universidade estácio de sá audálio ferreira sobrinho a reserva

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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ
AUDÁLIO FERREIRA SOBRINHO
A RESERVA PARTICULAR DO PATRIMÔNIO NATURAL COMO
INSTRUMENTO DE EFETIVAÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL AO MEIO
AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO
Rio de Janeiro
2006
1
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
AUDÁLIO FERREIRA SOBRINHO
A RESERVA PARTICULAR DO PATRIMÔNIO NATURAL COMO
INSTRUMENTO DE EFETIVAÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL AO MEIO
AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO
Dissertação apresentada como requisito
para obtenção do título de Mestre em
Direito, pela Universidade Estácio de Sá.
Orientador: Prof. Dr. Rogério Gesta Leal
Rio de Janeiro
2006
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Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
VICE-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
A dissertação
A RESERVA PARTICULAR DO PATRIMÔNIO NATURAL COMO
INSTRUMENTO DE EFETIVAÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL AO MEIO
AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO
elaborada por
AUDÁLIO FERREIRA SOBRINHO
e aprovada por todos os membros da Banca Examinadora foi aceita pelo Curso de Mestrado
em Direito como requisito parcial à obtenção do título de
MESTRE EM DIREITO
Rio de Janeiro, 07 de julho de 2006.
BANCA EXAMINADORA
______________________________________________
Prof. Dr. Rogério Gesta Leal
Presidente
Universidade Estácio de Sá
______________________________________________
Prof.ª Dr.ª Renata Braga Klevenhusen
Universidade Estácio de Sá
______________________________________________
Prof. Dr. Eduardo Takemi Dutra dos Santos Kataoka
Universidade Cândido Mendes
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
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A meu pai Manoel Correia (in memoriam).
A minha mãe Argemira, eterna fonte de inspiração e razão maior da minha vida.
À querida esposa Valquíria e a minha filha Raquel, por tudo que representam e pela
imensidão de amor e carinho que nos une.
À Amparo e todos nossos irmãos, pelo sentimento fraternal e por tudo que passamos juntos.
Aos tios José e Isabel, pelo acolhimento em sua casa, durante dez anos, e a conseqüente
viabilização de meu ingresso no caminho do saber.
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Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
AGRADECIMENTOS
Uma lista com os nomes de todos que contribuíram para que alcançássemos este
resultado, por maior que seja será sempre incompleta e haverá o risco de cometer uma
injustiça, pois dificilmente conseguiria apontar todos aqueles que, de forma direta ou indireta,
ajudaram-me a desenvolver e a concluir esta dissertação.
Mesmo assim, correrei o risco dessa injustiça, provavelmente deixando de fora
pessoas queridas e importantes na consecução deste trabalho, mas o faço por dever de
gratidão para com aqueles gravados na memória, neste momento, citando-os de forma
exemplificativa e com a convicção de que estão representando uma coletividade maior.
Agradeço, em especial, a meu orientador Professor Doutor e Desembargador
Rogério Gesta Leal, pelas orientações claras e imprescindíveis à materialização deste
trabalho, além de contribuir para estimular o meu crescimento profissional e minha evolução
como ser humano.
Aos Professores Doutores do Mestrado em Direito, agradeço pelos ensinamentos
transmitidos ao longo do curso. Impende destacar os que foram meus professores nas oito
disciplinas cursadas: Celso Azar, José Ratton, Leandro Ribeiro, Lúcia Vilarinho, Nuria
Belloso, Roberto de Abreu, Rogério Bento e Rogério Leal, inclusive, Maria Teresinha, pelo
incentivo e ajuda na parte final do curso.
Desejo ressaltar a competência, o carinho e a paciência da Prof.ª Dra. Lúcia
Vilarinho, quando da preparação do Projeto de Pesquisa que deu origem a esta Dissertação,
portanto registro o meu apreço e a minha gratidão pelo estímulo e confiança depositados em
mim.
Aos amigos, colegas mestrandos – Adriano Sarmento, Arlindo J. Silva, Carlos
Sarmento, Célia Nicolau, Danilo Klafke, Elinton Vargas, Fábio Pereira, Helvécio Santos, Isa
Chiesse, Marcos Ferreira, J. Muiños Piñeiro, José Petrúcio, Ronaldo Navarro, Ricardo da
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Cunha, Sérgio Pereira, Valter Costa, Vicente Grossi, Peregrino, Victor Queiroz, Vladimir
Soares, Wagner Inácio, William Miranda, dentre outros – pela motivação ou pela importância
do apoio mútuo compartilhado, nas diversas disciplinas deste agradável desafio.
Aos integrantes da Secretaria do Mestrado – Luciana Paula (ex-funcionária),
Clarissa (Prof.ª, convidada, de Inglês), Fábio Prior, Paulo Roberto e David – pela atenção e
valioso apoio, desde o início do curso.
Não há como deixar de lembrar daqueles que fizeram e dos que estão fazendo
(professores, alunos e funcionários) a história do Colégio Estadual Humberto Mendes,
Palmeira dos Indios, AL. Faço consignar minha eterna gratidão por terem lançado a semente
da educação, fundada em base ética e moral, na vida deste eterno e saudoso aluno.
Além disso, meu sincero agradecimento, particularmente, aos Professores: Abel
Cordeiro, Amparo Neves, Ceiça, Chico Potiguar, José Branco (in memoriam), José Correia,
Léa Rego, Lourdes Sá, Mauro Daniel, Mauro Feitosa, Sinvaldo Gama, Mons. Darci, Mons.
José Araújo, Mons. Odilon, Mons. Ferreira, Roberaldo, Paulo Marinho, Vanda Ramos (in
memoriam), Welinghton. Antigos alunos: Arnon, Carlos Alberto, Erivaldo, Paulo Weimar,
Perrone, Ricardo Vitório, Válter L. Santos, Vasco Brasil. Funcionários: Aquiles (in
memoriam - Bibliotecário), Oséas (in memoriam), Shirley (in memoriam - Secretária), dentre
outros.
Aos Professores e amigos da Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN),
Resende, RJ, pelo incentivo e apoio, quando de minha preparação para o concurso do
Mestrado em Direito: Claudemir Faria, Damião, José V.Cipriano, Moacyr Martins, Paulo H.
Lacerda, Paiani Durão, Regivaldo B. Monteiro, Panizzutti, Villardo.
Ao cabo desses agradecimentos, registro, ainda, o meu muito obrigado ao
Professor e amigo Lúcio Capri da AMAN, pela amizade, lealdade e inestimável cooperação à
concretude desta, gratificante, pesquisa epistemológica e sistêmica.
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Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
RESUMO
Esta dissertação compreende um estudo sobre a Reserva Particular do Patrimônio Natural
(RPPN) como instrumento de efetivação do direito humano fundamental ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, dentro do contexto norteado pela linha de pesquisa “Direitos
Fundamentais e Novos Direitos”. No intuito de resguardar os direitos fundamentais
consagrados internacionalmente, a Constituição da República Federativa do Brasil,
promulgada em 1988, em seu artigo 225, § 1º, inciso III, impôs ao Poder Público a
obrigatoriedade de definir espaços territoriais e seus componentes para receberem proteção
especial, a fim de garantir uma sadia qualidade de vida a todos, através de um meio ambiente
ecologicamente equilibrado. Neste sentir, fez-se uma análise da proteção ambiental, quanto à
eficácia de uma dessas unidades de conservação (RPPN) instituída por livre iniciativa de seu
proprietário, gravada com perpetuidade e com o objetivo de conservar a diversidade
biológica. Inicialmente, realizou-se uma abordagem histórica dos direitos humanos,
efetuando-se uma imbricação destes com a questão ambiental no Estado contemporâneo. As
concepções vigentes sobre meio ambiente foram discutidas, abordando-se a polarização entre
o antropocentrismo e o ecocentrismo. Foram expostas e analisadas algumas diretrizes
normativas ambientais no conjunto internacional e nacional, que consagraram o meio
ambiente ecologicamente equilibrado como direito humano e fundamental. Por fim, enfocouse a função socioambiental da RPPN – com uma crítica à sua classificação no contexto da Lei
nº. 9.985/00 e a sua eficácia no processo de preservação ambiental – como instrumento
garantidor da efetivação do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado.
Palavras-chave: Direitos Humanos. Meio Ambiente. Unidade de Conservação. Reserva
Particular do Patrimônio Natural.
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ABSTRACT
The present study aims to scrutinize the Private Reserve of the Natural Patrimony (PRNP) as
a fundamental human right’s effectiveness tool when it is crucial to an environment
ecologically stability within the context headed by the “Fundamental Rights” and “New
Rights” ´s line of research. On the lookout for uphold the fundamental rights internationally
acclaimed, the 1988´s Brazilian Federal Constitution, article 225 § 1º, III paragraph, compels
the Public Power the obligation to delineate territorial surroundings as well as its devices in
order to achieve especial protection, what would guarantee a positive quality of life to
everyone by means of a natural world ecologically in equilibrium. Therefore, an
environmental protection investigation is presented, regarding the competence of one of those
preservation units (PRNP) established by its owner’s free initiative, certificated with
perpetuity and determined to defend biodiversity. Firstly, a human rights´ historical approach
is put on view, along with its imbrication among the environmental issue in the current State.
Later on, recent conceptions in what concerns the polarization between anthropocentrism and
ecocentrism are examined. Finally, some environmental normative procedures are
demonstrated and analyzed in the national and international corps, what lifts an environment
ecologically equilibrated to a human and fundamental right status. Thus, the focus of the work
is the Private Reserve of the Natural Patrimony’s socio-environmental role – with an
assessment to its classification in relation to the Brazilian 9.985/00 Law plus its efficacy in
the green preservation – while an instrument which guarantees fundamental right’s efficiency
towards an environment ecologically balanced.
Keywords: Human Rights. Environment. Units of Preservation. Private Reserve of the
Natural Patrimony.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................................................................................
10
1 DIREITOS HUMANOS E MEIO AMBIENTE................................................................
16
1.1
Histórico dos direitos humanos......................................................................................
16
1.2
Aspectos conceituais sobre meio ambiente, Direito Ambiental, correntes
antropocêntricas e ecocêntricas......................................................................................
27
Direito ao meio ambiente em países estrangeiros..........................................................
36
1.3.1 Estados Unidos da América...........................................................................................
37
1.3.2 Alemanha.......................................................................................................................
39
1.3.3 França.............................................................................................................................
40
1.3.4 Portugal..........................................................................................................................
42
1.4
Direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.............................
43
2 EVOLUÇÕES TEÓRICAS E NORMATIVAS DO MEIO AMBIENTE......................
53
2.1
Princípios básicos ambientais........................................................................................
54
2.1.1 Princípio da precaução...................................................................................................
56
2.1.2 Princípio da prevenção...................................................................................................
58
2.1.3 Princípio do direito à sadia qualidade de vida...............................................................
59
2.1.4 Princípio do acesso eqüitativo aos recursos ambientais................................................
60
2.1.5 Princípio do desenvolvimento sustentável.....................................................................
61
2.1.6 Princípio da educação ambiental...................................................................................
63
2.2
Evolução das normativas internacionais do meio ambiente..........................................
65
2.3
Evolução das normativas nacionais do meio ambiente..................................................
86
3 A RESERVA PARTICULAR DO PATRIMÔNIO NATURAL ENQUANTO
MODALIDADE DE UNIDADE DE CONSERVAÇÃO, EM FACE DO SISTEMA
NACIONAL DE PROTEÇÃO DO AMBIENTE.................................................................
101
3.1
101
1.3
Sistema Nacional de Unidades de Conservação............................................................
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9
3.1.1 Unidades de proteção integral........................................................................................
105
3.1.2 Unidades de uso sustentável..........................................................................................
108
3.2
Histórico das Reservas Particulares do Patrimônio Natural..........................................
115
3.3
Educação ambiental e Reserva Particular do Patrimônio Natural.................................
119
3.4
Reserva Particular do Patrimônio Natural: a propriedade privada como instrumento
de efetivação do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e
sua função socioambiental.............................................................................................
125
CONCLUSÃO..........................................................................................................................
138
REFERÊNCIAS.......................................................................................................................
148
ANEXO A - Lei nº. 9.985, de 18 de julho de 2000...................................................................
159
ANEXO B - Categorias de unidades de conservação do SNUC...............................................
179
ANEXO C - Normas gerais para criar uma Reserva Particular do Patrimônio Natural: Dec.
nº. 5.746, de 5 de abril de 2006.................................................................................................
182
ANEXO D – Lista das RPPNs por Estado................................................................................
189
10
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INTRODUÇÃO
Os direitos humanos estão dentre os principais temas debatidos no mundo
contemporâneo. O meio ambiente – considerado pela doutrina majoritária como direito
humano fundamental de terceira geração – é um componente dos chamados “novos direitos”
que ocupa posição de relevo, principalmente, por sua natural importância e pela dificuldade
em compatibilizar o desenvolvimento econômico com a utilização sustentável dos recursos
naturais, fatos que podem comprometer a qualidade de vida no globo terrestre.
As discussões sobre a questão ambiental são recentes, e mais recentes são as
implementações normativas, internacionais e nacionais, com vistas a regulamentar as
atividades impactantes ao ambiente e a promover o desenvolvimento sustentável, de modo a
assegurar um direito fundamental do homem que é o direito à vida, na relação com o seu
entorno.
Não obstante haver registros significativos de uma legislação com reflexos
ambientalistas desde a Idade Antiga, o fato que marca o direito ao meio ambiente equilibrado
como direito fundamental do homem ocorre com a Conferência das Nações Unidas sobre o
Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo, Suécia, sob os auspícios da Organização
das Nações Unidas, em 1972.
Inclusive, vale destacar outro evento internacional de vulto, a Conferência das
Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, que ocorreu em 1992, no Rio de
Janeiro, sendo esta denominada de Cúpula da Terra, ou ECO-92. Desta conferência
resultaram cinco importantes documentos, dentre eles a Declaração do Rio de Janeiro sobre
Meio Ambiente e Desenvolvimento, bem como a Agenda 21 (numa alusão ao século que se
aproximava e que hoje se vivencia).
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A década de 1970, portanto, registra o início das preocupações ambientais globais,
e da mobilização social em torno dessas questões, resultando na proliferação de organizações
não-governamentais engajadas em movimentos pró-natureza. Foram assinalados, desde então,
tratados internacionais com caráter mais global, o que os tornou distintos dos acordos
internacionais que, até então, vinham sendo firmados.
O Brasil, na condição de país detentor de significativa biodiversidade, procurou
atualizar rapidamente sua legislação ambiental, estabelecendo mecanismos para assegurar um
ambiente adequado à vida, nas sua expressão humana, animal e vegetal.
A Constituição Federal de 1988 – inspirada, principalmente, nas Constituições
Portuguesa e Espanhola – balizou seus aspectos essenciais sobre o meio ambiente em seu
artigo 225, incluiu a temática em outros dispositivos constitucionais, estipulou competências
das esferas de governo e determinou a regulamentação posterior pela legislação
infraconstitucional, além de recepcionar boa parte da legislação ambiental pretérita.
Um desses mecanismos implementadores foi executado no ano de 2000, por meio
da Lei 9.985, de 18 de julho (ANEXO A), regulamentando o parágrafo 1º, incisos, I, II, III e
VII do artigo 225 da Constituição Federal (CF) de 1988, vindo instituir o Sistema Nacional de
Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) com suas diversas categorias (ANEXO B).
Impende ressaltar que o objetivo básico deste trabalho é analisar a eficácia de uma
das categorias de unidades de conservação previstas pelo SNUC, na garantia e consolidação
de um direito humano já consagrado pela doutrina jurídica internacional, e assimilado como
fundamental em diversos ordenamentos jurídicos internos.
Trata-se do direito humano fundamental ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, que encontra na Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN), uma das
formas mais expressivas de participação da sociedade civil na preservação ambiental.
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A relevância do desenvolvimento desta dissertação justifica-se, porque o seu
objeto de pesquisa advém da importância, atualidade e urgência de um tema pouco conhecido
da população brasileira, num contexto em que a doutrina pátria, por meio de seus renomados
jurisconsultos e operadores do Direito, não tem dado a merecida atenção epistemológica e
sistêmica ao assunto. Observa-se que existem inúmeras obras sobre o direito ambiental, mas
poucas são dedicadas ao importante papel das Unidades de Conservação, principalmente as
Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs).
Trazer a lume o tema, analisando a eficácia das RPPNs na garantia e preservação
dos recursos naturais e da biodiversidade, pode contribuir para a melhoria da qualidade de
vida e se constituir num mecanismo de educação ambiental, que estimulará os proprietários a
converterem parcela de suas propriedades em RPPN.
Inclusive, o presente estudo intenta evidenciar a necessidade de se aumentar o
quantitativo dessas unidades de conservação (UCs) no território brasileiro, conforme se
observa na listagem de criação dessas reservas (ANEXO D), desonerando o Estado de
instituir outras modalidades de UCs, o que normalmente implica onerosos processos de
desapropriação com seus respectivos gerenciamentos.
Outrossim, convém notar que as RPPNs podem exercer um importante papel no
intercâmbio Estado, sociedade e meio ambiente, à proporção que possibilitam ao cidadão
cumprir com a função socioambiental da propriedade que possui, além de poder viabilizar a
consecução de um novo paradigma de preservação da natureza.
Assim, esta pesquisa é dividida em três capítulos, sendo que o capítulo inicial –
DIREITOS HUMANOS E MEIO AMBIENTE – aborda sobre um breve histórico desses
direitos, a partir do Código de Hamurábi (séc. XVII a.C.), passando pelo matiz religioso que
se deu a essa questão por força do Cristianismo, chegando ao final da Idade Média, época em
que diversos documentos limitaram o poder estatal em favor do indivíduo, constituindo-se nos
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albores dos efetivos direitos humanos consolidados em legislações subseqüentes.
Analisa-se, também, a fundamentação dos direitos humanos e delineia-se a
distinção destes para com os chamados direitos fundamentais, procurando demonstrar a
vinculação desses direitos com a questão ambiental, no contexto do Estado contemporâneo.
Nesse capítulo, ainda, faz-se uma análise das concepções sobre o meio ambiente,
tendo em vista a utilização dos recursos naturais no processo de produção industrial e seu
conseqüente impacto na qualidade de vida humana. Enfoca-se a sustentabilidade do meio
ambiente sob a ótica do ecocentrismo, que valoriza a natureza e seus recursos bióticos e
abióticos pelo seu valor intrínseco, e sob a ótica do antropocentrismo, que valoriza a natureza
pelo seu valor de uso e conseqüente importância à sobrevivência da espécie humana.
Encerra-se o primeiro capítulo, evidenciando-se o tratamento dado à temática
ambiental em alguns países estrangeiros, de modo exemplificativo. Depois, é apresentado o
meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental do ser humano,
destacando a necessidade premente de se estabelecer um novo modelo de produção e
consumo, para evitar o colapso ambiental do planeta Terra.
No capítulo segundo – EVOLUÇÕES TEÓRICAS E NORMATIVAS DO MEIO
AMBIENTE – analisam-se alguns princípios ambientais básicos que norteiam a elaboração
das normas ambientais internacionais e nacionais, fundamentando a aplicação do Direito
Ambiental e assegurando a manutenção do direito humano fundamental ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, como preconiza a Constituição da República Federativa do
Brasil, promulgada em 1988.
Nessa linha, esse capítulo trata de alguns significativos estudos e relatórios da
comunidade científica internacional que subsidiaram conferências promovidas pela
Organização das Nações Unidas (ONU) e seus departamentos, resultando em tratados e
declarações que ajudaram a consolidar o meio ambiente ecologicamente equilibrado como
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direito humano fundamental.
Sobremais, é objeto de análise a legislação pátria que, principalmente, a partir da
década de 1980, estreitou relações com a temática ambiental de maneira mais sistematizada.
Nesse contexto, ressalta-se a legislação ambiental pretérita à Constituição Federal de 1988,
correlata ao tema pesquisado, analisando-se a sua recepção pela Constituição, bem como a
legislação ambiental subseqüente à referida Carta Magna.
No último capítulo – A RESERVA PARTICULAR DO PATRIMÔNIO
NATURAL ENQUANTO MODALIDADE DE UNIDADE DE CONSERVAÇÃO, EM
FACE DO SISTEMA NACIONAL DE PROTEÇÃO DO AMBIENTE – é desenvolvido o
ponto nodal desta dissertação. Trata-se de um dos instrumentos previstos, na Carta Política
vigente (art. 225), para assegurar o equilíbrio ecológico do meio ambiente, isto é, a Lei nº.
9.985, de 18 de julho de 2000, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação
(SNUC).
Procura-se estabelecer, nesse capítulo, a distinção entre as categorias de unidades
de conservação de proteção integral e as unidades de conservação de uso sustentável (Cf.
resumo no “ANEXO B”). Apresemtam-se dados quantitativos sobre as categorias,
relacionando-as com as principais normas internacionais e nacionais que objetivam a
manutenção equilibrada do meio ambiente, e procura-se efetuar uma análise do SNUC quanto
à sua adequabilidade ao panorama brasileiro.
Além disso, faz-se uma análise crítica do enquadramento da RPPN, a partir de sua
evolução no direito brasileiro, como unidade de uso sustentável, de seu caráter voluntário, de
seu gravame de perpetuidade, de sua adequação à função socioambiental da propriedade, das
atividades permitidas em seu domínio, e de sua eficácia como instrumento garantidor do
direito humano fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
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A parte final do trabalho apresenta as conclusões, tendo como base todas as
informações e dados analisados no contexto da linha de pesquisa: “Direitos Fundamentais e
Novos Direitos.”
Destarte, aplica-se nesta pesquisa uma metodologia multidisciplinar, utilizando-se
de abordagens dedutivo-indutivas e fazendo uso de técnicas a consultas bibliográficas, tais
como: livros, bibliografias, revistas especializadas, jornais, internet, dentre outros.
Assim, essas técnicas possibilitam uma análise no sentindo de verificar se as
propriedades particulares (RPPNs), de uso sustentável e gravadas em caráter de perpetuidade,
contribuem para a efetivação do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado.
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CAPÍTULO 1
DIREITOS HUMANOS E MEIO AMBIENTE
1.1 Histórico dos direitos humanos
Os antecedentes dos atuais direitos humanos podem ser identificados no antigo
Egito e Mesopotâmia, terceiro milênio antes de Cristo, em face da previsão de instrumentos
que visavam a proteger o indivíduo em relação ao poder do Estado.
O Código de Hammurabi (séc. XVII a.C.) possivelmente seja uma das primeiras
codificações a consagrar uma lista de direitos comuns a todos os homens, conforme leciona
Ezcurdia Lavigne,
[...] O el código de Hammurabi (1690 a.C.) com uma descripcion de
derechos comunes a todos los hombres respecto a la vida, família
propriedad, honor y buena fama, así como su proclamación de la Grecia de
Pericles (s. v a. de C.), con participación de todos los ciudadanos en los
negocios públicos, puede ser otro ejemplo a tener en cuenta, así como las
figuras roanas del “Curtator Civitas”, de la época de Trajano (87-117),
encargado de la defensa de los niños y clases humildes frente a los
poderosos y a los niños y clases humildes frente a los poderosos y a las
autoridades, y del “Defensor Plebis” o defensor Cevitatis”, estabelecido
pelo el Emperador Valentino I (365-375), que tenía encomendada la tarea
de simplificar los trámites en la administración de justicia y la lucha contra
los abusos de los poderosos. 1
Não se pode olvidar a contribuição filosófico-religiosa ao prenúncio dos direitos
humanos, particularmente com a propagação das idéias de Buda sobre a igualdade de todos os
homens (500 a.C.). Um documento dessa fase é a Lei das Doze Tábuas que pode ser
considerado como a origem dos textos escritos consagradores da liberdade, da propriedade e
da proteção aos direitos do cidadão.
1
EZCURDIA LAVIGNE, J. A. Curso de Derecho Natural. Perspectivas iusnaturalistas de los derechos
humanos. Madrid: Reus, 1987, p. 101.
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Mais adiante, a forte concepção religiosa trazida pelo Cristianismo, com a
mensagem de igualdade a todos os homens, independentemente de origem, raça, sexo ou
credo, influenciou diretamente o nascimento dos direitos do homem, enquanto necessários à
dignidade da pessoa humana. 2
Nessa mesma linha, a Idade Média se caracterizou por uma organização feudal e
pela rígida separação de classes estamentais, com a conseqüente relação de subordinação
entre os nobres e os servos, além de vários documentos que reconheciam a limitação do poder
estatal.
Jorge Miranda explica que os mais importantes antecedentes históricos das
declarações de direitos humanos encontram-se, inicialmente, na Inglaterra, onde se pode citar
a Magna Charta Libertatum, imposta ao Rei João Sem-Terra, em 15 de junho de 1215. Outros
documentos se destacam, tais como a Petition of Right, de 1628; o Habeas Corpus Act, de
1679; o Bill of Rights, de 1689; e o Act of Settlement, de 12 de junho de 1701. 3
Portanto, nos séculos XVII e XVIII da era cristã, principalmente, ocorreram fatos
históricos no Ocidente que deixaram marcas indeléveis dessa aproximação dos direitos
humanos. Dentre esses fatos convém assinalar a Revolução Inglesa (1689), a Independência
Americana (1776) e a Revolução Francesa (1789).
A esses eventos históricos, alguns pensadores – Thomas Hobbes (1588-1679), John
Locke (1632-1704), Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), dentre outros – contribuíram com
suas obras doutrinárias para a limitação do poder estatal, e como reflexo é observável o
pensamento crítico de Immanuel Kant (1724-1804) que ajudou a formar a base dos direitos
humanos. 4
2
MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos arts. 1º a 5º da
Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência . 6. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 7.
3
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. 3. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2000, p. 536.
4
CRETELLA JÚNIOR, José. Primeiras lições de direito. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 284-296.
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Dessa forma, vislumbrou-se a preservação da vida e da dignidade da pessoa humana
que marcou o surgimento do Estado contemporâneo, passando a consolidar-se uma visão
prospectiva de governo das leis e não mais dos homens: o Estado de Direito.
Há que se delinear, desde já, o que se entende por direitos humanos e direitos
fundamentais, a fim de que se possa continuar a análise do foco deste trabalho, cujo fio
condutor trata da Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) como instrumento de
efetivação do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Nesse rumo, vale assinalar a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de
26 de agosto de 1789, dentre as mais notórias das declarações. Essa importância decorre do
fato de, ainda hoje, merecer o respeito e a reverência dos que se preocupam com a liberdade e
os direitos do homem. 5
Tal documento tornou-se um marco histórico, a partir do qual faz sentido falar-se
em direitos humanos fundamentais. Norberto Bobbio registra que essa declaração, pelo menos
simbolicamente, marca o fim de uma época e o início de outra, e, portanto, uma virada na
história do gênero humano. Isto é, ocorre uma mudança de concepção, deixa de existir a
concepção organicista, substituída pela concepção individualista, da qual nasce a democracia
no sentido moderno da palavra: o poder dos cidadãos tomados um a um. 6
Além disso, esse autor leciona que “os direitos humanos são direitos históricos, ou
seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizadas por lutas em defesa de novas liberdades
contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez
por todas.”7
5
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direitos humanos fundamentais. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p.
19.
6
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. 13. ed. Rio de Janeiro: Campus,
1992, p. 85-119.
7
Ibidem, p. 5.
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Observa-se que três correntes se sobressaem em defesa dos direitos do homem ou
dos direitos humanos: jusnaturalistas, positivistas e moralistas. Os primeiros são oriundos da
Escola do Direito Natural, fundamentam os direitos humanos em uma ordem superior
universal, imutável e inderrogável. Para os seguidores dessa corrente, George Jellinek e
outros, os direitos humanos não são criações dos legisladores, tribunais ou juristas, e,
conseqüentemente, não podem desaparecer da consciência dos homens. 8
Nessa linha jusnaturalista, J. Delgado Pinto chama a atenção para os requisitos dos
direitos naturais,
[...] Primera: existe uma serie de reglas o princípios relativos a la
ordenación justa de la vida social que son universales e inmutables y a cuyo
conocimiento todos tenemos accesso mediante el uso de nuestra razón.
Segunda: sin embargo, tales regras o princípios son insuficientes para el
manteninimiento de una sociedad organizada, por lo que es imprescindible
la existtencia de una autoridad política [...]. Tercera: en todo caso, los
preceptos positivos de la autoridad sólo son obligatorios si representann el
desarrolho de los princípios naturales de justiça o, al menos, no entran en
contradicción con ellos. 9
Por sua vez, a segunda corrente composta, principalmente, por positivistas e
neopositivistas, fundamenta a existência dos direitos humanos na ordem normativa, desde que
seja legítima a manifestação da soberania popular. Dessa forma, somente seriam considerados
direitos humanos aqueles expressamente previstos no ordenamento jurídico positivo e por isso
chamados de direitos humanos fundamentais.
Conforme A. E. Pérez Luño, integrante dessa linha positivista, os usos lingüísticos,
jurídicos e políticos do termo direitos humanos surge como um conceito mais amplo e
impreciso que a noção de direitos fundamentais, pois
8
MORAES, Antônio Carlos Robert de. Meio ambiente e ciências humanas. São Paulo: Hucitec, 1997, p.16.
DELGADO PINTO, J. De nuevo sobre el problema del Derecho Natural. Salamanca: Universidad de
Salamanca, 1982, p.10.
9
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20
Los derechos humanos suelen venir entendidos como um conjunto de
faculdades e instituciones que, em cada momento histórico, concretan las
exigencias de la dignidad, la liberdad y la igualdad humanas, las cuales
deben ser reconocidas positivamente por los ordenamientos jurídicos a nível
nacional e internacional. En tanto que con la noción de los derechos
fundamentales se tiende a aludir a aquellos derechos humanos garantzados
por el ordenamiento jurídico positivo, en la mayor parte de casos en su
normativa constitucional y que suelen gozar de una tutela reforzada. 10
A terceira corrente é integrada pelos defensores da teoria moralista ou de
Perelman, e estrutura os direitos humanos tendo como base a própria experiência e a
consciência moral de um determinado povo.
Para J. Austin, defensor dessa última corrente, os direitos naturais, por exemplo,
normalmente significariam os direitos que correspondem à Lei Natural, isto é:
Derechos que se originan en todos o en la mayoria de los sistemas positivos
y que existirian como derechos morales aunque no hubieran emanado del
gobierno. [...] Supongo que les llamó derechos absolutos de las personas por
la misma razón que ha inducido a otros a llamarlos derechos naturales o
inherentes; esto es poque ellos no son dependientes del suceso de ningún
hecho concreto, sino que nosotros los adquirimos tan solo por nacer. 11
Conforme explica Alexandre de Moraes, 12 a importância dos direitos humanos
fundamentais não consegue ser explicada por qualquer das teorias existentes que se mostram
insuficientes.
Explica esse autor que as referidas teorias se complementam, devendo coexistir,
pois somente a partir da formação de uma consciência moral (teoria de Perelman), baseada em
valores na crença de uma ordem superior, universal e imutável (teoria jusnaturalista), é que o
legislador ou os tribunais encontram base política e social para reconhecerem a existência de
determinados direitos humanos fundamentais como integrantes do ordenamento jurídico.
10
PÉREZ LUÑO, A.E. Los derechos fundamentales. 3. ed. Madrid: Tecnos, 1988, p. 46-47.
AUSTIN, J. Lectures on Jurisprudence, 1869, vol. II, lecture XXXII, p. 592-593.
12
MORAES, Alexandre de op. cit., p.17.
11
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21
Ainda nessa mesma linha, Alberto Nogueira ensina que a teoria e a prática dos
direitos humanos, dos direitos fundamentais e das liberdades públicas, distante de se
excluírem, se complementam, pois formam as três rotas de convergência para o autêntico
Estado Democrático de Direito, e prossegue explicando que
[...] na confluência de três ricos movimentos sociais e políticos: o francês
(das liberdades públicas), o inglês (do civil rights ou humain rights) e o
alemão (dos direitos fundamentais), cada um deles, a seu modo, na busca de
um regime jurídico (e político) humanista, correspondente ao dos Direitos
Humanos ou de Homens. 13
Registre-se, ainda, que Eusébio Fernández García explica o que sejam direitos
humanos tendo como pressuposto as exigências éticas, posição esta corroborada por Nuria
Belloso Martín:
Los derechos humanos aparecem como derechos morales, es decir, como
exigências éticas y derechos que los seres humanos tienen por el
reconhecimento, proteción y garantía por el hecho de ser hombres y, por
tanto, con un derecho igual a su reconocimiento, protección y garantia por
parte del poder político y el derecho; derecho igual, obviamente basado en
la propriedad común a todos ellos de ser considerados seres humanos, y
derecho igual de humanidad independente de cualquer contingencia
histórica o cultural, característica física o intelectual, poder político o clase
social. 14
Dessa forma, depreende-se que os direitos humanos são aqueles inerentes à pessoa
humana e conforme a II Conferência Mundial de Direitos Humanos, realizada em Viena
(1993): “os direitos humanos são universais, indivisíveis, interdependentes e interrelacionados. A comunidade internacional deve tratar os direitos humanos globalmente, de
modo justo e eqüitativo, com o mesmo fundamento e a mesma ênfase.”
13
NOGUEIRA, Alberto. Globalização, regionalizações e tributação: a novla matriz mundial. Rio de Janeiro:
Renovar, 2000, p. 41-49.
14
FERNÁNDEZ GARCÍA, E. Teoría de la Justicia y Derechos Humanos. Madrid: Debate, 1984, p.107.
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22
Portanto, neste sentir, entende-se por direitos fundamentais aqueles direitos
humanos que têm como núcleo os princípios éticos e de justiça – qualidade de vida e
dignidade do ser humano - que fazem parte do Direito Positivo, inclusive considerados como
tais pelo ordenamento jurídico vigente.
Impende observar, depois dessa breve análise sobre os direitos humanos
fundamentais, que houve, após a Revolução Francesa de 1789, num primeiro momento, a
preocupação com os direitos de liberdade (chamados direitos de primeira geração), ou
ausência de ação do Estado, à proporção que implica uma atitude negativa deste para não
violar a esfera individual, e numa segunda fase deste primeiro momento surge a luta pelos
direitos civis e políticos. 15
Conforme leciona Paulo Henrique Lacerda em seus apontamentos, as liberdades
negativas exigem do Estado um não fazer, para que não seja impedido o exercício das
liberdades individuais, v.g., liberdade religiosa, de expressão, intelectual, de locomoção,
dentre outras. Tais liberdades surgem, no bojo da citada Revolução Francesa, contra o Estado
que, até então, se configurava como um Leviatã, despossuído de limites.
Num segundo momento, após o declínio das idéias liberais oitocentista, surgem as
preocupações com as questões assentadas em bases não estritamente individualistas, e o
Estado é chamado a implementar os direitos sociais, culturais e econômicos (chamados
direitos de segunda geração), mínimos necessários, para não comprometer os direitos já
conquistados; por conseguinte, advêm novos direitos, v.g., direito à educação, ao trabalho, à
previdência, dentre outros.16
Nessa fase, os direitos humanos passaram a abranger categorias de indivíduos,
estabelecendo conquistas socioeconômicas, tendo como estopim o movimento socialista na
15
LEAL, Rogério Gesta. Perspectivas hermenêuticas dos direitos humanos e fundamentais no Brasil. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2000, p. 98.
16
Ibidem, p. 98.
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23
luta contra a exploração do homem pelo capitalismo monopolista. Este período teve nas
Constituições do México (1917) e de Weimar (1919) o ponto de consolidação dos direitos de
igualdade do homem.
Em seguida, caracterizando um terceiro momento, as conquistas no âmbito dos
direitos humanos extrapolaram os limites do indivíduo e de grupos sociais mais restritos para
se tornarem cada vez mais abrangentes, envolvendo a humanidade com os direitos de
solidariedade ou de fraternidade (chamados direitos de terceira geração), v.g., direito ao meio
ambiente, à paz, à comunicação. Além disso, os direitos de quarta geração, tais como o direito
à realidade virtual, à democracia, ao pluralismo, dentre outros.17
Por sua vez, Paulo José Leite Farias sintetiza os direitos fundamentais de terceira
geração, assinalando quatro características especiais, a saber: homem-humanidade,
destacando a fraternidade ou solidariedade mundial e o homem como parte dessa coletividade
universal; titularidade-anônima, no sentido de abranger a todos; existência-transgeracional,
permite a titularidade a gerações futuras; e a qualidade-de-vida, visualiza o homem com a
dignidade necessária a sua existência. 18
Nesse rumo, Norberto Bobbio aponta para a gestação de novos direitos, apesar de
não fazer uma nítida distinção entre os direitos de terceira e os de quarta geração, pois ambos
constituem, ainda, uma categoria heterogênea e vaga que dificulta saber do que efetivamente
se trata. Mesmo assim, destaca as reivindicações dos movimentos ecológicos, tais como o
direito de viver num ambiente não poluído (terceira geração); e os decorrentes da pesquisa
biológica e suas conseqüentes manipulações genéticas, sendo de quarta geração. 19
Pode-se afirmar que essa última fase teve como ponto de partida as aflições do
primeiro grande conflito mundial, e a partir daí os direitos humanos assumiram aspectos de
17
Ibidem, p. 98-99.
FARIAS, Paulo José Leite. Água: bem jurídico econômico ou ecológico? Brasília: Brasília Jurídica, 2005, p.
185.
19
BOBBIO, op. cit., p. 6-7.
18
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24
normas internacionais por intermédio dos tratados e convenções celebrados entre os países.
Ademais, surgiram regras de comportamento em conflitos armados para a proteção
de prisioneiros, de civis, de militares não-combatentes e de patrimônios histórico-culturais,
inclusive normas proibindo o trabalho escravo e regulamentando o trabalho assalariado no
âmbito da comunidade internacional, por causa da expansão do capitalismo financeiro.
Exemplos dessas evoluções foram a Convenção de Genebra (1864) e seus
Protocolos Adicionais, a Conferência de Bruxelas (1890) e diversas convenções estabelecidas
pela Organização Internacional do Trabalho (1919).
Segundo Rogério Gesta Leal, é a Declaração Universal dos Direitos Humanos
aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas que, em 10 de dezembro de 1948,
estabelece um profundo marco na internacionalização dos direitos humanos, sendo
complementada, posteriormente, pelos Pactos Internacionais de 1966, sobre direitos civis e
políticos, e sobre direitos econômicos, sociais e culturais. Estes documentos respaldam a
obrigatoriedade jurídica dos acordos assumidos pelos Estados-Partes, no sentido de proteger e
efetivar tais direitos. 20
Com essa Declaração Universal, ficou reconhecida a necessidade de os países
observarem as regras deste importantíssimo documento, a fim de se verem respeitados os
direitos individuais, sociais e os chamados direitos metaindividuais; dentre eles, o Direito
Ambiental.
E, a partir de então, num intervalo de menos de meio século, Fábio Konder
Comparato explica que
Não apenas os direitos individuais, de natureza civil e política, ou os
direitos de conteúdo econômico e social foram assentados no plano
internacional. Afirmou-se também a existência de novas espécies de direitos
humanos: direitos dos povos e direitos da humanidade. [...] Chegou-se
20
LEAL, op. cit., p.102.
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25
enfim ao reconhecimento de que à própria humanidade, como um todo
solidário, devem ser reconhecidos vários direitos: à preservação de sítios e
monumentos, considerados parte integrante do patrimônio mundial, à
comunhão nas riquezas minerais do subsolo marinho, à preservação do
equilíbrio ecológico do planeta. 21
Esses direitos constituem uma das mais recentes categorias de direitos humanos,
com um caráter bem mais genérico e difuso, em que a titularidade pertence ao gênero
humano, e, em se tratando de meio ambiente, não se restringem somente à humanidade, mas a
todos os seres vivos.
A II Conferência Mundial de Direitos Humanos (1993), em Viena, sedimentou em
caráter universal a necessidade de ser reafirmado o compromisso e responsabilidade de todos
os Estados promoverem o respeito global à proteção dos direitos humanos.
O documento que dela derivou propugna pela cooperação dos Estados com as
Organizações Não-Governamentais (ONGs) para a garantia efetiva dos direitos humanos,
define a extrema pobreza como inibidora do pleno exercício dos direitos humanos, solicita o
fim do apartheid, reivindica a observação dos direitos humanos das mulheres, crianças e
minorias étnicas.
Recomenda, ainda, a ratificação dos tratados internacionais de direitos humanos e
a adesão de novos países a eles, solicita a elaboração de uma declaração efetiva sobre os
direitos dos povos indígenas e propõe que o desenvolvimento deve satisfazer às necessidades
ambientais para garantir a sobrevivência das gerações presentes e futuras, dentre outras
propostas.
Não se pode olvidar que é nesse contexto histórico contemporâneo que os direitos
humanos têm origem e, particularmente, os chamados de “novos direitos” ou direitos de
21
COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. 3. ed. São Paulo: Saraiva,
2003, p. 56-57.
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26
solidariedade – direito ao desenvolvimento, à paz, à comunicação, ao patrimônio comum da
humanidade, ao meio ambiente sadio – encontram condições férteis para se desenvolverem.
O mundo hodierno tem, dentre os principais desafios, a proteção do ser humano,
do meio ambiente, do desenvolvimento do processo civilizatório, para que as desigualdades
sociais que se apresentam com tanta nitidez, por meio da fome e da miséria, possam ser
mitigadas no âmbito internacional e nacional.
Implementar a proteção do ser humano e do meio ambiente requer um
enriquecimento conceitual do universo jurídico internacional, mediante a análise aprofundada
e eventual consagração de princípios emergentes, v.g., os de interesse comum da humanidade
(common concern of mankind ou humankind), atendimento das necessidades humanas básicas
(basic human needs), desenvolvimento sustentável, desenvolvimento humano, eqüidade
intergeracional e direitos das gerações futuras, parceria global eqüitativa, dentre outros. 22
Vale observar que o meio ambiente ecologicamente equilibrado, no sistema
democrático de direito (predominante no Ocidente), é considerado como direito fundamental
da pessoa humana. Sabe-se que os direitos fundamentais são históricos e que representam as
conquistas de um povo em determinada época, surgindo daí as gerações ou dimensões dos
direitos. Conforme João Batista Herkenhoff: “A história é movimento dialético, a ampliação
de direitos não se esgota. Novos direitos estão sendo reclamados, minorias tomam consciência
de sua dignidade [...].”23
Os direitos humanos possuem características variáveis, pois existem aqueles que
impõem limites à intervenção estatal: direito à vida, direito a não ser submetido a maus tratos,
liberdade e segurança da pessoa, liberdades de pensamento, consciência, religião e opinião,
liberdade de movimento. Por outro lado, existem aqueles que requerem ação estatal mais
22
CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Direitos humanos e meio ambiente: paralelo dos sistemas de
proteção internacional. Porto Alegre: Sérgio A. Fabris Editor, 1993, p. 198.
23
HERKENHOFF, João Batista. Curso de direitos humanos - gênese dos direitos humanos. São Paulo:
Acadêmica, 1994, p. 63.
27
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efetiva: direito ao trabalho e a um digno padrão de vida (alimentação, moradia e vestimenta);
direito à saúde e à previdência social; direito de organizar sindicatos; direito à educação. 24
Por último, é importante observar que o art. 3º da Declaração Universal dos
Direitos Humanos, de 1948, diz que toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança
pessoal. Quando diz "à vida", inclui-se aí o meio ambiente ecologicamente equilibrado, pois
se trata de uma das condições essenciais ontológicas do viver em toda a sua plenitude e
formas.
Dessa forma, serão analisados no próximo tópico determinados aspectos
conceituais sobre meio ambiente, Direito Ambiental, correntes antropocêntricas e
ecocêntricas, tão necessários ao prosseguimento do conteúdo desta pesquisa.
1.2 Aspectos
conceituais
sobre
meio
ambiente,
Direito
Ambiental,
correntes
antropocêntricas e ecocêntricas
Existe uma natural dificuldade em definir o termo ambiente. Isto ocorre pela
abrangência do termo e pela grande diversidade de significados. A fim de facilitar tal
entendimento e pela relevância de alguns conceitos para esta pesquisa, serão apresentadas
considerações epistemológicas de autores consagrados no estudo sobre meio ambiente,
Direito Ambiental, ou Direito do Ambiente, correntes antropocêntricas e ecocêntricas.
Inicialmente, observa-se que a palavra “ambiente” é definida no dicionário Novo
Aurélio Século XXI 25 da seguinte forma: “1. Que cerca ou envolve os seres vivos ou as
coisas, por todos os lados; envolvente. 2. Aquilo que cerca ou envolve os seres vivos ou as
coisas; meio ambiente. 3. Lugar, sítio, espaço, recinto. 4. Meio.” Logo, é fácil notar que os
24
CANÇADO TRINDADE, op.cit., p. 186.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio século XXI: o dicionário da língua portuguesa. 3.
ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999, p.117.
25
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28
termos “ambiente” e “meio” têm o mesmo significado; conseqüentemente, a expressão “meio
ambiente” apresenta um pleonasmo.
Nesse sentido, José Afonso da Silva explica também que o termo “meio ambiente”
traz na sua composição lingüística duas palavras sinônimas em uma expressão composta, mas
chama a atenção para o fato de a língua portuguesa utilizar-se desse recurso quando há
necessidade de destacar ou reforçar um termo que sofreu desgaste ao longo do tempo, ou
porque se deseja alcançar uma maior abrangência com o termo reforçado, em face de sua
aceitação e expressividade no idioma pátrio. 26
Esse autor conceitua meio ambiente de forma ampla, in verbis:
O meio ambiente é, assim, a interação do conjunto de elementos naturais
artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida
em todas as suas formas. A integração busca assumir uma concepção
unitária do ambiente, compreensiva dos recursos naturais e culturais. 27
Vale observar que a legislação federal, através da Lei de Política Nacional de
Meio Ambiente (art. 3º, I, da Lei 6.938/81), define meio ambiente como “o conjunto de
condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite,
abriga e rege a vida em todas as suas formas.”
