VSCP100 capa sust.indd

Transcrição

VSCP100 capa sust.indd
EDIÇÃO SUSTENTABILIDADE:
P A R A
Q U E M
Q U E R
V I V E R
M A I S
E
EDIÇÃO
M E L H O R
SUSTENTABILIDADE
ESPECIAL
100
P R O I B I D A
V E N D A
2010
ESTE EXEMPLAR É ESPECIAL PARA VOCÊ
DEZEMBRO
ASSINANTE
•
WWW.REVISTAVIDASIMPLES.COM.BR
IDEIAS, AÇÕES, INICIATIVAS E PESSOAS QUE FAZEM NOSSO MUNDO MELHOR
ideias, ações, iniciativas e pessoas
que fazem nosso mundo melhor
DEZEMBRO 2010
O BAIRRO IDEAL • O PODER DO MICROCRÉDITO • RUAS MAIS ACESSÍVEIS
TREM NO SERTÃO • BANCO COMUNITÁRIO • O LIXO QUE VIRA ENERGIA
FINANCIAMENTO ONLINE • TEATRO NA PALESTINA • BARCO EM SÃO PAULO
A PÉ NA AMAZÔNIA • CASA DE TERRA • INCUBADORAS • MÁQUINA DE ÁGUA
MINICASAS • SKATE NO AFEGANISTÃO • E MAIS 85 IDEIAS REVOLUCIONÁRIAS
[
]
SUMÁRIO
[22 a 33]
cocô e energia limpa,
painéis solares na áfrica,
água em zonas de
conflito, cisternas rurais,
hortas urbanas...
COMUNIDADE
[34 a 47]
o bairro ideal, microcrédito,
teatro na palestina,
skate no afeganistão,
financiamento online,
incubadoras sociais...
DESIGN
[48 a 60]
embalagens ecoeficientes,
design sem desperdício,
biomimética, concreto verde,
minicasas, casa de barro,
casa movida a algas...
MOBILIDADE
[62 a 73]
o bicicletário perfeito,
trens no ceará, trem-bala,
ruas acessíveis, car sharing,
teleférico na favela,
barco em são paulo...
CORPO
[74 a 82 ]
sustentabilidade no prato,
upcycling, poluição e saúde,
viajar de bike, a pé na amazônia,
vida sem carne, moda verde,
objetos esportivos ecológicos...
FALE COM A GENTE
Se você quer fazer comentários,
sugestões, críticas, tirar dúvidas
ou participar da seção Cartas,
entre em contato com a gente.
Telefone: 0800-7011341.
De 2ª a 6ª feira, das 9h às 12h
e das 14h às 18h.
Fax: (11) 3037-8308.
Cartas: av. das Nações Unidas, 7221,
14º andar, CEP 05425-902, São Paulo, SP.
Internet: www.revistavidasimples.com.br.
E-mail: [email protected].
ASSINATURAS
Internet: www.assineabril.com.br.
Ligue grátis: 0800-7752828.
Grande São Paulo: (11) 3347-2121
De 2ª a 6ª feira, das 8h às 22h.
Sábado, das 9h às 16h.
SERVIÇO DE ATENDIMENTO
AO CLIENTE (SAC)
Consultar dados sobre sua assinatura,
comunicar mudança de endereço,
tirar dúvidas sobre pagamento ou
entrega, renovação e outros serviços
Internet: www.abrilsac.com.
Ligue grátis: 0800-7752112.
Grande São Paulo: (11) 5087-2112.
De 2ª a 6ª feira, das 8h às 22h.
EDIÇÕES ANTERIORES
Solicite ao seu jornaleiro ou à banca mais
próxima de sua residência. O valor cobrado será o da última edição em banca.
PARA ANUNCIAR
Telefone: (11) 3037-5000/5756.
De 2ª a 6ª feira,
das 9h às 12h e das 14h às 18h.
Fax: (11) 3037-5609.
Internet: www.publiabril.com.br.
OUTROS PRODUTOS
Para comprar CD-ROMs, CDs,
almanaques, guias, livros e outros
lançamentos da Editora Abril.
Internet: www.lojaabril.com.br.
E-mail: [email protected].
Telefone: (11) 4003-8893.
De 2ª a 6ª feira, das 8h às 20h.
TRABALHE CONOSCO
www.abril.com.br/trabalheconosco
© Foto capa: Marcelo Zocchio; ilustração capa: Adriana C. Wolff | Ilustração ícones: Bruno Algarve
P L A N E TA
C A R TA A O L E I T O R
Fundador: VICTOR CIVITA
(1907 - 1990)
Editor: Roberto Civita
Presidente Executivo: Jairo Mendes Leal
S
ão dias de muito orgulho aqui na redação de VIDA SIMPLES. E
de muito trabalho. Quando nossa diretora de arte, a suave Adriana Wolff, percebeu a dimensão real da encrenca – eleger 100
ideias, ações, iniciativas e pessoas que estão transformando nosso mundo e converter tudo isso em material jornalístico de alta qualidade –, ela
abraçou a proposta no primeiro segundo e já começou a arregaçar as
mangas. Porque parecia muito texto para diagramar, muita foto para escolher, muita ilustração para encomendar. E era mesmo. Mas foi bastante graças ao trabalho de coordenação dela das muitas instâncias que fazem parte de uma edição com projeto gráfico diferente das nossas edições habituais que esta edição de VIDA SIMPLES pôde ficar de pé. A
Adriana e nossa equipe estão com um baita orgulho. Merecidíssimo.
Porque não é em qualquer esquina que você encontra uma revista
que tenha atingido a formidável marca de 100 edições. E VIDA SIMPLES chegou lá, enchendo-nos de alegria e aumentando ainda mais
a responsabilidade de entregar todo mês um cardápio variado de assuntos sobre meio ambiente, sabedoria, artes, inteligência.
Sim, 100 edições e um tema essencial: sustentabilidade. Pois esta VIDA SIMPLES, produzida com o apoio do Planeta Sustentável,
oferece a você um elenco formidável de ideias para um mundo melhor. São histórias de gente que conseguiu mudar a realidade, planos
quase mirabolantes, grandes sacadas a favor de uma vida melhor.
Tudo isso não seria possível sem a inteligência, o trabalho e o apoio
de Marcia Neder, nossa publisher, e de nossa equipe atual: Adriana
Wolff, Rafael Tonon, Rita Carvalho, Jeanne Callegari, Kareen Sayuri,
Adriana Baldin e Marcio Fujii.
Esperamos que você goste – e sinta-se cada vez mais com vontade de se engajar na causa de um mundo melhor, mais humano, mais
verde e inteligente.
Conselho Editorial: Roberto Civita (Presidente),
Thomaz Souto Corrêa (Vice-Presidente), Giancarlo Civita,
Jairo Mendes Leal, José Roberto Guzzo, Victor Civita
Diretor de Assinaturas: Fernando Costa
Diretor Digital: Manoel Lemos
Diretor Financeiro e Administrativo:
Fábio d’Avila Carvalho
Diretora Geral de Publicidade: Thais Chede Soares
Diretor Geral de Publicidade Adjunto: Rogerio Gabriel Comprido
Diretor de Serviços Editoriais: Alfredo Ogawa
Diretora Superintendente: Brenda Fucuta
Diretora de Núcleo: Marcia Villela Neder
Redator-chefe: Leandro
André Hauly, Erika Nakamura, Edvania Silva, Juarez Macedo, Leandro Marcinari,
Zeca França, Leo Ferreira, Rodrigo Lemes, Regina Sano,Vanessa Dalberto
VIDA SIMPLES ONLINE
Editores: Milton Strassacappa e Fernanda Fontes
Designer: Ileine dos Santos www.revistavidasimples.com.br
SERVIÇOS EDITORIAIS
Apoio Editorial: Carlos Grassetti (Arte), Luiz Iria (Infografia) Dedoc e Abril Press: Grace
de Souza Treinamento Editorial: Edward Pimenta
PUBLICIDADE CENTRALIZADA Diretores: Marcos Peregrina Gomez, Mariane Ortiz,
Robson Monte, Sandra Sampaio Executivos de Negócio: Ana Paula Moreno, Ana Paula
Leandro Sarmatz
Foto: Cinthia Sanchez; produção: Mario Mantovani; Ilustração: Juliana Russo
[email protected]
P.S.: Para celebrar esse número de respeito, colaboramos com
o plantio de 100 mudas de espécies nativas brasileiras em uma área
verde nos arredores de São Paulo. Você também pode colaborar.
Saiba mais em nosso site: www.vidasimples.com.br.
Sarmatz
Diretora de Arte: Adriana Dellamagna C. Wolff Editor: Rafael Tonon Repórter: Jeanne
Callegari Designers: Kareen Sayuri e Rita Carvalho Estagiário: Márcio Fujii
Atendimento ao Leitor: Adriana Baldin Assistente de Coordenação: Cida
Prado Assistente de Redação: Sueli Anselmo CTI: Alvaro Zeni (supervisor),
Teixeira, Ana Paula Viegas, Caio Souza, Camila Folhas, Carla Andrade, Cidinha Castro,
Claudia Galdino, Cleide Gomes, Daniela Serafim, Eliane Pinho, Emiliano Hansenn, Fabio
Santos, Jary Guimarães, Juliana Vicedomini, Karine Thomaz Marcelo Cavalheiro, Marcio
Bezerra, Maria Lucia Strotbek, Marcello Almeida, Marcus Vinicius, Nilo Bastos, Regina Maurano, Renata Miolli, Rodrigo Toledo, Tati Mendes, Virginia Any, Selma Costa, Susana Vieira
PUBLICIDADE DIGITAL Diretor: André Almeida Gerente: Luciano Almeida Executivos
de negócios: Alexandra Mendonça, André Bortolai, André Machado, Bruno Fabrin Guerra, Camila Barcellos, Carlos Sampaio, Daniela Alexandra Batistela, Elaine Collaço, Fabíola
Granja, Guilherme Bruno de Luca, Guilherme Oliveira, Herbert Fernandes, Laura Assis,
Luciana Menezes, Rafael de Camargo Moreira, Renata Carvalho, Renata Simões, Rodrigo
Scolaro, Veronica Souza PUBLICIDADE REGIONAL Diretor: Alex Foronda, Paulo Renato Simões Gerentes: Andrea Veiga, Cristiano Rygaard, Edson Melo, Francisco Barbeiro Neto, Ivan
Rizental, João Paulo Pizarro, Ricardo Mariani, Sonia Paula, Vania Passolongo Executivos de
Negócios: Adriano Freire, Ailze Cunha, Beatriz Ottino, Caroline Platilha, Celia Pyramo, Clea
Chies, Daniel Empinotti, Gabriel Souto, Henri Marques, Ítalo Raimundo, José Castilho, José
Rocha, Josi Lopes, Juliana Erthal, Leda Costa, Luciene Lima, Maribel Fank, Paola Dornelles,
Ricardo Menin, Samara Sampaio de O. Reijnders PUBLICIDADE NÚCLEO BEM-ESTAR Diretor: Alberto Simões de Faria Gerentes: Fernando Sabadin, Sandra Fernandes Executivos
de Negócio: Ana Carolina Kanj, Analucia Bertola, Alessandra Calissi, Alice Ventura, Cinthia
Curty, David Padula, Eduardo Chedid, Flavia Magalhães, João Eduardo Dias, Juliana Compagnoni, Leila Raso, Luis Caldas, Luis Fernando Lopes, Mara Marques, Reinaldo Murino,
Shirlene Pinheiro, Thaira Ferro, Vera Reis Assistente: Miriam Moya Manzano DESENVOLVIMENTO COMERCIAL Diretor: Jacques Baisi Ricardo MARKETING E CIRCULAÇÃO
Diretora de Marketing: Louise Faleiros Gerente de Publicações: Barbara Miklasevicius
Gerente de Marketing Publicitário: Danielle Oliveira Analistas de Marketing: Carolina
Pfulg, Juliana Fidalgo Estagiária Glaucia Carbonari Gerente de Eventos: Mônica Romano
Agostinho Analistas Adriana Paolini, Carolina Fioresi, Luciana Balieiro Estagiária Mariana Camargo Gerente de Circulação Avulsas: Magali Superbi Gerente de Circulação
Assinaturas: Alessandra Pallis PLANEJAMENTO, CONTROLE E OPERAÇÕES Gerente:
André Vasconcelos Consultor: Adriana Favilla Processos: Alexandre Toledo, Rosângela
Garcia ASSINATURAS Operações de Atendimento ao Consumidor: Malvina Galatovic
Recursos Humanos Diretora: Claudia Ribeiro Consultora: Marizete Ambran
Redação e Correspondência: Av. das Nações Unidas, 7221, 14º andar, Pinheiros, São Paulo,
SP, CEP 05425-902, tel. (11) 3037-2000 Publicidade São Paulo e informações sobre
representantes de publicidade no Brasil e no Exterior www.publiabril.com.br
PUBLICAÇÕES DA EDITORA ABRIL: Alfa, Almanaque Abril, Ana Maria, Arquitetura
& Construção, Aventuras na História, Boa Forma, Bons Fluidos, Bravo! , Capricho,
Casa Claudia, Claudia, Contigo!, Delícias da Calu, Publicações Disney, Elle, Estilo,
Exame, Exame PME, Gloss, Guia do Estudante, Guias Quatro Rodas, Info, Lola,
Loveteen, Manequim, Máxima, Men’s Health, Minha Casa, Minha Novela, Mundo
Estranho, National Geographic, Nova, Placar, Playboy, Quatro Rodas, Recreio, Revista
A, Runner’s World, Saúde!, Sou Mais Eu!, Superinteressante, Tititi, Veja, Veja Rio, Veja
São Paulo, Vejas Regionais, Viagem e Turismo, Vida Simples, Vip, Viva! Mais, Você RH,
Você S/A, Women’s Health Fundação Victor Civita: Gestão Escolar, Nova Escola
VIDA SIMPLES edição 100 (ISSN 977167876000), ano 8, nº 13, é uma publicação
mensal da Editora Abril S.A. Edições anteriores: Venda exclusiva em bancas, pelo
preço da última edição em banca. Solicite ao seu jornaleiro. Distribuída em todo o país
pela Dinap S.A. Distribuidora Nacional de Publicações, São Paulo. VIDA SIMPLES não
admite publicidade redacional.
Serviço ao Assinante: Grande São Paulo: (11) 5087-2112
Demais localidades: 0800-775-2112 www.abrilsac.com
Para assinar: Grande São Paulo: (11) 3347-2121
Demais localidades: 0800-775-2828 www.assineabril.com.br
IMPRESSA NA DIVISÃO GRÁFICA DA EDITORA ABRIL S.A.
Av. Otaviano Alves de Lima, 4400, Freguesia do Ó, CEP 02909-900, São Paulo, SP
INSTITUTO VERIFICADOR DE CIRCULAÇÃO
Presidente do Conselho
de Administração: Roberto Civita
Presidente Executivo: Giancarlo Civita
Vice-Presidentes: Arnaldo Tibyriçá,
Douglas Duran, Marcio Ogliara, Sidnei Basile
www.abril.com.br
[ 100 ]
IDEIAS PARA UMA VIDA SUSTENTÁVEL
Este não é um ranking. É uma seleção, feita pela redação de
VIDA SIMPLES e com o auxílio de alguns de nossos colaboradores,
de iniciativas a favor de um mundo melhor. De 1 a 100, estabelecemos
um elenco variado de assuntos divididos em cinco grandes seções:
Planeta, Comunidade, Design, Mobilidade e Corpo.
• A seção Planeta fala de meio ambiente e sustentabilidade.
• A seção Comunidade planta novas ideias para o convívio de todos.
• A seção Design esquadrinha soluções mais funcionais para o nosso mundo.
• A seção Mobilidade trata da circulação em nossas cidades.
• A seção Corpo fecha o foco sobre nosso bem-estar.
Um cardápio variado, como se vê. Há ideias de vanguarda, ações
contundentes, planos feéricos, sonhos que mobilizam. A roda gira,
o mundo se transforma: não há dúvida de que estamos vivendo
um momento especial, depois de décadas esgotando nossos
recursos naturais e produzindo o caos, a desordem e a violência.
São 100 motivos para você repensar o tempo em que vivemos.
E para ir além. Os textos identificados com o símbolo
oferecem material adicional em nosso site: www.vidasimples.com.br
Bem-vindo ao mundo das ideias.
Esta edição de VIDA SIMPLES faz a sua parte e vem impressa em papel cuja madeira
provém de florestas plantadas apenas para esse fim. Na tinta utilizada nesta e nas demais
páginas, um dos componentes petroquímicos foi substituído por substância vegetal à
base de soja. Além disso, os exemplares de assinantes são entregues em saco plástico
biodegradável feito à base de milho. Ótimas ideias para um mundo mais verde!
P L A N E TA
Nem só de sol e vento é possível produzir energia –
até o que você deixa no banheiro pode manter a luz
acesa ou a casa mais quentinha
Por Rafael Tonon | Ilustração Bruno Algarve
Todo o sistema de esgoto
das 200 casas teve de
ser adaptado, levando os
resíduos para uma estação
de tratamento construída
especialmente para tratá-lo.
Bactérias anaeróbias
levam até três
semanas para
decompor o cocô
e transformar
os resíduos
em gás
metano.
Do cocô ao calor
Mais de 200 casas da cidade de Didcot, no Reino Unido, mantêm
seu sistema de calefação funcionando graças ao que vai para a privada. É isso mesmo: todo o cocô dos moradores é direcionado para uma estação de tratamento onde ele é separado e convertido em
gás (sem odor, claro!) para poder alimentar os radiadores de calefação instalados nas residências. Utilizar nossos próprios resíduos como combustível não é algo novo, é verdade – há indícios de mais de
um século de que chineses e outros povos usavam o “número 2” para produzir energia. Mas o projeto de Didcot (que custou 4 milhões
de dólares) é uma prova de que é possível construir um sistema integrado de geração de gás e energia em grande escala através do cocô – uma energia limpa, sim, e totalmente renovável, já que a gente
não para nunca de fazer as necessidades fisiológicas, né?!
Luz nas praças
Uma praça cuja iluminação é toda mantida graças aos detritos que os
cães deixam por ali. Projetada pelo designer Matthew Mazzotta e batizada de Park Spark, essa praça existe e fica na cidade de Cambridge,
nos EUA. Pensando numa forma de dar um fim sustentável aos resíduos animais, Mazzotta desenvolveu um sistema com um grande tambor de ferro onde o cocô dos bichos é jogado e misturado, permitindo
que as bactérias possam fazer a decomposição dos resíduos e liberar
gás metano. Esse gás, que depois é canalizado, é distribuído por todo
o parque, onde é usado para manter a chama dos postes acesas, permitindo que as pessoas possam passear com seus cãezinhos durante a
noite em segurança. O projeto foi desenvolvido através do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) e a ideia é espalhar parques que
tenham a energia gerada pelo cocô da bicharada por todo o país.
TRONO MAIS VERDE
As privadas estão ficando mais sustentáveis. Pudera:
para cada descarga, cerca de 20 litros de água vão esgoto
abaixo. Pensando nisso, os fabricantes estão criando
privadas mais verdes. Conheça ao lado duas tendências
que devem estar em breve num banheiro próximo de você.
ÁGUA
FERTILIZANTES
O metano é distribuído pelos mais de 20 postes
instalados, mantendo as chamas sempre acesas.
O mesmo gás pode ser canalizado também para
fogões colocados na praça para piqueniques e
barraquinhas de vendedores de comida.
O cocô é recolhido em um
saco de plástico biodegradável
e, depois, jogado no tambor.
O dono do animal precisa girar
a manivela para misturar os resíduos
e permitir que as bactérias
possam agir, liberando
gás metano.
Uma forma de evitar o desperdício
é substituir a água pelo fogo. Os
novos modelos vão incinerar o xixi
e o cocô. Ao apertar a “descarga”,
os excrementos são queimados
– sem deixar cheiro, claro.
