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BIPOLAR
REVISTA DA ASSOCIAÇÃO DE APOIO AOS DOENTES DEPRESSIVOS E BIPOLARES
Nº 46
A.D.E.B.
• Circuitos da
Criatividade
• Cidadania
Ativa na
Saúde Mental
www.adeb.pt
Dia 30 de Novembro 2013, no Anfiteatro da Escola Superior de Saúde da Cruz Vermelha - Lisboa,
Av. de Ceuta, Edifício Urbiceuta, 1350-125 Lisboa
Assembleia Geral Ordinária:
1 10.00 horas • Análise e Aprovação do Programa de Acção
e Orçamento para o ano 2014
2 11.30 horas • Colóquio subordinado ao tema:
11:30 horas -Circuitos da Criatividade
Cidadania Ativa na Saúde Mental
(Ver Convocatória no encarte junto com a revista Bipolar)
2
REVISTA BIPOLAR
Editorial
SÍNTESE DO ESTATUTO EDITORIAL
• Editoriais temáticos;
• Publicação de documentos técnicos e científicos
sobre as doenças mentais em geral, e em
especial sobre a doença Unipolar e Bipolar;
A cidadania ativa é assaz uma
atitude de combate ao estigma…!
A Direção da ADEB no início do ano 2013, por razões de
contenção financeira e falta de apoios públicos e privados,
decidiu editar alguns números da revista Bipolar, números 44
e 45, em suporte informático, implicando que um número
assinalável de associados, mais antigos, ou seja filiados desde o
ano 1991 até 2005, não tenha tido a disponibilidade de acesso
a fontes de informação na Internet, assim ficando privados do
acompanhamento da vida associativa, atividades programadas
e da publicação de artigos técnicos e pedagógicos sobre a
saúde mental.
Embora prevaleça o mesmo grau de falta de sustentabilidade
financeira, foi considerado importante editar este número,
excecionalmente, tendo em vista proporcionar aos associados
um elo de comunicação institucional e solicitar um apoio e
colaboração dos associados que já tenham correio eletrónico
e que não recebem a revista em suporte informático. Desta
forma devem proporcionar e rentabilizar esta fonte de
comunicação para uma informação mais célere, atempada e
sem custos para [email protected] , indicando o nº de associado,
nome, e-mail , fim de ser registado e constar na Base de Dados
da ADEB.
Esta revista contém e dá relevância a duas temáticas: Circuitos
da Criatividade e Cidadania Ativa na Saúde Mental, que são
a expressão e o resultado de alguns trabalhos desenvolvidos
por associados da ADEB, bem como de outras instituições, no
campo das artes e letras durante o ano 2013, os quais foram
selecionados por uma equipa de peritos conceituados, e estão
publicados na página da internet da Direção Geral de Saúde,
(DGS), tendo sido alvo também de exposição pública na
comemoração do Dia Mundial de Saúde Mental de 2013, no
Museu Nacional de Soares dos Reis, no Porto, e no Museu do
Oriente em Lisboa.
Nesta sequência, a coleção dos trabalhos criativos produzidos
por alguns associados estão em exposição, até ao dia 31-112013, na Sede Nacional-Fórum da ADEB.
Assim, convidam-se todas as pessoas a fazerem uma visita para
apreciarem o acervo no campo da Saúde Mental e Arte.
Cumpre salientar que a Cidadania Ativa também inclui: “os
direitos culturais são parte integrante dos direitos humanos,
os quais são universais, indivisíveis e interdependentes”.
• Informação pedagógica de modo a contribuir para
a Reabilitação, Educação e Prevenção daqueles
que sofrem da doença Unipolar e Bipolar;
• Entrevistas, artigos de opinião e documentários;
• Divulgação e testemunhos de pacientes e familiares;
• Relatório das atividades sociais desenvolvidas pela ADEB;
• Consultório jurídico abrangendo todos os ramos do Direito;
• Espaço para divulgação das potencialidades dos
associados no campo cultural, recreativo e social;
ESCREVA E DIVULGUE A REVISTA BIPOLAR
Índice
Circuitos da Criatividade
3
Cidadania Ativa na Saúde Mental
6
Estigma Social
7
Despertar para a Arte e para a
Criatividade
Mais crise, mais desemprego,
mais depressão
International Forum on Innovation
in Mental Health
8
8
9
Emoção e Inspiração na Escrita Criativa 10
Testemunho da minha participação
enquanto bailarino intérprete no
projeto “Fragile” - testemunho
11
Aproveito desejar Votos de um Feliz Natal em paz e com
saúde, bem como um Melhor e Ativo Ano 2014, onde a
fraternidade e solidariedade impere em prol das pessoas mais
desprotegidas e descriminadas por “este mundo cão, onde uns
poucos comem tudo e, muitos passam fome e privação”.
Como descobri que era Bipolar - testemunho 12
Presidente da Direção da ADEB
Sócio nº 8. Um dos fundadores da ADEB
Diretor da revista “Bipolar”
Delfim Augusto d`Oliveira
Balanço das Comemorações do Dia
Mundial da Saúde Mental
14
Luís Carlos - testemunho
Nota Biográfica
13
15
tema de capa­
REVISTA BIPOLAR
3
Circuitos da Criatividade
Resumo
O presente artigo é uma abordagem à criatividade. Embora se trate de um tema multifacetado e complexo,
procurou-se, nesta apresentação, relacionar a criatividade
e os processos cognitivos, nomeadamente a flexibilidade
de pensamento (fluidez conceptual e a construção de
analogias). Pretende-se compreender os caminhos do
pensamento criativo e refletir sobre a relação entre arte
e saúde mental, mais precisamente o papel da criatividade
na doença mental.
“Analogando”
Palavras-chave: criatividade, flexibilidade de pensamento, analogia, doença mental, arte em contexto terapêutico.
Abstract
This article is an approach to creativity. Although it is a
multifaceted and complex subject, in this paper I relate
creativity and cognitive processes, concerning the flexibility of thought (conceptual fluidity and building analogies).
The aim is to understand the paths of creative thinking, and
reflect on the relationship between art and mental health,
more precisely the role of creativity in mental illness.
Keywords: creativity, flexibility of thought, analogy, mental illness, art in therapy context.
Introdução
Este artigo surgiu na sequência de um convite para escrever algumas palavras acerca da relação entre criatividade e doença bipolar (maníaco-depressiva). Optei por
iniciar este documento com a apresentação de um simples
exercício que utilizei como ponto de partida (Fig.1), inspirado na teoria das analogias e estabelecendo a ponte
com a criatividade. Para, desta forma, abordar o tema da
fluidez de pensamento, associada à criatividade, mas também à doença bipolar. Numa das primeiras leituras encontrei o seguinte: Creativity is extra/ordinary, original and
fitting, full-filling, in(ter)ventive, co-operative, un/conscious,
fe<>male, re…creation1 (Pope, 2005); e se alguém dizia
que é preciso ser-se criativo para abordar a criatividade,
nada melhor do que inaugurar o artigo com esta original
definição. Por outro lado, intitular este artigo de circuitos
da criatividade é com o objetivo de realizar um trajeto
pelos caminhos da criatividade e da flexibilidade de pensamento. Por último, procura-se refletir sobre a relação
entre arte e doença mental, valorizando alguns aspetos e
desmistificando outros.
Fig.1 esquema baseado na teoria de Hofstadter2
O esquema apresentado na Fig. 1 pretende, de forma simples, exemplificar como funciona o pensamento através de
analogias, procurando retratar as inúmeras e inesperadas
ligações que estabelecemos entre conceitos. Este exercício não é um elemento de avaliação/análise, apenas serviu
como levantamento de ideias ou fonte de inspiração na
concretização deste artigo. Solicitava-se que fossem estabelecidas associações à palavra CRIATIVIDADE; através
do preenchimento dos balões vazios com outros conceitos
(que estivessem interligados à palavra central). Foi interessante observar que estabelecemos associações distintas
uns dos outros, bem como, enumeramos conceitos muito
díspares entre si. Este esquema foi utilizado em diversos
contextos3 e a forma como cada um resolveu o desafio,
deveu-se, principalmente, ao conjunto de referências que
se encontram na “bagagem” individual. Cada individuo usa
os conceitos de forma muito diferente e é isto que pode
diferenciar o processo criativo pois será a partir daqui que
cada individuo constrói novas combinações e poderá criar
novos repertórios.
