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Hanuká: O Segredo do Milagre do Óleo
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Hanuká: O Segredo do Milagre do Óleo
Por Sha’ul Bensiyon
I - Introdução
Muitos, ao serem indagados sobre os motivos da celebração de Hanuká,
imediatamente se referem ao milagre do óleo do Templo, suficiente para apenas um dia, e
que teria durado oito dias.
Na realidade, a primeira surpresa para esses pode estar no fato de que o milagre
do óleo não é o tema central da festividade (conforme será visto no segundo item).
Mas, dentre os que já investigaram a questão, paira ainda uma verdade incômoda:
Mesmo quando se utilizam fontes religiosas, a narrativa do milagre parece não se
sustentar historicamente. Como compreender a questão?
Na realidade, o milagre do óleo de Hanuká esconde um dos mistérios mais
fascinantes da história do povo judeu.
Para compreendê-lo, contudo, é preciso percorrer uma trajetória histórica que
começa desde os primórdios da Revolta dos Macabeus, verifica o desenvolvimento da
comemoração e o panorama geopolítico do Oriente Médio por volta de dois milênios
atrás.
O autor deste material é o primeiro a reconhecer que este material possui bastante
informação, e por isso recomenda uma leitura atenta e cautelosa. Aquele que tiver a
perseverança de fazê-lo poderá ter acesso a uma realidade extraordinária, que para
sempre mudará (para melhor) a sua forma de observar os eventos desta festividade.
II - Uma Ausência Surpreendente
Observe o leitor atentamente as passagens abaixo. Elas indicam exatamente o
que, pela lei judaica (tradições e costumes locais à parte), deve ser lido ou dito em
Hanuká:
"…pelos milagres, pelas obras poderosas, pelos atos de livramento, pelo triunfo na
guerra, e pela redenção que Tu operaste para nós e nossos ancestrais naqueles distas a
esta época: nos dias de Matityah Ben Yohanan o sumo sacerdote hasmoneu e seus
filhos, quando o reino helenista maligno se levantou contra o Teu povo, a Casa de Israel,
para anular a Tua Torah e para fazê-los transgredir os estatus da Tua vontade; Em Tua
abundante compaixão Tu se levantaste por eles no seu tempo de tribulação; Tu
defendeste os seus direitos e lutaste a sua batalha e vingaste o erro cometido contra eles;
Tu entregaste guerreiros poderosos nas mãos dos fracos, os muitos nas mãos dos
poucos, os depravados nas mãos daqueles que apoiam a Tua Torá; Tu Te fizeste grande
fama no mundo, e para o Teu povo tu fizeste atos assombrosos e milagres.” (Trecho da
oração `Al haNissim, recitada na `Amidá, em Hanuká)
"Bendito és Tu ETERNO nosso Elohim rei do universo, que nos santificastes em teus
mandamentos e nos ordenaste a acendermos a lâmpada de Hanuká.
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Bendito és Tu ETERNO nosso Elohim rei do universo, que operaste milagres aos nossos
pais nos dias anteriores, a esta época.” (Bênçãos para Hanuká, segundo a Mishnê Torá Sefer Zemanim - Hilkhot Meguilá waHanuká 3:4)
É surpreendente que dentre aquilo que a lei judaica determina que seja recitado
durante a festividade, ocorra uma ausência total e absoluta de qualquer menção ao
milagre do óleo ser suficiente para apenas um dia, mas ter durado oito dias no total.
Uma das bênçãos faz alusão ao decreto da Corte Mosaica quanto ao acendimento
da lâmpada de Hanuká. Sem, no entanto, estabelecer essa vinculação. E os demais
elementos tão somente se limitam a mencionar a vitória militar da Casa dos Hasmoneus.
Por que a ausência do milagre do óleo na liturgia instituída pela Corte
Mosaica?
III - Referências ao Milagre
Afinal, o milagre do óleo é mencionado explicitamente pelo Talmud Babli, que
afirma:
"O que é Hanuká? Pois nossos sábios ensinavam: No décimo-quinto de Kislew são
os dias de Hanuká, que são oito, nos quais lamento pelos mortos e jejum são proibidos.
Pois quando os gregos entraram no Templo, profanaram todos os óleos que estavam no
Templo. Quando a Casa dos Hasmoneus prevaleceu contra eles e os derrotou,
procuraram e encontraram somente um jarro de óleo sobre o qual estava o selo do Sumo
Sacerdote, mas só continha o suficiente para um dia de iluminação. Porém, um milagre
aconteceu e eles acenderam [a Menorá] por oito dias. No ano seguinte esses [dias] foram
apontados como festividade, [com] Halel e ação de graças.” (b. Shabat 21b)
Essa narrativa também se encontra na Meguilat Hanuká, conforme indicado
abaixo:
"Depois disso, os filhos dos hasmoneus vieram ao Templo e reconstruíram os
portões que haviam sido destruídos, e repararam as brechas nas muralhas. Purificaram o
pátio dos cadáveres e da imundícia. Tentaram encontrar óleo puro de oliva para acender
a Menorá, mas só puderam encontrar um único vaso que estava selado com o anel sinete
do sumo sacerdote. Eles reconheceram que estava puro, mas só havia óleo suficiente
para um único dia. O Elohim dos céus, que fez o Seu Nome ali habitar, abençoou o óleo e
eles a acenderam por oito dias.” (Meguilat Hanuká)1
O Talmud Babli foi composto entre os séculos III e V EC.2 Já a Meguilat Hanuká
data, segundo Sa`adyah Ga’on, data do final do século II.3
A revolta dos Macabeus ocorreu em meados do século II AEC.
