Estudo de caso proposta de uso do bambu

Transcrição

Estudo de caso proposta de uso do bambu
Estudo de caso: proposta de uso do bambu
em projeto habitacional na cidade de Vitória – ES
Larissa Letícia Andara Ramos (1)
(1)
Centro Universitário Vila Velha, UVV, Brasil. E-mail: [email protected]
Resumo. Introdução: o bambu trata-se de uma espécie vegetal que une beleza, utilidade e valor
ecológico. É um material renovável, de alta produtividade, trabalhável, transportável, de fácil
propagação e de rápido crescimento em países de clima tropical úmido. Dentre os materiais alternativos,
mostra-se muito eficaz devido as suas características físicas, mecânicas e construtivas. Seu potencial
socializador é de importância vital no crescimento de países em desenvolvimento, como é o caso da
Costa Rica, Colômbia e China. Entretanto, no Brasil, esse material ainda é pouco utilizado e seu
emprego limita-se praticamente na produção artesanal, decorativa e paisagística. Objetivo: apresentar
algumas considerações para um correto emprego do bambu, desde a aquisição do material até a
construção de habitações de interesse social, aplicável em projeto habitacional na cidade de Vitória-ES
Método/Abordagens: Trata-se de um estudo de caso, a partir da perspectiva quanti-qualitativa, do tipo
exploro-descritivo. Foi utilizada a pesquisa bibliográfica e documental, com análise de experiências de
habitações sociais em bambú, além da experiência prática com o material adquirida pela autora
Resultados: Foram reagrupadas algumas técnicas e considerações para um correto emprego do
bambuna construção, apresentando as etapas do processo construivo de uma unidade habitacional de
interesse social. A proposta de uso do bambu em projetos habitacionais considerou as seguintes
temáticas: condições climáticas, condições projetuais e fases construtivas (plantação, colheita,
transporte, secagem, armazenamento, seleção, manejo, cortes, tratamentos, produção dos painéis,
fundação, estrutura de elevação e cobertura). Contribuições/Originalidade: após a cautelosa análise,
pode-se afirmar que esse material vai de encontro ao conceito mundial de sustentabilidade de produção.
Produzir e processar o bambu é uma atuação a baixo custo se comparado a outros materiais existentes,
aplicados na construção civi, sendo assim, sua ampla utilização, traduziria em economia, resultando em
uma possível alternativa para construções de habitações de interesse social, na cidade de Vitória-ES.
Palavras-chave: Bambu, Material natural, Técnicas alternativas, Habitações de interesse social
Abstract. Introduction: bamboo is a vegetal species that join beauty, utility and ecological value. It is a
renewable material, highly productive, workable, transportable, easy to expanse and rapid growth in
countries with humid tropical climate. This alternative material proves very effective due to their
physical, mechanical, and constructive characteristics. Its potential for socialization is vital in the growth
of developing countries, as is the case of Costa Rica, Colombia and China. However, in Brazil, this
material is still not used and its use is practically restricted to the handicraft, ornament and landscaping..
Objective: present some considerations for a correct use of bamboo, since the acquisition of materials to
the construction of social housing, applicable housing project in Vitoria-ES. Methods / Approaches: It is
a case study, with quantitative and qualitative perspective, explore the type-descriptive. We used the
literature review and documentary analysis with experience of social housing in bamboo, as well as
practical experience with the material. Results: some techniques and considerations for a correct
application we defined, showing the process steps of a buildable unit housing of social interest. The
suitability of this material was evaluated considering the following themes: Climate Conditions,
Projective and Constructive Conditions (planting, harvesting, transport, drying, storage, selection,
handling, cutting, treatments, production of the panels, foundation, Lifting structure and coverage).
Contributions/Originality: after this careful analysis, one can say that this stuff goes against the concept
of global sustainability of production. Produce and process the bamboo is a performance at low cost
compared to many other materials, used in construction. Thus, its widespread use, translate into savings,
resulting in a possible alternative for the construction of social housing.
Key-words: Bamboo, Natural material, Alternatives technical, Social housing.
VI Encontro Nacional e IV Encontro Latino-americano sobre Edificações e Comunidades Sustentáveis - Vitória – ES - BRASIL - 7 a