No processo criativo, a resposta a este desafio poderia
corresponder ao período de preparação4; considerado um
período inicial (onde os processos são maioritariamente
inconscientes). As analogias representam uma espécie
de veículo que nos guia aos lugares que desconhecíamos
ou que julgávamos que não existiam. Funcionam como
um processo cognitivo de transferência de informação,
demonstram a relação que existe entre as coisas (relação
de semelhança). Quando as pessoas estabelecem analogias, estão a perceber os aspetos das estruturas de duas
situações, aquilo que Hofstadter identifica como a essência
dessas situações, retirando elementos de uma e de outra.
Na sua conferência Analogy as a core of cognition, este autor refere que a analogia é o motor do carro do pensamento
e que as analogias acontecem sempre sem um propósito,
são transitáveis, aparecem e desaparecem.
Uma observação feita com o objetivo de falar na situação A
pode implicitamente aplicar-se à situação B, ainda que não
houvesse intenção de falar sobre a situação B e que B nunca
tivesse sido mencionada. (Hofstadter, 2007)
1
Tradução: Criatividade é extra/comum, original e ajustada, completa, in(ter)ventiva, cooperativa, in/consciente, feminina<>masculina, re…criação.
2
Hofstadter na sua abordagem sobre a perceção, define conceitos fluidos como conceitos com fronteiras
flexíveis (…) que se adaptam a circunstâncias não antecipadas (Hofstadter et al., 1995).
3
Nomeadamente numa sessão criativa, em contexto terapêutico.
4
Os períodos distinguidos por Wallas são quatro: preparação, incubação, iluminação e verificação (Pope, 2005).
4
REVISTA BIPOLAR
tema de capa­
Este exemplo sugere que utilizamos esquemas mentais
para resolver problemas. Marvin Minsky diz que temos um
grupo de trabalhadores no cérebro que explicam o que
o cérebro faz quando recebe um estímulo. Muitas vezes,
a informação não está lá toda, aquilo que Minsky refere
como um certo desconhecimento de quem são os agentes5 que fazem o nosso trabalho mental. Aquele trabalho
que nos faz encontrar as soluções para os nossos dilemas/
problemas. No que respeita à criatividade, com base na arquitetura cognitiva (onde se desenrolam os processos criativos), trata-se de um nível correspondente a uma maior
“busca”. Operações cognitivas cujo nível de operacionalidade está dependente do desenvolvimento da abstração.
A analogia como paradigma da cognição é um importante
tópico para o estudo da criatividade pois somos criados
com uma ilimitada capacidade para encaixar6 conceitos
(conceitos dentro de conceitos dentro de conceitos); possibilitando estabelecer conexões em geral e analisar semelhanças entre contextos aparentemente dissociados.
artístico pode causar exaltação, mas também promover
alívio, no sentido em que a arte pode repor o equilíbrio,
atuando como elemento unificador de uma certa desagregação. A importância de quebrar fronteiras para encontrar soluções criativas, serve para questionar e estabelecer novas relações. Segundo Bohm, para despertar o
estado mental criativo é necessário estar alerta das reações
mecânicas que nos causam adormecimento. A revelação criativa é crucial para dar novos passos e por isso fundamental
para a vida em geral (Bohm, 2001).
Paralelamente, pode-se pensar na arte como um possível
caminho para tornar a sociedade mais inclusiva pois poderá
contribuir decisivamente para a integração de todos7.
Esta ideia de inclusão é particularmente importante para
as minhas reflexões uma vez que pretendo, através dos
meus projetos, “operar” em transformações de atitudes,
construindo posturas mais criativas e por conseguinte mais
flexíveis.
Criatividade - Uma aliada (arte em contexto terapêutico)
Os artistas concebem associações e justaposições inesperadas, conceptualmente e visualmente. Eles agrupam,
mistu- ram, atenuam e contrastam ideias, materiais e
relíquias, tirando prazer do paradoxo e do imprevisível
realçando o vulgar, o estranho e o óbvio. (Ede, 2000)
O pensamento criativo, associado a um tipo de pensamento
designado divergente, pauta-se pela capacidade de propor
várias soluções para o mesmo problema, ca-racterizado
por um registo exploratório e flexível. Quanto maior for
o pensamento divergente maior será a capacidade criativa.
Importa, contudo, salientar que a criatividade não surge do
nada e a originalidade não se alcança através de formulas;
a atividade mental inovadora e original é a que se afasta
de padrões convencionais de resposta. O pensamento
criativo está igualmente associado à capacidade de antecipar problemas ou acontecimentos, sendo esta antevisão
importante para diversos contextos ou áreas profissionais.
Os meus projetos podem orientar o meu olhar e torná-lo mais
hábil e preciso; também posso construir a minha memória, a
minha linguagem, os meus sentimentos (…) o eu criador ou
executivo – o que planeia, escolhe, dirige, avalia, seleciona…
(Marina, 1995).
Numa outra perspectiva, podemos referir a importância
da arte no contexto terapêutico, como potenciadora da
criatividade. A arte desempenha hoje um papel incontornável na área da saúde, sendo por isso fundamental a
definição do seu papel nas dinâmicas de reabilitação e a
clarificação do seu contributo nos processos terapêuticos (criatividade e arte como terapia). Não de um ponto
de vista instrumental (como ferramenta), mas antes como
expansão de possibilidades. Através da arte podemos desenvolver estratégias para equilibrar a complexa relação
entre as expectativas e a realidade, traduzindo-se numa
maior capacidade de adaptação a diversas situações.
Segundo Vygotsky, a arte parece ser um meio psicológico
para criar um equilíbrio entre o ambiente e os pontos críticos do nosso comportamento (Vygotsky, 2006). O trabalho
Temperamento artístico
artístico
Temperamento
doença Bipolar
Bipolar
ee doença
Neste ponto, pretende-se estabelecer a ligação da criatividade com a doença mental. Podia-se explorar este
tema através do sofrimento como alimento para o ato
criativo, na perspectiva de que momentos difíceis podem
ser aproveitados criativamente. No entanto, no contexto
deste artigo interessa a abordagem no âmbito da fluidez
de pensamento.
Embora se possa associar o aumento da produtividade
artística à doença bipolar (talvez a doença ponha em evidência algumas das características mais criativas dos indivíduos), tal não justifica a relação direta entre a doença
bipolar e uma predisposição para as artes ou para as
atividades criativas em geral. A relação entre hipomania
e o talento artístico pode ser evidente, se considerarmos
os estados de espírito elevados e efusivos, uma autoestima
acentuada, enorme energia, pouca necessidade de sono, entre outros8 (Jamison, 2006). Ainda assim, mesmo considerando que certas características da doença, combinadas
com talento, podem traduzir-se numa fonte de criatividade, é sempre necessário manter a atenção, a disciplina e
o equilíbrio (Jamison, 2006). Esta disciplina está, portanto,
relacionada com a capacidade de planear, mas também de
executar. Fases mais difíceis da doença podem comprometer a capacidade de concretização.
5
O agente é qualquer parte ou processo da mente que é suficientemente simples por si só para ser entendido por si próprio, ainda que as interações entre os grupos destes agentes possam produzir fenómenos que são muito mais
difíceis de entender (Minsky, 1986).
6
Tradução de Chunking.
7
Promovendo o combate ao estigma da doença mental.
8
Muitas das mudanças de humor, de pensamento e de perceção que caracterizam os estados maníacos ligeiros - a inquietação, a ebulição, a expansividade, a irritabilidade, a mania das grandezas, os sentidos mais acelerados
e mais agudos, as intensas experiências emocionais, a diversidade do raciocínio, e a rapidez dos processos associativos - são também características do pensamento criativo (Jamison, 2006).
tema de capa­
Estudos apontam que num exercício de associações (semelhante ao apresentado na Fig.1), as respostas a uma
tarefa desta índole triplicavam durante a mania9 (Jamison,
2006), consequência da agilidade de raciocínio e grande
rapidez nos processos associativos10. Não obstante, importa entender em que medida esta capacidade beneficia
de facto o pensamento criativo. A fluidez de pensamento,
a tendência para “disparar em diversas direções” pode facilitar nas atividades criativas, mas apenas onde já exista algum talento ou motivação. À guisa de conclusão, deve-se
assinalar que nem todos os indivíduos com doença mental
são criativos, nem todos os criativos sofrem de doença
mental.
