PP Borderline - Oficina de Psicologia
Transcrição
PP Borderline - Oficina de Psicologia
Definir e categorizar as perturbações de personalidade Identificar a sua relação com a satisfação de necessidades Verificar aspetos específicos no trabalho clínico nesta área Descrever e aplicar a Terapia Cognitivo-Interpessoal na intervenção nas perturbações de personalidade "Every psychopathology is a gift of love.“ Lorna Benjamin Sintomas/ Comportamento Emoções Necessidades Padrão duradouro de relação, perceção e pensamento acerca do ambiente e de si mesmo; presente em variados contextos significativos da vida do cliente Possibilidade de manipulação como forma primitiva de satisfazer necessidades Dificuldade em estabelecer relações estáveis, gratificantes e duradouras Podem manifestar-se na adolescência ou mais cedo, podendo manter-se e reforçar-se na vida adulta e perder intensidade em idades avançadas A presença de PP reduz eficácia da intervenção sobre as perturbações de eixo I A medicação é uma ajuda importante no trabalho terapêutico A. Um padrão duradouro de experiência interna e de comportamento que se desvia marcadamente do esperado na cultura em que o indivíduo se insere. Este padrão é expresso em 2 (ou mais) das seguintes áreas: 1. cognição (e.g., formas de percepção e interpretação de si próprio, dos outros e dos acontecimentos) 2. afetividade (e.g., variedade, intensidade, instabilidade e adequação da resposta emocional) 3. funcionamento interpessoal 4. controlo de impulsos. B. O padrão duradouro é inflexível e está presente ao longo de um vasto leque de situações pessoais e sociais. C. O padrão duradouro conduz a dano ou sofrimento clinicamente significativo no funcionamento social, ocupacional ou noutras áreas de funcionamento. D. O padrão é estável, de longa duração e o seu início remonta pelo menos à adolescência ou início da idade adulta. E. O padrão duradouro não é melhor explicado por manifestação ou consequência de outro distúrbio mental. F. O padrão duradouro não é devido a efeitos fisiológicos diretos de uma substância (e.g., abuso de drogas, medicação) ou a uma condição médica geral (e.g., traumatismo craneano). (APA, 1994) Como vimos, as PP são padrões inflexíveis, rígidos e duradouros de sentir, fazer e pensar Desviam-se das expetativas sociais Têm auto e hetero-representações rígidas Ciclos interpessoais disfuncionais que se autoperpetuam e que “seduzem” o terapeuta a repetilos em sessão, reforçando-os! Foco principal no laço e menos nos objetivos e tarefas Ruturas de aliança tornam-se trabalho prioritário Terapeuta como observador-participante metacomunica para chegar a experiências emocionais corretivas (Vasco, 1997) 1. Rigidez Inflexibilidade e egossintonia 2. Evitamento Clientes que apresentam maior severidade evitam o contacto com emoções e cognições mais significativas (por exemplo, usando estratégias compensatórias) 3. Dificuldades Interpessoais Padrão de relações disfuncionais e que se manifesta também na relação terapêutica 4. Apresentação difusa dos problemas Apesar de manifestarem sofrimento psicológico elevado é frequente não apresentarem dificuldades que sejam foco claro de intervenção (ausência de consciência das suas necessidades e formas adaptativas de as preencher) Ligação entre domínios psicológicos em que cada um influencia o outro, contribuindo para a estabilidade da estrutura e dificultando a mudança Necessidade de intervenção fléxível, macro/micro e momento a momento A B C Paranóide Esquizóide Esquizotípica Anti-social Borderline Histriónica Evidante Dependente Perturbação de Personalidade Obsessiva Compulsiva - Narcísica - PP Paranóide - não há informação conclusiva PP Esquizóide - baixa densidade de recetores dopaminérgicos PP Esquizotípica - alterações semelhantes às dos pacientes com esquizofrenia PP Anti-social - Disfunção nos lobos frontais e no sistema límbico (amígdala) PP Borderline - córtex cingular anterior (regula a amígdala) e o sulco intraparietal inativos em situação de grande carga emocional PP Histriónica - não há informação conclusiva PP Narcísica - não há informação conclusiva Não há informação conclusiva Prevalência na população geral: 10 - 13% Um pouco superior nos meios urbanos, em pessoas solteiras e desempregradas Um pouco inferior nos idosos PP Borderline tem a maior comorbilidade com outras PP PP Dependente é a mais frequente e a PP Esquizotípica é a 2ª na população geral PP Anti-social, Esquizotípica, Esquizóide e Narcísica mais presentes nos homens PP Borderline e PP Dependente mais em mulheres 1. A maior parte das perturbações são adaptação ao meio Muitas não resultam de défices funcionais no organismo mas sim de esforços do cliente para se adaptar e restaurar o equilíbrio interpessoal e intrapsíquico 2. Cada pessoa tem pontos fortes e frágeis geneticamente definidos e biologicamente implementados Esta predisposição afeta a forma da perturbação e a resposta à psicoterapia (hardware-software). 