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RESENHA BffiLIOGRAFICA
R. A.
AMARAL VIEIRA
O Federalismo e a revisão da forma de Estado. Paulo Bonavides.
Revista de Informação Legi~lativa, ano 10, n. 37.
Em seu mais recente traba-lho, o professor Paulo Bonavides, da
Universidade do Ceará, analisa os problemas atuais do Estado
brasileiro a partir de um tema freqüentemente descurado pela
maioria dos críticos de nossa crise politica: a Federação em agonia. Bonavides estuda o nosso federalismo dentro do contexto
histórico do País, o que lhe enseja fundar o desenvolvimento de
suas teses em um a priori inquestionável: o artificialismo da
fórmula de Estado adotada pela República.
Uma revisão histórica mostra à sociedade a construção unitária do Estado brasileiro, paralelamente à tendência a um governo
central e forte. A tradição do Império é unitarista, embora já se
fizesse, a par com a pregação republicana, a propugnação pot· um
Estado federal. Embora alguns monarquistas. defendessem a adoção do sistema federal - caso das pregações de Nabuco e Rui
Barbosa, entre outros - é fora de dúvida que a federação aparecia no cenário das dicussões politicas como uma forma a mais
de oposição ao poder imperial. A Federação, estimavam seu adeptos, fortaleceria os estados em detrimento do governo central e,
conseqüentemente, subtrairia das mãos do Imperador considerável soma de poder.
Segundo Bonavides, a adoção federalista (Decreto n. 0 1) "foi
apenas o coroamento vitorioso de velhas aspirações autonomistas
que, não se podendo fazer nos quadros institucionais do Império
por um ato reformista, se fizeram pela via imprevista da ação
revolucionária de 15 de novembro de 1889, resultando assim na
implantação do sistema republicano." Essas velhas aspirações autonomistas a que se reporta Bonavides, todavia, jamais representaram, quer uma aspiração nacional, quer o coroamento natural
R. Ci. pol.,
Rio de Janeiro,
7(4) : 137-147,
out./dez. 1973
de sua formação política. Ao contrário, o Brasil foi sempre um
estado unitário; mesmo a experiência do legislativo provincial
jamais representou uma dose considerável de descentralização poLítica, até porque o modelo que inspiraria a redação do Decreto
n. 0 1 - a experiência americana -partira de uma evolução histórica que percorrera às avessas a construção do Estado brasileiro,
pretensamente descentralizado pela federação, contrariando sua
formação unitária desde o berço. Já o Estado americano encontrara na federação a forma de associação de estados tradicionalmente autônomos.
A idéia federalista, todavia, como diversas vezes assinala Bonavides não apareceu de sopetão com o 15 de novembro nem era
desconhecida de Rui Barbosa, que a defendera em longa campanha de imprensa durante o Impél"io, como uma solução para a
Monarquia, partilhando da mesma doutrina de Nabuco; ao contrário da maioria dos republicanos que defendiam pura e simplesmente a queda da Monarquia e a implantação da República,
deixando de lado preocupações de ordem formal como a decisão
pela manutenção do Estado unitário ou a sua substituição pela
descentralização oferecida pela federação. De qualquer maneira,
é fora de dúvida que os republicanos conquistados pela propagação federalista simplesmente viram nessa forma de governo
mais um entrave ao centralismo representado pelo Império que
procuravam apear. De outra pru:te, afigura-se-nos uma postura
de incrível ingenuidade política "a veleidade federativa sobre as
bases de um sistema com índole manifestamente centralizadora,
qual o do Império".
A Federação, todavia, não logrou salvar o Império e terminou
por infiltrar-se na República. " A medida que o Império entrava
em declínio, o movimento federalista tomava corpo e avançava
impetuosamente, de par com idéias tanto monarquistas como republicanas. O projeto de Nabuco, de 1885, e a campanha de imprensa desfechada por Rui Barbosa em prol de uma definição
federativa para as instituições do Império denotam suficientemente que a tese chegara amadurecida, tanto para a solução dada
no Decreto n. 0 1 do Governo Provisório como para sua consagração irretratável pelos constituintes de 1890."
Cabe discutir o grau de amadurecimento da idéia federalista
a que se refere Bonavides. De fato , a Federação não chegou a
representar uma saída para o Império e o enxerto de que resultou sua adoção republicana fez-se ao arrepio da tradição brasileira e encimada de vícios que comprometem sua pureza doutrinária.
É o próprio Bonavides quem afirma que "Quando se deu o ato
republicano de instituição do sistema federativo, as províncias
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foram declaradas sobe1·anas por decreto tecnicamente errôneo dos
federalistas da pl"oclamação da República, menos versados talvez
em teoria federativa do que os da Constituição de 1890/ 1891 e,
portanto, sem nenhuma lição teórica daqueles fatos desenrolados
na guerra civil dos Estados Unidos, país que, por um paradoxo,
lhes serviu de modelo ao projeto federativo e onde os adeptos da
causa vitoriosa foram às armas justamente para provar que não
há nem é possível haver Federação de Estados soberanos e, portanto, aptos à secessão."
Onde, portanto, o amadurecimento doutrinário? Aos Estados
criados pela federação republicana, como às províncias imperiajs,
falecia "a face mais importante com que na doutrina (federalista)
se identificam as características políticas da autonomia, a saber,
a capacidade autodeterminativa cuja presença empresta ao poder
o caráter de estabilidade."
A Federação, por fimJ esbarrava num obstáculo at~ aqui
inafastável: o "vício do executivo forte", como o denomina Bonavides, a saber, a tradição que uniu ao Estado unitário, o governo
central e forte. Com a Federação, excluídas algumas exceções
episódicas, ·esse vício tem-se agravado de tal sorte que o executivo
forte parece hoje constituir uma característica natural e histórica,
inajustável. Presentemente, essa tendência se observa na formação do poder em todo o mundo agravada na América Latina
graças à contribuição dos problemas econômicos e políticos fermentados pelo subdesenvolvimento. De fato, e::cectttivo forte é a
característica de governo dos Estados Unidos, da União Soviética,
da China, da França etc. Executivo forte é a marca do governo
do Brasil, do Paraguai, da Bolívia, do Peru e agora, do Chile.
Nesses países (a relação podia ser muito mais extensa, incluindo
Espanha, Portugal, Grécia, Cuba e todos os países socialistas e quase todos os países subdesenvolvidos), a par do executivo fo1·te pode-se assinalar a tendência para formação de governos claramente
militares (Peru, Chile, Grécia etc.) ou custodeados por militares
(União Soviética, Estados Unidos e França entre os grandes e
Uruguai, Argentina, Portugal, entre os pequenos). Nb caso brasileiro, o executivo forte que, além de absorver as prerrogativas
do legislativo limitou a ação do Judiciário inumeráveis vezes, não
é um mero acidente das duas últimas décadas, mas uma inclinação
que nos acompanha desde os primeiros passos do Império: '"!'ivemos, assim, Executivo forte para fazer a Independência, forte .
também, para consolidá-la, não menos forte para golpear a Constituinte, em 1823, e de vocação "Sempre forte, quando objeto de
contestação no decurso das crises que traumatizaram a comunhão
política do País. Aí sua fraqueza ocasional foi sempre pretexto
Resenha bibLiográfica
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para levantá-lo depois copioso de forças e carregado de onímodas
prerrogativas, conforme tem acontecido até aos nossos dias. Assim
na Abdicação, na Maioridade, na República, na Revolução Liberal, no Estado Novo, na Redemocratização, no suicídio de Vargas,
na renúncia de Jânio Quadros, na deposição de Goulart, servindo
todos esses momentos históricos de marcos com que assinalar uma
inclinação pendular do País para o advento do executivo forte.
Aqueles episódios ou antecederam ou sucederam a estados passageiros de fraqueza e abatimento e desorganização política, logo
ultrapassados pelo estabelecimento da autoridade, dotada de instrumentos fortes de ação executiva."
Bonavides esqueceu-se de incluir entre os exemplos de fraqueza. ocasional favorecendo seu fortalecimento, a crise que dominou a última fase do governo Costa e Silva, de que resultou
a imposição do Ato Institucional número 5.
Bonavides analisa ainda a natureza preponderantemente política do federalismo da primeira república e o fracasso do que
denomina "ilusão recente de um federalismo cooperativo".
Segundo Bonavides, o federalismo da primeira república
praticamente desconheceu ingredientes financeiros e econômicos
e, mesmo institucionalizado, jamais se apartou do combate pela
domesticidade do Poder Executivo. Foi sempre um federalismo
de índole exclusivamente política, no qual, mesmo a guerra interna das tarifas, "foi antes uma controvérsia jurídica à face de
uma correta aplicação do texto constitucional do que propriamente um conflito econômico de vasta potencialidade política, como
o que de último estala no federalismo contemporâneo, com o País
se repartindo economicamente em Regiões".
Presentemente, entre os múltiplos fatores antifederalistas
criados pelo governo central está a política tributária que asfixia
ainda mais as economias regionais em proveito, quer da União,
quer dos Estados fortes, como é o caso brasileiro do imposto de
circulação de mercadorias, instrumento a mais no esvaziamento
dos estados consumidores, a Nação praticamente em proveito dos
estados produtores (Rio-São Paulo) . Mas o Estado brasileiro presente não é apenas esse. É um estado no qual o desnível das economias regionais aniquila toda e qualquer possibilidade de autonomia econômica da maioria absoluta dos estados, cujas economias1
por outro lado, continuam sendo esgotadas pela sangria financeira
proporcionada tanto pela tributação, quanto pelo controle do sistema bancário e creditício que, com suas bases em apenas dois
ou três estados da Federação, transforma-os no desaguadouro de
todas as reservas do País. Esse desnível, que tende a agravar-se
nos planos estadual e regional, desmente a possibilidade de uma
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federação e ainda, fortalece e justifica a intervenção do Estado
na economia e política regionais. Nenhuma economia regional,
exceção feita à Guanabara e São Paulo, pode hoje subsistir à
outrance da União. Para completar, por razões políticas e econômicas, o Estado brasileiro é crescentemente intervencionista e
planejador, um estado centralizador que, se não tiver detida sua
marcha, descambará inevitavelmente para um "Estado unitário
monolítico, desenvolvimentista, tecnocrático, autoritário, superintendente dos objetivos econômicos permanentes, que nada deixaria ocioso ou autônomo às esferas intermediárias."
Nesse panorama, não há como falar em federação. Mesmo
porque os fundamentos ideológicos da federação, à frente o liberalismo chocam-se diante da realidade do Estado moderno, não
só centralizador e intervencionista, mas também antiliberal. "De
último, o conceito de federalismo, se o traduzirmos na linguagem
clássica da sociedade liberal, tende a desvanecer-se. Os fatos fizeram ontem a teoria federativa (sociedade do lai$sez-faire), os
fatos estão hoje a desmanchar essa teoria (sociedade do intervencionismo estatal). Breve, ou a palavra federação estará riscada do vocabulário polftico ou nos chamados países federalistas
uma Constituição ousada já não terá necessidade de empregá-la,
a menos que saiba utilizar aquele termo com respeito a uma estrutura organizada de Estado que nada tenha a ver com a doutrina dos compêndios nos quais leram outras gerações, atormentadas
de problemas diferentes e movidas de distintas preocupações políticas."
Diante do .h acasso do federalismo dualista, Bonavides sugere,
como solução para a crise política brasileira, um federalismo das
regiões, "não porque o vejamos já desenhado sociologicamente
nos traços mais r€centes de nossa evolução, mas por afigurar-senos a única alternativa ao Estado unitário de asfixiante centralização".
Bonavides parte do pressuposto de que a tarefa que se coloca
historicamente diante da nação é a da restauração federativa, a.o
afirmar que "não se deve redemocratizar o País sem cogitar por
igual na modalidade de federalismo que se perfilhar." É fora de
dúvida que os estados de índole federalista tendem mais ao exercício democrático, ao passo que a centralização favorece aos estados unitários, sempre de vocação absolutista.
Mas o problema não está na forma, mesmo porque não ficou
demonstrado que a Federação é insubstituível. No momento presente o que se deve colocar ao cientista político é a restauração
do Estado democrático e desenvolvimentista posto que não está
igualmente comprovada a tese totalitária segundo a qual desenResenha bibliográfica
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volvimento e liberdade não podem andar de mãos juntas. É verdade que "os vícios que mataram o federalismo das autonomias
não poderão conviver com uma estrutura legitimamente democrática", mas isso não deve adiar a conquista democrática. Ao contrário, redemocratizado o País, urge construir um novo sistema,
federativo ou não, qtte se harmonize com o novo Estado democrático. Invertendo a proposição de Bonavides, entendemos que
não basta pleitear um novo quadro federativo para o Brasil, se
sua implantaçpão não for antecedida pela consagração de novo
modelo político de relações de governo, no âmbito de um retorno
democrático. E no caso retorno não é o pleito do passado mas a
reatualização de seu valores ainda que ombro a ombro com valores da sociedade presente: executivo forte, centralismo e planejamento estatal.
Bonavides parte do sentimento regionalista da representação
política do nordeste, a que denomina B ancada da SUDENEJ para
construir sua teoria do federalismo das regiões. Parece-me que aí
está exagerada a importância do auditório dessa bancada (o Congresso) , de um lado, e de outro, desprezado o real caráter da
representação política entre nós. A união das diversas bancadas
nordestinas é uma exccssão no quadro político brasUeiro e formada muito antes da SUDENE é uma tentativa de fortalecimento
qualitativo por intermédio da associação quantitativa. Os deputaados e senadores nordestinos sempre estiveram juntos, seja reunindo votos para lograr uma representatividade digna nos quadros
das duas Casas, seja no combate às mazelas comuns (as secas à
frente), seja, por conseguinte na batalha pelos mesmos benefícios.
De fato, as agências do governo eram e são comuns a todos os estados da Região (DNOCS, SUDENE, BNB) , como era e é comum
a poHtica tributária etc. Mas se as delegações nordestinas precisavam unir-se, pois unidas, as diversas bancadas da região tinham a
força de um dos grandes estados da federação - o mesmo não sucedia com os estados mais aquinhoados, os quais desde cedo sempre
tiveram audiência na República, inclusíve com mando político e
exercício direto do governo. Basta um rápido exame da galeria
dos presidentes da República e ministros de estado. Mas se há a
bancada da SUDENE inexistem outras bancadas regionais, enquanto ba·ncada.s outras formam-se independentemente da representatividade regional de seus membros, temos a bancada dos
pecuaristas, a dos usineiros, dos banqueh·os, dos industriais e até
as bancadas políticas ...
Por outro lado, Estados há que pertencem a várias regiões
e, dentro de uma mesma região, há sub-regiões e interesses distintos. O nordeste do litol'al compõe um quadro de interesses
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divez·sos do nordeste do sertão; o nordeste do São Francisco é
uma região com interesses distintos do nordeste da zona da mata;
o nordeste industrializado é uma região cujos interesses não se
compatibilizam com os interesses do nordeste agrícola e latifundiário, com o nordeste dos usineiros etc. O mesmo aplica-se a
outras regiões e estados, como Minas, onde se destacam a Minas
dos Bancos e a Minas industrializada. a Minas da pecuária e a
Minas extrativa. J á não são os mesmos os interesses de gaúchos e
catarinenses, maranhenses e paraenses. Sobre todos paira a Uniao,
a quem caberia a "tarefa básica de operar a composição política
dos interesses discrepantes", desde que a composição econômica
ainda segundo Bonavides, já se teria alcançado desde o advento
do planejamento econômico, "concebido em bases regionais, ao
passo que a composição política com base regional s6 se alcançará
mediante uma reforma profunda da Carta Constitucional, que coloque o País em dia com as suas novas dimensões e realidades no
campo federativo."
Sem precisar demonstrar a irrelevância atual de qualquer reforma constitucional, dadas as facilidades formais de que dispõe
o Estado, é bom lembrar que a União não é uma entidade arbitrária ideal, mas ao contrário, possui representatividade própria.
Ela resulta da própria composição de poder da República, que é
a consagração dos interesses da economia majoritária e, por via
de conseqüência, do Estado ou dos estados mais fortes. Como
desaguadouro desses interesses é que a União interfere.
Se o intervencionismo estatal opera-se promovendo o desenvolvimento regional, o mecanismo que criou a SUDENE, a ...
SUDAM e mais recentemente a SUDECO, é o mesmo que instituiu a EMBRATUR e a SUDEPE. Mesmo dentro dos estados,
há as superintendências de desenvolvimentó regional, como um
exemplo dentre muitos a Superintendência do Desenvolvi'l'nento
do L itoral Paulista. Essa política encontra-se em quase todos os
estados como uma verticalização da política nacional do planejamento. "No conjunto atual, o remédio que o País emprega para
curar os males das tensões e desequilíbrios lhe é ministrado tãosomente pelo braço executivo federal, cujo poder centraliza todas
as faculdades decisórias. As providências concretas de coneção
dos agravos econômicos contra os quais bradam as regiões desfavorecidas e injuriadas, partem unilateralmente daquele poder.
Toda iniciativa e decisão lhe pertence. Posto numa elevação
olímpica, dali contempla, dali dirige, dali inspeciona o quadro
interno dos interesses em conflito e das súplicas regionais. .Tuiz
ReseTllta bibliogrnfica
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supremo e onipotente, esse poder de cima tanto poderá ser . dadivoso como avarento, sendo a incerteza a nota que sempre afligirá os pugnazes interesses regionais."
O fracasso do federalismo dualista, as ameaças decorrentes
dos desníveis regionais crescentes, a necessidade de opor obstáculos à marcha até aqui livre do Estado Leviatã encontrariam
remédio, segundo Bonavides, no federalismo das regiões: "A Região oferece ao País a saída exclusiva para a renovação de um
federalismo cujas bases foram aluídas. O federalismo contemporâneo no Brasil é cada vez menos um problema de Estados e cada
vez mais um problema de Regiões. Como a enfermidade politica
das autonomias estaduais, que sempre reputamos incurável no
seio de uma organização de pluralismo liberal já ultrapassado, fez
sucumbir por inteiro a autodeterminação dos Estados, é de esperar que a Federação possa ressurgir na legitimidade de seus traços mais característicos, mediante as linhas estruturais de um federalismo regional. Fora daí, a alternativa será o Estado unitário
com nome de federação, esse contra-senso que repugna e fere a
delicadeza do sentimento federalista, arraigado em cento e cinqüenta anos de existência pátria e cuja trasladação à ordem constitucional, tendo sido já objeto de tantos litígios desde o Império à
República, viria enfim parecer às mãos de um possível Estado Leviatã erguido à sombra de esquemas centralizadores."
Bonavides não vê alternativa democrática duradoura senão
à sombra da retomada federalista, pois "a raiz da centralização
fará renascer o Estado unitário de vocação absolutista, que dificilmente se compadece com o Estado de direito".
Restou indefinido o Estado de direito a que se refere pois
segundo entendemos, a Grécia, o Peru, a Bolívia, a Espanha, são
estados de direito tanto quanto os Estados Unidos e a Suécia uma
vez que, estado de direito é todo aquele que obedece a um determinado estatuto, aquele que segue regras por ele próprio ditadas. Na classificação de estado de direito, que é o mesmo estado
legal não interferem julgamentos de valor, ou seja, não se discute
o valor dessas regras mas simplesmente sua existência formal.
Se um estado revolucionário não é um estado legal, é estado de
direito aquele que se sucede ao regime revolucionário, desde
que sua atividade paute as regras de um estatuto pré-designado. Esse estado de direito só descamba para o estado de fato,
perdendo sua legalidade, quando altera as regras do jogo em
andamento, vira a mesa.
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P1·agmá.tica da comunicação humana. Paul Watzlawick, Janet
Helmick Beavin, Don D. Jackson. S. Paulo, Cultrix, 1973.
Pragmática da comunicação humana, que é um estudo dos padrões,
patologias e paradoxos da interação, analisa os efeitos da comunicação na conduta humana. Mas o faz, ao contrário do que ocorre com grande parte da bibliografia especializada, mormente a
nacional, em linguagem clara, direta, sucinta, ou seja, com a
preocupação permanente de transmitir idéias, comunicar. Essa
característica formal valoriza ainda mais a obra que constitui
um valioso instrumento de trabalho nas mãos de psicólogos, psiquiatras e comunicadores em geral. Enquanto muitos dos nossos
textos preocupam-se em criar um jargão pretensamente científico
e terminam indecifráveis sem lograr qualquer forma de comunicação, o livro dos professores do Instituto de Pesquisa Mental
de Pala Alto, Califórnia, alcança um excelente nível de comunicação, sem qualquer prejuízo para o caráter altamente científico
do texto, na medida que a psicologia pode alcançar um estágio
de abstração cientüica.
O livro não é escrito em comuniqu.ês e é profundo. Exije
leitura atenta, diria mesmo releitura, pressupõe uma série de
conhecimentos prévios, como de resto toda obra científica, mas
não se destina ao falso deleite de uma igrejinha de pretensos
iniciados no falso isoterismo da comunicação, que afinal é coisa
simples.
Os autores estão preocupados com os efeitos pragmáticos da
comunicação, com a sua instrumentalidade como modificadora do
comportamento. Se há uma tese central, esta é a negativa de qualquer hipótese de não comunicação, pois até o silêncio comunica.
("Atividade ou inatividade, palavra ou silêncio, tudo possui um
valor de mensagem; influenciam outros e estes outros, por sua
vez, não podem não responder a essas comunicações e, portanto,
também estão comunicando" p. 45). Me::;mo o esquizofrênico assim definido o que se distancia do meio, o que perde a linguagem do seu grupo - se comunica. Há até o esquizofrenês, linguagem sem dúvida patológica, mas que mesmo assim não deixa
de ser comunicante, pois transmite a mensagem: "Esquizofrenês"
é, pois, uma linguagem que deixa ao ouvinte fazer a escolha entre muitos significados possíveis, os quais não são só diferentes
mas podem até ser mutuamente incompatíveis. Assim, torna-se
possível negar qualquer ou todos os aspectos de uma mensagem.
Se instada a esclarecer o que quisera dizer com a sua declaração,
Resenha bibliográfica
145
a paciente (acima] talvez responda, apenas, num tom displicente:
'Oh, não sei. Devo estar maluca.'! Se lhe fosse pedida uma elucidação de qualquer dos aspectos da frase, ela poderia responder:
'Oh, não, não foi isso o que eu quis dizer, absolutamente ... ' Mas,
apesar de condensada de molde a impedir um reconhecimento
imediato, a declaração da moça é uma descrição lógica e coerente
da situação paradoxal em que ela se encontra e o próprio comentário 'devo estar maluca' pode ser inteiramente adequado, tendo
em vista a soma de auto-sugestão necessária para adaptar-se a
esse universo paradoxal." (p. 67)
Tornando o texto menos denso, os autores, além de casos
clínicos, lançam mão de casos retirados da literatura, como quando analisam os aspectos comunicacionais da peça Quem tem medo
de Vírginia. Wolf?. Não torcem o nariz de cientistas ao texto literário, ao contrário, aproveitam-se das relações que guardam mais
ou menos próximas do contexto humano.
Desprezam o estudo da mônade (uma entidade isolada) para
se dedicarem ao estudo das dfades ou trlades (relação entre duas
ou três entidades), sem jamais perderem de vista o caráter interacional (interação: troca de mensagens entre comunicantes), da comunicação e também o fato de nos movimentarmos
entre sistemas de comunicação. Analisam ainda e muito bem, o
sistema de comunicação familiar. Há exemplos muito interessantes: um casal cuja mulher tinha fobia a elevador e o marido fobia
a reuniões, estabeleceu um acordo tácito: não iriam a reuniões
em andares altos, por causa da fobia da mulher. Dessa forma, a
fobia do marido ficava escamoteada. . . Outro exemplo é oferecido
por um analfabeto casado com mulher de relativa instrução.
Quando, por tratamento psicoterapêutico, ele venceu os bloqueios
e começou a ler, o casamento se desfez. Muitas vezes a homeostase
das uniões matrimoniais tem base em fundamentos neuróticos que,
destruídos pela psicoterapia, podem levar de roldão o próprio
casamento. Desse ponto de vista, o casamento pode ser encarado
como um equili'brio entre estados suplementares ou complementares de neuroses.
O livro, assim, examina os efeitos pragmáticos (comportamentais), da comunicação humana, dedicando especial atenção aos
distúrbios do comportamento. Os dados da pragmática são não
só as palavras, suas configurações e significados que constituem
os dados da sintaxe e da semântica, mas também os seus concomitantes não-verbais e a linguagem do corpo.
t46
R.C.P. 4/73
O fenômeno geral da comunicação é encarado como fator de
mudança do comportamento humano. A perspectiva da pragmática conduz à afirmação de que todo comportamento, não s6 a
fala, é comunicação; e toda a comunicação - mesmo as pistas comunicacionais num contexto impessoal - afeta o comportamento.
(p. 19)
A possibilidade da não comunicação é contraposta a comunicação como conditio sine qua non da vida social: "A impossibilidade de não comunicar faz com que todas as situações de duasou-mais pessoas sejam interpessoais, comunicativas; o aspecto de
relação de tal comunicação especifica ainda mais esse ponto"
(p. 65) .
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principais livrarias do Pais. Os pedidos de Reembolso Postal devem
ser dirigidos ao Serviço de Publicações, Praia de Botafogo 188 C.P. 21.120 - ZC-05 - Rio de Janeiro - GB.
Re1enha bibliográfico
147
A EXPERitNCIA DO SABER
A SERVIÇO DO DESENVOLVIMENTO
administração economia planejamento comunicação
são alguns dos assuntos tratados pelos autores
editados pela fgv.
Edgar Morin e outros- Cultura e
comunicação de
massas
U Thanteoutros- Guerra à poluição
BID - Dez anosdelutapelaAmérica
Latina
Raúl Prebisch- Transtonnaçào e
desenvolvimento- A
grande tarefa da América
Latina
A.Balinky- A economiadeMarx:anáüse
e critica
BID -Os mercadosdecapitaisdaA mérica
lAtina
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RESENHA BffiLIOGRAFICA
A comunicação de massa nos Estados Unidos. Leo Bogart. In:
Diálogo, v. 5, n. 4.
R. A.
AMARAL VIEIRA
Partindo de um 4 priori inquestionável, a inviabilidade de uma
sociedade industrial avançada sem o apoio de um sistema bem
coordenado de comunicação de massa, Leo Bogart, vice-presiden~
te do Bureau of Adve.r tising of the American N ewspaper Publishers Association, analisa a comnosição dos veículos de comunicação de massa, nos Estados Unidos. A primeira vista, os números que manipula sugerem perfeita liberdade de informação
assegurada por uma rede de veículos tão extensa que praticamente teria reduzido a zero a possibilidade de qualquer minoria
sem apoio num canal de comunicação de massa. Escreve: "Nenhuma sociedade passada desfrutou (ou sofreu) de uma tão vasta e variada produção de comunicações de massa quanto os Estados Unidos contemporâneo. Um recenseamento recente apurou
a existência de 1 749 jornais diários, 573 jornais dominicais, 8 012
semanários, 652 revistas, 2 316 publicações regulares identificadas como órgãos de profissões ou de setores de negócios, além de
inumeráveis publicações escolares, sindicais e de outros ramos
especiais, refletindo interesses altamente localizados ou transitórios. Existem 832 emissoras de televisão, incluindo 167 emissoras
de TV educativa e 6 480 enússoras de rádio, incluindo 355 unidades educativas ou de serviços públicos. Um total de 767 editoras produzem 203 470 mil livros didáticos e 88 400 mil livros comerciais por ano (11% destes últimos são de ficção e 89% de não
ficção). Há 10 034 salas de cinema e 3 685 drive-ins, que exibem
tanto os 178 filmes produzidos anualmente por Hollywood como
filmes estrangeiros. Isto não inclui a totalidade dos recursos de
comunicação usados pelos anunciantes, que investem seis bilhões
R. Ci. pol.,
Rio de Janeiro,
7 (3): 169-174,
jul/set. 1973
de dólares em cartazes de rua e em veículos públicos, folhetos de
propaganda pelo correio e várias outras formas de exposição
e promoção de vendas. Esta variedade de veículos de contato
significa que as pessoas não estão na dependência de um determinado meio de comunicação de massa como fonte de informação,
recreio ou opinião."
Esta verdadeira babei de canais de informação, todavia, esbarra na concentração de seus leitores e ouvintes, de sorte que a
variedade de veículos não importa variedade de opções. É o que
se infere do texto seguinte: "O sistema americano de comunicações de massa não é propício à fácil e ampla difusão de gostos
e opiniões inconformistas, ainda que proporcione muitas saídas
para aqueles que se esforçam por manifestá-las. Revistas pequenas, periódicos acadêmicos e eruditos, jornais de opinião política
minoritária, são de fácil acesso apenas a uma facção da população. As sérias críticas de livros só se encontram em meia dúzia
de jornais. Existem comparativamente poucas livrarias que vendam livros sérios (2 081 lojas independentes, 858 seções de livros
em grandes magazines e 1815 livrarias universitárias) . Em sua
seleção de experiências dos veiculas de comunicação, como no
caso de outros artigos, o público dispõe sempre de uma gama
restrita de opções."
Essa ausência de opções, como resultado paradoxal do aumento de canais, é fruto da massificação. Em outras palavras, a
dispersão dos canais não se fez em atenção à necessidade de construir um sistema democrático no qual todas as tendências de
pensamento da sociedade encontrassem abrigo, mas como resposta a um complexo de fatores dentre os quais sobrelevam interesses industriais (produção em massa), comerciais e de ma1'keting. Os dados são ainda oferecidos por Bogart: "Numa palavra, embora exista uma grande variedade de canais de comunicação de massa, a tendência é para que o público esteja exposto à
concentração numa estreita faixa do espectro de opções existentes. A circulação das 20 maiores revistas para o grande público
corresponde a 41% da circulação total de revistas (652). Mesmo
em veículos locais, como os jornais diários, os 50 jornais de maior
circulação cobrem 39% da circulação total de cotidianos (1 749).