Conclusão
A fluidez de pensamento é uma das características associadas ao pensamento criativo e também à doença bipolar.
Contudo, é precipitada a estreita ligação, muitas vezes utilizada, entre esta doença e a tendência para as atividades
artísticas /criativas. Por outro lado, se a atividade criativa pode promover representações mais flexíveis e uma
maior capacidade de adaptação (conduzindo a ações mais
flexíveis), esta fluidez também pode ser aproveitada/ canalizada para a melhoria da qualidade de vida das pessoas
com doença mental. Através da arte podemos organizar
e reorganizar a nossa experiência no (e do) mundo, para
além de que a arte tem a capacidade de nos situar, contribuindo para o autoconhecimento (são atos de descoberta permanentes).
REVISTA BIPOLAR
5
Referências bibliográficas
BOHM, David. Sobre la creatividad. Editorial Kairós. Barcelona, 2001.
EDE, Siân. Strange and Charmed. Science and the contemporary visual arts. Calouste Gulbenkian Foundation. London,
2000.
HOFSTADTER, Douglas. Fluid Concepts and Creative Analogies: Computer Models of the Fundamental Mechanisms of
Thought. Basic Books. New York, 1995.
HOFSTADTER, Douglas. I Am a Strange Loop. Basic Books.
New York, 2007.
JAMISON, Kay Redfield. Tocados pelo fogo. A doença maníaco-depressiva e o temperamento artístico. Pedra de lua, artes, letras e ofícios, SA. Colares, 2006.
MARINA, José A. Teoria da Inteligência Criadora. Caminho.
Lisboa, 1995.
MINSKY, Marvin. The Society of Mind. Touchstone Book.
Published by Simon & Schuster Inc., New York, 1986.
PDM. Psychodynamic Diagnostic Manual. Silver Spring, MD:
Alliance of Psychoanalytic Organizations, 2006.
POPE, Rob. Creativity: theory, history, practice. Routledge,
London, 2005.
VYGOTSKY, Lev. Psicología del Arte. Editorial Paidós. Barcelona, 2006.
Analogy as a core of cognition – Douglas Hofstadter
http://www.youtube.com/watch?v=n8m7lFQ3njk
Dan Dennett: Can we know our own minds?
http://www.youtube.com/watch?v=fjbWr3ODbAo
Raquel Pedro
Licenciada em Artes Plásticas – Pintura, pela Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa (FBAUL) e Pós
Graduação em Ciência Cognitiva, Universidade de Lisboa. Atualmente, encontra-se a trabalhar na área da saúde mental (em Reabilitação Psicossocial), onde procura utilizar a arte em contexto terapêutico. Nos últimos anos, tem vindo
a colaborar regularmente com a Fundação Gulbenkian numa iniciativa entre o Serviço Educativo do Museu Calouste
Gulbenkian e a Casa de Saúde do Telhal, no âmbito das visitas culturais. No sentido de promover o debate reflexivo
sobre a experiência artística e proporcionando um espaço de intervenção através da arte. Colabora pontualmente
com o Serviço Educativo da Culturgest. Currículo artístico http://www.behance.net/raquelpedro.
9
Mania é caracterizada pelo excesso de energia e pode ser experimentada de forma negativa, como uma pressão interna disruptiva e perturbadora, ou positivamente, como uma sensação de poder infinito, de grande
habilidade e criatividade (PDM, 2006).
10
A capacidade de combinar as ideias ou as categorias do pensamento a fim de formar conexões novas e originais (JAMISON, 2006).
6
REVISTA BIPOLAR
tema de capa­
Cidadania Ativa na Saúde Mental?...
Ou simplesmente Cidadania?!
Todos somos seres individuais, que naturalmente procuram
satisfazer as suas necessidades com um objectivo final igual para
todos, atingir um bem-estar global que nos permita viver em
harmonia a maior parte do tempo!
Mas não vivemos isolados, vivemos inseridos numa comunidade,
num ou vários grupos sociais onde a interação é inevitável entre
todos os seus membros. Este facto faz de nós Seres Sociais e neste
papel existe igualmente a necessidade de satisfazer interesses
coletivos da comunidade em que estamos inseridos!
O exercício desse papel é o exercício da cidadania! O conceito
de cidadania teve origem na civilização greco-romana, na palavra
“cidade”, significa o estatuto de pertença de um indivíduo a
uma comunidade politicamente articulada e que lhe confere um
conjunto de direitos e de deveres. É do vínculo de cidadania
que decorrem as responsabilidades do cidadão face ao Estado,
nomeadamente, o direito de participar na formação da vontade
soberana e as obrigações cívicas, fiscais e de defesa.
E neste contexto, Cidadania é o exercício dos direitos e deveres
civis, políticos e sociais estabelecidos na constituição. Os direitos
e deveres de um cidadão devem andar sempre juntos, uma vez
que ao cumprirmos as nossas obrigações permitimos que o outro
exerça também seus direitos e vice-versa.
Exercer a cidadania é ter consciência desses direitos e obrigações e
lutar para que os mesmos sejam colocados em prática. A prática da
cidadania constitui um processo participado, individual e coletivo,
que apela à reflexão e à ação sobre os problemas sentidos por cada
um e pela sociedade. O exercício da cidadania implica, por parte
de cada indivíduo e daqueles com quem interage, uma tomada de
consciência, cuja evolução acompanha as dinâmicas de intervenção
e transformação social. A cidadania traduz-se numa atitude e num
comportamento, num modo de estar em sociedade que tem
como referência os direitos humanos, nomeadamente os valores
da igualdade, da democracia e da justiça social.
Mais recentemente aparece o conceito de Cidadania Ativa
que tem como obejctivo enfatizar o conceito inicial. Parte dos
princípios individuais e coletivos, e envolve a participação efetiva
dos indivíduos na vida política, na sociedade civil e na comunidade,
considerando o cidadão ativo como potencial ator político, que,
não só discute e debate, como também participa no curso dos
processos sociopolíticos da sociedade onde está inserido.
O exercício da cidadania, ativa ou não, está relacionado com a
saúde dos cidadãos. Dificilmente se podem ter competências
para uma cidadania positiva, implicada e ativa se o ator principal, o
cidadão, não estiver munido da melhor saúde, ou se não tiver a seu
lado quem o ajude nesse caminho.
Mas neste “mundo” da Cidadania, que é o mundo de todos nós,
quando se fala de Saúde Mental e de pessoas com um problema
de saúde mental, temos que falar de igualdade de oportunidades,
liberdade, empowerment e auto-representação.
Entenda-se, aqui, igualdade de oportunidades, não pela igualdade
de tratamento, mas pela ausência de descriminação, pela
possibilidade, escolhida, de participação em todas as esferas da
sociedade, aceitando as diferenças do outro.
Quando falamos de Empowerment, falamos de um processo em
que o individuo tem ao seu dispor instrumentos que lhe permitem
um aumento de poder (psicológico, sócio-cultural, politico e
económico) de modo a amplificar o exercício da sua cidadania. O
poder da escolha e da expressão inteiramente ligado à evolução
pessoal e social de cada um. O conceito de empowerment
defende a inclusão de todos os tipos de grupos que necessitam
de se envolver com a sociedade para se sentirem aceites e
poderem atingir objectivos que necessitam de alcançar tal como
equilíbrio de poder na sociedade, direitos iguais sem prejuízo das
suas características bem como a possibilidade de se exprimirem
livremente. Isso contribui para uma visão construtiva a longo prazo
no que diz respeito a evolução pessoal e social.
No que respeita ao conceito de auto-representação, este é um
princípio universal que se aplica a qualquer pessoa. Cada pessoa,
independentemente das suas capacidades ou dificuldades, deve
participar e ter voz ativa na tomada de decisões que afetam as
suas vidas. Todos temos direito à informação necessária para
poder tomar decisões e fazer escolhas bem como direito ao
conhecimento das possíveis consequências dos nossos atos,
O que difere de pessoa para pessoa é o apoio que cada um
necessita para tomar decisões e fazer escolhas, devido à sua idade,
conhecimentos, estado de saúde, experiências ou capacidades.
A auto-representação é então, um processo que envolve o reconhecimento de obstáculos e o desenvolvimento de estratégias para
ultrapassar esses mesmos obstáculos, aumentando a capacidade de
argumentação em defesa própria e de exercício de plena cidadania.
