Relatório - PDBFF - Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos

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Relatório - PDBFF - Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos
É dos pequenos que elas gostam mais? As maiores fêmeas de
Micrathena sp. (Araneae:Araneidae) estão associadas aos machos
menores
Alêny Lopes Francisco
com a fêmea fertiliza a maior parte de
Introdução
O
reprodutivo
seus ovos (Eberhard et al. 1993). Em
diferencial entre indivíduos do mesmo
grupos no qual o tamanho dos machos é
sexo é um dos fatores que determina a
variável,
seleção sexual, devido às diferentes
provavelmente terão maior sucesso de
formas de acesso aos parceiros sexuais
cópula (Shuster & Wade 2003 apud
(Andersson 1994). A seleção sexual
Chelini 2009).
pode
sucesso
ocorrer
através
de
os
machos
maiores
dois
A qualidade desses machos
mecanismos. Na seleção inter-sexual, os
como parceiros sexuais geralmente está
indivíduos de um sexo selecionam
associada
parceiros com um caráter específico. Na
condição
seleção intra-sexual, a seleção do
comportamento de corte e velocidade de
caráter é baseada em diferenças na
maturação sexual (Andersson 1994,
habilidade de indivíduos de um mesmo
Clark & Morjan 2001, Vanacker et al.
sexo em competir diretamente por
2004). Machos mais fortes e com
indivíduos do sexo oposto (Shuster &
estruturas como pedipalpos e quelíceras
Wade 2003 apud Chelini 2009).
mais
a
fatores
física,
como
tamanho
desenvolvidos
terão
idade,
corporal,
melhor
Na maioria dos animais, os
condições de lutar e vencer uma disputa
machos são responsáveis pela seleção
pela fêmea (Clark & Morjan 2001,
intra-sexual
pelo
Vanacker et al. 2004). Já as fêmeas são
comportamento de seleção inter-sexual
ornamentadas para atrair os machos.
(Berglund
Esse
Esse é o caso de Micrathena sp., em que
comportamento de seleção de machos e
as fêmeas possuem abdômen grande,
fêmeas ocorre em várias espécies de
com coloração preta e laranja e os
aranhas. Os machos lutam pela guarda
machos são consideravelmente menores
das
que as fêmeas e de cor marrom, sem
e
et
as
al.
parceiras
fêmeas
1996).
reprodutivas,
principalmente nas espécies em que o
esperma do primeiro macho a copular
nenhuma ornamentação.
Por causa dessas características
diferentes entre machos e fêmeas de
precipitação anual média é de 2.100 mm
(RADAM BRASIL 1978).
Micrathena sp. eu investiguei como
Realizei a procura das teias na
esses casais são selecionados. Em
vegetação do baixio, seguindo o curso
situações de disputa pela fêmea, é
de um igarapé à procura de fêmeas com
esperado que o macho maior vença e
o macho em sua teia. As fêmeas de
escolha a fêmea maior (Andersson
Micrathena
1994). Por outro lado, se as fêmeas
orbiculares com três pontos de fixação,
selecionam os machos, é esperado que
sendo dois laterais e um inferior. Todos
elas
indivíduos
os machos encontrados estavam na
maiores por ser um indicativo de melhor
região periférica da teia. Quando não
qualidade (Andersson 1994). Portanto,
estavam em um dos pontos de fixação
independentemente
de
laterais, encontrei os machos em um fio
seleção, minha hipótese é que o
acima da teia da fêmea. Coletei o macho
tamanho corporal é o fator de seleção
e a fêmea em recipientes de plástico
entre os machos e as fêmeas em
com álcool. Posteriormente, tirei foto de
Micrathena sp. Uma vez que o sucesso
cada indivíduo na lupa e, com o
reprodutivo
programa Image Tool 3.0, mensurei o
copulem
com
do
selecione
os
processo
os
melhores
sp.
constroem
teias
parceiros, espero que quanto maior for o
comprimento
comprimento do cefalotórax da fêmea,
indivíduos coletados e adotei essa
maior
do
medida como tamanho corporal. Para
cefalotórax do macho de Micrathena sp.
avaliar a associação entre fêmeas
será
o
comprimento
do
cefalotórax
dos
maiores com machos maiores, analisei
os dados usando uma correlação de
Métodos
Realizei o estudo na Reserva
Florestal do Km 41 (2°24’ S-59°44’ O)
pertencente
ao
Projeto
Spearman
entre
o
tamanho
do
cefalotórax das fêmeas e dos machos.