Assim que o gás
é produzido, ele é
coletado e distribuído
para as residências para
manter funcionando os
radiadores de calefação.
METANO
energia limpa
METANO
[01] COCÔ:
Do processo de tratamento,
além do metano, produzem-se
fertilizantes que são usados em
lavouras e plantações da cidade.
Um sistema a vácuo suga os detritos
e os jogá no esgoto – praticamente a
seco. Por isso, consome apenas 0,8 litro
de água a cada uso, 10 vezes menos
que um vaso comum. A energia para
produzir o vácuo vem de painéis solares.
P L A N E TA
[02]
Com passagens pelo Afeganistão, Darfur e Paquistão,
o italiano Michele Ungaro zela pelo abastecimento
de água em zonas de conflito pelo mundo
[03]
Já imaginou quantas garrafas plásticas de água vão parar diariamente no lixo de um restaurante? E de milhares deles? Incomodadas com o alto consumo
de um material que demora tanto para se
decompor, as amigas Letycia Janot e Maria Fernanda Franco chamaram atenção
para uma alternativa bem menos poluente e simpática – servir água na jarra.
A iniciativa tem como objetivo mudar o
hábito de restaurantes e empresas. “Nós não bebemos água de filtro fora de casa, o que não faz
o menor sentido se levarmos em conta que nossa água é de excelente qualidade e que a usamos
constantemente na preparação de comida, para fazer sucos, gelo etc.”, afirma Letycia. Para saber como estão economizando em plástico, os adeptos anotam a quantidade de jarras de água
vendidas por dia (uma jarra equivale a uma garrafinha). Para aderir ao projeto, o estabelecimento deve usar um ponto de água tratada, instalar um purificador certificado pelo Inmetro e
se comprometer a só utilizar garrafas se o cliente não quiser beber água na jarra. Por Nana Tucci
pois, com uma entidade francesa, foi à
República Democrática do Congo. E há
mais de dois anos trabalha para a Cruz
Vermelha Internacional, com a qual passou 16 meses em Darfur, no Sudão, e voltou ao Paquistão para uma nova missão.
“Trabalhamos com abastecimento e
estrutura sanitária em campos de refugiados, que deixaram suas casas por causa dos combates entre o exército paquistanês e os talibãs. Também me dedico a
recuperar aquedutos, cisternas e canais
de irrigação para a agricultura nos povoados no norte do Paquistão”, conta. “Me
sinto satisfeito por fazer algo importante
para os outros, dando apoio aos civis em
zonas de conflito, prevenindo problemas
ou aliviando o sofrimento da população.”
Por Maria Fernanda Vomero
© Ilustração: O Silva; Foto Michele Ungaro: Arquivo pessoal | Foto cisterna: Cia de Foto; Foto jarra: Cintia Sanches; Produção: Mario Mantovani; Foto máquina de água: Divulgação
Q
uando o italiano Michele Ungaro
terminou o curso de geologia, em
Ferrara, tinha apenas duas certezas: queria lidar com recursos hídricos e encontrar um trabalho que lhe permitisse viajar e desenvolver projetos em diferentes
lugares do mundo. Logo foi contratado
por uma companhia petrolífera francesa para fazer geologia de campo e gestão
dos dados que orientavam as perfurações. Esteve na Líbia, na Tunísia, na Argélia e no Iêmen. Depois, passou a trabalhar para uma companhia norte-americana, nos Estados Unidos e no Golfo do
México, desenvolvendo pesquisas geológicas para um software inovador.
“No início, o trabalho me agradava”,
lembra. “Porém, fui me dando conta de
que lidar com petróleo significava trabalhar para grandes companhias. E eu
sabia que muitas delas não contribuíam para o desenvolvimento da população local, serviam apenas ao interesse do
grande capital, o que me incomodava.” O
momento decisivo veio quando Michele
foi designado a ir à Nigéria. Ele estava a
par dos conflitos que envolviam a exploração de petróleo no delta do Níger, das
questões ambientais às demandas da população pobre da região. “Também sabia
que o governo nigeriano e as petrolíferas faziam tudo ilegalmente para não ter
de pagar nada às pessoas que moravam
lá”, diz. A sorte, contudo, esteve a seu lado: com a guerra do Iraque, em março
de 2003, o contrato foi suspenso e a ida à
Nigéria, cancelada. Surgiu, então, o convite para trabalhar com recursos hídricos em uma ONG italiana. Michele não
pestanejou: “A água envolve uma temática política e social complexa e muito interessante. Em zonas de conflito, trata-se
da primeira necessidade”. Esteve no Afeganistão, na Etiópia e no Paquistão. De-
Água na jarra: o fim
das garrafinhas plásticas
www.aguanajarra.com.br
04
4
Solução para o semiárido:
coletar água da chuva
Iniciado em 2003, o programa Um Milhão de Cisternas Rurais já construiu mais
de 294 mil cisternas na região, beneficiando
mais de 313 mil famílias. O projeto é tocado pela Articulação no Semi-Árido Brasileiro (Asa Brasil), um fórum que reúne ONGs
e entidades da sociedade civil preocupadas
com o desenvolvimento dessa parte do país. As cisternas são construídas por pedreiros
capacitados pelo programa, o que ajuda a gerar empregos na região, e pelas próprias famílias que serão beneficiadas. Cada cisterna
tem capacidade para armazenar 16 mil litros
de água da chuva, captada por meio de calhas no telhado das
casas. O programa
tem a intenção de
construir um milhão de cisternas e
assim beneficiar 5
milhões de pessoas que sofrem com
a seca na região.
[05]
E se solucionar o problema da falta de água potável fosse tão simples
como apertar um botão em uma máquina? Isso já é possível – e com tecnologia brasileira. A H2O Pure é uma
máquina de água que produz o líquido por meio de condensação da
umidade do ar. A água já sai livre de
impurezas para beber. A empresa fabricante (HNF Water) já vende o modelo de 60 litros para estabelecimentos como escolas, onde é usado como bebedouro. O de 5 mil litros é
ideal para a agricultura. Já o projeto
do chinês Chao Gao é uma máquina que usa a evaporação do solo pelo
calor do sol para fazer água potável.
P L A N E TA
T
odo dia que o Sol dá as caras na zona rural do sudeste africano é um
indício de que vai haver aula nas escolas da região. Foi graças à energia solar
que milhares de jovens puderam retomar (ou até iniciar, em alguns casos) os
estudos. Como muitas regiões da África sofrem com a falta de energia elétrica, um grupo de voluntários criou uma
força-tarefa para instalar painéis solares
nas escolas, possibilitando que os alunos pudessem aprender também a noite, quando os colégios costumavam ficar fechados por falta de eletricidade.
Com a energia limpa vinda dos raios de
sol, foi possível retomar as aulas em 108
escolas da região. A captação de ener-
gia solar também permitiu que os estudantes tivessem acesso ao computador
e à internet, buscando conteúdos na rede e aprendendo de uma maneira diferente daquela a que estavam acostumados. Essa é apenas uma das ações da
SolarAid, ONG que trabalha para gerar energia para as comunidades africanas. Com atuação em países como Quênia, Tanzânia, Maláui e Zâmbia, a instituição já conseguiu levar energia para mais de 10 mil residências e mais 19
clínicas, além de hospitais e comércios.
Com base em Londres, a SolarAid capacita voluntários para ensinarem os
próprios moradores dessas comunidades a instalarem as placas fotovoltaicas
(que transformam raios de sol absorvidos em energia elétrica) e ainda incentiva o empreendedorismo, à medida que
possibilita que os habitantes capacitados passem a vender (por preços justos,
claro) os produtos criados pela ONG
com o selo SunnyMoney, que vão desde luminárias para as casas a carregadores de celulares e outros equipamentos. Com um investimento de menos de
1,5 milhão de libras até agora, a instituição conseguiu gerar empregos, resolver o problema de falta de energia em
45% das comunidades carentes do sudeste africano, aumentar a incidência
de crianças e adolescentes nas escolas
e ainda promover o uso de uma energia limpa e renovável que, além de tudo,
faz bem aos próprios moradores – que,
assim, deixaram de consumir cerca de
2,3 milhões litros de querosene tóxico à
saúde. Por Rafael Tonon
Placa solar instalada em escola
infantil no interior do Quênia:
luz do sol possibilitou dobrar a
quantidade de alunos nos colégios
[07]
Quanto mais quente, melhor
Ar-condicionado movido a energia solar ajuda
a acabar com o calor nos ambientes
A energia solar pode até, quem diria, amenizar as altas temperaturas nos dias muito quentes. Pode parecer um contrassenso para a maioria, mas não para os cientistas chineses que desenvolveram o primeiro arcondicionado alimentado pelos raios de sol. Desenvolvido pela empresa
Shandong Vicot Air Conditioning, o projeto é uma parceria com a Academia Chinesa de Ciência para resolver uma questão primordial nos dias
de hoje: a quantidade de energia gasta para manter os aparelhos de arcondicionado ligados nos escritórios, casas e comércios do mundo todo,
que gera grandes quantidades de CO2 na atmosfera, aumentando o acirramento do efeito estufa e, consequentemente, do aquecimento global.
O protótipo possui 85% a mais de eficiência em conversão de energia do
que os condicionadores comuns. E ainda ajuda a amenizar as altas temperaturas que fazem transpirar – nosso corpo e o planeta.
© Foto: Solar Aid: Divulgação | Ilustração ar-condicionado: Catarina Bessel; Ilustração metano: Márcio Fujii; Foto ecosfera: Divulgação
[06]
Lá vem o sol
No sudeste africano, a energia solar permitiu transformar
a vida de diversas comunidades carentes
Transformar montes de lixo em algo produtivo, que
diminui a quantidade de
gases tóxicos lançados na atmosfera e
ainda gera energia: essa é a ideia por trás
das usinas de metano em funcionamento na cidade de São Paulo. Até 2007, cerca de 25% das emissões de gases de efeito estufa de São Paulo vinham dos aterros Bandeirantes, ativo entre 1979 e 2006
e o maior da América Latina, e São João,
que funcionou entre 1992 e 2007. Hoje, o metano (gás 21 vezes mais nocivo
que o CO2) liberado pelos lixões é
usado para gerar energia elétrica. Um acordo feito com a prefeitura permitiu que os dois lixões
fossem explorados para produzir
energia. As empresas responsáveis
por eles (Loga e EcoUrbis – que cuidam do Bandeirantes e do São João,
respectivamente) fecharam uma parceira com a Biogás para que o metano
captado seja queimado e transformado
em eletricidade. Os dois locais acumularam juntos 64 milhões de toneladas de lixo. O produto gerado por essa biomassa
abastece 800 mil pessoas e reduz em 20%
as emissões na cidade. Por Ainá Vietro
08
[09]
Não, não se trata de um aquário,
mas de uma ecosfera em miniatura
que funciona de forma totalmente autossustentável. Baseada em estudos feitos durante anos pela Nasa para pesquisar formas de vida em equilíbrio por longos períodos, essa bola de vidro guarda
um ecossistema que vive totalmente em
harmonia. Ali dentro, minúsculos camarões se alimentam de bactérias, que metabolizam resíduos orgânicos que servem de alimento para as algas que, por
sua vez, fazem a fotossíntese e liberam
o oxigênio necessário para os pequenos crustáceos. Uma minicomunidade
autossuficiente para ter na mesa da sala
(à venda só nos EUA). hammacher.com
P L A N E TA
A
ciência forense ajudando a flagrar crimes ambientais.
Essa é a rotina de Ken Goddard, do US Fish and Wildlife Service (Serviço de Proteção a Peixes e Vida Selvagem dos
EUA). Bioquímico de formação, ele se especializou em criminalística e técnicas forenses (basicamente, coleta e exame
de provas físicas), e trabalhou 12 anos analisando cenas de
crime. Então se cansou dos dramas humanos e resolveu usar
o que sabia em outra área – a ambiental. Desde 1979, trabalha como uma espécie de CSI da natureza, desvendando crimes sobre peixes e vida selvagem. Por Jeanne Callegari
Como a ciência forense pode ajudar a
proteger o meio ambiente?
Respondendo a seis questões básicas: quem, o quê, quando, onde, como e
por quê. Por exemplo, podemos determinar quem cometeu um crime específico
contra o meio ambiente, onde aconteceu,
quando, e quais os acontecimentos específicos do crime. Isso é feito examinando
e comparando evidências físicas para ligar o suspeito, a vida e a cena do crime.
Podemos identificar a vítima (por exemplo, um réptil cuja pele foi usada para fazer uma bolsa), como ela morreu (fazer
uma necrópsia em um puma), ou determinar que tipo de veneno ou munição foi
usada para matar uma vítima, ligando essas provas aos suspeitos.
Com quais crimes e ocorrências vocês
têm de lidar com maior frequência no
US Fish and Wildlife Service?
Os crimes mais comuns são violações
da Lei para Espécies Ameaçadas de Extinção, o Tratado-Lei para Aves Migratórias
e muitas violações envolvendo o contrabando ilícito de animais ou de suas partes
e produtos pelo país.
É uma tendência usar a ciência forense para desvendar crimes ambientais?
Estamos apenas começando a expandir as técnicas de investigação de cenas de
crime relacionadas à vida selvagem para
outros crimes ambientais, como resíduos
perigosos, destruição de habitats, destruição de recifes de coral. Se conseguirmos
desenvolver a expertise e as equipes de
laboratório para trabalhar nesses casos,
creio que conseguiremos ser bem-sucedidos em identificar os violadores de leis
ambientais e levá-los a julgamento em tribunais nacionais e internacionais.
Programas de TV como CSI: Las Vegas
ou CSI: Miami são parecidos com a vida real de um CSI?
[Rindo alto] Os programas de TV da
série CSI são bom entretenimento, e ajudam a educar o público. Mas, para contar uma boa história, foi necessário fazer
várias coisas erradas intencionalmente.
Por exemplo, na vida real, investigadores
de cena de crime raramente são cientistas
forenses e quase nunca oficiais juramentados. Se estão armados, não é boa ideia,
pois resíduos de pólvora podem contaminar facilmente as provas coletadas. Eles
dificilmente confrontam suspeitos e vítimas – essa é a função do detetive. Os CSIs
podem passar muitas horas – grande parte delas ajoelhados – em cenas sangrentas
e sujas, fotografando e coletando provas,
como impressões digitais. O trabalho não
é nada glamouroso, e o uniforme normal
é um par de aventais.
© Ilustração CSI Ambiental: Márcio Fujii; Foto Ken Goddard: USFWS photo | Ilustrações Hastes ao vento: Atelier DNA | Ilustração Catavento: Catarina Bessel
[10]
CSI ambiental: como usar as técnicas
da ciência forense para desvendar
os crimes contra a natureza
11
Hastes ao vento Conheça novas formas de obter
energia eólica, além das turbinas em terra
Um parque de energia eólica offshore, ou seja, aproveitando os ventos
dos mares e oceanos: essa é a aposta do Google no quesito energias alternativas. A companhia entrou como sócia no projeto Atlantic Wind Connection, que liga usinas de energia eólica ao longo do oceano Atlântico.
A capacidade do parque é de 6 mil MW de energia, um pouco menos de
meia Itaipu (14 mil MW) e o suficiente para atender 1,9 milhão de residências. Outro projeto que pretende aproveitar o enorme potencial dos
ventos para gerar energia é o das Windstalks, hastes que balançam ao vento e produzem a mesma energia que as tradicionais turbinas. Criadas pela
empresa nova-iorquina de design Atelier DNA para a cidade projetada de
Masdar, perto de Abu Dhabi, nos Emirados Árabes, as hastes são silenciosas, ocupam menos espaço e não oferecem riscos aos pássaros. O projeto
ganhou o segundo prêmio Land Art Generator, promovido por Masdar
para identificar os melhores projetos capazes de gerar energia renovável.
12
Energia eólica não é só para locais distantes, com turbinas enormes.
Você mesmo pode aproveitar os ventos do lugar onde mora para
construir uma miniturbina, que servirá para carregar aparelhos
como celulares e notebooks. Conheça alguns sites que dão o passo a
passo de como construir turbinas eólicas dos mais variados tamanhos
e jeitos – e de forma descomplicada:
Otherpower.com – Site americano, feito por entusiastas da energia
alternativa, com dicas no estilo faça você mesmo.
Scoraigwind.com – Página do britânico Hugh Piggotts, que sabe tudo
de energia eólica e renovável e escreveu alguns livros sobre o tema.
Gotwind.org – O site fornece planos de construção para turbinas
eólicas e um fórum para os entusiastas do tema.
P L A N E TA
13
[15]
Cultivo se aprende na escola
Colégio de Nova York cria uma
“minifazenda” para alunos
plantarem o próprio alimento
Horta nas alturas
Para dividir espaço
com os arranha-céus,
os ambientes verdes
seguem a tendência
da verticalização
C
A horta utiliza água reaproveitada
da chuva e adubo gerado através
da compostagem feita pelas crianças
14
Plantio pela web:
Dois sites para quem quer
se inspirar e embarcar na
ideia de plantar nas cidades.
We Patch (wepatch.org / EUA)
Reúne pessoas que buscam por
lugares para plantar com aquelas que
possuem espaço para oferecer. Basta
se cadastrar (como “plantador” ou
“parceiro”) no site e procurar onde
há interessados em promover a
colheita de alimentos na sua região.
Landshare (landshare.net /
Inglaterra) O site propõe uma
revolução que vai ser, segundo
seu criador – o ativista Hugh
Fearnley-Whittingstall –, a nova
grande tendência na forma de nos
relacionarmos com nosso alimento
(inclusive nas redes sociais): pessoas
interessadas no cultivo que buscam
locais nas grandes cidades para isso.
© Ilustração horta escola: Divulgação/Work AC | Ilustração horta nas alturas: Juliana Russo
Não se trata de ter aulas de culinária nem
de manter perto do pátio uma pequena hortinha. Um colégio público do Brooklyn, em Nova York, leva além a tendência das escolas de fazer com que as crianças tenham contato com o
alimento (e as formas de produzi-lo). O projeto,
elaborado pelo escritório Work AC em parceria
com a Fundação Chez Panisse, propõe um manifesto em prol das hortas comunitárias dentro
dos espaços urbanos e permite que os alunos sejam capazes de cultivar sua própria comida (de
verduras e legumes a ovos) em uma minifazenda orgânica totalmente integrada ao ambiente
escolar – tanto no currículo de aulas quanto na
produção da merenda. “O cultivo da terra é capaz de unir as crianças e fazê-las trabalhar juntas numa conexão mais profunda do que o contato na aula”, diz a diretora da escola, Célia Kaplinsky. Mais que isso, os alunos são envolvidos
em todos os aspectos: tanto na hora de plantar, como na de servir e comer. “Isso lhes oferece valores de nutrição, comunidade e relação
com a terra”, defende. E ainda educa as crianças
a perceberem a importância de uma alimentação saudável, o que ajuda a combater desde o
princípio a obesidade infantil, um problema sério nos EUA. O projeto ainda está em teste, mas
a ideia é implantá-lo, também, em outras escolas de NY – e, por que não, do mundo.
om cada vez menos espaço nas
grandes cidades, o céu é o limite para a construção de prédios residenciais
e comerciais que precisam abrigar tanta
gente no menor ambiente possível. Arranha-céus cada vez mais altos tentam dar
conta do recado. Partindo dessa “perspectiva vertical”, arquitetos, urbanistas
e designers têm partido da mesma lógica para repensar os espaços verdes, a fim
de integrá-los às metrópoles. Uma forma de trazer para perto dos moradores
jardins, hortas e até – pasmem! – fazendas. Um grupo de arquitetas espanholas,
por exemplo, desenvolveu o Spiral Garden, um espaço público verde em que as
pessoas podem plantar e colher de forma comunitária, permitindo maior proximidade com os alimentos e com a comunidade. A ser instalado no meio da cidade, segue a tendência de fazendas verticais, de levar a roça para as estruturas
urbanas. Uma boa saída para esses tempos em que a população está aumentando mais do que a capacidade atual de
produção de alimentos no planeta. Autossuficientes, muitas dessas fazendas
verticais são capazes de reutilizar água e
resíduos para produzir as plantas e vegetais, como é o caso do SkyFarm, um
projeto proposto para Toronto, no Canadá. Ainda usariam menos água e terra
do que as fazendas e sítios instalados nas
regiões rurais. E com a vantagem de estarem ao nosso pronto alcance.
