roope Mokka e Simo Vassinen, do Demos Helsinki [40] OLHOS NO MUNDO O fotógrafo francês JR é um adepto da grandiloquência. É através de enormes painéis e fotos gigantes espalhadas por cidades do mundo inteiro que ele mostra seu trabalho – e dá o seu recado. Ao reproduzir, por exemplo, retratos de mulheres que lidam todos os dias com os efeitos da © Foto Demos Helsinki: Bruno Fernandes | Foto Olhos no mundo: Divulgação [39] guerra, pobreza e opressão nos muros das periferias de Paris ou nas escadarias do morro da Previdência, no Rio de Janeiro, ele cria um manifesto-homenagem para que as pessoas possam enxergar (e se conscientizar) que essas Mulheres São Heroínas, como diz o nome da sua última mostra a céu aberto. JR omite sua identidade e gosta de ser chamado de “photograffeur” – palavra em francês composta da mistura entre fotógrafo e grafiteiro. Ele, que ganhou o TED Prize 2011, acredita que a arte precisa estar mesmo é nas ruas, bem mais aos olhos das comunidades. tedprize.org E TA PA 2 GN N DDEESSIIG PREENCHIMENTO: Agora é hora de colocar a matéria-prima triturada e misturada com o micélio em um molde com o formato do produto final. Exemplo: o molde dos protetores de quina para embalagens [41] EMBALAGENS SUSTENTÁVEIS Tóxicas e quase impossíveis de se decompor na natureza, elas já foram o vilão da ecologia, mas estão sendo redimidas por novos materiais Por Jeanne Callegari | ilustração Marcelo Bucaretchi E TA PA 1 Q uem fica com consciência pesada ao pegar uma sacolinha de plástico no supermercado já sabe: embalagens são um dos grandes vilões da sustentabilidade hoje. Se feitas de plástico, representam um material que demorará mais de 400 anos para se degradar no ambiente, se não reciclada. Outro material, o isopor, demora apenas oito anos, porém sua reciclagem é cara e dispendiosa. Em vez de tentar reduzir o tamanho das embalagens para diminuir seu impacto na natureza, algumas empresas estão partindo para uma abordagem diferente: usar materiais feitos a partir de matérias-primas biológicas, que possam ser decompostas na natureza, para fabricar de sacolas, caixas e outros itens de proteção a objetos. Um exemplo são os bioplásticos. Feitos em geral de sobras da agricultura, como fécula de mandioca, batata, milho ou cana-de-açúcar, esses biopolímeros têm características similares aos plásticos comuns, mas podem ser jogados na natureza, onde irão se decompor e até ajudar a tornar o ambiente mais fértil, pois, como são feitos de material orgânico, servem como adubo para as plantas. “Três princípios devem governar a criação de materiais melhores. Em primeiro, eles devem poder ser criados em todos os lugares do planeta. Segundo, eles devem requerer bem menos energia que os atuais para ser produzidos. Terceiro, eles devem poder ser descartados pelo maravilhoso sistema de reciclagem open-source que é a natureza”, disse, em uma palestra da conferência californiana TED, feita para divulgar ideias inovadoras, Eben Bayer, criador da Ecovative, empresa que usa o micélio dos cogumelos no lugar do plástico (veja no infográfico ao lado). MATÉRIA-PRIMA: Resíduos descartados pela agricultura servem como matéria-prima. De preferência, são produtos da região. Na Espanha, sementes de soja; na China, rebarbas de algodão 𰁳 𰁳 F UNGO A empresa Ecovative usa o micélio, parte do cogumelo responsável pela sustentação e absorção de nutrientes, como cola para os resíduos de agricultura, que formarão um material forte e resistente, que substitui o isopor R e c i c l e E TA PA 5 𰁳 𰁳 M ILHO Junto com a USP, a Biomater, de São Carlos (SP), desenvolve embalagens a partir de resíduos do milho 𰁳 MA NDIOC A A fécula de mandioca é usada pela brasileira CBPAK na fabricação de pratinhos de isopor para colocar alimentos 𰁳 𰁳 B ATATA A batata também é usada pela Biomater e por outras empresas como a Cereplast, para fazer sacolas etc. 𰁳 ALGA 𰁳 Mas a aposta da americana Cereplast está nos bioplásticos a partir de algas, ainda em desenvolvimento DESCARTE: Depois de usado, o objeto de micélio é facilmente descartado. Pode ser colocado no jardim como adubo, usado em composteira ou mesmo descartado no lixo, pois se decompõe rapidamente. E TA PA 3 CRESCIMENTO: O micélio vai crescer e dar a “liga” entre os resíduos biológicos que servem como matéria-prima. É aqui que a mágica acontece, pois o fungo é que está fazendo o trabalho E TA PA 4 PRODUTO: Aqui temos o produto final, como um berço para embalagens que substitui o isopor ou um bloco para construção. O produto de micélio é adequado para embalar coisas pesadas, como TVs DESIGN [43] D esign sem desperdício de material, sem sobras, não-prejudicial para os seres humanos e para as outras espécies. Essa é a ambição do químico alemão Michael Braungart, que, junto com o arquiteto William McDonough, escreveu o livro Cradle to Cradle – Rethinking the Way We Make Things (“Do berço ao berço – Repensando a maneira como fazemos as coisas”, sem tradução em português). Para a dupla, não devemos tentar fazer design com menos impacto na natureza. Ao contrário: devemos celebrar a abundância, por meio de uma forma completamente diferente de pensar o design, usando novos materiais e descartando a ideia de “jogar fora”. Braungart esteve no Brasil para a conferência TEDxAmazônia em novembro. Confira nossa entrevista com ele. Por Jeanne Callegari Em seu livro, você fala da ideia de eliminar o conceito de “resíduos”. Como é possível fazer isso, por meio do design? Essa seria a forma normal. Ter resíduos é falha de design, é uma sobra que não deveria existir. Quando as pessoas compram um produto, o que elas querem é a experiência ou serviço que aquele produto proporciona; mas hoje, quando elas compram, elas levam também as sobras, material para descartar depois, como a carcaça de uma televisão ou embalagens. Não é justo fazer as pessoas terem sobras quando tudo que elas querem é um serviço. Para mudar isso, é preciso não ficar pensando em diminuir o gasto de materiais, mas repensar completamente o design de um produto, de forma que ele não gere nenhum resíduo. Precisamos perguntar o que as pessoas realmente querem de um produto. Perguntar: qual o propósito disso que estou criando? Aí podemos usar os melhores materiais e fazer projetos melhores. Vocês falam em design “berço a berço”. Como isso funciona na prática, e em que isso é diferente do conceito “berço a túmulo” que existe hoje? Os produtos hoje são feitos para ser jogados fora. O planeta é um cemitério de coisas. Reciclar é apenas uma forma de mandar as coisas um pouco mais tarde para o cemitério. Nós temos sistemas biológicos de design – como uma árvore, por exemplo – e sistemas técnicos. Quando fazemos uma TV, temos que garantir que os sistemas téc- [44] O que significa fazer um design baseado na abundância? Se você olha para uma cerejeira, ela não se reprime: não há redução, apenas abundância. Não estamos falando de fazer menos mal, de reduzir impacto. Isso nós já temos bastante. Trata-se de fazer o bem. Eficiência é diferente de eficácia. Uma cerejeira tem milhares de flores; isso não é eficiente. Mas é extremamente eficaz. Outro exemplo é o do namorado que chega atrasado para um encontro, mas que, quando chega, traz um enorme buquê de flores: as flores não são eficientes, mas são eficazes para aplacar a ira da namorada. Falamos de produtos que não precisam ter seu consumo reduzido, pois quanto mais deles você tiver, melhor. Um prédio que gere energia para a cidade, que descarte água mais limpa do que antes, que deixe o solo mais rico e produtivo, que deixe o ar mais limpo, por exemplo. Um prédio que seja como uma árvore. A EcoChapa permite preparar suas refeições com uma pegada muito mais sustentável. A tecnologia está no sistema de fogareiro, que consegue produzir 40 minutos de chama com apenas 100 ml de álcool – energia limpa e renovável, que ainda é derivada da cana-de-açúcar, uma planta abundante no nosso país. O carvão das churrasqueiras tradicionais exige o desmate de árvores para ser produzido, além de liberar mais gás carbônico quando consumido pelo fogo, agravando o acirramento do efeito estufa e o aquecimento global. homesteel.com.br [45] nicos não vão para os sistemas biológicos, porque é ruim para eles. Quando as pessoas fazem janelas, por exemplo, usam químicos fortes na tinta que tornam muito difícil reciclar aquele material. Elas fazem assim porque é mais barato. A maioria dos produtos hoje não foi feita para ser reciclada. E mesmo isso não seria suficiente. O ideal é o conceito de upcycle: criar produtos que deixem o planeta mais limpo que antes, que não sejam neutros em carbono, mas positivos em seu impacto na natureza. © Foto Ecochapa: Divulgação; Ilustração: Luciano Veronezi; Foto Aspiradores: Divulgação [42] O alemão Michael Braungart propõe uma nova forma de lidarmos com o design: sem desperdícios, usando novos materiais e aproveitando a abundância dos recursos Para cada folha que você imprime, dois recursos naturais precisam ser retirados do meio ambiente: árvores, usadas para fazer o papel, e petróleo, matéria-prima da tinta dos cartuchos. Nenhum deles, porém, é gasto para imprimir na PrePean, essa impressora que usa um sistema térmico para gravar textos e imagens em folhas plásticas. À prova d’água, as folhas podem ser usadas mais de mil vezes, já que o calor trata de apagar a impressão anterior e registrar a nova. Ainda é um projeto conceitual, mas que daria um belo alívio para o planeta. sanwa-newtec.co.jp O projeto ambiental Vac From The Sea quer conscientizar as pessoas sobre a contaminação dos mares e oceanos com a quantidade de material plástico descartado indiscriminadamente nesses ambientes. Para isso, voluntários coletaram plásticos acumulados nas águas do oceano Pacífico, mar do Norte, mar Mediterrâneo, oceano Índico e mar Báltico que depois foram usados para criar uma linha de aspiradores conceituais para a Electrolux, empresa que mantém o projeto. Cada um dos cinco modelos feitos com plástico dos oceanos representa um dos mares e oceanos onde o projeto está em andamento. Os produtos não estão à venda – já que a quantidade