3. Experiências específicas formam sintomas específicos Isto é, para cada padrão interpessoal e intrapsíquico, há inputs sociais anteriores ou concorrentes que se relacionam com significado ao sintoma, de acordo com a estrutura de personalidade 4. A visão empática a partir de dentro da pessoa leva à extração de significado dos sintomas Se o terapeuta conseguir realmente ver o mundo aos olhos do cliente poderá encontrar e perceber a natureza adaptativa da perturbação 5. Os processos mentais “repetem” relações objetais iniciais Os pensamentos e as ações e emoções associadas relacionam-se proximamente com a forma e objetivo de interações sociais importantes (anteriores ou presentes) 6. A vinculação e a segurança são necessidades primárias e genéticas Quanto ocorre uma falha a esse nível, as vulnerabilidades biológicas tendem a revelar-se PP Paranóide Suspeita e desconfiança relativamente a outros que consideram manipuladores, desonestos ou traiçoeiros. São pessoas fechadas, críticas e que se escondem. Mais provável em pessoas com familiares com esquizofrenia PP Esquizóide Emocionalmente distantes, preferindo estar sozinhos e imersos nos seus pensamentos. Não têm interesse em se ligar a outros, criando um mundo imaginário e solitário PP Esquizotípica Apresentam pensamentos bizarros e “mágicos” e formas excêntricas de se vestir e se comportar. Por exemplo, acreditam no sobrenatural, poder ver o futuro ou viajar para outras dimensões. Dificuldade em se ligar a outros e ter relações duradouras. Com o tempo, podem desenvolver medo de situações sociais PP Anti-social Podem ser manipuladores, irresponsáveis e infringir a lei regularmente. Mostram reduzido respeito pelos direitos dos outros e não sentem remorsos nas suas ações negativas. Têm também tendência a desiludir muitas pessoas com promessas que não cumprem. Apresentam elevado risco de consumo de substâncias, principalmente estimulantes, e assim quebrarem o tédio e a irritabilidade. Tendência para a depressão e ansiedade PP Borderline Impulsivos, oscilam entre a idealização e a desidealização dos outros. Apresentam relações instáveis e intensas, caracterizadas por um medo extremo do abandono e rejeição. Podem apresentar auto-mutilação, problemas na auto-imagem e alimentação, ideação suicida e formas extremas de chamar a atenção. Três vezes mais comum nas mulheres PP Histriónica Comportamentos persistentes para chamar a atenção, exagerando as suas emoções e podendo usar a sexualidade para esse fim. Podem ser muito exigentes consigo e com os outros, procurando constantemente a proximidade de outros. Baixa tolerância à frustração, alta necessidade de estarem no centro das atenções e culpabilização dos outros em caso de fracasso ou insucesso PP Narcísica Consideram-se melhores que os outros, tendo grande necessidade de atenção e valorização. Culpam-nos nos momentos de insucesso e tem baixo respeito pelos seus direitos e necessidades. São muito sensíveis a críticas, respondendo prontamente com grande agressividade. Nas relações interpessoais, tendem a manipular e a controlar. No entanto, têm baixa auto-estima, tendência para deprimir e sentimentos de inferioridade PP Evitante Afastam-se de contactos sociais por terem sentimentos de inferioridade e grande sensibilidade interpessoal. Têm medo da rejeição e do ridículo, apenas tendo contacto com pessoas em quem têm total confiança. Preferem isolar-se do que passar pela desilusão PP Dependente Grande desejo de serem protegidos e cuidados, levando a que se anulem e sejam submissos. Têm imensa dificuldade em tomar decisões e preferem que outros liderem a sua vida. No mesmo sentido, têm ansiedade de separação quando sozinhos e procuram rapidamente um novo parceiro quando a relação presente manifesta problemas PP Obsessivo-compulsiva Não confundir com a POC. São exigentes, preocupados com a ordem, perfeição e controlo. O trabalho tem tendência a sobrepor-se às relações interpessoais, sendo inflexíveis e pouco empáticos nessa área. Têm tendência a deprimir-se e esgotar-se, manifestando uma visão pessimista do mundo Na vossa experiência, o que consideram mais difícil no trabalho com PP´s? Terão estas resolução total com psicoterapia? Quer seja sim ou não a vossa