Fazendas urbanas construídas
em meio aos prédios
residenciais nas cidades do
futuro – nem tão distante assim
P L A N E TA
17
Biodiversidade ao seu dispor: para aprender a preservar as
riquezas do meio ambiente, é preciso conhecê-las de perto
E de elefante, Z de zebra. No Brasil ainda se usam animais africanos para soletrar, apesar da diversidade de nossa fauna.
L de laranja, M de maçã. No Brasil também as frutas de origem estrangeira são
mais conhecidas do que nossa rica flora.
Esse desconhecimento não é indiferente. Ninguém conserva o que não conhece ou não considera útil. Por isso, a
efetiva proteção à nossa rica biodiversidade depende de informação. Depende de
sabermos identificar e valorizar, em nosso cotidiano, tecnologias e produtos originários de nossos ecossistemas, que já facilitam nossa vida, produzem riqueza e não
são apenas uma promessa para o futuro.
Tome a iniciativa de conhecer nossas
espécies. Prove sorvete de araticum do
cerrado ou geleia de uvaia da mata atlântica. Ponha biodiesel de pinhão-manso
no tanque e pare no semáforo aceso com
óleo de buriti. Saiba como o picão-preto age contra a malária e como o fio das
teias de aranha foi parar na sua roupa.
Conservação também se pratica na
cidade, com conhecimento e boas escolhas de consumo. A imensa biodiversidade brasileira está ao seu dispor, mas também sob sua proteção!
No apartamento em que você mora, um
painel controla os gastos de luz e água e a
temperatura. Os dados são transferidos para os sensores do edifício e depois enviados
para um cérebro eletrônico que estabelece
o consumo de toda a população em tempo real. Essa cidade está inteiramente integrada por sistemas de transporte coletivo e
ciclovias e quase toda a energia provém de
painéis solares, moinhos de vento e outras
fontes renováveis. Resposta para os tempos
atribulados das grandes urbes, onde é necessário poupar o planeta, a cidade inteligente já saiu do papel e começou
a ser erguida em outubro nas cercanias
de Paredes, região norte de Portugal. Os primeiros moradores chegaram e não são gente qualquer, mas funcionários de empresas
como Cisco, McLaren, Siemens, Microsoft,
Intel e IBM – o que dá uma ideia do que será
o futuro Silicon Valley lusitano. “Essa será a
primeira cidade em que a tecnologia estará
presente desde a construção dos edifícios e
dos espaços, o que cria novas oportunidades
de uso de energia, inovação e interação entre as pessoas”, diz Steve Lewis, coordenador
da PlanIT Valley, empresa que lidera a empreitada. “Acredito que a obra seja concluída
em 2015, mas a cidade estará em constante
desenvolvimento” afirma. O desejo dele, no
entanto, é que esse crescimento seja sustentável. “Não queremos algo gigante, como as
novas cidades da China. Terá que ser um
bom espaço para viver, com locais de trabalho e pesquisa, mas também infraestruturas
de educação, saúde e lazer, sempre preservando o meio ambiente”, acrescenta Lewis.
Por Edu Petta living-planit.com
Liana John é jornalista ambiental e autora do
blog Biodiversa, do site Planeta Sustentável.
Mulungu, uvaia
e ora-pro-nobis.
Exemplos da riqueza da
biodiversidade brasileira
© Fotos biodiversidade: Liana John | Foto Brasil diverso: Luciano Candisani
16
[18] BRASIL DIVERSO
O fotógrafo e biólogo Luciano
Candisani percorreu o território brasileiro com a máquina em punho disposto a registrar toda a riqueza dos nossos ecossistemas. Para o projeto Megadiversidade, clicou as tartarugas-verdes no atol das Rocas, mergulhou para
fotografar piraputangas no Pantanal e
partiu para alto-mar em Abrolhos para flagrar a baleia jubarte. A foto desta página mostra o muriqui, macaco
da nossa fauna que é um dos primatas
mais ameaçados do mundo e que foi
conservado graças a uma convivência
sustentável com o homem. “A espécie
só não desapareceu graças a um fazen-
deiro que, em plena década de 1940,
resolveu preservar as matas em torno
de seus cafezais, que serviam de morada aos muriquis”, conta ele, que integra a Liga Internacional de Fotógrafos
da Conservação, instituição que agrupa os principais fotógrafos de natureza do mundo. candisani.com.br
OM
MUUNNIIDDAADDEE
CCO
A cidade de COPENHAGUE possui
340 km de ciclovias e até as estradas têm corredores para ciclistas. As
ruas ganharam estacionamentos
públicos para as bikes e é possível
carregá-las no trem ou metrô. Em
MILÃO, uma das linhas de metrô
(vermelha) funciona graças à energia solar – são 23 mil m2 de placas
capazes de gerar 1,4 milhão de quilowatts de energia por ano.
Ao sul de LONDRES, uma ecovila
reúne 100 casas com emissão
zero em plena cidade. Tudo é
ecoeficiente: das grandes janelas
para iluminação natural (que evita
gastos com eletricidade) até placas solares e “cata-ventos” coletores de energia eólica.
[19] O BAIRRO IDEAL
Para imaginar como ele seria, selecionamos projetos
e ideias sustentáveis implantadas em cidades do mundo
todo e colocamos tudo em volta do mesmo quarteirão.
Com horta comunitária, baixa emissão de gases,
produção de energia limpa e comércio local,
seria o metro quadrado mais acolhedor da cidade.
Por Rafael Tonon | Ilustração Heitor Yida
Em BUNDANOON, Austrália, as garrafas de
água descartáveis foram abolidas, já que no país
o consumo anual é de 600 milhões de litros – o
que gera cerca de 60 mil toneladas de emissões
de CO2. Todas as ruas foram abastecidas com
bebedouros com água filtrada, onde é possível
beber e encher garrafões para usar em casa.
Toda a água da chuva que cai sobre a fonte da
praça Potsdamer Platz, em BERLIM, é colhida e
utilizada na irrigação de plantas e hortas, além
de ser usada para limpar os vasos sanitários e na
extinção de incêndios das construções da
região, em um projeto que alia um espaço
público ao planejamento urbano sustentável.
Na cidade de DACA, em Bangladesh, todos os
resíduos sólidos orgânicos são separados e
então utilizados para compostagem, que
depois é vendida para empresas de fertilizantes. Com isso, foi possível reduzir 1270 toneladas de CO2 em um ano (evitando a queima
desses resíduos). Em SANTANA DO PARNAÍBA, uma cooperativa de reciclagem criou
projeto que visa a coleta seletiva por meio de
conscientização da população. Todo o lixo da
comunidade é reciclado, o que gera emprego
a 69 catadores.
Em SYDNEY, Austrália, um projeto da prefeitura garante que todos
os moradores tenham acesso ao
centro da cidade em até 30 minutos utilizando transporte público.
Para isso, foram criadas linhas
integradas de metrô e ônibus.
A cidade de CINCINNATI, nos EUA, aprovou uma medida que fornece até 100%
de isenção fiscal para imóveis recémconstruídos ou reabilitados, comerciais
ou residenciais, que seguem preceitos
mínimos de construção verde (como
matérias-primas sustentáveis, uso racional de energia, iluminação natural etc.).
COMUNIDADE
O
Freedom Theatre (Teatro da Liberdade, na tradução literal) está situado no campo de refugiados de Jenin, cidade ao norte da Cisjordânia. O embrião
do atual Freedom Theatre começou em
1987 com o belo projeto da judia Arna
Mer-Khamis. Arna, nascida antes da criação do Estado de Israel, militava no Palmach, grupo de combate criado em 1941
e braço de elite do exército judeu na época do Mandato Britânico da Palestina.
Depois da guerra de 1948, casou-se com
o árabe Saliba Khamis, um dos líderes do
Partido Comunista de Israel. Defensora dos direitos humanos, ela estabeleceu
no campo de refugiados de Jenin um centro de atividades teatrais para as crianças.
Ali, elas descobriam seus talentos, um
novo jeito de encarar a vida – a despeito de todas as privações socioeconômicas
e das constantes e agressivas incursões do
exército israelense –, sentiam-se cuidadas
e desenvolviam autoestima.
O grande mérito do Freedom Theatre
talvez seja ensinar as crianças e os jovens a
sonhar e a expressar-se com liberdade, de
um modo que não seja nem violento nem
vingativo. E ainda permitir que possam
acreditar num mundo diferente para além
das fronteiras do campo de refugiados,
dos check-points, dos conflitos. Aos poucos, seus modelos não são mais os “mártires” mortos em confronto com o exército
israelense ou em atentados suicidas, mas
sim atores, cineastas, fotógrafos, professores e amigos, outras lideranças.
O grupo teatral fez diversas apresentações na Europa e nos Estados Unidos.
Tantas outras crianças começaram a participar das atividades da instituição. E, agora, uma nova sede – maior que a primeira – está sendo construída, na própria cidade de Jenin. Ainda me lembro de minha
despedida, quando o taxista veio me bus-
[21]
O Kibbutz Lotan, ao sul de Israel:
assentamento mistura vida comunitária
com muita sustentabilidade
F
oi no ano de 1983 que um grupo de jovens dos Estados Unidos, Austrália e Israel resolveu se juntar para fundar um kibbutz moderno no meio do deserto. A vida não é fácil numa região conhecida pela
aridez. Para completar, o assentamento comunitário está localizado no corredor entre a Jordânia e a Faixa de Gaza, umas das
áreas mais conturbadas do Oriente Médio.
O princípio básico de todo kibbutz é
simples: uma comunidade em que seus
membros têm acesso a recursos iguais,
independentemente do tipo de trabalho
que realizam. O Lotan é inovador porque
dispõe do Centro de Ecologia Criativa e
Aprendizagem Ambiental, com foco em
Permacultura e Design de Ecovilas, que
oferece uma infinidade de experiências
na área de sustentabilidade e ecologia.
“A proposta é diminuir o impacto que
o ser humano vem causando no ambiente”,
diz Mark Naveh, um dos fundadores. Em
2006, o kibbutz foi reconhecido pela Global
Ecovillage Network. Pudera: até as casas são
car de madrugada a fim de me levar até a
fronteira com a Jordânia. As mesquitas estavam silenciosas, os palcos do Freedom
Theatre também. As luzes, apagadas. Olhei
para o letreiro em vermelho e amarelo.
“Ah, a liberdade que permite o teatro. Ah,
Teatro da Liberdade”, pensei. E as cortinas
se abriram. Por Maria Fernanda Vomero.
thefreedomtheatre.org
Kibbutz “verde”:
o forno solar (abaixo)
usado pelos moradores
e as inusitadas casas
de barro (ao lado)
Atores em cena: a ficção
como uma forma de lidar
com a realidade
© Foto Freedom Theatre: Divulgação | Foto: Kibbutz: Alex Fisberg
[20]
Teatro transforma a realidade
de crianças e jovens palestinos de um campo
de refugiados em Jenin através da arte
feitas de lama, argila e palha, mas nem por
isso são menos resistentes que as construídas com alvenaria convencional.
Todas as casas estão interligadas a um
sistema de reaproveitamento de água, reciclagem de sólidos, além de utilizarem painéis solares para geração de energia. Ambientes comunitários têm lixos separados
para reciclagem, e todo o lixo orgânico passa por um processo de compostagem que
vira adubo para utilização nas plantações. A
água utilizada em chuveiros e torneiras é reaproveitada para irrigação de toda a região.
Toda essa inovação vem atraindo bastante atenção de estudantes ao redor do
mundo. “Acabei de terminar minha graduação em engenharia ambiental e tenho
certeza de que essa experimentação está sendo fundamental para os próximos
passos da minha carreira”, afirma Marcus
Adjon, jovem norte-americano integrante
do curso de Aprendizado Ecológico, com
duração de quatro meses. Por Alex Fisberg.
kibbutzlotan.com
COMUNIDADE
A Gente Transforma é um projeto colaborativo. Como se dá a interação entre
os diversos profissionais envolvidos?
Participaram a equipe do projeto, os
moradores da comunidade, universitários
do Brasil e do exterior, empresas e voluntários. O A Gente Transforma faz uso das cores
para despertar a criatividade e realizar mudanças dentro de uma comunidade, elevando sua autoestima e colocando o poder de
transformação nas mãos dos moradores.
zes culturais têm lugar de destaque, como
uma forma de incluir a própria história
no ambiente. No caso do A Gente Transforma, as cores, o curso de capacitação em
pintura, a participação efetiva dos moradores no processo de transformação do
único espaço de lazer que desfrutavam são
parte de um movimento inclusivo. Nossa expectativa é que esse projeto seja um
despertar. Queremos estimular as pessoas
para sua capacidade de realizar e articular
juntas, através da colaboração.
Como o design pode despertar o sentimento de autoestima em populações
menos favorecidas?
Morar é algo realmente importante
quando falamos de valores como identidade cultural, autoestima, cultura popular, memória e inclusão. Em nossos projetos, buscamos enxergar a casa como um
elemento capaz de elevar a autoestima do
brasileiro, onde a memória pessoal e as raí-
[23]
O estudante de artes Daniel Scandurra é
o autor de uma bela intervenção nos
relógios – abandonados – de São
Paulo. Enquanto os artefatos “dormem”
(à espera de uma solução da prefeitura
e da iniciativa privada), Daniel adesivou
mensagens inspiradas na arte concretista.
Uma intervenção pacífica, poética e
que promete um respiro no meio da urbe.
[24]
A França tem vivido dias de polêmica
graças ao debate sobre a proibição
do uso do véu islâmico. E é na capital
francesa que a artista Princess Hijab,
armada apenas de caneta preta,
pinta véus em cartazes expostos
no sistema de metrô parisiense.
São intervenções bem-humoradas,
com um sabor infantil, mas que não
escondem seu potencial transgressor.
25
© Foto A Gente Transforma: Divulgação; Foto Intervenções nos relógios: Camila Picolo | Foto Skateistan: Rhianon Bader; Foto faixa de pedestre esqueda: Alice Rodrigues ; direita: Antonio Komiyama
[22]
Um dos nomes à frente do projeto A Gente Transforma,
o arquiteto e designer Marcelo Rosenbaum acredita
que a arte pode mudar uma comunidade para melhor
Manobras radicais contra o radicalismo: projeto une skate
e cidadania em meio às regiões de conflito no Afeganistão
O horror da guerra não é um só, são vários:
doenças, problemas de infraestrutura, amizades
separadas por trincheiras, famílias destruídas. O
que dizer então do Afeganistão, encravado no centro da Ásia e no olho do furacão da guerra contra
o terror? Ali, tudo é uma aridez só. E para os jovens, então, parece não haver saída. Parecia. Uma
iniciativa chamada Skateistan (trocadilho com
skate e com o nome do país) está ajudando a restituir um pouco de sanidade a jovens sem família
ou destino. Trata-se de uma escola de skate que,
para muito além das manobras radicais, educa,
qualifica e traz de volta a esperança pela paz a milhares de jovens. Iniciativa dos skatistas australianos Oliver Percovich e Sharna Nolan, a escola
hoje conta com diversos colaboradores e está fazendo história em Cabul, a conflagrada capital do
país. Troca a desesperança e a revolta da guerra
pela alegria do esporte e a qualificação em ofícios
como informática, artes e espírito comunitário.
skateistan.org
26
Em Curitiba, um
consórcio de artistas
e designers utiliza a
faixa de pedestres
como suporte
artístico. A ação,
batizada de Arte na
Faixa, foi realizada
por 20 artistas da
capital paranaense.
São ilustrações, grafites
e pinturas que buscam
a paisagem urbana
como “tela” – e o melhor,
tudo com o apoio
da própria prefeitura.
artenafaixa.com.br
COMUNIDADE
Não é preciso muito dinheiro para
transformar a vida de uma pessoa, ou até
de uma comunidade. Essa é a ideia por
trás do microcrédito, termo cunhado nos
anos 1970 por Muhammad Yunus, fundador do Grameen Bank, de Bangladesh,
para designar o crédito concedido a pessoas de baixa renda, que não teriam acesso às formas tradicionais de financiamento. A ideia em si é antiga – os primeiros
registros são de 1846, quando um pastor
da Alemanha cedeu farinha para que as
pessoas fabricassem pão e assim se livrassem das dívidas com agiotas. Mas foi com
Yunus que a ideia ganhou corpo e passou
a mudar a realidade de milhões de pessoas. Em 1976, ele começou a fazer empréstimos de pequeno valor para produtores
rurais, no início, tirando o dinheiro do
próprio bolso. Assim surgiu o Grameen
28
Thiago Vinicius no palco
do TEDxAmazônia: aos 20
anos, ele já criou um banco
comunitário que ajuda
o bairro Jardim Sampaio,
onde mora, a prosperar
Bank. Uma característica do sistema desenvolvido por ele é o sistema de grupo
solidário, em que um conjunto de pessoas pega juntas o empréstimo e cada uma é
fiadora das outras. O agente de microcrédito também é importante: ele é quem irá
até a casa das pessoas para conhecê-las e
decidir se o crédito é liberado. Os agentes
passam a conhecer bem e acabam ficando amigos das pessoas que solicitam os
empréstimos. Essa relação mais próxima
quebra a impessoalidade dos bancos normais e ajuda a fazer o sistema dar certo:
no Grameen Bank, a taxa de pagamento
dos empréstimos beira os 99%. No Brasil,
um estudo feito pela Fundação Getúlio
Vargas com 175 empreendedores de Heliópolis mostrou que os que tinham recebido microcrédito tiveram suas vendas aumentadas em 60%. Por Jeanne Callegari
Além de grandes bancos que investem
em microcrédito, existem iniciativas menores, focadas em comunidades específicas, que também praticam microfinanças
e ajudam a combater a pobreza. São os
bancos comunitários. Aos 20 anos,
Thiago Vinicius é o fundador de um desses empreendimentos: o Banco Comunitário União Sampaio, no Jardim Maria
Sampaio, periferia de São Paulo. No evento TEDxAmazônia, no mês de novembro,
em Manaus, Thiago foi um dos palestrantes e contou como o banco, que tem pouco mais de um ano de vida, fornece crédito para os comerciantes da região, e do
sampaio, a moeda social criada pelo banco
para valorizar o comércio local. Quem
tem sampaios pode trocá-los por produtos
nas lojas que o aceitam. Thiago é responsável pela análise dos pedidos de empréstimo feitos ao banco, em uma relação próxima que ajuda a garantir o sucesso da iniciativa e fortalecer a comunidade.
© Foto Thiago Vinicius: Rodrigo Fonseca | Ilustração microcrédito: Catarina Bessel
[27]
Criado em Bangladesh, nos anos 1970, o microcrédito é
uma forma de gerar desenvolvimento nas comunidades
e produzir riqueza, ajudando as pessoas a realizar sonhos
[29]
A internet abriu possibilidade para novas formas de
microcrédito. São sites como o Kiva.org, que permitem que
qualquer pessoa empreste dinheiro para empreendedores
de baixa renda ao redor do globo. A ideia é ajudar a aliviar
a pobreza. O empréstimo mínimo é de 25 dólares. Você pode
emprestar tanto para uma vendedora de tecidos no Quirguistão
como para um grupo de plantadores de arroz no Camboja:
é só entrar no site, escolher o perfil dos candidatos e emprestar
via PayPal ou cartão de crédito. Todos são selecionados por
instituições de microcrédito de cada país. Um site com uma
proposta parecida é o Microempowering.org, que permite
doações para os empreendedores. Nesse caso, o dinheiro
não é pago de volta – é uma doação, não um empréstimo.
