3 - Revista Brasileira de Terapia Intensiva

Transcrição

3 - Revista Brasileira de Terapia Intensiva
Volume 16 - Nº 3
Julho/Setembro 2004
RBTI
EDITORIAL
Estamos no Bom Caminho
Gilberto Friedman
Dr. Ratton
José Maria da Costa Orlando
123
123
SESSÃO ESPECIAL - TRABALHOS
ORIGINAIS SELECIONADOS AO PRÊMIO RATTON
Triagem Não-Invasiva para a Exclusão Diagnóstica de Pacientes
com Suspeita de Tromboembolismo Pulmonar
124
Marcos Mello Moreira1, Renato Giuseppe Giovanni Terzi2.
Fração de Recuperação do 13CO2 no Ar Expirado de Pacientes
Sépticos sob Ventilação Mecânica*
130
Maria Auxiliadora Martins1, Maria Thereza Battiston2, Francisco Antônio
Coletto3, úlio Sérgio Marchini4, Anibal Basile-Filho5.
ARTIGO ORIGINAL
138
A Scanographic Assessment of Alveolar Recruitment
and Overinflation during High Frequency Ventilation Preliminary Results in Three Patients
Silvia Regina Rios Vieira1, Qin Lu2, Jean-Jacques Rouby3
ARTIGO ORIGINAL
142
Comparação entre a Pressão Inspiratória Máxima Medida
pelo Método da Válvula Unidirecional e pelo Convencional
em Pacientes Submetidos ao Processo de Desmame da
Ventilação Mecânica Invasiva
Wellington Pereira dos Santos Yamaguti1, Luiz Antonio Alves1, Ivanil
Aparecida Moro Kauss2, Carrie Chueiri Ramos Galvan3, Antonio Fernando
Brunetto4.
ARTIGO ORIGINAL
146
O Uso de Baixos Níveis de Pressão Suporte Influencia a
Avaliação de Parâmetros de Desmame?
Júlio Flávio Fiore Júnior1; Ana Carolina Serigatto de Oliveira2; Emerson
Pinho3; Edson Benassule3; Juliana Francischini4; Luciana Dias Chiavagato5.
ARTIGO ORIGINAL
150
Incidência de Coleção Líquida em Seios da Face de Pacientes
Intubados em Unidade de Terapia Intensiva
Aline Carloni Dias Jorge¹, Rosmari Aparecida Rosa Almeida de Oliveira²,
Sílvia Maria de Toledo Piza Soares², Inês Minniti Rodrigues Pereira3,
Sebastião Araújo4
ARTIGO ORIGINAL
155
Comportamento da Função Pulmonar e da Força Muscular
Respiratória em Pacientes Submetidos à Revascularização do
Miocárdio e a Intervenção Fisioterapêutica
Audrey Borghi e Silva1, Pires Di Lorenzo, V.A.1, Cláudio Ricardo de
Oliveira2, Sérgio Luzzi3
ISSN 0103-507X
ARTIGO ORIGINAL
160
Síndrome Cardiopulmonar por Hantavírus. Relato de Sete
Casos no Centro-Oeste do Brasil
Wagner Marques Pereira Malheiros1, Carlos José Alves2, Gilberto Paulo
Pereira Franco3, Abdon Salam Khaled Karhawi4, Marcos Vinícius Paes de
Barros5. Michelli Silva Daltro Coelho6, Mabel da Silva Gallina6, Paloma
Borges dos Santos6.
NEUROINTENSIVISMO ARTIGO ORIGINAL
164
Estudo Epidemiológico do TCE em Unidade de Terapia
Intensiva Geral como Resultado da Adesão ao Latin American
Brain Injury Consortium
Cláudio Piras1, Luís Vicente Forte2, Cássio Morano Peluso2, Ed Moreira
Lima1, Mirto Nelson Prandini3.
CONSENSO BRASILEIRO DE SEPSE –
Parte II
Distúrbios de Coagulação
170
Flávia R. Machado1, Eliézer Silva2, Werther Brunow de Carvalho3.
Terapia Nutricional na Sepse
175
Paulo César Ribeiro1
Tratamento: Suporte Ventilatório
179
Coordenação: Carmen Sílvia Valente Barbas1, Marcelo Britto Passos
Amato2, Carlos Roberto Ribeiro Carvalho3
Analgesia e Sedação em Sepse
182
José Luiz Gomes do Amaral1, Ana Paula Resque2, Hélio Penna Guimarães3,
Antônio Capone Neto4, Fábio Santana Machado5, Rachel Moritz6
ARTIGO DE REVISÃO
Disfunção Miocárdica na Sepse
185
Ludhmila Abrahão Hajjar1, Constantino José Fernandes Júnior2, Erick
Sessa Mercon1, Aécio Flavio T Góis1, Elias Knobel2 , Liliane Kopel3 , Silvia
Gelas Lage4
ARTIGO DE REVISÃO
192
O Uso de Isótopos Estáveis no Estudo da Cinética Protéica
em Medicina Intensiva
Anibal Basile Filho1, Júlio Sérgio Marchini2
ARTIGO DE REVISÃO
Insuflação Traqueal de Gás
197
Andréa Diogo Sala1, José Otávio Costa Auler Júnior2
RELATO DE CASO
Amaurose Cortical Pós-Parto. Relato de Caso
201
Wladmir Faustino Saporito1, Marcelo Eduardo Sproesser1, Fábio José
Concilio Fucci1, Adilson Casemiro Pires2
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
SUMÁRIO
Fundada em 1980
Diretoria para o Biênio
2004-2005
Presidente
José Maria da Costa Orlando
ARTIGO ORIGINAL
EDITORIAL
Estamos no Bom Caminho
123
Gilberto Friedman
Dr. Ratton
Vice-Presidente
Waldemar Henrique Fernal
1º Secretário
Marcelo Moock
2º Secretário
Luiz Alexandre A. Borges
1º Tesoureiro
Rosa G. Alheira Rocha
2º Tesoureiro
Afonso José Celente Soares
Associação de Medicina
Intensiva Brasileira
Rua Domingos de Moraes,
814 Bloco 2 – Conj. 23
Vila Mariana –
CEP 04010-100
São Paulo – SP
Tel.: (11) 5575-3832
[email protected]
Indexada na base de
dados Lilacs
A REVISTA BRASILEIRA
DE TERAPIA INTENSIVA reserva-se todos os
direitos, inclusive os de
tradução, em todos os
países signatários da
Convenção Pan-Americana e da Convenção
Internacional sobre os
Direitos Autorais. Os trabalhos publicados terão
seus direitos autorais
resguardados pela AMIB,
que em qualquer situação agirá como detentora dos mesmos.
123
Audrey Borghi e Silva1, Pires Di Lorenzo, V.A.1, Cláudio
Ricardo de Oliveira2, Sérgio Luzzi3
José Maria da Costa Orlando
SESSÃO ESPECIAL - TRABALHOS
ORIGINAIS SELECIONADOS
AO PRÊMIO RATTON
ARTIGO ORIGINAL
124
Marcos Mello Moreira1, Renato Giuseppe Giovanni Terzi2.
130
Maria Auxiliadora Martins1, Maria Thereza Battiston2,
Francisco Antônio Coletto3, úlio Sérgio Marchini4, Anibal
Basile-Filho5.
138
A Scanographic Assessment of Alveolar
Recruitment and Overinflation during High
Frequency Ventilation - Preliminary Results
in Three Patients
Silvia Regina Rios Vieira1, Qin Lu2, Jean-Jacques Rouby3
142
Comparação entre a Pressão Inspiratória
Máxima Medida pelo Método da
Válvula Unidirecional e pelo
Convencional em Pacientes Submetidos
ao Processo de Desmame da Ventilação
Mecânica Invasiva
146
O Uso de Baixos Níveis de Pressão Suporte
Influencia a Avaliação de Parâmetros de
Desmame?
Júlio Flávio Fiore Júnior1; Ana Carolina Serigatto de
Oliveira2; Emerson Pinho3; Edson Benassule3; Juliana
Francischini4; Luciana Dias Chiavagato5.
ARTIGO ORIGINAL
164
Estudo Epidemiológico do TCE em Unidade de
Terapia Intensiva Geral como Resultado da Adesão
ao Latin American Brain Injury Consortium
Cláudio Piras1, Luís Vicente Forte2, Cássio Morano Peluso2,
Ed Moreira Lima1, Mirto Nelson Prandini3.
CONSENSO BRASILEIRO DE
SEPSE – Parte II
Distúrbios de Coagulação
170
Terapia Nutricional na Sepse
175
Tratamento: Suporte Ventilatório
179
Analgesia e Sedação em Sepse
182
ARTIGO DE REVISÃO
185
Flávia R. Machado1, Eliézer Silva2, Werther Brunow de Carvalho3.
Paulo César Ribeiro1
Coordenação: Carmen Sílvia Valente Barbas1, Marcelo Britto
Passos Amato2, Carlos Roberto Ribeiro Carvalho3
José Luiz Gomes do Amaral1, Ana Paula Resque2, Hélio Penna
Guimarães3, Antônio Capone Neto4, Fábio Santana Machado5,
Rachel Moritz6
Wellington Pereira dos Santos Yamaguti1, Luiz Antonio
Alves1, Ivanil Aparecida Moro Kauss2, Carrie Chueiri Ramos
Galvan3, Antonio Fernando Brunetto4.
ARTIGO ORIGINAL
Wagner Marques Pereira Malheiros1, Carlos José Alves2,
Gilberto Paulo Pereira Franco3, Abdon Salam Khaled Karhawi4,
Marcos Vinícius Paes de Barros5. Michelli Silva Daltro Coelho6,
Mabel da Silva Gallina6, Paloma Borges dos Santos6.
NEUROINTENSIVISMO ARTIGO ORIGINAL
Fração de Recuperação do 13CO2 no
Ar Expirado de Pacientes Sépticos sob
Ventilação Mecânica*
ARTIGO ORIGINAL
160
Síndrome Cardiopulmonar por Hantavírus.
Relato de Sete Casos no Centro-Oeste do Brasil
Triagem Não-Invasiva para a Exclusão
Diagnóstica de Pacientes com Suspeita
de Tromboembolismo Pulmonar
ARTIGO ORIGINAL
155
Comportamento da Função Pulmonar e da Força
Muscular Respiratória em Pacientes Submetidos
à Revascularização do Miocárdio
e a Intervenção Fisioterapêutica
150
Incidência de Coleção Líquida em Seios da
Face de Pacientes Intubados em Unidade de
Terapia Intensiva
Aline Carloni Dias Jorge¹, Rosmari Aparecida Rosa Almeida
de Oliveira², Sílvia Maria de Toledo Piza Soares², Inês Minniti
Rodrigues Pereira3, Sebastião Araújo4
Disfunção Miocárdica na Sepse
Ludhmila Abrahão Hajjar1, Constantino José Fernandes
Júnior2, Erick Sessa Mercon1, Aécio Flavio T Góis1, Elias
Knobel2 , Liliane Kopel3 , Silvia Gelas Lage4
ARTIGO DE REVISÃO
192
O Uso de Isótopos Estáveis no Estudo da
Cinética Protéica em Medicina Intensiva
Anibal Basile Filho1, Júlio Sérgio Marchini2
ARTIGO DE REVISÃO
197
Insuflação Traqueal de Gás
Andréa Diogo Sala1, José Otávio Costa Auler Júnior2
RELATO DE CASO
201
Amaurose Cortical Pós-Parto. Relato de Caso
Wladmir Faustino Saporito1, Marcelo Eduardo Sproesser1,
Fábio José Concilio Fucci1, Adilson Casemiro Pires2
119
RBTI
REVISTA BRASILEIRA DE
TERAPIA INTENSIVA
CORPO EDITORIAL
Editor Chefe
Gilberto Friedman
Professor de Medicina, Faculdade de Medicina,
Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
Porto Alegre, RS, Brasil.
Conselho Consultivo
Cleovaldo S Pinheiro, Professor de
Medicina, Faculdade de Medicina, Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre,
RS, Brasil.
Rachel Moritz, Professor de Medicina,
Faculdade de Medicina, Universidade Federal
de Santa Catarina, Porto Alegre, SC, Brasil.
Werther B. de Carvalho, Professor de
Medicina, Escola Paulista de Medicina,
Universidade Federal de São Paulo, SP, Brasil.
Diretor de Publicações AMIB
José O Auler, Professor de Medicina,
Faculdade de Medicina, Universidade de São
Paulo, SP, Brasil.
Editores de Sessão
Revisão:
Renato G. Terzi, Professor de Medicina,
Faculdade de Medicina, Universidade de
Estadual de Campinas, SP, Brasil.
Pediatria:
Jefferson Piva, Professor de Medicina,
Faculdade de Medicina, Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul e Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre,
RS, Brasil.
Enfermagem:
Denis Moura Faria Jr, Enfermeiro Master
do CTI do Hospital Israelita Albert Einstein, São
Paulo, SP, Brasil.
Fisioterapia:
Antonio Duarte, Coordenador do
Departamento de Fisioterapia do Hospital
Português, Salvador, Bahia, Brasil.
Conselho Editorial
Alberto Biestro, Professor de Medicina,
Faculdade de Medicina, Universidade da
República, Montevidéu, Uruguai.
Álvaro Réa Neto, Professor de
Medicina, Faculdade de Medicina, Universidade
Federal do Paraná, PR, Brasil.
Andre Kalil, Assistant Professor of
Medicine, University of Nebraska, EUA
Anibal Basile-Filho, Professor de Medicina,
Faculdade de Medicina,, Ribeirão Preto,
Universidade de São Paulo, SP, Brasil
Arnaldo Dubin, Professor de Medicina,
Faculdade de Medicina, Universidade de
La Plata, La Plata, Argentina.
Carlos Carvalho, Professor de Medicina,
Faculdade de Medicina, Universidade de
São Paulo, SP, Brasil.
Cid Marcus David, Professor de Medicina,
Faculdade de Medicina, Universidade Federal
do Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Daniel Garros, Pediatric Intensive Care
Unit, Stollery Children’s Hospital, University of
Alberta, Edmonton, Canada
Dinis R. Miranda, Professor de Medicina,
Escola de Medicina, Universidade de
Gröningen, Holanda.
Ederlon C. Rezende, Diretor da UTI,
Hospital Público do Servidor Estadual, São
Paulo, SP, Brasil.
Eduardo Troster, Professor de Pediatria da
Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo, São Paulo, SP, Brasil.
Eliézer Silva, Professor de Medicina,
Universidade de Santo Amaro, SP, Brasil.
Felipe Dal Pizzol, Professor de Medicina,
Departamento de Medicina, Laboratório de
Fisiopatologia Experimental, Universidade do
Extremo Sul Catarinense, Criciúma, SC, Brasil.
Francisco J. Hurtado, Professor
de Medicina, Faculdade de
Medicina, Universidade da
República, Montevidéu, Uruguai.
Glenn Poblette Hernandez, Professor de
Medicina, Faculdade de Medicina, Pontifícia
Universidade Católica do Chile, Santiago, Chile.
Hervaldo Sampaio Carvalho, Professor de
Medicina, Universidade de Brasília, Brasil.
Humberto Correa, Professor de Medicina,
Faculdade de Medicina, Universidade da
República, Montevidéu, Uruguai.
Luis F. Poli de Figueiredo, Departamento
de Cardiopneumologia, Instituto do Coração,
Escola de Medicina, Universidade de São
Paulo, Sao Paulo, SP, Brasil.
Márcio Borges Sá, Investigador Associado,
Facultade de Medicina, Universidade
Complutense, Madrid, Espanha.
Maria Cecília Bueno Jayme Gallani,
Professora de Enfermagem, Faculdade de
Ciências Médicas da Universidade Estadual de
Campinas, Campinas, SP, Brasil.
Maria de Fátima F. Vattimo, Professora
de Enfermagem, Escola de Enfermagem,
Universidade de São Paulo, SP, Brasil.
Natan Weksler, Assistant Professor on
Anesthesiology and Critical Care Medicine,
Faculty of Health Sciences, Ben Gurion
University of the Negev, Beer Sheva, Israel
Patricia M. Veiga de C Mello, Professora de
Medicina, Faculdade de Medicina, Universidade
Estadual do Piauí, Teresina, Piauí, Brasil.
Pedro C. R. Garcia, Professor de
Medicina, Faculdade de Medicina,
Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil.
Raffo Escalante Kanashiro, Universidad
Nacional Federico Villarreal, Instituto
Especializado de Salud del Niño, Unidad de
Cuidados Intensivos, Lima Peru
Roberto Machado, Associate Investigator,
Laboratory of Chemical Biology, Critical Care
Department, Clinical Center, National Institutes
of Health, Bethesda, EUA
Roque Aras Junior, Professor de
Medicina, Faculdade de Medicina,
Universidade Federal da Bahia, Brasil.
Rui Paulo Jinó Moreno, Professor de
Medicina, Universidade Católica Portuguesa,
Lisboa, Portugal.
Sayonara de Fátima Faria Barbosa,
Professora de Enfermagem, Universidade Federal
de Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil.
Sebastião Araújo, Professor de
Medicina, Faculdade de Medicina, Universidade
Estadual de Campinas, SP, Brasil.
Silvia Regina Rios Vieira,
Professora de Medicina, Faculdade de
Medicina, Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil.
Suzana Lobo, Professora de Medicina,
Escola de Medicina, FUNFARME,
São José do Rio Preto, São Paulo, Brasil.
Jornalista Responsável
Marcelo Sassine - Mtb 22.869
Diretora de Arte
Anete Salviano
Projeto Gráfico e Produção Editorial
MWS Design
Fone: (11) 3399-3028 - www.amws.com.br
A correspondência para publicação deve ser endereçada para:
RBTI - Revista Brasileira de Terapia Intensiva
AMIB
Rua Domingos de Moraes, 814 – Bloco 2 – Conj. 23 - Vila Mariana – CEP 04010-100 – São Paulo – SP
Tel.: (11) 5575-3832 E-mail:[email protected]
120
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
NORMAS PARA PUBLICAÇÃO NESTA REVISTA
O escopo do jornal
RBTI é um jornal médico com revisão crítica que objetiva melhorar o
cuidado dos pacientes agudamente doentes através da discussão, distribuição e
promoção de informação baseada em evidência relevante aos profissionais envolvidos com medicina intensiva. O jornal publica comentários, revisões e pesquisa
em todas estas áreas do conhecimento relacionadas aos cuidados intensivos do
paciente grave.
Informação Geral
RBTI acolhe pesquisa de alta qualidade em qualquer aspecto relacionado ao
cuidado intensivo. Todos os trabalhos submetidos serão revisados. Todos os revisores são solicitados a responderem sua decisão inicial em 4-6 semanas.
Os autores são solicitados a garantir que nenhum material infrinja direito
autoral existente ou direito de uma terceira parte. Os autores que publicam com o
RBTI, retêm o direito autoral de seu trabalho.
Os artigos devem ser em português, espanhol ou inglês.
Instruções para os autores de artigos de pesquisa
A submissão de um artigo de pesquisa relatando pesquisa experimental em
humanos ou animais implica que os autores obtiveram aprovação para a sua pesquisa do comitê de ética apropriado, e estão em concordância com a Declaração de
Helsinki. Uma declaração deste efeito precisa estar incluída na sessão “Pacientes
e Métodos” do seu artigo.
Para todos os artigos que incluem informação ou fotografias clinicas relacionadas a pacientes individuais, um consentimento escrito e assinado de cada
paciente para publicar também precisa ser enviado por correio ou fax ao escritório
da revista. O manuscrito deve incluir uma declaração deste efeito na sessão de
“Agradecimentos” como a seguir: “Consentimento escrito foi obtido do paciente
ou seu parente para publicação do estudo”.
Nomes Genéricos das drogas devem ser usados. Quando nomes comerciais
são usados na pesquisa, estes nomes devem ser incluídos entre parênteses na sessão “Pacientes e Métodos”.
Como eu organizo meu artigo de pesquisa?
Todos os artigos de pesquisa devem incluir as seguintes sessões:
Página Título:
O titulo completo do artigo
Os nomes completos de todo os contribuintes
Todos os títulos/posições dos contribuintes (assistente, diretor, ou residente)
O endereço completo (incluindo telefone, fax e email) do autor para correspondência.
Resumo:
Não ter mais que 250 palavras
Ser estruturado com os mesmos cabeçários usados no texto principal.
Mencionar todas as palavras chaves
Refletir acuradamente todas as sessões do texto principal
Todos os trabalhos deverão ser acompanhados de um Abstract (resumo traduzido), necessariamente em inglês
Palavras chaves: ver sessão abaixo
Introdução - esta sessão deve ser escrita do ponto de vista dos pesquisadores sem conhecimento de especialista na área e deve claramente oferecer – e, se
possível, ilustrar – a base para a pesquisa e seus objetivos. Relatos de pesquisa
clínica devem, sempre que apropriado, incluir um resumo da pesquisa da literatura
para indicar porque o estudo foi necessário e o que o estudo visa contribuir para
o campo. Esta sessão deve terminar com uma breve declaração do que está senso
relatado no artigo.
Pacientes e métodos - deve incluir o desenho do estudo, o cenário, o tipo de
participantes ou materiais envolvidos, a clara descrição das intervenções e comparações, e o tipo de análise usado, incluindo o poder de cálculo se apropriado.
Resultados e discussão - os resultados e discussão podem ser combinadas
em uma sessão única ou apresentados separadamente. Resultados da análise estatística deve incluir, quando apropriado, riscos relativo e absoluto ou reduções de
risco, e intervalos de confiança. A sessão de resultados e discussão pode também
ser quebrada em sub-sessões com leituras curtas e informativas.
Conclusões - deve discorrer claramente as conclusões principais da pesquisa
e fornecer uma clara explicação da sua importância e relevância.
Referências – Nós preferimos que não exceda 30 referências. Para formatar a
referência veja a sessão abaixo’ Como eu formato as referências?’.
Figuras e Tabelas: Estas devem ser mantidas separadas do texto principal do
artigo. Veja abaixo ‘Figuras e tabelas’ para maiores informações.
Agradecimentos: ver sessão abaixo
Instruções para os autores de artigo de revisão
O artigo de revisão é uma descrição compreensiva de certo aspecto de cuidado de saúde relevante ao escopo do jornal. Deve conter não mais que 2000
palavras e 50 referências. Existem três tipos principais de revisões:
Revisões científicas - descrevendo ciência que podem ter impacto clínico
Revisões “bancada a beira do leito” - descrevendo ciência que suportam
situações clínicas
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
Revisões Clínicas - descrevendo puramente situações clínicas
Claramente, estes três tipos de revisões possuem o potencial de se sobrepor,
mas o objetivo de dividir o jornal nesta maneira é ajudar os leitores achar o tipo de
material que estão procurando.
Como eu organizo meu artigo de revisão?
Todos os artigos de revisão devem ser divididos nas seguintes sessões:
Página Título:
O título completo do artigo
Os nomes completos dos contribuintes
Todos os títulos/posições dos contribuintes (como assistente, diretor, ou
residente)
O endereço completo (incluindo telefone, fax e email) do autor correspondente.
Resumo:
Não ter maus que 250 palavras
Ser estruturado como o texto principal.
Mencionar todas as palavras chave
Refletir acuradamente todas as sessões do texto principal
Todos os trabalhos deverão ser acompanhados de um Abstract (resumo traduzido), necessariamente em inglês
Palavras Chave: ver sessão abaixo
Abreviações: ver sessão baixa
Referências: listar o máximo de 50 referências. Para formatar a referência
veja a sessão na página ao lado “Como eu formato as referências?”
Figuras e Tabelas: Estas devem ser mantidas separadas do texto principal do
artigo. Veja abaixo ‘Figuras e tabelas’ para maiores informações.
Deve haver, também, a sessão de métodos que relaciona as fontes de evidência usadas. Se você procurou numa bibliografia eletrônica como Medline, por
favor, liste as palavras usadas para realizar a procura.
Instruções para autores de um comentário?
Comentários são curtos (800-1000 palavras, excluindo o resumo), artigos de
opinião escritos por especialistas e lidos pela comunidade médica em geral. Muitos são solicitados, contudo os não solicitados são bem vindos e são rotineiramente revisados. O objetivo do comentário é destacar algo, expandindo os assuntos
destacados, e sugerir o que deve acontecer em seguida.
Qualquer declaração deve ser acompanhada por uma referência, mas nós preferimos que a lista de referências não exceda 15. Para a leitura, sentenças devem
ser curtas e objetivas. Use subtítulos para quebrar o comentário em sessões.
Por favor, lembre que, apesar de muitos de nossos leitores serem especialistas, eles podem não ser especialistas na sua área e assim você necessitar explicar
toda a terminologia e acrônimos a primeira vez que eles são usados. Por favor,
providencie uma lista alfabética de todas abreviações.
Assim como os comentários gerais também existem os tipos específicos:
Debates clínicos Pro/con
Dois autores convidados discutem suas diferentes opiniões sobre um assunto
clínico especifico. Os assuntos são levantados através de cenários clínicos escritos
pelo editor de sessão.
Cada autor é solicitado a escrever um artigo referenciado de 500-palavras,
descrevendo se eles concordam ou discordam com o cenário clínico (pro ou con).
Os artigos contrários são mostrados aos autores para uma resposta de não mais
que 100 palavras. Os autores sabem quem é seu oponente mas não podem ver o
artigo oposto até terem submetido seu. Não deve haver mais que 10 referências
no artigo de 500-palavras, e 2 referências na resposta de 100-palavras. Nós preferimos referências de estudos randomisados e controlados publicados nos últimos
10 anos.
Comentários de Pesquisas
Nossos artigos de pesquisa são freqüentemente acompanhados por comentários. Os mesmos visam descrever as qualidades e/ou deficiências da pesquisa, e
suas implicações mais amplas. O artigo de pesquisa discutido deve ser a primeira
referência do comentário.
Comentários publicações recentes
Artigos de pesquisa publicados são escolhidos pelo conselho editorial nos
últimos seis meses e os relata na forma de um comentário.
Como EU organizo meu comentário?
Todos os comentários devem incluir as seguintes sessões:
Página Título: deve listar todos os títulos/posições dos contribuintes e
endereços completos (incluindo telefone, fax e email), e deve indicar o autor
correspondente
Resumo: não deve ter mais que 100 palavras e deve mencionar todas as
palavras-chave (não se aplica a debates pro/con). Todos os trabalhos deverão ser
acompanhados de um Abstract (resumo traduzido), necessariamente em inglês
Palavras-chave: ver sessão abaixo
Abreviações: ver sessão abaixo
Texto Principal: veja ‘O que é um comentário’ para esclarecimento.
Subtítulos: Nós encorajamos o uso de subtítulos no seu texto.
121
NORMAS PARA PUBLICAÇÃO NESTA REVISTA
Instruções para os autores de cartas
Nós damos boas vindas a comentários em qualquer artigo publicado no
jornal. Cartas usualmente não são revisadas, mas, ocasionalmente, nós podemos
convidar respostas as cartas para publicação no mesmo número da revista. Nós
preferimos cartas com menos de 400 palavras e que contenham cinco ou menos
referências (a primeira delas a ser referida deve ser o artigo do RBTI ao qual a
carta se refere). Os autores devem também providenciar seus dados e endereço
completo (incluindo telefone, fax, e email). Todas as cartas são editadas; a versão
editada é enviada para os autores para aprovar antes da publicação.
Palavras chave: ver sessão abaixo
Agradecimentos: ver sessão baixo
Referências
Nós preferimos que a lista de referências não exceda 30. Para formatar a
referência veja a sessão abaixo ‘Como eu formato as referências?’.
Figuras e Tabelas
Estas devem ser mantidas separadas do texto principal do artigo. Veja abaixo
‘Figuras e tabelas’ para maiores informações.
Agradecimentos
Estes devem ser concisos. Os autores devem usar esta sessão se eles gostariam agradecer o financiamento da pesquisa ou outra ajuda de organismos
acadêmicos; ajuda de colegas ou colaboradores podem também ser mencionados.
Os autores devem obter permissão para agradecer a todos mencionados nos agradecimentos.
Interesses conflitantes
Os autores correspondentes são solicitados a assinar o nosso formulário de
interesses conflitantes em nome de todos os contribuintes. Por favor, mencione
qualquer ajuda, financeira ou outra qualquer, de entidades comerciais.
Como EU envio meu artigo?
Todos os artigos (incluindo as figuras) podem ser enviados ao escritório
editorial como anexos a emails. Eles devem ser menores que 1000Kb. Nós não
requeremos uma cópia impressa.
Nós aceitamos a maioria dos programas Word, em formatos PC.
Em todo caso, envie também o texto como um arquivo txt para evitar problemas de processamento do arquivo.
Se existem figuras, estas devem também ser enviadas como anexos a emails,
os quais devem ser enviados ao escritório editorial. Para maiores informações
sobre figuras, por favor, veja a sessão; ‘Figuras e tabelas’.
Se necessário, nós podemos aceitar também disquetes, e CD-ROMs. Por
favor, identifique os disquetes com os nomes dos autores’, o processador de texto
e a versão usada.
Se o disquete e o manuscrito diferirem, o manuscrito será tomado como a
versão definitiva.
Para evitar problemas com os arquivos, por favor:
Digite o texto não justificado e sem quebra de palavras com hífens.
Não use notas de rodapé.
Espaço duplo ao longo do texto.
Evite a inclusão de números de páginas.
Use o caracter ASCII se possível para caracteres especiais (e.g. letras gregas
e símbolos matemáticos); se você é incapaz de reproduzir um caracter especial
no seu arquivo, explique no seu email ou escreva em papel e envie ao escritório
editorial.
O que acontece uma vez que eu submito o meu artigo?
O escritório editorial agradece a todas submissões. Após, potencialmente
existem seis estágios:
O conselho editorial assegura que o artigo de pesquisa enquadra-se no escopo
do jornal
Se o artigo enquadra-se no escopo do jornal, três revisores sugeridos pelo
editor são convidados a revisar o artigo. Ele é revisado para estrutura, gramática,
e estilo do jornal.
O editor aconselha o conselho editorial se o artigo deve ser aceito, revisto
pelos autores ou rejeitado baseado nos relatos dos revisores.
O conselho editorial toma a decisão final e os autores são informados.
Nós temos como objetivo fornecer uma decisão inicial dentro de 4-6. Se o
artigo de pesquisa é aceito, ele é copiado, editado, formatado, e enviado ao autor
correspondente para verificação. Você será então solicitado a assinar nosso formulário de direitos autorais e separatas e nosso formulário de interesses conflitantes.
Como EU formato as referências?
Use as abreviações de revistas encontradas no Index Medicus/Medline. As
citações no texto devem ser feitas entre parênteses, correspondendo às respectivas referências listadas por ordem cronológica, não-alfabética. Estas devem ser
listadas ao final na ordem que aparecem no texto. Cada referência deve ter um
número individual de referência (não parte ‘a’ e parte ‘b’, por exemplo). Por favor,
evite um excesso de referências. O conselho editorial pode solicitar a redução do
número de referências antes do aceite.
Os livros devem ser referidos pelo autor, título, cidade-sede da casa editora,
122
nome da casa editora, número da edição (a partir da 2ª), volume, ano da impressão, e páginas inicial e final citadas. Se se tratar de capítulo de livro, fazer constar:
autor do capítulo, título do capítulo, a palavra In (grifada), dois pontos, nome
dos editores indicando com a abreviação eds., título do livro (grifado), cidade da
editora, nome da editora, nº da edição (a partir da 2ª), volume, ano da publicação,
páginas citadas. Quando o artigo tiver mais de três autores deverão ser citados os
três primeiros seguidos de et al.
Apenas artigos que foram publicados ou que estão em impressão podem ser
citados; material não publicado não deve ser incluído na lista de referências, mas
pode ser incluído no texto. A obtenção de permissão para citar dados na forma de
comunicações pessoais é de responsabilidade do autor(s), que deve incluir uma
confirmação escrita, que a permissão foi obtida com o manuscrito submetido.
EXEMPLO DE REFERÊNCIAS
Artigo de jornal
Baumann WR, Jung RC, Koss M et al. Incidence and mortality of adult
respiratory distress syndrome: a prospective analysis from a large metropolitan
hospital. Crit Care Med 1986; 14 :1-4.
Artigo de suplemento
Walker LK: Use of extracorporeal membrane oxygenation for preoperative
stabilization of congenital diaphragmatic hernia. Crit Care Med 1993, 21(suppl):
S379-S380.
Livro
Doyle AC: Biological Mysteries Solved, 2nd Ed, London: Science Press, 1991.
Capítulo de livro
Lachmann B, van Daal GJ: Adult respiratory distress syndrome: animal
models. In Pulmonary Surfactant. Edited by Robertson B, van Golde LMG, Batenburg JJ. Amsterdam: Elsevier, 1992:635-663
Resumo publicado
Varvinski AM, Findlay GP: Immediate complications of central venous cannulation in ICU [abstract]. Crit Care 2000, 4(suppl 1):P6.
Artigo In press
Kharitonov SA, Barnes PJ: Clinical aspects of exhaled nitric oxide. Eur
Respir J, in press.
Figuras, Ilustrações, Fotografias e Tabelas
Figuras e tabelas devem iniciar com o título que descreve a figura total. Tabelas não devem incluir linhas verticais. Elas não devem tomar mais espaço que
duas páginas no jornal impresso, incluindo seus títulos e legendas. Elas devem
ser mantidos separadas do texto principal do artigo, contendo suas respectivas
legendas e assinalando sua exata localização no texto. Somente serão aceitas as
ilustrações que permitirem boa reprodução.
Se as fotografias forem enviadas diretamente ao escritório, essas não devem
ser identificadas diretamente nas mesmas; não escreva no verso das cópias em
papel, mas anexe a identificação com os nomes dos autores e o número da figura.
Os autores são encorajados a submeter figuras em formato eletrônico de alta
qualidade. A resolução mínima para as figuras é 300 dpi. Por favor, lembre que a
reprodução pode reduzir qualidade da figura, assim providencie a mais alta resolução possível, e lembre que a redução do tamanho da figura irá também reduzir
o tamanho do label.
Formatos Eletrônicos: por favor, estes são os formatos de arquivo preferidos:
TIFF (formato preferido para fotos/imagens; mínimo 300 dpi)
Portable Document Format (PDF)
CorelDraw
PowerPoint
Arquivo de Figura podem ser submetidos por email. Alternativamente, os
arquivos podem ser submetidos em disquete ou CD-ROM.
Unitermos
Não mais que cinco palavras chave devem ser listadas em ordem alfabética.
Por favor, garanta que as palavras chave são achadas na lista do Medical Subject
Headings (MeSH) do Index Medicus. Estas palavras podem ser procuradas no
browser da National Library of Medicine’s MeSH.
Abreviações
Acrônimos e outras abreviações devem ser listadas em ordem alfabética. Por
favor, lembre que apesar dos seus leitores serem médicos, eles podem não ser
especialistas no seu campo específico e assim você precisa explicar a terminologia
e os acrônimos a primeira vez que eles são usados. Por favor, forneça uma lista
alfabética de todas as abreviações usadas.
Políticas de publicação do RBTI
Publicação
Submissão de um artigo ao RBTI implica que todos contribuintes leram e
concordam com seu conteúdo. O artigo não foi ainda publicado em outro jornal e
não deve estar em consideração por nenhum outro jornal.
Direitos autorais
Para artigos de pesquisa (incluindo qualquer material suplementar) e revisão,
o direito autoral é dos autores.
Os direitos de todo material publicado na RBTI pertence ao jornal.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / EDITORIAL
Estamos no Bom Caminho
Estamos crescendo. Nesta RBTI, vocês leitores poderão
se deliciar com um número inédito de trabalhos originais e
de revisão. Alguns trabalhos selecionados entre os melhores
do nosso último Congresso em Curitiba e que concorreram
ao Prêmio Ratton poderão ser lidos. A segunda parte do
Consenso Brasileiro de Sepse também poderá ser apreciada. Esta RBTI prova que se nós, intensivistas, trabalharmos
pelo seu crescimento ela poderá ser indexada. Falta pouco!
Eu, como o Editor-Chefe, só posso agradecer as inúmeras
contribuições, das mais variadas origens, que permitiram
este crescimento. Agradeço a AMIB que permitiu criar
uma estrutura mínima de secretaria com o trabalho de qua-
lidade da Evanilde e pela iniciativa de criar e viabilizar o
prêmio Ratton. Aos colegas intensivistas de todo o Brasil
que entenderam e atenderam a nossa chamada por trabalhos científicos.
Se mantivermos a quantidade e qualidade de trabalhos
encontradas nesta RBTI, a nossa revista poderá ser indexada
até o início de 2005. Um sonho? Ora, quem já não teve sonhos realizados......?
O meu muito obrigado deste editor otimista,
Gilberto Friedman
Editor Chefe da RBTI
Dr. Ratton
Assim era conhecido o Dr. José Luiz de Amorim Ratton,
médico intensivista por excelência, que se foi há pouco tempo.
Formado em 1964, na Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, apaixonou-se pela Medicina
Intensiva ao trabalhar na primeira UTI de Minas Gerais, na
segunda metade da década de 60.
Ficou muito conhecido por sua proficiência e pelo rigor
com que coordenava a UTI do Hospital Governador Israel
Pinheiro, em Belo Horizonte.
Foi cumpridor absoluto de suas obrigações e extremamente dedicado aos pacientes, além de exigir total obediência
às normas da Unidade, por parte de todos que nela trabalhavam. Este comportamento lhe valeu algumas incompreensões e dissabores.
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
Sócio fundador da AMIB e da Regional de Minas (SOMITI) participou ativamente e, continuamente, do movimento associativo em defesa da Medicina Intensiva.
Presidiu o congresso da AMIB 2000, em Belo Horizonte,
com total dedicação e brilho. Deixou uma legião de admiradores e seguidores na Medicina Intensiva.
Foi feliz a AMIB ao criar o Prêmio Ratton, entregue pela
primeira vez no Congresso deste ano, em Curitiba, em emocionante cerimônia.
Será sempre lembrado com saudade e admiração por todos que o conheceram e com ele aprenderam e conviveram.
José Maria da Costa Orlando
Presidente da AMIB
123
RBTI / SESSÃO ESPECIAL
TRABALHOS ORIGINAIS SELECIONADOS AO PRÊMIO RATTON
Triagem Não-Invasiva para a Exclusão Diagnóstica de
Pacientes com Suspeita de Tromboembolismo Pulmonar*
Noninvasive Screening for Diagnostic Exclusion of Patients with Suspected Pulmonary Thrombolism
Marcos Mello Moreira1, Renato Giuseppe Giovanni Terzi2.
SUMMARY
BACKGROUND AND OBJECTIVES: Present methods to diagnose pulmonary embolism (PE) are of relative risk, invasive,
expensive and not always available. A search for noninvasive, inexpensive and available diagnostic methods at the bedside
justifies this investigation. The objective of this paper is to report the correlation of the late dead space fraction (fDlate) with
pulmonary scintigraphy, spiral computed tomography and pulmonary angiography in patients with suspected PE.
METHODS: Prospective observational study in a University Hospital. 46 patients admitted to the hospital from January 2002
to January 2004 with clinical suspicion of PE underwent volumetric capnography (CO2SMO PLUS DX 8100) and arterial
blood gas analysis to permit the calculation of fDlate (PaCO2 – P(15%CPT)CO2) / PaCO2).
RESULTS: Employing a cutoff value of 0.12 as proposed by Eriksson, fDlate resulted true positive in 20 patients, false positive
in 5 patients and true negative in 20 patients. One patient with an fDlate of -0.23 resulted false negative. Analysis resulted
in a 95% sensitivity and 80% specificity.
CONCLUSIONS: As a single variable fDlate was not sufficient to diagnose PE. However, if combined with a DD assay, it
could be an acceptable method to exclude the diagnosis of PE.
Key Words: Pulmonary embolism; dead space airway, physiologic and alveolar; arterial pressure carbon dioxide; end-tidal
carbon dioxide; capnography; D-dimers; fDlate
O
tromboembolismo pulmonar (TEP) é uma entidade de difícil diagnóstico. Seus sinais e sintomas
são variados e inespecíficos1. As necrópsias revelam que o TEP é uma ocorrência mais freqüente do que
o suspeitado em vida e que os resultados anatomopatológicos são freqüentemente discrepantes da clínica2. É uma
doença cuja mortalidade na primeira hora é de 12%3,4, e
atinge 30% naqueles onde o diagnóstico não é realizado5,6,
logo, a pronta instituição da terapêutica, está diretamente
relacionada com o sucesso do tratamento. Em pacientes
que foram submetidos a tratamento adequado com heparinização sistêmica, a mortalidade diminuiu para 8%7,8.
A cintilografia pulmonar normal, virtualmente, exclui
o diagnóstico de TEP. Entretanto, de acordo com o Prospective Investigation of Pulmonary Embolism Diagnosis
(PIOPED)8, a maior parte dos pacientes com TEP não tem
uma cintilografia de alta probabilidade. Freqüentemente, a
cintilografia pulmonar não é suficiente para estabelecer um
diagnóstico definitivo. Nos casos de cintilografia de baixa
ou média probabilidade, a presença de trombose femoral
ou poplítea detectada em estudo ultra-sonográfico dos
membros inferiores, justifica a anticoagulação.
A Tomografia Computadorizada Helicoidal (TCH) é
um método de tecnologia recente e precisa. Entretanto,
êmbolos em ramos distais podem não ser identificados.
Embora haja relatos de que TEP subseqüente a uma TCH
negativa seja baixa9 não pode ser excluída, com certeza, a
possibilidade de um segundo fenômeno embólico fatal.
Sabe-se que podem ocorrer mortes súbitas por TEP e
que a anticoagulação é freqüentemente efetiva em reduzir
a possibilidade de um novo fenômeno embólico e a morte.
Por este motivo, os métodos diagnósticos por imagem (cintilografia e TCH) são solicitados toda vez que há uma suspeita clínica de TEP. Em nossa instituição os exames por
imagem são negativos na maior parte dos exames solicitados por suspeita clínica de TEP. Esta incidência também é
relatada por outros autores10-12. Os métodos diagnósticos
por imagem são invasivos, de alto custo e potencialmente de risco, porque nem sempre as condições clínicas permitem que o paciente seja transportado para a realização
do exame. O problema é, particularmente, mais sério em
países em desenvolvimento, onde os exames por imagem
não estão facilmente disponíveis. Por este motivo, métodos não-invasivos que possam excluir, com segurança, a
possibilidade de TEP, reduziriam, de forma significativa,
o número de pacientes submetidos, desnecessariamente, à
cintilografia pulmonar e à TCH, mesmo em hospitais onde
estes exames estão disponíveis. Da mesma forma, estes
métodos não-invasivos poderiam ser usados em pequenos
hospitais onde os exames por imagem não estão disponíveis, objetivando selecionar pacientes a serem transferidos
para instituições de referência para investigação por imagem. Dependendo do grau de confiabilidade destes exames
não-invasivos, expressos pela sua sensibilidade e especifici-
1. Fisioterapeuta. Pós-Graduando do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP – Universidade Estadual de
Campinas, Campinas, SP.
2. Professor Titular do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas,
Campinas, SP.
* Recebido do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP, Campinas, SP
Apresentado em 17 de agosto de 2004 - Aceito para publicação em 29 de setembro de 2004
Endereço para correspondência: Prof. Dr. Renato Giuseppe Giovanni Terzi - R. Conceição 233/810 - 13010-916 Campinas, SP - Telefones: R 19-32517738 - H 19-3789-9298 - AMIB 19-3233-2969 - 1. E-mail: [email protected] - 2. E-mail: [email protected] - [email protected]
124
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / SESSÃO ESPECIAL
TRABALHOS ORIGINAIS SELECIONADOS AO PRÊMIO RATTON
dade, é possível antever que, em futuro próximo, a decisão
de proceder a anticoagulação ou não, de um paciente com
suspeita de TEP, possa se basear exclusivamente em métodos não-invasivos.
Dois desses métodos parecem promissores: os D-dímeros e a capnografia volumétrica. Até o momento, nenhum
destes exames, isoladamente, se mostrou infalível em estabelecer um diagnóstico definitivo de TEP. Porém, já existem evidências suficientes, para justificar seu emprego, em
excluir da fila dos exames por imagem, boa parcela dos
pacientes com suspeita clínica de TEP.
As técnicas à beira do leito para avaliar pacientes com
TEP, incluem a medida da pressão parcial de dióxido de
carbono no sangue arterial (PaCO2), a utilização da capnografia, com a medida da pressão parcial de dióxido de
carbono no ar expirado ao final da expiração completa
(PETCO2)13-15, o cálculo do espaço morto fisiológico16, do
gradiente artério-alveolar de CO2 (P(a-et)CO2) ou a fração
do espaço morto alveolar17,18 com ou sem uma expiração
forçada15,18. Estes estudos têm algumas limitações pelas dificuldades de diferenciar pacientes com TEP daqueles com
outras doenças pulmonares de base.
Eriksson e col.19, foram capazes de diferenciar pacientes normais, pacientes com TEP e pacientes com função
pulmonar anormal (doença pulmonar obstrutiva crônica DPOC) usando para isto, uma variável - a fração de espaço
morto tardia (fDlate) - calculada pelo espirograma de CO2
obtido pela variação dos valores de PCO2 no ar exalado
em relação ao volume expirado, denominado de capnograma volumétrico.
Eriksson e col.19 extrapolaram a reta de regressão da
fase III até atingir o nível de PaCO2. Eles observaram que
em indivíduos normais e, mesmo em pacientes com DPOC,
a reta de regressão da fase III cruzava a reta da PaCO2 antes
de atingir 15% da capacidade pulmonar total (CPT). Em
pacientes com TEP; entretanto, o valor de CO2 extrapolado na fase III da curva, para um volume equivalente a 15%
da CPT, era insuficiente para alcançar o valor da PaCO2.
Em indivíduos normais e pacientes com DPOC a diferença
entre a PaCO2 e a PETCO2 extrapolada em 15% da CPT é,
portanto, um valor negativo e inferior a zero. Em pacientes
com TEP a diferença é um valor positivo e superior a zero.
Quando este gradiente é dividido pela PaCO2 temos uma
fração desta variável, denominada por Eriksson e col.19 de
fDlate, cuja expressão matemática é a seguinte:
PaCO2 – PET(15% CPT)CO2
fDlate = _______________________
PaCO2
Onde PaCO2 é a pressão parcial de CO2 no sangue arterial; PET(15% CPT)CO2 é a pressão parcial de CO2 no ar expirado extrapolada para 15% da CPT, de acordo com as
tabelas previamente publicadas20.
Eriksson e col.19 relataram que pacientes com TEP
apresentavam um fDlate acima de 0,12. Pacientes normais
e pacientes com DPOC, exibiram valores de fDlate menores que 0,1219. Estas observações referem-se a pacientes em
respiração espontânea.
Posteriormente, Anderson e col.21 avaliaram 12 pacienVolume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
Figura 1 – CO2 Volumétrico.
Notar que em indivíduos normais (A) a PETCO2 virtual , obtida por extrapolação da
Fase III atinge a reta da PaCO2 antes de ser atingido um volume de 15% da Capacidade Pulmonar Total (CPT). Observar que, em indivíduos com provável embolia
pulmonar, a PETCO2 virtual, obtida por extrapolação da Fase III até 15% da CPT
(CPT) não atinge os valores de PaCO2. O gradiente entre a PaCO2 e a PETCO2 extrapolada a 15% da CPT é utilizado para o cálculo do fDlate (ver equação no texto).
tes, dos quais 11 eram vitimas de trauma. Todos foram
submetidos à angiografia pulmonar por suspeita de TEP.
Cinco destes pacientes tiveram confirmação diagnóstica
para TEP, apresentando um fDlate de 0,12 a 0,48. Nove
tiveram angiografia negativa para TEP e oito destes pacientes tiveram valores de fDlate abaixo de 0,12 (-0,12 a
0,08). Apenas um paciente com angiograma negativo para
TEP apresentou um fDlate de 0,25. O estudo resultou em
100% de sensibilidade e 89% de especificidade, usando o
mesmo valor de corte proposto por Eriksson.
O objetivo do presente trabalho foi avaliar a sensibilidade e a especificidade da fDlate e de outras variáveis fisiológicas que expressam a fração de espaço morto alveolar,
para excluir o diagnóstico de TEP de forma não-invasiva.
Para tanto foi desenvolvido um protocolo para pacientes
internados em enfermarias ou em UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do Hospital das Clínicas da UNICAMP,
com suspeita clínica de TEP. O protocolo previa a realização de capnografia volumétrica, a gasometria arterial e um
ou mais exames de imagem suficientes para confirmar ou
afastar o diagnóstico de TEP.
PACIENTES E MÉTODO
Foram estudados 46 pacientes, 23 homens com idade
de 53,2 ± 14,4 anos e 23 mulheres com idade de 55,5 ± 14,2
anos. Todos os pacientes foram submetidos aos seguintes
exames:
1. Radiografia simples de tórax;
2. Monitorização da mecânica respiratória e CO2 volumétrico (CO2SMO PLUS);
3. Gasometria arterial.
Todos foram submetidos a um, ou mais, dos seguintes exames por imagem para confirmar o diagnóstico de
TEP:
1. Cintilografia pulmonar;
2. TCH;
3. Angiografia pulmonar;
4. Ultra-som ecodoppler venoso do membro inferior.
125
RBTI / SESSÃO ESPECIAL
TRABALHOS ORIGINAIS SELECIONADOS AO PRÊMIO RATTON
Critérios de Inclusão
Foram incluídos 46 pacientes com suspeita clínica de TEP.
A suspeita diagnóstica era levantada pelo médico assistente nas
Enfermarias e na Sala de Emergência do Hospital das Clínicas
da UNICAMP. Quando um método gráfico era solicitado (cintilografia, angiotomografia helicoidal ou angiografia pulmonar),
na seqüência ou anteriormente ao exame, era realizada a capnografia volumétrica e a gasometria arterial. No grupo TEP Positivo
o diagnóstico foi feito por cintilografia em nove pacientes, por cintilografia + TCH em dez pacientes, por TCH + Doppler em um
paciente e por cintilografia + Doppler em um paciente. No grupo
TEP Negativo, o diagnóstico foi excluído em três pacientes por
cintilografia normal, em quatro pacientes por TCH + cintilografia normais, em seis pacientes por TCH negativo + cintilografia de
baixa probabilidade, em um paciente por TCH negativo + Doppler negativo, em quatro pacientes por cintilografia de baixa probabilidade + angiografia pulmonar negativa, em quatro pacientes
por cintilografia de baixa probabilidade + Doppler Negativo e em
três pacientes por cintilografia normal + Doppler negativo.
Critérios de Exclusão
Foram excluídos pacientes com os seguintes critérios:
1. Morte encefálica
2. Idade ≤ 18 anos
MEDIDA DO VOLUME CORRENTE
(PNEUMOTACOGRAFIA) E DO
CO2 EXPIRADO (CAPNOMETRIA)
Material Utilizado
Monitor de perfil respiratório DX-8100 (CO2SMO PLUS)
Dixtal/Novametrix acoplado ao software Analysis Plus que
permite o cálculo do fDlate.
Pneumotacógrafo: Sensor descartável (Novametrix). Princípio: manometria diferencial em resistência fixa por orifício.
Fluxo: 2 a 180 L/min. Acurácia: Superior ±3% da leitura 0.5
L/min. Volume minuto: 2 a 60 litros. Volume corrente: 100 a
3000 ml. Pressão de vias aéreas: -120 a +120 cmH2O.
Capnômetro: (Capnostat Novametrix), Princípio: O sinal
elétrico correspondente à concentração de CO2 nas vias aéreas é captado por um sensor a partir de um feixe de luz infravermelha que atravessa (mainstream) o sensor descartável do
pneumotacógrafo. Acurácia: ± 2 mmHg (para 0 a 40 mmHg); ±
5% de leitura (para 41 a 70 mmHg); ± 8% de leitura (para 71 a
100 mmHg). Calibração: A seqüência de calibração interna está
incorporada ao software do aparelho. Embora não necessária,
uma segunda calibração foi realizada com dois gases de referência certificados pela firma fornecedora de gases (gás 1: CO2 =
20% e N2 = 80% e, gás 2: CO2 = 5% e O2 = 20% e N2 = 75%).
Protocolo
1. Estando o paciente sob ventilação mecânica, o sensor
do Monitor (CO2SMO PLUS) foi conectado entre o tubo
orotraqueal e o circuito do ventilador mecânico;
2. Estando o paciente sem ventilação mecânica, o sensor do
Monitor (CO2SMO PLUS) foi conectado a um bocal. Foi ainda
utilizado um clipe nasal, para evitar escape de ar pelo nariz.
As seguintes variáveis foram registradas por um período
de 3 minutos:
126
1. Volume corrente inspirado e expirado;
2. Espaço morto anatômico (VD/VTan);
3. Slope da fase III;
4. PETCO2.
Espaço morto anatômico
O espaço morto anatômico foi medido pelo método de
Fowler22 pelo software do Analysis Plus.
Espaço morto fisiológico
A determinação do espaço morto fisiológico foi calculada
de acordo com a equação de Bohr modificada por Enghoff
em 193823.
PaCO2 – PECO2
VD/VT fis = ________________
PaCO2
Onde PECO2 é a pressão parcial de CO2 médio medido no
ar expirado calculado pelo Analysis Plus
Espaço morto alveolar
O espaço morto alveolar é calculado pela diferença entre
o espaço morto fisiológico (Bohr/Enghoff) e o espaço morto
anatômico (Fowler):
VD/VT alv = (VD/VT fisiol) - (VD/VT an)
Parâmetros calculados
Gradiente artério-alveolar de CO2
P(a-et)CO2 = PaCO2 - PETCO2
Fração de espaço morto fisiológico:
VD/VT fisiol = (PaCO2 – PETCO2) / PaCO2
Fração de espaço morto alveolar:
VD/VT alv = VD/VT fisiol - VD/VT an
Fração de espaço morto alveolar end-tidal
AVDSf = (PaCO2 - PETCO2) / PaCO2
Fração de espaço morto alveolar tardía:
fDlate = (PaCO2 – Pet(15% CPT)CO2)/ PaCO2
RESULTADOS
Os parâmetros fisiológicos obtidos nos 46 pacientes com
suspeita de TEP são apresentados na tabela 1. Os valores dos
parâmetros coletados foram submetidos a um teste t para
amostras independentes a um nível de significância de 5%. As
variáveis acima foram submetidas a testes de sensibilidade e
especificidade e os resultados são apresentados na tabela 1.
Tabela 1 – Variáveis Medidas e Calculadas nos 21 Pacientes
com Diagnóstico Positivo e nos 25 Pacientes com Diagnóstico
Negativo para Tromboembolismo Pulmonar (Média ± DP)
Exames
Positivos
(n = 21)
Negativos
(n = 25)
Significância
PaCO2
32,84 ± 5,71
35,01 ± 10,05
NS
PETCO2
22,42 ± 6,31
29,65 ± 8,07
p < 0,05
P(a-et)CO2 (mmHg)
10,43 ± 4,69
5,36 ± 3,95
p < 0,05
VD/VT fisiol (fração)
0,52 ± 0,11
0,43 ± 0,10
p < 0,05
VD / VT alv (fração)
0,39 ± 0,17
0,27 ± 0,12
p < 0,05
AVDSf (fração)
0,32 ± 0,14
0,15 ± 0,10
p < 0,05
fDlate (fração)
0,25 ± 0,17
- 0,02 ± 0,19
p < 0,05
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / SESSÃO ESPECIAL
TRABALHOS ORIGINAIS SELECIONADOS AO PRÊMIO RATTON
Foi calculada a sensibilidade (Sens) e a especificidade
(Espec) para cada respectivo valor de corte de cada variável. Estes dados, acoplados à probabilidade do teste resultar positivo ou negativo são apresentados na Tabela 2.
Tabela 2 – Testes de Sensibilidade e Especificidade para as
diferentes Variáveis de acordo com os Valores de Corte
Valor de Corte
Sensibilidade
Especificidade
P(a-et)CO2 (mmHg)
VD/VT fis (fração)
VD / VT alv (fração)
AVDSf (fração)
fDlate (fração)
5 (13)
0,40 (16)
0,20 (24)
0,15 (25)
0,12 (19)
0,90
0,90
0,95
0,95
0,95
0,60
0,32
0,32
0,60
0,80
fDlate (fração) + DD
FDlate - 0,12 (19)
DD – 500 ng/ml (2)
1,00
0,80
Exames
Na tabela 3 são apresentados os valores preditivos positivos e negativos para cada variável estudada, incluindo
o intervalo de confiança de 95%.
Como a fDlate apresentou melhor sensibilidade e especificidade que os demais, esta variável foi selecionada para
a triagem de pacientes com suspeita de TEP. Porém, foi
encontrado um resultado falso-negativo. Isto inviabilizaria
seu uso pela possibilidade de não se finalizar a investigação diagnóstica. Como o paciente com fDlate falso-negativo também apresentou um teste para DD positivo, a associação destes dois testes resulta em triagem diagnóstica
positiva. Por isso, uma nova análise estatística para avaliar
a sensibilidade e a especificidade da associação do fDlate
com o DD no diagnóstico do TEP (Tabelas 2 e 3).
DISCUSSÃO
O diagnóstico do tromboembolismo pulmonar é essencial para indicar prontamente o tratamento e modificar o
prognóstico do paciente26. O diagnóstico de TEP exige a
necessidade de investimento em exames complementares
de alto custo e risco. Por isso, métodos de avaliação nãoinvasivos e facilmente disponíveis para uso à beira do leito
em pacientes com suspeita de TEP, resultariam na indicação mais racional de exames complementares complexos,
com redução de custos hospitalares e de riscos para os pacientes.
No presente trabalho foram estudados 46 pacientes
com suspeita clínica de TEP, todos submetidos à capnografia volumétrica e à gasometria arterial para o cálculo
da fDlate. Todos foram submetidos a algum tipo de exame gráfico capaz de confirmar ou afastar o diagnóstico de
TEP. Quase todos realizaram a cintilografia pulmonar de
inalação/perfusão. Alguns realizaram associada ou isoladamente a TCH ou a angiografia. Três pacientes encontravam-se sob ventilação mecânica.
Em toda a casuística de 46 pacientes a fDlate foi positiva em 20 pacientes (57%) dos quais 21 pacientes (54%)
com diagnóstico confirmado e 25 pacientes (46%) sem confirmação diagnóstica pelo exame de imagem. O número de
casos de pacientes com fDlate negativa foi de 26 pacientes
(43%). O método apresentou 95% de sensibilidade e 80%
de especificidade.
Deve-se enfatizar que a triagem não-invasiva de pacientes com suspeita de TEP não pode admitir resultados falso-negativos. Caso a avaliação diagnóstica fosse limitada
exclusivamente à fDlate, um resultado de fDlate negativa
implicaria em não prosseguir com exames diagnósticos
mais complexos. Essa conduta poderia, eventualmente,
resultar em fatalidade com as inerentes conseqüências
médico-legais. Contrariamente, os falso-positivos (5 pacientes) exigiriam a realização de exames complementares
de imagem. Nestes pacientes, a realização destes exames
aumentaria os custos hospitalares e seria de algum risco
para o paciente. Entretanto, caso algum dano ocorresse,
não caberia qualquer ação de má prática, visto que todos
os pacientes, e não somente os falso-positivos teriam sido
submetidos aos referidos exames. A triagem com a capnografia volumétrica permitiria limitar os exames mais
complexos e caros somente àqueles pacientes com fDlate
positiva. Neste grupo estariam incluídos os pacientes efetivamente com TEP (n=21), assim como os pacientes falso-positivos (5 pacientes) totalizando 26 dos 46 pacientes
estudados. Isto significa que a realização de 20 exames desnecessários poderia ser evitada, o que corresponde a 43%
de todos os casos com suspeita clínica de TEP.
Uma limitação deste método é a necessidade de se dispor de um capnógrafo volumétrico associado a um software
que permite derivar a inclinação da reta (slope) da fase III
do espirograma e extrapolar a reta até 15% da Capacidade Pulmonar Total. Outros métodos baseados na simples
medida da PETCO2 empregando um simples capnógrafo
comumente disponível no Centro Cirúrgico ou em Unidades de Terapia Intensiva permitem o cálculo do gradiente
P(a-et)CO2 ou da sua relação com a PaCO2, uma variável
denominada Fração de espaço morto alveolar end-tidal
(AVDSf )25.
É sabido que a doença pulmonar obstrutiva crônica
(DPOC), freqüentemente cursa com aumento do VD/VT fis
por conta de alterações anatômicas crônicas que vertem
em incordenação V’A/Q’. Como a DPOC não é infreqüen-
Tabela 3 – Valores Preditivos Positivos e Negativos para cada Variável Calculada.
Os Valores do Intervalo de Confiança de 95% encontram-se entre parênteses
Exames
P(a-et)CO2
VD/VT fis
VD / VT alv
AVDSf
fDlate
fDlate + DD
Verdadeiro Positivo
0,66 (0,46-0,81)
0,53 (0,36-0,69)
0,53 (0,36-0,70)
0,67 (0,47-0,82)
0,80 (0,59-0,92)
0,81 (0,60-0,92)
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
Falso Positivo
0,34(0,19-0,54)
0,47 (0,31-0,64)
0,46 (0,30-0,63)
0,33 (0,18-0,53)
0,20 (0,08-0,41)
0,19 (0,07-0,40)
Verdadeiro Negativo
0,88 (0,62-0,98)
0,80 (0,44-0,96)
0,89 (0,51-0,99)
0,94 (0,68-0,97)
0,95 (0,74-0,99)
1,00 (0,80-1,00)
Falso Negativo
0,12 (0,02-0,38)
0,20 (0,04-0,56)
0,11 (0,01-0,49)
0,06 (0,003-0,32)
0,05 (0,002-0,26)
0,00 (0,00-0,20)
127
RBTI / SESSÃO ESPECIAL
TRABALHOS ORIGINAIS SELECIONADOS AO PRÊMIO RATTON
te na população em geral, explica-se a grande quantidade
de resultados falso-positivos encontrados nos parâmetros
fisiológicos baseados no gradiente artério-alveolar (P(aet)CO2).
Na tentativa de melhorar a especificidade da P(aet)CO2 para a detecção de TEP em pacientes com doença
pulmonar de base, Hatle e Rokseth15 realizaram um espirograma estendido solicitando ao paciente uma expiração
prolongada. Eles sugeriram que a medida de um gradiente P(a-et)CO2 tardio poderia diferenciar quadros de TEP
e de DPOC. Porém, esta manobra interfere na fisiologia
normal da ventilação, desviando o processo de um regime
permanente (steady-state) para um regime transitório (non
steady-state). Além disto, a manobra exige a colaboração
e a capacidade física do paciente, nem sempre possíveis em
pacientes com falência cardiorrespiratória. Por isso, o gradiente P(a-et)CO2 tardio foi obtido por Eriksson e col.27,
por um método gráfico ao qual chamaram de fração de
espaço morto tardia (fDlate). Caracteriza-se por uma extrapolação matemática, prolongando a fase III (slope III)
do espirograma volumétrico de CO2 obtido durante um ciclo respiratório normal, até 15% da Capacidade Pulmonar
Total (CPT). Com esse método é possível inferir a PaCO2
sem exigir um esforço do paciente, passível de interferência
nos resultados. Eriksson avaliou 38 pacientes submetidos
à angiografia pulmonar por suspeita de TEP em respiração espontânea. Por extrapolação matemática da fase III
da curva do capnograma até 15% da capacidade pulmonar
total (CPT), o valor de corte da fDlate encontrado para
diferenciar pacientes com diagnóstico confirmado de TEP
foi de 0,12.
Olsson e col.27 usaram o mesmo valor de corte que Eriksson (0,12) quando calcularam a fDlate em 223 pacientes
submetidos a cintilografia pulmonar de inalação/perfusão.
Neste grande grupo de pacientes obtiveram uma sensibilidade de 85% e uma especificidade de 93%, incluindo três
resultados falso-negativos.
Em 1999, Anderson e col.21, utilizando o mesmo valor
de corte do fDlate (0,12)19 obtiveram 100% de sensibilidade e 89% de especificidade em doze pacientes submetidos a
angiografia pulmonar, dos quais, cinco apresentaram diagnóstico positivo para TEP. Obtiveram um resultado falso-positivo, porém, nenhum falso-negativo. Vê-se que nos
trabalhos de Olsson27 e Anderson21, a especificidade do método atingiu valores ao redor de 90%, indicando uma boa
discriminação entre pacientes portadores de TEP e aqueles
portadores de DPOC.
