Edição 22 Valeu a pena o investimento?

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Edição 22 Valeu a pena o investimento?
Impresso Especial
9912247598/2009-DR/BA
CRIARMED
a Revista dos Líderes da saúde do brasil
PROIBIDA
VENDA
aNO iv | n º 22 | jUL/aGO 2013 | r$ 50,00
E X E M P L A R
ASSINATURA
D E
mais de R$ 11 milhões
foram investidos
pelas operadoras
de saúde nas últimas
eleições
VALEU A PENA O
INVESTIMENTO?
a pouco mais de um ano das próximas eleições, levantamento inédito
da revista Diagnóstico revela o desempenho de congressistas que
receberam financiamento da saúde suplementar para se elegerem
04
Diagnóstico | jul/ago 2013
Diagnóstico | jul/ago 2013
05
06
Diagnóstico | jul/ago 2013
SUMÁRIO
Divulgação
08
57
ENTREVISTA
Florentino Cardoso
O presidente da Associação Médica
Brasileira (AMB) fala sobre o Programa
Mais Médicos e o desempenho do governo
16
58
ENSAIO
McKinsey
ENSAIO
60
E. Mesquita e D. Schout
Maisa Domenech
BOAS PRÁTICAS
Fidelização
Desafio de cativar clientes exige dos
hospitais agilidade, personalização e
qualidade no atendimento
ARTIGO
08
Eduardo Najjar
A emoção pode atrapalhar as decisões
tomadas em empresas com capital
controlado por familiares
26
ARTIGO
Todos os anos, milhares de pacientes sofrem
danos irreversíveis por falta de segurança
nos procedimentos
Assessores médicos da Anahp escrevem
sobre governança clínica e a jornada
contínua em busca da excelência
25
Susana Falchi
Com alto índice de corrupção, o setor
médico-hospitalar precisa mapear o perfil
dos executivos que entram para o ramo
Especialistas em gestão hospitalar apontam
o comportamento dos pacientes como um
eixo na redução de custos do sistema
22
DIRETO AO PONTO
FLORENTINO CARDOSO,
PRESIDENTE DA amb:
críticas ao governo
Valter Campanato/ABr
ENTREVISTA
Ena de Araújo
Pedagoga da Etesb defende uma gestão
menos verticalizada e com decisões
colegiadas
30
ENTREVISTA
Tracey Cooper
Presidente da ISQua – a acreditadora
das acreditadoras – diz que os hospitais
precisam reconhecer os próprios erros
39
ARTIGO
Paulo Lopes
Headhunter escreve sobre o desafio de
capacitar os líderes para assumirem o papel
de gestores da empresa
40
ESPECIAL
Visões da América
Victor Raúl Castillo Mantilla, da Fundación
Cardiovascular de Colombia, defende
investimentos em pesquisa
46
EMPREENDEDORISMO
MV
64
50
ENSAIO
CARO GESTOR
Osvino Souza
70
Especialista fala sobre como lidar com
a inquieta e hedonista Geração Y, que
começa a ocupar cargos de gestão
52
Paulo Magnus, um ex-engraxate do
interior gaúcho, deixou a terra natal para
ganhar o Brasil
48
CONGRESSO NACIONAL: doações fazem
parte do “custo da democracia”
ARTIGO
Fernando M. Machado
Espaços híbridos que mesclam instalações
tradicionais com diagnóstico por imagem
e cateterismo estão em alta nos EUA
76
Mercado de diagnóstico remoto gira em
torno de US$ 200 bilhões
54
CUSTEIO
Robert Pearl
Folha de pagamento
O atual modelo de ensino da medicina,
que inibe a criatividade, deveria buscar
inspiração nos homens de negócios
Projeto que reduz a carga horária dos
enfermeiros deve criar um déficit de R$ 7
bilhões nas contas dos hospitais
DESIGN
Salas de cirurgia
ÁFRICA
Ajuda humanitária
Bicicletas e motos driblam a falta de
transporte e conduzem pacientes e remédios
84
RESENHA
Saúde pública
Médicos Revolucionários revela as proezas
do modelo de saúde comunitária da
Venezuela de Hugo Chávez
EDITORIAL
Fu Xuepeng, Moses
Drileyo e o acesso à saúde
O
jovem chinês Fu Xuepeng tinha 25 anos quando ficou paraplégico ao colidir sua moto com um carro, enquanto ia a um supermercado. Incapaz de respirar sem a ajuda de um aparelho,
passou a ser cuidado em casa pelos seus pais. Apesar de viver
em um dos países que mais geram riqueza no mundo, a família
de Fu não pôde ter acesso a um serviço público de home care
para cuidar do seu ente querido. Em vez disso, ele teve que depender de um ventilador manual com um tubo de respiração em sua via aérea. Seus
pais e duas irmãs passaram a se revezar para espremer um saco ressuscitador 18 vezes
por minuto. A única pausa era à noite, quando um ventilador mecânico improvisado
– criado artesanalmente pelo irmão mais novo de Fu – era ligado. O alto custo da
eletricidade na China, contudo, restringia o uso do equipamento ao período da noite.
A história de Fu foi partilhada nos quatro cantos do mundo, há cerca de quatro meses.
O caso sensibilizou uma fabricante chinesa de respiradores artificiais, que doou um
equipamento à família.
No último mês de julho, um outro caso – com menos repercussão – voltou a ser
um exemplo de saúde medieval, em pleno século XXI. O garoto ugandense Moses
Drileyo brincava com seus amigos em uma área rural, no norte do país, quando caiu
de uma árvore. Com o choque do seu peito contra o solo, o menino ficou com dificuldades para respirar. A família entrou em pânico porque não havia como levar o
jovem ao hospital mais próximo, que ficava a 40 quilômetros de distância do local
do acidente. Com uma população superior a 193 mil pessoas, o distrito de Maracha
(Uganda) – leste da África –, onde aconteceu a queda de Moses, é servido por apenas
uma ambulância, que não estava nas proximidades de sua casa. E mesmo se o veículo
fosse utilizado, a família do garoto teria que arcar com as despesas do combustível –
uma tarifa de US$ 32 –, equivalente ao salário por duas semanas de trabalho de um
morador da região. Moses acabou sendo salvo também pela solidariedade. O socorro
foi feito por uma zambulância – como ficou conhecido o projeto de uma ONG americana que tem usado a bicicleta para salvar a vida de milhares de africanos. O assunto,
aliás, é tema de reportagem especial da edição que chega às mãos do leitor.
No Brasil, as zambulâncias são Fiat Uno, que acabam sendo usados como ambulância no Nordeste brasileiro para transporte de pacientes, em muitos casos com quadros graves de saúde. A jornada, quase sempre, é rumo a hospitais em capitais como
Salvador, Fortaleza e até Brasília. Trata-se de brasileiros reais, que quase sempre são
obrigados a agir por conta própria diante de um veredito rotineiro nos rincões do país:
ou o paciente é transferido para um hospital com melhor estrutura, ou vai morrer. E,
claro, como bom nordestino, é melhor morrer na estrada em busca de ajuda do que
inerte.
Três histórias de uma saúde desigual, com nuances que, de tão espetaculares, chegam a induzir à ficção. Mas elas podem servir de inspiração – como as zambulâncias
– para os que ainda acreditam em uma saúde universal e de qualidade. E que dependa
menos da solidariedade. E mais da razão.
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refletem necessariamente a opinião do veículo.
CORREIO
[email protected]
As dificuldades da saúde inglesa, que
sempre foi uma referência de serviço público de qualidade,
mostram o tamanho do desafio que as nações do mundo
inteiro têm pela frente para equacionar uma conta que insiste
em não fechar
Matias Morelli, São Paulo-SP
Capa
saúde inglesa
A opinião pública da Inglaterra tem tido papel decisivo na
manutenção do NHS, mesmo
com as reformas propostas
pelo atual governo. Trata-se
de um patrimônio britânico, e como tal, precisa ser
preservado. Nós, brasileiros,
deveríamos defender o nosso
SUS com o mesmo empenho.
Teríamos, certamente, uma
saúde pública imensamente
melhor.
Alexandre Macedo, São
Paulo-SP
A Diagnóstico surpreendeu
mais uma vez os seus leitores
com uma capa de extrema
beleza e que traduzia, apenas
com a imagem, o desafio
de financiar a saúde de um
mundo cada vez mais repleto
de idosos.
Augusto Caminha, Rio de
Janeiro-RJ
O “Dilema Inglês”, que foi
o título de capa da última
edição da Diagnóstico,
mostra bem como o Brasil
precisa fazer a lição de casa,
diante de desafios semelhantes enfrentados por outras
nações. Reportagens como
essa precisam servir de alerta
para nossos dirigentes, seja
da saúde suplementar ou
pública. É algo como “efeito
Orloff”: eles são a nossa
realidade amanhã.
Clécio Montalvão,
Porto Alegre-RS
Parabéns à equipe de arte da
Diagnóstico pela plástica e
beleza da capa da edição 21.
Não precisava dizer mais
nada.
Arlindo Crespo, Brasília-DF
Entrevista
THOMAS DOLAN
Não conhecia a Ache e fiquei
impressionado pela envergadura de uma instituição com
mais de 40 mil membros,
executivos e dirigentes da
saúde dos Estado Unidos. Dá
bem a dimensão da importância que a gestão tem na maior
economia do planeta.
Adalberto Alcântara, Rio de
Janeiro-RJ
Concordo plenamente com
o senhor Thomas Dolan, ao
defender a inclusão de mais
mulheres na carreira de gestoras do mercado de saúde. O
ambiente marcadamente masculinizado já se provou pouco
eficiente para lidar com temas
tão sensíveis. Tenho certeza
de que as mulheres podem
contribuir mais com atributos
que são bem característicos
da essência feminina, como
honestidade e transparência.
Entrevista
roberto d’Ávila
Foi com admiração que li a
entrevista desse prestigioso
veículo com o presidente do
CFM, Roberto D’Ávila. É
realmente importante que
dirigentes de classe comecem
a incluir em suas pautas as
discussões relacionadas a desvio de conduta de seus pares.
Trata-se de um assunto com
imensa gravidade e que atinge
toda cadeia produtiva do setor
com resultados maléficos para
todos.
Helena Sanches,
Curitiba-PR
Gestão
prática médica
Muito educativo o artigo “O
que a Toyota pode ensinar
à sua equipe”. Nós, que
atuamos no setor de saúde,
estamos quase focados nas
especificidades do mercado
de saúde e não nos damos
conta de como podemos evoluir pensando fora da caixa.
Está aí a Toyota para nos
ensinar que muitas soluções
para os nossos problemas já
foram resolvidas por empresas de outros segmentos.
A. S., Brasília-DF
Resenha
Biografia
José R. Fernandes, Recife-PE
Artigo
anahp
Louvável a iniciativa da
Anahp em dialogar com os
demais atores do mercado
de saúde em prol de uma
lógica de remuneração
justa para ambas as partes.
Em um mercado quase
sempre marcado pelo
recrudescimento das relações,
nada mais esperançoso
do que ver o diálogo
prevalecendo.
Everton Soares, São Paulo-SP
Comprei o livro Sonho
Grande após ler a resenha
publicada na Diagnóstico. De
fato, valeu cada centavo do
investimento. Empresários, de
verdade, sempre serão fonte
de inspiração para novos e
velhos empreendedores. O
que Jorge Paulo Lemann,
Marcel Telles e Beto Sicupira
construíram pode ser descrito
como um “império heroico”,
em um país onde ser empresário é quase um pecado,
punido com os maiores impostos do mundo e legislação
jurássica.
Pepe González,
São Paulo-SP
Diagnóstico | jul/ago 2013
09
Divulgação/AMB
ENTREVISTA
FLORENTINO CARDOSO
PRESIDENTE DA AMB,
FLORENTINO CARDOSO: a face
mais conhecida da oposição
ao programa Mais Médicos, do
governo federal
“Não sou
candidato a
nada”
Presidente da Associação Médica Brasileira, o cearense Florentino Cardoso admite que
não votou no PT nas últimas eleições presidenciais, garante não ter pretensões políticas
fora da AMB e avalia a gestão de Padilha como ruim: “De 0 a 10, dou nota 2”
Q
Reinaldo Braga
uando tomou posse,
em outubro de 2011,
no Theatro Municipal de São Paulo
lotado, o cearense
Florentino Cardoso
– atual presidente da
Associação Médica Brasileira (AMB) –
certamente não previa que sua gestão seria protagonista de um dos capítulos mais
importantes da militância médica brasileira. Cirurgião geral de formação e eleito
para um mandato de quatro anos, Cardoso
se tornou a face mais conhecida da oposição ao Programa Mais Médicos, ao lado
do presidente do CFM, Roberto d’Ávila.
Sem meias palavras e com críticas quase
sempre ácidas ao ministro da Saúde, Alexandre Padilha – a quem ele atribui nota
2, em uma escala de 0 a 10 –, o dirigente
vem ocupando boa parte de sua agenda
no últimos meses com a participação em
um sem-fim de programas de TV, entrevistas e debates sobre o futuro da saúde
no país – além, é claro, da presença em
protestos Brasil afora. “Não gosto de política partidária. E não tenho pretensão de
me candidatar a nenhum cargo público”,
faz questão de avisar o dirigente, para
quem acha que seu desempenho é típico
de político em campanha. Interlocutores
próximos ao dirigente admitem, contudo,
que a gestão de Cardoso alçou a AMB a
um status político sem precedente na história da entidade. Desde que a AMB foi
criada, em 1951, pelo então presidente da
Academia Paulista de Medicina, Jairo de
Almeida Ramos, os pilares da associação
sempre foram o apoio ao desenvolvimento científico e, de forma moderada, à luta
pela dignidade no exercício profissional.
“Os médicos estão mais politizados e
muito mais unidos neste momento”, justifica Cardoso, que admite não ter votado
no PT nas últimas eleições presidenciais.
“Nunca votei em partido. Voto em pessoas”, resume ele, que nasceu na cidade de
Crateús – sertão cearense –, onde também
a população sofre por falta de médicos.
De Brasília, Cardoso concedeu a seguinte
entrevista à Diagnóstico.
Revista Diagnóstico – Historicamente,
os médicos sempre se julgaram pouco
unidos na defesa de interesses ligados à
categoria. O que mudou?
Florentino Cardoso – Acho que os médicos estão muito mais unidos, sim. E as
recentes medidas propostas pelo governo, como obrigar a residência médica no
sistema público de saúde, extensão por
decreto da graduação médica de seis para
oito anos, além da importação de médicos
formados fora do Brasil – sem a devida
revalidação do diploma –, motivaram a
reação da categoria. Afinal, trata-se de
graves ameaças não somente aos médicos, mas especialmente à saúde da população brasileira.
Diagnóstico – A AMB está mais politizada?
Cardoso – Acredito que os médicos estão mais politizados e a população se in-
teirando da realidade social brasileira de
forma mais intensa. Há algum tempo a
AMB tem alertado as autoridades sobre
a deterioração da saúde pública brasileira. Apresentamos várias sugestões, mas
o governo ignorou todas. Entre as motivações do caos instalado na saúde brasileira, a AMB apontou três principais
causas: o subfinanciamento, má gestão
e a corrupção. Em nenhum momento o
governo lançou mão de uma medida provisória para atacar esses problemas.
Diagnóstico – Os entraves na saúde
brasileira eram menores nos governos
que antecederam o PT?
Cardoso – O que podemos dizer com
toda certeza é que nos últimos dois ou
três mandatos de governos petistas o financiamento da saúde publica, no que se
refere ao percentual investido pelo governo federal, vem gradativamente diminuindo. Há 12 anos, a União contribuía
com pouco mais de 60% do montante.
O restante correspondia aos estados e
municípios. Atualmente, o governo federal investe 44% (estados e municípios,
56%). Sabemos que o Brasil tem uma
elevada carga tributária e quem mais
arrecada recursos é o governo federal.
Mesmo assim, o poder central vem paulatinamente se desonerando em relação
aos recursos em saúde e sacrificando estados e municípios.
Diagnóstico – A CPMF poderia ter mudado o setor de saúde?
Diagnóstico | jul/ago 2013
11
ENTREVISTA
FLORENTINO CARDOSO
Cardoso – Sim, mas não foi o que ocorreu. Afinal, quando foi criada, a CPMF
tinha como único propósito aumentar os
investimentos públicos em saúde. Algo
que, todos sabem, não foi feito. O governo, aliás, passou a utilizar esses recursos
para outros fins. A cada R$ 10 milhões
que entravam no orçamento da saúde
arrecadados com o imposto do cheque,
outros R$ 10 milhões deixavam de ser
repassados pelo governo. A CPMF se
transformou em um grande engodo, por
parte do governo, junto à população.
Diagnóstico – Alguns analistas acham
que o tom das críticas de lado a lado
– governo e entidades representativas
dos médicos – pode tornar o debate
sobre o financiamento da saúde, que é
legítimo, em algo irracional. O senhor
concorda?
Cardoso – Não, porque a decisão sobre
a questão está agora nas mãos do Congresso Nacional. Há dois anos, o governo teve a chance de mudar a história da
saúde desse país, com a regulamentação
da Emenda 29. Mas preferiu vetar a proposta que previa o repasse para a saúde
de 10% da receita corrente bruta da arrecadação federal. Diante disso, a AMB
decidiu insistir na proposta via projeto
de lei de iniciativa popular, lançado em
fevereiro de 2012, e encampado por outras entidades – mais de dois milhões de
assinaturas foram coletadas. O objetivo
agora é fazer o Congresso Nacional se
sensibilizar com o clamor das ruas.
Diagnóstico – O senhor acredita que falta representatividade dos médicos no
Congresso Nacional?
Cardoso – Não diria que há carência de
representantes da categoria. Temos vários
médicos no Congresso Nacional. Mas as
duas casas (Câmara e Senado) deveriam
olhar mais para o povo. O que a sociedade está querendo? Melhorias na saúde
pública. Isso passa por investimento, infraestrutura, condições adequadas de trabalho e remuneração digna. Uma atenção
legítima não somente para que os médicos, mas todos os profissionais de saúde,
possam se deslocar dos grandes centros
para as periferias e pequenas cidades. O
que não podemos admitir é o governo
dizer, por exemplo, que não há médicos
em 700 cidades no Brasil. A AMB pediu
reiteradas vezes que o Ministério da Saúde coloque em seu site quais são as 700
12
Diagnóstico | jul/ago 2013
cidades brasileiras que não têm médicos.
Trata-se de uma informação que precisa ser esclarecida, já que o governo diz
muitas coisas que não são verdadeiras. É
preciso haver mais transparência sobre
a questão.
Diagnóstico – A tese de sabotagem do
Mais Médicos, defendida pelo governo,
procede?
Cardoso – O governo precisa provar o
que diz. Esse é um fato. O Ministério da
Saúde precisa provar quem sabotou. E,
se houve delito, que se utilize a legislação brasileira, faça-se a devida apuração,
e os culpados sejam punidos. Defendemos a legalidade e a cortesia. E o gover-
MINISTRO DA SAÚDE,
ALEXANDRE PADILHA: tom
crescente de críticas de lado
a lado (governo e entidades
de classe) não prejudica o
debate, garante o presidente
da AMB, Florentino Cardoso
no, na contramão, tem dito coisas que
não são verdadeiras. Queremos saber
como o governo chegou a este número
(municípios brasileiros sem médicos).
Recebemos várias denúncias de prefeituras que demitiram e estão demitindo
esses profissionais para criar déficit de
médicos. É um artifício usado pelos municípios para desonerar seu custeio com
a saúde, já que os gastos com os profissionais do Programa Mais Médicos são
integralmente assumidos pelo governo
federal. O fato, aliás, foi amplamente divulgado nas redes sociais (posteriormente, na grande imprensa).
Diagnóstico – O senhor fez uma denún-
cia grave contra a Escola Latino-Americana de Medicina (ELAM), sediada em
Cuba, e que estaria a serviço do PT, formando médicos militantes do partido,
com dinheiro brasileiro. O senhor chegou a dizer que a entrada desses profissionais atenderia a interesses políticos
do governo. Não teme, com isso, ser
visto como um dirigente pró-oposição?
Cardoso – Não, porque somos partidários da verdade.
Diagnóstico – O senhor tem como provar?
Cardoso – Qualquer cidadão que colocar no Youtube a expressão “estudantes
brasileiros na ELAM em Cuba” vai se
Elza Fiuza/ABr
Não votei em
Dilma, mas isso
não tem nenhuma
relevância. Aliás, nunca
votei em partido. O
que significa dizer que
voto em candidatos
não necessariamente
da mesma legenda.
Não tenho ideologia
de nenhum partido A,
B, C ou D. Nunca tive.
Já votei, inclusive, em
prefeito e deputados
do PT
deparar com vários depoimentos dos
próprios estudantes dizendo como foram
selecionados.
Diagnóstico – O senhor votou em Dilma
nas últimas eleições?
Cardoso – Não votei em Dilma, mas
isso não tem nenhuma relevância. Aliás, nunca votei em partido. Voto em
pessoas. O que significa dizer que voto
em candidatos não necessariamente da
mesma legenda. Não tenho ideologia de
nenhum partido A, B, C ou D. Nunca
tive. Já votei, inclusive, em prefeito e
deputados do PT.
Diagnóstico – Que nota o senhor daria
ao ministro da Saúde, Alexandre Padilha, em uma escala de 0 a 10? Há acertos?
Cardoso – Dois. Pela educação dele.
Diagnóstico – O senhor não vê nenhum
acerto em sua gestão?
Cardoso – [Pausa] Acerto... ele é uma pessoa muito bem educada e gentil, mas não
vejo acertos. Dos programas que o miDiagnóstico | jul/ago 2013
13
ENTREVISTA
FLORENTINO CARDOSO
nistério lançou na atual gestão, nenhum
foi adiante. Todos foram um fracasso.
No projeto Mais Médicos, a impressão
que temos é que a ideia surgiu e não foi
desenvolvida. Só há início, fumaça e fogos. E, em contraste a tudo isso, somos
cada vez mais um país atrasado do ponto
de vista da saúde pública. A hanseníase,
por exemplo, é uma doença citada na Bíblia. Mesmo assim, o Brasil é campeão
em hanseníase – uma doença curável. A
mortalidade materna e a incidência do
câncer no colo produzem escores de ineficiência cada vez mais crescente. Sempre torci muito que o país crescesse. E,
claro, como brasileiro, quero que o país
tenha sucesso. Mas efetivamente não é o
que vem acontecendo. Mas há esperança. E a reação da sociedade, indo às ruas
para exigir saúde, educação, segurança e
mobilidade, é um alento. Somos um país
que engatinha.
Valter Campanato/ABr
14
Diagnóstico | jul/ago 2013
Diagnóstico – O senhor acredita que
Adib Jatene se desgastou perante os
seus pares ao defender a extensão do
ensino médico proposto pelo governo?
Cardoso – Não avaliamos dessa maneira. Defendemos que todos têm o direito
de opinar e dar sugestões, especialmente
uma pessoa que tem a idoneidade e a integridade que o ex-ministro possui. Apenas pensamos um pouquinho diferente
sobre questões defendidas por ele. Em
outras, há similaridade.
PROTESTO CONTRA O
PROGRAMA MAIS MÉDICOS
EM BRASÍLIA: número
de municípios brasileiros
desassistidos estaria sendo
inflacionado para justificar
a vinda de profissionais do
exterior
Diagnóstico – Qual o ponto de convergência?
Cardoso – Quando o ministro Janete diz
que não se pode abruptamente estabelecer que um curso de medicina passe de
seis para oito anos, há uma concordância. Aliás, não existe país no mundo com
essa equivalência. Temos também a impressão de que algumas frases proferidas
por Jatene vêm sendo usadas pelo governo de maneira inadequada.
Diagnóstico – Na Inglaterra e Suécia,
os recém-formados trabalham dois
anos no sistema público de saúde.
Cardoso - É verdade. Mas eles trabalham em que posição? Com que remuneração? Exercem a profissão como
médicos formados? Presumo que em
condições de infraestrutura completamente diferentes das nossas. O que nos
induz a situações distintas. Do contrário, teríamos que usar o percentual do
PIB que a Suécia ou o Reino Unido investe na saúde e que parcela desse montante os seus governos centrais contribuem com financiamento do sistema.
Não por acaso, vários médicos brasileiros deixam o Brasil para trabalhar em
outros países que oferecem melhores
condições de trabalho.
Diagnóstico – O senhor acha que os
médicos têm alguma parcela de culpa
pelo estado em que se encontra a saúde brasileira?
Cardoso – Não nos eximimos de responsabilidades. Sou um médico que
nasci numa cidade pequena do interior
do Ceará, chamada Crateús. Saí de lá
com 11, 12 anos, para estudar na capital, Fortaleza. Fiz residência em cirurgia oncológica, e o meu pensamento era
me formar em medicina e voltar à minha cidade, que atualmente possui mais
de 70 mil habitantes. Infelizmente, não
consegui voltar.
Diagnóstico – Por quê?
Cardoso – Me fixei na capital, Fortaleza, porque é essa a escolha que os médicos acabam sendo obrigados a fazer.
É nas grandes cidades que se dispõe das
melhores condições de trabalho. Indícios fortes mostram que, para o médico
se fixar no lugar, são necessários pré-requisitos básicos. E o mais importante, dentre todos, é a possibilidade desse
profissional se reciclar. O segundo ponto mais importante é condição adequada
de trabalho. A Universidade Federal do
Ceará, por exemplo, possui médicos em
seus quadros que recebem salário muito
abaixo do mercado. Mas a recompensa
por se atualizar e se reciclar é maior. O
terceiro ponto é a satisfação. O que mais
impacta para o médico não é quanto ele
está ganhando e sim se ele pode se de-
senvolver profissionalmente. Afinal, os
médicos se formam com o compromisso de sempre oferecer o melhor aos seus
pacientes. Cinco anos sem se atualizar
já é suficiente para um médico reduzir
à metade o seu conhecimento científico. Por isso tudo, insistimos na tese de
que o Brasil precisa verdadeiramente
melhorar a sua estrutura de saúde e oferecer condições favoráveis para o exercício da medicina.
Diagnóstico – O município gaúcho de
Carlos Barbosa, na Serra Gaúcha, fica
em uma das regiões mais ricas do país,
tem uma infraestrutura boa e ainda
assim a prefeitura não consegue atrair
médicos. A que o senhor credita essa
dificuldade?
Cardoso – Não posso avaliar com precisão, pois não conheço a realidade da
cidade, que, por sinal, não é muito distante da capital, Porto Alegre. Por meio
de fotos, vi que a estrutura existe e parece ser conveniente. A foto, de fato,
é bonita. E, imagino, por dentro deve
haver ótimas condições de trabalho. É
possível ainda que o médico tenha boa
remuneração. Mas, como explanei, isso
não é tudo. Aliás, é preciso também dizer que nem sempre o que se diz sobre
os valores pagos aos médicos é verdade.
Pode explicar?
Cardoso – Vou dar um exemplo. Há nos
jornais anúncios de salários oferecidos
a médicos de até R$ 20 mil. Só que a
oferta não é verdadeira. Em geral, esses
valores, com um tempo, acabam sendo
reduzidos – quase sempre depois que o
médico já está instalado na cidade, com
a sua família. Outra questão, grave, é o
atraso recorrente no pagamento dos salários e os conhecidos calotes aplicados
nos médicos por muitas prefeituras do
interior do país.
Diagnóstico – O senhor será candidato a algum cargo público nas próximas
eleições?
Cardoso – Não. Não gosto de política
partidária. Não tenho pretensão de me
candidatar a nenhum cargo público.
Diagnóstico – Por que quis dirigir a
AMB?
Cardoso – Não foi algo estratégico. Era
membro da AMB, participei de sua diretoria e acabei presidente da associa-
Sou um médico
que nasci numa
cidade pequena do
interior do Ceará,
chamada Crateús.
Saí de lá com 11, 12
anos, para estudar na
capital, Fortaleza. Fiz
residência em cirurgia
oncológica, e o meu
pensamento era me
formar em medicina e
voltar à minha cidade.