1
Meguilat Hanuká - Edição Bilingue Português/Hebraico - Qol haTorá
2
Utiliza-se, neste artigo, a notação EC para ‘Era Comum’ e AEC para ‘Antes da Era Comum’.
3
Ibid - Introdução.
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3
Em outras palavras, as referências mais antigas que temos a esse fato são
dos séculos II e III EC. Literalmente, cerca 4 séculos e meio depois dos
acontecimentos em si!
Isso não seria problema, caso não houvesse nenhuma outra referência ao evento,
afinal é comum que eventos da antiguidade tenham pouca documentação histórica, ou
mesmo que os manuscritos mais antigos se percam, permanecendo somente as cópias.
Isso não é exclusivo do mundo religioso, mas acontece com toda a história antiga da
humanidade.
Todavia, este não é o caso da Revolta dos Macabeus.
IV - A Ausência do Milagre (II AEC)
Muito pelo contrário, há uma obra literária, originalmente escrita em hebraico (e
posteriormente preservada no grego) que narra os acontecimentos em detalhe, dando até
mesmo nomes, datas e descrições precisas dos eventos: 1 Macabeus.
Assim eles narram os eventos ocorridos em Hanuká:
"Disse então Yehudá, junto com seus irmãos: “Nossos inimigos estão derrotados. Vamos
subir a Yerushalayim, para purificar o lugar santo e restaurá-lo. Todo o exército se reuniu
e subiram para o monte Siyon. Aí viram o Santuário abandonado, o altar profanado, as
portas incendiadas, o mato crescendo nos átrios como num bosque ou na montanha, os
aposentos dos cohanim, destruídos. Rasgaram suas vestes e choraram amargamente,
cobrindo-se de cinza. Prostrados por terra, começaram a gritar, ao som das trombetas,
clamando ao céu. Yehudá ordenou a alguns de seus homens que contivessem os que
estavam na cidadela, enquanto era purificado o Templo. Para esta função escolhera
cohanim sem defeito, observantes da Torá, os quais purificaram o lugar santo e
removeram para um lugar impuro as pedras que o profanavam. Deliberaram também
sobre o que fazer do altar dos holocaustos, que tinha sido profanado e tiveram a boa idéia
de o demolir. Assim, ele não continuaria a ser motivo de desonra, pelo fato de as nações
o terem profanado. Demoliram, pois, o altar e deixaram as pedras no monte do templo,
em lugar conveniente, até que aparecesse o Profeta esperado, para decidir sobre o que
fazer com elas. Tomaram então pedras inteiras, não talhadas, segundo a Torá, e
construíram um altar novo, segundo o modelo do anterior. Restauraram o lugar santo e
consagraram a parte interna do Santuário e os átrios. Fabricaram novos utensílios
sagrados e introduziram no Templo a Menorá, o altar do incenso e a mesa. Acenderam o
fogo sobre o altar, bem como as lâmpadas da Menorá, para que iluminassem o Templo.
Colocaram em ordem os pães sobre a mesa, penduraram as cortinas e deram por
terminados todos os trabalhos. Antes do amanhecer, no dia vinte e cinco do nono mês,
isto é, o mês de Kislew, do ano cento e quarenta e oito, eles se levantaram para
oferecerem o sacrifício, de acordo com a Torá, sobre o novo altar dos holocaustos que
tinham construído. Exatamente na mesma época e no mesmo dia em que os gentios o
haviam profanado, o altar foi consagrado em meio a cânticos e cítaras e liras e címbalos.
Todo o povo prostrou-se por terra, em adoração, e fez subir para o céu os seus louvores,
para Aquele que lhes tinha concedido o sucesso. Durante oito dias celebraram a
dedicação do altar, oferecendo holocaustos com alegria e sacrifícios de comunhão e de
ação de graças. Enfeitaram a fachada do Templo com coroas de ouro e pequenos
escudos, e consagraram os portais bem como os aposentos, onde colocaram portas. Foi
muito grande a alegria do povo, tendo sido cancelado o opróbrio causado pelas nações.