As três redes dominantes de televisão atraem 92% do público
telespectador durante o chamado horário nobre, das 19.30 às 23
horas."
Esse quadro, que põe por terra toda e qualquer esperança
de encontrar, nos Estados Unidos, um sistema de comunicação
de massas democrático, posto que fundado num largo espectro de
170
R.C.P. 3/73
opções, não está longe de ser identificado entre nós. Faltam-nos,
a propósito, dados e informações estatísticas, mas é fácil verificar,
mesmo numa análise superficial, que estamos caminhando, também em termos de comunicação, para as concentrações que transformam os grandes veículos em monopolistas da informação e
ditadores da opinião. Se nos últimos 10 anos o número de canais
de televisão quase que duplicou, esses veículos, ainda quando
não integram cadeias ou redes, reduziram, no seu conjunto, as
opções do público brasileiro, desde que a programação de uns e
de outros está subordinada à programação das duas redes nacionais dominantes, os "associados" e a "Globo". As duas distribuem por todo o País a programação elaborada no Rio-S. Paulo;
mesmo as emissoras independentes estão divididas em dois grupos:
o dos que adquirem os programas da Globo e os que adquirem os
programas da Tupi. Em outras palavras, queremos dizer que ao
aumento do número de canais não correspondeu o aumento das
opções, antes determinou sua concentração, vez que, de uma forma ou de outra, o público está condenado a optar por uma ou
outra das duas programações. De certa forma o mesmo se deu
em termos de imprensa escrita. No Rio de Janeiro, a grande concorrência que se fazia, quase que em igualdade de condições, entre
os chamados órgãos lideres, Jornal do Brasil, O Globo, última
Hora (duas edições diárias), Diário de Notícias, o Jornal e Correio da Manhã, se reduziu, nos dias de hoje, a uma disputa entre
os dois primeiros veículos mencionados. Em São Paulo, a disputa
quase que se dá nos mesmos termos, com o Estadão de um lado
e, bem distante, As Folhas. O resto, tanto lá como cá, não pesa,
seja como veículos formadores de opinião, seja como simples
veículos difusores de informação. O mesmo se poderá dizer das
emissoras de rádio, das revistas de grande público, etc. Tanto
nos Estados Unidos quanto entre nós, a grande liberdade representada pelo discutível direito de cada cidadão ou grupo de minoria política poder montar seu próprio veículo é sufoeada pela
concentração de recursos que destrói as condições de uma concorrência perfeita e possibilita a concentração das audiências e
das tiragens, de forma esmagadora, nas mãos de poucos, pouquíssimos veículos.
Pondo de lado análises particulares aos Estados Unidos, Bogart se refere a uma das características mais notáveis da televisão, em todo o mundo, que é a de transformar os acontecimentos que transmite. A emissão se confunde com o próprio fato e
assim, modifica-o: ' 1A capacidade da televisão de transformar os
acontecimentos que transmite tornou-se uma questão de cresResenha, bibliográfica,
171
cente preocupação, tanto para os programadores como para a
sociedade. Quando os manifestantes de rua atuam para as câmaras e gritam: 'o mundo inteiro está nos olhando', é evidente
que o meio suscita a mensagem e não se limita, meramente, a
transmiti-la. Mas, embora o efeito revolucionário da televisão sobre a política seja, ao mesmo tempo, evidente e novo, o noticiarista nunca foi apenas um observador passivo dos acontecimentos.
Ele também é um ator que dispõe do poder de alterar o curso
tomado pelos eventos."
A recente história americana, como também a nossa, está
repleta de exemplos dessa ordem, desde o famoso debate dos candidatos Kennedy e Nixon que teria determinado a apertada vit6ria eleitoral do primeiro, até, mais recentemente, à transmissão
do interrogat6rio das testemunhas e acusados de W atergate.
Passando da televisão para a imprensa escrita, Bogart filiase ao grande grupo de cientistas políticos para os quai~ o jornal
gutenberguiano é um elemento de individualização e interiorização, levando o homem não apenas à leitura selecionada, fragmentada, mas principalmente privatizada. Ao contrário de McLuhan
e seguidores, Bogart vê hoje os meios de comunicação de massa
fundados nos auxiliares visuais, a televisão e o cinema à frente,
repetindo a mesma trajetória individualista e interiorizante dos
veículos gutenberguianos. Escreve Bogart: "A comunicação de
massa (excetuando o cinema) tende, historicamente, a representar experiências cada vez mais individuais para suas audiências.
Quando apenas um escasso número de pessoas sabia ler, elas
liam para outras. Com o fenômeno atual de uma alfabetização
quase universal, ler converteu-se agora num assunto inteiramente
privado, exceto no caso dos pais que lêem para seus filhos pequenos. Com o desenvolvimento do transistor, o rádio- outrora
o centro de entretenimento da família - tornou-se portátil, pessoal
e íntimo. Isto também está acontecendo agora com a televisão, à
medida que as familias adquirem mais de um aparelho. Entretanto, subsiste uma diferença entre o registro visível, tátil e permanente da comunicação impressa e a natureza intangível, evanescente, das mensagens telecomunicadas. O material impresso
é propício à generalização e abstração; a emissão é dirigida ao
imediato e específico."
Essa tendência à interiorização propiciada pela televisão é
acentuada, presentemente, não só pelos videocassettes, mas também pela televisão por cabo.
Depois que o Time Inc. vendeu suas estações de televisão e
rádio para se concentrar em atividades audiovisuais como o vi172
R.C.P. 3/73
deocassette e a televisão de cabo (CATV), muitos for am os que
passaram a temer, nos Estados Unidos, pelo futuro das grandes cadeias de televisão. Ameaçando as emissões de massa - nos Estados Unidos as transmissões coast-to-coast, no Brasil os famosos
"via Embratel para todo o Brasil" - a televisão CATV inaugura
a programação personalizada. Seu sucesso determinará o fim das
pesquisas de opinião e o inicio da escolha do programa e da informação que mais interessem a cada um. Prevê-se, até, programações absolutamente individuais.
O sistema CATV, hoje um fenômeno urbano, surgiu para
atender à necessidade tipicamente rural: levar a imagem televisada a pequenos lugares até onde não chegavam ou chegavam com
grandes deficiências as emissões normais. A imagem inicialmente
era captada por uma antena coletiva e transmitida, lar a lar, por
fio, oferecendo uma imagem perfeita, sem as desagradáveis interferências produzidas pelos obstáculos físicos. A partir desse emprego quase doméstico, o processo se desenvolveu até a instalação de estações destinadas ao sistema de transmissão por cabo.
Uma emissora pode oferecer simultaneamente (para escolha do
assinante) até 60 ou 100 programas diferentes, a um custo baixíssimo, pois as instalações transmissoras, por força do fio, dispensam os grandes investimentos dos sofisticados transmissores dos canais comerciais. Essa característica técnica chega ao quase milagre de proporcionar custos baixíssimos em transmissões para
grandes centros urbanos e para pequenos circuitos como um bairro, uma rede bancária, etc.
Que proporciona a CATV?
Seu emprego, pode-se dizer, vai até onde possa chegar nossa
imaginação. Pode ser utilizada numa rede comercial possibilitando,
por exemplo, realização de compras pela televisão; ligação de
r esidências, redações de jornais, universidades, a um centro
de computação; interligação de centros de pesquisa; interligação de
complexos industriais ou estabelecimentos comerciais; realização
de debates públicos conduzidos por televisão bidirecional; transmissão de programas educativos; realizaç.ã o de cursos; cotações
personalizadas da bolsa de valores; ligação da bolsa ~om escritórios de corretores, bancos e financeiras; programas destinados a
pequenos círculos; debates de matérias e assuntos vedados ao
grande público. Pode, ainda, alcançar o cúmulo da sofisticação
de possibilitar a um assinante a escolha de um determinado programa e sua recepção na hora, em casa, numa transmissão privada, pessoal, exclusivamente destinada ao seu receptor. No campo da educação, inumeráveis são as formas de seu emprego. Na
Resenha bibliográfica
173
imprensa, pode ligar sucursais entre si, redações e centros de impressão, empresas noticiosas e seus diversos assinantes e, por fim,
propiciar a emissão do jornal audiovisual.
O grande salto ~erá oferecido pela associação da CATV aos
gravadores de videotapes portáteis e aos videocassettes.
Sua dissenúnação se fez de forma muito rápida. Em 1965, nos
Estados Unidos, era de cerca de 2 milhões o número de assinantes
do sistema CATV; essa cifra elevava-se já em 1971 para quase 5
milhões e cerca de 2 500 estações transmissoras. Para 1980 as previsões estimam em 27 milhões o número de assinantes.
A figura do assinante proporcionará a essa televisão a possibilidade, negada pela televisão aberta, de programações em absoluto acordo com a qualificação do telespectador. Assim, serão possíveis emissões destinadas, por exemplo, a donas de casa, médicos,
advogados, executivos, de que resultará, a um tempo, tanto a possibilidade de verticalização da informação quanto a eficiência da
mensagem, emitida diretamente ao público a que se destina, num
caso e noutro, promovendo, cada vez mais, a individualização e a
privatização.
Mas a CATV poderá constituir-se numa esperança futura do
monopólio que ameaça a imprensa, falada , escrita e principalmente televisada. Possivelmente, os inconvenientes da interiorização, do individualismo, num mundo em que a competição estimula o individualismo, serão compensados pelo aumento de opções proporcionado pela CATV. Aliás, aumento de opções que
pode ser proporcionado pelo sistema de CATV desde que este não
caia, também, sob o controle do Estado ou dos mesmos cartéis que
manipulam e estandardizam as outras emissões. Infelizmente nada
nos assegura que o sistema CATV possa ser implantado de forma
diversa do monopólio que controla a imprensa americana, como
descrito por Bogart.
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Getulio Vargas. Peça nosso catálogo. O endereço é: F. G. V.,
Serviço de Publicações, Praia de Botafogo, 188, Caixa Postal
21.120, ZC-05, Rio de Janeiro, GB, Brasil
174
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RESENHA BmLIOGRAFICA
R.A.
AMARAL VIEIRA
A LUTA PELA INDEPEND:tl:NCIA DAS AMÉRICAS - IDSTóRIA DE SEUS HERóiS E MARTIRES, Osvaldo Orico, Edições
Atelier de Arte, 1972.
Trata-se de uma edição que, do ponto de vista gráfico, caracteriza-se pelo cuidado e bom gosto. A encadernação é rica e engenhosa, a impressão quase perfeita, a diagramação em geral e a
escolha de tipos e corpos sempre feliz. Nossos parabéns ao Atelier
de Arte. Uma única restrição pode ser feita à mancha tipográfica que, adotando uma linha de composição de 28 cíceros (sete,
pelo menos, a mais que a linha comum), terminou por constituir-se
em elemento perturbador da leitw·a. Mas, por outro lado, fun.cionou muito bem o aproveitamento da idéia - já concretizada
em outros livros - de fugir à axiomática impressão em preto,
optando os podutores do livro por um tom suave e repousante
entre o azul e o verde.
Quanto à organização editorial qa obra, todavia, cabem alguns
reparos. O mesmo editor que se lembrou de destacar o justo
copyright de Osvaldo Orico, esqueceu-se do dever de explicitar os
demais créditosJ como, por exemplo, o do autor ou autores das 22
ilustrações que abrem os 22 capítulos em que se divide a obra.
Não há, também, a menor referência a Vitor Meirelles, embora a
capa do livro e a folha de rosto sejam montadas a partir de sua
tela clássica. O sumário indica os heróis que mereceram o destaque de um capítulo, mas não fornece a página em que cada um
tem início. Fica, assim, praticamente sem função, tornando difícil a pesquisa e a localização do texto do interesse do leitor.
Outra critica pode ser formulada quanto à bibliografia. De
fato, não se compreende que obra dessa natureza - que já se
ressente da ausência de um índice analítico - de professado
~I
R. Ci. pol.,
Rio de Janeiro,
7{1): 119-128,
jan./mar. 1973
caráter científico e didático, abordando o processo libertário em
todas as Américas e refazendo a biografia de nada menos de 22
heróis nacionais, possa ser escrita sem auxílio de uma extensa
bibliografia, alimentando-se apenas da erudição e da memória do
autor. :f: que não há menção, de qualquer natureza, à bibliografia
acaso consultada. No prefácio há uma referência a "levantamento"
de William Borders, mas o leitor termina sem saber onde o autor
foi colher os elementos que manipula:
"Segundo um levantamento de William Borders, debate-se
agora, em toda a África Negra, qual deve ser a língua oficial dos
novos países chegados à maioridade política, em face do conceito
expendido por um colunista nig.e riano: Aceitar um idioma ·estrangeiro para sempre é continuar escravo dele."
Onde foi localizado o levantamento do Sr. William Borders?
Quem é esse "colunista nigeriano'~ e de onde foi retirada a irase
que lhe é atribuida?
Adiante (p. 12), encontramos:
"A tese" (nacionalismo linguístico) "ganha dimensões: em
Dacar, diretores de cinema senegaleses substituem os letreiros
em francês pela língua wolof) enquanto as aeromoças de Nairobi,
Quênia e outras regiões nacionalistas se dirigem em swahilZ a passageiros que só entendem o inglês."
De quem é a autoria do texto entre aspas? De Borders? Do
incógnito "colunista nigeriano"? De um terceiro especialista?
Orico não informa.
Além dos 22 ensaios biog.ráficos - analisando as figuras de
W ashlngton, Jefferson, Tiradentes, Miranda, Bolívar, San Martin, O'Higgins, Carrera, Santander, Sucre, Toussant-Louverture,
Morazan, José Bonifácio, Pedro I, Hidalgo, Morelos, Juárez, Cavallero, Francia, Artigas, Montalvo e Martí - Osvaldo Orico nos
oferece, em prefácio, um estudo globalizante do movimento pela
independência das Américas, com destaque, nos sucessos do papel
de cada um dos diversos heróis. Nesse estudo introdutório, Orico
minimiza os efeitos do enfoque que caracteriza as diversas biograrias, nas quais tende a confundir o fato em si com o papel nele
desempenhado pelos diversos heróis, despojando a história de seus
determinantes econômicos, culturais, etc. No prefácio, todavia, o
estudo que sobreleva é a análise do desenvolvimento contemporâneo das jovens nações africanas, despertadas para a independência
e para o progresso. A um tempo, o autor identifica a presença do
120
R.C.P. 1/73
Brasil nas origens da luta libertária africana e reclama nossa participação, desinteressada, no processo de construção econômica dos
novos países.
Após admitir que o conceito de independência, em nossos
dias, adquire conotações diversas das conhecidas nos fins do século
XVIIT (escreve: ''Dividida hoje a Humanidade em duas grandes
órbitas, que se disputam até o domínio dos astros, a palavra independência perdeu as características que possuía nos fins do século
XVIII e nos começos do século XIX, quando se processou a autonomia das colônias americanas") Osvaldo Orico, sem definir a
nova independência afirma a perda, pelo conceito clássico, das
características ideológicas em proveito do "novo caráter" do choque racial: "A luta entre Leste e Oeste, acordando os instintos
do pau-americanismo e acendendo o rastilho das reivindicações à
Asia e à Africa, tirou do vocábulo o sentido ideológico, para imprimir-lhe uma caracterfstica diferente: o choque racial".
Parece-nos - seja permitida a projeção em vista dos poucos
elementos fornecidos - que o autor se aproxima dos que, hoje,
aceitam a substituição do conceito político de independência pela
noção de interdependência, fórmula, que consagraria não apenas a
disputa Leste-Oeste mas, sobretudo, a administração em condomínio da humanidade, mormente dos países integrados no chamado "terceiro mundo": América Latina, África e Ásia. O registro
do novo tratado de Tordesilhas só tem sentido ao escritor do terceiro mundo quando, ao lado dessa afirmação, segue-se a pronta
negação de seus fundamentos e o propósito de sua denúncia, sem
o que nenhum país, quer africano, quer latino-americano, quer
asiático, alcançará, seja a independência políticfl, seja a interdependência político-econômica, essa escamoteada num conceito
abstrato de independência harmonizada aos interesses das duas
potências líderes.
Embora tendendo a aceitar o conceito de interdependência e portanto, pois é a ele imanente, a fatalidade histórica que destinou um país ao leste e outro oeste - Osvaldo Orico põe em relevo, no conturbado quadro da luta pela independência na África,
a contradição dos interesses econômicos: "Ninguém desconhece a
luta de interesses que se esconde atrás da benevolência com que
certos países colonialistas transigem diante do fato político e social, para poderem preservar o domínio econômico. Disso era
índice o caso do Congo. Pela sua posição geográfica, que o transforma em trampolim em pleno coração da Africa, tem o Congo
uma enorme importância estratégica para o mundo ocidental. Talvez as inquietações políticas dos negros e os seus sonhos de sobeResenha. bibliográfica
121
tania não sofressem maiores atropelos se, por baixo deles, não se
encontrassem as jazidas de cobre e urânio da província de Katanga''.
Na história africana contemporânea, Osvaldo Orico vê a presença da índole brasileira, representada pelo africano-brasileiro
que fez a viagem de volta às origens étnicas e culturais:
11
É curioso assinalar nas manifestações com que a Africa reclama sua libertação às raizes americanas de seus heróis. Vinculam-se a elas escravos brasileiros emigrados ou restituídos ao
continente negro após a abolição do cativeiro e que ali continuaram a viver. Desses velhos clãs familiares estão saindo muitos dos
caudilhos que abrem caminho às novas soberanias africanas. Entre eles, Sekou Touré, presidente da Guiné, neto de brasileiros.
Fizeram a viagem de volta. Muitos trazem ainda no nome a marca
da origem: no Toga, o primeiro-ministro Silvano Olímpio, o ministro dos Serviços Públicos Paulino Freitas e o líder nacionalista,
Agostinho dos Santos.
"O atestado mais positivo de nossa influência no processo
emancipador das colônias africanas está nas cores verde e amarelo
da bandeira nacional do Togo, que traduzem as que escolhemos
para o nosso pavilhão.
"Segundo o depoimento do escritor Amilcar Alencastre"
(Onde? Qual o texto do depoimento? Em que obra foi publicado?), "que se especializou na observação e estudo do processo
emancipador das colônias africanas, encontram-se vários descendentes de escravos brasileiros atuando ativamente no Camerum,
no Mali, em Gana, no Congo, em quase todo o litoral da Nigéria.
Dos Estados Unidos também fizeram ·a viagem de volta escravos
americanos; mas estes, restituídos ao habitat de, seus antepassados
preferiram constituir núcleos à parte, estabelecendo dois grupos
sociais distintos: os liberiano-americanos e os lorma-africanos.
Acenderam entre si uma divergência íntima, de que só agora se
estão libertando para vencer os antagonismos e chegar a um plano
de integração nacional, ao passo que os descendentes de escravos
brasileiros, retornando à Africa, levaram na sola dos pés as marcas
da convivência pacífica com outros grupos humanos."
Osvaldo Orico opõe-se ao apa:rtheid e à discriminação racial.
Mas não consegue livrar seu raciocínio das armadilhas do pensamento idealista: "Esta ( ... ) deixou de ser uma simples revolta
da cor contra a chibata e a espoliação; adquiriu fundamentos
filosóficos e morais que desafiam o respeito dos brancos."
122
R.C.P. 1/73
Está implícito, no texto assim posto, o reconhecimento da superioridade do branco sobre o preto - e isto é discriminação - e
o respeito do branco, como colocado, soa como uma concessão. A
discriminação só desaparece, efetivamente, quando em nossas bases
de valores - e portanto na formulação de nosso raciocínio - não
precisamos de distinguir os homens en1re si, entre brancos e negros por exemplo.
A indicação do fator econômico como centro da luta colonialista na África contemporânea, tese que se destaca no ensaio
de Orico, é repetida quando (p.ll) reafirma: "Alguns Estados
a{ricanos padecem ainda de certa imaturidade econômica que lhes
garanta a maioridade política." Em outras palavras, o que se lê é
que na A.frica - e por extensão na Asia e na América Latina - a
luta pelo desenvolvimento econômico permanece como o caminho
mais seguro para a emancipação política. A independência é um
mito que se consome na retórica se não se faz acompanhar da
soberania econômica. Como tal não nos referimos à auto-suficiência, cada vez mais distante no mundo da tecnologia, mas às bases
mínimas de uma estrutura econômica que assegura ao Estado os
meios de prover seu próprio desenvolvimento.
Osvaldo Orico, todavia, na mesma página 11, desenvolve uma
tese perigosa, máxime quando seu autor vive em um país que não
possui economicamente mais de 50% do vasto território que domina politicamente. Desdobrando a idéia, corretíssima, do desenvolvimento econômico cimentando a independência econômica,
chega porém a admitir a necessidade de tutelas aos não desenvolvidos: " ( ... ) Não há, porém, o que reprovar e criticar, se levarmos em conta que, decorrido meio século e mais ·após suas mudanças essenciais, a América inglesa e a América Latina ainda apresentam áreas incapazes de merecer economicamente a soberania
política, necessitando de serem tuteladas ou orientadas na gradual
conquista de sua autonomia". Esse paternalismo colonialista muito mal colocado na pena de um escritor latino-americano é o grande argumento de que se servem as nações que ainda tutelam a .África e a Asia, no esforço de oferecer à opinião pública
uma justificativa moral para a imoralidade em que se constitui a
opressão de povos e nações.
Parece-nos uma fratura em seu pensamento claramente antiracista a procura de elementos raciais pouco identificados nas
razões de diferentes formações políticas no continente africano.
Osvaldo Orico afirma que as colônias administradas por ingleses,
portugueses e espanhóis desfrutam de certa normalidade política,
enquanto as nações puramente africanas apresentam-se num deResenha. bibliográfica
123
sassossego político. Em hnguagem de sintese, o sangue europeu,
nas primeiras, teria determinado o "progresso" e a estabilidade;
o sangue africano seria o responsável pelo atraso e pela agitação
política: ·~nquanto as colônias inglesas, portuguesas e espanholas
da América se acomodaram aos regimes escolhidos para autogovernar-se, as jovens nações africanas experimentam um desassossego íntimo que as faz escravas de sua própria inquietação, sacudidas a cada momento pela ameaça de golpes militares".
Se a realidade africana é, realmente, essa dicotomia entre
estabilidade e desassossego, é do melhor conselho científico extrair da análise os preconceitos raciais e procurar nas estruturas
econômicas, nos determinantes políticos, as causas profundas e
reais da inquietação, essa na verdade, como o próprio Osvaldo
Orico sugere em outras passagens de seu livro, provocada e estimulada de fora para dentro pelas grandes potências que disputam
entre si o subsolo do continente negro. A instabilidade política e
os golpes militares são, de fato, apenas uma das faces da mesma
moeda, a forma de que se utilizam as nações colonialistas para
conduzir na direção dos seus próprios interesses a vida das nações
que precisam explorar.
Visto assim, em suas linhas gerais, o pensamento que dominou a elaboração da obra, resta-nos ingressar na análise de seu
texto propriamente dito, e sobre os ensaios biográficos. Na impossibilidade de comentar os 22 ensaios biográficos, optamos pela
análise do estudo da vida do protomártir de nossa Independência.
Osvaldo Orico inicia o estudo sobre Tiradentes reclamando
da injustiça dos pósteros no delineamento da imagem do herói <la
lndependência que não teria, nos quadros de nossa história, o destaque que seu papel exigiria. Atribui a esse pouco destaque ( ... )
o fato de Tiradentes, com a Inconfidência, haver-se levantado, de
uma só vez, contra Portugal e contra a Monarquia (p. 43). Mesmo com a Independência, não se poderia fazer justiça ao Alferes,
afirma, pois, se D. Pedro I chegaria ao ponto de nos libertar rompendo com a pátria-mãe, não poderia restabelecer a memória daquele que fora condenado por sua avó-Rainha justamente pelo
crime de haver intentado separar o Brasil de Portugal e destituir
aqui o poder reinal. Segundo Osvald<> Orico, somente um Estado
republicano poderia consagrar Tiradentes que fora, a um tempo,
libertador e republicano. Daí o pouco prestigio desfrutado por Tiradentes ( ... ) . Til'ante o discutído interesse da monarquia do
Brasil independente em exaltar a figura do primeiro mártir dessa
mesma Independência, resta lembrar que a República já dispõe
de 83 anos ... , tempo bastante para o restabelecimento da imagem do alferes. E, por concessão da Monarquia ou méritos post124
R.C.P. 1/73
republicanos, o fato é que, ao contrário do que afirma Osvaldo
Orico, de todos os vultos de nossa história, o que mais avulta na
consciência de nossa gente é a figura de José Joaquim da Silva
Xavier, cantado, em seu heroísmo em prosa e verso, herói não
apenas à vista dos estudiosos mas, fato excepcional, do homem
comum que o idolatra como a um santo, tema até do cancioneiro
popular. Ao contrário do que afirma Orico, nos textos para a juventude, particularmente nos textos didáticos, pouco se fala nos
cimentadores de nossa nacionalidade, reduzindo-se mesmo a Inconfidência à figura do Alferes. Qualquer ginasiano nos contará a
história de Tiradentes, mas poucos, pouquíssimos, poderão arrolar
seus companheiros de subversão, ou destacar o papel de Alvarenga, Cláudio Manuel da Costa ou Tomaz Antonio Gonzaga. José
Bonifácio, outra figura maior de nossa história, é simples coadjuvante nas biografias de D. Pedro I e este, só agora, começa a ter
seu verdadeiro papel delineado. Até bem pouco, os méritos de
estadista eram escondidos por uma crônica que se limitava a descrever-lhe a impetuosidade, a imaturidade e o mulherismo. Ainda
hoje ensina-se ao nosso colegial as aventuras do jovem Imperador
com a Marquesa de Santos, ao tempo que se omite a figura do
herói do cerco do Porto, do responsável pela implantação do liberalismo em Portugal. Mesmo no livro de Osvaldo Orico, enquanto
o ensaio sobre Tiradentes atinge a 15 páginas, o estudo sobre José
Bonifácio não vai além de seis páginas e o dedicado a D. Pedro I
fica em oito páginas ...
Infelizmente, o texto sobre Tiradentes não é uma obra "reparadora" mas até certo ponto, desabonadora da conduta de seus
companheiros de subversão. À página 44, por exemplo, escreve
1
Orico: ' Tiradentes1 herói popular direito e antilivresco, antecipará o sonho do homem americano nas terras da coroa portuguesa,
e suportará sozinho, sem companheiros nem hesitações, todas as
culpas e todos os riscos do direito de opinião. Enquanto os cúmplices de conspiração procuravam atalhos para desertar das malhas do processo, ele evocava a responsabilidade total do movimento, reunindo todas as parcelas da Inconfidência Mineira numa
só expressão humana".
Entendemos o episódio de outra forma.
Se os membros da Inconfidência- intelectuais, poetas e escritores levados ao sonho por impulsos mal medidos - tiveram, nas
horas mais duras da repressão, momentos de crise e de fuga,
nada há de condenável nessa conduta. Não cabe àqueles revolucionários colaborar com as forças de Barbacena e era legítima
toda a tentativa de negar o fato e dificultar a ação policial. A
Resenhq. bibliográfica,
125
tortura, de que todos foram vítimas, foi, aliás, o instrumento de
que se valeu a repressão exatamente para arrancar de cada um a
co~ssão que daria fundamento jurídico ao processo e forneceria
munição para o desbaratamento do resto da conjuração. Trradentes - a1 estão os Autos da Devassa - no primeiro momento, teve
o mesmo comportamento de seus cúmplices, isto é, negou e negaceou, procurou todos os atalhos possíveis para fugir da condenação; só na segunda fase do processo é que admitiu a culpa e
assumiu a responsabilidade pelo movimento. Outro reparo necessário é quanto à classificação do delito de Tiradentes. Osvaldo
Or ico entende que os conjurados arrastaram contra si "os riscos
do direito de opinião". Há uma distância, que não é um simples
liame, entre os delitos de opinião e o de sublevação, com mudança
da ordem jurídica. A Inconfidência não foi um movimento de opinião, mas uma tentativa de subversão da ordem constituída que se
consubstanciaria na ruptura de nossos laços com Portugal, na destituição dos governantes e na implantação de novo regime, o Republicano.
Depois de afirmar que Tiradentes era um herói "antilivresco"
(p. 44) , Osvaldo Orico intenta pr ovar a difícil ascendência cultu-
ral de Tiradentes sobre os companheiros de ação, e daí, a liderança do grupo. Escreve (p. 48):
''Não lhe faltaram missões de confiança impostas pelo desempenho cabal de funções que, embora modestas, atestavam lisura
de conduta, capacidade de ação e sentido de comando. Os testemunhos recolhidos sobre sua folha no Serviço de Cavalaria indicam um militar compenetrado, que levava a sério as obrigações
contraídas na tropa, completando-se com estudos que o situam no
plano dos estudiosos de problemas hidrológicos. Não se limitou a
aprender com o padrinho, Sebastião Ferreira Leitão, cirurgião
licenciado, a técnica de extrair dentes. Interessou-se pelas questões de canalização de águas, tendo, em uma de suas permanências
no Rio de Janeiro, dedicado atenção ao abastecimento de água da
cidade, com um plano para o aproveitamento dos rios Maracanã
e Andaraí. Se não foram aceitas as sugestões que então ofereceu,
nem por isso deixou de ser reconhecida pelos técnicos a viabilidade de seus planos, que lhe conferem um atestado de capacidade
no assunto.
"Esses dados escassos mas suficientes para nos certificarem de
sua idoneidade intelectual põem de lado a idéia de que sua alcunha
inscreve no rol dos Inconfidentes a presença de um simples sacamoelas, que houvesse sido vítima apenas da língua solta, no processo a que respondeu perante a história."
