Esofagite Eosinofílica - Departamento de Otorrinolaringologia do

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Esofagite Eosinofílica - Departamento de Otorrinolaringologia do
Otorrinolaringologia/ E2 Yara Amaral Mannes – Hospital da Cruz Vermelha – Curitiba. Esofagite Eosinofílica Introdução Como otorrinolaringologistas, temos muitos pacientes que vêm ao consultório diariamente queixando-­‐se de disfagia. Muitas vezes pensamos em doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) e prescrevemos inibidores de bomba de protons. Justamente por isso, o refluxo tem sido associado a muitas outras patologias, tais como rinite, rinossinusite, otite média, laringite, hipertrofia linfóide, e até mesmo asma. Mesmo o DRGE contribuindo em muitas patologias de cabeça e pescoço, é preciso que pensemos: “O que mais pode ser?”. Neste artigo, a esofagite eosinofílica (EEo) será apresentada como algo a ser pesquisada, especialmente em pacientes que são resistentes às terapias padrão para disfagia. História A EEo foi inicialmente descrita em 1978, baseada em biópsias esofágicas, no entanto, por muitos anos pensou-­‐se que o RGE estivesse por detrás de sua fisiopatologia. Em 1980, Winter e colaboladores correlacionaram a eosinofilia intraepithelial (>1 eos/hpf) com pH, manometria, endoscopia e achados histológicos sugestivos da DRGE. Já Lee e colaboradores apresentaram uma série de 11 casos mostrando que em 91% dos pacientes com > 5 eos/hpf havia DRGE associado. No inicio dos anos 90, no entanto, um trabalho veio para revolucionar. Attwood, em 1993, fez um estudo retrospectivo de 12 pacientes submetidos a esofafografia, pHmetria, manometria esofágica e biópsia por endoscopia. Caracterizaram que pacientes eosinofílicos com altas (>/= 20 eos/hpf) e baixas taxas (< 20 eos/hpf). Em média, os pacientes deste estudo tinham 56 eos/hpf. Noventa e dois porcento dos pacientes tinham alto grau eosinofilia, mas nenhum deles apresentou DRGE (pHmetria confirmando). Curiosamente, 58% dos pacientes tinham algum tipo de doença alérgica. Este grupo foi comparado com 90 controles (pH sugestivo de DRGE), e apenas 48% apresentaram eosinofilia intraepitelial com uma média de apenas 3,3 eos/hpf. Este estudo abriu o caminho para outros mais novos, afim de refutar o DRGE como única causa de eosinofilia. Em 1995, Kelly et al. sugeriu uma causa diferente da doença. Avaliaram um grupo de 75 pacientes pediátricos com achado de refluxo que eram resistentes à terapia convencional e descobriu em biópsia que 31% tinham eosinofilia persistente. Dos 75 pacientes avaliados, 12 concordaram em prosseguir com um estudo prospectivo de uma dieta elementar durante 6 semanas. Após, 80% apresentaram resolução completa dos sintomas e 60% apresentaram resolução completa da eosinofilia na biópsia de repetição. A conclusão, então, foi que a EEo pode ocorrer mais associada a alergia alimentar de que a refluxo e que dietas elementares são muito eficazes no tratamento de sintomas em doentes resistentes à terapia convencional para disfagia. 20 de junho de 2013 Otorrinolaringologia/ E2 Yara Amaral Mannes – Hospital da Cruz Vermelha – Curitiba. Outras pesquisas começaram a olhar para a alergia como participante importante na fisiopatologia da doença. Pacientes tinham recaídas em épocas de pólen e mantinham-­‐se assintomáticos com EDA normal no inverno. Em 2003, a dieta elementar tomou de vez lugar no manejo de pacientes com EEo refratarios a tratamentos tradicionais. Markowitz e colaboradores avaliaram 51 crianças tratadas por 4 semanas com dieta elementar. Destes, 96% apresentaram redução dos sintomas, sendo o tempo médio para a melhora, de apenas 8 dias, com queda de 33,7 para 1,0 eos/hpf. No ano de 2007 o primeiro consenso para EEo foi publicado com critérios diagnósticos para a doença, os quais seguem na tabela 1. Presença de sintomas Achados histológicos Adultos Crianças Disfagia Azia Azia Disfagia Dor retroesternal Náuseas/vômitos Odinofagia Dor abdominal Regurgitação Regurgitação Impactação de alimentos Falha no tratamento 1. Pacientes devem ser biopsiados após 6-­‐8 semanas de supressão com IBP em tomadas diárias ou ter um estudo de pHmetria normal 2. Biópsias gástricas e duodenais normais 3. Biópsia esofágica com ≥15 eos/hpf Tabela 1. Mostrando critérios diagnósticos de EEo Segundo consenso de 2007. Epidemiologia e características da doença A EEo está se ocidentalizando, e sua incidência e prevalência crescendo: era de 0.5/100,000 em 1995 e passou a 8.9/100,000 em 2004. É mais comum em homens e sua faixa etária tem distribuição bimodal, acometendo adultos de 30 a 50 anos e crianças de 5 a 10 anos. É importante ressaltar que cerca de 50 a 70% dos casos de EEo estão associados a doença alérgica. Tratando-­‐se dos componentes hereditários nas crianças acometidas, 7% têm pais com EEo, 5% têm irmãos diagnosticados e ainda pode ocorrer uma associação com a expressão da Eotaxin. 