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Então, Yehudá e seus irmãos, e toda a assembléia de Israel, determinaram que os dias
da dedicação do altar seriam anualmente celebrados, no seu devido tempo, pelo espaço
de oito dias, a partir do dia vinte e cinco do mês de Kislew, com júbilo e alegria."
(1 Macabeus 4:36-59)
Observe que o texto menciona que o Templo havia sido profado, e também que
houve toda uma obra de restauração.
O texto menciona ainda a celebração por oito dias, sem qualquer menção ao
milagre do óleo.
De fato, a própria festividade é chamada por Yehudá Makabi (Judá Macabeu) de
‘Hanukat haMizbeah’ (dedicação do altar), à semelhança do que diz a Torá:
"Esta foi a dedicação do altar [‫ח‬
ַ ‫ ֲחנֻכַּת ַה ִמּזְ ֵבּ‬- hanukat haMizbeah], feita pelos príncipes de
Israel, no dia em que foi ungido, doze pratos de prata, doze bacias de prata, doze
colheres de ouro.” (Bamidbar/Números 7:84)
Em outras palavras, o próprio nome da festividade, Hanuká, indica uma
festividade de dedicação do altar, e não uma festividade que comemore o milagre
do óleo.
Devido à sua precisão histórica, e um estilo literário que não critica a dinastia dos
Hasmoneus, que posteriormente teria sido péssima para Israel, assim como menciona
Roma em termos relativamente brandos, sabe-se que o autor da obra ou teria
presenciado os eventos, ou os teria ouvido de primeira mão, e sua autoria não pode ser
posterior ao final do século II AEC.4
Ou seja, 1 Macabeus predata o Talmud Babli e a Meguilat Hanuká em, pelo menos,
cerca de 4 séculos, e é portanto bem mais confiável historicamente.
V - Da Dedicação a Sukot (I AEC)
Uma outra obra, originária da comunidade judaica de Alexandria, também é
relevante para nos mostrar a evolução histórica dos eventos de Hanuká. Trata-se da obra
conhecida como 2 Macabeus.
Que o leitor não se engane: Apesar de sua designação como ‘2 Macabeus’, essa
obra foi escrita em grego, por um autor diferente, e é bem mais recente. Data, ao que
tudo indica, do final do século I AEC. Ainda assim, é 3 séculos mais antiga do que os
eventos do Talmud Babli.
4
Ref.: Maccabees, Books of - Crawford Howell Toy, George A. Barton, Joseph Jacobs, Israel
Abrahams - Jewish Encyclopedia
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O texto de 2 Macabeus diz o seguinte:
"Durante oito dias, fizeram uma festa semelhante à de Sukot, relembrando que, pouco
tempo antes, haviam passado essa festa vagueando pelos montes e cavernas, como
animais. Por isso, trazendo hastes e ramos verdes e folhas de palmeiras, entoavam hinos
Àquele que lhes estava dando a alegria de purificar o seu lugar santo. Depois, com um
decreto público, assumido por todos, prescreveram que toda a nação dos judeus
celebraria estes dias de festa cada ano." (2 Macabeus 10:6-8)
Em 2 Macabeus, ocorre a primeira associação de Hanuká com algum outro evento
para além da dedicação do altar. Isto é, com a festividade de Sukot.
O autor de 2 Macabeus associou os oito dias de Hanuká com os 8 dias de Sukot/
Shemini Asseret (Tabernáculos/Festa do Oitavo Dia), e chegou à conclusão de que
provavelmente os judeus teriam sido impedidos de celebrar Sukot na data adequada, e
por essa razão teriam feito uma festividade de oito dias.
Essa atribuição provavelmente se baseia na possibilidade aberta pela Torá, e com
precedente bíblico, do adiamento de uma festividade no caso da impossibilidade de uma
festividade ser celebrada na data adequada, como é o caso de Pessah sheni (a segunda
páscoa).5
Há várias teorias sobre essa atribuição do autor de 2 Macabeus. Uma seria a de
que a comunidade de Alexandria jamais teria adotado a festividade, e que a explicação de
ser simplesmente Sukot a teria deixado mais à vontade frente a esse evento. A segunda
possibilidade é de que a data escolhida por Yehudá Makabi teria causado desconforto,
por coincidir com a data da dedicação do Templo a Zeus Olimpo, por parte dos selêucidas
(o que, na realidade, visava indicar a vitória do Eterno sobre os falsos deuses gregos).
O que importa é que, de um jeito ou de outro, a data sofreu essa associação, e
mais uma vez não há qualquer menção ao milagre do óleo como razão para a celebração
dos 8 dias.
VI - Josefo desconhecia o milagre (I EC)
Isso indica que, até o final do século I AEC, a ideia do milagre do óleo não era
difundida entre o povo judeu.
Quando se passa ao próximo século, isto é, ao século I EC, encontra-se mais uma
vez uma total ausência de referência ao milagre. Isso ocorre quando se observam os
escritos de Flavio Josefo.