No fundo, o exercício de uma cidadania plena, implica já por si
uma participação ativa, de modo a facilitar a obtenção de algo que
se quer alcançar, seja a mudança, ou aspectos mais pontuais. Nunca esquecendo que é um processo que requer responsabilidade
para se alcançar o que se pretende, assumindo igualmente as consequências dessa escolha, equilibrando direitos e deveres.
Quando se liga o conceito e o exercício de uma cidadania plena e
ativa à Saúde Mental não podemos deixar de fazer outra ligação. A
ligação com o conceito de Reabilitação Psicossocial, conceito que
parte do princípio que é possível ajudar a pessoa a ultrapassar as
limitações causadas pela sua doença, através da (re)aprendizagem
de competências, não esquecendo a sensibilização da comunidade,
sempre com o intuito de diminuir barreiras. Os objectivos finais
desta intervenção passam pela emancipação do utente, a redução
da discriminação e do estigma, a melhoria da competência social
individual e, sempre que possível, a criação de um sistema de apoio
social de longa duração.
Ao longo das últimas décadas tem havido uma evolução
significativa neste campo, não esquecendo o processo de
desinstitucionalização e a reforma dos serviços de psiquiatria
que tem sido lenta e difícil mas tem acontecido, nomeadamente
com a criação de estruturas na comunidade. Nesta intervenção
comunitária é necessário continuar a incentivar e dinamizar ações
que impliquem a participação dos utentes e familiares na deteção
das necessidades, no planeamento de medidas e na avaliação
dos serviços reconhecendo a sua experiência como uma maisvalia, a promoção de grupos de auto-ajuda e do associativismo,
a luta contra o estigma, a discriminação e a desigualdade,
responsabilizando e apoiando as pessoas com problemas de
saúde mental e a sua família, de forma a que possam participar
ativamente em todas as áreas importantes da sua vida. Tudo isto
será possível se cada um de nós tiver consciência do exercício da
sua cidadania, sempre ativa!
Dra. Teresa Ribeiro
REVISTA BIPOLAR
ESTIGMA SOCIAL
Antigamente, o estigma era a marca de um corte ou uma
queimadura no corpo e significava algo de mal para a
convivência social. Podia simbolizar a categoria de escravos
ou criminosos, um rito de desonra etc. Era uma advertência,
um sinal para se evitar contatos sociais, no contexto
particular e, principalmente, nas relações institucionais de
caráter público, comprometendo relações comerciais.
Na época do cristianismo, as marcas corporais tinham um
significado metafórico; os sinais representavam a “graça
divina”, que se manifestava através da pele. Eram também
uma referência médica, representando perturbações físicas.
Na atualidade, a palavra “estigma” representa algo de mal,
que deve ser evitado, uma ameaça à sociedade, isto é, uma
identidade deteriorada por uma ação social.
Segundo Goffman (1993), a sociedade estabelece um
modelo de categorias e tenta catalogar as pessoas
conforme os atributos considerados comuns e naturais
pelos membros dessa categoria. Estabelece também as
categorias a que as pessoas devem pertencer, bem como
os seus atributos, o que significa que a sociedade determina
um padrão externo ao indivíduo que permite prever a
categoria e os atributos, a identidade social e as relações
com o meio. Criamos um modelo social do indivíduo e, no
processo das nossas vivências, nem sempre é impercetível
a imagem social do indivíduo que criamos; essa imagem
pode não corresponder à realidade, mas ao que Goffman
(op. cit.) denomina de uma identidade social virtual. Os
atributos, nomeados como identidade social real, são, de
fato, o que pode demonstrar a que categorias o indivíduo
pertence.
Alguém que demonstra pertencer a uma categoria com
atributos incomuns ou diferentes é pouco aceito pelo
grupo social, que não consegue lidar com o diferente e,
em situações extremas, o converte em uma pessoa má
e perigosa, que deixa de ser vista como pessoa na sua
totalidade, na sua capacidade de ação e transforma-se
em um ser desprovido de potencialidades. Esse sujeito
é estigmatizado socialmente e anulado no contexto da
produção técnica, científica e humana.
Para Goffman, o estigma estabelece uma relação impessoal
com o outro; o sujeito não surge como uma individualidade
empírica, mas como representação circunstancial de
certas características típicas da classe do estigma, com
determinações e marcas internas que podem sinalizar um
desvio, mas também uma diferença de identidade social.
O estigma é um atributo que produz um amplo descrédito
na vida do sujeito; em situações extremas, é nomeado como
“defeito”, “falha” ou desvantagem em relação ao outro; isso
constitui uma discrepância entre a identidade social virtual e
a identidade real. Para os estigmatizados, a sociedade reduz
as oportunidades, esforços e movimentos, não atribui
valor, impõe a perda da identidade social e determina uma
imagem deteriorada, de acordo com o modelo que convém
à sociedade. O social anula a individualidade e determina
o modelo que interessa para manter o padrão de poder,
anulando todos os que rompem ou tentam romper com
esse modelo.
Em 2002, a Organização Mundial da Saúde - OMS alerta
para a estigmatização ser uma das principais “barreiras
para a implementação de intervenções efetivas” na área
da saúde mental (Organização Mundial da Saúde, 2002,
p.101), vendo-a como a principal causa de discriminação.
Convida assim a uma maior educação e sensibilização
7
por parte dos profissionais de saúde, bem como para um
sistema de saúde mental mais próximo da comunidade
e ações de informação junto do publico em geral. Estas
recomendações abrangem não só a sociedade civil no
geral, mas também as famílias dos doentes em particular.
Em 2005, a Comissão das Comunidades Europeias reforça
esta ideia referindo que “a estigmatização, a discriminação
e o desrespeito dos Direitos do Homem e da dignidade da
pessoa doente ou diminuída mental, continua a ser uma
realidade que se opõe aos valores europeus fundamentais”.
Consequentemente, o Plano Nacional de Saúde Mental
2007-2016 prevê campanhas nacionais de luta contra o
estigma e a discriminação das pessoas com doença mental
grave (Coordenação Nacional para a Saúde Mental, 2008).
Recentemente, a atual Proposta de Plano de Acão para
a Reestruturação e Desenvolvimento dos Serviços de
Saúde Mental em Portugal 2007- 2016, indica também a
diminuição do estigma como um dos objetivos a alcançar
até 2016 (CNRSSM, 2007). Embora escassos, os dados
existentes sugerem que a prevalência dos problemas de
saúde mental não se afastará muito da encontrada em
países europeus com características semelhantes, ainda
que os grupos mais vulneráveis (mulheres, pobres, idosos)
pareçam apresentar um risco mais elevado do que no
resto da Europa. A análise do sistema de saúde mental em
Portugal mostra alguns aspetos positivos na evolução das
últimas décadas. Foi um dos primeiros países europeus a
adotar uma lei nacional (1963) de acordo com os princípios
da sectorização, a qual permitiu a criação de centros de
saúde mental em todos os distritos e o aparecimento de
vários movimentos importantes, tais como os da psiquiatria
social e da ligação aos cuidados de saúde primários.
A nova legislação de saúde mental, aprovada nos anos 90
(a Lei nº 36/98 e o Decreto Lei nº 35/99) reforçou este
capital, de acordo com os princípios recomendados pelos
organismos internacionais mais importantes na área da
organização dos serviços de saúde mental.
Nos últimos vinte anos, a ADEB tem sido a Associação
ligada á Saúde Mental que mais tem lutado no combate
ao estigma, através da valência da educação para a
saúde (Sessões Psicopedagógicas, Colóquios, Palestras,
intervenções em escolas, Municípios etc.), bem como
a presença nos meios de comunicação social (meios
audiovisuais e imprensa escrita). A ADEB tem ainda
participado em campanhas de sensibilização como “A
Depressão Dói” e “Saia do Escuro”.
“A sociedade estabelece os meios de categorizar as
pessoas e o total de atributos considerados como
comuns e naturais para os membros de cada uma
dessas categorias”. (Goffman, 1975)
Orlanda Correia
(Técnica Superior de Serviço social)
8
REVISTA BIPOLAR
Despertar para a Arte
e para a Criatividade
Mais crise, mais desemprego,
mais depressão
Desde que me lembro de ser pessoa, a Arte cativa-me,
expressão do olhar, da mente e da alma do artista. As formas, a
luz, as cores e os materiais sempre foram apelativos para mim.