Infelizmente, não
consegui voltar
ção. Fui atraído pelo aspecto científico
e de respeito à dignidade da profissão
– questões que sempre me atraíram a fazer parte da associação.
Diagnóstico – O mandato do senhor
termina ano que vem. Pretende ser
candidato à reeleição?
Cardoso – Eu não sei ainda. Assim
como não estava no meu projeto de vida
ser presidente da AMB e acabei sendo.
Tenho um pouco mais de um ano de
mandato. É bastante precoce. Na política partidária, é comum a antecipação de
cenários. Se for [candidato à reeleição],
é preciso que seja algo natural e no momento certo, que não é agora.
Diagnóstico – Que conselho daria a um
colega que se inscreveu no Mais Médicos?
Cardoso – Que eles façam o melhor que
puderem pelos doentes. Nada é mais
importante na vida de um médico que
cuidar bem dos seus enfermos. Vivemos em função dos nossos pacientes. É
o nosso dever fazer o melhor por eles.
Diagnóstico | jul/ago 2013
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16
Diagnóstico | jul/ago 2013
Diagnóstico | jul/ago 2013
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CONTROLE DE CUSTOS
OPERADORAS
o COMPORTAMENTO DO
paciente no centro
dos custos
Para enfrentar o aumento do custo de doenças crônicas, os sistemas de
saúde devem encontrar formas eficazes para levar as pessoas a adotar
comportamentos mais saudáveis. Entender como funciona a mente delas é o
primeiro grande passo
M
Sundiatu Dixon-Fyle, Shonu Gandhi, Thomas Pellathy e Angela Spatharou
udar o comportamento individual é
cada vez mais a questão central da assistência médica. O modelo antigo de
atenção à saúde – um sistema reativo
que trata doença aguda após o fato –
está evoluindo para ser mais centrado
no paciente, na prevenção e no gerenciamento contínuo das condições crônicas.
Esta evolução é essencial. Em todo o mundo, uma mudança
fundamental quanto aos riscos à saúde está ocorrendo, impulsionada pelo envelhecimento da população e o aumento da incidência de doenças crônicas induzidas pelo comportamento. Os
sistemas de saúde estão inovando no lado da prestação do serviço
para enfrentar este desafio, através de uma crescente ênfase na
atenção primária, modelos de cuidados integrados e reembolso
pay-for-value (pagamento por valor).
No entanto, é preciso fazer mais para reorientar os sistemas
de saúde para a prevenção e gestão, a longo prazo, das condições
crônicas. Em uma análise que realizamos dos custos de saúde
dos Estados Unidos (que estão agora se aproximando de US$ 3
trilhões por ano), 31% desses custos poderiam ser diretamente
atribuídos às condições crônicas influenciadas pelo comportamento. E 69% dos custos totais foram fortemente influenciados
pelo comportamento dos consumidores. Somente a baixa adesão
à medicação custa aos Estados Unidos mais de US$ 100 bilhões
por ano em gastos evitáveis de saúde. A carga que as escolhas
dos consumidores representa em países de média e baixa renda
é igualmente impressionante: a Harvard e o Fórum Econômico
Mundial estimam que as doenças não transmissíveis resultam
18
Diagnóstico | jul/ago 2013
em perdas econômicas para as economias em desenvolvimento
equivalentes a 4% ou 5% do seu PIB anual. A menos que os sistemas de saúde encontrem formas de levar as pessoas a mudar
seu comportamento (tanto em termos de fazer escolhas de estilo
de vida mais saudáveis, como de buscar e receber os cuidados
preventivos e primários adequados para gerir as suas condições
de saúde), eles vão falhar em sua missão de domar os custos de
saúde sem prejudicar o atendimento de qualidade ou o acesso.
A concepção e a implementação de programas que permitam
às pessoas alcançar a mudança de comportamento sustentável são
difíceis. Poucos programas tentados no passado alcançaram um
impacto sustentado. No entanto, muitas destas intervenções estavam enraizadas no velho modelo de cuidados de saúde, com foco
no tratamento de problemas clínicos após um evento agudo. Muitas vezes, as intervenções tiveram má concepção do programa,
avaliação de rigor insuficiente e problemas de implementação. As
falhas levaram muitos líderes do sistema de saúde a serem céticos
sobre se algum programa de mudança de comportamento pode
alcançar um impacto a longo prazo.
Acreditamos que os programas de mudança de comportamento podem ter sucesso, mas somente se o seu paradigma de
projeto for repensado. Este artigo descreve uma abordagem
emergente – um paradigma centrado na pessoa, que utiliza uma
base comportamental em vez de orientação baseada na doença
para promover a mudança de comportamento sustentável. Em
vez de assumir que os indivíduos são totalmente racionais, ele
reconhece que a tomada de decisão humana é afetada por sistemáticos desvios cognitivos, hábitos e normas sociais. Em vez
de focar exclusivamente na relação médico-paciente, procura-se
criar um ecossistema de apoio que envolve as pessoas e as pessoas mais próximas a elas. Nossas perspectivas desenham uma
análise das tendências globais, aliada à nossa vasta experiência
de trabalho com clientes em todo o setor de saúde sobre o tema
e a entrevistas com especialistas de renome. Elas se baseiam em
visões emergentes das ciências comportamentais que lançam luz
sobre como as pessoas realmente tomam decisões, bem como os
novos avanços tecnológicos.
Aproveitando essas ideias, desenvolvemos um quadro integrado para ajudar as organizações de saúde, em toda a cadeia de
valor, a entender o novo paradigma e como elas podem projetar e
implementar intervenções de alto impacto, com foco no paciente.
Elementos do Paradigma
O novo paradigma da pessoa focada para a mudança de comportamento possui cinco componentes principais:
– envolvimento das pessoas de forma mais eficaz, aproveitando novas perspectivas da psicologia comportamental e economia comportamental;
– integração da mudança de comportamento como um componente central de novos modelos de prestação de cuidados;
– uso do poder de influenciadores e rede para apoiar as mudança de comportamento;
– utilização de tecnologias remotas e autocuidado orientado
para apoiar e capacitar os indivíduos, além de conectá-los aos
médicos e outros influenciadores;
– adoção de uma abordagem multistakeholder, que inclui
parcerias público-privadas, para apoiar intervenções de alto impacto na sociedade e de prevenção primordial
1. Envolver os indivíduos
Insights de ciências comportamentais estão sendo amplamente utilizados em serviços financeiros, varejo e outros setores
para influenciar o que comprar, como economizamos e outros
aspectos de nosso comportamento. No entanto, a concepção da
maioria dos produtos relacionados com a saúde, serviços e intervenções permanece notavelmente não afetada sobre a forma
como os seres humanos tomam decisões.
O maior desafio para
a implementação desse
novo paradigma é a
mentalidade dos líderes
da saúde e médicos. Muitos
são altamente céticos em
relação a programas de
mudança de comportamento,
e alguns ainda não
consideram a alternativa
como parte das atribuições
de um sistema de saúde
Por exemplo, as intervenções clínicas tradicionalmente
orientadas supõem que os indivíduos compreendem seus próprios problemas de saúde e, geralmente, agem racionalmente
para resolvê-los. No entanto, muitas vezes está longe de ser o
caso. Em uma pesquisa que realizamos recentemente, 76% dos
participantes com condições clínicas de alto risco se descreveram como sendo “de excelente, de muito boa ou de boa saúde”.
Programas que não conseguem explicar essa diferença entre o
estado de saúde real dos indivíduos e como eles compreendem
e experimentam a sua saúde no dia-a-dia (e, portanto, como eles
estão dispostos a mudar seu comportamento) perdem o trem em
termos de projeto. Muitas vezes, esses programas simplesmente
atraem indivíduos que já estão “motivados” para alterar o seu
comportamento, em vez de alcançar aqueles que precisam de
ajuda antes que eles possam tomar medidas proativas para melhorar a sua saúde.
Como reconhecer um bom projeto? No que diz respeito a
intervenções de mudança de comportamento, três inovações parecem ser mais importantes.
Diagnóstico | jul/ago 2013
19
CONTROLE DE CUSTOS
OPERADORAS
Segmentação comportamental deve ser usada para aprofundar
conhecimentos em grupos específicos
As abordagens atuais para segmentação do paciente e modelagem preditiva tendem a centrar-se em condições clínicas. No
entanto, as intervenções de mudança são mais propensas ao sucesso se levarem em conta fatores adicionais, tais como perfil do
comportamento de uma pessoa ou motivação para a mudança de
comportamento. Esses insights possibilitam um direcionamento
mais focado nos grupos de pessoas para as quais é mais provável
que o impacto seja alcançado. Eles também tornam possível projetar programas que eliminem mais eficazmente os obstáculos
práticos para a mudança.
Por exemplo, a maioria dos programas voltados para usuários frequentes dos “Serviços de Urgência” ou pessoas com altas taxas de admissão hospitalar foca nos pacientes pelo risco da
doença ou baseado em análises retrospectivas de episódios de
alto custo. Incorporar conhecimentos comportamentais adicionais permite uma abordagem mais sutil. Em um projeto recente
para uma grande fonte pagadora dos EUA, usamos demografia,
estrutura familiar e dados de compras dos consumidores (por
exemplo, a natureza das compras, posse de carro etc.) para a
construção de um índice de isolamento social (a variável destinada a medir cada grau de conexão social do indivíduo ) para
a população-alvo. Quando combinado com os dados de reclamações, este índice nos permite fazer previsões de forma mais
eficaz sobre o universo de pessoas que estariam mais propensas
20
Diagnóstico | jul/ago 2013
a ter uma entrada de emergência de alto custo ou evento de internação – no caso específico de grupos com equivalentes riscos de
condições crônicas.
Descobrimos, por exemplo, que os custos hospitalares foram
24% maiores para os indivíduos socialmente isolados do que
para os indivíduos socialmente conectados com um nível equivalente de risco clínico. Mais ainda: que indivíduos socialmente
isolados também tinham uma menor utilização de medicamentos
prescritos.
Tais ideias podem ajudar a identificar os principais subgrupos
de pacientes antes que episódios de alto custo ocorram ao digitar
os nomes dos membros em sistemas de previsão definidos. Seria
possível também praticar intervenções direcionadas para estes
subgrupos, com o foco correto (por exemplo, serviços extensores
baseados em campo e intervenções para a adesão à medicação
voltadas a indivíduos socialmente isolados).
Caminhos focados na pessoa devem ser usados à medida que
ela tenta alterar o seu comportamento
A maioria dos programas de gestão da doença permanece enraizada em uma visão de mundo baseada na clínica. Por
exemplo, eles podem identificar corretamente um paciente com
diabetes ou outra condição crônica, mas não podem resolver
completamente o fato de que o mesmo paciente também pode
estar acima do peso, sofrer de doenças do coração, ter depressão leve ou moderada, desconfiar do seu médico e ser social-
Um estudo sobre a perda
de peso que realizamos
sugeriu que dar às pessoas
frequente feedback ajuda
a melhorar seu desempenho.
Mensagens de texto estão
sendo cada vez mais
utilizadas para apoiar
pacientes com diabetes ou
outras condições crônicas,
seja pelo envio de materiais
educativos, seja por
lembretes
mente isolado. Conhecimentos clínicos são fundamentais, mas
a nossa experiência mostra que esses programas são mais eficazes quando abordam diretamente as causas e as barreiras à
mudança de comportamento e proporcionam interações com o
timing e frequência certos para garantir um impacto. Em essência, estes projetos traduzem ideias clínicas em caminhos que
apoiam os indivíduos a partir do ponto em que eles decidem
fazer mudanças até o ponto em que os novos comportamentos
são sustentados.
Um exemplo simples demonstra o impacto de orientar os
pacientes para as intervenções de mudança de comportamento
que são mais adequadas para eles, com base em suas necessidades. Na Inglaterra, trabalhamos com um plano de saúde regional com o objetivo de melhorar o atendimento ao diabetes
através da definição de segmentos de comportamento entre os
pacientes afetados. Em seguida, combinamos o portfólio adequado dos programas de apoio para cada segmento. Os clínicos
gerais foram treinados para identificar quais pacientes pertenciam ao segmento, fazendo algumas perguntas simples e, em
seguida, encaminhando-os para a intervenção de mudança de
comportamento que melhor atendia às suas necessidades. Esta
simples discriminação levou a um aumento de nove vezes na
inscrição no programa (de 7% para 63 %) no prazo de seis meses, e, mais importante, a um aumento da taxa de conclusão do
programa.
Se ater à importância da comunicação ativa ao longo do
caminho também é um aspecto relevante, já que o feedback
frequente incentiva a mudança de comportamento. Um estudo
sobre a perda de peso que realizamos em parceria com economistas especializados em comportamento sugeriu que dar às
pessoas frequente feedback, automatizado ou não, ajuda a melhorar seu desempenho. Mensagens de texto estão sendo cada
vez mais utilizadas para apoiar pacientes com diabetes ou outras condições crônicas, seja pelo envio de materiais educativos,
lembretes de medicação, seja por dicas sobre o manejo da doença. Os resultados preliminares foram animadores.
Incentivos comportamentais deveriam ser usados para
encorajar a mudança
Os incentivos são uma parte crescente da caixa de ferramen-
tas para abordar a mudança de comportamento. Dois terços das
empresas americanas, por exemplo, oferecem agora incentivos
financeiros aos empregados para encorajar comportamentos
saudáveis.
O programa Discovery’s Vitality, por exemplo, informa aos
seus membros sobre o seu status de saúde, os encoraja a estabelecer objetivos de saúde que dependam de seu comportamento
e então os recompensa por atingir esses objetivos. Os membros
ganham pontos por comportamentos que vão de se submeter a
um exame de taxa de filtração glomerular (TFG) a compras de
produtos saudáveis nos supermercados. Em troca, recebem um
mix de recompensas de curto e longo prazo, incluindo ingressos
para o cinema e descontos em passagens aéreas. A Discovery
estima que o programa tenha reduzido em 15% os custos gerais
dos participantes com assistência médica. Programas inovadores de bem-estar corporativo, como os oferecidos pela Limeade,
também estão ganhando tração.
A estrutura das recompensas importa. Incentivos que levam
em conta os aspectos cognitivos das pessoas (por exemplo,
aversão a perdas, aversão a arrependimentos, otimismo e preferências atuais) são mais efetivos do que prêmios em espécie.
Recentemente, testamos incentivos baseados no comportamento através da “loteria do pesar”. O objetivo era fazer com que
os funcionários de uma empresa realizassem uma avaliação de
risco à saúde. Metade dos funcionários recebeu incentivos em
dinheiro diretamente, e os outros foram divididos em pequenas
equipes, e, então, inscritos no jogo.
A cada semana, uma equipe ganharia a loteria, mas as recompensas foram distribuídas apenas para os membros da equipe que completaram a avaliação. As equipes vencedoras foram
amplamente divulgadas para influenciar o pesar antecipado (a
aversão das pessoas a perder a sua chance de ganhar o grande
prêmio na semana se sua equipe não fosse selecionada). O resultado: 69 % dos empregados inscritos na loteria terminaram as
suas avaliações, em comparação aos 43% daqueles que receberam incentivos diretos.
2. Integrando a mudança de comportamento em novos modelos de prestação de cuidados
Muitos sistemas de saúde estão colocando maior ênfase
na atenção primária, especialmente através do uso de modelos
de prestação de cuidados integrados projetados para melhorar
a saúde da população. Para ter sucesso, estes novos modelos
devem estender seu alcance fora das quatro paredes de um
consultório médico para que eles possam apoiar a mudança de
comportamento do paciente, além de interações tradicionais
médico-paciente. Isso exige novas capacidades, incluindo ferramentas de fluxo de trabalho clínico para apoiar segmentação do
paciente, alertas de cuidados enviados para os clínicos e pacientes, comunicação avançada e suporte de gestão de cuidados para
os pacientes, além de monitoramento remoto. Mais fundamentalmente, os médicos devem adotar uma abordagem centrada no
paciente, concentrando-se em entender a pessoa como um todo
e suas barreiras à mudança.
Um bom exemplo deste tipo de modelo é CareMore, fornecedora da Califórnia, que se concentra em idosos. Um de seus
principais objetivos é incentivar mudanças de comportamento
importantes para a gestão efetiva das condições crônicas. CareMore combina inovações tecnológicas, incluindo prontuários
Diagnóstico | jul/ago 2013
21
CONTROLE DE CUSTOS
OPERADORAS
Shutterstock
eletrônicos dos pacientes (PEPs) e monitoramento remoto, com
uma ampla gama de serviços não tradicionais (por exemplo,
apoio do cuidador, podologia preventiva, transporte grátis para
os seus escritórios, suporte para ligações telefônicas na casa de
médicos e enfermeiras, centros de exercícios físicos adaptados
e uma equipe de intervenção que vai para as casas dos pacientes
para investigar problemas não clínicos).
A CareMore reporta que seus custos ajustados ao risco são
15% menores do que a média regional para os seus pacientes,
e seus resultados clínicos são acima da média. Por exemplo, a
taxa de amputação entre os pacientes diabéticos com feridas é
78% abaixo da média nacional. Na mesma medida, sua taxa de
hospitalização por doença renal em estágio final é 42%.
3. Usando o poder de influenciadores e redes
Escolhas de saúde não são feitas em um vácuo. Nossa pesquisa mostra que, quando confrontadas com um evento de saúde, as pessoas seguem o conselho para tratamento de amigos e
familiares em 86% dos casos. Alguns esforços de promoção da
saúde já reconheceram a importância desses influenciadores.
Por exemplo, os programas de cessação do tabagismo adulto no
Reino Unido e em outros lugares estão cada vez mais colocando as crianças como alvo, porque os pais que fumam são mais
propensos a responder às preocupações de seus filhos do que à
perspectiva de sua própria saúde. Fontes pagadores e fornecedores também passaram a apreciar o poder de influenciadores
para apoiar a mudança de comportamento usando ações específicas com considerável sucesso. Na Filadélfia, por exemplo, o
Veterans Affairs (VA), centro médico, criou um programa de parceiros para incentivar uma melhor autogestão do diabetes entre
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Diagnóstico | jul/ago 2013
PACIENTES À ESPERA DE
ATENDIMENTO EM CONSULTÓRIO:
serviços financeiros e o setor
de varejo já usam o estudo do
comportamento para influenciar
o que comprar. Na saúde, essa
tendência pode reduzir custos
afro-americanos (um grupo com predominância de diabetes mais
alta do que a média e um risco significativamente aumentado de
complicações). O programa identificou primeiro os “mentores”
– outros pacientes diabéticos que já mantinham seus níveis de
glicose sob controle – e lhes deu formação. Aos participantes do
programa foram atribuídos mentores com o mesmo background
demográfico (sexo, idade etc.).
Os participantes e mentores interagiram numa base semanal,
principalmente, por telefone. Após seis meses, os participantes
tinham alcançado uma queda de 11% nos seus níveis médios de
glicose (de 9,8% a 8,7%) – uma alteração suficiente para diminuir o risco de complicações relacionadas à doença. Por outro
lado, um grupo de pacientes sem mentores não experimentou
nenhuma melhora em seus níveis de glicose durante o estudo.
Quase dois terços dos participantes do programa de parceria disseram que ter um mentor que também tinha diabetes foi importante para ajudá-los a controlar seus próprios níveis de glicose.
Como o programa do VA demonstrou, as redes à base de parceiros podem ser relativamente fáceis de implementar. Enquanto o encontro de pares é feito de uma forma que ressoa com os
participantes, essas redes podem oferecer um sistema de suporte
adicional para ajudar a sustentar a mudança de comportamento.
4. Utilizando tecnologias remotas e autocuidado
orientado
Frequentemente, comunicação em tempo real e feedback
são importantes no apoio aos esforços de mudança. Os modelos tradicionais de prestação de cuidados têm, em seu núcleo,
as interações face a face entre médicos e pacientes. Novas tecnologias, no entanto, estão aumentando este modelo de interação e transformando radicalmente a forma com que os médicos
oferecem, e os indivíduos e seus amigos e família consomem
assistência médica. Aplicativos móveis, por exemplo, podem
facilitar o rastreamento e monitoramento. Os dispositivos sem
fios podem transmitir informações de adesão diretamente de
caixas de comprimidos, balanças, ou até mesmo “pílulas inteligentes” ingeridas. Webcams permitem consultas remotas.
Em última análise, estas tecnologias remotas e o autocuidado
orientado podem ajudar a criar um ecossistema de saúde verdadeiramente interativo para os pacientes.
Muitas dessas novas tecnologias estão ganhando força,
principalmente nos países em desenvolvimento, onde o acesso
continua a ser um problema. No entanto, elas também estão
sendo cada vez mais utilizadas nos países mais desenvolvidos.
No Reino Unido, por exemplo, um grande ensaio de dispositivos de telemedicina para pacientes com necessidades de cuidados sociais e de condições crônicas tem produzido resultados
positivos. Os participantes receberam ou equipamentos de monitoramento doméstico ou um conversor set-top box (STB) que
pode ser conectado a suas TVs. Os dispositivos habilitam os
pacientes a fazer perguntas sobre seus sintomas, emitem lembretes visuais ou de áudio sobre a hora das medições, mostram
vídeos educativos e traçam um gráfico com histórico de leituras
clínicas recentes.
Em um experimento, o uso de dispositivos de telemedicina
diminuiu a utilização de visitas à sala de emergência e as admissões nos hospitais. Nestes estudos, a utilização dos dispositivos produziu uma economia de até 13%.
5. Adotando uma abordagem multistakeholder
Há um reconhecimento crescente de que, se os sistemas de
saúde estão abordando toda a gama de problemas que afetam
negativamente a saúde dos pacientes, os líderes de saúde terão
que fazer uma parceria com um conjunto mais amplo de partes interessadas para criar um ambiente propício à condução de
comportamentos mais saudáveis e alcançar impacto. Temos trabalhado em estreita colaboração com os clientes tentando criar
tais coalizões amplas, o que acreditamos ser fundamental para
alcançar mudanças de comportamento sustentadas e fortes. Por
exemplo, trabalhamos com grandes varejistas e fabricantes de
alimentos em um país para enfrentar o desafio da obesidade
através da criação de um “movimento” para sensibilizar e estimular os consumidores, empresários, crianças, comunidades e
organizações para a ação. Com o apoio de uma coalizão multistakeholder, foi desenvolvido um plano em que os CEOs de varejistas participantes e fabricantes de alimentos comprometiam
suas organizações com determinadas metas e ações. As iniciativas incluíam programas de parceria com escolas saudáveis,
adequação nutricional nos ambiente de trabalho e mobilização
conjunta entre fabricantes e varejistas para reduzir a ingestão
calórica e aumentar a transparência nas informações contidas
nos rótulos. Embora o impacto econômico e as consequências
para a saúde destes tipos de esforços sejam difíceis de quantifi-
car, eles são fundamentais na criação de um ambiente que apoia
intervenções mais diretas. O impacto mais direto, contudo,
pode ser alcançado através de intervenções governamentais devidamente focadas e parcerias público-privadas. Um exemplo
clássico é o aumento nas tributações sobre os cigarros, porém
intervenções mais criativas também são possíveis.
Na Argentina, por exemplo, um programa de transferência
condicional patrocinado pelo governo tem como objetivo reduzir o consumo médio de sódio. Padeiros foram instados a
diminuir a quantidade de sal em seu pão, mas são diretamente
compensados pela perda de receitas de vendas mais baixas.
O impacto e a execução
Acreditamos que o novo paradigma focado na pessoa aqui
descrito é susceptível de produzir resultados mais fortes do que
os programas tradicionais de mudança de comportamento têm
produzido. Programas de gerenciamento de doenças enraizadas
no antigo modelo de saúde normalmente obtêm economias na
faixa de 2% a 5 % dos custos médicos. Com base em nossa experiência e os estudos publicados até o momento, estima-se que
programas concebidos sob o novo paradigma poderiam atingir
de 10% a 15 % de redução nos custos de populações-alvo, além
de ganhos de produtividade e melhor qualidade de vida.
A implementação do novo paradigma é um desafio, no
entanto. Uma questão importante é a escalabilidade: enquanto muitos dos elementos necessários existem e os pilotos não
faltam, há poucos casos de qualquer aplicação de todos os
elementos de desenho em escala. O custo de construção da
infraestrutura subjacente (por exemplo, plataformas para administrar incentivos e sistemas PEP provedores para habilitar
ideias eficazes dos pacientes) também é um problema, embora,
na maioria dos casos, as abordagens de baixa tecnologia e de
baixo custo existam e a inovação em curso esteja simplificando
e baixando o preço de muitas tecnologias. O maior obstáculo,
no entanto, é a mentalidade dos líderes da saúde e médicos. A
maioria permanece enraizada no antigo modelo de saúde. Muitos são altamente céticos em relação a programas de mudança
de comportamento, e alguns ainda não consideram a alternativa
como parte das atribuições de um sistema de saúde. Justamente
por isso, reorientar os sistemas de saúde em torno de um modelo focado na prevenção, gestão a longo prazo e cuidado centrado no paciente exigirá liderança de cima para baixo e apoio
declarado. Tal liderança é necessária para que os sistemas de
saúde possam atender à próxima onda de desafios do setor.
Se os sistemas de healthcare devem abordar as mudanças
nos riscos de saúde que estão acontecendo agora, especialmente as que decorrem de condições crônicas, eles devem encontrar
formas de levar as pessoas a adotar comportamentos mais saudáveis. Novos programas de mudança de comportamento com
base no foco na pessoa e não na doença estão provando que
é possível alcançar resultados sustentáveis e fortes. Contudo,
uma mudança de mentalidade é necessária se estes programas
forem ganhar uma utilização mais generalizada.
Sundiatu Dixon-Fyle (PHD) e Angela Spatharou (PHD) são executivos da
McKinsey em Londres, especializados em estratégia de custo centrada no
paciente. Shonu Gandhi é consultor, atua no escritório da McKinsey em
Washington, e Thomas Pellathy, em Pittsburg. Ambos são especialistas em
economia da saúde. Todos os direitos reservados. Tradução: Gilson Jorge
Diagnóstico | jul/ago 2013
23
Ensaios
Evandro Tinoco Mesquita e Denise Schout
GOVERNANÇA CLÍNICA – UMA JORNADA
CONTÍNUA EM BUSCA DA EXCELÊNCIA
A formação de profissionais de saúde capacitados para a gestão da assistência em conformidade com o
modelo hospitalista contemporâneo é uma peça-chave para o desenvolvimento de um processo pleno de
governança clínica
A
medicina praticada nos hospitais brasileiros e no mundo é considerada fragmentada, com elevado risco de erros assistenciais, problemas de comunicação
entre o corpo assistencial, administrativo e o paciente/família, além de possuir
custo elevado. A solução para essa realidade é repensarmos o modelo de gestão médico–assistencial,
que possa oferecer cuidados de elevada qualidade percebidos
como excepcionais pelo paciente (experiência do paciente) e
com menor custo para o sistema.
Esse novo modelo de “engenharia assistencial” é denominado governança clínica e teve seu início de forma sistematizada
no Reino Unido. Hoje a prática vem sendo progressivamente
incorporada nas instituições de saúde em todo o mundo com
diferentes designações e adaptações para contribuir com a excelência do cuidado.
No Brasil, a Associação Nacional de Hospitais Privados
(Anahp) é pioneira na discussão do tema e no desenvolvimento
de ferramentas para implementação da governança clínica nos
hospitais privados. O primeiro material publicado pela entidade – o Manual Organização do Corpo Clínico – apresenta de
forma objetiva as diretrizes para a construção de uma relação
saudável entre médicos e hospitais, reforçando a importância
das lideranças dos diretores técnico e médico para as equipes assistenciais e também junto aos superintendentes e diretores administrativos. Alinhado a iniciativas da entidade, não podemos
deixar de mencionar o Observatório Anahp, que representa uma
quebra de paradigma na saúde, com a publicação dos resultados
econômico-financeiros, operacionais e assistenciais dos hospitais membros da associação.