de material coletada ainda não é suficiente para suprir uma produção em grande escala –, mas servem como uma forma de conscientizar a necessidade de “aspirar” o lixo que jogamos nos mares. www.electrolux.com DESIGN E las são pequenas, mas nem por isso precisam ser minimalistas. Costumam ser erguidas com materiais sustentáveis. Isso sem falar que o próprio espaço que elas ocupam, bem menor que o habitual, já é um sinal de seu potencial verde: geram menos energia, desperdiçam bem menos, oferecem muito menos espaço para a habitual acumulação de pilhas, tralhas e outras inutilidades. E são baratas: ninguém vai passar os próximos 30 anos pagando hipoteca por elas, tampouco haverá a explosão de outra bolha imobiliária por sua causa. A tendência das minicasas, que se alastra pelo mundo a partir dos Estados Unidos (atente ao paradoxo: o país do desperdício é ao mesmo tempo o terreno de O designer e escritor Jay Shafer e sua casa de medidas diminutas: “Menor que muitos closets” [47] uma nova consciência ecológica), é a grande novidade arquitetônica e imobiliária dos últimos anos. Com dimensões próximas às das casas de bonecas – há modelos que começam em míseros 5 m2 até “mansões” de 78 m2 –, as minicasas têm no designer norte-americano Jay Shafer um de seus mais famosos apóstolos. Autor do livro The Small House Book (“O livro da minicasa”, ainda sem edição brasileira, veja na página ao lado), Shafer percorre seu país fazendo o catecismo das pequenas dimensões em palestras e workshops. Ele mesmo, como não poderia deixar de ser, mora em uma dessas casas mínimas. “Desde 1997 eu vivo em casas menores que o closet de muita gente”, afirma. The Small House Book, Jay Shafer (pode ser encomendado na www.amazon.com) [48] www.tumbleweedhouses.com © Fotos Tendência minicasas: NONONO | Foto Um pequeno refúgio: Arquivo Pessoal [46] Será que é preciso continuar erguendo casas imensas, com muito mais cômodos que o necessário? A resposta pode estar na tendência das minicasas Com a praticidade típica da cultura ianque, o livro do designer e construtor norte-americano Jay Shafer apresenta sugestões – com as devidas plantas e demais indicações – de minicasas sobre rodas que teoricamente qualquer um teria condições de pôr de pé. A obra de Shafer, que apareceu pouco tempo depois da débâcle hipotecária que assolou os EUA em 2008, tornou-se uma espécie de bíblia sustentável por unir a boa consciência ambiental com um verdadeiro libelo a favor da economia de meios, materiais e, claro, dinheiro. E aí, topa erguer a sua? Um pequeno refúgio Desde adolescente, sempre tive uma obsessão arquitetônica que alguns consideravam pouco usual: as estações científicas (ou os postos de observação) de lugares remotos – sendo que as mais conhecidas são as da Antártica. Esses lugares apontavam com frequência para a existência de uma situação-limite que me agradava, ao menos na teoria: a ideia de ficar sozinho, na natureza selvagem, durante um longo período. Queria silêncio, tempo e (algum) espaço e recriava mentalmente uma reminiscência da casa na árvore que havia ficado lá na infância, perdida entre os brinquedos de um parque vazio. Já adulto, inspirei-me nesse sonho antigo quando resolvi construir meu “posto avançado” no sertão da Barra do Una, região do litoral de São Paulo. Gastei o lápis rabiscando em diversas folhas de papel aquilo que seria meu esconderijo, mas o projeto só tomou forma depois que conheci o casal de arquitetos Vinícius Andrade e Lua Nitsche. Numa conversa com eles, acrescentei apenas duas recomendações ao meu desejo: custo baixo e preservação do ecossistema. Eles não apenas toparam como também desenvolveram soluções mais sofisticadas sem alterar a proposta minimalista: cobertura com pouca inclinação para reter as folhas e refrescar a habitação; paredes e portas de vidro para transformar a mata na personagem e não só no cenário; e estrutura em formato de trailer elevada cerca de 1 metro do chão para afastar a construção da umidade. Foram quatro meses de trabalho e algumas dezenas de picadas de mosquito. Nas primeiras noites que dormi sozinho por lá, ainda com a obra inacabada, ouvindo o rumor da mata, compreendi melhor as intenções de Thoreau em Walden. Afinal, quando um homem se mantém aquecido num refúgio como esse, o que é que ele quer mais? Ricardo Lombardi é jornalista e diretor da revista VIP. DESIGN [49] A história de perseverança e trabalho de dona Angelita, uma das líderes da Associação das Mulheres Rendeiras de Petrolina [50] os 66 anos, casada e com quatro filhos, Angelita Maria Santos esbanja vitalidade e disposição. Acorda entre 4h e 4h30 e, além dos trabalhos domésticos e do cuidado com a família, destina boa parte de seu tempo à Associação das Mulheres Rendeiras, entidade que ajudou a fundar em 1998 com o objetivo de gerar oportunidades de renda às mulheres do bairro José e Maria, na periferia de Petrolina (PE), promover seus direitos e valorizar a cultura do Vale do São Francisco. Presidente da associação pela terceira vez, Angelita acredita muito no potencial de seu grupo, ainda que tenha de lidar com dificuldades diversas, como a falta de financiamento externo, períodos de pouca demanda de trabalho e a frequência oscilante de várias associadas (que atualmente somam 35). “Meu marido vive me dizendo que a associação me exige muito”, diz. Pudera. O artesanato que produzem não se resume ao bordado e a figuras de inspiração regional; inclui trabalhos com retalhos, fuxicos, roupas e bonecas, entre outros. Quando explica por que tanta dedicação a uma causa coletiva, Angelita sempre se recorda dos pais com muita emoção. A mãe, parteira, costumava acompanhar as mulheres antes mesmo do nascimento do bebê, sempre disposta a preparar um caldo ou um chá, ainda que tarde da noite. E nunca voltava imediatamente para casa depois do parto. Por isso, era tão querida e requisitada pela comunidade de Exu (PE), cidade onde Angelita nasceu e viveu até a juventude. O pai, agricultor, não tinha renda fixa ou salário, mas ainda assim não deixava que a família passasse algum tipo de necessidade, realizando também alguns trabalhos como artesão. “Não me tornei parteira como minha mãe, mas Deus me deu outro tipo de parto para re- alizar, bem mais difícil: lidar com gente, contribuir para a capacitação profissional de mulheres pobres e a conscientização sobre seus direitos.” Além do trabalho com as rendeiras, ela também desenvolve atividades com moradores do Assentamento Terra da Liberdade, em Petrolina. Angelita terminou o ensino médio em 2008 e fala em fazer faculdade. Três de seus filhos já estão profissionalmente encaminhados; um deles, inclusive, estuda na Alemanha. “Não podia imaginar que chegariam tão longe”, conta, orgulhosa. Por Maria Fernanda Vomero © Ilustração: O Silva; Foto Angelita Maria Santos: Lucí Braga | Foto saco de lixo: Divulgação; Foto interruptor: Tim Holley; Foto EcoATM: Divulgação A Design ecoeficiente: os objetos que nos ajudam a ter uma vida mais sustentável Tá certo, a maioria das pessoas (ainda bem!) já se conscientizou de que é preciso viver cada vez mais de forma sustentável, preservar os recursos naturais do planeta e refrear o consumo. Mas como fazer isso na prática, hein? Mudar hábitos não é uma tarefa fácil, mas há ferramentas que podem nos ajudar a adotar uma vida mais ecologicamente correta. E o design está aí para provar isso. De uns anos para cá, os produtos (e até suas embalagens, diga-se) estão ficando mais “verdes”. “Hoje a questão da sustentabilidade já se transformou num requisito. Os objetos precisam ser pensados levando em conta a facilidade para fabricá-los, o baixo impacto ambiental e o uso de materiais renováveis”, diz Cyntia Malaguti, professora de Design e Sustentabilidade do Centro Universitário Senac. “Tudo como forma de diminuir a agressão ao meio ambiente.” Não apenas no conteúdo, mas também na forma de consumir os objetos. Não basta ter um produto feito com material reciclado ou que não polui. “É necessário que o design possa nos incentivar a gastar menos energia, a consumir menos ou a promover o descarte correto de resíduos. A adotar um modo de vida mais sustentável, enfim”, completa Deyan Sudjic, diretor do Museu do Design, em Londres. [53] [52] Quem é que nunca deixou a luz acesa mais tempo que o necessário que apague o primeiro interruptor. Foi justamente para conscientizar as pessoas (e principalmente as crianças) a não gastar energia elétrica demais que o designer Tim Holley criou o Tio Light System, um produto tão lúdico quanto educador. Em forma de fantasma, o interruptor de parede vai mudando de cor à medida que o tempo passa, mostrando quanto tempo a lâmpada se manteve ligada. Uma forma de criar a responsabilidade ambiental das crianças desde cedo. E de forma divertida! timholley.de [51] O lixo nas ruas pode acarretar um problema sério para o planeta – e para as cidades. Além de entupirem galerias de esgoto e provocarem enchentes, resíduos sólidos demoram muito para se decompor. Para incentivar a coleta de detritos, a dupla de designers Wieden+Kennedy criou sacos de lixo divertidos, como o da foto, que reproduz os saquinhos com peixes que comprávamos na infância. Uma forma irônica de jogar o lixo. suck. uk.com A EcoATM, é uma máquina que funciona de maneira bem parecida com os caixas eletrônicos dos bancos, só que, em lugar do cartão, você só precisa inserir ali um celular usado para ela devolver dinheiro. A máquina reconhece o modelo do aparelho e calcula quanto ele vale. Você pode escolher tirar o dinheiro na hora ou então apertar um botão para doá-lo à caridade. Já o celular é encaminhado para centros especializados de reciclagem. Uma ótima forma de impedir que esses componentes que poderiam contaminar o meio ambiente acabassem no lixo, né? A primeira estação foi instalada em Omaha, nos EUA. A ideia é espalhar as máquinas – e o bom exemplo – pelo mundo todo. ecoatm.com DESIGN Concreto verde: o barro que se molda às novas tendências de construção sustentável Cerca de 3 bilhões de pessoas moram ou trabalham em casas de barro. A terra batida já é conhecida por ser