Josefo narrara em detalhes os acontecimentos do povo judeu, e demonstrava ter
relativo conhecimento sobre Judaísmo, e também sobre seitas judaicas em seu tempo. E
procura descrevê-las de forma relativamente neutra, enfatizando as crenças de cada
grupo.
5
Vide Nm. 9 e 2 Cr. 30
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No entanto, ao falar sobre Hanuká, Josefo afirma:
“E então Yehudá e seus companheiros celebraram o festival da restauração dos
sacrifícios do Templo por oito dias, e não omitiram qualquer tipo de prazer, mas todos
banquetearam sobre ricos e esplêndidos sacrifícios. E honraram a Elohim, e se
deleitaram com salmos de louvor e tocaram harpas. De fato, ficaram tão felizes com o
reviramento de seus costumes e, depois de um longo período, tendo inesperadamente
readquirido o direito à adoração, tornaram lei para a sua posteridade que observassem
um festival celebrando a restauração da adoração no Templo por oito dias. E desde
aquele tempo até este, nós o celebramos, o qual chamamos de Festival das Luzes
porque, eu imagino, além das nossas esperanças esse direito foi trazido à luz, e esse
nome foi posto sobre o festival.” (Antiguidades 12:7:7)
Note que Josefo dá exatamente o mesmo motivo para a celebração que 1
Macabeus: A dedicação do altar (Hanukat haMizbeah). Não há, da parte de Josefo,
qualquer alusão ao milagre do óleo.
Nessa época, porém, Josefo já faz alusão ao apelido de Festival das Luzes,
indicando que em algum momento entre os séculos I AEC e I EC, essa conexão
aconteceu.
VII - O Início da Festa das Luzes
A pergunta que qualquer pessoa faria, neste ponto é: O que mudou em Israel,
entre os séculos I AEC e I EC?
Para responder a essa pergunta, é preciso conhecer um pouco da história da
dominação de Israel por parte de Roma.
Após a Revolta dos Macabeus, o sumo-sacerdote Yehonatan (Jonatas) busca fazer
aliança com Roma:
"Vendo Yehonatan que o tempo trabalhava em seu favor, escolheu alguns homens e os
enviou a Roma para confirmar e renovar a amizade recíproca. 2ambém aos espartanos e
a outros lugares enviou cartas no mesmo sentido. Os enviados, pois, dirigindo-se a
Roma, entraram no Senado e disseram: "O sumo sacerdote Yehonatan e a nação dos
judeus enviaram-nos para que renoveis a amizade e a aliança com eles tal como outrora,"
E os romanos lhes entregaram cartas para as autoridades locais, a fim de que lhes
favorecessem o retorno tranquilo até à terra de Yehudá.” (1 Macabeus 12:1-4)
Em meio a brigas, traições e assassinatos, que ao tema deste estudo, a dinastia
dos Hasmoneus conseguiu se manter no poder, até que suas brigas internas culminaram
na intervenção de Roma, no final do século I AEC.
Em outras palavras, o que mudou durante essa época foi justamente a
aproximação, e posterior intervenção, por parte do poder romano.
Lembre-se que a data utilizada por Antíoco Epifânio para a inauguração do Templo
não era uma data qualquer, mas sim uma data próxima ao solstício de inverno.
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A temática do fogo no solstício de inverno é algo bastante antigo na humanidade,
acostumada a entender que um rito poderia de alguma forma ajudar o sol a recuperar a
sua luz.
Possivelmente, a presença romana ratificou o costume do acendimento de luzes à
época do solstício, algo que acabou sendo adotado como simbólico dentro de Hanuká. As
razões para isso serão explicadas mais adiante.
Antes de chegar na questão dos milagres, uma pergunta é relevante: Por que a
Corte Mosaica instituiu o acendimento das luzes de Hanuká?
Na realidade, a instituição do acendimento, a exemplo de inúmeros
mandamentos da Torá, tem como objetivo justamente combater a prática idólatra.
Ao estabelecer que o acendimento das luzes seria feito para comemorar a vitória
do Eterno, a Corte Mosaica eliminou a necessidade de se buscar um costume idólatra
para manter uma determinada prática.
Vale aqui fazer um parêntesis e ressaltar que não existe no Judaísmo uma fobia
quanto a ritos ou práticas que derivem de outros povos, ou mesmo de origem pagã.
Muitos desses ritos e práticas foram adaptados dentro da própria Torá, e adequados à
realidade monoteísta.
O que importa para o Judaísmo não é a origem das coisas, mas sim a
intenção delas ao serem praticadas nos dias atuais.
De fato, a absorção de novos costumes em Hanuká acontece até hoje. Sobre isso,
o rabino Eliyahu Fink (um rabino ortodoxo), escreve:
“Dreidel, latkes, sufganiyot e presentes vieram de fora como consequência do povo
judeu assimilar práticas não-judaicas em Hanuká. Não há mal nenhum nisso. Tem
acontecido por centenas de anos. Em algum momento ao longo do caminho, decidimos
que nada mais do mundo externo seria kasher. Penso que isso seja um grande erro.