A consolidação da governança clínica em um ambiente complexo como o hospital é uma longa jornada, que deve priorizar
um conjunto de elementos, como auditoria clínica, capacitação
em gestão da qualidade, gerenciamento de risco, avaliação de
desempenho das equipes assistenciais, RH estratégico, desenvolvimento de lideranças e trabalho em times multidisciplinares, promovendo a comunicação efetiva entre todos que cuidam
do paciente. A centralidade do cuidado nas necessidades do pa24
Diagnóstico | jul/ago 2013
ciente, garantindo informações que possam tornar as escolhas
do paciente e de seus familiares melhores e livres de conflitos
de interesse, é um item de grande relevância nos projetos de governança clínica, rompendo a lógica de que o paciente é apenas
um ser biológico e assumindo a complexidade da pessoa doente
(bio – psico – sócio – espiritual).
A governança clínica precisa de um corpo assistencial bem
estruturado e alinhado. Com a disseminação dos programas de
acreditação hospitalar nos hospitais brasileiros, a sua implementação tem sido acelerada. A liderança médica representa o
principal condutor no processo de gerenciamento e operacionalização da governança clínica, pois são os grandes responsáveis
pela mudança de cultura, por meio do exemplo e da supervisão.
Nos últimos três anos, a Agência Nacional da Saúde Suplementar (ANS) tem trabalhado no desenvolvimento do Programa
de Qualificação dos Prestadores de Serviço de Saúde, baseado
em indicadores assistenciais. A iniciativa certamente tornará o
sistema mais transparente e deve contribuir para a escolha dos
usuários de planos de saúde. A Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (Anvisa) também tem contribuído com elaboração de
diretrizes para orientar o funcionamento das instituições hospitalares, de forma a construir uma assistência mais segura. Essas
iniciativas contribuem significativamente para a implantação da
governança clínica nas instituições hospitalares.
A formação de profissionais de saúde capacitados para a
gestão da assistência em conformidade com o modelo hospitalista contemporâneo é uma peça-chave para o desenvolvimento
de um processo pleno de governança clínica. Por essa razão,
programas de educação permanente e contínuo desenvolvimento de lideranças são fundamentais. A fuga de talentos, algo bastante comum nos hospitais, tem proporcionado elevado turnover
dos profissionais de saúde, o que representa um desafio para a
consolidação de um modelo de governança clínica maduro nas
instituições e deve ser vista como questão prioritária nos hospitais, especialmente entre os gestores e diretores. A governança clínica busca envolver toda a instituição, atuando de forma
conjunta e organizada, na busca da excelência operacional por
meio de processos de melhoria contínua da qualidade dos cuidados, alcançando padrões de excelência em todas as dimensões
do cuidado do paciente – resultados assistenciais, eficiência e
satisfação dos pacientes.
MÉDICO COMO PILAR – O processo de auditoria clínica, de-
senvolvido a partir da revisão sistematizada dos registros assistenciais, avalia a qualidade das informações, a conformidade
dos protocolos clínicos, a identificação de erros assistenciais e
a qualidade da prescrição eletrônica. Trata-se de um dos principais recursos para alcançar a excelência assistencial, além de
ser uma ferramenta de educação das equipes multidisciplinares para melhoria contínua da qualidade do cuidado e um dos
pilares desse novo modelo de gestão médico-assistencial. Por
isso, deve ser realizado em todas as unidades assistenciais. O
médico é o principal pilar de um projeto de governança clínica.
Dessa forma, o treinamento, capacitação, retenção, avaliação de
desempenho, critérios explícitos de concessão de privilégios e
regulação profissional (regulamento do corpo clínico) e pleno
funcionamento das comissões (ética, bioética, pesquisa clínica,
prontuário e revisão dos óbitos) são importantes ferramentas
para gerenciar a prática médica. Os profissionais devem apresentar seus indicadores assistenciais e não assistenciais para o
corpo diretivo das instituições e elaborar planos para melhoria
do desempenho de suas unidades e também promover disseminação das políticas institucionais e dos resultados para as equipes (comunicação efetiva).
Os erros assistenciais podem ser reduzidos de forma significativa por meio da construção de sistemas seguros conduzidos
por lideranças que dominem os conceitos de gestão de risco e
com o auxílio de tecnologias que minimizem falhas decorrentes ao fator humano. Nas organizações comprometidas com a
excelência em governança clínica, todos trabalham juntos em
prol da segurança assistencial, frequentemente liderados pela
alta gestão, que prioriza no seu dia-a-dia atitudes e escolhas que
remetam ao compromisso com as boas práticas para prevenção
dos erros assistenciais e reforçam de forma positiva a cultura da
segurança.
A construção de um modelo de governança clínica de excelência nos hospitais em todo o mundo é frequentemente dificultada por um conjunto de fatores que podem ser eliminados para
fluir de forma orgânica nas instituições, como, por exemplo,
cultura institucional focada no médico, liderança corporativa,
falta de investimentos em educação continuada e treinamento,
incentivos desalinhados para as equipes, times multidisciplinares fragmentados, falta de um sistema de informação assistencial e ausência de uma estrutura assistencial com médicos
hospitalistas.
A Anahp tem proporcionado o ambiente ideal para o fortalecimento da governança clínica em seus hospitais ao compartilhar boas práticas nacionais e internacionais, promovendo
fóruns e congressos, além de reforçar que o modelo adequado
deve ser apoiado pela alta gestão administrativa como a única
forma de gerar valor para o paciente e sustentabilidade para a
saúde privada em nosso país.
A sustentabilidade das organizações hospitalares do século
XXI envolve a capacidade de equilibrar os conflitos presentes
no dinâmico ambiente da saúde privada, a partir da excelência
da governança clínica associada às boas práticas da governança
corporativa em prol dos interesses do paciente.
Evandro Tinoco Mesquita é médico, diretor clínico do Hospital Pró-Cardíaco e coordenador do Grupo de Trabalho Melhores Práticas Assistenciais da
Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp).
Denise Schout é médica e assessora técnica da Associação Nacional de
Hospitais Privados (Anahp).
Diagnóstico | jul/ago 2013
25
ARTIGO
Eduardo Najjar
Divulgação
O futuro da empresa de sua família
P
ara entender se a empresa de sua família tem
chances de continuar sendo bem sucedida nas
próximas décadas, é necessária uma análise mais
profunda do que simplesmente levantamentos
relacionados ao EBTDA, condições atuais e futuras do mercado em que atua e força da marca,
o branding.
É necessário saber se a empresa é um projeto de negócios
para a maior parte dos membros de sua família.
Senão vejamos: analisar uma empresa familiar significa dizer
que há, em seu DNA, uma família empresária. O fundador, ou
dono de uma empresa, é, com grandes chances de acerto, um
empreendimento. Essa forma de envolvimento da nova geração
familiar/do cônjuge no negócio pode causar choques de opinião.
Quando isso acontece, a empresa deixa de ser o negócio de um
empreendedor para converter-se na empresa em que a família
está envolvida. Neste caso, o diagnóstico é a falta da comunicação do sonho empresarial do fundador à nova geração e o não
planejamento empresarial familiar, que inclui o envolvimento da
família. Voltando ao início deste artigo, não importando em que
fase se encontram os negócios familiares e em que fase de desenvolvimento está sua família, será importante iniciar um processo
de reflexão sobre os caminhos até agora trilhados e sobre o futuro dos negócios. Importante que exista abertura e bom senso
por parte de todos ou
da maioria dos membros da família para
abordar aspectos nem
se comunicar internamente e analisar as expectativas
sempre confortáveis
e simples. Um ponto
de seus membros, as metas empresariais e outros
de partida que pode
apoiar a criação desse
indicadores
ambiente de confiança e disponibilidade
empreendedor e um empresário.
de condução do processo é o desejo do encaminhamento do paIsso não significa que passará o comando para a próxima ge- trimônio familiar face ao futuro das novas gerações.
ração de sua família em condições razoáveis para que continue
Outra ação que pode propiciar a união das expectativas da
no mercado. Além dos indicadores econômico-financeiros, fo- família nesse caminho é a leitura de materiais – artigos, livros,
ram criadas novas lideranças entre os familiares e existe vontade publicações – a respeito do tema “negócios familiares”, a particida família na continuidade da operação. Cada geração de uma pação em eventos e cursos dedicados a famílias empresárias e a
família empresária deve ter o interesse pelos seus negócios, a busca de aconselhamento com especialistas.
vocação de manter a sua continuidade e transmiti-la à geração
Os diferentes pontos de vista devem ser entendidos por todos
seguinte.
os membros das famílias empresárias. O fundador é, quase semO ciclo de vida da primeira geração de criadores de uma em- pre, uma pessoa muito solitária em suas tomadas de decisões a
presa diz muito a respeito de suas condições de vir a se tornar respeito do negócio. A maior parte dos familiares, quase sempre,
uma empresa familiar.
não está suficientemente esclarecida a respeito do projeto dos
Caso o fundador (fundadores) decida que seu sonho, seu em- negócio familiares. A comunicação dentro das famílias em geral
preendimento, será compartilhado com sua família, e esta aceitar, e especialmente nas famílias empresárias não pode ser considea decisão de vir a se tornar um negócio familiar recairá sobre as rada um ponto alto.
próximas gerações. Cada geração deverá referendar este comproA consideração do quadro traçado e o futuro da empresa da
misso. Terão êxito aquelas famílias que souberem se comunicar família podem se iniciar hoje mesmo. Cabe a decisão a você, a
internamente e analisar as expectativas de seus membros, dese- partir de uma reflexão confortável e bem sustentada, do ponto de
nhando a forma de ligar as expectativas às metas empresariais, vista técnico.
manutenção da empresa ao longo do tempo e outros indicadores
empresariais. Na prática, na maior parte dos casos, em alguma
Eduardo Najjar é expert brasileiro em family business, consultor e palestrante
fase da vida do negócio, o empreendedor visualiza o envolvi- associado da Empreenda, coordenador do GrandTour Family Business Intermento de sua família, seja por uma reflexão sobre o futuro do national, professor na ESPM e, além da Diagnóstico, é colunista do Blog do
negócio e da família, ou por necessidade de mão de obra para o Management (Exame.com).
Terão êxito aquelas famílias que souberem
Diagnóstico | jul/ago 2013
27
Alan Sampaio
ENTREVISTA
ENA DE ARAÚJO
A PEDAGOGA ENA DE
ARAÚJO: no ambiente
da saúde, há os que
pensam e os que
executam
28
Diagnóstico | jul/ago 2013
“A invisibilidade dos profissionais
técnicos de saúde existe. E é real”
Diretora da Escola Técnica de Saúde de Brasília (Etesb), a pedagoga Ena de Araújo
critica o excesso de poder dos médicos na rotina dos hospitais e defende uma gestão
de saúde menos verticalizada e com decisões colegiadas
Gilson Jorge
Como a invisibilidade dos profissionais
técnicos de saúde pode ser percebida?
Ena de Araújo – Ela existe, é real e percebida de forma mais contundente na divisão e fragmentação das ações por eles
exercidas, além dos salários – de forma
mais evidente. No ambiente da saúde, há
os que pensam e os que executam.
Há situações em que essa realidade se
transforma em assédio moral?
Ena – Isso é uma coisa muito delicada
de se falar, mas as evidências existem –
inclusive com uso de expressões do tipo
“faça o que eu mando, mas não faça o que
faço”. Só que as pessoas têm medo de falar para não perder o emprego, a gratificação. Elas falam aquilo que os gestores, os
seus superiores gostam de ouvir. É uma
coisa muito velada, como não é claro o
assédio moral em lugar nenhum.
Na Europa, enfermeiros e técnicos exercem atividades que no Brasil são prerrogativas exclusivas dos médicos. A Lei do
Ato Médico é atrasada sob esse aspecto?
Ena – A Lei do Ato Médico foi alvo de
críticas por diversas categorias, e muitas
ponderações, que acabavam restringindo
a atuação dos médicos, acabaram sendo
vetadas pelo Executivo. Lembro de um
caso em que uma enfermeira docente foi
levada à justiça porque estava ensinando
consulta de enfermagem – uma prerrogativa prevista na Lei 7.498/86, que regulamenta o exercício da profissão. É como se
o termo consulta, em toda a sua acepção,
fosse de propriedade exclusiva dos médicos. A gente consulta a cartomante, o
dicionário, a bula do remédio. Não é possível haver um dono para o termo.
Há muito corporativismo e classismo entre os médicos?
Ena – Há uma divisão de classes clara. E
um histórico das profissões que justifica
esse status. Afinal, os alunos de medicina
saem, com raras exceções, de uma classe social mais alta, de famílias que têm
poderes de vocalização e aquisitivo muito
evidente. Assim, o processo de trabalho
em saúde é deflagrado por essa hierarquia. É o médico que prescreve a alimentação do paciente e o nutricionista cumpre. A enfermagem aplica a medicação.
A farmácia fornece o remédio. De certa
forma há uma “predominância” do médico sobre as demais categorias. Tanto é
assim que quando há uma “insurgência”
para se democratizar essas ações, como a
participação colegiada, discussão do processo de trabalho e gestão compartilhada,
o movimento é visto como uma ameaça.
É possível medir o impacto dessa invisibilidade no desempenho desses profissionais?
Ena – Não há dados estatísticos sobre a
questão. Há, por outro lado, uma especificidade, que é a divisão técnica do trabalho. Há um superior, que supervisiona, e o
técnico, que executa. Trata-se de um modelo usado em linha de montagem de uma
fábrica, que é trazido para a área social.
O setor, aliás, tem uma forte regulamentação. A Lei do Exercício da Enfermagem,
por exemplo, define todas as nuances da
prática da enfermagem – inclusive as
ações de supervisão e ensino. Cabe ao auxiliar, contudo, as ações repetitivas, como
se eles não pensassem. Sempre lutei contra esse status, porque se trata de trabalhadores que cuidam da vida de pessoas.
Desde a época do DASP (Departamento
Administrativo do Serviço Público, criado em 1938), porém, esses profissionais
são definidos como auxiliares de serviços
diversos. Algo que perdura até hoje. Essas
pessoas não têm identidade profissional
e não são sindicalizadas. Compõem uma
massa de manobra para executar tarefas
que não exijam grandes preparos. Mas na
área da saúde até a limpeza requer conhecimento científico, já que uma ação mal
executada pode disseminar uma infecção
hospitalar em toda a unidade.
Como essa invisibilidade se manifesta no
SUS?
Ena – O que eu vejo no SUS de forma
mais clara é que, primeiro, o sistema de
saúde ainda hoje é centrado na doença,
no hospital e no lugar individual. Nesse
ambiente, são requeridos, predominantemente, profissionais de nível superior –
por disporem de um melhor aparato para
resolver os problemas. Eles assumem o
comando e gerem os processos de trabalho dos profissionais técnicos. Para o nível
médio, é muito recorrente o trabalho em
procedimentos do tipo “faça isso, arruma
assim”. Eles vão repetindo o trabalho de
forma acrítica, sem autonomia. Há pouco
tempo, em um hospital público de Brasília, ocorreu um episódio evitável de falha
na assistência, devidamente alertado por
um auxiliar, à médica responsável. Ela o
interpelou e fez questão de “restabelecer
a hierarquia”. O desdém diante da “intromissão”, contudo, fez com que o paciente
– uma criança – viesse a óbito. Um exemplo desastroso da organização do trabalho
no ambiente médico hospitalar brasileiro,
fortemente marcada pelo verticalismo.
Como superar essa barreira?
Ena – Implementando políticas que levem
a decisões colegiadas, trabalho em equipe e valorização do profissional – tanto
no que se refere aos salários, quanto aos
processos de educação permanente, autonomia e avaliação constante de desempenho. Ações que devem redundar em
motivação financeira e meritocracia. Vale
lembrar que estamos falando de enfermeiros, técnicos e auxiliares, que correspondem a quase 60% da força de trabalho da
saúde no nosso país.
Diagnóstico | jul/ago 2013
29
informe publicitário
Delfin gonzalez
miranda e arthur
rosa: seis novos
equipamentos de ponta
para o tratamento
oncológico na Bahia
Grupo Delfin cresce
e avança para terapia
oncológica
Expertise e investimentos em tecnologia no setor de diagnóstico por
imagem serão aplicados em novos serviços de tratamento do câncer na
Bahia e em outros estados do Nordeste
C
om tecnologia de ponta
e a experiência de mais
de 35 anos na realização
de exames de diagnóstico por imagem, o Grupo
Delfin, maior empresa do setor no
Nordeste e quarta do país, passa a
oferecer o serviço na área de terapia
oncológica. A rede adquiriu seis equipamentos de radioterapia de última
geração da empresa sueca Elekta.
Dois deles já atendem ao público
no complexo médico-hospitalar da
Delfin em Lauro de Freitas (CMD),
Região Metropolitana de Salvador.
30
Diagnóstico | jul/ago 2013
Outros quatro estão no Hospital Português e Hospital da Bahia, ambos
na capital baiana, com expectativa
para go-live (primeiro tratamento) até
dezembro.
O novo serviço tem um vasto campo pela frente na opinião do
presidente do Grupo, Delfin Gonzalez Miranda. Ele ressalta dados que
lhe chamaram a atenção durante um
evento da Elekta em que participou.
“Segundo a apresentação deles,
hoje existe um acelerador linear para
cada 80 mil americanos, um para
cada 400 mil europeus e um para
cada 2,6 milhões de latino-americanos. É muita demanda e poucos aparelhos”, explicou.
Com sete unidades de medicina
diagnóstica na Bahia, duas em Natal
(RN) e mais três clínicas para serem
inauguradas na Região Nordeste, o
Grupo Delfin segue para se manter
como referência também nos serviços de terapia oncológica. De acordo
com o presidente do grupo, a instituição mantém parcerias importantes,
além de fomentar a área de educação e pesquisa para discutir condutas e novidades do setor.
ELEKTA AXESSE:
aparelhos suecos dão
mais precisão durante a
terapia oncológica
Tecnologia arrojada –
Os equipamentos adquiridos para o
novo serviço são os mais modernos
do país. “Eles permitem a realização
de tratamentos extremamente personalizados. Usando a modulação do
feixe de radiação (IMRT), é possível
esculpir a dose nos volumes que integram o tratamento, seja o tumor, seja
as estruturas sadias adjacentes, aplicando somente onde é necessário.
A radioterapia de arco volumétrico é
outra tecnologia que permite uma entrega de dose mais rápida, reduzindo
o risco de perda com a mobilização
involuntária do paciente”, explicou o
coordenador médico da radioterapia
do Grupo Delfin, Arthur Rosa.
Os aceleradores lineares estão
capacitados para realização de tratamentos avançados, como a radiocirurgia com lâminas de proteção de
0,25 cm, as menores do mercado,
além da radioterapia estereotáxica
fracionada craniana e a extracraniana. Todas as tecnologias podem ser
verificadas com o IGRT no momento
do tratamento, através de um equipamento de tomografia computadorizada integrado ao acelerador.
Outro grande diferencial dos aparelhos é a mesa HexaPod. Os seis
graus de liberdade fazem ela se movimentar nos três eixos cartesianos
(x, y e z) e angular em três direções,
dando mais precisão ao tratamento. Ele também ressaltou a estrutura montada para a instalação das
máquinas. “Construímos um bunker
(ambiente blindado no qual o equipamento é operado), único no Brasil
hoje, e, devido a alguns aspectos estruturais do hospital, fizemos sem um
vão de labirinto e com uma porta que
pesa dez toneladas e é movimentada por um motor. Foi uma tecnologia
feita para nós a partir de uma inspiração que tivemos com uma experiência na Alemanha”, revelou o físico
médico Edmario Costa.
Futuro – A segurança no volumoso fluxo de informações, que
a partir de 2014 será integrado por
meio de conexão remota é garantida
por conta da digitalização e controle de todos os procedimentos. “Não
usamos papel, nem filmes. Fizemos
também um investimento alto em
dosimetria e controle de qualidade.
Medimos a dose nos phantoms (sistemas físicos que simulam os tecidos
humanos) para avaliar se a dose entregue naquele volume é real. Tudo
é feito de forma digital”, destacou
Rosa.
O coordenador ainda elenca mais
vantagens do serviço de terapia on-
cológica no Grupo Delfin. “Antes, as
medições levavam dias. Agora, fazemos em algumas horas e de forma
mais segura. Nosso planejamento
é de que, até o final do primeiro semestre de 2014, vamos integrar os
três serviços, acelerar esse controle
de informações e melhorar a segurança dos pacientes”, adiantou Rosa.
Equipe qualificada – Médicos, físicos e tecnólogos com formações acadêmicas e clínicas realizadas em diferentes instituições
nacionais e internacionais e experiência completa na atenção oncológica fazem parte da equipe do serviço
de terapia oncológica. “A educação
continuada dos colaboradores que
realizam o serviço no complexo médico-hospitalar da Delfin envolveu
alguns treinamentos na Alemanha
e em São Paulo. Seguindo o plano
de parceria com a Elekta, de nos tornarmos um centro de referência em
treinamento, vamos usar a expertise
que adquirimos em Lauro de Freitas
para treinar nestes novos equipamentos os profissionais que atuarão
no Hospital Português e no Hospital
da Bahia”, projetou Costa. A equipe
da unidade em funcionamento conta
com dois tecnólogos, dois físicos e
dois radio-oncologistas, que podem
atender até 60 pacientes por dia.
Negócios – Para o presidente
do grupo, o novo serviço significa o
fechamento do ciclo dos negócios em
radiação ionizante. “Há uma relação
intrínseca entre imagem e oncologia.
As duas atividades se complementam. Temos um histórico com o diagnóstico por imagem e estamos em
processo de expansão”, garantiu.
O pioneirismo em disponibilizar
exames de ressonância magnética
fora do ambiente hospitalar, se repetiu quando o Grupo Delfin tornou-se a
primeira empresa privada no Norte e
Nordeste a instalar uma indústria para
desenvolver e fabricar marcadores
biomoleculares (radiofármacos), utilizados para diagnósticos em oncologia (por exemplo, FDG), cardiologia
e neurologia. O espaço no complexo
médico também deu origem ao primeiro centro de pesquisa e desenvolvimento das substâncias na região.
Diagnóstico | jul/ago 2013
31
ENTREVISTA
tracey cooper
André Telles
A IRLANDESA TRACEY
COOPER, PRESIDENTE DO
ISQua: pacientes devem se
“sentir ouvidos” em casos
de erro médico
“Os hospitais
precisam admitir
quando erram”
Presidente da ISQua – conhecida como a acreditadora das acreditadoras
–, a irlandesa Tracey Cooper defende a “divulgação aberta” de eventos
adversos aos pacientes. Uma iniciativa que já se tornou lei em muitos países
32
Diagnóstico | jul/ago 2013
D
e seu escritório
em Dublin, na Irlanda, a International Society for
Quality in Health
Care (ISQua), conhecida como “a
acreditadora das acreditadoras”, tem
o papel único de fornecer reconhecimento global para as organizações que
se dedicam a estabelecer os mais altos
padrões de segurança ao paciente, através do Programa de Acreditação Internacional (IAP, na sigla em inglês). Até
outubro deste ano, essa missão está nominalmente a cargo da irlandesa Tracey
Cooper, uma cirurgiã por formação que
depois de atuar como médica em diversas cidades do Reino Unido retornou ao
seu país natal, onde curiosamente nunca exerceu a medicina. “Somos pessoas que simplesmente querem aprender
umas com as outras e partilhar os seus
conhecimentos”, define Tracey, cujo
cargo de presidente da ISQua ela diz
exercer de forma colegiada. Em conversa com a Diagnóstico, Tracey falou sobre um tema que continua sendo tabu no
segmento de saúde: admitir que o médico e o seu hospital cometeram um erro
médico. “Cada vez mais, os países estão
tentando melhorar a cultura que existe
entre os profissionais de saúde e gestores para promover a ‘divulgação aberta’ de eventos adversos aos pacientes”,
defende ela. “O hospital precisa admitir
quando erra”. A convite do Consórcio
Brasileiro de Acreditação (CBA), Tracey esteve no Brasil para participar do
II Congresso Internacional de Acreditação, realizado no Rio de Janeiro, em
agosto passado. Entre um compromisso
e outro, a executiva deu a seguinte entrevista à Diagnóstico.
Diagnóstico – A segurança do paciente
é o lema da 30ª Conferência Internacional da ISQua, em Edimburgo. Qual é
atualmente a maior preocupação com
o bem-estar de quem está internado
em um hospital?
Tracey Cooper – Há um certo número
de riscos para a segurança do paciente
em todo o mundo, embora existam obviamente desafios adicionais, em regiões específicas, que lutam para prover
os recursos básicos para os pacientes.
De forma recorrente, entretanto, as infecções de saúde associadas, erros de
medicação, ambiente errado para cirurgias e falhas no fornecimento das noções básicas de cuidados e de avaliação
continuam sendo os maiores desafios
para a segurança do paciente. Para as
pessoas mais velhas e mais vulneráveis,
proporcionar nutrição e hidratação adequada também são fatores-chave que
precisam ser geridos de forma a reduzir
o risco de danos às pessoas que estão
internadas em um hospital.
Diagnóstico – Em todo o mundo, os pacientes têm dificuldade em provar em
tribunal que foram vítimas de negligência médica. Nesses casos, é comum
hospitais e médicos sendo acusados
de não querer colaborar com as investigações. Admitir erros ainda é um
tabu na relação entre prestadores de
serviços de saúde e consumidores?
Tracey – Este é definitivamente um desafio em muitas nações. Cada vez mais,
os países estão tentando melhorar a cultura que existe entre os profissionais de
saúde e gestores para promover a “divulgação aberta” de eventos adversos
aos pacientes. O hospital precisa admitir quando erra. Em algumas nações,
isso é exigido por lei. A forma como
os profissionais de saúde respondem
aos pacientes e seus familiares quando as coisas vão mal faz uma diferença significativa na maneira como esses
pacientes se sentem envolvidos com a
instituição. Assim, é preciso fazer com
que os pacientes se sintam ouvidos e
tenham confiança de que o profissional
de saúde, a equipe clínica, o gerente e o
hospital tenham aprendido com o incidente, a fim de reduzir a chance de que
isso aconteça novamente.
Diagnóstico – Em sua atuação como
cirurgiã, a senhora presenciou muitos
erros médicos?
Tracey – Testemunhei um procedimento
cirúrgico incorreto, realizado na sala ao
lado de onde eu e minha equipe estávamos operando. O episódio envolveu
um paciente idoso durante uma cirurgia
para o que se pensava fosse uma massa
em seu ceco (parte do intestino). Mas,
na verdade, tratava-se de anomalia no
rim direito do paciente, que estava significativamente distendido. Isso ocorreu devido à documentação incorreta no
prontuário do paciente. A equipe médica não repassou as informações ou re-
alizou uma avaliação incompleta antes
da cirurgia.
Diagnóstico – Como tirar proveito de
casos como esse?
Tracey – Quando se está ciente de incidentes dessa natureza, a consciência
deve ficar em alerta sobre as falhas que
ocorreram relacionadas aos procedimentos. Se espera que a falha sensibilize as equipe a tal ponto que novos erros
não se repitam.
Diagnóstico – Há uma abundância de
casos de negligência que estavam ligados a padrões inadequados de comportamento por parte de médicos e
enfermeiros, como a falta de humildade, a dificuldade em trabalhar em
equipe e vaidade. Estes são atributos
que podem efetivamente interferir na
segurança do paciente?
Tracey – Isto é bastante verdadeiro.
Os “fatores humanos” dos elementos
de uma assistência médica segura são
fundamentais. E para se evitar entraves decorrentes desse desvio de comportamento, é preciso que haja uma
comunicação eficaz entre as pessoas
(pacientes e funcionários do hospital e
entre os próprios profissionais de saúde); relações eficazes entre profissionais
de saúde e as equipes, com a vigência
de equipe de trabalho (estudos têm demonstrado que onde as equipes clínicas
não funcionam eficazmente, em seguida, os serviços são mais propensos a ser
inseguros); e, por fim, o comportamento
eficaz entre os profissionais de saúde e
entre os profissionais de saúde e pacientes. No coração desses fatores está
a necessidade de uma liderança forte,
eficaz e uma positiva e aberta cultura de
aprendizagem.