Nessa vereda, Toshio Mukai corrobora com tal entendimento conceitual
globalizante de meio ambiente e define Direito Ambiental da seguinte forma:
O Direito Ambiental (no estágio atual de sua evolução no Brasil) é um
conjunto de normas e institutos jurídicos pertencentes a vários ramos do
direito reunidos por sua função instrumental para a disciplina do
comportamento humano em relação ao seu meio ambiente. 28
26
SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. 5. ed. São Paulo: Malheiros. 2004, p. 19.
Ibidem, p. 20.
28
MUKAI, Toshio. Direito ambiental sistematizado. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005, p. 11.
27
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29
Um outro conceito desse “novo direito”, tendo como base o ordenamento jurídico
brasileiro, é lecionado por Édis Milaré, in verbis:
Direito do Ambiente, considerando-o como o complexo de princípios e
normas coercitivas reguladoras das atividades humanas que, direta ou
indiretamente, possam afetar a sanidade do ambiente em sua dimensão
global, visando à sua sustentabilidade para as presentes e futuras gerações. 29
Como resultado desses ensinamentos, depreende-se que a expressão meio
ambiente representa uma idéia de integração dos elementos que constituem o meio em que se
vive, sejam eles naturais, artificiais, ou culturais, todos inter-relacionados por normas e
princípios que compõem o Direito Ambiental os quais visam ao equilíbrio da vida em todas as
suas formas.
No prosseguir desses aspectos conceituais, torna-se importante lembrar que fazer
uma abordagem sobre a temática ambiental requer cautela para não se enveredar por
concepções tendenciosas e extremas que medeiam entre o tecnicismo apaixonado e o
naturalismo romântico, permanecendo num circuito ineficiente de produção de idéias e de
soluções inviáveis para a problemática ambiental. 30
Em rápidas pinceladas, tem-se o surgimento da conscientização ambiental dividida
em correntes antropocêntricas e ecocêntricas, cujas estratégias e ações objetivam um mesmo
ponto, apesar de terem visões diferentes em relação ao tema.
Vale observar que neste trabalho será considerada a ótica da teoria biocêntrica
contida na teoria ecocêntrica, lato sensu, que vincula todos os entes físicos e biológicos, sejam
eles animados ou inanimados, em oposição à visão antropocêntrica. 31
29
MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: doutrina, jurisprudência, glossário. 4. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005, p. 155.
30
BRESSAN, Delmar. Gestão racional da natureza. São Paulo: Hucitec, 1996, p. 11.
31
Sobre o tema: Cf. MILARÉ, op. cit., p. 86-95; FARIAS, op. cit., p. 101-110.
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30
Diante das preocupações ambientais que se vivencia, Almerindo Lessa,
prefaciando a obra de Paulo de Almeida Machado, traz a seguinte indagação:
Encaminha-se a Humanidade para um suicídio coletivo ou prepara a sua
apoteose? Submetida a sucessivos movimentos: a idade do ferro, uma
revolução agrícola, três revoluções industriais, e dispondo de enormes
poderes de intervenção sobre a sua mais íntima biologia, estará ela a ser
conduzida para um suicídio coletivo, como é de regra em biologia sempre
que uma espécie se deforma em gigantismo; ou, ao contrário, a caminhar
por uma série de criações esplendorosas, e muitas ainda invisíveis, para uma
apoteose? 32
Os estudos sobre o meio ambiente surgiram atrelados às ciências biológicas, mas
evoluíram e se desdobraram permeando outras ciências, inclusive a jurídica. Com isso, foi
sendo desvendada a importância do meio físico e dos fatores ambientais bióticos ou
abióticos, bem como dos fatores sociais.
O avanço tecnológico coloca questões éticas, especialmente no campo da
biotecnologia e na construção de novas espécies animais ou vegetais, a partir da engenharia
genética. O limite entre a natureza e a cultura se torna mais difuso.
A dimensão social da ecologia humana se reveste de grande importância, porque
os custos econômicos e impactos prejudiciais de ações humanas tendem a recair, com maior
peso, sobre os segmentos sociais com menor poder político, menor carga de informações ou
menor capacidade social de defender e garantir seus interesses.
A sustentabilidade social e a eqüidade são componentes centrais de um
ecodesenvolvimento. Para ser sustentável, o desenvolvimento precisa enfrentar o desafio de
eliminar a pobreza e reduzir desigualdades e injustiças socioeconômicas. Precisa reconhecer
os crescentes riscos e ameaças à segurança individual e social representados pelos
desequilíbrios ambientais.
32
ALMEIDA MACHADO, Paulo de. Ecologia humana. São Paulo: Cortez, 1984, p. 13.
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31
Importante destacar que o meio ambiente humano é mais complexo que qualquer
outro; pois, além do universo biótico e abiótico, inclui, ou desenvolve um universo sui
generis, composto de culturas, religiões, doutrinas, teorias, economias, maquinários,
governos, sociedades, mitos, histórias, dentre outros elementos.
É por isso que o estudo das interações entre o homem e o meio ambiente em que
vive (físico, biológico, cultural, social), deve levar em conta o desenvolvimento social
resultante das interações de ambos, fenômeno esse que resulta da adaptação constante a um
universo em evolução.33
Nesse contexto, as cidades e seus fluxos, típicos da espécie humana, constituem
ecossistemas construídos que se diferenciam internamente em função de fatores econômicos,
sociais, culturais e também naturais.
As cidades se relacionam com o ambiente ao seu redor, de onde extraem materiais,
energia, alimentos, água, ar, para seu uso e consumo, provocando impactos ambientais. Há
necessidade de alimentar-se de fluxos de energia provenientes de várias fontes para se
sustentar. Esses centros urbanos podem manter-se sustentáveis caso utilizem, adequadamente,
os recursos de seu próprio abastecimento.
A concepção ambiental proposta pela Ecologia Humana se preocupa em garantir a
sustentabilidade energética dos sistemas urbanos e industriais, bem como a adoção de
matrizes energéticas eficientes, que gerem menores custos à qualidade ambiental.
Isso, porque a qualidade de vida humana depende da manutenção do equilíbrio
dinâmico entre os elementos bióticos e abióticos da biosfera, equilíbrio este submetido a
limites estabelecidos pelas leis da natureza.
33
Ibidem, p. 136.
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32
Os projetos e atividades humanas promovem alterações na parte de um todo, cuja
resultante no conjunto das intervenções em nível de biosfera contém ameaças potenciais de
rupturas dos limites que asseguram a sustentabilidade do ambiente global.
Ao longo da história ecológica do globo, as relações de uma espécie com as
demais sempre foram mais cooperativas que competitivas, mas “a história do homem sobre a
Terra é a história da ruptura progressiva entre a sociedade e o entorno.”34
No atual estágio de desenvolvimento e evolução da humanidade, a escolha e
decisão sobre os padrões sustentáveis de produção e de consumo podem significar a diferença
entre o desastre ecológico e a sobrevivência das novas gerações de seres humanos dentro da
biodiversidade.
As concepções ambientais, apesar das inúmeras feições que podem assumir em
virtude de um ou outro aspecto mais evidenciado, basicamente se restringem a duas grandes
vertentes, conforme já mencionadas: a concepção antropocêntrica e a ecocêntrica.
A primeira tem significado sócio-biológico, enquadrando as circunstâncias que
envolvem os seres vivos, afetados por aspectos físicos, químicos e biológicos, tanto
propriamente naturais como construídos pelos homens. Nessa concepção, o termo “meio
ambiente” é usado para se referir às circunstâncias nas quais vive o homem, tendo a espécie
humana como referencial, por considerá-la o ápice do evolucionismo ou do criacionismo.
A segunda considera a funcionalidade interativa da geosfera-biosfera, focalizando
a existência de unidades organizadoras dos elementos abióticos e bióticos que compõem o
meio ambiente, elaborados mesmo sem a presença e ação do ser humano. Nessa concepção, o
34
SANTOS, Milton. A redescoberta da natureza. Aula inaugural da FFLCH-USP, 1992.
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33
termo “meio ambiente” é usado para designar o conjunto dos componentes da geosferabiosfera, sem privilegiar esta ou aquela espécie viva. 35
Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy constata uma “clivagem conceitual no
movimento ecológico” em que, de um lado,
[...] um segmento mais social preocupa-se com legalismo prescritivo que
determina como cuidar-se do meio ambiente. Parcela mais crítica concentrase nos porquês da aludida proteção, desenhando-se uma ética da terra, um
ambientalismo holístico. Esse grupo também convive com uma dicotomia.
Para os mais conservadores, protagonistas de um ambientalismo pouco
profundo (shallow environmentalism) a proteção ambiental decorre do fato
de que a natureza tem valor instrumental para nós, seres humanos; trata-se
da concepção dominante. A esse intenso antropocentrismo contrapõe-se um
biocentrismo insurgente, que reconhece direitos intrínsecos à própria
natureza, hostilizando o pragmatismo de matiz humanista. Conotações mais
sociológicas denunciam o uso do ambientalismo por parte de injunções
políticas orquestradas para a captação de recursos externos e de simpatias
ensejadoras de votos, prestígio, poder. 36
Esse autor alega que o pensamento ocidental, embasado numa concepção
filosófica e religiosa antropocêntrica, é o responsável pela dicotomia entre natureza e homem,
pois este é visto como o ápice da criação, feito à imagem e semelhança do Criador, inserido
no planeta com a messiânica tarefa de dominar a natureza, subjugando-a e dela se apropriando
para seu deleite e usufruto.
Ainda, Arnaldo Godoy esclarece que as concepções sobre o meio ambiente são
fortemente antropocêntricas, pois o objetivo do preservacionismo, do conservacionismo, do
desenvolvimentismo sustentável é, em última instância, assegurar a continuidade e qualidade
da vida humana.
35
CHRISTOFOLETTI, Antônio. Impactos no meio ambiente ocasionados pela urbanização tropical. In: SOUZA,
Maria Adélia A. de (Org.). Natureza e sociedade de hoje: uma leitura geográfica. São Paulo: Hucitec, 1997, p.
127-138.
36
GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Fundamentos filosóficos do Direito Ambiental. Revista Paradigmas
de Filosofia Brasileira, Londrina, v. 4, n. 2, p. 119-123, jun. 2001.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
34
Para esse autor, a Declaração do Rio (1992) confirmou tal presunção, reforçando a
idéia de que a humanidade deve proteger a natureza porque a natureza protege a humanidade.
A percepção antropocêntrica postula a valorização e proteção do meio ambiente por critérios
de utilidade, tanto é que o que não for assim considerado, ou que possa ameaçar a existência
humana, pode ser sumariamente eliminado.
Exemplos disso são os tombamentos de monumentos naturais e paisagens pelos
seus valores cênicos, fato que só existe, em última análise, para assegurar o deleite humano. A
preservação da biodiversidade tropical tem em vista resguardar espécimes conhecidos e
desconhecidos que tenham ou possam ter aproveitamento futuro. Mesmo quando não há uma
utilidade direta, a justificativa está em manter o equilíbrio dos ecossistemas, pois uma vez
rompido, afetará a comunidade humana do entorno, e dependendo das dimensões, a
comunidade humana global.
Um outro aspecto que evidencia a dimensão antropocêntrica das concepções
ambientais está na expressão “gerações futuras”, referindo-se à necessidade de preservar, de
conservar, para que outros seres humanos possam vir a utilizar esse ou aquele recurso, ou se
deleitar com essa ou aquela paisagem.
Embora a questão ambiental tenha sido deflagrada há menos de meio século
(décadas de 1960-70), rapidamente tomou dimensões planetárias, com vieses culturais e
políticos que geraram uma variedade de linhas de pensamento e ação, com diversas propostas
para as relações homem-natureza, tendo no ecologismo biocêntrico sua vertente
“fundamentalista”, a esquerda radical do movimento ecológico.
Essa corrente preconiza uma ética ambiental revolucionária na qual a natureza
passaria, de objeto dominado, a sujeito de direitos numa modalidade inédita de relação,
negando-se à espécie humana qualquer centralidade ou superioridade no mundo natural.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
35
Conforme Barbosa & Drummond, a proposta biocêntrica consiste em estender os
direitos naturais aos elementos bióticos e até mesmo abióticos do mundo natural, pois
consideram que animais, plantas e elementos inanimados teriam direitos intrínsecos,
independentemente de sua utilidade ou significado para os seres humanos. 37
Os ecocentristas combatem a ideologia antropocêntrica de dominação da natureza,
rejeitando os interesses humanos como única medida das coisas. Alegam que o modelo
antropocêntrico encara a natureza como fonte de recursos à satisfação humana, quando não a
tem como fonte de representações negativas que justificariam sua alteração, sua dominação, o
extermínio de determinadas espécies e a modificação de determinados ambientes.
Ou melhor, significa dizer que a natureza selvagem, tão cara ao ecocentrismo, é
vista pelos antropocentristas como um mundo ruim, eivado de perigos, doenças, privações,
devendo ser dominado e transformado para o bem estar da espécie humana.
O ecocentrismo, passando-se pelo biocentrismo, difere das outras concepções de
meio ambiente justamente na ênfase que atribui ao valor intrínseco do mundo natural,
pretendendo estender-lhe os mesmos direitos naturais atribuídos aos seres humanos,
independentemente do sentido utilitário ou estético que a natureza possa ter. Sentido esse,
muitas vezes dissimulado nas vertentes conservacionistas, preservacionistas, ecoteológicas,
ecodesenvolvimentistas, que por isso mesmo seriam (apesar de não assumirem
ostensivamente tal postura) antropocêntricas.
Conforme vaticina Félix Guattari, “mais do que nunca a natureza não pode ser
separada da cultura e precisamos aprender a pensar transversalmente as interações entre
ecossistemas, mecanosfera e Universos de referência sociais e individuais.” 38
37
BARBOSA, Lívia Neves de Holanda; DRUMMOND, José Augusto. Os direitos da natureza numa sociedade
relacional: reflexões sobre uma nova ética ambiental. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 7, n. 14, p. 265289, 1994.
38
GUATTARI, Félix. As três ecologias. São Paulo: Papirus, 1991, p. 25 .
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36
Embora certos segmentos do movimento ecológico defendam as concepções
endêmicas para o meio ambiente, e outros se posicionem no lado oposto, é essencial
estabelecer uma posição entre os extremos de um naturismo desumanizador e de um
economismo destruidor.
Assim, o respeito ao meio ambiente e à vida são as referências básicas perseguidas
por essas duas correntes – antropocêntrica e ecocêntrica -, visando à sobrevivência qualitativa
da humanidade. Ou seja, independente do ponto de vista, essas correntes objetivam lutar por
condições ambientais necessárias à efetivação do direito fundamental ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado.
No tópico subseqüente, será analisado o ordenamento jurídico sobre o meio
ambiente, em caráter exemplificativo, nos seguintes países: Estados Unidos da América,
Alemanha, França e Portugal.
1.3 Direito ao meio ambiente em países estrangeiros
O Direito Ambiental tem se caracterizado predominantemente no âmbito
internacional ou interno, pela multidisciplinaridade e pelo fato de ter como núcleo principal a
dignidade da pessoa humana.
Observa-se a característica multidisciplinar desse “novo direito”, quando da sua
relação com a Ecologia (v.g., estudo dos ecossistemas), a Economia (v.g., avaliação do dano
ambiental), a Antropologia (e.g., levantamento de culturas diferentes), Estatística (e.g.,
cálculo de probabilidade de estudo de impacto ambiental), dentre outras relações. 39
Além disso, o Direito Ambiental mantém estreitas relações interdisciplinares, por
exemplo, com o Direito Constitucional, Penal, Tributário, Processual, Civil, Internacional, ou
39
MILARÉ, op. cit., p. 175-176.
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37
seja, “o Direito Ambiental penetra os outros ramos do Direito e faz com que estes assimilem
as preocupações de proteção ambiental.” 40
Ademais, o núcleo desse direito, integrado pela dignidade da pessoa humana,
constitui a estrutura sobre a qual se torna “a finalidade última e a razão de todo o sistema
jurídico.” 41 Por isso, entende-se que os problemas ambientais devem ser analisados e
estudados globalmente, contudo sua eficácia ocorre a partir da atuação no ambiente local em
que se vive ou que se protege.
Nessa mesma linha, Ingo Wolfgang Sarlet 42 ensina ser indissociável a relação
entre a dignidade da pessoa e os direitos fundamentais (v.g., o meio ambiente), pois sem que
se reconheçam à pessoa humana tais direitos – privacidade, honra, tratamento não
discriminatório, direito geral de igualdade, direito à sadia qualidade de vida, dentre outros –
que lhe são inerentes, em verdade estar-se-á negando-lhe a própria dignidade.
Portanto, nesse contexto multidisciplinar e complexo que permeia o Direito
Ambiental por um ambiente ecologicamente equilibrado, serão apresentados abaixo, tomando
como exemplo, quatro países estrangeiros com suas próprias características evolutivas no que
tange a esse “novo direito”. Vale salientar que o Brasil será analisado, com mais abrangência,
no tópico 2.3 (Evolução das normativas nacionais do meio ambiente) deste trabalho.
1.3.1 Estados Unidos da América
Os Estados Unidos da América estão dentre os primeiros países a legislar sobre o
meio ambiente. Faz-se necessário lembrar que, em 1899, o governo americano adotou a Lei
40
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 7. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1999, p. 47.
COMPARATO, op. cit., p. 61
42
SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal
de 1988. 4. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 84-86.
41
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38
de Rios e Portos e proibiu a descarga de refugos em vias navegáveis, passando a controlar e
avaliar as conseqüências do lançamento desses produtos poluidores em cursos d’água. 43
Todavia, o Direito Ambiental, de acordo com o moderno entendimento, teve
início, efetivamente, nos Estados Unidos em fins da década de 1960 e no princípio da década
de 1970, ficando este período caracterizado pela sanção da Lei de Política Ambiental de
1969. 44
Observa-se que a evolução ambiental norte-americana decorreu da forte tradição
de seus cidadãos reivindicarem seus direitos ao Poder Judiciário. De certa forma, isto tem
servido de inspiração a vários países quanto à prática dos litígios pertinentes à proteção
ambiental. 45
Nesse passo, a evolução do Direito sobre o controle do uso do solo, que começou
entre 1920 e 1930, adquiriu importância na década de 1960 e subseqüentes, tendo em vista a
evolução do chamado Direito de planificação, isto é, os planos passaram de documentos não
muito importantes para documentos de caráter normativo.
Impende destacar a citada Lei de Política Ambiental – National Environmental
Policy Act of 1969 (NEPA) – que exigia audiências públicas e se referia aos estudos de
impacto ambiental, tornou-se uma espécie de lei fundamental para o Direito Ambiental norteamericano, em linhas gerais seguida por grande parte dos estados-membros componentes de
sua federação. 46
Destarte, verifica-se que os norte-americanos, desde 1969, inseriram o meio
ambiente no planejamento governamental – Lei de Controle de Poluição da Água, de 1972;
Clean Air Act, de 1970, emendado em 1990 – e seus estados-membros assumem cada vez
mais responsabilidades em relação à proteção ambiental.
43
ANTUNES, op. cit., p. 279.
MUKAI, op. cit., p. 154-156.
45
ANTUNES, op.cit., p. 45.
46
Ibidem, p. 280.
44
39
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1.3.2 Alemanha
A República Federal da Alemanha inseriu o Direito Ambiental como disciplina
jurídica a partir do início de 1970. Vale lembrar que sua Lei Fundamental, de 1949, dispunha
a respeito da proteção ambiental, apesar de fazer prescrições específicas sobre substâncias
perigosas, energia nuclear, gestão dos recursos hídricos, ordenamento rural e suas
competências, dentre outras prescrições. 47
Conforme Aluísio Gonçalves de Castro Mendes, a defesa judicial dos interesses
difusos e coletivos (v.g., o meio ambiente) na Alemanha é feita por meio das Verbandsklagen,
que são as ações associativas, cuja cultura do
[...] associativismo e do Gruppierrung (agrupamento) está entranhada no
povo alemão. A necessidade de organização e estruturação dos interesses
comuns, sejam eles esportivos, festivos ou voltados para a defesa do meio
ambiente ou dos consumidores, enseja o fortalecimento das entidades e
organizações civis. 48
Outrossim, há três princípios jurídicos nucleares que regem o Direito Ambiental
germânico: o princípio da prevenção, o do poluidor-pagador e o da cooperação. Por sua vez, o
Poder Legislativo, assim como a jurisprudência em matéria de planejamento do solo, do
planejamento da construção, de aeroportos, de estradas, desenvolveram mais um princípio, no
qual todos os interesses públicos e privados afetados pelo planejamento devem ser tomados
em consideração, visando ao bem comum.
49
Além disso, existe no direito de planejamento alemão um programa para avaliação
de impacto ambiental, embora não haja um dever formal de avaliação de impacto, que será
47
MUKAI, op. cit., p. 155-156.
MENDES, Aluísio Gonçalves de Castro. Ações coletivas no direito comparado e nacional. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2002, p. 121.
49
MUKAI, op. cit., p. 156.
48
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40
implantado com os ajustes decorrentes das diretrizes sobre o assunto pela Comunidade
Européia.
Verifica-se, também, que o governo federal da Alemanha tem integral
competência legislativa para o controle da poluição do ar, da eliminação de resíduos, do
planejamento de construção, contudo em assunto sobre poluição de águas, ordenamento rural,
proteção da natureza, a sua competência geral possibilita, somente, decretar leis que
prescrevam princípios gerais. Portanto, quando houver necessidade de uma unidade no
direito, pode ser decretada uma disposição detalhada; mas, para publicar-se uma lei geral, a
representação dos governos estaduais terá que autorizá-la. 50
A saber, a justiça nesse país está organizada com ramos específicos que não
existem no Brasil, dentre os quais o da Administração Pública, o das Finanças e na esfera do
Direito Processual Administrativo há uma preocupação com a tutela dos interesses coletivos,
por meio da implementação dos denominados “processos modelos.” 51
Assim, observa-se que não existe a unificação das normas desse “novo direito” na
Alemanha, e que suas leis não puderam fazer respeitar plenamente os interesses ambientais,
havendo uma clara debilidade essencial e política nas posições atinentes à proteção do meio
ambiente. 52
1.3.3 França
A França inseriu o Direito Ambiental nas universidades a partir de 1971. Este
campo do saber era destinado a não juristas, no contexto de um diploma pluridisciplinar.
50
CHAGAS, Márcia Correia. O direito ao meio ambiente como direito fundamental à vida. 1998. 177 f.
Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 1998, p. 109.
51
MENDES, op. cit., p. 122-123.
52
MUKAI, op. cit., p. 156.
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41
Passado certo tempo, algumas Faculdades de Direito introduziram tal disciplina, como
matéria optativa, e, em 1988, como um Magistério.53
O ordenamento jurídico francês adota, desde julho de 1976, o estudo do impacto
ambiental, quando a Assembléia Nacional Francesa aprovou a lei que passou a exigir essa
importante medida de proteção ao meio ambiente.
A regulamentação de tal norma veio ocorrer em outubro de 1977, fato muito
criticado pelos especialistas, dentre eles Michel Prieur, que considerou o referido
retardamento algo “escandaloso”, tendo em vista, no período do vacatio legis da citada
norma, ter havido autorização para a implantação de três usinas nucleares sem o prévio estudo
de impacto ambiental. 54
Ademais, é de verificar-se, conforme Aluísio Gonçalves de Castro Mendes, que a
tutela coletiva na França tem característica peculiar, pois sempre esteve vinculada ao processo
penal, através da denominada action civile. Inclusive, esse autor ratifica a existência de leis –
Código Rural – no âmbito do Direito Ambiental que dispõe sobre a legitimação da
propositura de tal ação judicial, objetivando proteger o ambiente. 55
O sistema de avaliação de impacto ambiental francês é muito burocratizado, mas
reconhece a existência do princípio do respeito ao meio ambiente que se aplica a três
modalidades de intervenção ambiental: obras públicas ou privadas, projetos urbanísticos e
planos de manejo. Também, existem modelos a serem aplicados, segundo as exigências de
análise das repercussões ambientais do projeto a ser implantado: mininotícia de impacto,
notícia de impacto e estudo de impacto.56
Por último, a França tentou implementar vários planos de proteção ambiental. Vale
destacar o décimo plano – Lei de 10 de julho de 1989 –, tendo em vista ter provocado a
53
Ibidem, p. 158.
ANTUNES, op. cit., p. 284.
55
MENDES, op. cit., p. 152-155.
56
ANTUNES, op. cit., p. 286.
54
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42
elaboração de uma nova política governamental do meio ambiente, integrando este a todos os
setores socioeconômicos, além de instaurar bases para uma política ambiental duradoura. 57
1.3.4 Portugal
A Constituição de Portugal vigente, aprovada em 2 de abril de 1976, ainda sob a
influência da Revolução dos Cravos (1974), consagra o direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado e eleva-o à dignidade de direito fundamental do cidadão (art. 66,
nº. 1, da Constituição da República). 58
Nessa mesma linha, foram publicadas no Direito Positivo português algumas
normas importantes visando à proteção do meio ambiente, v.g., a Lei das Associações de
Defesa do Ambiente ( Lei nº. 10, 4 de abril de 1987), a Lei de Bases do Ambiente (Lei nº.11,
07 de abril de 1987).
Outrossim, segundo Aluísio Gonçalves de Castro Mendes, a ação popular, forma
de exercício da cidadania, por força da Lei Complementar 1/89, ganha novos contornos e a
Constituição da República passou a especificar, em seu art. 52, nº. 3, o seguinte:
A todos ou através de associações de defesa dos interesses em causa, o
direito de ação popular nos casos e termos previstos na lei, nomeadamente o
direito de promover a prevenção, a cessação ou a perseguição judicial das
infrações contra a saúde pública, a degradação do ambiente e da qualidade
de vida, ou a degradação do patrimônio cultural, bem como de requerer para
o lesado ou lesados a correspondente indenização. 59
Incumbe observar que a finalidade do Direito Ambiental é definida de maneira
genérica no art. 2º, nº. 2, da Lei de Bases do Ambiente: “Otimizar e garantir a continuidade de
57
MUKAI, op. cit., p. 159.
Ibidem, p. 161.
59
MENDES, op. cit., p. 134-135.
58
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43
utilização dos recursos naturais, qualitativa e quantitativamente, como pressuposto básico de
um desenvolvimento auto-sustentado.”60
À guisa de conclusão, cumpre assinalar que o direito luso estrutura esse “novo
direito” em três princípios fundamentais: prevenção, poluidor-pagador e cooperação. Além
disso, consagra a responsabilidade objetiva (art. 41 da Lei 11/87), considera o direito ao
ambiente como um direito da personalidade humana e as associações de defesa do ambiente
assumem papel relevante em defesa de condições da qualidade de vida humana, sadia e
ecologicamente equilibrado. Para esclarecer esse conceito, o próximo tópico irá traduzir uma
síntese desse direito que objetiva uma melhor qualidade de vida a todos. Por isso, será
analisado com mais amplitude.
1.4 Direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado
A questão ambiental toca diversas áreas das Ciências Humanas, exigindo
abordagens nos campos econômico, religioso, ético e político. Imiscui-se nas relações dos
cidadãos entre si e da sociedade com o Estado, tendo este a incumbência delegada por
aqueles, de normatizar as relações e possibilitar a convivência harmoniosa e sustentável.
Dentro do contexto político, entendido como toda relação social de poder, a crise
ambiental evidencia a dificuldade dos mecanismos políticos de considerar a complexidade dos
problemas sociais.
Nesse aspecto, a questão ambiental faz parceria com os desequilíbrios sociais,
econômicos que geram vários tipos de conflito – étnicos, raciais, xenofobia, regimes
autoritários, marginalização de uma significativa parcela da sociedade – por causa da
60
MUKAI, op. cit., p. 162.
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44
incapacidade do Estado em articular soluções políticas que trabalhem a questão ecológica no
conjunto dos demais problemas da sociedade. 61
O surgimento da conscientização ambiental nos diversos segmentos da sociedade
remete a uma questão fundamental em matéria de Direito; pois, além da necessária
implementação da educação ambiental, também se insere o direito de viver assegurado pelo
Estado.
Todavia, esse direito de viver exige condições adequadas, aliadas a um
crescimento e desenvolvimento saudável, que só podem ocorrer em ambientes salubres,
capazes de prover as necessidades básicas da vida dos seres em geral, dentro de um
ecossistema global, equilibrado e sustentável.
Portanto, a vida só se desenvolve adequadamente em sistemas ecológicos que não
apresentem variações quantitativo-qualitativas que a tornem vulnerável, estando o direito a
um ambiente propício para a manutenção dos ciclos vitais na base das reivindicações
ecológicas.
Conseqüências dessas reivindicações surgiram os direitos humanos fundamentais
de terceira geração, que Rogério Gesta Leal analisa como produtos dos processos sociais,
políticos, econômicos, concluindo que a
[...] concepção de Direitos Humanos e Fundamentais emerge da reflexão
sobre temas referentes ao desenvolvimento e à autodeterminação dos povos,
à paz, ao meio ambiente saudável e ecologicamente equilibrado [...]
gerando-se, a partir daí [...] uma plêiade de novas demandas e novos
direitos, ampliando ainda mais as possibilidades de configurações dos
Direitos Humanos e Fundamentais, como [...] os direitos relacionados à
questão ecológica. 62
61
TEIXEIRA, Zaneir Gonçalves. Direito e crise ambiental: condições para a efetivação do direito fundamental
ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. 2002. 189 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade
Federal do Ceará, Fortaleza, 2002, p.59.
62
LEAL, op. cit., p. 43-45.
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45
Pela abordagem recente das questões ambientais no campo da ciência jurídica,
Márcia Rodrigues Bertoldi questiona
[...] Inerentemente ao que possa significar o "direito a um meio ambiente
adequado e equilibrado ecologicamente" há uma implícita existência de
uma forte ligação entre direitos humanos e meio ambiente que nos conduz à
pergunta: quando se viola o direito ao meio ambiente, também se violam
direitos humanos? Até o presente momento esta indagação não tem uma
resposta, apesar da existência de tendências e proposições. 63
Os legisladores brasileiros avançaram significativamente na abordagem das
questões ambientais com a promulgação da Constituição Federal de 1988, elevando o meio
ambiente à categoria jurídica de res communis omnium (bens pertencentes a todos), por
considerá-lo essencial à sadia qualidade de vida, assimilando a tendência mundial dos direitos
de terceira geração, e lastreando a questão ambiental nos direitos fundamentais.
Nesse sentido, Paulo de Bessa Antunes aponta para um aspecto do artigo 5º da
Constituição Federal de 1988, nem sempre percebido, qual seja, o inciso LXXIII, que
estabelece um remédio constitucional a ser aplicado pelo cidadão na ocorrência de atos
lesivos ao meio ambiente, a Ação Popular, e conclui:
Ora, se é uma garantia fundamental do cidadão a existência de uma ação
constitucional com a finalidade de defesa do meio ambiente, tal fato ocorre
em razão de que o direito ao desfrute das condições saudáveis do meio
ambiente é, efetivamente, um direito fundamental do ser humano. 64
Outrossim, conforme leciona Robert Alexy, a garantia, a promoção e a efetividade
do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado devem ser implementadas pelo
Estado Democrático de Direito, o que confere a esse direito a sua inserção definitiva no rol
63
BERTOLDI, Márcia Rodrigues. O direito humano a um meio ambiente equilibrado [2000]. Disponível em:
<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=1685> . Acesso em 29 nov. 2005 .
64
ANTUNES, op.cit., p. 20.
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46
dos direitos fundamentais. 65
Entretanto, o meio ambiente ecologicamente equilibrado se reveste de um caráter
difuso, posto que não possa ser classificado como bem público nem como bem privado, não
havendo como identificar seu titular e sendo seu objeto insuscetível de divisão.
O art. 81, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor estabeleceu a definição
legal dos direitos difusos nos seguintes termos: “interesses ou direitos difusos, assim
entendidos para efeitos deste Código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que
sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato.” 66
Nesse contexto, Antonio E. Pérez Luño assim leciona sobre as gerações dos
direitos fundamentais,
Uno de los aspectos que más decisivamente contribuyen a caracterizar a la
tercera generación de derechos humanos se refiere a la redimensión y
ampliación de sus formas de titularidad, poe el reconocimiento de nuevas
situaciones y posiciones jurídicas subjetivas. [...] Para cualquier ciudadano
del mundo actual, sea cual fuere su nacionalidad, la amenaza de un conflicto
atómico le afecta directa e indirectamente. Del mismo modo, que la
catástrofe ecológica de Chernobyl no redujo sus nocivas consecuencias para
el medio ambiente y la calidad de vida a un país. 67
Os direitos difusos decorrem, v.g., de danos ao meio ambiente, dentre outros.
Nesses casos, tais direitos pertencem a todos, seus titulares são indetermináveis e o bem
protegido é indivisível, como a água, o ar, a paisagem histórica, a defesa da flora e fauna.
A proteção ou rejeição de medidas saneadoras aos exemplos acima citados atinge
necessariamente a todos, por isso o meio ambiente – direito difuso por excelência – deve ser
garantido e protegido pelo Estado e pela sociedade.
65
ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Tradução de Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estúdios Políticos y Constitucionales, 1997, p. 451.
66
GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do
anteprojeto. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004, p. 798.
67
PÉREZ LUÑO, A.E. Las generaciones de derechos fundamentales, en Revista del Centro de Estudios
Constitucionales, nº 10, p. 216-217, 1991.
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47
Assim, o patrimônio ambiental vem sendo denominado de bem de interesse social,
no qual se inserem tanto os bens pertencentes ao domínio público como os bens de caráter
privado, mas todos subordinados à consecução de um fim comum, previsto e assegurado
constitucionalmente: a manutenção da vida (de forma sadia), o que só pode ser concretizado
por meio de ambientes ecologicamente equilibrados. 68
De acordo com Flávio José Moreira Gonçalves, pode-se admitir que haja a
positivação, no ordenamento jurídico pátrio, de direitos fundamentais que não estejam, ainda,
previstos na Constituição Federal (CF). Tal conclusão decorre da interpretação do art. 5º, § 2º,
da Lei Maior: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros
decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em
que a República Federativa do Brasil seja parte.”69
Inclusive, vale destacar que a Emenda Constitucional 45, de 2004, altera o 5º da
Carta Magna vigente, inserindo o § 3º, conforme textualiza: “Os tratados e convenções
internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso
Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão
equivalentes às emendas constitucionais.”
Dessa forma, vê-se que os tratados e convenções que preenchem tais requisitos,
passam a ser enquadrados como uma das cláusulas pétreas da Constituição Federal (CF art. 60
§ 4º, IV), e, a partir daí, incorporam-se aos direitos fundamentais que são amparados pelo
Direito Positivo brasileiro, tendo também aplicação imediata.
Isso representa um reforço à consolidação do meio ambiente ecologicamente
equilibrado como direito humano fundamental no Brasil, posto que, além da previsão
constitucional, o Brasil é signatário de diversos tratados internacionais em matéria ambiental.
68
SILVA, José Robson da . O meio ambiente: função social e ambiental. Revista Jurídica da UEPG, Ponta
Grossa, vol. 1, ano 1, 1997. Disponível em: <http://www.uepg.br/rj/a1v1at08.htm>. Acesso em 29 set. 2005.
69
GONÇALVES, Flávio José Moreira. Dos direitos humanos aos direitos fundamentais. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 1997, p. 31-43.
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48
Na ótica de Paulo Bonavides, os direitos fundamentais de terceira geração, dentre
os quais se insere o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, são direitos dotados
“de altíssimo teor de humanismo e universalidade”, e por isso mesmo, não são
particularizados a esse ou àquele indivíduo, mas a “toda coletividade, embora o indivíduo
possa se valer de mecanismos garantidores desses direitos para salvaguardar as boas e
salutares condições ambientais.” 70
A necessidade de criar mecanismos de defesa das boas condições de vida, para
enfrentar as ameaças oriundas da aliança entre desenvolvimento científico, tecnológico e
processo de produção de bens, desencadeou a inclusão do direito ao meio ambiente saudável
no rol dos direitos fundamentais, positivados constitucionalmente e assegurados por garantias.
O fenômeno é recente, remontando ao início da década de 1970, quando ficou
estabelecida a Declaração de Estocolmo sobre Meio Ambiente Humano, e que proclamou em
seu Princípio primeiro:
O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute
de condições de vida adequadas em um meio ambiente de qualidade, tal que
lhe permita levar uma vida digna e gozar de bem-estar, tendo a solene
obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente para as gerações
presentes e futuras. A este respeito, as políticas que promovem ou
perpetuam o apartheid, a segregação racial, a discriminação, a opressão
colonial e outras formas de opressão e de dominação estrangeira são
condenadas e devem ser eliminadas. 71
Percebe-se aí, a opção por um antropocentrismo que permeou as ações e políticas
ambientais implementadas posteriormente, sendo o meio ambiente pensado em termos de
proteção para assegurar a preservação e a qualidade de vida da espécie humana.
70
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 7. ed. Malheiros: São Paulo, 1997, p. 523.
CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE MEIO AMBIENTE HUMANO, 1972, Estocolmo.
Declaração da Conferência das Organizações das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano.
Disponível em:
<http://www.unama.br/institucional/proreitorias/pppe/supes/MeioAmbiente/Documentos/Declaração%20Estocol
mo.doc>. Acesso em 30 jul. 2005.
71
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49
O reconhecimento de que os problemas ambientais ignoram fronteiras, afetando
todo o bioma planetário, com efeitos deletérios e cumulativos, alterando a biodiversidade,
circulação atmosférica, climas, ciclo hidrológico, levaram a comunidade internacional a exigir
medidas protetivas do meio ambiente, como forma de resguardar o direito fundamental à vida
e à dignidade humana, direitos esses primordiais e, por isso, reconhecidos logo na primeira
geração dos direitos humanos.
Isso traduz o reconhecimento de que o direito fundamental à vida, em seu sentido
lato, inclui a manutenção de uma qualidade de vida que, por sua vez, está intrinsecamente
associada à manutenção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado e sustentável.
O escopo fundamental que se busca atingir com a manutenção de um meio
ambiente equilibrado ecologicamente é que o homem tenha condições de usufruir concreta e
plenamente de seu inalienável direito à vida em condições dignas, pois o uso insustentável do
patrimônio natural, reconhecidamente esgotável, é gerador das mazelas econômicas e sociais
que a grande maioria da humanidade padece.
De acordo com Erik Assadourian, se os níveis de consumo das pessoas mais
abastadas replicarem-se pela metade dos nove bilhões de pessoas que serão adicionadas ao
planeta até o ano de 2.050, os impactos nos recursos hídricos, na qualidade do ar, nas
florestas, climas, diversidade biológica e saúde humana serão extremamente graves. 72
O consumo, em si, não é pernicioso, pois a sobrevivência humana e animal estão
atreladas a isso. A própria Ecologia distingue os seres vivos em consumidores primários,
secundários e terciários. 73 Porém, o consumo ameaça o meio ambiente e o bem-estar das
pessoas, quando se torna um fim em si mesmo.
As economias de consumo em massa que geraram um mundo de abundância para
72
ASSADOURIAN, Erik. et al. O estado do consumo hoje. In WORLDWATCH INSTITUT (Org.). Estado do
mundo 2004: estado do consumo e o consumo sustentável. Tradução de Henry Mallett e Célia Mallett.
Salvador: Universidade Livre da Mata Atlântica, 2004, p. 3-24.
73
ODUM, Eugene Pleasants. Ecologia. 3. ed. São Paulo: Pioneira, 1977, p.150.
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50
alguns, enfrentam agora novos desafios no século XXI: tais como redirecionar os padrões de
consumo a patamares sustentáveis e igualitários, assegurar melhor qualidade de vida às
pessoas, e causar menos danos ambientais. Tudo isso com o objetivo de garantir o direito
fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e à própria vida.
Não se pode olvidar que a vida, direito humano fundamental, e por isso cercada de
garantias constitucionais, correlaciona-se de maneira direta e intensiva com a saúde, o bemestar individual e social.
De modo geral, as buscas agressivas de uma sociedade de consumo em massa,
além de afetar os recursos naturais, têm contribuído para o declínio dos indicadores de saúde
humana em muitos países, resultando em “doenças do consumo”, típicas da sociedade
contemporânea, como o tabagismo, a obesidade e o estresse. A saúde “social” igualmente
vem declinando, fruto das desigualdades na distribuição dos recursos numa sociedade
consumista e excludente.74
Ademais, nesse modelo de sociedade, leis e incentivos econômicos inconseqüentes
e descompromissados com a qualidade de vida estimulam as pessoas a transporem limiares
econômicos, ambientais e sociais sustentáveis, pondo em risco a manutenção dos direitos
humanos fundamentais.
Segundo Balmford, verificações constantes do declínio ambiental global são
apontadas pelo Índice Planeta Vivo, elaborado pelo Fundo Mundial para a Natureza (WWF
Internacional), para aferir o estado de preservação dos ecossistemas naturais. De 1970 a 2000,
o Índice Planeta Vivo registrou um aumento de 35% na degradação ambiental. 75
74
A saúde “social” se refere aos aumentos da pobreza, suicídio juvenil, carência de seguro saúde e desigualdade
de renda, a partir da década de 1970. Faz parte do Índice de Pobreza Humana, do Programa das Nações Unidas
para o Desenvolvimento (PNUD), que compila indicadores de pobreza, analfabetismo funcional, longevidade e
inclusão social. Cf . ASSADOURIAN, Erik. et al. In: WORLDWATCH INSTITUT (Org.). Estado do mundo
2004: estado do consumo e o consumo sustentável. Tradução de Henry Mallett e Célia Mallett. Salvador:
Universidade Livre da Mata Atlântica, 2004, p. 3-24.
75
BALMFORD, Andrew. et al. Razões econômicas para a conservação da natureza. Nova Iorque: PNUMA,
2002, p. 21.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
51
Ou seja, demonstra-se que, apesar de se enquadrar o direito ao meio ambiente
equilibrado como direito fundamental de terceira geração, direito humano que enfatiza a
solidariedade, a fraternidade, ou, como propõe Manuel Gonçalves Ferreira Filho, um “direito
de situação” 76, ainda se tem muito a fazer no âmbito comportamental, político e econômico
para sair de um paradigma desenvolvimentista degradador e fruir de um desenvolvimentista
sustentável.
Esse mesmo autor destaca que, no rol dos direitos fundamentais de terceira
geração, existe, ao lado do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, o direito ao
desenvolvimento. Enquanto o primeiro vem consignado em documentos internacionais como
a Declaração de Estocolmo (1972), a Declaração do Rio (1992), o segundo encontra guarida,
de maneira indireta, na Comissão dos Direitos do Homem (ONU – 1977) e na Declaração
sobre Raça e Preconceitos Raciais (UNESCO – 1978), sendo consagrado na Declaração sobre
o Direito ao Desenvolvimento (ONU – 1986).
A observação que se faz tem por escopo chamar a atenção para a possibilidade de
existirem conflitos entre ambos os direitos fundamentais, considerando que a matriz
desenvolvimentista empregada desde a primeira Revolução Industrial até a Revolução TecnoCientífica vem demonstrando ser incompatível com a sustentabilidade do meio ambiente e
seus recursos naturais.
Portanto, daí advém a urgência em se modificar os padrões de exploração,
produção e consumo, a fim de atender a manutenção de ambos os direitos, todos fundamentais
à vida humana, conforme assinala Enrique Iglesias:
O desenvolvimento sustentável adota uma perspectiva de longo prazo do
processo de desenvolvimento econômico e social que compreende a
salvaguarda e o incremento do capital ambiental e social e a redução da
iniqüidade. [...] Hoje, porém, ainda resta a questão fundamental: como
76
FERREIRA FILHO, op. cit., p. 66-67.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
52
intensificar a sustentabilidade do desenvolvimento? [...] é imperativo
melhorar a gestão e a direção dos recursos naturais e ambientais. Isso
significa diminuir as barreiras à conservação [...] e aumentar a eficiência no
uso de recursos essenciais, como água e energia. Igualmente importante é
reconhecer que a redução da degradação ambiental protege a saúde humana,
torna a terra mais produtiva e melhoram diversos outros elementos do
progresso econômico e social. 77
Como se observa, os avanços tecnológicos propiciaram elevados índices de
produtividade, superiores ao requerido pela demanda, fomentando o consumo e os sistemas de
descarte em massa. A economia altamente produtiva exige que seja feito do consumismo um
meio de vida, acarretando sérios impactos aos ecossistemas de onde provêm a matéria-prima e
para onde se destinam os rejeitos da produção, ou seja, aplica-se, cada vez mais um princípio
muito pouco sustentável e de obsolescência programada.
Registre-se, ainda, que a veneração ao consumo compulsivo transporta a
humanidade para o limiar de um colapso ambiental, exaurindo recursos, disseminando
poluentes, minando ecossistemas. Isto ameaça, inclusive, o equilíbrio ecológico global com
reflexos deletérios à saúde, à qualidade de vida e à própria manutenção da vida humana. 78
Portanto, é imprescindível desenvolver formas éticas e justas de aliviar o ônus
ambiental associado ao consumo, a fim de proteger os direitos humanos e reduzir as pressões
sobre o meio ambiente, possibilitando resguardar o direito fundamental ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado.
Nesse contexto, torna-se importante que se avaliem as “EVOLUÇÕES
TEÓRICAS E NORMATIVAS DO MEIO AMBIENTE”, o que será feito no capítulo
subseqüente.
77
IGLESIAS, Enrique. Estado do mundo e consumo sustentável. In: WORLDWATCH INSTITUT (Org.).
Estado do mundo 2004: estado do consumo e o consumo sustentável. Traduçãode Henry Mallett e Célia
Mallett. Salvador: Universidade Livre da Mata Atlântica , 2004, p. vii.
78
HALWEILL, Brian; NIERENBERG, Danielle. Rumos para uma economia menos consumista. In:
WORLDWATCH INSTITUT (Org.). Estado do mundo 2004: estado do consumo e o consumo sustentável.
Tradução de Henry Mallett e Célia Mallett. Salvador: Universidade Livre da Mata Atlântica, 2004, p. 120-147.
