ocupação humana no início do holoceno às margens de uma lagoa

Transcrição

ocupação humana no início do holoceno às margens de uma lagoa
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
OCUPAÇÃO HUMANA NO INÍCIO DO HOLOCENO ÀS
MARGENS DE UMA LAGOA CÁRSTICA NA REGIÃO DE LAGOA
SANTA - MG
(Early Holocene human occupation around a karstic lake of the Lagoa Santa
region – MG: an interdisciplinary approach)1
André Menezes Strauss
Orientador: Astolfo Gomes Araujo
Co-orientador: Joel Barbujiani Sígolo
MONOGRAFIA DE TRABALHO DE FORMATURA
(TF-08/05)
SÃO PAULO
2008
1
No abstract in English
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
OCUPAÇÃO HUMANA NO INÍCIO DO HOLOCENO ÀS
MARGENS DE UMA LAGOA CÁRSTICA NA REGIÃO DE LAGOA
SANTA - MG
André Menezes Strauss
_______________________________________________
Orientador: Astolfo Gomes Araujo
_______________________________________________
Co-orientador: Joel Barbujiani Sígolo
_______________________________________________
SÃO PAULO
2008
Strauss, André Menezes
Ocupação Humana no Início no Holoceno
às Margens de uma Lagoa Cárstica na Região de
Lagoa Santa – MG / André Menezes Strauss –
São Paulo. A.M. Strauss 2008.
p. 94 il.
Monografia (Trabalho de Conclusão de
Curso) – Instituto de Geociências da Universidade
de São Paulo.
1. Geoarqueologia 2. Paleoíndio 3. Lagoa
do Sumidouro
Dedico
Às amigas e parceiras
Elisângela Cordeiro Pessoa
Gabriella Talamo Fontaneta
Sem elas não teria conseguido (literalmente).
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao meu orientador prof. Astolfo Araujo por ter investido em minha formação.
Ao meu co-Orientador prof. Joel Sígolo pelas profícuas conversas.
Ao meu relator anônimo pelas correções dedicadas.
Aos colegas Emiliano de Castro, Paulo Haddad e Michelle Tizuka pelo pioneirismo.
Ao prof. Gergely Szabó pela ajuda com as seções delgadas.
À Ximena Villagrán que não hesitou em nos ajudar quando foi preciso.
Ao prof. Walter Alves Neves e a toda equipe do LEEH-USP por fazerem parte do meu lar
acadêmico nos últimos cinco anos.
À minha fabulosa turma da Geologia que tornou estes cinco anos muito agradáveis.
À equipe do LabSed, pela paciência.
Aos trabalhadores Bruno, Danilo, João, Mané e Newton por terem feito boa parte do nosso
trabalho.
À Fundação de Amparos à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pelo suporte financeiro.
Sumário
1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................................ 6
2. LOCALIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO ......................................................................................... 7
3. GEOLOGIA REGIONAL ................................................................................................................ 7
4. GEOMORFOLOGIA REGIONAL ................................................................................................. 11
4.1. PAISAGEM CÁRSTICA: A EVOLUÇÃO DO TERRENO .......................................................... 15
4.2. PAISAGEM CÁRSTICA: A EVOLUÇÃO DAS CAVERNAS ...................................................... 16
5. EMBASAMENTO TEÓRICO ....................................................................................................... 18
5.1. EMBASAMENTO TEÓRICO: SUPERFÍCIES DE APLAINAMENTO ......................................... 18
5.2 EMBASAMENTO TEÓRICO: RETRAÇÃO DE VERTENTES ..................................................... 22
5.3 EMBASAMENTO TEÓRICO: PROCESSOS PEDOGENÉTICOS ............................................... 28
5.4 EMBASAMENTO TEÓRICO: AGENTES PEDOTURBADORES ................................................ 35
6. MATERIAIS E MÉTODOS .......................................................................................................... 39
6.1 MÉTODOS DE ESCAVAÇÃO e ETAPAS DE CAMPO ............................................................. 39
6.2 MAPA TOPOGRÁFICO E PERFIL ......................................................................................... 40
6.3 ANÁLISE GRANULOMÉTRICA ............................................................................................. 41
6.4 DATAÇÃO POR LUMINESCÊNCIA ÓTICAMENTE ESTIMULADA (LOE) ................................ 42
6.5 DATAÇÃO RADIOCARBÔNICA ............................................................................................ 45
7. RESULTADOS ........................................................................................................................... 46
7.1 DESCRIÇÃO DO SÍTIO E DAS SONDAGENS ......................................................................... 46
7.2 DATAÇÕES POR LUMINESCÊNCIA ÓTICAMENTE ESTIMULADA ........................................ 83
7.3 DATAÇÕES RADIOCARBÔNIBICA ....................................................................................... 84
7.4 ANÁLISES GRANULOMÉTRICAS ......................................................................................... 87
8. DISCUSSÃO e CONCLUSÕES .................................................................................................... 88
9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................................... 96
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho é ao mesmo tempo monografia de conclusão do
bacharelado em Geologia (IGc – USP) e parte do Projeto Temático FAPESP
(04/01321-6) intitulado “Origens e Microevolução do Homem na América: Uma
Abordagem Paleoantropológica”, desenvolvido pelo Laboratório de Estudos
Evolutivos Humanos do Instituto de Biociências da USP. Este projeto, desde
seu início, privilegia o olhar interdisciplinar fazendo com que pesquisadores de
áreas tão distintas como Ciências Sociais, História, Arqueologia, Biologia,
Odontologia, Medicina, Geografia e Geologia trabalhem juntos discutindo um
tema em comum.
Dentro deste Projeto Temático a identificação e escavação de sítios
arqueológicos do início do holoceno, relacionados a uma ocupação humana
denominada “paleoíndia” pelos arqueólogos, é uma das atividades de maior
relevância. Em sua maioria, estes sítios estão localizados em abrigos calcários,
nos quais as condições de preservação são quase ideais. Entretanto, é
evidente que os antigos habitantes da região, ou paleoíndios, não viviam
confinados em tais abrigos, de maneira que seria de se esperar que também
fossem encontrados sítios arqueológicos a céu aberto. Nesse sentido foi
realizado um grande investimento na prospecção de tais sítios, tendo sido
detectados pelo menos dois sítios potencialmente antigos, ambos às margens
da Lagoa do Sumidouro. Um deles, denominado Sítio Sumidouro, foi escolhido
como objeto de estudo desta monografia, por ter apresentado materiais
arqueológicos em níveis discretos, uma estratigrafia bastante profunda, com
aproximadamente 2 m, e idades radiocarbônicas de até 8.300 anos AP.
O estudo geoarqueológico a que nos propomos neste trabalho parte da
observação de que a gênese do registro arqueológico, especialmente em sítios
a céu aberto, é profundamente influenciada por fatores geogênicos. O trabalho
do geoarqueólogo consistiria, portanto, em entender os processos de formação
do sítio e com isso discernir as feições verdadeiramente antropogênicas das
feições geogênicas. Este tipo de abordagem é fundamental para acabar com a
idéia ingênua segundo a qual o registro arqueológico é como a Pompéia
idealizada. Pelo contrário, onde quer que estudos geoarqueológicos tenham
sido realizados revelou-se a enorme complexidade do registro arqueológico,
explicitando que os mais simples pressupostos podem estar equivocados. No
sítio arqueológico do Sumidouro não foi diferente.
2. LOCALIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO
O sítio arqueológico do Sumidouro encontra-se na margem da Lagoa do
Sumidouro, localizada na divisa entre os municípios de Lagoa Santa e Pedro
Leopoldo, dentro da Área de Proteção Ambiental do carste de Lagoa Santa
(APA Carste de Lagoa Santa). Esta região encontra-se cerca de 50km ao norte
da capital do estado de Minas Gerais, Belo Horizonte (Fig. 2-1). O acesso à
Lagoa é feito por estradas vicinais que ligam aqueles dois municípios. As
coordenadas UTM do sítio são 611004E 78388820S (Fuso 23 SUL).
44º
15º
46º
SÃ F RANCIS
O
40º
17º
s
da
RI O
MINAS GERAIS
Rio
Velhas
48º
50º
42º
CO
19º
APA Carste de
Lagoa Santa
Belo Horizonte
21º
100 km
Figura 2-1. Mapa do estado de Minas Gerais, com a localização da APA Carste de
Lagoa Santa (extraído de Piló, 2003).
3. GEOLOGIA REGIONAL
O cráton do São Francisco ocupa uma posição interior na placa do
Atlântico do Sul a qual se uniu no final do Neoproterozóico por uma série de
orogenias. Está delimitado a sul e oeste pela faixa Brasília, a noroeste pela
faixa Rio Preto, a norte pelas faixas Riacho do Pontal e Sergipana e a sudeste
pela faixa Araçuaí, todas elas de gênese brasiliana (Alkmim, 2004). Das três
principais unidades morfotectônicas que recobrem o cráton, notadamente o
Aulacógeno do Paramirim, o Rifte Recôncavo-Tucano-Jatobá e a Bacia do São
Francisco, apenas esta última é diretamente relevante para este trabalho.
A Bacia do São Francisco apresenta área de cerca de 500.000km2,
incluindo porções dos estados de Goiás, Minas Gerais e Bahia (Fig. 3-1). A
leste e a oeste seus limites coincidem com os do cráton enquanto que a norte
e, principalmente a sul, os limites são de natureza erosiva. A estratigrafia desta
bacia intra-cratônica registra os mais distintos ambientes tectônicos nos mais
distantes períodos da história do planeta. Assim, na base da bacia encontra-se
o Supergrupo Espinhaço formado há cerca de 1,75 Ga durante a tafrogênese
Estateriana. Segundo Brito-Neves (1996), os quartzitos e filitos do referido
super-grupo teriam preenchido os ramos de um sistema ensiálico de riftes.
Figura 3-1. Mapa geológico simplificado do cráton do São Francisco (Alkmim et
al. 1993)
Acima do Supergrupo Espinhaço localiza-se o Supergrupo São
Francisco, constituído pelo Grupo Macaúbas e pelo Grupo Bambuí. O grupo
Macaúbas é constituído por arenitos e diamictitos que foram depositados
durante a glaciação Sturtiana. Nas porções mais interiores ao cráton registra-se
uma glaciação de caráter continental, enquanto nas regiões mais próximas às
faixas que o bordejam o registro indica uma glaciação marinha.
Já o Grupo Bambuí consiste em sedimentos argilosos e carbonatados
Neoproterozóicos que ocupam todo o lado oriental da Faixa Brasília e
recobrem o Cráton do São Francisco. Registra uma transgressão marinha
generalizada e marca o comportamento flexural de antepaís que o interior
cratônico passou a exibir como resposta à sobrecarga criada pelo
desenvolvimento dos cinturões orogênicos brasilianos à sua volta, iniciando-se
pelo desenvolvimento da Faixa Brasília. A litoestratigrafia do grupo atualmente
é dividida em seis formações: Jequitaí, Sete Lagoas, Serra de Santa Helena,
Lagoa do Jacaré, Serra da Saudade e Três Marias. Essa seqüência
litoestratigráfica apresenta-se mais ou menos constante através dos estados de
Goiás, Minas Gerais e Bahia, apesar das variações de tamanho das lentes
carbonáticas e da espessura relativa das diversas formações. O grupo recobre
em discordância tanto o embasamento como os metassedimentos dos grupos
Araí e Paranoá.
O início da sedimentação do Grupo Bambuí, também representado pelos
conglomerados basais Lagamar, Carrancas e correlatos, está provavelmente
relacionado a um sistema montanhoso adjacente referente às frentes de
empurrão da faixa de dobramentos Brasília (Thomaz et al., 1998). As datações
disponíveis colocam a base do Grupo Bambuí no final do Neoproterozóico
(Tabela 3-1). O degelo no fim da glaciação propiciou as condições necessárias
para a instalação de um ambiente marinho e o início da deposição dos
sedimentos argilo-carbonáticos sobre a área cratônica do São Francisco. Esse
conjunto sedimentar, que sucede a glaciação Jequitaí, é representado por três
megaciclos regressivos, sendo que cada um é iniciado por uma rápida
trangressão marinha de amplitude regional, associada a uma brusca
subsidência da bacia traduzida pela aparição de fácies argilosa de ambientes
marinhos profundos passando a fácies de plataforma rasa e fácies litorâneas
Tabela 3-1. Idades Radiométricas mais representativas para o Grupo Bambuí
Isócronas Rb-Sr em rocha total (RT) –
folhelhos e siltitos
Isócronas Rb-Sr em fração fina (<2 ) –
folhelhos e siltitos
Determinação K-Ar em fração fina (<2 ) –
590 a 640 Ma (Razão inicial=
0,711 a 0,714)
570 a 640 Ma (Razão inicial=
0,708 a 0,720)
480 a 580 Ma
folhelhos e siltitos
Isócrona Pb-Pb em calcários
690 ± 70 Ma
Isócrona Pb-Pb em galenas (curva de
1850 ± 150 Ma e 650 ± 50 Ma
evolução)
Composição isotópica do Sr em calcários
~ 595 Ma
(Extraído de Thomaz et al. 1998)
O primeiro megaciclo de regressão ficou registrado na Fm. Sete Lagoas
em cuja base estão presentes calcilutitos cinza-escuros que dão lugar, nas
posições mais elevadas da estratigrafia, a calcários e dolomitos, caracterizando
uma sequência granocrescente. O segundo megaciclo ficou registrado na Fm.
Serra de Santa Helena, cuja natureza essencialmente argilosa indica uma
subsidência brusca e generalizada que é seguida pela deposição dos calcários
cinza-escuros da Fm. Lagoa do Jacaré, que apresenta sua gênese ligada à
ação de correntes de maré e tempestade. Por fim, o terceiro megaciclo ficou
registrado na Fm. Serra da Saudade que foi sedimentada em ambiente de
plataforma profunda e pela Fm. Três Marias, predominantemente arcoseana,
depositada em ambiente de plataforma rasa dominada pela ação de
tempestades e correntes litorâneas.
No que diz respeito especificamente à Fm. Sete Lagoas, ela foi
originalmente dividida em Fácies Pedro Leopoldo e Fácies Lagoa Santa
(Schöll, 1976). Posteriormente Tuller et al. (1992) elevaram estas fácies à
categorias de membros. O Membro Pedro Leopoldo corresponde às porções
basais em que se encontram intercalações de leitos finos de pelitos e camadas
médias de calcissiltitos. Seu contato com o embasamento é abrupto e
discordante, sugerindo que seja decorrente de falhas de deslocamento. O
Membro Pedro Leopoldo apresenta espessura máxima na ordem dos 100
metros. Já o Membro Lagoa Santa, que ocorre no interior do planalto cárstico,
é composto por calcários, calcissiltitos, brechas, estromatólitos e milonitos.
Seus calcários são famosos pela pureza na ordem dos 90% de CaCO3.
Segundo Piló (1998) ocorrem preferencialmente entre as cotas 850 a 650m, e é
nestas rochas que boa parte do desenvolvimento cárstico tomou forma.
4. GEOMORFOLOGIA REGIONAL
A primeira descrição geomorfológica da região de Lagoa Santa foi feita
por Lanari em 1909, que já atentava para a natureza cárstica do terreno.
Entretanto, foi só com o trabalho de Tricart em 1956 que os primeiros modelos
genéticos foram propostos. A presença esporádica de formas calcárias na
região não permite classificá-la como caracteristicamente cárstica. Para ele, a
presença dos altos paredões era decorrência de erosão diferenciada entre as
rochas metamórfica encaixantes e as rochas carbonáticas. Segundo ele, ainda
que estas estivessem originalmente sobrepostas, processos geradores de
falhas teriam colocado-as lado a lado em algumas regiões, gerando assim os
escarpamentos retilíneos. No mesmo ano Lester King publicou seu trabalho
atribuindo aos seus ciclos denudacionais o relevo cárstico da região de Lagoa
Santa (Piló, 1998).
Em 1977 Journaux caracteriza o carste de Lagoa Santa como pouco
evoluído devido à ausência de depressões alargadas com testemunhos
residuais no centro. Para ele, os paredões seriam resultado do aprofundamento
gradual de dolinas periféricas a eles. Bálazs (1984) apresenta idéia oposta
segundo a qual o rebaixamento do terreno teria levado ao recobrimento dos
morros remanescentes por sedimentos provenientes de lagos, rios e
abatimentos de vertentes. Este é um dos poucos autores que colocam o início
do desenvolvimento da carstificação da região de Lagoa Santa em pleno
Mesozóico. Segundo ele, os resíduos do carste foram várias vezes exumados
e sepultados, e o processo atual de exumação está ocorrendo desde o fim do
terciário (Piló, 1998).
No final da década de 1970, Kohler elaborou a primeira carta comentada
sobre a geomorfologia da região. A compartimentação fisiográfica proposta por
ele será a adotada no resto deste trabalho e, portanto, será descrita em
detalhes. Ao sul do Planalto de Lagoa Santa encontra-se a Depressão de Belo
Horizonte, que é limitada a SW-NE pela escarpa da Serra do Curral. O relevo
foi elaborado sob clima tropical e é constituído por um típico sistema de morros
policonvexos desenvolvido sobre rochas graníticas. A drenagem é feita pelo
Córrego dos Arrudas, tributário do Rio das Velhas.
A leste o Planalto de Neves apresenta-se como um grande plano
inclinado cujas arestas delimitam o limite entre a bacia do Rio das Velhas e a
do Rio Paraopeba. O relevo é acidentado, marcado por esporões alongados
separados
por
amplos
vales.
A
drenagem
intensa,
direcionada
majoritariamente ao Ribeirão da Mata, é abruptamente interrompida pela
soleira migmatítica da Serra dos Ferradores.
O Ribeirão da Mata separa o Planalto de Neves, a leste, do Planalto de
Lagoa Santa, a oeste. Este rio apresenta direção NW-SE em seu alto curso,
mas, após receber o Córrego das Areias inflete radicalmente, em forma de
cotovelo, para leste. Após esta inflexão ele passa a drenar a Depressão de
Vespasiano. Esta depressão apresenta relevos moderados e está encaixada
entre o front da cuesta do Planalto de Lagoa Santa, a norte, e o relevo do
embasamento a sul.
O Planalto de Lagoa Santa encontra-se entre as cotas 650m e 900m. A
sul é delimitado pela Depressão de Vespasiano, a leste pelo Planalto de Neves
e a norte pela Depressão de Sete Lagoas. Desenvolve-se sobre rochas filíticas
e carbonáticas, nas quais se desenvolve o relevo cárstico característico deste
compartimento geomorfológico. O flanco norte do Planalto de Lagoa Santa foi
dissecado por processos erosivos, dando origem à depressão de Sete Lagoas
a uma cota de cerca de 750 metros.
