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Escola Nacional de Administração Pública
Diretoria de Formação Profissional
Coordenação-Geral de Especialização
ORGANIZAÇÕES SOCIAIS FEDERAIS: a difícil expansão.
ALEXANDRE NAVARRO GARCIA
Brasília - DF
JANEIRO/2011
1
ALEXANDRE NAVARRO GARCIA
ORGANIZAÇÕES SOCIAIS FEDERAIS: a difícil expansão.
Monografia apresentada como condição para
obtenção do título de Especialista em Gestão
Pública, outorgado pela Escola Nacional de
Administração Pública - ENAP.
Orientador: Prof. Amarildo Baesso
Brasília - DF
JANEIRO/2011
RESUMO
GARCIA, Alexandre Navarro. Organizações sociais federais: a difícil expansão.
Orientador: Amarildo Baesso. Brasília: ENAP, 2011, 64 fl. Monografia para Conclusão de
Curso de Especialização em Gestão Pública.
Este trabalho, centrado no modelo administrativo de Organizações Sociais - OSs,
implantado no Brasil a partir de 1998, no contexto das discussões interpostas pelo Plano
Diretor de Reforma do Estado, a partir de 1995, tem como objetivo analisar o desempenho das
entidades federais, elencando entraves legais, contradições acerca da flexibilidade na provisão
de contratações e prestação de serviços, bem como apresentar sugestões visando a ajustes.
Assemelhadamente a outros países, o debate neste período visou dotar certas áreas
da administração pública brasileira como ensino, pesquisa científica, desenvolvimento
tecnológico, proteção e preservação do meio ambiente, cultura e saúde de instrumentos
gerenciais - orçamento, contratação, transparência e responsabilização - mais flexíveis,
contrapondo-se, notadamente, a normatizações (leis de licitações e do regime jurídico do
serviço público) mais pormenorizadas e burocráticas.
O intuito da proposta, referendada, à época, pela Lei nº 9.637, em 15 de maio de
1998 (Lei das OS)1, era destravar processos administrativos com o intuito de, paralelamente à
celeridade procedimental necessária à aplicação da política oficial, conferir resultados a estes
meios que, no mais das vezes, oferecessem ao contribuinte resultados imediatos conjugados
com qualidade do serviço e eficiência em sua consecução.
De 1998 para cá, entretanto, apesar de ter surtido o efeito esperado, qual seja a
realização de resultados, este arranjo, como outros (agencias reguladores e executivas), ainda
exige modificações e aperfeiçoamentos. Não é um processo acabado, portanto.
1
A ideia central da norma está contida no art. 37, § 8º, CF, inserida por meio da EC nº 19/98, dentro do mesmo
ambiente de discussão.
Colabora para isto, fundamentalmente, a falta de decisão por parte do Supremo
Tribunal Federal - STF acerca da constitucionalidade da Lei, provocando a limitação do
modelo, no âmbito da administração pública federal, à área de Ciência e Tecnologia - C&T,
incompreensão por parte de Cortes de Contas, estaduais e nacional, além de impedir, por fim,
a própria atualização da norma.
Resultados das OSs federais (C&T, exclusivamente), questionamento legal,
dificuldade interpretativa e sugestões para ajustes no corpo da Lei associados ao histórico de
implementação do modelo no Brasil compõem, assim, a estrutura deste estudo.
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1: Distribuição de Doutores Formados pelo IMPA, por País ................................... 20
Gráfico 2: Distribuição de Doutores Formados pelo IMPA, por Estado ............................... 21
Gráfico 3: rede Ipê - Backbone da RNP .................................................................................. 27
Gráfico 4: Capacidade Central do Backbone da Rede ............................................................ 28
Gráfico 5: Troca de Tráfego Internacional - Link SP/Américas ............................................. 29
Gráfico 6: Evolução do Número de Comunidades com Manejo Apoiado ............................ 33
Gráfico 7: Índice de Mortalidade Infantil - IMI (RDSM) ....................................................... 35
Gráfico 8: Evolução das publicações científicas ..................................................................... 36
Gráfico 9: Evolução Comparativa com Outros Institutos com Atuação na Amazônia .......... 37
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Ranking de Produção Científica (2009) .................................................................. 21
Tabela 2: Indicadores de Produção Científica (2009) ............................................................. 23
Tabela 3: Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas .................................... 23
Tabela 4: Evolução do Volume Produzido x Composição da Renda na RDSM .................... 33
Tabela 5: Evolução das publicações científicas ...................................................................... 36
Tabela 6: OS x OSCIP ............................................................................................................ 53
SUMÁRIO
1. Introdução ........................................................................................................................... 08
2. Metodologia ........................................................................................................................ 12
3. Referencial teórico .............................................................................................................. 14
4. Organizações sociais federais ............................................................................................. 15
4.1. Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada - IMPA .............................. 17
4.2. Rede Nacional de Ensino e Pesquisa - RNP ..................................................... 24
4.3. Instituto de Desenvolvimento sustentável Mamirauá - IDSM .......................... 31
4.4. Associação Brasileira de Tecnologia de Luz Síncroton - ABTLuS .................. 37
4.5. Centro de Gestão e Estudos Estratégicos - CGEE ............................................ 41
5. Limites para o credenciamento de organizações sociais ..................................................... 46
6. Supremo e Tribunal de Contas, obstáculos legais e interpretativos .................................... 48
7. Adequado, mas precisa de ajustes ....................................................................................... 56
8. Conclusão ............................................................................................................................ 61
Referências .............................................................................................................................. 63
1. Introdução
Impactada por acentuado endividamento internacional nos anos oitenta do século passado, a
reforma do aparelho administrativo brasileiro, paralelamente à crise fiscal da década de noventa,
revelou, nestes anos, senão propostas de melhoria na gestão pública e atingimento de metas no
atendimento ao cidadão, novos tratados para a ação no serviço público brasileiro, pautados,
notadamente, pelos modelos gerenciais, focados no cliente-cidadão, adotados na Grã-Bretanha,
durante o governo de Margareth Tatcher, a partir de 1979.
Programas como “unidades de eficiência” (efficiency units), recobertos por mecanismos de
accountability e valoração da despesa dos órgãos do Estado, “próximos passos” (next steps),
formador das agências executivas e “garantias do cidadão” (citizens chart), visavam a tornar o
serviço público do país mais célere e conectado com o cidadão.
Muitos deles se espalharam por Austrália, Nova Zelândia e Suécia, todos eles, no mais das
vezes, ocupados por governos social-democratas. Reprogramado a partir da modelo “reinventando o
governo” (Osborne, David; Gaebler, Ted, 1992, apud Bresser-Pereira, 2001), o gerencialismo
chegou aos Estados Unidos nos anos 90, com o democrata Bill Clinton, com o programa “revisão
do desempenho nacional” (nacional performance review).
No Brasil, não diferente, Bresser-Pereira (2001, p. 10), então ministro da Administração e da
Reforma do Estado, à época responsável pela elaboração das normatizações relativas à implantação
do modelo gerencial, assim sintetiza o clima do período:
“A administração pública gerencial emergiu, na segunda metade deste século,
como resposta à crise do Estado; como modo de enfrentar a crise fiscal; como
estratégia para reduzir custos e tornar mais eficiente a administração dos imensos
serviços que cabem ao Estado; e como um instrumento para proteger o patrimônio
público contra os interesses do rent-seeking2 ou da corrupção aberta. Mais
2
Indivíduos que atuam na intermediação entre grupos privados e legisladores. Segundo Matias-Pereira (2010, p. 19),
pela teoria da delegação no setor público sua concepção demonstra “que as oportunidades serão utilizadas de forma
positiva e/ou negativa, visando ao rent-seeking (busca de renda) e aos bens privados, em detrimento da provisão de bens
públicos. Nesse cenário é onde existem mais oportunidades para o clientelismo, o interesse na qualidade da gestão é
menor e haverá menos investimento no desenvolvimento de controles”. O mesmo autor diz, ademais, que o conceito
“vem sendo empregado com bastante freqüência nos úlrimos anos pelos autores das áreas de ciência política, economia,
administração pública, entre outras, que tratam da reforma do Estado. Esse fenômeno - utilizado sob o aspecto
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especificamente, desde os anos 60 ou, pelo menos, desde o início da década dos
70, crescia uma insatisfação, amplamente disseminada, em relação à
administração pública burocrática”.
Uma das receitas adotadas, no ambiente do programa nacional de publicização, e concebida
como uma estratégia central do PDRE, foi a autorização para instituição de organizações sociais,
entidades entabuladas, em princípios constitucionais, no art. 37, § 8º (EC nº 19/98), baseadas no
modelo de instituição com a finalidade pública não-estatal, cujas atividades são de interesse
público, porém não exclusivas de Estado.
Para Moraes (2005, p. 942), o caráter não-estatal não o aparta das responsabilidades
inerentes à movimentação de recursos públicos. Segundo ele:
“A EC nº 19/98, ao introduzir um § 8º ao art. 37 da Constituição Federal
prevendo a possibilidade de ampliação da autonomia gerencial, orçamentária e
financeira dos órgãos e entidades da administração direta e indireta mediante
contrato, a ser firmado entre seus administradores e o poder público, que tenha por
objeto a fixação de metas de desempenho para o órgão ou entidade, consagrou
constitucionalmente a possibilidade de contratos de gestão, cabendo, porém à lei,
discipliná-los em relação ao prazo de duração do contrato; aos controles e critérios
de avaliação de desempenho, direitos, obrigações e responsabilidades dos
dirigentes; e à remuneração de pessoal.”
Bresser-Pereira (2005, p. 85) as insere num quadro de Estado direcionado ao público,
fazendo frente, de um lado, a práticas patrimonialistas, mediante ação de indivíduos ou grupos de
pressão e, de outro, substituindo a administração pública burocrática pela gerencial, voltada ao
cliente. De acordo com suas próprias palavras:
“O Estado deve ser público, as organizações não-estatais e sem fins lucrativos
(ou organizações não-governamentais) devem ser públicas. Bens estritamente
públicos, como um meio ambiente protegido, devem ser públicos. Direitos
públicos são os direitos que nos asseguram que o patrimônio público - a res
pública -, entendido em sentido amplo, seja público; que seja de todos e para
todos, e não um objeto de rent-seeking, algo privatizado por grupos de interesse”.
A afirmação, substrato para convalidar práticas administrativistas preponderantes em países
centrais usa, no mais das vezes, ações não comportadas pela res pública, atentatórias à ideia de
povo e apenadas publicamente, no caso as ações de rent-seeking e ineficiência para, de um lado,
pejorativo - pode ser entendido como a privatização do setor público, efetivado por meio da organização de grupos de
pressão em torno do aparelho estatal, visando obter vantagens pessoais, para um grupo ou para suas respectivas classes.
A concretização da privatização do setor público decorre, em parte, pelo apoio de parte da burocracia, consolidando o
padrão de articulação público-privado e Estado-sociedade no Brasil” (2010, p.31).
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desconstituir a figura do Estado, carimbando-o como figura deturpada e passível de desvios e, de
outro, fazer prevalecer a proposta-objeto, como a implantação de OSs.
Inobstante o modelo tenha apresentado os resultados contratados junto ao órgão financiador,
seja sob a ótica de custos, transparência e resultados, o modelo ainda requer ajustes em relação à
representação e alternância diretiva, fazendo paralelo e equilibrando a relação entre aporte de
recursos pelo setor público, quase que totalizados pela participação oficial, e a gestão da entidade.
Do mesmo modo, não é como é materializada a administração pelo Estado a única questão a
ser analisada frente a idiossincrasias e pregações consensuais. A crise financeira mundial de 2008/9
evidencia isto.
Não há como sugerir sua desconstituição, nem propor sua preponderância absoluta, lato
sensu.
Se as OSs, de um lado, promovem resultados, sob a ótica administrativa e orçamentária, a
partir da flexibilização das amarras legais que sobrestavam seu exercício, a ausência da intervenção
do Estado, de outro, em áreas estratégicas, induzindo o desenvolvimento socioeconômico em
setores não viáveis à iniciativa privada, mostrou, igualmente, que a radicalização não é uma boa
conselheira. Nem para liberalização, simplesmente, nem para o fechamento em torno do Estado.
Há que se ter planejamento estratégico para entabular cenários futuros dando opção para
que, qualquer país, antevendo situações que possam prejudicar a o check and balance mundial, trate
igualmente externos e internos, independentemente de “consensos” mundiais. Há que se consertar a
própria formatação do modelo de OS, sem lhe tirar os pressupostos já referendados por resultados.
Se o contexto de Estado e de ação política não pode ser diminuído, não se pode, igualmente,
eliminar as propostas à hora apresentadas.
Em Ciência e Tecnologia, objeto deste estudo, não há como suprimir o caráter da
flexibilização, com vetores de “racionalidade técnica” e “agilidade” presentes.
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Não há necessidade de se desconstituir, assim, por atitudes paralelas, corrupção como
elemento mais ponderável e visível, a ação do Estado como indutor e regulador do desenvolvimento
sócio-econômico de qualquer país, para implantar métodos administrativos que hoje, fonte deste
trabalho, se mostraram eficientes. O fato é que é mais do que possível a convivência entre esta
forma de ação do Estado com práticas publicizadas, no caso as OS.
Discutir e enfrentar ações rent-seeking é, ademais, função do próprio Estado, dentro de suas
esferas de controle, responsabilização e apenamento.
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2. Metodologia
O presente estudo apresenta as condições, legais, notadamente, que fazem com que, na
esfera federal, a qualificação de OSs não consiga passar das cinco contratadas junto ao ministério da
Ciência e Tecnologia - MCT.
Diferentemente de estados e municípios, a indecisão do Supremo Tribunal Federal - STF em
julgar o questionamento da Lei que assegura seu funcionamento e as reiteradas interposições de
acórdãos por parte do Tribunal de Contas da União - TCU, repisando fatos já explicados, fora do
escopo de suas atribuições, qual seja comparar valores monetários com resultados obtidos, têm
criado obstáculos para a transposição do sistema para outros ministérios.
Colabora para a redação da monografia, além dos relatórios de gestão das OSs, percepções
de seus presidentes (César Camacho - IMPA; Nélson Simões - RNP; Ana Rita - IDSM; e Walter
Colli - ABTLuS; e Lúcia Melo - CGEE) obtidas por meio de entrevista e questionário estruturado.
A consulta foi composta por quatro perguntas, questões fulcrais tanto para a elaboração da
monografia como para a compreensão do momento por que passam as OSs federais, quais sejam:
1.