[30]
O Brasil também participa do jogo do microcrédito. De
instituições governamentais – como SP Confia e Banco do
Nordeste, o maior do gênero no país – a empresas privadas, muita
gente percebeu o potencial dessa iniciativa. Jerônimo Ramos,
superintendente dessa área no Santander Microcrédito, um dos
bancos privados a investir no segmento, se apaixonou pela ideia.
“O microcrédito é diferente do microempréstimo:
o dinheiro não vai para consumo, mas para investimento em
um negócio, no sonho das pessoas”, diz. “Assim, gera-se renda e
desenvolvimento. Muita gente sai da linha da pobreza por causa
disso.” É a dona de um bar que comprou uma geladeira nova e
assim pode ampliar o negócio, ganhando dinheiro para colocar os
filhos em uma escola de música; é o dono de um salão de beleza
que viu a clientela aumentar depois que reformou o local. Segundo
Jerônimo, os filhos e familiares estão entre os mais beneficiados
pelos empréstimo. “No microcrédito, não é o cliente que
vai até o banco, mas o banco que vai até a casa do cliente”, diz.
COMUNIDADE
[31]
[32]
Ao longo de 15 anos,
a muçulmana Zilka
Spahic-Siljak tem
visitado diferentes vilarejos
na Bósnia sempre com
a mesma mensagem:
é possível viver em paz
Q
trata de tarefa fácil; a equipe encontra resistências por todos os lados, de cidadãos
comuns a líderes políticos ou religiosos,
todos céticos em relação às mudanças.
A guerra também deixou marcas em
Zilka, que engravidou durante o período. “Não foi uma decisão racional, mas
estou feliz que tenha sido assim.” O conflito ainda estava em curso quando ela
começou o trabalho de acolhimento e
assistência aos refugiados, especialmente mulheres que foram estupradas ou sofreram algum tipo de violência.
Hoje, segundo ela, a situação é diferente. Por lidar com temas relacionados
à paz e ao perdão, valores em que realmente acredita, acompanha muitas histórias positivas, de reconciliação e mudança
de comportamento. “A paz é um processo que não pode ser interrompido, temos
de ser agentes permanentemente”, diz Zilka. Aos 42 anos, embora tenha vivido numa cidade sitiada durante a guerra e visto
muitas atrocidades, ela não deixa que suas esperanças percam o frescor. Ao fim da
conversa, confessa: “Sou uma romântica”.
O mundo lhe agradece. M.F.V.
[34]
© Foto Zilka: Divulgação | Foto pintura na rua: Divulgação; Foto Williamsburg: Max Plogia (It’s Green Design).
uando encontrei Zilka Spahic-Siljak, pesquisadora e professora do
Centro para Estudos Interdisciplinares de
Pós-Graduação da Universidade de Sarajevo, na Bósnia, o Ramadã já havia começado. Zilka, muçulmana praticante, jejuava. “Estou cansada, ainda não tive um dia
de descanso”, disse, com um sorriso. Além
da atividade acadêmica – ela ensina disciplinas ligadas a gênero, direitos humanos
e religião –, Zilka dirige há 15 anos a Fundação Educacional, Psicossocial e Transcultural, uma entidade voltada para trabalhos práticos de reconciliação e diálogo em vilarejos marcados pela guerra que
devastou a Bósnia (1992-95), durante o
esfacelamento da ex-Iugoslávia.
Num país formado por três etnias majoritárias frequentemente confundidas
com identidade religiosa – sérvios (ortodoxos), croatas (católicos) e bosniaks
(muçulmanos) – e que esteve quase 50
anos sob um regime socialista, o período
pós-guerra propiciou o recrudescimento de antigos nacionalismos e de ódios latentes na sociedade. “Como é importante reunir pessoas de grupos étnicos e religiosos diferentes neste país! Temos muito
trabalho”, diz. Ela e sua equipe promovem
workshops, reuniões e eventos em vilarejos ortodoxos, católicos e muçulmanos
sempre com a mesma mensagem: é possível conviver com o outro. “Queremos
contribuir para a melhora da relação entre as pessoas, ensiná-las a perdoar, a se
reconciliar, a viver juntas de novo.” Não se
Unir os moradores de uma comunidade em prol de melhorar e tornar mais
agradável o espaço comum. Uma série de iniciativas com esse intuito, tão antigo
quanto singelo, tem cada vez mais tomado
as cidades do mundo. A fundação ArtsWave
promoveu, junto com o estúdio de design Higher Level Art,
uma intervenção artística coletiva que fez lembrar esse tipo
de prática, mas em maiores proporções. Cinco artistas, 100
organizadores e 1500 voluntários de todas as idades sujaram as mãos de tinta e transformaram 800 metros do asfalto cinza e frio do histórico bairro Over-the-Rine, em Cincinnati (Ohio), com desenhos, formas e cores alegres e vibrantes. A ação durou 12 horas e o resultado final foi ver o
melancólico bairro de cara nova. Guiada pela proposta de
criar comunidades através das artes, a ArtsWave se esforça
para fazer da cidade um lugar melhor para viver, trabalhar
e, por que não, brincar. Confira o vídeo da intervenção no
link: theartswave.org. Por Mariana Del Grande
33
Uma vez por ano, a rua Bedford, em Williamsburg,
no Brooklyn nova-iorquino, acorda com gramados verdes, sombra e água fresca, além de artistas, artesãos e áreas de lazer desejando bom dia a toda a comunidade local. Durante o verão, acontece ali o Williamsburg Walks,
um evento destinado a repensar os espaços públicos, inspirados em eventos que acontecem em cidades
do mundo todo, como Londres e Tóquio. A ideia é simples: bloquear o trânsito de uma das ruas principais, permitindo que a comunidade celebre o próprio bairro e
desfrute de pequenos espaços criados no meio do asfalto, priorizando os pedestres em vez dos carros. Nem que
seja por alguns dias no ano... Por Max Poglia
Depois do furacão Katrina ter devastado Nova Orleans, cerca de 2 mil pessoas
resolveram se mudar para a cidade e auxiliar na sua reconstrução. Entre elas estava o músico-viajante Andreas Hoffmann,
que pensou em uma maneira de ajudar
que fosse positiva também para o meio
ambiente. Foi então que ele criou o Green
Light, um grupo de voluntários que percorre as ruas da cidade de bicicleta (para
não emitir gases, claro) para substituir
as lâmpadas comuns das casas por
modelos fluorescentes, que gastam muito menos energia. A ideia
foi tão bem aceita que até hoje Hoffman,
sua banda e 4500 colaboradores já conseguiram trocar 230 mil lâmpadas de quase 9 mil casas, economizando 90 milhões
de kW/h. “Passamos pelas casas e mudamos, também, a mentalidade das pessoas,
que percebem a importância de economizar energia e diminuir a emissão de CO2”,
diz ele. “Afinal, muitos estudos mostram
uma relação da maior incidência dos fenômenos naturais, como os furacões, com
a questão do aquecimento global. Mesmo
dez anos depois da tragédia, continuamos
fazendo a nossa parte.”
COMUNIDADE
[36]
Incubadoras sociais dão um empurrão para que negócios
com preocupação ambiental ou social virem realidade
Negócios que, além de viabilidade
econômica, tenham impacto social. Esses
são os alvos das incubadoras sociais, que
ajudam a botar de pé empreendimentos
que vão além do lucro e pretendem mudar o mundo para melhor. Algumas são
focadas em redução de pobreza, como é o
caso da Artemísia, de São Paulo. Outras,
como a dos holandeses da Enviu, procuram soluções para os problemas ambien-
tais. Em comum, a ideia de ajudar negócios do chamado setor 2,5, que fica entre
as ONGs e instituições com fins sociais,
e os empreendimentos que visam lucro.
Para estar numa incubadora social, o negócio precisa ser sustentável economicamente, além de para a sociedade e para o
ambiente. Assim, garante-se a continuidade das ações independentemente de doações – o que é bom para todo mundo.
Uma discoteca que gera energia elétrica enquanto as pessoas dançam; um carrinho do tipo riquixá híbrido, que gere renda para as populações pobres e não polua
o ambiente. Esses são dois dos projetos em
que a Enviu, incubadora holandesa voltada para a sustentabilidade,
esteve envolvida. Seu fundador, Stef van
Dogen, esteve no Brasil para a conferência TEDxAmazônia, em novembro, onde falou sobre a origem da empresa. Nascido em uma família de empreendedores, Stef tinha a ambição de ficar rico cedo.
Mas, ao conhecer a realidade de famílias
pesqueiras no Chile, pensou que o ecoturismo poderia ser uma solução para tirálos da pobreza e ainda acabar com a pesca predatória na região. Levou especialistas da Holanda para lá e apoiou a criação
de 30 microempresas. A partir daí, criou a
Enviu, que trabalha com empreendedores
e inovadores jovens do mundo todo. Seus
projetos mais marcantes são o Sustainable Dance Club (“Discoteca Sustentável”)
e o Hybrid TukTuk (“TukTuk híbrido”). O
tuktuk é um carrinho do tipo riquixá usado na Índia para transportar pessoas. Movidos a gasolina, costumam ser muito poluentes; seus motoristas são em geral das
parcelas mais pobres da população. A Enviu abriu uma competição de design para que inovadores do mundo todo criassem soluções para o carrinho. Uma parceria entre a incubadora e um empreendedor indiano gerou uma empresa para
fabricar o modelo vencedor e oferecê-lo a
preços baixos para os motoristas da Índia,
permitindo que melhorem de vida dirigindo um veículo que melhorará a qualidade
do ar nas cidades e reduzirá a emissão de
gás carbônico na atmosfera.
O Hybrid TukTuk, projeto da Enviu:
transporte sustentável para os indianos
[37]
Financiamento online: um novo jeito
de bancar projetos criativos surge na web
Financiar ações que envolvem criatividade se tornou
mais fácil com o Kickstarter, site americano que une
pessoas com boas ideias a gente querendo investir nelas.
No site, é possível inscrever projetos como um novo
documentário, um espetáculo de dança, um projeto
fotográfico ou de design, a invenção de um novo objeto
e até mesmo a programação de um novo software. Se
aprovada, a ideia fica aberta para investimentos no site.
Qualquer pessoa pode entrar e investir o quanto quiser;
em troca, ganhará uma experiência única para aquele
projeto, como uma cópia autografada do CD ou acesso
ao palco em uma apresentação de dança, por exemplo.
O dono do projeto só receberá o dinheiro se a cota
definida como necessária para concluir a empreitada
for arrecadada dentro do prazo (os valores conseguidos
ficam à mostra, em uma barra, na página de cada projeto).
Assim, garante-se que os artistas e empreendedores
só começarão a criar quando tiverem grana para isso,
evitando que se dediquem a projetos e tenham que parar
no meio por falta de recursos. Um projeto que arrecadou
mais de 200 mil dólares no Kickstarter foi o da rede social
Diaspora, criado para concorrer com o Facebook.
[38]
© Foto Tuk Tuk: Divulgação | Foto ovos: Robert Kirk/Getty Images; Ilustração: Márcio Fujii
[35]
Formar pessoas que possam ser atores de transformação social, por meio de negócios que ajudem a reduzir a pobreza. Esse é um dos pilares da Artemísia, aceleradora de negócios sociais de São Paulo. A ideia da empresa é que, com equipes fortes e afinadas, os empreendimentos terão mais chance de prosperar. Por isso, um
dos focos de seu trabalho acontece no Centro de Formações, em que dão treinamentos técnicos e teóri-
cos para que pessoas que querem fazer a diferença no mundo se tornem futuros gestores. “O Brasil
pode ser um polo de negócios que reduzem a pobreza”,
diz Maure Pessanha, diretora do Centro de Formações da
Artemísia. “Afinal, o país está crescendo macroeconomicamente, temos uma cultura empreendedora e muitos
desafios sociais para solucionar.” Quem quiser participar
e não tiver dinheiro para pagar os cursos pode oferecer
uma contraproposta empreendedora, trocando serviços
que beneficiem a aceleradora ou o campo de negócios
sociais. A Artemísia também tem um Programa de Aceleração de Negócios, em que ajuda financeiramente empreendimentos que surgiram nos cursos de formação ou
que a equipe identificou como sendo interessantes.
COMUNIDADE
O coletivo Demos Helsinki existe para pensar questões
urbanas primordiais – como o que nos deixa felizes
Demos Helsinki é um think tank (grupo de estudo e pesquisas) da Finlândia focado em discutir novos rumos para a democracia no século 21. O grupo começou
as atividades em 2005, quando dois amigos que se conheceram na faculdade de filosofia decidiram trabalhar juntos. “Nosso
trabalho fica no meio entre o jornalismo, a
pesquisa acadêmica e uma consultoria política”, diz Roope Mokka, um dos fundadores do grupo. Junto com Simo Vassinen,
também membro do Demos, veio ao Brasil
para dar uma palestra no TEDxAmazônia.
O trabalho do think tank é baseado em
pesquisas científicas. Para escrever The Politics of Happiness – A Manifesto (“A Política da Felicidade – Um Manifesto”, que deve ter tradução para o português em breve), por exemplo, o grupo foi atrás das
mais recentes pesquisas para descobrir o
que torna uma pessoa feliz. Mas também
tem muito de jornalismo, pois tenta divulgar as informações em um formato atraente – como o próprio manifesto. O grupo se parece com uma consultoria ao propor ações práticas de mudança com base
nas informações levantadas.
Em The Politics of Happiness, propõem
que o foco de preocupação dos governos deve mudar da economia para a felicidade. Segundo pesquisas, a partir de uma certa faixa de renda, em que as necessidades humanas básicas estão supridas, mais dinheiro
não traz felicidade. O exemplo é dos Estados Unidos e da Finlândia, que aumentaram
progressivamente o nível de riqueza nas últimas décadas, mas permaneceram com níveis estáveis de bem-estar. “Estudos mostram que somos incrivelmente ruins em
avaliar o que nos faz felizes. Buscamos felicidade em coisas que só nos fornecem descargas momentâneas, e que estão destruindo o
bem-estar das próximas gerações”, diz o manifesto. As cinco propostas para aumentar a
felicidade das pessoas seriam: mais e melhor
tempo livre, lugares significativos, participação na comunidade, criação de uma cultura
do bem-estar e o aprofundamento de nossos relacionamentos com amigos, vizinhos
e família. “O Brasil poderia ser uma superpotência da felicidade no mundo”, disseram
Roope e Simo no TEDxAmazônia. A receita
para isso? “Quebrar as barreiras que separam as pessoas.” Por Jeanne Callegari
Roope Mokka e Simo Vassinen, do Demos Helsinki
[40] OLHOS NO MUNDO
O fotógrafo francês JR é um
adepto da grandiloquência. É através de enormes painéis e fotos gigantes espalhadas por cidades do mundo
inteiro que ele mostra seu trabalho –
e dá o seu recado. Ao reproduzir, por
exemplo, retratos de mulheres que lidam todos os dias com os efeitos da
© Foto Demos Helsinki: Bruno Fernandes | Foto Olhos no mundo: Divulgação
[39]
guerra, pobreza e opressão nos muros das periferias de Paris ou nas escadarias do morro da Previdência, no
Rio de Janeiro, ele cria um manifesto-homenagem para que as pessoas
possam enxergar (e se conscientizar)
que essas Mulheres São Heroínas, como diz o nome da sua última mostra
a céu aberto. JR omite sua identidade
e gosta de ser chamado de “photograffeur” – palavra em francês composta
da mistura entre fotógrafo e grafiteiro. Ele, que ganhou o TED Prize 2011,
acredita que a arte precisa estar mesmo é nas ruas, bem mais aos olhos
das comunidades. tedprize.org
E TA PA 2
GN
N
DDEESSIIG
PREENCHIMENTO: Agora é hora de
colocar a matéria-prima triturada
e misturada com o micélio em um
molde com o formato do produto
final. Exemplo: o molde dos protetores de quina para embalagens
[41] EMBALAGENS SUSTENTÁVEIS
Tóxicas e quase impossíveis de se decompor
na natureza, elas já foram o vilão da ecologia,
mas estão sendo redimidas por novos materiais
Por Jeanne Callegari | ilustração Marcelo Bucaretchi
E TA PA 1
Q
uem fica com consciência pesada
ao pegar uma sacolinha de plástico
no supermercado já sabe: embalagens são
um dos grandes vilões da sustentabilidade
hoje. Se feitas de plástico, representam um
material que demorará mais de 400 anos
para se degradar no ambiente, se não reciclada. Outro material, o isopor, demora
apenas oito anos, porém sua reciclagem é
cara e dispendiosa. Em vez de tentar reduzir o tamanho das embalagens para diminuir seu impacto na natureza, algumas
empresas estão partindo para uma abordagem diferente: usar materiais feitos a
partir de matérias-primas biológicas, que
possam ser decompostas na natureza, para fabricar de sacolas, caixas e outros itens
de proteção a objetos. Um exemplo são os
bioplásticos. Feitos em geral de sobras
da agricultura, como fécula de mandioca, batata, milho ou cana-de-açúcar, esses
biopolímeros têm características similares
aos plásticos comuns, mas podem ser jogados na natureza, onde irão se decompor
e até ajudar a tornar o ambiente mais fértil, pois, como são feitos de material orgânico, servem como adubo para as plantas.
“Três princípios devem governar a criação de materiais melhores. Em primeiro,
eles devem poder ser criados em todos os
lugares do planeta. Segundo, eles devem
requerer bem menos energia que os atuais para ser produzidos. Terceiro, eles devem poder ser descartados pelo maravilhoso sistema de reciclagem open-source
que é a natureza”, disse, em uma palestra
da conferência californiana TED, feita para divulgar ideias inovadoras, Eben Bayer,
criador da Ecovative, empresa que usa o
micélio dos cogumelos no lugar do plástico (veja no infográfico ao lado).
MATÉRIA-PRIMA: Resíduos descartados pela agricultura servem
como matéria-prima. De preferência, são produtos da região. Na Espanha, sementes de soja; na China,
rebarbas de algodão
𰁳
𰁳 F
UNGO
A empresa Ecovative usa o micélio, parte
do cogumelo responsável pela sustentação
e absorção de nutrientes, como cola para
os resíduos de agricultura, que formarão um
material forte e resistente, que substitui o isopor
R e c i c l e
E TA PA 5
𰁳
𰁳 M
ILHO
Junto com a USP,
a Biomater, de São
Carlos (SP), desenvolve
embalagens a partir
de resíduos do milho
𰁳
MA
NDIOC
A
A fécula de mandioca
é usada pela brasileira
CBPAK na fabricação de
pratinhos de isopor para
colocar alimentos
𰁳
𰁳 B
ATATA
A batata também é
usada pela Biomater
e por outras empresas
como a Cereplast,
para fazer sacolas etc.
𰁳 ALGA 𰁳
Mas a aposta da
americana Cereplast
está nos bioplásticos
a partir de algas, ainda
em desenvolvimento
DESCARTE: Depois de usado, o objeto de micélio é facilmente descartado. Pode ser colocado no jardim
como adubo, usado em composteira ou mesmo descartado no lixo,
pois se decompõe rapidamente.
E TA PA 3
CRESCIMENTO: O micélio vai
crescer e dar a “liga” entre os resíduos biológicos que servem como
matéria-prima. É aqui que a mágica acontece, pois o fungo é que
está fazendo o trabalho
E TA PA 4
PRODUTO: Aqui temos o produto
final, como um berço para embalagens que substitui o isopor ou um
bloco para construção. O produto
de micélio é adequado para embalar
coisas pesadas, como TVs
DESIGN
[43]
D
esign sem desperdício de material, sem sobras, não-prejudicial para os seres humanos e para as outras espécies. Essa é a ambição do químico alemão Michael Braungart, que, junto com o arquiteto William McDonough, escreveu o livro Cradle to Cradle –
Rethinking the Way We Make Things (“Do berço ao berço – Repensando a maneira como
fazemos as coisas”, sem tradução em português). Para a dupla, não devemos tentar fazer
design com menos impacto na natureza. Ao contrário: devemos celebrar a abundância,
por meio de uma forma completamente diferente de pensar o design, usando novos materiais e descartando a ideia de “jogar fora”. Braungart esteve no Brasil para a conferência
TEDxAmazônia em novembro. Confira nossa entrevista com ele. Por Jeanne Callegari
Em seu livro, você fala da ideia de eliminar o conceito de “resíduos”. Como é
possível fazer isso, por meio do design?