O bloco interfluvial Rio das Velhas – Ribeirão da Mata (IRV) é a unidade
de relevo na qual se insere a Lagoa do Sumidouro. Sua topografia é
decorrência do escalonamento sub-horizontal das litologias que o compõem.
No extremo oeste aloja-se o vale do Ribeirão da Mata. Adjacente a ele erguese a Serra dos Ferradores, em cujo topo encontram-se os filitos da unidade
Serra de Santa Helena. Trata-se do ponto mais alto do bloco interfluvial. A
partir dele estabelece-se, para leste, uma redução altimétrica escalonada, que
culmina nas planícies cársticas. Estas por sua vez estabelecem a conexão
hidrológica entre o carste e o Rio das Velhas.
Os relevos não cársticos constituem 30% do interflúvio e se
desenvolveram ou sobre o embasamento, ou sobre a unidade dos calcifilitos ou
sobre os próprios filitos. O primeiro caso tem pequena expressão em área,
estando presente apenas no vale do Ribeirão da Mata e nas soleiras da Serra
dos Ferradores. Já os calcifilitos estão presentes na Depressão de Vespasiano,
nas bordas do Planalto de Lagoa Santa e na região do Fidalgo. Eles constituem
o embasamento impermeável do carste, podendo apresentar feições cársticas
em função da corrosão de lentes de carbonato neles contidas (Kohler, 1989).
Os filitos estruturam o cume dos alinhamentos serranos de Confins e da Serra
dos Ferradores, localizados entre 830-850 metros de altitude. A superfície
delimitada por estas serras seriam remanescentes da Superfície Sul-americana
estabelecida por King (1956), cujos topos caracteristicamente apresentam-se
aplainados e alongados na direção SE-NW.
Os relevos cársticos constituem 70% do IRV. Segundo Kohler, eles
podem ser divididos em quatro unidades fisiográficas distintas. A primeira delas
corresponde aos “Desfiladeiros e abismos com altos paredões”, que se
encontram nas cotas mais altas do calcário. Este compartimento encontra-se
próximo à cidade de Matozinhos, onde um corredor deprimido estabeleceu-se
no sentido SW-NE, criando uma conexão entre a planície do Mocambeiro e o
compartimento do Ribeirão da Mata.
O compartimento dos “Cinturões de
Ouvalas” localiza-se dentro de uma depressão irregular, marginal ao flanco
leste da Serra dos Ferradores, na qual há um alto índice de ocorrência de
ouvalas. O “Planalto de Dolinas” situa-se abaixo das cotas de 800 m e a cima
das cotas de 700 m. As dolinas apresentam um alinhamento SW-NE sugerindo
um rígido controle estrutural em sua gênese. Alguns dos sítios arqueológicos
mais conhecidos estão inseridos neste compartimento fisiográfico, como são os
casos de Cerca Grande, Lapa Vermelha e Lapa do Santo.
O último compartimento fisiográfico estabelecido por Kohler são as
“Planícies Cársticas (poljés)”. Os poljés são uma forma típica dos terrenos
cársticos. Segundo Piló (1998:57): “... polje é uma ampla depressão fechada,
com comprimentos e larguras que chegam a dezenas de quilômetros de
largura, com paredes abruptas, fundo plano rochoso ou, mais comumente,
recoberto por argilas de descalcificação, aluviões ou depósitos lacustres”.
Segundo Gams (1978, Apud Piló, 1998) para se classificar uma depressão
como polje ela precisa apresentar um largo piso horizontal de rocha ou material
inconsolidado, uma bacia fechada com bordas íngremes, pelo menos em um
lado, e drenagem tipicamente cárstica. A gênese do poljé está profundamente
relacionada com algum fator que impeça o prosseguimento do entalhamento
vertical do terreno. Assim, quando a erosão atinge uma rocha insolúvel ou o
nível de base, o vetor erosivo horizontaliza-se levando à dissolução progressiva
das bordas da depressão.
O compartimento das planícies cársticas localiza-se abaixo dos 670
metros de altitude com uma superfície contínua de mais de 4 quilômetros
quadrados. Ambas planícies cársticas do IRV, a do Fildalgo e a do
Mocambeiro, estão próximas ao Rio das Velhas e são alimentadas por águas
autóctones do carste e periodicamente são inundadas pelas águas do aqüífero
cárstico. A Lagoa do Sumidouro ocupa cerca de 80% da planície do Fildalgo,
um amplo vale cego alimentado pelo córrego do Samambaia. O fundo da lagoa
é constituído por calcifilitos impermeáveis, o que condicionou o seu
desenvolvimento lateral. Inclusive, segundo Journaux et al. (1978. Apud Kolher
1989), a presença de quartzo no edifício rochoso do Rochedo do Fidalgo
sugere uma fácies próxima ao calcifilito. O sítio arqueológico do Sumidouro,
foco do presente trabalho, situa-se na margem sudoeste da Lagoa do
Sumidouro, próximo ao Rochedo do Fidalgo.
4.1. PAISAGEM CÁRSTICA: A EVOLUÇÃO DO TERRENO
Em meados do século XIX, o termo karst passou a ser empregado para
se referir a uma região específica do nordeste da Itália e noroeste da
Eslovênia, na qual se desenvolveram os primeiros estudos sobre o tema. A
escola geográfica de Viena, da qual era integrante A. Penck, foi quem primeiro
elaborou estudos teóricos sobre este tipo de relevo. São dessa época as
noções de que o carste é um relevo característico de áreas onde ocorrem
rochas solúveis, sendo a água o principal agente na evolução do terreno. Já
no século XX, com os trabalhos de Tricart, deu-se grande atenção à influência
do clima na morfologia da região cárstica (Piló, 1998).
Ainda que as contingências estruturais do relevo cárstico do IRV possam
remontar ao pré-cambriano, a gênese da atual configuração morfológica do
terreno teve início no Terciário, com os ciclos denudacionais Velhas. Estes
ciclos entalharam, durante o Terciário Médio, a superfície Sul-americana que
se estendia por todo bloco interfluvial nas cotas superiores a 900m. Nesta
época, o Rio das Velhas passava diretamente sobre o bloco interfluvial e não à
sua margem como ocorre atualmente. Ao invés de ser tributário do Rio São
Francisco, o Rio das Velhas teria sido tributário do Rio Paraopeba, correndo no
sentido NW pelo o que hoje é o vale do Ribeirão da Mata, justamente no
contato entre o embasamento e a cobertura carbonática. Assim, se poderia
explicar o super dimensionamento do vale do Ribeirão da Mata, cujos mais de
100 metros de largura são incompatíveis com o atual fluxo hídrico.
Conforme entalhava a Superfície Sul-americana do IRV, o paleo Rio das
Velhas depositava os seixos que hoje podem ser encontrados entre as cotas
850m e 900m. Quando no Pleistoceno Médio a dinâmica denudacional enfim
exumou as rochas carbonáticas, o paleo Rio das Velhas se tornou um rio
cárstico, depositando grande quantidade de seixos rolados e sedimentos nos
condutos. Segundo Kohler (1989:57): “A própria evolução do relevo cárstico só
pode ser explicada com um fluxo de água muito maior que o atual, que gira em
torno de 3 metros cúbicos por segundo. O volume atual do Rio das Velhas, da
ordem de 200 metros cúbicos por segundo, explicaria e justificaria os
processos paleocársticos responsáveis pela configuração atual do Relevo”.
Uma
vez
exumadas
as
rochas
carbonáticas,
tem
início
o
desenvolvimento do relevo exocártisco com suas características vertentes
decapeadas e verrugas. Os vales cegos são represados e as vertentes dos
paredões assumem um perfil côncavo da base para o topo, gerado pelo
contato com as águas das lagoas temporárias. Finalmente, no Pleistoceno
Inferior, algum processo tectônico teria gerado um adernamento do IRV para
SE, acarretando uma mudança radical do curso do rio das Velhas e na
instalação do Ribeirão da Mata com seu curso anômalo no sentido NW-SE.
4.2. PAISAGEM CÁRSTICA: A EVOLUÇÃO DAS CAVERNAS
Em sua grande maioria as cavernas da região de Lagoa Santa ocorrem
como passagens secas no fundo de dolinas ou na base de maciços calcários e
apresentam padrão anamostosado. Comumente o assoalho e a parede das
cavernas estão cobertos por sedimentos, evidenciando uma dinâmica
policíclica de sedimentação. Segundo Auler (1999), os condutos cársticos de
Lagoa Santa foram gerados majoritariamente por paragênese. Afinal, em
muitas cavernas não existem juntas no teto, atestando que o nível inicial do
conduto não correspondia ao do teto atual. No lugar das juntas encontra-se um
canal meandrante, sugerindo um fluxo lento de água não saturada. Como os
tetos das cavernas de Lagoa Santa não são muito planos, assume-se que a
paragênese não atingiu o lençol freático.
Entender a cronologia envolvida na gênese dos condutos é fundamental
para entender a própria dinâmica da evolução de todo relevo do IRV, já que o
início das carstificação é correlato com a exumação das rochas carbonáticas.
Ainda que King (1956) e Kohler (1989) tenham, respectivamente, sugerido que
o início da drenagem dos condutos ocorrera no Plioceno e no Pleistoceno, foi
apenas a partir do trabalho de Piló (1998) que métodos mais precisos foram
utilizados para abordar a questão. Através de uma série de datações em
Urânio, ele estabeleceu uma taxa de incisão para a dolina em estudo de
110m/Ma. Extrapolando este valor para a altura que existiu entre o assoalho da
dolina e a superfície Terciária Sul-americana, Piló (1999) estabeleceu que a
idade máxima para a exumação das rochas carbonáticas seria de 1.9 Ma.
Entretanto, Auler (1999) identifica uma série de problemas nas
premissas utilizadas por Piló (1998), como a de que existiria uma superfície de
aplainamento Terciária ou de que o nível de calcita datada realmente seja
contemporâneo ao assoalho da dolina. Apesar das críticas, as idades
oferecidas por Auler (1999) para a exumação das rochas carbonáticas (1.93.7Ma) se baseiam na pura extrapolação das taxas de denudação cratônicas
estabelecidas por Harman et al (1998). Ainda assim, Auler (1999: 138) afirma
que: “Estes dados demonstram que o desenvolvimento das cavernas começou
ainda no meio do Terciário, e que o começo da drenagem e carstificação antes
do Pleistoceno. A antiguidade das cavernas de Lagoa Santa é ainda
sustentada pelo fato de que muitas cavernas são atualmente meros resquícios
em cima das torres cársticas”.
De qualquer maneira, não há duvida de que as cavernas apresentam
evidência inconteste de eventos pretéritos de aporte e erosão de sedimentos.
Assim como ocorre em superfície, os ciclos de sedimentação clástica das
cavernas é fortemente controlado pelos ciclos paleoclimáticos. Entretanto,
enquanto em superfície o registro sedimentar é completamente obliterado por
eventos mais recentes, dentro das cavernas existem muitas possibilidades para
que haja a preservação deste registro. Em regiões cratônicas o quadro é ainda
mais interessante, pois as baixas taxas de rebaixamento do nível de base faz
com que as cavernas permaneçam por um período muito mais longo na zona
de atividade hídrica. O resultado disso é um registro sedimentar policíclico de
longa duração que foi afetado por diversos eventos de mudanças climáticas.
Atualmente, o Carste de Lagoa Santa encontra-se numa fase de remoção ativa
de sedimentos das cavernas que deve ter se iniciado após a última glaciação
(Auler, 1999). Em regiões onde o aporte de sedimento é majoritariamente
originado das vertentes das dolinas, como é o caso da Lagoa Santa, os
períodos de seca são os que mais contribuem para o preenchimento da
caverna. Já a erosão ocorre nas épocas de transição de climas úmidos (nos
quais se desenvolveriam espeleotemas) para climas secos, que induziriam a
erosão do solo.
5. EMBASAMENTO TEÓRICO
5.1. EMBASAMENTO TEÓRICO: SUPERFÍCIES DE APLAINAMENTO
Durante o século XIX James Hutton introduziu a idéia revolucionária de
que pequenas mudanças acumuladas durante longos períodos de tempo
seriam capazes de explicar a conformação atual do planeta. Do ponto de vista
geomorfológico, isto era o mesmo que afirmar que processos denudacionais
subaéreos de ampla extensão seriam capazes de modelar a paisagem tal qual
ela se apresenta hoje. Em 1883 W. M. Davis começou a desenvolver seu
conceito de “ciclo geográfico” segundo o qual as paisagens, assim como os
organismos, avançavam sucessivamente por estágios juvenis, maduros e
senis. Eventualmente, em decorrência de algum tipo de soerguimento
tectônico, os terrenos senis voltavam ao início do ciclo. No fundo, a teoria de
Davis era profundamente marcada por elementos evolucionistas não
Darwinianos. Afinal, apesar do termo “ciclo” aparecer no próprio título da teoria,
ele só se realizava fora da dinâmica evolutiva proposta por Davis.
Para ele, o processo erosivo tinha início logo após o soerguimento
tectônico. Nos primeiros momentos deste processo, o relevo jovem
apresentava rios que entalhavam rapidamente seus vales, levando a uma
rápida evolução da paisagem regional. O estágio maduro seria caracterizado
pelo desenvolvimento de meandros em vales aluvionares. Outro critério era a
remoção total das superfícies inter-fluviais da paisagem regional. Já o estágio
senil, é mais difícil de ser caracterizado pois apresenta em relação ao maduro
apenas diferenças quantitativas e não qualitativas. Assim, Davis sugere que em
estágios senis os vales fossem muito mais largos do que a área de alcance dos
meandros que o cortavam e que seriam invariavelmente preenchidos por
material aluvionar.
Segundo Davis, regiões tectonicamente estáveis que foram submetidas
a longos períodos de erosão e intemperismo tenderiam a apresentar uma
paisagem que ele chamou de “peneplano”. O prefixo “pene” é uma derivação
do latim que significa “quase”. Portanto, o peneplano nada mais é do que uma
superfície regional com relevo pouco acidentado, baixas altitudes absolutas, e
que foi gerado pela ação continua e prolongada da erosão fluvial.
Em contraposição quase que absoluta às idéias de Davis estão as idéias
de Walther Penck. Este cientista alemão morreu antes de publicar seus
trabalhos, de maneira que grande parte de sua produção foi levada ao público
de língua inglesa por outros pesquisadores, dentre eles o próprio Davis. Penck
aceitava a idéia de que as paisagens poderiam ser reduzidas às formas finais
de baixo relevo, mas sustentava que estas formas jamais voltavam a ser o
ponto de partida para novos episódios de dissecação. Uma diferença
fundamental entre a teoria de Penck e a de Davis é que, enquanto este último
via os processos de soerguimento crustal como eventos quase instantâneos, o
primeiro acreditava que estes eventos começavam com baixa intensidade e
aos poucos iam se intensificando até atingir uma taxa máxima de
soerguimento, após a qual o ritmo ia diminuindo até eventualmente cessar.
Segundo Penck, os estágios iniciais do soerguimento, enquanto ele ainda é
lento e gradual, levam à destruição das paisagens pretéritas gerando uma nova
superfície pouco acidentada. É sobre esta nova superfície que os eventos
decorrentes agiriam.
Penck nega categoricamente a possibilidade de que distintas formas de
relevo pudessem se suceder numa seqüência temporal. Isso porque as
vertentes, uma vez desenvolvidas, retrairiam paralelamente a si próprias,
conservando assim sua morfologia inicial até que interceptassem outra
vertente. Juntando esta idéia com sua maneira de entender o processo de
soerguimento crustal, Penck foi capaz de oferecer uma explicação inédita para
os perfis côncavo-convexos tão típicos das vertentes. Os topos convexos
seriam resultado dos períodos nos quais haveria uma aceleração positiva da
taxa de soerguimento. Quando a taxa se mantinha constante as vertentes
ficam planas e, quando a aceleração era negativa, formavam-se os perfis
côncavos.
Os geomorfólogos que vieram após Penck deram continuidade as suas
idéias na forma dos “pediplanos”. Ao retraírem, as vertentes deixam em suas
bases o pedimento: um material residual que se acumula em baixo ângulo.
Conforme as vertentes retraem paralelamente a si mesmas, elas deixam em
seus caminhos verdadeiros campos de pedimentos recobertos por matacões e
pedimentos mais antigos. A estas camadas de pedimento chamou-se
pediplanos. Numa mesma paisagem é possível que diversas gerações de
pediplanos coexistam e interajam entre si. Nesta perspectiva não há uma
seqüência de paisagens que se sucedem no tempo já que, uma vez formados,
os pedimentos são estáveis e imutáveis.
Na década de 1960 Hack propôs a teoria de que as paisagem se
encontrariam num estado de equilíbrio dinâmico. Profundamente influenciado
pela teoria dos sistemas, Hack enxergava o relevo como um sistema físico
aberto no qual variáveis interdependentes se regulariam num processo
homeostático. Na analogia pictórica recorrentemente utilizada pelos estudiosos
da teoria dos sistemas, o redemoinho formado no fundo da pia seria o melhor
exemplo de um sistema em equilíbrio dinâmico. Neste caso, a forma (estrutura)
do redemoinho está em equilíbrio, ainda que haja um fluxo constante de
matéria através dele. Assim, o que caracteriza e define o redemoinho não é
exclusivamente a matéria que o compõe, mas sim os aspectos relacionais
desta que geram a estrutura emergente reconhecida como o redemoinho.
Para Hack a paisagem seria como o redemoinho: uma estrutura
necessária que emerge das relações estabelecidas pelas partes que a
compõem. Para ele, a maioria das paisagens que haviam sido consideradas
como maduras dentro da perspectiva Davisiana nada mais eram do que
superfícies em equilíbrio dinâmico, sem conotação alguma de desenvolvimento
seqüencial. Ainda que Hack se colocasse contra o modelo cíclico de Davis, é
impossível não reparar que seu próprio modelo também é sequencial. A
diferença reside no fato de que para Hack o estágio de equilíbrio dinâmico
ocuparia quase que a totalidade do processo de desenvolvimento do relevo.