Diagnóstico – Que desafios devem ser
superados pelos hospitais para atender com mais segurança o aumento da
participação dos idosos no sistema de
saúde?
Tracey – Há uma série de demandas a
serem supridas, que incluem a compreensão das alterações fisiológicas e
físicas das pessoas à medida que envelhecem e a necessidade de nutrição e
hidratação adequadas. O entendimento
de que as pessoas mais velhas podem
ter problemas com a viabilidade de sua
pele e podem ser menos móveis e, porDiagnóstico | jul/ago 2013
33
ENTREVISTA
tracey cooper
tanto, ter maior risco de desenvolver
úlceras de pressão é um ponto pacífico
a ser perseguido pelas equipes médicas.
Há outros pontos relevantes, como a necessidade de que as pessoas sejam mantidas tão móveis quanto possível, bem
como garantir que os pacientes idosos
não estejam usando mais medicação do
que necessitariam. Esses também são
fatores importantes que devem ser levados em conta.
Diagnóstico – A senhora veio ao Brasil
a convite do CBA. O que sabe sobre o
sistema de saúde nacional?
Tracey – Estou familiarizada apenas
com as informações que tenho colhido
de colegas no Brasil e da minha compreensão sobre os desafios que o país
enfrenta, que são semelhantes aos de
muitas outras nações
Diagnóstico – O ex-secretário do Tesouro dos EUA, Paul O’Neill, defendeu
em um artigo publicado no Journal of
JCI, que hospitais apliquem métodos
de organização da indústria, como a
resolução de problemas na hora em
que eles ocorrem. O que mais o setor
hospitalar pode aprender de outros
ramos da economia?
Tracey – Acho que o segmento de saúde, de forma geral, pode aprender, de
fato, como outros setores industriais gerenciam os seus negócios. E isso já vem
ocorrendo. Por exemplo, usando princípios de gestão da qualidade, controle
estatístico de processo e redesign. Esse
legado se estende também às indústrias
de alta confiabilidade, que são especialistas em reduzir a variações e eliminar
o risco de erros repetidos. Outra referência importante vem da gestão dos recursos humanos do setor aéreo, que resulta
em menos acidentes e um desempenho
focado no trabalho de equipe e baseado
em uma cultura de comunicação aberta.
Diagnóstico – A senhora esteve em
Gana neste ano, verificando o uso das
tecnologias de baixo custo na área da
saúde, tais como o uso de aplicações
móveis que orientam grávidas em áreas remotas sobre o nascimento e os
primeiros meses de vida da criança.
Fale sobre a importância dessas tecnologias em comunidades pobres.
Tracey – Sim, estivemos em Gana, em
fevereiro, com colegas de 17 países em
34
Diagnóstico | jul/ago 2013
O segmento
de saúde pode
aprender como
outros setores
industriais gerenciam
seus negócios. Uma
referência importante
vem da gestão dos
recursos humanos do
setor aéreo, que resulta
em menos acidentes
e foco no trabalho de
equipe
toda a África e da OMS e Usaid. Ouvimos excelentes exemplos de progressos
significativos que estavam sendo feitos
em alguns países para reduzir a mortalidade materna, as mortes de crianças
menores de 5 anos de idade e a ocorrência de HIV/Aids, tuberculose e malária.
Uma série de excelentes exemplos envolveu o uso de tecnologia de telefonia
móvel para lembrar as mulheres sobre
a importância de se manter fiéis às consultas clínicas de pré-natal e pós-natal,
além do uso de aplicativos para fornecer
acesso a aconselhamento clínico e orientações dos profissionais de saúde nos lugares mais remotos.
Diagnóstico – A senhora declarou recentemente ter ficado constrangida
pelo fato de que os países ricos “não fazem o melhor uso da tecnologia de que
dispõem”, em comparação, por exemplo, a países africanos com poucos recursos, onde há experiências simples,
mas entusiasmadas de medicina. São
diferentes lógicas de atenção médica?
Tracey – Em Gana, ouvimos exemplos
surpreendentes e bastante impressionantes de melhorias tangíveis em qualidade e segurança, com o uso de recursos
limitados. Ao retornar da África, um
relatório sobre as mortes evitáveis de
pacientes em um hospital na Inglaterra
foi publicado – o inquérito sobre o Mid
Staffordshire Hospital Foundation Trust.
Era um contraste sobre algo que ocorreu em um país rico e desenvolvido, em
comparação com o que havia testemunhado na África em termos de paixão,
comprometimento e melhorias mensuráveis na qualidade e segurança do paciente. Minha conclusão foi a de que muito
mais poderia ser alcançado, na África,
com os recursos disponíveis em países
desenvolvidos.
Diagnóstico – O relatório citado pela
senhora, divulgado em fevereiro deste
ano, mostrou que mais de 1.200 pacientes morreram no Mid Staffordshire
Hospital entre 2005 e 2008, por causas
relacionadas à negligência. Que tipo de
impacto uma experiência traumática
como essa causou nos padrões de segurança hospitalar do Reino Unido?
Tracey – Repercutiu enormemente nas
discussões sobre a questão, não apenas
no Reino Unido, mas em diversas outras
nações. Principalmente no que se referiu
à essência mais fundamental dos cuidados e da liderança nas organizações de
saúde, além das organizações nacionais
que supervisionam, gerem o desempenho e regulamentam os profissionais de
saúde. Isso resultou em uma revisão dos
tipos de informações coletadas como
indicadores de qualidade, segurança e
um compromisso de alinhar as prioridades para se concentrar nos elementos
importantes do cuidado, bem-estar, respeito e deveres básicos dos profissionais
de saúde. Além disso, foram reforçados
os fundamentos de uma liderança forte,
com coragem necessária para garantir
que as instalações de saúde tenham uma
cultura justa e aberta, que sejam totalmente dedicadas ao fornecimento de um
atendimento seguro e de alta qualidade
para os pacientes e não se distraiam deste
objetivo.
Diagnóstico – No próximo ano, a Conferência Internacional da ISQua acontece
no Rio de Janeiro. Como está o processo
de organização?
Tracey – Progredindo excelentemente.
Será uma excelente oportunidade para
mostrar o trabalho emocionante que está
acontecendo na área de qualidade e segurança no Brasil e na América do Sul.
Diagnóstico | jul/ago 2013
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Diagnóstico | jul/ago 2013
Diagnóstico | jul/ago 2013
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Diagnóstico | jul/ago 2013
Ricardo Benichio
Quem lê
decide.
Quem
decide lê.
Carlos Eduardo
Gouvêa, presidente da
Aliança Brasileira da
Indústria Inovadora em
Saúde (ABIIS)
a Revista
dos Líderes
da saúde
do brasil
Diagnóstico
| jul/ago
2013
39
ARTIGO
Paulo Lopes
Roberto Abreu
GESTÃO DE PESSOAS – O DESAFIO DAS ORGANIZAÇÕES
A
o longo de minha carreira profissional, tanto como executivo, consultor empresarial
e headhunter, tenho observado que há uma
área crítica nas organizações que diz respeito à liderança de pessoas.
Não importa como as organizações denominam seus ativos humanos – empregados, colaboradores,
associados, pessoas, talentos –, o que verifico é que não é
dada prioridade ao grande ativo que são as pessoas.
Nos nossos trabalhos de consultoria de gestão e desenvolvimento de executivos, observo que é muito falada e pouco
praticada a liderança de pessoas. Verifica-se que existem muitos motivos, mas destacaria:
• A pouca capacitação dos executivos na liderança de pessoas.
• A função do RH não é estratégica e sim operacional.
• Inexistência de políticas e cultura organizacional com
ênfase na atração, desenvolvimento e manutenção de pessoas.
• Formação técnica dos executivos preponderante em relação aos aspectos comportamentais.
Acredito que esses motivos têm muito a ver com a forma-
sos humanos. Hoje, o gerente contemporâneo deve assumir a
responsabilidade direta pela gestão de pessoas da sua equipe
em organizações cada vez mais horizontais. Neste contexto,
o grande desafio do gestor está em exercer o papel de coach
do seu time para a obtenção de altos índices de performance.
Contudo, é oportuno lembrar que, para cada gestor atuar
como coach, é necessário que esta cultura parta do executivo
principal, pois este, como maestro, é que ditará o ritmo da
música.
Diante deste cenário, destaco que há necessidade de que
os profissionais da área de recursos humanos desenvolvam
muitas competências, tais como:
a) Conhecimento do negócio, pois essa compreensão lhes
permite atrelar a área de recursos humanos com a estratégia e
resultados da organização.
b) Fornecimento de práticas de RH para todos os líderes
da organização – essa é a condição sine qua non para cultivar
a “marca” profissional de RH.
c) Gestão da mudança – o profissional de RH deve ser capaz de diagnosticar problemas, cultivar relacionamentos com
os clientes, articular a visão da empresa, definir a agenda de
liderança, resolver problemas
e implantar metas.
d) Gestão de cultura – os
profissionais de RH precisam
compreender que eles são os
assumir a responsabilidade direta pela gestão de
“guardiões da cultura” e que
seu impacto vai além das
pessoas da sua equipe em organizações cada vez
fronteiras funcionais.
e) Credibilidade pessoal
mais horizontais
– se os quatro pilares citados
anteriormente podem ser considerados os pilares da comção e desenvolvimento pessoal dos executivos. Na maioria petência do RH, a credibilidade pessoal seria descrita como o
dos treinamentos, tenho observado uma ênfase muito grande alicerce em que se apoiam esses pilares. Acreditamos que esse
nos aspectos técnicos e pouco investimento no desenvolvi- atributo envolva três dimensões:
mento de habilidades tais como comunicação, relacionamento
1. Os profissionais devem viver os valores da empresa.
interpessoal, inteligência emocional, liderança, criatividade,
2. Seu relacionamento com os colegas deve ser baseado
negociação e administração de conflitos.
na confiança recíproca.
Outro ponto altamente crítico é a falta de sistemas de ava3. Devem agir com “firmeza”, ou seja, sustentar ideias
liação de potencial, o que pode, na prática, dificultar a pro- e estimular o debate sobre temas cruciais.
moção de profissionais para posições executivas quando suas
Logo, o grande desafio das organizações é o investimento
maiores competências são técnicas.
na área de recursos humanos e na capacitação dos líderes para
Tudo isto repercute na cultura vigente das organizações atuarem como verdadeiros gestores de pessoas e proporciobrasileiras, nas quais hoje o que se fala é que há falta de talen- narem às organizações um clima organizacional que permita
tos no mercado de trabalho. Até posso concordar, pois sinto o crescimento e o desenvolvimento organizacional de forma
na pele no nosso trabalho de headhunter. Contudo, observo sustentável e produtiva.
que faltam competências dentro das organizações para a seleção, treinamento, avaliação e remuneração de pessoas.
É importante recordar que, no passado, a administração da Paulo Lopes é CEO do Grupo Organiza, headhunter, coach, palestrante e
força de trabalho era uma atividade própria da área de recur- autor do livro Segredos de um Headhunter.
O gerente contemporâneo deve
Diagnóstico | jul/ago 2013
41
VISÕES DA AMÉRICA
Fundación Cardiovascular de Colombia
O FUTURO DOS
SISTEMAS DE SAÚDE
DA AMÉRICA LATINA:
INVESTIMENTO EM
PESQUISA
No quarto artigo da série Os Ideais da América Latina, o CEO da
Fundación Cardiovascular de Colombia, Victor Raúl Castillo Mantilla,
defende investimentos do setor público de toda a região em
pesquisa na área de saúde e mais recursos para a formação de
mão de obra qualificada
Fotos: Divulgação
Victor Raúl Castillo Mantilla
CEO da Fundación Cardiovascular de Colombia. Formou-se em medicina na Universidad
Juan M. Corpas, de Bogotá, e fez pós-graduação em cirurgia geral na Universidad del
Valle e em cirurgia cardiovascular na Universidad Pontificia Bolivariana de Medellin
U
m dos desafios mais importantes para os
que têm responsabilidade pelo destino de
nossos países é alcançar a meta de permitir, a todos os cidadãos, acesso a serviços de saúde de qualidade, de forma
oportuna. Adicionalmente, conseguir a
equidade e a eficiência na utilização dos
recursos destinados para tal fim. Este preceito se converte em
uma exigência iminente dada a crescente fragmentação dos
serviços de saúde, o envelhecimento da população, o aumento
das enfermidades crônicas, a comorbidade mais complexa em
42
Diagnóstico | jul/ago 2013
muitos casos, o aumento das expectativas e o acesso à informação de parte da população.
Sob estas circunstâncias, são múltiplas as barreiras de
acesso aos serviços. A sua prestação é feita em condições deficientes de qualidade, com altos custos e um uso irracional
e ineficiente dos recursos disponíveis. O que resulta, quase
sempre, em indicadores de gestão clínica deficientes e, principalmente, uma baixa satisfação dos usuários quanto aos serviços recebidos.
Pelo exposto, urge em muitos países da América Latina,
como a Colômbia, a necessidade de mudar o enfoque tradicio-
nal e atual para passar de um sistema assistencialista – centrado na enfermidade – a um no qual se prime pela promoção da
saúde e a salvaguarda de suas determinantes, tendo como eixo
central a saúde pública.
Em 1978, mediante a Declaração de Alma-Ata, a atenção
primária de saúde (APS) foi promulgada como estratégia para
se alcançar a saúde para todos, em cumprimento do princípio
de universalidade. Sob esse aspecto, se firmou como diretriz
a operação de serviços integrais e centrados na pessoa – seu
núcleo primário, que é a família – e em maior proporção a
comunidade, com sua ativa participação. Além, é claro, do
devido apoio de políticas públicas que permitem atender às necessidades das populações de maneira integral e com um alto
nível de serviços de saúde prestrados.
Portanto, falar do presente e do futuro da saúde implica ter
claro um enfoque muito mais amplo, que transcenda as esferas
biológica, psicológica, social, emocional e do indivíduo, para
abarcar também seu entorno. A isso, entenda-se as condições
ambientais e nível de cobertura das necessidades básicas, com
um apropriado conhecimento de seus direitos que fornece ao
cidadão critérios de decisão e de juízo na hora de requerer e
utilizar os serviços de saúde.
Atualmente na América Latina é comum que se apresentem brechas claramente demarcadas em aspectos assistenciais,
sociais e tecnológicos entre os serviços básicos de saúde e os
de alta complexidade. Estas fissuras, na maioria dos casos, coexistem e tendem a se potencializar umas com as outras, na
medida em que todos os fatores mencionados anteriormente
se fazem cotidianos – tanto para o pessoal da saúde como para
os que utilizam os serviços ambulatoriais e/ou hospitalares de
qualquer nível de complexidade.
Apesar do panorama exposto, há mostras claras em distintos países da América Latina que nos permitem ter a certeza de
que, sim, pode-se conseguir o nível de saúde mais alto possível
em cada indivíduo. Para isso, é necessário que os governos
foquem seus esforços em garantir de maneira certa e real o direito à saúde mediante a definição de políticas claras, eficazes
e de longo prazo. Compromisso que deve ter como garantia a
qualidade da atenção, a avaliação e apropriação de novas tecnologias, além da equidade e o acesso aos serviços de saúde
por meio de ferramentas de APS e de redes integradas de serviços de saúde (RISS) – ações cujos frutos já foram comprovados em distintas partes do planeta.
Requer-se ainda como fator fundamental para a melhoria
dos serviços de saúde um compromisso profundo das autoridades na definição e implementação de políticas de qualidade
na prestação dos serviços, em todos os níveis de complexidade
e em instituições públicas e privadas. Estas definições deverão
incorporar incentivos para que os atores do sistema se motivem a investir na consolidação da qualidade de suas instituições, gerando um círculo virtuoso de eficiência e excelência
na prestação de serviços de saúde. Algo que, adicionalmente,
representará uma otimização de custos para o sistema.
FUNDACIÓN CARDIOVASCULAR DE COLOMBIA,
NA CIDADE DE BUCARAMANGA: a nona melhor
instituição hospitalar da América Latina em 2012,
segundo o ranking da revista América Economía
Diagnóstico | jul/ago 2013
43
VISÕES DA AMÉRICA
Fundación Cardiovascular de Colombia
Incidência dos medicamentos no Custo
de Atenção
O setor farmacêutico é um dos mais ativos do mercado de
saúde, com vendas estimadas em nível mundial de US$ 1 trilhão para 2014. Para o ano quem vem, as projeções apontam
para um crescimento de 5% – número que, ao menos, deve se
manter nos anos subsequentes. Uma indústria que, por razões
óbvias, tem relevância diferenciada em mercados de economias
emergentes, como os países integrantes da América Latina.
O perfil demográfico e o comportamento das enfermidades
nas populações vêm mudando, em especial no último século.
Atualmente, à medida em que as populações ampliam sua expectativa de vida e se tornam mais longevas, o impacto de enfermidades crônicas e complexas é maior, requerendo atenção
à saúde de maior complexidade – o que, na mesma medida, se
faz acompanhar do desenvolvimento de novos medicamentos.
De maneira sustentável, vem aumentando também o investimento em saúde no mundo. A complexidade e o custo dos
medicamentos também cresceram, o que representa um dos
desafios mais relevantes impostos a estados e a sociedade para
garantir o acesso oportuno e equitativo aos medicamentos pela
população.
Uma alternativa que se vislumbra para diminuir o custo dos
medicamentos é o estabelecimento de políticas que favoreçam
o desenvolvimento da indústria dos medicamentos genéricos,
cuja participação no mercado aumentou – não obstante as dúvidas e a má percepção sobre a qualidade de alguns deles. Para
gerar confiança em relação a seu uso, faz-se necessário que
se fortaleça o papel e a gestão das entidades reguladoras e se
defina um estrito marco regulatório a respeito.
Enquanto o preço dos medicamentos depende de muitos fatores e tende a diminuir com o passar do tempo e a entrada de
competidores, tende a ser mais alto em países com mercados
precariamente regulados.
Uma estratégia válida na otimização do custo dos medicamentos é a implementação de um sistema de regulação de
preços ou do mercado, ou inclusive um mecanismo de compras
centralizadas. Também se coloca a necessidade de estabelecer
um controle aos monopólios sobre medicamentos específicos,
através de um monitoramento dos preços e do consumo. Outra
alternativa corresponde a diminuir a carga tributária sobre os
medicamentos, especialmente os catalogados como essenciais.
Estima-se que na Colômbia, de acordo com dados do Ministério da Saúde, o gasto com medicamentos corresponde
a 30% de todo o custeio com a saúde. Este custo está especialmente influenciado por aquelas substâncias de recente desenvolvimento e introdução no mercado. Em especial, para
enfermidades complexas como o câncer e em casos que correspondem a alternativas únicas de tratamento. Uma realidade
que impõe sérios questionamentos à oportunidade e ao acesso
aos medicamentos.
Estima-se que cerca de 30% das pessoas que têm prescrição
médica não recebem o medicamento. É necessário e imperioso
para os estados garantir o acesso oportuno, assim como repensar o paradigma de que um medicamento, por ser novo, deve
ser custoso. Há um claro interesse e necessidade das sociedades e dos estados de prover e dispor de medicamentos a baixo
custo, que permitam dar viabilidade aos sistemas de saúde e
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Diagnóstico | jul/ago 2013
A Pesquisa em Saúde na
América Latina enfrenta
um desafio comum,
que foi discutido na
Primeira Conferência
Latino-americana
sobre Pesquisa e
Inovação para a Saúde:
Como fazer com que a
investigação atenda Às
prioridades de saúde
dos países e contribua
para o desenvolvimento
equitativo na América
Latina?
representem para a população a possibilidade de acessar e dispor de tratamentos adequados.
Tecnologia Informática e Integração
para fechar brechas
A Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), no documento número 4 da série A Renovação da Atenção Primária de
Saúde nas Américas, publicado em 28 de maio de 2010, assinalou que os sistemas de saúde das Américas se caracterizam por
altos níveis de fragmentação de seus serviços. Uma anomalia
que se manifesta com a falta de coordenação entre os níveis
e locais de atenção, duplicidade nos serviços e infraestrutura,
capacidade instalada ociosa e serviços de saúde prestados no
local menos apropriado. Na experiência dos pacientes, esta
fragmentação se expressa como inacessibilidade aos serviços,
perda de oportunidade e falta de congruência ajustada a suas
necessidades.
Para dar resposta a estas necessidades, deve-se materializar
a implementação de modelos de atenção em saúde baseados em
Redes Integradas de Serviços de Saúde (RISS), as quais, através de serviços de telemedicina e mediante ferramentas informáticas, gerenciam os diferentes níveis de complexidade dos
serviços de saúde para unificar e melhorar a disponibilidade e
usabilidade da informação de saúde de cada um dos cidadãos.
De tal maneira que se consiga , dessa forma, a integração das
RISS com a história clínica e o familiograma de cada paciente,
rompendo, assim, com a fragmentação e segmentação da atenção e melhorando a equidade, a eficiência e a racionalidade.
Pesquisa em saúde na América Latina
A pesquisa em saúde na América Latina enfrenta um desafio comum, que foi discutido na Primeira Conferência Latino-Americana sobre Pesquisa e Inovação para a Saúde: Como
fazer com que a investigação atenda às prioridades de saúde
Diagnóstico | jul/ago 2013
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VISÕES DA AMÉRICA
Fundación Cardiovascular de Colombia
dos países e contribua para o desenvolvimento equitativo na
América Latina?
Para assumir este desafio, requer-se a responsabilidade indelegável dos estados para fortalecer os sistemas nacionais de
ciência e tecnologia. A partir dos quais, de forma consensuada
com os atores requeridos, devem se construir políticas efetivas
que articulem a pesquisa e a inovação com as prioridades do
desenvolvimento social e de saúde pública. Políticas que devem ser mantidas dentro de um prazo, com metas claras e com
indicadores que sejam avaliados de forma contínua.
De maneira simultânea, requer-se que a América Latina
(AL) incremente o investimento em pesquisa e desenvolvimento (P&D). Segundo o informe InnovaLatino: Impulsionando a inovação na América Latina, atualmente, o investimento
público e privado em P&D da AL se encontra atrasado se o
compararmos com o dos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e o dos poderes econômicos emergentes da Ásia. Entretanto, existe uma
grande heterogeneidade no investimento. Na média, a América
Latina investe 0,3% de seu PIB em P&D – dois pontos percentuais abaixo da média sugerida pela OCDE (2,3%) e muito abaixo de países como EUA ou Japão, que investem 3% e
3,5%, respectivamente. Entre os países latino-americanos que
mais destinam recursos em P&D se encontram Brasil (1,02
%) e Chile (0,67%), e entre os que menos investem, Honduras
(0,04%) e Nicarágua (0,05%). A Colômbia investe 0,17% do
PIB em P&D.
Por outro lado, faz-se necessário seguir trabalhando na formação de talento humano altamente qualificado e na criação de
espaços oportunos para que estes investigadores se integrem
aos setores acadêmicos e produtivos, a partir dos quais se impulsione a pesquisa em saúde. Sob esse aspecto, faz-se necessário trabalhar e persuadir os que tomam decisões de Estado
em saúde sobre as vantagens estratégicas e o valor agregado da
pesquisa como insumo fundamental para a tomada de decisões.
Por último, deve-se seguir insistindo na cooperação regional e internacional em P&D como fator-chave para permitir
a redução das desigualdades em matéria de conhecimento,
tecnologia e financiamento. Para isso, se requer a geração
de estratégias e projetos de cooperação baseados em interesses comuns e complementares, conciliando, por sua vez, interesses da propriedade intelectual com os da saúde pública.
A Educação em Saúde e Talento Humano na
América Latina
Em relação à educação em saúde e diante da imperiosa necessidade de contar com profissionais em número suficiente,
competentes e de qualidade, a América Latina deve se preparar
para iniciar uma transformação nos processos educativos em
saúde. É imperioso, contudo, que tal objetivo se dê situando as
necessidades em saúde da população com o objetivo principal
da formação do profissional, cuja avaliação de desempenho e
processo formativo devem estar em sintonia com os impactos
na saúde da população.
As instituições educativas deverão melhorar os métodos
educativos, fazendo-os menos estáticos e fragmentados, fortalecendo os programas de pós-graduação, os planos de estudo e
a sua avaliação. Os programas de formação deverão se integrar,
revisando e reorientando os processos de formação para uma
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Diagnóstico | jul/ago 2013
melhor qualidade e responsabilidade social dos graduados.
Medidas que levariam as instituições universitárias a revisar
seus programas de formação e a reincorporar a seus currículos as competências que permitam aos profissionais de saúde
desempenhar um papel protagonista nos programas de atenção
primária em saúde da região.
Como resposta a estes desafios, os programas de formação
em saúde deverão se orientar pelo uso das tecnologias de informação, comunicação e pela gestão da inovação, além da investigação, da ética, da segurança do paciente e da humanização
dos serviços de saúde. Tudo isto em consonância com os avanços no conhecimento científico, a incorporação de novas tecnologias e a globalização. O profissional da saúde deverá ainda
ser tecnicamente competente e ter a capacidade de desenvolver
trabalho colaborativo, de se comunicar em diferentes idiomas
e com diferentes culturas. Some-se a isso, a capacidade para o
gerenciamento e administração dos recursos da saúde e para se
adaptar a um entorno em mutação.
Para isto, mais uma vez, as universidades e centros de formação da América Latina deverão estar capacitados para responder às necessidades mutantes de uma região mais interconectada e intercultural, oferecendo as respostas e as soluções
que a comunidade e o avanço da ciência e do conhecimento
requerem. Isso vai desde os serviços de atenção primária em
saúde até a prestação de serviços em instituições de alto nível
de complexidade, que dispõem em suas rotinas do uso constante de telemedicina, biotecnologia, bioinformática, entre
outros aribultos de vanguarda. A inclusão da investigação dos
programas acadêmicos fortalecerá os profissionais da saúde ao
provê-los com conhecimentos e ferramentas para a resolução
de problemas da região e do mundo, de maneira mais ampla.
Nos próximos anos, a América Latina deverá enfrentar
grandes desafios regionais e globais, dados por um rápido
crescimento da economia, mudanças sociais, políticas e das
populações, que vão requerer talento humano suficiente para
responder às necessidades em saúde da população. Assim, a
oferta educativa estará orientada a formar profissionais e trabalhadores da saúde competentes e capazes de responder aos
desafios da região. Os países promoverão, desta forma, o desenvolvimento de estratégias que incentivem o talento humano
em saúde para trabalhar nas diferentes zonas da geografia, de
maneira tal que os serviços de saúde possam ter um caráter
mais equitativo e universal para toda a população da AL.
Dessa forma, poderão ser estabelecidos programas de educação continuada, estímulos para a formação e a criação de
redes colaborativas, entre outras, para apoiar o talento humano
em saúde. Nisso, o componente das tecnologias da comunicação e informação se constituem e fatores-chave do êxito ao
facilitar a acessibilidade à formação e educação continuada do
talento humano.
O Estado, por outro lado, deverá ser capaz de responder
às necessidades e expectativas do talento humano em saúde,
para harmonizá-las com as necessidades da região e para criar
e adaptar postos de trabalho atraentes e de acordo com as transformações sociais da América Latina.
O sistema educativo, na mesma medida, deverá se comprometer firmemente com os programas de qualidade que promovam a transversalidade dos conhecimentos e a educação mais
generalista.
Diagnóstico | jul/ago 2013
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Ivan Baldivieso
EMPREENDEDORISMO
MV
paulo magnus, da mv:
operações no México e
no Chile e market share
de 50% no mercado de
hospitais do Brasil, acima
de 50 leitos
o dono
do jogo
Caçula de uma família de descendentes de alemães,
Paulo Magnus, dono da MV, não gosta de perder. Um dia
decidiu que sairia do campo, no interior do Rio Grande do
Sul, para nunca mais voltar. Ganhou o Brasil
I
Regiane de Oliveira
magine uma final de campeonato
de vôlei de praia. Uma dupla vence por 10 a 2, no calor escaldante
do litoral do Recife. A essa altura,
virar o jogo parece algo impossível, certo? Depende de quem
está jogando. “Essa partida foi
histórica, já que recuperamos e ganhamos
o jogo”, recorda Eduardo Queiroz, superintendente da Santa Casa de Misericórdia
da Bahia, que faz questão de dar o crédito
da vitória ao companheiro na empreitada.