A governança do modelo OS está resolvida?
2.
Quais são os principais resultados e projetos da OS?
3.
Quais são as principais resistências enfrentadas pelo modelo?
4.
Quais são os desafios para o modelo OS?
Inobstante indagações e diálogos particulares, estas respostas contribuíram, sobremaneira,
para a elucidação das questões que perpassam a discussão diária sobre organizações sociais, seus
problemas e possibilidades.
O texto, com esta contribuição direta dos representantes das OSs, está dividido, então, em
quatro eixos principais: introdução; organizações federais existentes e resultados contratados junto
ao órgão; limitações legais referentes à Lei e à sua convalidação; e ajustes.
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A primeira parte, introdutória, recorda os pressupostos da implantação de OSs no Brasil no
bojo do Plano Diretor de Reforma do Estado - PDRE, iniciado em 1995 e concluído, para efeito de
aplicações de organizações sociais, em 1998, com a Emenda Constitucional - EC nº 19.
Os resultados das organizações estão impressos nesta monografia a partir dos relatórios de
gestão das entidades. Como forma de interpor discussão acerca do funcionamento, características
administrativas específicas e travamento legal foram realizadas entrevistas programadas com
dirigentes das OSs.
As limitações e ausência de decisão acerca da validade constitucional da Lei (terceira parte)
basearam-se, fundamentalmente, na análise da Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI nº
1923/98, peça interposta e voto-vista, em referencial teórico e, também, no conhecimento particular
epistemológico (empírico e formal).
A parte final apresentará alguns ajustes no texto da Lei notados neste período de doze anos
de funcionamento. Inobstante se fazerem necessários para a atualização da norma, os ajustes
também vêm sendo sobrestados até a decisão do Pleno do STF.
A conclusão, item final desta monografia, apresenta a resposta à indagação inicial, qual seja
não expansão do modelo para outras áreas da Administração Pública federal, ficando circunscrita
hoje, tão somente, às cinco unidades do MCT.
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3. Referencial teórico
O referencial teórico que respalda este trabalho está, no mais das vezes, tirante algumas
inferências cruzadas entre itens, expresso nos próprios capítulos.
Independentemente disso, como fonte geral, a teoria que entabula a parte introdutória desta
monografia não poderia deixar de registrar o professor Bresser-Pereira, então ministro responsável
pela materialização do PDRE, Osborne e Gaebler e os próprios cadernos do Ministério da
Administração e Reforma do Estado - MARE.
Na parte relativa às OS as ideias estão consubstancias pelos relatórios de gestão (edição
esta solicitada pela Lei das OS para dar transparência e accountability3 ao sistema).
A questão legal, responsável pelo vacatio iuris da Lei pauta-se pelas alegações interpostas
pela ADI nº 1.923/98, em tardia deliberação pelo STF, e pelas interpretações do TCU em vista do
modelo das OSs: autonomia, flexibilidade, ausência de utilização da lei nº 8.666/93 e da Lei nº
8.112/90 versus processualismo contábil e aplicação de regrarismos de ente público. Di Pietro,
Mendes e Modesto concentram as ideias desta parte.
Associada à materialização epistemológica formal do texto estão insculpidas no trabalho
interpretações empíricas particulares adquiridas nestes sete anos de laboração direta ou indireta com
estas entidades, impressões essas que não poderia deixar de inferir na redação final da monografia.
O trabalho, então, está norteado por arcabouços teóricos, mas que não concluem o tema.
Muitas das interpretações teóricas (Oliveira, capítulo 6, p. ex., que acompanha os outros autores
citados neste trabalho) não são concretiza na leitura mais detalha da Lei que criou as OSs.
3
Responsabilização do agente público. Segundo Matias-Pereia (2010, p.137), a accountability enquadra-se nos nos ritos
da governança corporativa e “requerem de todos os envolvidos que identifiquem e articulem suas resposabilidades e as
suas relações; considerem quem é responsável por que, perante quem e quando; o reconhecimento da relação existente
entre os stakeholders e aqueles a quem confiam a gestão dos recursos; e que apresentem resultados. Requer também
uma compreensão clara e apreciação dos papéis e responsabilidades dos participantes no quadro da governança, onde os
Ministros, a Administração da entidade e o CEO são componentes chaves de uma responsabilidade saudável. O
afastamento desses requisitos impede a organização de conseguir seus objetivos”.
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3. Organizações sociais federais
Embora as condições de gestão próprias do modelo colaborem para os resultados, o que se
viu, no Brasil, foi o retardamento, não-adoção ou descredeciamento destas entidades, não
consagrando as expectativas do ex-ministro, pelo menos na esfera federal. Dois problemas,
fundamentalmente, colaboram para esta descontinuidade de ampliação: atraso na decisão final pelo
Supremo Tribunal Federal - STF acerca da constitucionalidade da Lei que rege as OSs; e, em
decorrência desta indefinição, também, reiterados questionamentos por parte de cortes de controle
acerca da aplicação de recursos e processos de accountabilty, e que, na ausência de confirmação da
norma, permite interpretações as mais amplas possíveis.
Sobre este vácuo, Camacho reclama, com razão, da “ambiguidade na interpretação da Lei
9.637 por falta de regulamentação adequada. Excesso de controle burocrático das OS que gera
problemas na execução de tarefas com perda da flexibilidade e celeridade o que, finalmente, se
reflete no aumento do custo administrativo” (questionário, 2010).
Por ora, “persistem” em funcionamento as primeiras e únicas tentativas de aplicação do
modelo, todas elas como centros de pesquisa e contratadas pelo Ministério da Ciência e Tecnologia
- MCT, quais sejam: Associação Brasileira de Tecnologia de Luz Síncrotron - ABTLuS; Rede
Nacional de Ensino e Pesquisa - RNP; Centro de Gestão e Estudos Estratégicos - CGEE; Instituto
de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá - IDSM; e o Instituto Nacional de Matemática Pura e
Aplicada - IMPA.
Persistindo, frente aos reiterados questionamentos apresentados, as instituições cumprem os
resultados materiais (os relatórios confirmam e o reconhecimento privado e público são
identificáveis) pedidos pela Lei das OSs, com excelência: macro-objetivos, indicadores e metas,
notadamente.
Lúcia Melo, presidente do CGEE, em resposta ao questionário formulado, elenca as
vantagens do modelo:
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“Várias são as vantagens já demonstradas pelo modelo OS na
operacionalização de instituições de natureza as mais distintas, em especial no
ambiente da CT&I conforme já evidenciado pelos resultados alcançados por tais
instituições supervisionadas pelo MCT. Dentre essas vantagens merecem
destaque:
1. Maior agilidade na operação. O fato de a gestão ser regida pelo conceito de
resultado permite que as OSs possam tomar decisões e implementar ações com
maior agilidade do que se estivessem presas ao cumprimento de rotinas e
processos, o que reduz riscos, incertezas e custos nas operações;
2. Flexibilidade operacional. A facilidade com que orienta suas decisões e
gastos proporciona capacidade de adaptação a situações de risco e imprevistos
com respostas ágeis e objetivas;
3. A participação de segmentos da sociedade na gestão e controle das
atividades garante continuidade de ações e descolamento das pressões políticas
que muitas vezes interferem na agenda executiva;
4. Facilidade de criação e de monitoramento de resultados com participação
da sociedade;
5. Facilidade de ampliação e redução de equipes de trabalho, sempre em
função das necessidades de agenda, sem que implique em ônus de permanência
em momentos de reduzida atividade; e
6. Facilidade de cancelamento das atividades, do financiamento das
atividades pelo Estado e de encerramento das funções sempre que não cumpridos
os objetivos que motivaram sua criação.”
A despeito do olhar detalhado nas contas e finanças das entidades, necessidade esta
fundamental para o avanço do modelo, pois se trata de dinheiro público, não é por este caminho
(resultados) que as cortes de controle devem atuar, especializando-se em resultados. Ana Rita
Alves, diretora-presidente do IDSM, respondendo a consulta, explica esta inversão e cobra para que
o
“controle feito nas OS tenha um caráter finalístico avaliando-se os resultados
alcançados que é o que determinam os contratos de gestão, porém o TCU não tem
adotado essa postura e tem feito um controle baseado em procedimentos e isto
inviabiliza o modelo. Isto gera insegurança e as OS ficam confusas sem saber qual
a conduta a adotar.”
Essas instituições sofrem, também, com reiterados questionamentos por órgãos de controle,
no mais das vezes indagando sobre questões já resolvidas: transparência (todos os relatórios estão
na internet); accountability (os representantes do ente público e da sociedade publicizadora estão
todos identificados no contrato de gestão e no conselho de administração); separação de contas (nos
mesmos compêndios estão pontuados o relatório financeiro, a demonstração contábil de custos e
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nota financeira sobre o contrato e aditivos e pareceres dos auditores independentes e do conselho
fiscal).
Duas outras tentativas não lograram êxito. A Associação Brasileira para o Uso Sustentável
da Biodiversidade da Amazônia - Bioamazônia foi descredenciada pelo Ministério do Meio
Ambiente, por não cumprimento dos objetivos previstos no contrato, e a Associação de Educação
Comunicativa Roquette Pinto - ACERP, vinculada à Secretaria de Comunicação da Presidência da
República foi incorporada pela Empresa Brasileira de Comunicação - EBC, deixando de existir o
contrato.
Embora descontinuadas por outros motivos, estes dispostos na Lei, não cumprimento de
meta e objetivo e extinção, as cobranças, por questões explicadas, em grande parte contribuíram
para o fechamento destas duas ideias. Há que se retomá-las e expandi-las para as outras áreas,
enquanto perdurar a Lei.
4.1. Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada - IMPA4
Com a finalidade de estimular o estudo científico de Matemática, O IMPA foi a primeira
unidade de pesquisa, de caráter nacional, criada pelo então Conselho Nacional de Pesquisas - CNPq
(hoje, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) em 1952, visando à
formação de pesquisadores, docentes e à difusão e aprimoramento de soluções e ao aprendizado de
Matemática.
Braço do desenvolvimento científico e tecnológico, o Instituto, entabulado uma década antes
da profusão e qualificação de mestres e doutores no Brasil, a partir da década de 60, notadamente,
representa o que há de excelência na aplicação de estudos matemáticos voltados não só à pesquisa,
em si, mas, sobretudo, ao desenvolvimento socioeconômico do país.
4
www.inpa.gov.br.
17
Já em 1957, o IMPA, por meio da oferta dos “Colóquios Brasileiros de Matemática”,
realizados a cada biênio, recebeu, mesmo não possuindo à época projetos formais de pós-graduação,
50 matemáticos. Hoje, o encontro tem a participação de 1,2 mil pesquisadores brasileiros e
estrangeiros.
Paralelamente à formalização de programas de mestrado e doutorado, em 1962, o IMPA
passou a oferecer, em associação com a Universidade Federal do Rio de Janeiro, títulos de doutores
e mestres. Em 1981, o IMPA passou a ter sede própria, onde se localiza até hoje, no Horto Florestal
do Rio de Janeiro.
Com o advento dos novos modelos de gestão administrativa, financeira e de contratação,
consubstanciados pela EC nº 19 (art. 37, § 8º) e pela Lei nº 9.637/98, no âmbito do PDRE, o IMPA,
mediante Decreto nº 3.605, de 20 de setembro de 2000, foi qualificado como Organização Social,
registrado como Associação Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA-OS) e transferido para
o MCT, na forma exigida pela Lei, assumindo, por sua vez, as tarefas e estruturas do antigo IMPA.
Formalmente, as etapas que elenca o Tribunal de Contas do Distrito Federal - TCDF (2004,
p. 25) para transformação de serviços não-exclusivos de Estado em propriedade pública não-estatal,
por meio do programa de publicização, são as que mais se identificam ao processo de transformação
por que passou o IMPA para ser transformado em OS. Nas demais OSs esta sequência proposta
pelo TCDF não existe. Senão, vejamos:
“a) extinção do órgão ou entidade;
b) qualificação de entidade não-estatal (associação ou fundação de direito privado) como
organização social; e
c) absorção das atividades pela organização social mediante celebração de contrato de
gestão.”
Os resultados hoje apresentados estão diretamente vinculados à autonomia adquirida pelo
IMPA, na forma inscrita no contrato de gestão assinado junto ao MCT, os quais abarcam, como
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objetivos estratégicos globais, o desenvolvimento de pesquisas matemáticas em padrão
internacional, capacitação científica de jovens pesquisadores e professores universitários, difusão do
conhecimento matemático, melhoria do ensino matemático em todos os níveis de ensino, criação de
aplicações voltadas às tecnologias de informação, por meio de softwares inovadores destinados ao
setor produtivo e políticas públicas, bem como à articulação com centros nacionais e internacionais.
Stricto sensu, no espaço de ensino, as metas concentram-se na formação de pesquisadores e
docentes (mestres e doutores), realização de cursos avançados em pesquisa matemática no
arcabouço do projeto “Escola de Altos Estudos”, em parceria com a Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES.
No ambiente de captação de alunos excepcionais concentra-se na realização do “Programa
de Verão”, encontros anuais realizados nos meses de janeiro e fevereiro, a realização das olimpíadas
de matemática voltadas a pesquisadores - OBM, e das escolas públicas, voltadas a alunos do ensino
da 6ª à 9ª série do ensino fundamental - OBMEP, assim como à manutenção dos exitosos colóquios
de Matemática.
O modelo de OS aplicado ao IMPA, no mais das vezes, é fundamental para esta nova fase
de aprofundamento dos estudos matemáticos, titulação de mestres e doutores e melhoria do ensino
matemático no Brasil proporcionando, ademais, em linhas transversais de estudos, aplicações a
outras áreas da Ciência e Tecnologia brasileira: exploração de petróleo, clima, previsão do tempo,
bio-matemática, Medicina, Economia e Finanças.
A conjugação de gestão flexível com metas e indicadores expressos no contrato de gestão
MCT-IMPA, com o plano estratégico elaborado pelo Conselho de Administração do IMPA,
elencando as prioridades a serem enfrentadas, como proposto no modelo OS, é referendada pelo
Relatório Especial do Contrato de Gestão 2001 - 2009 (2010, p 11):
“A par desta nova visão mais abrangente de atuação, a agilidade
administrativa inerente às organizações sociais, com o conhecimento e a
participação do Conselho de Administração, tem permitido orientar e às vezes
19
reorientar certos investimentos que viabilizem a consecução das metas do contrato
de gestão.