Beneficiei de uma educação aberta aos horizontes culturais, em
geral, e artísticos, em particular. Já jovem, algo me compelia a
procurar os museus, as exposições, os livros e o cinema sobre
Arte, desde os cânones clássicos até aos contemporâneos.
Todavia, a biografia de muitos célebres artistas era fonte de
inquietação, pois parecia haver um gene de loucura que os
amaldiçoava. Vejamos os casos de Van Gogh, Munch, Camille
Claudel, entre outros. Decidi atribuir à Arte o lugar de
ocupação de tempos livres, ou nenhum lugar, em períodos de
escassez de tempo disponível por imperativos laborais...
Tenho encontrado ao longo da minha vida adulta, sobretudo
nos espaços de formação artística que fui frequentando de
forma intermitente (destacando a Sociedade Nacional de
Belas Artes), diversas pessoas que se interessam pela Arte,
simplesmente pessoas, sem qualquer rótulo de doença / saúde
mental. Quanto a mim, mais de metade dos quarenta e poucos
anos de vida tem sido acompanhada pela doença unipolar
(depressão recorrente), agravada por sintomas psicóticos.
Tem sido um longo percurso de aprendizagem e adoção de
estratégias para minimizar a doença – em que a Arte tem um
papel –, com mais ou menos apoio de familiares e amigos, bem
como de profissionais, gerindo melhor ou pior as atividades
que estruturam a vida. Fruto da degradação da minha saúde
mental e das circunstâncias, eis-me atualmente dedicada à
criação artística.
A relação entre a Criatividade e a saúde mental é uma
questão que merece a atenção de médicos, psicólogos, entre
outros técnicos. Creio que uma pessoa não é doente por ser
criativa. Uma pessoa criativa pode ser ou não doente, sendo
que a Criatividade pode ser um instrumento terapêutico. Em
que medida?
Criar é construir algo que nos realiza e edifica. A Criatividade
que habita em mim revela-se sobretudo na Arte pictórica, mas
a Criatividade pode manifestar-se de muitas outras formas, tais
como Literatura, Música, Dança, Artesanato, etc. e pode refletirse em muitos domínios da vida. Ao criar podemos transformar
muitos tormentos em energias positivas. Podemos exteriorizar
o que nos vai na alma: o que nos perturba, o que desejamos.
Podemos acalmar o caos da nossa mente e, eventualmente,
reorganizar o que pensamos e sentimos. Podemos, a pouco e
pouco, observar o mundo com novos olhos e voltar a acreditar
em dias melhores. Podemos restaurar energias. Podemos
melhorar a autoestima. Podemos simplesmente experimentar
um novo desafio, sem certo ou errado.
O que representa a minha colaboração com a ADEB,
codinamizando workshops / oficinas de desenho e aguarela?
Em geral, representa uma oportunidade para partilhar, abrindo
portas para que outros explorem o potencial libertador
da Arte. Em particular, é um modo de proporcionar a (re)
aprendizagem da capacidade de observação e de interpretação
de motivos materiais ou imateriais. É também um meio para
transmitir como recriar volumes na superfície do papel, seja
pela delicadeza dos traços e manchas a grafite ou a tinta da
China, bem como pela expressividade do carvão (desenho),
seja pela magia das cores, associada ao imprevisto inerente ao
elemento água (aguarela). Em qualquer caso, é uma porta para
descobrir e desenvolver uma bagagem criativa, quebrando a
solidão, proporcionando realização e bem-estar. Em suma, é
uma ponte para menos doença / mais saúde para quem ensina
e quem aprende.
A Organização Mundial de Saúde considera a depressão a grande
epidemia do século XXI. Já atinge quase ¼ dos Portugueses,
sendo a principal causa de incapacidades e a origem de mais
de um milhar de mortes anualmente. Portugal vive numa grave
depressão, também em termos de coesão social. Esta sociedade
tem cada vez menos capacidade de resposta em momentos de
falta de saúde, desemprego e pobreza extrema. A erosão da
coesão social é galopante, repercutindo-se acentuadamente
na saúde mental dos nossos concidadãos, na combalida
sanidade das famílias, no aumento exponencial dos suicídios,
na ocorrência de mortes evitáveis. A depressão instala-se e é
diretamente proporcional à penúria de resposta do mercado
de trabalho. Quem está desempregado e não recebe prestação
social – deprime. Esta sociedade economicamente anémica e
socialmente desigual e injusta, empobrecida e onde o comum
cidadão não interessa para nada, espoleta cada vez mais um
maior número de pessoas vulneráveis à depressão. A área da
saúde mental é muito sensível aos apoios sociais e quando estes
vão sendo suprimidos a gravidade dos quadros depressivos
aumenta significativamente. As dificuldades económicas, a
perda de emprego, da casa e por vezes da própria família,
deixam as pessoas mais do que tristes, causando o desespero.
Há casos em que os doentes não conseguem ultrapassar a
doença apenas com a ajuda da Psicologia, necessitando de
complementar a terapêutica com medicamentos. As doenças
mentais e neurológicas já afetam 2,5 milhões de Portugueses,
daqui a uns anos os índices serão reveladores... Devido à
potenciada crise e ao darwinismo social instalado, a falta de
dinheiro gera dramas como os doentes terem que interromper
a medicação e não se poderem deslocar aos hospitais e centros
de saúde. Porém, na Europa somos os que gastamos mais em
antidepressivos (!). Esta gente que diz governar (diz...), cada
vez menos dinheiro utiliza do PIB para tratar a saúde mental.
Está em marcha um plano de regressão sobre os psicofármacos
receitados. Prescrevem-se remédios de há 40/50 anos com
efeitos secundários perversos, dando origem à significativa
perda de qualidade de vida dos doentes. Porquê esta perniciosa
opção? Porque o ministro fiscalista da saúde “quer fazer mais
com menos”. Como disse?
“A saúde mental é tão ou mais importante que a saúde física”
disse e bem o Presidente da ADEB, Delfim Augusto de Oliveira
(aproveito para lhe dar um abraço de Saúde!). Investir na nossa
saúde mental é lutar por melhor qualidade de vida, diminuindo
o sofrimento das pessoas com diagnóstico psiquiátrico. A
prevenção é a melhor forma de poupar dinheiro. “(...)a doença
mental é responsável por quase metade do absentismo laboral
[e] os custos de não agir, ou agir de forma insuficiente para a
dimensão do problema, serão enormes e consumirão muito
mais recursos no futuro, com as consequências negativas daí
decorrentes. Esta é mais uma dívida pública para as gerações
vindouras pagarem!” escreveu assertivamente no Diário de
Notícias, o bastonário da Ordem dos Psicólogos Portugueses,
Telmo M. Baptista. Cortar e recortar na saúde mental é CRIME!Humor irregular, insónia persistente, ansiedade, angústia,
falta de energia anímica, raciocínio e memória em perda e ideias
pessimistas acompanhadas de tendência para o suicídio , são
alguns dos sintomas que pré-anunciam depressão, precisando
de ajuda e acompanhamento da Psicologia e Psiquiatria. Quem
aceitar e admitir o seu transitório estado depressivo tornará
mais fácil, mais rápido e mais eficaz o tratamento. É da mais
elementar justiça realçar o meritório trabalho desenvolvido
pela ADEB – Associação dos Doentes Depressivos e Bipolares,
como um bom porto de abrigo para recuperação, reinserção
e superação de inúmeros casos diagnosticados. Urge ser
resiliente. Os tratamentos existem, a cura é possível e a Vida
(que é Querida!) voltará a sorrir também com Força interior.
È preciso Acreditar!, que a depressão pode deixar de doer!!
14 de outubro de 2013
Vítor Colaço Santos
Socio ADEB
Maria João Neves
REVISTA BIPOLAR
9
International Forum
on Innovation in
Mental Health
Decorreu no passado dia 3 e 4 de outubro de 2013, em
Lisboa, o “International Forum on Innovation in Mental Health”,
organizado pela plataforma de Saúde Mental Global da
Gulbenkian em colaboração com a Organização Mundial de
Saúde.