A razão pela qual todos esses rituais estrangeiros foram adotados não foi porque um
rabino-mágico realizou espiritual-oscopia e declarou esses costumes kasher. Aconteceu
porque o povo gostava das coisas que via outros povos fazendo em suas datas especiais
e as acrescentou aos dias judaicos. Não é complicado.” (Make your Chanukah festive
and don’t fight the holiday spirit)
Em suma, qualquer pessoa que queira gritar ‘paganismo!’ devido a costumes
importados será culpada de hipocrisia, pois há milênios adotamos diversas práticas
estrangeiras, inclusive dentro da própria Torá.
O que acontece é que essa adoção deve obedecer alguns critérios. Não pode, por
exemplo, dar sinais de idolatria, nem tampouco introduzir na adoração ao Eterno
elementos que contrariem os seus valores (exemplos: sacrificar pessoas, auto-flagelo,
etc.) nem o monoteísmo.6
6
Para maiores informações, vide a palestra ‘Porque o Eterno ordenou sacrifícios’, onde há
comentários de Rambam (Maimônides) e de outros rabinos sobre o tema.
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De volta à questão em pauta, em Roma uma festividade era muito popular: A
Saturnália.
Introduzida em 217 AEC, a Saturnália era uma festividade celebrada no dia 17 de
dezembro, em honra a Saturno, e que durava 7 dias, culminando no solstício de inverno,
em 23 de dezembro.
É importante recapitular: Antíoco Epifânio havia rededicado o Templo de Jerusalém
a Zeus Olimpo em 25 de Kislew, por volta do solstício de inverno. Mesma época em que
os romanos celebravam a Saturnália.
Como o acendimento das luzes era parte das festividades de inverno em boa parte
das culturas da civilização no hemisfério norte, era inevitável que houvesse luzes sendo
acesas em Israel a essa época. E o costume, outrora combatido, passava a ser
amplamente divulgado sob a proteção da pax romana.
Ainda assim, observe o leitor que não se chegou à questão do milagre do óleo.
Afinal, como visto em Flavio Josefo, apelidar a festividade de ‘Festa das Luzes’ é algo
anterior ao surgimento da história do milagre.
VIII - O Milagre permanece desconhecido (início de II EC)
Avançando ainda para o final do século I, ou início do século II EC, temos outro
registro histórico: o da Meguilat Ta’anit. Observe:
"Por que eles fizeram essa dedicação de oito dias? Porque nos dias dos reis gregos os
Hasmoneus entraram no Templo e construíram um altar e o cobriram com revestimento e
prepararam os vasos do Templo, e levaram oito dias trabalhando nele." (Scholion Meguilat Ta’anit)
Observe que ainda a essa época, não há menção ao milagre do óleo durar oito
dias.
Em outras palavras, pode-se identificar de fato a história do milagre como tendo
origem no século II EC. Isso tem uma relevância enorme.
Se observarmos a cronologia dos eventos geopolíticos, foi justamente no final do
século I até meados do século II EC que os judeus se rebelaram contra o jugo romano.
E todo esse pano-de-fundo histórico é fundamental para que se compreenda a
verdadeira história do milagre de Hanuká, haja vista que era algo relativamente conhecido
dos leitores à época.
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IX - Judite e o Uso de Histórias Codificadas
Uma história também serve como inspiração para entender a questão do milagre
de Hanuká. A saber, a história de Yehudit (Judite).
O livro de Yehudit (Judite) conta a história de uma heroína que vence de maneira
improvável um general de um exército invasor. O texto, no entanto, começa dizendo:
"Era o décimo segundo ano do reinado de Nabucodonosor, que reinou sobre os assírios
em Nínive, a grande cidade” (Judite 1:1)
Ora, todos os judeus sabiam que Nabucodonosor havia sido rei da Babilônia, e não
da Assíria, e que jamais reinara sobre Níneve. Essa afirmação no começo do livro é uma
dica sobre o fato de que Judite era um midrash nacionalista, escrito para inspirar o povo,
e não um livro histórico.
A Enciclopédia Judaica diz, sobre a obra:
“…com as primeiras palavras da narrativa… o narrador dá a seus ouvintes uma piscada
solene. Eles devem entender que isto é ficção, e não história. Não aconteceu neste ou
naquele período definido da história judaica, mas simplesmente ‘era uma vez’” 7
Até hoje, um Midrash de Yehudit (Judite), da Idade Média, é lido costumeiramente
no Shabat durante o período de Hanuká. Nele, os personagens do período da Revolta
dos Macabeus são identificados mais diretamente.
Isso significa que a história de Yehudit (Judite) foi compilada, ou talvez até editada,
como uma alegoria distribuída durante a dominação selêucida, de forma a ocultar sua real
intenção de instigar o povo à revolta.