Em conclusão, todas as metas propostas foram atingidas no contrato e a
estrutura de uma Organização Social tem se mostrado altamente apropriada para o
funcionamento da Instituição, permitindo, em particular, uma adequada
flexibilidade administrativa visando alcançar seus objetivos maiores.”
Este modelo, ao autorizar contratações fora do Regime Jurídico, que rege a laboração na
Administração Pública, associado ao estabelecimento de um quadro fixo de pesquisadores nacionais
e estrangeiros, ainda nos anos 70, mantidos por meio de bolsas do CNPq, permitiu que o quadro
laboral do Instituto registrasse, em 2009, 171 pessoas, entre celetistas (75), terceirizados (40) e
pesquisadores cedidos pelo MCT (56) dando-lhe condições administrativas para atender às
estratégias referendadas pelo Conselho e interpostas no contrato.
“O IMPA está conseguindo mediante a contratação parcimoniosa e planejada de jovens
pesquisadores brilhantes, não somente recompor seu quadro científico, mas também introduzir
novas áreas de pesquisa, importantes para o desenvolvimento do país” respondeu Camacho à
indagação deste estudo.
Como resultado, lato sensu, o IMPA formou, até 2009, 682 mestres e 337 doutores,
espalhados por diversos países (Gráfico1). César Camacho vislumbra um período especial do IMPA
sendo que, para ele, “estamos testemunhando também um aumento significativo do número de
doutores formados pelo IMPA. Nos últimos quatro anos esse número anual praticamente duplicou”.
Distribuição de Doutores Formados pelo IMPA, por País
20
fonte: IMPA, Relatório Especial, 2010
Gráfico 1
Para pesquisa matemática nacional, Rio de Janeiro, com 107 doutores, e São Paulo, com 30,
lideram os estados com títulos de doutorado conferidos (Gráfico 2).
Distribuição de Doutores Formados pelo IMPA, por Estado
fonte: IMPA, Relatório Especial, 2010
Gráfico 2
Castro recorda que a produção científica da OS, somada a outros 422 centros de pesquisa,
privados e públicos, todos eles com mais de 10 doutores em seus quadros, contribuiu para que o
Brasil saísse do 30º lugar em número de publicações científicas (1980) e passasse para a 13ª posição
(2010), à frente de países com histórico mais bem resolvido em matéria de investimento em
pesquisa científica e tecnológica, como Rússia, Holanda, Suíça e Taiwan (Tabela 1): “Nosso maior
orgulho são os cursos de pós-graduação, o único segmento que temos alta performance. Um
exemplo é o Instituto de Matemática Pura e Aplicada do Rio de Janeiro. Com foco bem definido e
aplicação eficiente dos recursos, o Impa se tornou uma referência” (2010, p. 48).
Ranking de Produção Científica (2009)
Posição 1 2 3 4 5 País EUA China Alemanha Inglaterra Japão Artigos 341038 118108 89545 79780 78930 Participação em relação ao mundo (%) 28,62% 10,71% 7,51% 6,69% 6,62% 21
6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 França Canadá Itália Espanha Índia Coréia Austrália Brasil Holanda Rússia 65301 55534 51606 44324 40250 38651 38599 32100 30204 30178 5,48% 4,66% 4,33% 3,72% 3,38% 3,24% 3,24% 2,69% 2,53% 2,53% fonte: Science Indicators 2009, Thomson Reuters - ISI, elaboração CAPES
Tabela 1
Contribuindo para a posição brasileira neste rol, o IMPA, como meta contratada junto ao
MCT para produção de artigos originais de pesquisa matemática em revistas de circulação
internacional e de alto padrão científico, estimou 60 publicações no ano de 2009. Suplantando a
meta, conseguiu 85 estudos, providos por 30 pesquisadores.
Levando-se em conta o critério de artigos publicados ou aceitos para publicação, indicador
mais real, posto que há um lapso temporal entre a aceitação e a divulgação, enquanto a meta
estipulada foi de 120 edições o resultado novamente a superou, com 145 artigos e 35 autores.
Isoladamente, o Instituto, com 36 pesquisadores e 66 publicações (média de 1,83 artigos por
autor, em 2007), de acordo com o Mathscinet (banco de dados da American Mathematical Society,
2006 e 2007), ocupa a 1ª colocação mundial em termos de produção científica, ultrapassando
universidades estadunidenses consagradas como Harvard (1,28), Princeton (1,73) e Berkeley (1,6).
Comparada à mais bem posicionada, a brasileira Universidade de São Paulo - USP, a produção do
IMPA a suplanta seja em Estatística, Matemática Pura ou Aplicada, com índices de 1,27, 0,81 e
0,36, respectivamente (Tabela 2).
Esta situação é assim reproduzida pela revista Science (2010, p. 1306):
“Os bons tempos (do Brasil) estão alcançando a ciência também. Entre 1997 e
2007, o número de publicações brasileiras indexadas mais que dobrou, chegando a
19 mil títulos por ano. Em publicações, o Brasil está classificado agora em 13º
agora, de acordo com a agência Thomson & Reuters, ultrapassando países como
Holanda, Israel e Suíça. As universidades brasileiras formaram duas vezes mais
PhDs este ano que em 2001 ......”
22
O presidente da Academia Brasileira de Ciências - ABC, Jacob Palis, primeiro presidente do
IMPA, comparando pesquisa e qualidade de vida arremata: “Há uma correlação entre investimentos
em ciência, tecnologia e inovação e o avanço no padrão de vida da população” (O Globo, 2010, p.
40).
INSTITUIÇÃO IMPA Harvard Princeton Chicago Berkley Northwestern Paris-­‐Orsay Imperial College-­‐London USP-­‐Matemática USP-­‐Matemática Aplicada USP-­‐Estatística Indicadores de Produção Científica
2006 2007 Pesquisador Publicação Média Pesquisador Publicação Média 33 62 1,88 36 66 1,83 18 24 1,33 18 23 1,28 39 73 1,87 37 64 1,73 39 58 1,49 42 62 1,48 70 76 1,09 67 107 1,6 36 29 0,81 35 31 0,89 172 116 0,67 109 124 0,88 69 80 1,169 28 41 1,46 86 55 0,64 86 70 0,81 26 5 0,19 25 9 0,36 37 30 0,81 37 47 1,27 fonte: Mathscinet, American Mathematical Society, 2009
Tabela 2
Conforme Relatório de Gestão (p. 23-24, 2010), o IMPA realiza, na outra ponta de
formação, base para divulgação e popularização do estudo e atração de alunos para o estudo
matemático, desde 2005, a OBMEP. Com recursos do MCT e do Ministério da Educação - MEC, e
apoio da Sociedade Brasileira de Matemática - SBM, o certame teve a participação de 19,2 milhões
de estudantes do ensino público, realizado em 31 mil escolas de 93,5% dos municípios brasileiros,
contra 10,5 milhões em 2005 em 43,8 mil escolas (93,5% dos municípios). Cerca de 140 mil
professores voluntários são responsáveis pela correção das provas (Tabela 3).
Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas
Evolução das Inscrições Ano Escolas Inscritas Municípios Inscritos (%) Alunos 2005 31.030 93,5 10.520.830 2006 32.655 94,5 14.181.705 2007 38.450 98,1 17.341.732 2008 40.937 98,7 18.326.029 2009 43.854 99,1 19.198.710 fonte: IMPA/MCT, 2010
Tabela 3
23
A cada ano são premiados 3 mil alunos com medalhas de ouro, prata e bronze. Cada um
participa de cursos de iniciação científica de um ano de duração, ministrado por professores
universitários, em 200 centros do país. Para esta atividade, os alunos recebem bolsas de Iniciação
Científica Júnior do CNPq. Ao ingressarem na universidade passam a receber, neste momento,
bolsas para Iniciação Científica (CNPq), de até dois anos, seguidos de Curso de Mestrado em
Matemática (bolsa CAPES): “A ideia é a de oferecer a esses alunos a possibilidade de realizar um
Mestrado em Matemática simultaneamente com seu curso de graduação” (Relatório Especial do
Contrato de Gestão, 2010, p. 10).
Sobre o futuro, aguardando ansiosamente o desenrolar da ação no Supremo, e as
novidades dos controladores, Camacho (questionário, 2010) mostra esperança.
“No Contrato de Gestão assinado pelo IMPA e MCT para o período 2010 2015, desenha-se um crescimento progressivo para os próximos seis anos de apoio
do IMPA à pós-graduação brasileira, na forma de programas especiais destinados a
estimular uma maior presença de seus professores no IMPA de maneira a
aproveitar o excelente ambiente de trabalho da Instituição. Soma-se a isso uma
ação especial em prol do desenvolvimento da Matemática Aplicada.”
A resposta à aspiração de Camacho está nas mãos do STF.
4.2. Rede Nacional de Ensino e Pesquisa - RNP5
A Rede Nacional de Ensino e Pesquisa, quando criada, em setembro de 1989, pelo MCTCNPq, visava, inicialmente, a construir a infraestrutura de rede da internet nacional, provendo
acesso e interligando o sistema acadêmico de alto desempenho brasileiro.
A partir de 2002, a RNP, com sede no Rio de Janeiro, é qualificada como OS e passa a
promover, com escopo ampliado, na forma do Contrato de Gestão MCT-RNP, “atividades de
pesquisas tecnológicas em redes, de desenvolvimento e operação de meios e serviços de redes
avançadas e do desenvolvimento tecnológico na área de redes” (Decreto nº 4.077, de 9 de janeiro de
2002), criando soluções inovadoras para pesquisa em educação, saúde e cultura.
5
www.rnp.br.
24
Sobre esta fase inaugural da RNP, Nelson Simões, presidente da OS, em consulta
encaminhada pela presente monografia, explica:
“A RNP difundiu a Internet no Brasil a partir de sua criação como projeto do
CNPq em 1989. Na fase recente, após sua qualificação como Organização Social
em 2002 e a celebração do Contrato de Gestão com o MCT, foi possível
consolidar o Programa Interministerial de redes avançadas para educação e
pesquisa com participação de outros três ministérios, Educação, Cultura e Saúde.
Este programa visa construir o futuro do País, baseado no uso massivo de
tecnologia de informação e comunicação em benefício das instituições de
educação, pesquisa e cultura.”
Alcança, hoje, todos os 26 estados brasileiros e o Distrito Federal, interligando mais de
600 instituições de ensino e pesquisa nacionais e provendo acesso de alta velocidade a mais de um
milhão de usuários entre alunos, professos e pesquisadores. Na rede implantada (backbone) também
são realizadas pesquisas e testes para novos usos de tecnologias da informação e comunicação TIC.
Messina (2009), coordenador da Rede Universitária de Telemedicina - RUTE, afirma que
a rede permite, em qualquer lugar do país, a qualquer tempo, a discussão, por profissionais de
Saúde, médicos, enfermeiros, nutricionistas, fisioterapeutas, odontólogos e anestesistas de
diagnósticos, cirurgias e manipulação de terapias adequadas para cada tipo de problema,
colaborando, através de soluções técnicas à distância, para que rede de Saúde possa fazer frente à
escassez de recursos financeiros ou, em lugares mais distantes, desassistidos de procedimentos
médicos, carentes de profissionais especializados, de análises que não poderiam ser feitas sem a
conexão com estabelecimentos mais complexos.
Relatando os procedimentos de telecardiologia em Minas Gerais, que atende 300
municípios, Messina (2009) afirma que “lá, foram contabilizadas 600 solicitações, por dia, de um
serviço conhecido como segunda opinião. É a forma encontrada para que o médico discuta
diagnósticos com especialistas de diversas partes do Brasil. Nas localidades onde não há hospitais
universitários, são firmados convênios com faculdades de saúde.”
25
O sistema telessaúde, de baixo custo, se tornou braço operacional do serviço médico
brasileiro, permitindo que médicos de localidades distantes enviem imagens, fotos e exames para
centros universitários especializados, numa espécie de teleconsultoria, permitindo um segundo
diagnóstico evitando, no mais das vezes, que o paciente de lugares isolados seja encaminhado para
uma cidade central.
Segundo o Relatório de Gestão RNP 2009, para garantir o funcionamento da rede, a
RUTE oferece a cada hospital universitário, conexão de 1 Gbps6 nas cidades que dispõem da Rede
Comunitária de Educação e Pesquisa - Redecomep (outro serviço da RNP), criação de Núcleos de
Telemedicina e Telessaúde, adaptação e adequação de salas de videoconferência, teleconsulta e
telediagnóstico, homologação das salas de videoconferência e criação e manutenção de Grupos de
Interesse SIGs7.
O trabalho da RNP destinado ao fornecimento de infraestrutura regional para redes de alta
velocidade gerou, na primeira fase, a partir de 2007, notadamente, a Redecomep, trabalho que já
ocupa todas as regiões do país, com redes em 16 cidades: Belém-PA, Manaus -AM, Macapá-AP,
Brasília-DF, Goiânia-GO, Cuiabá-MT, Fortaleza-CE, Natal-RN, Campina Grande-PB, SalvadorBA, São Luís-MA, Aracaju-SE, São Paulo-SP, Vitória-ES, Florianópolis-SC e Curitiba-PR.
A Redecomep, além de prover interligação às Instituições de Pesquisa - IPÊS, por meio de
uma estrutura ótica metropolitana administrada, por sistema de consórcio, vem desenvolvendo e
conectando a comunidade científica, professores, pesquisadores e tecnologistas a problemas locais
destas áreas. A partir de sua estrutura comunidade e pesquisa estão constituído, sinergicamente,
arranjos produtivos locais entabulados em decorrência do potencial produtivo da região.
6
1 gigabyte por segundo.
Grupos de profissionais de Saúde das instituições integrantes da RUTE que debatem, em sistemas de vídeo ou
webconferências, assuntos voltados ao ensino, pesquisa ou atendimento à distância. Já existem 30 SIGs que discutem
assuntos médicos nas áreas de enfermagem, cardiologia, psiquiatria, oftalmologia e saúde da criança e adolescentes,
entre outras especialidades. Em 2009 foram registradas a participação de 412 instituições nas reuniões, representando
um aumento de 362,92% em relação a ano anterior. Enfermagem intensiva de alta complexidade registro o maior
avanço, passando de 3 instituições em 2008 para 52 em 2009.
