Economia Pública Prof. Carlos Barros 1 Aula 6 III – Externalidades e

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Economia Pública Prof. Carlos Barros 1 Aula 6 III – Externalidades e
Economia Pública
Aula 6
III – Externalidades e sua correcção
1 – Conceito e taxomania
2 – Externalidade e eficiência
Bibliografia : Cullis & Jones (1998) : 2.4 ; 2.5 e 2.6
Pontos a abordar :
1 – Conceitos, tipologias e exemplos ;
2 – Um modelo simples de externalidades na produção;
3 – Causas das externalidades
4 – Solução de Pigou : ilustração gráfica;
5 – Solução de Pigou : modelo algébrico.
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Externalidades :
Definição de externalidade - Estamos perante uma externalidade quando a
actuação de um determinado agente económico influencia o bem-estar ou o lucro de
outro agente económico sem que essa interdependência seja obtida através do sistema
de preços.
O modelo concorrencial diz-nos que as relações entre agentes económicos são
feitas através do sistema de preços, mas na presença de externalidades este mecanismo
não funciona e o óptimo (equilíbrio) não é atingido.
As externalidades podem ser positivas (benefícios externos) ou negativas (custos
externos) e ocorrer ao nível da produção ou do consumo.
Exemplos de externalidades no consumo:
Externalidade positiva no consumo – Considerem-se dois vizinhos e que um deles
decide construir um jardim. Se ambos apreciarem o jardim então aquele que o construiu
usufrui do jardim como uma externalidade positiva.
Externalidade negativa no consumo – Num recinto fechado certas pessoas fumam
e outras não. Os que não fumam são obrigados a respirar fumo, tendo uma externalidade
negativa.
Exemplos de externalidades na produção:
Externalidades positivas na produção – Numa rua com uma livraria instalou-se
uma loja de discos. Cada uma delas ao atraír a sua clientela tende a aumentar a clientela
da outra devido à sua proximidade gerando uma externalidade recíproca.
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Externalidade negativa na produção – Empresa que para produzir emite poluição
para a atmosfera, afectando a qualidade do ar.
Um modelo simples de externalidade na produção :
Considere-se um produtor de aço, que no processo de produção gera poluição
(poluição do ar e ruído). O produtor vende unidades de aço e recebe rendimento em
contrapartida.
No gráfico abaixo a linha R representa o rendimento líquido incremental (lucro
marginal) que o produtor ganha pela venda de unidades adicionais de aço. Um produtor
que maximiza o lucro produzirá até ao ponto em que não existam lucros adicionais, isto
é, output q1, com R=0.
Como os vizinhos sofrem da poluição tentarão oferecer ao produtor uma
compensação para o induzir a reduzir a produção. A compensação é o pagamento
máximo que os vizinhos podem pagar sem reduzirem o seu bem-estar. Trata-se de uma
medida da variação compensadora.
Na situação inicial a produção é q1. Admita-se que se estabelece negociação entre
os dois agentes. Os vizinhos oferecem uma compensação q * 12q1 para o produtor
reduzir a produção para q*. Nesta situação o produtor ganha o triângulo 12q1 . Se os
vizinhos oferecem apenas q * 1q1 o produtor ganhava 12q1 .
Conclui-se que existe espaço para a negociação entre as partes interessadas em
induzir à internalização da externalidade. Mas devem ser os poluídos a compensar o
poluidor ? Esta é uma questão normativa.
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A existência das externalidades significa que o mercado não maximiza o bemestar. A negociação entre as partes internaliza as externalidades e satisfaz o critério de
Pareto. Mas existirão negociações no contexto de externalidade ?
Causas das Externalidades
A externalidade apenas designa um tipo de falência de mercado, mas qual é a sua causa?
Porque razão aparecem as externalidades?
As externalidades aparecem devido à inexistência de direitos de propriedade sobre
recursos. Os direitos de propriedade definem quem possui o direito de utilizar o recurso.
Se ninguém tiver essa propriedade, o recurso está disponível para quem quiser utilizar.
A pessoa utiliza o recurso, relativamente ao qual não existem direitos de propriedade,
não paga pela sua utilização. Como não paga nada, a pessoa não considera a utilização
do recurso um custo. Mas se o recurso tem uma utilização alternativa, terá um custo de
oportunidade. Conclui-se assim que apesar dos recursos serem escassos e possuírem
usos alternativos, i.e. têm custo de oportunidade, os indivíduos apenas os considerarão
recursos se tiverem de pagar pela sua utilização. Nas externalidades não têm de pagar
pela sua utilização, por isso não considerarão o recurso como tendo um uso alternativo,
pelo que o respectivo custo marginal social excederá o custo marginal privado.
Como se Eliminam as externalidades
Existem duas formas de eliminar as externalidades: Soluções públicas (Pigou) e
soluções privadas (Coase).