X - A Agadá da Saturnália
O artifício literário de midrashim, alegorias ou parábolas (agadot, ou hagadot) com
intuito de revelar algo a mais, também aparece em conexão com Hanuká numa
passagem do Talmud, que afirma:
"Disse R. Hanan b. Raba: A Calenda é observada oito dias depois do equinócio. A
Saturnália nos oito dias que antecedem o equinócio. Como um mnemônico, tome o verso:
'Tu me cercaste por detrás e diante.' [Sl. 139:5]
Nossos rabinos ensinaram: Quando Adam, o primeiro, viu o dia gradualmente tornarse mais curto, disse: 'Ai de mim, talvez porque pequei, o mundo à minha volta está se
escurecendo e retornando ao seu estado de caos e confusão. Este, portanto, é o tipo de
morte ao qual fui sentenciado pelos céus! Então começou a observar um jejum de oito
dias.
7
JUDITH, BOOK OF - Crawford Howell Toy, Charles C. Torrey
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Mas, a medida que observava o solstício de inverno, notou que o dia tornava-se
cada vez mais longo, e disse: 'Este é o decurso do mundo,' e passou a observar uma
festa de oito dias. No ano seguinte, apontou a ambos por festividades. Agora, ele os
apontou em razão dos céus, mas os [pagãos] os apontaram em razão da idolatria." (b.
`Abodá Zará 8a)
É evidente que os rabinos sabiam que a Saturnália começara com os
romanos, e não havia sido inventada por Adam (Adão).
Mas, o que quer dizer a passagem acima então?
Ela busca reconhecer que desde os primórdios da humanidade, o ser humano se
assombra com a natureza e busca controlá-la. E que nisso está a raiz da idolatria.
Afinal, a tentativa de transformar as forças da natureza em deuses era justamente
com a finalidade de controlar suas consequências e decorrências.
Sobre quem acredita que tais midrashim e agadot talmúdicos são literais, Rambam
(Maimônides) diz:
"Deve-se ter pena de tais pessoas de mente fraca pois, em sua tolice, acham que
estão honrando e elevando as palavras dos sábios, quando na realidade, elas os
arrastam para o nível mais baixo…
Eles destróem a glória da Torá e escurecem o seu brilho, fazem da Torá do Eterno o
oposto do que era a intenção. Ele afirmou na Torá perfeita acerca das nações que ouvem
acerca de todos esses estatutos, que dirão: ‘Este grande povo é nação sábia e
entendida.’ [Dt. 4:6] Mas quando as nações ouvirem como esse grupo relata as palavras
dos sábios de maneira literal, dirão: ‘Este povo insignificante é nação tola e ignorante.’ A
maioria desses expositores explicam ao público o que eles próprios na realidade não
entendem. Quem dera ficassem quietos ou dissessem: ‘’Não entendemos o que os
rabinos queriam dizer nessa afirmação ou como interpretá-la.’"
(Introdução ao Pereq Heleq)
XI - A Criação da Narrativa do Milagre
A ideia de que a história do milagre seja literal se torna bastante improvável, não
porque o milagre seja impossível (afinal, a vitória contra os selêucidas foi milagre bem
maior). Mas sim porque não há qualquer indício dela antes do século II EC. Pelo
contrário, tudo aponta para que ela não fosse conhecida antes disso.
Caso o milagre tivesse ocorrido de forma literal, certamente teria sido lembrado,
alardeado, e comemorado enormemente. E teria sido mencionado por pelo menos uma
das diversas fontes históricas que falam sobre o evento.
Mas, e se o objetivo dos rabinos com a narrativa do milagre fosse outro?
Alguns afirmam que o objetivo original seria ofuscar a dinastia dos Hasmoneus,
considerada uma grande traidora do Judaísmo, afinal sua gestão desastrosa teria
conduzido os romanos até Israel.
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Essa é a tese da Enciclopédia Judaica, que afirma:
"“Nos círculos farisaicos, as realizações políticas dos Hasmoneus foram empurradas para
segundo plano, e o próprio nome de Judá Macabeu caiu no esquecimento." 8
No entanto, essa tese tem um problema primordial: Tanto nos escritos históricos
dos séculos seguintes quanto na própria liturgia judaica, a Revolta dos Macabeus
permanece no centro dos eventos.
Como se observou no começo deste artigo, nada há que exalte o milagre do óleo,
ou que diminua do papel dos hasmoneus.
E se, portanto, o objetivo fosse criar uma agadá (parábola) para ensinar algo
mais profundo?
XII - Bons motivos para não enfatizar a Revolta dos Macabeus
É importante, neste momento, recapitular algumas das principais condições aqui
vistas:
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Originalmente, a festividade comemorava a vitória contra os selêucidas, e a
rededicação do altar. (Tema que permanece até hoje nas orações litúrgicas)
Durante 4 séculos, não se ouviu falar do milagre do óleo
A literatura judaica está repleta de midrashim e agadot (homilias e parábolas)
Uma delas, lida à época de Hanuká, traz uma mensagem secreta de incentivo à luta
contra os selêucidas
A temática das luzes surge por influência de outras festividades por volta do solstício
de inverno, rededicada ao monoteísmo
À época em que a história do óleo surge, Israel estava dominado pelo Império
Romano
Originalmente escrito em hebraico, 1 Macabeus só sobrevive graças a traduções
gregas
Mesmo o trecho litúrgico fala pouco sobre a vitória contra uma cultura estrangeira
Observando todos esses elementos, é possível que à época da dominação
romana, a história de Hanuká fosse extremamente desconfortável Império.
Afinal, trata-se de uma história que fala sobre um pequeno grupo de insurgentes
que se revoltou contra uma nação dominadora, livrando-a do seu jugo.
As semelhanças entre a dominação selêucida e a dominação romana seriam
numerosas demais para passarem desapercebidas não apenas por Roma em si, como
também por seus aliados, a saber, aqueles que permaneciam no poder por influência
romana.
Pode-se citar, dentre esses por exemplo, o rei Herodes I e sua dinastia, muito
conhecidos devido à sua citação na literatura cristã, que foram importantes tiranos na
época que precedeu a insurgência judaica contra Roma.
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Hanukkah - Kaufmann Kohler
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Hanuká: O Segredo do Milagre do Óleo
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O conteúdo sensível do livro de 1 Macabeus certamente pode explicar a razão de
seu desaparecimento. Pelo menos, dentre as comunidades judaicas que viviam em Israel.
A versão grega teria sobrevivido nas comunidades da diáspora, como em
Alexandria por exemplo, menos sensíveis a essa questão nacionalista.
Diante disso, como manter a memória dessa grande conquista? E ainda
manter as esperanças do povo diante da dominação?
XIII - O Segredo do Milagre do Óleo
A resposta para isso: Recorrer àquilo que o povo judeu fazia tão bem, e que já
havia sido utilizado pela própria ocasião da dominação selêucida: a criação de agadot.
Dentro do exposto, é importante examinar a narrativa do milagre do óleo:
"Pois quando os gregos entraram no Templo, profanaram todos os óleos que
estavam no Templo. Quando a Casa dos Hasmoneus prevaleceu contra eles e os
derrotou, procuraram e encontraram somente um jarro de óleo sobre o qual estava o selo
do Sumo Sacerdote, mas só continha o suficiente para um dia de iluminação. Porém, um
milagre aconteceu e eles acenderam [a Menorá] por oito dias.” (b. Shabat 21b)
Aqui ocorrem alguns temas importantes:
•
•
•
•
A entrada dos gregos no Templo
A profanação dos óleos
Um jarro remanescente, cujo óleo duraria somente um dia
Mesmo assim, por um milagre, durou oito dias.
1) Os gregos no Templo
A entrada dos gregos no Templo remete a uma questão ocorrida à época dos
selêucidas, mas que também estava acontecendo no período da dominação romana: A
interferência estrangeira no Templo.
“Entrando com arrogância no Santuário, apoderou-se do altar de ouro, do
candelabro com todos os seus acessórios.” (1 Macabeus 1:21)
Da mesma forma, ocorrera com os romanos, que em 66 EC, como resposta à
insurgência judaica, pilhou o Templo de Jerusalém.
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2) A Profanação do Óleo
A profanação dos óleos remete à questão da unção. O óleo era símbolo do
sacerdócio, haja vista que a Torá diz:
“Também ungirás a Aharon e seus filhos, e os santificarás para me administrarem o
sacerdócio. E falarás aos filhos de Israel, dizendo: Este me será o óleo da santa unção
nas vossas gerações.” (Shemot/Êxodo 30:30,31)
O óleo profanado é uma alusão à profanação dos sacerdotes. A corrupção no
sacerdócio, em busca de poder, era um tema recorrente desde os tempos de Antíoco
Epifânio até o Império Romano:
“Foi quando vieram ter com ele todos os homens iníquos e ímpios de Israel,
conduzidos por Alcimo, que pretendia o cargo de sumo sacerdote. Esses acusaram o
povo diante do rei, dizendo: Judas com os seus irmãos fez perecer todos os teus amigos,
e a nós expulsou da nossa terra.” (1 Macabeus 7:5,6)
Posteriormente, seriam os sacerdotes corruptos que convidariam o poder romano a
dominar Israel.
