Terra da Gente
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Terra da Gente
Um novo jeito de produzir Um levantamento recente do Incra aponta que cerca de 20 mil famílias assen tadas da reforma agrária, ocupantes de aproximadamente 700 mil hectares, promovem algum modelo de atividade agroecológica. Mais do que números, a pesquisa mostra a gradual transição de um modelo de produção tradicion al, baseado na utilização de agrotóxico, para um modelo sustentável, ambientalmente responsável e gerador de renda para essas famílias. O protagon ismo dos assentamentos na consolidação da agricultura ecológica está sintonizado com o Plano Brasil Agroecológico, lançado pelo Governo Federal em outubro de 2013. O objetivo é articular políticas e ações de incentivo ao cultivo de alimentos orgânicos e de base agroecológica no País aliadas à conservação dos recursos naturais. Nos assentamentos, a produção de alimentos agroecológicos tem por base a articulação entre famílias assentadas e o Incra. Por meio de assistência técnica de qualidade, implantação de cursos voltados às práticas agroecológicas e incentivo aos processos simplificados de comercialização, os agricultores da reforma agrária contribuem para o aumento da produção de alimentos livres de agrotóxicos. Um dos programas do Incra que incentivam a promoção da transição dos sistemas convencionais para os agroecológicos é o Terra Sol. Desde sua criação, o programa beneficiou mais de 180 mil famílias assentadas em todas as regiões do País. Nos últimos cinco anos, foram aplicados mais de R$ 15 milhões em projetos nos assentamentos, a maior parte de beneficiamento e comercialização de produtos orgânicos e de base agroecológica. Outra iniciativa acontece na região Nordeste, onde uma parceria entre Incra, Fundação Banco do Brasil e Associação de Orientação às Cooperativas do Nordeste implantou 200 unidades de produção agroecológica em assen tamentos nos estados do Rio Grande do Norte, Ceará, Alagoas e Pernambuco. O Programa de Produção Agroecológica Integrada e Sustentável (Pais) é uma tecnologia social que possibilitou a produção de alimentos saudáveis tanto para consumo das famílias quanto para comercialização nas comunidades onde os assentamentos estão localizados. A consolidação das políticas e das ações de apoio à produção agroecológica também passa pelos bancos das salas de aula. O Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera) atualmente atende 1.582 estudantes assentados ou que atuam em assentamentos. A parceria entre Incra e instituições de ensino superior oferece 35 cursos de especialização em Residên cia Agrária destin ados a 358 assentamen tos em 334 municípios. Vinte e três dos cursos têm foco em agroecologia. O resultado deste esforço conjun to entre Incra, organizações govern amentais e não governamentais e trabalhadores assentados pode ser visto nesta publicação. Iniciativas em assentamentos de Norte a Sul mostram, na prática, uma nova forma de produzir alimentos, com respeito à natureza e ampliação do nível de renda das famílias. { SUMÁRIO } 08 46 O fino do chocolate Boa terra de futuro 22 Alimentos com grife 54 Renovação pela agroecologia Incra/PB incentiva promoção de Feiras da Reforma Agrária O sonho por alimentos mais saudáveis Políticas públicas 30 64 Um grande lote Convergência de ações Agricultura saudável 76 36 Práticas diversificadas garantem segurança alimentar das famílias Agroecologia na sala de aula 82 106 Aliança pela saúde Resistir é orgânico Minifloresta Maravilhosa 88 116 Aprendendo com a natureza 94 Agroecologia a 100% 124 Cada um com sua receita 100 Produção aliada à sustentabilidade Bendito fruto [6 incra.gov.br BAHIA NÚMERO DE ASSENTAMENTOS: 674 FAMÍLIAS ASSENTADAS: 45.932 ÁREA EM HECTARES: 2.009.945.12 TE R R A D A GE N TE [ BAHIA ] O fino do chocolate Assentamento Terra Vista produz chocolate orgânico fino de modo artesanal Reportagem e fotos: Cintia Melo [8 incra.gov.br O assentado Gilvan de Almeida Santos tem participado de feiras, festivais e exposições com o chocolate Artesanal Terra Vista, representando a área de reforma agrá ria. Uma delas foi a Feira das Flores e Chocolates do Sul da Bahia, que ocorreu no primeiro semestre de 2014. Com 56% de cacau orgânico fino, o Chocolate Artesa- comercializado no valor de R$ 15,00, e outro de 30 nal Terra Vista é o primeiro produzido num assenta- gramas, por R$ 5,00. Com os chocolates prontos, eles mento na Bahia e que leva o selo da reforma agrária. são levados por assen tados para feiras, exposições e Desde setembro, as famílias agroecologistas fabricam festivais da região. e embalam o chocolate no próprio assentamento. “O investimento nessa máquina foi de R$ 15 mil”, Antes, as amêndoas do cacau fino eram levadas para informa Ferreira. Segundo o coordenador, os recursos uma fábrica de chocolate, a 100 Km de distância, obtidos com a comercialização dos chocolates arte- para serem processadas e empacotadas. sanais são reinvestidos na produção das embalagens O chocolate resulta do esforço, estudo e dedicação à e no pagamento aos assentados que produzem as agroecologia e à produção de cacau orgânico das 55 fa- amêndoas finas. mílias do assentamento, situado no município de Arataca, no litoral Sul. Desde 2013, a área conquistou o selo do Instituto Biodinâmico (IBD) para orgânicos. De acordo com o coordenador da Cooperativa de Produção Agropecuária Construindo o Sul (Cooprasul), Joelson Ferreira, do Terra Vista, a produção do chocolate está se consolidando com a aquisição da máquina que fabrica chocolate artesanal, em parceria com o Instituto Cabruca, que tem sede em Ilhéus (BA). Filha de assentado, Vanessa Garcez, 12 a nos, revela que adora viver no Terra Vista. “Cultivamos orgânicos para termos um futuro melhor. Não é só para o bem dos que vivem aqui, mas de todo o planeta”. De acordo com Ferreira, a instalação da máquina artesanal está dentro das normas exigidas e o equipamento processa, a cada 36 horas, 17 quilos do produto. O Chocolate Artesanal Terra Vista é embrulhado em dois taman hos de caixin has, um de 90 gramas, terra da gente 9] [ BAHIA ] Visão da chegada ao assentamento Terra Vista. [10 incra.gov.br O Terra Vista é destaque na produção de mudas ar- Desde o ano 2000, cerca de 100 mil mudas de ma- bóreas e frutíferas de matrizes da Mata Atlântica. deiras de lei, como o Jequitibá, Jacarandá, Pau-Brasil Tem capacidade produtiva de 200 mil mudas para e Jatobá foram plan tadas no assentamento. A inicia- reflorestamento, a cada 90 dias, em dois viveiros e tiva visou ao reflorestamento das matas ciliares e uma estufa. dos passivos ambientais existentes desde a época da Ainda se sobressai em educação com ênfase na criação do assentamento, em 1995. agroecologia. São 990 alunos matriculados em duas Dos 913 hectares do Terra Vista, 35% da área é de escolas no assentamento, além de uma especializa- Reserva Legal, onde estão identificadas 400 matrizes ção por meio do Programa Nacional de Educação na arbóreas e frutíferas fornecedoras de sementes para Reforma Agrária (Pronera). a produção das mudas. Cacau fino produzindo ao menos 200 arrobas por lote de nove O objetivo das pesquisas desenvolvidas no assen- hectares, em três anos”, acrescenta. Cada arroba tamento é melhorar a produtividade do cacau fino. possui 15 quilos. Trata-se de uma iniciativa em parceria com a Univer- Por meio das pesquisas, o Terra Vista, em sua área sidade Estadual de Santa Cruz (Uesc), Instituto Fede- experimental, já ultrapassou a produtividade de 13 ral Baiano (IF Baian o), Instituto Cabruca, situados em arrobas por hectare para 83 arrobas do chamado ca- Ilhéus, e o Centro Estadual de E ducação Profissional cau orgânico fin o. do Campo Milton Santos (Ceepc), que fica no próprio O técnico em agroecologia e pesquisador da Fundação Terra Vista. de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesb), Joelson Ferreira enfatiza que agora as famílias se pre- Salvio Oliveira dos Santos, que nasceu no assen ta- param para a produção de uma maior quantidade do men to e é filho de assentados, explica os passos para cacau orgânico fino. “A expectativa é de que estejam a produção desse tipo de fruto. Mata ciliar recomposta com mudas de plantas nativas da Mata Atlântica. terra da gente 11] [ BAHIA ] 1) Enxertia: Salvio mostra muda com enxerto do cacau fino que dura entre seis a oito meses para começar a se desenvolver. “Primeiro são escolhidas as mudas resistentes aos fun gos e às pragas, como a Vassoura de Bruxa”, ex- 3) Plantação: os assentados Derva l Bispo e José Carlos dos Santos plantam muda de cacau orgânico fino com uma compostagem feita com folhas seca s, matéria orgânica e casca de cacau. A muda pode entrar em produção em quatro anos. plica. As mudas recebem o que ele chama de “en- “Após as mudas serem plantadas, entram em produ - xertia” de clones especiais de cacau fino, essa etapa ção em torno de quatro anos após o plantio. Com o dura entre seis a oito meses. Quando a muda “pega”, fruto, as amêndoas desses cacaueiros passarão por fica cerca de um ano na estufa. um processo de fermen tação durante oito dias”, continua Salvio. O passo seguinte é levar as amêndoas para a barcaça (espécie de secador natural) por mais sete dias. Então, esses grãos são denominados cacau orgânico fino. 2) Mudas: Joelson Ferreira mostra muda s em desenvolvimento. Essa fase demora um ano. 4) Barcaça: agora é a vez do agricultor João Ribeiro trabalhar com secagem das amêndoas do cacau fino, processo que dura em torno de sete dias. [12 incra.gov.br Salvio: agroecologia é seu modo de vida. Quando Salvio Oliveira Santos nasceu, o assentamen- o extrativismo de plantas medicinais e semen tes to ainda era uma fazenda a ser desapropriada pelo sem danificar o meio ambiente é meu objetivo de Incra. Técnico em agroecologia e bolsista da Fapesb, trabalho”, ressalta. ele conta que participou ativamente da construção Há mais d e dois anos, Salvio colhe d ad os para pes- do Sistema Agroflorestal, da adoção da agroecologia quisadore s da Uesc, IF Baiano e I nstitu to Cabruca à produção orgânica no Terra Vista. numa área exp erime ntal de um hectare. “ Planta- Tímido, Salvio é um rapaz de 25 anos de poucas pa- mos legumino sas, co mo fe ijão de p orco , gliricídia lavras, mas se mostra enfático em seus posiciona- e gu an du, e m b usca d e alcan çar u m alto n íve l de men tos ambientalistas. “Conservar a mata e produzir nitrogê nio n o solo. Reco lh o as amostras da terra e orgânicos é a verdadeira interação entre o homem e envio p ara en genh eiros agrônomos e florestais”, a natureza. Por isso, produzir, extrair alimentos, fazer explica o técnico. terra da gente 13] [ BAHIA ] Aula dos alunos de química de uma das turmas do Curso Técnico em Segurança no Trabalho do Colégio Milton Santos, que fica no Terra Vista. A instituição oferece outros cinco cursos técnicos profissionalizantes para estudantes do meio rural e urbano. Educação No Terra Vista funciona o Centro Educacional Florestan Fernandes, onde estudam 270 crianças no Ensino Fundamental I e II. Já o Centro Educacional Milton Santos foi implantado pelo governo do estado e oferece ensino profissionalizante para 720 estudan tes do assentamento e das regiões rural e urbana de Arataca e de outros municípios vizinhos. O Florestan Fernandes também abriga a Especialização em Agroecologia Aplicada à Agricultura Familiar, nos moldes do Residência Agrária, por meio do Pronera e em parceria com a Uesc e IF Baiano, onde estudam 42 alunos. O Florestan ainda recepcionou o curso superior do Pronera em Engenharia Agronômica, com ênfase em agroecologia, cuja turma se formou em 2013. O Centro Milton Santos dispõe de 25 turmas nos três turnos com seis cursos profissionalizantes. São eles: Agroecologia, Agroindústria, Agroextrativismo, Informática, Zootecnia e Segurança no Trabalho. Para o diretor do Centro, Luciano Costa, o assentamento é essencial para a formação dos estudantes. “E stamos dentro da Mata Atlântica e os estudantes podem de senvolver estudos e pesquisa do que é aprendido em sala de aula”, diz. “Cacauada” Leite, cacau orgânico fino e açúcar. É com essa mistura que a família do assentado Ailton Moreira Mendonça incrementa a renda. Levemente doce, a “cacauada” acompanha o Chocolate Artesanal no Terra Vista nas feiras e exposições. “É um produto orgânico e caseiro”, explica Moreira, que produz a “cacauada” há 2 anos. A cada quantidade manufaturada, ele procura aprimorar o sabor. O assentado conta que comercializa 200 gramas do produto por R$ 6,00. “Em alguns meses, ch egamos a obter até R$ 1,2 mil, mas desse custo temos que retirar os gastos com gás, açúcar e leite”, contabiliza. [14 incra.gov.br A “cacauada artesanal”, produzida em casa, ajuda famílias a melhorarem a renda, como acontece com o assentado Ailton Mendonça. Sistema Agroflorestal garante respeito à natureza e bons rendimentos às famílias baianas Reportagem e fotos: Cintia Melo Boa terra de futuro Três gerações de mulheres e um só mantra: nenhuma árvore pode ser derrubada. A matriarca Marivalda Soares dos Santos, 50 anos, criou os filhos, entre eles, Fernanda Santos de Jesus, com esse ensinamento e o transmite para a neta Jenifer Santos, de 4 anos. terra da gente 15] [ BAHIA ] “Preservar a natureza para nós é preparar um futuro melhor para nossos filhos e netos. Existem lugares que não têm mais água, pois desmataram. E aqui estamos rodeados de floresta”, ressalta Antonival Alves dos Santos, que é agricultor do Auxiliadora há 17 a nos. Ele acredita que a borracha irá incrementar a renda quando todas as seringueiras plantadas há cinco anos entrarem em produção. Santos explica ainda que o “sarnabi de tigela” (como chamam a borracha sangrada da árvore) é comercializado a R$ 2,20 o quilo. [16 incra.gov.br Enquanto ela e Fernanda colhem os grãos de café presidente da associação dos assentados, Juarez Nas- de início de safra, a pequena Jenifer brinca com os cimento, estima uma renda média das famílias em galhos, folhas e grãos caídos. “Por causa das árvo- torno de R$ 1,5 mil ao mês. “Aqui todos têm sua res, temos chuva, sombra e vento. Tudo que faz bem moto ou seu carrinho”, revela. para as plantações”, afirma a matriarca. Ainda assim, a família de dona Marivalda deseja mais. Dona Marivalda é um exemplo de como pensam e Cada filho sonha em construir uma casa no assenta- agem as 28 famílias que vivem no assentamento mento. “Quero aumentar o nosso lucro com o projeto Nossa Senhora Auxiliadora, criado em 1999 e situado da piscicultura e com as seringueiras, quando entra- no município de Camacan, no litoral Sul da Bahia. rem em produção”, ressalta o agricultor Gilmar Soares Os agricultores cultivam cafezais, cacaueiros, bananei- de Jesus, 30 anos, filho da assentada. ras e seringueiras dentro do remanescente da Mata Além de uma nova moradia, Fernanda sonha em criar Atlântica com um respeito nato a cada arbusto que Jenifer no sossego do assentamento. “Quero que ela compõe a mata. Ao todo, são 388 hectares de terras. estude e aprenda para nos ajudar aqui no futuro”, al- Trata-se de um sistema consorciado com a floresta meja a mãe da pequena. Fernanda acrescenta ainda que vem ren den do bons resultados, numa asserti- que, quando assiste a alguma reportagem sobre a va de que é possível obter bons lucros e, ao mesmo preservação do meio ambiente, sente orgulho da sua tempo, respeitar o meio ambiente. Meio cabreiro, o família. “Fazemos nossa parte”, frisa. O presidente da associação do Nossa Senhora Auxiliadora, Juarez Nascimento, aponta para onde estão os lotes das família s no Sistema Agroflorestal. Mirando ao longe os altiplanos ou os baixios do Auxiliadora, é difícil distin guir as espécies de madeira de lei como Jacarandá, Vinh ático, Pau-Brasil, Maçaranduba , entre outras árvores nativas, das plantações de seringas, café, cacau e bananas. Para conhecê-las é preciso caminhar na mata adentro pisando a terra escorregadia, úmida e forrada de folhagem amarelada. Dentro da mata, encontram-se bananeiras, alguns seringueiras . A luta das famílias é grande, mas todos metros depois, cacaueiros, e logo em seguida concordam que o trabalho compensa. O trabalhador rural Adriano Bispo de Souza (ao lado), como a maioria dos a ssentados no Nossa Senhora Auxiliadora, era empregado do dono da fazenda quando a área foi desapropriada. Agora Souza traba lha duro em seu lote. Só numa semana colheu 170 sacos de 60 quilos de café cereja. “Trabalho para mim e as condições de hoje são 100% melhores do que na época anterior à cria ção do assentamento”, frisa. Café A safra de 2014 surpreendeu as famílias do Auxiliadora ao atingir 2,2 mil sacas de 60 quilos de café beneficiado, ou seja, secado e despolpado. O preço do café beneficiado, do tipo conilon, cultiva- Entretanto, Juarez Nascimento (alto da página) lembra que é preciso descon tar os gastos. “Esse an o precisamos empregar 70 pessoas para ajudar nas máquinas de secar e despolpar. Além disso, temos custo do transporte e manutenção dos equipamentos”, contabiliza. do pelas famílias, alcançou uma média de R$ 230,00 No total, o assentamento possui 205 mil pés de café a saca, o que rendeu, aproximadamente, R$ 5 06 mil produtivos do tipo conilon. Há ainda outros 50 mil pés aos assentados. de café que entrarão em produção nos próximos anos. terra da gente 17] 17] [ BAHIA ] O café colhido por Adriano Souza dura nte uma semana chega para ser beneficiado no secador e despolpador (retirada da casca do café). [18 incra.gov.br O secador e o despolpador foram conseguidos pela R$ 45,00 a saca de 60 quilos. associação, há seis anos, por meio da Companhia de “Sabemos que se tivéssemos os cafezais em áreas mais Desenvolvimento e Ação Regional (CAR), órgão do abertas a produção seria maior, mas optamos por não governo do estado. De acordo com o presidente da danificar a mata”, frisa Nascimento. A lenha utilizada associação, Juarez Nascimento, sem os equipamentos no secador, segundo ele, vem das galhas e dos troncos eles estariam comercializando o café “in natura” por caídos, que se acumulam na floresta durante o ano. Fontes de renda Demonstrando o funcionamento do despolpador, o trabalhador rural Orlando Santos Figueiredo relata que só depois de ter se tornado assentado conseguiu cumprir com “as responsabilidades com a família”. Figueiredo se refere ao fa to de hoje poder sustentá-la de forma digna. “Já passei dificuldade alimentar. Após o assentamento tudo mudou na minha vida e de minha família”, reconhece. As famílias estão renovando contrato com o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) da Companhia Na cional de Abastecimento (Conab) para 2015 . Esse ano, enviaram ban anas e hortaliças