20 de junho de 2013 Otorrinolaringologia/ E2 Yara Amaral Mannes – Hospital da Cruz Vermelha – Curitiba. Attwood e colaboradores, em 1993 questionaram-­‐se de a doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) seria realmente o causadoe da EEo. Foi feito um estudo retrospectivo em 12 pacientes, todos submetidos a esofafografia, pHmetria, manometria esofágica e biópsia por endoscopia. Dividiram os grupos em altas taxas de eosinofilia (>/= 20 eos/cga) e baixas taxas (< 20 eos/cga), e de acordo com esta classificação, 92% tinham altas taxas de eosinofilia mas com pHmetria normal e 58% tinha alergias ou asma associados. Diante deste estudo mostrando que o DRGE talvez não fosse o vilão, a alergia começou a ser investigada como causadora da EEo. Estudos como de Kelly e colaboladores vieram a corroborar com esta hipótese. Avaliaram 75 pacientes pediátricos com achado de refluxo que eram resistentes à terapia convencional. Destes, 31% tinham eosinofilia persistente. Doze destes pacientes foram submetidos a 6 semanas de dieta elementar (à base de aminoácidos livres, absorvidas no trato digestivo superior, sem fibras, teor reduzido de lipídeos, alto custo). Oitenta porcento dos pacientes tiveram resolução completa dos sintomas, 60% resolução completa dos achados histológicos, e a taxa de eosinofilia caiu de 41 para 0,5 eos/cga. Dez pacientes (dos 12) reintroduziram a dieta comum e houve retorno dos sintomas dentro de 1hr (dieta com leite de vaca, soja, amendoin, ovos, trigo). Ainda no sentido de reforçar a teoria alérgica, houve um relato de caso de homem com 21 anos com Eeo, asma e alergia documentados, sendo que a sua biópsia era normal no inverno e alterada em estações com pólen, o que induz-­‐nos a pensar que aeroalérgenos, e não somente os alimentos, são capazes de induzir a EEo. Resumidamente… O DRGE foi descartado como vilão… e a alergia assumiu este papel… e então estabeleceram-­‐se critérios diagnósticos (Tabela 1). Fisiopatologia Alergia É comum, mas nem todos a têm. Apresenta variações sazonais e há envolvimento das IL-­‐5 e IL-­‐13 que estão em excesso no esôfago de pacientes com EEo, e quando superexpressas estimulam maior quimiotaxia dos mastócitos e eosinófilos Genética A Eotaxina-­‐3 é um gene que se expresso em demasia (até 50 vezes mais) pode estar associado ao desenvolvimento ds EEo. Caracteriza-­‐se por ser um potente ativador e quimiotático de eosinófilos e é induzido pela IL-­‐13 para que haja maior proliferação intraepitelial e fibrose. Epitélio Esofágico 20 de junho de 2013 Otorrinolaringologia/ E2 Yara Amaral Mannes – Hospital da Cruz Vermelha – Curitiba. O esôfago é o único seguimento do trato gastrointestinal (TGI) sem eosinófilos. Trata-­‐se de um epitélio escamoso não queratinizado, e em caso de queratinócitos expostos diretamente ao conteúdo esofágico, estes ficam sujeitos a ação da eotaxina-­‐3, IL-­‐13 e IL-­‐5 EEo em crianças Apresentam mais sintomas sitêmicos (dor abdominal, irritação, nauseas, vômitos, etc) e mais incomum cursarem com estenoseso que reforça a teoria da EEo tratar-­‐se de uma doença crônica. É comum, no entando, que tenham pais com disfagia de longa data, estenoses esofágicas documentadas ou eosinofilia identificadas em biópsia. História natural da doença Há, geralmente, um intervalo de 4,3 anos entre o início dos sintomas e o diagnostic. É uma desordem restrita ao esôfago, não regride, e por ser prolongada promove o remodelamento esofaágico. Não cursa com transformações pré-­‐maligna ou malignas, e em mais de 20 anos de pesquisas não houve casos de mortalidade relacionados a EEo. A maioria dos pacientes (50%) precisa efetuar mudanças mínimas nos hábitos de vida, outra boa porção (47%) sequer modifica seus hábitos, mas há uma minoria (3%) que pode chegar ao extremo, de por exemplo, ter que trocar de emprego pois não pode ter almoços de negócios e onde se alimenta mal e favorece a EEo. Associações ORL Pode estar associada a rinussinusite, rinite alérgica, laringite, estenose subglótica, tosse recorrente, e na população pediátrica, em especial, pode estar associada a otite média crônica por efusão. Diagnóstico Diferencial 20 de junho de 2013 Otorrinolaringologia/ E2 Yara Amaral Mannes – Hospital da Cruz Vermelha – Curitiba. Faz diagnostic diferencial com alergias alimentares, DRGE, candidíase esofágica, doença inflamatória intestinal, doença celíaca, parasitose intestinal, síndrome de Churg-­‐Strauss, esclerodermia, síndrome eosinofílica, enteropatia autoimmune e esofagite viral (CMV/HSV). Achados de exame físico Dificilmente há sintomas somente esofágicos e é preciso confiar na história e na EDA com bx para fazer-­‐se o diagnóstico. Exames diagnósticos É importante ressaltar que nenhum teste é diagnostic ou pode predizer a evolução da doença. São eles: O