Essa seria a forma normal. Ter resíduos é
falha de design, é uma sobra que não deveria existir. Quando as pessoas compram um
produto, o que elas querem é a experiência
ou serviço que aquele produto proporciona;
mas hoje, quando elas compram, elas levam
também as sobras, material para descartar
depois, como a carcaça de uma televisão ou
embalagens. Não é justo fazer as pessoas terem sobras quando tudo que elas querem é
um serviço. Para mudar isso, é preciso não
ficar pensando em diminuir o gasto de materiais, mas repensar completamente o design de um produto, de forma que ele não
gere nenhum resíduo. Precisamos perguntar
o que as pessoas realmente querem de um
produto. Perguntar: qual o propósito disso
que estou criando? Aí podemos usar os melhores materiais e fazer projetos melhores.
Vocês falam em design “berço a berço”. Como isso funciona na prática, e
em que isso é diferente do conceito
“berço a túmulo” que existe hoje?
Os produtos hoje são feitos para ser jogados fora. O planeta é um cemitério de coisas. Reciclar é apenas uma forma de mandar
as coisas um pouco mais tarde para o cemitério. Nós temos sistemas biológicos de
design – como uma árvore, por exemplo –
e sistemas técnicos. Quando fazemos uma
TV, temos que garantir que os sistemas téc-
[44]
O que significa fazer um design baseado na abundância?
Se você olha para uma cerejeira, ela não
se reprime: não há redução, apenas abundância. Não estamos falando de fazer menos mal, de reduzir impacto. Isso nós já temos bastante. Trata-se de fazer o bem. Eficiência é diferente de eficácia. Uma cerejeira
tem milhares de flores; isso não é eficiente.
Mas é extremamente eficaz. Outro exemplo
é o do namorado que chega atrasado para
um encontro, mas que, quando chega, traz
um enorme buquê de flores: as flores não
são eficientes, mas são eficazes para aplacar a ira da namorada. Falamos de produtos que não precisam ter seu consumo reduzido, pois quanto mais deles você tiver, melhor. Um prédio que gere energia para a cidade, que descarte água mais limpa do que
antes, que deixe o solo mais rico e produtivo,
que deixe o ar mais limpo, por exemplo. Um
prédio que seja como uma árvore.
A EcoChapa permite preparar suas refeições com
uma pegada muito mais sustentável. A tecnologia está no
sistema de fogareiro, que consegue produzir 40 minutos
de chama com apenas 100 ml de álcool – energia limpa e
renovável, que ainda é derivada da cana-de-açúcar, uma
planta abundante no nosso país. O carvão das churrasqueiras tradicionais exige o desmate de árvores para ser
produzido, além de liberar mais gás carbônico quando
consumido pelo fogo, agravando o acirramento do efeito
estufa e o aquecimento global. homesteel.com.br
[45]
nicos não vão para os sistemas biológicos,
porque é ruim para eles. Quando as pessoas fazem janelas, por exemplo, usam químicos fortes na tinta que tornam muito difícil reciclar aquele material. Elas fazem assim
porque é mais barato. A maioria dos produtos hoje não foi feita para ser reciclada.
E mesmo isso não seria suficiente. O ideal
é o conceito de upcycle: criar produtos que
deixem o planeta mais limpo que antes, que
não sejam neutros em carbono, mas positivos em seu impacto na natureza.
© Foto Ecochapa: Divulgação; Ilustração: Luciano Veronezi; Foto Aspiradores: Divulgação
[42]
O alemão Michael Braungart propõe uma nova forma
de lidarmos com o design: sem desperdícios, usando
novos materiais e aproveitando a abundância dos recursos
Para cada folha que você imprime,
dois recursos naturais precisam ser retirados do meio ambiente: árvores, usadas para fazer o papel, e petróleo, matéria-prima da tinta dos cartuchos. Nenhum deles, porém, é gasto para imprimir na PrePean, essa impressora que
usa um sistema térmico para gravar
textos e imagens em folhas plásticas. À
prova d’água, as folhas podem ser usadas
mais de mil vezes, já que o calor trata de
apagar a impressão anterior e registrar a
nova. Ainda é um projeto conceitual, mas
que daria um belo alívio para o planeta.
sanwa-newtec.co.jp
O projeto ambiental Vac From
The Sea quer conscientizar as pessoas sobre a contaminação dos mares e
oceanos com a quantidade de material plástico descartado indiscriminadamente nesses ambientes. Para isso, voluntários coletaram plásticos acumulados nas águas do oceano Pacífico,
mar do Norte, mar Mediterrâneo, oceano Índico e mar Báltico que depois
foram usados para criar uma linha de aspiradores conceituais para a Electrolux, empresa que mantém
o projeto. Cada um dos cinco modelos
feitos com plástico dos oceanos representa um dos mares e oceanos onde o
projeto está em andamento. Os produtos não estão à venda – já que a quantidade de material coletada ainda não é
suficiente para suprir uma produção em
grande escala –, mas servem como uma
forma de conscientizar a necessidade de
“aspirar” o lixo que jogamos nos mares.
www.electrolux.com
DESIGN
E
las são pequenas, mas nem por isso precisam ser minimalistas. Costumam ser erguidas com materiais sustentáveis. Isso sem falar que o próprio espaço
que elas ocupam, bem menor que o habitual, já é um sinal de seu potencial verde: geram menos energia, desperdiçam
bem menos, oferecem muito menos espaço para a habitual acumulação de pilhas,
tralhas e outras inutilidades. E são baratas: ninguém vai passar os próximos 30
anos pagando hipoteca por elas, tampouco haverá a explosão de outra bolha imobiliária por sua causa.
A tendência das minicasas, que se alastra pelo mundo a partir dos Estados Unidos (atente ao paradoxo: o país do desperdício é ao mesmo tempo o terreno de
O designer e escritor Jay Shafer
e sua casa de medidas diminutas:
“Menor que muitos closets”
[47]
uma nova consciência ecológica), é a grande novidade arquitetônica e imobiliária
dos últimos anos. Com dimensões próximas às das casas de bonecas – há modelos
que começam em míseros 5 m2 até “mansões” de 78 m2 –, as minicasas têm no designer norte-americano Jay Shafer um de
seus mais famosos apóstolos. Autor do livro The Small House Book (“O livro da
minicasa”, ainda sem edição brasileira,
veja na página ao lado), Shafer percorre
seu país fazendo o catecismo das pequenas dimensões em palestras e workshops.
Ele mesmo, como não poderia deixar
de ser, mora em uma dessas casas mínimas. “Desde 1997 eu vivo em casas menores que o closet de muita gente”, afirma.
The Small House Book,
Jay Shafer
(pode ser encomendado na
www.amazon.com)
[48]
www.tumbleweedhouses.com
© Fotos Tendência minicasas: NONONO | Foto Um pequeno refúgio: Arquivo Pessoal
[46]
Será que é preciso continuar erguendo casas imensas,
com muito mais cômodos que o necessário?
A resposta pode estar na tendência das minicasas
Com a praticidade típica da cultura
ianque, o livro do designer e
construtor norte-americano Jay
Shafer apresenta sugestões – com
as devidas plantas e demais indicações
– de minicasas sobre rodas que
teoricamente qualquer um teria
condições de pôr de pé. A obra de
Shafer, que apareceu pouco tempo
depois da débâcle hipotecária que
assolou os EUA em 2008, tornou-se
uma espécie de bíblia sustentável
por unir a boa consciência ambiental
com um verdadeiro libelo a favor da
economia de meios, materiais e, claro,
dinheiro. E aí, topa erguer a sua?
Um pequeno refúgio
Desde adolescente, sempre tive uma obsessão
arquitetônica que alguns consideravam pouco usual: as estações científicas (ou os postos de observação) de lugares remotos – sendo que as mais conhecidas são as da Antártica. Esses lugares apontavam com frequência
para a existência de uma situação-limite que
me agradava, ao menos na teoria: a ideia de
ficar sozinho, na natureza selvagem, durante um longo período. Queria silêncio, tempo e
(algum) espaço e recriava mentalmente uma
reminiscência da casa na árvore que havia ficado lá na infância, perdida entre os brinquedos de um parque vazio. Já adulto, inspirei-me nesse sonho antigo quando resolvi
construir meu “posto avançado” no sertão da
Barra do Una, região do litoral de São Paulo. Gastei o lápis rabiscando em diversas folhas de papel aquilo que seria meu esconderijo, mas o projeto só tomou forma depois que
conheci o casal de arquitetos Vinícius Andrade e Lua Nitsche. Numa conversa com eles,
acrescentei apenas duas recomendações ao
meu desejo: custo baixo e preservação do
ecossistema. Eles não apenas toparam como
também desenvolveram soluções mais sofisticadas sem alterar a proposta minimalista:
cobertura com pouca inclinação para reter as
folhas e refrescar a habitação; paredes e portas de vidro para transformar a mata na personagem e não só no cenário; e estrutura em
formato de trailer elevada cerca de 1 metro
do chão para afastar a construção da umidade. Foram quatro meses de trabalho e algumas dezenas de picadas de mosquito. Nas
primeiras noites que dormi sozinho por lá,
ainda com a obra inacabada, ouvindo o rumor da mata, compreendi melhor as intenções de Thoreau em Walden. Afinal, quando um homem se mantém aquecido num refúgio como esse, o que é que ele quer mais?
Ricardo Lombardi é jornalista e diretor
da revista VIP.
DESIGN
[49]
A história de perseverança e trabalho de
dona Angelita, uma das líderes da Associação
das Mulheres Rendeiras de Petrolina
[50]
os 66 anos, casada e com quatro filhos, Angelita Maria Santos esbanja vitalidade e disposição. Acorda entre
4h e 4h30 e, além dos trabalhos domésticos e do cuidado com a família, destina
boa parte de seu tempo à Associação das
Mulheres Rendeiras, entidade que ajudou a fundar em 1998 com o objetivo de
gerar oportunidades de renda às mulheres do bairro José e Maria, na periferia de
Petrolina (PE), promover seus direitos e
valorizar a cultura do Vale do São Francisco. Presidente da associação pela terceira vez, Angelita acredita muito no potencial de seu grupo, ainda que tenha de
lidar com dificuldades diversas, como a
falta de financiamento externo, períodos
de pouca demanda de trabalho e a frequência oscilante de várias associadas (que
atualmente somam 35). “Meu marido vive me dizendo que a associação me exige muito”, diz. Pudera. O artesanato que
produzem não se resume ao bordado e a
figuras de inspiração regional; inclui trabalhos com retalhos, fuxicos, roupas e
bonecas, entre outros.
Quando explica por que tanta dedicação a uma causa coletiva, Angelita sempre
se recorda dos pais com muita emoção. A
mãe, parteira, costumava acompanhar as
mulheres antes mesmo do nascimento do
bebê, sempre disposta a preparar um caldo ou um chá, ainda que tarde da noite.
E nunca voltava imediatamente para casa depois do parto. Por isso, era tão querida e requisitada pela comunidade de Exu
(PE), cidade onde Angelita nasceu e viveu
até a juventude. O pai, agricultor, não tinha renda fixa ou salário, mas ainda assim não deixava que a família passasse algum tipo de necessidade, realizando também alguns trabalhos como artesão. “Não
me tornei parteira como minha mãe, mas
Deus me deu outro tipo de parto para re-
alizar, bem mais difícil: lidar com gente,
contribuir para a capacitação profissional de mulheres pobres e a conscientização sobre seus direitos.” Além do trabalho
com as rendeiras, ela também desenvolve atividades com moradores do Assentamento Terra da Liberdade, em Petrolina.
Angelita terminou o ensino médio
em 2008 e fala em fazer faculdade. Três
de seus filhos já estão profissionalmente encaminhados; um deles, inclusive, estuda na Alemanha. “Não podia imaginar
que chegariam tão longe”, conta, orgulhosa. Por Maria Fernanda Vomero
© Ilustração: O Silva; Foto Angelita Maria Santos: Lucí Braga | Foto saco de lixo: Divulgação; Foto interruptor: Tim Holley; Foto EcoATM: Divulgação
A
Design ecoeficiente: os objetos que nos
ajudam a ter uma vida mais sustentável
Tá certo, a maioria das pessoas (ainda bem!) já se conscientizou de
que é preciso viver cada vez mais de forma sustentável, preservar os recursos naturais do planeta e refrear o consumo. Mas como fazer isso na
prática, hein? Mudar hábitos não é uma tarefa fácil, mas há ferramentas que podem nos ajudar a adotar uma vida mais ecologicamente correta. E o design está aí para provar isso. De uns anos para cá, os produtos (e até suas embalagens, diga-se) estão ficando mais “verdes”. “Hoje
a questão da sustentabilidade já se transformou num requisito. Os objetos precisam ser pensados levando em conta a facilidade para fabricá-los, o baixo impacto ambiental e o uso de materiais renováveis”, diz
Cyntia Malaguti, professora de Design e Sustentabilidade do Centro
Universitário Senac. “Tudo como forma de diminuir a agressão ao meio
ambiente.” Não apenas no conteúdo, mas também na forma de consumir os objetos. Não basta ter um produto feito com material reciclado
ou que não polui. “É necessário que o design possa nos incentivar a gastar menos energia, a consumir menos ou a promover o descarte correto
de resíduos. A adotar um modo de vida mais sustentável, enfim”, completa Deyan Sudjic, diretor do Museu do Design, em Londres.
[53]
[52]
Quem é que nunca deixou a luz acesa mais tempo que
o necessário que apague o primeiro interruptor. Foi
justamente para conscientizar as pessoas (e principalmente as crianças) a não gastar energia elétrica demais
que o designer Tim Holley criou o Tio Light System,
um produto tão lúdico quanto educador. Em forma de
fantasma, o interruptor de parede vai mudando de cor
à medida que o tempo passa, mostrando quanto tempo a lâmpada se manteve ligada. Uma forma de criar a
responsabilidade ambiental das crianças desde cedo. E
de forma divertida! timholley.de
[51]
O lixo nas ruas pode acarretar um problema sério
para o planeta – e para as
cidades. Além de entupirem galerias de esgoto e
provocarem enchentes,
resíduos sólidos demoram
muito para se decompor.
Para incentivar a coleta
de detritos, a dupla de designers Wieden+Kennedy
criou sacos de lixo divertidos, como o da foto, que reproduz os saquinhos com peixes
que comprávamos
na infância. Uma
forma irônica de jogar
o lixo. suck.
uk.com
A EcoATM, é uma máquina que funciona
de maneira bem parecida com os caixas
eletrônicos dos bancos, só que, em lugar
do cartão, você só precisa inserir ali um
celular usado para ela devolver dinheiro.
A máquina reconhece o modelo do
aparelho e calcula quanto ele vale. Você pode escolher tirar o dinheiro
na hora ou então apertar um botão
para doá-lo à caridade. Já o celular
é encaminhado para centros especializados de reciclagem. Uma ótima forma de impedir que esses componentes que
poderiam contaminar o meio ambiente acabassem no lixo, né? A primeira
estação foi instalada em Omaha, nos
EUA. A ideia é espalhar as máquinas
– e o bom exemplo
– pelo mundo todo.
ecoatm.com
DESIGN
Concreto verde: o barro que se molda às
novas tendências de construção sustentável
Cerca de 3 bilhões de pessoas moram
ou trabalham em casas de barro. A terra
batida já é conhecida por ser uma alternativa de construção barata e inteligente
há séculos e não apenas as comunidades
mais pobres de áreas rurais se beneficiariam dessa técnica tão econômica quanto
eficaz. A bioconstrução, assim
chamada por designers dispostos a investir em uma proposta sustentável, resgata esse
material já conhecido, que se
molda perfeitamente às necessidades do futuro sustentável do
planeta. O barro propicia que
a umidade seja mantida em
níveis ideais, tanto no inverno quanto no verão. Ninguém precisa ficar refém do
[55]
[56]
ar-condicionado e, portanto, o consumo
de energia pode baixar. Além disso, possibilita a autoconstrução, uma vez que não
depende de ser transportado de um lado
para o outro, como o cimento. Basta terra,
água e o trabalho das mãos para moldar o
barro e garantir a resistência desse “concreto verde”. Arquitetos contemporâneos
e ecoconstrutores estão, agora, procurando grupos étnicos para aprender como é
que se pode trabalhar com o material, como no caso do povo musgum, de Camarões, cujas casas são erguidas com simplicidade quase orgânica, de curvas, ranhuras e telhados cônicos. Os veios externos
ainda contribuem para o escoamento da
água da chuva. Uma técnica antiga que
aponta novos caminhos para a arquitetura moderna. Por Lívia Lisbôa
tão, o hábito de copiar as saídas encontradas pelos seres vivos rendeu inventos como
tintas autolimpantes para carros ou casas,
inspiradas na superfície de folhas de plantas; prédios que dispensam ar-condicionado, baseados na ventilação de cupinzeiros;
e até processos de eliminação de mercúrio,
um elemento químico tóxico, do solo ou
água, a partir do que fazem enzimas usadas por bactérias. Uma das tendências que
mais crescem no design, a biomimética é
perfeita para criar soluções sustentáveis,
com base em tecnologia testada e aprovada pela natureza. Por Roberto Saraiva
[57]
Escola cria novas soluções
a partir de antigos materiais
Aprender com alegria. Essa é a filosofia da Meti, escola localizada na cidade de
Rudrapur, em Bangladesh. Nesse caso, o
aprendizado começou antes mesmo de o
prédio ficar pronto: no próprio processo de
construção das paredes (de barro, palha de
arroz e juta), do teto (em camadas de varas
de bambu) e do jardim vertical da fachada
(que protege as paredes da erosão). Criando
novas soluções de design a partir de antigos
materiais, especialistas e voluntários da Alemanha e da Áustria uniram-se aos artesãos
locais, aos professores, aos pais e aos futuros
alunos para levantar os dois andares do colégio, que fica numa área de 325 m². Persianas regulam a entrada de luz e a ventilação,
e pequenas cavernas moldadas no barro revelam espaços de estudo ou de brincadeira.
Cada porta colorida e cada nome de criança pintado na parede são a prova de um conhecimento profundo do lugar e do significado dos sonhos que moram ali. L.L
Biomimética: baseados na observação da natureza, designers
e engenheiros criam produtos melhores e mais sustentáveis
A natureza atravessou 3,8 bilhões de
anos de seleção natural; nesse tempo, criou
soluções eficazes e duráveis para diversos
problemas. Quando designers e engenheiros perceberam que podiam replicar algumas delas para criar produtos melhores e
mais limpos, surgiu o termo biomimética.
A primeira aplicação dessa lógica data de
1941, quando o suíço Georges de Mestral
levou as sementes que grudavam no pelo
de seu cachorro ao microscópio. Lá, ele viu
que elas tinham hastes com ganchos nas
pontas, especialmente eficazes para agarrar
tecidos. Estava criado o velcro. Desde en-
© Ilustração: Catarina Bessel; Foto escola de barro: Kurt Horbst | Foto colmeia: Divulgação
[54]
A natureza é uma fonte de inspiração para Marko
Brajovic, arquiteto croata radicado no Brasil. Em seus
projetos de design, arquitetura e cenografia, ele procura
aplicar os conceitos da biomimética e assim aproveitar
a tecnologia que a natureza produziu ao longo dos anos. É fascinado, por exemplo, por colmeias
de abelhas, e já fez vários projetos inspirados em sua estrutura, como a criação, para o Sebrae do Mato Grosso,
de um jogo interativo com caixas hexagonais de papelão
reciclado que imitam uma colmeia gigante. Outro projeto de seu escritório foi a proposta de uma ponte-ciclovia
sobre o rio Tietê, que usa a prática da cestaria, comum
para a humanidade desde os tempos pré-históricos, para
fazer uma moldura em torno da ponte sobre rio. Marko
também é o autor do projeto de um auditório flutuante
no meio do rio Negro, em Manaus, local onde foi realizada a conferência TEDxAmazônia, em novembro, no qual
ele foi um dos palestrantes, além de autor da cenografia.