para h ospitais, creches e instituições de caridade de Camacan e tiveram um contrato an tecipado de R$ 160 mil. Outra fonte de renda das famílias é com a cacauicultura. A safra foi iniciada em junho e alcançou 2,5 mil arrobas. O cacau atualmente é comercializado por cerca de R$ 110,00 a arroba (15 quilos). “No ano passado, devido às chuvas fracas, apanhamos 1,5 mil arrobas”, relembra Nascimento. As bananas do tipo da terra, prata, d´água, china e pacovan somam 20 mil pés nos 28 lotes. As famílias contam que saem seman al ou quinzenalmente entre um e dois caminhões carregados do fruto. Há ainda 50 mil pés de seringueiras n o assentamento, alguns com apenas cinco anos de plantados. O agricultor Aberval Evangelista de Souza mostra a produção de banana. “Ainda estão verdes, aguardamos o crescimento do fruto pa ra vender”. Evangelista destaca que cada cacho é comercializado por R$ 8,00. “Já perdemos a conta da quantidade de banana vendida. O caminhão sai cheio”, enfatiza. “Aqui temos saúde, a lavoura e nossa renda”, explica o a gricultor Izaudo Xavier dos Santos enquanto demonstra o processo de seca gem do café do tipo conilon, plantado no Auxiliadora. Para ele, o mais importante é a qualidade de vida. “Se temos dinheiro ou não, ficamos bem do mesmo jeito, diferente da cida de gra nde. Isso aqui é um sossego e o café é nosso maior ganha pão”, finaliza. terra da gente 19] ESPÍRITO SANTO NÚMERO DE ASSENTAMENTOS: 94 FAMÍLIAS ASSENTADAS: 4.261 ÁREA EM HECTARES: 51.961.53 TE R R A D A GE N TE [ ESPÍRITO SANTO ] A agroecologia já é realidade nos assentamentos capixabas e está melhorando a renda das famílias agricultoras Reportagem: Johnny Cardoso Fotos: Girley Vieira O sonho por alimentos mais saudáveis [22 incra.gov.br “Nós éramos meeiros. E hoje ter um lote da família e produzir alimentos saudáveis é um sonho realizado. Trabalhar pela n ossa força, com humildade e honestidade é o mais importante.” Esse depoimento do agricultor familiar Elizeu Machado Falcão traduz muito bem o sentimento daqueles que escolheram produzir e preservar o meio ambiente como alternativa de exploração da terra. O sítio da família recebeu o sugestivo nome de “Sonho realizado”, prática local de n ominar os lotes como forma de humanizar e criar uma identidade na relação do assentado com a terra. Em razão da atividade agroecológica, o lote tornou-se referência na região como Unidade Demonstrativa de Produção Sustentável, conferida pelo projeto interinstitucional Corredores Ecológicos – do qual participa o Governo Federal – à visitação de estudantes e pesquisadores até mesmo do exterior (México, Japão, Haiti). Essa família foi assen tada há dez anos no projeto estadual (PE) Córrego Alegre (173 hectares e 18 famílias), localizado a 3 Km da sede do município de Nova Venécia e distante 250 Km da capital do Espírito Santo, em um lote com 8,6 hectares. Nele, a produção de hortaliças e outros alimentos orgânicos ocupa apenas 3,5 hectares. A maior parte da área é formada por Mata Atlântica que a família preferiu preservar como reserva legal – e os frutos dessa preservação também começam a parecer como fonte de renda. Elizeu é beneficiário do Programa Estadual de Ampliação da Cobertura Florestal (Reflorestar), como estímulo ao desenvol- a dominar os conceitos de agroecologia e as técnicas de man ejo de solo para esse tipo de atividade. “Em 2004, iniciei uma horta com seis canteiros e, vimento sustentável no meio rural capixaba, e no de repente, eram 30. Na primeira vez que saí com período 2014-2016 deve receber algo em torno de algumas folhas para vender n a região, con segui R$ 12 mil por conta das ações de reflorestamento e R$ 20,00, o que empolgou meu pai e minha mãe a se de preservação executadas em seu lote. dedicarem à produção de hortaliças”, relata Eliveltro. A ideia de produzir alimentos sem agrotóxicos sur- Esse passo importante foi seguido de diversos cursos giu ainda na chegada da família ao assentamento. realizados na área e uma série de medidas adotadas Proposta acolhida pela esposa Lucilene Maria Miran- no sítio pela família rumo à certificação da atividade da Falcão, o filho Eliveltro Miranda Falcão e, atual- de produção orgânica de hortaliças. O resultado foi a men te, também pela nora Rosilane Bispo Martins. conquista da declaração obtida junto ao Ministério da A participação do filho de Elizeu foi fundamental Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) como nesse processo. Como ele havia realizado o ensino organização de controle social, em 2010, e pelo Ins- médio na Escola Agrotécnica de Vila Pavão, passou tituto Chão Vivo, em 2013. terra da gente 23] [ ESPÍRITO SANTO ] Produção orgânica e fonte de renda infestam as cultivares, e pelo pastejo e adubo pro- A horta orgânica é atualmente a principal fonte de ren- processo de erosão em uma área de encosta do lote da da família Falcão, que aproveita a área útil do lote que estava ameaçada. também com o plantio de café sombreado no Sistema O processo de produção de hortaliças na propriedade Agroflorestal (SAF) em consórcio com outras culturas, está baseado no sistema orgânico, sem a presença como coco e banana, e a criação de galinhas caipiras no de qualquer insumo químico ou agrotóxicos e otimi- mesmo espaço das lavouras. Essa integração é justifi- zado apenas pela utilização do adubo composto. Já a cada pelo controle de insetos e pragas, que em geral produção de café ainda é considerada agroecológica porcionados por esses pequenos animais. Por sinal, o SAF do cultivo do café em consórcio permitiu evitar o por utilizar o adubo granulado, embora seu uso esteja sendo reduzido de forma gradual para que até 2016 o processo se adeque aos padrões do orgânico. Em termos de hortaliças, legumes e frutas, a produção no sítio “Sonho realizado” é bastan te diversificada: couve, rúcula, alface, hortelã, taioba, cebolinha, salsa, coentro, cenoura, brócolis, mostarda, açafrão, cacau, coco, n on i (fins medicinais), fruta-pão, inhame, laranja, cajá, limão branco, açaí, abacate, abacaxi , banana e cajá japonês. Para manter uma certa escala e garantir a entrega regular a seus clientes em feiras livres e lojas de orgânicos), a tarefa de produção de mudas – tanto para o reflorestamento (Ipê e Imbaúba) e exploração de atividade extrativista (Pupunha, Araçá e Açaí) quan to para o manejo de hortaliças – é considerada pela família uma tarefa primordial. Com o comércio na feira livre, realizada aos sábados no município, Elizeu obtém por mês cerca de R$ 1 mil. A esse valor soma-se, em média, entre R$ 900,00 e R$ 1,1 mil mensais referentes a en tregas de hortaliças que faz de duas a três vezes por semana na loja da Associação Veneciana de Agroecologia - Universo Orgânico, da qual é um dos asso ciados. “União importante que faz a diferença em se tratando de sustentabilidade e geração de renda aos assentados e agricultores familiares do município”, afirma. Os 7,5 mil pés de café existentes no lote dos Falcão produziram, na safra 2013, 64 sacas – com um retorno líquido de quase R$ 18 mil. Já o turismo educativo proporciona um acréscimo de aproximadamen te R$ 2 mil na renda anual familiar. [24 incra.gov.br Visão de futuro Os agricultores se preparam agora para novas ações ligadas ao Programa Refloresta. Serão cultivadas mudas de uma série de espécies para melhorar ainda mais as condições de produção e preservação do lote do agricultor familiar Elizeu Falcão. As espécies que serão plan tadas são Seringueira, Ipê, Cedro Mogno, Cacau, Pupunha, Açaí, Citros e Abacate. Para o futuro, ele projeta participar do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) e fornecer seus produtos às escolas da região. Com esse intuito, planeja aumentar a produção e garantir a excelência na entrega das hortaliças. Outro projeto da família é construir uma pousada, já que é grande a visitação de estudantes e pesquisadores na propriedade. Assistência técnica tendência é de crescimento do número de produto- A engenheira florestal Flávia Barreto Pinto, agente res associados à loja de orgân icos, tendo em vista a de extensão e desenvolvimento rural do Instituto Ca- aceitação dos produtos pela população. pixaba de Pesquisa e Extensão Rural (Incaper), expli- Para incentivar os agricultores, ele diz que a prefeitu- ca que sua atividade é transmitir informações sobre o ra irá melhorar as condições de comercialização dos modo de produção orgânica. Ela orienta os agriculto- produtos agroecológicos. “A prefeitura disponibilizou res do assen tamento quanto à conservação, ao ma- um local para a loja de orgânicos no projeto de refor- nejo do solo e as vantagen s do Sistema Agroflorestal. mulação do Hortomercado e isso melhorará o acesso “No caso específico do lote do senhor Elizeu Falcão, do consumidor aos alimentos saudáveis”, informa. é interessante destacar que, como unidade demonstrativa, ele desenvolve o projeto de turismo educati- Histórico vo e recebe estudantes da Escola Família Agrícola e Constituída em 2008, a loja de orgânicos da Asso- estagiários de cursos de meio ambiente. Isso facilita ciação Vene cian a de Agroecolo gia - Universo Orgâ- o apren dizado e a assimilação de todas as técnicas nico - está sob a ge rê ncia de Sérgio Bin ow. que são por nós transmitidas”, ressalta. Ele organiza todo o recebimento das entregas d os 40 asso ciad os e a forma como os produtos são co- Gestão municipal locados nas gôn dolas. Solang e Furlan Pessin é uma O vice prefeito e secretário municipal da Agricultura das clientes da associação e reconhe ce a qu alid ade de Nova Venécia, Theomir Basseti Filho, avalia que a dos alimen to s fornecidos pelos agricultores. terra da gente 25] [ ESPÍRITO SANTO ] Políticas públicas [26 incra.gov.br O primeiro crédito recebido pelos agricultores do Projeto Estadual Córrego Alegre, já reconhecido pelo Incra, foi em 2004 na modalidade Material de Construção - Recuperação, à época no valor de R$ 2,5 mil. Segundo Elizeu, “o crédito pago pelo Incra foi muito importante, pois ajudou na colocação de um novo telhado. Em 2014, essa família foi inscrita no Programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV) do Governo Federal, e terá direito a R$ 36 mil (dos quais R$ 8 mil como contrapartida do governo estadual, que é parceiro no projeto) para construir uma nova casa de 68m 2. Pelo Programa Nacional de Fortalecimen to da Agricultura Familiar (Pronaf), em 2010 a família obteve crédito no valor de R$ 14,7 mil para financiamento de projeto de irrigação na propriedade e aquisição de mudas de café conilon. No mesmo programa, na modalidade Aquisição de Veículos, foram financiados uma motocicleta, no valor de R$ 9,9 mil – já quitada – e um automóvel, no valor de R$ 30 mil. Integrado ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) do Governo Federal no fornecimento de seus produtos a diversas entidades beneficentes de Nova Venécia, o trabalhador rural obteve, em 2013, uma renda de R$ 4,5 mil. Este ano, o contrato deve atingir a marca de R$ 6,5 mil. “É uma força a mais para agricultura familiar, um reforço em termos de renda e isso estimula as famílias a trabalhar unidas, “comenta”. terra da gente 27] [28 incra.gov.br GOIÁS NÚMERO DE ASSENTAMENTOS: 298 FAMÍLIAS ASSENTADAS: 13.014 ÁREA EM HECTARES: 697.787,32 TE R R A D A GE N TE [ GOIÁS ] Assentados adotam nova relação com a terra e abastecem supermercados e restaurantes da histórica cidade de Goiás, reconhecida pela Unesco como patrimônio histórico da humanindade Reportagem e fotos: Cristiane Santiago e Jucimeire Costa [30 incra.gov.br Agricultura saudável Embora estivesse em silêncio, a terra estava dando o seu recado. Na definição do agricultor José Osmar Nunes Marques, morador do assentamento Serra Dourada, no município de Goiás (GO), o solo demonstrava fraqueza, mesmo sendo alimentado com agrotóxicos. A insatisfação de seu José era a queda frequente na produção e na qualidade das hortaliças e da mandioca. Com dúvida sobre o que estava errado, ele procurou auxílio profissional de um técnico da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e foi quando ouviu que a solução para recuperar o solo seria a adoção de uma agricultura “limpa”, pautada nos princípios da agroecologia. A orientação foi bem compreendida e, há sete an os, ele e mais sete famílias do Serra Dourada passaram a ter uma n ova relação com a terra. Uma das mudanças implementadas foi a adição de leguminosas na superfície do solo para enriquecê-lo nutricionalmente com nitrogênio, isto é, fizeram a chamada adubação verde, e utilizaram ainda esterco animal e vegetal para o preparo da terra, além de introduzir a rotação de cultura. “ Essa prática repetida durante três anos renovou a terra, que nos respondeu com produção farta e viçosa”, lembra o agricultor. De uma área de 2,5 hectares, hoje seu José colhe semanalmente 450 pés de alface, 200 de couve e 200 maços de cheiro verde. A lavoura de mandioca também passou a produzir com pujança, atingindo cinco toneladas anuais. Toda a produção abastece supermercados, restaurantes da histórica Cidade de Goiás , escolas públicas, asilos e entidades assistenciais atendidas por programas governamentais, como o Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) e de Aquisição de Alimentos (P AA). terra da gente 31] [ GOIÁS ] Cooperativismo No Serra Dourada, as famílias assentadas também [32 incra.gov.br A ideia é aproveitar os frutos do Cerrado, como cagaita, caju, cajazinho e araçá, para extrair a polpa. se uniram para comercializar a produção. Oito delas Clarice dos Reis Gonçalves da Cruz Sousa, que mora integram a Cooperativa Mista de Agricultores Fami- na parcela um do Serra Dourada, relata que as fa - liares do Município de Goiás e Região (Coopar). Os mílias estão entusiasmadas com a fábrica e com cooperados en tregam 30% de sua produção para a von tade de trabalhar. “É mais uma oportunidade Coopar. Assim, eles atendem entes governamentais de incrementar a renda”, afirma. Segundo ela, a e in stituições assistenciais, fornecen do produtos para possibilidade é aumentar em pelo menos um salário o Pnae e PAA. mínimo o rendimento familiar. Recentemente, por meio da CPT, a Coopar conseguiu A unidade de processamento de frutos, que aguar- recursos da Oikos, organização internacional que traba- da liberação dos órgãos de inspeção sanitária para lha no desenvolvimento de soluções sustentáveis para entrar em funcionamento, beneficiará mais de 70 a erradicação da pobreza, e construiu na área coletiva agricultores familiares e assentados de Goiás e dos do assentamento uma fábrica de polpa de frutas. mun icípios de Itaberaí e Heitoraí ligados à Coopar. Confiança do público gera mais renda Preservação ambiental O assen tamento Serra Dourada é referência no muni- dos canteiros de hortaliças agroecológicas. Os rios e cípio e a propaganda positiva sobre as boas práticas nascentes, que desde o século XVIII sofreram com o ci- agrícolas atrai visitantes brasileiros e estrangeiros, clo da mineração, passaram a ter a mata ciliar recons- além de estudantes de escolas agrícolas da região tituída com a flora do Cerrado. Entre 2000 e 2001, os para troca de experiências produtivas. Toda essa pu- assentados plantaram 10 mil mudas de árvores, como blicidade contribui também para o aumento de clien- Ipês, Perobas, Tarumãs, entre outras. tes em busca de alimentos mais saudáveis, aumen- Convicto de que sua comunidade está fazendo a me- tando a renda das famílias assentadas. lhor escolha, seu José diz que as mudanças no assen- Seu José diz que a confiança do consumidor fez suas tamento estão apenas começando. “O ser humano ven das dispararem. “Antes de iniciar práticas agroe- tem a missão de zelar pela saúde. A agroecologia é cológicas, eu ganhava em torn o de R$ 1,5 mil. Ago- o zelo pela saúde da terra onde moramos. Esta terra, ra minhas vendas atingem até R$ 8 mil por mês”, que nos consumiu luta, sacrifício e suor, não pode comemora. morrer por maus tratos”, frisa. A consciência ambiental no Serra Dourada está além terra da gente 33] 33] MARANHÃO NÚMERO DE ASSENTAMENTOS:1005 FAMÍLIAS ASSENTADAS:130.161 ÁREA EM HECTARES:4.696.454,70 TE R R A D A GE N TE [ MARANHÃO ] Práticas diversificadas garantem segurança alimentar d Dona Lió, seu esposo Louro e o filho do casal realizando a poda das árvores do quintal Reportagem e fotos: Flávia Almeida A produção agroecológica ganha espaço nos assentamentos maranhenses situados na região dos Lençóis/Munim. Na medida em que favorece o equilíbrio ambiental, a segurança alimentar, incentiva a divisão social do trabalho e a diversificação da produção, a agroecologia abre novos mercados para a comercialização nas feiras e para programas do Governo Federal. A sustentabilidade dos recursos naturais é garantida pela não utilização de agrotóxicos, uso de defensivos orgânicos ao invés dos químicos, adubação verde e proteção das nascentes dos rios. Os assentados adotam vários cuidados para gerar uma produção harmonizada com a fauna e a flora existentes. Os assentamentos Rio Pirangi, no município de Morros, e São João do Rosário, no município de Rosário, são exemplos da aceitação consciente das técnicas agroecológicas pelos assentados. Grande parte dessa con sciên cia só foi possível graças aos serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) oferecidos pelo Incra, e executados por meio da Associação Agroecológica Tijupá. [36 incra.gov.br r das famílias assentadas terra da gente 37] [ MARANHÃO ] Dona Lió se diz satisfeita com a transformação do solo. Agora há plantação de maracujá no quintal. Quintal agroflorestal As nove famílias residentes no povoado Patizal encontraram na agroecologia a solução para mudarem [38 incra.gov.br quintal de casa, foi implantado um Sistema Agroflorestal (SAF). A principal característica do SAF é o plantio consorciado de espécies frutíferas, madeiráveis, radicalmente as características do solo nas áreas uti- hortaliças e medicinais, aliado à criação de animais lizadas para agricultura familiar. Pertencente ao as- de pequeno porte. sentamento Rio Pirangi, localizado no município de “Passamos por várias capacitações, fizemos in ter- Morros e situado no Território dos Lençóis/Munim, o câmbios em outros estados e pesquisadores de vá- solo do assentamento, constituído em sua maior par- rios países, como França, Bolívia e Colômbia, vieram te de areia quartzosa marinha (a mesma encontrada conhecer nossa área. Seguindo as orientações que em áreas de restinga e nas proximidades de praias), recebemos sobre adubação orgânica, poda das árvo- dificultava bastante a produção dos assentados. res e utilização de defensivos naturais para controle Foi em meados de 2004 que essa situação começou de