126
R.C.P. 1173
Ora, na própria afirmação de Osvaldo Orico, a Inconfidência
era "uma conspiração acadêmica, planejada por magistrados e
poetas": o desembargador Cláudio Manuel da Costa, o ouvidor
Tomaz Antonio Gonzaga, o doutor José Alvares Maciel e o ouvi~
dor Inácio José de Alvarenga Peixoto. Ao passo em que faz essa
afirmação, Osvaldo Orico deixa claro o esforço de Tiradentes para
acompanhar as viagens intelectuais de seus companheiros e ter
acesso ao catecismo da Inconfidência, à Constituição dos Estados
Unidos: ''o caso mais típico e expressivo é o do alferes Xavier,
que aprende francês" (há dúvidas quanto a isso) "e nele se exercita, recorrendo ao porta-estandarte do regimento a que pertencera e aos padres que se filiaram ao movimento, para chegar a ler
os capítulos de um livro em francês, publicado na Suíça, que di~
vulgava o texto da Constituição dos Estados Unidos".
Resta não estabelecida a figura intelectual de Tiradentes.
Esse comentário se faz - ressalte-se - em vista do texto de Osvaldo Orico, pois não entendemos que Tiradentes necessitasse desse
atributo quer para desempenhar seu real papel, quer para merecer a posição de destaque que desfruta na coluna de nossos heróis.
Há porém, no texto de Osvaldo Orico, uma passagem que
deixa mal o alferes. É seu encontro com Joaquim Silvério, assim
descrito:
"Encontrando-se no cruzamento de uma estrada com o alferes
Xavier, o coronel Joaquim Silvério dos Reis, cujos negócios andavam muito mal parados em conseqüência de suas dívidas e rixas
com o fisco, manifestou-lhe seu desagrado com o governo da Ca~
pitania, por ele classificado como abominável e odioso. Ouvindo-o,
o alferes sentiu nesse desabafo a oportunidade de conquistar mais
um elemento para a rebelião. Seduzido por tais manifestações, o
aUeres não teve dúvidas em requisitá-lo para o levante, contandolhe os planos já elaborados e o cálculo das probabilidades favoráveis aos inconfidentes. Teria sido leviano? Falastrão? Ainda que a
fluência de seus argumentos lhe acarrete a responsabilidade de
boquirroto, não se pode culpá-lo pelas conseqüências que sobrevieram daquele colóquio inesperado. Ao sair dele, esperava o al~
feres ter conquistado mais uma adesão para sua causa, enquanto
Joaquim Silvério encontrava uma solução para seus problemas."
Na p. 55, Osvaldo Orico se insurge contra a expressão Inconfidência Escreve:
"Muita coisa está errada na caracterização e julgamento da
conspiração mineira, a partir do nome com que é mais conhecida
e registrada nos anais da História: o de Inconfidência.
Reaen1lll bibliográfica,
127
Embora usado geralmente como sinônimo de conjuração, inconfidência signifca infidelidade ou traição ao Rei.
Ora, se o movimento originário de Vila Rica visava a autonomia da colônia e sua transformação numa república independente, se havia um programa para libertar o povo da tutela de
Portugal e dar-lhe condições econômicas e políticas diversas daquelas a que estava submetido, se havia um programa estabelecido ao arrepio das normas que o encadeavam a uma tutela estranha aos seus anseios e necessidades, a conjuração mineira deixava
de ser uma traição ao Rei para ganhar a autenticidade de um
movimento de independência tão natural como o que legitimou
a revolta das colônias inglesas da América."
Por tudo isso é que o movimento foi uma inconfidência. Que
pretendia o movimento, senão separar o Brasil de Portugal, derrubar a administração colonial e instalar a República? Tratava-se,
portanto, de um quadro de subversão da ordem com o emprego,
inclusive, da violência. Era portanto um movimento que, malgrado atendesse aos anseios mais cívicos da nacionalidade brasileira, e talvez por isso mesmo, era um movimento contra Portugal e a Rainha.
Ao fim do texto, a idéia que Osvaldo Orico nos deixa da Inconfidência é a de um movimento sem raízes mais profundas, sem
perspectiva nacional, municipal e provinciano, "sem voz ativa na
tropa e sem retaguarda nos quartéis", gerado e perdido por intelectuais idealistas mas ingênuos. Um movimento sem maior profundidade, enfim, destacado e 1·eprimido com extremo rigor, não
pelo que representava em si, mas, principalmente, como instrumento para uma advertência a todo aquele que intentasse contra
o Reino.
128
R.C.P . 1/73
RESENHA BffiLIOGRAFICA
R.A.
AMARAL
VIEIRA
1. Pensamento Marxista y Sociología. Henri Lefebvre,
apud Revista. Mexicana de Ciência Política, n. 62.
A Revista Mexicana de Ciência. Política inaugura o número 62,
dedicado à visão da sociologia contemporânea, com o artigo Pensamiento marxista y sociología, do discutido pensador francês
Henri Lefebvre. Trata-se, de fato, do primeiro capítulo de seu livro
Sociologie de Ma1·x, editado na França em 1966 pela Presses Universitaires de France e lançado no Brasil em 1968, pela Cia. Editora Forense, sob o título Sociologia de Marx. O artigo vale o
livro (do qual, aliás, é o primeiro capítulo), e assim está justificada esta resenha.
Henri Lefebvre, pensador independente apesar de sua filiação
marxista, dá curso a projeto audacioso intentado inicialmente
com o livro Marx, sa. vie, son oeuvre, avec un exposé de sa philosophie (Paris, Presses Universitaires de France, 1964) : uma nova
leitura de Marx. Não é uma releitura, mas o que claramente
denomina de revisão do marxismo.
Sua revisão foi imediatamente confundida (pelo marxismo
ortodoxo) como traição ao texto original, embora, convenhamos,
revisão não implique, necessariamente, em revi.sionismo, no sentido pejorativo com o qual o marxismo oficial impugna as incursões doutrinárias menos ortodoxas, como esta de Lefebvre. Bem
entendido o propósito do pensador francês, não se trata de retirar as categorias fundamentais do marxismo, ou mesmo contradizê-las, ou lê-las com outras palavras, mas reler procurando
R. Cl. pol.,
Rio de Janeiro,
6(4): 107-122,
out./dez. 1972
criar, se o texto original é criador ou ensejador de criação. (Re)
Ler levando em conta toda a experiência humana acumulada a
partir da morte de Marx.
Sem entrar no mérito das proposições de Lefebvre, inserimos
seu estudo entre as mais recentes contribuições européias visando
à análise crítica de uma filosofia, no caso o socialismo, posto em
questão pelo que ele mesmo (Lefebvre) denomina, sem definir,
de "desenvolvimento contraditório do pensamento marxista e do
mundo moderno". Não lhe ocorrendo a necessidade de quaisquer
explicações, ou esclarecimentos, cabe ao leitor identificar, de sua
parte, o que terá sido esse "desenvolvimento contraditório". O
stalinismo ou a desestalinização? A CJ:ise sinosoviética? O burocratismo? A ditadura? A invasão da Hungria? Praga? Não
define nem esclarece. Como o projeto não está concluído, pode ser
que o esclarecimento e a definição surjam mais tarde.
A partir da consciência desses desvios, Lefebvre propõe-se a
uma tarefa extraordinária e que certamente deitou ciúmes nos
centros ou institutos de estudos marxistas dos países socialistas:
manter firme o espírito dialético em oposição ao dogmatismo. Ora,
o projeto, em si, na sua simples formulação já envolvia uma grave
denúncia. Pressupunha a soberania do dogmatismo sobre a dialética. Eis uma tentativa de explicação: o stalinismo - antidialético - suprimira a construção doutrinária, ensejando o desenvolvimento de verdadeiros quistos, antíteses (que ironia!) dentro
do corpo do marxismo-leninismo. Seu filho dileto - o tecnoburocratismo soviético e a política chauvinista de grande potência dele
decorrente - seria fruto dessa fase de negação.
Esse é o quadro atual que se apresenta a Lefebvre.
Lembrando Sartre, Lefebvre procura corrigir o marxismo,
pelo qual se confessa irresistivelmente atraído, malgrado as
ostensivas reservas dos ortodoxos que não aceitam quer o filósofo da náusea, quer o pretenso revisor do marxismo. Se Sartre
intentou incorporar ao marxismo categorias fenomenológicas da
primeira fase (idealista-heideggeriana) de seu existencialismo,
Lefebvre lançar-se-ia a uma tarefa ainda mais audaz, e de resto
irrealizada, que é a revisão, no sentido já fixado, de toda a doutrina. Nesse ponto surge a crítica a Lefebvre, acusado de fraturar,
negando-os, os fundamentos de uma doutrina que se procura
manter viva e enriquecida, com a criação. Estranhamente,
Lefebvre, que combate a dogmatização da doutrina, é acusado,
pelos dogmáticos, de haver tentado violentá-la. Ora, a consciência
da crise (o desenvolvimento contraditório do pensamento marxista) e a decisão de (contribuir para) superá-la (tarefa esboçada
108
R.C.P. 4/72
em Sociologie de Marx) não autorizam - eis a objeção fundamental a Lefebvre - aceitar como socialismo criador a revisão
dos pontos básicos (seu projeto) fundamentais e estruturais da
doutrina. Mas não foi essa a missão a que Lefebvre se propôs. De
qualquer sorte, o campo deixado livre às intervenções do filósofo
(de Lefebvre e outros), todavia, j~ inexplorado: revisão do que
foi feito sem suficiência, explicação de textos obscuros, adaptação
do pensamento original às situações modernas que o filósofo e
historiador (seja permitida essa afirmação) não pôde prever.
Lefebvre mais uma vez parece vítima de incompreensões. O
que seu interessante ensaio defende, precisamente em Pensamiento
marxista y sociología, é a existência de uma sociologia de ou em
Marx. E isso não é um crime, nem mesmo à luz do marxismo.
Mas também nesse ponto seu pensamento encontra restrições
junto de muitos filósofos engajados para os quais o materialismo
histórico se bastaria como sociologia geral, ao conter as leis gerais
de toda a sociedade. Não se justificam as críticas a Lefebvre, até
porque, seja na crítica ao oficialismo {ou ortodoxismo), seja na
formulação da tese ge1·al, o filósofo francês não inova nem cria:
s,implesmente relê {e portanto não re-visa), mantendo-se assim
rigorosamente dentro dos limites de seus propósitos iniciais.
Não se trata de (mais uma vez) ressuscitar o jovem Marx
(Althusser) , pois, é inescamoteável; seus escritos, quer políticos,
quer históricos, quer econômicos, desenvolveram-se sob o prisma
sociológico, razão pela qual mesmo os fenômenos históricos e econômicos são estudados pela perspectiva do fenômeno social total
(global).
Um mérito a mais destaca-se do ensaio: Lefebvre afasta as
interpretações historicistas e economicistas sem incidir no erro,
comum, de substituir o historicismo ou o economicismo pelo sociologismo. Neste ponto é injusta qualquer acusação de haver
abandonado as nascentes de seu pensamento. Assim e por isso
não deveria haver uma sociologia em Marx, se o materialismo
histórico é a sociologia do marxismo, esta entendida como a teoria
geral do desenvolvimento social: seu objeto é o estudo dos fenômenos históricos, econômicos etc., não apenas segundo suas leis
particulares, mas segundo a perspectiva do fato social em sua integralidade.
A crítica comum dos marxistas a Lefebvre é, em síntese, a de
que não haveria sociologia, mas marxismo. Para essa corrente,
mesmo a existência de uma sociologia em Marx (uma capitis deminutio no materialismo histórico?) não permitiria ver sua obra
pelo prisma das divisões disciplinares; tratar-se-ia de um método
Resenha bibliogTáfiea
109
Visando a uma totalidade que, não sendo unívoca, é diferenciada.
Resistiria, assim, por exemplo, aos apelos às especializações e à
tendência à concepção interdisciplinar com que no Ocidente procuramos superar a compartimentalização.
Lefebvre sugere a existência nos textos dos filósofos "de Tréves - e em O capital notadamente - de uma sociologia das cidades
e do campo, dos grupos sociais, das classes, das sociedades em seu
conjunto, do conhecimento, do Estado etc. Ora, se o fundamento
da existência social é a atividade efetiva de sujeitos humanos concretos (Marx) , a afirmação de Lefebvre não é uma heresia.
A criação, ou sua tentativa honesta, não pode ser questionada
por nenhuma filosofia, muito menos por uma doutrina que se
afirma dialética, em construção, um sistema, um método de análise
e uma doutrina política. Se ela não é uma obra acabada, se tudo, e
também a doutrina, é mutação num mundo que é um projeto, é
justo e honesto o projeto de Lefebvre.
O projeto continuado de Lefebvre não é rever, mas reler (e
por que não rever?); competirá ao leitor (a quem sugerimos o
texto completo Sociologia de Marx, edição da Forense), decidir
se a revisão (ou simples releitura) redundou em revisionismo, ou
seja, se houve emulação ou criação.
2.
O Arquivo Nacional e as comemorações do Sesquicentenário
Contribuindo para as comemorações do Sesquicentenário da Independência, o Arquivo Nacional editou As Cartas Régias de 1.0 ,
2 e 6 de agosto de 1822 e O constitucionalismo de D. Pedro I no
BrasiL e em Portugal.
O primeiro volume reúne o fac-símile das famosas cartas de
D. João dirigidas ao Príncipe Regente e que teriam dado motivo
ao Grito do Ipiranga. São essas cartas: 1. Carta Régia mandando
anular a Convocação do Conselho de Procuradores. 2. Carta
Régia mandando investigar os moti'\l'os do não-compárecimento
dos deputados de Minas Gerais às Cortes. 3. Carta Régia sobre
a residência do Príncipe, instalação das juntas governativas e
nomeação de Ministros para o Brasil. 4. Carta Régia mandando
processar os membros da Juntil Provisória do Governo da Província de São Paulo e os signatários do discurso dirigido ao
Príncipe Regente.
De acordo com vários estudiosos, historiadores, essas teriam sido as cartas que o Mensageiro real, Bregaro, teria levado ao encontro do Príncipe, acompanhadas de cartas da
Princesa D. Leopoldina e de José Bonifácio incitando o Príncipe
à independência. De fato, essas cartas só chegariam ao Brasil e
110
R.C.P. 4172
às mãos do Príncipe depois da nação emancipada. O que D. Leopoldina e José Bonifácio enviaram ao Príncipe, alcançando-o às
margens do Ipiranga, foram antecipações dessas cartas, notícias
chegadas ao Rio com o brigue Três Corações que aportara a 7
de setembro. As cartas, datadas de 1.0 , 2 e 6 de agosto jamais
chegariam ao Rio em tempo de motivar o grito de independência
(7 de setembro). Talvez por isso mesmo tenham sido preservadas,
incólumes. Na apresentagão do volume, escreve Raul Lima, diretor do Arquivo Nacional:
"O Arquivo Nacional guarda, entre as preciosidades do seu imenso
acervo, as Cartas Régias que D. João VI, comunicando decisões
das Cortes portuguesas, dirigiu ao Príncipe Regente D. Pedro,
datadas de 1.0 , 2 e 6 de agosto de 1822.
Contêm elas as medidas, além de outras, das quais a 28 do
mesmo mês a Princesa D. Leopoldina e José Bonifácio de Andrada e Silva tiveram notícias com a chegada do brigue Três Corações, entrado no porto naquele dia. E que foram transmitidas ao
Príncipe a 7 de setembro, às margens do Ipiranga, provocando o
grito memorável.
Chegadas quando a nação já se emancipara, as cartas são
pouco conhecidas na íntegra. Varnhagem refere-se apenas às de
1.0 e 2 de agosto, publicadas pelo Visconde de Cairu. Entretanto,
elas, mais do que tudo, justificariam a decisão libertadora.
Estão aqui reproduzidas em fac-símile, uma delas com os respectivos anexos, em publicação comemorativa do Sesquicentenário da Independência promovido pelo Instituto Histórico
e Geográfico Brasileiro e a Comissão Executiva Central do Sesquicentenário da Independência com a colaboração do Instituto
Histórico e Geográfico de São Paulo".
O segundo volume, O constitucionalismo de D. Pedro I no
Brasil e em Portugal contém, antecedidos de introdução de Afonso Arinos de Melo Franco: fac-símiles de um trecho de carta de
D. Pedro I; artigos da Constituição escritos pelo Conselheiro
Francisco Gomes da Silva, o Chalaça; e de trecho da Constituição
escrito pelo mesmo Conselheiro, com emendas em caracteres
maiores e mais fortes da caligrafia do Imperador. Anotações, adições e emendas do Conselheiro Francisco Gomes da Silva à Constituição do Império do Brasil para adaptá-la como Carta Constitucional da Monarquia Portuguesa. Anotações, adaptações e
emendas à Constituição do lmpérito do Brasil por D . Pedro I
sobre as adaptações sugeridas pelo Conselheiro Francisco Gomes
da Silva. Texto final da Carta Constitucional da Monarquia
Resenha bibliográfica
111
Portuguesa resultant-e de adaptação, feita por D. Pedro I e pelo
Conselheiro Francisco Gomes da Silva, da Constituição do Império do Brasil.
Na apresentação, escreve Raul Lima:
"D. Pedro I passa à história como o fundador do constitucionalismo no Brasil e em Portugal .
Nesse papel teve a colaboração intensa, até hoje ainda não
devidamente reconhecida em profundidade, como o permitem os
documentos, do Conselheiro Francisco Gomes da Silva, o Chalaça.
O Arquivo Nacional, neste ano do Sesquicentenário da Independência do Brasil, resolveu publicar testemunhos do trabalho
realizado por ambos no sentido de adaptar a recém-jurada Constituição do Império do Brasil para, emendando abundantemente
exemplares do Projeto, cujo texto, aliás, é definitivo, elaborar a
Carta Constitucional de Portugal, do qual o nosso Imperador
era o Rei, como sucessor de D. João VI, embora às vésperas de
abdicar em favor de sua filha Maria da Glória que, por sua vez,
menor, ficaria sob a tutela do pai até 1834 .
Em estudo de alta categoria doutrinária que o eminente jurista e historiador Afonso Arinos de Melo Franco escreveu para
esta publicação encontram-se as origens e razões daqueles impulsos constitucionalistas e das idéias aí em ebulição.
Apreciando com mais vagar os documentos que vão aqui reproduzidos e outros que, por dificuldades técnicas, deixam de figurar embora interessando ao exame geral e mais profundo do episódio, o Serviço de Pesquisa Histórica do Arquivo Nacional
chamou a atenção para outras observações que se podem fazer
sobre os pontos de vista, as posições firmes e pretensões dos dois
redatores constitucionalistas.
Os andaimes da Carta Constitucional da Monarquia Portuguesa que aqui se reúnem não são de- todo desconhecidos. Otávio
Tarquínio de Souza, em sua obra História dos fundadores do Império, v. 3. p. 662, limitou suas pesquisas, no caso, aos documentos
incorporados ao Arquivo do Museu Imperial, detendo-se apenas
no texto emendado por D. Pedro I. Não conheceu o outro exemplar que jazia na Seção de Documentação Histórica, entre os
papéis vindos do Palácio de São Cristóvão em 1891, e é o que
permite verificar com segurança a verdadeira posição do Conselheiro Francisco Gomes da Silva naquele lance de bastidores da
112
R.C.P . 4/72
história portuguesa. O :referido documento, em virtude de permuta cuidadosamente realizada com o Museu Imperial, possibilitando ao Arquivo Nacional reintegrar valiosa coleção que fora
desfalcada indevidamente, passou a pertencer também ao acervo
daquele Museu. Não obstante, seu ilustre Diretor, Prof. Lourenço Luis Lacombe, não fez qualquer objeção a esta reprodução.
Está aberto aos estudiosos um campo bem interessante para
analisar a natureza e o teor das idéias dos colaboradores, cotejando-se as sugestões, aceitações e rejeições por parte de cada
um, do que talvez resulte o reconhecimento de papel porventura
mais importante do Chalaça. Nota-se sobretudo seu empenho em
consignar dispositivos em que o interesse do Brasil prevalecia
sobre o de Portugal. Assim a obrigatoriedade de socorro de força
armada portuguesa em defesa do Império do Brasü, sem reciprocidade. Chamam atenção suas idéias sobre a nobreza hereditária, rejeitadas prudentemente pelo Imperador.
Raciocinando com vistas ao ex.ercfcio, pelo gove1·no do Brasil, da regência sobre o 'Reino de Portugal, a qual deveria normalmente se estender até a declaração de maioridade de D. Maria
da Glória, em 1837, cogitou em notas esparsas de artigos disciplinadores dessa regência por todo o período que, entretanto, foi
drasticamente reduzido pela antecipação da declaração de maioridade de D. Maria II, em 1834.
Mais ainda.
No que ficou sendo o art. 96 da Carta, prevendo impossibilidade física ou moral do Rei para governar, situação essa reconhecida por pluralidade de cada uma das Câmaras das Cortes,
pretendia que assim também o declarasse a Assembléia brasileira,
para em lugar do Rei governar como Regente o Príncipe Real,
se for maior de 18 anos.
Assim, além dos documentos aqui reunidos, precedidos de
tão valioso estudo, fornecerem material de variada curiosidade,
que esperamos seja exercida, ainda se encontram nos arquivos
outros papéis que podem levar ao conhecimento de detalhes de
um dos instantes em que mais esteve interligada, intimamente
associada a história dos dois povos, um consolidando a sua Independência e outro iniciando a gestação de novo e atormentado
período da vida nacional em que o Rei outorgante da Carta Constitucional foi intervir, como guerreiro e herói, em defesa do trono
de sua filha."
Resenha. bibliográfica
113
REGISTROS
BRASIL AÇUCAREIRO. Publicação do Min.istério da Indústria
e do Comércio, Instituto do Açúcar e do Alcool, em seu ano 40 a 79,
número 6, de junho de 1972 contém:
N ota.s e comentários. IAA: Trinta e nove anos de criação; Apoio à
administração; Voto de congratulações; O IAA em Campos; Refinaria no Nordeste; Transportes de cana; Nelson Barbalho; Folclore
premia; Nova diretoria; ICCJ do IAA; Homenagem; Coleção "Dimensões do BrasiP'; Homenagem; Ensino técnico; Museus de arte;
Lux-Jomal; Recursos; Diálogo; Roteiro cultural; Brasil cinema;
Congresso ISSCT; Campanha da Cigarrinha na Câmara. Tecnologia
açucareira no mundo. Efeito da impureza na nucleação e cristalização da Sucrose; Entomologia; Chilo Agamemnon Bles; Eldano Wlk.
Sacarina; Diatrae Sacaralis na sua dupla variedade; Eulacaspis
Tegalensis; Composição química e ação de Sclex; Caso extraordinário da POJ no México; "Sucrose Chemicals" ; Realizações do
New York Sugar Trade Laboratory de 70771; Matéria estranha à
cana e sua produção econômica. Panorama canavieiro. Fusões; IAA
assina convênio com sindicato da orla marítima: preservados os
salários dos trabalhadores no porto do Recife; Brasil/ desenvolvimento- plano de saneamento; Ocorrência de cigarrinhas em canaviais de Santa Catarina. A. K. Dodson; O teor fósforo no caldo de
algumas variedades de cana-de-açúcar. Marco Antônio Azeredo
Cesar, Moacir Roberto Mazzari, Enio Roque de Oliveira; Levantamento das variedades de cana-de-açúcar cultivadas nos estados de
São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Goiás.
G.M. Azzi; Tecnologia do açúcar (Notas de laboratório e fabricação) Diário real; Medições e pesos; Açúcar aproveitável; Relatório
semanal. Cunha Bayma; Estudo sobre o comportamento da cana
"bis" em relação às suas características agro-industriais (li). Marco Antôrúo Azeredo César; Cana, engenho e açúcar (I) . Raymundo
Souza Dantas; Açúcar no sangue e música na alma. Claribalte Passos; Combate às cigarrinhas; Mercados interno e externo. F. Watson; Fundo de Assistência Financeira; Atos; Bibliografia; Açúcar
- congressos e convenções; Destaque.
NOTICIAS GRAFICAS. Revista de Economia Política e Desenvolvimento editada no Rio de Janeiro, Brasil, em seu ano 2, n. 13
contém:
A vez do Centro-Oeste; A crise do dólar e o comércio internacional;
Irracionalismo destruidor; O imposto sobre o valor agregado.
114
R.C .P. 4/72
REFORMA AGRARIA. Boletim da Associação Brasileira de Reforma Agrária. ABRA. Do número 6 de junho de 1972, ano 2,
consta:
Editorial. Terra, problema também no Sul. Aspectos dos arrendamentos de terras no Rio Grande do Sul. José Luiz Marasco Cavalheiro Leite; O fenômeno migratório e o trabalhador rural no Rio
Grande do Sul. Arabela Rota Chiarelli. Notícias. O que vai pelo
mundo; Novidades na América Latina; Notícias do Brasil. Livros
novos. Leitores escrevem.
REVISTA LATINOAMERICANA DE SIDERURGIA. Publicação
mensal do Instituto Latinoamericano Del Fierro Y Acero. ILAFA.
O número 145 do ano 13 de maio de 1972 trás:
Página de reclacción. Los empresarios se reúnen para agilizar el
intercambio siderúrgico. Inforntaciones de actualidad. IV Reu.nión
Técnica COPANT- ILAFA de Normalización de Productos Tubulares de Acero. Noticiário latinoamericano. Temas técnicos. Consideraciones para el establecimiento de una planta SL-RN de
hierroesponja. Ing. René Barbis D.; Práctica moderna de la producción de arrabio en el alto horno. G. Sommer y E. Beppler.
Normalización siderúrgica. Actividades de miembros afiliados de
Ilafa. Resumen síderúrgico mundial. Guia para. compradores.
DNEF. Revista trimestral em seu ano 4, número 20 (março de
1972) publica:
Inaugurada a ligação Oiticica-Castelo-Altos; Trânsito de superfície
problema em busca de equação nos EUA; Custos médios na E.F.
Dona Tereza Cristina; Ferrovia x rodovia; Discurso de posse do
eng.0 Roberto Freire Costa na chefia do 3.0 Distrito Ferroviário;
São Francisco terá metrô elevado e túnel sob a baía; Novas placas
de sinalização ferroviária; Hovertrem britânico inicia testes em
trilhos; As relações entre o governo e suas ferrovias; Trens superexpressos operados por computador; Transporte ferroviário de
passageiro; Instantâneos ferroviários; Instituição do "Dia Sem
Automóvel" numa cidade-satélite de Tóquio; Direito ferroviário.
PESQUISAS AGROPECUARIAS NO NORDESTE. Publicação
semestral da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste.
O número 2 volume 3 relativo a junho/ dezembro de 1971, inclui
no seu sumário:
Melhoramento genético do algodoeiro anual no Nordeste do Brasil.
J. Boulanger; A poda do algodoeiro Mocó -Resultados dos enResenha bibliográfica
115
saios executados na Estação Experimental do Seridó Cruzeta - RN
João da Mata Toscano Neto e Oderval Leandro dos Santos; Estudo
químico e tecnológico da banana e do caju. Geraldo Arraes Maia,.
Luciano Flávio Frota de Holanda e Carlos Brunet Martins; Informações tecnológicas sobre processamento de sucos (caju, maracujá
e abacaxi). Vicente Tavares Filho; Indicação para o feijoeíro
Macáçar- (Vigna Sinensís L.) na Zona da Mata do Nordeste (I).
Sarah Krutman, Manoel Duarte Lopes, Roberto J. de Melo Moura
li e Edna Gomes Bastos; Adubação mineral em feijão (Phaseolus
Vulgaris L.) na serra da Ipiapaba, Ceará L. Gerson C. Cunha,
J. Jackson L. Albuquerque e Neile Gomes L. Verde; Observações
sobre algumas argilas dos solos da zona litoral - mata de Pernambuco. Arão Horowitz e Ivan Ferreira Gomes; O anel vermelho do coqueiro, ;no estado do Ceará. J. Júho da Ponte, J.
Albérsio Araújo Lima e Egídio Brandine; Informações técnicas;
Melhoramento e experimentação com milho (Zea Mays) , no estado
do Ceará (1967/ 68) - ii. Maria Arlene Cavalcante Nogueira.
O DIREITO. Revista de Ciências Jurídicas e Administração Pública. Subsidiada pelo I Instituto de Alta Cultura (Propriedade de
Cancela de Abreu e Marcello Caetano) , publica no fascículo 4,
ano 103, outubro/ dezembro de 1971:
Artigos doutrinais. Acidentes de viação. Aspectos da responsabilidade civil. A. Carlos Lima; Obrigações convertíveis em ações
(conclusão). Rui Pena; Notas e comentários. Contribuição industrial. Custos: amortização de concessões de carreiras. A. Carlos
Lima; J'U:risprudêncict. Assento do Supremo Tribunal de Justiça,
de 27 de janeiro de 1971, anotado por Eridano de Abreu; Fatos
e documentos. Coexistência e cultura no mundo contemporâneo.
Henrique Martins Carvalho; Medalha comemorativa do centenário de O Direito.