Outra importante extensão da idéia de pediplanação de Penck é o
conceito de superfície de aplainamento, fundamental na geomorfologia de
áreas tectonicamente estáveis. Estas superfícies são facilmente reconhecíveis
na paisagem e se encontram distribuídas em ampla extensão territorial em
continentes como África, Austrália e América do Sul. Lester King foi quem
popularizou a idéia a partir de um modelo no qual uma série de superfícies
erosivas delimitadas por escarpas se formavam em decorrência de eventos
globais de soerguimento crustal. Entretanto, conforme alerta Auler (1999), uma
das premissas centrais da teoria de King é a existência de episódios de rápido
soerguimento crustal. Entretanto, Gilchrist e Summerfield (1991) privilegiam um
modelo no qual o soerguimento é contínuo e devido a causas isostáticas.
Assim, após o evento tectônico de soerguimento gerado pela separação dos
continentes, a altimetria do interior do cráton permaneceria constante já que o
soerguimento isostático estaria em equilíbrio com as taxas de denudação.
Harman et al. (1998) calcularam as taxas de denudação para o cráton de
São Francisco através da análise da “fission track” da apatita e chegaram a um
valor entre 20 e 40 metros por milhão de ano. Além disso, eles também
identificaram um aumento na taxa de denudação conforme se aproxima da
margem passiva. Amaral et al (1997) realizaram estudos similares e chegaram
a taxas na ordem de 18m/Ma. Auler (1999) analisou as inversões
paleomagnéticas dos sedimentos de uma caverna localizada no norte do
Cráton de São Francisco e estabeleceu uma taxa entre 25-34m/Ma para o
rebaixamento do nível de base regional.
No Brasil as superfícies de aplainamento foram determinadas pelo
próprio Lester King num trabalho de 1956. Segundo ele, era possível identificar
cinco principais superfícies a que ele chamou de Gondwana, Pós-Gondwana,
Sul-americana, Velhas e Paraguaçú. A mais antiga seria a Gondwana, que
teria se desenvolvido antes da separação do supercontinente homônimo e que
atualmente estaria restrita às porções mais altas de serras e montanhas. A
superfície pós-Gondwana teria se estabelecido após a separação dos
continentes, durante o Cretácio Médio. A Superfície Sul-americana, também
conhecida como Superfície de Moorland, é a mais extensa de todas e funciona
como guia para o estabelecimento das demais superfícies. A superfície Velhas
teria se iniciado no Oligoceno (34-24Ma), tendo atingindo o nível de
aplainamento apenas nas regiões norte do cráton enquanto que nas porções
meridionais apresenta-se na forma de entalhes na superfície Sul Americana. O
ciclo Paraguaçu, do Plioceno, é o mais recente, não tendo atingido, em
nenhum local, o grau de pediplanação.
Segundo Kohler, no estado de Minas Gerais a superfície Sul-americana
encontra-se entre as cotas 800m e 900m, é recoberta por solos lateríticos e
nela predomina cobertura vegetal de cerrado: “A Superfície Sul Americana de
King é, sem dúvida, o maior testemunho fisiográfico do Terciário. É uma
constante do relevo brasileiro de norte a sul.” (Kohler,1989:31). Na região em
estudo, os locais onde esta superfície melhor se apresenta é no topo da Serra
dos Ferradores e em Confins, onde seu mergulho de 2,7% coincide com o
gradiente do Ribeirão da Mata (Kohler 1989).
5.2 EMBASAMENTO TEÓRICO: RETRAÇÃO DE VERTENTES
Os processos de retração de vertentes talvez estejam entre os principais
elementos de toda teoria geomorfológica. Portanto, nesta seção será feita uma
breve discussão sobre o tema.
Ainda
que
agentes
específicos
sejam
importantes
em
regiões
específicas do globo, parece ser bastante seguro afirmar que o fluxo hídrico na
superfície terrestre é o agente dominante na transformação das paisagens.
Davis, por exemplo, afirmava que uma região era climaticamente normal se ela
não fosse quente a ponto de evaporar toda água ou fria a ponto de congelar
toda água disponível. Este fluxo hídrico superficial ocorre predominantemente
através de rios que formam sistemas fluviais. Estes sistemas são alimentados
pela conversão da energia potencial solar e da energia potencial gravitacional
em energia cinética. Grande parte dessa energia é dissipada nas mais diversas
formas, sendo que uma delas é no trabalho mecânico da erosão (Bloom, 1978).
A erosão começa com a água meteórica. Após o substrato estar
saturado, a água começa a correr junto à superfície levando consigo partículas
e sedimentos. Quanto mais profundo no solo, maior a participação da
componente verticalizada do movimento da água. Assim, apenas próximo à
superfície é que ocorre um fluxo laminar. Este fluxo muitas vezes não possui
energia suficiente para remover grãos do substrato, levando consigo apenas o
material que foi removido pelo próprio impacto da gota de chuva. O fluxo de
água laminar sub-superficial ganha velocidade e energia conforme avança
vertente abaixo, tornando-se um agente erosivo. Assim, o fluxo d’água nas
vertentes só consegue erodir o material que esteja há uma certa distância do
topo da vertente. Isso ajuda a explicar a concavidade das partes mais inferiores
das mesmas. Por mais plana, jovem e homogênea que seja uma vertente,
processos estocásticos garantem que condutos preferenciais de escoamento
serão formados. Estes condutos acabam sendo regiões de intensificação do
processo erosivo que formam pequenos canais. Num primeiro momento, estes
canais são tão estreitos que são obliterados pelo rastejamento da vertente.
Entretanto,
quando
estes
canais
são
suficientemente
grandes
para
sobreviverem ao intervalo entre duas chuvas, eles passam a funcionar como
coletores de água, especialmente nas suas porções mais próximas ao topo da
vertente. Formam-se pequenas cachoeiras entre a superfície da vertente e os
canais recém-formados. Estas pequenas cachoeiras são regiões de intensa
atividade erosiva fazendo com que os canais se expandam rapidamente em
direção à vertente, gerando um padrão de canais paralelos e não dendríticos.
Conforme estes canais se expandem e se interceptam eles formam ravinas,
que é o primeiro passo no processo de dissecação fluvial da paisagem (Bloom,
1978).
O passo seguinte seria a extensão destas ravinas formando sistemas
fluviais. Entretanto, por mais intuitiva que esta idéia possa parecer, não há
consenso entre os geomorfólogos a respeito do modo exato através do qual se
dá este processo. Afinal, quais são as provas científicas de que os vales
realmente foram formados pelos rios que neles correm? A primeira apreciação
sobre o tema foi feita no início do século XIX e ficou conhecida como lei de
Playfair. Segundo este matemático e geólogo escocês, a probabilidade de que
os sistemas de vales fossem tão bem adaptados uns aos outros por mero
acaso era efêmera. Já no século XX pesquisadores deram prosseguimento aos
trabalhos de Playfair através do que ficou conhecido como geomorfologia fluvial
quantitativa. Shreve (1967, 1975) abordou a questão através de modelos
aleatórios e demonstrou que a organização dos sistemas de drenagem era
muito provável. Para ele, as configurações assumidas pelos sistemas de
drenagem são resultado de processos aleatórios altamente previsíveis. Por
outro lado, Howard (1971) mostrou que é igualmente possível estabelecer um
sistema de drenagem a partir de processos não estocásticos. Assim, ele fez
uma simulação baseada no crescimento para montante e na ramificação dos
canais, e conseguiu obter um sistema fluvial de drenagem. Ou seja,
teoricamente o sistema de drenagem pode-se formar quer seja pelo avanço à
montante de ravinas pré-existentes, quer seja pela intersecção progressiva de
pequenos canais conforme a água corre para jusante.
Uma vez estabelecido o sistema fluvial, os canais assumem diferentes
morfologias em decorrência de uma série de fatores. Nesse sentido, conforme
a quantidade de água no canal aumenta, a inclinação do leito do rio diminui.
Como conseqüência, em rios efluentes nos quais a descarga hídrica aumenta
conforme se aproxima da foz, o perfil do rio será côncavo para cima. Estudos
empíricos revelam que é exatamente isso que ocorre (Carlston, 1969). É claro
que esta tendência se realiza mais facilmente nas porções em que o rio corre
sobre substrato aluvionar. Trechos onde o substrato é rochoso podem fazer
com que o perfil seja plano e até mesmo convexo.
Outra propriedade fundamental de um rio, no que diz respeito à sua
influência nos processos erosivos de retração de vertentes, é a competência. A
competência de um rio define a sua capacidade de transportar um certo
tamanho máximo de grãos. Este tamanho máximo é função direta da
velocidade da água do rio. A Figura 5.2-1 mostra esta relação, salientando uma
diferença entre erosão e transporte. Enquanto a fração fina pode ser
transportada por correntes muito suaves, é necessária uma grande quantidade
de energia para erodi-la, ou seja, iniciar seu transporte. Assim, um rio que
carrega predominantemente argila e silte tenderá a desenvolver canais mais
estreitos e profundos com uma seção transversal na forma de trapézio. Por
outro lado, rios que carreguem areia e seixos irão desenvolver canais
aluvionares largos e rasos.
1000
erosão
Velocidade (cm/s)
100
10
transporte
deposição
1
0
0.001 0.01
argila
silte
0.1
1.0
areia
10
100
cascalho
Tamanho da Partícula (mm)
Figura 5.2-1. Curva de Hjulström mostrando a relação entre a velocidade do fluxo
hídrico e sua competência (Hjulström 1935; Apud Bloom 1978).
Por uma necessidade quase que lógica, os sedimentos constituintes do
leito de um rio estão na maior parte do tempo acima da competência do
mesmo. Não fosse este o caso tais sedimentos estariam em suspensão e não
fariam parte do leito. Em decorrência disto, infere-se que a movimentação dos
sedimentos presentes no leito do rio ocorrem em eventos onde a vazão
aumenta significativamente, tal como uma cheia. Como existe uma correlação
linear entre a vazão de um rio e a quantidade de sedimentos suspensos no
mesmo, o primeiro efeito que o aumento da vazão surte no leito é uma
agradação de material aluvionar decorrente do aumento repentino do aporte de
sedimentos. Entretanto, esta agradação leva a um aumento da inclinação do
leito do rio e, conseqüentemente, à sua erosão. Eventualmente, esta erosão
pode fazer com que o leito do rio atinja patamares mais baixos do que
originalmente apresentava. Entretanto, se o sistema fluvial estiver em
equilíbrio, o leito do rio tenderá a retornar à sua disposição original. Portanto,
após o evento de grande vazão, o que ocorre é uma reciclagem do leito do rio
que apresenta a mesma configuração de antes da cheia, mas é constituído por
novos sedimentos. Os sedimentos “velhos” por sua vez foram descarregados
em algum ponto à jusante e, em algum momento, chegarão ao oceano (Selby
1985).
O processo descrito acima favorece a idéia de que os sistemas fluviais
são sistemas abertos que mantém a si próprios num equilíbrio dinâmico por
mecanismos de auto-regulação. Entretanto, nem todo sistema fluvial está em
equilíbrio.
Sistemas
jovens
podem
ser
reconhecidos
em
ambientes
tectonicamente ativos durante os últimos milhões de anos. Do ponto de vista
sistêmico, pode-se dizer que ele não está em equilíbrio enquanto as variáveis
intrínsecas ao sistema não forem capazes de se auto-regular. Num rio jovem,
por exemplo, a quantidade de sedimento em suspensão é determinada por
deslizamentos que ocorrem ao acaso na margem do rio. As dimensões do
canal dependem exclusivamente do substrato rochoso, não sendo possível
adequá-la a outros parâmetros fluviais, como a competência e a vazão. Da
mesma maneira, num rio jovem a inclinação do leito é fortemente determinada
pela topografia original do terreno. Este quadro começa a mudar quando o
substrato do rio passa a ser aluvionar. A partir de então, o rio começa a definir
a si próprio. Além de tornar o rio mais maleável, o alúvio ainda funciona como
um protetor em situações de pico de energia: é como se o alúvio funcionasse
como uma solução tampão que fornece tempo para que o sistema se autoregule. Portanto, a presença de um substrato aluvionar é indicativa de que
naquele trecho o rio está num estado de equilíbrio dinâmico. Normalmente,
este estado de equilíbrio é atingido primeiro à jusante e, posteriormente,
avança à montante (Summerfield, 1991).
Além dos sistemas fluviais, os processos de movimento de massa são
responsáveis em grande parte pela retração das vertentes. Existem diversos
tipos de movimentos de massa, desde aqueles lentos e localizados até
avalanches e corridas de lamas. Dentre eles, o escorregamento é aquele que
atua de modo mais constante e ubíquo. Trata-se de um movimento não
acelerado da cobertura pedológica vertente abaixo. O efeito cumulativo deste
processo pode ser verificado nas fendas presentes na vertente, na inclinação
de objetos verticais como postes de eletricidade ou na curvatura do tronco de
árvores. A movimentação ocorre por camadas tabulares de tal forma que,
quanto mais profundo, menores são os efeitos do escorregamento. Além da
gravidade, o escorregamento ocorre como conseqüência da expansão e
contração do solo. Durante a expansão volumétrica as partículas são
movimentadas perpendicularmente à superfície do solo. Entretanto, quando
ocorre a contração a partícula não retorna exatamente para a mesma posição,
pois neste caso a força gravitacional exerce influência (Figura 5.2-2).
Figura 5.2-2. Seta vermelha indica movimento da partícula durante a expansão e
a seta azul o movimento durante retração.
O caráter temporalmente constante dos diferentes processos de
movimentação de massa fazem com que as vertentes sejam entidades
transicionais, tanto em sua forma como no processo que leva à sua criação.
Ainda assim, é possível descrever esquematicamente a morfologia de uma
vertente como tipicamente convexa em seu cume, côncava em sua base e com
um segmento plano entre os dois extremos. Eventualmente há uma parede
vertical livre rica em material intemperizado a montante do segmento plano.
Neste caso o segmento plano a jusante da face é chamado talus, que não é um
tipo de material, mas sim um tipo de relevo. Muitas vezes o talus é visto como o
simples resultado do empilhamento de blocos caídos da parte superior da
parede livre. Entretanto, muitas vezes, o talus é o uma entidade dinâmica na
qual há renovação constante de seu material constituinte (Bloom, 1978).
A porção superior convexa da vertente é fortemente controlada pelos
processos de movimentação de massa, especialmente o escorregamento. Ao
que tudo indica, contingências intrínsecas a este processo são responsáveis
pela morfologia convexa do topo da vertente. Esta idéia foi originalmente
proposta por Gilbert em 1909 e se baseia no fato de que a quantidade de
material escorregando é proporcional à distância de um determinado ponto da
vertente em relação ao seu topo. Como o escorregamento é um fenômeno
gravitacional, o ângulo da vertente deve aumentar radialmente a partir do cume
permitindo a movimentação cada vez maior de matéria.
Como vimos anteriormente, o fluxo hídrico em uma vertente só adquire
energia suficiente para transportar o solo quando já está consideravelmente
afastado do cume. Assim, nas porções inferiores da vertente a água passa a
ter uma importância maior do que o escorregamento. No início de sua trajetória
vertente abaixo a água meteórica distribui-se em diversos caminhos
preferências muitos finos. Conforme continuam descendo, estes diversos
caminhos se juntam, formando cursos ligeiramente maiores, e assim
progressivamente até a base da vertente. Acontece que cada vez que dois
cursos mais finos de água se juntam há uma redução da fricção da superfície
do curso da água em relação à sua vazão. Como resultado, o novo curso
d’água pode transportar a carga conjunta de seus dois predecessores à mesma
velocidade que estes, mas numa superfície menos inclinada. Assim, nas
regiões da vertente onde os processos hídricos são os agentes remodeladores
predominantes estabelece-se uma morfologia côncava (Selby, 1985).
5.3 EMBASAMENTO TEÓRICO: PROCESSOS PEDOGENÉTICOS
O solo surge da interação entre a atmosfera, a litosfera, a biosfera e a
hidrosfera. Ainda que sua composição varie enormemente é possível dizer que,
de maneira geral, o solo é composto por uma mistura de material orgânico e
inorgânico num sistema onde a matéria está presente em seus três estados
fundamentais:
gasoso,
sólido
e
líquido.
A
fase
sólida
é
composta
principalmente por minerais e matéria orgânica decomposta. A fase líquida é
composta por uma solução aquosa rica em nutrientes e íons e ocupa os
espaços existentes entre as partículas sólidas. O ar do solo também ocupa
estes poros e, de maneira geral, se assemelha ao ar atmosférico, do qual
provém.
Tradicionalmente, conforme proposto por Dokuchaev no final do século
XIX, a formação dos perfis pedológicos é considerada como dependente de
cinco fatores: tipo de rocha parental, clima, topografia, atividade biológica e
tempo. A rocha parental que dá origem aos solos faz parte da porção superior
da crosta terrestre. Esta parte da crosta é chamada de Sial pois é constituída
majoritariamente por oxigênio (47%), silício (27,5%), alumínio (8,6%) e ferro
(5%). Usualmente os átomos de oxigênio se organizam na forma de um
tetraedro, cuja região central é usualmente ocupada por um átomo de silício.
Esta é a unidade fundamental dos alumino-silicatos, que são os principais
constituintes da crosta terrestre. Os silicatos compõem 99% do peso e do
volume da crosta terrestre (Luchese et al., 2002).
Ainda que os tetraedros de oxigênio comumente apresentem um átomo
de silício em seu centro é possível que outros átomos de tamanho compatível
substituam-no. No caso específico do tetraedro de oxigênio, esta substituição é
feita pelo átomo de alumínio cujo raio iônico de 0.45 Å é compatível com o raio
iônico do silício, que é de 0.38 Å. Tal substituição, ainda que isomórfica,
acarreta na alteração da carga do tetraedro que passa de 4+ para 3+. Outras
substituições comuns são entre o cálcio e o sódio ou entre o ferro e o
magnésio. Estas substituições estão na essência de todo processo
pedogenético já que são elas que permitem a neoformação de minerais
autóctones nos distintos horizontes do solo (Klein, 2002; Luchese et al., 2002).
O processo de modificação do material parental e a decorrente formação
de um perfil característico para cada solo é chamado de intemperismo. Ainda
que na natureza não seja possível efetuar tal dissociação, tradicionalmente a
ação do intemperismo é dividida em física, química e biológica. O intemperismo
físico é decorrente de alterações mecânicas sobre a rocha, levando à sua
cominuição. Um exemplo de intemperismo físico são os minerais que
apresentam diferentes coeficientes de dilatação. Com isso, a oscilação diária
de temperatura leva à ruptura da fábrica da rocha. Outro caso bastante
conhecido é o do alívio de pressão de rochas recém exumadas, levando a um
fraturamento sub-horizontal das camadas superficiais da rocha, gerando as
feições conhecidas como juntas de alívio. O intemperismo físico tende a ser
mais comum em regiões secas, onde a disponibilidade hídrica impede que as
reações químicas ocorram de forma intensa.