[58]
A empresa americana Qualcomm foi
pioneira ao copiar o sistema de refle-
xão de luz das asas de borboletas
para desenvolver o display portátil mirasol,
que consome uma quantidade mínima de
energia, mas é visível em qualquer luminosidade, até sob o sol forte. O sistema usa
espelhos minúsculos, mil vezes menores
que 1 milímetro, e membranas ajustáveis
para atingir diferentes cores a partir da imagem exibida e da luz ambiente. O backlight, iluminação dos displays convencionais responsável por até metade do gasto
energético das baterias de celulares, é totalmente dispensado no mirasol. Em imagens estáticas, o consumo chega a zero.
DESIGN
[59]
[61]
Através de fotossíntese: projeto criado por estudantes
de Cambridge cria casa cuja energia é alimentada por algas
geneticamente modificadas
Energia solar? Isso é tão anos 1980...
Estudantes da prestigiosa Universidade de
Cambridge, no Reino Unido, criaram uma
casa cuja energia – limpa – é produzida
inteiramente por algas. A “Casa das Algas”,
que conta com algas geneticamente
modificadas para obter mais eficiência no
processo de fotossíntese, é um tremendo
avanço rumo a um futuro com menos
desperdício de energia.
A construção tem uma série de tubos
que abrigam as algas: são elas que, desti-
É como uma nécessaire, mas,
em vez de produtos de higiene e
beleza, você leva seus gadgets dentro.
O Amp Solar Charger tem placas
solares embutidas na sua parte externa
que permitem recarregar celular, MP3
e outros aparelhos eletrônicos. Cerca
de 4 horas de sol são suficientes para
restabelecer a bateria de um iPhone,
por exemplo, que vai protegido dentro
da bolsinha – que ainda é à prova
d’água e vem com adaptadores para
nove tipos de equipamentos portáteis.
voltaicsystems.com
tuídas de enxofre, produzirão o hidrogênio que será convertido em eletricidade.
Mas, para isso acontecer, funcionou o engenho dos pesquisadores, que usam graus
variados de luz (mais intensa no cinzento inverno europeu, mais amena no verão) para estimular as plantinhas. Os responsáveis pelo projeto garantem a energia de uma residência com duas pessoas
com todos os apetrechos modernos (como computador, microondas, TV etc.).
www.algaetecture.com
Pesquisando novas formas de criar eletrônicos que
impactem menos o planeta, a Sony desenvolveu uma linha conceitual chamada ODO, em que os objetos são
fabricados a partir de plástico reciclado e o funcionamento é feito na maioria das vezes através de energia cinética. Além de lúdicos, eles não têm bateria nem precisam
ser ligados na tomada. Entre os produtos “idealizados” está a câmera digital Spin N Snap, por exemplo, que possui
dois orifícios que servem tanto como visor quanto como
carregador: basta girar os furos com o dedo que ela fica
pronta para o clique. Há uma filmadora que usa manivela e até fones de ouvido que precisam dar corda. Desde
2007, a empresa desenvolve pesquisas e produtos para a
linha, que ainda não é comercializada. Mas já indica que,
a exemplo dos antigos relógios do vovô, o futuro dos eletroeletrônicos também pode ser mais analógico do que
poderíamos supor. Por Ellen Kanamori www.sony.net
© Fotos: Divulgação
[63]
[60]
[62]
Sabe quando a bateria do seu celular
acaba e você está longe de qualquer
tomada? Pois o Wind-up Multi Mobile
é um carregador que não te deixa na
mão. É só dar corda que ele abastece
seu celular sem gastar 1 kW de energia
sequer. Girando numa velocidade de 2,5
voltas por segundo durante 3 minutos,
você ganha cerca de 10 minutos para
falar. Ele ainda é compatível com
celulares de diversas marcas. À venda só
na Europa. www.iwantoneofthose.com
O escritório de arquitetura
e design americano Forrest
Fulton propôs uma nova
forma de integrar residências,
comércio e espaços verdes na
cidade de Yerevan, na Armênia.
Batizado de Lace Hill, o
projeto vai na contramão dos
grandes espigões espelhados
que dominam as cidades e
imagina um edifício aberto
ao entorno, numa proposta de
conectividade com o contexto:
apaisagemhistóricaaoredordo
monte Ararat. Os 85 mil m2 dessa estrutura multifuncional
pretendem unir praticidade, sustentabilidade e atração
visual. A parte externa da colina é coberta por vegetação
nativa, irrigada com a água reutilizada do prédio, e atua
como um conjunto de observatórios, com espaços flexíveis
sem colunas ou vigas, criando uma variedade de pontos de
vista para a paisagem. Os espaços abertos dessa superfície
promovem a circulação de ar e a passagem de luz natural.
Pedestres e ciclistas teriam acesso ao morro; já o tráfego de
veículos seria limitado a um estacionamento totalmente
subterrâneo, com saída para uma rodovia, que liga Lace
Hill às cidades adjacentes. Um exercício de futurologia
verde, como alternativa a um modelo de desenvolvimento
tradicional. Por Lívia Lisbôa forrestfulton.com
[64]
Desligar o monitor ao sair é
uma boa forma de economizar
energia. Mas nem sempre só apertar o
botãozinho pode significar uma contenção
de eletricidade. O Eco Button é um
aparelhinho que pode ajudar nessas horas:
basta ligá-lo ao computador pela entrada
USB e pressioná-lo toda vez que atender
uma ligação, ir para uma reunião etc. Seu
computador entra automaticamente no
modo mais econômico de energia sem ter
que reiniciar ou hibernar (o que, às vezes,
pode significar perder alguma coisa).
O software do aparelho
ainda calcula quanto de
energia, gás carbônico
e dinheiro você
economizou durante
o período.
eco-button.com
DESIGN
Uma caçamba nem sempre
é uma caçamba. Não na mente
criativa do artista Oliver BishopYoung, que passeia pelas ruas
procurando novas formas de interagir com os objetos que fazem
parte da paisagem urbana. Foi
assim, caminhando pela Union
Street, em Londres, que ele deparou com uma caçamba estacionada e pôs a cabeça para pensar.
“Com uma tábua, criei uma mesa de pingue-pongue que convida
as pessoas a jogar e que questiona
sobre o que elas realmente gostariam de achar no meio da cidade”,
explica. Como forma de interagir
com esse objeto tão característico
nas urbes, ele também criou uma
piscina, um jardim e uma rampa
de skate sobre a estrutura de ferro. “É uma maneira de explorar
melhor o que a cidade nos dá.”
oliverbishopyoung.co.uk
© Fotos: Tomas Valenzuela
[65] (RE)DESCOBRINDO A CIDADE
MOBILIDADE
[66] PARQUE DAS MAGRELAS
LOJINHA
Pisca-piscas, coletes refletivos,
capacetes, bagageiros: a lojinha de um
centro de facilidades para ciclistas seria
acessível, com bons preços e produtos
voltados para o ciclista urbano.
Um centro de facilidades ideal para guardar as bicicletas na cidade
Por Jeanne Callegari | Ilustração Luciano Veronezi
ESTACIONAMENTO
O bicicletário em si é a estrela da festa.
Nada como ter um lugar coberto e
seguro para deixar as bicicletas durante
o dia, sem ter que se preocupar com
roubos. Ganchos no teto otimizam o
espaço e permitem que mais bicicletas
sejam colocadas no mesmo lugar.
OFICINA
A oficina mecânica deve praticar preços
baixos, para democratizar o acesso ao
serviço. Regular as marchas e os freios,
consertar partes quebradas e mesmo fazer
uma revisão geral não deve ser caro.
VESTIÁRIO
COM CHUVEIRO
Importantíssimos para
quem quer usar a bicicleta,
mas não quer chegar ao
seu destino suado. Uma
opção para quem quer
pedalar distâncias maiores,
todavia não tem vestiário
no trabalho.
CAFÉ
Um local para beber água, cafezinho
ou fazer um lanche – principalmente
se a distância percorrida for grande.
O local também serve de ponto
de encontro para os ciclistas.
INTEGRAÇÃO COM
TRANSPORTE PÚBLICO
Um bom bicicletário fica perto, ou
junto, de uma estação de metrô ou
trem. Assim as pessoas podem deixar
as bicicletas e terminar de chegar de
transporte público a seus destinos.
À medida que aumenta o uso de bicicletas nas cidades, cresce a necessidade de estruturas que facilitem a vida do ciclista, como um bom lugar para deixar as magrelas. A arquiteta Annie Scheel ganhou uma competição de design sustentável em
Delaware, nos EUA, com a proposta de transformar um antigo estacionamento em
um centro de facilidades para ciclistas na Filadélfia, com restaurante, vestiário, loja,
aluguel de bicicletas e um estacionamento para as bicis. No Brasil, um projeto semelhante já está em funcionamento desde 2001, em Mauá (SP). É a Ascobike, associação de ciclistas criada por um funcionário da Companhia de Trens Metropolitanos (CPTM) que tinha a missão de dar um jeito nas bicicletas paradas em frente à
estação de trem. Com espaço para 1700 bicicletas, a Ascobike é o maior estacionamento para bicicletas das Américas e oferece também chuveiros, oficina de reparos, empréstimo de bicicletas, café e água, apoio jurídico e assistência social.
© Consultoria: Luiz Iria e Eber Evangelista
Bicicleta guardadinha em segurança
ACESSIBILIDADE
Locais para estacionar as bicicletas que sejam
mais fáceis de usar para idosos, grávidas e
pessoas com deficiência ou com mobilidade
reduzida. Os espaços para parar as bikes
ficam no chão, não em ganchos no teto.
ALUGUEL DE BICICLETAS
Para turistas ou quem ainda não tem
uma bike. O local pode ser integrado a
um sistema de bicicletas públicas, como
o Vélib, da França. Também pode emprestar
bikes para quem deixou a sua na oficina.
MOBILIDADE
“Como é possível que tantos de nós
comecemos a trabalhar com as melhores
intenções e mesmo assim acabemos contribuindo para um mundo que brutaliza
tantas pessoas?” Essa foi uma das questões levantadas por Chris Carlsson, escritor, editor e ativista do espaço público, na conferência TEDxAmazônia, que
reuniu em Manaus, em novembro, palestrantes do mundo todo para discutir o tema “qualidade de vida para todas as espécies”. Morador de São Francisco, na Califórnia, Chris foi o fundador da Critical
Mass (“Massa Crítica”), um encontro de
ciclistas que se reúnem na última sexta do
mês para pedalar pela cidade e celebrar a
ocupação do espaço urbano, e que se espalhou para o mundo todo. Hoje, a Massa
Crítica existe em mais de 300 cidades do
mundo, inclusive no Brasil, onde é conhecida como Bicicletada. O movimento começou de forma simples: em 1992, Chris,
que já era ativista preocupado com o espaço público da cidade, decidiu fazer uns
panfletos e convidar as pessoas para a pedalada. Não sabia se alguém iria aparecer,
mas 72 pessoas foram. E no mês seguinte
mais pessoas, e assim a cada mês. “A Critical Mass fez com que mais pessoas passassem a usar a bicicleta. Ela é um ponto de
referência e de encontro, a partir do qual
outras estruturas se formam, como ONGs
pró-bicicleta, grupos de pedal, encontros
com interesses mais específicos”, diz.
Autor de seis livros, Chris é um historiador da contracultura nos Estados Unidos, especialmente de São Francisco. Ele
não milita apenas na causa da bicicleta:
projetos de jardinagem comunitária, de
ocupação do espaço público e de comunicação horizontal fazem parte do seu escopo de pensamento e ativismo. Um de
seus livros, Nowtopia (“Utopia do agora”), fala das pessoas que estão ajudan-
do a fazer uma nova política do trabalho
no mundo: ciclistas, cientistas de permacultura, jardineiros urbanos, pessoas interessadas em combustíveis sustentáveis,
programadores piratas, todas essas pessoas vão além da lógica do mercado e estão mudando, desde já, o mundo, ao levar
uma nova forma de pensar, mais artística,
para seus projetos. “A vida, hoje, está dividida em duas: as coisas que fazemos por
dinheiro e as coisas que fazemos porque
gostamos e acreditamos”, diz. A aposta de
Chris é nessa segunda opção. “São atividades do tipo do-it-yourself [faça-vocêmesmo], mas bem poderíamos chamá-las
de do-it-together [façamos-juntos]. Porque nesses projetos é que criamos conexões e relacionamentos significativos para
nossas vidas”, afirma. Por Jeanne Callegari
68
Nem metrô nem ônibus – veículo sobre trilhos
liga cidades no meio do sertão nordestino
Em pleno sertão do Cariri, no sul do
Ceará, um meio de transporte causa estranheza na paisagem árida: cobrindo os 14
quilômetros que separam Crato e Juazeiro do Norte, um misto de metrô e ônibus
transporta passageiros. Trata-se do primeiro VLT (veículo leve sobre trilho) do Brasil, um tipo de transporte coletivo capaz de
melhorar o trânsito nas cidades sem acarretar tantos malefícios ao ambiente. Além
de mais baratos que os metrôs, transportam muito mais passageiros que os ônibus e são até 93% menos poluentes que
esses. Descendentes dos velhos bondes, es-
© Ilustração: Fabiano Silva; Foto Chris Carlsson: Michael Rauner | Foto VLT: Divulgação | Foto Carro elétrico: Divulgação
[67]
Chris Carlsson
Ativista do espaço urbano, ele acredita que as atividades
mais significativas da vida ocorrem fora do trabalho
69
ses veículos modernos e mais “verdes” devem ganhar espaço também em outras cidades do Nordeste (como Recife, Fortaleza, João Pessoa e Natal, por exemplo), que
já estudam implantar seus VLTs – que circulariam sobre antigas linhas que pertenciam à Rede Ferroviária Federal (RFFSA)
e que estavam abandonadas. Uma forma
sustentável (e barata) de restabelecer essas
rotas e melhorar o transporte dos moradores de toda a região.
Com emissão zero, carro elétrico distribui
correspondência pelas ruas do interior paulista
Desde outubro, um pequeno e curioso carro cinza com uma espécie de caixa
amarela na traseira tem circulado de maneira discreta pelas ruas do Taquaral, bairro residencial de Campinas (interior de
São Paulo). Mas a discrição do carrinho
não diz respeito só aos poucos quilômetros (cerca de 70) que ele percorre diariamente, mas também ao impacto que ele
tem no meio ambiente: por ser um veículo
elétrico, tem emissão zero de gases de efeito estufa. A iniciativa de colocar na rua pe-
la primeira vez um carro totalmente movido a eletricidade para entregas tem a ver
com uma parceria entre a CPFL Energia
e os Correios para a utilização do transporte na distribuição de Sedex. O utilitário Aris foi fabricado especialmente para cumprir essa tarefa: ele tem autonomia
para rodar entre 90 e 120 km e pode levar
até dois passageiros. O carregamento, em
tomada comum, é feito duas vezes ao dia
– e com a vantagem de ser 25% mais econômico que um veículo a gasolina.
MOBILIDADE
Se você não usa o carro todo dia, qual o sentido
de ter um? Não seria melhor dividi-lo com uma pessoa, ou melhor, com várias? Essa é a ideia por trás do
car sharing, ou compartilhamento de veículos. Na
prática, é uma evolução do sistema de aluguel de
carros, com regras mais simples e flexíveis. A pessoa
retira o veículo em uma estação da empresa e devolve em outra, próxima de seu destino final. O sistema
está ajudando a diminuir a quantidade de veículos
das ruas: segundo a Universidade da Califórnia, um
terço dos usuários vendeu o seu após experimentar.
Algumas diferenças em relação às locações normais
são o pagamento por hora ou até minuto usado; a
praticidade, já que a retirada é feita inteiramente pelo cliente; e a comodidade, pois a maioria das empresas funciona 24 horas. “Um cidadão que come-
[ 71]
A Zipcar é a maior empresa de
compartilhamento de veículos no
mundo: presente em 50 cidades da
América do Norte e Inglaterra, tem
6500 carros e detém 80% do mercado americano, com foco nas universidades. A companhia projeta
redução de 15 a 20 carros nas
ruas pelo compartilhado. Na
França, a prefeitura deve lançar em
2011 o Autolib, sistema de car sharing inspirado no Vélib, o programa de bicicletas públicas de Paris.
O projeto deve estrear com uma
frota de 3 mil carros elétricos, que
poderão ser retirados nas 700 estações pela cidade, ao custo de 15 euros anuais (34 reais) mais 8 euros
(18 reais) pela hora rodada. R.S.
ce a utilizar um carro alugado dessa forma tende a
alterar padrões conceituais de mobilidade”, considera Creso Peixoto, mestre em Engenharia de Transportes e professor da Fundação Educacional Inaciana (FEI). Em troca de não precisar arcar com impostos, manutenção, depreciação de até 8% ao ano
e ainda ganhar seguro e combustível (inclusos na tarifa), a pessoa paga uma mensalidade ou anuidade.
Comparando-se os custos, o car sharing sai mais barato, segundo Peixoto. O primeiro projeto com um
sistema semelhante ao atual foi o Witkar, que durou de 1974 a 1986 em Amsterdã e foi fundado pelos criadores do plano de bicicletas brancas públicas
da cidade. Mas a ideia só ganhou força e gerou lucro
a partir dos anos 90, com a maior preocupação com
a natureza e a economia. Por Roberto Saraiva
[72]
O Brasil já tem uma empresa especializada em car
sharing: a Zazcar, que começou
a funcionar em julho de 2009, em
São Paulo. A empresa é a primeira da América Latina a apostar no
compartilhamento de veículos como solução para as metrópoles
brasileiras. Para usar o serviço, basta fazer um cadastro pelo site ou
pelo call center. Os planos são flexíveis: é possível escolher por quantas vezes por mês se quer alugar o
veículo. Aí, é só fazer a reserva, desbloquear o carro em um dos PODs
(pontos de estacionamento) e pegar as chaves para fazer o programa escolhido e sair andando pelas
ruas. R.S. www.zazcar.com.br
© Ilustração trem: Marcio Fujii | Foto Fusca: Christian Castanho; foto fila: David Young-Wolff/Getty images | Foto barquinho: Macelo Zocchio
[70]
Car sharing é uma forma inteligente de usar o carro na
cidade: em vez de ter um, você só aluga quando precisa
[73]
Uma viagem de São Paulo ao Rio de Janeiro em pouco mais de uma hora e meia,
sem trânsito ou voos. Esse é um dos pontos
altos do Trem de Alta Velocidade (TAV),
um projeto com extensão de 520 quilômetros que teve o edital de licitação lançado em julho deste ano. O plano é ligar
Campinas, São Paulo e Rio de Janeiro com
composições que podem chegar a 350 quilômetros por hora. Com o custo total de
33,1 bilhões de reais – em uma união de investimentos privados, participação estatal
e financiamento público –, a linha terá entre sete e nove estações. A intenção do governo é deixar o TAV pronto para a Olimpíada de 2016. Mas estudos mostram que
as obras podem levar até seis anos – o leilão para as empresas interessadas em participar da licitação está previsto para abril de
2011. A demanda é estimada para 89 mil
passageiros por dia. Por Ainá Vietro
[75]
Teleféricos: novo transporte
para quem mora na favela
Visto muitas vezes (equivocadamente) só como um
transporte para locais turísticos, os teleféricos podem ser
uma ótima alternativa para deslocamentos em terrenos
acidentados, como no caso do Complexo do Alemão, no
Rio de Janeiro. A comunidade foi erguida em cima do
morro de forma desordenada, onde a instalação de outros meios de transporte seria bastante difícil. Por isso,
a inauguração de um teleférico que começa a operar na
região a partir do início do próximo ano pode resolver
um problema de deslocamento para os 100 mil moradores dessa comunidade. Ligando Bom Sucesso à favela da
Fazendinha, o trajeto, que costuma ser feito em uma hora a pé, poderá ser feito em pouco mais de 10 minutos.