CORREIO. Publicação de Centro Regional de Pesquisas Educacionais do Rio Grande do Sul. Instituto N acionai de E.jstudos Pedagógicos. Divulga em seu número 62, de outubro/ novembro/ dezembro de 1971:
Controle e eficiência do processo ensino-aprendizagem. Flávia
Maria Sant'Anna; Vultos rio-grandenses. Prof. Antônio da Rocha
Almeida e Walter Spalding; Efeitos de vários tipos de reforço
no condicionamento verbal. Euza Maria de R. Bonarnigo; Vinte e
cinco anos em prol de um mundo melhor; Obra de arte, objeto
estético e suas relações. Silvio Augusto Crespo Filho; Curso de
recursos audiovisuais de baixo custo; Curso sobre metodologia do
116
R.C.P. 4/72
ensino para professores universitários da área da saúde. Louremi
Ercolani Saldanha; Técnicas de dinâmica de grupos; MOBRAL
- sua atuação no Rio Grande do Sul; Pesquisa sobre matemática
reformulada; Visitantes do INEP; Ensino supletivo e a nova Lei
do Ensino de 1.0 e 2.0 Graus. Neusa Norma da Silveira; Lançamentos de editoras gaúchas; Bibliografia para a disciplina de
estrutura e funcionamento do ensino de 2.0 grau; Bibliografia sobre
filosofia da educação. Compilada por Maria Luiza Leite; Edições
do CRPE/RS.
INTRODUÇÃO AOS DIREITOS TECNOLóGICOS. Autoria de
Walter T. Alvares- Coordenador do Instituto de Direito da Eletricidade, Belo Horizonte, 1972. Cadernos Jurídicos da Eletricidade, 12. Do seu sumário consta:
l.a parte. Dimensões 1wrnw.tivas da. ciência e da. tecnologia..
Cap. I. Disciplina da pesquisa científica e da aplicação tecnológica ao meio social;
Cap. li. Tecnologia como extensão humana;
Cap. m. Cibernética e tecnologia.
2.a parte. Noção de direitos tecnológicos.
Cap. IV. Continuum jurídico;
Cap. V. Acoplamento de direito e tecnologia;
Cap. VI. Atividade jurídica em era tecnológica.
3.8 parte. Grupos de direitos tecnotógicos.
Cap. VII.
a)
b)
Cap. VIII.
a)
b)
Grupo direito marítimo:
Direito submarino;
Direto marítimo.
Grupo direito da energia:
Direito atômico;
Direito da eletricidade.
Cap. IX. Grupo direito espacial:
a)
b)
Direito astronáutico;
Direito aeronáutico.
índice analítico.
Resenhtl bibliogrdfica.
117
JUR1DICA. Revista trimestral editada pelo Instituto do Açúcar
e do Alcool, Ministério da Indústria e do Comércio. No número
116, ano 17, janeiro/ março de 1972 divulga:
Temas em destaqu-e.
Conselho Internacional de Magistrados.
Alfredo Buzaid; A influência portuguesa no direito brasileiro.
Pontes de Miranda; Machado Villela, primeiro jurista luso-brasileiro. Haroldo Valadão; Viagem na minha terra. Eliézer Rosa;
Comunidade luso-brasileira. Clovis Ramalhete; Das fontes lusas
do direito agrário brasileiro. J. Motta Maia; Execução da pena em
Portugal. Carlos de Araújo Lima; As sociedades por quotas de
responsabilidades limitadas, no direito português e no direito brasileiro. Otto Gil; A "execução para prestação de fato" do direito
português e a reforma do processo civil brasileiro. José Carlos
Barbosa Moreira; O novo código civil português e o projeto brasileiro. Amoldo Wald; A comunidade luso-brasileira. Egberto da
Silva Mafra; Código civil português. João de Oliveira Filho;
A instituição dos Forais. Samuel Duarte; O princípio da boa fé
no código civil português. Orlando Gomes; História do direito
luso-brasileiro. Arthur Cezar Ferreira Reis; O direito agrário português. Carlos F. Mignone; A prisão-escola no panorama prisional
português. Armida Bergamini Miotto; Um bolseiro brasileiro na
Universidade de Lisboa - A ação popular - Direito português
e brasileiro. Ivo Frey; Responsabilidade civil do Estado no Brasil
e em Portugal. José Aguiar Dias; D. Pedro I e a ordem jurídica
brasileira. Thomas Leonardo; A idéia de reforma agrária na legislação medieval portuguesa. José Arthur Rios; Breve histórico da
justiça colonial e da justiça imperial prasileira. Luiz Antônio da
Costa Carvalho; Considerações sobre o art. 1.0 da Constituição
portuguesa. Luís Ivani de Amorim Araújo; A mulher no mundo;
a mulher em Portugal. Maria Irene Dionísio de Arriaga; Ghana
- A mina dos portugueses, a costa do ouro dos franceses e dos
ingleses. Diva de Miranda Moura; A liberdade da moeda do contrato no código civil português. Reginaldo Nunes; Santo Ivo, Portugal e o Brasil Artur de Castro Borges; Rumos da cultura jurídica. Cristovam Breiner; Personalidades femininas portuguesas.
Zeia Pinho Rezende. Documentário. Leis, decretos e resoluções.
Resenha. Registro biblíográfico.
REFESA. Publicação bimestral do Departamento de Relações
Públicas da RFFSA. O número relativo a maio/ junho de 1972
contém:
118
R.C.P. 4/72
Os corredores de exportação; Um técnico na presidência da
RFFSA; Todo o conforto ao passageiro; Maquinista - uma vida
de emoções; Cartão de crédito viaja de trem; RFFSA mostra seu
trabalho; As barreiras da comunicação; Uma capela tomba na
linha do minério; Vagão-escola; A comunidade dos transportes;
RFFSA vai abastecer terminal açucareiro; Paraopeba: corredor de
minérios; Exportação tem novas obras; Novo acesso para o trigo;
Mãe ferroviária - dia do trabalho; Apoio a Fepasa; Ferrovia por
toda a parte; Ferroviários comemoram o 21 de abril; NorfolkWestern; Curso de locomotivas; Uma nova estrada Rio-São Paulo;
No mundo dos transportes; Gente; Fim de linha.
REVISTA DO DIREITO AUTORAL. Editada pelo Serviço de
Defesa do Direito Autoral, em seu ano 1, número 2, agosto 1972,
publica:
A palavr-a. do dir-etor; Distribuição unificada agradou e foi aplaudida; Justiça autoral se faz também através da assistência social
Em destaque. Repercutiu bem o aparecimento da Revista. do
Direito Autoral; A procura de autores para pagar direitos; Breves
e semibreves. Distribuição autoral: do usuário ao autor, um louco
complexo e oneroso trajeto; Viúvas dos compositores confirmam:
"Direitos autorais continuam sendo pagos - não temos queixas
das sociedades"; Do exterior. Reprint: Herivelto Martins (reeleito
para o sindicato por mais 4 anos) e a luta pela aposentadoria do
autor; O direito de autor nas constituições brasileiras; Como,
quando, onde e quanto pagar de direitos autorais; Jorn.al do SDDA.
O edifício do SDDA. Catálogo geral de música popular; O estado
e a propriedade literária e artística; Bibliografia básica sobre direitos autorais e direitos conexos.
NOT1CIAS GRAFICAS. Revista de economia política e desenvolvimento, editada no Rio de Janeiro, Brasil, ano 1, número 11,
de setembro de 1971, contém dentre outros artigos:
Porque 200 milhas; São Paulo não deve parar; Brasil: 8.a nação
mais populosa do mundo; Estratégia de desenvolvimento e política
tecnol6gica.
U9
de pragas que atacam o milho; Combate às verminoses requer
planificação. Seções fixas: Conve1·sa. informal. Cartas dos leitores.
Novas publicações. Flagrantes. Novos prod'U.tos. Qual é o seu
problema?
RAE- Revista da Associação de Engenheiros da EFCB. O número
relativo a julho/ agosto de 1972, no seu ano 15, número 118 publlca:
A nova diretoria da AECB; Membro da nova diretoria; A tração
elétrica no mundo; Um urubu perigoso; Odontologia da empresa.
Notícias e comentários. Bolsas de estudo; A RFFSA tem novo presidente; País das tulipas; Fer1·ofocas. Sociais e aniversariantes. Engenheiros e técnicos da RFF fazem cursos sobre locomativas;
Brasil inspirou um microscópio premiado; Palavras cruzadas. Atas
do Conselho Deliberativo; Novos salários para os engenheiros regidos pela CLT.
REVISTA JUR!DICA. Revista trimestral editada pelo Instituto
do Açúcar e do Alcool, Ministério da Indústria e do Comércio.
No número 117, ano 17, abril/junho de 1972, divulga:
Temas em destaque. O direito do fornecedor de cana à majoração
da cota de fornecimento como decorrência de sua capacidade de
produção. João Soares Palmeira; Imunidades dos cônsules acerca
dos atos oficiais e funcionais. Haroldo Valladão; Honorários de
advogado, segundo as regras do código de ética, as do estatuto
da OAB e da lei das duplicatas. Otto Gil; Ensino J urídjco na
UNB. lgor Tenório; História do direito luso-brasileiro. Carlos de
Araujo Lima; Novos rumos para o mercado de capitais. Amoldo
Wald; Os Alimentos no código civil de 1966. L. P. Moitinho de
Almeida; Estrangeiros, condição jurídica, admissão e expulsão.
Luís lvani de Amorim Araujo; Natureza jurídica da "Embratel".
M. T. de Carvalho Britto Davis; Perigo de vida no novo CP.
Damásio E. de Jesus; Fundamento do valor obrigatório do direito
internacional público. Magdalena Londero; Anteprojeto do Código
de obrigações. Jupira Palhano de Jesus; A mulher advogada.
Nailê Russomano de Mendonça Lima; A empresa na filosofia da
reforma agrária. J. Paulo Bittencourt; Considerações sobre o
poder de polícia. Diogo de Figueiredo Moreira Neto; A justiça e
o tempo. Homero Freire; Pela estabilidade das normas legais
alusivas ao reflorestamento. Otávio Mello Alvarenga; Direito apli·
ca.do. Documentário. Leis, decrett;>s e resoluções. Institt,to do
Açúcar e do Alcool. Resenha. Registro bibliográfico.
122
R.C.P . 4/72
PORTUGAL. Turismo cultura e informação. Publicação do Centro de Turismo de Portugal no Brasil, em seu número 7 de julho
de 1972, publica:
Portugal: 10 anos de progresso; Angola: mais de 1.300 centrais
eléctricas; Termas de Portugal, uma estação rupestre, 50.0 aniversário da 1. a travessia do Atlântico sul; li Bienal Internacional do
Livro; 6.0 Congresso Mundial das Agências de Viagens; Intercâmbio teatral luso-brasileiro; Moderna poesia portuguesa; Flagrantes.
CAMARA DE COMERCIO DEL BRASIL EN ESPANA. Boletfn
de información, números 19 e 20, setembro e outubro de 1972,
Madrid, contém:
7 de septiembre de 1822: "Independencia o muerte"; Aspectos del
desarrollo brasileíío a partir de 1920; Confianza extranjera en la
economía del Brasil; Grandes ventajas que ofrece Brasil a las
inversiones extranjeras; Aspectos de la mecanización de la agriculturales; Espana: oportunidades comerciales. Ofertas; ofertas de
empresas espaííolas (socios de la cámara); Espana. Oportunidades
comerciales (pedidos de Espaíía) . Firmas espanolas interesadas
en productos brasilefios; Espana: consultas hecbas e la Cámara
por empresas espaiiolas (exportadores); Brasil: importadores; Las
cinco etapas de las naciones; Noticiaria general; El régimen de
importación brasileíío ( continuación) ; La gran exposición industrial espaiíola en Brasil: abril de 1973; Sesiones de la Cámara realizadas bajo la nueva Junta directiva; La 50 Feria Muestrario
Internacional de Valencia (Bodas de Oro) ; Cartas de los lectores
sobre nuestra revista; Comercio entre Espana y Brasil en 1971;
Brasil: planificación económica y dei territorio; Espana en la
actualidad; Nuevos socios activos; Actividad de nuestros socios.
BOLETIM DO INTERIOR. órgão informativo da Secretaria do
Interior do Governo do Estado de São Paulo elaborado pelo Centro
de Estudos e Pesquisas de Administração Municipal. O número
28, relativo a janeiro, fevereiro, março de 1972 .no seu ano 5,
contém:
Comunicações diversas; Estudos-pareceres-jurisprudência; Legislação federal; Legislação estadual; índice.
BOLETiN DE LA VIDA LOCAL. Revista editada pelo Instituto
de Estudios de Administración Local. Em seu número 53 de junho
de 1972 contém:
Editorial. En el acto de clausura. Cronica N acionat. Audiência
de SS.AA.RR. los Príncipes de Es~aíía a los funcionarias munici120
R.C.P . 4172
pales iberoamericanos participantes en el Ili Curso de D.ixección
Pública Local; Importante discurso del Director General de Administraci6n Local en La Corufia; Don Francisco Ruiz Fernández,
Vicepresidente del Colegio Nacional de Secretarias, Interventores
y Depositarias de Adm.i.nistraci6n Local; Don Federico Garcia
Perrote, D.ixector general segundo dei Banco de Crédito Local; La
labor docente e investigadora en el Instituto de Estudios de Administración Local se computará para opositar a cátedras de universidad. Cronica. del XIV Congresso Intera.merica.no de Municípios.
Espafuz., miembro de pleno derecko de la. Orga.nizadón I1~terame­
ricana. de Coopera.ción Intermunicipal (OICI). Entrevista con el
professor De la Vallina Velarde. VIII Seminario Universittirio
Intera.mericano sobre Assuntos Municipa.les. Conferencia. del
doctOT Don Carlos Acedo Mendoza. sobre "Fundacomun". Cronica.
del Instituto. Seminarios de investigación; Simpósios de experiencia y proyectos; Seminarios permanentes de investigación aplicada;
Fondo de documentos de las corporaciones locales; Promoci6n
de publicaciones; Escuela Nacional de Administración LocaL
Agenda municipal.
REVISTA DE ESTUDOS DE LA VIDA LOCAL. Editada trimestralmente pelo Instituto de Estudios de Administración Local,
traz em seu número 174, relativo a abril/ maio/ junho de 1972, no
seu ano 31:
Sección doctrinal. El régimen local dei Sáhara . .Tosé Antônio Manzanedo Mateos; Los escollos de la regionallzación. Ramón Martin
Mateo; La doctrina dei silencio positivo en la aprobación de los
Planes de Ordenación urbana. Jose-Mario Corella Monedero. El
recurso ordinario de apelación con respecto a la impugnación
jurisdiccional de nombramientos de funcionarios locales. José
Hernández Corredor; Cronicas. IT Coloquio Nacional de Municípios de Lourenço Marques. Gumersindo Guerra-Librero y Arroyo.
Esta.dístic4. Los censos de edificios y de viviendas de 1970. lgancio
Ballester Ros. Jurispru.dencia.. Acción popular para impugnar en
vía contenciosa la inactividad de la administración ante infracciones de normas urbanísticas. N emesio Rodríguez Moro. Bibli~a.­
fia.. Revista de revistas.
O DIRIGENTE RURAL. Publicação relativa a julho/ agosto de
1972, volume 11, número 9-10,,contém:
Em busca da auto-suficiência; Ciclo lavoura-pasto é chave do êxito
de pecuarista; Nova técnica à vista: semeadura sem aração; Os
caminhos para uma estrada melhor; Ainda se descura do controle
Resenha bibliográfica
121
RESENHA BffiLIOGRAFICA
R. A.
AMARAL
VIEIRA
LmERDADE E NECESSIDADE, Joan Robinson, Zabar
Editores, Rio, 1971
Na Biblioteca de Ciências Sociais, Zabar Editores lançam Liberdade e necessidade (uma introdução ao estudo da sociedade), de
autoria de Joan Rob.inson, da Universidade de Cambridge. Tratase de excelente abordagem histórico-econômica do processo civilizatório que, partindo de momentos imemoriais e estruturas primitivas, chega a nossos dias como a sociedade tecnotrônica construída pela revolução tecnológica. A obra da ilustre professora de
Cambridge discorre, mesmo de forma sumária mas sem superficialidade, sobre o processo de formação social tendo como ponto
de referência o fundamento econômico das relações sociais. Por
isso mesmo, sua orientação é francamente histórica.
Ao apreciar a origem da sociedade, detém-se na análise do
grupo e aí sua orientação é solidarista. Abandona por completo
as criações do jusnaturalisrno e questiona a imanência da sociabilidade humana. O sedentarismo, por exemplo, é justificado pela
ambiência: onde o suprimento de comida se acha mais ou menos
espalhado de modo uniforme por grandes áreas, é possível um estilo gregário de vida; doutra forma, a dificuldade de suprimentos
determinaria o nomadismo - os herbívoros das pradarias geralmente vivem em rebanhos e a alimentação com plâncton permite
a vida grupal às baleias.
O grupo, em síntese, responde a uma fase do processo evolutivo e atende à necessidade de fortalecimento do indivíduo. Reportando-se a Washburn e Hamburg (Primate Behavior), justifica o grupo como resultado da aprendizagem necessária: "O grupo constitui local de conhecimento e experiência que excedem em
muito os do membro individual. É no grupo que a experiência
R. 01. pol.,
Rio de Janeiro,
v. 6, n. 2, p. 151-159,
al;>r./jun. 1972
se reúne e as gerações se ligam. A função adaptativa de uma prolongada juventude biológica é dar ao animal tempo para aprender. Durante esse período, enquanto aprende dos outros membros do grupo, é protegido por eles. O desenvolvimento lento, em
isolação, significaria simplesmente a desg1·aça para o individuo e
a extinção para a espécie". Ou seja, segundo as próprias palavras
de Robinson: "Com o desenvolvimento placentário e diversos
anos de crescimento até chegar à maturidade, a vida em grupo
tornou-se necessária. Em algumas espécies, o grupo constitui uma
"familia nuclear" de um casal com os seus filhotes; noutras, um
grande rebanho ou tropa de muitas famllias". A ilustração dessa
tese pode ser dada com a familia do gorila e a horda do chimpanzé. Justificando uma e outra teríamos a força de um e a
fraqueza de outro na luta contra a natureza?
Segundo entendemos, a sociabilidade foi uma conquista experimental do homem. Posto diante e no meio da natureza circundante, a um tempo fonte de vida e morte - e não há distinção
entre sua história e a da natureza - o indivíduo, para sobreviver
como espécie, teve de fortalecer-se no convívio plural. Culturalmente, repetiria o mesmo processo de autodefesa, de salto qualitativo pela soma de unidades observado na biologia: em algumas
espécies do reino animal, observa-se uma tendência ao comportamento gregário, em outras as condutas são mais individualizadas,
como ilustram os já oferecidos exemplos do chimpanzé e do gorila.
As condições de vida tendem a aumentar, criando mecanismos ou
reflexos condicionados cada vez mais refinados; a integração social determina condutas estereotipadas nos antropóides (homo
sa.piens) . Parece haver uma relação direta entre a forma de existência (tendência maior ou menor à integração) e a sociabilidade,
que é uma das características do homem. Na luta pela vida, o
homem curvou-se ao império da vida social; a experiência dos
primeiros embates mostrou a conveniência de fortalecer-se mediante o concurso de todos, na vida em sociedade, para, desta
forma, superar as deficiências - solidarizou-se, venceu. A solidariedade, de que deriva a sociabilidade, é experimental.
Robinson vê o aparecimento do direito como ulterior à sociabilidade, e derivado do relacionamento: "a vida social exige a
transmissão de conhecimentos e habilidades através da aprendizagem; ela dá origem ao problema moral básico - um conflito
de interesses entre o indivíduo e o grupo - que é solucionado
pela capacidade de submeter-se a um código aceito de comportamento". Em outras palavras, a lei admitida numa coletividade é
algo que se suporta e não uma regra livremente consentida.
152
R.C.P. 2/72
A propriedade privada (ver capítulo Terra e mão-de-obra) é
apresentada como uma conseqüência da descoberta da agricultura;
as necessidades de sobrevivência determinaram no homem uma
maneira nova de ganhar a vida; assim, partiu, por exemplo, da
predação de rebanhos de animais, como o búfalo ou a rena, para
sua domesticação. "Onde havia água disponível, a agricultura e a
lavoura se uniram pelo arado e o cultivo estabelecido tornou-se a
base da vida".
É construído o conceito da propriedade privada. Não se trata
da propriedade da taba, da oca, do cocar, mas dos instrumentos
de produção; do comunismo primitivo, caracterizado pela propriedade comum dos meios de produção, e dos bens deles resultantes, o homem salta para uma economia de produção, fundada
na propriedade privada dos meios de produção. As famílias podiam ter tanta terra quanto mão-de-obra e sementes tivessem
para cultivá-la. Ou seja, instaurava-se o regime de riqueza fundado na apropriação de bens (a que Robinson não se refere):
quanto maior a apropriação de bens, maior a acumulação de riquezas; quanto maior a utilização de mão-de-obra, maior a apropriação de bens. A escravidão, fruto das dívidas saldadas com o
braço escravo e as guerras de conquista de força de trabalho são a
resultante desse regime.
Joan Robinson vai encontrar no instituto da herança- uma
conseqüência da propriedade privada - os fundamentos para o
culto da virgindade e do conceito de honra da filha, irmã e esposa: "A castidade das mulheres", como disse o Dr. Johnson, 1
"é de máxima importância, uma vez que toda propriedade depende dela". Fruto dessa ou daquela razão (pode-se falar, até,
nas noções mágicas das sociedades primitivas), a virgindade fez-se
sempre acompanhar da instituição da prostituição, "a fim de
reconciliar a sexualidade masculina excessiva com os requisitos
do sistema familiar".
A virgindade só seria possível num regime monogâmico, ou,
pelo me;nos, naqueles em que predominasse o macho (os diversos
regimes poligâl:nicos). Na poliandria, regime em que uma mulher
poderia ser fecundada por diversos homens, era impossível estabelecer a linha de parentesco a partir do pai, restando a linha
uterina como única indicação familiar. Talvez esteja nesse fato
a origem das expressões matrimônio para significar a união do
1
Boswekk, James. Life of Dr. Johnson. Allen and Unwin, v. 2, p. 86.
Resenh~
bibliográfica
153
homem com a mulher, e patrimônio, a riqueza do casal, quase
sempre trazida pelo homem. Na poliandria, a indicação do parentesco era pela linha materna; daí matrimônio?
A propriedade privada dividiu a sociedade em segmentos sociais a partir de situações econômicas; o senhor da terra e o trabalhador da terra, vale dizer, os proprietários dos meios de produção e os que "alugam" esses meios; os proprietários e os rendeiros. "Uma família que não possuísse terras teria de trabalhar
muito mais. Um rendeiro que tem de dar a metade do produto
bruto de um terreno a fim de que lhe permitam trabalhar nele
terá de trabalhar mais de duas vêzes que uma família livre que
controle a mesma ái·ea, se é que deseja comer tão bem quanto
ela (mais de duas vezes, na realidade, porque entrega a metade
do produto bruto e tem de tirar as sementes de sua pr6pria
metade)".
Os excedentes de produção (p. 45) são apresentados como
decorrentes da propriedade privada: "se não houvesse proprietários de terras, não haveria excedentes, porque as famílias livres
não teriam motivo para produzir mais do que necessitariam para
consumir". O regime da propriedade gerou as guerras e essas
estimularam a produção dos excedentes, com os quais as tropas
eram alimentadas: "Os fidalgos lutam e organizam as lutas, enquanto que os agricultores são obrigados a apoiá-los, fornecendo
um excedente agrícola acima e além de seu pr6prio consumo e
deixando que seus filhos sejam recrutados para as fileiras dos
exércitos. Os agricultores de cada região possuem um motivo
poderoso para apoiar seus pr6prios fidalgos, porque, se não o fizerem, os fidalgos de outras regiões os assaltarão e matarão".
Se a utilização de braços já se fizera necessária para aumentar a apropriação de bens, ela agora se impõe para substituir os
braços utilizados na guerra e, num círculo vicioso, a captura de
escravos se transformou numa utilização econômica da guerra:
"O sistema de utilizar escravos para cultivar as terras enquanto
os fidalgos se achavam ocupados com a guerra foi encontrado num
certo número de reinos africanos. Seu exemplo mais famoso (fora
dos tempos modernos) foi o do império ateniense: Esparta dependia menos dos escravos capturados que de uma população nativa
que utilizava como serva. Uma sociedade, contudo, não pode
consistir apenas de gentis-homens e escravos. Tem de haver uma
população livre suficientemente grande, de categoria mais baixa,
que se identifique com os fidalgos e lhes permita manter os escravos em ordem. Em Atenas, a aristocracia era constituída por
R.C.P. 2/72
aquelas famílias que possuíam terras e escravos suficientes para
sustentar seus filhos como cavaleiros, enquanto que a infantaria
era fornecida por pequenos fazendeiros que tinham poucos escravos, eles próprios trabalhando. Os administradores e capangas
necessários para dirigir as grandes propriedades eram amiúde escravos promovidos pelos fidalgos, a fim de manter trabalhando
seus companheiros de escravidão. Quanto aos escravos domésticos, como o Tio Tom, havia menos necessidade de força para
mante-los em ordem. A guerra continuada era necessária para
manter o suprimento de novos cativos".
O excedente de produção, portanto, era consumido em parte
para manter um estabelecimento militar e em parte para sustentar
o padrão de vida da classe fidalga (p. 48) .
Fundado nessa mesma visão histórica, Joan Robinson considera, ainda, a expansão capitalista (partindo de Ricardo, analisa a
crítica de Marx e os conselhos de Marshall); passa em revista o
boom das quatro primeiras décadas do século; as relações entre a indústria e o Estado do pós-guerra; as caracterfsticas do
capitalismo protecionista de nossos dias, a que denomina "o novo
mercantilismo", o caminho chinês e sua heterodoxia, o terceiro mundo constituido pelas nações subdesenvolvidas; estuda as
idéias de Adam Smith, Mill e Keynes que, a seu ver, salvou o
sistema capitalista ao convencer os governos que eles tinham o
poder e o dever de conservar um emprego quase pleno (p. 115) .
O último capítulo denomina-se Ciência e moralidade: "Os
economistas da escola do laissez-faire pretenderam abolir o problema moral demonstrando que a busca do auto-interesse por
cada indivíduo resulta no beneficio de todos. A tarefa da geração
atualmente em revolta é reafirmar a autoridade da moralidade
sobre a tecnologia; a missão dos cientistas sociais é auxiliá-la a
ver quão necessária e dificil essa tarefa vai ser''.
É discutível, portanto, todo sistema econômico que, objetivando uma maior produção e acumulação de riquezas e a maior
produtividade dos fatores da produção, esqueça que o objetivo
final de tudo isso é o bem-estar da sociedade. Contrario senso, de
que serve a riqueza?
CI~CIA POLíTICA, Paulo Bonavides, Fundação Getulio Vargas, Rio, 1972
A editora da Fundação Getulio Vargas acaba de lançar a 2.8
edição da obra fundamental do professor Paulo Bonavides. Sobre
a anterior (1967), a presente - que é praticamente um outro
Resenha. bibliogTáfica.
155
livro -
além de melhorada, revista e ampliada (vários capítulos
foram acrescidos), apresenta-se valorizada por um minucioso
mdice analítico e uma referenciação bibliográfica cuja ausência
empobrecia o primeiro texto.
A obra do professor Bonavides é um manual na melhor tradição européia e seu texto está à altura das grandes contribuições
de Duverger e Gurvitch. A bibliografia brasileira, assim, está enriquecida com esse livro que é, pelo menos, um dos mais completos
já postos à disposição dos estudantes e dos estudiosos em geral de
ciência política. E aqui já se destaca uma das suas qualidades:
texto didático, concebido para esse fim, não se limita a uma exposição superficial da história e do desenvolvimento das idéias e
das teorias políticas; sem se tornar por isso um texto de diffcil
acesso, ou obra unilateral de um pensador, o manual do professor Bonavides desce ao âmago das questões, expõe as principais tendências doutrinárias, mas revela sempre o pensamento
crítico do autor.
Além de enfrentar as questões "clássicas" da ciência política,
e como tal inserimos a discussão terminológica, as relações entre
sociedade e Estado e seus elementos constitutivos, legalidade e
legitimidade do poder político; institutos como o da soberania,
a separação de poderes, as diversas formas de Estado, as formas
de governo, os sistemas representativos ,e eleitorais, o sufrágio, a
democracia, os sistemas de pressão, etc., o professor Bonavides focaliza temas em regra abandonados pelos manuais de teoria geral
do Estado, a saber, revolução e golpe de Estado, grupos de pressão e tecnocracia, opinião pública, o partido político no Brasil,
etc. Sua obra revela, além de honestidade científica, argúcia
cdtica e extraordinária atualização com o processo histórico que,
em nossos dias, num ritmo estatelante, transforma as instituições
politico-sociais.
Ao tratar dos grupos de pressão, por exemplo, alude à emergência da tecnocracia com uma clareza e uma profundidade científicas tais que seu estudo, sem dúvida, ficará como um clássico
na matéria:
"A temática do planejamento econômico e educacional, a chamada política nuclear, as relações exteriores, a segurança nacional, o sistema tributário, o combate à inflação, a valorização e
a desvalorização da moeda constituem problemas capitais do Estado na segunda metade deste século, exigindo da cúpula governante uma preparação prévia e rigorosa, para a qual não se acham
qualificados os parlamentos tradicionais nem tampouco aptos os
executivos herdados à sociedade do nosso tempo pelo Est-ado li156
R.C.P. 2/72
beral. Daqui a crise recentíssima que .resultou na formação da
nova elite de tecnocratas. Sua intervenção silenciosa ou ostensiva
será sempre perturbadora do princípio democrático, que parece
impelido a um retrocesso insuportável e aos olhos de muitos já
irremediável. A tecnocracia descamba no monopólio da decisão
política sonegada ao povo e seus representantes. Na melhor das
hipóteses lhes concede tão-somente a possibilidade de uma participação plebiscitária, ilustrativa do novo cesarismo - o tecnológico- que politizou a sociedade, e no qual ela se precipita vertiginosamente, governada pelos novos principes do vocabulário político de Debré".