53
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CAPÍTULO 2
EVOLUÇÕES TEÓRICAS E NORMATIVAS DO MEIO AMBIENTE
A consciência da evolução normativa ambiental internacional ou nacional
propiciou o surgimento e o desenvolvimento de normas ambientais na maioria dos países. Isso
decorre da necessidade do homem de saber de onde veio, para onde vai e quais as
conseqüências dessas transformações históricas abruptas sobre o ambiente, cujas alterações,
que normalmente levariam milhares de ano, têm ocorrido num intervalo de tempo muito
curto, o que coloca em risco as várias espécies de vida, inclusive a humana.
Por seu turno, a questão ambiental e seu agravamento têm se desenvolvido
diuturnamente por meio de ações concretas e visíveis, ou através das várias informações
acessadas dos órgãos de comunicação. Essas mudanças científicas e culturais que se
instauram na modernidade obrigam uma revisão do conceito de progresso e desenvolvimento,
particularmente pela ação voraz do capitalismo que gera lucros e se esquece da relação
umbilical e harmônica a prevalecer entre o homem e a natureza.
O alerta para a gravidade desses riscos foi dado pela Conferência da Nações
Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, no ano de 1972, em Estocolmo, Suécia, contando
com a presença de 113 países. Esta Conferência foi resultado da percepção das nações ricas e
industrializadas da degradação ambiental causada pelo seu modelo de crescimento econômico
e a progressiva escassez de recursos naturais. 79
Observa-se que a utilização dos recursos naturais tem sido excessiva e vem sendo
utilizada como se esses bens não fossem finitos e mais ainda, sem a preocupação necessária
de preservá-los para as gerações presentes e futuras. Portanto, compatibilizar o
desenvolvimento com a proteção ambiental deve ser a base a ser engendrada nas políticas que
79
MILARÉ, op.cit., p. 50.
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54
visem a gerir os recursos naturais em relação ao consumo e ao conseqüente desenvolvimento
econômico.
Assim, o desenvolvimento dessa consciência protetiva ambiental tem passado por
significativas transformações, em âmbito externo e interno, conforme será visto nos tópicos
ulteriores. De imediato, serão analisados seis princípios, dentre os citados pela doutrina
majoritária, que servem de fundamento ao Direito Ambiental e mais pertinentes às RPPNs.
2.1 Princípios básicos ambientais
O Direito Ambiental se fundamenta em princípios, cuja finalidade é a proteção da
vida em todas as formas que venham se apresentar. Esses princípios são imprescindíveis, pois
seus objetivos têm como rumo garantir a dignidade da pessoa humana e harmonizar a relação
do direito ao desenvolvimento econômico com a sustentabilidade ambiental, num contexto
ecologicamente equilibrado.
Para tanto, há de se refletir sobre o que se pode ou não fazer, tendo como base
princípios os quais José Joaquim Gomes Canotiho assim preceitua:
Princípios são normas que exigem a realização de algo, da melhor forma
possível, de acordo com as possibilidades fáticas e jurídicas. Os princípios
não proíbem, permitem ou exigem algo em termos de ‘tudo ou nada’,
impõem a otimização de um direito ou de um bem jurídico, tendo em conta
a ‘reserva do possível’, fáctica ou jurídica. 80
Conforme Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, o verbete princípio é definido
como: “causa primária, momento ou local em que algo tem origem, base, origem de um
conhecimento.”
80
81
81
Inclusive, chega aos dias atuais que Tales de Mileto, filósofo naturalista e
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1991, p. 545.
FERREIRA, Aurélio B. H. op. cit., p. 1639.
55
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pré-socrático, quando se referiu a um importante componente do meio ambiente, disse: “A
terra flutua na água e esta é o princípio do universo.”
Existem princípios explícitos e implícitos. Os primeiros são aqueles escritos
claramente nas normas legais, principalmente nos textos constitucionais. Os implícitos ou
tácitos são aqueles que decorrem dos textos constitucionais, mesmo que não se encontrem
escritos. Paulo de Bessa Antunes explica que se devem buscar os princípios jurídicos
ambientais na Constituição, nas leis ou nos fundamentos éticos, os quais irão nortear as
relações entre os seres humanos e destes com as demais formas de vida.
82
Nesse sentido, vale lembrar o imperativo categórico de Immanuel Kant 83 (“age
segundo a máxima tal, que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne lei universal”),
que encerra o princípio de todo dever ser, isto é, devemos pautar nossas ações de acordo com
princípios morais universalmente aceitos. Trata-se de uma obrigação ética que conduz a
distinção do certo ou errado, pois serve de fundamento ao Direito Natural e traz seus reflexos
ao Direito Positivo (variável de povo para povo), particularmente ao Direito Ambiental, base
do presente estudo.
Assim, os princípios e normas que compõem o Direito Ambiental mantêm uma
relação transversal com os demais ramos do direito, ou melhor, as normas ambientais se
imiscuem em cada uma das demais normas jurídicas, obrigando a levar em consideração a
proteção ambiental em todas as dimensões possíveis da ciência jurídica.
Por último, serão analisados seis princípios básicos sobre o tema que servem de
alicerce ao Direito Ambiental84 e contribuem para preservar a vida no planeta Terra, além de
nortear os tópicos subseqüentes, pertinentes à evolução das normativas ambientais
internacionais, nacionais, e às RPPNs.
82
ANTUNES, op. cit., p. 31.
KANT, Immanuel. A Metafísica dos Costumes. Tradução Edson Bini. São Paulo: Edipro, 2003, p. 68.
84
Cf. MILARÉ, op. cit., p. 157 et seq.
83
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56
2.1.1 Princípio da precaução
O princípio da precaução (prudência ou cautela) representa uma evolução na
legislação ambiental brasileira, à proporção que as normas oriundas de conferências e tratados
internacionais que visam a proteger o ambiente planetário, acompanham o Direito Positivo
pátrio e se inserem nele.
Etimologicamente, a palavra precaução (do latim: praecautione) é substantivo do
verbo precaver-se, e sugere cuidado antecipado, prudência, cautela para que um fato não
venha a materializar-se ou a resultar em conseqüências indesejáveis.
Tal princípio se caracteriza por determinar que não se produzam intervenções no
meio ambiente, antes de ter a certeza de que estas não serão adversas a ele. Por isso, o
princípio da precaução exige a cautela no agir; pois, diante da incerteza científica, entende-se
que a prudência é o melhor rumo a seguir, evitando-se danos, muitas vezes, irreparáveis. 85
Conforme Roberto Adorno, a aplicação de tal princípio deve preencher algumas
condições básicas, para evitar seu uso desnecessário, ou seja, deve-se, principalmente, avaliar
a incerteza sobre o risco, ter visão prospectiva de um dano grave irreversível, seguido de
estudo científico sobre o possível fato. 86
Portanto, quando se trabalha com o princípio da precaução, tem-se um risco
potencial, pois a relação entre o risco de dano e a tecnologia existente produz incerteza quanto
ao provável resultado danoso daquele empreendimento ou atividade. Além disso, essa relação
de causalidade é objetiva. Caberá ao empreendedor o ônus da prova, é ele que detém o
conhecimento qualificado do que pretende fazer e provar que sua ação não causará dano ao
ambiente, obrigando-se a agir com precaução. É o que ocorre, v.g., no campo da Bioética.
85
ANTUNES, op. cit., p. 35-36.
ANDORNO, Roberto. El principio de precaucion: um nuevo standard jurídico para la era tecnológica.
Buenos Aires: La Ley, 2002, p. 10-12.
86
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57
Vale lembrar que a gênese desse princípio no Brasil ocorreu a partir da
implementação de Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), que inseriu
como objetivos dessa política pública a compatibilização do desenvolvimento econômicosocial com a preservação da qualidade do meio ambiente. Em seu texto legal, foram previstas
algumas medidas protetivas ambientais tais como: responsabilização do poluidor,
independente de culpa (art. 14, § 1º); e o estudo do impacto ambiental (art.8º, II).
Nessa mesma linha, a Carta Política de 1988, art. 225, caput, amplia o conceito de
meio ambiente, passando a considerá-lo ecologicamente equilibrado e dentro de um contexto
ambiental interdisciplinar, “bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de
vida”, a que todos têm direito sem possibilidade de exclusão.
Conforme Paulo de Bessa Antunes, 87 a existência no ordenamento jurídico do
estudo do impacto ambiental, como condição prévia para implantar um projeto ambiental com
avaliação de seus possíveis efeitos, vem a ser a concretização do art. 170, VI, da Lei Maior
que trata da defesa do meio ambiente..
Entretanto, o reconhecimento internacional desse princípio ocorreu após a
Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992), conforme assinala seu
Princípio nº. 15:
De modo a proteger o meio ambiente, os Estados devem aplicar
amplamente o princípio da precaução, de acordo com suas capacidades.
Quando houver perigo de dano grave ou irreversível, a falta de uma certeza
absoluta não deverá ser utilizada para postergar-se a adoção de medidas
eficazes em função do custo para impedir a degradação do meio ambiente.
Do exposto, infere-se que não se pode alterar o entorno sem antes avaliar os riscos
de um empreendimento em relação ao meio.
87
ANTUNES, op. cit. p. 35-36.
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58
Assim, a implementação do princípio da precaução torna-se necessária, pois o
equilíbrio e sobrevivência dos ecossistemas terrestre dependerão de medidas cautelosas que
objetivem o desenvolvimento econômico aliado à preservação ambiental.
2.1.2 Princípio da prevenção
O princípio da prevenção se caracteriza por ser aplicável a impactos ambientais já
conhecidos e sobre os quais há informações. Tal princípio tem o licenciamento ambiental e o
estudo de impacto ambiental, dentre seus principais instrumentos de prevenção de danos
ambientais.
Vale assinalar que esses instrumentos são aplicáveis de forma a prevenir os danos
que um determinado empreendimento causaria, se não tivesse sido submetido, verbi gratia, ao
estudo do impacto ambiental (art. 225, § 1º, IV, da CF/88). 88
Segundo a etimologia da palavra, prevenção (do latim: praeventione) é substantivo
do verbo prevenir, e significa ato ou efeito de prevenir-se, antecipar-se, chegar antes; induz
uma conotação de generalidade (mais amplo), simples antecipação no tempo, com intuito
conhecido. 89
Ademais, o mencionado princípio está previsto no preâmbulo da Convenção de
Basiléia sobre o Controle de Movimentos Transfronteiriços de Resíduos Perigosos e seu
Depósito de 1989. Além disso, quanto à prevenção do dano esse princípio expressa que
As Partes da presente Convenção, atentas também ao fato de que a maneira
mais eficaz de proteger a saúde e o meio ambiente dos perigos que esses
resíduos representam é a redução ao mínimo de sua geração em termos de
quantidade ou potencial de seus riscos e determinadas a proteger por meio
88
Ibidem, p. 37.
MILARÉ, op. cit. p.165-166. Este autor considera um só princípio, isto é, a prevenção englobando a
precaução, mas não é este o pensamento corrente na doutrina majoritária.
89
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59
de um controle rigoroso, a saúde humana e o meio ambiente contra os
efeitos adversos que podem resultar da geração e administração de resíduos
perigosos e outros resíduos[...]. 90
Nesse mesmo sentido, o princípio da prevenção está inserido na Convenção da
Diversidade Biológica (ECO – 92), em cujo preâmbulo se afirma: “é vital prever, prevenir e
combater na origem as causas da sensível redução ou perda da diversidade biológica.” 91
No ordenamento jurídico brasileiro, observa-se que a Lei 6.938/81, em seu art. 2º,
assinala “a proteção dos ecossistemas, com a preservação das áreas representativas; e a
proteção de áreas ameaçadas de degradação,” como princípios a serem observados, indicando
onde se deve aplicar o princípio da prevenção, ou seja, as medidas preventivas estão
diretamente ligadas àquelas que objetivam proteger o meio ambiente e, conseqüentemente, a
dignidade da pessoa humana. 92
Assim, verifica-se que o princípio da prevenção integra o cerne do Direito
Ambiental, e sua colocação em prática vincula-se a riscos atuais, mensuráveis, não se
devendo procrastinar a sua aplicabilidade, é óbvio, pois in dubio pro ambiente.
2.1.3 Princípio do direito à sadia qualidade de vida
O direito à vida é assegurado no art. 5º, caput, da Constituição Federal de 1988,
houve um “plus” em relação às Cartas Políticas anteriores, pois garante a sadia qualidade de
vida. Isto já reflete o que está previsto na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio
Ambiente Humano (Estocolmo, 1972), que em seu Princípio 1 garante ao homem adequadas
condições de vida, em um meio ambiente de qualidade.
90
SILVA, Vicente Gomes da. Legislação ambiental comentada. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2004, p.27.
Ibidem, p. 27.
92
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 82.
91
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
60
Nessa direção, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento (ECO-92), também no seu primeiro Princípio assegura que os seres
humanos têm direito a uma “vida saudável e produtiva em harmonia com a natureza.”
Em consonância com Paulo Affonso Leme Machado,
A saúde dos seres humanos não existe somente numa contraposição a não
ter doenças diagnosticadas no presente. Leva-se em conta o estado dos
elementos da Natureza – água, solo, ar, flora, fauna e paisagem – para se
aquilatar se esses elementos estão em estado de sanidade e de seu uso
advenham saúde ou doenças incômodas para os seres humanos. 93
Portanto, a sadia qualidade de vida é um princípio fundamental que deve ser
alcançado por todos os seres humanos, cujas necessidades básicas passam pelo nível
adequado de educação, saúde e bem-estar que convergem para os desideratos teleológicos do
homem: o bem comum e a possibilidade de fruição da felicidade.
2.1.4 Princípio do acesso eqüitativo aos recursos ambientais
A natureza e seus bens – água, ar, solo, dentre outros – devem satisfazer as
necessidades comuns de todos os seres vivos, a fim de possibilitar o equilíbrio sustentável do
ecossistema global.
Essa visão concreta de que os recursos naturais são finitos, fez abolir o conceito
de meio ambiente inspirado no direito romano, que atribuía à fauna o conceito de res nullius
(coisa sem dono), res derelictae (coisa abandonada) e res communis (coisa comum,
susceptível de apropriação), passando-se a considerá-lo como “bem de uso comum do povo”,
conforme o art. 225, caput, da Carta Magna vigente. 94
93
94
Ibidem, p. 54.
Ibidem, p. 56.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
61
Impende observar que o Princípio 5 da Declaração de Estocolmo/1972 textualiza
claramente: “os recursos não-renováveis do planeta Terra devem ser empregados de maneira a
se evitar o risco de seu esgotamento e assegurar a toda humanidade a partilha nos benefícios
de tal emprego.”
Nesse contexto, a eqüidade servirá para orientar a utilização proporcional dos
recursos naturais diante de casos concretos, visando à necessidade real dos usuários, mas
dentro de um quadro que respeite a sustentabilidade, ou seja, assegurando esses bens para as
gerações presentes e futuras.
Dessa forma, o Direito do Ambiente irá estabelecer normas que indiquem como
verificar as necessidades de uso dos recursos ambientais, cuja preocupação com a natureza
deve ser norteada pelo desenvolvimento sustentável, mas tendo incrustado no seu bojo o
princípio da eqüidade.
2.1.5 Princípio do desenvolvimento sustentável
O princípio do desenvolvimento sustentável (sustainable development) está
esculpido no art. 225, caput, da Constituição Federal vigente, que determina:
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao
poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações.
Ou seja, infere-se que esse princípio é fundamentado numa política ambiental que
não bloqueie o desenvolvimento econômico, porém com uma gestão racional dos recursos
naturais, de maneira que sua exploração atenda à necessidade presente sem exauri-los, ou
comprometê-los para as gerações futuras.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
62
Vale destacar que a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento, em 1992, por meio da Declaração do Rio e da Agenda 21 trouxe
instrumentos normativos valiosos a serem implementados pelos países signatários da ONU, e
que já está trazendo resultados notáveis para o ecossistema global.
Por seu turno, a citada Declaração do Rio prescreve em seu Princípio 4: “Para
alcançar o desenvolvimento sustentável, a proteção ambiental constituirá parte integrante do
processo de desenvolvimento e não pode ser considerada isoladamente deste”.
Outrossim, em consonância com Édis Milaré, o dilema – ou desenvolvimento ou
meio ambiente – é falso, à proporção que ambos se complementam, pois o segundo é fonte de
recurso para o primeiro, conseqüentemente devem harmonizar-se. 95
Nesse contexto, esse autor leciona que viver de forma sustentável conduz a aceitar
a inexorável busca de harmonia homem-natureza, no conjunto do Direito Positivo, conforme
uma estratégia mundial.
Tal estratégia deve orientar-se pelos seguintes princípios: respeitar e cuidar da
comunidade e dos seres vivos; melhorar a qualidade da vida humana; conservar a vitalidade e
a diversidade do planeta Terra; minimizar o esgotamento de recursos não-renováveis;
permanecer nos limites da capacidade de suporte do planeta Terra, modificar atitudes e
práticas pessoais; permitir que as comunidades cuidem de seu próprio meio ambiente; gerar
uma estrutura nacional para a integração do desenvolvimento e da conservação; e constituir
uma aliança global. 96
Portanto, depreende-se que o princípio do desenvolvimento sustentável torna-se
imprescindível na conjuntura atual, pois objetiva garantir o equilíbrio entre o
desenvolvimento e a proteção ambiental, isto é, conciliar o progresso e a tecnologia com o
95
96
MILARÉ, op. cit., p.53.
Ibidem, p. 65-67.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
63
meio ambiente ecologicamente equilibrado, dessa forma propiciar a melhoria da qualidade de
vida a toda coletividade.
2.1.6 Princípio da educação ambiental
No contexto do mundo hodierno, que passa por acelerado processo de
desenvolvimento industrial, muitas vezes sem respeitar a natureza, é preciso que seja
observado o princípio da educação ambiental, como condição imperativa para a sobrevivência
da humanidade.
Tal princípio encontra seu respaldo na Constituição Federal de 1988, em seu art.
225, § 1º, VI, ao estabelecer que compete ao poder público: “promover a educação ambiental
em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio
ambiente”.
Essa necessidade já era apontada na Declaração de Estocolmo de 1972, no texto do
Princípio 19:
É essencial que seja ministrada educação sobre questões ambientais às
gerações jovens como aos adultos, levando-se em conta os menos
favorecidos, com a finalidade de desenvolver as bases necessárias para
esclarecer a opinião pública e dar aos indivíduos, empresas e coletividades o
sentido de suas responsabilidades no que concerne à proteção e melhoria do
meio ambiente em toda sua dimensão humana.
Vale lembrar que a educação ambiental é uma atividade estratégica por viabilizar o
esclarecimento necessário ao desenvolvimento sustentável a todas as gerações. Nesse sentido,
a Carta de Belgrado (1975) e a reunião de Tbilisi, na Geórgia, em 1977, constituem-se em
mais um esforço internacional a enfrentar o tema rumo à transdisciplinaridade, tendo como
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
64
base as dimensões socioeconômicas, culturais e axiológicas. Portanto, vieram a representar
uma importante ampliação da linha sugerida pela Conferência de Estocolmo. 97
Dessa conferência de Tbilisi, surgiu como conclusão aceita a de que a
Educação ambiental seria a síntese criativa de uma abordagem nova, de
caráter transdisciplinar, sustentada pelas informações e saber acumulados,
dispersos pelas diversas especialidades. Teria de ser um ponto de
cruzamento e não de dispersão destas informações. 98
O Direito Positivo pátrio procurou adequar-se a vereda internacional. Após a
promulgação da Carta Política vigente, publicou-se a Lei 9.795, de 27.04.1999, instituindo a
Política Nacional de Educação Ambiental e determinando outras providências, conforme seu
art. 1º, que preceitua educação ambiental da seguinte forma:
Entende-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o
indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos,
atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem
de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida e sua
sustentabilidade.
Registre-se, ainda, que a mencionada lei reconhece a educação ambiental como um
componente da educação brasileira, pois estabelece no art. 2º que “seus fundamentos devem
ser articulados em todos os níveis e modalidades do processo educativo”; no art. 10 determina
que seja desenvolvida como uma prática contínua e permanente, inclusive sendo vedada a
implantação como “disciplina específica do currículo de ensino”, em face da sua importância
e abrangência para educação nacional.
97
SOUSA, Nelson Mello e. Educação ambiental: dilemas da prática contemporânea. Rio de Janeiro: Thex
Editora, 2000, p. 23-25.
98
Ibidem, p. 25.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
65
Além disso, o citado diploma legal dispôs em seu art. 4º acerca dos princípios
básicos ambientais, onde se evidencia a visão holística do meio ambiente, a interdependência
do meio natural com os fatores socioeconômicos, culturais, científicos e éticos, que devem
estar voltados para o bem comum da coletividade. É importante ressaltar que a
conscientização pública da educação ambiental exige, para se tornar eficaz, a participação
democrática da população.99
Assim, vê-se que os objetivos básicos da educação ambiental estão delineados no
ordenamento jurídico brasileiro e sua consecução interligada ao Direito Ambiental decorre do
efetivo exercício da cidadania. Isso, num contexto de estado democrático de direito que está
em contínua evolução, pela força normativa interna, e/ou internacional. Uma análise desta
última será empreendida no próximo tópico.
2.2 Evolução das normativas internacionais do meio ambiente
Por conta da exploração dos recursos minerais e da intensificação produtiva que
se operou com a primeira Revolução Industrial, foi-se tornando mais evidente e urgente a
necessidade de mecanismos para a preservação ambiental, já que a degradação do ambiente
muitas vezes avança pelas fronteiras dos Estados, não se limitando ao território em que foi
gerada.
Desse modo, em nível internacional, iniciaram-se acordos entre Estados, escritos e
regulados pelo Direito Internacional. Isso diz respeito aos tratados, considerados aqui em sua
acepção ampla, que inclui todas as espécies de acordos internacionais – convenções,
declarações, atos, protocolos – cujos termos obrigam a cada um dos Estados signatários e
alcançam seus nacionais, por meio do direito interno.
99
MILARÉ, op. cit., p. 680.
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66
Os principais temas dos Tratados Internacionais ambientais dizem respeito, dentre
outros tópicos, a: poluição transfronteiriça, poluição marinha, mudanças climáticas,
contaminação do espaço aéreo, região Antártica, recursos aqüíferos comuns, comércio
internacional de animais e controle de pragas.
Conforme Wagner Costa Ribeiro, “as primeiras tentativas de se estabelecer
tratados internacionais que regulassem a ação humana sobre o ambiente remontam a 1900,”
quando foi realizada a Convenção para a Preservação dos Animais Selvagens, Pássaros e
Peixes na África, como resposta à matança de animais, caçados nos famosos safáris
africanos. 100
Nesse mesmo sentido, Zulmira Maria de Castro Baptista também aponta para fins
do século XIX e o início do século XX como ponto de partida da “[...] consciência para o
resguardo do equilíbrio ecológico [...]”, citando a criação do primeiro parque nacional no
mundo, o Parque Nacional de Yellowstone, seguido dos Parques Nacionais de Yosemite,
General Grat, Sequóia e Mount Rainier, entre 1872 e 1899, nos EUA, e das primeiras
convenções internacionais enfocando a necessidade de proteção de segmentos específicos da
natureza.
Entretanto, essa autora ressalva que “[...] àquela época, ainda não havia perigo
iminente da degradação do meio ambiente, e muito menos a idéia de frear o desenvolvimento
industrial, em particular nos EUA, que viviam na mais exarcebada filosofia consumista
baseada na aquisição de bens móveis.” 101
As questões ambientais afloraram, em nível de organismos internacionais, na
Organização das Nações Unidas para Alimentação e a Agricultura (Food and Agriculture
Organization - FAO), que entre 1947 e 1952 realizou conferências para discutir adequados
100
RIBEIRO, Wagner Costa. A ordem ambiental internacional. São Paulo: Contexto, 2005, p. 54 e 157.
BAPTISTA, Zulmira Maria de Castro. O direito ambiental internacional: política e conseqüências. São
Paulo: Pillares, 2005, p. 38.
101
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67
usos do solo e incentivos ao desenvolvimento dos pequenos produtores em países tropicais.
Assim, por meio dessas conferências foram definidos planos de manejo florestal
para a exploração dos recursos naturais, que não degradassem o solo e nem comprometessem
a reprodução das espécies. A grande preocupação naquele período era a perda de áreas de
culturas agrícolas na Europa, devido à guerra, e de solo, nos países tropicais, causada por
processos erosivos oriundos dos desmatamentos.
Contudo, o principal organismo da ONU a tratar da temática ambiental até a
década de 1970 foi a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura
(UNESCO). Sua primeira ação significativa – a Conferência das Nações Unidas para a
Conservação e Utilização dos Recursos – ocorrida em 1949, em Lake Success, EUA, com a
participação de 49 países.
A crescente pressão sobre os recursos naturais e a interdependência econômica
desses recursos; a questão dos alimentos, florestas, animais e combustíveis; a aplicação de
tecnologia para desenvolvimento de novos recursos; as técnicas de recursos educacionais para
países subdesenvolvidos e o desenvolvimento integrado de bacias hidrográficas foram temas
discutidos nessa conferência.
Mais do que estabelecer recomendações e exigências aos países membros, o
objetivo maior dessa conferência era gerar um ambiente de discussão acadêmica, a partir do
qual se pudesse delinear ações conservacionistas com base nos conhecimentos científicos da
época.102
Outra conferência da UNESCO, ocorrida em Paris no ano de 1968, e de maior
repercussão, foi a Conferência Intergovernamental de Especialistas sobre as Bases Científicas
para Uso e Conservação Racionais dos Recursos da Biosfera, ou simplesmente, Conferência
da Biosfera.
102
MCCORMICK, John. Rumo ao paraíso: a história do movimento ambientalista. Rio de Janeiro: RelumeDumará, 1992, p. 52-53.
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68
Nessa conferência foram discutidos os impactos ambientais causados pela ação
antrópica, sob uma óptica exclusivamente cientificista, que colocou a ciência e a tecnologia
como redentoras dos problemas ambientais gerados pelo capitalismo industrial. 103
Concebeu-se o Programa “O Homem e a Biosfera” (MAB), lançado oficialmente
em 1971, preconizando a cooperação científica internacional sobre as interações entre o
homem e seu meio, com o intuito de produzir mais conhecimento sobre os ecossistemas, e de
difundi-los por meio da educação ambiental. Foi a partir dos objetivos educacionais da
Conferência da Biosfera, que a UNESCO promoveu, em 1975, o Encontro de Belgrado, na
Iugoslávia, e em 1977, na cidade de Tbilisi, Geórgia, a Primeira Conferência
Intergovernamental em Educação Ambiental.
Também foi introduzida a idéia de formar uma rede mundial para proteger áreas
do planeta expressivas em recursos naturais e biodiversidade. Essas áreas passaram a ser
denominadas de “reservas da biosfera”, entendidas como “[...] zonas de ecosistemas terrestres
o costeros/marinos, o una combinación de los mismos, reconocidas en el plano internacional
como tales en el marco del Programa sobre el Hombre y la Biosfera (MAB) da la UNESCO
[...].” 104
Os objetivos básicos que se pretendem alcançar com a instituição de reservas da
biosfera são três, assim descritos no artigo 3 º do Estatuto da Rede Mundial de Reservas da
Biosfera:
Artículo 3 – Funciones. Las reservas de biosfera, combinando las tres
funciones que se exponen a continuación, deberían procurar ser lugares de
excelencia para el ensayo y la demonstración de métodos de conservación
y desarrollo sostenible en escala regional:
i) Conservación: contribuir a la conservación de los paisajes, los
ecosistemas, las especies y la variación genética.
ii) Desarrollo: fomentar un desarrollo económico y humano sostenible
desde los puntos de vista sociocultural y ecológico.
103
RIBEIRO, op.cit., p. 64-65.
UNESCO. Reservas de biosfera: la Estratégia de Sevilla y el Marco Estatutário de la Red Mundial. Paris:
UNESCO, 1996, p. 17.
104
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69
iii) Apoyo logístico: prestar apoyo a proyectos de demonstración, de
educación y capacitación sobre el medio ambiente y de investigación y
observación permanente en relación con cuestiones locales, regionales,
nacionales y mundiales de conservación y desarrollo sostenible. 105
Em 1983 foi realizado o 1º Congresso Internacional sobre Reservas da Biosfera,
em Minsk, Rússia, ocasião em que se definiu um Plano de Ação para as Reservas da Biosfera,
reavaliado em 1995 na Conferência de Sevilha, revisando-se, ainda, o conceito de reserva da
biosfera e seus três objetivos básicos.
Sobre essa reavaliação,
La Conferencia de Sevilla concluyó que, pese a los problemas y
limitaciones que se planteaban a la aplicación del concepto de reserva de
biosfera, el programa en su conjunto habia sido innovador y habia tenido
um éxito indiscutible. Las tres funciones tienen plena vigencia para los
años venidero. 106
Na ocasião foi gerado o documento intitulado “Estratégia de Sevilha”, com dez
diretrizes, dentre as quais importa destacar:
1. Fortalecer la contribuición de las reservas de biosfera a la aplicación de
los acuerdos internacionales que fomentan la conservación y el desarrollo
sostenible, en particular el Convenio sobre la Diversidad Biológica y otros
acuerdos como los referentes al cambio climático, la desertificación y los
bosques. [...]
5. Asegurar que todas las zonas de las reservas de biosfera contribuyen a la
conservación, el desarrollo sostenible y el conocimiento científico. 107
Contemporânea à Conferência da Biosfera de 1968, a publicação do relatório “Os
limites do crescimento”, encomendado pelo Clube de Roma 108 ao Massachussetts Institute of
Technology (MIT) foi, conforme Édis Milaré, o primeiro grande alerta sobre o estado do
planeta, que despertou a atenção da comunidade científica e laica para os catastróficos
105
Ibidem, p. 17.
Ibidem, p. 5.
107
Ibidem, p. 6.
108
Associação internacional formada por intelectuais, cientistas e empresários, fundada em 1968 pelo italiano
Aurélio Peccei.
106
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70
prognósticos relativos ao futuro da vida na Terra. 109
Esse relatório enfatizava a insuficiência dos recursos naturais para a produção de
alimentos, tomando por base o padrão de consumo norte-americano e os índices de natalidade
que aumentavam nos países em desenvolvimento, face às quedas das taxas de mortalidade em
função da melhoria nas condições médico-sanitárias das populações. Concluía sobre a
necessidade de sustar o crescimento econômico e populacional para aliviar as pressões sobre
os recursos naturais, evitando uma escassez de alimentos nos próximos 100 anos. 110
Para a comissão que elaborou o relatório, quatro aspectos conexos estariam na
origem dos problemas ambientais: o crescimento populacional, o crescimento econômico,
representado pelo desenvolvimento industrial, o esgotamento dos recursos naturais e a
insuficiência na produção de alimentos para sustentar uma população cada vez maior, com um
nível de consumo elevado e em escala crescente.
Assumindo uma feição claramente malthusiana, o relatório propugnava pelo
controle do crescimento populacional nos seguintes termos: “Há somente dois modos de
restaurar o desequilíbrio resultante: ou diminuir a taxa de natalidade, para que ela se iguale à
nova taxa de mortalidade, mais baixa, ou deixar que esta última torne a subir.” 111
Na Conferência de Estocolmo, o Relatório Meadows foi adotado e defendido pelos
adeptos do crescimento zero, tanto populacional quanto econômico, e combatido pela corrente
desenvolvimentista, representada por países em franco desenvolvimento econômico, como
Brasil, México e Índia. Estes países, embora contrários ao relatório, acataram suas
recomendações no que se refere ao controle da natalidade.
Tanto a Conferência da Biosfera, como o relatório “Os limites do crescimento”
subsidiaram a realização da conferência que marcou o ambientalismo internacional: a
109
MILARÉ, op.cit., p. 999.
RIBEIRO, op.cit, p. 77-78.
111
MEADOWS, Donella et al. Limites do crescimento. São Paulo: Perspectiva, 1973, p. 156 .
110
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71
Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, em Estocolmo, Suécia, no
ano de 1972, onde
[...] a proteção do meio ambiente teve reconhecimento [...] como um direito
fundamental dos indivíduos, a existência de um meio ambiente sadio e
equilibrado, sendo a condição necessária à efetividade de numerosos
direitos da pessoa humana para as gerações presentes assim como para as
gerações futuras. 112
A Conferência foi marcada pelo embate de duas teses econômico-industriais: a do
crescimento zero e a desenvolvimentista. A primeira foi baseada no Relatório Meadows, 113
enquanto a segunda teve como referência as necessidades econômicas dos países em
desenvolvimento e a defesa da soberania dos Estados, no que diz respeito à utilização de seus
recursos naturais.
Portanto, a década de 1970 marcou o início de uma profunda mudança de
comportamento do ser humano em relação ao meio ambiente, a partir da mencionada
Conferência de Estocolmo. O item 1 dessa Conferência proclama que:
O homem é ao mesmo tempo criatura e criador do meio ambiente, que lhe
dá sustento físico e lhe oferece a oportunidade de desenvolver-se
intelectual, moral, social e espiritualmente. A longa e difícil evolução da
raça humana no planeta levou-a a um estágio em que, com o rápido
progresso da Ciência e da Tecnologia, conquistou o poder de transformar de
inúmeras maneiras e em escala sem precedentes o meio ambiente. Natural
ou criado pelo homem, é o meio ambiente essencial para o bem-estar e para
gozo dos direitos humanos fundamentais, até mesmo o direito à própria
vida. 114
Assim, foi aprovada a Declaração sobre o Meio Ambiente Humano, ou Declaração
112
CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Direitos humanos e meio-ambiente: paralelo dos sistemas de
proteção internacional. Porto Alegre: Sérgio A. Fabris Editor, 1993, p. 20.
113
Nome como ficou conhecido o relatório “Os limites do crescimento”, em alusão a Donella e Dennis
Meadows, principais organizadores do documento.
114
CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE MEIO AMBIENTE HUMANO, 1972, Estocolmo.
Declaração da Conferência das Organizações das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano.
Disponível em:
<http://www.unama.br/institucional/proreitorias/pppe/supes/MeioAmbiente/Documentos/Declaração%20Estocol
mo.doc>. Acesso em 30 jul. 2005.
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72
de Estocolmo, contendo vinte e seis princípios, cujos objetivos estabeleceram diretrizes para
as tomadas de decisões sobre questões ambientais de caráter mundial.
Dentre os princípios mais pertinentes a este trabalho, podem ser destacados os
seguintes:
Principio 1 - El hombre tiene el derecho fundamental a la liberdad, la
igualdade y el disfrute de condiciones de vida adecuadas em um médio
ambiente de calidade tal que le permita llevar uma vida digna y gozar de
bienestar, y tiene la solemne obligación de proteger y mejorar el medioambiente para las generaciones presentes y futuras. [...] 115
Este princípio evidencia o reconhecimento da comunidade internacional 116 de que
há uma estreita relação entre as boas condições de vida e um meio ambiente saudável,
havendo necessidade que este seja protegido e melhorado para assegurar aquela. É a partir
daqui que o próprio meio ambiente saudável começa a ser reconhecido como direito
fundamental em si mesmo.
Principio 2 - Los recursos naturales de la tierra incluídos el aire, el água, la
tierra, la flora y la fauna y especialmente muestras representativas de los
ecosistemas naturales, deben preservarse em benefício de las generaciones
presentes y futuras, mediante una cuidadosa planificación u ordenación,
según convenga. 117
Tal princípio reconhece que uma das formas de resguardar o meio ambiente e, por
conseqüência, os direitos fundamentais a ele atrelados, é a preservação de amostras
representativas dos ecossistemas, cujos elementos bióticos e abióticos poderão ser mantidos
intactos in situ .
115
CANÇADO TRINDADE, op. cit., p. 250.
MILARÉ, op.cit., p. 1002. Participaram da Conferência de Estocolmo, significativa representação de 113
países e 250 organizações não-governamentais.
117
CANÇADO TRINDADE, op.cit., p. 250.
116
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73
Por seu turno, admite a necessidade de um planejamento cauteloso e elencado no
Princípio 17: “Debe confiarse a las instituciones nacionales competentes la tarea de planificar,
administrar o controlar la utilización de los recursos ambientales de los Estados con el fin de
mejorar la calidade del medio-ambiente.” 118
Isto significa que o Estado tem por dever, normatizar e efetuar o planejamento, a
implementação e a fiscalização de políticas ambientais que promovam a utilização sustentável
dos recursos da natureza, e resguardar, desse modo, os direitos fundamentais de seus
cidadãos.
Contudo, a Declaração de Estocolmo não dispensa ou ignora a necessidade de
participação da sociedade civil, e enfatiza a importância da educação ambiental e do papel da
mídia na missão de salvaguardar o direito ao meio ambiente saudável.
É o que se pode inferir do Princípio 19:
Es indispensable una labor de educación en cuestiones ambientales, dirigida
tanto a las generaciones jóvenes como a los adultos y que preste la debida
atención al sector de población menos privilegiado, para ensanchar las bases
de una opinión pública bien informada, y de una conducta de los individuos,
de las empresas y de las colectividades inspirada en el sentido de su
responsabilidad en cuanto a la protección y mejoramiento del medioambiente en toda su dimensión humana. Es también esencial que los medios
de comunicación de masas eviten contribuir al deterioro del medioambiente humano y difundan, por el contrario, información de carácter
educativo sobre la necesidad de protegerlo y mejorarlo, a fin de que el
hombre pueda desarrollarse en todos los aspectos. 119
Para operacionalizar a Declaração de Estocolmo, foi idealizado um Plano de Ação
com 109 recomendações para os países-membros, mas tal plano não chegou a ser posto
efetivamente em prática.
118
119
Ibidem, p. 254.
Ibidem, p. 254.
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74
O resultado mais concreto da Conferência de Estocolmo foi a criação do Programa
das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), órgão da ONU que, na análise de
Wagner Ribeiro, nasceu desacreditado pelo fato de ter sede estabelecida na cidade de Nairóbi,
no Quênia, país marginal ao eixo de poder econômico e político.
Os países periféricos e as organizações não-governamentais acreditavam que a
instalação do PNUMA em um país pouco expressivo econômica e politicamente, representava
um desprestígio à temática ambiental por parte dos países desenvolvidos que também
estariam a desviar a atenção de seus problemas ambientais, além de fiscalizarem as atividades
econômicas dos países periféricos sob pretextos ambientalistas. 120
Mas ao longo de quase quatro décadas, o PNUMA foi se firmando como principal
organismo da ONU a fomentar programas ambientais, gerindo recursos do Fundo Mundial
para o Meio Ambiente (FMMA), que recebe contribuições de diversos países. 121
Um dos relevantes programas implementados pelo PNUMA, em parceria com a
União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) e do Fundo Mundial para a Vida
Selvagem (WWF), foi a Estratégia Mundial para a Conservação, em Nova Iorque (1980), com
o objetivo básico de explorar as interfaces entre conservação de espécies e ecossistemas, e
entre manutenção da vida no planeta e a preservação da diversidade biológica.
Além da capacitação de pessoal para os governos, esse programa estabelece
recomendações para a promoção da educação ambiental e da mudança da legislação
ambiental nos países.
Reconhecendo o aspecto de que os problemas ambientais podem extrapolar as
fronteiras geográficas de seus países de origem, foram realizadas, ao longo das décadas de
1970-1990, convenções e tratados abordando a poluição causada pela emissão de gases
120
RIBEIRO, op. cit., p. 82.
LIST
of
States
Participating
in
the
Restructured
GEF.
Disponível
em:
<http://www.gefweb.org/participants/Members_Countries/members_countries.html >. Acesso em 10 fev 06.
Atualmente o FMMA/PNUMA conta com o aporte financeiro de 176 países.
121
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75
industriais, dissipada pela circulação geral da atmosfera, e responsáveis pelas chuvas ácidas,
pela reação com o ozônio estratosférico e sua conseqüente destruição, pelo aquecimento
global do planeta e seus efeitos correlatos, e pelas inversões térmicas com sérios danos à
saúde humana.
A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) realizou
a Convenção sobre Poluição Transfronteiriça de Longo Alcance (CPT), em Genebra, Suíça
(1979). Seus dispositivos, inicialmente restritos aos países da Comissão Econômica Européia
das Nações Unidas, foi estendido à América do Norte.
O grande objetivo da CPT foi estabelecer um consenso para redução gradativa na
emissão de gases poluentes. Em face disso, firmaram-se alguns protocolos, como o Protocolo
de Helsinque para Redução das Emissões de Enxofre (Finlândia, 1987); o Protocolo de Sofia
para Redução dos Nitrogenados (Bulgária, 1988); o Protocolo de Genebra para Redução dos
Compostos Orgânicos (Suíça, 1991) e o Protocolo de Aarhus para Redução de Metais Pesados
(Dinamarca, 1998).
A participação e adesão aos protocolos da CPT por diversos países desenvolvidos
da Europa e América do Norte, responsáveis por grande parte das emissões de gases
poluentes, animaram a comunidade internacional, embora tenha havido muito dissenso quanto
aos percentuais das metas de redução a serem alcançadas. 122
A evolução dos debates em torno da poluição atmosférica, conjugada às
descobertas científicas sobre a ação de substâncias destruidoras da camada de ozônio (SDO),
conduziu à Convenção de Viena para a Proteção da Camada de Ozônio (CV, 1985) e ao
Protocolo de Montreal sobre Substâncias que Destroem a Camada de Ozônio (PM, 1987).
Na análise de Édis Milaré, a Convenção de Viena
[...] tornou-se um marco no Direito Internacional do Ambiente, pelo
122
RIBEIRO, op.cit. , p. 96.
76
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fato de que, primeira vez na história, diversos países acordaram em
combater um problema ambiental antes que seus efeitos se tornassem
irreversíveis e mesmo antes que tais efeitos restassem cabal e
cientificamente comprovados. Adotou-se tacitamente o Princípio da
Precaução. 123
Nessa mesma linha, o Protocolo de Montreal inovou ao levar em consideração o
status diferenciado de país desenvolvido e em desenvolvimento, para estabelecer prazos
distintos na redução das emissões de substâncias destruidoras da camada de ozônio, dilatandoos para os países em desenvolvimento.
Vale ressaltar que, por meio do Fundo Multilateral para a Aplicação do Protocolo
de Montreal, foi obtido financiamento para projetos de capacitação de recursos humanos,
redução de SDO e desenvolvimento de novos produtos não reagentes com o ozônio.
No intervalo de tempo que medeia da Conferência de Estocolmo (1972) ao ano de
1992, forjou-se um conceito fundamental para a temática do ambiente que se tornou “um [...]
discurso poderoso promovido por organizações internacionais, empresários e políticos,
repercutindo na sociedade civil internacional e na ordem ambiental internacional.”
124
Trata-
se do conceito de desenvolvimento sustentável, cuja raiz está no Encontro Preparatório da
Conferência de Estocolmo, em Founex (Suíça, 1971), onde se iniciou uma reflexão sobre as
implicações de um modelo de desenvolvimento calcado exclusivamente no crescimento
econômico industrial.
Foi quando se registrou o termo “ecodesenvolvimento” para designar um modelo
de desenvolvimento e crescimento econômicos que considerassem o equilíbrio ecológico e a
exploração racional dos recursos naturais, por meio de um estilo de desenvolvimento
123
MILARÉ, op. cit., p. 1011.
RIBEIRO, Wagner da Costa et. al. Desenvolvimento sustentável: mito ou realidade? Revista Terra Livre,
São Paulo, nº 11/12, p. 91-101, out. 1996.
124
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
77
particularmente adaptado às regiões rurais do Terceiro Mundo. 125
Muitas críticas foram feitas ao conceito de ecodesenvolvimento formulado por
Ignacy Sachs, alegando-se que a particular adaptação ao ambiente rural dos países
subdesenvolvidos estaria a reforçar a divisão do trabalho, tanto em âmbito interno, na
dicotômica relação campo-cidade, como em nível externo, na relação Norte-Sul.
Mas para Wagner Ribeiro, “[...] Sachs vislumbra o ambiente rural como o lugar
possível para se desenvolver um modo de vida capaz de manter e reproduzir as condições da
existência humana, sem comprometer a base natural necessária à produção das coisas.” 126
Sachs partia do pressuposto de que seria mais adequado promover mudanças nos padrões de
produção a partir de ambientes menos deteriorados pelos processos de urbanização e
industrialização, do que a partir de regiões já detentoras de passivos ambientais.
Posteriormente, o conceito de ecodesenvolvimento sofreu algumas evoluções até
ser substituído pelo conceito de desenvolvimento sustentável, a partir do relatório elaborado
em 1988 pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD), da
ONU, intitulado “Nosso futuro comum”, ou Relatório Brundtland.
Conforme esse relatório, desenvolvimento sustentável é “[...] aquele que atende às
necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem
as suas próprias necessidades.” 127 Tal conceito procura conciliar dois direitos humanos
fundamentais: o direito ao desenvolvimento e o direito a um meio ambiente de qualidade, que
permite ao ser humano vida digna e bem estar.
Na lição de Antônio Augusto Cançado Trindade,
125
SACHS, Ignacy. Estratégias de transição para o séc. XXI: desenvolvimento e meio-ambiente. São Paulo:
Nobel, 1993, p. 75 .
126
RIBEIRO, op. cit., p. 111.
127
COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso futuro comum.
Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1988, p. 46.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
78
Dificilmente se poderia abordar o direito a um meio-ambiente sadio em
isolamento. [...] Não se pode considerá-lo sem referência a outro direito do
gênero, a saber, o direito ao desenvolvimento como direito humano. [...]
Pode bem ocorrer que o princípio do desenvolvimento sustentável [...]
forneça um possível vínculo entre o direito ao desenvolvimento e o direito a
um meio-ambiente sadio. 128
A associação entre conservação ambiental e desenvolvimento, este considerado em
seus múltiplos aspectos, econômico, social, cultural e político, com enfoque na distribuição de
renda, tem sido evidenciada em diversos documentos oriundos de tratados internacionais, que
fazem menção ao “[...] círculo vicioso ligando pobreza, subdesenvolvimento e degradação
ambiental [...].”129
Entretanto, não se deve olvidar o trinômio desenvolvimento-consumismodegradação ambiental, típico dos países desenvolvidos. Porque, se de um lado a miséria
promove o avanço da população sobre os recursos naturais (florestas, mananciais, fauna), por
outro o consumismo das elites também promove o avanço sobre os mesmos recursos naturais,
porém de modo distinto e com objetivos diversos.