pHmetria O
Manometria esofágica O
Radiografia O
EDA com bx O
Testes alérgicos O
Exames laboratoriais  Eosinofilia periférica 
5-­‐50% dos pacientes com EE  Níveis de IgE 
O
Elevados em 70% das eosinofilias EDA com biópsia Nela, as alterações de mucosa são as mais variadas, sem nenhum “sinal patognomônico”, e desta forma fica difícil diagnosticar-­‐se somente com este exame. Faz-­‐se necessário a biópsia. Alguns podem ser os achados sugestivos na EDA: franzido irregular, placas leucoplásicas, edema, cisalhamento, friabilidade, mucosa em aspecto de papel crepe, calibre esofágico reduzido e anéis mucosos concêntricos 20 de junho de 2013 Otorrinolaringologia/ E2 Yara Amaral Mannes – Hospital da Cruz Vermelha – Curitiba. Vale ressaltar que em 30% das crianças e 9% dos adultos ela é normal. As biópsias devem, ser feitas em esôfago proximal e distal, sendo que em número de 4 em crinaças e 5 em adultos para garantir uma sensibilidade de 100% (distal é 5 cm acima da junção escamocolunar e proximal é 10 cm acima da distal) Achados na histologia Os achados mais comuns são: >15 eso/cga, espessamento da camada basal, estratificação na superfície, micro abscessos (>4 eos agrupados) e degranulação eosinofílica. Testes alérgicos O Prick test (IgE mediada) é standard e com resultados consistentes. Identifica: ovo, leite, soja, trigo, amendoim, feijão, centeio e carne. Complicações da EEo A impactação de alimentos é a mais comum, pode persistir por horas, ocorrendo em 60% dos pacientes, sendo que um dado importante a se saber é que 50% dos pacientes com impactação esofágica tem EEo. Oas mais comumente presos são arroz e carne. Caracteriza-­‐se por desconforto retrosternal, hipersalivação e disfagia. Estreitamentos esofágicos são visíveis a EDA em 57% dos casos, e são menos comuns em crianças (6%) Outra complicação menos comum é a candidíase, ocorrendo após corticoterapia. Ela exacerba a disfagia e antifúngicos auxiliam na melhora da sintomatologia. Rotura esofageana (Boerhaave) é incomum, tendo apenas 3 casos de rotura expontânea relatados em literatura. Dois após vômitos incoercíveis por gastroenterite, e um após vomitar alimento impactado. Embora incomum exige atenção, especialmente em pacientes crônicos. Tratamento 20 de junho de 2013 Otorrinolaringologia/ E2 Yara Amaral Mannes – Hospital da Cruz Vermelha – Curitiba. Modificações na dieta, corticoterapia cia oral e tópica, anti-­‐leucotrienos, dilatações recorrentes e inibidores de bomba de protons são as alternativas mais utilizadas. De 92 a 98% dos pacientes tem reposta satisfatória tanto sintomática como histológica a mudanças na dieta, sendo aceita a reintrodução gradual dos alimentos acompanhada por EDA + biópsia repetida após cada 5-­‐7 novos alimentos. No entanto, obviamente, causa trantornos, mas é melhor aceita que as dietas elementares. Os alimentos mais alergenos são os laticínios, soja, ovo, trigo, carne, amendoim e milho. Após as mudanças na dieta o CTD tópico é asegunda opção. Cursa com resolução clínica e histológica em semanas. A mais usada é a fluticasona (880ug/d 1-­‐10 anos; 1760ug/d >10 anos). Já os CTD sistêmicos são optados em casos refratários e exacerbados, sempre associados a CTD tópico (prednisona 1mg/kg/d, max 60mg/d) A dilatação esofageana é a última escolha, feita quando o tratamento clínico falha ou se há impactação de alimentos. O risco de perfuração esofágica ja foi relatado, mas segundo Jacobs e Spechler, em 2010, em uma revisão sistemática de 671 dilatações em pacientes com Eeo, foi verificada apenas uma perfuração durante o procedimento (0.1%) Os IBP devem sempre ser utilizados, talvez por auxiliar na sintomatologia, ou ainda por um hábito que vem da época em que o grande vilão da EEo era a DRGE. Outras terapias consistem no uso do montelucaste, anticorpo monoclonal e anti-­‐TNF-­‐β, todos ainda sem estudos perfeitamente conclusivos. No futuro aguardamos por marcadores não-­‐invasivos da doença. 20 de junho de 2013 

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