No capítulo dedicado à opinião pública, que não constava da
edição anterior, cumpre, por sua atualidade, referir ao item relativo à relação cada vez mais íntima entre a opinião pública e os
meios de propaganda: "Na sociedade de massas, de índole coletivista, a opinião aparece "racionalizada" em suas fontes formadoras, mediante o emprego da técnica, com todos os recursos
cientificas de comunicação de massas - a imprensa, o rádio e a
televisão - deliberadamente conjugados, a compor um extenso
laboratório de "criação" da opinião, para atender a interesses
maciços de grupos ou poderes governantes, acreditando-se, no entanto, cada vez menos, no teor racional dessa opinião, que todos
reconhecem ou proclamam uma força feita irretorquivelmente de
sentimentos e emoções".
Não se entenda como propagand-a, portanto, tão simplesmente, a utilização dos veículos de massa (mass-commu.nication)
ou instrumentos do processo de vendas e consumo. Insere-se aqui,
também, sua utilização como meio de propaganda do Estado.
De fato, a revolução dos meios de informação, especialmente
os recursos advindos dos auxiliares audiovisuais, aumentaram as
possibilidades de intervenção do Estado e criaram meios extraordinários de informação. A reivindicação liberal clássica consistente no direito à formação da opinião pública (e de influir nessa
formação através da imprensa livre) corresponde o direito, da
opinião pública, de informar-se. E a propaganda, nas mãos do
Estado ou dos grupos, ou de ambos, é o veículo formador da
opinião. Em outras palavras, é questionável a legitimidade da
ação externa da propaganda, ou do controle da imprensa e da
comunicação de massa, visando a intervir no processo elaborativo
da opinião pública. Não apenas as tentativas de condução da
opinião pública, por intermédio da imprensa, de forma direta, ou
seja, o jornalismo de opinião ou a censura da imprensa são formas
de intervenção indébita, pois é preciso destacar, igualmente, os
processos que restringem a defesa do ouvinte-objeto, a emissão suResenha bibliográfica
157
blim.inar, por exemplo, orientando muitas vezes o consumo para
interesses que não os da população; levando-a a utilizar alimentos
de qualidade inferior, ao hábito do fumo, da bebida, etc., criando
mitos, transformando seus valores.
Tanto a massificação (de que a propaganda é instrumento)
quanto o consumismo sugerem não apenas o esmagamento da
vontade individual, como também, o que se nos afigura igualmente grave, a manipulação da vontade geral em direção a objetivos
prefixados pelos controladores dos meios e instrumentos de comunicação. Essa intervenção na sociedade contemporânea, sobre ser
corrente, é uma das caracterIsticas, possivelmente a mais marcante, de nossa civilização.
Os meios de comunicação, não apenas pelo que informam
ou pela maneira como (de) formam mas, principalmente, pelo
que deixam de informar, ditam as opiniões de cada ser humano, determinando-lhe as paixões e 6dios. A liberdade individual
parece esboroar-se à medida que a sociedade tecnológica liberta o homem da natureza. Imagine-se, agora, os instrumentos
atuais de comunicação {propaganda) associados à informática, à
computação de dados e da informação a serviço desse mecanismo
kafkiano ...
A intervenção desconhece limites éticos, e os instrumentos
que a realizam podem deixar de ser lícitos. O instrumento básico
da manipulação é a propaganda, direta, indireta ou subliminar; seu
objetivo pode ser polftico (manipulado ou não pelo Estado) e puramente comercial. Se a propaganda governamental pode dirigir
a população para os objetivos mais sagrados (a quem compete
mensurar essa graduação?) da civilização como um todo e do pais
em particular, pode igualmente ser instrumento de pressão política. Esse expediente é usualmente utilizado visando à conservação do poder pela classe dirigente ou, ainda por força desse objetivo, utilizado para, violentando a fonnação cultural da população,
moldá-la aos objetivos momentâneos do Estado, impondo-lhe nova
filosofia de vida, etc. Por seu turno, a propaganda comercial não
raro induz a população em erro, levando-a a preferir produtos nem
sempre os mais indicados ou mais baratos, determinando o consumismo com a transformação do consumo em instrumento da produção. Deixa então o processo produtivo de visar ao atendimento
das necessidades, para cair no circulo vicioso do consumo pelo
consumo. Pode-se, ainda, questionar a existência de uma progaganda comercial pura, ou seja, totalmente voltada para o aumento
das vendas. Na programação comercial, imanente, há um fundo
ideológico raramente escamoteável
158
R.C.P. 2/72
A ciência política, tal como a exerce Bonavides, não é uma
ciência pura, contemplativa; mergulha no fato social e daí retira
conclusões, antevê crises e sugere opções. E nessa perseguição
do factual talvez esteja a distância entre o ensino clássico da
teoria geral do Estado e a configuração de uma disciplina universitária que pressupõe o rompimento da departamentalização
do conhecimento e das ciências sociais. Como assinalado na apresentação do editor, a ciência política, embora já esteja armada de orientação metodológica e de objetividade da pesquisa,
opera ainda em terreno que, afora movediço, não tem suas fronteiras claramente fixadas; é a um só tempo, ainda que à procura de seu próprio escopo, ciência jurídica, sociologia e filosofia. Mas é certo que sua autonomia, seja metodológica, seja científica, existirá na medida em que, afastando-se do juridico, caminhe para a compreensão do fenômeno político como um elemento denn·e as variáveis e as determinantes sociológicas, vale dizer,
quanto menos teoria do Estado e mais sociologia. Esse distanciamento elaborará o processo criativo, político-filosófico, que deve
ser o grande objetivo do cientista político.
Presa à sua origem jurídica, limitada até ainda há pouco
ao estudo nas escolas de direito, versada exclusivamente por juristas, padece ainda a ciência polftica, no Brasil, de um jurisdicismo
que a inibe e a afasta de discussões como, por exemplo, as que
têm sido objeto de preocupação de Morin na França e Galbraith
nos Estados Unidos. Registra-se, porém, com a extensão dos estudos científico-políticos a uma área bem maior da universidade,
uma tendência à libertação da ciência política. A obra do Professor Bonavides revela uma opção nesse sentido, embora a concepção do manual tenha pretendido inicialmente prover os cursos
jurídicos com um texto básico.
O Instituto de Organização Racional do Trabalho da Guanabara - IDORT-GB - como seus congêneres de outros Estados,
propõe-se a realizar e proporcionar a seus associados e demais
interessados:
Intercâmbio internacional
Forum de estudos
Treinamento
Assistência técnica
Sede:
Revista
Biblioteca
Prêmio de organização e administração
Congressos
Praia de Botafogo 186, Rio de Janeiro, GB.
Resenha bibliogTá.fica
159
RESENHA BIBLIOGRÁFICA
R.
A. AMARAL VIEIRA
L'AVENIR DE LA PRESSE li:CRITE. Francisco C.P.
Balsemão. Apud Revista deZ Instituto de Cienciaes
Sociales, n. 16, p. 151 e segs.
A revolução da informação pôs em xeque o futuro da imprensa escrita. Na medida em que explodem a informação e
os meios de comunicação de massa, transformando o grande
universo na pequena aldeia global de que nos fala Marshall
McLuhan, definham os órgãos tradicionais de imprensa. Nos
Estados Unidos já é longa a relação dos jornais e revistas
com suas atividades encerradas. Qual o desarranjo que, na
era da comunicação, estaria condenando à morte os veículos
tradicionais de informação - o jornal, a revista e o livro?
Dêste, diz-se que já era, expressão que procura significar sua
irremediável superação. A revista, o livro, estariam vivendo a
hora da verdade, derrotados pelo poder da televisão, que deu
à notícia o extraordinário caráter de contemporaneidade do
fato. Enquanto o jornal, no maior esfôrço, consegue noticiar
o fato ocorrido há pelo menos 12 horas, e a revista o comenta
com uma distância de cêrca de uma semana, a televisão não
precisa de noticiar ou comentar: mostra-o sob todos os ângulos, no momento mesmo de sua ocorrência. Os jornais noticiaram a chegada do primeiro homem à Lua; as revistas trouxeram as primeiras fotografias coloridas e o relato dos principais sucessos; a televisão apresentou ao mundo, incrédulo,
o fato histórico extraordinário em tôdas as suas nuanças,
com o impacto inigualável da experiência visual. Nós, os espectadores de todo o mundo, não mais somos apenas contemporâneos da história, mas, de certa forma, testemunhas e partícipes.
R. Ci. pol.,
Rio de Janeiro,
5(4): 177-198,
out./dez. 19'11
1cérebro do
administra
realiza mais operaçõe~
do que ocomputador.
RAP REiiiSTRA.
REVISTA DE ADMINISTRAÇIO POBUCJ
UMA PUBLICAÇAO DA FUNDAÇAO GETÚUO VARGAS
O homem que antes lia a descrição do fato (jornal) passou em seguida a ouvir a revelação do acontecimento (rádio)
e agora, a ver com os próprios olhos, dispensando a versão
do noticiarista ou do narrador. Conforme já tivemos oportunidade de assinalar (cf. Juventude em crise. p. 56) o homem
contemporâneo, tornando obsoletos os conceitos modernos de
informação, realiza a grande revolução das comunicações.
Depois do transistor - que violentou as barreiras da cultura,
levando a informação aos pontos mais longínquos do globo,
conduzindo notícia do que ocorria no mundo ao interior da
Amazônia, da China e da índia; depois da televisão - que
trouxe ao seio do mundo as imagens da guerra e da violência, que misturou hábitos e crenças, que aproximou o homem
simples dos lideres e dos ídolos - o satélite e a computarização dos dados.
No mundo da tecnologia parece não haver lugar para
os livros, para as revistas, para a imprensa escrita. Que será
feito dos jornais, com seu longo período de elaboração e sua
circulação lenta e restrita?
Poder-se-á dizer que o livro já era?
~sse o tema de Francisco C. P. Balsemão. Mas, antes de
entrar na análise pr9priamente dita do seu texto, afirmemos,
lembrando Heráçlito, a mutabilidade de tôdas as coisas, ou,
segundo Hegel, tudo é e nada é. Vale dizer: tudo se acha
em perpétuo fluxo, a realidade está sujeita a um vir-a-ser
contínuo. A partir dessa noção dialética de ser e não ser, afigura-se difícil garantir que o livro sobreviverá ou sucumbirá
devorado pela revolução da informação. Que livro? Que é livro?
Recuemos um pouco na história e procuremos, dentro
dela, situar o livro. Para êsse efeito, o livro será apenas um
instrumento de comunicação entre os homens, mais precisamente, o instrumento que se caracteriza pela transmissão
da informação escrita. Na história do homem, situemos sumàriamente, a história da comunicação.
Desde que o homem é um animal político e, portanto,
animal que só se desenvolve em sociedade', é um animal que
depende, para sobreviver, da interação de indivíduos, grupos
ou clãs. Essa interação é também intercomunicação. O homem, vivendo em sociedade, tinha como pressuposto a comunicação entre os grupos e, dentro do grupo, de seus membros
entre si.
178
R.C.P. 4/71
Segundo as necessidades, tivemos e teremos diversas formas de comunicação. A primeira delas, retrato das condições
precárias da estrutura social primitiva, terá sido a expressão
corporal, a gesticulação, o rictus facial. De certa forma, à
medida que evolui, o homem se distancia de seu semelhante,
mas não tem prejudicado seu relacionamento, desde que preenche o vácuo do espaço físico com instrumentos de comunicação que entra a criar.
Com êsse distanciamento, o rictus faci.al ou a gesticulação tornaram-se ineficazes como instrumentos de comunicação. Surge a linguagem oral e, a seguir, a descoberta da emissão de sons por meio de instrumentos de percussão, aparece
um código de símbolos e sinais possibilitando a comunicação
a médias distâncias. O tambor terá sido o satélite da aldeia,
reunindo em tôrno de si tôda a tribo. Ao alargar as distâncias, a mensagem precisou de ser levada até onde não chegavam os sons; nasce a comunicação semafórica e o código de
sinais, a transmissão da mensagem (notícia) mediante sinais
produzidos, por exemplo, pela fumaça. Mas o desenvolvimento
da sociedade imporia novas necessidades no campo da comunicação, entre elas a fixação da mensagem e sua emissão para
longas distâncias. Surge a linguagem escrita, possibilitando
a conservação, reconsulta e recuperação da informação, e
assim a documentação, ao mesmo tempo que, transportada
pelo mensageiro, a pé, no lombo de animais ou por intermédio das primeiras navegações, podia alcançar distâncias a que
jamais chegariam os processos anteriores. A descoberta e
alargamento do mundo do homem, aumentando as distâncias, criaram a necessidade de instrumentos de comunicação
mais rápidos; emerge o telégrafo com fio, o eletromagnetismo,
o telégrafo de Morse, o cabo submarino, o telefone, o avião e,
por fim, o satélite. Durante todo êsse período, existindo a
escrita e o livro, êsse conservaria a mesma finalidade, embora
variasse grandemente em seu aspecto formal, nada mais havendo em comum entre os primeiros papiros e a brochura ou
o pocket book contemporâneos, a não ser o princípio da conservação da informação pela impressão de caracteres. Com
o aparecimento da arte da escritura, pode-se também registrar o nascimento do livro e do periódico, ou seja, o instrumento de transmissão da informação (antes pela tradição
oral), agora por meio da palavra escrita, no livro documentando a mensagem, no periódico transmitindo-a mais ràpidamente.
Reser~ha
Bíbliográfiéa.
179
Desde já podemos imaginar o que teriam respondido os
primeiros copistas à pergunta dos futurólogos sôbre o amanhã do livro. É fora de dúvida que não lhes seria possível,
aos escreventes dos papiros, supor a sobrevivência do livro
como o instrumento conhecido de nossos dias, impresso em
papel, copiável em milhares de exemplares, volumoso, ilustrado, leve, barato, etc. A distância que nos separa dos papiros é
ainda menor que a observada entre a brochura de hoje e o
livro inimaginável do amanhã. Os pontos em comum, no último caso, serão talvez ainda menos significativos e em menor grau que no primeiro período. Mas o livro terá sobrevivido, ou seja, ter-se-á transformado, desde que, mutação, não
terá fim, mas adaptação.
Qual o amanhã do livro?
Segundo Francisco C. P. Balsemão, valendo-se de dados
da UNEJSCO, estaríamos diante não apenas da revolução da
informação (de que resultou beneficiada a televisão), mas
também, da revolução da imprensa, a mais importante em
seus quatro séculos de história:
"Les remarquables progrês technique affectués depuis
1950 ont contribué au dévelopement de la Presse, bien
que, dans la plupart des pays, un petit nombre seulement de ces techniques ait été, jusqu'à maintenant, appliqué à une grande échelle. n semble toutefois évident
que la Presse est sw· le point de connaitre la révolution
la plus importante de ses quatre siêcles d'histo~e".
Que eventos, fatos notáveis, avanços sensacionais, caracterizariam essa revolução?
Segundo estudos da UNESCO, divulgados desde 1966, estamos próximos do jo1-nal mundial. Balsemão descreve o jornal que é uma simbiose do jornal tradicional com a televisão.
Cada assinante, ao invés de esperar a chegada do jornaleiro,
limitar-se-á a discar um número de telefone (utilizando-se do
aparelho comum) e, imediatamente, na tela de seu aparelho
de televisão a êle acoplado, aparecerá a primeira página de
seu jornal; o simples girar de um botão, fará a segunda página surgir a seus olhos, e assim por diante, qualquer que
seja o jornal, local ou não, a página escolhida, à hora desejada. Poderá fixar a imagem, deter-se e demorar-se em determinado ponto, ir adiante e voltar, como quiser.
180
R.C.P. 4/71
Ainda no campo da prospecção, durante a Conferência
Geral da UNESCO, reunida em Paris, novembro de 1968, Alphonse Ouimet, presidente da subcomissão de Informação,
previu, segundo informa Balsemão:
"Dans une genération, des supercerveaux électroniques assureront la distribution d'informations à domicile,
comme celle du gaz ou de l'électricité ( ... ) . Le début
de cette phase nouvelle será signalé par l'instalation, dans
les grands centres urbaines, de centrales de communication munies de supercerveaux électroniques, qui distribueront l'information à domicile au moyen devastes réseaux de câbles souterrains, véritables conduits d'information, nous reliant à une centrale d'information locale
ou regionale, à laquelle nous serons abonnés. Ces banques
d'information seront, à leur tour, reliés entre elles pa1
des satellites ou par des pipe-lines souterrains ou transocéaniques qui permettront aux abonés de chaque centrale d'accês à toute l'information, visuelle ou sonore,
accumulé dans le monde entier. Nous disposerons, chez
nous, d'un centre de communications électroniques qui
nous donnera la possibilité de choisir entre des centaines
d'emissions de Télévision et de Radio. Nous pourrons consulter les plus grandes bibliothêques du monde sans nous
déplacer. Nos journaux et nos revues seront imprimés
chez nous, en un format réduit, car nous ne recevrons
que ce qui nous intéressera".
A despeito de imparciais e fidedignos, êsses dados oriundos da UNESCO, são prospecção, ainda que os fatos possam
assegurar grande margem de segurança à estimativa. Vejamos
agora, acompanhando Balsemão, o que de concreto já se operou como revolução na imprensa.
As tendências da revolução nesse campo podem ser reduzidas a dois itens. O primeiro, de realização a longo prazo,
resultaria no desaparecimento da imprensa clássica (jornal,
revista, livro), e cujas possibilidades foram vistas nos últimos
exemplos, ou seja, a transformação do jornal tradicional num
órgão da nova ordem, por cujas características como veículo
divulgador de notícias e de opinião poderá até continuar sendo identificado como jornal, mesmo que, material e formalmente, nada mais tenha em comum com qualquer dos Jornais
de hoje. O segundo, compreende aquelas transformaçoes por
Resenha Bibliográfica
181
que passarão os jornais atuais, graças à incorporação à sua
tecnologia das conquistas provocadas pela revolução da comunicação, especialmente os computadores e os satélites.
Com o advento do rádio e da televisão, os jornais perderam as caucterísticas de únicos veículos de informação, e tiveram de adaptar-se às novas condições criadas pela presença
de meios de transmissão mais rápida de noticias. Mesmo com
vistas à publicidade, de que depende para sobreviver, a imprensa escrita se orientou de maneira a não entrar em competição direta com a TV (tôdas as vêzes em que tentou. saiu
perdendo), não mais se preocupando em realizar e oferecer
a cobertura instantânea das noticias. O caminho escolhido
foi, assinala Balsemão, o da convergência, que consiste em
oferecer aos leitores uma cobertura completa e uma informação em profundidade que os demais veículos - o rádio e
a televisão - não podem assegurar, tais como a exatidão e
oportunidade dos comentários, as opiniões interpretativas ou
orientadoras. Mais do que nunca, a televisão se conduz como
veículo de informação, e o jornal, a revista e o livro como
veículos de formação de opinião, mediante tratamento valorativo da informação veiculada pela televisão. Mesmo assim,
malgrado conservarem suas características clássicas e não
pretenderem concorrer, seja com a televisão seja com o rádio, os jornais, para cumpTirem essa missão, teriam de sofrer
reformulação tecnológica: os sistemas de comunicação, de
composição, de impressão, de gravura e mesmo de redação,
deveriam ser mais rápidos e mais eficientes. Para o aumento
dessa eficiência e rapidez não bastaria a introdução do teletipo, da radiofoto, da composição fria e da impressão otfset.
Dentre as principais transformações, dentre os mais signíficativos modelos de modernização da imprensa, na impossibilidade de referir-se a todos, Balsemão relaciona as modificações mais diretamente ligadas à atividade jornalística.
A primeira dessas inovações é a introdução do computador eletrônico na sala de redação. Atualmente, no Brasil e
no mundo, a coleta de informação pelo repórter obedece mais
ou menos ao seguinte rito: o jornalista vai ao local onde se
desenvolveu a ação, faz sua pesquisa e anotações, entrevista
quem julgar necessário e retorna ao seu jornal onde então
redigirá a matéria, que a seguir será copidescada e submetida ao editor correspondente. A chegada da noticia, já redigida, em alguns casos, poderá ser abreviada, dispensando a
presença do repórter: poderá ser transmitida pelo telefone,
182
-
~
R.C. P . 4/71
-
--
radiotelefone, pelo telégrafo, pelo telex, pelo correio ou por
portador , quando o jornalista é um informante. No nôvo sistema, o repórter em serviço externo leva consigo uma telemáquina de escrever portátil. Concluído o trabalho de coleta
de dados, a matéria será redigida in loco, na máquina, como
se estivesse na redação. Concluída a datilografia, poderá reler
o texto, corrigi-lo, etc., o repórter tomará das páginas escritas
e as introduzirá no dispositivo de emissão em fac-símile, ligará o microfone de um telefone comum à extremidade do
dispositivo de fac-similação e discará normalmente o número
da redação, onde o texto aparecerá reproduzido num dispositivo de recepção de fac-símiles, também ligado ao telefone.
~sse sistema, que parece história de mil e uma noites,
foi utilizado, com pleno sucesso, pela Telepress Xerox, na
cobertura do Campeonato Aberto de Gôlfe dos Estados Unidos,
em 1968.
Ainda nem sequer se pensou na produção dêsses aparelhos em escala industrial, e já existem planos mais ousados.
Agora, o repórter fará a ligação entre a máquina e a redação, antes de iniciar a escrever. O texto, à medida que fôr
sendo datilografado, será recebido pelo computador instalado
na sede da redação. Lá, no momento exato em que precisar
da matéria do repórter, o editor comprimirá um botão instalado em sua própria mesa e imediatamente todo o texto
surgirá no vídeo da televisão à sua frente. Com a ajuda de
um lápis luminoso, depois de ler todo o texto, o editor poderá
emendá-lo, corrigi-lo, alterá-lo, substituindo .ou acrescentando
letras, palavras ou proposições completas. Poderá tanto escrever novos parágrafos, como suprimh· outros. Corrigido o
texto, êste será devolvido ao computador que imediatamente
irá compô-lo automàticamente, procedendo às separações silábicas e à justificação dos espaços, segundo a programação
que receber.
Outro recurso à disposição dos jornais contemporâneos é
a utilização do computador como banco de notícias pelas agências telegráficas.
Segundo Balsemão, ao invés de enviar as notícias diretamente aos jornais, através do teletipo por exemplo, como
fazem atualmente, as agências acumularão as noticias em
um computador que as utilizará à medida que novos acontecimentos sejam registrados. Assim, exemplificando, o editor
internacional de um jornal receberá sôbre o vídeo de sua teResenha Bibliográfica
183
levisão o resumo das notícias do dia, escolherá as que julgar
mais importantes e instruirá o computador da agência (ao
qual o da redação está ligado) para que as envie ao jornal.
Com sua máquina de escrever ou com o lápis luminoso, procederá, na forma já conhecida, às correções necessárias. Se a
notícia é das que podem ser atualizadas no curso da elaboração da edição - tais como o andamento da apuração de um
pleito eleitoral - o editor manterá de sobreaviso o computador da agência, de forma que o do jornal seja alimentado
com a matéria complementar, até a hora limite de envio de
material à composição.
As possibilidades abertas pela máquina de fac-símile estendem-se, evidentemente, à transmissão de fotografias ou de
tôda sorte de documentos. BaJsemão registra uma experiência histórica efetivada em 1967, com transmissões em facsímile. A primeira página do Daily Express de 17 de outubro
daquele ano foi transmitida a San Juan de Pôrto Rico, numa
distância de mais de 10 mil quilômetros, e publicada naquele
mesmo dia no jornal local EZ Mundo. A imagem recebida, de
qualidade excelente, foi transmitida em 14 minutos e fêz o
seguinte percurso: Londres-Comualha, por um fio cuja capacidade equivale a 12 linhas telefônicas funcionando si.multâneamente; Carnualha-satélite Early Bird-Nova Escócia
por microondas; Nova Escócia-Flórida por cabo terrestre;
Flórida-Pôrto Rico por cabo submarino.
A propósito, Arthur C. Clark (apud Comunicação na era
espacial. Fundação Getúlio Vargas, 1969. p. 52) registra a
composição simultânea de edições internacionais. É a vez dos
jornais orbitais, transmitidos de um centro a todos os quadrantes da terra. Essa experiência será particularmente importante para países continentais como os Estados Unidos, a
União Soviética, o Brasil e a China.
De todos os programas atualmente em execução, Balsemão considera com razoão como o mais estatelante o d~momi­
nado ANPAT, American Newspaper Publishers Abstracting
Technique Association, organizado pela ANPA, American
Newspaper Publishers Association. O ANPAT permite ao
computador IBM 1130 receber uma fita perfurada TTS de
qualquer serviço telegráfico e resumi-la, a qualquer tamanho, segundo as necessidades do editor. o computadox lê o
texto, atribui a cada palavra um valor numérico e, graças às
fórmulas matemáticas com que trabalha, decide o que é mais
importante, o que é supérfluo e reduz a nota telegráfica às
184
R.C.P. 4/71
dimensões desejadas pela redação. O fato extraordinário está
sem dúvida na nova tarefa atribuída ao computador: pela pri~
meira vez a máquina executa um trabalho jornalístico e nisso
reside seu caráter de excepcionalidade. O avanço inusitado e
insólito, adverte Balsemão, inquietante por si, não nos deve
levar a fechar os olhos, ou pensar em destruir o aparelho.
Afigura-se a êle, e a nós, mais racional e inteligente, descobrír novas funções para o computador
LES ASPECTES QUALITATIFS DE LA PLANIFICATION DE LWUCATION. Preparado por C. E. Beeby.
UNESCO, Instltut Intematlonal de Planificatlon de
l'éducatlon, 1971.
PLANIFICAÇAO DA EDUOAÇAO. Fundação Getúlio
Vargas, 1971, versão brasileira de La plan11icat1on
de l'éducatlon, edição original da UNESCO.
O primeiro dêsses livros resultou de um colóquio organizado pelo Institut International de Planüication de l'Education,
IIPE, durante o qual foram estudados os aspectos qualitativos do planejamento da educação, particularmente nos países
subdesenvolvidos. Durante os debates enfeixados no volume
- intervieram, além dos dirigentes do IIPE e da UNESCO,
17 especialistas recrutados nos mais diversos países: Bélgica,
Estados Unidos, França, Grécia, índia, Japão, Nova Zelândia, Líbano, Polônia, Reino Unido, Senegal e SUécia (o Brasil,
nada obstante seu desenvolvimento, permanece estranhamente ausente dos simpósios promovidos pela UNESCO e outras
organizações internacionais, às quais não tem chegado com
sua contribuição). Alguns dêsses especialistas, além de teóricos de reconhecido valor, ofereceram ao simpósio larga e
rica experiência pessoal; a reunião de especialistas experimentados, ao lado de teóricos da educação sem experiência
prática, foi proposital, desde que o objetivo do simpósio, plenamente alcançado, pelo que se depreende do texto produzido,
era, desprezando as soluções práticas e concretas - de difícil transposição sem risco de mecanismo - fixar idéias comuns, básicas, precisar o sentido das palavras, esclarecer os
conceitos permanentemente empregados no corrente da linguagem dos planejadores e cujo significado exato a ninguém,
até aqui, havia parecido possível, embora necessário, determinar.
Resenha Bibliográfica
185
O simpósio, assim, foi mais uma tentativa visando a, com
evidentes vantagens para a técnica do planejamento na educação, estabelecer os têrmos comuns com que trabalham os
especialistas nos diversos países. Definidas as noções comuns,
o texto põe à disposição dos diversos países a soma das experiências dos planejamentos já efetivados, dando condição ao
teórico ou ao planej ador de, a partir da experiência multinacional, flrmar os têrmos com que o planejamento deve ser
introduzido em uma sociedade, respeitados os parâmetros culturais que individualizam cada experiência.
Les aspects qualitatijs de la planification de l'éducation,
porém, não se constitui em simples resumo do colóquio,
mas da contribuição de cada um dos participantes, com o
que foi pôsto ao alcance dos leitores a oportunidade de formular suas próprias impressões e projetar suas próprias generalizações, evidentemente, a partir do texto básico.
No capítulo 1, Philip Coombs situa a questão em têrmos
de análise e avaliação qualitativa das diversas experiências
de planejamento da educação. Sua tese é que a expressão
linear, deliberadamente escolhida, há pouco tempo, pela maioria <;ias sistemas de educação, tornar-se-á inviável e deverá
ser substituída, com a maior urgência, por uma outra concepção de expansão, na qual os aspectos qualitativos (relegados a segundo plano pelos países subdesenvolvidos, vitimas
da pressão de baixo para cima representada pelo choque provocado pela inadequação entre a população em idade escolar
e a possibilidade de absorção da escola), sobrelevarão de importância.
C. E. Beeby, também coordenador do livro, é o responsável pelo capítulo 2. Procura, por uma questão de método,
colocar-se na condição de um ministro de educação de um
imaginário país subdesenvolvido participante do colóquio.
Os capitulas 3 e 4, partindo dos dois principais documentos de trabalho teórico, refletem a melhor parte das discussões
do colóquio. Resumem uma longa discussão sôbre a medida de
avaliação da qualidade da educação, formulada nos têrmos
da seguinte questão: como as normas de qualidade, que até
aqui têm sido elaboradas pelos países desenvolvidos, podem
atender aos interêsses e às conveniências de um país subdesenvolvido? É fora de dúvida que, qualquer que seja essa
186
R.C.P. 4/71
norma, ela se mostrará ineficaz se a sua aplicação não se
fizer mediante a prévia redução às características culturais
e econômicas da sociedade subdesenvolvida.
A propósito, parece-nos pertinente lembrar a advertência de Jan Tinbergen (Programação para o desenvolvimento.
2. ed. Rio, FGV, 1969. p. 73) : "Há por que suspeitar que nem
sempre é feita a devida escolha" (refere-se à escolha da tecnologia). "Um dos motivos para isso é a tendência a copiarse a técnica dos países desenvolvidos. Muitos técnicos acreditam que a tecnologia avançada é algo desejável por si mesmo.