uma alternativa de construção barata e inteligente há séculos e não apenas as comunidades mais pobres de áreas rurais se beneficiariam dessa técnica tão econômica quanto eficaz. A bioconstrução, assim chamada por designers dispostos a investir em uma proposta sustentável, resgata esse material já conhecido, que se molda perfeitamente às necessidades do futuro sustentável do planeta. O barro propicia que a umidade seja mantida em níveis ideais, tanto no inverno quanto no verão. Ninguém precisa ficar refém do [55] [56] ar-condicionado e, portanto, o consumo de energia pode baixar. Além disso, possibilita a autoconstrução, uma vez que não depende de ser transportado de um lado para o outro, como o cimento. Basta terra, água e o trabalho das mãos para moldar o barro e garantir a resistência desse “concreto verde”. Arquitetos contemporâneos e ecoconstrutores estão, agora, procurando grupos étnicos para aprender como é que se pode trabalhar com o material, como no caso do povo musgum, de Camarões, cujas casas são erguidas com simplicidade quase orgânica, de curvas, ranhuras e telhados cônicos. Os veios externos ainda contribuem para o escoamento da água da chuva. Uma técnica antiga que aponta novos caminhos para a arquitetura moderna. Por Lívia Lisbôa tão, o hábito de copiar as saídas encontradas pelos seres vivos rendeu inventos como tintas autolimpantes para carros ou casas, inspiradas na superfície de folhas de plantas; prédios que dispensam ar-condicionado, baseados na ventilação de cupinzeiros; e até processos de eliminação de mercúrio, um elemento químico tóxico, do solo ou água, a partir do que fazem enzimas usadas por bactérias. Uma das tendências que mais crescem no design, a biomimética é perfeita para criar soluções sustentáveis, com base em tecnologia testada e aprovada pela natureza. Por Roberto Saraiva [57] Escola cria novas soluções a partir de antigos materiais Aprender com alegria. Essa é a filosofia da Meti, escola localizada na cidade de Rudrapur, em Bangladesh. Nesse caso, o aprendizado começou antes mesmo de o prédio ficar pronto: no próprio processo de construção das paredes (de barro, palha de arroz e juta), do teto (em camadas de varas de bambu) e do jardim vertical da fachada (que protege as paredes da erosão). Criando novas soluções de design a partir de antigos materiais, especialistas e voluntários da Alemanha e da Áustria uniram-se aos artesãos locais, aos professores, aos pais e aos futuros alunos para levantar os dois andares do colégio, que fica numa área de 325 m². Persianas regulam a entrada de luz e a ventilação, e pequenas cavernas moldadas no barro revelam espaços de estudo ou de brincadeira. Cada porta colorida e cada nome de criança pintado na parede são a prova de um conhecimento profundo do lugar e do significado dos sonhos que moram ali. L.L Biomimética: baseados na observação da natureza, designers e engenheiros criam produtos melhores e mais sustentáveis A natureza atravessou 3,8 bilhões de anos de seleção natural; nesse tempo, criou soluções eficazes e duráveis para diversos problemas. Quando designers e engenheiros perceberam que podiam replicar algumas delas para criar produtos melhores e mais limpos, surgiu o termo biomimética. A primeira aplicação dessa lógica data de 1941, quando o suíço Georges de Mestral levou as sementes que grudavam no pelo de seu cachorro ao microscópio. Lá, ele viu que elas tinham hastes com ganchos nas pontas, especialmente eficazes para agarrar tecidos. Estava criado o velcro. Desde en- © Ilustração: Catarina Bessel; Foto escola de barro: Kurt Horbst | Foto colmeia: Divulgação [54] A natureza é uma fonte de inspiração para Marko Brajovic, arquiteto croata radicado no Brasil. Em seus projetos de design, arquitetura e cenografia, ele procura aplicar os conceitos da biomimética e assim aproveitar a tecnologia que a natureza produziu ao longo dos anos. É fascinado, por exemplo, por colmeias de abelhas, e já fez vários projetos inspirados em sua estrutura, como a criação, para o Sebrae do Mato Grosso, de um jogo interativo com caixas hexagonais de papelão reciclado que imitam uma colmeia gigante. Outro projeto de seu escritório foi a proposta de uma ponte-ciclovia sobre o rio Tietê, que usa a prática da cestaria, comum para a humanidade desde os tempos pré-históricos, para fazer uma moldura em torno da ponte sobre rio. Marko também é o autor do projeto de um auditório flutuante no meio do rio Negro, em Manaus, local onde foi realizada a conferência TEDxAmazônia, em novembro, no qual ele foi um dos palestrantes, além de autor da cenografia. [58] A empresa americana Qualcomm foi pioneira ao copiar o sistema de refle- xão de luz das asas de borboletas para desenvolver o display portátil mirasol, que consome uma quantidade mínima de energia, mas é visível em qualquer luminosidade, até sob o sol forte. O sistema usa espelhos minúsculos, mil vezes menores que 1 milímetro, e membranas ajustáveis para atingir diferentes cores a partir da imagem exibida e da luz ambiente. O backlight, iluminação dos displays convencionais responsável por até metade do gasto energético das baterias de celulares, é totalmente dispensado no mirasol. Em imagens estáticas, o consumo chega a zero. DESIGN [59] [61] Através de fotossíntese: projeto criado por estudantes de Cambridge cria casa cuja energia é alimentada por algas geneticamente modificadas Energia solar? Isso é tão anos 1980... Estudantes da prestigiosa Universidade de Cambridge, no Reino Unido, criaram uma casa cuja energia – limpa – é produzida inteiramente por algas. A “Casa das Algas”, que conta com algas geneticamente modificadas para obter mais eficiência no processo de fotossíntese, é um tremendo avanço rumo a um futuro com menos desperdício de energia. A construção tem uma série de tubos que abrigam as algas: são elas que, desti- É como uma nécessaire, mas, em vez de produtos de higiene e beleza, você leva seus gadgets dentro. O Amp Solar Charger tem placas solares embutidas na sua parte externa que permitem recarregar celular, MP3 e outros aparelhos eletrônicos. Cerca de 4 horas de sol são suficientes para restabelecer a bateria de um iPhone, por exemplo, que vai protegido dentro da bolsinha – que ainda é à prova d’água e vem com adaptadores para nove tipos de equipamentos portáteis. voltaicsystems.com tuídas de enxofre, produzirão o hidrogênio que será convertido em eletricidade. Mas, para isso acontecer, funcionou o engenho dos pesquisadores, que usam graus variados de luz (mais intensa no cinzento inverno europeu, mais amena no verão) para estimular as plantinhas. Os responsáveis pelo projeto garantem a energia de uma residência com duas pessoas com todos os apetrechos modernos (como computador, microondas, TV etc.). www.algaetecture.com Pesquisando novas formas de criar eletrônicos que impactem menos o planeta, a Sony desenvolveu uma linha conceitual chamada ODO, em que os objetos são fabricados a partir de plástico reciclado e o funcionamento é feito na maioria das vezes através de energia cinética. Além de lúdicos, eles não têm bateria nem precisam ser ligados na tomada. Entre os produtos “idealizados” está a câmera digital Spin N Snap, por exemplo, que possui dois orifícios que servem tanto como visor quanto como carregador: basta girar os furos com o dedo que ela fica pronta para o clique. Há uma filmadora que usa manivela e até fones de ouvido que precisam dar corda. Desde 2007, a empresa desenvolve pesquisas e produtos para a linha, que ainda não é comercializada. Mas já indica que, a exemplo dos antigos relógios do vovô, o futuro dos eletroeletrônicos também pode ser mais analógico do que poderíamos supor. Por Ellen Kanamori www.sony.net © Fotos: Divulgação [63] [60] [62] Sabe quando a bateria do seu celular acaba e você está longe de qualquer tomada? Pois o Wind-up Multi Mobile é um carregador que não te deixa na mão. É só dar corda que ele abastece seu celular sem gastar 1 kW de energia sequer. Girando numa velocidade de 2,5 voltas por segundo durante 3 minutos, você ganha cerca de 10 minutos para falar. Ele ainda é compatível com celulares de diversas marcas. À venda só na Europa. www.iwantoneofthose.com O escritório de arquitetura e design americano Forrest Fulton propôs uma nova forma de integrar residências, comércio e espaços verdes na cidade de Yerevan, na Armênia. Batizado de Lace Hill, o projeto vai na contramão dos grandes espigões espelhados que dominam as cidades e imagina um edifício aberto ao entorno, numa proposta de conectividade com o contexto: apaisagemhistóricaaoredordo monte Ararat. Os 85 mil m2 dessa estrutura multifuncional pretendem unir praticidade, sustentabilidade e atração visual. A parte externa da colina é coberta por vegetação nativa, irrigada com a água reutilizada do prédio, e atua como um conjunto de observatórios, com espaços flexíveis sem colunas ou vigas, criando uma variedade de pontos de vista para a paisagem. Os espaços abertos dessa superfície promovem a circulação de ar e a passagem de luz natural. Pedestres e ciclistas teriam acesso ao morro; já o tráfego de veículos seria limitado a um estacionamento totalmente subterrâneo, com saída para uma rodovia, que liga Lace Hill às cidades adjacentes. Um exercício de futurologia verde, como alternativa a um modelo de desenvolvimento tradicional. Por Lívia Lisbôa forrestfulton.com [64] Desligar o monitor ao sair é uma boa forma de economizar energia. Mas nem sempre só apertar o botãozinho pode significar uma contenção de eletricidade. O Eco Button é um aparelhinho que pode ajudar nessas horas: basta ligá-lo ao computador pela entrada USB e pressioná-lo toda vez que atender uma ligação, ir para uma reunião etc. Seu computador entra automaticamente no modo mais econômico de energia sem ter que reiniciar ou hibernar (o que, às vezes, pode significar perder alguma coisa). O software do aparelho ainda calcula quanto de energia, gás carbônico e dinheiro você economizou durante o período. eco-button.com DESIGN Uma caçamba nem sempre é uma caçamba. Não na mente criativa do artista Oliver BishopYoung, que