7
26
Nas IPEs, ocorreram, de imediato, aumento significativo da capacidade de tráfego de
dados interna e externamente, com outras instituições, a substituição de “linhas de conexão
cobradas” por operadoras de telecomunicações pela rede da RNP, a integração de todas as IPEs ao
sistema RNP, melhorando substancialmente a conectividade com as entidades de pesquisas
análogas no país, redução de custos de infraestrutura de comunicação de dados e expansão da rede
metropolitana destas capitais sem qualquer custo adicional.
Na fase II, denominada Comint, a ideia e meta contratual pauta-se pela interiorização do
sistema, chegando a cidades que apresentem outros conjuntos de educação e pesquisa não
alcançados no primeiro momento. Campinas-SP, Itajubá-MG, Ouro Preto-MG, Pelotas-RS,
Petrolina-PE, São José dos Campos-SP, Uberaba-MG, Uberlândia-MG, Niterói-RJ e Petrópolis-RJ,
cidades que já dispõem, além de instituições de pesquisa, de aglomerados de empresas maduras
formam parques tecnológicos promissores.
Esse trabalho, envolvendo substituição de contas-acesso pagas, alta velocidade de ligação
entre IPEs, realização de procedimentos médicos à distância, a melhoria na estrutura de pesquisa
científica no país somente tornou-se possível a partir da construção e implantação da rede Ipê
(Gráfico 3), backbone/espinhal dorsal da RNP de fibras óticas que conecta computadores a uma
velocidade de 10 Gbps. A rede abarca 27 Pontos de Presença - PoPs, um em cada estado, além de
ramais para atender mais de 600 institutos de ensino e pesquisa conectados.
rede Ipê - Backbone da RNP
fonte: RNP, 20108
8
Gráfico 3
Disponível em http://www.rnp.br/backbone/index.php; acessado em 11 nov 2010.
27
A RNP amplia a rede brasileira de soluções de internet rápida, a profusão de parcerias
internacionais na forma de “condomínios de conexão”. Juntas, RNP e Academic Network at São
Paulo - ANSP (rede acadêmica de São Paulo), aliam-se à Clara (Cooperação Latino-americana de
Redes Avançadas) que opera, desde 2004 a Rede Clara, com 13 países conectados: Brasil,
Argentina, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, El Salvador, Guatemala, México, Panamá, Peru,
Uruguai e Venezuela.
O Compêndio da Rede Clara (2009, p.27), analisando a capacidade dos backbones9 dos
países latino-americanos associados às Redes Nacionais de Pesquisa e Educação - NREN,
qualificou a RNP como principal rede quanto ao oferecimento de serviços e detentora da maior
capacidade de transmissão de dados entre seus PoPs, sendo que, neste item, é a que detém,
igualmente, mais usuários, universidades conectadas e pontos de presença (Gráfico 4).
Além dessa malha externa, por meio da rede Ipê são anexadas outras acadêmicas
internacionais, como a norte-americana Internet2 e a europeia Géant, com capacidade de conexão
própria à internet comercial mundial de 2,5 Gbps.
Capacidade Central do Backbone da Rede
fonte: Compêndio Clara 200910
Gráfico 4
9
Capacidade central do backbone da rede: capacidade de operação entre os nós (PoPs) aos quais estão conectadas cada
NREN. Algumas não têm espinha dorsal, valendo para o cômputo destas a capacidade máxima dentro do nó central da
rede.
10
Disponível em http://alice2.redclara.net/images/ALICE2/compendium/compendio_clara-alice2_la-nren_2009
_po.pdf, acessado em 11 nov 2010.
28
Por meio do projeto Whren/Lila, financiado pela National Science Fundation, agência
estadunidense para promoção científica, e pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São
Paulo - FAPESP, os 10 Gbps da rede Ipê somam-se a outro enlace de 10 Gbps da ANSP permitindo
que, desde outubro de 2009, a RNP, financiadora do condomínio, ofereça uma ligação de São Paulo
a Miami, que antes rodava a 2,5 Gbps, multiplicada por oito, com 20 Gbps (Gráfico 5).
Troca de Tráfego Internacional - Link SP/Américas
fonte: RNP, 201011
Gráfico 5
Dessa velocidade, 3 Gbps são destinados à internet comercial e outros 17 ao complexo
acadêmico nacional (sete vezes superior à atual capacidade), formando a internet acadêmica
brasileira. Stanton (2009), diretor de Pesquisa e Desenvolvimento da RNP, ilustra esta ampliação
como um processo necessário para a atualização da rede Ipê: “o aumento de capacidade para
colaboração científica beneficia várias comunidades de usuários que já vêm realizando grandes
transferências de informação pela rede”, permitindo, além de sua conectividade internacional, novas
parcerias com instituições no exterior.
Sobre resultados e metas12, objetivos do contrato de gestão, assim recorda Simões
(questionário, 2010):
“Os órgãos de governo responsáveis pelo acompanhamento e avaliação das
metas do contrato de gestão, no seu primeiro ciclo, conferiu nota média de 9.44, o
11
Disponível em http://www.rnp.br/ceo/trafego/?tipo_arquivo=1&tipo_conexao=5, acessado em 11 nov 2010.
“e. as atribuições, responsabilidades e obrigações do Poder Público e da organização social são definidas por meio do
contrato de gestão, que deve especificar o programa de trabalho proposto pela organização social, estipular as metas a
serem atingidas, os respectivos prazos de execução, bem como os critérios objetivos de avaliação de desempenho,
inclusive mediante indicadores de qualidade e produtividade” (Di Pietro, 2009, p. 266).
12
29
que representa a consecução plena de todas as metas pactuadas nos últimos cinco
anos.
Os órgãos de controle externo, público (ex. CGU) e privado (ex. auditores
externos independentes contratados pelo conselho de administração) aprovaram
com regularidade todas as suas contas.”
De olho no futuro, a RNP projeta para o final de 2010 uma velocidade de 233,2 Gbps (um
aumento de 280% em relação à capacidade agregada atual), fruto da parceria com a empresa de
telecomunicações Oi que cederá sua infraestrutura de transmissão em fibras ópticas para uso nãocomercial em troca de partilhar com a Rede projetos de pesquisa e desenvolvimento de interesse
comum.
De acordo com Simões (questionário, 2010), na vigência do Plano de Ação de Ciência,
Tecnologia e Inovação 2007-2010 (PACTI), o MCT estabeleceu dois programas com a RNP: a
Nova RNP - Internet Avançada para Educação e Pesquisa e o Programa Tecnologias Digitais de
Comunicação, Mídias e Redes. Segundo Simões, o
“Programa Nova RNP - Internet Avançada para Educação e Pesquisa”
expandiu o alcance da Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP), abrangendo
todo o País, e integrando, em alta velocidade, as organizações federais e estaduais
de educação e pesquisa, incluindo o acesso às suas unidades descentralizadas, para
suporte à educação a distância (Universidade Aberta do Brasil - UAB), à ciência, à
telessaúde e ao intercâmbio de conteúdos audiovisuais, mediante parceria com
governos estaduais e com outros órgãos do governo envolvidos em projetos de
Infovias.”
No bojo deste programa insere-se, ainda, como subprograma, o “suporte à e-ciência”- Einfraestrutura compartilhada entre Europa e América Latina (EELA) -, implantado por meio do
desenvolvimento de computação em grade, interligando uma série de universidades e institutos de
pesquisa destas duas regiões para dar resposta a problemas com computação intensiva. Provido com
recursos da Comissão da União Européia (UE), o projeto é coordenado pelo Ciemat (Centro de
Investigações Energética, Meio-ambientais e Tecnológicas), da Espanha.
30
4.3. Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá - IDSM13
O Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá - IDSM, qualificado como OS do
MCT (Decreto s/nº, de 4 de julho de 1999), começou a ser idealizado ainda nos anos 80, a partir de
projeto voltado à conservação da biodiversidade da região amazônica. Consubstanciados por grupos
de pesquisa e pela presença da população local no desenvolvimento das ideias, o modelo
propugnava a implantação de Reservas de Desenvolvimento Sustentável - RDS, zoneamento e
normatização de áreas de bioprospecção e preservação.
A partir de 1996, quando a categoria RDS, nos moldes antes propostos, foi criada, a
conjugação entre participação popular local - responsáveis, diretamente, pelo manejo, usufruto e
preservação - e agentes da pesquisa científica, o que proporcionou as condições epistemológicas
para a instauração do Instituto. Se, de um lado, o poder público enfrenta dificuldades para prover
fiscalização de áreas remotas, controle fundiário, novos métodos de estudo aliados ao conhecimento
real de moradores, ribeirinhos e extrativistas, trazidos pelo Instituto fomentaram condições reais
para ações voltadas ao manejo, preservação e conservação, num regime de apropriação natural
sustentável associada ao desenvolvimento socioeconômico da região.
No âmbito dos compromissos firmados com o MCT, conforme Relatório Segundo Ciclo
do Contrato de Gestão 2006-2010 (2010, p.6), nesse período os acervos de 30% de mamíferos,
répteis e peixes localizados na região oeste da Amazônia brasileira foram catalogados e
informatizados.
Na Região de Desenvolvimento Sustentável do Mamirauá - RDSM, cinco comunidades
foram agregadas às atividades de manejo florestal (São Raimundo da Batalha, São Francisco do
Pinhal, Vila Alfaia, Bom Jesus e Santa Fé), estando prontas para exploração legal de madeira. Na
“área subsidiária” da RDSM, composta por regiões de Fonte Boa, Auati-Paraná e Maraã, o
13
www.mamiraua.org.br.
31
programa de manejo pesqueiro já capacitou, em contagem e monitoramento de pirarucu, 30
comunidades destas áreas.
Na Região de Desenvolvimento Sustentável de Amaná - RSDA, oito comunidades foram
agregadas às atividades de manejo da pesca (Várzea Alegre, São do Repartimento, São José da
Messajana, Nova Jerusalém, Vila Nova do Amaná, Santo Estevão e Boa Vista do Calafate). Por
meio de dois Acordos de Pesca, fato inusitado na região, tendo em vista a não identificação de
espaços de manejo e prospecção comercial e conflitos constantes pelas áreas de produção,
pescadores das Colônias de Pesca dos Municípios de Alvarães e Tefé poderão, a partir do Acordo,
partilhar, no interior das unidades de conservação, espaços de pesca em parceria.
A junção de pesquisa e população e o conseqüente aumento de seu bem-estar nessas regiões
é elencada por Alves (questionário, 2010) como duas das principais realizações do Instituto:
“Fortalecimento da gestão comunitária das Reservas de Desenvolvimento
Sustentável Mamirauá e Amanã a partir dos diversos investimentos sociais no
manejo dos recursos naturais com base nas pesquisas científicas sobre o uso dos
recursos; Investimentos que contribuíram para a melhoria da qualidade de vida das
populações locais.”
Confirma, igualmente, a prática de equaciomento entre natureza, gente e produção relata que
“entre as ações mais relevantes realizadas pelo Instituto de Desenvolvimento
Sustentável Mamirauá - IDSM ao longo de seus 11 anos de existência podemos
destacar, dentre outras, o fortalecimento das pesquisas biológicas e sociais para a
conservação da biodiversidade das florestas alagadas da Amazônia Central, com
manejo participativo dos recursos naturais e com investimentos sociais na melhoria
da qualidade de vida das populações ribeirinhas locais e a continuidade na
construção de conhecimentos direcionados ao desenvolvimento sustentável da
Amazônia, sendo o IDSM o principal centro de referência de desenvolvimento
social nessa região.”
Entre os anos 2006 e 2009, houve um crescimento de 38% de comunidades mapeadas.
Igualmente, o número de populações da RDSM e RDSA com manejo apoiado que passaram a
desenvolver processos sustentáveis de prospecção ambiental cresceu 36% (Gráfico 6).
32
Evolução do Número de Comunidades com Manejo Apoiado
fonte: IDSM, O segundo ciclo do contrato de gestão 2006-2009, 2010
Gráfico 6
Para medir o resultado de suas intervenções na ação da população amazônica junto ao
meio ambiente, o ISDM calculou a relação entre as práticas sustentáveis adotadas na exploração dos
recursos naturais e o crescimento de renda gerado em virtude dos programas de manejo
introduzidos. De 1994/95 a 2005/06, por meio de manipulação sustentada, a renda das comunidades
da RDSM aumentou 116%. O aumento da renda decorre da conjugação de três fatores: maior
produção; melhor qualidade; e, consequentemente, aumento dos preços dos produtos (Tabela 4).
Evolução do Volume Produzido x Composição da Renda14 na RDSM
Renda (US$ 1,00)
Renda pela produção/Número
de cestas básicas
Renda por salários e pensões
Renda bruta anual
888
Número de
Cestas
Básicas16
(dez 1995)
10,8
552
1.440
6,7
17,5
1994/9515
1.914
Número de
Cestas
Básicas18
(dez 2006)
26,0
1.405
3.319
19,1
45,1
2005/0617
fonte: IDSM, O segundo ciclo do contrato de gestão 2006-2009, 2010, BACEN e Dieese
Incremento
(%)
140,1
184,5
157,7
Tabela 4
14
O valor em dólar foi convertido em cestas básicas a preços correntes, visando ao deflacionamento da moeda bem
como à representação de incremento no consumo da população local medido por este índice.
15
Cotação do dólar em 29/12/1995 = R$ 0,974, disponível em http://www4.bcb.gov.br/pec/taxas/port/
PtaxRPesq.asp?idpai=TXCOTACAO, acessado em 12 nov 2010.
16
Valor da cesta básica na cidade de Belém/PA em dez/1995 = R$ 80,07, disponível em http://turandot.dieese.
org.br/bdcesta/ tmp/12_199586015.html, acessado em 12 nov 2010. Como o Dieese não computava Manaus neste
período foi utilizado o de Belém.
17
Cotação do dólar em 29/12/2006 = R$ 2,1372, disponível em http://www4.bcb.gov.br/pec/taxas/port/
PtaxRPesq.asp?idpai=TXCOTACAO, acessado em 12 nov 2010.
18
Valor da cesta básica na cidade de Belém/PA em dez/2006 = R$ 157,16, disponível em http://turandot.
dieese.org.br/bdcesta/tmp/12_200686019.html, acessado em 12 nov 2010.