Nas regiões tropicais onde a disponibilidade hídrica é grande predomina
o intemperismo químico. Como o próprio nome diz, o intemperismo químico
envolve a decomposição da rocha parental através de reações químicas tais
como hidrólise, dissolução de sais e oxirredução que levam à formação de
novos minerais, mais estáveis nas condições da superfície terrestre. Na região
de estudo deste projeto os dois tipos de reações químicas mais importantes
são a dissolução de sais e a hidrólise. A própria formação do terreno cárstico é
decorrente da dissolução do carbonato segundo a reação:
A hidrólise é o processo mais importante no intemperismo tropical.
Envolve, necessariamente, íons de hidroxila (OH–) ou de hidrogênio (H+). A
presença destes elementos quebra as ligações originais do retículo cristalino
dos silicatos. Os desequilíbrios químicos gerados por estas quebras são
compensados pela inclusão de grupamentos hidroxila ou hidrogênio. Na
superfície terrestre tais reações dependem fortemente de agentes aceleradores
como álcalis, ácidos e enzimas hidrolizantes.
A hidrólise pode ser parcial ou total, dependendo da disponibilidade de
água. Na hidrólise total praticamente toda silica e cátions são removidos na
forma de ácido metassilícico (H2SiO3) e íons em solução. Os produtos finais
deste processo, que permanecem no perfil de alteração, são oxi-hidróxidos de
ferro e alumínio. Aos processos que levam à formação destes produtos chamase, respectivamente, ferritilização e alitização. Já na hidrólise parcial tanto os
cátions como a silica não são completamente lixiviados de maneira que os
produtos finais são argilo-minerais e não hidróxidos. Dependendo da
intensidade da hidrólise os argilo-minerais formados podem ser do tipo 1:1,
como a caulinita, ou do tipo 2:1, como a esmectita e a montmorilonita. Ao
primeiro caso chama-se monossiliatização e, ao segundo, bissiliatização.
(Klein, 2002; Toledo et al., 2003).
Um exemplo clássico que ilustra os diferentes processos descritos acima
é a alteração do feldspato potássico (KAlSi3O8). Após o início da hidrólise parte
do potásio e parte da sílica foram removidos em solução. Assim, o feldspato
potássico transforma-se no argilo-mineral 2:1 esmectita, o qual ainda possuí
átomos de potássio em sua composição (hidrólise parcial, bissialitização):
2,3KAlSi3O8 + 8,4H2O → Si3,7Al0,3O10Al2(OH)2K0,3 + 2K+ + 2OH-+3,2H4SiO4
Conforme o processo de hidrólise se intensifica, a perda de sílica é acentuada
e todo potássio é eliminado, tornando a estrutra bilaminar da esmectita instável.
Forma-se, assim, a caulinita que é uma argila 1:1 que não possui potássio em
sua composição (hidrólise parcial, monossialitização):
4KAlSi3O8 + 22H2O → Al4Si4O16(OH)8 + 4K+ + 4OH- + 8H4SiO4
O próximo passo é a hidrólise total, na qual não só os cátions foram
completamente eliminados como também a silica não está mais presente.
Formam-se então os hidróxidos, que estão entre as formas químicas mais
estáveis sobre a superfície terrestre, e que não possuem em sua composição
nem potássio nem sílica (hidrólise total):
KAlSi3O8 + 8H2O → Al(OH)3+ + 3H4SiO4 +K+ + OHO intemperismo químico gera, portanto, minerais secundários que são
constituintes importantes da fase sólida do solo não apenas pelo volume que
ocupam mas também por conferirem a ele seu caráter químico ativo. Dentre os
minerais secundários, os mais importantes são as argilas bilaminares do grupo
1:1, as argilas trilaminares do grupo 1:2, as argilas tetralaminares do grupo 2:2,
e os óxidos. As argilas bilaminares do grupo 1:1 são formadas pelo arranjo de
uma lâmina tetraédrica contendo o silício ao centro envolvido por oxigênios,
com uma lâmina octaédrica contendo alumínio ao centro envolvido por
oxigênios e oxidrilas. Estes arranjos são unidos através de ligações do tipo
ponte de hidrogênio o que faz com que a estrutura seja rígida e não expansível.
Ou seja, a distância entre as duplas de lâminas tetraedro-octaedro, que são a
unidade cristalográfica deste tipo de argila, é fixa não permitindo que ocorra
adsorção interna às lâminas. Com isso, as argilas 1:1, especialmente a
caulinita, apresentam uma baixa capacidade de troca de cátions (Luchese, et
al., 2002).
As argilas trilaminares 2:1 formam-se pela intercalação de uma lâmina
octaédrica de alumínio por duas lâminas tetraédricas de sílica, unidas entre si
pelos oxigênios apicais. Os principais integrantes deste grupo são as
vermiculitas, smectitas e montmorilonitas. A vermiculita, por exemplo,
apresenta alta frequência de substituição isomórfica nos tetraédros de silica por
alumínio. Isto gera um déficit negativo de carga que é suprido pela inserção de
cátions, como o magnésio, entre as unidades trilaminares. A presença de
cátions entre as unidades cristalográficas torna estas regiões hidrofílicas
tornando estes minerais expansíveis. No caso da vermiculita, o espaçamento
entre as camadas aumenta em 50% entre os estados não expandido e
expandido. A presença de água entre as camadas não apenas torna as argilas
expansíveis como aumenta enormemente sua superfície de adsorção interna o
que, por sua vez, implica em capacidades de troca catiônica elevadas (Klein,
2002).
Os principais óxidos são os de ferro e de alumínio. A gibsita Al(OH) 3 é o
principal óxido de alumínio e sua estrutura pode ser definida como o
empilhamento de dois planos de hidroxilas, com Al3+ preenchendo dois terços
dos interstícios octaédricos (Klein, 2002). Já os óxidos de ferro mais
frequentemente encontrados nos solos são a goetita, FeOOH, de cor brunoamarelada e a hematita Fe2O3 de coloração avermelhada. A hidrólise rápida
dos íons Fe (III) favorece a formação de ferrihidrita, que por agregação e
desitradação, origina a hematita. Já a hidrólise lenta dos íons Fe(III) favorece a
formação de goetita.
Além da porção mineral, a fase sólida do solo é composta de matéria
orgânica cujo teor pode variar muito entre diferentes tipos de solo. A matéria
orgânica no solo corresponde a restos de animais e vegetais que se encontram
em constante processo de decomposição. Os processos de degradação da
matéria orgânica são de natureza bioquímica e envolvem organismos como as
bactérias e os fungos. Existem basicamente dois processos pelos quais ocorre
a decomposição da matéria orgânica: a mineralização e a humificação. A
mineralização é um processo de queima no qual matéria orgânica mais
oxigênio resultam em gás carbônico, água e energia. Além de CO2 e água a
mineralização também produz uma série de compostos orgânicos. A formação
do húmus provém da polimerização destes compostos orgânicos formados pela
decomposição da matéria orgânica. A matéria orgânica influencia as
propriedades do solo, aumentando a sua tonalidade escura e reduzindo sua
plasticidade e ecoesão. Assim o solo torna-se mais permeável, elevando sua
taxa de aeração. Além disso, a matéria orgânica exerce um efeito de solução
tampão para o pH e aumenta a capacidade de troca catiônica e aniônica do
solo. Por fim, a matéria orgânica é um importante agente pedogenético já que
contribui para a peptização, coagulação e quelação das partículas do solo.
Tanto a parcela orgânica como inorgânica podem estar presentes na
forma de micelas coloidais. A fração coloidal é a mais ativa do ponto de vista
físico-químico. No caso das argilas existem dois tipos de cargas elétricas: as
permanentes e as dependentes de pH. As cargas permanentes são geradas
por substituições isomórficas nas estruturas das argilas, como a substituição de
sílica por alumínio discutida acima. Já as cargas dependentes de pH localizamse nas superfícies quebradas dos cristais de argila. Já as micelas orgânicas
apresentam exclusivamente cargas dependentes de pH. Micelas com cargas
permanentes apresentam sempre uma carga definida, seja ela negativa ou
positiva. Já micelas cuja carga é dependente de pH podem apresentar tanto
carga positiva, negativa ou neutra, dependendo o valor do pH. No caso da
somatória das cargas dependentes de pH ser zero diz-se que a micela está no
ponto de carga zero. Assim, quando o pH é maior do que este ponto de carga
zero, aumentam as cargas negativas e, quando o pH é menor do que este
ponto, aumentam as cargas positivas.
As propriedades eletro-químicas da fração coloidal vão determinar os
tipos de interações que ocorrerão entre a parcela sólida e a parcela líquida do
solo. A fase líquida do solo é composta principalmente por água. Uma
propriedade fundamental da molécula da água é que ela é polarizada. Com
isso, ocorre uma interação entre as moléculas de água e os íons em solução.
Esta relação leva à hidratação dos íons que, uma vez hidratados, apresentam
um comportamento distinto do seu estado não hidratado. Assim, no equilíbrio
tem-se ao redor de cada íon uma camada de água de densidade diferente da
água pura. A esta camada chama-se camada de hidratação e o número de
moléculas de água que a compõe determina o número de hidratação de um íon
(Figura 5.3-1).
+
-
+
-
+
+
+
-
- +
Molécula de água
+
-
-
+
-
+
+
-
+
-
+
+
+ - +
+ + +
-
-
Camada de hidratação
Figura 5.3-1. Representação gráfica do cátion e do ânion hidratado formando a
camada de hidratação
No caso de uma micela carregada negativamente, os cátions hidratados
serão atraídos para perto da superfície carregada, neutralizando o campo
elétrico. Entretanto, o deslocamento de cátions para próximo das micelas deixa
uma porção da solução com carência de cátions e, portanto, com carga
relacional negativa. No equilíbrio estabelecem-se duas regiões na solução. A
chamada solução interna apresenta uma concentração de íons de carga oposta
à da micela maior do que na solução como um todo. Já na chamada solução
externa
há
um
equilíbrio
de
cargas
eletrostaticamente neutro (Figura 5.3-2).
caracterizando
um
ambiente
Concentração
+
Solução Interna
Solução Externa
Distância da superfície da micela
Figura 5.3-2. Distribuição das cargas elétricas na camada interna e na camada
externa. (Luchese, et al., 2002)
5.4 EMBASAMENTO TEÓRICO: AGENTES PEDOTURBADORES
Pedoturbação refere-se ao distúrbio pós-deposicional do sedimento ou
do solo devido à exumação ou mistura.Trata-se de um fenômeno global que
ocorre em sub-superfície. A pedoturbação pode tanto obliterar a estratificação
como criar feições que mimetizam níveis estratigráficos. Portanto, é muito
importante que seus efeitos no registro arqueológico sejam levados em
consideração (Bateman, 2003). A atividade de invertebrados em sub-superfície
é reconhecidamente um dos fatores mais importantes nos processos de
perturbação da estratigrafia de sítios arqueológicos. Ainda que outros agentes,
tais como mamíferos possam contribuir de forma significativa neste processo
(Araújo, 1995), a ação dos pequenos invertebrados é menos óbvia e, portanto,
muitas vezes acaba passando despercebida. O primeiro a chamar a atenção
para a potencialidade da ação cumulativa de minhocas e vermes no processo
de mobilização das partículas do solo foi Charles Darwin. Já naquela época ele
realizava seus pequenos experimentos nos quais observava pedras afundarem
em seus jardins em decorrência da ação da mesofauna e microfauna.
Existem mais de 3000 espécies de minhocas em todo mundo. Elas
vivem no horizonte mineralizado do solo (classificação MSW), particularmente
na camada onde ocorre a decomposição da matéria orgânica. Alimentam-se de
qualquer tipo de matéria orgânica, possuem sangue frio, respiram pela pele e,
apesar de não possuírem olhos, são fotossensíveis. Todas as minhocas são
hermafroditas e se reproduzem tanto por auto-fecundação como por
partenogênese. São divididas em três grandes categorias: habitantes da
superfície (litter dwellers), cavadoras profundas e cavadoras horizontais.
Os buracos feitos pelas minhocas são facilmente reconhecíveis durante
as escavações como feições verticais com espessura entre 1 e 3 cm
preenchidas por sedimentos de cor e textura distinta do material no qual foi
feito o buraco. Enquanto a minhoca está viva, o buraco permanece vazio. A
densidade de buracos por metro quadrado pode variar, mas em seu estudo
sobre Lumbricus terrestris, Pitkanen e Nuuitinen (1997) encontraram cerca de
10 buracos ativos por metro quadrado. Conforme colocado por Canti (2003):
“Obviamente, se tal quantidade de buracos estivessem sendo escavados
regularmente pelas minhocas haveria pouca arqueologia pré-histórica para ser
investigada nos primeiros metros de solo em regiões tropicais”. Ainda segundo
a mesma autora, se cada minhoca vive cerca de cinco anos e homogeneíza
1cm2 de solo, em 5000 anos toda área teria sido completamente revolvida.
Entretanto, não é isso que parece ocorrer: provavelmente existe um intenso
processo de reutilização de um mesmo buraco por diversas gerações de
minhocas.
Estes buracos são gerados na medida em que estas ingerem o solo em
busca de alimentos. Posteriormente, o material ingerido é expelido na forma de
fezes. Algumas minhocas defecam em subsuperfície, próximo ao local no qual
ingeriram o solo. Neste caso os danos à estratigrafia são pequenos. Por outro
lado, algumas minhocas defecam na superfície, em volta da boca de seu
buraco, formando feições características.
Este hábito é potencialmente danoso para a estratigrafia do sítio, na
medida em que acarreta no transporte constante de sedimentos originalmente
em níveis profundos para a superfície. Assim, qualquer objeto deixado na
superfície irá afundar rapidamente durante os primeiros anos, posteriormente
tendo o ritmo de rebaixamento gradualmente diminuído. Eventualmente, o
objeto atingirá uma profundidade na qual a atividade das minhocas não chega,
estabilizando-se. Com o passar do tempo haverá uma acumulação de materiais
de fração grosseira neste nível. O grau de impactação dependerá fortemente
da profundidade máxima que uma minhoca pode atingir. Originalmente
pensava-se que a profundidade máxima de escavação era uma característica
peculiar a cada espécie (Stein, 1983). Entretanto, o grau de compactação do
solo é um fator importante já que existe um limite físico a partir do qual se torna
impossível para as minhocas escavarem o solo. Binet e Le Bayon (1999), por
exemplo, estabeleceram que para um aumento de 20% na compactação dos
solos ocorre um aumento de 100% na quantidade de fezes expelidas em
superfície. Ainda que minhocas sejam capazes de chegar até a um metro de
profundidade, parece que o enterramento de artefatos não ultrapassa os 25
cm.
Além do enterramento de artefatos decorrente dos processos de
digestão das minhocas, conforme descritos acima, outro hábito completamente
distinto gera resultados similares. Algumas espécies de minhocas coletam
material (sedimento, sementes...) de cerca de 2 mm na superfície e o
depositam em sub-superfície. Normalmente este material é utilizado para forrar
a câmara subterrânea na qual a minhoca hiberna durante períodos de seca.
Ainda não se sabe quais benefícios este tipo de comportamento traz às
minhocas. De qualquer maneira, após algum tempo, a câmara colapsa
resultando numa feição característica conhecida em inglês como “pea grit”.
Uma vez que as maiores partículas que as minhocas podem carregar não
possuem mais do que cinco milímetros de diâmetro seu impacto na
movimentação direta de artefatos arqueológicos não deve ser expressiva.
Outro hábito interessante das minhocas é que elas costumam acumular
montículos de gravetos ou grânulos em volta da boca de seu buraco. Cada
montículo é construído e habitado por uma única minhoca e podem
permanecer inalterados por muitos anos. A construção destes montículos
ocorre à noite e sua função é absolutamente desconhecida. Além de carregar
grânulos para dentro de seus buracos, as minhocas ainda são capazes de criar
pequenos grãos de carbonato de cálcio através de glândulas especiais,
localizadas próximas a suas bocas. Estes grânulos, que podem atingir até
2mm, apresentam uma morfologia característica. Além disso, sua presença é
muito mais expressiva em níveis próximos à superfície do que em níveis
profundos. Assim, sua freqüência em distintos níveis de uma seção colunar
podem ajudar a determinar eventuais paleo-solos.
6. MATERIAIS E MÉTODOS
6.1 MÉTODOS DE ESCAVAÇÃO e ETAPAS DE CAMPO
A unidade básica de escavação é chamada Sondagem e constitui uma
área quadrada com lados de 1 m. As escavações procedem por níveis
artificiais de 10 cm, que acompanham a topografia original da superfície da
sondagem. O material escavado é peneirado para que todo e qualquer vestígio
arqueológico seja recuperado. Basicamente três tipos de materiais são
recolhidos: artefatos líticos, cerâmica e carvão. O material recuperado é
separado por níveis, ou seja, o carvão do nível 0-10cm é acondicionado
separadamente do carvão do nível 10-20cm, e assim por diante. O mesmo é
válido para todo e qualquer tipo de material recolhido durante a escavação.
Todo material coletado recebe um número de proveniência. A cada nível de
10cm também é feita uma descrição do material sedimentar incluindo cor,
compactação, textura e inclusões.
Após o término da escavação de cada sondagem são desenhadas
seções colunares na escala 1:10, identificando os distintos horizontes
presentes. Tais horizontes são estabelecidos pelo contraste de características
como cor, textura, compactação e composição. As seções colunares também
servem ao propósito de sintetizar de forma esquemática todas as informações
disponíveis para uma dada sondagem. Assim, além de informações
estritamente pedológicas/sedimentológicas, as seções colunares também
incluem dados a respeito do material arqueológico que foi recuperado durante
as escavações. Outra função fundamental das seções colunares é orientar a
coleta de amostras.
O desenho das seções colunares é feito através de um sistema de
marcação. Ou seja, uma vez estabelecidos, os limites entre horizontes são
marcados por palitos coloridos fincados no sedimento. A posição destes palitos
é lida a partir de um sistema cartesiano estabelecido de maneira conveniente
para que os valores das ordenadas correspondam à profundidade e o das
abscissas à localização lateral na seção colunar. Isto é feito colocando-se uma
trena verticalmente ao longo da seção colunar. O zero desta trena é colocado
no piso inferior da sondagem. Esta trena será responsável pelos valores das
ordenadas dos palitos coloridos. A obtenção destes valores é feita através de
um barbante associado a um nível de bolha. Assim, alinha-se o barbante
horizontalizado com o palito que se quer estabelecer o valor das ordenadas e
faz-se a leitura na trena verticalizada. Em seguida, com outra trena, mede-se a
distância do palito até a altura correspondente na trena vertical. Com isso, têmse os valores de “y” e “x” para determinado palito (Figura 2). O procedimento é
repetido quantas vezes forem necessárias e as coordenadas de cada palito são
marcadas num papel milimetrado. Estes pontos são então unidos, delimitandose assim a geometria dos horizontes previamente estabelecidos. Além dos
horizontes, também são representados nos perfis raízes, carvões, fissuras ou
qualquer outra feição que se julgue relevante. Atenção especial é dada para
estruturas indicadoras de bioturbação, tais como crotovinas. Estas feições
também são desenhadas a partir do mesmo sistema de marcação.
