A ANÁLISE FÍLMICA E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES

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A ANÁLISE FÍLMICA E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES
A ANÁLISE FÍLMICA E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES: RELATO
DE EXPERIÊNCIA COM O FILME “A BETTER LIFE”
MACÊDO, Helenize Carlos de 1 - UEPB
CAVALCANTI, Senyra Martins2 - UEPB
Grupo de Trabalho – Comunicação e tecnologia
Agência Financiadora: PROEAC/UEPB
Resumo
O cinema constitui-se em ferramenta importante de comunicação e disseminação de práticas
sociais, culturais e políticas. Dessa forma, analisar filmes é importante para compreender a
reprodução de determinadas práticas nos espectadores e entender como este foi organizado
metodologicamente para atender a esses fins. Para a realização desse pressuposto, foi
realizada uma oficina dentro das atividades do curso de extensão Metodologia e Técnica da
Pesquisa com Filmes e Desenhos Animados, em abril de 2012. O filme escolhido para análise
foi “A Better Life” (2011) e as metodologias empregadas foram: exibição do filme, exposição
dialogada, slides, aplicação de uma atividade e avaliação dos resultados alcançados pelos
participantes. Foram utilizadas as metodologias de Gancho (1999) para analisar o enredo, a
caracterização dos personagens, o tema, o assunto e a mensagem do filme, e a metodologia de
Propp (2001), a partir da qual analisamos as funções dos personagens na narrativa. Na
atividade, os participantes foram solicitados a comparar as diferenças e semelhanças da
metodologia de análise de filmes empregada por estes autores no contexto do filme proposto
para análise. Os resultados da avaliação mostram que dos 52 cursistas que responderam à
avaliação, a maior parte combinaram as duas metodologias e não identificaram diferenças
significativas entre elas, a não ser na nomenclatura ou na quantidade dos termos de análise.
Palavras-chave: Análise fílmica. Cinema. Metodologias de análise.
1
Monitora de Extensão/PROEAC-UEPB, bolsista do Programa de Iniciação à Pesquisa-PIBIC/CNPq,
Graduanda em Geografia pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). E-mail: [email protected].
2
Coordenadora do Projeto de Extensão/PROEAC-UEPB, Mestre em Sociologia pela UFPB, Professora do
Departamento de Educação da UEPB. E-mail: [email protected].
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Introdução
O cinema constitui-se em ferramenta importante de comunicação e disseminação de
práticas sociais, culturais e políticas. De acordo com Ferreira (2009, p. 4) constitui-se em
uma linguagem universal que exerce enorme poder sobre as massas e sobre os
indivíduos, graças à sua grande força sugestiva e ao impacto que provoca sobre a
sensibilidade das diferentes platéias em conseqüência da diversidade de seus
gêneros e dos grandes recursos técnicos e artísticos de que dispõe. É também
considerado como um importante veículo de propagação de cultura para a
população. Sendo assim, o cinema por vezes representa um instrumento de
modificação social fazendo parte da memória, tanto individual quanto coletiva, de
uma sociedade.
Com a expansão do audiovisual na sociedade, surgiram novas formas de ensinar, agir,
pensar, perceber e compreender a educação e as práticas pedagógicas (FERREIRA, 2009, p.
1). Nesse contexto, surgiram possibilidades diversas de utilização dessas novas linguagens no
ensino, como a utilização de filmes enquanto recurso didático.
Assim, surgem questionamentos de como abordar essas novas linguagens no ensino.
Os professores vêm empregando as linguagens midiáticas no ensino, embora muitas vezes,
apenas como forma de entretenimento, não que não se possa utilizá-los como entretenimento,
porém, deve-se atentar para outros aspectos do filme que são importantes, como a estética, as
mensagens veiculadas, dentre outros.