Serão seis estações que poderão atender 30 mil passageiros por dia, possibilitando o acesso da população às suas
próprias casas – se o tráfico não impedir, claro.
[74]
Os moradores de São Paulo não imaginam, mas poderiam cruzar a cidade em
barcos em vez de ficarem presos nos engarrafamentos das marginais. O arquiteto
e urbanista Alexandre Delijaicov, professor
da USP, pesquisou a origem das propostas
de transporte fluvial, que datam do fim do
século, e chegou a um projeto para o setor. Segundo o plano, a capital paulista
contaria com 600 quilômetros de
canais navegáveis, ligando os rios Tietê, Pinheiros e Tamanduateí e as represas
Billings, Guarapiranga e Taiaçupeba. Para
Delijaicov, isso seria apenas resgatar uma
vocação local. “Onde hoje fica São Paulo,
os portugueses encontraram aldeias indígenas interligadas pelos rios”, diz. A mudança veio em 1930, época em que tanto
o Tietê quanto o Tamanduateí eram navegáveis. O urbanista culpa o prefeito Prestes
Maia, que governou de 1938 a 1945, pela
mudança de paradigma que transformou
canais em avenidas como a 9 de Julho e 23
de maio e eliminou 4 mil quilômetros de
riachos e córregos e o dobro de margens
para o lazer. Se o caminho escolhido tivesse sido outro, o município teria hoje parques fluviais, assim como os existentes em
metrópoles como Paris, Londres e Amsterdã. Para o arquiteto, só o transporte fluvial de carga como entulho e lixo das estações de tratamento de esgoto já viabilizaria financeiramente o projeto, que teria
um custo de 1 bilhão reais e levaria cerca
de 20 anos para ser concluído.
concluído R.S.
R S.
MOBILIDADE
Ainda no século 19 os parisienses inventaram a figura do flâneur, esse passeador urbano, despreocupado, que (e daí
vem o termo) flana pelos bulevares de
uma grande cidade. Experimente bancar
essa figura em uma cidade brasileira e sair
levinho por aí, olhando o horizonte (isso quando há horizonte), sem se preocupar com cada passo que der: o menos grave que poderá acontecer será um tropeço.
Mas há casos de pernas quebradas e outras encrencas mais graves.
Com raras exceções – zona sul do Rio
de Janeiro, avenida Paulista em São Paulo e mais uns poucos lugares –, o estado e
a fluidez de nossas calçadas não são uma
preocupação dos governantes. Tampouco
dos cidadãos, que esquecem sua importância inclusive como elemento de sociabilidade (lembra quando as pessoas ficavam
conversando nas calçadas? Pois é.).
Aí é o caminhão que estaciona no meio
do passeio público, o lixo acumulado entre
o poste e o meio-fio, a banca do camelô entre o poste, o orelhão e o portão do prédio.
Como passar? É com esse mote que
o jornalista Eduardo Nasi, morador do
Brooklin, na capital paulista, participa de
uma página no Flickr com verdadeiros
flagrantes de descaso urbanístico com
essa figura cada vez mais rara, o cidadão
que caminha. “A intenção não é fazer uma
denúncia e recriminar os vizinhos. Porque
o problema é geral, é cultural, a gente
deixou de ver a calçada como um lugar
bacana do bairro. As pessoas não fazem por
mal. Quando elas se dão conta do que estão
fazendo, se constrangem. Pedem desculpas.
E tomam providências de verdade”, diz.
Por Leandro Sarmatz
“Eu costumo dizer que o problema da falta de acessibilidade é o
menos complicado: se não tem rampa em um determinado local, um pedreiro e um pacote de cimento poderiam resolver a
situação, certo? Mas não adianta ter a rampa se muita gente não sabe ou não se
importa com a necessidade que ela representa para quem precisa dela. Ou mesmo a vaga reservada em estacionamento, bem como o piso tátil e qualquer outro
recurso para uma pessoa com deficiência ou mobilidade reduzida. Muita gente
não conhece a lei, não tem informação sobre o tema. E aí nasce um outro obstáculo do qual precisamos tentar desviar: o preconceito. Conseguimos grandes conquistas em São Paulo porque realizamos um trabalho de sensibilização. Hoje já
colhemos frutos dele, mas ainda falta muito.” Depoimento a Lívia Lisbôa
[77]
Mara Gabrilli, eleita deputada federal, é tetraplégica há 15 anos. Criou a ONG
Projeto Próximo Passo, que promove pesquisas para a cura de paralisias.
© Fotos cidade: Eduardo Nasi | Foto Mara Gabrilli: Lailson Santos | Foto Paulista: Diego Martins | Foto Brasil para todos: Acervo PEPE/Pinacoteca
[76]
Circular pela cidade
deveria ser um direito de todos. Mas e quando
as calçadas se transformam em armadilhas?
[78]
Paulista para todos: uma das principais e mais emblemáticas ruas
de São Paulo se torna ainda mais democrática – e acessível!
A avenida Paulista é um exemplo de acessibilidade às pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida. Isso graças a adaptações por que a
mais conhecida via paulistana passou em seu passeio público (que substituiu o mosaico por placas de concreto armado), pelo posicionamento do mobiliário urbano (bancas de jornal, lixeiras, floreiras) e pelo conceito de acesso. Foram
55 mil m² de área revitalizados para democratizar ainda mais esse espaço tão plural da metró-
Quando Andrea Schwarz foi parar em uma cadeira de rodas, há 12 anos, por causa de uma malformação congênita na medula, percebeu a dificuldade de continuar frequentando os mesmos restaurantes,
cinemas e shoppings. Foi então que resolveu criar o Guia Brasil Para Todos, iniciativa de mapear as dez capitais brasileiras
mais procuradas por turistas na perspectiva da acessibilidade,
da segurança e da autonomia. Cada estabelecimento indicado
é visitado por um turista com deficiência, acompanhado de um
jornalista. Assim, além das informações que um guia comum
oferece, ainda está registrada a existência de rampas ou elevadores, de suítes adaptadas, de balcões de check-in rebaixados,
de espaço para circulação nos salões de restaurante etc. A infraestrutura turística de cidades como Manaus, Fortaleza, Recife, Salvador, Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte,
Curitiba e Florianópolis ainda são registrados na forma de depoimentos por seus próprios moradores, que avaliam se sua cidade é receptiva de verdade. L.L. www.brasilparatodos.org
[79]
pole, que ganhou 120 guias rebaixadas, gradis de
proteção nas esquinas e pisos podotáteis de alerta a pessoas com baixa visão ou cegas. As bancas foram realocadas e os pisos nivelados, para acabar com os degraus. Por ali, também, passa uma frota de ônibus adaptados e táxis acessíveis – ainda desconhecidos por muitas pessoas.
Uma forma de integrar os habitantes da cidade e
permitir que a avenida seja, realmente, um espaço para que todos possam ir e vir. Por Lívia Lisbôa
MOBILIDADE
[80]
Morar perto do trabalho, para quem vive nas grandes
cidades, pode ser uma baita mão na roda
S
e para o personagem Brás Cubas, do
romance Memórias Póstumas de Brás
Cubas, de Machado de Assis, a felicidade
era um par de botas, para quem mora nas
grandes metrópoles de hoje ela pode ser algo tão simples como morar perto do trabalho. Estudos mostram que o tempo gasto para chegar ao trabalho é estressante e
uma das maiores causas de infelicidade dos
dias de hoje. Uma pesquisa chamada Stress
That Doesn’t Pay: The Commuting Paradox
(“Stress eu não se paga: o paradoxo das viagens para o trabalho”), dos pesquisadores
Alois Stutzer e Bruno Frey, da Universidade
de Zurique, na Suíça, mostram que quanto
mais tempo as pessoas gastam no trajeto ao
emprego, menor é seu bem-estar. A ideia de
morar em uma casa grande em um subúrbio afastado da cidade pode parecer tentadora, mas, na prática, é pouco sustentável (muito gasto de combustível, trânsito)
e não ajuda ninguém a ficar bem. Isso porque nos acostumamos rápido com a paisagem do ambiente em que moramos, o que
faz com os benefícios logo deixem de ser
valorizados. Em compensação, o stress de
pegar trânsito todo dia e gastar horas para
chegar ao escritório nunca passa.
© Foto Morar perto do trabalho: Kelvin Murray/Getty Images | Ilustração: Catarina Bessel | Foto DPS2000: Divulgação Prefeitura de Jaú
81
Quem tem iPhone já pode compartilhar os caminhos que faz sobre a bicicleta através de suas redes sociais.
O SocialBike é um aplicativo gratuito, desenvolvido pela Yahoo! Brasil, que permite registrar as rotas (através do GPS), as fotos do trajeto (publicadas no Flickr) e os vídeos dos passeios. Basta baixar a ferramenta e sair
pedalando: o programa automaticamente identifica quando o usuário está em movimento e dá informações como velocidade e a distância percorrida.
Depois, você decide se posta tudo no
Twitter, no Facebook ou no Meme. Suas aventuras ainda podem ser compartilhadas no site, que traz informações
sobre a segurança dos ciclistas, dicas
de trânsito, manual de primeiros socorros e agenda de eventos. Por Lívia Lisbôa
yahoo.com.br/socialbike
8
83
82
Para ajudar os usuários a se locomoverem nas cidades usando os transportes públicos, o programador Stefan Wehrmeyer criou o Mapnificent, uma ferramenta que recebe dados de várias metrópoles e, com busca
integrada do GoogleMaps, mostra quão longe e quanto
tempo leva para se deslocar com esses meios mais baratos e sustentáveis. Basta marcar um endereço no mapa, deslizar o marcador de minutos para um ponto específico e, então, visualizar a área que você é capaz de
alcançar. O site ainda está em modo de teste – usuários
de 20 cidades ao redor do mundo (incluindo Londres e
Berlim) já estão testando a ferramenta, que ainda não
tem previsão para englobar cidades brasileiras. Mas que
pode ser uma forma eficiente e prática de ajudar os moradores a se deslocarem. L.L. www.mapnificent.net
A cidade de Jaú, no interior de São Paulo, é pioneira na implantação de um sistema que visa garantir maior autonomia a deficientes visuais em transportes públicos. O DPS2000 é um
equipamento que funciona através de radiofrequência, permitindo
ao usuário acionar a linha de ônibus que pretende utilizar e alertar o
motorista a 100 metros da parada. O código da linha é gravado no
aparelho transmissor que, ao ser ativado, emite um sinal de rádio. Ao
estacionar no ponto, uma gravação automática informa o número
da linha repetidas vezes, até que o usuário embarque; assim ele não
corre o risco de errar. Os motoristas de 61 ônibus da frota urbana do
município receberam treinamento no início de novembro. “Já estamos em acordo com as cidades de Rio de Janeiro, Porto Alegre e Niterói, para um teste-piloto”, afirma Tiago Buccini, um dos sócios da
Geraes Tecnologias Assistivas, empresa que criou a tecnologia. L.L.
MOBILIDADE
Perfeitas para circular por nossas ruas,
a bike fixa arrebanha adeptos sem parar
Um jeito diferente de pedalar: conhecidas
lá fora há algum tempo, as bicicletas fixas começam a se tornar populares também no Brasil. Trata-se de uma forma diferente de encarar a magrela: como tem a
transmissão fixa, a bicicleta só anda quando se move o pedal, ou seja, não é possível
parar de pedalar. Com apenas uma marcha e, em alguns casos, com freio apenas
no pedal, a relação do ciclista com a bici-
cleta é bem diferente. Perfeitas para andar
na cidade, por serem leves e fáceis de controlar no trânsito das metrópoles, as fixas
têm ganhado cada vez mais adeptos por
aqui. Em São Paulo, já há até uma loja especializada nesse tipo de bicicleta: a Tag
& Juice, no bairro da Vila Madalena, onde é possível montar a bicicleta, comprar
acessórios e também ver exposições de arte relacionadas ao universo urbano.
[86] TODOS EM UM
85
Não é uma moto, mas também não chega a ser um carro. Ideal para
as grandes cidades, onde o espaço é cada vez mais reduzido por causa
de tantos autos nas ruas,
r
esse veículo individual funciona com
eletricidade – o q
que poupa o meio ambiente, já que usa menos
da metade de energia
en
que a maioria dos carros híbridos à venda hoje. Feito com três rodas (para manter boa estabilidade),
chega à velocidade de 112 km/h e tem autonomia
para percorrer 50 quilômetros sem precisar ser reca
carregado. E vem completo: com bancos ajustáveis, CD player, cinto de segurança e outros
opcionais. Tudo isso com pouco menos de 1,3
m
metro de comprimento por 1,2 metro de altura.
ww
www.hammacher.com
© Foto Bike fixa: Divulgação | Foto Veículo individual: Divulgação
[84]
O artista e fotógrafo sueco Michael Johansson tem uma obsessão
por agrupar e empilhar coisas. Seu desafio é criar instalações únicas a partir
de uma série de objetos. “É como brincar de quebra-cabeças”, diz. Mas, em
vez de peças, ele usa objetos que coleta
em visitas a mercados de pulgas, peças
que encontra em suas andanças e que
ganha de amigos, como móveis, brinquedos e outras quinquilharias. Mas
não se trata de porcarias, ele garante.
“Seriam objetos que iriam para o lixo,
mas que procuro usar pela história que
carregam.” Assim, ele garante, as obras
ficam mais autorais. Na instalação acima, ele resolveu aumentar as escalas e
usar elementos de transporte, como
um trator, contêineres, um antigo trailer de família e até o carro velho de um
amigo. michaeljohansson.com
CORPO
sustentabilidade
[87] NO PRATO
Cada vez mais o que comemos indica quem somos
– e como agimos no mundo. Conheça algumas
tendências alimentares que vão passar pela sua mesa.
Por Rafael Tonon
COMPRE LOCAL
1
Os alimentos locais são mais frescos e saudáveis que os encontrados em vendas e
supermercados, que normalmente precisam de muitos aditivos químicos (conservantes, etc.)
para aumentar a durabilidade e mantê-los sem apodrecer até que cheguem a seu destino
e sejam vendidos. Os locais também são geralmente produzidos por pequenos
produtores, o que ajuda a aumentar a oferta de empregos nas comunidades.
Os alimentos cultivados perto da sua casa
tendem a ser mais saudáveis – e sustentáveis.
Eles requerem menos deslocamento, o que
evita a emissão de gases por transporte.
ABERTA A TEMPORADA
2
É preciso lembrar que frutas, verduras e legumes são mais (ou menos)
comuns em cada estação do ano. Respeitar suas épocas é
importante porque eles se tornam prioridade entre os produtores
e são mais saudáveis. Por serem cultivados no período adequado,
eles também são mais abundantes e, por isso, mais baratos.
Respeitar a sazonalidade dos produtos
pode garantir alimentos mais nutritivos
– e gostosos, já que eles têm a época
certa para atingir o auge do seu sabor.
PENSE NO CULTIVO
3
Com a oferta de produtos orgânicos crescendo, novas
formas de cultivo ganham força, como os alimentos
biodinâmicos. Produzidos sem o uso de adubos sintéticos,
o solo onde são produzidos é tratado com chás e
homeopatia e o cultivo é orientado pelas fases da Lua.
A forma como um alimento é
produzido conta muito: tanto para a
saúde quanto para o planeta. Saber
como foi cultivado é o primeiro passo.
ALIMENTO TOTAL
MENOS CARNE
5
As carnes estão perdendo cada vez mais
espaço nos pratos. O semivegetarianismo
prega diminuir o consumo de proteína animal,
sem a necessidade de aboli-la completamente.
© Foto: Tom Schierlitz/Getty Images
ilustração: Marcio Fujii
4
Um mesmo tomate pode ser usado para mais de quatro
preparações diferentes. As sementes podem ser torradas e
moídas, usadas como farinha; a pele desidratada pode finalizar
pratos e deixá-los crocantes; a polpa é ótima para molhos,
enquanto o líquido que sai das sementes pode render uma geleia.
O aproveitamento integral dos alimentos
é cada vez mais valorizado nesses
tempos de sustentabilidade, quando
qualquer desperdício precisa ser evitado.
∞ A tendência já pode ser percebida nos cardápios de restaurantes do mundo
todo, que chegam a preparar suas receitas com até 30% a menos de carne,
o que significa quase 40 gramas a menos de bife nos pratos.
∞ Ações como a do beatle Paul McCartney, que incentiva a tirar a proteína animal da
dieta às segundas-feiras, pode ser uma opção para reduzir – sem eliminar – o consumo.
CORPO
Viver em uma grande cidade está deixando você doente. Essa é a conclusão a
que chegou o médico patologista Paulo
Saldiva, de São Paulo. Coordenador do
Laboratório de Poluição Atmosférica Experimental da Faculdade de Medicina da
USP, ele estudou as consequências da poluição do ar, da contaminação das águas,
da quantidade de ruídos, das inundações
e das ilhas de calor para a saúde de quem
vive nos centros urbanos. O resultado foi
o livro Meio Ambiente e Saúde: o Desafio
das Metrópoles, que acaba de ser lança-
[89]
Para criar pranchas mais sustentáveis, Marcelo Ulysséa voltou o olhar para os antigos surfistas. Afinal,
a adrenalina dos pioneiros não tinha nada a ver com o
poliuretano dos modelos de hoje: feitas a partir de blocos de madeira, garantiam alta performance e a perfeita
integração do surfista com a natureza. Marcelo aprendeu a técnica de fabricação de pranchas de madeira na
Califórnia e criou a Agave Hunter Wood Blanks. Como
os blocos são feitos a partir da madeira seca, retirada da
planta já morta, não há desmatamento. Todo o processo
de fabricação é artesanal e leva de 30 a 60 dias, envolvendo apenas resíduos biodegradáveis, que viram adubo orgânico. L.L. agavehunter.com.br
do pelo Instituto Saúde e Sustentabilidade. A intenção da obra não é alarmar, mas
fazer as pessoas pensarem sobre os males que a vida urbana nos causa, e com os
quais nos acostumamos pouco a pouco.
Em suas pesquisas com poluição atmosférica, Saldiva descobriu que 4 mil mortes
por ano em São Paulo são causadas pela
poluição do ar – é como se cada habitante fumasse um a dois cigarros por dia. E
80% dessa poluição é causada por veículos. Essa é uma das razões por que Saldiva
vai para o trabalho de bicicleta.
Considerando que a indústria da moda
é uma das mais poluentes do planeta
(com a utilização de produtos químicos
e a curta vida útil dos produtos), toda saída
original para diminuir resíduos é válida.
Trabalhando com designers renomados, a
Worn Again aplica a técnica do upcycling
em artigos inusitados como uniformes
e forros de assentos de trem descartados
da Eurostar, ou balões de ar aposentados
pela Virgin. Tudo isso pode virar modernas
jaquetas, bolsas para laptop e acessórios
como protetores de iPod – que são
vendidos pelo site ou em algumas lojas do
Reino Unido, da Noruega e da Alemanha.
A empresa ainda oferece um serviço de
consultoria para grandes empresas que
querem encontrar uma forma sustentável e
rentável de lidar com seus resíduos têxteis.