Enquanto no primeiro caso é a própria população miserável que avança para
prover a subsistência, no segundo caso indústrias e empresas vão em busca da matéria-prima
para prover o supérfluo dos mais aquinhoados.
Nesse aspecto, o relatório “Nosso Futuro Comum” enfoca a justiça social, o acesso
controlado aos recursos naturais, a participação comunitária efetiva e a cooperação
internacional para atingir um modelo de desenvolvimento sustentável que não pressione a
capacidade de regeneração dos ecossistemas, conduzindo-o a limites críticos, quer por
necessidade, quer por ganância.
128
CANÇADO TRINDADE, op. cit., p. 165-166.
Ibidem, p. 167-168. O autor cita como exemplos desses documentos internacionais, a Mesa-Redonda de
Berlim sobre Meio-Ambiente, Recursos Naturais e Interdependência Norte-Sul (Alemanha, 1988); Reunião de
Cúpula Latino-americana e Caribenha sobre o Meio Ambiente (Brasil, 1989).
129
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
79
O relatório da Comissão Brundtland é particularmente enfático em insistir
que o próprio conceito de desenvolvimento sustentável requer a
erradicação da pobreza generalizada ou extrema e a adoção pelos mais
afluentes estilos de vida consideravelmente menos consumistas e mais
consoantes com os meios ecológicos [limitados] do mundo. 130
Segundo Paulo José Leite Farias, “a conceituação desse desenvolvimento engloba
questões ideológicas, visto que a própria noção de desenvolvimento sempre acompanhou
disputa por diferentes formas de apropriação da riqueza e reprodução social”. Isso remete à
questão de que há diferenças entre os termos crescimento econômico e desenvolvimento, posto
que aquele, para se equiparar a este, tem que unir a ampliação de riquezas com a justiça
social, servindo como instrumento de dignificação do homem, ocasião em que o
desenvolvimento sustentável deve ser interpretado como uma espécie de ética do
desenvolvimento.131
E foi justamente essa ética do desenvolvimento que se pretendeu implantar e
regulamentar em caráter internacional, com a realização da Conferência das Nações Unidas
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), realizada em 1992, no Rio de
Janeiro. 132
A CNUMAD tinha por objetivo geral, conseguir um equilíbrio justo entre as
necessidades econômicas, sociais e ambientais das gerações presentes e futuras, firmando as
bases para uma associação mundial entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento, e
entre os governos e os setores da sociedade civil.
O exame da situação ambiental global desde 1972, as transferências de tecnologias
não-poluentes entre os países, a incorporação de critérios ambientais nos processos de
desenvolvimento e a cooperação internacional contra ameaças ambientais foram objetivos
130
Ibidem, p. 171.
FARIAS, op. cit., p. 210-211.
132
Essa conferência também ficou conhecida como Cúpula da Terra, Conferência da Terra, Rio-92 ou ECO-92.
Contou com a participação de 172 governos, e com a presença de 116 Chefes de Estado, além de diversas
organizações não-governamentais e da sociedade civil, conforme registra MILARÉ, op. cit., p.1.021.
131
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
80
mais específicos que se buscou atingir por meio dos diversos documentos produzidos na
CNUMAD.
Essa Conferência de 1992 elaborou cinco relevantes documentos: Declaração do
Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, Agenda 21, Convenção da Biodiversidade,
Convenção sobre Mudança de Clima, Declaração de Princípios para a Administração
Sustentável das Florestas. Vale ressaltar que os quatro primeiros documentos estão dentre as
mais importantes referências, na ordem ambiental internacional.
A Declaração do Rio arrola vinte e sete princípios que reafirmaram o conteúdo da
Declaração de Estocolmo, avançando a partir desta, sobre os aspectos do desenvolvimento
econômico em si. Assume uma postura antropocêntrica, quando afirma em seu Princípio 1
que “os seres humanos estão no centro das preocupações com o desenvolvimento
sustentável,” 133 e a partir daí estabelece as recomendações necessárias para os Estados
equacionarem de maneira sustentável a relação entre o meio ambiente e o desenvolvimento.
Por intermédio do Princípio 10, a Declaração do Rio sugere que “a melhor maneira
de tratar as questões ambientais é assegurar a participação, em nível apropriado, de todos os
cidadãos interessados [...]”, além de recomendar a adoção de legislação ambiental eficaz, em
seu Princípio 11. 134
Essa Declaração, ainda, enfatiza a solidariedade sócio-econômica e a cooperação
técnico-científica entre os Estados, além de um relacionamento destes com setores
estratégicos da sociedade, e com os indivíduos, como forma de amenizar as tensões
ambientais.
A Convenção sobre Mudanças do Clima, firmada por 154 países além da
Comunidade Européia, estipulou como meta a estabilização da emissão de gases do efeito
estufa em níveis que não comprometam a estabilidade climática pelo aumento da temperatura
133
134
CANÇADO TRINDADE, op. cit., p. 257.
Ibidem, p. 259-260.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
81
global, tomando-se por base o ano de 1990. Para alguns críticos, o congelamento das emissões
aos níveis de 1990 acabou por se constituir num privilégio aos países desenvolvidos, que
adquiriram o direito de manterem os índices praticados nesse ano. 135
Essa Convenção foi pautada pelo Princípio 7 da Declaração do Rio, na medida em
que estabeleceu a responsabilidade comum, mas diferenciada dos Estados, tendo em vista o
grau de industrialização e conseqüente volume de emissão de gases.
Um dos aspectos interessantes firmados pela Convenção Climática é o que diz
respeito ao aumento da capacidade de sumidouros e reservatórios para estabilização dos gases
do efeito estufa, o que pode ser conseguido com a implementação de reflorestamentos ou da
preservação de áreas florestadas.
Documento de grande repercussão internacional que polarizou discussões entre
países desenvolvidos, detentores de biotecnologia e conhecimentos em engenharia genética, e
países subdesenvolvidos, detentores da biodiversidade in situ, foi a Convenção sobre
Diversidade Biológica (CDB), ou Convenção sobre Biodiversidade.
O objetivo visado por essa convenção era estabelecer um consenso entre a
conservação da biodiversidade, o uso sustentável de seus componentes e a divisão eqüitativa e
justa dos benefícios gerados com a utilização dos recursos genéticos.
A CDB ressalta que “[...] a exigência fundamental para a conservação da
diversidade biológica é a conservação in situ dos ecossistemas e dos habitats naturais e a
manutenção e recuperação de populações viáveis de espécies no seu meio natural” 136, o que
pode ser plenamente viabilizado nas diversas modalidades de unidades de conservação.
Aspectos pertinentes a este trabalho, elencados na CDB, são o desenvolvimento de
estratégias, planos ou programas para a conservação e a utilização sustentável da diversidade
biológica, aplicando-se medidas de identificação, monitoramento, treinamentos, educação e
135
136
RIBEIRO, op. cit., p. 126.
ANTUNES, op. cit., p. 397.
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82
conscientização ambiental para a preservação da biodiversidade, além de estimular a
cooperação entre as autoridades governamentais e o setor privado, o que faz deste documento
“[..] um marco na legislação internacional e é reconhecida por seu enfoque integral dos
ecossistemas para a proteção da diversidade biológica.” 137
Outro documento de vulto, gerado pela CNUMAD, foi a Agenda 21, que, apesar
de não ter logrado o êxito inicial de se constituir num plano de ação para os problemas
ambientais, por falta de aporte financeiro, 138 tornou-se um referencial na abordagem das
dimensões sociais e econômicas da questão ambiental, e em temas como participação da
sociedade civil, valorização de comunidades locais, transferência de tecnologia, ciência e
educação ambiental.
Um dos aspectos da Agenda 21 mais pertinente ao presente trabalho diz respeito à
conservação e gestão dos recursos naturais, que inclui ações para proteção da atmosfera, com
adoção de medidas de mitigação das alterações climáticas e de qualidade do ar; e o combate
ao desflorestamento para a manutenção de todos os tipos de florestas e regiões de mata.
Esse documento reforça as instituições nacionais e incentiva a participação do
setor privado ligados aos ecossistemas florestais; manejo de ecossistemas frágeis, como
desertos, regiões semi-áridas, montanhas, terras úmidas, ilhas e áreas costeiras; conservação
da diversidade biológica, além de fortalecer as diretrizes estabelecidas pela Convenção sobre
Diversidade Biológica, tal como a proteção da qualidade dos recursos hídricos, para assegurar
oferta hídrica de boa qualidade para todos, ao mesmo tempo em que se preservam as funções
hidrológicas, biológicas e químicas dos ecossistemas. 139
Nesse contexto, não se pode olvidar das discussões sobre as mudanças climáticas
decorrentes do Protocolo de Kyoto, pois durante a ECO-92 foi negociada e assinada uma
137
MILARÉ, op.cit., p. 1.024.
RIBEIRO, op. cit., p.127-128.
139
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e
Desenvolvimento: Agenda 21. Brasília: Câmara dos Deputados, 1995, p. 111 et. seq.
138
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
83
Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança de Clima (The United Nations
Framework Convenction on Climate Change), na qual os governos reconheceram que ela
poderia ser propulsora de ações mais enérgicas no futuro, a respeito dos chamados gases
causadores do efeito estufa.
Em 1995 foi realizada a primeira Conferência das Partes (COPs), em Berlim, na
Alemanha, onde é proposto um protocolo de decisões sobre as obrigações listadas na
Convenção. O principal documento desta conferência foi o Mandato de Berlim. Em 1997,
houve a terceira Conferência das Partes e foi adotado o Protocolo de Kyoto, no Japão,
prevendo que até 2012, trinta e oito países industrializados terão que reduzir em 5,2% as
emissões de gases de efeito estufa, dentre eles, o dióxido de Carbono (CO 2 ).
Nessa linha cronológica, em 2001, os Estados Unidos, maior poluidor do mundo, se
retiram das discussões sobre o Protocolo por considerá-lo custoso demais à economia norteamericana. O país é responsável por 36% das emissões globais de gases estufa e, desde 1990,
suas emissões aumentaram em 13%. Em 2004, ocorre a 10.ª Conferência das Partes, na
Argentina. Cresce a pressão para que os países em desenvolvimento também tenham metas
em 2012.
Finalmente, a partir de 16 de fevereiro de 2005 com a ratificação de 141 países,
entra em vigor o Protocolo de Kyoto, após o apoio do Parlamento canadense antes contrário
ao documento em 2002, e a adesão da Rússia em 2004. Para entrar em vigência e se tornar um
regulamento internacional, o acordo precisava do apoio de um grupo de países que, juntos,
respondessem por, ao menos, 55% das emissões de gases nocivos no mundo. Com a entrada
da Rússia, o segundo maior poluidor, responsável por 17% delas, a cota foi atingida. Até
então, apesar da adesão de 127 países, a soma de emissões era de apenas 44%, com a nova
inclusão, esse índice chega a 61%.
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84
Em Kyoto, teve-se a oportunidade de assistir a uma das mais importantes reuniões
sobre a ordem ambiental internacional, pois os dados divulgados pelo
Painel
Intergovernamental sobre Mudanças de Clima (IPCC) eram preocupantes. Os países
desenvolvidos, integrantes do chamado Anexo I: Estados Unidos, Rússia, Japão, Alemanha,
dentre outros, aumentaram, assustadoramente, as emissões de gases estufa (dióxido de
carbono, ozônio, metano, óxido nitroso).140
Havia necessidade de conter esse ritmo avassalador do mundo capitalista,
compatibilizando-o com a sadia qualidade de vida, inclusive procurando equacionar o
problema, de tal forma que a diminuição tóxica dessas emissões de gases tóxicos, por meio de
novas técnicas antipoluição, não viesse reduzir a atividade econômica e gerasse desemprego.
A finalidade do Protocolo de Kyoto é estabelecer que os países industrializados e
aqueles em transição para economias de mercado reduzam suas emissões de gases de efeito
estufa, pelo menos 5% abaixo dos níveis de 1990, no período entre 2008 e 2012. O efeito
estufa natural mantém a atmosfera aquecida e possibilita a vida na Terra. Contudo, o aumento
artificial dessas emissões gera um aquecimento adicional com efeitos que podem ser
catastróficos para a humanidade, como, por exemplo, o aumento do nível do mar. 141
As Mudanças Climáticas têm caráter global e, assim, seus efeitos podem atingir
qualquer parte do planeta. Portanto, independentemente de onde ocorra a redução de emissão
de determinado gás de efeito estufa, o benefício advindo é também global, pois o sistema
climático mundial fica menos vulnerável.
A redução de emissões prevista no Protocolo de Kyoto é um primeiro passo para
se evitar que as previsões científicas de aumento dos fenômenos climáticos extremos se
concretizem. Trata-se da primeira iniciativa mundial efetiva para se evitar o aumento das
140
141
RIBEIRO, op.cit., p. 139.
SILVA, J. Afonso da. , op. cit., p. 67.
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85
enchentes, das ondas de calor e do nível dos mares, riscos associados a perda de áreas
agricultáveis e de recursos hídricos, dentre outros efeitos danosos.
Vale ressaltar que duas idéias se destacaram, em Kyoto. A primeira, liderada pelo
Brasil, defendia o mecanismo de desenvolvimento limpo, tendo como objetivo assistir aos
países não desenvolvidos – criar um fundo para pesquisas ambientais, tendo como parâmetro
os índices de poluição dos países desenvolvidos – a fim de que atinjam o desenvolvimento
sustentável e contribuam para o objetivo final da Convenção, e, também, fiscalizar os países
desenvolvidos no cumprimento de seus compromissos de limitação e redução de emissões,
previstos no art. 3º do Protocolo.
A outra idéia, encabeçada pelos Estados Unidos, propunha transformar a emissão
de gases estufa em um negócio (art. 17 do Protocolo). Consiste em poder comercializar parte
de redução de emissões que excederem as metas compromissadas para o período de 2008 a
2012. Isto é, se um Estado desenvolvido não atingir o que foi estabelecido como meta de
redução de emissão de gases estufa, ele pode comprar de outro país, a diferença entre o limite
estabelecido e a efetiva redução, inclusive introduzindo técnicas de controle ambiental. 142
Essa proposta, que está sendo implementada, resultará na compra do direito de
poluir e sua contribuição para a melhora da qualidade de vida e do ambiente é, no mínimo,
duvidosa; pois, não importa de onde saem os gases, mas sim a quantidade que chega à
atmosfera. Assim, o espírito preservacionista final não está sendo o foro deste tipo de
comércio.
Portanto, os principais países poluidores, dentre eles os Estados Unidos,
continuam insensíveis ao problema e insistem em transferir cotas de poluição entre as partes,
ao invés de contribuir para, efetivamente, mitigar tão grave problema.
142
RIBEIRO, op. cit., p.139.
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86
Dessa forma, observa-se que a evolução das normas internacionais sobre o meio
ambiente, apesar de algumas restrições, tem contribuído sobremaneira para a consolidação do
Direito Internacional Ambiental.
Assim, em consonância com Zulmira Baptista, a evolução das normativas
internacionais ambientais “[...] tem respondido às novas demandas na medida do possível, por
meio de abordagens flexíveis e da criação de novos conceitos [...],”143 além de produzir
reflexos positivos no direito brasileiro, conforme será analisado no próximo tópico.
2.3 Evolução das normativas nacionais do meio ambiente
A consciência ambientalista aprimorada na segunda metade do século XX
favoreceu a evolução das normativas ambientais, e bem recente observa-se o tratamento
normativo dado pela ciência jurídica a essas questões, dentro de um contexto holístico que
entende o meio ambiente imerso em todas as dimensões da vida, sendo o seu próprio
corolário.
Nessa linha, o tema meio ambiente passou a fazer parte das Cartas Magnas dos
países, consolidando-se como direito fundamental por ser recepcionado constitucionalmente,
marcando indelevelmente uma época em que a humanidade desperta para a necessidade de
preservar, a fim de possibilitar a sobrevivência no planeta Terra.
Isso evidencia a índole transformadora do Direito e seu “plus” normativo, em sua
evolução histórica como afirma Lênio Luiz Streck,
[...] o Estado Democrático de Direito faz uma síntese das fases anteriores,
agregando a construção das condições de possibilidade para suprir as
lacunas das etapas anteriores, representadas pela necessidade do resgate das
143
BAPTISTA, op. cit., p. 45 .
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87
promessas da modernidade, tais como igualdade, justiça social e a garantia
dos direitos humanos fundamentais. 144
De modo geral, nos países estrangeiros (mas não foi diferente no Brasil) a
legislação ambiental proliferou de maneira “variada, dispersa e freqüentemente confusa”, ora
sendo uma extensão de leis sanitárias e protetoras de florestas, caça, recursos minerais, ora se
constituindo em normas setorizadas e estanques (leis sobre águas; leis sobre florestas; lei
sobre poluição atmosférica, dentre outras). 145
Ann Helen Wainer reconstitui o histórico da legislação ambiental brasileira,
remontando ao período as Ordenações Afonsinas (1446), Manuelinas (1521) e Filipinas
(1580), adaptadas e aplicadas ao Brasil Colônia. 146
Essas legislações previam a proibição do corte de árvores frutíferas, proibiam a
utilização de instrumentos de caça capazes de causar sofrimento e dor aos animais;
determinavam a comercialização de colméias sem a eliminação das abelhas. Por sua vez, as
Ordenações Filipinas vedavam o lançamento aos rios e lagoas de qualquer material que
pudesse sujar as águas, matar ou impedir a reprodução da fauna aquática, principalmente
pesqueira.
Conforme a autora, a influência das ordenações reais vigorou do Brasil Colônia
até o Brasil República, por força de uma lei editada no ano de 1823, até ser revogada pelo art.
1807 do Código Civil de 1916.
Como bem observa Édis Milaré, as citadas leis, ainda que contribuíssem para a
manutenção de certos aspectos do meio ambiente, constituindo-se até numa espécie de
zoneamento ecológico-econômico incipiente, não foram editadas com a preocupação que
144
STRECK, Lênio Luiz. Hermenêutica e concretização dos direitos fundamentais-sociais no Brasil. In:
ANDRADE, André G. C. de. (Org.). A constitucionalização do direito: a constituição como locus da
hermenêutica jurídica. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003, p. 3-41.
145
SILVA, J. Afonso da. , op. cit., p. 34.
146
WAINER, Ann Helen. Legislação ambiental brasileira: subsídios para a história do direito ambiental. Rio
de janeiro: Forense, 1991, p.5-25.
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88
permeia a legislação ambiental contemporânea, pois “[...] acima dos interesses ambientais
objetivos, havia maior preocupação com a propriedade da nobreza e da Coroa [...].”147 E
arremata:
Toda essa legislação, antiga, complexa, esparsa e inadequada, deixava
imune (se é que não incentivava) o esbulho do patrimônio natural,
despojado do seu caráter de bem comum e tratado ignominiosamente como
propriedade privada, gerido e explorado sem escrúpulos, com
discricionariedade acima de qualquer legislação coerente, de qualquer
interesse maior. 148
O Brasil Imperial, conquanto sofresse influência das ordenações reais, teve a
edição do primeiro código criminal, em 1830, que tipificava o corte ilegal de madeira, e a Lei
nº. 601 de 1850, que disciplinava a ocupação do solo, declarando como ilícitos atos como
invasões, desmatamentos e incêndios que, de uma forma ou de outra, degradavam o meio
ambiente.
O Brasil Republicano registrou a edição de várias normas atinentes a fatores
ambientais, como o Código Florestal, o Regulamento de Defesa Sanitária Vegetal e o Código
de Águas, todos do ano de 1934; o Código de Pesca, do ano de 1938; o Código de Minas, do
ano de 1940. Na década de 1960 tem-se a publicação do Estatuto da Terra, do novo Código
Florestal, de Pesca e de Mineração; da Lei de Proteção à Fauna; da Política Nacional de
Saneamento Básico, Dec.-Lei nº. 248/67; do Dec.-Lei nº. 303/67, que instituiu o Conselho
Nacional de Controle da Poluição Ambiental. 149
Conforme José Afonso da Silva, “esses dois decretos continham as linhas gerais
de uma Política de Meio Ambiente, embora incipiente e insuficiente.” 150 Foram revogados e
substituídos pela Lei nº. 5.318/67, que instituiu a Política Nacional de Saneamento, que
147
MILARÉ, op.cit., p. 135.
Ibidem, p. 136.
149
Ibidem, p. 139.
150
SILVA, José Afonso da, op. cit., p. 36.
148
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89
deixou a desejar, pois não aproveitou devidamente os dispositivos dos decretos revogados,
estabelecendo, de certa forma, um retrocesso na proteção ambiental.
A unificação de normas é um procedimento que deve ser aplicado com extrema
cautela, pois não é raro acontecer de serem olvidadas conquistas inseridas num determinado
documento legal, quando este é transposto para um código. Esse é um dos aspectos que
muitos doutrinadores questionam a codificação da legislação ambiental brasileira.
Toshio Mukai e Georgette Nazo consideram que no período de 1960-1970
surgiram “[...] os principais diplomas legais com uma preocupação mais concreta com a
proteção ambiental”, registrando, ainda, a edição do que consideram a primeira obra de cunho
ambiental na doutrina jurídica, de autoria de Osny Duarte Pereira, intitulada “Direito florestal
brasileiro.” 151
No âmbito constitucional, tem-se como significativo avanço em matéria
ambiental, a Constituição Federal de 1988. As Constituições que a precederam jamais se
preocuparam com a proteção do ambiente de forma específica, tanto que em momento algum
empregaram a expressão meio ambiente ou outra equivalente.
De modo geral, a Constituição do Império, de 1824, não fez qualquer referência à
matéria, apenas cuidando da proibição de indústrias contrárias à saúde do cidadão (artigo
179). A Constituição Republicana, de 1891, atribuía competência legislativa à União para
regulamentar minas e terras (artigo 34).
A Constituição de 1934 dispensou proteção às belezas naturais, ao patrimônio
histórico, artístico e cultural (artigo 10, III e 148); conferiu à União competência em matéria
de riquezas do subsolo, mineração, águas, florestas, caça, pesca e sua exploração (artigo 5º).
A Carta de 1937 também se preocupou com a proteção dos monumentos
151
MUKAI, Toshio; NAZO, Georgette Nacanto. O direito ambiental no Brasil: evolução histórica e a relevância
do direito internacional do meio ambiente. In: BENJAMIN, Antônio Hermann V.; MILARÉ, Édis (Coord.).
Revista de Direito Ambiental, São Paulo, ano 7, n. 28 , p. 71-100, out.-dez. 2002.
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90
históricos, artísticos e naturais, bem como das paisagens e locais especialmente dotados pela
natureza (artigo 134); incluiu, dentre as matérias de competência da União legislar sobre
minas, águas, florestas, caça, pesca e sua exploração, dentre outros.
A Constituição de 1946, além de manter a defesa do patrimônio histórico, cultural
e paisagístico (artigo 175), conservou como competência da União legislar sobre normas
gerais da defesa da saúde, das riquezas do subsolo, das águas, das florestas, caça e pesca.
A Carta Política de 1967 conservou a necessidade de proteção do patrimônio
histórico, cultural e paisagístico (artigo 172, parágrafo único); conservando a União as
mesmas atribuições anteriores. A Emenda Constitucional nº. 1, outubro de 1969, cuidou
também da defesa do patrimônio histórico, cultural e paisagístico (artigo 180, parágrafo
único). No tocante às competências, manteve as disposições da Constituição emendada.
As várias Constituições brasileiras, desde 1934, mantiveram a proteção ao
patrimônio histórico, paisagístico e cultural do país, cuidando o legislador em proteger o meio
ambiente de forma incidental, referindo-se isoladamente a alguns de seus elementos
integrantes (florestas, caça, pesca), ou disciplinando matérias a eles indiretamente
relacionadas (mortalidade infantil, saúde, propriedade).
A dimensão conferida ao tema ambiental na Constituição Federal de 1988 (CRFB)
alcança inúmeros dispositivos inseridos ao longo de seu texto nos mais diversos títulos e
capítulos, decorrentes do conteúdo multidisciplinar da matéria, a cujo respeito bem observa
José Afonso da Silva que, embora o núcleo da temática ambiental na CRFB se concentre no
Capítulo VI, do Título VIII, dirigido à Ordem Social, o seu entendimento,
[...] será deficiente se não se levar em conta outros dispositivos que a ela se
referem explícita ou implicitamente. De fato [...] a questão ambiental
permeia o texto constitucional mediante expressão explícita ao meio
ambiente, que se mostra ao pesquisador com maior clareza.. Há, porém,
91
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
muitos outros dispositivos em que os valores ambientais se apresentam sob
o véu de outros objetos da normatividade constitucional. 152
E, em seguida, esse autor elenca as primeiras referências expressas ao meio
ambiente na Constituição Federal, como sendo as constantes no art. 5º, LXXIII, relativa à
ação popular por ato lesivo ao meio ambiente; o art. 20, II, referente às terras devolutas
indispensáveis à preservação do meio ambiente; os art. 23 e 24, que definem as competências
comum e concorrente das instâncias dos governos para legislar em matéria ambiental.
Além disso, cita o art. 91, § 1º, III, que inclui como atribuição do Conselho de
Defesa Nacional opinar sobre a exploração de recursos naturais; o art. 129, III, que prevê
como função do Ministério Público promover o inquérito civil e a ação civil pública para
proteção do meio ambiente; o art. 170, VI, que reputa a defesa do meio ambiente como um
dos princípios da ordem econômica; o art. 174, § 3º, que trata da proteção do meio ambiente
em atividades garimpeiras; o art. 186, II, que aborda a função social da propriedade rural
como estando atrelada à preservação do meio ambiente.
Os diversos artigos da CRFB que tratam direta ou indiretamente sobre meio
ambiente contemplam normas de natureza processual, penal, econômica, sanitária,
administrativa, e normas de repartição de competência administrativa. “Este conjunto
diversificado de normas confirma e consagra a transversalidade do Direito Ambiental.”
153
O caráter ambiental inovador da Constituição Federal de 1988 não se concentra,
somente, em tais referências explícitas e implícitas, que revelam o aspecto interdisciplinar da
matéria ambiental. Há um capítulo inteiro dedicado a esse tema, onde foram inseridos
elementos não jurídicos emprestados de outras áreas do conhecimento humano, tomando-se o
cuidado para não se restringir apenas a aspectos biológicos ou ecológicos, mas se levando em
152
153
SILVA, José Afonso da, op. cit., p. 47.
ANTUNES, op. cit., p. 64.
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92
conta os fatores humanos e sociais, “[...] todo ele impregnado de valores de qualidade de
vida.” 154
O tema em foco, na CRFB, pauta-se numa série de princípios nem sempre
coincidentes entre os doutrinadores, 155 além de suscitar a problemática da recepção das
normas ambientais pré-existentes no ordenamento jurídico brasileiro, conduzindo à indagação
sobre a validade da legislação pretérita.
Conforme Vicente Gomes da Silva, a legislação ambiental anterior à Carta Magna
de 1988 foi “[...] in totum recepcionada pelo novo texto constitucional, em virtude da
elevação do direito ambiental ao status constitucional e do amplo enunciado programático do
art. 225 da CF, o qual dispõe sobre o meio ambiente.” 156
Porém registra alguns problemas decorrentes dessa recepção, quando afirma:
Alguns aspectos da legislação dificultam a interpretação e a aplicação de tais
normas. O primeiro aspecto surge em função da existência de normas gerais
e também de normas específicas nessas leis, pelo simples fato de que foram
editadas sob a regência das constituições anteriores, época em que a
competência da União era plena para legislar sobre matéria ambiental. Por
outro lado, o atual texto constitucional mudou por completo este cenário,
pois a União só pode legislar sobre normas gerais e ainda pelo fato de que as
competências ambientais foram repartidas politicamente entre os três níveis
de governo [...]. 157
Significa que, se por um lado a não revogação constitucional das normas
ambientais anteriores à promulgação da CRFB tem seu aspecto positivo no sentido de
eliminar a necessidade de publicação de novas leis, por outro lado apresenta o aspecto
negativo de ter sido elaborada em um outro contexto sócio-político-econômico.
154
Ibidem, p. 48.
Sobre os princípios ambientais constitucionais, Cf. tópico 2.1 desta dissertação. Cf., ainda, os seguintes
autores: ANTUNES, op.cit., p. 31-43; MILARÉ, op.cit., p. 157-174; MACHADO, op.cit., p. 53-99.
156
SILVA, Vicente Gomes da., op. cit., p. 38.
157
Ibidem, p. 38.
155
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
93
Portanto, essas leis ambientais recepcionadas pela Carta Magna, tendo um ou
outro ponto dissonante com a realidade constitucional, geram dúvidas na aplicação ao caso
concreto que pode resultar em prejuízo para o meio ambiente.
Da legislação pretérita à CRFB/88, por esta recepcionada e pertinente a este
trabalho, é possível enumerar a Lei nº. 4.771/65 (Código Florestal), a Lei nº. 5.197/67
(Código de Proteção à Fauna), o Dec.-Lei nº. 221/67 (Código de Pesca), a Lei 6.803/80
(zoneamento industrial em áreas poluídas), a Lei nº. 6.938/81 (Política Nacional do Meio
Ambiente - PNMA) , a Lei nº. 7.347/85 (Ação Civil Pública).
No elenco das leis federais posteriores à Carta Magna de 1988, também, correlatas
a este trabalho, têm-se a Lei nº. 7.803/89 (altera o Código Florestal de 1965), a Lei nº.
8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), a Lei nº. 7.804/89 (altera a PNMA), a Lei nº.
9.433/97 (Plano Nacional de Recursos Hídricos), a Lei nº. 9.605/98 (Lei de Crimes
Ambientais), a Lei nº. 9.795/99 (Política Nacional de Educação Ambiental), a Lei nº.
9.985/00 (Sistema Nacional de Unidades de Conservação - SNUC), o Dec.nº. 99.274/90
(regulamenta a PNMA), o Dec.nº. 4.339/02 (Política Nacional da Biodiversidade), a Lei nº.
7.802/89 (Lei de Agrotóxicos), o o Dec.nº. 5.746/06 (Regulamenta o art. 21 da Lei nº.
9.985/00).
Impende ressaltar que a Constituição Federal de 1988, que recepcionou o Código
Florestal de 1965, foi a que mais tratou do tema “florestas”, abordando-o em seus artigos 23,
inc.VIII; 24, inc.VI; e 225 § 4º. Conforme Paulo de Bessa Antunes, “a preservação das
florestas é uma das questões fundamentais para a sobrevivência da humanidade e de todas as
formas de vida,” 158 pois se associam intimamente à questão climática, ao ciclo hidrológico, à
preservação dos solos, à biodiversidade.
158
ANTUNES, op. cit., p. 541.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
94
Tal Constituição evidenciou, também, o caráter de bem público da água, pondo
abaixo a concepção de um recurso passível de apropriação privada, e que podia ser utilizada
sem custo algum pelo particular, em detrimento geral da sociedade.
Paulo José Leite Farias esclarece que, até o advento da CRFB/88, a legislação que
tratava dos recursos hídricos tinha um caráter híbrido, com tendências a considerar a
dominialidade das águas mais pela ótica do direito privado do que pela ótica do direito
público. Contudo,
Atualmente, [...] a solução adotada pelo ordenamento jurídico brasileiro
modifica esta configuração híbrida, buscando uma apreciação uniforme,
calcando-se na proteção da água (de toda ela) como bem público, o que
salienta o interesse comum na sua preservação, por se tratar de um recurso
natural limitado, representativo da integração do homem à Natureza. 159
Paulo Affonso Leme Machado ensina que a Carta Política vigente apresenta uma
concepção mista de meio ambiente: “[...] o caput do art. 225 é antropocêntrico, [...] nos
parágrafos (4º e 5º e nos incisos I, II, III e IV do § 1º) do art. 225 equilibra-se o
antropocentrismo com o biocentrismo, havendo a preocupação de harmonizar e integrar seres
humanos e biota.”160
Nesse mesmo sentido, Paulo de Bessa Antunes, ao comentar o conceito normativo
de meio ambiente, constante do art. 3º da Lei 6.938/81 que instituiu a Política Nacional de
Meio Ambiente, alega que “[...] a Constituição Federal modificou inteiramente a compreensão
que se deve ter do assunto, pois inseriu, de forma bastante incisiva, o conteúdo humano e
social no interior do conceito.”161
Esse autor ressalta a ruptura que a CRFB/88 estabeleceu com o tradicional
enfoque dado aos bens de uso comum, como sendo somente bens de dominialidade pública,
159
FARIAS, op. cit., p. 397.
MACHADO, op.cit., p. 118.
161
ANTUNES, op.cit., p. 64.
160
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95
quando estende esse entendimento aos bens de domínio privado, para cujos proprietários são
fixadas obrigações relativas à preservação ambiental, atreladas à função socioambiental da
propriedade. 162
Um aspecto relevante sobre a temática ambiental contida no art. 225 da
Constituição Federal é o que alude à sua eficácia plena no mundo jurídico. É possível
constatar que muitos incisos e parágrafos do art. 225 não exigem subseqüente regulamentação
em nível extraconstitucional, enquanto outros demandam leis específicas para terem
aplicabilidade, por conseguinte eficácia plena.
No entendimento de Paulo de Bessa Antunes, não existem “dúvidas em afirmar
que as normas que consagram o direito ao meio ambiente sadio são de eficácia plena e não
necessitam de qualquer norma subconstitucional para que operem efeitos no mundo
jurídico.” 163 E isto porque seu conteúdo já recepcionou a legislação existente, tendo seus
incisos e parágrafos desdobramentos e aplicabilidade através dessa legislação.
Desse modo, as obrigações imputadas ao poder público, nos incisos do § 1º do art.
225 da CRFB/88, têm a legislação infraconstitucional correspondente, editada anterior ou
posteriormente à Carta Magna, e que objetiva assegurar a efetividade do direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado.
No que se refere à restauração dos processos ecológicos e ao manejo das espécies,
previstos no inciso I do § 1º, tem-se a Lei nº. 6.938/81 como principal suporte. Esta lei
estabelece a Política Nacional de Meio Ambiente (PNMA) e está regulamentada pelo Dec. nº.
99.274/90.
A PNMA incorporou e aperfeiçoou normas estaduais já vigentes e instituiu o
Sistema Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA, integrados pela União, Estados, Distrito
162
163
Ibidem, p. 67.
Ibidem, p. 72.
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96
Federal e Municípios, atribuindo aos Estados maior parcela de responsabilidade na execução
das normas protetoras do meio ambiente.
O SISNAMA tem como órgão superior o Conselho Nacional do Meio Ambiente
(CONAMA), cuja finalidade é assessorar, estudar e propor diretrizes de políticas
governamentais para o meio ambiente e os recursos naturais, além de deliberar, no âmbito de
sua competência, sobre normas e padrões compatíveis com o meio ambiente ecologicamente
equilibrado e essencial à sadia qualidade de vida.
A Lei 6.938/81 traz em seu art. 9º instrumentos de que a Política Nacional de
Meio Ambiente (PNMA) lança mão para atingir seus objetivos. Trata-se de medidas, meios e
procedimentos pelos quais o Poder Público executa a política ambiental.
De acordo com José Afonso da Silva, os instrumentos da PNMA podem ser
subdivididos em instrumentos de intervenção ambiental, instrumentos de controle ambiental e
instrumentos de controle repressivo. 164
Através dos instrumentos de controle ambiental, o Poder Público verifica o
cumprimento das normas e exigências para implantação de atividades poluidoras ou passíveis
de degradar o ambiente. Faz-se por meio dos licenciamentos ambientais, regulados pelas
Resoluções do CONAMA nº. 237/97 e nº. 006/87 que devem estar subsidiados pelo Estudo
Prévio de Impacto Ambiental (EIA) e pelo Relatório de Impacto Ambiental (RIMA).
Inclusive, vale destacar os instrumentos de controle repressivo que são as aplicações de
sanções administrativas, civis ou penais, para atos lesivos ao meio ambiente já consumados.
Segundo Antônio Inagê de Assis Oliveira, o licenciamento ambiental é um dos
instrumentos mais importantes, porque
É exatamente por este instrumento, o licenciamento ambiental, que o Poder
Público, ao examinar os projetos a ele submetidos, verifica sua adequação
aos princípios da Política Nacional do Meio Ambiente. Para tanto, avalia,
164
SILVA, José Afonso da, op.cit., p. 216.
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97
em termos ambientais, as conseqüências positivas e negativas, de sua
implantação tendo em vista o bem comum e decide pela autorização ou não
de sua implantação, formulando as exigências cabíveis para minimização de
seus impactos ambientais negativos ou maximização de seus impactos
positivos, inclusive do ponto de vista socioeconômico. 165
A preservação da diversidade e integridade do patrimônio genético, a fiscalização
das instituições de pesquisa desse tipo de material, previstos no inciso II, § 1º, art. 225 da
CRFB, têm na Medida Provisória (MP) nº. 2.186-16/01, a sua regulamentação. Tal MP
também regulamenta o § 4º do referido artigo, que trata da utilização sustentável da Amazônia
brasileira, da Mata Atlântica, da Serra do Mar, do Pantanal Mato-grossense e da Zona
Costeira. 166
Igualmente deve ser arrolado o Dec.nº. 4.339/02 que instituiu os princípios e
diretrizes para a implementação da Política Nacional da Biodiversidade. Esse decreto é
criticado por Paulo de Bessa Antunes: segundo esse autor, ele demonstra “[...] elaboração
pouco técnica e assistemática [...]”, tratando de temas que não constam na CDB, pecando pela
falta de rigor técnico legal, “[...] com o valor que ele deve ter em um estado democrático de
direito”, somando-se a isso o fato de não ter sido editado na forma de lei, e sim de decreto, o
que “[...] ab initio, põe em dúvida toda a constitucionalidade da mencionada política.” 167
Além disso, a definição dos espaços territoriais e seus componentes a serem
protegidos na área de todos os Estados federados, conforme preconizado no inciso III, § 1º,
art. 225 da CRFB, remete à Lei nº. 9.985/00, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação (SNUC), e que será objeto de detalhamento no próximo capítulo deste trabalho.
Remete, ainda, aos dispositivos da Lei nº. 4.771/65 (Código Florestal) que,
segundo Paulo Affonso Leme Machado, “[...] antecipou-se à noção de interesse difuso, e foi
165
OLIVEIRA, Antônio Inagê de Assis. Introdução à legislação ambiental brasileira e licenciamento
ambiental. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005, p. 287.
166
SILVA, Vicente Gomes da, op.cit., p. 502.
167
ANTUNES, op. cit., p. 463.
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98
precursor da Constituição Federal quando conceituou meio ambiente como bem de uso
comum do povo”, sendo também inovador, quando considerou o descumprimento de seus
dispositivos como uso nocivo da propriedade. 168
As Resoluções do CONAMA nº. 001/86 e nº. 237/97 também satisfazem o
mandamento do inciso IV, § 1º, art. 225 da CRFB, que exige o estudo prévio de impacto
ambiental (EIA) para instalação de obra ou atividade potencialmente degradadora do meio
ambiente.
Importa ressaltar que, embora a CRFB exija a realização do EIA “na forma da lei”,
e o assunto venha regulado por resoluções do CONAMA, estas se amparam na Lei nº.
6.938/81 que foi recepcionada pela CRFB. 169
Também a promoção da educação ambiental prevista no inciso VI, § 1º, art. 225 da
CRFB vem atendida pela Lei nº. 9.795/99 que, no entendimento de Vicente Gomes da Silva,
[...] representa um enorme passo no sentido de criar as condições
necessárias para promover a conscientização de toda a população no sentido
de cuidar dos recursos naturais. Permeia o sentimento de todos aqueles que
militam nos órgãos ambientais o fato de que sem educação ambiental esta
luta não será vencida. 170
Merece destaque a Lei de Crimes Ambientais (Lei nº. 9.605/98), pois ela
contextualiza novas formas de crimes praticados contra o meio ambiente em função da
tecnologia e da globalização, prestigia penas restritivas de direito em substituição às penas
168
MACHADO, op.cit., p. 718.
A Lei nº 6.938/81 – PNMA, ao tratar do CONAMA, confere-lhe competência para estabelecer normas e
critérios para o licenciamento ambiental de atividades poluidoras, e para determinar a realização de estudos de
alternativas e possíveis conseqüências ambientais de projetos públicos e privados em obras em atividade
potencialmente poluidoras, conforme consta dos incisos I e II do artigo 8º do PNMA.
170
SILVA, Vicente Gomes da, op.cit., p. 52.
169
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99
privativas de liberdade, organiza e sistematiza diversos textos que tratavam de matéria
criminal ambiental esparsamente. 171
Essa norma introduz o crime de perigo ambiental, evidenciando o princípio de
prevenção, e descriminaliza a caça por motivo de fome, considerando a necessidade motivada
pelas desigualdades regionais e até mesmo a tradição da caça em algumas regiões brasileiras.
Notável avanço foi a responsabilização penal da pessoa jurídica que, na ótica de
Paulo Affonso Leme Machado, textualiza
O acolhimento da responsabilidade penal da pessoa jurídica na Lei 9.605/98
mostra que houve atualizada percepção do papel das empresas no mundo
contemporâneo. Nas últimas décadas, a poluição, o desmatamento
intensivo, a caça, a pesca predatória não são mais praticados só em pequena
escala. O crime ambiental é principalmente corporativo. 172
A Lei de Crimes Ambientais é considerada um significativo avanço na legislação
ambiental; pois, sendo o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado um direito
fundamental da pessoa humana, justifica-se a imposição de sanções penais às agressões contra
ele perpetradas.
Conforme leciona Ivette Senise Ferreira, a tutela penal ambiental é a última ratio,
pois “[...] esta é chamada a intervir somente nos casos em que as agressões aos valores
fundamentais da sociedade alcancem o ponto do intolerável ou sejam objeto de intensa
reprovação do corpo social.” 173 Logo, percebe-se que a legislação ambiental brasileira é
bastante profícua e atende, de forma geral, aos dispositivos do art. 225 da CRFB, nela
encontrando o respaldo maior e a ela se adequando.
171
A Lei nº. 9.605/98 poderia ter sido mais abrangente, pois deixou de incluir muitas condutas nocivas ao meio
ambiente, e punidas por outros diplomas legais, como as constantes do Código Penal, da Lei de Contravenções
Penais, da Lei nº 6.453/77, da Lei nº 7.643/87, conforme aponta MILARÉ, op. cit., p. 847.
172
MACHADO,op. cit., p. 683.
173
FERREIRA, Ivette Senise. Tutela do patrimônio cultural. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 68.
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100
A competência para legislar em matéria ambiental, estipulada pela CRFB como
sendo comum (art. 23) e concorrente (art. 24) à União, Estados, DF e Municípios, favorece a
expansão do rol de normas protetoras do meio ambiente. Entretanto, deve-se cuidar para que
as legislações efetivamente se complementem e efetivamente contribuam para garantir o
direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Há quem critique a variada gama de leis ambientais brasileiras, alegando que isso
dificulta o conhecimento e a aplicação eficaz das normas. Argumentam que a edição de um
código ambiental traria mais resultados positivos à defesa do meio ambiente, pelo fato de
tornar mais acessível e compreensível a comunicação da lei ambiental, reunindo normas
gerais sobre direito ambiental com capítulos que tratam da fauna, flora, mineração, recursos
hídricos, competência, responsabilidades civis, penais e administrativas, e com normas de
caráter processual.
Todavia, a codificação das leis ambientais pode resultar em perdas de várias
conquistas já sedimentadas em diversas legislações que poderiam não ser contempladas, além
de tornar mais difíceis futuras e necessárias alterações no Código Ambiental, como ocorreu
com o Código Civil e o Código Penal, cujos trâmites legislativos demoraram décadas.
Portanto, seria conveniente sistematizar a legislação ambiental brasileira de modo
que as leis e normas consolidadas possam ser revistas e atualizadas periodicamente. Dessa
forma, manter-se-ia a flexibilidade legislativa instituída pelo sistema de competências
constitucionais em matéria de meio ambiente, tão necessária em um Estado Democrático de
Direito.
Assim, a partir de agora, dentro desse contexto meio ambiente-direitos humanos
fundamentais, faz-se necessário analisar a Reserva Particular do Patrimônio Natural, enquanto
modalidade de unidade de conservação, pois constitui o escopo deste trabalho, motivo pelo
qual será avaliada com maior detalhe no capítulo subseqüente.
101
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CAPÍTULO 3
A RESERVA PARTICULAR DO PATRIMÔNIO NATURAL ENQUANTO
MODALIDADE DE UNIDADE DE CONSERVAÇÃO, EM FACE DO SISTEMA
NACIONAL DE PROTEÇÃO DO AMBIENTE
3.1 Sistema nacional de unidades de conservação
O Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), instituído pela Lei
9.985/00, foi concebido para atender especificamente ao disposto no inciso III, § 1º do artigo
225 da CRFB que impõe ao Poder Público a obrigatoriedade de instituir áreas especialmente
protegidas, incluindo seus respectivos componentes, procurando reunir e sistematizar os
procedimentos relativos às diferentes unidades de conservação existentes nas três esferas de
governo.
Conforme Paulo Affonso Leme Machado, a Lei 9.985/00 denominou tais áreas de
unidades de conservação (UCs), e estas
[...] inserem-se no conceito de área protegida, levando-se em conta sua
definição: área definida geograficamente, que é destinada, ou
regulamentada, e administrada para alcançar objetivos específicos de
conservação, dependendo da categoria da unidade. 174
Cabe ressaltar que a definição abordada por Paulo Affonso Leme Machado é a
prevista no artigo 2º da Convenção da Biodiversidade, cuja redação assemelha-se à que está
preconizada no inciso I, artigo 2º da Lei 9.985/00 (ANEXO A).
O termo “conservação” utilizado pela lei, deve ser entendido de forma ampla,
compreendendo a preservação, manutenção, uso sustentável, restauração e recuperação do
174
MACHADO, op. cit., p. 783 .