9 de setembro de 2011
1. INTRODUÇÃO
Esse é um momento diferente de qualquer outro na história da humanidade, somos contemporâneos de
um impasse civilizatório em que o modelo de desenvolvimento vem exaurindo, com grande velocidade,
os recursos naturais não-renováveis do planeta, dando origem a uma grande crise ambiental com impactos
negativos sobre as condições que se tornaram acolhedoras aos seres humanos.
A destruição da natureza, assim como o desequilíbrio político, social e cultural gerou uma crise ambiental
que se propaga rapidamente. Essa crise não surgiu de uma hora para outra, ela é o conjunto de ações
danosas que o homem vem causando ao longo da sua existência, mas foi entre a Idade Média e a
Moderna, com a Revolução Industrial, que começaram as agressões ao meio ambiente e a utilização
exagerada dos recursos naturais, estimulados pelo capitalismo.
Quando se fala em crise ambiental, não se remetem apenas aos aspectos físicos,
biológicos e químicos das alterações do meio ambiente que vem ocorrendo no planeta.
A crise ambiental é bem mais que isso: É uma crise da civilização contemporânea; é
uma crise de valores, que é cultural e espiritual (JUNIOR, 2010, p.02).
No caso dos países de clima tropical úmido (tal como na maior parte território brasileiro), a atração
excessiva por novos materiais e as influências culturais externas vem gerando um grave impacto em
relação às formas e às expressões arquitetônicas, contribuindo para a construção de habitações que muitas
vezes contradizem com a realidade climática e cultural local (CORBELLA, 2003).
Com o desenvolvimento tecnológico, o homem passou a introduzir, no setor construtivo, materiais
industrializados e, com isso, os materiais tradicionais e naturais - tais como a madeira, a pedra, o bambu
e a terra crua - passaram a ser menos utilizados na construção de habitações.
Com a crise ambiental, agravada também pela atual crise econômica, a busca por materiais renováveis e
tecnologias alternativas revela-se necessária a fim de diminuir, sobretudo, às agressões ao meio ambiente.
Em uma época sensível as necessidades ambientais, direcionar-se a materiais e tecnologias renováveis,
além de promover economia dos recursos finitos, proporcionaria a redução da poluição e melhoria da
qualidade de vida urbana (HIDALGO-LÓPEZ, 2003).
O atual cenário das grandes cidades brasileiras mostra que a problemática habitacional ainda é crítica. De
acordo com o Ministério da Cidade apud UOL Noticias (2009), o déficit habitacional no Brasil é de quase
8 (oito) milhões de moradias, dados de 2006 e têm como base a Pnad (pesquisa nacional por amostra de
domicílios) realizada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) com números daquele
mesmo ano. A pesquisa da Fundação João Pinheiro, também citada por UOL Noticias (2009) aponta uma
carência de 7.934.719 moradias no país; só no Espírito Santo, esse número chega a 126.821 habitações,
correspondendo a 12% dos domicílios do estado.
Entretanto, muitos têm sido os investimentos com o objetivo de encontrar uma solução para atenuar o
problema habitacional brasileiro, sobretudo referente à economicidade e à durabilidade das habitações.
Sendo assim, dentro desse contexto, torna-se fundamental inserir no setor construtivo, materiais
alternativos, naturais e de baixo custo em projetos habitacionais, permitindo a substituição ou o
incremento de sistemas construtivos tradicionais sem comprometer a durabilidade, o conforto e a
qualidade dessas edificações.
Referenciando-se nos estudos e projetos desenvolvidos pelos autores Ghavami (1992), Janssen (1995) e
Hidalgo-López (2003) sobre tecnologias e materiais alternativos empregados no setor construtivo para
países em desenvolvimento, sugere-se o bambu como recurso de grande potencial. Dentre os materiais
naturais, o bambu mostra-se muito eficaz, devido as suas características físicas, mecânicas e construtivas.
Suas propriedades físicas e mecânicas variam conforme a espécie, a idade do bambu no momento do
corte, o conteúdo de umidade, o clima , o terreno e o ponto do colmo (os bambus têm diminuição gradual,
no sentido da base para o topo, no diâmetro do colmo, na espessura da parede e no comprimento
internodal).A tabela 1 compra a resistência à tração e o peso específico de alguns materiais de construção.
VI Encontro Nacional e IV Encontro Latino-americano sobre Edificações e Comunidades Sustentáveis - Vitória – ES - BRASIL - 7 a
9 de setembro de 2011
TABELA 1: Relação entre a resistência à tração e o peso específico
Resistência à tração
Peso específico
Relação
Material
σt (MPa)
(MPa x 10-2)
R= σt x 102 u
Aço (CA 50A)
500
7,83
0,63
Ferro
281
7,20
0,39
Alumínio
304
2,70