Esta ação, que contou com o contributo de especialistas de
todo o mundo, procurou promover uma reflexão critica que
contribua para a melhoria do conhecimento sobre saúde
mental, tendo em conta quatro temas relevantes:
- Determinantes sociais que possam ser modificados para
ajudarem na promoção da saúde mental e prevenção das
doenças mentais;
- As relações fundamentais entre a doença física e mental, e
as implicações da integração da saúde mental nos planos de
saúde em geral;
- A urgência de uma mudança radical na gestão das doenças
mentais, afastando-se das hospitalizações a longo termo e
promovendo a integração destes cuidados na comunidade;
- A importância da proteção dos direitos de pessoas com
doença mental, especialmente as crianças em ambientes
psiquiátricos.
Foram apresentados relatórios com dados de vários países
dentro destas áreas e foi reiterada a necessidade de se dar
mais protagonismo e importância, por parte da comunidade e
dos decisores políticos, ao impacto real da doença mental nas
pessoas, na sociedade e na economia, assentando no princípio
de que não pode haver saúde, sem saúde mental.
Segundo um estudo mundial, realizado em 2005, cerca de
28% do peso das doenças com impacto nos anos de vida e
na produtividade das pessoas, são doenças neuropsiquiátricas,
afetando a doença Unipolar cerca de 10% e a doença Bipolar
cerca de 2% da população mundial (Prince M. et al. No Health
without mental health. The Lancet, 2007, 370 (9590): 85977). No entanto, e apesar desta constatação, esta área não
é valorizada no quadro global estratégico de intervenção,
em detrimento de outras doenças, o que dificulta bastante a
implementação de mais estratégias inovadoras e eficazes.
Vários especialistas de diferentes países partilharam a sua
visão acerca das estratégias e determinantes envolvidos na
área da saúde mental. O processo de desinstitucionalização,
que passou, também em Portugal, pelo encerramento de
grandes hospitais psiquiátricos, nem sempre foi acompanhado
pelo desenvolvimento de estruturas na comunidade que
proporcionassem um alternativa consistente aos doentes e
às suas famílias, tendo muitas vezes resultado num aumento
da população de pessoas com doença mental nas prisões e
nos sem-abrigo. Por outro lado, têm sido desenvolvidas
na comunidade respostas que, progressivamente, vão
assegurando a manutenção dos cuidados médicos,
complementados por estratégias de integração e reabilitação
psicossocial e capacitação dos doentes e suas famílias, para que
possam sentir-se mais informados e apoiados.
Há que manter o investimento nestas estruturas, para que elas
possam melhorar os serviços que proporcionam e abranger
áreas populacionais cada vez mais vastas. O rácio de médicos e
instituições por pessoa é abismalmente díspar em continentes
como a Europa e África, por exemplo, e até dentro dos
próprios continentes, tendo em conta as suas especificidades
culturais, geográficas e socio económicas.
Foi no entanto muito importante a identificação de vários
projetos que começam a dar os seus passos, em áreas do
planeta normalmente mais vulneráveis e menos protegidas,
por exemplo em África e Ásia. No entanto, nem sempre
o rendimento per capita implica necessariamente uma
diferenciação positiva na esperança média de vida, nem na
qualidade de vida, devendo cada situação ser analisada e
interpretada à luz das suas características específicas.
A relação de uma doença como a depressão, com o aumento
de probabilidade de morte por outras doenças foi também
um fator abordado, bem como a dificuldade de se fazer um
diagnóstico médico adequado neste tipo de casos, remetendose para a necessidade de uma mais eficaz integração da saúde
mental nas estratégias de gestão da saúde em geral.
É necessário que existam mais profissionais qualificados,
distribuídos geograficamente de acordo com as necessidades
das populações em todo o mundo, e com o envolvimento
das políticos e das comunidades, para que este objetivo seja
alcançado com eficácia. Estas questões estão identificadas há
muito, mas há uma certa resistência na sua implementação
no terreno. Um dos conferencistas abordou a importância
que estratégias inovadoras como a Tele psiquiatria (consultas
via telefone ou via Skipe), tem em países com vastas áreas
geográficas e com más redes de transporte. Esta, como outras
técnicas está em fase de exploração, para que se possa concluir
acerca da eficácia da sua implementação, mas representa um
esforço criativo de ultrapassar as dificuldades que se vão
encontrando.
Foi dada uma grande importância ao papel da intervenção
precoce, nas crianças e nos jovens, quer em termos médicos,
quer sociais, visto que estas áreas estão bastante interligadas e
influenciam-se mutuamente.
O objetivo global da redução do risco da doença mental deve
ser feito através de intervenções estruturais, ambientais e locais,
integradas no sistema global de saúde de cada país, apostandose na melhoria dos processos de desinstitucionalização, e no
desenvolvimento de respostas complementares adequadas.
Há que dar-se continuidade à prevenção e promoção da saúde
mental, com vista a alcançar estes objetivos.
Dra. Renata Frazão
Psicóloga Clínica ADEB
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REVISTA BIPOLAR
testemunho
Emoção e Inspiração na Escrita Criativa
À partida todas as formas de escrita são potencialmente
criativas. O estímulo que nos assola ao escrever pode ter
origem em variadíssimos acontecimentos, por exemplo
um sonho, um fenómeno da vida real, uma palavra, um
gesto, etc.; A isto chamamos muitas vezes inspiração.
Quantas e quantas vezes não nos emocionamos com
algo que nos acontece, quantas vezes esse facto não é
pretexto para um texto ou um poema? A Escrita Criativa
pode-se desenvolver mas não se pode ensinar, não tem
receitas nem dogmas.
A leitura é indispensável; só quem lê observa e
interpreta todo o mundo da escrita. É muito difícil
escrever sem ler muito. A leitura dá-nos bagagem e
ferramentas para estruturar a nossa própria escrita.
Escrita Criativa é todo o universo que se nos apresenta
numa folha em branco. Começar é o primeiro desafio,
fazer desfilar as palavras segundo o nosso contentamento,
segundo o nosso gosto, preenchendo assim, o espaço
vazio da nossa folha. Quando emocionalmente
envolvidos, a caneta toma conta das palavras e toma
conta de todo o texto; Uma vontade irreprimível agarranos na mão e conduz-nos a um mundo que à partida
não se nos afigurava real. É necessário uma boa dose
de perseverança para escrever e é preciso ter uma
intenção: um objectivo. Devemos sempre estabelecer o
nosso objetivo: organizar previamente o que se pretende
alcançar e quais as etapas para o concretizar. Para isso
é necessária força de vontade, porque nem sempre
as coisas saem como nós queremos, muitas vezes é
preciso recomeçar e recomeçar até conseguirmos algum
resultado.
Sendo a escrita produto de emoção e inspiração, o
ato de escrever é sempre um ato solitário, somos nós
e a nossa folha. É com esta solidão que temos de nos
confrontar; o nosso desígnio depende desta solidão e
só assim podemos ser completamente críticos do nosso
trabalho. O sentido de autocrítica deve estar sempre
presente. Nós somos os nossos mais cruéis juízes.
Todo o texto criativo é produto de reflexão e de
trabalho de ideias, cresce quando começa e esgotase quando termina. Por tudo isto é importante termos
presente todas as fases da escrita, estarmos atentos às
nossas emoções e contar sempre com uma dose de
inspiração.
António Alberto
testemunho
REVISTA BIPOLAR
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Testemunho da minha participação
enquanto bailarino intérprete no
projeto “Fragile”
Poder fazer parte de um elenco profissional composto
por pessoas que amam e dedicaram grande parte da sua
vida à dança foi extremamente gratificante. Na minha
perspetiva, participar neste projeto exigiu um grau de
disponibilidade elevado ao nível físico e mental, bem como
muita responsabilidade devido aos compromissos que
foram assumidos e a interdependência que se estabeleceu
entre todo o grupo de trabalho.
Responsabilidade acrescida pela minha necessidade de
conciliar todos os fatores com o meu trabalho e estudos.
Foi sem dúvida um grande desafio. A possibilidade de
aprender várias técnicas e metodologias associadas ao
processo artístico da dança contemporânea e poder
expressar-me através desta arte com todo o elenco, foi
uma experiência maravilhosa e única.
O projeto português foi criado de raiz, onde todos fomos
parte ativa e nos foi dada a possibilidade de contribuir na
criação, desenvolvimento e construção da nossa peça. A
metodologia utilizada originou altos níveis de identificação
por parte de todos os intervenientes.
Voltar a pisar grandes palcos foi muito importante. Viajar,
poder expressar-me através da dança contemporânea a
outros povos e culturas, foi uma experiência extremamente
positiva e inesquecível.