Baseiam-se, em parte, talvez, na maior perfeição técnica do
produto. Como as suas responsabilidades são muito acanhadas, não logram, muitas vêzes, perceber as conseqüências sociais das suas escolhas: um nível de emprêgo menor que o
que seria possível obter com outros processos de produção".
Leitura indispensável e complementar a Les aspects qualitatifs de la planification de l'éducation é a coletânea Planificação da educação, também da UNESCO, e recentemente
lançada em versão portuguêsa pela Editôra da Fundação Getúlio Vargas. Enquanto no primeiro livro o escopo é a busca
de ideais qualitativos e a indicação de instrumentos e critérios para sua medida, o objeto já agora é simplesmente o de
estender o planejamento à área da educação, até esta parte,
na maioria dos países subdesenvolvidos, contida pela oposição
a tôda sorte de contrôle, regulação e, por fim, planejamento.
O texto de Planificação da educação decorre de uma Conferência Internacional sôbre a Educação promovida pela
UNESCO e realizada em Paris de 6 a 14 de agôsto de 1968.
Evitando a discussão de temas genéricos, a educação em geral, a conferência fixou-se nos problemas oriundos do planejamento educacional nas fases de preparação e execução,
ainda que permanecesse difícil - o que é observado na primeira leitura do texto - estabelecer uma distinção clara e
inequívoca entre planejamento educacional - tema central
e específico do colóquio -, de um lado, e política da educação, ou problemas educativos específicos, de outro. É evidente, contudo, que não é possível elaborar um plano ou projeto de educação sem uma prévia definição (política) de
objetivos mediatos. Haverá um plano, sim, mas subordinado
a uma tática e a uma estratégia, a objetivos de curto, médio
e longo prazos, todos êles, por seu turno, subordinados aos
objetivos maiores do planejamento global da sociedade, no
qual estão inseridos e do qual são uma facêta, ainda que, em
Resenha Bibliográfica
187
determinado momento histórico, a mais importante. Neste
ponto os objetivos a serem alcançados confundem-se com a
própria discussão da substância mesma da educação que se
propõe planejar.
Planificaçãa da educação não é um manual de planejamento; sua leitura não oferecerá os instrumentos necessârios
à elaboração técnica de um planejamento; mas, colocando a
discussão no nível politico, oferece os instrumentos indispensáveis à elaboração de uma politica educacional que tenha
por base o planejamento. Em outras palavras, não se destinando a divulgar técnicas de planejamento, transformou-se
em leitura indispensável a quantos compete traçar uma política educacional fundada no planejamento. Cresce dessa forma sua importância prática, desde que a opção pelo planejamento já se transformou numa regra, especialmente entre os
subdesenvolvidos às voltas não apenas com a necessidade de
progresso econômico e social, mas com o problema maior
que é a realização dêsse progresso de forma a mais intensa
e rápida possível, superando, com o prejuízo de poucas gerações, o gap tecnológico e cultulral que os separa das nações
industriais e pós-industriais. Um dos instrumentos decisivos
para êsse salto é - ao lado da superação do liberalismo econômico - a introdução do planejamento como técnica inerente a tôdas as atividades sociais. O planejamento em qualquer nivel, mas na educação em particular, não é monopólio
de nenhum sistema administrativo, político ou cultural, nem
está automàticamente ligado à tecnocracia ou à burocracia.
Como salienta o prefácio dessa obra utilíssima, os especialistas parecem estar cada vez mais conscientes de que um planejamento educacional realista e eficaz supõe a informação
e a consulta ao conjunto da sociedade, e de que êle próprio
se constitui num instrumento de democracia e educação".
ESCOLHA E ACASO. Briam Skyrms, edição brasileira da Edltôra Cultrlx, São Paulo, 1971.
Escolha e acaso é uma introdução à lógica indutiva, cujo
prestígio procura restaurar. De resto, o livro investe, restabelecendo a verdade cientifica, contra uma série de noções
errôneas incorporadas ao acervo da cultura. Neste caso, o
conceito de argumento e as noções, na lógica formal, da deduçãa e da indução. Trata-se do entendimento, que Skyrms
mostra falho, segundo o qual as duas grandes pilastras da
188
R.C.P. 4/71
lógica formal poderiam ser distinguidas uma da outra pela
simples identificação do geral e do específico. Escreve, a prcr
pósito: "Um dos erros mais comuns, no campo da lógica, é
o de supor que os argumentos dedutivos partem do geral para
o especifico, e que os argumentos indutivos partem do específico para o geral. Isso é absurdo porque os argumentos não
se distribuem em duas categorias: os dedutivos e os indutivos.
Não se daria que todos os argumentos válidos partem do geral para o particular e que que todos os argumentos indutivamente fortes partem do particular para o geral? Isso não é
absurdo - é simplesmente errôneo. Há argumentos dedutivamente válidos que partem do geral para o geral:
Todos os gorilas são macacos.
Todos os macacos são mamiferos.
Todos os gorilas são mamiferos.
do particular para o particular.
Ezequiel é um lôbo.
Ezequiel tem cauda.
A cauda de Ezequiel é de lôbo.
e do particular para o geral:
Um é número de sorte.
Três é número de sorte.
Cinco é número de sorte.
Sete é número de sorte.
Nove é número de sorte.
Todos os números ímpares de zero a 10 são de
sorte."
Escola e acaso está dividido em cinco partes: 1. Probabilidade e indução, 2. O problema da indução: enfoque tradicional, 3. O paradoxo de Goodman e os novos enigmas da
indução, 4. Alicerce da lógica indutiva - amostragem e estatística e 5. Interpretação do cálculo de probabilidades.
Brian Skyrms - ilustre professor da Universidade de
Michigan, EUA - elaborou o texto visando a destiná-lo ao
uso nos cursos de lógica nas diversas áreas do ensino supeResenha Bibliográfica
189
rior. Dado o caráter introdutório do volume e a clareza com
que o texto foi escrito, pode ser utilizado não apenas por alunos dos cursos especializados de filosofia, mas igualmente
como livro de apoio nos cursos de matemática, filosofia da
ciência e em todos aquêles em que a lógica ou os estudos de
metodologia constituam preocupação curricular.
A edição se faz em convênio da Editô1·a Cultrix com a
Editôra da Universidade de São Paulo. A tradução do inglês
para o nosso idioma é da responsabilidade dos professôres
Leônidas Hegenber e Octanny Silveira da Mota, ambos do
Instituto Tecnológico de Aeronáutica, ITA.
Brochura de 228 páginas é vendida ao preço de 11,00.
REGISTROS
1 . Metafísica, para quê? Adísia Sá. Imprensa Universitária
do Ceará, 1971. A partir do título provocante, Adísia Sá consegue reunir num pequeno volume de 110 páginas suas notas de aula como professôra de problemas metafísicos na Faculdade de Filosofia do Ceará. Ao mestre em filosofia, veio
juntar-se a antiga jornalista profissional, dessa associação
resultando um texto escorreito e leve, proporcionador de leitura agradável e amena em tema invariàvelmente carregado
de aridez. É evidente que a clareza do texto tem muito a ver
com o enfoque oferecido à matéria; no caso do livro de Adísia
Sá pode-se dizer que a limpidez do texto lembra os córregos,
que são claros por não serem profundos. Nessa observação,
todavia, não se deve recolher qualquer restrição ao ensaio;
é evidente que a autora não se propôs a um tratado, mas a
uma exposição sistemática de suas aulas, o que só merece
elogios, seja pela contribuição representada pelo texto em si,
seja pela coragem de expor idéias e pôr a nu sua didática.
2. Metodologia para avaliação do desempenho da rêde do
ensino industrial. Arlindo Lopes Corrêa e Edson Machado de
Souza. MEC, 1971. Responde a encomenda do Departamento
de Ensino Médio do Ministério da Educação e seu desenvolvimento parte de dois a priori: a) a ·conscientização da importância do setor educacional no processo desenvolvimentista
das nações e b) a certeza de que essa contribuição não se
efetivará se os órgãos que atuam no setor educacional não
estiverem apoiados numa sólida infra-estrutura administrativa caracterizada pelo planejamento. Mas em todo o pais,
190
R.C.P. 4/ 71
nos mais diversos setores, particularmente nas áreas ligadas
à educação, a improvisação tem sido a tônica, seja à ausência
de uma política de planejamento, seja por notória carência
de pessoal especializado. Essa última deficiência determinou
o trabalho dos economistas Arlindo Corrêa e Edson de Souza,
que procuram estender ao setor educacional, particularmente
ao ensino industrial, as noções de produtividade, rendimento
e eficiência.
3 . A política de transportes marítimos do Brasü (crônica de
uma batalha). Murillo Gurgel Valente, edição do Serviço de
Documentação do Ministério dos Transportes. Rio, 1971. Obra
classüicada em primeiro lugar no n Concurso de Monografias promovido pelo Serviço de Documentação do Ministério
dos Transportes. A comissão julgadora estêve constituída pelos engenheiros Eliseu Resende e Horácio Madureira e presidida pelo General Ayrton Pereira Tourinho. Na apresentação,
o embaixador George Alvares Maciel, nosso representante junto à Organização dos Estados Americanos, observa:
"Um dia, alguém publicará todos os pormenores da longa
luta. É preciso esperar o dia em que esteja plenamente vitoriosa e aceita a tese brasileira em todo o mundo. Não tenho
dúvida de que isso acontecerá; e em futuro não muito distante. O público conhecerá então as peripécias do extenso
caminho que vai desde a implantação de modesta semente na
Carta de Argel, de outubro de 1967, até a ata ou tratado
solene que consagrará a posição que nos coube defender.
Deverão sobreviver a teoria da liberdade do alto-mar e
a de liberdade de navegação, inclusive a de passagem inocente
no mar territorial de três ou de duzentas milhas. O que não
pode perdurar é o corolário ilegitimo em nossos dias de plena
liberdade de acesso às cargas, sem qualquer quaUficação. Como
não poderá persistir a confusão entre a teoria da liberdade
e a sua aplicação prática internacional, que a nega concretamente. Os argumentos teóricos contribuirão para desfazer
um e outro; entretanto, mais decisivas serão provàvelmente
as medidas governamentais que se vão tomando no Brasil e
em outros paises. Creio que o trabalho de Murillo Gurgel
Valente indica e justüica tal prognóstico".
4.
Meu primeiro ano no Tribunal Superior do Trabalho.
Mozart Victor Russomano. José Konfino Editor, Rio, 1971.
Professor eminente, jurista consagrado, um de nossos principais tratadistas de direito do trabalho, Mozart Victor RusResenha Bibliográttca
191
somano teria de ser excelente juiz. Suas decisões no primeiro
ano de judicatura, enfeixadas na obra, não constituem apenas uma seleção jurisprudencial valiosíssima ao advogado militante; não só isso; ao lado de seu alto valor jurisprudencial,
sobreleva a importância da construção doutrinária.
5.
Revista da Universidade Federal do Pará, 1 (1) 1971.
Num pais pobre de publicações técnicas, e de público reduzido para o consumo de obras científicas, transformando em
aventura a imprensa especializada, é sempre motivo de prazer registrar a intervenção, na área, das universidades brasileiras, de que hoje, mais do que nunca, está a depender
a sobrevivência dos poucos órgãos de cultura especializada.
Por definição, sem público que lhes permita a sobrevivência
econômica, as revistas especializadas não contam, por outro
lado, com a contribuição oficial, limitada ao livro (os programas do INL desconhecem êsse tipo de imprensa). Assim,
os periódicos que não tiverem atrás de si uma instituição ao
mesmo tempo rica e de indiscutivel idoneidade cientfiica, estão sujeitas ao breve desaparecimento, ou à vida espasmódica, como o Jornal de Letras. Dentro dêsse quadro, portanto,
cumpre às universidades brasileiras uma missão do maior
significado cultural: criar novos instrumentos de cultura, assistir aos atualmente existentes, e garantir a sobrevivência
e o nível científico de ambos.
Preenchendo tôdas essas finalidades, surge a Revista
da Universidade Federal do Pará. Pensada e escrita em Belém,
composta e impressa em Belém, nas oficinas da Imprensa
Universitária, essa Revista é bem o shnbolo e o retrato de
uma das mais pujantes universidades brasileiras aquela em
que, talvez, seja mais clara a consciência da missão da universidade como instrumento de desenvolvimento e libertação
cultural e econômica. Na apresentação do nôvo órgão, o reitor Aloisio Costa Chaves mostra-se consciente dessa missão
histórica: "A revista que ora se edita corresponde a um imperativo cultural de tôda Universidade, em geral, e particularmente da nossa, após a Reforma Universitária, em fase
de implantação".
O primeiro número, em referência, oferece, entre outros
estudos, uma análise sôbre O ensino superior no Pará trabalho de pesquisa do Professor Armando Dias Mendes, já nosso
conhecido como autor de Viabilidade econ6mica da Amaz6nia,
obra de fôlego e lançamento editorial recente da Imprensa
192
R.C.P. 4/71
Universitária do Pará. Na mesma revista, o professor Adherbal Meira Mattos se insurge contra a tendência que se observa nos diversos projetos de reforma (currículo) universitária e que visa a suprimir do programa de direito o ensino
de direito internacional público. Ãpio Paes Costa aborda o
tema Dante - poeta cristão e Simão Chicre Miguel Bitar
traduz e explica As bucólicas, de Virgilio (que escreve com e).
6. Brasil Açucareiro, n. 6. Circulando a revista do Instituto
do Açúcar e do Alcool, trazendo em seu sumário: I.A.A. : Trinta e oito anos; Estação experimental de cana-de-açúcar do
I.A.A., Araras, São Paulo; Tecnologia açucareira no mundo;
As nuvens ficaram escmas num amanhecer de junho; Comentário econômico- cotas de produção; Brasil/ desenvolvimento; Cana-de-açúcar- planejamento na formação de viveiros;
A importâncias dos levantamentos fitossanitários no contrôle
das pragas; Definições que os dicionários não registram e cada
um adota o que quiser; Um plano e uma consternação.
7.
Revista do Instituto de Direito da Eletricidade, n. 13,
agôsto de 1971, editada pela Faculdade Mineira de Direito,
da Universidade Católica de Minas Gerais, com o patrocínio
da ELETROBRAS (Centrais Elétricas Brasileiras S.A.) e pela
CEMIG (Centrais Elétricas de ML'las Gerais S.A.).
Dentre os diversos artigos, destacam-se: Os jovens de
hoje e o contrôle do futmo, palestra pronunciada pelo engenheiro João Camilo Alvim Penna na abertura da I Semana
de Engenharia Elétrica; Criterios generales para el establecimiento de tarifas electricas, trabalho apresentado pelo engenheiro Jorge E. Caballero ao III Congresso Pan-americano
de Engenharia Mecânica e Elétrica, realizado em San Juan
de Puer'to Rico; Análise sumária do consumo de energia elétrica (considerações teóricas e um exemplo comparativo entre três estados da Federação), Antonio Fernando de Menezes
Duarte do Instituto de Direito de Eletricidade; Fornecimento
gratuito de energia elétrica, José Luiz Ladeira Bueno, do Instituto de Direito da Eletricidade; A avaliação de faixa de
servidão para linhas transmissoras de energia elétrica, José
Carlos Pellegrino; Natureza jurídica da eletricidade, Walter
T. Alvares.
8. A cidade de Frei Carlos, Pe. Antonio Gomes de Araújo,
edição da Faculdade de Filosofia do Ct·ato, coleção Estudos
e Pesquisas, introdução do Prof. José Newton Alves de Souza.
O volume é o primeil·o das obras do Pe. Antonio Gomes de
Resenha Bibliográfica
193
Araújo, na coleção num plano de cinco volumes. O primeiro
volume, A cidade de Frei Carlos, é integrada pelos seguintes
estudos: 1. O Pe. Antonio Gomes de Araújo e a pesquisa histórica no Cariri, José Newton Alves de Souza; 2. A cidade de
Frei Carlos (Missão do Miranda); 3. Naturalidade de Bárbara
de Alencar- a heroína do Crato; 4. A cidade de Frei Carlos;
5. Mitos e realidades; 6. Qual a versão certa da casa em que
nasceu o Pe. Cícero, em Crato? 7. O Instituto Frei Carlos
e o Jardim da Praça da Sé; 8. Primeiro vigário de Crato; 9.
Crato não foi Curato; 10. A comunidade originária; 11. Aldeamento da Missão do Miranda e revelação de sua arqueologia; 12. Alvorada da glória; 13. As armas do Município; e
As armas do município do Crato.
9 . A desnacionalização e a crise da pequena e média empresa. Departamento de Imprensa Nacional, B1·asília, 1971.
Reunião de dois discursos pronunciados pelo Deputado Federal Freitas Nobre, nas sessões de 13 de abril e 17 de maio
de 1971.
10. De1·echo penal alemán. Prof. Hans Welzel, Editorial Jurídica de Chile, 11. edição. O texto alemão foi traduzido pelos professôres Juan Bustos Ramírez e Sergio Yáfíez Pérez,
ambos do Instituto de Ciencias Penales de Chile, que patrocinou a edição. O plano da obra é o que se segue: 1. Introducción: sentido y misión dei derecho penal; resefía histórica
dei derecho penal alemán; Fuentes y literatura del derecho
penal; Concepto del Derecho Penal; Derecho Penal y Iey penal; El ámbito de validez dei derecho penal a1emán; 2. La
conducta punible y su autor; Introducción: Misión y objeto
de la teoria general del derecho penal; La estructura dei delito y la naturaleza dei autor; La Teoría de la acción; Lo
injusto y su hachor; Lo injusto de los delitos dolosos; Lo
injusto de los delitos culposos; ITI) La culpabilidad; IV) Las
etapas de desarrollo dei delito: la tentativa; V) La misión
punible; VI) Unidad y pluralidad de delitos; VII) Las penas
y las medidas de seguridad.
11. Revista Cámara de Comercio de Bogotá, editada pela
Câmara de Comércio de Bogotá. Em seu primeiro número
destacam-se dois estudos: Metas de exportación de los produetos no tradicionales colombianos para 1971 e La política
del Café.
12. Revista Mexicana de Ciencia Política (Revista de Ciencias Políticas y Sociales). Em seu número 61, lê-se: Las l'elaciones internacionales y los derechos humanos (Héctor Cua194
R.C.P. 4/71
didático, calamidade pública, Deputado Padre Nobre e Poder Legislativo - considerações gerais, Paulo Affonso Martins
de Oliveira.
15. Jurisprudência, publicação do Tribunal de Justiça do
estado de Santa Catarina, reunindo os principais julgados e
decisões de 1970. Os acórdãos são dispostos segundo a classificação processual, agravo de instrumento, agraV'o de petição, apelação cível, apelação criminal, apelação de desquite,
Conselho disciplinar da magistratura, habeas-corpus; habeascorpus, recursos de; mandado de segurança; mandado de
segurança, recursos de; recurso criminal; revisão criminal.
Dentro de cada categoria, a matéria é exposta na ordem cronológica. A publicação é enriquecida e a consulta facilitada
por um minucioso índice alfabético.
16. Revista de Estudios de la Vi.d a Local, editada pelo Instituto de Estudios da Administración Local (Madri, Espanha).
O número 169 apresenta os seguintes estudos, ao lado de crônicas, trabalhos estatísticos, jurisprudência e bibliografia: Limites constitucionales de la reforma de la Ley de Regimen
local en materia de elecciones municipales, Fernando Garrido
Falia; Vigencia y revisión de los planes de Urbanismo, José Ma.
Boquera e El porvenir de la descentralización ante el proceso
planificador ~ Esquema para um planteamiento actual del
tema, Gaspar Ariiio Ortiz.
17. Aviação - presença antiga na integração nacional. Senador Vasconcelos Torres. Brasília, 1971. Reunião de discursos, projetos de lei, requerimentos proferidos ou apresentados
pelo senador pelo Estado do Rio e relativos à problemática da
aviação no Brasil.
18. Revista del Instituto de Ciencias Sociales. Mais uma vez
a famosa e excelente revista de Xifra Heras dedica-se à análise dos problemas relativos à informação e suas conseqüências no conjunto dos direitos individuais. O número 16, subordinado à temática Informação e pessoa humana, está dividido, ainda, em Información y cultura de masas e Información y Educación. Dentre os inúmeros trabalhos que constituem o número, destacamos: La persona, entre la educación
y la información: Communication and the human condition;
Les moyens d'information et la personalité humaine; Prensa,
integración social y libertad; Status giuridico della persona
umana ed informazione demodossalogica; La solidaridad
como forma de comunicación social em algunos relatos de
196
R.C.P. 4/71
guerra autobiográficos; Notas sobre la ambiguedad de la sociologia de la cultura de masas en Espana; Receptor o consumidor? El individuo frente a la oferta de los medios de
comunicación; L'avenh· de la presse écrite; L'informazione
statistica nella vita moderna; L'information objet de recherche scientifique; Información y nueva generación; Mass media and continuing life-long education; Los medias de información y la deseducación permanente; Le journaliste, doit-il
être "l'instituteur des adultes"? Información y educación permanente; Mass communication as an educational influence;
Objetivos educacionales de la radio; El proyecto inglés de la
"Universidad del Aire" o "Universidad Abierta"; Información
y salud mental; La Comunicación en la classe como grupo;
Israel's collective-democratic education.
19. Cadernos de Formação e Cultura (nova série), n. 1-3,
1971. Destacam-se dois trabalhos, o primeiro, Homem e mulher, o drama da convivência, é assinado pelo Pe. Pedro Américo (S.J.) e o segundo, aliás o mais interessante, é um Dicionário crítico do moderno romano-brasileiro. Não há, porém,
assinatura, o que nos impede de conhecer a autoria dos verbetes.
20. Revista de Estudios de la Vida Local. O número de 170
apresenta os estudos seguintes: Problemas estructurales del
Derecho de la organización administrativa, José Ortiz Diaz;
Autogobierno y centralismo en los orígenes del Regimen local
francês, José Antonio Manzanedo Mateos, e as modernas actividades de la Administración pública, Francisco Rodriguez
Haro.
21. Cadernos de Jornalismo e Comunicação, edições Jornal
do Brasil n. 30. O último número em circulação (maio/junho
de 1971), trouxe as seguintes matérias: 1. Observações, Alberto Dines; 2. Um jornal em debate; 3. Informação, mudança e envolvimento urbano, Rubem George Oliven, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 4. O processo sondável
da opinião pública, Josse Melange, do Instituto Belga de Informação e Documentação; 5. Central de Informática: modêlo de programação, João Jorge da Cunha, do Instituto de
Estudos Avançados; Coniere, um grande jornal provinciano?
Araújo Netto; Edição, um conceito em fase de transição, Marc
Saporta; O subdesenvolvimento da publicidade na França,
Mareei Blausntein-Blanchet.
Resenha Bibliográfica
197
22. Açúcar e álcool, ontem e hoje. Hamilton Fernandes. Rio,
1971, Coleção Canavieira n. 4, divulgação do Ministério da
Indústria e Comércio, Instituto do Açúcar e do Alcool, Divisão
Administrativa, Serviço de Documentação. Obra de divulgação, bastante ilustrada e atendendo a uma concepção editorial que visa a aumentar a comunicação com o leitor. Em
seu sumário (errôneamente chamado, no livro, de indice), lêse: O que é o açúcar; E tudo começa com a história; O Engenho Real Sergipe do Conde; Ainda os antigos engenhos;
A usina moderna; Clarificação do caldo; Decantador contínuo; Filtragem da bôrra; Filtro rotativo; Evaporação; Vácuo; Cristalizadores; Turbinas; Difusão; A usina e o engenho; Subprodutos; Obtenção do álcool; A destilaria e o alambique; Refinação do açúcar; O açúcar na economia humana.
23. Trilha perdida. Martins, 1971. Romance de Maslowa
Gomes Venturi. A obra e a autora são apresentadas, com entusiasmo, por Jorge Amado em nota de 4. a de capa.
24. Duas faces. Edições Encontro. Nôvo livro de poesias de
Cesar de Araújo. :G:sse volume é apresentado por Pascoal Carlos Magno.
25. Pássaro ele fogo. Cid Carvalho. Edição da Imprensa Universitária do Ceará. Seleta de poesia do jovem poeta cearense.
26. A formação do símbolo na criança, de Jean Piaget, é
um dos mais recentes lançamentos de Zahar Editôres. Examina as realidades que conduzem à simbolização como fenômeno vital, e que a configuram transitoriamente: a imitação,
o jôgo, o sonho, a imagem projetada e a representa~ão. :tste
interessante livro de Piaget, o último em versão portuguêsa,
destina-se não só a psicólogos, como também a uma vasta camada de leitores cultos, desejosos de ampliar seus conhecimentos de psicologia genética.
27. Gênese das estruturas lógicas elementares. Piaget e
Inhelder. Na sua linha de psicologia genética, a Zahar Editôra lança em obra conjunta de Jean Piaget e Barbel Inhelder, resultado de um acúmulo de pesquisas e experiências
exaustivamente trabalhadas, a partir do interrogatório a que
responderam nada menos de 2 159 crianças.
198
R.C.P. 4/71
RESENHA BffiLIOGRAFICA
R. A. AMARAL VIEIRA
AMOR e FOME - Os institutos primitivos encarados
à luz do futuro. Bodo Mansteln. São Paulo, Edições
Melhoramentos, 1971.
No ano 2000 a população do mundo atingirá a fabulosa cifra
dos 7 bilhões, 63% na Asia com a China, 15% na Europa
com a União Soviética. O que alarma aos analistas dos processos demográficos é o ritmo galopante em que a população aumenta, e se multiplica. Em 1650 a população da
Terra era de 500 milhões; daqui a 55 anos, no ano 2026,
essa população ter-se-á tornado tão grande que os homens
esmagar-se-ã.o uns contra os outros. Essa, a macabra profecia do físico Heinz von Foerster, mil vêzes mais trágica
que o fantasma malthusiano do crescimento populacional.
Até o fim do nosso século, ou seja, nos próximos 29 anos, o
número de habitantes de nosso planêta saltará de um pouco
mais de três bilhões para seis, seis e meio. A informação é
do Professor Fritz Baade, que acrescenta: "Isso (o aumento
nessa proporção) nunca houve antes na história humana:
um aumento em dôbro da população em pouco mais de trinta anos. Nos trinta e dois anos que temos na nossa frente
o aumento numérico dos homens será maior do que em todo o
tempo desde o nascimento de Cristo até o presente". (p. 245).
A verificação dêsses dados, alarmantes, tem despertado a
atenção das autoridades internacionais, especialmente dos
técnicos da FAO, para o problema resultante da escassez de
meios para suprir com alimentos essa população que cresce
em ritmo vertiginoso. Em outras palavras, ressuscita-se a
teoria de Malthus. A única forma de evitar, amanhã, o trágico desaparecimento de nossa espécie, por inanição, está no
contrôle da natalidade.
R. Cl. pol.,
Rio de Janeiro, 5(3) : 169-187,
Jul./set. 1971
•
Antes de tratar mais detidamente das teses levantadas
pelo Professor Bodo Manstein, em seu excelente A11WT' e
Fome, cumpre, pois, retomar a doutrina mathusiana.
A lei malthusiana do crescimento populacional, reduzida a têrmos matemáticos, ensina que a população tende a
crescer em progressão geométrica enquanto a produção dos
gêneros de subsistência aumenta em proporção aritmética.
No desdobramento de sua teoria, Malthus afirma que é imanente no homem a capacidade de procriação ilimitada, pelo
que o número de indivíduos de cada espécie encontraria um
limite fatal nos meios de subsistência disponíveis.
Assim, o fantasma do malthusianismo seria, exatamente, a certeza do impulso incontrolável no sentido da multiplicação indefinida da população, contra o desaparecimento
inevitável das condições de subsistência. Por via-de-conseqüência, o pastor protestante aconselharia reações cautelares
visando a limitar a explosão demográfica. Mas, mesmo quando o faz, é tão-somente encarando êsse contrôle como possibilidade unicamente teórica, sem fôrças para anular a conclusão fundamental de sua lei: a morte inexorável, rondando sôbre nosso futuro como sombrio fantasma.
Fácil de ver o engano da teoria elaborada com aparato
e ostentação cient1fica. Malthus viu inerte um mundo em
desenvolvimento.
Seu primeiro êrro foi o de basear-se em observação comprovadamente falsa. O esquematismo da explosão demográfica não resistiria a análise mais profunda. F. v. Kleinwhater (in Economia política, Barcelona, 2. ed. Gustavo
Gil Editor, 1929. p. 180) assinala que "la experiencia de los
hechos ensefía que el aumento de población no se realiza de
um modo tan esquemático como se suele suponer seguiendo
la teoria de Malthus. Todos sabenws que en la antigu.a Roma
se exteriarizaban las quijas sobre el debil aumento de la población y los distintos privilegias que se concedieron al padre
de tres o más hijos, por el justrium liberorum, atestiguan
que el Estado consideraba como una calamidad el escaso
aumento de la población y procuraba contrarestarlo. El limitado numero de nascimientos prodoce una gran preocupación a la Francia de nuestros dias; pero también en Austria
y Alemania se hacen patentes quejas de que el aumento de
población queda muy por debajo del alcanzado en Rusia.
Los magiares asimisrrw afirmam que en su pais la natalidad
es muy escassa. Aqui no podemos decidir, como facilmente
170
R . C.P. 3/71
(1831), nem o telégrafo de Morse (1832), a utilização do arado
de aço na economia americana (1832), as sociedades cooperativas de trabalhadores (1843), o cabo submarino (1852), ou
o processo Bessemer de fabricação de aço (1856).
Que dizer, então, da revolução tecnológica?
