origem, história e evolução do direito administrativo
Transcrição
origem, história e evolução do direito administrativo
ORIGEM, HISTÓRIA E EVOLUÇÃO DO DIREITO ADMINISTRATIVO1 Hebert de Melo RESUMO Discute-se a evolução histórica do Direito Administrativo passando por uma breve análise das contribuições do direito francês, alemão e italiano para o direito pátrio. Apresenta-se a necessidade da sistematização administrativa apontando para a passagem do estado de polícia para o estado de direito como o início propriamente do Direito Administrativo. E como marco da sistematização deste ramos do direito apresenta-se a contribuição doutrinária e jurisprudencial do Caso Blanco do direito francês. Por fim discute-se o seu surgimento no direito pátrio comentando sua divisão em quatro fases (colonial, imperial, republicano e democrático). Afirma-se seu surgimento como ramo autônomo a partir da Constituição de 1934, e com advento da Constituição Cidadã de 1988 que discrimina normas norteadoras da função púbica, quanto à observância da lei e do direito. Enfatizam-se os princípios da legalidade e razoabilidade como imperiosos para que se atinja o escopo deste ramo do direito, o interesse público. Palavras–Chave: Administração pública. Estado de direito. Legalidade. Razoabilidade. Interesse público. ABSTRACT Discusses the historical evolution of Administrative Law passing a short analysis of the contributions of the French, German and Italian law to the parental right. Shows the need for administrative systematization pointing to the passage of the police state to the rule of law as the beginning itself of Administrative Law. And as a mark of systematization of this branch of law presents the doctrine and jurisprudence contribution Case Blanco French law. Finally we discuss its emergence in the parental right commenting its division into four phases (colonial, imperial, republican and democratic). It is said its emergence as an independent branch from the 1934 Constitution, and with the advent of Citizen Constitution of 1988 detailing rules guiding the pubic function, as the observance of the law and law. Emphasize the principles of legality and reasonableness as compelling to the achievement of the scope of this branch of law, the public interest. Key-Words: Public administration. Rule of law. Legality. Reasonableness. Public interest. 1 Artigo científico apresentado para a publicação na Revista Eletrônica Aphonline. Aphonline.:Trindade – GO,v.3,n.1,p.1-20,jan-dez.2013 Aphonline.:Trindade – GO,v.3,n.1,p.1-20,jan-dez.2013 1 INTRODUÇÃO Discute-se neste artigo a evolução histórica do direito administrativo, partindo da compreensão de que não existe governo sem administração pode-se notar, desta forma, que mesmo incipientemente, as civilizações antigas exerceram, de seu modo e de acordo com suas necessidades, uma organização político-administrativa. A vida citadina exige esta organização, embora não se possa afirmar a existência de um direito administrativo em civilizações antigas, a necessidade de uma sistematização jurídica é indispensável. Que justamente ocorrerá na passagem do estado de polícia para o estado de direito. Destacam-se também as valorosas fundamentações teóricas do discurso filosófico que contribuíram para a constituição e legitimação do direito administrativo (como também de outras disciplinas do direito). Os filósofos tais como: Aristóteles e sua Política, Montesquieu e o Espírito das Leis e Rousseau com seu Contrato Social foram os destaques em que se procurou demonstrar que a preocupação filosófica se aproxima de forma salutar da preocupação jurídica. Após um panorama histórico e evolutivo das noções organizacionais político-administrativas, passa-se a discussão da importância para o ordenamento jurídico pátrio das contribuições da doutrina jurídica francesa, alemã e italiana. Por fim apresenta-se a sistematização evolutiva do direito administrativo brasileiro discutindo as primeiras ordenações jurídicas que vigoravam no país até a constituição de normas de direito público em que enfatizam a função pública do Estado como também a imprescindível observância a lei e ao direito, regindo-se sob a tutela dos princípios da legalidade e da rezoabilidade. 2 NOÇÕES PRELIMINARES DO HISTÓRICO DO DIREITO ADMINISTRATIVO Ainda que seja imprescindível estabelecer uma data como marco inicial deste ramo do direito, é necessário ter em mente que a sua construção histórica pode anteceder o século de referência que usualmente reconhecemos como a de seu nascedouro. Pode-se muito bem afirmar que como “ramo autônomo, nasceu em fins do século XVIII e início do século XIX” (DI PIETRO, 2010, p. 1), contudo não Aphonline.:Trindade – GO,v.3,n.1,p.1-20,jan-dez.2013 3 se pode deslindar o fato de que não houve antes normas que pudessem ser enquadradas como administrativas, pois a administração como forma de cuidar, dirigir e governar um país, um povo etc., é um fato que existe desde sociedades antigas, como: minóica, egípcia, grega, romana1, chinesa etc., “onde quer que exista o Estado2, existem órgãos encarregados do exercício de funções administrativas” (DI PIETRO, 2010, p. 1). Não significa, contudo, que sejam tais normas reconhecidamente administrativas, ou seja, regras de um direito administrativo tal como é entendido nos dias de hoje. Em muitas destas sociedades o poder temporal não se separava do poder secular (VERNANT, 1987, p. 30-31). Nestas sociedades não havia um direito tal como percebemos hodiernamente, tão pouco uma especialização do direito, como o administrativo. Mas também não significa que não houvesse normas que disciplinassem sua vida citadina. Como exemplo citase a sociedade minóica com sua espetacular organização para o século XVI a.c, em que se organizavam com um sistema de escrita conhecida por linear B (VERNANT, 1987, p. 23). Esta escrita era realizada em tábuas de barro, que posteriormente cozidas ao fogo preservava as informações e conhecimentos pertinentes à sua cultura, destacando-se a vida econômica, por exemplo, a colheita de cereais. Ainda como título exemplificativo apresenta-se a lição de Pedro Braga (2006), em que menciona que uma organização político-administrativa é imprescindível para a constituição dos grandes impérios. A exemplo do que se discute é notório a organização de Roma e Bizâncio, como a estrutura administrativa da Igreja Católica, herdeira do legado cultural romano. Todos os povos da Antiguidade tiveram um sistema de funções e de serviços públicos que proporcionaram o estabelecimento de impérios. Com efeito, nenhum povo subsiste sem administração [sem destaque no original]. No ocidente, no tocante ao Direito Administrativo, foi estuário das experiências de Roma e de Bizâncio. A grande legatária, no entanto, foi a Igreja Católica desde a Antiguidade, quando tomou de empréstimo forma e regras a fim de construir a estrutura de um novo império, no século XII, sob o cetro do papado, sendo, destarte, criada uma ciência pelos juristas da Igreja. (BRAGA, 2006, p. 14) 1 Como um exemplo de uma organização administrativa alude-se ao Império Romano, que com seu corpo jurídico muito influenciou o mundo contemporâneo. 2 Deve-se entender, neste caso, que o termo „Estado‟ não significa propriamente o Estado moderno, mas sim, uma organização com sentido de uma união, lingüística, cultural, religiosa, e até mesmo política no caso do Império Romano. Contudo este verbete, neste caso específico, pode se assemelhar mais ao conceito de nação. 3 4 O certo é que não havia uma elaboração sistemática deste ramo do direito, que justificasse uma autonomia epistemológica no campo das ciências jurídicas. O que havia eram normas esparsas que regulavam a administração do „Estado‟, como: cobrança de tributos, aplicação de multas etc, que se enquadrava em seu jus civile. Por exemplo, a divisão administrativa do Império de Carlos Magno3 entre altos funcionários da corte, condes, duques e marqueses; cada qual com uma função distinta na dinastia Carolíngia, assim escreve Boulos: Os marqueses administravam as marcas, nome dado aos territórios situados nas fronteiras do Império; os duques controlavam os ducados, territórios próximos às fronteiras, e eram encarregados de formar e liderar exércitos; os condes administravam os demais territórios, cobrando impostos, multas e fazendo cumprir as decisões do rei. (BOULOS, 2009, p. 18) Atualmente reconhece que é somente com a passagem do „Estado de Polícia‟ para o „Estado de Direito‟ que se tem propriamente um direito administrativo, pois o primeiro se caracteriza com submissão do indivíduo ao direito, próprio das monarquias absolutas, já o segundo, ao contrário, subordina o próprio Estado às normas reguladoras que ele mesmo edita4. Pois somente com o Estado de Direito, que se pode falar de direito administrativo. Com a vinculação da administração às normas de direito, ou seja, à lei, e tendo como seus destinatários tanto os órgãos agentes da Administração, como os particulares em geral. Somente deste modo será possível pensar concretamente em um direito administrativo, assim leciona Oliveira: O Estado de Polícia é típico das antigas monarquias absolutistas, em que não havia a divisão de poderes, com todo o poder político concentrado na pessoa do Rei, que o exercia por delegação divina. Sendo representante de Deus, tampouco se sujeitava o Rei às próprias leis editadas pelo Estado. Conforme a doutrina da investidura divina, os monarcas eram responsáveis unicamente perante Deus, jamais perante os homens. A revolução francesa veio derrubar essa doutrina e instituir o 5 Estado de Direito. (OLIVEIRA, 2012) . 3 Historicamente situa-se Carlos Magno entre os anos 742-814, final do século VIII e início do século IX. Característica que se refere-se a primado essencial para a defesa das liberdades públicas, o „Estado Democrático de Direito. 5 OLIVEIRA, Luciano Henrique. Origem e História do Direito administrativo. Disponível em: http://www.editoraferreira.com.br/publique/media/toq41_luciano_oliveira.pdf Acesso em: 29 jan. 2012. 4 4 5 Nas palavras de Celso Bandeira de Mello, o direito administrativo nasce com o Estado de Direito, porque é: O Direito que regula o comportamento da Administração. É ele que disciplina as relações entre Administração e administrados, e só poderia mesmo existir a partir do instante em que o Estado, como qualquer [outro], estivesse enclausurado pela ordem jurídico e restrito a mover-se dentro do âmbito desse mesmo quadro normativo estabelecido genericamente (MELLO, 2007, p. 46) Em consequência do exposto, o regime de Estado de Direito tem seus primórdios históricos resultantes dos princípios da Revolução Francesa, numa dupla perspectiva: por um lado, ele é um colorário do princípio da separação de poderes; por outro lado, é uma consequência da concepção da lei como expressão da vontade geral, onde decorre o caráter subordinado à lei da Administração Pública. Não será muito dizer que a filosofia tem especial contribuição nesta busca histórica, como também dos fundamentos deste ramo específico do direito, qual seja o direito administrativo. Aponta-se na Filosofia Antiga, o filósofo Aristóteles, que em sua reflexão sobre política definia poderes separados, em sua obra „Política‟ (1997). Entretanto será com o filósofo iluminista Montesquieu que esta divisão dos poderes será melhor sistematizado em sua obra „Espírito das Leis‟ (1997). Como também importante foi o pensamento do filósofo iluminista Jean Jacques Rousseau em sua obra „Contrato Social‟ (1983), o qual já menciona a vontade do cidadão como expressão legítima do poder; nas palavras do filósofo „vontade geral‟. Interessante pontuar que com divisão de poderes abre-se o caminho para o reconhecimento do direito de limitar o poder do Estado, em relação aos direitos do indivíduo. Estabelecendo uma relação entre o Estado e o particular. É claro que nem sempre foi assim. Na Idade Média reinava-se uma situação de „Estado de Polícia‟, na qual o desejo do soberano é era lei. Muitas vezes confundindo o Estado com a própria figura do rei. Como exemplo histórico, temos os reis absolutistas da Europa, especialmente o rei francês Luís XIV, o Rei-Sol, que exigia de seus súditos total obediência e lealdade, e agia de acordo com a frase que ele mesmo lhe atribuiu: 5 6 L’État c’est moi6. Esta frase manifesta uma forma de pensar onde não há possibilidade de um direito público, pois não há limites para o rei. Há muitas consequências para este pensamento, um vez que sua justificação teórica procura apresentar o rei como representante de Deus na Terra, é como tal é infalível. Assim o rei tinha o direito de governar de forma absoluta, porque a origem e o fundamento de seu poder vinham diretamente de Deus. Essa teoria foi criada por Jacques Bossuet e é conhecida por „teoria do direito divino dos reis‟7. Representa o Estado de Polícia, que se mostra diametralmente oposto ao Estado de Direito, pois naquele o rei é possuidor de um direito ilimitado para administrar e sua autoridade é incontestável. Desta forma leciona Di Pietro: A Idade Média não encontrou ambiente propício para o desenvolvimento do Direito Administrativo. Era a época das monarquias absolutas, em que todo o poder pertencia ao soberano; sua vontade era a lei, a que obedeciam todos os cidadãos [súditos], justificadamente chamados servos ou vassalos (aqueles que se submetem à vontade de outrem). Nesse período, do chamado Estado de Polícia, [...] que o direto público se esgota num único preceito jurídico, que estabelece um direito ilimitado para administrar, estruturando sobre princípios segundo os quais quod regi placuit lex est, the king can do no wrong, le roi ne peut mal faire. (DI PIETRO, 2010, p. 1) Essa teoria de que o rei não pode errar (le roi ne peut mal faire), pois é o escolhido de Deus, e, portanto, legitima sua autoridade na vontade divina perdurou por muito tempo, findando na França com a queda da Bastilha, isto é, com a deflagração da Revolução Francesa. É claro que esta revolução não ocorreu apenas pelo fato do rei legitimar seu poder em Deus, mas pelas consequências advindas desse poder absoluto, como o excesso do poder, arbitrariedades, privilégios etc. Antes da queda do poder real (na França ou em outros Estados) ou a diminuição da extensão ou da influência do „Estado de Polícia‟, os monarcas, por sua vontade, criam Tribunais com a prerrogativa de julgar os particulares. Contudo “o rei não podia ser submetido aos tribunais, pois seus atos se colocavam acima de qualquer ordenamento jurídico” (DI PIETRO, 2010, p. 1), 6 O Estado sou eu. Este posicionamento teórico será seriamente criticado por John Locke em seu Primeiro Tratado Sobre o Governo Civil (2001) 7 6 7 pois seu poder não emana de si mesmo, mas de Deus, e Deus não é questionado, isto é, não há como a criatura contestar o criador! Por outro lado, por terem sido estes criados pelos monarcas, não havia, como se esperar, tribunais independentes, muitas vezes decidindo o rei os conflitos entre particulares ou quando delegava as funções judicantes a um conselho este ficava subordinado ao próprio rei. Embora diante destes relatos negativos quanto a este histórico da Idade Média, é possível mencionar que incipientemente houve tentativas de glosadores entre os séculos XIII e XIV em comentar esta função do direito, e até mesmo lançar o germe de uma teoria moderna de Estado. Como ilustra Losano: No entanto, apontam-se algumas obras de glosadores da Idade Média, principalmente dos séculos XIII e XIV, nas quais se encontra o germe dos atuais direitos constitucional, administrativo e fiscal. Indica-se a obra de Andréa Bonello (1190 a 1275 d.c), dedicada ao estudo dos três últimos livros do Código Justiniano, que tinham sido deixados de lado, porque dedicados a estruturas fiscais e administrativas de um império que já não existia. Outro texto o qual trabalharam os juristas, na época, foi o Liber Constitutionis, publicado pelo parlamento de Melfi em 1231. no século XIV, a obra de Bartolo de Sassoferrato (1313-57) lança as bases da teoria do Estado Moderno (LOSANO, 1979 apud DI PIETRO, 2010, p. 2) Pode-se afirmar que o Direito Administrativo, como um arcabouço epistemológico próprio e independente terá início somente a partir da submissão do Estado à lei, “o direito administrativo surgiu com a instauração dos governos subordinados a uma constituição”(MAFRA FILHO, 2012)8. Desta forma, o Estado de Direito concretiza-se como uma estrutura jurídica em que se apresenta uma divisão das funções do poder em legislativo, executivo e judiciário; outrossim, a isonomia jurídica entre os partícipes da sociedade política, considerada entre particulares9 como também entre Estado e particulares. Sendo inerente ao conceito de Estado Moderno o conceito de Estado de Direito, pois este se funda sobre o princípio da legalidade 10 como também sobre o princípio da separação dos poderes. Nas sábias palavras de 8 MAFRA FILHO, Francisco de Salles Almeida. História do Direito Administrativo: idéias para um debate. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=918. Acesso em 29 jan. 2012. 9 A relação entre o público e o privado, isto é, a relação jurídica entre Estado e o cidadão. 10 O princípio no qual muitos doutrinadores afirmam ter nascido propriamente o Estado de Direito, pois constitui uma das principais garantias de respeito à lei, entre todos os partícipes da sociedade política. Pois é a lei uma representação abstrata, da vontade de todos que plasma-se sobre todos. 7 8 Celso Bandeira de Melo, tem-se: “O Direito Administrativo só se plasmou como disciplina autônoma quanto se prescreveu processo jurídico para atuação do Estado-poder, através de programas e comportas [comportamento] na realização de suas funções” (MELLO, 1979 apud DI PIETRO, 2010, p. 2) De sua origem e evolução histórica, o Direito Administrativo teve em cada país uma estruturação distinta. Contudo são marcantes na história da formação do Estado Moderno os princípios levantados pela Revolução Francesa, pois estes marcam radicalmente a passagem do „Estado Antigo‟, para o „Estado Moderno‟. Assim a ampliação do Direito Administrativo, com a forma de Estado e a forma de poder irá determinar a abrangência da atuação estatal no ramo do direito público. Desta forma têm-se três países que contribuíram muito com a evolução do Direito Administrativo. De que modo que é inegável a participação francesa na formação do Direito Administrativo, mas também se faz necessário descrever a participação do direito alemão e italiano para a sua consolidação como ramo do direito de forma autônoma. Discute-se a seguir a influência do direito francês, alemão e italiano11 para uma elaboração sistemática e científica do Direito Administrativo. DIREITO ADMINISTRATIVO: FRANCÊS, ALEMÃO E ITALIANO É notório entre muitos doutrinadores administrativistas apontarem o direito francês como uma inegável contribuição para a consolidação e autonomia do Direito Administrativo. Como leciona Di Pietro, “costuma-se indicar, como termo inicial do nascimento do Direito Administrativo, a Lei de 28 pluvioso do Ano VIII (1800), que organizou juridicamente a Administração Pública na França.” (DI PIETRO, 2010, p. 4) No Estado francês, pós-revolucionário, criou um tribunal específico para julgar as lides em que o Estado era parte, e, esse órgão foi conhecido por „Conselho de Estado‟. O importante é que os franceses darão eficácia à doutrina 11 Segundo Di Pietro („A‟, 2010, p. 3-4), o direito francês inaugura a escola legalista ou exegética, pela característica da interpretação de textos legais. O direito alemão (influenciado pelo direito francês), por sua vez, procurou dar uma elaboração científica, e o direito italiano (o qual sofre a influência do direito francês e alemão) procura fazer uma sistematização do Direito Administrativo. 8 9 da separação das funções do poder de Montesquieu, pois até mesmo em âmbito administrativo haverá uma jurisdição independente. Na França terá, portanto, uma jurisdição administrativa ao lado da jurisdição comum, tem-se, desta forma, um 12 contencioso administrativo . Como confirma Di Pietro: Com efeito, os constituintes franceses pós-revolucionários deram alcance mais amplo à teoria da separação de poderes, entendendo que a solução dos litígios nos quais a Administração Pública é parte não pode ser atribuída ao Poder Judiciário, sob pena de criar-se subordinação de um Poder ao outro. (DI PIETRO, 2010, p. 4) Embora no seu início a própria Administração decidisse seus conflitos com os particulares, característica que será conhecida por administrador13 juiz . Mas com a criação do Conselho de Estado tem-se início, verdadeiramente, de uma jurisdição administrativa. 14 Como leciona Oliveira (2012) , a evolução do Conselho de Estado francês passa por três fases distintas. Em 1799 „justiça retida‟, pois teria competência apenas consultiva e recursal, podendo o Chefe de Estado alterar o que foi decidido pelo Conselho. E em 1872 a „justiça delegada‟, uma evolução da verdadeira função do Conselho, pois extinguia a homologação do Chefe de Estado, podendo apenas revisá-las, mas não havia constância desta prerrogativa. E em 1889 foi extinta totalmente esta função, pelo próprio Conselho de Estado, surgindo, assim, na França a dualidade na jurisdição. Este Conselho inaugura o contencioso administrativo, e, por conseguinte a instrução dos princípios informativos do Direito Administrativo com uma rica elaboração jurisprudencial. E, a partir desta elaboração pretoriana ter-seá a incorporação noutros regimes jurídicos de diversos países, como no brasileiro. Todavia não será a contribuição francesa apenas jurisprudencial, pois será o sistema francês o primeiro a colocar a disciplina de Direito Administrativo de forma regular para o ensino universitário dos bacharéis em 12 Como salienta Di Pietro, se institui na França o contencioso administrativo a partir do texto da Lei de 16-24 de agosto de 1790, em seu artigo 13 menciona que: “as funções judiciárias são distintas e permanecerão sempre separadas das funções administrativas. Não poderão os juízes, sob pena de prevaricação, perturbar de qualquer modo as operações dos corpos administrativos, nem citar diante de si os administradores por motivo das funções que estes exercem” (DI PIETRO „A‟, 2010, p. 4) 13 Este termo significa que a administração pública era, ao mesmo tempo, juiz e parte na relação jurídica-administrativa. 14 OLIVEIRA, Luciano Henrique. Origem e História do Direito administrativo. Disponível em: http://www.editoraferreira.com.br/publique/media/toq41_luciano_oliveira.pdf Acesso em: 29 jan. 2012. 9 10 Direito. E desta forma, com uma cátedra regular e obrigatória a contribuição doutrinária será pujante. Destaca-se as obras de Macarel (Les éléments de jurisprudence administrative,1818); de Cormenin (Questions de droit administratif, 1822), de Gerando (Institutes du droit administratif français,1830); Ducroq (Cours de droit administratif), Aucoc (Conférences sur le Droit) e Laferrière (Traité sur la juridiction administrative). E como catedrático da “Faculdade de Direito de Paris [...] ministrada pelo Barão de Gerando, que publica o seu Programe du Cours de Droit Public Positif Administratif à la Faculte de Droit de Paris [...] Em 1829, ele publica as Institutes du Droit Administratif Français” (MELLO, 2007 apud DI PIETRO, 2010, p. 6-7) No entanto foi somente no „caso Blanco‟ que o direito administrativo francês se consolida com uma ciência jurídica com um estatuto epistemológico definido, assim menciona Di Pietro: Pode-se dizer que a autonomia do Direito Administrativo, ou seja, a sua posição como ciência dotada de objeto, método, institutos, princípios e regime jurídico próprios, começou a conquistar-se a partir do famoso caso Blanco, ocorrido em 1873, e que envolveu uma menina (Agnes Blanco) que, ao atravessar uma rua da cidade francesa de Bordeaux, foi colhida por uma vagonete da Companhia Nacional de Manufatura de Fumo, que transportava matéria-prima de um para outro edifício. Naquela oportunidade, o Conselheiro Davi, do Tribunal de Conflitos, preferiu o seu voto, colocando de lado o Código Napoleão e afirmando, pela primeira vez, o equacionamento e a solução da responsabilidade civil do Estado [sem destaque no original] em termo publicísticos. (CRETELLA, 1969 apud DI PIETRO, 2010, p. 5) A importância deste caso foi a decisão sobre a controvérsia a quem cabia decidir o conflito, isto é, a competência seria da justiça comum ou justiça administrativa, sendo este representado pelo Conselho de Estado. A competência foi dada ao Conselho de Estado, por ser o Estado parte da relação jurídica. Assim, cristaliza no âmbito do Direito Administrativo a responsabilidade do Estado, contudo com um instituto próprio da seara que agora se inaugura, o Direito Administrativo. Sendo diferente a perspectiva da responsabilidade civil no campo do Direito Privado e no Direito Público. Assim afirma Horoshkeyeff: Neste momento, houve a saída do instituto da responsabilidade do campo do direito civil, como até então era tratado, para integralizar o 10 11 campo do direito administrativo, onde a relação entre preposto e preponente é diversa dessa mesma relação no campo do direito civil. (HOROSHKEYEFF, 2012)15 Já o Direito Administrativo alemão, embora influenciado pela sistemática francesa, seguiu uma orientação diversa. A evolução do Direito Administrativo alemão não foi produto de uma elaboração pretoriana como no francês, mas de um trabalho acadêmico de doutrinadores alemães. Não sendo um objeto de uma revolução (tal como aconteceu na França), mas de um processo de evolução, pois “decorreu da prática das autoridades, da jurisdição administrativa e do trabalho silenciosa da doutrina” (FLEINER, 1933 apud DI PIETRO, 2010, p. 9) Na Idade Média alemã, figurava-se um território fragmentado que persistiu até mesmo quando algumas nações européias se constituíam como Estados16, isto é, com uma estrutura que lhe garantem os elementos básicos e constitutivos, como a população, território e governo (MALUF, 2003, 23). Assim, não houve inicialmente uma uniformidade entre os territórios alemães fragmentados jurídica e politicamente. Persistindo muitas vezes novas concepções jurídicas ao lado de velhos direitos. Não obstante a função da autoridade, como o príncipe, apesar dos privilégios não se compara com o exemplo francês. Afirma Di Pietro (2010, p. 9) que a proteção jurídica para o particular e para a autoridade eram as mesmas, sujeitando-se ambas as instâncias jurisdicionais. Contudo o príncipe possuía, por conta de sua autoridade, um direito eminente (jus eminens), o qual lhe dava a prerrogativa de exercer sua autoridade em benefício à coletividade. Posteriormente houve uma ampliação de seu poder, podendo o príncipe intervir na vida privada de seus súditos, sob o pretexto, ainda, de atingir os interesses da coletividade; este era o direito de política (jus politiae). Com este novo direito o príncipe passa a editar normas de polícia e normas de justiça. No entanto, houve consequências para o particular, pois nas primeiras normas o príncipe age de forma absoluta, não podendo o particular 15 HOROSHKEYEFF, Kathia Loviat. História do Direito Administrativo. Disponível em: http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=3924. Acesso em: 29 jan. 2012. 16 Deixa-se de ser uma realidade sociológica, para se afirmar com uma realidade jurídica, como uma unidade orgânica. 11 12 apelar a nenhuma instância superior. Todavia a justiça, mesmo com normas editadas pelo príncipe, ficava fora de sua ação, sendo deste modo independente. Diante disso, no direito alemão houve uma preferência para dirimir os conflitos em que era parte o poder público as normas regidas pelo Direito Civil. Não havia direitos como penal, processual etc., havia um sentimento de direito, isto é, de justiça. Mas com as decisões da justiça foram dando vitória às pretensões do indivíduo, mesmo fundamentas em direito privado “deixou este de ser o direito único, pois se desenvolveu o direito público, em especial o Direito Administrativo, para reger as relações entre o Estado e os administradores; o Direito Civil passou a ter aplicação apenas subsidiária” (DI PIETRO, 2010, p. 9) O direito alemão, como já salientado, é diferente do sistema francês, surge de forma diversa, contudo “não se rompeu drasticamente com o sistema anterior como o francês” (HOROSHKEYEFF, 2012)17. Não foram normas derrogatórias e exorbitantes do direito comum (tal como ocorreu na França), mas uma sistematização da dogmática administrativista, contudo sem desprezar a contribuição do direito privado. No sistema italiano o seu Direito Administrativo seguiu uma tendência mista, apoiando ora na escola exegética como na científica. Assim como o alemão não foi consequência de uma revolução, mas uma sistematização evolutiva das normas de direito público, isto é, de Direito Administrativo. Como Di Pietro (2010, p. 10) leciona, o direito italiano apresenta três períodos. O primeiro refere-se ao início de normas administrativista no direito italiano, sob a influência do direito francês. Uma época sob o domínio da França, vez sentir a influência do direito francês, a qual tratava sobre a „unificação administrativa do reino‟. O segundo período vai de 1865 até a Primeira Guerra Mundial, em que se altera a lei supracitada para atender as exigências liberais da Europa do século XIX. A terceira fase ocorreu entre 1922 a 1943, pós Primeira Guerra, em que o regime totalitário fascista deu início a uma derrogação das instituições democráticas. Com o fim do fascismo voltam às instituições democráticas, e por sua vez a sistematização de um Direito Administrativo e uma noção de Administração Pública: 17 HOROSHKEYEFF, Kathia Loviat. História do Direito http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=3924. Acesso em: 29 jan. 2012. Administrativo. Disponível em: 12 13 Começaram a surgir manuais sobre a matéria de Direito Administrativo, dando início uma sistematização própria da disciplina. Em 1814 Romagnosi edita a obra Principi fondamentali del diritto amministrativo onde tesserne le istituzioni. Em Milão, cria-se a cátedra denominada “Alta legislação em referência à Administração Pública”, regida por 18 Romagnosi. Como fruto de duas correntes do Direito Administrativo, o direito italiano operou uma sistematização, não se apegando excessivamente a nenhum dos dois, como o francês e ao alemão19. 3 DIREITO ADMINISTRATIVO NO BRASIL O Direito Administrativo no Brasil teve a influência, sobretudo, do direito alienígena, francês e italiano. Entretanto há também a participação do sistema jurídico norte-americano, conhecido por common law, em nosso direito pátrio administrativo. Em seu artigo sobre „500 anos de Direito Administrativo Brasileiro‟, Di Pietro divide o Direito Administrativo no Brasil em quatro fases: a) período colonial, sob domínio da legislação portuguesa; b) período imperial, já com o início da influência do direito francês, decorrente da criação do Conselho de Estado; c) período republicano, até a Constituição de 1988, em que se plasmou o direito administrativo como ramo autônomo; d) período atual, posterior a Constituição de 1988, quando o direito administrativo altera, de certa forma, o seu perfil, em decorrência da instauração do Estado Democrático de Direito, dos princípios informadores da Reforma do Estado e da globalização. (DI PIETRO, 20 2011) Na constituição jurídica do ordenamento pátrio é inegável a participação do sistema europeu, entretanto, não nasceu no Brasil como um ramo autônomo, visto ser o direito da metrópole, isto é, o direito português as normas jurídicas que vigoram em nosso país, pois era o Brasil sua colônia. Estava desta forma ligada ao regime de uma monarquia absoluta. Como a coroa portuguesa preferiu dividir a colônia brasileira em capitanias hereditárias, buscando incentivar nobres portugueses a povoar as 18 Para esta citação bibliográfica não foi possível localizar o autor da mesma, pois o sítio em que fora feito a pesquisa não está mais disponível na rede mundial de computadores, há um direcionamento para outro sítio, mas não há como localizar mais o artigo em que foi extraída esta citação direta. http://www.cardanfe.com/?tag=direito-administrativo acessado em 01 fev. 2012. 19 Na primeira fase ou período desta-se há influência do sistema francês, mas também uma aspiração ao direito privado. Já a segunda fase assume um caráter científico colocando-se ao lado do sistema alemão. 20 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. 500 anos de Direito Administrativo Brasileiro. Disponível em http://www.direitopublico.com.br Acesso em: 05 out. 2011. p. 3 13 14 terras brasileiras, esta concessão dava aos “respectivos donatários [...] poderes absolutos que lhes eram outorgados pelo monarca português e que abrangiam, sem qualquer controle, a administração, a legislação e a distribuição da justiça” (DI PIETRO, 2010, p. 20). Di Pietro (2011) ainda salienta que certa forma havia uma distribuição de funções, ou seja, do exercício da administração. Embora sejam normas que caracterizam um Estado de Polícia, não sendo muito estranhas as formas como as monarquias do passado exerciam seu poder; havia uma distribuição de atribuições, entre governador-geral (representante do rei), o provedor-mor (representante do fisco) e ouvidor-geral (distribuidor da justiça). Entretanto, mesmo com tal divisão, o poder concentrava-se nas mãos do governador-geral, pois legislava e presidia a justiça, sendo até mesmo conhecido por „vice-rei‟; recebendo, mais tarde, poderes que em matéria civil e criminal, até mesmo de aplicar a pena capital (DI PIETRO, 2010, p. 20). Quanto às normas jurídicas da metrópole, poucas tiveram repercussão na colônia, pois detinham poderes absolutos os donatários. Algumas ordenações, como eram chamadas, em tese poderiam ser aplicadas, mas de fato o que regia na colônia eram os usos e costumes. Quando foi „descoberto‟ as terras brasileiras vigoravam em Portugal as Ordenações Afonsinas. Foram substituídas a partir de 1511, pelas Ordenações Manoelinas. Estas foram revogadas em 1613, que passaram a vigorar as Ordenações Filipinas ou Ordenações do Reino como também eram conhecidas. Estas últimas normas jurídicas vigoraram no Brasil até mesmo após a independência, “só deixando de ser aplicada na medida em que foram baixados os grandes códigos” (DI PIETRO, 2011)21 Do modelo escolhido pela coroa portuguesa, as capitanias hereditárias, se mostrariam hoje em dia, como uma autarquia territorial ou geográfica independente e com autonomia, mas com submissão ao monarca. Seria, assim, um início de uma administração pública, em nosso território, normas emanadas de um poder absoluto, mas que estipulavam atribuições entre os funcionários do rei. 21 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. 500 anos de Direito Administrativo Brasileiro. Disponível em http://www.direitopublico.com.br Acesso em: 05 out. 2011. p. 4 14 15 Já na época do Império, com a promulgação da primeira Constituição de 1824, pode-se afirmar a existência, ainda que de forma incipiente, de normas administrativas. Neste período o Brasil é fortemente influenciado pelo sistema francês, tanto que haverá também um Conselho de Estado, tal como na França, todavia não independente como o francês. Essa Constituição do Império teve influência liberal, dividiu o Império em províncias, como também o poder, havendo quatro funções do poder: executivo, legislativo, judiciário e moderador. No entanto, os dois últimos poderes concentravam-se nas mãos do imperador, e sendo o poder moderador, uma função que exorbitava a divisão constitucional dos poderes, ou seja, como o próprio nome diz, „moderava‟ ou controlava os „excessos‟ dos outros poderes. O Conselho de Estado existiu mesmo antes da Constituição de 1824, mais foi oficialmente previsto nesta Carta Magna. Contudo este Conselho exercia somente atribuições consultivas, não jurisdicionais, ou seja, não era independente, pois dependia do Imperador, sujeitando-se as determinações deste. Posteriormente foi extinto, recriado e definitivamente extinto em 1889. Mesmo sem as atribuições, pelo menos consultiva, do Conselho de Estado, foi nesta época que se tem no Brasil a criação da primeira cátedra de Direito Administrativo22. Foi “instalado em 1856, na Faculdade de Direito de São Paulo e regida por José Antônio Joaquim Ribas” (DI PIETRO, 2010, p. 20). No período imperial começou a pensar o Direito Administrativo como uma ciência jurídica, assim afirma Di Pietro (2011): [...] constitue hoje uma sciencia positiva, verdadeira e completa, que de um lado divide com o direito civil, e de outro com o publico positivo. Tem sua legislação, que por não estar codificada, não é menos numerosa, variada, constante e obrigatória, sua jurisprudência cujas regras vão se formando, assentadas por precedentes bem definidos. (DI PIETRO, 23 2011) Há neste período uma rica produção acadêmica, mas apensar de se pensar nesta seara do direito como uma ciência, não havia entre os doutrinadores uma uniformidade quanto ao tratamento da matéria ou ao seu objeto. 22 Instituída pelo decreto de 09-01-1825, o qual criava o curso jurídico na corte. FERNANDO apud DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. 500 anos de Direito Administrativo Brasileiro. Disponível em http://www.direitopublico.com.br Acesso em: 05 out. 2011. p. 10 23 15 16 Com o período republicano, supre-se o poder moderador, em consequência disso à administração pública afasta-se do campo do direito privado, visto também terem sido diminuídas à influência da dupla jurisdição do sistema francês. Submete-se a Administração Pública ao controle jurisdicional24. E com a extensão das atividades estatais, a partir da previsão constitucional de 1934, assumindo o Estado atividades sociais e econômicas, como saúde, higiene, educação, previdência social etc., amplia-se seu campo de atuação e, por conseguinte a necessidade de aparato administrativo. Como afirma Di Pietro (2011), neste período há uma intensa atividade doutrinária: Como conseqüência, cresce a máquina estatal, pela criação de novas pessoas jurídicas públicas, quer as de capacidade específica para execução de serviços públicos (autarquias), que as de capacidade genérica (territórios); paralelamente, aumenta o quadro de funcionários públicos necessários para o atendimento das novas tarefas assumidas pelo Estado. Na realidade, já estava definido, a essa época, o direito administrativo, como ramo autônomo do direito público, com institutos, princípios e regime jurídico próprio, tendo por objeto os órgãos, agentes e pessoas jurídicas administrativas que integram a Administração Pública, a atividade jurídica não contenciosa que exerce e os bens de que se utiliza para a consecução de seus fins, de natureza pública. (DI PIETRO, 25 2011) Com estes apontamentos históricos da origem e evolução do Direito Administrativo, especialmente em nosso direito administrativo pátrio, pode-se afirmar que surge como um ramo autônomo a partir da Constituição de 1934. Como qualquer ciência pode-se perceber uma evolução deste ramo do direito em relação com a constituição de Estado que o país adotou ao longo de sua história. Por exemplo, na Constituição de 1891, teve-se o Estado Liberal de Direitos, na Constituição de 1934, fala-se do Estado Social de Direitos; assim na atual Constituição de 1988 já se tem o Estado Democrático de Direitos. Assim a atuação da administração pública segue esta concepção de Estado adotada, ou seja, do Estado Democrático de Direitos, influindo o direito público e a atuação do Estado de acordo com as concepções políticas assumidas. Atualmente o Direito Administrativo a partir da Constituição de 1988, assume como normas norteadoras da função pública a observância à lei e ao direito. São, 24 Destaca-se, agora, a influência do sistema americano, que é a unidade da jurisdição. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. 500 anos de Direito Administrativo Brasileiro. Disponível em http://www.direitopublico.com.br Acesso em: 05 out. 2011. p. 17 25 16 17 portanto, fundamentais os princípios da legalidade e razoabilidade para alcançar a interesse público, propósito finalístico deste ramo do direito. 17 18 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS O direito administrativo se inicia quando as funções públicas do Estado se submetem à lei, ou seja, quando se instala o estado de direito. Esta figura somente se concretiza no Estado Moderno, em que os princípios da legalidade e da separação dos poderes são empregados. O excesso de poder, arbitrariedades, e privilégios são características que estão na contramão da função pública que o Estado deve exercer, e não sendo muito dizer do próprio direito administrativo. Assim é necessário compreender como se constituiu o direito administrativo, sua evolução história e contribuições doutrinárias, em especial, do direito administrativo pátrio, para que se perceba a relevante função pública no atendimento ao interesse público. O pensamento filosófico e as reminiscências históricas são salutares para o entendimento da sistematização do direito administrativo; inclusive de sua autonomia enquanto ramo do direito. A contribuição jurídica de doutrinas alienígenas, em especial a francesa, alemã e italiana, fomentaram a constituição do direito administrativo pátrio, contribuindo para iniciar a discussão. Mas apontando a reflexão pátria para as peculariedades próprias do Estado brasileiro, pois não há em nosso ordenamento jurídico um contencioso administrativo, visto ter o legislador optado por uma unicidade da jurisdição. Por fim reconhece-se a importância do trabalho jurisprudencial e doutrinário, podendo-se afirmar que o sentido da evolução do Direito Administrativo Brasileiro, após se distanciar dos sistemas francês e americano, foi, em seu início, os estudos doutrinários, passando pelos acórdãos jurisprudências das cortes e, por fim, a positivação deste ramo do direito em leis esparsas e específicas. 18 19 REFERÊNCIAS ARISTÓTOLES. Política. Trad. Mário da Gama Kury. 3 ed. Brasília: UNB, 1997. 321p BRAGA, Pedro Ética, Direito e Administração Pública. Brasília: Senado Federal, Subsecretaria de Edições Técnicas, 2006. 211 p. BOULOS JÚNIOR, Alfredo. História: sociedade e cidadania. São Paulo: FTD, 2009 (Coleção História: sociedade & cidadania – 7º ano) DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2010. 875 p. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. 500 anos de Direito Administrativo Brasileiro. Disponível em http://www.direitopublico.com.br Acesso em: 05 out. 2011. HOROSHKEYEFF, Kathia Loviat. História do Direito Administrativo. Disponível em: http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=3924. Acesso em: 29 jan. 2012. LOCKE, John. Dois tratados sobre o governo. Trad. Julio Fischer. 1 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001. 639 p (Clássicos) MAFRA FILHO, Francisco de Salles Almeida. História do Direito Administrativo: idéias para um debate. Disponível em: http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=918. Acesso em 29 jan. 2012. MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 26 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. 389 p MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22 ed. São Paulo: Malheiros, 2007. MONTESQUIEU. O espírito das leis. São Paulo: Nova Cultural, 1997. 384 p (Col. Os Pensadores – Volume I e II) OLIVEIRA, Luciano Henrique. Origem e História do Direito administrativo. Disponível em: http://www.editoraferreira.com.br/publique/media/toq41_luciano_oliveira.pdf Acesso em: 29 jan. 2012. ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do Contrato Social. Trad. Lourdes Santos Machado. 3 ed. São Paulo: Abril Cultural, 1983. 432 p (Os Pensadores) VERNANT, Jean-Pierre. Origens do Pensamento Grego. Trad. Manuela Torres. 5 ed. Lisboa: Teorema, 1987. 159 p (Col. Estudos Gerais) 19