33
A tabela mostra o impacto sobre a renda da população. Excluída a remuneração de
prestação continuada (salários, aposentadorias e pensões), a produção qualificada e ampliada
agregou, em 2005/06, US$ 1,9 mil à capacidade de consumo do produtor. De 1994/94 a 2005/06
houve um crescimento de 116%. Convertidos os valores em poder de compra, por meio de cestas
básicas, o crescimento foi de 140,1%. Ressalte-se, ademais, que esta renda era ínfima antes da
introdução de técnicas saudáveis de manuseio ambiental. O pescador Hélio Frasão dos Santos
(Assayag, 2010) explicita isto: “Juntos, os ribeirinhos ganharam cerca de R$ 1 milhão e aprenderam
que preservar é um bom negócio. Agora estamos vendo a fartura, depois de muitos anos. Todo dia a
gente ver fartura. É uma festa [...]. Dos pescadores né?, o manejo assim”.
Paripassu ao crescimento da renda, identifica-se um crescimento no padrão de consumo
da população, conquanto tabulação a partir de uma lista mínima de compras pela população,
anotando que a
“cesta básica dos moradores tinha, em 1995, um custo médio mensal de R$ 40,00,
e era composta por artigos essenciais, tais como açúcar, café, sabão em barra, óleo
de cozinha, leite em pó e sal. Já em 2008, este custo médio foi de R$ 73,00. O
consumo de mercado estava fundamentalmente direcionado à alimentação, que
constituiu 53% do total do gasto. Os gastos com energia e instrumentos de
produção representavam apenas 14% do consumo de mercado. Portanto, num
período em que a geração de renda aumentou em cerca de 130%, a capacidade de
consumo destas populações foi aumentada em 82,5%.” (Relatório, 2010, p. 22)
Junto com a capacidade de consumo ampliada da população, ultrapassando compras
limitadas a açúcares e amidos, num regime de alimentação menos pasteurizada, a mudança
socioeconômica da população da RDSM trouxe, em paralelo, alterações em sua dinâmica
demográfica. Com o aumento do consumo de bens de mercado e maior acesso a serviços públicos,
saúde, saneamento, higiene e educação, o Índice de Mortalidade Infantil – IMI melhorou (Gráfico
6).
34
Índice de Mortalidade Infantil - IMI (RDSM)19
fonte: IDSM, O segundo ciclo do contrato de gestão 2006-2009, 2010
Gráfico 7
O resultado do IDMS desfaz e idéia de que há confronto entre desenvolvimento
sustentável e “negócio”. A junção é possível e reconhecida (Assayag, 2010):
“O pirarucu está ameaçado de extinção. A pesca é proibida em todo estado do
Amazonas e liberada apenas nas reservas de Mamirauá e Amanã. Parece uma
contradição. Mas desde 1999, quando a pesca controlada teve início, aumentou e
muito a quantidade de pirarucus na região.Os ribeirinhos sentem a diferença. Só
tem muito porque os 900 pescadores que vivem na reserva viraram fiscais.
Durante três anos, ninguém apanhou pirarucu. Ainda hoje, eles impedem a entrada
de qualquer barco de fora. Na reserva inteira os pescadores apanharam mais de
5.200 mil pirarucus, em 2008. Para receber o lacre, que garante a procedência, o
bicho tem que ter pelo menos um metro e meio”.
Os resultados sociais não ficaram apartados da ampliação na produção científica da
instituição (Tabela 5 e Gráfico 7). Pesquisa e bem estar são os braços que movem os resultados e
cumprimento de metas e indicadores interpostos pelo Contrato de Gestão MCT-IDSM.
19
Por número de crianças de 0 a 5 anos mortas em cada grupo de 100 nascidas vivas, no período de 1993 a 2008.
35
Produção Científica
Artigos científicos em
revistas indexadas
Livros e capítulos de
livros
Total de publicações
revisadas por pares
Evolução das publicações científicas20
Ano
2001 2002 2003 2004 2005 2006
2007
2008
2009
5
7
2
5
2
19
25
33
52
11
5
3
8
9
6
4
22
8
16
13
5
13
11
25
29
55
60
fonte: O segundo ciclo do contrato de gestão 2006-2009, 2010
Tabela 5
Evolução das publicações científicas
fonte: IDSM, O segundo ciclo do contrato de gestão 2006-2009, 2010
Gráfico 8
Comparado com outros institutos com atuação na Região Amazônica, todos do MCT, o
IDSM, atrás dos demais até 2007, nos dois anos seguintes, a partir de publicações sobre estudos
desta região, os suplanta ou equipara (Gráfico 7).
20
O fator de crescimento é demonstrado pela análise do IPub (índice de publicações) do IDSM, com base per capta do
TNSE (número de Técnicos de Nível Superior e Especialistas).
36
Evolução Comparativa com Outros Institutos com Atuação na Amazônia21
fonte: O segundo ciclo do contrato de gestão 2006-2009, 201022
Gráfico 9
Para este incremento em pesquisa, fato relevante foi a fixação e o apoio de pesquisadores23
de alta qualificação na região de Tefé, sede do Instituto. Em 2003, o IDSM tinha 2 pesquisadores
com doutorado em sua equipe, em 2006, 6. Com mestrado o número cresceu de 6 para 26. Com
especialização, de 1 para 5.
4.4. Associação Brasileira de Tecnologia de Luz Síncrotron - ABTLuS24
A ABTLuS foi qualificada como OS do MCT pelo Decreto n° 2.405, de 26 de novembro de
1997. Hoje gerencia três laboratórios25: o Laboratório Nacional de Luz Síncrotron - LNLS, o
21
Evolução com base no IPub dos Institutos INPA - Instituto de Pesquisas Amazônicas; MPEG - Museu Paraense
Emílio Goeldi; e Instituo de Pesquisas Espaciais - INPE. Para o ano de 2009 somente há informação do IDSM.
22
Dados obtidos dos Relatórios de Gestão IDSM/IMPA/MPEG/INPE.
23
Os pesquisadores são custeados por bolsas CNPq do tipo DTI - Desenvolvimento Tecnológico e Industrial, de longa
duração, voltadas à elaboração de projetos de pesquisa, desenvolvimento ou inovação.
24
www.abtlus.org.br.
25
Dois Laboratórios estão em fase inicial de operação, ambos criados em 2009 na ambiência do contrato de gestão
MCT/ABTLuS. O Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol - CTBe (www.bioetanol.org.br) focado
na área energética e direcionado, neste primeiro momento, a dois temas: melhoria da gestão no setor agropecuário;
aprimoramento de novas tecnologias para a produção de etanol, como a hidrólise do bagaço e o uso da palha para a
produção de energia; e o Laboratório Nacional de Biociências - LNBio (www. lnbio.org.br), promotor de pesquisa e
desenvolvimento em biotecnologia, focado nas áreas de biologia estrutural e síntese química. É o antigo Centro de
37
Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol - CTBe e o Laboratório Nacional de
Biociências - LNBio, por meio de contrato de gestão com o Ministério, compondo o complexo do
Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais - CNPEM, sediado em Campinas-SP.
Sobre o Laboratório Nacional de Biociências - LNBio, criado como um Laboratório
nacional aberto para a área de biociência, baseado nas diversas aplicações de biotecnologia,
inobstante estar em fase de consolidação, já confirma o acerto em sua construção, como afirma o
presidente da ABTLuS, Walter Colli, que, ao responder a consultas deste projeto, o coloca como
um dos principais desafios da OS.
“Inicialmente implantado como Centro de Biologia Molecular Estrutural, no
ano de 2001, consolidado a partir de 2009 como um Laboratório Nacional de
Biociências (LNBio), aberto à comunidade acadêmica e industrial, tendo firmado
uma série de parcerias conjuntas com o setor farmacêutico, químico e cosméticos.
Recentemente esse laboratório fechou contrato com a Braskem para incubar um
laboratório dessa empresa a fim de produzir plástico verde.”
O segundo centro do complexo, o Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do
Bioetanol - CTBE, Colli (questionário, 2010) o enquadra, igualmente, como instituição que tratará
dos mais importantes projetos de bioenergia do Brasil, participando
“como instrumento estratégico da Política Nacional da Ciência e Tecnologia, para
o setor de produção de cana-de-acúçar e álcool. Nesse centro, cuja fase de
construção terminou recentemente, será reproduzido todo o ciclo de produção do
etanol, desde a plantação da cana-de-açúcar até o desenvolvimento de processos
inovativos que levam ao aumento de rendimento na produção do etanol de segunda
geração.”
Emblemático para a pesquisa e a produção de soluções materiais por via da ciência física
brasileira, o Laboratório Nacional de Luz Síncrotron - LNLS26 foi incorporado pela OS ABTLuS
quando da edição do Decreto.
Idealizado a partir de 198127, mas com início de operação apenas em 1997, o LNLS é, hoje,
detentor da única Fonte de Luz Síncroton da América Latina , máquina emissora de raios
Biologia Molecular Estrutural (CeBiME) que, ao longo de uma década, qualificou pesquisadores, produziu
conhecimento e contribuiu para o avanço na área de Biologia Estrutural no país o centro ainda está em formação.
26
www.lnls.br.
38
ultravioleta e raios-x sobre materiais, operação destinada ao estudo do comportamento e reação de
materiais expostas à radiação.
Dentro do complexo LNLS encontra-se, também, o Centro de Nanociências e
Nanotecnologia Cesar Lattes (C2Nano), unidade mais recente, inaugurada em 2008, como fruto da
proposta MCT-LNLS de consolidação e atualização da instrumentalização necessária à pesquisa de
propriedades de materiais subdivididos em partículas atômica e nuclear trabalhando em linhas de
pesquisa com semicondutores e catálise, permitindo a nanocaracterização de elementos químicos
que compõem cada material.
Fonte de Luz Síncrotron e C2Nano contam com cerca de 1,5 mil cientistas e pesquisadores
do Brasil e estrangeiros que desenvolvem, no Laboratório, estudos e soluções nas áreas de física,
química, engenharia de materiais e ciências da vida. O centro qualifica alunos da iniciação científica
ao pós-doutorado em pesquisa, ensino e produtos voltados às estratégicas linhas da ciência como
nanotecnologia, materiais avançados, fármacos e energias alternativas.
Nestes treze anos de existência, o número de usuário da fonte de luz cresceu
exponencialmente. Em 1997, 180 usuários pesquisam os espectros da Luz Síncrotron; em 2009, o
número de operadores cresceu 590%, sendo manipulado por 1068 pessoas. Comparativamente, de
2000 a 2008 o número de usuários da luz mantida pelo Departament of Energy - DOE (Estados
Unidos), cresceu 40%; a luz mantida pela OS cresceu 444% (de 253 para 1123). Outro operador de
luz síncrotron internacional, o European Syncrotron Radiation Facility (ESRF), de 2003 a 2008
recebeu incremento de 30% de novos usuários; em tempo igual o número de pessoas dedicadas ao
estudo da luz do LNLS cresceu 146% (de 770 para 1123).
Acompanhando o padrão dos anos anteriores, em 2009, a Fonte de Luz Síncrotron operou 24
horas, de segunda a sábado pela manhã, com duas paradas para manutenção e estudos da máquina,
27
Embora com impulso maior a partir de 1983, momento que permitiu o início de operação a partir de 1997, a idéia de
uma máquina de física brasileira remonta a década de 50, com a criação do CNPq, em 1951. À época imaginava-se
prover o Brasil de um equipamento pesado de sincrocíclotron assemelhado ao que existia na Universidade de Chicago.
39
programadas, alternadamente, de duas em duas semanas. No ano, foram oferecidas 4.060 horas do
feixe de luz (pouco abaixo da meta - 4.140, mas com peso 2), gerando uma confiabilidade28 da
Fonte de 96,4%. A meta era de 93%, o que compensa a diferença de horas disponibilizadas, pois
este item tem peso 3 (Relatório Anual 2009, pp. 10 e 119).
Enquadrados no macro-objetivo direcionado a “prover e manter infraestrutura nacional de
classe mundial para pesquisa” os indicadores do contrato de gestão, nos itens horas destinadas
(4.060) e confiabilidade (96,4), registraram qualificação no nível de eficácia. No mesmo objetivo item a satisfação dos usuários - o indicador de satisfação contratado junto ao MCT previa, como
meta, 85%. Chegou a 96% (grau de efetividade). No indicador número total de publicações a meta
em 2009 era de 230 edições. Proveu 274 publicações, anotando grau de efetividade (Relatório
Anual, p. 119). Dos 274 artigos publicados, 20 foram indexados com fator igual ou superior a 529.
No macro-objetivo “realizar e difundir pesquisa própria”, o indicador publicações por
pesquisador (equipe interna do LNLS - participaram 17 pesquisadores do LNLS e 9 do
CeBiME/LNBio) pedia, como meta, 2,5 edições por cada um. Conseguiu 2,930. No macro-objetivo
“gerir a infraestrutura, visando ganhos de eficiência na difusão da ciência”, o indicador número de
técnicos estrangeiros treinados estipulava meta de 25. Ultrapassou um: 26 - eficiência (Relatório
Anual 2009, p. 120).
Mesmo sendo metrificáveis, os resultados do complexo ABTLuS, de fácil compreensão,
produzindo e reproduzindo ciência a todo tempo, com alto desempenho e cumprimento das metas e
objetivos interpostos pelo contrato com o MCT, a insegurança e o desconforto trazem conflitos à
administração quanto à governança do modelo.
“(....) o Estado contrata uma organização privada para prestar serviços de
interesse público (....) Esta organização cumpriria seus resultados com maior
28
A confiabilidade leva em conta apenas 3.959 horas de feixe, conforme programação destinada aos usuários.
Publicações de usuários da infraestrutura de pesquisa da ABTLuS em periódicos indexados pelo Institute For
Scientific Information/Thomson Scientific - ISI.
30
Para este cálculo considera-se artigo em periódicos indexados que tenha o nome do pesquisador como um dos
autores.
29
40
autonomia e flexibilidade (....) No entanto, cada vez mais os Órgãos de Controle da
Administração Pública tentam avaliar as Organizações Sociais por meio de normas
típicas do serviço público, levando-as a operar como se fossem da administração
pública impondo, com isso, um prejuízo às características de flexibilidade e
agilidade de operação do setor privado. Portanto, a governança do modelo que
prevê Organizações Privadas a serviço das políticas públicas não está resolvida por
inconformismo ou falta de compreensão dos órgãos de controle” (questionário,
2010).
Esta preocupação, como se vê, é generalizada. Tanto pelo que não está decidido como pelo
que, devido à indecisão anterior, provoca exageros. Na ABTLuS não é apenas um laboratório, são
três (quatro com o C2Nano), todos eles diretamente vinculados ao que o país é e,
fundamentalmente, será daqui a alguns anos, não muito tarde, espera-se.