Neste trabalho foi utilizado o mesmo valor de corte
proposto por Eriksson (0,12)19. É, sem dúvida, preocupante, a constatação, nesta casuística, de um resultado
da fDlate falso-negativo. Não se trata um valor da fDlate
próximo do valor de corte (0,12), o que poderia ser interpretado como inerente aos limites arbitrários definidos
originalmente por Eriksson e col.19. Pelo contrário, o valor
da fDlate de - 0,23 é um dos valores mais negativos da
casuística.
Trata-se de um paciente portador de neoplasia pulmonar cujo tumor broncogênico acometia a mesma região
anatômica que o êmbolo pulmonar. Essa inusitada situação foi interpretada como uma “lobectomia funcional”,
128
visto que a ausência de ventilação mascarou o espaço morto resultante da ausência de perfusão. É sabido que pacientes submetidos a ressecções pulmonares não cursam, via
de regra, com aumento de espaço morto. Esse resultado
falso-negativo ocorreu por eventual singularidade e deve
ser considerado na triagem dos pacientes com suspeita de
TEP submetidos ao método fDlate. Porém, neste paciente,
o DD medido pelo método de aglutinação do látex (D-Di
test Diagnóstica Stago) foi positivo (2 a 4 µg/dL), logo, este
paciente foi considerado positivo pela triagem não-invasiva quando o critério de triagem se baseou na associação
dos dois métodos (fDlate e DD).
Poderia ser argumentado que o DD pode ser positivo
em portadores de neoplasia e que o resultado positivo não
determina se a causa é neoplasia ou TEP. Isto é irrelevante,
visto que tanto os casos com DD positivo por TEP (verdadeiros positivos) como por neoplasia (falso-positivos)
seriam encaminhados para exames complementares para
confirmar, ou não, a presença de TEP.
Nesta casuística, a associação da fDlate ao DD apresentou uma sensibilidade de 1,00 e uma especificidade de
0,80.
Embora ainda com uma casuística incipiente, pode-se
observar que o método proposto por Eriksson19 (fDlate)
quando associado ao DD é superior aos outros apresentados (VD alv/VT alv + DD e AVDSf + DD).
De acordo com os dados apresentados nesta casuística,
a associação fDlate e DD permitiu excluir com segurança
a presença de TEP. Além da rapidez e da facilidade de se
obter esta informação, visto que, tanto a fDlate como o
DD, podem ser obtidos, em alguns minutos, na Sala de
Emergência, poderiam ser evitados quase a metade dos
exames de imagem.
Se a exclusão do diagnóstico de TEP pela associação
fDlate + DD for confirmada por outros autores em estudos
multicêntricos, que é o que sinaliza Verschuren e col.11, este
processo de triagem diagnóstica, na Sala de Emergência ou
nas Enfermarias, poderá contribuir para a racionalização
de recursos, para a redução da demanda aos Serviços de
Imagem, para a redução dos custos hospitalares e para o
conforto e a segurança dos pacientes e da equipe multiprofissional.
RESUMO
JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: Métodos para confirmar o diagnóstico de tromboembolismo pulmonar (TEP) são
de risco relativo, de alto custo e nem sempre disponíveis. Justifica-se a busca de métodos mais acessíveis, não-invasivos, de
baixo custo e que possam ser realizados à beira do leito. O
objetivo deste trabalho foi comparar o cálculo da fração de
espaço morto tardia (fDlate) com a cintilografia pulmonar,
a tomografia helicoidal computadorizada e a arteriografia
pulmonar em pacientes com suspeita de tromboembolismo
pulmonar.
MÉTODO: Foi realizado um estudo prospectivo e observacional em Hospital Universitário com 46 pacientes internados, no período de janeiro de 2002 a janeiro de 2004, com
suspeita clínica de tromboembolismo pulmonar. Foi utilizada
a capnometria (CO2SMO PLUS DX 8100) e a gasometria arRBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / SESSÃO ESPECIAL
TRABALHOS ORIGINAIS SELECIONADOS AO PRÊMIO RATTON
terial para posterior cálculo da fDlate (PaCO2 – P(15%CPT)CO2)
/ PaCO2).
RESULTADOS: Considerando um valor de corte proposto por Eriksson (0,12), a fDlate resultou positiva em 20
pacientes; falso-positiva em 5 pacientes; e negativa em 20
pacientes, quando comparada com os exames por imagem.
Obteve-se também um resultado falso-negativo (-0,23). Estes
dados resultaram em 95% de sensibilidade e 80% de especificidade para o método.
CONCLUSÕES: A fDlate quando utilizada de forma
isolada não demonstrou ter uma sensibilidade suficiente para
o diagnóstico não invasivo de tromboembolismo pulmonar.
Esta técnica de triagem para tromboembolismo pulmonar
poderia ser melhorada associando-se outras variáveis não-invasivas, tais como o D-dímero (DD).
Unitermos: tromboembolismo pulmonar; espaço morto
anatômico, fisiológico e alveolar; pressão parcial de dióxido
de carbono no sangue arterial (PaCO2); pressão parcial de dióxido de carbono no ar expirado ao final da expiração completa (PetCO2); capnografia; D-dímeros; fDlate.
REFERÊNCIAS
01. Owings JT, Kraut E, Battistella F et al - Timing of the occurrence of pulmonary
embolism in trauma patients. Arch Surg, 1997;132:862-866.
02. Vitório PK, Mendes ESPS - Dímeros no Diagnóstico de Embolia Pulmonar.
In: Fernandes ALG, Mendes ESPS, Terra Fo MEDS. Pneumologia - Atualização e Reciclagem. Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia. São Paulo,
Atheneu, 2000;2:213-220.
03. Gillum RF - Pulmonary embolism and thrombophlebitis in the United States,
1970-1985. Am Heart J, 1987;114:1262-1264.
04. Anderson FA, Wheeler HB, Goldberg RJ et al – A population-based perspective
of the hospital and case-fatality rates of deep vein thrombosis and pulmonary
embolism. The Worcester DVT Study. Arch Intern Med, 1991;151:933-938.
05. Dalen JE, Alpert JS - Epidemiology and natural history of venous thromboembolism. Prog Cardiovasc Dis, 1994;36:417-422.
06. Goldhaber SZ – Pulmonary embolism death rates. Am Heart J, 1988;115:1342-1343.
07. Moser KM – Pulmonary embolism. Am Rev Respir Dis, 1977;115: 829-852.
08. Value of ventilation/perfusion scan in acute pulmonary embolism. Results of
the prospective investigation of pulmonary embolism diagnosis (PIOPED).
The PIOPED Investigators. JAMA 1990;263:2753-2759.
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
09. Goodman LR, Lipchik RJ, Kuzo RS et al - Subsequent pulmonary embolism:
risk after a negative helical CT pulmonary angiogram – prospective comparison with scintigraphy. Radiology, 2000;215:535-542.
10. Lorut C, Ghossains M, Horellou MH at al - A noninvasive diagnostic strategy
including spiral computed tomography in patients with suspected pulmonary
embolism. Am J Respir Crit Care Med, 2000;162:1413-1418.
11. Verschuren F, Liistro G, Coffeng R et al - Volumetric capnography as a
screening test for pulmonary embolism in the emergency department. Chest,
2004;125:841-850.
12. Dixon AK, Coulden RA, Peters AM - The non-invasive diagnosis of pulmonary embolus. BMJ, 2001;323:412-413.
13. Robin ED, Julian DG, Travis DM et al - A physiologic approach to the diagnosis of acute pulmonary embolism. N Engl J Med, 1959;260:586-591.
14. Nutter DO, Massumi RA - The arterial-alveolar carbon dioxide tension gradient in diagnosis of pulmonary embolus. Dis Chest, 1966;50:380-387.
15. Hatle L, Rokseth R - The arterial to end-expiratory carbon dioxide tension
gradient in acute pulmonary embolism and other cardiopulmonary diseases.
Chest, 1974;66:352-357.
16. Burki N - The dead space to tidal volume ratio in the diagnosis of pulmonary
embolism. Am Rev Respir Dis, 1986;133:679-685.
17. Kline JA, Meek S, Boudrow D et al - Use of the alveolar dead space fraction
(Vd/Vt) and plasma D-dimers to exclude acute pulmonary embolism in ambulatory patients. Acad Emerg Med, 1997;4:856-863.
18. Chopin C, Fesard P, Mangalaboyi J et al - Use of capnography in diagnosis of
pulmonary embolism during acute respiratory failure of chronic obstructive
pulmonary disease. Crit Care Med, 1990;18:353-357.
19. Eriksson L, Wollmer P, Olsson CG et al - Diagnosis of pulmonary embolism
based upon alveolar dead space analysis. Chest, 1989;96:357-362.
20. Grimby G, Söderholm B - Spirometric studies in normal subjects. III static lung
volumes and maximum voluntary ventilation in adults with a note on physical
fitness. Acta Med Scand, 1963;173:199-205.
21. Anderson JT, Owings JT, Goodnight JE - Bedside noninvasive detection acute pulmonary embolism in critically ill surgical patients. Arch Surg, 1999;134:869-874.
22. Fowler WS - Lung function studies. II: The respiratory dead space. Am J Physiol 1948;154:405. III: Uneven pulmonary ventilation in normal subjects and in
patients with pulmonary disease. J Appl Physiol 1949; 2:283.
23. Enghoff H - Volumen inefficax. Uppsala Läkaref Förhand 1938; 44:191.
24. Kline JA, Israel EG, Michelson EA et al - Diagnostic accuracy of bedside Ddimer assay and alveolar dead-space measurement for rapid exclusion of pulmonary embolism: a multicenter study. JAMA, 2001;285:761-768.
25. Rodger MA, Jones G, Rasuli P et al - Steady-state end-tidal alveolar dead space
fraction and D-dimer: bedside tests to exclude pulmonary embolism. Chest,
2001;120:115-119.
26. Sasahara AA, Sharma GV, Barsamian EM et al - Pulmonary thromboembolism. Diagnosis and treatment. JAMA, 1983;249:2945-2950.
27. Olsson K, Jonson B, Olsson CG et al - Diagnosis of pulmonary embolism by
measurement of alveolar dead space. J Intern Med, 1998;244:199-207.
28. Johanning JM, Veverka TJ, Bays RA et al - Evaluation of suspected pulmonary
embolism utilizing end-tidal CO2 and D-Dimer. Am J Surg, 1999;178:98-102.
129
RBTI / SESSÃO ESPECIAL
TRABALHOS ORIGINAIS SELECIONADOS AO PRÊMIO RATTON
Fração de Recuperação do 13CO2 no Ar Expirado
de Pacientes Sépticos sob Ventilação Mecânica*
CO2 Recovery Fraction in Expired Air of Septic Patients under Mechanical Ventilation
13
Maria Auxiliadora Martins1, Maria Thereza Battiston2,
Francisco Antônio Coletto3, úlio Sérgio Marchini4, Anibal Basile-Filho5.
SUMMARY
BACKGROUND AND OBJECTIVES : Despite extensive efforts regarding intensive care management’s to improve outcome
and survival of patients with sepsis and septic shock, its mortality remains high. In this context, continuous intravenous administration of isotopic sodium bicarbonate (NaH13CO3) is a tool that allows the evaluation of the organic retention of the
13
CO2 fraction, used in the correction of the calculation of substrate oxidation, amino acids in particular. The aim of this study
was to evaluate, in septic patients under mechanical ventilation, the 13CO2 recovery fraction (RF) in the expired air.
METHODS: This study included prospectively 10 patients (4 men and 6 women) victims of septic shock, between the 2nd
and 5th day of evolution. Mean age was 55.1 ± 19 years. The APACHE II was 25.9 ± 7.4 with death risk of 60% ± 20% and
the sepsis score of 19.1 ± 4.2. Initially, the CO2 baseline was collected and indirect calorimetry was performed. A prime
of 5 mL of NaH13CO3 was administered followed by continuous infusion of 5 mL.h-1 for 6 hours. Six VCO2 measurements
were made with a portable metabolic cart connected to a respirator and hourly samples of expired air were obtained for
13
CO2 enrichment.
RESULTS: The patients presented a mean VCO2 value of 182 ± 52 mL.min-1. The mean RF was 0.68 ± 0.06.
CONCLUSIONS: These original findings allow the conclusion that the 13CO2 recovery fraction in septic patients is incomplete, indicating retention of 13CO2. The severity of the septic shock is not associated on the 13CO2 recovery fraction in
expired air.
Key Words: 13CO2 Recovery fraction, stable isotope, septic shock.
A
sepse, o choque séptico e a disfunção de múltiplos
órgãos são as principais causas de morte em unidades de terapia intensiva, apesar do grande avanço
tecnológico e científico nesse contexto e do esforço que tem
sido feito no sentido de melhorar a sobrevida dos pacientes1-3.
A unidade de terapia intensiva desempenha um papel fundamental na sobrevida dos pacientes vítimas de sepse e choque
séptico.
Vários aspectos devem ser valorizados com relação ao paciente séptico. Além da avaliação hemodinâmica, infecciosa
e da resposta imune, os aspectos metabólicos são relevantes.
O metabolismo orgânico é um processo dinâmico, sobretudo em situações patológicas, ou seja, processos de síntese e
degradação protéica ocorrem constantemente. O dióxido
de carbono (CO2) é produzido em sua maior parte devido
à oxidação de substratos que pode ser quantificado através
do emprego de isótopos estáveis. Não se pode evitar a resposta endócrino-metabólica desencadeada pela sepse, mas
pode-se tratá-la prevenindo lesão tecidual maior através do
conhecimento pormenorizado do metabolismo. Atualmente
nenhum método utilizado oferece parâmetros acurados de
monitorização do metabolismo e um guia para a utilização
de um determinado tipo de substrato energético nos quadros
sépticos. Uma das mais importantes alterações metabólicas
no curso da sepse e choque séptico é a predominância da resposta catabólica da musculatura esquelética. Essa resposta
é multifatorial e reflete a inibição da captação de aminoácidos e a redução da síntese protéica com quebra acelerada
de proteínas em particular a degradação de miofibrilas4. A
degradação protéica excede a síntese levando ao aumento do
consumo de O2 (VO2) que se não for corrigido tende a evoluir
para disfunção orgânica muitas vezes irreversível.
A medida da taxa de oxidação de nutrientes em pacientes
críticos recebendo terapia nutricional é de grande interesse5-7.
Através do uso de isótopos estáveis como o carbono marcado (13C) é possível se obter a fração de aparecimento do CO2
no ar expirado a partir da administração por via venosa de
bicarbonato marcado (NaH13CO3)8. Como o CO2 produzido
a partir do substrato marcado interage com o pool de bicarbonato antes de ser expirado, é necessário o conhecimento
dessa fração de recuperação do 13CO2 no ar expirado para
se estudar a taxa de oxidação de um determinado substrato
(p. ex.: proteína). Essa fração de recuperação atuará como
um fator de correção nesse cálculo da oxidação protéica em
1. Médica Assistente e Supervisora de Equipe Médica do CTI – FMRP – USP.
2. Médica Residente do Centro de Terapia Intensiva – FMRP – USP
3. Médico Assistente e Pós-Graduando do Centro de Terapia Intensiva – FMRP - USP
4. Professor Associado e Chefe do Laboratório de Espectrometria de Massa, Departamento de Clínica Médica da FMRP – USP
5. Professor Associado e Chefe da Disciplina de Terapia Intensiva do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP – USP
*Recebido da Disciplina de Terapia Intensiva do Departamento de Cirurgia e Anatomia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo.
• Trabalho Apresentado no 33rd SCCM Congress, Orlando, Flórida, EUA, 2004
Tese de doutorado (2004) realizada na Disciplina de Terapia Intensiva do Departamento de Cirurgia e Anatomia (Centro de Terapia Intensiva
Campus – Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo).
Projeto de pesquisa financiado pela FAPESP (99/07266-7).
Apresentado em 22 de julho de 2004 - Aceito para publicação em 01 de outubro de 2004
Endereço para correspondência: Dr. Aníbal Basile-Filho - Av. Bandeirantes, 3900 - 14049-900 Ribeirão Preto, SP - Fone (16) 602-2439 - E-mail:
[email protected] - Fone: (16) 602-2439
130
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / SESSÃO ESPECIAL
TRABALHOS ORIGINAIS SELECIONADOS AO PRÊMIO RATTON
estudos subseqüentes.
Os objetivos deste trabalho foram mensurar a fração de
recuperação do 13CO2 no ar expirado de pacientes críticos vítimas de sepse ou choque séptico sob ventilação mecânica,
recebendo terapia nutricional enteral ou parenteral, através
da infusão venosa contínua de NaH13CO3 e descrever a fração
de recuperação do 13CO2 em grupos de pacientes selecionados
de acordo com a gravidade (Índice prognóstico APACHE II
e o Escore de Sepse).
MÉTODO
Após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa do
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão
Preto, tendo sido obtido o termo de consentimento livre e esclarecido em todos os casos (Processo n° 4989/99 - HCRP), foi
realizado um estudo clínico prospectivo no Centro de Terapia
Intensiva do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (Campus). A investigação envolveu 10
pacientes de ambos os sexos (quatro do sexo masculino e seis
do sexo feminino), vítimas de sepse de qualquer origem, ou
choque séptico, após restauração volêmica e estabilização hemodinâmica. Foram incluídos pacientes entre o 2º e 5º dia de
evolução do quadro, com indicação de ventilação mecânica
invasiva, idade entre 15 e 85 anos, necessidade de FiO2 (fração de oxigênio no ar inspirado) < 0,6, PAM (pressão arterial
média) > 50 mmHg, diurese horária > 50 ml.h-1 e utilização
de terapia nutricional. Os critérios de exclusão foram insuficiência renal oligúrica de qualquer etiologia, ventilação espontânea, fístula aérea, morte encefálica e recusa do paciente
ou responsável. Os critérios utilizados para o diagnóstico de
sepse e choque séptico foram os estabelecidos pela conferência de consenso realizada pelo American College of Chest
Physicians/Society of Critical Care Medicine9. Os pacientes
foram divididos em dois grupos de acordo com a gravidade
pelo índice prognóstico APACHE II (Acute Physiologic and
Chronic Health Evaluation)10 e pelo sistema de graduação de
sepse ou escore de sepse (Sepsis score - SS)11. Em todos os
casos foram realizados restauração volêmica, suporte ventilatório mecânico com ventilador microprocessado (BIRD 8400
STi Bird Prod Corp, EUA, SERVO 900C Siemens, Suécia ou
Savina Dragger), antibioticoterapia adequada, uso de drogas
vasoativas e terapia nutricional de acordo com o gasto energético real calculado pela calorimetria indireta (70% de carboidratos, 30% de lipídios em relação ao valor calórico total
e 1 g.kg-1.dia-1 de proteínas), conforme a dieta padronizada
pelo HCFMRP-USP12. Os pacientes foram sedados com benzodiazepínicos e/ou opióides e o bloqueador neuromuscular
foi utilizado quando necessário. A calorimetria indireta foi
realizada em todos os pacientes com o calorímetro portátil
Deltatrac II Metabolic Monitor (Datex-Ohmeda, Finlândia)
acoplado ao ventilador mecânico. A calibração de pressão
barométrica e de gases foi realizada antes de cada protocolo.
A calorimetria foi realizada durante as 6 horas do protocolo,
sendo realizada uma média do valor do VCO2 a cada hora
juntamente com a coleta do ar expirado. O peso dos pacientes foi obtido no dia do protocolo de estudo por meio de balança portátil (Slingscale 2002, Instrucom/Hill-Rom series,
Hillenbrand Industries, EUA).
O protocolo teve duração média de seis horas. InicialmenVolume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
te foi realizada a coleta do CO2 expirado basal, ou seja, antes
de iniciar a infusão de bicarbonato com carbono marcado
(NaH13CO3) e calorimetria indireta durante todo o estudo.
Após a coleta de gases basal, era realizado um bolus de 5 ml
de NaH13CO3, seguido de infusão contínua a 5 ml.h-1 durante
6 horas (T1 a T6). O valor médio obtido a cada hora (tempo)
do estudo foi utilizado para a base do cálculo da fração de recuperação do 13CO2 no ar expirado. Utilizou-se para o cálculo da fração de recuperação, o VCO2 (convertido de ml.min-1
para mmol.kg-1.h-1) obtido através de medidas de calorimetria
indireta e o valor do 13CO2 no ar expirado, conforme pode ser
visualizado no delineamento do protocolo (Figura 1).
Figura 1 - Delineamento do Protocolo de Estudo.
O cálculo da dose do NaH13CO3 foi de acordo com o peso
do paciente no dia da realização do protocolo. A dose utilizada para infusão em bolus (prime) foi de 3,8 µmol.kg-1 e para
infusão contínua foi de 3,8 µmol.kg-1.h-1, baseado nos estudos
de Tissot e col.13. O isótopo estável utilizado no estudo foi o
NaH13CO3 (99 atm%) (Mass Trace Technologies, MA, EUA).
A preparação do isótopo foi realizada na Divisão de Farmácia do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, em capela de
fluxo laminar obedecendo todos os cuidados relacionados à
assepsia e anti-sepsia. Foram coletadas gasometrias arteriais
antes e após o protocolo de estudo para avaliar eventuais interferências da dose do NaH13CO3 no estado metabólico do
paciente.
O ar expirado foi coletado inicialmente para estabelecer
um valor basal de referência no tempo de estudo -40, -25
e -15 minutos, antes de iniciar a infusão do isótopo. Após,
foram coletadas sempre duas amostras a cada hora durante
todo o protocolo de estudo (6 horas de infusão do isótopo).
A coleta era realizada através de uma bolsa coletora de gases
de 750 ml (Quintron, EUA) que era conectada na via expiratória do ventilador mecânico. As amostras foram analisadas
por espectrometria de massa (Isotope ratio mass spectrometry
- IRMS) (Europa Scientific, Inglaterra). As equações utilizadas para o cálculo da fração de recuperação do 13CO2 no ar
expirado foram as seguintes:
*VCO2 (ml.min-1) x 60 min
VCO2* = __________________________
Peso (kg) x 22,4
Onde, VCO2 = Produção de CO2
* Conversão de VCO2 em ml.min-1 para mmol.kg-1.h-1.
131
RBTI / SESSÃO ESPECIAL
TRABALHOS ORIGINAIS SELECIONADOS AO PRÊMIO RATTON
Enr 13CO2 (APEx1000) = 13CO2 i - 13CO2 b x 1000
RESULTADOS
Onde: O valor Enr 13CO2 APEx1000 (Enriquecimento
do ar expirado em Átomos por cento em excesso) refere-se
à diferença aritmética entre os valores de 13CO2 obtidos nas
amostras de ar expirado após infusão (13CO2 i) e os valores
basais (13CO2 b) antes da administração de NaH13CO3.
A idade média dos pacientes variou de 55,1 ± 19 anos.
O índice prognóstico APACHE II médio foi de 25,9 ± 7,4
com risco de óbito calculado de 60 ± 20%. O escore de sepse médio foi de 19,1 ± 4,2. A utilização do isótopo estável
(NaH13CO3) venoso não alterou o estado ácido básico dos
pacientes confirmado através da coleta de gasometrias arteriais antes e após o protocolo de estudo. Dos 10 pacientes estudados, oito (80%) evoluíram para o óbito. De acordo com
o índice prognóstico APACHE II, a média de óbitos esperada
era de 60% ± 20% (Tabelas 1 e 2).
O gasto energético médio dos pacientes avaliados foi de
1587 ± 430 kcal.min-1 e quando utilizou-se a equação de
Harris-Benedict15 verificou-se um gasto energético médio
de 1440 ± 121 kcal.min-1. Não houve diferença estatisticamente significativa entre os dois métodos de avaliação
do gasto energético real (p = 0,43) com diferença entre as
médias dos dois métodos de 146 kcal.min-1. O volume minuto médio dos pacientes avaliados foi de 7,7 ± 1,8 L.min-1
caracterizando uma ventilação minuto alveolar dentro dos
limites da normalidade sugerindo pouca possibilidade de
interferência da eliminação do CO2 sobre a fração de recuperação, uma vez que os valores de PaCO2 (pressão parcial
de CO2) permaneceram estáveis. A produção de CO2 média
dos pacientes avaliados foi de 182 ± 52 ml.min-1, valores
que estão numericamente dentro dos limites da normalidade (Tabela 3).
O cálculo da fração de recuperação do 13CO2, nas amostras de ar expirado, foi o seguinte14,15:
[13CO2 no ar expirado]
______________________
*FR = Fração de Recuperação =
[13CO2 infundido]
*Onde, FR = fração de recuperação do 13CO2 no ar expirado, VCO2 = produção de CO2, 13CO2 enr (APEx1000) =
enriquecimento do ar expirado em átomos por cento em excesso.
As medidas das variáveis estão expressas em média ±
desvio padrão. O teste estatístico utilizado para comparação
entre os dois grupos estudados de acordo com a gravidade
foi o teste não-paramétrico dos sinais de Wilcoxon para duas
amostras correlacionadas. Considerou-se como estatisticamente significativas, as comparações com valor de p < 0,05.
Foi realizado também o coeficiente de correlação de Spearman entre a variável fração de recuperação do 13CO2 e o
VO2, VCO2, volume minuto e gasto energético real.
Tabela 1 - Diagnósticos Clínicos, Dados Demográficos e Índices Prognósticos dos Pacientes Estudados.
Paciente
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
Diagnóstico Infeccioso
Pneumonia, parotidite purulenta
Peritonite, pneumonia
Abscesso intra-abdominal
Pneumonia
Pseudocisto infectado
Pneumonia, endocardite
Sinusite
Pneumonia
Pneumonia
Empiema pleural
Mediana
Média
DP
Sexo
F
M
F
M
F
M
F
F
F
M
Idade (anos)
64
72
71
76
48
78
28
40
37
37
56
55,1
19
Peso (kg)
64
80
99
77
59
72
78
62
79
60
68,5
73
12,3
Altura (cm)
160
170
171
179
157
162
157
165
165
170
165
165,6
7
APII
27
37
32
25
18
24
24
37
17
18
24,5
25,9
7,4
RO (%)
63
88
86
44
30
45
45
88
37
29
60
60
20
SS
18
20
24
22
16
18
18
26
11
18
18
19,1
4,2
Óbito
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Não
Sim
Sim
Não
AP II = Índice prognóstico APACHE II, RO = Risco de óbito calculado pelo AP II (%), SS = Escore de Sepse.
Tabela 2 – Avaliação da Fração de Recuperação do 13CO2 no Ar Expirado durante a Infusão de NaH13CO3 em Diferentes Situações13,16,17,19,20,22,29,30- 32.
Autores
Allsop e col. (1978)
Irving e col. (1983)
Irving e col. (1984)
Wolfe e col. (1984)
Irving e col. (1985)
Garlick e col. (1987)
Hoerr e col. (1989)
Bresson e col. (1990)
Tissot e col. (1993)
Jeevanandam e col. (1994)
132
Pacientes
Adultos
Adultos
Adultos
Adultos
Criança
Adultos
Saudável
Recém-nascido
Crítico
Trauma
Terapia Nutricional
Jejum
Jejum
Jejum
Pós-prandial e exercício físico
Pós-prandial
Jejum
Jejum
Pós-prandial
Pós-prandial
Jejum e pós-prandial
Fração de recuperação
0,81
0,51
0,74
0,78 a 0,98
0,57
0,73
0,52 a 0,95
0,96
0,9
1,0
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / SESSÃO ESPECIAL
TRABALHOS ORIGINAIS SELECIONADOS AO PRÊMIO RATTON
Tabela 3 - Valores Médios do Gasto Energético Real, Volume Minuto, Produção de CO2 (VCO2),
Consumo de Oxigênio (VO2) e Quociente Respiratório (RQ) nos Pacientes Estudados.
Paciente
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
Média ± DP
Gasto Energético (kcal.min-1)
1191
1155
2258
1455
1458
1565
1773
1131
2353
1528
1587 ± 430
Volume Minuto (l.min-1)
6,0
7,9
10,0
8,5
6,4
6,9
7,5
5,2
11,1
7,6
7,7 ± 1,8
O consumo de O2 médio dos pacientes avaliados foi de
229 ± 67 ml.min-1, valores que permaneceram estáveis durante todo o protocolo de estudo. Isso era esperado, uma vez que
os pacientes, apesar do estado de choque séptico, se apresentavam estáveis no momento à custa de suporte hemodinâmico. O quociente respiratório médio dos pacientes avaliados
foi de 0,79 ± 0,10 caracterizando um estado de metabolismo
adequado, sem predomínio de lipólise e neoglicogênese e nem
de lipogênese (Tabela 3).
Os valores médios do enriquecimento do 13CO2 no ar
expirado dos pacientes estudados foram de 4,01 ± 0,76
(APEx1000) no período de 120 a 360 minutos. A avaliação
dinâmica ao longo do protocolo de estudo evidenciou que
houve um estado de equilíbrio (steady-state) em torno de
duas horas após o início da infusão do isótopo, o que é o
esperado devido à realização da dose inicial. Posteriormente
houve um aumento gradual do enriquecimento demonstrando que a metodologia foi adequada (Figura 2). Não houve diferença estatisticamente significativa entre o enriquecimento
nos grupos de acordo com a gravidade (p = 0,99).
Figura 2 - Valores Médios e Respectivos Desvio-Padrão do
Enriquecimento do 13CO2 (APEx1000) no Ar Expirado ao Longo
do Protocolo de Infusão de NaH13CO3 nos Seis Momentos
Avaliados (n = 10).
VCO2 (ml.min-1)
149
145
277
168
165
165
158
146
281
162
182 ± 52
VO2 (ml.min-1)
174
140
327
215
217
211
277
163
343
225
229 ± 67
Quociente Respiratório
0,85
0,9
0,84
0,78
0,76
0,78
0,57
0,89
0,82
0,72
0,79 ± 0,10
A fração de recuperação média do 13CO2 no ar expirado
dos pacientes estudados variou foi de 0,68 ± 0,06. Esses valores são diferentes daqueles relatados para pacientes críticos
não sépticos, sugerindo que em algum momento na evolução
choque séptico possa existir algum desvio do CO2 para outras
vias metabólicas.
Quando comparou-se a fração de recuperação do 13CO2
em diferentes grupos de acordo com a idade (p = 0,81), sexo
(p = 0,25) e gravidade da doença (p = 0,62), não encontrou-se
diferença estatisticamente significativa.
A comparação entre os grupos de pacientes selecionados
de acordo com os níveis de uréia e bicarbonato sérico não
evidenciou diferença estatisticamente significativa (p = 0,99 e
p = 0,25, respectivamente).
Quando realizou-se a comparação entre os grupos selecionados de acordo com os valores de VCO2 verificou-se que
apenas dois pacientes apresentaram VCO2 cima do normal
(> 200 ml.min-1) e oito pacientes apresentaram VCO2 < 200
ml.min-1. Quando realizou-se uma categorização em grupos
de acordo com valores de VCO2 e APACHE II acima e abaixo da média e comparados esses grupos, verificou-se que sete
pacientes apresentaram APACHE II acima da média e três
abaixo da média. Dentre os sete pacientes que apresentaram
APACHE II acima da média, cinco apresentaram VCO2 acima da média e dentre os três com APACHE II abaixo da média, todos apresentaram VCO2 também abaixo da média.
Quanto à via utilizada para terapia nutricional, verificouse que três pacientes utilizaram nutrição parenteral e sete
Tabela 4 - Valores Médios da Fração de Recuperação do 13CO2 no
Ar Expirado nos Pacientes Estudados (n = 10).
Houve uma correlação positiva, porém fraca entre o enriquecimento e o volume minuto e o gasto energético real sugerindo que há alguma influência da ventilação alveolar e da
dieta oferecida na porcentagem de enriquecimento do 13CO2
no ar expirado.
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
Paciente
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
Média ± DP
Fração de Recuperação do 13CO2
0,71
0,68
0,74
0,70
0,70
0,60
0,70
0,55
0,72
0,72
0,68 ± 0,06
133
RBTI / SESSÃO ESPECIAL
TRABALHOS ORIGINAIS SELECIONADOS AO PRÊMIO RATTON
utilizaram terapia nutricional enteral e não houve diferença
estatisticamente significativa entre os grupos (p = 0,5).
Houve uma correlação positiva entre a fração de recuperação e o gasto energético real (r = 0,62) e (Figura 3) entre a
fração de recuperação e o VO2 (r = 0,75) (Figura 4). Houve
uma correlação positiva, porém pequena, entre a fração de
recuperação e o volume minuto (r = 0,58) (Figura 5) e entre a
fração de recuperação e o VCO2 (r = 0,57) (Figura 6).
Figura 6 - Coeficiente de Correlação entre os Valores
Médios da Fração de Recuperação do 13CO2 no Ar Expirado
e os Valores Médios do VCO2 nos 10 Pacientes Estudados.
Figura 3 - Coeficiente de Correlação entre os Valores Médios
da Fração de Recuperação do 13CO2 no Ar Expirado e os Valores
Médios do Gasto Energético Real nos 10 Pacientes Estudados.
DISCUSSÃO
Figura 4 - Coeficiente de Correlação entre os Valores
Médios da Fração de Recuperação do 13CO2 no Ar Expirado
e os Valores Médios do VO2 nos 10 Pacientes Estudados.
Figura 5 - Coeficiente de Correlação entre os Valores Médios
da Fração de Recuperação do 13CO2 no Ar Expirado e os
Valores Médios do Volume Minuto nos 10 Pacientes Estudados.
134
Não existem dados disponíveis na literatura até o presente momento, que explorem a taxa de recuperação do
CO2 isotópico em pacientes sépticos sob ventilação mecânica. Isto pode ser devido, por um lado, pela dificuldade
em se manter um paciente em condições de steady-state
por um período prolongado (6 a 8 horas) e por outro, as
dificuldades materiais (recursos humanos e financeiros)
em se conduzir um protocolo experimental dessa magnitude à beira do leito do paciente em estado crítico. Isto
reflete o esforço do nosso grupo de pesquisa, nos últimos
anos, em procurar investigar alguns aspectos metabólicos
dos pacientes com quadro de sepse/choque séptico, especialmente no nosso meio. No presente estudo, avaliou-se
de maneira inédita, a fração de recuperação do 13CO2 no
ar expirado de pacientes sépticos selecionados em grupos
de acordo com a gravidade. Um dos propósitos iniciais
foi também correlacionar a fração de recuperação do
13
CO2 no ar expirado com as variáveis metabólicas obtidas pela calorimetria indireta, como o consumo de O2
(VO 2), produção de CO 2 (VCO 2), volume minuto e gasto
energético real.
A utilização do carbono 13 (13CO2) possibilita o estudo do metabolismo do CO 2 e suas vias de atuação. A
técnica tem como princípio, a injeção de uma substância
enriquecida com carbono marcado ( 13C) na circulação
sangüínea e a avaliação da fração de recuperação dessa
substância através da coleta do ar expirado.
Vários estudos já avaliaram o valor dessa fração de
recuperação em animais de experimentação e em seres
humanos através da infusão de bicarbonato marcado
(NaH 13CO3) com resultados que variam de 0,51 a 0,95
(Tabela 2).
Em indivíduos adultos a fração de recuperação do
13
CO2 é bastante variável de acordo com diversos estudos13,16-19. Durante o jejum essa taxa pode variar de 0,52 a
0,94 e durante a alimentação de 0,72 a 0,90 em adultos em
repouso. Vários fatores podem explicar as discrepâncias
encontradas nesses estudos, como idade, estado metabólico ou nutricional e a presença de condições patológicas
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / SESSÃO ESPECIAL
TRABALHOS ORIGINAIS SELECIONADOS AO PRÊMIO RATTON
subjacentes e, sobretudo as condições em que o protocolo
experimental foi realizado.
Estudos na população de pacientes críticos sob ventilação mecânica, embora escassos, também já foram
relatados, porém, sem distinção de doença específica 13.
De acordo com Tissot e col. a fração de recuperação do
13
CO2 no ar expirado de pacientes críticos estáveis e em
ventilação mecânica foi de 0,89 ± 0,26 sugerindo que uma
porcentagem fica retida no organismo, com possível utilização em outras vias metabólicas não totalmente conhecidas. Porém, esses resultados foram obtidos através de
estudos em pacientes críticos que apresentam diferentes
condições patológicas não devendo ser aplicados incondicionalmente a uma doença específica.
O princípio do uso de isótopos estáveis determina
que o elemento (carbono 13) será reconhecido pelo organismo como o elemento natural já existente, pois eles
apresentam as mesmas propriedades químicas. O isótopo
administrado deverá entrar em equilíbrio dentro de vias
metabólicas já existentes. A quantidade do isótopo que
entra no pool é igual à quantidade que sai desse pool. A
entrada, nesse caso, é representada pela administração
da substância e a saída pela oxidação da mesma. Para se
atingir uma estabilidade mais rapidamente foi realizada,
nesse estudo, uma dose inicial do isótopo que determinou um equilíbrio (steady-state) em aproximadamente
120 minutos, sem a dose inicial esse equilíbrio poderia ser
atingido em até 24 horas 20. O protocolo se estendeu até
360 minutos para que se pudesse ter uma avaliação segura
e detalhada da cinética do 13CO2. Escolheu-se o bicarbonato marcado (NaH 13CO3) porque esse isótopo já foi
validado em estudos anteriores (Tabela 2), interage com
o pool de bicarbonato rapidamente e a sua transformação
em CO2 é a única forma de interação em vias metabólicas. Além de apresentar menor custo, fácil manipulação e interpretação dos dados. Quando administramos o
NaH13CO3 endovenoso e avaliamos sua fração de recuperação no ar expirado, verificamos que nem todo o isótopo
administrado foi recuperado. Estudos clínicos avaliando
a fração de recuperação do 13CO2 no ar expirado relatam
valores que variam de 0,52 a 0,95 18. Valores inferiores a
um indicam que a fração do isótopo administrada não é
totalmente eliminada como 13CO2 no ar expirado. Existem três destinos principais identificados até o momento
para a retenção desse isótopo no organismo. Primeiro, o
13
CO2 pode ser incorporado na síntese de uréia. Segundo,
o 13CO2 pode ser incorporado em metabólitos intermediários como o oxalacetato ou malato 21, 22. E, finalmente o
13
CO2 pode participar de troca no sistema do bicarbonato
ósseo, contribuindo para o aumento da sua concentração
no pool ósseo, com conseqüente diminuição de seu fluxo
plasmático. Estudo experimental em ratos23 demonstrou
que após 120 minutos de infusão de NaH 14CO2, 7% a 10%
é recuperado no esqueleto. Considerando o 13C incorporado na síntese de uréia, avaliamos dois grupos de acordo
com os níveis de uréia e verificou-se que não houve diferença estatisticamente significante na fração de recuperação do 13CO2 no ar expirado entre os grupos com níveis
elevados e normais de uréia (p = 0,99).
Considerando que o 13CO2 se dilui em um pool de biVolume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
carbonato preexistente, deve-se descartar uma possível
interferência do valor basal do bicarbonato sérico na
fração de recuperação do 13CO2 no ar expirado obtida.
Se o valor basal do bicarbonato é elevado, o 13C será diluído em um pool maior e, portanto a probabilidade de
sua eliminação no ar expirado poderia ser menor do que
nos casos em que o bicarbonato se encontrava em níveis
menores. Quando analisou-se os grupos com bicarbonato
baixo e elevado não se encontrou significância estatística
entre eles (p = 0,25). Outros fatores podem interferir com
a retenção do 13CO2 no organismo, como o exercício físico moderado e prolongado17, obesidade24,25, paciente em
estado crítico13 estado de jejum ou pós-prandial.
Não existe evidência documentada que indique qual é
o padrão de recuperação do dióxido de carbono isotópico
(13CO2 ou 14CO2) no ar expirado do paciente crítico vítima
de sepse ou choque séptico. O delineamento experimental
foi realizado com o objetivo de estudar pacientes vítimas
de choque séptico entre o 2º e 5º dia de evolução em estabilidade hemodinâmica, recebendo terapia nutricional.
A produção de CO2 também deve ser considerada
como potencial fator de interferência na fração de recuperação do 13CO2 no ar expirado. Essa variável pode ser
afetada por vários fatores, principalmente a ventilação
alveolar e o estresse oxidativo, por isso decidiu-se avaliar
os pacientes selecionados de acordo com os valores de
VCO2. Partindo-se do pressuposto que o 13CO2 é eliminado pelo pulmão, o valor do VCO 2 obtido pela calorimetria indireta poderia interferir na sua eliminação e conseqüentemente afetar a fração de recuperação do 13CO2 no
ar expirado. O fator ventilação minuto alveolar provavelmente não interferiu nos valores do VCO 2 uma vez que
o padrão ventilatório permaneceu estável e fisiológico
durante todo o protocolo de estudo. Por outro lado, o
fator peso corpóreo que afeta a quantidade de bicarbonato infundido e o processo oxidativo individual poderia
alterar o valor do VCO 2. Sendo assim, nos pacientes com
VCO2 mais elevados poderia ser esperada uma menor
probabilidade de eliminação do 13CO2. Nesses casos, seria
importante considerar esse fator limitante. Quando esta
análise foi realizada verificou-se que apenas dois pacientes apresentaram VCO2 acima do normal (> 200 ml.min-1)
e sete pacientes apresentaram VCO2 abaixo do normal e
a fração de recuperação do 13CO2 no ar expirado foi semelhante entre os grupos. No presente estudo, a fração
de recuperação 13CO2 foi de 0,68 ± 0,06 em pacientes sépticos recebendo terapia nutricional. Quando analisou-se
grupos em estado grave, variáveis de acordo com o índice
APACHE II e a graduação de sepse (Sepsis Score-SS), verificou-se que não houve diferença estatisticamente significativa entre eles (p = 0,62 e p = 0,99, respectivamente).
O mesmo ocorreu quando avaliamos diferentes grupos
selecionados de acordo com a idade (p = 0,81) e sexo (p =
0,25). O padrão de variação entre os pacientes avaliados
foi de 8,8% demonstrando que o resultado foi bastante
homogêneo na população estudada (Tabela 3). Esse dado
é importante, pois, a população de pacientes sépticos é
intrinsecamente heterogênea, no entanto, nesse contexto
a heterogeneidade não interferiu com os resultados.
O fator que provavelmente mais contribui para a fra-
135
RBTI / SESSÃO ESPECIAL
TRABALHOS ORIGINAIS SELECIONADOS AO PRÊMIO RATTON
ção de recuperação do 13CO2 no ar expirado é a taxa metabólica. Wolfe e col.16 relataram aumento na FR de 0,78
para 0,98 durante exercício intenso e prolongado. A mesma alteração foi encontrada por Hoerr e col.17 em resposta à dieta com correlação positiva entre VO 2, VCO 2, gasto energético real e os valores de fração de recuperação
do 13CO2 no ar expirado em adultos. Entretanto, Tissot e
col.13 encontraram uma correlação positiva, porém fraca
entre a FR e o VO2 e gasto energético real (ambas com r
= 0,55) e não encontrou correlação entre FR e o VCO 2.
Assim sendo, deve-se ter cuidado na interpretação desses
dados devido ao risco de ocorrência de acoplamento matemático entre parâmetros que têm variáveis comuns26,27.
Esse risco é particularmente maior para a correlação entre a Fração de recuperação (FR) e a produção de CO2
(VCO2) [FR = (VCO 2 x 13CO2 Enr)/(F x 0,99)]. Por outro lado, o volume minuto é uma variável comum para o
cálculo da FR e do VO 2. No presente estudo houve uma
correlação positiva, porém fraca entre o volume minuto e
a fração de recuperação do 13CO2 no ar expirado (r=0,58)
e uma melhor correlação entre o gasto energético real
e a fração de recuperação do 13CO2 no ar expirado (r =
0,62) e o VO2 e a fração de recuperação do 13CO2 no ar
expirado (r = 0,75). Esses resultados sugerem que a correlação entre essas últimas variáveis (Consumo de O 2 e
fração de recuperação do 13CO2 no ar expirado) não foi
resultado de simples acoplamento matemático uma vez
que a variável comum aos dois parâmetros (volume minuto) não se correlacionou com a fração de recuperação
do 13CO2 no ar expirado. Considerando que o consumo de
O2 (VO 2) é uma variável que se relaciona com sobrevida
dos pacientes28, a fração de recuperação do 13CO2 no ar
expirado poderia ter um papel semelhante, o que não foi
evidenciado neste estudo, talvez pela casuística pequena.
Esse raciocínio é particularmente relevante se inferir-se
que uma fração de recuperação do 13CO2 no ar expirado
menor poderia estar relacionada com maior gravidade,
ou seja, a menor recuperação do 13CO2 significando que
o mesmo estaria sendo desviado para vias metabólicas alternativas que estariam agindo com o objetivo de resolver
a lesão em questão.
No entanto, até o presente momento, a recuperação
incompleta do 13CO2 no ar expirado não está totalmente explicada porque não existem dados consistentes que
documentem em qual compartimento orgânico o isótopo
é perdido. É possível que uma significante porção do isótopo seja incorporada em vias metabólicas alternativas,
as quais podem funcionar de maneira distinta de acordo
com a condição patológica. Estudos devem ser realizados
com o objetivo de elucidar valores de fração de recuperação em diferentes grupos de acordo com a idade, terapia nutricional e condições patológicas específicas com a
finalidade de interpretar melhor a oxidação de substratos. Com isso, pode-se utilizar mais um caminho pouco
explorado até então para alterar o prognóstico, validar
novas modalidades terapêuticas e, quem sabe melhorar a
sobrevida dos pacientes vítimas de sepse e choque séptico. Assim os resultados originais deste estudo permitem
concluir que a fração de recuperação do 13CO2 em pacientes sépticos não é completa (0,68 ± 0,06) indicando que
136
ocorre retenção do isótopo no organismo. A gravidade do
choque séptico de acordo com o índice APACHE II e o
Escore de Sepse – SS parece não interferir com a fração
de recuperação do 13CO2 no ar expirado.
AGRADECIMENTOS
Ao apoio financeiro adicional para a execução do
presente projeto fornecido pela Pró-Reitoria de Pesquisa
da Universidade de São Paulo (USP) e pela Fundação
de Amparo ao Ensino Pesquisa e Assistência (FAEPA)
do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de
Ribeirão Preto – USP.
RESUMO
JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: Apesar dos grandes esforços para melhorar a sobrevida de pacientes sépticos, a sua taxa de mortalidade permanece elevada. Nesse contexto, a administração por via venosa contínua de
bicarbonato de sódio isotópico (NaH13CO3) tem sido um
instrumento que avalia a fração de recuperação (FR) do
13
CO2 no ar expirado, que é utilizada para a correção do
cálculo de oxidação de substratos, como os aminoácidos.
O objetivo desse estudo foi avaliar a FR do 13CO2 no ar
expirado de pacientes sépticos sob ventilação mecânica.
MÉTODO: Foram incluídos prospectivamente 10 pacientes (quatro homens e seis mulheres) com diagnóstico
de choque séptico entre o 2º e 5º dia de evolução. A idade
média foi de 55,1 ± 19 anos. O APACHE II médio foi de
25,9 ± 7,4 com risco de óbito de 60% ± 20%. O escore de
sepse foi de 19,1 ± 4,2. Foi realizada coleta do CO 2 expirado basal e a calorimetria indireta. Uma dose inicial de
5 ml de NaH 13CO3 foi administrada, seguida de infusão
contínua a 5 ml.h -1, durante 6 horas. Obteve-se seis medidas do VCO2, através de um calorímetro portátil acoplado a um ventilador e amostras horárias de ar expirado
para a medida do 13CO2.
RESULTADOS: Os pacientes apresentaram um valor
médio VCO 2 de 182 ± 52 ml.min -1. A fração média de recuperação do 13CO2 no ar expirado foi de 0,68 ± 0,06.
CONCLUSÕES: Estes resultados originais permitem
concluir que a FR do 13CO2 em pacientes sépticos não
é completa, indicando que ocorre retenção do 13CO2. A
gravidade do choque séptico não está associada com a
fração de recuperação do 13CO2 no ar expirado.
Unitermos: Fração de recuperação do 13CO2, isótopo
estável, choque séptico.
REFERÊNCIAS
01. Parrillo JE - Myocardial depression during septic shock in humans. Crit
Care Med, 1990;18:1183-1184.
02. Vincent JL, Van Der Linden P - Septic shock: particular type of acute
circulatory failure. Crit Care Med, 1990;18:S70-S74.
03. Friedman G, Silva E, Vincent JL - Has the mortality of septic shock
changed with time. Crit Care Med, 1998;26:2078-2086.
04. Rosenfeld RS - Alterações Metabólicas e Nutricionais no Paciente Crítico,
em: Loss S, Ferro HC, Azevedo JR - Nutrição Parenteral e Enteral em
UTI - Clínicas Brasileiras de Medicina Intensiva, São Paulo, Atheneu,
2001;311-334.
05. Wolfe RR, Durkot MJ, Allsop JR et al - Glucose metabolism in severely
burned patients. Metabolism, 1979;28:1031-1039.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / SESSÃO ESPECIAL
TRABALHOS ORIGINAIS SELECIONADOS AO PRÊMIO RATTON
06. Wolfe RR, Herndon DN, Jahoor F et al - Effect of severe burn injury on
substrate cycling by glucose and fatty acids. N Engl J Med, 1987;317:403408.
07. Shaw JH, Wolfe RR - Response to glucose and lipid infusions in sepsis: a
kinetic analysis. Metabolism, 1985;34:442-449.
08. Bodamer OA, Leonard JV, Tasker RC et al - Protein turnover in critically
ill children. Eur J Pediatr, 1997;156:(Suppl1):S59-S61.
09. Bone RC, Balk RA, Cerra FB et al - Definitions for sepsis and organ failure
and guidelines for the use of innovative therapies in sepsis. The ACCP/
SCCM Consensus Conference Committee. American College of Chest
Physicians/Society of Critical Care Medicine. Chest, 1992;101:1644-1655.
10. Knaus WA, Draper EA, Wagner DP et al - APACHE II: a severity of disease classification system. Crit Care Med, 1985;13:818-829.
11. Elebute EA, Stoner HB - The grading of sepsis. Br J Surg, 1983;70:29-31.
12. Marchini JS, Okano N, Cupo P et al - Nutrição Parenteral – Princípios
Gerais, Formulários de Prescrição e Monitorização. Medicina (Ribeirão
Preto) 1998;31:62-72.
13. Tissot S, Delafosse B, Normand S et al - Recovery of [13C] bicarbonate
as respiratory 13CO2 in mechanically ventilated patients. Am J Clin Nutr,
1993;57:202-206.
14. El-Khoury AE, Fukagawa NK, Sanchez M et al - The 24-h pattern and
rate of leucine oxidation, with particular reference to tracer estimates of
leucine requirements in healthy adults. Am J Clin Nutr, 1994;59:10121020.
15. Harris JA, Benedict FG - A biometric study of basal metabolism in man.
Carnegie Institute of Washington, 1919;297.
16. Wolfe RR - Radioisotope and Stable Isotope/mass Spectrometry Methods,
em: Tracers in Metabolic Research. Laboratory and Research. Methods
in Biology and Medicine. New York, Alan R. Liss Inc, 1984;55-59.
17. Hoerr RA, Yu YM, Wagner DA et al - Recovery of 13CO2 in breath from
NaH13CO3 infused by gut and vein: effect of feeding. Am J Physiol,
1989;257:E426-E438.
18. Young VR - Adult amino acid requirements: the case for a major revision
in current recommendations. J Nutr, 1994;124:1517S-1523S.
19. Jeevanandam M, Holaday NJ, Petersen SR - Nutritional influence on the
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
recovery of 14CO2 in critically ill trauma patients. Am J Physiol, 1994;266:
E366-E371.
20. Allsop JR, Wolfe RR, Burke JF - Tracer priming the bicarbonate pool. J
Appl Physiol, 1978;45:137-139.
21. Elia M, Fuller N, Murgatroyd P - The potential use of the labelled bicarbonate method for estimating energy expenditure in man. Proc Nutr Soc,
1988;47:247-258.
22. Irving CS, Wong WW, Shulman RJ et al - [ 13C] bicarbonate kinetics in
humans: intra- vs. interindividual variations. Am J Physiol, 1983;245:
R190-R202.
23. Poyart CF, Freminet A, Bursaux E - The exchange of bone CO 2 in vivo.
Respir Physiol, 1975;25:101-107.
24. Leijssen DP, Elia M - Recovery of 13CO2 and 14CO2 in human bicarbonate
studies: a critical review with original data. Clin Sci, 1996;91:665-677.
25. Suen VMM - Taxa de recuperação do gás carbônico no ar expirado em
obesos. Tese de Doutorado. Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto.
Universidade de São Paulo, 2001.
26. Archie JP Jr - Mathematic coupling of data: a common source of error.
Ann Surg, 1981;193:296-303.
27. Moreno LF, Stratton HH, Newell JC et al - Mathematical coupling of
data: correction of a common error for linear calculations. J Appl Physiol, 1986;60:335-343.
28. Shoemaker WC, Appel PL, Kram HB - Oxygen transport measurements to
evaluate tissue perfusion and titrate therapy: dobutamine and dopamine
effects. Crit Care Med, 1991;19:672-688.
29. Bresson JL, Mariotti A, Narcy P - Recovery of [ 13C]-bicarbonate as respiratory 13CO2 in parenterally fed infants. Eur J Clin Nutr, 1990;44:3-9.
30. Garlick PJ, Mcnurlan MA, Mchardy KC et al - Rates of nutrient utilization
in man measured by combined respiratory gas analysis and stable isotopic
labelling: effect of food intake. Hum Nutr Clin Nutr, 1987;41:177-191.
31. Irving CS, Wong WW, Wong WM et al - Rapid determination of wholebody bicarbonate kinetics by use of a digital infusion. Am J Physiol,
1984;247(4 Pt 2):R709-R716.
32. Irving CS, Lifschitz CH, Wong WW et al - Characterization of HCO 3-/CO2
pool sizes and kinetics in infants. Pediatr Res, 1985;19:358-363.
137
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
A Scanographic Assessment of Alveolar Recruitment
and Overinflation during High Frequency Ventilation Preliminary Results in Three Patients*
Silvia Regina Rios Vieira1, Qin Lu2, Jean-Jacques Rouby3
SUMMARY
BACKGROUND AND OBJECTIVES: High-frequency ventilation (HFV) may offer an attractive alternative to conventional
strategies in the ventilation of the acute respiratory distress syndrome (ARDS) or acute lung injury (ALI) because it can
minimize lung injury. Maintaining ventilation between lower and upper inflection points, it can warrant alveolar recruitment
with probably reduced level of overinflation. The goal of this study was to compare alveolar recruitment and overinflation
induced by HFV versus conventional mechanical ventilation with positive-end expiratory pressure (PEEP), in three patients
with ALI/ARDS.
METHODS: This was a prospective study in an Intensive Care Unit of a University Hospital, evaluating three ALI/ARDS
patients. Scanographic measurements were done, using special software (Lungview), during HFV and conventional ventilation with or without PEEP, in a randomised order. In HFV and PEEP mean airway pressure was kept constant. Lung density
histograms were plotted. Alveolar recruitment was calculated as the percentages of air that entering in sick lung areas. Overinflation was calculated as lung volume under –900 Hounsfield units.
RESULTS: Lung density histograms were similar in both conditions. Alveolar recruitment was 49 ± 35% versus 48 ± 27% and
overinflation was15 ± 5 ml (0.4 ± 0.1 %) and 2 ± 2 ml (0.1 ± 0.1%) in HFV and PEEP, respectively.
CONCLUSIONS: In the three patients evaluated application of HFV and conventional mechanical ventilation with PEEP
showed, for the same mean airway pressure, similar lung density histograms as well as similar level of alveolar recruitment
and lung overinflation.
Key Words: acute respiratory distress syndrome, acute lung injury, high frequency ventilation, positive-end expiratory pressure, alveolar recruitment, lung overinflation.
M
echanical ventilation can have deleterious effects
in patients with acute respiratory distress syndrome (ARDS) or acute lung injury (ALI)1. This has
raised concerns about the conventional ventilatory management of this syndrome and high-frequency ventilation
(HFV) may offer an attractive alternative to conventional
strategies because it minimizes lung injury2. HFV is a form
of mechanical ventilation in which small tidal volumes (1
to 5 ml per kilogram) are administered at high rates (60 to
3600 cycles per minute. While applying small and frequent
tidal volumes, it maintains the respiratory system between
the lower and the upper inflection points from the pressure-volumes (P-V) curves2, making good physiologic sense
in the management of ARDS. Clinical trials did not show
benefits in mortality principally in adult patients with ALI
or ARDS3-8. Nevertheless it has been used as a ventilatory
mode for managing this syndrome not only in pediatric but
also in adult patients9-16.
The goals of mechanical ventilation in ARDS patients
are to recruit damaged lung tissue causing the least lung
overinflation in order to prevent barotrauma. Some studies have been done in the last years measuring alveolar
recruitment and overinflation associated to conventional
mechanical ventilation with positive end-expiratory pres-
sure (PEEP), using CT scan measurements. It has been demonstrated that PEEP can induce alveolar recruitment17,18
but also that, at least sometimes, it can be associated with
lung overinflation19-21, defining overinflation as lung volumes above –900 Hounsfield units (HU) in lung density
histograms. There is no study, in our days, evaluating scanographic measurements of recruitment and overinflation
induced by HFV.
The goal of this study was to compare alveolar recruitment and lung overinflation induced by HFV versus conventional mechanical ventilation with PEEP, in three patients
with ALI or ARDS.
METHODS
The study was designed to include patients with ARDS
or ALI, defined according to the consensus conference (22),
with diffuse radiological manifestations in CT scans examinations and with a lower inflection point in P-V curves. Patients with hemodynamic instability, heart failure, acute coronary insufficiency, chronic obstructive pulmonary disease
(COPD), severe head injury and having a chest tube with air
leak were excluded.
The protocol was approved by the Comité Consultatif de
1. Professor of Internal Medicine, Department of Internal Medicine, Faculty of Medicine, Federal University from Rio Grande Do Sul, Intensive
Care Unit, Hospital de Clinicas de Porto Alegre, Brazil.
2. Praticien Hospitalier, Surgical Intensive Care Unit Pierre Viars, Research Coordinator, La Pitié-Salpétrière Hospital, University of Paris VI,
Paris, France
3. Professor of Anesthesiology and Critical Care Medicine, Director of the Surgical Intensive Care Unit Pierre Viars, La Pitié-Salpétrière Hospital,
University of Paris 6, Paris, France
* Received from the Surgical Intensive Care Unit, Department of Anesthesiology, Pitié-Salpêtrière Hospital, University of Paris VI, France.
Received 28th June 2004 - Accepted 17th August 2004
Address for correspondence: Profa Dra Silvia Regina Rios Vieira - Rua São Luis, n° 1127/501 - 90620-170 Porto Alegre, RS, Brazil - E-mail :
[email protected]
138
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Protection des Personnes dans la Recherche Biomédicale of
la Pitié-Salpêtrière Hospital (Paris, France) and written informed consent was obtained from each patient’s next of kin.
During the study, all patients were treated according to the
routine from the Intensive Care Unit (ICU). They were sedated, paralyzed, orally intubated with a HI-Lo Jet number 8
Mallinckrodt tube (Mallinckrodt Inc; Argyle, NY, USA) and
under mechanical ventilation. In all patients hemodynamic
measurements were monitored using a fiberoptic thermodilution pulmonary artery catheter and a radial or femoral
arterial catheter. P-V curves were obtained according to a
constant flow technique23 and used to determine the lower
inflection point.
Patients were evaluated during conventional ventilation
without (ZEEP) or with PEEP and during high frequency
jet ventilation (HFV) in a randomised order. Conventional
mechanical ventilation was performed with a César Ventilator, (Taema, France). Connections between the endotracheal tube and the ventilator were removed as well as
the filter, replaced by a hot humidificator. Ventilatory parameters were: FIO2 1, I/E ratio 0.40, no inspiratory pause,
respiratory rate at the limit of intrinsic PEEP, tidal volume
between 6 and 8 mL/kg in order to keep PaCO2 value between 35 and 45 mmHg, plateau pressure below 30 cmH2O
and PEEP 2 cmH2O above the lower inflection point. A
sigh was administered 4 times a minute using 1.5 times the
tidal volume, in order to reproduce conditions from HFV.
With those ventilatory parameters mean airway pressure (measured in the distal portion from the endotracheal
tube) and PaCO2 were unregistered and used as reference
for HFV adjustments.
HFV was performed using an AMS 1000 ventilator (Acutronic Medical Systems AG, Hirzel, Switzerland). Rewarming
and humidification of gases were provided by an HH-812 jet
humidifier (Acutronic Medical Systems AG, Hirzel, Switzerland). Additional conventional ventilation was obtained
using a CPU 1 ventilator (Ohmeda, Maurepas, France). In
HFV pressure and I:E ratio were adjusted in order to achieve
the reference mean airway pressure measured in conventional ventilation. In the same way, tidal volume and respiratory
rate were adjusted to achieve the same PaCO2 measured in
conventional ventilation ± 5 mmHg. HFV was done in the
proximal channel from the Mallinckrodt tube. Conventional
ventilation was maintained with a volume of 100 mL, I/E ratio 1/15, respiratory rate 4 breaths per minute. Measurements
of mean airway pressure in the distal portion from the endotracheal tube did not take in account the breaths from conventional ventilation.
Data collected were: age; Simplified Acute Physiologic
Score (SAPS II)24; Lung Injury Severity Score (LISS)25; cardiorespiratory measurements as well as CT acquisition unregistered as in other previous protocols19-21,23,26-28. Scanographic assessment was done using specifically designed software (Lungview) according to previous description21,26-28.
Lung density histograms were plotted in the three conditions
studied. Total and partial lung volumes and the volume of
gas and tissue were measured and calculated as percentage
of the total lung volume. As previously described19,20 different
lung regions were defined as: nonaerated (–100 to +100 HU),
poorly aerated (–100 to –500 HU), normally aerated (–500
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
to –900HU) and overinflated (–900 to –1000 HU). Alveolar
recruitment was calculated as the percentage of air going into
sick lung areas, according to the method proposed by Malbouisson et al.28.
Cardiorespiratory measurements were unregistered after
one hour periods and CT acquisitions were taken after fifteen
minute periods, in the following order, according to randomization: ZEEP, PEEP or HFV, ZEEP and PEEP or HFV.
In PEEP and HFV they were compared in the same level of
mean airway pressure.
RESULTS
During one year only three patients (mean age 47 ± 19 years, SAPS score 29 ± 10 and a LISS score 3 ± 0.6) fulfilled the
inclusion and non-exclusion criteria. Two of them had ALI
(PaO2/FIO2 = 258 and 247) and one ARDS criteria (PaO2/
FIO2 = 145). The three patients survived.
The mean airway pressure during PEEP or HFV was 21
± 7 cm H2O. The mean PEEP level used was 15 ± 5 cmH2O.
The tidal volume was 713 ± 80 mL in ZEEP, 647 ± 50 ml in
PEEP and 122 ± 39 in HFV. The respiratory rate was 18 ± 6
in ZEEP, 19 ± 5 in PEEP and 187 ± 23 in HFV.
The most important cardiorespiratory and lung volume
measurements in ZEEP, PEEP and HFV are shown in table
1. The measurements obtained in HFV and in PEEP were
similar, but some small differences could be seen when both
conditions were compared: arterial pressure and systemic
vascular resistance were slightly lower; pulmonary pressure,
pulmonary vascular resistance, PaCO2 and Qs/Qt were slightly higher in HFV. Alveolar recruitment was the same in
HFV and PEEP. The volume of overinflation was slightly
greater with HFV but similar when calculated in percentage
over total lung volume. The lung density histograms obtained
in the three conditions are shown in figure 1. There was no
difference comparing HFV and PEEP, in the three patients
described.
DISCUSSION
In the three patients studied application of conventional
mechanical ventilation with PEEP and HFV had, for a same
mean airway pressure, the same level of alveolar recruitment
and overinflation.
Previous results concerning clinical studies with HFV demonstrated very good results concerning oxygenation, being
better than conventional ventilation with PEEP and, sometimes, lifesaving. It is true both when it is done as high frequency
jet ventilation14 or as high frequency oscillation11,13. Considering its physiological basis, HFV is a ventilatory strategy that
maintains the respiratory system between the lower and the
upper inflection points from pressure-volume curves2. Taking
in account this information one could hypothesize that HFV
can induce the same or greater alveolar recruitment than
PEEP with less risk of overinflation. This hypothesis was not
observed in the three patients described here.