Nesse aspecto, Ferreira (2009, p. 1) mostra que “no universo escolar o enfoque dado à
Sétima Arte muitas vezes se restringe ao conteúdo das histórias e não a outros aspectos que
compõem a experiência do cinema, ou seja, não se valoriza a estrutura comunicativa e estética
de um filme”. Compreende-se que o emprego da linguagem cinematográfica em sala de aula,
de forma a entreter os alunos, envolve inúmeros aspectos como a formação dos professores,
que muitas vezes, não contempla um currículo que congregue conhecimentos que abordem a
pesquisa e utilização das linguagens midiáticas em sala de aula.
Dessa forma, é importante ter conhecimentos a respeito de metodologias de análise
fílmica, que podem auxiliar no desenvolvimento das atividades em sala de aula. Nesse
sentido, é que se propôs o curso de Extensão “Metodologia e Técnica da Pesquisa com Filmes
e Desenhos Animados”, promovido pela PROEAC/UEPB, no período de setembro-2011 a
junho-2012. O público alvo deste curso foram os graduandos dos diversos cursos de
licenciatura e formação de professores da UEPB e outras IES da cidade de Campina GrandePB, como Letras, História, Geografia, Pedagogia, dentre outros.
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Foram desenvolvidas atividades que contemplaram a análise de filmes diversos,
contribuindo para a formação dos cursistas. Dentre essas atividades, foi realizada a oficina de
análise de narrativas, na qual se utilizou o filme “A Better Life” (2011) para entender de que
forma aplicar as metodologias de analise de narrativas de Propp (2001) e Gancho (1999).
Assim, este trabalho se propõe analisar as interpretações dos cursistas sobre as metodologias
de análise empregadas bem como discutir sobre a análise fílmica.
A análise fílmica: importância no ensino
A análise fílmica constitui-se importante no ensino, através do conhecimento de
técnicas e metodologias de análise, o professor pode abordar de forma mais proveitosa
possível à imagem em sala de aula. De acordo com Vanoye e Goliot-Lété (2009, p. 23)
“analisar um filme é também situá-lo num contexto, numa História”. Ou seja, interpretar o
contexto em que o filme se insere, a época, a cultura, a sociedade. Todos esses aspectos são
importantes e podem ser observados em sala de aula.
No período em que vivemos, onde a imagem ocupa papel preponderante na vida da
sociedade, a escola e os professores não podem deixar de observar a importância, bem como a
utilização da cultura midiática em sala de aula, pois, neste contexto se fazem necessários a
leitura e interpretação de novas linguagens. Nesse sentido, Varão (2010, p. 1-2) mostra:
No século XXI Já não é suficiente, ser um leitor competente apenas de livros e/ou do
texto oral, pois estamos vivendo uma evolução constante das novas tecnologias em
vários setores e as práticas sociais exigem um leitor capaz de ler e compreender
códigos e linguagens variados (principalmente a linguagem imagética, visual e
gestual) que envolvem tanto a leitura do livro quanto a leitura de textos virtuais, por
exemplo: a pintura, o filme, o texto eletrônico, entre outros. Para isso, os alunos
precisam desenvolver competências e habilidades constituintes de múltiplos
letramentos, principalmente do letramento virtual.
Assim, o desenvolvimento de competências necessárias para ler e compreender o filme
como um todo, não só os aspectos da História como muitas vezes os professores fazem, mas
outros aspectos como a estética, o roteiro, a narração, situar o filme em um contexto histórico
de produção, compreendendo os aspectos, culturais, econômicos e tecnológicos que
envolveram a produção de determinado filme, dentre outros aspectos importantes, são
fundamentais para formar leitores críticos da imagem.
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Nesse sentido, Faheina et al (2008, p.3) revela que é imprescindível, a análise e
interpretação crítica da imagem, de seu conteúdo e forma, das mensagens que ela codifica e
do seu uso pedagógico positivo no espaço escolar. Devido a sua riqueza semântica e
semiótica, apresenta-se, desse modo o filme como uma alternativa didática para efetivar o
diálogo entre alunos, professores e os campos de conhecimento.