pragas, transformamos completamente o solo a mudar, após as orientações recebidas da equipe da que utilizávamos”, frisa o casal, feliz com a conquista Associação Agroecológica Tijupá, entidade contrata- que serviu de estímulo para que outras famílias do da pelo Incra para prestar serviços de assistência téc- povoado aderissem à produção agroecológica. nica aos assentados da reforma agrária no Território Dona Lió ressalta que o plantio de feijão guandu, dos Lençóis/Munim. uma espécie de leguminosa adubadeira, também foi “Antes nós só plantávamos mandioca e criávamos um gran de aliado para aumentar os nutrientes e fer- porcos”, explica o casal Leontina dos Santos, conhe- tilidade do solo, devido à fixação do oxigênio no solo cida como Lió, e Lourival Pereira, chamado de Louro. que o guandu proporcion a. Eles foram a primeira família do povoado a expe- As espécies frutíferas encontradas no quintal de Lió e rimentar técnicas agroecológicas de produção. No Louro são muitas: maracujá, carambola, limão, coco, bacuri, abacaxi, ata, melancia, açafrão, gengibre, a segurança alimentar das famílias e gera uma ren- gergelim, araruta, entre outras. E ntre as espécies da maior a partir da comercialização nas feiras e por mad eireiras, estão o Pau D’árco , Janaú ba, Peroba meio da venda para o Programa Nacional de Alimen- e Pitomb eira. As espécies medicin ais, como boldo, tação Escolar (Pnae)”, ressalta. alfavaca, artemísia e pariri, também são culti- Desde 2 012, Lió e Louro comercializam a p rodu- vad as no quintal agroflorestal, que p ossui ainda ção na F eira Agroecoló gica do município de Mor- galinha caipira. ros, q ue acon tece três vezes por mês, e também De acordo com a técnica em agroindústria da As- fornecem produ to s p ara merend a n as escolas da sociação Tijupá, Lucineide Gonçalves Pinho, o SAF zona rural. “Duas vezes por semana en trego p ro- proporciona às famílias diversificação de culturas, dutos na escola do povoado. Além do fran go e garantin do assim que em todas as épocas do ano verduras, també m levo polpa de fru tas e bolos de seja colhido algum tipo de fruta, legume ou grão. massa p uba, macaxe ira e tapioca. E m 201 3, receb i “O modelo de produção agroecológica proporciona R$ 2.1 25,00 ”, co nta. Dona Lió comercia lizando a produção do seu lote na Feira Agroecológica de Morros terra da gente 39] [ MARANHÃO ] Cultivo em Aléias Adepto à produção agroecológica, o assentado Eugênio Nascimento, mais con hecido como Dotôr, é um dos moradores do povoado Cajazal, que pertence ao assentamento São João do Rosário, localizado no O assentado Dotôr em meio à plantação de feijão de porco, leguminosa utilizada como adubo verde. Essa técnica con stitui no cultivo racional de árvores em fileiras (ruas) com espaçamento entre elas, onde é feito o plantio das culturas agrícolas consorciadas com espécies adubadeiras. Esse é um sistema bastante eficaz para melhoria de solos pobres, evitando mun icípio de Rosário. Em Cajazal, moram 11 famílias a roça migratória. que desenvolvem atividades produtivas baseadas na As duas principais vantagens elencadas por Dotôr nes- agroecologia. Entre outras experiências, Dotôr está se tipo de cultivo são: conseguir produzir sempre na trabalhando, desde 2008, com o sistema de cultivo mesma área, não necessitando mudar o local de cultivo em Aléias. por conta do empobrecimento do solo ao final do ciclo produtivo; e utilização do método de queimada para realizar a limpeza da área e dar início ao novo plantio. A queimada é somente uma vez, não sendo preciso queimar novamente para iniciar outro plantio, pois o sistema conta com a rotação de culturas que tem diferentes necessidades e contribuições ao sistema. “A área é dividida em ruas, sempre alternando uma rua para produção e outra para adubação. Assim, enquanto nas ruas de produção eu estou colhendo, na rua de adubação estou preparando a terra para o próximo plantio”, explica Dotôr. A preservação dos nutrientes no solo é feita a partir da adubação verde com a utilização de cobertura morta (galhos, folhas, matéria orgân ica) espalhada sobre o solo e que irá passar por decomposição. Esse processo serve também para controlar e evitar que as ervas danin has ataquem a produção. Nas ruas de produção, Dotôr tem um cultivo diversificado: abacaxi, mamão, maxixe, mandioca, pepino, milho, arroz, batata-doce e quiabo. Nas ruas de adubação, ele planta leguminosas de grande porte (ingá, nim, leucen a e palheteira) e leguminosas de pequeno porte (crotalária, olho de boi e mucuna). “A diversificação da minha produção garante a ali men tação da minha família, respeitando a sazonalidade de cada cultura. Como também implantei um quintal agroflorestal na minha casa, cultivo lá outras espécies e, assim, consigo alimentar minha família, ven der nas feiras agroecológicas e fornecer para as escolas por meio do Pnae”, conta Dotôr, que também é o secretário-geral da Associação de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais do Povoado Cajazal. [40 incra.gov.br Meliponicultura A criação de abelhas, de uma forma bem gen eralista, pode ser praticada de duas maneiras: apicultura, caracterizada pela criação de abelhas do tipo (que se defendem com ferroadas venenosas) e meliponicultura, criação de abelhas do tipo (que têm o ferrão atrofiado e por isso n ão ferroam). Tanto a apicultura como a meliponicultura podem ser realizadas dentro dos princípios agroecológicos. Para isso, a criação das abelhas deve ser feita den tro de caixas racionais, não sendo necessário o corte de árvores para derrubada das colmeias (retirada predatória do mel) e, consequentemente, a morte das abelhas, como é feito no sistema extrativista mais tradicional. A meliponicultura, com a criação de abelhas Tiúba, foi o modelo escolhido pela assentada Ivanilce Silva dos Santos, conhecida como Nicota. Moradora do po- dando suporte a meliponicultura é a melhoria da voado Timbó, pertencente ao assentamento Rio Pi- qualidade da polinização, já que as abelhas vão se rangi, no município de Morros, ela se encantou pelas alimentar de plantas que são livres de agrotóxicos. abelhas após participar de uma capacitação realizada A coleta do mel é feita com seringas e em seguida pela Associação Agroecológica Tijupá, no final do ano há o processo de higienização, o que não é realizado de 2005. no sistema de meleiro (modo extrativista que não “Cuido como se elas fossem minhas filhas. Todo dia venho ao meliponário. A gente vai se apaixonando”, conta. Durante o processo de capacitação, Nicota recebeu duas caixas povoadas e duas caixas vazias. Cada caixa tem entre 400 a 800 abelh as, que formam uma colônia. Esse foi o ponta-pé para iniciar em 2006 a criação de abelhas Tiúbas. segue princípios agroecológicos). Hoje, no meliponário de Nicota existem 13 caixa s, totalizando aproximadamente 5,2 mil abelhas. Em 2013, ela coletou 13 litros de mel e comercializou cada litro por R$ 25,00, em média. A expectativa é que em 2014 ela consiga coletar 20 litros de mel. “Toda minha produção é vendida rapidamente, não Dona Nicota relata que passou três anos sem coletar dá pra quem quer. Ano passado, apurei R$ 325,00 o mel e fazendo apenas a divisão das caixas, pro- ven den do na porta da minha casa, sem custo algum cesso que consiste em pegar uma filiação de uma de transporte. Isso é uma complementação para mi- caixa-mãe e transportá-la para a caixa-filh a com o nha renda, pois também pratico a agricultura fami- objetivo de formar outra colônia. “Quis deixar a pro- liar”, explica. dução de mel dos três primeiros anos para alimentação das abelhas, que ainda estavam se adaptando ao clima da região, pois vieram de outro município”, explica, informando que a primeira coleta foi realizada em 2009 e rendeu apenas 1,5 litro. Outra vantagem da utilizaçãodetécnicas agroecológicas A assentada Nicota visita todos os dias o meliponário para acompanhar a produção de mel. No assentamento Rio Pirangi, existem 12 famílias trabalhando com meliponicultura e sete com apicultura. Já no assentamento São João do Rosário, são três famílias trabalhando com meliponicultura e cin co com apicultura. terra da gente 41] [ MARANHÃO ] risoto temperado, sopas semi-prontas e almôndegas. “Agora estamos recebendo produtos mais naturais, como frutas, verduras, polpa de frutas, frango, bolos”, conta Gina Mara. A mudança na alimentação, entre outros fatores, é apontada pela diretora da escola, Mirabel dos Santos Salgado, como um fator motivador para o aumento da frequência do aluno na escola. “Em 201 1, tínhamos 120 alunos, agora estamos com 263”, contabiliza a diretora. Para Edilangela Estefane Martins, 11 anos e aluna do 7º ano, a merenda escolar melhorou bastante. “Gosto mais da bananada, suco de goiaba e dos bolos de milho e tapioca”, comentou. Mas não só as escolas estão sendo beneficiadas, os assentados também estão felizes em poder avançar para um novo mercado consumidor por meio do ProAlunos da Unidade Integrada Nossa Senhora do Rosário já estão desfrutando de uma alimentaçã o escolar balanceada. Alimentação saudável nas escolas Os alunos da rede pública municipal de Rosário e Morros estão há dois anos comendo alimentos mais saudáveis produzidos nos assentamentos São João do Rosário e Rio Pirangi. Essa mudança nos hábitos alimen tares foi percebida pelos alunos, diretores, professores e merendeiras da Unidade Integrada Nossa [42 incra.gov.br grama Nacional de Alimentação Escolar (Pnae). Quem explica isso é o secretário-Geral da Associação dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais do Povoado Cajazal, Eugênio Nascimento, conhecido com Dotôr. “Já trabalhamos com o Programa de Aquisição de Alimento (P AA), mas hoje estamos mais voltados para comercialização via Pnae. Nos três últimos me ses de 2013, a Associação forneceu produtos sema nalmente para 15 escolas da zona rural e faturou R$ 84.612,50”, relata Dotôr, ressaltando que 16 for- Senhora do Rosário, escola que atende do maternal necedores estão envolvidos nesse processo com a ao 9º ano, localizada na zona rural do município utilização de técnicas agroecológicas. de Rosário. Para 2014, a Associação dos Trabalhadores e Traba- As merendeiras Gina Mara Souza Cabral e Chyleam lhadoras Rurais do Povoado Cajazal já apresentou Silva Costa são as responsáveis por preparar a ali- proposta no valor de R$ 100.965,00. V ale ressaltar men tação dos alunos desde 2005. Ambas relataram que a venda para o Pnae pode ser feita por meio de que antes a escola recebia muitos produtos industria- grupos formais (associações) e grupos informais (os lizados e enlatados para a merenda dos alunos, como agricultores individualmente). Números do Pnae R$ 157.948,00 com a participação de 28 famílias. Já O assentamento São João do Rosário comercializou o PA Rio Pirangi alcançou, em 2013, R$ 53.311,50 em 2013, por meio do Pnae, R$ 107.101,50 em com o envolvimento de 34 famílias. Para 2014, há a alimentos para merenda escolar, envolvendo 22 fa- expectativa de participação de 76 famílias, aumen- mílias. Em 2014, já aprovou o projeto no valor de tando a comercialização para R$ 83.000,00. Assentadas do Rio Pirangi comercializam a produção na Feira Agroecológica de Morros. Feiras agroecológicas A realização de feiras agroecológicas nos municípios tem se tornado uma grande aliada no processo de comercialização dos produtos oriundos da agricultura familiar e reforma agrária. Famílias dos assentamentos São João do Rosário e Rio Pirangi, localizados nos mun icípios de Rosário e Morros, respectivamente, apontam a participação nesses eventos como mais uma oportunidade de garantir renda semanal. A lógica das feiras é baseada nos princípios da agroecologia e da economia solidária. “A base é a comercialização a preços justos e solidários, a gestão participativa e a tomada de decisão coletiva”, explica Regilma de Santana, técnica da Associação Agroecológica Tijupá, entidade contratada pelo Incra e que presta serviços de assessoria técnica para os assentados da região. A Feira Agroecológica do Município de Morros é a mais antiga da região dos Lençóis/Munim. Teve início em 2010 e conta com a participação de cerca de 20 famílias do assentamento Rio Pirangi. Já a Feira Agroecológica do Município de Rosário foi iniciada no segundo semestre de 2013 e tem cerca de 15 famílias do assentamento São João do Rosário. A qualidade dos produtos, sempre frescos e sem agro tóxicos, é a principal vantagem apontada pelos clientes. “Compro aqui desde a primeira edição. Não penso só no preço, levo em conta a segurança de ter um produto saudável e que sai diretamente da roça para a nossa mesa”, destaca a consumidora Dagmar Moraes, que frequenta a Feira Agroecológica de Rosário. Principais ítens comercia lizados nas feiras agroecológicas são legumes, verduras, produtos do agroextrativismo, polpa de frutas, frutas, aves vivas e comida caseira. terra da gente 43] MINAS GERAIS NÚMERO DE ASSENTAMENTOS: 328 FAMÍLIAS ASSENTADAS: 15.866 ÁREA EM HECTARES: 879.897,90 TE R R A D A GE N TE [ MINAS GERAIS [46 incra.gov.br ] Há sete anos, professores da escola Balão Vermelho, na capital mineira, descobriram, em visita ao assentamento Pastorinhas, no município de Brumadinh o, a 51 km da capital, a qualidade dos hortifrutigranjeiros produzidos sem agrotóxicos. O contato com os produtores fez somar ao projeto pedagógico da instituição de ensino in fantil e fundamental o conhecimento tradicional do campo. Do con tato inicial, veio a proposta para a venda direta dos alimentos na escola para os pais dos alunos. O sucesso foi imediato. Mas todo sucesso incomoda. O mercado de hortaliças do outro lado da avenida Bandeirantes, que corta quatro bairros nobres de Belo Horizonte, iniciou uma série de denúncias para tentar impedir a venda. Os motivos eram os mais banais, como o estacionamento irregular. Dado o impasse, os produtores, professores e pais se uniram e solicitaram autorização da prefeitura para o comércio das hortaliças. Com a autorização concedida, começou a venda oficial dos produtos agroecológicos do Pastorinhas na calçada em frente à escola e logo se tornaram alimentos de uma “grife” saudável. “A gente comprava dentro do colégio com o intuito de Alimentos com grife ajudar o Pastorinhas. Com as denúncias do sacolão e a autorização da prefeitura, quem ganhou foi a comunidade, que agora tem uma feira externa”, diz Patrícia Aranha, jornalista e mãe de aluno da escola Balão. O proprietário do mercado iniciou um processo de concorrência, vendendo os produtos abaixo do preço Produção de assentamento recebe elogios pela qualidade e dribla concorrência em bairros de classe média de Belo Horizonte no dia da feira dos assentados. Mesmo assim, o mercado não prosperou e logo foi comprado por uma rede de drogarias. “O comerciante achava que estava fazendo vantagem, mas perdeu muitos clientes por causa disso ”, lembra Ascendino Padilha de Araújo, um dos mem- Reportagem: Daniel Fleming e Dôra Guimarães Fotos: Daniel Fleming e Rodrigo Barbosa bros das oito famílias assentadas que praticam a agroecologia no Pastorinhas. terra da gente 47] [ MINAS GERAIS ] Turismo rural A visita ao assentamento passou a ser um atrativo a mais ao consumo dos alimentos saudáveis, pois o contato com os produtores e o conhecimento local da produção aumentaram o interesse dos clientes. “Se esses pais e mães começaram a visitar o assentamento e a comprar aqui instigados pelos filhos é porque comprovaram que os produtos são bons”, diz Patrícia Aranha. O que sobra da venda não é desperdiçado como em muitas feiras tradicionais. Toda semana, as 425 crianças e adolescentes do Educandário e Creche Menino Jesus, no bairro Concórdia, n a capital, recebem os produtos saudáveis produzidos no assentamento. “É espetacular. A gente tem o que outras instituições não conseguem comprar, o que vem direto do campo. A quantidade é sign ificativa e as crianças aprenderam a comer verdura e a se alimentar bem com alimentos sem agrotóxicos”, comemora a irmã Fátima Gonçalves, diretora da Instituição. Além do ponto em frente ao colégio às segundas-feiras, os produtos agroecológicos do Pastorinhas são vendidos em outros locais definidos no Programa Direto da Roça, da prefeitura de Belo Horizonte. No domingo, estão na Rua Grão Mogol, ao lado da Igreja do Carmo. Às terças e sextas-feiras, na esquina das avenidas Assis Chateubriand com a Francisco Sales. Ainda na sexta-feira, a banca de produtos saudáveis do assentamento é montada na Praça Afon so Arinos, no centro da capital. Ao todo, são cinco pontos de venda que fun cionam das 6h às 14h ou enquanto houver produto. [48 incra.gov.br Satisfação e saúde da faculdade de Engenharia de Produção da PUC e os Para o ecólogo preservacionista Cléber Vasconcelos, a outros dois no ensino médio. qualidade dos produtos é visível e pode ser constata- Ele ressalta que a esco lh a dos assen tados pela pro- da na saúde dos mais de 400 pássaros exóticos que dução agroecológica foi, por tradição e opção de se alimentam com as três dúzias de couve que com- vida, em defesa da saúde das pesso as e da preser- pra semanalmente dos agricultores do Pastorinhas. vação do meio amb iente. “Eu não conheço um apa- “Nunca tive nenhum caso de morte por intoxicação relho que me ça a qu alidade de vida. Durma uma ou por infecção e, por isso, só compro aqui. Eu verifi- noite aqu i, coma uma g alin ha caip ira n a hora, uma quei primeiro onde eles são plantados, o carinho com verdura d o q uintal e você perceberá as diferenças”, a plantação e a colheita. Os pássaros são pequenos e qualquer presença de agrotóxico mataria todos eles. O trabalho agroecológico dos agricultores favorece minha criação preservacionista”, reconhece o cliente. Para o agricultor Márcio José da Silva, o contato direto com os clientes é fundamental para a produção. “Temos a oportunidade de colocar o produto direto convida. Grupos de estudantes e turistas já estão conh ecendo o assentamento em programas que incluem almoço tradicional com os alimentos agroecológicos e visitação ao plantio, à capela e a outras atrações locais. O Pastorinhas está localizado em umas das regiões para o consumidor com preço melhor porque não há com maior potencial turístico do centro de Minas, intermediação de atravessadores. Você trabalha mui- ao lado da reserva remanescente da Mata Atlântica. to, mas pode aumentar sua renda em mais da me- Fica a apenas algun s quilômetros do Museu de Arte tade e também planejar seus dias de lazer”, avalia. Contemporânea In hotim e tem se tornado polo gas- Márcio tem três filhos, um deles está no terceiro ano tronômico min eiro. terra da gente 49] 49] [ MINAS GERAIS ] O assentamento O assentamento Pastorinhas