4.5. Centro de Gestão e Estudos Etratégicos - CGEE31
O CGEE (qualificado como OS pelo Decreto n° 4.078, de 9 de janeiro de 2002), sediado
em Brasília, diferentemente das demais OSs do MCT, devido às suas idiossincrasias materiais, não
convertíveis em número, carga, volume ou gente, é um caso especial, o que traz, na contramão,
mais questionamentos que as outras.
Enquanto IMPA, RNP, ABTLuS e IDSM, como visto nos itens anteriores, conseguem
medir doutores e mestres formados, número de crianças premiadas e apoiadas em estudo de
Matemática, professores formados e especializados; tamanho de rede implantada, velocidade de
informação transmitida, quantidade de entidades com infraestrutura de rede melhorada, número de
procedimentos médicos transmitidos de cidade a cidade, hospital a hospital; tempo de Luz
Síncrotron exposta para pesquisa, número de publicações editadas, quantidade de experts formados;
número de pessoas e comunidades capacitadas e adaptadas ao manejo responsável para com a
natureza, quantidade de peixes preservados e repostos ao habitat por manipulação e uso-fruto
responsável e área vegetal preservada, o CGEE não consegue expor nenhum metro que seja
mensurável. Não faz nada disto, num primeiro momento. Mas é o principal responsável por
entabular, preparar, dar o norte estratégico e prospectivo para que aqueles e outra parcela
31
www.cgee.org.br.
41
considerável da produção, ciência, pesquisa e inovação tecnológica do país, se beneficie de seus
estudos. Essa parcela faz, diretamente, mas o CGEE é quem diz e dá o caminho para o que fazer, o
que estudar, onde aplicar ou o que produzir e com quem associar-se.
Devido ao resultado do que faz somente acontecer a posteriori, na operação do agente
outro orientado, inibindo-lhe a apresentação de gráficos com resultados materiais metrificáveis,
diretamente, as indagações do presente trabalho se fazem mais visíveis para esta OS.
Conforme relatos anteriores, todos dirigentes enxergam na insegurança provocada pelo
vácuo na confirmação da Lei das OSs e na difícil relação com órgãos de controle, no mais das vezes
reais, situações de dificuldade. Com o CGEE, esta impressão, que se substancia em interpelações,
seja na OS ou no contratante, o MCT, se expande consideravelmente.
Como foi criado para entabular estratégias, sua “abstração” espalha-se por seus objetivos e
finalidades: promover e realizar estudos e pesquisas prospectivas na área de ciência e tecnologia;
promover e realizar atividades de avaliação de estratégias e de impactos econômicos e sociais das
políticas, programas projetos de C&T; publicizar informações, experiências e projetos à sociedade;
promover a interlocução dos setores de C&T e produtivo; e prestar suporte técnico e logístico a
instituições públicas e privadas.
Se, para auditores, controladores e advogados públicos é difícil compreender os resultados
das demais OSs, que têm produtos prontos, de fácil mensuração, como medir resultados com visão
finalística - condição primária e principal do modelo - do CGEE e não apenas, como dito
anteriormente por Alves, a partir de procedimentos de rotinas?
Sobre isto Melo (questionário, 2010) expõe:
“A idéia de que o poder máximo esteja localizado no Conselho de
Administração, associada a idéia de que nessa instância o Estado exerce o seu
poder controlador, embora não majoritário, o que o obriga a negociar com os
segmentos da sociedade interessados na atividade, deve ser visto como
fundamental para o sucesso do modelo. No entanto este aspecto ainda não foi
42
adequadamente assimilado pelas instâncias de controle (TCU e CGU) que pelos
seus atos questionam essa compreensão.
Com isso produzem um retrocesso fundamental que é a substituição do
controle por resultados preconizado no modelo, pelo controle de processos,
mecanismo usual nos órgãos públicos da administração direta ou indireta,
chegando mesmo a aplicar as OS’s o tratamento de administração indireta o que
consiste em confronto com o estabelecido em Lei que define as OS”s como de
natureza jurídica de Direito Privado”.
Simples, que nas próximas seleções para estas funções contrate-se especialistas que
entendam da área, que venham da área de pesquisa, que tenham projetos de ciência, tecnologia e
inovação, que se exija experiência em institutos com estas aplicações, que sejam titulados em grau
superior vinculado.
Que, no curso de formação, separem-se contadores, economistas, advogados, médicos e
outros, sem estas características, para atuação na área que lhe diga respeito. Que os profissionais
selecionados sob este critério acompanhem todos os momentos de definição daquilo que será pago
com dinheiro público. Que participem das ideias e soluções propostas pela entidade e pelo modelo.
Que façam o acompanhamento em paralelo, não como ocorre no presente, a posterior, a partir de
planilhas e relatórios numéricos, tão somente. Isso vale para todas as outras áreas do Executivo
Federal, como Defesa, Meio Ambiente, Saúde, Segurança etc.
Há que se ter, assim, o conhecimento epistemológico legal, da regra, da norma, da rotina,
mas há também se ter o conhecimento da especificidade em que labora. Quiçá com alguma
capacidade ontológica de compreender idiossincrasias e feitos da vida. Poder-se-á, com este quadro,
entender esta OS e compreender melhor as outras, seja em C&T ou em outro ambiente qualquer.
É importante entender que a missão finalística, por resultados, foi efetivada, como relata
Eduardo Moacyr Krieger, presidente do Conselho de Administração do CGEE até o ano passado.
“O que me parece muito claro é que o CGEE vem sendo demandado por um conjunto amplo de
43
instituições públicas e privadas, consolidando e dando relevo ao papel para o qual foi criado”
(Relatório Anual 209, p. 4).
Um deles, apoiado pela comunidade cientifica da área naval e associado à Marinha, foi a
elaboração do projeto de construção de navio de pesquisa oceanográfica, que gerou a elaboração de
especificações técnicas dos sistemas operacionais e científicos, permitindo, por sua vez, a licitação,
fabricação e construção da embarcação projeto. Funcionou, aqui, como uma central de projetos,
numa área estratégica para o país.
Organizou estudos visando à implantação da Rede de Inovação da Amazônia, uma
proposta visando ao aproveitamento dos recursos naturais da região. Indicou gargalos das cadeias
de pesquisa e produção frente à exploração sustentável da biodiversidade da Amazônia. Duas redes
foram entabuladas, madeira - Ritec Madeira e Pesca32.
Especificou questões técnicas, institucionais e estratégicas pra implantação do CTBE (item
3.4) a partir de programação e articulação com entidade de pesquisa, desenvolvimento e inovação PD&I brasileiras e estrangeiras da cadeia do bioetanol. Apontou a viabilidade do desenvolvimento
de complexos enzimáticos para uso in house na produção de etanol de segunda geração (2G).
Estabeleceu a proposta de maximização da produtividade por meio da minimização da carga
produzida e que custos relativos menores que US$ 0,10 podem ser conseguidos com a otimização
destes parâmetros33.
Elaborou diagnóstico para o uso sustentável de princípios ativos de biodiversidade
elencando oportunidades e desafios do setor de fitoterápicos na indústria brasileira e mapeando
competências em pesquisa e desenvolvimento de fitoterápicos em cada bioma do país. O estudo é
32
33
O estudo encontra-se no endereço http://www.cgee.org.br/publicacoes/amazonia.php.
Informações sobre o tema encontram-se no endereço http://www.cgee.org.br/publicacoes/bietanol.php.
44
de grande relevância estratégica, pois extratos de plantas são a matéria-prima central para
fabricação fitoterápicos e outros medicamentos.
Concluiu, em 2009, o planejamento estratégico do sistema de ensino da Faculdade de
Medicina da USP e do Hospital das Clínicas - FMUSP-HC e do Instituto de Medicina Integral de
Pernambuco Fernando Figueira, trabalho que pode ser passado a outros sistemas de ensino e
pesquisa na área médica. Sobre o projeto paulista, Krieger diz o seguinte:
“Fiquei particularmente feliz com o resultado final do planejamento
organizacional do sistema Faculdade de Medicina - Hospital das Clínicas, ambos
da USP, também realizado com a equipe técnica do Centro, onde questões ligadas à
inovação em um complexo de pesquisa e serviços em saúde deram origem a
orientações para a elaboração de um plano de gestão estratégica.” (Relatório Anual
2009, p. 4)
Desenvolveu os Planos de Gestão Estratégica (PGEs) para as Organizações Estaduais de
Pesquisa Agropecuária - OEPAS, concebendo, igualmente, o Sistema de Monitoramento e
Avaliação dos PGEs, a ser adotado pelas OEPAS para facilitar o acompanhamento e avaliação das
diretrizes inseridas34.
O próprio CGEE recorda outros projetos anteriores a 2009:
“Valendo-se da estrutura permanente, propiciada pelo fomento do MCT ao
seu funcionamento, conceito que está na base da idéia de Organizações Sociais,
pode atender a demandas surgidas sob forma de Contratos Administrativos de
outros entes.
Cabe destacar os trabalhos realizados para a Anatel, para o Ministério do
Planejamento, que se valeu de estudos do CGEE para orientar decisões de
políticas públicas territoriais e finalmente a ABDI e o MDIC, através de subsídios
para a implementação de agendas estratégicas tecnológicas no âmbito da Política
de Desenvolvimento Produtivo - PDP” (questionário, 2010).
Como se vê, é difícil mensurar as ações do CGEE. O resultado envolve parceiras e
realizações no tempo. Não é construção de quilômetros de estrada. A par disso, há que se ter
agentes públicos afetos à realização dos recursos repassados ao CGEE que se disponham e
entendam do processo de produção de soluções e idéias.
34
O estudo encontra-se no endereço http://www.cgee.org.br/publicacoes/oepas_2009.php.
45
5. Limites para o credenciamento de organizações sociais
Regidas pela Lei nº 9.637, de 15 de maio de 1998, as OSs estão restritas para atuar na
execução de atividades dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à
proteção e preservação do meio ambiente, à cultura e à saúde (art. 1°).
Sobre as áreas abarcadas, relata Bresser-Pereira (1999. p. 137) que, “ao nível federal, os
serviços estatais não exclusivos mais importantes são as universidades, escolas técnicas, centros de
pesquisa, hospitais, e museus. A proposta de reforma os transformará em um tipo especial de
entidade de não-estatal chamado organizações sociais”.
Essa legislação introduz uma nova forma de relação entre o poder público e as entidades
privadas sem fins lucrativos e constitui uma importante inovação administrativa, pois permite o
fomento de atividades não-exclusivas de Estado em parceria com entidades sem fins lucrativos, para
o desenvolvimento destas atividades.
Por sua natureza estas entidades têm grande capacidade de articulação com a sociedade
civil, elemento fundamental para o alcance dos objetivos das políticas públicas nas áreas de sua
atuação, bem como permite maior agilidade e flexibilidade administrativa, em comparação com os
órgãos públicos.
César Camacho, presidente do Instituto de Matemática Pura e Aplicada - IMPA, em resposta
ao questionário proposto pelo presente estudo, assegura:
“A governança do modelo OS tem como objetivo a ação conjunta,
transparente e compartilhada entre Estado, Associação e a sociedade civil, visando
a uma solução inovadora dos problemas e execução de projetos focados em suas
atividades fins, com uma administração com mais flexibilidade voltada para o
controle de resultados. O controle do bom uso dos recursos é feito por vários
órgãos: auditoria interna, auditoria independente, CGU e TCU. Na prática, ela está
resolvida mantendo-se essas características.”
Como entidade de direito privado, a OS não integra a Administração Pública, nem está
necessariamente submetida às normas do direito público. O que a vincula ao poder público é o
contrato de gestão e, portanto, suas responsabilidades estão definidas por este instrumento. Cabe ao
46
poder público estabelecer condições que julgue necessárias para a celebração do contrato de gestão
e a liberação de recursos.
Qualificada a OS e celebrado o contrato de gestão, esse passa a ser o termo de referência ou
projeto básico das atividades a serem desenvolvidas, por meio de um compromisso institucional
entre a entidade não-estatal e o parceiro público, abarcando, pelo lado público contratante,
compromissos de implementação, acompanhamento e avaliação, de forma descentralizada, e, pelo
lado contratado, instrumentos de gestão voltados à consecução da atividade publicizada, num
roteiro Estado-entidade-sociedade: “como instrumento de acompanhamento, o contrato de gestão
permitirá a definição e a adoção de estratégias de ação que se mostrem necessárias para oferecer à
instituição melhores condições para o atingimento dos objetivos e metas acordados” (Cadernos
MARE, 1997, p. 37).
Trata-se, pois, de mecanismo para viabilizar prestação de serviços, concentrada ou
desconcentradamente, para aplicação de políticas vinculadas a planos e programas nacionais,
sempre restritos a áreas publicizáveis.
As OSs facilitam o controle social, por meio da participação nos conselhos de administração
dos diversos segmentos representativos da sociedade civil e, ao mesmo tempo, favorecem seu
financiamento por meio da compra de serviços e doações por parte da sociedade.
Inobstante, gozam de autonomia administrativa muito maior que aquela possível dentro da
organização do Estado. Em compensação, seus dirigentes são chamados a assumir uma
responsabilidade maior, em conjunto com a sociedade, na gestão da instituição e na melhoria da
eficiência e da qualidade dos serviços, atendendo melhor o cidadão-cliente a um custo menor.
47
6. Supremo e Tribunal de Contas, obstáculos legais e interpretativos
Inobstante pouca idade do modelo OS, número reduzido de entidades que operam a
flexibilização administrativa na esfera federal (cinco, como dito, de C&T), sua ampliação ou
mesmo manutenção, às duras penas, enfrenta um problema que contribui para o aparecimento de
todos os outros, ou de todo o outro, se tomarmos o segundo em grau de relevância, qual seja o
Controle das contas.
Questionada há 12 anos, mantida em liminar, mas ainda dependente de confirmação pelo
plenário do Supremo, a Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI nº 1.923/98, emperra a
aplicação da Lei nº 9637/98, que baliza o sistema.
Do lado do julgado, cria, assim, insegurança sobre o que pode ser feito: quem pode adotálo? Como será processada a contratação entre entidades de Direito privado e o Estado? O que estará
incluso na orçamentação da parceria? Quais as obrigações do quadro qualificado (macro-objetivos,
metas, indicadores, ampliação de parcerias, publicas e, idealmente, privadas)? Deve, no mais das
vezes, o qualificado qualificar-se, apresentando um boletim com nota superior a nove.