passeia pelas ruas procurando novas formas de interagir com os objetos que fazem parte da paisagem urbana. Foi assim, caminhando pela Union Street, em Londres, que ele deparou com uma caçamba estacionada e pôs a cabeça para pensar. “Com uma tábua, criei uma mesa de pingue-pongue que convida as pessoas a jogar e que questiona sobre o que elas realmente gostariam de achar no meio da cidade”, explica. Como forma de interagir com esse objeto tão característico nas urbes, ele também criou uma piscina, um jardim e uma rampa de skate sobre a estrutura de ferro. “É uma maneira de explorar melhor o que a cidade nos dá.” oliverbishopyoung.co.uk © Fotos: Tomas Valenzuela [65] (RE)DESCOBRINDO A CIDADE MOBILIDADE [66] PARQUE DAS MAGRELAS LOJINHA Pisca-piscas, coletes refletivos, capacetes, bagageiros: a lojinha de um centro de facilidades para ciclistas seria acessível, com bons preços e produtos voltados para o ciclista urbano. Um centro de facilidades ideal para guardar as bicicletas na cidade Por Jeanne Callegari | Ilustração Luciano Veronezi ESTACIONAMENTO O bicicletário em si é a estrela da festa. Nada como ter um lugar coberto e seguro para deixar as bicicletas durante o dia, sem ter que se preocupar com roubos. Ganchos no teto otimizam o espaço e permitem que mais bicicletas sejam colocadas no mesmo lugar. OFICINA A oficina mecânica deve praticar preços baixos, para democratizar o acesso ao serviço. Regular as marchas e os freios, consertar partes quebradas e mesmo fazer uma revisão geral não deve ser caro. VESTIÁRIO COM CHUVEIRO Importantíssimos para quem quer usar a bicicleta, mas não quer chegar ao seu destino suado. Uma opção para quem quer pedalar distâncias maiores, todavia não tem vestiário no trabalho. CAFÉ Um local para beber água, cafezinho ou fazer um lanche – principalmente se a distância percorrida for grande. O local também serve de ponto de encontro para os ciclistas. INTEGRAÇÃO COM TRANSPORTE PÚBLICO Um bom bicicletário fica perto, ou junto, de uma estação de metrô ou trem. Assim as pessoas podem deixar as bicicletas e terminar de chegar de transporte público a seus destinos. À medida que aumenta o uso de bicicletas nas cidades, cresce a necessidade de estruturas que facilitem a vida do ciclista, como um bom lugar para deixar as magrelas. A arquiteta Annie Scheel ganhou uma competição de design sustentável em Delaware, nos EUA, com a proposta de transformar um antigo estacionamento em um centro de facilidades para ciclistas na Filadélfia, com restaurante, vestiário, loja, aluguel de bicicletas e um estacionamento para as bicis. No Brasil, um projeto semelhante já está em funcionamento desde 2001, em Mauá (SP). É a Ascobike, associação de ciclistas criada por um funcionário da Companhia de Trens Metropolitanos (CPTM) que tinha a missão de dar um jeito nas bicicletas paradas em frente à estação de trem. Com espaço para 1700 bicicletas, a Ascobike é o maior estacionamento para bicicletas das Américas e oferece também chuveiros, oficina de reparos, empréstimo de bicicletas, café e água, apoio jurídico e assistência social. © Consultoria: Luiz Iria e Eber Evangelista Bicicleta guardadinha em segurança ACESSIBILIDADE Locais para estacionar as bicicletas que sejam mais fáceis de usar para idosos, grávidas e pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida. Os espaços para parar as bikes ficam no chão, não em ganchos no teto. ALUGUEL DE BICICLETAS Para turistas ou quem ainda não tem uma bike. O local pode ser integrado a um sistema de bicicletas públicas, como o Vélib, da França. Também pode emprestar bikes para quem deixou a sua na oficina. MOBILIDADE “Como é possível que tantos de nós comecemos a trabalhar com as melhores intenções e mesmo assim acabemos contribuindo para um mundo que brutaliza tantas pessoas?” Essa foi uma das questões levantadas por Chris Carlsson, escritor, editor e ativista do espaço público, na conferência TEDxAmazônia, que reuniu em Manaus, em novembro, palestrantes do mundo todo para discutir o tema “qualidade de vida para todas as espécies”. Morador de São Francisco, na Califórnia, Chris foi o fundador da Critical Mass (“Massa Crítica”), um encontro de ciclistas que se reúnem na última sexta do mês para pedalar pela cidade e celebrar a ocupação do espaço urbano, e que se espalhou para o mundo todo. Hoje, a Massa Crítica existe em mais de 300 cidades do mundo, inclusive no Brasil, onde é conhecida como Bicicletada. O movimento começou de forma simples: em 1992, Chris, que já era ativista preocupado com o espaço público da cidade, decidiu fazer uns panfletos e convidar as pessoas para a pedalada. Não sabia se alguém iria aparecer, mas 72 pessoas foram. E no mês seguinte mais pessoas, e assim a cada mês. “A Critical Mass fez com que mais pessoas passassem a usar a bicicleta. Ela é um ponto de referência e de encontro, a partir do qual outras estruturas se formam, como ONGs pró-bicicleta, grupos de pedal, encontros com interesses mais específicos”, diz. Autor de seis livros, Chris é um historiador da contracultura nos Estados Unidos, especialmente de São Francisco. Ele não milita apenas na causa da bicicleta: projetos de jardinagem comunitária, de ocupação do espaço público e de comunicação horizontal fazem parte do seu escopo de pensamento e ativismo. Um de seus livros, Nowtopia (“Utopia do agora”), fala das pessoas que estão ajudan- do a fazer uma nova política do trabalho no mundo: ciclistas, cientistas de permacultura, jardineiros urbanos, pessoas interessadas em combustíveis sustentáveis, programadores piratas, todas essas pessoas vão além da lógica do mercado e estão mudando, desde já, o mundo, ao levar uma nova forma de pensar, mais artística, para seus projetos. “A vida, hoje, está dividida em duas: as coisas que fazemos por dinheiro e as coisas que fazemos porque gostamos e acreditamos”, diz. A aposta de Chris é nessa segunda opção. “São atividades do tipo do-it-yourself [faça-vocêmesmo], mas bem poderíamos chamá-las de do-it-together [façamos-juntos]. Porque nesses projetos é que criamos conexões e relacionamentos significativos para nossas vidas”, afirma. Por Jeanne Callegari 68 Nem metrô nem ônibus – veículo sobre trilhos liga cidades no meio do sertão nordestino Em pleno sertão do Cariri, no sul do Ceará, um meio de transporte causa estranheza na paisagem árida: cobrindo os 14 quilômetros que separam Crato e Juazeiro do Norte, um misto de metrô e ônibus transporta passageiros. Trata-se do primeiro VLT (veículo leve sobre trilho) do Brasil, um tipo de transporte coletivo capaz de melhorar o trânsito nas cidades sem acarretar tantos malefícios ao ambiente. Além de mais baratos que os metrôs, transportam muito mais passageiros que os ônibus e são até 93% menos poluentes que esses. Descendentes dos velhos bondes, es- © Ilustração: Fabiano Silva; Foto Chris Carlsson: Michael Rauner | Foto VLT: Divulgação | Foto Carro elétrico: Divulgação [67] Chris Carlsson Ativista do espaço urbano, ele acredita que as atividades mais significativas da vida ocorrem fora do trabalho 69 ses veículos modernos e mais “verdes” devem ganhar espaço também em outras cidades do Nordeste (como Recife, Fortaleza, João Pessoa e Natal, por exemplo), que já estudam implantar seus VLTs – que circulariam sobre antigas linhas que pertenciam à Rede Ferroviária Federal (RFFSA) e que estavam abandonadas. Uma forma sustentável (e barata) de restabelecer essas rotas e melhorar o transporte dos moradores de toda a região. Com emissão zero, carro elétrico distribui correspondência pelas ruas do interior paulista Desde outubro, um pequeno e curioso carro cinza com uma espécie de caixa amarela na traseira tem circulado de maneira discreta pelas ruas do Taquaral, bairro residencial de Campinas (interior de São Paulo). Mas a discrição do carrinho não diz respeito só aos poucos quilômetros (cerca de 70) que ele percorre diariamente, mas também ao impacto que ele tem no meio ambiente: por ser um veículo elétrico, tem emissão zero de gases de efeito estufa. A iniciativa de colocar na rua pe- la primeira vez um carro totalmente movido a eletricidade para entregas tem a ver com uma parceria entre a CPFL Energia e os Correios para a utilização do transporte na distribuição de Sedex. O utilitário Aris foi fabricado especialmente para cumprir essa tarefa: ele tem autonomia para rodar entre 90 e 120 km e pode levar até dois passageiros. O carregamento, em tomada comum, é feito duas vezes ao dia – e com a vantagem de ser 25% mais econômico que um veículo a gasolina. MOBILIDADE Se você não usa o carro todo dia, qual o sentido de ter um? Não seria melhor dividi-lo com uma pessoa, ou melhor, com várias? Essa é a ideia por trás do car sharing, ou compartilhamento de veículos. Na prática, é uma evolução do sistema de aluguel de carros, com regras mais simples e flexíveis. A pessoa retira o veículo em uma estação da empresa e devolve em outra, próxima de seu destino final. O sistema está ajudando a diminuir a quantidade de veículos das ruas: segundo a Universidade da Califórnia, um terço dos usuários vendeu o seu após experimentar. Algumas diferenças em relação às locações normais são o pagamento por hora ou até minuto usado; a praticidade, já que a retirada é feita inteiramente pelo cliente; e a comodidade, pois a maioria das empresas funciona 24 horas. “Um cidadão que come- [ 71] A Zipcar é a maior empresa de compartilhamento de veículos no mundo: presente em 50 cidades da América do Norte e Inglaterra, tem 6500 carros e detém 80% do mercado americano, com foco nas universidades. A companhia projeta redução de 15 a 20 carros nas ruas pelo compartilhado. Na França, a prefeitura deve lançar em 2011 o Autolib, sistema de car sharing inspirado no Vélib, o programa de bicicletas públicas de Paris. O projeto deve estrear com uma frota de 3 mil carros elétricos, que poderão ser retirados nas 700 estações pela cidade, ao custo de 15 euros anuais (34 reais) mais 8 euros (18 reais) pela hora rodada. R.S. ce a utilizar um carro alugado dessa forma tende a alterar padrões conceituais de mobilidade”, considera Creso