resposta, reflitam sobre o respetivo impacto num processo psicoterapêutico com clientes PP Personalidade Estratégia Crença Anti-social Predatória Os outros são bodes expiatórios Dependente Procura de ajuda Preciso dos outros para sobreviver Narcísica Competitiva Estou acima das regras Histriónica Exibicionista Vivo como me sinto Esquizóide Autónoma As relações são um problema Paranóide Defensiva A boa vontade tem segundas intenções Evitante Desligada As pessoas vão rejeitar-me Compulsiva Ritualizada Os detalhes são tudo 3A 2B 1A 1B 2A 3B 1A Identificação: Eu sou como tu. Isto significa que te amo e que te perdoo. Vê como eu te reproduzo. Amame por isso 1B Contra-Identificação: Sou exatamente o oposto de ti. Dedico a minha vida a ser tudo o que tu não és, e quero que tu o saibas. Admite que estás errado, e compensa-me. Ama-me, sobretudo 2A Recapitulação: As tuas regras e pontos de vista são os meus; eu defendê-los-ei agora e sempre. Quando reparares que me influenciaste tanto, vais-me amar ainda mais 2B Contra-Recapitulação: Farei o oposto do que tu queres de mim, até admitires que eu estou certo e tu errado. Quero que me aceites nos meus termos. Amame como sou 3A Introjeção: Trato-me como tu me tratavas. Tu é que sabes aquilo que eu sou. Ama-me por concordar contigo 3B Projeção: Trato-te como me sinto. Eu é que sei quem és. Ama-me por te orientar 1. Prazer (físico e psicológico) 2. Proximidade (criar e manter relações significativas) 3. Produtividade (atingir objetivos) 4. Controlo (influenciar o meio) 5. Atualização/Exploração (explorar e procurar novidade) 6. Coerência do self (equilíbrio entre eu real e ideal; entre o que se faz, se pensa e se sente) 7. Auto-estima (satisfação com o próprio) Dor (tolerar desconforto e dar-lhe significado) Diferenciação (auto-determinação e autonomia) Lazer (relaxar sem culpa) Cooperação/Cedência (delegar, deixar ir) Manutenção (aproveitar o que já se tem) Incoerência do self (tolerar dúvida e conflito ocasionais) Auto-crítica (identificar, tolerar e aprender com insatisfações pessoais) Procurem articular este modelo com as várias PP: A Paranóide B Antisocial C Evidante Esquizóide Esquizotípica Borderline Histriónica Dependente Perturbação de Personalidade Obsessiva Compulsiva - Narcísica - Quando “suspeitam” que estão na presença de um cliente com PP? Que sinais vos chamam a atenção para essa possibilidade? 1) O cliente ou outro significativo referem que o padrão de comportamento é crónico 2) Inúmeros contactos terapêuticos prévios 3) Ausência de um ponto de referência interno adaptativo 4) Pobre auto-monitorização 5) Auto-monitorização dos outros também fraca ou distorcida 6) A terapia é uma série de crises 7) A terapia parece ter chegado a um súbito e inexplicável impasse 8) O comportamento é egossintónico 9) Resistência à terapia 10) Comportamento rígido e compulsivo 11) Questionamento quanto à eficácia da terapia na ausência de mudança observável (Freeman, 1998) Defina claramente as regras, limites e funcionamento das sessões e contacto entre estas Use a auto-revelação com moderação Acredite na capacidade do cliente em melhorar: agente ativo e responsáveis nas suas escolhas Metacomunique no aqui e agora Despiste comorbilidades Não fique centrado no sintoma, lembre-se da pessoa (necessidades) Se o cliente estiver com tendência para fazer mal a si próprio ou a outros, mostre-se mais determinado do que nunca A certa altura do processo, vá dando maior autonomia ao cliente para decidir o tema da sessão Use a supervisão como rede Se algum paciente o está a desafiar, desafie-se e pesquise. Lembre-se que o trabalho com PP é muito útil para as outras problemáticas! Procure não trabalhar apenas com PP (por exemplo, num mesmo dia) Sinta o seu corpo e repare nas suas emoções Permita-se errar, não se deixando envolver demasiado na vida dos clientes e cultivando o seu próprio lazer e prazer As PP, pelas características que vimos, poderão contribuir para ruturas da aliança terapêutica Gerir e transformar esses momentos tornase assim um fator decisivo para o sucesso da intervenção… Negociação, adaptação e equilíbrio entre subjetividades do terapeuta e do cliente O objetivo é reparar a aliança e torna-la mais sólida mas acima de tudo: Levar a que o cliente entenda a forma como constrói os eventos e de que forma essa criação influencia a sua relação com os outros O cliente ganhará formas mais adaptativas de se relacionar com pessoas significativas O cliente ficará mais à vontade com as suas necessidades e emoções, tornando-o mais flexível na sua expressão e contribuindo para relações de maior qualidade 1) Desacordo de tarefas na terapia 2) Desacordo nos objetivos na terapia 3) Tensão no laço emocional (não mutuamente exclusivas) 1) Evitamento 2) Confronto 1) Repetir o racional terapêutico (explicar o objetivo e as vantagens de uma intervenção) 2) Mudar a tarefa ou objetivo 3) Clarificar “faltas de comunicação” (superfície) 4) Explorar temas relacionais associados à rutura (profundidade) 5) Ligar a rutura ao padrão de vida do cliente (cuidado!) 