3) O Único Jarro Remanescente
O único jarro remanescente simboliza aqueles poucos sacerdotes que não teriam
se corrompido. Fiéis ao Eterno, porém capazes de resistir somente por um breve tempo
(um dia):
"E diziam, elevando a voz para o céu: "Que faremos desta gente e para onde os
levaremos? Teu lugar santo está sendo conculcado e profanado, teus sacerdotes jazem
no luto e na humilhação. Vê que os gentios se coligaram contra nós a fim de nos
aniquilarem: tu sabes o que tramam contra nós! Como poderemos resistir diante deles, se
não vieres tu em nossa ajuda?” (1 Macabeus 3:49-51)
4) Os Oito Dias
O óleo que dura os oito dias representa o milagre do pequenino remanescente de
sacerdotes fiéis (e seus seguidores) que conseguiu sobrepujar os selêucidas, à época.
"Tu entregaste guerreiros poderosos nas mãos dos fracos, os muitos nas mãos dos
poucos, os depravados nas mãos daqueles que apoiam a Tua Torá.”
(Trecho da `Amidá de Hanuká)
E por que dos oito dias? Há duas possibilidades. A primeira é que seja
simplesmente uma alusão ao período da dedicação do Templo ter durado oito dias.
Mas, há uma segunda hipótese, relacionada à simbologia do número 8.
Na cultura semita, o número 7 simboliza um ciclo completo. O exemplo mais
conhecido sendo a própria semana da Criação, realizada em sete dias.
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Analogamente, o número 8 simboliza o começo de um novo período. Isso pode ser
observado em inúmeros exemplos na Torá. A seguir, dois dos mais conhecidos:
"O filho de oito dias, pois, será circuncidado, todo o homem nas vossas gerações; o
nascido na casa, e o comprado por dinheiro a qualquer estrangeiro, que não for da tua
descendência.” (Bereshit/Gênesis 17:12)
Ao concluir o ‘ciclo do nascimento’ (os sete primeiros dias), o menino é
circuncidado no começo de sua nova etapa, agora como cidadão da aliança.
“Quando, pois, o que tem o fluxo, estiver limpo do seu fluxo, contar-se-ão sete dias para a
sua purificação, e lavará as suas roupas, e banhará a sua carne em águas correntes; e
será limpo. E ao oitavo dia tomará duas rolas ou dois pombinhos, e virá perante ADONAY,
à porta da tenda da congregação e os dará ao sacerdote.” (Wayiqrá/Levítico 15:13,14)
O período de purificação duraria sete dias. Ao oitavo, a pessoa estaria purificada
após o rito.
Assim como esses, há inúmeros outros exemplos.
Em sendo assim, os oito dias simbolizam a esperança de que o remanescente fiel
de Israel veria novos tempos. Sobreviveria e venceria as trevas de maneira milagrosa, até
a chegada de uma nova etapa.
Foi exatamente o que aconteceu durante o período dos selêucidas, e era
exatamente o que os sábios esperavam que o povo se recordasse, para que pudesse
manter as esperanças durante o período da dominação romana.
XIV - Conclusão
Uma história de um milagre, uma agadá, estaria livre de censura, seu sentido mais
profundo conhecido pelos mestres do povo, e transmitido juntamente com a tradição da
festividade.
Vale aqui fazer duas observações importantes. A primeira é que, no Judaísmo, uma
agadá não tem menos importância por ser uma narrativa figurativa. Muito pelo contrário!
Se os sábios se deram ao trabalho de transmitir um ensinamento dessa forma, ele se
torna essencial.
Reflita o leitor, nem que por um breve momento, sobre o risco corrido por aqueles
que ensinavam esta agadá, como forma de manter viva a chama da esperança
monoteísta.
A narrativa, ainda que agádica, é um testemunho da bravura e da perseverança do
povo judeu, diante de adversidades recorrentes, e constantes.
Mesmo diante de dominação, disputa de poder, corrupção no sacerdócio, um bravo
remanescente persistia, e prevalecia, e confiava no Criador dos céus e da terra.
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A segunda observação importante é que conhecer o aspecto agádico do milagre do
óleo em nada muda a prática de Hanuká em si, segundo a halakhá tradicional. Até
porque, como visto, a liturgia do dia foca integralmente nos milagres relativos à libertação
de Israel.
Como se pode perceber, a história do óleo visava impedir que o povo perdesse a
memória dos milagres realizados pelo Eterno no passado, para que pudesse ter em vista
um tempo em que esse milagre ocorreria novamente.
Esse é o segredo do milagre do óleo. Um segredo cuja mensagem permanece
atual, e que nos lembra que os maiores milagres são realizados através de um pequenino
e improvável remanescente.
O milagre da Revolta dos Macabeus, bem como da sobrevivência do povo judeu
não apenas aos selêucidas, quanto ao Império Romano, e a tantos outros que ainda
viriam, é na realidade o cerne da festividade, e muito maior e mais grandioso do que a
multiplicação do óleo.
O segredo de Hanuká: A narrativa agádica do milagre menor faz alusão ao milagre
maior: a perseverança do remanescente de Israel, e convida o justo a manter essa chama
acesa.
Que isto possa estar nos corações de todo aquele que acende as luzes desta
festividade.
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