Peixoto, mestre em Engenharia de Transportes e professor da Fundação Educacional Inaciana (FEI). Em troca de não precisar arcar com impostos, manutenção, depreciação de até 8% ao ano e ainda ganhar seguro e combustível (inclusos na tarifa), a pessoa paga uma mensalidade ou anuidade. Comparando-se os custos, o car sharing sai mais barato, segundo Peixoto. O primeiro projeto com um sistema semelhante ao atual foi o Witkar, que durou de 1974 a 1986 em Amsterdã e foi fundado pelos criadores do plano de bicicletas brancas públicas da cidade. Mas a ideia só ganhou força e gerou lucro a partir dos anos 90, com a maior preocupação com a natureza e a economia. Por Roberto Saraiva [72] O Brasil já tem uma empresa especializada em car sharing: a Zazcar, que começou a funcionar em julho de 2009, em São Paulo. A empresa é a primeira da América Latina a apostar no compartilhamento de veículos como solução para as metrópoles brasileiras. Para usar o serviço, basta fazer um cadastro pelo site ou pelo call center. Os planos são flexíveis: é possível escolher por quantas vezes por mês se quer alugar o veículo. Aí, é só fazer a reserva, desbloquear o carro em um dos PODs (pontos de estacionamento) e pegar as chaves para fazer o programa escolhido e sair andando pelas ruas. R.S. www.zazcar.com.br © Ilustração trem: Marcio Fujii | Foto Fusca: Christian Castanho; foto fila: David Young-Wolff/Getty images | Foto barquinho: Macelo Zocchio [70] Car sharing é uma forma inteligente de usar o carro na cidade: em vez de ter um, você só aluga quando precisa [73] Uma viagem de São Paulo ao Rio de Janeiro em pouco mais de uma hora e meia, sem trânsito ou voos. Esse é um dos pontos altos do Trem de Alta Velocidade (TAV), um projeto com extensão de 520 quilômetros que teve o edital de licitação lançado em julho deste ano. O plano é ligar Campinas, São Paulo e Rio de Janeiro com composições que podem chegar a 350 quilômetros por hora. Com o custo total de 33,1 bilhões de reais – em uma união de investimentos privados, participação estatal e financiamento público –, a linha terá entre sete e nove estações. A intenção do governo é deixar o TAV pronto para a Olimpíada de 2016. Mas estudos mostram que as obras podem levar até seis anos – o leilão para as empresas interessadas em participar da licitação está previsto para abril de 2011. A demanda é estimada para 89 mil passageiros por dia. Por Ainá Vietro [75] Teleféricos: novo transporte para quem mora na favela Visto muitas vezes (equivocadamente) só como um transporte para locais turísticos, os teleféricos podem ser uma ótima alternativa para deslocamentos em terrenos acidentados, como no caso do Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro. A comunidade foi erguida em cima do morro de forma desordenada, onde a instalação de outros meios de transporte seria bastante difícil. Por isso, a inauguração de um teleférico que começa a operar na região a partir do início do próximo ano pode resolver um problema de deslocamento para os 100 mil moradores dessa comunidade. Ligando Bom Sucesso à favela da Fazendinha, o trajeto, que costuma ser feito em uma hora a pé, poderá ser feito em pouco mais de 10 minutos. Serão seis estações que poderão atender 30 mil passageiros por dia, possibilitando o acesso da população às suas próprias casas – se o tráfico não impedir, claro. [74] Os moradores de São Paulo não imaginam, mas poderiam cruzar a cidade em barcos em vez de ficarem presos nos engarrafamentos das marginais. O arquiteto e urbanista Alexandre Delijaicov, professor da USP, pesquisou a origem das propostas de transporte fluvial, que datam do fim do século, e chegou a um projeto para o setor. Segundo o plano, a capital paulista contaria com 600 quilômetros de canais navegáveis, ligando os rios Tietê, Pinheiros e Tamanduateí e as represas Billings, Guarapiranga e Taiaçupeba. Para Delijaicov, isso seria apenas resgatar uma vocação local. “Onde hoje fica São Paulo, os portugueses encontraram aldeias indígenas interligadas pelos rios”, diz. A mudança veio em 1930, época em que tanto o Tietê quanto o Tamanduateí eram navegáveis. O urbanista culpa o prefeito Prestes Maia, que governou de 1938 a 1945, pela mudança de paradigma que transformou canais em avenidas como a 9 de Julho e 23 de maio e eliminou 4 mil quilômetros de riachos e córregos e o dobro de margens para o lazer. Se o caminho escolhido tivesse sido outro, o município teria hoje parques fluviais, assim como os existentes em metrópoles como Paris, Londres e Amsterdã. Para o arquiteto, só o transporte fluvial de carga como entulho e lixo das estações de tratamento de esgoto já viabilizaria financeiramente o projeto, que teria um custo de 1 bilhão reais e levaria cerca de 20 anos para ser concluído. concluído R.S. R S. MOBILIDADE Ainda no século 19 os parisienses inventaram a figura do flâneur, esse passeador urbano, despreocupado, que (e daí vem o termo) flana pelos bulevares de uma grande cidade. Experimente bancar essa figura em uma cidade brasileira e sair levinho por aí, olhando o horizonte (isso quando há horizonte), sem se preocupar com cada passo que der: o menos grave que poderá acontecer será um tropeço. Mas há casos de pernas quebradas e outras encrencas mais graves. Com raras exceções – zona sul do Rio de Janeiro, avenida Paulista em São Paulo e mais uns poucos lugares –, o estado e a fluidez de nossas calçadas não são uma preocupação dos governantes. Tampouco dos cidadãos, que esquecem sua importância inclusive como elemento de sociabilidade (lembra quando as pessoas ficavam conversando nas calçadas? Pois é.). Aí é o caminhão que estaciona no meio do passeio público, o lixo acumulado entre o poste e o meio-fio, a banca do camelô entre o poste, o orelhão e o portão do prédio. Como passar? É com esse mote que o jornalista Eduardo Nasi, morador do Brooklin, na capital paulista, participa de uma página no Flickr com verdadeiros flagrantes de descaso urbanístico com essa figura cada vez mais rara, o cidadão que caminha. “A intenção não é fazer uma denúncia e recriminar os vizinhos. Porque o problema é geral, é cultural, a gente deixou de ver a calçada como um lugar bacana do bairro. As pessoas não fazem por mal. Quando elas se dão conta do que estão fazendo, se constrangem. Pedem desculpas. E tomam providências de verdade”, diz. Por Leandro Sarmatz “Eu costumo dizer que o problema da falta de acessibilidade é o menos complicado: se não tem rampa em um determinado local, um pedreiro e um pacote de cimento poderiam resolver a situação, certo? Mas não adianta ter a rampa se muita gente não sabe ou não se importa com a necessidade que ela representa para quem precisa dela. Ou mesmo a vaga reservada em estacionamento, bem como o piso tátil e qualquer outro recurso para uma pessoa com deficiência ou mobilidade reduzida. Muita gente não conhece a lei, não tem informação sobre o tema. E aí nasce um outro obstáculo do qual precisamos tentar desviar: o preconceito. Conseguimos grandes conquistas em São Paulo porque realizamos um trabalho de sensibilização. Hoje já colhemos frutos dele, mas ainda falta muito.” Depoimento a Lívia Lisbôa [77] Mara Gabrilli, eleita deputada federal, é tetraplégica há 15 anos. Criou a ONG Projeto Próximo Passo, que promove pesquisas para a cura de paralisias. © Fotos cidade: Eduardo Nasi | Foto Mara Gabrilli: Lailson Santos | Foto Paulista: Diego Martins | Foto Brasil para todos: Acervo PEPE/Pinacoteca [76] Circular pela cidade deveria ser um direito de todos. Mas e quando as calçadas se transformam em armadilhas? [78] Paulista para todos: uma das principais e mais emblemáticas ruas de São Paulo se torna ainda mais democrática – e acessível! A avenida Paulista é um exemplo de acessibilidade às pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida. Isso graças a adaptações por que a mais conhecida via paulistana passou em seu passeio público (que substituiu o mosaico por placas de concreto armado), pelo posicionamento do mobiliário urbano (bancas de jornal, lixeiras, floreiras) e pelo conceito de acesso. Foram 55 mil m² de área revitalizados para democratizar ainda mais esse espaço tão plural da metró- Quando Andrea Schwarz foi parar em uma cadeira de rodas, há 12 anos, por causa de uma malformação congênita na medula, percebeu a dificuldade de continuar frequentando os mesmos restaurantes, cinemas e shoppings. Foi então que resolveu criar o Guia Brasil Para Todos, iniciativa de mapear as dez capitais brasileiras mais procuradas por turistas na perspectiva da acessibilidade, da segurança e da autonomia. Cada estabelecimento indicado é visitado por um turista com deficiência, acompanhado de um jornalista. Assim, além das informações que um guia comum oferece, ainda está registrada a existência de rampas ou elevadores, de suítes adaptadas, de balcões de check-in rebaixados, de espaço para circulação nos salões de restaurante etc. A infraestrutura turística de cidades como Manaus, Fortaleza, Recife, Salvador, Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Curitiba e Florianópolis ainda são registrados na forma de depoimentos por seus próprios moradores, que avaliam se sua cidade é receptiva de verdade. L.L. www.brasilparatodos.org [79] pole, que ganhou 120 guias rebaixadas, gradis de proteção nas esquinas e pisos podotáteis de alerta a pessoas com baixa visão ou cegas. As bancas foram realocadas e os pisos nivelados, para acabar com os degraus. Por ali, também, passa uma frota de ônibus adaptados e táxis acessíveis – ainda desconhecidos por muitas pessoas. Uma forma de integrar os habitantes da cidade e permitir que a avenida seja, realmente, um espaço para que todos possam ir e vir. Por Lívia Lisbôa MOBILIDADE [80] Morar perto do trabalho, para quem vive nas grandes cidades, pode ser uma baita mão na roda S e para o personagem Brás Cubas, do romance Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, a felicidade era um par de botas, para quem mora nas grandes metrópoles de hoje ela pode ser algo tão simples como morar perto do trabalho. Estudos mostram que o tempo gasto para chegar ao trabalho é