Dinâmica
Biológica de Fragmentos Florestais
Resultados
(PDBFF-INPA), localizada a 80 Km ao
Coletei um total de 28 casais
norte de Manaus, AM, Brasil. A
de Micrathena sp., cujo comprimento
vegetação da região é caracterizada
do cefalotórax das fêmeas foi de
como Floresta Ombrófila Densa, cujo
2,20±0,18 mm (média±desvio padrão) e
dossel varia de 30 a 37 m de altura e a
dos
machos
1,46±0,13
mm.
O
comprimento do cefalotórax dos casais
1 de Micrathena sp. tiveram uma forte
tamanho corporal estão associadas aos
correlação
machos de menor tamanho corporal
negativa
(RS=-0,48;
p=0,009) no qual as fêmeas com maior
(Figura 1).
Comprimento do cefalotórax dos machos (mm)
1,9
1,8
1,7
1,6
1,5
1,4
1,3
1,2
1,1
1,8
2,0
2,2
2,4
2,6
2,8
Comprimento do cefalotórax das fêmeas (mm)
Figura 1: Relação entre o comprimento do cefalotórax de machos e fêmeas de Micrathena sp.em uma
floresta de terra firme na Amazônia Central. A linha representa a reta estimada da correlação.
as
Discussão
A
associação
esperada
de
estratégias
provavelmente
estão
reprodutivas
ocorrendo
machos maiores de Micrathena sp. com
diferente do padrão esperado, em que
as fêmeas maiores não foi confirmada.
machos maiores têm maior sucesso
Os machos menores foram encontrados
reprodutivo.
na teia das fêmeas maiores, indicando
Uma estratégia que explique tal
que machos grandes nem sempre são
relação pode ser o comportamento
favorecidos na reprodução (Gribbin &
furtivo de aproximação do macho para
Thompson 1991). Para Micrathena sp.
não
ser
percebido
pela
fêmea,
2 diminuindo o risco de ser predado por
eventualmente
ela
de
podem ter vantagens na reprodução
acasalamento (Gonzaga 2007). Machos
quando conseguem evitar o confronto
menores podem provocar uma menor
com machos maiores.
e
aumentando
a
chance
indivíduos
menores
vibração na teia ao se aproximar da
fêmea. Com essa estratégia eles podem
Agradecimentos
conseguir fêmeas maiores e garantir
maior vigor de sua prole.
Agradeço
primeiramente
a
Deus por permitir essa experiência
Outra estratégia reprodutiva que
maravilhosa para minha vida pessoal e
os machos de Micrathena sp. podem
profissional. Aos amigos da UFMS e
utilizar é a protandria, onde alguns
orientador Erich que me incentivaram a
machos nascem mais cedo (Braby &
inscrever
New 1988). Esses machos atingem a
organizadores do EFA 2010, ao Zé que
maturidade primeiro comparado aos
não pôde estar conosco, mas sua
machos que nascem depois (Alcock et
dedicação ao organizar o curso foi
al. 1978, Braby & New 1988). A
muito importante para nós. Ao Paulinho
estratégia da protandria será vantajosa
Estefano que nos enriqueceu com seus
quando não houver machos de outra
conhecimentos e correções, obrigada
geração competindo com os recém
pela dedicação. Às monitoras super
maduros ou quando a fêmea não é um
carinhosas e atenciosas, Claudinha e
recurso limitado. Os machos menores
Dani, que pacientemente nos auxiliou
de Micrathena sp. que encontrei nas
em árduas coletas e construções de
teias, podem ter nascido mais cedo e
relatórios
tiveram a chance de procurar por
infindáveis.
fêmeas maiores sem a necessidade de
amigona Camila, mais conhecida como
disputá-las com os machos maiores.