Colli (questionário, 2010) reverbera a insegurança:
“Embora a lei esteja em vigor, esse questionamento levanta incertezas
permanentes sobre a legislação que de fato se aplica às OS. Com isso, tanto os
dirigentes ficam inseguros sobre as possibilidades de ação quanto os órgãos de
Controle Público, adicionais àqueles previstos na Lei 9637/98, se julgam no direito
de intervir sobre a forma de operação da entidade privada qualificada como OS”.
Desde a criação, no ano de 1998, das primeiras OS do país, o modelo procura essas
respostas, frente a restrições de ordem legal, fundamentalmente pelo questionamento da
inaplicabilidade da Lei de Licitações e pela flexibilidade no regime de contratação (itens
questionados no STF), frente às limitações materiais e formais dispostas pelo regime jurídico do
servidor público.
Nesse mesmo ano, foi encaminhada ao STF uma argüição de constitucionalidade do sistema,
sustentando os requerentes, o Partido dos Trabalhadores - PT e o Partido Democrático Trabalhista PDT, que o art. 1º da Lei nº 9.648/99 (esta Lei tratava, inicialmente, da reestruturação das Centrais
48
Elétricas Brasileiras - ELETROBRÁS e de suas subsidiárias), que alterou o inciso XXIV do art. 24
da Lei nº 8.666/93, autorizando a “celebração de contratos de prestação de serviços entre o Poder
Público e as organizações sociais, com dispensa de licitação, violou os dispositivos
constitucionais”, (ADI 1.923/98, p.3).
Sobre isso, Modesto (1997, p. 15) assevera que “desde que cumpridos requisitos de
salvaguarda do interesse público, mais intensos e onerosos quanto mais ampla for a transferência de
encargos e recursos, a cooperação é licita e até mesmo estimulada pela Constituição da República”.
Note-se que o fulcro incide sobre o interesse público, num modelo desde a origem engendrado pelo
relacionamento com o cliente, qual seja o cidadão receber do serviço de Estado, numa esfera
pública não estatal.
Mendes (2007, p. 357) corrobora, lembrando que as organizações sociais “traduzem um
modelo de parceria entre o Estado e a sociedade para a consecução de interesses públicos comuns,
com ampla participação da comunidade”.
É uma qualificação atribuída pelo Poder Executivo às entidades de direito privado, sem fins
lucrativos (associações, fundações ou sociedades civis). Esta qualificação permite que a
organização receba recursos públicos e administre serviços, instalações e equipamentos públicos,
após ser firmado um contrato de gestão com o poder público, por intermédio do órgão supervisor,
com objetivos e metas bem estabelecidos.
Segundo Di Pietro (2001, p. 28), esses suportes são fundamentais para que setores da
iniciativa privada possam exercer atividades de interesse público, posto que “não têm condições de,
sozinhas, assumir o encargo”.
Uma vez dotadas de personalidade jurídica, tais entidades devem agir em nome do Estado a
par do fim público, nos limites de suas competências e prerrogativas para o exercício de atividade
pública ou de utilidade pública, na forma contratada.
49
No campo jurídico, convém lembrar que quaisquer organizações sem fins lucrativos, sejam
elas associações ou fundações, uma vez qualificadas como organizações sociais, não entram no
arcabouço da Administração Pública indireta, consagrando intacta a natureza jurídica de direito
privado.
Para Barreto (1999, p. 17),
“a implantação desse modelo inaugura nova forma de parceria entre a sociedade e
o Estado, baseada em resultados, que conjuga autonomia, flexibilidade e
responsabilidade na gestão (...). Com essa iniciativa, o Estado oferece aos
dirigentes de órgãos e entidades públicas estatais responsáveis pela prestação de
serviços sociais a possibilidade de se libertarem das disfunções operacionais do
Estado e, portanto, de assumirem plenamente a gestão estratégica de suas
respectivas organizações”.
Essa indefinição ocorre, no mais das vezes, em decorrência da insegurança jurídica criada na
interpretação da norma. Passados doze anos da sanção da Lei, a ADI, senão decidida
favoravelmente pelo plenário do Supremo, pode colocar por terra todos os contratos federais,
quando, não muito, carregar todas as organizações proclamadas nos estados e municípios para o
fechamento.
Melo (questionário, 2010) registra esta preocupação:
“Embora esteja clara do ponto de vista legal a instancia de gestão das
Organizações Sociais com relação a composição e competências da Direção
Executiva (presidência/diretor geral e diretores) do Conselho de Administração e,
quando previsto, do Conselho Fiscal, o modelo OS ainda carece de confirmação
de sua constitucionalidade, e em conseqüência de sua governança.
Em decorrência desse fato um conjunto de incertezas quanto à sua operação e
principalmente seu futuro permanece sem uma definição que garanta a necessária
segurança jurídica.
Ainda que exista um indicativo de que será considerado constitucional em
esperado julgamento pelo STF, paira sobre o modelo uma série de
questionamentos que somente a manifestação daquela Corte poderá encaminhar
para uma solução, principalmente que garanta uma relação estável com o Estado
financiador.”
Por enquanto, ainda vence o voto-vista do ministro Gilmar Mendes, mantendo a
integralidade do texto, mas em decisão liminar. Questões como regime de contratação e
50
obrigatoriedade de cumprimento da Lei nº 8.666/93, notadamente, podem impedir os pressupostos
de aplicação de programa, no âmbito do sistema publicizado.
A indecisão cria problemas de toda ordem. Cartórios, por desconhecer a Lei das OS, vez por
outra, quando interposta a criação de uma nova organização social, negam o registro da associação,
posto que as enquadram em normas do Código Civil. Desconhecimento. A Lei que as rege é a de
número 9.637/98. Mas, também, não culpa isolada destas instituições. Sem estar transitado em
julgado, o lapso é normal.
No Congresso, estas entidades são tratadas como Organizações da Sociedade Civil de
Interesse Público - OSCIPs, embora erradamente enquadradas, as duas, lato sensu, no chamado
“Terceiro Setor”, ou seja, “entidades privadas não lucrativas que colaboram com o Estado no
desempenho de suas atividades” (Oliveira, 2009, p. 277).
Duas correções quanto à esta situação. Primeiro: OS e OSCIP não são a mesma coisa.
Segundo: para o caso das OSs de C&T apresentadas neste trabalho, quatro delas não podem nem ser
consideradas como do Terceiro Setor. Há que se olhar o objetivo de cada contrato para caracterizála como tal, ou não.
Sobre essa segunda incorreção, Oliveira (2009, p. 277) caminha numa direção que elimina
dúvidas. Senão, vejamos:
“O surgimento do Terceiro Setor pode ser justificado a partir de três
fundamentos: a) a passagem da Administração Pública imperativa para a
Administração Pública consensual; b) a consagração do princípio da
subsidiariedade; c) o fomento estatal às atividades privadas de caráter social”
(grifos inexistentes no original).
Os critérios, previstos nos incisos do artigo 3º da Lei das OSCIPs (9.790/99), que estabelece
as finalidades para uma entidade de Direito Privado, sem fins lucrativos, qualificar-se como de
interesse público, corrobora com a afirmação anterior e exclui as OSs do MCT deste rol, in verbis:
“Art. 3°
I - promoção da assistência social;
II - promoção da cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e
artístico;
51
III - promoção gratuita da educação, observando-se a forma complementar
de participação das organizações de que trata esta Lei;
IV - promoção gratuita da saúde, observando-se a forma complementar de
participação das organizações de que trata esta Lei;
V - promoção da segurança alimentar e nutricional;
VI - defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do
desenvolvimento sustentável;
VII - promoção do voluntariado;
VIII - promoção do desenvolvimento econômico e social e combate à
pobreza;
IX - experimentação, não lucrativa, de novos modelos sócio-produtivos e de
sistemas alternativos de produção, comércio, emprego e crédito;
X - promoção de direitos estabelecidos, construção de novos direitos e
assessoria jurídica gratuita de interesse suplementar;
XI - promoção da ética, da paz, da cidadania, dos direitos humanos, da
democracia e de outros valores universais;
XII - estudos e pesquisas, desenvolvimento de tecnologias alternativas,
produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e científicos que
digam respeito às atividades mencionadas neste artigo.”
Ora, as entidades discutidas nesta monografia, RNP, IMPA, ABTLuS e CGEE, tomadas por
seus objetivos, não se reconhecem em nenhum destes dispositivos, nem mesmo no inciso XII, que
vincula a atividade aos itens anteriores, consubstanciados, todos eles, de caráter social e subsidiário,
como elenca Oliveira. Das OSs de C&T, apenas o IDSM pode figurar na lista de Terceiro Setor,
pois presta os serviços postos nos incisos II, V, VI, VIII e IX. Assim, enquadra-se no critério XII.
Não é possível, desta forma, dizer, simplesmente, como tratado pela maioria dos autores,
inclusive Oliveira, que OS, lato sensu, é do Terceiro Setor. Vale ressaltar, novamente, a necessidade
de serem analisadas as metas pactuadas e os resultados esperados de cada entidade, conforme
previsto no decreto de qualificação e no contrato de gestão assinado com o órgão responsável.
O próprio conceito de subsidiariedade confirma o pressuposto social, fato inexistente no
pressuposto das quatro OSs citadas:
“A subsidiariedade eleva a sociedade civil a um plano na estrutura
organizacional do estado e concebe a cidadania como pressuposto básico para sua
realização, colocando a instância privada a serviço do interesse geral a partir,
também, da ideia de solidariedade, que se funda, principalmente, na maior
52
eficiência da ação social sobre a ação estatal junto a grupos menores (Torres,
2001, p. 15 apud Oliveira, 2009, p. 277).
Sobre a primeira incorreção, embora ambas criadas pela iniciativa privada, sem fins
lucrativos, detentores de certificado emitido pelo Poder Público e não pertencentes à Administração
Indireta, os dois procedimentos de qualificação têm muitas diferenças, conforme comparações da
CONAM - Consultoria em Administração Municipal (Figueira et al, 2008, p. 63) - Tabela 6.
OS x OSCIP
Atributo
Legislação
Objetivo
Atuação
Amplitude
legal
Relação
Contratação
Organizações Sociais
Lei nº 9.637/98 - Lei Federal
Gestão e execução de
serviços públicos
Poder Público sai da atuação
para que a OS execute o
serviço
É necessário que cada ente
federativo elabore sua própria
lei de qualificação das
entidades como OS35
Entidade substitutiva
Contrato de Gestão
Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público
Lei nº 9.790/99 - Lei Nacional
Serviços que atendem às necessidades coletivas
Poder público continua prestando os serviços paralelamente
às atividades realizadas pela OSCIP
Não é necessário que cada esfera de governo qualifique as
OSCIPs. Basta a federal
Entidade parceria
Termo de Parceria
Tabela 6
Paralelamente à inexistência de decisão aparece outra fragilidade muito bem identificada por
Alves, do IDSM. A situação por ela anotada se torna mais visível e recorrente pelo fato de o
Instituto situar-se em uma região isolada do país, o que provoca uma alternância muito grande de
auditores de contas que acompanham a execução do contrato e, no mais das vezes, a mudança do
inspetor, a cada ano, não o especializa para ação, condição que já não é muito fácil em se tratando
de C&T, mesmo para aqueles que batem ponto diariamente em busca de convênios,
descentralizações e destaques orçamentários, contratos administrativos e termos de parceria. Se não,
vejamos o que diz Alves (questionário, 2010):
35
Como exemplo da disseminação - estaduais e municipal deste modelo - “Diversos Estados e Municípios já possuem
suas leis. No Estado de são Paulo, tem-se a Lei Complementar nº 846/98 (alterada pela Lei Complementar nº 971/05) e
o Decreto nº 43.493/98; no Município de São Paulo, a Lei nº 14.132/06 (com alterações introduzidas pelas Leis
Municipais nos 14.482/07, 14.664/08 e 14.669/08 e os Decretos Municipais nos 49.462/08, 49.523/08 e 49.786/08
disciplinam a matéria; no Estado de Goiás, a Lei nº 15.503/05 dispõe acerca da qualificação das OSs; em Sergipe, temos
as Leis nos 5.217/03 e 5.28/04; no Distrito Federal, as Leis nos 2.415/99 e 2.523/00; na Bahia, a Lei nº 8.647/03 e o
Decreto nº 8.890/04; em Santa Catarina, as Leis nos 12.929/04 e 13.343/05 e o Decreto 3.294/05; no Município de
Barretos, a Lei nº 3.447/01; em Barueri, a Lei nº 1.360/03; no Município de Santo André, a Lei nº 8.294/01 e o Decreto
nº 14.905/03” (Figueira et al, 2008, p. 54).
53
“As principais resistências ao modelo são as decorrentes do poder público em
geral, através de seus órgãos de controle, que por desconhecimento do modelo e de
seus resultados não confiam plenamente no modelo. Algumas alegações vêm do
fato da OS não estar vinculada à lei 8.666. Os órgãos controladores acham, em
princípio, que existe uma facilidade maior para fraudes.
O interessante é que nas auditorias realizadas no IDSM nunca nenhum órgão
de controle encontrou algum problema na execução financeira e na obtenção dos
resultados acordados no Contrato de Gestão com o MCT.
A partir desse conhecimento eles passam a dar crédito de confiança para a
instituição. Ocorre que há uma mudança muito grande nos auditores e, no ano
seguinte, os novos avaliadores voltam com a mesma opinião e o nosso trabalho
acaba sendo de uma repetição cansativa para, mais uma vez, mostrarmos os
trabalhos como estão sendo executados.”
Sem essa decisão, fruto de preferência para inclusão na pauta, solicitada pelo presidente da
República, em 2009, na voz do então advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli, o
modelo, inseguro juridicamente, pode virar letra morta, nas três esferas de governo (alguns
exemplos na nota 37).
Do lado do TCU, impõe-se as cobranças comuns já adotadas pelas corte de contas;
transparência, responsabilização, auditagem independente, relatórios financeiros (receitas, despesa e
resultado operacional).
Obrigação real, posto que é dinheiro público - os artigos 70 e 71 da Constituição balizam a
idéia - mas que produz, ao mesmo tempo, um tratamento enviesado a uma Lei que confere
autonomia administrativa (focada, diretamente, em resultados metrificáveis que cumpram e
atendam a interesse público), de contratação e de compras às OS - artigo 37, § 8°, da mesma Carta a interpretando com atributos de regime público e, em casos muito especializados, C&T
notadamente, amparados por agentes que desconhecem completamente a área, apesar de
entenderem muito das leis nº 8.666/9336 e nº 8.112/9037.