estressante e uma das maiores causas de infelicidade dos dias de hoje. Uma pesquisa chamada Stress That Doesn’t Pay: The Commuting Paradox (“Stress eu não se paga: o paradoxo das viagens para o trabalho”), dos pesquisadores Alois Stutzer e Bruno Frey, da Universidade de Zurique, na Suíça, mostram que quanto mais tempo as pessoas gastam no trajeto ao emprego, menor é seu bem-estar. A ideia de morar em uma casa grande em um subúrbio afastado da cidade pode parecer tentadora, mas, na prática, é pouco sustentável (muito gasto de combustível, trânsito) e não ajuda ninguém a ficar bem. Isso porque nos acostumamos rápido com a paisagem do ambiente em que moramos, o que faz com os benefícios logo deixem de ser valorizados. Em compensação, o stress de pegar trânsito todo dia e gastar horas para chegar ao escritório nunca passa. © Foto Morar perto do trabalho: Kelvin Murray/Getty Images | Ilustração: Catarina Bessel | Foto DPS2000: Divulgação Prefeitura de Jaú 81 Quem tem iPhone já pode compartilhar os caminhos que faz sobre a bicicleta através de suas redes sociais. O SocialBike é um aplicativo gratuito, desenvolvido pela Yahoo! Brasil, que permite registrar as rotas (através do GPS), as fotos do trajeto (publicadas no Flickr) e os vídeos dos passeios. Basta baixar a ferramenta e sair pedalando: o programa automaticamente identifica quando o usuário está em movimento e dá informações como velocidade e a distância percorrida. Depois, você decide se posta tudo no Twitter, no Facebook ou no Meme. Suas aventuras ainda podem ser compartilhadas no site, que traz informações sobre a segurança dos ciclistas, dicas de trânsito, manual de primeiros socorros e agenda de eventos. Por Lívia Lisbôa yahoo.com.br/socialbike 8 83 82 Para ajudar os usuários a se locomoverem nas cidades usando os transportes públicos, o programador Stefan Wehrmeyer criou o Mapnificent, uma ferramenta que recebe dados de várias metrópoles e, com busca integrada do GoogleMaps, mostra quão longe e quanto tempo leva para se deslocar com esses meios mais baratos e sustentáveis. Basta marcar um endereço no mapa, deslizar o marcador de minutos para um ponto específico e, então, visualizar a área que você é capaz de alcançar. O site ainda está em modo de teste – usuários de 20 cidades ao redor do mundo (incluindo Londres e Berlim) já estão testando a ferramenta, que ainda não tem previsão para englobar cidades brasileiras. Mas que pode ser uma forma eficiente e prática de ajudar os moradores a se deslocarem. L.L. www.mapnificent.net A cidade de Jaú, no interior de São Paulo, é pioneira na implantação de um sistema que visa garantir maior autonomia a deficientes visuais em transportes públicos. O DPS2000 é um equipamento que funciona através de radiofrequência, permitindo ao usuário acionar a linha de ônibus que pretende utilizar e alertar o motorista a 100 metros da parada. O código da linha é gravado no aparelho transmissor que, ao ser ativado, emite um sinal de rádio. Ao estacionar no ponto, uma gravação automática informa o número da linha repetidas vezes, até que o usuário embarque; assim ele não corre o risco de errar. Os motoristas de 61 ônibus da frota urbana do município receberam treinamento no início de novembro. “Já estamos em acordo com as cidades de Rio de Janeiro, Porto Alegre e Niterói, para um teste-piloto”, afirma Tiago Buccini, um dos sócios da Geraes Tecnologias Assistivas, empresa que criou a tecnologia. L.L. MOBILIDADE Perfeitas para circular por nossas ruas, a bike fixa arrebanha adeptos sem parar Um jeito diferente de pedalar: conhecidas lá fora há algum tempo, as bicicletas fixas começam a se tornar populares também no Brasil. Trata-se de uma forma diferente de encarar a magrela: como tem a transmissão fixa, a bicicleta só anda quando se move o pedal, ou seja, não é possível parar de pedalar. Com apenas uma marcha e, em alguns casos, com freio apenas no pedal, a relação do ciclista com a bici- cleta é bem diferente. Perfeitas para andar na cidade, por serem leves e fáceis de controlar no trânsito das metrópoles, as fixas têm ganhado cada vez mais adeptos por aqui. Em São Paulo, já há até uma loja especializada nesse tipo de bicicleta: a Tag & Juice, no bairro da Vila Madalena, onde é possível montar a bicicleta, comprar acessórios e também ver exposições de arte relacionadas ao universo urbano. [86] TODOS EM UM 85 Não é uma moto, mas também não chega a ser um carro. Ideal para as grandes cidades, onde o espaço é cada vez mais reduzido por causa de tantos autos nas ruas, r esse veículo individual funciona com eletricidade – o q que poupa o meio ambiente, já que usa menos da metade de energia en que a maioria dos carros híbridos à venda hoje. Feito com três rodas (para manter boa estabilidade), chega à velocidade de 112 km/h e tem autonomia para percorrer 50 quilômetros sem precisar ser reca carregado. E vem completo: com bancos ajustáveis, CD player, cinto de segurança e outros opcionais. Tudo isso com pouco menos de 1,3 m metro de comprimento por 1,2 metro de altura. ww www.hammacher.com © Foto Bike fixa: Divulgação | Foto Veículo individual: Divulgação [84] O artista e fotógrafo sueco Michael Johansson tem uma obsessão por agrupar e empilhar coisas. Seu desafio é criar instalações únicas a partir de uma série de objetos. “É como brincar de quebra-cabeças”, diz. Mas, em vez de peças, ele usa objetos que coleta em visitas a mercados de pulgas, peças que encontra em suas andanças e que ganha de amigos, como móveis, brinquedos e outras quinquilharias. Mas não se trata de porcarias, ele garante. “Seriam objetos que iriam para o lixo, mas que procuro usar pela história que carregam.” Assim, ele garante, as obras ficam mais autorais. Na instalação acima, ele resolveu aumentar as escalas e usar elementos de transporte, como um trator, contêineres, um antigo trailer de família e até o carro velho de um amigo. michaeljohansson.com CORPO sustentabilidade [87] NO PRATO Cada vez mais o que comemos indica quem somos – e como agimos no mundo. Conheça algumas tendências alimentares que vão passar pela sua mesa. Por Rafael Tonon COMPRE LOCAL 1 Os alimentos locais são mais frescos e saudáveis que os encontrados em vendas e supermercados, que normalmente precisam de muitos aditivos químicos (conservantes, etc.) para aumentar a durabilidade e mantê-los sem apodrecer até que cheguem a seu destino e sejam vendidos. Os locais também são geralmente produzidos por pequenos produtores, o que ajuda a aumentar a oferta de empregos nas comunidades. Os alimentos cultivados perto da sua casa tendem a ser mais saudáveis – e sustentáveis. Eles requerem menos deslocamento, o que evita a emissão de gases por transporte. ABERTA A TEMPORADA 2 É preciso lembrar que frutas, verduras e legumes são mais (ou menos) comuns em cada estação do ano. Respeitar suas épocas é importante porque eles se tornam prioridade entre os produtores e são mais saudáveis. Por serem cultivados no período adequado, eles também são mais abundantes e, por isso, mais baratos. Respeitar a sazonalidade dos produtos pode garantir alimentos mais nutritivos – e gostosos, já que eles têm a época certa para atingir o auge do seu sabor. PENSE NO CULTIVO 3 Com a oferta de produtos orgânicos crescendo, novas formas de cultivo ganham força, como os alimentos biodinâmicos. Produzidos sem o uso de adubos sintéticos, o solo onde são produzidos é tratado com chás e homeopatia e o cultivo é orientado pelas fases da Lua. A forma como um alimento é produzido conta muito: tanto para a saúde quanto para o planeta. Saber como foi cultivado é o primeiro passo. ALIMENTO TOTAL MENOS CARNE 5 As carnes estão perdendo cada vez mais espaço nos pratos. O semivegetarianismo prega diminuir o consumo de proteína animal, sem a necessidade de aboli-la completamente. © Foto: Tom Schierlitz/Getty Images ilustração: Marcio Fujii 4 Um mesmo tomate pode ser usado para mais de quatro preparações diferentes. As sementes podem ser torradas e moídas, usadas como farinha; a pele desidratada pode finalizar pratos e deixá-los crocantes; a polpa é ótima para molhos, enquanto o líquido que sai das sementes pode render uma geleia. O aproveitamento integral dos alimentos é cada vez mais valorizado nesses tempos de sustentabilidade, quando qualquer desperdício precisa ser evitado. ∞ A tendência já pode ser percebida nos cardápios de restaurantes do mundo todo, que chegam a preparar suas receitas com até 30% a menos de carne, o que significa quase 40 gramas a menos de bife nos pratos. ∞ Ações como a do beatle Paul McCartney, que incentiva a tirar a proteína animal da dieta às segundas-feiras, pode ser uma opção para reduzir – sem eliminar – o consumo. CORPO Viver em uma grande cidade está deixando você doente. Essa é a conclusão a que chegou o médico patologista Paulo Saldiva, de São Paulo. Coordenador do Laboratório de Poluição Atmosférica Experimental da Faculdade de Medicina da USP, ele estudou as consequências da poluição do ar, da contaminação das águas, da quantidade de ruídos, das inundações e das ilhas de calor para a saúde de quem vive nos centros urbanos. O resultado foi o livro Meio Ambiente e Saúde: o Desafio das Metrópoles, que acaba de ser lança- [89] Para criar pranchas mais sustentáveis, Marcelo Ulysséa voltou o olhar para os antigos surfistas. Afinal, a adrenalina dos pioneiros não tinha nada a ver com o poliuretano dos modelos de hoje: feitas a partir de blocos de madeira, garantiam alta performance e a perfeita integração do surfista com a natureza. Marcelo aprendeu a técnica de fabricação de pranchas de madeira na Califórnia e criou a Agave Hunter Wood Blanks. Como os blocos são feitos a partir da madeira seca, retirada da planta já morta, não há desmatamento. Todo o processo de fabricação é artesanal e leva de 30 a 60 dias, envolvendo apenas resíduos biodegradáveis, que viram adubo orgânico. L.L. agavehunter.com.br do pelo Instituto Saúde e Sustentabilidade. A intenção da obra não é alarmar, mas fazer as pessoas pensarem sobre os males que a vida urbana nos causa, e com os quais nos acostumamos pouco a pouco. Em suas