6) Nova experiência relacional (quando o cliente não consegue estar no aqui e agora; sem explorar o significado agir para construir) Fases sequenciais mas flexíveis! Tomada de consciência pelo terapeuta que estão envolvidos num ciclo disfuncional (confronto ou evitamento) Há ruturas manifestas e outras latentes Metacomunicar, no aqui e agora, sobre ambos (impede culpabilização e modela a relação) Foco no corpo e nas emoções Afirmação e asserção pelo cliente do que sente e pensa com a rutura, no momento presente Tomada de consciência da atribuição de significado da rutura Generalizar para outras relações Expressar emoções na rutura pode aumentar a ansiedade do cliente Surge um bloqueio/self crítico que impede o acesso ao desconforto emocional Explorar, no aqui e agora, a ligação da ansiedade à rutura e explorar o evitamento Validação no momento presente pelo terapeuta levará o cliente a sentir-se mais confortável para expressar o que sente até que chega à necessidade O cliente aprende a identificar a origem do desconforto e a regulá-lo, validando-se Responsabilização e tomada de decisão Regulação das expetativas iniciais (Safran & Muran, 2008) Role-play com troca de papéis de 2 ruturas de aliança (uma por evitamento e outro por confronto – tarefas, objetivos ou laço) e aplicação deste modelo: 1) Identificar o marcador de rutura 2) Reconhecer e desligar da matriz relacional 3) Explorar a perspetiva do cliente 4) Evitar a vulnerabilidade – agressão 5) Expressar o desejo ou necessidade T: “The mind can be a scary place.” C: “Yes, and you wouldn’t want to go in there alone!” Obrigado! John Bowlby American Psychiatric Association (1994). Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders: DSM-IV. 4th ed. Washington: Author Barlow, D. (Ed.). (2001). Clinical handbook of psychological disorders: A step-by-step treatment manual. (3rd ed.). New York: Guilford Press Benjamin, L. S. (1993). Interpersonal diagnosis and treatment of personality disorders. New York: Guilford Benjamin, L. S. (2003). Interpersonal reconstructive therapy. New York: Guilford Bordin, E. S. (1994). Theory and research on the therapeutic working alliance: New directions. In A. O. Horvath & L. S. Greenberg (Eds.), The working alliance: Theory, research, and practice (pp. 13-37). New York: Wiley Frank, J.D., & Frank, J.B. (1991). Persuasion and healing (3ª ed.). Baltimore: Johns Hopkins University Press Freud, S. (1901). Psychopathology of Everyday Life. London - T. Fisher Unwin Gonçalves, I., & Vasco, A.B. (2001). Estudo de caso de uma perturbação “borderline da personalidade” à luz do modelo de “complementaridade paradigmática.” Psicologia, Vol. XV, nº 2, pp. 227-266 Greenberg, L. S., & Safran, J. D. (1987). Emotion in psychotherapy. New York: Guilford Press Millon, T., & Davis, R. D. (1996). Disorders of personality: DSM-IV and beyond. New York: John Wiley Millon, C., Meagher, S., & Ramnath, R. (2004). Personality disorders in modern life (2nd ed.). Hoboken, NJ: Wiley Norcross, J. C. (Ed.) (2002). Psychotherapy relationships that work. Oxford, Mass.: Oxford University Press Norcross, J. C., & Goldfried, M. R. (Eds.). (2005). Handbook of psychotherapy integration (2nd ed.). New York: Oxford University Press Safran, J. D., Crocker, P., McMain, S. & Murray, P. (1990). Therapeutic alliance rupture as a therapy event for empirical investigation. Psychotherapy: Theory, Research, and Practice, 27, 154-165 Safran, J. D., Muran, J. C., & Samstag, L. W. (1994). Resolving therapeutic alliance ruptures: A task analytic investigation. In A. O. Horvath & L. S. Greenberg (Eds.), The working alliance: Theory, research, and practice. (pp. 225-255). New York: Wiley Safran, J.D. & Muran, J.C. (2000). Negotiating the therapeutic alliance: A relational treatment guide. New York: Guilford Press Vasco, A.B., & Dryden W. (1994). The development of psycotherapists theoretical orientation and clinical practice. British Journal of Guidance and Counselling, 22, 327-341 Vasco, A.B. (2001). Fundamentos para um modelo integrativo de “complementaridade paradigmática.” Psicologia, XV, pp. 219-226