Malthus não estimou as inovações que deram partida à
revolução industrial, acelerando as técnicas de produção e
o processo de formação de capital. Ter-lhe-á surpreendido e
aos corüeus de seu fatalismo o desenvolvimento da civilização
industrial: em sua primeira fase, caracterizado, até os
anos setenta do século passado, pelo que Celso Furtado (in
Subdesenvolvimento na América Latina. Rio, Ed. Civilização
Brasileira, 1966. p. 4-5) denomina de preeminência de ação
de fatôres de ordem econômica, principalmente ligados à
transformação estrutural de oferta de bens e serviços:
"A moderna tecnologia ia sendo aplicada na criação de
novos processos produtivos, os quais entravam em choque
com o velho sistema de produção artesanal, acarretando modificações na estrutura social através da concentração das
atividades produtivas e de urbanização. ~m razão da elasticidade de oferta de mão-de-obm,, os salários reais tendiam a
permanecer estáveis, concentrando-se os frutos do momento
de produtividade em maiores lucros, parte substancial
dos quais seria aplicada em novas indústrias, o que permitiria que a transformação da velha estrutura econômica e social
prosseguisse em ritmo cada vez mais intenso."
Se não chegara a tão pouco, Malthus jamais suporia
a possibilidade da revolução tecnológica contemporânea e
sua importância no desenvolvimento do capitalismo que
logrou conhecer em sua plenitude.
Se ao teórico clássico pode-se explicar a falência da
elucubração aparentemente cientifica, aos discipulos retardatários não se permite o desconhecimento da economia moderna, o progresso tecnológico constituindo o fator básico
do crescimento e da estabilidade social. Sua teoria, por ausência de visão histórica, é impregnada de pessimismo e descrença com relação à sociedade de cuja análise resulta seu
pensamento. Na abertura de sua obra fundamental, lemos:
- aNuma investigação concernente à melhoria da sociedade, o tratamento que a mesma tem a seguir é:
172
R.O.P. S/'11
se comprende, si la reducción del número de nascimientos es
un fenómeno que se presenta automaticamente en todos los
pueblos que han alcanzado un elevado nível cultural y 'l.(.n
gran bienestar o si es una peculiaridad de determinadas
razas. Pero, en todo caso, pane de manifesto este tenómeno
que el fantasma de la "superpoblación'-' de Malthus non es
tan peligroso como se podria suponer a primera vista."
Há uma incontrastável relação- ainda que subestimada por alguns teóricos contemporâneos -entre. subdesenvolvimento econômico e explosão demográfica. O simplismo de
Malthus, todavia, daria ênfase ao problema populacional. Em
sua economia política o destaque dado à explosão demográfica reduziria a segundo plano o estudo do aumento da produtividade. Entenderia que se o número de nascimentos cor-.
respondesse ao de óbitos, a terra seria um reino de fartura:
todo recém-nascido encontraria seu lugar no mundo, inexistindo, assim., pobreza, miséria e fome. A "questão social"
nada mais seria que o fruto da diferença entre o número de
nascimentos e o de vagas abertas no quadro populacional.
Escrevendo nos fins do século XVIII (seu Essay on the
principle of population veio a lume em 1789), não teve meios
de enxergar a grande revolução que sacudiria o mundo,
transformando em escombros as teorias prêsas ao imobilismo
histórico. Ou seja, como afirmado, Malthus viu parado um
mundo em movimento, embora tivesse sido contemporâneo
do alvorecer da revolução industrial. Da época em que deve
ter concebido sua teoria: as primeiras máquinas de fiar
patenteadas na Inglaterra (1738), a fabricação do primeiro laminador de ferro (Colt, 1754) a primeira fábrica
inglêsa de fiação (1771), a máquina a vapor de Watt (1775),
a construção do balão pelos irmãos Montgolfier (1779), os
teares a vapor de Cartwright (1785), o barco a vapor de
Patrick Miller (1787), a máquina de descaroçar algodão de
Eli Whitney (1794), a abolição da escravatura nas colônias
francesas (1794) o arado de ferro patenteado por Charles
Newbold (1793), o início das exportações de ferro da Inglaterra (1797) e a invenção da pilha vóltica (1798).
A Malthus que presenciara todos êsses inventos e fatos
marcantes dos primeiros momentos da Revolução Industrial,
faltou a necessária imaginação para antever os progressos
que estavam reservados para os próxim.os anos. Sua teoria
não comportaria o acumulador de Ritter (1802), nem a locomotiva de Richar Truithick (1804), ou o eletromagnetismo
Resenha Bibliográfica
171
1 . investigar as causas que impediram, até agora, a evolução da humanidade à felicidade; e
2. examinar as possibilidades de supressão total ou parcial
dessas causas no futuro."
Trata-se, pois, como bem assinala Temperani Pereira
(op. cit., p. 322), de "um descrente, um pessimista com relação às condições da sociedade do seu tempo". Falta-lhe,
ainda, frieza. Dominado pelos preconceitos de sua formação
cultural, cometeria o êrro do mecanicismo grosseiro, das generalizações apressadas, transplantando para todo o mundo
a experiência da anâlise da sua Inglaterra. Desrespeitaria
espaço e tempo, condições mesológicas e históricas.
O mesmo Temperani: ucom esta simples idéia - a de
que a causa que impediria a evolução da humanidade era a
tendência a aumentar, a reproduzir-se além do que permitem
os recursos disponíveis para a subsistência - desenvolveu êle
o conhecido antagonismo entre o crescimento da população
e a produção de gêneros. fartindo da observação de sua ilha,
a Inglaterra, e depois generalizando o assunto ao todo universal, e baseado na idéia que impressionava sua formação
cultural, que era a idéia religiosa - dado que descendia de
uma família de curas, de pastores protestantes - achava ile
que as gerações sucediam-se de 20 em 20 anos, dobrando a
população na face da terra, enquanto que os meios de subsistência não acompanhavam esta mesma prcrporção.
O resto, é sabido.
Para evitar - ou retardar - êsse sombrio destino humano, Malthu.s aconselhava, estamos em 1798, o constrangimento moral com relação à procriação. Mais precisamente,
a disciplina sexual, o retardamento do casamento e a limitação dos filhos.
Destroem-se as pilastras do malthusianismo, mas se revigora o contrôle da natalidade, já agora sem apoio em uma
teoria econômica digna de crédito científico.
Dois postulados se repelem. O princípio malthusiano do
crescimento das populações e a capacidade produtiva da
sociedade. Se aceitamos o primeiro estamos, como assinala
Paulo Bonavides (in CMncia política. Rio, Ed. Fundação Getúlio Vargas, 1967. p. 40), "aceitando as enfermidades sociais
como oriundas de determinismo social, das leis da natureza,
contra as quais nada pode o homem em sociedade". Vamos
Resenha Bibliográfica
173
um pouco além do publicista. A aceitação do malthusianismo
valeria reconhecer a incapacidade do homem de agir sôbre
a natureza; implicaria em descrer do progresso e do desenvolvimento tecnológico que nos cercam no mundo atual;
implicaria em negar o que vemos, tocamos e sentimos.
Ao contrário, o futuro da humanidade é anunciado por
um otimismo lúcido, uma honesta certeza de progresso e
desenvolvimento.
A produção de gêneros alimenticios - para nos atermos
aos elementos da teoria em exame - não se trata de um
fator isolado, fixo. A produtividade da economia inglêsa
contemporânea não é a mesma de 1798. . . O desenvolvimento da humanidade, os diversos ciclos econômicos, correspondem a diversas fases de exploração dos bens da
natureza. O número de indivíduos alimentados pela agricultura é determinado pelas relações de produção. As novas técnicas, a racionalização do trabalho, os novos meios empregados, o uso de instrumental técnico aprimorado, desde o arado
primitivo às máquinas modernas, as novas relações de produção, por fim, são fatôres de produtividade. Mas dêles Malthus
descurou. O conhecimento que temos do mundo e do potencial humano, só nos pode convencer da certeza do desenvolvimento sempre crescente de novas técnicas e meios de produção, a superação das necessidades, à proporção que são
aumentadas pelas conquistas da ciência, determinando, por
seu turno, um sofisticado processo de desenvolvimento, numa cadeia sem fim, incluindo, desde o aperfeiçoamento do
instrumental utilizado na atividade produtiva, à evolução das
características das formas politicas e sociais e das relações
de produção a ela inerentes.
Bonavides (op. cit., p. 42) refere-se aos contestadores do
malthusianismo: ''Em que se apóia fundamentalmente a
crítica antimalthusiana? Num otimismo que não vacüa acêrca ãas possibilidades da técnica e da ciência, no seu desenvolvimento, no seu contínuo progresso, de criarem para o /tomem as mais risonhas e promissoras perspectivas de libertação econ6mica. Em conseqüência, a resposta da: ciência
é clara e otimista: a ciência, por meio de técnica adiantada e
racional, técnica altamente aprimorada, pode produzir, com
capacidade ilimitada, quase iTIJfinita, os bens necessários à
existência humana. Basta que se atente na libertação de fôrças poderosíssimas, por exemplo, ãa desintegração do átomo.
A era nuclear, que já se está oferecendo ~ realidade, na
antemanhã de suas melhores promessas, dana resposta irre174
R.O.P. 3/71
torquível aos que vêem cobertas de cinza as idades vindouras
da hum(mi~ade".
Ao lado do incontível desenvolvimento tecnológico existem, pari passu, ostensiva ou veladamente, as transformações
políticas e sociais, a superação de velhas instituições, a reformulação de conceitos de govêrno e administração, as reformas estruturais e institucionais, emprêgo da planificação
econômica, e a intervenção do Estado no domínio econômico,
possibilitando a: utilização da técnica e da ciência na transformação das estruturas arcaicas que contêm o progresso,
tornando realidade, com o soerguimento da condição humana, os anseios de felicidade e bem-estar. Os velhos regimes
não mais çonstituem empecilho à utilização do patrimônio técnico .c ultural da humanidade em proveito da construção de uma existência digna. Mais do que excedente populacional, o problema seria a imperfeita distribuição da riqueza.
E êste problema é o objeto da economia moderna.
E o livro de Manstein?
O título pouco significativo entre nós e ensejador de interpretações errôneas (original alemão: Lieàe und Hunger,
Die Ultriebe im Licht der Zukunfd) quanto ao seu conteúdo,
esconde uma das obras mais sérias já editadas em nosso País,
sôbre a matéria. :É um livro ao qual se pode dar, sem susto de
precipitação, a classificação de trabalho científico.
Manstein filia-se à linha dos que preconizam o contrôle
de natalidade. Como a grande maioria dos autores naturais
desenvolvidos, desde que não encontrem meios de conter a
atual taxa de desenvolvimento demográfico. Contrastando,
porém, com a maioria dos escritores que trataram do assunto, especialmente americanos, Manstein evita as generalizações e as globalizações. Se o problema da natalidade pode
constituir-se em preocupação para a humanidade como um
todo, há de ser encarado particularmente, país a pais. Manstein distingue a situação dos países desenvolvidos dos subdesenvolvidos, e dentre êsses destaca a Asia e nela a índia.
Evita, assim, o êrro grosseiro dos técnicos que arrolam sob
o título de subdesenvolvidos, a um só tempo, o Brasil e a
índia, e a ambos receitam o mesmo tratamento de choque do
contrôle da ' natalidade.
:É fora de dúvida que o problema não pode ser visto em
sua globalidade, mas em seus aspectos particulares. Não a
Resenha Bíbliográfíca
175
humanidade como um todo, ou mesmo os subdesenvolvidos
como um bloco uniforme; dentre êsses há a explosão populacional indiana e a baixa taxa demográfica brasileira, com os
desertos populacionais da Amazônia e do centro-oeste, perigosamente ricos e desocupados, num mundo que já começa
a falar, outra vez, em "espaço vital".
Fritz Baad, colaborador de Manstein, divide a humanidade, em têrmos de relação população-produção de bens, em
três grupos: a) países nos quais a produção de alimentos
cresce mais depressa do que o número de habitantes que
devem ser alimentados (Europa Ocidental, América do Norte, Austrãlia, Nova Zelândia e mais alguns pafses menores);
b) países nos quais a produção de alimentos cresce mais
ou menos tão depressa quanto o número de habitantes
(União Soviética e China); e c) paises nos quais a atual produção de alimentos não acompanha o crescimento populacional (América Latina, Atrica, grande parte da Asia).
Verifica-se~ assim, que o problema se agrava, tão-somente, nos países mais atrasados, sem tecnologia, carentes de capital. A medida que êsses países resolvam seus problemas é
razoável esperar-se que, a exemplo da União Soviética e da
China e, remontamente, a exemplo dos pafses enquadrados na
primeira faixa, 1mperem seus problemas internos e entrem a
produzir o necessário para atender às necessidades de suas
populações. É evidente que Manstein prefere aconselhar o
contrôle da natalidade nos países às voltas com gap de produção de alimentos.
Baad refere-se à uma série de medidas tendentes tôdas
elas a promover a superação dessas diferenciações: substâncias nutritivas para as plantas e combate às pragas da lavoura; aumento da produtividade por hectare; maior aproveitamento da água e cta energia; utilização das reservas alimentares dos oceanos.
Todos os autores são acordes em apontar uma relação
direta entre o contrôle espontâneo e as populações ricas e
cultas; por outro lado, em regra, as populações pobres e
incultas estão a braços com elevadas taxas de natalidade.
Tem-se mostrado remédio da maior eficácia a alfabetização
das populações. Além dos resultados diretos (higiene, aprendizagem de métodos de contrôle etc.), a alfabetização é até
agora o melhor instrumento conhecido para a realização de
uma economia agrária progressista, e assim, produtiva.
1T6
R.C.P. 3j71
Afigura-se-nos, pois, plenamente exequível e ao alcance
de nossas fôrças "construir uma técnica de produção, propor
uma planificação, adotar um dirigismo econ6mico que vençam de futuro todo êste desdobrar de tatos ameaçadores, os
quais, na aparência, e tão-somente na aparência, confirmam
o triste vaticínio malthusiano" (Bonavides. op. cit., p. 42}.
Segundo os autorizados dados da ONU, já em 1951 a discriminação das rendas nacionaiS por habitante construiria
quadro elucidativo: a Europa (incluída a URSS} e a América do Norte, juntas, constituindo 32% da população mundial, detinham 83% da renda do globo; por outro lado, a
Africa e a América Latina, representando juntas cêrca de 14%
da população mundial, detinham, respectivamente, 4,5% e
2% da renda mundial ...
O problema da renda nacional, sempre relegado a
segundo plano, precisa de entrar na liça:
"Um têrço dos sêres humanos vive em países cuja renda
nacional por habitante e por ano é inferior a 50 dólares e
mais da metade dos homens se encontra em Estados cujas
rendas por pessoa são inferiores a 100 dólares. Em 1954, para
o conjunto dos países subdesenvolvidos, a renda nacional por
habitante e por ano era de 586 dólares para o grupo dos países desenvolvidos (1 . 870 nos Estados Unidos).
"Além disso, êsse desnível, já considerável, cresce ràpidamente, dado que os paises desenvolvidos progridem bem mais ràpidamente que os outros. Assim, a renda nacional por habitante nos Estados Unidos era 15 vêzes mais elevada que a da
tndia, antes da guerra. Vinte anos mais tarde, seria necessário multiplicar para 35 a renda de um indiano para igualála à de um ianque" (Lacoste, Yves. Geografia do subdesenvolvimento. São Paulo, Difusão Européia do Livro1 1966.
p. 12).
Não por acaso a tndia é um país subdesenvolvido às
voltas com explosão demográfica, e os Estados Unidos
superdesenvolvidos, desconhecem essa ameaça. Repita-se: o
"problema" crucial da explosão demográfica está exatamente no desnível do crescimento populacional frente ao crescimento da produção de bens de subsistência. O problema,
pois, é de nível econômico: desenvolvimento nacional. Controlar a natalidade, tão simplesmente, ou apenas isso, seria
reconhecer nossa incapacidade de promover o desenvolvimento econômico .
.Resenha Bibliográfica
177
Não deve constituir mera coincidência o fato de dois
dos paises mais populosos, a União Soviética e os Estados
Unidos, o primeiro o mais populoso da Europa, o segundo,
das Américas, desconhecerem o fantasma da superpopulação,
por serem, ao mesmo tempo, as duas nações mais desenvolvidas do mundo. Seria ridículo, e nenhum organismo governamental se atreveria a tanto, propor às populações soviética
e americana o contrôle da natalidade para evitar a fome,
quando aquêles países se dão ao luxo de grandes populações ... e grande produção. Mas tanto em um como no outro,
nas épocas históricas corretas, o problema foi atacado pela
raiz: o desenvolvimento econômico.
No âmbito dos subdesenvolvidos, afora o atraso econômico, existe o desperdicio da produção. O desequilíbrio
entre os recursos naturais e o efetivo da população poderá ser
anulado, não só pela produção de gêneros de subsistência,
mas também pela racionalização dos processos de produção,
pelo planejamento econômico, pela adoção de uma politica
de incremento, com a introdução de técnicas modernas, contrôle de mercado etc.
E a corrida armamentista, o desperdicio com a guerra,
imolando vidas úteis, destruindo recursos naturais, arrasando economias, desviando para a esterilidade riquezas que,
escoadas para o aumento da produção, teriam resolvido, por
sem dúvida, os problemas atuais?
Fritz Baad indica a solução para o problema que é hoje
alimentar a população do globo: parar com os armamentos.
Vale a pena transcrever êsse trecho (p. 261):
"O problema de alimentar os habitantes da terra, que até o
fim de nosso século terão aumentado para mais de seis bilhões, só pode ser solucionado se forem reduzidas de muito
as despesas com armamentos, empregando-se em atividades
produtivas, sobretudo no terreno intelectual, os recursos assim poupados. Esta é a fórmula mágica tanto para os países
que dão ajuda como para os que a recebem. O primeiro a
dizê-lo aos que ajudam outros foi Sir John Boyd Orr, autoridade máxima em economia agrícola. Em seu livro The
white man's dilenuna escreveu êle que os Estados Unidos
com seus aliados e a União Soviética com seus satélites deviam pôr à disposição de uma autoridade internacional, que
representasse os interêsse de todos os povos, 10% das somas
que gastam com armamentos e que os recursos assim obti178
R.C.P. 3/'ll
mais em educação do que em qualquer outra região subdesenvolvida.
Desgraçadamente, o mundo gasta três vêzes mais com
armas que com saúde pública, é o que declara a UNESCO
(cf. El Correo de la UNESCO, novembro de 1970), onde se lê:
No periodo de 70 anos, desde 1900, o aumento médio da carga
teal representada pelos armamentos no mundo inteiro atingiu a 5% anuais. A partir de 1948 a percentagem subiu para
6%. Isto significa que, de 1948 a 1968 o custo real dos armamentos TRIPLICOU.
Se o aumento de gastos com armamentos prossegue no
ritmo de nossos dias, e infelizmente nada nos conduz a prever o contrário, o despêndio terá outra vez dobrado daqui a
nove anos, em 1980. O total mundial de gastos em 1968, segundo os preços de 1960, foi de 153. 498 milhões de dólares
(americanos). Já em 1980 será de 306 . 966 milhões.
Vejam~se êsses dados conclusivos: O Vietnã (do Norte
e do Sul), gastara;m, em 1968, em armamentos pesados,
1. 200 milhões de dólares. Essa cifra extraordinária aplicada
em regime de paz, teria acabado com a pobreza, a fome e o
analfabetismo naquela populosa e conflagrada região do
globo. Faz-se desnecessário estimar o quanto resultaria em
riqueza, nessa região, a inversão das inimagináveis somas que
os Estados Unidos consomem atualmente, no esfôrço de
guerra.
São as tristes irracionalidades a que se refere Bodo
Manstein:
"E:x;i.stem pois irraciona.lidades difíceis ou impossíveis de calcular, às quais pertencem tôda a escala de condutas religiosas, políticas, econômicas e biológicas dos povos. tstes povos, de tão diferentes civilizações, estarão prontos a aceitar
novas idéias, que por um lado são condição prévia para tôdas as medidas de grande alcance a serem introduzidas, mas
por outro lado, em muitos casos, trazem consigo uma total
ou parcial dissolução de sistemas que se tornaram hábito antigo? Mal é de se esperar que o estejam, quando se v~ com
que objetivos, em nossos dias, quando em muitos países
morre gente de tome na beira da rua, se travam guerras e
como permanecem sem solução os problemas raciais".
Em seu livro, por demais importante, Manstein aborda
o problema populacional sob os mais diversos ângulos, o bio180
R . C.P . S/71
dos deviam ser empregados na luta contra a fome e contra
a pobreza. No ano de 1967 o Papa Paulo VI, na Encíclica
Populorum Progressio, secundou. esta. proposta. com as seguintes palavras: "Em Bombaim pedimos a instituição de
um grande fundo internacional, que devia ser constituído
por uma parte dos recursos gastos para fins militares, destinado a socorrer os mais pobres. O que se aplica à. luta direta contra a miséria é de importância também para a ajuda
ao desenvolvimento. Quando tantos povos sofrem fome,
quando tantas familias vivem na miséria, quando tantas
criaturas humanas vegetam na ignorância, quando falta
construir tantos hospitais, tantas escolas e moradias decentes, todo e qualquer esbanjamento de dinheiros públicos e
mesmo privados, tôda e qualquer despesa feita para satisfazer ambições nacionais ou pessoais, tôda corrida armamentista que esgota as fôrças da nação, constituem escândalo intolerável". Nesta declaração está formulada de mlV
neira clássica a mobilização das reservas humanas do mu~
do para a luta universal contra a fome, no que se refere às
nações ricas e em condições de ajudar. Mas também para
os países que recebem ajuda esta deve ser a fórmula para
a eliminação de seus deficits alimentares. Só quando a
fórmula indiana - gastos com armamentos trés v€-zes maiores do que os gastos destinados d instrução - f~ substituída pela fórmula mexicana - quatro vêzes mais verbas
para instrução do que para armamentos - podemos ter esperanças de ver as reservas humanas da Terra mobilizadas
de maneira tal que também as reservas materiais se tornem
produtivas e que a luta mundial contra a fome e a pobreza
termine com a vitória da Humanidade".
Se verdadeiras as estatisticas do Serviço de Desarmamento e Contrôle de Armamentos dos Estados Unidos (cf.
meu livro Juventude em crise. p. 90), tudo faz crer que a
América Latina, finalmente, compreendeu o sentido da advertência de MacNamara (No mundo moderno, a defesa, a
segurança nacional, consiste, em boa verdade, no desenvoZ..
vimento econômico e científico. Por vkes, é-nos difícil perceber isso, nós que alimentamos opiniões um tanto estereotipadas, consistindo em calcular a segurança em térmos puramente militares) partindo para investimentos maciços no
setor da educação. O Serviço de Desarmamento realizou uma
pesquisa a respeito do que se gasta em Fôrças Armadas
(Exército, Marinha e Aeronáutica), cuja conclusão, honrosa
para nós, é a de que os pafses da América Latina despendem
R&enha Bfbltográjfca
179
mais em educação do que em qualquer outra região subdesenvolvida.
Desgraçadamente, o mundo gasta três vêzes mais com
armas que com saúde pública, é o que declara a UNESCO
(cf. El Correo de la UNESCO, novembro de 1970) , onde se lê:
No período de 70 anos, desde 1900, o aumento médio da carga
real representada pelos armamentos no mundo inteiro atingiu a 5% anuais. A partir de 1948 a percentagem subiu para
6%. Isto significa que, de 1948 a 1968 o custo real dos armamentos TRIPLICOU.
Se o aumento de gastos com armamentos prossegue no
ritmo de nossos dias, e infelizmente nada nos conduz a prever o contrário, o despêndio terá outra vez dobrado daqui a
nove anos, em 1980. O total mundial de gastos em 1968, segundo os preços de 1960, foi de 153.498 milhões de dólares
(americanos). Já em 1980 será de 306.966 milhões.
Vejam-se êsses dados conclusivos: O Vietnã (do Norte
e do Sul), gastaram, em 1968, em armamentos pesados,
1. 200 milhões de dólares. Essa cifra extraordinária aplicada
em regime de paz, teria acabado com a pobreza, a fome e o
analfabetismo naquela populosa e conflagrada região do
globo. Faz-se desnecessário estimar o quanto resultaria em
riqueza, nessa região, a inversão das inimagináveis somas que
os Estados Unidos consomem atualmente, no esfôrço de
guerra.
São as tristes irracionalidades a que se refere Bodo
Manstein:
uExistem pois irracionalidades difíceis ou impossíveis de calcular, às quais pertencem tôda a escala de condutas religiosas, políticas, econômicas e biológicas dos povos. tstes povos, de tão diferentes civilizações, estarão prontos a aceitar
novas idéias, que por um lado são condição prévia para tôdas as medidas de grande alcance a serem introduZídas, mas
por outro lado, em muitos casos, trazem consigo uma total
ou parcial dissolução de sistemas que se tornaram hábito antigo? Mal é de se esperar que o estejam, quando se vê com
que objetivos, em nossos dias, quando em muitos países
morre gente de fome na beira da rua, se travam guerras e
como permanecem sem solução os problemas raciais".
Em seu livro, por demais importante, Manstein aborda
o problema populacional sob os mais diversos ângulos, o bio180
R .C.P. 3/'11
lógico, o político, o econômico etc. Inicia-o tratando da Regulagem e Ordem biológica, seguindo-se os seguintes capitulas: Avalancha incontida de filhos, Em tôrno do Equador da
Fome, Extensão e riscos do abôrto propositado, Métodos de
regulagem da prole, O Espaço vital dos netos. A segunda
parte é constituída pela reunião do texto de diversos debates
assinados pelas mais destacadas autoridades européias: Alimentação universal exemplos de um prognóstico, Prof.
Dr. Georg Picht; Contrôle da natalidade segundo o Direito
da República Federal da Alemanha, Dr. Fritz Bauer; Em
tôrno do futuro do amor, Prof. Dr. Friedrich Heer; Planejamento do futuro e economia do lucro, Jean Améry; O eros
politizado, Dr. Rainer Kabel; Emancipação feminina e grupos subdesenvolvidos, Dra. Hedda Heuser; Malôgro da nova
geração - culpa da velha, Peter-Wolfang Engelmeir; Condições fundamentais para um planejamento bem sucedido
na família e jat6res que o entravam, Prof. Dr. Joachim D.
Beekmann; Como vencer na l'ltta mundial contra a tome,
Prof. Dr. Drs. h. c. Fritz Baade.
Desconheço as caracteristicas do original alemão, mas
não perdôo à Editôra Melhoramentos haver publicado êsse
livro sem armá-lo com um minucioso índice analltico. Obras
dessa natureza, obras para serem lidas, anotadas e guardadas na estante para novas consultas, não podem prescindir
de índices analíticos, único instrumento válido para a localização e recuperação da informação.
O CONCEITO DE DffiEITO NATURAL EM
JOHANNES MESSNER. E. Serrano. Apud Revtsta
de la Faculdad de Derecho, Untversidad del Zulia.
A revista da Faculdade de Direito da Universidade de Zulia,
Macaraibo, Venezuela, em seu número 29, traz, entre outros
trabalhos, El concepto de derecho natural em Johannes
Messner, assinado pelo Dr. Alberto E. Serrano.
O Dr. Serrano, propondo-se a uma anãli$e de Ética social, politica y económica a la luz del derecho natur al, versão
castelhana de Das Naturrecht, obra básica de Messner, realiza um pequeno estudo acêrca do conceito de direito natural
na doutrina do jurisconsulto alemão. Seu estudo é despretencioso, limitando-se a extrair da obra do mestre alemão
os aspectos mais caracteristicos, de forma a oferecer ao leitor.
sem maiores considerações, seu conceito de direito natural.
Resenha Bibliográfica
181
A importância do conceito de direito natural em Messner deriva de sua posição absolutamente pessoal, rompendo
com os quadros tradicionais da classüicação jusnaturalista. É sabido que, em linhas gerais, as direções tradicionais
do jusnaturalismo podem ser reduzidas a dois grupos de autores: a) os que assinalam uma instância supramundana como origem e fonte dos princípios básicos do direito natural (Deus); e b) os que derivam êsses princípios básicos
a partir da razão humana. A saber, essas perspectivas, embora
distintas, mantêm em comum o método dedutivo, pôsto que
partem de um princípio geral - Deus ou a razão - para
uma série de princípios ou verdades particulares, os direitos
naturais fundamentais. Nesse quadro, como se situa Messner? Parte para uma terceira posição, indutiva. De uma
série de verdades ou princípios particulares (dados recolhidos das ciências empíricas), obtém princípios ou verdades
mais gerais (princípios de direito natural primário) em virtude de um processo de apstrações sucessivas. De certa forma, o pensamento de Messner pode ser encarado como uma
volta, ou redescoberta contemporânea, do jusnaturalismo de
Santo Tomás. Sem embargo dessa evidência, sua doutrina
mostra pontos de contato com o existencialismo sartreano,
não obstante a conservação do apêlo deísta impugnado pelo
autor francês. Segundo Messner (Das Naturrecht, tradução
castelhana referida, p. 36), a conduta exigida para a plena
realização da natureza do homem vem determinada pelos
fins traçados nos instintos corporais e espirituais de sua natureza. A saber: êsses instintos tendem a atualizar-se, como
fôrças que são, em cada homem, em cada sujeito considerado individualmente, e a atualização de referidos instintos
deve passar através da autodeterminaçã,o de cada homem individual na medida que é existência, liberdade, capacidade de propor-se possibilidades e escolber uma dentre
essas possibilidades (favoráveis) propostas. A partir dêsse ponto de vista podemos afirmar que referidos instintos - denominados por Messner fins existenciais - tendem a um fim.
Messner se preocupa com o homem enquanto uma existência
em situação, seja, na medida que é um sujeito hic et
nunc.