Por Lívia Lisbôa www.wornagain.co.uk
© Foto Inversão térmica: Edu Garcia/AE; Foto Worn Again: Divulgação | Foto Pranchas: Divulgação; Foto Shwood: Divulgação; Foto Touch: Divulgação
[88]
[90]
De olho no ar: as partículas que você inala sem
perceber fazem mais mal do que você imagina
[91]
[92]
Quando pequeno, o americano Eric
Singer pegava as ferramentas de carpintaria
na garagem do pai e, por molecagem, criava
objetos com os galhos que encontrava na
vizinhança. Um dia, com um graveto, um
par de dobradiças enferrujadas e as lentes
da lojinha da esquina, ele criou seu primeiro
par de óculos com armação de madeira.
Ficou tão legal que a garagem acabou se
transformando na oficina da marca Shwood,
onde hoje são produzidos mais de mil óculos
por mês (com lentes 100% UVA e UVB). “As
armações são de madeira de reflorestamento,
feitas manualmente”, diz Singer. O processo
artesanal e a especificidade de cada madeira
garantem o caráter único das peças. Os
preços vão de 95 a 155 dólares e é possível
fazer encomendas para o Brasil. Por Márcia
Bindo www.shwoodshop.com
Assim que resolveu deixar o universo
da moda, em 1998, a ex-modelo e
ativista ambiental brasileira Zoë Melo
queria trabalhar com algo que pudesse
tocar o mundo e as pessoas. Depois de
algumas incursões no design industrial
e na arte, resolveu fundar a própria
empresa, não por acaso batizada de
Touch, que visa promover produtos
que seguem o ecodesign e que tenham
sido produzidas com matéria-prima de
manejo sustentável. Ela atua como uma
ponte para unir e interligar fornecedores,
criadores e ONGs dispostas a criar peças
que sigam políticas em prol do planeta.
Além de designers consagrados como
Tord Boontje, Takeshi Ishiguru e os
irmãos Fernando e Humberto Campana,
Zoë também auxilia trabalhadores
locais a desenvolverem objetos que
possam melhorar nossa relação com o
meio ambiente. “Quero poder ajudar
as pessoas a pensar uma forma de
construir um novo significado para a
vida do planeta”, diz Zoë, que construiu,
ela mesma, um novo significado para
sua própria vida. zoemelo.com
CORPO
[94]
Andarilho na Amazônia
Para conscientizar sobre a preservação da
floresta, britânico caminha 9,5 km selva adentro
N
o dia 2 de abril de 2008 o britânico Ed Stafford deu, literalmente, o
primeiro passo em uma jornada que iria transformar sua vida. Ele
se tornou o único homem a percorrer todo o trajeto do rio Amazonas
a pé, da nascente nos Andes peruanos até o oceano Atlântico, nas cercanias de Belém. Exatos 860 dias de caminhada depois, ele comemorou
a vitória com uma frase singela em seu blog: “Hoje foi o melhor dia da
minha vida”. Difícil encontrar palavras para narrar a emoção de um feito que o levou 9500 quilômetros selva adentro.
Ex-capitão do exército de seu país (esteve no Afeganistão pela ONU),
Stafford enfrentou temperaturas de sauna, corredeiras, cobras, insetos e
onças, mas o que mais o assustou foram mesmo alguns seres humanos
que cruzou pelo caminho. “Fui feito refém por uma milícia, extorquido
por traficantes e quase assassinado por índios ashaninkas. A selva acabou sendo a parte poética da história”, diz.
Além do desafio pessoal, que exigia fôlego para cerca de 8 a 10 horas
ininterruptas de trilha por dia, Stafford fez da viagem uma cruzada pela
preservação da floresta. Munido de um laptop carregado com placa solar, blogava sempre que podia, chamando atenção para o desmatamento
e o estado de pobreza das crianças da região. Foi destaque na mídia em
22 países e arrecadou mais de 70 mil reais para instituições de caridade
com projetos para as comunidades ribeirinhas do Amazonas.
Depois da empreita, Stafford trocou o facão pela pena. Ele agora escreve
o livro Walking the Amazon, previsto para março de 2011. Quer tentar pôr
no papel a experiência que viveu. “E fazer com que as pessoas sintam uma
verdadeira conexão com a Amazônia, suas maravilhas e, principalmente,
seus problemas. É minha forma de alertar as pessoas sobre a mais importante floresta do mundo.” Por Edu Petta www.walkingtheamazon.com
© Foto Andarilho Amazônia: Keith Ducatel | Foto Cicloturismo: Eduardo Green; Foto escalada: Divulgação; Foto mochila ciclista: Lee Myung Su
[93]
Turismo sobre duas rodas: uma forma de
conhecer o mundo com as próprias pernas
[95]
Já vai longe o tempo em que o cicloturista era visto como louco. “Assim eram tachados os viajantes de bicicleta”,
diz Antonio Olinto, que deu a volta ao mundo à base de pedal
em meados dos anos 90. Dados da ATTA (associação mundial do trade de turismo de aventura) sinalizam o crescimento da procura por viagens de bicicleta, o aumento da oferta
de destinos e o maior interesse dos cicloturistas.
No Brasil, Santa Catarina é o estado mais tarimbado a lidar com esse público. Além dos dois circuitos já existentes (Vale Europeu e Costa Verde&Mar), ganhou em novembro o Circuito de Cicloturismo Acolhida na Colônia, desenhado para percorrer as pousadas na região interiorana do
estado, referência em turismo rural. Alimentação orgânica e
caminhos idílicos bordejando a mata atlântica fazem parte
dos atrativos do trajeto. O Circuito tem mapas detalhados e
tracks GPS para viagens autoguiadas. Por Fernando Angeoletto acolhida.com.br/cicloturismo.
Praticar escalada envolve mais do que
apenas a coragem de desafiar a gravidade.
Os amantes da técnica, além de concentração e resistência, têm em comum a relação com a natureza. Para eles, a Lao Engenharia criou paredes de escalada
sustentáveis com baixo impacto ambiental. De diferentes níveis de dificuldade, são construídas com madeira recuperada ou com ecoplaca (feita com resíduos de tubos de pasta de dente e embalagens longa-vida), com estrutura metálica
e revestidas com pedras de resina PET e
areia. A empresa ainda possui mais de 70
criações de ecodesign, como arquibancadas, aparelhos de ginástica e brinquedos.
L.L. laoengenharia.com.br
[96]
Quase todo ciclista carrega uma mochila nas costas para
transportar objetos pessoais como laptop, carteira e garrafa d’água. Pois o designer coreano Lee Myung Su acrescentou mais um item ao backpack de quem pedala – um sinalizador de LED para aumentar a segurança dos
ciclistas à noite. “Eu pedalo e queria criar algo que fosse
mais eficiente que os sinais de mão e os piscas comuns usados nas bikes”, afirma. As luzes ficam embutidas na mochila e um controle sem fio vai preso no guidão. Funciona como o pisca-alerta de carros e motos – basta um toque com o
dedo para o ciclista sinalizar se vai parar, entrar à direita ou
virar à esquerda. Sem falar nas opções de emoticons, caso o
ciclista queira mostrar seus sentimentos durante pedalada.
A mochila à prova d’água venceu o Red Dot Design Award
2010 e será comercializada na Europa, EUA e Ásia. M.B.
leemyungsu.com
CORPO
[97]
Um dos principais nomes da literatura americana atual,
Jonathan Safran Foer enfrentou um dilema para parar
de comer carne; mas resolveu tirá-la de vez da sua dieta
[98]
escritor americano Jonathan Safran
Foer não é um vegetariano do tipo
radical. Parar de comer carne, para ele, não
foi uma decisão simples, dessas que se tomam de uma hora para outra. Fã confesso
do sabor da carne e das memórias afetivas
evocadas por um bife bem preparado, ele
entrou em certa “crise alimentar” quando
começou a indagar mais sobre os processos
que envolvem um pedaço de filé até ele, de
fato, chegar ao nosso prato. Mas nem sempre era muito contundente e acabava, vez
por outra, por se render a um hambúrguer
ou a um frango assado.
Sua decisão de parar efetivamente de
comer carne só foi tomada quando ele descobriu que iria ser pai. Foi aí que tudo se
iluminou: como as crianças aprendem pelo
exemplo, principalmente dos pais, Foer resolveu ser um ótimo exemplo para seu filho
e passou a buscar argumentos mais incisivos para uma dieta sem proteína animal.
“Em meus três anos de pesquisas eu aprendi muito sobre os efeitos da carne na saúde humana e no planeta – assim como seu
efeito nos próprios animais – para me sentir apto a comer proteína animal de novo. É
a pior coisa que fazemos ao meio ambiente”, disse em conversa com a VIDA SIMPLES, de Nova York, onde mora.
O escritor se refere aos maus tratos com
que os animais são criados para a produção
de alimentos nos EUA e que ele relata em
seu livro Comer Animais, a ser lançado agora em janeiro no Brasil. Em seus relatos, ele
cita estudos científicos que sugerem a contaminação das galinhas criadas em granjas
por bactérias das fezes, que comprovam os
maus tratos por que passam os porcos que
ficam sempre presos para não atacarem uns
aos outros e que indicam que parte do gado
é cortada enquanto ainda está consciente.
A indústria da carne, de acordo com as
pesquisas que aponta, é responsável pela
morte anual de cerca de 450 bilhões de animais terrestres e contribui 40% mais para
o aquecimento global do que todo o transporte do planeta. “Eu descobri que os tipos
de fazenda que a maioria de nós imagina
quando pensa na criação de animais estão,
por todos os interesses e razões, mortos.”
Não há vacas pastando tranquilas e galinhas ciscando nas fazendas industriais dos
EUA. “Por isso, está na hora de adotarmos
novas medidas e práticas”, defende.
A saída de Foer foi abolir – não sem pesar – a carne do prato. “Eu não acho que as
pessoas vão todas parar de comer proteína
animal logo. Mas acredito que deve haver
um movimento global sobre a quantidade de carne que frequentemente consumimos à medida que as pessoas passarem a
pensar mais sobre isso”, diz. “E, assim, não
estaremos mais rodeados de 50 milhões de
animais confinados em situações lamentáveis.” Por Rafael Tonon
© Foto Jonathan Safran Foer: Divulgação; Ilustração: O Silva | Ilustração camiseta: Marcio Fujii; Foto Crudivorismo: Geoff Brightling/Getty Images
O
Vida no prato a nutrição
através dos alimentos crus
Você sabe o que é alimentação viva? É uma forma de
se alimentar que privilegia alimentos com maior vitalidade, aqueles que geram a vida, como as sementes germinadas e os brotos. Essa culinária também é chamada
de crudivorismo, pois só usa alimentos crus – cozinhar os
alimentos faz com que percam 60% de seus nutrientes e
vitalidade. “Hoje a ciência sabe da importância dessa vitalidade na ativação das reações químicas e desempenho
de todas as nossas funções”, diz a médica Maria Luiza Nogueira da Silva, do Centro de Saúde Escola Germano Sinval Faria e coordenadora do Projeto Terrapia – Alimentação Viva na Promoção da Saúde. Os trabalhos do Terrapia começaram em 1997, em um campus da Fundação
Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro. Lá, existe um pomar e
uma praça de alimentação com varanda, locais onde as
pessoas da comunidade aprendem sobre a culinária viva.
Os frequentadores, em geral vindos da comunidade de
Manguinhos, aprendem a produzir sementes germinadas
e brotos, a preparar pratos sem cozinhar e a pensar sobre
nutrição. “Quem passa por aqui passa a ser mais ativo
no autocuidado, principalmente no âmbito alimentar”,
diz Maria Luiza. Ela já perdeu a conta de quantas pessoas passaram pela varanda do Terrapia: só em 2009, foram
19 mil participações em atividades do grupo.
[99]
Quer começar a se beneficiar
da alimentação viva? Saiba como:
A médica Maria Luzia, do Projeto Terrapia, dá os passos. “Comece pela germinação da semente de girassol e faça o suco de clorofila”, diz. Para fazer brotar o girassol, que também poderá ser usado em saladas e em
outros pratos, siga os passos a seguir. O suco de clorofila, uma mistura
de frutas, vegetais e sementes germinadas altamente nutritiva e energética, você aprende no site da Terrapia: www.ensp.fiocruz.br/terrapia.
[1] Lave bem as sementes e deixe de molho em água por 8 horas.
[2] Escorra bem a água e lave as sementes por cinco vezes.
[3] Coloque o vidro com a semente úmida em um local inclinado
a 45 graus de maneira que possa pegar ar. Escorra o excesso de água
[4] Depois de lavá-las bem de manhã e à noite, retorne-as ao local inclinado.
[5] Depois de 24 horas, mais ou menos, elas devem estar prontas para
colher. Verifique se estão com os “narizinhos”, os brotos, para fora. Então é só provar e sentir os benefícios.
CORPO
[97]
Um dos principais nomes da literatura americana atual,
Jonathan Safran Foer enfrentou um dilema para parar
de comer carne; mas resolveu tirá-la de vez da sua dieta
[98]
escritor americano Jonathan Safran
Foer não é um vegetariano do tipo
radical. Parar de comer carne, para ele, não
foi uma decisão simples, dessas que se tomam de uma hora para outra. Fã confesso
do sabor da carne e das memórias afetivas
evocadas por um bife bem preparado, ele
entrou em certa “crise alimentar” quando
começou a indagar mais sobre os processos
que envolvem um pedaço de filé até ele, de
fato, chegar ao nosso prato. Mas nem sempre era muito contundente e acabava, vez
por outra, por se render a um hambúrguer
ou a um frango assado.
Sua decisão de parar efetivamente de
comer carne só foi tomada quando ele descobriu que iria ser pai. Foi aí que tudo se
iluminou: como as crianças aprendem pelo
exemplo, principalmente dos pais, Foer resolveu ser um ótimo exemplo para seu filho
e passou a buscar argumentos mais incisivos para uma dieta sem proteína animal.
“Em meus três anos de pesquisas eu aprendi muito sobre os efeitos da carne na saúde humana e no planeta – assim como seu
efeito nos próprios animais – para me sentir apto a comer proteína animal de novo. É
a pior coisa que fazemos ao meio ambiente”, disse em conversa com a VIDA SIMPLES, de Nova York, onde mora.
O escritor se refere aos maus tratos com
que os animais são criados para a produção
de alimentos nos EUA e que ele relata em
seu livro Comer Animais, a ser lançado agora em janeiro no Brasil. Em seus relatos, ele
cita estudos científicos que sugerem a contaminação das galinhas criadas em granjas
por bactérias das fezes, que comprovam os
maus tratos por que passam os porcos que
ficam sempre presos para não atacarem uns
aos outros e que indicam que parte do gado
é cortada enquanto ainda está consciente.
A indústria da carne, de acordo com as
pesquisas que aponta, é responsável pela
morte anual de cerca de 450 bilhões de animais terrestres e contribui 40% mais para
o aquecimento global do que todo o transporte do planeta. “Eu descobri que os tipos
de fazenda que a maioria de nós imagina
quando pensa na criação de animais estão,
por todos os interesses e razões, mortos.”
Não há vacas pastando tranquilas e galinhas ciscando nas fazendas industriais dos
EUA. “Por isso, está na hora de adotarmos
novas medidas e práticas”, defende.
A saída de Foer foi abolir – não sem pesar – a carne do prato. “Eu não acho que as
pessoas vão todas parar de comer proteína
animal logo. Mas acredito que deve haver
um movimento global sobre a quantidade de carne que frequentemente consumimos à medida que as pessoas passarem a
pensar mais sobre isso”, diz. “E, assim, não
estaremos mais rodeados de 50 milhões de
animais confinados em situações lamentáveis.” Por Rafael Tonon
© Foto Jonathan Safran Foer: Divulgação; Ilustração: O Silva | Ilustração camiseta: Marcio Fujii; Foto Crudivorismo: Geoff Brightling/Getty Images
O
Vida no prato a nutrição
através dos alimentos crus
Você sabe o que é alimentação viva? É uma forma de
se alimentar que privilegia alimentos com maior vitalidade, aqueles que geram a vida, como as sementes germinadas e os brotos. Essa culinária também é chamada
de crudivorismo, pois só usa alimentos crus – cozinhar os
alimentos faz com que percam 60% de seus nutrientes e
vitalidade. “Hoje a ciência sabe da importância dessa vitalidade na ativação das reações químicas e desempenho
de todas as nossas funções”, diz a médica Maria Luiza Nogueira da Silva, do Centro de Saúde Escola Germano Sinval Faria e coordenadora do Projeto Terrapia – Alimentação Viva na Promoção da Saúde. Os trabalhos do Terrapia começaram em 1997, em um campus da Fundação
Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro. Lá, existe um pomar e
uma praça de alimentação com varanda, locais onde as
pessoas da comunidade aprendem sobre a culinária viva.
Os frequentadores, em geral vindos da comunidade de
Manguinhos, aprendem a produzir sementes germinadas
e brotos, a preparar pratos sem cozinhar e a pensar sobre
nutrição. “Quem passa por aqui passa a ser mais ativo
no autocuidado, principalmente no âmbito alimentar”,
diz Maria Luiza. Ela já perdeu a conta de quantas pessoas passaram pela varanda do Terrapia: só em 2009, foram
19 mil participações em atividades do grupo.
[99]
Quer começar a se beneficiar
da alimentação viva? Saiba como:
A médica Maria Luzia, do Projeto Terrapia, dá os passos. “Comece pela germinação da semente de girassol e faça o suco de clorofila”, diz. Para fazer brotar o girassol, que também poderá ser usado em saladas e em
outros pratos, siga os passos a seguir. O suco de clorofila, uma mistura
de frutas, vegetais e sementes germinadas altamente nutritiva e energética, você aprende no site da Terrapia: www.ensp.fiocruz.br/terrapia.
[1] Lave bem as sementes e deixe de molho em água por 8 horas.
[2] Escorra bem a água e lave as sementes por cinco vezes.
[3] Coloque o vidro com a semente úmida em um local inclinado
a 45 graus de maneira que possa pegar ar. Escorra o excesso de água
[4] Depois de lavá-las bem de manhã e à noite, retorne-as ao local inclinado.
[5] Depois de 24 horas, mais ou menos, elas devem estar prontas para
colher. Verifique se estão com os “narizinhos”, os brotos, para fora. Então é só provar e sentir os benefícios.
CORPO
O Jardim Gramacho, no Rio de Janeiro, é considerado o maior lixão a céu aberto do mundo. Ali,
são despejadas 7 mil toneladas de lixo todos os dias –
70% de todo o detrito produzido na cidade. De seus
resíduos sobrevivem muitos catadores, que dali tiram seu sustento – e até sua alimentação. Disposto a
retratar essas pessoas usando o próprio lixo, o artista plástico brasileiro Vik Muniz passou uma tempo-
rada no Gramacho. O que era para ser apenas mais
um de seus trabalhos se transformou em um legítimo envolvimento do artista com a comunidade. As
fotos que fez dos catadores foram vendidas em leilões de arte e revertidas para a recuperação do local.
Toda essa história é relatada no documentário Wasteland, que já angariou vários prêmios e tem previsão
de estreia em fevereiro. wastelandmovie.com
© Foto: Divulgação
[100] LIXO EXTRAORDINÁRIO
CORPO
O Jardim Gramacho, no Rio de Janeiro, é considerado o maior lixão a céu aberto do mundo. Ali,
são despejadas 7 mil toneladas de lixo todos os dias –
70% de todo o detrito produzido na cidade. De seus
resíduos sobrevivem muitos catadores, que dali tiram seu sustento – e até sua alimentação. Disposto a
retratar essas pessoas usando o próprio lixo, o artista plástico brasileiro Vik Muniz passou uma tempo-
rada no Gramacho. O que era para ser apenas mais
um de seus trabalhos se transformou em um legítimo envolvimento do artista com a comunidade. As
fotos que fez dos catadores foram vendidas em leilões de arte e revertidas para a recuperação do local.
Toda essa história é relatada no documentário Wasteland, que já angariou vários prêmios e tem previsão
de estreia em fevereiro. wastelandmovie.com
© Foto: Divulgação
[100] LIXO EXTRAORDINÁRIO