Mesmo com a ideia importante acerca da presença da razoabilidade, em caráter geral, não
esmiuçado contabilmente, questiona, por exemplo, o TCU, o décimo primeiro termo aditivo do
36
37
Lei de Licitações e Contratos.
Regime Jurídico do servidor público.
54
CGEE em relação à “transparência de gastos”, ou seja, contabilidade detalhada de custos
comparados a preços de mercado (Processo n° TC 020.245/2008-1):
“a) ausência de análise e/ou crítica, por ocasião da assinatura do Décimo Primeiro
Termo Aditivo ao Contrato de Gestão firmado com o CGEE, acerca das
estimativas de custos apresentadas pelo Centro nas “Planilhas de Custos do Plano
de Ação 2007”, as quais não permitiam transparência de gastos exigida pelo
subitem 1.2 do Acórdão nº 2.742/2004 - Primeira Câmara, uma vez que não foram
elaborados de forma analítica, não permitiam qualquer conclusão acerca da
razoabilidade ou economicidade dos custos informados, não evidenciavam a
compatibilidade dos valores com os de mercado, nem estavam acompanhados de
detalhamento ou memória de cálculo a respeito das rubricas de gastos (Ofício
TCU, 2009, p. 2).”
Sobre esta exigência, de valores detalhados, faz-se necessário esclarecer que a dinâmica e,
em particular, o processo negocial, anterior à celebração de qualquer instrumento aditivo entre o
MCT, a Financiadora de Estudos e Projetos - FINEP e o CGEE, prepara a estimativa dos
recursos/custos envolvidos no instrumento aditivo e ainda a própria natureza, abrangência e foco
dos objetos e produtos tratados.
Superada a fase acima, passa-se à preparação de uma proposta de plano de ação preliminar
elaborada pelo CGEE para iniciar discussão, negociação e pactuação do mesmo com a alta
administração do MCT, já contendo o título e ementa das ações identificadas e uma estimativa de
gastos e prazos para sua execução.
Como em C&T prazos (geralmente ultrapassam o exercício financeiro anual) e valores
conexos para realização de estudos não são matematicamente planejáveis, ou contabilmente
mensuráveis, como pede o TCU, o que impera - e está apresentado na Lei - são estimativas de
preços e prazos próximos. O que dever ser cobrado são resultados e não contas, frise-se, novamente,
da mesma forma que foi posto no texto da Lei.
Resta ao Supremo resolver esta Lei. Passada esta etapa, as OSs, em qualquer governo,
proliferarão, mais na União, proporcionalmente, que nos Estados.
55
7. Adequado, mas precisa de ajustes
Passados 12 anos da inauguração do modelo de OSs, mesmo período em que tarda o
Supremo para julgar definitivamente a Lei que as instituiu, o sistema, pautado por flexibilização na
administração de recursos, fora do rito legal da Administração Pública, mostra resultados
convincentes, na forma imaginada inicialmente pelo MARE. Não é, entretanto, um mecanismo
administrativo acabado, completo. A Lei exige atualizações.
Simões (questionário, 2010) cobra este ajuste:
“Um modelo de gestão precisa ser desenvolvido e aprimorado continuamente.
De fato, os resultados obtidos com o modelo de organizações sociais é
extremamente positivo no nível federal, e em várias instâncias na sua adoção por
estados e municípios.
As fragilidades e problemas observados são necessariamente resultados a
serem corrigidos. Contudo, do ponto de vista do Estado brasileiro, persiste o
grande desafio de seu aprimoramento. Desde sua criação e adoção pelo governo
federal não houve avanços significativos capazes de viabilizar sua completa e
adequada regulamentação à luz da experiência adquirida. Desta forma, falta uma
formulação estratégica que enuncie como política pública do Estado o
desenvolvimento do modelo de organização social.”
Melo (questionário, 2010), do CGEE, mesmo elencando vantagens do sistema, lembra que
certas questões o prejudicam, como item a ser resolvido:
“Como desvantagem poderia ser mencionado o fato de que tendo seu
funcionamento dependente da formalização de uma contratualização, a instituição
terá necessariamente de conviver com uma certa instabilidade, a qual somente será
reduzida na medida que consolide sua atuação e conquiste prazos maiores em seus
contratos de gestão.
Também a cultura brasileira de emprego público além de eventuais
impedimentos de salários competitivos de mercado para atrair e manter pessoal
pode gerar instabilidade e perda de recursos humanos com relativa freqüência.”
Uma das alterações enquadra-se no alcance de áreas da Administração Pública
qualificáveis como organização social. A Lei nº 9.637/98 limitou o escopo da atuação a parcelas de
grandes segmentos do setor público, quais sejam atividades voltadas ao ensino, pesquisa científica,
56
desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação do meio ambiente, cultura e saúde, todas elas
não oferecidas exclusivamente pelo Estado (art. 1°)38.
Não há que se falar em ensino, como se as OS pudessem simplesmente ocupar-se de
organismos voltados à transmissão de conhecimento ou como diz Baranov (1989, p. 75) a
empenhar-se em "um processo bilateral de ensino e aprendizagem". Deve abarcar Educação, lato
sensu, permitindo que se constituam OSs nesta área voltadas, inclusive, para o desenvolvimento
institucional das unidades de ensino, de qualquer nível, preparação e acompanhamento de provas e
certames de acesso, livros didáticos e apostilas.
Da mesma forma, pesquisa científica e desenvolvimento tecnológico têm de ser tratados
como Ciência, Tecnologia e Inovação, inclusive C&T voltada à inclusão social. Permitirá que
muitas OSCIPs que atuam com expertise na área social sejam convertidas em OSs, garantindo a
elas, assim, fluxo contínuo de valores para funcionamento e aplicação de políticas públicas
inclusivas de C&T.
Proteção e preservação do meio ambiente passa ao status de Meio Ambiente, com
abrangência total sobre sistemas ambientais, preservação, bioprospecção, manipulação econômica,
manejo sustentável etc. Há que se acrescentar ao artigo outras duas atividades não exclusivas, quais
sejam Turismo, Desporto, Agropecuária e Comunicação.
Há que se corrigir um problema de origem. Enquanto a idéia original do modelo previa e
estimulava o aumento, no tempo, da participação privada no financiamento das políticas aplicadas,
o que se viu, após 12 anos, foi a estagnação desta proposta. Hoje, como dantes o ente público
contratante, exclusive pequenas parcelas de recursos e contratos com empresas interessadas nos
produtos desenvolvidos pelas OSs, é o responsável por quase 100% dos montantes destinados aos
projetos das entidades.
38
Não podem ser alcançadas por regimes de OSs as atividades exclusivas de Estado impedindo, assim, que
trabalhadores de entidades de direito privado atuem em atividades autorizadas ao uso do poder de polícia, regulação,
fiscalização, diplomacia, forças armadas e juridicidade previstas na Constituição (art. 247, CF).
57
Sendo assim, é fundamental a correção na representação da administração da organização
(art. 3°). Com a composição atual, ao poder público, que financia e arca com a responsabilidade na
aplicação dos recursos, fica designada a ocupação de 20% a 40% dos cargos de administração.
Mesmo quanto ocupado por 40% estes são divididos entre estado, municípios e União, dispersando
e fragilizando o órgão supervisor.
Como ente responsável pela totalidade dos recursos este deve participar com 40% das
cadeiras. Além disso, é importante que todas essas vagas - dos 40% e não da totalidade - sejam do
ente contratante (no caso em tela, o MCT), sem a convocação de representantes de outras esferas do
Poder Público.
Se acaso chamados, que ocupem as vagas dos 30% eleitos pelo conselho, como membros
indicados da sociedade civil, e não representantes dos 40% da cota pública. À entidade da sociedade
civil registrada como OS permanecer-se-iam os mesmos 60% previstos na Lei e a ela reservados.
Em nada modificar-se-ia a relação na representação sociedade civil e poder público, permanecendose intacto caráter da publicização ou sua matiz pública não estatal sem, necessariamente, ter a
aparência publica.
Com esta mesma impressão, deverão as OSs, posto que têm a permissão de uso dos bens
públicos para seu funcionamento (arts. 12 e 13, Lei nº 9.637/98) e contratação de servidores
efetivos do regime jurídico com direito a pró-labore, autorização herdada das Leis de Diretrizes
Orçamentárias de 2008 a 2011, manter nestes estabelecimentos prediais, equipamentos anexos e
resultados publicados a marca do órgão contratante, ao lado de sua própria insígnia. Não
descaracterizar-se-ia, em nenhum momento, sua face socializada. Firmar-se-ia, contrariamente, a
relação de parceira.
Esta correlação, da mesma forma, não pode ser estanque. Deve prever um reescalonamento
em relação ao aporte de capitais. Quanto maior o financiamento privado, menor o número de
participantes do órgão público, até o limite de um. Ou seja, quanto mais recursos privados
58
destinados à preparação de estudos, produtos ou processos uma OS receba, menor a participação da
representação pública no Conselho de Administração da OS.
Este processo estimularia, no mais das vezes, a retomada do pressuposto inicial, qual seja,
o estímulo e a ampliação da participação privada nas atividades desenvolvidas pelas entidades:
“elas receberão recursos orçamentários, podendo obter outros ingressos através de prestações de
serviços, doações, legados, financiamentos etc” (Di Pietro, 2009, p. 264).
Igualmente, enquanto o responsável pela maior parte dos recursos repassados for o ente
público, a remuneração da diretoria da OS não pode ultrapassar o valor teto do serviço público (art.
37, XI, CF).
Sobre isto, disciplina Di Pietro (2009, p. 269), como necessidade de enquadramento das
OSs aos princípios constitucionais: “e. imposição de limitações salariais quando dependam de
recursos orçamentários do Estado para pagar seus empregados; [...] ”.
No caso de servidor cedido para ocupar estes postos, as vantagens percebidas no órgão de
origem devem ser somadas à remuneração de cargo de direção, valendo, para este caso, também, o
limite constitucional. Há que se colocar este item na Lei, fato ausente. Se, de outro lado, a OS passa
a receber os recursos de origem privada, quanto mais alto este o for, menor o vínculo ao teto.
Inobstante os recursos elencados no contrato serem estabelecidos por estimativa, é
necessário incluir novo parágrafo ao art. 8° da Lei, prevendo a elaboração de nota de razoabilidade,
por parte do demandante do projeto, não necessariamente o órgão supervisor contratante,
relativamente aos valores da atividade. Como o regime é simplificado e flexível necessitar-se-ia, tão
somente, de três consultas de preços para o custo do evento realizado. Esta é uma proposta, não
muito operosa, do TCU, que não esbarra no modelo e lhe dá mais segurança e transparência de
gastos.
Há que se evitar, por fim, receio este também enfrentado na gênese do modelo, que certos
grupos se apoderem do organismo, criando feudos particulares, ora em cargos de direção, ora como
59
membros de conselhos, ora indicados por uma entidade, ora por outra, gerando distorções na gestão
do sistema OS.
Os mandatos para direção ou conselho nunca devem ultrapassar quatro anos, renováveis,
mesmo quando a indicação for feita por outra entidade da sociedade civil, ou quando for eleito
pelos demais conselheiros.
60
8. Conclusão
Não obstante as regras que estabelecem condições para implantação de organizações sociais
no Brasil datarem de 1998, sua discussão iniciou-se em 1995.
Quinze anos depois este modelo de contratação, seleção e operação sem as amarras normais
que regem a Administração Pública brasileira, Leis de Licitação e Regime Jurídico, notadamente,
continua, a despeito de espalhar-se por estados e municípios, como começou, indefinido.
Esta indefinição teve impacto muito maior na federação. A inexistência da garantia de
vigência da Lei que rege estas instituições simplesmente as impediu de expandir-se, restringindo a
cinco operadas por meio do MCT.
Áreas como Ensino, Meio Ambiente, Cultura e Saúde, outras quatro passíveis de adotar OSs
em colaboração à sua gestão ficaram reféns da decisão do STF. Meio ambiente e Ensino ainda
chegaram a implantar suas unidades, Bioamazônica e Roquette Pinto, respectivamente, mas foram
obrigadas, no tempo, a desfazer o contrato de gestão. Não apenas por falha da entidade associada ao
órgão, mas também pela própria entidade pública.
A dificuldade em operar e, principalmente, a deficiência em confirmar resultados a órgãos
de controle, imbuídos, independentemente do modelo aplicado, das regras da administração pública,
hoje faz falta, como opção de suporte, a estas áreas de governo.
Nem a própria atualização da norma, corrigindo alguns aspectos que se mostraram
incorretos no período, foi possível, visto a não validação pelo STF.
Decorre, então, desta insegurança jurídica, outro óbice que procrastina e questiona a
ampliação do sistema, qual sejam os reiterados questionamentos do TCU. Inexistindo norma,
discutem-se itens fundamentais de seu funcionamento (contratação e licitação).
61
Embora resolvidos em alguns casos, fato demonstrado pela existência de cinco OSs em
regime de contrato de gestão, a falta de decisão acerca da Lei pelo STF configura-se como o
obstáculo central para sua expansão, além do MCT.
Esta situação, tratada nesta monografia a partir das unidades federais, não é isolada, em
seu resultado, da multiplicação deste modelo em estados (aplicada em 21 deles) e municípios. Em
São Paulo, a Lei Complementar no 846/98 regulamentou a parceria com instituições filantrópicas,
caracterizado-as como OS, para firmamento de contratos de gestão com a secretaria de Saúde e
prestação de serviços na área médica.
No estado já são cinquenta e sete contratos realizados dessa forma, para realização de
internação, atendimento ambulatorial, casos de urgência e diagnósticos terapêuticos para pacientes
externos aos hospitais. Entre 1999 e 2003, o número de internações cresceu de 29,2 mil para 116,4
mil atendimentos. No regime ambulatorial, de 225,3 mil para 1,1 milhão. Nas ocupações de
emergência, em 1999, foram recebidas 1,0 milhão de pessoas; em 2003, 1,4 milhão (cf. Mendes,
2007).
Por enquanto, ainda vence o voto-vista do ministro Gilmar Mendes, mantendo a
integralidade do texto, mas em decisão liminar. Questões como regime de contratação e
obrigatoriedade de cumprimento da Lei no 8.666/93, notadamente, podem impedir os pressupostos
de aplicação de programa, no âmbito do sistema publicizado.
Sem essa decisão, o prejudicado não será apenas o estabelecimento federal, mas de igual
forma estados e municípios.
62
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