Despite the small number of patients, this report was
the first one showing lung density histogram during HFV
and trying to quantify alveolar recruitment and lung overinflation with this ventilatory strategy, using the same sca-
139
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Table 1 – Cardiorespiratory Parameters and Lung Volumes
in ZEEP, HFV and PEEP in the Three Patients Studied
ZEEP
HFV
PEEP
HR (bpm)
90 ± 20
88 ± 18
84 ± 22
MAP (mmHg)
93 ± 13
83 ± 14
89 ± 19
MPAP (mmHg)
29 ± 4
34 ± 1
29 ± 4
PAOP (mmHg)
16 ± 4
15 ± 5
12 ± 5
CI (L.min-1.m-2)
4.0 ± 1.6
3.2 ± 0.5
3.1 ± 0.7
SVR (dynes.s.cm .m )
2004 ± 1383 1845 ± 791
2200 ± 1232
-5
2
PVR (dynes.s.cm .m )
303 ± 151
489 ± 210
449 ± 152
PaCO2 (mmHg)
38 ± 10
46 ± 8
38 ± 4
PaO2 (mmHg)
217 ± 62
283 ± 56
295 ± 20
PaO2 + PaCO2 (mmHg)
254 ± 66
329 ± 64
333 ± 22
DO2 (mL.min .m )
500 ± 165
417 ± 41
405 ± 66
VO2 (mL.min-1.m-2)
111 ± 35
109 ± 10
121 ± 13
Qs/Qt (%)
35 ± 5
30 ± 6
24 ± 4
Total lung volume (mL)
1630 ± 459
2555 ± 883 2729 ± 725
-5
-1
2
-2
Overinflated volume (mL) 0 ± 0
15 ± 5
2±2
(%)*
Normally aerated
volume (mL)
(%)*
0±0
0.4 ± 0.1
0.1 ± 0.1
402 ± 270
1764 ± 683 1965 ± 501
26 ± 15
68 ± 5
72 ± 6
Poorly aerated volume (mL) 705 ± 248
335 ± 58
329 ± 69
(%)*
14 ± 3
12 ± 2
Non-aerated volume (mL) 523 ± 266
442 ± 138
433 ± 217
(%)*
18 ± 3
16 ± 5
49 ± 35
48 ± 27
Recruitment** (%)*
44 ± 9
31 ± 9
ZEEP= Zero PEEP; PEEP= Positive end-expiratory pressure; HFV= high frequency
ventilation; HR = heart rate; MAP = mean arterial pressure; MPAP = mean pulmonary artery pressure; PAOP = pulmonary artery occlusion pressure; CI = cardiac
index; SVR = indexed systemic vascular resistance; PVR = indexed pulmonary
vascular resistance; PaCO2 = arterial pressure of CO2; PaO2 = arterial pressure of
oxygen; DO2 = oxygen delivery; VO2 = oxygen consumption; Qs/Qt = pulmonary
shunt; * percentages over the total lung volume; ** recruitment calculated according to Malbouisson et al [Malbouisson, 2001 #1988].
nographic methods previously described for conventional
ventilation with PEEP19,20,28. Maintaining the same mean
airway pressure, lung density histograms were superimposable as well as the calculated volume of recruitment and
overinflation.
The limitations of this report are that, till now, only three
patients were included. Therefore, no definitive conclusion
could be established from the observations described. A greater number of patients have to be enrolled in order to confirm
the tendency observed here. In the same way, other protocols
have to be considered using, for instance, the same plateau
pressure instead of the same mean airway pressure.
In conclusion, we have described three patients in whom
HFV was compared by CT scan methods with conventional
mechanical ventilation with PEEP and, for the same mean airway pressure, both ventilatory methods showed similar lung
density histograms as well as the same amount of alveolar
recruitment and lung overinflation.
140
Figure 1: Individual lung density histograms in the 3 conditions;
ZEEP = Zero PEEP; PEEP = Positive end-expiratory pressure; HFV
= high frequency ventilation.
RESUMO
JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: A ventilação de alta
freqüência (HFV) pode oferecer uma alternativa às estratégias ventilatórias convencionais em pacientes com síndrome
da angústia respiratória aguda (SARA) ou lesão pulmonar
aguda (LPA), pois pode minimizar a lesão pulmonar. Como
mantém a ventilação entre os pontos de inflexão inferior e
superior, pode assegurar recrutamento e reduzir a possibilidade de hiperinflação. O objetivo deste estudo foi comparar o recrutamento alveolar e a hiperinflação induzidos pela
HFV versus ventilação mecânica convencional com pressão
expiratória final positiva (PEEP), em três pacientes com LPA/
SARA.
MÉTODO: Foi realizado um estudo prospectivo em uma
Unidade de Tratamento Intensivo de um Hospital Universitário, avaliando três pacientes com LPA/SARA. Medidas
tomográficas foram realizadas, utilizando um programa especial (Lungview), durante HFV e ventilação convencional
com ou sem PEEP, em ordem aleatória. Durante HFV e
PEEP a pressão média de vias aéreas era mantida constante.
Foram comparados os histogramas de densidade pulmonares. O recrutamento alveolar foi calculado como a quantidade de ar que penetrava nas áreas pobremente e não aeradas.
A hiperinflação foi calculada como o volume pulmonar com
densidade abaixo de –900 unidades Hounsfield.
RESULTADOS: Os histogramas pulmonares foram similares em HFV e em PEEP. O percentual de recrutamento foi
de 49 ± 35% versus 48 ± 27% e os valores de hiperinflação
foram 15 ± 5 ml (0.4 ± 0.1 %) e 2 ± 2 ml (0,1 ± 0,1%), respectivamente em HFV e PEEP.
CONCLUSÕES: Nos três pacientes estudados, a aplicação de HFV ou de ventilação mecânica convencional com
PEEP mostrou, para a mesma pressão média de via aérea,
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
histogramas de densidade pulmonares similares, bem como
níveis semelhantes de recrutamento alveolar e de hiperinflação pulmonar.
Unitermos: Síndrome da angústia respiratória aguda; lesão pulmonar aguda; ventilação de alta freqüência; pressão
expiratória final positiva; recrutamento alveolar, hiperinflação pulmonar.
REFERENCES
01. Rouby JJ, Lherm T, Martin de Lassale E et al - Histologic aspects of pulmonary
barotrauma in critically ill patients with acute respiratory failure. Intensive
Care Med, 1993;19:383-389.
02. Herridge MS, Slutsky AS, Colditz GA - Has high-frequency ventilation been
inappropriately discarded in adult acute respiratory distress syndrome? Crit
Care Med, 1998;26:2073-2077.
03. Schuster DP, Klain M, Snyder JV - Comparison of high frequency jet ventilation to conventional ventilation during severe acute respiratory failure in
humans. Crit Care Med, 1982;10:625-630.
04. Carlon GC, Howland WS, Ray C et al - High-frequency jet ventilation. A prospective randomized evaluation. Chest, 1983;84:551-559.
05. Holzapfel L, Robert D, Perrin F et al - Comparison of high-frequency jet ventilation to conventional ventilation in adults with respiratory distress syndrome.
Intensive Care Med, 1987;13:100-105.
06. The HIFI study group. High-frequency oscillatory ventilation compared with
conventional mechanical ventilation in the treatment of respiratory failure in
preterm infants. N Engl J Med, 1989;320:88-93.
07. Hurst JM, Branson RD, Davis K Jr et al - Comparison of conventional mechanical ventilation and high-frequency ventilation. A prospective, randomized trial in patients with respiratory failure. Ann Surg, 1990;211:486-491.
08. Derdak S, Mehta S, Stewart TE et al - High-frequency oscillatory ventilation for
acute respiratory distress syndrome in adults: a randomized, controlled trial.
Am J Respir Crit Care Med, 2002;166:801-808.
09. Rouby JJ, Simonneau G, Benhamou D et al - Factors influencing pulmonary
volumes and CO2 elimination during high- frequency jet ventilation. Anesthesiology, 1985;63:473-482.
10. Rouby JJ, Viars P - Clinical use of high frequency ventilation. Acta Anaesthesiol Scand, 1989;90:(Suppl):134-139.
11. Fort P, Farmer C, Westerman J et al - High-frequency oscillatory ventilation for adult respiratory distress syndrome--a pilot study. Crit Care Med,
1997;25:937-947.
12. Froese AB - High-frequency oscillatory ventilation for adult respiratory distress
syndrome: let’s get it right this time! Crit Care Med, 1997;25:906-908.
13. Mehta S, Lapinsky SE, Hallett DC et al - Prospective trial of high-frequency
oscillation in adults with acute respiratory distress syndrome. Crit Care Med,
2001;29:1360-1369.
14. Riou B, Zaier K, Kalfon P et al - High-frequency jet ventilation in life-threatening bilateral pulmonary contusion. Anesthesiology, 2001;94:927-930.
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
15. Dobyns EL, Anas NG, Fortenberry JD et al - Interactive effects of high-frequency oscillatory ventilation and inhaled nitric oxide in acute hypoxemic respiratory failure in pediatrics. Crit Care Med, 2002;30:2425-2429.
16. Plavka R, Kopecky P, Sebron V et al - Early versus delayed surfactant administration in extremely premature neonates with respiratory distress syndrome
ventilated by high-frequency oscillatory ventilation. Intensive Care Med,
2002;28:1483-1490.
17. Gattinoni L, Pesenti A, Bombino M et al - Relationships between lung computed tomographic density, gas exchange, and PEEP in acute respiratory failure.
Anesthesiology, 1988;69:824-832.
18. Gattinoni L, Pelosi P, Crotti S et al - Effects of positive end-expiratory pressure
on regional distribution of tidal volume and recruitment in adult respiratory
distress syndrome. Am J Respir Crit Care Med, 1995;151:1807-1814.
19. Vieira SR, Puybasset L, Richecoeur J et al - A lung computed tomographic assessment of positive end-expiratory pressure-induced lung overdistension. Am
J Respir Crit Care Med, 1998;158:1571-1577.
20. Vieira SR, Puybasset L, Lu Q et al - A scanographic assessment of pulmonary
morphology in acute lung injury. Significance of the lower inflection point
detected on the lung pressure-volume curve. Am J Respir Crit Care Med,
1999;159:(5 Pt 1):1612-1623.
21. Puybasset L, Muller JC, Cluzel P et al - Group CSAs. Regional distribution of
gas and tissue in acute respiratory distress syndrome. III. Consequences for the
effects of positive end-expiratory pressure. Intensive Care Med, 2000;26:12151227.
22. Bernard GR, Artigas A, Brigham KL et al - The American-European Consensus Conference on ARDS. Definitions, mechanisms, relevant outcomes,
and clinical trial coordination. Am J Respir Crit Care Med, 1994;149:(3 Pt
1):818-824.
22. Bernard GR, Artigas A, Brigham KL et al - The American-European Consensus Conference on ARDS. Definitions, mechanisms, relevant outcomes,
and clinical trial coordination. Am J Respir Crit Care Med, 1994;149:(3 Pt
1):818-824.
23. Lu Q, Vieira SR, Richecoeur J et al - A simple automated method for measuring
pressure-volume curves during mechanical ventilation. Am J Respir Crit Care
Med, 1999;159:275-282.
24. LeGall JR, Lemeshow S, Saulnier F - A new simplified acute physiology score
(SAPS II) based on a European/North American multicenter study. JAMA
1993;270(24):2957-63.
25. Murray JF, Matthay MA, Luce JM et al - An expanded definition of the adult
respiratory distress syndrome. Am Rev Resp Dis, 1988;138:720-723.
26. Puybasset L, Cluzel P, Gusman P et al - Regional distribution of gas and tissue
in acute respiratory distress syndrome. I. Consequences for lung morphology.
Intensive Care Med, 2000;26:857-869.
27. Rouby JJ, Puybasset L, Cluzel P et al - Regional distribution of gas and tissue in
acute respiratory distress syndrome. II. Physiological correlations and definition of an ARDS Severity Score. CT Scan ARDS Study Group. Intensive Care
Med, 2000;26:1046-1056.
28. Malbouisson LM, Muller JC, Constantin JM et al - Computed tomography
assessment of positive end-expiratory pressure-induced alveolar recruitment
in patients with acute respiratory distress syndrome. Am J Respir Crit Care
Med, 2001;163:1444-1458.
141
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Comparação entre a Pressão Inspiratória Máxima Medida
pelo Método da Válvula Unidirecional e pelo
Convencional em Pacientes Submetidos ao Processo
de Desmame da Ventilação Mecânica Invasiva*
Comparison between Maximal Inspiratory Pressure Measure by One-Way Valve Method
and Conventional Method in Patients under Weaning from Invasive Mechanical Ventilation
Wellington Pereira dos Santos Yamaguti1, Luiz Antonio Alves1, Ivanil Aparecida Moro Kauss2,
Carrie Chueiri Ramos Galvan3, Antonio Fernando Brunetto4.
SUMMARY
BACKGROUND AND OBJECTIVES: Maximal Inspiratory Pressure (MIP) is an effective method to estimate strength of inspiratory muscles and a significant predictive index for outcome in weaning from invasive mechanical ventilation. The objectives of this study were to compare MIP assessed by one-way valve and conventional methods and evaluate their learning
effects, in patients under weaning, mechanical ventilation .
METHODS: Then patients were evaluated, age means 44 ± 12 years. Consecutive patients under weaning, mechanical ventilation , conscious and cooperative, admitted in a 6 month period in an adult ICU. MIP was measured by both methods in
a randomized sequence, through 10 measures each. The best values of 10 measures (MIP10) and first 3 measures (MIP3)
from both methods were selected to statistical analysis.
RESULTS: The MIP measured by conventional method was 48.9 ± 18.4 cmH2O and by one-way valve was 62 ± 19.8 cmH2O
(p < 0.003). The MIP3 and MIP10 measured by conventional method were, respectively, 45.1 ± 16.4 cmH2O and 48.9 ±
18.4 cmH2O (p < 0.02) and by one-way valve method, 60.1 ± 19.9 cmH2O and 62 ± 19.8 cmH2O (p = 0.06).
CONCLUSIONS: The one-way valve method is the best method for MIP assessment in patients under weaning, mechanical
ventilation because it produces larger values and has no learning effect.
Key Words: Maximal Inspiratory Pressure, Respiratory Muscles, Weaning, Mechanical Ventilator
A
mensuração da Pressão Inspiratória Máxima (PImax) é um método efetivo para a avaliação da força muscular inspiratória1. O método mais comum
para se mensurar a PImax é através da manutenção de pressão negativa máxima por pelo menos um segundo após uma
expiração forçada até o volume residual, contra uma via
aérea ocluída2, com valores registrados em manovacuômetro analógico ou digital. Esse método é amplamente utilizado ambulatoriamente em pacientes respirando espontaneamente, tendo a particularidade de necessitar a colaboração
do paciente.
Em Unidades de Terapia Intensiva a PImax tem-se mostrado como um dos índices preditivos de sucesso no desmame
da ventilação mecânica invasiva3-5. Sahn e Lakshminarayan6,
mostraram que pacientes capazes de gerar pressões menores
que -30 cmH2O obtiveram sucesso no desmame da ventilação
mecânica invasiva e aqueles incapazes de gerar uma pressão de
pelo menos -20 cmH2O não obtiveram sucesso no desmame.
Em pacientes submetidos à ventilação mecânica a avaliação da PImax por esse método convencional torna-se difícil
em virtude da dificuldade do paciente em cooperar, fato que
pode comprometer a acurácia das medidas. Para resolver esse
problema, Truwit e Marini7 desenvolveram uma técnica que
otimiza o esforço inspiratório de pacientes críticos e não cooperativos. Esses autores propõem a utilização de uma válvula
expiratória unidirecional onde a expiração é permitida sem
resistência e a inspiração é bloqueada. Isso faz com que o paciente inicie sucessivos esforços inspiratórios progressivamente mais próximos do volume residual, gerando uma pressão
negativa cada vez maior. Esse método envolve menor coordenação entre o paciente e o avaliador porque representa uma
resposta fisiológica (aumento do drive respiratório depois de
uma inspiração prévia insuficiente), podendo ser utilizado em
pacientes incapazes de colaborar para a realização da manobra de PImax pelo método convencional.
Caruso e col.8 compararam a técnica convencional e a válvula unidirecional, encontrando uma PImax maior quando
medida pelo método da válvula unidirecional. Porém, diante
do pequeno número de manobras realizadas em cada modalidade, os resultados encontrados poderiam não refletir a realidade em virtude de um possível efeito aprendizado existente
nas técnicas.
1. Residente em Fisioterapia Pulmonar do Hospital Universitário Regional Norte do Paraná / UEL
2. Fisioterapeuta da Unidade de Terapia Intensiva do Hospital Universitário Regional Norte do Paraná / UEL
3. Docente do Curso de Fisioterapia da UEL
4. Docente do Curso de Fisioterapia da UEL e da UNOPAR
* Recebido do Hospital Universitário Regional Norte do Paraná, Londrina, PR
Apresentado em 11 de julho de 2004 - Aceito para publicação em 27 de setembro de 2004
Endereço para correspondência: Wellington Pereira dos Santos Yamaguti - Av. Robert Kock, 60 - 86038-440 Londrina, PR. - Fone: (43) 3371-2477
- Fax: (43) 3371- 5100 - E-mail: [email protected]
142
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Dessa forma, os objetivos desse estudo foram comparar
a PImax obtida pelo método convencional e pelo método da
válvula unidirecional em pacientes em processo de desmame
da ventilação mecânica invasiva e avaliar o possível efeito
aprendizado existente em ambos os métodos.
MÉTODO
O estudo foi desenvolvido na Unidade de Terapia Intensiva do Hospital Universitário Regional do Norte do Paraná
(HURNPr), tendo sido previamente aprovado pelo Comitê
de Ética em Pesquisa do referido hospital. Todos os pacientes
internados e em processo de desmame de ventilação mecânica durante um período de 6 meses foram avaliados. Os pacientes selecionados para o estudo deveriam, necessariamente, utilizar via aérea artificial, apresentar condições clínicas
aceitáveis para o desmame de ventilação mecânica, apresentar bom nível de entendimento e compreensão, estar hemodinamicamente estável e concordar em participar do estudo
por meio de um termo de consentimento. Foram excluídos do
estudo pacientes que apresentassem contra-indicações para a
realização de manobra inspiratória forçada (hipertensão intracraniana e instabilidade da caixa torácica) e aqueles que
apresentassem sinais clínicos de fadiga muscular inspiratória
ou qualquer sintoma de intolerância durante a realização das
manobras.
O protocolo de desmame da ventilação mecânica foi realizado de maneira padronizada em todos os pacientes, utilizando-se da modalidade de pressão de suporte ventilatório.
Foi utilizado um manovacuômetro digital (MVD500,
Porto Alegre, Brasil) capaz de registrar pressões de até -300
cmH2O, calibrado contra uma coluna de mercúrio antes do
início da coleta de dados e semanalmente durante as mensurações. Na mensuração da PImax pelo método convencional,
o manovacuômetro era acoplado a um tudo “T”, com uma
saída fechada e a outra acoplada ao tubo endotraqueal do
paciente. Na mensuração pelo método da válvula unidirecional, uma das saídas do tubo “T” era acoplada ao tubo
endotraqueal e a outra a uma válvula unidirecional de baixa
resistência que permitia apenas a expiração seletiva.
Os pacientes com requisitos para participarem do estudo foram encaminhados pelo corpo clínico da UTI adulto
aos pesquisadores responsáveis pela coleta de dados. Após
contato inicial, os pacientes receberam as explicações para a
autorização em participar do estudo e orientados quanto aos
procedimentos que seriam realizados.
O método a ser inicialmente aplicado foi definido previamente por alocação aleatória. Antes da realização das medidas era avaliada a condição da via aérea artificial e, quando
necessário, era realizada a aspiração de secreções brônquicas
e/ou ajuste de pressão do balonete. Durante a realização das
mensurações de PImax, os pacientes permaneceram sentados
em semi-decúbito de 45º e foram constantemente incentivados verbalmente de maneira padronizada. Após a realização
do teste prévio, ocorria um intervalo de 20 minutos antes da
realização do segundo teste, período em que o paciente permanecia conectado ao ventilador e em modalidade de desmame.
Método convencional: o paciente era desconectado do
ventilador mecânico e conectado ao manovacuômetro. SoliVolume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
citava-se para o paciente realizar uma expiração prolongada
até próximo do volume residual (permitida pela não oclusão
total da saída do manovacuômetro), seguida de um esforço
inspiratório máximo com a conexão totalmente ocluída durante cerca de 2 a 3 segundos.
Método da válvula unidirecional: o paciente era desconectado do ventilador mecânico e conectado ao tubo “T”
acoplado à válvula unidirecional com a entrada inspiratória
totalmente ocluída. Era solicitado ao paciente para que tentasse inspirar e expirar com o máximo esforço durante cerca
de 20 segundos.
Foram realizadas um total de 10 manobras de PImax
para cada um dos métodos pelo mesmo investigador, com um
intervalo de um minuto entre cada manobra. Durante esses
intervalos o paciente era reconectado ao ventilador mecânico. Foi selecionado o maior valor obtido de 10 mensurações
para a comparação entre os métodos. Também foi selecionado o maior valor das três primeiras medidas (PImax3) para a
comparação com o maior valor de 10 medidas (PImax10) em
cada um dos métodos, com o intuito de verificar a existência
de efeito aprendizado nas diferentes técnicas.
ANÁLISE ESTATÍSTICA
A normalidade da distribuição dos valores foi avaliada
através do teste de Shapiro-Wilk, seguido da aplicação do
teste t de Student para dados pareados (distribuição gaussiana) ou do teste de Wilcoxon (distribuição não-gaussiana)
para comparar os valores de PImax obtidos pelos métodos
convencional e da válvula unidirecional, além de comparar
os maiores valores obtidos nas três primeiras medidas (PImax3) com os maiores valores de 10 medidas (PImax10) em
ambos os métodos, considerando nível de significância para
p < 0,05.
RESULTADOS
Foram avaliados um total de 10 pacientes que atendiam a
todos os critérios de inclusão. As características dessa população estão descritas na tabela 1.
Tabela 1 – Características da População Estudada
Idade (anos) *
Peso (kg) *
Altura (cm) *
Sexo
Masculino
Feminino
Período sob ventilação mecânica invasiva (h) *
Critério de admissão na UTI
Pacientes em pós-operatório
Paciente com insuficiência respiratória aguda
44 ± 12
70 ± 49
158,5 ± 6,9
3
7
60 ± 50
6
4
* Valores expressos pela Média ± DP
O valor médio da PImax obtida pelo método convencional foi 48,9 ± 17,5 cmH2O e o valor médio da PImax obtida pelo método da válvula unidirecional foi de 68,4 ± 28,5
cmH2O, apresentando diferença estatisticamente significativa
(Wilcoxon, p < 0,003) (Figura 1).
143
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Figura 1 - Valores de PImax Medidos pelo Método Convencional e
pelo Método da Válvula Unidirecional
* - diferença estatisticamente significante (p < 0,003)
No método convencional, quando se comparou a PImax3
(45,4 ± 15,6 cmH2O) com a PImax10 (48,9 ± 17,5 cmH2O)
observou-se uma diferença estatisticamente significativa entre os valores (Wilcoxon, p < 0,02). Já no método da válvula
unidirecional, não foi observada diferença estatisticamente
significativa (Wilcoxon, p = 0,0656) entre a PImax3 (63,2 ±
27,4 cmH2O) e a PImax10 (68,4 ± 28,5 cmH2O) (Figura 2).
Figura 2 – Comparação entre a PImax10 e a PImax3
Mensuradas pelo Método Convencional e pelo
Método da Válvula Unidirecional
* - diferença estatisticamente significante entre PImax3 e PImax10 no método
convencional (p < 0,02)
DISCUSSÃO
Esse estudo teve como proposta verificar qual dos dois
métodos é capaz de determinar maiores valores de PImax em
pacientes ventilados artificialmente. Os resultados mostram
que a PImax mensurada pelo método da válvula unidirecional é significativamente maior que a PImax mensurada pelo
método convencional. No estudo de Caruso e col.8, o valor da
144
PImax mensurada pela válvula unidirecional foi aproximadamente 30% maior que a PImax mensurada pelo método convencional, apresentando um valor muito próximo ao presente
estudo (diferença de 27%). Fica evidente, então, que avaliação
pelo método convencional subestima a PImax em pacientes
intubados e que a comparação com valores de normalidade1,9
(onde a PImax foi avaliada em indivíduos saudáveis e através
do método convencional) fica prejudicada quando se utiliza
o método da válvula unidirecional.
Tentando excluir a influência do efeito aprendizado, foram realizados nesse estudo 10 manobras de PImax para cada
método, selecionando o maior valor para a comparação dos
resultados. A diferença entre a PImax obtida pelos dois métodos se manteve, mesmo selecionando o melhor valor obtido
em 10 mensurações. Isso evidencia que outras variáveis devem ser responsáveis por essa diferença. Conforme discutido
por Caruso e col.8, estímulo ao drive respiratório decorrente
de estímulos mecânico pulmonar e metabólico por retenção
de dióxido de carbono, além da realização da manobra em
volume pulmonar próximo ao volume residual, fazem com
que maiores valores sejam atingidos utilizando-se o método
da válvula unidirecional.
Caruso e col.8 realizaram apenas três medidas de PImax
para cada método, selecionando o maior valor para a análise
estatística e discutem sobre a possibilidade do valor de PImax obtido pelo método convencional ter sido subestimado
por um possível efeito aprendizado existente nessa técnica.
Alguns estudos realizados com indivíduos saudáveis ou pacientes respirando espontaneamente, utilizando-se do método convencional, mostraram que é necessária a realização
de dez ou mais manobras para se anular o efeito aprendizado10,11. A partir dessas afirmações, apresenta-se a hipótese de
que a realização de apenas três medidas de PImax pode não
ter sido suficiente para a obtenção de um valor máximo no
método convencional, sendo esse fator uma possível explicação para a diferença encontrada entre a PImax obtida pelos
dois métodos.
Para verificar a existência de efeito aprendizado em ambos
os métodos, foram comparados os maiores valores de PImax
obtidos em 3 e em 10 mensurações em ambos os métodos.
No método convencional ocorreu uma diferença estatisticamente significativa entre a PImax3 e a PImax10, sugerindo a
existência de efeito aprendizado na aplicação desse método.
E essa diferença pode ter sido encontrada pelo fato da técnica convencional depender da colaboração e da motivação
do paciente. Quando comparada a PImax3 com a PImax10
no método da válvula unidirecional, não foi encontrada diferença estatisticamente significativa, sugerindo a ausência de
efeito aprendizado nesse método. Tal resultado pode sugerir
que essa técnica depende exclusivamente de fatores não controlados pelo paciente. Sendo assim, a realização de apenas
três mensurações no método da válvula unidirecional foi suficiente para se obter o maior valor da PImax.
Os resultados deste estudo podem ser generalizados para
todos os tipos de pacientes em processo de desmame de ventilação mecânica, inclusive os não colaborativos. Há que se
ressaltar que o tamanho reduzido da população de estudo
pode ter influência nos valores encontrados em função de um
menor poder estatístico, mas como evidenciado pelas baixas
possibilidades de valores determinados pelo acaso (p < 0,05),
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
a tendência de maiores valores produzidos pelo método da
válvula unidirecional e do relevante efeito aprendizado do
método convencional ficam claros.
CONCLUSÃO
Diante do exposto, conclui-se que o método da válvula unidirecional é o mais adequado para a determinação da pressão
inspiratória máxima de indivíduos submetidos ao desmame da
ventilação mecânica invasiva, uma vez que apresenta maiores
valores e não sofre influência de efeito aprendizado.
AGRADECIMENTOS
A Joseane Lopes pelo auxílio na redação do summary.
valores obtidos nas 10 medidas (PImax10) e nas 3 primeiras
medidas (PImax3) de cada método foram selecionados para
análise estatística.
RESULTADOS:. A PImax obtida pelo método convencional foi 48,9 ± 18,4 cmH2O e pela válvula unidirecional foi de
62 ± 19,8 cmH2O (p < 0,003). A PImax3 e PImax10 obtidas
pelo método convencional foram, respectivamente, 45,1 ± 16,4
cmH2O e 48,9 ± 18,4 cmH2O (p < 0,02) e pela da válvula unidirecional, 60,1 ± 19,9 cmH2O e 62 ± 19, 8 cmH2O (p = 0,06).
CONCLUSÕES: O método da válvula unidirecional é
o mais adequado para mensuração da PImax em pacientes
submetidos ao processo de desmame de ventilação mecânica
invasiva, uma vez que produz maiores valores e não possui
efeito aprendizado.
Unitermos: Desmame de Ventilador Mecânico, Músculos
Respiratórios, Pressão Inspiratória Máxima
LISTA DE ABREVIAÇÕES
REFERÊNCIAS
PImax
PImax3
PImax10
Pressão Inspiratória Máxima
Maior valor de PImax nas 3 primeiras medidas
Maior valor de PImax nas 10 medidas
RESUMO
JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: A avaliação da Pressão Inspiratória Máxima (PImax) é um método efetivo para
estimar a força dos músculos inspiratórios, sendo empregado
como índice preditivo para desmame de ventilação mecânica.
Os objetivos desse estudo foram comparar a PImax obtida
pelo método convencional e pelo método da válvula unidirecional em pacientes em processo de desmame de ventilação
mecânica e avaliar o possível efeito aprendizado.
MÉTODO: Foram avaliados 10 pacientes, com idade média de 44 ± 12 anos. Todos estavam em processo de desmame
de ventilação mecânica invasiva, conscientes e cooperativos,
internados por um período de 6 meses na UTI adulto. A PImax foi medida pelos dois métodos de forma aleatória, sendo realizadas 10 mensurações de cada método. Os maiores
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
01. Black LF, Hyatt RE - Maximal respiratory pressures: normal values and relationship to age and sex. Am Rev Respir Dis, 1969; 99:969-974.
02. Black LF, Hyatt RE - Maximal respiratory pressures in generalized neuromuscular disease. Am Rev Respir Dis, 1971;103:641-650.
03. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. II Consenso Brasileiro de
Ventilação Mecânica. J Pneumol, 2000;26:(Supl2):S1-S68.
04. Feeley TW, Hedley-White J - Weaning from controlled ventilation and supplemental oxygen. N Engl J Med, 1975;292:903-906.
05. Yang KL, Tobin MJ - A prospective study of indexes predicting the outcome of
trials of weaning from mechanical ventilation. N Engl J Med, 1991;324:14451450.
06. Sahn SA, Lakshminarayan S - Bedside criteria for discontinuation of mechanical ventilation. Chest, 1973;63:1002-1005.
07. Truwit JD, Marini JJ - Validation of a technique to assess maximal inspiratory
pressure in poorly cooperative patients. Chest, 1992;102:1216-1219.
08. Caruso P, Friedrich C, Denari S et al - The unidirectional valve is the best
method to determine maximal inspiratory pressure during weaning. Chest,
1998;115:1096-1101.
09. Neder JA, Andreoni S, Lerario MC et al - Reference values for lung function
tests. II. Maximal respiratory pressures and voluntary ventilation. Braz J Med
Biol Res, 1999;32:719-727.
10. Wen AS, Woo MS, Keens TG - How many maneuvers are required to measure
maximal inspiratory pressure accurately? Chest, 1997;111:802-807.
11. Fiz JA, Montserrat JM, Picado C et al - How many maneuvers should be done
to measure maximal inspiratory mouth pressure in patients with chronic airflow obstruction? Thorax, 1989; 44:419-421.
145
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
O Uso de Baixos Níveis de Pressão Suporte Influencia
a Avaliação de Parâmetros de Desmame?*
Low Levels of Pressure Support Can Influence Evaluation of Weaning Parameters?
Júlio Flávio Fiore Júnior1; Ana Carolina Serigatto de Oliveira2; Emerson Pinho3;
Edson Benassule3; Juliana Francischini4; Luciana Dias Chiavagato5.
SUMMARY
BACKGROUND AND OBJECTIVES: Investigate whether pressure support ventilation when used in minimal levels to compensate additional work of breathing caused by endotracheal tube can influence the evaluation of weaning parameters.
METHODS: Twenty-six patients considered ready for extubation in post-operative period of cardiac surgery were evaluated.
All patients underwent evaluation of respiratory rate, tidal volume, minute volume and rapid shallow breathing index after
30 minutes of spontaneous breathing in a T-piece and after 30 minutes of ventilation under pressure support adjusted in
minimal levels to compensate endotracheal tube resistance (7 cmH2O). These trials were applied in a random order.
RESULTS: The values of respiratory rate (p < 0.01), minute volume (p < 0.05) and rapid shallow breathing index (p < 0.01)
were significantly lower and tidal volume were significantly higher (p < 0.01) when measured after ventilation under pressure support compared to 30 minutes T-piece spontaneous breathing.
CONCLUSIONS: The evaluation of respiratory rate, tidal volume, minute volume and rapid shallow breathing index is
influenced by the use of pressure support ventilation even when adjusted to compensate endotracheal tube resistance. It’s
recommended to obey rigorously the methodology used in the studies that originally described the weaning parameters to
avoid prejudice to its predictive value.
Key Words: pressure support, mechanical ventilation, weaning.
A
determinação do momento ideal para a interrupção
da ventilação mecânica (VM) é um desafio para os
profissionais de terapia intensiva, sendo necessária
a distinção entre os pacientes aptos a tolerar a ventilação espontânea daqueles que necessitam prosseguir com o suporte
ventilatório1,2. A retirada precoce da VM permite diminuir os
riscos associados ao procedimento, tais como infecções nosocomiais, estenose traqueal, barotrauma e toxicidade pelo
oxigênio2-4, porém, a desconexão prematura pode exacerbar
a instabilidade cardiorrespiratória e piorar o prognóstico do
paciente3,4. Para orientar esta decisão diversos parâmetros foram propostos com o intuito de predizer o sucesso ou a falha
no desmame da ventilação mecânica.
Os estudos que descrevem os parâmetros de desmame e
seus valores de referência, em sua grande maioria, realizam a
avaliação com o paciente respirando espontaneamente através de tubo T5-9, no entanto, o uso de suporte ventilatório
durante a avaliação é freqüente na prática clínica. O estudo
de Rodrigues e col.10 mostrou que nas unidades de terapia intensiva da cidade de São Paulo o modo pressão suporte (PS)
é extensivamente utilizado durante a avaliação dos parâmetros de desmame, com níveis de pressão variando entre 6 e
12 cmH2O. Alguns estudos sugerem que a avaliação de parâ-
metros de desmame na vigência de suporte pressórico pode
subestimar os valores encontrados na avaliação e prejudicar a
acurácia preditiva dos parâmetros. El-Khatib e col.11 mostraram que o valor do índice de ventilação rápida e superficial
(IRRS) é subestimado quando a avaliação é realizada com o
paciente conectado ao ventilador mecânico no modo pressão
positiva contínua nas vias aéreas (CPAP). Lee e col.12 avaliaram o IRRS com pacientes conectados ao ventilador no
modo CPAP ou PS mostrando prejuízo na acurácia preditiva
do índice, porém, sem descrever os níveis de suporte pressórico utilizados.
O modo pressão suporte é muitas vezes utilizado para
compensar a resistência e o trabalho ventilatório impostos
pelo tubo orotraqueal durante o desmame. Isso permitiria
que o padrão ventilatório do paciente após a extubação traqueal fosse estimado antes da desconexão do ventilador5. Os
estudos de Fiastro e col.13 e Brochard e col.14 sugerem que 7
a 8 cm H2O são os níveis mínimos de PS para compensar a
resistência imposta pelo tubo.
O objetivo do presente estudo foi verificar se o uso do modo
PS, quando ajustado em níveis mínimos para compensar a resistência imposta pelo tubo orotraqueal, têm influência na avaliação de parâmetros de desmame da ventilação mecânica.
1. Fisioterapeuta Especialista em Fisioterapia Respiratória pela UNIFESP. Supervisor do Curso de Especialização em Fisioterapia Respiratória
da UNIFESP. Fisioterapeuta do Hospital Alemão Osvaldo Cruz.
2. Fisioterapeuta Especialista em Fisioterapia Respiratória pela UNIFESP. Fisioterapeuta do Hospital do Câncer A.C. Camargo.
3. Fisioterapeuta Especialista em Fisioterapia Respiratória pela UNIFESP. Supervisor do Curso de Especialização em Fisioterapia Respiratória
da UNIFESP. Fisioterapeuta do Hospital Israelita Albert Einstein.
4. Doutoranda em Ciências da Saúde pela UNIFESP. Fisioterapeuta Supervisora do Curso de Especialização em Fisioterapia Respiratória da
UNIFESP. Docente do Curso de Fisioterapia da Universidade São Camilo.
5. Doutoranda em Ciências da Saúde pela UNIFESP. Fisioterapeuta Supervisora do Curso de Especialização em Fisioterapia Respiratória da
UNIFESP. Docente do Curso de Fisioterapia da UNICID e UNISA.
* Recebido da Disciplina de Pneumologia. Universidade Federal de São Paulo, SP - UNIFESP
Apresentado em 21 de julho de 2004 - Aceito para publicação em 18 de outubro de 2004.
Endereço para correspondência: Dr. Júlio Flávio Fiore Junior - Rua Onze de Junho, 643/153 - 04041-052. São Paulo, SP - E-mail: juliofiore@ig.
com.br - Fone: (11) 9909-1533
146
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
MÉTODO
RESULTADOS
Foram avaliados 26 pacientes, de ambos os sexos, submetidos à cirurgia de revascularização do miocárdio, troca valvar ou correção de aneurisma de aorta, internados
na Unidade de Pós-Operatório de Cirurgia Cardíaca do
Hospital São Paulo – UNIFESP/EPM. O protocolo de
estudo foi previamente aprovado pelo Comitê de Ética
da Instituição.
Ao término da cirurgia os pacientes foram encaminhados a Unidade de Pós-Operatório de Cirurgia Cardíaca
e conectados a ventilação mecânica (Bird 8400) durante
o período de pós-operatório imediato. A inclusão destes
pacientes no protocolo dependeu dos seguintes critérios:
(1) paciente alerta, cooperativo e atendendo a comandos
verbais simples; (2) hemodinamicamente estável (PAM >
7 mmHg, FC < 140); (3) gasometria arterial mostrando
pH de 7,35 a 7,45 e PaO 2 > 80 mmHg com FiO 2 < 40%
e PEEP = 5 cmH2O; (4) padrão ventilatório adequado
(avaliação clínica); (5) ausência de disritmias graves; (6)
ausência de sangramento excessivo (> 200 ml/h) pelos
drenos torácicos.
Os pacientes que obedeceram aos critérios de inclusão
foram então submetidos a duas condições experimentais.
Durante a condição 1 os parâmetros freqüência respiratória (f), volume corrente (VC), volume minuto (Ve) e índice
de respiração rápida superficial (IRRS) foram avaliados
após 30 minutos de macronebulização com tubo-T (FiO2
ajustada para SpO2 > 92%). Durante a condição 2 os parâmetros f, VC, Ve e IRRS foram avaliados após 30 minutos
de ventilação em pressão suporte (PS = 7 cmH2O, PEEP =
5 cmH2O, FiO2 ajustada para SpO2 > 92%), com o paciente
ainda conectado ao ventilador mecânico. As duas condições experimentais foram aplicadas seqüencialmente, de
forma aleatória. Após a realização das medidas propostas
os pacientes foram extubados.
A avaliação dos parâmetros foi realizada através do
ventilômetro Ohmeda Respirometer, modelo 121. O ventilômetro foi conectado diretamente ao tubo orotraqueal
do paciente para as medidas após ventilação espontânea
em tubo-T e conectado à porção proximal (ao paciente)
do circuito expiratório para as medidas após o período de
ventilação em PS. Optou-se pela utilização de disparo a
pressão no ventilador mecânico para evitar a influência
do fluxo de base sobre as medidas. O Ve foi obtido considerando a quantidade de ar exalada pelo paciente durante um minuto. A f considerada através da observação
da quantidade de excursões do ponteiro do ventilômetro
durante um minuto. O VC foi obtido através da divisão do
Ve pela f. O IRRS foi considerado a partir da divisão da f
pelo VC em litros.
Os pacientes excluídos do estudo foram os que apresentaram instabilidade hemodinâmica (PAM < 7 mmHg, FC
> 140), piora do padrão ventilatório (f > 35, uso de musculatura acessória e diaforese), hipoxemia (SpO2 < 90% com
FiO2 = 40%) ou vômito durante a análise.
A análise estatística dos dados foi realizada através do
teste t de Student, comparando os valores de f, VC, VM e
IRRS após o período de ventilação em tubo-T e PS. Foi
estabelecido como nível de significância p < 0,05 ou 5%.
As características dos pacientes estudados, assim como os
tipos de cirurgias realizadas encontram-se na tabela 1.
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
Tabela 1 – Dados Demográficos
Pacientes (n = 26)
Idade (anos)
Sexo
Cirurgias
Tempo de IOT (horas)
59,08 ± 11,36
Masculino =
18 (69,2%)
Feminino =
8 (30,8%)
Revascularização
do miocárdio
18 (69,2%)
Troca de valva aórtica
Troca de valva mitral
3 (11,6%)
2 (7,7%)
Correção de
aneurisma de aorta
2 (7,7%)
Correção de
comunicação inter-atrial
1 (3,8%)
15,84 ± 7,86
Durante os procedimentos realizados não foram observadas deterioração da FC, PAM, SpO2 ou padrão ventilatório que justificassem a interrupção do estudo em nenhuma
das condições experimentais.
Os resultados encontrados na avaliação do IRRS durante
as diferentes condições experimentais estão descritos na figura 1. Os valores de f (p < 0,01), VM (p < 0,05) e IRRS (p <
0,01) foram significativamente menores e os valores de VC
(p < 0,01) foram significativamente maiores quando avaliados após ventilação em PS em comparação com a avaliação
após ventilação espontânea em tubo-T. Todos os pacientes
foram extubados com sucesso após a realização do estudo.
DISCUSSÃO
Para que os parâmetros de desmame sejam aplicáveis
clinicamente e capazes de predizer adequadamente o sucesso da extubação traqueal é imprescindível que o método de
avaliação seja simples e reprodutível6,15, porém, os estudos
que descrevem os parâmetros, muitas vezes não expõem de
forma adequada o método utilizado para a sua obtenção ou
utilizam instrumentos pouco disponíveis e aplicáveis16-18. Isso
repercute na prática clínica, onde se observa uma grande variabilidade nos métodos e critérios utilizados para obtenção
dos parâmetros10,16.
O uso de suporte ventilatório durante a avaliação dos parâmetros de desmame é freqüente na prática clínica. Rodrigues e col.10 mostraram que 91% dos fisioterapeutas que atuam em unidades de terapia intensiva da cidade de São Paulo
utilizam o modo PS durante a avaliação dos parâmetros, com
níveis variando entre 6 e 12 cmH2O. Em unidades de terapia
intensiva da cidade de Los Angeles 31% dos terapeutas respiratórios afirmam utilizar a PS durante a avaliação, com níveis
variando entre 1 e 10 cmH2O16.
Segundo Hoo e Park16, o uso de suporte pressórico durante a avaliação dos parâmetros de desmame, seja através de PS
ou CPAP, é uma das principais causas de comprometimento da acurácia preditiva dos parâmetros. O presente estudo
mostra que a utilização de PS, mesmo quando aplicada em
níveis mínimos para compensação da resistência do tubo oro-
147
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Figura 1 - Comparação da Freqüência Respiratória, Volume
Corrente, Volume Minuto e Índice de Ventilação Rápida
Superficial em Tubo-T e Pressão Suporte (PS). Media ± DP.
traqueal gera influência significativa sobre os valores encontrados na avaliação dos parâmetros, subestimando - no caso
da f, Ve e IRRS - ou superestimando seus valores - no caso
do VC. A principal conseqüência desta influencia, se considerados os valores de referência descritos na literatura, seria
a extubação traqueal precoce de pacientes ainda não aptos a
tolerar a ventilação espontânea.
A influência do uso de suporte ventilatório durante a avaliação dos parâmetros de desmame é sugerida em alguns estudos, especialmente quando avaliado o IRRS. O estudo de
El-Katib e col.11, realizado em pacientes em pós-operatório
de cirurgia cardíaca, comparou valores de IRRS obtidos os
pacientes em CPAP (PEEP = 5 cmH2O) com FiO2 de 40%,
CPAP (PEEP = 5 cmH2O) com FiO2 de 21% e com os pacientes em ar ambiente (FiO2 = 21%) sem suporte pressórico. O
valor do IRRS foi significantemente menor quando avaliado
em CPAP em relação à avaliação realizada sem aplicação de
pressão positiva. A variação da FiO2 não gerou influencia
sobre o valor do índice. Lee e col.12 avaliaram 62 pacientes,
32 mantidos em PS e 30 no modo CPAP. O IRRS foi avaliado após a permanência dos pacientes durante uma hora nos
modos ventilatórios descritos, com os pacientes ainda conectados ao ventilador mecânico. Os resultados mostraram que,
quando avaliado nestas condições, o IRRS perde a acurácia
preditiva em relação à avaliação nas condições originais descritas por Yang e Tobin6. Os autores do estudo, porém, não
descrevem os valores de PS utilizados. Stroetz e Rubmayr19
mostraram que quanto maior o nível de PS menor é a f e
maior é o VC, logo, mais baixos são os valores encontrado
na avaliação do IRRS. Em nosso estudo buscou-se avaliar o
índice com níveis de PS mínimos para compensação do trabalho ventilatório imposto pelo tubo orotraqueal13,14, sendo
estes os níveis freqüentemente utilizados em trials de desmame com PS5.
Os resultados obtidos neste estudo permitem concluir que
a avaliação dos parâmetros f, VM, VC e IRRS é influenciada
pela utilização do modo PS, mesmo quando este é ajustado
em níveis mínimos para compensação da resistência imposta
pelo tubo orotraqueal. Para a obtenção dos parâmetros de
desmame recomenda-se obedecer rigorosamente o método
empregado nos estudos que originalmente os descreve, evitando, desta forma, influencia sobre os valores encontrados
na avaliação e prejuízo à capacidade preditiva destes parâmetros.
RESUMO
* p < 0,01
# p < 0,05
148
JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: Verificar se o uso de
baixos níveis de pressão suporte gera influência na avaliação
de parâmetros de desmame.
MÉTODO: Foram avaliados 26 pacientes em pós-operatório de cirurgia cardiovascular considerados aptos para extubação traqueal. Os parâmetros freqüência respiratória, volume corrente, volume minuto e índice de respiração rápida
superficial foram avaliados após trinta minutos de ventilação
espontânea em tubo-T e após trinta minutos de ventilação
no modo pressão suporte, ajustado em níveis mínimos para
compensação da resistência imposta pelo tubo orotraqueal (7
cmH2O). Os pacientes foram distribuídos para que a ordem
das avaliações fosse aleatória. A análise estatística dos dados
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
foi realizada através do teste-t pareado.
RESULTADOS: Os valores de freqüência respiratória (p
< 0,01), volume minuto (p < 0,05) e índice de ventilação rápida superficial (p < 0,01) foram significativamente menores e
os valores de volume corrente (p < 0,01) foram significativamente maiores quando avaliados após ventilação espontânea
em pressão suporte em comparação com a avaliação após
respiração espontânea em tubo-T.
CONCLUSÕES: A avaliação dos parâmetros freqüência respiratória, volume corrente, volume minuto e índice de
respiração rápida superficial é influenciada pela utilização
do modo PS mesmo quando este é ajustado em níveis mínimos para compensação da resistência imposta pelo tubo
orotraqueal. Para a obtenção dos parâmetros de desmame
recomenda-se obedecer rigorosamente o método empregado
nos estudos que originalmente os descreve, evitando, desta
forma, prejuízo à sua capacidade preditiva.
Unitermos: ventilação mecânica, desmame, suporte de pressão.
REFERÊNCIAS
01. MacIntyre NR, Cook DJ, Ely Jr EW et al - Evidence-based guidelines for weaning and discontinuing ventilatory support: A collective task force facilitated
by the American College of Chest Physicians; the American Association for
Respiratory Care; and the American College of Critical Care Medicine. Chest,
2001;102:375S -395S.
02. Manthous CA, Schimidt GA, Hall JB - Liberation from mechanical ventilation:
a decade of progress. Chest 1988;114:886-901.
03. Saldias F, Castellon JM, Garayar B et al - Indices predictores del retiro precoz
de ventilación mecánica en pacientes sometidos a cirugia cardíaca. Rev Med
Chile 1996;124:959-966.
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
04. Strieter R, Lynch JP - Complications in the ventilated patient. Clin Chest Med,
1988;9:127-139.
05. Esteban A, Alia I, Gordo F et al - Extubation outcome after spontaneous
breathing trials with T-tube of pressure support ventilation. The Spanish Lung
Failure Collaborative Group. Am J Respir Crit Care Med, 1997;156:459-465.
06. Yang KL, Tobin MJ - A prospective study of indexes predicting the outcome of trials of weaning from mechanical ventilation. N Engl J Med, 1991;324:1445-1450.
07. Jacob B, Chatila W, Manthous CA - The unassisted respiratory rate/tidal volume ratio accurately predicts weaning outcome in postoperative patients. Crit
Care Med, 1997;25:253-257.
08. Chatila W, Jacob B, Guaglionone D et al - The unassisted respiratory rate-tidal
volume ratio accurately predicts weaning outcome. Am J Med, 1996;101:61-67.
09. Epstein SK - Etiology of extubation failure and the predictive value of rapid
shallow breathing index. Am J Respir Crit Care Med, 1995;152:545-549.
10. Rodrigues MM, Fiore Jr JF, Benassule E et al - Variação na mensuração dos
parâmetros de desmame da ventilação mecânica em hospitais da cidade de São
Paulo. Rev Bras Fisioter, 2004;(Supl):177
11. El-Khatib MF, Jamaleddine GW, Khoury AR et al - Effect of continuous positive airway pressure on the rapid shallow breathing index in patients following
cardiac surgery. Chest, 2002;121:475-479.
12. Lee KH, Hui KP, Chan TB et al - Rapid shallow breathing (frequency-tidal
volume ratio) did not predict extubation outcome. Chest, 1994;105:540-543.
13. Fiastro JF, Habib MP, Quan SF - Pressure support compensation for inspiratory work due to endotracheal tubes and demand continuous positive airway
pressure. Chest, 1988;93:499-505.
14. Brochard L, Rua F, Lorino H et al - Inspiratory pressure support compensates
additional work of breathing caused by endotracheal tube. Anesthesiology,
1991;75:739-745.
15. Yang KL - Reproducibility of weaning parameters. A need for standardization.
Chest, 1992;102:1829-1832.
16. Soo Hoo GW, Park L - Variations in the measurement of weaning parameters:
a survey of respiratory therapists. Chest, 2002;121:1947-1955.
17. Fiastro JF, Habib MP, Shon BY et al - Comparison of standard weaning parameters and the mechanical work of breathing in mechanically ventilated
patients. Chest, 1988;94:232-238.
18. Borges VC, Andrade Jr A, Lopes AC - Desmame da ventilação mecânica. Rev
Bras Clin Terap, 1999;25:171-178.
19. Stroetz RW, Hubmayr RD - Tidal volume maintenance during weaning with
pressure support. Am J Respir Crit Care Med, 1995;152:1034-1040.
149
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Incidência de Coleção Líquida em Seios da Face de
Pacientes Intubados em Unidade de Terapia Intensiva*
Incidence of Mucosal Thickening in Paranasal Sinuses in Critically Ill Intubated Patients
Aline Carloni Dias Jorge¹, Rosmari Aparecida Rosa Almeida de Oliveira²,
Sílvia Maria de Toledo Piza Soares², Inês Minniti Rodrigues Pereira3, Sebastião Araújo4
SUMMARY
BACKGROUND AND OBJECTIVES: The purpose of this study was to verify the incidence of complete opacification of
the paranasal sinuses and its possible association with the presence of the orotracheal tube in patients under prolonged
mechanical ventilation.
METHODS: Fourteen patients with an hospitalization time less than 48 hours, orotracheally intubated and under mechanical
ventilation, were enrolled in this study. Simple cranial x-ray had been taken at bedside immediately after the admission of the
patients in the Intensive Care Unit and at the third and fifth days of evolution.
RESULTS: Suggestive images of liquid collections in the paranasal sinuses of the patients were found before and after 24h
of orotraqueal intubation. Radiographic and clinical findings were carefully evaluated searching for documentation of the
presence of liquid collections in the maxillary sinuses, since they are frequently affected and easier to be visualized in a
simple cranial x-ray.
CONCLUSIONS: Complete opacification of the maxillary sinuses wasn’t seen in any patient, thus making not possible to
associate the presence of the orotracheal tube and sinusitis based on simple cranial x-ray images.
Key Words: orotracheal intubation, mechanical ventilation, x-ray, paranasal sinuses.
A
sinusite é definida como infecção dos seios da
face, com duração de até três semanas, secundária
à uma infecção viral ou bacteriana1,2. A infecção
recorrente é diagnosticada quando o paciente apresenta de
dois a quatro episódios infecciosos por ano, com menos de
oito semanas entre cada episódio. A sinusite crônica é a persistência da sintomatologia durante 12 (doze) semanas, com
ou sem a exacerbação do quadro2.
A incidência da sinusite é variável, dependendo do critério diagnóstico utilizado e da população estudada. Alguns
autores a definem através de resultados radiográficos ou da
tomografia computadorizada1,2; outros, através da presença
de anormalidades radiográficas associadas à febre e cultura
positiva do material aspirado dos seios da face3.
O acometimento dos seios maxilares geralmente está associado com o envolvimento dos seios esfenóide, etmóide
e/ou frontal, sendo diagnosticada a Sinusite Maxilar geralmente em menos de sete dias nos pacientes que se encontram
intubados4. Dessa forma, a sinusite paranasal tem sido relatada como importante complicação infecciosa em pacientes
internados em unidades de terapia intensiva (UTI)3-5.
Dentre as complicações decorrentes das infecções nosocomiais do trato respiratório encontradas em pacientes sob
tempo prolongado de ventilação mecânica, cuja causa principal é a sepse, destacam-se a sinusite, a traqueobronquite e
a broncopneumonia3-5.
A sinusite nosocomial é uma complicação associada
à intubação traqueal e à ventilação mecânica prolongada
em pacientes graves. Seu diagnóstico é baseado em exames
de imagem (radiografias simples ou tomografias computadorizadas de crânio) e em culturas microbiológicas, sendo
que as radiografias simples podem ser executadas à beira
do leito.
Sabe-se também que a presença do tubo nasotraqueal ou
sonda nasogástrica, os quais provocam irritação da mucosa
e edema locais, impossibilitando a drenagem decorrente da
obstrução mecânica dos seios da face, predispõe o paciente
à inflamação e à infecção dos seios paranasais4,5. Rouby e
col.3 relataram que os pacientes com tubos nasotraqueais
desenvolveram evidências radiológicas de sinusite (95,5%)
mais freqüentemente do que os que estavam intubados por
via orotraqueal (22,5%). Também relataram que após sete
dias da presença de sonda nasogástrica associada ao tubo
nasotraqueal é freqüente os sinais sugestivos de sinusites
nas imagens tomográficas (95%), ao passo que apenas 25%
dos pacientes intubados por via orotraqueal apresentaram
as mesmas evidências3.
O presente estudo teve como finalidade principal avaliar a incidência de coleções líquidas nos seios paranasais
de pacientes intubados por via orotraqueal, sob ventilação
mecânica prolongada, baseada na análise de radiografias
simples de seios da face realizadas à beira do leito, procurando associar esses resultados com o tempo de presença do
tubo orotraqueal.
1. Fisioterapeuta Especializada em Fisioterapia Respiratória em UTI de Adultos do HC–UNICAMP
2. Fisioterapeuta Supervisora do Curso de Especialização em Fisioterapia Respiratória na UTI de Adultos do HC/UNICAMP
3. Professora Assistente, Doutora e Chefe do Departamento de Radiologia da Faculdade de Ciências Médicas do HC–UNICAMP
4. Professor Assistente do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas, Doutor e Diretor da UTI de Adultos do HC–UNICAMP
*Recebido da Universidade Estadual de Campinas da Universidade de Campinas, SP – UNICAMP.
Apresentado em 16 de julho de 2004 - Aceito para publicação em 09 de setembro de 2004
Endereço para correspondência - Aline Carloni Dias Jorge - Rua Oscar Leite, 147/74 - Ponte Preta - 13041-620 Campinas, SP - Fone (19) 8121-9109
- E-mail: [email protected]
150
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
MÉTODO
Foi realizado um estudo prospectivo, longitudinal, na
Unidade de Terapia Intensiva do Hospital de Clínicas da
UNICAMP no período de setembro de 2003 a janeiro de
2004, sendo aprovado pelo Comitê Institucional de Ética em
Pesquisa sob o protocolo nº 381/2003.
A população elegível para o estudo foi composta por pacientes intubados por via orotraqueal e com perspectivas de
ventilação mecânica prolongada.
Os critérios de inclusão foram:
a) Pacientes com idade igual ou maior que 18 anos;
b) Internação na UTI, com tempo de internação hospitalar inferior a 48 horas;
c) Pacientes intubados orotraquealmente, com perspectiva de duração da ventilação mecânica por no mínimo cinco
dias.
Os critérios de exclusão foram definidos como:
a) História de sinusopatia crônica;
b) Pacientes com fraturas de face ou má-formação congênita;
c) Pacientes provenientes de outros serviços já com a presença do tubo orotraqueal e/ou traqueostomia;
d) Pacientes com impossibilidade de posicionamento a
90º para avaliação radiográfica,
e) Gestantes;
f) O não consentimento dos familiares responsáveis para
a participação do paciente no estudo.
A presença de líquido nos seios da face foi verificada através do exame radiográfico simples realizado à beira do leito. Os pacientes foram devidamente posicionados sentados
à 90º no próprio leito e com extensão máxima possível da
coluna cervical. Em alguns casos foi necessário a utilização
de um coxim na região interescapular para uma adequada
obtenção do posicionamento. Os exames radiológicos foram
obtidos no primeiro, terceiro e quinto dias de internação
na UTI, utilizando-se um aparelho portátil, da marca GE,
modelo VMX-Plus, com raios 18 x 24 cm, com utilização da
técnica 20 mAs com 65 Kv, sendo a incidência de Waters em
ântero-posterior. As imagens foram obtidas por um técnico
especializado e treinado para a sua realização. O seio maxilar
foi utilizado como referência para a confirmação da presença
de líquido, por ser o mais comumente acometido e avaliado
em trabalhos científicos3,4.
A evolução das imagens radiográficas foi avaliada por
uma médica radiologista experiente na área, que pesquisou
os resultados específicos nos seios maxilares, tais como espessamento mucoso e os velamentos parcial e total (opacificação
completa), baseando-se na presença de nível hidro-aéreo acometendo o interior dos seios maxilares. A fim de auxiliar a
análise estatística, os laudos das imagens radiográficas foram
pontuados respectivamente com 0 (zero) quando estavam
normoaerados, 1 (um) quando apresentavam espessamento
mucoso (opacificação acima de 4 mm), 2 (dois) quando apresentavam velamento parcial (opacificação acima de 50% ou
mais) e 3 (três) quando se apresentavam totalmente velados
(opacificação completa).
As variáveis mensuradas incluíram o dia e tempo de intubação (sendo este maior ou menor que 24 horas), presença
de sonda enteral, nasogástrica ou orogástrica, temperatura
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
corporal e radiografias simples dos seios da face.
Para a análise estatística foi utilizado o programa SAS
System for Windows (Statistical Analysis System), versão 8.2.
Para verificar a presença de associação ou comparar proporções foram utilizados os testes Qui-quadrado, McNemar ou
Exato de Fisher, quando necessário. O nível de significância
adotado foi de 5% (p < 0,05).
RESULTADOS
Catorze pacientes, sendo oito do sexo masculino e sete do
sexo feminino, com média de idade de 55,4 anos, compuseram a população do estudo. Destes, sete fizeram o primeiro
exame radiográfico dos seios da face antes de 24 horas de
intubação e os demais com um tempo de intubação inferior
a 48 horas.
Dos 14 pacientes que realizaram o primeiro exame, onze
foram submetidos a dois exames (no primeiro e terceiro dias
de internação) e sete pacientes foram submetidos aos três
exames propostos originalmente (no primeiro, terceiro e
quinto dias de intubação). Três pacientes foram submetidos
a apenas uma radiografia dos seios da face (primeiro dia de
internação).
Quanto à distribuição dos acometimentos dos seios maxilares, na primeira imagem realizada nos 14 pacientes, oito
estavam sem velamento, três apresentavam espessamento mucoso, três apresentavam velamento parcial e nenhum paciente
apresentava velamento total. Na segunda imagem radiográfica foram estudados 11 pacientes, sendo que cinco estavam
sem velamento, quatro apresentavam espessamento mucoso,
dois pacientes apresentavam velamento parcial e seios e nenhum paciente apresentava velamento total. Na terceira imagem radiológica foram estudados sete pacientes e três destes
estavam sem velamento, apenas um apresentava espessamento mucoso, três pacientes apresentavam velamento parcial e
nenhum apresentava velamento total de seios maxilares.
Dos pacientes submetidos a duas imagens radiográficas
nenhum apresentou quadro radiológico evolutivo, dois permaneceram com os seios da face não acometidos e dois pacientes permaneceram com espessamento mucoso nas duas
imagens radiológicas realizadas.
Dentre os sete pacientes submetidos às três imagens radiográficas, seis mantiveram o quadro inalterado, sendo
que três destes apresentavam os seios da face normais nas
três imagens, um paciente apresentou espessamento mucoso
nas três imagens e dois mantiveram a imagem sugestiva de
velamento parcial nos três momentos. Apenas um paciente
apresentou evolução do acometimento dos seios maxilares,
evoluindo de seios normoaerados para espessamento mucoso na segunda imagem e para velamento parcial no terceiro
exame radiográfico.
Na ocasião do primeiro exame, 11/14 pacientes (79%)
estavam com sonda nasogástrica (SNG) posicionada. No
segundo exame, 10/11 pacientes (90%) tinham SNG. No terceiro exame, sete pacientes formavam a população estudada
e todos eles apresentavam SNG no momento da obtenção da
imagem radiográfica.
A tabela 1 demonstra a distribuição dos acometimentos
encontrados nos exames radiográficos realizados, a idade,
sexo e diagnósticos dos pacientes incluídos no estudo.
151
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Paciente
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
Tabela 1 – Distribuição dos Acometimentos dos Seios da Face, Idade, Sexo e Diagnósticos dos Pacientes.
1º RX
1º RX
1º RX
Idade
Sexo
Diagnóstico
1
1
62
Masculino
Politrauma
0
59
Masculino
Insuficiência respiratória aguda
0
0
0
45
Feminino
Pós-operatório
0
1
2
55
Masculino
Acidente vascular encefálico hemorrágico
0
0
0
69
Masculino
Acidente vascular encefálico isquêmico
0
67
Masculino
Infarto agudo do miocárdio
2
80
Masculino
Edema agudo pulmonar
0
0
59
Masculino
Transplante hepático
2
2
2
45
Masculino
Edema agudo pulmonar
0
0
0
46
Feminino
Acidente vascular encefálico isquêmico
2
2
2
28
Feminino
Lúpus
1
1
70
Feminino
Acidente vascular encefálico hemorrágico
0
0
73
Feminino
Pós-operatório de cirurgia ortopédica
1
1
1
18
Feminino
Lúpus
0 - seios da face normoaerados (normal, não há velamento); 1 - espessamento mucoso (opacificação acima de 4 mm); 2 - velamento parcial (opacificação acima de 50%
ou mais); 3 -velamento total (opacificação completa dos seios).
Figura 1 – Evolução das Imagens Radiológicas
A figura 1 ilustra a evolução das imagens radiológicas
realizadas em todos os pacientes incluídos no estudo e sua
legenda segue a mesma da tabela 1.
A figura 2 demonstra a evolução das imagens radiológicas
dos sete pacientes em que foi possível a sua realização no primeiro, terceiro e quinto dias de intubação orotraqueal.
DISCUSSÃO
No presente estudo, uma pesquisa piloto idealizada como
proposta para dissertação de mestrado, em que foram incluídos pacientes com diferentes diagnósticos clínicos, objetivouse analisar prospectiva e longitudinalmente a evolução das
imagens radiográficas dos seios paranasais de pacientes com
intubação por via orotraqueal e submetidos à ventilação mecânica prolongada, com o objetivo de se detectar alterações
sugestivas de sinusite.