Solução Pública: - Padrões de emissão
-
Fixando impostos ou multas pela emissão de poluentes
-
Emitindo permissões de emissão
Soluções Privadas: - negociação entre as partes
-
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Recorrendo aos tribunais
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Soluções Públicas
Nas soluções públicas o Governo intervem enquanto regulador. Considere-se o gráfico
abaixo:
$
Curva do custo
marginal social
M
N
0
Poluição
Q*
Y
Curva do lucro
marginal da
empresa
A curva do lucro marginal da empresa descreve o custo de oportunidade de diminuir a poluição, enquanto
a curva de custo social marginal descreve o benefício social marginal de diminuir a poluição.
O nível de poluição óptimo é 0Q* onde o benefício marginal é igual ao custo social marginal. A
diminuição da poluição é YQ*.
1ª Considere-se neste contexto a fixação de padrões de emissão.
Por hipótese os padrões de emissão devem gerar poluição zero. Esta situação corresponde ao ponto de
zero output. Esta solução não é desejável porque a sociedade estará a perder o output, que valoriza, como
se pode ver pela curva de benefício marginal. O benefício marginal 0Xé maior do que o custo no ponto
zero e até ao ponto Q*. Conclui-se que o padrão de emissão que assegura BMS=CMS deverá ser o
adoptado, o que corresponde ao ponto Q*.
2º Imposto ou multa
O imposto ou multa socialmente eficiente será aquele que leve a empresa poluidora a escolher o nível de
output que resulta no nível de poluição óptimo 0Q*. Consegue-se atingir este objectivo fixando uma taxa
que mimetize a curva de custo social marginal, por forma que a curva de custo marginal da empresa passe
a reflectir o custo social. Este ponto corresponde ao ponto 0M por unidade de poluição. Com este valor de
imposto ou multa, a curva de custo marginal da empresa seria MN, a qual intercepta XY no nível de
poluição OQ*. Nestas condições a empresa escolheria o nível de poluição do óptimo social.
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Naturalmente que para fixar o nível de poluição socialmente eficiente através de padrões de emissão ou
através de um imposto, a empresa teria de identificar um nível de output correspondente à intercepção da
curva de benefício marginal com a curva de custo social marginal para toda a actividade geradora de
poluição na economia. Isto é impossível, pelo que utiliza-se níveis de poluição que atendem a critérios de
saúde humana.
3º Emissão de permissões de emissão
Muitas empresas produzem poluição que gostariam de despejar no rio. Mas o rio tem uma capacidade de
absorção limitada. Definida essa capacidade de absorção, é possível emitir permissões de poluição. Como
definir essas permissões? Nos EUA, local onde este tipo de regulação tem sido utilizado, as permissões
são
leiloadas
e
vendidas
às
empresas
que
pagam
pela
emissão
(
vide,
htttp://www.epa.gov/airmarkets/trading/index.html).
Soluções privadas
Nas soluções privadas propõem-se a negociação entre as partes, Coase (1961). Acontece quese os
poluidores forem em grande número pode tornar-se difícil conseguir que eles cheguem a acordo no
pagamento da compensação ao poluidor. Esta questão é conhecida na literatura como o problema dos
comuns. Nenhum consumidor sofre o suficiente para querer pagar o custo total. Como existem muitos
indivíduos, o free-rider aparece, e o seu oportunismo é considerado um custo de transacção que interfere
na possibilidade de atingir uma solução negociada. Negociações permitem resolver problemas de
externalidades quando existem poucos agentes em ambos os lados da negociação.
Uma outra questão relacionada com a negociação reside no facto de ser injusto aos poluídos pagarem ao
poluidor paraele produzir no nível óptimo social. Se o poluidor é que provoca a externalidade, qual é a
justificação dos poluidos pagarem a compensação? Este resultado é um efeito arbitrário de ninguém ter
direitos de propriedade. Se os direitos de propriedade pertencem aos poluidos é natural que seja a empresa
poluidora quem tenha de pagar a indeminização por produzir poluição.
Tribunais
Quando a questão não se resolve por negociação, recorre-se aos tribunais. O tribunal concede o direito de
propriedade a um dos litigantes e obriga a outra parte a negociar com o detentor de direitos. Naturalmente
que a negociação enfrentará o problema do free-rider como no caso anterior.
Tem particular interesse referir que para se atingir a eficiência, não interessa, sob certas condições, a
quem o tribunal atribui os direitos de propriedade. Para efeitos de equidade tem interesse, saber a quem o
tribunal atribui os direitos.
Resoluções por tribunal não são usuais na Europa.
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A Solução de Pigou para as Externalidades
O primeiro economista a analisar o problema das externalidades foi Pigou (1912).
O óptimo social requer a igualdade entre o benefício marginal social (BmgS) e o custo
marginal social (CmgS). O BmgS é dado pela agregação do BmgS privado com o BmgS
externo. O CmgS é dado pela agregação do CmgS privado e o CmgS externo.
BmgS = Bmg privado + Bgm externo
Para Pigou a existência de uma externalidade provocava uma divergência entre os
custos ou benefícios sociais e os custos ou benefícios privados.
Exemplo : Uma fábrica produz bens e serviços e também gera poluição. Vende
produtos para um mercado e funciona num mercado competitivo. Determina a
quantidade óptima de output dada a estrutura de custos e o preço de mercado.
A fábrica tem custos provenientes de matérias-primas e da remuneração dos
factores. Tem ainda outros custos (externalidades) que não são contabilizadas pelos
empresários e que, por conseguinte, não influenciam a decisão da determinação da
quantidade óptima.
Admite-se que existem duas empresas, próximas uma da outra, utilizando o factor
trabalho como o único factor de produção. A proximidade geográfica provoca
interacções entre as duas empresas que assumem a forma de uma externalidade negativa
causada pela empresa 2 à empresa 1.
Q2 = q2 (L2)
com ∂q2/∂L2 > 0
Q1 = q1 [(L1,q2 (L2)]
com ∂q1/∂L1 > 0
q2 reflecte a interdependência existente entre a produção da empresa 2 e a da
empresa 1.
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∂q1/∂q2 < 0 – Pelo facto de a externalidade ser negativa ( quanto mais a empresa 2
produzir menor será a produção da empresa).
O óptimo competitivo (óptimo de mercado)
Max π 1 = P1.q1 [L1,q2(L2)] – WL1
com WL1 = taxa de salário
L1
Max π 2 = P2.q2 (L2) - WL2
L2
Condição de maximização do lucro
∂ π /∂L1 = P1. ∂q1/∂L1 – W = 0
P1.PmgL1 = W
⇔
∂ π /∂L2 = P2 . ∂q2/∂L2 – W = 0
P2.PmgL2 = W
com : P.PmgL = acréscimo de receita por empregar mais um trabalhador
W = acréscimo de despesas de empregar um trabalhador
A taxa de salário deve igualar o valor marginal que o empresário detém quando
emprega uma unidade adicional do factor.
P1 = W/PmgL1
O preço que maximiza o lucro deve ser igual ao rácio do
salário pela produtividade marginal.
P2 = W/PmgL2
A Pmg é uma medida física de quanto aumenta a produção quando adiciono uma
unidade de L.
Maximização do lucro com fusão das duas empresas :
Admite-se que as duas empresas são adquiridas pelo mesmo indivíduo, o qual
quer maximizar o lucro total (lucro conjunto) independentemente da origem desse lucro.
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Max π = P1.[q1 (L1,q2 (L2)] + P2.q2 (L2) – W (L1 + L2)
L
A maximização do lucro vem :
∂ π /∂L1 = P1.PmgL1 – W = 0
∂ π /∂L2 = P1. (∂q1/∂q2).PmgL2 + P2.PmgL2 - W = 0
W = P1.PmgL1
W = P2.PmgL2 + P1.(∂q1/∂q2).PmgL2
(dado marginal que a empresa 2 provoca à empresa 1, resultante do impacto
negativo que 2 tem sobre 1)
Com a fusão a externalidade é internalizada
P1 = W/PmgL1
Com : P1P = P privado
P1S = P social
P2 = W/PmgL2 – P1.∂q1/∂q2
Em equilíbrio temos P1P = P1 S e P2 P < P2 S
P2 S/P1 S > P2 P/P1 P
Ao internalizar através da fusão, a produção dois dois bens, o preço do bem 2 vai
aumentar por ter internalizado a externalidade. passando a reflectir o verdadeiro custo
de oportunidade do bem 2, que passa de A para B.
Em termos gráficos temos :
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Ao passar do equilíbrio no mercado (privado) para o equilíbrio social, a empresa
tem de reduzir a quantidade produzida.
Face a esta situação Pigou afirma :
•
A externalidade não controlada gera para a empresa que produz externalidade
negativa um preço mais baixo do que no óptimo social.
•
Pode-se eliminar a externalidade através da intervenção do Estado , recorrendo a
impostos e subsídios.
com Cmg2E = custo marginal da
externalidade.
No ponto A temos : Cmg 2P = P2P
No ponto B temos : Cmg2S =Cmg2P + Cmg2E =P2S ,
Se o Estado quiser obrigar a empresa poluente a produzir no óptimo social, deve
aplicar um imposto por unidade produzida que deve ser igual no óptimo ao CmgE :
T = CmgE (q2S) = Cmgq2E - Cmgq2P
O Estado impõe T por forma a que o preço de cada unidade produzida q
corresponde ao óptimo de Pareto.
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O excedente do consumidor no bem-estar social , (WS), é :
WS = ABE
WP = ACE – BCG
∆W = WS - WP
Com a aplicação do imposto gera-se uma carga excedentária (deadweight loss),
mas no caso do imposto Pigouviano o imposto não possui carga excedentária, porque a
taxa correctora corrige a externalidade e conduz a economia para o óptimo de Pareto.
Caso de uma externalidade positiva :
CmgP > CmgS
qS >qP
Conclusão – Embora a taxa ou subsídio Pigouviano gere um óptimo ou equilíbrio,
para definir essa taxa ou subsídio tenho de saber qual o óptimo social. Se isso for
possível não posso calcular as taxas Pigouvianas.
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