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
102
ambiente natural, e neste aspecto, Antônio Herman V. Benjamim aponta uma inadequação
terminológica do texto legal do SNUC, pois
[...] com a promulgação da Lei do SNUC o ordenamento brasileiro passa a
contar com duas definições coexistentes de Unidades de Conservação. Uma
descritiva, taxativa e estreita, em sede penal. A outra, funcional, aberta e
flexível, para os demais fins, sejam civis, administrativos ou tributários. 175
Observa-se que, para fins do SNUC, o termo “conservação” é bastante abrangente,
porém Antônio Herman V. Benjamin ressalta a inadequação do termo “unidades de
conservação,” se confrontado com os objetivos do SNUC que incluem a preservação. Isto é,
conservação e preservação são coisas distintas, ambas são espécies de proteção especial da
natureza as quais comportam níveis diferentes de ações e restrições. 176
Conforme leciona Paulo de Bessa Antunes, a idéia de um Sistema Nacional de
Unidades de Conservação remete a um modelo estabelecido em lei federal que deve ser
adotado por todos os integrantes da Federação, muito embora estes tenham autonomia em
matéria ambiental. 177 Desse modo, o SNUC é constituído pelas UCs instituídas pelos
governos federal, estadual e municipal, todos convergindo para as diretrizes da Lei 9.985/00 e
tendo seus objetivos colimados pela Lei Maior.
Importa destacar que o SNUC trata de uma das modalidades de espaços territoriais
especialmente protegidos, com previsão constitucional, sendo que as demais categorias
encontram regulamentação em outros dispositivos legais. Assim, além das UCs protegidas
pela Lei 9.985/00, existem outras normas de proteção ambiental, v.g., Lei de Parcelamento do
Solo Urbano (Lei 6.766/79) e Estatuto da Cidade (Lei 10.257/01) num contexto urbano;
175
BENJAMIN, Antônio Herman V. O regime brasileiro de unidades de conservação. In: ______.; MILARÉ,
Édis (Coord.). Revista de Direito Ambiental, São Paulo, ano 6, n. 21, p. 27-56, jul.-set. 2001.
176
Idem. Introdução à lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação. In: BENJAMIN, Antônio Herman
V. (Coord.). Direito ambiental das áreas protegidas: o regime jurídico das áreas de conservação. Rio de
Janeiro: Forense Universitária, 2001, p. 277-316.
177
ANTUNES, op. cit. , p. 628-629.
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103
Código Florestal (Lei 4.771/65) e Medida Provisória (MP 2.166-67/01) que altera este
Código, no âmbito rural. 178
Para se enquadrar como unidade de conservação, o espaço protegido deve
preencher alguns pressupostos, como: ter relevância natural; ser oficializado pelo Poder
Público, ainda que seja instituído em área privada; ser delimitado; apresentar um regime
especial de proteção e administração; e ter objetivo conservacionista.
Tais condições são inferidas do conceito de UC preconizado pelo SNUC, em seu
artigo 2º, inciso I:
Art. 2º Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
I – unidade de conservação: espaço territorial e seus recursos ambientais,
incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes,
legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e
limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam
garantias adequadas de proteção.
Entretanto, como bem indaga Antônio Herman V. Benjamin, “[...] o que seria
relevância natural?” Para esse jurista, o termo deve ser compreendido de forma ampla,
extrapolando o simples entendimento de beleza paisagística, devendo ser encarado como “[...]
uma noção de fundo ecológico e não um juízo prisioneiro da percepção ou apreciação
humana.” 179
Sendo assim, a relevância natural de uma área que está para ser considerada
unidade de conservação inclui não só uma apreciação de caráter cênico, mas também relativo
a seus componentes abióticos (componentes não vivos do ecossistema, p. ex., oxigênio,
carbono, umidade, temperatura, vento) e bióticos (componentes vivos do ecossistema, p. ex.,
plantas, animais).
178
MILARÉ, op. cit., pp. 359-362.
BENJAMIN, Antônio Herman V. Introdução à lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação. In:
______. (Coord). Direito ambiental das áreas protegidas: o regime jurídico das áreas de conservação. Rio de
Janeiro: Forense Universitária, 2001, p. 277-316.
179
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
104
A oficialização pelo Poder Público é um pressuposto jurídico-formal, processado
por meio de um ato declaratório, que tanto pode ser uma lei como um decreto, resolução ou
decisão judicial. Já a definição espacial ou geográfica, é determinada pela individualização e
delimitação da área a ser especialmente protegida, e sobre a qual recairá as benesses e os ônus
estipulados pela legislação. Tal delimitação territorial confere identidade própria à unidade de
conservação, distinguindo-a de seu entorno, não devendo ser confundida com limitação da
extensão territorial ou área da UC, que pode ter tamanhos variados.
O pressuposto do objetivo conservacionista se configura pela potencialidade de
proteção ou conservação à integridade e à função ecológica do ecossistema abrangido pela
área delimitada, por meio de um regime especial de proteção e administração. Tais regimes
são expressos pela inclusão dessas áreas sob a esfera de proteção da Lei de Crimes
Ambientais (Lei nº. 9.605/98), do Código Penal (Dec.-Lei nº. 2.848/40), das regras
específicas regulando a modificação das características, usos e status jurídico das UCs que só
podem ser alterados mediante lei.
Todas essas medidas, restringindo as alterações físicas e funcionais das unidades
de conservação visam dar mais efetividade à proteção do meio ambiente através do Sistema
Nacional de Unidades de Conservação e, desse modo, propiciar mais eficácia à manutenção
do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Portanto, os dois grupos de unidades de conservação integrantes do SNUC Unidades de Proteção Integral e Unidades de Uso Sustentável - serão avaliados nos
subtópicos a seguir, segundo o quadro ilustrativo abaixo:
105
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SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO
- SNUC -
UNIDADES DE PROTEÇÃO INTEGRAL
UNIDADES DE USO SUSTENTÁVEL
Estação Ecológica
Área de Proteção Ambiental
Reserva Biológica
Área de Relevante Interesse Ecológico
Parque Nacional ou Estadual
Floresta Nacional ou Estadual
Monumento Natural
Reserva Extrativista
Refúgio de Vida Silvestre
Reserva de Fauna
___________________
Reserva de Desenvolvimento Sustentável
___________________
Reserva Particular do Patrimônio Natural
3.1.1 Unidades de proteção integral
O Sistema Nacional de Unidades de Conservação, na medida em que regulamenta
e sistematiza a implantação e funcionamento de unidades de conservação no espaço
geográfico, estabelece uma forma de planejamento da ocupação do território nacional, de
forma a “[...] excluir espaços da atividade humana, seja pela retirada total da atividade
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106
humana, seja pelo exercício de outras atividades que não se relacionam com a reprodução
global dos recursos para o mercado.”180
Nesse sentido, as Unidades de Proteção Integral (UPIs) compõem um dos grupos
de UCs previstas pelo SNUC que admite o uso indireto de seus componentes naturais através
de atividades que não impliquem consumo, coleta, dano ou destruição dos recursos
ambientais. Pode-se citar como exemplo a pesquisa científica, para a qual a lei admite
exceções quanto à coleta e à visitação pública para fins educacionais e de lazer. Em algumas
categorias de UPIs, no entanto, até mesmo esse tipo de visitação é vedada (ANEXO B).
Quanto à dominialidade, as UPIs são divididas em cinco categorias e apresentam
exclusivo domínio público em se tratando de estações ecológicas, reservas biológicas e
parques nacionais. Nas categorias monumento natural e refúgio da vida silvestre, pode haver
dominialidade privada, desde que os proprietários das respectivas áreas concordem com a
implantação da UPI, e que as atividades desenvolvidas sejam compatíveis com os objetivos de
preservação, pois do contrário haverá necessidade de se promover a desapropriação.
Ou seja, conforme Ibraim Rocha, tal possibilidade de constituir UPIs em
propriedades privadas afasta o mito de que essas unidades de conservação caracterizam-se
pela ausência humana dentro de seus limites. 181
Embora as UPIs apresentem características gerais semelhantes, diferenciam-se
quanto aos objetivos específicos de preservação, sendo que algumas já tinham previsão legal
anterior à Lei 9.985/00, que tão somente veio regular alguns aspectos mais detalhados.
180
DERANI, Cristiane. A estrutura do Sistema Nacional de Unidades de Conservação – Lei nº 9.985/2000. In:
BENJAMIN, Antônio Herman V. (Coord.). Direito ambiental das áreas protegidas: o regime jurídico das
unidades de conservação. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001, p. 232-246.
181
ROCHA, Ibraim. Posse e domínio na regularização de unidades de conservação. In: BENJAMIN, Antônio
Herman V.; MILARÉ, Édis (Coord.). Direito ambiental das áreas protegidas: o regime jurídico das áreas de
conservação. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001, p. 127-154.
.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
107
Desse modo, as estações ecológicas (ESECs) são áreas representativas dos
ecossistemas brasileiros, destinadas a pesquisas científicas aplicadas à Ecologia e à proteção
integral do ambiente natural, permitindo-se visitação pública somente para fins estritamente
educacionais. As ESECs já eram regulamentadas pela Lei nº. 6.902/81. Segundo dados do
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis – IBAMA – existem
vinte e nove unidades federais dessa categoria no Brasil. 182
As reservas biológicas (REBIOs) são áreas que possuem ecossistemas importantes,
característicos, ou espécies de flora e fauna significantes pela sua diversidade biológica,
devendo ser, por esse motivo, preservadas como recursos genéticos. As REBIOs devem
garantir que os processos naturais se desenvolvam sem interferência direta do homem, mesmo
que tais processos impliquem alteração do ecossistema, desde que tais alterações tenham
causa natural. O Brasil possui vinte e seis unidades dessa categoria, 183 que têm sua origem no
Código Florestal de 1965 e no Código de Caça de 1967. O SNUC, inserindo as REBIOs em
sua esfera de influência, restringiu alguns aspectos mais permissivos na legislação pretérita,
como a visitação pública, que agora só é admitida para fins educacionais e obtenção de
conhecimentos científicos. 184
Os parques nacionais (PARNAs) são, dentre as unidades de conservação de
proteção integral, os que mais contabilizam unidades: cerca de cinqüenta e três, com uma
distribuição equilibrada entre as cinco regiões geográficas do Brasil. Apresentam uma
vocação maior para a visitação pública, sendo áreas por excelência apropriadas para a prática
do turismo ecológico. E como bem lembra Édis Milaré, “[...] constituem a mais antiga e
182
BRASIL. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Lista das unidades de
conservação federais. Disponível em: <http://www2.ibama.gov.br/unidades/geralucs/tabl.htm>. Acesso em 09
mar. 2006.
183
Ibidem.
184
LEITE, José Rubens Morato et al. Estação ecológica e reserva biológica. Direito ambiental posto ou aplicado
? In: BENJAMIN, Antônio Herman (Coord.). Direito ambiental das áreas protegidas: o regime jurídico das
áreas de conservação. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001, p. 372-389.
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108
popular modalidade de unidade de conservação.” 185 Os PARNAs têm sua normatização
prevista desde o Código Florestal de 1965, regulamentada posteriormente pelo Dec.
84.017/79, podendo também ser criados na esfera estadual ou municipal, recebendo as
denominações de parque estadual ou parque natural municipal.
O monumento natural é uma categoria prevista, mas ainda inexistente, e de todas,
é a que mais se aproxima da concepção leiga de área preservada ambientalmente, pois se trata
de uma região de exclusiva beleza cênica e protegida, somente, por esse atributo. Segundo
Antônio Inagê de Assis Oliveira, o termo “monumento natural” surgiu pela primeira vez na
Constituição Federal de 1937, sendo definido pelo Dec. nº. 58.054/66 e detalhado pelo
SNUC. Pode abranger propriedade privada e admite ampla visitação pública. 186
Os refúgios de vida silvestre tratam de uma modalidade de UC que visa a proteger
determinados ambientes naturais importantes para a reprodução e existência de espécimes
animais e vegetais. Podem ser encarados como berçários da fauna, constituindo-se num
importante suporte para espécimes migratórias, principalmente da avifauna que visitam o
território brasileiro sazonalmente. 187
A seguir, serão analisadas as unidades de uso sustentável, como complemento a
esse subtópico.
3.1.2 Unidades de uso sustentável
Procurando compatibilizar a proteção ao meio ambiente com o desenvolvimento
econômico, foram concebidas as unidades de conservação de uso sustentável (UUS),
185
MILARÉ, op.cit., p. 374 .
OLIVEIRA, Antônio Inagê de Assis. Introdução à legislação ambiental brasileira e licenciamento
ambiental. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005, p. 269.
187
BRASIL. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Lista das unidades de
conservação federais. Disponível em: <http://www2.ibama.gov.br/unidades/geralucs/tabl.htm>. Acesso em 09
mar. 2006.
186
109
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
subdivididas em sete categorias: área de proteção ambiental, área de relevante interesse
ecológico,
floresta
nacional,
reserva
extrativista,
reserva
da
fauna,
reserva
de
desenvolvimento sustentável e reserva particular do patrimônio natural (ANEXO B).
A dominialidade vigente nessas unidades de conservação é a propriedade pública,
contudo as áreas de proteção ambiental e as áreas de relevante interesse ecológico aceitam,
como uma ocorrência marginal, a dominialidade privada. Mas, a reserva particular do
patrimônio natural, somente o domínio privado.
Vale observar que a presença humana e a exploração dos recursos naturais ou o
desenvolvimento de atividades econômicas nessas UCs são aspectos comuns e pressupostos
de seu enquadramento como unidade de uso sustentável, à exceção da reserva da fauna, que
não admite presença humana. 188
Nesse contexto de conservacionismo, as áreas de proteção ambiental (APAs)
foram instituídas no ordenamento jurídico brasileiro em 1981, pela Lei 6.902, e inseridas no
bojo da Política Nacional de Meio Ambiente, Lei 6.938/81, como instrumentos de efetivação
dessa política ambiental.
Posteriormente, a Resolução 010/88 do Conselho Nacional de Meio Ambiente
(CONAMA) regulamentou em detalhes as APAs, estabelecendo a obrigatoriedade de um
zoneamento ecológico-econômico, a fim de fixar os usos e não-usos permitidos nessas áreas,
em consonância com as peculiaridades locais.
As áreas de proteção ambiental têm obtido grande sucesso de implantação e
aceitação como UCs, 189 pelo fato de não exigirem desapropriação para sua consolidação. Um
outro aspecto é a flexibilidade nos usos econômicos que contribui para essa aceitação das
188
ROCHA, op. cit., p. 127-154.
BRASIL. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Lista das unidades de
conservação federais. Disponível em: <http://www2.ibama.gov.br/unidades/geralucs/tabl.htm>. Acesso em 09
mar. 2006. Atualmente existem 29 APAs federais no Brasil.
189
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
110
áreas inseridas em uma APA, revelando objetivos a serem atingidos, tais como o bem-estar
das populações que as habitam e a adequabilidade desse modelo ao ambiente urbano.
Esse quadro pode ser corroborado com as previsões, na Lei Orgânica do Município
do Rio de Janeiro, das figuras da Área de Proteção Ambiental e Recuperação Urbana
(APARU) e da Área de Proteção Ambiental Cultural (APAC) que procuram tratar a questão
urbana e a proteção cultural dentro de uma perspectiva ambiental. 190
Entretanto, Tereza Jorge Pádua estabelece uma crítica acintosa às áreas de
proteção ambiental, alegando que, na prática, pelo fato de se constituírem nas UCs que
admitem as maiores extensões territoriais, aproveitando grande parcela de propriedades
privadas em seu interior, e por conseqüência, variados atores sociais, sua gestão torna-se
extremamente difícil, pouco se diferenciando o seu manejo daquilo que é praticado nas áreas
adjacentes não protegidas. 191
Além disso, por não necessitarem de desapropriação, extensas áreas “protegidas”
são usadas e criadas demagogicamente, gerando um “boom” de APAs estaduais nos últimos
anos, em detrimento de outras UCs mais restritivas aos usos, porém mais eficientes na
conservação e preservação dos ecossistemas.
As áreas de relevante interesse ecológico (ARIEs) 192 igualmente fazem parte da
PNMA, constando dos mesmos dispositivos legais que as APAs, e regulamentadas pelo Dec.
nº. 89.336/84. Conforme Paulo Nogueira Neto,
Um aspecto muito vanguardeiro do Decreto Federal nº. 89.336/84 é o seu
art. 8º, no qual está prevista a possibilidade de o Poder Público não somente
190
RODRIGUES, José Eduardo Ramos. Aspectos jurídicos das unidades de conservação. In: BENJAMIN,
Antônio Herman V.; MILARÉ, Édis (Coord.). Revista de Direito Ambiental, São Paulo, ano 1, n. 1, p. 107142, jan.-mar. 1996.
191
PÁDUA, Maria Tereza Jorge. Área de proteção ambiental. In: BENJAMIN (Coord.), op. cit., p. 425-433.
192
BRASIL. IBAMA, op. cit., (2006). Registros no IBAMA contabilizam 17 ARIEs em território nacional.
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111
adquirir, mas também arrendar terras para uma ARIE, se “isso assegurar
uma proteção mais efetiva das mesmas.” 193
Tais áreas visam manter os ecossistemas naturais com características
extraordinárias ou com exemplares raros da fauna ou flora regionais, estando nesses dois
atributos – extraordinariedade e raridade – a essência da implantação de uma ARIE. Suas
dimensões são modestas, entendidas como “pequena extensão” pelo artigo 16 da Lei
9.985/00, e delimitada em até 5.000 ha pelo Dec. nº. 89.336/84 .
Contudo, suas características e objetivos, similares a de outras UCs, podem gerar
equívocos. Na percepção de José Eduardo Ramos Rodrigues
[...] parece-nos que a Área de Relevante Interesse Ecológico é a unidade de
conservação que sofre maior crise de identidade. Quando situada em área
pública confunde-se com a Estação Ecológica ou Reserva Biológica, tipos
de unidades de uso bastante restrito [...] Quando particulares confundem-se
com áreas de uso um pouco menos restrito dentro das APA’s. 194
Nessa esteira, observa-se que as florestas nacionais (FLONAs) foram as primeiras
modalidades de unidade de conservação a tratarem da permanência de populações tradicionais
que anteriormente já habitassem as áreas, sendo previstas originariamente pelo Código
Florestal de 1965. 195
Essas florestas, regulamentadas pelo Dec. nº. 1.298/94, evidenciaram como seus
objetivos basilares o uso múltiplo e sustentável dos recursos florestais, a produção madeireira
e o desenvolvimento de técnicas de produção e pesquisa científica. 196 Um outro, Dec. nº.
2.473/98, criou o “Programa Florestas Nacionais”, enfatizando o manejo florestal sustentável
comunitário ou empresarial pelas populações que já habitavam as áreas das FLONAs,
193
NOGUEIRA NETO, Paulo. Evolução histórica das ARIEs e APAs. In: BENJAMIN, Antônio Herman V.
(Coord.). Direito ambiental das áreas protegidas: o regime jurídico das unidades de conservação. Rio de
Janeiro: Forense Universitária, 2001, p. 363-370.
194
RODRIGUES, op. cit., pp. 107-142.
195
MILARÉ, op. cit., p. 378.
196
OLIVEIRA, op. cit., p. 264-265.
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112
anteriormente aos seus atos de criação. A Lei 9.985/00 não revogou os dispositivos dos
decretos anteriores, pois incluiu essas UCs na categoria de uso sustentável, admitindo sua
criação nas esferas estadual e municipal.
Por sua vez, as reservas extrativistas (RESEX) foram instituídas pela Lei 7.804/89
e regulamentadas pelo Dec. nº. 98.897/90, documentos legais que não sofreram alteração face
aos dispositivos do SNUC referentes a essa UC.
Desse modo, a essência da implantação dessas reservas extrativistas continua
sendo a exploração auto-sustentável dos recursos naturais renováveis, exclusivamente por
populações nativas da RESEX, motivo pelo qual devem ser criadas em espaços territoriais
considerados de interesse ecológico e social, possuidores de características naturais ou de
exemplares dos ecossistemas que possibilitem a sua exploração auto-sustentada, sem prejuízo
da conservação ambiental.
Sua origem está na atividade seringueira praticada na Amazônia Legal, e isso
explica porque vinte e três RESEX, das trinta e cinco existentes no Brasil estão implantadas
na Região Norte. 197
Analisando especificamente as RESEX na Amazônia, Mary Helena Allegretti,
arrola quatro argumentos favoráveis à sua implantação, e que podem ser extensivas a outras
unidades de conservação dessa categoria, implantadas em diversas regiões brasileiras:
[...] em primeiro lugar, social: as populações seringueiras não podem de
uma hora para outra ficar sem alternativas de sobrevivência. Em segundo
lugar, legal: o direito que têm às áreas de floresta onde vivem há gerações.
Em terceiro lugar, econômica: querem melhorar as condições de produção
extrativista e de utilização de suas riquezas. Por último, ambiental: elas
preservam a floresta. 198
197
BRASIL. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Lista das unidades de
conservação federais. Disponível em: <http://www2.ibama.gov.br/unidades/geralucs/tabl.htm>. Acesso em 09
mar. 2006.
198
ALLEGRETTI, Mary Helena. Reservas extrativistas: uma proposta de desenvolvimento para a Floresta
Amazônica. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, SEADE, v. 3, nº 4, p. 24-27, out.-dez. 1989.
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113
Cabe frisar que a RESEX se destina à atividade extrativista por populações
nativas, em regime de concessão real de uso a título gratuito, sendo vedadas a extração de
recursos minerais, já que o extrativismo remete à noção de recursos naturais renováveis,
categoria na qual os minerais não se enquadram. 199
As reservas da fauna (RF) são novidades implantadas pela lei 9.985/00, com o
escopo de proteger determinada área natural que contenha animais nativos passíveis de serem
pesquisados para fins de manejo econômico sustentável.
Não há registros de reservas de fauna implantadas no Brasil, e as mesmas são
pouco abordadas pelos autores, não havendo menção a categorias similares regulamentadas
em leis anteriores.
Semelhantes às reservas extrativistas, as reservas de desenvolvimento sustentável
(RDS), introduzidas e sistematizadas em nível nacional pela Lei 9.985/00, têm como
pressuposto a utilização dos recursos naturais por populações tradicionais, incentivando-se o
aprimoramento das técnicas de manejo sustentável dessas populações, por meio de pesquisas.
A definição legal de reserva do desenvolvimento sustentável, contida no artigo 20
da Lei 9.985/00, é a de uma área natural que abriga populações tradicionais, cuja existência se
baseia em sistemas sustentáveis de exploração dos recursos naturais, desenvolvidos ao longo
de gerações e adaptados às condições ecológicas locais, que desempenham um papel
fundamental na proteção da natureza e na manutenção da diversidade biológica.
199
BRASIL. Lei 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1º , incisos I, II, III e VII da
Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras
providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 19 jul. 2000. Disponível em:
<http:// www.sabesp.com.br/legislação/PDF/LF9985.pdf> . Acesso em 13 dez. 2005. Ainda, sobre o tema: art 2º
da Lei 9.985, [...] inciso XII – extrativismo: sistema de exploração baseado na coleta e extração, de modo
sustentável, dos recursos naturais renováveis. Cf. “ANEXO A” desta dissertação.
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114
Conforme Sônia M. P. Wiedemann, a fonte de inspiração para o modelo da RDS
foi a Reserva de Desenvolvimento Sustentável de Mamirauá, em nível estadual, implantada
no Estado do Amazonas, em 1996. 200
A autora considera esse tipo de área protegida “sui generis” porque é a primeira
unidade de conservação que se tenta harmonizar o desenvolvimento sustentável das
populações residentes com a conservação da biodiversidade, indo ao encontro da
multidiversidade ambiental típica da região Norte, enquanto as outras “categorias criadas
levam em conta basicamente as peculiaridades geográficas e a biodiversidade das regiões
Nordeste e do Centro-Sul do País.” 201
Neste ponto, há que se ressaltar a diferença entre as reservas de desenvolvimento
sustentável e as reservas extrativistas, visto que estas também envolvem populações
residentes e exploração de recursos naturais.
A diferença fundamental entre ambas está em que, na RESEX a atividade
econômica permitida é mais restrita, baseada na coleta e extração sustentável dos recursos
naturais renováveis, enquanto que na RDS, permite-se a prática de outras atividades
igualmente sustentáveis, além do extrativismo. 202
Por fim, tem-se a Reserva Particular do Patrimônio Natural – ponto nodal desta
pesquisa – deslocada na categoria de unidade de conservação de uso sustentável que será
analisada com profundidade, no tópico a seguir, iniciando pelo seu histórico.
200
WIEDMANN, Sônia Maria Pereira. Reserva de desenvolvimento sustentável – RDS. In: BENJAMIN,
Antônio Herman V. (Org.). Manual prático da Promotoria de Justiça do Meio Ambiente. 2.ed. São Paulo:
IMESP, 1999, p. 448-454.
201
Ibidem, p. 448-454.
202
MILARÉ, op. cit., p. 381.
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115
3.2 Histórico das Reservas Particulares do Patrimônio Natural
O histórico da conservação de ecossistemas e suas biodiversidades em terras
particulares brasileiras antecedem a criação das Reservas Particulares do Patrimônio Natural
(RPPNs). Isto é, observa-se a existência das Florestas Protetoras previstas no Código Florestal
de 1934, cuja posse e domínio de tais áreas pertenciam ao proprietário.
O Código Florestal foi reformado em 1965 e extinguiu essa categoria, mas
manteve a possibilidade do proprietário de floresta não preservada gravá-la para conservação
em perpetuidade. Isso consistia na assinatura de um termo diante da autoridade florestal e da
averbação à margem da inscrição no Registro Público (art. 6º, Lei 4.771/65); contudo,
transferiu o detalhamento deste instrumento para regulamentação posterior.
Conforme Mesquita & Vieira, 203 foi a regulamentação desse detalhamento que
permitiu o surgimento das RPPNs, de acordo com o que se concebe nos dias atuais (Decreto
Federal n. 98.914 de 31 de janeiro de 1990).
Vale lembrar que, até 1977, não havia regras para a criação de reservas privadas
no Brasil e quando alguns proprietários procuraram o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), desejando transformar parte de seus imóveis
em reservas particulares, foi editada a Portaria 327/77 do extinto Instituto Brasileiro de
Desenvolvimento Florestal (IBDF), criando os Refúgios de Animais Nativos.
Nesta mesma linha, o IBAMA, por meio da Portaria 217 de 27 de julho de 1988,
revogou a regra da Portaria anterior e criou as Reservas Particulares de Fauna e Flora. Não há
informações precisas sobre o número e a área protegida no país sob esta categoria, mas sabese que muitas das RPPNs foram, inicialmente, Refúgios de Animais Nativos ou Reservas
203
MESQUITA, Carlos Alberto Bernardo; VIEIRA, Maria Cristina Weyland. Reservas particulares do
patrimônio natural da Mata Atlântica. São Paulo: Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Mata
Atlântica, 2004, p. 15-22.
116
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Particulares de Fauna e Flora. 204
Conforme Sônia Maria Pereira Wiedmann, 205 o impulso para a criação desta nova
categoria partiu da sociedade, particularmente do Rio Grande do Sul, na década de 1980.
Nesse período, alguns proprietários procuraram o IBAMA objetivando transformar parte de
seu imóvel em reservas particulares para protegê-lo, principalmente, da caça a animais
silvestres.
Portanto,
surgiu
dessa
necessidade
a
busca
por
uma
regulamentação
pormenorizada, a fim de proteger as áreas privadas, estabelecendo, também, recompensa aos
seus proprietários, como reconhecimento e incentivo à conservação.
Mesquita & Vieira deixam claro que para atender essa demanda foi publicado o
Decreto Federal nº. 98.914 de 31 de janeiro de 1990, regulamentando as principais regras para
a proteção ambiental em área privada. Surgiu a partir dessa norma o conceito e os principais
preceitos das Reservas Particulares do Patrimônio Natural, ainda válidos na conjuntura atual,
tais como: as atividades permitidas, a forma de incentivo, e os benefícios oferecidos aos seus
proprietários. 206
Esses autores afirmam que para corrigir algumas lacunas e definir com mais
nitidez a aplicabilidade das normas e proteger tais Reservas Particulares, foi assinado em 05
de junho de 1996 o Decreto Federal nº. 1.922, estabelecendo as possibilidades das RPPNs
serem reconhecidas pelos órgãos ambientais estaduais. Inclusive, os estados de Minas Gerais,
Paraná, Mato Grosso do Sul e Pernambuco estão dentre aqueles que já possuem legislação
estadual específica sobre as citadas propriedades privadas.
Impende assinalar que foi a partir do ano 2000 que as RPPNs passaram a integrar
as Unidades de Conservação, com a aprovação da Lei Federal nº. 9.985, que instituiu o
204
WIEDMANN, Sonia Maria Pereira. As reservas particulares do patrimônio natural. Anais do I Congresso
Brasileiro de Unidades de Conservação. Curitiba: Universidade Livre do Meio Ambiente, 1997, p. 3-14.
205
Ibidem, p. 3-14.
206
MESQUITA & VIEIRA, op. cit., p. 16.
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117
Sistema Nacional de Unidades de Conservação, tornando-se o Brasil o único país da América
Latina a incluir, oficialmente, as reservas particulares em seu sistema de áreas protegidas.
As Reservas Particulares do Patrimônio Natural são classificadas como unidades
de uso sustentável, mas
[...] poderiam ser consideradas como de proteção integral “de fato”, uma
vez que o item do artigo 21 da referida lei que possibilitava a extração de
recursos naturais em uma RPPN, foi vetado pelo Presidente da República.
Como ao Executivo cabe apenas o poder de veto, não lhe sendo permitida a
alteração de redação ou quaisquer modificações, a não ser a supressão de
trechos da lei aprovada pelo Congresso Nacional, as RPPN permaneceram
entre as unidades de conservação de uso sustentável. 207
Esse mesmo entendimento tem Édis Milaré ao afirmar que soa estranho a inclusão
das RPPNs no grupo das unidades de uso sustentável. Entretanto, tal erro se explica em razão
do veto ao art. 21, § 2º, III, da Lei 9.985/2000, que possibilitava o extrativismo nessas áreas.
Continua esse autor explicando que, embora a RPPN não integre formalmente o
rol do art. 8º da Lei 9.985/2000, “a exclusão da atividade extrativista leva a enquadrá-la no
mesmo regime jurídico das de proteção integral, pois nessas áreas permitem-se apenas
atividades típicas de preservação.”208
Os sistemas de unidades de conservação da natureza do Brasil, por meio de
associações, Confederação Nacional e organizações ambientais, já sinalizam para a criação de
novas categorias de manejo voluntárias em terrenos particulares. Ou seja, vê-se a sociedade
procurando alternativas que conciliem desenvolvimento sustentável e proteção do patrimônio
natural.
Portanto, a Reserva Particular do Patrimônio Natural é uma unidade de
conservação em área privada, gravada com perpetuidade por iniciativa do proprietário, cujo
207
208
Ibidem, p. 17.
MILARÉ, op.cit. p. 383.
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118
objetivo é conservar a diversidade biológica (art. 21, caput, da Lei n. 9.985/2000). Nessas
reservas só podem ser realizadas atividades relacionadas à pesquisa científica e à visitação,
seja com fins turísticos, recreativos ou educacionais.
O interesse público é determinante para que se possa reconhecer àquela
propriedade como RPPN. Logo, é necessário que o proprietário desse imóvel se dirija à
Superintendência do IBAMA na Unidade da Federação onde estiver situado o mesmo ou
junto ao Órgão Estadual do Meio Ambiente (OMEA), acompanhado dos documentos legais
exigidos (Dec. n.º 5.746 de 05 de abril de 2006; Cf. ANEXO C).
Nesse contexto, o dono do imóvel que decide constituir esse tipo de reserva, com o
todo ou parte dele, continua sendo o proprietário da área, além de poder contar com o apoio
do governo e de entidades ambientalistas (fundações, órgãos públicos, organizações civis do
Terceiro Setor, dentre outros) na manutenção, proteção e gestão dessa unidade de
conservação.
Vale lembrar que as RPPNs surgiram da idéia do cidadão participar no processo
efetivo de proteção dos ecossistemas, sendo proporcionados incentivos a seus proprietários,
mediante isenção de impostos. Portanto, essas reservas têm isenção do Imposto sobre
Propriedade Territorial Rural (ITR), além de ser possível encaminhar projetos ao Fundo
Nacional do Meio Ambiente para financiar a manutenção das mesmas e desenvolver
atividades de pesquisa, ecoturismo e educação ambiental.
Cabe destacar que essas reservas não podem ser desapropriadas para fins sociais,
pois já cumprem esta função com a proteção do patrimônio natural nelas existentes. Essas
reservas podem ser criadas em qualquer ecossistema ou biomas do território brasileiro onde
haja propriedades particulares.
Isto é, a criação de uma RPPN decorre da vontade e decisão do proprietário, caso
deseje que seu imóvel ou parte dele se torne uma unidade de conservação sustentável.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
119
Assinalam Mesquita & Vieira que, apesar de haver casos bem sucedidos do ponto de vista da
proteção de áreas relevantes, a criação de uma RPPN não deve ser usada como medida
compensatória por impactos ao meio ambiente. 209
Ademais, a criação dessas reservas particulares vem assegurar alguns benefícios,
tais como: o direito de propriedade preservado; a isenção do ITR referente à área protegida; a
prioridade na análise dos projetos pelo Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA), a
preferência na análise de pedidos de concessão de crédito agrícola, junto às instituições
oficiais de crédito, para projetos a serem implementados nas mesmas; e a possibilidade de
cooperação com entidades privadas e públicas na proteção, gestão e manejo dessas RPPNs.
Destarte, as RPPNs tornam-se importantes para a preservação ambiental. Em face
das suas contribuições para uma rápida ampliação das áreas protegidas no país, são facilmente
criadas. As relações custo-benefício são altamente positivas. Possibilitam a participação da
iniciativa privada no esforço nacional de conservação e contribuem para a proteção da
biodiversidade dos biomas brasileiros.
Assim, pode-se observar que as áreas naturais protegidas e estabelecidas em
propriedades privadas constituem-se num importante instrumento associador aos esforços
públicos para proteção da biodiversidade brasileira, conforme ficará evidenciado no próximo
tópico, em face da relevância da educação ambiental no contexto da RPPN.
3.3 Educação ambiental e Reserva Particular do Patrimônio Natural
A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão da Constituição Francesa de
1793 proclama, em seu artigo 23, que “A instrução é necessidade de todos. A sociedade deve
209
MESQUITA & VIEIRA, op. cit., p. 25.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
120
favorecer com todo o seu poder o progresso da inteligência pública e colocar a instrução ao
alcance de todos os cidadãos.” 210
Com isso, evidencia-se a relevância do ensino e da educação para desenvolver o
respeito aos direitos e liberdades inerentes à pessoa humana, proclamando que toda pessoa
tem direito à educação a qual deve visar ao pleno desenvolvimento da personalidade humana
e ao reforço do respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais.
Nesse contexto, insere-se a educação ambiental, que pode ser entendida como a
construção de “[...] valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências
voltadas para a conservação do meio ambiente [...]”, como pressuposto para a sadia qualidade
de vida e sua sustentabilidade. 211
Por sua vez, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano, de
1972, na sua recomendação nº. 96, atribuía grande importância estratégica à educação
ambiental, sendo que a partir dela se realizou o Encontro de Belgrado no ano de 1975, na
Iugoslávia, sob os auspícios da UNESCO. Desse encontro resultou a Carta de Belgrado, que
contém princípios e orientações para um programa de educação ambiental mundial.
Conforme observa Genebaldo Freire Dias,
A Recomendação 96 da Conferência de Estocolmo sobre o Ambiente
Humano nomeia o desenvolvimento da Educação Ambiental como um dos
elementos mais críticos para que se possa combater rapidamente a crise
ambiental do mundo. [...] esse documento reúne premissas importantes, e
ainda se constitui, passadas quase duas décadas, em um marco conceitual
relevante no tratamento das questões ambientais. 212
210
COMPARATO, op. cit. p.159.
BRASIL. Lei nº 9.795, de 27 de abril de 1999. Política Nacional de Educação Ambiental. Disponível em:
< http://www.presidencia.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9795.htm > . Acesso em 20 mar. 2006. Em seu artigo 1º
estabelece a definição de educação ambiental.
212
DIAS, Genebaldo Freire. Educação ambiental: princípios e práticas. 5 ed. São Paulo: Global, 1998, p.60 .
211
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
121
Vale relembrar que a Primeira Conferência Intergovernamental sobre Educação
Ambiental – realizada em Tbilisi (1977), na Geórgia (ex-URSS) –, considerada um dos
grandes marcos do ambientalismo, constitui, até hoje, o ponto culminante do Programa
Internacional de Educação Ambiental. Nessa Conferência foram definidos os objetivos e as
estratégias pertinentes, em nível nacional e internacional. Postulou-se que a educação
ambiental é um elemento essencial para uma educação global, orientada para a resolução dos
problemas, em favor do bem-estar da comunidade humana.
O avanço a ser destacado com essa Conferência é a importância dada às relações
natureza-sociedade. A necessidade de fazer crescer a divulgação de informações (por meio de
livros, filmes, mídia em geral) e a sensibilidade diante das questões ambientais perante toda
coletividade, em especial à população mais rica e com maior nível educacional, por causa de
seu maior poder de interferir nesse processo.
Nessa Conferência, acrescentou-se aos princípios básicos da Carta de Belgrado
que a educação ambiental deve ajudar a descobrir os sintomas e as causas reais dos problemas
ambientais, deve desenvolver o senso crítico e as habilidades necessárias para resolver
problemas, utilizar diversos ambientes educativos e uma ampla gama de métodos para a
aquisição de conhecimentos, sem esquecer da necessidade de realização de atividades práticas
e de experiências pessoais.
Neste sentido, práticas educativas não formais têm sido utilizadas para a
sensibilização das comunidades sobre as questões ambientais, que não podem ser tratadas
dissociando-se das realidades cotidianas. Por isso, a educação ambiental deve sempre
trabalhar valores que podem propiciar o interesse, a autoconfiança e o engajamento em ações
conservacionistas, preferencialmente de modo prático e não simplesmente teórico. 213
213
OVALLES, Omar; VIEZZER, Moema Libera. Manual latino-americano de educ-ação ambiental. São
Paulo: Gaia, 1994, p. 30-31.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
122
Para a prática da educação ambiental, as áreas naturais protegidas são ambientes
adequados onde o aprendizado se dá por intermédio da experimentação direta, oportunizando
ao indivíduo a utilização de todos os sentidos. Constituem-se espaços propícios à educação
ambiental informal, através da visitação pública monitorada ou não, ou da educação ambiental
formal, mediante parcerias com estabelecimentos de ensino, uma vez que a Lei 9.394, de 20
de dezembro de 1996 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) –, estabelece o
assunto “meio ambiente” como tema transversal a ser tratado nos parâmetros curriculares
nacionais. 214
No sentido amplo, a educação ambiental pode ser apontada como um dos fatores
responsáveis pelo aumento de unidades de conservação no Brasil, a partir da década de 1990,
quando a temática ambiental difundiu-se na sociedade através das organizações nãogovernamentais, ocupando espaço na mídia impressa e falada, ensejando projetos
governamentais e mobilizando diversos setores.
Esse reflexo de uma educação (conscientização) ambiental fez-se sentir na
implantação das RPPNs, principalmente se considerado o fato desta unidade de conservação
ser gravada com ônus de perpetuidade e, de boa parte das RPPNs, serem de propriedade de
pessoas físicas. 215
Promover a educação ambiental e exercer os conhecimentos adquiridos através
dela constituem o verdadeiro exercício da cidadania. Somente alguém conscientizado quanto
à problemática ambiental, embora com conhecimentos ainda que não profundos e não formais
sobre a questão ecológica, disponibilizaria parcela de sua propriedade para a manutenção de
ecossistemas e sua biodiversidade, o que reverte em benefícios não somente para si, mas
também para a sociedade.
214
BRASIL. Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
Disponível em: <http://www.presidencia.gov.br/CCIVIL/leis/L9394.htm>. Acesso em 20 mar. 2006.
.
215
MESQUITA & VIEIRA, op. cit., p. 29-40.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
123
Trata-se de uma orientação da vontade do proprietário, despertada pelos
conhecimentos adquiridos, ainda que informalmente, e que acabam reforçando suas
convicções morais e inserindo-as numa “[...] autocompreensão ética, que coloca a
preocupação com o próprio bem-estar a serviço do interesse pela justiça” 216 (neste caso,
social).
Tais conhecimentos ecológicos são adquiridos por intermédio de mecanismos
formais e não formais propiciados pela educação ambiental que pode ser desenvolvida no
contexto de uma RPPN, através da possibilidade de atividades de pesquisa científica. Já a
visitação, mesmo tendo caráter turístico ou recreativo, possibilita incorporar a transmissão
informal de conhecimentos ambientais, como acontece em muitas unidades de conservação.
Mesquita & Vieira, abordando atividades de estudos desenvolvidas em RPPNs no
bioma da Mata Atlântica, esclarecem que
As pesquisas científicas que vêm sendo realizadas nas RPPN da Mata
Atlântica são muito relevantes para o conhecimento deste bioma,
especialmente nos ramos da biologia (botânica e zoologia), geografia e
geologia. Tais pesquisas têm sido realizadas por diversas instituições,
gerando inúmeras publicações. 217
Esses autores citam os trabalhos de catalogação de mais de trezentas espécies de
vertebrados e vegetais nos 6.069 hectares da RPPN Estação Vera Cruz (BA), considerada a
maior unidade de conservação desta categoria totalmente implantada em domínios de Mata
Atlântica. Citam, ainda, as teses de mestrado, doutorado e pós-doutorado realizadas a partir de
estudos efetuados na RPPN Feliciano Miguel Abdala (MG), “[...] assim denominada em
216
HABERMAS, Jürgen. Democracia e direito: entre facticidade e validade. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro,
1997, v. I, p. 7.
217
MESQUITA & VIEIRA, op. cit., p. 41.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
124
homenagem a seu primeiro proprietário, que desde os anos de 1970 disponibilizava sua
fazenda como laboratório natural para pesquisas em relação à preservação das espécies.” 218
Além disso, relacionam outras RPPNs em que pesquisas científicas vêm
ampliando os conhecimentos sobre a biodiversidade brasileira, inclusive com a descoberta de
novos espécimes, e contribuindo sobremaneira para subsidiar ações em educação ambiental.
Ressalta-se, ainda, que as reservas naturais privadas já eram utilizadas para as mais
variadas atividades e programas de educação ambiental e ecoturismo, mesmo antes de serem
reconhecidas como RPPNs, reputando o fato à própria educação e conscientização ambiental
de seus proprietários. 219
Em consonância com Helita Barreira Custódio, vê-se que
A educação ambiental é considerada como um processo permanente de
autêntico conhecimento progressivo, por todos os meios ou métodos
legítimos, formais ou informais, o qual concorre para a conscientização
crescente de todas as pessoas sobre a realidade do meio ambiente saudável
como direito de todos[...]. Evidentemente, a educação ambiental [...]
constitui, na verdade, o caminho fundamental, o meio único capaz de
conduzir qualquer pessoa ao imprescindível grau de real sensibilidade e de
responsável tomada de consciência, aliado ao firme propósito, por meio de
efetiva participação, contribuição ou ação no sentido de explorar ou utilizar
racionalmente a propriedade (própria ou alheia, pública ou privada), os
recursos ambientais (naturais ou culturais) nela integrantes, bem como
integrantes do meio ambiente e da Natureza em permanente defesa e
preservação do patrimônio ambiental saudável, como condição essencial à
continuidade da vida em geral e à sobrevivência da própria humanidade. 220
Portanto, a educação ambiental está intrinsecamente relacionada com o
cumprimento constitucional da função social da propriedade, ressaltando que a RPPN cumpre
seu papel, na medida em que estabelece o dever consciente de uso benéfico da propriedade
218
Ibidem, p. 42.
Ibidem, p. 50.
220
CUSTÓDIO, Helita Barreiro. Direito à educação ambiental e à conscientização pública. In: BENJAMIN,
Antônio Hermann V.; MILARÉ, Edis (Coord.). Revista de Direito Ambiental, São Paulo, ano 5, n. 18, p. 3856, abr.-jun. 2000.
219
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
125
privada e dos seus recursos naturais, através da conscientização de seu proprietário e de todos
aqueles que, de uma forma ou de outra, travam contato com a realidade ambiental, razão que
será analisada com maior profundidade no tópico a seguir.
3.4 Reserva Particular do Patrimônio Natural: a propriedade privada como instrumento
de efetivação do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e
sua função socioambiental
A função da propriedade perpassa o Estado Liberal, que apresenta o direito de
propriedade como um direito natural e individual diretamente ligado ao trabalho: “[...] a
extensão de terra que um homem lavra, planta, melhora, cultiva e de cujos produtos
desfrutam, constitui a sua propriedade.” 221 Tal entendimento chega aos dias atuais, visando
não só ao interesse particular, mas também ao interesse social e ambiental da coletividade.
Nessa esteira e procurando eliminar a tendência individualista do liberalismo,
Augusto Comte buscou, na ligação existente entre todos os seres humanos, a justificativa para
tal rompimento. Por sua vez, Leon Duguit inspirou-se nas idéias de Comte e delineou um
novo conceito jurídico de propriedade, concebendo-a como elemento satisfatório das
necessidades particulares de seu possuidor e da coletividade. Tal conceito possibilita ao
proprietário ter o poder de fruir de seus bens e riquezas, embora tenha de adequar o seu uso às
necessidades metaindividuais.
Segundo Rogério Gesta Leal, a propriedade, entendida como instituição
sociopolítica, vem sendo tratada de várias formas pela civilização ocidental, tendo se firmado
no modelo romano que passou da propriedade coletiva à individual, tornando-se um direito
absoluto que vai,
221
LOCKE, John. Segundo tratado sobre o governo. Tradução Alex Marins. São Paulo: Martin Claret, 2002,
p.40.
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126
[...] com o decorrer dos tempos, sofrendo limitações legais inspiradas em
motivos de ordem pública, privada, ética, higiênica ou prática. Assim, é
admitido usar e fruir da propriedade, inclusive abusar dela, desde que isso
não ofereça danos à propriedade ou aos direitos de outrem, respeitando-se
desta forma os direitos de vizinhança. 222
Modernamente, passou-se a sustentar que o uso da propriedade deve estar
relacionado com o bem da coletividade, sendo esse posicionamento oriundo da doutrina
jurídica francesa, que visualisa no instituto da propriedade uma destinação econômica e social
atrelada ao modo como o objeto-propriedade é utilizado pelo seu detentor.
Tem-se, portanto, uma evolução na concepção do direito de propriedade que, embora
seja um direito fundamental do indivíduo, consagrado pela Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão, de 1789, passa a ter uma conotação mais socializada, conforme leciona
Rogério Gesta Leal:
Se o titular do direito não utiliza as faculdades inerentes ao domínio para
extrair do bem os frutos que este tem capacidade de produzir, ficará sujeito
às cominações legais, para que a propriedade possa ser recolocada em seu
caminho normal. A função social, aqui, visa justamente a fazer com que ela
seja utilizada de maneira a cumprir o fim a que se destina, ao menos
dogmaticamente, não gerando contraposição entre os interesses individuais
e coletivos. 223
No direito brasileiro, a expressão “propriedade” apresenta duplo sentido, ao se
referir a uma relação de poder entre um indivíduo e um objeto, relação essa legalmente
protegida, ou ao se referir ao próprio objeto dessa relação. Logo, a legislação pátria não define
222
LEAL, Rogério Gesta. A função social da propriedade e da cidade no Brasil: aspectos jurídicos e
políticos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998, p. 40-42 .
223
Ibidem, p. 51.
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127
“propriedade”, enquanto instituição jurídica, cujo termo pode ser entendido como “[...] poder
garantido pelo direito de um sujeito sobre determinado objeto.”224
A Constituição brasileira de 1934, inspirada na Constituição alemã de Weimar, de
1919, incorporou a restrição do direito de propriedade pelo interesse social da coletividade e
as que se seguiram consolidaram essa função social.
Por sua vez, a Constituição Federal de 1988 introduziu vários dispositivos sobre a
propriedade que se encontram caracterizados como direito e garantia fundamental, devendo
atender à sua função social e se assegurando da justa e prévia indenização, na hipótese de
desapropriação por necessidade ou utilidade pública. Constata-se, ainda, que a Lei Maior
(Título VII, Capítulo I), ao tratar da ordem econômica e financeira, estabelece um afinado
relacionamento entre as normas de proteção do meio ambiente e as normas relativas ao direito
de propriedade, quando aborda os princípios gerais da atividade econômica. 225
Nesse contexto, observa-se que a Constituição Federal inovou ao vincular o
cumprimento da função social às obrigações de defesa do meio ambiente, exsurgindo daí a
Reserva Particular do Patrimônio Natural, instituída pela Lei 9.985/00 para fazer cumprir o
previsto no art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da Carta Magna vigente. Portanto, não há mais
que falar em propriedade privada absoluta e ilimitada, pois a mesma passou a ter restrições,
devendo atender - além do interesse privado - a sua função socioambiental.
E, nessa direção, Ivan Lira de Carvalho assegura que
[...] a Constituição Federal lança balizas para a fruição equilibrada do
direito material de ter. Dá força específica às garantias incidentes sobre o
direito de propriedade inseridas no art. 5º, incisos XXII a XXVI. Assim, é
óbvio que desatenderá ao comando de atuar socialmente, o proprietário que,
fazendo mal uso do seu patrimônio, perpetra atos turbativos da natureza,
224
DERANI, Cristiani. A propriedade na Constituição de 1988 e o conteúdo da “função social”. In: BENJAMIN,
Antônio Hermann V.; MILARÉ, Édis (Coord.). Revista de Direito Ambiental, São Paulo, ano 7, n. 27, p. 5669, jul.-set. 2002.
225
BRASIL. Constituição (1988), op. cit., art. 5º, caput, incisos XXII , XXIII; artigo 170, incisos II, III e VI.
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128
maculando o preceito de que todos têm direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado. 226
Impende destacar que a função social da propriedade traz embutida em seu
conceito uma dimensão ambiental, considerando que o direito a um meio ambiente
ecologicamente equilibrado é um direito humano fundamental, cabendo não só ao Estado,
mas também aos cidadãos o dever de preservá-lo para as atuais e futuras gerações. Portanto,
uma das maneiras do cidadão contribuir para tal, dar-se por meio do uso adequado que faz de
sua propriedade (v.g., a RPPN), seja esta urbana ou rural.
Na observação de Cristiani Derani que teve como base os artigos 182, § 2º; e 186,
incisos, I, II, III, IV da CRFB/88,
[...] a função social do proprietário de bem urbano está na disposição,
finalidade, transformação, modo de utilização desse bem, que deverá
contribuir para o desenvolvimento de uma vida social urbana agradável e
produtiva.
São condições de urbanismo e de qualidade de vida nas cidades que devem
ser atendidas pelo proprietário privado detentor de bem urbano, para que a
propriedade atenda sua função social.
[...] A propriedade agrária, como meio de produção, está submetida à
função social no que tange ao modo como dela são extraídas as mercadorias
e também a própria mercadoria produzida.
Os bens ambientais contidos nas propriedades rurais são tornados sociais
pelo trabalho (de manutenção ou transformação). O homem se apropria da
terra e a faz objeto social imprescindível a sua existência e felicidade. 227
Por seu turno, em conformidade com a Carta Magna vigente, o novo Código Civil
brasileiro (art. 1288, §1º) acabou por contemplar a função socioambiental da propriedade, ao
prescrever que tal direito “[...] deve ser exercitado em consonância com as suas finalidades
226
CARVALHO, Ivan Lira de. A empresa e o meio ambiente. In: BANJAMIN, Antônio Hermann V.; MILARÉ,
Édis (Coord.). Revista de Direito Ambiental, São Paulo, ano 4, n.13, p. 13-35, jan.-mar. 1999.
227
DERANI, Cristiani. A propriedade na Constituição de 1988 e o conteúdo da “função social”. In: BENJAMIN,
Antônio Hermann V.; MILARÉ, Édis (Coord.). Revista de Direito Ambiental, São Paulo, ano 7, n. 27, p. 5669, jul.-set. 2002.
129
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econômicas e sociais e de modo que sejam preservados [...] a flora, a fauna, as belezas
naturais, o equilíbrio ecológico [...], bem como evitada a poluição do ar e das águas.”228
A esse respeito, Fernanda de S. Cavedon declara que
a propriedade privada, absoluta e ilimitada, torna-se incompatível com a
nova configuração dos direitos, que passam a tutelar Interesses Públicos,
dentre os quais a preservação ambiental. Assim, o Direito de Propriedade
adquire nova configuração, e passa a estar vinculado ao cumprimento de
uma Função Social e Ambiental. É limitado no interesse da coletividade e a
fim de adequar-se às novas demandas de ordem ambiental. 229
Por isso, quando se tratar da apropriação privada de recursos do meio ambiente, a
obrigação de cumprir com a função socioambiental da propriedade incorpora-se ao domínio, e
o proprietário ou possuidor só terá legitimado e protegido seu domínio se vincular-se a uma
ética de responsabilidade solidária no usufruto de seu bem, trazendo, com isso, ganhos à
sociedade.
É justamente o cumprimento da função socioambiental prevista à propriedade, que
legitima o exercício desse direito pelo seu titular. “[...] O cumprimento da função social é
condição sine qua non para o reconhecimento do direito de propriedade.” 230
Nesse mesmo sentido explicam Figueiredo & Leuzinger, afirmando que a função
social da propriedade opera internamente nesse direito, como um de seus elementos
constitutivos, e sem o qual perderá suas garantias legais.
231
Importa ressaltar que a admissão do princípio da função socioambiental da
propriedade extrapola a simples limitação ao exercício do direito de propriedade, exigindo-se
228
BRASIL. Código Civil (2002). Novo código civil brasileiro: estudo comparativo com o código civil de
1916. Coordenação Gisele de Melo Braga Tapai. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p.181.
229
CAVEDON, Fernanda de Salles. Função social e ambiental da propriedade. Florianópolis: Visualbooks,
2003, p. 61 .
230
PACCAGNELLA, Luis Henrique. Função socioambiental da propriedade rural e áreas de preservação
permanente e reserva florestal legal. In: BENJAMIN, Antônio Hermann V.; MILARÉ, Édis (Coord.). Revista de
Direito Ambiental, São Paulo, ano 2, n. 8, p. 5-19, out.-dez. 1997.
231
FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin; LEUZINGER, Márcia Dieguez. Desapropriações ambientais na Lei
n. 9.985/2000. In: BENJAMIN, Antônio Hermann V. (Coord.). Direito ambiental das áreas protegidas: o
regime jurídico das unidades de conservação. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001, p. 465-489.
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130
do proprietário mais do que somente abstenções de usos nocivos à coletividade. O exercício
do direito de propriedade requer um comportamento positivo do proprietário, tendo
[...] como conseqüência básica fazer com que a propriedade seja
efetivamente exercida para beneficiar a coletividade e o meio ambiente
(aspecto positivo), não bastando apenas que não seja exercida em prejuízo
de terceiros ou da qualidade ambiental (aspecto negativo). 232
Conforme essa interpretação, a função social da propriedade traz consigo o viés
ambiental. Cabe ao proprietário de parcela do meio ambiente torná-lo ou mantê-lo
ecologicamente equilibrado através de atos comissivos. Isto se verifica, facilmente, nas
peculiaridades das RPPNs citadas no tópico anterior.
Nessa vereda, Eros Grau 233 assevera: "Isto significa que a função social da
propriedade atua como fonte de imposição de comportamentos positivos – prestação de fazer,
portanto, e não meramente, de não fazer – ao detentor do poder que deflui da propriedade.”
Inclusive, apesar do regime constitucional de 1988 ter inovado ao estabelecer uma
função socioambiental para a propriedade, Antônio Herman V. Benjamin alega que
[...] o Brasil é pobre em estudos e aplicação efetiva da função social da
propriedade. Aceito como abstração teórica, o instituto deixa de manifestarse no cotidiano das relações produtivas brasileiras e, a partir delas, no que
mais nos importa, no conflito homem-natureza. 234
Por seu turno, cumpre observar que a clássica teoria do direito de propriedade
sempre conferiu ao titular de uma propriedade privada o direito de usar, gozar e dispor
plenamente da coisa para atender, apenas, ao seu interesse. Essa concepção exclusivista,
232
MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Princípios fundamentais do direito ambiental. In: BENJAMIN, Antônio
Hermann V.; MILARÉ, Édis (Coord.). Revista de Direito Ambiental, São Paulo, ano 1, n. 2, p. 51-66, abr.-jun.
1996.
233
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p.
213.
234
BENJAMIN, Antônio Herman V. Manual prático da Promotoria de Justiça do Meio Ambiente. 2. ed. São
Paulo: IMESP, 1999, p. 27.
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131
levada a extrema por uma sociedade erigida num sistema consumista e de elevada
concentração fundiária, tem sido causadora de inúmeros conflitos socioambientais.
Corroborando com as idéias acima descritas, a disponibilidade dos bens está
condicionada às obrigações crescentes de seus proprietários, objetivando atender a função
social e ambiental da propriedade (artigos 1228, 1277 e 1297 do Código Civil de 2002), e
conforme ratifica Helita Barreiro Custódio,
O conceito de propriedade contemporânea compreende em seu conteúdo e
alcance, além do tradicional direito de uso, gozo e disposição dos bens por
parte de seus titulares [...], a obrigatoriedade do atendimento de sua função
social, cujo conceito é inseparável do requisito obrigatório do uso racional
da propriedade e dos recursos ambientais que lhe são integrantes. O
proprietário (pessoa física ou jurídica, esta de direito público ou privado),
como membro integrante da comunidade, sujeita-se a obrigações crescentes
que, ultrapassando os limites do direito de vizinhança, no âmbito do direito
privado, abrange, o campo dos direitos de coletividade, visando ao bemestar geral, no âmbito do direito público. 235
Convém frisar que isso não significa dizer que a propriedade privada, mais
especificamente a RPPN, tornou-se algo intocável e fora do domínio de seu proprietário.
Apenas, sofreu limitações constitucionais e infraconstitucionais em prol do interesse público
maior, em face do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Como se pode notar, a propriedade privada, enquanto RPPN, implica na
repartição da responsabilidade de promoção do bem comum entre Estado e sociedade através
de atividades exercidas no interesse comum, e não apenas no interesse dos indivíduos que as
executam. Isto é válido para as atividades de pesquisa e visitação pública nas RPPNs.
Um aspecto que necessita maior elaboração teórica diz respeito a um elemento
considerado fundamental para a determinação da função social da propriedade: a
235
CUSTÓDIO, Helita Bareiro. Questão constitucional: propriedade, ordem econômica e dano ambiental.
Competência legislativa concorrente. In: BENJAMIN, Antônio Hermann V. (Coord.). Dano ambiental:
prevenção, reparação e repressão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 115-143.
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132
produtividade. A questão está justamente em como deve ser entendida essa produtividade.
Na lição de Maria Luísa Faro Magalhães, a Constituição Federal de 1988, em seu
artigo 186, inciso I,
Vincula a função social ao aproveitamento racional e adequado da
propriedade. Esta imposição [...] tem uma forte conotação econômica e vem
vinculada a índices de produtividade da propriedade, como critério para se
aquilatar o cumprimento ou não da função social. O objetivo do instituto é o
da busca de uma situação social que permita, de maneira mais eqüitativa, o
acesso a bens materiais suficientes a camadas mais amplas da população
[...]. 236
Desse modo, pegue-se a título de exemplo uma propriedade rural (privada), em
que seu dono tenha decidido paralisar as atividades agropecuárias em significativa extensão
para recuperar e manter a área intocada a fim de preservar uma bela paisagem, um sítio
paleontológico, arqueológico ou histórico, ou ainda, por ter descoberto na localidade um
espécime endêmico da flora ou fauna.
Essa propriedade, ou sua parcela, haveria de ser classificada improdutiva por não
estar mais produzindo conforme a percepção capitalista? Poderia, por conta disso, ser arrolada
como passível de desapropriação para fins de reforma agrária? Ou poderia ser abrangida por
uma concepção mais ampla e atualizada de produtividade, que incluiria a produção de
qualidade de vida pela restauração e manutenção de um ecossistema ecologicamente
equilibrado nos seus variados aspectos bióticos e abióticos, fato que está intrinsecamente
ligado à manutenção da vida em si, tida como direito humano fundamental?
Conforme explica José Robson da Silva,
O não uso do bem em decorrência de motivos ambientais, não o transforma
em propriedade improdutiva e por conseqüente suscetível de desapropriação
236
MAGALHÃES, Maria Luísa Faro. Função social da propriedade e meio-ambiente: princípios reciclados. In:
BENJAMIN, Antônio Hermann V. (Coord.). Dano ambiental: prevenção, reparação e repressão. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1993, p. 147-151.
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133
para fins de reforma agrária. É relevante considerar que o fato do não uso
em dadas circunstâncias liga-se à preservação da vida e funciona como uma
garantia para gerações presentes e futuras. 237
Tal abordagem pode ser analisada em um dos instrumentos elaborados pelo
Governo Federal para fazer cumprir os dispositivos do artigo 225 da Constituição Federal,
consubstanciado no Sistema Nacional de Unidades de Conservação, Lei nº. 9.985, de 18 de
julho de 2000, visando a atender a uma das obrigações impostas ao Poder Público no sentido
de promover a adequação dos usos de bens ambientais particulares aos interesses coletivos de
caráter ambiental.
Isso ocorre quando o Poder Público, por intermédio de atos normativos, define os
espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, convertendo-os em
unidades de conservação, com regras próprias de uso e manejo.
A transformação de determinada área em unidade de conservação pode ou não
alterar a situação dominial do bem. Normalmente, são estabelecidas limitações
administrativas com restrições ao direito de propriedade, e até mesmo com transferência do
bem ao patrimônio público, mediante desapropriação e justa indenização. Tais medidas
dependem da categoria de unidade de conservação que irá pertencer o imóvel no contexto das
unidades de proteção integral ou das unidades de uso sustentável (AEXO B).
A RPPN é a única unidade de conservação prevista pelo SNUC que,
obrigatoriamente, só pode ser instituída em propriedade privada, com o detalhe de que a
iniciativa para a transformação em RPPN tem que partir do proprietário do imóvel, não
cabendo desapropriação.
Tais reservas têm antecedentes que remontam ao Código Florestal de 1934, na
figura das florestas protetoras. A instituição dessas florestas, privadas, sujeitava seu
237
SILVA, José Robson da . O meio ambiente: função social e ambiental. Revista Jurídica da UEPG, Ponta
Grossa, vol. 1, ano 1, 1997. Disponível em: <http://www.uepg.br/rj/a1v1at08.htm>. Acesso em 29 set. 2005.
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134
proprietário ao cumprimento de algumas determinações dos órgãos governamentais, relativas
à sua exploração. Contudo, o proprietário era mantido na posse e no domínio de sua área. Já
havia uma vantagem para se contrapor às restrições legais: uma área declarada floresta
protetora era isenta de impostos. Inclusive, já se previam punições (detenção e multa) para os
danos a essas florestas.
O Código Florestal de 1965 estipulou normas mais flexíveis ao manejo das
florestas nessas áreas, que passaram a ser denominadas áreas de preservação permanente. Em
contrapartida, excluiu a isenção de tributos, que só foi retornar em 1991 com a entrada em
vigor da Lei nº. 8.171, de 17 de janeiro de 1991, conhecida como Lei Agrícola.
No citado código permaneceu a possibilidade de uma floresta privada ser mantida
perpetuamente, daí a semelhança com a RPPN, também gravada com esse ônus. 238 A Lei
9.985/2000 (SNUC), mantendo as RPPNs em seu quadro de unidades de conservação,
possibilitou à pessoa, física ou jurídica, uma forma de cumprir com o dever de preservar o
meio ambiente, consoante o preconizado no “caput” do artigo 225 da Constituição Federal
vigente.
Sônia Maria Pereira Wiedmann 239 enfatiza a predominância da vontade do
proprietário em destinar parte de sua propriedade para a preservação ambiental, ainda que isso
implique restrições perpétuas ao seu uso. Tal animus parte do princípio da livre iniciativa
elencado no artigo 5º da Carta Política, atendendo, também, ao que dispõe esse mesmo artigo
sobre o direito de propriedade e sua função social.
Apesar dessa iniciativa gerar um ônus perpétuo à propriedade, Sílvio Alexandre
Fazolli afirma que as RPPNs apresentam “[...] singular importância na preservação dos
238
O art. 6º do Código Florestal de 1965 foi revogado pela Lei nº. 9.985, de 18 de julho de 2000 (SNUC).
WIEDMANN, Sônia Maria Pereira. Reserva particular do patrimônio natural – RPPN – na Lei nº. 9.985/2000
que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC. In: BENJAMIN, (Coord.). Direito
ambiental das áreas protegidas: o regime jurídico das unidades de conservação. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2001, p. 400-421.
239
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
135
direitos difusos [...] de difícil implementação se não fossem as investidas da educação
ambiental” 240 e
algumas vantagens econômicas que podem ser auferidas pelo seu
proprietário.
Ou seja, quem se dispõe a contribuir com a preservação ambiental instituindo uma
RPPN em sua propriedade, evidencia o entendimento do meio ambiente como uma res
communis omnium (bens de uso comum), que pode ser composta por bens pertencentes ao
domínio público, ou ao domínio privado.
Isto implica numa distinção do meio ambiente, globalmente considerado como
bem incorpóreo, imaterial, com uma dimensão qualitativa necessária à vida saudável, tido
como bem público, por ser direito fundamental de todos, e na percepção desse mesmo
ambiente em seu aspecto material, representado pelos seus elementos corpóreos, apropriáveis
pelo particular nos limites e critérios previstos em lei que devem assegurar o aspecto
qualitativo.
Originalmente arrolada na Lei nº. 9.985/2000 (SNUC) como unidade de
conservação de uso sustentável, a RPPN é, de fato, uma unidade de conservação de proteção
integral, pois em seus limites só é possível desenvolver atividades típicas de preservação,
como a pesquisa científica e a visitação turística, recreativa ou educacional.
O enquadramento inadequado ocorreu porque o uso sustentável da RPPN estava
previsto no artigo 21, § 2º, inciso III, do SNUC, que tinha a seguinte redação:
Art. 21 [...]
§ 2º Só poderá ser permitida, na Reserva Particular do Patrimônio Natural,
conforme se dispuser em regulamento:
[...]
III – a extração de recursos naturais, exceto madeira, que não coloque em
risco as espécies ou o ecossistema que justificaram a criação da unidade. 241
240
FAZOLLI, Sílvio Alexandre. A Reserva particular do patrimônio natural e desenvolvimento sustentável:
preservação
da
fauna
e
da
flora.
Jus
Navigandi,
2004.
Disponível
em:
<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5752> . Acesso em 20 out. 2005.
241
BRASIL. Lei 9.985, de 18 de julho de 2000, op. cit., (2005).
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
136
O referido inciso foi vetado pelas seguintes razões:
O comando inserto na disposição, ao permitir a extração de recursos
naturais em Reservas Particulares do Patrimônio Natural, com a única
exceção aos recursos madeireiros, desvirtua completamente os objetivos
dessa unidade de conservação, como também, dos propósitos do seu
instituidor. Por outro lado, tal permissão alcançaria a extração de minérios
em área isenta do ITR e, certamente, o titular da extração, em tese, estaria
amparado pelo benefício. Justifica-se, pois, o veto ao inc III do § 2º do
art.21, certo que contrário ao interesse público. 242
As RPPNs vêm se constituindo num importante mecanismo de proteção ambiental,
porque assumem a feição de zonas de amortecimento, quando implantadas no entorno de
outras unidades de conservação e de corredores ecológicos para a fauna migrante. Além disso,
as atividades nelas permitidas, de pesquisa e visitação pública, contribuem significativamente
para ampliar o acervo de conhecimentos sobre a biodiversidade brasileira e para a
conscientização da comunidade acerca dos problemas ecológicos, através de uma educação
ambiental informal.
Segundo dados do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis, o número de RPPNs no Brasil aumentou consideravelmente após a edição da Lei
9.985/2000, computando-se, atualmente, cerca de 426 RPPNs federais em todo o território
nacional, perfazendo uma área de 440.145,39 ha. 243
De acordo com Mesquita & Vieira, existem um total de 656 (seiscentas e
cinqüenta e seis) RPPNs e área global aproximada de 519.000 ha. Entretanto, é preciso
esclarecer que nesse cômputo estão inseridas as RPPNs estaduais, considerando-se as
242
WIEDMANN, Sônia Maria Pereira. Reserva particular do patrimônio natural – RPPN – na Lei nº. 9.985/2000
que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC. In: BENJAMIN, (Coord.) Direito
ambiental das áreas protegidas: o regime jurídico das unidades de conservação. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2001, p. 400-421.
243
BRASIL. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Relatório resumido
das RPPN por Estado. Brasília, DF, 2006. Relatório. Disponível em: <http://www.ibama.gov.br>. Acesso em
26 mai. 2006.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
137
competências comum e concorrente atribuídas pela Constituição Federal aos Estados, para
legislar em matéria ambiental. 244
Portanto, quem institui uma RPPN evidencia a consciência de que a apropriação
privada da natureza deve se destinar a uma fruição coletiva, dado o caráter difuso do direito
ao meio ambiente. Cristiane Derani esclarece:
Se essa apropriação traz prejuízos ao desenvolvimento da existência, ao
produzir relações sociais de dominação e exploração e ao destruir as bases
naturais necessárias para a construção dos princípios sociais de equidade e
liberdade, o agente privado não está comprometido com a formação social
da qual faz parte nem com a concretização da ordem jurídica de uma nação.
Inversamente, é a sociedade que é posta em função do seu agir individual.
Nessa situação, a natureza, como exteriorização do homem-social,
dominada e exaurida, passa a ser, então, a exteriorização da dominação do
homem. A natureza modificada e esgotada é a representação, figura
explicitadora, da ação individual que nega a existência da sociedade, por dar
as costas à reprodução sustentável do viver. 245
Nessa ótica, a RPPN representa uma notável contribuição à manutenção do direito
ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, este submetido à relação individual de
propriedade, cuja fruição pela sociedade depende do efetivo cumprimento das normas
protetivas ambientais relativas ao exercício da função socioambiental do exercício desse
direito.
Assim, a Reserva Particular do Patrimônio Natural vem se constituindo num
eficiente instrumento de exercício de cidadania, possibilitando ao indivíduo mais bem
aquinhoado da sociedade capitalista cumprir a função socioambiental da propriedade e, de
forma legítima, contribuir para efetivar e aprimorar o meio ambiente ecologicamente
equilibrado.
244
MESQUITA & VIEIRA, op. cit., p. 09.
DERANI, Cristiane. A propriedade na Constituição de 1988 e o conteúdo da “função social”. In: BENJAMIN,
Antônio Hermann V.; MILARÉ, Édis (Coord.). Revista de Direito Ambiental, São Paulo, ano 7, n. 27, p. 5669, jul.-set. 2002.
245
138
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
CONCLUSÃO
Todos os seres vivos, de um modo ou de outro, causam transformações no
ambiente em que vivem, mas o homem tem sido capaz de promover alterações em escala e
ritmo crescentes, transformando paisagens, esgotando recursos naturais, extinguindo espécies
da flora e da fauna, e colocando em risco a própria existência.
A evolução da humanidade é, também, a evolução das alterações ambientais, da
degradação do solo, da água, do ar, da deterioração da qualidade de vida do próprio ser
humano, artífice e vítima de um desenvolvimento insustentável.
Os impactos ambientais promovidos pela ação humana tornaram-se desenfreados e
assustadores a partir da primeira revolução industrial. Foi então que, percebendo as ações
deletérias à própria sobrevivência, o homo sapiens sapiens despertou para atuações mais
condizentes com a conservação de recursos minerais e da biodiversidade. Ainda que ocorram
pontualmente, esses impactos apresentam conseqüências que nem sempre se restringem às
fronteiras territoriais dos Estados que os promovem. Muitas vezes extrapolam limites
geográficos e causam prejuízos a toda a coletividade.
Por conta disso, os Estados se preocuparam em estabelecer acordos para a
promoção de um desenvolvimento sustentável, inclusive a legislação interna dos países que
integram a Organização das Nações Unidas foi sendo elaborada para adequar-se às diretrizes
dos tratados internacionais.
Se o histórico da degradação ambiental remonta ao surgimento do homem na
Terra, se a intensificação desses impactos ocorre, principalmente, a partir de 1750, foi
somente a contar de 1972 que a conservação do meio ambiente consolidou posição na agenda
internacional, sendo reconhecido o direito humano fundamental ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
139
A inserção do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado no rol dos
direitos humanos fundamentais remonta à evolução histórica dos direitos humanos, em seus
primórdios, desde o Código de Hamurábi (séc. XVII a.C.). Colheu posteriormente subsídios
em doutrinas filosófico-religiosas, com especial destaque para o cristianismo, cuja mensagem
de igualdade a todos os homens, independentemente de origem, raça, sexo ou credo,
influenciou diretamente o nascimento dos direitos do homem, enquanto necessários à
dignidade da pessoa humana.
A consolidação dos direitos humanos, numa primeira fase, se dá com a Declaração
dos Direitos do Homem e do Cidadão, em 1789. É a primeira geração de direitos humanos,
assegurando as liberdades individuais. Numa segunda fase, resguardam-se os direitos que
migram da esfera do indivíduo para a esfera de categorias sociais, econômicas e culturais,
caracterizando uma geração de direitos humanos coletivizados e passando a exigir uma
obrigação de fazer, por parte do Estado.
Por fim, numa terceira fase, os direitos humanos extrapolaram os limites do
indivíduo e de grupos sociais mais restritos para se tornarem cada vez mais abrangentes,
tornaram-se metaindividuais, envolvem a humanidade com os direitos de solidariedade ou
fraternidade, e por se destinarem a todos, indistintamente, também ficaram conhecidos como
direitos difusos.
Os direitos humanos têm na Declaração Universal dos Direitos Humanos, do ano
de 1948, o seu respaldo internacional, pois estabeleceu parâmetros para toda a legislação
subseqüente, quer em nível interno dos Estados, quer em nível internacional, sendo
complementada, posteriormente, pelo Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e
pelo Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ambos de 1966.
Por sua vez, o direito a um meio ambiente saudável, equilibrado ecologicamente e
sustentável, passou a figurar no rol dos direitos humanos de terceira geração – direitos difusos
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140
– a partir da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano (Estocolmo,
1972), e adquiriu o status de “fundamental”, justamente, por ser imprescindível à manutenção
da vida das gerações presentes e futuras.
Esse direito constitui uma das facetas dos “novos direitos”, que extrapolam a
dimensão individual e a dimensão restrita a grupos sociais específicos para se elevar acima de
tudo e proteger a todos, indistintamente, enfatizando a condição humana de pertencer a uma
única e mesma espécie, que deve ser solidária entre si. Portanto, os novos direitos humanos
exigem uma adequação jurídico-conceitual para serem interpretados, compreendidos e
aplicados.
Nesse sentido, os embates conceituais sobre o meio ambiente, no intuito de
enquadrá-lo no contexto dos direitos de terceira geração, ocorrem sobre a ótica de dois pontos
de vista: a visão antropocêntrica e a visão ecocêntrica. Apesar de ambas colimarem o mesmo
objetivo – meio ambiente ecologicamente equilibrado – seus enfoques partem de pressupostos
distintos.
Observa-se que, por um lado, o antropocentrismo considera necessário preservar
os recursos naturais e a biodiversidade para assegurar uma boa qualidade de vida nos
ambientes urbanos e seus entornos, a fim de garantir a sobrevivência da espécie humana e
suas gerações. Vale acentuar que, na visão antropocêntrica do meio ambiente, o homem é a
medida de tudo.
Por outro lado, o ecocentrismo parte da premissa que o meio ambiente deve ser
preservado por conta do valor intrínseco dos elementos bióticos e abióticos da natureza,
independentemente do seu valor de uso para a espécie humana.
A concepção ambiental antropocêntrica continua predominante nos dias atuais,
pois os tratados internacionais deixam isso evidenciado em seus textos, dentre eles os
decorrentes da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano (Estocolmo,
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141
1972) e a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio de
Janeiro, 1992). Isto é, os principais documentos internacionais que balizam o direito humano
fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado apresentam uma visão de mundo
centrada na espécie humana.
A espécie humana é a única que gera e acumula conhecimentos, transmitindo
legados para as gerações subseqüentes, que os aperfeiçoam num processo evolutivo constante.
O que não significa dizer que os legados sejam sempre positivos. Basta lembrar as sucessivas
catástrofes ambientais ocorridas no globo terrestre, v.g., Chernobyl.
Equivocam-se os que alegam que, pela concepção antropocêntrica, o homem se
mantém externo à natureza. Pelo contrário, permanece no centro, com o ambiente, natural ou
artificial à sua volta, de modo que tudo o que trouxer prejuízos ao seu entorno, prejudicá-lo-á
também.
A concepção ecocêntrica peca pelo reducionismo, na medida em que pretende
inserir o homem no ambiente, apenas como mais um elemento da natureza, desconsiderando a
complexidade da própria natureza humana. Em contrapartida, surge a dificuldade enfrentada
pelo antropocentrismo, que deve abordar as questões ambientais através de múltiplos
enfoques dados à complexidade das interações humanas, em todos os aspectos.
Portanto, ergue-se a necessidade de uma possível complementação dessas duas
correntes - a posição antropocêntrica sendo enriquecida por idéias emanadas de uma visão
ecocêntrica sobre a questão do meio ambiente -, tendo como base princípios éticos que sirvam
de fundamentação a uma melhor forma de vida para todas as espécies.
Nessa mesma direção, os próprios direitos humanos fundamentais, como o direito
ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, são produtos de complexos processos sociais,
políticos e econômicos. Por isso a abordagem das questões ambientais precisa ser
multidisciplinar, e o enfoque da ciência jurídica, na elaboração e análise das diretrizes
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142
normativas, deve buscar apoio nas outras áreas do conhecimento humano, para promover uma
equilibrada adequação entre a conservação do meio ambiente e a promoção de um
desenvolvimento sustentável.
Vale lembrar que, na elaboração das normativas ambientais, somente reconhecer e
afirmar esse status de direito fundamental não foi suficiente. Foi necessário que, partindo
dessa concepção de direito fundamental, se desenvolvessem mecanismos para assegurar o
equilíbrio ecológico do meio ambiente, procurando envolver ao máximo todos os segmentos
da sociedade.
Os tratados internacionais das quatro últimas décadas tiveram o condão de
estabelecer as diretrizes gerais para os Estados, referentes às ações a serem implementadas
para a sustentabilidade ambiental.
Os principais temas desses tratados dizem respeito a problemas que, gerados
localmente, extrapolam as fronteiras nacionais e internacionais de suas localidades de origem.
A produção de normas internacionais regulando problemas ambientais transfronteiriços é
significativa e revela uma conscientização ambiental que se aprimorou rapidamente a partir
do século XX.
Isso refletiu nas legislações constitucionais e infraconstitucionais dos países
componentes da ONU que passaram a aperfeiçoar seu ordenamento jurídico para adequá-los
às exigências da sociedade contemporânea, cada vez mais consciente e presente nas
reivindicações e defesa de seus direitos fundamentais, dentre os quais o direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado.
O aprimoramento da consciência ambiental, refletida nas legislações em vigor, e
nas normas em desenvolvimento, traduz uma continuidade no processo de evolução dos
direitos humanos fundamentais, processo esse deflagrado, principalmente, com a Revolução
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143
Francesa de 1789, que teve como base os três princípios axiológicos fundamentais dos
direitos humanos: liberdade, igualdade, fraternidade ou solidariedade.
Nessa mesma linha de atuação, o Brasil não permaneceu à margem desse processo,
e a evolução normativa ambiental foi profícua a partir da década de 1970, ainda que careça de
sistematização. Aprimorou-se a legislação específica, sendo a Constituição Federal de 1988
um marco divisório nesse contexto, recepcionando ou endossando boa parte da legislação
ambiental pretérita e balizando as subseqüentes.
Faz-se mister ressaltar que fauna, flora, caça, pesca, extrativismo, recurso mineral,
água, biodiversidade, poluição, impacto ambiental, educação, e outras tantas matérias
relacionadas ao meio ambiente tiveram desdobramentos legislativos, com um enfoque mais
conservacionista no Brasil, a partir de 1988.
Ademais, um dos aspectos mais expressivos e de conseqüências positivas no
resguardo do equilíbrio ecológico ambiental foi a previsão constitucional da função social da
propriedade, que estabeleceu uma ruptura com o tradicional enfoque dado aos bens de uso
comum, como sendo somente bens do patrimônio público, quando estende esse entendimento
ao patrimônio privado, a cujos proprietários são fixadas obrigações relativas à preservação
ambiental, atreladas à função social da propriedade.
Outro aspecto inovador da Carta Magna de 1988 foi a responsabilização penal da
pessoa jurídica, reforçada pela Lei de Crimes Ambientais, posto que boa parte dos impactos
lesivos ao meio ambiente são promovidos por empresas, indústrias e outros entes jurídicos,
através de seus prepostos.
Impende destacar que uma das previsões normativas mais bem articulada foi a
possibilidade de salvaguardar o equilíbrio ecológico ambiental, criando Unidades de
Conservação por intermédio da Lei nº. 9.985 de 2000 (ANEXO A) que instituiu o Sistema
Nacional de Unidades de Conservação.
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Esse Sistema de Conservação prevê a possibilidade de se ter a preservação de
ecossistemas brasileiros, partindo tanto da iniciativa governamental (ANEXO B), como da
iniciativa privada, criando-se unidades de conservação de proteção integral, ou unidades de
conservação de uso sustentável.
Nesse mister, a legislação brasileira possibilita a participação da sociedade na
constituição de uma unidade de conservação, quando permite ao proprietário de área privada,
possuidora de significativa amostra da biodiversidade brasileira, ou de paisagens com singular
beleza cênica, solicitar ao poder público a instituição de uma unidade de conservação,
intitulada Reserva Particular do Patrimônio Natural (ANEXO C).
Esse estímulo associa-se às investidas da educação ambiental, principalmente de
âmbito informal, à medida que projetos e campanhas de instituições governamentais e nãogovernamentais esclarecem a sociedade sobre a necessidade de preservação do meio
ambiente, e sobre os benefícios que podem ser auferidos com a preservação ambiental no
campo econômico, como isenção de impostos, prática de ecoturismo, obtenção de
financiamentos ambientais.
Outrossim, o desenvolvimento das atividades legalmente permitidas em uma
RPPN privilegia ações em educação ambiental através da possibilidade de realização de
pesquisas científicas e de visitação turística, propiciando o contato direto e pessoal com
atividades práticas de conservacionismo em ambientes naturais diversos.
Vale assinalar que outra contrapartida para o ônus assumido pelo proprietário ao
transformar seu imóvel em RPPN está, não só no aspecto econômico que disso pode resultar,
mas, também, na preservação do seu direito de propriedade que não poderá ser desapropriada
para fins sociais, posto que já se encontra cumprindo essa finalidade.
Na medida em que a Carta Política prevê uma função social para a propriedade,
atrelada à preservação de seus recursos naturais, é possível inferir uma função ambiental
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correlata que, em sendo atendida, estabelece um novo parâmetro de produtividade ainda não
bem assimilado pela sociedade, mas que diz respeito à produção da qualidade de vida, através
de um meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Como se observa, equivoca-se quem alega que a propriedade mantida intocada
para fins de preservação ambiental é uma propriedade improdutiva, que não atende à sua
função social, e, portanto, está passível de desapropriação para fins de reforma agrária.
A figura da RPPN se ajusta perfeitamente a mais recente concepção de
propriedade privada, que traz embutida uma forte conotação social, em que a preservação do
meio ambiente é um dos aspectos mais expressivos, por vincular-se a um direito humano
fundamental.
Do exposto, infere-se que as RPPNs são propriedades de domínio privado e seus
proprietários – de maneira voluntária, estimulados pela consciência ambiental e com o apoio
do Estado – resolvem exercer a cidadania, propiciando importantes contribuições ao meio
ambiente, dentre elas: ampliar as áreas protegidas no país; possibilitar a participação da
iniciativa privada no esforço nacional de conservação; contribuir para a proteção da
biodiversidade dos biomas brasileiros (ANEXO D).
Tais reservas, na medida em que só podem ser instituídas por vontade expressa de
seu dono, tendo caráter irrevogável e sem a possibilidade de desapropriação pelo poder
público, evidenciam considerável noção ambiental de seus proprietários.
Além disso, vê-se o resultado epistemológico da proteção ambiental preconizada
por normativas internacionais e nacionais, determinando mudanças que objetivam preservar a
natureza. Dentre essas alterações, é possível destacar a viabilização do processo sistêmico de
implementação das RPPNs, sendo respaldado pelo art. 225 da Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988.
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Portanto, a RPPN revela-se um instrumento de maior eficácia, visto que seu
proprietário, compreendendo perfeitamente as exigências conservacionistas impostas pela
função socioambiental a todas as propriedades privadas, de forma geral, assume
voluntariamente um ônus perpétuo de contribuir para a manutenção de um direito já
consagrado como fundamental para o ser humano.
Por seu turno, o direito fundamental ao ambiente ecologicamente equilibrado
encontra substancial respaldo nos institutos da Carta Magna vigente e da legislação
infraconstitucional, principalmente nos aspectos relativos à função social do domínio e da
posse, razão pela qual a propriedade, privada ou não, deve atender ao interesse coletivo.
Logo, depreende-se que os deveres inerentes ao direito de propriedade
consubstanciados no princípio da função socioambiental desta, não devem ser entendidos tão
somente como limitações ao exercício do próprio direito. Estas implicam meras abstenções do
titular do direito, em não fazer o que possa prejudicar a coletividade. Tais deveres devem ser
entendidos como encargos próprios do direito de propriedade, orientando seu exercício e
ações, de forma que se traduzam em benefício para sociedade.
Destarte, a Reserva Particular do Patrimônio Natural vem se constituindo num
eficiente instrumento de exercício de cidadania, possibilitando ao indivíduo melhor
aquinhoado da sociedade capitalista contribuir para a manutenção e elevação da boa qualidade
de vida dos concidadãos, que, em última instância, equivale à manutenção do direito
fundamental à própria vida.
Assim, as RPPNs, à medida que constituem unidades de conservação, cuja
iniciativa de preservação ambiental depende exclusivamente da vontade de seu proprietário
em manter a área preservada perpetuamente, representam um dos exemplos mais
significativos de adequação do direito individual de propriedade ao direito fundamental de um
ambiente sadio, equilibrado e sustentável. Inclusive, isto segue ao encontro da idéia de que a
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função socioambiental da propriedade somente se consolida com a participação da sociedade
e a conseqüente implementação da educação ambiental.
Por tudo isso, a Reserva Particular do Patrimônio Natural se torna um instrumento
de efetivação do direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado – direito humano
fundamental de 3ª geração – que tem engendrado no seu bojo o respeito à vida e à dignidade
da pessoa humana.
148
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159
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
ANEXO A - Lei nº. 9.985, de 18 de julho de 2000
Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal,
institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza 246 e dá outras
providências.
O Vice-Presidente da República no exercício do cargo de Presidente da República.
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
CAPÍTULO I
DAS DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 1o - Esta Lei institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da
Natureza – SNUC, estabelece critérios e normas para a criação, implantação e gestão das
unidades de conservação.
Art. 2o Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
I - unidade de conservação: espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo
as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo
Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de
administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção;
II - conservação da natureza: o manejo do uso humano da natureza,
compreendendo a preservação, a manutenção, a utilização sustentável, a restauração e a
recuperação do ambiente natural, para que possa produzir o maior benefício, em bases
sustentáveis, às atuais gerações, mantendo seu potencial de satisfazer as necessidades e
aspirações das gerações futuras, e garantindo a sobrevivência dos seres vivos em geral;
III - diversidade biológica: a variabilidade de organismos vivos de todas as
origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros
ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte; compreendendo ainda
a diversidade dentro de espécies, entre espécies e de ecossistemas;
IV - recurso ambiental: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e
subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a
fauna e a flora;
V - preservação: conjunto de métodos, procedimentos e políticas que visem a
proteção a longo prazo das espécies, habitats e ecossistemas, além da manutenção dos
processos ecológicos, prevenindo a simplificação dos sistemas naturais;
246
BRASIL. Lei 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1º , incisos I, II, III e VII da
Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras
providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 19 jul. 2000. Disponível em:
<http:// www.sabesp.com.br/legislação/PDF/LF9985.pdf> . Acesso em 13 dez. 2005.
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160
VI - proteção integral: manutenção dos ecossistemas livres de alterações causadas
por interferência humana, admitido apenas o uso indireto dos seus atributos naturais;
VII - conservação in situ: conservação de ecossistemas e habitats naturais e a
manutenção e recuperação de populações viáveis de espécies em seus meios naturais e, no
caso de espécies domesticadas ou cultivadas, nos meios onde tenham desenvolvido suas
propriedades características;
VIII - manejo: todo e qualquer procedimento que vise assegurar a conservação da
diversidade biológica e dos ecossistemas;
IX - uso indireto: aquele que não envolve consumo, coleta, dano ou destruição dos
recursos naturais;
X - uso direto: aquele que envolve coleta e uso, comercial ou não, dos recursos
naturais;
XI - uso sustentável: exploração do ambiente de maneira a garantir a perenidade
dos recursos ambientais renováveis e dos processos ecológicos, mantendo a biodiversidade e
os demais atributos ecológicos, de forma socialmente justa e economicamente viável;
XII - extrativismo: sistema de exploração baseado na coleta e extração, de modo
sustentável, de recursos naturais renováveis;
XIII - recuperação: restituição de um ecossistema ou de uma população silvestre
degradada a uma condição não degradada, que pode ser diferente de sua condição original;
XIV - restauração: restituição de um ecossistema ou de uma população silvestre
degradada o mais próximo possível da sua condição original;
XV – (Vetado)
XVI - zoneamento: definição de setores ou zonas em uma unidade de conservação
com objetivos de manejo e normas específicos, com o propósito de proporcionar os meios e as
condições para que todos os objetivos da unidade possam ser alcançados de forma harmônica
e eficaz;
XVII - plano de manejo: documento técnico mediante o qual, com fundamento nos
objetivos gerais de uma unidade de conservação, se estabelece o seu zoneamento e as normas
que devem presidir o uso da área e o manejo dos recursos naturais, inclusive a implantação
das estruturas físicas necessárias à gestão da unidade;
XVIII - zona de amortecimento: o entorno de uma unidade de conservação, onde
as atividades humanas estão sujeitas a normas e restrições específicas, com o propósito de
minimizar os impactos negativos sobre a unidade; e
XIX - corredores ecológicos: porções de ecossistemas naturais ou seminaturais,
ligando unidades de conservação, que possibilitam entre elas o fluxo de genes e o movimento
da biota, facilitando a dispersão de espécies e a recolonização de áreas degradadas, bem como
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a manutenção de populações que demandam para sua sobrevivência áreas com extensão maior
do que aquela das unidades individuais.
CAPÍTULO II
DO SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO
DA NATUREZA – SNUC
Art. 3o - O Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza - SNUC é
constituído pelo conjunto das unidades de conservação federais, estaduais e municipais, de
acordo com o disposto nesta Lei.
Art. 4o - O SNUC tem os seguintes objetivos:
I - contribuir para a manutenção da diversidade biológica e dos recursos genéticos
no território nacional e nas águas jurisdicionais;
II - proteger as espécies ameaçadas de extinção no âmbito regional e nacional;
III - contribuir para a preservação e a restauração da diversidade de ecossistemas
naturais;
IV - promover o desenvolvimento sustentável a partir dos recursos naturais;
V - promover a utilização dos princípios e práticas de conservação da natureza no
processo de desenvolvimento;
VI - proteger paisagens naturais e pouco alteradas de notável beleza cênica;
VII - proteger as características relevantes de natureza geológica, geomorfológica,
espeleológica, arqueológica, paleontológica e cultural;
VIII - proteger e recuperar recursos hídricos e edáficos;
IX - recuperar ou restaurar ecossistemas degradados;
X - proporcionar meios e incentivos para atividades de pesquisa científica, estudos
e monitoramento ambiental;
XI - valorizar econômica e socialmente a diversidade biológica;
XII - favorecer condições e promover a educação e interpretação ambiental, a
recreação em contato com a natureza e o turismo ecológico;
XIII - proteger os recursos naturais necessários à subsistência de populações
tradicionais, respeitando e valorizando seu conhecimento e sua cultura e promovendo-as
social e economicamente.
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162
Art. 5o - O SNUC será regido por diretrizes que:
I - assegurem que no conjunto das unidades de conservação estejam representadas
amostras significativas e ecologicamente viáveis das diferentes populações, habitats e
ecossistemas do território nacional e das águas jurisdicionais, salvaguardando o patrimônio
biológico existente;
II - assegurem os mecanismos e procedimentos necessários ao envolvimento da
sociedade no estabelecimento e na revisão da política nacional de unidades de conservação;
III - assegurem a participação efetiva das populações locais na criação,
implantação e gestão das unidades de conservação;
IV - busquem o apoio e a cooperação de organizações não-governamentais, de
organizações privadas e pessoas físicas para o desenvolvimento de estudos, pesquisas
científicas, práticas de educação ambiental, atividades de lazer e de turismo ecológico,
monitoramento, manutenção e outras atividades de gestão das unidades de conservação;
V - incentivem as populações locais e as organizações privadas a estabelecerem e
administrarem unidades de conservação dentro do sistema nacional;
VI - assegurem, nos casos possíveis, a sustentabilidade econômica das unidades de
conservação;
VII - permitam o uso das unidades de conservação para a conservação in situ de
populações das variantes genéticas selvagens dos animais e plantas domesticados e recursos
genéticos silvestres;
VIII - assegurem que o processo de criação e a gestão das unidades de conservação
sejam feitos de forma integrada com as políticas de administração das terras e águas
circundantes, considerando as condições e necessidades sociais e econômicas locais;
IX - considerem as condições e necessidades das populações locais no
desenvolvimento e adaptação de métodos e técnicas de uso sustentável dos recursos naturais;
X - garantam às populações tradicionais cuja subsistência dependa da utilização de
recursos naturais existentes no interior das unidades de conservação meios de subsistência
alternativos ou a justa indenização pelos recursos perdidos;
XI - garantam uma alocação adequada dos recursos financeiros necessários para
que, uma vez criadas, as unidades de conservação possam ser geridas de forma eficaz e
atender aos seus objetivos;
XII - busquem conferir às unidades de conservação, nos casos possíveis e
respeitadas as conveniências da administração, autonomia administrativa e financeira; e
XIII - busquem proteger grandes áreas por meio de um conjunto integrado de
unidades de conservação de diferentes categorias, próximas ou contíguas, e suas respectivas
zonas de amortecimento e corredores ecológicos, integrando as diferentes atividades de
163
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preservação da natureza, uso sustentável dos recursos naturais e restauração e recuperação dos
ecossistemas.
Art. 6o - O SNUC será gerido pelos seguintes órgãos, com as respectivas
atribuições:
I - Órgão consultivo e deliberativo: o Conselho Nacional do Meio Ambiente Conama, com as atribuições de acompanhar a implementação do Sistema;
II - Órgão central: o Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade de coordenar
o Sistema; e
III - Órgãos executores: o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis - IBAMA, os órgãos estaduais e municipais, com a função de
implementar o SNUC, subsidiar as propostas de criação e administrar as unidades de
conservação federais, estaduais e municipais, nas respectivas esferas de atuação.
Parágrafo único - Podem integrar o SNUC, excepcionalmente e a critério do
Conama, unidades de conservação estaduais e municipais que, concebidas para atender a
peculiaridades regionais ou locais, possuam objetivos de manejo que não possam ser
satisfatoriamente atendidos por nenhuma categoria prevista nesta Lei e cujas características
permitam, em relação a estas, uma clara distinção.
CAPÍTULO III
DAS CATEGORIAS DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO
Art. 7o - As unidades de conservação integrantes do SNUC dividem-se em dois
grupos, com características específicas:
I - Unidades de Proteção Integral;
II - Unidades de Uso Sustentável.
§ 1o - O objetivo básico das Unidades de Proteção Integral é preservar a natureza,
sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais, com exceção dos casos
previstos nesta Lei.
§ 2o - O objetivo básico das Unidades de Uso Sustentável é compatibilizar a
conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais.
Art. 8o - O grupo das Unidades de Proteção Integral é composto pelas seguintes
categorias de unidade de conservação:
I - Estação Ecológica;
II - Reserva Biológica;
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164
III - Parque Nacional;
IV - Monumento Natural;
V - Refúgio de Vida Silvestre.
Art. 9o - A Estação Ecológica tem como objetivo a preservação da natureza e a
realização de pesquisas científicas.
§ 1o - A Estação Ecológica é de posse e domínio públicos, sendo que as áreas
particulares incluídas em seus limites serão desapropriadas, de acordo com o que dispõe a lei.
§ 2o - É proibida a visitação pública, exceto quando com objetivo educacional, de
acordo com o que dispuser o Plano de Manejo da unidade ou regulamento específico.
§ 3o - A pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável
pela administração da unidade e está sujeita às condições e restrições por este estabelecidas,
bem como àquelas previstas em regulamento.
§ 4o - Na Estação Ecológica só podem ser permitidas alterações dos ecossistemas
no caso de:
I - medidas que visem a restauração de ecossistemas modificados;
II - manejo de espécies com o fim de preservar a diversidade biológica;
III - coleta de componentes dos ecossistemas com finalidades científicas;
IV - pesquisas científicas cujo impacto sobre o ambiente seja maior do que aquele
causado pela simples observação ou pela coleta controlada de componentes dos ecossistemas,
em uma área correspondente a no máximo três por cento da extensão total da unidade e até o
limite de um mil e quinhentos hectares.
Art. 10 - A Reserva Biológica tem como objetivo a preservação integral da biota e
demais atributos naturais existentes em seus limites, sem interferência humana direta ou
modificações ambientais, excetuando-se as medidas de recuperação de seus ecossistemas
alterados e as ações de manejo necessárias para recuperar e preservar o equilíbrio natural, a
diversidade biológica e os processos ecológicos naturais.
§ 1o - A Reserva Biológica é de posse e domínio públicos, sendo que as áreas
particulares incluídas em seus limites serão desapropriadas, de acordo com o que dispõe a lei.
§ 2o - É proibida a visitação pública, exceto aquela com objetivo educacional, de
acordo com regulamento específico.
§ 3o - A pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável
pela administração da unidade e está sujeita às condições e restrições por este estabelecidas,
bem como àquelas previstas em regulamento.
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165
Art. 11 - O Parque Nacional tem como objetivo básico a preservação de
ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a
realização de pesquisas científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e
interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico.
§ 1o - O Parque Nacional é de posse e domínio públicos, sendo que as áreas
particulares incluídas em seus limites serão desapropriadas, de acordo com o que dispõe a lei.
§ 2o - A visitação pública está sujeita às normas e restrições estabelecidas no Plano
de Manejo da unidade, às normas estabelecidas pelo órgão responsável por sua administração,
e àquelas previstas em regulamento.
§ 3o - A pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável
pela administração da unidade e está sujeita às condições e restrições por este estabelecidas,
bem como àquelas previstas em regulamento.
§ 4o - As unidades dessa categoria, quando criadas pelo Estado ou Município,
serão denominadas, respectivamente, Parque Estadual e Parque Natural Municipal.
Art. 12 - O Monumento Natural tem como objetivo básico preservar sítios naturais
raros, singulares ou de grande beleza cênica.
§ 1o - O Monumento Natural pode ser constituído por áreas particulares, desde que
seja possível compatibilizar os objetivos da unidade com a utilização da terra e dos recursos
naturais do local pelos proprietários.
§ 2o - Havendo incompatibilidade entre os objetivos da área e as atividades
privadas ou não havendo aquiescência do proprietário às condições propostas pelo órgão
responsável pela administração da unidade para a coexistência do Monumento Natural com o
uso da propriedade, a área deve ser desapropriada, de acordo com o que dispõe a lei.
§ 3o - A visitação pública está sujeita às condições e restrições estabelecidas no
Plano de Manejo da unidade, às normas estabelecidas pelo órgão responsável por sua
administração e àquelas previstas em regulamento.
Art. 13 - O Refúgio de Vida Silvestre tem como objetivo proteger ambientes
naturais onde se asseguram condições para a existência ou reprodução de espécies ou
comunidades da flora local e da fauna residente ou migratória.
§ 1o - O Refúgio de Vida Silvestre pode ser constituído por áreas particulares,
desde que seja possível compatibilizar os objetivos da unidade com a utilização da terra e dos
recursos naturais do local pelos proprietários.
§ 2o - Havendo incompatibilidade entre os objetivos da área e as atividades
privadas ou não havendo aquiescência do proprietário às condições propostas pelo órgão
responsável pela administração da unidade para a coexistência do Refúgio de Vida Silvestre
com o uso da propriedade, a área deve ser desapropriada, de acordo com o que dispõe a lei.
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166
§ 3o - A visitação pública está sujeita às normas e restrições estabelecidas no Plano
de Manejo da unidade, às normas estabelecidas pelo órgão responsável por sua administração,
e àquelas previstas em regulamento.
§ 4o - A pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável
pela administração da unidade e está sujeita às condições e restrições por este estabelecidas,
bem como àquelas previstas em regulamento.
Art. 14 - Constituem o Grupo das Unidades de Uso Sustentável as seguintes
categorias de unidade de conservação:
I - Área de Proteção Ambiental;
II - Área de Relevante Interesse Ecológico;
III - Floresta Nacional;
IV - Reserva Extrativista;
V - Reserva de Fauna;
VI – Reserva de Desenvolvimento Sustentável; e
VII - Reserva Particular do Patrimônio Natural.
Art. 15 - A Área de Proteção Ambiental é uma área em geral extensa, com um
certo grau de ocupação humana, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais
especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, e
tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de
ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais.
§ 1o - A Área de Proteção Ambiental é constituída por terras públicas ou privadas.
§ 2o - Respeitados os limites constitucionais, podem ser estabelecidas normas e
restrições para a utilização de uma propriedade privada localizada em uma Área de Proteção
Ambiental.
§ 3o - As condições para a realização de pesquisa científica e visitação pública nas
áreas sob domínio público serão estabelecidas pelo órgão gestor da unidade.
§ 4o - Nas áreas sob propriedade privada, cabe ao proprietário estabelecer as
condições para pesquisa e visitação pelo público, observadas as exigências e restrições legais.
§ 5o - A Área de Proteção Ambiental disporá de um Conselho presidido pelo órgão
responsável por sua administração e constituído por representantes dos órgãos públicos, de
organizações da sociedade civil e da população residente, conforme se dispuser no
regulamento desta Lei.
Art. 16 - A Área de Relevante Interesse Ecológico é uma área em geral de pequena
extensão, com pouca ou nenhuma ocupação humana, com características naturais
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167
extraordinárias ou que abriga exemplares raros da biota regional, e tem como objetivo manter
os ecossistemas naturais de importância regional ou local e regular o uso admissível dessas
áreas, de modo a compatibilizá-lo com os objetivos de conservação da natureza.
§ 1o - A Área de Relevante Interesse Ecológico é constituída por terras públicas ou
privadas.
§ 2o - Respeitados os limites constitucionais, podem ser estabelecidas normas e
restrições para a utilização de uma propriedade privada localizada em uma Área de Relevante
Interesse Ecológico.
Art. 17 - A Floresta Nacional é uma área com cobertura florestal de espécies
predominantemente nativas e tem como objetivo básico o uso múltiplo sustentável dos
recursos florestais e a pesquisa científica, com ênfase em métodos para exploração sustentável
de florestas nativas.
§ 1o - A Floresta Nacional é de posse e domínio públicos, sendo que as áreas
particulares incluídas em seus limites devem ser desapropriadas de acordo com o que dispõe a
lei.
§ 2o - Nas Florestas Nacionais é admitida a permanência de populações
tradicionais que a habitam quando de sua criação, em conformidade com o disposto em
regulamento e no Plano de Manejo da unidade.
§ 3o - A visitação pública é permitida, condicionada às normas estabelecidas para o
manejo da unidade pelo órgão responsável por sua administração.
§ 4o - A pesquisa é permitida e incentivada, sujeitando-se à prévia autorização do
órgão responsável pela administração da unidade, às condições e restrições por este
estabelecidas e àquelas previstas em regulamento.
§ 5o - A Floresta Nacional disporá de um Conselho Consultivo, presidido pelo
órgão responsável por sua administração e constituído por representantes de órgãos públicos,
de organizações da sociedade civil e, quando for o caso, das populações tradicionais
residentes.
§ 6o - A unidade desta categoria, quando criada pelo Estado ou Município, será
denominada, respectivamente, Floresta Estadual e Floresta Municipal.
Art. 18 - A Reserva Extrativista é uma área utilizada por populações extrativistas
tradicionais, cuja subsistência baseia-se no extrativismo e, complementarmente, na agricultura
de subsistência e na criação de animais de pequeno porte, e tem como objetivos básicos
proteger os meios de vida e a cultura dessas populações, e assegurar o uso sustentável dos
recursos naturais da unidade.
§ 1o - A Reserva Extrativista é de domínio público, com uso concedido às
populações extrativistas tradicionais conforme o disposto no art. 23 desta Lei e em
regulamentação específica, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites devem
ser desapropriadas, de acordo com o que dispõe a lei.
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168
§ 2o - A Reserva Extrativista será gerida por um Conselho Deliberativo, presidido
pelo órgão responsável por sua administração e constituído por representantes de órgãos
públicos, de organizações da sociedade civil e das populações tradicionais residentes na área,
conforme se dispuser em regulamento e no ato de criação da unidade.
§ 3o - A visitação pública é permitida, desde que compatível com os interesses
locais e de acordo com o disposto no Plano de Manejo da área.
§ 4o - A pesquisa científica é permitida e incentivada, sujeitando-se à prévia
autorização do órgão responsável pela administração da unidade, às condições e restrições por
este estabelecidas e às normas previstas em regulamento.
§ 5o - O Plano de Manejo da unidade será aprovado pelo seu Conselho
Deliberativo.
§ 6o - São proibidas a exploração de recursos minerais e a caça amadorística ou
profissional.
§ 7o - A exploração comercial de recursos madeireiros só será admitida em bases
sustentáveis e em situações especiais e complementares às demais atividades desenvolvidas
na Reserva Extrativista, conforme o disposto em regulamento e no Plano de Manejo da
unidade.
Art. 19 - A Reserva de Fauna é uma área natural com populações animais de
espécies nativas, terrestres ou aquáticas, residentes ou migratórias, adequadas para estudos
técnico-científicos sobre o manejo econômico sustentável de recursos faunísticos.
§ 1o - A Reserva de Fauna é de posse e domínio públicos, sendo que as áreas
particulares incluídas em seus limites devem ser desapropriadas de acordo com o que dispõe a
lei.
§ 2o - A visitação pública pode ser permitida, desde que compatível com o manejo
da unidade e de acordo com as normas estabelecidas pelo órgão responsável por sua
administração.
§ 3o - É proibido o exercício da caça amadorística ou profissional.
§ 4o - A comercialização dos produtos e subprodutos resultantes das pesquisas
obedecerá ao disposto nas leis sobre fauna e regulamentos.
Art. 20 - A Reserva de Desenvolvimento Sustentável é uma área natural que abriga
populações tradicionais, cuja existência baseia-se em sistemas sustentáveis de exploração dos
recursos naturais, desenvolvidos ao longo de gerações e adaptados às condições ecológicas
locais e que desempenham um papel fundamental na proteção da natureza e na manutenção da
diversidade biológica.
§ 1o - A Reserva de Desenvolvimento Sustentável tem como objetivo básico
preservar a natureza e, ao mesmo tempo, assegurar as condições e os meios necessários para a
reprodução e a melhoria dos modos e da qualidade de vida e exploração dos recursos naturais
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das populações tradicionais, bem como valorizar, conservar e aperfeiçoar o conhecimento e as
técnicas de manejo do ambiente, desenvolvido por estas populações.
§ 2o - A Reserva de Desenvolvimento Sustentável é de domínio público, sendo que
as áreas particulares incluídas em seus limites devem ser, quando necessário, desapropriadas,
de acordo com o que dispõe a lei.
§ 3o - O uso das áreas ocupadas pelas populações tradicionais será regulado de
acordo com o disposto no art. 23 desta Lei e em regulamentação específica.
§ 4o - A Reserva de Desenvolvimento Sustentável será gerida por um Conselho
Deliberativo, presidido pelo órgão responsável por sua administração e constituído por
representantes de órgãos públicos, de organizações da sociedade civil e das populações
tradicionais residentes na área, conforme se dispuser em regulamento e no ato de criação da
unidade.
§ 5o - As atividades desenvolvidas na Reserva de Desenvolvimento Sustentável
obedecerão às seguintes condições:
I - é permitida e incentivada a visitação pública, desde que compatível com os
interesses locais e de acordo com o disposto no Plano de Manejo da área;
II - é permitida e incentivada a pesquisa científica voltada à conservação da
natureza, à melhor relação das populações residentes com seu meio e à educação ambiental,
sujeitando-se à prévia autorização do órgão responsável pela administração da unidade, às
condições e restrições por este estabelecidas e às normas previstas em regulamento;
III - deve ser sempre considerado o equilíbrio dinâmico entre o tamanho da
população e a conservação; e
IV - é admitida a exploração de componentes dos ecossistemas naturais em regime
de manejo sustentável e a substituição da cobertura vegetal por espécies cultiváveis, desde
que sujeitas ao zoneamento, às limitações legais e ao Plano de Manejo da área.
§ 6o - O Plano de Manejo da Reserva de Desenvolvimento Sustentável definirá as
zonas de proteção integral, de uso sustentável e de amortecimento e corredores ecológicos, e
será aprovado pelo Conselho Deliberativo da unidade.
Art. 21 - A Reserva Particular do Patrimônio Natural é uma área privada, gravada
com perpetuidade, com o objetivo de conservar a diversidade biológica.
§ 1o - O gravame de que trata este artigo constará de termo de compromisso
assinado perante o órgão ambiental, que verificará a existência de interesse público, e será
averbado à margem da inscrição no Registro Público de Imóveis.
§ 2o - Só poderá ser permitida, na Reserva Particular do Patrimônio Natural,
conforme se dispuser em regulamento:
I - a pesquisa científica;
170
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II - a visitação com objetivos turísticos, recreativos e educacionais;
III – (Vetado)
§ 3o - Os órgãos integrantes do SNUC, sempre que possível e oportuno, prestarão
orientação técnica e científica ao proprietário de Reserva Particular do Patrimônio Natural
para a elaboração de um Plano de Manejo ou de Proteção e de Gestão da unidade.
CAPÍTULO IV
DA CRIAÇÃO, IMPLANTAÇÃO E GESTÃO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO
Art. 22 - As unidades de conservação são criadas por ato do Poder Público.
§ 1o - (Vetado)
§ 2o - A criação de uma unidade de conservação deve ser precedida de estudos
técnicos e de consulta pública que permitam identificar a localização, a dimensão e os limites
mais adequados para a unidade, conforme se dispuser em regulamento.
§ 3o - No processo de consulta de que trata o § 2o, o Poder Público é obrigado a
fornecer informações adequadas e inteligíveis à população local e a outras partes interessadas.
§ 4o - Na criação de Estação Ecológica ou Reserva Biológica não é obrigatória a
consulta de que trata o § 2o deste artigo.
§ 5o - As unidades de conservação do grupo de Uso Sustentável podem ser
transformadas total ou parcialmente em unidades do grupo de Proteção Integral, por
instrumento normativo do mesmo nível hierárquico do que criou a unidade, desde que
obedecidos os procedimentos de consulta estabelecidos no § 2o deste artigo.
§ 6o - A ampliação dos limites de uma unidade de conservação, sem modificação
dos seus limites originais, exceto pelo acréscimo proposto, pode ser feita por instrumento
normativo do mesmo nível hierárquico do que criou a unidade, desde que obedecidos os
procedimentos de consulta estabelecidos no § 2o deste artigo.
§ 7o - A desafetação ou redução dos limites de uma unidade de conservação só
pode ser feita mediante lei específica.
Art. 22-A - O Poder Público poderá, ressalvadas as atividades agropecuárias e
outras atividades econômicas em andamento e obras públicas licenciadas, na forma da lei,
decretar limitações administrativas provisórias ao exercício de atividades e empreendimentos
efetiva ou potencialmente causadores de degradação ambiental, para a realização de estudos
com vistas na criação de Unidade de Conservação, quando, a critério do órgão ambiental
competente, houver risco de dano grave aos recursos naturais ali existentes (Incluído pela Lei
nº. 11.132, de 2005).
§ 1o - Sem prejuízo da restrição e observada a ressalva constante do caput, na área
submetida a limitações administrativas, não serão permitidas atividades que importem em
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
171
exploração a corte raso da floresta e demais formas de vegetação nativa (Incluído pela Lei nº.
11.132, de 2005).
§ 2o - A destinação final da área submetida ao disposto neste artigo será definida
no prazo de 7 (sete) meses, improrrogáveis, findo o qual fica extinta a limitação
administrativa (Incluído pela Lei nº. 11.132, de 2005).
Art. 23 - A posse e o uso das áreas ocupadas pelas populações tradicionais nas
Reservas Extrativistas e Reservas de Desenvolvimento Sustentável serão regulados por
contrato, conforme se dispuser no regulamento desta Lei.
§ 1o - As populações de que trata este artigo obrigam-se a participar da
preservação, recuperação, defesa e manutenção da unidade de conservação.
§ 2o - O uso dos recursos naturais pelas populações de que trata este artigo
obedecerá às seguintes normas:
I - proibição do uso de espécies localmente ameaçadas de extinção ou de práticas
que danifiquem os seus habitats;
II - proibição de práticas ou atividades que impeçam a regeneração natural dos
ecossistemas;
III - demais normas estabelecidas na legislação, no Plano de Manejo da unidade de
conservação e no contrato de concessão de direito real de uso.
Art. 24. O subsolo e o espaço aéreo, sempre que influírem na estabilidade do
ecossistema, integram os limites das unidades de conservação.
Art. 25 - As unidades de conservação, exceto Área de Proteção Ambiental e
Reserva Particular do Patrimônio Natural, devem possuir uma zona de amortecimento e,
quando conveniente, corredores ecológicos.
§ 1o - O órgão responsável pela administração da unidade estabelecerá normas
específicas regulamentando a ocupação e o uso dos recursos da zona de amortecimento e dos
corredores ecológicos de uma unidade de conservação.
§ 2o - Os limites da zona de amortecimento e dos corredores ecológicos e as
respectivas normas de que trata o § 1o poderão ser definidas no ato de criação da unidade ou
posteriormente.
Art. 26 - Quando existir um conjunto de unidades de conservação de categorias
diferentes ou não, próximas, justapostas ou sobrepostas, e outras áreas protegidas públicas ou
privadas, constituindo um mosaico, a gestão do conjunto deverá ser feita de forma integrada e
participativa, considerando-se os seus distintos objetivos de conservação, de forma a
compatibilizar a presença da biodiversidade, a valorização da sociodiversidade e o
desenvolvimento sustentável no contexto regional.
Parágrafo único - O regulamento desta Lei disporá sobre a forma de gestão
integrada do conjunto das unidades.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
172
Art. 27 - As unidades de conservação devem dispor de um Plano de Manejo.
§ 1o - O Plano de Manejo deve abranger a área da unidade de conservação, sua
zona de amortecimento e os corredores ecológicos, incluindo medidas com o fim de promover
sua integração à vida econômica e social das comunidades vizinhas.
§ 2o - Na elaboração, atualização e implementação do Plano de Manejo das
Reservas Extrativistas, das Reservas de Desenvolvimento Sustentável, das Áreas de Proteção
Ambiental e, quando couber, das Florestas Nacionais e das Áreas de Relevante Interesse
Ecológico, será assegurada a ampla participação da população residente.
§ 3o - O Plano de Manejo de uma unidade de conservação deve ser elaborado no
prazo de cinco anos a partir da data de sua criação.
Art. 28 - São proibidas, nas unidades de conservação, quaisquer alterações,
atividades ou modalidades de utilização em desacordo com os seus objetivos, o seu Plano de
Manejo e seus regulamentos.
Parágrafo único - Até que seja elaborado o Plano de Manejo, todas as atividades e
obras desenvolvidas nas unidades de conservação de proteção integral devem se limitar
àquelas destinadas a garantir a integridade dos recursos que a unidade objetiva proteger,
assegurando-se às populações tradicionais porventura residentes na área as condições e os
meios necessários para a satisfação de suas necessidades materiais, sociais e culturais.
Art. 29 - Cada unidade de conservação do grupo de Proteção Integral disporá de
um Conselho Consultivo, presidido pelo órgão responsável por sua administração e
constituído por representantes de órgãos públicos, de organizações da sociedade civil, por
proprietários de terras localizadas em Refúgio de Vida Silvestre ou Monumento Natural,
quando for o caso, e, na hipótese prevista no § 2o do art. 42, das populações tradicionais
residentes, conforme se dispuser em regulamento e no ato de criação da unidade.
Art. 30 - As unidades de conservação podem ser geridas por organizações da
sociedade civil de interesse público com objetivos afins aos da unidade, mediante instrumento
a ser firmado com o órgão responsável por sua gestão.
Art. 31 - É proibida a introdução nas unidades de conservação de espécies não
autóctones.
§ 1o - Excetuam-se do disposto neste artigo as Áreas de Proteção Ambiental, as
Florestas Nacionais, as Reservas Extrativistas e as Reservas de Desenvolvimento Sustentável,
bem como os animais e plantas necessários à administração e às atividades das demais
categorias de unidades de conservação, de acordo com o que se dispuser em regulamento e no
Plano de Manejo da unidade.
§ 2o - Nas áreas particulares localizadas em Refúgios de Vida Silvestre e
Monumentos Naturais podem ser criados animais domésticos e cultivadas plantas
considerados compatíveis com as finalidades da unidade, de acordo com o que dispuser o seu
Plano de Manejo.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
173
Art. 32 - Os órgãos executores articular-se-ão com a comunidade científica com o
propósito de incentivar o desenvolvimento de pesquisas sobre a fauna, a flora e a ecologia das
unidades de conservação e sobre formas de uso sustentável dos recursos naturais, valorizandose o conhecimento das populações tradicionais.
§ 1o - As pesquisas científicas nas unidades de conservação não podem colocar em
risco a sobrevivência das espécies integrantes dos ecossistemas protegidos.
§ 2o - A realização de pesquisas científicas nas unidades de conservação, exceto
Área de Proteção Ambiental e Reserva Particular do Patrimônio Natural, depende de
aprovação prévia e está sujeita à fiscalização do órgão responsável por sua administração.
§ 3o - Os órgãos competentes podem transferir para as instituições de pesquisa
nacionais, mediante acordo, a atribuição de aprovar a realização de pesquisas científicas e de
credenciar pesquisadores para trabalharem nas unidades de conservação.
Art. 33 - A exploração comercial de produtos, subprodutos ou serviços obtidos ou
desenvolvidos a partir dos recursos naturais, biológicos, cênicos ou culturais ou da exploração
da imagem de unidade de conservação, exceto Área de Proteção Ambiental e Reserva
Particular do Patrimônio Natural, dependerá de prévia autorização e sujeitará o explorador a
pagamento, conforme disposto em regulamento.
Art. 34 - Os órgãos responsáveis pela administração das unidades de conservação
podem receber recursos ou doações de qualquer natureza, nacionais ou internacionais, com ou
sem encargos, provenientes de organizações privadas ou públicas ou de pessoas físicas que
desejarem colaborar com a sua conservação.
Parágrafo único - A administração dos recursos obtidos cabe ao órgão gestor da
unidade, e estes serão utilizados exclusivamente na sua implantação, gestão e manutenção.
Art. 35 - Os recursos obtidos pelas unidades de conservação do Grupo de Proteção
Integral mediante a cobrança de taxa de visitação e outras rendas decorrentes de arrecadação,
serviços e atividades da própria unidade serão aplicados de acordo com os seguintes critérios:
I - até cinqüenta por cento, e não menos que vinte e cinco por cento, na
implementação, manutenção e gestão da própria unidade;
II - até cinqüenta por cento, e não menos que vinte e cinco por cento, na
regularização fundiária das unidades de conservação do Grupo;
III - até cinqüenta por cento, e não menos que quinze por cento, na implementação,
manutenção e gestão de outras unidades de conservação do Grupo de Proteção Integral.
Art. 36 - Nos casos de licenciamento ambiental de empreendimentos de
significativo impacto ambiental, assim considerado pelo órgão ambiental competente, com
fundamento em estudo de impacto ambiental e respectivo relatório - EIA/RIMA, o
empreendedor é obrigado a apoiar a implantação e manutenção de unidade de conservação do
Grupo de Proteção Integral, de acordo com o disposto neste artigo e no regulamento desta Lei.
174
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§ 1o - O montante de recursos a ser destinado pelo empreendedor para esta
finalidade não pode ser inferior a meio por cento dos custos totais previstos para a
implantação do empreendimento, sendo o percentual fixado pelo órgão ambiental licenciador,
de acordo com o grau de impacto ambiental causado pelo empreendimento.
§ 2o - Ao órgão ambiental licenciador compete definir as unidades de conservação
a serem beneficiadas, considerando as propostas apresentadas no EIA/RIMA e ouvido o
empreendedor, podendo inclusive ser contemplada a criação de novas unidades de
conservação.
§ 3o - Quando o empreendimento afetar unidade de conservação específica ou sua
zona de amortecimento, o licenciamento a que se refere o caput deste artigo só poderá ser
concedido mediante autorização do órgão responsável por sua administração, e a unidade
afetada, mesmo que não pertencente ao Grupo de Proteção Integral, deverá ser uma das
beneficiárias da compensação definida neste artigo.
CAPÍTULO V
DOS INCENTIVOS, ISENÇÕES E PENALIDADES
Art. 37 - (Vetado)
Art. 38 - A ação ou omissão das pessoas físicas ou jurídicas que importem
inobservância aos preceitos desta Lei e a seus regulamentos ou resultem em dano à flora, à
fauna e aos demais atributos naturais das unidades de conservação, bem como às suas
instalações e às zonas de amortecimento e corredores ecológicos, sujeitam os infratores às
sanções previstas em lei.
Art. 39 - Dê-se ao art. 40 da Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, a seguinte
redação:
"Art. 40. (Vetado)
"§ 1o - Entende-se por Unidades de Conservação de Proteção Integral as Estações
Ecológicas, as Reservas Biológicas, os Parques Nacionais, os Monumentos Naturais e os
Refúgios de Vida Silvestre." (NR)
"§ 2o - A ocorrência de dano afetando espécies ameaçadas de extinção no interior
das Unidades de Conservação de Proteção Integral será considerada circunstância agravante
para a fixação da pena." (NR)
"§ 3o - ........................................................................................................................"
Art. 40. Acrescente-se à Lei no 9.605, de 1998, o seguinte art. 40-A:
"Art. 40-A - (Vetado)
175
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"§ 1o - Entende-se por Unidades de Conservação de Uso Sustentável as Áreas de
Proteção Ambiental, as Áreas de Relevante Interesse Ecológico, as Florestas Nacionais, as
Reservas Extrativistas, as Reservas de Fauna, as Reservas de Desenvolvimento Sustentável e
as Reservas Particulares do Patrimônio Natural." (AC)
"§ 2o - A ocorrência de dano afetando espécies ameaçadas de extinção no interior
das Unidades de Conservação de Uso Sustentável será considerada circunstância agravante
para a fixação da pena." (AC)
"§ 3o - Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade." (AC)
Capítulo VI
DAS RESERVAS DA BIOSFERA
Art. 41 - A Reserva da Biosfera é um modelo, adotado internacionalmente, de
gestão integrada, participativa e sustentável dos recursos naturais, com os objetivos básicos de
preservação da diversidade biológica, o desenvolvimento de atividades de pesquisa, o
monitoramento ambiental, a educação ambiental, o desenvolvimento sustentável e a melhoria
da qualidade de vida das populações.
§ 1o - A Reserva da Biosfera é constituída por:
I - uma ou várias áreas-núcleo, destinadas à proteção integral da natureza;
II - uma ou várias zonas de amortecimento, onde só são admitidas atividades que
não resultem em dano para as áreas-núcleo; e
III - uma ou várias zonas de transição, sem limites rígidos, onde o processo de
ocupação e o manejo dos recursos naturais são planejados e conduzidos de modo participativo
e em bases sustentáveis.
§ 2o - A Reserva da Biosfera é constituída por áreas de domínio público ou
privado.
§ 3o - A Reserva da Biosfera pode ser integrada por unidades de conservação já
criadas pelo Poder Público, respeitadas as normas legais que disciplinam o manejo de cada
categoria específica.
§ 4o - A Reserva da Biosfera é gerida por um Conselho Deliberativo, formado por
representantes de instituições públicas, de organizações da sociedade civil e da população
residente, conforme se dispuser em regulamento e no ato de constituição da unidade.
§ 5o - A Reserva da Biosfera é reconhecida pelo Programa Intergovernamental "O
Homem e a Biosfera – MAB", estabelecido pela Unesco, organização da qual o Brasil é
membro.
CAPÍTULO VII
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS E TRANSITÓRIAS
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
176
Art. 42 - As populações tradicionais residentes em unidades de conservação nas
quais sua permanência não seja permitida serão indenizadas ou compensadas pelas
benfeitorias existentes e devidamente realocadas pelo Poder Público, em local e condições
acordados entre as partes.
§ 1o - O Poder Público, por meio do órgão competente, priorizará o reassentamento
das populações tradicionais a serem realocadas.
§ 2o - Até que seja possível efetuar o reassentamento de que trata este artigo, serão
estabelecidas normas e ações específicas destinadas a compatibilizar a presença das
populações tradicionais residentes com os objetivos da unidade, sem prejuízo dos modos de
vida, das fontes de subsistência e dos locais de moradia destas populações, assegurando-se a
sua participação na elaboração das referidas normas e ações.
§ 3o - Na hipótese prevista no § 2o, as normas regulando o prazo de permanência e
suas condições serão estabelecidas em regulamento.
Art. 43 - O Poder Público fará o levantamento nacional das terras devolutas, com o
objetivo de definir áreas destinadas à conservação da natureza, no prazo de cinco anos após a
publicação desta Lei.
Art. 44 - As ilhas oceânicas e costeiras destinam-se prioritariamente à proteção da
natureza e sua destinação para fins diversos deve ser precedida de autorização do órgão
ambiental competente.
Parágrafo único - Estão dispensados da autorização citada no caput os órgãos que
se utilizam das citadas ilhas por força de dispositivos legais ou quando decorrente de
compromissos legais assumidos.
Art. 45 - Excluem-se das indenizações referentes à regularização fundiária das
unidades de conservação, derivadas ou não de desapropriação:
I – (Vetado)
II - (Vetado)
III - as espécies arbóreas declaradas imunes de corte pelo Poder Público;
IV - expectativas de ganhos e lucro cessante;
V - o resultado de cálculo efetuado mediante a operação de juros compostos;
VI - as áreas que não tenham prova de domínio inequívoco e anterior à criação da
unidade.
Art. 46 - A instalação de redes de abastecimento de água, esgoto, energia e infraestrutura urbana em geral, em unidades de conservação onde estes equipamentos são
admitidos depende de prévia aprovação do órgão responsável por sua administração, sem
prejuízo da necessidade de elaboração de estudos de impacto ambiental e outras exigências
legais.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
177
Parágrafo único - Esta mesma condição se aplica à zona de amortecimento das
unidades do Grupo de Proteção Integral, bem como às áreas de propriedade privada inseridas
nos limites dessas unidades e ainda não indenizadas.
Art. 47 - O órgão ou empresa, público ou privado, responsável pelo abastecimento
de água ou que faça uso de recursos hídricos, beneficiário da proteção proporcionada por uma
unidade de conservação, deve contribuir financeiramente para a proteção e implementação da
unidade, de acordo com o disposto em regulamentação específica.
Art. 48 - O órgão ou empresa, público ou privado, responsável pela geração e
distribuição de energia elétrica, beneficiário da proteção oferecida por uma unidade de
conservação, deve contribuir financeiramente para a proteção e implementação da unidade, de
acordo com o disposto em regulamentação específica.
Art. 49 - A área de uma unidade de conservação do Grupo de Proteção Integral é
considerada zona rural, para os efeitos legais.
Parágrafo único - A zona de amortecimento das unidades de conservação de que
trata este artigo, uma vez definida formalmente, não pode ser transformada em zona urbana.
Art. 50 - O Ministério do Meio Ambiente organizará e manterá um Cadastro
Nacional de Unidades de Conservação, com a colaboração do IBAMA e dos órgãos estaduais
e municipais competentes.
§ 1o - O Cadastro a que se refere este artigo conterá os dados principais de cada
unidade de conservação, incluindo, dentre outras características relevantes, informações sobre
espécies ameaçadas de extinção, situação fundiária, recursos hídricos, clima, solos e aspectos
socioculturais e antropológicos.
§ 2o - O Ministério do Meio Ambiente divulgará e colocará à disposição do
público interessado os dados constantes do Cadastro.
Art. 51 - O Poder Executivo Federal submeterá à apreciação do Congresso
Nacional, a cada dois anos, um relatório de avaliação global da situação das unidades de
conservação federais do País.
Art. 52. Os mapas e cartas oficiais devem indicar as áreas que compõem o SNUC.
Art. 53 - O IBAMA elaborará e divulgará periodicamente uma relação revista e
atualizada das espécies da flora e da fauna ameaçadas de extinção no território brasileiro.
Parágrafo único - O IBAMA incentivará os competentes órgãos estaduais e
municipais a elaborarem relações equivalentes abrangendo suas respectivas áreas de
jurisdição.
Art. 54 - O IBAMA, excepcionalmente, pode permitir a captura de exemplares de
espécies ameaçadas de extinção destinadas a programas de criação em cativeiro ou formação
de coleções científicas, de acordo com o disposto nesta Lei e em regulamentação específica.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
178
Art. 55 - As unidades de conservação e áreas protegidas criadas com base nas
legislações anteriores e que não pertençam às categorias previstas nesta Lei serão reavaliadas,
no todo ou em parte, no prazo de até dois anos, com o objetivo de definir sua destinação com
base na categoria e função para as quais foram criadas, conforme o disposto no regulamento
desta Lei.
Art. 56 - (Vetado)
Art. 57 - Os órgãos federais responsáveis pela execução das políticas ambiental e
indigenista deverão instituir grupos de trabalho para, no prazo de cento e oitenta dias a partir
da vigência desta Lei, propor as diretrizes a serem adotadas com vistas à regularização das
eventuais superposições entre áreas indígenas e unidades de conservação.
Parágrafo único - No ato de criação dos grupos de trabalho serão fixados os
participantes, bem como a estratégia de ação e a abrangência dos trabalhos, garantida a
participação das comunidades envolvidas.
Art. 58 - O Poder Executivo regulamentará esta Lei, no que for necessário à sua
aplicação, no prazo de cento e oitenta dias a partir da data de sua publicação.
Art. 59 - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 60 - Revogam-se os arts. 5o e 6o da Lei no 4.771, de 15 de setembro de 1965;
o art. 5o da Lei no 5.197, de 3 de janeiro de 1967; e o art. 18 da Lei no 6.938, de 31 de agosto
de 1981.
Brasília, 18 de julho de 2000; 179o da Independência e 112o da República.
Marco Antonio de Oliveira Maciel
José Sarney Filho
(Publicado no DOU de 19.07.2000)
179
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
ANEXO B – Categorias de unidades de conservação do SNUC
A Lei 9.985, de 18 de julho de 2000, instituiu o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação 247 e definiu, no corpo de seu texto, as doze categorias – cinco Unidades de
Proteção Integral e sete de Uso Sustentável - de que é composto, conforme quadro ilustrativo
a seguir.
Categorias de
Unidade de
Artigos da
Principais Finalidades e Características
Conservação
Lei 9.985 de
2000
Unidades de Proteção Integral
Preservação; pesquisa científica. Propriedade pública,
Estação Ecológica
se particular, faz-se a desapropriação. Visitação
9º
proibida, exceto para fins educacionais. Exemplo:
Estação Ecológica do Panga, MG.
Preservação. Propriedade pública, se particular, faz-se
Reserva Biológica
a desapropriação. Visitação proibida, exceto parta fins
10
educacionais. Exemplo: Poço das Antas, RJ.
Preservação de ecossistemas de grande relevância
Parque Nacional
ecológica e beleza; pesquisa científica; educação
ou Estadual
ambiental; recreação; ecoturismo. Propriedade pública,
11
se particular, faz-se a desapropriação. Visitação é
sujeita a normas. Exemplos: Itatiaia, Tijuca, RJ.
Preservação de sítios naturais raros ou de grande beleza.
Propriedade rural pública, pode ser particular, se compatível
Monumento
com os objetivos da Unidade de Conservação. Visitação é
Natural
sujeita a normas. Permite-se: a exploração florestal, agrícola
12 e 31
ou pecuária, pesca e piscicultura, espécies exóticas, manejo
247
BRASIL. Lei 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1º , incisos I, II, III e VII da
Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras
providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 19 jul. 2000. Disponível em:
<http:// www.sabesp.com.br/legislação/PDF/LF9985.pdf> . Acesso em 13 dez. 2005.
180
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
de fauna. Exemplo: Monumento Natural dos Costões
Rochosos, Rio de Janeiro, RJ.
Proteger ambientes naturais para assegurar a existência
ou reprodução de espécies. Propriedade rural pública,
Refúgio de Vida
pode ser particular, se compatível com os objetivos da
Silvestre
Unidade de Conservação. Visitação é sujeita a normas.
13 e 31
Permite-se: a exploração florestal, agrícola ou pecuária,
pesca e piscicultura, espécies exóticas. Exemplo:
Refúgio de Vida Silvestre do Molhe Leste, RS.
Unidades de Uso Sustentável
Proteger a biodiversidade; disciplinar a ocupação;
assegurar a sustentabilidade. Propriedade pública ou
privada. Área extensa, com certo grau de ocupação
Área de Proteção
humana, possui importantes atributos para qualidade de
Ambiental
vida da população, tais como a existência de infra-
15 e31
estrutura: rural, de lazer, urbana, de transporte,
energética, industrial. Permite-se: exploração florestal,
agrícola ou pecuária, extrativismo, pesca e piscicultura,
espécies exóticas, mineração. Exemplo: Guapimirim,
RJ.
Manter o ecossistema; compatibilizar o uso com a
conservação. Propriedade pública ou privada. Área de
Área de Relevante
pequena extensão, com pouca ou nenhuma ocupação,
Interesse
características naturais extraordinárias ou abrigo de
Ecológico
espécies
raras.
Permite-se:
exploração
16
florestal,
agrícola ou pecuária, extrativismo, pesca, manejo da
fauna. Exemplo: Ilha das Cagarras, RJ.
Pesquisa científica; assegurar o uso sustentável.
Propriedade
Floresta Nacional
pública,
se
particular,
faz-se
a
desapropriação. Floresta de espécies predominante
17 e 31
181
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
nativas, admitida a permanência de populações
ou Estadual
tradicionais.
Permite-se:
extrativismo,
espécies
exploração
exóticas,
florestal,
mineração,
assentamentos humanos, possui infra-estrutura de
transporte
e
industrial
madeireira.
Exemplo:
Seropédica, RJ.
Proteger meios de vida e cultura das populações; assegurar o
uso sustentável. Propriedade pública com uso concedido, se
Reserva
particular, faz-se a desapropriação. Área utilizada por
Extrativista
populações extrativistas tradicionais. Permite-se: exploração
18 e 31
florestal, extrativismo, espécies exóticas, caça, pesca,
espécies exóticas, agricultura e pecuária de subsistência,
assentamentos e vivendas rurais, infra-estrutura de turismo.
Exemplo: Arraial do Cabo, RJ.
Estudar o manejo econômico sustentável de recursos da
Reserva de Fauna
fauna. Propriedade pública, se particular, faz-se a
19
desapropriação. Área com espécies residentes ou
migratórias. Permite o manejo de fauna.
Preservar a natureza; melhoria da qualidade de vida e
exploração de recursos. Propriedade pública, se
Reserva de
particular, faz-se a desapropriação. Abriga populações
Desenvolvimento
tradicionais que exploram recursos naturais de forma
Sustentável
sustentável. Permite atividades tradicionais, tais como:
agricultura
e
pecuária,
exploração
20 e 31
florestal,
extrativismo, caça, pesca, piscicultura, assentamentos
humanos, vivenda rural, infra-estrutura de turismo.
Exemplo: Reserva de Desenvolvimento Sustentável
Mamirauá, AM.
Conservar a biodiversidade. Propriedade particular.
Reserva Particular
Área particular gravada com perpetuidade, por
do Patrimônio
iniciativa do proprietário. Permite-se a pesquisa
Natural
científica e a visitação com objetivos turísticos,
recreativos e educacionais.
desta pesquisa.
Confira o “ANEXO D”
21
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
182
ANEXO C - Normas gerais para criar uma Reserva Particular do Patrimônio Natural
O proprietário interessado em criar uma RPPN, pessoa física ou jurídica, deverá
apresentar, nas Gerências Executivas do IBAMA ou no órgão oficial de meio ambiente do
Estado, a documentação prevista no Decreto nº 5.746, de 5 de abril de 2006, conforme a
seguir.
Esse Decreto regulamenta o art. 21 da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000, que
dispõe sobre o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza. 248
Art. 1º A Reserva Particular do Patrimônio Natural - RPPN é unidade de conservação
de domínio privado, com o objetivo de conservar a diversidade biológica, gravada com
perpetuidade, por intermédio de Termo de Compromisso averbado à margem da inscrição no
Registro Público de Imóveis.
Parágrafo único. As RPPNs somente serão criadas em áreas de posse e domínio
privados.
Art. 2º As RPPNs poderão ser criadas pelos órgãos integrantes do Sistema Nacional de
Unidades de Conservação da Natureza - SNUC, sendo que, no âmbito federal, serão
declaradas instituídas mediante portaria do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis - IBAMA.
Art. 3º O proprietário interessado em ter seu imóvel, integral ou parcialmente,
transformado em RPPN, deverá, no âmbito federal, encaminhar requerimento ao IBAMA,
solicitando a criação da RPPN, na totalidade ou em parte do seu imóvel, segundo o modelo do
Anexo I deste Decreto, e na forma seguinte:
I - o requerimento relativo a propriedade de pessoa física deverá conter a assinatura do
proprietário, e do cônjuge ou convivente, se houver;
II - o requerimento relativo a propriedade de pessoa jurídica deverá ser assinado pelos
seus membros ou representantes com poder de disposição de imóveis, conforme seu ato
constitutivo e alterações posteriores; e
III - quando se tratar de condomínio, todos os condôminos deverão assinar o
requerimento ou indicar um representante legal, mediante a apresentação de procuração.
§ 1º O requerimento deverá estar acompanhado dos seguintes documentos:
I - cópia autenticada das cédulas de identidade dos proprietários; do cônjuge ou
convivente; do procurador, se for o caso, e dos membros ou representantes, quando pessoa
jurídica;
248
BRASIL. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Passos para a criação
de RPPN. Brasília, DF, 2006. Relatório. Disponível em: <http://www.ibama.gov.br>. Acesso em 26 mai. 2006.
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183
II - cópia autenticada dos atos constitutivos e suas alterações, no caso de requerimento
relativo a área de pessoa jurídica;
III - certidão do órgão do Registro de Empresas ou de Pessoas Jurídicas, indicando a
data das últimas alterações nos seus atos constitutivos, no caso de requerimento relativo a área
de pessoa jurídica;
IV - certidão negativa de débitos expedida pelo órgão de administração tributária
competente para arrecadação dos tributos relativos ao imóvel;
V - certificado de Cadastro do Imóvel Rural - CCIR;
VI - três vias do Termo de Compromisso, na forma do Anexo II deste Decreto,
assinadas por quem firmar o requerimento de criação da RPPN;
VII - título de domínio do imóvel no qual se constituirá a RPPN;
VIII - certidão de matrícula e registro do imóvel no qual se constituirá a RPPN,
indicando a cadeia dominial válida e ininterrupta, trintenária ou desde a sua origem;
IX - planta da área total do imóvel indicando os limites; os confrontantes; a área a ser
reconhecida, quando parcial; a localização da propriedade no município ou região, e as
coordenadas dos vértices definidores dos limites do imóvel rural e da área proposta como
RPPN, georreferenciadas de acordo com o Sistema Geodésico Brasileiro, indicando a base
cartográfica utilizada e assinada por profissional habilitado, com a devida Anotação de
Responsabilidade Técnica - ART; e
X - memorial descritivo dos limites do imóvel e da área proposta como RPPN, quando
parcial, georreferenciado, indicando a base cartográfica utilizada e as coordenadas dos
vértices definidores dos limites, assinado por profissional habilitado, com a devida ART.
§ 2º A descrição dos limites do imóvel, contida na certidão comprobatória de
matrícula do imóvel e no seu respectivo registro, deverá indicar, quando possível, as
coordenadas do ponto de amarração e dos vértices definidores dos limites do imóvel rural
georreferenciadas, conforme especificações do Sistema Geodésico Brasileiro.
Art. 4º As propostas para criação de RPPN na zona de amortecimento de outras
unidades de conservação e nas áreas identificadas como prioritárias para conservação terão
preferência de análise.
Art. 5º A criação da RPPN dependerá, no âmbito federal, da avaliação pelo IBAMA,
que deverá:
I - verificar a legitimidade e a adequação jurídica e técnica do requerimento, frente à
documentação apresentada;
II - realizar vistoria do imóvel, de acordo com os critérios estabelecidos no Anexo III
deste Decreto;
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
184
III - divulgar no Diário Oficial da União a intenção de criação da RPPN; disponibilizar
na internet, pelo prazo de vinte dias, informações sobre a RPPN proposta, e realizar outras
providências cabíveis, de acordo com o § 1o do art. 5o do Decreto no 4.340, de 22 de agosto
de 2002, para levar a proposta a conhecimento público;
IV - avaliar, após o prazo de divulgação, os resultados e implicações da criação da
unidade, e emitir parecer técnico conclusivo que, inclusive, avaliará as propostas do público;
V - aprovar ou indeferir o requerimento, ou, ainda, sugerir alterações e adequações à
proposta;
VI - notificar o proprietário, em caso de parecer positivo, para que proceda à
assinatura do Termo de Compromisso, e averbação deste junto à matrícula do imóvel afetado,
no Registro de Imóveis competente, no prazo de sessenta dias contados do recebimento da
notificação; e
VII - publicar a portaria referida no art. 2o deste Decreto, após a averbação do Termo
de Compromisso pelo proprietário, comprovada por certidão do Cartório de Registro de
Imóveis.
Parágrafo único. Depois de averbada, a RPPN só poderá ser extinta ou ter seus limites
recuados na forma prevista no art. 22 da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000.
Art. 6º No processo de criação de RPPN, no âmbito federal, não serão cobradas do
interessado taxas ou qualquer tipo de exação referente aos custos das atividades específicas do
IBAMA.
Art. 7º Para fins de composição de cadastro, a comunicação da criação de RPPNs
pelos demais entes federados ao IBAMA disponibilizará, dentre os elementos previstos no §
1o do art. 50 da Lei no 9.985, de 2000, o Termo de Compromisso e a planta de localização, se
possível georreferenciada.
Art. 8º A área criada como RPPN será excluída da área tributável do imóvel para fins
de cálculo do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural - ITR, de acordo com a norma do
art. 10, § 1o, inciso II, da Lei no 9.393, de 19 de dezembro de 1996.
Art. 9º O descumprimento das normas legais, constantes deste Decreto e do Termo de
Compromisso, referentes à RPPN, sujeitará o proprietário às sanções da lei desde a assinatura
do referido Termo.
Parágrafo único. A partir da averbação do Termo de Compromisso no Cartório de
Registro de Imóveis, ninguém mais poderá alegar o desconhecimento da RPPN.
Art. 10. A RPPN poderá ser criada em propriedade hipotecada, desde que o
proprietário apresente anuência da instituição credora.
Art. 11. A RPPN poderá ser criada abrangendo até trinta por cento de áreas para a
recuperação ambiental, com o limite máximo de mil hectares, a critério do órgão ambiental
competente, observado o parecer técnico de vistoria.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
185
§ 1º A eventual utilização de espécies exóticas preexistentes, quando do ato de criação
da RPPN, deverá estar vinculada a projetos específicos de recuperação previstos e aprovados
no plano de manejo.
§ 2º Os projetos de recuperação somente poderão utilizar espécies nativas dos
ecossistemas onde está inserida a RPPN.
Art. 12. Não será criada RPPN em área já concedida para lavra mineira, ou onde já
incida decreto de utilidade pública ou de interesse social incompatível com os seus objetivos.
Art. 13. A RPPN poderá ser criada dentro dos limites de Área de Proteção AmbientalAPA, sem necessidade de redefinição dos limites da APA.
Art. 14. A RPPN só poderá ser utilizada para o desenvolvimento de pesquisas
científicas e visitação com objetivos turísticos, recreativos e educacionais previstas no Termo
de Compromisso e no seu plano de manejo.
Art. 15. O plano de manejo da RPPN deverá, no âmbito federal, ser aprovado pelo
IBAMA.
Parágrafo único. Até que seja aprovado o plano de manejo, as atividades e obras
realizadas na RPPN devem se limitar àquelas destinadas a garantir sua proteção e a pesquisa
científica.
Art. 16. Não é permitida na RPPN qualquer exploração econômica que não seja
prevista em lei, no Termo de Compromisso e no plano de manejo.
Art. 17. Somente será admitida na RPPN moradia do proprietário e funcionários
diretamente ligados a gestão da unidade de conservação, conforme dispuser seu plano de
manejo.
Parágrafo único. Moradias e estruturas existentes antes da criação da RPPN e aceitas
no seu perímetro poderão ser mantidas até a elaboração do plano de manejo, que definirá sua
destinação.
Art. 18. A pesquisa científica em RPPN deverá ser estimulada e dependerá de
autorização prévia do proprietário.
§ 1o A realização de pesquisa científica independe da existência de plano de manejo.
§ 2º O plano de manejo deverá indicar as prioridades de pesquisa e, se envolver coleta,
os pesquisadores deverão adotar os procedimentos exigidos na legislação pertinente.
Art. 19. A reintrodução de espécies silvestres em RPPN somente será permitida
mediante estudos técnicos e projetos específicos, aprovados pelo órgão ambiental competente,
que comprovem a sua adequação, necessidade e viabilidade.
Art. 20. A soltura de animais silvestres em RPPN será permitida mediante autorização
do órgão ambiental competente e de avaliação técnica que comprove, no mínimo, a
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
186
integridade e sanidade físicas dos animais e sua ocorrência natural nos ecossistemas onde está
inserida a RPPN.
§ 1º Identificado algum desequilíbrio relacionado à soltura descrita no caput deste
artigo, a permissão será suspensa e retomada somente após avaliação específica.
§ 2º O órgão ambiental competente organizará e manterá cadastro das RPPNs
interessadas em soltura de animais silvestres, orientando os proprietários e técnicos de RPPN
sobre os procedimentos e critérios a serem adotados.
Art. 21. É vedada a instalação de qualquer criadouro em RPPN, inclusive de espécies
domésticas.
Parágrafo único. Excetuam-se da proibição prevista no caput deste artigo os
criadouros científicos vinculados a planos de recuperação de populações de animais silvestres
localmente ameaçados, ou de programas de repovoamentos de áreas por espécies em declínio
na região, de acordo com estudos técnicos prévios aprovados pelo órgão ambiental
competente.
Art. 22. Será permitida a instalação de viveiros de mudas de espécies nativas dos
ecossistemas onde está inserida a RPPN, quando vinculadas a projetos de recuperação de
áreas alteradas dentro da unidade de conservação.
Parágrafo único. Será permitida a coleta de sementes e outros propágulos no interior da RPPN
exclusivamente para a atividade prevista no caput deste artigo.
Art. 23. No exercício das atividades de vistoria, fiscalização, acompanhamento e
orientação, os órgãos ambientais competentes, diretamente ou por prepostos formalmente
constituídos, terão livre acesso à RPPN.
Art. 24. Caberá ao proprietário do imóvel:
I - assegurar a manutenção dos atributos ambientais da RPPN e sinalizar os seus
limites, advertindo terceiros quanto a proibição de desmatamentos, queimadas, caça, pesca,
apanha, captura de animais e quaisquer outros atos que afetem ou possam afetar a integridade
da unidade de conservação;
II - submeter, no âmbito federal, à aprovação do IBAMA o plano de manejo da
unidade de conservação, em consonância com o previsto no art. 15 deste Decreto; e
III - encaminhar, no âmbito federal, anualmente ao IBAMA, e sempre que solicitado,
relatório da situação da RPPN e das atividades desenvolvidas.
Art. 25. Caberá, no âmbito federal, ao IBAMA:
I - definir critérios para elaboração de plano de manejo para RPPN;
II - aprovar o plano de manejo da unidade de conservação;
III - manter cadastro atualizado sobre as RPPNs, conforme previsto no art. 50 da Lei
no 9.985, de 2000;
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187
IV - vistoriar as RPPNs periodicamente e sempre que necessário;
V - apoiar o proprietário nas ações de fiscalização, proteção e repressão aos crimes
ambientais; e
VI - prestar ao proprietário, sempre que possível e oportuno, orientação técnica para
elaboração do plano de manejo.
Parágrafo único. O IBAMA, no âmbito federal, poderá credenciar terceiros com a
finalidade de verificar se a área está sendo administrada de acordo com os objetivos
estabelecidos para a unidade de conservação e seu plano de manejo.
Art. 26. O representante legal da RPPN será notificado ou autuado pelo IBAMA, no
âmbito federal, com relação a danos ou irregularidades praticadas na RPPN.
Parágrafo único. Constatada alguma prática que esteja em desacordo com as normas e
legislação vigentes, o infrator estará sujeito às sanções administrativas previstas em
regulamento, sem prejuízo da responsabilidade civil ou penal.
Art. 27. Os projetos referentes à implantação e gestão de RPPN terão análise
prioritária para concessão de recursos oriundos do Fundo Nacional do Meio Ambiente FNMA e de outros programas oficiais.
Art. 28. Os programas de crédito rural regulados pela administração federal priorizarão
os projetos que beneficiem propriedade que contiver RPPN no seu perímetro, de tamanho
superior a cinqüenta por cento da área de reserva legal exigida por lei para a região onde se
localiza, com plano de manejo da RPPN aprovado.
Art. 29. No caso de empreendimento com significativo impacto ambiental que afete
diretamente a RPPN já criada, o licenciamento ambiental fica condicionado à prévia consulta
ao órgão ambiental que a criou, devendo a RPPN ser uma das beneficiadas pela compensação
ambiental, conforme definido no art. 36 da Lei no 9.985, de 2000, e no art. 33 do Decreto no
4.340, de 2002.
§ 1º É vedada a destinação de recursos da compensação ambiental para RPPN criada
após o início do processo de licenciamento do empreendimento.
§ 2º Os recursos provenientes de compensação ambiental deverão ser empregados na
preservação dos recursos ambientais da RPPN.
Art. 30. No caso da RPPN estar inserida em mosaico de unidades de conservação, o
seu representante legal tem o direito de integrar o conselho de mosaico, conforme previsto no
art. 9º do Decreto no 4.340, de 2002.
Art. 31. Ao proprietário de RPPN é facultado o uso da logomarca do IBAMA nas
placas indicativas e no material de divulgação e informação sobre a unidade de conservação,
bem como dos demais órgãos integrantes do SNUC, caso autorizado.
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
188
Art. 32. O Decreto no 1.922, de 5 de junho de 1996, regulará apenas as RPPNs
constituídas até a vigência deste Decreto, exceto nos casos de reformulação ou aprovação de
novo plano de manejo.
Art. 33. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 5 de abril de 2006; 185o da Independência e 118o da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Marina Silva
189
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ANEXO D – Lista das RPPNs por Estado
A seguir, tem-se a lista das RPPNs brasileiras (federais), catalogadas por Estado e
sistematizadas a partir de informações obtidas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Hídricos. 249
Estado: Acre (1 RPPN; 38,01 ha)
ANO
2000
RPPN
Santuário Ecológico Amazônia Viva
MUNICIPIO
Rio Branco
ÁREA (ha)
38,01
Estado: Estado: Alagoas (7 RPPNs; Total: 610, 58 ha)
ANO
1992
1994
1995
2001
2001
2001
2001
RPPN
Vera Cruz
Fazenda Rosa do Sol
Fazenda São Pedro
Fazenda Lula do Lobo I
Fazenda Pereira
Gulandim
Reserva Santa Tereza
MUNICIPIO
Chã Preta
Barra de São Miguel
Pilar
Coruripe
Coruripe
Teotônio Vilela
Atalaia
ÁREA (ha)
115,00
15,50
50,00
68,50
219,91
41,00
100,52
Estado: Amapá (5 RPPNs; Total: 10.113,97 ha)
ANO
RPPN
MUNICIPIO
1997
1998
1998
1998
Reserva Retiro Paraíso
Retiro Boa Esperança
Lote Urbano
Seringal Triunfo
2000
Aldeia Ekinox
Macapá
Porto Grande
Santana
Ferreira Gomes e Porto
Grande
Macapá
ÁREA
(ha)
46,75
43,01
17,18
9.996,16
10,87
Estado: Estado: Amazonas (13 RPPNs; Total: 598,46 ha)
ANO
1995
1995
249
RPPN
Nazaré das Lajes e Lajes
Bela Vista
MUNICIPIO
Manaus
Manaus
ÁREA (ha)
52,06
27,35
BRASIL. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Relatório resumido
das RPPN por Estado. Brasília, DF, 2006. Relatório. Disponível em: <http://www.ibama.gov.br>. Acesso em
26 mai. 2006.
190
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
1996
1997
1998
1998
1998
2000
2001
2001
2001
2001
2001
Sitio Morada do Sol
Estância Rivas
Santuário
Adão e Eva
Sítio Bela Vista
Laço de Amor
Reserva Sol Nascente
Morada do Sol e da Lua
Fazenda Betel
Reserva dos Arqueiros
Reserva Quatro Elementos
Presidente Figueiredo
Presidente Figueiredo
Presidente Figueiredo
Presidente Figueiredo
Presidente Figueiredo
Manaus
Presidente Figueiredo
Presidente Figueiredo
Presidente Figueiredo
Presidente Figueiredo
Presidente Figueiredo
43,55
100,00
60,00
100,00
63,00
8,00
20,00
7,00
67,50
25,00
25,00
MUNICIPIO
Queimadas
Caravelas
Simão Filho
Itapebi
Ibotirama
Ubaíra
Entre Rios
Ribeira do Pombal
Ilhéus
Ilhéus
Jussarí
Malhada
Malhada
Malhada
Palmas de Monte Alto
Malhada
Itabela
Porto Seguro
Itacaré
Malhada
Malhada
Ilhéus
Una
Uruçuca
São Sebastião do Passé
Queimadas
Uruçuca
Caravelas
Piraí do Norte
Cachoeira
ÁREA (ha)
726,00
469,10
86,96
100,00
1.259,20
5,00
1.377,33
5,00
25,00
118,00
200,00
1.500,00
2.000,00
1.800,00
1.000,00
3.000,00
47,00
6.069,00
110,00
1.500,00
1.700,00
10,00
83,28
4,70
216,00
110,00
26,00
31,00
450,02
257,00
Ibicaraí
Palmeiras
95,00
50,00
Estado: Bahia (54 RPPNs; Total: 33.673,04 ha)
ANO
1990
1990
1990
1991
1992
1994
1996
1996
1997
1997
1997
1997
1997
1997
1998
1998
1998
1998
1998
1998
1998
1998
1999
1999
2000
2000
2000
2000
2000
2000
2000
2000
RPPN
Fazenda Morrinhos
Fazenda Avaí
Fazenda Coqueiros
Fazenda Itacira
Fazenda Pé de Serra
Fazenda Kaybi
Fazenda Lontra/Saudade
Fazenda Flor de Liz
Fazenda São João
Reserva Salto Apepique
Reserva Nat. da Serra do Teimoso
Fazenda Boa Vista
Fazenda Boa Vista
Fazenda Forte
Lagoa das Campinas
Fazenda Retiro
Fazenda Pindorama
Reserva Estação Veracruz
Araçari
Fazenda Forte
Fazenda Boa Vista
Fazenda Arte Verde
Ecoparque de Una
Fazenda Sossego
Reserva Panema
Fazenda Piabas
Fazenda Paraíso
Lagoa do Peixe
Reserva Fugidos
São Joaquim da Cabonha Apa I, Apa
II
Estância Manacá
Córrego dos Bois
191
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
2000
2000
2001
2001
2001
2001
2001
2001
2001
2001
2002
2002
2002
2002
2002
2002
2003
2004
2004
2004
2004
2006
Fazenda Água Branca
Fazenda Boa Aventura
Reserva Caroá
Portal Curupira
Agda
São Francisco da Trijunção
Mata Atlântica a Manona
Guara
Guara I e II
Dunas de Santo Antônio
Reserva da Peninha
Lagoa do Formoso
Adilia Paraguaçu Batista
Juerama
Cajueiro
Carroula
Fazenda Ararauna
Rio Capitão
Pedra do Sabiá
Das Dunas
Mãe da Mata
Rio dos Monos
Valença
Igaratí
Santana
Porto Seguro
Pojuca
Cocos
Porto Seguro
Cocos
Cocos
Mata de São João
Cachoeira
Cocos
Mucugê
Maraú
Esplanada
Prado
Una
Itacaré
Itacaré
Camaçari
Ilhéus
Barra do Choça
97,00
4.750,00
220,00
50,00
13,39
162,00
7,00
1.050,00
633,00
370,72
350,00
502,00
70,00
27,00
379,00
15,00
39,00
385,49
22,00
78,00
13,00
8,85
MUNICIPIO
Parambu
Amontada
Itapipoca
Quixadá
Barbalha
Crateús
General Sampaio
Serra de Aratanha
Quixeramobim
Crateús
ÁREA (ha)
2.610,00
50,00
464,33
300,00
27,81
4.749,58
200,00
263,17
441,00
494,50
Estado: Ceará (10 RPPNs; Total: 9.600,39 ha)
ANO
1991
1993
1994
1998
1999
2000
2000
2001
2001
2002
RPPN
Fazenda Olho D'água do Urucu
Mercês Sabiaquaba e Nazário
Sítio Ameixas
Não Me Deixes
Arajara Park
Reserva Serra das Almas
Ambientalista Francy Nunes
Monte Alegre
Rio Bonito
Serra das Almas II
Estado: Distrito Federal (4 RPPNs; Total: 138,22 ha)
ANO
1997
1999
1999
2001
RPPN
Chakra Grisu
Santuário Ecológico Sonhem
Maria Velha
Reserva Córrego da Aurora
MUNICIPIO
Brasília
Brasília
Brasília
Brasília
ÁREA (ha)
1,00
126,00
8,00
3,22
192
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
Estado: Espírito Santo (3 RPPNs; Total: 574,22ha)
ANO
1998
1998
2001
RPPN
Fazenda Cafundó
Fazenda Santa Cristina
Fazenda Sayonara
MUNICIPIO
Cachoeiro do Itapemirim
Montanha
Conceição da Barra
ÁREA (ha)
517,00
29,22
28,00
MUNICIPIO
Pirenópolis
Itaberaí
Goiânia
Palmeiras de Goiás
Cristalina
Alto Paraíso
Pirenópolis
Alto Paraíso
Alto Paraíso
Pirenópolis
Cristalina
Cristalina
Alto Paraíso
Paraúna
Serranopólis
Pirenópolis
Aruanã
Alto Paraíso
Padre Bernardo
Pirenópolis
ÁREA (ha)
17,00
7,20
5,00
2.178,00
469,44
7.500,82
800,00
600,00
612,00
390,00
143,00
636,00
110,00
269,14
175,00
65,20
1.058,19
60,16
80,00
43,31
Cidade Ocidenta
Cocalzinho
Alto Paraíso
Hidrolândia
l5,04
108,25
975,00
13,22
Planaltina de Goiás
Planaltina de Goiás
Santo Antonio do
Descoberto
Nova Crixás
Teresopólis
Planaltina
Luziânia
Alto Paraíso
100,19
48,98
2,90
Estado: Goiás (44 RPPNs; Total: 21.962,95 ha)
ANO
1990
1991
1992
1992
1994
1994
1995
1996
1996
1996
1997
1997
1997
1997
1998
1998
1998
1998
1998
1998
2000
2000
2000
RPPN
Fazenda Vaga Fogo Boa Vista
Fazenda Santa Luzia
Chácara Mangueiras
Fazenda Palmeira
Linda Serra dos Topázios
Fazenda Campo Alegre
Fazenda Arruda
Vale Encantado da Cach. dos Cristais
Fazenda Brancas Terra dos Anões
Fazenda Gleba Vargem Grande I
Fazenda Vereda do Gato
Fazenda Pindorama
Fazenda Mata Funda
Fazenda Jaquanêz
Reserva Pousada das Araras
Reserva Santuário de Gabriel
Reserva Boca da Mata
Vale dos Sonhos
Fazenda Cachoeirinha
Santuário de Vida Silv. Flor das
Águas
Sítio Estrela Dalva
Fazenda Cachoeira Boa Vista
Cara Preta
Res.Amb. de Educ. e Pesq. Banana
Menina
Cachoeira do Profeta
Bacia do Ribeirão Cocal
João de Barro
2000
2000
2001
2001
2001
Pontal do Jaburu
Reserva Fazenda Santa Branca
Apa da Lagoa
Reserva Itapuã
Vita Parque
1998
1998
1999
1999
2.904,00
36,26
125,19
74,94
23,26
193
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
2001
2001
2001
2001
2001
2001
2002
2002
2005
2005
2005
2005
Reserva Cachoeira das Andorinhas
Reserva Ecológica Serra Dourada
Terra do Segredo
Escarpas do Paraíso
Reserva Santa Mônica
Fazenda Bom Sucesso
Reserva Ecológica Rio Vermelho
Biosantuário Trajeto do Cerrado
Varanda da Serra
Vale das Araras
Soluar
Cachoeira das Pedras Bonitas
Aporé
Trombas
Alto Paraíso
Alto Paraíso
Corumbá
Goianapólis
Britânia
Cocalzinho
Cavalcante
Cavalcante
Cavalcante
Colinas
29,04
136,54
40,00
82,71
215,03
14,11
1.592,59
48,40
1,42
31,75
42,48
92,19
Estado: Maranhão (11 RPPNs; Total: 3.738,27 ha)
ANO
1990
1994
1996
1997
1997
1998
1998
1999
1999
2001
2001
RPPN
Sitio Jaguarema
Estiva
Fazenda São José Gleba Itinga
Fazenda São Francisco
Fazenda Boa Esperança
Jaguarema
Fazenda Sto Antonio do Pindaré 1
Ilha do Caju
Fazenda Pantanal
Estância Pedreiras
Amoreira
MUNICIPIO
São José do Ribamar
São Benedito do Rio Preto
Açailândia
Bacabal
São Luiz
São Luiz
Açailândia
Araioses
Codó
São Luiz
Rosário
ÁREA (ha)
7,68
116,57
704,79
150,00
75,00
2,63
2.151,83
102,00
40,76
38,01
349,00
Estado: Mato Grosso (15 RPPNs; Total: 172.980,67 ha)
ANO
1997
1997
1997
1997
1997
1998
2000
2001
2002
2002
2002
2002
2002
2004
2004
RPPN
Estância Ecológica Sesc - Pantanal
Parque Ecológico João Basso
Lote Cristalino
Fazenda Terra Nova
Fazenda Estância Dorochê
Estância Ecológica Sesc - Pantanal
Reserva Ecológica da Mata Fria
Reserva Jubran (Pantanal)
Rama
Reserva Ecol. Verde Amazônia
Reserva Ecológica José Gimenes
Soares
Reserva Ecológica Lourdes Felix
Soares
Reserva Ecol. América Amazônica
Hotel Mirante
Fazenda São Luiz
MUNICIPIO
Barão de Melgaço
Rondonópolis
Alta Floresta
São José do Xingu
Poconé
Barão de Melgaço
Chapada dos Guimarães
Caceres
Água Boa
Apiacás
Nova Canaã do Norte
ÁREA (ha)
49.485,72
3.624,57
670,00
1.542,50
26.518,00
38.385,72
9,95
35.531,00
400,00
10.650,67
200,00
Nova Canaã do Norte
800,00
Apiacás
Chapada dos Guimarães
Cuiabá
4.942,75
19,79
200,00
194
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
Estado: Mato Grosso do Sul (15 RPPNs; Total: 67.840,68 ha)
ANO
1990
1991
1993
1994
1994
1994
1996
1997
1997
2000
2000
2001
2001
2002
2002
RPPN
Fazenda Lageado
Estãncia Santa Inês
Fazenda Trevo
Fazendinha
Fazenda Singapura
Fazenda América
Fazenda Boqueirão
Fazenda Penha
Fazenda Acurizal
Fazenda Margarida
Fazenda Santa Helena
Fazenda Capão Bonito
Fazenda Floresta Negra
Fazenda Arara Azul
Paculândia
MUNICIPIO
Dois Irmãos do Buriti
Campo Grande
Bonito
Aquidauana
Bonito
Bonito
Bonito
Corumbá
Corumbá
Bela Vista
Corumbá
Maracaju
Sete Quedas
Corumbá
Corumbá
ÁREA (ha)
12.550,00
132,00
27,85
9.619,00
456,00
401,00
173,60
13.100,00
13.200,00
1.999,18
4.295,32
683,67
971,06
2.000,00
8.232,00
Estado: Minas Gerais (67 RPPNs; Total: 32.339,39 ha)
ANO
1990
1992
1992
1993
1993
1993
1994
1994
1994
RPPN
Fazenda Vereda Grande
Fazenda Caetano - Santo Agostinho
Fazenda Pedra Bonita
Monlevade
Fazenda Catingueiro I
Fazenda Catingueiro II
Santuário Caraça
Sitio São Domingos/Agartha
Fazenda Macedônia
1995
1995
1995
1995
1995
1997
1997
1997
1997
1997
1997
1997
Alto da Boa Vista
Sitio Grimpas
Unidade De Cons Galheiros
Fazenda Samoinho
Fazenda João Pereira
Mata da Cruz
Reserva Ecológica Panga
Reserva da Cachoeira
Sítio Sannyasim
Sítio Estrela da Serra
Fazenda do Lobo
Fazenda Cachoeira
MUNICIPIO
Presidente Olegário
Paracatu
São João Nepomuceno
João Monlevade
Lagoa da Prata
Lagoa da Prata
Santa Bárbara
Espera Feliz
Santo Antonio do Ipaba e
Iapu
Descoberto
Brumadinho
Perdizes
Igaratinga
Congonhas
Conceição do Pará
Uberlândia
Santana do Riacho
Descoberto
Olaria
São Roque de Minas
Serra do Salitre
ÁREA (ha)
2.994,80
1.184,00
33,00
518,70
50,30
39,23
10.187,89
1,50
560,00
96,00
2,00
2.694,73
12,50
336,73
3,50
409,50
58,30
5,40
30,10
74,00
122,00
195
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
1997
1997
1997
1997
1997
1997
1998
1998
1998
1998
1998
1998
1998
1998
1999
1999
1999
1999
1999
1999
1999
1999
1999
1999
1999
2000
2000
2000
2000
Fazenda Bom Jardim
Reserva do Jacob - Fazenda Limeira
Mata da Califórnia
Fazenda Gana
Fazenda Do Sino
Fazenda Chacrinha
Apa de Proteção do Res. de Juramento
Vila Ana Angélica
Sítio São Francisco
Mato Virgem do Logradouro
Estação Biológica Mata do Sossego
Fazenda Serrote
Fazenda Ressaca
Fazenda Morro da Cruz das Almas
Ly e Cléo
Alto da Boa Vista
Sítio Raio Solar
Fazenda Cruzeiro
Usina Maurício
Mitra do Bispo
Sítio Cerro das Acácias
Fazenda Alto da Boa Vista
Fazenda Caetano
Fazenda Barra do Pirapetinga
Fazenda Iracambi
Reserva Ecol. Fundação Rocha Loures
Segredo das Águas
Nave da Esperança
Reserva Sarandi
2000
2000
2001
Sítio Pirilampo
Fazenda da Serra
Comodato Reserva de Peti
2001
2001
2001
2001
2001
2001
Cachoeira do Cerradão
Cabeceira das Flores
Feliciano Miguel Abdala - Ebc
Poço Fundo
Panelão dos Muriquis
Parque Arq. da Serra do Santo
Antônio
Reserva Pé da Laje
Itajuru ou Sobrado
Semente do Arco Íris
Dos Feixos
Brejo Novo
Mata do Bugio
Vila Amanda
Reserva Arara Vermelha
2001
2002
2002
2002
2002
2004
2005
2005
Matozinhos
Nova Ponte
Salto da Divisa
Tupaciguara
Betim
Coração De Jesus
Juramento
Antonio Dias
Congonhas
Corinto
Simonésia
Ibiá
Manga
Paracatu
Monte Sião
Descoberto
Extrema
Diamantina
Itamarati De Minas
Bocaina
São João Nepomuceno
Bocaina de Minas
Paracatu
Piranga
Rosário da Limeira
Unaí
Pote
Aiuruca
Santa Bárbara do Monte
Verde
Ijaci
Lima Duarte
São Gonçalo do Rio
Abaixo
São Roque de Minas
Paineiras
Caratinga
Congonhas
Fervedouro
Andrelândia
172,80
358,33
155,40
93,36
16,20
34,00
3.108,00
45,93
7,50
25,37
133,74
493,00
4.055,00
73,44
1,47
22,00
28,69
180,00
303,75
35,00
1,00
55,00
1.420,65
21,94
70,00
300,00
15,00
27,37
3,50
Cláudio
Santa Bárbara
Toledo
Nova Lima
Santos Dumont
Rio Novo
Paraopeba
Arinos
1,10
43,06
1,65
2,10
18,35
35,22
34,18
248,45
2,00
22,48
96,41
37,70
28,32
957,58
90,00
40,17
9,00
196
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
Estado: Pará (5 RPPNs; Total: 2.806,00 ha)
ANO
1993
1998
1999
2000
2005
RPPN
Nadir Júnior
Fazenda Pioneira
Tibiriçá
Sumaúma
Reserva Klagesi
MUNICIPIO
Mojú
Marabá
Marabá
Barcarena
Santo Antonio do Tauá
ÁREA (ha)
2.000,00
400,00
400,00
6,00
23,00
MUNICIPIO
São João do Cariri
São José dos Cordeiros
Santa Rita
Sapé
Santa Terezinha
Araruna
Solânea
Catingueira
ÁREA (ha)
750,00
3.505,00
1.058,62
266,53
325,00
390,66
170,00
186,31
MUNICIPIO
Tibagi
Palmeira
Guaraqueçaba
General Carneiro
Guaraqueçaba
Seges e Itararé
Arapotí
Nova Laranjeiras e Rio
Bonito do Iguaçur
Morretis
Bocaiuva
Lapa
ÁREA (ha)
400,00
153,17
819,18
115,00
400,78
507,50
218,05
5.151,00
Estado: Paraíba (8 RPPNs; Total: 6.652,62 ha)
ANO
1990
1990
1994
1995
1998
1998
1999
2000
RPPN
Fazenda Santa Clara
Fazenda Almas
Engenho Gargaú
Fazenda Pacatuba
Fazenda Tamanduá
Fazenda Várzea
Fazenda Pedra de Água
Major Badú Loureiro
Estado: Paraná (11 RPPNs; Total: 7.932,19 ha)
ANO
1997
1994
1994
1999
1999
1999
2000
2001
2002
2002
2004
RPPN
Fazenda Primavera
Fazenda Alegrete
Fazenda Figueira
Das Araucárias
Reserva Ecológica Sebuí
Vale do Corisco
Fazenda Barra Mansa
Reserva Particular Corredor do
Iguaçu I
Sítio do Bananal
Sítio Monte Ararat
Urú
28,84
10,00
128,67
197
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
Estado: Pernambuco (7 RPPNs; Total: 2.560,52 ha)
ANO
1997
2000
2000
2001
2002
2002
2002
RPPN
Reserva Ecológica Maurício Dantas
Nossa Senhora do Oiteiro
Maracaípe
Frei Caneca
Fazenda Santa Beatriz do Carnijó
Reserva Cabanos
Reserva Natural Brejo
Cantidiano Valgueiro de C. Barros
MUNICIPIO
Floresta e Betânia
Ipojuca
ÁREA (ha)
1.485,00
76,20
Jaqueira
Moreno
Altinho
Saloá/Dist. de Iatecá
Floresta
630,43
25,50
6,00
52,39
285,00
MUNICIPIO
Canavieira
Altos
Buriti dos Lopes
Teresina
Castelo do Piaui
Piracuruc
ÁREA (ha)
27.458,00
579,78
139,68
238,00
5.096,86
179,15
Estado: Piauí (6 RPPNs; Total: 33.691,47 ha)
ANO
1997
1998
1999
1999
2000
2004
RPPN
Fazenda Boqueirão
Fazenda Boqueirão dos Frades
Fazenda Centro
Santa Maria de Tapuã
Marvão
Recanto da Serra Negra
Estado: Rio de Janeiro (41 RPPNs; Total: 4.258.35 ha)
ANO
1991
1992
1992
1993
1993
1993
1994
1994
1996
1996
1996
1997
1997
1998
1998
1998
1999
1999
1999
1999
RPPN
Fazenda Roça Grande
Sítio Poranga
Sítio Angaba
Fazenda Bom Retiro
Fazenda Córrego da Luz
Pedra dos Amarilis
Ceflusmme
Fazenda Arco Iris
Sítio Santa Fé
Granja Redenção
Fazenda Santa Izabel
Sítio Cachoeira Grande
Fazenda Limeira
Sítio Shangrilah
Maria Francisca Guimarães
Gleba o Saquinho de Itapirapuã
Do Sítio Santa Cruz
Fazenda Suspiro
Fazenda São Geraldo
Sítio Granja São Jorge
MUNICIPIO
Rio Claro
Itaguaí
Itaguaí
Casimiro de Abreu
Casimiro de Abreu
Petrópolis
Rio De Janeiro
Silva Jardim
Silva Jardim
Silva Jardim
Mangaratiba
Silva Jardim
Petrópolis
Macaé
Teresopólis
Angra dos Reis
Mendes
Teresopólis
Valença
Rio de Janeiro
ÁREA (ha)
63,70
34,00
29,00
472,00
20,00
39,64
3,40
45,86
14,31
33,80
525,00
14,00
18,73
86,00
1,02
3,97
46,80
18,21
173,00
2,60
198
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
1999
1999
1999
1999
1999
1999
2000
2000
2000
2001
2001
2001
2002
2002
2002
2002
2002
2002
2004
2004
2005
El Nagual
Fazenda Barra do Sana
Fazenda Cachoeirinha
Reserva Querência
Reserva Jornalista Antenor Novaes
Reserva Ce. Ecol. Met. Ana Gonzaga
Sítio Fim da Picada
Reserva Mato Grosso
Reserva União
Floresta Alta
Gaviões
Fazenda São Benedito
Sec/Tinguá
Sítio Paiquerê
Gaia
Reserva Porangaba
Fattoria Grigea
Nossa Senhora Das Graças
Serra Grande
Sítio Azul
Graziela Maciel Barroso
Majé
Macaé
Mangaratiba
Magé
Eng. Paulo de Frontin
Rio de Janeiro
Rio Claro
Saquarema
Silva Jardim
Silva Jardim
Silva Jardim
Rio Claro
Tinguá
Nova Iguaçu
Bom Jardim
Itaguaí
Nova Friburgo
Rio Claro
Silva Jardim
Nova Friburgo
Petrópolis
17,20
162,40
650,00
6,30
125,00
73,12
7,05
26,11
343,10
524,03
117,39
144,00
16,50
14,10
40,00
9,00
10,20
30,73
108,00
5,08
184,00
Estado: Rio Grande do Norte (3 RPPNs; Total: 2.950,17 ha)
ANO
1994
1996
2000
RPPN
Fazenda Salobro
Reserva Sernativo
Mata Estrela
MUNICIPIO
Jucurutu
Acarí
Baía Formosa
ÁREA (ha)
755,95
154,29
2.039,93
Estado: Rio Grande do Sul (25 RPPNs; Total: 4.044,79 ha)
ANO
1992
1992
1995
1996
1996
1996
1997
1997
1998
1998
1998
1999
RPPN
Fazenda Rodeio Bonito
Reserva Particular Schuster
Sítio Porto da Capela
Estancia Santa Isabel do Butuí
Fazenda Branquilho
Fazenda Caneleira
Rancho Mira-Serra
Reserva do Paredão
Bosque de Canela
Reserva do Capão Grande
Estância Santa Rita
Minas do Paredão
MUNICIPIO
Júlio de Castilhos
Humaitá
Porto Alegre
São Borja
Dom Pedrito
Dom Pedrito
São Francisco de Paula
São Francisco de Assis
Canela
Barra do Ribeiro
Santa Vitória do Palmar
Piratini
ÁREA (ha)
2.761,55
4,00
14,00
135,00
13,00
45,00
17,68
140,00
6,00
9,00
340,00
15,00
199
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
1999
1999
1999
1999
1999
1999
2000
2000
2001
2001
2002
2002
2005
Do Uruquá
Pontal da Barra
Chacara Sananduva
Mariana Pimentel
Fazenda Curupira
Prof. Delamar Harry dos Reis
Costa do Serro
Reserva dos Mananciais
Fazenda das Palmas
Reserva Jardim da Paz
Fazenda Morro de Sapucaia
Recanto do Robalo
Farroupilha
São Luiz Gonzaga
Pelotas
Viamão
Mariana Pimentel
Pedro Osório
Viamão
Porto Alegre
Dom Pedrito
Encruzinhada do Sul
Porto Alegre
Sapucaia do Sul
Torres
Viamão
29,00
65,33
3,00
46,00
100,20
10,00
8,00
11,11
160,00
1,75
90,25
9,95
9,97
MUNICIPIO
Porto Velho
Teixeirópolis
Cacoal
Pimenta Bueno
Pimenta Bueno
ÁREA (ha)
623,24
65,65
47,52
995,47
981,18
MUNICIPIO
Boa Vista
Boa Vista
Boa Vista
ÁREA (ha)
109,59
54,58
883,37
Estado: Rondônia (5 RPPNs; Total: 2.713,06 ha)
ANO
1997
1999
2000
2001
2001
RPPN
Seringal Assunção
Vale das Antas
Água Boa
Parque Nacional Leonildo Ferreira 1
Parque Nacional Leonildo Ferreira 2
Estado: Roraima (3 RPPNs; Total: 1.047,54 ha)
ANO
1991
2001
2001
RPPN
Reserva Mani
Sesc Tepequém
Tupaquir
Estado: Santa Catarina (25 RPPNs; Total: 15.212,87ha)
ANO
1990
1992
1992
1992
1997
1998
1998
1999
1999
1999
1999
RPPN
Reserva do Caraguatá
Reserva Burgerkopf
Parque Ecológico Artex
Fazenda Palmital
Fazenda Pousada Serra Pitoco
Reserva do Caraguatá
Reserva do Caraguatá Ii
Morro das Aranhas
Barra do Rio do Meio
Reserva Natural Menino Deus
Reserva Normando Tedesco
MUNICIPIO
Antônio Carlos
Blumenau
Blumenau
Itapoã
Ituporanga
Antonio Carlos
Major Gerciano
Florianópolis
Santa Rosa de Lima
Florianópolis
Baneáreo Camburiú
ÁREA (ha)
1.854,00
82,07
5.296,16
590,60
3,00
558,86
900,39
44,16
10,00
16,00
3,82
200
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
2000
2000
2001
2001
2001
2001
2001
2002
2002
2002
2002
2002
2004
2005
Gralha-Azul
Fazenda Araucária
Guaxinim
Caetezal
Ano Bom
Chácara Edith
Prima Luna
Morro da Palha
Bio Estação Águas Cristalinas
Morro dos Zimbros
Reserva Emílio Florentino Battistela
Reserva Rio das Furnas
Passarim
Rio das Lontras
Água Doce
São Joaquim
São José
Joenville
São Bento do Sul
Brusque
Nova Trento
São Francisco do Sul
Brusque
Porto Belo
Curupá
Alfredo Wagner
Paulo Lopes
São Pedro de Alcântra e
Águas Mornas
49,00
50,00
26,00
4.613,80
88,00
415,79
100,00
7,00
102,96
45,90
100,96
10,00
226,47
17,93
MUNICIPIO
Cubatão
Itapevi
Pirapora do Bom Jesus
Santana de Parnaíba
Monteiro Lobato
Joanópolis
Palheiros
Araçariguama
São José dos Campos
Santa Izabel
Guapiara
Cruzeiro
Tapiraí
Ubatuba
Itápolis
Atibaia
São Luiz do Paraitinga
São Sebastião
Jaguariúna
Jaú
Araçoiaba da Serra
Bragança Paulista
Serra Azul
Ibiuna
Ibiúna
Araçoiaba da Serra
Ibiúna
Mairiporã
ÁREA (ha)
0,70
19,47
56,85
58,45
8,70
50,00
10,89
26,00
84,71
560,02
34,40
86,14
60,91
22,80
24,30
51,38
19,30
2,70
26,67
142,88
28,40
15,00
242,00
72,60
111,30
7,00
145,20
5,00
Estado: São Paulo (33 RPPNs; Total: 3.731,33 ha)
ANO
1992
1993
1994
1994
1994
1995
1995
1997
1998
1999
1999
1999
1999
1999
1999
1999
2000
2000
2000
2000
2001
2001
2001
2001
2001
2001
2001
2001
RPPN
Carbocloro
Sítio Ryan
Voturuna V
Voturuna II
Sítio do Cantoneiro
Sítio Sabiuna
Sítio Curucutu
Sítio Pithon
Fazenda San Michele
Fazenda Rio dos Pilões
Fazenda Hori
Fazenda Bela Aurora
Fazenda Agro-Pastoril Gonçalves
Morro do Curussu Mirim
Sítio Palmital
Ecoworld
Sítio Primavera
Toque Toque Pequeno
Estância Jatobá
Reserva Ecológica Amadeu Botelho
Centro de Vivência Com a Natureza
Fazenda Serrinha
Fazenda Palmira
Fazenda Meandros III
Fazenda Meandros
Floresta Negra
Meandros II
Sítio Capuavinha
201
Prof. Audálio Ferreira Sobrinho
2001
2002
2002
2002
2003
Sítio do Jacu
Parque dos Pássaros
Fazenda Relógio Queimado
Parque São Marcelo
Rizzieri
Caraguatatuba
Bragança Paulista
Cafelândia
Mogi Mirim e Mogi Guaçu
São Sebastião
1,59
174,90
111,44
187,63
1.282,00
MUNICIPIO
Areia Branca
ÁREA (ha)
13,27
MUNICIPIO
Almas
Palmas
Abreulândia
Palmas
ÁREA (ha)
745,00
52,73
127,95
113,61
Estado: Sergipe (1 RPPNs; Total: 13,27ha)
ANO
1999
RPPN
Fonte da Bica
Estado: Tocantins (4 RPPNs; Total: 1.039,29 ha)
ANO
1996
1998
2000
2001
RPPN
Fazenda Minnehaha
Sítio Ecológico Monte Santo
Água Bonita
Reserva Bela Vista
Total de RPPNs: 426
Área Total: 440.145,39 ha

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