Uma vez que na UTI do Hospital de Clínicas da UNICAMP os pacientes tendem a receber alta precocemente e
permanecem intubados em geral por tempo menor que o descrito na maioria dos relatos da literatura, limitou-se a sete
dias de intubação o tempo utilizado como referência para o
levantamento bibliográfico utilizado para a elaboração do
presente estudo. Por essa razão, foi determinado que a terceira imagem radiográfica seria realizada no quinto dia de intubação orotraqueal, para que se pudesse realizar uma análise
152
Figura 2 - Evolução das Imagens Radiológicas
dos Pacientes Submetidos às Três Radiografias.
evolutiva das imagens obtidas.
No início da década de 1970, estudos retrospectivos sugeriram que a sinusite nosocomial estava associada com a ventilação mecânica6. Na sua interpretação fisiopatológica incluiu-se a drenagem prejudicada dos seios da face na posição
supina, a diminuição da drenagem venosa frente à pressão
positiva da ventilação mecânica e a obstrução dos trajetos
devido à presença de sonda nasogástrica ou tubo nasotraqueal.
De fato, a intubação prolongada (nasal ou orotraqueal)
tem sido relatada como causa de sinusite, e, embora haja poucos estudos comparando as vias de intubação e suas associações com esta complicação, tem sido descrito um aumento
do risco de infecção dos seios paranasais com a intubação
nasotraqueal5,7.
No presente estudo foram realizadas imagens radiográficas simples dos seios da face (no primeiro, terceiro e quintos
dias de intubação orotraqueal) como exame para diagnosticar a presença de velamento nos seios da face, embora não
existam referências bibliográficas que discutam a incidência
de sinusopatias diagnosticadas através de exames radiográficos realizados no leito e sua relação com tubo orotraqueal.
Dentre os pacientes estudados, não foi possível o diagnóstico
clínico de infecção, mesmo com controle rigoroso e diário do
hemograma, devido ao fato de estarem aleatoriamente em
uso de corticóides e/ou antibioticoterapia empírica.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Em um estudo prospectivo e observacional, com 366 pacientes internados em duas UTI por mais de um ano8, a incidência de sinusite nosocomial, que foi definida através de
anormalidades radiográficas em um dos seios maxilares e a
realização de culturas de material obtido através da aspiração transnasal foi de 7,7%, estimando-se uma incidência em
torno de 12 casos por 1.000 pacientes por dia. Esses índices
foram de 15,7 casos por 1.000 em pacientes/dia para pacientes com tubo nasotraqueal, com ou sem ventilação mecânica,
e de 1,6 casos por 1.000 pacientes/dia para aqueles pacientes
sem acesso nasal. Nos pacientes que receberam ventilação
mecânica através do tubo orotraqueal, a incidência foi de
19,8 episódios por 1.000 tubos nasoenterais/dia. Os fatores
de risco foram: colonização nasal por bacilos Gram-negativos, sondas nasoenterais, uso de sedativos e escala de coma
de Glasgow menor que oito.
Em 1994, Rouby e col.3 avaliaram 162 pacientes sob ventilação mecânica prolongada, através de tomografia computadorizada realizada após 48 horas de admissão e repetidas
após sete dias. Os pacientes foram divididos aleatoriamente
de acordo com as primeiras imagens radiológicas dos seios
maxilares (normal: 40 pacientes, espessamento mucoso: dois
pacientes e sinusite definida pela presença de nível aéreo ou
opacidade total na imagem radiológica: 96 pacientes). Os pacientes sem o diagnóstico de sinusite foram divididos em dois
grupos, de acordo com a presença de tubo orotraqueal ou
nasotraqueal, e foram submetidos a novas imagens radiológicas sete dias após a intubação. A sinusite desenvolveu-se em
95% dos pacientes que estavam com tubo nasotraqueal comparado com 22,5% dos pacientes que foram intubados por
via oral. Após sete dias, 46% dos pacientes que apresentavam
espessamento mucoso evoluíram para sinusite e 12% normalizaram-se. No grupo de pacientes que apresentavam sinusite
na primeira imagem radiológica, a análise estatística mostrou
que havia discreta diferença que identificava o tubo nasotraqueal (p < 0,001), sonda nasogástrica (p < 0,05), duração da
intubação endotraqueal (p < 0,01) e duração do tubo gástrico (p < 0,05) como fatores de risco isolados. A sinusite foi
microbiologicamente confirmada através da punção transnasal em apenas 38% dos pacientes que apresentavam imagem
radiológica sugestiva. Nos pacientes que apresentavam sinusite na primeira imagem radiológica, a pneumonia associada
à ventilação mecânica desenvolveu-se em 67% nos pacientes
em que a sinusite foi confirmada em comparação com os 43%
restantes (p < 0,02).
Nos pacientes incluídos no presente estudo, 79% possuíam algum tipo de acesso nasal durante a realização da primeira imagem radiográfica. Estudos sugerem que acessos nasais
representam importante fator de risco para o desenvolvimento de sinusite nosocomial e, conseqüentemente, pneumonia
nosocomial5. Mais importante, sugerem a necessidade de se
definir um protocolo que inclua punção transnasal, drenagem e lavagem dos seios da face por mais de 15 dias sem a
associação com a antibioticoterapia, e ele pode ser utilizado como controle de pacientes sob ventilação mecânica que
apresentam sepse de origem desconhecida e na presença de
imagem radiológica que confirme a sinusite5.
Em um estudo realizado na França por Holzapfel e col.9,
o impacto de uma busca sistemática do tratamento de sinusite maxilar em 399 pacientes sob ventilação mecânica através
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
de tubo nasotraqueal na incidência de pneumonia foram investigados. No grupo de intervenção, a sinusite foi diagnosticada com a presença de temperatura maior ou igual a 38 ºC,
com sinais radiográficos comprovados na tomografia computadorizada e na presença de aspiração de secreção purulenta
transnasal que envolviam os seios da face, diagnosticada em
80 dos 199 pacientes tratados com lavagem associada à antibioticoterapia. No grupo controle, nenhum paciente realizou
tratamento para sinusite. A pneumonia associada à ventilação mecânica foi observada em 34% dos pacientes do grupo
estudo e em 47% dos pacientes do grupo controle. Além disso,
no 60° dia de internação a taxa de mortalidade foi estimada
em 36% no grupo estudo e de 46% no grupo controle.
Em suma, a sinusite nosocomial é provavelmente subestimada em pacientes críticos submetidos à ventilação mecânica, naqueles em que pode ser vista como uma conseqüência
direta da impossibilidade de drenagem dos seios da face devido à presença de acessos nasais. Este fato representa um risco
significativo do desenvolvimento de pneumonia nosocomial e
sua prevenção poderia incluir a opção pela intubação orotraqueal, embora se saiba que evitar qualquer tipo de acesso nasal é praticamente muito difícil em pacientes não sedados10.
CONCLUSÃO
No presente estudo, nenhum paciente apresentou velamento total dos seios paranasais até o sétimo dia da evolução,
não sendo possível estabelecer qualquer tipo de relação entre
a incidência de velamentos nos seios da face com o tempo de
intubação orotraqueal.
Muito embora a casuística deste estudo piloto imponha
certas limitações, conclui-se que a radiografia simples dos
seios da face não é um exame radiológico adequado para
ser utilizado diante da suspeita clínica de sinusite em pacientes intubados e sob ventilação mecânica, devendo-se, nessa
eventualidade, lançar mão de outros recursos diagnósticos de
imagem, como por exemplo a CT de crânio.
AGRADECIMENTOS
Em especial à boa vontade e dedicação dos profissionais
do Departamento de Radiologia do Hospital das Clínicas da
UNICAMP, que forneceram informações e recursos técnicos
imprescindíveis para a elaboração deste estudo; ao Dr. Sebastião Araújo, pelo constante amparo e orientações recolhidas
de sua prática pessoal; aos profissionais da UTI/HC-UNICAMP pela paciência e dedicação acima do dever; aos demais autores pelas idéias e orientações durante a realização
da pesquisa.
RESUMO
JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: O presente estudo
teve a finalidade de avaliar incidência de velamento nos seios
da face e sua possível associação com a intubação orotraqueal em pacientes sob ventilação mecânica prolongada.
MÉTODO: Foram avaliados 14 pacientes com tempo de
internação hospitalar inferior a 48 horas, intubados e sob
ventilação mecânica. O exame radiográfico simples dos seios
da face foi realizado no primeiro, terceiro e quinto dias de
153
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
internação na Unidade de Terapia Intensiva.
RESULTADOS: Os resultados obtidos mostraram imagens sugestivas de coleção líquida nos seios maxilares dos
pacientes antes e após 24 horas transcorridas da intubação
orotraqueal. Os laudos médicos das imagens radiológicas revelaram que os seios maxilares são os mais acometidos e mais
fáceis de serem visualizados em uma radiografia simples.
CONCLUSÕES: Nenhum paciente apresentou velamento total dos seios maxilares, não sendo possível associar o
tempo de presença do tubo orotraqueal com a suspeita diagnóstica de sinusite através de exames radiográficos simples
dos seios da face.
Unitermos: Intubação orotraqueal, ventilação mecânica,
radiografia, sinusite.
REFERÊNCIAS
01. Piccirillo JF - Clinical practice. Acute bacterial sinusitis. N Engl J Med,
2004;351:902-910.
02. Araújo Neto S - Alterações incidentais dos seios da face à tomografia com-
154
putadorizada do crânio e órbitas em crianças. Tese de Mestrado em Saúde da
Criança e do Adolescente na Área de Concentração de Saúde da Criança e do
Adolescente – FCM- UNICAMP, 2004.
03. Rouby JJ, Laurent P, Gosnach M et al - Risk factors and clinical relevance
of nosocomial maxillary sinusitis in the critically ill. Am J Respir Crit Care
Med,1994;150:776-783.
04. Bert F, Lambert-Zechovsky N - Sinusitis in mechanically ventilated patients and
its role in the pathogenesis of nosocomial pneumonia. Eur J Clin Microbiol
Infect Dis, 1996;15:533-544.
05. Eggimann P, Pittet D - Infection control in the ICU. Chest, 2001;120:20592093.
06. Arens JF, LeJeune FE Jr, Webre DR – Maxillary sinusitis, a complication of
nasotracheal intubation. Anesthesiology, 1974;40:415-416.
07. Michelson A, Schuster B, Kamp HD - Paranasal sinusitis associated with nasotracheal and orotracheal long-term intubation. Arch Otolaryngol Head Neck
Surg, 1992;118:937-939.
08. George DL, Falk PS, Meduri GU et al - Nosocomial sinusitis in patients in the
medical intensive care unit: a prospective epidemiological study. Clin Infect
Dis, 1998;27:463-470.
09. Holzapfel L, Chastang C, Demingeon C et al. A randomized study assessing
the systematic search for maxillary sinusitis in nasotracheally mechanically
ventilated patients. Influence of nosocomial maxillary sinusitis on the occurrence of ventilator-associated pneumonia. Am J Respir Crit Care Med,
1999;159:695-701.
10. Bach A, Boehrer H, Schmidt H et al – Nosocomial sinusitis in ventilated patients:
Nasotracheal versus orotracheal intubation. Anaesthesia, 1992;47:335-339.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Comportamento da Função Pulmonar e da Força Muscular
Respiratória em Pacientes Submetidos à Revascularização
do Miocárdio e a Intervenção Fisioterapêutica*
Pulmonary Function and Respiratory Muscle Strength behavior in Patients Submitted
to Coronary Artery bypass Grafting and Physiotherapy Intervention
Audrey Borghi e Silva1, Pires Di Lorenzo, V.A.1, Cláudio Ricardo de Oliveira2, Sérgio Luzzi3.
SUMMARY
BACKGROUND AND OBJECTIVES: Cardiac surgery (CS) is associated with respiratory complications due to reduction of
pulmonary function and respiratory muscle strength. This objective is determining the prevalence of preoperative pulmonary
dysfunction and to evaluate the post-operative changes of pulmonary function and of respiratory muscle strength (RMS) in
patients submitted to CS and physiotherapy intervention.
METHODS: A prospective in patient from Intensive Care Unit of Santa Casa de Araraquara. Were evaluated 47 patients with,
aging 57 ± 11 years were enrolled in this study. The spirometric variables and the maximal respiratory pressures (PImax and
PEmax) were measured preoperative, at the 1st postoperative day and at hospital discharge.
RESULTS: High prevalence of pre-operative pulmonary dysfunction was observed. Moreover, significant reduction of the
pulmonary function and of respiratory muscle strength from the preoperative period to hospital discharge was observed. The
RMS significantly increased from the first post-operative day to hospital discharge, however, it didn’t return to pre-operative
values, although it was observed a lower incidence of post-operatives complications.
CONCLUSIONS: These data suggest that the reduction of respiratory muscle strength and of some pulmonary function
variables values do not reverse to pre-operative levels until hospital discharge. Moreover, despite the high prevalence of preoperative pulmonary dysfunction, low rates of complications were observed in the present study.
Key Words: Cardiac surgery, pulmonary function, respiratory muscle strength, physiotherapy
A
cirurgia de revascularização do miocárdio (CRM)
com circulação extracorpórea (CEC) está associada a uma prevalência significativa de complicações
neurológicas, renais e pulmonares, levando a prejuízos da
função respiratória1,2. As complicações respiratórias tem sido
associadas à reduções dos volumes e capacidades pulmonares, modificação do padrão ventilatório, alteração da relação
ventilação/perfusão (V/Q) que aumenta o shunt pulmonar, e
a ineficácia dos mecanismos de defesa das vias aéreas, como
a tosse e a depressão do sistema imunológico3. Além disso, a
anestesia geral causa depressão respiratória, resultando em
hipoventilação alveolar3, com conseqüente redução da capacidade residual funcional, com colapso alveolar e o aparecimento de atelectasias no pós-operatório4.
Alguns autores5 observaram que no pós-operatório de
CRM ocorreram importantes alterações dos parâmetros da
função pulmonar, com lenta reversão, sendo necessários recursos ou técnicas fisioterápicas associados à aplicação de
pressão positiva nas vias aéreas com a finalidade de reduzir
as complicações decorrentes da cirurgia6,7. No entanto, Richter Larsen e col.8 constataram que mesmo com a aplicação
de pressão positiva nas vias aéreas, os valores espirométricos
não são totalmente restabelecidos até a alta hospitalar.
Dentre as diversas alterações pulmonares encontradas
no pós-operatório de cirurgia cardíaca, manifestadas pelas alterações na mecânica respiratória, destacam-se aquelas relacionadas aos músculos respiratórios. A redução da
força muscular inspiratória e expiratória contribuem para
o aumento da incidência de atelectasias no pós-operatório, hipoxemia e ineficácia da tosse. Alguns autores9 têm
demonstrado que o treinamento muscular respiratório nos
pacientes submetidos à cirurgia cardíaca tem sido efetivo
para melhorar a força dos músculos respiratórios tanto no
pré como no pós-operatório.
Em vista do exposto, os objetivos deste estudo foram avaliar a função pulmonar e a força muscular respiratória em
pacientes submetidos à cirurgia cardíaca que participaram de
uma rotina de fisioterapia, tanto na fase pré como pós-operatória.
MATERIAL E MÉTODO
Foram incluídos neste estudo 47 pacientes, no período de
fevereiro de 2001 a outubro de 2002, sendo a amostra composta de 33 homens e 14 mulheres, com idade media de 57 ±
11 anos, que foram avaliados no dia anterior à cirurgia. Os
pacientes foram informados sobre os procedimentos a serem
realizados e assinaram um termo formal de consentimento
1. Professor Doutor do Curso de Fisioterapia da Universidade Federal de São Carlos- UFSCar2. Médico Cirurgião da Santa Casa de Misericórdia de São Carlos.
3. Médico Cirurgião cardíaco da Santa Casa de Misericórdia de Araraquara.
*Estudo desenvolvido na Santa Casa de Misericórdia de Araraquara - Unidade de Terapia Intensiva e Enfermaria da Cardiologia, em convênio
com o curso de Fisioterapia da UNIARA- Centro Universitário de Araraquara - Estágio supervisionado em Fisioterapia Cardiorrespiratória
Apresentado em 19 de julho de 2004 - Aceito para publicação em 30 de agosto de 2004
Endereço para correspondência: Dra. Audrey Borghi e Silva - Rua Caetano Mirabelli, nº 79 - Parque Santa Marta. - 13564-210 São Carlos, SP
- Fone: (16) 3307-8607 - E-mail: [email protected]
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
155
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
livre e esclarecido para participar deste estudo, em atendimento à Resolução 196/96 do CNS. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em pesquisa em seres humanos da
instituição. Foram excluídos os pacientes que apresentaram
instabilidade hemodinâmica, aqueles com seqüelas neurológicas associadas ou dificuldade de compreensão e/ou de
aderência aos procedimentos realizados neste estudo. Todos
os pacientes foram submetidos de forma eletiva à cirurgia de
revascularização do miocárdio, com incisão cirúrgica via esternotomia mediana. Os pacientes foram orientados quanto
aos procedimentos cirúrgicos e à intubação traqueal, como
também à importância da fisioterapia desde o pós-operatório
imediato até a alta hospitalar.
Os pacientes foram submetidos a medidas antropométricas e questionados quanto aos hábitos tabágicos. Foram
calculados o índice de massa corpórea (produto do peso corpóreo (kg) pela altura (m) ao quadrado) e registrados os tempos de internação, tempo total de cirurgia, tempo de perfusão
extracorpórea. As medidas da freqüência cardíaca e da saturação periférica de oxigênio foram registradas diariamente,
com um oxímetro de pulso portátil (Nonim 8500A, Plymouth, Mn, USA).
termitente (RPPI), tosse assistida, mobilização passiva, ativa-assistida e ativa-livre dos membros inferiores e deambulação no corredor, de acordo com a tolerância do paciente e
as respostas cardiovasculares. Os exercícios foram realizados
progressivamente, à medida que os pacientes tornavam-se
menos restritos ao leito, com a retirada dos drenos e cateteres. A deambulação, entretanto, ocorreu somente após o 3º
dia de pós-operatório, quando os pacientes encontravam-se
na enfermaria.
Espirometria
Após as medidas de altura e peso realizou-se a espirometria com um aparelho da marca Vitalograph modelo
Hand Held 2021 (Ennis, Ireland). Durante os testes de
função pulmonar os pacientes permaneceram sentados
sendo realizadas as manobras de Capacidade Vital Lenta
(CVL) e de Capacidade Vital Forçada (CVF). Os procedimentos técnicos, critérios de aceitabilidade e reprodutibilidade foram realizados segundo as normas recomendadas pela ATS 10. Os valores de referência utilizados foram
os de Knudson e col.11. Os resultados obtidos foram expressos em condições BTPS. Os distúrbios ventilatórios
foram classificados em leve, moderado e grave, segundo o
consenso brasileiro de espirometria12. As medidas espirométricas foram realizadas no pré-operatório e no dia da
alta hospitalar.
No total, 68 pacientes foram elegíveis para o estudo, porém apenas 47 pacientes constituíram a população final da
pesquisa. Dos 21 pacientes excluídos da amostra, três apresentavam instabilidade hemodinâmica, não sendo liberados
pela equipe médica para realização das medidas espirométricas e de força muscular respiratória, dois apresentavam
seqüelas neurológicas, cinco apresentaram dificuldades na
execução da prova espirométrica e déficit de compreensão,
três pacientes foram a óbito no pós-operatório e oito não
aderiram ao tratamento fisioterápico proposto, devido à falta
de colaboração nas diversas sessões e/ou recusa aos atendimentos.
A tabela 1 mostra as características antropométricas e
demográficas dos pacientes incluídos neste estudo. O tempo
médio de internação dos pacientes estudados foi de 7,2 ±
1,5 dias (6 a 12 dias). Somente cinco pacientes apresentaram
internação superior a 10 dias, decorrentes de complicações
com a incisão cirúrgica (dois pacientes), presença de hipersecreção pulmonar (dois pacientes) e derrame pleural (um
paciente).
Força Muscular Respiratória
A força muscular respiratória foi obtida com um manovacuômetro escalonado em cmH2O, de acordo com o método
proposto por Black e col.13. A pressão inspiratória máxima
(PImax) foi obtida a partir do volume residual e a pressão
expiratória máxima (PEmax) a partir da capacidade pulmonar total. Os pacientes foram orientados a sustentar esforços
máximos contra uma via aérea ocluída, com um pequeno orifício para a manutenção da glote aberta, com um clipe nasal.
As medidas da força muscular respiratória foram realizadas
no pré-operatório, no 1º dia de pós-operatório (1º PO) e no
dia da alta hospitalar.
INTERVENÇÃO
Os pacientes foram submetidos a duas intervenções fisioterapêuticas diárias, desde o pós-operatório imediato até
a alta hospitalar, que constou de exercícios de reeducação
diafragmática e respiração fracionada, manobras desobstrutivas, exercícios com respiração por pressão positiva in-
156
ANÁLISE ESTATÍSTICA
Para a comparação dos valores espirométricos obtidos no
pré-operatório e na alta hospitalar, utilizou-se o teste nãoparamétrico de Wilcoxon. Para a comparação dos valores de
PImax e PEmax entre o pré, 1º PO e a alta hospitalar foi aplicado o teste não-paramétrico para as comparações múltiplas
de Friedman. Para as diferenciações entre as situações foi utilizado o teste de Dunn. O nível de significância foi fixado em
p < 0,05.
RESULTADOS
Tabela 1 – Características Antropométricas, Demográficas,
Clínicas e Cirúrgicas da População Estudada.
Variáveis
Média(DP)
Idade (anos) *
57 ± 11
Sexo
Masculino
33
Feminino
14
Peso (kg) *
68 ± 13
Altura (m) *
1,66 ± 0,10
Índice de massa corpórea *
23 ± 3,9
Tabagistas (%)
46
Ex-tabagistas (%)
22
Tempo total de cirurgia (min) *
186,3 ± 45,6
Tempo de perfusão (min) *
82,8 ± 23,4
Tempo de internação (dias) *
7,2±1,5
* Valores expressos em Média ± DP
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
A figura 1 ilustra o percentual dos distúrbios ventilatórios
observados nos pacientes estudados, obtidos no pré-operatório. Pode-se constatar que 27,6% dos pacientes apresentaram distúrbio ventilatório misto, 8,5% obstrução leve, 8,5%
obstrução moderada e 4,2% distúrbio ventilatório restritivo.
Somente 51,1% dos pacientes apresentaram prova espirométrica normal. Constatou-se que 49% dos pacientes estudados
apresentavam prova espirométrica alterada, que foi detectada no pré-operatório. Também, 46% dos pacientes estudados
eram fumantes atuais e 22% ex-tabagistas.
Figura 2 – Resultados Obtidos entre as Variáveis Espirométricas
do Pré-Operatório para a alta Hospitalar.
Figura 1 – Percentual dos Distúrbios
Ventilatórios na Amostra Estudada.
res da força muscular respiratória, e os percentuais de perdas
e ganhos obtidos.
Tabela 3 – Resultados da Força Muscular Respiratória,
Percentual de Diminuição e Ganho em Relação
ao Pré-Operatório, 1º PO e na Alta Hospitalar.
Os resultados dos valores espirométricos obtidos no préoperatório e na alta hospitalar estão apresentados na tabela
2. Pode-se constatar que, para todas as variáveis espirométricas, não houve restabelecimento total a seus valores prévios
até a alta hospitalar, com valores percentuais menores que 20
a 30% daqueles obtidos no pré-operatório.
Tabela 2 – Resultados dos Valores Espirométricos e Percentual de
Diminuição em Relação ao Pré-Operatório.
Pré-Operatório
Pré-alta
Percentual
74,5 ± 18,8
54 ± 18
↓27,4%
CVF (%)
76 ± 20
54,5 ± 20,5
↓28,3%
VEF1 (%)
72,7 ± 16,4
50,7 ± 15,3
↓30,2%
65 ± 28
50,8 ± 20,5
↓21%
57,6 ± 25,2
40,1 ± 17,9
↓30,3%
CVL (%)
PF (%)
FEF 25%-75%
Pré-Operatório
1º PO
Alta
PImax
(cmH2O)
61,1 ± 24,6
25,4 ± 14
(↓59,4%)
42,9 ± 21 (↑47%)
PEmax
(cmH2O)
73,6 ± 24,0
34,5 ± 16
(↓53,1%)
58,2 ± 28 (↑47%)
PImax = Pressão Inspiratória Máxima; PEmax = Pressão Expiratória Máxima.
A figura 3 ilustra o comportamento dos valores de força muscular respiratória, onde se pode constatar uma queda
significativa entre o pré-operatório e o 1º PO, com p < 0,001
para a PImax e p < 0,001 para a PEmax. Foram também
observados aumentos significativos dos valores de força muscular respiratória entre o 1º PO e a alta hospitalar, com p <
0,001 para a PImax e p < 0,001 para a PEmax. Entretanto,
quando comparados os valores do pré-operatório para a alta
hospitalar, constatou-se uma diminuição significativa dos valores de PImax (p < 0,01) e PEmax (p < 0,05).
Figura 3 – Resultados Obtidos entre as Situações
Pré-Operatório, 1º PO e Alta Hospitalar para a PImax e PEmax.
CVL = Capacidade Vital Lenta; CVF = Capacidade Vital Forçada; VEF1 = Volume
Expiratório Forçado no 1º segundo; PF = Pico de Fluxo Expiratório; FEF25%-75%
= Fluxo Expiratório Forçado entre 25%-75% da Curva Expiratória, % = percentual
do previsto.
A figura 2 ilustra os resultados espirométricos obtidos na
fase pré-operatória e na alta, sendo observadas diminuições
significativas para as variáveis CV, CVF e VEF1, com p <
0,001.
Com relação à força muscular respiratória, avaliada pelos
valores de PImax e PEmax, pode-se observar que houve uma
diminuição de 59% e 53% respectivamente, do pré-operatório
para o 1º PO. Entretanto, do1º PO para a alta, houve um
aumento de 47% tanto para a PImax quanto para a PEmax.
Os percentuais de recuperação dos valores da força muscular
respiratória do pré-operatório para a alta foram de 71% para
a PImax e de 79% para a PEmax. A tabela 3 mostra os valoVolume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
DISCUSSÃO
Este estudo investigou os efeitos da cirurgia cardíaca de
revascularização do miocárdio associada com CEC sobre
a função pulmonar e a força muscular respiratória em pa-
157
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
cientes submetidos à rotina de intervenção fisioterapêutica.
Além disso, este estudo avaliou a prevalência de distúrbios
ventilatórios encontrados na fase pré-operatória dos pacientes elegíveis, não sendo excluídos da amostra final aqueles com prova de função pulmonar alterada.
As alterações da função pulmonar podem estar associadas a vários fatores como o tipo de incisão cirúrgica, a técnica de anestésica empregada, a disfunção diafragmática14,
a dor pós-operatória15, e o posicionamento do dreno pleural16. No presente estudo, todos os pacientes que realizaram
enxerto com artéria torácica interna apresentavam dreno
torácico na região subxifóide, sendo assim uniformizado
este fator.
Com relação aos percentuais de diminuições encontrados
neste estudo, observou-se que não houve retorno dos valores
das variáveis de volumes e fluxos do pré-operatório para a alta
hospitalar, mesmo na vigência da intervenção fisioterapêutica. Resultados semelhantes foram relatados por Ricksten e
col.17, em pacientes no pós-operatório de cirurgia abdominal
alta eletiva submetidos à fisioterapia associada à aplicação de
pressão positiva contínua nas vias aéreas (CPAP).
Também Lindner e col.18 constataram aumentos dos volumes e fluxos pulmonares logo após a aplicação do CPAP,
porém estes valores foram menores, em torno de 25%, no
5° dia de pós-operatório, quando comparados aos valores
basais do pré-operatório. Similarmente, neste estudo, observou-se uma redução entre 20% e 30% dos valores espirométricos na alta, mesmo com a intervenção fisioterapêutica.
Com relação à força muscular respiratória, observou-se
que a cirurgia cardíaca com CEC produziu prejuízos sobre
a mecânica respiratória, reduzindo assim a capacidade dos
músculos respiratórios em gerar tensão suficiente para vencer o trabalho imposto, por desvantagem mecânica ou por
dor pós-operatória. Alguns autores têm constatado aumentos do trabalho respiratório em pacientes que foram submetidos à cirurgia cardíaca com CEC19.
Outros estudos9,20 têm demonstrado que o treinamento
muscular respiratório é efetivo para aumentar a força dos
músculos respiratórios em pacientes submetidos a cirurgia
cardíaca. Entretanto, esses autores não relataram se os valores das variáveis por ocasião da alta são restabelecidos aos
valores do pré-operatório. Nesse contexto, faz-se necessária
a comparação dos valores obtidos na alta hospitalar com
aqueles do pré-operatório, com o intuito de observar se há
ou não um ganho real da força em relação à avaliação précirúrgica.
Não foi constatado neste estudo o retorno dos valores
da PImax e PEmax nos pacientes estudados, quando comparados os valores pré-operatórios com os da alta hospitalar. Entretanto, houve um aumento de 70% e 80% para
a PImax e PEmax, respectivamente, do 1º PO para a alta,
mesmo sem a realização do treinamento muscular respiratório. Além disso, foram observados baixos percentuais de
complicações no pós-operatório, sendo que somente dois
pacientes apresentaram hipersecreção pulmonar (1,41%)
que ocasionou aumento do tempo de internação por complicações respiratórias.
Estudos prévios têm demonstrado que tanto a função
pulmonar como a mobilidade de caixa torácica superior é
altamente prejudicada após a cirurgia cardíaca21,22,. Richter
158
Larsen e col.8 constataram que a CVF retornou aos valores
do pré-operatório somente após seis meses da cirurgia cardíaca. Já a mobilidade torácica superior retornou aos valores basais após um ano da intervenção cirúrgica23.
Este estudo apresenta algumas limitações tal como a
ausência de um grupo controle (sem tratamento) com o objetivo de verificar se os pacientes submetidos à intervenção
fisioterapêutica apresentariam valores superiores de função
pulmonar e da força muscular respiratória, quando comparados àqueles sem intervenção. Porém, todos os pacientes
foram tratados, seguindo uma rotina estabelecida pelo setor
de fisioterapia. Além disso, não foi possível realizar medidas
de função pulmonar no 1°PO, pois as manobras foram dificultadas pela dor.
Em conclusão, os pacientes submetidos à cirurgia cardíaca eletiva mostraram uma alta prevalência de alterações espirométricas na fase pré-operatória. Além disso, a cirurgia
cardíaca com CEC levou a prejuízos da função pulmonar e
da força muscular respiratória. A intervenção fisioterapêutica aplicada aos pacientes incluídos no estudo possivelmente
favoreceu um aumento da força muscular respiratória, porém os valores basais tanto da FP como da FMR não se
mostraram completamente recuperados até a alta hospitalar. A intervenção fisioterápica pode ser justificada devido
à alta prevalência basal de distúrbios ventilatórios observados nesses pacientes, com o intuito de reduzir a incidência
de complicações respiratórias no pós-operatório.
RESUMO
JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: A cirurgia cardíaca
está associada à complicações respiratórias decorrentes de
alterações da função pulmonar e da força muscular respiratória. O objetivo deste estudo foi determinar a prevalência de
alterações pulmonares no pré-operatório e avaliar o comportamento no pós-operatório, da função pulmonar e da força
muscular respiratória em pacientes submetidos à cirurgia cardíaca e a intervenção fisioterapêutica.
MÉTODO: Participaram deste estudo prospectivo 47 pacientes, internados na Santa Casa de Misericórdia de Araraquara, com idade média de 57 ± 11 anos. Foram mensuradas
as variáveis espirométricas e a força muscular respiratória
(FMR) no pré-operatório, 1º pós-operatório e na alta hospitalar.
RESULTADOS: Foi observada alta prevalência de alterações da função pulmonar (FP) no pré-operatório. Além
disso, foram constatadas reduções significativas da FP do
pré-operatório para a alta, bem como da FMR (p < 0,05).
A FMR aumentou significativamente do 1º pós-operatório
para a alta; entretanto, não retornou aos valores do pré-operatório, embora tenham constatados baixos percentuais de
complicações pós-operatórias.
CONCLUSÕES: Estes dados sugerem que a redução dos
valores da FMR e da FP no pós-operatório não revertem
completamente aos níveis pré-operatórios até a alta hospitalar. Entretanto, apesar da alta prevalência de alterações da
FP no pré-operatório, neste estudo foram constatadas baixas
taxas de complicações pós-operatórias.
Unitermos: Cirurgia cardíaca, função pulmonar, força
muscular respiratória, fisioterapia.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
REFERÊNCIAS
01. Taggart DP, el-Fiky M, Carter R et al – Respiratory dysfunction after uncomplicated cardiopulmonary bypass. Ann Thorac Surg, 1993;56:1123-1128.
02. Shapira N, Zabatino SM, Ahmed S et al – Determinants of pulmonary function in patients undergoing coronary bypass operations. Ann Thorac Surg,
1990;50:268-273.
03. Irwin S, Tecklin J - Fisioterapia Cardiopulmonar. São Paulo, 2ª Ed, Manole,
1994;315-324.
04. Frolund L, Madsen F - Self-administered prophylactic postoperative positive
expiratory pressure in thoracic surgery. Acta Anaesthesiol Scand, 1986;30:381385.
05. Matte P, Jacquet L, Van Dyck M et al - Effects of conventional physiotherapy,
continuous positive airway pressure and non-invasive ventilatory support with
bilevel positive airway pressure after coronary artery bypass grafting. . Acta
Anaesthesiol Scand, 2000;44:75-81.
06. Andersen JB, Olesen KP, Lansen E et al - periodic continuous positive airway pressure, CPAP, by mask in the treatment of atelectasis. Eur J Res Dis,
1980;61:20-25.
07. Knobel E - Condutas no Paciente Grave. 2ª Ed, São Paulo, Atheneu, 1999;393402.
08. Richter Larsen K, Ingwersen U, Thode S et al - Mask physiotherapy in patients after heart surgery: a controlled study. Intensive Care Med, 1995;21:469474.
09. Elias DG, Costa D, Oishi J et al - Efeitos do treinamento muscular respiratório
no pré e pós-operatório de cirurgia cardíaca. Rev Bras Fisiot, 2000;12:9-18.
10. American Thoracic Society. Pulmonary Rehabilitation. Am J Respir Crit Care
Med, 1999;159:1666-1682.
11. Knudson RJ, Lebowitz MD, Holberg CJ et al - Changes in the normal maximal expiratory flow-volume curve with growth and aging. Am Rev Respir Dis,
1983;127:725-734.
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
12. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. I Consenso Brasileiro sobre
espirometria. J Pneumol, 1996;22:105-164.
13. Black LF, Hyatt RE - Maximal static respiratory pressures in generalized muscular disease. Am Rev Res Dis, 1971;103:641-650.
14. Dureuil B, Cantineau JP, Desmonts JM – Effects of upper or lower abdominal
surgery on diaphragmatic function. Br J Anesth, 1987;59:1230-1235.
15. Symreng T, Gomez MN, Rossi N - Intrapleural bupivacaine versus saline after
thoracotomy - effects on pain and lung function - a double-blind study. J Cardiothorac Anesth, 1989;3:144-149.
16. Guizilini S, Gomes WJ, Faresin SM et al - Efeitos do local de inserção do
dreno pleural na função pulmonar no pós-operatório de cirurgia de revascularização do miocárdio. Rev Bras Cir Cardiovasc, 2004;19:47-54.
17. Ricksten SE, Bengtsson A, Soderberg C et al - Effects of periodic positive airway pressure by mask on postoperative pulmonary function. Chest,
1986;84:774-781.
18. Lindner KH, Lotz P, Ahnefeld FW - continuous positive airway pressure effect on functional residual capacity, vital capacity and its subdivisions. Chest,
1987;92:66-70.
19. Garzon A, Seltzer B, Karlson KE - Respiratory mechanics following openheart surgery for acquired valvular disease. Circulation, 1966;23:(Suppl4):I5764.
20. Garcia RCP, Costa D - Treinamento muscular respiratório em pós-operatório
de cirurgia cardíaca eletiva. Rev Bras Fisiot, 2002;6:139-146.
21. Barbosa RAG, Carmona MJC - Avaliação da função pulmonar em pacientes
submetidos a cirurgia cardíaca com circulação extracorpórea. Rev Bras Anestesiol, 2002;52:689-699.
22. Ragnarsdottir M, KrustjAnsdittir A, Ingvarsdottir I et al - Short-term changes in pulmonary function and respiratory movements after cardiac surgery via
median sternotomy. Scand Cardiovasc J, 2004;38:46-52.
23. KristjAnsdottir A, Ragnarsdottir M, Hannesson P et al - Respiratory movements are altered three months and one year following cardiac surgery. Scand
Cardiovasc J, 2004;38:98-103.
159
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Síndrome Cardiopulmonar por Hantavírus.
Relato de Sete Casos no Centro-Oeste do Brasil*
Cardiopulmonary Syndrome due to Hantavirus.
Report of Seven Cases on the Midwest of Brazil
Wagner Marques Pereira Malheiros1, Carlos José Alves2, Gilberto Paulo Pereira Franco3,
Abdon Salam Khaled Karhawi4, Marcos Vinícius Paes de Barros5.
Michelli Silva Daltro Coelho6, Mabel da Silva Gallina6, Paloma Borges dos Santos6.
SUMMARY
BACKGROUND AND OBJECTIVES: The diseases related to Hantaviruses, endemic in Eurasia as hemorrhagic fever with
renal syndrome, were described in America in 1993, predominantly as a cardiopulmonary syndrome. The disease is transmitted to man through the inhalation of viral particles from feces and urine of small rodents, and is followed by the prodromic,
cardiopulmonary and recovery periods. The viral induced damage to the lung capillary endothelium is the most important
event in the cardiopulmonary period, and may be associated or not to some degree of ventricular dysfunction.
CONTENTS: We report seven cases of the disease, confirmed by serology, and gathered within a period of three years. We
reinforce the importance of a high degree of clinical suspicion, due to its impact on treatment; witch is based on judicious
fluid replacement and the use of vasoactive drugs on the approach to shock. The oxygenation variables tended to a rapid
improvement with this approach. We report one death in this group of patients. Ribavirin, witch was not used in these cases,
is under evaluation by controlled trials.
CONCLUSIONS: We believe that hantaviruses will become a more frequent differential diagnosis with acute pulmonary
disease leading to respiratory failure and shock, especially due to the growing urban character it has acquired.
Key Words: Hantaviruses, cardiopulmonary syndrome.
A
s doenças relacionadas aos diversos tipos de hantavirus não eram descritas no território americano
até junho de 1993. Presentes nos demais continentes
(em especial na Ásia e Europa), manifestavam-se por febre
hemorrágica com insuficiência renal, sem envolvimento pulmonar1,2.
Em maio de 1993 uma doença febril aguda associada à
falência respiratória, choque e alta letalidade foi descrita na
região de Four Corners, sudoeste dos EUA3. Investigação
promovida pelo CDC demonstrou que um novo tipo de hantavirus era o agente etiológico envolvido, denominado inicialmente Four Corners, a seguir Muerto Canyon e finalmente
Sin Nombre4,5. Posteriormente foram observados casos em
outros estados americanos6,7, embora a predominância na região sudoeste permanecesse. Esta nova espécie de hantavirus
diferenciava-se das demais previamente descritas pelo pouco
comprometimento renal e pelo grave envolvimento pulmonar, com elevada letalidade.
Na epidemia de Four Corners foram compilados 48 casos.
Havia predominância no sexo masculino; a idade mediana
era de 31 anos e a letalidade alcançava 60%8.
Em novembro e dezembro de 1993 foram relatados três
casos na região Sudeste do Brasil, na área rural de Juquitiba,
SP9. Os pacientes eram irmãos e apresentavam doença respiratória aguda, dois deles evoluindo para o óbito. A investigação mostrou que o agente causal era um vírus semelhante ao
Sin Nombre.
O hantavírus tem como hospedeiro pequenos roedores
silvestres10,11, existentes em grandes populações nas regiões
produtoras de grãos. A presença de silos ou outros locais de
armazenagem inadequadamente construídos, além do desmatamento, propicia o contato humano com os excretas destes roedores. A transmissão ao homem dá-se sob a forma de
aerossol.
O principal evento fisiopatológico, a lesão básica, reside
nas células endoteliais dos capilares pulmonares, por ação direta do vírus nas integrinas beta 3, promovendo brutal alteração da permeabilidade, resultando em edema pulmonar12-14.
A agressão viral não se limita ao pulmão, sendo encontradas
partículas virais nas células cardíacas, resultando em redução
funcional e surgimento de arritmias cardíacas15. Partículas
virais podem também ser encontradas em diversos órgãos e
tecidos, porém a maior relevância clinica sobre os pulmões e
o coração fez com que a síndrome fosse alcunhada como uma
1. Especialista em Pneumologia/Tisiologia e Broncoscopia; Responsável pela rotina de doenças pulmonares/broncoscopia da UTI do Hospital
Jardim Cuiabá.
2. Chefe da UTI Adulto do Hospital Jardim Cuiabá; Especialista em Terapia Intensiva; Professor Assistente na Disciplina de Semiologia Médica
na Universidade de Cuiabá – UNIC.
3. Especialista em Terapia Intensiva; Responsável pela rotina médica da UTI Adulto do Hospital Jardim Cuiabá.
4. Doutor em Infectologia; Especialista em Terapia Intensiva
5. Especialista em Cardiologia; Especialista em Terapia Intensiva
6. Graduanda de Medicina na Universidade de Cuiabá – UNIC
* Recebido do Hospital Jardim Cuiabá - Centro de Terapia Intensiva Adulto, Cuiabá – MT
Fonte de Patrocínio: Centro de Estudos em Medicina Intensiva; Grupo Cuiabano de Medicina Intensiva - GCMI
Apresentado em 06 de agosto de 2004 - Aceito para publicação em 18 de outubro de 2004
Endereço para correspondência: Dr. Wagner Marques Pereira Malheiros - Rua Ceilão, 480 Bairro Shangri-lá - 78070-150 Cuiabá, MT - Celular:
(65) 9982-7699 CTI Adulto: (65) 612-4416 Residência: (65) 634-1544 - e-mail: [email protected]. FAX: (65)612-4415
160
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
entidade cardiopulmonar. A presença de receptores do tipo
integrinas beta 3 nas plaquetas humanas justifica a moderada redução na contagem destes elementos, embora eventos
hemorrágicos sejam incomuns. Outras alterações da coagulação, quando presentes, tendem a ser discretas e de rápida
recuperação.
A quantidade de inóculo infectante parece estar relacionada à gravidade da doença, observando-se desde casos mais
brandos com boa evolução até outros com acentuada repercussão hemodinâmica. O período de incubação da doença
pode variar de poucos dias a semanas, seguindo-se as manifestações clinicas iniciais.
A síndrome cardiopulmonar por hantavírus é dividida
clinicamente em três fases. Uma fase prodrômica, caracterizada por febre não elevada, mialgia intensa (principalmente
na região dorsal do abdômen e posterior das coxas), tosse
seca e dispnéia. Pode-se observar vômitos, diarréia e cefaléia, sendo esta última mais comum. Não ocorrem sintomas
de vias aéreas superiores. Segue-se a fase cardiopulmonar,
com deterioração hemodinâmica e respiratória, representada por colapso circulatório e insuficiência respiratória aguda
por edema pulmonar, usualmente não cardiogênico. Efusão
pleural é comum nesta fase. As alterações laboratoriais demonstram grande hemoconcentração, podendo o hematócrito atingir valores bastante elevados. Trombocitopenia,
hipocalemia, leucocitose com presença de linfócitos atípicos,
elevação de transaminases e desidrogenase lática são observados. Neste período a febre não mais é observada, cessando
imediatamente após o inicio das alterações hemodinâmicas.
A alteração da permeabilidade endotelial pulmonar resulta
em inundamento alveolar, de maneira que nas observações
radiológicas pode-se encontrar desde formas intersticiais até
um padrão semelhante ao da SARA. Os valores de pressão
de oclusão da artéria pulmonar podem ser normais ou notadamente baixos; a resistência vascular periférica tende à ele-
vação e o trabalho ventricular esquerdo à redução. A terceira
fase é a de convalescença.
DESENVOLVIMENTO
O estudo foi realizado em uma UTI mista de um hospital
geral privado na cidade de Cuiabá, Mato Grosso. Foi realizada revisão de prontuário de sete pacientes, internados no
serviço, com diagnóstico sorológico de síndrome cardiopulmonar por hantavírus, no período de dezembro de 2000 a
dezembro de 2003.
Todos os pacientes eram provenientes de área rural, em
região produtora de grãos, especialmente soja, morando próximo a locais de armazenamento da produção, possibilitando
o contato indireto com pequenos roedores. A idade variou
de 13 a 57 anos (mediana de 37anos) e quatro dos pacientes
eram do sexo feminino.
Os sintomas iniciais em todos eles eram tosse, mialgia, em
especial na região dorsal do abdômen e posterior das coxas,
febre não elevada e dispnéia. A cefaléia foi observada em
quatro pacientes. Não foram observados sintomas gastro-intestinais. Em cinco pacientes os sintomas iniciais ocorreram
entre 48 e 96 horas antes da admissão. Os outros dois pacientes (um casal com sintomas mais tardios) eram provenientes
de pequeno hospital no interior, com relato clinico dos mesmos sintomas iniciais, tendo sido admitidos após quinze dias
do inicio do quadro clinico. A avaliação inicial dos pacientes
pode ser observada na tabela 1.
As alterações radiológicas variaram desde infiltrado intersticial, nos casos mais brandos, até um padrão de SARA
(Figuras 1 e 2).
Na paciente mais jovem (13 anos) a presença de esplenomegalia importante era notada. Nenhum outro paciente
apresentava visceromegalias. O estudo laboratorial inicial dos
pacientes pode ser observado na tabela 2.
Tabela 1 - Estudo Clinico Inicial/Uso de Ventilação/Cateter de Artéria Pulmonar/Droga/Destino.
Casos
Idade
Sexo
Dobutamina
APACHE
PAM
mmHg
FC
FR
TA
PaO2/FiO2
S.Ganz
Ventilador
Mecânico
Final
1
2
3
4
5
6
7
37
57
36
31
13
50
43
M
F
F
M
F
M
F
Sim
Não
Sim
Sim
Sim
Não
Sim
27
10
16
16
14
12
13
40
140
53
67
35
70
50
120
105
160
120
145
122
130
38
30
32
28
48
26
34
35.6
36.2
36.8
36.4
36,5
36.5
36.8
95.2
125
100
106.4
172
120
108
sim
não
não
não
não
não
não
sim
não
sim
não
não
não
não
Óbito
Alta
Alta
Alta
Alta
Alta
Alta
FC – freqüência cardíaca, FR = freqüência respiratória, TA = temperatura axilar
Figura 1. Evolução radiológica.
Figura 2. Evolução radiológica.
Caso 3: A - Evolução radiológica inicial, com padrão intersticio-alveolar, predominando na área medular do pulmão em “asa de borboleta”; B - Em 12 h, evoluindo com
padrão de SARA; C - Após terapêutica instituída, quase normalização após 96 h.
Caso 4: A - Avaliação radiológica inicial infiltrado interstico-alveolar difuso; B
- Evolução com padrão de SARA seis horas após; C - Padrão radiológico pouco
antes de evolução para óbito por atelectasia pulmonar.
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
161
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
Casos
Leucometria
(total/mm³)
Hematócrito
(%)
1
2
3
4
5
6
7
13.000
9.700
13.000
5.000
6.700
8.000
10.600
61.1
41
44
58
45
54
46
Tabela 2 - Exames Laboratoriais Admissionais
Creat.
Sódio
Potássio
Plaquetas
Sérico
Sérico
Sérica
(total/mm³)
(mg/dl)
(mEq/dl)
(mEq/Dl)
90.000
1.9
128
3.2
287.000
1.0
134
3.4
146.000
1.1
130
3.6
87.000
0.5
134
3.5
81.000
0.8
128
3.6
95.000
0.7
130
3.3
113.000
1.6
133
3.1
Os pacientes apresentavam-se, em geral, hipotensos à
admissão. A reposição volêmica, em alíquotas, respeitou as
reavaliações clinicas, as trocas gasosas e as alterações radiográficas à beira do leito. Chamava a atenção que, em geral,
pequenos volumes hídricos pioravam as trocas gasosas, bem
como tornavam mais evidentes as alterações radiológicas.
Em cinco pacientes foi necessário o emprego de amina vasoativa (dobutamina, na dose de 2 a 10 µg/kg/min, conforme
Guideline do CDC)8. Todos os pacientes foram submetidos à
ecocardiografia à beira do leito, sendo, em alguns, notada disfunção sistólica difusa de grau leve. Um paciente foi também
monitorizado com cateter de artéria pulmonar, em razão da
não resposta às manobras iniciais; os indices eram de baixa
pressão de oclusão da artéria pulmonar, resistência vascular
sistêmica elevada e trabalho ventricular esquerdo reduzido.
Todos os pacientes apresentavam baixa relação PaO2/
FiO2, porém com melhora observada num espaço de tempo
que variou de minutos a poucas horas, conseguida com acréscimo de oxigênio através de máscara de Venturi e a infusão
mais judiciosa de volume.
Dois pacientes necessitaram de ventilação mecânica.
Ambos haviam evoluído também com maior refratariedade
à correção do choque e rebaixamento do sensório. Um deles permaneceu em ventilação mecânica por 48 horas, com
melhora das trocas gasosas após estabilização pressórica. O
outro evoluiu para o óbito por atelectasia pulmonar à direita
no sétimo dia de internação, quando já estava em processo
de desmame ventilatório. O evento foi súbito, com intensa
hipoxemia, seguindo arritmia ventricular refrataria. Não
houve tempo para realização de broncoscopia para liberação
do pulmão afetado. Em ambos se observou exteriorização de
volumoso líquido amarelado pelo tubo orotraqueal, podendo este ser um indicativo para excluir a presença de hemorragia alveolar e suas doenças correlatas. Foi realizada broncofibroscopia no paciente que veio a falecer, caracterizando o
BAL com poucas células, mas predominantemente linfocitico
(> 30%), sem hemácias e células epiteliais. As culturas foram
negativas e não se observou inclusões nos macrófagos. Uma
paciente evoluiu com perda parcial da acuidade visual, tendo
sido observada a presença de manchas de Roth em sua retina.
O ecocardiograma de beira de leito foi normal, não sendo
realizado por via trans-esofágica.
Todos os outros obtiveram alta da UTI em período inferior a dez dias.
DISCUSSÃO
O reconhecimento, o entendimento da fisiopatologia e o
162
LDH
TGO
TGP
Hemocultura
824
550
451
406
562
62
25
84
34
48
110
79
68
27
90
36
18
90
59
negativa
negativa
negativa
negativa
negativa
negativa
negativa
aporte terapêutico adequado vêm reduzindo a mortalidade
da síndrome, que outrora variava de 50% a 80%16.
A reanimação volêmica, pilar na abordagem dos casos de
choque circulatório, se não for extremamente cuidadosa, pode
ser deletéria aos pacientes com síndrome cardiopulmonar por
hantavírus, levando a um acréscimo na mortalidade17,18. Em
decorrência da acentuada alteração na permeabilidade capilar pulmonar, notadamente aumentada, expansões volêmicas
que seriam utilizadas em outras patologias que cursam com
choque, aqui mais rapidamente deterioram as trocas gasosas,
por avassalador inundamento alveolar. Entende-se, então,
que o manuseio do choque, nestes casos, deve levar em conta
judiciosa reposição volêmica. Acreditamos que o reconhecimento precoce da doença e seu manuseio, justifiquem que
apenas dois pacientes requereram uso de ventilação mecânica, apesar dos baixos níveis de índice de oxigenação iniciais.
A melhora do quadro clinico em geral é rápida, mas a evolução pode ser catastrófica, apesar do pouco volume infundido. Em alguns pacientes observamos que pequeno volume (
100-150 ml ) infundido, o agravamento do quadro clinico era
avassalador.
A noradrenalina não foi utilizada nos pacientes em choque, especialmente pela fisiopatogenia da doença cursar com
elevados valores de resistência periférica. O emprego da dobutamina foi eficaz no controle destes pacientes.
O uso de rivabirina é recomendado com base na sua ação
in vitro19, ainda que nenhum trabalho tenha demonstrado seu
impacto sobre a mortalidade na síndrome. É difícil o acesso
à sua apresentação por via endovenosa em nosso meio, razão
da sua não utilização.
Estudos publicados sobre o lavado bronco-alveolar
(BAL) fazem referência a um líquido rico em proteínas, sem
hemácias ou características de LBA hemorrágico, importante no diagnóstico diferencial com doenças que cursam com
hemorragia alveolar e na leptospirose com acometimento
pulmonar20.
A suspeita clinica da doença baseia-se em um quadro
inexplicável de insuficiência respiratória aguda seguindo-se
colapso circulatório, aparentemente sem envolvimento cardiogênico, associado à história epidemiológica e características laboratoriais como hemoconcentração e plaquetopenia.
O padrão radiológico demonstrando doença pulmonar difusa, com predomínio medular, variando desde a forma intersticial até o padrão de SARA, associado com silhueta cardíaca
normal, pode sugerir edema pulmonar não cardiogênico.
Febre foi relatada na fase inicial da doença em todos os
casos, com desaparecimento após a instalação do choque, o
que corrobora as séries anteriormente publicadas. Não houve
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO ORIGINAL
leucocitose expressiva em nenhum de nossos casos. As alterações eletrolíticas mais observadas foram hiponatremia e hipocalemia, mantidas durante quase toda evolução dos casos.
O grau de suspeição clínica deve ser elevado, devido ao
seu impacto sobre a abordagem terapêutica. Infelizmente, tal
suspeição ocorre, na maioria das vezes, quando de pequenas
epidemias, nas quais a similaridade e a gravidade dos casos
remete a diagnósticos incomuns. Casos isolados dificilmente
suscitam suspeita ou investigação para hantavirose, sendo em
geral rotulados dentro das diversas causas de doença pulmonar com distúrbio hemodinâmico, em especial as pneumonias atípicas ou comunitárias graves. É possivel, então, ser
a hantavirose doença sub-diagnosticada, com mortalidade
incrementada quando do manuseio inadequado.
Na nossa série, todos os pacientes eram de zona rural. Entretanto, relatos confirmados da doença em ambiente urbano
vêm se sucedendo, empobrecendo a história epidemiológica,
mas alertando para a existência da doença nesse meio.
CONCLUSÃO
Devido à sua particular fisiopatologia, principalmente em
relação à agressão sobre o endotélio capilar pulmonar, deparamos com uma situação na qual a abordagem inicial ao choque pode contrariar o “instinto” do intensivista, por cursar
com parcimoniosa reposição volêmica, atitude que se torna
ainda mais difícil sem um diagnóstico definitivo precoce, com
decisões guiadas pela elevada suspeita clinica.
Acredita-se que esta doença tornar-se-á diagnóstico diferencial mais presente nos casos inexplicáveis de doença pulmonar com insuficiência respiratória e choque. Sua presença
em nosso meio tem se tornado cada vez mais comum, especialmente pelo caráter urbano que vem adquirindo.
RESUMO
JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: As doenças relacionadas à hantavirose, endêmicas na Eurásia sob a forma de
febre hemorrágica e com síndrome renal, foram descritas no
continente americano em 1993, predominantemente como
síndrome cardiopulmonar. A transmissão da doença ao homem dá-se por aspiração de partículas virais em aerossóis de
fezes e urina de pequenos roedores, e é seguida pelas fases
prodrômica, cardiopulmonar e de convalescença. A agressão
viral ao endotélio capilar pulmonar com dramático aumento
da permeabilidade caracteriza o principal evento fisiopatológico na fase cardiopulmonar, associado ou não a algum grau
de disfunção ventricular.
CONTEÚDO: Sete casos sorologicamente comprovados
da doença, compilados ao longo de três anos. A importância de um elevado grau de suspeição clínica, deve ser ressaltada, devido ao seu impacto no tratamento, caracterizado
por hidratação judiciosa e emprego de drogas vasoativas na
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
abordagem do choque. Os índices de oxigenação tenderam
à rápida melhora com esta abordagem. Relatamos um óbito
na presente série. A ribavirina, droga não utilizada em nosso
meio, está sendo avaliada em estudos controlados.
CONCLUSÕES: Acredita-se que esta doença tornar-se-á
diagnóstico diferencial mais presente nos casos inexplicáveis de
doença pulmonar com insuficiência respiratória e choque. Sua
presença em nosso meio tem se tornado cada vez mais comum,
especialmente pelo caráter urbano que vem adquirindo.
Unitermos: Hantavirose, Síndrome cardiopulmonar por
hantavírus.
REFERÊNCIAS
01. Lee H, van der Groen G - Hemorrhagic fever with renal syndrome. Prog Med
Virol, 1989;36:62-102.
02. Ahmeti S, Kutllovic M, Baljosevic S et al - Clinical and epidemiological characteristics of haemorrhagic fever with renal syndrome (HFRS) during epidemic.
In: Symposium on Arbovirus in the Mediterranean Countries. 2nd Ed, Dubrovnik, Yugoslavia, 1989;S34.
03. Duchin JS, Koster FT, Peters CJ et al - Hantavirus pulmonary syndrome: a
clinical description of 17 patients with a newly recognized disease. N Engl J
Med, 1994;330:949-955.
04. Ksiazek TG, Peters CJ, Rollin PE et al – Identification of a new North American hantavirus that causes acute pulmonary insufficiency. Am J Trop Med
Hyg, 1995;52:117-123.
05. Nichol ST, Spiropoulou CF, Morzunov S et al - Genetic identification of a
hantavirus associated with an outbreak of acute respiratory illness. Science,
1993;262:914-917.
06. Khan AS, Spiropoulou CF, Morzunov S et al - Fatal illness associated with a
new hantavirus in Louisiana. J Med Virol, 1995;46:281-286.
07. Khan AS, Gaviria M, Rollin PE et al - Hantavirus pulmonary syndrome in
Florida: association with the newly identified Black Creek Canal virus. Am J
Med, 1996;100:46-48.
08. C.D.C. Hantavirus pulmonary syndrome – United States, 1993. MMWR,
1994;43:45-48.
09. Vasconcelos MJ, Pedroso de Lima VC, Iversson LB et al - Doença humana
por hantavirus na área rural de Juquitiba, área metropolitana de São Paulo,
Brasil. In: XXX Congresso da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical em
Salvador, 1994.
10. Song JW, Baek LJ, Gajdusek DC et al - Isolation of pathogenic hantavirus from
white-footed mouse (Peromyscus leucopus). Lancet, 1994;344:1637.
11. Childs JE, Ksiazek TG, Spiropoulou CF et al - Serologic and genetic identification of Peromyscus maniculatus as the primary rodent reservoir for a new hantavirus in the southwestern United States. J Infec Dis, 1994;169:1271-1280.
12. Nolte KB, Feddersen RM, Foucar K et al - Hantavirus pulmonary syndrome
in the United States: a pathological description of a disease caused by a new
agent. Hum Pathol, 1995;26:110-120.
13. Mackow ER, Gravilovskaya IN - Cellular receptors and hantavirus pathogenesis. Curr Top Microbiol Immunol, 2001;256:91-115.
14. Peters CJ, Zaki SR - Role of endothelium in viral hemorrhagic fevers. Crit Care
Med, 2002;30:(Suppl5):S268-S273.
15. Hallin G, Simpson SQ, Crowell RE et al - Cardiopulmonary manifestations of
hantavirus pulmonary syndrome. Crit Care Med, 1996;24:252-258.
16. C.D.C. Update: Hantavirus disease – United States, 1993. MMWR Mord Mortal Wkly Rep, 1993; 42421-42424
17. Campos GM - Estudo clinico-epidemiológico sobre a hantavirose na região
de Ribeirão Preto, SP (dissertação). São Paulo: Faculdade de Medicina de
Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, 2002.
18. Zhao X, Hay J - The Evolution of hantavirus. Immunol Invest, 1997;26:191197.
19. Chapman LE, Ellis BA, Koster FT et al - Ribavirin Study Group. Discriminators between hantavirus infected and uninfected persons enrolled in a trial of
intravenous ribavirin presumptive hantavirus pulmonary syndrome. Clin Infec
Dis, 2002;34:293-304.
20. Levy H, Simpson SQ - Hantavirus pulmonary syndrome. Am J Respir Crit Care
Med, 1994;149: 1710-1713.
163
RBTI / NEUROINTENSIVISMO - ARTIGO ORIGINAL
Estudo Epidemiológico do TCE em Unidade de
Terapia Intensiva Geral como Resultado da Adesão
ao Latin American Brain Injury Consortium*
Epidemiologic Survey of Traumatic Brain Injury in a General Intensive
Care Unit as a Result of Latin American Brain Injury Consortium Adherence
Cláudio Piras1, Luís Vicente Forte2, Cássio Morano Peluso2, Ed Moreira Lima1, Mirto Nelson Prandini3.
SUMMARY
BACKGROUND AND OBJECTIVES: The authors present the Latin American Brain Injury Consortium (LABIC) their objectives and impact on a general ICU in Vitória city. The implantation of this Consortium in our state results in a traumatic brain
injury (TBI) epidemiologic study in our city with the objective to acquire knowledge about them and promote actions in
order to improve prevention and treatment of those patients.
METHODS: Retrospective study of 105 patients accepted in a general ICU since January 2003 through October 2003.
RESULTS: There were 92 (87.62%) men and 13 (12.38%) women. Twenty eight patients suffered TBI from fall (26.67%),
ten patients suffered TBI from penetrating gunshot (9.52%) and fifty seven patients suffered TBI from crashes (54.29%)
that was responsible for 54.76% of deaths. The overall mortality was 40% and was more prevalent in the elderly (80%),
falls (39.28%), penetrating gunshot (50%) and crush (50%). Eighty one patients had Glasgow Coma Scale less than 9 on
admission (77.19%). Mortality reached 92.31% (p = 0.0329) when APACHE II was more than 23.
CONCLUSIONS: The authors concluded that the adherence to the LABIC was responsible for the knowledge of the actual
situation of TBI in our city and give them means to make public those data in order to divulge the neurologic intensive care
and promote debates and actions to prevent TBI as well as treat them.
Key Words: brain hemometabolism, brain ischemia, intensive care, epidemiology, trauma, brain injury.
A
lesão isquêmica é o evento final mais comum na destruição do tecido encefálico, quer por ação primária
ou secundária, de forma difusa ou focal, ocorrendo
em conseqüência de alterações permanentes ou temporárias
do fluxo sangüíneo para um dado metabolismo encefálico.
Diversas condições etiológicas estão associadas com a lesão
encefálica1.
A compreensão crescente dos mecanismos de lesão e o
desenvolvimento de tratamentos específicos despertaram o
interesse de diversos grupos e agências. Surgiram drogas com
o objetivo de tratar, evitar ou diminuir as áreas de isquemia.
A necessidade de colaboração nacional e internacional,
em grande escala, sobre a lesão encefálica aguda foi claramente estabelecida pelo EBIC (Europen Brain Injury Consortium) e outras organizações2. A falta de dados epidemiológicos precisos na América Latina dificulta o conhecimento
da incidência real das lesões encefálicas nesse continente. A
análise de apenas um fator etiológico, o trauma, pode servir
como exemplo. Estudos indicam que o TCE é um grave problema de saúde pública nos EUA3,4 e que na América Latina
a situação pode ser ainda pior. Essa incidência estimada abre
um vasto campo para investigações clínicas multicêntricas e
o desenvolvimento de equipamentos, drogas sedativas, trombolíticas e de neuroproteção.
A possibilidade de estabelecer estudos multicêntricos re-
gionais e a existência de outros dois Consórcios (Europeu5
e Americano6) incentivaram pesquisadores a conceber uma
estrutura similar na América Latina.
Após a adesão ao LABIC, realizou-se um estudo epidemiológico do TCE e avaliou-se as possíveis repercussões da
adesão em uma UTI no Estado do Espírito Santo.
MÉTODO
Foram estudados 105 pacientes internados na Unidade de
Tratamento Intensivo (UTI), por traumatismo cranioencefálico (TCE), no período entre 01/01/2003 e 31/10/2003.