foi criado em julho de 2006. A capacidade é para 22 famílias e a área to tal 156,44 hectares. Destes, 43,06 hectares ou pouco mais de 27% da área total são constituídos por vegetação de Mata Atlântica. O assentamento está numa região de relevo ondulado a montanhoso, a cerca de 1.500 metros de altitude e temperatura média anual de 20 graus Celsius. As famílias assentadas foram selecionadas entre agricultores da região que tradicionalmente já trabalh avam com horticultura em sistema de exploração coletiva. Compre direto dos produtores e visite o assentamento: Ascendino de Araújo (31) 9824-6539 Márcio da Silva (31) 8545-4010 Valéria Carneiro (31) 9601 – 0277 [email protected] Pontos de Venda (das 6h às 14h) Domingo – Rua Grão Mogol – ao lado da Igreja do Carmo; Segunda-feira – Aven ida Bandeirantes nº 800 – em frente ao colégio Balão Vermelho; Terça e sexta-feira - Esquina das avenidas Assis Chateubriand e Francisco Sales; Sexta-feira - Praça Afon so Arinos, Centro de Belo Horizonte. [50 incra.gov.br terra da gente 51] PARAÍBA NÚMERO DE ASSENTAMENTOS: 307 FAMÍLIAS ASSENTADAS: 14.460 ÁREA EM HECTARES: 288.210,76 TE R R A D A GE N TE [ PARAÍBA ] Renovação pela agroecologia Espaços para comercialização de alimentos produzidos sem agrotóxicos garantem renda e elevam autoestima dos assentados Reportagem e fotos: Kalyandra Vaz [54 incra.gov.br “Tirando a agroecologia estou morto”. A frase do agricultor José Maria Batista, con hecido como Marola, do assentamento Santa Helena, em Sapé (PB), reflete a mudança na vida do assentado que, após dez an os trabalhando com vários tipos de agrotóxicos, deixou-se convencer pela equipe da assistência técnica de que era possível produzir sem veneno. A transição para a agroecologia foi iniciada há quatro anos. “Fui teimoso porque achava que não ia dar certo”, afirma seu Marola, um dos centenas de assentados da Paraíba que estão se dedicando à produção agroecológica. Espalhadas por todo o estado, cerca de 40 feiras permanentes comercializam a produção de agricultores familiares e assentados da reforma agrária paraibanos. Destas, 14 são reconhecidas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) como agroecológicas. A maioria surgiu por iniciativa dos próprios assentados com o apoio de movimentos sociais, responsáveis, muitas vezes, pela mobilização dos feirantes e pela aquisição das barracas padronizadas. A possibilidade de ampliar os canais de comercialização, driblar atravessadores, dar mais visibilidade à produção da reforma agrária, promover a autonomia econômica e elevar a autoestima das famílias assentadas levou o Incra/PB a, mais do que apoiar a realização de feiras, determinar que as entidades contratadas para prestar assistência técnica nos assentamentos implantem e mantenham Feiras da Reforma Agrária nas regiões onde atuam. terra da gente 55] [ PARAÍBA ] Assentado José Maria Batista, conhecido como Marola, do assentamento Santa Helena, em Sapé (PB). “É um orgulho produzir sem agrotóxicos e vale a pena. É mais barato e basta seguir a orientação dos técnicos”. [56 incra.gov.br “Foram três meses para me convencer. Agora, ve- sistema de irrigação na horta, comprou um automó - neno nunca mais”, contou o assentado Marola, que vel utilitário e aumentou a produção. comercializa a produção na Feira de Sapé, inaugura- A Feira Agroecológica de Sapé reúne 12 famílias de oito da há pouco mais de 1 ano e distante 55 Km de João assentamentos da Zona da Mata Norte e tem como Pessoa. principal diferencial o horário de funcionamento, das Até 2010, o assen tado utilizava agrotóxicos na plan- 17h às 19h30. Alguns dos feirantes também comercia- tação de alface, cebolinha e coentro, mas a chegada lizam na Feira Agroecológica realizada no Campus da da assistên cia técnica ao assentamento mudou tudo. Universidade Federal da Paraíba (UF PB), em João Pes- Após uma década trabalhando com agrotóxicos e se soa, e cerca de 90% deles fornecem alimentos para o dedicando a apenas três culturas, os técnicos o con- Programa de Alimentação Escolar de Sapé. ven ceram a iniciar a transição para a agroecologia. Em João Pessoa, os assen tados da reforma agrária Hoje o assen tado também planta macaxeira e é dono contam com quatro feiras agroecológicas permanen- de uma horta variada. tes: às sextas-feiras, na UFPB; aos sábados, no Bairro “É um orgulho, me sinto muito valorizado em traba- do Bessa e no Departamento Nacional de Obras Con- lhar sem veneno porque os clientes compram e veêm tra as Secas (Dnocs), no Bairro dos Estados; e toda que o produto é diferente. Quem leva para casa sabe primeira terça-feira do mês na praça de eventos Pon- que dura muito na geladeira”, disse seu Marola. to de Cem Réis, no centro da capital. Muitos clientes vão ao assentamento Santa Hele- Embora as equipes de assistência técnica acompa- na para comprar os produtos do assentado, que se nhem a produção dos assentados que trabalham de transformou em um multiplicador agroecológico e forma agroecológica para garantir a qualidade dos fez de sua horta um espaço de aprendizagem para produtos comercializados nas feiras, na Paraíba, ain- outras famílias. da são poucas as famílias assentadas que possuem Os benefícios, segundo o assentado, vão além do au- o Cadastro Social de Vendas Diretas das Unidades de men to da ren da familiar, que chegou a 60%. “Che- Produções Agroecológicas do Ministério da Agricul- guei a ficar tonto com o cheiro do veneno que eu tura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Várias delas usava para fazer a semente germinar”, disse seu estão em processo de obtenção, em parceria com o Marola, que vendeu as 12 cabeças de gado da famí- Sebrae, e outras ainda estão em transição da agricul- lia para apostar na agroecologia. Ele implantou um tura convencional para a agroecologia. Feira pioneira “Adorei a novidade. Aqui eu encontrei coisas que não acho nas outras feiras”, diz Rosa Maria da Silva ao compora r quatro quilos de umbu na Feira de Barra de Santa Rosa. A primeira feira agroecológica criada para comercializar a produção da reforma agrária na Paraíba foi idealizada pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) e fun ciona há 13 anos no Campus da (UFPB) em João Pessoa. Toda sexta-feira, das 5h às 12h, estudantes, professores e funcionários da universidade compram aproximadamente seis toneladas de alimentos produzidos em seis assentamen tos e em um acampamen to da Zona da Mata. O técnico agropecuário Luiz Sena integra a Comissão sem agrotóxicos. “Elas contribuem para a melh oria de Produção Orgânica (CPOrg) do Mapa/PB e é um da saúde do agricultor e da população, para a pre- dos pioneiros na organização das feiras agroecoló- servação da natureza, são parte importante da renda gicas no estado. Segundo ele, as vantagens da feira das famílias assentadas e fortalecem a economia so- vão muito além do estímulo à produção de alimen tos lidária”, afirma. Feira do Ponto de Cem Réis oito assentamentos e de dois acampamentos do Agres- A mais recente feira da reforma agrária permanente em Sousa, da Coordenação da CPT em João Pessoa, a venda João Pessoa é uma iniciativa da CPT, com apoio do In- de cerca de 12 toneladas de produtos a cada feira. cra/PB e da prefeitura. Criada em novembro de 2013, a “Houve uma ótima recepção da população. Muita Feira Agroecológica da Reforma Agrária é realizada toda gente pede que a feira continue e elogia o horário primeira terça-feira do mês, no centro da capital, das em que ela é realizada, que favorece quem está 14h às 18h, e comercializa a produção de 30 famílias de saindo do trabalho”, afirma Tânia. te, do Vale do Mamanguape e do Litoral Sul da Paraíba. A clientela diversificada garante, segundo Tânia Maria de terra da gente 57] 57] [ PARAÍBA ] Feira Agroecológica da Reforma Agrária dos assentamentos da Zona da Mata Sul, em Pedras de Fogo (PB). [58 incra.gov.br Incra/PB incentiva promoção de Feiras da Reforma Agrária Para estimular a transição da agricultura convencio- mia solidária e da gestão social de políticas públicas. nal para a agroecológica nos assentamentos, o In- A nota também dispõe sobre orientação e procedimen- cra/PB determinou, em Nota Técnica de novembro tos públicos para prorrogação dos contatos de Chamada de 2013, que as entidades prestadoras de assistência Pública do Programa de Assistência Técnica (Ates). técnica incluam em seu plano de trabalho a implan- Cabe às entidades produzir relatórios sobre a deman - tação e manutenção de Feiras da Reforma Agrária. da de venda direta da produção dos assentamen tos, A Nota Técnica, formulada com a participação do Insti- organizar os grupos de produção, estudar a viabilida- tuto de Assessoria à Cidadania e ao Desenvolvimento de econômica das feiras, elaborar plan o de negócios Local Sustentável (IDS), que atua como articulador en- e de marketing e propaganda das atividades produ- tre as prestadoras de Ates e o Incra/PB, define as dire- tivas e, caso constatada a viabilidade e interesse dos trizes a serem adotadas pelas entidades para repensar assentados, implan tar a feira. as dinâmicas produtivas nos assentamentos segundo O trabalho das equipes de Ates começa ainda os princípios e práticas da agroecologia, da econo- nos assentamen tos, onde as famílias recebem orientações técnicas sobre o manejo agroecológico elétrica, montagem das barracas e local para armaze- do solo, a produção de mudas e o controle de pragas ná-las. e doenças com defensivos naturais. Estu da-se ainda o fortalecimen to d a feira que fu n- Os equipamentos n ecessários ao funcionamen to das ciona às sextas-feiras em Cajazeiras, no Alto Sertão feiras, como barracas, aventais, bonés, caixas plásti- paraibano, a cerca de 460 Km de João Pessoa. cas para transporte de mercadorias, balanças e sacolas plásticas, são adquiridos pelas entidades prestadoras de Ates. “Os assentados não precisam comprar nada para participar das feiras. Na primeira feira ele já tem lucro com o que vender”, afirma a assistente social Liana Rocha, do Setor de Ates do Incra/PB. A proposta é que a gestão das feiras seja feita pelos próprios assentado s com o apo io d a autarq uia e das entidades prestadoras de assistência técnica. Para isto, é necessário a criação de um fundo rotativo com con tribuições dos assentados e a elaboração de um regimento interno com os dire itos e d everes dos feirantes. Feiras da Reforma Agrária Duas feiras criadas com recursos da Ates estão em fun cionamento na Paraíba: em Barra de Santa Rosa, a 200 Km de João Pessoa, no Curimataú, e em Pedras de Fogo, na Zona da Mata Sul, a 54 Km de distância. Outras duas estão em implantação no Brejo paraiba- Barra de Santa Rosa A primeira feira da reforma agrária implantada com recursos da Ates na Paraíba é a de Barra de Santa Rosa, inaugurada em julho de 2013. A Feira dos Assentados da Reforma Agrária do Curimataú comercializa a produção de dez assentamen tos localizados em Barra de Santa Rosa, Sossego e Damião, onde vivem 534 famílias. Apesar da prolongada estiagem na região, cerca de meia tonelada de produtos são comercializados a cada edição da feira, realizada às quartas-feiras, a partir das 6h. Promovida através da Cooperativa de Prestação de Serviços Técnicos da Reforma Agrária (Cooptera), que presta assistência técnica aos assentamentos da região, com o apoio das prefeituras dos três municípios, a feira conta com cerca de 24 famílias, que comercializam hortaliças, feijão, raízes, frutas, doces, queijos, carn e bovina, peixes, ovos e aves caipiras vivas e abatidas. no, em Banan eiras, distante 141 Km de João Pessoa, Pedras de Fogo e em Alagoa Grande, a 107 Km da capital, pela en- A Feira Agroecológica da Reforma Agrária dos tidade prestadora de assistência técnica Assessoria Assentamentos da Zona da Mata Sul, em Pedras de de Grupo Multidisciplinar em Tecnologia e Extensão Fogo, foi inaugurada em março de 2014 e reúne, às (Agemte). segun das-feiras, a produção agroecológica de quatro A feira de Ban an eiras foi in aug urada no primeiro se- assentamentos dos municípios de Pedras de Fogo e mestre de 20 14 e acontece às quartas-feiras, a par- Caaporã, onde estão assentadas 455 famílias. Cerca tir das 6 h, com 20 assentados de dez assentamen- de uma tonelada de produtos diversificados são co- tos. Dez das 20 barracas da feira foram adquiridas mercializados semanalmente na feira, que é promo- pela prefeitura de Bananeiras, que é resp onsável vida pela entidade prestadora de assistência técnica pela limp eza d o local e transporte das mercadorias. Consultoria e Planejamento de Projetos Agropecuá- Em Alagoa Grande, a feira foi in augu rada em no- rios (Consplan). vembro de 2014. Ela é realizada às sextas-fe iras, A barraca de Severino do Ramo da Silva, (foto página a partir d as 6h , e reúne a produção de cerca de 60) do assentamento Campo Verde, tem de tudo um dez assen tamentos da reg ião. A prefeitura de Ala- pouco: feijão verde, cocos verde e seco, maracujá, goa Grande garante a infraestrutura da feira – energia limão, alface e maxixe. terra da gente 59] [ PARAÍBA ] Segundo ele, que há cerca de dois anos possui o Ca- participa da feira do Dnocs em João Pessoa, onde che- dastro Social de Vendas Diretas das Unidades de Pro- ga a faturar R$ 1 mil por semana. “Comprei moto e duções Agroecológicas concedido pelo Mapa, produzir motor de irrigação com o dinheiro das feiras”, disse. de forma agroecológica é mais difícil para o agricultor, Para Severino, trabalhar de forma agroecológica possi- mas vale a pena. “O produto é fácil de vender e, prin- bilitou, além do aumento da renda familiar, uma mu- cipalmente, garante a saúde da família que produz dança radical na vida da família, que passou a ter uma e dos clientes”, constata o assentado, que também dieta mais saudável e variada. “Agora temos fartura!”. Projeto Feira-Modelo da Reforma Agrária beneficiará mil famílias no Nordeste “Nossa alimentação melhorou 100%. Hoje escolhemos o que queremos comer e é difícil até pegar uma gripe”, diz Severino do Ramo da Silva, do assentamento Campo Verde, em Pedras de Fogo. [60 incra.gov.br Cerca de mil famílias assentadas do Nordeste serão be- dos em feiras livres, o Incra fortalece a Rede de Fei- neficiadas com a primeira etapa do projeto Feira Mode- ras de Abastecimento Popular da Reforma Agrária, lo da Reforma Agrária na região. Para discutir a padro- dá mais visibilidade aos assentados e, principalmen- nização desses espaços e a aquisição de kits que com- te, resgata a dignidade e a autoestima das famílias”, põem cada banca, o Incra reuniu em Campina Grande afirma o técnico Gerson Beuter, do Setor do Terra Sol (PB), no período de 26 a 28 de março de 2014, técnicos no Incra/RS, autor do projeto Feiras de Abastecimen- da Divisão de Desenvolvimento de Assentamentos das to Popular da Reforma Agrária. superintendências regionais nordestinas. Os kits devem ser compostos por barraca padroniza- Esta primeira oficina no Nordeste teve como princi- da, lonas plásticas, saia ou tapadeira em lona com a pal objetivo elaborar o edital para aquisição dos kits logomarca da feira, sacolas plásticas biodegradáveis, para os assentados feirantes da região, através do bonés, aventais, caixas plásticas para o transporte e programa Terra Sol, priorizando os que comerciali- acondicionamento de produtos, caixa térmica, placas zam em espaços já existentes nos municípios. de iden tificação com o nome do assentamento, sua “Ao padron izar as barracas e equipamentos utiliza- localização e a quantidade de famílias assentadas. terra da gente 61] PARANÁ NÚMERO DE ASSENTAMENTOS: 325 FAMÍLIAS ASSENTADAS: 18.659 ÁREA EM HECTARES: 426.612,19 TE R R A D A GE N TE [ PARANÁ ] Assentados no Paraná formam cooperativa de autogestão rural baseada em um modelo de desenvolvimento sustentável com participação social Reportagem e fotos: Rodrigo Asturian Um grande lote [64 incra.gov.br Localizado junto à Rodovia PR-464, o assentamento Santa Maria, em Paranacity, no Paraná (a 497 Km da capital, Curitiba), tem uma organização social peculiar. Ao contrário da maioria dos assentamentos do Incra, que dividem os espaços de produção e moradia em lotes, o que se vê, logo na entrada, é uma estrutura similar à uma agrovila atuante no entorno da Cooperativa de Produção Agropecuária Vitória Ltda (Copavi). Na vizinhança, formada por 22 famílias, pastagen s e fazendas com monocultura de cana de açúcar em uma região bastante sensível à erosão, denominada de Arenito Caiuá. A Copavi completou 21 anos de existência em 2014 e é referência em todo o País e n o mundo (exporta para Europa, em especial França e Itália) na produção de açúcar mascavo orgânico, cachaça e melado, além de panificados e derivados de leite. terra da gente 65] [ PARANÁ ] explica. Conforme Gumieiro, o cultivo tradicional da cana de açúcar precisava vir acompanhado de técnicas de produção sem a utilização de defensivos agrícolas justamente para aumentar a fertilidade do solo, ainda mais em uma região sensível ao processo de erosão. O que se vê no assentamento é uma diversidade vegetal e animal que destoa de todas as propriedades monocultoras. A cana de açúcar tradicional cresce em um imenso “mosaico” formado por pessoas, áreas de proteção ambiental, hortas, pequenas pastagens de gado leiteiro, estufas para plantio de mudas, espécies florestais como Mogno–Africano ( e ) e Pau–Rei ( ). “Assim, aumentamos a eficiên cia econômica, com maior produtividade da cana e a diversificação da produção”, conclui Gumieiro. Produtos da Copavi são vendidos no mercado interno e também exportados: melado, cachaça e açúca r mascavo. [66 incra.gov.br Em um modelo de desenvolvimento sustentável por meio de cooperativa de autogestão rural, as moradias dos assentados ficam muito próximas das outras. Os espaços de uso comunitário (refeitório, es- Certificação participativa Os produtos feitos na Copavi têm certificação orgâ- critório) e de produção (usina de beneficiamento nica com o selo “Orgânico Brasil”, em um processo da cana, laticínio e plantações) são bem definidos. participativo realizado por meio da Rede Ecovida, O mesmo assentado que cuida do escritório pode conforme a lei federal nº 10.831. Para se chegar a também estar escalado para cuidar da alimentação esse nível de excelência, houve um trabalho de cons- das aves e irrigação da horta orgânica. As refeições cientização junto aos assentados do assen tamento. são feitas em um espaço comum, tal como um re- “Nesse processo, não é você que muda o ambiente. feitório de uma empresa urbana. A diferença é que A mudança ocorre dentro de você. Todo o ambiente a comida vem quase toda do próprio assentamento. é um único corpo vivo”, diz o assentado Elson Borges De acordo com o engenheiro agrônomo (e assenta- dos Santos, conhecido como Zumbi. do) da Copavi, Adilson Gumieiro, o modelo de socie- Zumbi é membro da Comissão Nacional de Agroecolo- dade atual no assentamento Santa Maria foi resulta- gia e Produção Orgânica (Cnapo), originada da Política do de uma construção coletiva que considerou a ori- Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Plana- gem dos então acampados e a realidade encontrada po). O objetivo é integrar e articular um conjunto de na nova terra a ser desbravada no entorno de uma re- políticas, programas e ações capazes de estimular a gião até então desconhecida por todos. “Viemos, na produção orgânica, e a produção de base agroecológi- maior parte, do Sudoeste do Paraná, onde prevalece ca, como uma forma de se contribuir para o desenvol- a bovinocultura do leite e produção, em pequena vimento sustentável. escala, de milho, feijão e hortaliças. É uma lógica “No âmbito do Planapo, vamos encaminhar para o totalmente diferente aqui. Por isso, tratamos desde Programa de Fortalecimento e Ampliação das Redes o princípio de conhecer o entorno do Arenito para de Agroecologia, Extrativismo e Produção Orgânica que pudéssemos experimentar até chegar à matriz (Ecoforte) um projeto de estruturação de grupos para agroecológica de produção por meio da cooperação”, fomento e certificação no Arenito Caiuá, fazendo da Copavi uma unidade de referência para assentamentos, unidades da agricultura familiar e até para empreendedores urbanos”, diz Zumbi. O objetivo, segundo ele, é ampliar o processo de diversificação produtiva na região, como ocorreu com os assentados do Santa Maria, com um manejo correto do solo, considerando o risco altíssimo de desertificação da região do Arenito. O resultado está ali mesmo: um oásis de biodiversidade no meio do “deserto verde” formado por pastagens e plantações de cana de açúcar. Uma “ilha” de biodiversidade no Arenito Caiuá O Santa Maria fica dentro da área denomina- cultu ra do café e, mais recentemente, à cana de da Arenito Caiuá, na região Noroeste do Paran á. açúcar e pastagens de gado de corte . De acordo A denominação “ Arenito” indica um amb ien te al- com o In stituto Agronômico do Paraná (Iap ar), o tamente suscetível à erosão, uma vez que há uma Arenito ocupa 16% (3,2 milhões de h ectares) da acentuad a presença de areia na composição do área total do estad o de 20 milhões de hectares. solo da região. P ara agravar a situação, a cobe rtu- As práticas agroecológicas ad otadas no assenta- ra florestal foi quase toda derrubada. Atualmente, mento melhoram a fertilidade do solo, conservam a estimativa d a Universidade Federal do Paraná a b iod iversid ade e, consequentemente, en riquecem (UFPR) é de que 18% da região ten ha cobertu ra o ecossistema com a reaproximação d e aves nativas florestal. O restante da áre a deu lug ar à mon o- (araras e p apagaios) e animais silvestres. A cooperativa mantém, ainda, um laticínio para produção de leite. Família, férias e lazer O assentado Francisco Strozak vive com a filha Janaí- onde conheceu o marido Alfonso, engenheiro eletri- na, o genro Alfonso e o neto João no assentamento. cista que agora cuida da manutenção das máquinas Francisco e Janaína fazem parte do grupo de 16 famí- na agroindústria de cana instalada no assentamento. lias que vieram de diversas regiões do Paraná (Sudes- “Fiquei impressionado com a riqueza da biodiversida- te, Centro-Sul e Sudoeste) e ficaram um ano acam- de do assentamento. Isso aqui é uma escola de vida padas na então fazenda Santa Maria até a criação do para mim em todos os sentidos, tanto na produção assentamento, em 12 de novembro de 1992. A área, como no modo de viver”, diz o espanhol. Para a his- de 256 hectares, foi desapropriada pelo Incra por ser toriadora, ainda é preciso avançar em alguns segmen- improdutiva. “Desde a época do acampamento, o tos, como cultura e lazer no meio rural. “Precisamos nosso grupo é formado por pessoas que trabalham superar a ideia que a vida no campo é apenas trabalho de forma indistinta. Os mesmos que planejam as penoso, físico. As pessoas do campo têm direito ao ações são os que executam as tarefas”, diz Francisco. lazer, descanso, férias, acesso à informação, dentre A filha Janaína é formada em História, com mestra- outros itens”, diz Janaína. No Santa Maria, todos os do na Universidade Autônoma de Madri (Espanha), assentados têm 30 dias de férias por ano. terra da gente 67] [ PARANÁ ] Adubações verdes melhoram produtividade De acordo com o en genh eiro florestal Allan Francisco Ferreira, que presta serviço de assistência técnica a partir da chamada pública de Ater, realizada pelo In cra em 2013, o plantio da cana é feito após o cultivo de adubações verdes. “Para a reforma dos canaviais, usamos a (planta de cor amarela que ilustra a págin a 64). Esta planta eleva o nível de matéria orgânica, ajuda no controle da nematóide do solo, aumenta a disponibilidade de n utrien tes importantes à cultura e, consequentemente, melhora a fertilidade do solo”, explica. “Com o correto manejo da cana de açúcar, houve uma melhora de 20% na produtividade e otimizamos a conservação do canavial. Atualmen te, a média de produção é de 65 a 70 toneladas por hectare, atingindo até cinco cortes por plantio”, explica Ferreira. Equipe trabalha na agroindústria que processa a cana de açúcar plantada no assentamento Santa Maria. Indicadores de produção em pacotes de meio quilo. de açúcar, manejados de forma agroecológica. sal de 6,5 mil kg) é dividido da seguinte forma: cana de açúcar: açúcar mascavo, cachaça e melado. 50% para atacadistas (fábrica de bolachas), 30% A produção de açúcar mascavo é de 30 toneladas para lojistas e 20% ao mercado institucional. por mês (85% é para o mercado institucional e 15% vendidos aos lojistas). ses (exportação) é estimada em 15 mil litros/ano. nadas aos atacadistas em sacas de 25 quilos. Os que acontece em Paranacity/PR semanalmente, outros 16,6% são ven didos para lojas de produtos além da venda direta realizada ao consumidor três naturais, supermercados e direto ao consumidor, vezes por semana. COPAVI Cooperativa de Produção Agropecuária Vitória Ltda. Assentamento Santa Maria: PR-464, km 01, s/nº, Paranacity-PR CE P: 87.660-000 [68 incra.gov.br Consciência ecológica, capacitação e assistência técnica contribuem para mudar a realidade de assentamentos no Centro-Oeste do Paraná Reportagem e fotos: Marina Oliveira Convergência de ações terra da gente 69] [ PARANÁ ] O empenho e a predisposição para cultivar uma pro- produção de forma sustentável. dução totalmente livre de agrotóxicos têm ganhado A maioria das famílias ainda está em fase de tran - cada dia mais adeptos nos assentamentos Oito de sição do cultivo conven cional para o orgânico, mas Junho, em Laranjeiras do Sul (a 368 km de distância algumas delas já conseguiram obter a certificação de da capital, Curitiba), e Ireno Alves, município de Rio seus lotes. São duas certificações na produção de lei- Bonito do Iguaçu (a 382 km de Curitiba). Assentados no Centro-Oeste do Paraná, a maioria dos trabalhadores tem compartilhado um senso comum: o uso da agroecologia nas suas rotinas produtivas. O carro-chefe da região, localizada no Território da Cidadania Cantuquiriguaçu, é a produção do leite, mas as hortas orgânicas também têm se fortalecido com Cooperativa foi cria da há sete anos por um grupo de mulheres te no assentamento Ireno Alves e oito lotes certificados na horta orgân ica no Oito de Junh o. A certificação agroecológica é obtida de forma participativa, por meio da Rede Ecovida, conforme a Lei 10.831/2003. Na produção dessas famílias não é utilizado qualquer tipo de agrotóxico. A adubação é orgânica com o uso a contribuição do serviço de Assistência Técnica e Ex- de biofertilizantes e caldas, que são defensivos n atu- tensão Rural (Ater) contratado pelo Incra. O objetivo rais. Além disso, os produtores estão começando a se é melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores valer da homeopatia para tratar pragas nas plantas e rurais por meio do aperfeiçoamento dos sistemas de doenças nos animais. Cooperativa A produção é escoada através da Cooperativa Agroin dustrial do assentamento Oito de Junho (Cooperju nho), que atende não só o assentamento de Laran jeiras do Sul, mas também os demais produtores assentados em Rio Bonito do Iguaçu. São 51 sócios, envolvendo cerca de 40 famílias. A Cooperjunho foi criada em 2007, a partir da iniciativa de um grupo de mulheres que deu início ao trabalho com panifício. O empreendimento cresceu e gerou a necessidade de criação da cooperativa para fomentar a entrada no mercado de alimentos da região. Parte dos produtos utilizados no panifício é oriunda da produção orgânica. São fabricados 13 tipos de biscoito, dez tipos de cuques, pão branco e integral, macarrão caseiro, roscas, pão de frutas, geleias e doce de leite. Além disso, a cooperativa está em fase de testes para a produção de queijo colonial orgânico, experiência recém implementada que deverá ser lançada em breve n o mercado. Seiscentos quilos de produtos do panifício, em média, são comercializados por semana para o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). São vendidos também 1,5 mil kg de hortaliças e frutas semanalmente para o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pane). Outra parte da produção da cooperativa é levada para cantinas, eventos e feiras de municípios da região. [70 incra.gov.br Educação O sucesso da Cooperjunho se deve em grande parte ao de quem está à frente da administra- ção do negócio. São filhos de assentados formados pelo Programa Nacional de Educação n a Reforma Agrária (Pronera) que colocam em prática o conhecimento adquirido nos cursos. É o caso de Ivandro Amorim, que em 2004 se formou em técnico em agropecuária e hoje é o presidente da cooperativa. “O curso foi pensado para discutir a produção do leite orgânico e mudar a matriz tecnológica”, conta. Segundo ele, ainda h á entraves e desafios na produção, mas também o empenho técnico na resolução. Ivete Foss, uma das admin istradoras da Cooperjunh o, teve toda a formação educacional e a profissionalizante adq uirid as pelo P ro nera. “Foi p or estar n o assentamento que tive oportunidade de Leite Agroecológico. Todos os cursos são resultado de estudar. Eu tin ha o so nho, mas n ão tinha o acesso. parcerias do Incra através do Pronera. O Pronera tornou tudo isso possível”, lembra. A predisposição e organização dos trabalhadores, Ela diz que é gratificante poder con tribuir no próprio aliadas à convergência de programas do Incra e do assentamento e ajudar as famílias a conseguir de- Governo Federal, mostram que é possível expandir senvolver a produção orgânica. Ivete concluiu o curso com eficiência uma rede de ações que visa melhorar de Técnico em Gestão de Assentamentos em 2005, a qualidade de vida e aumentar a renda das famílias formou-se em Tecnólogo em Agroecologia em 2009 rurais, contribuindo efetivamente para o desenvolvi- e, em 2014, cursou a pós-graduação em Produção de men to do campo. Queijo colonial orgânico chegará ao mercado nos próximos meses. Os pioneiros do leite orgânico na região Seu Darcy Lira e dona Teresinha Lira criaram três filhos O leite produzido pela família recebe todos os anos notas com a renda adquirida através da comercialização do positivas na análise aplicada pela Cooperativa Central de leite. Pioneiros na produção orgânica na região, aca- Captação do Leite (Coopleite), de Londrina/PR, conforme baram por se tornar exemplo para os agricultores vizi- a Instrução Normativa 62/2011 do Ministério da Agricul- nhos. O lote de 18 hectares, totalmente certificado pela tura, que regula as técnicas de produção do leite. Rede Ecovida, é uma unidade demonstrativa de pique- “Cuidados como a h igiene na ordenha e em todo teamento no assentamento Ireno Alves (Rio Bonito). o processo de manejo somam para que nossa ava- “Produzimos alimento orgânico em defesa da vida. liação na contagem bacteriana e no percentual de Nessa caminhada de mais de dez anos, foram mui- gordura seja sempre favorável”, afirma Teresinha, tas dificuldades, mas o benefício do agroecológico é que sonha em ver o leite beneficiado e transforma- maior e compensa as possíveis perdas”, declara seu do em outros alimentos, como iogurtes e queijos. Darcy. Na propriedade, são 36 cabeças de gado produ- “Os próprios leiteiros ficam admirados com a quali- zindo uma média de 1,8 mil litros de leite orgânico por dade do leite, já me falaram que até o cheiro é dife- mês, com processamento realizado pela Cooperjunho. rente quando ferve”, con ta, orgulhosa. terra da gente 71] [ PARANÁ ] Homeopatia contribui na saúde da cadeia produtiva Seu Francisco cria 200 a ves sem utilização de insumos químicos. Em 2012, a Cooperjunho foi a vencedora do Prêmio Agricultura ”, conta Eduardo Silva, veterinário e res- Nestlé de Criação de Valor Compartilhado com um pro- ponsável técnico pelo laboratório. jeto de produção sustentável de leite a partir da agri- São 400 tipos d e medicamentos que deverão se r cultura familiar. O prêmio possibilitou a implantação utilizados nas hortas e pastagens e para o trata- de um laboratório de homeopatia, cujo espaço físico mento de bovino s. As sub stân cias manipuladas também abrigará um laboratório para análise de leite. são 100 % naturais, extraídas das próprias plantas “O objetivo principal do laboratório é viabilizar a pro- e do s an imais. O laboratório atend erá 107 famí- dução do leite orgânico. Estamos em fase de con - lias nos dez municípios da região, cu ja p ro dução clusão, só faltando a liberação pelo Ministério da enco ntra- se em fase de transição agroecoló gica. Galinha caipira orgânica incrementa renda familiar A sustentabilidad e ecológica, através da varie- agroecoló gico. Segu indo esse exemplo , o casal de dade na p ro dução, é um do s pilares do sistema agricultores Francisco d e And rad e e Zofia d e And ra de, assentado s no Ire no Alves, estão in creme ntando a produção no lote com a criação de galinh a caipira orgânica. Os produtores já fornecem uma variedade de produtos da horta orgânica para o PAA e Pnae, além de comercializar cerca de 2.800 litros de leite para uma indústria de laticínios. A criação das galinhas, ainda em fase inicial e em processo de certificação orgânica, contribui para tornar o ecossistema mais equilibrado, preservando a saúde das plantas e animais. “Decidimos adotar o cultivo orgânico n ão só pelo lado econômico, mas principalmen te pela questão da saúde e da conservação do meio ambiente”, afirma seu Francisco. São cerca d e 200 aves e todas con somem milho orgânico em pasto com barreiras de taquara, bananeira e e ucalipto, en tre outras espécies vegetais. No lote foi instalada uma unidade demon strativa de galinha caip ira que de verá receber, em breve, uma máquina chocadeira. A previsão do agricultor é que as primeiras galinhas comecem a ser comercializadas em de 2015. [72 incra.gov.br Transformação de vida com a agroecologia Após verem a filha ainda criança adoecer seriamen te em decorrência de sua mãe ter trabalhado em colheita de fumo durante a gravidez, o casal de assentados Sadi Amorim e Delci Welter, do assentamento Oito de Junho, decidiu adotar um estilo de vida mais saudável. Há 18 an os passaram a cultivar plan tas medicinais para o tratamento de enfermidades e, com o tempo, a priorizar a produção agroecológica. “Nossa filha não respondeu bem ao tratamento químico e fomos vendo que para melhorar a nossa saúde seria necessário que tudo passasse a ser to- variedades de banana, mexerica e laranja. A maioria talmente natural”, lembra Sadi. Logo substituíram a é repassada para o Pnae e a outra parte é comercia- produção convencional pela orgânica e, hoje, todo o lizada para feiras no município de Laranjeiras do Sul. lote é livre de agrotóxicos. A renda é complementada com a ven da dos mais Certificados desde 2011 pela Rede Ecovida, a famí- de cem tipos de ervas medicinais que o casal ainda lia produz cerca de 18 tipos de hortaliças, além de cultiva na propriedade. Casal produz 18 tipos de hortaliças certificada s. Profissionalização gera multiplicadores Ronaldo da Siliva, formado pelo Pronera, leva conhecimento aos assentados. Nos assentamentos da região, é comum encontrar prestadores de assistência técnica cujos conhecimentos ten ham sido adquiridos por meio do Pronera. Na maioria, filhos de assentados que retornam com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento das suas regiões de origem. É o caso de Ron aldo da Silva. Ele é morador do assentamento Marcos Freire e trabalha com 294 famílias no Ireno Alves, ambos no município de Rio Bonito. “Me sinto honrado de ter a oportunidade de poder discutir agroecologia com os assentados, resgatando práticas que eles já tinham mas n ão conseguiam utilizar ”, conta. Capacitação em Agroecologia (Ceagro). Formado no ano de 2010 como técnico em agroeco- Embora já se sinta realizado com as atividades que logia pelo Pronera através de uma parceria entre o desempenha, o jovem entende que está apenas ini- Incra e a Universidade Federal do Paraná (UFPR), Ro- ciando a “peleja”. “É uma experiência muito gratifi- naldo presta assistência técnica aos assentamentos cante trazer a agroecologia para a subsistência dos atendidos pelo núcleo operacional de Rio Bon ito do assentados, con tribuindo para o uso respon sável dos Iguaçu, do Centro de Desen volvimento Sustentável e recursos naturais”, afirma. terra da gente 73] RESIDÊNCIA AGRÁRIA CURSOS: 35 ALUNOS ATENDIDOS: 1582 ASSENTAMENTOS: 358 MUNICÍPIOS: 334 TE R R A D A GE N TE [ RES IDÊNCIA AGRÁRIA ] Agroecologia na sala de aula A consolidação de uma agricultura voltada à produção de alimentos, através de práticas ambientalmente sustentáveis e livres de agrotóxicos, passa também pelos bancos da sala de aula. O Incra, por meio do seu Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), atualmente atende 1582 estudantes assentados ou que atuam em seus assentamentos. Essa formação é feita pelos cursos de especialização em Residência Agrária (lato senso) executados por Instituições de Ensino Superior (IES) que firmaram parcerias com a autarquia. Em todo o Brasil, são 35 cursos que atendem estudantes de 358 assentamentos e 334 municípios. No total, 30 instituições de en sino superior oferecem 23 cursos com foco em agroecologia e 10 em educação do campo. [76 incra.gov.br Incra investe R$ 55 milhões no Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera) para qualificação de estudantes assentados em todo o País. terra da gente 77] [ RES IDÊNCIA AGRÁRIA Estudantes da especialização em Residência