1,13
Madeira
75
0,6
1,25
Bambu
140
0,8
1,75
Fonte: GHAVAMI (1992)
O bambu trata-se de uma espécie vegetal que une beleza, utilidade e grande valor ecológico. É um
material renovável, de alta produtividade, trabalhável, transportável, de fácil propagação e de rápido
crescimento em país de clima tropical úmido. A velocidade no seu crescimento permite uma produção de
oxigênio superior a cerca 30% comparada as demais árvores (JANSSEN, 1995). Com cerca três anos de
vida da planta, sua cana já pode ser cortada, tornado-se um material adequado para o setor construtivo.
O que diferencia o bambu, de imediato, de outros materiais vegetais estruturais é sua
alta produtividade. Dois anos e meio após ter brotado do solo, o bambu possui
resistência mecânica estrutural, não tendo portanto, neste aspecto, nenhum concorrente
no reino vegetal. Somam-se às características favoráveis uma forma tubular acabada,
estruturalmente estável, um peso específico baixo, uma geometria oca, otimizada em
termos da razão resistência mecânica/peso do material. O resultado destas
características são baixo custo de produção, transporte, maneabilidade, que se revertem
em diminuição dos custos de construção (GHAVAMI,1992, p.36 ).
O alto grau de resistência de suas fibras dispensa estruturas de ferro na construção de casas, tornando-as
aproximadamente 40% mais barata que as erguidas totalmente em alvenaria. Toda essa tecnologia está
baseada em estudos técnicos e uma normatização que atesta as possibilidades e limitações deste material
(HIDALGO-LÓPEZ, 2003).
Confrontando o bambu (de raízes monopodial) com outra árvore de crescimento acelerado (por exemplo
o eucalipto), verifica-se que o seu crescimento é 12 vezes mais rápido. Alguns estudos também registram
que uma plantação de bambu é capaz de capturar até 17 toneladas de dióxido de carbono por hectares ao
ano (HIDALGO-LÓPEZ, 2003).
A tradição construtiva em bambu vem sendo explorada há milhares de anos, tanto que os métodos e os
instrumentos empregados são simples, eficazes e acessíveis até mesmo a operadores pouco experientes. a
maior parte dos edifícios construídos com este material encontra-se nas zonas rurais dos países em vias de
desenvolvimento de clima tropical úmido, onde essa fibra cresce em abundância. São edifícios
construídos com métodos tradicionais e segundo costumes locais.
Mesmo sendo utilizado há milhares de anos pelos asiáticos, esse recurso começa a ser recentemente
reconhecido pelo ocidente, principalmente pela suas potencialidades que permitem novas criações
arquitetônicas a partir de expressões culturais e climáticas locais, mostrando-se um grande recurso a ser
desfrutado.Na Costa Rica, por exemplo, o “Projeto Bambu” foi o pioneiro no país em fazer uso
combinado com a madeira para a construção de casas pré-fabricadas num sistema de paredes moduladas,
permitindo, a cada ano, a execução de cerca 1000 (mil) casas com a colheita de 60 (sessenta) hectares de
plantação de bambu. Resultado que muito vem contribuindo para diminuir o déficit habitacional no país.
Entretanto, no Brasil esse material é pouco utilizado. Seu emprego limita-se praticamente na produção
artesanal, decorativa e paisagística, ao contrário do que ocorre em realidades próximas (Colombia,
Equador e Costa Rica) onde o bambu é tambem empregado principalmente em projetos habitacionais.
VI Encontro Nacional e IV Encontro Latino-americano sobre Edificações e Comunidades Sustentáveis - Vitória – ES - BRASIL - 7 a
9 de setembro de 2011
2. OBJETIVO
A presente artigo tem como objetivo apresentar algumas considerações para um correto emprego do
bambu em projetos habitacionais, desde a aquicição do material até a construção, tendo como estudo de
caso a cidade de Vitória- ES. Pretende-se também analisar as qualidades e as limitações do bambu como
material alternativo de construção para o clima tropical úmido. Estudar tecnologias apropriadas para a
realização de habitações sustentáveis de interesse social, considerando aspectos climáticos, projetuais e
sociais presentes. Verificar o seu uso em projetos arquitetônicos sustentáveis de interesse social.
3. MÉTODO
Trata-se de um estudo de caso, a partir da perspectiva quanti-qualitativa, do tipo exploro-descritiva, com
as necessárias adequações à área de estudo em questão. Para cada resultado esperado com o projeto,
atividade ou conjunto deles, em face das questões a serem trabalhadas, foi adotado um conjunto categorial
analítico, com instrumentos operacionais, buscando coletar os dados, propiciar o seu cotejo e sua
classificação.
A análise das condições de uso do bambu como material construtivo foi realizada ao interno do programa
integrado de habitação popular Projeto Terra da Prefeitura Muncipal de Vitória (PMV). A proposta teve
como estudo de caso a região da Poligonal 08, localizada a Oeste da cidade.
A idoneidade do material foi avaliada considerando as seguintes temáticas: condições climáticas,
coeficiente de apreciação do material, condições de projeto e fases construtivas (plantio, colheita,
transporte, secagem, armazenamento, seleção, cortes, tratamento preservativo, produção dos painéis,
fundação, estrutura de elevação, cobertura e montagem final dos painéis).
Para tanto, foi utilizada a pesquisa bibliográfica e documental, tendo também como unidade de análise
empírica estudos e experiências nacionais e internacionais acerca de habitações de interesse social em
bambú, além da experiência prática com o material, diretamente adquirida pela autora.
4. RESULTADOS
4.1 Condições Climáticas
De acordo com dados climáticos da cidade de Vitória (latitude 20º 19’), seu clima tropical úmido é
caracterizado por altas temperaturas, baixas variações e por um período chuvoso e outro seco. A média
mensal da umidade relativa é de cerca 76%, influenciada principalmente pela alta precipitação anual, pela
presença do mar e da vegetação. Estas condições climáticas são favoráveis ao crescimento do bambu.
O índice de conforto térmico de Vitória foi examinado segundo os parâmetros estabelecidos por Givoni
(1998) em seu diagrama psicométrico-bioclimático, também conhecido por carta bioclimática. Os dados
foram obtidos utilizando o programa Analasys, da Universidade Federal de Santa Catarina.
FIGURA 01: Análise bioclimática da cidade de Vitória, utilizando a Carta bioclimática de Givoni.
Fonte: Programa Analasys (2006)
VI Encontro Nacional e IV Encontro Latino-americano sobre Edificações e Comunidades Sustentáveis - Vitória – ES - BRASIL - 7 a
9 de setembro de 2011
Após essa análise, constatou-se que a maioria dos dias do ano encontra-se ao interno da zona de conforto,
mesmo se situados no extremo superior do diagrama (como evidenciado na figura 01). Nesse caso, para
garantir o conforto interno nas habitações, a estratégia projetual aconselhada consiste em aumentar a
circulação do ar, sombrear os edifícios e utilizar materiais de baixa inércia térmica tal como o bambu.
4.2 Coeficiente de Apreciação do material
Antes de iniciar o processo construtivo, por ser tratar de um material pouco apreciado, torna-se necessário
conscientizar a sociedade e os atores envolvidos, das qualidades desse recurso natural e da possibilidade
de se construir habitações econômicas e de alta prestação ambiental. Para isso, é de fundamental
importância organizar workshops e cursos de formação para promover e divulgar a cultura do bambu.
4.3 Condições de Projeto
Tendo em vista a alta radiação solar da cidade de Vitória, proveniente da leste e da oeste, aconselha-se
que os edifícios tenham formas levemente alongadas e com ausência de aberturas nessas direções. Para
ativar a circulação do ar, recomenda-se posicionar as janelas em lados opostos, priorizando os ventos
dominantes. Ainda assim, é importante que as aberturas situadas na direção dos ventos sejam de
dimensões menores que àquelas situadas no lado oposto.
A projetação do sistema construtivo proposto, além de exigir condições técnicas específicas, desde as
fases iniciais, é também condicionada pela possibilidade de se prever o comportamento dos componentes
estruturais. Vale ressaltar que não são todas as espécies de bambu que podem ser utilizadas na construção.
Entre as idôneas, cada uma delas há um campo específico de aplicação e a espécie utilizada deve ser
cultivada e tratada adequadamente para prolongar a vida útil do material.
Sendo assim, a espécie identificada, por motivos técnico-estruturais, foi a Phyllostachys P. Pubensces.
Esta espécie oferece canas retilíneas, de 20 a 25 metros, diâmetro de 7 a 15 cm e entrenós de cerca 30cm.
Para a espécie selecionada, é necessário, de acordo com a norma ISO/DIS-22157 (Determinação das
características físicas e mecânicas do bambu), realizar testes de prova para verificar os valores de suas
características físicas e mecânicas.
Conforme o método elaborado por Janssen (2000) para a definição das resistências mecânicas dos
elementos construtivos em bambu, a tensão de ruptura admissível para a compressão, flexão,
cisalhamento e o módulo de elasticidade da espécie selecionada foi calculada. Esta metodologia opera
utilizando um multiplicador que liga a densidade e a resistência. A proporção entre a densidade (kg/m3) e
tensão admissível (N/mm2) é expressa conforme a tabela abaixo:
TABELA 2- Relação entre densidade e esforço admissível 1
Material
Bambu seco2
Bambu úmido ou verde
Compressão
(sem tratamento)
0,013
0,011
Flexão
Cisalhamento
0,020
0,003
0,015
-
Fonte: Janssen (2000)
Considerando que a densidade média equivalente para a espécie P. Pubensces é de 600 kg/m3, obteve-se
as seguintes tensões admissíveis:
- Para a compressão: 0,013 x 600 = 7,8 N/mm2 → 78 kg/cm2
- Para a flexão : 0,020 x 600 = 12 N/mm2 → 120 kg/cm2
- Para o cisalhamento: 0,003 x 600 = 1,8 N/mm2 → 18 kg/cm2
- Módulo de elasticidade: 24.103 N/mm2 → 24. 104 kg/cm2
1
2
Ex.: Se a densidade do bambu seco é de 600kg/ m3, a solicitação máxima a flexão será de 0,020 x 600 = 12N/mm2
Umidade de 12%, quando a umidade relativa do ar equivale a 70%.
VI Encontro Nacional e IV Encontro Latino-americano sobre Edificações e Comunidades Sustentáveis - Vitória – ES - BRASIL - 7 a
9 de setembro de 2011
4.4 Condições Construtivas
O sistema construtivo proposto utiliza painéis pré-fabricados realizados pelo próprio proprietário. A préfabricação permite minimizar o tempo de construção e controlar a qualidade do produto final. Nesse
sentido, pretende-se dividir a realização da obra em três fases: o provimento e a preparação do material; a
fabricação dos painéis e a construção in loco da unidade habitacional. Essas etapas devem respeitar uma
ordem no processo construtivo, assim caracterizadas de acordo com a sequência abaixo:
4.4.1 Plantio do bambu
Para que sejam sempre disponíveis varas de bambu adequadas à construção, torna-se necessário cultiválas. Para isso, pretende-se envolver o setor agrícola estimulando os agricultores locais a plantar
bambuzais da espécie selecionada, formando a matéria prima para o desenvolvimento do projeto. Aos
agricultores poderão ser concedidos os recursos necessários para iniciar a plantação. Como contrapartida
toda a produção poderá ser vendida à Prefeitura ou ao Ente financiador para a construção das habitações.
4.4.2 Colheita das varas
Se utilizadas para a construção, essas devem ser maduras, cortadas da planta com idade não inferior a três
anos ( possuem características mecânicas adequadas a construção). Para diminuir a umidade dos colmos,
aconselha-se que a colheita seja feita no inverno. Para não danificar as raízes, o corte deve ser efetuado
acima do primeiro nó, a uma distância de cerca 20 cm, de modo a evitar também o acúmulo de água.
FIGURA 02: Phyllostachys P.
Pubensces.Fonte: Ebiobambu (2005)
FIGURA 03: Corte da vara madura.
Fonte: Foto da autora (2005)
FIGURA 04: Corte correto da vara.
Fonte: foto da autora (2005)
4.4.3 Transporte das varas
Após os cortes, aconselha-se que a varas sejam transportados até o local onde serão preparadas. Para
evitar a deteriorização e os custos excessivo com o deslocamento, sugere-se que as plantações de bambus
sejam localizadas próximas ao local de construção.
4.4.4. Secagem e armazenamentos das varas
A secagem tem como finalidade reduzir a umidade das varas, aumentar a resistência mecânica e reduzir a
massa especifica, facilitando a maleabilidade do material. Recomenda-se posicionar as varas em vertical,
a uma distância de 20 a 30 cm do chão, protegidas da chuva e do sol, por um período de seis a doze
semanas. Se for necessário armazenar o material, sugere-se que o local seja coberto e arejado
FIGURA 05- Varas cortadas.
Fonte: Foto da autora ( 2005)
FIGURA 06: Armazenagem das
varas. Fonte: Foto da autora (2005)
FIGURA 07: Secagem na vertical.
Fonte: Foto da autora (2005)
VI Encontro Nacional e IV Encontro Latino-americano sobre Edificações e Comunidades Sustentáveis - Vitória – ES - BRASIL - 7 a
9 de setembro de 2011
4.4.5
Seleção das varas
Por ser um material natural, as varas de bambu variam na forma e dimensão. É importante seguir alguns
critérios de seleção baseados na sua aplicação construtiva. Para a construção de elementos estruturais
(lajes, pilares e vigas), os colmos devem ser retilíneos, sem imperfeições, com entrenós curtos, diâmetro
de cerca 10 cm e espessura da parede interna de aproximadamente 1 cm. Já as varas com aplicação não
estrutural, o diâmetro e a espessura da parede interna podem ser inferiores a esses valores.
4.4.6
Manejo e cortes das varas
Recomenda-se que as varas sejam cortadas sempre em proximidade dos nós (até 1/3 dos entrenós), para
que as cargas verticais apóiem-se na parte mais resistente. Para a realização das uniões, é importante que
a extremidade dessas varas seja cortada com a técnica correta. Os cortes podem ser: à boca de peixe, à
boca de tubarão e à boca de jacaré, dependendo da tipologia das uniões ente as varas de bambu. Para a
formação dos fechamentos verticais, as varas podem ser divididas em tiras e, para a forração das lajes e
da cobertura, é aconselhável abri-las em esteiras.
FIGURA 08: Corte à boca de peixe.
Fonte: Ebiobambu (2005)
FIGURA 09: Corte à boca de tubarão .
Fonte: Ebiobambu (2005)
FIGURA 10: Divisão da vara em
tiras. Fonte: Foto da autora (2005)
FIGURA 11: Sequência da divisão de uma vara de bambu em tiras
Fonte: HIDALGO-LÓPEZ (2003)
FIGURA 12: Vara aberta em esteiras
Fonte: Foto da autora (2005)
FIGURA 13: Sequência de uma vara de bambu aberta em esteiras.
Fonte: HIDALGO-LÓPEZ (2003)
4.4.7 Tratamento preservativo das varas
Para garantir a resistência e a durabilidade do material, as varas de bambu devem ser bem protegidas dos
agentes nocivos (fungos e insetos) e das agressões naturais. Neste caso, aconselha-se o tratamento com
uma solução de boro que, além de ser econômica, é atóxica e de fácil preparação. Essa solução é
composta por 15% octoborato (Octoborato Dissódico Tetrahidratado) e 3% de inseticida (2% cipertrina
+ 1% diclovos) para cada 1 litro d’água. Para a aplicação do produto, é necessário injetar, próximo a
VI Encontro Nacional e IV Encontro Latino-americano sobre Edificações e Comunidades Sustentáveis - Vitória – ES - BRASIL - 7 a
9 de setembro de 2011
cada um dos nós, cerca 60 ml da solução. As varas cortadas em tiras e aquelas abertas em esteiras poderão
ser tratadas por imersão, utilizando a mesma solução mencionada.
4.4.8 Produção dos painéis pré-fabricados
Torna-se necessário utilizar uma forma ou um molde específico para facilitar a preparação dos painéis. A
proposta é, no perímetro do molde, são posicionadas as varas de bambu de 8 cm (para dar a forma) e, na
transversal, varas de bambu intermediárias (para garantir a estabilidade).
Posteriormente, em ambos os lados dos painéis sugere-se fixar tiras de bambu com largura de cerca 3 cm,
distanciadas uma das outras aproximadamente 2 cm.
A dimensão dos painéis depende da sua posição no projeto. Vale ressaltar que o espaço vazio de ar, ao
interno do painel, comporta-se como isolante térmico, resultando em uma parede leve e de baixa inércia
térmica que, além de incidir menos na estrutura, é ideal para garantir o conforto interno no interior das
habitações localizadas em regiões de clima tropical úmido.
FIGURA 14: Varas posicionadas nos
moldes. Fonte: TEIXEIRA (2006)
FIGURA 15: Produção do painél.
Fonte: Ebiobambu (2005)
FIGURA 16: Painél pronto.
Fonte: Ebiobambu (2005)
4.4.9 Fundação
O processo construtivo inicia com o nivelamento do terreno e a remarcação do projeto no mesmo.
Recomenda-se compactar uma camada de 10cm de terra e, posteriormente, aplicar uma segunda camada
de reforço com varas de bambu abertas em esteiras, e, em seguida, uma terceira camada niveladora de
cerca 3cm de cimento e areia.
Para as colunas estruturais, propõe-se fixar, com auxílio de vergalhões, as varas de bambus estruturais em
uma base de concreto. Além disso, para evitar o contato direto do bambu com a umidade do solo,
recomenda-se que toda a construção seja elevada de 50 cm do nível do terreno. Essa base, por sua vez,
pode ser constituída por duas fileiras de tijolos (ou blocos de cimento), uma camada de impermeabilizante
e finalizada por uma base de cerca 4 cm de cimento.
FIGURA 17: Preparação da fundação.
Fonte: Ebiobambu (2005)
FIGURA 18: Colunas estruturais.
Fonte: Ebiobambu (2005)
FIGURA 19: Varas elevadas.
Fonte: Ebiobambu (2005)
4.4.10 Estrutura de elevação (Pilares, vigas e laje)
Para uma maior estabilidade da estrutura, os pilares e as vigas podem ser formadas por varas inteiras de
bambu desde que essas possuam idade mínima de 03 anos, com diâmetro de cerca 10 cm, espessura das
VI Encontro Nacional e IV Encontro Latino-americano sobre Edificações e Comunidades Sustentáveis - Vitória – ES - BRASIL - 7 a
9 de setembro de 2011
paredes internas superior a 1 cm e previamente tratadas como especificado anteriormente. Na união de
uma coluna com uma viga, por exemplo, é necessário unir ambas as partes com elementos metálicos e
preenchê-las com cimento para aumentar a resistência desse tipo conexão.
FIGURA 20: Esquema da laje intemediária.
Fonte: Desenho da autora (2005)
FIGURA 21: Desenho esquemático da união entre as
varas. Fonte: Desenho da autora (2005)
A estrutura da laje também pode ser formada por varas de bambu inteiras e retilíneas, posicionadas
primeiramente a uma distância entre elas de cerca 45 cm, e, posteriormente, a uma distância de 22,5cm
(como ilustrado na figura 18). Sobre essa estrutura podem ser posicionados os bambus abertos em
esteiras, em seguida, recobertos por uma rede de juta e uma camada niveladora de 3 a 4 cm de cimento.
4.4.11 Cobertura
De acordo com as condições climáticas locais, a cobertura é o elemento de maior solicitação térmica e,
por isso, deve ser bem ventilada, impermeabilizada e isolada termicamente. Neste caso, recomenda-se que
o beiral seja de cerca 1/3 da altura do edifício, comprimento adequado para proteger a estrutura e a
fachada das intempéries. A proposta é realizar uma cobertura curva, formada por bambus de diferentes
medidas que, além de evidenciar a flexibilidade do material, também permite a circulação do ar. Sobre a
estrutura de cobertura são colocados os bambus abertos em esteiras, recobertos por uma rede de juta, e,
posteriormente, revestidos com uma manta impermeabilizante e isolante de betume e cimento.
FIGURA 22: Esquema da cobertura e de seu revestimento.
Fonte: Desenho da autora (2005)
FIGURA 23: Cobertura curva em bambu.
Fonte: Desenho da autora (2005)
4.4.12 Montagem dos painéis
Precedentemente, cada painel deve ser preparado, numerado e transportado até o local de construção,
posicionado próximo onde será instalado. Para garantir a verticalização e a estabilidade dos painéis, é
necessário que a montagem inicie-se pelas extremidades. É importante também, que cada painel seja
fixado ao bambu secundário e não ao bambu estrutural. Depois de serem posicionados, ambos os lados
dos painéis são recobertos com rede de juta, obtendo-se, assim, uma superfície adequada ao reboco final.
VI Encontro Nacional e IV Encontro Latino-americano sobre Edificações e Comunidades Sustentáveis - Vitória – ES - BRASIL - 7 a
9 de setembro de 2011
FIGURA 24: Fachada das habitações propostas sem
revestimento Fonte: Desenho da autora (2005)
FIGURA 25: Fachada das habitações propostas com
revestimento. Fonte: Desenho da autora (2005)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após a cautelosa análise das condições de uso do bambu na construção de habitações de interesse social
pode-se afirmar que esse material vai de encontro ao conceito mundial de sustentabilidade de produção,
especialmente ligado ao melhor uso dos recursos naturais locais. Percebe-se também a grande capacidade
do bambu na humanização das moradias, permitida pela exploração estética, tecnológica e formal.
A utilização de materiais para habitações de interesse social requer normas técnicas padronizadas o que
ainda não existe para as construções em bambu. Entretanto, a eficiência deste material pode ser
comprovada por vários resultados de testes e pesquisas de prestações físicas e mecânicas realizados, tais
como Ghavami (2005). Além disso, trata-se de um material natural e econômico, por isso, sua utilização
no setor construtivo traduziria em economia, resultando em possível alternativa para construções a baixo
custo, atendendo à demanda habitacional brasileira e àquela do Espírito Santo.
Dotar o mercado com componentes industrializados de alta qualidade pode vir a ser uma das soluções
para romper com os preconceitos ainda existentes relativos a esse material. O desenvolvimento de
pesquisa e a formação de profissionais qualificados também tornam-se importante para superar os limites
que ainda persistem no imaginário da população, a qual ainda considera, preconceituosamente, as
habitações construídas em bambu como sinônimo de precariedade e pobreza.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CORBELLA, O. Em Busca de uma Arquitetura Sustentável para os Trópicos. Rio de Janeiro: Revan, 2003.
EBIOBAMBU. CD-room Centro Pesquisa Tecnologia Experimental Bambu. Rio de Janeiro: Ebiobambu, 2005
GHAVAMI, K. Bambu: um material alternativo na Engenharia. Rio de Janeiro: PUC-RJ, 1992.
____. Propriedades físicas e mecânicas do colmo inteiro do bambu da espécie Guadua angustifolia. In Revista
Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, v.9, n.1, p.107-114, 2005
GIVONI, B. Climate considerations in Buildings and urban Design. New York: John Wiley & Sons, 1998.
HIDALGO-LÓPEZ,O. Bamboo, the gift of the Gods. Bogota: Oscar Hidalgo-Lopez editor, 2003.
ISO. International Organization for Standardization. ISO/DIS-22157- Determination of physical and mechanical
properties of bamboo. 2001
JANSSEN, J. A. Building with bamboo – a handbook. London, UK: Intermediate Tecnology Publications. 1995.
JUNIOR, A.T. O estado ambiental de direito. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/web/cegraf/pdf>.
Acesso em: 02 março 2010.
TEIXEIRA, A. A. Painéis de Bambu para habitações Econômicas: Avaliação do Desempenho de Painéis
Revestidos com Argamassa. Dissertação de Mestrado em Arquitetura e Urbanismo, Universidade de Brasília, 2006.
UOL Notícias. Déficit habitacional no país é de 8 millhões de moradias. In UOL Notícias: Brasília, 2009.
Disponível em: < http://noticias.uol.com.br/cotidiano/2009/03/25/ult5772u3355.jhtm> Acesso em: 10.05.11.
VI Encontro Nacional e IV Encontro Latino-americano sobre Edificações e Comunidades Sustentáveis - Vitória – ES - BRASIL - 7 a
9 de setembro de 2011

Documentos relacionados

Caro Hans e demais colegas, Envio dois - Isomax

Caro Hans e demais colegas, Envio dois - Isomax O Tigre no entanto é pouco estudado em função do baixo nível de importancia, afinal,"ele só destroi bambus"!. Ninguém está disposto a pagar por isto! Eu tenho Pica Paus a vontade aqui no Bambuplatz...

Leia mais

Download!

Download! técnica é empregada no Japão para a produção de colmos quadrangulares (Hidalgo, 2004).

Leia mais

Conhecendo Bambus e suas Potencialidades para Uso na

Conhecendo Bambus e suas Potencialidades para Uso na LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Dados de resistência à tração, módulo de elasticidade e coeficiente de Poisson................................................................................. 49 Tabel...

Leia mais

Lecao_Bambu_Cultivo_Pioneirias

Lecao_Bambu_Cultivo_Pioneirias criatividade necessita de uma ajuda técnica que este livro do Lecão nos vai proporcionar. É um condensado bem elaborado da arte de fazer as Pioneirias escoteiras. Pioneiria é tudo aquilo que pode s...

Leia mais

Baixar este arquivo PDF - OJS - UFSC

Baixar este arquivo PDF - OJS - UFSC Esse setor é essencial para o crescimento de uma nação, desempenhando um papel importante e vital para sociedade, transformando necessidades em infra-estrutura (IBRAHIM et al., 2010). Entretanto, o...

Leia mais