O grupo com TCE foi escolhido para o estudo pelos seguintes motivos: integra o núcleo de interesse do LABIC,
possui alta incidência, maior prevalência em adultos jovens,
apresenta tempo de internação prolongado, possui elevada
taxa de morbidade e mortalidade, necessita de reabilitação,
envolve elevado custo social e financeiro, os fatores de risco
são conhecidos e possibilitam a implantação de programas
de prevenção.
Os pacientes foram avaliados quanto ao sexo, idade, tempo de permanência na UTI, fator causal e APACHE II (Acute Physiology and Chronic Health Evaluation versão II).
O grupo Faixa Etária (FE) foi dividido em quatro subgrupos: subgrupo I, idades entre 15 e 29 anos; subgrupo II, entre
1. Médico Intensivista do Hospital São Lucas. Especialista em Terapia Intensiva pela AMIB. Membro do LABIC Espírito Santo.
2. Neurocirurgião. Diretor do Instituto de Tratamento Neurológico e de Terapia Intensiva (INETI). Membro fundador do LABIC.
3. Coordenador do Curso de Pós-Graduação em Neurocirurgia da UNIFESP.
*Recebido da Unidade de Terapia Intensiva do Hospital São Lucas, Vitória, ES
Apresentado em 19 de julho de 2004 - Aceito para publicação em 04 de outubro de 2004
Endereço para correspondência: Dr. Cláudio Piras - Rua Alaor de Queiroz Araújo, 175/602 - Enseada do Suá - 29055-010 Vitória, ES - Fone: (27)
3345-1118 / Fax (27) 3345-1297 - E-mail: [email protected]
164
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / NEUROINTENSIVISMO - ARTIGO ORIGINAL
30 e 44 anos; subgrupo III, entre 45 e 59 anos; e subgrupo IV,
idade igual ou superior a 60 anos.
O grupo Fator Causal (FC) foi dividido em sete subgrupos: subgrupo A, pacientes vítimas de acidente de trânsito
em automóvel; subgrupo B, pacientes vítimas de acidente
de trânsito envolvendo motocicletas; subgrupo C, pacientes
vítimas de atropelamento; subgrupo D, pacientes vítimas de
lesão encefálica por projétil de arma de fogo (PAF); subgrupo
E, pacientes vítimas de espancamento; subgrupo F, pacientes
vítimas de quedas; e subgrupo G, outros fatores causais não
incluídos nos demais grupos.
O índice APACHE II foi utilizado para se correlacionar a
gravidade dos pacientes, através de faixas de pontuação com
a mortalidade obtida. Foi utilizado também para se analisar
a existência de diferença estatística significativa entre os valores médios obtidos nos pacientes que tiveram alta da UTI e
os que evoluíram para o óbito.
O Grupo APACHE II (AP) foi dividido em quatro subgrupos: subgrupo 1, valores de APACHE II entre 0 e 7 pontos; subgrupo 2, valores de APACHE II entre 8 e 15 pontos;
subgrupo 3, valores de APACHE II entre 16 e 23 pontos; e
subgrupo 4, valores de APACHE II igual ou superior a 24
pontos.
A mortalidade foi analisada em cada grupo, entre os seus
subgrupos, entre os sexos e de forma global.
Os resultados foram apresentados na forma de números,
percentuais (com duas casas decimais) e, quando cabia, através de análise estatística. Os testes utilizados foram o Quiquadrado e o Exato de Fisher (quando uma ou mais variantes tinham número inferior a cinco). O programa estatístico
utilizado foi o EpiInfo for Windows 2002 (Centers for Disease
Control and Prevention, Atlanta). Foram considerados significativos os valores de p menores que 0,05 (apresentados com
4 casas decimais), tendo sido registrados no texto e nas tabelas apenas esses.
RESULTADOS
Dos 105 pacientes estudados 92 (87,62%) eram do sexo
masculino e 13 (12,38%) do sexo feminino. A permanência na
UTI variou de 1 a 55 dias, com média de 10,85 ± 9,74 dias).
A idade dos pacientes variou entre 15 e 82 anos (Grupo
FE). O subgrupo I (15 e 29 anos) com 46 pacientes (43,81%);
o subgrupo II (30 e 44 anos) com 33 pacientes (31,43%); o
subgrupo III (45 e 59 anos) com 16 pacientes (15,24%); e o
subgrupo IV (60 anos ou superior) com 10 pacientes (9,52%).
Esses resultados estão apresentados na tabela 1.
Tabela 1 - Distribuição dos Pacientes Portadores de
Traumatismo Cranioencefálico por Faixa Etária (Grupo FE)
Subgrupos
I (15 a 29 anos)
II (30 a 44 anos)
III (45 a 59 anos)
IV (60 anos e superior)
Total
Nº de pacientes
46
33
16
10
105
%
43,81
31,43
15,24
9,52
100,00
Quanto ao fator causal (Grupo FC) observou-se a incidência de 9 pacientes (8,57%) no subgrupo A (vítimas
de acidente de trânsito em automóvel); de 22 (20,95%) no
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
subgrupo B (vítimas de acidente de trânsito em motocicleta); de 26 (24,76%) no subgrupo C (vítimas de atropelamento); de 10 (9,52%) no subgrupo D (vítimas de lesão
encefálica por arma de fogo); de 8 (7,62%) no subgrupo E
(vítimas de espancamento); de 28 (26,67%) no subgrupo
F (vítimas de queda); e de 02 (1,91%) no subgrupo G (outros fatores causais). Esses resultados estão apresentados
na tabela 2.
Tabela 2 - Distribuição dos Pacientes Portadores de Traumatismo
Cranioencefálico por Fator Causal (Grupo FC) e Mortalidade
Subgrupos
A (automóvel)
B (motocicleta)
C (atropelamento)
D (projétil arma
fogo)
E (espancamento)
F (quedas)
G (outros)
Nº de
Pacientes
9
22
26
8,57
20,95
24,76
Nº de
Óbitos
2
8
13
22,22
36,36
50,00
10
9,52
5
50,00
8
28
2
7,62
26,67
1,91
2
11
1
25,00
39,28
50,00
%
%
Não houve diferença estatística significante na mortalidade entre os subgrupos
Na internação, 81 pacientes (77,14%) apresentavam
pontuação na Escala de Coma de Glasgow (ECG) ≤ 8; 20
(19,05%) ECG entre 9 e 13 pontos; e 4 (3,81%) acima de 13.
O Grupo APACHE II (AP) apresentou os seguintes resultados: 6 pacientes (5,71%) no subgrupo 1 (0 a 7 pontos); 42
(40%) no subgrupo 2 (8 a 15 pontos); 44 (41,91%) no subgrupo
3 (16 a 23 pontos) e 13 (12,38%) no subgrupo 4 (24 pontos ou
superior). Esses resultados estão apresentados na tabela 3.
Tabela 3 - Distribuição dos Pacientes Portadores de Traumatismo
Cranioencefálico por Pontuação no APACHE II (Grupo AP)
Subgrupos
1 (0 a 7 pontos)
2 (8 a 15 pontos)
3 (16 a 23 pontos)
4 (24 pontos ou superior)
Total
Nº de Pacientes
6
42
44
13
105
%
5,71
40,00
41,91
12,38
100,00
APACHE – Acute Physiology and Chronic Health Evaluation
A mortalidade global foi de 40% (42 óbitos em 105 pacientes). A incidência de óbito no sexo masculino foi de 38,04%
(35 óbitos em 92 pacientes) e no sexo feminino de 53,85%
(7 óbitos em 13 pacientes). Não houve diferença estatística
significativa entre os dois grupos.
Relacionando a faixa etária com a mortalidade encontrou-se 30,43% de óbitos no subgrupo I, 36,36% de óbitos no
subgrupo II, 50% de óbitos no subgrupo III e 80% de óbitos
no subgrupo IV. Não foi observada diferença estatística significante na mortalidade entre os subgrupos (Tabela 4).
Tabela 4 - Distribuição da Mortalidade por Faixa Etária em
Pacientes Portadores de Traumatismo Cranioencefálico (Grupo FE)
Subgrupos
I (15 a 29 anos)
II (30 a 44 anos)
III (45 a 59 anos)
IV (60 e superior)
Nº de Pacientes
46
33
16
10
Nº de Óbitos
14
12
8
8
%
30,43
36,36
50,00
80,00
Não houve diferença estatística significante na mortalidade entre os subgrupos
165
RBTI / NEUROINTENSIVISMO - ARTIGO ORIGINAL
A mortalidade no grupo FC (fator causal) foi de: 22,22%
(2 óbitos em 9 pacientes) no subgrupo A; 36,36% (8 óbitos
em 22 pacientes) no subgrupo B; 50% (13 óbitos em 26 pacientes) no subgrupo C; 50% (5 óbitos em 10 pacientes) no
subgrupo D; 25% (2 óbitos em 8 pacientes) no subgrupo E;
39,28% (11 óbitos em 28 pacientes) no subgrupo F; 50% (1
óbito em 2 pacientes) no subgrupo G. Não houve diferença
estatística significante na mortalidade em os subgrupos analisados. Esses resultados estão apresentados na tabela 2.
O valor médio do APACHE II nos pacientes que obtiveram alta foi de 14,06 (DP 6,17) e nos que evoluíram para
o óbito de 19,98 (DP 6,48). Não houve diferença estatística
significante entre os valores obtidos.
Analisando a mortalidade no Grupo AP (APACHE II)
encontrou-se: 0% (0 óbitos em 6 pacientes) de mortalidade
no subgrupo 1 (0 a 7 pontos); 23,81% (10 óbitos em 42 pacientes) no subgrupo 2 (8 a15 pontos); 45,45% (20 óbitos em
44 pacientes) no subgrupo 3 (16-23 pontos); e 92,31% (12 óbitos em 13 pacientes) no subgrupo 4 (24 pontos ou superior).
Houve diferença estatística significante entre os subgrupos 1
e 4 (p=0,0368); e 2 e 4 (p=0,0093). Não foi encontrada diferença estatística significante entre o subgrupo 3 e os demais
subgrupos, nem entre os subgrupos 1 e 2 (Tabela 5).
Tabela 5 - Distribuição da Mortalidade por Pontuação
de APACHE II nos Pacientes Portadores de Traumatismo
Cranioencefálico (Grupo AP)
Subgrupos
1 (0 a 7 pontos)
2 (8 a 15 pontos)
3 (16 a 23 pontos)
4 (24 pontos ou superior)
Nº de
Pacientes
6
42
44
13
Nº de
Óbitos
0
10
20
12
%
0,00 (*)
23,81 (#)
45,45
92,31
APACHE – Acute Physiology And Chronic Health Evaluation
(*) p = 0,0368 quando comparado com o subgrupo 4 (teste Exato de Fisher)
(#) p = 0,0093 quando comparado com o subgrupo 4
O subgrupo 3 não apresentou diferença estatística significante com os demais
subgrupos
Os subgrupos 1 e 2 não apresentaram diferença estatística significante entre si
DISCUSSÃO
O neurointensivismo apresentou um crescimento marcante na última década. Vários fatores contribuíram para essa
tendência, entre eles destacam-se:
• Alta incidência de lesões neurológicas em pacientes jovens internados em UTI.
• Possibilidade de diagnósticos precisos e rápidos com os
novos exames de imagem.
• Melhor conhecimento da fisiopatologia das doenças
neurológicas em suas diferentes fases evolutivas.
• Possibilidade de controle adequado dos parâmetros
ventilatórios e cardiovasculares na UTI.
• Evolução das técnicas neurocirúrgicas.
• Novas técnicas de monitorização do hemometabolismo
encefálico.
As medidas empíricas de neuroproteção deram lugar ao
tratamento objetivo direcionado pela manutenção das condições hemodinâmicas e metabólicas adequadas7,8. Para atingir
essa meta o tratamento deve ser instituído de forma precoce
e agressiva9,10.
166
Atreladas a esse conceito foram publicadas e, posteriormente revisadas, diretrizes de tratamento para algumas condições, tais como: TCE5,6,11-13, AVCI, HSA.
A alta incidência projetada de lesões encefálicas agudas, a
falta de dados epidemiológicos precisos, diferenças locais e regionais no tratamento e evolução dos pacientes demonstram
a necessidade de divulgação e adoção do neurointensivismo
na América Latina. A existência de outros dois Consórcios
(Europeu5 e Americano6) incentivou pesquisadores latinoamericanos a conceber uma estrutura similar. Em outubro de
2003 foi formado o LABIC com representantes de Unidades
de Terapia Intensiva (UTI), de diversos países da América
Latina.
O LABIC tem os seguintes objetivos principais:
1. Capacitar os profissionais envolvidos no neurointensivismo.
2. Promover e conduzir investigações clínicas para melhorar os resultados.
3. Propiciar maior intercâmbio entre os centros (UTIs)
participantes.
4. Negociar e participar, junto aos patrocinadores, no desenho e condução do estudo, análise e publicação dos resultados obtidos.
5. Atuar como um órgão de assessoria nos aspectos teóricos e práticos relacionados com os diversos estudos.
6. Estabelecer consensos de tratamento e monitorização
em neurointensivismo.
O Consórcio estabeleceu as seguintes áreas de interesse
para atuação: TCE, traumatismo raquimedular (TRM), hemorragia subaracnóidea (HSA), estado de mal epiléptico,
acidente vascular isquêmico e hemorrágico (AVCI e AVCH).
O núcleo formador do Consórcio elaborou um questionário para analisar o perfil epidemiológico dos centros (UTIs)
participantes. As questões exploram e, conseqüentemente, incentivam a organização do centro através de várias medidas,
entre elas destacam-se:
• Disponibilizar meios para diagnóstico precoce.
• Armazenar as informações de forma confiável.
• Utilizar escalas para avaliação da condição do paciente
na internação e alta da UTI.
• Estabelecer diretrizes de tratamento.
Ainda que o objetivo do questionário não fosse sugerir
ou criar preceitos, a auto-avaliação ocorre naturalmente. O
centro passa a ter um modelo “ouro” de comparação. Se por
um lado a comparação pode expor as deficiências de cada
centro, por outro serve como referencial para o planejamento
das mudanças necessárias. Os resultados serão registrados e
formarão um banco de dados latino-americano sobre lesão
encefálica. Essa medida permitirá conhecer as características
de atendimento em cada região e possibilitará a implantação
de medidas de capacitação e treinamento.
A proposta central do LABIC é justamente incentivar a
produção científica e divulgar o neurointensivismo, visando
uma melhora nos resultados do tratamento. O Consórcio
poderá criar um programa de educação continuada para médicos, enfermeiros, fisioterapeutas e demais profissionais envolvidos no tratamento ao paciente neurológico crítico, assim
como credenciar Centros de Pesquisa Neurológica na América Latina para realização de estudos multicêntricos clínicos
para novas drogas, procedimentos e equipamentos. No nosso
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / NEUROINTENSIVISMO - ARTIGO ORIGINAL
meio estimulamos a realização de um estudo epidemiológico
em pacientes vítimas de TCE.
O estudo foi realizado em um hospital público, terciário,
referência para o atendimento de pacientes adultos politraumatizados. Essas características explicam a baixa incidência
em idosos e a ausência de vítimas com menos de 15 anos.
Apesar da falta de significância estatística em diversas
correlações, os resultados encontrados estão de acordo com
as tendências observadas em outros estudos nacionais e internacionais. O número pequeno da amostra pode ter sido responsável pela não confirmação das correlações investigadas.
O estudo de Langlois e col.3 revelaram a importância do
tema e o impacto no planejamento das ações de saúde. Cerca
de 1,5 milhões de TCE ocorrem anualmente nos EUA, desses
250.000 necessitam de internação e cerca de 80.000 pacientes
necessitam de ajuda para atividades diárias um ano após o
trauma. A lesão encefálica traumática é a maior causa de epilepsia14. Os gastos diretos e indiretos com TCE chegam a US
$56 bilhões/ano. A incidência global é maior entre adultos
jovens do sexo masculino. Nesse grupo a principal causa observada foram os acidentes com veículos automotivos (carros
e motocicletas).
Vários estudos demonstraram que as causas etiológicas
podem variar em níveis regionais e grupos etários específicos.
BALDO et al.15 revisaram a epidemiologia de 55.368 casos de
TCE, no nordeste da Itália, no período de 1996 a 2000. Em
60% dos casos foi identificada a causa: 48,5% acidentes com
automóveis (maior incidência em adultos jovens e nos finais
de semana), 8,8% acidentes de trabalho e 12,2% domésticos
(maior incidência em crianças e idosos). Aare e von Holst16
revisaram 27.122 casos de TCE por acidente com motocicleta, no período de 1987 a 1999, na Suécia. A incidência foi
maior em homens (8 vezes) e nos indivíduos com menos de
26 anos. Andersson e col.17 detectaram uma alta de incidência
(546 por 100.000) de TCE na região oeste da Suécia. A causa
principal foi queda do mesmo nível (31%). Hukkelhoven e
col.18 encontraram características regionais com impacto na
epidemiologia, tratamento e evolução de pacientes com TCE.
Diferenças significativas foram encontradas entre o continente europeu e americano e entre os países europeus que refletem variações sociais, culturais e aspectos organizacionais de
cada local.
Observou-se que a principal causa de TCE nos pacientes com mais de 60 anos foram as quedas da própria altura
e a taxa de mortalidade foi elevada nesse grupo. Hukkelhoven e col.19 alertaram para os fatores de risco para queda,
em idosos: artrite, fraqueza muscular, distúrbio da marcha,
equilíbrio ou visão e uso de 4 ou mais medicamentos por dia.
Masson e col.20 realizaram um estudo prospectivo, baseado
em população, da epidemiologia de 248 pacientes com TCE
grave e compararam os resultados com o perfil observado em
centros especializados. Concluíram que no estudo baseado
em população os pacientes eram mais idosos, vítimas de queda e com taxa de mortalidade maior (52%) do que os pacientes dos centros de trauma. Diversos estudos também encontraram relação entre evolução pior (aumento da morbidade
e mortalidade) e idade avançada. Hukkelhoven e col.19 realizaram uma extensa metanálise de 5600 pacientes com TCE e
determinaram que as proporções de mortalidade e resultado
insatisfatório aumentam com a idade: 21% e 39%, respectivaVolume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
mente, para menores de 35 anos e 52 e 74% para maiores de
55 anos. Harris e col.21 analisaram 13.908 casos de TCE, entre
1994 e 1995, divididos por décadas de idade. Concluíram que
o risco de mortalidade aumenta progressivamente a partir
dos 30 anos e o maior aumento ocorre após os 60 anos.
Encontramos elevado número de pacientes vítimas de
agressão física (17,14%), sendo 9,52% de ferimentos por PAF
e 7,62% de vítimas de espancamento. Gerhart e col.22 revisaram 2.771 casos de TCE causados por agressão entre 1996 e
1999. Concluíram que as vítimas de agressão são, predominantemente, homens jovens, membros de grupos minoritários
(gangues), solteiros e com antecedentes de alcoolismo. Um
ano após o trauma, ainda apresentavam cefaléia, confusão
mental, distúrbios de atenção e dificuldade para integração
na comunidade. Burnett e col.23 confirmaram os achados de
Gerhart e col.22. O ferimento por PAF pode ser considerado como a forma mais violenta de agressão física. Martins
e col.24, no Brasil, revisaram 319 casos de PAF na cabeça,
no período de 1994 a 2000. Os seguintes fatores foram considerados preditivos de alta mortalidade ou morbidade: baixa
pontuação na ECG na admissão, anisocoria, pupilas médias
e fixas, trajeto central do projétil (tipo transventricular ou
bihemisférico) e ferimentos bi ou multilobar detectados pela
TC. Eles concluíram que a cirurgia não deve ser recomendada
em pacientes com ferimento penetrante e com 3 a 5 pontos na
ECG, na ausência de hematoma causando efeito de massa.
Langlois e col.3 revisaram a epidemiologia dos sobreviventes de TCE, em 1997, nos EUA. A incidência foi maior em
adolescentes (15 –19 anos) e idosos (≥ 65 anos). As principais
causas do TCE foram acidente com veículos motorizados,
quedas e assaltos. Eles relataram que 46% dos ocupantes de
veículos, 53% dos motociclistas e 41% dos ciclistas não estavam usando equipamentos de proteção pessoal no momento
do trauma. As elevadas taxas de morbidade e mortalidade, e
a falta de uso de equipamentos de proteção individual verificadas nos estudos citados, levaram vários autores a propor a
adoção de medidas preventivas para os fatores causais mais
relevantes. Essas foram direcionadas, principalmente, para
os acidentes com veículos automotivos, agressões e quedas
(campanhas de educação no trânsito, prevenção do TCE)15,16.
Servadei e col.25 verificaram que a lei italiana que obriga o
uso de capacete reduziu a incidência de TCE e procedimentos neurocirúrgicos em motociclistas, com o desaparecimento
quase que completo dos hematomas extradurais. A lei e o policiamento foram efetivos na prevenção do TCE nesse grupo.
O questionário do LABIC levou os autores a realizarem
uma avaliação epidemiológica e organizacional do centro.
Os resultados encontrados descrevem a realidade da região
e servirão de base para a discussão de medidas preventivas,
em grupos específicos. Servadei e col.26 utilizaram um estudo
da epidemiologia local (Roma e região) para planejar o tratamento do TCE. Concluíram que o número de internações
de TCE leve pode ser reduzido com o uso adequado da tomografia de crânio em adultos. Santos e col.27 observaram
que o atendimento pré-hospitalar teve impacto relevante na
mortalidade global dos pacientes com TCE.
A taxa de mortalidade global foi elevada (40%), variou
diretamente com a idade, foi maior nas mulheres (predominantemente idosas), em vítimas de atropelamento (50%)
e ferimento por PAF (50%). Esses resultados estão de acor-
167
RBTI / NEUROINTENSIVISMO - ARTIGO ORIGINAL
do com o material discutido anteriormente. Houve evidente
presença de maior mortalidade nos pacientes com índice de
APACHE II superior igual ou superior a 24 pontos, quando
comparados com pontuações inferiores a 15 pontos.
Não avaliamos a incidência de seqüelas neurológicas que
poderiam expressar a morbidade associada aos diferentes
agentes causais e demais parâmetros epidemiológicos. E não
pesquisamos o atendimento pré-hospitalar que pode ter impacto relevante na mortalidade global.27
Merecerão atenção especial na adoção de medidas preventivas os pedestres (atropelamentos 20,95%), os motociclistas (acidentes com motocicletas 24,76%) e a segurança pública (agressão física 17,14%).
Os achados reforçam a necessidade de se ampliar esse estudo epidemiológico a fim de levantar subsídios para campanhas preventivas, no que se refere a associação de drogas
e álcool com acidentes de trânsito em geral e no que diz respeito às seqüelas funcionais que geram incapacidade para o
trabalho, associando menor massa produtiva com maior custo em benefícios.
As vantagens regionais para o estabelecimento de um centro associado ao LABIC são várias e podem ser divididas em:
• Científica – possuir um centro de pesquisa, treinamento
e formação especializada no tratamento de doenças neurológicas em fase aguda.
• Operacional - divulgar diretrizes de tratamento a outras
unidades para uniformização dos processos. Acompanhamento das incidências reais das diversas lesões neurológicas
(banco de dados), do impacto das medidas de tratamento e
desenvolvimento de campanhas profiláticas dirigidas.5,6,28
• Financeira - reduzir gastos na área da saúde, através de
um programa organizado, racional e focado na prevenção.
• Social - todos nós estamos sujeitos a lesões neurológicas
graves. Nessa situação tempo e tratamento racional são fundamentais para uma boa recuperação.
CONCLUSÃO
Os preceitos, indiretamente, divulgados e estimulados
pelo questionário do LABIC foram importantes para a reflexão sobre o tratamento dos pacientes com lesão encefálica
aguda e, especificamente nesse trabalho, vítimas de TCE.
A auto-avaliação baseada nos aspectos positivos e negativos
encontrados na análise retrospectiva desencadeou o interesse em
se promover ações para melhorar a organização do centro e os
resultados do tratamento de pacientes portadores de TCE.
Pode-se concluir que:
1. A idéia de se estabelecer centros especializados em neurointensivismo é fundamental para o tratamento de pacientes
com lesões encefálicas.
2. A adesão ao LABIC resultou em uma análise epidemiológica que permitiu o reconhecimento da real situação
local.
3. Os estudos epidemiológicos são fundamentais para
subsidiar campanhas de prevenção de TCE.
4. As informações obtidas pela análise do APACHE II
nos diversos subgrupos são relevantes e demonstram a importância da adoção de escalas de avaliação do paciente (específicas e gerais).
5. A adesão de mais centros ao grupo LABIC-ES deverá
168
ter repercussão benéfica no tratamento e prevenção das lesões encefálicas.
Essas conclusões incentivaram os autores a divulgar o
neurointensivismo, no Estado do Espírito Santo, através das
seguintes medidas:
1. Divulgar os objetivos do LABIC;
2. Incentivar a adesão de novos centros (UTIs) ao LABIC;
3. Incentivar a adoção de diretrizes e consensos de tratamento em neurointensivismo;
4. Sugerir medidas estaduais de prevenção ao TCE;
5. Estimular a pesquisa científica em neurointensivismo.
RESUMO
JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: O LABIC (Latin
American Brain Injury Consortium) pretende capacitar profissionais, incentivar a pesquisa científica e divulgar diretrizes
de tratamento em neurointensivismo. O núcleo formador do
Consórcio elaborou um questionário para analisar o perfil
epidemiológico dos centros (UTI) participantes. A adesão ao
LABIC, com o preenchimento do questionário proposto, resultou no interesse em se estudar o perfil epidemiológico de
pacientes vítimas de traumatismo cranioencefálico (TCE). O
objetivo de se traçar o perfil dos pacientes vítimas de TCE é o
de ter-se dados fidedignos para serem utilizados no estímulo
dos órgãos competentes a promover ações de prevenção e de
adequação das Unidades de Terapia Intensiva para o tratamento desses pacientes.
MÉTODO: Estudo retrospectivo de 105 pacientes, com
traumatismo cranioencefálico internados em uma UTI geral
estadual, no período de janeiro a outubro de 2003.
RESULTADOS: Dos pacientes estudados 92 (87,62%)
eram homens e 13 (12,38%) mulheres. A idade variou entre
15 e 82 anos. Vinte e oito pacientes sofreram queda (26,67%),
ocorreu incidência importante (9,52%) de ferimentos por
projétil de arma de fogo (PAF). O tempo médio de internação
foi de 10,85 dias. Na internação, 81 pacientes (77,19%) possuíam escala de Coma de Glasgow ≤ 8. A mortalidade global foi
de 40%, 35 óbitos no grupo masculino (38,04% do grupo) e
7 no feminino (53,85%). A mortalidade foi maior, porém sem
diferença estatística significante, nos pacientes com idade acima de 60 anos (80%), nos grupos vítimas de queda (39,28%),
atropelamento (50%) e PAF (50%). Os acidentes no trânsito
(resultado de acidentes envolvendo automóvel, motocicleta
ou atropelamento) foram responsáveis por 54,76% dos óbitos. Pacientes com valor de APACHE II (Acute Physiology
and Chronic Health Evaluation) acima de 23 pontos tiveram
taxa elevada de mortalidade, 92,31% (p = 0,0329). Os sobreviventes apresentaram valor médio de APACHE II de 14,06
pontos (DP 6,17).
CONCLUSÕES: A adesão ao LABIC desencadeou uma
análise epidemiológica que permitiu o reconhecimento da real
situação local e a discussão de possíveis medidas preventivas
a serem apresentadas aos órgãos competentes. A divulgação
do neurointensivismo e a adesão de mais centros ao grupo
LABIC-ES deverão ter repercussões benéficas no tratamento
e prevenção das lesões encefálicas.
Unitermos: hemometabolismo encefálico, traumatismo
cranioencefálico, isquemia encefálica, neurointensivismo,
epidemiologia, trauma, lesão encefálica.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / NEUROINTENSIVISMO - ARTIGO ORIGINAL
REFERÊNCIAS
01. Peluso CM, Prandini NM, Forte LV - Monitorização da Oximetria Cerebral
Transcutânea Durante Circulação Extracorpórea. Dissertação de Mestrado
em Neurocirurgia. Universidade Federal de São Paulo, 1998.
02. Teasdale GM, Braakman R, Cohadon F et al - The European Brain Injury
Consortium. Nemo solus satis sapit: nobody knows enough alone. Acta Neurochir (Wien), 1997;139:797-803.
03. Langlois JA, Kegler SR, Butler JA et al - Traumatic brain injury-related hospital discharges. Results from a 14-state surveillance system, 1997. MMWR
Surveill Summ, 2003;52:1-20.
04. Narayan RK, Michel ME, Ansell B et al - Clinical trials in head injury. J Neurotrauma, 2002;19:503-557.
05. Maas AI, Dearden M, Teasdale GM et al - EBIC-guidelines for management of
severe head injury in adults. European Brain Injury Consortium. Acta Neurochir (Wien), 1997;139:286-294.
06. Marmarou A - Conduct of head injury trials in the United States: the American
Brain Injury Consortium (ABIC). Acta Neurochir Suppl (Wien), 1996;66:118121.
07. Cruz J, Raps EC, Hoffstad OJ et al - Cerebral oxygenation monitoring. Crit
Care Med, 1993;21:1242-1246.
08. Godoy R, Peluso CM, Forte LV et al - A hipotermia no tratamento da hipertensão intracraniana. An Paul Med Cir, 2002;129:36-40.
09. Prandini MN, Peluso CM, Forte LV - Conceitos básicos de fisiopatologia para o
tratamento da isquemia encefálica. J Bras Neurocirug, 2002;13:5-11.
10. Reinert MM, Bullock R - Clinical trials in head injury. Neurol Res, 1999;21:330338.
11. de Andrade AF, Marino R, Ciquini O et al - Guidelines for neurosurgical trauma in Brazil. World J Surg, 2001;25:1186-1201.
12. Chesnut RM - The management of severe traumatic brain injury. Emerg Med
Clin North Am, 1997;15:581-604.
13. Davella D, Brambilla GL, Delfini R et al - Guidelines for the treatment of
adults with severe head trauma (part III). Criteria for surgical treatment. J
Neurosurg Sci, 2000;44:19-24.
14. Bruns J Jr, Hauser WA - The epidemiology of traumatic brain injury: a review.
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
Epilepsia, 2003;44:(Suppl10):2-10.
15. Baldo V, Marcolongo A, Floreani A et al - Epidemiological aspect of traumatic
brain injury in Northeast Italy. Eur J Epidemiol, 2003;18:1059-1063.
16. Aare M, von Holst H - Injuries from motorcycle and moped crashes in Sweden
from 1987 to 1999. Inj Control Saf Promot, 2003;10:131-138.
17. Andersson EH, Bjorklund R, Emanuelson I et al - Epidemiology of traumatic
brain injury: a population based study in western Sweden. Acta Neurol Scand,
2003;107:256-259.
18. Hukkelhoven CW, Steyerberg EW, Farace E et al - Regional differences in patient characteristics, case management, and outcomes in traumatic brain injury: experience from the tirilazad trials. J Neurosurg, 2002;97:549-557.
19. Hukkelhoven CW, Steyerberg EW, Rampen AJ et al - Patient age and outcome
following severe traumatic brain injury: an analysis of 5,600 patients. J Neurosurg, 2003;99:666-673.
20. Masson F, Thicoipe M, Mokni T et al - Epidemiology of traumatic comas: a
prospective population-based study. Brain Inj, 2003;17:279-293.
21. Harris C, DiRusso S, Sullivan T et al - Mortality risk after head injury increases
at 30 years. J Am Coll Surg, 2003;197:711-716.
22. Burnett DM, Kolakowsky-Hayner SA, Slater D et al - Ethnografic analysis of
traumatic brain injury patients in the national Model Systems database. Arch
Phys Med Rehabil, 2003;84:263-267.
23. Gerhart KA, Mellick DC, Weintraub AH - Violence-related traumatic brain
injury: a population-based study. J Trauma, 2003;55:1045-1053.
24. Martins RS, Siqueira MG, Santos MT et al - Prognostic factors and treatment
of penetrating gunshot wounds to the head. Surg Neurol, 2003;60:98-104.
25. Servadei F, Begliomini C, Gardini E et al - Effect of Italy’s motorcycle helmet
law on traumatic brain injuries. Inj Prev, 2003;9:257-260.
26. Servadei F, Antonelli V, Betti L et al - Regional brain injury epidemiology as the
basis for planning brain injury treatment. The Romagna (Italy) experience. J
Neurosurg Sci, 2002;46:111-119.
27. Santos ME, De Sousa L, Castro-Caldas A - Epidemiologia do trauma craniocerebral em Portugal. Acta Med Port, 2003;16:71-76.
28. Vukic M, Negovetic L, Kovac D et al - The effect of implementation of guidelines for the management of severe head injury on patient treatment and outcome. Acta Neurochir (Wien), 1999;141:1203-1208.
169
RBTI / CONSENSO BRASILEIRO DE SEPSE – PARTE II
Distúrbios de Coagulação
Coagulation Disorders
Flávia R. Machado1, Eliézer Silva2, Werther Brunow de Carvalho3.
SUMMARY
This document presents a concise review about sepsis-induced coagulation disturbances, as well as the clinical trials which have
used anti-thrombin, activated protein C and tissue factor pathway inhibitor as potential therapeutic agents for septic patients.
Key Words: coagulation, sepsis, organ dysfunction, anti-thrombin, activated protein C, tissue factor
A
coagulopatia é responsável, em grande parte, pela
disfunção de múltiplos órgãos observada em pacientes com sepse, no entanto, só recentemente a relação entre o processo inflamatório sistêmico, a coagulopatia
com microtrombose difusa e a hipóxia tecidual, acarretando
disfunção orgânica, tem sido claramente demonstrada.
MÉTODO
Utilizou-se a base de dados MedLine, envolvendo os anos
de 1990 até 2002. As principais palavras-chave utilizadas foram: sepse, coagulopatia, anti-trombina, fator tecidual, proteína C ativada, diagnóstico, terapêutica e clinical trials.
FISIOPATOLOGIA DOS DISTÚRBIOS
DA COAGULAÇÃO
Cada fenômeno trombótico desencadeado no organismo
é acompanhado pela geração de substâncias anticoagulantes
e fibrinolíticas. Lesão endotelial (incluindo endotoxina), estimula a produção do fator tecidual. O complexo é capaz de
gerar uma segunda molécula crucial na fisiologia da coagulação, a trombina. A trombina, por sua vez, atua na transformação do fibrinogênio em fibrina, a qual é um dos principais
componentes do coágulo. Além disso, liga-se à trombomodulina, que é expressa na superfície das células endoteliais, no
processo de ativação da proteína C. Três importantes vias controlam a cascata da coagulação: antitrombina (AT), proteína
C ativada/proteína S e inibidor da via do fator tecidual.
A antitrombina, produzida no fígado, é um dos mais potentes inibidores da cascata da coagulação. Ela exerce seu
papel como anticoagulante através da inibição da trombina
e dos fatores XIIa, XIa, IXa, Xa, plasmina e calicreína. Além
disso, pode bloquear o complexo VIIa-FT. Além de inibir a
trombina, liga-se a glicosaminoglicanos específicos (na ausência de heparina) na superfície das células endoteliais, induzindo a síntese de prostaciclina. Esta, por sua vez, inibe a
agregação plaquetária, a expressão de moléculas de adesão
e a ligação de neutrófilos às células endoteliais e atenua a liberação de IL-6, IL-8 e TNF a partir das células endoteliais
(atividade antiinflamatória).
O inibidor da via do fator tecidual bloqueia a ação do
complexo fator VIIa-FT ao se ligar com o fator Xa, impedindo o desencadeamento da cascata da coagulação em sua fase
inicial. A principal fonte do inibidor da via do fator tecidual
são as células endoteliais.
Outra molécula importante no controle da cascata de
coagulação é a proteína C. Esta molécula, quando ativada,
exerce seu papel como anticoagulante ao inativar os fatores
Va e VIIIa, bloqueando a geração de trombina. Como destacado, a própria trombina, ao se ligar a trombomodulina,
ativa a proteína C, funcionando como uma “alça” de controle
da própria geração de trombina. Além desta ação anticoagulante, a proteína C ativada é capaz de bloquear a ação do
PAI-1 (inibidor do ativador do plasminogênio-1)1 e do TAFI
(inibidor da fibrinólise dependente de trombina)2, diminuindo o efeito supressivo destes compostos sobre a fibrinólise.
Portanto, a proteína C ativada apresenta um papel pró-fibrinolítico. Por fim, a proteína C ativada é capaz de reduzir a resposta inflamatória por vários mecanismos. Além da inibição
direta da trombina, bloqueando a ação inflamatória dessa
molécula, este complexo transloca-se até o núcleo e apresenta
múltiplos efeitos: a) diminuindo a geração de trombina; b)
diminuindo a geração de citocinas inflamatórias (bloqueando
a ação intracelular do NF-kB)3,4; c) impedindo a ligação do
LPS ao seu receptor de membrana o CD145; d) diminuindo
a expressão do fator tecidual; e) reduzindo a expressão de
moléculas de adesão3; f) reduzido a transcrição de genes próapoptóticos e aumentado a de genes anti-apoptóticos3.
O plasminogênio é uma proteína inativa, circulante no
plasma, que se liga à fibrina à medida que o coágulo está
sendo formado. O plasminogênio é convertido a plasmina no
momento da formação deste complexo com a fibrina, iniciando a fibrinólise. Os compostos que controlam a fibrinólise são
1. Professora Adjunta e Chefe Clínica do Setor de Terapia Intensiva da Disciplina de Anestesiologia, Dor e Terapia Intensiva da Universidade
Federal de São Paulo
2. Doutor em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo; Supervisor do Centro de Terapia Intensiva do Hospital Israelita Albert Einstein;
Professor da Pós-Graduação da Universidade Federal de São Paulo
3. Professor Adjunto Livre-Docente do Departamento de Pediatria – UNIFESP – EPM e Chefe das Unidades de Terapia Intensiva dos Hospitais
São Paulo e Santa Catarina
Apresentado na Assembléia do Consenso Brasileiro de Sepse em fevereiro de 2003 - Aceito para publicação em 04 de outubro de 2004
Endereço para correspondência: R. Napoleão de Barros 715 4a andar - Secretaria da Disciplina de Anestesiologia, Dor e Terapia Intensiva - CEP
– 04024-900, São Paulo, SP
170
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
os já citados PAI, especialmente o PAI-1 e o TAFI.
Inúmeros mecanismos fisiopatológicos interligam coagulação e a resposta inflamatória. Vários estudos têm
demonstrado que a inflamação sistêmica é acompanhada
por ativação do sistema de coagulação 6,7. A IL-6 parece
ser a grande responsável pelo aumento na expressão de
FT, assim como o TNF. Citocinas inflamatórias inibem
a síntese de trombomodulina, que é essencial para a ativação da proteína C8, potencializando assim a ação prócoagulante destas citocinas.
Outro aspecto a ser destacado é a participação da ativação do sistema de coagulação na resposta inflamatória.
Boa parte deste papel é desempenhada pela trombina 9,
que pode estimular a produção de citocinas inflamatórias, promover a expressão de P-selectina pelas células
endoteliais – causando adesão de neutrófilos e monócitos
– e de fator ativador plaquetário (PAF).
Durante um episódio séptico a cascata da proteína C
pode estar comprometida em quase todos os seus passos.
Os níveis plasmáticos de proteína C estão reduzidos por
múltiplas razões. O consumo de proteína C está aumentado pela ativação da cascata, a síntese hepática está reduzida pelo desvio de função para produção de proteínas
de fase aguda e ocorre extravasamento para o interstício
devido à permeabilidade capilar aumentada.
Além disso, a presença de citocinas inflamatórias,
principalmente TNF-α e IL-1, faz com que haja redução
da expressão de trombomodulina e EPCR, comprometendo os mecanismos de ativação10,11.
A trombose da microcirculação decorrente desses
fenômenos caracteriza um estado de coagulação intravascular disseminada. Essa síndrome está presente na
maioria dos pacientes com sepse grave, manifestando-se
geralmente como disfunção orgânica e não como sangramento.
Embora os critérios de coagulação intravascular disseminada sejam controversos, recentemente foi elaborado
pela Scientific Subcommittee on Disseminated Intravascular Coagulation (DIC) of the International Society on
Thrombosis and Haemostasis (ISTH) a seguinte definição
consensual: “CIVD é uma síndrome adquirida caracterizada pela ativação intravascular da coagulação secundária a diferentes causas. Pode-se originar de lesões a microvasculatura bem como causar dano á mesma, o qual
pode ser suficientemente grave ao ponto de desencadear
disfunção de múltiplos órgãos”. Este mesmo subcomitê
criou um algoritmo para se diferenciar os quadros clássicos, multisintomático de CIVD (overt DIC) daqueles
menos claros, com poucas manifestações clínico-laboratoriais (non overt DIC), como pode ser visto nos algoritmos abaixo.
ALGORITMO PARA O DIAGNÓSTICO
DE CIVD CLÁSSICA (OVERT DIC)
1. Avaliação do risco: o paciente apresenta uma doença
de base que sabidamente está associada à CIVD clássica?
Se a resposta for positiva, prossiga neste algoritmo; caso
contrário, abandone-o;
2. Coagulograma (contagem de plaquetas, tempo de protrombina (TP), fibrinogênio, monômeros solúveis de fibrina
ou produtos da degradação de fibrina)
3. Escore global para os testes da coagulação
• contagem de plaquetas (> 100 = 0; < 100 = 1; < 50 = 2)
• indicadores relacionados com elevação da formação de
fibrina (por ex., produtos da degradação de fibrina
(sem elevação: 0; elevação moderada: 2; elevação acentuada: 3)
• tempo de protrombina prolongado
(< 3 seg.= 0; > 3 seg. mas < 6 seg.= 1; > 6 seg. = 2)
• nível de fibrinogênio
(> 1 g/l = 0; < 1 gram/l = 1)
4. Cálculo do escore
5. Se ≥ 5: compatível com CIVD clássica; repetir o escore
diariamente
Se < 5: sugestivo (não afirmativo) de CIVD não clássica;
repetir o escore em 1-2 dias.
SISTEMA DE ESCORE PARA CIVD
NÃO CLÁSSICA (NON OVERT DIC)
1. Avaliação de risco: o paciente possui alguma doença de
base sabidamente associada a CIVD?
sim = 2; não = 0
2. Critérios maiores
Quadro 1
3. Critérios específicos
Antitrombina
Proteína C
TATcomplexos
……
normal = -1
Θ
normal = -1
Θ
normal = -1
Θ
normal = -1
Θ
baixo = 1
Θ
baixo = 1
Θ
alto = 1
Θ
anormal = 1
Θ
4. Cálculo do escore
Este sistema de escore é útil não somente para realizar
o diagnóstico de CIVD clássica ou não-clássica, bem como,
Quadro 1
Plaquetas >
TP < 3 sec
Θ
Fibrina solúvel
ou PDF
100 x109/l = 0
Θ
> 3 sec
Θ
normal
Θ
<100 x 109/l =1
elevando = -1
estável = 0
Θ
+
Θ
Θ
caindo = -1
estável = 0
elevando = alargamento
+
Θ
Θ
Θ
elevada
caindo = -1
estável = 0
elevando = 1
Θ
+
Θ
Θ
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
caindo = 1
Θ
171
para monitorizar a gravidade e a evolução da coagulopatia
na sepse. Outra utilidade deste sistema é permitir maior homogeneização dos parâmetros que definem a presença ou
não da coagulopatia intravascular.
INTERVENÇÕES TERAPÊUTICAS
Uma forma de se verificar a relação entre sepse, coagulopatia e disfunção de órgãos é a constatação que há diminuição
de anticoagulantes endógenos e elevação de substâncias antifibrinolíticas, inclusive com implicações prognósticas. Fourrier
e col. demonstraram que em pacientes com choque séptico há
diminuição importante de antitrombina e proteína C naqueles
que evoluem para óbito em relação aos sobreviventes12.
Essa associação entre os componentes da cascata de coagulação e o prognóstico de pacientes com sepse que evoluem
para disfunção orgânica motivou estudos envolvendo antitrombina, proteína C ativada e inibidor da via fator tecidual.
UTILIZAÇÃO DE PROTEÍNA C
A meia vida da proteína C ativada no organismo é curta, o
que inviabiliza sua utilização a partir de plasma de doadores.
O desenvolvimento de uma molécula por meio de engenharia
genética, na forma já ativada, permitiu sua avaliação clínica.
A molécula de proteína C ativada recombinante humana, denominada drotrecogina alfa ativada, foi utilizada em estudo
clínico de fase III, recentemente concluído e publicado, onde
se avaliou sua infusão em pacientes com sepse grave e choque
séptico13. O mesmo foi interrompido precocemente uma vez
que, pela primeira vez, houve redução significativa da taxa de
mortalidade. Este é o primeiro estudo com impacto favorável
na terapêutica da sepse envolvendo os mecanismos fisiopatológicos ligados à resposta inflamatória/ microtrombose.
O principal efeito colateral observado foi a ocorrência de
sangramentos graves em 3,5% dos pacientes no grupo tratamento versus 2% no grupo placebo (p = 0,06). A ocorrência de sangramento parece estar relacionada com a presença
de coagulopatia grave, plaquetopenia e com a realização de
procedimentos durante a administração da medicação. O uso
concomitante de heparina não esteve relacionado ao aumento do risco de sangramento.
UTILIZAÇÃO DE ANTITROMBINA
A antitrombina (AT) é utilizada, na Europa, em pacientes com CIVD desde a década de 1980. Muitos estudos já
demonstraram benefícios com relação à reversão da disfunção orgânica e parâmetros laboratoriais da coagulação. Em
pacientes com choque séptico, Fourrier e col. 1993, demonstraram a redução significativa dos níveis plasmáticos de monômeros de fibrina após dois dias da administração de AT em
comparação com a utilização de placebo14. Também houve
redução da mortalidade, embora não significativa. Eles também mostraram melhora significativa das disfunções orgânicas, bem como redução dos níveis plasmáticos de IL-6 e de
moléculas de adesão no grupo da droga15.
Esses resultados favoráveis ensejaram um estudo clínico
de fase III, com o objetivo primário de avaliar a redução de
mortalidade em pacientes com sepse grave16. Um total de
172
2314 pacientes adultos com sepse grave foi incluído, divididos igualmente entre os grupos placebo e tratamento. Era
necessária a presença de seis critérios de inclusão, sendo três
deles obrigatórios: evidência de infecção, alteração na contagem de leucócitos e na temperatura. Os demais referiam-se
basicamente a critérios de resposta inflamatória sistêmica e
de disfunção orgânica . Os pacientes alocados para o grupo
da droga recebiam, durante 96 horas, um total de 30.000 U,
por via venosa, de antitrombina. A mortalidade global, no
28º dia, foi de 38,9% no grupo AT versus 38,7% no grupo
placebo (p = 0,94). Quando se estratificou a amostra pela gravidade, determinada pelo índice SAPS II, o subgrupo de pacientes considerados de alto risco (mortalidade prevista pelo
SAPS II entre 30% a 60%) mostrou tendência a redução de
mortalidade em 90 dias (p = 0,07).
INIBIDOR DA VIA DO FATOR TECIDUAL
O inibidor da via do fator tecidual recombinante foi
avaliado em estudo de fase II em 210 pacientes com sepse
grave, onde se mostrou uma redução de 20% na mortalidade
(não significativa), com melhora de disfunção orgânica (p =
0,053)17. O estudo fase III, recentemente publicado, avaliou a
eficácia da infusão venosa da droga em 1754 pacientes com
sepse grave. Não houve diferença significativa na mortalidade
entre os grupos placebo e tratamento18.
ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE OS ESTUDOS
Muitas razões possíveis foram apontadas na tentativa de
justificar porque a infusão de proteína C ativada diminuiu a
mortalidade de pacientes com sepse grave e a antitrombina e,
mais recentemente, o TFPI não. Diferenças nos mecanismos
de ação das moléculas ou no desenho do estudo poderiam ser
responsáveis por esse resultado.
Com relação ao mecanismo de ação, sabe-se que todas
têm atividade anticoagulante, embora por vias diferentes. A
ação anticoagulante da APC ocorre prioritariamente na microcirculação, como pode ser observado em pacientes com
deficiência congênita que desenvolvem púrpura fulminans
(doença microangiopática). Entretanto, os portadores de deficiência de AT apresentam doença macroangiopática, isto é,
trombose venosa ou arterial de grandes vasos, sugerindo que
seria esse o principal local de atuação da molécula. A ação do
TFPI se dá num momento inicial da cascata da coagulação.
A presença de múltiplos sistemas de retroalimentação positiva poderia manter essa cascata ativada, apesar da administração de TFPI.
Parece relevante a diferença no tocante a ação antiinflamatória, pelo menos com base nos conhecimentos atuais. Entre outras ações, a APC modula a resposta inflamatória pela
inibição da produção de NFκB e da apoptose. Essa forma de
atuação não foi claramente demonstrada em relação à AT ou
ao TFPI. Dado importante seria também a atividade pró-fibrinolítica desempenhada pela APC, não compartilhada pela
AT ou pelo TFPI.
Outra possível explicação origina-se da interação existente entre a heparina e a antitrombina. O papel aditivo da heparina e AT sobre o risco de sangramento e o efeito da heparina
inibindo a ligação da AT com seu receptor de membrana,
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
bloqueando sua ação antiinflamatória, podem ter sido capitais na falta de eficácia da AT. Essa interação não ocorreu no
estudo da proteína C.
RECOMENDAÇÕES
A avaliação laboratorial e o diagnóstico de CIVD não são
necessárias para a indicação de terapia com proteína C ativada, mas podem ser necessários para a utilização de antitrombina em pacientes com sepse grave.
Nível de evidência: II
Grau de recomendação: C
No estudo PROWESS, para reposição de proteína C ativada, 99% dos pacientes tinham evidência de coagulopatia,
embora os critérios descritos não tenham sido utilizados.
Essa população havia sido selecionada por critérios clínicos,
o que sugere que o diagnóstico laboratorial não seja necessário para a indicação da reposição. Além disso, nesse estudo,
mesmo os pacientes com níveis normais de proteína C tiveram benefício com a administração da medicação.
Entretanto, alguns dos estudos de fase II de reposição de
AT, guiaram a dose a ser utilizada pelos níveis plasmáticos de
atividade da mesma, objetivando alcançar um nível de atividade pré-definido.
Assim, para a utilização de drotrecogina alfa ativada fica
claro que não existe a necessidade do diagnóstico laboratorial
de CIVD, nem da dosagem do nível de proteína C, o mesmo
não pode ser dito com relação a antitrombina. As recomendações sobre a utilização ou não dessas drogas estão a seguir.
A Utilização de Antitrombina não está Indicada em Pacientes com Sepse Grave.
Nível de evidência: I
Grau de recomendação: B
O estudo Kybersept não demonstrou redução significativa da mortalidade com a reposição com AT, além de mostrar
aumento do risco de sangramento. Com base nesse estudo, o
uso de AT nesses pacientes não pode ser recomendado.
Em pacientes que não utilizam heparina, a utilização de antitrombina no tratamento da sepse grave é uma questão ainda
não resolvida.
Nível de evidência: III
Grau de recomendação: D
No estudo Kybersept, o subgrupo de pacientes com sepse
grave que não utilizaram heparina teve sua mortalidade significativamente reduzida. Entretanto, como trata-se de análise
de subgrupo, embora definido previamente, os dados quanto
ao balanceamento entre o grupo placebo e droga não foram
fornecidos. Assim, até que novos estudos sejam feitos e comprovem a eficácia da medicação nessa população específica, a
questão permanece não resolvida.
A utilização de inibidor da via do fator tecidual em pacientes com sepse grave não está indicada.
Nível de evidência: I
Grau de recomendação: B
O estudo de fase III mostrou que não houve redução de
mortalidade.
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
A utilização de concentrado de proteína C em pacientes
com sepse grave não está indicada.
Nível de evidência: IV
Grau de recomendação: E
Não existem estudos duplos cegos, randomizados, placebo-controlados que mostrem que a utilização de concentrado
de proteína C reduza a mortalidade de pacientes com sepse
grave. Os casos já publicados mostraram efeitos benéficos,
como redução da necessidade de amputação e de disfunção
orgânica, em comparação com valores históricos. Assim, não
existem dados para indicar ou contra-indicar o seu uso.
A utilização de drotrecogina alfa ativada está indicada em
pacientes com sepse grave com alto risco de morte.
Nível de evidência: I
Grau de recomendação: B
O estudo PROWESS demonstrou redução significativa
da mortalidade em pacientes que apresentavam, pelo menos, uma disfunção orgânica com instalação em menos de
48 horas. Assim a medicação está indicada nessa categoria
de pacientes, na dose de 24 µg/kg/hora em infusão contínua
durante 96 horas.
O paciente “ideal” para ser tratado com drotrecogina alfa
ativada deve preencher esses requisitos mínimos:
1. diagnóstico acurado de um quadro infeccioso de base;
2. no mínimo 3 sinais de resposta inflamatória sistêmica
secundários à infecção;
3. presença de duas ou mais disfunções orgânicas secundária à infecção.
A dosagem dos níveis plasmáticos de proteína C não é necessária para indicar a administração de drotrecogina alfa ativada.
Nível de evidência: I
Grau de recomendação: B
No estudo PROWESS, tanto os pacientes com níveis plasmáticos reduzidos quanto aqueles com níveis normais se beneficiaram da infusão da medicação.
A utilização do índice APACHE II como critério para indicar a administração de drotrecogina alfa ativada em pacientes
com sepse grave ainda é uma questão não resolvida.
Nível de evidência: III
Grau de recomendação: D
No estudo PROWESS, no subgrupo de pacientes com
APACHE II menor que 25, a mortalidade do grupo placebo
foi menor que no grupo da droga, embora sem significância
estatística. Isso sugere que pacientes menos graves podem
não se beneficiar do uso da medicação, ao mesmo tempo em
que estão expostos a um risco aumentado de sangramento.
Como o estudo foi interrompido precocemente, o número de
indivíduos analisados nesse subgrupo foi pequeno o que dificulta conclusões definitivas a respeito. Além disso, embora
esse raciocínio seja válido do ponto de vista de análise de grupo, não existem dados que sugiram que o APACHE II possa
ser usado individualmente para previsão de risco de óbito.
Também não se trata de um índice adequado para mensuração de disfunção orgânica.
Está atualmente em curso um estudo duplo-cego, randomizado, placebo-controlado para avaliação do impacto na
173
mortalidade do uso de drotrecogina alfa ativada em pacientes
com sepse grave e APACHE II menor que 25. Os resultados
desse estudo vão contribuir para elucidar a primeira dessas
questões. Entretanto, o problema da utilização de forma individual desse índice não poderá ser respondido.
A drotrecogina alfa ativada está contra-indicada em pacientes com risco aumentado de sangramento.
Nível de evidência: I
Grau de recomendação: B
Alguns dos critérios de exclusão do estudo PROWESS visavam a segurança dos pacientes. Como já observado, houve
um aumento do risco de sangramento associado ao uso da
medicação, incluindo casos fatais de hemorragia no sistema
nervoso central, principalmente em pacientes com plaquetopenia grave (menor que 50.000 células/mm3). Esse aumento de
risco se confirmou em estudos posteriores, com 2,5% e 5,3%
de sangramentos considerados graves, respectivamente durante a infusão e nos 28 dias após o uso, incluindo SNC (0,5% e
1,1%, respectivamente) (dados ainda não publicados). O risco
de sangramento parece estar associado à realização de procedimentos durante a infusão da droga. Dessa forma, é de fundamental importância observar atentamente as regras no tocante
a procedimentos nesses pacientes, com interrupção da infusão
duas horas antes e reinicio em tempo variável de acordo com o
tipo de procedimento (desde imediato para pequenas intervenções até 12 horas após cirurgias de grande porte).
Com base nisso, fatores que aumentem o risco de sangramento devem ser evitados, havendo algumas contra-indicações absolutas para o uso da medicação, citadas a seguir.
 Presença de sangramento ativo
 Cirurgia de grande porte há menos de 12 horas ou
trauma recente
 Acidente vascular encefálico hemorrágico nos últimos três meses
 Cirurgia intracraniana ou intraespinhal nos últimos
dois meses, TCE grave, massas intracranianas ou presença de
cateter peridural.
 Contagem de plaquetas abaixo de 30.000 células/mm3
A utilização de parâmetros laboratoriais (dosagem de plaquetas e INR) para nortear a interrupção precoce da infusão de
drotrecogina alfa ativada é ainda uma questão não resolvida.
Nível de evidência: II
Grau de recomendação: C
No estudo PROWESS, recomendava-se a interrupção da
infusão caso a contagem de plaquetas diminuíssem a níveis
inferiores a 30.000 células/mm3, o tempo de tromboplastina
parcial maior que 120 segundos e o tempo de protrombina
aumentado com INR acima de 3.0. Não houve associação
clara entre as alterações do coagulograma e o risco de sangramento, mas a presença de plaquetopenia grave parece predispor a sangramento em sistema nervoso central. Também o
tempo de protrombina muito alargado pode estar relacionado ao aumento da incidência de sangramento. Com relação
ao TTPA, sua mensuração fica alterada na presença de drotrecogina, o que torna o exame inadequado.
Com base nesses resultados, sugere-se que sejam feitos
diariamente os dois primeiros exames, interrompendo-se a infusão de drotrecogina caso a contagem de plaquetas diminua
174
abaixo do limite já citado. A transfusão de plaquetas para
manter os níveis acima desse limite não parece ser segura,
visto não ter diminuído as probabilidades de sangramento no
sistema nervoso central. Isso provavelmente se deve ao fato
da plaquetopenia ser, na realidade, um indicador da gravidade
do distúrbio de coagulação. Além disso, a meia vida das plaquetas transfundidas está muito diminuída nesses pacientes.
RESUMO
Este documento apresenta uma síntese dos mecanismos
fisiopatológicos envolvidos na coagulopatia da sepse, bem
como os ensaios clínicos envolvendo substâncias anti-coagulantes, incluindo antitrombina, proteína C ativada e inibidor
da via do fator tecidual.
Unitermos: coagulação, sepse, disfunção de órgãos, antitrombina, proteína C ativada, fator tissular.
REFERÊNCIAS
01. Krishnamurti C, Young GD, Barr CF et al – Enhancement of tissue plasminogen activator-induced fibrinolysis by activated protein C in endotoxin-treated
rabbits. J Lab Clin Med, 1991;118:523-530.
02. Bajzar L, Nesheim ME, Tracy PB – The profibrinolytic effect of activated protein C in clots formed from plasma is TAFI-dependent. Blood, 1996;88:20932100
03. Joyce DE, Gelbert L, Ciaccia A et al – Gene expression profile of antithrombotic protein C defines new mechanisms modulating inflammation and apoptosis.
J Biol Chem, 2001;276:11199-11203.
04. White B, Schmidt M, Murphy C et al – Activated protein C inhibits lipopolysaccharide-induced nuclear translocation of nuclear factor KappaB (NF-KappaB) and tumour necrosis factor alpha (TNF-alpha) production n the THP-1
monocytic cell line. Br J Haematol, 2000;110:130-134.
05. Grinnell BW, Joyce D – Recombinant human activated protein C: a system
modulator of vascular function for treatment of severe sepsis. Crit Care Med,
2001;29:(Suppl7):S53-S60.
06. Vervloet MG, Thijs LG, Hack CE – Derangement’s of coagulation and fibrinolysis in critically ill patients with sepsis and septic shock. Semin Thromb
Hemost, 1998;24:33-44.
07. Lorente JA, Garcia-Frade L, Landin L et al – Time course of hemostatic abnormalities in sepsis and its relation to outcome. Chest, 1993;103:1536-1542.
08. Levi M, van der Poll T, ten Cate H et al – The cytokine-mediated imbalance between coagulant and anticoagulant mechanisms in sepsis and endotoxaemia.
Eur J Clin Invest, 1997;27:3-9.
09. Esmon C – The normal role of Activated Protein C in maintaining homeostasis
and its relevance to critical illness. Crit Care, 2001;5:S7-S12.
10. Fukudome K, Esmon CT – Identification, cloning and regulation of a novel endothelial cell protein C/activated protein C receptor. J Biol Chem,
1994;269:26486-26491.
11. Conway EM, Rosenberg RD – Tumor necrosis factor suppresses transcription of
the thrombomodulin gene in endothelial cells. Mol Cell Biol, 1988;8:5588-5592.
12. Fourrier F, Chopin C, Goudemand J et al – Septic shock, multiple organ failure,
and disseminated intravascular coagulation. Compared patterns of antithrombin III, protein C, and protein S deficiencies. Chest, 1992;101:816-823.
13. Bernard GR, Vincent JL, Laterre PF et al – Recombinant human protein C
Worldwide Evaluation in Severe Sepsis (PROWESS) study group. Efficacy and
safety of recombinant human activated protein C for severe sepsis. N Engl J
Med, 2001;344:699-709.
14. Fourrier F, Chopin C, Huart JJ et al – Double-blind, placebo-controlled trial of
antithrombin III concentrates in septic shock with disseminated intravascular
coagulation. Chest, 1993;104:882-888.
15. Inthorn D, Hoffmann JN, Hartl WH et al – Effect of antithrombin III supplementation on inflammatory response in patients with severe sepsis. Shock,
1998;10:90-96.
16. Warren BL, Eid A, Singer P et al – KyberSept Trial Study Group. Caring for the
critically ill patient. High-dose antithrombin III in severe sepsis: a randomized
controlled trial. JAMA, 2001;286:1869-1878.
17. Abraham E, Reinhart K, Svoboda P et al – Assessment of the safety of recombinant tissue factor pathway inhibitor in patients with severe sepsis: a multicenter, randomized, placebo-controlled, single-blind, dose escalation study.
Crit Care Med, 2001;29:2081-2089.
18. Abraham E, Reinhart K, Opal S et al - OPTIMIST Trial Study Group. Efficacy
and safety of tifacogin (recombinant tissue factor pathway inhibitor) in severe
sepsis: a randomized controlled trial. JAMA, 2003;290:238-247.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
Terapia Nutricional na Sepse
Nutritional Therapy Sepse
Paulo César Ribeiro1
SUMMARY
In the last years, there has been a great interest on nutritional support in sepsis due to different reasons including the impossibility of
make use of natural feeding ways, requirements of essential elements for survival during septic injury and the possibility of employ
nutritional components by pharmacological doses and on especial combinations for metabolic and immunological control, resulting in improved outcome of these patients. This document synthesizes the best evidence available in the literature.
Key Words: nutrition, therapy, sepsis
D
ados os avanços tecnológicos e científicos logrados
nas últimas décadas, os pacientes graves internados em UTI sobrevivem por um tempo muito mais
longo. É relativamente comum, atualmente, nos depararmos
com enfermos que permanecem na UTI por meses, freqüentemente impossibilitados de se alimentar pelas vias naturais.
A Terapia Nutricional, seja ela enteral ou parenteral, no mínimo, impede a morte por inanição, ou seja, provê nutrientes
essenciais para a sobrevivência.
Além disso, abre-se um campo magnífico e apaixonante
onde se vislumbra a possibilidade de utilizar os nutrientes em
doses farmacológicas e em combinações especiais não mais
com o fim de nutrir o paciente, mas, controlá-lo do ponto de
vista metabólico e modificar sua evolução, que é o que chamamos de farmaconutrição.
Tudo isso torna a Terapia Nutricional ferramenta indispensável no cuidado do paciente séptico grave em UTI, e não
é possível conceber seu tratamento sem que se saiba manuseá-la com destreza.
AVALIAÇÃO DA COMPOSIÇÃO CORPÓREA
A mensuração da composição corpórea pode auxiliar na
avaliação nutricional inicial e na eficácia do suporte nutricional
ao longo do tempo. Métodos mais práticos, factíveis à beira do
leito, mostram-se muito pouco precisos em função das alterações
de distribuição hídrica apresentadas pelo paciente grave. Métodos antropométricos como peso, costuma apresentar variações
consideráveis sendo útil apenas quando comparado ao peso prémórbido, ou quando determinações seriadas podem ser feitas de
maneira adequada. A expressão mais comumente usada para
cálculo do peso relacionado à altura é o Índice de Massa Corpórea (IMC) = Peso (kg) /Altura2 (m) que correlaciona quantidade
de tecido adiposo melhor que o peso isoladamente, porém, freqüentemente classifica como obesos indivíduos com excesso de
água, que é o caso dos pacientes em questão.