Ainda, sobre a importância de utilização dos filmes em sala de aula Resende (2010, p.
6) mostra:
A linguagem cinematográfica nos permite viajar e construir ideias. Os filmes são
instrutivos e instigantes, sendo um excelente material didático e educativo.
Acreditamos que a utilização de filmes é muito interessante, pois, além de incluir a
arte na sociedade em que vivemos, mostra outras análises e perspectivas sobre
filmes que eventualmente os alunos já viram, mas não exploraram de tal maneira. É
um recurso importante no sentido de contextualizar temas dentro de uma abordagem
interdisciplinar. Os filmes nos possibilitam também entender a época e as
perspectivas daqueles que reconstruíram em imagens cinematográficas as histórias
ocorridas ou imaginadas.
Nesse aspecto, compreende-se a importância de que durante a formação na
Universidade, os professores tenham em seu currículo, disciplinas ou em alguma delas uma
abordagem voltada para o trabalho com as imagens em sala de aula. Os cursos de formação de
professores devem inserir em seus currículos o trabalho com as novas linguagens para que os
futuros profissionais tenham melhor subsidio para usá-las na escola.
Metodologia
Diante da importância do uso das diferentes linguagens no ensino e na pesquisa, é que
foi proposto o curso de Extensão “Metodologia e Técnica da Pesquisa com Filmes e Desenhos
Animados”, promovido pela PROEAC/UEPB, no período de setembro-2011 a junho-2012,
com carga horária de 90 horas. O público alvo deste curso foram os graduandos dos diversos
cursos de licenciatura e formação de professores da UEPB e outras IES, como Letras,
História, Geografia, Pedagogia, dentre outros.
Foram desenvolvidas diversas atividades durante o curso, dentre elas a oficina de
análise de narrativas, na qual se utilizou o filme “A Better Life” para analisar com os cursistas
as metodologias de analise de narrativas de Gancho (1999) e Propp (2001). Para o
desenvolvimento da pesquisa utilizou-se da seguinte metodologia:
• Exibição do filme;
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• Exposição dialogada com apoio de slides;
•
Aplicação de atividade e
• Avaliação dos resultados.
Resultados e Discussões
A partir da discussão do filme os cursistas responderam uma atividade que visava
analisar a compreensão destes em relação às duas metodologias trabalhadas Gancho (1999) e
Propp (2001). A metodologia proposta por Gancho (1999) aborda cinco elementos que
compõe a narrativa: Enredo, personagens, tempo, espaço e narrador. Durante a oficina foram
trabalhados os conceitos de enredo, os personagens, assim como identificar o tema, assunto e
mensagem no filme. A partir da metodologia de Propp (2001) foram abordadas as funções das
personagens na narrativa, que de acordo com Propp são: o vilão, o doador (provedor), o
ajudante, a princesa (ou pessoa procurada) e seu pai, o expedidor, o herói ou vítima, o falso
herói.
Assim, durante a oficina os cursistas identificaram a função dos personagens na
narrativa de acordo com a metodologia de Propp (2001) da seguinte forma:
• O vilão (Santiago): é o personagem que rouba a caminhonete, estruturando o conflito
na narrativa do filme.
• O herói (Carlos) personagem principal da trama;
• O ajudante (Luís) filho de Carlos que o ajuda na busca pela caminhonete roubada.
• O provedor (Anita) irmã de Carlos provém o dinheiro emprestado para ele comprar a
caminhonete.
Em relação aos aspectos da trama Gancho (2009) mostra que as narrativas são
estruturadas a partir do conflito, componente da história que cria uma tensão e que prende a
atenção do espectador. O conflito é que irar determinar as partes do enredo: exposição
(momento inicial da história, no qual são apresentados os fatos, os personagens), complicação
(é a parte do enredo que inicia os conflitos), clímax (momento de maior tensão na história),
desfecho (é a solução dos conflitos).
Nesse sentido, os cursistas identificaram na trama os momentos correspondentes à
estrutura da narrativa de acordo com a metodologia proposta por Gancho (1999):
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• Exposição: Em relação a exposição foram identificados no filme dois aspectos: o
econômico exposto no início do filme, quando mostra as condições dos imigrantes
mexicanos nos Estados Unidos e o cultural, representando a não aceitação da cultura
mexicana do pai (Carlos) pelo seu filho Luís, que nasceu nos Estados Unidos e não
tem a identidade mexicana.
• A complicação de acordo com a interpretação dos cursistas foi o momento em que o
carro foi roubado.
• O clímax foi identificado como o momento em que Carlos recupera o carro roubado,
porém é preso por ser imigrante ilegal.
• O desfecho foi identificado como o momento em que Carlos foi deportado para o seu
país de origem.
Em relação à aplicação dessas duas metodologias, foi perguntado durante a atividade se
futuramente em análises fílmicas, utilizariam as metodologia propostas, neste aspecto os
cursistas responderam (36,5%, 19 dos 52 presentes) que utilizariam a metodologia de Gancho
(1999) por ser uma metodologia clara e fácil de identificar, no filme, os elementos (funções
das personagens, enredo, características sociais). 53,1 % utilizariam as duas por considerarem
importante conhecer mais de uma metodologia para análise de filmes e compará-las com a de
outros autores. 2% não utilizaria a de Gancho (1999), pois esta não segue a estrutura de Propp
(2001) e 8,4% não utilizariam nenhuma das duas metodologias.
Em relação às semelhanças e diferenças entre as duas metodologias os cursistas
afirmaram não haver diferenças (46,5%); 12% afirmaram haver diferença nas nomenclaturas
utilizadas e na quantidade de termos de análise; Já em relação aos elementos 5,7% afirmaram
não encontrar na metodologia de Gancho (1999) os 31 elementos presentes na metodologia de
Propp (2001); 5,7% afirmaram Gancho utiliza de uma sequência e 2% que Propp utiliza de
uma sequência; 9,6% afirmaram que Propp é mais detalhista e esclarecedor em sua análise e
5,7% que Gancho é mais simples; 5,7% afirmaram que Gancho é mais detalhista.
A partir da abordagem de tais metodologias e sua aplicação na análise fílmica, a partir
do filme “A Better Life” (2011), observa-se que os cursistas conseguiram aplicar os
conhecimentos adquiridos e diferenciar as metodologias, contribuindo desse modo para a
formação dos mesmos.
Considerações Finais
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A abordagem de filmes no currículo dos cursos universitários constitui-se importante
para a formação dos professores, bem como de outros profissionais. No contexto, do mundo
atual, em que as imagens estão cada vez mais presentes, formar cidadãos que tenham
habilidades de ler e compreender essas novas linguagens é fundamental.
Assim, o curso de Extensão “Metodologia e Técnica da Pesquisa com Filmes e
Desenhos Animados”, promovido pela PROEAC/UEPB, se propôs a dar formação aos
graduandos de diversas áreas bem como a professores da educação Básica. Através das
diversas atividades realizadas, dentre elas a oficina de análise de narrativas, foi possível
estudar conceitos e metodologias importantes para a formação profissional dos mesmos.
A partir dos resultados da oficina de análise de narrativas verificou-se que os cursistas
compreenderam a aplicação de tais metodologias, bem como expressaram, significativamente,
que utilizariam as mesmas futuramente na análise de filmes.
REFERÊNCIAS
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FERREIRA, A. M. Cinema e formação de professores. Travessias: revista eletrônica de
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GANCHO, Cândida Vilares. Como analisar narrativas. São Paulo: Ática, 1999. Disponível
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PROPP, V. Morfologia do Conto Maravilhoso. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001.
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