Partilhar o palco com artistas de outros países com
diferentes perspetivas de vida foi muito enriquecedor.
Este projeto vale pelo seu todo, tem uma dimensão
grandiosa ao nível pessoal, humano e social. É uma
referência para trabalhar com pessoas que possuam
necessidades específicas e teve um impacto muito positivo
na sociedade. Os meus familiares, amigos, colegas e
professores ficaram extremamente satisfeitos ao constatar
que é possível pessoas com necessidades específicas
na área da visão poderem exprimir-se e dançar a nível
profissional.
Senti admiração por me verem a ultrapassar todas estas
barreiras tantas vezes intransponíveis, umas vezes por
pura ignorância, outras porque outros valores se levantam,
dando primazia ao materialismo em detrimento do
Humanismo.
Este projeto só foi possível porque existiu consciência
política, económica e social para a sua concretização.
É extremamente importante que haja continuidade destas
políticas e que as pessoas com necessidades específicas
que receberam formação nesta área sejam acolhidas,
acarinhadas e envolvidas em novos projetos, para que
a semente que foi plantada se possa transformar numa
árvore robusta que dê belos frutos.
Gostaria por último de agradecer a toda a equipa com
quem trabalhei, à Ana Rita Barata, Pedro Sena Nunes,
Joana, Bernardo Gama, Sofia Serominho, Clara, Tiago,
João Caxulo, a todos os Colegas que constituíram o
elenco da Noruega e Estónia, bem como a todos aqueles
que assistiram aos nossos espetáculos, nos aplaudiram e
acarinharam.
Deixo ainda um agradecimento à Vo´arte e à ADEB,
instituição onde trabalho e que desde o início me apoiou
e incentivou durante todo este projeto, não podendo
ainda esquecer o meu Colega José Torres que me apoiou
incondicionalmente nesta caminhada, bem como à minha
mulherDiana Couto, às minhas filhas Ana Rita e Bruna
Raquel e ao meu pai Delfim Oliveira e Mãe Aurelina
Oliveira, bem como às minhas irmãs Catarina e Mónica.
Porque a união faz a força e a diferença entre o possível e
o impossível é ínfima e depende única e simplesmente da
determinação de cada um. E porque ter participado numa
experiência como a que foi proporcionada neste projeto
foi extraordinário,
Verto aqui a palavra saudade
Muito Obrigado a Todos
Até Sempre
Luís Oliveira
12
REVISTA BIPOLAR
testemunho
COMO DESCOBRI QUE ERA BIPOLAR!...
Agora tenho 47 anos, tenho esta doença desde os meus vinte
anos, naquele tempo chamavam-lhe
maníaco-depressiva. Parece que ainda estou a ouvir a minha
irmã a gritar no Centro de Saúde Mental de V.N.Gaia:
- “Ela é maníaca!”
Foi quando ela e a minha mãe me acompanharam num episódio
de crise; já não era a primeira vez, mas foi a primeira vez que a
enfermeira disse o nome da doença.
Recuamos 23 anos atrás e tudo era quase desconhecido,
principalmente quando se tratava de uma doença do foro
psiquiátrico.
Eu era uma rapariga “normal” quando andava na escola, nunca
reprovei, no liceu vivi o meu 1º amor e a 1ª desilusão. Após essa
experiência desastrosa, adormecia sempre a chorar, andei assim
durante 1 ano. Tinha um quarto só para mim, por isso ninguém
se apercebeu.
Mudamos de casa, acabei o 12º ano e como não entrei na
universidade, ao surgir a possibilidade de emigrar, não pensei
duas vezes. Fiz 18 anos em outubro e em dezembro, uma
semana antes do Natal, lá fui eu para a Suiça, ganhar tanto como
o meu pai, que já trabalhava à 20 anos. O meu 1º emprego e
sem nunca ter estado fora de casa, à exceção do mês das férias
grandes, na aldeia em Trás dos Montes.
Um ano antes desta minha partida, tivemos uma grande tragédia
na família, num acidente de automóvel perdi a minha avó, um
tio e a minha afilhada no mesmo dia. Fiquei um mês nos C.
Intensivos do Hospital Pediátrico de Coimbra a cuidar de um
primo cujos pais, que também ficaram feridos, não tinham
condições para o fazer. Digo isto porque há pessoas que dizem
que acontecimentos traumatizantes podem espoletar a doença.
No Natal de 1988 estávamos muito atarefados no que diz
respeito a clientes (ex. Carolina do Mónaco, família Agnelli,
etc.), pela 1ª vez fui ao médico da aldeia dos Alpes onde
trabalhava; talvez o velho Dr. Durban tenha diagnosticado mal
aquele episódio, atribuindo o meu problema ao stress receitoume umas gotas para tomar 15 antes de dormir. Passei esse fim
de ano no Hospital Psiquiátrico quase a 200 km, tendo sido
encaminhada depois para um psicólogo no Hospital de Samedan.
Nessa única consulta, pós internamento, o psicólogo chegou à
conclusão que o meu problema era igual ao dele, “saudades”,
era italiano casado com uma suiça, disse que sentia “nostalgia”
do seu país e amigos.
Considerou que sendo eu muito nova, nunca tendo estado longe
de casa antes, tinha sido desenraizada da família, amigos e de
tudo o que me era mais querido.
Um ano mais tarde, para dar oportunidade à minha irmã de
arranjar lá trabalho, fui numa viagem de barco, com amigos
ingleses, suíços, holandeses, etc. de Espanha até à Grécia.
Quando lá chegámos, e porque o mar é muito desgastante, já
estava doente. Voltei através da embaixada, entregue a uma
hospedeira.
Fui levada por uma tia à urgência do Hospital Magalhães Lemos,
fiquei internada cerca de 2 semanas. A minha mãe falou com a
médica que concordou com o médico italiano ao dizer que eu
não tinha estofo para emigrante, criando na minha mãe a ideia
que se eu ficasse por cá nunca mais ficaria doente.
A verdade é que tal não aconteceu, comecei a trabalhar em
Maio de 1989 na empresa onde estou hoje e Graças a Deus
onde todos são meus amigos e me tentam ajudar.
Depois de vários internamentos no CHVN Gaia, e depois de
um casamento desastroso, ouvi falar da ADEB; já tinha tentado
encontrar a associação noutra ocasião, sem sucesso, ainda era
na Boavista.
Em Agosto de 2010, estava com outra depressão e o meu
diretor insistiu que eu tinha de ser internada. Isso eu tinha a
certeza que não queria. Fiquei um mês de baixa e aproveitei
para procurar encontrar a ADEB.
Desde essa altura, depois de ter sido muito bem acolhida e
acompanhada, quer em consultas de apoio psicológico, quer
fazendo parte do GAM (grupo de ajuda mútua), participando
em sessões psicopedagógicas ou em Workshops (ex. sobre
Ansiedade), etc., tenho andado muitíssimo bem.
Continuo a ser acompanhada pela minha psiquiatra no H Santos
Silva, mas a verdade é que me foram facultadas armas e ajudas
na ADEB para enfrentar esta doença que se eu continuasse
sozinha talvez esta história fosse bem mais triste.
Há muitas pessoas que poderiam aparecer por lá e ser ajudadas.
Eu conheço pessoas com familiares doentes a quem falei, mas
preferem suportar o fardo sozinhas. Dizem logo, é melhor não.
Ainda há vergonha nos dias de hoje de procurar ajuda. Têm
medo que digam disparates e os deixe ficar mal. Não querem
arriscar, têm filhos em casa, até era bom para eles entenderem
um pouco mais o que se passa.
Eu tenho um filho com 16 anos, não tem sido fácil para ele, mas
desde que estou na ADEB, já precisei de apoio para ele e tenho
a certeza que neste momento me entende muito melhor graças
ao apoio que lhe foi facultado.
Não é escondendo-nos em casa, fugindo das pessoas, tentando
ignorar a doença que ficamos melhor.
1º Passo é aceitá-la e tentar falar com outros pois não
estamos sós.
2º Passo nunca esquecer de tomar a medicação, estes
serão os 2 primeiros de muitos outros que nos podem
proporcionar bem estar, só de nós depende encontrar
força para não entrar em depressões e tentar viver o
melhor possível.
Espero que este testemunho ajude mais pessoas que como eu
andaram muito tempo numa montanha russa de emoções e que
agora estão estáveis, não é uma cura milagrosa, mas não custa
tentar.
Até sempre!...