RECOMENDAÇÃO
A Avaliação Subjetiva Global, proposta por Detsky permite, de maneira simples, ágil e direta avaliação suficientemente sensível e específica nessa população.
AVALIAÇÃO DO GASTO ENERGÉTICO
Consensualmente a calorimetria indireta é o método
de referência para cálculo do gasto energético, medindo o
consumo de oxigênio e produção de gás carbônico durante
troca de gases respiratórios. Através da equação de Weir e
da medida do O2 consumido e CO2 produzido calcula-se o
gasto energético como segue: GEB = {[3,796 x VO2] + [1,214
x VCO2]} x 1440. O consumo de oxigênio também pode ser
calculado através de medidas feitas pelo cateter de SwanGanz, através da equação de Fick que subestima o gasto
energético quando comparado com os métodos de referência. A fórmula mais antiga para calcular o gasto energético
basal é a de Harris-Benedict na qual, ao gasto energético
basal somam-se fatores de ajuste à gravidade da doença,
grau de atividade, etc.
No intuito de evitar a hiperalimentação, há proposta
de utilizar a fórmula de Harris-Benedict no paciente grave
sem considerar os fatores de gravidade. Para regimes de
manutenção do estado nutricional recomenda-se administrar o gasto energético medido ou calculado (GE) (kcal/
dia) x 1 a 1,1; para regimes de repleção recomenda-se o
GE x 1,3 a 1,5
Recomendação: Vários estudos recentes mostram claramente que o gasto energético diário do paciente grave dificilmente ultrapassa 20 a 30 kcal/kg (peso “seco”). Portanto,
é perfeitamente justificável utilizar esse valor como referência para maioria dos pacientes em Terapia Intensiva.
ALTERAÇÕES METABÓLICAS
Pode-se resumir as alterações metabólicas quanto aos aspectos nutricionais:
• Obtenção de energia através da oxidação compulsória
de carboidratos, lípides e proteínas; e, ao mesmo tempo, uma
limitação metabólica em utilizá-los.
• Importante mobilização protéica do compartimento periférico para o central, com perda real de nitrogênio que só se
atenua quando é possível controlar a causa da resposta hipermetabólica, quando prolongada, esgota as reservas protéicas
de diversos órgãos e co-fator relevante para desenvolvimento
da Insuficiência Orgânica Múltipla.
1. Responsável pelo Serviço de Terapia Nutricional do Hospital Sírio Libanês; Diretor da Socidade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral
Apresentado na Assembléia do Consenso Brasileiro de Sepse em fevereiro de 2003 - Aceito para publicação em 18 de outubro de 2004
Endereço para correspondência: Rua Barata Ribeiro 237 cj 22 - Bela Vista - 01308-000 São Paulo, SP
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
175
ADMINISTRAÇÃO DE NUTRIENTES
A necessidade energética nos pacientes típicos das UTI, situa-se geralmente entre 20 e 30 kcal/kg/dia. A glicose, permanece primeira fonte calórica nos pacientes hipermetabólicos;
a taxa máxima de oxidação de glicose é de 5 mg/kg/min, ou
seja, 7,2 g/kg/dia, e, no grupo em questão, parte desta carga
máxima tolerável de glicose é fornecida pela gliconeogênese.
Portanto, administração de glicose em quantidade superior a
5 g/kg/dia, freqüentemente leva ä hiperglicemia, hiperosmolaridade, esteatose hepática e aumento na produção de CO2 e
trabalho respiratório.
Sugere-se, ao suprir as necessidades energéticas do paciente, que se utilize sempre fonte calórica mista e que a glicose contribua com aproximadamente 60% das calorias não
protéicas e os lípides com o restante.
Os lípides devem ser administrados diariamente, como
necessidade energética, uma vez que a oxidação de glicose
está limitada. Isto ainda previne a falta de ácidos graxos essenciais. A dose recomendada, é de no máximo 1,5 g/kg/dia,
e, se usada a via venosa que a administração seja lenta por
20 a 24 horas; não se aconselha doses superiores a 109 g em
24 horas. Não está determinada a relação ideal entre TCM e
TCL a ser administrada, mas o que se preconiza atualmente
é uma mistura de 50% de TCM e 50% de TCL.
As necessidades protéicas do paciente hipercatabólico são
grandes e o balanço nitrogenado é o parâmetro nutricional
isolado mais consistentemente associado à melhora do prognóstico. A quantidade recomendada de proteínas para estes
pacientes é de 1,5 a 2 g/kg/dia, estudos mostram que a faixa
de suprimento protéico que mais se relaciona com melhora
do balanço nitrogenado está em torno de 1,25 g/kg/dia.
NUTRIENTES ESPECÍFICOS
Ácidos Graxos Polinsaturados
Os ácidos graxos polinsaturados tipo ômega-6, levam a
maior produção de ácido araquidônico, ativando a cascata
que resulta na formação de mediadores inflamatórios que,
além de imunossupressores, são muito ativos quanto a fenômenos inflamatórios. Utilização de fórmulas enterais enriquecidas com ácidos graxos ômega 3 e antioxidantes têm mostrado benefícios nos pacientes com lesão pulmonar aguda,
reduzindo o processo inflamatório, o tempo sob ventilação
mecânica e de internação na UTI e a incidência de falência
de múltiplos órgãos.
A possibilidade de se usar ácidos graxos do tipo ômega
três por via venosa talvez traga benefícios semelhantes1
GLUTAMINA
A glutamina é o amino-ácido (aa) mais abundante do organismo. Estima-se que 50% da necessidade energética do intestino seja suprida pela glutamina. Há estudos que mostram
redução drástica dos níveis de glutamina no plasma e músculo de pacientes sépticos. Vários trabalhos em animais e humanos suportam o fato de que a suplementação de glutamina
melhora a função imune, o balanço nitrogenado, favorece a
manutenção da integridade e a função da parede intestinal.
Doses recomendadas são de 0,5 a 0,7 g/kg/dia. Mais recen-
176
temente, alguns estudos sugerem superioridade de ação da
glutamina por via venosa em pacientes agudamente graves
de UTI. Pacientes de UTI que utilizaram Nutrição Parenteral (NPP) enriquecida com glutamina tiveram redução da
mortalidade, custos e permanência hospitalar comparados
aos pacientes pareados que receberam NPP sem glutamina.
A via enteral é considerada adequada para administração de
glutamina no paciente grave de UTI. A glutamina é muito
instável em solução e sua administração por via parenteral
se faz de maneira mais segura usando-se dipeptídeos como
alanil-glutamina ou glicil-glutamina.
NUCLEOTÍDEOS
Os nucleotídeos da dieta são considerados fatores importantes para a manutenção da imunidade normal. Dietas isentas de nucleotídeos levam à diminuição da hipersensibilidade
tardia, supressão seletiva dos linfócitos T auxiliares, redução
das enzimas necessárias à maturação dos linfócitos T e redução da barreira intestinal.
ARGININA
A dose recomendada diária é de 2% da carga calórica total, aproximadamente 30 g para uma adulto de 70 kg. Doses
acima de 4% da carga calórica total levam à perda dos efeitos benéficos tanto imunológicos e de retenção nitrogenada,
aumentando a mortalidade na sepse. Há atualmente sérias
dúvidas quanto ao papel de dietas imunoestimulantes de primeira geração em pacientes sépticos. Metanálises recentes e
bem conduzidas mostram que, em pacientes de UTI, o uso
de tais fórmulas enterais não influenciou a taxa de infecção,
reduziu o tempo sob ventilação mecânica, e a permanência
hospitalar, talvez por uma tendência a aumento da mortalidade. Quanto às dietas imunomoduladoras de segunda
geração(não enriquecidas com arginina), faltam estudos bem
desenhados para provar seu efeito na população em questão.
No entanto, trabalhos europeus atuais provam em animais e
em humanos(ESPEN, 2004) benefícios com o uso de arginina
na sepse.
Recomendação: Não se preconiza hoje uso de fórmulas
imunoestimulantes no paciente séptico de UTI, mas nutrientes específicos isolados, associados a fórmulas enterais comuns. São necssários mais estudos para uma conclusão mais
sólida2-4.
ANTIOXIDANTES
Teoricamente, em situações em que há excessiva produção
de oxidantes, a administração de agentes que os neutralizem ou
repletem o organismo com defesas antioxidantes poderia conferir proteção contra a lesão tecidual e a disfunção orgânica.
Deve-se lembrar que:
• Doses de antioxidantes no paciente e nas diferentes doenças não estão estabelecidas;
• Equilíbrio entre antioxidantes e sua relação com minerais e oligoelementos não nos são plenamente familiares;
• Necessidades de oligoelementos na saúde e principalmente nos estados patológicos são pouco conhecidas e excesso de antioxidantes e oligoelementos pode ser muito prejudiRBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
cial, desviando o equilíbrio orgânico;
• Antioxidantes na dieta são equilibrados bioquimicamente, o que não acontece na suplementação farmacológica.
Embora se saiba que, tanto perdas quanto necessidades
de micronutrientes no paciente agudo grave estejam aumentadas e que sua administração possa ser benéfica as doses não
estão ainda estabelecidas e qualquer regime adotado é infelizmente empírico.
OLIGOELEMENTOS
É difícil a avaliação dos parâmetros bioquímicos de maneira absoluta; se preconiza reposição de Fe no doente agudo
grave apenas quando há sinais claros de deficiência de Fe, ou
seja, quando há Fe baixo associado a Ferritina também baixa
e aumento da CTLFe, ou sempre que houver perda aguda
importante (hemorragia).
Presume-se que a suplementação do Zinco seja importante pela ação na imunidade e cicatrização de feridas, alem disso Hormônio de Crescimento (GH) não age adequadamente
em situações de baixas concentrações de Zn. Há estudos que
mostram aumento da reação de fase aguda (RFA) associado
à suplementação de Zn, demonstrado por febre mais alta e
duradoura e aumento da liberação de Interleucina-1 beta. A
orientação empírica é que nos doentes catabólicos se reponha
7 a 10 mg/dia, a menos que haja grandes perdas sensíveis por
fístulas digestivas ou sonda gástrica (repor 12 a 17 mg por
litro de débito).
QUANDO INICIAR
Há poucos dados concretos disponíveis sobre quando
deva ser iniciado o suporte nutricional. A literatura não é
conclusiva a respeito dos benefícios da alimentação precoce, embora estudos recentes sugiram que alimentação enteral
precoce leve a melhor evolução dos pacientes quanto à morbidade infecciosa.
Algumas considerações:
Em pacientes instáveis clinicamente, a nutrição parenteral
pode representar mais um fator de desequilíbrio e seria mais
sensato retardar-se o suporte nutricional por 24 a 48 horas
até que se atinja uma situação metabólica mais estável.
Em pacientes hemodinamicamente instáveis, necessitando de quantidades crescentes de drogas vasopressoras, principalmente norepinefrina, o fluxo sangüíneo intestinal está
reduzido ao valor limítrofe, e, introdução de suporte nutricional enteral pode desencadear necrose intestinal já que não
há possibilidade de aumento do fluxo intestinal em resposta à
introdução do alimento. Pacientes de UTI recebendo drogas
vasoativas, sejam quais forem, “estáveis na sua condição hemodinâmica”, devem iniciar precocemente terapia nutricional preferentemente enteral.
VIAS DE ADMINISTRAÇÃO
Enteral
O uso da via enteral como a preferencial apoia-se em várias premissas:
De menor custo, fisiológica, segura, mantém a morfoloVolume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
gia e função do trato gastrintestinal, prevenindo translocação
bacteriana.
MANUTENÇÃO DA MORFOLOGIA E
FUNÇÃO DO TRATO GASTRINTESTINAL:
Estudos mostram evidências menos convincentes de que,
a curto prazo, o jejum ou a nutrição parenteral levem a alterações significativas na estrutura e função da parede intestinal.
Alguns nutrientes específicos são relevantes para manutenção
do trofismo e função da parede intestinal. São exemplos a
glutamina e ácidos graxos de cadeia ultracurta, como o ácido
butírico e valérico.
PREVENÇÃO DA TRANSLOCAÇÃO BACTERIANA:
A permeabilidade seletiva da parede intestinal está diretamente ligada à sua integridade. Nos doentes agudamente graves, alterações na permeabilidade da parede intestinal podem
levar a translocação bacteriana, explicando a persistência de
um quadro séptico na ausência de foco infeccioso definido.
MELHOR EVOLUÇÃO
Pacientes graves em nutrição enteral apresentam índices
de infecção muito menores do que os que recebem nutrição
parenteral. Que outro fator poderia estar influenciando a melhor evolução infecciosa nesses pacientes?
Praticamente 50% do Sistema Retículo Endotelial e
células imunológicas são oriundas do intestino; 80% das
imunoglobulinas são produzidas no intestino; 50% dos
linfócitos T “helper” circulantes com receptores D14 para
endotoxinas vem do intestino. Linfócitos B sensibilizados
por estímulo antigênico saem das placas de Peyer, circulam
pelo corpo aumentando a defesa da mucosa local e sistêmica através do aumento na produção de IgA na lâmina
própria que na luz intestinal se aglutina com microorganismos, facilitando sua eliminação. Há evidências cada vez
maiores que a manutenção da massa tecidual linfóide do
intestino preserve a imunidade local e sistêmica. A nutrição enteral relaciona-se a maior produção de colecistocinina (aumenta o Ca nos linfócitos, que é um co-fator para
multiplicação dos linfócitos), regula produção de mediadores inflamatórios nos monócitos e aumenta produção de
IgA intraluminar.
A falta de nutrientes na luz intestinal, como ocorre no
suporte nutricional exclusivamente parenteral ou na administração de dietas elementares que são absorvidas no jejuno
proximal, aumenta a expressão das adesinas, fazendo com
que a aderência bacteriana2-7.
A detoxificação hepática é um mecanismo importante
que consiste em duas fases. Tanto a Fase I como a II dependem de uma série de nutrientes como bioflavonóides,
alguns aminoácidos como cisteína, N-acetil cisteína, taurina, glutamina freqüentemente ausentes nas soluções mais
comuns para suporte nutricional parenteral e mesmo em algumas fórmulas de nutrição enteral. Nas situações de Sepse
ou SIRS, onde há formação de muitas substâncias tóxicas
para organismo a suplementação desses nutrientes parece
importante.
177
PNEUMONIA NOSOCOMIAL RELACIONADA
À NUTRIÇÃO ENTERAL:
O papel do pH gástrico na patogênese da pneumonia nosocomial é controverso. Em dois estudos recentemente publicados o sucralfato, que protege a parede gástrica sem elevar o pH,
para prevenção da hemorragia digestiva alta, levou a menores
índices de pneumonia do que o uso de antiácidos isolados ou
em combinação com antagonistas da histamina, no entanto
é discutível se uso isolado de antagonistas da histamina relaciona-se com maiores índices de pneumonia nosocomial. No
entanto, não só o pH intraluminar, mas também o volume gástrico deve ser considerado como fator de risco para aspiração e
conseqüente pneumonia e suporte nutricional enteral, quando
por via gástrica, atua elevando o volume gástrico, contribuindo para a ocorrência de pneumonias por aspiração8,9.
O impacto do suporte nutricional enteral na aspiração
leva em conta vários fatores:
• Posição do paciente,
• Via de administração - Alimentação jejunal deve ser a
escolha para pacientes com alto risco para aspiração. A via
gástrica pode e deve ser usada para aqueles que tenham alterações da deglutição de diversas causas, alterações de motilidade esofágica, falta de iniciativa para se alimentar, etc. A
gastrostomia percutânea ou convencional parece relacionarse com índices mais baixos de aspiração, pelo menos a médio
prazo e pode ser alternativa nos pacientes em que a permanência de sondas naso ou orogástricas seja problema.
• Modo de administração: administração intermitente
parece ser mais fisiológica. Há estudos que mostram não haver diferença na freqüência de aspiração segundo administração intermitente ou contínua. A administração contínua
no estômago mantém o pH luminar constantemente alto o
que favoreceria a pneumonia, a menos que se utilizasse uma
pausa noturna para acidificar o estômago ou se acidificasse o
alimento administrado.
PARENTERAL
A Nutrição Parenteral, principalmente no paciente grave, em muitas situações é não só muito útil como imperativa.
Este grupo, freqüentemente apresenta intolerância total ou
parcial à nutrição enteral, ou, por catástrofes abdominais,
não pode utilizar o trato digestivo, ou apresenta instabilidade
hemodinâmica importante que coloca em risco a viabilidade intestinal, ou necessita de suplementação parenteral para
atingir seus requerimentos nutricionais. Independentemente
de seu inestimável valor, algumas desvantagens podem ser
apontadas: reduz complicações não infecciosas, mas aumenta a morbidade infecciosa dos pacientes; pela não utilização
do trato alimentar; alguns estudos mostram índices de infecção 2,2 vezes superiores nos pacientes que recebem nutrição
178
parenteral quando comparados aos que recebem nutrição
enteral10. É mais comum hiperalimentação quando usa-se
nutrição parenteral e isto significa excesso de glicose e de lípides e suas conseqüências indesejáveis relativas à diminuição
das defesas antiinfecciosas. O suporte nutricional parenteral
exige na maioria das vezes um acesso venoso central favorecendo a ocorrência de infecção pela presença do cateter.
Nos pacientes sépticos com utilização do cateter central para
monitorização e administração de medicamentos, nutrição,
etc. a taxa de infecção por cateter costuma ser maior do que
quando utilizado isoladamente para NP (1% a 2%). Cateteres
de múltiplos lumens independentes, cada um usado para uma
finalidade, cursa com índices de infecção superiores aos dos
cateteres de luz única, da ordem de 13%, segundo alguns estudos, provavelmente por excesso de manipulação, principal
fator determinante de contaminação11.
RESUMO
Nos últimos anos cresceu o interesse pelo suporte nutricional ao paciente séptico por diversos motivos, tais como a
impossibilidade de utilizar as vias naturais de alimentação,
a necessidade de prover elementos essenciais à sobrevivência
durante o insulto séptico e a possibilidade de se utilizar nutrientes em doses farmacológicas e em combinações especiais
para o controle metabólico e até imunológico, podendo resultar em melhor evolução destes pacientes. Este documenta
sintetiza todas essas possibilidades utilizando as melhores
evidências disponíveis na literatura.
Unitermos: nutrição, terapia, sepse.
REFERÊNCIAS
01. Gadek JE, deMichele SJ, Karlstad MD et al - Effect of enteral feeding with
eicosapentaenoic acid, gamma linolenic acid, and antioxidants in patients with
acute respiratory distress syndrome. Crit Care Med, 1999;27:1409-1420.
02. Heyland DK, Keefe L, Drover JW - Total parenteral nutrition in the critically
ill patient: a meta-analysis. JAMA, 1998;280:2013-2019.
03. Heyland DK - Parenteral nutrition in the critically ill patient: more harm than
good? Proc Nutr Soc, 2000;59:457-466.
04. Heyland DK, Novak F, Drover JW et al - Should immunonutrition become
routine in critically ill patients? A systematic review of the evidences. JAMA,
2001;286:944-953.
05. Beale RJ, Bryg DJ, Bihari DJ - Immunonutrition in the critically ill: a systematic
review of clinical outcome. Crit Care Med, 1999;27:2799-2805.
06. Kudsk KA, Li J, Renegar KB - Loss of upper respiratory tract immunity with
parenteral feeding. Ann Surg, 1996;223:629-658.
07. Li J, Kudsk KA, Gocynsky B et al - Effects of parenteral and enteral nutrition
on gut-associated lymphoid tissue. J Trauma, 1995;39:44-52.
08. Cook DJ, Laine LA - Nosocomial pneumonia and the role of gastric pH: a
meta-analysis. Chest, 1990;100:7-13.
09. Tryba M - Sucralfate versus antiacids or H2-antagonists for stress ulcer prophylaxis: a meta-analysis on efficacy and pneumonia rate. Crit Care Med,
1991;19:942-949.
10. Brennan MF, Pisters PW, Posner M - A prospective randomized trial of total parenteral nutrition after major pancreatic resection for malignancy. Ann
Surg, 1994;220:436-444.
11. Clark-Christoff N, Watters VA, Sparks W - Use of triple-lumen subclavian catheters for administration of total parenteral nutrition. JPEN, 1992;16:403-407.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
Tratamento: Suporte Ventilatório
Treatment: Ventilatory Support
Coordenação: Carmen Sílvia Valente Barbas1
Marcelo Britto Passos Amato2, Carlos Roberto Ribeiro Carvalho3
SUMMARY
The ventilatory support of the septic patient aim to reduce the work of breathing and energetic demand as well as to avoid
the ventilator induced lung injury. The ventilation with low tidal volumes (6 mL/kg) and individual PEEP levels titration must
be done to keep the lungs opened and guarantee an homogeneous ventilation.
Key Words: mechanical ventilation, repiratory failure, sepsis, weaning
A
sepse caracteriza-se por resposta inflamatória sistêmica a presença de microorganismos e/ou de toxinas
e ou mediadores inflamatórios liberados por estes.
Os pacientes sépticos, mesmo os sem comprometimento pulmonar, apresentam taquipnéia e aumento da ventilação minuto como resposta do sistema respiratório à sepse1-5. Além
disso, os pulmões podem ser afetados como local primário
ou secundário da infecção causadora da sepse e ou ainda serem acometidos pela Lesão Pulmonar Aguda e ou Síndrome
do Desconforto Respiratório Agudo6-9. Com o objetivo de
otimização do suporte ventilatório destes pacientes pode-se
classificá-los em:
1. PACIENTE SÉPTICO ESTÁVEL
HEMODINAMICAMENTE (SEM USO
DE DROGAS VASOATIVAS)
a) sob ventilação espontânea sem comprometimento pulmonar
b) sob ventilação espontânea com comprometimento pulmonar
c) sob ventilação mecânica sem comprometimento pulmonar
d) sob ventilação mecânica com comprometimento pulmonar
2. PACIENTE SÉPTICO INSTÁVEL
HEMODINAMICAMENTE (COM USO
DE DROGAS VASOATIVAS)
a) sob ventilação mecânica sem comprometimento pulmonar
b) sob ventilação mecânica com comprometimento pulmonar
c) sob ventilação mecânica com comprometimento cardíaco e pulmonar
3. PACIENTE SÉPTICO EM DESMAME
DA VENTILAÇÃO MECÂNICA.
1.a) Paciente séptico estável hemodinamicamente (sem uso
de drogas vasoativas) sob ventilação espontânea sem comprometimento pulmonar:
Nestes pacientes observa-se o aumento da freqüência
respiratória (FR) e do volume minuto com conseqüente aumento do trabalho respiratório e gasto energético. Na tentativa de diminuir o trabalho respiratório pode-se acoplar a
estes pacientes um suporte ventilatório não-invasivo através
de máscaras faciais com ventiladores de alta sensibilidade,
tempo de resposta rápido e níveis de pressão inspiratória suficientes para reduzir o esforço muscular e poder proporcionar
o repouso da musculatura respiratória10.
Grau de evidência : E
1.b) Paciente séptico estável hemodinamicamente ( sem uso
de drogas vasoativas) sob ventilação espontânea com comprometimento pulmonar.
Este paciente normalmente apresenta taquipnéia, aumento do trabalho respiratório e graus variados de hipoxemia de
acordo com a extensão e intensidade do comprometimento
pulmonar. A administração de oxigênio é obrigatória através
de cateter de O2 e ou máscara de Venturi para manutenção da
SpO2 > 93%. O suporte ventilatório não- invasivo pode ser
instalado com níveis de EPAP para manter a SpO2 > 93%.
Com níveis de FIO2 < 40% e níveis de IPAP para manter o
volume corrente acima de 350 ml e a freqüência respiratória
< 28 mov/resp/min. O paciente que necessitar de FIO2 > 50%
com níveis ótimos de EPAP deve ser intubado e conectado à
ventilação mecânica invasiva. O uso de níveis de IPAP> 25
cmH2O para manutenção de volume corrente acima de 350
ml e ou FR< 28 também é indicativo de intubação orotraqueal5,9,10.
Grau de evidência: E
1. Professora Livre Docente da Disciplina de Pneumologia da FMUSP e Coordenadora científica da equipe e da pós-graduação em Pneumologia
do CTI Adultos do Hospital Israelita Albert Einstein.
2. Doutor em Pneumologia e chefe do laboratório experimental em ventilação mecânica da Disciplina de Pneumologia da USP.
3. Professor Associado da Disciplina de Pneumologia da FMUSP.
Apresentado na Assembléia do Consenso Brasileiro de Sepse em fevereiro de 2003 - Aceito para publicação em 15 de outubro de 2004
Endereço para correspondência: Prof. Dra. Carmen Sílvia Valente Barbas - Av. Albert Einstein 627 – 5º Andar - CTI-Adultos – Hospital Israelita
Albert Einstein - Morumbi - São Paulo, SP
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
179
1.c). Paciente séptico estável hemodinamicamente (sem
uso de drogas vasoativas) sob ventilação mecânica sem comprometimento pulmonar.
Este paciente normalmente necessita de intubação orotraqueal e ventilação mecânica pela diminuição do nível de
consciência e ou proteção de vias aéreas e ou anestesia para
dor nos casos de politrauma e ou para procedimentos cirúrgicos. Nestes pacientes os níveis de PEEP devem ser mantidos para garantir a FIO2 < 40% e relação PaO2/FIO2 > 300.
Níveis de volume corrente devem ser mantidos entre 6 e 8
ml/kg (considerar peso ideal) respeitando a pressão de platô
máxima de 35 mmHg ( para evitar ocorrência de lesão induzida pela ventilação mecânica), com freqüência respiratória
entre 15 e 20 mov/resp/min5,9.
Grau de evidência: E
1.d). Paciente séptico estável hemodinamicamente (sem
uso de drogas vasoativas) sob ventilação mecânica com comprometimento pulmonar.
Este tipo de paciente geralmente apresenta pneumonia
grave associada à sepse e ou LPA/SDRA associada a sepse.
Se possível realizar tomografia computadorizada de tórax
para melhor avaliação do comprometimento pulmonar e de
sua extensão, de preferência com vários níveis de PEEP para
um melhor entendimento da resposta pulmonar à aplicação
de pressão positiva. Os níveis de PEEP devem ser ajustados
para manutenção de uma troca gasosa adequada (PaO2/
FIO2 > 300) com uma ventilação pulmonar homogênea.
Os níveis de volume corrente devem ficar entre 6 e 8 ml/kg
(considerar peso ideal do paciente) respeitando a pressão de
platô máxima de 35 mmHg5,9,11,12.
Grau de evidência: E
2.a) Paciente séptico instável hemodinamicamente (com
uso de drogas vasoativas) sob ventilação mecânica sem comprometimento pulmonar.
Este paciente deve ser mantido sedado e monitorado.
Deve ser realizada reanimação volêmica precoce e o uso de
drogas vasoativas (noradrenalina e dobutamina) para manutenção dos níveis de SvO2 > 75% e os níveis de lactato
arterial e ou venoso central os mais próximos possíveis do
normal. Os níveis de PEEP devem ser mantidos para garantir relação PaO2/FIO2 as mais altas possíveis (de preferência
acima de 300). O volume corrente deve ser mantido entre 6 e
8 ml/kg (considerar peso ideal), respeitando a pressão platô
máxima de 35 cmH2O, com freqüência respiratória entre 15
e 20 mov/resp/min para se evitar o desenvolvimento de lesão
induzida pela ventilação mecânica como já demonstrado
em estudos experimentais5,9,11-13,16.
Grau de evidência: E
2.b) Paciente séptico instável hemodinamicamente (com
uso de drogas vasoativas) sob ventilação mecânica com comprometimento pulmonar.
Este paciente deve ser mantido sedado e monitorado.
Deve ser realizada reanimação volêmica precoce e o uso de
drogas vasoativas (noradrenalina) para manutenção dos níveis de SvO2 > 75% e os níveis de lactato arterial e ou venoso
central os mais próximos possível do normal . Ventilar com
volume corrente de 6 ml/kg ( considerar peso ideal e utilizar
180
modos ventilatórios com limitação de pressão de platô). A
freqüência respiratória deve ser mantida em 20 mov/resp/
min e os níveis de PEEP titulados 2 cmH2O acima do ponto
de inflexão inferior da curva pressão-volume do sistema respiratório, (geralmente entre 15 e 25 cmH2O), pelo método
dos volumes aleatórios Deve-se tentar manter, se possível,
a FIO2 < 50%14-18.
Grau de evidência: C
Trinta e cinco por cento dos pacientes sépticos desenvolvem Síndrome do desconforto respiratório agudo. Para
estes pacientes existem evidências que volumes correntes de
6 ml/kg ( peso ideal) diminuem a mortalidade se comparados a 12 ml/kg14,15.
Grau de evidência: A
Quando disponível, realizar tomografia computadorizada de tórax para observação do grau e distribuição do comprometimento pulmonar. As manobras de recrutamento alveolar com níveis de PEEP progressivos (até 45 cmH2O) com
níveis de pressão controlada fixos em 15 cmH2O podem ser
utilizadas. Nos pacientes com hipoxemia refratária as manobras de recrutamento alveolar deve-se utilizar a posição prona e ou decúbito ventral e se observar a resposta. Nos casos
de hipoxemia refratária (PaO2/FIO2 <100) apesar do máximo
suporte ventilatório já descrito pode-se utilizar a oxigenação
extracorpórea com oxigenador de membrana16-21.
Grau de evidência : E
2.c) Paciente séptico instável hemodinamicamente (com
uso de drogas vasoativas) sob ventilação mecânica com comprometimento pulmonar e cardíaco.
Este paciente deve ser mantido sedado e monitorado.
Ajustar a volemia e drogas vasoativas (noradrenalina e dobutamina) de maneira a manter a SvO2 > 75% e níveis de lactato arterial e ou venoso central os mais próximos possíveis
do normal. Se possível mensurar o índice de trabalho dos
ventrículos direito e esquerdo, assim como o índice trabalho
do ventrículo esquerdo/ pressão capilar pulmonar (tentar
manter este índice acima de 3)22-24. Ventilar o paciente com
volume corrente de 6 ml/kg, freqüência respiratória de 20 e
níveis de PEEP titulados pelo ponto de inflexão inferior da
curva pressão-volume do sistema respiratório (PEEP entre
15 e 25 cmH2O) com manutenção de FIO2 mais baixas possíveis para manutenção de PaO2 entre 80 e 100 mmHg. Se os
níveis de CO2 tiverem acima de 50 mmHg, com pH < 7,2 ou
houver intolerância cardiovascular aos níveis aumentados
de CO2 ( aumento importante das pressões de artéria pulmonar) pode-se associar o uso de insuflação intra-traqueal
de gases e ou ainda se os níveis de pressão de platô permitirem aumentar os níveis de volume corrente até 8 ml/kg14-21.
Grau de evidência: E
3. Paciente séptico em desmame da ventilação mecânica.
O desmame do paciente séptico da ventilação mecânica
deve ser iniciado assim que este esteja capacitado a iniciar um
modo assistido de ventilação com níveis mínimos de trabalho
respiratório, normalmente o modo pressão de suporte. O paciente deve estar estável hemodinamicamente (uso mínimo de
drogas vasoativas) e com a FIO2 < 40%. A sedação deve ser
descontinuada para permitir que o paciente inicie a ventilaRBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
ção espontânea com níveis de pressão de suporte que garantam um volume corrente acima de 350 ml e uma freqüência
respiratória abaixo de 28 mov/resp/min, mantendo o paciente
confortável e sem dor. Os níveis de pressão de suporte devem ser baixados progressivamente até níveis de 8-10 cmH2O
quando , então, deve se iniciar a diminuição dos níveis de
PEEP. Quando a PSV estiver em níveis de 5 a 7 cmH2O e
os níveis de PEEP de 5 a 6 com FIO2 < 40% e SpO2 > 95%
considerar o paciente apto para extubação. Neste momento
deve-se verificar a PImáx (> 25 cmH2O), capacidade de tosse,
nível de consciência e balanço hídrico e função do VE. Neste
momento deve-se fazer uma prova de ventilação espontânea
em Tubo T e ou PSV de 5 a 7 cmH2O e PEEP de 5 a 6 cmH2O
por 30 minutos a 2 horas. Se o paciente mantiver o volume
corrente maior que 350 ml, freqüência respiratória < 28 mov/
resp/min e SpO2 > 93%, sem disritmias com risco de vida, sem
hipertensão arterial grave e ou freqüência cardíaca maior que
120 bat/min: o paciente poderá ser extubado.
Grau de evidência: C
Nos pacientes em ventilação mecânica e sedados, há evidências de que o desmame do suporte ventilatório ocorrerá
mais rapidamente com a interrupção da sedação uma vez
ao dia para avaliação do nível de consciência do paciente e
a possibilidade de progressão do desmame27.
Nível de evidência: B
Nos pacientes com fraqueza muscular (comum na polineuromiopatia da sepse) verificar a dose de corticosteróide
e mantê-la a menor possível, ajustar o aporte nutricional e
iniciar a reabilitação da musculatura respiratória com treinamento progressivo com aparelhos de treinamento de musculatura inspiratória destinados a este fim. Estes pacientes
devem ser extubados com auxílio de ventilação mecânica
não-invasiva, que deve ser mantida pelo menos 24 horas
após a extubação destes pacientes28.
Nível de evidência: E
Na ausência de melhora da força muscular com reabilitação (PImáx >20 cmH2O), deve-se indicar traqueostomia
e ser iniciado o treinamento progressivo da musculatura
respiratória seguidos de períodos de descanso com pressão
inspiratória positiva. Com a melhora da força muscular
respiratória, o paciente deve permanecer por períodos progressivos em nebulização e ou respiração espontânea até a
retirada total da pressão positiva e posterior fechamento da
traqueostomia28.
Nível de evidência: E
RESUMO
O suporte ventilatório do paciente séptico deve ser realizado no sentido de diminuir seu trabalho respiratório e
gasto energético e de evitar a lesão induzida pela ventilação mecânica. A ventilação com volumes correntes de 6
ml/kg .e os níveis de PEEP devem ser ajustados individualmente para se garantir os alvéolos abertos e ventilação
homogênea.
Unitermos: ventilação mecânica, insuficiência respiratória, sepse, desmame.
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
REFERÊNCIAS
01. Amato MBP, Barbas CSV, Medeiros DM et al - Efffect of a protective-ventilation
strategy on mortality in the acute respiratory distress syndrome. N Engl J Med,
1998;338:347-354.
02. Amoateng-Adjepong Y, Jacob BK, Ahmad M et al - The effect of sepsis on breathing pattern and weaning outcomes in patients recovering from respiratory failure.
Chest, 1997;112:472-477.
03. Antonelli M, Conti G, Pelosi P et al – New treatment of acute hypoxemic respiratory failure: noninvasive pressure support ventilation delivered by helmet-a pilot
controlled trial. Crit Care Med, 2002; 30: 602-608.
04. Bolton CF - Sepsis and the systemic inflammatory response syndrome: neuromuscular manifestations. Crit Care Med, 1996;24:1408-1416.
05. Brochard L, Rauss A, Benito S et al - Comparison of three methods of gradual
withdrawal from ventilatory support during weaning from mechanical ventilation.
AM J Respir Crit Care Med, 1994;150:896-903.
05. Brower RG, Fessler HE - Mechanical ventilation in acute lung injury and acute
respiratory distress syndrome. Clin Chest Med, 2000;21:491-510.
06. Fein AM, Calalang-Colucci MG - Acute lung injury and acute respiratory distress
syndrome in sepsis and septic shock. Crit Care Clin, 2000;16:289-317
07. Feissel M, Michard F, Mangin I et al - Respiratory changes in aortic blood velocity
as an indicator of fluid responsiveness in ventilated patients with septic shock.
Chest, 2001;119:867-873
08. Huang CC, Tsai YH, Lin MC et al - Gastric intramucosal PCO2 and pH variability
in ventilated critically ill patients. Crit Care Med, 2001;29:88-95
09. Huang CC, Tsai YH, Chen NH et al - Spontaneous variability of cardiac output in
ventilated critically ill patients. Crit Care Med, 2000;28:941-946
10. Hund EF, Fogel W, Krieger D et al - Critical illness polyneuropathy: clinical findings
and outcomes of a frequent cause of neuromuscular weaning failure. Crit Care
Med, 1996;24:1328-1333
11. Keenan SP, Heyland DK, Jacka MJ et al - Ventilator-associated pneumonia. Prevention, diagnosis, and therapy. Crit Care Clin, 2002;18:107-125
12. Khadaroo RG, Marshall JC - ARDS and the multiple organ dysfunction syndrome. Common mechanisms of a common systemic process. Crit Care Clin,
2002;18;127-141
13. Kress JP, Pohman AS, O`Connor MF et al - Daily interruption of sedative infusions in critically ill patients undergoing mechanical ventilation. N Engl J Med,
2000;342:1471-1477.
14. MacIntyre NR, Cook DJ, Ely Jr. EW et al - Evidence-based guidelines for weaning and discontinuing ventilatory support: a collective task force facilitated by
the American College of Chest Physicians; the American Association for Respiratory Care; and the American College of Critical Care Medicine. Chest,
2001;120:(Suppl6):375S-395S.
15. Mangialardi RJ, Martin GS, Bernard GR et al - Hypoproteinemia predicts acute respiratory distress syndrome development, weight gain, and death in patients with
sepsis. Ibuprofen in Sepsis Study Group. Crit Care Med, 2000;28:3137-3145
16. Make BJ, Hill NS, Goldberg AI et al - Mechanical ventilation beyond the intensive
care unit. Report of a consensus conference of the American College of Chest
Physicians. Chest, 1998;113:(Suppl5):289S-344S.
17. Moriyama S, Okamoto K, Tabira Y et al - Evaluation of oxygen consumption
and resting energy expenditure in critically ill patients with systemic inflammatory
response syndrome. Crit Care Med, 1999;27:2133-2136
18. Mutlu GM, Mutlu EA, Factor P - GI complications in patients receiving mechanical ventilation. Chest, 2001;119:1222-1241
19. Pfeiffer B, Hachenberg T, Wendt M et al - Mechanical ventilation with permissive
hypercapnia increases intrapulmonary shunt in septic and nonseptic patients with
acute respiratory distress syndrome. Crit Care Med, 2002;30:285-289.
20. Reignier J, Bensaid S, Perrin-Gachadoat D et al - Erythromycin and early enteral
nutrition in mechanically ventilated patients. Crit Care Med, 2002;30:1237-1241
21. Savel RH, Yao EC, Gropper MA - Protective effects of low tidal volume ventilation in a rabbit model of Pseudomonas-aeruginosa induced acute lung injury. Crit
Care Med, 2001;29:392-398.
22. Sprung CL, Bernard GR, Dellinger RP - International sepsis forum. Intensive Care
Med, 2001:27:S1-S2
23. Esteban A, Alia I, Tobin MJ et al - Effect of spontaneous breathing trial duration
on outcome of attempts to discontinue mechanical ventilation. Am J Respir Crit
Care Med, 1999;159:512-518.
24. Tang W, Pakula JL, Weil MH et al - Adrenergic vasopressor agents and mechanical ventilation for the treatment of experimental septic shock. Crit Care Med,
1996;24:125-130.
25. Vincent JL - New management strategies in ARDS Immunomodulation. Crit Care
Clin, 2002;18: 69-78
26. White MS, Shepherd RW, McEniery JA - Energy expenditure in 100 ventilated,
critically ill children: improving the accuracy of predictive equations. Crit Care
Med, 2000;28:2307-2312
27. Herrera MT, Toledo C, Valladares F et al - Positive end-expiratory pressure modulates local and systemic inflammatory responses in a sepsis-induced lung injury
model. Intensive Care Med. 2003;29:1345-1353.
28. Rivers E - Early goal-directed therapy in the treatment of severe sepsis and septic
shock. N Engl J Med, 2001;345:1368-1377
181
Analgesia e Sedação em Sepse
Sedation and analgesia
José Luiz Gomes do Amaral1, Ana Paula Resque2, Hélio Penna Guimarães3,
Antônio Capone Neto4, Fábio Santana Machado5, Rachel Moritz6
SUMMARY
Adequate analgesia and sedation increase comfort, reduce stress response and facilitate diagnostic and therapeutic procedures in critically ill septic patients. Analgesia and sedation may also have a beneficial impact on morbidity. Additionally,
management of these patients is best guided by simple clinical scores. Implementation of guidelines for rational analgesia
and sedation would help to reduce patients’ length of stay in the intensive care unit.
Key Words: sedation, analgesia, sepsis
A
depressão da consciência, bem como do controle
neural da respiração e da atividade autonômica induzida por analgésicos e sedativos agrava-se na sepse. Além disso, essas drogas alteram a resposta imunológica,
aumentando risco de infecções e sepse1,2.
Os opióides afetam a proliferação, a diferenciação e a
função das células imunológicas3,4, a resposta à atividade fagocitária e a ação de mediadores inflamatórios5,6. Os benzodiazepínicos afetam a função linfocitária7. O propofol parece
estimular, enquanto o midazolam reduz a produção de interleucinas (IL)-1beta, IL-6 e TNF-alfa, e ambos suprimem
a produção de IL-88. Através de mecanismos diversos o tiopental também afeta a resposta imunológica9,10. A estimulação dos receptores α-2 pela dexmedetomidina pode, in vitro,
induzir a agregação plaquetária e in vivo, promover liberação
do óxido nítrico do endotélio vascular e a diminuição da liberação de catecolaminas, ao estimular os adrenorreceptores
α-2 pós-sinápticos11.
A fraqueza muscular após uso prolongado de bloqueadores neuromusculares constitui um dos fatores limitantes ao uso
destes fármacos. A sepse e a disfunção de múltiplos órgãos tem
sido, por sua vez associada à miopatia12-18 ou polineuropatia,
denominada “polineuropatia do paciente grave”19-24.
As disfunções orgânicas hepática, renal e circulatória que
acompanham a sepse modificam as intervenções destinadas a
promover sedação e analgesia ao paciente séptico.
Metabolismo de Sedativos e Analgésicos na Sepse
Os opióides são eliminados através do metabolismo hepático (conjugação) e excreção renal. As disfunções nestes
órgãos, devida a sepse, poderão acompanhar-se de acúmulo destes agentes ou seus metabólitos ativos e prolongar seus
efeitos25-27.
Da mesma forma, a eliminação dos diazepínicos depende
do fluxo sangüíneo do fígado e da sua atividade enzimática,
pois o metabolismo extra-hepático destes agentes não tem
grande expressão clínica.
A duração da ação do propofol é relativamente pouco
afetada em portadores de disfunção renal ou hepática, o que
não limita o seu uso em pacientes graves sob tratamento intensivo28.
A taxa de ligação protéica da dexmedetomidina é de 94%,
e ela não é afetada pela disfunção renal. No entanto, nos
pacientes com disfunção hepática, pode resultar em valores
menores de depuração.
INSTABILIDADE HEMODINÂMICA,
SEDAÇÃO E ANALGESIA NA SEPSE
Em razão da instabilidade hemodinâmica associada à
sepse, é fundamental, ao se prescrever analgésicos e sedativos, estar atento aos seus efeitos cardiovasculares:
Todos os opióides promovem bradicardia em razão de
estimulação vagal, e dentre eles, a morfina tem maior potencial de histaminoliberação, que determina a vasodilatação arteriolar e venosa. Os demais opióides não afetam
a pré-carga ou a pós-carga desde que não haja prévia estimulação adrenérgica. Na presença de hipovolemia, quando o equilíbrio hemodinâmico depende da intensificação
do tônus adrenérgico, os opióides poderão precipitar a
hipotensão arterial - redução do retorno venoso por venodilatação e redução da resistência vascular sistêmica por
dilatação arteriolar - acentuada.
O diazepam29 e o midazolam30 têm ação vasodilatadora direta. Isto faz com que estes agentes, principalmente
quando administrados em bolus, ou associados a opióides,
1. Professor Titular da Disciplina de Anestesiologia, Dor e Terapia Intensiva da Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo
2. Médica Assistente e Coordenadora da Unidade de Terapia Intensiva Neurocirúrgica do Setor de Terapia Intensiva da Disciplina de Anestesiologia, Dor e Terapia Intensiva da Escola Paulista de Medicina - Universidade São Paulo
3. Médico Assistente do Setor de Terapia Intensiva da Disciplina de Anestesiologia, Dor e Terapia Intensiva da Escola Paulista de Medicina
- Universidade Federal de São
4. Médico assistente e Coordenador do Grupo de Suporte Neurológico do Centro de Terapia Intensiva do Hospital Albert Einstein; Médico assistente do Serviço de Fisiologia Aplicada, do Instituto do Coração, da Universidade de São Paulo
5. Médico do Centro de Terapia Intensiva do Hospital Albert Einstein Médico Assistente da Disciplina de Clínica Médica da Faculdade de
Medicina - USP
6. Professora da UFSC, Mestre em Ciências Médicas, Doutora em Engenharia de Produção - Ergonomia
Apresentado em Apresentado na Assembléia do Consenso Brasileiro de Sepse em fevereiro de 2003 - Aceito para publicação em 05 de outubro
de 2004
Endereço para correspondência: Dr. José Luiz Gomes do Amaral - Disciplina de Anestesiologia, Dor e Terapia Intensiva UNIFESP - Rua Napoleão de Barros 715 - 4º andar - 04024 900 São Paulo, SP
182
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
sejam mal tolerados em pacientes hipovolêmicos ou portadores de instabilidade hemodinâmica.
Já em indivíduos normais, a administração de propofol
é acompanhada de redução significativa da pressão arterial, do débito cardíaco e da resistência vascular. Este efeito é ainda mais intenso quando associado a opióides, ou
se for administrado em pacientes hipovolêmicos ou debilitados31,32. Sua associação com cetamina pode reduzir este
inconveniente32. Os efeitos hemodinâmicos do propofol devem-se a vasodilatação33, dos territórios de capacitância34,
da resistência35 e da depressão da atividade baroreflexa36.
A dexmedetomidina promove sedação e analgesia, sem
depressão respiratória. Do ponto de vista hemodinâmico,
apresenta comportamento bifásico. Em menores doses,
age sobretudo nos receptores α2a com redução da freqüência cardíaca, pressão arterial média e resistência vascular periférica. Em doses maiores, age sobre receptores α2b
com aumento da resistência vascular sistêmica, com conseqüente aumento da pressão arterial e diminuição reflexa
da freqüência cardíaca36.
Particularmente na indução de pacientes em choque37
e em procedimentos de curta duração em pacientes graves,
são usados a cetamina e o etomidato. A cetamina estimula
o sistema cardiovascular, por meio da combinação de ações
indireta simpática central e periférica, bem como direta no
músculo liso dos vasos e miocárdio38. A cetamina inibe a
recaptação de catecolaminas39 e promove a vasodilatação
direta40. O inotropismo positivo observado em indivíduos
normais, não se manifesta na presença de reserva miocárdica reduzida41. Entre os demais agentes hipnóticos usados em
anestesia ou sedação para procedimentos invasivos, o etomidato é o fármaco com menor impacto hemodinâmico41,
afetando pouco o inotropismo ou a capacitância venosa42,43.
As doses elevadas de tiopental utilizadas no tratamento da
hipertensão intracraniana resultam amiúde em acentuada
depressão cardiovascular, exacerbada na presença de sepse.
Doses e velocidade de injeção de barbitúricos tem de ser
ajustadas para esta condição. O haloperidol pode aumentar
o intervalo da onda QT, com risco aumentado de disritmias
cardíacas ventriculares, incluindo Torsades de Pointes. O
aumento significativo do intervalo da onda QT já foi descrito, com doses baixas de 35 mg e a presença de disritmias relatadas após infusão, por via venosa, de 20 mg ou mais44,45.
A taquicardia associada ao pancurônio e o efeito histaminoliberador atribuído a alguns bloqueadores neuromusculares, como pancurônio e atracúrio pode sobreporse à expressão clínica de quadros sépticos, dificultar sua
avaliação clínica e, eventualmente, constituir complicação
do tratamento.
O flumazenil é um antagonista gabaérgico que reverte
os efeitos dos diazepínicos por competição. Seu uso isolado nas doses terapêuticas não resulta em efeito significativo sobre a pressão arterial, a freqüência cardíaca, a pressão ocluída da artéria pulmonar, o índice cardíaco, a resistência vascular sistêmica e as variáveis respiratórias. No
entanto, não está recomendando após o uso prolongado de
benzodiazepínicos pelo risco de induzir sintomas de abstinência e aumentar o consumo de oxigênio do miocárdio.
A naloxona, antagonista puro de todos os receptores
opióides, tem curta duração de ação o que pode propiciar
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
a recorrência do efeito do opióide, quando administrada em
pequenas doses. A superdosagem pode resultar em hipertensão arterial grave, disritmias cardíacas e edema pulmonar
agudo47,48.
A taquicardia associada ao pancurônio e o efeito histaminoliberador atribuído a alguns bloqueadores neuromusculares, como o pancurônio e o atracúrio pode sobreporse ã expressão clínica de quadros sépticos, dificultar a sua
avaliação clínica e, eventualmente, constituir complicação
do tratamento.
RECOMENDAÇÕES
A monitorização da qualidade da analgesia, do nível de
sedação e do grau de bloqueio neuromuscular tem particular relevância no paciente em sepse. A interpretação dos resultados exige cuidadosa interpretação em razão do impacto da sepse sobre os sistemas nervoso e neuromuscular.
Grau E*
A interferência dos agentes usados em sedação e analgesia sobre a resposta imunológica não contra-indica utilização destes fármacos, mas exige consideração na prescrição de pacientes sépticos.
Grau E*
A disfunção de múltiplos órgãos que acompanha a sepse exige ajustes freqüentes na prescrição dos agentes usados em sedação.
Grau E*
A instabilidade circulatória que acompanha a sepse exige cuidado adicional na titulação de sedativos, hipnóticos e
bloqueadores neuromusculares. Os opióides e sedativos reduzem o tônus adrenérgico e podem precipitar hipotensão
arterial em pacientes dependentes da resposta autonômica
e reserva cardíaca limitada. Agentes dotados de expressivo
potencial de histaminoliberação devem ser evitados.
Grau E*
O uso de antagonistas, tanto de benzodiazepínicos
como de opióides, não está recomendado. Seu uso está
associado à precipitação de abstinência ou ao retorno do
efeito sedativo dessas drogas.
Grau E*
*As recomendações Grau E encontram respaldo na opinião de especialistas e representam extrapolação de situações
análogas às encontradas na sepse. Não são, portanto, baseadas em estudos prospectivos, controlados aleatoriamente
realizados em pacientes sépticos e controles normais.
RESUMO
Adequadas sedação e analgesia aumentam o conforto,
reduzem a resposta ao estresse e facilitam os procedimentos diagnósticos e terapêuticos em pacientes sépticos gravemente enfermos. Analgesia e sedação podem também
reduzir morbidades. Além disso, o tratamento destes pacientes é melhor guiado por escores clínicos simples. A implementação de diretrizes para sedação e analgesia podem
reduzir o tempo de permanência nas unidades de terapia
intensiva.
Unitermos: sedação, analgesia, sepse.
183
REFERÊNCIAS
01. Pacifici R, Di Carlo S, Bacosi A et al - Pharmacokinetics and cytokine production in heroin and morphine-treated mice. Int J Immunopharmacol,
2000;22:603-614.
02. Casalinuovo IA, Gaziano R, Di Francesco P – Cytokine pattern secretion by
murine spleen cells after inactivated Candida albicans immunization. Effect
of cocaine and morphine treatment. Immunopharmacol Immunotoxicol,
2000;22:35-48.
03. Salo M, Pirttikangas CO, Pulkki K – Effects of propofol emulsion and thiopentone on T helper cell type-1/type-2 balance in vitro. Anaesthesia, 1997;52:341344.
04. Roy S, Charboneau RG, Barke RA – Morphine synergizes with lipopolysaccharide in a chronic endotoxinemia model. J Neuroimmunol, 1999;95:107-114.
05. Nuñez G, Urzúa J – Opioids ant the immune system. Rev Med Chil,
1999;127:341-348.
06. McCarthy L, Wetzel M, Sliker JK et al - Opioids, opioid receptors, and the immune response. Drug Alcohol Depend, 2001;62:111-123.
07. Magro CM, Crowson AN – Drug-induced immune dysregulation as a cause
of atypical cutaneous lymphoid infiltrates: a hypothesis. Hum Pathol,
1996;27:125-132.
08. Helmy SA, Al-Attiyah RJ – The immunomodulatory effects of prolonged intravenous infusion of propofol versus midazolam in critically ill surgical patients.
Anaesthesia, 2001;56:4-8.
09. Ruud B, Benestad HB, Opdahl H – Dual effect of thiopentone on human granulocyte activation. Non-intervention by ketamine and morphine. Acta Anaesthesiol Scand, 1988;32:316-322.
10. Salo M – Effect of atropine-pethidine premedication on peripheral blood lymphocytes. Acta Anaesthesiol Scand, 1977;21:517-520.
11. Cohen J, Eckstein L, Gutman Y – Pharmacokinetics of dexmedetomidine infusion for sedation of postoperative patients requiring intensive care. Br J Pharmacol, 1986;71:135-142.
12. Coakley JH, Nagendran K, Honavar M et al – Preliminary observations on the
neuromuscular abnormalities in patients with organ failure and sepsis. Intensive Care Med, 1993;19:323-328.
13. Giostra E, Magistris MR, Pizzolato G et al – Neuromuscular disorder in intensive care unit patients treated with pancuronium bromide. Occurrence in a
cluster group of seven patients and two sporadic cases, with electrophysiologic
and histologic examination. Chest, 1994;106:210-220.
14. Hanson P, Dive A, Brucher JM et al - Acute corticosteroid myopathy in intensive care patient. Muscle Nerve, 1997;20:1371-1380.
15. Helliwell TR, Coakley JH, Wagenmakers AJ et al – Necrotizing myopathy in
critically-ill patients. J Pathol, 1991;164:307-314.
16. Lacomis D, Giuliani MJ, Van Cott A et al – Acute myopathy of intensive
care: clinical, electromyographic and pathological aspects. Ann Neurol,
1996;40:645-654.
17. Lacomis D, Petrella JT, Giuliani MJ – Causes of neuromuscular weakness in the
intensive care unit: a study of ninety-two patients. Muscle Nerve, 1998;21:610617.
18. Ramsay DA, Zochodne DW, Robertson DM et al – A syndrome of acute severe muscle necrosis in intensive care unit patients. J Neuropathol Exp Neurol,
1993;52:387-398.
19. Barat M, Brochet B, Vital C et al – Polyneuropathies during prolonged stays in
resuscitation. Rev Neurol, 1987;143:823-831.
20. Coronel B, Mercatello A, Couturier JC et al – Polyneuropathy: potential cause
of difficult weaning. Crit Care Med, 1990;18:486-489.
21. Lyclama J, Nijeholt A, Troost J – Critical Illness Polyneuropathy, em: Matthews
WB - Handbook of Clinical Neurology. Amsterdam, Elsevier, 1987;575-585.
22. Op de Coul AA, Verheul GA, Leyten AC et al – Critical illness polyneuromyopathy after artificial respiration. Clin Neurol Neurosurg, 1991;93:27-33.
23. Waldhausen E, Keser G, Schulz WB et al – Weaning failure due to acute neuromuscular disease. Crit Care Med, 1989;17:594-595.
184
24. Wijdicks EF, Litchy WJ, Harrison BA et al – The clinical spectrum of critical
illness polyneuropathy. Mayo Clin Proc, 1994;69:955-959.
25. Gilton A, d’Honneur G, Sandouk P et al – Morphine 6 glucuronide accumulation in CSF of renal failure patients after oral morphine. Anesthesiology,
1993;79:A368.
26. Chauvin M, Sandouk P, Scherrmann JM et al – Morphine pharmacokinetics in
renal failure. Anesthesiology, 1987;66:327-331.
27. Don HF, Dieppa RA, Taylor P – Narcotic analgesic in anuric patients. Anesthesiology, 1975;42-745-747.
28. Albanese J, Martin C, Lacarelle B et al – Pharmacokinetics of long-term propofol infusion used for sedation in ICU patients. Anesthesiology, 1990;73:214217.
29. Abel RM, Staroscik RN, Reis RL – The effects of diazepam on left ventricular function and systemic vascular resistance. J Pharmacol Exp Ther,
1970;173:364-370.
30. Chang KS, Feng MG, Davis RF – Midazolam produces vasodilatation by
mixed endothelium- dependent and -independent mechanisms. Anesth Analg,
1994;78:710-717.
31. Hug CC, McLeskey CH, Narhwold ML et al – Hemodynamic effects of propofol: data from over 25,000 patients. Anesth Analg, 1993;77:(Suppl4):S21-S29.
32. Hui TW, Short TG, Hong W et al – Additive interactions between propofol and
ketamine when used for anesthesia induction in female patients. Anesthesiology, 1995;82:641-648.
33. Rouby JJ, Andreev A, Leger P et al – Peripheral vascular effects of thiopental
and propofol in humans with artificial hearts. Anesthesiology, 1991;75:32-42.
34. Robinson BJ, Ebert TJ, O’Brien TJ et al – Mechanisms whereby propofol mediates peripheral vasodilatation in humans. Sympathoinhibition or direct vascular relaxation? Anesthesiology, 1997;86:64-72.
35. Lowe D, Hettrick DA, Pagel PS et al – Propofol alters left ventricular afterload
as evaluated by aortic input impedance in dogs. Anesthesiology, 1996;84:368376.
36. Ebert TJ – Is gaining control of the autonomic nervous system important to our
specialty? Anesthesiology, 2000;93:382-394.
37. Waxman K, Shoemaker WC, Lippmann M – Cardiovascular effects of anesthetic induction with ketamine. Anesth Analg, 1980;59:355-358.
38. Ivankovitch AD, Miletich DJ, Reimann C et al – Cardiovascular effects of centrally administered ketamine in goats. Anesth Analg, 1974;53:924-933.
39. Salt PJ, Barnes PK, Beswick FJ – Inhibition of neuronal and extraneuronal
uptake of noradrenaline by ketamine in the isolated perfused rat heart. Br J
Anaesth, 1979;51:835-838.
40. Altura BM, Altura BT, Carella A – Effects of ketamine on vascular smooth
muscle function. Br J Pharmacol, 1980;70:257-267.
41. Ruth WJ, Burton JH, Bock AJ – Intravenous etomidate for procedural sedation
in emergency department patients. Acad Emerg Med, 2001;8:13-18.
42. Coriat P, Benameur M, Lebret F – Utilization Clinique de l’étomidate, em:
6th Journées de Mises au Point en Anesthésie-Réanimation – MAPAR, Paris,
1988;145-151.
43. Leger P, Rouby JJ, Andreev A et al – Peripheral vascular effects of etomidate.
Anesthesiology, 1988;69:A592.
44. Lawrence KR, Nasraway AS - Conduction disturbances associated with administration of butyrophenone antipsychotics in the critically ill: a review of the
literature. Pharmacotherapy, 1997;17:531-537.
45. Sharma ND, Rosman HS, Padhi ID et al – Torsades de Pointes associated with
intravenous haloperidol in critically ill patients. Am J Cardiol, 1998;81:238240.
46. Riou B, Viars P, Lecarpentier Y – Effects of ketamine on cardiac papillary
muscle of normal hamsters and those with cardiomiopathy. Anesthesiology,
1990;73: 910-918.
47. Michaelis L, Hickey P, Clark T et al - Ventricular irritability associated with the
use of naloxone. Ventricular irritability associated with the use of naloxone
hydrochloride. Two case reports and laboratory assessment of the effect of the
drug on cardiac excitability. Ann Thorac Surg, 1974;18:608-614.
48. Tanaka GY – Hypertensive reaction to naloxone. JAMA, 1974;228:25-26.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
Disfunção Miocárdica na Sepse*
Myocardial Dysfunction in Sepsis
Ludhmila Abrahão Hajjar1, Constantino José Fernandes Júnior2, Erick Sessa Mercon1,
Aécio Flavio T Góis1, Elias Knobel2 , Liliane Kopel3 , Silvia Gelas Lage4
SUMMARY
BACKGROUND AND OBJECTIVES: Myocardial dysfunction in sepsis occurs in approximately 40% of the patients, and is
responsible for significant increase of mortality. The objective of this article is to review myocardial dysfunction in sepsis,
regarding its pathogenetic mechanisms and clinical consequences.
CONTENTS: Although its pathogenesis and clinical consequences remain incompletely understood, myocardial dysfunction plays a clear role in human septic shock. Septic myocardial depression in humans has been seen to be characterised
by reversible ventricular dilation, decreased systolic function, and decreased response to both fluid resuscitation and catecholamine estimulation, all in the presence of a hyperdynamic circulation. This phenomenon is related to the presence of
circulating myocardial depressant factors, like TNFα IL-1 and nitric oxide.
CONCLUSIONS: Our current approach to cardiac dysfunction in patients with septic shock is still aimed at goals of reestablishing organ and tissue perfusion and oxygen delivery by fluid resuscitation and inotropic or vasopressor therapy.
However, as we continue to understand the cellular mechanisms of organ dysfunction, the hope is that there will be exciting
new strategies and therapeutic options to reduce mortality of critical patients.
Key Words: Myocardial dysfunction, myocardial depression, sepsis
A
sepse é uma entidade complexa definida como uma
síndrome de resposta inflamatória sistêmica à infecção, caracterizada e modulada por vários mediadores
inflamatórios e antiinflamatórios1,2. Nos pacientes críticos a sepse é um problema crescente, dada sua alta prevalência e altas
taxas de mortalidade, variando de 25% a 70%3. A morbimortalidade da sepse, é em grande parte resultante de distúrbios graves
no sistema cardiovascular, com hipotensão arterial refratária e
colapso cardiovascular4.
Apesar do progresso obtido em monitorização hemodinâmica e cuidados intensivos, a mortalidade atribuída à sepse persiste extremamente elevada. Atualmente, o paciente com sepse
não morre da infecção primária e sim de disfunção orgânica
progressiva, atribuída em parte ao fenômeno sistêmico de resposta inflamatória5.
A depressão miocárdica associada à sepse é uma das manifestações da disfunção orgânica dessa afecção2. Estima-se que a
disfunção do sistema cardiovascular ocorra em 40% dos pacientes com sepse3. A taxa de mortalidade aumenta de 20% a 30%
na sepse sem acometimento cardiovascular para 40% a 70% no
choque séptico3. O maior entendimento do acometimento cardiovascular na sepse abre perspectivas na elucidação dos mecanismos envolvidos nessa síndrome e pode orientar estratégias
terapêuticas no manuseio do choque séptico.
HISTÓRICO
Na era moderna, o conceito de depressão ou disfunção
miocárdica reversível foi pela primeira vez descrito por Wiggers
em 1947, que postulou a existência de um fator depressor do
miocárdio responsável por disfunção miocárdica no choque hemorrágico6. Nas décadas de 1960 e 1970, estudos experimentais
demonstraram evidências de disfunção miocárdica temporária
em várias formas de doença crítica, incluindo choque hemorrágico e séptico7,8.
Em 1973, foi publicada uma metanálise de sete estudos correlacionando sobrevida de pacientes sépticos com o índice cardíaco9. A redução do índice cardíaco correlacionou-se a maiores
taxas de mortalidade (p < 0,02). Esses estudos foram corroborados por modelos animais de sepse induzida por injeção de
endotoxina ou organismos vivos10-12. Quase todos os modelos
produziam choque caracterizado por débito cardíaco reduzido
e resistência vascular sistêmica aumentada. As críticas a esses
estudos fundamentam-se na comparação do choque induzido
experimental com o choque séptico em humanos, e na utilização
das medidas da pressão venosa central (PVC) como estimativa
do volume diastólico ventricular final. Evidências acumuladas
nas últimas quatro décadas sugerem que a PVC tem baixa correlação com a pré-carga do ventrículo esquerdo nos pacientes
críticos, particularmente no paciente séptico13,14. Alguns autores
propuseram que o déficit de volume circulante seria o responsável pelo débito cardíaco reduzido no choque séptico9,12.
Estudos seqüenciais mostraram que os pacientes portadores de choque séptico adequadamente reanimados, tipicamente apresentavam um estado circulatório hemodinâmico de alto
débito e baixa resistência sistêmica, com depressão miocárdica,
apesar do alto débito14-18. Nos pacientes que morriam, esse padrão hemodinâmico persistia até o óbito.