“Paulo Magnus sempre foi perseverante.
Ele não vê problema em nada. Quanto
mais difícil, melhor”. Queiroz trabalhou
por quatro anos no Hospital Memorial
Guararapes, na cidade Jaboatão (PE), cujo
mantenedor é Paulo Magnus – fundador
da MV – e com quem o parceiro diz ter
aprendido muito vendo o estilo Magnus
de gerir os negócios. Jogador nato e muito
competitivo, o empresário não sabe o significado das palavras mau humor e timidez. Esse dinamismo não agrada a todos,
é fato. Mesmo assim, ele conseguiu criar
uma sólida rede de relacionamento para
dar suporte ao que muitos chamam de
“ideias malucas”, mas que, via de regra,
dão certo. Está aí a MV para provar que
audácia não faz mal a ninguém.
“Fui engraxate, jornaleiro, leiteiro,
maleiro. Meu pai dizia que a única forma
de sair da vida humilde é estudando. E foi
o que eu fiz. Abracei toda oportunidade
que tive para continuar estudando”, conta
Paulo Magnus. O caçula de uma família
de descendentes alemães perdeu o pai aos
12 anos na Colônia de São Pedro, no Rio
Grande do Sul. Sua adolescência foi marcada por buscar formas de não ter de voltar
ao campo. Foi para Torres fazer o segundo
grau, onde trabalhou em uma imobiliária,
até conseguir um trabalho como faturista
no Hospital Nossa Senhora dos Navegantes. A primeira experiência empresarial de
Magnus nasceu de um movimento novo
no setor de saúde: a terceirização do faturamento das contas hospitalares, no início
dos anos 1980. A RM Processamentos de
Dados foi aberta em parceria com colegas
do trabalho. Mas o empresário, que tinha
se formado em engenharia eletrônica, sonhava mais alto.“Queria produzir sistemas
que melhorassem a vida dos hospitais. Naquele ponto, eu entendia de faturamento,
mas só isso não resolvia a questão”, conta
Magnus. A cisão da empresa aconteceu
em 1987. Os sócios queria continuar apostando na terceirização; Magnus acreditava
que o futuro estava na tecnologia. Nascia
assim a MV Informática. O empreendedor
diz que, a partir daí, o desenvolvimento do
negócio foi um misto de sorte e trabalho.
“Se hoje a gestão na saúde ainda é considerada frágil, imagine lá atrás, quando
começamos, em que não havia sequer
computadores nos hospitais”, lembra. A
terceirização de faturamento continuou
sendo um dos serviços-chave da empresa
por muitos anos. A abertura de uma filial
do negócio em Recife foi rápida, em 1988.
Um ano depois, a MV estabeleceu contrato com a Secretaria Estadual de Saúde de
Pernambuco para realizar o faturamento
das contas hospitalares e apontar soluções
para a melhoria da receita de 200 hospitais. O universo das filantrópicas também
estava na mira da companhia. Com bons
relacionamentos na Confederação das Misericórdias do Brasil, a MV começou prestando serviços para o Hospital Tricentenário de Olinda. Essas empresas chegaram a
representar mais da metade da carteira de
clientes da MV.
Só na década de 1990, a MV começou
a atuar com sistemas integrados para faturamento e atendimento. O Sistema de Gestão Hospitalar Integrado (SGHI) foi um
dos primeiros do país a atender à maioria
das funções de um hospital. Foram tempos
difíceis para o setor, com o empobrecimento dos hospitais que trabalhavam com
o Sistema Único de Saúde. “Muitos hospitais privados filantrópicos, com bastante
serviço e pouca qualidade, passaram a ter
maior exigência do governo”. O resultado? A oferta de leitos foi reduzida para
atender às demandas de qualidade, mas a
remuneração não aumentou para compensar as perdas. O setor precisou reorganizar
os negócio e diminuir a dependência do
SUS, e a MV também teve de se reorganizar. “Crescemos muito de 1987 a 1994.
Depois desse ano, até 2000, passamos por
um período de dificuldade e tivemos que
migrar nossa carteira de clientes”, explica. A MV passou a buscar espaço entre
as empresas particulares para diminuir a
dependência dos hospitais do SUS e filantrópicas. A maior diferença foi no tamanho
dos projetos. Se antes a MV podia fazer
projetos “em casa”, passou a ter de implantar sistemas de ponta diretamente nos
clientes. “Custo maior, maior obrigação”,
lembra Magnus.
Era preciso atestar a qualidade dos produtos da MV. A companhia firmou uma
parceria com a Oracle Corporation, pas-
sando a integrar o Oracle Partner Program
(OPP) – programa mundial de parcerias
que a Oracle possui para atestar e desenvolver tecnicamente os produtos baseados
em sua tecnologia. O lançamento do Sistema MV 2000, em 1998, foi uma consequência. O produto reunia tecnologia Oracle
em desenvolvimento de sistemas e modernos conceitos de administração hospitalar.
“Conseguimos construir uma plataforma
muito aderente à realidade do Brasil, em
uma época em que muitas empresas de
fora até tentaram entrar no mercado, mas
não conseguiram se manter”, conta o empresário, que garante ter hoje duas concorrentes: a Agfa HealthCare e a Philips.
Aquisições – Para se manter forte, a
MV foi às compras. Adquiriu, dentre outras, a primeira empresa a fornecer sistemas de tecnologia para a saúde, a Hopidata, em 2012. Para sanar a deficiência em
software de imagem, a MV também comprou o Grupo Microdata no ano passado,
fechando assim 100% de atendimento da
cadeia de saúde. Com as aquisições, a MV
chegou a cerca de mil unidades de saúde
em sua carteira de clientes. Sobre a participação da MV no mercado, Magnus afirma que há várias formas de analisar esse
desempenho no Brasil. Se considerado o
universo de 5 a 7 mil hospitais, a MV tem
cerca de 20% de participação. Por outro
lado, se forem tomados apenas os grandes hospitais – com mais de 50 leitos –, a
empresa chega a um market share de 50%.
“Ainda temos uma lista para novas aquisições”, adianta Magnus. Mas também há
oportunidades no mercado externo. Com
operação em Angola, desde 2003, a MV
começou recentemente a atuar no México e Chile. O acirramento da velocidade
de compras está em linha com a entrada
de um novo parceiro, o fundo americano
Insight Venture Partner, que adquiriu uma
participação minoritária de 20% na empresa no final de 2012. Magnus garante
que a Insight tem pouca interferência nas
ações da empresa. Porém, as coisas estão
diferentes. A MV não divulga mais seu
faturamento, por exemplo. Expectativa de
crescimento? “Deixa prá lá”, diz Magnus.
Uma novidade para quem, até há pouco,
gostava de contar que a MV teve uma
receita de R$ 154 milhões no ano passado, com crescimento de 54% em relação
a 2011. Será uma mudança nas regras do
jogo? Seja o que for, Paulo Magnus não
entra em quadra para perder.
Diagnóstico | jul/ago 2013
49
ENSAIO
ensino médico
para o cirurgião
plástico e
professor de
negócios de yale,
robert Pearl, o
atual modelo de
ensino médico
inibe o pensamento
alternativo
Robert Pearl
Os líderes empresariais
podem ensinar os médicos
a serem mais criativos
50
Diagnóstico | jul/ago 2013
A
primeira vez que pus os pés no campus da
minha faculdade de medicina percebi que teria que deixar a minha criatividade na porta.
Para a maioria dos estudantes de medicina e
residentes em treinamento hoje, essa experiência permanece inalterada.
O objetivo da educação médica é ensinar
aos médicos aspirantes “o caminho certo” para prestar cuidados
médicos. Para a maioria dos pacientes – e para muitos médicos
– há conforto nas respostas definitivas que os médicos são ensinados a oferecer. Mas o mundo está mudando.
A criação do conhecimento está se acelerando, e os problemas de saúde estão se tornando mais complexos. Os médicos do
futuro precisarão de um conjunto de habilidades diferentes e de
muito mais criatividade. Para entender melhor essas necessidades, vamos comparar a educação médica com a abordagem da
escola de negócios.
Eu tenho o privilégio de ensinar tanto na Faculdade de Medicina quanto na graduação da Escola de Negócios de Stanford.
Estas duas academias são muito próximas geograficamente, mas
suas culturas são mundos separados. Os estudantes de medicina
aprendem por repetição – memorização baseada na repetição.
Mas, para os estudantes de negócios, a educação acontece através
de estudo de caso, análise e discussão.
Na escola de negócios, histórias sobre uma determinada empresa ou líder forçam os estudantes a analisarem um dilema e
oferecerem suas próprias soluções. A diversidade de pensamento é valorizada, e as retomadas de discussões são comuns. Os
alunos apontam para suas próprias experiências prévias e o seu
conhecimento como base para as suas reivindicações. Eles são
desafiados por colegas a defender suas soluções – e raramente há
apenas uma solução certa.
A disciplina que eu ensino na escola de negócios, Liderando
a Mudança Estratégica no Setor de Saúde, incentiva os alunos a
pensar grande e sem limites. Gasto o mínimo de tempo apresentando aos alunos “os fatos” – eles podem ler sobre isso em seu
próprio ritmo. Assim, mutualmente meus alunos incentivam uns
aos outros a desenvolver novas ideias que poderiam transformar
o setor de saúde.
Estudantes de negócios entendem que o caminho empresarial
é inteiramente baseado no mérito. Só o conhecimento, trabalho e
criatividade importam. O fracasso é aceito e até acolhido. As histórias heroicas são muitas vezes sobre as pessoas que fundaram
várias startups que faliram antes de criar um sucesso. É assim
que empresas que mudaram a indústria, como a Nike, a Sun Microsystems e a StubHubwere se formaram. A escola de medicina
não poderia ser mais diferente. O processo de aprendizagem durante os primeiros dois anos envolve predominantemente memorização. Um dia, os estudantes memorizam os ossos do pulso. No
dia seguinte, eles memorizam as etapas do ciclo de Krebs – série
de reações químicas que ocorrem na vida da célula e seu metabolismo. Há uma razão sólida para isto. Os estudantes de medicina
precisam desta informação para oferecer o melhor atendimento
aos pacientes. Ninguém se sentiria confortável com um cirurgião
iniciante que decidisse empregar uma nova, “criativa” abordagem cirúrgica que não tinha sido testada. Mas o foco singular
deste modelo de instrução inibe o pensamento alternativo. E o
sistema hierárquico da educação médica garante que as verdades
de ontem permaneçam as respostas de amanhã. O fracasso não é
O sistema hierárquico da
educação médica garante
que as verdades de ontem
permaneçam as respostas
de amanhã [...]. Os médicos do
futuro precisarão de muito
mais criatividade
tolerado, a criatividade é desencorajada, e os médicos aspirantes
são ensinados a se proteger aceitando a sabedoria transmitida pelos seus professores. Os estudantes de medicina sabem que não
podem dar errado se aderirem a “padrões da comunidade”.
“pensar fora da caixa” – O processo pelo qual os
professores ensinam a medicina sufoca a criatividade. Mesmo
décadas depois de sua graduação, os médicos continuam influenciados tanto pela sua instituição como pelos avanços na sua especialidade. Pior ainda, este processo sufoca o espírito inovador necessário para transformar a saúde. Não é de admirar que poucos
médicos estejam confortáveis em “pensar fora da caixa”.
Ainda que os médicos sejam as melhores pessoas para liderar
mudanças na área da saúde, poucos estão na vanguarda das transformações mais influentes na prestação de assistência médica.
Até agora, essas mudanças foram impulsionadas pela tecnologia
moderna e lideradas por contribuintes do lado de fora olhando
para dentro da medicina.
Empresas de prontuários eletrônicos dos pacientes (PEP)
como a Epic e Athenahealth têm transformado a maneira como
as instalações médicas operam. A Vocera, fornecedora de um sistema de comunicação mãos-livres, redefiniu a forma como milhares de enfermeiros trabalham. A HealthTap está virtualizando
cuidados com uma plataforma online que permite que os pacientes façam perguntas aos médicos licenciados.
Essas empresas foram fundadas por pessoas com formação
em ciência da computação, matemática aplicada e negócios. A
importância destas inovações não pode ser minimizada. Mas se o
processo de inovação médica é estruturado e liderado principalmente por quem nunca praticou a medicina clínica, suas soluções
não vão resolver completamente as necessidades de pacientes e
médicos. E, por isso mesmo, essas respostas nunca serão eficientemente adotadas. Os médicos são uma parte crítica da equação.
Se os médicos simplesmente servem como consultores ou reatores para inovações propostas, o processo de mudança irá falhar.
Precisamos repensar a educação médica e se queremos médicos que descubram e criem a próxima geração de soluções. E não
vai ser uma escolha “ou/ou”. Ambos, médicos e líderes empresariais, devem trabalhar juntos. Educadores médicos precisam reter o que é necessário no currículo de hoje, enquanto promovem
abordagens criativas e incentivam os alunos a desafiarem o status
quo. Até que isso aconteça, as melhores soluções permanecerão
ocultas e a saúde de diversas nações irá sofrer.
Robert Pearl é médico formado pela Escola de Medicina da Universidade de
Yale, com residência em cirurgia plástica e reconstrutiva na Universidade de
Stanford, onde ensina estratégia, liderança e tecnologia. É colunista da revista
Forbes.
Diagnóstico | jul/ago 2013
51
OSVINO SOUZA
Carogestor
A chamada Geração Y (seres inquietos e bastante competitivos) já começa a assumir cargos de
comando em grandes corporações – eles surgiram na década de 80, segundo especialistas.
Trata-se de uma comunidade pouco habituada a
lidar com o “não” e bastante hedonista (buscam
o prazer do dinheiro a qualquer custo). Como essas prerrogativas vão impactar o futuro da gestão?
Carlos Sampaio – Maringá/PR
Primeiramente, considero importante reduzir o peso do
rótulo que estamos colocando sobre estes jovens. Nem todos
têm essas características e com tal intensidade. Convivo com
muitos deles em vários programas realizados pela Fundação
Dom Cabral, de trainees a especialização, e vejo comportamentos variados, sendo que muitos não se encaixam no padrão que lhes está sendo imposto. Sou da chamada Geração
Baby Boomer e não reconheço entre meus contemporâneos
comportamentos tão semelhantes, bem como nas gerações seguintes, que correspondam tão exatamente às características
apontadas. Aliás, os especialistas recomendam estes cuidados.
52
Diagnóstico
Diagnóstico || jul/ago
jul/ago 2013
O fato é que um novo mundo do trabalho está nascendo debaixo de nosso nariz, por diversas razões, não apenas devido
à Geração Y, que é de certa forma causa e consequência delas.
A evolução tecnológica cada vez mais veloz e impactante e as
profundas transformações sociais têm obrigado as organizações a adotarem novas configurações e modelos de negócios
e de gestão. Teorias da administração que vigoraram até 20
ou dez anos atrás começam a ser questionadas e substituídas
gradualmente por novas ainda não suficientemente validadas,
particularmente no campo do comportamento e do desenvolvimento organizacional. Apenas tomando como um exemplo, só
muito recentemente a gestão das emoções, uma característica
inerente ao ser humano, começou a ser estudada como um fator
importante a ser considerado no ambiente de trabalho, no qual
a gestão pela razão sempre predominou. O que quero dizer é
que não é para gerir a Geração Y que devemos nos preparar,
mas para um novo mundo do trabalho, no qual o ser humano
será visto como tal e não mais como uma mera engrenagem da
empresa-máquina em que só podia dizer “sim”, atendendo a
regras ainda vigentes na maioria das organizações, como, por
exemplo, a do “manda quem pode e obedece quem tem juízo”.
A meritocracia ainda é a melhor fórmula de se fazer um time vencedor? Por que muitas empresas
ainda falham ao implantar esse tipo de estratégia?
Alessandro Ferreira, São Paulo/SP
Na seção Caro Gestor da edição nº 21 desta revista, respondi
a uma pergunta sobre meritocracia. Sugiro que você a leia, pois
nosso espaço aqui é muito pequeno. Vou tentar ampliar a resposta. Todo ser humano normal gosta de ter seus feitos, suas realizações reconhecidas. Todo ser humano gosta de ser distinguido dos
outros pela diferença que faz em qualquer campo de sua vida.
No campo do trabalho isto não é diferente. Gostamos e queremos
ser reconhecidos pelos nossos feitos e pelas nossas diferenças,
desde que seja em nosso favor. Não é fácil implantar um sistema
de meritocracia por várias razões. A primeira delas é a justiça do
sistema. Ele precisa tratar todos de forma justa, e aí começam
as dificuldades (e que dificuldades!), uma vez que entramos no
campo da subjetividade. Como definir um tratamento justo para
todos se cada um tem sua percepção do que é justo? Se cada um
percebe suas realizações como as melhores e se sente diferente
e melhor dos que os outros? Por mais que a organização se empenhe para criar um sistema justo do seu ponto de vista, será do
seu (organização) ponto de vista. Haverá sempre alguém que não
concorda com este olhar. Mesmo quando o sistema é construído
de forma participativa, não há como chegar a um consenso que
agrade a todos. Além disso, um sistema construído hoje, para
uma determinada situação, pode não valer para amanhã, dada a
velocidade e intensidade com que as mudanças ambientais, internas e externas, ocorrem. O sistema tem que ser ágil e adaptável
a estas mudanças. Ele tem de se ajustar rapidamente à estratégia
da organização, suportando-a a todo o momento, e pode diferir
no tratamento entre áreas dentro de uma mesma organização. Se
esta diferença de tratamento não for muito bem comunicada e
compreendida pelas áreas, isso pode ser percebido como injustiça e repercutir sobre o desempenho geral da organização.
Na Mineradora Vale, quem é demitido não pode
mais trabalhar na empresa. Na Odebrecht, o funcionário é aposentado após 30 anos de serviço,
mesmo que ainda esteja no auge da carreira. No
hospital no qual trabalho, os filhos dos fundadores
e as futuras gerações são proibidos de atuar no ne-
gócio. Há como mensurar os resultados desse tipo
de cultura organizacional? O que é certo e que é
errado?
ANÔNIMO
Os tópicos que você cita são políticas ou práticas que compõem o modelo de gestão de determinadas organizações. Estou
no mundo do trabalho há mais de 40 anos. Conheço vários modelos de gestão que adotam políticas e práticas semelhantes. Eu
mesmo já fui submetido a algumas delas e hoje oriento organizações a identificarem aquelas que melhor se adaptam a sua
cultura e estratégia. Eu diria que não há certo ou errado. Há o
que é melhor para cada organização e o que é melhor é o que
dá resultados. O problema está em testar políticas e práticas
diferentes, quebrando paradigmas, para se certificar de que as
que estão em uso hoje são as que dão melhores resultados no
momento atual do negócio. Frequentemente, quando investigamos a origem destas políticas e práticas, verificamos que tiveram
motivos aparentemente justificáveis para serem adotadas. Com
o passar do tempo, foram incorporadas à cultura da organização,
deixando de ser questionadas para se certificar se as justificativas
iniciais ainda continuam válidas. Se isto não é mais verdade, a
organização deve estar perdendo oportunidades e energia. Em
empresas familiares, a questão é ainda mais complexa, pois é necessário considerar as perspectivas da família, dos proprietários e
do negócio em si. Alinhar os interesses dessas três perspectivas é
sempre um grande desafio. Qualquer problema que ocorra numa
dessas perspectivas pode gerar como reação a criação de uma
política ou prática que emperre o bom desempenho do negócio.
Mas o inverso também pode acontecer, ou seja, a reação pode
ser para a proteção do negócio, mesmo que pareça descabida sob
algum olhar. A meu ver, as medidas radicais, proibitivas, como
as que você cita, deveriam ser revisitadas de tempos em tempos
para verificar se as condições que as estabeleceram ainda permanecem. Se não, deveriam ser revistas. Perpetuar um negócio
familiar é sempre um grande desafio, mas ao mesmo tempo pode
ser uma grande realização, motivo de grande satisfação para o
fundador e para seus sucessores.
Osvino Souza é professor da Fundação Dom Cabral nas áreas de
Comportamento e Desenvolvimento Organizacional.
Diagnóstico | jul/ago 2013
53
Divulgação
ARTIGO
Fernando M. Machado
A competitividade dos serviços privados de saúde
no Brasil - ameaças e oportunidades na porta da
frente (parte I)
U
reconstrutivas cerebrais da Materialise, na Bélgica, que converte
IRMs e TCs, via impressoras de 3D, em modelos anatômicos específicos em três dimensões, as impressões em 3D nas reconstruções de prótese de face e cavidade oral da University College,
em Londres, as curas em três dias de queimaduras de segundo
grau da Universidade Wake Forest e do McDowan Institute for
Regenerative Medicine, com aplicação de células epiteliais cultivadas de amostras do próprio paciente. Da mesma forma, novos
sensores em qualquer corpo, vestuário ou equipamento, poderão
dialogar e interagir com instruções recebidas via internet. O número atual de aparelhos conectados à internet já é de 12 bilhões
A empresa Proteus Digital Health já aprovou, na FDA dos
EUA, uma pílula-sensor ingerível cuja fonte de energia se ativa
com o suco gástrico e que monitora a ação de fármacos no corpo humano, além de enviar os
dados correspondentes a um
aplicativo de celular. Espera-se que os eletrocardiogramas
já poderão ser feitos também
revolucionada pelos diagnósticos remotos, que
através de aplicativo para o
celular, no próximo ano. Por
representam um mercado de US$ 200 bilhões
sua vez, a medicina transformativa representa inovações
baseadas em rupturas tecnoregistrada, por exemplo, na educação superior, nos últimos anos. lógicas ainda mais pronunciadas. A fusão entre a medicina e as
A medicina preventiva, curativa e, crescentemente, a transfor- engenharias, patente na constante evolução dos equipamentos,
mativa – que inclui a regenerativa – sofrem atualmente mudanças instrumentos e procedimentos de diagnóstico médico e cirurgias,
de tipo radical, cujo ritmo de aceleração nos próximos 50 anos adquire agora um impulso exponencial na criação de uma nova
deverá ser 32 vezes maior do que as últimas cinco décadas. E se fase evolutiva do ser humano. Na atualidade, depois de mais de
baseia na utilização da biotecnologia, tecnologias de informação 150 anos da contribuição de Darwin, a adaptabilidade natural ao
e comunicação (TICs), nanotecnologias, novos materiais e outras meio ambiente como a força motora da evolução humana requer
ser reconsiderada. O homem do futuro não será, por exemplo,
tecnologias de impacto transetorial.
A medicina preventiva já vem sendo revolucionada, entre ou- aquele capaz de respirar mais CO2, sobreviver em altas tempetros, pelos diagnósticos remotos via aplicativos de celular e via raturas ou se adaptar a outras mudanças de um meio ambiente de
internet, por algoritmos específicos aplicados a grandes volumes aquecimento global. O direcionamento de sua evolução está mais
de dados e informações médicas, como o Watson, e pelos diag- plasmado pelas suas necessidades de sobrevivência como espénósticos a partir do genoma humano, o que já representa um mer- cie, incluindo a longevidade com crescente qualidade de vida,
o desenvolvimento genético de capacidades super-humanas, a
cado global superior a US$ 200 bilhões.
O atual programa-software Watson, da IBM, foi treinado em imortalidade, a juventude eterna e a adaptabilidade às viagens
oncologia através da rápida leitura de mais de 600 mil relatórios espaciais.
Face ao exposto, que relação guardam os atuais serviços ofede evidências médicas, 1,5 milhão de registros de pacientes e
mais de 2 milhões de páginas de relatórios de provas clínicas e de recidos pelos hospitais, clínicas, casas de saúde e outros prestadores de serviços privados do sistema de saúde com as inovações
artigos de publicações médicas na área de oncologia.
Hoje o Watson é o principal apoio aos diagnósticos e decisões radicais descritas acima?
dos médicos oncologistas do Memorial Sloan Kettering Cancer
Research de Nova Iorque. Muitas aplicações das novas TICs têm Fernando M. Machado é mestre em Administração pela Univesidade de
igual incidência na medicina curativa, como demonstram os brô- Aston (Inglaterra) e presidente da Focototal Ltda. Foi diretor de Tecnologia
nquios artificiais da Universidade de Michigan, EUA, as cirurgias das Nações Unidas entre os anos de 1981 e 2006.
m recente estudo da Abimed revelou que
as empresas brasileiras do setor saúde têm
perdido competitividade nos mercados internacionais. Além da precária participação
de 0,19% no mercado externo, suas exportações cresceram somente metade da taxa
média anual de crescimento global registrada no período 2007-2011. Além disso, a atual revolução tecnológica e suas respectivas inovações estão colocando de ponta cabeça a competitividade e sobrevivência das organizações privadas
que se dedicam aos serviços de saúde no país.
A avalanche de novos competidores, principalmente do exterior, municiados com uma ampla diferenciação por serviços de
alta tecnologia, afetará o setor de maneira mais marcante que a
A medicina preventiva já vem sendo
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Diagnóstico | jul/ago 2013
Ricardo Benichio
SAÚDE
CUSTEIO
PRESIDENTE DA ABRAMGE,
ARLINDO DE ALMEIDA:
operadoras vão ser
obrigadas a repassar os
custos para os usuários
vai ser difícil
fechar a conta
H
Ruy Barata
Em fase decisiva de
negociações, projeto
de lei que reduz a
carga horária de
enfermeiros deverá
impactar os hospitais
em aproximadamente
R$ 7 bilhões. Ainda não
se sabe de onde virão
os recursos
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Diagnóstico | jul/ago 2013
neto,
de Brasília
á 13 anos em tramitação no Congresso Nacional, o
projeto de lei (PL)
2295/2000, que reduz a carga horária
de enfermeiros – de
44 horas para 30 horas semanais –, entra
na fase decisiva de negociações. Passado o conflito em torno dos vetos presidenciais do Ato Médico – que acabaram
sendo mantidos pelo Parlamento, no mês
passado –, o governo promete às organizações de trabalhadores que irá retomar as
conversas sobre a jornada dos enfermeiros, técnicos, auxiliares de enfermagem
e parteiros. A expectativa é abrir nova
mesa de negociações, ainda em setembro,
para responder à última e mais difícil das
questões que impedem o avanço da proposta: de onde sairá o dinheiro para pagar
a conta pela redução da jornada? A conta
é salgada: gira em torno de R$ 7 bilhões
por ano, de acordo com relatório produzido por um grupo de trabalho formado por
representantes do Ministério da Saúde, de
hospitais filantrópicos e privados, dos trabalhadores e dos conselhos de secretários
estaduais e municipais de saúde. As partes
têm que discutir os mecanismos de financiamento necessários para cobrir a despesa sem que isso comprometa o equilíbrio
financeiro das instituições de saúde e nem
o orçamento público nas esferas federal,
estadual e municipal.
O presidente da Federação Nacional
dos Estabelecimentos de Serviços de Saúde (Fenaess), Humberto Gomes, diz que,
por enquanto, não há recursos suficientes
nem na área pública e nem no setor privado para bancar a redução de jornada.
“Não há problema nenhum em reduzir a
carga de trabalho, seja qual for a categoria
profissional, mas desde que se deixe claro
quem irá pagar a conta”, afirma Gomes.
Segundo estudos desenvolvidos pelo
GT da jornada dos enfermeiros, o principal impacto da redução da jornada se dará
sobre programas de saúde públicos que
são pautados no trabalho de enfermeiros
e técnicos. A obrigatoriedade de contratar
mais profissionais para compensar o expediente menor da categoria pode colocar
em risco travas da lei de responsabilidade
fiscal (LRF) nos estados e municípios.
Para amenizar o impacto da redução
da jornada, entidades representativas dos
enfermeiros já fecharam compromisso
com o governo de aceitar uma redução escalonada da jornada de trabalho dentro de
um período de cinco anos e, por enquanto,
excluir da nova legislação os profissionais
que atuam no Programa Estratégia Saúde
da Família. Segundo a presidente da Federação Nacional dos Enfermeiros (FNE),
Solange Caetano, os compromissos firmados viabilizam o avanço do projeto de
lei. Fica faltando apenas resposta para a
questão do financiamento para a contratação de mais profissionais de enfermagem.
“Entendemos que é preciso haver uma
alternativa para os estados, municípios e
hospitais filantrópicos. E é justamente o
que esperamos que o Planalto ofereça”,
afirma Solange, que já articula mobilizações das entidades de enfermagem para
pressionar o governo a apoiar a redução
da jornada. As manifestações estão marcadas para ter início em setembro.
Mesmo assim, há discussões avançadas para que haja medidas compensatórias, caso o projeto vire lei. Uma das
formas de cobrir o buraco poderia se dar
por meio do aumento de repasses do SUS
para os procedimentos executados pelos
hospitais filantrópicos. Mas essa alternativa também depende de espaço fiscal suficiente em âmbito federal, que a União
parece não dispor.
Outro caminho de negociação que poderia resolver parte do problema, segundo
a FNE, seria retomar a inclusão dos hospitais privados entre os setores contemplados pela desoneração da folha de pagamento de funcionários – que substitui
os 20% de contribuição patronal do INSS
sobre os salários dos funcionários pelo re-
colhimento de 1% a 2% do imposto sobre
o faturamento da empresa. A demanda
dos hospitais privados já foi, contudo, vetada pela presidente Dilma Rousseff exatamente por falta de recursos necessários
para garantir a desoneração.
REPASSE PARA O USUÁRIO – Segundo Francisco Roberto Balestrin Andrade, presidente da Associação Nacional
dos Hospitais Privados (Anaph), os hospitais filiados à entidade teriam que aumentar em pelo menos 30% o número de
funcionários para responder aos impactos
da diminuição da jornada de trabalho dos
enfermeiros, mas essa não seria a única providência. “As repercussões dessas
medidas serão inúmeras porque não basta apenas contratar novos profissionais.
É preciso organização das instituições,
treinamento dos novos profissionais, ou
seja, uma série de providências”, afirma
Balestrin. “Não há esse planejamento
para absorver tal impacto”, diz ele. De
acordo com o presidente da Associação
Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge), Arlindo de Almeida, a PL 2295,
se aprovada, trará impacto direto no custeio da saúde suplementar. “Sessenta por
cento dos nossos custos são com folha de
pagamento. Seremos obrigados a repassar
a oneração dos gastos com pessoal para
o usuário”, avisa ele, que representa 240
operadoras de todo o país com rede própria de atendimento.
O projeto está pronto para ser votado
pelo plenário da Câmara dos Deputados,
mas não deve ser colocado em pauta sem
acordo entre as partes envolvidas pelo
menos dentro de um horizonte de dois
meses. Além da prerrogativa do presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves
(PMDB-RN), decidir o momento em
que o projeto será colocado em pauta, há
três PLs com regime de urgência constitucional que, apesar de poder ser retirado a qualquer momento pelo Palácio do
Planalto, por enquanto, ainda impedem o
pleito dos enfermeiros de ir a votação – o
novo Código de Mineração, a anistia de
débitos com o INSS para as santas casas
de misericórdia e a criação da Agência
Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (Anater). Em comparação
a outras nações, o Brasil tem jornada de
trabalho superior à dos países desenvolvidos. A redução da carga horária aproximaria a realidade brasileira de nações
que já trabalham com jornada inferior a
40 horas semanais, a exemplo do Canadá.
Segundo a OMS, o Brasil se encontra no
subgrupo de países com número insuficiente de enfermeiros necessários para o
atendimento da população. A agência da
ONU sugere serem necessários quatro
profissionais de enfermagem para cada
mil habitantes – no Brasil, a proporção
é de apenas 0,99 para cada grupo de mil.
“A defasagem de enfermeiros no Brasil é
muito grande”, afirma Solange. Um pleito
para lá de justo, mas cujo ônus deve cair
no colo do contribuinte, com a devida solidariedade do usuário do sistema de saúde suplementar.
Tatiana Viana
Solange caetano, da
federação NACIONAL
dos enfermeiros
(fne): mobilização para
pressionar Governo e
Congresso a aprovarem o
projeto
Diagnóstico | jul/ago 2013
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Diagnóstico | jul/ago 2013
Diretoaoponto
SUSANA FALCHI
Flavio Guarnieri/Divulgação
“O setor médico-hospitalar
tem um acentuado índice
de corrupção”
Integrante do Comitê de Recursos Humanos do Instituto Brasileiro de Gestão
Corporativa, a consultora Susana Falchi coordenou recentemente uma pesquisa
com 5.000 administradores de empresas, de 135 corporações, na Ásia, Europa e
Américas. E o resultado foi inquietante. Cerca de 20% dos executivos entrevistados
cometem desvios de conduta. Uma definição ampla, que inclui desde assédio moral
ao pagamento de propinas a funcionários públicos para conseguir contratos. Prática
comum, segundo a pesquisa, e que está presente em setores-chave da sociedade,
a exemplo do mercado de saúde. Curiosamente, Susana afirma que em muitos
casos as empresas contratam pessoas com esse perfil especificamente para fazer o
trabalho sujo junto a governos, sem manchar o nome da organização interessada. E
duvida que casos como o escândalo do metrô de São Paulo, envolvendo a Siemens
e a Alstom, ocorram sem a anuência das matrizes das empresas. “São ações que
precisam ter a aprovação externa, especialmente quando envolvem bilhões de
reais”, disse à Diagnóstico a executiva, que é CEO da HSD Consultoria.
Os executivos sul-americanos
são mais corruptos quando
comparados a americanos e
europeus?
Os dados da pesquisa não permitem essa
comparação, mas o cenário brasileiro é
altamente permissivo em razão da impunidade. Justamente por isso é importante
que no ambiente empresarial exista um
controle, um código de conduta dizendo o
que acontece quando um executivo age de
modo não ético.
É comum premiar executivos
que descumprem as leis em benefício da organização?
É difícil afirmar, porque não é algo feito
às claras. O que observamos, e a pesquisa
mostra isso, é que da totalidade das pessoas
que atingiram o topo da carreira, 20% apresentavam desvio de caráter. Em algum momento, se presume, elas foram valorizadas
por isso. Eu já ouvi do presidente de uma
companhia a seguinte declaração: ele nos
rouba, mas traz resultados.
É possível acreditar que, num
caso como o da Siemens e
da Alstom, a alta direção da
empresa não saiba sobre as
ações pouco éticas da matriz
no Brasil?
Está comprovado que em uma série de
resultados (de licitações) há relações, estratégias envolvidas. Episódios que acontecem no Brasil e que, quase sempre, não
aconteceriam em nações onde as leis são
mais severas. Justamente pela complexidade, episódios como esse precisam ter
aprovação externa, especialmente quando
envolvem bilhões de reais. Há corporações, inclusive, que fazem isso de forma
contumaz – em alguns casos, chegam a
contratar executivos para executar o trabalho sujo, como pagar propina em nome
da empresa para que ela não apareça.
Isso explica por que é tão difícil para uma corporação admitir publicamente que um executivo foi demitido por desvio
de conduta?
Em uma empresa de capital aberto, por
exemplo, isso pode inclusive comprometer
a credibilidade de mercado dessa empresa
para investidores externos. Então, esses assuntos são tratados de forma absolutamente
sigilosa.
Há formas de minorar os riscos de uma gestão fraudulenta?
Uma sugestão é mapear o perfil comportamental das pessoas que estão dentro dessa
gestão. É possível conseguir, através de
uma metodologia específica, identificar
pessoas com desvio de caráter. É sempre
Susana Falchi, da HSD
Consultoria: pesquisa com 5.000
executivos de 135 empresas das
Américas, da Europa e da Ásia
recomendável a realização de uma auditoria nesses ambientes.
Que segmentos econômicos
estão mais propensos a desvios de conduta dos executivos?
Todas essas empresas que atuam muito
com o governo acabam incorrendo mais
nesse tipo de comportamento. A pesquisa não indica isso, mas a gente observa
que essas empresas tendem a buscar
mais profissionais que sejam flexíveis
em relação à conduta ética.
Como os gestores de hospitais podem se precaver de
maus executivos?
As fraudes no setor de saúde, que tem
um índice de corrupção acentuado, são
muito complexas e não se limitam à gestão. Conheço o setor e, como qualquer
outro, há pessoas muito sérias e outras
nem tanto. O comissionamento de médicos para usar determinados equipamentos e o duplo faturamento de produtos
são exemplos sabidos de má conduta no
setor. Não sei o quanto os órgãos fiscalizadores estão preparados para fazer o
controle. No que tange aos executivos, é
mais do que importante mapear o perfil
de quem se candidata a uma vaga no setor médico-hospitalar.
Diagnóstico | jul/ago 2013
59
ARTIGO
Maisa Domenech
esta tão verbalizada, porém pouco aplicada nos nossos dias. Na
publicação em 1961, o Prof. Dr. Remilson Tourinho Domenech
Roberto Abreu
descreve que “indicar certo, no particular, é procurar restituir ao
paciente a morfologia e a função, integralmente, com o mínimo
de sacrifício de sua parte. É atender ao problema médico, não
desprezando o aspecto econômico-social. É considerar, acima de
tudo, o paciente em si, seguindo o que tão sabiamente já foi dito:
‘tratar o paciente e não a radiografia’. É procurar tratar mais o
fraturado e menos a fratura. É tratar visando à reintegração funcional futura do fraturado, antes que a exclusiva restituição morfológica imediata. Indicar certo é procurar fazer com o paciente o
mesmo que gostaríamos que fosse feito conosco”. Mais adiante,
sugere o Dr. Domenech que a leitura do referido trabalho sirva
á muito tinha o desejo de dedicar um des- para contribuir para que o tratamento, invariavelmente invasivo
ses artigos que escrevo a meu pai, Prof. Dr. no tipo de fratura ali estudado, possa ser resolvido perfeitamente
Remilson Tourinho Domenech. Médico por meio de método mais inócuo, mais econômico e eficaz.
Embora os holofotes sobre a não conformidade na saúde braortopedista e cirurgião, hoje aposentado,
professor catedrático da Escola de Medi- sileira sejam recentes, e nos EUA a discussão iniciada nos anos
cina da UFBA e sócio de hospital de re- 80 (vide revista Diagnóstico ano IV Nº 20/ mar/abr 2013), vi referência em ortopedia e traumatologia na tratada na tese aqui mencionada, escrita há mais de 50 anos, prinBahia, no qual o seu nome, formação e credibilidade no mercado cipalmente, a segurança desejada por um paciente quando em
de saúde foram decisivos na construção de uma marca poderosa, busca de uma aconselhamento médico, em busca de apoio, em
cuja instituição e a especialidade ortopedia passaram a ser sinô- busca dos devidos esclarecimentos sobre os riscos impostos pelo
procedimento cirúrgico e eventuais alternativas não cirúrgicas.
nimos, durante os muitos anos de sua atuação no negócio.
Para ele, ser professor, transmitir e multiplicar seu aprendi- Vi, também, o tão procurado equilíbrio necessário para a perpezado, suas crenças e a larga experiência obtida através da função tuação de um sistema de saúde, seja ele público ou suplementar.
Extrapolando tais escritos e consolidando os conceitos aludidos, por diversas vezes pude presenciar muitos pacientes com
indicação de cirurgia consultarem para uma
mais o fraturado e menos a fratura. É procurar segunda opinião aquele que era chamado durante toda a sua vida profissional de
fazer com o paciente o mesmo que gostaríamos “papa da ortopedia”. A contraindicação do
procedimento invasivo, quando não necesque fosse feito conosco
sário, em prol de um tratamento conservador, ainda que indicado na sua unidade de
saúde, é uma marca na sua vida profissional.
de cuidar do outro, mais do que ser médico, trazia muito prazer. Dr. Domenech diversas vezes repetiu que “algumas fraturas são
Ficava eu buscando entender o porquê de tanto prazer em lecio- operadas por falta de personalidade médica capaz de enfrentar
nar, o que não foi difícil, pois desde a minha infância, e ainda até com superioridade críticas maléficas e destrutivas oriundas de
hoje, posso presenciar com frequência o orgulho demonstrado espíritos incapazes, que, deixando de lado os princípios básicos
por muitos dos seus alunos – hoje profissionais de destaque na da deontologia médica e mesmo o sentido humanitário, visam,
por meio de radiografias feitas antes e após o ato operatório exiárea médica – em tê-lo tido como professor.
O meu desejo em lhe fazer esta referência, muito mais do bidas aos pacientes, se projetar como verdadeiros solucionadores
que o enorme carinho e orgulho de filha, veio da reflexão sobre a de tais casos. Pobres pacientes! Operados desnecessariamente;
expressão escandalizada de Hipócrates na capa da revista Diag- satisfeitos, entretanto, pelo fato de presenciarem radiologicanóstico de mar/abr de 2013 e da releitura recente das suas teses: mente o seu osso ‘encanado’. Pobres pacientes enganados”.
Não tenho qualquer dúvida de que Hipócrates, diante deste
Contribuição ao Tratamento das Fraturas Diafisárias do Úmero,
em 1961, e Contribuição ao Tratamento das Fraturas Supracon- exemplo, assim como de outros, que buscam através da prátidilianas do Úmero na Criança, em 1973, ambas apresentadas à ca médica cuidar do outro com o mesmo cuidado e afinco que
Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia. Atra- gostariam de receber, jamais estaria com o semblante de horror
vés da primeira e concurso em agosto de 1961, obteve o título de tal como na capa da revista Diagnóstico acima citada, mas dorlivre docente da cadeira de Clínica Cirúrgica Infantil e Ortopé- mindo em berço esplêndido, muito tranquilo e sereno em ter a
dica e o título de doutor em Ciências Médico-Cirúrgicas. Com a medicina em mãos de profissionais tais como o meu pai.
segunda, o título de professor titular em Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia.
No primeiro trabalho, aparece retratado o conceito sobre o Maisa Domenech é engenheira civil, pós-graduada em Administração Hospitaque é ser verdadeiramente médico, verdadeiramente cidadão e, lar, consultora da ADM Consultoria em Saúde e representante técnica da Febase
sobretudo, a efetiva aplicação dos conceitos de ética, palavra no Departamento de Saúde Suplementar da CNS.
Hipócrates,
nem tudo está
perdido
H
Indicar certo [...] é procurar tratar
60
Diagnóstico | jul/ago 2013
Diagnóstico | jul/ago 2013
61
BOASPRÁTICAS
3
A
CAMINHOS para
a FIDELIZAÇÃO DE
CLIENTES NO SETOR
DE SAÚDE
Adalton dos Anjos
o se relacionarem com clientes cada vez
mais exigentes e habituados a fazer pesquisas e comparações sobre os produtos
e serviços que irão consumir, as empresas
estão cada vez mais atentas à qualidade da
experiência com suas marcas. No caso de
instituições do setor de saúde, os gestores
acreditam que o desafio é maior, já que o mercado é bastante
sensível e exige agilidade, personalização e qualidade. Os investimentos em relacionamento têm retorno garantido, segundo
pesquisa do Instituto Ibero-Brasileiro de Relacionamento com
o Cliente (IBRC). O levantamento, feito este ano, revela, por
exemplo, que em um hospital de grande porte o impacto deste
setor no faturamento pode chegar a 20%.
Uma das cinco maiores operadoras de plano de saúde no
país, com uma carteira de mais de 1 milhão de associados e
faturamento de R$ 1,9 bilhão, a Golden Cross entendeu as necessidades deste novo consumidor e desenvolveu uma filosofia
de atendimento que foi reconhecida na 11ª edição do Fórum
Brasileiro de Relacionamento com o Cliente 2013, promovido
pelo IBRC. A companhia conquistou ainda o primeiro lugar entre as instituições do setor de saúde no ranking Exame/IBRC de
Atendimento ao Cliente. “O consumidor deve ser o objetivo de
toda organização, mesmo nas áreas em que as empresas não se
relacionam diretamente com ele”, defende a superintendente de
serviços ao cliente da Golden Cross, Anita Assis. “Justamente
por ser o elo mais importante da cadeia, todos os investimentos em integração de informações, capacitação de pessoas e em
tecnologia são de suma importância”. Ela pontua que o segredo
do sucesso do case da operadora no setor de atendimento ao
cliente está fundamentado no investimento em três pilares, nesta ordem: pessoas, processos e tecnologia.
1
Pessoas
O principal desafio enfrentado pela Golden Cross para se
tornar um benchmarking para o setor foi a capacitação dos mais
de 1.500 funcionários – 400 apenas no setor de atendimento –
espalhados na sede, no Rio de Janeiro, e em filiais localizadas
em São Paulo, Belo Horizonte, Brasília, Salvador, Porto Alegre,
Belém, Recife e Vitória. “O atendente bem informado é o ponto
de partida para qualquer relacionamento. É necessário ir além
dos investimentos em tecnologia e mudanças de processos, já
que lidamos com seres humanos”, pontua a executiva. “Não por
acaso, nosso perfil de atuação é voltado para o comportamento
62
Diagnóstico | jul/ago 2013
e para os sentimentos. Se não, seria outro tipo de atendimento, não personalizado”. Os novos colaboradores do setor de
atendimento da Golden Cross passam por três meses de treinamentos antes de assumirem suas funções. Primeiramente, eles
recebem informações gerais da empresa, dos produtos e serviços oferecidos, além de terem contato com a missão, a visão e
os valores. Após esta etapa, os novatos são direcionados para
uma preparação mais específica para o setor em que vão atuar
– Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC), Central Técnica,
Fale Conosco, Central de Serviços, Atendimento ao Corretor
e serviços oferecidos pela web. “Oitenta por cento dos nosso
atendimentos se dá via call center. Por isso, 60% dos nossos
esforços são em pessoas”, afirma Anita. E, mesmo assim, nem
sempre a demanda do cliente é atendida. Casos, por exemplo,
em que uma solicitação de procedimento, não coberta pelo plano, é preciso ser informada ao cliente. A tarefa deve caber, por
razões óbvias, a um profissional habilitado. “Nosso mercado é
muito sensível, por isso a importância da capacitação para que
o colaborador esclareça de forma adequada os motivos de uma
negativa”, avalia executiva.
Para o presidente do IBRC, Alexandre Diogo, a preparação
dos colaboradores é um grande passo na conquista da credibilidade dos clientes pelo serviço. “É preciso treinar toda a equipe.
Parece óbvio, mas não é”, defende defende Diogo. “É preciso
sair do amadorismo”. Outro ponto relevante é a escolha, por caráter técnico, dos cargos de comando dos setores responsáveis
pelo atendimento ao cliente. Uma situação comum, nesses casos, é a indicação de um médico, enfermeiro ou secretário que
se destacou na empresa. Um erro, segundo Diogo. “As pessoas
têm que ser contratadas pela avaliação de competência, experiência no cargo e conhecimento técnico-científico”.
2Processos
Outra etapa importante do processo de configuração da filosofia de atendimento da Golden Cross está relacionada ao fluxo
de informações e ao processamento dos dados para a melhoria
dos métodos de atendimento. Nestes casos, é preciso revisitar
e fazer pequenas modificações dos processos de forma continuada. Ouvir o cliente também é uma estratégia usada pela
operadora de saúde para obter informações para o desenvolvimento de novos processos que promovam o atendimento mais
personalizado. Para isso, no caso específico da Golden Cross,
uma ouvidoria foi montada, seguindo todas as regras da Resolução Normativa 323/13 da ANS, que regulamenta a atividade
“O objetivo da Ouvidoria Golden Cross é atender às manifestações dos beneficiários, como elogios, sugestões, consultas e
reclamações, para tentar resolver conflitos no atendimento ao
público e subsidiar o aperfeiçoamento dos processos de trabalho da operadora”, salienta Anita. Para isso, esta ferramenta de
comunicação deve estar ligada ao executivo principal da empresa. “A mensuração da satisfação dos clientes é uma importante fonte de dados para os ajustes nos processos”, sentencia
Diogo. “Exatamente por isso, a pesquisa é fundamental para
reverter qualquer problema que tenha acontecido e para revisi-
tar processos em todos os níveis”. Segundo ele, um dos maiores
problemas da relação médico-paciente no setor privado – e que
impacta diretamente a sinistralidade dos planos de saúde – é
a insegurança dos pacientes. O que os leva, quase sempre, a
procurar a famosa “segunda opinião”.
3
Tecnologia
Para conseguir realizar os 3,7 milhões de contatos por ano,
a Golden Cross também investe em infra-estrutura. “Precisamos de uma tecnologia que facilite o acesso, promova agilidade
e confiabilidade às informações que obtemos e que damos também”, observa Anita. “Usamos uma arquitetura de informação
apoiada por ferramenta de customer relationship management
(CRM), plataforma robusta tanto na área de telecomunicações
como de sistemas”. De acordo com a executiva, até o final deste ano, a companhia implantará uma atualização da ferramenta
de relacionamento que dará uma visão de forma holística do
cliente e facilitará o contato entre a empresa e o consumidor. O
CRM não é uma novidade no setor de atendimento no setor de
saúde. No entanto, muitas empresas, inclusive de grande porte,
ainda desconhecem a ferramenta, de acordo com o presidente
do IBRC. Na área de relacionamento com o cliente, a solução
mais avançada atualmente e pouco usada no segmento de saúde
no Brasil é o business intelligence (BI), conjunto de teorias,
metodologias, processos e tecnologias que fornecem informações precisas da gestão da empresa. “O BI é a grande menina
dos olhos do mercado. A customização é fundamental, e os recursos são muito mais modernos. Eles também estão atentos ao
relacionamento via mídias sociais”, ressalta Diogo.
No total, a Golden Cross investiu R$ 2,9 milhões somente
na parte de tecnologia para a implantação de uma central telefônica, realizada em 2011, que promove mais agilidade no
atendimento. Em cumprimento à regra que regulamenta os serviços de atendimento ao consumidor, as ligações têm que ser
atendidas em 60 segundos – 60% delas são atendidas em até 20
segundos. Além disso, as chamadas são gravadas e disponibilizadas aos clientes, – caso seja necessário – e as informações
obtidas através desse material são usadas para retroalimentar
os processos.
Diagnóstico | jul/ago 2013
63
64
Diagnóstico | jul/ago 2013
65
POLÍTICA
SAÚDE SUPLEMENTAR
Uma aposta
nA POLÍTICA
Operadoras de saúde multiplicaram por sete o investimento em campanhas políticas
nas últimas eleições, da presidente Dilma ao senador cassado Demóstenes Torres.
Um custo/benefício, por razões óbvias, ainda difícil de mensurar
O
Ruy Barata
neto,
de Brasília |Colaborou Gilson Jorge
mercado de saúde
suplementar
vem
aumentando exponencialmente suas
apostas no financiamento de campanhas
políticas nas eleições
brasileiras. Desde 2002, o avanço no volume de recursos aportados legalmente
para candidatos a deputados federais, estaduais, senadores e presidente da República – eleitos ou não – saltou de R$ 1.398
milhões para R$ 11.834 milhões nas últimas eleições, em 2010. Um acréscimo de
mais de 746%. Com base no levantamen-
66
Diagnóstico | jul/ago 2013
to Representação Política e Interesses
Particulares na Saúde: o caso do financiamento de campanhas eleitorais pelas
empresas de planos de saúde no Brasil,
os escores mostram ainda que, apesar do
número de empresas doadoras do setor
ter caído de 62, em 2006, para 48, em
2010, houve um acréscimo de mais de
R$ 3,2 milhões nos valores doados, entre
as duas últimas campanhas. Somente as
Unimed’s – todas as doações vieram de
operadoras – arcaram com cerca de 66%
dessas doações, seguidas pelas administradoras e corretoras (17%), medicina de
grupo (10,15%) e seguradoras (5,9%). As
legendas que mais receberam recursos
foram o PMDB (R$ 3,4 milhões), PSDB
(R$ 2,1 milhões) e PT (R$ 1,6 milhão).
Em valores, as maiores doadoras foram
a Unimed do Estado de São Paulo, com
R$ 3,5 milhões, e a Qualicorp, R$ 1,9
milhão. O dado mais relevante, contudo, é o total de recursos simplesmente
jogado fora com candidatos que sequer
foram eleitos. Somente para a Câmara
Federal, o valor desperdiçado chegou a
R$ 4,4 milhões. Desse total, R$ 2,3 milhões foram investidos pelas Unimed’s –
regional sul – na candidatura fracassada
do médico Dalmo Oliveira (PMDB-SC)
PLENÁrio vazio do
congresso nacional:
do total de deputados
eleitos com recursos
da saúde suplementar,
menos de um terço
apresentou projetos em
prol da saúde
Valter Campanato/ABr
a uma vaga na Câmara Federal. Outros
R$ 1,4 milhão foram gastos com parlamentares estaduais que igualmente não
obtiveram êxito nas urnas. Somados, os
valores representam quase 50% do investimento total do setor – uma margem de
acerto, no mínimo, questionável. O estudo, elaborado pelos pesquisadores Mário
Scheffer, do Departamento de Medicina
Preventiva da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo (USP), e Lígia
Bahia, do Laboratório de Economia Política da Saúde da Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ), tem como base
informações do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Legítimo, o financiamento de
campanhas eleitorais no Brasil é regulamentado pela Lei 9.504, de 1997.
Levando-se em conta a atuação dos
parlamentares que contaram com o apoio
do setor nesses últimos anos, será que
esse investimento valeu a pena? A Revista Diagnóstico foi conferir se, passados dois anos e meio dos atuais mandatos parlamentares – e praticamente a um
ano das próximas eleições –, os recursos
aplicados por empresas do setor de saúde nas campanhas de deputados federais
e senadores, eleitos em 2010, de fato se
traduziram em conquistas positivas para
os interesses da saúde no Congresso Nacional. A resposta, à primeira vista, não
é nada animadora, se construída a partir
de pelo menos três critérios: o número de
projetos de lei de interesse para a saúde
suplementar apresentados pelos eleitos
desde 2011; a participação deles em comissões permanentes que concentram os
debates em torno das propostas legislativas de interesse do setor; e, finalmente, o
nível de influência destes parlamentares
sobre os seus pares.
O acompanhamento foi feito tendo
como ponto de partida uma lista de 38
deputados eleitos com a ajuda de doações legais de campanha, registradas no
Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Deste
universo observado, a impressão que fica
é a de que o montante de R$ 2,7 milhões
– total aplicado pelas empresas nas campanhas dos parlamentares efetivamente
eleitos – praticamente não trouxe o retorno esperado. Destes 38 parlamentares,
apenas dez – menos de 1/3 – apresentaram
projetos de lei relacionados com a saúde
desde 2011, quando iniciaram o mandato.
A maioria dos beneficiados sequer apresentou um único projeto relacionado a
políticas de saúde. Mais: apenas dois deputados da lista lançaram propostas que
impactam diretamente o setor de saúde
suplementar, embora nenhuma delas traga medidas que possam ser consideradas
positivas para a atividade dos planos de
saúde.
BAIXA INFLUÊNCIA – A apresentação de projetos de lei é um dos indicadores que podem ser usados na avaliação
dos resultados esperados pelos agentes
financeiros quando decidem investir na
eleição de candidatos ao Legislativo, mas
não é o único mecanismo. Além da falta de projetos de lei de interesse para o
setor, a presença dos deputados nas comissões permanentes pelas quais passam
propostas que impactam a atividade das
empresas também é aquém do potencial.
Na Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF), os deputados que contaram
com o apoio do setor de saúde suplementar ocupam apenas oito vagas entre o total
dos 75 membros da comissão. Em outra
comissão importante, a de Finanças e
Tributação (CFT), há nove parlamentares
beneficiados pelas empresas do setor em
um total dos 66 membros. A proporção de
participação é ainda menor na comissão
que mais traz ameaças para o interesse das
empresas: a Comissão de Defesa do Consumidor (CDC), na qual, entre 45 membros, apenas três deputados presentes
estão na lista dos que foram beneficiados
pelos planos de saúde. O número mostra
o baixo poder dos deputados apoiados
pelos planos de construírem maioria para
barrar ou aprovar projetos que tramitam
nestas comissões.
Esta constatação fica ainda mais evidente se analisado o poder de influência
conquistado pelo grupo de parlamentares
na Câmara dos Deputados. Com base na
edição de 2013, publicada em agosto,
do levantamento do ranking Cabeças
do Congresso Nacional, elaborada pelo
Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP), apenas oito dos
38 eleitos em 2011 estão classificados
entre os 61 deputados considerados de
mais forte capacidade de influência no
Congresso. Outros seis dos deputados
apoiados pela saúde suplementar são
considerados como “parlamentares em
ascensão”. O conceito é aplicado pelo
DIAP para definir o parlamentar que vem
recebendo missões partidárias, políticas
ou institucionais e se desincumbindo bem
delas. Estão também nessa categoria os
parlamentares que têm buscado abrir canais de interlocução, criando seus próprios espaços e se credenciando para o
exercício de lideranças formais ou informais no âmbito do Parlamento.
No senado, a participação dos senadores é mais ativa. As duas senadoras eleitas com o apoio da Unimed Rio Grande
do Sul e Central Nacional Unimed, Ana
Amélia (PP-RS) e Lúcia Vânia (PSDB-GO), estão entre os parlamentares com
maior poder de influência entre os colegas
(segundo a classificação do Cabeças do
Congresso). A nota destoante fica com o
senador Demóstenes Torres (sem partido),
que teve mandato cassado após denúncias
que identificaram seu envolvimento com
o bicheiro Carlinhos Cachoeira. Ele recebeu R$ 30 mil da Central Nacional Unimed. Claramente, um investimento que se
mostrou ruim para o país.
Diagnóstico | jul/ago 2013
67
POLÍTICA
SAÚDE SUPLEMENTAR
presidente da frente
parlamentar da saúde,
Darcísio perondi (PMDB-RS):
é equívoco do parlamentar se
comprometer apenas com os
interesses de quem o financiou
Luis Macedo/Câmara dos Deputados
Alegando um “natural desconforto”
para falar sobre o tema, a maioria dos
deputados procurados pela Diagnóstico
demonstrou receio em falar sobre o financiamento de campanha, ou não atendeu à
reportagem. O tema é espinhoso porque
resvala em discussões sobre as nuances
da legitimidade do próprio financiamento
privado de campanha, uma questão que é
discutida como parte da reforma política
proposta pela presidente Dilma Rousseff
e hoje alvo de debates acalorados no Congresso Nacional. A mesma reação se deu
com os financiadores, que não responderam aos pedidos de entrevista via e-mail.
Para o presidente da Frente Parlamentar
de Saúde, Darcísio Perondi (PMDB-RS),
o tema é delicado, uma vez que há sinais
negativos resultantes da relação entre parlamentares e membros do Executivo com
os financiadores do segmento da saúde
suplementar. Para Perondi, que curiosamente não integra a lista dos beneficiados
com doações, o lobby mais forte do setor
ocorre sobre o Executivo e sobre legendas
partidárias pela distribuição dos cargos da
administração federal.
“O governo tem optado pelo loteamento político das agências reguladoras, esvaziando o modelo de regulação
do país”, denuncia Perondi, ao referir-se
aos conflitos de interesses identificados
na ANS. Ele avalia que, apesar da ajuda
do financiamento privado dos planos de
saúde para a eleição de parlamentares, a
maior preocupação dos congressistas da
bancada da saúde tem sido a de aumen68
Diagnóstico | jul/ago 2013
tar o financiamento do Sistema Único de
Saúde (SUS) e melhorar a organização
deste sistema. “A lei permite o financiamento privado de campanha, mas há uma
ótica negativa de se trabalhar com isso.
E uma outra positiva”, afirma. “A ótica
equivocada ocorre quando se observa um
comprometimento do candidato apenas
com os interesses de um dos segmentos
que o financiou”. O lado positivo, em sua
opinião, é a oportunidade do parlamentar
discutir a saúde de um ponto de vista mais
amplo, com enfoque no interesse público.
Assim também pensa o deputado Eleuses Paiva (PSD-SP), que recebeu R$ 100
mil para a sua campanha da Unimed do
Estado de São Paulo. Apesar de ter sido
eleito com a ajuda da saúde suplementar,
o deputado diz concentrar seu mandato na
defesa do SUS e é autor de projeto que
vincula 10% da receita corrente bruta da
União para a saúde, proposta similar a outra apresentada por Perondi.
cooperativismo – “Entrei no parlamento para discutir saúde”, justifica
Paiva, ao ressaltar que tem projetos apresentados que vão de encontro a interesses
de grandes grupos privados da saúde suplementar. Ele cita como exemplo uma
proposta apresentada no ano passado
(Projeto de Lei 4542/12) que proíbe estrangeiros de serem sócios majoritários
em operadoras de planos de saúde nacionais. A decisão veio a reboque da repercussão da compra, pela americana
UnitedHealth Group (UHG), do controle
acionário da JPL, empresa controladora
da Amil Participações (Amilpar). A preocupação, segundo o parlamentar, é a de
que o negócio abra caminho para novas
aquisições do tipo no Brasil. Fora da lista
de doações a parlamentares, a Amil financiou a candidatura do atual governador
do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB/
RJ), que recebeu R$ 100 mil, e do candidato a senador derrotado nas últimas eleições Cesar Maia (DEM-RJ) – R$ 300 mil.
O deputado eleito que mais recebeu
recursos de financiamento privado do
setor de saúde suplementar nas últimas
eleições, Marco Aurélio Ubiali (PSB-SP)
– R$ 285 mil doados também pela Unimed do Estado de São Paulo – , não se
furtou a falar sobre o tema. Segundo ele,
não há conflitos de interesses quando há
uma convergência ideológica do parlamentar com o setor que o apoia. “A expectativa do meu financiador, como a de
todos os setores econômicos que apostam
em campanhas eleitorais, é a busca de representatividade no Parlamento. E o que
eles (os financiadores) me cobram? Que
eu faça exatamente aquilo que eu acredito: a defesa do cooperativismo”, afirma
Ubiali, que é titular da Comissão de Finanças e Tributações (CFT) e participa
da comissão especial montada na Câmara
para discutir o financiamento para a saúde
pública.
Apesar dessa aparente fraqueza de
representação no Parlamento, cientistas
políticos rejeitam a tese de que o financiamento privado às campanhas políticas
não tem valido a pena para as empresas.
O que de fato ocorre é que esta relação
não é clara e nem é fácil de ser comprovada. Os agentes econômicos que buscam
ganhar influência política têm interesses
diversos e nem sempre procuram obter
vitórias do processo legislativo. Os ganhos pretendidos passam por outros caminhos relacionados aos bastidores da
política. O cientista político Manoel Leonardo Santos, coordenador do Centro
de Estudos Legislativos da Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG), explica que não há uma relação direta entre
as contribuições para financiamento de
campanha e a expectativa de respostas
positivas para os interesses das empresas
investidoras nas votações do Congresso.
Responsável por elaborar um estudo que
tenta avaliar com mais clareza os efeitos
do lobby no Congresso, Santos admite
que a própria literatura acadêmica sobre
o assunto é dúbia ao responder questões
acerca de sua efetividade. Há autores que
dizem que financiamento de campanha
não tem nenhum efeito prático na tentativa das empresas de influenciar o processo
legislativo. Outros dizem que os efeitos
são condicionais e dependem do momento político e da inexistência de conflitos
que podem ocorrer em função da defesa
de determinadas posições pelo parlamentar. “São necessários estudos com lupa
para identificar esses efeitos”, reconhece
Santos.
Uma resposta mais ampla à questão
também passa pelos interesses específicos que os agentes econômicos buscam
no mundo político. O que se procura,
muitas vezes, não passa pela aprovação
de projetos de lei ou mesmo pelos debates para mudanças nas regras de regulação do setor. “Para muitos financiadores
de campanha, o objetivo deste investimento é o acesso à política, à informação
privilegiada”, afirma o cientista. “O que
significa conquistar alguém que seja intermediador dos interesses deles com o
Executivo”. Avaliação similar é compartilhada por Mario Scheffer, professor do
Departamento de Medicina Preventiva da
Faculdade de Medicina da USP e um dos
autores do estudo que deu origem a essa
reportagem.
Para ele, há uma série de benefícios
obtidos pelas empresas que vão além do
processo legislativo, que é por si só muito
limitado por conta das naturais dificuldades exigidas para aprovação de projetos
de lei. “O lobby da saúde é tradicional e
bastante difuso”, define Scheffer, que já
atuou como assessor da CPI dos Planos
de Saúde, em 2003. Ele explica que o financiamento funciona mais para criar um
ambiente favorável à aprovação de certas medidas, mas isso não significa exatamente uma moeda de troca que pode
ser claramente visualizada. Em sua avaliação, não faltam sinais de que o lobby
do setor de saúde suplementar funciona
e obtém retornos positivos às empresas
por negociações à margem do processo
político. “A porta giratória da ANS pas-
Gustavo Lima/Câmara dos Deputados
sa por indicações de políticos que contaram com apoio das empresas de plano
de saúde”, sugere Scheffer. Há outras
formas de atuação em que parlamentares
mais próximos das operadoras, por vezes,
atuam como verdadeiros “anteparos” a
propostas que podem ameaçar a atividade das empresas. É o exemplo que se
observa nas tentativas para a abertura de
uma comissão parlamentar de inquérito
(CPI) voltada para investigar denúncias
de irregularidades praticadas por planos
de saúde. A iniciativa tem sido impedida
de ir adiante, segundo o líder do PSOL na
Câmara, Ivan Valente (SP). O parlamentar, membro da Comissão de Defesa do
Consumidor na Câmara, protocolou pedido de abertura da CPI em junho. Valente
afirmou à Diagnóstico que teve dificuldades em conseguir recolher as 171 assinaturas necessárias para viabilizar a abertura da CPI. “Havia apoio na Comissão
de Defesa do Consumidor, mas quando
a questão ia ao plenário, muitos se abstinham de defender o tema”, afirma.
Divergência – O pedido da CPI já
foi homologado na Secretaria-Geral da
Câmara e agora depende de decisão do
presidente da Casa, Henrique Eduardo
Alves (PMDB-RN) para efetivá-la. Há,
contudo, uma fila de 16 pedidos de abertura de CPI na Câmara. Como o regulamento da Casa não permite que mais de
cinco comissões funcionem simultaneamente, a perspectiva de que as investigações ocorrem com brevidade é remota.
A expectativa de compromisso em
deputado marco aurélio
ubiali (Psb-SP) RECEBEU
A MAIOR DOAÇÃO DE UM
PARLAMENTAR ELEITO – R$ 285
MIL, DA UNIMED DE SÃO PAULO:
defesa do cooperativismo na
Câmara Federal
votações no Congresso de deputados ou
senadores que foram eleitos com a ajuda
do setor de saúde suplementar também
não é uma equação fácil de ser costurada.
Os recursos doados a campanhas de forma legal no TSE representam uma pequena parcela do universo de vínculos entre
empresas e políticos que, em geral, não
servem ao lobby. Há parlamentares que,
embora constem da lista de beneficiados
pelo setor de planos de saúde, têm feito
propostas contrárias aos interesses comuns do mercado.
Apesar de ter sido financiado pela
Unimed, em 2010, isso não impediu o
deputado Eleuses Paiva (PSD-SP) de
apresentar projetos de lei que ampliam
a cobertura dos planos para atender demandas como as de reprodução assistida.
Experiência similar ocorre no caso do
deputado Antônio Carlos Mendes Thame
(PSDB-SP), que propõe projeto, apresentado este ano, alterando a lei dos planos
de saúde (9656/1998) com o objetivo de
garantir tratamento equivalente nas carteiras de pessoas físicas e jurídicas. Na
justificativa, a proposta visa acabar com
a política de desestimulo, por parte das
operadoras, à manutenção dos planos
individuais. O deputado Mendes Thame
Diagnóstico | jul/ago 2013
69
POLÍTICA
SAÚDE SUPLeMENTAR
recebeu R$ 50 mil de doação de campanha feita pela Unimed do Estado de São
Paulo.
Variáveis como essa – comuns ao
jogo democrático – ajudam a colocar
mais sombra sobre a complexa equação
entre financiamento de campanha e seus
resultados práticos. Mesmo assim, apesar
das incertezas que envolvem a escolha
do parlamentar a ser financiado durante
as campanhas eleitorais, os grupos econômicos não têm a opção de abrir mão
destes investimentos, mesmo contando
com possíveis derrotas no Parlamento ou
enfrentando posições contrárias de seus
políticos ao longo dos anos de mandato.
Em suma, o investimento, mesmo de alto
risco, não pode deixar de ser feito. “Se
minha atividade depende da regulação
do Estado, eu não posso escolher por não
fazer política, porque se eu não defender
os meus interesses, outros grupos concorrentes na minha atividade com certeza o
farão”, afirma o cientista político Manoel
Santos. Para ele, sempre será uma tarefa
difícil prever se o investimento nos políticos terá ou não bons resultados para
os interesses das empresas, mas qualquer
segmento estará pior se não construir
uma interlocução. Isso explicaria por que
as doações só fazem aumentar de valor.
Apostas que, quase sempre, guardam
expectativas tão subjetivas quanto o resultado nas urnas. Nas eleições presidenciais, por exemplo, tanto o candidato do
PSDB, José Serra, quanto a do PT, Dilma
Rousseff, receberam doações – respectivamente R$ 500 mil e R$ 1 milhão,
vindas da Qualicorp. Outros R$ 400 mil
foram investidos pela seguradora na campanha de eleição do atual governador de
São Paulo, Geraldo Alckmin. Ofuscado
pelos fracassos das últimas eleições, Serra, que foi ministro da Saúde, dificilmente será uma boa aposta em 2014. Já a presidente Dilma e o governador Alckmin
viveram nos últimos meses um dos maiores reveses em seus mandatos, desde que
assumiram o poder em janeiro de 2011,
com manifestações que assolaram o país.
Se a resposta sobre se valeu ou não a
pena o investimento em suas campanhas
viesse das ruas, no auge da crise, certamente a resposta seria um sonoro não.
Nos Estados Unidos, financiamento é “custo da democracia”
N
o ano passado, pela primeira
vez desde a década de 70, as
empresas americanas puderam comprar espaço publicitário na
TV, no rádio, internet e impressos para
as campanhas dos políticos de sua
preferência que concorreram a cargos
federais, como presidente, senador e
deputado federal. Embora a doação
direta aos comitês eleitorais continue
proibida, a decisão da Suprema Corte
reacendeu o debate sobre as doações
de empresas e até que ponto vale a
pena, para o setor privado, contribuir
para as campanhas.
Em uma matéria publicada recentemente sob o título Dissecando as
doações de empresas às campanhas,
o jornal The New York Times mostra
que desde 2002 mudanças na lei americana já vinham facilitando as coisas
para empresários dispostos a investir
seu próprio dinheiro para manifestar,
através dos meios de comunicação, o
seu apoio ou a rejeição a um determinado candidato – medida que sempre
foi vista com cautela por parte do empresariado simplesmente pelo medo
de que a sua marca sofresse arranhões
junto à opinião pública.
Mas essa disposição em intervir mais ativamente na vida política
aflorou mais intensamente no empresariado americano em 2010, quando
70
Diagnóstico | jul/ago 2013
a Suprema Corte decidiu expressamente
eliminar as barreiras para a compra de horário político por parte de empresas (Nos
Estados Unidos, a veiculação de propaganda política no rádio e na TV é paga.)
Uma das fontes ouvidas pelo The
New York Times foi o cientista político Stephen Ansolabehere, professor de
Harvard e coautor do livro Why is there
so little money in US politics (Por que há
tão pouco dinheiro na política americana,
em tradução livre). O livro afirma que a
discrepância entre o valor da política e os
valores contribuídos deforma as noções
básicas de economia. Na entrevista, Ansolabehere complementou: “Dado o valor
do que está em jogo, as empresas e os outros grupos de interesse devem dar mais”,
seguindo a lógica dos “custos da democracia” – definição consagrada nos anos
70 pelo também cientista político Alexander Heard. Para dar força a seu argumento, Ansolabehere ressaltou que o valor
das doações de campanha nos Estados
Unidos, em 2010 – cerca de US$ 4 bilhões –, ficou muito abaixo das despesas
de custeio do governo, de US$ 1 trilhão.
Defensores da maior participação
do capital na vida pública afirmam, por
exemplo, que nenhum político americano
vai optar por comprometer o seu mandato com um determinado setor financiador
em detrimento da opinião pública. Um
nível de percepção típico de nações nas
quais o exercício democrático e acesso à informação já estão consolidados.
Um estudo publicado pela Universidade de Harvard, aliás, mostrou
que as mudanças na legislação eleitoral desde 1971 até 2002 não tiveram
impacto sobre os preços das ações
das empresas financiadoras de políticos. Entretanto, algumas empresas
sofrem diretamente com boicotes ao
apoiarem candidatos com bandeiras
políticas polêmicas, como os que são
abertamente a favor ou contra o aborto e casamento entre homossexuais,
por exemplo.
Mesmo com poucos riscos, o financiamento de campanhas é visto
como pouco eficaz por parte dos analistas políticos. Um estudo comparativo feito pela Universidade de Chicago
mostra que, entre 1972 e 1990, o dinheiro teve pouco efeito no resultado
das eleições proporcionais em uma
sociedade com maior acesso à informação, como os Estados Unidos. Pelos cálculos do professor Steven Levitt – autor do estudo –, cada US$
175 mil investidos “comprariam”, no
máximo, 0,33% dos votos. Ansolabehere, por sua vez, estima que no sistema político americano um candidato
a deputado nos Estados Unidos teria
que gastar US$ 1,5 milhão a mais do
que os seus oponentes.
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72
Diagnóstico | jul/ago 2013
equipamentos de imagem e de raios-x de
última geração em uma sala de operação
permite procedimentos menos invasivos,
mais seguros e com tempos de recuperação mais rápidos para os pacientes. O
equipamento de imagem ajuda os cirurgiões a identificarem a área da incisão e
fornece feedback instantâneo durante os
procedimentos. Por exemplo, os casos de
neurocirurgia endovascular, como operações de aneurisma, agora podem ser realizados de forma mais segura e eficiente
em uma sala de cirurgia híbrida. À medida
que os cirurgiões conduzem estes casos
complexos – e de alto risco –, o diagnóstico por imagem de alta tecnologia aumenta
os resultados positivos, permitindo que os
neurocirurgiões transitem sem problemas
de um procedimento fechado para um público, sem perder tempo crítico para transportar um paciente a outro local para fazer
imagens.
Se projetada com fluxo clínico em
mente, a sala cirúrgica híbrida pode ser
A integração no Ambiente
híbrido (foto ao lado)
vai além do aspecto
arquitetônico: equipe médica
(esq.) pode navegar em uma
variedade de diferentes sistemas
de equipamentos a partir de um
painel de controle centralizado
uma força para o futuro das plataformas
de intervenção. Através da combinação de
imagem e capacidades cirúrgicas, os hospitais estão redefinindo a suíte intervencionista, com grandes vantagens na assistência ao paciente e eficiência de custos.
Planejamento e projeto –
Com o surgimento de salas cirúrgicas híbridas aparecem implicações culturais e
de design que vão muito além da sala de
cirurgia propriamente dita e se estendem
por todo o centro cirúrgico e pelo hospital
como um todo.
O primeiro passo no planejamento de
uma sala híbrida é buscar a absorção de
cada um dos especialistas cirúrgicos que
irão utilizar a sala. As equipes de projeto
devem incluir representantes de departamentos cirúrgico e perioperatório, administração, instalações e TI. A equipe também deve visitar salas cirúrgicas híbridas
em outros hospitais e experimentar estes
novos tipos de espaços.
Durante a fase de projeto, é fundamental usar as mais recentes ferramentas
de desenho 3-D para criar uma visão clara
dos elementos da sala híbrida. Uma vez
que o projeto seja aprovado, uma maquete em tamanho natural deve ser construída. Isto dará à equipe a oportunidade de
identificar e resolver todos os desafios de
design na sala antes de ela ser construída.
A seleção primária e a coordenação
dos fornecedores também são passos importantes, especialmente se a adição de
equipamentos de imagem acrescente complicações espaciais para a sala de cirurgia.
Em particular, os tetos requerem uma consideração cuidadosa e um planejamento
antecipado, pois ambos os equipamentos,
cirúrgico e de imagem, tendem a ser montados no teto. Com planejamento antecipado, os designers têm a oportunidade
de incentivar os fornecedores a trabalhar
juntos para ajustar parâmetros específicos
do projeto. Cada vez mais, os fabricantes
têm se unido para oferecer soluções mais
sinérgicas.
Por exemplo, na sala cirúrgica híbrida
Fotos:Divulgação
do Centro Médico Geisinger Wyoming
Valley, na Pensilvânia, dois fornecedores
se uniram para integrar seus sistemas em
uma solução. O braço do aparelho de um
fabricante foi adicionado aos monitores
de outros fornecedores necessários ao
sistema de hemodinâmica, reduzindo a
quantidade de equipamentos no teto. Os
fornecedores também estão trabalhando
para oferecer sistemas que integram a TI
com o equipamento. Por exemplo, agora é
possível para a equipe médica navegar em
uma variedade de diferentes sistemas de
equipamentos, inclusive cirúrgico, vídeo
e monitoramento de pacientes, a partir de
um painel de controle centralizado.
Layout e equipamentos – As
salas híbridas podem ter uma variedade
de equipamentos de imagem, incluindo
simples ou biplanos, e cada vez mais tomógrafos e ressonância magnética (RM).
As RMs podem variar em tamanho de
111 metros quadrados a 241 metros quadrados, enquanto os tomógrafos executados a partir de 74 metros quadrados e até
102 metros quadrados. Ambos os quartos
devem ter espaço para a sala de controle,
espaço de provisão, área de purificação,
uma sequência de armários e a plataforma
cremalheira do gerador, que administra o
equipamento. As diretrizes para projeto e
construção de estabelecimentos de saúde,
versão 2014, do Instituto de Diretrizes Arquitetônicas dos EUA (Facility Guidelines
Institute) vão incluir uma nova seção sobre salas cirúrgicas híbridas que requerem
armários embutidos de armazenamento de
aço inoxidável em vez dos racks de rolamento para armazenamento de cateteres –
típicos das salas de cirurgia tradicionais.
Por esta razão, os suprimentos devem ser
cuidadosamente considerados.
Todas as ressonâncias magnéticas híbridas exigem equipamentos não ferrosos,
assim como as quatro zonas de segurança,
que vão desde o acesso público gratuito (Zona I), a rigorosamente controladas
zonas de acesso restrito (zonas III e IV)
– identificados pelo Colégio Americano
de Radiologia (American College of Radiology). Se uma sala híbrida vai ser um
espaço flexível usado por várias especialidades que utilizam as salas de maneiras
diferentes e exigem diferentes configurações de sala, dimensionar a sala híbrida
para acomodar cada um é fundamental
durante o processo de planejamento. Hospitais podem atingir dimensionamento
ideal, certificando-se de consultar representantes de cada especialidade que irá
utilizar a sala.
Localização – Idealmente, salas cirúrgicas híbridas devem ser integradas em
uma suíte de intervenção – isto mantém a
logística simples. No entanto, se as salas
de cirurgia existentes de um hospital são
separadas de sua sala de raio-x, então é
importante localizar salas cirúrgicas híbriDiagnóstico | jul/ago 2013
73
DESIGN
PRÁTICA MÉDICA
das com outras salas de cirurgia. Colocar
o quarto híbrido dentro de um centro cirúrgico evita a duplicação de espaços de
apoio, incluindo material cirúrgico, instrumentação e equipamentos. Isso leva o
hospital a economizar custos adicionais
para a duplicação de equipamento e evita ineficiências no movimento dos materiais limpos e sujos. A colocação da sala
cirúrgica híbrida também reduz as preocupações dos funcionários, pois o pessoal
de apoio cirúrgico, como as equipes de
enfermagem perioperatória, perfusionistas, anestesistas e cirurgiões, não terá que
trabalhar em mais de uma área do campus.
Fluxo de Trabalho – A fim de alcançar um fluxo de trabalho eficiente na
nova sala cirúrgica, a equipe de design
também deve levar em conta o fluxo de
pacientes e o fornecimento de material,
além da proximidade da equipe. Salas cirúrgicas híbridas reúnem um novo espectro de usuários no mesmo departamento,
misturando diferentes disciplinas de cirurgiões com intervencionistas, anestesistas,
cardiologistas, eletrofisiologistas, patologistas, enfermeiros, técnicos e muito mais.
Em uma sala de cirurgia tradicional, as
posições de trabalho, aplicações clínicas
e os requisitos de equipamentos, logística paciente/materiais e agendamento para
cada um dos itens acima seriam preocupações mutuamente exclusivas. As salas
cirúrgicas híbridas borram essas linhas.
Elas também aumentam a quantidade de
espaço necessário ao pessoal de apoio. O
74
Diagnóstico | jul/ago 2013
Centro Médico Geisinger
Wyoming Valley, na
Pensilvânia, EUA: a era das
salas cirúrgicas híbridas abre
portas para a eficiência na
redução de custos em recursos
humanos, equipamentos, materiais
e procedimentos
design destes espaços deve facilitar a interação interdisciplinar entre as equipes de
atendimento. Materiais adequados para
todas as disciplinas também precisam
estar à mão na suíte cirúrgica. Assim, a
equipe de planejamento deve considerar o
armazenamento para o inventário exigido.
Será que é necessário haver uma mudança
no manuseio de materiais em termos de
cases de fornecimento?
Os novos tipos de procedimentos que
ocorrem em uma sala cirúrgica híbrida
exigem novos tipos de carrinhos para
medicamentos, que carregam os pacotes
de materiais e instrumentos necessários
para cada caso. Suprimentos para procedimentos de neurocirurgias endovasculares,
cardiologia e eletrofisiologia devem estar
todos disponíveis.
Salas cirúrgicas híbridas nem sempre
têm que ser utilizadas para procedimentos
híbridos. Elas podem ser projetadas para
permitir procedimentos operacionais normais quando o equipamento de imagem é
girado para fora do caminho, ou para uso
de imagem intervencionista. Os pacientes
geralmente se deslocam da preparação
para um longo procedimento na sala híbrida, e, em seguida, para uma unidade
de cuidados intensivos especiais. No entanto, quando o espaço é utilizado como
uma sala tradicional ou para geração de
imagens, haverá uma rápida virada e um
aumento da taxa de utilização do espaço e
dos seus recursos. Isto irá aumentar o número de espaços de preparação e de recuperação necessários e demandar pessoal e
recursos de armazenamento de suprimentos adicionais.
esforço que vale a pena –
Embora haja um número relativamente
pequeno de salas cirúrgicas híbridas nos
Estados Unidos hoje, este número deve
crescer significativamente no futuro próximo. A pesquisa de 2011 pelo Millenium
Research Group prevê uma taxa de crescimento anual de 15% para as salas híbridas
ao longo de um período de cinco anos.
As vantagens dessas salas incluem melhorar a experiência do paciente, permitindo
procedimentos minimamente invasivos
que aumentam a segurança do paciente
e diminuem o tempo de recuperação, reduzindo a inconveniência de os doentes
serem transferidos de uma ala do hospital para outra. Para os hospitais, a era das
salas cirúrgicas híbridas abre a porta para
a eficiência na redução de custos em recursos humanos, equipamentos, materiais
e procedimentos. Tal como acontece com
todas as novas tecnologias, integrar uma
sala híbrida perfeitamente em um hospital
existente requer premeditação e planejamento significativo, mas as recompensas
para os pacientes e hospitais fazem o processo valer a pena.
Catherine Gow e Brenda Byrd são arquitetas e trabalham na área de planejamento de construções do
escritório de arquitetura Francis Cauffman, respectivamente, nas filiais da Filadélfia e de Nova Iorque.
Publicado originalmente na revista Healthcare Design. Todos os direiros reservados.
Diagnóstico | jul/ago 2013
75
informe publicitário
Blue Mídia apresenta sistema inovador
de gestão de atendimento e comunicação
Produto promove ganhos em comunicação, produtividade de funcionários e gestão nas
unidades de saúde
A
s televisões e painéis digitais em salas de espera
de clínicas, laboratórios, consultórios e hospitais
podem ser muito mais do que simples ferramentas
para entreter e organizar o atendimento dos clientes. Um novo produto lançado pela Blue Mídia
oferece uma solução que otimiza e, ao mesmo tempo, fornece informações preciosas para os gestores sobre o tempo de espera dos
pacientes e a produtividade dos colaboradores de modo informatizado. O sistema de gestão de atendimento também moderniza
as recepções, já que em uma mesma tela é possível visualizar a
programação da TV aberta ou TV corporativa e as informações
que eram emitidas nos painéis digitais, como a senha e o guichê.
“É preciso substituir aqueles modelos antigos de atendimento por
um produto mais moderno, simples e integrado. Nossa solução
promove ganhos em comunicação, produtividade e em gestão”,
explicou o diretor executivo da empresa, Nilvânio Gonçalves.
Segundo ele, todo o sistema funciona de modo bastante simples,
já que somente um equipamento, uma espécie de servidor, é instalado junto às televisões na sala de espera, e o software é acessado pela rede interna da instituição, pelos médicos, atendentes
e gestores, através dos seus computadores. As notícias que circulam na tela são atualizadas diariamente, e é possível veicular
conteúdo institucional, como unidades de atendimento, especialidades, horários de funcionamento, dicas de saúde, diretamente
aos pacientes em espera.
Para os executivos, a solução da Blue Mídia moderniza a comunicação e facilita a obtenção de informações sobre o ritmo do
atendimento, que demandaria tempo de pesquisa. “Todo o monitoramento acontece online e em tempo real. A ferramenta dá uma
visão para o gestor da produtividade de funcionários, do tempo
de espera dos clientes, do tamanho da fila, dos horários e especialidades com maiores demandas, ou seja, uma infinidade de
76
Diagnóstico | jul/ago 2013
informações”, detalhou o diretor executivo. Villy Almeida, diretor de marketing, defende que o novo produto é completo. “Não
entregamos um software, entregamos um serviço que é todo feito
pela Blue Mídia. Fazemos desde a instalação e manutenção, que
pode ser realizada até por acesso remoto, até o treinamento dos
usuários e criação de conteúdo e visual para a TV corporativa. A
ferramenta de gestão é customizada de acordo com os serviços e
especialidades do cliente, visando dinamizar e aprimorar o atendimento. Ela tem a possibilidade de emitir mais de 20 tipos de
relatórios com gráficos e informações estatísticas por unidade,
usuário, horário etc., de maneira muito simples”, garantiu.
O diretor de marketing também ressaltou os ganhos em produtividade dos funcionários que alguns dos clientes da Blue Mídia
têm observado a partir da utilização do sistema. “Facilitamos o
trabalho de toda a equipe. O paciente é chamado de modo informatizado, sendo possível até mesmo ao médico chamá-lo de
dentro do seu consultório, com apenas um clique”, observou. Almeida também citou o caso das empresas que mantêm um televisor para entretenimento, banners e cartazes com informativos
institucionais, e outro aparelho para ajudar no painel de chamada.
“Conseguimos agregar tudo em uma ferramenta só”, declarou.
Depois de cerca de um ano personalizando e otimizando o sistema na área de saúde, os diretores acreditam que chegaram a um
formato capaz de corresponder às demandas do segmento e já fazem planos para o futuro. “Queremos anteder o mercado baiano
e expandir nosso produto para outros estados do Nordeste, com o
intuito de inovar a gestão da saúde”, pontuou Gonçalves.
Empresa: Blue Mídia | Telefone: 71.3489-5013 | Endereço: Ed.
Tancredo Neves Trade Center, sala 118, Caminho das Árvores,
Salvador – BA | Site: tvsaude.bluemd.com.br E-mail: contato@
bluemd.com.br
Fotos: Divulgação
ÁFRICA
AJUDA HUMANITÁRIA
O americano Dustin
McBride, fundadoR
da ZAmbikes, ao lado
de líder comunitário
africano: bicicleta
foi transformada em
ambulância
Uma carona
para a vida
D
Gilson Jorge
Dois projetos de ajuda
humanitária, com
base no uso de motos
e bicicletas, estão
levando esperança a
comunidades isoladas
da África. Exemplos
reais de como ações
simples e uma dose de
boa vontade podem
salvar a vida de
milhares de pessoas
78
Diagnóstico | jul/ago 2013
urante uma viagem
à África, em 1988,
para verificar os resultados do trabalho
da ONG Save The
Children, que combate a mortalidade
infantil, o então astro do motociclismo, o
americano Randy Mamola, sua relações
públicas, Andrea Coleman, e o marido
dela, o jornalista esportivo Barry Coleman, se deram conta de que o atendimento médico a milhões de africanos estava
sendo prejudicado pela falta de transporte. E que os poucos carros e motos disponíveis no sistema de saúde passavam
boa parte do tempo parados por falta de
manutenção.
Com uma longa trajetória em corridas de motocicleta, os três decidiram usar
seus conhecimentos técnicos e a sua rede
de relacionamentos para montar uma associação sem fins lucrativos que, 25 anos
depois, ajuda os governos de sete países da
África subsaariana a levar pacientes para
os hospitais e medicamentos para os vilarejos mais remotos, com uma economia
de até 62% nos gastos oficiais com transporte. A Riders for Health (Carona para a
Saúde, em tradução livre) é um dos mais
bem sucedidos exemplos de iniciativas da
sociedade civil para levar o tratamento a
quem não tem como ir, por contra própria,
a um hospital. “Para mim, era inaceitável
que, no final do século XX, pessoas estivessem morrendo de doenças facilmente
curáveis apenas porque elas não podiam
ser alcançadas”, afirmou à Diagnóstico a
CEO da Riders for Health, Andrea Coleman, que é ex-motovelocista. “Ao mesmo
tempo, os veículos que deveriam levar assistência médica estavam parados e sem
uso porque ninguém sabia como cuidar
deles”.
Apesar de ter passado por uma tragédia pessoal – perdeu o seu primeiro marido, Tom Herron, em 1979, em um acidente durante uma competição no Reino
Unido –, o motociclismo se tornou símbolo de vida para esta inglesa que desenhou
o modelo de operação da entidade. A
ONG, que atualmente ajuda a levar atenção médica a aproximadamente 14 milhões de pessoas em sete países, funciona
como uma espécie de locadora de veículos sem fins lucrativos. A Riders for Health coloca à disposição dos governos associados cerca de mil motocicletas e 400
ambulâncias convencionais para transportar, respectivamente, medicamentos
e pacientes. O valor da tarifa é calculado
de forma a garantir o pagamento dos 400
funcionários da ONG, da manutenção dos
veículos, do combustível e das despesas
com logística. Outra forma de garantir a
redução de custos foi a implantação do
programa Gerenciamento das Fontes de
Transporte (TRM, na sigla em inglês),
que, com o treinamento dos funcionários
da manutenção, permite uma economia
extra. Se os técnicos são treinados para
garantir que os veículos tenham manutenção adequada, os motoristas recebem
treinamento de direção segura, o que evita
que os automóveis sofram danos maiores
ao circularem pelas péssimas estradas dos
países atendidos, aumentando a vida útil
de motos e ambulâncias.
“Além disso, os nossos modelos financeiros para a gestão dos veículos implicam que, pela primeira vez, os ministérios da saúde podem ter um orçamento
preciso para a assistência médica”, disse à
Diagnóstico o diretor executivo da ONG,
Barry Coleman. “E eles sabem que o serviço será confiável porque os veículos não
vão quebrar”.
COMBATE À AIDS – Segundo ele, um
trabalhador de saúde motorizado pode
chegar a até cinco vezes mais pessoas,
e gastar o dobro do tempo em atenção a
uma comunidade. “O resultado é que estamos transformando a assistência médica
para 14 milhões de pessoas”, contabiliza
Barry, referindo-se ao total de atendimentos no Quênia, Lesoto, Malavi, Zâmbia,
Zimbábue, Gâmbia e Nigéria.
O trabalho da Riders for Health nos
sete países em que atua é dividido em seis
tarefas, muitas das quais a ONG acaba
assumindo papéis que tradicionalmente
são função do Estado. Entre as suas atribuições estão o gerenciamento das frotas
de veículos, treinamento dos motoristas e
motociclistas, além do controle da cadeia
de suprimentos médicos e transporte de
amostras laboratoriais (que visa sobretudo garantir rapidez na análise de exames
de tuberculose e HIV/Aids, doenças endêmicas na África). A entidade, aliás, se
orgulha do seu papel no combate a HIV/
Aids. Segundo dados da própria ONG,
94% dos seus funcionários desempenham
rotineiramente tarefas que ajudam na prevenção da doença, como programas educacionais, distribuição de camisinhas e de
remédios para o tratamento de pacientes
infectados pelo vírus. Uma doença que já
matou 17 milhões de pessoas em todo o
continente e que, em alguns casos, afeta
até um terço da população de determinados países. Em Botsuana, por exemplo,
36% dos habitantes possuem o vírus da
Aids. Em Lesoto e no Zimbábue, que são
atendidos pela Riders for Health, o índice
de contaminação fica em 24% e 25%, res-
Na áfrica subsaariana,
veículos de duas rodas
são os principais meios de
transporte: bicicleta chega a
custar o equivalente a dois anos de
salários de um trabalhador africano
pectivamente. Nações cujo PIB fica em
torno de US$ 9 bilhões – do Zimbábue (o
equivalente ao PIB de Londrina, no PR) –
e US$ 2 bilhões, no caso do desconhecido
Lesoto, que fica na África austral e cuja
riqueza gerada anualmente é equivalente à do município de Bragança Paulista,
interior de São Paulo. Em nações tão pobres, qualquer programa que alie eficiência e redução de custos tem um impacto
positivo. No Zimbábue, por exemplo, a
economia do Ministério da Saúde com
transporte chega a 62%.
Para mover toda essa engrenagem, a
ONG trabalha com um orçamento anual
de pouco mais de US$ 8 milhões, dos
quais 41,3% vêm de recursos gerados
pela sua atividade. A maior parte da verba necessária para manter a estrutura em
financiamento vem de doações feitas por
instituições como a Skoll Foundation e
o Department for International Development (DFID), órgão do governo britânico
que ajuda a promover o desenvolvimento
Diagnóstico | jul/ago 2013
79
ÁFRICA
AJUDA HUMANITÁRIA
de países pobres. Além de doadores individuais. O programa, que tem como patrona a princesa real britânica Ana, filha
da rainha Elizabeth, conta com uma boa
popularidade no Reino Unido e, por duas
vezes, foi alvo da campanha beneficente
que o jornal The Times realiza todos os
anos no Natal. Somente no último ano, a
administração do circuito de Silverstone
doou 70 mil libras esterlinas, o equivalente a cerca de R$ 250 mil. Muitas dessas
doações vêm de pessoas envolvidas em
corridas de motociclismo. “Riders for Health cresceu no final da década de 1980,
a partir deste esporte, que ainda fornece
uma parte importante do nosso apoio”,
assinalou Hann. “Recentemente, realizamos o nosso evento de angariação de
fundos, o Dia dos Campeões, no MotoGP
da Inglaterra, em Silverstone”, assinalou
Hann.
O terceiro fundador da ONG, Randy
Mamola, trabalha como uma espécie de
embaixador da causa, usando o seu prestígio pessoal em viagens pelo mundo para
angariar fundos para a promoção da saúde
na África. Mamola, que na década de 80
chegou ao vice-campeonato das 500 cilindradas – considerada a Fórmula 1 do
motovelocidade –, agora representa uma
ideia mais do que vencedora e que ainda
tem muita estrada pela frente.“Queremos
um mundo em que a assistência médica
atinja todas as pessoas, em todos os lugares. Obviamente, há um longo caminho a
seguir, mas nosso objetivo é que em 2017
estejamos atendendo a 25 milhões de pessoas”, declarou Andrea Coleman.
Bicicletas-ambulâncias – Outra experiência bem sucedida são as zambulâncias – bicicletas acopladas a charretes (o nome é uma mistura do nome do
equipamento com Zâmbia, país onde o
conceito começou a ser usado com ambulâncias). E sua importância pode ser
mensurada com uma pequena história.
No último mês de julho, um garoto ugandense brincava com seus amigos em uma
área rural, no norte do país, quando caiu
de uma árvore. Com o choque do seu peito contra o solo, o menino ficou com dificuldades para respirar, e a família entrou
em pânico porque não havia como levar
o jovem ao hospital mais próximo, que
ficava a 40 quilômetros de distância do
local do acidente. Com 193 mil pessoas,
o distrito de Maracha – onde aconteceu
a queda do jovem Moses Drileyo – é ser80
Diagnóstico | jul/ago 2013
O CASAL Andrea E
Barry Coleman, DA
Riders for Health:
locadora de veículos
sem fins lucrativos é
financiada por doações,
como a da família real
britânica
vido por apenas uma ambulância, que
não estava nas proximidades de sua casa.
E mesmo se o veículo fosse utilizado, a
família teria que arcar com as despesas
do combustível, uma tarifa de US$ 32, o
equivalente ao salário por duas semanas
de trabalho de um morador da região. É
justamente em locais assim do continente
africano que uma invenção simples tem
feito a diferença entre viver e morrer. Para
a sorte do garoto acidentado, alguém se
lembrou que, na semana anterior à queda
de Moses, o povoado onde ele mora havia
sido contemplado com uma zambulância
(zambulance). Simples, o veiculo dispõe
de uma maca, envolta em uma cobertura, que leva e traz pacientes aos hospitais
com o pagamento de uma taxa de US$ 4.
O objetivo da Zambikes, ONG americana responsável pelo projeto, é que nos
próximos anos sejam distribuídas 20 mil
unidades entre países do sul da África, o
que, segundo seus cálculos, poderia ajudar a salvar até 520 mil vidas por ano,
apenas permitindo que pessoas enfermas
cheguem ao hospital a tempo de receber
atendimento. “É maravilhoso estar envolvido em um projeto que impacta positivamente a vida de pessoas que necessitam
de ajuda”, declarou à Diagnóstico, da Califórnia, o diretor executivo da Zambikes,
Tom Larson, ao explicar por que um cida-
dão como ele, que tem acesso ao melhor
do que o capitalismo pode oferecer, se
empolga com a possibilidade de melhorar a vida de pobres desconhecidos de um
país estranho.
A primeira experiência de trabalho
voluntário de Larson aconteceu em 1997,
quando deixou o emprego de redator publicitário e se mudou, junto com a mulher, para a República Dominicana, onde
desenvolveu atividades filantrópicas promovidas pela igreja que o casal frequenta.
Após essa experiência, Larson fundou a
ONG Healing Waters (em tradução livre, Águas que Curam), responsável pelo
fornecimento de água de boa qualidade
para cerca de 100 mil pessoas no México, Guatemala e Quênia, além da própria
República Dominicana. Há seis anos,
Larson acompanha de perto a inspiradora
história dos jovens que decidiram fazer
algo em prol da saúde na África.
um médico para 23 mil – A
zambulância começou a ser projetada
em 2007, quando os jovens americanos
Dustin McBride e Vaughn Spethmann fizeram uma viagem missionária à Zâmbia,
promovida pela Azusa Pacific University,
onde eles estudavam. Em meio às partidas de futebol com os moradores locais
– a principal forma de socialização para
Diagnóstico | jul/ago 2013
81
ÁFRICA
AJUDA HUMANITÁRIA
os americanos –, eles se deram conta de
que a falta de meios de transportes no país
era, ao mesmo tempo, um transtorno para
os cidadãos e uma oportunidade de negócio para alguns zambianos. “As bicicletas
ajudam a criar empregos e salvar vidas na
Zâmbia”, costuma definir McBride. “Nós,
americanos, as enxergamos apenas para a
prática de esportes, mas para os africanos
elas representam, em muitos casos, a condição de permanecerem vivos”.
Com cerca de 11 milhões de habitantes
espalhados por uma área de 752.618 quilômetros quadrados (cerca de três vezes o
território do estado de São Paulo), apenas
20 mil quilômetros de rodovias pavimentadas – de um total de 91 mil – e 64%
da população vivendo abaixo da linha da
pobreza, a Zâmbia oferece um desafio cotidiano a milhões de cidadãos que precisam ir de um lado a outro. Para comprar
uma bicicleta tradicional, por exemplo,
um zambiano tem que pagar o equivalente
zambulância – como o
projeto ficou conhecido na
Zâmbia – em ação na áfrica:
equipamento modesto, de pouco
mais de US$ 1 mil, ajuda a salvar
uma vida a cada duas semanas
82
Diagnóstico | jul/ago 2013
ao que recebe de salário por dois anos de
trabalho. O que dá uma dimensão do desespero que as famílias enfrentam quando
precisam levar um enfermo ao hospital.
De volta aos Estados Unidos, ainda
em 2007, McBride e Spethmann pensaram em como aplicar no país africano as
noções de negócios sociais aprendidas na
faculdade. Assim surgiu a Zambikes, uma
organização não governamental com sede
na Califórnia que se dedica a financiar,
através de doações, fabricantes artesanais
zambianos de bicicletas, charretes e dos
conjuntos de bicicletas acopladas a charretes, logo batizados de zambulâncias.
Um detalhe interessante é que o quadro da
bicicleta é feito de bambu. Estima-se que
desde o início do trabalho, há seis anos,
a ONG tenha distribuído cerca de 1.000
zambulâncias somente na Zâmbia. Uma
inestimável ajuda para uma nação que tem
a modestíssima taxa de um médico por 23
mil habitantes, quando, para os padrões da
África, a Organização Mundial de Saúde
recomenda um médico para cada 7 mil
habitantes.
Os dados estatísticos de toda a África subsaariana na área de saúde, aliás, são
devastadores. Em 2011, aproximadamente 1,1 milhão de crianças morreram antes
de completar um mês de nascimento. No
ano anterior, cerca de 162 mil mulheres
morreram durante o parto ou logo depois
de dar à luz seus bebês nessa região do
mundo que tem um índice de mortalidade
materna 100 vezes maior do que a média
dos países desenvolvidos.
Argumentos que têm sido largamente
explorados pela Zambikes em sua campanha para conseguir doações. “Uma
zambulância, que custa em torno de US$
1.000, pode salvar uma vida a cada duas
semanas. Em um ano, são 26 pessoas
salvas por cada equipamento”, argumenta Larson. Com o sucesso da experiência
na Zâmbia, o modelo tem sido exportado
para países vizinhos. A República Democrática do Congo recebeu 125 unidades,
Uganda ganhou 50, e o Malawi, outras 25.
A Zambikes agora mira Ruanda, Burundi,
Moçambique, Tanzânia e o Sudão. E para
isso conta com a ajuda de doadores.
Assim como a contratação de médicos
para as cidades do interior do Brasil não
resolve, por si, todos os problemas de saúde do país, a existência das zambulâncias
não vai elevar isoladamente o IDH dos
países subsaarianos. Mas a iniciativa dos
jovens americanos mostra que é possível
fazer algo relevante pela saúde de pessoas
carentes, mesmo quando falta quase tudo
ao redor.
Diagnóstico | jul/ago 2013
83
84
Diagnóstico | jul/ago 2013
Diagnóstico | jul/ago 2013
85
RESENHA
saúde pública
Médicos revolucionários
Ativista político americano Steve Brouwer defende o modelo de assistência
médica popular criado na Venezuela e mostra como a aposta na formação
de médicos dentro das comunidades pode ser uma solução para o Brasil
H
Gilson Jorge
á exatamente 13
anos, em outubro
de 2000, o então
presidente da Venezuela,
Hugo
Chávez, morto em
março deste ano,
dava início ao seu ambicioso projeto
chamado Missão Bairro Adentro, pelo
qual se comprometia a levar assistência
médica aos locais mais isolados da capital, Caracas, com o suporte fundamental
de uma equipe de médicos enviados por
Cuba. Alguns anos depois, entraria em
cena o programa Medicina Integral Comunitária, destinado a formar médicos
oriundos das zonas pobres do país, que
substituiriam os cubanos quando eles
voltassem ao seu país. Estava em marcha
o plano chavista de atender ao povo e,
ao mesmo tempo, espezinhar o modelo
norte-americano.
E foi um norte-americano que se
encarregou de fazer a propaganda de
Chávez em seu próprio país. O ativista
político Steve Brouwer, que morou na
Venezuela entre 2007 e 2008, acompanhou de perto a colaboração entre os
dois países na área médica, assim como
a tentativa de exportar o modelo de assistência para os outros países da Alternativa Bolivariana para as Américas (Alba),
composta por Bolívia, Equador e Nicarágua. As observações de Brouwer resultaram no livro Revolutionary Doctors:
How Venezuela and Cuba are Changing
the World’s Conception of Health Care
(Médicos Revolucionários: como Venezuela e Cuba estão mudando o conceito
mundial de assistência médica).
A obra, ainda sem tradução para o
português, começa invocando o médico e revolucionário argentino Ernesto
“Che” Guevara, que antes de se engajar
na Revolução Cubana, se ofereceu para
86
Diagnóstico | jul/ago 2013
trabalhar como voluntário em projetos
sociais na Guatemala. Ninguém vai imaginar que em todo o mundo os médicos
vão empenhar os seus longos anos de
estudo em trabalhos mal remunerados
em prol do bem coletivo. Então, a que
mudança conceitual da medicina exatamente Brouwer se refere?
O ponto central da defesa que o ativista faz do programa de Chávez é a formação de médicos dentro das próprias
comunidades, com um objetivo nobre:
estimular estudantes de medicina pobres
a não se afastarem nem por um dia dos
problemas que afligem os seus familiares
enquanto recebem a sua formação acadêmica. Um total de 30 mil jovens cursou
o programa nos seus seis primeiros anos
de existência. Isso representa quase a
totalidade dos médicos que existiam na
Venezuela, somando-se todas as especialidades, quando Hugo Chávez chegou ao
poder, em 1998.
Para Brouwer, a aposta do comandante Chávez na formação de médicos
comunitários – todos de origem humilde
– só foi possível graças à determinação
de levar o atendimento médico aos bairros mais carentes. Justamente aonde os
médicos já estabelecidos não queriam ir.
Uma medida que teve como efeito colateral a ascensão social de uma juventude
que talvez nunca pudesse sonhar em usar
um jaleco branco. Milhares deles.
REAÇÃO DOS MÉDICOS – Os números grandiosos do programa, aliás,
são defendidos em tom abertamente militante por Brouwer, para quem essa experiência de treinar doutores em medicina comunitária já mereceria a atenção do
mundo inteiro – ainda que se limitasse,
em sua fase embrionária, a uns poucos
jovens de uma vila rural venezuelana.
Assim como acontece atualmente no
Brasil, em razão da vinda de médicos
estrangeiros, a atenção médica proposta
pelo governo enfrentou forte oposição
dos profissionais estabelecidos no mercado, que colocaram em dúvida a qualidade da formação dos novos colegas de
trabalho.
“Este não é um curso de curta duração para auxiliares de saúde ou ‘médicos
descalços’, mas um rigoroso programa
projetado para produzir um novo tipo de
médico”, assevera o autor do livro. Um
novo tipo de médico que, para Brouwer,
está muito ligado à perspectiva revolucionária de Che Guevara, de quem o
autor toma emprestado a frase “os camponeses teriam corrido imediatamente e
com entusiasmo ilimitado para ajudar os
seus irmãos”, ao justificar a presença de
médicos cubanos nas áreas desassistidas
da Venezuela.
Não é fácil calcular o grau de entusiasmo com que um médico que é empregado de um regime comunista larga
família e amigos para atender pacientes
ao redor do mundo. Aliás, em seu livro,
o ativista americano também aborda o
episódio em que cerca de 500 médicos
cubanos lotados na Venezuela desertaram rumo aos Estados Unidos, em 2010.
Na época, os jornais relataram denúncias
feitas pelos profissionais de que pagaram
suborno a servidores públicos dos dois
países latino-americanos para poderem
fugir rumo ao norte.
A fuga em massa, segundo o autor,
foi encorajada por um programa lançado pelo governo americano para atrair os
médicos com o objetivo de desestabilizar uma das principais bandeiras sociais
do governo de Hugo Chávez. Os médicos que fugiram, por sua vez, acusaram
Cuba e Venezuela de promover a escravidão moderna através do trabalho forçado dos cubanos como pagamento pelo
Reprodução
“Este não é um curso de curta duração para
auxiliares de saúde ou ‘médicos descalços’, mas
um rigoroso programa projetado para produzir um
novo tipo de médico”
Steve Brouwer
Divulgação
O eNTÃO presidente
da venezuela, hugo
chÁvez, JÁ FALECIDO,
durante o lançamento
do equivalente ao mais
médicos em seu país:
ideais revolucionários
fornecimento de petróleo à ilha de Fidel.
Mas a recente polêmica envolvendo
o Programa Mais Médicos levou o governo brasileiro a informar que a Venezuela paga bem menos aos profissionais
cubanos do que os R$ 4 mil que os compatriotas de Fidel Castro devem receber
pelo seu trabalho no Brasil. Levando
em conta a nossa realidade, um grande
mérito do livro é contar a experiência de
formação de médicos dentro das próprias
comunidades carentes. Uma alternativa
que talvez possa ser usada pelo Brasil,
quando não for mais possível (ou desejá-
vel) manter os médicos estrangeiros nos
rincões do país.
REVOLUTIONARY DOCTORS | Steve Brou-
wer | Editora Monthly, Review Press 240
páginas, 2011, (US$13,86)
Diagnóstico | jul/ago 2013
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Diagnóstico | jul/ago 2013
Diagnóstico | jul/ago 2013
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Estante&resenhas
Divulgação
Marcelo Santana
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Um novo conceito criado pelo professor e consultor Pedro Mandelli vai
ajudá-lo a assumir o perfil de um gestor
que valoriza as pessoas e os processos
de desenvolvimento próprio e de seus
subordinados, para que todos cresçam
profissionalmente e entreguem os resultados.
Renata Spallicci, diretora de
assuntos corporativos da Apsen
Farmacêutica (SP)
Trata-se da busca do sonho de um
executivo, da realização de um ser humano por meio do autoconhecimento.
Este livro reforça a ideia de que todos os
executivos deveriam possuir a seguinte
essência: a economia baseada no ser e
não no ter, bem como a de realizar um
trabalho íntegro. Ele mostra que um executivo só é verdadeiramente bem sucedido quando ele o é como ser humano
e não apenas em sua carreira. Leitura
recomendada para líderes de uma nova
realidade.
É uma leitura
recomendada para os
líderes de uma nova
realidade
“A Escola dos Deuses - Formação dos Líderes
da Nova Economia”
Autor: Elio D’anna
Editora: Novo Século
Número de Páginas: 408
Preço sugerido: R$ 58,00
90
Diagnóstico | jul/ago 2013
João Fhilype Andrade Souto
Maior, membro Health 2.0 no
Brasil
O livro aborda temas importantes
como empreendedorismo, marketing, vendas, negociações, operações
e design de sistemas, além de outros
exemplos. Após a leitura, é possível
praticar alguns desses conceitos e
exercitar habilidades empreendedoras
que são essenciais a todos os gestores.
O livro de Josh Kaufman está muito
bem organizado e é ótimo para quem
precisa fazer consultas periódicas,
pois serve de referência para o cotidiano de um CEO.
O livro permite
exercitar habilidades
empreendedoras
essenciais ao gestor
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Gestor do Século XXI”
Autor: Josh Kaufman
Editora: Saraiva
Número de Páginas: 400
Preço sugerido: 37,00
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Número de páginas: 216
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Bill George traça o argumento
persuasivo de que a jornada até a liderança autêntica e sustentável, que
passa pela descoberta do seu próprio
norte, é a chave para a liderança em
todos os campos, seja ele negócios,
governo ou iniciativa privada.
“O líder autêntico”
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Número de Páginas: 224
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Diagnóstico | jul/ago 2013
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Diagnóstico | jul/ago 2013

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