Festival de Cinema de Gramado II – Segunda noite: a revanche

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Festival de Cinema de Gramado II – Segunda noite: a revanche
Festival de Cinema de Gramado II – Segunda noite: a revanche - Simplicíssimo
Escrito por Pedro Schestatsky
Qui, 25 de Setembro de 2003 22:00 - Última atualização Sex, 23 de Junho de 2006 04:13
O tempo estava passando e lá estava eu de novo sem um plano definido para
noite. Acho que não estou mais na idade de sair sozinho. Isto demanda uma
quantidade de energia e hormônios muito grandes. Mas o que eu podia fazer?
Ficar em casa batendo punheta é que não. Rumei então para o Palácio dos
Festivais, da mesma maneira que havia feito na noite anterior.
A mostra foi à tarde e começou com uma picaretagem estilo Andy Warhol, que
sinceramente, não vejo graça nenhuma. Vejo sim, como o Cristiano Zanella
também viu, uma certa injustiça nisto. Enquanto meu primo gastara mais de
20000 reais produzindo o filme, trabalhando que nem um cavalo noite a fio,
chega um sujeito, que é a cara do “Gabriel, O pensador”, pega uma câmera de
vídeo provavelmente estragada e fica mais 30 min filmando uma parede,
ganhando a mesma credencial e estadia de graça no Serrano. Sobre os
roteiros, achei que sobrou muito sexo e violência injustificáveis, gratuitos
e um pouco cagados. Bem repetitivo. Ano que vem vou apresentar um filme tipo
Andy Warhol em troca de uma credencial. Já decidi isso. O Cristiano até já
prometeu que vai me dar umas sobras de seus filmes, que eu poderia fazer
umas montagens aleatórias e apresentá-las como uma “obra pós-moderna
carregada de segundas mensagens”. Depois os outros me explicariam o seu
significado e eu concordaria com tudo.
O meu pressentimento sobre o Cristiano estava certo. No caminho me liga o
meu tio anunciando a premiação mais que merecida. “Vão ter que me engolir”,
diria o cineasta momentos depois, parafraseando o velho Zagallo. Nos
reunimos todos na padaria para festejar, junto com várias equipes de outros
curtas. O clima era de felicidade, mesmo entre os que não ganharam nada.
Legal. Depois de várias cervejas, começou a rolar o papo da “festa dos
artistas” no Serra Azul. “Vamos invadir aquela merda”, gritavam alguns mais
entusiasmados, dispostos a revolucionar o ambiente. Aí eu dei uma ponderada:
“Pois é pessoal, talvez seja difícil entrar lá. Eu acabei de checar isso”
Alguns me olharam com certo ceticismo (“quem é você?”), mas era a pura
verdade. Eles teriam que entender isso ou, do contrário, dariam com seus
narigões bem no meio da porta. Um plano deveria ser minuciosamente
planejado. Esqueci de dizer que estacionara o carro defronte ao Serra Azul e
entrara no hotel para saber sobre a festa. Quase fui barrado, mas como a
festa ainda não havia começado, os seguranças não viram graça nenhuma em me
barrar naquele momento. Iriam esperar até mais tarde, para quando tivesse
platéia assistindo.
Havia uma comitiva discutindo os últimos preparativos. Perguntei para um
segurança distraído qual era o nome do rapaz que estava a frente do grupo.
Cheguei então perto da comitiva e perguntei:
“André Warfárin?”
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Escrito por Pedro Schestatsky
Qui, 25 de Setembro de 2003 22:00 - Última atualização Sex, 23 de Junho de 2006 04:13
“Sim, sou eu”
“Eu me chamo Pietro, sou um simples mortal. Gostaria de saber como faço para
entrar nesta festa. Por isso vim cedo. De quem é esta festa?”
“Olha, é da revista “pçydaisvbçqi” e, infelizmente só vai entrar quem tem
convite” – falava como se fosse gay.
“Me dá um”
“Não tenho nem para mim”
“Sei... Que revista é essa, hein? Nunca ouvi falar”
Os seguranças riram junto com Warfárin. Ele então respondeu com certa
arrogância: “Acho que tu deves te informar melhor, baby. Esta revista tá
SHOW”
“Acho que você tem toda razão. Até mais”
“Até, gato”
Não tinha como insistir. Poderia me fazer de gay e deixar ele pensar que ia
me comer depois em troca de um convite, mas não estava tão a fim de ir
naquela festa, embora confesse que, na saída, cheguei até pensar em entrar
no banheiro e esperar 5 horas pelo início do evento. Olhei-me no espelho
adiante e percebi que minha barba estava por fazer.
Lá estávamos, eu e várias figuras integrantes do momento cinematográfico
gaúcho atual, em franca desigualdade com relação as chances de obtenção de
convite. Eles não paravam de usar seus celulares, negociando credenciais (já
que as suas de praxe, não valiam nada para aquela festa independente). Senti
que ia sobrar mais uma vez na parada. Mas eu tinha uma vantagem sobre eles
que nem eu me dava conta. Alguém me pedira para segurar o Kikito recém
ganho, enquanto ia fumar um beck com amigos. E qual não foi a minha e a
surpresa de todos quando uma senhora saiu do salão e veio direto em minha
direção me oferecendo seu convite. “Toma que tu merece!”. YES, agora eu
estava com poder. As pessoas em volta passaram então a me admirar um pouco.
Radiante de felicidade, pedi licença e conduzi-me a porta. “Vou tentar fazer
o possível e o impossível para vocês entrarem, especialmente você FLU (um
dos fundadores do Defalla), confiem em mim”, disse com sinceridade. Não
consegui nada, mas no final das contas todos ali entraram por suas próprias
forças. Duvido que me fizessem entrar se eu não tivesse conseguido por
minhas “próprias forças”. Eu não tinha ganho nada.
Me diverti à beça lá dentro, embora tivesse que ter bebido para isso e feito
algumas confusões, como cumprimentar efusivamente Werner Schunemann como se
fosse Hique Gomes. A sorte é que eu tinha visto várias vezes “Verdes Anos” e
fiz alguns comentários pertinentes a tempo sobre este filme para me
recuperar. Que sorte.
Nem sei como aconteceu, mas quando me dei conta estava sainda da festa com
uma guria bem interessante por sinal. Chamava-se Ângela e aquilo me agradava
muito, pelo seu nome e por sua energia. Ela tinha um sotaque paulista
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Escrito por Pedro Schestatsky
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exagerado e uma personalidade algo excêntrica, nada que me incomodasse
muito. Era uma das “bobetes” do Bob Pop Show. Fazíamos boas piadas um com o
outro. Contei aquela que eu levei um dia inteiro para decorar, do ladrão que
foi roubar as galinhas do Rui Barbosa e foi pego em flagrante. Aí o Rui
disse (é meio sacal de ler – leia meio por cima):
“Pare! Alto lá, verme rastejante que vagueia errante e desnorteado pelos
pantanais inférteis de ignorância. Não é pelo peso do bípide, nem tampouco
pelo valor total do galináceo, mas sim por teres a ousadia de penetrar
sorrateiramente nos umbrais de minha residência. Se for por mera estultice,
perdoar-te-ei, mas se for para zombares de minha alta prosopopéia, juro
contascois metafóricas que reduzir-te-ei a parcas cinzas escaravélicas sob o
bico do meu sapato”
Aí o ladrãozinho respondeu:
“OK, seu Rui. Mas só me diz uma coisa: levo ou não levo as galinhas?”
(Esta piada eu decorara com muito custo, tendo sido obrigado a contá-la pelo
menos 1x/dia – para não esquecer)..............................................................
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