Messner, lê-se na resenha de Serrano, localiza no ser
humano uma série de estruturas e impulsos básicos ao largo
de tôda a história e de tôda a geografia do glo'bo terrestre.
182
R.C.P. 3/71
Essas estruturas e impulsos básicos constituem os instintos
corporais e espirituais que se encontram inscritos na natureza peculiar do homem; como exemplo dos primeiros teriamos o impulso à reprodução, enquanto que, como exemplo
dos segundos, poderíamos assinalar a busca de conhecimento, que é um impulso vital característico do ser humano.
Ainda em Das Naturrecht, Messner indica quais são os
impulsos básicos ou fins existenciais do ser humano: a própria conservação, assim entendendo-se a inta.ngibilidade corporal e a consideração social (honra pessoal). A própria perfeição física e espiritual, nela compreendido também o desenvolvimento de suas capacidades para o melhoramento de suas
condições de vida, assim como de previsão de seu bem-estar
econômico através da garantia da propriedade ou da renda
necessária à sobrevivência. A ampliação da experiência do
saber e da aptidão para apreciar a beleza. A reprodução
mediante a coabitação e a educação dos filhos. A participação do bem-estar espiritual e material dos demais homens
como um ser humano dotado da mesma dignidade. A união
social para o fomento da utilidade geral, que consiste no asseguramento da paz e da ordem, e de tomar possivel o aperfeiçoamento humano de todos os membros da sociedade por
meio de uma participação proporcional na quantidade
de bens disponíveis. Por fim, o conhecimento e o culto de
Deus e o definitivo cumprimento do destino do homem
mediante a união com :f!!le.
:€ fora de dúvida que, salvante o último, como bem assinala Serrano, os demais fins existenciais são perfilhados
por todos os homens, ou quase todos.
ASPECTOS DA ECONOMIA BRASILEIRA. Jayme
Magrassi de Sá. Rio-São Paulo. Editôra Alba.
Como o próprio titulo indica, não estamos diante de um
manual para aproveitamento didático, ou de um texto acadêmico. Mesmo o desenvolvimento doutrinário é relegado a
segundo plano, em proveito do tratamento conjuntural:
análise de aspectos concretos da economia brasileira. A elaboração não obedece a um plano pré-estabelecido, constituindo-se mais precisamente em uma bem selecionada coletânea
de textos autônomos, ainda que necessàriamente harmonizados.
Resenha Bibliográfica
183
Reunião de artigos publicados em épocas distintas na
imprensa diária do Rio de Janeiro, o livro do economista
Jayme Magrassi de Sá, na medida que perde em profundidade (incompativel com o tratamento jornalístico a que se
propôs), ganha em comunicação. O autor procura deliberadamente e quase sempre atinge um tratament<1 claro e ameno, pois não lhe faltam nível científico e competência técnica
bastantes para descer aos meandros da economia brasileira
contemporânea.
Livro escrito nas vagas dos fins-de-semana, dirige-se
àquele segmento de leitor que os jornalistas denominam de
"grande público não iniciado em matéria econômica", mas
despertado por um interêsse crescente: profissionais liberais, homens de negócio, estudantes e outros. Talvez por isso
mesmo, alguns dos assuntos abordados cheguem a constituir-se em temas polêmicos, como por exemplo a correção
monetária. Pedra de toque para mal-entendidos, envolve as
preocupações de todo o Pais, desde os escalões mais altos da
adlninistração federal até a economia do lru: mais modesto:
alcançando a todos de forma inflexível, embora em doses discriminatôriamente distintas, a correção monetária tem provocado os mais vivos e desconcertantes debates, muitos de
ordem puramente técnica, muitos timbrados pela tônica
emocional.
Inconvenientemente convertida em tabu por seus primeiros teóricos, a correção monetária é apresentada como
obra acabada: intocável, intangível, imaculável, constitui
mesmo irreverência tentar a mais inocentes das críticas. Os
corüeus da correção não admitem, ao menos, que se examine,
cientificamente, o seu comportamento e seus resultados; se
a correção monetária era a solução boa, bons devem ser seus
resultados. Para que mensurá-los? Aos que propugnam a
análise dos resultados para a retificação das distorções acaso
detetadas, se objeta o anátema de "inimigos da correção", o
que por si basta para encerrar qualquer debate. Mas a verificação dos resultados se impõe: é que sua adoção- medida
correta e inafastável, reconhece Magrassi - prescindiu, até
por fôrça mesmo das condições emergenciais características
do momento político em que se implantou, de análise prospectiva mais detida.
Passados seis anos de sua vigência, será simples ataque
ao instituto sugerir a verificação dos resultados? Mas a posição contrãria, ensejando a manutenção dos desvios de cur184
R . C.P. 3/71
so, poderá conduzir à condenação em bloco da correção, o
que não é solução, mas saída ainda mais desastrosa. O temor
das pequenas correções alimenta as distorções que poderão
comprometer o próprio instituto. Veja-se um exemplo: projetada em 1964, quando a situação crítica da economia brasileira impunha o tratamento antiinflacionário de choque, a
correção permanece a mesma ainda hoje, quando a inflação
se mostra sob contrôle. Ora, como explica Magrassi, a correção já agora está gerando, ante a redução da taxa de inflação, a criação de determinada faixa de renda real, mas
em favor dos credores; êsses, passam a auferir dois tipos de
renda: a decorrente de juros, comissões etc., e a que lhes
chega implícita no produto da correção. Ou seja, transferiuse para os credores as vantagens que a inflação atlibuía aos
devedores.
Por outro lado, se está havendo - e não há como negar - uma absorção gradual da inflação, não será heresia
pretender uma absorção gradativa do próprio instrumento
da correção, que apenas se justifica pela existência da inflação, e na sua medida. Não deve, portanto, a aplicação,
obedecer a um esquema rígido, mas acompanhar a própria
evolução da economia. Entre nós, todavia, mantém-se intocada a alvíssara de sua introdução. Daí, algumas distorções
humanamente inevitáveis, tais como sua lenta absorção que,
não promovendo o decréscimo da taxa de desvalorização, não
pode estar, evidentemente, ajudando o esfôrço antiinflacionário.
Os que acusam a existência de discrepâncias no exercício da inflação partem do reconhecimento de que está definitivamente vitoriosa a política econômico-financeira do
govêrno; e essa vitória mesma é quem fornece ao govêrno
meios e instrumentos que tornam ridículo qualquer receio ou
mêdo de manter a correção em rédeas mais curtas. A gradual absorção da inflação deve assegurar a tranqüila correção
da correção, eliminando, por exemplo, a assimetria de comportamento e a exiguidade dos prazos de reajustamento, ou,
reduzindo o percentual da inflação, fazendo-o igual a uma
dada percentagem da taxa de inflação possível.
Segundo Magrassi de Sá, e assim conclui seu ensaio,
"o que se impõe é uma orientação ponderada, caminhando~
se para a erradicação, no momento oportuno e com os cuidados necessários, de algo que só pode existir numa ecoResenha Btbliográfica
185
nomia enfêrma e cuja aplicação, se imperfeita, acaba concorrendo para alimentar o estado de enfermidade. Dentro
de uma política antiinflacionária gradualista, tal orientação
só pode desenvolver-se gradualmente, sob pena de incompatibilidades e precipitações. Mas, há que iniciá-la com urgência".
De resto, o que parece inquestionável é o anticientüismo da posição dos que consideram intocáveis a correção e
os processos utilizados para aplicá-la. A ciência, inclusive e
principalmente a ciência econômica, é incompatível com os
tabus.
Mas, A "Ccm-eção" da Correção é apenas um dos aspectos da economia brasileira enfocados por Magrassi de Sá. Em
seu livro são abordados ainda os mais variados temas, entre
os quais cumpre registrar: Recuperação financeira do Brasil, O sistema financeiro e o desenvolvimento, Desenvolvimento regional integrado, O mercado de capitais, Contr6le dos
preços, Contróle da natalidade, O uso do agregado produto
e muitos outros.
LANÇAMENTOS RECENTES
Zahar Edltôres
Teorias do desenvolvimento econ6mico, William O. Thweatt,
da Vanderbilt Universit, e diretor, até bem pouco, dos cursos
de pós-graduação em Economia da Universidade de São Paulo. Seu mais recente livro focaliza as diversas teorias que, a
seu ver, contribuíram para a formação do quadro atual da
economia brasileira.
Perspectivas do capitalismo moderno, coordenação do
Professor Luiz Pereira, da Universidade de São Paulo. Reúne
alguns dos mais destacados especialistas.
Uma introdução d sociologia, Wil!red A. Andersen e Frederick B. Parker, das Universidades de Cornell e Delaware.
Com clareza e segurança analisa as principais correntes do
pensamento sociológico, dispensando gráficos e diagramas.
A emprêsa privada e o interêsse público, Gordon C.
Bjork. Partindo de um estudo sôbre a lógica do desenvolvimento capitalista nos Estados Unidos, analisa a for186
R.C.P. 3/'11
mação econômica americana, e o impacto que sObre ela
provocaram as diversas correntes econômicas, principalmente
o pensamento marxista.
Editor Borsol
Curso de direito internacional público, Luis Ivanl de Amorim Araújo.
Manual didático, dedicado aos alunos dos cursos jurídicos. O primeiro volume, o único lançado, vai, desde o Conceito de Direito Internacional Público à anãlise dos mecanismos reguladores da Extradição. Os temas são tratados
de forma sumária, direta e acessivel. Não há indice analltlco, ao menos nesse volume.
PUBLICAÇÕES DA CAMARA
DOS DEPUTADOS
1. Deputados õra.sflefros (Repertório biográfico dos membros
do. Câmara dos Deputados - 6.• legislatura)
4.
Anat! da CâmaTa dos Deputados
Anais da Constituição de 1967
Partü:tpação do trabalhador nos lucros da empr~sa (Série
7.
Referência legtslattva.
2.
3.
Documentos Parlamentares)
5. Súmula de difcursos
6. Sérte Emendas à Constftutçllo de 1946
8. Resenha legislativa
9.
10.
11 .
12.
13.
Bibztografia sôbre Federalismo (separata)
Bibliografia sôbre a Universidade de Brasília (separata)
Apartheid. Bibliografia 86bre a pOlítica de segregaç4o ra,ctal na A.frl.ca do Sul
Politü:a de desenvolvimento e atuação da SUDENE (Bibliografia) (separata)
Btbltogralfa de José Bcmttácto de Andrada e Silva (0 Pa-
triarca da Independência) (separata)
A venda. nas Uvrarlas da. FGV ou pelo reembõlso postal. Pedidos
paro. o. Fundação Getúlio Vargas, Serviço de Publicações, Prl\ia.
de Botatogo 188, Caixa Postal 21.120, ZC-05, Rio de Janeiro, OB .
Ruenha Bibliográfica
187
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RESENHA BffiLIOGRAFICA
R. A. AMABAL VIEIRA
As idéias de McLuha:n. Miller, Jonathan. Editora Cultrix, Editora da Universidade de São Paulo, São Paulo, 1973.
Apesar da sugestão do titulo, As idéias de McLuha.n (no original
americano: McLuha.n) , não se trata de simples exposição do
elenco de idéias do autor de Understa.nding media. Com esse livro,
Jonathan Miller não pretende oferecer um inventário do que há
de mais importante na temática mcluhaniana; ao contrário, destinando-se mais aos conhecedores da obra polêmica de McLuhan,
embora declare dirigir-se ao leitor "não iniciado", é um estudo
contestador.
A exposição das idéias de McLuhan desenvolve-se a partir
das críticas e das reservas de Miller. Neste sentido, trata-se de
um livro de contestação, o que certamente justifica o estilo não
só contraditório mas também hostil que o caracteriza, da primeira à última página: "Na exposição, adotei deliberadamente
um tom hostil, em parte porque - devo admitir - estou em
quase total discordância com o conjunto principal das idéias de
McLuhan, mas em parte, ainda, para emprestar certo vigor r etórico à discussão. Meu meio é parte de minha mensagem."
Para a apresentação caleidosc6pica das idéias de McLuhan autor de cerca de 11 livros e de copiosa colaboração em revistas
e jornais - Jonathan Miller não necessitou, porém, de lançar mão
de toda a sua bibliografia limitando-se, basicamente, a uma só de
suas obras, de certo a obra fundamentai do conjunto mcluhaniano.
A partir de A galáxia de Gu.temberg (publicada no Brasil em 1972
pela Editora Nacional), Miller intenta apresentar e criticar o conjunto das idéias de McLuhan. Para o autor, a limitação não impôs qualquer ordem de dificuldades ao seu projeto: "Embora
McLuhan tenha mostrado, em anos recentes, espantosa produtividade, seu único livro em condições de reclamar procedentemente
R. Ci. pol.,
Rio de Janeiro,
17(1): 157-163,
jan./mar. 1974
nossa estima foi publicado e largamente comentado no início da
década de 1960. Posteriormente, a maior parte do que ele disse
foi repetição, ou melhor, constituiu-se em uma série de glosas, espirituosas, a propósito dos temas abordados em A galáxia de
Gutenberg. Entendo que, resumindo a linha básica em torno da
qual esse livro se desenvolve, poderei fazer adequada apresentação das principais idéias de McLuhan, embora reconheça que há
notáveis ineditismos epigramáticos disseminados por quase tudo
o que ele publicou até nossos dias."
Os pontos básicos da exposição e, portanto, da crítica são:
1. A superioridade da comunicação fundada na linguagem oral
sobre a comunicação com base nos recursos visuais, pois o can~
da audição é intrinsecamente mais rico, ou seja, na linguagem
mcluhaniana, mais quente do que o da visão. ("Como conseqüência, ainda que não existissem outras vias sensórias acompanhando
o uso da fala, aquele que ouve continuaria a receber mensagem
mais rica, mais quente do que a que lhe chegaria exclusivamente
através dos olhos.") Segundo McLuhan, quanto maior o número
de sentidos em pauta, melhor a possibilidade de transmitir uma
cópia fiel; a capacidade de um meio qualquer agir depende do
número de canais sensórios que ele chame a atuar. De todos, o
que menos exige é o meio tipográfico, enquanto, pelas mesmas
razões, avultam os meios baseados nos recursos audiovisuais, os
m.a.is qtumtes.
2. A primazia dos audiovisuais decorre da reunião dos meios
frios da visão aos quentes, representados pela linguageJD, audição
e tato (McLuhan afirma que o tele:spectador chega a "tocar" na
imagem ... ). Se a linguagem era enriquecedora, a escrita viria
a ser empobrecedora. Assim Miller resume essas idéias: "Por
ambas essas razões, McLuhan afirma que a linguagem falada
exerce irresistível poder sobre a imaginação de quem ouve e que
as palavras adquiriram o status daquilo que o filósofo Usener
denominou 'de idades que duram um momento'. O homem primitivo, que se apóia, de maneira quase total, em trocas orais, vive
conseqüentemente, numa condição de fértil encantamento imaginativo, com o espirito estimulado em toda a extensão e largura
de suas gamas sensitivas. Segundo McLuhan, a invenção da escrita violou essa multiplicidade sagrada e forçou os homens a se
concentrarem na visão, em detrimento de todos os outros canais
sensórios. Para usar uma metáfora que não é de McLuhan, diremos que a mensagem transmitida através de um manuscrito
semelha-se à melodia sinfônica e executada por um violino, ao
158
R.C.P. l/74
passo que a mesma idéia expressa por meio de palavras faladas
reflete a execução de todo o conjunto orquestral."
3. O empobrecimento propiciado pela descoberta da linguagem
escrita seria levado ao seu paroxismo pela invenção de Gutenberg. "A clara legibilidade dos tipos tornou possível que o olho
corresse sobre a superfície 'asfaltada' de um texto, absorvendo,
num descuidado lançar de vista, noções que poderiam ser mais
sutilmente moduladas e matizadas, se emitidas como expressão
verbal." Esse empobrecimento implicaria, ainda, em um segundo
momento, a diminuição do raciocínio criativo, substituído pelo
racioclnio lógico formal, linear, estéril: "O homem-Gutenberg é,
pois, segundo McLuhan, explicito, lógico e literal; permitindo que
os bem enfileirados regimentos do texto o tornassem superdisciplinado, o homem fechou seu espírito a possibilidades mais amplas de expressão imaginativa."
4. A uniformidade tipográfica facilitou o enquadramento da individualidade; a standardíza.ção da informação {do meio) , facilitou
a standardização da vida. "O homem que vive da letra impressa
e por meio dela, submete-se, sem queixas, a quadros de horário, a
listas de pesos e medidas, à instrução formal e a todos os outros
racionalizados fiats da vida moderna. O homem-Gutemberg é pontual, produtivo e tem senso de oportunidade; e como, além disso,
ele agora absorve tanto conhecimento sem jamais ter de colocar-se
diante da fonte individual humana, seu sentimento de comunidade
espiritual tendeu a desaparecer, enquanto florescia a sua capacidade técnica. "
Esse inventário permitiu a Miller a organização de uma série
de críticas e a formulação de outras tantas teorias a propósito
das idéias de McLuhan, que nos será apresentado como um escritor r eacionário, beato, preso a raízes rurais e retardatário adversário do progresso, representado pela introdução das máquinas.
É bom lembrar que a invenção de Gutenberg foi tipicamente da
máquina que possibilitou a fabricação de tipos móveis de cobre
e outros metais resistentes, de que resultou a tipografia, vale dizer, a reprodução em massa, a vulgarização da cultura.
Para Miller, na critica ao homem-Gutenberg, McLuhan "assume a posição de um luddista refinado, distinguindo-se daqueles
que o precederam no ataque à máquina pela maneira como acentua que a descoberta da imprensa constituiu-se num pecado original de onde derivaram todos os infortúnios subseqüentes da civilização industrial ."
Retenha bibliográfica
159
•
A posição de McLuhan, todavia, desse ponto de vista, seria
contraditória, desde que "olha os mais recentes desenvolvimentos
da tecnologia eletrônica em termos de uma abertura que, inspirada por Deus, permite fuga da escravidão exercida por engrenagens e alavancas. De modo algo confuso, ele identificou os circuitos de engenharia elétrica aos do próprio sistema nervoso
humano e convida-nos a reconhecer que, através da televisão e
do rádio, concedemo-nos a oportunidade de estabelecer comunicação reciproca utilizando vias capazes de reproduzir a simultaneidade plural do próprio pensamento. Utilizando essas vias, as
imagens e os sons podem ser prontamente transmitidos a um
espírito atento, com velocidade telepática; e, como os vários mecanismos podem ser relacionados entre si, de modo a constituírem
uma vasta r ede, o homem-eletrônico voltou a encontrar-se numa
aldeia tribal de escala planetária. "
A análise às idéias de McLuhan exigiria prévio estudo do
meio que o formou e permanece influenciando toda a sua produção. O Canadá de McLuhan, segundo Miller, é o Canadá agrário
e católico, a um tempo preso à cultura-mãe da Europa, conquanto
sinta-se livre do que algumas vezes considera o peso morto de
uma tradição exaurida, inveja, ao mesmo tempo, sua complexa
herança viva. Para o mesmo Miller as idéias do distributivismo
agrário, herdados do ambiente em que se criou, bem como seu
catolicismo, formam o principal tema subjacente da obra que
o tornou conhecido.
Segundo Miller, o jovem (rural) McLuhan, recém-chegado
a Cambridge para o curso de pós-graduação de English studies,
dedicaria todas as suas simpatias intelectuais a F . R. Leaves,
cujas idéias são resumidas no texto a seguir: "Essa fortaleza
do inglês pertence ao próprio espírito da língua-espírito que se
formou quando o povo inglês que lhe deu origem vivia predominantemente no campo (. .. ) E quão mais rica era a vida naquela ordem antiga e predominantemente rural do que no moderno mundo suburbano! ( ... ) Quando a isso se acrescenta que,
dentro da velha ordem, em vez de ler ou de ouvir rádio, a arte
popularmente cultivada era a do falar (o que tornava Shakespeare
possível), faz-se claro que a promessa de regeneração por meio
da gíria norte-americana, idioma citadino corriqueiro, ou a invenção dos cosmopolitanos de transição, correspondem a um débil
consolo para a perda que sofremos."
Para Miller os ideais do distributivismo agrário foram consagrados por McLuhan, de "forma sutilmente disfarçada" na A
galáxia de Gutenberg, que jamais foi uma versão desapaixonada
dos efeitos das novas tecnologias sobre os sentidos do homem.
160
R.C.P. 1{74
O catolicismo é, na visão de Miller, outra característica, conflituosa, do pensamento de McLuhan.
"A pretensão de imparcialidade de McLuhan lança luzes sobre uma peculiar feição de seu pensamento. De fato, conquanto
ele se proclame inteiramente isento de valores, sua obra encontra
alicerce no ardente desejo de ver prevalecerem certos princípios
éticos muito claros. Revoltado, como patentemente se mostra, contra o racionalismo cientifico ateu, não deixa de mostrar, ao mesmo
tempo, grande sujeição ao prestigio intelectual daquela corrente
de idéias. E, para dar maior força aos argumentos que contra ela
dirige, adotou o que entende ser a posição do cientista, para derrotar seus oponentes no próprio campo em que estes atuam. Infelizmente, adotou a posição sem conhecer as regras que a disciplinam. Tal como ocorre com seu companheiro de beatice,
Teilhard de Chardin, só consegue impressionar aqueles cujo horror
à ciência apenas é igulado ou ultrapassado pela suscetibilidade
que revelam para com o especial jargão científico."
"Comparar McLuhan a Teilhard de Chardin seria injusto,
mas, com freqüência, torna-se útil classificar as variedades de
desatino intelectual e evidenciar que exemplos aparentemente
dispares de pensamento desorientado pertencem, efetivamente, a
certas categorias muito conhecidas. McLuhan e Teilhard de
Chardin colocam-se na mesma categoria; naquela que Sir Peter
Medawar condenou em seu famoso ensaio: The phenomenon of
Chardin:
The phenomenon of man é de caráter anti científico (os cientistas são mostrados como pessoas sem profundidade, patinando sobre a superfície das coisas) e - como se isso não constituísse recomendação bastante - foi escrito por um cientista, circunstância
que parece imprimir-lhe particular autoridade e peso. Os leigos
acreditam que entre os cientistas se encontre uma espécie única
de pessoas. Ignoram que os diferentes ramos da ciência exigem
aptidões e graus de capacidade muito diversos. Teilhard cultivou
um tipo de ciência intelectualmente incorreto, no qual veio a alcançar moderada proficiência. Não tem sensibilidade para o que
seja um argumento lógico ou para o que se erija em prova. Não
mantém nem mesmo a compostura comum. da redação científica,
embora seu livro seja, declaradamente, um tratado científico."
"V em escrito de modo quase totalmente inintellgível, o que é
apresentado como evidência prima facie de profundidade. É por
Teilhard de Chardin oferecer esses pensamentos de tão maraviRewnha bibli.ogrdfica
161
lhosa profu:ndidade que se torna dilicil acompanhá-lo - situa-se
para além de minha capacidade cerebral e não é isso exatamente
que mostra quão profundo e importante deve ser?" (The art of
the soZu.bZe. p. 79-80) .
Miller, a seguir, aproxima McLuh~n de Teilhard de Chardin,
dentro do enunciado propósito de demonstrar que "a massa da
obra de McLuhan está fortemente penetrada de devoção católica
e que a proclamação de imparcialidade é, em parte, recurso tático para iludir o inimigo."
Uma crítica que se pode fazer a McLuhan, e da qual Miller
não cogita, é relativa à tendência, da televisão, à oralidade e à
individualidade, características por ele emprestadas à comunicação gutenberguiana.
A televisão, segundo entendemos, com sua riqueza de imagens
e sons é, de algum modo, a volta à oralidade.
A linguagem era originariamente oral. Mesmo com os manuscritos, a comUnicação é uma espécie de conversação. A leitura
solitária era uma leitura em voz alta, e em voz alta o texto era
transmitido pelo mestre (leitor) aos discípulos. Mesmo na Renascença, depois da separação das palavras e depois do advento
da palavra impressa, o ato de ler continuou sendo feito em
voz alta. Se hoje em dia o movimento labial é indicador de baixa
cultura, se o leitor letrado lê silenciosamente, a leitura em voz
alta foi por muito tempo a melhor forma de publicação dos livros.
As recitações da Idade Média repetem-se atualmente quando o
professor é um repetidor de leituras; repetem-se na cultura puramente oral dos cantadores, cronistas de sua sociedade, e na literatura de cordel, que ainda resiste, heroicamente, no interior do
nordeste brasileiro. A um tempo jornal e romance, essa literatura
- hoje gravemente atingida pela penetração da televisão - destina-se a um público quase sempre contraditoriamente inatingível,
por ser analfabeto. O vendedor de cordel é, antes de mais nada,
um contador de histórias, um violeiro e um recitador, lendo e recitando em voz alta, nas feiras e nas praças dos povoados.
Hoje, em toda parte, a fanu'lia se prostra diante da televisão,
o novo pajé. Mantida essa característica, a Tv constituiria, hoje,
um instrumento intimista, fortalecedor do eu e do individualismo.
Se a leitura é uma ocupação introvertida, solitária, reforçaclara da interiorização e da individualidade (McLuhan), a comunicação eletrônica - e a televisão é ainda exemplo válido - arranca o homem de si mesmo, transporta-o para o fato ou traz o
evento para dentro de casa, comunica-se interiorizando.
162
R .C .P. 1/74
lhosa profundidade que se torna difícil acompanhá-lo - situa-se
para além de minha capacidade cerebral e não é isso exatamente
que mostra quão profundo e importante deve ser?" (The art of
the sotubte. p. 79-80) .
Miller, a seguir, aproxima McLuhan de Teilhard de Chardin,
dentro do enunciado propósito de demonstrar que "a massa da
obra de McLuhan está fortemente penetrada de devoção católica
e que a proclamação de imparcialidade é, em parte, recurso tático para iludir o inimigo."
Uma crítica que se pode fazer a McLuhan, e da qual Miller
não cogita, é relativa à tendência, da televisão, à oralidade e à
individualidade, características por ele emprestadas à comunicação gutenberguiana .
A televisão, segundo entendemos, com sua riqueza de imagens
e sons é, de algum modo, a volta à oralidade.
A linguagem era originariamente oral. Mesmo com os manuscritos, a comunicação é uma espécie de conversação. A leitura
solitária era uma leitura em voz alta, e em voz alta o texto era
transmitido pelo mestre (leitor) aos discípulos. Mesmo na Renascença, depois da separação das palavras e depois do advento
da palavra impressa, o ato de ler continuou sendo feito em
voz alta. Se hoje em dia o movimento labial é indicador de baixa
cultura, se o leitor letrado lê silenciosamente, a leitura em voz
alta foi por muito tempo a melhor forma de publicação dos livros.
As recitações da Idade Média repetem-se atualmente quando o
professor é um repetidor de leituras; repetem-se na cultura puramente oral dos cantadores, cronistas de sua sociedade, e na literatura de cordel, que ainda resiste, heroicamente, no interior do
nordeste brasileiro. A um tempo jornal e romance, essa literatura
- hoje gravemente atingida pela penetração da televisão - destina-se a um público quase sempre contraditoriamente inatingível,
por ser analfabeto. O vendedor de cordel é, antes de mais nada,
um contador de histórias, um violeiro e um recitador, lendo e recitando em voz alta, nas feiras e nas praças dos povoados.
Hoje, em toda parte, a família se prostra diante da televisão,
o novo pajé. Mantida essa característica, a Tv constituiria, hoje>
um instrumento intimista, fortalecedor do eu e do individualismo.
Se a leitura é uma ocupação introvertida, solitária, reforçadora da interiorização e da individualidade (McLuhan) , a comunicação eletrônica - e a televisão é ainda exemplo válido - arranca o homem de si mesmo, transporta-o para o fato ou traz o
evento para dentro de casa, comunica-se interiorizando.
162
R.C.P. 1/74
Se a televisão é e pode ser assistida em grupo, não há integração no grupo; não é o grupo que assiste ao programa, mas
todas as pessoas que o integram, isoladamente. A exemplo da
assistência cinematográfica, os telespectadores exigem silêncio,
não-intervenção, não-interrupção. 1!: possivel ficar só, assistindo
individualmente à televisão, embora esteja-se em grupo diante
do vfdeo.
Se a televisão traz os acontecimentos até nossa casa e nos
transporta para todo o mundo (e nesse sentido é o instrumento
que nos conduzirá à planetarização) , a um tempo - de tão completa como veículo de informação e comunicação - pode-nos isolar do mundo, transformando-se no nosso mundo pessoal, solitário, instrospectivo, individualista, neurótico. Nessa medida, construindo o homem à imagem do individualismo gutenberguiano,
o que deveria (ou deverá) destruir?
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A fim de simplíticar e tornar mais rápido o envio de pedidos de
publicações da Fundação Getulio Vargas, sugerimos o uso do reembolso postal, que beneficiará principalmente às pessoas residentes
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PRAIA DE BOTAFOGO, 188- CAIXA POSTAL, 21.120, ZC·05,
RIO DE JANEIRO- GB.
Resenha. bibliográfica
163
A EXPERitNCIA DO SABER
A SERVIÇO DO DESENVOLVIMENTO
.
administração economia planejamento comunicação
são alguns dos assuntos tratados pelos autores
editados pela Cgv.
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Edgar Morin e outros- Cultura e
comunicaç4o de
massas
UThanteoutros- Guerraàpoluição
BID- Dez anos de luta pela América
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Raúl Prebisch -Transformação e
desenvolvimento- A
grande tarefa da América
Latina
A. Balinky- A economia de Marx: análise
e critica
BID-Os merc:ados de capitais da Amériça
lAtina
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re4w.,.,.. Fu4afie w hlh v.,.,.
J>rúa ~e a.wer-. 111
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