Posteriormente os desenhos feitos em campo são digitalizados para uma
melhor apresentação.
6.2 MAPA TOPOGRÁFICO E PERFIL
O mapa topográfico é uma ferramenta tanto para a escavação quanto
para a interpretação de um sítio arqueológico. Os dados para a confecção do
mapa consistem em coordenadas tridimensionais obtidas por uma estação total
(Sokkia). Optou-se pela configuração de estação livre, o que permite que o
equipamento seja alocado em qualquer local do sítio. A ordenada do sistema
cartesiano foi definida de maneira que ficasse paralela às paredes Norte-Sul
das sondagens. A origem do sistema cartesiano foi estabelecido no extremo
sudoeste do sítio, a cerca de 50 metros para sul e para oeste em relação a
sondagem S-07. Com isso, todo o sítio arqueológico fica locado em valores
positivos de “x” e “y”. Já o valor de “z” (altura) foi estabelecido como 10.000mm,
próximo a sondagem S-07. Como sabemos que o desnível entre esta
sondagem até a parte mais rebaixada do sítio é inferior a 10 metros, esta
escolha garante que todo o sítio será cotado com valores positivos (o que não
é necessário mas é conveniente). Por outro lado, o desnível máximo entre a
sondagem mais alta e a mais baixa é inferior a 20 m, o que levou à escolha de
um mapa topográfico com curvas de níveis a cada meio metro. Ao todo foram
coletados 83 pontos dispersos por toda a área do sítio arqueológico e seu
entorno. Além da topografia, o mapa é importante na medida em que permite a
localização precisa de cada sondagem, tanto vertical quanto horizontalmente.
A partir do mapa topográfico foi elaborado um perfil no sentido Norte-Sul,
com exagero vertical de cinco vezes. Neste perfil, além da topografia foram
incluídas todas as sondagens feitas no sítio. Também foram incluídas
informações sobre densidade de material arqueológico, níveis pretéritos da
lagoa e a profundidade da linha de cascalho.
6.3 ANÁLISE GRANULOMÉTRICA
Durante os meses de fevereiro, março e abril foram realizadas 18
análises granulométricas das quais três tiveram de ser descartadas por
apresentarem erro superior ao admitido de 5%. Ou seja, houve uma diferença
superior a 5% entre a massa inicial e a massa final do material analisado. As
análises granulométricas foram feitas no LabSed do IGc-USP e o protocolo
utilizado foi aquele proposto por Suguio (1973). O primeiro passo do processo
é a secagem em estufa de cerca de 100 gramas de amostra durante pelo
menos dois dias. Isto feito, separa-se 60 gramas de sedimentos, massa
máxima recomendada para não saturar a dispersão aquosa em 1000 ml, nem
sobrecarregar as peneiras. Em seguida, 1 grama do antifloculante pirofosfato
de sódio (Na2P2O7) é adicionado. Este sal evita a agregação das partículas de
argila, o que é especialmente importante em materiais de textura muito argilosa
como os do sítio do Sumidouro.
Esta mistura de sedimento e antifloculante é então colocada num Becker
e é recoberta por cerca de 200 ml de água destilada. Em seguida, com o uso
de um misturador de polpa à hélice, a solução é homogeneizada durante cerca
de 20 minutos. Isto feito, leva-se a cabo o processo de desagregação física
num almofariz de porcelana com o uso de um pistilo de borracha. O processo
de desagregação física é considerado como terminado apenas a partir do
momento
em
que
a
água
destilada
utilizada
esteja
completamente
transparente. Uma vez terminado este procedimento toda solução com
sedimento desagregado e pirofosfato de sódio está contida dentro de uma
proveta em 1000ml de água destilada.
Antes de iniciar o processo de pipetagem, cinco placas de petri de 50 ml
são pesadas e identificadas. Estes recipientes receberão a solução aquosa que
posteriormente irá determinar a proporção de cada uma das cinco faixas
granulométricas de interesse. A pipetagem foi feita de acordo com a tabela
padrão disponível no LabSed que indica o intervalo de tempo entre cada coleta.
Tal tabela é baseada na lei de Stokes, que prevê o comportamento de
partículas em fluídos estacionários. Uma vez encerrada a pipetagem, as placas
de petri são levadas à estufa onde permanecem por pelo menos dois dias ou
até toda água evaporar. Em seguida, as placas de petri são pesadas e os
dados inseridos numa planilha, o que permite avaliar se o erro está dentro do
aceitável ou não. Caso o erro não seja admissível, o processo de pipetagem
deve ser repetido. Caso contrário, a amostra restante na proveta é colocada
em um funil pelo qual passa um fluxo ascendente de água corrente. Com isso a
fração fina (<62mm) é lavada no processo de elutriação. Este processo leva
cerca de 30 minutos. Uma vez concluída a elutriação, o sedimento lavado é
filtrado a vácuo e levado para secagem em estufa. Após seco, a fração grossa
é separada em 12 frações granulométricas distintas através de peneiramento
(<
0,062mm;
0,088-0,062mm;
0,150-0,088mm;
0,177-0,150mm;
0,250-
0,177mm; 0,354-0,250mm; 0,500-0,354mm; 0,707-0,500mm; 1,00-0,707mm;
1,410-1,00mm; 2,00-1,410mm; >2,00). Com estes dados, estabelece-se a
distribuição granulométrica da amostra.
6.4 DATAÇÃO POR LUMINESCÊNCIA ÓTICAMENTE ESTIMULADA (LOE)
A datação por luminescência parte da premissa que cada grão individual
de quartzo ou feldspato se comporta como micro dosímetros. A quantidade de
energia armazenada por eles é proporcional à quantidade de radiação
ionizadora à qual eles ficaram expostos após seu enterramento. Toda vez que
os grãos são expostos à luz do sol ou altas temperaturas esta energia
armazenada é liberada zerando o sinal de radiação e, portanto, reiniciando o
relógio isotópico. Outra premissa da datação por luminescência é que o
sedimento a ser analisado foi completamente zerado por exposição à luz solar
antes de ser enterrado e que, após isto ter ocorrido, nenhum tipo de
perturbação pós-deposicional ocorreu.
Portanto, o sedimento coletado para este fim não pode, sob hipótese
alguma, ser exposto à luz solar. Tradicionalmente o método de coleta de
sedimento para LOE utiliza um tubo oco e opaco de cerca de 50mm de
diâmetro e 30 cm de comprimento que é introduzido no perfil. Quando retirado
o tubo traz consigo o sedimento. Na etapa de campo de 2007 foram coletadas
5 amostras utilizando este método. Entretanto, este procedimento apresenta
três problemas. O primeiro deles é que o diâmetro do tubo é maior do que seria
desejado. Afinal, quanto menor a espessura do pacote sendo amostrado maior
será a precisão da data obtida. Em segundo lugar, ao se introduzir um tubo de
30cm dentro do perfil perde-se completamente a noção da natureza do
sedimento que está sendo amostrado. Um exemplo óbvio é alguma
bioturbação que está ausente no perfil mas presente alguns centímetros no seu
interior. Neste caso o material bioturbado seria coletado sem a consciência do
pesquisador. Por fim, uma limitação prática é que a 3 metros de profundidade o
solo é tão compacto que a introdução de um tubo de PVC não é tarefa fácil.
Tendo em vista estas considerações, optou-se por um método inédito
para a coleta de amostras de LOE no qual o sedimento é retirado de uma
ampla superfície horizontal completamente visível ao pesquisador. O primeiro
passo é estabelecer no perfil a exata profundidade da qual deverá ser extraída
amostra. Isto pode ser feito com um barbante que, com a ajuda de um nível, é
esticado horizontalmente. O próximo passo é criar no perfil uma superfície
ampla e horizontal da qual será coletado o sedimento. É fundamental que, num
primeiro momento, esta superfície seja estabelecida cerca de três ou quatro
centímetros acima do nível escolhido para a coleta da amostra. Quanto mais
ampla esta superfície menor será a espessura necessária para preencher o
recipiente que ira receber o sedimento. No caso do Sítio do Sumidouro, as
superfícies estabelecidas apresentavam cerca de 40 cm de largura e
adentravam cerca de 30 cm no perfil.
Uma vez estabelecida esta superfície ampla e horizontal a cerca de 4 cm
do nível a ser extraída a amostra, o próximo passo é cobrir a sondagem com
lonas plásticas de maneira que o ambiente dentro desta seja absolutamente
afótico. Dentro da sondagem deve permanecer uma pessoa para dar
procedimento à coleta. Esta pessoa pode contar com uma pequena lanterna
recoberta por papel celofane vermelho, o que não irá afetar a luminescência
dos grãos. Uma vez certificado que o ambiente está absolutamente escuro, o
processo de coleta pode continuar. Para isso deve-se retirar aqueles três ou
quatro centímetros excedentes em relação ao nível horizontal estabelecido
para a coleta. Também deve-se retirar cerca de 3cm de sedimento da parede
do perfil. Com isto garante-se que o material que será efetivamente coletado
não entrou de maneira alguma em contato com a luz solar. Uma vez realizados
estes procedimentos têm-se enfim a superfície horizontal ampla da qual o
sedimento será efetivamente coletado. É importante que a superfície seja
horizontal, o que deve ser verificado com um nível. A coleta é feita com o
auxilio da lanterna recoberta por celofane vermelho e instrumentos metálicos
previamente limpos, evitando qualquer tipo de contaminação. O recipiente que
receberá o material deve ser totalmente opaco. Nossas amostras foram
guardadas em canos de PVC de 30cm de comprimento e 5cm de diâmetro. Ao
contrário do que pode parecer o PVC não é absolutamente opaco, de maneira
que cada tubo foi recoberto por uma camada dupla de papel alumínio e
posteriormente enrolado em fita isolante preta. O recipiente deve ser
completamente selado ainda em ambiente afótico. Uma vez coletadas as
amostras, sua localização é inserida nos perfis esquemáticos previamente
desenhados. Na etapa de campo de 2008 foram coletadas 6 amostras para
LOE.
6.5 DATAÇÃO RADIOCARBÔNICA
Existem três isótopos de carbono. Dois deles são estáveis (12C e
um
instável
14
( C).
Este
isótopo
instável
apresenta
uma
meia
13
C) e
vida
consideravelmente curta de aproximadamente 5730 anos. Conseqüentemente,
não seria de esperar que após mais de 4 bilhões de anos de existência do
Planeta ainda se conseguisse encontrar o elemento carbono em sua versão
radioativa. Por outro lado, a ação dos raios cósmicos leva à transformação do
N2 em
14
C na alta atmosfera, garantindo o suprimento do isótopo radioativo do
carbono. Assumindo-se que a taxa de transformação seja constante é possível
estabelecer que a razão entre os isótopos estáveis e o radioativo também seja
constante. Uma vez que o
14
C insere-se na estrutura molecular do dióxido de
carbono ele acaba fazendo parte de plantas e animais. Ficam satisfeitas,
assim, as condições para utilizar o decaimento radiocarbônico como um relógio
isotópico.
Neste trabalho a datação radiocarbônica foi feita sobre amostras de
carvão recuperadas em sub-superfície. As amostras de carvão são inicialmente
desagregadas em água deionizada. Em seguida, são lavadas em ácido
clorídrico para remoção de carbonatos e em hidróxido de sódio para remoção
de ácidos orgânicos secundários. Durante este processo, contaminantes
mecânicos como sedimentos e raízes são removidos. Antes de serem levadas
para o espectrômetro de cintilação as amostras são neutralizadas. Por fim, é
obtida a razão entre carbono 13 e carbono 14 que fornece uma idade não
calibrada para a amostra. Esta idade é usualmente expressa seguida da sigla
AP, que é abreviação de Antes do Presente. Por convenção o ano de 1950 foi
adotado pela comunidade científica como “presente”. Entretanto, o pressuposto
da constância da concentração de
14
C ao longo do tempo não é satisfeito na
realidade. Esta variação pode ser determinada através da análise de anéis de
crescimento em árvores ou através do estudo de isótopos presos em camadas
de gelo polar. Isto permite que curvas de calibração sejam estipuladas,
permitindo uma aproximação mais fiel entre a idade radiocarbônica e a idade
real. Todas as datações radiocarbônicas foram feitas no laboratório
Analytic Inc.”, localizado em Miami, Flórida.
“Beta
7. RESULTADOS
7.1 DESCRIÇÃO DO SÍTIO E DAS SONDAGENS
A Lagoa do Sumidouro apresenta uma forma semi-eliptica, com seu eixo
maior apresentando cerca de 1.2km orientado no sentido NW-SE e seu eixo
menor com cerca de 0.7km orientado no sentido NE-SW. Em sua extremidade
SE há um maciço calcário residual com cerca de 50 metros de altura. Em suas
margens Norte e Sul a lagoa é bordejada por vertentes com declividade de
cerca de 10-15º com que se elevam até 80 metros em relação ao nível da
mesma. A lagoa é alimentada pelo Córrego do Samambaia, que chega até ela
pela extremidade oeste (Fig. 7.1-1). A Lagoa do Sumidouro localiza-se a não
mais do que 2km da Rio das Velhas, nível de base regional. Toda água da
lagoa escoa pelo sumidouro, localizado na base do maciço calcário, e chega ao
Rio das Velhas (Fig. 7.1-2).
O sítio arqueológico do Sumidouro localiza-se na extremidade SE da
lagoa, cerca de 30 metros ao sul do maciço calcário, numa depressão que atua
como um braço da lagoa em períodos de cheia. O maciço calcário apresenta
uma faixa horizontal nítida, de coloração esbranquiçada, que foi interpretada
como sendo a marca deixada pela água da lagoa em eventos de cheia. Com o
auxílio da estação total a marca d’água do maciço calcário foi projetada na
vertente que se encontra ao sul do sítio, evidenciando que todas as quadras
exceto a S-09 e S-10 estiveram submersas durante os picos de cheia (Fig. 7.13 a 7.1-6).
As sondagens foram dispostas numa malha ortogonal a cerca de 15
metros uma das outras. Parte da área em que se encontra o sítio é
descampada, e parte florestada. Entre a sondagem mais elevada e a menos
elevada, S-10 e S-06 respectivamente, existe um desnível de cerca de 9,6
metros. Com exceção da S-10, as sondagens estão localizadas na porção
côncava da vertente (Fig. 7.1-3 a 7.1-6). Das 10 sondagens que constituem o
sítio arqueológico optamos por descrever apenas as seis que melhor
descrevem o perfil topográfico.
Figura 7.1-1. Vista aérea da Lagoa do Sumidouro e do Rio das Velhas, indicado pela seta azul. Toda água da Lagoa do Sumidouro
desemboca no Rio das Velhas, que é o nível de base regional. A distância entre o sumidouro da lagoa e o rio não passa de 2km. A seta
vermelha indica a posição do sítio arqueológico do Sumidouro.
Figura 7.1-2. Vista aérea da Lagoa do Sumidouro. A elipse vermelha delimita a área do Sítio Arqueológico do Sumidouro. As setas
vermelhas indicam o Córrego do Samambaia. A elipse azul delimita o maciço calcário em cuja base encontra-se o sumidouro através do
qual ocorre toda descarga do fluxo hídrico do carste de Lagoa Santa. O nível da lagoa está consideravelmente baixo na imagem.
Figura 7.1-3. Vista aérea do Sítio Arqueológico do Sumidouro. O polígono vermelho delimita a área do sítio e a linha amarela indica o
trajeto do perfil topográfico.
50
51
52
Sondagem S-06
A sondagem mais baixa do perfil topográfico é a S-06. Esta sondagem
foi aberta na etapa de julho de 2007 e sua localização foi determinada em
relação à sondagem S-05, localizada 15 metros ao sul desta. Nos primeiros
dez centímetros foram identificadas conchas funiliformes de animais aquáticos,
evidenciando que se trata de região que deve eventualmente ficar recoberta
(ou pelo menos muito próxima) d’água. Atualmente, este mesmo tipo de
carapaça pode ser encontrada em grande abundância no sedimento localizado
a até 10 metros do nível da Lagoa (uma estimativa visual indica que cerca de
30% da parte superficial do sedimento que margeia a Lagoa é composto por
estas carapaças). No segundo nível da escavação foi encontrado um
instrumento metálico histórico, provável fecho de carroça. Já no terceiro nível
da escavação apareceram os primeiros artefatos líticos: três lascas das quais
uma foi feita sobre sílex. Também é a partir do terceiro nível que aparecem os
primeiros fragmentos de carvão. A quantidade de artefatos líticos recuperados
aumentou no nível seguinte (30-40cm) totalizando 12 lascas. Neste mesmo
nível foi recuperado um fragmento de âmbar. No nível seguinte ocorre um
aumento expressivo na quantidade de carvão e nenhum artefato foi
recuperado.
Os
níveis
seguintes
(50-60,
60-70
e
70-80cm)
ficaram
caracterizados por uma quantidade muito expressiva de carvão. O pico ocorre
em 85 fragmentos no nível 60-70, em seguida diminui para 46 fragmentos, para
então reduzir drasticamente para 8 fragmentos, já no nível 80-90. Em
compensação, neste nível foram recuperados três artefatos líticos feitos em
quartzo hialino. É interessante notar que quase nenhum material arqueológico
foi recuperado nos níveis ricos em carvão, sugerindo que não se trata de
material de origem antrópica. Eventualmente o material poderia ter deslizado
de áreas mais altas, como por exemplo da região onde foi escavada a
sondagem S-07, muito rica em carvão. Neste mesmo nível foi recuperado um
fragmento de quartzo hialino com cerca de 3cm de diâmetro. Se trata do
mesmo material presente nos conglomerados (descritos a mais a frente). Este
fragmento merece atenção na medida em que o sedimento é constituído quase
que plenamente por argila. No que diz respeito à coloração, até o nível 6070cm o sedimento apresentava cor 75YR 4/4 (Marrom), mas a partir do nível
53
70-80cm é possível perceber uma mudança na coloração que se torna
ligeiramente mais clara (7,5YR 4/6 – Marrom Escuro). Analogamente conforme
aprofunda-se a sondagem, o sedimento vai se tornando cada vez mais duro de
ser escavado. O nível 90-100cm também apresentou pouquíssimo carvão mas
em compensação 6 lascas feitas em sílex foram recuperadas. Já no nível 100110cm foi encontrada uma concentração muito grande de carvão, cerca de 136
fragmentos. Entretanto, este carvão estava concentrado num único ponto da
quadra. Neste mesmo nível foi encontrado um único artefato lítico feito em
sílex, de cerca de 4cm de diâmetro (grande para os padrões locais). Este é o
nível mais profundo no qual foi recuperado material arqueológico. De maneira
similar, o nível seguinte é o último nível em que foram recuperados fragmentos
de carvão, ainda que em pequena quantidade. Ou seja, nesta sondagem tanto
o material arqueológico como os fragmentos de carvão estão restritos a uma
mesma profundidade, notadamente 1,20m. O alcance máximo das raízes
também é por volta desta mesma profundidade.
Além disso, 1,30m também é a profundidade máxima a que chegam as
fissuras mapeadas na seção colunar. Estas fissuras apresentam cerca de meio
centímetro de espessura e parecem continuar para dentro das seções
colunares. Nas porções superficiais (0-20cm) elas são difíceis de serem
identificadas, eventualmente nem mesmo estando presentes. Elas são subverticalizadas e algumas vezes se ramificam dando origem a duas fissuras.
Sua densidade na sondagem S-06 é de cerca de duas por seção colunar, ou
seja, cerca de uma a cada 50cm. Estas fissuras estão presentes em todas as
paredes da sondagem, não apresentando, portanto, nenhuma orientação
preferencial.
Mais do que isso, também é por volta de um metro de profundidade que
o sedimento assume coloração mais amarelada (10YR 5/6 Marrom Amarelado)
e passa a apresentar um capeamento de cor negra, provavelmente óxido de
manganês. Este capeamento de cor negra encontra-se disperso pelo
sedimento atribuindo-lhe um aspecto mosqueado. Alguns torrões de terra
retirados do nível 120-130cm estavam “recobertos” por um sedimento muito
avermelhado (2,5 YR 3/6) com óxido de ferro (Fig. 7.1-7).
54
Figura 7.1-7. Sondagem S-06. Sedimento avermelhado recoberto com óxido de
ferro.
O nível 130-140 também apresenta estes capeamentos de óxidos
metálicos. Nele foi recuperado um seixo de quartzo leitoso de 6x4cm. Ou seja,
parece que existem clastos centimétricos flutuando na matriz argilosa.
Inclusive, um destes seixos foi registrado na seção colunar leste da sondagem
S-06 a 160cm de profundidade. O último nível a ser escavado na etapa de julho
de 2007 foi o 140-150cm. Nele foi registrado um aumento sensível na
participação do material escuro (óxido de manganês) mesclado ao sedimento
10YR 5/6.
Os trabalhos na sondagem S-06 foram retomados na etapa de julho de
2008. Os dois níveis seguintes (150-160cm e 160-170cm) apresentaram a mais
alta concentração de hidróxidos metálicos da sondagem. Quando avaliados
pela seção colunar ficou claro que se trata de um nível com cerca de 30cm de
espessura, no qual há um acúmulo de óxido de manganês (Fig. 7.1-8; 7.1-10).
As feições diapíricas assumidas pelo material de cor escura sugerem que o
nível esteja em processo de decomposição. Este nível foi interpretado como
óxido de manganês precipitado devido à oscilação do lençol freático. Uma vez
que não constitui um horizonte bem delimitado deve estar em processo de
desagregação, indicando que sua formação não está vinculada à dinâmica
hídrica atual da vertente. O padrão de distribuição das evidências dos
55
processos de redução e oxidação, com concentrações de óxidos de ferro e/ou
manganês no interior dos elementos estruturais constitui uma boa indicação do
caráter epiáquico deste pacote. Logo abaixo deste nível encontra-se uma
camada horizontalizada de cerca de 3 cm de espessura que apresenta
inclusões centimétricas de argila vermelha. A delimitação espacial destas
inclusões não pôde ser feita com um alto grau de certeza. Ainda assim,
algumas feições sugerem que se trate de canais ou túbulos preenchidos que se
prolongam para dentro do perfil. Se este fosse o caso, seria possível interpretar
este nível como um aquitarde gerador de um plano preferencial para o fluxo
hídrico subterrâneo.
Figura 7.1-8. Vista em planta do nível 150-160 da sondagem S-06. Detalhe para as
manchas negras dispersas pelo sedimento argiloso.
56
Figura 7.1-9. Sondagem S-06, perfil leste. Detalhe, nível a 150cm de profundidade
com acúmulo de hidróxido de manganês.
Figura 7.1-10. Sondagem S-06 perfil norte. Detalhe do nível de 30cm de
espessura rico em hidróxido de manganês. Reparar na morfologia diapirica,
sugerindo que está ocorrendo a decomposição do material.
57
Entre os níveis 140-150cm e 160-170cm foram recuperados vários clastos de
quartzo leitoso cujo diâmetro máximo oscilava entre 2cm e 8cm. São em sua
maioria subangulosos. Sua morfologia lembra muito a de um veio de quartzo.
Após o nível de óxido de manganês, que ocorre entre as profundidades
de 140 e 160cm, o sedimento volta a assumir coloração 10YR 5/6 (Marrom
Amarelado). Com relação ao sedimento de mesma cor que se encontra acima
do nível de óxido de manganês o sedimento abaixo dele apresenta uma
porcentagem maior de óxido de manganês, disperso pela matriz argilosa. A
partir do nível 160-170cm a presença de clastos diminui quase que
completamente. Apenas alguns poucos fragmentos de calcário alterado foram
recuperados no nível 210-220cm. No nível seguinte foi recuperado um único
seixo alongado, sub-anguloso de 2cm de comprimento. O mesmo padrão é
recorrente até o nível 260-270cm, quando aparecem os primeiros indícios de
que a “linha de cascalho” foi atingida. Ou seja, entre as profundidades de
160cm (fim do nível de hidróxido de manganês) e 260cm (início da linha de
cascalho) existe muito pouca variação do sedimento. Ainda assim, é possível
identificar uma suave mudança de cor conforme se desce pela seção colunar
na qual o Marrom Amarelado (10YR 5/6) assume tonalidades mais escuras
(10YR 4/6). Além disso, há uma diminuição na presença dos capeamentos de
óxido de manganês conforme se aprofunda no perfil.
No que diz respeito à linha de seixos, ela pode ser descrita como um
conglomerado clasto-sustentado. É constituído por fragmentos angulosos e
sub-angulosos de quartzo leitoso, que em sua maioria se apresentam na fração
calhau. Estes fragmentos apresentam uma orientação da trama de cristais de
quartzo imprimindo um aspecto “fibroso” à superfície do material. Alguns destes
clastos apresentam pequenos (no máximo 1cm de espessura)
cristais
prismáticos de quartzo hialino, tipicamente presentes nos veios de quartzo
encontrados na região. Portanto, interpreta-se este material como proveniente
de veios de quartzo da formação Serra de Santa Helena. Além destes
fragmentos encontram-se seixos arredondados, de no máximo 3cm, cuja
superfície é polida por processos naturais. São muito similares aos seixos
encontrados em rios e são interpretados como tal. Ainda que nenhuma
abordagem estatística tenha sido empregada, observações de campo indicam
58
que cerca de 85% da fração grossa são constituídas pelos fragmentos subangulosos de quartzo leitoso e apenas os 15% restante seriam compostos
pelos seixos arredondados. Os calhaus e seixos encontram-se em contato
entre si. Entre os clastos há uma matriz de textura muito argilosa de cor
marrom escuro amarelado (10YR 4/6). Esta matriz, entretanto, não deve
compor mais do que 20% do pacote. O contato entre este conglomerado e o
pacote superior é abrupto, caracterizando uma discordância erosiva. Na porção
norte do perfil, o pacote apresenta cerca de 30 cm de espessura enquanto que
na porção sul não chega aos 5cm. Caracteriza-se assim uma inclinação para
sul. Entretanto, tal topologia deve ser entendida como uma feição localizada. O
limite inferior deste conglomerado não pode ser observado. O último nível
escavado da sondagem S-06 foi o 290-300cm, no qual ainda estava presente o
dito conglomerado.
Portanto, é possível resumir as principais feições da sondagem S-06 da
seguinte forma: existe um nível superior de cerca de 10cm profundamente
afetado pela ação de organismos aquáticos, tal como evidenciado pelas
carapaças, e tantos outros tipos de invertebrados. Um instrumento de metal foi
encontrado entre 10 e 20cm de profundidade, revelando que este nível não
deve ser muito antigo. Entre 10 e 120cm de profundidade o sedimento
apresenta cor castanha (Marrom Escuro 7,5 YR 4/4), textura muito argilosa,
intensa ação biótica (tal qual indicada por muitas raízes capilares originadas
em vegetação rasteira), pouco compacto, porosidade intergranular atribuindo
uma aparente permeabilidade, presença de fissuras sub-verticalizadas com
cerca de meio centímetro de espessura. Tanto o material arqueológico como os
fragmentos de carvão só ocorrem neste intervalo. A abundância de carvão se
comporta de forma Gaussiana com pico entre 60 e 70cm de profundidade. No
que diz respeito aos artefatos líticos é possível sugerir dois níveis distintos de
ocorrência: um primeiro entre 20 e 40 cm e, um segundo, entre 80 e 100cm. É
interessante notar que os artefatos líticos ocorrem logo antes e logo depois do
nível rico em carvão. No que diz respeito à matéria-prima estão presentes tanto
quartzo hialino como sílex em ambos os níveis sugeridos acima.
Os níveis inferiores a 120cm são absolutamente estéreis quanto à
presença de material arqueológico e carvão. De maneira geral é possível dizer
59
que dos 120cm até o início dos conglomerados o sedimento é basicamente o
mesmo: cor marrom amarelado (10YR5/6 para as partes mais próximas aos
120cm e 10YR4/6 para as partes mais próximas à linha de cascalho), textura
muito argilosa com alguns clastos esparsos
(quartzo leitoso e calcário)
flutuando na argila, ausência de ação biótica, ausência de fissuras, muito
compacto, porosidade muito incipiente indicando uma menor permeabilidade,
presença generalizada de uma capa de óxidos de manganês recobrindo
aglomerados de argila. A homogeneidade deste pacote é quebrada por um
nível de óxido de manganês com cerca de 25cm de espessura localizado entre
140 e 160cm de profundidade. Imagina-se que este nível tenha se formado
pela oscilação do lençol freático. Entretanto, a maneira como o óxido está
disposto sugere que, atualmente, ele esteja em fase de decomposição. Na
base deste nível de óxido de manganês há uma concentração, de não mais do
que 3cm de espessura, de argilas vermelhas dispostas em estruturas que
poderiam ser canalículos. Sendo este o caso, esta região deveria acomodar um
fluxo preferencial de água subterrânea.
Por fim, abaixo deste sedimento, a partir 270cm de profundidade, se
encontra o conglomerado. Este é composto majoritariamente por clastos de
quartzo leitoso sub-angulosos, muito provavelmente advindos dos veios de
quartzo da Fm. Serra de Santa Helena. Entretanto, também estão presentes,
ainda que em muito menor proporção, seixos arredondados com superfície
polida, típicos de ambientes fluviais. A matriz deste conglomerado parece ser
exatamente a mesma argila amarelada.
60
61
62
Sondagem S-05
A sondagem S-05 encontra-se 15 metros a norte da S-06. As maiores
concentrações de carvão estão nos dois primeiros níveis sub-superficiais e
entre 70 e 130cm de profundidade (Fig. 7.1-13). Já o material lítico ocorre
quase que exclusivamente nos quatro primeiros níveis, ainda que algumas
peças tenham sido recuperadas a até 150cm de profundidade. A principal
característica desta sondagem é a grande quantidade de crotovinas presente
entre 50 e 130cm de profundidade. São pelo menos oito crotovinas com
formato aproximadamente elíptico, com cerca de 30cm de extensão em seu
maior eixo. Estas crotovinas são particularmente importantes na medida em
que são preenchidas por dois tipos distintos de sedimento. Em sua metade
inferior o sedimento apresenta cores amareladas e, em sua metade superior,
cores mais escuras, sendo o contato entre eles sub-horizontalizado (Fig. 7.114). Além das crotovinas, a ação pedoturbadora nesta sondagem também fica
evidente através da presença de macro-poros (decimétricos) encontrados a até
250cm de profundidade (Fig. 7.1-15). Por fim, a ação bioturbadora na medida
em que promove a mistura de sedimentos de distintos horizontes confere ao
material desta sondagem um aspecto variegado no qual porções de sedimento
amarelado “intrudem” o pacote mais avermelhado (Figura 7.1-16).
Apesar de estar localizada a apenas 15m da sondagem S-06, na qual o
nível de cascalheira aparece claramente, a sondagem S-05 não apresenta tal
nível. Outra feição peculiar desta sondagem, em comparação às tendências
gerais do sítio, é que os níveis mais profundos (250-300cm) apresentam
sedimento com cores francamente avermelhadas (5 YR 5/8) e não amareladas.
63
Figura 7.1-13. Seção colunar norte da sondagem S-05. Detalhe das crotovinas
em forma de elipses preenchidas por sedimento amarelado.
Figura 7.1-14. Seção colunar norte da sondagem S-05. Detalhe de uma
crotovina mostrando como em sua metade inferior ela é preenchida por
sedimento de cor amarelada enquanto em sua porção superior por sedimento de
cor mais escura.
64
Figura 7.1-15. Sondagem S-05. Vista em planta do nível 250cm. Detalhe para as
estruturas vazias de tamanho decimétrico, prováveis galerias de insetos.
Reparar que o fundo da sondagem apresenta cor avermelhada, estando o pacote
com cor amarelada restrito à uma faixa estreita.
Figura 7.1-16. Sondagem S-05. A ação bioturbadora imprime ao sedimento um
aspecto variegado.
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Sondagem S-04
A sondagem S-04 está entre a S-07 e a S-05 no perfil Norte-Sul. Nela foi
recuperado um vaso cerâmico inteiro, ainda que bastante fragmentado,
associado a fragmentos de carvão e terra queimada (Fig. 7.1-18). A ocorrência
do material arqueológico pode ser dividida em duas zonas. Uma delas,
contendo 10 artefatos líticos e o vaso cerâmico vai dos 10cm até os 90cm de
profundidade. A outra, que contém 9 artefatos líticos, vai de 160 a 200cm de
profundidade. Quanto à presença de carvão, as maiores concentrações estão
logo abaixo da superfície e entre 110 e 170cm de profundidade. Foram
recuperados 4 fragmentos de âmbar entre 150 e 170cm de profundidade. No
nível 180-190cm foram encontradas 4 lascas de quartzo hialino que se
remontavam duas a duas. Isso indica que essas peças se movimentaram
pouco desde o momento de sua deposição. Entre 240-250cm de profundidade
há um nível rico em matéria orgânica que se apresenta na forma de manchas
escuras em meio ao sedimento (Fig. 7.1-19). Foram observadas em planta
gretas de contração nesse nível orgânico, sugerindo um evento de exposição
subaérea (Fig. 7.1-20). Este material foi enviado para ser datado mas até o
momento os resultados ainda não ficaram prontos. Logo abaixo deste nível há
um horizonte rico em clastos na fração cascalho. Entretanto, a pequena
densidade dos clastos e seus tamanho diminutos (não mais do que 6cm) não
permitem que este nível seja associado às cascalheiras típicas do sítios tais
como encontrada nas sondagens S-03, S-06, S-07 e S-08. Por fim, é
importante salientar que a sondagem S-04 apresentou ação marcante de
bioturbação na forma de orifícios ocos, inclusive em seus níveis mais profundos
(Fig. 7.1-21).
67
Figura 7.1-18. Sondagem S-04. Vaso cerâmico encontrado a cerca de 10cm da
superfície. Ainda que bastante fragmentado, o vaso está inteiro.
Figura 7.1-19. Sondagem S-04. Detalhe do nível rico em matéria orgânica. Logo
abaixo dele é possível visualizar o nível rico em cascalho. Nitidamente não se
trata do mesmo tipo descrito em outras sondagens (Vide Fig. 7.4-16)
68
Figura 7.1-20. Sondagem S-04. Vista em planta das feições que foram
interpretadas como gretas de contração associadas ao nível rico em material
orgânico.
Figura 7.1-21. Sondagem S-04. Detalhe do orifício vazio presente a quase 3m de
profundidade.
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Sondagem S-07
A Sondagem S-07 encontra-se no limite entre a região florestada e o
descampado. No que diz respeito à presença de material arqueológico, das 13
peças encontradas 9 foram recuperadas entre 130 e 200cm de profundidade.
Outros três artefatos líticos foram encontrados no nível superficial. Já quanto à
presença de carvão pode-se considerar esta como uma sondagem abundante.
É possível determinar dois picos distintos de concentração de carvão, um a
20cm de profundidade e outro a 130cm de profundidade. Em ambos os casos
há uma distribuição normal dos desvios em relação a estes picos. A ocorrência
do pacote mais rico em artefatos líticos (entre 130-200cm) coincide, grosso
modo, com o segundo pico de presença de carvão.
O sedimento apresenta textura muito argilosa por toda sondagem até o
aparecimento da linha de cascalho, a cerca de 260cm de profundidade. Entre
a superfície e cerca de 60cm de profundidade predominam cores próximas ao
marrom escuro. A partir deste ponto, até a linha de cascalho, há um
avermelhamento do sedimento, passando do marrom escuro (7,5YR 5/6) para
um vermelho amarelado (5YR 5/8). É apenas na matriz da linha de cascalho
que se encontra aquele sedimento francamente amarelado recuperado nas
demais sondagens com cor 10YR5/8 (Marrom amarelado). Da mesma maneira
que ocorre nas demais sondagens, há um aumento progressivo da
compactação do solo conforme aumenta a profundidade. O material
constituinte da linha de cascalho é idêntico ao descrito para a sondagem S-09
(Fig 7.1-23).
Esta sondagem é profundamente afetada por processos biomecânicos
de pedoturbação. A ação de cupins é intensa tal qual explicitado não apenas
por uma enorme crotovina de meio metro de extensão a 200cm como pela
observação, durante as escavações, de cupins vivos até 277cm de
profundidade. Ou seja, mesmo próximo ao limite superior da cascalheira, a
ação de cupins ainda está presente. Entretanto, parece que nos níveis mais
profundos a ação bioturbadora é menos intensa. Sugestivamente, a base da
supracitada crotovina coincide com o fim do material arqueológico e dos
carvões. Também estão presentes raízes capilares e de maior porte nos níveis
71
mais superiores (Fig. 7.1-24). No que diz respeito às fissuras sub-verticalizadas
elas se prolongam da superfície até o início do nível de cascalho. Esta é a
única sondagem na qual as fissuras chegam até o pacote com cascalho.
Figura 7.1-23 – Seção colunar leste da sondagem S-07. Detalhe do nível de
cascalheira.
Figura 7.1-24. Seção Colunar da Sondagem S-07. Detalhe das raízes capilares
presentes até cerca de 180cm de profundidade.
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73
Sondagem S-09
A Sondagem S-09 foi aberta com o objetivo de se obter uma unidade
que estivesse acima da cota delimitada pela marca d’água presente no maciço
calcário. Sua posição foi determinada a partir do alinhamento Norte-Sul
formado pelas sondagens S-06, S-05, B-02 e S-07. Assim ela ficou localizada
cerca de 21 metros ao Norte da sondagem S-07. A sondagem S-09 foi a
primeira a ser aberta dentro da zona de mata. Próximo a ela, havia dois
cupinzeiros com cerca de 40cm de altura e 60cm de diâmetro cada. Ambos
aparentam ter sofrido bastante erosão mas, conforme foi possível verificar,
ainda são habitados por colônias ativas. Ainda que na sondagem em si não
tenha sido reconhecido nenhum cupinzeiro propriamente dito, em seu centro
foram encontradas larvas de cupim.
Já no primeiro nível da escavação foi recuperado um fragmento de
cerâmica com um entalhe na superfície. Os dois primeiros níveis apresentaram
muitos fragmentos de carvão, presença marcante de raízes capilares e também
de raízes grossas (2-3cm diâmetro). Alguns vermes foram detectados e o
sedimento parecia estar muito ressecado. Concreções e nódulos centimétricos
de terra de cor escura são encontrados de forma esparsa durante as
escavações. Interpreta-se este material como terra queimada. Nos dois níveis
seguintes (20-40cm) há uma redução na quantidade de carvões para, em
seguida, nos níveis 40-70cm ocorrer um novo aumento. A partir dos 40cm de
profundidade há uma nítida diminuição na quantidade de raízes capilares. A
partir dos 40cm também é possível detectar uma ligeira mudança na coloração
do sedimento, passando do 7,5YR 4\4 para 7,5YR 5\6. Conforme se aprofunda
no perfil estas desaparecem, permanecendo apenas raízes mais grossas. O
material sedimentar destes níveis é friável e pouco compacto. No nível 6070cm a escavação interceptou, em sua parede Norte, uma porção do
cupinzeiro.
A partir do nível 70-80cm há uma nova redução na quantidade de
carvão. É neste nível que foi recuperado o primeiro artefato lítico desta
sondagem. Uma estilha de quartzo hialino que foi coletada sob o número 169.
No nível 80-90cm foi encontrada uma “estrutura” bastante comum pelo sítio.
74
Ela apresenta formato esférico, com cerca de 4-5cm de diâmetro. Sua parte
externa forma uma crosta de cerca de 3-4mm, que por ser de argila compacta
confere resistência à estrutura (Fig. 7.1-26). A parte interna é preenchida pelo
mesmo sedimento presente na sondagem. Entretanto, esta estrutura não é
uma esfera completa, apresentando um orifício. Ao que parece esta estrutura é
um ninho de algum inseto, como besouro ou cigarra.
Figura 7.1-26. Estrutura esférica produzida por algum invertebrado. Reparar que
logo abaixo e logo acima desta estrutura estão presentes fissuras verticalizadas.
No nível 100-110cm há novo aumento nas concentrações de carvão. O
sedimento apresenta-se levemente mais compacto e argiloso. Nos dois níveis
seguintes há nova redução na quantidade de carvão. No nível 110-120cm uma
porção localizada da sondagem apresentou material em fração mais grosseira
(cascalho). Entretanto, era uma feição que não se desenvolveu. No nível
seguinte foi recuperada uma lasca com cerca de 1cm feita em algum tipo de
arenito silicificado. Neste mesmo nível foram recuperados nódulos bem
desenvolvidos de hidróxido de manganês. No nível seguinte, 130-140cm,
ocorre novo aumento na quantidade de carvões, que permanece elevada pelos
próximos quatro níveis. Além disso, neste nível foi recuperada uma daquelas
estruturas esféricas descritas acima. No nível seguinte (140-150cm) foi
encontrado um ramo de cupinzeiro ativo. Entretanto, não houve maiores
desenvolvimentos do cupinzeiro dentro da sondagem. Ao término do nível foi
75
recuperada uma estilha de quartzo hialino. O nível 160-170cm é o mais rico em
carvão de toda sondagem, apresentando cerca de 95 fragmentos. Em seguida
(nível 170-180cm), há nova redução na quantidade de carvão e o aparecimento
de mais uma estilha de quartzo hialino. No nível 180-190cm, a quantidade de
carvão diminui e duas estilhas são recolhidas. O sedimento permanece
basicamente inalterado, apenas progressivamente mais compacto conforme
aprofunda-se a sondagem. Também estão presentes, de forma esparsa,
fragmentos sub-angulosos de quartzo leitoso de cerca de 5cm de comprimento.
Os dois níveis seguintes são os últimos nos quais há presença, ainda que
pequena, de carvão na sondagem. O nível 200-210cm marca uma mudança
nítida na coloração do sedimento, que assume tons mais amarelados (7,5YR
5\8). O último artefato lítico foi encontrado no nível 210-220cm, marcando o fim
da presença de material arqueológico e carvão na sondagem. A partir de então,
o sedimento torna-se cada vez mais amarelado e compacto. A partir do nível
270-280cm a cor é 10YR 6\8, que se mantém até o último nível escavado (320330cm).
Portanto, é possível resumir as principais feições da sondagem S-09 da
seguinte forma. Entre a superfície e 210cm de profundidade pode-se identificar
um horizonte no qual o sedimento apresenta cor Castanha, sendo que nos
primeiros 50cm se trata de Castanho Puro (Castanho 7,5 YR 4/4), e entre os
50-210cm de Castanho Escuro (7,5YR 5\6). A textura é muito argilosa, ainda
que haja presença esparsa de material na fração de grânulos e cascalho.
Próximo à superfície é pouco compacto, com porosidade intergranular,
atribuindo uma aparente permeabilidade ao material. Conforme aumenta a
profundidade, a compactação aumenta, mas mesmo a 210cm é possível dizer
que, pelo menos quando comparado com o sedimento mais amarelado que se
encontra abaixo, este material de cor mais avermelhada ainda é menos
compacto e mais poroso.
Este horizonte também é marcado pela presença de fissuras subverticalizadas que atingem até 210cm de profundidade. Assim como ocorre em
outras sondagens, as fissuras estão presentes em todas as paredes, não
apresentando portanto nenhuma orientação preferencial. Na seção colunar
Norte da Sondagem S-09 foram registradas 3 principais fissuras verticalizadas
76
(Fig. 7.1-27). É comum que estas fissuras passem por regiões onde o
sedimento se encontra mais friável em decorrência da ação bioturbadora,
sugerindo uma eventual contribuição da biota na formação destas feições.
Além disso, foi possível observar carvões dentro das fissuras, comprovando
que estas podem potencialmente ser responsáveis por algum grau de
movimentação vertical do material arqueológico (Fig. 7.1-28). Dentre as três
fissuras duas terminam a cerca de 150cm de profundidade mas outra prolongase até 200cm de profundidade. Esta fissura mais profunda termina na
extremidade de uma feição horizontalizada com meio metro de extensão e
cerca de 4 cm de espessura. Esta feição contém sedimento friável rico em
fração grosseira (cascalho) composta por nódulos de argila e hidróxidos de
ferro ou manganês. Ou seja, pelo menos até 200cm de profundidade ocorreu
remobilização de sedimento. Por fim, nesta sondagem também foi identificada
uma fissura sub-horizontalizada a 180cm de profudidade (Figura 7.1-29).
Figura 7.1-27. Seção Colunar Norte da Sondagem S-09. Detalhe das fissuras subverticalizadas indicadas pelos palitos coloridos
77
Figura 7.1-28. Seção Colunar Norte da Sondagem S-09. Detalhe de um carvão
(indicado pela seta) localizado dentro de uma fissura vertical.
Figura 7.1-29. Colunar Norte da Sondagem S-09. Fissura sub-horizontalizada
localizada a 180cm de profundidade.
78
A ação biótica é intensa em toda extensão deste horizonte, conforme
indicado pela presença de cupinzeiros tanto a 60cm, como a 150cm de
profundidade. Ainda que as raízes capilares estejam restritas aos primeiros
50cm da sondagem, raízes de até 3cm de diâmetro estão presentes até cerca
de 170 cm de profundidade. Ainda que em sua maioria estas raízes estivessem
em posição sub-horizontalizada, houve uma raiz verticalizada que acompanhou
o rebaixamento da sondagem até cerca de 140 cm de profundidade. Por fim,
casulos de algum tipo de invertebrado (as estruturas esféricas descritas acima)
foram encontrados numa profundidade de até 140cm.
A presença de carvão esta limitada, grosso modo, à extensão deste
horizonte. É possível identificar pelo menos três picos de abundância de carvão
na sondagem. O primeiro deles é logo nos primeiros 20cm abaixo da superfície
topográfica. O segundo ocorre entre 40 e 70cm de profundidade. Por fim, há
carvão entre 100 e 200cm, com um pico de 95 fragmentos no nível 160-170.
No que diz respeito ao material arqueológico foram recuperados 8 artefatos
líticos e um fragmento de cerâmico. Os artefatos líticos apresentam tamanho
muito pequeno, não excedendo os 2cm no eixo de maior comprimento. Tanto
quartzo hialino como sílex foram usados como matéria-prima. Os artefatos
líticos estão distribuídos de forma esparsa pela sondagem desde os 80cm até
os 220cm de profundidade. Portanto, o fim do nível de material arqueológico
coincide com o fim do nível com carvão.
Abaixo deste horizonte o sedimento assume cores cada vez mais
amareladas, indo de um amarelo avermelhado (7,5YR 5\8|6\8) entre os 220280cm profundidade, até um amarelo acastanhado (10YR 6\8) nos níveis mais
profundos da sondagem. Analogamente, ocorre um forte aumento da
compactação conforme avança-se na profundidade, o que acarreta numa
permeabilidade intergranular muito baixa. Não há nenhum sinal de atividade
bioturbadora ou fissuras. Por fim, é importante ressaltar que na sondagem S-09
não ocorre o nível de cascalho descrito em outras sondagens. Entretanto, é
preciso levar em consideração que este nível pode estar presente em
profundidades maiores, simplesmente não tendo sido alcançado pelas nossas
escavações, o que é justamente o que nós assumimos neste trabalho.
79
80
Sondagem S-10
A sondagem S-10 é a mais alta no perfil Norte-Sul, estando cerca de 10
metros a cima da S-06. Nesta sondagem foi recuperado um único artefato
lítico, logo no primeiro nível escavado. Portanto, o limite Norte do sítio pode ser
estabelecido em algum ponto entre a S-09 e a S-10. No que diz respeito à
presença de carvão esta sondagem apresenta uma acumulação muito intensa
a 130cm de profundidade. Também há uma acumulação sub-superficial no
nível 10-20cm. O último nível em que foi recuperado carvão foi o 210-220 cm,
mas desde 170cm de profundidade a concentração já é bem baixa.
Quanto ao solo ele é bastante homogêneo, de textura muito argilosa. Da
superfície até cerca de 200cm de profundidade apresenta cor vermelho
amarelado (5YR 5/6). A partir deste ponto até o fim da sondagem assume
cores mais amareladas 7,5YR 6/8. Não atinge, entretanto, nem nos níveis mais
profundos, cor francamente amarela tal qual encontrada nas demais
sondagens. Entre 280 e 290cm de profundidade foi identificado um nível de
cascalho incipiente. Ainda que o material constituinte seja o mesmo dos demais
níveis de cascalho do sítio este é muito menos denso, apresentando poucos
clastos. Uma feição particular desta sondagem é a existência de pequenos
bolsões de uma argila de cor branca, provavelmente caulinita (Fig. 7.1-31).
Figura 7.1-31. Sondagem S10. Material argiloso de cor branca encontrado em
bolsões de cerca de 10cm de diâmetro.
81
As fissuras sub-verticalizadas atingem 170cm de profundidade e
apresentam-se em todas as paredes da sondagem. Portanto, não parece haver
nenhuma orientação preferencial das fissuras. Nesta sondagem, o fim das
fissuras coincide com o fim da presença de carvões. Além disso, as três raízes
registradas na seção colunar (Fig. 7.1-32 – FIGURA AUSENTE) encontram-se
também na zona de maior presença de carvão. Como agentes bioturbadores
também foram reconhecidas as estruturas esféricas descritas acima, que
estavam localizadas justamente dentro de uma fissura sub-vertical a 115cm de
profundidade.
82
7.2 DATAÇÕES POR LUMINESCÊNCIA ÓTICAMENTE ESTIMULADA
Foram obtidas cinco datações por LOE realizadas pelo Dr. James
Feathers, do Laboratório de Luminescência da University of Washington,
Seattle, EUA (Tabela 7.2-1). Todas são da coluna sul da sondagem B-01.
Dentre as cinco datas disponíveis, não há nenhuma inversão cronológica. As
taxas de sedimentação sugeridas por estas datas são: 0,16mm/a entre 1900 e
4300; 0,12mm/a entre 4300 e 9900; 1mm/a entre 9900 e 10100; 0,12mm/ka
entre 10100 e 12500 AP. Com exceção da taxa de 1mm/a, os valores obtidos
estão de acordo com aqueles encontrados por outros pesquisadores. Gouveia
e Pessenda (2000), por exemplo, encontraram taxas de deposição entre 0,21 e
0,26mm/a para colúvios do Brasil Central e Interior Paulista. Em relação às
datações radiocarbônicas, as datas obtidas por LOE são sistematicamente
mais antigas para uma mesma profundidade. Assim, enquanto a datação por
LOE para o nível 140-150cm resulta numa idade de 10100±700 AP, o carvão
recuperado no nível 150-160cm resulta numa idade calibrada de 9450 AP.
Entretanto, como apenas duas datas 14C estão disponíveis para a sondagem B01 estas relações devem ser vistas com incerteza.
As seis amostras coletadas em 2008 foram enviadas para Washington
para serem datadas mas foram retornadas pela Receita Federal. No momento
estamos pedindo uma autorização para o DNPM para enviar novamente estas
amostras.
83
Tabela 7.2-1. Datações por LOE.
Nº Amostra
Sondagem
Profundidade (cm)
Data (LOE)
UW1392
B-1
10-20
1900±200
UW1391
B-1
50-60
4300±300
UW1390
B-1
120-130
9900±700
UW1389
B-1
140-150
10100±700
UW1388
B-1
170-180
12500±900
7.3 DATAÇÕES RADIOCARBÔNIBICA
Foram obtidas 16 datações radiocarbônicas (Tabela 7.2-1). Todas as
idades 14C serão apresentadas tanto em anos antes do presente (AP) como em
sua forma calibrada para anos calêndricos. De maneira geral, existe coerência
entre as datas. Ou seja, os carvões coletados das porções mais profundas das
sondagens apresentam datas mais antigas.
A unidade de escavação mais
bem datada até o momento é a sondagem S-04. No nível 20-30cm, rico em
material cerâmico e artefatos líticos, as idades são de 340 e 540 AP e, dois
níveis abaixo, a idade é de 1350 AP. A próxima idade disponível encontra-se já
no nível 100-110cm e é de 2210 AP. Logo abaixo dela, uma idade de 4220 AP
evidencia a primeira incongruência nas datas. A próxima data de 3450 AP é a
primeira inversão cronológica do perfil. Os níveis 120-130cm até 150-160cm
estão muito bem caracterizados por seis datações radiocarbônicas. Apesar de
existirem algumas inversões cronológicas estas são pouco expressivas e de
maneira geral, estas seis datas seguem uma lógica temporal com início em
3450 AP e fim em 5820 BP. Em nenhum destes níveis há material
arqueológico. A datação seguinte está no nível 220-230cm e é de 5860 AP. Ou
seja, apesar de se localizar a mais de 70cm abaixo daquele pacote com seis
datações, este carvão se encontra absolutamente dentro do espectro temporal
84
do dito pacote. Da mesma maneira, no nível 230-240cm um carvão foi datado
em 430 AP, tratando-se da data mais “problemática” da sondagem S-04.
Entretanto, justamente por se tratar de uma aberração tão nítida, a data
de 430AP não é capaz de ameaçar a legitimidade das outras datas do perfil.
Por outro lado, se levarmos em conta a data de 5860AP do nível 220-230, fica
evidente que processos de migração vertical estão ocorrendo de maneira
expressiva no sítio. Assumindo-se que as datas de 340 e 540 AP no nível 2030cm sejam autóctones no perfil, então o carvão datado em 430 AP deve ter
migrado cerca de 2,2m até o local onde foi recolhido. Analogamente, o carvão
datado em 5860AP teria de ter migrado cerca de 70cm verticalmente. Esta
migração vertical pode ser atribuída basicamente a dois fatores. Por um lado,
animais escavadores e raízes de árvores geram zonas de bioturbação pelas
quais os materiais de níveis superiores podem migrar para níveis inferiores.
Além disso, o fato da textura do solo do sítio e de seu entorno ser muito
argilosa (ver seção 7.4), junto com a existência de uma distinção marcante
entre as estações secas e úmidas, leva à formação de fissuras pelas quais a
migração vertical também pode ocorrer. Os dois tipos de feições foram
observados nas secções colunares descritas na etapa de campo de julho de
2008.