1. Médicos Cardiologistas do Instituto do Coração – HCFMUSP, Especialista em Medicina Intensiva pela AMIB.
2. Médicos Intensivistas da Unidade de Terapia Intensiva do Hospital Israelita Albert Einstein
3. Médicos Cardiologistas do Instituto do Coração – HCFMUSP
4. Médica Diretora da Unidade de Terapia Intensiva Clínica do Instituto do Coração – HCFMUSP
*Recebido do Instituto do Coração – HCFMUSP/Hospital Israelita Albert Einstein, São Paulo, SP
Apresentado em 15 de julho de 2004. - Aceito para publicação em 24 de agosto de 2004
Endereço para correspondência: Dra. Ludhmila Abrahão Hajjar - Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44 - 05403-000 São Paulo, SP - E-mail:
[email protected] - Fones (11) 11 – 9937 2144/11- 30810609 11- 30695651
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
185
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
A fase mais recente do entendimento e estudo das manifestações cardiovasculares da sepse e choque séptico deu início com o
desenvolvimento das técnicas de cineangiografia de radionuclídeos portátil (ventriculografia radioisotópica) e com a aplicação da
ecocardiografia volumétrica no manuseio do paciente crítico.
co implicaria em uma probabilidade 5,7 vezes maior de morrer
em associação com a disfunção miocárdica sepse-induzida26.
AVALIAÇÃO DA DISFUNÇÃO VENTRICULAR
NOS PACIENTES COM SEPSE
Após a descrição e a confirmação do padrão hemodinâmico
de alto débito cardíaco e baixa resistência sistêmica no choque
séptico, alguns autores continuaram a argumentar que a disfunção cardíaca era fato importante, uma vez que as demandas metabólicas excediam a performance miocárdica2,9.
Weisel e col.14 e Rackow e col.27 avaliaram a resposta a volume nos pacientes com choque séptico através do cateter SwanGanz. Ambos demonstraram evidências semelhantes de depressão miocárdica, com reduzida resposta de trabalho sistólico ao
volume empregado.
Parker e col.20, utilizando ventriculografia seriada e medidas de débito por termodiluição em pacientes com choque
séptico, demonstraram o padrão típico hiperdinâmico. Destes,
75% apresentaram depressão da fração de ejeção ventricular
nos dois primeiros dias do choque. Surpreendentemente, todos
os pacientes com choque séptico com disfunção ventricular de
moderada a grave (fração de ejeção do ventrículo esquerdo ≤
0,40) sobreviveram. Dos pacientes que evoluíram para óbito,
apenas um tinha fração de ejeção ventricular esquerda menor
que 0,40. Os sobreviventes apresentaram dilatação ventricular
esquerda aguda com aumento do índice de volume diastólico
final (IVDF) e índice de volume sistólico final (IVSF), que juntos com a fração de ejeção reduzida, retornaram ao normal em
7 a 10 dias à medida que os pacientes se recuperavam. Os não
sobreviventes apresentaram IVDF, IVSF, índice de volume sistólico e a função ventricular normais durante todo o curso da
doença até a morte.
Nesse estudo20, alguns aspectos interessantes são descritos.
Primeiro, os sobreviventes do choque séptico sofreram dilatação ventricular esquerda aguda e redução da fração de ejeção
quando comparados aos não sobreviventes que mantiveram
inalterados os volumes cardíacos e a fração de ejeção. Ambos os
grupos apresentavam débito cardíaco normal ou elevado. Esse
paradoxo aparente de dilatação ventricular esquerda no grupo
sobrevivente pode ser atribuído a vários fatores. Uma explicação
potencial é que os não sobreviventes tinham uma maior redução na resistência vascular sistêmica que os sobreviventes, o que
permitiria que estes mantivessem o débito cardíaco e a fração
de ejeção sem necessidade de dilatação ventricular apesar de seu
miocárdio com disfunção16,20. No grupo de não sobreviventes,
a menor resistência sistêmica poderia indicar uma disfunção
microvascular mais acentuada, o que poderia ser associada
com edema miocárdico, e aumento do infiltrado de polimorfonucleares de permeio às fibras caracterizando uma verdadeira
miocardite intersticial28. A perda de complacência e a falência
subseqüente do ventrículo comprometeriam a performance miocárdica, levando a aumento de mortalidade.
O segundo achado importante desse estudo refere-se à caracterização da reversibilidade da depressão miocárdica séptica:
alterações agudas nos volumes ventriculares e na fração de ejeção são sustentadas até 4 dias e então retornam ao normal em 7
a 10 dias nos sobreviventes.
A definição das alterações diastólicas não é tão clara como a
disfunção sistólica na sepse. Ellrodt e col.29 sugeriram a ocorrência
Estudos experimentais em animais têm demonstrado que
a sepse claramente altera a contratilidade miocárdica in vitro e
in vivo19. No homem, pelo fato do débito cardíaco encontrarse normal ou elevado após a reanimação volêmica, a disfunção
ventricular tem sido de difícil avaliação através de estudos hemodinâmicos4,13,19. Com o uso da cintilografia radioisotópica e
medidas hemodinâmicas de termodiluição, tem sido demonstrado redução da fração de ejeção no choque séptico19. De acordo
com uma série de estudos clínicos e experimentais, a redução
na fração de ejeção ocorre entre 24 e 48 horas após o início da
sepse, e é reversível nos pacientes que sobrevivem, em 5 a 10 dias
após o surgimento5,20,21. A combinação de fração de ejeção reduzida em pacientes com resistência sistêmica diminuída sugere a
presença de depressão miocárdica intrínseca.
A análise hemodinâmica com o cateter de Swan-Ganz permite o diagnóstico de uma pequena proporção de pacientes que
se apresenta com disfunção miocárdica grave, caracterizada por
débito cardíaco reduzido, saturação venosa mista baixa e/ou resposta alterada a volume. Freqüentemente a monitorização hemodinâmica mostra-se insensível para o diagnóstico desta grave
condição, visto que não é incomum encontrar débitos cardíacos
elevados associados à baixos índices de trabalho sistólico do
ventrículo esquerdo em pacientes sépticos, independentemente
da associação com disfunção miocárdica definida pelo encontro
de níveis elevados de troponina I sérica22. Estudos recentes mostraram que a ecocardiografia bidimensional é ferramenta valiosa no diagnóstico da disfunção miocárdica da sepse2,19. Polaert e
col.21 mostraram que a ecocardiografia transesofágica bidimensional com Doppler identifica vários subgrupos de pacientes de
acordo com sua função sistólica e diastólica do ventrículo esquerdo. Esse estudo sugeriu que a disfunção cardíaca no choque
séptico tem caráter espectral, variando de disfunção diastólica
isolada até a falência ventricular 21.
Alguns autores sugerem que a ventriculografia radioisotópica tem o poder de superestimar o volume ventricular e a ecocardiografia de subestimar, resultando em avaliações conflitantes
da função miocárdica. Uma moderada dilatação ventricular
esquerda tem sido observada com qualquer método nos pacientes com choque séptico2,3,23. Tem sido postulada a utilização da
ecocardiografia com estresse como um método de avaliação de
reserva miocárdica na sepse19,24.
Atualmente, um dos métodos sugeridos como avaliação do
comprometimento da função miocárdica na sepse é a medida
dos níveis séricos da troponina I cardíaca. A troponina I é um
indicador altamente específico de lesão do cardiomiócito. Estudos recentes descreveram sua elevação em mais de 50% dos pacientes com choque séptico25. Sua detecção sugeriria a presença
de lesão miocárdica mesmo que leve, sem diminuição do débito
cardíaco, já que sua positividade associa-se a graus variados de
disfunção ventricular esquerda19,25. Também há relatos de que a
elevação do BNP > 190 pcg/ml no segundo dia do quadro sépti-
186
FUNÇÃO DO VENTRÍCULO ESQUERDO
NA SEPSE E NO CHOQUE SÉPTICO
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
de disfunção diastólica nos pacientes sépticos, baseado na ausência de correlação entre a pressão capilar medida e qualquer parâmetro de volume ou performance ventriculares. Jafri e col.30, com
técnicas de Doppler, demonstraram redução do tempo de esvaziamento ventricular e maior dependência da contribuição atrial
ao volume diastólico final esquerdo (redução da complacência)
em pacientes com sepse ou choque séptico quando comparados
com controles. Em estudo recente com pacientes portadores de
choque séptico dependentes de vasopressores, Poelaert e col.21, demonstraram um espectro de fisiopatologia ventricular esquerda,
variando de disfunção diastólica isolada a anormalidades sistólica e diastólica combinadas. Posteriormente, esses dados foram
confirmados por Munt e col.31, que descreveram alterações diastólicas mais acentuadas ainda no grupo de não sobreviventes.
FUNÇÃO DO VENTRÍCULO DIREITO
NA SEPSE E NO CHOQUE SÉPTICO
Embora em condições fisiológicas o débito dos ventrículos
seja semelhante, em condições fisiopatológicas como no choque
séptico, o ventrículo direito (VD) pode estar sujeito a influências
diferentes que o ventrículo esquerdo32. Não se pode assumir que
a função do ventrículo direito na sepse e no choque séptico seja
igual à do ventrículo esquerdo por várias razões. Na circulação
sistêmica, o choque séptico associa-se a redução da resistência
vascular sistêmica e da pressão arterial. Isto quase sempre resulta em redução da pós-carga ventricular, que tende a manter
ou elevar o débito cardíaco apesar da presença de depressão da
contratilidade miocárdica. Por outro lado, a pós-carga do ventrículo direito usualmente encontra-se elevada nesses pacientes
devido a aumento da resistência vascular pulmonar associada a
lesão pulmonar ou a síndrome de desconforto respiratório agudo2,33. Isso tende a reduzir o débito ventricular direito. Alguns
autores sugerem que a redução do débito do ventrículo direito
seja resultado de redução no gradiente de perfusão durante o
choque associado com hipertensão pulmonar33.
Raper e col.34, utilizando ventriculografia radioisotópica,
demonstraram depressão intrínseca da contratilidade do ventrículo direito em pacientes com sepse normotensos quando
comparados com pacientes vítimas de trauma. Hoffman e col.35
e Kimchi e col.36 demonstraram redução da função ventricular
direita em portadores de choque séptico.
Parker e col.37 demonstraram comportamento do VD semelhante ao já descrito do VE no choque séptico. Pacientes que
sobreviveram apresentaram disfunção acentuada de VD com
dilatação ventricular, com normalização na recuperação, enquanto os não sobreviventes tinham fração de ejeção discretamente reduzida de VD que persistia até a morte. Nesse estudo,
foi documentada dilatação biventricular nos sobreviventes.
Assim, os dados disponíveis até o momento indicam a importância da disfunção ventricular direita no paciente séptico.
Evidências mostram que apesar das diferenças dos ventrículos
quanto a estrutura e função, seu comportamento na sepse é semelhante.
MECANISMOS DA DEPRESSÃO MIOCÁRDICA
NA SEPSE E NO CHOQUE SÉPTICO
Desde a concepção inicial da depressão miocárdica na sepse,
muito tem sido discutido sobre os mecanismos envolvidos em
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
sua gênese e manutenção. Há duas teorias vigentes. A primeira,
que prevaleceu por vários anos, foi a da hipoperfusão miocárdica resultando em lesão isquêmica ao coração séptico. Essa teoria
foi sustentada vários anos por modelos caninos de choque endotóxico que demonstravam evidência de hipoperfusão miocárdica global10,33. Entretanto, cada vez mais tornou-se conhecido
que o choque endotóxico não era o modelo mais apropriado de
estudo da disfunção miocárdica da sepse. Após essa constatação, emergiu a segunda teoria, que cada vez se fortalece mais, a
de substâncias depressoras circulatórias no choque séptico11. As
origens dessa teoria remontam a descrição clássica de Wiggers6,
que propôs a presença de uma fator depressor no choque hemorrágico experimental.
O maior conhecimento sobre a fisiopatologia da sepse envolvendo a inflamação e a imunomodulação sustenta a idéia de que
diversos mediadores estejam envolvidos na cardiodepressão da
sepse, como o fator de necrose tumoral alfa (TNF-α), a interleucina I (IL-1) e o óxido nítrico (NO). Abaixo, estão descritos os
fatores supostamente envolvidos na disfunção miocárdica.
a) Hipoperfusão Miocárdica
A hipótese da hipoperfusão global no miocárdio com isquemia e reperfusão foi praticamente abandonada após a publicação de dois estudos38,39. Cunnion e col.38, mediram o fluxo e avaliaram o metabolismo coronário através de cateteres com termodiluição em 7 pacientes com choque séptico. Foi demonstrado
que o fluxo coronariano encontrava-se normal (com freqüência
cardíaca abaixo de 100 batimentos/minuto) ou aumentado (se a
freqüência fosse abaixo de 100/minuto). Não houve diferenças
no fluxo coronariano entre os pacientes com ou sem depressão miocárdica. Não ficou demonstrada produção miocárdica
de lactato. Dhainaut e col.39, em uma série grande de pacientes, confirmaram os resultados descritos, de fluxo coronariano
mantido e ausência de lactato local. Estudos experimentais com
infusão de endotoxinas resultando em padrão hiperdinâmico
também confirmam esses achados por mostrar aumento do fluxo sangüíneo miocárdico2,9.
b) Agressão Miocárdica
Turner e col.25 avaliaram o comportamento da troponina em
portadores de choque séptico com o objetivo de determinar a
presença de agressão miocárdica não diagnosticada clinicamente. Nesse estudo, foi encontrado que a troponina I estava elevada
em 12 de 15 pacientes com choque séptico comparados com um
de seis pacientes críticos sem sepse25. Houve correlação positiva
entre troponina elevada e necessidade de vasopressores e correlação negativa entre troponina e índice de trabalho sistólico
ventricular25.
No estudo de Mehta e col.40, 37 pacientes com sepse sem doença coronariana prévia foram submetidos à dosagem de troponina sérica à admissão, em 24 e em 48 horas após a inclusão. Os
pacientes foram divididos em dois grupos – troponina I alta ou
troponina I baixa. Foram realizados ecocardiograma, eletrocardiograma e avaliações bioquímicas e hemodinâmicas seriadas.
Dezesseis pacientes (43%) apresentavam elevação da troponina
I – esses comparados ao grupo com baixos níveis de troponina tiveram maior necessidade de vasopressores (81% x 43%, p
= 0,018), maior pontuação no score APACHE II (28 x 21, p =
0,004), maior incidência de disfunção segmentar no ecocardiograma (60% x 6%, p = 0,002), menor fração de ejeção (46% x
187
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
60%, p = 0,04) e maior mortalidade (50% x 19%). A análise de
regressão logística mostrou que a troponina é um fator preditivo
independente de mortalidade, duração da internação na terapia
intensiva e necessidade de terapia com vasopressores40.
A agressão miocárdica pode ser conseqüência da hipotensão
arterial e do choque nos pacientes sépticos, podem ser causadas ou pioradas pelo uso das catecolaminas, ou pode estar relacionada com a ação de uma substância depressora miocárdica
circulante. O valor prognóstico da troponina nos pacientes sépticos ainda não está definido. O estudo da troponina na sepse
tem o potencial de elucidar muitas dúvidas da fisiopatologia do
miocárdio nessa condição. Novas pesquisas provavelmente vão
esclarecer se a avaliação da troponina será uma ferramenta clínica útil no manuseio do choque séptico, como se tornou no
tratamento da doença coronariana.
c) Substâncias Depressoras Circulatórias
A ligação entre a ocorrência de depressão miocárdica na
sepse humana e a evidência do efeito depressor miocárdico do
soro de pacientes com sepse só foi esclarecida após o estudo de
Parrillo e col. em 19852,41 . Eles foram os primeiros a mostrar a
ligação entre a depressão ventricular na sepse humana e o efeito
depressor miocárdico de um mediador circulante do soro desses pacientes. Foi demonstrado que o soro de pacientes sépticos com disfunção miocárdica induzia depressão significativa
da contratilidade miocárdica em ratos comparados ao soro de
pacientes críticos sem sepse. Monslave e col.42 descreveram em
1984 a depressão miocárdica no choque séptico meningocócico. Pathan e col.43, em 2002, confirmaram a presença de uma
substância depressora circulatória no sangue de crianças com
choque por meningococcemia.
Os resultados desses estudos ratificaram a proposição da teoria de depressores circulantes em detrimento da hipoperfusão
miocárdica, sendo aberta a partir de então novas linhas de pesquisa buscando a identificação desses mediadores44.
c.1. Citocinas
Os mediadores inflamatórios endógenos potencialmente envolvidos incluem os metabólitos do ácido araquidônico
(prostaglandinas e leucotrienos), o fator ativador plaquetário,
histamina, endorfinas2. Mas, as citocinas, um grupo distinto de
mediadores imunológicos polipeptídicos/protéicos idealmente
preenchem o padrão bioquímico do fator depressor circulante42.
Embora seja um grupo extenso contemplando entre outras a
IL-1β, TNF-αIL-2, IL-4, IL-6, IL-8, IL-10, IFN-γ, endotelina,
e TGF-α, o TNF-α e a IL-1β têm importância singular na disfunção miocárdica2,3,41,44.
O TNF-α desempenha papel fundamental na resposta inflamatória e está implicado em várias afecções além da sepse. A
administração do TNF-α em modelos experimentais e em voluntários humanos produz clínica e hemodinâmica de choque
séptico (hipotensão arterial, débito cardíaco aumentado e resistência reduzida)45.
Esses dados foram reforçados por estudos que demonstraram
que a aplicação do TNF-α em tecido miocárdico de animais e humanos resulta em depressão da contratilidade concentração-dependente45-47. Kumar e col.45 removendo o TNF-α do soro de pacientes sépticos, eliminaram parcialmente a atividade depressora
do miocárdio, e a terapia com anticorpo monoclonal anti-TNF-α
mostrou-se capaz de bloquear a disfunção miocárdica dos mode-
188
los experimentais de sepse2. Em alguns estudos, a administração
do anticorpo monoclonal anti-TNF-α em pacientes com choque
séptico mostrou melhora da função ventricular50.
Muitos dos efeitos biológicos do TNF-α são compartilhados pela IL-1β, como o encontro de níveis elevados na sepse e no
choque séptico e sua capacidade de induzir sepse com disfunção
miocárdica2,41. A administração do antagonista da IL-1β atenua
as manifestações metabólicas e hemodinâmicas do choque experimental e no homem51. Sua imunoabsorção no soro de pacientes sépticos parcialmente neutraliza a atividade depressora
miocárdica da sepse2, mas não altera a mortalidade.
Apesar de fortes evidências sugerindo o papel dessas citocinas na disfunção miocárdica da sepse, alguns aspectos dessa
associação ainda não foram esclarecidos. Um deles é a rápida
redução das concentrações plasmáticas desses fatores ao mesmo
tempo em que se observa depressão miocárdica mantida por
vários dias19. Alguns autores explicam esse fato através de estudos que revelam a produção local miocárdica de citocinas, o que
perpetuaria a disfunção19.
Dados recentes sugerem que o TNF tem efeitos pleomórficos
no coração além de sua ação na contratilidade cardíaca; muitos
destes podem ser benéficos, protegendo os cardiomiócitos em situações de estresse. A estimulação de miócitos com o TNF promove aumento da expressão das proteínas do choque térmico
(HSP 27 e 72 kD), substâncias que sabidamente promovem reparo tecidual5. Além disso, a exposição do tecido cardíaco ao TNF
leva à produção de antioxidantes endógenos, que devem proteger
o coração do estresse oxidativo5. Também foi demonstrado que
o TNF leva a adaptações a curto prazo estimulando resposta de
crescimento do miocárdio com hipertrofia e ativação das metaloproteínas, com função no remodelamento ventricular5.
Embora o TNF-α seja reconhecido como o principal mediador da disfunção miocárdica da sepse, esses achados sugerem
que seus efeitos podem também incluir respostas adaptativas
que protegem o coração sob condições de estresse52.
FIGURA 1: Efeitos Pleomórficos do TNF-α
na Função Miocárdica na Sepse.
c2. Óxido Nítrico
Embora vários mecanismos possam estar envolvidos na depressão miocárdica na sepse, a geração de óxido nítrico parece
ter papel central nesse processo53. Sob condições fisiológicas,
o óxido nítrico (NO) tem ação reguladora no tônus vascular
e ação discreta sobre a contratilidade miocárdica, embora seja
conhecido que este modula a ação de agonistas na função cardíaca. Também foi descrita ação do óxido nítrico nos canais de
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
cálcio modificando a atividade da proteína cinase, reduzindo a
resposta das miofibrilas ao cálcio e inibindo a função mitocondrial50. A ausência de efeito significativo do NO na contratilidade cardíaca em condições fisiológicas é explicada por estudos
anatômicos que mostram que a imunorreatividade da óxido nítrico sintase no coração e no músculo liso é fraca.
A geração patológica de óxido nítrico e GMP cíclico parece
contribuir para a disfunção cardiovascular na sepse e no choque
séptico2,54. Esse processo parece ocorrer em parte pela geração
de óxido nítrico e GMP cíclico via ativação da sintase constitutiva, o que é consistente com o surgimento rápido da disfunção
contrátil em alguns modelos48. Mas, esse mecanismo não explica
a depressão miocárdica tardia relacionada a citocinas. Atribuise a este último à disfunção de adrenorreceptores por sub-unidades inibitórias da proteína G, além da geração tardia da óxido
nítrico sintase induzida. Tem sido sugerido que citocinas como
o TNF e a IL-1 estimulem a produção de óxido nítrico sintase
em suas duas formas19.
Assim como as ações benéficas do TNF na homeostase circulatória, alguns estudos sugerem que o óxido nítrico seja um
mediador antiinflamatório e regulador do fluxo microvascular
na sepse. Tem sido demonstrado que a administração de l-Arginina (que aumenta a produção do NO) reverte a depressão
miocárdica no choque endotóxico e melhora a perfusão regional
em estados de choque. Em modelos experimentais de sepse, a
inibição da óxido nítrico sintase reduz o fluxo microvascular e
aumenta a isquemia tecidual no intestino, fígado e rins, o que
é parcialmente revertido com a administração de l-Arginina.
Sugere-se que a produção do NO deva contrapor-se à ação de
vasoconstritores como a endotelina e exerça efeitos antiinflamatórios agindo nas moléculas de adesão e citocinas.
Recentemente, um estudo clínico aleatório utilizando um
inibidor seletivo da óxido nítrico sintase em pacientes com sepse
foi suspenso pela alta mortalidade observada no grupo tratado5.
Por outro lado, um estudo observou redução de mortalidade
em pacientes sépticos cuja alimentação enteral era enriquecida
com arginina5. A importância da suplementação com l-arginina
é sustentada pela proposição de classificação da sepse como um
estado deficiente em l-arginina devido à redução da ingestão,
aumento do metabolismo e redução da arginina pelo aumento
da expressão da arginase. Assim, até o momento apesar de evidências de efeitos depressores cardiovasculares do óxido nítrico
na sepse, não se encontrou ainda a maneira ideal de modular sua
ação com repercussões positivas na evolução dos pacientes.
c.3. Catecolaminas
Na sepse, os níveis de catecolaminas encontram-se elevados e associam-se com sub-regulação dos β-adrenorreceptores
cardíacos, resultando em implicações clínicas como necessidade
maior de drogas β-agonistas nos pacientes sépticos. Quando o
plasma de pacientes sépticos é incubado com cardiomiócitos
murinos neonatais por 48 horas, os β-adrenorreceptores são
reduzidos em 35% e o nível das sub-unidades inibitórias da proteína G aumentam em 60%5. Esses dados sugerem que a atividade simpatomimética em excesso no soro resulta em redução
da contratilidade miocárdica no contexto do choque, independente se é pela sepse ou por doença intrínseca do miocárdio5.
Outro mecanismo proposto de disfunção contrátil causada pelo
excesso de catecolaminas é a indução de hipertrofia ventricular
levando à necrose miocitária.
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
c.4. Outras Substâncias Relacionadas
Na sepse, há produção aumentada de fator ativador plaquetário, tromboxano e prostaciclinas, o que se associa a
maior mortalidade. O aumento do nível desses prostanóides
relaciona-se a aumento da expressão da ciclooxigenase-2 nas
células endoteliais, musculares lisas e nas células do endocárdio. Essa enzima poderia alterar a auto-regulação vascular
coronariana, a ativação leucocitária e a função endotelial,
com implicações na disfunção miocárdica.
Outras substâncias recentemente apontadas como mediadoras da depressão miocárdica na sepse são as caspases,
que são proteases intracelulares da cisteína que participam
da ativação de citocinas inflamatórias e da apoptose celular. Algumas isoformas das caspases são conhecidas como a
m-calpaína e a µ-calpaína. Ativação excessiva das calpaínas
tem sido implicada na fisiopatologia da inflamação, trauma
e isquemia/reperfusão55. Tissier e col.56 demonstraram que
o tratamento com inibidores da calpaína melhorou a disfunção miocárdica e a inflamação induzida pela endotoxina
em ratos.
Uma outra molécula ultimamente discutida como possivelmente relacionada à depressão cardíaca da sepse é a esfingosina57. A produção celular da esfingosina poderia inibir
a liberação sarcoplasmática de cálcio e reduzir o cálcio do
miócito, resultando em disfunção contrátil58.
Charpentier e col.26, ilustraram o provável papel do peptídeo natriurético cerebral (BNP) como marcador de disfunção sistólica da sepse, representando este um fator de
mau prognóstico nesses pacientes. Knuefermann e col.59 têm
defendido o papel dos receptores Toll-like na mediação inflamatória da sepse com possível efeito no colapso cardiovascular da sepse.
d. Distúrbios no Metabolismo do Cálcio como Base Celular
da Depressão Miocárdica
As bases celulares da depressão contrátil têm sido estudadas e o papel de alterações no metabolismo do cálcio torna-se
evidente5,46,60. Uma redução na resposta dos miofilamentos ao
cálcio pode constituir-se na base celular da dilatação ventricular
aguda observada no choque séptico, provavelmente decorrente da fosforilação indesejada das proteínas contráteis60. As vias
do AMP e GMP cíclico seriam responsáveis pela fosforilação
protéica, sendo proposto que alterações na troponina I seriam
Figura 2 - Mecanismos da Disfunção Miocárdica da Sepse.
Uma vez ocorrido o estímulo infeccioso, a resposta inflamatória subseqüente
caracteriza-se por fenômenos complexos envolvendo ativação dos linfócitos B
(B), monócitos/macrófagos (Mo), polimorfonucleares (PMN) e linfócitos T, que
no contexto do complexo de histocompatibilidade (CPH) reconhecem as células apresentadoras de antígenos (Apc) culminando com a produção de citocinas
inflamatórias, endotelina, radicais livres de oxigênio (RLO) e ativação da óxido
nítrico sintase (iNOS). O resultado dessa ativação Inflamatória é disfunção contrátil e disfunção ventricular.
189
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
determinantes da disfunção contrátil da sepse5. Alguns estudos
demonstram redução dos canais de cálcio tipo L, e que essa redução é paralela à redução da contratilidade.
A confirmação da possibilidade do envolvimento de distúrbios do metabolismo do cálcio na depressão miocárdica da sepse levanta a possibilidade que drogas sensibilizantes do cálcio
devem ter aplicação clínica nos portadores de choque séptico.
TRATAMENTO DA DEPRESSÃO
MIOCÁRDICA RELACIONADA À SEPSE
A reanimação volêmica adequada associada à antibioticoterapia precoce é o cerne do tratamento do choque séptico. O
objetivo principal da terapia volêmica nos pacientes sépticos é
restaurar a perfusão tissular através da otimização das pressões
de perfusão e do débito cardíaco. O choque séptico é acompanhado de hipovolemia absoluta e aumento da capacitância
venosa. Essas alterações volêmicas participam da disfunção
cardíaca da sepse, o que é confirmado pelo fato da reposição
volêmica aumentar o índice cardíaco em 25% a 40%.
Atualmente, a tendência de início precoce dos vasopressores tem sido observada e ainda são necessários fatores preditores da resposta dos pacientes aos fluidos. Estudos recentes
mostram que em pacientes sépticos em ventilação mecânica,
a análise das alterações respiratórias na pressão arterial ou na
área final diastólica medida por ecocardiografia transesofágica
são métodos eficientes para prever a resposta do débito cardíaco à reposição volêmica.
A reanimação volêmica em muitos casos isoladamente não
consegue restaurar a perfusão e faz-se necessário o uso de vasopressores, como a dopamina e a noradrenalina, esta última
mais atualmente utilizada por incorrer em menos efeitos deletérios no débito cardíaco e na função orgânica.
O tratamento específico da disfunção miocárdica na sepse ainda não está estabelecido. Deve-se ter em mente que a
depressão miocárdica é freqüente, porém na maior parte dos
casos, esta não limita o aumento do débito em resposta a volume. Dessa forma, parece que apenas uma minoria de pacientes
deve se beneficiar do tratamento com inotrópicos. Agentes inotrópicos, preferencialmente a dobutamina, devem ser administrados se detectado índice cardíaco reduzido apesar de reposição volêmica adequada. Pacientes com índice cardíaco normal
ou aumentado provavelmente não necessitam de inotrópicos.
Embora alguns autores defendam o aumento da oferta tissular
de oxigênio via um incremento no índice cardíaco com o uso
de inotrópicos, não foi mostrado que essa estratégia reduz a
mortalidade dos pacientes sépticos.
A hemofiltração tem sido uma ferramenta útil em alguns
casos de choque séptico com o objetivo de remover mediadores
deletérios circulantes. Essa terapia, em alguns estudos, mostrou-se ter impacto na performance cardíaca, com demonstrações de aumento de mais de 50% do débito cardíaco e melhora
da pressão arterial em portadores de choque séptico5. Entretanto, estudos definitivos ainda são necessários, uma vez que
são poucos e conflitantes os resultados disponíveis.
CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS
Nos últimos 50 anos muito tem sido o progresso relacionado ao maior entendimento da patogênese e hemodinâmica
190
da sepse e do choque séptico. A importância dos mecanismos
inflamatórios e da resposta imunológica na sepse torna-se gradativamente crescente, acoplada à maior compreensão da disfunção orgânica nessa afecção.
Nesse contexto, a disfunção miocárdica da sepse tem sido
caracterizada com seus mecanismos cada vez mais elucidados,
com os objetivos de se obter maior conhecimento sobre o colapso cardiovascular do choque séptico e propor estratégias
terapêuticas que reduzam sua mortalidade. A depressão miocárdica parece desempenhar um papel claro no choque séptico
humano – caracteriza-se por dilatação biventricular reversível,
disfunção contrátil, redução de funções sistólica e diastólica,
e por redução das respostas à reanimação volêmica e a vasopressores, na presença de uma circulação hiperdinâmica. Este
fenômeno é de natureza complexa, regido por diversos mediadores dos quais destacam-se as citocinas inflamatórias e o óxido nítrico.
A visão atual sobre a depressão miocárdica da sepse alicerça-se na teoria de substâncias depressoras circulatórias que
levariam à redução da função contrátil e à agressão miocárdica, o que é corroborado pela liberação de marcadores de necrose como a troponina. A aplicação clínica desses achados
impulsiona o estudo do emprego de antagonistas de citocinas,
inibidores do óxido nítrico e outros no tratamento do choque
séptico, ainda sem impacto clínico. Alguns autores têm sugerido que a detecção de troponina ou de níveis aumentados de
peptídeo natriurético cerebral serviria para se diagnosticar a
depressão miocárdica da sepse, mesmo sem repercussão cardíaca e seria o bastante para indicar o uso de terapia inotrópica.
A elucidação dos mecanismos de depressão miocárdica da
sepse abre fronteiras para a maior compreensão da fisiopatologia da sepse e maior esclarecimento sobre os mecanismos
celulares da disfunção orgânica dessa entidade. À luz dos conhecimentos atuais, a disfunção cardiovascular da sepse ainda
representa um fenômeno complexo pouco compreendido, cujo
estudo deve resultar em estratégias atraentes e opções terapêuticas eficazes no manejo da sepse.
RESUMO
JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: A disfunção miocárdica da sepse é uma das manifestações da disfunção orgânica
da sepse, presente em aproximadamente 40% dos pacientes e
responsável pelo aumento significativo da mortalidade. O objetivo deste estudo foi revisar a disfunção miocárdica da sepse,
no que se refere aos seus aspectos fisiopatológicos e implicações clínicas.
CONTEÚDO: Embora sua patogênese e conseqüências
clínicas não estejam totalmente elucidadas, a depressão miocárdica parece desempenhar um papel claro no choque séptico humano. Esta caracteriza-se por dilatação biventricular
reversível, disfunção contrátil, redução de funções sistólica e
diastólica, e por redução das resposta à reanimação volêmica
e a vasopressores, na presença de circulação hiperdinâmica.
Este fenômeno é de natureza complexa, regido por diversos
mediadores dos quais destacam-se as citocinas inflamatórias
e o óxido nítrico.
CONCLUSÕES: Atualmente a abordagem da disfunção
miocárdica tem como metas o restabelecimento da perfusão
tissular e a otimização da oferta de oxigênio através de reaniRBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
mação volêmica e utilização de inotrópicos e vasopressores. A
elucidação dos mecanismos de depressão miocárdica da sepse
abre fronteiras para a maior compreensão da fisiopatologia
da sepse e esclarecimento sobre os mecanismos celulares da
disfunção orgânica dessa entidade, devendo resultar em estratégias e opções terapêuticas eficazes visando reduzir a morbimortalidade do paciente crítico.
Unitermos: disfunção miocárdica, depressão miocárdica,
insuficiência cardíaca na sepse
REFERÊNCIAS
01. Bone RC, Balk RA, Cerra FB et al - Definitions for sepsis and organ failure and
guidelines for the use of innovative therapies in sepsis. Chest, 1992;101:16441655.
02. Krishnagopalan S, Kumar A, Parrillo JE et al - Myocardial dysfunction in the
patient with sepsis. Curr Opin Crit Care, 2002;8:376-388.
03. Dhainaut JF, Cariou A, Laurent I - Myocardial dysfunction in sepsis. Sepsis,
2000;4:89-97.
04. Hotchkiss RS, Karl IE - The pathophysiology and treatment of sepsis. N Eng J
Med, 2003;348: 138-150.
05. Piper R - Myocardial dysfunction in sepsis. Clin Exp Pharmacol Physiol,
1998;25:951-954.
06. Wiggers CJ - Myocardial depression in shock. A survey of cardiodynamic studies.
Am Heart J, 1947;33:633-650.
07. Brand ED, Lefer AM - Myocardial depressant factor in plasma from cats in irreversible post-oligemic shock. Proc Soc Exp Biol Med, 1966;122:200-203.
08. Clowes GH, Vucinic M, Weidner MG - Circulatory and metabolic alterations
associated with survival or death in peritonitis: clinical analysis of 25 cases. Ann
Surg, 1966;163:866-885.
09. Kumar A, Haery C, Parrillo JE - Myocardial dysfunction in septic shock: Part
I. Clinical manifestation of cardiovascular dysfunction. J Cardiothorac Vasc
Anesth, 2001;15:364-376.
10. Hinshaw LB - Myocardial function in endotoxin shock. Circ Shock, 1979;1(Suppl):43-51.
11. Lefer AM, Martin J - Origin of myocardial depressant factor in shock. Am J
Physiol, 1970;218:1423-1427.
12. Weil MH, Shubin H, Biddle M - Shock caused by gram-negative microorganisms.
Analysis of 169 cases. Ann Intern Med, 1964;60:384-400.
13. Packman MI, Rackow EC - Optimum left heart filling pressure during fluid
resuscitation of patients with hypovolemic and septic shock. Crit Care Med,
1983;11:165-169.
14. Weisel RD, Vito L, Dennis RC et al - Myocardial depression during sepsis. Am J
Surg, 1977;133:512-521.
15. Ahmed AJ, Kruse JA, Haupt MT et al - Hemodynamic responses to gram-positive versus gram-negative sepsis in critically ill patients with and without circulatory shock. Crit Care Med, 1991;19:1520-1525.
16. Parker MM, Shelhamer JH, Natanson C et al - Serial cardiovascular variables in
survivors and nonsurvivors of human septic shock: heart rate as an early predictor of prognosis. Crit Care Med, 1987;15:923-929.
17. Shoemaker WC - Cardiorespiratory patterns in complicated and uncomplicated
septic shock: physiologic alterations and their therapeutic implications. Ann
Surg, 1971;174:119-125.
18. Wilson RF, Thal AP, Kindling PH et al - Hemodynamic measurements in septic
shock. Arch Surg, 1965;91:121-129. http://gateway2.ovid.com/ - 20
19. Mebazaa A, Tavernier B, Callebert J - Heart dysfunction in human septic shock.
Clin Pulm Med, 2002;9:206-212.
20. Parker MM, Shelhamer JH, Bacharach SL et al - Profound but reversible myocardial depression in patients with septic shock. Ann Intern Med, 1984;100:483-490.
21. Poelaert J, Declerck C, Vogelaers D et al - Left ventricular systolic and diastolic
function in septic shock. Intensive Care Med, 1997;23:553-560.
22. Fernandes CJ Jr, Akamine N, Knobel E - Cardiac troponin: a new serum marker
of myocardial injury in sepsis. Intensive Care Med, 1999;25:1165-1168.
23. Dhainaut JF, Brunet F, Monsallier JF et al - Bedside evaluation of right ventricular performance using a rapid computerized thermodilution method. Crit Care
Med, 1987;15:148-152.
24. Chidiac TA, Salon JE - Left ventricular segmental wall motion abnormality in
septic shock. Crit Care Med, 1995;23:594-598.
25. Turner A, Tsamitros M, Bellomo R - Myocardial cell injury in septic shock. Crit
Care Med, 1999;27:1775-1780.
26. Charpentier J, Luyt CE, Fulla Y et al - Brain natriuretic peptide: a marker of
myocardial dysfunction and prognosis during severe sepsis. Crit Care Med,
2004;32:660-665.
27. Rackow EC, Kaufman BS, Falk JL et al - Hemodynamic response to fluid repletion in patients with septic shock: evidence for early depression of cardiac performance. Circ Shock, 1987;22:11-22.
28. Fernandes Junior CJ, Iervolino M, Neves RA et al - Interstitial myocarditis in
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
sepsis. Am J Cardiol, 1994;74:958.
29. Ellrodt AG, Riedinger MS, Kimchi A et al - Left ventricular performance in septic
shock: reversible segmental and global abnormalities. Am Heart J, 1985;110:402-409.
30. Jafri SM, Lavine S, Field BE et al - Left ventricular diastolic function in sepsis.
Crit Care Med, 1990;18:709-714.
31. Munt B, Jue J, Gin K et al - Diastolic filling in human severe sepsis: an echocardiographic study. Crit Care Med, 1998;26:1829-1833.
32. Dhainaut JF, Lanore JJ, de Gournay JM et al - Right ventricular dysfunction in
patients with septic shock. Intensive Care Med, 1988;14:(Suppl2):488-491.
33. Sibbald WJ, Paterson NA, Holliday RL et al - Pulmonary hypertension in sepsis:
measurement by the pulmonary artery diastolic-pulmonary wedge pressure gradient and the influence of passive and active factors. Chest, 1978;73:583-591.
34. Raper RF, Sibbald WJ, Driedger AA et al - Relative myocardial depression in
normotensive sepsis. J Crit Care, 1989;4:9-18.
35. Hoffman MJ, Greenfield LJ, Sugerman HJ et al - Unsuspected right ventricular
dysfunction in shock and sepsis. Ann Surg, 1983;198:307-319.
36. Kimchi A, Ellrodt AG, Berman DS et al - Right ventricular performance in septic
shock: a combined radionuclide and hemodynamic study. J Am Coll Cardiol,
1984;4:945-951.
37. Parker MM, McCarthy KE, Ognibene FP et al - Right ventricular dysfunction
and dilatation, similar to left ventricular changes, characterize the cardiac depression of septic shock in humans. Chest, 1990;97:126-131.
38. Cunnion RE, Schaer GL, Parker MM et al - The coronary circulation in human
septic shock. Circulation, 1986;73:637-644.
39. Dhainaut JF, Huyghebaert MF, Monsallier JF et al - Coronary hemodynamics
and myocardial metabolism of lactate, free fatty acids, glucose, and ketones in
patients with septic shock. Circulation, 1987;75:533-541.
40. Mehta NJ, Khan IA, Virin G et al - Myocardial injury predicts myocardial dysfunction and poor outcome in sepsis syndrome. Chest, 2002;122:14-15.
41. Kumar A, Krieger A, Symeoneides S et al - Myocardial dysfunction in septic
shock: part II. Role of cytokines and nitric oxide. J Cardiothorac Vasc Anesth,
2001;15:485-511.
42. Monsalve F, Rucabado L, Salvador A et al - Myocardial depression in septic
shock caused by meningococcal infection. Crit Care Med, 1984;12:1021-1023.
43. Pathan N, Sandiford C, Harding SE et al - Characterization of a myocardial depressant substance in meningococcal septicemia. Crit Care Med, 2002;30:2191-2198.
44. Reilly JM, Cunnion RE, Burch-Whitman C et al - A circulating myocardial depressant substance is associated with cardiac dysfunction and peripheral hypoperfusion (lactic acidemia) in patients with septic shock. Chest, 1989;95:10721080.
45. Kumar A, Thota V, Dee L et al - Tumor necrosis factor-alpha and interleukin-1
beta are responsible for depression of in vitro myocardial cell contractility induced by serum from humans with septic shock. J Exp Med, 1996;183:949-958.
46. Ruiz Bailen M - Reversible myocardial dysfunction in critically ill, noncardiac
patients: a review. Crit Care Med, 2002;30:1280-1290.
47. Van der Poll T, Van Deventer JH - Cytokines and anticytokines in the pathogenesis of sepsis. Infect Dis Clin North Am, 1999;13:413-426.
48. Finkel MS, Oddis CV, Jacob TD et al - Negative inotropic effects of cytokines on
the heart mediated by nitric oxide. Science, 1992;257:387-389.
49. Weisensee D, Bereiter-Hahn J, Schoeppe W et al - Effects of cytokines on the contractility of cultured cardiac myocytes. Int J Immunopharmacol, 1993;15:581–587.
50. Vincent JL, Bakker J, Marecaux G et al - Administration of anti-TNF antibody
improves left ventricular function in septic shock patients. Results of a pilot
study. Chest, 1992;101:810-815.
51. Fisher CJ Jr, Slotman GJ, Opal SM et al - Initial evaluation of human recombinant interleukin-1 receptor antagonist in the treatment of sepsis syndrome: a
randomized, open-label, placebo-controlled multicenter trial. Crit Care Med,
1994;22:12-21.
52. Dinarello CA - Proinflammatory and anti-inflammatory cytokines as mediators
in the pathogenesis of septic shock. Chest, 1997;112:(Suppl 6):S321-S329.
53. Belcher E, Mitchell J, Evans T - Myocardial dysfunction in sepsis: no role for NO?
Heart, 2002;87:507-509.
54. Brady AJ, Warren JB, Poole-Wilson PA et al - Nitric oxide attentuates cardiac
myocyte contraction. Am J Physiol, 1993;265:H176-H182.
55. Neviere R, Fauvel H, Chopin C et al - Caspase inhibition prevents cardiac dysfunction and heart apoptosis in a rat model of sepsis. Am J Respir Crit Care
Med, 2000;163:218-225.
56. Tissier S, Lancel S, Marechal X et al - Calpain Inhibitors impreve myocardial dysfunction and inflammation induced by endotoxin iin rats. Shock, 2004;21:352-357.
57. Friedrichs GS, Swillo RE, Jow B et al - Sphingosine modulates myocyte electrophysiology, induces n
egative inotropy, and decreases survival after myocardial ischemia. J Cardiovasc
Pharmacol, 2002;39:18-28.
58. Favory R, Lancel S, Marchetti P et al - Endotoxin-induced myocardial dysfunction:
evidence for a role of sphingosine production. Crit Care Med, 2004;32:495-501.
59. Knuefermann P, Nemoto S, Baumgarten G et al - Cardiac inflammation and
innate immunity in septic shock: is there a role for toll-like receptors ? Chest,
2002;121:1329-1336.
60. Sugishita K, Kinugawa K, Shimizu T et al - Cellular basis for the acute inhibitory
effects of IL-6 and TNF-alpha on excitation-contraction coupling. J Mol Cell
Cardiol, 1999;31:1457-1467.
191
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
O Uso de Isótopos Estáveis no Estudo da
Cinética Protéica em Medicina Intensiva*.
Stable Isotopes Use on Protein Turnover in Intensive Care Medicine.
Anibal Basile Filho1, Júlio Sérgio Marchini2.
SUMMARY
BACKGROUND AND OBJECTIVES: The stable isotopes are required to follow the movement and quantify the metabolic
fates of biologically important molecules in vivo, such as aminoacids witch have been used to estimate protein synthesis,
breakdown and oxydation.
CONTENTS: This article reviews the use of stable isotope in metabolism research. Indeed, the tracer technique has contributed greatly to the existing knowledge on whole-body protein turnover and its regulation, including in the critically ill
patient, victim of trauma or sepsis. For the study of hypermetabolism, stables isotopically labeled substrates satisfy both the
analytical and ethical requirements for tracer use in the critical care setting. Using stable isotopes data to develop models of
biological systems dynamics is an essential element of estimating substrats events that take place in cells or organs otherwise
inaccessible in humans.
CONCLUSIONS: The enhanced availability of stable isotopes and the gas chromatography/mass spectrometry allow spreading world-wide the use of these techniques, including the critically ill patient, especially among us.
Key Words: Stable isotopes, proteins, leucine.
R
udolph Schoenheimer e col.1 utilizaram, há quase
setenta anos, pela primeira vez, o isótopo estável
deutério (água pesada ou 2H2O), na tentativa de
elucidar parte do metabolismo intermediário no tecido adiposo do homem. A partir desse trabalho clássico e pioneiro,
o legado deixado por este autor produziria uma infinidade de
investigações em animais de experimentação e em seres humanos, no sentido de explorar a cinética do metabolismo dos
carboidratos, lipídios e proteínas, numa extensa variedade de
condições clínicas2.
Entre as décadas de 1950 e 1960, no entanto, enquanto
as técnicas de administração de isótopos radioativos estavam muito em voga, na pesquisa ou diagnóstico em Biologia,
Medicina e Cirurgia, os maiores usuários dos isótopos estáveis não radioativos eram os metabologistas. Várias razões
justificaram o emprego de isótopos estáveis em Nutrição e
Metabologia, dentre as quais destacam-se: (a) a dinâmica
da interação dos nutrientes metabolicamente ativos com os
seus locais de reserva foi primeiramente explorada e melhor
compreendida, através do uso de isótopos estáveis; (b) o seu
emprego, sobretudo clínico, era seguro, sendo o isótopo 15N
mais conveniente na exploração do metabolismo nitrogenado orgânico; e (c) a proibição formal do uso de substâncias
radioativas em populações desnutridas, onde se aguardava,
ansiosamente, a exploração detalhada do metabolismo dessas populações, para a melhor compreensão desse estado fisiopatológico e posterior tratamento3.
Apesar das vantagens mencionadas, o emprego do isó-
topo foi restringido em virtude da limitada disponibilidade
desses isótopos estáveis, assim como as dificuldades técnicas
envolvidas em suas análises quantitativas. Porém, nessas três
últimas décadas, essa situação mudou drasticamente. Esses
obstáculos iniciais foram ultrapassados graças ao advento da
análise de compostos estáveis específicos (Compound-Specific Isotope Analysis), através da introdução da cromatografia
gasosa acoplada a um espectrômetro de massa (Gas Cromatography/Mass spectometry - GCMS) com ionização por
impacto dos elétrons (Selective Ion Monitoring - SIM). Este
método de análise foi descrito por Matthews & Hayes4, em
1978, que se valeram desta técnica para a análise quantitativa
dos isótopos de carbono. Desde então, vários isótopos entre
eles os de carbono, os de oxigênio e os de hidrogênio têm sido
empregados no estudo do metabolismo de substâncias de alta
relevância fisiológica, como os ácidos graxos, os carboidratos
e os aminoácidos5.
DEFINIÇÃO DE ISÓTOPOS ESTÁVEIS
Todos os átomos de um elemento têm, por definição, o
mesmo número de prótons em seu núcleo. No entanto, o isótopo estável é um elemento que possui o mesmo número de
prótons e diferente número de nêutrons. Por exemplo, o átomo
de hidrogênio (1H) possui um próton em seu núcleo, enquanto
que o deutério (2H) possui um próton e um nêutron. Devido
ao mesmo número de prótons, eles ocupam a mesma (“iso”)
posição (“topo”) na tabela periódica e possuem diferentes
1. Professor Associado e Chefe da Disciplina de Terapia Intensiva do Departamento de Cirurgia e Anatomia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo
2. Professor Associado e Chefe do Laboratório de Espectrometria de Massa do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina de
Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo
*Recebido da Disciplina de Terapia Intensiva - Departamento de Anatomia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – Universidade de São
Paulo, Ribeirão Preto, SP
Apresentado em 20 de julho de 2004 - Aceito para publicação em 14 de outubro de 2004
Endereço para correspondência: Dr. Aníbal Basile Filho - Av. Bandeirantes, 3900 - 14049-900 Ribeirão Preto, SP - Fone: (16) 602-2439 - E-mail:
[email protected]
192
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
partículas e o campo magnético provoca um desvio dos íons
de acordo com a relação massa/carga (m/z) dos mesmos. Por
exemplo, o íon 13CO2+, pelo fato de ser mais pesado (m/z =
45) do que o 12CO2+ (m/z = 44) atinge o eletrodo negativo em
um local diferente, podendo ser facilmente diferenciado, da
mesma maneira, o pico de leitura para a fenilalanina não isotópica é de m/z 336 e m/z 338 para a [2H2] fenilalanina. De um
modo geral, todos os isotopômeros possuem as mesmas características em relação aos seus elementos correspondentes.
massas, porém apresentam propriedades químicas idênticas.
Certos isótopos, como o 14C, são radioativos e se desintegram
ao longo dos anos, emitindo partículas extremamente deletérias para a estrutura celular. Por outro lado, o 13C não se
desintegra, permanecendo estável por muito tempo. Na prática, o isótopo estável, também designado por “tracer”, é uma
substância biológica marcada capaz de identificar rotas e velocidades de formação de substratos diversos.
A incorporação destes isótopos estáveis em moléculas de
interesse biológico permite sua utilização, pelo fato de serem
inócuos6, em experimentos em seres humanos de qualquer
idade, raça ou sexo, em estudos de fisiologia7-9 ou mesmo
em situações clínicas complexas, como no caso do hipermetabolismo conseqüente ao trama, sepse e queimaduras
graves(10,11,12,13,14). Contudo, a sua utilização depende da sua
proporção, que deve ser inferior a 10%, em relação ao isótopo mais abundante na natureza. Em outras palavras, o 13C
apresenta-se na proporção de 1,11% em relação ao 12C, largamente mais abundante, na proporção de 98,89%. O organismo humano não somente absorve diferentes isótopos dos
diversos elementos, após a sua administração em ensaios experimentais ou clínicos, como também é constantemente exposto a esses isótopos estáveis, em virtude de sua ocorrência
natural em alimentos, na terra, na água e no ar. A abundância
dos isótopos estáveis, presentes na natureza e mais utilizados
em estudos, pode ser visualizada na tabela 1.
A administração por via venosa em dose única (bolus)
de NaH13CO3, em conjunção com um aminoácido marcado,
é de particular relevância nos estudos isotópicos que envolvem o metabolismo do aminoácido estudado, em virtude da
interligação entre o pool do bicarbonato e a oxidação desse
aminoácido. Além disso, essa administração intravenosa em
dose única faz com que a concentração de 13CO2 atinja um
platô (steady-state) em duas horas, facilitando a sua detecção
(dosagem), a partir dos valores basais e incorporação de seus
valores nos cálculos de produção total de CO2 e na taxa de
oxidação do determinado aminoácido (Figura 1).
Tabela 1 – Abundância (em %) dos Isótopos Estáveis mais
Utilizados em Estudos Clínicos, Presentes na Natureza.
Figura 1 – Efeito da Dose Inicial (prime) de NaH13CO3
sobre o Enriquecimento Plasmático de 13CO2 [E].
Elemento
Símbolo
Massa
Abundância
Natural (%)
Hidrogênio
H
D ou 2H
1,007825
2,014102
99,9
0,01
C
C
12,00000
13,003354
98,89
1,11
N
N
14,003074
15,000108
99,635
0,365
O
O
18
O
15,994915
16,999133
17,999180
99,759
0,037
0,204
Carbono
Nitrogênio
12
13
14
15
16
Oxigênio
17
A IMPORTÂNCIA DA DETERMINAÇÃO
DA FRAÇÃO DE RECUPERAÇÃO DO 13C
BICARBONATO NO AR EXPIRADO NA
CINÉTICA DO METABOLISMO AMINOACÍDICO.
EMPREGO DO ESPECTRÔMETRO DE MASSA POR
DETERMINAÇÃO DA RAZÃO ISOTÓPICA (IRMS).
O espectrômetro de massa é conhecido pelo fato de se
obter medidas precisas em concentração isotópica muito
baixa. Assim, por exemplo, quantidades de 0,001 MPE (mol
por cento em excesso ou mol acima da abundância natural)
podem ser determinadas em amostras gasosas, cujas concentrações de CO2 e N2 varia entre micromoles e nanomoles(3,5).
A amostra de gás a ser analisada é introduzida a baixa pressão (10-8 mbar), dentro da primeira parte do aparelho, conhecida como câmara de ionização), onde as moléculas do
gás são bombardeadas por um feixe de elétrons emitidos por
um filamento aquecido, produzindo íons gasosos positivos.
Em seguida, os íons formados são submetidos a um filtro de
massa. Neste filtro, os íons positivos são acelerados pela presença, na extremidade distal, de um cátodo, sendo também
aplicado um campo eletromagnético perpendicular à trajetória dos íons. O resultado da interação entre a aceleração das
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
No entanto, uma fração variável de 52 a 95%15 e de
89,9±2,6%16 do 13C bicarbonato administrado em indivíduos
saudáveis ou pacientes críticos, respectivamente, é recuperado como 13CO2 no ar expirado. Contudo, o restante é retido
pelo organismo, por várias razões, justificando, assim um estudo prévio dessa fração de recuperação de 13CO2 no ar expirado, através da infusão intravenosa contínua de NaH13CO3.
Dentre essas razões, destacam-se: o dióxido de carbono isotópico (13CO2) pode ser incorporado na síntese de uréia, sendo eliminado pela urina ou retido no organismo por tempo
indeterminado17. As perdas urinárias de 13CO2, incorporado
na uréia, são estimadas em 3 a 4% do total do fluxo de bicarbonato; o 13CO2 pode, também, ser utilizado em etapas
intermediárias do metabolismo do oxaloacetato ou malato18;
o 13CO2 pode fazer parte de troca do sistema do bicarbonato
ósseo, contribuindo para o aumento da sua concentração no
193
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
‘pool’ ósseo, com conseqüente diminuição de seu fluxo plasmático. Na verdade, o tempo de infusão de bicarbonato parece influenciar o grau de recuperação do 13CO2 no ar expirado,
pois em infusões de longa duração (12 a 36 horas) existe uma
tendência de equilíbrio isotópico do 13CO2 e de todos os pools orgânicos; - a diferença na taxa metabólica dos diversos
grupos de indivíduos estudados, em condições experimentais
dissimilares. Wolfe19, em 1984, demonstrou que o exercício físico de média intensidade e prolongado aumenta a fração do
bicarbonato de 78 a 98%; e, finalmente, o padrão de recuperação do 13CO2 no ar expirado pode ser variável por alterações
interindividuais ou em situações orgânicas especiais como a
obesidade.
Apesar dos estudos em pacientes em estado crítico (trauma e/ou sepse) serem escassos, alguns relatos apontam para o
fato de que a recuperação do 13CO2 no ar expirado varia com
a gravidade do quadro clínico e com o estado nutricional prévio dos pacientes. Assim, foram observadas amplas variações
no padrão de recuperação do dióxido de carbono isotópico,
nesses pacientes, da ordem de 78%16 a 100%11. Nesse particular, Martins e col.20 estudaram 10 pacientes sépticos sob ventilação mecânica. vítimas de choque séptico em ventilação
mecânica a partir da infusão endovenosa contínua com 3,8
µmol.kg-1.h-1 de NaH13CO3, durante 6 horas. Os pacientes
apresentaram um valor médio de produção de CO2 (VCO2)
de 182 ± 52 mL.min-1 durante a fase de equilíbrio. A fração
média de recuperação do 13CO2 no ar expirado foi de 0,68 ±
0,06.
Finalmente, a importância de estimar-se, com precisão, a
fração de recuperação do 13CO2 no ar expirado, num determinado grupo de pacientes, submetidos a um modelo experimental sobre a cinética protéica corpórea global utilizando a
13
C-leucina como marcador, está ligada ao fato desta fração
de recuperação ser utilizada como fator de correção no cálculo da taxa de oxidação desse aminoácido.
Várias críticas surgiram após o emprego deste marcador
protéico, onde as maiores dificuldades de utilização deste
método repousam no fato de assumir-se a sua distribuição
eqüitativa em todos os compartimentos, como se o organismo fosse um único compartimento (teoria do “single pool”).
Na verdade a glicina não tem distribuição uniforme no plasma e nem possui fluxo celular similar, como por exemplo, nas
hemácias26. Além disso, ao utilizar-se a 15N-glicina, as condições metodológicas devem ser absolutamente pré-definidas e
invariáveis, com grupos controle adequados e critérios experimentais rigorosos, sob pena de se verificar resultados diferentes daqueles obtidos com outros marcadores do metabolismo
protéico27.
Em virtude da inconstância nos resultados observados
com o emprego da 15N-glicina e com o advento das técnicas
de GCMS, mais precisas, que permitiram determinar o enriquecimento de produtos intermediários do metabolismo, em
concentrações de nmoles, a 13C-leucina e o seu metabólito,
o 13C-αcetoisocaproato (13C-KIC), começaram a serem mais
empregados, como marcadores biológicos da cinética do metabolismo protéico corpóreo total, possibilitando cálculos
mais acurados da síntese e da degradação protéica em todas
as situações clínicas, mesmo nos pacientes em estado crítico
(Figura 2).
Figura 2 – Etapas Metabólicas da Oxidação da Leucina,
com Transaminação e Formação de αcetoisocaproato (KIC) (1),
seguida de Descarboxilação com a Formação de CO2 (2),
que pode ser Recuperado no ar Expirado.
A IMPORTÂNCIA DA DETERMINAÇÃO DA
CINÉTICA PROTÉICA CORPÓREA GLOBAL,
ATRAVÉS DO METABOLISMO DA 13C-LEUCINA.
Vários estudos publicados na literatura médica dos últimos anos destacaram o uso de isótopos estáveis no estudo do
metabolismo protéico, cujas finalidades específicas são a evolução no esclarecimento do metabolismo dos aminoácidos no
homem e o estabelecimento das necessidades básicas diárias
desses nutrientes21-24. O interesse em se conhecer as necessidades básicas diárias dos aminoácidos reveste-se de particular
importância em saúde pública, cujo leque estende-se desde a
elaboração dos protocolos de alimentação em determinados
grupos populacionais, até situações fisiopatológicas complexas como, por exemplo, no trauma e na sepse.
Um dos métodos, utilizando isótopos estáveis, para estimar a cinética total corpórea das proteínas foi a administração de 15N-glicina25. A validação deste método exige a assunção de várias hipóteses, tais como: o pool metabólico de
nitrogênio (N) deve ser único; a glicina penetra igualmente
em todos os compartimentos do organismo onde existe nitrogênio; deve existir proporção constante entre o N da glicina e
o dos outros aminoácidos em todo o organismo e durante o
experimento não deve existir reciclagem do N marcado.
194
O uso da 13C-leucina, como marcador protéico, tem também, embora menores do que a 15N-glicina, suas limitações,
onde algumas hipóteses devem ser aceitas para validar a interpretação dos resultados obtidos, tais como: o isotopômero
(13C-) não é reciclado durante a realização do experimento,
ou seja, a única fonte de substância marcada é proveniente
de sua própria administração exógena; o enriquecimento
plasmático é semelhante ao intracelular. No caso da leucina,
o seu enriquecimento plasmático é sempre maior do que o
celular, razão pela qual, recomenda-se a utilização do seu metabólito transaminado intracelular, o 13C-αcetoisocaproato
(13C-KIC), para fins de cálculos de sua oxidação28. Além disso, o enriquecimento intracelular do 13C-KIC é semelhante à
da 13C-leucina-t-RNA, no tecido muscular, resultando numa
estimativa apropriada da síntese protéica; a fração de recuperação deve ser estimada para o grupo específico de pacientes
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
investigados, em estudos com infusão intravenosa contínua
de NaH13CO3, conforme foi salientado acima; a utilização de
qualquer aminoácido essencial marcado deve fornecer resultados comparáveis. Apesar da leucina ser oxidada, de maneira preferencial, na musculatura esquelética e a fenilalanina
no fígado, ambos permitem o cálculo da cinética protéica
corpórea global, sendo os resultados semelhantes; enfim, o
método que emprega a leucina como aminoácido marcado,
vem sendo utilizado, há mais de 20 anos. Um dos seus pontos
mais fortes repousa no fato de se apoiar em cálculos matemáticos consistentes e ser estocástico, isto é, ser baseado em
compartimentos corpóreos bem definidos e constantes29.
Existem poucos relatos, na literatura, do uso da 13C-leucina no paciente grave12,13 ou submetido a estresse cirúrgico
importante14, para fins de cálculo da cinética protéica corpórea, sendo de crucial importância o conhecimento, em nosso
meio, do perfil de cinética protéica global de pacientes críticos, estratificado em diferentes grupos de gravidade.
O modelo cinético da leucina é similar ao estudo do metabolismo da fenilalanina e da tirosina proposto por Clarke
e Bier, em 198230. Assim, o fluxo plasmático da leucina (Leu)
é calculado de acordo com as normas padrões, baseados nos
princípios utilizados no estudo da hemodiluição dos isótopos estáveis, essencialmente da mesma maneira descrita por
Matthews e col., em 198031, de acordo com a equação:
Q (µmol.kg-1.h-1) = i (Ei/Ep)
onde:
Ql = Fluxo Plasmático da Leucina (µmol.kg-1.h-1)
i = Taxa de Infusão da Leucina Isotópica (µmol.kg-1.h-1)
Ei e Ep = Concentração da 13C-leucina na solução infundida e
no plasma, respectivamente.
A taxa total de produção plasmática de 13CO2, produzida pela oxidação da [13C]leucina e liberada pelo bicarbonato
deve calculada de acordo com as normas preestabelecidas
por El-Khoury e col., em 199432. Essas taxas são corrigidas
para a remoção natural do 13CO2 pelo organismo (FR ou
Fração de Recuperação), tendo sido baseadas em estudos
anteriores de infusão contínua de NaH13CO320,32,33. O valor
horário, da concentração plasmática dos isótopos descritos e
da VCO2 (convertida de mL.min-1 em mmol.kg-1.h-1), obtida
através de medidas de calorimetria indireta, conforme descrito anteriormente, deverão ser utilizadas como o valor para a
base de cálculos. A equação a seguir é utilizada no cálculo da
produção total de 13CO2:
VCO2 x concentração de 13CO2
Produção de CO2 _________________________________________________________
(µmol.kg-1.h-1) =
FR
13
A exemplo dos cálculos efetuados observados em outros
estudos32, é computada a taxa de oxidação da leucina, a partir da relação entre a produção de 13CO2 e a concentração
plasmática do metabólito da leucina isotópica ou [13C]KIC
(α-cetoisocaproato), em equação enunciada a seguir:
Produção de 13CO2 (mmol.kg-1.h-1)
Leu-Ox (µmol.kg-1.h-1) = _____________________________
Concentração Plasmática
de [13C]-KIC (APE/100)*
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
* O valor APE (Átomos por cento em excesso) refere-se
à diferença aritmética entre os valores de [13C]-KIC obtidos
nas amostras de sangue e da média dos valores basais antes
do início da infusão contínua de 13C-leucina.
Durante a infusão intravenosa contínua de 13C-leucina, o
platô de equilíbrio no plasma é atingido em, aproximadamente, duas horas. Este fato implica que cada molécula de leucina
marcada (ou isotópica) é diluída pela leucina natural (“cold
leucine”), passando, em conjunto, a fazer parte do ‘pool’ total orgânico da leucina. Nestas condições, a razão entre a leucina marcada e a não marcada é igual à razão do débito de
infusão da 13C-leucina (i), e à taxa de aparecimento endógeno
da leucina (em µmol.kg-1.h-1), via degradação protéica.