Teresa Ribeiro
Sócia ADEB
testemunho
Tive no verão de 1990 uma grande paixão por uma
cantora muito conhecida do rock português e deixei de
dormir cerca de duas semanas.
Não sabendo o que tinha, fui internado no hospital
psiquiátrico do Telhal.
Mais tarde melhorei e comecei a pensar na minha vida. Em
1993, com vontade de pintar, fui para a Escola de Artes , o
A.R.C.O tirar um curso de pintura.
Nessa altura já escrevia poesia e letras para canções.
Comecei a fazer exposições, com a saúde em bom estado,
tomando a medicação que me era receitada pela Psiquiatra
e tudo foi andando.
No ano 2000 fui representar Portugal à Hungria num
workshop de artes plásticas, tive um descuido com
a medicação e fui parar ao Hospital de Veranka, a cem
quilómetros de Budapeste, capital da Hungria.
Hoje escrevo livros e faço exposições, com a saúde
estabilizada, tomando sempre a medicação, frequentando
o apoio psicológico da ADEB e não tenho uma crise há
treze anos.
Há dois anos deixei as bebidas alcoólicas e melhorei ainda
mais.
Leio muito sobre a doença, sinto-me normal, faço aquilo
de que gosto e assumi publicamente num livro que escrevi
que tinha a doença Bipolar.
Para terminar vou dizer o seguinte a todas as pessoas
que têm a doença Bipolar: tomem a medicação e
evitem as bebidas alcoólicas, porque tiram o efeito dos
medicamentos.
Medicado, um doente Bipolar pode ter uma vida normal,
mas sem estar medicado tem muitos problemas.
Sabemos que neste mundo bipolar existem também
grandes génios, da literatura, da política e da arte.
Eu já escrevi até agora três livros de poesia, fiz doze
exposições individuais e quinze exposições coletivas de
pintura. Esta doença não tem cura, mas não mata ninguém.
Luís Carlos Lopes
REVISTA BIPOLAR
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REVISTA BIPOLAR
BALANÇO DAS COMEMORAÇÕES do DIA
MUNDIAL da SAÚDE MENTAL,
subordinado ao tema
“Encontros de Saberes e Memórias entre Gerações”.
No passado dia 12 de Outubro de 2013, no âmbito
das Comemorações do Dia Mundial da Saúde Mental
subordinado ao tema “Encontros de Saberes e Memórias
entre Gerações”, a Delegação Norte da ADEB realizou no
Auditório do Município de Matosinhos, uma Sessão Pública
em que foram apresentadas as comunicações sobre a
“Saúde Mental na Comunidade” e “Impacto da Doença na
Pessoa com Perturbação do Humor e na Família”, ambas
enquadradas no programa de ação e na consequente
função de intervenção comunitária.
A abertura da Sessão foi presidida pela Sra. Vereadora
do Pelouro da Ação Social da C. M. de Matosinhos,
Dra. Lurdes Queirós, em representação do Presidente
da Câmara, Dr. Guilherme Pinto e pelo Membro da
Direcção e Coordenador da Delegação da Região Norte
Dr. António Vieira, em representação do Presidente da
Direção Nacional da ADEB, Delfim Oliveira.
Como oradores convidados participaram o Dr. Álvaro
Carvalho (Director do Programa Nacional para a Saúde
Mental), o Dr. Jorge Bouça (Coordenador Regional da
Saúde Mental-ARSN), a Dra. Ana Venâncio (representante
do Centro Distrital da Segurança Social do Porto), o Dr.
Jaime Neto (Membro da FNERDM), a Dra. Fátima Ferreira
(Directora do Serviço de Psiquiatria da UL. de Saúde de
Matosinhos), o Dr. Paulo Horta (Médico psiquiatra do
Hospital Magalhães Lemos), a Prof. Dra. Lia Fernandes
(Médica Psiquiatra do Hospital de S. João, e Presidente
da Associação Portuguesa de Gerontopsiquiatria) e o Dr.
Adrián Gramary (Director Clínico do Hospital do Conde
Ferreira).
A realização deste evento pela ADEB insere-se
na vertente da Promoção e Educação para a Saúde
Mental, como meio de proporcionar à comunidade,
aos associados da ADEB bem como aos seus familiares,
informação especializada, permitindo aceder a elementos
fundamentais na educação para a saúde, de modo a gerar
um maior conhecimento e uma proximidade interpessoal
mais salutar.
A sessão contou com a presença de setenta pessoas,
entre as quais representantes de autarquias e unidades
de saúde, profissionais de reabilitação psicossocial,
estudantes, bem como associados e familiares e terminou
com um almoço convívio.
Este evento foi Co-Financiado pela Segurança Social:
AFEAF’2012 | Apoio Financeiro do Estado às Associações
de Família.
Orlanda Correia
outubro/2013
poesias
REVISTA BIPOLAR
15
NOTA BIOGRÁFICA
Taita M. Cunha nasceu em Huambo, Angola, em 29 de
Março de 1959. É licenciada em Engenharia Agroindustrial,
tem uma graduação em Engenharia da Qualidade e é
actualmente, doutoranda em Bioquímica.
determinado pelas relações que a pessoa faz entre
as imagens e o seu contexto. Essas relações são
únicas para cada pessoa e cada contexto, mas são
balisadas nas experiências prévias da pessoa.
Em Janeiro de 2009 começou a desenhar devido a
uma psicose. É uma autodidata. Continuou a pintar,
atravessando todas as depressões e psicoses que teve,
com o seu Cristal – a Pintura-. Grande parte dos seus
quadros foi pintada em hospitais.
Os conjuntos possuem leis próprias e estas regem os seus
elementos (e não o contrário). Só através da perceção
da totalidade é que o cérebro humano pode perceber,
descodificar e assimilar uma imagem ou um conceito.
Taíta M. Cunha tem um verdadeiro fascínio pelas cores.
Muito embora toda a sua vida tenha sido de grande esforço
e sacrifício, todos os seus trabalhos refletem Alegria,
sintonia com o Universo e uma grande Paz interior.
Os desenhos de Taita M. Cunha representam um
verdadeiro desafio à flexibilidade mental. Os múltiplos
efeitos de ilusão óptica e o facto de alguns poderem ter
leituras em várias posições, transportam a perceção visual
para o mundo da fantasia. Não basta um simples olhar para
os observar.
O resultado da percepção de um arranjo visual é
Taita M. Cunha dá vida aos seus desenhos com base no
princípio Gestalt da Psicologia de que “o todo é mais do
que a soma das partes”. Isto equivale a dizer que “A +
B” não é simplesmente “(A+B)”, mas sim um terceiro
elemento “C” que possui características próprias.
Gestalt é um termo intraduzível do alemão, utilizado para
abarcar a teoria da perceção visual baseada na psicologia
da forma.
Taita M. Cunha foi selecionada, este ano (2013), para
representar Portugal, no mais importante livro de arte
internacional que sai em Novembro, “State of the Art –
Artist’s Book”
AGUACEIROS
CANÇÃO DE EMBALAR
Até quando?
Ate quando a solidão e a dor?
Quero um verdadeiro amor
vê-lo sorrir ao chegar
e em seus braços descansar
Tenho tantos sonhos, tantos e tão belos
Porque não levaste, Mãe, um dois ou três?
Eram meus tesouros, são os teus anelos
E são tantos sonhos, tantos e tão belos
Que sempre me deste mais um dois ou três
Quando?
Quando virá a paixão
que em amor se tornará
a febre no coração
corpo e alma ao deus dará
O canto que eu canto
É voz a fluir
Da voz do encanto
Que eu gosto de ouvir
Será uma tola ambição
querer viver em sintonia
ter o desejo latente
mistura de corpo e de mente?
O todo é a soma das partes?
Amor, Sexo e Paixão
3 vertentes de 3 artes
com salpicos de razão
numa teia de ilusão
Desprograma o inconsciente,
usa a auto-sugestão
vive as emoções a quente,
solta a imaginação!
Joana Plácido
De onde a outra voz?
Que estranho doer
A fugir de nós
A sorrir a sós
Sem qualquer nascer
Em tantas cantigas
De nada passou
E em loas antigas
Triste não parou
Este coração
Meu tesouro inquieto
Chave sem razão
Com nada secreto
Voa se quiseres
Mas volta ao lugar
Se não esqueceres
O que te é voar!
Otília Ferreira

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