pesquisas com poluição atmosférica, Saldiva descobriu que 4 mil mortes por ano em São Paulo são causadas pela poluição do ar – é como se cada habitante fumasse um a dois cigarros por dia. E 80% dessa poluição é causada por veículos. Essa é uma das razões por que Saldiva vai para o trabalho de bicicleta. Considerando que a indústria da moda é uma das mais poluentes do planeta (com a utilização de produtos químicos e a curta vida útil dos produtos), toda saída original para diminuir resíduos é válida. Trabalhando com designers renomados, a Worn Again aplica a técnica do upcycling em artigos inusitados como uniformes e forros de assentos de trem descartados da Eurostar, ou balões de ar aposentados pela Virgin. Tudo isso pode virar modernas jaquetas, bolsas para laptop e acessórios como protetores de iPod – que são vendidos pelo site ou em algumas lojas do Reino Unido, da Noruega e da Alemanha. A empresa ainda oferece um serviço de consultoria para grandes empresas que querem encontrar uma forma sustentável e rentável de lidar com seus resíduos têxteis. Por Lívia Lisbôa www.wornagain.co.uk © Foto Inversão térmica: Edu Garcia/AE; Foto Worn Again: Divulgação | Foto Pranchas: Divulgação; Foto Shwood: Divulgação; Foto Touch: Divulgação [88] [90] De olho no ar: as partículas que você inala sem perceber fazem mais mal do que você imagina [91] [92] Quando pequeno, o americano Eric Singer pegava as ferramentas de carpintaria na garagem do pai e, por molecagem, criava objetos com os galhos que encontrava na vizinhança. Um dia, com um graveto, um par de dobradiças enferrujadas e as lentes da lojinha da esquina, ele criou seu primeiro par de óculos com armação de madeira. Ficou tão legal que a garagem acabou se transformando na oficina da marca Shwood, onde hoje são produzidos mais de mil óculos por mês (com lentes 100% UVA e UVB). “As armações são de madeira de reflorestamento, feitas manualmente”, diz Singer. O processo artesanal e a especificidade de cada madeira garantem o caráter único das peças. Os preços vão de 95 a 155 dólares e é possível fazer encomendas para o Brasil. Por Márcia Bindo www.shwoodshop.com Assim que resolveu deixar o universo da moda, em 1998, a ex-modelo e ativista ambiental brasileira Zoë Melo queria trabalhar com algo que pudesse tocar o mundo e as pessoas. Depois de algumas incursões no design industrial e na arte, resolveu fundar a própria empresa, não por acaso batizada de Touch, que visa promover produtos que seguem o ecodesign e que tenham sido produzidas com matéria-prima de manejo sustentável. Ela atua como uma ponte para unir e interligar fornecedores, criadores e ONGs dispostas a criar peças que sigam políticas em prol do planeta. Além de designers consagrados como Tord Boontje, Takeshi Ishiguru e os irmãos Fernando e Humberto Campana, Zoë também auxilia trabalhadores locais a desenvolverem objetos que possam melhorar nossa relação com o meio ambiente. “Quero poder ajudar as pessoas a pensar uma forma de construir um novo significado para a vida do planeta”, diz Zoë, que construiu, ela mesma, um novo significado para sua própria vida. zoemelo.com CORPO [94] Andarilho na Amazônia Para conscientizar sobre a preservação da floresta, britânico caminha 9,5 km selva adentro N o dia 2 de abril de 2008 o britânico Ed Stafford deu, literalmente, o primeiro passo em uma jornada que iria transformar sua vida. Ele se tornou o único homem a percorrer todo o trajeto do rio Amazonas a pé, da nascente nos Andes peruanos até o oceano Atlântico, nas cercanias de Belém. Exatos 860 dias de caminhada depois, ele comemorou a vitória com uma frase singela em seu blog: “Hoje foi o melhor dia da minha vida”. Difícil encontrar palavras para narrar a emoção de um feito que o levou 9500 quilômetros selva adentro. Ex-capitão do exército de seu país (esteve no Afeganistão pela ONU), Stafford enfrentou temperaturas de sauna, corredeiras, cobras, insetos e onças, mas o que mais o assustou foram mesmo alguns seres humanos que cruzou pelo caminho. “Fui feito refém por uma milícia, extorquido por traficantes e quase assassinado por índios ashaninkas. A selva acabou sendo a parte poética da história”, diz. Além do desafio pessoal, que exigia fôlego para cerca de 8 a 10 horas ininterruptas de trilha por dia, Stafford fez da viagem uma cruzada pela preservação da floresta. Munido de um laptop carregado com placa solar, blogava sempre que podia, chamando atenção para o desmatamento e o estado de pobreza das crianças da região. Foi destaque na mídia em 22 países e arrecadou mais de 70 mil reais para instituições de caridade com projetos para as comunidades ribeirinhas do Amazonas. Depois da empreita, Stafford trocou o facão pela pena. Ele agora escreve o livro Walking the Amazon, previsto para março de 2011. Quer tentar pôr no papel a experiência que viveu. “E fazer com que as pessoas sintam uma verdadeira conexão com a Amazônia, suas maravilhas e, principalmente, seus problemas. É minha forma de alertar as pessoas sobre a mais importante floresta do mundo.” Por Edu Petta www.walkingtheamazon.com © Foto Andarilho Amazônia: Keith Ducatel | Foto Cicloturismo: Eduardo Green; Foto escalada: Divulgação; Foto mochila ciclista: Lee Myung Su [93] Turismo sobre duas rodas: uma forma de conhecer o mundo com as próprias pernas [95] Já vai longe o tempo em que o cicloturista era visto como louco. “Assim eram tachados os viajantes de bicicleta”, diz Antonio Olinto, que deu a volta ao mundo à base de pedal em meados dos anos 90. Dados da ATTA (associação mundial do trade de turismo de aventura) sinalizam o crescimento da procura por viagens de bicicleta, o aumento da oferta de destinos e o maior interesse dos cicloturistas. No Brasil, Santa Catarina é o estado mais tarimbado a lidar com esse público. Além dos dois circuitos já existentes (Vale Europeu e Costa Verde&Mar), ganhou em novembro o Circuito de Cicloturismo Acolhida na Colônia, desenhado para percorrer as pousadas na região interiorana do estado, referência em turismo rural. Alimentação orgânica e caminhos idílicos bordejando a mata atlântica fazem parte dos atrativos do trajeto. O Circuito tem mapas detalhados e tracks GPS para viagens autoguiadas. Por Fernando Angeoletto acolhida.com.br/cicloturismo. Praticar escalada envolve mais do que apenas a coragem de desafiar a gravidade. Os amantes da técnica, além de concentração e resistência, têm em comum a relação com a natureza. Para eles, a Lao Engenharia criou paredes de escalada sustentáveis com baixo impacto ambiental. De diferentes níveis de dificuldade, são construídas com madeira recuperada ou com ecoplaca (feita com resíduos de tubos de pasta de dente e embalagens longa-vida), com estrutura metálica e revestidas com pedras de resina PET e areia. A empresa ainda possui mais de 70 criações de ecodesign, como arquibancadas, aparelhos de ginástica e brinquedos. L.L. laoengenharia.com.br [96] Quase todo ciclista carrega uma mochila nas costas para transportar objetos pessoais como laptop, carteira e garrafa d’água. Pois o designer coreano Lee Myung Su acrescentou mais um item ao backpack de quem pedala – um sinalizador de LED para aumentar a segurança dos ciclistas à noite. “Eu pedalo e queria criar algo que fosse mais eficiente que os sinais de mão e os piscas comuns usados nas bikes”, afirma. As luzes ficam embutidas na mochila e um controle sem fio vai preso no guidão. Funciona como o pisca-alerta de carros e motos – basta um toque com o dedo para o ciclista sinalizar se vai parar, entrar à direita ou virar à esquerda. Sem falar nas opções de emoticons, caso o ciclista queira mostrar seus sentimentos durante pedalada. A mochila à prova d’água venceu o Red Dot Design Award 2010 e será comercializada na Europa, EUA e Ásia. M.B. leemyungsu.com CORPO [97] Um dos principais nomes da literatura americana atual, Jonathan Safran Foer enfrentou um dilema para parar de comer carne; mas resolveu tirá-la de vez da sua dieta [98] escritor americano Jonathan Safran Foer não é um vegetariano do tipo radical. Parar de comer carne, para ele, não foi uma decisão simples, dessas que se tomam de uma hora para outra. Fã confesso do sabor da carne e das memórias afetivas evocadas por um bife bem preparado, ele entrou em certa “crise alimentar” quando começou a indagar mais sobre os processos que envolvem um pedaço de filé até ele, de fato, chegar ao nosso prato. Mas nem sempre era muito contundente e acabava, vez por outra, por se render a um hambúrguer ou a um frango assado. Sua decisão de parar efetivamente de comer carne só foi tomada quando ele descobriu que iria ser pai. Foi aí que tudo se iluminou: como as crianças aprendem pelo exemplo, principalmente dos pais, Foer resolveu ser um ótimo exemplo para seu filho e passou a buscar argumentos mais incisivos para uma dieta sem proteína animal. “Em meus três anos de pesquisas eu aprendi muito sobre os efeitos da carne na saúde humana e no planeta – assim como seu efeito nos próprios animais – para me sentir apto a comer proteína animal de novo. É a pior coisa que fazemos ao meio ambiente”, disse em conversa com a VIDA SIMPLES, de Nova York, onde mora. O escritor se refere aos maus tratos com que os animais são criados para a produção de alimentos nos EUA e que ele relata em seu livro Comer Animais, a ser lançado agora em janeiro no Brasil. Em seus relatos, ele cita estudos científicos que sugerem a contaminação das galinhas criadas em granjas por bactérias das fezes, que comprovam os maus tratos por que passam os porcos que ficam sempre presos para não atacarem uns aos outros e que indicam que parte do gado é cortada enquanto ainda está consciente. A indústria da carne, de acordo com as pesquisas que aponta, é responsável pela morte anual de cerca de 450 bilhões de animais terrestres e contribui 40% mais para o aquecimento global do que todo o transporte do planeta. “Eu descobri que os tipos de fazenda que a maioria de nós imagina quando pensa na criação de animais estão, por todos os interesses e razões, mortos.” Não há vacas pastando tranquilas e galinhas ciscando nas fazendas industriais dos EUA. “Por isso, está na hora de adotarmos novas medidas e práticas”, defende. A saída de Foer foi abolir – não sem pesar – a carne do prato. “Eu não acho que as pessoas vão todas parar de comer proteína animal logo. Mas acredito que deve haver um movimento global sobre a quantidade de carne que frequentemente consumimos à medida que as pessoas passarem a pensar mais sobre isso”, diz. “E, assim, não estaremos mais rodeados de 50 milhões de animais confinados em situações lamentáveis.” Por Rafael Tonon © Foto Jonathan Safran Foer: Divulgação; Ilustração: O Silva | Ilustração camiseta: Marcio Fujii; Foto Crudivorismo: Geoff Brightling/Getty Images O Vida no prato a nutrição através dos alimentos crus Você sabe o que é alimentação viva? É uma forma de se alimentar que privilegia alimentos com maior vitalidade, aqueles que geram a vida, como as sementes germinadas e os brotos. Essa culinária também é chamada de crudivorismo, pois só usa alimentos crus – cozinhar os alimentos faz com que percam 60% de seus nutrientes e vitalidade. “Hoje a ciência sabe da importância dessa vitalidade na ativação das reações químicas e desempenho de todas as nossas funções”, diz a médica Maria Luiza Nogueira da Silva, do Centro de Saúde Escola Germano Sinval Faria e coordenadora do Projeto Terrapia – Alimentação Viva na Promoção da Saúde. Os trabalhos do Terrapia começaram em 1997, em um campus da Fundação Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro. Lá, existe um pomar e uma praça de alimentação com varanda, locais onde as pessoas da comunidade aprendem sobre a culinária viva. Os frequentadores, em geral vindos da comunidade de Manguinhos, aprendem a produzir sementes germinadas e brotos, a preparar pratos sem cozinhar e a pensar sobre nutrição. “Quem passa por aqui passa a ser mais ativo no autocuidado, principalmente no âmbito alimentar”, diz Maria Luiza. Ela já perdeu a conta de quantas pessoas passaram pela varanda do Terrapia: só em 2009, foram 19 mil participações em atividades do grupo. [99] Quer começar a se beneficiar da alimentação viva? Saiba como: A médica Maria Luzia, do Projeto Terrapia, dá os passos. “Comece pela germinação da semente de girassol e faça o suco de clorofila”, diz. Para fazer brotar o girassol, que também poderá ser usado em saladas e em outros pratos, siga os passos a seguir. O suco de clorofila, uma mistura de frutas, vegetais e sementes germinadas altamente nutritiva e energética, você aprende no site da Terrapia: www.ensp.fiocruz.br/terrapia. [1] Lave bem as sementes e deixe de molho em água por 8 horas. [2] Escorra bem a água e lave as sementes por cinco vezes. [3] Coloque o vidro com a semente úmida em um local inclinado a 45 graus de maneira que possa pegar ar. Escorra o excesso de água [4] Depois de lavá-las bem de manhã e à noite, retorne-as ao local inclinado. [5] Depois de 24 horas, mais ou menos, elas devem estar prontas para colher. Verifique se estão com os “narizinhos”, os brotos, para fora. Então é só provar e sentir os benefícios. CORPO [97] Um dos principais nomes da literatura americana atual, Jonathan Safran Foer enfrentou um dilema para parar de comer carne; mas resolveu tirá-la de vez da sua dieta [98] escritor americano Jonathan Safran Foer não é um vegetariano do tipo radical. Parar de comer carne, para ele, não foi uma decisão simples, dessas que se tomam de uma hora para outra. Fã confesso do sabor da carne e das memórias afetivas evocadas por um bife bem preparado, ele entrou em certa “crise alimentar” quando começou a indagar mais sobre os processos que envolvem um pedaço de filé até ele, de fato, chegar ao nosso prato. Mas nem sempre era muito contundente e acabava, vez por outra, por se render a um hambúrguer ou a um frango assado. Sua decisão de parar efetivamente de comer carne só foi tomada quando ele descobriu que iria ser pai. Foi aí que tudo se iluminou: como as crianças aprendem pelo exemplo, principalmente dos pais, Foer resolveu ser um ótimo exemplo para seu filho e passou a buscar argumentos mais incisivos para uma dieta sem proteína animal. “Em meus três anos de pesquisas eu aprendi muito sobre os efeitos da carne na saúde humana e no planeta – assim como seu efeito nos próprios animais – para me sentir apto a comer proteína animal de novo. É a pior coisa que fazemos ao meio ambiente”, disse em conversa com a VIDA SIMPLES, de Nova York, onde mora. O escritor se refere aos maus tratos com que os animais são criados para a produção de alimentos nos EUA e que ele relata em seu livro Comer Animais, a ser lançado agora em janeiro no Brasil. Em seus relatos, ele cita estudos científicos que sugerem a contaminação das galinhas criadas em granjas por bactérias das fezes, que comprovam os maus tratos por que passam os porcos que ficam sempre presos para não atacarem uns aos outros e que indicam que parte do gado é cortada enquanto ainda está consciente. A indústria da carne, de acordo com as pesquisas que aponta, é responsável pela morte anual de cerca de 450 bilhões de animais terrestres e contribui 40% mais para o aquecimento global do que todo o transporte do planeta. “Eu descobri que os tipos de fazenda que a maioria de nós imagina quando pensa na criação de animais estão, por todos os interesses e razões, mortos.” Não há vacas pastando tranquilas e galinhas ciscando nas fazendas industriais dos EUA. “Por isso, está na hora de adotarmos novas medidas e práticas”, defende. A saída de Foer foi abolir – não sem pesar – a carne do prato. “Eu não acho que as pessoas vão todas parar de comer proteína animal logo. Mas acredito que deve haver um movimento global sobre a quantidade de carne que frequentemente consumimos à medida que as pessoas passarem a pensar mais sobre isso”, diz. “E, assim, não estaremos mais rodeados de 50 milhões de animais confinados em situações lamentáveis.” Por Rafael Tonon © Foto Jonathan Safran Foer: Divulgação; Ilustração: O Silva | Ilustração camiseta: Marcio Fujii; Foto Crudivorismo: Geoff Brightling/Getty Images O Vida no prato a nutrição através dos alimentos crus Você sabe o que é alimentação viva? É uma forma de se alimentar que privilegia alimentos com maior vitalidade, aqueles que geram a vida, como as sementes germinadas e os brotos. Essa culinária também é chamada de crudivorismo, pois só usa alimentos crus – cozinhar os alimentos faz com que percam 60% de seus nutrientes e vitalidade. “Hoje a ciência sabe da importância dessa vitalidade na ativação das reações químicas e desempenho de todas as nossas funções”, diz a médica Maria Luiza Nogueira da Silva, do Centro de Saúde Escola Germano Sinval Faria e coordenadora do Projeto Terrapia – Alimentação Viva na Promoção da Saúde. Os trabalhos do Terrapia começaram em 1997, em um campus da Fundação Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro. Lá, existe um pomar e uma praça de alimentação com varanda, locais onde as pessoas da comunidade aprendem sobre a culinária viva. Os frequentadores, em geral vindos da comunidade de Manguinhos, aprendem a produzir sementes germinadas e brotos, a preparar pratos sem cozinhar e a pensar sobre nutrição. “Quem passa por aqui passa a ser mais ativo no autocuidado, principalmente no âmbito alimentar”, diz Maria Luiza. Ela já perdeu a conta de quantas pessoas passaram pela varanda do Terrapia: só em 2009, foram 19 mil participações em atividades do grupo. [99] Quer começar a se beneficiar da alimentação viva? Saiba como: A médica Maria Luzia, do Projeto Terrapia, dá os passos. “Comece pela germinação da semente de girassol e faça o suco de clorofila”, diz. Para fazer brotar o girassol, que também poderá ser usado em saladas e em outros pratos, siga os passos a seguir. O suco de clorofila, uma mistura de frutas, vegetais e sementes germinadas altamente nutritiva e energética, você aprende no site da Terrapia: www.ensp.fiocruz.br/terrapia. [1] Lave bem as sementes e deixe de molho em água por 8 horas. [2] Escorra bem a água e lave as sementes por cinco vezes. [3] Coloque o vidro com a semente úmida em um local inclinado a 45 graus de maneira que possa pegar ar. Escorra o excesso de água [4] Depois de lavá-las bem de manhã e à noite, retorne-as ao local inclinado. [5] Depois de 24 horas, mais ou menos, elas devem estar prontas para colher. Verifique se estão com os “narizinhos”, os brotos, para fora. Então é só provar e sentir os benefícios. CORPO O Jardim Gramacho, no Rio de Janeiro, é considerado o maior lixão a céu aberto do mundo. Ali, são despejadas 7 mil toneladas de lixo todos os dias – 70% de todo o detrito produzido na cidade. De seus resíduos sobrevivem muitos catadores, que dali tiram seu sustento – e até sua alimentação. Disposto a retratar essas pessoas usando o próprio lixo, o artista plástico brasileiro Vik Muniz passou uma tempo- rada no Gramacho. O que era para ser apenas mais um de seus trabalhos se transformou em um legítimo envolvimento do artista com a comunidade. As fotos que fez dos catadores foram vendidas em leilões de arte e revertidas para a recuperação do local. Toda essa história é relatada no documentário Wasteland, que já angariou vários prêmios e tem previsão de estreia em fevereiro. wastelandmovie.com © Foto: Divulgação [100] LIXO EXTRAORDINÁRIO CORPO O Jardim Gramacho, no Rio de Janeiro, é considerado o maior lixão a céu aberto do mundo. Ali, são despejadas 7 mil toneladas de lixo todos os dias – 70% de todo o detrito produzido na cidade. De seus resíduos sobrevivem muitos catadores, que dali tiram seu sustento – e até sua alimentação. Disposto a retratar essas pessoas usando o próprio lixo, o artista plástico brasileiro Vik Muniz passou uma tempo- rada no Gramacho. O que era para ser apenas mais um de seus trabalhos se transformou em um legítimo envolvimento do artista com a comunidade. As fotos que fez dos catadores foram vendidas em leilões de arte e revertidas para a recuperação do local. Toda essa história é relatada no documentário Wasteland, que já angariou vários prêmios e tem previsão de estreia em fevereiro. wastelandmovie.com © Foto: Divulgação [100] LIXO EXTRAORDINÁRIO