A leucina é um aminoácido essencial proveniente da dieta, no presente caso da nutrição parenteral (Leu-NP) ou da
degradação endógena de proteínas (Leu-PB). Por outro lado,
a leucina é oxidada de maneira irreversível a CO2 (Leu-Ox)
ou incorporada em proteína, via síntese protéica (Leu-PS).
No estado de equilíbrio metabólico, a quantidade (fluxo – Q)
de leucina que entra no plasma (taxa de aparecimento – Ra) é
igual à que sai (taxa de desaparecimento – Rd), sendo representado pelos seguintes cálculos31 (Figura 3):
Figura 3 – Modelo de Utilização da 13C-leucina
para o Estudo da Cinética Protéica Global.
Ra = [Leu-PB] - [Leu-NP] = Leu-PS + Leu-Ox
Leu-PS* = Q - Leu-Ox
Leu-PB* = Q - [Leu-NP + i]
Leu-PT* = [Leu-PS] - [Leu-PB]
* valores expressos em µmol.kg-1.h-1
Em conclusão, essa nova linha de pesquisa, a beira do
leito, tem contribuído muito para o conhecimento da taxa
global de renovação protéica, em diversas situações, inclusive
no paciente em estado crítico, vítima de trauma ou sepse. No
estudo específico do paciente com hipermetabolismo, essas
substâncias satisfazem as condições analíticas e éticas para o
seu emprego, nesse grupo de pacientes. Além disso, o uso de
isótopos estáveis em modelos biológicos dinâmicos tornou-se
numa poderosa ferramenta para analisar etapas metabólicas
que ocorrem nas células, outrora inacessíveis em seres humanos. Por outro lado, com o incremento do uso dessas substâncias e da cromatografia de gás/espectrometria de massa
disseminaram o emprego desta técnica, inclusive em nosso
meio.
195
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
AGRADECIMENTOS
Ao Professor Vernon Roberts Young, PhD (1936-2004)
do Clinical Research Center do Massachusetts Institute of
Technology (MIT), Cambridge-Boston, EUA, onde pudemos ter a honra do convívio e o privilégio de compartilhar
algumas idéias muito construtivas entre 1993 e 1997, na qualidade de Visiting-Scientist.
RESUMO
JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: Os isótopos estáveis
são substâncias biológicas marcadas, que permitem identificar rotas e velocidade da formação de substratos diversos, in
vivo, tais como os aminoácidos que têm sido largamente utilizados para mensurar a oxidação, a síntese e o catabolismo
de proteínas.
CONTEÚDO: Este artigo revisa o emprego do isótopo
estável no estudo do metabolismo. Esta técnica tem contribuído muito para o conhecimento da taxa global de renovação
protéica, em diversas situações, inclusive no paciente em estado crítico, vítima de trauma ou sepse. No estudo específico
do paciente com hipermetabolismo, essas substâncias satisfazem as condições analíticas e éticas para o seu emprego nesse
grupo de pacientes. Além disso, o uso de isótopos estáveis
em modelos biológicos dinâmicos tornou-se numa poderosa
ferramenta para analisar etapas metabólicas que ocorrem nas
células, outrora inacessíveis em seres humanos.
CONCLUSÕES: O incremento do uso dessas substâncias e da cromatografia de gás/espectrometria de massa disseminaram o emprego desta técnica, em nosso meio, inclusive
para o paciente em estado crítico.
Unitermos: Isótopos estáveis, proteínas, leucina.
REFERÊNCIAS
01. Shoenheimer R, Rittenberg D - Deuterium as an indicator in the study of intermediary metabolism III. The role of fat tissues. J Biol Chem, 1935;111:175181.
02. Young VR, Ajami A - Isotopes in nutrition research. The Rudolf Schoenheimer
Centenary Lecture. Proc Nutr Soc, 1999;58:15-32.
03. Bier DM - Stable isotopes in biosciences, their measurements and models for
amino acid metabolism. Eur J Pediatr, 1997;156:(Suppl 1):S2-S8.
04. Matthews DE, Hayes JM - Measurements of stable isotope in nutrition. Anal
Chim, 1978;50:1465-1479.
05. Matthews DE, Bier DM - Stable isotope methods for nutricional investigation.
Annu Rev Nutr, 1983;3:309-339.
06. Koletzko B, Sauerwald T, Demmelmair H - Safety of stable isotope use. Eur J
Pediatr, 1997; 156: (Suppl 1):S12-S17.
07. El-Khoury AE, Fukagawa NK, Sanchez M et al - Validation of the tracer-balance concept with reference to leucine: 24-h intravenous tracer studies with
L-[1-13C]leucine and [15N-15N]urea. Am J Clin Nutr, 1994;59:1000-1011.
08. Basile-Filho A, El-Khoury AE, Beaumier L et al - Continuous 24-h L-[113
C]phenylalanine and L-[3,3-2H2]tyrosine oral-tracer studies at an intermediate phenylalanine intake, to estimate requirements in adults. Am J Clin Nutr,
1997;65:473-488.
09. Basile-Filho A, Beaumier L, El-Khoury AE et al - Twenty-four-hour L-[113
C]tyrosine and L-[3,3-2H2]phenylalanine oral tracer studies at generous, intermediate, and low phenylalanine intakes to estimate aromatic amino acid
196
requirements in adults. Am J Clin Nutr, 1998;67:640-659.
10. Wolfe RR, Jahoor F, Herndon DN et al - Isotopic evaluation of the metabolism of pyruvate and related substrates in normal adult volunteers and severely burned children: effect of dichloroacetate and glucose infusion. Surgery,
1991;110: 54-67.
11. Jeevanandam M, Holaday NJ, Petersen SR - Nutritional influence on the recovery of 14CO2 in critically ill trauma patients. Am J Physiol, 1994; 266:E366E371.
12. Yu YM, Ryan CM, Burke JF et al - Relations among arginine, citrulline, ornithine, and leucine kinetics in adult burn patients. Am J Clin Nutr, 1995;62:960968.
13. Yu YM, Young VR, Castillo L - Plasma arginine and leucine kinetics and urea
production rates in burn patients. Metabolism, 1995;44:659-666.
14. Carli F, Halliday D - Modulation of protein metabolism in the surgical patient.
Effect of 48-h continuous epidural block with local anesthetics on leucine kinetics. Reg Anesth, 1996;21:430-435.
15. Hoerr RA, Yu YM, Wagner DA et al - Recovery of 13CO2 in breath from
NaH13CO3 infused by gut and vein: effect of feeding. Am J Physiol, 1989;257:
E426-E438.
16. Tissot S, Delafosse B, Normand S et al - Recovery of [13C] bicarbonate as respiratory 13CO2 in mechanically ventilated patients. Am J Clin Nutr, 1993;57:202206.
17. Elia M, Fuller N, Murgatroyd P - The potential use of labeled bicarbonate
method for estimating energy expenditure in man. Proc Nutr Soc, 1988;47:247258.
18. Irving CS, Wong WW, Shulman RJ et al - 13C bicarbonate kinetics in man: intravs interindividual variations. Am J Physiol, 1983,245:R190-R202.
19. Wolfe RR - Radiosotope and stable Isotope/Mass Spectrometry Methods. In:
Tracers in Metabolic Research. Laboratory and Research. Methods in Biology
and Medicine. New York: Alan R. Liss Inc, 1984;55-59.
20. Martins MA, Battiston MT, Passos NMM et al - 13CO2 recovery fraction in
expired air of septic patients under mechanical ventilation. Crit Care Med,
2004; 31:(Suppl12):A450.
21. Young VR, Bier DM, Pellett PL - A theoretical basis for increasing current
estimates of the amino acid requirements in adult man, with experimental support. Am J Clin Nutr, 1989;50:80-92.
22. Young VR, Marchini JS - Mechanisms and nutritional significance of metabolic
responses to altered intakes of protein and amino acids, with reference to nutritional adaptation in humans. Am J Clin Nutr, 1990;51:270-289.
23. Young VR - Adult amino acids requirements: the case for a major revision in
current recommendations. J Nutr, 1994; 124 (8 Suppl) 1517S-1523S.
24. Young VR, El-Khoury AE - Can amino acid requirements for nutritional maintenance in adult humans be approximated from the amino acid composition of
body mixed proteins? Proc Natl Acad Sci, 1995; 92:300-304.
25. Waterlow JC, Golden MH, Garlick PJ - Protein turnover in man measured with
15N: comparison of end products and dose regimes. Am J Physiol, 1978;235:
E165-E174.
26. Darmaun D, Froguel P, Rongier M et al - Darmaun D - Amino acid exchange
between plasma and erythrocytes in vivo in humans. J Appl Physiol, 1989;
67:2383-2388.
27. Fern EB, Garlick PJ, Waterlow JC - Apparent compartmentation of body nitrogen in one human subject: its consequences in measuring the rate of wholebody protein synthesis with 15N. Clin Sci, 1985;68:271-282.
28. Matthews DE, Schwarz HP, Yang RD et al - Relationship of plasma leucine and
alpha-ketoisocaproate during a L-[1-13C] leucine infusion in man: a method for
measuring human intracellular leucine tracer enrichment. Metabolism, 1982;
31:1105-1112.
29. Cobelli C, Saccomani MP, Tessari P et al - Compartmental model of leucine
kinetics in humans. Am J Physiol, 1991; 261: E539-E550.
30. Clarke JT, Bier DM - The conversion of phenylalanine to tyrosine in man.
Direct measurement by continuous intravenous tracer infusions of L-[Ring2
H5]phenylalanine and [1-13C] tyrosine in the post absorptive state. Metabolism, 1982;31:999-1005.
31. Matthews DE, Motil KJ, Rohrbaugh DK et al - Measurements of leucine metabolism in man from a primed, continuous infusion of L-[1-13C]leucine. Am J
Physiol, 1980; 238: E473-E479.
32. el-Khoury AE, Fukagawa NK, Sanchez M et al - The-24 pattern and rate of
leucine oxidation, with particular reference to tracer estimates of leucine requirements in healthy adults. Am J Clin Nutr, 1994; 59:1012-1020.
33. Kurpad AV, el-Khoury AE, Beaumier L et al - An initial assessment, using
24-h [13C] leucine kinetics, of the lysine requirements of healthy adult Indian
subjects. Am J Clin Nutr, 1998; 66:58-66.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
Insuflação Traqueal de Gás*
Tracheal Gas Insufflation
Andréa Diogo Sala1, José Otávio Costa Auler Júnior2.
SUMMARY
BACKGROUND AND OBJECTIVES: The technique called “tracheal gas insufflation” TGI is defined as a continuous or intermittent insufflation of fresh gas inside the central airways. The objective of this method is the improvement of alveolar ventilation and or reduction of airway pressures. After the introduction of the concept of lung protective strategy in ARDS patients,
in the clinical practice, the data concerning TGI results may represent a useful association during mechanical ventilation in
severe ARDS. Theoretically TGI allows to keep PaCO2 near normal during strategies of volume minute reduction.
CONTENTS: This review of the literature has the purpose to examine the main articles published about TGI in an attempt
to describe its technique, clinical application and to compare different modes related to its efficacy in CO2 reduction and
interference in the volume and pressures of the respiratory system. Concerning TGI technique the data showed better results
when TGI catheter is positioned one, two cm above carina, utilizing maximum gas flows of 6 L/min. The way of TGI application during respiratory cycle: continuous, inspiratory, total expiratory, initial of expiration, final of expiration, has been studied
by several authors in an effort to safely introduce the method in the clinical practice.
CONCLUSIONS: Doubts still remain related to the value of flow to be applied as well as the modality during respiratory
cycle. Finally more studies are necessary to better define the best way to use this technique as a routine practice in ICU
patients.
Key Words: Tracheal Gas Insufflation; Alveolar Ventilation; Gas Exchange; Hypercapnia
A
insuflação traqueal de gás (TGI – do inglês tracheal gas insufflation) consiste na insuflação contínua
ou fásica de gás fresco nas vias aéreas centrais, para
aumentar a eficiência da ventilação alveolar e/ou minimizar a
necessidade de pressões ventilatórias1.
A TGI facilita a eliminação do dióxido de carbono (CO2),
mas também pode ter efeitos indesejáveis no volume corrente
e pressões do sistema respiratório, dependendo do modo de
ventilação e método de administração2, sendo que os estudos
sobre TGI, principalmente com modelos pulmonares, têm o
objetivo de avaliar estas alterações.
Esta revisão de literatura se propõe a reunir os principais
artigos publicados sobre a TGI, para descrever a técnica, suas
aplicações, e comparar os modos de TGI com relação à sua
eficácia na redução do CO2 e alterações de volumes e pressões
no sistema respiratório.
A revisão dos artigos publicados na literatura entre 1966
e 2004 (palavras-chave: tracheal and gas and insufflation) foi
realizada por meio de pesquisa no site da BIREME (www.bireme.br), em Biblioteca Virtual em Saúde, no banco de dados
MEDLINE (Literatura Internacional em Ciências da Saúde
e Biomédica).
Os benefícios da redução no espaço morto anatômico,
para melhorar a ventilação, têm sido notados desde 1966,
quando a traqueostomia foi empregada como tratamento
para pacientes com grave enfisema pulmonar e insuficiência
respiratória3.
A TGI começou a ser estudada em 1969, quando Stresemann e Sattler4 demonstraram em cães normais anestesiados, que a lavagem expiratória do espaço morto proximal
permitiu decrescer o volume minuto sem alteração na PaCO2.
Outro estudo dos mesmos autores5 utilizando TGI, de forma
contínua ou somente na expiração, em dois pacientes com insuficiência respiratória, resultou em decréscimo na ventilação
minuto sem efeito na PaCO2.
Outros trabalhos aplicaram a insuflação traqueal de oxigênio em cães em apnéia tanto com pulmões saudáveis, quanto com lesão por ácido oléico, conseguindo-se manter adequadas trocas gasosas; sugerindo que esta técnica pode ser
útil para ventilação de emergência, mesmo quando o edema
pulmonar ocorre após a reanimação6,7.
A partir das estratégias de ventilação protetora em pacientes com síndrome da angústia respiratória aguda (SARA)8, os
estudos com TGI indicam que a sua associação à ventilação
mecânica pode representar uma nova estratégia, permitindo
decrescer o volume minuto, enquanto mantém a PaCO2 constante9,10.
TGI ASSOCIADA À VENTILAÇÃO MECÂNICA NA SARA
A estratégia ventilatória protetora foi desenvolvida para
diminuir as lesões pulmonares induzidas pela ventilação mecânica convencional em pacientes com SARA. A proposta
dos autores foi a manutenção da pressão positiva no final da
1. Mestre em Ciências pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; Fisioterapeuta da Unidade de Apoio Cirúrgico da Disciplina
de Anestesiologia da FMUSP e da UTI do Hospital Alemão Oswaldo Cruz; Supervisora do Curso de Aprimoramento em Fisioterapia em UTI do
HCFMUSP e do Curso de Especialização em Fisioterapia Hospitalar da USP
2. Professor Titular da Disciplina de Anestesiologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; Diretor da Divisão de Anestesia e
Unidade de Apoio Cirúrgico do Hospital das Clínicas da FMUSP; Diretor do Serviço de Anestesiologia e UTI Cirúrgica do Instituto do Coração
– InCor-HC-FMUSP.
* Trabalho realizado no Laboratório de Biofísica da Disciplina de Anestesiologia da Faculdade de Medicina da USP, São Paulo
Apresentado em 18 de agosto de 2004 - Aceito para publicação em 19 de outubro de 2004
Endereço para correspondência: Prof. Dr. José Otávio Costa Auler Júnior. - Serviço de Anestesia e Terapia Intensiva Cirúrgica, Instituto do Coração, HC-FMUSP. - Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, n° 44 - Cerqueira César - 05403-900 São Paulo, SP - Fone 0xx (11) 3069-5232 - E-mail:
[email protected] e [email protected]
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
197
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
expiração (PEEP) acima do ponto de inflexão inferior da curva pressão-volume, volume corrente inferior a 6 ml/kg, pressão inspiratória menor do que 20 cmH2O acima da PEEP e
hipercapnia permissiva8.
Embora a hipercapnia permissiva seja bem tolerada, existem alguns inconvenientes, como por exemplo na vigência de
hipertensão intracraniana devido à elevação no fluxo sangüíneo encefálico9; nos cardiopatas, pela ação direta do CO2 sobre o coração e pela resposta do sistema nervoso autônomo;
e em pacientes com insuficiência renal, devido à intensa vasoconstrição e diminuição no ritmo de filtração glomerular10.
Belghith e col.11 propuseram a utilização da TGI, para
substituir a remoção extracorpórea de CO2, em pacientes
com SARA, onde a TGI pela remoção do CO2 aumentou a
tolerância da ventilação limitada à pressão.
Outros estudos12-17 associando TGI à técnica de hipercapnia permissiva comprovam sua eficácia na redução da PaCO2
e na manutenção de um pH tolerável, permitindo maior redução no volume minuto.
Levy e col.18 empregaram a TGI em dois pacientes com
SARA e hipertensão intracraniana, obtendo decréscimo na
PaCO2 de 17% e 26%, respectivamente bem como redução na
hipertensão intracraniana e aumento na pressão de perfusão
cerebral calculada.
Existem dois mecanismos principais responsáveis pela redução da PaCO2 durante a aplicação da TGI: o proximal,
no qual o gás fresco introduzido próximo à carina principal,
dilui o CO2 contido no espaço morto anatômico proximal à
extremidade do cateter no final da expiração. O mecanismo
proximal é o responsável pela maior redução do CO2 reduzindo a concentração do CO2 re-inalado na inspiração subseqüente. No mecanismo distal, a turbulência gerada pelo jato
na extremidade do cateter, pode aumentar a mistura gasosa
em regiões distais ao orifício, aumentando ainda mais a eliminação de CO219.
A diferença na PaCO2 entre a TGI aplicada com cateter
direto e reverso, serve para quantificar quanto o mecanismo
distal contribui para a redução do CO2, sendo este valor estimado em 22% a 29% da diminuição total do CO219-21.
também testaram o cateter de TGI localizado abaixo da carina, porém de forma seletiva (em apenas um brônquio-fonte),
o que resultou em redistribuição da ventilação entre os pulmões, com o pulmão ipsilateral sendo relativamente hiperventilado, e o contralateral, relativamente hipoventilado.
Nahum e col.20 ao posicionar o cateter da TGI entre um e
dez cm acima da carina, concluíram, que para a turbulência
jato-induzida contribuir para a eliminação do CO2, a zona de
turbulência necessita estar localizada próxima à carina.
Visto que a eficácia da TGI é maior quando a extremidade
do cateter é situada próximo à carina, a maioria dos estudos
com TGI tem sido realizada com o cateter um cm acima da
carina7,15,17,23,24,30,33,35-38 ou dois cm acima da mesma11,13,18,34,39.
Em relação à configuração do cateter, dois tipos têm sido
mais estudados: o cateter direto (fluxo direcionado à carina)
e o cateter reverso (fluxo direcionado às vias aéreas superiores). Controvérsias ainda existem sobre a eficiência da TGI
relacionada à direção do fluxo, porém o sistema reverso de
aplicação da TGI evita danos potenciais à mucosa causados
pelo jato direto, e elimina o aumento na PEEP causado pelo
fluxo de TGI com cateter direto2.
Nahum e col.19 compararam a TGI aplicada por meio do
cateter direto e do reverso, observando menor PaCO2 e maior
volume pulmonar expiratório final, com o cateter direto.
Dolan e col.40 em trabalho experimental também encontraram maior eficácia na redução da PaCO2 aplicando a TGI
com o cateter direto quando comparado com o reverso, tanto
antes quanto após lesão pulmonar com solução fisiológica.
Outro estudo41, apenas com cães saudáveis, obteve o mesmo
resultado.
Ao contrário, Imanaka e col.42 não obtiveram diferenças
significativas na redução da PaCO2 entre TGI com cateter
direto ou reverso. Entretanto, o cateter com fluxo direto aumentou a PEEP total.
Delgado e col.25 compararam a TGI aplicada por meio de
cateter direto, reverso e bidirecional (fluxos simultâneos em
direção à carina e vias aéreas superiores) associada a válvula
de alivio de pressão. Não observaram diferenças na redução
da PaCO2 entre os tipos de cateter. A PEEP total aumentou
com o cateter fluxo direto, ficou reduzida com o cateter reverso e não se alterou com o cateter bidirecional, em relação à
linha de base.
DIÂMETRO, POSIÇÃO E TIPOS DE CATETERES DE TGI
FLUXOS DE TGI
O diâmetro do cateter não influencia na eficácia da TGI
em decrescer o CO2, bem como não promove alterações significativas no volume corrente e nas variáveis de pressão22.
A partir deste princípio, tem-se preconizado a utilização de
cateteres com diâmetro interno (DI) variando entre 1,1 mm e
3 mm para a aplicação da TGI7,11-15,17,18,22-35. Está bem estabelecida na literatura a posição do cateter de TGI que confere
maior eficácia à técnica. Nahum e col.22, Ravenscraft e col.29 e
Nakos e col.31 observaram a maior redução na PaCO2 quando o cateter foi posicionado 1 cm acima da carina.
Long e col.27 estudaram o posicionamento do cateter de
TGI abaixo da carina (um cateter em cada brônquio fonte),
comparando com o cateter 2 cm acima da carina, havendo
tendência para a redução da PaCO2 ser maior quando o cateter foi posicionado abaixo da carina. Eckmann e Gavriely32
Os fluxos de TGI empregados na maioria dos estudos
atingem no máximo 15 L/min, sendo que fluxos entre 1 e 4 L/
min mostram-se eficientes na redução da PaCO2, sem alterações na pressão de pico inspiratória (PIP) e pressão média das
vias aéreas (Pmva)11. Fluxos de até 20 L/min podem produzir
decréscimos adicionais na PaCO2 de modo fluxo-dependente,
porém determinam elevação importante nas pressões das vias
aéreas27. Quando comparados fluxos de 4 e 6 L/min de TGI
contínuo, conseguiu-se reduções progressivas na PaCO2 e na
relação VD/VT ao se elevar o fluxo para 6 L/min, permanecendo constantes PIP e Pmva13,30.
Aumentando progressivamente o fluxo do cateter até 10
L/min, ocorre redução na PaCO2 de modo fluxo-dependente,
sem alterações na PIP29,34,36; embora o volume pulmonar29,36 e
a auto-PEEP41 tendam a elevar-se com maior fluxo.
MECANISMOS DE AÇÃO DA TGI
198
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
A TGI contínua com fluxos de 4, 8 e 12 L/min, aumentou
o volume corrente, PIP, pressão alveolar (PA) e auto-PEEP de
modo fluxo-dependente43. Os mesmos fluxos de TGI expiratória não alteraram a PIP, quando associados à PCV (ventilação controlada a pressão), mas promoveram elevação na
PIP e PEEP de modo fluxo-dependente quando associados à
VCV (ventilação controlada a volume)44.
Nahum e col.19 avaliaram a TGI contínua a fluxos de 5, 10
e 15 L/min, obtendo redução fluxo-dependente na PaCO2, e
elevações na Pmva, pressão traqueal (Ptr) e volume pulmonar
no final da expiração conforme aumento no fluxo do cateter,
não havendo mudanças na PIP.
Dolan e col.40 também compararam fluxos contínuos de
5, 10 e 15 L/min, encontrando reduções progressivamente
menores na PaCO2 conforme aumento no fluxo da TGI.
A TGI expiratória promoveu reduções progressivas no
volume corrente com fluxos de 2, 5 e 10 L/min, sendo não
significativa com fluxo de 15 L/min, enquanto a PaCO2 se
manteve constante33.
Em outro estudo quando a TGI foi liberada no final da
expiração a fluxos de 2,5, 5, 10 e 15 L/min, ocorreu redução
na PaCO2 de modo fluxo-dependente, com pequena diferença
entre os fluxos, sem alterar a PIP38.
MODOS DE APLICAÇÃO DA TGI
Os modos de aplicação da TGI - contínua, inspiratória,
expiratória total, bem como fluxos liberados no início da expiração, final da expiração - têm sido estudados por vários
autores, para viabilizar sua aplicação clínica.
A eficácia da TGI contínua na redução da PaCO2 e relação VD/VT foi comprovada por estudos clínicos em pacientes
com SARA11,13-15,18, lesão pulmonar aguda30, insuficiência respiratória aguda de diversas etiologias29 e com doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC)31. Também foi comprovada
por estudos experimentais em animais com pulmões saudáveis22,28,32, com lesão pulmonar induzida por ácido oleico37 e
lavagem com solução fisiológica2, com broncoespasmo induzido34 e tórax restritivo com edema pulmonar associado35.
Imanaka e col.43 utilizando a TGI contínua em modelo
pulmonar unicompartimental, observaram que particularmente com tempos inspiratórios prolongados e altos fluxos
de TGI, ocorreu elevação no volume corrente, no pico de
pressão alveolar e de vias aéreas, e na auto-PEEP, sendo estes efeitos mais pronunciados quando a TGI foi associada a
VCV do que a PCV. Na TGI contínua associada a PCV, uma
vez que o fluxo inspiratório do ventilador retorna a zero, o
fluxo da TGI resulta em aumento na pressão no sistema respiratório acima da pressão inspiratória ajustada, principalmente a tempos inspiratórios prolongados e altos fluxos do
cateter41,43.
Quando associada a VCV, aumentos no volume corrente
e nas pressões no sistema, são atribuídas à soma do fluxo da
TGI com o volume liberado pelo ventilador mecânico43. Vários estudos13,37,43,44 preconizam a correção no volume corrente do ventilador mecânico, quando associada a TGI contínua
(TGI volume ajustado), subtraindo o volume gerado pelo cateter da TGI (fluxo da TGI em mL/s multiplicado pelo tempo
inspiratório) do volume programado no ventilador.
Aumentos na auto-PEEP promovidos pela TGI contíVolume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
nua1,2,22,28,36,37 refletem elevação na capacidade residual funcional (CRF)21,22. Nahum e col.28 citam três potenciais razões para
o desenvolvimento da auto-PEEP: momento da troca entre o
fluxo da TGI e o gás dos pulmões; fluxo da TGI que retarda
a expiração; e a presença do cateter aumentando a resistência
expiratória, devido a redução do diâmetro das vias aéreas.
Por outro lado, quando a TGI ocorre seletivamente durante a inspiração, parte do volume corrente inspirado é decorrente do fluxo liberado pelo cateter intratraqueal, ultrapassando o espaço morto proximal36.
Burke e col.36 compararam a efetividade da TGI inspiratória com a TGI contínua, e no terço final da expiração;
observaram que o fluxo no tempo inspiratório promoveu o
menor decréscimo na PaCO2 e na relação VD/VT, melhorando
sua eficácia com fluxos maiores (10 L/min). A eficácia da TGI
expiratória foi comprovada em pacientes com SARA12, em
animais submetidos a lesão pulmonar com ácido oléico24 e
em animais com pulmões saudáveis23.
No estudo de Nahum e col.24, foram examinados os efeitos da TGI expiratória a fluxos de 10 L/min, não observando
alterações no volume corrente, na complacência pulmonar
nem no pico de pressão das vias aéreas, mesmo após lesão
pulmonar. Neste estudo os decréscimos no espaço morto
(VD) e na relação VD/VT resultantes da TGI foram significativamente menores após a lesão pulmonar, mas a mudança
absoluta na PaCO2 foi similar.
Imanaka e col.44 observaram em seu estudo com modelo pulmonar mecânico, que a TGI expiratória associada a
modalidade PCV não aumentou as pressões de pico alveolar
nem de vias aéreas, embora a pressão alveolar no final da
expiração aumentasse; quando associada a modalidade VCV.
Neste trabalho a TGI expiratória elevou todas as pressões das
vias aéreas.
Em pacientes com SARA a TGI expiratória associada à
técnica de hipercapnia permissiva mostrou uma redução de
30% na PaCO2, elevação no pH, aumento de 44% na PaO2 e
redução de 24% no shunt pulmonar. Entretanto, estes potenciais efeitos benéficos foram associados a aumentos na pressão de platô (PPLAT) e Pmva em 26% e 29% respectivamente,
acarretando o potencial risco de barotrauma pulmonar5.
Burke e col.36 consideram que duas condições devem ser
encontradas para maximizar a efetividade da TGI expiratória. Primeiro, a deflação pulmonar deve estar encerrada relativamente precoce no período exalatório, permitindo tempo necessário para o gás fresco ocupar a via aérea proximal
antes do próximo ciclo respiratório. Segundo, o produto do
fluxo do cateter pelo tempo de fluxo expiratório deve resultar em volume suficiente para substituir todo gás exalado no
compartimento proximal à extremidade do cateter com gás
fresco antes do próximo ciclo inspiratório.
Já foi demonstrado previamente que a expiração é o segmento ativo do ciclo respiratório para a TGI, e que o efeito
de lavagem do CO2 deve ocorrer principalmente na fase final
da expiração36,38.
Pelo estudo de Burke e col.36, a TGI liberada no terço final
da expiração foi eficaz na redução da PaCO2. Este trabalho
mostrou que a maior parte do fluxo produziu efeito de lavagem do espaço morto anatômico, e pequena parte do mesmo
participou como fluxo inspiratório, liberado durante o terço
terminal da fase expiratória.
199
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
Carter e col.39 avaliaram a TGI aplicada nos últimos 20%,
40%, 60% e 100% da expiração, observando que a PaCO2 decresceu progressivamente com o aumento da duração da TGI
até 60%, mas não a 100% da expiração.
Ravenscraft e col.38 compararam a TGI liberada no 1,2
s final da expiração com durações maiores (2,4 e 4,8 s), não
encontrando diferença na eficácia da redução da PaCO2 ou
relação VD/VT. Neste estudo o volume inspiratório e pressões
nas vias aéreas permaneceram inalteradas. Compararam
também a TGI liberada no início e no final expiração, demonstrando maior eficácia da TGI no final da expiração na
redução da PaCO2.
Em modelo pulmonar foram avaliados os efeitos da TGI
expiratória (associada a PCV e VCV) e TGI contínua com
volume ajustado, nas pressões e volumes do sistema. Todos
os modos de TGI testados aumentaram a PEEP de modo similar. A TGI expiratória em conjunto com PCV resultou em
mínimas alterações nas pressões de pico alveolar e de vias
aéreas. A TGI contínua com volume ajustado mostrou alterações similares nos volumes e pressões quando comparada
a TGI expiratória com VCV, mas sua utilidade foi limitada
devido à impossibilidade de ajustar os parâmetros do ventilador mecânico com altos fluxos de TGI e tempos inspiratórios
prolongados44.
Pelo estudo de Nahum e col.19, a TGI contínua foi superior à expiratória (terço final da expiração) em termos de trocas gasosas, porém a pressão de pico nas vias aéreas durante
a TGI expiratória foi significativamente menor que a observada durante a TGI contínua. O volume pulmonar no final
da expiração aumentou de forma fluxo-dependente apenas
na TGI contínua.
A TGI liberada ao final dos 60% do tempo expiratório
obteve eficácia na redução da PaCO2. Esta redução não foi
significativamente diferente da TGI expiratória total, porém
limitou a exposição da traquéia ao fluxo da TGI, reduzindo
potencial hiperinsuflação induzida pela TGI39.
Embora sincronização de tempo seja requerida, a TGI
expiratória representa refinamento técnico da sua variante
contínua; mas até que questões com relação à segurança e eficácia sejam resolvidas, e as características operacionais precisamente definidas, o uso clínico de qualquer modo de TGI
deve ser considerado ainda como experimental45.
CONCLUSÃO
Os estudos comparando a eficácia da TGI durante toda a
expiração com a TGI no final da expiração são controversos,
ainda não sendo possível determinar qual a melhor forma de
aplicação da técnica. Dúvidas também persistem em relação
ao valor de fluxo a ser utilizado, não estando bem delimitado
se os ganhos adicionais na redução do CO2 com elevações no
fluxo da TGI compensam os aumentos nos volumes e pressões do sistema respiratório. Da mesma forma, questiona-se
a eficácia da TGI expiratória (principalmente a TGI no final
da expiração) quando há redução no tempo expiratório, e se
há necessidade de utilizar fluxos maiores nesta situação.
Muito embora haja crença na utilidade da TGI é necessária a realização de mais estudos para que possa ser estabelecida a melhor forma de aplicação desta técnica, com o intuito
de sua adoção rotineira nas unidades de terapia intensiva.
200
LISTA DE SIGLAS
Auto-PEEP
CO2
CRF
DPOC
PaCO2
PA
PCV
PEEP
PIP
Pmva
PPLAT
Ptr
SARA
TGI
VCV
VD
VD/VT
pressão positiva no final da expiração intrínseca
dióxido de carbono
capacidade residual funcional
doença pulmonar obstrutiva crônica
pressão parcial de dióxido de carbono no sangue arterial
pressão alveolar
pressure control ventilation (ventilação controlada a pressão)
positive end expiratory pressure (pressão positiva no final da expiração)
pressão inspiratória de pico
pressão média das vias aéreas
pressão de platô
pressão traqueal
Síndrome da Angústia Respiratória Aguda
tracheal gas insufflation (insuflação traqueal
de gás)
volume control ventilation (ventilação controlada a volume)
espaço morto
relação espaço morto/volume corrente
RESUMO
JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: A insuflação traqueal de gás (TGI – do inglês tracheal gas insufflation,
consiste na insuflação contínua ou fásica de gás fresco nas
vias aéreas centrais, para aumentar a eficiência da ventilação alveolar e/ou minimizar o requerimento de pressões
ventilatórias. A partir das estratégias de ventilação protetora em pacientes com síndrome da angústia respiratória
aguda, os estudos com TGI indicam que a sua associação
à ventilação mecânica pode representar uma nova estratégia, permitindo durante o decréscimo do volume minuto,
manter a PaCO2 constante.
CONTEÚDO: Esta revisão de literatura se propõe a
reunir os principais artigos publicados sobre a TGI, para
descrever a técnica, suas aplicações, e comparar os modos
de TGI com relação à sua eficácia na redução do CO2 e
alterações de volumes e pressões no sistema respiratório.
Com relação à técnica da TGI, os estudos demonstram
maior eficácia da TGI quando se posiciona o cateter 1 a 2
cm acima da carina, com fluxos de até 6 L/min. Os modos
de aplicação da TGI - contínua, inspiratória, expiratória
total, início da expiração, final da expiração - têm sido estudados por vários autores, para viabilizar sua aplicação
clínica.
CONCLUSÕES: Dúvidas persistem em relação ao valor de fluxo a ser utilizado e qual o modo de aplicação
é mais eficaz. Há necessidade de se realizar mais estudos
para que possa ser estabelecida a melhor forma de aplicação da TGI, a fim de que esta técnica possa ser adotada
como rotina nas unidades de terapia intensiva.
Unitermos: Insuflação Traqueal de Gás; Ventilação Alveolar; Troca Gasosa; Hipercapnia
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / ARTIGO DE REVISÃO
REFERÊNCIAS
01. Nahum A - Animal and lung model studies of tracheal gas insufflation. Respir
Care, 2001;46:149-157.
02. Kirmse M, Fujino Y, Hromi J et al – Pressure-release tracheal gas insufflation
reduces airway pressures in lung-injured sheep maintaining eucapnia. Am J
Respir Crit Care Med, 1999;160:1462-1467.
03. Bruderman I, Alkalay I, Stein M et al - Tracheostomy for acute respiratory
failure. Dis Chest, 1966;50:393-402.
04. Stresemann E, Sattler FP - Effect of washout of anatomical dead space on
ventilation, pH and blood gas composition in anesthetized dogs. Respiration,
1969;26:116-121.
05. Stresemann E, Votteri A, Sattler FP - Washout of anatomical dead space for
alveolar hypoventilation: preliminary case report. Respiration, 1969;26:424434.
06. Slutsky AS, Watson J, Leith DE et al - Tracheal insufflation of O2 (TRIO) at low
flow rates sustains life for several hours. Anesthesiology, 1985;63:278-286.
07. Mendham JE, Mcgrady EM, Mackenzie CF et al - Efficacy of tracheal insufflation of oxygen during oleic acid-induced pulmonary edema. Ann Emerg Med,
1991;20:1188-1192.
08. Amato MBP, Barbas CSV, Medeiros DM et al - Effect of protective-ventilation
strategy on mortality in the acute respiratory distress syndrome. N Eng J Med,
1988;338:347-354.
09. Hess DR, Kacmarek RM - Essentials of Mechanical Ventilation. New York,
McGraw-Hill. Determining appropriate physiologic goals, 1996;59-62.
10. Carvalho CRR, Barbas CSV, Amato MBP. Métodos para Minimizar a Lesão
Induzida pela Ventilação Pulmonar Mecânica, em: Carvalho WB, Bonassa J,
Carvalho CRR et al - Atualização em Ventilação Pulmonar Mecânica. São
Paulo, Atheneu, 1997;93-140.
11. Belghith M, Fierobe L, Brunet F - Is tracheal gas insufflation an alternative to
extrapulmonary gas exchangers in severe ARDS? Chest, 1995;107:1416-1419.
12. Kalfon P, Rao GS, Gallart L et al - Permissive hypercapnia with and without
expiratory washout in patients with severe acute respiratory distress syndrome.
Anesthesiology, 1997;87:6-17.
13. Kuo PH, Wu HD, Yu CJ et al - Efficacy of tracheal gas insufflation in acute
respiratory distress syndrome with permissive hypercapnia. Am J Respir Crit
Care Med, 1996;154:612-616.
14. Barnett CC, Moore FA, Moore EE et al - Tracheal gas insufflation is a useful
adjunct in permissive hypercapnic management of acute respiratory distress
syndrome. Am J Surg, 1996;172:518-521.
15. Miro AM, Hoffman LA, Tasota FJ et al - Auto-positive end-expiratory pressure
during tracheal gas insufflation: testing a hypothetical model. Crit Care Med,
2000;28:3474-3479.
16. Rossi N, Musch G, Sangalli F et al - Reverse-thrust ventilation in hypercapnic
patients with acute respiratory distress syndrome. Acute physiological effects.
Am J Respir Crit Care Med, 2000;162:363-368.
17. Hoffman LA, Miro AM, Tasota FJ et al - Tracheal gas insufflation. Limits of
efficacy in adults with acute respiratory distress syndrome. Am J Respir Crit
Care Med, 2000;162:387-392.
18. Levy B, Bollaert PE, Nace L et al - Intracranial hypertension and adult respiratory distress syndrome: usefulness of tracheal gas insufflation. J Trauma,
1995;39:799-801.
19. Nahum A, Ravenscraft SA, Nakos G et al - Effect of catheter flow direction
on CO2 removal during tracheal gas insufflation in dogs. J Appl Physiol,
1993;75:1238-1246.
20. Nahum A, Ravenscraft SA, Adams AB et al - Distal effects of tracheal gas
insufflation: changes with catheter position and oleic acid lung injury. J Appl
Physiol, 1996;81:1121-1127.
21. Carter CS, Hotchkiss JR, Adams AB et al - Distal projection of insufflated gas
during tracheal gas insufflation. J Appl Physiol, 2002;92:1843-1850.
22. Nahum A, Ravenscraft SA, Nakos G et al - Tracheal gas insufflation during
pressure-control ventilation. Effect of catheter position, diameter, and flow
rate. Am Rev Respir Dis, 1992;146:1411-1418.
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
23. Dingley J, Findlay GP, Foex BA et al - Tracheal gas insufflation apparatus. Performance of a novel phase-specific device. Anaesthesia, 2001;56:433-440.
24. Nahum A, Shapiro RS, Ravenscraft SA et al - Efficacy of expiratory tracheal
gas insufflation in a canine model of lung injury. Am J Respir Crit Care Med,
1995;152:489-495.
25. Delgado E, Hete B, Hoffman L et al - Effects of continuous, expiratory, reverse,
and bi-directional tracheal gas insufflation in conjunction with a flow relief
valve on delivered tidal volume, total positive end-expiratory pressure, and
carbon dioxide elimination: a bench study. Respir Care, 2001;46:577-585.
26. Bitterman H, Kerem DH, Shabtai Y et al - Respiration maintained by externally applied vibration and tracheal insufflation in the cat. Anesth Analg,
1983;62:33-38.
27. Long SE, Menon AS, Kato H et al - Constant oxygen insufflation (COI) in a
ventilatory failure model. Am Rev Respir Dis, 1988;138:630-635.
28. Nahum A, Burke WC, Ravenscraft SA et al - Lung mechanics and gas exchange
during pressure-control ventilation in dogs. Augmentation of CO2 elimination
by an intratracheal catheter. Am Rev Respir Dis, 1992;146:955-973.
29. Ravenscraft SA, Burke WC, Nahum A et al - Tracheal gas insufflation augments CO2 clearance during mechanical ventilation. Am Rev Respir Dis,
1993;148:345-351.
30. Nakos G, Zakinthinos S, Kotanidou A et al - Tracheal gas insufflation reduces
the tidal volume while PaCO2 is maintained constant. Intensive Care Med,
1994;20:407-413.
31. Nakos G, Lachana A, Prekates A et al - Respiratory effects of tracheal gas
insufflation in spontaneously breathing COPD patients. Intensive Care Med,
1995;21:904-912.
32. Eckmann DM, Gavriely N - Intra-airway CO2 distribution during airway insufflation in ventilatory failure. J Appl Physiol, 1995;78:546-554.
33. Nahum A, Ravenscraft SA, Adams AB et al - Inspiratory tidal volume sparing
effects of tracheal gas insufflation in dogs with oleic acid-induced lung injury.
J Crit Care, 1995;10:115-121.
34. Miro AM, Hoffman LA, Tasota FJ et al - Tracheal gas insufflation improves
ventilatory efficiency during methacholine-induced bronchospasm. J Crit
Care, 1997;12:13-21.
35. Okamoto K, Kishi H, Choi H et al - Combination of tracheal gas insufflation
and airway pressure release ventilation. Chest, 1997;111:1366-1374.
36. Burke WC, Nahum A, Ravenscraft SA et al - Modes of tracheal gas insufflation.
Comparison of continuous and phase-specific gas injection in normal dogs.
Am Rev Respir Dis, 1993;148:562-568.
37. Nahum A, Chandra A, Niknam J et al - Effect of tracheal gas insufflation
on gas exchange in canine oleic acid-induced lung injury. Crit Care Med,
1995;23:348-356.
38. Ravenscraft SA, Shapiro RS, Nahum A et al - Tracheal gas insufflation: catheter
effectiveness determined by expiratory flush volume. Am J Respir Crit Care
Med, 1996;153:1817-1824.
39. Carter C, Adams AB, Stone M et al - Tracheal gas insufflation during late exhalation efficiently reduces PaCO2 in experimental acute lung injury. Intensive
Care Med, 2002;28:504-508.
40. Dolan S, Derdak S, Solomon D et al - Tracheal gas insufflation combined with
high-frequency oscillatory ventilation. Crit Care Med, 1996;24:458-465.
41. Gowski DT, Delgado E, Miro AM et al - Tracheal gas insufflation during pressure-control ventilation: effect of using a pressure relief valve. Crit Care Med,
1997;25:145-152.
42. Imanaka H, Kirmse M, Mang H et al - Expiratory phase tracheal gas insufflation and pressure control in sheep with permissive hypercapnia. Am J Respir
Crit Care Med, 1999;159:49-54.
43. Imanaka H, Kacmarek RM, Ritz R et al - Tracheal gas insufflation-pressure
control versus volume control ventilation. A lung model study. Am J Respir
Crit Care Med, 1996;153:1019-1024.
44. Imanaka H, Kacmarek RM, Riggi V et al - Expiratory phase and volumeadjusted tracheal gas insufflation: a lung model study. Crit Care Med,
1998;26:939-946.
45. Marini JJ - Phasic expiratory tracheal gas insufflation: short but sweet. Crit
Care Med, 1998;26:825-826.
201
RBTI / RELATO DE CASO
Amaurose Cortical Pós-Parto. Relato de Caso*
Postpartum Cortical Blindness. Case Report
Wladmir Faustino Saporito1, Marcelo Eduardo Sproesser1, Fábio José Concilio Fucci1, Adilson Casemiro Pires2.
SUMMARY
BACKGROUND AND OBJECTIVES: Eclampsia and Preeclampsia occur during gestation especially in primigravidas, and are
characterized by arterial hypertension associated with proteinuria and edema. In spite of intense investigation, its pathophisiology has not been well defined. One proposed mechanism is that hypertension causes brain vasoconstriction resulting in
brain ischemia or vasogenic edema. The incidence of visual perturbations in eclampsia/preeclampsia is reported to be 20%25% in the medical literature and that of transient cortical blindness, in this condition, is 1%-3%. Therefore, transient cortical blindness is an uncommon disease, that is however distressing to the medical community, patients and their relatives.
CASE REPORT: Transient cortical blindness in a 23-year old primigravida. After cesarean section the patient’s course was
complicated by mild arterial hypertension requiring treatment with captopril. Six days after delivery, she developed sudden
loss of vision with severe headache and hypertension. Magnetic resonance angiography showed narrowing of the left posterior brain artery and mapping demonstrated a predominance of bilateral slow waves in the temporal parietal regions.
CONCLUSIONS: She was therefore transferred to the intensive care unit and hydration, phenytoin and analgesics were
prescribed. After 36 hours, blindness completely resolved.
Key Words: Cortical blindness, Preeclampsia, Pregnancy complications.
A
eclâmpsia/pré-eclâmpsia surge durante a gestação, principalmente em primigestas, sendo caracterizada clinicamente após a 20° semana, devido
ao início de uma hipertensão induzida pela gravidez associada a proteinúria e edema. Apesar dos intensos estudos sobre esta doença, sua patogênese ainda não esta
muito bem esclarecida. A amaurose cortical temporária é
um exemplo de manifestação clinica atípica, associada ao
quadro de hipertensão durante a gestação. Os autores relatam um caso de cegueira cortical associada à hipertensão
gestacional.
fálica posterior esquerda. No eletroencefalograma com
mapeamento encefálico evidenciou-se a presença de ondas
lentas com predomínio têmporo-parietal bilateral.
Foi encaminhada para a unidade de terapia intensiva
(UTI) e instituída hidratação, infusão de fenitoína em dose
de ataque de 20 mg/kg e manutenção de 4 mg/kg, dexametasona 16 mg/dia e analgesia. Ocorreu melhora progressiva
do quadro clínico, com reversão completa após 36 horas
do início do tratamento.
RELATO DO CASO
A eclâmpsia/pré-eclâmpsia é uma manifestação da
doença hipertensiva específica da gestação (MHEG) que
acomete preferencialmente, primigestas, dentre estas,
aquelas que ocupam os extremos das faixas etárias. Os
estados de eclâmpsia/pré-eclâmpsia seguem sendo, junto
com as infecções e hemorragias uma das principais causas
de mortalidade materna1. As manifestações neurológicas
mais graves ocorrem na eclâmpsia, onde o típico quadro
convulsivo pode evoluir para alterações da consciência e
coma. Além disso, é a causa principal de acidentes cerebrovasculares hemorrágicos e da maior parte das mortes
causadas por hipertensão em gestantes sem conseqüência
de hemorragias intracranianas1.
A incidência de alterações visuais nas mulheres com
pré-eclâmpsia grave são cerca de 20% a 25%2, sendo que
as principais manifestações oftalmológicas descritas são
descolamento de retina, vasoespasmo da artéria retiniana,
trombose da artéria retiniana central e amaurose cortical
reversível3.
A amaurose cortical é uma manifestação passageira
Paciente com 23 anos, primigesta, realizou seu pré-natal sem anormalidades, submetida à cesariana sob anestesia peridural sem intercorrências. Após o parto a paciente apresentou hipertensão arterial sistêmica (HAS), sendo iniciado o uso de captopril. No sexto dia pós-parto,
apresentou quadro de perda súbita da visão associado à
cefaléia intensa e HAS leve (150/100 mmHg), sem outras
alterações. Foi submetida a exames complementares que
apresentaram os seguintes parâmetros: análise bioquímica
de líquor sem alteração, exame de fundo de olho normal
(resposta pupilar, sem descolamento de retina ou qualquer
outra alteração), hemograma normal. uréia, creatinina, sódio, potássio, glicemia e TGO/TGP todos normais e VHS
aumentada (92 mm). Realizado também tomografia computadorizada de crânio (TC) e ressonância nuclear magnética da cabeça (RNM) apresentando-se normais, sendo
evidenciado a angiorressonância de artérias encefálicas,
uma redução do calibre do segmento P1 da artéria ence-
DISCUSSÃO
1. Intensivista do Hospital Nossa Senhora de Lourdes - Especialista pela AMIB/SP
2. Intensivista do Hospital Nossa Senhora de Lourdes - SP
* Recebido do Hospital Nossa Senhora de Lourdes, São Bernardo do Campo, SP
Apresentado em 10 de maio de 2004 - Aceito para publicação em 04 de outubro de 2004.
Endereço para correspondência: Dr. Wladmir Faustino Saporito - Rua Silva Jardim, 470 - São Bernardo do Campo, SP - E-mail: [email protected]
202
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
RBTI / RELATO DE CASO
que pode durar de 4 horas até 8 dias após o parto1,2. No
entanto, Mion e col. relataram que pode durar até o 21°
dia4, sendo que, evolui com completa normalização após
esse período e, portanto possui bom prognóstico. Sua incidência em casos de eclâmpsia/pré-eclâmpsia varia de 1% a
3%2, mas alguns autores relataram incidência de até 15%4,5.
A amaurose cortical é caracterizada por resposta pupilar normal frente ao estímulo luminoso e sem alterações
de fundo de olho1,2. A anóxia encefálica tem sido atribuída
como causa da cegueira cortical temporária, mas a etiologia e o mecanismo de desenvolvimento dessa rara desordem visual não foi muito bem elucidado.
Beal6, Lorincz7 e Stein8 citaram a trombose venosa
encefálica como causa da amaurose cortical, porém seus
casos referiam-se a pacientes com hipotensão pós-parto e
não a casos de eclâmpsia/pré-eclâmpsia.
Estudos mais recentes tem outro ponto de vista inclusive comprovados pelos resultados de ressonância nuclear
magnética. Apollon e col.3 acreditaram que a patofisiologia é baseada no aumento da permeabilidade a líquidos
e proteínas em torno dos tecidos, resultando em edema
vasogênico e hiperperfusão da circulação encefálica posterior. Já outros autores acreditam que essa alteração visual
é uma conseqüência do vasoespasmo cerebrovascular com
lesão isquêmica5 e da maior susceptibilidade dos lobos occipitais à redução de fluxo sangüíneo por estarem localizados em zona de perfusão limite1. Além disso, a inervação
simpática da circulação dos lobos occipitais é deficitária
e, portanto pode causar vasoconstrição seletiva da artéria
encefálica posterior e grave redução do aporte sangüíneo
nessa região1. No caso relatado evidenciou-se vasoespasmo através da angiorressonância de artérias encefálicas e
a presença de ondas lentas com predomínio têmporo-parietal bilateral no mapeamento encefálico, sugerindo uma
crise convulsiva iminente.
Na ausência de qualquer lesão patológica do olho, nervo óptico e trato óptico, a amaurose cortical temporária
deve ser questionada e a hipertensão arterial rapidamente
revertida.
O tratamento da hipertensão arterial impõe-se com
urgência uma vez que a amaurose cortical é considerada
como uma manifestação análoga à crise convulsiva caracterizando, deste modo, uma situação de eclâmpsia. A
maioria dos autores inicia o tratamento com hidralazina
por via venosa na dose de 5 mg não havendo, entretanto,
consenso quanto ao tipo de droga a ser utilizado. Enquanto Verdile e col.9 recomendam o uso de labetalol tanto por
via venosa (na fase aguda) quanto via oral no tratamento
continuado, Hara e col.10 recomendaram a nicardipina por
via venosa na fase aguda na dose de 0,3 µg/kg/min.
O uso de sulfato de magnésio venoso por 24 a 48 horas é
recomendável pela maioria dos autores e diazepam venoso
no momento de eventual crise convulsiva é necessário11.
A prevenção de crises convulsivas subseqüentes é recomendável através do uso de fenitoína não havendo consenso a respeito do tempo de duração deste tratamento11,12.
Por tratar-se de uma síndrome caracterizada por vasoespasmo e edema encefálico o uso de corticosteróide como
a dexametasona, análogos de manitol e bloqueadores de
canais de cálcio estariam indicados10.
Volume 16 - Número 3 - Julho/Setembro 2004
Quanto ao prognostico a maioria dos autores é veemente em citar a reversão do quadro de amaurose em poucos dias sem seqüelas visuais uma vez instituído o controle
da hipertensão arterial sistêmica e da crise convulsiva.
RESUMO
JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: A eclâmpsia/préeclâmpsia surge durante a gestação, principalmente em
primigestas sendo caracterizada por hipertensão arterial
sistêmica (HAS) associada a proteinúria e edema. Apesar
de intensos estudos sua patogênese ainda não está bem definida, podendo resultar de vasoespasmo com lesão isquêmica ou de um edema vasogênico. A incidência de eclâmpsia/pré-eclâmpsia varia de 20% a 25% e da amaurose cortical temporária, nesta condição, de 1% a 3% preocupando
a comunidade médica, os pacientes e os familiares quando
ocorre.
RELATO DO CASO: Amaurose cortical temporária
em paciente primigesta de 23 anos. Após cesariana, cursou com hipertensão arterial sistêmica leve iniciando-se o
uso de captopril e no 6° dia após o parto apresentou quadro de perda súbita da visão associada à cefaléia intensa
e HAS. Submetida a exames complementares apresentou
à angiorressonância uma redução do calibre da artéria
encefálica posterior esquerda e ao mapeamento encefálico com predomínio de ondas lentas em região têmporoparietal bilateral.
CONCLUSÕES: A paciente foi encaminhada para
Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e tratada com hidratação, fenitoína e analgesia, ocorrendo reversão completa
do quadro, após 36 horas do início do tratamento.
Unitermos: Cegueira cortical, Pré-eclâmpsia, Complicações na gravidez.
REFERÊNCIAS
01. Dávila M, Pensado A, Rama P et al - Ceguera cortical como síntoma de presentación de una preeclampsia. Rev Esp Anestesiol Reanim, 1998;45:198200.
02. Ebert AD, Hopp HS, Entezami M et al - Acute onset of blindness during
labor: report of a case of transient cortical blindness in association with
HELLP syndrome. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol, 1999;84:111-113.
03. Apollon KM, Robinson JN, Schwartz RB et al - Cortical blindness in severe preeclampsia: computed tomography, magnetic resonance imaging,
and single-photon-emission computed tomography findings. Obstet Gynecol, 2000;95:1017-1019.
04. Mion G, Olive F, Forel JM - Cécité corticale au cours de la toxémie gravidique. Amaurose transitoire par baisse de pression de perfusion cérébrale. Ann Fr Anesth, Reanin, 1998;17:196-198.
05. Anate M - Transient cortical blindness in gestational hypertension: report
of two cases. East Afr Med J, 1996;73:838-840.
06. Beal MF, Chapman PH – Cortical blindness and homonymous hemianopia
in the postpartum period. JAMA, 1980;244:2085-2087.
07. Chapman K, Karimi R - A case of postpartum eclampsia of late onset
confirmed by autopsy. Am J Obstet Gynecol, 1973;117:858-861.
08. Stein LB, Roberts RI, Marx J et al - Transient cortical blindness following
an acute hypotensive event in the postpartum period. N Y State J Med,
1989;89:682-683.
09. Verdile VP, Verdile LA – Postpartum amaurosis. Ann Emerg Med,
1991;20:311-314.
10. Hara N, Fujii T, Tsutsumi O – Postpartum eclampsia associated with cortical blindness. Int J Gynaecol Obstet, 1994;47:287-288.
11. Mandelkern D, Burger A – Cortical blindness in postpartum preeclampsia
progressing to eclampsia: case report. Mt Sinai J Med, 1992;59:72-74.
12. Slater RM, Wilcox FL, Smith WD et al – Phenytoin infusion in severe preeclampsia. Lancet, 1987;1:1417-1421.
203
RBTI / ERRATA
ERRATA do Suplemento do XI Congresso Brasileiro de Medicina
Intensiva Realizado em Curitiba de 11 a 15 de Junho de 2004
O-100
LETALIDADE EM REVASCULARIZAÇÕES E
ANGIOPLASTIAS CORONÁRIAS NAS DOENÇAS
ISQUÊMICAS DO CORAÇÃO NO ESTADO DO RIO
DE JANEIRO NO PERÍODO DE 1999 A 2002
Gláucia Maria Moraes de Oliveira, Paulo Henrique Godoy, Carlos
Henrique Klein, Nelson Albuquerque de Souza e Silva
Instituição: Universidade Federal do Rio de Janeiro - Escola Nacional de Saúde Pública - Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro
Introdução: Revascularizações (RM) e angioplastias coronárias (AC)
são intervenções não farmacológicas utilizadas no tratamento das doenças isquêmicas do coração (DIC). Objetivo: Estimar a letalidade nos
procedimentos de RM e AC em grupos de DIC, nos hospitais do SIH/
SUS (Sistema de Informações Hospitalares/Sistema Único de Saúde) no
Estado do Rio de Janeiro (ERJ), de 1999 a 2002.
Métodos: Os procedimentos considerados RM e AC provieram do
banco do DATASUS. As taxas foram padronizadas por sexo e idade,
tendo como padrão todos os procedimentos de alta complexidade cardiovascular, realizados no ERJ em 2000. Os grupos de DIC são infarto
agudo do miocárdio (IAM, CID-10 I21 a I23), síndrome coronariana
aguda sem supra de ST (SCAsSST, CID-10 I24) e insuficiência coronariana rônica (ICoC, CID-10 I20 e I25).
Resultados: As letalidades globais por IAM, SCAsSST e ICoC foram de 16,48, 2,85 e 3,14%, respectivamente. As letalidades por RM/
AC foram respectivamente 6,76/6,33% (IAM), 7,33/1,17% (SCAsSST) e
8,24/1,44% (IcoC).
Conclusão: As intervenções RM e AC são benéficas nos IAM, ainda
que as letalidades sejam relativamente elevadas. Na RM ocorreu letalidade desproporcionalmente elevada nas ICoC quando comparada com
aquela ocorrida nos IAM. Na AC o padrão de letalidades nos procedimentos primários e eletivos foi o esperado.
P-079
FATORES DETERMINANTES NA MORTALIDADE NO
TROMBOEMBOLISMO PULMONAR EM IDOSOS
Gláucia Maria Moraes de Oliveira, Paulo Henrique Godoy, Maurício da
Rocha Pantoja, Ronir Raggio Luiz, Hugo Wiedemann, Marcelo Brandão,
Márcio Roberto Moraes Carvalho, Gustavo Novais, Marcos Miranda
Instituição: Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ e UTI
- Prontocor Lagoa - Rio de Janeiro - RJ- Brasil
Introdução: O tromboembolismo pulmonar (TEP) aumenta com a idade.
Objetivo: Analisar fatores determinantes da mortalidade nos pacientes idosos com TEP em UTI.
Método: Coorte prospectiva de 1298 pacientes, idade >65 anos, seguimento de 48 meses. Os pacientes (n=43) com alta probabilidade clínica
realizaram dímero D, eletrocardiograma, gasometria arterial, radiografia
de tórax, ecocardiograma transtorácico e Doppler venoso dos MMII.
Utilizou-se o ecocardiograma transesofágico, a cintigrafia ventilação/
perfusão (alta probabilidade), a angiotomografia ou a angioressonância
para confirmação diagnóstica. A associação com a mortalidade foi pelo
teste exato de Fisher, ANOVA e curva de sobrevida de Kaplan-Meier,
considerando-se 5% nível de significância.
Resultado: A média da idade foi 80±9 anos e APACHE 13±5. Um
seguimento durante 6 meses ocorreu em 95% dos casos. A mortalidade
pelo TEP foi 16%, o restante por choque séptico. Apenas neoplasia se
associou com mortalidade (p=0,013). Essa associação também ocorreu
com PA sistólica <100mmHg (p=0,001) e freqüência respiratória >20
irpm (p=0,019) nas primeiras 24 horas da internação. O Doppler venoso
positivo para TVP (p=0,033) e APACHE II >15 (p=0,002) correlacionaram-se com mortalidade por TEP.
Conclusão: A neoplasia, taquipnéia, hipotensão, APACHE II >15 e
o Doppler venoso positivo nas primeiras 24 horas de internação, associaram-se com maior mortalidade nesta população.
204
P-231
ANTIBIOTICOTERAPIA EMPÍRICA E MORTALIDADE
EM IDOSOS COM CHOQUE SÉPTICO
Gláucia Maria Moraes de Oliveira,Paulo Henrique Godoy, Maurício da
Rocha Pantoja, Ronir Raggio Luiz, Carlos Eduardo Figueiredo, Renata
Rocha Casemiro, João Regalla, Lenir Solha, Paolo Blanco Villela
Instituição: Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ e UTI
- Prontocor Lagoa - Rio de Janeiro - RJ- Brasil
Introdução: Persistem dúvidas na eficácia da antibioticoterapia empírica (ATBE) no choque séptico (CS).
Objetivo: Avaliar o emprego de ATBE na mortalidade dos pacientes
com CS.
Métodos: Coorte prospectiva de 67pac., 32 meses, idade >65a e
tratamento para o CS (ressuscitação volêmica, culturas-24 h, ABTE
largo espectro, suporte ventilatório e hemodinâmico). A ABTE seguiu
provável sítio e natureza (comunitária/nosocomial) da infecção, considerando-se adequada quando um antibiótico estivesse correto. Avaliou-se
comorbidades (MORB), número falências orgânicas (FO) (critérios de
Le Gall) e APACHE II. Empregou-se testes: t Student, qui-quadrado e
Kaplan-Meier (significância=5%).
Resultados: A média da idade foi 80±7a, APACHE II 19±5, tempo
de permanência (TP) 18±9d, CS pulmonar em 70%, urinário 3%, ambos
27%, 10% das hemoculturas positivas e 8% de germes multiresistentes. Os
gram negativos causaram 79% das infecções (Pseudomonas=36%). Das
MORB destacaram-se HAS-40%, cardiopatia isquêmica-31%, AVE-21%
e DPOC-30%. Ocorreram 39 óbitos. ATBE estavam corretas em 87%
e foram modificados em média 72h (piora clínica/resultado do antibiograma). Não houve associação entre idade (p=0,22), ATBE adequada
(p=0,46) e mortalidade, porém APACHE II (p<0,001) e FO (p=0,006)
associaram-se. O TP não correlacionou-se com ATBE (p=0,66).
Conclusão: A ATBE adequada e precoce não se associou com a mortalidade ou com o TP nesta população.
P-374
MODELO SIMPLES PARA PREDIÇÃO DA
MORTALIDADE EM IDOSOS COM CHOQUE
SÉPTICO
Glaucia Maria Moraes de Oliveira,Paulo Henrique Godoy, Maurício da
Rocha Pantoja, Ronir Raggio Luiz, Roberta de Lima Machado, Antonio
Farias Neto, Paolo Blanco Villela, Leonardo J. C. Paula
Instituição: Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ e UTI
- Prontocor Lagoa - Rio de Janeiro - RJ- Brasil
Introdução: Os pacientes idosos com choque séptico têm crescido,
tornando-se importante investigar a existência de fatores prognósticos.
Objetivo: Elaborar um modelo prognóstico simples de mortalidade
em idosos com choque séptico internados em UTI clínica.
Métodos: Coorte prospectiva de 67 pacientes (idade ³ 65 anos), período de 32 meses, tendo monitoração da artéria pulmonar devido ao
choque séptico. Empregou-se como variável dependente o óbito e como
variáveis independentes àquelas com p-valor altamente significativos na
análise univariada: APACHE II, presença de doenças cardiovasculares
prévias (DCV), positividade da troponina I, necessidade de noradrenalina em doses ³0,5mg/Kg/min e número de falências orgânicas pelos critérios de Le Gall. As variáveis foram dicotomizadas e acrescentadas no
modelo, tendo ao final apenas o APACHE II e as DCV. Empregou-se o
pacote estatístico SPSS 10, sendo 5% nível de significância.
Resultados: Àqueles com DCV e APACHE II ³20 tiveram 85% de
probabilidade de óbito e os com DCV e o APACHE II >20, 74%. Aqueles com APACHE II <20 e sem DCV tiveram probabilidade de 5%.
Conclusão: A DCV deveria ser incluída nos modelos para predizer
probabilidade de óbito nos pacientes idosos com choque séptico. Este
modelo simples deverá ser ampliado e aplicado em população semelhante para validação.
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva