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Publicação
Entrevistas
Testemunho de um pioneiro
Eduardo Fischer
Made in Brazil
PJ Pereira
Engenharia de marcas
é a sua especialidade
revista da espm • volume 19 • ano 18 • edição nº4 • julho/agosto 2012 • R$ 28,00
João Ciaco
comunicação integrada
espetáculo à procura de maestros
Artigos
A vida é um espetáculo
à procura de maestros
O espetáculo é a mensagem
Mobile não é tecnologia,
é comportamento
Profissional do futuro
Os golfinhos da comunicação
Mesa-redonda
Sobra talento,
falta consenso
Artigos
Fora de foco
A aldeia agora é global
O princípio do beijo
A hierarquia dos valores
Manual de sobrevivência digital
Do outro lado do balcão
A costura da comunicação
integrada
O manobrista
bem-sucedido
instituição mantenedora
conselho deliberativo
associados
• Armando Ferrentini – Presidente
• Alex Periscinoto
• Armando Strozenberg
• Dalton Pastore
• Décio Clemente
• João Vinicius Prianti
• José Carlos De Salles Gomes Neto
• Luiz Marcelo Dias Sales
• Luiz Lara
• Roberto Duailibi
• Sérgio Reis
• Adriana Cury
• Alex Periscinoto
• Altino João de Barros
• Antonio Fadiga
• Antonio Jacinto Matias
• Armando Ferrentini
• Armando Strozenberg
• Claudio de Moura Castro
• Dalton Pastore
• Décio Clemente
• Francisco Gracioso
• Jayme Sirotsky
• João Carlos Saad
• João De Simoni Soderini Ferracciù
• João Roberto Marinho
• João Vinicius Prianti
• José Bonifácio de Oliveira Sobrinho
• José Carlos De Salles Gomes Neto
conselho fiscal
Titulares
• Antonio Jacinto Matias
• Luiz Carlos Brandão
Cavalcanti Júnior
• Percival Caropreso
4
Revista da ESPM | maio/junho de 2012
• José Heitor A­ttilio Gracioso
• Luiz Carlos Brandão
Cavalcanti Júnior
• Luiz Carlos Dutra
• Luiz Lara
• Luiz Marcelo Dias Sales
• Marcello Serpa
• Octávio Florisbal
• Orlando Marques
• Percival Caropreso
• Petrônio Corrêa
• Ricardo Fischer
• Roberto Civita
• Roberto Duailibi
• Roberto Martensen
• Saïd Farhat
• Sérgio Reis
• Waltely Longo
Diretoria
executiva
da ESPM
• J. Roberto Whitaker Penteado
Presidente
• Alexandre Gracioso
Vice-presidente Acadêmico
• Elisabeth Dau Corrêa
Vice-presidente Administrativo Financeira
• Emmanuel Publio Dias
Vice-presidente Corporativo
• Hiran Castello Branco
Vice-presidente de Operações
editorial
EXPEDIENTE
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Alexandre Gracioso
Hiran Castello Branco
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J. Roberto Whitaker Penteado
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Coordenação Editorial
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Editora Assistente
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Edição de Arte
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Revisão
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Redação
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Editora Referência Gráfica
Distribuidor Exclusivo
Fernando Chinaglia
Distribuidora S/A
Revista da ESPM
Uma publicação bimestral da Escola
Superior de Propaganda e Marketing. Os con­­ceitos emitidos em
artigos assinados são de exclusiva
responsabilidade dos respectivos
autores.
Professores, pesquisadores, consul­
tores e executivos são convidados a
apresentar matérias sobre su­as especialidades, que venham a contribuir
para o aperfeiçoamento da teoria e da
prática nos campos da administração
em geral, do mar­k­eting e das comunicações. In­for­ma­ções sobre as formas
e condições, favor entrar em contato
com a coordenadora editorial.
Nova era de uma velha arte
A
definição mais atual de comunicação integrada é o uso combinado da
mídia tradicional com as novas arenas da comunicação, como o marketing
promocional, o universo digital e os grandes eventos esportivos, musicais
e culturais. O termo refere-se também à capacidade de “surfar” as notícias, isto é,
criar ou estimular a divulgação de informações de nosso interesse e que a mídia
veicula como conteúdo editorial. Finalmente, registre-se também que o Festival
de Cannes já distribui há mais de cinco anos os seus Titanium Lions, justamente
para premiar as melhores campanhas de comunicação integrada.
Entre nós, a ESPM foi pioneira há vários anos na conceituação das novas arenas
da comunicação, como forma nova e importante de atingir o mercado. Mais recentemente a ABAP adotou oficialmente o termo comunicação integrada, como
desdobramento natural da propaganda tradicional. Em todos os casos, dentro e
fora do Brasil, esta importância da comunicação integrada tem muito a ver com as
expectativas e o comportamento típico da vida moderna. Vivemos em uma grande
sociedade do espetáculo e as pessoas buscam freneticamente o entretenimento
e a diversão, como forma de fugir à aridez do mundo de hoje. De certa forma, a comunicação integrada coloca esta tendência a serviço da comunicação de mercado.
Por tudo isso, não deixa de ser surpreendente o que constatamos, nos inúmeros
contatos que mantivemos com publicitários e anunciantes, durante a preparação
desta edição. Muitos profissionais parecem estar ainda confusos a respeito do que
vem a ser a nova comunicação integrada. Alguns deles até confundem o termo com
a comunicação dirigida, talvez pelo fato de que a nova comunicação integrada é
geralmente segmentada e atinge setores específicos do mercado consumidor. De
qualquer maneira, todos reconhecem que estamos diante de um novo fenômeno
de importância incalculável para o futuro da comunicação com o mercado. Como
é natural, restam ainda muitos problemas a resolver, para que a comunicação integrada se difunda mais rapidamente entre nós e tire o nosso país do relativo atraso
em que se encontra. Entre eles estão, sem dúvida, a conciliação de interesses de
todas as partes envolvidas no processo – inclusive as agências e a grande mídia.
Outro ponto é a necessidade de se aperfeiçoar a coordenação das campanhas
que combinam a mídia tradicional e as novas arenas da comunicação. Podemos
mesmo dizer que, se a vida moderna é um grande espetáculo, faltam maestros para
dirigi-lo. Mas estes percalços iniciais são até naturais. A nossa geração está tendo
o grande privilégio de testemunhar o surgimento de uma nova era da velha arte
de informar e persuadir o consumidor.
Francisco Gracioso
Presidente do Conselho Editorial
PARA ASSINAR, LIGUE: (11) 5085-4508 OU MANDE UM FAX PARA: (11) 5085-4646 - www.espm.br/revistadaespm
índice
Artigos
A vida é um espetáculo
à procura de maestros
Francisco Gracioso
Nos últimos anos, alguns anunciantes
se tornaram especialistas na arte de
”surfar” as notícias, obtendo cobertura
editorial gratuita na grande imprensa,
como é o caso da Apple. Confira como
funciona essa poderosa estratégia de
comunicação integrada
Página 20
O espetáculo é a mensagem
Anna Gabriela Araujo
Os principais executivos de grandes
empresas, como Microsoft, Sony e
McDonald’s, falam sobre o impacto
que as novas arenas da comunicação
estão causando no planejamento de
marketing dessas marcas
Mobile não é tecnologia,
é comportamento
Marcio Chaer
Quem ainda não acredita na revolução
da mobilidade vive em outro planeta.
Já podemos afirmar, com toda certeza,
que o consumidor é mobile. Ainda
assim, a maioria das marcas não
utiliza esse meio de forma correta
Página 36
Profissional do futuro
Alexandre Gracioso e Laura Chiavone
Pesquisa ”Beta e Bravura”,
idealizada pela ESPM/SP e executada
pela Limo Inc., apresenta o perfil
do executivo de marketing do século
21, com base na análise de oito
escolas de comunicação destacadas
no Festival de Criatividade de Cannes
Página 48
8
Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
shutterstock
Página 28
Os golfinhos
da comunicação
Marcelo Vergílio Paganini de Toledo
Em um mundo multiconectado,
multi-informado, multi-impactado e
multidisperso, quais são os desafios
das empresas para desenvolver sua
comunicação corporativa de forma
efetiva para atingir globalmente
todos os públicos de seu interesse?
Página 56
Fora de foco
Valeria Ravier
A era digital encurtou os tempos,
multiplicou as possibilidades e trouxe
à tona a miopia dos executivos da
Kodak, que foram incapazes de
reinventar uma empresa com 124
anos de história. Será esse o fim do
slogan ”Você aperta o botão, nós
fazemos o resto”?
Página 60
O princípio do beijo
Adriana Gomes
Para haver relação, é preciso
reconhecer o outro. Com base nesta
teoria, a autora mostra como o
uso frenético das mídias digitais
tem provocado o empobrecimento
da capacidade mais humana que
possuímos: a comunicação.
Página 70
índice
A costura da
comunicação integrada
Paulo Roberto Ferreira da Cunha
Por mais que inovações,
tecnologias e preceitos sejam
promulgados sempre, a prática
da comunicação integrada
convoca gestores de processos de
comunicação a buscar no essencial
as respostas mais elementares;
as quais permanecerão como
fundamento
Página 76
Manual de
sobrevivência digital
Ana Luiza Collares Xavier
Suas estratégias de marketing
digital estão trazendo o resultado
esperado? Se você pretende
realizar ações efetivas na internet,
primeiro precisa entender como
este meio é utilizado por seus
clientes
Página 82
A aldeia agora é global
Roberto Muylaert
Se o grande teórico da
comunicação tivesse nas mãos
os dispositivos móveis de hoje,
que somam num só sistema as
três modalidades de comunicação
preconizadas, não teria dúvida
em afirmar, encantado, que,
agora sim, o mundo é mesmo
uma Aldeia Global
Página 86
Seções
Leitura recomendada
Ponto de Vista
10
Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
[Mesa-redonda]
Sobra talento, falta consenso
Entrevistas
Fabio Baracho Martinelli (da Ambev),
Pedro Cabral (da AgênciaClick) e Luiz
Buono (da Fábrica) discutem o futuro
da comunicação integrada com os
professores Francisco Gracioso, Paulo
Cunha e João Matta (da ESPM)
Página 90
12
A hierarquia dos valores
Hermano Roberto Thiry-Cherques
Existem valores que são mais
importantes do que outros? Caso
existam, qual a hierarquia que lhes
corresponde?
Testemunho
de um pioneiro
Eduardo Fischer
Página 100
Do outro lado do balcão
Adriano Maluf Amui
Pesquisa inédita apresenta as
estruturas de trade marketing no
Brasil. Estudo realizado pelo Invent
revela a percepção dos profissionais
a respeito da atividade, a mapeia e
demonstra como essas estruturas
estão organizadas nas empresas
Página 102
40
Engenharia
de marcas é sua
especialidade
João Ciaco
O manobrista bem-sucedido
Carlos Roberto F. Chueiri
Cid Mesquita Garcia Filho,
superintendente do Sistema
Estapar/Riopark, mudou sua
vida após investir em um dos
cursos da ESPM
Página 108
64
114
117
Made in Brazil
PJ Pereira
entrevista
Testemunho
de um pioneiro
E
m 30 anos de profissão, Eduardo Fischer já protagonizou grandes espetáculos baseados na integração de diversas ferramentas do marketing.
Brahma Número 1, Baby Telesp Celular, Experimenta Nova Schin e a volta do Baixinho da Kaiser são apenas alguns dos cases que ilustram seu currículo.
Formado em comunicação social, com vários cursos de
especialização no exterior, ele foi um dos pioneiros na defesa
e prática da comunicação integrada na América Latina.
Presidente do Comitê Estratégico da rede Fischer, o executivo também responde pela construção da primeira multinacional brasileira no mercado publicitário: o Grupo Totalcom,
do qual é presidente. Seu case mais recente foi a criação do
SWU Music and Arts, uma plataforma de comunicação, lançada em junho de 2010, com o objetivo de promover a sustentabilidade por meio do entretenimento.
O reconhecimento de todo o seu trabalho está registrado
nos mais de 700 prêmios de marketing conquistados pelo
criativo no Brasil e no exterior. No dia 7 de agosto, ele compareceu à sede da ESPM para receber mais um trófeu para a
sua coleção pelo case SWU, que foi um dos vencedores da 11ª
edição do prêmio Marketing Best Sustentabilidade. A seguir,
Fischer apresenta a fórmula de sua comunicação integrada.
Entrevistado por Francisco Gracioso e Anna Gabriela Araujo
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
Eduardo Fischer
Gracioso – Há cinco anos, a Revista da
ESPM falou publicamente sobre comunicação integrada, com a preocupação acadêmica de explicar tudo de forma correta,
associando o tema ao que chamamos de sociedade do espetáculo. Hoje, o mundo está
cada vez mais voltado para o espetáculo e
por uma simples razão: as multidões querem
fugir da aridez da vida e encontram em mil
facetas do espetáculo a oportunidade de viver um momento de fantasia.
Fischer – Acredito nisso desde quando
entrei nesse negócio, lançando o conceito
da comunicação integrada no mercado
nacional.
Gabi – Na época, você estava com 19 anos.
Certo?
Fischer – Sim. E ainda não era formado.
Por dificuldade de encontrar estágio em
agências, tive pouca experiência de funcionário. Optei por investir em cursos de
especialização no exterior. Por exemplo,
fui ao Creative Problem Solving Institute,
em Buffalo (EUA), para fazer um curso de
criatividade. Em Las Vegas, fiz um curso
de entretenimento e outro de marketing na
Universidade de Nova York. Aos 19 anos,
tornei-me um profissional multifacetado
na área da comunicação. Quando voltei
ao Brasil, tinha uma visão mais ampla do
negócio. Nessa época, a propaganda brasileira começava a se projetar como uma das
melhores do mundo, focada principalmente no comercial de 30”. Para aparecer e conquistar meu lugar nessa indústria, montei
um discurso que não condizia com a época.
Costumava dizer que o comercial de TV era
excelente, mas tão importante quanto um
evento, uma promoção ou uma campanha
de incentivo. Todas essas ações colocadas
embaixo de um único conceito são mais
fortes do que apenas o filme publicitário.
Fiquei falando sozinho durante dez anos.
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
13
entrevista
Gabi – O mercado seguia essa tendência muito em função do anunciante,
que queria o comercial de 30”, da
mesma forma que agora exige mais
retorno sobre o investimento.
Fischer – Sem dúvida. Todo o mercado estava voltado para isso.
Gracioso – Concordo. Para nós, a
comunicação era propaganda.
Fischer – Propaganda como sendo
o ato de propagar a mensagem usando basicamente quatro veículos
de massa: rádio, jornal, revista e
televisão. Era esse o nosso mundo.
Eu não era contra, mas sabia que
nesse mundo já surfavam grandes
profissionais como Alex Periscinoto, Roberto Duailibi, José Zaragoza, Francesc Petit e tantos outros.
Como empresário da comunicação,
aos 19 anos de idade, eu precisava
de um novo discurso para ter uma
chance no mercado nacional.
Gabi – Quem não gostou muito da
ideia foi seu pai, não é?
Fischer – Meu pai não entendia o
mercado publicitário, mas ainda
assim patrocinou a abertura da
minha primeira agência, cuja sede
ficava em um escritório de 49m 2 e o
telefone era o mesmo do dentista do
sexto andar. Assim começou minha
história. Enveredei nesse negócio
para ter a chance de construir um
novo discurso de comunicação.
Entre 1985 e 1990, produzi grandes
campanhas, sempre associadas a
um modelo que oferecia algo além
da publicidade. Um exemplo foi
o lançamento da Calvin Klein no
Brasil, feito pela Fischer América,
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
“Eu costumava dizer que o comercial de 30” era
excelente, mas tão importante quanto um evento,
uma promoção ou uma campanha de incentivo...
Fiquei falando sozinho durante dez anos”
no início dos anos de 1980, por meio
de uma criação comportamental,
que misturava comerciais com uma
série de eventos para ajudar a alavancar a campanha da marca.
Gracioso – Os eventos, às vezes,
provocavam mais mídia do que a propaganda.
Fischer – Posicionei-me com base
nessa tendência, só que com uma
cortina de ferro, porque o mercado
não achava que isso era pertinente. Até que, em 1990, ao apostar
na comunicação integrada, acabei
ganhando toda a conta da Brahma,
que estava sendo disputada por oito
agências bem tradicionais. Com o
conceito “Brahma, a nº 1”, transformamos uma empresa quebrada – que
havia sido comprada pelo grupo
Garantia por US$ 50 milhões – em
uma marca mais valiosa do que sua
principal concorrente, a Antarctica,
que na época liderava o mercado
cervejeiro do país. A comunicação
integrada virou esse jogo, porque tínhamos um cliente que acreditava e
investia no nosso trabalho e não deixava que eu parasse de fazer projetos
pensando “fora da caixa”. Passados
30 anos, hoje o que se vê no Festival
de Cannes, na categoria Titanium,
nada mais é do que a comunicação
integrada que fazíamos para clientes
como a Brahma. O primeiro branded
content da propaganda brasileira foi
feito para o grupo têxtil Vicunha,
com o Projeto Expresso Brasil, que
no fim da década de 1980 exibiu na
Rede Globo uma série de TV composta por 40 capítulos de cinco minutos cada um. Na trama, um trem
servia de ponto de encontro para
vários personagens famosos das no-
Eduardo Fischer
velas da emissora, como o prefeito
Odorico Paraguaçu e o matador Zeca
Diabo, de O Bem Amado, ou ainda
Sinhozinho Malta e a viúva Porcina,
de Roque Santeiro. Era um trem que
vendia o Brasil e trazia a assinatura
da Vicunha, marca que ficou conhecida em todo o país.
Gracioso – Sua agência coleciona
uma série de casos como este...
Fischer – Sem dúvida. Em 1997,
por exemplo, o então ministro da
Comunicação Social do governo
Fernando Henrique Cardoso, Sergio Amaral, me convocou para lançar o projeto Marca Brasil. A ideia
era aproveitar a Copa de 1998, na
França, para mostrar ao mundo o
que o país fazia não só com os pés,
mas também com a cabeça. A verba
era de apenas US$ 3 milhões. Ouvi
a proposta e respondi que ficaria
difícil fazer um projeto grandioso
com aquela quantia, mas iria pensar. Passados 45 dias, voltamos
com o conceito “É tempo de Brasil”,
que foi a maior exposição da marca
Brasil já feita até hoje no exterior.
Iluminamos a pirâmide do Louvre
e fizemos uma exposição extraordinária em Paris.
Gracioso – Nesse momento começou
a ser criada a imagem do Brasil moderno, que temos hoje lá fora.
Fischer – Provavelmente. Isso foi
um marco histórico para o Brasil.
Pela primeira vez, o Carrousel du
Louvre foi fechado por um país.
Usei aqueles US$ 3 milhões para
montar o projeto e consegui atrair
40 companhias que fizeram comigo
o programa Hora do Brasil, composto por ícones nacionais, como
uma exposição da arte barroca e
ações para div ulgar a culinária
brasileira. Tudo ancorado por uma
grande campanha publicitária que
incentivava o mundo a conhecer o
Brasil. Outro exemplo foi a criação
do “Baby”, da Telesp Celular. O briefing dizia “vamos lançar o mimo” – o
primeiro celular pré-pago do Brasil.
Mimo, em português, tem relação
com mímico, que tem relação com
mudo, calado. Este conceito deu
certo em Portugal, mas não sabia se
funcionaria no Brasil. Os portugueses que compraram a Telesp passaram o briefing para sete agências –
seis fizeram a adaptação do “mimo”.
Nós chegamos lá com o Baby, um
produto que já nascia falando. Apresentamos não só uma proposta de
marca, como também todo um novo
modelo de negócios. Por exemplo:
inicialmente, a recarga era para ser
vendida em bancas de jornal. Nós
criamos o Baby Machine, máquinas
de recarga que foram espalhadas
por todo o país. Dentro do grupo
Telefônica, o case Baby ganhou
como o melhor case de pré-pago do
mundo.
Gabi – E como chegar a este conceito
de comunicação integrada?
“Ninguém dizia: “Vai lá e faça comunicação
integrada”. Mas sim: “Vai lá e resolve o problema”,
como no caso da Schincariol. Com 8% de share, a
marca tinha um alto índice de rejeição”
Fischer – Isso é treinamento. Hoje,
é muito simples, você junta tudo
que fizemos na década de 1980 e faz
uma grande campanha. O problema
é que, em vez de sair em busca de
uma ideia explosiva, primeiro você
precisa entender todo o processo,
o que chamamos de radiografia do
mercado. Essa análise precisa ser
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
15
entrevista
profunda e é preciso olhar mais o
competidor do que o seu mercado.
No caso da Brahma, observamos
muito a Antarctica. Para criar “A
nº 1”, me baseei na campanha “Nós
viemos aqui pra beber ou pra conversar? Antarctica faz a melhor
cerveja do Brasil”, com Adoniran
Barbosa. Essa era a melhor campanha de cerveja já feita no Brasil até
então. Aprendi a desenvolver temas
para o meu negócio, olhando a concorrência – ato que, naquela época,
não era tão presente assim no dia a
dia. Quando você aprende tudo sobre determinado mercado, em vez
de uma ideia para um comercial,
você, necessariamente, passa a buscar um conceito.
Gracioso – Vejo dois pontos comuns em todas as ideias descritas
por você. O primeiro é que o produto
é o mais importante do mundo. E o
segundo: o nosso produto é notícia,
e isso é tão importante que falarão
dele gratuitamente.
Fischer – É fantástico, ele deixa de
ser um comercial para ser um parceiro do seu cotidiano.
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
“Dizer que o
comercial de 30”
vai morrer
é, no mínimo, não
entender de economia,
sociologia, mercado
e marketing ou
não querer ver”
Gracioso – Isso derruba a velha
definição de propaganda. Certa vez,
a American Association of Advertising Agencies definiu a propaganda
como “uma mensagem que procura
estimular mudanças mentais em relação ao produto, quer torná-lo mais
conhecido, mais desejado. É veiculada
em mídia de massa e é identificada
e assinada pelo patrocinador”. Isso
acaba, no mínimo, com a terceira definição. Na verdade, você acabou com
a principal porque, muitas vezes, você
não pagava o espaço que dedicavam
ao seu produto.
Fischer – Não resta dúvida, mas é o
cotidiano. Isso que o senhor expõe
é muito interessante, porque o que
é o Facebook, alguém paga?
Gracioso – Prefiro não responder.
Fischer – Quem está gerando conteúdos hoje são os jovens e não
mais a televisão. E eles estão produzindo tudo isso sem um tostão.
Então, a pertinência do cotidiano
tem que ter a ver comigo.
Gracioso – O cotidiano é pertinente.
Fischer – O resultado de um bom
projeto de comunicação integrada
procura antever e ser pertinente
para o cotidiano, caso contrário,
volta a ser uma publicidade normal. Nas missões que nos davam,
ninguém dizia: “Vai lá e faça um
projeto de comunicação integrada”.
Mas sim: “Vai lá e resolve o problema”, como no caso da Schincariol.
Com 8% de market share, a marca
representava uma cerveja com alto
índice de rejeição, um dos maiores
que já vi. Ela não chegava a custar
R$ 1, enquanto as demais valiam o
dobro, ou seja, os 8% conquistados
eram apenas por preço. As pessoas
podiam pagar por ela, mas não sentiam orgulho em consumir esta cerveja. Na época, estávamos fora do
Eduardo Fischer
segmento cervejeiro há cinco anos.
No passado, fui campeão algumas
vezes com uma Ferrari, a Brahma.
Saí quando a Antarctica, muito
fragilizada, foi comprada pela Brahma e a Ambev passou a ter 90% do
mercado. Quando fui chamado por
Nelson Schincariol, ele precisava
de uma marca forte, capaz de suportar uma cerveja premium, que
havia produzido em sua fábrica. Daí
criei o projeto “Nova Schin”, uma
nova cerveja, com nova fórmula,
novo rótulo, nova equipe de vendas, novo treinamento e a primeira
convenção nacional de vendas da
Schincariol. Criamos o mote da
autoestima e um novo status quo
para o produto. Fizemos uma ação
exclusiva para os proprietários dos
pontos de venda. Mandamos uma
Nova Schin para cada um deles experimentar. A empresa apostou alto
nesta campanha, que fez a marca
arriscar seus 8% de market share
em um novo conceito.
Gracioso – Hoje, cinco anos depois,
a Nova Schin ainda é o ativo mais
valioso dessa nova companhia que os
japoneses compraram.
Fischer – O resultado dessa campanha foi que a marca saiu de R$ 19 para
R$ 27 a caixa, se igualando ao preço
da Skol, que naquele momento era líder do segmento. Em 60 dias, a companhia conquistou 15% de market share.
Gabi – Essa também foi uma campanha muito criticada na época, porque
não teria como fazer uma segunda
fase, já que o conceito “Nova Schin”
ficaria desgastado com o tempo.
Fischer – Mas, ainda assim, a marca continuou crescendo por três
anos, porque este foi um projeto de
comunicação integrada, no qual o
conceito permeou todas as ferramentas utilizadas.
Gracioso – Ouvindo você falar, até parece fácil. Hoje, 30 anos depois de suas
primeiras experiências, muitos ainda
não entenderam o conceito. Outros
falham na execução e não conseguem
trazer a mídia para o seu lado. Como
exemplo, temos a decisão da Libertadores da América, quando o Corinthians
enfrentou os argentinos na disputa da
taça de um campeonato cujo nome inicial é Santander Libertadores. Entretan-
to, a mídia não cita o nome do banco,
que investe milhões de dólares nessa
ação latino-americana. No dia do jogo,
para que sua marca fosse lembrada,
ele teve que colocar painéis nas laterais
do campo. E quem mais apareceu foi a
Fiat, por meio de sua marca de caminhões Iveco, que patrocinou a camisa
do Corinthians. Não adianta entender
o conceito de comunicação integrada ou
querer ter o seu nome na propaganda,
no marketing esportivo, na música...
Isso porque existe um funil através do
qual tudo caminha para a mente do
público, que é a grande mídia, e é aí que
muitos falham.
Fischer – Não posso comentar um
caso específico, mas o senhor tem
razão. O mercado mudou demais. E
o primeiro problema é que a execução precisa ser notoriamente bem
feita por pessoas que conheçam
todo o processo. Esse é o primeiro
problema: para tentar executar um
projeto integrado, o anunciante
acaba contratando cinco ou dez
fornecedores, com especialidades
diferentes. Mas falta um coordenador. Você começa a segmentar,
a multifacetar, e esquece do objeto
“Criamos o Baby, da Telesp Celular,
o primeiro celular pré-pago do
Brasil que já nasceu falando”
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
17
entrevista
“Em 2010, lançamos a plataforma de comunicação “SWU
(Starts with You) – Começa com Você”, que é entretenimento na veia”
integrador capaz de impulsionar
tudo isso para ter mais efetividade. O segundo ponto é que muitos
anunciantes são guiados pela mesa
de compra, e isso é um grande problema, porque ele pode ter dinheiro
para comprar o direito de ter o
patrocínio, mas muitas vezes não
tem verba para fazer a ativação. Em
terceiro lugar, está o fato de que
ninguém quer mais correr riscos.
Dificilmente você verá outra companhia fazendo o que Nelson Schincariol fez ao apostar no lançamento
da Nova Schin.
Gabi – Mas aí entra o problema do ROI.
Fischer – Correr riscos significa
fazer a diferença no seu negócio.
Todos os grandes projetos que fiz
foram arriscados. Lançamos a campanha da Brahma dizendo: “Você só
18
Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
precisa levantar o dedo para o Brasil
ganhar a Copa do Mundo”. Em 1994,
passamos sete meses com esse mesmo discurso, e o Brasil não ganhava
uma Copa há 20 anos. Dois mil eventos foram realizados em todo o país
naquele ano, além de uma campanha publicitária para levantar a estima do povo brasileiro. Na ocasião,
registramos US$ 50 milhões de retorno de mídia espontânea. Na prática, a desintegração dos processos,
a mesa de compra e a incapacidade
dos grandes profissionais em assumir riscos são fatores que impedem
a realização de grandes cases de
comunicação integrada.
Gracioso – Interessante, porque a
minha definição da agência do futuro
é uma mistura da propaganda tradicional, consultoria de marketing estratégico e empresário de circo ou teatro.
Fischer – Estamos no caminho,
com o lançamento, em 2010, de uma
empresa dentro do grupo Totalcom
para cuidar de entretenimento e
conteúdo, como a plataforma de
comunicação “SWU (Starts with
You) – Começa com Você”, que é entretenimento na veia. É um projeto
de consciência em prol da sustentabilidade, que usa o entretenimento
para chamar a atenção e divulgar
o evento por meio da rede social.
Hoje, temos no entretenimento o
futuro e, quem sabe, a chance de um
processo mais fácil da comunicação
integrada ajudando o movimento do
velho comercial de 30” a alavancar-se novamente. Mistura de circo com
consultoria e publicidade. É isso que
o grupo Totalcom tem sido hoje, e
fico mais confortável com sua valiosa opinião em saber que estamos no
caminho certo.
Eduardo Fischer
Gabi – Entretenimento com conceito.
Fischer – E para chegar a isso é
necessária muita consultoria estratégica, que obtemos através da TEN
(Tecnologia, Estratégica e Negócios)
– que funciona dentro do grupo.
Gracioso – Nesse novo mundo que
começa a surgir, qual será o papel da
propaganda?
Fischer – Não sou daqueles que
acham que o comercial ou a televisão vai morrer. O Brasil é um
mercado completamente diferente
dos outros que vemos por aí. Temos
um modelo publicitário único, no
qual a televisão tem mais de 50%
de audiência e é poderosíssima nas
classes C, D e E. Hoje, essas classes
são as que estão alavancando o
país. Então, dizer que o comercial
de 30” vai morrer é, no mínimo,
não entender de economia, sociologia, mercado e marketing ou não
querer ver. Agora, dizer que vai ser
tão poderoso quanto foi nas décadas de 1970, 1980, 1990 ou 2000 é
um exagero, porque já tem muita
gente, principalmente os jovens
das classes A e B, que não assiste
televisão, não lê jornal porque suja
a mão e acham que ler a revista
Veja é passado, porque traz notícias da semana anterior.
Gracioso – Em outras palavras, novos estilos de vida, novos valores serão
transmitidos de outra maneira.
Fischer – No entanto, o comercial
vai “varejar” cada vez mais, vai servir
para informar as novidades e lançar
produtos. Mas não será o carro-chefe,
a locomotiva da propaganda.
Gracioso – Na verdade, não há nada
Gabi – Com tantas revoluções em curso,
que crie impacto a preço tão baixo
como a propaganda. E isso continuará
assim por muitos anos. Agora, é possível levar esse ambiente de emoção e
persuasão para o mundo digital?
ficou mais difícil construir uma marca?
“O objetivo de
tornar pertinente
a sua marca
é que terá de ser
buscado o tempo
todo. E aí vem um
ponto importante:
será que essa
descoberta vai
ser feita por um
publicitário?”
Fischer – Estou escrevendo um
livro há cinco anos, chamado Trinta segundos de emoção – estamos
todos integrados, que não consigo
terminar. Quando consigo identificar um processo, fecho o livro e vou
ler as notícias, e aí vejo que aquilo
que estou retratando precisa ser
aprimorado.
Gracioso – Porque é algo contraditório.
Fischer – Ou já evolutivo. É uma
coisa extraordinária... Comecei
a escrever este livro na época do
iPod, que já acabou. Estamos vivendo a revolução da construção
do futuro, algo que nunca se passou antes. São várias revoluções
acontecendo ao mesmo tempo. O
celular, por exemplo, é outra grande
revolução.
Fischer – A marca deve ser pertinente na distribuição da mensagem
em todas as plataformas utilizadas.
Então, voltamos àquela máxima em
que acreditei lá em 1990...
Gracioso – Este ano, em Cannes,
Joseph Tripodi, diretor internacional
de marketing da Coca-Cola, disse que
o desafio nº 1 da Coca-Cola é tornar a
marca relevante para este novo mundo que está surgindo.
Fischer – É a minha resposta, concordo plenamente. E a proposta da
comunicação integrada do passado
era sair de um comercial informativo para o cotidiano da pertinência
no seu dia a dia. Então, a base está
aí. Vamos imaginar que a mídia seja
um canal de distribuição, a base que
você vai atingir, precisa ser testada.
É fácil para a GM falar que o Facebook não funcionou, assim como
é fácil para o Facebook tentar se
defender dizendo que com os outros
funciona. A dificuldade é avaliar
qual é a mensagem e como a GM está
usando o Facebook. Essa rede social
gerou a descoberta de um novo comportamento que ninguém sabia que
existia: a vontade de você contar o
seu dia a dia, essa necessidade era
tangente. Agora, o objetivo de tornar
pertinente a sua marca é que terá de
ser buscado o tempo todo. E aí vem
um ponto importante: será que esta
descoberta vai ser feita por um publicitário? Essa é a minha provocação.
Gracioso – Eduardo, muito obrigado.
Em duas horas de conversa, conseguimos montar um curso completo.
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arenas da comunicação
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A vida é um espetáculo
à procura de maestros
Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
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Na era digital, ações de marketing esportivo, cultural e de entretenimento se
transformam em grandes arenas de comunicação para os anunciantes e em
lucrativos canais de relacionamento entre as marcas e seus diversos públicos
Por Francisco Gracioso
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
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arenas da comunicação
N
musicais, culturais e outros. No entanto, há sempre as
exceções. Alguns anunciantes multinacionais são especialistas em “surfar” as notícias, obtendo cobertura
editorial gratuita até mesmo no caso de lançamento de
novos produtos, como ocorre com a Microsoft e a Apple,
ou com as grandes montadoras automobilísticas mundiais. Até mesmo no jogo decisivo entre o Corinthians e
o Boca, tivemos um bom exemplo disso, com o destaque
que teve a Iveco, marca de caminhões da Fiat, na camisa
corinthiana.
Entenda a sociedade do espetáculo
Lamentavelmente, o exemplo da Taça Santander Libertadores é mais comum do que se imagina. Nos últimos
anos, alguns anunciantes de renome têm feito tentativas
gnumarcelo
o último mês de julho, os paulistanos em geral
e os corinthianos em particular viveram dias
de expectativa e angústia até o desfecho feliz
de uma longa história, quando o Corinthians
bateu o Boca Juniors e conquistou a Taça Santander Libertadores deste ano. Durante semanas a fio, a imprensa
dedicou muito tempo e espaço ao tema, valorizando o
evento, mas cometendo uma grave omissão: ninguém
falou o nome do Santander, que é o patrocinador oficial
da competição sul-americana e investe vários milhões
de dólares todos os anos no campeonato.
Esse é mais um exemplo da dificuldade que têm os
anunciantes e as agências de propaganda em suas relações com a mídia, quando se trata de tirar proveito de
investimentos de vulto feitos em eventos esportivos,
Uma das ruas do centro
de São Paulo, que é
conhecido por oferecer
atrações culturais e opções
gastronômicas para todos
os gostos e bolsos
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
Na cidade de São Paulo, por exemplo,
há mais de 250 peças de teatro
permanentemente em cartaz e cerca
de 80 mil bares, restaurantes, danceterias,
lanchonetes e outros locais onde o
espetáculo continua sem parar
custosas de associação com grandes eventos esportivos,
musicais ou culturais, sem obter o retorno desejado. As
notícias aparecem na mídia, mas o crédito ao patrocinador é omitido. No fundo, ocorrem dois grandes problemas
que os anunciantes e as agências de propaganda ainda
não conseguiram decifrar: a compreensão do que é a
sociedade do espetáculo em que vivemos hoje; e a necessidade de rever completamente as atuais relações entre
clientes, agências e veículos, visando constituir autênticas parcerias estratégicas, com vantagens evidentes
para todas as partes.
Comecemos pela sociedade do espetáculo. O ser
humano sempre foi fascinado pelo espetáculo, desde a
ópera chinesa ou o circo romano. Mas o que ocorre hoje
é o total predomínio do espetáculo na vida diária, e isso
inclui a mídia, o marketing e a comunicação com o mercado consumidor. Nada é o que parece e, no entanto, as
pessoas creem em quase tudo que veem.
Queremos ter, ser, fazer, pertencer. E tudo com um único objetivo: esquecer a nossa condição humana. Somos
parte da horda e, no entanto, pretendemos ser individualistas. É nesse contexto que acontece o marketing de hoje,
apoiado cada vez mais no mundo do entretenimento, que
surgiu para satisfazer o hedonismo das massas liberadas.
Na verdade, a própria função de marketing está passando por mudanças rápidas, integrando-se cada vez
mais ao foco estratégico das empresas. Isso foi mostrado
recentemente pelo livro CMO Thought Leaders: the rise
of the strategic marketer, de autoria de Geoffrey Precourt
(Booz Allen Hamilton, 2007). A publicação versa sobre a
metamorfose do marketing e analisa os resultados de
shutterstock
As arenas da comunicação
Figura 1
Figura 2
Figura 3
Arenas que desembocam
na grande mídia
Arenas que desembocam
no grande varejo
Arenas que desembocam
no universo digital
Marketing esportivo, música
popular, cultura e lazer,
sustentabilidade, conteúdo
editorial (ou merchandising),
propaganda tradicional
Novo uso do varejo como
mídia, marketing promocional,
lançamentos/ofertas,
concursos/demonstrações,
propaganda cooperativa
Sites institucionais, redes
sociais, serviços de busca
(Google, Yahoo, Facebook etc.)
Grande mídia
Grande varejo
Universo digital
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arenas da comunicação
uma pesquisa feita entre os principais executivos de
marketing de 40 grandes empresas americanas. Feito
por meio de uma parceria entre a Booz Allen Hamilton e
a Association of National Advertisers (ANA), nos Estados
Unidos, o estudo revela, logo no início, dois fatos importantes: (1) o prazo médio de permanência no cargo dos
executivos principais de marketing vem caindo – agora
é de apenas dois anos –, refletindo o clima de tensão
constante em que vivem esses executivos; e (2) as empresas nas quais o marketing tem uma função estratégica
central, na condução dos negócios, são também as que
apresentam maior índice de crescimento e taxas de
lucratividade mais alta.
Mas o livro diz também que uma das principais mudanças observadas no comportamento das empresas
é a sua filosofia de relacionamento com as agências de
propaganda e com a mídia em geral. Os grandes anunciantes já perceberam que terão de introduzir mudanças
significativas nos esquemas atuais.
Monumentos à sociedade do espetáculo
Quem viajar pela Alemanha não deve deixar de conhecer
o grande porto de Hamburgo, no Mar do Norte. A cidade é
um burburinho de gente de todas as origens, acotovelando-se na avenida Rittermann, um mundo encantado com
oito quilômetros de comprimento, ocupados de ponta a
ponta com choperias, casas noturnas, bares e tudo que
se possa imaginar para nos fazer esquecer da vida. A
Europa de hoje, aliás, está cheia de monumentos como
este e até mesmo entre nós eles já começam a surgir. Na
cidade de São Paulo, por exemplo, há mais de 250 peças
de teatro permanentemente em cartaz e cerca de 80 mil
bares, restaurantes, danceterias, lanchonetes e outros
locais onde o espetáculo continua sem parar. Mas não é
só isso. Pelo Brasil afora, ocorrem espetáculos sobre os
quais mal ouvimos falar, desde rodeios gigantescos até
partidas de hockey na grama e concertos de música de
câmara em igrejas. Aliás, esta é a característica principal
da sociedade do espetáculo: ela se desdobra, adquirindo
mil variações para satisfazer segmentos e nichos determinados, com um impacto e um poder de convicção que
a propaganda tradicional não consegue mais igualar.
Esse é o mundo do espetáculo do qual se originaram as
novas arenas da comunicação com o mercado, como esporte, lazer e cultura. Mas essas arenas incluem também outros
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
É preciso formar verdadeiras
parcerias estratégicas com a mídia,
tornando-a nossa aliada.
Naturalmente, isso é um jogo
para gente grande e afasta
desde o início os pequenos anunciantes
destinos, como o grande varejo, o marketing promocional
e o novo mundo da internet. É evidente que as agências
de propaganda têm necessidade de marcar presença em
todos esses universos da comunicação, pois a abrangência
e a qualidade do atendimento ao cliente dependem fundamentalmente da familiaridade da agência com essas novas
formas de comunicação. No entanto, são raras as agências
capazes de orquestrar e dirigir espetáculos multifacetados
que vão muito além da mídia tradicional.
Se analisarmos as principais arenas que surgiram para
complementar a propaganda, perceberemos que elas
desembocam em três grandes cenários: a grande mídia,
o grande varejo e o novo universo digital (ver quadro na
página 23)
1. A grande mídia
Como se vê na figura 1, é por meio da grande mídia,
principalmente nas grandes redes de TV e rádio, que
muitas arenas da comunicação ganharam repercussão
e atingiram milhões de pessoas. O Peão de Boiadeiro de
Barretos, por exemplo, atinge diretamente cerca de 500
mil pessoas todos os anos. Mas, por meio da cobertura
da TV, esse evento pode atingir facilmente 6 milhões de
pessoas. O mesmo ocorre com os grandes espetáculos
de música pop, os eventos esportivos, a área cultural e
o setor de sustentabilidade, entre outros. Muitas vezes,
comete-se o erro de investir pesadamente no evento
propriamente dito, sem pensar na mídia que o tornará visível, e isso faz cair uma cortina de silêncio sobre o palco.
A conclusão nos parece óbvia: é preciso formar verdadeiras parcerias estratégicas com a mídia, tornando-a
nossa aliada. Naturalmente, isso é um jogo para gente
grande e afasta desde o início os pequenos anunciantes.
No entanto, sendo o mundo do espetáculo tão diversificado, há sempre lugar para os pequenos anunciantes em
nichos determinados com cobertura local.
dan vitoriano
Shopping centers,
supermercados e
grandes redes de lojas
assumiram o papel de
mídia dentro do mix de
comunicação
Usando um pouco de futurologia, podemos mesmo
imaginar que um dia surgirão grandes organizações
combinando o espírito e a estrutura das atuais agências
de propaganda com a versatilidade e o oportunismo dos
empresários de espetáculo e o poder de penetração da
grande mídia eletrônica.
2. O varejo como mídia
Discorreremos agora sobre o papel que o grande varejo
desempenha hoje, como autêntica arena da comunicação
com o mercado, independentemente de seu papel como
canal de vendas. São inúmeros os exemplos de marcas de
produtos de consumo, ou mesmo bens duráveis, que são
relevantes em seus segmentos, mas que nunca fizeram
grandes investimentos em publicidade. Ao contrário,
utilizaram estratégias de “trade marketing” para estabelecer parcerias com as grandes redes de varejo e assim
tornarem-se cada vez mais conhecidas e respeitadas
pelos consumidores.
Não pense que essa convivência entre o varejo e a
indústria seja tranquila. Na verdade, o que existe hoje é
um confronto permanente entre as duas partes, e vence
quem tem mais trunfos. Nos últimos anos, as grandes
redes de supermercados e lojas adquiriram um tamanho
desmesurado, por meio de estratégias de concentração, e
têm hoje um peso específico comparável ao das grandes
empresas que fornecem ao varejo. Por outro lado, os nomes das grandes redes de varejo se transformaram em
verdadeiras marcas, que são cada vez mais respeitadas
e confiáveis. Hoje, o consumidor que compra no Pão de
Açúcar ou na Casas Bahia está implicitamente confiando
no aval de qualidade que esses varejistas transferem aos
produtos que revendem. O grande varejo sabe disso muito
bem, e acredita que deve cobrar a sua parte, impondo
aos fornecedores taxas de vários tipos, como o uso do
espaço da loja, as campanhas cooperativas, os custos
de promoções e demonstrações, a exibição de material
promocional da marca etc. Pode-se mesmo dizer que o
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
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arenas da comunicação
grande varejo concorre hoje, diretamente, com as mídias
tradicionais como destino das verbas publicitárias dos
grandes anunciantes. Essa, aliás, é a razão principal da
relativa estagnação nas verbas da propaganda em mídia
de produtos de grande consumo popular, enquanto crescem as verbas destinadas ao varejo.
Houve também grandes mudanças nas balanças do
poder, no seio das grandes empresas produtoras. Antigamente, nas estruturas de marketing, os gerentes de
produtos ocupavam um lugar privilegiado e a ênfase
era dada aos objetivos estratégicos da marca. Hoje, o
momento da venda é o clímax do marketing e o prato da
balança pende para os gerentes de vendas e de relações
com o varejo, encarregados de executar a política de
“trade marketing”. Os estudiosos dizem mesmo que o
futuro das grandes marcas depende, hoje, de dois fatores
fundamentais: a sua relevância para o consumidor, isto
é, a sua capacidade de manter-se sempre atual; e a sua
relevância para o varejo, ou seja, a sua capacidade de
contribuir decisivamente para a rentabilidade da loja.
A festa do Peão de Boiadeiro de Barretos atinge
diretamente cerca de 500 mil pessoas todos os anos.
Mas, por meio da cobertura da TV, esse evento pode
ser visto por mais de 6 milhões de pessoas
Uma análise serena do que vem ocorrendo na internet
nos permite concluir que está crescendo a sua importância como canal de mão dupla entre os anunciantes e os
internautas. No entanto, curiosamente, enquanto cresce
a importância da internet como fonte de informações
antecipadas para o anunciante, diminui o interesse dos
grandes anunciantes pela inserção de propaganda no veículo. O que ocorreu, recentemente, no lançamento das
ações do Facebook ilustra o que acabamos de afirmar. O
gatilho que detonou a desconfiança em relação ao valor
das ações foi a notícia divulgada, na mesma ocasião,
de que a General Motors havia cancelado uma grande
programação de comerciais no Facebook, pela pobreza
dos resultados obtidos. Trata-se de um velho problema
que ainda suscita muitas dúvidas, e outros estudos
deverão ser feitos para comprovar o verdadeiro valor
da propaganda nos clubes sociais, serviços de busca e
outros nichos da internet.
Inversamente, em palestra proferida no festival de
Cannes, o chief marketing e commercial officer da
Coca-Cola Company, Joseph Tripodi, disse com todas as
letras que a multinacional não dispensa as informações
valiosas sobre as suas marcas que ela obtém nos clubes
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
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3. O novo universo digital
Gerardo Lazzari
O espetáculo sempre fez parte
de nossas vidas, mas hoje há uma
grande diferença: a mídia onipotente
que amplifica tudo e atinge,
instantaneamente, milhões de pessoas.
Um megashow no Morumbi, assistido
por 80 mil pessoas, atinge na verdade
muitos milhões de jovens em todo o país
sociais. Segundo a Coca-Cola, essas informações nos dão
uma espécie de aviso antecipado daquilo que o grosso
do mercado só irá refletir mais tarde.
De qualquer maneira, as agências de propaganda não
devem mais viver fora do mundo digital. Parece simples,
mas na realidade os anunciantes estão recorrendo cada
vez mais às agências especializadas nesse novo veículo,
pois as agências tradicionais não conseguem sequer
entendê-lo, quanto mais atendê-lo!
Rótulos modernos
De certa forma, o leitor poderá concluir que não há nada de
novo sob o sol e que a sociedade pós-moderna seria apenas
mais um rótulo. Afinal, como vimos, angústia, frenesi e
fuga sempre acompanharam o ser humano. O espetáculo
sempre fez parte de nossas vidas, mas hoje há uma grande
diferença: a mídia onipotente que amplifica tudo e atinge,
instantaneamente, milhões de pessoas. Um megashow no
Morumbi, assistido por 80 mil pessoas, atinge na verdade
muitos milhões de jovens em todo o país.
Quando falamos de novas arenas da comunicação,
a mídia é o fator decisivo que explica a repercussão do
que ocorre nelas. Não é por outra razão que o mundo é
hoje dominado por grandes conglomerados que incluem
veículos de massa e empresários de espetáculos.
Para as empresas que adotam as novas arenas em
seu mix de comunicação, isso sugere que é essencial o
relacionamento com a mídia, por canais diretos. Muitas
vezes, as ideias e os temas para novas campanhas surgem desse relacionamento.
Francisco Gracioso
Conselheiro associado da ESPM
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arenas da comunicação
O espetáculo
é a mensagem
No ritmo da comunicação integrada, grandes
anunciantes mostram quem são os maestros e quais
os instrumentos que, atualmente, estão orquestrando
os planos de marketing das empresas
Por Anna Gabriela Araujo
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
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Arenas da comunicação
O
que os GPs de Titanium, Cyber, Direct e
Promo do Festival de Cannes deste ano têm
em comum?
Como em uma orquestra, esses cases fizeram a melodia do marketing fluir no mercado e acabaram
conquistando fãs e seguidores em todo o mundo. Isso porque representam ideias inovadoras e integradas na técnica, que permeiam diversos canais e mídias, além daqueles
que deram a elas o disputado Leão de Ouro. Assim é o case
Small Business Gets An Official Day, produzido pelas agências Crispin Porter (de Boulder) e Digitas (de Nova York),
para a American Express. O mesmo trabalho – que criou
uma data nacional dedicada aos pequenos varejistas do
país, com a aprovação no Congresso – conquistou o grande
prêmio em duas categorias: Direct e Promo & Activation.
Já a Nike levou os GPs de Titanium e Cyber com a ação
Fuelband, que desenvolveu uma pulseira para monitorar
todos os dados da atividade física do usuário, que pode
comparar seus resultados com os de qualquer outra pessoa no mundo. A iniciativa deu origem a uma espécie de
academia virtual, um game que pode ser “praticado” a
qualquer hora e em qualquer lugar.
E o maestro dessas duas sinfonias que brilharam em
A Nike levou o GPs de Titanium e Cyber com
a ação Fuelband, que promoveu a criação de
uma pulseira para monitorar todos os dados
da atividade física do usuário
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
Cannes atende pelo nome de comunicação integrada e
reflete o momento de transformação pelo qual passa a
indústria da comunicação. A partitura desse clássico
começou a ser escrita há cinco anos, com a publicação
do livro Novas Arenas de Comunicação com o Mercado
(Francisco Gracioso, Editora Atlas, 2008). “O filósofo
canadense Marshall MacLuhan dizia que ‘a mídia é a
mensagem’. Hoje, poderíamos dizer que o espetáculo
é a mensagem”, assegura o autor, que presidiu a ESPM
durante 27 anos. “Em resumo, ricos ou pobres, somos
todos pós-modernos. Queremos ter, ser, fazer, pertencer.
Tudo com um único objetivo: esquecer a nossa condição
humana”, detalha Gracioso. “O espetáculo, em todas as
suas formas – megashows, espetáculos esportivos, desfiles de moda, grandes feiras, eventos e o novo universo
digital –, é obra da imaginação e seu objetivo principal é
fazer-nos sonhar e fugir por um momento da realidade
árida que nos cerca.”
Em busca da melodia perfeita
Um exemplo desse movimento é o trabalho desenvolvido
pela agência Ideal, uma empresa de gestão da reputação
que estrutura seus serviços em três pilares: earned media
O filósofo David Hume dizia que só a
arte dá vida à verdade. Logo, do Fuelband
da Nike ao Mapa Cultural dos Suruí, cada
nota que compõe essa grande sinfonia
do marketing é pensada para encantar,
emocionar e entreter o público
ávido por um grande show
(mídia espontânea), owned media (mídia proprietária, feita
por meio de branded content e social media), e paid media
(mídia paga). “Nascemos para atender o Google, que depois de muito procurar, não encontrou nenhuma agência
de comunicação capaz de atendê-los, principalmente no
mundo virtual, onde ele atua com uma série de iniciativas
de comunicação integrada”, revela Eduardo Vieira, sócio
da agência Ideal. Em outras palavras, o que a equipe de
Vieira faz é pensar em ideias criativas e trabalhar para
difundi-las em diversos canais, sem atrelá-las à mídia
paga. “No Brasil, o anunciante demorou a perceber que
poderia falar com o consumidor final sem intermediários,
por meio das redes sociais, numa espécie de diálogo virtual”, observa o jornalista, que deixou a redação de grandes
veículos de comunicação, em 2007, para abrir seu próprio
negócio. “Trabalhamos com três tipos de mídia – espontânea, proprietária e paga –, que conversam em todos os
meios de comunicação e não apresentam fórmulas definidas para a construção da reputação das marcas.”
Nesse novo cenário, a única certeza que se tem é que, se
o conteúdo for relevante, ele se enquadra em qualquer mídia. Como exemplo, ele cita o case da American Express,
que levou dois GPs em Cannes. “A iniciativa quase ficou
também com o Grande Prêmio de PR (Public Relations),
por conta de um trabalho de relações públicas que foi considerado a cereja do bolo dessa ação”, detalha Vieira. Ao
criar o dia do pequeno varejista, a agênia de PR da Amex
vendeu a pauta para várias emissoras de TV, conciliando
a data com a agenda do presidente Barack Obama. No dia,
ele foi a um desses estabelecimentos e comprou algumas
coisas para prestigiar o pequeno varejo. Tudo registrado
pelas equipes de reportagem dos principais veículos de
comunicação dos Estados Unidos. “A notícia se espalhou
pelas redes sociais, o filme do Obama fazendo compras
foi um dos mais acessados do YouTube e, naquele sábado, foi registrado um aumento de 30% nas vendas dos
Eduardo Vieira, da Agência Ideal: ”O conteúdo de marca é algo
que engaja e que, uma vez alimentado na rede social, consegue
fazer de tudo, inclusive vender produtos e serviços”
pequenos e médios estabelecimentos. Com essa ação
de comunicação integrada, a Amex quase que triplicou
a presença da marca no pequeno varejo.”
Outro exemplo semelhante foi desenvolvido pela Agência Ideal para o Google. “Por meio de uma parceria com a
tribo Suruí, de Rondônia, profissionais do Google deram
smartphones para os índios da região e os ensinaram a
utilizar o aparelho e as ferramentas do buscador – como
Picasa, Google Docs, YouTube e Google Earth – para monitorar o desmate na terra indígena ou ainda catalogar
espécies e animais”, lembra o sócio da Agência Ideal, que
ajudou a construir esse projeto. “Em paralelo, convidamos
quatro emissoras de TV – CNN, BBC, Reuters TV e TV Globo – para passar uma semana na tribo Suruí, conferindo
o trabalho que estava sendo feito. A partir daí, inúmeras
notícias foram geradas no mundo inteiro”, assegura Vieira.
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Arenas da comunicação
“Tivemos um retorno absurdo com essa iniciativa, que
impactou 200 milhões de pessoas.” E a ação, que teve
início em 2008, continua rendendo pautas até hoje. Na
conferência Rio+20, por exemplo, a tribo da Amazônia
lançou o Mapa Cultural dos Suruí no Google Earth. Já o
Google fez o curta Trocando Arcos e Flechas por Laptops:
Carbono e Cultura, para contar a história do projeto.
Desenvolvendo projetos como esse, a agência já conta
com 150 profissionais e uma carteira de 60 clientes, como
Nike, McDonald’s, Grupo Fiat, Gatorade, GE, Nextel e
Grupo Pão de Açúcar. “O conteúdo de marca é algo que
engaja e que, uma vez alimentado na rede social, consegue fazer de tudo, inclusive vender produtos e serviços”,
observa Vieira, que para atender a essa demanda está
montando, na agência, um departamento de publicidade
especializado na criação de anúncios em redes sociais.
“Nós nos posicionamos como consultores de comunicação, capazes de resolver o problema do cliente usando
um mix de ferramentas ou apenas parte dele.”
Palco das artes
Há quase 300 anos, o filósofo inglês David Hume já dizia
que só a arte dá vida à verdade. Logo, do Fuelband da Nike ao
Mapa Cultural dos Suruí, cada nota que compõe essa grande
sinfonia do marketing é pensada para encantar, emocionar
e entreter o público ávido por um grande show.
E para avaliar qual o impacto dessas novas arenas no
segmento publicitário, a Revista da ESPM foi a campo
colher a opinião de diretores e gerentes de marketing de
grandes anunciantes brasileiros. Em comum, há o fato
de todos terem participado do Festival de Cannes 2012.
Este foi o terceiro ano de Marcos Swarowsky, diretor de
publicidade e on-line da Microsoft Brasil, no Festival de
Cannes. Patrocinadora do evento há 15 anos, a empresa de
tecnologia utiliza o festival para exercitar a comunicação
integrada. Lá, em plena Riviera Francesa, a companhia
aproveita para estreitar relacionamentos, lançar produtos
e mostrar para publicitários e anunciantes novas possibilidades de uso das arenas da comunicação a partir das fer-
Campanha Small Business Gets An Official Day, da American Express, foi GP em duas categorias: Direct e Promo & Activation
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
ramentas desenvolvidas pela marca. Um dos lançamentos
apresentados no Palais des Festivals foi o Surface, o tablet
criado para competir com o iPad, da Apple, que chega ao mercado no fim do ano. “A grande novidade foi o anúncio de uma
parceria entre a Microsoft e a 9ine focada na Copa do Mundo
de 2014.” A ideia é desenvolver projetos personalizados para
os anunciantes que adquirirem cotas de patrocínio. “Vamos
utilizar nossos devices – como o MSN e o Skype – e trabalhar
todos os nossos canais para que os consumidores vivenciem
novas experiências. Já a 9ine entra como uma consultoria
para viabilizar essas iniciativas.”
Segundo ele, não se trata de criar um novo produto, e sim
oferecer novas plataformas de comunicação. “Teremos,
no máximo, dez parceiros, porque não estamos falando
da venda de um pacote de mídia, mas de algo muito mais
customizado, de acordo com a necessidade de cada cliente.
É uma espécie de crossdevice, que permitirá à pessoa permanecer o tempo todo conectada na Copa do Mundo, 24 horas
por dia, onde quer que ela esteja, seja utilizando o MSN no
computador ou jogando no Xbox.”
Ao assegurar que os anunciantes estão investindo cada
vez mais no meio digital, Swarowsky afirma que o investimento médio das empresas brasileiras neste canal já é de
15%. “O futuro do marketing passa, necessariamente, pela
internet, que com a proliferação de aplicativos começa a
registrar o aumento das microaudiências destinadas a públicos muito específicos, e isso ficou muito claro em vários
seminários e palestras de Cannes.”
Carla Ramos, diretora de comunicação da Leroy Merlin: ”Voltei
de Cannes querendo inovação, que já poderá ser vista em
nossa próxima campanha”
Marketing orquestrado
Já Carla Ramos, diretora de comunicação da Leroy Merlin,
voltou do sul da França encantada com o GP da Nike e o
Sprite Shower – ação promocional criada pela Ogilvy Brasil para a Coca-Cola, que conquistou um Leão de Ouro no
Festival de Cannes ao transformar um chuveiro de praia
em uma máquina de refrigerantes gigante. Outra ação da
Coca-Cola que chamou a atenção da executiva foi o Refil
da Felicidade, um equipamento que foi instalado em um
quiosque na praia de Copacabana, no Rio de Janeiro, que
carrega o aparelho celular com créditos da operadora Oi
para navegar na internet banda larga. “Estamos discutindo
esses dois cases internamente, porque eu quero fazer uma
ação dessas para os consumidores da Leroy.”
Maior anunciante do setor de material de construção, a
marca hoje investe 50% da verba de marketing em campanhas de varejo na mídia de massa e outros 50% em ações
Ação criada pela Ogilvy Brasil conquista Leão de Ouro em
Cannes ao transformar um chuveiro de praia em uma
máquina de refrigerantes gigante
no ponto de venda, promoção, marketing direto, endomarketing e na produção de seu tabloide, que tem tiragem
de 1,5 milhão de exemplares por edição. “Voltei de Cannes
querendo inovação, que já poderá ser vista em nossa próxima campanha, que estreia no próximo dia 5 de setembro.”
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
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Arenas da comunicação
Mais do que cases premiados, o que levou Gustavo
Diament, vice-presidente de marketing da Nextel, a
Cannes, foi o conteúdo relevante dos inúmeros seminários apresentados durante o evento. “É uma semana de
provocações intensas. Mas, como disse Joseph Tripodi,
VP executivo e Chief Marketing & Commercial Officer da
The Coca-Cola Company, em sua palestra: ‘Se você não
gosta de mudança, vai gostar de irrelevância!’.”
Pensando nisso, Diament está promovendo uma
verdadeira revolução no departamento de marketing da
Nextel. “Subimos mais um degrau no estágio de evolução
da comunicação integrada. Hoje, estamos colocando
nossas seis agências – Loducca, Ideal, Casa, One Digital,
Sunset e Riot – juntas, para criar. Não existe mais o papel
do dono da ideia, e sim um grande centro de criação.”
Para isso acontecer de maneira sinérgica, a empresa acabou de fundir suas áreas de comunicação digital e off-line.
“Antes, tínhamos duas gerências separadas. Agora, todos
trabalham de maneira integrada com uma liderança só”,
Maria Gadu ajuda a Nextel trabalhar o conceito de redes no
meio digital em anúncio da marca
afirma o executivo. “Com isso, passamos a arriscar mais,
como na campanha da Maria Gadu, que foi toda produzida
a partir do conceito de criação de redes no meio digital.”
De acordo com Diament, a integração da rede da artista
com outros cantores que tinham fãs no YouTube gerou para
o filme publicitário nove milhões de videoviews em oito
semanas de veiculação na internet. “Isso mantém a saúde
de nossa marca, o que acaba gerando negócios, já que no
Brasil 40% do valor da Nextel vem da marca, ante 15% das
demais empresas de telefonia.” Ele explica que a reputação
corporativa é um dos pilares da empresa, que não tem em
seu portfólio aparelhos de última geração, como o iPhone.
“Ainda assim, temos quatro milhões de clientes no país e
um crescimento médio de 25% ao ano.”
Faça seu pedido
Gustavo Diament, VP de marketing da Nextel: ”Subimos mais
um degrau no estágio de evolução da comunicação integrada.
Colocamos nossas seis agências juntas para criar”
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
Integrar é também o desafio da Sony, que atua em 11 categorias de produtos e possui consumidores nas classes A, B
e C. “Por isso é que, recentemente, a empresa reestruturou
o departamento de marketing e comunicação, no qual os
gerentes de marketing de produtos são responsáveis pelos
“Ps” de produto, preço e praça. Já a gerência de comunicação
passa a responder por toda a estratégia de propaganda e
promoção, incluindo o trabalho de relações públicas”, detalha Luciano Bottura, gerente de marketing e comunicação
da Sony. “Dessa forma, a mensagem não se perde entre as
categorias, mantendo assim a comunicação integrada entre
todos os pontos de contato do consumidor.”
Ele também participou do Festival de Cannes e garante
que o mercado agora só quer saber do famoso ROI (resultado
sobre o investimento). “A criatividade está sendo deixada
Joseph Tripodi, VP executivo e Chief Marketing & Commercial
Officer da The Coca-Cola Company apresentou um dos
seminários mais comentados do Festival de Cannes 2012
Luciano Bottura, gerente de marketing e comunicação da
Sony: ”Em Cannes, os quatro ‘Ps’ do Kotler viraram: Purpose
(propósito), Presence (presença), Proximity (proximidade) e
Partnership (parceria).”
de lado. A qualidade do material e como o consumidor
entende a mensagem também não importam mais em
alguns casos. Com a chegada da internet e a possibilidade
de mensuração de dados de uma maneira mais precisa (por
minutos, mapeamento de Cookies, remarketing etc.), só
está se falando de números.”
Para Bottura, o destaque deste ano foi a palestra de Kimberley Kadlec, vice-presidente de marketing da Johnson &
Johnson, que retratou o novo panorama do marketing com
Como disse Joseph Tripodi, VP executivo
e Chief Marketing & Commercial Officer
da The Coca-Cola Company, em sua
palestra: ‘Se você não gosta de mudança,
vai gostar de irrelevância!’
a inclusão do meio digital. “Para explicar as mudanças que
vêm ocorrendo no mundo do marketing, ela rebatizou os
quatro ‘Ps’ de Philip Kotler para os quatro ‘Ps’ da comunicação: Purpose (propósito), Presence (presença), Proximity
(proximidade) e Partnership (parceria).”
Essa parece ser a receita utilizada por Roberto Gnypek,
diretor de planejamento e marketing da Arcos Dourados,
empresa que opera a marca McDonald’s no Brasil. “Recentemente, realizamos o ‘Viver o Espírito Olímpico’, um concurso cultural que levou cinco crianças de 9 a 14 anos para
assistirem aos Jogos Olímpicos em Londres e atuarem como
correspondentes mirins inserindo textos, fotos e vídeos em
um blog no site do McDonald’s.” O concurso foi divulgado por
meio de ações integradas envolvendo TV, internet, relações
públicas e redes sociais “Todo esse esforço serviu para ampliar a associação da marca com os Jogos Olímpicos.”
Ressaltando o recorde de leões conquistados pelo Brasil ,
que teve 79 cases premiados em Cannes, Gnypek revela que,
no plano de marketing da rede de restaurantes, a comunicação
integrada nunca é mais importante que o objetivo a ser atingido. “Em alguns casos, não é necessário usá-la. Às vezes, uma
ação isolada com um conteúdo relevante é mais eficaz. Agora,
qualidade e posicionamento estratégico são dois ingredientes
que não podem faltar.”
E pensar que esse espetáculo das novas arenas da comunicação está apenas começando!
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
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mobile marketing
Mobile não
é tecnologia, é
comportamento
Uma verdadeira revolução digital está em curso. No próximo ano
serão vendidos mais de 1,1 milhão de smartphones. Quem ainda
não acredita na revolução da mobilidade vive em outro planeta!
H
oje vivemos uma verdadeira revolução, não tecnológica, mas de
comportamento. A forma como
interagimos uns com os outros,
a maneira como consumimos conteúdo, tudo
isso mudou radicalmente. O nosso comportamento agora é mobile.Portanto, chegamos à
óbvia conclusão de que as marcas que querem
se comunicar com seus consumidores também
precisam mudar e rápido.
Desta vez, não há mais tempo de ter medo e
insegurança. A revolução mobile é para ontem.
Quanto mais as marcas demorarem para compreender este caminho sem volta, mais elas perderão
excelentes oportunidades.
Nem sequer a realidade digital, na qual fomos
todos inseridos com a chegada da internet,
há 15 anos, foi verdadeiramente absorvida e
inserida no contexto da propaganda. A chegada
das mídias sociais fez com que as marcas se
animassem com os canais digitais e passassem
a acreditar nelas. A maioria já mantém presença
nas redes, por meio de perfis corporativos e posts
frequentes.
Porém, acredite, nem mesmo as mídias sociais são corretamente utilizadas pelas marcas.
Dados de uma pesquisa realizada recentemente
e publicada no dia 15 de junho passado, pelo Emarketer, mostram o quanto elas ainda precisam
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
enxergar melhor o comportamento do mercado
consumidor.
Não me canso de bater na tecla da palavra
“revolução”, porque é isso que estamos vivendo. Sabemos com absoluta certeza que todo
consumidor é mobile. As pesquisas mostram
números impressionantes. Há, por exemplo,
mais celulares no mundo do que escovas de
dentes. As vendas de smartphones não param
de crescer e as vendas de tablets aumentam
de forma exponencial. Pesquisas do IDC
apontam que em 2013 serão comprados mais
de 1,1 milhão desses equipamentos. Quem
ainda não acredita na revolução mobile vive
em outro planeta.
Quer a prova disso? Vamos fazer um exercício
de reflexão. Pare e pense em como começa o seu
dia, a partir do momento em que acorda. Primeiro,
você desperta com o alarme do celular, checa a
agenda, estuda a previsão do tempo, olha e-mails
e mensagens. Tudo antes de se levantar. Isso sem
falar nas inúmeras vezes em que você utiliza seu
celular ou tablet para curtir comentários de amigos nas redes sociais, responder a e-mails e fazer
check-in em seus lugares favoritos. Sem desprezar
as mensagens via SMS que você troca por dia com
amigos, familiares e colegas de trabalho.
Mais uma vez concluímos que nos encontramos diante de uma grande mudança de comporta-
shutterstock
Por Marcio Chaer
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
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mobile marketing
Algumas das campanhas premiadas em Cannes, na nova categoria Mobile Lions: MicroLoan Foundation ”Pennies for life”; Pain
Squad e Coca-cola. O Brasil ganhou um leão, com o case ”Anúncio Falso”, criado pela AlmapBBDO para o Bradesco Seguros
mento da sociedade, que deve gerar alterações significativas
na forma de as marcas se comunicarem. É preciso compreender rapidamente este novo comportamento e inserir o mobile
na estratégia de comunicação e no marketing mix de grandes
marcas e agências.
Muitos profissionais do marketing ainda confundem o
comportamento mobile com tecnologia e tateiam o mercado
com ações digitais ineficazes. Mobile não é tecnologia! Ela
é apenas o enabler, a ferramenta por meio da qual se viabilizam campanhas mobile.
Portanto, por incrível que possa parecer, neste exato momento em que vivemos a maior revolução de comportamento
e interatividade, o consumidor não está apenas à frente das
marcas. Ele já está “anos-luz” à frente delas. O mobile ainda
nem sequer faz parte do “marketing mix” das marcas e, muito
menos, do planejamento de mídia das agências.
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
Evolução do meio
Há pouco tempo, era muito difícil ser ouvido. Hoje, as marcas
estão mais receptivas, buscam nosso conhecimento, querem
nos ouvir. As agências começam a sentir a pressão de clientes
e também passaram a buscar conhecer mais sobre mobile.
Prova disso é que mobile se tornou uma categoria separada no Festival de Cannes, o maior evento de premiação da
indústria publicitária do mundo, com vários cases inscritos.
Muitos deles conseguiram captar a essência do que é fazer
mobile marketing, que nada mais é do que contar uma boa
história dentro dessa nova evolução que vivemos.
Alguns dos cases ganhadores em Cannes são inspiradores,
revolucionários e até geniais. Um SMS transformando a vida
de mulheres na África é um exemplo do quanto o mobile pode
gerar engajamento. Uma campanha londrina – Leão de Ouro
na categoria – mostrou justamente que não há limites para
Em 2013, serão comprados mais de
1,1 milhão de smartphones e tablets.
Mesmo com essa previsão otimista, os
anunciantes ainda não sabem explorar
todos os benefícios do meio
a criatividade e que a tecnologia de hoje é apenas mais um
enabler para grandes ações transformadoras.
Um outdoor digital em um shopping center de Londres
mostrava imagens inacabadas de mulheres feitas de
pennies (moedas de um centavo). Ao enviar um SMS com
a palavra “CHANGE” (que, além de “mudança”, significa
“troco” em inglês), as pessoas doavam pequenas quantias para a entidade anunciante e, imediatamente, em
tempo real, essa doação ajudava a completar a imagem
do outdoor e, claro, direcionava a doação para pequenas
empreendedoras africanas que precisavam de ajuda para
começar o seu negócio.
Enquanto isso, alguns iPhones e um simples aplicativo foram suficientes para tornar mais eficaz o tratamento do câncer infantil em um hospital canadense. Os próprios pacientes
preenchiam quando e onde sentiam mais dor, tornando-se
pequenos oficiais do chamado “Pain Squad” (Esquadrão da
Dor), e contribuindo para melhorar o seu próprio tratamento.
E se pudéssemos delatar e expor motoristas mal-educados
por meio do celular, como possibilitou a genial campanha de
um jornal na Rússia?
Tivemos um case brasileiro que ganhou ouro por uma
publicidade genial, criada pela AlmapBBDO para o Bradesco
Seguros. A campanha foi vencedora na categoria tablets.
Esses exemplos de real transformação social comprovam e disseminam o verdadeiro sentido do mobile
marketing que estamos discutindo aqui: o engajamento.
Vendo tudo isso, percebemos o quanto já passou da hora
de agências e marcas perceberem que mobile não é tecnologia, é criatividade, sempre! A forma como contamos
uma boa história tem de ser diferente e adequada a esse
novo comportamento mobile.
Mas não se engane: nem só de tablets e smartphones vive
o mobile marketing, que também está presente em ferramentas mais simples, como o SMS – basta ver a campanha londrina mencionada acima. Não precisa ser só tecnologia high end
para usuários high end. Afinal, nem sempre a infraestrutura
e a qualidade da rede permitirão que a sua criação seja viável
para todos, o que pode afetar, drasticamente, seus resultados.
Isso no Brasil ainda é um dilema – veja que recentemente
tivemos a proibição da Anatel sobre a venda de chips por
várias operadoras. Nossa rede ainda precisa evoluir muito.
Mas o fato é que não importa o meio escolhido para a
criação de uma campanha mobile. Quando bem elaborada
e inserida em uma concreta estratégia, ela pode ser transformadora, envolvente, e atingir o objetivo máximo de uma boa
comunicação: o engajamento do consumidor.
O “x” da questão, por enquanto, permanece sendo o reduzido conhecimento das marcas sobre como montar uma
estratégia mobile. Afinal, criar aplicativos ou desenvolver
sites móveis sem uma estratégia é apenas um canal. Para encurtarmos o caminho entre o comportamento do atual consumidor e o conhecimento das marcas, é preciso educá-las.
O mercado mobile só vai deslanchar quando esse gap
se fechar. Isso pode acontecer de três maneiras: educação,
informação e privacidade. Estes três pilares são as bases da
estratégia da MMA.
Educamos as marcas por meio de treinamentos, como
já fizemos com a Coca-Cola no Brasil e em toda a América
Latina, falando para seus times de marketing.
Provemos informações por intermédio de pesquisas que
fazemos em parceria com os nossos membros. Recentemente, tivemos uma pesquisa do Yahoo Insights sobre o mobile
aqui no Brasil, que levantou valiosos dados.
Na questão da privacidade, estamos trabalhando de forma
global para criar regras e melhores práticas para proteger os
dados dos usuários. De forma mais local, estamos atuando
junto com as operadoras, para definirmos melhores práticas
quanto à publicidade móvel aqui no Brasil.
A mobilidade é uma realidade inegável e será determinante para o sucesso da comunicação de marcas. Conforme os
profissionais absorverem essa verdade, teremos um rápido
crescimento na adoção da mobilidade como recurso estratégico e aumento de investimentos em publicidade móvel.
Mobilidade e engajamento são as palavras-chave para se
comunicar com os consumidores e clientes. Nossa missão é
ajudar marcas e agências a entender como se comunicar e
engajar com seu consumidor.
Queremos as empresas brasileiras usufruindo da mobilidade. Os resultados serão indiscutíveis.
Marcio Chaer
Diretor da Mobile Marketing Association - MMA Latam
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sanzio mello
entrevista
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
João Ciaco
F
Engenharia de
marcas é a sua
especialidade
ormado em engenharia e administração de empresas, com
pós-graduação em marketing pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS), João Ciaco atua nas “arenas da comunicação” desde a década de 1980. Fez carreira nos departamentos de
marketing e vendas da Unilever durante oito anos, deixando a empresa em
1995 para assumir a diretoria de marketing da Kodak. Seis anos depois, decidiu dar uma acelerada em sua trajetória ao assumir o desafio de implantar o
projeto de Customer Relationship Management (CRM) na Fiat.
Para tanto, o executivo precisou desenvolver estratégias de internet e interatividade com muitas ações de marketing de relacionamento, programas de
fidelidade e até cartões de crédito co-branded. Não demorou para Ciaco passar
a responder também pelas áreas de comunicação publicitária e mercadológica
da montadora, além do planejamento estratégico e branding da marca que, há
dez anos, lidera a indústria automobilística brasileira.
No posto de diretor de publicidade e marketing de relacionamento da Fiat
Automóveis para o Brasil e América Latina, Ciaco se transformou em um dos
grandes protagonistas da moderna comunicação integrada. O carro conceito
Fiat Mio – que foi todo desenvolvido na internet – e o lançamento do Palio na
plataforma Xbox são dois dos inúmeros cases que este engenheiro de marcas
coleciona em seu currículo.
Nesta entrevista, ele retrata o abismo que há entre a teoria e a prática da
comunicação integrada e apresenta alguns caminhos que deverão ser trilhados pelo marketing nos próximos anos.
Entrevistado por Francisco Gracioso e Anna Gabriela Araujo
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entrevista
Gracioso – Comunicação integrada
não é um tema novo. Há 50 anos,
quando lecionava planejamento e
redação de propaganda, já falávamos
da necessidade de integrar os vários
veículos por meio dos objetivos coincidentes. O que hoje o mercado chama
de comunicação integrada é a tendência cada vez maior de ultrapassar a
mídia tradicional e acrescentar ao mix
da comunicação a chamada mídia
alternativa, que de alternativa nada
tem. É o esporte, a música popular,
a cultura, o lazer, o mundo digital, o
próprio varejo. Você concorda com
essa definição?
Ciaco – Concordo plenamente e
acrescento à ela um ponto essencial, que é a saída da comunicação de massa para a comunicação
dirigida. Isso dá à integração da
comunicação outro viés que precisa ser considerado. Quando se
olhava a intenção de falar com o
maior número possível de pessoas
em uma mesma direção, tínhamos,
basicamente, um conteúdo, uma
mensagem que deveria ser replicada
no maior número de meios disponíveis para o maior target possível. Na
comunicação de massa usávamos
uma mesma mensagem para a campanha institucional, a promoção
do produto, as ações no varejo, o
patrocínio... Tínhamos uma direção
só, cujo objetivo era comunicar uma
intenção. Integrar nesse contexto
era fazer a famosa comunicação em
360º. Nos anos 1990, passamos a
falar em comunicação dirigida, com
o marketing one-to-one e a internet
funcionando como mídia dirigida.
Nesse momento, começamos a entender os diferentes estágios que
se estabelecem na relação do con-
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
sumidor com as marcas, em vários
meios. A marca passou a se apresentar de forma diferente para o consumidor, em cada uma das mídias
utilizadas, e a integração se tornou
mais do que necessária. Deixamos
a intenção de lado e passamos a
“O exercício mais
difícil do profissional
de marketing é saber
dosar quanto de risco
ele está disposto a
correr diante dos
benefícios que a ação
poderá gerar”
ter uma necessidade absoluta de
integrar para dar sentido à marca.
Estamos caminhando para a personalização da comunicação, com
mais mensagens e vozes dentro da
mesma marca.
Gabi – Há dez anos, a Fiat é líder da
indústria automobilística no Brasil.
Como o marketing e, especificamente,
a comunicação integrada contribuíram para esta liderança?
Grac ioso – Eu agregaria a essa
pergunta uma lembrança. O melhor
exemplo de comunicação integrada,
no sentido da capacidade de “surfar” a notícia, foi dado pela Fiat, no
começo do governo Collor, quando
Gianni Anhelli – presidente da Fiat,
na ocasião – convenceu o presidente
Collor de que o carro abaixo de mil cilindradas era a melhor solução para
o Brasil. A partir daí, Collor abriu o
mercado para a entrada desse modelo, e a Fiat foi a primeira a aproveitar
essa oportunidade. Isto é um exemplo
de como é possível extravasar a co-
municação tradicional e alargá-la de
mil maneiras.
Ciaco – Sua lembrança é muito pertinente. Essa é a amplitude da comunicação integrada. Retomando essa
história, foi a própria Fiat que, na
época do ágio forte, instituiu uma
forma diferente de comunicação,
criando o Mille on-line (sistema
que permitia ao consumidor fazer
a reserva do carro desejado com o
pagamento de um sinal; a quitação
ocorria na entrega do veículo). Esse
canal colocou o cliente final em
contato direto com a montadora no
início dos anos de 1990. Como foi
antes do surgimento da internet,
tudo era feito via fax. Essa é a forma
de pensar em comunicação integrada, considerando a distribuição,
o potencial industrial e as novas
oportunidades, como o motor 1.0,
que transformou o mercado brasileiro. Construímos grande parte
da nossa história por meio de um
modelo único e uma marca baseada num portfólio restrito. Quando
abrimos esse portfólio, o desafio foi
construir uma marca única associada aos diversos discursos de nossos
produtos. Integrar sempre foi muito
importante para a Fiat.
Gabi – Para isso, você precisa estabelecer um certo alinhamento dos fornecedores. Mas, analisando os cases de
mercado, este relacionamento entre
agência e anunciante nem sempre
acontece da forma desejada. Este foi
um dos motivos que o levaram a criar
a Agência Fiat?
Ciaco – Vai nessa direção, sim. No
processo de integração, decidimos
trabalhar com as melhores empre-
João Ciaco
Em parceria com a Microsoft, a Fiat lançou o novo Palio usando a plataforma Xbox como canal de mídia
sas de cada área. Tentamos construir um arsenal de fornecedores
que pudesse nos ajudar a atingir
a excelência em marketing. Com
a criação da Agência Fiat, trouxemos a responsabilidade de integrar
para dentro de casa, e ficamos responsáveis por fazer a costura, o
alinhavo de cada trabalho. Em um
ano de agência, o modelo evoluiu.
No início, juntávamos todos os
fornecedores para desenvolver um
único briefing criativo, a partir de
um determinado posicionamento
estratégico. A integração de todas as
ações de marketing direto, comunicação de massa, internet e ponto de
venda acontecia depois da criação
de cada trabalho. Com o passar do
tempo, observamos que tínhamos
unidades estanques: a comunicação
de massa ficava concentrada apenas
em TV, jornais, revistas e rádio; a
comunicação on-line se passava ex-
clusivamente na internet; a ação de
CRM era, basicamente, voltada para
o marketing direto; e a estratégia
de ativação acontecia somente no
ponto de venda. De certa maneira,
todos os nossos fornecedores acabavam entregando a mesma coisa em
“Trouxemos a
responsabilidade de
integrar para dentro
de casa e ficamos
responsáveis por fazer
a costura, o alinhavo
de cada trabalho”
diferentes canais. Mas integrar tudo
isso depois de pronto era muito difícil. Aí surgiu a ideia da Agência Fiat.
Gracioso – Isso deve ter facilitado a
coordenação, também.
Ciaco – Muito. Perdíamos um tempo
resolvendo conflitos entre as agências fornecedoras, porque tínhamos
várias pessoas trabalhando com o
mesmo assunto. E o resultado não
era satisfatório. Com a Agência Fiat,
em vez de integrar a execução, passamos a integrar o planejamento,
pensando em formas de construir
conteúdos que pudessem ser trabalhados em várias mídias, canais e
especialidades. As ideias já nascem
integradas. Para isso, criamos um
Comitê de Planejamento Integrado,
com pensadores de nossas duas
principais agências (AgênciaClick
e Leo Burnett Tailor Made). Agora
estamos trazendo mais agências
para o processo de criação, no qual
as áreas de planejamento se reúnem
para discutir a solução criativa de
determinado problema. Depois, a
execução é dividida de acordo com a
especialidade de cada agência.
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
43
entrevista
Em 2009, a Fiat apresentou o Punto T-Jet por meio do jogo online T-Racer, que permitia fazer um test-drive virtual
Gracioso – Quando um grande anunciante, como a Fiat, entra na área da
comunicação integrada multifacetada, a tendência é parte da verba que
cabe à mídia tradicional cair ou permanecer estável?
Ciaco – Tende a cair, e está caindo,
com certeza. Mas a mídia tradicional continua sendo fundamental.
O sucesso de uma ação on-line depende do sucesso da ação off-line.
Se eu não criar buzz, se não gerar
um grande movimento que faça com
que as pessoas naveguem de maneira interessante na internet, não consigo ter um pleno resultado da ação
on-line. Em um país tão grande e
diferente como o Brasil, não dá para
prescindir da mídia de massa. Ela
continua sendo fundamental, mas
sua importância diminuiu. Temos
um investimento menor em mídia
de massa, mas os veículos de TV,
44
Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
rádio e mídia impressa continuam
sendo fundamentais para a divulgação de qualquer campanha.
Gracioso – Até porque essas atividades,
que chamamos de arenas da comunicação, só ganham vida na própria mídia.
Ciaco – Sem dúvida. Esses arranjos entre on-line e off-line, mídia
segmentada e de massa, ta rget
reduzido e ampliado são conversas
que precisamos ter para entender
como integrar as mídias. O que
estamos analisando hoje é que não
é mais possível estruturar produto,
comunicação e ação só pensando
em um único target. Em outras
palavras, talvez seja mais eficiente
você conhecer esse segmento e não
se comunicar diretamente com
ele, mas com um outro público que
seja mais relevante que a voz da
empresa.
Gabi – Como este pensamento se aplica?
Ciaco – Fizemos isso no lançamento do Punto T-Jet, um carro pequeno, que tem o perfil do pai, mas
não é um automóvel para a família.
Portanto, está posicionado para
ser o segundo veículo da casa. Em
uma campanha tradicional, buscaríamos entender quem é este pai e
quais as mídias mais efetivas. Por
fim, faríamos uma comunicação
dirigida a ele. Por meio do trabalho
integrado, entendemos que a forma
mais efetiva de comunicação era
falar com o pai por meio do filho.
Dentro de casa, esse filho seria
capaz de construir a imagem do
novo carro melhor do que nós. Então, optamos por fazer um game e
ações dirigidas no universo on-line.
Só depois fomos para a mídia de
massa legitimar os comentários
que já estavam acontecendo dentro
João Ciaco
da casa do nosso target. Mas ainda
estamos engatinhando nesta nova
forma de estruturar a comunicação. No dia a dia acabamos testando uma série de modelos, e isso é
o que vai fazer a comunicação ser
mais efetiva daqui para frente.
Gabi – Você foi um dos jurados do
Festival de Cannes deste ano, na
categoria Creative Effectiveness.
Que tipo de avaliação você faz do
evento, principalmente do resultado
da categoria Titanium Lion?
Ciaco – A Categoria Titanium mostra
todas estas questões que estamos
discutindo, mas com cases distantes da realidade brasileira, porque
representam grandes investimentos.
Ainda temos de construir um Titanium com a cara do Brasil. Temos
uma questão muito característica
no mercado nacional, que é a grande
penetração da televisão aberta, presente em quase 100% dos lares brasileiros. Isso faz com que o anunciante
tenha uma certa homogeneidade na
mensagem de massa, o que não ocorre em outros países. Não vejo Cannes
como um festival de tendências. Lá
não se veem grandes novidades, nem
mesmo nos seminários. Tudo o que
é reunido no Palais des Festivals já
foi visto em alguma parte do mundo.
Esse evento funciona como uma
espécie de revisão geral do que está
acontecendo no marketing.
Gabi – Voltando à questão do investimento, na Fiat, como está dividida a
verba que vai para a mídia de massa
e às demais arenas de comunicação?
Ciaco – Hoje, a internet representa 20%
do nosso investimento. Depois, temos
os desdobramentos que acontecem
no on-line, como o próprio CRM e os
clubes de relacionamento, que não
estão incluídos neste percentual. Asseguro que 60% de nossa mídia ainda é
de massa e este número não irá mudar
muito, nos próximos anos. Outros 20%
acabam indo para o marketing digital
e os 20% restantes são as ações de
ponto de venda, patrocínio, ativação,
promoção e outras atividades.
Gracioso – Hoje, o anunciante tem
inúmeras formas de se comunicar por
meio de mensagens, que muitas vezes
não são assinadas pela marca e que,
para o consumidor desprevenido, aparecem como sendo endossadas pelo
veículo que as transmite. O merchandising numa novela é um exemplo
clássico. Essa prática não levanta uma
série de problemas éticos e até legais?
“Hoje, o que estamos
vendo é uma inversão
dessa equação, porque o
meio pode não ser mais
a mensagem. Talvez,
a mensagem é que
irá definir o meio
daqui em diante”
Ciaco – Este é um dos principais
pontos considerados na gestão de
mídia. Não temos grandes respostas. Todos os nossos modelos, bancos de dados e indicadores de performance são baseados na mídia
paga, isso é o que sempre soubemos
fazer. A própria definição de propaganda passa por este modelo, já que
o anunciante paga pelo espaço para
poder dizer o que quiser e assina o
que está dizendo. O fato é que já não
dá para considerar a mídia somente
numa dimensão. Hoje falamos de
três dimensões: mídia paga, mídia proprietária e mídia adquirida.
A primeira é muito conhecida. Já
como exemplo da segunda mídia,
temos o site da Fiat, que recebe mais
de quatro milhões de visitantes
únicos por mês, o ponto de venda,
além do próprio carro. E tem ainda
uma terceira dimensão, em que começamos a trabalhar com as redes
sociais. Essa mídia adquirida acontece a partir das duas primeiras e
representa todos os movimentos ao
redor da marca que não são gerados
pela própria empresa. É o que se fala
da marca nas redes sociais.
Gabi – Um exemplo é o Fiat Mio, o
primeiro carro colaborativo desenvolvido no Brasil com base em uma
plataforma aberta na web.
Ciaco – Sim. Não teve mídia paga,
toda criação do carro aconteceu
inteiramente nas redes sociais, a
partir do movimento dessa mídia
adquirida e que não é a paga, se
originou uma mídia proprietária,
o próprio carro. Apenas na última
fase do projeto fomos para a mídia
paga. Apresentado no Salão do Automóvel em outubro de 2010, ele
foi concebido com base em ideias
postadas por mais de 2,6 milhões de
internautas, de 160 países.
Gracioso – É possível ter persuasão
e emoção via internet na mesma proporção que se transmite através da
televisão?
Ciaco – É totalmente possível. A
internet permite estabelecer uma
maior proximidade entre o consu-
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
45
entrevista
midor e a marca. Ainda carregamos
a herança histórica de Herbert Marshall McLuhan, para quem “o meio
é a mensagem”. Todos os nossos
processos são trabalhados dessa
forma. Primeiro, o anunciante define o meio, a mídia, depois decide o
que vai colocar lá dentro. Antes do
começo do ano, faço uma negociação de mídia e já sei qual a verba que
irei alocar para a televisão, o rádio,
a mídia impressa[...] Depois, vou
discutir o conteúdo. Sempre foi assim. Mas hoje o que estamos vendo
é uma inversão dessa equação, porque o meio pode não ser mais a mensagem. Talvez, a mensagem é que
irá definir o meio daqui em diante.
Gabi – A Fiat foi a primeira empresa brasileira a utilizar a Plataforma
Xbox, da Microsoft, como canal de
mídia, por meio da criação de uma
fábrica virtual para apresentar o
novo Palio. O que representa esse
investimento dentro do esforço de
comunicação da montadora?
C i a c o – A i nda n ão recebemos
todos os dados, porque este é um
case mu ito novo. O que observa mos é que a ntes t í n ha mos o
mercha nd isi ng na T V que f u ncionava. Hoje, estar presente nos
jogos é u ma forma de i nteragi r
com o consumidor, que funciona
como um vetor de construção de
conteúdo, de valor de marca. É um
jeito novo de gerar experiência de
marca. Temos investido em outras
formas de comunicação, que não
se baseiam no discurso, mas na
vivência da marca. Já temos uma
história longa na área de games
que vem sendo trabalhada até dentro das concessionárias.
46
Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
Gabi – Com base nessas novas arenas
do marketing, a Fiat acabou de lançar
o Doblò Xingu, inspirado no filme
Xingu, que estreou em abril. Em outra
frente, a Iveco apostou alto no Corinthians, com o patrocínio da camisa do
time, que gerou uma exposição acima
da média para a marca de caminhões
do grupo Fiat. Utilizar mídias de massa como polos geradores de eventos é
uma forma de elevar o ROI (retorno
sobre o investimento)?
Ciaco – Sim. Esse tipo de estratégia aumenta o ROI e a eficiência
da marca nas mídias não pagas.
É uma nova maneira de trabalhar
“Nos últimos dez anos, a
carreira de CEO passa,
necessariamente, pela
área de finanças, o que
afastou o marketing
da direção geral das
empresas. Logo, a
atividade perdeu
prestígio dentro das
organizações”
os veículos como canal de entretenimento, e aí entram o cinema,
o esporte, as ações culturais. Tudo
isso faz parte de uma comunicação
integrada. Aqui, a preocupação
não é o ROI, e sim o fato de construir conteúdos relevantes para os
vários públicos que se relacionam
com a marca.
Gracioso – O risco de um investimento feito neste tipo de estratégia é
maior do que aqueles feitos na mídia
tradicional?
Ciaco – É mais arriscado porque
desconhecemos uma série de coisas. Basta ver o que acontece em
época de crise. Os investimentos
se voltam para TV e revista, porque
o risco é menor. Hoje, o exercício
mais difícil do profissional de marketing é saber dosar quanto de risco ele está disposto a correr diante
dos benefícios que a ação poderá
gerar. O mais difícil do trabalho
é vender essas ideias inovadoras
dentro da companhia, porque os
profissionais entendem muito bem
a linguagem do GRP (Gross Rating
Point), e do TR P (Target Rating
Point). Mas quando você começa a
olhar para indicadores de atenção,
de dimensões diferentes da mídia e
de circulação, eles apresentam índices que as pessoas ainda não estão
acostumadas. Então, é bem mais difícil aprovar planos que não passam
pela mídia tradicional.
Gabi – No posto de presidente da
Associação Brasileira de Anunciantes (ABA), como você avalia o
marketing que vem sendo praticado
pelo mercado?
Ciaco – No gera l, o anunciante
brasileiro está preparado e buscando novas alternativas de comunicação, visando a melhores
resultados, processos mais sólidos
e formas mais efetivas de rentabilizar o que se vende. Na ABA temos
vários comitês que trabalham essas questões.
Gabi – Considerando sua experiência com a Agência Fiat, que vive
um processo de evolução constante,
como você vê o marketing daqui a
dez anos?
João Ciaco
O projeto do Fiat Mio contou com a participação de 17 mil pessoas de 160 países e recebeu mais de 11 mil ideias
Ciaco – Estamos trabalhando para
melhorar os processos internos.
Por exemplo: antes tínhamos uma
dupla de criação on-line e outra dupla off-line. Vinha o briefing e esses
quatro profissionais sentavam juntos para criar. Começamos a ver que
este modelo não estava funcionando bem, até porque a criação do off-line
independe da mídia, enquanto a
criação on-line depende, necessariamente, de um canal, a internet.
Portanto, o trabalho do on-line fica
muito mais próximo da estratégia,
do conceito de mídia integrada. Então, resolvemos testar outras fórmulas, passando a trabalhar com trio,
em vez de dupla de criação. Quando
a ação tem um olhar mais tradicional, colocamos dois profissionais
de off-line e um de on-line. Quando
a iniciativa é mais voltada para o
on-line, juntamos um profissional
de off-line e dois de on-line. Tenho
discutido muito sobre o futuro do
marketing. Tivemos uma época na
qual, para ser CEO da empresa, era
preciso passar pelo marketing. Nos
últimos dez anos, a carreira de CEO
passa, necessariamente, pela área
de finanças, o que afastou o marketing da direção geral das empresas.
Logo, a atividade perdeu prestígio
dentro das organizações. Agora, o
marketing precisa recuperar essa
participação estratégica no proces-
so de decisão. E a perda de importância está relacionada com a forma
como a marca foi trabalhada. Quem
cuidava da marca no passado era
exclusivamente o marketing. Hoje, a
área está dividida entre marketing,
comunicação corporativa, comunicação interna, design, sustentabilidade, relações com o governo,
relação com a comunidade, patrocínio... Marca e marketing estão fragmentados dentro das organizações.
O futuro do marketing pode estar
em agregar tudo isso, com um olhar
mais estratégico e não apenas um
olhar da mídia. Temos aí um longo
caminho de conquista e reestruturação do nosso jeito de pensar.
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
47
pesquisa
Profissional do futuro
Levantamento feito pela ESPM, em parceria com a Limo Inc, aponta
o perfil do profissional das arenas da comunicação e como as escolas
podem fortalecer a formação dos futuros estrategistas brasileiros
N
o primeiro semestre de 2012, a ESPM e
a empresa de cultura e comportamento
Limo Inc., firmaram uma parceria
para realizar uma pesquisa inédita e
necessária nestes tempos de mudanças estruturais
marcantes na sociedade e na indústria da comunicação. O objetivo do levantamento foi identificar
os principais direcionadores para a formação dos
futuros profissionais das arenas da comunicação.
Claro está que esse é um grande desafio, levando-se
em conta a diversidade das arenas da comunicação,
a variedade de funções que esses profissionais
realizam, e irão realizar, além das diferentes
expectativas de cada segmento da indústria em
relação aos estudantes que se formam a cada ano.
Para identificar esses direcionadores, foi elaborado um projeto de pesquisa baseado em entrevistas com especialistas do setor, profissionais e
acadêmicos, no Brasil e no exterior. Também foi
promovido um grande esforço de análise de dados
secundários, como reportagens e estudos acadêmicos. A iniciativa contou com a participação de
grandes especialistas na área da comunicação,
profissionais com vasta experiência acadêmica e
de mercado, como Emmanuel Publio Dias (vicepresidente Corporativo da ESPM), Luiz Fernando
Garcia (diretor da Unidade de Cursos Graduação
da ESPM-SP) e João Matta (coordenador do curso
de publicidade e propaganda da ESPM), que participaram diretamente de todas as fases do projeto.
No total, foram realizadas 22 entrevistas, sete
com professores ou diretores de escolas de comunicação e 15 com ex-alunos dessas instituições.
Como base para a amostra, foram selecionadas
oito escolas. Além da própria ESPM, participaram
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
do estudo outras sete escolas mais premiadas no
Festival de Cannes: VCU Brandcenter, Miami Ad
School, Award School, Berlin School of Creative
Leardership, Michigan State University, Berghs
School e Alfred University. Para enriquecer a amostra, mais cinco escolas foram selecionadas: Parsons
School, Harvard, Hyper Island, Lemon School e
Elissava Escuela de Diseño.
Uma das primeiras constatações foi a existência
de três grandes transformações sociais, que serviram de premissas para a análise das entrevistas
realizadas na pesquisa. São elas: a revolução da informação, o surgimento da geração “snack” e a ocorrência de uma grande mudança na natureza do trabalho
realizado pelos profissionais da comunicação.
As consequências desta revolução pela qual passa a
comunicação são a democratização da informação, a
criação de novos canais em ritmo acelerado e a transformação do receptor em produtor potencial de conteúdo na rede. Para Juliana Siqueira, ex-aluna da VCU
Brandcenter e uma das entrevistadas do projeto, “ser
um profissional de comunicação está cada vez mais
complexo, estamos em um mundo multilinguagem e
novos canais não param de surgir”.
Geração “snack” é um termo que designa um grupo
de jovens, hoje com idade entre 10 e 20 anos, que, como
resultado do uso constante de mídias sociais, consomem conteúdo de uma forma diferente do que ocorria
no passado. Esta geração tem muita dificuldade para
se aprofundar em um determinado tema, ou de se
concentrar em um único assunto por um período mais
prolongado. David Regan, professor da Michigan State
University, afirma que “[a] maioria dos alunos tem
facilidade de transitar entre diversos assuntos, mas
geralmente falta profundidade em cada um deles”.
shutterstock
Por Alexandre Gracioso e Laura Chiavone
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
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pesquisa
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
A geração ”snack” tem muita dificuldade
para se aprofundar em um determinado
tema, ou de se concentrar em um único
assunto por um período mais prolongado
Grupos de habilidades e
competências encontrados
Técnica e repertório
• Pensamento complexo
• Postura crítica
• Formação de repertório
• Curadoria de conteúdo
Finalmente, as mudanças na forma como a sociedade
contemporânea encara a evolução profissional tornaram
possível aos estudantes vislumbrar cada vez mais uma
carreira não linear, que possibilite mais experimentação.
Eles podem mudar tanto de área dentro da comunicação
como de setor. É o que percebe o coordenador do curso de
comunicação social da ESPM, professor João Matta: “Existem hoje diversas opções na carreira da comunicação, eles
podem trabalhar com marketing, criação e produtoras.
E durante a carreira transitar por essas áreas também”.
Principais resultados
As entrevistas realizadas possibilitaram a identificação
de três grandes grupos de competências e habilidades
que devem ser trabalhadas durante o curso universitário (ver quadro ao lado). Esses grupos dizem respeito à
formação técnica do futuro profissional, à capacitação
comportamental e, finalmente, ao percurso que o estudante deve privilegiar (e as escolas devem possibilitar),
durante a sua formação.
Confira a seguir as principais características de cada
grupo de competências:
1 . T é c n i c a e r e p e r t ó r i o – Este grupo diz respeito à formação profissional mais concreta e imediata,
no sentido de serem competências necessárias para a
execução do trabalho propriamente dito. Embora exista
alguma insatisfação das agências, produtoras e outros
integrantes das arenas da comunicação com relação a essas competências, a percepção geral é a de que este grupo
é o que vem sendo mais bem trabalhado pelas escolas.
a. Pensamento complexo: é a capacidade de buscar soluções não lineares para as questões que se apresentam. Não
deve ser confundido com a busca, por vezes desnecessária, de soluções demasiadamente elaboradas. É cada vez
Atitude profissional
• Forma e contexto
• Comportamento empreendedor
• Resistência e frustações
Perspectiva acadêmica
• Comunicação com o mercado
• Educação Beta
• Formação individual
mais necessário em um mundo no qual sobram problemas
elaborados e falta simplicidade.
b. Postura crítica: é imprescindível desenvolver uma
postura questionadora, capaz de interpretar e resolver
questões. Um ponto de vista crítico recebe com menos
facilidade [ou ingenuidade] os desafios apresentados.
c. Formação de repertório: é a busca pela ampliação do
campo de visão e do universo de referências. Para isso, as
instituições precisam trazer diferentes aspectos culturais
e disciplinas para o processo de formação, da arquitetura
ou do design à psicologia ou arte contemporânea e incentivar a vivência de novas experiências fora da sala de aula.
d. Curadoria de conteúdo: se o “excesso de informação”
tornou-se a palavra de ordem, saber fazer escolhas é mandatório. Comunicadores precisam ser criteriosos para selecionar o que é conhecimento e o que é apenas “barulho”.
2 . A t i t u d e p r of i s s i o n a l – Diz respeito às compe-
tências humanas de relacionamento, postura individual
e resiliência, frente às inevitáveis frustrações inerentes
a qualquer carreira.
a. Forma e contexto: trata-se de estar constantemente
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
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pesquisa
em busca de novos recursos, linguagens e formatos
para constituir o processo criativo, estimulando os estudantes a entender e interpretar a cultura que os cerca.
b. Comportamento empreendedor: em um mercado
cada vez mais competitivo, é preciso empreender em
todos os cenários, contextos e níveis hierárquicos, assumindo uma postura de comprometimento com resultados e crescimento, seja por meio do próprio negócio
ou de uma visão empreendedora dentro das empresas.
c. Resistência e frustrações: é preciso entender que a
indústria criativa também é constituída por dificuldades,
dúvidas e fracassos. Saber lidar com tais fatores e extrair
aprendizados de todas as situações vividas é imprescindível para o sucesso do profissional de comunicação.
3 . P e r s p e c t i v a a c a d ê m i c a – Faz referência aos
a. Comunicação com o mercado: dialogar com o mercado
significa discutir de igual para igual, e não apenas atender
ao que as empresas pedem. É imprescindível estimular
os estudantes a resolver desafios “reais”, alinhados ao
mercado de trabalho. No entanto, surge a oportunidade [e
a necessidade] para as instituições assumirem um papel
mais incisivo na formação, propondo novos questionamentos e perspectivas.
b. Educação Beta: a formação está sempre na fase de testes
e é um processo em constante desenvolvimento. Não há
receitas prontas ou findas a seguir. Estudar e aprender
continuamente diferencia o indivíduo. Para as instituições de ensino isso deve ser traduzido em um processo
de renovação constante.
c. Formação individual: em um cenário tão líquido e
mutante, é natural que cada indivíduo trilhe um caminho
único em sua formação, gerando inúmeras perspectivas
e possibilidades.
No seu conjunto, o perfil profissional que emerge das entrevistas realizadas é o de alguém que inicia a sua carreira não
só com um bom domínio da técnica, mas com competências
comportamentais bastante amadurecidas e que teve, ao
longo de seu processo de aprendizagem, a oportunidade de
vivenciar uma grande diversidade de experiências.
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
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caminhos que, em conjunto, estudantes e escolas devem
trilhar pensando na formação dos futuros profissionais
das arenas da comunicação.
Chama a atenção a importância que se dá às competências
humanas. Esta não é uma exigência somente da indústria da
comunicação. Em nossa experiência com recrutadores e executivos de RH e de outras áreas das mais diversas indústrias
e setores empresariais, esta é uma demanda comum a todos
e que vem se tornando cada vez mais importante na decisão
de contratação. É significativo notar que, há alguns anos,
aceitava-se que o jovem recém-formado iria desenvolver habilidades humanas ao longo de sua carreira, principalmente
para ser considerado para posições gerenciais. Porém estava
claro para os recrutadores que o processo de amadurecimento comportamental, no sentido profissional, seria desenvolvido em grande parte dentro das empresas.
A educação no Brasil deve atender
à dupla finalidade de preparar o
indivíduo para uma atuação política
no contexto nacional (o exercício da
cidadania) e capacitá-lo a atuar
no mundo do trabalho
Hoje a realidade é diferente. As agências e empresas
têm a expectativa de que os iniciantes já demonstrem um
amadurecimento que antes somente era exigido de profissionais com vários anos de experiência. Essa demanda
impõe sobre as escolas desafios adicionais que devem ser
enfrentados ao se desenvolverem as experiências de aprendizagem que serão oferecidas aos estudantes ao longo de
seus programas. Como as escolas devem se preparar para
essa nova realidade?
Ensino nota 10!
Existe uma tensão permanente no desenvolvimento de
qualquer programa de nível superior e na escolha de quais
competências deverão ser desenvolvidas ao longo do curso.
Em um extremo temos a formação puramente técnica, que
atenderia às necessidades imediatas do mercado de trabalho
e, talvez, fosse útil para os primeiros curtos anos da carreira
do profissional. No outro extremo, temos a formação puramente intelectual, com caráter marcadamente humanista e
científico, que serve de base para todo e qualquer aprendizado
posterior, mas que teria pouca utilidade prática imediata.
Historicamente, mercado e academia não conseguiram
chegar a um consenso sobre como melhor equilibrar essas necessidades e demandas. É comum as empresas se
queixarem de que as universidades formam profissionais
que desconhecem a profissão e precisam ser ensinados
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
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do zero quando chegam ao mercado de trabalho. Do outro
lado, as universidades criticam o fato de que as empresas
desejam pessoas sem pensamento próprio e sem iniciativa,
puramente técnicas. Esse foi o principal ponto de debate
na apresentação da pesquisa aos profissionais do Grupo de
Planejamento, em julho.
Antes de abrir este artigo para o debate, é interessante
conhecer o entendimento dos principais documentos que
regem a educação no Brasil, a saber: a própria Constituição
de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira
de 1996. Alguns trechos destes documentos abordam de
maneira muito objetiva a questão de qual deve ser a missão
de uma Instituição de Ensino Superior (IES). Por exemplo:
o artigo 205 da Constituição de 1988 diz que “[a] educação,
direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando
ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
A Lei de Diretrizes e Bases (LDB), de 1996 (Lei 9.394, de
1996), reforça a Constituição ao utilizar, essencialmente,
o mesmo texto no parágrafo 2º: “[a] educação, dever da
família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade
e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade
o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
Coerentes com essas diretrizes mais amplas, definidas para a sociedade brasileira como um todo, somos da
opinião de que a educação no Brasil deve atender à dupla
finalidade de preparar o indivíduo para uma atuação
política no contexto nacional (o exercício da cidadania), e
capacitá-lo a atuar no mundo do trabalho. Esse não é um
desafio simples nem fácil de ser atingido, dada a realidade
da educação em nosso país, em que alunos despreparados
chegam ao ensino superior. Também é preciso levar em
conta que os estudantes passam curtos quatro anos em
seus cursos de graduação, na área da comunicação, e que
muito precisa ser discutido e aprendido.
O que devem, portanto, as escolas fazer? Antes de responder, gostaríamos de esclarecer que estamos fazendo
sugestões tendo em mente uma realidade muito diversificada de cursos de comunicação, que inclui escolas
com modelos muito simples e que atendem a públicos
com formação escolar ruim, mas que também conta com
escolas de excelência que já fazem muitas das propostas
aqui apresentadas. Dito isto, nossa experiência sugere
que as escolas precisam se esforçar para abandonar o
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
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pesquisa
A experiência prática durante o curso
facilita e potencializa o aprendizado.
Atividades como grupo de teatro e
colaboração no diretório acadêmico
também contribuem nesse processo
modelo tradicional de sala de aula e abraçar experiências
de aprendizado mais amplas e diversificadas, centradas
em projetos e percursos mais flexíveis. Infelizmente, é
mais fácil falar do que fazer.
Na ESPM, os recrutadores são unânimes em afirmar
que estudantes que passaram por experiências de aprendizagem, que vão além da sala de aula, como a Empresa
Jr, a Agência Experimental, a ESPM Social, chegam mais
bem preparados ao mercado. É interessante ressaltar duas
proposições adicionais sobre esse ponto. Em primeiro lugar,
a superioridade é sentida tanto no preparo técnico quanto
no comportamental. Ou seja, a experiência prática durante
o curso facilita e potencializa o aprendizado. Além disso,
não são somente as experiências de caráter profissional
que aceleram o desenvolvimento. Atividades como grupo
de teatro, colaboração no diretório acadêmico, entre outras
que os estudantes desenvolvem, também contribuem, significativamente, nesse processo.
Portanto, o incentivo da prática e a oferta sistemática de
ambientes de aprendizagem diferenciados, nos quais os estu-
dantes possam exercitar os conceitos desenvolvidos em sala,
são fundamentais no preparo de profissionais com um perfil
mais próximo ao desejado pelo mercado e pela sociedade.
Uma implicação dessa mudança conceitual no desenvolvimento de cursos é a diminuição do número de disciplinas
que os estudantes devem cumprir e também da carga horária
exigida pelas atividades tradicionais de sala de aula. Esses
pontos são delicados de serem tratados com professores que
foram treinados em modelos tradicionais. Isso inclui os tão
necessários profissionais de mercado que também atuam
como professores. Também estes conhecem somente os
modelos tradicionais de ensino e aprendizagem, portanto
um amplo programa de treinamento e capacitação do corpo
docente se faz necessário.
Como será o amanhã?
Os grandes desafios do setor foram apresentados durante
o V Congresso Brasileiro da Indústria da Comunicação.
A seguir, você confere as principais propostas aprovadas
no plenário do evento, que foi realizado em maio de 2012,
ocasião em que os resultados desta pesquisa foram apresentados pela primeira vez.
1. Â m bi to ger a l
Todos os integrantes da indústria da comunicação são
corresponsáveis e solidários na busca contínua da construção de um futuro comum, no qual se valorize o ser humano e se busque o desenvolvimento social e econômico.
2. Â m bi t o ac a dê m ico
a. As entidades profissionais devem facilitar a presença
contínua de profissionais de mercado no ambiente acadêmico.
b. As escolas, apoiadas pelas entidades profissionais, devem elaborar uma coleção de casos regionais, nacionais
e internacionais, para facilitar e atualizar os conteúdos
acadêmicos.
c. Deverá ser encaminhada ao Ministério da Educação
uma solicitação do V Congresso a fim de flexibilizar conteúdos disciplinares e a contratação de profissionais de
mercado como professores, independentemente de suas
titulações formais.
d. As escolas de comunicação devem incorporar aos seus
currículos (teóricos e experimentais), noções essenciais de
gestão de negócios, finanças, gestão de pessoas, inovação
e empreendedorismo.
3. Â m bi t o da s e m pr es a s
a. As agências devem incrementar a gestão de RH/Pessoas, como uma de suas prioridades.
b. As agências devem buscar a criação de novos métodos e modelos de trabalho que favoreçam o exercício
do pleno potencial dos profissionais, a partir de seu crescimento pessoal.
4 . Â m bi t o da s en t i da des
a. Deve ser promovida a aproximação contínua das entidades profissionais com as escolas de graduação, pósgraduação e extensão.
b. Recomenda-se à Associação Brasileira de Agências de
Publicidade (Abap) a análise da viabilidade de criação de
um banco de talentos, para oferecer, simultaneamente,
a capacitação contínua e alternativas de atuação no
mercado.
Para a nossa satisfação, a mensagem que fica do V Congresso
é a de aproximação entre a academia e a indústria. Acreditamos que esta seja uma saudável providência que todos
nos comprometemos a implementar. A experimentação é
fundamental para a boa formação profissional, assim como
também o são o exercício e o desenvolvimento de faculdades
e habilidades mais genéricas, como um repertório cultural
extenso e uma postura comportamental mais madura.
Dificilmente as escolas conseguirão fazer tudo isso
sozinhas, sem o apoio e o comprometimento de parceiros
do mercado corporativo. Por outro lado, na realidade atual
de falta de cooperação, empresas, agências e produtoras
precisam incorrer significativos custos em termos financeiros e também de tempo e dedicação de seus executivos
mais seniores para arredondar a formação empreendida
no ensino superior. Portanto, é razoável esperar ganhos
bastante concretos para ambas as partes como decorrência dessa cooperação mais estreita. Mais importante
do que isso, talvez seja o fato de os estudantes que se
preparam para entrar na indústria da comunicação só
terem a ganhar com esse diálogo mais franco e aberto.
Alexandre Gracioso
Vice-presidente acadêmico da ESPM
Laura Chiavone
CEO da Limo Inc
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
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Comunicação corporativa
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
Os golfinhos
da comunicação
O objetivo da comunicação corporativa é transmitir de forma clara a todos
os públicos de interesse de uma organização não só o que ela faz, mas também
quem ela é e no que acredita. Como é possível fazer isso hoje de forma globalizada?
Por Marcelo Vergílio Paganini de Toledo
O
principal desafio ao se realizar um plano
de comunicação integrada é dar à empresa
uma só voz, alinhando sua comunicação
institucional e sua comunicação mercadológica. Realizar a conciliação entre as mensagens que
deseja transmitir, os públicos de interesse e os pontos
de contato da empresa com o mercado é o principal fator
de sucesso de uma estratégia de comunicação bem realizada. Porém, com o advento da globalização, essa tarefa
ficou mais difícil, já que as mensagens locais e globais se
confundem em todas as áreas da comunicação integrada
e envolvem todos os seus públicos de interesse. Isso dá
aos gestores da empresa uma maior responsabilidade de
gerenciamento com o objetivo de garantir uma “identidade” única, pois, no mundo atual, essa organização pode
ter consumidores na Malásia, investidores nos Estados
Unidos, funcionários na China, fornecedores no Brasil
e operações administrativas na Itália.
Um dos pilares da comunicação integrada que mais
sofrem com isso é a comunicação corporativa. Ela
funciona como uma orquestração de instrumentos de
comunicação interna e externa, que são empregados pela
administração para estabelecer uma imagem favorável
com as partes interessadas e que congrega, entre diversas
atividades, itens como propaganda corporativa, relações
com a imprensa, comunicação interna e relações com
investidores, governos e grupos de interesse.
Isso ocorre porque a comunicação corporativa tem
como responsabilidade comunicar não somente o que
as organizações produzem, mas também como elas são
e em que acreditam. Estes dois últimos elementos, hoje,
devem fazer sentido em uma escala global.
A comunicação corporativa é utilizada como uma
das principais ferramentas para a construção da
reputação de uma organização. Assim, ela possui o
desafio de fazer com que a missão, os valores, a visão
e a estratégia de atuação das empresas sejam, além
de compreendidos, respeitados e admirados por meio
de uma mensagem sólida para todos os públicos de
interesse presentes nos mais diversos países. Essa é a
maneira encontrada para que as organizações possam
exportar sua reputação.
Ter uma presença internacional faz com a empresa fique mais envolvida com os ambientes locais dentro de um
dado país ou mercado, observando sempre a identidade
nacional, a língua, os gostos, as preferências, as barreiras jurídicas e políticas e as questões socioeconômicas.
Todos esses pontos de alguma maneira influenciam
seus públicos de interesse e devem ser considerados na
construção de uma estratégia de comunicação.
Essa estratégia deve sempre buscar o alinhamento
entre a imagem e a identidade de uma empresa e, por
consequência, a construção de sua reputação corporativa que já não pode ser pensada em nível local, e sim
global. Um problema ambiental em uma unidade da
empresa nos Estados Unidos pode causar uma crise com
investidores em Singapura. Uma denúncia de trabalho
escravo na China causa uma crise de confiança com os
consumidores nos Estados Unidos.
A informação mundial ocorre em tempo real, com
alcance global. Com o advento da internet e das redes
sociais, todo conhecimento pode e é compartilhado.
Com isso, o cenário de atuação da comunicação corporativa deixa de ser o país e passa a ser todo o mundo.
Dentro dessa nova realidade, faz-se necessária a construção de uma sólida reputação global. E a comunicação
corporativa é uma ferramenta de grande importância,
devido aos seguintes fatores:
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
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•
•
•
•
O público tem um enorme acesso e um apetite voraz
por informações, sejam elas relacionadas aos seus
interesses ou simplesmente fonte de entretenimento.
A maioria dos governos do mundo decidiu não
competir mais por meio de guerras ou financiamento
de exércitos. A competição agora se dá mais
intensamente na esfera econômica. As armas
utilizadas passaram a ser de produção, em vez de
destruição. Esse novo ordenamento produz reflexos
expressivos na reputação empresarial, tornando-a
arma para competição em todo o planeta.
Ao longo dos anos, as empresas dominantes
consolidaram as mesmas técnicas de produção em
massa e de marketing. Além disso, a comoditização
de produtos e serviços faz com que haja uma grande
dificuldade de diferenciação. Uma das poucas formas
de ser percebido fundamenta-se em grande parte na
reputação das empresas e de marcas.
O capitalismo conquistou o mundo e trouxe
com ele a necessidade cada vez maior de capital.
A captação desse capital se dá basicamente por
meio de investimentos diretos, e a boa reputação
empresarial faz com que a empresa se torne uma
opção para o investidor.
Com isso, transmitir credibilidade, confiabilidade,
segurança e responsabilidade passa a ser fator preponderante para as empresas de sucesso. E a comunicação
desses atributos é uma responsabilidade e um objetivo
a ser considerado em todos os planos de comunicação.
A razão de tal preocupação é devida ao fato de que
nós hoje, ao tomarmos uma decisão de consumo, investimento, indicação a um amigo ou colega ou escolha de
uma posição de trabalho, estamos preocupados não só
com o que as empresas produzem, mas também com o
que elas fazem, pois só o produto ou o serviço prestado
não sustenta a longevidade de uma organização e nossa
confiança em relação a ela. Bem-vindos à “Economia
da reputação”.
Independentemente de para quem, por que e onde a
mensagem deva ser comunicada, simplicidade, clareza
e consistência são atributos básicos de um diálogo entre
as empresas e seus públicos em qualquer parte do mundo.
Quanto mais fácil for a comunicação, melhor será o seu
entendimento, principalmente em um momento em
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
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Comunicação corporativa
Independentemente de para quem,
por que e onde a mensagem deva ser
comunicada, simplicidade, clareza e
consistência são atributos básicos de um
diálogo entre as empresas e seus públicos
que estamos todos multiconectados, multi-informados,
multi-impactados e multidispersos com a quantidade de
informações que recebemos.
Outro fator impactante é a necessidade de incorporar a comunicação “boca a boca” em uma plataforma
integrada e, por consequência, na comunicação institucional da empresa. Torna-se mandatória essa atenção,
pois quanto maior o controle que a empresa possui da
informação, menor a confiança de seus públicos com
esse conteúdo. Um exemplo disso são o processo de
tomada de decisão para a compra de um produto ou
serviço, a realização de algum investimento em ações
de uma companhia ou a aceitação de uma proposta de
trabalho. Em todos esses casos recorremos aos meios
tradicionais de informação. Porém sempre procuramos
a opinião de um amigo que tenha conhecimento no
tema. Com a internet e o surgimento das mídias sociais,
esses amigos estão em qualquer lugar do planeta, opinando sobre as empresas e estabelecendo comunicação
interativa onde o “boca a boca” é realizado em tempo
Encontrar um caminho de coerência na comunicação
institucional da empresa irá ajudá-la a construir sua reputação
corporativa de forma global
real e de forma globalizada. Esse fim de
mutuamente a localizar presas e, assim,
exclusividade no discurso das empresas
se a limentar. Em f unção dessa coné um fator de atenção aos gestores de
vivência, os golfinhos servem como
comunicação sob o ponto de vista de
indicadores de cardumes de atum. A
como engajar e interagir com os públicaptura de atum com rede de cerco,
cos em uma escala global.
um dos métodos que eram empregaEncontrar um caminho de coerência na
dos antigamente para essa pesca, já foi
comunicação institucional da empresa irá
responsável pela matança de mais de 7
ajudá-la a construir sua reputação corporativa
milhões de golfinhos nos últimos 35 anos.
Selo de qualidade
de forma global. Isso traz benefícios para toPor meio do conceito Dolphin Safe, certiestampado nas latas
dos os públicos da empresa, como a criação de
ficado fornecido pela Earth Island Institute,
de atum indica o
valor para o acionista, a atratividade, a motiessas empresas garantem que o sistema de
uso de um método
vação e retenção dos melhores colaboradores,
captura dos atuns seja realizado por meio de
diferenciado de
o desenvolvimento da preferência dos conpesca com vara, linha e anzol. Apesar de repesca, que assegura
sumidores pelos seus produtos e serviços, a
sultar em menor produtividade, este método
a proteção dos
golfinhos
e
ajuda
minimização de impactos em caso de alguma
diferenciado de pesca é a segurança da proessa indústria a se
crise e, principalmente, o desenvolvimento
teção dos golfinhos. O selo Dolphin Safe nas
posicionar a favor da
de uma atitude positiva e a legitimização da
latas de atum garantem que o consumidor
preservação do meio
sociedade para com sua atuação.
está adquirindo um produto que não causa
ambiente
Todos sabemos da importância e dos dedanos aos golfinhos. Assim, as pessoas que
safios na comunicação institucional em um mundo glodesejam comer atum porque é gostoso e saudável, e quebalizado. E a pergunta sempre feita é: como desenvolver
rem continuar admirando os golfinhos, podem adquirir
uma plataforma que atinja todos os públicos, em todos
esses produtos sem peso na consciência.
os mercados e países onde atuo com a mesma relevância
Para que isso fique claro a todos os públicos de intee interesse?
resse dessas organizações, é utilizada uma plataforma
As empresas, por definição, não são todas semede comunicação integrada, que demonstra de forma real
lhantes, porém podem utilizar as mesmas linguagens
não só o que a empresa faz, mas também aquilo em que
ou causas globais para facilitar o relacionamento
ela acredita por meio de valores sensíveis a uma grande
com seus públicos em diversos países. Com isso, a
parcela da população mundial, que é a preocupação
companhia consegue estabelecer uma comunicação
ambiental. Do lado institucional, demonstrar essa preofavorável em nível mundial. Um exemplo é o trabalho
cupação certamente levará a um maior reconhecimento
realizado pela americana Kraft Foods, pela europeia
sobre a reputação dessas empresas e, consequentemente,
Calvo e pela brasileira Camil em relação ao atum ena uma imagem e uma identidade corporativa forte e polatado que comercializam.
sitiva. Tudo isso graças aos golfinhos!
Por meio do conceito Dolphin Safe, todas exaltam o seu
comprometimento de preservar o meio ambiente, mediante
Marcelo Vergílio Paganini de Toledo
processamento e fabricação de atum enlatado, que vai ao
Professor de graduação e pós na ESPM e BSP e dos cursos de
encontro da preocupação com o bem-estar dos golfinhos.
educação continuada da FGV. Pós-graduado pela ESPM.
E qual é a relação entre o atum e o golfinho?
Mestrando em gestão internacional pela ESPM. Sócio da 3.0
A resposta para isso é que, no oceano, golfinhos
Marketing & Inteligência, consultoria atuante nas áreas de planejamento
de marketing, pesquisas de satisfação e reputação corporativa
e atuns vivem numa associação em que se ajudam
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
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depositphotos
Branding
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
Fora de foco
Em janeiro de 2012, a Kodak pediu concordata, nos Estados Unidos.
Aparentemente, a empresa não pôde ser reinventada no rumo sinalizado há 124 anos
pelo seu fundador. Será esse o fim do slogan “Você aperta o botão, nós fazemos o resto”?
Por Valeria Ravier
E
ra 1888, quando George Eastman pronunciou que iria manter a Kodak como líder absoluta no mercado
as oito palavras mágicas que ficariam marcadas de material fotográfico durante muitos anos.
A frase demonstrou ainda ter um caráter praticamente
para sempre na história da fotografia e do marketing: “Você aperta o botão, nós fazemos o resto”. mágico, pois, ao permitir que cada consumidor se identiA frase representou um dos pontos altos no desenvol- ficasse com um lugar em que jamais tinha sido colocado,
vimento de uma técnica capaz de concretizar, para um criou do nada um número inédito de fotógrafos amadonúmero crescente de pessoas, o antigo desejo de capturar res que iriam se tornar os principais consumidores dos
a realidade. A invenção de Eastman inaugurou também produtos Kodak.
Milhões de americanos passaram
uma ideia que iria ser amplamente
a documentar o seu dia a dia familiar,
discutida no futuro da fotografia: há
iniciando um detalhado arquivo de
um sujeito por trás da câmera.
informações visuais sobre o cotidiaEis aí o paradoxo de uma técnica
no nunca antes visto na história da
que nasceu com a intenção de se
humanidade.
constituir em um retrato fiel e objeO que Eastman fez naquele motivo da realidade, mas que depende
mento foi multiplicar de modo expode um operador cujo ponto de vista,
nencial a possibilidade de captar e
subjetivo, define um recorte para a
registrar instantes, de parar o tempo
realidade a ser representada.
e chamar a atenção para cenas que,
O fundador da Kodak, nome que
sem a sensibilidade do fotógrafo
Eastman, aparentemente, criou sem
aliada à técnica, teriam se perdido
nenhuma outra referência, a não ser
para sempre. Cenas que por meio da
pelo fato de gostar da letra K, tinha
fotografia passaram a ser, também
desenvolvido uma câmera pequena
para sempre, ficcionais.
e portátil, com um negativo seco e
É importante lembrar, no entandescartável que não precisava ser
to, que, por trás de toda e qualquer
revelado imediatamente após a
fotografia, existe uma realidade hisexposição. Em termos de produto,
tórica. Que cada imagem fotográfica
isso representou a superação de tonasce de uma época, seus costumes
dos os limites que a fotografia tinha
e tradições.
enfrentado desde que Joseph Niépce
As imagens mais interessantes,
obtivera, em 1826, após oito horas
porém, como aponta Roland Barde exposição, a imagem que ficaria
thes no livro Camera Lucida (Hill
conhecida como Ponto de Vista desde
and Wang, 1981), são aquelas que
a Janela de Gras.
Com oito palavras, o empreendedor
conseguem transcender o momenDa perspectiva do marketing, o
George Eastman criou um dos slogans
mais famosos da história da fotografia
to a que visualmente se referem,
slogan foi uma fórmula de sucesso
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
61
Branding
despertando uma sutil dimensão que se lança em direção
à subjetividade de cada espectador, aguçando o seu desejo
de ver além do espaço e do tempo que essa imagem congela
e imortaliza.
Desse ponto de vista, a fotografia não é mera representação da realidade, senão linguagem, narrativa, interpretação
de um fotógrafo destinada a ser revisitada todas as vezes em
que houver um interlocutor.
Quem aperta o botão?
Na década de 1960, a Kodak encomendou uma pesquisa ao
sociólogo Pierre Bourdieu, cujas conclusões seriam publicadas na França, em 1965, sob o título Uma arte mediana:
ensaio sobre os usos sociais da fotografia (Un art moyen: essai
sur les usages sociaux de la photographie).
Bourdieu é um pensador que retoma e, de certa forma,
mantém a ideia da objetividade no campo sociológico,
afirmando, no entanto, que essa objetividade se constrói e
perpetua através das subjetividades. É nesse sentido que ele
entende a fotografia como um produto social que contribui
fortemente para a continuidade dos sistemas de percepção,
pensamento e apreciação existentes que, de acordo com ele,
se fundam em valores estéticos e éticos da classe à qual o
fotógrafo aficionado está subordinado e que este, por sua
vez, ajuda a reproduzir.
As proposições de Bourdieu nesse estudo não se aplicam unicamente ao meio fotográfico, representando certa
exemplificação da sua teoria no campo da fotografia, mais
precisamente da fotografia leiga encontrada nos álbuns
de família. No fundo, a ideia de que a fotografia seria uma
atividade cultural menor em relação a outras mais exigen-
tes é também uma crítica àquele personagem que a Kodak
ajudou a criar e que foi o foco perseguido pela empresa desde
o início, o fotógrafo amador.
A perspectiva analítica desse autor destaca, de outro
ângulo, a relação que o meio fotográfico guarda com a realidade. Para ele, o fato de que toda imagem fotográfica se refira
a uma cena que realmente ocorreu, – e de alguma maneira
continua ocorrendo graças ao impacto que essa representação provoca no espectador – torna essa prática cultural
especialmente eficaz na interiorização da objetividade e
consequente reprodução de subjetividades objetivadas.
O que fazer com o resto?
Em janeiro de 2012, mais de 120 anos após Eastman ter
enunciado aquelas oito palavras mágicas, a Kodak entrou
com um pedido de concordata. Pessimistas enxergam a
atitude como o fim de um império. Otimistas a veem como
mais uma tentativa de se manter nos negócios. Todos parecem concordar com o fato de que a empresa não soube se
reinventar na era da fotografia digital.
O estudo de Bourdieu na década de 1960 e o próprio
mercado, a partir do ano 2000, puseram em xeque, respectivamente, cada uma das afirmações de Eastman.
Quem aperta o botão? Quem faz o resto? Aparentemente
os executivos da Kodak não souberam enfrentar esses dilemas. A marca foi criadora da primeira câmera digital, em
1975, época em que a empresa detinha 90% do mercado e
os seus lucros vinham dos produtos químicos e dos filmes.
Mas naquele momento ela recuou diante da possibilidade
de investir em um lançamento que pudesse prejudicar o seu
negócio tradicional. Pouco tempo depois, nos anos 1980,
A evolução das
campanhas
publicitárias dessa
empresa centenária,
que acabou superada
pela própria invenção:
a imagem digital
produzida pelo
fotógrafo amador
62
Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
começou a sua decadência em relação a empresas como
a Fuji Photo Film Co. Com o tempo, foi ultrapassada pelos
concorrentes, que investiram no mercado digital e desenvolveram nessa área câmeras muito superiores às da Kodak.
A era digital encurtou os tempos e multiplicou as possibilidades. A grande maioria dos consumidores de hoje quer
apertar o botão e, caso decida fazer algo com o resto, ter a
opção de fazê-lo por si mesma.
A reinvenção do fotógrafo amador
A análise de Bourdieu destacava, em 1965, uma forte correlação entre fotografia e integração grupal. A câmera compacta de Eastman foi o primeiro passo nessa direção, que
tem sido potencializada nos últimos anos com a invenção
de câmeras digitais compactas, celulares e outros dispositivos com câmera. Fotografar ficou mais barato na medida
em que é possível ter acesso virtual imediato às imagens e,
eventualmente, imprimir as melhores.
A crescente exposição à câmera, por outro lado, tem sido
responsável pela transformação das imagens em parâmetro
de beleza por excelência. Cada vez mais, ser bonito é ser
fotogênico. Nesse sentido, Susan Sontag já dizia, há quase
30 anos, que o medo de ser fotografado já não passava pelo
temor de ficar sem alma, senão pela possibilidade de ser
reprovado pela câmera.
O que esta autora não conseguiu prever foi que na era do
Photoshop não há maneira de não ser fotogênico. A imagem
de si mesmo, como todas as outras, é facilmente manipulada, modificada, reinventada.
Mas, ainda assim, Sontag não estava errada. A tecnologia
foi capaz de criar ferramentas capazes de nos tornar tão
fotogênicos quanto desejemos e, no entanto, o temor de
sermos reprovados pelo outro aumenta entre as novas gerações, compelidas a revestir de um carácter inovador cada
pequeno detalhe das suas vidas, exibindo suas aventuras
cotidianas publicamente nas redes sociais como se fossem
eventos promovidos por meio de ações de marketing.
Um lado positivo desse avanço tecnológico é o de ter
permitido a um número crescente de pessoas com acesso
à internet ser potencialmente capaz de escrever e publicar
um livro, compor e divulgar músicas, fazer vídeos, construir
páginas na web e tantas outras atividades criativas.
Embora a análise de Bourdieu seja interessante e até
certo ponto pertinente, cabe destacar um aspecto que este
autor não leva em consideração: a iniciativa de Eastman de
lançar uma câmera portátil de baixo custo, que pudesse ser
utilizada por qualquer leigo, foi pioneira no movimento de
democratização do acesso à tecnologia.
É importante, neste ponto, lembrar das assertivas de
Umberto Eco em Apocalípticos e integrados (Perspectiva,
2008), onde ele afirma que, no nível da circulação das
ideias e dos valores culturais, não ocorre a cristalização
reformista que pode ser encontrada na base socioeconômica. O exemplo que ele nos fornece no livro Obra aberta
(Perspectiva, 2001) é contundente e esclarecedor: se
perante uma ameaça de greve é aumentado o salário dos
trabalhadores de uma fábrica, é possível que esta solução
evite a ocupação do estabelecimento. Mas, se um político
ensina os membros de uma comunidade de analfabetos
a ler, para que tenham acesso ao seu ponto de vista, nada
impede que no futuro esses mesmos camponeses tenham
contato, também, com outros discursos.
A miopia dos executivos da Kodak foi não terem sido
capazes de reinventar a empresa sem perder de vista o
rumo ditado pelo seu fundador, falecido em 1932. Eastman
estava certo em 1888 e continua certo em 2012: a democratização do acesso à tecnologia é um contexto propício para
o surgimento de novos consumidores. Sendo coerente com
as suas origens, é para o surgimento desses personagens
que as estratégias da Kodak deveriam apontar. Afinal,
como conclui Theodore Levitt no famoso artigo Marketing
myopia (Harvard Business Review, Jul/2004), “a organização
precisa aprender a considerar sua função, a aquisição de
clientes e a realização de ações que levarão as pessoas a
querer trabalhar com ela. Seu presidente precisa saber
exatamente onde deseja chegar, assegurando-se de que
toda organização esteja entusiasmada e ciente disso”. Para
Levitt, esse é um dos principais requisitos para a liderança: “A menos que ele saiba para onde está indo, qualquer
caminho o conduzirá a esse local. Se qualquer caminho
serve, então o dirigente máximo da empresa pode muito
bem arrumar sua pasta e ir pescar. Se uma organização não
souber ou não tiver interesse em saber para onde está indo,
não precisa fazer propaganda desse fato com um chefe
protocolar. Todos irão perceber bem rápido”.
Valeria Ravier
Antropóloga, consultora de marketing
com MBA pela ESPM/SP e escritora.
Website: www.anthropophotography.com
e-mail: [email protected]
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
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entrevista
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
PJ Pereira
Q
Made in
Brazil
uando o mercado publicitário ainda tentava
entender o que seria a sigla www e qual a melhor forma de utilizar a internet, ele já estava
nadando de braçada no meio digital. PJ Pereira
começou sua carreira aos 13 anos de idade, como programador. Ingressou na publicidade nove anos mais tarde, quando
trabalhou na DM9DDB. Em 1999, ajudou a fundar a AgênciaClick, que logo no seu primeiro ano ganhou um GP de Cyber,
em Cannes. Cinco anos depois, se mudou para os Estados
Unidos para assumir o posto de diretor de criação da AKQA
e atender grandes contas como McDonald’s, Nike, Coca-Cola,
Visa e Microsoft.
Em 2008, quando a crise financeira começava a dar seus
primeiros sinais, o publicitário deixou a AKQA para montar
sua própria agência, a Pereira & O’Dell, em parceria com o
americano Andrew O’Dell e o Grupo ABC, de Nizan Guanaes.
O momento delicado da economia, que para a maioria das
empresas americanas foi um verdadeiro tsunami, para essa
agência, de alma brasileira, foi uma oportunidade. Baseado
em uma filosofia de trabalho que parte de uma boa ideia para
integrar a técnica e não o meio, o empreendimento de PJ
cresceu e conquistou o prêmio de melhor agência com até 150
funcionários (Small Agency of the Year), pela Ad Age em 2010.
Hoje, ele atende Corona, Skype e Lego, entre outros clientes.
De São Francisco (EUA), na sede da Pereira & O’Dell, PJ
concedeu esta entrevista para a Revista da ESPM, por Skype.
Entrevistado por Anna Gabriela Araujo
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entrevista
Gabi – Hoje, o conceito de comunicação
PJ Pereira – Quando falta dinheiro,
integrada é entendido e praticado por
muitos anunciantes brasileiros como
sendo a realização de campanhas complexas, que envolvem não só a mídia
tradicional, mas também as novas ferramentas do marketing. Muitos definem
o tema como a arte de criar fatos e promover notícias que são apresentadas
em benefício de determinado produto.
Como o assunto é tratado pelo mercado
americano?
você é obrigado a fazer escolhas, e aí
precisa ser uma escolha inteligente,
até por uma questão de sobrevivência.
Ao reduzir o próprio time e cortar fornecedores, o anunciante passou a ter
mais responsabilidade e capacidade
para investir apenas em uma única
disciplina de comunicação. Logo, passou a utilizar as ideias mais originais
e criativas. Em um segundo momento,
esse posicionamento mudou a relação
entre o anunciante e o consumidor,
que não quer saber se a comunicação
está integrada ou não.
PJ Pereira – Esse conceito invadiu
os Estados Unidos na última década.
Todos queriam garantir que o visual
e o tema das peças fossem parecidos
em todos os pontos de contato com o
consumidor. Alguém criava um spot
de TV, outra agência pegava a mesma
peça e adaptava para mídia impressa
e outros meios. Isso deixou o mercado
um pouco mais disciplinado, mas enfraqueceu a mensagem. Num primeiro
momento, esse esforço de integração
fez a propaganda americana ficar pior.
Isso aconteceu porque, nos Estados
Unidos, o departamento de marketing
dos grandes anunciantes era muito
segmentado. Muitos mantinham uma
equipe especializada em ações digitais, outra em RP (relações públicas),
mais uma em mídia impressa, e assim
por diante. Aqui, a comunicação integrada nada mais era que um checklist
gigante para tentar fazer com que a
marca chegasse a um denominador comum. Quando a crise bateu, o dinheiro
acabou, o cliente passou a ter menos
profissionais especializados em seu
departamento de marketing e a situação começou a mudar.
Gabi – Nesse caso, o corte das verbas
representou uma evolução no mercado
publicitário americano?
66
Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
“Quando falta dinheiro,
você é obrigado a fazer
escolhas, e aí precisa ser
uma escolha inteligente,
até por uma questão de
sobrevivência”
Gabi – Mas você acredita em comunicação integrada?
PJ Pereira – Não. Na prática, esse
termo só tem três sentidos possíveis:
1 – Reduzir todas as peças da campanha a um mínimo denominador
comum para que elas fiquem “combinadinhas”. 2 – Cobrir 360º para que a
mesma mensagem esteja em todas as
formas de comunicação possíveis, o
que gera a chamada propaganda por
checklist. Somos mais inteligentes que
isso. De onde venho, 360º é quando
você dá uma volta inteira e termina no
mesmíssimo lugar. 3 – Pensar no que
a propaganda poderia ser, caso fosse
inventada hoje, “integrando” todas as
ferramentas que temos nas mãos. Esse
terceiro argumento eu compro, mas
o nome integrado nao cai bem aqui,
porque faz as pessoas acharem que é
suficiente integrar no final, em vez de
fazer isso no início do processo.
Gabi – E em qual conceito está baseado
o trabalho desenvolvido pela Pereira &
O’Dell?
PJ Pereira – Em inteligência, curiosidade e criatividade. Sempre oriento
meu time a resolver o briefing como se
a propaganda tivesse sendo inventada
naquele momento. Não porque eles tenham de mudar o mundo, mas porque
eles podem utilizar as ferramentas em
uma combinação que não faria sentido
em nenhuma outra campanha. Aí,
sim, sai coisa nova e interessante – não
porque a campanha é “integrada”, mas
porque ela é nova. Nossa missão é
resolver o problema do cliente, desconsiderando toda e qualquer fórmula já
utilizada até então.
Gabi – Como a crise se refletiu nos negócios da agência?
PJ Pereira – Brinco que somos o Forrest Gump da propaganda. Abrimos
a agência em 2009, em plena crise.
Enquanto o mercado estava demitindo, nós estávamos contratando gente.
Desde então, temos crescido ano a ano.
Hoje, temos 110 funcionários. Em 2011,
nossa receita foi de US$ 14 milhões.
Este ano, conquistamos quatro contas
– Skype, Mattel, Dial e Purex – e devemos registrar um crescimento de 30%.
Gabi – Tanto do lado da agência
quanto do anunciante, nota-se, muitas vezes, que os resultados não saem
conforme o planejado por conta de
falhas na coordenação das ações
de todos os parceiros envolvidos no
projeto. Como a Pereira & O’Dell
PJ Pereira
trabalha na tentativa de reverter esse
cenário?
PJ Pereira – Nosso trabalho é baseado
em uma ideia que integra a técnica, e
não o meio. E essa é a forma de pensar
mais velha do mundo, como mostra
o seriado Mad Men, que é ambientado nos anos de 1960 e conta a história de Donald Draper, um dos mais
influentes executivos do mercado
publicitário. O que essa série retrata
são maneiras de resolver muitos problemas da propaganda. Larry Dobrow
(publicitário que foi editor da revista
Adweek e vice-presidente da Bozell
Worldwide), um dos meus mentores,
que faleceu no ano passado, costumava contar um caso clássico para
ilustrar esse conceito. Certa vez, foi
chamado pela Government Employees Insurance Company (seguradora
dos empregados do governo), para fazer uma campanha, porque esse órgão
queria vender seguros para todos os
americanos. Ele pensou e disse: “Vocês
não precisam de uma campanha, e
sim de um novo nome”. E criou a GEICO Auto Insurance, que se tornou uma
marca querida dos americanos e uma
das maiores seguradoras do país. A
propaganda está voltando a esse ponto.
É preciso acabar com a preguiça intelectual e perguntar: qual é o problema?
Só depois de obter essa informação, é
que a agência deve pensar em alguma
solução realmente criativa.
Gabi – Em um mundo pautado pelo
excesso de canais e informações, o
storytelling pode ajudar a disseminar
uma ideia ou construir uma marca com
mais eficácia na tentativa de conquistar o
público pela emoção?
PJ Pereira – Depende da ideia. A
regra é simples: o que faz sentido
tem maior impacto. Estratégia é isso:
entender e escolher o que será desenvolvido. Fazer tudo não é inteligente,
porque deixa a marca mais fragmentada. O segredo está em pensar na
propaganda como conteúdo que as
pessoas vão querer ver. É como brincar de Lego. Você tem uma série de
blocos e pode montá-los como bem
quiser. Basta ser criativo.
gastando mais na produção. Não posso
revelar números, mas, segundo executivos das duas empresas, o aumento de
vendas foi mais do que surpreendente
no ano passado. Também registramos
um aumento quase que imoral na preferência das marcas Intel e Toshiba.
Mais do que o retorno sobre o investimento, o que vale aqui é a inovação, a
coragem que as duas marcas tiveram
de investir em algo novo.
“A regra é simples:
o que faz sentido
tem maior impacto.
Estratégia é isso:
entender e escolher o
que será desenvolvido.
Fazer tudo não é
inteligente”
Gabi – Agora, vocês acabaram de lançar
Gabi – No ano passado, você criou a
ação Inside, um filme colaborativo,
desenvolvido para a Toshiba e a Intel,
que convidou os internautas a participar
da história por meio das redes sociais.
Filmada em Hollywood, a produção
consumiu US$ 3 milhões, teve 50 milhões
de page views em 45 dias e em nenhum
momento foi exibida na mídia de massa.
Para a imagem das marcas, o retorno foi
excelente. Mas como toda essa exposição
foi revertida para um real aumento nas
vendas?
PJ Pereira – A verdade é que existe
pouco histórico para prever o que
acontece hoje depois de uma campanha como essa, porque não temos
referência. O que sabemos é que foi a
melhor campanha que as duas marcas
já fizeram. Tanto que, neste ano, Toshiba e Intel resolveram fazer uma nova
ação nos mesmos moldes da anterior e
um novo social filme, o The Beauty Inside, também para a Toshiba e a Intel. O
que mudou em relação à campanha do
ano passado?
PJ Pereira – Em 2011, contamos a história de Christina, uma mulher de 20 e
poucos anos que é sequestrada junto
com o seu notebook. Sua sobrevivência
depende da rede social, alcançando
amigos, parentes e qualquer um que
possa ajudá-la a descobrir onde ela
está presa e como pode escapar. Esse
primeiro filme era frenético e em tempo real. Agora, criamos um romance.
Estamos contando a história de Alex,
um sujeito que tem uma doença esquisita. Todo dia, ele acorda em um corpo
diferente. Um dia ele é um senhor.
Outro dia, uma mulher, e assim por
diante. Com o tempo, ele aprendeu a se
divertir e a curtir a vida desse jeito, até
o dia em que se apaixona, e isso vira
um problema. Estamos convidando
o internauta para assumir o papel de
Alex, já que não tem um dia que ele não
acorde de cara nova! Durante as próximas seis semanas, as pessoas vão
participar da ação e até conversar com
Alex pelo Facebook.
Gabi – Quais os primeiros resultados
dessa ação?
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
67
entrevista
“O segredo está em
pensar na propaganda
como conteúdo que as
pessoas vão querer ver”
essa separação, criou uma forma de
trabalhar que agora engessa a criação
de novas ideias, já que a estratégia
fica muito focada na mídia de massa.
Como nos Estados Unidos se opera
com agências de mídia, as agências de
criação não dependem de uma determinada mídia para ganhar dinheiro,
mas sim de ideias mais inteligentes
do que criativas e que realmente resolvam o problema do cliente. Essa liberdade para pensar é muito importante.
Muitos reclamam da fase atual da propaganda. Mas, hoje, trabalhar na área
está mais interessante, mais aberto e
desconfortante, já que você não tem
uma fórmula pronta.
Gabi – Há alguns anos, vocês chegaram
a trabalhar com uma trinca de criação,
em vez da tradicional dupla. Esse modelo
evoluiu, na Pereira & O’Dell?
PJ Pereira – Introduzimos a trinca de
PJ Pereira – Lançamos o trailer no
YouTube, durante a Olimpíada de Londres e o vídeo foi o mais assistido em
todo o mundo, superando até as marcas patrocinadoras dos Jogos Olímpicos. Antes do lançamento, ocorrido
no último dia 16 de agosto, a página já
registrava mais de 6 milhões de views.
Esse é um romance, o que faz com que
a ação atinja um público maior.
68
Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
Gabi – Com base nesse tipo de ação,
quais as principais diferenças entre o
mercado anunciante dos Estados Unidos
e o do Brasil?
PJ Pereira – No Brasil, a maior dificuldade está na impossibilidade de
separar mídia de criação, por conta do
poder da TV, da mídia impressa. A conquista que o país teve, ao não permitir
criação porque não tínhamos no mercado muitos criativos com experiência
no mundo digital. Então, passamos a
trabalhar com uma dupla tradicional
e um profissional mais técnico. Hoje,
não faço mais isso. Não contrato ninguém que não tenha compreensão do
meio digital, até porque o mercado
americano já formou uma geração de
profissionais especialistas em on e off-line. Voltei para o formato das duplas,
mas com combinações diferentes.
Dependendo da ação, um designer
pode trabalhar em conjunto com um
redator, um especialista digital pode
formar uma dupla com um criativo…
PJ Pereira
Gabi – Hoje, algumas agências de RP estão criando departamentos de publicidade para promover a imagem das marcas
no mundo digital. Nesse novo modelo de
negócios, publicitários trabalham em parceria com jornalistas para gerar notícias
e anúncios diferenciados para grandes
marcas, como Google, Facebook e Microsoft. Qual a sua avaliação sobre esse novo
momento pelo qual passa a indústria da
comunicação, em especial o mercado
publicitário?
PJ Pereira – Esse é o ponto que separa
a propaganda moderna da antiga. As
redes sociais são lugares onde pessoas
estão conversando sobre os mais diversos assuntos. Na hora que a empresa entra nessa conversa para dar opinião, o
internauta para de falar. Esse ambiente
digital pertence às pessoas. Para a marca entrar nesse meio, precisa ser muito
cuidadosa e oferecer conteúdos que tenham valor para as pessoas. Dessa forma, a melhor estratégia de mídia social
é a da invisibilidade, que faz com que
a conversa aconteça sem que a marca
apareça. A empresa só acende o pavio e
depois a coisa pega fogo sozinha.
Gabi – E qual é a consequência disso no
dia a dia das agências?
PJ Pereira – Aqui, o que tenho visto
é que os investimentos estão sendo
radicalmente movidos da mídia para
a área de produção. Antes, você tinha
90% da verba sendo destinada para a
mídia e 10% apenas para a produção.
Hoje, a própria Toshiba está investindo
60% na produção do The Beauty Inside.
Todos estão tentando transformar a
mensagem publicitária em conteúdo
que possa ser compartilhado pelas pessoas. Então, precisamos de profissionais que pensem na mensagem como
entretenimento e não mais como ação
de marketing. É o que faz um estúdio
de cinema quando lança um filme. Ele
não gasta anunciando a nova produção,
e sim fazendo o filme. Por meio de uma
boa divulgação, de um trabalho de RP,
espalha a mensagem antes da estreia,
o que faz com que o filme seja considerado um sucesso antes mesmo do seu
lançamento. E a verba publicitária ele
investe toda no primeiro fim de semana de exibição.
“Hoje, o valor de uma
ideia é o poder que ela
tem de ser comentada
entre os amigos, a
imprensa e a sociedade.
Isso torna a área de
relações públicas cada
vez mais relevante
para as marcas”
Gabi – Como o profissional de marketing deve encarar essa nova fase da
indústria da comunicação?
PJ Pereira – No mundo social, o que
vale é o princípio da gravidade: massa
atrai massa. Nesse novo cenário, o segredo está em conseguir construir massa crítica em pouco tempo. É preciso ser
rápido para que as pessoas que não estão falando do assunto achem que estão
perdendo uma conversa importante. Se
demorar, a ação morre de inanição. É aí
que mídia paga funciona. Nos Estados
Unidos, muitos anunciantes compram
uma cota de patrocínio no Super Bowl
– evento esportivo de maior audiência
nos Estados Unidos e que tem a publicidade mais cara da TV americana – para
dar visibilidade às suas marcas. Eles
preparam o comercial e, uma semana
antes do jogo, veiculam o filme na web
para que, quando o público assistir a
esse comercial no Super Bowl e depois
for procurá-lo no YouTube, veja que ele
já tem massa crítica. O problema é que
o profissional de marketing se acostumou a fazer tudo com base no ROI
(retorno sobre o investimento). Nessa
nova era, ele precisa ser mais intuitivo,
não deve mais contar só com a muleta
dos números. Muitos esqueceram que
propaganda dá retorno e passaram a fazer conta. Na hora que o profissional de
marketing virou sujeito dos números,
deu um tiro de bazuca no próprio pé e
acabou ganhando um chefe, um CFO
(Chief Financial Officer).
Gabi – E qual é o próximo salto que a
comunicação dará?
PJ Pereira – Tenho a sensação de que
será o mesmo salto que a propaganda
deu quando montou a dupla de criação,
colocando diretor de arte e redator
para trabalhar juntos. Isso acontecerá
quando o profissional de RP passar a
trabalhar em dupla com o atendimento.
Essa sinergia entre informação e publicidade mudará tudo novamente. Hoje,
o valor de uma ideia é o poder que ela
tem de ser comentada entre os amigos,
a imprensa e a sociedade. Isso torna
a área de relações públicas cada vez
mais relevante para as marcas. Agora,
essa disciplina está sendo incluída
dentro do mundo da propaganda. Mas
é importante ressaltar que esse é um
trabalho completamente diferente do
que faz hoje a assessoria de imprensa.
A assessoria não tem capacidade de
inventar uma história, já o RP, junto
com as agências de propaganda, sim. A
propaganda já é uma mistura de digital,
assessoria de imprensa, design, marketing direto e entretenimento. Mas não é
preciso usar tudo de uma só vez. Basta
ter a ideia certa e avaliar em qual canal
ela sobreviverá.
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
69
comportamento
O princípio
do beijo
Não há milagres, mas pequenos atos podem interferir
positivamente na qualidade dos relacionamentos pessoais
e profissionais. Surpreenda-se, não há nada de novo nisso!
Por Adriana Gomes
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A
pesar da aparente conectividade em que vivemos e de todas as
maneiras possíveis de se comunicar que a humanidade tem
à disposição, atualmente, uma das queixas mais frequentes
entre as pessoas é a dificuldade nas relações, em todas as
esferas, profissionais, pessoais e familiares.
Vivemos numa Torre de Babel, quando o assunto é comunicação interpessoal. As pessoas, em geral, demonstram grande dificuldade para expressar
verbalmente as suas ideias, objetivos, percepções e emoções. Num mundo
de imagens em que os instantâneos fotográficos substituem as palavras, a
relação com a comunicação verbal está realmente perdendo espaço.
Não é difícil flagrarmos a humanidade teclando freneticamente em seus
aparelhos celulares por todos os lados, nas ruas, nos elevadores, nas salas de
aula e até ao volante. Em estudos apresentados pela Associação Brasileira
de Medicina de Tráfego (Abramet), o condutor que envia SMS enquanto
dirige aumenta em 23 vezes as chances de sofrer ou provocar uma colisão.
É a quarta principal causa de acidentes de trânsito no Brasil e no mundo.
Esse teclar constante captura a pessoa para um espaço virtual, fazendo
com que, muitas vezes, perca o contato com a realidade física. Temo que, até
durante as refeições, prefira teclar para seu acompanhante a falar com ele ou,
pior, a companhia em carne e osso seja menos interessante do que a virtual.
É o empobrecimento da capacidade mais humana que possuímos. Tudo
me parece superficial, breve e rápido. Por outro lado, e talvez na mesma
proporção, a capacidade para escutar o outro parece estar diminuindo.
Não somos os melhores ouvintes. A experiência da digitação de mensagens
coloca o receptor na condição de leitor.
Estamos perdendo a capacidade de escutar atentamente o outro. Quando se tecla, o tempo de resposta se dá no tempo do outro, e isso pode ser
um flagelo para quem espera, pois a expectativa é que o outro responda
imediatamente, no tempo de quem digita. Se o outro estiver conectado no
mesmo tempo, sorte, senão a mensagem estará lá e será respondida, ou
não, em outro tempo.
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comportamento
Vai se perdendo também a capacidade de “ler” os sinais
das expressões faciais, pois as pessoas não têm fisionomias
emoticons. Os sentimentos humanos são muitos, e não raramente contraditórios. Difícil escolher aquele que melhor
defina determinada situação. Por vezes, devem ser vários os
emoticons para a mesma situação, e ainda deve-se contar que
o receptor seja ótimo intérprete, senão fica por isso mesmo
– “eu escrevo e o outro finge que entende”, e acaba por aí. No
Facebook só existe a opção “curtir” ou o silêncio, o desprezo.
Não ser curtido é uma experiência chata. Dizer alguma coisa
que ninguém notou é como contar uma piada sem graça, que
ninguém ri, e que deixa o contador constrangido.
Pior do que perder a percepção do outro é perder a conexão consigo mesmo. Tornar-se incapaz de reconhecer as
sensações do próprio corpo e os próprios sentimentos em
relação às coisas e pessoas. Se não for capaz de reconhecer os
sentimentos e sensações em si mesmo, o que dirá no outro.
Falta o sentir, depois vem o verbo. A humanidade caminha
a passos largos nessa direção, evitando sentir e não falar.
Agora, transporte tudo isso para o ambiente organizacional. São muitos os desafios dos gestores de pessoas.
As relações humanas nunca foram simples. Porém, com o
advento da “virtualização”, as relações dos gestores com a
equipe também precisam de atenção.
Meu pensamento é que, antes que os gestores se entusiasmem com novos aplicativos e ferramentas eletrônicas, para
gestão de pessoas, deve-se retroceder para o básico, a construção de vínculos. Essa ideia do princípio KISS, acrônimo
que em inglês quer dizer “Keep it simple, stupid” ou “keep it
simple and straightforward”, também um trocadilho de “princípio do beijo”, valoriza a simplicidade do projeto e defende
que toda a complexidade desnecessária seja descartada.
Muito se revela através do bom e velho olho no olho, da
escuta ativa, da atenção ao não verbal e à linguagem corporal. Fatalmente, são aspectos que se perdem numa relação
virtual e/ou digitalizada.
Não quero fazer nenhuma crítica contra as ferramentas
eletrônicas. Elas vieram para ficar. Facilitam a vida, desde
que as dominemos, e não sejamos dominados por elas.
Campanha contra a “cultura do ódio”, criada pela Benetton,
que levou o Grand Prix na categoria Press do Festival de
Cannes 2012, ilustra o conceito do príncipio do beijo
Percebo as pessoas escravas de seus aparelhos. Algumas
até adoecem se ficam sem conexão, como se estivessem
abandonadas ou excluídas do universo. Será?
Segundo o American Journal of Psychiatry, mais do que
vício, o uso excessivo de internet pode ser considerado distúrbio mental. “Viciados” podem perder a noção do tempo,
chegando a esquecer de comer e dormir. Comportamentos
exagerados podem levar ao isolamento social. Quem não
vive sem o aparelho celular também é chamado de nomo-
“Estamos perdendo a capacidade de escutar atentamente o outro.
Quando se tecla, o tempo de resposta se dá no tempo do outro, e isso
pode ser um flagelo para quem espera, pois a expectativa é que o
outro responda imediatamente, no tempo de quem digita”
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sociedade
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Percebo as pessoas escravas
de seus aparelhos. Algumas
até adoecem se ficam sem
conexão, como se estivessem
abandonadas ou excluídas
do universo. Será?
fóbico. Na Inglaterra, esse termo surgiu para designar o mal
que afeta cerca de 76% dos jovens do país.
A atenção para a criação de vínculos é importante, mesmo
que sejam virtuais ou a partir deles. Nem sempre as relações
são satisfatórias, e isso acontece não só em função de “com
quem”, mas também do “como” nos relacionamos, e variam
de acordo com a qualidade, a consistência, a constância, o
significado, a força.
O ambiente digital on-line oferece condições ideais para
que as pessoas se expressem, e isso pode trazer oportunidades e ameaças. Há redes mais focadas nas relações
profissionais, visando à exposição das experiências no
mercado de trabalho e à participação de grupos relacionados
a tais interesses. Isso tem facilitado muito os processos de
recrutamento e seleção e até, em muitos casos, encurtado o
caminho para localizar pessoas que sejam facilitadoras para
aproximar profissionais e/ou empresas com interesses afins.
Quanto às ameaças, a mídia especializada informa:
“Cuidado com sua imagem 2.0”. Empresas de recrutamento
e seleção utilizam informações das redes sociais para analisar o perfil dos candidatos. Tudo pode ser utilizado contra
você. Comentários negativos sobre a empresa, vazamento de
informações sigilosas, opiniões desdenhosas sobre líderes
e gestores. Demissões decorrentes de postagens viraram
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lugar comum. Certamente, não é nesse espaço que se deve
dizer tudo o que se pensa.
Há outras redes em que a proposta é mais social e se vê de
tudo. Disseminação de pensamentos filosóficos, imagens
agradáveis, paisagens bucólicas, refeições em andamento,
desabafos, piadas, pensamentos comunitários, compartilhamentos de ideias e ideais nem sempre praticadas por
quem as posta. Parece um mundo de fantasias, sorrisos,
festas e viagens. Celebridades anônimas se mostrando para
quem quiser ver. Pode-se até pensar que as pessoas sejam
mesmo “janelas abertas” para o mundo.
A meu ver, sob os Avatares sorridentes, parece mais uma
tentativa de fuga da realidade, a busca da satisfação imediata, do ser visto, notado, da relação sem compromisso, do
contato sem profundidade, lazer para o indivíduo e distração
fácil e garantida no ambiente de trabalho. Por outro lado, é
enorme o potencial de negócios cibernéticos, impensáveis
há bem pouco tempo, pois é possível monitorar tudo por
meio das tantas ferramentas de informações e inteligência
sob inocentes cliques. Sabia que a câmera de vídeo do seu
computador pode ser ligada remotamente sem que você
saiba? Que você certamente já conversou com robôs e nem
se deu conta? Já recebeu como resposta a alguma informação
postada na internet a seguinte pergunta: “Você é humano?”.
“A atenção para a criação de vínculos é importante, mesmo que
sejam virtuais ou a partir deles. Nem sempre as relações são
satisfatórias, e isso acontece não só em função de “com quem”, mas
também do “como” nos relacionamos, e variam de acordo com a
qualidade, a consistência, a constância, o significado, a força”
Há pesquisas nesse “cyberterreno”, de arrepiar.
Mas o tema do vínculo é desafiador. Voltemos a ele, porque, de fato, expor-se para o outro gera diversos sentimentos:
medo, ansiedade, angústia, prazer, alegria, cooperação,
cumplicidade, competitividade, inveja etc. Assim, o ato de
se relacionar ou de criar vínculo implica o exercício de estar
atento a si e ao outro e cuidar dessa relação. O que de fato não
acontece nas redes sociais. O exercício é individual, a pessoa
posta o que ela quer, sem qualquer tipo de preocupação. O
outro ou outros da sua rede de relacionamento, em muitos
casos, é um desconhecido.
É fato que em muitas ocasiões é mais fácil falar sobre situações difíceis com um estranho. Isso realmente promove a
sensação de alívio, mas, no caso virtual, a exposição atinge
escalas gigantescas, correndo o risco de a pessoa sofrer
“bullying eletrônico” ou “cyberbullying”.
Voltemos então às relações não virtuais, para o simples, o
básico, que é a proposta deste artigo. Como construir vínculos, a base dos relacionamentos humanos? Como melhorar a
comunicação entre as pessoas em todas as esferas?
Não há milagres, mas pequenos atos podem interferir positivamente na qualidade dos relacionamentos. Surpreendase, não há nada de novo nisso. Não se trata da inovação das
comunicações, apenas o básico. Seguem algumas dicas ou
sugestões que poderão fazer diferença:
• Olhar e perceber a pessoa com quem você mantém uma
conversa, por mais breve que seja. O olhar é a maneira
mais poderosa de inclusão, e seu contrário também
é verdadeiro.
• Dirigir-se às outras pessoas com gentileza, utilizar
palavras como “por favor”, “obrigado”, demonstrando a
capacidade de reconhecimento de um préstimo.
• Elogiar com palavras gentis.
• Cumprimentar as pessoas com quem você convive, nos
elevadores, corredores, em salas de reunião, em casa,
os pais, os filhos, os irmãos, os vizinhos.
•
•
•
•
Respeitar as diferenças, desenvolver a capacidade
empática. As pessoas são diferentes. Às vezes, digo
para alguns pais que não é preciso enviar o filho para
uma experiência no exterior; basta mandá-lo para a casa
de um amigo por uns dias, e ele já perceberá a diferença.
Evitar o modo “multi e automático” quando iniciar a
conversa com alguém. Não seja mecânico. Privilegie
aquele momento, e só aquele momento. Mantenha o
foco naquilo que está fazendo, principalmente se
envolver outra pessoa.
Escutar o que o outro está dizendo. Evitar interromper
quem está falando e aguardar que finalize o raciocínio
antes de responder.
Evite julgar o outro e fazer críticas desnecessárias.
A sensibilidade é fundamental.
Por parecer relativamente simples, as pessoas não costumam dar muita atenção para esse tipo de comentário.
Entretanto, se vale como estímulo, não somos nada sem
os outros. O ser humano é naturalmente gregário, e a vida
em sociedade permite o amplo aprendizado, consigo e com
os outros. Conseguimos nos desenvolver e melhorar como
seres humanos pelas relações com o outro. As pessoas
percebem, assim como você, quando alguém está verdadeiramente interessado no que está sendo dito.
Precisamos do outro para saber se crescemos. É ele quem
nos informa, direta ou indiretamente, sobre a nossa própria
evolução e adequação social, favorecendo o autoconhecimento. Assim, não espere que o outro dê o primeiro passo
para começar a agir de maneira mais gentil e cordial. Talvez,
no início, alguns até achem estranho, mas se o que foi dito
neste artigo fizer sentido para você, coloque em prática.
Adriana Gomes
Diretora do site www.vidaecarreira.com.br. Coordenadora
do Centro de Carreiras e do Núcleo de Estudos e Negócios
em Desenvolvimento de Pessoas da ESPM
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Estratégia
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A costura da
comunicação
integrada
A gestão contemporânea de processos de
comunicação encontra respostas no básico
e no essencial para desenvolver um conceito
estratégico capaz de integrar todas as ações do
plano e definir o papel de cada ação diante dos
objetivos do projeto e da proposta de integração
Por Paulo Roberto Ferreira da Cunha
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Q
uanto mais complexo o cenário das alternativas estratégicas de comunicação, mais vital
o debate acerca da prática da comunicação
integrada. A demanda pelo exercício estratégico e cotidiano da comunicação ultrapassa a questão
financeira para seguir ao encontro da coordenação e
da implementação de projetos alinhados às marcas,
inseridas em ambientes muito competitivos. A ideia é
provocar uma reflexão sobre a gestão de processos de
comunicação, não para propor rupturas, mas para ampliar a percepção de oportunidades e evitar que novos
paradigmas compliquem, desnecessariamente, o tema.
Por mais óbvio que possa parecer, a premissa da comunicação integrada é o alinhamento estratégico do
conjunto de ações de comunicação de uma marca em
torno de um conceito estratégico. Cabe, pois, resgatar que
toda marca possui um posicionamento baseado em seus
atributos e benefícios. É recomendável que esses atributos possam ser traduzidos em uma proposta estratégica
contextualizada no momento, nas práticas de comunicação dos players da categoria em que ela está inserida e
na possibilidade de estabelecer um diálogo mais efetivo
com seus consumidores-alvo.
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Estratégia
Essa é uma prática que gera maior competitividade,
contemporaneidade e senso de oportunidade, além de
preservar os valores da marca, oriundos do próprio posicionamento. O resultado final do processo é o conceito
estratégico, que será a base para a consecução dos projetos
de comunicação. Especificamente no que tange ao trabalho da criação, o conceito tende a evoluir para uma abordagem, um tema de campanha, uma concepção criativa,
cujo foco será sempre a tradução da lógica estratégica em
envolvimento e encantamento.
A essência da prática
A prática da comunicação integrada não consegue, de fato,
se sustentar apenas na premissa do conceito estratégico
de uma campanha ou de plataformas de ações. Isso porque
é parte fundamental do pensamento estratégico indicar
áreas e formas em que esse conceito será implementado,
concretizando assim o objetivo proposto para o projeto.
Trata-se de desenhar a arquitetura do plano de ações, onde
a indicação de áreas da comunicação deve aparecer, sem
recair no detalhamento tático de cada ação, posto que isso
será mérito de profissionais das áreas e arenas indicadas.
Por mais estranho que possa parecer, há planejadores que
delimitam anacronicamente a sua prática até a definição
da estratégia de comunicação, incluindo-se aí até a definição do conceito.
Nesse sentido, é importante que o gestor de processos
estratégicos de comunicação compreenda as características, potencialidades e oportunidades de cada disciplina
para poder arbitrar a confluência e a complementaridade
das ações a serem propostas. Também é preciso saber
como mensurar os resultados – sim, a ética pressupõe não
apenas indicar, mas acompanhar e mensurar os impactos
versus o objetivo do projeto.
Ampliando a perspectiva da comunicação integrada,
a potencialidade das ações de comunicação deve ser
avaliada para que recursos e espaços sejam corretamente
atribuídos. Teóricos adotam, por exemplo, terminologias
contemporâneas como plataformas e multiplataformas.
Mas o que realmente diferencia essas duas estratégias de
uma campanha convencional?
O plano de ações de uma campanha compreende o
esforço pontual voltado à consecução de um objetivo que
determinada marca possui. Em paralelo, a mesma marca,
certamente, implementa outras atividades e pontos de
contato com seus stakeholders. Se uma dessas atividades
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É importante que o gestor de
processos estratégicos de comunicação
compreenda as características,
potencialidades e oportunidades
de cada disciplina para poder arbitrar
a confluência e a complementaridade
das ações a serem propostas
adquire um caráter mais perene, consolidada em foco e
independentemente das demais ações de comunicação,
pode ser definida como plataforma. Se a marca possuir
mais de uma, pode-se afirmar que trabalha com uma
estratégia multiplataforma. Em outras palavras, usar o
Facebook para divulgar parte de uma campanha é matéria
diferente de ter no Facebook e/ou em outras mídias sociais
um ambiente propício, com objetivo e estratégia própria,
que transcenda uma campanha. Portanto, entender o papel de cada ação e manter as premissas do posicionamento
e do conceito estratégico são posturas fundamentais para
que o conjunto dos esforços de comunicação desenvolvidos por uma marca consiga construir, numa perspectiva
mais ampla, a mesma percepção que se coadune com o
processo de branding de forma exemplar.
O caso Sprite
A partir do relatório Creative Planning Awards, da Ogilvy
América Latina, a campanha da marca de refrigerantes
Sprite – As coisas são como elas são – surge como exemplo
de integração de ações pontuais de comunicação. Lançada
na Argentina, com posterior roll-out no continente, a campanha teve por objetivo reinventar o sentido de autenticidade,
expondo o que um adolescente, o principal target-group de
Sprite, nunca contaria a ninguém: pensamentos e opiniões
que expressam seu peculiar comportamento, coisa que um
adulto jamais faria. Dessa forma, a transparência poderia
ser exercitada por uma franqueza “absoluta”. O conceito que
alinhou todas as ações – brutal honesty – traduzia a honestidade com o toque irreverente e marcante do adolescente.
Em termos do conjunto de ações de comunicação dessa
campanha, dois comerciais para a TV apresentaram esse
tom provocador. O primeiro polemizava que, após um bom
gole de refrigerante, a melhor coisa da vida seria arrotar – e
desfilavam as personagens, em cenas cotidianas, praticando essa máxima. Outro, mais recente, demonstrava fatos
”As coisas como são” - a campanha da Sprite retratou as verdades da vida, como os filmes ”Arroto” e ”Ver beber dá sede”
não ditos como a expectativa de não receber presentes no
seu aniversário. Em paralelo, outras ações – como mídia digital, eventos, merchandising no PDV – compunham o ambiente para que a experiência gerada pela marca por meio
dessa campanha fosse devidamente assimilada. Também
foram criados o blog Fale a verdade sobre celebridades, o site
www.somebodyhadtotellyou.com e a loja-conceito Brutal
honesty store, onde araras disputavam espaço com placas
que apontavam coisas como “Ei, esta camiseta faz você
parecer uma vadia”. A campanha contou ainda com uma
promoção de vendas, que provocava os consumidores com
chamadas do tipo “Existem 0,0002% de chances de você
ganhar este Hummer 2.0. Por que você ganharia se você
nunca ganhou nada em toda a sua vida?”.
Um olhar preciso observará que o conceito da marca
aparece o tempo todo, dialogando com os adolescentes, em
ações focadas nessa campanha e, sobretudo, em detalhes
não tão pequenos, mas fundamentais para o exercício da
experiência fidelizadora e da diferenciação.
O caso Axe
Tomando por base a livre interpretação da estratégia de
comunicação da marca global de desodorantes Axe, da Unilever, é possível encontrar aquilo que se caracteriza como
campanha e como plataforma, e atentar para a construção
da força de sua imagem e de sua comunicação mesmo com
outro label – Lynx – em alguns países. O conceito estratégico
de Axe e de Lynx é o mesmo e está presente em todas as
ações de comunicação do mundo – que pode ser descrito
como “coadjuvante do homem contemporâneo urbano em
suas conquistas diárias” – e que reflete toques sexistas e
machistas. A arquitetura da comunicação de Axe sugere a
existência de três pilares, que concentram, praticamente,
todas as ações e plataformas: campanhas de lançamento de
fragrâncias, ações de branding e projetos táticos.
Um bom exemplo disso foi o lançamento da fragrância Jet,
que aconteceu na Austrália em 2005, quando, em um esforço
multitask, Lynx criou uma companhia aérea fake – Lynxjet – e,
com isso, pelos comerciais para TV, spots para rádio, virais,
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Estratégia
pontos de contato na internet, redes sociais, eventos, anúncios em jornais e revistas, além de intervenções urbanas com
um grupo de fogosas comissárias de bordo, pôde explorar o
imaginário masculino sobre esse ambiente enquanto vendia
o novo produto. Na mesma linha, uma das mais recentes
campanhas brasileiras de Axe explora a síndrome da transpiração precoce para estabelecer uma cumplicidade com o
consumidor, ao exibir, sugestivamente, um dos temores
masculinos por meio do humor. Observa-se que, pelo caráter
de sua orientação massiva, essas campanhas fazem uso forte
de mídia TV e de diversas ferramentas de comunicação para
atingir seus objetivos de gerar rápido e alto conhecimento.
De modo complementar ao principal eixo de visibilidade – que são os lançamentos de fragrâncias –, Axe e
Lynx apostam em ações de branding, cujo objetivo é esta-
Million Axe Homepage foi uma ação viral feita para divulgar
o novo site de Axe no Brasil
Para lançar a fragrância Jet, em 2005, foi criada uma
companhia aérea fake - a Lynxjet -, que explorou o
imaginário masculino em diversos meios de comunicação
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belecer diálogos mais próximos com os consumidores,
evidenciando seus valores propostos no posicionamento
e no conceito estratégico, aqui exemplificados: (1) Na
década de 1990, em Londres, foi inaugurada a barbearia
Lynx Barbershop, onde a ambientação detalhadamente
masculina, sem apelos sensuais, buscou inspiração em
cokpits de carros de Fórmula 1 para desenvolver a bancada
e a cadeira. Como point masculino, foi palco de eventos de
visibilidade midiática, como o lançamento do Playstation
2, relacionando assim a marca a elementos do universo
masculino. (2) Em 2006, em parceria com a MTV, foi lançado nos Estados Unidos o reality show Game killers, com
personagens que incorporavam os perfis identificados em
pesquisa anterior, como aqueles que mais atrapalhavam
um homem na hora do xaveco em uma balada. E, por meio
da participação popular, também estimulada por comerciais cômicos que mostravam individualmente esses
tipos em ação, foi escolhido o pior deles. (3) Em 2007, foi
lançada a minissérie de animação City hunters, desenvolvida em parceria com o canal Fox da Argentina – depois
veiculada em outros países, como o Brasil –, cuja temática
extremamente erótica dos 15 episódios girava em torno
do aprendizado do jovem Axel sobre a sedução feminina,
dentro de uma milenar confraria masculina dedicada ao
tema, para que assim se tornasse um absolutis seductor.
masculino, que se transformava em alavanca para mecânicas promocionais e passos de engajamento do consumidor.
Por fim, cabe apontar que o portfólio de atividades de
comunicação de Axe/Lynx pressupõe e comprova a importância de um conceito estratégico estruturado e forte. Uma
vez definido, ele ganha vida na medida em que é adotado
e investido. Permite que se desdobre em ricos detalhes a
cada particularidade das ações implementadas, a ponto de
prevalecer ante a existência de duas marcas para o mesmo
produto. Observa-se que cada campanha possui um conjunto de ações de comunicação, ao mesmo tempo que algumas
das atividades começam a constituir abordagens e processos específicos – como o caso das ações de relacionamento
através de canais digitais – e que podem ser denominados
como uma plataforma digital. É plataforma na medida em
que possui vida própria, embora participe de algumas das
ações de outras campanhas e que compartilhe o mesmo
conceito estratégico.
A arquitetura da comunicação de Axe
sugere a existência de três pilares, que
concentram, praticamente, todas
as ações e plataformas: campanhas
de lançamento de fragrâncias, ações
de branding e projetos táticos
O terceiro pilar, o de projetos táticos, apresenta um
range amplo de necessidades e soluções – desde ativações
regionais a eventos patrocinados, passando por atividades
de relacionamento e promoções. Como exemplo, em 2007,
a campanha viral Million Axe Homepage tinha por objetivo
divulgar o novo site da marca no Brasil e estimular o então
insuficiente volume de acessos. Nela, a fictícia modelo
Carol supostamente faria um ensaio fotográfico sensual
para Axe. Para ter o vislumbre das fotos, o interessado deveria se cadastrar antes. Depois, no site, cada acesso desse
internauta eliminava um dos pixels que cobriam a foto da
Carol, configurando a lenda não comprovada de que, ao
se completar um milhão de acessos, a imagem nua seria
revelada. A iniciativa estimulava a ideia de que “ele havia
ajudado a tirar a roupa de Carol”. Uma promoção anterior a
essa ação, a Ilha do Jeremias, também no Brasil, prometia aos
participantes a possibilidade de ganhar, em um sorteio, um
final de semana de baladas e muitas mulheres bonitas numa
ilha deserta. Ambos os casos brincavam com o imaginário
O olhar contemporâneo
Por mais que inovações, tecnologias e preceitos sejam
promulgados constantemente, ainda que repletos de valor, a prática da comunicação integrada convoca gestores
de processos de comunicação a buscar no básico e no
essencial as respostas, talvez mais elementares àquelas
que, independentemente do que possa advir em termos
de práticas ou pensamentos, permanecerão como fundamento: a urgência do conceito estratégico que traduza
o posicionamento da marca; a articulação do conceito
estratégico entre ações diferenciadas de comunicação
e a compreensão e a delimitação do papel e da função de
cada ação perante o todo do espectro comunicativo de uma
marca e o respectivo objetivo que norteará a sua exposição.
Sem esquecer que o entusiasmo da discussão abstrata da
estratégia não deve nunca prevalecer sobre o ofício de gerir
impactos, gerar experiências fidelizadoras e mensurar
resultados. Reside aqui a ética de gestores, estrategistas
e planejadores de comunicação, básica e elementar como
o pensamento deve ser, antes de se sofisticar. Delicado na
costura, forte na resistência.
Paulo Roberto Ferreira da Cunha
Professor de planejamento estratégico e supervisor da trilha de
comunicação integrada da ESPM-SP, publicitário, consultor de empresas,
psicanalista, coach e autor do livro O cinema musical norte-americano:
gênero, história e estratégias da indústria do entretenimento
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marketing digital
Manual de
sobrevivência
digital
O ciberespaço é um meio relativamente barato
de divulgar e criar valor para uma marca.
Mas, se você não souber fazer isso bem, estará
desperdiçando recursos da sua organização
Por Ana Luiza Collares Xavier
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A
coisa mais importante que se deve saber sobre tecnologia é
que ela muda os hábitos e costumes das pessoas. Sendo assim, faz-se necessário entender e mapear o impacto dessas
mudanças para extrair benefícios e se adaptar ao meio. O
homem é um ser social. “Ainda que mude a forma ou o meio, ele continua sendo aquele ser social estudado por Aristóteles na Antiguidade.
A humanidade, mesmo após várias evoluções da curva ascendente, na
espiral histórica, não mudou sua essência. A conexão entre os homo
sapiens é natural, posto que somos um ser coletivo, que necessita de
outras pessoas e de compartilhar coisas para realizar sua plenitude
como indivíduo”, afirma João Batista, titular da JB2 Innovation, em
artigo publicado na revista Wide (edição março/abril de 2012), com o
título de “No timeline do Facebook você é você?”.
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marketing digital
Porém as coisas estão mudando rapidamente. “Hoje
podemos perceber uma demanda por portabilidade,
comodidade, praticidade e imediatismo. Queremos facilidade, estamos mais exigentes e com uma postura mais
ativa”, ressaltou Ari Meneghini, diretor-executivo do IAB
Brasil, durante uma das edições do Fórum de Marketing
Digital Digitalks Day 2012, evento itinerante realizado em
diversas capitais do Brasil, com o objetivo de compartilhar
conhecimento e difundir as tendências e novidades do
marketing digital no mercado nacional.
Outro palestrante do Fórum, o CEO do Show de Ingressos, João Kepler, salienta que as barreiras foram rompidas
de forma que o real e o virtual se misturam e ao mesmo
tempo se complementam. “Vivemos conectados, ligamos
menos e cada vez mais deixamos de mandar e-mail. Passamos a usar as redes sociais.” Houve uma mudança de
poder da empresa para o consumidor que, em posse da
possibilidade de expor seus descontentamentos a infinitos
usuários nas redes sociais, altera a percepção de inúmeras
pessoas sobre uma marca, tanto positiva quanto negativamente, no espaço de um segundo.
Nesse cenário é importante para as empresas serem
transparentes, pois é fácil descobrir uma mentira.
A estratégia a ser adotada na web deve estar focada
em conteúdo, em formar conexões com os diversos públicos de interesse, interagir, entender necessidades dos
internautas e saber como atendê-las. Deve-se também
ficar atento aos usuários mais relevantes, saber deles a
abrangência e o sentimento com a sua marca. Existem
ferramentas no mercado para medir essa relevância.
As marcas que usarem as redes sociais apenas para
vendas vão fracassar. “A rede não foi criada para as pessoas
falarem das empresas, e sim para se conectarem e trocarem informações. Devemos ouvir, aprender e transformar
esse aprendizado em melhorias de serviço, produto e
processo”, explica Tiago Luz, presidente da underDOGS,
que também participa do Fórum de Marketing Digital Di-
Sentir que descobriu algo surpreendente
na web e querer compartilhar
faz parte dos momentos mais
agradáveis que passamos em frente à
tela do computador. Logo, seja criativo e
inusitado nas suas campanhas
gitalk Day 2012. De acordo com o Google Worldwide, ele foi
responsável por idealizar o melhor case mundial de SEM
no setor imobiliário, para a Tecnisa, que destacou o uso
de palavras-chave em campanhas de links patrocinados,
busca orgânica, LandingPages de outros setores, além de
compra de mídia segmentada por canais e horários.
As empresas têm o costume de realizar suposições
sobre o seu cliente, de pensar que compreendem o que se
passa na cabeça dele. Porém muitas delas apenas imaginam, não sabem de verdade. A única forma de conhecer realmente o cliente é ouvi-lo. Há ferramentas que permitem
isso, como pesquisas. Podemos também mapear o que ele
faz na rede, com quem ele se comunica e o que comunica.
A mensuração das ações no meio digital deve ser planejada tanto quanto nas outras mídias. Afinal, como saber
o que está dando certo ou errado? Os erros devem ser relacionados e classificados como lições aprendidas. Essas
análises ajudam a traçar novas estratégias e diminuir
riscos nos planejamentos futuros, possibilitando chegar
aos objetivos de forma eficaz.
Buzz na rede
O segredo para que uma campanha cause o buzz na web
é entender o usuário. Deve-se saber o que interessa a ele
e ao seu grupo, a fim de entregar um conteúdo que possa
atendê-lo e surpreendê-lo, gerando exposição positiva da
empresa e maior valor agregado à marca.
“Se você conhece o inimigo e conhece a si mesmo, não precisa
temer o resultado de cem batalhas. Se você se conhece, mas
não conhece o inimigo, para cada vitória ganha sofrerá também
uma derrota. Agora, se você não conhece nem o inimigo nem
a si mesmo, perderá todas as batalhas”, Sun Tzu, filósofo chinês
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Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
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O usuário deve sentir uma simplicidade na ação proposta, aliando fatores de seu convívio de forma a transportá-lo
para dentro da comunicação. Ele tem de se identificar na
peça e acreditar que estamos falando diretamente com ele.
É preciso despertar o sentimento de descobrimento
de algo novo, interessante e estimulante. Isso porque
sentir que descobriu algo surpreendente na web e querer
compartilhar faz parte dos momentos mais agradáveis
que passamos em frente à tela do computador. Logo, seja
criativo e inusitado nas suas campanhas e dê facilidade
de compartilhamento para seus fãs e seguidores.
Não se esqueça de ter uma estratégia por trás da campanha, que precisa estar alinhada ao posicionamento
de sua empresa. É necessário que seus objetivos sejam
alcançáveis e que estejam claros e bem definidos. Afinal,
vemos aquele velho ditado: “Para quem não sabe aonde
quer chegar, qualquer caminho serve”.
Concorrência virtual
“Se você conhece o inimigo e conhece a si mesmo, não
precisa temer o resultado de cem batalhas. Se você se
conhece, mas não conhece o inimigo, para cada vitória
ganha sofrerá também uma derrota. Agora, se você não
conhece nem o inimigo nem a si mesmo, perderá todas
as batalhas”, assegura Sun Tzu, o famoso estrategista da
China antiga. Então, lembre-se:
• Você é o que compartilha! Se só escrever bobagem,
só terá seguidores bobos.
• A empresa não é o que diz ser, e sim o que os clientes
dizem que ela é.
• Conheça seu público-alvo.
O conteúdo na rede é colaborativo. O compartilhamento
de experiências deve ser o foco ao formular as estratégias
de marketing empresarial do mundo hodierno.
Ana Luiza Collares Xavier
Formada em comunicação social pela ESPM-Rio, fez curso de
marketing global na University of California Irvine (UCI) e hoje
é aluna de pós-graduação em administração na FGV.
Trabalha na Light, concessionária de energia do RJ.
@lightclientes
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relações internacionais
A aldeia agora é global
“Não te falei ainda dos benefícios da publicidade... Se caíres de um carro, sem outro dano, além do susto,
é útil mandá-lo dizer aos quatro ventos, não pelo fato em si, que é insignificante, mas pelo efeito de
recordar um nome caro às afeições gerais” – Teoria do Medalhão, Machado de Assis
Por Roberto Muylaert
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E
ntre a Teoria do Medalhão, de
Machado de Assis, e a busca
atual para virar celebridade a
qualquer custo, passaram-se
140 anos e mais uma tonelada de avanços
tecnológicos e científicos, que poderiam ter
deixado o “bruxo do Cosme Velho” superado
em seus escritos. No entanto, a personagem
de Machado de Assis tem tudo a ver com a
mídia atual, lotada de gente “famosa por
ser famosa”.
Prossegue o texto, ao falar da publicidade,
aplicada à pessoa física: “[...] Uma notícia traz
outra; cinco, dez, 20 vezes põe o teu nome ante
os olhos do mundo[...]”. Pronto, está criado o
conceito de rede social, assim como fica clara, desde então, a importância do networking,
burilado com determinação e empenho, “[...]
quando a amizade pessoal e a estima pública
instigam à reprodução das feições de um homem
amado ou benemérito”.
Colocar-se em contato com o mundo
inteiro, falando cara a cara com cada um
que interessa, era o sonho utópico de todo
publicitário de alguns anos atrás, quando o
dito mais em moda, entre engraçado e verdadeiro, era mais ou menos assim: “Metade
do que se anuncia numa campanha é jogado
fora, só que não sabemos qual metade”. E o
mais importante é que o cliente achava graça
nisso e ainda pagava a conta.
A individualização da mensagem e a possibilidade da via de duas mãos entre o emissor
e o receptor são progressos que não podiam
ser vislumbrados naquela época, porque
dependiam de instrumentos nem cogitados
pelas mentes mais avançadas e criativas,
sem a existência da internet. Eis a razão pela
qual os futurólogos, a partir de extrapolações
lineares, acabam errando feio, quando surgem invenções ou influências impossíveis de
prever quando ainda estão distantes.
Há a história do cientista francês que,
impressionado com o crescimento das carruagens circulando por Paris, em meados
do século 19, chegou à conclusão correta de
que a camada de esterco depositado pelos
cavalos nas ruas da cidade atingiria um
metro e meio por volta de 1950, sem poder
levar em conta o advento dos automóveis
movidos a gasolina.
O gênio Steve Jobs deu um salto mágico
na simplificação e praticidade dos aparelhos
eletrônicos, desde que lançou o seu computador pessoal, o Macintosh. Acreditava que
o novo equipamento seria utilizado predominantemente por professores e alunos
das universidades. Ficou surpreso quando
descobriu que uma quantidade muito superior às suas melhores previsões procedia de
compras das empresas.
Nem seria possível imaginar que os computadores pessoais seriam ligados entre si, sem
a dependência do mainframe, dando origem
à forma de comunicação que uniu todos a
todo mundo, a internet. Um sistema que fora
criado para garantir a comunicação militar,
na contingência de um apagão total.
Voltada para a aplicação civil, a humanidade
pode agora voar com a imaginação solta, a partir
dos tablets de várias origens, dos celulares que
substituem todo o resto e mais o que vier.
A propósito, a revista The Economist traz,
em uma de suas últimas edições, reportagem
sobre a Huawei (pronuncia-se, em inglês,
hwah-way), empresa número um do mundo
em equipamentos de telecomunicação,
destronando da liderança a sueca Ericsson.
Na capa, uma ilustração de um iPhone chinês – com mercado na casa das centenas de
milhões de aparelhos –, sendo fácil perceber
que do design original copiado de Steve
Jobs só faltou o símbolo da maçã. Se bem
que ninguém pode criticar os asiáticos pela
iniciativa, já que as peças dos aparelhos
ocidentais são fabricadas e montadas por lá,
sendo natural a ideia de criar marca própria.
Sendo uma empresa de grande porte, com
140 mil funcionários, lucro acima de US$ 30
bilhões, a Huawei pode estar sendo ajudada
pelo governo chinês a ganhar contratos internacionais, como aconteceu na revolução dos
celulares na África, onde aparelhos chineses
de baixo custo servem muito bem à população.
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relações internacionais
ligados à programação ditada pelas grandes
Como posto avançado da China, a
redes de TV, sem a possibilidade de uma
Huawei serviria também para espionar o
interação para o espectador se expressar.
tráfego eletrônico internacional, onde um
Se o grande teórico da comunicação
grupo de hackers, com apoio estatal, teria
tivesse nas mãos os dispositivos de hoje,
condições de bisbilhotar segredos comerque somam num só sistema as três mociais em escala maciça. Mas o Ocidente
dalidades de comunicação preconizadas,
também não é inocente nessa área, como
não teria dúvida em afirmar, encantado,
acontece com o desenvolvimento do vírus
que, agora sim, o mundo é mesmo uma
Stuxnet, focado em possíveis ataques ao
Aldeia Global, onde a tão desejada indesenvolvimento nuclear do Irã.
dividualização massificada aconteceu,
Apesar da tecnologia de ponta digital
traduzida na somatória dos sites, blogs,
acessível às classes A e B, dois terços do
Reportagem sobre a chinesa
e redes sociais.
Brasil ainda vive na era McLuhan, sem
Huawei, maior fabricante
Um espelho de tudo que a humanidade
acesso à internet rápida. Prevalece a hiper- de equipamentos de
desenvolveu ao longo de séculos (para o
trofia da TV aberta, em que uma emissora telecomunicaçao do mundo
bem ou para o mal), está agora ao alcance
de televisão galvaniza a audiência ao unir as
diversas classes sociais sintonizadas no mesmo programa de todos, ao simples toque de uma tecla, em processo de
de artes cênicas. A novela constitui o máximo de concentra- convergência de meios, em alta definição, que permite um
ção que Marshall McLuhan poderia imaginar, no conceito diálogo real, simultâneo, sem fronteiras geográficas, onde
formulado por ele na década de 1960, mérito da Rede Globo. todos são emissores e receptores.
Mas o estágio atual não deve permanecer assim indefiniNa TV aberta, as verbas de publicidade são crescentes, apesar da audiência descendente, formando o gráfico “boca de damente, com a algaravia de comentários e informações de
jacaré”. O porquê está na teoria do criador da “Aldeia Global”, hoje mandando para o espaço a ética das comunicações. É
necessária a hierarquização da notícia, com a credibilidade
o filósofo e educador canadense, que nasceu em 1911.
Em seu livro The Gutenberg Galaxy (A Galáxia de Guten- da indispensável checagem das fontes.
Ainda durante alguns anos, o conceito original da Aldeia
berg, University of Toronto Press, 1962), o autor estuda as
características de cada meio de comunicação, em três gran- Global seguirá valendo no Brasil para a maioria da populades períodos: “cultura oral ou acústica, tipográfica ou visual ção, onde a interação com o emissor continuará sendo a
e eletrônica”. Para McLuhan, cada uma delas corresponde à licença para votar no BBB, pagando pelos impulsos.
Nessa altura, não se deve esquecer da palavra escrita,
forma de pensar o mundo.
Na cultura oral o homem está próximo das pessoas e de onde se origina a grande maioria dos conceitos e pautas
das coisas, suscitando a criatividade de quem fala e de que chegam à internet, com profissionais ainda pagos pelas
quem ouve. A palavra escrita, sustentada pela imprensa, receitas dos veículos em papel. Nesse quesito, as revistas
torna possível a expansão da coletividade. Os meios de não têm sido tratadas com a atenção que merecem, apesar
comunicação eletrônicos, na velocidade da difusão, per- da qualidade do produto editorial e da capacidade de adaptar
mitem a partilha de experiências distantes e exóticas, seus títulos para o meio digital, com grande proficiência.
Falta apenas que os anunciantes se convençam de que,
aproximando-as em larga escala.
Com a experiência possível da década de 1960, a terceira assim como no impresso, a revista digital também merece
forma de comunicação constitui a “Aldeia Global”, com todos publicidade, a preços justos.
Sendo uma empresa de grande porte, com 140 mil funcionários, lucro acima de
US$ 30 bilhões, a Huawei pode estar sendo ajudada pelo governo chinês a ganhar
contratos internacionais, como aconteceu na revolução dos celulares na África, onde
aparelhos chineses de baixo custo servem muito bem à população.
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O conceito original da Aldeia Global seguirá
valendo no Brasil, onde a interação com o
emissor continuará sendo a licença para
votar no BBB, pagando pelos impulsos
Roberto Muylaert
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Pesquisas recentes do instituto Ipsos/Marplan revelam
a clara aceitação e respeito do público pelo meio revista,
veículo mais vivo do que nunca, a merecer um share de publicidade bem maior do que o atual, que está na casa dos 6%.
Os brasileiros das classes A, B e C, que vivem nas nove
principais regiões metropolitanas do país, estão consumindo mais revistas. Na comparação entre o primeiro semestre
de 2012 versus igual período de 2011, verifica-se um grande
crescimento da penetração do meio em todas as classes
dos mercados analisados (São Paulo, Rio de Janeiro, Recife,
Porto Alegre, Salvador, Belo Horizonte, Curitiba, Brasília e
Fortaleza). O aumento mais significativo foi notado na classe
AB, cuja participação saltou de 52% para 63% no período. Já
a classe C cresceu de 31% a 38% na mesma faixa de tempo.
Entre as cidades, o Rio de Janeiro (52%) registrou o maior
crescimento, seguido por São Paulo (51%) e Curitiba (47%).
Além disso, o Ipsos/Marplan iniciou a verificação em quatro
novas regiões: Vitória, Florianópolis, Goiânia e interior de
São Paulo, que, em média, têm penetração de 39% de leitura
para o meio revista.
Não fossem estes argumentos suficientes para conquistar
mais verbas, existem outros dados que indicam as revistas
como o meio mais relacionado com os seguintes atributos:
influência no momento de decisão sobre uma compra;
tempo de leitura (44 minutos em média no Brasil, ante 41
minutos nos EUA, segundo o MPA); quantidade de títulos
lidos por pessoa (três em média); índice de “leitura exclusiva”
(65%, o maior valor percentual); e a mais baixa rejeição à
publicidade, entre todas as mídias.
Assim, o meio revista permite atingir com grande eficiência grupos de pessoas em que estão os formadores de opinião. Uma verdadeira Aldeia Global segmentada, atingindo
justamente quem tem poder de decisão.
Jornalista, editor, escritor e presidente da
Associação Nacional dos Editores de Revistas (Aner)
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mesa-redonda
Sobra talento,
falta consenso
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Paulo – Nesta edição, vamos debater sobre
Encontro na ESPM reúne Luiz Buono (sócio da Fábrica Comunicação Dirigida), os professores Francisco
Gracioso, Paulo Cunha e João Matta (da ESPM), Pedro
Cabral (fundador da AgênciaClick) e Fabio Baracho
Martinelli (diretor de mídia da Ambev) para debater os
rumos da comunicação integrada no Brasil e no mundo
Fotos Donizeti da Silva Pinto
comunicação integrada. Para abrir o debate, convido o presidente do Conselho Editorial da Revista da ESPM, ex-presidente da
faculdade e conselheiro associado da ESPM,
professor Francisco Gracioso.
Gracioso – Quando eu era redator de propaganda, há décadas, o contato falava: “Garoto,
tome cuidado com o que diz no anúncio impresso para dizer também no jingle de rádio.
Não vá confundir as coisas”. Sempre houve
uma preocupação com a comunicação integrada. É evidente que o sentido que damos
hoje é completamente diferente. Ele se tornou mais comum a partir da mídia digital,
devido às oportunidades de integração oferecidas pela internet. Mas é consenso que a
comunicação integrada seja composta por
campanhas que excedem a mídia tradicional e aproveitam as “novas arenas da comunicação”. Que o digam os cases de Titanium
Lions, de Cannes. Há inúmeras maneiras de
integrarmos outras formas de comunicação
à mídia tradicional. Pode-se também dizer
que a comunicação integrada é a arte de
criar fatos para gerar notícias que surfamos,
aproveitando a onda em benefício da nossa
imagem ou do nosso produto – de maneira
tão natural que muitas vezes isso passa despercebido, até. Por exemplo: recentemente,
estavam anunciando que o governo americano patrocinou a produção de um filme
sobre a morte do Osama Bin Laden, que
será exibido nos cinemas, lembrando que
a morte de Bin Laden foi o ponto mais alto
da popularidade de Barack Obama. Com a
proximidade das eleições, é evidente que o
governo lançará este filme para provocar
notícias e discussões em torno de um fato
que irá favorecer a imagem do Partido Democrata. Os americanos são mestres nisso.
Paulo – Isso exposto, de quem seria a responsabilidade de gerir os processos de comunicação integrada?
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mesa-redonda
Pedro – Do diretor de marketing da empresa. Hoje, existe
uma série de ferramentas que podem ser utilizadas na
comunicação. Isso também estimula outra atividade do marketing, que é a própria concepção do produto e todas as áreas que envolvem o negócio, como as cadeias de distribuição
e o trade marketing. Do ponto de vista do relacionamento,
hoje se classifica a mídia como paid media, que é a comprada; owned media, que é a mídia própria; e earned media, que
é a conquistada. Na verdade, tudo isso são audiências. É a
atenção que essas pessoas dão para determinada marca. A
integração dessas estratégias faz com que você crie um círculo virtuoso, usando mídia comprada, criando ambientes
receptivos de mídia própria – web sites, lojas de todo tipo e
até a própria gôndola –, e essa mídia conquistada, que é a
energia das pessoas sendo posta a serviço da propagação de
ideias. Em geral, essa propagação ocorre sem um controle
total. De qualquer forma, o guardião das ações deve ser o
diretor de marketing do anunciante.
Fábio – Concordo. É difícil que qualquer parceiro tenha
100% de acesso à informação relacionada à atividade de
mercado, marca, indicadores e resultado de desempenhos.
Há uma mudança no processo de comunicação integrada
que nasceu da necessidade de se criar uma relação com
um grupo de pessoas que criticam, elogiam, dão sugestões
sobre tudo o que a marca faz. Para a comunicação integrada
acontecer de fato, temos de ter especialistas e parceiros
com habilidades específicas, e cabe ao anunciante conseguir integrar esses parceiros para que todos trabalhem
juntos. Hoje temos uma área, a Connections, para criar e
gerir os pontos de conexão e a forma de comunicação com
nosso consumidor, que triplicou de tamanho, em dois anos.
Então, se você não capacita o seu time interno, fica mais
dependente de um terceiro. O mercado ainda não tem uma
fórmula mágica para responder a esse cenário complexo.
Buono – A relação das marcas com os anunciantes mudou.
Hoje, ela é relacional, baseada num diálogo. O marketing é
feito o tempo inteiro, em todos os canais e utiliza todas as
ferramentas. Tenho clientes na agência que entram com 50
jobs de comunicação dirigida por mês. Abro uma verticalidade de conversa com o público dele naquela disciplina tão
intensa e dinâmica, que não há a menor possibilidade de
essa conversa estar integrada, no sentido de concatenação
com tudo. Imagine a Ambev, que tem conversas dirigidas
com os donos de bares e com milhares de consumidores no
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“A imagem que tenho do meio é a de um
empresário de circo com o chicote na mão
controlando o trabalho do leão e com o
outro lado voltado para o palhaço dando
as dicas para que ele entre e saia de cena”
Francisco Gracioso
ponto de venda e também no computador deles, 365 dias do
ano. A comunicação integrada só funciona no conceito antigo. O que integra, volto a dizer, é o conhecimento que tenho
do DNA, do branding daquela marca.
Paulo – Mas há uma interação.
Buono – Sim, mas é completamente diferente de como
aprendemos lá atrás.
Gracioso – Como esse tipo de ideia não surge de uma agência tradicional, e sim em locais como a AgênciaClick, a imagem mais próxima que nos ocorre é a de um empresário de
circo com o chicote na mão controlando o trabalho do leão
e com o outro lado voltado para o palhaço dando as dicas
para que ele entre e saia de cena. A comunicação dirigida e
integrada exige cada vez mais esse sentido de espetáculo. A
propaganda também está se transformando em um espetáculo em busca de maestros para ser dirigida.
Buono – A partir do momento em que estabeleço uma
conversa com o consumidor, não estou mais numa posição
de compra e venda, imponho minha mensagem e você
recebe o espetáculo, ou seja, o lado do entretenimento e da
prestação de serviço passa a ser de grande importância. Nas
redes sociais, se você não tem o tom relacional, o serviço é
“Do ponto de vista do relacionamento,
hoje se classifica a mídia como paid
media, que é a comprada; owned media,
que é a mídia própria; e earned media,
que é a conquistada. Na verdade, tudo
isso são audiências” Pedro Cabral
execrado, porque nesse diálogo não dá para ficar vendendo
coisas. É errado pegar um tema de campanha criado para
a TV, uma mídia passiva, e inserir esse filme de 30” interrompendo algo que o internauta quer assistir. Se ele fosse
inteligente, criaria uma mensagem de 5” personalizada,
para reter a atenção desse público.
Pedro – Você presta atenção na televisão?
Buono – O palco da televisão é diferente. Ele favorece o comercial porque tem uma tela de 42 polegadas e recursos de
som, imagem e áudio para passar a mensagem.
Pedro – O que lhe causa estranheza nessa interrupção antes de um vídeo na internet também causou estranheza um
dia na televisão. A diferença é que ela foi assimilada, culturalmente, porque somos uma geração que já nasceu com
a televisão, o que faz com que as pessoas não se importem
com a veiculação de comerciais. A questão é que 65% desses
comerciais são totalmente ignorados e 95% não causam nenhuma lembrança no dia seguinte. A questão não é só a linguagem. O que buscamos hoje é a distribuição do conteúdo
pelas pessoas. As campanhas de sucesso são aquelas de que
as pessoas carregam o bordão. Hoje, a grande ideia parte de
um conteúdo que muitas vezes é pautado pelo diretor de
marketing. E o vídeo é uma superlinguagem para você contar uma história, que pode ser assimilada e compreendida
num curto espaço de tempo. E isso vem do cinema, que é
uma linguagem encantadora.
Gracioso – O internauta busca, acima de tudo, informação. É preciso que a mensagem seja rica em conteúdo.
Pedro – O grande fenômeno na internet que acontece nas
redes sociais é o da interação entre as pessoas. Hoje, as
maiores audiências estão nas redes sociais e ocorrem entre
pessoas. O que está lá é conteúdo a respeito de pessoas e as
pessoas se conectam. Esse é o grande atrativo.
Paulo – O mercado brasileiro sabe capitalizar e aferir visibilidade para as ações de outras arenas de comunicação por intermédio da grande mídia?
João – Uma ideia integrada tem o elemento lógico do crossmedia, ou seja, como transponho essa ideia em todas as
mídias. Como hoje tudo é mídia, não interessa se vou para
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a televisão ou para a internet. A grande ideia tem de ser
algo pertinente à vida das pessoas. Toda marca tem uma
grande história a ser contada, mas precisa pertencer aos
consumidores. Eles têm de se sentir engajados, integrados
nessa história para repercuti-la. Comentávamos antes que
a Bolsa de Valores oscila e deixa de oscilar de forma muito
sensível a qualquer assunto que acontece no mundo. Nós
somos diferentes. A novela das oito continua pautando
as conversas de esquina. Todos estão comentando sobre
os personagens, mas não temos esse aproveitamento
das histórias geradas, por exemplo, num filme ou em
uma rede social. Falta aprendermos a trabalhar bem essa
questão das ideias nas mídias. Além de integrada, a comunicação precisa ser sincronizada, porque se você jogar um
tema e ele demorar para aparecer em uma mídia, aquilo
se esvazia.
“Em grandes campanhas, as ideias
e a criação ainda são atreladas dentro
da televisão como meio principal”
João Matta
Buono – Esse fenômeno das pessoas abraçando a ideia e
levando adiante é promovido pela democratização das mídias. Estamos vivendo uma fase de aprendizado, de como
gerar um conceito, uma ideia que vá, naturalmente, mobilizar as pessoas. No passado, você fazia um grande espetáculo porque as pessoas estavam lá para assistir. Hoje, é preciso
encontrar algum ponto em que a pessoa fique tão envolvida
com aquilo que queira levar adiante. Em vez de grandes
espetáculos, são histórias mais reais, e aí surge outro problema. Vendo algumas histórias de sucesso, os anunciantes
começaram a demandar das agências a criação de ideias.
Mas, às vezes, essas ideias nascem e você apenas aproveita
o conceito, não necessariamente cria algo novo.
Paulo – E as agências sabem fazer isso?
Gracioso – A mídia é sempre o gargalo através do qual os
fatos e as notícias repercutem entre o povo. Quando, por
exemplo, provocamos um grande espetáculo no Morumbi
e atraímos 80 mil jovens para ver uma banda canadense, é
evidente que o retorno esperado está muito além do público
presente ao evento. A verdade é que, muitas vezes, não há,
nas reuniões prévias, uma conciliação de interesses entre
a mídia, a empresa e a agência. Ainda estamos aprendendo,
essa é a verdade. E, honestamente, precisamos admitir que
temos um longo caminho a percorrer.
Fábio – Estamos em busca de bons conteúdos para
distribuí-los da melhor maneira. O fato é que os veículos
de comunicação no Brasil monetizam toda e qualquer
iniciativa que parta de um anunciante. Aqui, é quase
impossível criar ações de grande visibilidade e ter a expectativa de que naturalmente essas ações vão explodir.
Você consegue se relacionar diretamente com o seu
consumidor na internet, mas está preso a esse escopo de
atuação. Pego o exemplo do caso do Barack Obama, identificando que a morte do Bin Laden possua um conteúdo
incrível para ser capitalizado por intermédio de um filme. Lá, essa produção pode ser explorada na campanha
do próprio presidente, pelos veículos de comunicação
que têm interesse no tema, por jornais e revistas que vão
voltar a falar do assunto. No Brasil, o conteúdo de uma
marca está fadado a uma exibição restrita no canal no
qual ele foi concebido e de acordo com o potencial que
a marca tem de disseminar esse conteúdo em redes sociais. Fora disso, ela precisa pagar.
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Pedro – Depende muito da marca. Existem marcas que
são mais fáceis de carregar do que outras. Por exemplo,
todos conhecemos Porsche e temos uma percepção da
marca, mas provavelmente nunca vimos um comercial
dela na televisão, talvez no Festival de Cannes. É porque
esta marca tem um potencial gigante, uma história, uma
narrativa, uma essência que acaba penetrando na sua vida
pelo ambiente em que você vive. Caminhando mais para o
lado da física, marca é uma energia potencial armazenada. É como se pegasse uma pedra e fosse levantando a tal
ponto que, se você a largar, ela se transforma em velocidade. O lançamento de um produto da Apple é notícia, não
tem como esconder isso.
Fábio – Também tem ações incríveis que a Nike fez e a
imprensa, de certa forma, absorveu, porque não vê nessa
marca um potencial anunciante.
Buono – Você tocou num ponto fundamental: Nike, um produto de massa. Lembra daquela história da Copa do Mundo
na África do Sul, em que a Adidas era patrocinadora e a
Nike apareceu mais? O que aconteceu foi que a Nike, já bem
preparada com o seu marketing em outros mercados onde
a mídia de massa não é tão forte quanto aqui, desenvolveu
uma estratégia na qual os consumidores levam essa comunicação pelas plataformas digitais. Com isso, ela consegue
ter uma visibilidade enorme.
Fábio – É a questão do relacionamento. A exposição pura
e simples de uma marca tende a lhe entregar menos, num
universo onde você precisa construir uma relação.
Buono – No ano passado, a Coca-Cola deu uma aula em
Cannes, com o seminário “Liquid and Linked Mystique”,
que mostrava como a marca criava temas para as pessoas
levarem adiante. Hoje, mais de 80% da estratégia deles
não está relacionada à mídia de massa. Na Inglaterra, a
televisão aberta perde de longe para a internet, em termos
de audiência. Esse movimento ainda vai chegar ao Brasil.
A tendência é de que essa estratégia usada por Coca-Cola e
Nike seja aplicada aqui.
Gracioso – Há 20 anos, a Brahma ainda era uma companhia independente e entregou a conta para o publicitário
Eduardo Fischer. A primeira coisa que ele fez foi bolar
um jeito de a marca Brahma aparecer na transmissão da
“No ano passado, a Coca-Cola deu
uma aula em Cannes, com o seminário
‘Liquid and Linked Mystique’, que
mostrava como a marca criava temas
para as pessoas levarem adiante”
Luiz Buono
Copa do Mundo, com o conceito número 1, o que deixou a
Globo muito zangada. Isso significa que, mesmo quando
a TV aberta é o veículo principal, há formas de comunicação paralelas, alternativas que vão desembocar no
veículo dominante.
Paulo – Há cinco anos, Cannes adotou a categoria Titanium
e o Brasil nunca teve um Leão de Ouro nessa área. Como o
mercado brasileiro está praticando a comunicação integrada?
Em que grau estamos?
Buono – Você já deu a resposta. O Brasil está engatinhando. O Brasil ainda está muito atrasado por conta
do cenário midiático de massa. Se você pegar o ranking
das 20 maiores agências brasileiras, todas ainda estão
estruturadas no modelo de comunicação de massa, com a
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remuneração vinculada no montante investido em mídia.
Nesse cenário é difícil você ser uma sumidade ou ter um
papel de destaque na mídia integrada. Os melhores profissionais do país, aqueles que em tese têm as ideias mais interessantes, ainda estão trabalhando na máquina antiga.
Pedro – Quando se olha o ranking publicado no primeiro
trimestre, a AgênciaClick aparece como compra de mídia
em 26º lugar, mesmo sendo uma das dez maiores agências
do Brasil, em termos de receita. É porque a receita não está
baseada exclusivamente na veiculação, e os volumes de
veiculação em televisão acabam gerando, na contabilização
do monitor, um ranking que é completamente distorcido.
Gracioso – No caso de uma grande empresa, como a Ambev, que tem uma gerência de compra de mídia, as decisões
partem de seu departamento. Por que vocês continuam a
preferir a mídia tradicional?
Fábio – Como um grande anunciante, a Ambev é o terceiro
maior do país. A decisão é técnica, estratégica e atrelada ao
resultado. Independentemente do modelo de negócio das
nossas agências, nos blindamos do máximo de informações possíveis, para evitar qualquer distorção do modelo.
João – A que resultado você se refere?
Fábio – Investimos muito em pesquisa e informação, em métricas que dizem o quanto os consumidores preferem nossas
marcas. Com base nisso, tomamos a decisão tática dos meios
de custo por ponto, cobertura, frequência... Exploramos esses dados, no limite, para garantir uma boa compra. Existe
todo um ferramental para garantir que o melhor mix está
sendo executado. A dificuldade que temos hoje é que parte da
comunicação integrada não está mais em nossas mãos. Parte
você compra, outra é preciso construir nas plataformas proprietárias. E uma terceira parte vem do consumidor. Quanto
mais você estimular o consumidor a gerar mídia orgânica,
melhor para o seu negócio. Estamos menos presos a modelos, mas, diferentemente de outros países, a televisão ainda é
um meio muito forte no Brasil.
Paulo – Hegemônico.
Fábio – Campanhas que conseguem, juntas, criar uma
proposta de comunicação, uma relação com o consumidor,
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“Há cinco anos, Cannes adotou
a categoria Titanium, e o Brasil
nunca ganhou nenhum Leão de
Ouro nessa área” Paulo Cunha
têm melhor desempenho do que uma campanha isolada na
televisão. A quantidade de informação que a internet trouxe
para qualquer análise de retorno é gigante. É muito difícil
para o grande anunciante tomar uma decisão por pura recomendação.
João – Em grandes campanhas, as ideias e a criação ainda
são atreladas dentro da televisão, como meio principal.
Fábio – Não necessariamente. Temos um ciclo criativo
diferente. Por exemplo: temos uma rotina semanal com a
Skol, onde pomos em discussão quatro, cinco agências com
habilidades e condições específicas, e dali surgem as ideias.
Estamos menos atentos à origem e mais ao quanto essa
ideia pode ser desenvolvida. Pelo volume de investimento e
os compromissos que temos com a televisão, muitas vezes
acabamos nos obrigando a desenvolver algo para esse veículo de comunicação em cima daquela ideia.
Buono – Alguma narrativa nova.
Fábio – A marca precisa se personificar. No momento em
que você cria uma relação, uma personalidade, as histórias
e os conteúdos que puser no ar devem corresponder àquela
personagem que você está querendo construir junto com
àquela pessoa.
Paulo – Isso acontece com as marcas da Ambev, mas como você
vê o conceito aplicado à grande parte dos anunciantes?
Fábio – Isso surge do anunciante, das agências e dos veículos. Aqueles que investem mais e conseguem munir o
anunciante com mais informação têm muito mais relevância, que é o que acontece com a internet. O meio digital
ganha relevância no momento em que proporciona para
o anunciante a possibilidade de ter informações novas; os
outros veículos e as agências têm de se preparar para entregar esse mesmo conhecimento. Mas os grandes meios se
estabilizaram num nível de informação que hoje não tem
mais relevância.
Fábio – Mas está relacionado à personalidade da marca?
Buono – Sempre. Isso é branding.
Fábio – Essa questão de personificar a marca é maior
do que o conceito de branding. As marcas que conseguem se relacionar de verdade com as pessoas são
aquelas que criaram uma identidade própria e aí o
grande desafio é você manter a essência de uma marca
de massa. Nesse caso, concordo que é preciso ter uma
segmentação complicada.
Buono – Não tenho a menor dúvida.
“Investimos muito em pesquisa e
informação, em métricas que dizem o
quanto os consumidores preferem nossas
marcas. Com base nisso, tomamos a
decisão tática dos meios de custo por
ponto, cobertura, frequência...”
Fábio Baracho Martinelli
Paulo – Atingiram uma zona de conforto?
Fábio – Talvez.
Buono – Marcas como a Ambev precisam fazer esse trabalho de massa para manter o share, porque a tendência é
perder participação de mercado. Historicamente, a CocaCola tinha muito mais share do que tem hoje. A Maionese
Hellmann’s, a mesma coisa. Vão surgindo os nichos. E para
quem tem o produto “nichado”, hoje, consegue alavancar a
marca mais rápido com a ajuda dos novos meios.
Gracioso – Então, o que chamamos de comunicação integrada tem muito de comunicação dirigida? Ela, em geral,
é muito mais indicada quando se pretende atingir, com
maior impacto, determinados segmentos do mercado.
Buono – Na verdade, é tudo conceitual. As marcas precisam fazer um trabalho extremamente dirigido, “nichado”,
e ao mesmo tempo usar três ou quatro meios de comunicação que atuem de maneira integrada.
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
97
mesa-redonda
Debate comprova
que a indústria da
comunicação está
repensando seu
modelo de negócios
Fábio – Mas o mundo não vai ser segmentado, porque
mesmo nos Estados Unidos, que têm a questão das
cervejas artesanais, elas pertencem a um segmento
premium, com um produto que consegue entregar um
valor seis vezes maior do que o da própria categoria e
não conseguiu sair desse universo. A mesma coisa no
Brasil: você vai a uma gôndola de um mercado superqualificado e há 80 marcas de cerveja. O volume dele
é 90% de marcas tradicionais. As pessoas precisam ter
uma sensação de pertencimento que só as marcas de
massa oferecem.
João – Esse exemplo da cerveja é bom, principalmente
se pensarmos na tradição europeia. Parece existirem
dois mercados: um de massa, que é o das grandes cervejas, e outro pulverizado. No início, falávamos sobre consumidor. Será que o mercado está conhecendo profundamente o consumidor e suas histórias? Em que meio
e por qual plataforma? Nesse ponto, nunca a antropologia, a sociologia e todas essas disciplinas do sujeito
social fizeram tanto sentido quanto estão fazendo hoje.
Pedro – Há uma grande mudança, sim. Hoje, as pessoas
estão o dia inteiro conectadas em telas. A pessoa acorda
98
Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
com o smartphone do lado e logo cedo entra no Facebook,
durante o café da manhã, para ver o que aconteceu enquanto ela dormia.
Fábio – No mínimo, ela passa a gerenciar a sua marca.
Pedro – Isso acaba gerando um mundo mais transparente,
em que as historinhas não ficam de pé. Se observarmos hoje
as marcas que ganham mais valor no mundo, são as que têm
uma preocupação grande com todo o aspecto holístico da geração de valor no relacionamento. Por exemplo, por que uma
marca como o Google se tornou tão popular, sem necessariamente ter uma iniciativa agressiva num primeiro momento?
Há um ano, ele não fazia nada de propaganda. O Facebook
também é um fenômeno no Brasil. Essas empresas fazem
sucesso porque têm um compromisso com o seu freguês,
com a pessoa que está diante do seu produto. Então, tudo o
que se cria dentro daquele sistema tem por função principal
atender à pessoa que está do outro lado, porque ela está
criando valor para si no uso daquele produto, em um ciclo
positivo de geração de valor. Quando se pensa numa empresa
moderna de grande valor, como a Apple, ela nem sempre
teve a história mais ilibada do mundo, do ponto de vista de
sustentabilidade – há uma série de histórias escabrosas –,
mas nos últimos tempos ela se transformou num verdadeiro
exemplo de marca que gera valor para a sociedade como um
todo. Ela conquistou essa popularidade toda porque, quando
foi criado o iPod, a experiência gerada pelo produto mudou
a forma de distribuir, produzir e comercializar a música – e
quem ganhou com isso foram as pessoas.
camente, o anunciante queria que a agência comprasse a
mídia do próprio bolso e ele só pagaria o produto entregue,
instalado, vendido, o que é um absurdo, porque depois a
receita recorrente do produto não iria para a agência. É preciso haver um compromisso maior por parte das agências,
para correr riscos junto com o anunciante.
Paulo – Do ponto de vista da comunicação integrada, como as
João – As agências, às vezes, se portam mais como fornecedoras de ações de comunicação e mídias que as interessam.
agências poderiam auxiliar relações entre a indústria e o varejo?
Buono – Entendendo as melhores plataformas para o varejo e como alimentá-las fazendo a conversa fluir, de maneira
que todos ganhem – o varejista, o consumidor e a indústria.
É preciso transformar a informação do varejo em ação.
Gracioso – Está surgindo uma nova “ciência”, o trade marketing, justamente para disciplinar e melhorar as relações
entre empresa, fornecedor e varejo. Realmente, seria preciso um mergulho em profundidade para que as agências conhecessem um dos verdadeiros problemas que os grandes
fornecedores estão enfrentando no varejo.
Fábio – Concordo 100%. Falamos muito de todos os canais de conexão com o fornecedor e entendemos o trade
que acontece no ponto de venda como a última etapa
do processo, não no sentido de terminar na compra,
mas do pensar no setor depois que já pensei e resolvi o
problema de todo o resto. É como transformar a experiência no ponto de venda em algo mais verdadeiro, mais
conectado com a personalidade da marca, capaz de
criar uma relação, e creio que temos alguns exemplos
de marcas que estão fazendo isso, que transformaram a
compra em si em uma experiência.
Pedro – Em parceira com os anunciantes, as agências precisam criar métricas mais transparentes que levem a um
compromisso e a uma parceira maior para a compreensão
da cultura do negócio. É preciso estabelecer um conjunto
transparente de métricas entre anunciante e agência, que
mexa até no modelo de remuneração.
Gracioso – Necessariamente, tem de mexer.
Pedro – No varejo, é saudável que exista um compromisso
com o resultado. As agências, de maneira geral, são resistentes a isso. Outro dia vi uma concorrência em que, prati-
Pedro – Algumas agências podem se dar o luxo de fazer
isso porque ficam com o filé mignon, que é a veiculação em
TV, e ponto final.
João – Quando você trabalha em outras mídias, não.
Buono – Normalmente, quem pega esse serviço como algo
que se viabiliza pela sobra da televisão acaba entregando
mal. Estou cansado de receber cliente falando exatamente
isso, que foi em tal agência e eles disseram que entregavam
360º. Mas, quando ele passou 30 jobs de comunicação dirigida, não conseguiram entregar três, por isso o cliente foi
buscar um especialista. Por outro lado, já vi muita agência
de trade marketing no Brasil trabalhar full time para aquele
anunciante, mas a receita que ela obtém não paga a conta, já
que você precisa manter um nível de profissionais de qualidade, e aí a coisa complica.
Fábio – Existem agências e agências. O mercado está se
inventando – tem agência que consegue entregar aquilo que
entende como seu core business, outras entregam algo mais.
Não precisamos ficar presos a um modelo.
Paulo – Para fechar, gostaria de pontuar algumas questões expostas aqui no debate. Primeiro, a responsabilidade do gestor de
marketing na articulação e implementação de ações diferentes
e outras arenas de comunicação, sempre respeitando o DNA
da marca. Além disso, há novas relações com consumidores
que passam pela experiência midiática, pelo engajamento, pela
forma de produção de conteúdo. O mercado está repensando o
modelo de trabalho dentro de uma ótica de maior compromisso
com resultados, de novos sistemas de métricas, avançando até,
talvez, a um novo modelo de remuneração e das relações entre
todos esses players da indústria da comunicação.
Gracioso – Obrigado a todos vocês.
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
99
Ensaio
A hierarquia
dos valores
Existem valores que são mais importantes
do que outros? Caso existam, qual a
hierarquia que lhes corresponde?
Por Hermano Roberto Thiry-Cherques
shutterstock
N
100
Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
o Renascimento, para ordenar os vícios e
virtudes de forma plausível, Dante Alighieri
não teve outro recurso a não ser compartir os
juízos de valores com Deus. A Divina Comédia
(Editora 34, 1998) condena e absolve pecadores de acordo
com as enigmáticas orientações da Igreja e os esquecidos
critérios florentinos. O recurso à divindade ou a seus
intérpretes, benéfico para a métrica e a poesia, segue
alimentando convicções e seduzindo entendimentos,
mas não se presta ao pensamento filosófico.
Outra, mais racional e enfadonha, foi a solução aventada
por Max Ferdinand Scheler (Munique, 1874 – Frankfurt, 1928)
para a ordenação dos valores. Filósofo eclético, Scheler foi
um dos pensadores mais influentes da primeira metade
do século 20. Hoje respeitosamente ignorado, ele propôs
uma hierarquia de valores que subsiste mais ou menos
intacta na apática literatura filosófica.
Filho de uma família burguesa, de pai protestante e mãe
judia, Scheler foi vagamente deísta na infância, tornou-se
católico na juventude e panteísta na maturidade. Como a
orientação religiosa, a sua filosofia passou por várias fases,
espelhadas em livros como Essência e forma da simpatia
(Esencia y formas de la simpatia , Salamanca-Sigueme,
2005), que trata do conhecimento simpático como origem
da coesão social; O ressentimento na construção moral (Das
ressentiment im aufbau der moralen, Klostermann, 1978)
que expõe a mágoa característica da moral cristã como um
veneno psicológico que provoca deformação mais ou menos
permanente nos valores; A posição do homem no cosmos
(The human place in the cosmos, Max Scheler, Karin S. Frings e Eugene Kelly, Northwestern University Press, 2008),
basicamente uma afirmação panteísta da realização huma-
”…ressentimento é um
autoenvenenamento da mente que
tem causas e consequências bem
definidas. É uma atitude mental duradoura,
causada pela repressão sistemática de
certas emoções e afecções”
na de Deus; e O sentido do sofrimento, (Ressentiment, Max
Scheler, Lewis B. Coser e William W. Holdheim, Free Press
of Glencoe, 1961), que considera o sofrimento como função
do sacrifício decorrente daquilo que tem valor inferior por
algo que tem valor superior, obrigando-nos a subordinar
a vida sensível a uma atividade espiritual cada vez mais
elevada. A hierarquia dos valores consta de seu livro mais
conhecido, O formalismo na ética (Formalism in ethics and
non-formal ethics of values, Max Scheler, Manfred S. Frings
e Roger L. Funk, Northwestern University Press, 1973), cujo
título é autoexplicativo.
Na impossibilidade de invocar o pensamento de um deus
incerto e variável para explicar os valores, Scheler recorreu
à fenomenologia de Edmund Husserl. Estendeu-a para descrever relações entre conteúdos intencionais de que não
se pode predicar nem a inteligibilidade racional, como no
positivismo, nem o caráter lógico de sua assimilação consciente, como na fenomenologia original. Esses conteúdos
são os valores, que se oferecem à descrição com o mesmo
título de legitimidade que outros objetos, sendo atemporais
e absolutamente válidos. Segundo Scheler, as essências dos
valores podem ser alcançadas pelas emoções, dadas a nós
no nível mais baixo da função psíquica, no plano onde nosso
impulso vital atua cegamente. A partir dessa base diáfana,
Scheler sustentou a existência de uma hierarquia objetiva
dos valores, fundamentada e apreendida pela emoção.
A teoria de Scheler é uma fenomenologia geral dos
afetos. Supõe que os valores são uma espécie de ser que
poderia ser apreendido de maneira evidente, não como
objeto de compreensão racional, mas como conteúdos do
sentir. Pela exploração do reino dos valores se alcançaria a
esfera de objetos que têm uma particularidade irredutível,
distinta das leis da lógica. Chegar-se-ia às essências puras,
a priori, intuídas emocionalmente no âmbito de vivências
afetivas. Os valores assim definidos seriam objetivos,
absolutos e eternos na medida em que são anteriores aos
atos com que são apreendidos.
Segundo essa argumentação, cada indivíduo particular
é formado ( bildung ) pelas essências e pelos valores que o
integram. Quem assimila os valores não é o ego ou indivíduo, mas a “pessoa”, capaz de benevolência e de piedade.
Daí que Scheler funde a hierarquia dos valores no reverso
do amor, no ressentimento pessoal, que descreveu da seguinte forma: “…ressentimento é um autoenvenenamento
da mente que tem causas e consequências bem definidas.
É uma atitude mental duradoura, causada pela repressão
sistemática de certas emoções e afecções que, como tal,
são componentes normais da natureza humana. Sua
repressão leva a tendência constante para certos tipos
de delírios de valor e juízos de valor correspondentes. As
emoções e afetos em causa são principalmente a vingança, o ódio, a maldade, a inveja, o impulso para diminuir e
ultrajar os outros”.
Da ideia da mágoa e da relação entre maior ou menor
amargura, Scheler extraiu a hierarquia fartamente disseminada, que contrapõe a transcendência pessoal (amorosa, positiva e superior) ao ressentimento (desapiedado,
negativo e inferior). O livro Da reviravolta dos valores:
ensaios e artigos (Max Scheler, Vozes, 1984) detalha o
que, segundo o autor, muitos acreditam ser uma ordem
universal dos valores, constante e imutável, e que se dispõe da seguinte forma:
Max Scheler - hierarquia dos valores
valores
positivo
Negativo
Sagrado
Supremo
Profano
Moral
Certo
Errado
Estético
Belo
Feio
Lógico
Verdadeiro
Falso
Vital
Nobre
Vulgar
Sensual
Agradável
Desagradável
Útil
Necessário
Supérfluo
Hermano Roberto Thiry-Cherques
Pós-Doutor pela Médiation Culturelle, Université de Paris. Doutor em
ciência da engenharia, Coppe-UFRJ. Mestre em filosofia, IFCS-UFRJ.
Bacharel em administração, Ebap/FGV. Professor titular da FGV-Ebape e
pesquisador do CNPq/FGV
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
101
tendências & Perspectivas
102
Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
Do outro
lado do
balcão
Estudo inédito define as estruturas do
trade marketing no Brasil, identificando as
funções deste departamento nas empresas,
seu estágio de desenvolvimento e o perfil do
novo profissional da área
Por Adriano Maluf Amui
shutterstock
R
ealizada pelo Instituto Nacional de Vendas e Trade Marketing (Invent), a pesquisa “As Estruturas de Trade Marketing
no Brasil” foi pensada com o objetivo
de revelar a percepção dos profissionais a respeito
da atividade no país e mapear como a atividade está
estruturada nas empresas brasileiras. Com base
nesses princípios, o estudo identifica as funções do
departamento de trade marketing nas empresas, seu
estágio de desenvolvimento, o perfil do novo profissional da área e suas expectativas, por meio de um
questionário quantitativo, composto por 59 questões.
Para sua aplicação, foi criado um formulário on-line,
administrado pela plataforma SurveyMonkey (www.
surveymonkey.com), com identificação opcional do
respondente. Focada no profissional das áreas de trade marketing, marketing e vendas de todo o Brasil, a
pesquisa foi iniciada por 771 profissionais e concluída
por 376, sendo este segundo grupo o contingente da
amostra analisada. Os 395 questionários não concluídos justificam-se pela especificidade e nível de
complexidade crescente das questões.
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
103
tendências & perspectivas
Departamento responsável
pelo trade marketing
Ou
tro
N/
A
Ind
epe
nd
en
te
Ma
rke
tin
g
Ven
da
s
45%
40%
35%
30%
25%
20%
15%
10%
5%
0%
Área alocada para
a verba de trade
80%
60%
40%
20%
0%
Marketing
104
Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
Vendas
N/A
Anual
Semestral
Bimestral
Mensal
Semanal
Diário
40%
35%
30%
25%
20%
15%
10%
5%
0%
Não desenvolve
Periodicidade das reuniões
A partir dessas respostas, o Invent definiu o perfil dos
profissionais de trade que atuam no mercado nacional.
Grande parte deles vem das áreas de marketing (21,9%) e de
vendas (21%), seja por meio de realocação dentro da empresa
ou contratação. O interessante é que 9,3% dos profissionais
foram contratados ou designados a implantar um departamento de trade marketing na companhia, o que indica
o crescimento e a evolução desta área nas organizações.
A média de idade do profissional do segmento é de 26 a 35
anos, sendo que o público masculino representa 64,7% do
setor. A maioria possui pós-graduação (63,7%) e 54% fizeram
cursos complementares sobre o assunto. Além disso, a maior
parte deles tem cargo de gerente (33,5%), ou de coordenador/
supervisor (26%). Outro fator extremamente relevante é que
60% daqueles que responderam à pesquisa pretendem seguir
carreira na área pelos próximos cinco anos.
Pouco mais da metade desse público atua há menos de
seis anos na área. Este dado mostra a existência de um setor
ainda novo no Brasil, que está em processo de desenvolvimento de suas estruturas e com profissionais em estágio
de amadurecimento. Logo, muitas dessas áreas ainda
precisam passar por alguns ajustes para acertar a direção
e a eficácia das ações desenvolvidas. Não é à toa que 30,7%
das empresas revisaram recentemente o papel de seu departamento de trade marketing e mais de 15% chegaram a
constituir uma equipe de inteligência em trade, o que leva
a crer que os gestores têm reforçado suas iniciativas a fim
de integrar o olhar estratégico às ações táticas.
A maioria das organizações analisadas (45,6%) pertence
ao segmento industrial, que concentra grande parte das
estruturas mais amadurecidas de trade marketing. Vale
destacar também o crescimento desse departamento em
organizações que atuam nos setores de varejo, distribuição
e atacado. Grande parte dos segmentos foi contemplada
no estudo, com destaque para as indústrias de alimentos,
bebidas e bens de consumo de diferentes portes (33%).
Nesse contexto, 54,4% das indústrias que participaram
da pesquisa são de grande porte e faturam acima de R$ 500
milhões por ano. A maior parte dessas organizações conta
também com o contingente de mil a cinco mil funcionários.
É interessante observar que, geralmente, o departamento
de trade marketing das grandes empresas é mais maduro,
pois dispõe de mais recursos para investimentos em ferramentas, informações e profissionais.
Nos últimos anos, a atividade cresceu significativamente no país. A maior prova disso é que 70,7% dos
Empresas que envolvem
a área nas discussões
de vendas, giro dos produtos
e margens a serem praticadas
para a formação de preços
80%
60%
40%
20%
0%
Não
N/A
Atuação da equipe
35%
30%
25%
20%
15%
10%
5%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
N/A
100% no campo
Cerca de 25% na sede
e 75% no campo
Cerca de 50% na sede
e 50% no campo
Cerca de 75% na Sede
e 25% no campo
0%
Planejamento estruturado
O estudo registrou uma quantidade expressiva de organizações que já contam com um planejamento profissional
de trade e objetivos definidos dentro de seu plano anual
de negócios.
Neste momento de plena evolução do segmento, as
companhias já começam a migrar mais fortemente da
fase de compreensão dos conceitos táticos para um
pensamento mais estratégico e mais bem estruturado.
A pesquisa aponta que 70% dos empreendimentos pesquisados contam com o apoio do trade marketing para
desenvolver ações estratégicas e táticas organizadas por
preços, produtos e serviços. Já 74,4% das empresas diferenciam seus preços estrategicamente de acordo com o
Sim
100% na sede
profissionais pesquisados afirmam que suas empresas
já contam com um departamento formal de trade marketing. Por outro lado, 22,3% das empresas contam apenas
com um responsável para a área e 7% ainda não possuem
um setor específico para a prática da atividade.
Dos fatores que mais influenciaram a criação dessa
estrutura nas empresas pesquisadas, o principal é a
“percepção da oportunidade de gerar valor para toda a
cadeia”, que apareceu em 55,3% das respostas. De maneira geral, essas estruturas ainda são jovens nas empresas
brasileiras, uma vez que 61,9% delas possuem menos
de seis anos e estão alocadas de forma equilibrada nos
setores de vendas (38,6%) e marketing (34,9%). Apenas
14,9% das companhias optaram por administrar a área
de maneira independente. Este terceiro cenário é considerado ideal pela maioria dos profissionais do trade.
Em uma atividade em que é imprescindível ir a campo
para visitar lojas e identificar as necessidades dos clientes, é preocupante avaliar que 31,6% dos profissionais de
trade marketing permanecem 100% do tempo de trabalho
nas sedes de suas empresas. Os dados também mostram
que pouco mais de 15% das empresas fazem um balanço
equilibrado entre o lado estratégico e o tático.
Embora a maioria organize suas equipes por canal de
venda, neste quesito parece não haver uma regra definida
para estruturar a forma mais adequada de atuação. Organização por área geográfica, conta-chave (KAM) e categoria também são muito utilizadas. O desenvolvimento
de novas frentes de atuação indica uma maturidade na
estratégia de diferenciação de produtos e clientes com
foco no melhor resultado.
Empresas que desenvolvem
um plano anual de negócios
para trade marketing
Sim
Não
N/A
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
105
tendências & perspectivas
N/A
Vice Presidente
Diretor/Gerente
Executivo
Superintendente
Gerente
Coordenador ou
supervisor
Analista
Trainee
Assistente
Estagiário
50%
45%
40%
35%
30%
25%
20%
15%
10%
5%
0%
Nível hierárquico
Estruturação do departamento
50%
40%
30%
20%
Outra
N/A
Não existe
Funcional
(atividade)
Categoria
Área
geográfica
Marca
Conta-chave
0%
Canal
10%
Investimento médio em trade
marketing versus faturamento
da empresa
40%
30%
Trade em pauta
20%
Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
Valor
exato
Não sei
Maior
que 10%
Entre
2% e 5%
Até
2%
0%
Entre
5% e 10%
10%
106
canal, categoria, conta-chave, marca, área geográfica,
categoria e/ou funcional.
Outro exercício interessante é analisar que 31,2%
dos entrevistados ainda não possuem um calendário
de atividades promocionais e, portanto, correm o sério
risco de gerar conflitos entre os canais de distribuição
em suas ações estratégicas.
A maturidade das empresas em relação às estruturas
de trade marketing passa necessariamente pela evolução
do planejamento estratégico. Quando o assunto é plano
para a gestão de conflitos entre canais, a maioria (52,6%)
dos respondentes afirma que a empresa não possui essa
ferramenta. E mais: outros 10,2% não souberam responder a esta questão.
Nota-se também que o ritmo de treinamento aplicado pelas empresas brasileiras na atividade ainda é
baixo. Cabe destacar que 18% das organizações sequer
promovem treinamentos periódicos ou pontuais para
suas equipes. As mudanças constantes do mercado e o
aumento da competitividade entre as empresas tornam
o investimento em treinamentos imprescindível nas
organizações. A exigência na busca de profissionais mais
bem preparados em todos os níveis de complexidade
cresce a cada dia.
A pesquisa mostra ainda que a maioria das empresas
realiza reuniões periódicas com as equipes de vendas.
A frequência média da maior parte das organizações é
um encontro mensal para discutir as principais ações
estratégicas, assim como a mensuração de resultados.
Apesar de todas as tecnologias disponíveis, que permitem reuniões entre profissionais em diferentes locais
do mundo, a quase unanimidade prefere a eficácia das
reuniões presenciais. Nada como o famoso “olho no olho”.
Ciente de seu papel fundamental nas definições estratégicas no ponto de venda, grande parte das equipes
de trade marketing discute vendas, giro de produtos e
margens a serem praticadas para a formação de preço
dos produtos, assim como são convocadas pela equipe
de vendas para negociar ações de PDV com o cliente.
No levantamento feito pelo Invent, alguns indicadores
demonstram a percepção das empresas a respeito da
importância do investimento feito em trade marketing.
O primeiro indica que a maioria das companhias possui
verbas específicas para este departamento, sendo que
Outra
N/A
Constituição de uma equipe de
inteligência em trade marketing
Nenhuma
mudança
Constituição de uma equipe
de trade marketing
Constituição de uma equipe
regional de trade marketing
Revisão do papel da área de
trade marketing
Constituição de uma equipe
por canal de distribuição
Constituição de uma
equipe por conta-chave
35%
30%
25%
20%
15%
10%
5%
0%
Práticas utilizadas
para organizar metas
e mensurar resultados
60%
50%
40%
30%
20%
N/A
Define objetivos de resultados
claros e mensuráveis para ações
que serão implementadas
Apura o resultado líquido
financeiro de cada cliente
Tem o controle dos gastos
em cada cliente, apurando
o custo de servir
0%
Mensura resultados de
negócios por canal
10%
Possui relatório/planejamento
financeiro (P&L) por canal
Adriano Maluf Amui
Presidente do Invent, da Esfera Gestão e professor na ESPM. Tem
especialização em estratégia pela Kellogg, em governança corporativa
pelo IBGC e mestrado em administração pela FGV
Motivos das mudanças
nas estruturas de trade
Estabelece metas de
resultados por canal
em alguns casos esse investimento já representa mais
de 10% do faturamento total da companhia.
Quando a empresa não apresenta uma verba específica para a atividade, os investimentos ficam alocados
nos departamentos de marketing ou de vendas, sendo
o marketing predominante nessa relação de administração de recursos. Esse cenário acontece em 66,7% das
organizações pesquisadas.
É possível observar uma questão interessante retratada pelo estudo: mesmo com a verba alocada em outros
departamentos, o trade marketing é que determina a
aplicação deste investimento (75% da amostra) na maioria
das empresas.
À medida que o trade marketing ganha espaço nas empresas brasileiras, cresce também o desafio em relação à organização das principais metas e mensuração dos resultados.
Por fim, o levantamento indica a existência de um
grande potencial de crescimento para a estrutura de trade marketing, sobretudo baseado no grau de maturidade
atual das estruturas da grande maioria das organizações.
Importante ressaltar que, hoje, empresas e profissionais
reconhecem claramente a área como fundamental para o
desenvolvimento dos negócios e o grande desafio é como
se estruturar para galgar os próximos passos.
Esta pesquisa nos dá mostras evidentes de como a área
de trade marketing ganhou importância estratégica no
Brasil nos últimos anos. Se fosse realizada há uma década,
pelo menos, certamente estaríamos ainda discutindo
conceitualmente o que é trade marketing e quais as suas
atribuições. Sim, ainda existem profissionais e empresas
despreparados, mas a maioria já tem total compreensão e
entendimento a respeito da relevância do trade marketing
para os negócios. Portanto, o que podemos ver através
desta pesquisa, nunca antes realizada, é o mais límpido
panorama de um segmento que já está em um segundo
passo de desenvolvimento, em pleno estágio de amadurecimento, discutindo e debatendo as melhores práticas
de condução das estruturas de trade marketing nas organizações brasileiras. Para ter acesso ao estudo na íntegra,
basta acessar o endereço eletrônico www.inventrade.com.
br/invent.docs/pesquisa.pdf
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
107
ELE PASSOU PELA ESPM
Cid Mesquita Garcia Filho
O manobrista
bem-sucedido
Apaixonado por automóveis, como todo bom
brasileiro, há mais de 30 anos, Cid Mesquita
Garcia Filho ganha a vida estacionando
carros. Hoje, ele é superintendente do Sistema
Estapar/Riopark, mas toda essa história teve
início em uma das salas de aula da ESPM
Por Carlos Roberto F. Chueiri
especial para a Revista da ESPM
Fotos Roberto Braga
C
id Mesquita Garcia Filho costuma creditar à sua
ex-professora Aylza Munhoz a concretização
de seu interesse inusitado pelo marketing. No
final dos anos de 1970, o aluno do primeiro
curso matutino da ESPM, ainda instalada na rua Humaitá,
na capital paulista, foi desafiado, juntamente com seus
colegas, a responder a determinada questão de marketing,
proposta ao sabor de uma discussão de classe.
Naquela aula, a professora, visando aumentar a saudável competição entre seus alunos, reforçou: “Aquele que
apresentar a melhor solução para o problema que estamos
discutindo, ganha um emprego”.
Na semana seguinte, Cid estava instalado numa pequena sala da Unipark Estacionamento e Garagens, no cargo
de auxiliar do departamento de marketing.
Assim, em 1978, era iniciada oficialmente a saga que o
conduziria à superintendência de operação e marketing
da companhia. Hoje, sua atividade principal envolve um
sofisticado esquema de marketing de prestação de serviços, em permanente desafio, inserido em um mercado
altamente competitivo.
108
Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
A ESPM mudou a vida de
Cid Mesquita Garcia Filho,
que hoje ocupa o cargo
de superintendente do
Sistema Estapar/Riopark
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
109
ELE PASSOU PELA ESPM
A professora Aylza, que, à época, prestava consultoria
para a Unipark, uma das pioneiras na administração profissional de estacionamentos no Brasil, não foi enganada
em sua aposta. “Não foi tão fácil, assim, como parece”,
revela o entrevistado. “Antes de me dedicar em tempo
integral à prática de marketing na Unipark, trabalhei em
pesquisa de mercado, como entrevistador. Também fiz
estágios na área de promoção e merchandising.”
Segundo ele, toda a experiência adquirida acabou
sendo útil na Unipark. “Porque nesta área da empresa
fazíamos de tudo: de cartão de visita e material de
escritório até folhetos e anúncios! Sabe? Nada mais
generoso e construtivo do que utilizar, na prática, aquilo
que aprendi na ESPM.”
Aos 55 anos, Cid ainda guarda lembranças marcantes
de seu tempo acadêmico. As amizades nascidas na ESPM
são lembradas anualmente, em reuniões e encontros
comemorativos. Os contatos são frequentes entre eles.
“Os colegas acabaram se tornando amigos inseparáveis
e insuperáveis”, conta com orgulho nostálgico o entrevistado, que passou pela ESPM entre os anos de 1977 e 1981.
Com relação ao próprio curso, Cid conta que procurou
desfrutá-lo ao máximo na busca do conhecimento que seria útil para o desenvolvimento de sua carreira. Naquela
época, a ESPM propunha uma opção, na “grade” dos dois
últimos anos do curso regular. O aluno podia selecionar
duas “concentrações”: marketing ou propaganda. “Acabei
fazendo as duas especialidades: marketing no diurno e
propaganda no noturno. Por quê? A vontade era não deixar escapar nada... Já intuía que a soma maior de conhecimentos haveria de facilitar o meu caminho profissional.”
Custeando o curso que fazia, o profissional começou a
encontrar dificuldades para a sua manutenção pessoal.
Afinal, no departamento de marketing da Unipark, as
possibilidades financeiras não eram tão gratificantes
“Antes de me dedicar
em tempo integral à
prática de marketing na
Unipark, trabalhei com
pesquisa de mercado”
110
Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
Ponto de parada
• A frota de veículos que rodam no Estado de
São Paulo corresponde a 23 milhões de carros
• O segmento emprega cerca de 50 mil trabalhadores,
direta e indiretamente
• De acordo com o Sindepark, existem 12 mil
estabelecimentos em funcionamento no Estado de
São Paulo
• São Paulo conta com, aproximadamente, um milhão
de vagas, que são utilizadas mensalmente por 90
milhões de veículos em todo o Estado
• A Estapar administra cerca de 850 operações em
dez Estados brasileiros, além do Distrito Federal
• A operação da Estapar é feita por quatro mil
colaboradores, que operam mais de 200 mil vagas
nas principais cidades brasileiras
como imaginou que seria ao ser contratado. “Procurei e
encontrei uma vaga de manobrista na própria Unipark e
passei a trabalhar aos finais de semana. Aceito, instintivamente, fui me apropriando de experiências práticas
no processo operacional da atividade. Afinal, estava
perto da minha maior paixão: o automóvel!”, revela o
entrevistado.
Quando entrou na Unipark, Cid encontrou uma empresa que administrava 22 estacionamentos. Depois de
passar pela área que ensejou a sua contratação, sua carreira foi redirecionada para o departamento “operacional/
administrativo”, criado com o objetivo de promover a
expansão da empresa. Naturalmente, sem perder de vista
os princípios básicos da prática do difícil marketing de
prestação de serviços. “Por depender do fator humano, a
área talvez seja a mais ‘complexa’ das variações do marketing praticado na moderna administração.”
Ele participou do substancial robustecimento da
companhia, que cresceu por meio de fusões e compras de
concorrentes. Foi dele a ideia de implementar uma série
de aperfeiçoamentos nas áreas de operação (“campo”),
sem jamais descuidar do treinamento das equipes. Mui-
tas vezes adotou atitudes pioneiras, ao investir recursos
técnicos de ponta, advindos da evolução tecnológica.
Conhecimentos que buscava apreender nas viagens que
fazia, regularmente, aos mercados mais adiantados.
Também assumiu desafios em áreas paralelas àquelas consideradas “convencionais” na atividade. Eram
participações em eventos sazonais de maior porte, que
batizou de “operações especiais”, desenvolvidas em áreas
com grande concentração de usuários. Alguns exemplos
emblemáticos: a Festa do Carreteiro (1980-1986) e as exposições agropecuárias realizadas em mercados importantes, como Curitiba (PR), Londrina (PR) e Governador
Valadares (MG). Em diferentes oportunidades, participou
também de eventos que tiveram lugar de destaque no
Parque de Exposições da Água Funda, na capital paulista. Assim, além dos parques de estacionamento, dos
shoppings e das garagens urbanas, a Unipark inovava a
atividade e, dentro dela, acabava se diversificando.
Em 1987, depois de alcançar o cargo de gerente-geral
de operações e marketing da Unipark, onde havia desenvolvido consistente carreira durante uma década,
Cid aceitou o desafio para ocupar a superintendência
de operações e marketing no Sistema Estapar/Riopark.
“Considero o meu ingresso nesse sistema um verdadeiro
divisor de águas na minha carreira.”
Ele explica que o Sistema Estapar/Riopark, anteriormente coligado à própria Unipark, passou por transformações acionárias. Na verdade, a marca Estapar é a abreviação da razão social de “Estacionamento do Paraná” e,
obviamente, “Riopark” era o seu braço carioca.
Em 1987, com a bandeira única de Estapar, a operação
foi deslocada para a capital paulista, onde passou a operar
três estacionamentos em São Paulo (SP), seis no Rio de
Janeiro (RJ) e um em Curitiba (PR).
Com um posicionamento relativamente modesto,
começava a história de um empreendimento que atualmente abriga, sob sua bandeira, em diferentes condições
contratuais, cerca de 850 operações em todo o Brasil.
“Talvez esta seja a maior operação de parking sob uma
única bandeira em toda a América Latina”, avalia Cid.
Voltando a falar de sua carreira, o entrevistado lembra
que, através de novas alterações societárias, em 1992,
foi constituída a CMC Parking, empresa voltada para o
estacionamento de grandes hotéis, como Transamérica,
Hyatt e Sofitel, entre outras bandeiras nacionais e multinacionais do ramo de hospedagem. No mesmo ano, surgiu
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
111
ELE passou pela espm
outra operação paralela, a Auto Vagas, integralmente
voltada para atuar em shopping centers.
Atualmente, Cid comanda sete empresas, todas voltadas para as operações de estacionamento e guarda de
veículos de terceiros por meio da prestação de serviços
especializados, para os mais diferentes segmentos de
mercado. Cerca de cem estacionamentos franqueados
estão sob a responsabilidade direta desse conglomerado.
O ex-aluno da ESPM tem orgulho de alguns aspectos
de sua trajetória profissional, principalmente pela contribuição pessoal e profissional que, junto com esse grupo
empresarial, ele proporcionou para o desenvolvimento
da atividade no país. Outro ponto foi o pioneirismo da
adoção da informática em diferentes rotinas dos estacionamentos, o que contribuiu para o aprimoramento
da prestação de serviços. Além disso, o desenvolvimento
de parcerias com as companhias de seguro e cartões de
crédito, por exemplo, também contribuiu para a expansão
dos negócios. Entre os projetos realizados por Cid e sua
equipe está a introdução de uma intensa política de treinamento das equipes focada no atendimento e no respeito,
que precisam estar voltados para o maior patrimônio dos
prestadores de serviço: o cliente.
Para que tudo isso aconteça, ele administra uma equipe
de profissionais que acumula, em média, 25 anos de experiência em especialidades que partem do desenvolvimen-
Atualmente, Cid comanda sete
empresas, todas voltadas para as
operações de estacionamento e guarda
de veículos de terceiros por meio da
prestação de serviços especializados, para
os mais diferentes segmentos de mercado
to de softwares e hardwares e se espraiam pelas diferentes
áreas administrativas e operacionais das atividades de
parking. Muitas dessas inovações são “adaptadas” imediatamente pelos concorrentes. “Aquilo que criamos e
desenvolvemos na área vira moda”, ironiza Cid.
Ele está ligado, institucionalmente, ao desenvolvimento e aperfeiçoamento do segmento em que suas empresas
operam. Tanto que sempre recebe e procura responder
aos convites para exposições e palestras em reuniões e
workshops do setor. Costuma dizer, com uma ponta de
vaidade e muita “corujice”, que tem três tesouros em casa:
seus filhos de 18, 17 e 16 anos.
Ainda hoje continua curtindo carros e motocicletas –
tem quatro máquinas na sua garagem, sendo uma delas
considerada um exemplar clássico dos anos de 1950 e
1960. Não abre mão de um risoto, preferencialmente de
Raio x de Cid Mesquita Garcia Filho
1957
Nasceu, em São Paulo, no dia
8 de julho. Cursou o ensino
regular no Mackenzie. Aos 14
anos foi ser office-boy de um
escritório de advocacia. Como
não se adaptou, decidiu investir
no seu esporte favorito, o surfe,
com a produção e reparação
artesanal de pranchas na
garagem de sua casa
112
1977
Ingressou na ESPM para se
aperfeiçoar na parte prática e
operacional da profissão que
escolhera. Realiza estágios,
como trainee, em empresas
de pesquisas de mercado
e fornecedores da área de
promoção, como a Otavio
Roth Produções Gráficas
e a Dart Merchandising
Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
1978
A grande chance para o
ingresso na área de marketing
nasceu ao responder a um
repto em plena sala de
aula na ESPM. Cid assume
o cargo de auxiliar no
departamento de marketing
da Unipark, empresa pioneira
na profissionalização das
atividades de parking
no Brasil
1978-1987
Visando aumentar seus
rendimentos e entender
melhor o mecanismo
operacional da empresa,
Cid enfrenta o desafio de
ser manobrista da Unipark,
nos seus períodos de folga.
Foi assim que, em 1978,
ele participou da primeira
operação profissional de
valet realizada no Brasil: a
inauguração do edifício da IBM,
em São Paulo
“Considero o meu
ingresso nesse sistema
um verdadeiro divisor de
águas na minha carreira”
frutos do mar. Aprecia a leitura de obras atuais, mas se
concentra naquelas que aumentam seus conhecimentos
nas áreas de administração e de operações na atividade que desenvolve. Adora filmes de ação e aventura,
“que servem para mexer com a adrenalina”, assinala o
profissional. “Viajar, curtir a família, ampliar a cultura
pessoal, conhecer novas paragens, descobrir novidades gastronômicas, tudo isso continua sendo o melhor
remédio para superar o estresse das grandes cidades,
onde desenvolvo a minha profissão.”
Ao encerrar o encontro com Revista da ESPM, sobre as
preferências do chamado esporte bretão, o corinthiano
“roxo” filosofou: “Quem esperou 102 anos para alcançar
um objetivo, não é um fanático, e sim um crente...”. Reflexo
do orgulho de vibrar, com outros 30 milhões de “loucos”,
pelo mais novo campeão da Libertadores: o alvinegro do
futuro “Itaquerão”, que está sendo edificado na zona leste
da cidade onde nasceu. E pelo qual morre de amores.
1987
Cid busca novas áreas de
atuação para a Unipark, como
os eventos de grande porte e
as áreas de estacionamento
de shoppings e hospitais.
Após dez anos de dedicação,
ele chega à gerência geral
de operações e marketing
da organização que, por
ocasião de seu ingresso,
administrava pouco mais
de 20 estacionamentos na
capital paulista
1988
Cid Mesquita é promovido
a superintendente de
operação e marketing do
Sistema Estapar/Riopark.
Ao longo das últimas
três décadas, Cid apoiou
e contribuiu, fortemente,
para o desenvolvimento do
segmento de parking no
Brasil, por meio de modernas
técnicas de administração,
a expansão da informática
e o treinamento profissional
1992
Cid participa de mais duas
empresas agregadas ao
grupo, a CMC Parking e a Auto
Vagas, ambas voltadas para
operações complementares
à atividade de parking. Ele
intensifica a sua presença em
eventos internacionais, como
os congressos da National
Parking Association (NPA)
realizados em Chicago (1992)
e Orlando (1994)
1997
No ano em que a Estapar
ingressou no Sindicato das
Empresas de Garagens e
Estacionamentos do Estado
de São Paulo (Sindepark),
Cid passou a difundir seu
conhecimento com os
demais profissionais do setor.
Atualmente, é conselheiro da
entidade. Também participa
da Associação Brasileira de
Estacionamentos (Abrapark)
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
113
leitura recomendada
A alma da propaganda,
a propaganda da alma
Mayra Luna
Porto de Ideias, São Paulo – 2011
268 p. – R$ 34,90
A publicidade precisa mudar sua história. Esta é a tese que a autora defende
no livro ao mostrar que a mídia e o
público mudaram, e fazer propaganda como se fazia nos anos 1990 já
não dá mais resultado. Segundo ela,
chegou a hora de a criação se fazer
presente para ter resultados significativos na transformação do mundo.
”E a criação só terá salvação por meio
da arte. Ou melhor, da alma”, defende
Mayra Luna, que neste livro se expõe
e divaga entre a realidade e o sonho
com seus prazeres e dores de corpo e
alma. O equilíbrio entre o pessoal e o
profissional transforma dois livros em
um. O livro pode ser comprado diretamente com a autora (mayralunaarte@
hotmail.com).
Mayra Luna é formada em comunicação
social pela ESPM desde 2001.
Faz pós-graduação para docência de
ensino superior na COC Uniseb.
É diretora de arte e escritora.
114
Revista da ESPM | JULHO/AGOSTo de 2012
Nos bastidores da Apple:
como a empresa mais
admirada (e secreta) do
mundo realmente funciona
Adam Lashinsky,
Silvio Floreal de Jesus Antunha (tradução)
Editora Saraiva, São Paulo – 2012
216 p. – R$ 44,90
Disponível na versão digital
Este é mais um título da coleção Nos
bastidores. Considerado um dos melhores textos escritos sobre a Apple, o
livro traz informações sobre a transição
da era Jobs para a era Cook, além de
mostrar como a marca da maçã usa o
sigilo e sua peculiar estrutura de gestão
para continuar sendo tão ágil como
uma empresa em início de atividade. A
obra revela ainda o que seus executivos
chamam de tempero secreto: como os
sistemas e as estratégias permitiram
que a empresa de Steve Jobs revolucionassem múltiplas indústrias, como a
de computadores com os Macs e a das
comunicações com o iPhone e o iPad.
Adam Lashinsky cobre Vale do Silício e Wall
Street para a revista Fortune. É debatedor
do programa Cavuto on Business, do canal
Fox News.
Tudo o que é fácil já foi
feito: e outras reflexões
de colaboradores e chefes
sobre os novos tempos do
mundo empresarial
Luiz Marins
Editora Saraiva, São Paulo – 2012
152 p. – R$ 29,90
Para vencer na vida é preciso se preparar dia a dia, pois a competição está
cada vez mais acirrada, não só entre
as empresas, mas também entre os
profissionais. Não se deve esperar que
a empresa proporcione apenas prazer e
bem-estar. Nesse cenário, o livro mostra que as pessoas perderam a noção
concreta de que trabalho não é lazer. A
ilusão de querer um emprego que só dê
alegrias tem deixado tanto os funcionários quanto os chefes infelizes. Luiz
Marins deixa claro que essas expectativas devem ser revistas, pois o objetivo
das empresas é maximizar resultados.
Nenhuma empresa é instituição de caridade, nem uma associação de amparo
aos desempregados.
Luiz Marins é antropólogo. Lecionou
antropologia em universidades do Brasil e
do exterior. É consultor de empresas.
Tempo de Gangorra
Saïd Farhat
Relações Internacionais
em Euclides da Cunha:
cartas de sete léguas
Editora Tag&Line, São Paulo – 2010
472 p – R$ 45,00
Marleine Paula Marcondes
e Ferreira de Toledo
Esta é mais uma produção do Instituto
Cultural ESPM. Com prefácio de Hernâni
Donato, o livro é dividido em duas partes.
A primeira reconstrói os fatos relacionados à tomada do poder pelo regime militar em 1964 e seus desdobramentos. Já
a segunda parte retrata, com detalhes
de bastidores jamais revelados – e
permitidos somente a quem esteve tão
próximo do governo – os meandros do
processo que levou a nação à retomada
da democracia. O autor faz uma análise
precisa dos fatos mais importantes do
período que levou à redemocratização
do Brasil. ”Conto só o que vi com meus
próprios olhos e ouvidos e o que me foi
dito em confidência.”
Nankin Editorial, São Paulo – 2012
231 p. – R$ 40,00
Saïd Farhat foi o primeiro civil a exercer
o cargo de secretário de Comunicação
Social da Presidência da República no
regime militar no Brasil, no governo de João
Figueiredo. Participou do processo que
levou à democracia como solução política
para o país, mesmo em um ambiente
militar, com convicções radicais.
Pela primeira vez é publicada a obra
que destaca o trabalho de Euclides
da Cunha nas relações internacionais
brasileiras e nas questões diplomáticas
e de fronteiras do Brasil no início do
século 20. O livro analisa as mais de
400 correspondências escritas por ele,
entre 1866 e 1909, em vários momentos
que marcaram a história do país, como
a incorporação do território do Acre ao
Brasil. Aqui estão retratadas as várias
faces de Euclides da Cunha como polígrafo (jornalista, engenheiro, poeta, filósofo, historiador, geógrafo e cartógrafo).
O livro conta com prefácio do diplomata
e ex-ministro das Relações Exteriores
Luiz Felipe Lampreia e apresentação
do presidente da ESPM, J. Roberto Whitaker Penteado.
Marleine Paula Marcondes e Ferreira
de Toledo é jornalista, pesquisadora
e professora da ESPM.
A literatura infantil de
Monteiro Lobato: uma
pedagogia para o progresso
Rose Lee Hayden
São Paulo – 2012
194 p. – R$ 30,00
Como parte do 1º ciclo ESPM de Comunicação e Marketing, o Instituto Cultural
ESPM lançou essa tese da professora
americana Rose Lee Hayden, única
estrangeira a escrever sobre o autor.
O livro aborda o universo do escritor e
foca a qualidade da obra, apontando
a utilização do método socrático de
ensino, valorizando o estudo informal
e partindo das experiências do próprio
Lobato, que, dessa forma, absorvera a
maior parte dos seus conhecimentos.
Esta é, com certeza, uma das mais importantes reflexões sobre aquele que é
considerado o ”pedagogo do progresso”.
O livro pode ser solicitado pelo e-mail:
[email protected].
Rose Lee Hayden tem 40 anos de
experiência no campo da educação. Como
VP da Eagle Multimídia, foi responsável
por inúmeros programas educacionais
para televisão e atuou como consultora de
mídia para a WGBH em Boston.
JULHO/AGOSTo de 2012 | Revista da ESPM
115
leitura recomendada
As novas regras
do marketing verde:
estratégias, ferramentas
e inspiração para
o branding sustentável
Jacquelyn A. Ottman
M.Books – São Paulo – 2012
328 p. – R$ 79,00
Como implantar em sua marca o conceito de sustentabilidade e de compromisso com a ecologia e o meio ambiente? A
resposta está neste livro, que mostra
como assumir e implantar essa filosofia
na produção e operacionalidade, agregando aos seus produtos e marcas um
comprometimento real e verdadeiro. A
ideia é que a marca seja identificada
pelos consumidores, que, ao adquirirem
seus produtos e serviços, sintam que
estão colaborando com a melhoria da
qualidade do meio ambiente. Ottman
oferece uma chance de desenvolver a
criatividade e implementar estratégias
práticas que ressaltem o valor inerente
dos produtos para que a sustentabilidade seja integrada às marcas.
Jacquelyn A. Ottman tornou-se pioneira
no marketing verde fundando a empresa
J. Ottman Consulting, Inc.
116
Revista da ESPM | JULHO/AGOSTo de 2012
Responsabilidade social:
Conceitos e práticas:
construindo o caminho
para a sustentabilidade
nas organizações
Cid Alledi Filho e Vânia de Lourdes
Marques (organizadores)
Como vencer a concorrência
de forma lucrativa:
ensinamentos do Google,
Intel, Sap, Cielo, Man,
Wahler, Petrobras e
outras empresas
Eduardo Vasconcellos
Atlas, São Paulo – 2012
280 p. – R$ 65,00
Atlas, São Paulo – 2012
264 p. – R$ 48,00
O diferencial dessa obra é a abordagem
didática utilizada no tratamento dos
temas fundamentais para o estudo da
ética, transparência, sustentabilidade e
da responsabilidade social empresarial,
tanto do ponto de vista estratégico
quanto das práticas de gestão. A obra
apresenta as metodologias que buscam direcionar as organizações na
implantação de práticas sustentáveis.
O sucesso de uma marca, um produto, um serviço ou mesmo da própria
empresa depende do uso adequado
de estratégias e modelos organizacionais para vencer a concorrência
e ao mesmo tempo gerar resultados de forma sustentável.O autor
mostra quais as características e
diferenciais presentes nesse tipo de
posicionamento, principalmente nas
áreas de tecnologia e inovação. O
livro retrata cases de sucesso construídos por companhias de grande
porte, como a Intel, o Google, a SAP
e a Cielo.
Cid Alledi Filho é doutorando em
engenharia civil pela UFF e professor de
ética nos negócios, responsabilidade social
e sustentabilidade no Latec/UFF, Unicamp,
UFSJ, UniEthos, Universidade Petrobras,
Inmetro e IBP.
Vânia de Lourdes Marques é doutoranda
em engenharia civil e mestre em ciência
ambiental pela UFF e professora convidada
na UFF-Latec, UniEthos, Ibmec-RJ e IBP.
Eduardo Vasconcellos é doutor em
administração pela FEA-USP e professor
e pesquisador da FEA-USP nas áreas
de organização para inovação e
gerenciamento estratégico da tecnologia.
Ponto de vista
Uma profissão delirante
M
uita gente normal me pergunta por que os
publicitários são tão obcecados por prêmios
e por que se vangloriam tanto deles, se trabalham numa profissão que tem prêmios para todos.
Prêmios regionais, locais, nacionais e internacionais.
Prêmios para criadores, planejadores, mídias, diretores,
produtores. Prêmios para os analógicos, prêmios para os
digitais. Prêmios para todo mundo.
A pergunta que, maliciosamente, embute a resposta
tem lógica, e a resposta é uma constatação. Realmente
são tantos os prêmios no universo da publicidade que, a
qualquer momento, qualquer publicitário pode ser atingido por um deles.
Digo isso sem cuspir no prato em que comi durante
anos, já que fui muito favorecido pelos prêmios, particularmente no início da minha carreira, quando o número deles
era bem menor e os benefícios de imagem que geravam
para os premiados eram, por consequência, bem maiores.
Aproveitei-me disso no momento certo, mas rapidamente percebi que os prêmios, por mais prestigiosos que
fossem, eram apenas um início para a construção de uma
imagem profissional respeitável, e que jamais podiam
ser encarados como um fim, se eu imaginasse minha
carreira como uma maratona, em vez de uma corrida de
cem metros rasos.
Essa postura, acompanhada da minha obsessão pela
cultura popular, me ajudou a consolidar uma imagem
profissional e pública que venho construindo desde os 19
anos de idade, mas não virou um exemplo seguido pela
maioria e pelas novas gerações como eu, pretensiosamente, imaginava e gostaria que acontecesse.
Pelo contrário: mesmo com todo o meu discurso contra
o prêmio pelo prêmio, iniciado em 1992, quando criei a
expressão “propaganda fantasma”, a verdade é que, nos
últimos anos, a obsessão pelos prêmios por parte da maioria dos publicitários só aumentou. Deixou de ser uma tara
exclusiva dos criativos e se disseminou pela maioria dos
departamentos das agências. Na verdade, virou uma tara das
agências, com todos sonhando ser premiados, de qualquer
Washington Olivetto
jeito, a qualquer custo, em qualquer lugar, mas de preferência
na mais famosa das premiações: o Cannes Lions.
Nascido originalmente como Festival do Cinema Publicitário de Veneza (depois Cannes), que premiava com
um número restrito de leões os melhores comerciais do
mundo, o hoje Cannes Lions se autointitula um festival de
ideias e premia com fartura de leões muitíssimas categorias. Conhecido no mundo inteiro, o Cannes Lions é, além
de tudo, um dos maiores responsáveis pelo aumento do
faturamento dos deliveries de pizza nos meses de março,
abril e maio, época em que publicitários de todas as etnias
viram noites nas agências criando peças especialmente
para o festival.
O fato se repete todos os anos: agências de propaganda
do mundo inteiro gastam milhões em energia e dinheiro
criando, produzindo, divulgando e inscrevendo suas ideias
no Cannes Lions, na intenção de serem eleitas a mais criativa agência na terceira semana de junho, ou pelo menos
uma das mais criativas. O problema é que boa parte dessa
montanha de trabalhos que concorrem no Cannes Lions
não existe, nunca existiu e nem vai existir. Mas para que
serve a propaganda que não existe?
Para os organizadores do festival, serve para deixá-los
cada vez mais prósperos, até porque as inscrições custam
alguns bons euros.
Para as agências que participam dele, serve para colocar
umas estátuas na recepção e fazer um ou dois anúncios de
autopromoção nas semanas seguintes ao festival.
Para os profissionais de propaganda, serve para alimentar cada vez mais a reputação duvidosa dos seus egos e a
imagem de superficialidade da classe.
Para a maioria dos clientes, de nada serve. Até porque o
negócio dos clientes funciona durante o ano todo, e comunicação bem feita, responsável e eficiente deve ser o dia a
dia dessa profissão e não apenas algo que acontece dentro
de alguns auditórios do sul da França, durante uma semana.
A verdade é que o Cannes Lions como laboratório, painel
de tendências, tecnologias e negócios está cada vez mais interessante e relevante. Verdadeiramente imperdível. Assim
julho/agosto de 2012 | Revista da ESPM
117
Ponto de vista
“Para a maioria dos clientes, o festival
de nada serve. Até porque o negócio
dos clientes funciona durante o
ano todo, e comunicação bem feita,
responsável e eficiente deve ser o dia
a dia dessa profissão e não apenas
algo que acontece dentro de alguns
auditórios do sul da França”
118
Revista da ESPM | julho/agosto de 2012
como o sul da França, na semana de junho que antecede o
verão, está cada vez mais lindo.
Já no capítulo premiações, o Cannes Lions, com seus
leões distribuídos para uma quantidade enorme de peças
representantes da propaganda fantasma, scam ou trucha,
está cada vez menos importante. Assim como a competição
entre agências e profissionais, com ingredientes de falsidade
ideológica, luta de bastidores e conchavos políticos, está
cada vez mais grosseira e constrangedora.
Para tentar entender um pouco por que isso acontece,
convém lembrar uma outra região da França, a Córsega,
e um dos seus maiores representantes: o escritor, poeta,
ensaísta e filósofo Paul Valéry. Para ele, a publicidade se
enquadrava na categoria das Profissões Delirantes. Profissões que dependem de segurança pessoal e da opinião dos
outros, em vez de habilidades comprovadas. Em resumo,
dependem da mais instável de todas as posses: a reputação.
Desesperadas por construir boa reputação, algumas
agências e publicitários do mundo inteiro falseiam suas
realidades em Cannes, obtendo assim seus leões mancos
e desdentados que, na verdade e a curtíssimo prazo, só
prejudicam a reputação delas mesmas, de toda a atividade
e do próprio Cannes Lions.
O fato só não é tão importante porque uma, duas ou três
semanas depois do Cannes Lions, essa parte circense dos
leões de Cannes cai no esquecimento e as reputações voltam
às suas realidades, o que nos leva a uma conclusão quase
óbvia, mas necessária: reputação é um valor flutuante e delicado, resultado real de uma série de operações complicadas
envolvendo ética, competência, honestidade e eficiência.
Na publicidade, isso tudo só é conquistável a partir
de trabalhos criativos, reais e conhecidos. Aqueles que
recheiam os bate-papos de botecos, dos salões de cabeleireiros e das viagens de elevadores. Aqueles que entram
no vocabulário e viram cultura popular. Aqueles que
eventualmente até ganham prêmios depois de conquistar
a maior glória que uma peça publicitária pode almejar, que
é o reconhecimento do público.
Porque este, sim, é o grande momento desta profissão
delirante: quando conseguimos a missão quase impossível
de levar a galera ao delírio.
Washington Olivetto
Chairman da WMcCann

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