Agrária debatem as vantagens das técnicas agroecológicas para a produção agrícola familiar. [78 incra.gov.br ] Um dos exemplos deste esforço acontece no Sul e Uma turma fica no campus da universidade em Ma- Sudeste do Pará. A região, segundo o professor da rabá e a outra tem aula n o assentamento Palmares II Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Uni- (município de Parauapebas), na sede do IALA Ama- fesspa), Fernando Michelotti, possui 500 projetos de zônico – Instituto de Agroecologia Latino Americano. assentamentos com mais de 70 mil famílias assen- “Reforçamos nas duas turmas a ideia de que a escola tadas. “Nosso desafio é consolidar uma produção e a assistência técnica precisam se aproximar dos as- camponesa de base agroecológica nesses assenta- sentamentos trabalh ando as temáticas da agroeco- men tos, contribuin do para uma reforma agrária sus- logia e da educação do campo”, ressalta Michelotti. tentável na Amazônia”, diz o professor. O que é pesquisado e debatido em sala de aula co- Atualmen te, em parceria com a Unifesspa, o Incra meça a ganhar forma nos assentamentos. Um projeto mantém duas turmas da especialização em Residên- que está em elaboração é a implantação de uma hor- cia Agrária com 25 alunos em cada. ta educativa na escola do assentamento Palmares II. A experiência busca envolver os estudantes do cur- cia e investirá outros 15 milhões entre 2014 e 2015 so e os moradores da localidade onde eles atuarão. para uma nova ação na modalidade Residência Agrá- O resultado é a discussão coletiva dos problemas e a ria. Será o Residência Agrária Jovem - nível médio, implantação de um modelo de produção econômica que con ta com a parceria da Secretaria Nacional da e ambientalmente sustentável. “Estamos trabalhando Juventude, além do Conselho Nacional de Desen vol- para que a experiência acumulada com essas turmas vimento Científico e Tecnológico. Este último selecio- do Residência Agrária possa subsidiar projetos peda- nará projetos para formação de jovens do meio rural gógicos dos novos cursos e fortalecer uma perspectiva em agroecologia. da universidade de voltar-se para a solução dos graves O objetivo é formar e certificar em nível médio e/ou problemas agrários da região Sul e Sudeste do Pará”, profissionalizante esses jovens para que desenvolvam afirma Fernando Michelotti. novas experiências em agroecologia e atuem em suas O Incra investiu R$ 40 milhões na parceria com o próprias unidades de produção, comunidades tradicio- CNPq para viabilizar os projetos que estão em vigên- nais, na agricultura familiar e nas escolas do campo. Consolidar as práticas agroecológicas Coorden adora Geral de Educação do Campo e Cida- Segundo dados da II Pesquisa Nacional sobre Educação dania, Clarice dos Santos sustenta que os cursos de na Reforma Agrária, entre o final de 2014 e início de especialização em agroecologia precisam ir além de 2015 estarão formados cerca de 8 mil estudantes. A pes- produzir conhecimento. Ela ressalta, ainda, que a for- quisa sistematizou dados desde 1998. ”Temos um qua- mação em agroecologia também é ofertada em cur- dro de profissionais formados capazes de implementar sos de nível médio, superior e n as especializações. as ações previstas no Plano Nacional de Agroecologia e “É preciso avançar na consolidação de práticas que Produção Orgânica (Planapo) porque estamos há mais transformem as áreas em que o projeto estiver in- de uma década formando e capacitando os próprios tra- serido”, diz. balhadores com esta finalidade”, frisa Clarice dos Santos. A realidade muda também no Semiárido Em Campina Grande, na Paraíba, 60 alunos foram Semiárido brasileiro era uma área inóspita, imprópria aprovados no curso de especialização em agroecolo- à vida humana. Para ele, realizar uma revisão crítica gia pelo Residência Agrária. O curso é realizado por dessa forma de enxergar a região é fundamen tal. meio de uma parceria entre a Universidade Federal “Os estudantes começam a assimilar o protagonismo de da Paraíba e o Instituto Nacional do Semiárido. uma reforma agrária popular e de característica agroe- As ativid ad es dos estudantes são desenvolvidas cológica capaz de fazer frente à lógica do agronegócio”, em 16 comunidades/assentamentos da refo rma diz. Segundo o professor, o conhecimento traz uma agrária em seis estad os do Semiárido Brasileiro. nova perspectiva para o futuro de cada trabalhador . O trabalho é acomp anhado pelos mon itores e pro- “A partir do momento que se produz e se absorve novo fessores d o curso. conhecimento convivendo com o Semiárido, isso refle- O professor José Jonas Duarte da Costa avalia que ao te positivamente nos indivíduos e possibilita o cresci- longo dos anos foi construída uma visão de que o mento coletivo da comunidade” observa. terra da gente 79] RIO DE JANEIRO NÚMERO DE ASSENTAMENTOS: 78 FAMÍLIAS ASSENTADAS: 5.950 ÁREA EM HECTARES: 178.696,40 TE R R A D A GE N TE [ RIO DE JANEIRO ] Produtos da reforma agrária são destaque em feira orgânica carioca Minifloresta Maravilhosa Com vista para dois importantes cartões postais do Rio de Janeiro, o Pão de Açúcar e o Outeiro da Glória, a Feira Orgânica da Glória se incorporou ao circuito de feiras cariocas. Semanalmente passam por ela centenas de visitantes em busca de alimentos sem agrotóxico. Nesse cenário bucólico, a barraca do agricultor Erenildo da Silva é o exemplo da reforma agrária que dá certo e oferece frutos. [82 incra.gov.br terra da gente 83] [ RIO DE JANEIRO ] Morador do assentamento Casas Altas, em Seropé- dona Aldeni, conseguiram criar suas três filhas, hoje dica, distante 75 Km da capital carioca, o agricultor casadas, e m um sítio que mais parece uma mini- oferece aos fregueses uma variedade de alimen tos floresta. Da diversidade de árvores encontradas, resultantes de sua produção diversificada. Palmito, acerola, manga, feijão, abóbora, abacaxi, can a de açúcar, banana, inhame, cebola, abacate, fruta do conde, carambola, jabuticaba, goiaba, milho, quiabo, pepino, caju, cajá, limão e aipim são apenas alguns [84 incra.gov.br destacam-se o Ipê, o Jatob á, o Jequitibá, a Sapucaia, o Pau-brasil e a Palmeira Imperial. Quase não há espaço vazio para circular no lote. “Aqui não tinha nada, era tudo pasto e a gen te sofria dos exemplos de comidas saudáveis que chegam à muito com o fogo. Eu que plantei tudo e, depois que mesa do carioca. a mata começou a fechar, nunca mais entrou fogo”, Somente com a ren da da feira, Erenildo e a esposa, orgulha-se o assen tado. Dificuldades viver no campo junto com sua família. No início, nada Erenildo nasceu em Presidente Kennedy, no E spírito foi fácil. A paisagem do assentamento era formada por Santo, onde aprendeu a trabalhar na lavoura. Seus pastagens degradadas e o local sofria com constantes pais eram meeiros em uma pequena propriedade de incêndios, o que deixava as condições do solo bastante arroz e café e precisavam que os oito filhos ajudas- desfavoráveis para a prática da agricultura. sem na roça. Com a morte dos pais no início dos anos “Por conta do solo ruim, eu não conseguia implantar 1980, Erenildo foi tentar a sorte no Rio de Janeiro. o sistema que aprendi no Espírito Santo, porque lá eu Chegou a trabalhar num supermercado, mas nunca não botava veneno, seguia as fases da lua. Mas aqui perdeu a vontade de voltar à agricultura. nada pegava, eu tive praga de lesma que quase aca- A criação do assentamento Casas Altas, em 1993, foi bou com a plantação, também dava muito besouro, a oportunidade que Erenildo encontrou para voltar a era tudo bem difícil”, relembra. Sistemas agroflorestais A saída encontrada por Erenildo diante das adversidades foi abrir as portas de seu sítio para a universidade. Próximo ao assentamento funciona o campus da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e a sede da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Agrobiologia (Embrapa Agrobiologia). Foi a partir do contato com o Grupo de Agricultura Ecológica (GAE) da Universidade Federal do Rio de Janeiro - realizador de atividades de ensino, pesquisa e extensão na temática agroecológica - que o assentado iniciou as experiências agroflorestais em seu sítio. Ele fez diversos cursos n a universidade e, com pesquisadores da Embrapa, iniciou o plantio de frutas, madeira de lei, lavoura branca (milho, arroz e feijão) e olericultura (folhosas, raízes, bulbos, tubérculos e frutos diversos). Com a adubação verde oriunda de podas e quedas de folhas das árvores, percebeu a melhora do solo e passou a usar esse sistema como trunfo para recuperar a fertilidade de suas terras. “Eu cultivo aqui a gliricídia, que fixa o oxigênio na terra, planto minhas mudas no solo, e não na estufa, e não roço e nem capino para fazer o plantio”, explica Erenildo, que afirma ter também utilizado a criação de minhocas para melhorar o solo. A partir do contato com a equipe da UFRRJ, o assentado se aproximou da Associação dos Agricultores Biológicos do Estado do Rio de Janeiro (Abio), uma Garantia (SPG), pelo qual os componentes da rede de produção orgânica realizam visitas nas propriedades para avaliar se os produtores cumprem de fato as exigências da produção orgânica. “Essa é a garantia de que levamos para a feira produtos comprovadamen te sem agrotóxicos”, afirma Erenildo. O assentado participa todo sábado da Feira Orgânica da Glória. “O alimento orgânico está tendo uma boa saída. Ele não precisa ser bonito, pois a sua maior propaganda é ser saudável”, comenta. Para aqueles que reclamam do preço mais alto dos produtos orgânicos, ele justifica: “a perda do produtor é muito grande com o orgânico. A gente planta 100%, mas colhe em torno de 30%, por isso o preço sobe”, explica. organização sem fins lucrativos que coordena o Circuito Carioca de Feiras Orgânicas em parceria com Serviço a Secretaria Especial de Desen volvimento Econômico Solidário da prefeitura do Rio de Janeiro. Associação dos Agricultores Biológicos do Estado do Rio de Janeiro (Abio) Certificação Rua Dr. Júlio Otoni, 3 57/01 Santa Teresa - Rio de Janeiro - RJ Telefones: (21) 3495-2898 - de segunda à sexta, O sítio de Erenildo recebeu o Certificado de Conformidade Orgânica, emitido pelo Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade (Opac), credenciado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e responsável legal pelo processo perante os órgãos oficiais e a sociedade. O agricultor também se in corporou ao Sistema Participativo de das 9h às 13h (exceto às quintas-feiras) Endereço eletrônico: [email protected] Feira Orgânica da Glória Todo sábado, das 7h às 13h, na rua do Russel, em frente ao número 300, ao lado da estátua de São Sebastião e do Memorial Getúlio Vargas. terra da gente 85] RIO GRANDE DO SUL NÚMERO DE ASSENTAMENTOS: 343 FAMÍLIAS ASSENTADAS: 12.571 ÁREA EM HECTARES: 293.090,26 TE R R A D A GE N TE [ RIO GRANDE DO SUL ] Aprendendo com a natureza Hortigranjeiros de qualidade produzidos no assentamento Integração Gaúcha conquistam frequentadores de feira em Porto Alegre Reportagem e fotos: Keila Reis [88 incra.gov.br Banca do grupo na Feira Agroecológica da Redenção: qualidade e variedade fidelizam o público consumidor. Produzir alimentos saudáveis, livres de agrotóxicos e em sintonia com a natureza é o objetivo de um grupo de assentados de Eldorado do Sul, na região metropolitana de Porto Alegre (RS). Há 22 anos eles se dedicam à horticultura totalmente orgânica e estão entre os pioneiros deste segmento na tradicional Feira Agroecológica da Redenção, realizada semanalmen te em um dos parques mais famosos da capital gaúcha. O grupo é formado por oito famílias do assentamento estadual Integração Gaúcha, que cultivam juntas cerca de quatro hectares de hortas. Elas produzem 42 espécies de verduras, temperos e h ortaliças, desde alface dos tipos comuns a outras mais finas – como a frisée (parecida com a escarola, mas com folhas mais crespas e crocantes) ou a italiana (a primeira muda foi trazida da Itália) – e raízes e plantas aromáticas não convencionais, utilizadas na culinária oriental, tailandesa e indiana, como o manjericão roxo, a bertalha e o sichô. terra da gente 89] [ RIO GRANDE DO SUL ] Os assentados também preservam culturas tradicio- Segun do e la, o re sgate das espécies con tribui para nais que desapareceram do mercado. A azedinha (da o equilíbrio ambiental. “Trabalhamos com respeito família das folhosas) é uma das mais procuradas na à natureza, interferimos o me nos possível na vida Feira da Redenção, assim como o alho nirá, ambos do meio ambiente. Por isso, produzimos de acor- produzidos somente pelo grupo. “A gente trouxe as do com a época de cada produto. O tomate, por primeiras mudas da casa da minh a mãe, que, por exemp lo, é d e verão, não adianta forçar para ter no sua vez, trouxe da casa da mãe dela. Iniciamos o cul- inverno, p orque a natureza nos d á no verão devi- tivo ainda no acampamento e mantivemos até hoje do às propriedades que precisamos ne ste período ”, porque quase nem existe mais”, conta Marines Riva. explica Marines. Opção de vida é cuidadosamente natural desde o preparo da terra, Famílias do assentamento e a produção orgânica: renda e saúde. Junto com o marido, José Mariano Matias, Marines [90 incra.gov.br passando pelo plantio, a colheita e a comercialização. lembra que iniciaram a horta para o autossusten- O trabalh o é inteiramente braçal, de “domingo a do- to logo que chegaram ao assentamento. Após dois mingo”, e envolve, além das oito famílias assenta- anos, receberam assistência de uma organização não das, outros dois diaristas, conforme a necessidade. governamental e intensificaram a produção, sempre O cuidado é tanto que os maços de temperos são orgânica. amarrados com cordão de algodão, evitando o uso No início, a opção pela agroecologia também foi feita de materiais sintéticos ou plásticos para não conta- em função da redução de custos com adubação (uti- minar as folhas. As sementes e as mudas também lizavam restos de alimentos, plantas, entre outros) e são produzidas pelos próprios assentados, com o de- maquinário. Agora, Matias afirma que todo o processo vido tratamento ecológico. “A gente aprende com a natureza, vai observando possuem consumidores fiéis, que chegam antes da e tem prazer no que faz. Optamos pela agroecolo- abertura da feira, por volta das 7h. “ Temos clientes gia porque nós vamos ter saúde, a natureza fica em antigos, principalmente os orientais ou donos de res- equilíbrio e os nossos consumidores ganham saúde taurantes vegetarianos. Eles nos procuram porque sa- também. Nosso remédio é o que a gente come”, bem que a gente tem o produto e é de qualidade. destaca Marines. Até mesmo nos fazem pedidos específicos de iguarias que a gente procura e tenta cultivar”, conta o assentado. Mercado garantido Cada família recebe entre R$ 2 mil a R$ 5 mil, já descontados os custos com diaristas, frete e manu- Os assentados produzem em torno de 300 caixas por tenção. O grupo abastece, ainda, dois mercados da semana de h ortigranjeiros. Além da Redenção, eles região e entrega couve, alface, temperos, beterraba comercializam os produtos também no bairro Meni- e espinafre para o Programa Nacional de Alimenta- no Deus, em Porto Alegre, em feira que ocorre às ção Escolar (Pnae) e o excedente da produção para o quartas-feiras e aos sábados. Programa de Aquisição de Alimentos (P AA). “Começamos aos poucos, a cada 15 dias na Reden- Também fazem parte, junto com outras nove famí- ção. Vendíamos na calçada, na saída da missa”, re- lias, da Cooperativa de Produtos Orgânicos Pão da corda Matias. Hoje, com uma estrutura própria, eles Terra, que produz panifícios integrais e orgânicos. Quatro hectares de horta são cultivados pelas famílias no Integração Gaúcha. O assentamento O assentamento Integração Gaúcha – localizado a 53 Km de Porto Alegre – foi criado pelo governo estadual em 1992 e, seis anos depois, reconhecido pelo Incra, passando a integrar as políticas nacionais de reforma agrária. Uma delas é a assistência técnica, social e ambiental às famílias, prestada há cinco an os por equipes contratadas pelo Incra/RS. O investimento total chega a aproximadamente R$ 250 mil. Atualmen te, o acompanhamento é feito pela Cooperativa de Prestação de Serviços Técnicos (Coptec), que também cuida da certificação orgânica dos produtos. Conforme o técnico Artêmio Marques, as hortas são certificadas pelo Organismo de Controle Social da Cooperativa Central de Assentamentos (OCS-Coceargs). A fim de incentivar a participação feminin a, o Incra/RS também liberou, entre 2013 e início de 2014, R$ 117 mil para 39 mulh eres assentadas que desen volvem projetos coletivos de panificação, horticultura e produção animal. tamanho médio de 17 hectares cada. Além da horti- Com capacidade para 74 famílias, a área total do as- cultura, também há produção de arroz irrigado (maior sentamento é de 1.256 hectares. Os lotes possuem parte agroecológico) e pomares para autoconsumo. terra da gente 91] RONDÔNIA NÚMERO DE ASSENTAMENTOS: 217 FAMÍLIAS ASSENTADAS: 38.773 ÁREA EM HECTARES: 6.183.754,72 TE R R A D A GE N TE [ RONDÔNIA ] Cada um com sua receita A alimentação da família e a comercialização dos produtos são os dois pilares do trabalho agroecológico em hortas e pomares iniciado em 2013 pelo programa de Assistência Técnica do Incra (Ater). O trabalho começou com a adoção da adubação e fun gicidas n aturais pelos agricultores dos assentamen tos Flor do Amazonas I, II III e IV e Paraíso das Acácias, no município de Candeias do Jamari (RO), distante 24 Km da capital do estado. [94 incra.gov.br Hortas e pomares em Rondônia utilizam adubação e fungicidas agroecológicos e a capacitação dos assentados incluirá até orientação postural com fisioterapeutas Reportagem e fotos: Jeanne Margaretha Machado terra da gente 95] [ RONDÔNIA ] Agrônomo Francis Ra phael (foto acima) Cidade ensina como utilizar fungicida natural na horta. [96 incra.gov.br “Trabalhamos com horta doméstica com 74 famílias incluindo jiló, quiabo, maxixe, pepino e outros ali- e horta comercial com 12. Iniciamos com os cursos mentos”, disse Edvanete. A ampliação, segundo ela, ensinando as técnicas agroecológicas na preparação depende de investimentos, especialmente para cons- da terra e agora estamos na etapa de orientações in- trução de poço artesiano e aquisição de maquinários. dividuais”, explica o agrônomo Francis Raphael Bar- O casal teve problemas com ataque de pulgões na bosa de Oliveira Cidade, que ministrou os cursos de plantação de couve e a alternativa discutida com o Composto Laminar e Compostagem. agrônomo foi utilizar calda de cebola e alho, já que Após a realização dos cursos, algumas famílias ime- o cheiro forte repele a praga. A alta umidade e o diatamente iniciaram o cultivo com as novas técnicas calor da região favorecem o ataque de determinados e já comercializam os produtos. O casal de assenta- insetos e fungos. dos Edvanete Moreira da Silva Cruz e Cléberson do “Não existe uma fórmula pronta na agroecologia. Império Rodrigues, que está plantando cebolinha, Cada um tem a sua receita, então, vamos testando e couve e coentro, é um exemplo. aproveitando o conhecimento individual. A troca de “Hoje temos uma renda média mensal de R$ 1 mil informações é fundamental para o sucesso”, explica com nossa horta e queremos ampliar o plantio o agrônomo. Fungicida natural e aplicação de calda bo rd olesa, u m fungicida na- O agricultor Sebastião F élix dos Santos p ossui um tural, nos locais do corte para evitar a e ntrad a do pomar com cerca de 80 0 pés de laran ja, limão e me- fungo . xerica, recen teme nte atacado também p or pu lgões “É bom trabalhar assim, mas é muito difícil tam- e fumag ina, uma d oença provenien te d e fun gos. bém”, afirma o agricultor ao relembrar as diversas O trab alho realizad o em con junto com o agrôn o- tentativas feitas para conter naturalmente as pragas. mo envolveu u ma po da oste nsiva p ara arejar os Seu projeto agora é montar uma agroindústria agro- pés, já que a praga g osta de ambientes abafados, ecológica para produção de polpa de frutas. Como as vantagens da agroecologia são inúmeras, passando pelo respeito a todos os seres, ao solo e sua Fisioterapia O agrônomo Francis Raphael conta que já registrou vá- recuperação, prevenção de doenças nos agricultores e rios casos de agricultores que trabalhava com horta e consumidores, não agressão à natureza, baixo custo e pararam a produção por problemas na coluna vertebral trabalho coletivo, o esforço do grupo continua e diver- e joelhos. Por isso, ele pretende agregar profissionais sas famílias permanecem utilizando as técnicas apren- de Fisioterapia às oficinas de agroecologia para orientar didas nos cursos. sobre a postura correta durante o manejo com a terra. Do acampamento ao assentamento com produção agroecológica Shirley Francisco de Paula está no assentamento Flor do Amazonas II há nove anos, desde a época em que a área ainda era um acampamento de trabalhadores rurais na então fazenda Urupá. Retomada pelo Incra, a fazenda foi transformada em 2008 nos assentamentos Flor do Amazonas I a IV, com 375 famílias. Com o marido, Amarildo Salvador Alves, e o auxílio da assistência técnica, a agricultora cultivou sua horta agroecológica em 2013. Plantaram cebolinha, chicória, coentro, jambu e pepino, chegando a obter uma renda de R$ 800,00 por semana. “Usamos cama de frango, esterco do curral e o mato cortado na adubação. Chegamos a ter oito canteiros de cebolinha com 70 metros cada”, conta Shirley. Na ún ica vez que ela foi testar adubo químico, enfrentou problemas. “Matei canteiros de chicória e coentro porque o produto natural usamos à vontade, já o químico é muito forte”, disse. Shirley faz um balanço da sua trajetória n as terras da antiga fazenda, local de grandes conflitos, muito boa que o Incra fez para nós. Hoje, com meus como in cêndios crimin osos em 2007, até o resul- dois filhos, posso comer bem, comprar uma televisão, tado de sua produção agroecológica. “Estou aqui uma máquina de lavar roupa, minha casa está arru- desde 2005 e nunca tive uma vida tão estabilizada mada e vivo bem. Muitos pais de família foram embo- como tenho agora. Nosso assentamento começou ra e moram mal nas periferias urbanas. Eles podiam a andar com a assistência técnica. Foi uma coisa estar aqui produzindo seu próprio alimento”. Assistência Técnica e produção agroecológica deram estabilidade à Shirley para viver no assentamento. terra da gente 97] RORAIMA NÚMERO DE ASSENTAMENTOS: 67 FAMÍLIAS ASSENTADAS:16.537 ÁREA EM HECTARES:1.445.926,55 TE R R A D A GE N TE [ RORAIMA ] Produção aliada à sustentabilidade [100 incra.gov.br Em Roraima, assentados fazem curso de tecnólogo para produzir com sustentabilidade, sem o uso de agrotóxicos Reportagem e fotos: Loide Gomes Expedito Carlos da Silva caminha pela horta e lavoura de feijão cultivados sem o uso de agrotóxicos. O agricultor Francisco das Chagas Batista, mais conhecido por Martinho da Vila, se enche de orgulho quando troca a lida no campo por uma imersão de vinte dias de estudos em tempo integral na Escola Agrotécnica da Universidade Federal de Roraima (UFRR). Ele é um dos 52 alunos que estão no curso de tecnólogo em agroecologia oferecido pelo Incra em Roraima, por meio do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera). terra da gente 101] [ RORAIMA ] Graças aos ensinamentos obtidos em sala de aula, a assentamento Nova Amazônia, na zona rural de Boa produção no seu lote agora é sustentável. “Antes, ate- Vista. Ele vive no lote dos tios que o adotaram com ava fogo para limpar o terreno e plantar. Hoje, junto mais dois irmãos que se formaram técnicos em agro- tudo e faço adubo orgânico”, narra. A mudança trou- pecuária n a mesma unidade de ensino. xe ganhos para a saúde da família, reduziu custos e A família cria aves e produz hortaliças, tu do sem melhorou a produtividade. “Crio frango de corte e a o uso d e agrotóxicos ou adu bos químicos. Bem es- perda era de 50%. Agora, com o manejo adequado, truturado, o lote tem e nergia elé trica, poço artesia- caiu para 10%”, comemora. no, sistema de irrigação e abatedouro. “Mas faltam Mais velho da turma, Francisco das Chagas, 64, é o lí- recursos para custeio e investimentos”, comenta o der do grupo e se contagia com o entusiasmo dos mais pai, Clério Andrade Laus, 40, que tem um galpão jovens. Kléber Araújo Santos de Sousa, 22 anos, sonha vazio pronto para criar mil p in tos em sistema de com um mestrado em agroecologia. “Não fosse esse confin amento. curso do Incra, jamais teria condições de ingressar no Toda semana eles montam barracas em duas feiras ensino superior ou sonhar com o mestrado. Quero me de Boa Vista para comercializar a produção direta- especializar e trabalhar aqui. Meu objetivo é mudar men te aos consumidores. Aos sábados, levam cheiro a mentalidade das pessoas para uma produção mais verde, couve, rúcula, quiabo, pimenta e frango para barata e saudável, sem o uso de agrotóxicos”, diz. a feira agroecológica montada pelo Sebrae, no bairro Kléber mora a 1 Km da Escola Agrotécnica - que fica Caranã. O excedente é vendido aos domingos no Ga- no campus Murupu da UFRR, encravado no meio do rimpeiro, a maior feira livre do estado. (UFPB), Jandiê Araújo da Silva. “A UFRR quer colocá-lo na grade regular da Escola Agrotécnica”, revela. Todos os alunos são assentados. A metodologia de ensino é dividida pelo tempo-escola (de vinte dias de aulas em tempo integral, inclusive aos sábados) - e pelo tempo-comunidade (quando os agricultores voltam para seus lotes para trabalhar durante trinta dias). Neste período, devem fazer relatórios sobre a produção e recebem a visita de professores. No tempo-escola, recebem hospedagem e alimentação gratuitas. Também têm acesso a biblioteca, laboratórios e internet. O convênio com a Universidade Federal de Roraima cobre todos os custos dos alunos. “Sem esse apoio, os assentados não têm condições Professor Jandiê Araújo, coordenador do curso: “assentados querem o diploma de nível superior”. [102 incra.gov.br Curso deve entrar para a grade da UFRR de dar continuidade à educação formal”, explica a coordenadora do Pronera em Roraima, Derocilde Pinto. A grade curricular é ampla para abranger ao máximo o potencial dos assentados. Há desde disciplinas bá- O curso de tecnólogo em agroecologia já é uma expe- sicas, como olericultura, mecanização agrícola, irriga- riência exitosa, embora ainda esteja na metade das ção e drenagem, manejo de pastagem, até as mais aulas, segundo seu coordenador, o professor doutor complexas, como sanidade animal, melhoramento em Agronomia pela Universidade Federal da Paraíba genético e economia solidária. A maioria já produz dentro da técnica agroecológi- média das universidades. “A evasão não chega a 5%. ca e o resultado é a melhoria da qualidade de vida Eles querem obter o diploma de nível superior”, ob- dos assentados e de seus familiares, além da oferta serva Jandiê. de produtos mais saudáveis para os consumidores. O Pronera tem a missão de ampliar os níveis de esco- “Esses lotes servem de espelho para a comunidade, larização formal dos trabalhadores rurais assentados. que passa a assimilar os conceitos da agroecologia”, Em Roraima, 9.497 assentados já foram beneficia- constata o professor, que visitou os lotes de todos dos, investimento que ultrapassa R$ 1 9,7 milhões. os alunos. Atualmen te, 1.785 alunos estão matriculados em A busca dos assentados pelo con hecimento e o com- cursos de alfabetização, ensino fundamental, médio, prometimento com o curso também estão acima da superior e na especialização em Residência Agrária. Os produtos com selo agroecológico atraem consumidores que buscam um estilo de vida mais saudável. Produtos com selo agroecológico são vendidos em feira Produzir durante a semana e trabalhar em feiras aos produz mais p or falta de mercado. sábados e domingos é a rotina de muitos agriculto- Rosilene Santos de Sousa e a nora, Carolina Oliveira, res do assentamento Nova Amazônia, localizado na produzem e comercializam maxixe, quiabo, limão, zona rural de Boa Vista. Hortaliças, legumes, frutas e feijão, rúcula, cebolin ha, coentro e couve. Depois que pequenos animais são os principais produtos levados deixou de usar agrotóxico na plantação, diz que nun- à mesa do roraimense. ca mais gripou. “ Minha saúde melhorou”, constata. O cearense Exp edito Carlos da Silva (foto página Estes agricultores fazem parte do programa Produção 101) planta feijão, cebola, cebolinha, coentro, ma- Agroecológica Integrada e Sustentável (Pais), desen - caxeira e couve no lote de 11 h ectares da vicinal volvido pelo Sebrae em parceria com a Fundação 2. Ele fatura, em média, R$ 2 mil por mês e só não Banco do Brasil. terra da gente 103] SANTA CATARINA NÚMERO DE ASSENTAMENTOS: 160 FAMÍLIAS ASSENTADAS: 5.097 ÁREA EM HECTARES: 104.426.59 TE R R A D A GE N TE [ SANTA CATARINA ] No meio-oeste catarinense, agricultores e consumidores se unem em busca de uma alimentação livre de agrotóxicos Reportagem e Fotos: Vanessa Ibrahim Aliança pela saúde [106 incra.gov.br “Meu pai tinha muita ânsia, então era eu quem passava o veneno no fumo. Ficava com a respiração ofegante e dor de cabeça. Era um trabalho que tomava todo o tempo e tínhamos que comprar do vizinho o feijão para comer. Vinha carregado de veneno. Foi aí que passamos para o orgânico, para cuidar do que comemos e do que os outros comem”. O relato é de Fabio Chagas, filho de assentados do projeto Dandara, localizado em Fraiburgo, no meio-oeste catarinense. “Acho que grande parte das doenças de hoje vem do veneno, dos antibióticos e dos hormônios usados no campo. Não quero mais isso para minha família nem pra ninguém”, diz Vitelsso Carlesso, do assentamento Faxinal dos Domingues I “ (foto ao lado). terra da gente 107] [ SANTA CATARINA ] Ariel Stefaniak, Ariel Bonadiman, Fabio Alípio e Fabio Chagas: nova geração acredita na dissemina ção dos orgânicos. [108 incra.gov.br Como muitas famílias do estado, a dele também ti- para a agroecologia e agora repassa sua experiência nha a renda baseada no cultivo do fumo, que além como técnico da Assistência Técnica e Extensão Rural de requerer a utilização de agrotóxico em larga escala, (Ater). Sentado à mesa com os colegas de sua geração é base para a fabricação de cigarros responsáveis por na sede da Cooperativa de Assentados da Região do muitos tipos de câncer. Chagas acompanhou a trans- Contestado (Coopercontestado), ele conversa sobre a formação do lote para a lavoura orgânica de hortaliças venda do feijão orgânico cultivado nos assentamentos e criação de gado de leite, que hoje rendem cerca de e comercializado ali. Todos são unânimes na crença de R$ 5 mil por mês. Teve formação educacional voltada que o caminho agroecológico é o futuro. Entrega em domicílio consumidores, que acabaram criando vín culo com os E o futuro já está sendo plantado em Fraiburgo. produtores”, conta Alípio. Do lote de Fabio Chagas, do vizinho Fabio Alípio e de O projeto nasceu no curso de especialização do téc- mais duas famílias saem hortaliças orgânicas certifi- nico de Ater e também filho de assentados Ariel cadas que abastecem escolas e órgãos públicos pelos Bonadiman. “Pesquisei a demanda na cidade e ide- programas de Aquisição de Alimentos (PAA) e de Ali- alizei o projeto que, por não ter intermediários, ga- men tação Escolar (Pnae). Desde o segundo semestre rante o mesmo preço do produto convencional para de 2013, a produção das famílias chega diretamente quem compra e mais lucro para quem vende”, conta. a várias casas da cidade em cestas orgânicas. “Entre- “Recebo o produtor em casa, tiro as dúvidas e até gamos toda sexta-feira vin te cestas diretamente aos já troquei receita quando veio uma verdura que eu nunca tinha comido. Assim eu confio que o produto é orgânico mesmo, acredito mais nele do que no supermercado”, afirma Daniel Steinhauser, um dos clientes O cabeleireiro Daniel Steinhauser a posta nos orgânicos para cuidar da saúde e evitar o desperdício em casa. do grupo. Daniel ainda cita como vantagem a durabilidade dos alimentos que, por serem orgânicos e colhidos na véspera da entrega, demoram mais a estragar. Feijão preto orgânico é comercializado com a marca que reúne produtos da reforma agrária catarinense e selo da Rede Ecovida de agroecologia. Origem nos grãos A agroecologia nos assentamentos de Fraiburgo e região teve início com o cultivo de feijão. Famílias que plantavam o grão convencional migraram para o agroecológico e hoje fazem o cultivo associado a outras culturas e às criações, mantendo todo o lote orgânico. A certificação é feita de forma participativa. Agricultores, técn icos e consumidores se reúnem no núcleo denominado Alto Vale do Rio do Peixe, que tem 35 produtores certificados divididos em seis grupos. “Em comissões de ética, os próprios grupos verificam se as regras da agroecologia estão sendo cumpridas e eles também recebem visitas da Rede a umidade dos grãos, dado polimento, separados Ecovida e do Ministério da Agricultura, Pecuária e os subtipos, feita a embalagem e encaminhada a Abastecimento (Mapa)”, explica Ariel Stefaniak, téc- distribuição . Na média, são comercializadas 50 tone- nico de Ater. ladas de feijão orgânico por safra. O preço varia com As sacas de feijão saem dos assentamentos certifi- o mercado e é calculado em 30% a mais sobre o cadas e chegam à agroindústria da Coopercontesta- valor da saca convencional. Em 2014, cada saca de do, que também passa por certificação. Lá é retirada 60 kg rendeu de R$ 170,00 a R$ 210 ao produtor. Sabedoria antiquímica Trabalhando com agrotóxico perto de casa, veio o “O agrotóxico abala até os nervos”, diz Vitelsso Antônio “estalo” de que algo precisava mudar. A família cul- Carlesso (foto página 107) buscando expressar toda a tivava pêssego e a orientação na época era ter as rejeição que atualmente nutre pelos químicos. Assen- árvores perto de casa para colher mais fácil e passar tado no projeto Faxinal dos Domingues I desde 1990, agrotóxico em tudo. “A gente se cobria para passar o há dez anos começou a converter a produção para a veneno com a máquina costal, depois tirava e ficava agroecologia. Iniciou com o feijão, veio o caqui e agora conversando ali, na varanda, como se ele não ficasse o projeto é certificar o leite e vender como orgânico. no ar, não estivesse em tudo o que a gente tocava”, A consciência foi crescendo na conversa com os téc- conta Carlesso. Desde então, ele eliminou os agrotóxi- nicos, na observação das doenças que surgiam e cos, parou de ser vítima em sua própria terra e passou nas sensações que o veneno trazia ao próprio corpo. a ser sujeito de sua transformação orgânica. terra da gente 109] [ SANTA CATARINA ] Antenor, Luciane, Luana e Rafael Ehrenbrink: família aposta no modelo de cultivo que garante saúde ao produtor e ao consumidor. Contra a força da soja e a contaminação dos agrotóxicos, família ergueu seu pequeno universo agroecológico e produtivo Reportagem e fotos: Vanessa Ibrahim Resistir é orgânico Erguendo barreiras de árvores contra os ventos que trazem agrotóxicos e cavando valetas para desviar a chuva venenosa que escorre da lavoura vizinh a, encontram-se os catarinenses Ehrenbrink. Há oito anos, a família deixou um barraco de lona para se tornar beneficiária da reforma agrária no assentamento Pátria Livre, em Correia Pinto/SC, e encarou o desafio da agroecologia. E assim, do lote foi brotando milho, feijão, batata, moranga, cebola, alface, melancia e ainda h ouve espaço para a criação de galin ha, porco e gado. “Se fosse no convencional, não íamos fazer tudo o que estamos fazendo”, comemora Antenor Aloísio Ehrenbrink. [110 incra.gov.br terra da gente 111] [ SANTA CATARINA ] Cercar o lote das ameaças de contaminação é preocupação da família. [112 incra.gov.br Para subsistência e comercialização, tudo é cultiva- dos Santos, técnico da assistência técnica contratada do sem adubos químicos, agrotóxicos e hormônios. pelo Incra para atender o assentamento. Uma diversidade que garante o sucesso do empreen- Segundo Santos, a opção pelo modo de produção dimento familiar e a certeza de que a opção pelo culti- orgânico requer paciência no início, em que o solo vo agroecológico não só é possível como vale a pena. ainda está tóxico devido à adubação química, e pode “Cultivar orgânicos é mais trabalhoso, mas dá mais di- levar de dois a quatro anos para render bem com nheiro, além de fazer bem para todo mundo. Hoje, se o adubo orgânico. Entretanto, após esse período, a fosse no convencional, não íamos fazer tudo o que es- economia com agroquímicos e o maior preço alcan- tamos fazendo”, comemora Antenor Aloisio Ehrenbrink. çado pelo produto compensam. “Esse agricultor sempre buscou o cultivo orgânico Ainda que a produtividade seja menor, as 18 tonela- por pensar que o alimento com agrotóxico que não das de cebola colhidas pelos Ehrenbrink nesse ano, por deseja para sua família não deveria também chegar exemplo, se aproximam das 21,6 toneladas por hecta- a uma criança, a outra família. Por isso enfrentou re, que é a média estadual para o cultivo convencional as dificuldades do começo, insistiu e hoje tem um de cebola, segundo a Empresa de Pesquisa Agropecuá- bom mercado de venda”, conta Everson Rodrigues ria e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri). Crédito e associativismo impulsionam produção Para garantir uma boa comercialização, os Ehrenbrink certificam anualmente a produção e associaram-se a outros produtores agroecológicos da região. Juntos, enviam a produção para uma grande rede de supermercados com sede em São Paulo e também ven dem para marcas regionais e para o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). “Vender junto ajuda bastante, mas ainda não temos marca própria, a intenção é lutar para isso”, planeja Antenor Ehrenbrink. Outro suporte importan te são os créditos. “Tivemos créditos do Incra na instalação do assentamento e recentemente pegamos R$ 20 mil pelo Pronaf A”, revela a esposa de Antenor, Luciane. O recurso viabilizou o investimento em adubo, maquinário e calcário. E os projetos n ão acabam. “ Agora eu quero fazer dois açudes para criar peixes”, conta o patriarca dos Ehrenbrink, já mostrando o local reservado para a atividade. “Nosso trabalho é de formiguinha”, resume Luciane, ao explicar o esforço que fazem durante todo um ano para garantir somente uma ou duas colheitas, como é o caso do feijão, da cebola e da moranga. Pequenas como formigas, também são as proporções de suas terras e poderia ser a força da família perante a grandeza das fazendas de soja dos arredo- carregando muito mais do que o seu peso para er- res e o peso econômico dos agrotóxicos usados na guer mon umentais formigueiros, sabe o quão surpre- vizinhança. Mas quem já foi criança e leu fábulas ou endente é a capacidade de uma formiga. E essa é a se pegou admirado com um desses singelos insetos moral de toda a história do Ehrenbrink. Em 2014, a família colheu Identificação do Assentamento de melancia, 18 O assentamento Pátria Livre está localizado a 8 Km Números 3,5 toneladas toneladas de cebola e 20 toneladas de moranga . do centro urbano de Correia Pinto, às margens da Somente com a cebola, que tem melhor preço e rodovia BR-116, em Santa Catarina. Contatos com mercado, o ganho foi de mais de R$ 30 mil. a família Ehrebrink podem ser feitos pelo telefone: (49) 8857-9277. terra da gente 113] SÃO PAULO NÚMERO DE ASSENTAMENTOS: 267 FAMÍLIAS ASSENTADAS: 16.999 ÁREA EM HECTARES: 337.969,68 TE R R A D A GE N TE [ SÃO PAULO ] [116 incra.gov.br Assentamento localizado no Vale do Ribeira, em São Paulo, tem toda a sua produção agroecológica em meio à Mata Atlântica Reportagem e fotos: Marina Koçouski Agroecologia a 100% A caminho de Apiaí, na região do Vale do Ribeira (SP), pode-se observar a beleza da Mata Atlântica – um dos biomas mais ricos em biodiversidade do mun do, sendo cortada pela SP-250, rodovia que liga os municípios de Capão Bonito a Apiaí. Dos dois lados da rodovia, por volta do Km 310, avistam-se estradinhas de acesso às chamadas “ilhas”, áreas verdes isoladas entre si – ao todo doze – que compõem o Projeto de Assentamento Sustentável (PDS) Professor Luiz Antonio David de Macedo. terra da gente 117] [ SÃO PAULO ] [118 incra.gov.br Em virtude de sua localização contígua a remanes- em qualidade de vida: “Plantei tomate convencional centes de Mata Atlântica, o assentamento foi conce- quase a minha vida toda. Resolvi mudar porque es- bido no modelo de PDS. Criado em 2006, o assenta- tava estragando minha saúde. Aqui no assentamen to men to tem capacidade para 80 famílias, mas apenas aposto na diversidade de cultivos, inclusive de toma- 13% de sua área de 7.626 hectares é agricultável, te orgânico durante o verão”, diz ele, que também descontando-se matas, nascentes e Áreas de Pre- planta arroz, pimenta cambuci, mandioca e inhame. servação Permanente (APPs). Assim, desde o início, Outra vantagem da produção agroecológica, confor- seu principal diferencial foi a adoção de cultivo 100% me destaca a assentada Vanda Monteiro Prado, pro- agroecológicos por parte dos assentados. dutora de melancia e mel, é o sabor e a textura di- A adesão dos assentados à agroecologia não foi difí- ferenciada dos alimentos, além de sua durabilidade . cil, já que são frequentes os relatos de intoxicação e “Os produtos agroecológicos conservam-se por mais de surgimento de doenças graves em agricultores de tempo em relação aos convencionais. A abóbora co - Apiaí e municípios vizinhos, região conhecida como lhida chega a durar seis meses. Temos menos perda “terras do tomate”, onde é predo minante o cultivo de produtos destinados à venda, além de fornecer- convencional – monocultura e uso extensivo de agro- mos alimentos totalmente saudáveis para o consu- tóxicos. Para Jessé Jacob Gonçalves, a transferência midor”, afirma. para o plantio agroecológico representou um salto A diversidade produtiva é uma característica em todo o assentamento, mas o maior desafio ainda é agre- produção dos assentados como orgânica. gar valor ao produto orgânico. Essa é a avaliação de A certificação garante aos assentados comercializar agricultores assentados como Valdir Souza de Oliveira, seus produtos com a tarja orgânico, mas apenas por que planta hortaliças, tubérculos e frutas, e Luiz Apa- meio de feiras livres, na venda direta ao consumi- recido Aguiar, que trabalha com hortaliças e legumes. dor, ou ainda em programas do Governo Federal, Um passo nesse sentido foi dado, há dois anos, quan- como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), do a Associação de Produtores Agroecológicos da Mata que paga um preço 30% superior para orgânicos se Atlântica do Vale do Ribeira (Ecoovalle), que represen- comparado aos produtos convencionais. Apenas a ta os assentados, obteve a certificação Organização conquista do Selo Orgânico possibilita a venda a mer- de Controle Social (OCS), do Ministério da Agricultura, cados varejistas e via internet, o que ainda é uma Pecuária e Abastecimento (Mapa), caracterizando a meta a ser alcançada pelos assentados. A caminho do Selo Orgânico (SPG), no qual grupos formados por produtores, téc- De olho no mercado varejista de produtos orgânicos, certificarmos nossos próprios produtos, poderemos o diretor da Ecoovalle, que representa os assentados certificar outros produtores da região”, argumenta. Se- do PDS Luiz e Osvaldo Calodiano Leite, acredita que no gundo ele, a obtenção do Selo terá um custo mínimo prazo de um ano a associação obterá o Selo Orgânico. ao produtor, em torno de R$ 50,00 a R$ 80,00 por ano. De acordo com o diretor, a associação já passou por “Se conseguirmos o Selo Orgânico, vamos poder vender oficinas de orientação do Mapa. O objetivo da Ecooval- para diversos mercados varejistas, incluindo os dos mu- le é fazer parte do Sistema Participativo de Garantia nicípios de Curitiba, Itapeva e São Paulo”, conclui. nicos e pesquisadores se autocertificam. “Para isso, precisamos contratar um técnico agrícola. Além de terra da gente 119] [ SÃO PAULO ] Produção orgânica de tomate do assentamento custa 80% menos do que a convencional, aponta pesquisa de mestrado [120 incra.gov.br No P DS Luiz David de Macedo, a preservação da apontam o aumento no surgimento da incidência de Mata Atlântica forma uma barreira natural contra pragas no cultivo conven cional de tomates. Esse fa - a incidência de pragas no cultivo de tomates or- tor tem obrigado os produtores a investirem, cada gânicos e reduz os custos de sua produção em até vez mais, recursos financeiros e humanos para man- 84%, se comparados aos de lavouras convencionais. ter sua produtividade. É o que afirma a pesquisa de mestrado do engenheiro Segundo Tomas, no município de Apiaí, um dos prin- agrônomo Fábio Leonardo Tomas, defendida na Escola cipais centros de produção de tomate de mesa do Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Uni- estado, a lavoura é submetida em média a 36 pul- versidade de São Paulo (USP). verizações de produtos químicos em conjunto por ci- A pesquisa “A influência da biodiversidade florestal clo, o que torna o cultivo do tomate um dos sistemas na ocorrência de insetos-praga e doenças em cultivos agrícolas mais caros e contaminantes, tanto para de tomate no município de Apiaí-SP”, orientada pelo as pessoas envolvidas na sua produção quanto no professor Fabio Poggiani, embasa-se em estudos que seu con sumo. Já a produção agroecológica tem um caminho totalmente inverso. “Nossos experimentos desmatamen tos na região não h avia tantas pragas”, revelaram que a porção de Mata Atlântica conserva- revela o pesquisador. Além disso, conforme Tomas, da agiu como um regulador, dispensando o uso de Apiaí e redondezas apresentam recordes em uso de agrotóxicos, que en carecem consideravelmente o agrotóxicos e de contaminação de trabalhadores. produto final”, considera. Os agrotóxicos também encarecem o preço do toma- Como método de pesquisa, foram instalados cinco ex- te que é comercializado. “O cultivo tradicion al tem perimentos agroecológicos no assentamento, compa- variação de custo na média de R$ 5,00 por pé de rando-os a cinco cultivos convencionais, no período de tomate, já o experimental sai a R$ 0,80”, con clui. 2008 a 2010. O uso de módulos experimentais baseia-se no experimento do professor Paulo Yoshio Kageyama, da Usp, para o plantio de seringueiras no Acre, denominado Ilhas de Alta Produtividade (IAPs). Os cultivos são espalhados em clareiras abertas na mata, um recurso que se apresenta como substituto ao desmatamento da cobertura natural do terreno. “Os produtores mais antigos apontam que antes dos PDS Professor Luiz Antonio David de Macedo Endereço: Rodovia Sebastião Ferraz de Camargo Penteado (SP-250), km 313. Fazenda Vitória – Caixa Postal 03 – CEP: 18.320-000. Apiaí – São Paulo. terra da gente 121] SERGIPE NÚMERO DE ASSENTAMENTOS: 233 FAMÍLIAS ASSENTADAS: 10271 ÁREA EM HECTARES: 194.181,23 TE R R A D A GE N TE [ SERGIPE ] Bendito fruto Sob o calor quase desértico do Sertão Ocidental, mãos cuidadosas revolvem a terra e ajeitam pequenos montes de palha de milho, esterco e restos do plantio de feijão. O material, que recobre e protege o solo, recebe a sombra tímida de pequenas espaldeiras, que guardam a nova menina dos olhos de agricultores assentados no projeto Jacurici, em Poço Verde (distante cerca de 150 Km de Aracaju), no in terior sergipano. [124 incra.gov.br Protagonistas em experiência produtiva, assentados descobrem benefícios do maracujá agroecológico no Sertão Sergipano Reportagem e fotos: Daniel Pereira terra da gente 125] [ SERGIPE ] Regada diariamente por três meses, durante o pe- de estiagem que atingem a região”, explica a enge- ríodo de estiagem que atinge a região Semiárida, nheira agrônoma Neirivane Santos do Nascimento, a pequena plantação, cultivada no quintal do agri- do Programa de Assessoria Técnica, Social e Ambien - cultor Carlos Ferreira da Silva, começa a revelar no- tal (Ates) do Incra, que presta assistência produtiva vos frutos, que alimentam a esperança dele e dos aos agricultores assen tados. demais companheiros do assentamento. “A gen- Consolidado a partir do modelo agroecológico, o pro - te tem se dedicado e vê que o trabalho está dan- jeto, iniciado em maio de 2013 e estruturado sob a do certo. Quem sabe, mais para frente, isso não orientação da equipe de Ates, ganhou rapidamente ajude a gente a melhorar nossa renda”, analisa a adesão dos agricultores, transformando o pequeno o agricultor. quintal em uma unidade demonstrativa de produção As esperanças dele e de outros dez vizinhos de as- do fruto. “Eles manifestaram interesse no cultivo do sentamento estão depositadas em um projeto agroe- maracujá agroecológico, participaram de oficinas so- cológico experimental que tem no maracujá seu car- bre o assunto e compraram a ideia. Todas as 11 fa- ro chefe. “É uma cultura que, se bem desenvolvida, mílias do assentamento se engajaram, cuidaram da no futuro poderá servir como uma boa opção para estrutura, do cultivo, e hoje estão animadas com os o convívio dessas famílias com os lon gos períodos primeiros resultados”, comenta Neirivane. Projeto agroecológico A partir da experiência dele, os demais assentados Filho de agricultores familiares que cultivavam o maracujá em Lagarto, cidade próxima a Poço Verde, o Seu Nildo (foto abaixo): “com adubo químico, o solo fica mais fraco e a planta dura bem menos. Com o natural, a gente gasta menos, o plantio fica melhor e dura bem mais”. assentado José de Oliveira Santos, o seu Nildo, foi o primeiro morador de Jacurici a confirmar a viabilidade da fruta no solo árido do assentamento. “Resolvi testar, plan tei o maracujá no meu quintal e deu muito certo. A terra daqui é boa e a fruta cresceu bem”, lembra o agricultor. se interessaram pelo cultivo do maracujá e decidiram aceitar a sugestão técnica pela adoção do modelo agroecológico para a sua produção. “Fizemos a proposta de implantarmos um plantio agroecológico de maracujá, consorciado com alguns tipos de feijão. O feijão fixa o nitrogênio no solo e ajuda o maracujá a se desenvolver melhor. É um modelo que barateia a produção e gera alimentos de melhor qualidade”, explica Neirivane. Sem o uso de agrotóxicos e com a aplicação de adubos naturais, elaborados a partir do esterco bovino e de restos de matéria orgânica, a produção dos feijões e do maracujá se desenvolveu, aumentando a confiança dos agricultores no modelo agroecológico. “Com adubo químico, o solo fica mais fraco e a planta dura bem menos. Com o natural, a gen te gasta me nos, o plantio fica melhor e dura bem mais”, analisa seu Nildo. Com o desenvolvimento do trabalho, os primeiros bons resultados começaram a aparecer. À espera da segunda colh eita do maracujá, os benefícios do cultivo já estão na ponta do lápis. “É um projeto experimental e, por isso, não apresenta grandes lucros, mas as vantagens são evidentes. Foram investidos R$ 400,00 para estruturar a produção, que rendeu [126 incra.gov.br 400 quilos de maracujá. Com o preço atual da fruta, agricultores, que se impressionam também com a o projeto daria um retorno de R$ 1.200,00, ou seja, qualidade das frutas. “O maracujá daqui tem mais um ganho cerca de três vezes maior do que o custo polpa e é bem mais saboroso”, comentou a assen- de produção”, afirma Neirivane. tada Josefa Martins Santana, que também participa A quantidade e os ganhos potenciais animam os do projeto. Futuro do projeto Iniciado a partir do plantio de sementes adquiridas junto aos assentamentos Karl Marx, em Lagarto, e Carlos Marighella e Nossa Senhora Aparecida II, em Itapicuru, na Bahia, o projeto conta com um trabalho paralelo para assegurar sua manutenção. “Estamos estruturando com eles um banco de semen tes crioulas, que irá subsidiar os novos plantios no assentamen to”, conta Neirivane. Cultivadas naturalmente, sem produto químicos, as sementes crioulas apresentam vantagens já conhe- de maracujá para áreas fora da unidade demons- cidas pelos agricultores do assentamento. “Essas se- trativa, os trabalhadores do assentamento esperam men tes não têm veneno e são muito melhores. Se ter acesso, em breve, a recursos destinados à pro- você usa a semente com adubo químico, ela só dura dução, como os oferecidos pela linha A do Programa uma safra. Depois disso, a produção já começa a cair. Nacional de Fortalecimen to da Agricultura Familiar Já a semente crioula dá para gente usar uma vida (Pronaf) e pelo Programa de Fomento às Atividades toda”, explica seu Nildo. Produtivas Rurais, integrado às ações do Plano Bra- O projeto do banco, já em fase de implantação, conta sil Sem Miséria, do Governo Federal. “O cultivo do com sementes de maracujá, milho (utilizado em outras maracujá é dispendioso, mas a gente viu que vale áreas do assentamento e na produção do adubo natu- a pena. Quando conseguirmos acesso aos créditos, ral) e dos feijões carioquinha, branco, praia e de corda. vamos tentar aumentar a produção, para, se Deus Para ampliar a experiência e expandir a produção quiser, alcançarmos mais renda”, planeja seu Nildo. Filha da reforma agrária a própria vida e passou a usar sua experiência para Membro do Núcleo de Simão Dias do Programa Ates contribuir com o desenvolvimento de centenas de fa- e uma das responsáveis pela orientação das famílias mílias assentadas em Sergipe. do projeto Jacurici e de outros assentamen tos da re- Mestre em “Agroecologia e Desenvolvimen to Sus- gião, Neirivane Santos do Nascimento já esteve “do tentável” pela Universid ad e Agrária de Havan a outro lado da história”. (Unah), em Cuba, ela é uma das difusoras d e pro- Filha de assentados do projeto Antonio Conselheiro, im- jetos baseados na matriz agroecológica de pro- plantado pelo Incra no município de Lagarto, a jovem dução pelas áreas de refo rma agrária de Sergipe. agricultora teve sua vida transformada a partir de 2008. “A ag ro ecologia casa muito b em com a ag ricultura Formada na primeira turma do curso de Engenharia familiar e pode fazer a d iferença, com a produção Agronômica realizado pela Universidade Federal de de alimentos mais saudáveis e a melhoria da renda Sergipe (UFS), por meio do Programa Nacional de Edu- dos trabalhadores asse ntad os”, comenta a en ge- cação na Reforma Agrária (Pronera), Neirivane mudou nhe ira agrôn oma. Agricultora mostra produção da unidade demonstrativa implantada no assentamento. terra da gente 127] 127] EXPEDIENTE Presidenta da República | Dilma Vana Rousseff Ministro do Desenvolvimento Agrário | Miguel Soldatelli Rossetto Presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária | Carlos Mário Guedes de Guedes Diretora de Programa | Érika Galvani Borges Diretor de Obtenção de Terras e Implantação de Assentamentos (DT) | Marcelo Afonso Silva Diretor de Desenvolvimento de Projetos de Assentamentos (DD) | César Fernando Schiavon Aldrighi Diretor de Ordenamento da Estrutura Fundiária (DF) | Richard Martins Torsiano Diretor de Gestão Administrativa (DA) | Juliano Flávio dos Reis Rezende Diretora de Gestão Estratégica (DE) | Maria Jeigiane Portela da Silva Procurador Chefe da Procuradoria Federal Especializada (PFE) | Sérgio de Britto Cunha Filho Coordenação da Assessoria de Comunicação Social | Ivonete Pereira Motta | Registro Profissional 615/GO Jorna lista responsável César Oliveira | Registro Profissional 7596/RS Revisão | Telma Peixoto, Jucimeire Costa e Gilson Afonseca Textos e fotos Bahia | Cíntia Melo Espírito Santo | Johnny Cardoso e Girley Vieira Goiás | Cristiane Santiago e Jucimeire Costa Maranhão | Flávia Almeida Minas Gerais | Daniel Fleming, Dôra Guimarães e Rodrigo Barbosa Paraíba | Kalyandra Vaz e Jaimaci Andrade Paraná | Marina Oliveira, Rodrigo Asturian e Cássia Morgana Faxina Rio de Janeiro | Sarita Coelho Rio Grande do Sul | Keila Reis Rondônia | Jeanne Margaretha Machado Roraima | Loide Gomes Santa Catarina | Vanessa Ibrahim São Paulo | Marina Koçouski Sergipe | Daniel Pereira Projeto gráfico e editoração eletrônica | Alessandro Mendes