85
Tabela 7.3-1. Datas radiocarbônicas
N º Amostra Sondagem
Profundidade (cm)
Idade Convencional (AP)
Idade Calibrada
Delta 13C
1181
S-04
25
340± 40
500 até 300
-25.8
1136
S-04
20-30
510±40
620 até 610 ou 560 até 500
-27.1
814
S-04
31
400±40
520 até 420
-26.6
1180
S-04
46
1350±40
1320 até 1240 ou1200 até 1190
-26.4
1104
S-04
100-110
2210±40
2340 até 2120
-24
1105
S-04
110-120
4220±40
-25.7
1173
S-04
130
3450±40
4850 até 4800 ou 4760 até 4690
ou 4680 até 4640
3830 até 3620
1176
S-04
135
4640±40
5470 até 5300
-26.5
1102
S-04
130-140
4580±50
-26.4
1103
S-04
140-150
5810±40
5450 até 5380 ou 5330 até
5220 ou 5190 até 5060
6720 até 6500
1174
S-04
146
4460±40
5290 até 4960 ou 4920 até 4910
-24.3
1175
S-04
154
5130±40
5940 até 5860 ou 5830 até 5750
-25.5
1101
S-04
220-230
5860±50
6790 até 6550
-25.7
1019
S-04
230-240
450±40
540 até 470
-27.5
0137
B-01
130-140
5030±70
5920 até 5600
-25.6
0160
B-01
150-160
8310±40
9450 até 9240
-25.3
-25.8
-25.8
86
7.4 ANÁLISES GRANULOMÉTRICAS
Todas as 15 amostras para as quais foram estabelecidas as
distribuições granulométricas são da sondagem B-2. Com isso, foi possível
estabelecer o comportamento granulométrico ao longo da coluna. Fica evidente
que se trata de material com predomínio da fração argila. Estes resultados
estão de acordo com as descrições fornecidas por Piló (1998) e por CPRM
(2000), segundo os quais os solos da região apresentam, caracteristicamente,
textura argilosa e muito argilosa. É possível perceber um aumento tênue na
porcentagem da fração argila conforme se aprofunda no perfil. Assim, os níveis
mais superficiais apresentam cerca de 55% de argila enquanto que a 2m de
profundidade a argila responde por cerca de 70% do total do sedimento. Abaixo
de 2m, entretanto, há um aumento sensível na participação da fração areia,
com uma conseqüente diminuição da fração argila. Os resultados estão
sintetizados no gráfico da Figura 7.4-1.
100%
90%
80%
70%
60%
50%
Areia
40%
Silte
30%
Argila
20%
10%
0%
15 25 45 55 95 125 145 155 165 185 195 205 235 245 255
Profundidade (Cm) Obs: Nem todos os níveis foram analisados
Figura 7.4-1. Contribuição das frações argila, silte e areia para cada nível de 10
cm.
87
8. DISCUSSÃO e CONCLUSÕES
O objetivo deste trabalho é integrar dados de cunho arqueológico,
geológico e geomorfológico, de maneira a permitir que as informações
advindas de diferentes disciplinas, comumente estanques, possam ser
integradas em uma abordagem verdadeiramente interdisciplinar, evitando a
simples acumulação de informações na forma de apêndices e anexos. Nosso
objetivo transcende o tradicional empréstimo que a arqueologia costuma fazer
das Ciências da Terra, uma vez que não só os dados arqueológicos puderam
ser
melhor
entendidos
por
meio
de
uma
abordagem
geológica
e
geomorfológica, mas também a observação e análise dos dados arqueológicos
permitiram que se procedesse a algumas interpretações e se colocassem
algumas questões a serem pensadas por pesquisadores de outras áreas.
Além das particularidades de cada sondagem é possível observar alguns
elementos gerais que podem se relacionar diretamente com os processos de
formação do sítio arqueológico.
O sítio do Sumidouro é composto basicamente por três horizontes
pedológicos distintos. O horizonte superior apresenta cores próximas ao
marrom e ao vermelho (7.5YR 5/6; 5YR 4/4; 5YR 5/4), é profundamente
bioturbado, apresenta porosidade intergranular e uma grande permeabilidade.
Outra característica fundamental é que o material arqueológico está restrito a
esse primeiro horizonte. Abaixo dele encontra-se um horizonte composto por
um solo muito mais compactado, sem porosidade intergranular e pouca
evidência de ação bioturbadora. Apresenta cores amarelas caraterísticas (7.5
YR 6/8) e é chamado pela população local de “aricanga”. Ainda que ambos os
horizontes tenham textura muito argilosa, há um aumento na proporção de
argila conforme se passa do horizonte mais avermelhado para o horizonte mais
amarelado, o que pode eventualmente se dar por translocação de argilas.
Estes horizontes estão presentes em toda região do carste de Lagoa Santa,
não constituindo assim uma feição particular do sítio arqueológico em questão
(Piló, 1998). O terceiro horizonte é constituído por uma cascalheira composta
majoritariamente por calhaus de quartzo leitoso oriundos de veios da Fm. Serra
88
de Santa Helena, contendo, também, uma proporção menor de seixos rolados,
típicos de ambiente fluvial.
A profundidade relativa e espessura dos dois primeiros horizontes
parece estar fortemente determinada pela sua posição topográfica na vertente.
Assim, nas sondagens mais próximas à lagoa (ex. S-06), a transição entre o
horizonte superior e o horizonte de cor amarela ocorre a cerca de 100cm de
profundidade. Já em sondagens em cotas intermediárias como a S-07 a
transição ocorre a 150cm. Na sondagem S-09, a transição ocorre a quase
280cm de profundidade. Por fim, na sondagem S-10, que se localiza 70 metros
a sul e está topograficamente elevada em 11 metros acima da S-06, o
horizonte amarelado sequer aparece. A mesma relação não pode ser
observada para o nível rico em cascalho, já que ele pode ou não estar presente
numa mesma cota da vertente. Parece que este horizonte inicia-se
preferencialmente entre 200 e 250cm de profundidade, sendo constituído ora
por pacotes densos e espessos (ex: S-06 e S-03) ora por pacotes mais
esparsos e finos (ex: S-05 e S-10). Geralmente essas cascalheiras são
consideradas como relíquias de eventos de aridez, sendo a elas imputado um
significado paleoclimático. São o que autores como Ab’Sáber (1966) e Bigarella
et al. (1965) chamaram de “paleopavimentos detríticos” (com conotação
interpretativa) ou o que outros autores denominam “stone lines” ou “linhas de
pedra” (com conotação descritiva). No caso do Sítio do Sumidouro, é patente o
caráter descontínuo dessa cascalheira, o que sugere, ao invés de um
pavimento, o preenchimento de ravinas por seixos advindos das porções
superiores da vertente. Ainda assim, é possível que tais cascalheiras tenham
significado paleoambiental, uma vez que podem ser o resultado do
ravinamento produzido por eventos de chuva torrencial em meio a períodos
geralmente secos, com escassa cobertura vegetal.
No maciço calcário é possível identificar diversas marcas d’água, sendo
uma delas especialmente proeminente. Esta marca encontra-se a cerca de 12
metros acima do atual nível da lagoa (julho 2008). Relatos orais descrevem a
ocorrência de uma grande cheia da Lagoa do Sumidouro durante boa parte da
década de 1940. Assumimos, portanto, que a dita marca seja decorrência
deste grande evento de cheia. Seja este o caso ou não, ao projetarmos a
89
marca d’água na vertente sul do sítio arqueológico, verificamos que ela
coincidia não só com o limite entre a mata e o descampado como também com
uma quebra de relevo (knick-point), provável margem da lagoa durante tal
evento de cheia. Isto significa que, com exceção de duas sondagens (S-09 e
S10), todas as demais se encontraram submersas durante considerável
período de tempo.
As conseqüências de tal fato não são certas, mas algumas sugestões
podem ser feitas. Em primeiro lugar é preciso que se considere o efeito que
uma lâmina d’água mais alta teria sobre a vertente. Partindo do pressuposto
que a grande cheia dos anos 1940 deve ter se repetido inúmeras vezes ao
longo dos milênios, a erosão laminar pode ter sido bastante ativa em grande
parte do sítio. Que a última grande cheia tenha formado uma quebra de relevo
é fato bastante sugestivo. A Lagoa do Sumidouro apresenta duas
características que podem favorecer, de maneira bastante incisiva, a erosão
das margens: 1) flutuações sazonais extremas no nível d’água; e 2) a
existência de um sumidouro, ou ponto de escoamento por onde toda a água é
drenada periodicamente, ao menos uma vez por ano. Se levarmos em conta
que o material que chega à lagoa é predominantemente constituído por argila
(vide item 7.3), seria esperado que o efeito das ondas nas margens resultasse
na remoção de boa parcela do solo, constituído de material fino. Os artefatos
arqueológicos, por sua vez, tenderiam a sofrer menos transporte. Esta hipótese
poderia explicar a menor espessura do horizonte superior de solo
(avermelhado) nas porções mais baixas da vertente. Apesar de intuitivamente
esperarmos uma maior espessura de colúvio avermelhado na porção mais
baixa e mais plana da vertente, ocorreu justamente o contrário. Todas as
sondagens escavadas apresentaram material arqueológico. Ainda assim, é
possível perceber uma tendência de aumento na concentração conforme se
desce a vertente. Assim, a sondagem S-09 apresenta 8 artefatos recuperados
e, a sondagem S-06, 28 artefatos recuperados. Arqueologicamente isto poderia
ser explicado na medida em que regiões com cotas mais baixas tivessem sido
utilizadas de forma mais intensa pelos Paleoíndios. Alternativamente, a maior
concentração nas porções mais baixas da vertente poderia ser resultado de um
acúmulo decorrente da erosão das porções superiores. Algumas observações
90
parecem apoiar a idéia de que processos erosivos tenham ocorrido nas
porções inferiores da vertente. Enquanto que na S-09 (alta vertente) o pacote
arqueológico tem início a cerca de 100cm de profundidade na S-06 (baixa
vertente) ele está logo abaixo da superfície. Ainda assim, ambos pacotes
apresentam uma espessura na ordem de 90cm. Poder-se-ia sugerir que os
cerca de 100 cm de sedimento que recobrem o pacote arqueológico na alta
vertente foram removidos pela erosão. Isto seria também uma maneira
alternativa para entender a redução (também de cerca de 100cm) na
espessura do horizonte superior de cor avermelhada conforme se desce a
vertente. Quando esse colúvio proveniente das porções superiores chegasse
na baixa vertente, seria mais facilmente erodido por ação da lagoa, sendo a
fração fina removida diferencialmente, concentrando os artefatos em um pacote
menos espesso. Desse modo, a sondagem S-06 representaria um conjunto
heterogêneo, uma composição de artefatos in situ associados a artefatos que
foram erodidos de porções superiores da vertente.
Além destes efeitos estritamente geogênicos, é possível que tais
eventos de grande cheia tenham algum tipo de impacto sobre a distribuição do
material arqueológico propriamente dito. Estudos de monitoramento realizados
nas margens de lagos nos EUA (Will & Clark 1996) mostram que pode haver
movimentação considerável de artefatos vertente acima, especialmente por
ação de ondas.
É tambem preciso que se leve em consideração que praticamente todo o
sedimento do sítio arqueológico e do entorno da lagoa apresenta textura
argilosa.
Espera-se, portanto,
que haja
uma considerável diminuição
volumétrica após a secagem da área alagada levando à formação de fissuras
no solo. Em alguns trechos da margem atual da lagoa (fora do sítio) foram
observadas fissuras de até 3cm de espessura que se prolongavam por mais de
30 metros. Supõe-se que logo após um evento de grande cheia, fissuras ainda
maiores possam ter se formado. Conforme descrito acima, fissuras de até 1cm
de espessura estão presentes nas sondagens. Ainda que não seja uma regra,
em pelo menos três sondagens (S-06, S-08 e S-09) foi possível observar que
existe uma coincidência entre o fim do nível arqueológico, das ocorrências de
carvão, e da profundidade máxima das fissuras. Além disso, foram observados
91
carvões dentro das ditas fissuras. Portanto, é possível que ocorra migração
vertical de peças por tais fissuras. Entretanto, não se pode afirmar que este
fenômeno seja importante a ponto de alterar a relação estratigráfica entre os
artefatos e os carvões.
Com relação aos carvões, nas sondagens S-07, S-09 e S-10 sua
distribuição é caracteristicamente normal, com um pico em torno de 150cm de
profundidade. Ainda nesse sentido, é importante realçar que esta distribuição
não parece estar associada diretamente ao material arqueológico. Tal
observação foi feita em várias sondagens, principalmente na B-01, onde a
maior concentração de carvão não coincide com os níveis arqueológicos, e na
S-10, sondagem sem material arqueológico. Outro ponto importante é que nas
sondagens localizadas abaixo da cota d’água da grande cheia a distribuição de
carvão não segue o mesmo padrão tão bem definido. Tais dados sugerem que
a produção de carvão ao longo do Holoceno se deu mais por fatores naturais
(fogo de cerrado) do que por ação humana (fogueiras). Outro dado importante
fornecido pelo comportamento quantitativo dos carvões no sítio é que,
enquanto há um aumento na quantidade de material arqueológico nas porções
mais inferiores da vertente, há também uma sensível diminuição na quantidade
de carvão. Tal observação reforça a hipótese de erosão nas porções mais
baixas da vertente, uma vez que a ação das ondas removeria facilmente os
carvões, muito menos densos do que os artefatos de pedra.
Outra questão fundamental diz respeito à dispersão vertical do material
arqueológico. Enquanto nas sondagens S-06 e S-09 existe um único nível de
material arqueológico, em sondagens como S-04, S-08, S-03 e B-02 o material
arqueológico encontra-se dividido em dois níveis razoavelmente distintos.
Determinar se estes níveis distintos representam ou não dois eventos
separados no tempo de ocupação humana é um dos principais objetivos deste
trabalho. Em ambos os níveis estão presentes artefatos líticos, mas apenas no
nível superior é que foi encontrado material cerâmico. Isto sugere que a
distinção entre os dois níveis seja real. Além disso, a integridade do vaso
cerâmico recuperado na S-04 e as lascas localizadas próximas umas das
outras e que remontavam sugerem que o grau de movimentação não tenha
sido intenso. Já as datações radiocarbônicas apontam para um quadro no qual,
92
apesar de ocorrerem algumas inversões, há uma coerência que indica que o
material arqueológico se encontra in situ. Novamente, estes dados se
coadunam com a hipótese de erosão por ação de ondas na porção inferior da
vertente, com aumento da concentração de peças na sondagem S-06 devido à
remoção diferencial de material fino. No caso da sondagem S-09,
topograficamente mais alta, a ocorrência de apenas um nível arqueológico,
com peças esparsas, pode se dever tanto à não existência de ocupação
humana mais antiga neste ponto da vertente, como ao fato de ela existir, mas
estar mais profunda (a sondagem foi escavada até 3m de profundidade).
Por fim, os dados obtidos pela escavação do sítio suscitaram uma
importante questão a respeito das relações entre os horizontes de solo,
principalmente envolvendo sua cronologia e seu significado paleoambiental. Foi
observado, tanto no Sítio do Sumidouro como no Sítio Coqueirinho, localizado
na mesma situação, que os materiais arqueológicos sempre estão associados
ao horizonte de solo superior, bruno-avermelhado, e nunca ocorrem no
horizonte de solo inferior, amarelado, independente da espessura dos mesmos.
O mesmo pode ser dito dos carvões. Tal fato sugere fortemente que o limite
entre os horizontes de solo é eminentemente cronológico, e não relacionado a
circulação de água, topografia ou quaisquer outros fatores microclimáticos ou
geoquímicos atuais / subatuais. Ou seja, segundo este modelo o horizonte
amarelo estaria se transformando no horizonte vermelho. O principal agente
desta transformação seriam plantas e animais. O exemplo da sondagem S-05 é
muito sugestivo neste sentido já que, apesar de estarem localizadas nos níveis
de material mais avermelhado, as crotovinas estão preenchidas por sedimento
nitidamente amarelo. Tal transformação teria se iniciado antes, mas talvez não
muito antes, da chegada dos primeiros humanos na região de Lagoa Santa.
Esses primeiros habitantes teriam “pisado” sobre o solo bruno-avermelhado,
que na época seria ainda pouco espesso. Cabe então a pergunta: o que teria
promovido tal transformação? Uma possibilidade seria justamente o aumento
das condições de temperatura e umidade que ocorreram após o Último Máximo
Glacial (UMG), promovendo consigo o aumento da flora e da fauna de solo. A
ausência de carvões no horizonte de solo amarelado seguiria o mesmo
93
raciocínio, na medida em que a vegetação durante o UMG seria muito esparsa,
talvez composta de gramíneas.
Trabalhos futuros devem ser desenvolvidos no intuito de melhor
esclarecer os pontos discutidos acima. A relação entre os três horizontes
pedológicos presentes no sítio poderá ser melhor entendida frente à uma
caracterização geoquímica e micromorfológica. Amostras da matriz argilosa da
linha de cascalho foram enviadas para serem datadas por LOE o que permitirá,
através da correlação entre distintas sondagens, verificar se este horizonte
possui ou não um significado cronológico. Futuras análises tipológicas dos
artefatos líticos ajudarão a avaliar se existe ou não mais de um nível de
ocupação do sítio. Para avaliar a ocorrência de migração vertical das peças
seria interessante proceder à pesagem dos artefatos e verificar se existe algum
tipo de correlação entre profundidade da sondagem e a massa da pedra.
Analogamente, a pesagem do carvão permitirá uma avaliação mais precisa da
abundância relativa deste, tanto dentro como entre as sondagens. Igualmente
importante será datar mais sondagens, especialmente a S-09, única com
material arqueológico localizada acima do nível d’água da cheia de 1940.
Esta monografia procurou apresentar os múltiplos aspectos que estão
envolvidos no entendimento de um sítio arqueológico. Demos ênfase aos
processos
naturais
que
podem
potencialmente
modificar
o
registro
arqueológico. Nitidamente, mesmo os três princípios básicos da estratigrafia
não podem ser tomados como certos. Entretanto, e ai reside a principal
contribuição desta monografia, essa complexidade do registro arqueológico
não é auto-evidente. Caso não tivessem sido feitas 14 datações para uma
única sondagem de 1m2 muito dificilmente se perceberiam as inversões
cronológicas por nós observadas. Não se tivesse datado uma mesma
sondagem por dois métodos distintos não teríamos observado as discrepância
entre eles. Sem os perfis detalhados de cada sondagem não teríamos reparado
nas relações entre os distintos horizontes e sua relação com o material
arqueológico.
Da
mesma
maneira,
se
não
tivéssemos
mapeado
meticulosamente cada uma das fissuras verticais, jamais notaríamos que
nestas residem carvões tão pequenos que quase não podem ser vistos. Ou
seja, é apenas vendando os olhos que é possível encontrar um sítio que não
94
tenha sido modificado por processos geogênicos. O estudo geoarqueológico
comumente contribui mais para complicar do que para simplificar a
interpretação de um sítio arqueológico. Não se trata, entretanto, de afirmar que
a geoarqueolgia gere mais perguntas do que respostas, mas sim que o estudo
geoarqueológico traz à tona questões fundamentais que de outra maneira
jamais seriam feitas.
95
9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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