Oferenda, que esteve ao meu lado desde
Estratégias
com
À
o
EFA.
discussões
minha
Aos
quase
mais
nova
de
o aeroporto, sempre foi minha vizinha
menos
de rede e me cativou com seu jeitinho
favorecidos por seleção sexual são
carinhoso e meigo, além do auxílio com
importantes para o entendimento dos
seus
mecanismos que interferem na seleção
assuntos
de parceiros. O fato de machos menores
pernambucano, que agora são minhas
de Micrathena sp. estarem associados a
best friends, Gabi, Kátia e Laura, as
fêmeas
pessoas mais “arrétadas”, carinhosas e
indivíduos
que
reprodutivas
para
podem
maiores
ser
indicou
que
conhecimentos
científicos.
em
diversos
Ao
trio
1 dengosas. Sem elas o EFA não teria
típico gaúcho. Báh! Você é muito
graça, amo muito vocês, vici!? Ah!
inteligente tchê! Aos professores que
Laura e Kátia muito obrigada por me
passaram bons momentos conosco,
desatolar
transmitindo
do
igarapé!
Ao
Thiago
conhecimentos
e
Branco, grande amigo, que me aturou
detectando nossas intrusões demoníacas
em quase todas as fases de projetos
nas
orientados (e nos livres nós escolhíamos
especial aqueles que nos ensinaram a
ficar no mesmo grupo!). Ao Thiago
enxergar o lado “fofuxo” da Amazônia
Preto com seu jeito carinhoso e formal
e a conhecer a noite do igapó de cima
que nos cativou rapidamente. Jamais
do barco. Agradeço imensamente aos
vou esquecer sua risada de menino
corretores Paulinho Estefano e Manoela
levado. À Moniquinha, mais conhecida
que corrigiram este trabalho e me
como Selvagem, que me ajudou muito
ensinaram muito. Agradeço também a
nas correções. Sentirei falta dos nossos
toda a equipe de apoio, Dona Eduarda,
momentos de confidências e banhos no
João, Júnior e os motoristas, pois sem
igarapé! À galera do IgaraFest que
vocês o nosso EFA não seria o mesmo.
sempre animou muito bem as últimas 15
Agradeço ainda, a todos que estão
noites do curso. Fernanda (confidente
distante, rezando e torcendo por mim:
de festas), Gláucia (jeitinho meigo e
Família, Diego e todos os amigos e
cativante), Bruno Cid “Mr. Amblypigi”
parentes.
(sempre de bom humor), Bruno “Cueca
esquecendo de alguém? Não! O mais
Suja” (com teorias inteligentíssimas),
especial fica para o final! Paulinho
Demétrius (cantor revelação de rock),
(Enrique), muitíssimo obrigada por essa
João (mineirinho simpático), Rodrigo
oportunidade maravilhosa. Agora posso
(fora do normal) e Amazon Charming
dizer que mais um objetivo profissional
(não
né,
foi alcançado. Obrigada por me ensinar
Ricardo?), vocês são maravilhosos.
a enfrentar meus monstros, expor
Ótimas companhias para momentos
minhas idéias e buscar o que quero.
sérios e, principalmente, momentos
Você conseguiu em muito pouco tempo
relax. Agradeço à Sara “Flor”, pelo
conquistar o coração dessa goiana sul-
carinho e confiança. Á Thalita que me
matogrossense. Isso não é muito fácil!
ensinou que “ou é ou não é”, não tem
Mais difícil ainda é sair daqui de
“pode ser”. Ao Deco, baiano nato e
dentro... acho que... jamais! Obrigada
polêmico nas discussões. Ao Pedro,
por tudo! Confesso que será difícil sair
precisa
nem falar
nada
correções
dos
Hum...
relatórios,
será
que
em
estou
2 do “País da Amazonha” para voltar a
Floresta
viver no mundo real, mas valeu a pena!
Camargo, F. Pinto, G. Machado
Amazônica”
(J.L.
& P.E.C. Peixoto, eds.). Manaus:
INPA.
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4 

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