2012 nº 11

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2012 nº 11
ISSN 0100-7203
2012
Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia Novembro
nº 11
Novembro 2012
volume 34
volume 34
número 11 p. 485 - 530
Publicação mensal
ISSN 0100-7203
Órgão Oficial de Divulgação Científica da Federação Brasileira das
Associações de Ginecologia e Obstetrícia
Rev Bras Ginecol Obstet v. 34, n. 11, p. 485-530, novembro 2012
Publicação indexada na Base de
Dados LILACS e SciELO. Disponível
eletronicamente no SciELO
www.scielo.br/rbgo nas versões
português e inglês
Indexada na
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Krikor Boyaciyan (São Paulo/SP)
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Sebastião Freitas de Medeiros (Cuiabá/MT)
Selmo Geber (Belo Horizonte/MG)
Sérgio Hofmeister de Almeida Martins Costa (Porto Alegre/RS)
Sérgio Mancini Nicolau (São Paulo/SP)
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Victor Hugo de Melo (Belo Horizonte/MG)
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autores. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos, desde que mencionada a fonte.
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Publicação mensal
ISSN 0100-7203
Órgão Oficial de Divulgação Científica da Federação Brasileira das
Associações de Ginecologia e Obstetrícia
Rev Bras Ginecol Obstet v. 34, n. 11, p. 485-530, novembro 2012
Sumário
Editorial
485
Teresa Cristina Barroso Vieira
Eduardo de Souza
Mary Uschiyama Nakamura
Rosiane Mattar
Sexualidade na gestação: os médicos brasileiros estão
preparados para lidar com estas questões?
Sexuality in pregnancy: are Brazilian physicians prepared to conduct these questions?
Artigos Originais
488
Gláucia Virgínia de Queiroz Lins Guerra
Alex Sandro Rolland de Souza
Bruna Faria da Costa
Flávia Renata Queiroz do Nascimento
Mariana de Andrade Amaral
Ana Caroline Paz Serafim
494
Raquel Santos Robalo Fernandes
Ana Filipa Bernardino Simões
Ana Cristina Neves Figueiredo
Ana Rita Silva Ribeiro
Francisca Maria Ferreira Aleixo
Sílvia Margarida Duarte Teixeira
Guerra Aragüés
Njila Yakalage Barreira Amaral
499
Danielle Albuquerque Pires Rocha
Josiane Montanho Mariño
Cristina Maria Borborema do Santos
Exame simples de urina no diagnóstico de infecção urinária em
gestantes de alto risco
Urine test to diagnose urinary tract infection in pregnant women at high risk
Prognóstico obstétrico de pacientes portadoras de diabetes
mellitus pré-gestacional
Pregnancy outcomes in women with pre-existing diabetes
Detecção de Citomegalovírus Humano e Herpesvírus Simples
tipo 2 em amostras cervicais
Detection of Human Cytomegalovirus and Herpes Simplex Virus type 2 in cervical sample
505
Fátima Faní Fitz
Ana Paula Magalhães Resende
Liliana Stüpp
Thaís Fonseca Costa
Marair Gracio Ferreira Sartori
Manoel João Batista Castello Girão
Rodrigo Aquino Castro
511
Caio Augusto Hartman
Cássia Raquel Juliato
Efeito da adição do biofeedback ao treinamento dos músculos
do assoalho pélvico para tratamento da incontinência urinária
de esforço
Effect the adding of biofeedback to the training of the pelvic floor muscles to treatment of stress
urinary incontinence
Inclusão dos sintomas na discriminação entre tumores anexiais
benignos e malignos
Inclusion of symptoms in the discrimination between benign and malignant adnexal masses
Luis Otávio Sarian
Amilcar Barreta
Maria Carolina Szymanski de Toledo
Denise da Rocha Pitta
Sophie Derchain
518
Juraci Almeida Cesar
Gabriela Breitembach dos Santos
Andrea Tomais Sutil
Carolina Fischer Cunha
Samuel de Carvalho Dumith
524
Luciana Azôr Dib
Michele Gomes Da Broi
Maria Cristina Picinato Medeiros
de Araújo
Roberta Cristina Giorgenon
Rui Alberto Ferriani
Paula Andrea de Albuquerque
Sales Navarro
Citopatológico de colo uterino entre gestantes no Sul do Brasil:
um estudo transversal de base populacional
Pap smears among pregnant women in Southern Brazil: a representative cross-sectional survey
Análise invasiva e não invasiva do fuso meiótico de oócitos
humanos obtidos de ciclos estimulados: dados preliminares
Invasive and noninvasive analysis of the meiotic spindle of human oocytes obtained from stimulate
cycles: preliminary results
Agenda
530
Agenda
Instruções aos Autores
A Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia (Rev Bras Gincecol
as respectivas publicações sobre o tema. Se houver interesse da revista,
será enviado convite para apresentação do texto definitivo. Todos
os autores devem ter publicações em periódicos regulares, indexados
sobre o tema da revisão. O número de autores é limitado a quatro,
dependendo do tipo de texto e da metodologia empregada. Devem ser
descritos os métodos e procedimentos adotados para a obtenção do
texto, que deve ter como base referências recentes, inclusive do ano em
curso. Tratando-se de tema ainda sujeito a controvérsias, a revisão deve
discutir as tendências e as linhas de investigação em curso. Apresentar,
além do texto da revisão, resumo, abstract e conclusões. Ver a seção
“Preparo do manuscrito” para informações quanto ao texto principal,
página de rosto, resumo e abstract;
Obstet., ISSN 0100 7203), publicação mensal de divulgação científica
da Federação das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo),
é dirigida a obstetras, ginecologistas e profissionais de áreas afins, com
o propósito de publicar contribuições originais sobre temas relevantes no
campo da Ginecologia, Obstetrícia e áreas correlatas. É aberta a contribuições nacionais e internacionais. A revista aceita e publica trabalhos em
português, inglês e espanhol.
O material enviado para análise não pode ter sido submetido simultaneamente à publicação em outras revistas nem publicado anteriormente.
Na seleção dos manuscritos para publicação, são avaliadas originalidade,
relevância do tema e qualidade da metodologia utilizada, além da adequação às normas editoriais adotadas pela revista. O material publicado
passa a ser propriedade da Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia
e da Febrasgo, só podendo ser reproduzido, total ou parcialmente, com
a anuência dessas entidades.
5.
Comentários Editoriais, solicitados pelo editor;
6.
Resumos de Teses apresentadas e aprovadas nos últimos 12 meses,
contados da data de envio do resumo. Devem conter, aproximadamente, 300 palavras e, para serem aceitos, devem seguir as normas
da revista quanto à estruturação, à forma e ao conteúdo. Incluir título
em português e inglês e, no mínimo, três palavras ou expressõeschave. Não há revisão do texto dos Resumos de Teses. No arquivo
enviado, informar: nome completo do autor e do orientador; membros
da banca; data de apresentação e a identificação do serviço ou
departamento onde a tese foi desenvolvida e apresentada. Lembramos
que a publicação do resumo não impede a posterior publicação do
trabalho completo em qualquer periódico.
Os manuscritos submetidos à revista são analisados por pareceristas
e o sigilo sobre a autoria e a identidade dos revisores é garantido durante
todo o processo de edição. Os pareceres dos revisores e as instruções do
editor serão enviados para os autores para que eles tomem conhecimento
das alterações a serem introduzidas. Os autores devem reenviar o texto
com as modificações solicitadas assim que possível, devendo justificar, na
carta de encaminhamento, se for o caso, o motivo do não atendimento de
alguma sugestão para modificação. Não havendo retorno do trabalho
após três meses, presume-se que os autores não têm mais interesse na
publicação. Os autores podem solicitar em qualquer ponto do processo
de análise e edição do texto a sustação do processo e a retirada do
trabalho. Os conceitos e as declarações contidos nos artigos são de
responsabilidade dos autores.
A revista publica contribuições nas seguintes categorias:
1.
Artigos Originais, trabalhos completos prospectivos, experimentais ou
retrospectivos. Manuscritos contendo resultados de pesquisa clínica
ou experimental original têm prioridade para publicação.
2. Relatos de Casos, de grande interesse e bem documentados, do
ponto de vista clínico e laboratorial. Os autores deverão indicar
na carta de encaminhamento os aspectos novos ou inesperados em
7. Cartas dos Leitores para o Editor, versando sobre matéria editorial
ou não, mas com apresentação de informações relevantes ao leitor.
As cartas podem ser resumidas pela editoria, mas com manutenção
dos pontos principais. No caso de críticas a trabalhos publicados,
a carta é enviada aos autores para que sua resposta possa ser
publicada simultaneamente.
Informações gerais
1.
A revista não aceita material editorial com objetivos comerciais.
2.
Conflito de interesses: devem ser mencionadas as situações que podem
influenciar de forma inadequada o desenvolvimento ou as conclusões do
trabalho. Entre essas situações, menciona-se a participação societária
nas empresas produtoras das drogas ou dos equipamentos citados
ou utilizados no trabalho, assim como em concorrentes da mesma.
São também consideradas fontes de conflito os auxílios recebidos, as
relações de subordinação no trabalho, as consultorias etc.
3.
No texto, deve ser mencionada a submissão e a aprovação do estudo por um Comitê de Ética em Pesquisa reconhecido pelo Comitê
Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP).
4.
Artigo que trate de pesquisa clínica com seres humanos deve incluir
a declaração, na seção Métodos, de que os sujeitos do estudo
assinaram o termo de consentimento livre e informado. Os autores
relação aos casos já publicados. O texto das seções Introdução e
Discussão deve ser baseado em revisão bibliográfica atualizada. O
número de referências pode ser igual ao dos trabalhos completos.
3.
Técnicas e Equipamentos, para apresentação de inovações em diagnóstico, técnicas cirúrgicas e tratamentos, desde que não sejam, clara ou
veladamente, propaganda de drogas ou outros produtos. Valem para essa
categoria todas as normas aplicadas para trabalhos completos.
4.
Artigos de Revisão, incluindo avaliação crítica e sistematizada da literatura,
meta-análises ou revisões sistemáticas. A seleção dos temas e o convite
aos autores têm como base planejamento estabelecido pela editoria.
Contribuições espontâneas podem ser aceitas. Nesse caso, devem ser
enviados inicialmente um resumo ou roteiro do texto, a lista de autores e
v
devem informar, também, que a pesquisa foi conduzida de acordo
com a Declaração de Helsinque revisada em 2008.
5. No caso de trabalhos envolvendo experimentação animal, os
autores devem indicar na seção Métodos que foram seguidas as
normas contidas no CIOMS (Council for International Organization
of Medical Sciences) Ethical Code for Animal Experimentation (WHO
Chronicle 1985; 39(2):51-6) e os preceitos do Colégio Brasileiro
de Experimentação Animal - COBEA (www.cobea.org.br).
6. Todos os ensaios controlados aleatórios (randomized controlled
trials) e clínicos (clinical trials) submetidos à publicação devem ter
o registro em uma base de dados de ensaios clínicos. Essa é uma
orientação da Plataforma Internacional para Registros de Ensaios
Clínicos (ICTRP) da Organização Mundial da Saúde (OMS), e
do International Committee of Medical Journal Editors (ICMJE). As
instruções para o registro estão disponíveis no endereço eletrônico
do ICMJE (http://www.icmje.org/clin_trialup.htm) e o registro pode
ser feito na base de dados de ensaios clínicos da National Library
of Medicine, disponível em http://clinicaltrials.gov/ct/gui.
Preparo dos manuscritos
As normas que seguem foram baseadas no formato proposto pelo ICMJE
e publicado no artigo “Uniform Requirements for Manuscripts Submitted to
Biomedical Journals”, atualizado em Outubro de 2008 e disponível no
endereço eletrônico: http://www.icmje.org/.
Apresentação do texto
1.
Os trabalhos devem ser digitados em espaço 2 em todas as seções, da
página de rosto às referências bibliográficas, tabelas e legendas. Cada
página deve conter aproximadamente 25 linhas em uma coluna. Usar
preferencialmente o processador de texto Microsoft Word® e a fonte Times
New Roman 12. Não dar destaque a trechos do texto: não sublinhar ou
usar negrito. Numerar todas as páginas, iniciando pela de rosto.
Não usar maiúsculas nos nomes próprios (a não ser a primeira letra)
no texto ou nas referências bibliográficas. Não utilizar pontos nas
siglas (DPP em vez de D.P.P.). Quando usar siglas ou abreviaturas,
descrevê-las por extenso na primeira vez que mencionadas no texto.
Iniciar cada seção em uma nova página: página de rosto; resumo e
palavras ou expressões-chave; abstract e keywords; texto; agradecimentos; referências; tabelas individuais e legendas das figuras.
7.
O número de autores de trabalhos completos e relatos de casos é limitado a sete. Trabalhos de autoria coletiva (institucionais) devem ter os
responsáveis especificados. Trabalhos e estudos multicêntricos podem
ter número de autores compatível com o número de centros (cada situação será avaliada pela editoria e pelos revisores). Os investigadores
responsáveis pelos protocolos aplicados devem ser especificados. Todos
os autores devem ter conhecimento do texto enviado para a revista.
2.
8.
O conceito de coautoria é baseado na contribuição de cada um, para
a concepção e planejamento do trabalho, análise e interpretação
dos dados, para a redação ou revisão crítica do texto. A inclusão
de nomes cuja contribuição não se enquadre nos critérios citados ou
que tenham fornecido apenas suporte material não é justificável.
Página de rosto
9. Os autores serão informados, por correspondência eletrônica, do
recebimento dos trabalhos. Os trabalhos que estiverem de acordo
com as Instruções aos Autores e se enquadram na política editorial
da revista serão enviados para análise por revisores indicados pelo
editor. Os originais em desacordo com os objetivos da revista ou
com essas instruções são devolvidos aos autores para as adaptações
necessárias antes da avaliação pelo Conselho Editorial ou recusados
sem análise por revisores.
10. Junto dos arquivos originais, deve ser enviada uma carta de encaminhamento, na qual deve ficar explícita a concordância com as
normas editoriais, com o processo de revisão e com a transferência
de copyright para a revista.
11. Para manuscritos originais, não ultrapassar 25 páginas de texto
digitado ou aproximadamente 30.000 caracteres. Limitar o número
de tabelas e figuras ao necessário para apresentação dos resultados
que são discutidos (como norma geral, limitar a cinco). Para manuscritos do tipo Relato de Caso, não ultrapassar 15 páginas de texto
ou 18.000 caracteres (ver “Preparo do manuscrito”, “Resultados”).
12. O trabalho deve ser enviado pelo sistema de submissão online no portal
SciELO. O endereço eletrônico de todos os autores deve ser fornecido.
Desta forma, os coautores receberão informação sobre a submissão do
vi
trabalho e, assim, não será necessária a assinatura de todos na carta
de encaminhamento. O endereço eletrônico para correspondência com
a revista é [email protected]. O arquivo correspondente ao trabalho
deve ser único e deve conter texto, referências, tabelas e figuras.
Apresentar o título do trabalho em português e em inglês; nomes
completos dos autores sem abreviaturas; endereços eletrônicos válidos de
todos os autores (opcional, em substituição à carta de encaminhamento);
nome da instituição onde o trabalho foi desenvolvido; afiliação institucional
dos autores; informações sobre auxílios recebidos sob forma de bolsas de
estudos, financiamento, fornecimento de drogas, reagentes ou equipamentos. Obrigatoriamente deve ser fornecido o endereço da instituição onde o
trabalho foi desenvolvido, o qual é publicado na página inicial do trabalho.
Devem ser indicados nome, endereço, telefone/fax e e-mail do autor para
o qual a correspondência deve ser enviada. Essas informações pessoais
são empregadas apenas para correspondência com a revista e somente
são publicadas se houver pedido do(s) autor(es).
Resumo
O resumo do trabalho deve aparecer na segunda página. Para trabalhos completos, redigir um resumo estruturado, que deve ser dividido em
seções identificadas: objetivo, métodos, resultados e conclusões. Deve ter
aproximadamente 300 palavras. O resumo deve conter as informações
relevantes, permitindo que o leitor tenha uma ideia geral do trabalho. Deve
incluir descrição resumida de todos os métodos empregados e da análise
estatística efetuada. Expor os resultados numéricos mais relevantes, e não
apenas indicação de significância estatística. As conclusões devem ser
baseadas nos resultados do trabalho e não da literatura. Evitar o uso de
abreviações e símbolos. Não citar referências bibliográficas no resumo.
Abaixo do texto do resumo indicar o número de registro e/ou identificação para os ensaios controlados aleatórios e ensaios clínicos (ver item
5 das “Informações Gerais”).
Na mesma página do resumo, citar pelo menos três palavras ou
expressões-chave que serão empregadas para compor o índice anual da
revista. Devem ser baseadas nos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS)
publicado pela Bireme, que é uma tradução do Medical Subject Headings
(MeSH) da National Library of Medicine e está disponível no endereço
eletrônico: http://decs.bvs.br.
O abstract deve ser versão fiel do texto do resumo estruturado (purpose,
methods, results e conclusions). Deve ser também acompanhado da versão
para o inglês das palavras ou expressões-chave (keywords). O resumo e o
abstract dos Relatos de Casos e dos Artigos de Revisão e de Atualização
não devem ser estruturados e são limitados a 150 palavras.
Introdução
Repetir, na primeira página da introdução, o título completo em português
e inglês. Nessa seção, mostre a situação atual dos conhecimentos sobre o
tópico em estudo, divergências e lacunas que possam eventualmente justificar o desenvolvimento do trabalho, mas sem revisão extensa da literatura.
Para Relatos de Casos, apresentar um resumo dos casos já publicados,
epidemiologia da condição relatada e uma justificativa para a apresentação
como caso isolado. Expor claramente os objetivos do trabalho.
Métodos
Iniciar essa seção indicando o planejamento do trabalho: se prospectivo
ou retrospectivo; ensaio clínico ou experimental; se a distribuição dos casos
foi aleatória ou não etc. Descrever os critérios para seleção das pacientes
ou Grupo Experimental, inclusive dos Controles. Identificar os equipamentos
e reagentes empregados (fabricante, cidade e país). Se a metodologia
aplicada já tiver sido empregada, indicar as referências, além da descrição
resumida do método. Descrever também os métodos estatísticos empregados
e as comparações para as quais cada teste foi empregado.
Os trabalhos que apresentam como objetivo a avaliação da eficácia
ou a tolerabilidade de tratamentos ou drogas devem, necessariamente,
incluir Grupo Controle adequado. Para informações adicionais sobre o
desenho de trabalhos desse tipo, consultar ICH Harmonized Tripartite
Guideline - Choice of Control Group and Related Issues in Clinical Trials
(http://www.hc-sc.gc.ca/hpfb-dgpsa/tpd-dpt/e10_e.html). Ver também
itens 4 e 5 das “Informações Gerais”.
Resultados
Apresentar os resultados em sequência lógica, no texto, nas tabelas
e nas figuras. Expor os resultados relevantes para o objetivo do trabalho
e que são discutidos. Não repetir no texto dessa seção todos os dados
das tabelas e figuras, mas descrever e enfatizar os mais importantes, sem
interpretação dos mesmos (ver também “Tabelas”). Nos Relatos de Casos,
as seções “Métodos” e “Resultados” são substituídas pela “Descrição do
caso”, mantendo-se as demais.
Discussão
Devem ser realçadas as informações novas e originais obtidas na
investigação. Não repetir dados e informações já mencionados nas seções
“Introdução” e “Resultados”. Evitar citação de tabelas e figuras. Ressaltar
a adequação dos métodos empregados na investigação. Comparar e
relacionar suas observações com as de outros autores, comentando e explicando as diferenças. Explicar as implicações dos achados, suas limitações
e fazer as recomendações decorrentes. Para Relatos de Casos, basear a
discussão em ampla e atualizada revisão da literatura. As informações
sobre os casos já publicados podem ser tabuladas e exibidas nessa seção
para comparações.
Agradecimentos
Dirigidos a pessoas que tenham colaborado intelectualmente, mas
cuja contribuição não justifica coautoria, ou para aquelas que tenham
provido apoio material.
Referências
Todos os autores e trabalhos citados no texto devem constar dessa
seção e vice-versa. Numerar as referências bibliográficas por ordem de
entrada no trabalho e usar esses números para as citações no texto. Evitar
número excessivo de referências, selecionando as mais relevantes para
cada afirmação e dando preferência para os trabalhos mais recentes.
Não empregar citações de difícil acesso, como resumos de trabalhos
apresentados em congressos, teses ou publicações de circulação restrita
(não indexados). Não empregar referências do tipo “observações não
publicadas” e “comunicação pessoal”. Artigos aceitos para publicação
podem ser citados acompanhados da expressão: “aceito e aguardando
publicação” ou “in press”, indicando-se periódico, volume e ano. Trabalhos
aceitos por periódicos que estejam disponíveis online, mas sem indicação
de fascículos e páginas, devem ser citados como “ahead of print”.
Outras publicações dos autores (autocitação) devem ser empregadas
apenas se houver necessidade clara e forem relacionadas ao tema. Nesse
caso, incluir entre as referências bibliográficas apenas trabalhos originais
publicados em periódicos regulares (não citar capítulos ou revisões).
O número de referências bibliográficas deve ser aproximadamente
35. Os autores são responsáveis pela exatidão dos dados constantes das
referências bibliográficas.
Para todas as referências, citar os autores até o sexto. Se houver
mais de seis autores, citar os seis primeiros, seguidos da expressão et al.,
conforme os seguintes modelos:
Formato impresso
• Artigos em revistas
- Ceccarelli F, Barberi S, Pontesilli A, Zancla S, Ranieri E. Ovarian
carcinoma presenting with axillary lymph node metastasis: a case
report. Eur J Gynaecol Oncol. 2011;32(2):237-9.
- Jiang Y, Brassard P, Severini A, Goleski V, Santos M, Leamon A, et al.
Type-specific prevalence of Human Papillomavirus infection among
women in the Northwest Territories, Canada. J Infect Public Health.
2011;4(5-6):219-27.
• Artigos com título em inglês e texto em português ou outra língua
Utilizar o titulo em inglês, entre colchetes e no final da referência,
indicar a língua na qual o artigo foi publicado.
- Prado DS, Santos DL. [Contraception in users of the public and private
sectors of health]. Rev Bras Ginecol Obstet. 2011;33(7)143-9.
Portuguese.
- Taketani Y, Mizuno M. [Application of anti-progesterone agents for
contraception]. Rinsho Fujinka Sanka. 1988;42(11):997-1000.
Japanese.
• Livro
- Baggish MS, Karram MM. Atlas of pelvic anatomy and gynecologic
surgery. 2nd ed. Philadelphia: WB Saunders; 2006.
vii
• Capítulos de livro
- Picciano MF. Pregnancy and lactation. In: Ziegler EE, Filer LJ, editors.
Present knowledge in nutrition. Washington (DC): ILSI Press; 1996.
p. 384-95.
Formato eletrônico
Apenas para informações estatísticas oficiais e citação de referências de periódicos não impressos. Para estatísticas oficiais, indicar
a entidade responsável, o endereço eletrônico, o nome do arquivo
ou entrada. Incluir o número de tela, data e hora do acesso. Termos
como “serial”, “periódico”, “homepage” e “monography”, por
exemplo, não são mais utilizados. Todos os documentos devem ser
indicados apenas como [Internet]. Para documentos eletrônicos com o
identificador DOI (Digital Object Identifier), este deve ser mencionado
no final da referência, além das informações que seguem:
- Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS [Internet]. Informações de
Saúde. Estatísticas vitais. Mortalidade e nascidos vivos: nascidos
vivos desde 1994. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2008. [citado
2007 Fev 7]. Disponível em: <http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/
deftohtm.exe?sinasc/cnv/nvuf.def >
Legendas
Digitar as legendas usando espaço duplo, acompanhando as respectivas figuras (gráficos, fotografias e ilustrações). Cada legenda deve ser
numerada em algarismos arábicos, correspondendo a cada figura, e na
ordem em que foram citadas no trabalho.
Abreviaturas e siglas
Devem ser precedidas do nome completo quando citadas pela primeira
vez no texto. Nas legendas das tabelas e figuras, devem ser acompanhadas
de seu nome por extenso. As abreviaturas e as siglas não devem ser usadas
no título dos artigos e nem no resumo.
Empregar o seguinte endereço para correspondências não previstas nas
instruções:
Jurandyr Moreira de Andrade
Editor
Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia – Editoria – Avenida
Bandeirantes, 3.900, 8º andar – Campus Universitário – CEP 14049-900 –
Ribeirão Preto (SP) – Fone: (16) 3602-2803 – Fax: (16) 3633-0946 –
E-mail: [email protected].
• Monografia na Internet ou livro eletrônico
- Foley KM, Gelband H, editors. Improving palliative care for cancer [Internet]. Washington: National Academy Press; 2001 [cited 2002 Jul 9].
Available from: http://www.nap.edu/books/0309074029/html/.
Tabelas
Apresentar as tabelas em páginas separadas, com espaço duplo e
preferencialmente fonte Arial 8. A numeração deve ser sequencial, em
algarismos arábicos, na ordem em que foram citadas no texto. Todas as
tabelas devem ter título e todas as colunas da tabela devem ser identificadas
com um cabeçalho. A legenda deve conter informações que permitam ao
leitor entender o conteúdo das tabelas e figuras, mesmo sem a leitura do
texto do trabalho. As linhas horizontais devem ser simples e limitadas a
duas no topo e uma no final da tabela. Não empregar linhas verticais.
Não usar funções de criação de tabelas, comandos de justificação, tabulações decimais ou centralizadas. Utilizar comandos de tabulação (tab)
e não o espaçador para separar as colunas e, para nova linha, a tecla
enter. No rodapé da tabela, deve constar legenda para abreviaturas e
testes estatísticos utilizados.
Figuras (gráficos, fotografias e ilustrações)
As figuras devem ser apresentadas em páginas separadas e numeradas
sequencialmente, em algarismos arábicos, conforme a ordem de aparecimento
no texto. Todas as figuras devem ter qualidade gráfica adequada e apresentar
título e legenda. Para evitar problemas que comprometam o padrão da revista,
o processo de digitalização de imagens (scan) deve obedecer aos seguintes
parâmetros: para gráficos ou esquemas, usar 300 dpi/bitmap para traço;
para ilustrações e fotos (preto e branco), usar 300 dpi/RGB ou grayscale. Em
todos os casos, os arquivos devem ter extensão .tif e/ou .jpg. Também são
aceitos arquivos com extensão .xls (Excel), .eps, .psd para ilustrações em curva
(gráficos, desenhos e esquemas). São aceitas, no máximo, cinco figuras. Se as
figuras já tiverem sido publicadas, devem vir acompanhadas de autorização
por escrito do autor/editor e constando a fonte na legenda da ilustração.
viii
Itens para a conferência para a submissão do manuscrito
Antes de enviar o manuscrito, conferir se as Instruções aos Autores foram
seguidas e verificar o atendimento dos itens listados a seguir:
1.
carta de encaminhamento assinada por todos os autores (escaneada
e anexada como documento suplementar ou enviada pelo correio)
ou informação dos endereços eletrônicos válidos de todos os autores
na página de rosto;
2. citação da aprovação do projeto do trabalho por Comissão de
Ética em Pesquisa, assinatura do termo de consentimento livre e
informado (na seção “Métodos”) e informação sobre o atendimento
das exigências para pesquisa em animais;
3.
número ou código do registro do estudo, se necessário, na página
de rosto (item 5 das “Informações Gerais”);
4.
conflito de interesses: informar se há ou não. Se houver, explicar sem
omissão de informações relevantes;
5.
página de rosto com todas as informações solicitadas;
6.
resumo e abstract estruturados e compatíveis com o texto do trabalho;
7. três ou mais palavras-chave relacionadas ao texto e respectivas
keywords baseadas no Decs;
8.
verificar se todas as tabelas e figuras estão corretamente citadas no
texto e numeradas, e se as legendas permitem o entendimento das
mesmas;
9. referências bibliográficas: numeradas na ordem de aparecimento e
corretamente digitadas. Verificar se todos os trabalhos citados estão
na lista de referências e se todos os listados estão citados no texto.
Teresa Cristina Barroso Vieira1
Eduardo de Souza2
Mary Uschiyama Nakamura2
Rosiane Mattar2
Sexualidade na gestação: os médicos
brasileiros estão preparados para lidar com
estas questões?
Sexuality in pregnancy: are Brazilian physicians prepared to conduct
these questions?
Editorial
Introdução
A sexualidade é uma função biológica humana que não se atém à genitalidade e sim à corporalidade total. Segundo a Neuroendocrinologia, a função sexual é um fenômeno biopsicossocial
complexo no qual estímulos internos e externos são modulados pelo sistema nervoso central e
periférico, resultando em uma cascata de alterações bioquímicas, hormonais e circulatórias que
culminam no resultado sexual físico e cognitivo1,2. É um fenômeno que envolve aspectos biológicos, psicológicos e sociológicos3. Na atualidade, o comportamento sexual humano transcendeu
o aspecto reprodutivo e passou a ser considerado parte integral da qualidade de vida4,5.
Apesar de alguns avanços ao longo dos últimos séculos, o exercício da sexualidade ainda é
cercado por tabus, preconceitos e crendices em muitas culturas modernas. O conceito de disfunções sexuais surgiu somente no século XX, após os primeiros estudos sobre a resposta sexual
fisiológica humana. Em 1966, Masters e Johnson6 propuseram o modelo que descrevia a resposta
sexual masculina e feminina como um processo linear didaticamente subdividido em quatro
fases denominadas excitação, platô, orgasmo e resolução. Embora cada fase tenha características
específicas distintas, não são unidades separadas, mas partes inseparáveis de um processo unitário,
sequencial, contínuo e ordenado. Em 2001, Basson propôs um novo modelo específico para a
resposta sexual feminina segundo o qual a resposta sexual das mulheres seria circular e dividida
em cinco fases (neutralidade, excitação, desejo responsivo, satisfação e intimidade)7. Segundo
esse novo modelo, o desejo não necessariamente desencadearia toda a resposta sexual feminina,
mas a intimidade física do casal poderia ser a base para a motivação sexual8. Consequentemente,
muitas mulheres que seriam classificadas como disfuncionais segundo o modelo antigo deixariam
de sê-lo segundo esse novo modelo9.
Sexualidade na gestação
Se a resposta sexual feminina foi esquecida durante muitos séculos, o estudo dessa função
durante o ciclo gravídico-puerperal recebeu ainda menos atenção. A gravidez é caracterizada
por modificações bioquímicas, funcionais e anatômicas que se iniciam logo após a implantação
Correspondência
Teresa Barroso Vieira
Rua Napoleão de Barros, 875 – Vila Clementino
CEP: 04024-002
São Paulo (SP), Brasil
Recebido
24/09/2012
Aceito com modificações
29/10/2012
Trabalho realizado no Departamento de Obstetrícia da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP), Brasil.
Departamento de Obstetrícia, Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP), Brasil.
2
Departamento de Obstetrícia, Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP), Brasil
1
Vieira TCB, Souza E, Nakamura MU, Mattar R
e que geralmente se acompanham de modificações emocionais. Todas essas alterações acabam por interferir no
comportamento sexual da maioria das gestantes, em graus
e formas diferentes10,11.
A cópula é considerada segura durante a gravidez normal. Além de não causar danos, a relação sexual durante a
gestação pode beneficiar o casal, pois tranquiliza a mulher
e o parceiro, dissipa energias acumuladas e alivia a tensão e
a ansiedade por meio da satisfação5,10,11. A maioria das mulheres mantém atividade sexual durante a gestação, porém
com padrão diferente em relação ao período pré-gestacional.
Com o avançar da gravidez, ocorre redução na frequência da
atividade sexual, no desejo sexual e no intercurso vaginal12-15.
No pós-parto, muitas mulheres continuam a relatar declínio
no interesse, desejo ou libido sexual, porém 80% dos casais
restabelecem relações sexuais até a 12ª semana após o parto14-16.
As mudanças na função sexual observadas durante o ciclo
gravídico-puerperal são atribuídas a alterações hormonais e/
ou metabólicas, à fadiga e a fatores psicogênicos.
O assunto da função sexual na gravidez ainda é cercado
por numerosos tabus movidos por ignorância e preconceitos
culturais, pessoais ou religiosos. Talvez por todos esses motivos, dificuldades sexuais são bastante frequentes durante a
gravidez, afetando entre 40 e 70% das mulheres em algumas
culturas13,14,17,18. A maioria dos casais se preocupa com as
modificações que ocorrem durante a gestação e com possíveis
repercussões negativas da atividade sexual sobre o concepto
e a gravidez; no entanto, por constrangimento ou medo,
frequentemente relutam em fazer perguntas espontâneas
sobre sexualidade, a não ser que um profissional de saúde
aborde o assunto primeiro12,15,19,20.
O médico está preparado para abordar
questões de sexualidade na gestação?
Dificuldades sexuais durante a gestação podem levar
a estresse, ansiedade e problemas maritais que podem
afetar negativamente a qualidade de vida do casal13,14,18,19.
A falta de conhecimento de médicos e pacientes a respeito
da sexualidade, assim como preconceitos, reforçam as
inadequações sexuais durante o período gestacional. O
pré-natal é uma excelente oportunidade para que o casal
expresse seus medos, esclareça suas dúvidas, receba informações corretas e descubra novas abordagens sexuais
que possibilitem a manutenção de sua intimidade física,
satisfação emocional e qualidade de vida durante essa fase
de suas vidas. Segundo diversos estudos, a maioria das
gestantes deseja discutir com seu médico suas dúvidas e
preocupações relacionadas às mudanças na sua sexualidade
durante essa fase, mas nem sempre se sentem confortáveis
em iniciar essa conversa espontaneamente. Por outro lado,
muitos médicos também se sentem despreparados e pouco
486
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):485-7
à vontade para abordar esse tema com suas pacientes11.
Essa conspiração silenciosa de a paciente “não contar” e de
o médico “não perguntar” leva muitos casais a sofrimento
desnecessário.
Para que ocorra um diálogo produtivo entre o médico e o casal grávido, é necessário que o obstetra esteja
disponível e sinta-se preparado e confortável para incentivar, ouvir e responder questões ligadas à sexualidade.
Todavia, muitos médicos, embora interessados, sentem-se
despreparados para esse tipo de atendimento em razão
de deficiências na sua formação na área da sexualidade
humana em geral e em particular na gestação.
Apesar de as queixas sexuais espontâneas serem
frequentes nos consultórios de todas as especialidades
médicas, a maioria dos cursos de medicina não prepara
adequadamente seus alunos para lidar com tais questões.
De acordo com um estudo que analisou o currículo
de 1.700 faculdades de Medicina em todo o mundo,
apenas um número mínimo delas oferecia um programa
multidisciplinar sobre sexualidade, e a duração média
desse ensino era de 6 a 10 horas21.
A residência médica é outro período em que seria
possível complementar o escasso conhecimento teórico
sobre o tema e treinar jovens médicos no atendimento
de pacientes com queixas sexuais; porém, não existe
normatização quanto ao conteúdo e a carga horária
mínima de treinamento em sexualidade humana nas
residências de Tocoginecologia, Psiquiatria ou Clínica
Geral. Dessa forma, o jovem médico é lançado no
mercado pouco preparado e inseguro para lidar com
essas questões.
Em estudo recente, avaliamos a atitude e a prática
de 154 residentes de três programas da Universidade
Federal de São Paulo (UNIFESP-EPM) sobre questões
de sexualidade na gestação22. Embora 70% dos participantes tenham declarado que perguntas sobre saúde
sexual deveriam fazer parte da história de todas gestantes
atendidas, menos de 20% dos residentes de Ginecologia
e Obstetrícia rotineiramente faziam perguntas a esse
respeito. Menos de um quarto dos participantes sentia-se
completamente seguro para responder a perguntas de
gestantes sobre sexualidade e 71% deles declararam
não ter conhecimentos específicos sobre disfunções
sexuais. Ainda, segundo os entrevistados, a falta de
conhecimento e de tempo durante as consultas seriam
os principais obstáculos para abordar questões sexuais
com gestantes.
Esta foi a primeira publicação que analisou a
atitude e prática de residentes em relação a questões
sexuais na gravidez. Outros estudos que avaliaram
o conhecimento e preparo de diversos especialistas
também evidenciam a falta de preparo de médicos que
atuam em diferentes áreas e com vários anos de prática
Sexualidade na gestação: os médicos brasileiros estão preparados para lidar com estas questões?
ao lidarem com queixas sexuais em pacientes adultos
de ambos os gêneros e em diferentes faixas etárias23,24.
Não há quem negue a importância da sexualidade
na qualidade de vida. No entanto, a dificuldade em
abordar, perguntar e responder com naturalidade a
questões relacionadas à sexualidade parece ser generalizada. Um médico bem preparado e seguro pode
ser um importante agente educativo e terapêutico no
atendimento de casais grávidos com queixas sexuais.
Não obstante, esse tipo de profissional é raro em nosso
meio, o que aponta para a necessidade de melhorar a
qualidade da educação em saúde sexual oferecida aos
alunos de Medicina e aos residentes.
Conclusão
Em razão de fatores biológicos, hormonais, psicológicos e culturais, dificuldades sexuais são bastante
frequentes durante a gravidez e podem afetar negativamente a qualidade de vida de muitos casais. O pré-natal
é uma excelente oportunidade para que os casais possam
expor suas dúvidas, medos e queixas sexuais e obter os
esclarecimentos e orientações necessários; porém, a maioria
dos médicos está despreparada para lidar com questões
de sexualidade durante o ciclo gravídico-puerperal. São,
portanto, necessárias intervenções educativas para melhorar essa situação.
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Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):485-7
487
Gláucia Virgínia de Queiroz Lins Guerra1
Alex Sandro Rolland de Souza2
Bruna Faria da Costa3
Flávia Renata Queiroz do Nascimento3
Mariana de Andrade Amaral3
Ana Caroline Paz Serafim4
Exame simples de urina no diagnóstico de
infecção urinária em gestantes de alto risco
Urine test to diagnose urinary tract infection in highh-risk
pregant women
Artigo Original
Resumo
Palavras-chave
Urinálise
Infecções urinárias/diagnóstico
Bacteriúria
Gravidez de alto risco
Keywords
Urinalysis
Urinary tract infections/diagnosis
Bacteriuria
Pregnancy, high-risk
OBJETIVO: Identificar a acurácia do exame simples de urina para diagnóstico de infecção urinária em gestantes de alto
risco. MÉTODOS: Realizou-se um estudo transversal, prospectivo, em 164 gestantes admitidas na enfermaria de alto
risco do Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira (IMIP), no período de janeiro a junho de 2011. Foram
excluídas as pacientes em uso de antibiótico nos últimos dez dias. Todas as pacientes foram submetidas aos exames
de urina simples e urocultura no início de sua admissão. A concordância entre os resultados dos exames foi avaliada
pelo índice Kappa (K), sendo, ainda, determinados a acurácia, sensibilidade, especificidade e valor preditivo positivo
(VPP) e negativo (VPN). RESULTADOS: Utilizando como critério de diagnóstico apenas a presença de piócitos no
exame simples de urina para sugerir bacteriúria, observou-se uma fraca concordância quando comparado à urocultura
(K=0,16). A acurácia foi de 61%, com sensibilidade de 62,5% e especificidade de 60,6%. O VPP foi de 27,78%
e o VPN, de 87%. CONCLUSÃO: Na presença de alteração do exame simples de urina não necessariamente está
em curso uma infecção urinária, sendo necessária a realização da urocultura. Porém, quando o exame simples de
urina for normal, a urocultura pode ser dispensada.
Abstract
PURPOSE: To identify the accuracy of urinalysis in the diagnosis of urinary tract infection in pregnant women at high risk.
METHODS: a prospective, cross-sectional study was conducted on 164 pregnant women admitted to the high-risk the
ward of the Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira (IMIP) during the period from January to June 2011.
Patients who had been taking antibiotics in the last ten days were excluded. All patients were subjected to simple urine
tests and urine culture at the beginning of their admission. The agreement between the results of the examinations was
evaluated by Kappa indices (K), and accuracy, sensitivity, specificity, and positive (PPV) and negative (NPV) predictive
values were also determined. RESULTS: When only the presence of pus cells in urinalysis was used as a diagnostic
criterion suggesting bacteriuria, there was a poor agreement when compared to uroculture (K=0.16). Accuracy was
61%, sensitivity 62.5%, and specificity 60.6%. PPV was 27.78% and NPV was 87%. CONCLUSION: The presence
of alteration of urinalysis does not necessarily indicate an ongoing urinary tract infection, with urine culture being
necessary. However, when urinalysis data are normal, uroculture may be avoided.
Correspondência
Alex Sandro Rolland de Souza
Rua dos Coelhos, 300 – Boa Vista
CEP: 50070-550
Recife (PE), Brasil
Recebido
03/08/2012
Aceito com modificações
12/09/2012
Centro de Atenção à Mulher do Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira – IMIP – Recife (PE), Brasil.
1
Setor de Gestação de Alto Risco do Centro de Atenção à Mulher, Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira – IMIP – Recife
(PE), Brasil.
2
Setor de Medicina Fetal do Centro de Atenção à Mulher, Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira – IMIP – Recife (PE), Brasil.
3
Curso de Medicina, Faculdade Pernambucana de Saúde – FPS – Recife (PE), Brasil.
4
Programa de Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia, Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira – IMIP – Recife
(PE), Brasil.
Fonte de financiamento: Bolsistas do Programa Institucional de Iniciação Científica (PIBIC) do CNPq e IMIP.
Conflito de interesses: não há.
Exame simples de urina no diagnóstico de infecção urinária em gestantes de alto risco
Introdução
A infecção urinária caracteriza-se pela presença de
agentes infecciosos e invasão dos tecidos urinários, sendo
classificada segundo sua localização em infecção urinária
baixa e alta. A bacteriúria assintomática é definida como o
isolamento de bactérias na urina em quantidade maior ou
igual a 105 unidades formadoras de colônias por mililitros
(UFC/mL), sem sinais ou sintomas locais ou sistêmicos
de infecção1-3. Entre mulheres, gestantes ou não, sua prevalência é de 2 a 10%4, e encontra-se associada ao nível
socioeconômico, história de infecção urinária recorrente,
diabetes e anormalidades anatômicas do sistema urinário1.
Durante a gravidez, há uma série de alterações
fisiológicas no organismo materno que leva a maior
predisposição à infecção urinária e suas complicações.
A estase urinária secundária, a compressão do ureter
pelo útero gravídico e o relaxamento da musculatura
por ação da progesterona favorecem o surgimento de
bacteriúria, sendo um fator de risco importante para
o desenvolvimento de pielonefrite e suas complicações
durante a gravidez. Nessas mulheres, quando a bacteriúria, assintomática ou sintomática, não é tratada
ou inadequadamente tratada, evolui para pielonefrite
em 30% dos casos1,4,5. Estudos sugerem, ainda, que a
bacteriúria, assintomática ou sintomática, encontra-se
fortemente associada a complicações maternas e fetais,
como a rotura prematura de membranas, trabalho de
parto prematuro, corioamnionite, baixo peso ao nascer,
febre materna e infecção neonatal4,5.
O exame mais utilizado para o diagnóstico de bacteriúria e infecção urinária é o exame simples de urina,
também conhecido como sumário de urina e urinálise2,6.
Este analisa a urina quanto à cor, densidade, aspecto,
presença de leucócitos, bactérias, sangue, glicose, urobilinogênio, bilirrubina, nitrito e sedimentos urinários.
Para esse diagnóstico provável, a literatura sugere que a
presença de leucócitos, hemácias e nitrito são bons indicativos de bacteriúria ou infecção urinária. Entretanto,
esses elementos são apenas sinais indiretos de inflamação, não sendo precisos para o diagnóstico definitivo de
bacteriúria significativa. Para a confirmação de infecção
urinária exige-se a cultura de urina, na qual o patógeno
em crescimento é isolado e quantificado6.
Apesar de a literatura sugerir que o exame simples de
urina apresenta um alto valor preditivo negativo, ou seja,
quando ausentes sinais sugestivos de infecção urinária,
aproximadamente 90% das mulheres encontram-se sem
bacteriúria, as sociedades médicas internacionais ainda
recomendam a realização da cultura de urina de rotina no
rastreamento pré-natal da infecção urinária2,6-8.
Porém, diferentemente do exame simples de urina,
que é de baixo custo, fácil acesso e realização, a urocultura
não é disponibilizada de rotina na grande maioria dos
serviços de pré-natal2. Assim, é importante haver estudos
sobre a validação diagnóstica do exame simples de urina
comparada à urocultura para reforçar o uso do melhor
teste diagnóstico na rotina de pré-natal, visto que a
bacteriúria, mesmo assintomática, quando não tratada
de forma adequada poderá trazer grandes prejuízos para
o binômio mãe e feto.
Métodos
Realizou-se um estudo analítico, prospectivo, do
tipo transversal, envolvendo 164 gestantes admitidas
na enfermaria de Gestação de Alto Risco do Instituto
de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira (IMIP),
localizado em Recife, Pernambuco, Brasil, no período de
janeiro a junho de 2011.
Foram incluídas as gestantes internadas na enfermaria de gestação de alto risco por motivos diversos,
independentemente de apresentarem queixas urinárias.
As pacientes em uso de antibiótico e/ou que o utilizaram
nos últimos dez dias foram excluídas.
Todas as gestantes foram abordadas e esclarecidas
quanto aos objetivos da pesquisa, sendo incluídas apenas
após concordarem em participar e assinar o termo de
consentimento livre e esclarecido. O estudo teve início
apenas após aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa
em seres humanos do IMIP (CEP nº. 1.889-20, de outubro
de 2010), sendo conduzida de acordo com a Declaração de
Helsinque revisada em 2008.
O cálculo do tamanho amostral foi realizado utilizando o software Statcalc do Epi-info versão 3.5.1,
prevendo-se uma frequência de bacteriúria assintomática
de 10%2, com precisão de 30% e intervalo de confiança
de 80% Encontrou-se um número de 164 participantes;
prevendo-se eventuais perdas, optou-se por incluir no
estudo 180 gestantes.
Assim, durante o estudo, foram candidatas à participação 211 gestantes, sendo 31 excluídas por uso de
antibióticos no momento da admissão ou até 10 dias antes,
e 16 foram perdidas por ausência de resultado de um dos
exames após inclusão no estudo. Portanto, foram avaliadas
164 gestantes com idade entre 14 e 46 anos (27,9±7,5
anos) e idade gestacional variando entre 12 a 39 semanas
(30,0±5,9 semanas) (Tabela 1).
A mediana da paridade foi um, e a de número de
abortos anteriores foi zero, com 41,5% de mulheres
nulíparas. A maioria das gestantes era proveniente do
Recife e região metropolitana (53,7%), sendo as demais
do interior do Estado de Pernambuco e de outros Estados,
40,9 e 5,5%, respectivamente. Em relação ao estado civil, 73,7% tinham companheiro, 22,6% eram solteiras
e 3,7% divorciadas. Os principais motivos da internação
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):488-93
489
Guerra GVQL, Souza ASR, Costa BF, Nascimento FRQ, Amaral MA, Serafim ACP
foram síndrome hipertensiva, diabetes e trabalho de parto
prematuro (Tabela 1).
Para todas as participantes foram solicitados exames
de urina simples, urocultura e aplicado um instrumento
de coleta de dados no momento da admissão com as
seguintes variáveis: idade, estado civil, procedência, paridade, idade gestacional, motivo da internação, presença
de sinais e sintomas atuais de infecção urinária e resultado
dos exames realizados.
O exame simples da urina foi realizado utilizando
o aparelho Uriscan Pró II (Coreia) do laboratório de urinálise do IMIP e a análise foi automatizada. Avaliou-se
a presença de nitrito, piócitos, hemácias (cinco ou mais
hemácias por campo) e células epiteliais. Para o diagnóstico de bacteriúria/infecção urinária considerou-se como
critério a presença de mais que quatro piócitos por campo
e/ou nitrito positivo3.
A cultura de urina para isolamento e quantificação
de microrganismos foi realizada no laboratório central de
microbiologia do IMIP, conforme rotina estabelecida,
segundo técnica de disco-difusão7. Considerou-se bacteriúria/infecção urinária quando a urocultura evidenciou
mais que 105 bactérias por colônia3,7.
A coleta da urina pela paciente foi realizada após
instruções dadas pelos profissionais de saúde da enfermaria (técnicos de enfermagem ou enfermeiros). Colheu-se
para o exame o jato intermediário da primeira urina do
dia, após a realização de assepsia. O exame simples de
urina e a urocultura foram realizados por profissionais do
laboratório da instituição sem o conhecimento prévio do
estudo ou da realização de ambos os exames.
A sintomatologia referida pela paciente foi definida
como a presença de qualquer um dos sinais e sintomas,
como disúria (dor ou ardor durante a micção), alteração do
odor da urina, polaciúria (aumento na frequência urinária),
hematúria (presença de sangue), febre (temperatura axilar
maior que 37,5ºC) e dor lombar.
A analise estatística foi feita pelo programa Epi-Info
versão 3.5.3 e Open-Epi versão 2.2. Para descrever as
características da amostra foram utilizadas medidas de
tendência central, dispersão e distribuição de frequências.
Para validar o diagnóstico de bacteriúria/infecção urinária
pelo exame simples de urina, foi determinada a acurácia
(A), sensibilidade (S), especificidade (E), valor preditivo
positivo (VPP) e negativo (VPN), razão de verossimilhança positiva e negativa e seus respectivos intervalos
de confiança a 95% (IC95%).
Utilizou-se ainda o índice de Kappa (K) para se
determinar a concordância entre os exames simples de
urina e a urocultura, sendo considerada concordância ruim
quando igual a 0,00; fraca, de 0,01 a 0,20; sofrível de
0,21 a 0,40; regular de 0,41 a 0,60; boa de 0,61 a 0,80;
ótima de 0,81 a 0,99; e perfeita quando igual a 1,008,9.
490
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):488-93
Resultados
Quando se considerou o critério diagnóstico de bacteriúria/infecção urinária apenas pela presença de mais
que quatro piócitos por campo, o exame de urina simples
foi considerado sugestivo de infecção em 72 mulheres
(43,9%), das quais 63 (87,5%) eram assintomáticas.
Porém, considerando a presença de piócitos e nitritros
a bacteriúria/infecção urinária foi sugestiva em apenas
seis gestantes (3,6%), sendo três (50,0%) assintomáticas.
Destaca-se que todas as gestantes com nitrito positivo
apresentavam quatro ou mais piócitos por campo.
Na urocultura, o exame foi positivo em 32 participantes (19,5%) e apenas 7 (21,9%) eram sintomáticas. O
agente etiológico de maior frequência foi Escherichia coli,
responsável por 28% das infecções, seguido de Klebsiella
pneumoniae, Staphylococcus coagulase negativa e Streptococcus
beta hemolítico, com 18,7, 18,7 e 15,6%, respectivamente.
A presença de um ou mais sintomas foi relatado por
22 gestantes (13,4%). Os sintomas mais frequentes foram
disúria (n=11; 6,7%), polaciúria (n=9; 5,5%), hematúria
Tabela 1. Características das gestantes de alto risco no Instituto de Medicina Integral
Prof. Fernando Figueira
Características (n=164)
Idade (anos)
Média±DP
Variação
27,9±7,5
14–46
Idade gestacional (semanas)
Média±DP
Variação
30,0±5,9
12–39
Paridade
Mediana
1
Variação
0–11
Nulíparas n (%)
68 (41,5)
Abortos
Mediana
0
Variação
0–3
Procedência n (%)
Recife e região metropolitana
88 (53,7)
Interior de Pernambuco
67 (40,9)
Outros estados
9 (5,5)
Estado civil n (%)
Com companheiro
121 (73,7)
Solteira
37 (22,6)
Divorciada
6 (3,7)
Indicações de internamento n (%)*
Síndrome hipertensiva
60 (36,6)
Diabetes
52 (24,4)
Trabalho de parto prematuro
32 (19,5)
Rotura prematura das membranas
11 (6,7)
Outros
70 (42,7)
*Uma paciente pode apresentar mais de uma indicação de internamento.
Exame simples de urina no diagnóstico de infecção urinária em gestantes de alto risco
Tabela 2. Validação diagnóstica do exame de urina simples com a urocultura em gestantes de alto risco do Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira
Urocultura
Positiva
EU (P)
EU (N+P)
Negativa
n
%
n
%
Alterada
20
27,8
52
72,2
Normal
12
13,0
80
87,0
Alterada
4
66,7
2
33,3
Negativo
28
17,7
130
82,3
S
E
VPP
VPN
A
K
Valor p*
62,5
60,6
27,8
86,9
60,9
0,16
0,02
12,5
98,5
66,7
82,3
81,7
0,16
0,003
*Teste do χ2. EU: exame de urina; P: piócitos presentes; N+P: nitritos e piócitos presentes; S: sensibilidade; E: especificidade; VPP: valor preditivo positivo; VPN: valor
preditivo negativo; A: acurácia; K: índice Kappa.
(n=8; 4,9%), dor lombar (n=7; 4,3%), febre (n=5; 3,0%)
e odor forte (n=2; 1,2%).
Quando o exame simples de urina foi sugestivo de
infecção, utilizando como critério apenas a presença de
piócitos, em 27,8% das pacientes a urocultura foi positiva.
Quando o exame simples de urina foi normal, em 87,0%
das vezes a urocultura foi negativa. Assim, observou-se
um índice de Kappa de 0,16 (IC95% 0,03–0,3), com
acurácia de 61,0% (IC95% 53,3–68,1), sensibilidade
de 62,5% (IC95% 45,2–77,1), especificidade de 60,6%
(IC95% 52,1–68,5), valor preditivo positivo 27,8%
(IC95% 18,8–39,0), valor preditivo negativo de 87,0%
(IC95% 78,6–92,4), razão de verossimilhança positiva de
1,6 (IC95% 1,4–1,7) e razão de verossimilhança negativa
de 0,6 (IC95% 0,5–0,7) (Tabela 2).
Quando se analisou a presença de piócitos associada à
presença de nitrito o índice de Kappa foi de 0,16 (IC95%
0,05–0,3), com acurácia de 81,7% (IC95% 53,3–68,1),
sensibilidade de 12,5% (IC95% 5,0–28,1), especificidade
de 98,5% (IC95% 94,6–99,6), valor preditivo positivo
66,8% (IC95% 30,0–90,3), valor preditivo negativo de
82,3% (IC95% 75,6–87,4), razão de verossimilhança
positiva de 8,2 (IC95% 0,1–678,7) e razão de verossimilhança negativa de 0,9 (IC95% 0,8–0,9) (Tabela 2).
Discussão
Em nossa pesquisa, analisamos a acurácia do exame
de urina simples no diagnóstico de infecção urinária a
partir de amostra representativa de gestantes atendidas em
uma enfermaria de gestação de alto risco. As sociedades
médicas americanas recomendam a realização de rotina
da urocultura para o rastreio de bacteriúria assintomática
durante a gestação10,11. O Ministério da Saúde do Brasil
indica que a urocultura seja reservada quando o exame
simples de urina sugira infecção do trato urinário ou
quando o médico julgar necessário12.
O American College of Obstetrics and Gynecology recomenda que a cultura de urina seja realizada na primeira
consulta pré-natal e repetida no 3º trimestre de gravidez10,
enquanto, a recomendação do U.S. Preventive Services Task
Force é que a urocultura seja realizada entre a 12ª e 16ª
semanas de gestação11.
As dúvidas em relação ao exame de rastreamento
de infecção urinária ou bacteriúria assintomática10-12 e a
maior frequência dessas entidades clínicas em gestações
de alto risco motivaram a realização dessa pesquisa nesse
grupo de mulheres13,14. De forma semelhante a outros
estudos nos quais se incluíram gestantes de alto risco15,16,
as mulheres investigadas em nossa pesquisa eram jovens,
apresentando média de idade de 27,9 anos, 41,4% delas
eram primíparas e 27,4% declaravam antecedente de pelo
menos um aborto. A maioria provinha do Recife e região
metropolitana e viviam com companheiro.
Síndromes hipertensivas, diabetes, trabalho de parto
prematuro e rotura prematura das membranas foram os
principais diagnósticos. Tais frequências estão de acordo
com estudos realizados em enfermarias de gestação de alto
risco15, da mesma forma que o principal diagnóstico na
internação foi a hipertensão durante a gravidez, provavelmente porque as síndromes hipertensivas são bastante
frequentes em nosso meio15,16.
Diabetes, trabalho de parto prematuro e rotura
prematura das membranas, além de serem importantes
causas de internação pré-natal, também estão associadas à
bacteriúria/infecção urinária sintomática ou não1. Estudos
sugerem uma associação significativa de causa e efeito da
bacteríuria/infecção e o parto prematuro e rotura prematura
das membranas17,18. Por seu lado, o diabetes está associado
à instalação de processos infecciosos, particularmente a
bacteriúria/infecção urinária19.
Em nosso estudo a cultura de urina foi positiva em
19,5% das pacientes. Resultados esses semelhantes à
maioria dos estudos2,14,20. Da mesma forma, o agente
etiológico mais frequente foi a Escherichia coli, quando
comparado a outros estudos2,21,22. Porém a frequência de
Escherichia coli foi aproximadamente 28%, menor que a
encontrada em outros2,22. Pode-se atribuir a esse fato a
diferença das populações incluídas nos estudos:.este em
ambiente hospitalar, e os outros em ambiente ambulatorial.
Além disso, vários estudos vêm descrevendo a mudança
do perfil etiológico dessa infecção. Estudo realizado no
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):488-93
491
Guerra GVQL, Souza ASR, Costa BF, Nascimento FRQ, Amaral MA, Serafim ACP
próprio IMIP descreveu um aumento na frequência de
Klebsiela sp. em mulheres internadas não gestantes7. Tal
fato também pode estar ocorrendo entre as gestantes.
Em relação aos sinais e sintomas relativos à infecção urinária, referidos pelas gestantes, constatamos que
apenas 21,9% das gestantes com urocultura positiva
apresentaram algum tipo de sintomatologia. Porém,
analisar sinais e sintomas de infecção do trato urinário (ITU) durante a gestação é por vezes difícil para o
profissional de saúde assistente, já que muitos deles são
habitualmente referidos pelas gestantes, não caracterizando ITU20. Um estudo observou que, das 232 mulheres
incluídas, 46,5% relataram sintomas urinários, porém
apenas 10 (4,3%) apresentaram crescimento bacteriano
na cultura de urina. Assim, na maioria das mulheres
os sintomas foram atribuídos a mudanças fisiológicas
induzidas no sistema urinário durante a gravidez21. Em
relação à maior frequência de infecção urinária sintomática em nosso estudo, podemos justificar pela amostra
de gestantes de alto risco e devido à metodologia dos
estudos ser diferente.
De forma semelhante a outros autores, os sintomas
mais referidos pelas pacientes foram a disúria e polaciúria21.
Porém, a completa ausência de sintomas não descarta a
presença de bacteriúria e, consequentemente, os riscos
dela decorrentes21,23. Assim, destacamos a importância da
realização do diagnóstico de bacteriúria/infecção urinária
independente da presença ou ausência de sintomas durante
a gravidez, desencorajando o início do tratamento apenas
baseado na sintomatologia clínica.
A bacteriúria assintomática pode evoluir para pielonefrite em 25 a 40% dos casos, se a paciente não for tratada13,23. Das 164 gestantes analisadas no presente estudo,
a frequência de bacteriúria assintomática foi de 15,2%,
estando acima da referida na literatura14,21,23. Isso pode ser
explicado pela população do nosso estudo — mulheres
internadas no setor de gestação de alto risco.
Sabendo-se do risco aumentado para o desenvolvimento de ITU na gestação, da possibilidade de ocorrência
de bacteriúria assintomática e das possíveis complicações
maternas e perinatais, alguns pesquisadores apontam como
inquestionável a necessidade de realização de urocultura,
rotineiramente, no início da gestação10,11. Entretanto, a
urocultura exige laboratórios e profissionais especializados, sendo sua realização difícil em alguns dos serviços
de pré-natal do Brasil, particularmente nas regiões menos
desenvolvidas e nas Unidades Básicas de Saúde.
Um estudo realizado na Índia afirma que a urocultura
pode ser solicitada apenas quando o exame simples de
urina estiver alterado2, que está de acordo com o resultado
encontrado em nossa população. Observamos que, quando
o exame simples de urina foi normal (utilizando apenas o
critério de piócitos), apenas em 13% a cultura de urina
foi discordante — isto é, positiva — resultando em um
valor preditivo negativo para o exame simples de urina de
86,9%. Porém, é importante destacar que, quando acrescentamos à presença de nitritos como critério diagnóstico,
a especificidade do exame simples de urina aumenta de
62,5 para 98,5%, mantendo o valor preditivo negativo
semelhante. Vários estudos encontraram resultados semelhantes ao nosso: alto valor preditivo negativo, uma boa
especificidade, porém baixa sensibilidade, e baixo valor
preditivo positivo2,14,20,24,25.
Assim, após analisar o valor preditivo positivo e
o valor preditivo negativo do exame simples de urina,
concluiu-se que na presença de alteração do exame não
necessariamente está em curso uma infecção urinária, sendo
necessária a realização da urocultura. Quando o exame
simples de urina for normal, o resultado dessa pesquisa
indicou que em 87% das vezes a urocultura pode ser
dispensada. Assim, nossos dados sugerem que em locais
onde há impossibilidade de realização da urocultura, o
exame simples de urina pode ser utilizado como rastreio
de infecção urinária.
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Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):488-93
493
Raquel Santos Robalo Fernandes1
Ana Filipa Bernardino Simões1
Ana Cristina Neves Figueiredo1
Ana Rita Silva Ribeiro2
Francisca Maria Ferreira Aleixo3
Sílvia Margarida Duarte Teixeira
Guerra Aragüés3
Prognóstico obstétrico de pacientes
portadoras de diabetes mellitus pré-gestacional
Pregnancy outcomes in women with pre-existing diabetes
Njila Yakalage Barreira Amaral3
Artigo Original
Resumo
Palavras-chave
OBJETIVO: Avaliar as alterações epidemiológicas, de perfil clínico e de prognóstico obstétrico em pacientes portadoras de
diabetes mellitus pré-gestacional. MÉTODOS: Estudo retrospetivo (coorte) de todas as gestações simples, com diagnóstico
de diabetes prévio que foram seguidas num centro com apoio perinatal diferenciado entre 2004 e 2011 (n=194).
Analisaram-se tendências relacionadas com dados demográficos e variáveis clínicas maternas, dados de indicadores de
cuidados pre-concepcionais e durante a gravidez, e de controle metabólico. Dados do parto como a idade gestacional
(IG) do parto, via do parto e peso do neonato foram variáveis também estudadas. RESULTADOS: A frequência global
de diabetes prévia, durante o período estudado, foi de 4,4 por mil, não se verificando variações significativas durante
o período de estudo. Os casos de diabetes tipo 2 permaneceram constantes. Em 67% dos casos o parto foi de termo
(máximo de 80% em 2010–2011), registrou-se uma redução significativa dos partos por cesárea eletiva (p=0,03) e
na incidência de neonatos considerados grandes para a IG (p=0,04) ao longo dos anos em estudo. Apesar dos bons
resultados relacionados com o controle metabólico ao longo da vigilância da gravidez não foi registrada nenhuma
melhora ao longo do tempo. Da mesma forma a proporção de gestantes diabéticas com avaliação pre-concepcional
permaneceu pouco animadora. CONCLUSÕES: O seguimento de gestantes portadoras de diabetes mellitus em unidades
multidisciplinares parece permitir um ajuste metabólico tão precoce quanto possível, de forma a conseguir melhorar o
prognóstico obstétrico. A melhora nos cuidados pré-concepcionais continua sendo um desafio.
Diabetes mellitus/metabolismo
Diabetes gestacional/metabolismo
Complicações na gravidez
Resultado da gravidez
Keywords
Diabetes melittus/metabolism
Diabetes, gestational/metabolism
Pregnancy complications
Pregnancy outcome
Abstract
PURPOSE: To describe trends in prevalence, indicators of care and pregnancy outcomes for women with pre-existing type
I or type II diabetes. METHODS: Cohort study of all consecutive singleton pregnancies complicated by pre-existing type I
or type II diabetes followed from 2004 to 2011 at a tertiary perinatal care centre (n=194). We collected data from the
medical records and described trends in demographics, clinical history, indicators of care before or during pregnancy
and glycaemic control. We also studied perinatal outcomes, including gestational age at delivery, mode of delivery, and
birthweight. RESULTS: The overall incidence of pregestational diabetes was 4.4 per 1000, with no significant changes
throughout the study period. The number of type 2 diabetes cases also remained constant. In 67% of cases delivery occurred
after 37 weeks (maximum 80% in 2010–11). During this period there was a significant reduction in rates of elective
caesarean section (p=0.03) and in the incidence of large infants for gestational age (p=0.04). Indicators of glycaemic
control were favorable throughout pregnancy, with no significant trends detected during the study period. However,
preconceptional care indicators were substandard, with no significant improvement. CONCLUSIONS: A multidisciplinary
approach to diabetic management and obstetric practice contributed to adequate glycaemic control throughout pregnancy
and to improved pregnancy outcomes. Preconceptional care remains a key challenge.
Correspondência
Raquel Robalo
Serviço de Medicina Materno-Fetal
Maternidade Dr. Alfredo da Costa
Rua Viriato
CEP: 1069-089
Lisboa, Portugal
Recebido
20/06/2012
Aceito com modificações
15/10/2012
Trabalho realizado no Serviço de Medicina Materno-Fetal da Maternidade Dr. Alfredo da Costa – Lisboa, Portugal.
Serviço de Ginecologia e Obstetrícia, Maternidade Dr. Alfredo da Costa – Lisboa, Portugal.
2
Serviço de Ginecologia e Obstetrícia, Hospital de Santarém, EPE (Santarém) – Portugal.
3
Maternidade Dr. Alfredo da Costa – Lisboa, Portugal.
1
Prognóstico obstétrico de pacientes portadoras de diabetes mellitus pré-gestacional
Introdução
A prevalência em mulheres em idade reprodutiva
vem aumentando. Um estudo retrospetivo de 175.249
gestantes demonstrou que a frequência — que era de 0,8%
em 1999 — aumentou para 1,8% em 20051. O diabetes
preexistente à gravidez está associado aos piores resultados
obstétricos e perinatais2,3. Com o intuito de melhorar o prognóstico obstétrico, a importância da avaliação pré-concepcional de
mulheres com DM tipo 1 ou tipo 2 não deve ser negligenciada.
O mau controle metabólico no período da organogênese
associa-se a um aumento da taxa de aborto espontâneo e
de malformações fetais4,5. Durante o tempo de gestação
subsequente aumenta o risco de macrossomia e das suas
comorbidades associadas. Também contribuem para os
maus resultados obstétricos as complicações relacionadas
com a doença, como a vasculopatia, o aumento do risco
de parto pré-termo, restrição do crescimento fetal, doença
hipertensiva da gravidez e morbimortalidade perinatal6.
Estudos recentes, de base populacional, revelaram que
nas últimas duas décadas, apesar do esforço de melhoras
nos cuidados da população de gestantes diabéticas, estas
continuaram apresentando os piores resultados obstétricos e
perinatais, quando comparadas com gestantes não diabéticas, e que as taxas de mortalidade perinatal, malformações
fetais e macrossomia não sofreram melhoras significativas7,8.
Tendo como objetivo melhorar o prognóstico obstétrico de mulheres com diagnóstico de DM prévio à
gravidez, é fundamental apostar na formação de equipes
multidisciplinares com obstetras, endocrinologistas,
nutricionistas e enfermeiros empenhados na otimização
do controle metabólico da grávida diabética, com experiência na terapêutica hipoglicemiante adaptada às novas
necessidades na gravidez, no incentivo constante do cumprimento da dieta e na promoção do exercício físico. A
melhor interligação com os cuidados de saúde primários
e associações de diabéticos tem como meta aumentar o
número de gestações planejadas e, consequentemente,
melhorar o controle metabólico dessas mulheres9.
O objetivo deste estudo é avaliar as alterações epidemiológicas, de perfil clínico e de prognóstico obstétrico
em pacientes portadoras de DM pré-gestacional na Região
Central de Portugal.
Métodos
Foi efetuado um estudo retrospetivo, de coorte, que
incluiu todas as gestações simples, com diagnóstico de
diabetes prévio, com vigilância na Maternidade Dr. Alfredo
da Costa, em Lisboa, entre 1º de janeiro de 2004 e 31 de
dezembro de 2011 (n=194).
Definiu-se diabetes prévia como DM tipo 1 ou tipo 2,
diagnosticada até pelo menos um ano antes da data prevista
do parto. Foram excluídas gestantes que optaram pela
interrupção voluntária da gravidez, em que o parto não
ocorreu na nossa instituição e casos sem dados maternos
ou perinatais completos.
Com as consultas dos prontuários obtivemos dados
da história clínica, indicadores de cuidados pré-natais e
de controle metabólico na gestação, e informação relativa
ao parto. Foram avaliadas variáveis como a idade materna,
tipo de DM, paridade, raça e índice de massa corporal
(IMC) materno. Foram analisados os dados de cuidados
pré-concepcionais e gestacionais, destacando-se a realização
de consulta pré-concepcional e a idade gestacional (IG), em
semanas completas, na entrada da consulta (determinada
por datação no 1º trimestre). O ganho ponderal durante a
gestação foi definido como insuficiente, adequado ou excessivo de acordo com a IG do parto, e o IMC pré-gestacional
de acordo com as guidelines do Institute of Medicine10.
O controle metabólico foi avaliado na data de entrada
no seguimento de CGD e pelo menos uma vez por trimestre através do valor de hemoglobina glicosilada (HbA1c),
definindo-se como bom controle metabólico quando esse
valor se encontrava abaixo de 6,5%11.
Foram analisadas as variáveis do parto: IG, via de parto
e peso do recém-nascido (RN). Considerou-se gravidez de
termo quando IG foi superior a 37 semanas completas.
Considerou-se aborto as situações de perda fetal antes da
24ª semana de gestação.
A macrossomia fetal foi definida para um peso ao nascer
superior a 4000 g. Os casos em que o peso ao nascimento
era superior ao percentil 90 do peso para a idade gestacional
e gênero12 foram definidos como recém-nascidos grandes
para a idade gestacional (GIG).
Na análise das diferentes tendências ao longo dos anos
em estudo agrupou-se a amostra em quatro grupos, com igual
período de tempo (2004–2005, 2006–2007, 2008–2009 e
2010–2011). Testou-se a associação entre a evolução temporal
em grupos e os diferentes parâmetros em estudo por meio da
análise de variância (one-way ANOVA) para variáveis contínuas
com distribuição normal, e por meio do teste do χ2 (associação
e tendência) para variáveis categoriais. A análise estatística
foi realizada recorrendo-se ao programa SPSS, versão 16 para
Windows, e o nível de significância adotado foi p<0,05.
Pelas características da metodologia utilizada, a
apreciação pelo Comitê de Etica Médica e a necessidade
de obtenção de termo de consentimento livre e esclarecido
foram dispensadas como prevê a legislação portuguesa.
Resultados
No estudo foram incluídas 194 gestantes com diagnóstico
de DM tipo 1 ou tipo 2, seguidas na nossa instituição entre
2004 e 2011. Registrou-se o nascimento de 168 recém-nascidos
(81%), 20 casos de aborto espontâneo (90% no primeiro
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):494-8
495
Fernandes RSR, Simões AFB, Figueiredo ACN, Ribeiro ARS, Aleixo FMF, Aragüés SMDTG, Amaral NYB
trimestre) e 6 casos de interrupção médica da gravidez por
opção do casal (um caso de síndrome malformativo e cinco
casos de trissomia 21), todos antes da 24ª semana de gravidez,
após deferimento da Comissão Técnica de Certificação e dentro
do enquadramento legal em vigor em Portugal.
Num universo de 44 593 partos a incidência de diabetes prévia, durante os 8 anos estudados, foi de 4.4‰.
Cento e vinte e quatro gestantes (64%) tinham DM tipo
1 e 70 (36%) eram gestantes com DM tipo 2. O número
de casos com diabetes tipo 2 permaneceu constante.
Em relação à raça, 36% das gestantes com DM tipo 2
eram de raça não branca versus 11% das gestantes com DM
tipo 1 (p<0,001). Outras características maternas e sua variação
ao longo do período em estudo podem ser consultadas na
Tabela 1. Ao longo dos anos houve uma redução da proporção de gravidez em diabéticas nulíparas desde 2006–2007.
Constatou-se que a média de idade materna e a proporção de gestantes com idade superior a 35 anos, nos anos
2008–2009 foi significativamente mais elevada quando
comparada com os anos restantes, dentro do período estudado (p=0,02). Apesar de não ter havido, observou-se,
ao longo dos anos, uma diminuição dos casos de gestantes
com excesso de peso ou obesas.
Vários indicadores de cuidados pré-natais foram avaliados, como a existência de consulta pré-concepcional,
o início da vigilância hospitalar até à décima semana de
gestação ou a avaliação de controle metabólico no primeiro
trimestre de gravidez. Apenas 15,5% do total dos casos
havia tido uma consulta pré-concepcional. Em 64% dos
casos a primeira consulta foi efetuada até a 10ª semana de
gestação; em 77% foi possível obter uma avaliação do valor
de HgA1c até a 12ª semana e em 95% dos casos foi feita a
avaliação do fundo ocular no 1º trimestre. Essas variáveis
mantiveram-se estáveis ao longo do período estudado.
Entre os casos em que ocorreu perda fetal antes da 24ª
semana verificou-se que o valor de HgA1C média no 1º
trimestre foi superior, quando comparado com as gestantes
que não tiveram perda fetal em igual período (8,7 versus
7,1; p=0,001). Verificou-se, também, que a proporção
de casos cujo o valor de HgA1C foi superior a 6,5% foi
significativamente mais elevada entre as gestantes que
experimentaram perda fetal antes da 24ª semana, quando
comparadas com as restantes (15% versus 2%; p=0,01).
Indicadores de cuidados pré-natais (Tabela 2) e os
dados do parto (Tabela 3) foram estudados após exclusão
dos casos de perda gestacional antes da 24ª semana (n=168).
Valores de bom controle metabólico (definido como
valor de HgA1c inferior a 6,5%) foram mais prevalentes
no segundo e terceiro trimestres de gravidez, não tendo
sido registradas melhoras ao longo dos anos em estudo.
Não foi registrada nenhuma alteração, com significância, nos dados relativos ao ganho ponderal das gestantes, ao
longo dos anos de estudo. Porém, destacam-se os valores
de ganho ponderal excessivo em 39% dos casos. Em 42
gestantes com valores de IMC prévio superior 25% o ganho
Tabela 2. Indicadores de cuidados pré-natais nos casos de parto após as 24 semanas
2004–
2005
(n=46)
20062007
(n=40)
2008–
2009
(n=42)
2010–
2011
(n=40)
Valor p
0,6
Indicadores de cuidados durante a gravidez
Ecocardiograma
fetal-18–22
semanas: n (%)
38 (82,6)
35 (87,5)
38 (90,5)
36 (90)
Aumento ponderal
insuficiente: n (%)
8 (17,8)
7 (18,4)
8 (19)
13 (32,5)
Aumento ponderal
adequado: n (%)
19 (42,2)
15 (39,5)
18 (42,9)
11 (27,5)
Aumento ponderal
excessivo: n (%)
18 (40)
16 (42,1)
16 (38,1)
16 (40)
0,6
Indicadores de controle metabólico*
Tabela 1. Características maternas e variação dos parâmetros ao longo dos anos (2004– 2011)
18 (54,5)
12 (37,5)
9 (25)
13 (41,9)
0,09
2004–
2005
(n=47)
2006–
2007
(n=45)
2008–
2009
(n=55)
2010–
2011
(n=47)
Valor
p
Hga1C <6,5% entre
13–27 semanas:
n (%)
24 (70,6)
28 (75,7)
19 (52,8)
27 (67,5)
0,2
4,1
3,9
5
4,3
–
Hga1C <6,5% após
27 semanas: n (%)
27 (64,3)
21 (63,6)
19 (57,6)
20 (54,1)
0,7
31 (6)
31 (6)
33 (6)
31 (6)
0,1
*Valores de proporção apenas se referem aos casos avaliados.
Idade materna >35
A: n (%)
13 (27,7)
12 (26,7)
21 (38,2)
15 (31,9)
0,5
Tabela 3. Informações sobre a via de parto e peso dos recém-nascidos
Etnia não branca: n (%)
7 (14,9)
10 (22,2)
11(20)
11 (23,4)
0,7
Nuliparidade: n (%)
24 (51,1)
31 (68,9)
32 (58,2)
26 (55,3)
0,3
Excesso de peso e
obesidade: n (%)
23 (50)
23 (53,5)
27 (49,1)
17 (37,8)
0,4
Incidência
(por 1000 partos)
Idade materna
média (±DP*)
Diabetes tipo 2: n (%)
19 (40,4)
*DP: desvio padrão.
496
Hga1C <6,5% antes
das 13 semanas:
n (%)
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):494-8
17 (37,8)
17 (30,9)
17 (36,2)
0,7
2004–
2005
(n=46)
2006–
2007
(n=40)
2008–
2009
(n=42)
2010–
2011
(n=40)
Valor p
IG* parto >37
semanas
27 (58,7)
26 (65)
27 (64,3)
32 (80)
0,1
Cesárea eletiva
24 (52,2)
17 (42,5)
30 (71,4)
18 (45)
0,03
RN* peso >4000 g
7 (15,2)
10 (25)
8 (19)
3 (7,5)
0,1
RN GIG*
15 (32,6)
17 (43,6)
16 (38,1)
6 (15)
0,03
*IG: Idade gestacional; RN: Recém-nascido; GIG: Grandes para a idade gestacional.
Prognóstico obstétrico de pacientes portadoras de diabetes mellitus pré-gestacional
ponderal na gravidez foi excessivo. Pela grande dispersão de
dados e pelo reduzido tamanho amostral, optou-se por não
estudar a variação do ganho ponderal dentro de cada categoria de IMC pré-gestacional ao longo dos anos de estudo.
Em 67% o parto foi de termo e, apesar de não ter
significância estatística, observou-se um aumento progressivo dos partos de termo, tendo ocorrido em 80% dos
casos em 2010–11. O parto por cesárea eletiva ocorreu
em 53% (n=89), registrando-se uma redução significativa
desse tipo de parto (p=0,03), ao longo dos anos de estudo.
Dados totais relativos aos motivos para cesárea eletiva relacionados com as complicações do DM foram: 25 casos por suspeita
de macrossomia; 5 casos por retinopatia grave contraindicando o
parto vaginal; 5 casos por más condições de indução do trabalho
de parto (ITP) no contexto de pré-eclâmpsia grave; e 12 casos por
cesárea anterior sem condições de oferecimento de prova de trabalho.
Observou-se uma tendência de redução na proporção
de neonatos considerados grandes para o IG ao longo dos
anos em estudo (p=0,039).
Discussão
no presente estudo foram apresentadas variações epidemiológicas, de perfil clínico e de resultados das gestações com
diagnóstico de DM, seguidas em um único centro com apoio
perinatal diferenciado de Portugal. Observou-se um aumento
global na prevalência de diabetes preexistente à gravidez1,13,14.
Esse aumento, para além de baseado no aumento da prevalência
da doença em idades mais jovens15,16, reflete o aumento dos casos
de DM tipo 2 demonstrado em estudos de base populacional,
principalmente em países desenvolvidos8,13. Em nosso estudo,
os resultados foram divergentes dessa realidade: globalmente,
nenhuma tendência foi encontrada em relação ao número
de gestantes com DM seguidas no nosso centro. No biênio
2010–2011 houve um decréscimo no número de casos
referenciados em relação aos seguidos em igual período em
2008–2009, que coincidiu com a reorganização dos centros de
referenciação de gestantes diabéticas na região central do país.
Da mesma forma, em nosso estudo não se verificou nenhuma
variação em relação à idade materna ou em relação à incidência
dos casos de DM tipo2 ao longo dos anos. Todas essas variáveis
permaneceram constantes ao longo do período de estudo.
Em relação à raça das gestantes os dados apresentados
também não confirmam os encontrados na literatura, que
apontam o aumento dos casos de DM tipo 2 em mulheres
de raça não branca17-19. Em nossa amostra, apesar do ligeiro
aumento de casos em gestantes de raça não branca nos
últimos anos de estudo em relação aos primeiros, a maioria dos casos corresponderam a gestantes de raça branca.
Vários estudos apontam que o planejamento da gravidez
em mulheres portadoras de DM tem um impacto significativo
na redução de riscos materno-fetais4,9,20. Quando se avaliaram
os cuidados pré-concepcionais oferecidos a essas mulheres,
verificou-se que alguns parâmetros ficaram aquém do esperado,
o fato de não se ter registrado nenhuma melhora na proporção de gestantes que tiveram consulta pré-concepcional foi
desapontador. No entanto, a análise de resultados em relação
aos cuidados de pré-natal precoces na gestação registraram
progresso. A referenciação no primeiro trimestre da gestação
e a consulta diferenciada e multidisciplinar, entre os anos de
2004 e 2009, registraram progressos muito significativos. Em
igual período foi possível obter uma avaliação precoce do valor
de HbA1c em proporção crescente nas gestantes seguidas.
Na avaliação clínica dessas mulheres, é também
fundamental a observação do fundo ocular previamente
à gravidez ou de forma precoce em seu decurso; o período gestacional constitui uma janela de oportunidade
de avaliação, seguimento e terapêutica das complicações
microvasculares da doença21. Em nosso centro os resultados
foram excelentes ao longo de todo o período de estudo.
Outro fator importante para melhorar o prognóstico
obstétrico de gestantes diabéticas é o controle do aumento de
peso materno. A obesidade materna e o ganho de peso acima do
recomendado estão associados aos piores resultados obstétricos22-24.
Na avaliação do ganho ponderal das nossas gestantes, o qual foi
aferido de acordo com o IMC prévio e ajustado à IG do parto,
os resultados não demonstraram melhora ao longo dos anos de
estudo. Em 39% do total de gestantes o ganho ponderal foi
excessivo. Esse dado levou à reflexão de que apesar de ter sido
oferecido acompanhamento nutricional específico, as gestantes
não tiveram uma boa adesão às orientações da equipe.
As complicações gestacionais/fetais classicamente associadas ao diabetes são as malformações congênitas, o aborto
espontâneo e a macrossomia. A hiperglicemia é o deterninante
mais importante desses riscos25-27. De acordo com a literatura,
no presente estudo foram demonstrados valores de HgA1C
média no 1º trimestre superiores nas gestantes que tiveram
abortos espontâneos. Em contraste com essa realidade, nas
gestantes que não tiveram perda gestacional antes da 24ª
semana, os valores de controle metabólico foram globalmente
muito promissores, apesar de não se ter demonstrado nenhuma
variação ao longo do tempo. Grande proporção das gestantes atingiu baixos níveis de HgA1c no segundo trimestre
e, apesar do aumento da resistência à insulina, próprio do
terceiro trimestre, os resultados de bom controle metabólico
mantiveram-se igualmente altos nesse trimestre.
A avaliação da proporção de neonatos GIG, no presente
estudo, revelou melhoras significativas, registrando-se uma
redução da proporção desses neonatos ao longo do tempo de
estudo. Da mesma forma e em igual periodo, observou-se
uma redução significativa de parto por cesárea eletiva. Esses
resultados levaram à reflexão de que o bom controle metabólico foi, com certeza, decisivo. No entanto, é importante
lembrar que nesses tipos de gestações, é certo que muitos
outros fatores implicam o pior prognóstico dessas gestantes
quando comparadas com gestantes de baixo risco. Evers e
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):494-8
497
Fernandes RSR, Simões AFB, Figueiredo ACN, Ribeiro ARS, Aleixo FMF, Aragüés SMDTG, Amaral NYB
colaboradores publicaram dois importantes estudos prospectivos que demonstraram que gestantes com DM tipo 1 têm
pior prognóstico obstétrico, mesmo em condições de ótimo
ou subótimo controle metabólico28,29.
Apesar do exposto, continuamos acreditando que
a avaliação pré-concepcional, a vigilância precoce e por
equipe multidisciplinar, um bom controle metabólico
antes e durante toda a gestação e a melhora no controle
de aumento de peso inadequado por parte de gestantes
portadoras de DM contribuem de forma decisiva para
a melhora do prognóstico obstétrico dessas gestações
de alto risco.
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Danielle Albuquerque Pires Rocha1
Josiane Montanho Mariño1
Cristina Maria Borborema do Santos2
Detecção de Citomegalovírus Humano e
Herpesvírus Simples tipo 2 em amostras
cervicais
Detection of Human Cytomegalovirus and Herpes Simplex Virus
type 2 in cervical sample
Artigo Original
Resumo
Palavras-chave
OBJETIVO: Testar a presença de DNA de Citomegalovírus Humano (HCMV) e Herpesvírus Simples tipo 2 (HSV-2)
em amostras cervicais de mulheres atendidas em um serviço de atenção primária à saúde no município de Coari,
Amazonas, Brasil. MÉTODOS: Participaram deste estudo 361 mulheres sexualmente ativas, variando entre 18 e
78 anos, atendidas em Unidades Básicas de Saúde para exame ginecológico de rotina. As amostras cervicais foram
coletadas por meio de escova endocervical. A detecção dos vírus deu-se por meio de Reação em Cadeia da Polimerase
(PCR) em tempo real. RESULTADOS: A média de idade das mulheres participantes foi de 36,4 anos (desvio-padrão
(DP)=13,4). Foi encontrado DNA de HCMV em amostras cervicais de 30 mulheres (8,3%; IC95% 5,8–11,8) e de
HSV-2 em 2 mulheres (0,6%; IC95% 0,1–2,2). Duas mulheres relataram ser portadoras do HIV, estando uma delas
infectada com o HCMV. Não foram encontradas associações estatisticamente significativas entre a infecção pelos
patógenos estudados e as variáveis socioeconômicas, clínicas e comportamentais. CONCLUSÕES: A prevalência de
infecção pelo HCMV encontrada na amostra estudada chama a atenção para a necessidade do rastreio desse vírus
na gestação e da vigilância nos pacientes imunocomprometidos. A baixa prevalência do HSV-2 deve-se provavelmente
ao fato de a amostra cervical não ser adequada para este tipo de estudo por causa das características da biologia
viral relacionadas à neurolatência.
Infecções por citomegalovírus/diagnóstico
Herpevírus humano 2
Reação em cadeia da polimerase em
tempo real
Técnicas de diagnóstico molecular
Amazonas
Brasil
Keywords
Cytomegalovirus infections/diagnosis
Herpesvirus 2, human
Real-time polymerase chain reaction
Molecular diagnosis
Amazonas
Brazil
Abstract
PURPOSE: To detect the presence of Human Cytomegalovirus (HCMV) and Herpes Simplex Virus type 2 (HSV-2) DNA in
cervical samples from women assisted in a primary health care clinic in the city of Coari, Amazonas, Brazil. METHODS:
Participated in this study 361 sexually active women between 18 and 78 years. They were been assisted in a Basic
Health Care Clinic for routine gynecological exam. The cervical samples were collected using endocervical brush.
The viruses were detected using real-time Polymerase Chain Reaction (PCR) technique. RESULTS: Mean age was 36.4
years (standard deviation (SD)=13.4). HCMV DNA was found in cervical samples from 30 women (8.3%; IC95%
5.8–11.8) and HSV 2 DNA in 2 women (0.6%; IC95% 0.1–2.2). Two women related being HIV positive, one of them
infected with HCMV. There were no statistically significant associations between infections by the pathogens studied
and socioeconomic, clinical or behavioral variables. CONCLUSIONS: The prevalence of the HCMV infection found
in the sample points to the need for screening of the virus during pregnancy and surveillance in immunocompromised
patients. The low prevalence of HSV-2 found is probably due to the fact that cervical sampling is not appropriate for
this type of study because of the characteristics of viral biology related to neurovirulence.
Correspondência
Danielle Albuquerque Pires Rocha
Universidade Federal do Amazonas
Estrada Coari-Mamiá, 305 – Espírito Santo
CEP 69460-000
Coari (AM), Brasil
Recebido
22/05/2012
Aceito com modificações
02/10/2012
Trabalho realizado no Programa de Pós-graduação em Biotecnologia da Universidade Federal do Amazonas – UFAM – Manaus (AM), Brasil.
Instituto de Saúde e Biotecnologia, Universidade Federal do Amazonas – UFAM – Manaus (AM), Brasil.
2
Faculdade de Farmácia, Universidade Federal do Amazonas – UFAM – Manaus (AM), Brasil.
Conflito de interesse: não há.
1
Rocha DAP, Mariño JM, Santos CMB
Introdução
Os herpesvírus formam um grupo de vírus de
genoma grande, sendo alguns deles patogênicos em
seres humanos. Todos os herpesvírus estudados apresentam uma marcante característica comum: o estabelecimento de um período de latência após uma fase
de replicação lítica ativa. Durante o ciclo infeccioso,
a maioria dos genes virais é expressa resultando em
uma grande disseminação viral. Em contraste, a expressão gênica viral é largamente reprimida durante a
fase de latência, e partículas virais não são formadas.
Dentre os herpesvírus patogênicos em humanos, o
Citomegalovírus Humano (HCMV) e o Herpesvírus
Simples tipo 2 (HSV-2) são dois importantes vírus
transmissíveis por via sexual1-4.
O herpes genital pode ser causado pelos HSV-1 e
HSV-2, porém a infecção pelo HSV-2 é mais comum,
mais grave e mais propensa às recorrências. A transmissão sexual do HSV-2 depende de contato íntimo entre
um indivíduo susceptível e um indivíduo excretando
vírus ativamente. O vírus deve entrar em contato
com as superfícies mucosas para que a infecção seja
iniciada. Após a infecção, o vírus replica-se na região
genital, perigenital ou anal, colonizando o gânglio
sacral. A seguir, os vírus migram pelos axônios até
os gânglios sensitivos regionais (neurovirulência),
onde permanecem em latência, em uma forma não
infecciosa, em equilíbrio com a célula hospedeira,
porém, com reativação periódica e liberação do vírus
infeccioso3,5,6.
Uma grave consequência da infecção por HSV-2 é
a transmissão para o feto ou recém-nascido. A infecção
fetal intrauterina ocorre como consequência de infecções
transplacentárias ou infecção ascendente e acontece
em cerca de 10% dos casos. A forma mais comum
de infecção, todavia, é o contato do recém-nascido,
durante o parto, com secreções maternas infectadas,
ocorrendo em 75 a 80% dos casos5,7,8.
O outro importante herpesvírus que pode ser
transmitido por via sexual (embora não exclusivamente)
é o Citomegalovírus Humano (HCMV). O HCMV
é um clássico agente de infecção oportunista, que
pode causar severa doença na ausência de uma efetiva
resposta imune, de forma que sua importância tem
sido cada vez mais apercebida em razão dos recentes
tratamentos imunossupressores (por exemplo, na
quimioterapia do câncer e no transplante de órgãos),
bem como por causa da epidemia de AIDS no mundo. O HCMV estabelece uma infecção latente com
episódios de reativação durante os quais é excretado
na saliva, urina, secreção cervical, esperma e leite
500
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):499-504
materno 9-12. A transmissão vertical do HCMV da mãe
para o feto ou recém-nascido é comum e desempenha
um papel importante na manutenção da infecção na
população. Nesses casos, o HCMV pode ser transmitido de três formas: transplacentária, intraparto ou
por meio do leite materno, e essa infecção pode ser
causa de malformação congênita, atraso psicomotor
e surdez 3,10,13,14.
O objetivo deste trabalho foi determinar a frequência do HCMV e do HSV-2 em espécime cervical
por meio de Reação em Cadeia da Polimerase (PCR)
em tempo real e relacionar esses dados de infecção
com características sociodemográficas, história clínica
e informações a respeito do comportamento sexual de
uma população feminina atendida em uma unidade
primária da Estratégia Saúde da Família (ESF).
Métodos
Este é um estudo de corte transversal, desenvolvido
no município de Coari, estado do Amazonas, Brasil,
com mulheres atendidas nas Unidades Básicas de Saúde
(UBS) do referido município, assistidas pela Estratégia
de Saúde da Família. Os critérios de inclusão foram:
mulheres sexualmente ativas, acima de 18 anos, que
apresentassem queixas clínicas ou não, quer estivessem grávidas ou não. Os critérios de exclusão foram:
mulheres histerectomizadas e mulheres submetidas a
tratamento recente (últimos três meses) para infecções
genitais, quer por via sistêmica quer tópica.
Foram incluídas 361 mulheres nesta pesquisa.
Para o cálculo amostral, considerou-se a prevalência
de 42% de doenças sexualmente transmissíveis (DST)
em geral no Brasil15, com margem de erro de 5% e
confiança de 95%. As mulheres foram registradas sequencialmente nesta pesquisa de acordo com demanda
espontânea. Todas as participantes do estudo foram
esclarecidas quanto à importância dele e assinaram o
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
Esta pesquisa foi submetida e aprovada pelo Comitê
de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do
Amazonas (UFAM).
As mulheres foram entrevistadas, respondendo a
um questionário-padrão contendo perguntas estruturadas e não estruturadas sobre as principais informações
clínicas, socioeconômicas e comportamentais. Todas
as mulheres foram submetidas a consulta e exame
físico, incluindo exame pélvico, pelo(a) enfermeiro(a)
responsável por esse procedimento na UBS.
As amostras foram coletadas com o auxílio de espéculo vaginal, utilizando-se escova endocervical (citobrush).
Foram acondicionadas em microtubos de 1,5 mL contendo
Detecção de Citomegalovírus Humano e Herpesvírus Simples tipo 2 em amostras cervicais
400 mL de tampão TRIS-EDTA (TRIS-HCl 10 mM e
EDTA 1 mM pH 8,0), colocadas imediatamente no gelo
e depois armazenadas em freezer a -20ºC no Instituto de
Saúde e Biotecnologia da UFAM, em Coari, Amazonas;
posteriormente, foram transportadas em gelo para o
Laboratório de Diagnóstico Molecular da UFAM em
Manaus, Amazonas, Brasil.
Depois de descongeladas à temperatura ambiente,
as amostras foram submetidas ao processo de extração
de DNA. Acrescentou-se 400 μL de tampão proteolítico TPK (TE [TRIS HCl 50 mM + EDTA 50 mM
pH=8,0], Tween 20% e Proteinase K 10 mg/mL) e
incubou-se por 60 minutos a 56°C e por 10 minutos
a 95˚C em banho seco. A seguir, o DNA foi extraído
pelo método fenol/clorofórmio, precipitado com etanol
absoluto e ressuspenso em 50 μL de água ultrapura
(pH 7,6)16.
A detecção do HSV-2 foi realizada por meio da
PCR em tempo real, com um ensaio do tipo TaqMan.
Foi utilizado o master mix TaqMan ® Environmental
Master Mix 2.0 da Applied Biosystems. Os iniciadores e sondas utilizados foram descritos por Corey
et al. (2005)17. Nesse sistema, os iniciadores HSV-F
e HSV-R amplificam ambos os HSV-1 e HSV-2 com
igual eficiência, e para discriminação entre os tipos
foi usada a sonda específica para o HSV-2 marcada
com FAM. A reação teve um volume final de 20 μL,
que continha os seguintes reagentes: 0,5 μL de
HSV-F 10 pmol, 0,5 μL de HSV-R 10 pmol, 0,5 μL
de sonda 10 pmol, 10 μL de master mix (2X), 4 μL
DNA e 4,5 μL de água.
Para detecção do HCMV, foi utilizada também
a PCR em tempo real. Para isso, foi utilizado um
ensaio pronto do tipo presença/ausência da Applied
Biosystems, o Taqman ® Gene Expression Assay
Pa03453400_s1. Nesse ensaio, os iniciadores e a
sonda já vêm misturados nas seguintes concentrações: iniciadores a 900 nM e a sonda a 250 nM, e o
fluorófogo presente na sonda é o FAM. Também foi
utilizado o master mix TaqMan Environmental Master
Mix 2.0, da Applied Biosystems. A reação teve um
volume final de 20 μL, que continha 10 μL de master
mix 2X, 1 μL do Assay Pa 03453400_s1 (20X), 4 μL
de DNA e 5 μL de água.
As amostras foram distribuídas em placa apropriada
para leitura óptica (MicroAmp Fast Optical 48-Well
Reaction Plate) da Applied Biosystems. A placa foi
levada ao aparelho de PCR em tempo real Step OneTM
Real Time PCR Systems, da Applied Biosystems. As
condições de termociclagem foram: 5 minutos a 95ºC
e 40 ciclos de 95ºC por 15 segundos e 60ºC por 60
segundos. Ao final da reação, o resultado foi obtido
a partir do programa Step OneTM Software v2.0. As
amostras foram consideradas positivas se o Cycle
Threshold (CT) foi até 37.
Os dados foram inicialmente tabulados e geraram
bancos de dados que foram analisados pelo software EpiInfo 3.5.3 para Windows (programa desenvolvido e
distribuído gratuitamente pelo Center of Disease Control
and Prevention (CDC)). Na análise das variáveis quantitativas, quando os dados apresentavam distribuição
normal, foi calculada a média e o desvio-padrão (DP),
e na rejeição da hipótese de normalidade, o teste não
paramétrico de Mann-Whitney. Na análise das variáveis
categóricas, foram calculadas as frequências absolutas
simples e relativas e, em alguns casos, o Intervalo
de Confiança ao nível de 95%. Na análise dos dados
categóricos, foi calculado o teste do qui-quadrado de
Pearson, e na impossibilidade da aplicação do teste de
Pearson foi aplicado o teste exato de Fisher. O nível de
significância fixado na aplicação dos testes foi de 5%.
Resultados
Todas as amostras foram positivas na PCR para
detecção do DNA genômico humano. Foi encontrado DNA de HCMV em 30 mulheres (8,3%; IC95%
5,8–11,8) e DNA de HSV-2 em 2 mulheres (0,6%;
IC95% 0,1–2,2).
No nosso estudo, encontramos mulheres jovens
infectadas pelo HCMV. A média das idades das
mulheres infectadas foi bem abaixo da média das
mulheres não infectadas (32,3±14,0 e 36,8±13,3
anos, respectivamente), porém essa diferença não foi
estatisticamente significante (p=0,078). Uma das
mulheres infectadas relatou ser portadora do HIV.
O grupo de mulheres solteiras/divorciadas/viúvas
apresentou maior prevalência (9,8%) em relação às
casadas/união estável (7,9%), e o grupo de mulheres
que relatou ter tido mais de 10 parceiros sexuais ao
longo da vida apresentou também maior prevalência
(10,7%) em relação aos grupos que relataram 1 a 5
parceiros (8,5%) e entre 6 e 10 (6,1%). Foi encontrada
prevalência maior entre as mulheres que afirmaram
uso não frequente do preservativo com parceiros fixos
(12,9%) em relação às que não usavam (8,3%), mas,
em relação aos parceiros eventuais, foi maior a prevalência entre mulheres que relataram uso inconsistente
do preservativo (14,3%) em relação às que disseram
usar “sempre” (8,0%). Entretanto, não houve diferença significativa entre os grupos nas quatro situações
citadas. Associações significativas entre a infecção
pelo HCMV e outras variáveis estudadas também não
foram encontradas (Tabela 1).
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):499-504
501
Rocha DAP, Mariño JM, Santos CMB
Tabela 1 - Distribuição segundo a frequência da história clínica em relação ao resultado do Citomegalovírus Humano nas mulheres amostradas no município de Coari (AM)
Citomegalovírus humano
Variáveis (n=361)
Positivo
Negativo
fi
%
fi
%
Total
Escolaridade
Valor p
0,3*
Fundamental incompleto
11
6,9
148
93,1
159
Fundamental completo
19
9,4
183
90,6
202
Idade
0,07**
Média±DP
32,3±14,0
36,8±13,3
Amplitude
18–70
18 –78
Estado civil
0,5*
Solteira/Divorciada/Viúva
8
9,8
74
90,2
82
Casada/União estável
22
7,9
257
92,1
279
Número de parceiros na vida
*****
1a5
24
8,5
260
91,5
284
6 a 10
3
6,1
46
93,9
49
Acima de 10
3
10,7
25
89,3
28
Número de filhos
0,1****
Mediana
2,0
3,0
Amplitude
0–14
0–16
Uso de preservativo com parceiro fixo (n=328)
0,2*
Nem sempre
22
8,3
243
91,7
265
Sempre
8
12,9
54
87,1
62
Uso de preservativo com parceiro eventual (n=33)
0,5***
Nem sempre
1
14,3
6
85,7
7
Sempre
2
8,0
23
92,0
25
Tem /Já teve DST
0,1***
Sim
–
–
20
100,0
20
Não
30
8,8
311
91,2
341
Parceiro com história de DST nos últimos 12 meses
0,4***
Sim
2
10,5
17
89,5
19
Não
28
8,2
314
91,8
342
Motivo da consulta
0,09*
Consulta de rotina
20
10,7
167
89,3
187
Queixas clinicas
10
5,8
162
94,2
172
fi: frequência absoluta simples; DP: desvio–padrão; *Teste do χ2 de Pearson; **Teste t de Student; ***Teste exato de Fisher; ****Teste não paramétrico
de Mann-Whitney; *****Não é possível aplicar a estatística de teste em razão das restrições do
Discussão
A associação entre o HSV-2, um patógeno que causa
formação de úlceras, e a infecção pelo HIV tem aumentado
o interesse sobre a epidemiologia do HSV-2. Já o crescente
interesse pelo HCMV está relacionado principalmente à sua
característica oportunística em pessoas imunodeprimidas,
como pacientes com HIV, e as submetidas a tratamentos
imunossupressores, como os transplantados, situação cada
vez mais frequente12,18.
502
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):499-504
χ2 .
Considera-se que mais de 70% das infecções por HSV-2
não sejam conhecidas. Portanto, estudos epidemiológicos
são importantes para o entendimento do padrão de distribuição da infecção dentro das populações18,19. O método
diagnóstico mais usado nos estudos epidemiológicos é a
sorologia. Estudos mais antigos usavam a combinação do
ELISA (para detectar anticorpo anti-HSV) e Western blot
(para discriminar entre HSV-1 e HSV-2)5,20,21, enquanto só
mais recentemente os testes de ELISA discriminaram entre
anticorpos anti-HSV-1 e anti-HSV-218,19,22. Nos estudos
Detecção de Citomegalovírus Humano e Herpesvírus Simples tipo 2 em amostras cervicais
brasileiros, as soroprevalências para o HSV-2 tanto por
ELISA quanto pela combinação de ELISA com Western
blot em mulheres (gestantes, HIV-positivas, estudantes
universitárias, etc.) variam entre 7,3 e 50,7%5,18-22.
Em nosso estudo, encontramos DNA do HSV-2 em
apenas duas mulheres utilizando raspado cervical como
amostra. A detecção viral nesse tipo de amostra para fim de
estudo epidemiológico é limitada, uma vez que o HSV-2
apresenta latência no gânglio sacral (neurolatência) e não está
presente nos tecidos epiteliais e conjuntivos a não ser nas
fases de reativações5,6. Outras utilidades podem ser citadas
para a detecção do vírus em amostra cervical, por exemplo,
avaliar se uma parturiente previamente diagnosticada como
portadora da infecção está em fase de reativação assintomática.
Nesse caso, seria indicado um parto cesariano para evitar a
ocorrência de herpes neonatal decorrente de contaminação
no canal do parto. Outra importante utilidade desse teste é
a avaliação da presença de DNA viral em úlceras genitais
a fim de determinar a etiologia diante de outras doenças
formadoras de úlceras5,23,24.
Provavelmente, as duas mulheres positivas para
HSV-2 neste estudo desconheciam ser portadoras do
vírus, pois nenhuma delas relatou história prévia dessa
infecção, sugerindo-se que estavam em fase de reativação
assintomática. Outros estudos como os de Corey et al.17
e Dinc et al.23, comparando a sorologia com a detecção
do HSV-2 por técnica molecular em amostras cervicais
e/ou úlceras, são necessários para que se possa ter mais
segurança em relação à aplicabilidade desse ensaio.
O HCMV é transmitido pelo contato direto com
fluidos corporais de pessoas excretando o vírus. Uma
diferença marcante em relação ao HSV-2 é que, após a
aquisição inicial, o HCMV é excretado em altos títulos
na urina, saliva, lágrima, sêmen e secreções cervicais por
meses ou anos, ao passo que o HSV-2 é excretado apenas
localmente e em um curto intervalo de tempo, tanto
durante a infecção inicial quanto nas reativações3,10. Essa
característica da biologia viral faz do tipo de amostra
analisada nesta pesquisa, amostra cervical colhida com
citobrush, portanto contendo tanto fluido quanto células
cervicais, uma amostra mais adequada para detecção do
HCMV em relação à detecção do HSV-2.
Foram encontradas 30 mulheres com a presença do
HCMV na secreção cervical. A detecção desse vírus em
fluidos corporais teria uma indicação muito importante
relacionada ao diagnóstico de infecção congênita ou
perinatal em urina de recém-nascidos, proporcionando
a intervenção com recursos terapêuticos que podem
minimizar a gravidade dos casos e, no caso das infecções
congênitas, possibilitando diminuir a intensidade das
sequelas25. A detecção na secreção cervical diagnosticaria a mulher excretando ativamente o vírus, porém não
discriminaria entre infecção primária e reativação, o que
poderia ser feito em um acompanhamento de soroconversão durante a gestação26. No entanto, o rastreamento
dessa infecção durante a gravidez é discutido há vários
anos, sem consenso estabelecido13.
Das cinco mulheres que estavam grávidas em nosso
estudo, uma delas apresentou-se positiva para a infecção pelo HCMV. Entre as mulheres grávidas, a infecção
por esse vírus é frequentemente uma séria ameaça ao
feto. Perda auditiva e severo dano neurológico são as
principais manifestações da infecção congênita, e menos
frequentemente ocorre morte fetal ou neonatal. Essa
mulher pode estar em infecção primária ou em reativação
da infecção e tanto uma como outra situação são quase
sempre assintomáticas e favorecem a disseminação viral
horizontal e vertical10,27. Uma vez que essa paciente está
excretando o vírus ativamente, transmissão congênita ou
perinatal pode ocorrer.
As infecções assintomáticas são predominantes na
população, e em nossa amostra não foi diferente. Todas
as 30 mulheres infectadas pelo HCMV desconheciam a
sua infecção, pois nenhuma delas relatou história prévia.
A despeito da alta prevalência mundial, as infecções pelo
HCMV são geralmente assintomáticas na população, exceto em recém-nascidos de mães infectadas e em pacientes
imunodeprimidos, como citado, nos quais o HCMV
afeta muitos órgãos12. Eliminar ou reduzir a morbidade
associada com a infecção pelo HCMV durante a gravidez
seria o foco do rastreamento sorológico durante essa fase.
Neste estudo, duas mulheres disseram-se conhecedoras
da sua condição de soropositividade para o HIV, e uma
delas apresentou infecção pelo HCMV. A infecção pelo
HCMV é muito preocupante em pessoas com quadros
de imunodeficiência, pois este é um vírus oportunista,
que causa severos quadros de pneumonite, lesões gastrointestinais, hepatite, retinite, pancreatite, miocardite
e, às vezes, encefalite, além de maior propensão a outras
infecções oportunistas fúngicas e bacterianas11,12. Nesses
pacientes, somente a detecção com PCR não necessariamente correlaciona-se com doença ativa, porque os vírus
que se encontram em estado latente também podem ser
amplificados. A PCR em tempo real, portanto, também
tem sido utilizada para detecção e quantificação de carga
viral. Um ensaio quantitativo de infecção pelo HCMV é
uma ferramenta importante, pois a análise da carga viral
no sangue é um importante fator preditivo de infecção e
aparecimento de doenças em pacientes HIV-positivos28,29.
Assim, este estudo chama a atenção para a prevalência
encontrada de HCMV em amostra cervical de mulheres
em exame ginecológico de rotina. Tal prevalência serve de
alerta para o não relaxamento da solicitação da sorologia
para esse vírus durante a gestação e para a verificação
mais detalhada da condição de portador em pacientes
imunodeprimidos.
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):499-504
503
Rocha DAP, Mariño JM, Santos CMB
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Fátima Faní Fitz1
Ana Paula Magalhães Resende1
Liliana Stüpp1
Thaís Fonseca Costa1
Marair Gracio Ferreira Sartori1
Manoel João Batista Castello Girão1
Rodrigo Aquino Castro1
Efeito da adição do biofeedback ao
treinamento dos músculos do assoalho
pélvico para tratamento da incontinência
urinária de esforço
Effect the adding of biofeedback to the training of the pelvic floor
muscles to treatment of stress urinary incontinence
Artigo Original
Resumo
Palavras-chave
Terapia por exercícios
Contração muscular/fisiologia
Retroalimentação fisiológica/fisiologia
Incontinência urinária por estresse/
reabilitação
Diafragma da pelve
Keywords
Exercise therapy
Muscle contraction/physiology
Feedback, physiological/physiology
Urinary incontinence, stress/rehabilitation
Pelvic floor
OBJETIVO: Verificar o efeito da adição do biofeedback (BF) ao treinamento dos músculos do assoalho pélvico (TMAP)
para o tratamento da incontinência urinária de esforço (IUE). MÉTODOS: Estudo piloto prospectivo, randomizado e
controlado, com mulheres com IUE sem deficiência esfincteriana detectada ao estudo urodinâmico e que realizavam a
correta contração dos MAP. Foram excluídas mulheres com doenças neuromusculares e com prolapso genital graus III e
IV. Foram randomizadas 40 mulheres em Grupo Controle e Grupo BF. O protocolo de TMAP com equipamento de BF
foi constituído de três séries de dez contrações lentas (tônicas), com tempo de manutenção de seis a oito segundos em
cada contração, seguido de um período de repouso de mesmo valor. Após cada contração sustentada, eram realizadas
de três a quatro contrações rápidas (fásicas) em decúbito dorsal e ortostatismo, duas vezes na semana, totalizando 12
sessões. Avaliou-se o efeito da adição do BF ao TMAP na qualidade de vida pelo King’s Health Questionnaire (KHQ),
nos sintomas urinários pelo diário miccional e na função dos músculos do assoalho pélvico (MAP) pela palpação
digital. A avaliação foi realizada inicialmente e após as 12 sessões de tratamento. O resultado foi descrito em médias
e desvios padrão. Para análise de homogeneidade e verificação das diferenças entre os grupos utilizou-se o teste de
Mann-Whitney, e para diferenças entre os momentos de observação, o teste de Wilcoxon, com nível de significância
de 0,05. RESULTADOS: Diminuição significativa nos escores dos domínios avaliados pelo KHQ na comparação entre
os grupos, exceto para o domínio saúde geral (Grupo BF 32,8±26,9 versus Grupo Controle 48,4±29,5; p≤0,13).
Em concordância, observou-se melhora da função dos MAP após o tratamento no grupo BF, na power (4,3±0,8;
p=0,001), endurance (6,0±2,2; p<0,001) e fast (9,3±1,9; p=0,001). Quando comparados os grupos, o Grupo
BF destacou-se positivamente em relação ao power (Grupo BF 4,3±0,8 versus Grupo Controle 2,5±0,9; p<0,001),
endurance (Grupo BF 6,0±2,2 versus Grupo Controle 2,7±1,9; p<0,001) e fast (Grupo BF 9,3±1,9 versus Grupo
Controle 4,6±3,2; p<0,001). Redução da frequência urinária noturna (1,2±1,2 versus 0,7±0,9; p=0,02) e da perda
de urina nos esforços (1,5±1,4 versus 0,6±0,8; p=0,001) foi observada no Grupo BF. CONCLUSÃO: A adição
do BF ao TMAP para o tratamento da IUE, aplicado de acordo com o protocolo descrito, contribui para melhora da
função dos MAP, redução dos sintomas urinários e melhora da qualidade de vida.
Abstract
PURPOSE: To investigate the effect of adding biofeedback (BF) to the training of pelvic floor muscles (PFMT) for the
treatment of stress urinary incontinence (SUI). METHODS: A prospective pilot study, randomized and controlled with
women with SUI without sphincter deficiency, detected by urodynamic study and who performed the correct PFM
contraction. Women with neuromuscular disorders and grade III and IV genital prolapse were excluded. Forty women
were randomized into a Control Group and BF Group. The PFMT protocol with BF equipment consisted of three sets of
ten slow contractions (tonic), with a holding time of six to eight seconds at each contraction followed by a rest period
of equal duration. After each sustained contraction, they performed three to four fast contractions (phasic) in the supine
and standing position twice a week, for a total of 12 sessions. We evaluated the effect of adding BF to PFMT on quality
of life using King’s Health Questionnaire (KHQ) regarding urinary symptoms based on a voiding diary and regarding
Correspondência
Fátima Faní Fitz
Departamento de Ginecologia da Escola Paulista de Medicina –
Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP
Rua Borges Lagoa 783, conjunto 31, 3° andar
CEP: 04038-031
São Paulo (SP), Brasil
Recebido
24/07/2012
Aceito com modificações
12/09/2012
Trabalho realizado na Seção de Uroginecologia e Cirurgia Vaginal, Departamento de Ginecologia da Escola Paulista de Medicina,
Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP), Brasil.
1
Seção de Uroginecologia e Cirurgia Vaginal, Departamento de Ginecologia da Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal
de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP), Brasil.
Fitz FF, Resende APM, Stüpp L, Costa TF, Sartori MGF, Girão MJBC, Castro RA
the function of pelvic floor muscles by digital palpation. The evaluation was performed initially and after 12 treatment sessions. Data are reported as mean
and standard deviation. The Mann-Whitney test was used for the analysis of homogeneity and to determine differences between groups, and the Wilcoxon
test was used to determine possible differences between the times of observation, with the level of significance set at 0.05. RESULTS: A significant decrease
in the scores of the domains assessed by the KHQ was observed in the comparison between groups, except for the general health domain (BF Group:
32.8±26.9 versus Control Group: 48.4±29.5, p≤0.13). Accordingly, there was improvement in PFM function after treatment in the BF Group, regarding
power (4.3±0.8, p= 0.001), endurance (6.0±2.2, p<0.001) and fast (9.3±1.9, p=0.001). When comparing the groups, the BF Group showed a positive
result regarding power (BF Group 4.3±0.8 versus Control Group 2.5±0.9, p<0.001), endurance (6.0±2.2 BF Group versus Control Group 2.7±1.9,
p<0.001) and fast (BF Group 9.3±1.9 versus Control Group 4.6 ± 3.2, p<0.001). Reduction of nocturnal urinary frequency (1.2±1.2 versus 0.7±0.9,
p=0.02) and of effort urine loss (1.5±1.4 versus 0.6±0.8, p=0.001) was observed in the BF Group. CONCLUSION: The addition of BF to the PFMT for
the treatment of SUI, applied according to the protocol described, improved PFM function, reduced urinary symptoms, and improved of the quality of life.
Introdução
Incontinência urinária é definida como a perda involuntária de urina. Dentre os sintomas mais comuns
encontra-se a incontinência urinária de esforço (IUE), que
consiste na perda involuntária de urina durante a tosse,
espirro ou atividades esportivas1.
A prevalência dos sintomas da IUE de qualquer
intensidade é de aproximadamente 80% em mulheres
entre 25 e 60 anos de idade2. Muitas dessas mulheres
têm vida social e profissional ativa e, dessa forma, essa
condição implica grande impacto na qualidade de vida, o
que reduz a participação em atividades sociais e interfere
no bem-estar psicossocial. Por esses fatores, o tratamento
da IUE torna-se primordial3-5.
A International Continence Society (ICS) reconhece os
exercícios para fortalecimento dos músculos do assoalho
pélvico (MAP) como padrão-ouro ao tratamento da IUE6,
com eficácia demonstrada em uma revisão sistemática7. Esses
exercícios podem ser feitos por meio de contrações isoladas ou
associadas ao biofeedback (BF), considerado um adjuvante ao
treinamento. Essa técnica promove a facilitação do aprendizado da correta contração muscular, bem como é auxiliar na
motivação do esforço da paciente durante o treinamento6,8.
No entanto, aproximadamente 30% das mulheres não
conseguem realizar a contração isolada dos MAP, mesmo
após instruções verbais e escritas9. Com isso, acredita-se
que os prováveis benefícios do uso do BF relacionam-se
à aquisição da correta contração dos MAP, o que facilita
a resposta fisiológica específica, e, por ser um motivador,
pode melhorar a adesão da paciente aos programas de
tratamento, uma vez que os efeitos desse tratamento são
parcialmente dependentes da adesão10,11.
Assim, o presente estudo tem por objetivo verificar
o efeito da adição do BF ao treinamento dos MAP para o
tratamento da IUE.
Métodos
Trata-se de estudo piloto prospectivo, randomizado e
controlado, realizado no período de março de 2009 a julho
506
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):505-10
de 2010. Esse estudo foi desenvolvido no Ambulatório
de Uroginecologia e Cirurgia Vaginal da Universidade
Federal de São Paulo – UNIFESP/EPM. Obteve-se aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da UNIFESP – CEP
nº 1966/09. Todas as participantes assinaram o termo de
consentimento livre e esclarecido, redigido conforme a
Resolução nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.
Foram incluídas mulheres com história clínica de
IUE sem deficiência esfincteriana, detectada pelo estudo
urodinâmico e com capacidade de realizar a correta contração dos MAP. Os critérios de exclusão foram doenças
neuromusculares, prolapso genital correspondente aos
graus III e IV de acordo com a classificação da ICS1 e o
uso de terapia hormonal.
Inicialmente, foram realizados os procedimentos
médicos de rotina (anamnese, exame físico geral, exame ginecológico e estudo urodinâmico). Em seguida,
realizou-se o processo de avaliação fisioterapêutica para
o recrutamento. Ao atenderem aos critérios de inclusão
e exclusão, e aceitarem a participar deste estudo, deu-se
início à randomização, com divisão em dois grupos. Para
randomização, utilizou-se tábua de números randômicos
gerados por computador12. Dessa forma, os sujeitos foram
divididos em: Grupo Controle — neste, as pacientes não
sofreram nenhuma intervenção médica ou fisioterapêutica;
e Grupo BF — no qual as pacientes realizaram 12 sessões
de treinamento dos MAP com BF. Ao término deste estudo, foram encaminhadas para tratamento as pacientes
referentes ao Grupo Controle. As participantes de ambos
os grupos foram desencorajadas a utilizar outras formas
de tratamento durante o período da realização do estudo.
Para as mulheres do Grupo BF, utilizou-se o protocolo de treinamento dos MAP, descrito previamente13.
Essas mulheres foram incentivadas a realizar três séries
de dez contrações lentas (fibras tônicas), com tempo de
manutenção de seis a oito segundos em cada contração,
seguido de um período de repouso de mesmo valor. Após
cada contração sustentada, realizaram de três a quatro
contrações rápidas (fibras fásicas) nas posições de decúbito
dorsal e ortostática. As sessões ocorreram consecutivamente
duas vezes na semana — o que totalizam 12 sessões. O
Efeito da adição do biofeedback ao treinamento dos músculos do assoalho pélvico para tratamento da incontinência urinária de esforço
tempo de duração de cada sessão foi de 30 a 40 minutos.
Para o treinamento dos MAP, utilizou-se o equipamento de biofeedback, modelo Neurodyn Evolution®, da marca
Ibramed. Uma sonda com balão inflável foi introduzida
no canal vaginal, a fim de mensurar a pressão da contração
muscular. O equipamento foi conectado ao computador,
fornecendo feedback visual da contração dos MAP por meio
de gráficos, em tempo real.
Como parte das medidas de desfecho,
mensurou-se a função dos MAP por meio de palpação
bidigital. Considerou-se avaliação da função muscular o
registro das seguintes variáveis: power (P), com a graduação
da escala de Oxford; endurance muscular (E), correspondente
à manutenção da contração muscular em segundos; e fast
(F), determinado pelo número de contrações de fibras
musculares rápidas. Referida avaliação foi adaptada do
método PERFECT14, amplamente utilizado na literatura.
Previamente à avaliação, todas as pacientes do grupo
BF receberam orientações a respeito da localização e função dos MAP, e de como contraí-los adequadamente15,16,
o mais forte e isoladamente possível, sem a ativação de
outras musculaturas, como os glúteos, abdominais e adutores. Os procedimentos de avaliação foram explicados
detalhadamente.
Avaliou-se o número de perdas urinárias pela utilização
de um diário miccional simplificado, no qual a paciente
anotou, pelo período de sete dias, as frequências urinárias
diurna e noturna, além do número de perdas urinárias.
Para a análise do impacto da IUE na qualidade de
vida, utilizou-se o King˙s Health Questionnaire (KHQ),
validado no Brasil17. O KHQ é um questionário composto por 30 perguntas, arranjadas em nove domínios:
percepção da saúde, impacto da incontinência, limitações
nos desempenhos das tarefas, limitação física, limitação
social, relacionamento pessoal, emoções, sono/energia e
medidas de gravidade. Para todas as respostas são atribuídos valores numéricos, somados e avaliados isoladamente
pelos domínios. O KHQ é pontuado em cada um de seus
domínios, não havendo, portanto, escore geral. Os escores
variam de 0 a 100, sendo que quanto maior a pontuação
obtida, pior é a qualidade de vida relacionada àquele domínio17. O questionário foi originalmente padronizado
para ser autoadministrado, porém, a aplicação foi feita
em forma de entrevista e as perguntas foram verbalizadas
ipsis litteris pelo avaliador.
Foram realizadas em ambos os grupos duas avaliações, previamente ao início do tratamento e ao término
do período experimental do estudo.
Os dados foram descritos em médias e desvios padrão.
Foi utilizado o programa SPSS (Statistical Package for Social
Sciences), em sua versão 20.0, para a obtenção dos resultados.
Para análise de homogeneidade e para verificar diferenças
entre os grupos, utilizou-se o teste de Mann-Whitney. Para
verificarmos possíveis diferenças entre os momentos de
observação, utilizou-se o teste de Wilcoxon. Adotou-se o
nível de significância de 0,05.
Resultados
Inicialmente, foram avaliadas 40 mulheres no estudo.
Dessas, 37 atenderam aos critérios e foram randomizadas
em Grupo Controle (n=19) e Grupo BF (n=18). No Grupo
Controle, três mulheres desistiram do tratamento: duas
devido à mudança de trabalho e a terceira porque optou
por realizar tratamento cirúrgico. Já no Grupo BF, duas
pacientes desistiram do tratamento: uma por mudança de
trabalho e outra por problemas de saúde. Ao final foram
analisadas 32 pacientes, sendo 16 no Grupo BF e 16 no
Grupo Controle.
Os grupos foram homogêneos no que se refere à idade, índice de massa corpórea, gestação, número de partos
vaginais e estado hormonal (Tabela 1). A aderência das
pacientes durante o período de tratamento no grupo de
intervenção foi correspondente a 100%.
Ao efetuar a comparação entre os grupos, observou-se
diminuição significativa nos escores dos domínios avaliados pelo Kings Health Questionnaire (KHQ), exceto para o
domínio saúde geral (Tabela 2).
Tabela 1. Perfil epidemiológico das pacientes incluídas: critérios para comparação com
Grupo Controle (homogeneidade entre os grupos)
Variáveis
Grupo Biofeedback
Grupo Controle
Valor p
58,1(±9,3)
58,3(±8,9)
0,80
Gestação
4,0(±2,8)
3,7(±2,4)
0,77
Parto
3,2(±2,6)
3,1(±2,5)
0,83
Menopausa
48,5(±4,1)
45,8(±7,1)
0,48
IMC
29,4(±6,4)
31,0(±6,7)
0,52
Idade
IMC: índice de massa corpórea; Dados apresentados como média±desvio padrão.
Valor p≤0,05 obtido pelo teste de Mann-Whitney.
Tabela 2. Comparação entre os grupos quanto aos escores da qualidade de vida após o
tratamento, segundo os domínios do Kings Health Questionnaire
Variáveis
Grupo Biofeedback
Grupo Controle
Valor p
Saúde geral
32,8(±26,9)
48,4(±29,5)
0,13
Impacto da incontinência
25,0(±28,5)
64,5(±30,9)
0,001
Limitações nas
atividades diárias
15,6(±28,8)
28,1(±21,7)
0,04
Limitações físicas
20,8(±30,7)
40,6(±22,7)
0,02
Limitações sociais
5,5(±10,7)
20,8(±18,0)
0,001
Relações pessoais
1,3(±4,8)
30,5(±36,1)
0,001
16,6(±25,0)
39,5(±25,6)
0,01
7,2(±21,9)
19,7(±26,6)
0,02
26,5(±24,7)
52,0(±15,9)
0,001
Emoções
Sono/Disposição
Medidas de gravidade
Dados apresentados como média±desvio padrão. O valor p≤0,05 indica diferença
estatística significante obtida pelo teste de Mann-Whitney.
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):505-10
507
Fitz FF, Resende APM, Stüpp L, Costa TF, Sartori MGF, Girão MJBC, Castro RA
Tabela 3. Avaliação dos sintomas urinários, por meio do diário miccional de sete dias,
antes e após o tratamento no Grupo Biofeedback
Antes do
tratamento
Após o
tratamento
Frequência urinária diurna
7,2(±2,0)
7,2(±1,7)
0,6
Frequência urinária noturna
1,2(±1,2)
0,7(±0,9)
0,02
Perda de urina aos esforços
1,5(±1,4)
0,6(±0,8)
0,001
Variáveis
Valor p
Dados apresentados como média±desvio padrão. O valor p≤0,05 indica diferença
estatística significante obtida pelo teste de Wilcoxon.
Em concordância, observou-se melhora da função dos
MAP antes e após o tratamento para o Grupo BF. Os seguintes
resultados foram observados: power (2,5±1,1 versus 4,3±0,8;
p=0,001), endurance (2,9±1,6 versus 6,0±2,2; p<0,001) e fast
(5,1±3,1 versus 9,3±1,9; p=0,001).
Quando comparados os grupos, o Grupo BF
destacou-se positivamente em comparação ao Grupo
Controle: power (Grupo BF 4,3±0,8 versus Grupo Controle
2,5±0,9; p<0,001); endurance (Grupo BF 6,0±2,2 versus
Grupo Controle 2,7±1,9; p<0,001) e fast (grupo BF
9,3±1,9 versus Grupo Controle 4,6±3,2; p<0,001).
Na avaliação dos sintomas urinários, por meio do
diário miccional, observou-se redução da frequência urinária noturna e da perda urinária aos esforços no Grupo
BF (Tabela 3).
Discussão
O treinamento dos músculos do assoalho pélvico
tem sido recomendado para o tratamento das disfunções
do assoalho pélvico, com nível de evidência “A” para
o tratamento da incontinência urinária18. Contudo, a
adição do BF nos programas de reabilitação do assoalho
pélvico é controversa. Uma meta-análise de 1999 buscou
verificar se esse efeito adicional do BF sobre o tratamento
da IUE foi avaliado, e concluiu que esse recurso é efetivo
no fortalecimento dos MAP, principalmente por apresentar altas taxas de cura19. Por outro lado, relata-se que
os diversos tipos de medidas de desfecho e as diferentes
formas de aplicação da intervenção caracterizam evidente
falta de padronização metodológica, o que dificulta a
busca por evidências8.
No presente estudo, analisou-se o efeito da adição
do BF ao treinamento dos MAP para tratar a IUE. Os
resultados mostram que a adição do BF ao treinamento
dos MAP a curto prazo pode ser benéfico no alívio dos
sintomas de mulheres com IUE. Esses resultados corroboram com diversos estudos publicados na literatura20-24.
O sucesso da reeducação dos MAP, com ou sem o
BF, pode ser explicado pelo aumento da ação reflexa das
fibras musculares rápidas e pelo aumento da capacidade
de ativação desses músculos. Para o desenvolvimento da
força muscular é necessário um recrutamento mais efetivo
508
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):505-10
das unidades motoras25. A capacidade de efetuar a correta
contração dos MAP é primordial para a realização do treinamento muscular, e o BF tem sido sugerido como uma
técnica contribuidora para aquisição dessa habilidade23,6,11,
bem como para a melhora do controle desses músculos26.
Neste estudo, realizou-se a avaliação da função muscular do assoalho pélvico por meio da palpação bidigital,
técnica validada e amplamente utilizada na literatura14,27,28.
Previamente ao tratamento, observou-se uma função
débil dos MAP de acordo com a escala de Oxford. Devida
escala determina a função muscular adequada como grau
cinco. No presente estudo, o tempo de tratamento foi
a curto prazo e, ao final, observou-se força muscular de
graduação satisfatória. Em concordância, estudos relatam
melhora da função dos MAP nas duas semanas iniciais
de tratamento25,29.
Quando comparados ambos os grupos em relação à
função muscular, encontrou-se diferença positiva para o
grupo de intervenção. Esse fato reforça que a reabilitação
dos MAP com BF é mais eficaz que o não tratamento em
mulheres com IUE.
Em concordância com esses resultados, observou-se
melhora da qualidade de vida, avaliada pelo questionário KHQ, para o Grupo BF. Apenas no domínio
referente à percepção da saúde geral, não se encontrou alteração. Recente estudo corrobora com estes
achados. Para os autores, isto se deve ao fato de esse
domínio avaliar uma variedade de aspectos da saúde,
o que pode não estar relacionado especificamente com
a incontinência urinária30.
A melhora da função dos músculos do assoalho
pélvico e da qualidade de vida somou-se à otimização
da incontinência urinária. Observamos no Grupo BF a
redução da frequência urinária noturna e do número de
perdas urinárias, ambos os sintomas avaliados pelo diário
miccional. Este tem sido considerado uma ferramenta
importante na mensuração objetiva da perda urinária,
com boa correlação com o relato da paciente a respeito
de seus sintomas31.
Outro fator a ser considerado nos programas de exercícios
é a adesão correspondente ao tratamento. Neste estudo,
o índice foi de 100%, o que corrobora com os resultados
positivos encontrados nos desfechos clínicos avaliados. A
aceitabilidade ao tratamento é de extrema importância,
visto que adesão e efeito caminham para a mesma direção,
como o demonstrado em diversos estudos32-34. A eficácia
dos exercícios terapêuticos só pode ser estabelecida quando os pacientes aderem ao regime de exercícios35. Essa
aderência é mais bem verificada quando os pacientes não
percebem barreiras, são amplamente instruídos e recebem
um feedback positivo10. Como mencionado anteriormente,
o BF é utilizado como uma técnica que fornece motivação
aos pacientes para realizar os exercícios de treinamento
Efeito da adição do biofeedback ao treinamento dos músculos do assoalho pélvico para tratamento da incontinência urinária de esforço
dos MAP, funcionando como reforço positivo da correta
contração dos MAP21.
Pode-se concluir que a adição do BF ao TMAP
para o tratamento da incontinência urinária de esforço,
aplicado de acordo com o protocolo descrito, é capaz de
contribuir para a melhora da função dos MAP, bem como
para a redução dos sintomas urinários e para a melhora
da qualidade de vida.
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Caio Augusto Hartman1
Cássia Raquel Juliato1
Luis Otávio Sarian1
Amilcar Barreta1
Maria Carolina Szymanski de Toledo1
Denise da Rocha Pitta2
Sophie Derchain1
Inclusão dos sintomas na discriminação entre
tumores anexiais benignos e malignos
Inclusion of symptoms in the discrimination between benign and
malignant adnexal masses
Artigo Original
Resumo
Palavras-chave
Neoplasias ovarianas/diagnóstico
Sintomas
Keywords
Ovarian neoplasms/diagnosis
Symptoms
OBJETIVO: Avaliar a associação entre sintomas clínicos e malignidade em mulheres com tumores anexiais, submetidas
à cirurgia. MÉTODOS: Estudo de corte transversal com coleta prospectiva, no qual foram incluídas 105 mulheres,
atendidas em um hospital de ensino do Estado de São Paulo de novembro de 2009 a março de 2011, devido ao
tumor anexial e à indicação de laparotomia/laparoscopia. Todas foram submetidas a uma entrevista estruturada sobre
a ocorrência de 18 sintomas associados ao câncer de ovário. A entrevista incluiu gravidade, frequência e duração dos
sintomas nos 12 meses prévios à primeira consulta. Também foram avaliados os níveis de CA125 e a classificação
ultrassonográfica. Foi calculada para cada sintoma a razão de prevalência com intervalo de confiança de 95%. O
padrão-ouro foi o resultado do exame anatomopatológico das peças cirúrgicas. RESULTADOS: Das 105 mulheres
incluídas, 75 (71,4%) apresentaram tumores benignos e 30 (28,6%), malignos. Em mulheres com tumores malignos, os
sintomas foram mais frequentes, dentre eles: inchaço abdominal (70%), aumento do volume abdominal (67%), dor pélvica
(60%), irregularidade menstrual (60%), empachamento (53%), dor abdominal (50%), dor nas costas (50%) e saciedade
precoce (50%). As mulheres com tumores benignos apresentaram essencialmente dor pélvica (61%), irregularidade
menstrual (61%) e inchaço abdominal (47%). Os sintomas significativamente associados com malignidade foram:
sensação de inchaço abdominal (RP=2,0; IC95% 1,01–3,94), aumento objetivo do volume abdominal (RP=2,16;
IC95% 1,12–4,16), dor nas costas (RP=1,97; IC95% 1,09–3,55), empachamento (RP=2,25; IC95% 1,25–4,07),
saciedade precoce (RP=2,06; IC95% 1,14–3,70), massa abdominal (RP=1,83; IC95% 1,01–3,30), dificuldade para
deglutir (RP=1,98; IC95% 1,10–3,56) e sangramento pós-menopausa (RP=2,91; IC95% 1,55–5,44). A presença
de dor pélvica, constipação, dispareunia, fadiga, dor abdominal, náusea e/ou vômito, irregularidade menstrual,
perda de peso, diarreia e sinusorragia foram semelhantes nos dois grupos. CONCLUSÕES: Em mulheres com tumores
anexiais com indicação cirúrgica, a avaliação pré-operatória dos sintomas pode auxiliar na predição da malignidade.
Abstract
PURPOSE: To assess the association between clinical symptoms and the diagnosis of malignancy in women with
adnexal tumors who underwent surgery. METHODS: Cross-sectional study, in which 105 women with adnexal tumors
and indication for laparotomy/laparoscopy were included. All women were treated at a teaching hospital in the
state of São Paulo between November 2009 and March 2011. All patients underwent a structured interview about
the occurrence of 18 symptoms associated with ovarian cancer. The interview included the severity, frequency, and
duration of these symptoms in the 12 months prior to the first medical consultation. The CA125 levels and the ultrasound
classification of the tumors were also evaluated. We calculated for each symptom the prevalence ratio with 95%
confidence intervals. The golden-standard was the result of the pathological examination of the surgical specimens.
RESULTS: Of the 105 women included, 75 (71.4%) had benign tumors and 30 (28.6%) had malignant ones. In women
with malignant tumors, the most frequent symptoms were: abdominal bloating (70%), increased abdominal size (67%),
pelvic pain (60%), menstrual irregularity (60%), swelling (53%), abdominal pain (50%), backache (50%), and early
repletion (50%). Women with benign tumors showed essentially pelvic pain (61%), menstrual irregularities (61%), and
Correspondência
Cássia Raquel Juliato
Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Faculdade de Ciências
Médicas da Universidade Estadual de Campinas
Rua Alexander Fleming, 101 – Cidade Universitária “Zeferino Vaz” –
Barão Geraldo Caixa Postal 6111
CEP: 13083-970
Campinas (SP), Brasil
Recebido
15/08/2012
Aceito com modificações
17/09/2012
Trabalho realizado no Hospital da Mulher Professor Doutor José Aristodemo Pinotti, Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher
(CAISM), Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil.
1
Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP –
Campinas (SP), Brasil.
2
Hospital da Mulher Professor Doutor José Aristodemo Pinotti, Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher, Universidade Estadual
de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil.
Conflito de interesses: não há.
Hartman CA, Juliato CR, Sarian LO, Barreta A, Toledo MCS, Pitta DR, Derchain S
abdominal swelling (47%). Symptoms significantly associated with malignancy were: bloating (PR=2.0; 95%CI 1.01–3.94), increased abdominal size
(PR=2.16; 95%CI 1.12–4.16), backache (RP=1.97; 95%CI 1.09–3.55), swelling (PR=2.25; 95%CI 1.25–4.07), early repletion (RP=2.06; 95%CI
1.14–3.70), abdominal mass (PR=1.83; 95%CI 1.01–3.30), eating difficulties (PR=1.98; 95%CI 1.10–3.56), and postmenopausal bleeding (PR=2.91;
95%CI 1.55–5.44). The presence of pelvic pain, constipation, dyspareunia, fatigue, abdominal pain, nausea or vomiting, menstrual irregularity, weight
loss, diarrhea, and bleeding after intercourse was similar in both groups. CONCLUSIONS: In women with adnexal tumors including indication of surgical
treatment, the preoperative evaluation of symptoms may help predicting malignancy.
Introdução
Anualmente, cerca de 255.000 casos novos de câncer
de ovário são diagnosticados no mundo, o que o coloca
na sétima posição entre as neoplasias malignas mais
detectadas nas mulheres. Sua letalidade, no entanto,
é proporcionalmente a mais alta dentre os cânceres
ginecológicos, causando aproximadamente 140.000
mortes, por ano1. A incidência do câncer de ovário é
mais elevada nos países industrializados, embora naqueles em desenvolvimento esteja concentrado o maior
número de casos (96.700 versus 107.500). Na América
Latina, a incidência de 8/100.000 mulheres aproxima-se
daquela dos países desenvolvidos, que é de 10/100.000
mulheres. Estimam-se 6.190 casos novos de câncer do
ovário para o Brasil em 2012, com um risco estimado
de 6 a cada 100.000. Sem considerar os tumores da pele
não melanoma, este é o sétimo tipo mais incidente na
maioria das regiões, com um risco estimado de: 8/100.000
mulheres no Sul, 7/100.000 no Sudeste, 6/100.000 no
Centro-Oeste e 4/100.000 no Nordeste, enquanto, na
região Norte (2/100.000), é o oitavo mais frequente2.
Devido à dificuldade de diagnóstico pré-operatório de
malignidade, uma em cada dez mulheres será submetida
à cirurgia por um tumor anexial durante sua vida. Entre
elas, em apenas 17% haverá um tumor anexial maligno3. Atualmente, o padrão-ouro para diferenciação entre
tumores anexiais benignos e malignos é a determinação
do tipo histológico no exame microscópico em parafina.
A ultrassonografia e a dosagem sérica dos CA125 possuem alta sensibilidade e especificidade no diagnóstico
pré-operatório de tumores possivelmente neoplásicos4,5.
Entretanto, os sintomas que poderiam auxiliar na seleção
de mulheres com maior risco de malignidade têm sido
pouco valorizados.
Devido à posição anatômica do ovário, solto e profundo na pelve, supunha-se que o aumento de seu volume
não causaria sintomas nas fases iniciais, ou seja, antes que
atingisse um grande volume ou houvesse focos de disseminação. Entretanto, o conceito do ‘matador silencioso’ tem
sido contestado e, ao que parece, deveria ser descartado6,
pois mulheres com câncer de ovário, em qualquer estádio,
apresentam sintomas, até mesmo 36 meses antes do diagnóstico7,8. Esses sintomas são geralmente subestimados
512
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):511-7
pelas mulheres e por seus médicos, por serem inespecíficos e presentes em muitas outras condições benignas.
No entanto, ao se examinar uma paciente com mais de
50 anos, especialmente na pós-menopausa, que se queixe
repetidamente de constante distensão abdominal, mudanças nos hábitos intestinais ou urinários, dor abdominal
ou pélvica ou aumento da circunferência abdominal para
a qual seja afastada condição aguda, deve-se considerar
câncer de ovário entre os diagnósticos diferenciais. É
importante entender que tais sintomas são vagos e ainda
não foram totalmente compreendidos.
Alguns grupos de pesquisadores estão atualmente
conduzindo estudos que visam estabelecer quais seriam os sintomas específicos do câncer ovariano inicial
e qual seria a melhor estratégia para diminuir atrasos
no diagnóstico. Até que se demonstre o contrário, a
triagem de pacientes sintomáticas parece ser a maneira mais promissora de se detectar o câncer de ovário,
enquanto a doença tenha um volume menor e de mais
fácil controle terapêutico6,8-10. Assim, o objetivo deste
estudo foi avaliar a associação entre os sintomas clínicos
e a malignidade em mulheres brasileiras com tumores
anexiais, que foram submetidas à cirurgia.
Métodos
Este foi um estudo prospectivo, tipo corte transversal, realizado no Hospital da Mulher Professor Doutor
José Aristodemo Pinotti, Centro de Atenção Integral à
Saúde da Mulher (CAISM) da Universidade Estadual de
Campinas (Unicamp), entre novembro de 2009 a março
de 2011. Foram convidadas para participar do estudo 210
mulheres encaminhadas ao Ambulatório de Oncologia
Pélvica-Ovário do CAISM pela presença de tumoração
anexial, que foi previamente identificada em exame
clínico e/ou de imagem, com indicação de cirurgia para
diagnóstico e/ou tratamento.
Das 210 mulheres selecionadas, foram excluídas 105:
32 por não comparecerem para realizar o exame de ultrassonografia do protocolo de pesquisa; 28 por não apresentarem
tumor anexial detectável ao exame realizado no CAISM;
22 por não apresentarem indicação cirúrgica; 13 por perda
de seguimento após exame inicial; 5 por óbito antes da
cirurgia; 2 por apresentarem tumores não ginecológicos;
Inclusão dos sintomas na discriminação entre tumores anexiais benignos e malignos
e 3 por apresentarem diagnóstico histopatológico prévio
(cirurgia ou biópsia realizada em outra instituição).
Dados clínicos e entrevista
Após entrevista inicial e esclarecimentos quanto aos
métodos e quanto à intenção da pesquisa, as mulheres
incluídas no estudo assinaram o termo de consentimento
livre e esclarecido. Este estudo obteve a aprovação do
Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências
Médicas (FCM) da Unicamp (processo 1092/2009). Após
admissão na pesquisa, as pacientes foram submetidas
a uma entrevista estruturada sobre a ocorrência de 18
sintomas associados ao câncer de ovário nos 12 meses
prévios à consulta. Foram avaliadas a presença e a intensidade de: dor pélvica, sensação de inchaço abdominal,
aumento objetivo do volume abdominal, constipação,
dispareunia, fadiga, dor abdominal, náusea e/ou vômito,
irregularidade menstrual, dor nas costas, empachamento,
saciedade precoce, perda de peso, massa abdominal, dificuldade para deglutir, diarreia, sinusorragia e sangramento
pós-menopausa. Para cada sintoma, avaliou-se: a severidade, categorizada em sem sintoma (0), mínima (1) à
severa (5); a frequência, por número de dias no mês, <1,
1–2, 3–6, 7–12, 13–19, >20 dias; e duração, por número
de meses dos últimos 12 meses anteriores à entrevista,
<1, 1–2, 3–4, 5–6, 7–9, 10–12, >12 meses11. Também
foram avaliados: idade em anos a contar da data de nascimento referida pela paciente; índice de massa corpórea
(IMC), calculado como relação da medida do peso com a
medida da altura elevada ao quadrado; raça; uso atual ou
anterior de contraceptivo hormonal; e estado menstrual
(classificado em menarca ou menopausa).
Classificação ultrassonográfica
Foi utilizada a classificação ultrassonográfica baseada
nos critérios de Timmerman et al.12 para agrupar as lesões
anexiais em ultrassonograficamente malignas ou benignas.
Os cinco critérios malignos, denominados ‘M’, incluíram:
tumor sólido irregular (M1); presença de ascite (M2);
presença de pelo menos quatro projeções papilíferas (M3);
tumor irregular multilocular sólido com medida maior ou
igual a 100 mm (M4) e alto fluxo ao Doppler – índice de
cor 4 (M5). Os outros cinco critérios benignos, denominados ‘B’, incluíram: cisto unilocular (B1); presença de
componentes sólidos menores que 7 mm de diâmetro (B2);
presença de sombra acústica (B3); tumor multiloculado
com parede lisa medindo menos de 100 mm em seu maior
diâmetro (B4) e ausência de fluxo ao Doppler – índice de
cor 1 (B5). Na presença de um ou mais critérios M e na
ausência dos critérios B, a tumoração é classificada como
maligna. Quando um ou mais critérios B estão presentes
e na ausência de critérios M, a tumoração é classificada
como benigna. Quando ambos os critérios B e M estão
presentes ou quando nenhum deles está presente, a massa é considerada como não classificável. Nestes casos, a
tumoração foi classificada como subjetivamente benigna
ou maligna por um examinador experiente.
Dosagem do CA125
A análise deste marcador foi realizada por quimioluminescência de fase sólida, em sistema automatizado,
utilizando-se o teste OM-MA (Siemens Medical Solutions
Diagnostics, Tarrytown, EUA), de acordo com as instruções,
os reagentes e os equipamentos fornecidos pelo fabricante.
Os valores foram expressos em unidades por mililitro
(U/mL). Os valores de CA125 foram posteriormente
dicotomizados em positivo para neoplasia ou negativo,
conforme ponto de corte determinado por curva ROC em
tal população (37,4 U/mL).
Cirurgia e análise patológica
As cirurgias para diagnóstico e/ou tratamento foram
realizadas no CAISM, e as técnicas e procedimentos cirúrgicos foram escolhidos e procedidos conforme indicação
médica. A média do tempo entre o exame ultrassonográfico
e a cirurgia foi de 64,3 dias, variando de menos de 24 horas
nos casos de procedimentos de emergência até o máximo
de 112 dias. O padrão-ouro foi o diagnóstico histopatológico das peças cirúrgicas, realizados no Departamento
de Anatomia Patológica da FCM da Unicamp, seguindo
as normas da classificação internacional dos tumores ovarianos da Organização Mundial da Saúde (OMS)13. Para
efeitos de análise estatística, os tumores tipo borderline
foram classificados como malignos.
Análise estatística
Os dados foram digitados em uma planilha do Microsoft
Excel (Microsoft Corporation, Redmond, WA, USA) e
analisados com o software R Environment for statistical
computing14. Foram comparadas as características clínicas
dos grupos histologicamente classificados como benigno
e maligno, usando o teste do χ2 para variáveis categóricas
e o de Kruskal-Wallis para as contínuas. Para calcular
a proporção de tumores corretamente classificados pela
ultrassonografia em benignos ou malignos, comparou-se
o tipo histológico do tumor com a classificação ultrassonográfica. Foi criada uma curva do tipo Receiver Operator
Characteristics (ROC) para determinar o ponto com a
melhor sensibilidade e a melhor especificidade do CA125
na diferenciação dos tumores histologicamente benignos
dos malignos. Os níveis de CA125 foram categorizados
em negativos (<37,4 U/mL) ou positivos para neoplasia
(≥37,4 U/mL). Calculou-se a razão de prevalência (RP)
com seus respectivos intervalos de confiança (IC) de 95%
para os sintomas presentes nas mulheres com tumores
benignos e malignos.
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):511-7
513
Hartman CA, Juliato CR, Sarian LO, Barreta A, Toledo MCS, Pitta DR, Derchain S
Resultados
Entre as 75 mulheres com tumores benignos, os mais
frequentes foram os teratomas presentes em 21 delas (28%),
seguido pelo fibroma em 15 (20%) e cistoadenomas mucinosos ou serosos em 13 (17%). Um total de 13 mulheres
(17%) apresentou endometriomas. Entre os 30 tumores
malignos, a linhagem histológica epitelial foi a mais frequente com 16 (53,3%) carcinomas (Tabela 1). Quanto ao
estádio clínico patológico, 17 (57%) encontravam-se no
I, 3 (10%) no II, 7 (23%) no III e 4 (13%) no IV (dados
não apresentados em tabelas).
A média de idade das 75 mulheres com tumores benignos incluídas neste estudo foi de 46,8 anos (±15,0) e
das 30 com malignos, 54,2 (±15,1, p=0,02). A proporção
de pacientes na pós-menopausa no grupo dos tumores
benignos foi de 38%, sendo mais elevada no grupo dos
tumores malignos (53%; p=0,33). O IMC, a raça e o uso
de contraceptivos hormonais fizeram distribuição similar
entre os grupos. Os níveis de CA125 foram significativamente mais elevados em mulheres com tumores malignos
(p<0,001). Observou-se que entre as mulheres com tumores
malignos a ultrassonografia classificou adequadamente 25
das 30 (83,3%) e entre os benignos, 64 de 75 (85,3%),
como observado na Tabela 2.
Em mulheres com tumores malignos, os sintomas
foram mais frequentes e entre eles destacam-se inchaço
abdominal (70%), aumento do volume abdominal (67%),
dor pélvica (60%), irregularidade menstrual (60%),
empachamento (53%), dor abdominal (50%), dor nas
costas (50%) e saciedade precoce (50%). As mulheres
com os benignos apresentaram essencialmente dor pélvica
(61%), irregularidade menstrual (61%) e sensação de inchaço abdominal (47%). Os sintomas significativamente
associados com malignidade foram: inchaço abdominal
(RP=2,0; IC95% 1,01–3,94); aumento objetivo do volume
abdominal (RP=2,1; IC95% 1,12–4,16); dor nas costas
(RP=1,9; IC95% 1,09–3,55); empachamento (RP=2,2;
IC95% 1,25–4,07); saciedade precoce (RP=2,0; IC95%
1,14–3,70); massa abdominal (RP=1,8; IC95% 1,01–3,30);
dificuldade para deglutir (RP=1,9; IC95% 1,10–3,5) e
sangramento pós-menopausa (RP=2,9; IC95% 1,55–5,44).
A frequência de dor pélvica, constipação, dispareunia,
fadiga, dor abdominal, náusea e/ou vômito, irregularidade
menstrual, perda de peso, diarreia e sinusorragia foram
semelhantes em ambos os grupos (Tabela 3).
Discussão
Entre as 105 mulheres com tumores anexiais avaliadas
neste estudo, observou-se que os sintomas foram mais
frequentes naquelas com tumores malignos, sendo que
todas aquelas com tumores malignos referiram algum
tipo de sintoma.
Pessoas do sexo feminino com câncer de ovário frequentemente têm múltiplos sintomas, sendo que, em
geral, muitos não são ginecológicos. Entrevistando 1.725
mulheres com câncer de ovário dos Estados Unidos e
Canadá, Goff et al.15 observaram que 95% das mulheres
referiam ter tido algum sintoma de três a seis meses antes
de procurarem um médico. Segundo os autores, o estádio da
doença não se relacionou com a prevalência dos sintomas.
Nesse estudo, os sintomas mais comuns foram: aumento
do volume (77%), gastrintestinal (70%), dor (58%),
perda de peso (50%), urinários (34%) e pélvicos (26%)15.
É importante reiterar que tanto as mulheres quanto
os médicos não valorizam tais sintomas, o que contribui
para o atraso no diagnóstico. Os médicos frequentemente
diagnosticam as mulheres com síndrome do colo irritável,
estresse, gastrite ou depressão, meses antes de detectar
o câncer de ovário8. A subvalorização dos sintomas pelas
mulheres e pelos médicos provavelmente é parcialmente
Tabela 1. Distribuição das 105 mulheres segundo o diagnóstico histológico
Doença benigna
n
%
Doença maligna
n
%
Teratoma
21
28
Adenocarcinoma seroso
9
30
Fibroma
15
20
Adenocarcinoma endometrioide
5
17
Cistoadenoma mucinoso
8
11
Adenocarcinoma mucinoso
2
7
Cistoadenoma seroso
5
7
Tumor de células da granulosa
5
17
Tumor de Brenner
2
<3
Tumor do saco vitelínico
1
<4
Cistoadenofibroma
2
<3
Carcinossarcoma
1
<4
Fibrotecoma
1
<1
Tumores ovarianos mistos
1
<4
13
17
Borderline seroso
2
7
Edema ovariano maciço
2
<3
Borderline mucinoso
2
7
Gestação tubária
2
<3
Metástase
2
7
Hidrossalpinge
2
<3
Cistos funcionais
2
Endometrioma
Total
514
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):511-7
<3
75
30
Inclusão dos sintomas na discriminação entre tumores anexiais benignos e malignos
Tabela 2. Distribuição das 105 mulheres segundo as características clínicas e o diagnóstico histológico
Características clínicas
Benigno
n
Média de idade (DP)
Maligno
%
n
46,8±15
%
54,2±15,1
0,02
Estado menopausal
0,3
Pré-menopausa
38
51
11
37
Pós-menopausa
28
38
16
53
8
11
3
10
Histerectomia
Ignorado
1
0
Raça
1,0000
Branca
54
78
22
82
Negra/Parda
14
20
5
18
Ignorada
7
3
Índice de massa corpórea (kg/m2)
<18,5
0,9
2
3
0
0
Entre 18,5 e 24,9
25
33
11
37
Entre 25 e 29,9
24
32
8
27
Entre 30 e 34,9
19
25
8
27
5
7
3
10
Sim
18
31
7
30
Não
40
69
16
70
Ignorado
17
≥35
Valor p
Contraceptivo hormonal atual ou anterior
0,9
7
CA125 U/mL
Média (DP)
27,5±61,5
336,8±629,9
<0,001**
Negativo (<37,4)
65
88,0
9
31,0
Positivo (≥37,4)
9
12,0
20
69,0
Ignorado
1
<0,001
1
Classificação ultrassonográfica
Benigno
64
85,3
5
16,7
Maligno
11
14,7
25
83,3
Total
75
100
30
<0,001
100
*p: nível de significância; **Kruskal-Wallis; DP: desvio padrão.
responsável pelos diagnósticos em estádios mais avançados.
O rastreamento do câncer de ovário não é recomendado para
mulheres assintomáticas sem história familiar de câncer
de mama ou ovário ou sem mutação dos genes BRCA1 e
BRCA2. Entretanto, recentemente, o American College
of Obstetrics and Gynecology recomenda que sejam
oferecidos exame pélvico, dosagem sérica de CA125 e
ultrassonografia transvaginal para mulheres com sintomas
compatíveis com câncer de ovário16. Na presente casuística,
mais da metade das mulheres com câncer foi diagnosticada em estádio I. Porém, elas foram encaminhadas por
achado acidental de tumor anexial pela ultrassonografia,
e não pelos seus sintomas.
A média de idade das pacientes com tumores malignos
foi superior àquela das mulheres com tumores benignos,
assim como a proporção de mulheres na pós-menopausa,
dados que são confirmados pela literatura17. Segundo
estatísticas americanas, 80% dos diagnósticos do câncer
de ovário são realizados em mulheres com mais de 45
anos, com idade média de 6318.
Neste estudo, seguiu-se a classificação ultrassonográfica proposta por Timmerman et al.12, que preconiza
a utilização de critérios bem definidos, os quais permitam criar regras simples e facilmente reprodutíveis
em unidades de ultrassonografia. Seguindo essas regras
simples, mais de 80% dos tumores benignos e malignos
foram corretamente diagnosticados. Já o CA125 esteve
aumentado em menos de 70% das mulheres com neoplasia maligna de ovário. Embora tal marcador seja útil
para avaliação prognóstica de pacientes com carcinoma,
submetidas à quimioterapia, seu papel na diferenciação
das massas anexiais entre tumores benignos e malignos é amplamente questionado4. Atualmente, tem-se
tentado associar determinados sintomas relacionados
ao câncer de ovário com os níveis de CA125 e outros
marcadores na predição de malignidade. Andersen et
al.9, num estudo prospectivo comparando 74 mulheres com câncer de ovário e 137 saudáveis, concluíram
que o CA125 isoladamente teve uma sensibilidade de
81,1% para detecção de neoplasia maligna e, quando
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):511-7
515
Hartman CA, Juliato CR, Sarian LO, Barreta A, Toledo MCS, Pitta DR, Derchain S
Tabela 3. Distribuição das 105 mulheres com câncer comparadas com aquelas com tumores
benignos segundo os sintomas
Diagnóstico histológico
Benigno
(n=75)
Maligno
(n=30)
n (%)
n (%)
Dor pélvica
45 (61)
Inchaço abdominal
35 (47)
Aumento do volume
abdominal
Sintomas
RP*
IC95%*
18 (60)
0,98
0,53–1,81
21 (70)
2,00
1,01–3,94
30 (40)
20 (67)
2,16
1,12–4,16
Constipação
28 (38)
11 (37)
0,96
0,52–1,81
Dispareunia
27 (41)
8 (38)
0,90
0,42–1,93
Fadiga
27 (36)
12 (41)
1,16
0,62–2,16
Dor abdominal
24 (32)
15 (50)
1,67
0,92–3,02
Náusea e/ou vômito
22 (30)
12 (40)
1,37
0,75–2,51
Irregularidade menstrual
22 (61)
6 (60)
0,96
0,32–2,95
Dor nas costas
20 (27)
15 (50)
1,97
1,09–3,55
Empachamento
19 (26)
16 (53)
2,25
1,25–4,07
Saciedade precoce
19 (26)
15 (50)
2,06
1,14–3,70
Perda de peso
14 (19)
4 (13)
0,74
0,29–1,85
Massa abdominal
14 (19)
11 (37)
1,83
1,01–3,30
Dificuldade para deglutir
11 (15)
10 (33)
1,98
1,10–3,56
Diarreia
6 (8)
4 (13)
1,43
0,63–3,27
Sinusorragia
6 (9)
2 (9)
1,00
0,28–3,53
Sangramento
pós-menopausa
3 (8)
8 (42)
2,91
1,55–5,44
*RP: razão de prevalência; IC95%: intervalo de confiança de 95%.
associado a um índice de sintoma, houve um aumento
para 91,9%. Goff et al.11 caracterizaram os sintomas
relevantes como aqueles que aparecem mais de 12 vezes
por mês há menos de um ano.
A mulher com tumor anexial é frequentemente
um grande desafio para o ginecologista. Tumores anexiais benignos podem ser tratados com segurança por
cistectomia, ooforectomia ou anexectomia, sem outras
intervenções, mas tumores malignos demandam uma
abordagem muito mais complexa19. Segundo a Federação
Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO), o
carcinoma restrito ao ovário deve ser tratado e estadiado
adequadamente20. Nos casos de carcinoma avançado,
faz-se necessária a citorredução. Quando comparados os
resultados do tratamento provido por ginecologistas gerais
frente àquele realizado por ginecologistas especializados
em tratar câncer ginecológico, concluiu-se que tanto o
estadiamento quanto a citorredução mostram-se mais
adequados quando a cirurgia é realizada por especialistas
em câncer ginecológico, com um aumento de até oito
meses na sobrevida global21.
Em conclusão, embora os sintomas não sejam específicos de malignidade em mulheres com tumores anexiais,
sua investigação sistematizada e cuidadosa pode auxiliar
o ginecologista a discriminar mulheres de maior risco de
câncer de ovário. Muitos estudos referentes a sintomas
associados ao câncer de ovário têm sido divulgados na
ultima década, e atualmente já não se pode considerar o
mesmo como uma doença assintomática9-11,15. Os médicos,
em geral, e as mulheres devem estar atentos a tais sintomas
de forma a evitar atrasos no diagnóstico.
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517
Juraci Almeida Cesar1
Gabriela Breitembach dos Santos2
Andrea Tomais Sutil2
Carolina Fischer Cunha2
Samuel de Carvalho Dumith1
Citopatológico de colo uterino entre
gestantes no Sul do Brasil: um estudo
transversal de base populacional
Pap smears among pregnant women in Southern Brazil: a
representative cross-sectional survey
Artigo Original
Resumo
Palavras-chave
Gestantes
Esfregaço vaginal
Fatores de risco
Neoplasias do colo do útero
Citodiagnóstico
Programas de rastreamento
Cobertura de serviços de saúde
Keywords
Pregnant women
Vaginal smears
Risk factors
Uterine cervical neoplasms
Cytodiagnosis
Mass screening
Health services coverage
OBJETIVO: Determinar a prevalência e identificar fatores associados ao não rastreamento voluntário para citopatológico
(CP) de colo uterino entre puérperas em Rio Grande (RS). MÉTODOS: Entrevistadores previamente treinados aplicaram
questionário padronizado, ainda na maternidade, em busca de informações sobre características demográficas da
gestante, nível socioeconômico da família e tipo de assistência recebida durante o pré-natal para todas aquelas residentes
nesse município que tiveram filhos entre 1º de janeiro e 31 de dezembro de 2010. Foram utilizados o teste do χ2 para
comparar proporções e a regressão de Poisson com ajuste robusto da variância na análise multivariável. RESULTADOS:
Dentre as 2.288 entrevistadas, 33% não se submeteram ao CP de colo uterino. Destas, dois terços disseram desconhecer
a necessidade de realizá-lo, 18% não fizeram este exame por medo ou vergonha e as demais por outras razões. Após
ajuste para diversos fatores de confusão, as maiores razões de prevalência (RP) para não buscar por CP ocorreram entre
aquelas de menor idade (RP=1,5; IC95% 1,25–1,80) e escolaridade (RP=1,5; IC95% 1,12–2,12), que viviam sem
companheiro (RP=1,4; IC95% 1,24–1,62), fumantes (RP=1,2; IC95% 1,07–1,39), que não planejaram a gravidez
(RP=1,3; IC95% 1,21–1,61), que completaram menos de seis consultas durante pré-natal (RP=1,4; IC95% 1,32–1,69)
e usuárias de contraceptivo oral (RP=1,2; IC95% 1,04–1,38). CONCLUSÕES: Quanto maior o risco para câncer de
colo uterino, menor a probabilidade de a gestante se submeter ao CP de colo uterino. Isso, certamente, tem contribuído
para o aumento da morbimortalidade por esta doença nesta localidade.
Abstract
PURPOSE: To determine the prevalence and risk factors associated with failure of voluntary screening for cervical cancer during
the gestational period in Rio Grande, Rio Grande do Sul State, Southern Brazil. METHODS: Previously trained interviewers
applied a standardized questionnaire in the maternity to all mothers from this municipality who had delivered from January
1st to December 31st 2010 to obtain information about the demographic characteristics of the pregnant women, family
socioeconomic status, and prenatal care received. The χ2 test was used to compare proportions and Poisson regression
with robust adjustment of variance was used in the multivariate analysis. RESULTS: Among the 2,288 respondents, 33%
were not submitted to the Pap smear during pregnancy. Two thirds of these women stated that they were not aware of the
need to perform it, 18% were not screened out of fear or shame, and the rest for other reasons. After adjustment, the highest
prevalence ratios (PR) for noncompliance with the Pap smear occurred among young women (PR=1.5; 95%CI 1.25–1.80),
with lower educational level (PR=1.5; 95%CI 1.12–2.12), who were living without a partner (PR=1.4; 95%CI 1.24–1.62),
smokers (PR=1.2; 95%CI 1.07–1.39), who did not plan the current pregnancy (PR=1.3; 95%CI 1,21–1.61), who had
attended less than six medical visits during the prenatal period (PR=1.4; 95%CI 1.32–1.69) and among users of oral
contraceptives (PR=1.2; 95%CI 1.04–1.38). CONCLUSIONS: The higher the risk for uterine cervical cancer, the less likely
a pregnant woman is to undergo a Pap smear. This definitely contributed to the increased morbidity and mortality from this
disease in this setting.
Correspondência
Juraci Almeida Cesar
Rua General Osório, s/nº, 4º Andar – Campus Saúde
Área Acadêmica Prof. Newton Azevedo
CEP: 96201-900
Rio Grande (RS), Brasil
Recebido
11/06/2012
Aceito com modificações
27/09/2012
Trabalho realizado na Divisão de População & Saúde da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande – FURG – Rio
Grande (RS), Brasil.
1
Divisão de População & Saúde da Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio Grande – FURG – Rio Grande (RS), Brasil.
2
Curso de Medicina, Universidade Federal do Rio Grande – FURG – Rio Grande (RS), Brasil.
Citopatológico de colo uterino entre gestantes no Sul do Brasil: um estudo transversal de base populacional
Introdução
O câncer de colo uterino é a segunda neoplasia mais
comum entre mulheres no Brasil. Estima-se, para 2012, a
ocorrência de 17,5 mil casos. Isso representa cerca de 10%
de todos os tipos de cânceres no sexo feminino e uma taxa de
incidência de 18 casos para cada 100 mil mulheres1.
Essa neoplasia tem bom prognóstico, desde que
diagnosticada e tratada precocemente1,2. A detecção dessa
doença faz parte das ações de prevenção secundária, cuja
principal estratégia é o rastreamento entre mulheres
sexualmente ativas por meio do exame citopatológico
(CP) do colo uterino3.
Dentre os fatores associados à ocorrência de câncer
de colo uterino já definidos destacam-se: início precoce de
atividade sexual; idade mais avançada; baixo nível socioeconômico; múltiplos parceiros; tabagismo; e, principalmente, infecção por papilomavírus humano (HPV)1,4-9.
A avaliação do câncer de colo uterino em grupos
populacionais, como por exemplo, de gestantes, permite
identificar o perfil daquelas submetidas (ou não) a esse tipo
de exame, independentemente de tê-lo feito no sistema
público ou no sistema privado. Esta informação é fundamental para estimar a cobertura e o foco dos programas
em andamento, definir metas a ser alcançadas e, ao fazê-lo, priorizar aquelas com maior risco4,10, permitindo um
planejamento mais realístico das necessidades em saúde,
potencializando o impacto das ações a ser desenvolvidas
e otimizando o uso de recursos em saúde10.
Considerando a ocorrência quase universal (99,5%)
de parto hospitalar no município de Rio Grande (RS),
a facilidade em identificar e abordar gestantes nas maternidades, a importância desse grupo populacional na
utilização de serviços de saúde e na determinação da carga
de doenças na população, é que se decidiu pela realização
do presente estudo, o qual teve por objetivo medir a prevalência e identificar fatores associados a não submissão
ao exame citopatológico de colo uterino entre gestantes
residentes em Rio Grande.
Métodos
Foram incluídas neste estudo todas as puérperas cujo
filho nasceu com peso igual ou superior a 500 gramas ou
pelo menos 20 semanas de idade gestacional nas maternidades da Santa Casa de Misericórdia de Rio Grande e
no Hospital Universitário da Universidade Federal do
Rio Grande (HU–FURG), Rio Grande do Sul entre 1º
de janeiro e 31 de dezembro de 2010. Além disso, essas
mães deveriam residir no município de Rio Grande.
Especificamente no caso do desfecho avaliado neste artigo, a gestante deveria ter, ainda, feito pelo menos uma
consulta de pré-natal. O delineamento utilizado foi do
tipo transversal11, com as puérperas sendo entrevistadas
na maternidade nas primeiras 24 horas após o parto.
Todas as informações foram coletadas por meio de
questionário único pré-codificado com a quase totalidade
das perguntas fechadas. Esse questionário foi aplicado por
entrevistadoras previamente treinadas nas maternidades
desses hospitais, em geral, em até 24 horas após o parto, e
foi dividido em blocos com perguntas sobre caraterísticas
demográficas (idade, estado civil, cor da pele e situação
conjugal), reprodutivas maternas (número de gestações,
de filhos tidos vivos e mortos, ocorrência prévia de abortamento, de prematuridade e de filho com baixo peso
ao nascer, planejamento da gravidez atual e uso prévio
de método contraceptivo) e comportamentais maternas
(consumo de álcool, tabaco, chimarrão e atividade física).
Em relação à assistência recebida durante a gestação e o
parto, as seguintes variáveis foram investigadas: idade
gestacional por ocasião do inicio do pré-natal, número de
consultas realizadas, tipo e quantidade de exames laboratoriais efetivados, exames clínicos a que foram submetidas
essas gestantes, recebimento de vacina antitetânica, suplementação com sulfato ferroso e vitaminas, profissional
que fez o parto e ocorrência de doenças e hospitalizações ao
longo do período gestacional. Além dessas características,
foram obtidas informações sobre nível socioeconômico
(escolaridade da gestante e do companheiro, renda e valor
recebido de aposentadoria para cada um dos moradores
do domicílio no mês anterior à entrevista).
Três entrevistadoras graduadas em Ciências Sociais
foram contratadas para realizar essas entrevistas. O treinamento dessas entrevistadoras consistiu de leitura
do questionário e do manual de instruções e aplicação do
questionário em estudo piloto na primeira quinzena de
dezembro de 2009. Durante o período de coleta de dados,
essas entrevistadoras realizaram rodízio mensal nas duas
maternidades. O questionário era aplicado somente após
concordância da mãe e assinatura do termo de consentimento.
O desfecho foi constituído pela não submissão no
período gestacional ao CP de colo uterino segundo relato da gestante. Aquelas submetidas ao CP há menos de
cinco anos foram consideradas como tendo realizado o
exame. Apesar de um grande número de variáveis terem
sido investigadas, somente as incluídas no modelo hierárquico previamente definido e que mostraram associação
com valor p de até 0,20 foram levadas às análises bruta e
ajustada. Como variáveis independentes incluíram-se no
modelo: idade em anos completos, cor da pele autorreferida, se viviam com companheiro e escolaridade materna
em anos completos, renda familiar, tabagismo da gestante
nos seis meses anteriores à gestação, ocorrência prévia de
aborto, planejamento da gravidez, número de consultas
de pré-natal realizadas, uso de anticoncepcional oral e
ocorrência de hospitalização no período gestacional.
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):518-23
519
Cesar JA, Santos GB, Sutil AT, Cunha CF, Dumith SC
Os questionários aplicados foram codificados pelas
próprias entrevistadoras ao final de cada dia de trabalho e
entregues na sede do projeto onde eram revisados, digitados
e analisados em blocos de, no máximo, 100 questionários
quanto à presença de valores inesperados. Nesse caso, o
questionário físico foi buscado e eventuais distorções foram
corrigidas. Persistindo a dúvida, a puérpera foi contactada
por telefone ou através de visita domiciliar. Em seguida,
foram colocados rótulos e realizada categorização de variáveis,
bem como criadas variáveis derivadas. Essa entrada de dados
foi feita por meio do programa Epidata 3.112, enquanto a
análise dos dados foi conduzida no programa Stata 11.013.
A análise dos dados baseou-se em modelo hierárquico
previamente definido com três níveis de determinação
causal14. No primeiro deles, incluiu-se as variáveis idade,
cor da pele, se vive com companheiro, escolaridade da
gestante e renda familiar; no segundo nível, as variáveis
tabagismo, ocorrência de aborto prévio e planejamento
da gravidez. Por fim, no terceiro nível, foram incluídas
frequência a seis ou mais consultas de pré-natal, uso de
anticoncepcional oral e ocorrência de hospitalização durante a gravidez atual. O nível de significância estatístico
empregado foi de 95% para testes bicaudais15.
Para a obtenção das prevalências conforme a categoria das variáveis utilizou-se o teste do χ2 de Pearson
para proporções, enquanto a medida de efeito — no caso
a razão de prevalência, porque a ocorrência do desfecho
em questão era superior a 10% —, foi obtida por meio da
regressão de Poisson com ajuste para variância robusta15.
O protocolo de pesquisa foi submetido e aprovado pelo
Comitê de Ética em Pesquisa na Área da Saúde (CEPAS) da
Universidade Federal do Rio Grande. Garantiu-se ainda,
à mãe, confidencialidade dos dados coletados, participação voluntária e possibilidade de deixar o estudo quando
desejasse, sem necessidade de justificativa.
Resultados
Em 2010, houve 2.464 partos cujas mães residiam no
município de Rio Grande. Dessas, 2.395 (97,2%) foram
entrevistadas. O denominador deste estudo foi constituído
por 2.288 gestantes, ou seja, somente por aquelas que
compareceram a pelo menos uma consulta de pré-natal.
A média de idade foi 25,9 anos, variando de 11 a 47 anos,
enquanto a mediana de renda familiar foi de R$ 1.000,00.
Das gestantes, 19% eram adolescentes (<20 anos), 68%
de cor de pele branca, 83% viviam com companheiro,
6% completaram ensino superior, 26% haviam fumado
pelo menos um cigarro por dia nos seis meses anteriores à
gestação, 44% eram primigestas, 14% já tinham sofrido
pelo menos um aborto (espontâneo ou provocado), 36%
afirmaram ter planejado a gravidez, 80% haviam realizado
seis ou mais consultas de pré-natal, 84% relataram uso
520
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):518-23
de contraceptivo oral antes de engravidar e 11% foram
hospitalizadas durante a gestação.
Dentre as 2.288 mulheres que frequentaram pré-natal,
33% (IC95% 30,8–34,6) não foram submetidas ao CP de
colo uterino, mas deveriam tê-lo feito. Os principais motivos para sua não efetivação foram: desconhecimento da
necessidade de realizá-lo (66%), sentir medo ou vergonha
(18%), falta de oportunidade para ir ao serviço de saúde
(6%) ou de material ou de profissional para realizá-lo (10%).
A Tabela 1 mostra que a prevalência de não coleta de CP
conforme a categoria das variáveis do modelo variou de 19%
para puérperas com 12 anos ou mais de estudo a 52% entre
para aquelas que tiveram menos de 6 consultas no pré-natal.
Essa mesma tabela mostra que, após ajuste para diversos fatores de confusão, mantiveram-se significativamente
associadas ao desfecho as seguintes variáveis: idade, viver
com companheiro, escolaridade, renda familiar, tabagismo
nos seis meses anteriores à gravidez, planejamento da
gravidez, número de consultas de pré-natal realizadas e
hospitalização durante o período gestacional.
Discussão
Um terço das puérperas riograndinas cujos filhos
nasceram em 2010 não se submeteram ao CP de colo
uterino. A maior probabilidade de não coleta desse exame
ocorreu entre aquelas de menor idade, que não viviam
com companheiro, que tinham menor escolaridade e
renda familiar, que fumaram nos seis meses anteriores à
gestação, que referiram ocorrência de aborto em algum
momento no passado, que não planejaram a gravidez, que
concluíram menos de seis consultas durante o pré-natal,
que usaram anteriormente contraceptivo oral e que foram
hospitalizadas durante a gestação. Excetuando-se idade,
todas as demais variáveis revelam que as puérperas com
maior risco de adoecer e morrer por câncer de colo uterino
foram as que mostraram maior probabilidade de não se
submeterem ao CP de colo uterino durante a gestação.
A taxa de não efetivação do CP em estudos de base
populacional varia de 15 a 45% em diferentes localidades6,16-20. No entanto, vale destacar que as pesquisas
citadas incluem mulheres em diferentes faixas etárias,
o que dificulta a comparabilidade dos resultados. De
qualquer forma, essa taxa vem diminuindo nos últimos
anos, ao mesmo tempo em que a proporção daquelas
que concluem o exame em demasia praticamente não se
modifica16,20,21. Isso sugere que, apesar de a cobertura para
CP estar aumentando, o foco segue inadequado10,21. Em
geral, quem mais precisa menos faz CP e, quando o faz,
é com atraso, o que gera importantes implicações para o
tratamento e para o prognóstico da doença5,6,21.
Esta situação parece ainda ocorrer no município de Rio
Grande. Entre 1994 e 2004, a taxa de mulheres em idade
Citopatológico de colo uterino entre gestantes no Sul do Brasil: um estudo transversal de base populacional
Tabela 1. Distribuição das parturientes que não se submeteram ao exame citopatológico de colo uterino conforme categoria da variável incluída no modelo e resultados das análises
bruta e ajustada
Nível
I
II
III
Análise (RP e IC95%)
Não se submeteram ao exame CP
de colo uterino
Bruta
Ajustada
Idade (anos)
30 ou mais
20–29
Até 19
(%)
24,5
32,3
46,7
p<0,001
1,00
1,32 (1,13–1,55)
1,91 (1,61–2,26)
p<0,001#
1,00
1,24 (1,06–1,46)
1,50 (1,25–1,80)
Cor da pele
Branca
Parda
Preta
30,5
37,2
38,1
p=0,004
1,00
1,22 (1,06–1,40)
1,25 (1,04–1,51)
p=0,160†
1,00
1,12 (0,98–1,28)
1,14 (0,95–1,36)
Vive com companheiro
Sim
Não
29,9
48,4
p<0,001
1,00
1,62 (1,45–1,84)
p<0,001
1,00
1,42 (1,24–1,62)
Escolaridade (anos)
12 ou mais
9–11
5–8
0–4
19,4
28,4
40,6
39,9
p<0,001
1,00
1,46 (1,11–2,92)
2,09 (1,60–2,73)
2,05 (1,50–2,81)
p=0,01#
1,00
1,22 (0,93–1,61)
1,49 (1,12–1,98)
1,54 (1,12–2,12)
Renda familiar (quintis)
5 (maior)
4
3
2
1 (menor)
23,3
25,6
31,8
36,6
45,0
p<0,001
1,00
1,10 (0,87–1,38)
1,36 (1,09–1,70)
1,57 (1,27–1,94)
1,93 (1,58–2,35)
p<0,001#
1,001,42 (1,14–1,76)
0,95 (0,76–1,20)
1,10 (0,87–1,38)
1,19 (0,95–1,49)
Tabagismo nos seis meses anteriores à gestação
Não
Sim
29,5
46,1
p<0,001
1,00
1,43 (1,26–1,61)
p=0,002
1,00
1,22 (1,07–1,39)
Paridade
0
1
2
3 ou +
31,8
34,5
30,7
35,9
p=0,30
1,00
1,08 (0,91–1,27)
0,97 (0,82–1,13)
1,13 (0,97–1,32)
p=0,11#
1,00
1,25 (1,04–1,50)
1,04 (0,88–1,23)
1,12 (0,92–1,37)
Ocorrência prévia de aborto
Sim
Não
28,4
33,4
p=0,08
1,00
1,17 (0,97–1,42)
p=0,10
1,00
1,17 (0,97–1,42)
Gravidez planejada
Sim
Não
36,0
64,0
p<0,001
1,00
1,64 (1,43–1,89)
p<0,001
1,00
1,39 (1,21–1,61)
Realizou pelo menos seis consultas de pré-natal
Sim
Não
27,8
52,4
p<0,001
1,00
1,89 (1,68–2,12)
p<0,001
1,00
1,49 (1,32–1,69)
Uso de contraceptivo oral
Sim
Não
30,5
44,8
p<0,001
1,00
1,47 (1,28–1,68)
p=0,010
1,00
1,20 (1,04–1,38)
Hospitalização durante o período gestacional
Sim
Não
27,1
33,3
p=0,08
1,00
1,20 (0,97–1,48)
p=0,04
1,00
1,24 (1,01–1,52)
Total (n=2395)
32,7
Variável
CP: exame citopatológico; RP: Razão de Prevalência; #Teste de Wald para tendência linear; †Teste de Wald para heterogeneidade.
fértil não submetidas à CP foi reduzida de 575 para 42%22.
No entanto, foram exatamente as mulheres com maiores
risco para câncer de colo uterino que apresentaram maior
probabilidade de não efetivação do exame. Em 2010, 33%
das gestantes deveriam ter sido submetidas ao exame, mas
não foram. Essa diminuição observada ao longo dos anos
para esse município pode ter sido decorrente da expansão
da Estratégia de Saúde da Família (ESF). A implantação da
ESF em Rio Grande foi iniciada em 2002 com duas equipes.
Atualmente possui 24 equipes cobrindo cerca de 30% da
população total, o que corresponde a cerca de metade da
população mais pobre, exatamente onde se encontra a maioria
das mulheres com maior risco e que muito frequentemente
não se submetem ao citopatológico de colo uterino.
Mulheres de menor idade, em geral adolescentes, tradicionalmente são as que menos aderem a esse tipo de exame5,6,9,21.
As principais razões são desconhecimento da sua necessidade,
vergonha ou medo, constrangimento, dificuldade de comunicação,
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):518-23
521
Cesar JA, Santos GB, Sutil AT, Cunha CF, Dumith SC
desconforto, ausência de problemas ginecológicos, dificuldade
de acesso e discriminação social e racial4,16,17,23,24. Em geral, são
essas mesmas mulheres que vivem sem companheiro, fator de
risco amplamente conhecido para câncer de colo uterino16-18,20,22.
Mulheres com pouca escolaridade e pertencentes a
famílias de baixa renda tradicionalmente se submetem a esse
exame com muito menos frequência que as demais5,6,9,16-21.
Em 1995, a razão de prevalências (RP) a não adesão ao
CP entre mulheres com até quatro anos de escolaridade
e renda familiar de até dois salários-mínimos foram, respectivamente, de 1,29 e 1,3 (1,12–1,51) em comparação
àquelas com nove anos ou mais de escolaridade e renda
familiar mensal superior a cinco salários-mínimos5. Essas
RP são inferiores às observadas neste estudo, sugerindo que
a probabilidade de não efetivação do CP entre gestantes
é maior do que aquela observada para mulheres em idade
fértil. Riscos semelhantes para renda e escolaridade foram
observados em outras localidades6,9,18,21..Maior nível de
escolaridade e melhor renda facilitam o acesso aos serviços
de saúde, com consequente aumento da cobertura e redução
no risco de desenvolvimento de câncer de colo uterino16.
O tabagismo tem sido identificado como um fator
associado ao atraso ou a não efetivação de CP em vários
estudos9,18,21. É bem provável que entre tabagistas isso
seja decorrente de comportamento de risco característico
dessas mulheres que, além de não buscarem por esse cuidado junto aos serviços de saúde, também estão expostas
a outras situações que implicam maior risco à sua saúde16.
Não se encontrou um único estudo de base populacional cuja análise tenha sido ajustada para fatores de
confundimento, em que o não planejamento da gravidez
tenha se mostrado associado de forma significativa a não
se submeterem ao CP. Este achado necessita de avaliação
em outros estudos, a fim de verificar sua consistência.
Maior número de consultas de pré-natal favorece
o contato com o serviço de saúde e, consequentemente,
facilita a adesão ao CP de forma oportunista17,24. Por essa
razão, a frequência de consultas aparece diretamente associada, e de forma significativa, à maior cobertura para
este tipo de exame entre essas mulheres.
Mulheres hospitalizadas durante a gestação mostraram
RP maior para não se submeterem ao CP em relação às
demais. A internação hospitalar, apesar de ser um evento
esporádico, em geral, decorre de doença já instalada, o
que favorece a investigação e aumenta a probabilidade
de receber cuidados preventivos, sugerindo que o rastreamento do câncer de colo uterino ocorra de maneira
oportunista9,17,25.
Por fim, o não uso de contraceptivo oral no período
imediatamente anterior à gravidez foi identificado neste
estudo como fator de risco a não adesão de CP durante
o período gestacional. Mulheres que se preocupam em
prevenir a gravidez ou que decidem assumir essa condição
522
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):518-23
em momento julgado por elas como mais apropriado estão
certamente mais preocupadas com seu estado físico, e isso
faz com que procurem por outros cuidados, sobretudo
aqueles que possibilitam a identificação precoce de enfermidades que mais comumente afetam sua saúde como,
por exemplo, o câncer de colo uterino16,25.
O rastreamento do câncer cérvico-uterino depende,
acima de tudo, do estabelecimento de políticas públicas
que visem à redução da vulnerabilidade individual e social
a que estão potencialmente expostas as mulheres, sobretudo
as mais pobres16. É certo que intervenções com a vacina
contra o HPV, o principal causador deste tipo de câncer,
terão enorme impacto sobre a morbimortalidade por esta
doença, mas isto está ainda longe de acontecer, sobretudo
em países não ricos e populosos como o Brasil1,26.
A situação observada para o município de Rio Grande
é preocupante, muito mais pela desorganização (de gestores e usuárias) do que pela quantidade de serviço oferecido. Nesse município, apesar de oito em cada dez
gestantes irem a não menos que seis consultas de pré-natal
ao longo de nove meses, três em cada dez delas chegam ao
momento do parto sem estar com o CP atualizado. É inaceitável que em um município com extensa rede de serviço de
saúde — cerca de três quartos da população vive a menos de
1 km de algum serviço publico de saúde —, 1 em cada 20
gestantes não complete uma única consulta durante todo o
pré-natal. Não custa também lembrar que Rio Grande está
localizado em uma das regiões mais desenvolvidas do país.
Isto carece de modificação, e uma das formas seria incentivar
a busca ativa nos domicílios pelos agentes comunitários
de saúde, sobretudo daquelas gestantes que não realizam
uma consulta de pré-natal. Em relação àquelas que vão às
consultas de pré-natal, os profissionais de saúde deveriam
esclarecer, incentivar e oferecer este exame.
Por fim, ao interpretar os resultados aqui apresentados
há que se considerar a possibilidade de a entrevistada ter
dificuldade em diferenciar exame ginecológico de CP.
Há, também, a possibilidade de a entrevistada responder
positivamente, ou seja, dizer que foi submetida ao CP em
virtude de ser este o comportamento esperado de todas
elas. Apesar dessas limitações, o cenário não seria melhor
que o apresentado e, além disso, a quase totalidade dos
estudos que trata deste assunto o faz desta maneira, ou
seja, a partir de informação prestada pela entrevistada.
Agradecimentos
Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico
e Tecnológico (CNPq), pelas Bolsas de Iniciação Científica
para Gabriela Breitembach dos Santos e Andreia Tomais
Sutil; e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do
Rio Grande do Sul (FAPERGS) pela Bolsa de Iniciação
Científica para Carolina Fischer Cunha.
Citopatológico de colo uterino entre gestantes no Sul do Brasil: um estudo transversal de base populacional
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Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):518-23
523
Luciana Azôr Dib1
Michele Gomes Da Broi1
Maria Cristina Picinato Medeiros de Araújo2
Roberta Cristina Giorgenon2
Rui Alberto Ferriani3,4
Paula Andrea de Albuquerque
Sales Navarro3,4
Análise invasiva e não invasiva do fuso
meiótico de oócitos humanos obtidos de
ciclos estimulados: dados preliminares
Invasive and noninvasive analysis of the meiotic spindle of human
oocytes obtained from stimulate cycles: preliminary results
Xxxxxxxxx
Resumo
Palavras-chave
Oócito humano
Fuso
Microscopia de polarização
Microscopia confocal
Meiose
Fertilização in vitro
Keywords
Human oocyte
Spindle
Microscopy, polarization
Microscopy, confocal
Meiosis
Fertilization in vitro
OBJETIVOS: Avaliar a concordância entre as técnicas de microscopia de polarização e microscopia confocal na
avaliação do fuso meiótico de oócitos humanos maturados in vivo. MÉTODOS: Estudo prospectivo que avaliou
oócitos com o primeiro corpúsculo polar extruído obtidos de mulheres inférteis submetidas à estimulação ovariana
para realização de injeção intracitoplasmática de espermatozoide. Os oócitos com o primeiro corpúsculo polar
extruído foram avaliados por meio da microscopia de polarização e, imediatamente após, foram fixados e corados
para avaliação dos microtúbulos e cromatina pela microscopia confocal de alto desempenho. Foram comparadas
as técnicas de microscopia de polarização e confocal, de acordo com a visualização ou não do fuso meiótico pela
microscopia de polarização e a presença ou não de anomalias meióticas à análise pela microscopia confocal. Foram
calculados os intervalos de confiança, o índice de Kappa e a concordância entre as metodologias, considerando a
análise da microscopia de imunofluorescência como padrão-ouro para avaliação de normalidade do fuso e distribuição
cromossômica oocitária. RESULTADOS: Observou-se que 72,7% dos oócitos em metáfase II com fuso celular não
visível à polarização apresentaram anormalidades meióticas à análise confocal e que 55,6% dos oócitos em metáfase
II com fuso celular visível à polarização apresentaram-se como oócitos anormais à análise confocal. Somente 44,4%
dos oócitos com fuso celular visível à polarização apresentaram-se como normais à análise confocal. A concordância
entre os métodos foi de 51,1% (Kappa: 0,11; IC95% -0,0958–0,319). CONCLUSÕES: A baixa concordância entre
a microscopia de polarização e a confocal na avaliação do fuso meiótico oocitário sugere que a visualização do
fuso meiótico de oócitos humanos em metáfase II pela microscopia de polarização tem limitado o valor preditivo de
normalidade meiótica oocitária.
Abstract
PURPOSE: To evaluate the concordance between polarization microscopy and confocal microscopy techniques in
the evaluation of the meiotic spindle of human oocytes matured in vivo. METHODS: Prospective study that evaluated
oocytes with the first polar extruded body obtained from infertile women who had undergone ovarian stimulation for
intracytoplasmic sperm injection. The oocytes with the first polar extruded body were evaluated by polarization microscopy
and were then immediately fixed and stained for microtubule and chromatin evaluation by high-performance confocal
microscopy. We determined the correlation of polarization microscopy with confocal microscopy in the detection of
meiotic oocyte anomalies, and we also evaluated the percentage of oocytes with a visible and non-visible cell spindle
by polarization microscopy and with meiotic normality and abnormalities by confocal microscopy. Confidence intervals,
Kappa’s index and concordance between the methodologies were calculated, considering immunofluorescence
microscopy analysis as the golden-standard for evaluating normal spindle and oocyte chromosome distribution. RESULTS:
We observed that 72.7% of metaphase II oocytes with a nonvisible meiotic spindle by polarization microscopy showed
no meiotic abnormalities by confocal analysis and 55.6% of metaphase II oocytes with a visible meiotic spindle by
polarization microscopy were found to be abnormal oocytes by the confocal analysis. Only 44.4% of oocytes with
a visible meiotic spindle by polarization microscopy were found to be normal by confocal analysis. Concordance
Correspondência
Paula Andrea de Albuquerque Salles Navarro
Setor de Reprodução Humana, Departamento de Ginecologia
e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da
Universidade de São Paulo
Avenida Bandeirantes, 3.900 – Monte Alegre
CEP: 14049-900
Ribeirão Preto (SP), Brasil
Recebido
20/06/2012
Aceito com modificações
25/09/2012
Trabalho realizado no Setor de Reprodução Humana, Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de
Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo – USP – Ribeirão Preto (SP), Brasil.
1
Programa de Pós-graduação do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto,
Universidade de São Paulo – USP – Ribeirão Preto (SP), Brasil.
2
Laboratório de Reprodução Assistida do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo – USP – Ribeirão Preto (SP), Brasil.
3
Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo – USP –
Ribeirão Preto (SP), Brasil.
4
Instituto Nacional de Ciências e Tecnologia, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq – Hormônios
e Saúde da Mulher, Brasil.
Conflito de interesses: não há.
Análise invasiva e não invasiva do fuso meiótico de oócitos humanos obtidos de ciclos estimulados: dados preliminares
between the methods was 51.1% (Kappa: 0.11; 95%CI -0.0958–0.319). CONCLUSIONS: The low correlation between polarization microscopy and
confocal microscopy in the assessment of oocyte meiotic spindle suggests that visualization of the meiotic spindle of human oocytes at metaphase II by
polarization microscopy is not a good indicator of oocyte meiotic normality.
Introdução
A qualidade oocitária depende da adequada aquisição de maturação citoplasmática e nuclear, sendo a última
dependente da presença de um fuso celular normal. O fuso
celular oocitário é uma estrutura extremamente sensível
à ação de diversos fatores, tais como o envelhecimento,
as mudanças térmicas, o suporte insuficiente de oxigênio
durante o tempo de cultura, a manipulação oocitária, entre
outros1-4. Alterações ao fuso meiótico podem gerar alteração
no complemento cromossômico, induzindo um estado de
aneuploidia por não disjunção, junção desbalanceada ou
disjunção prematura das cromátides e perda de cromossomos, o que compromete o desenvolvimento embrionário5-8.
O fuso meiótico pode ser visualizado por meio da
microscopia confocal (MC) de elevado desempenho, que
oferece informações detalhadas das estruturas microtubulares e dos cromossomos, sendo considerada a metodologia
de padrão-ouro para avaliação desta estrutura celular9-11.
Entretanto, esta metodologia requer a fixação dos oócitos,
o que inviabiliza sua utilização subsequente nos procedimentos de reprodução assistida (RA).
Considerando a relevância de se avaliar as qualidades
oocitária e embrionária com a finalidade de se aperfeiçoar os resultados dos procedimentos de RA, cada vez
mais têm sido estudadas e empregadas metodologias
com esta finalidade. Atualmente, um dos métodos não
invasivos mais estudados é a microscopia de polarização
(MP)12-14, que permite a análise de estruturas birrefringentes, como o fuso celular oocitário e a zona pelúcida sem
a necessidade de fixação do oócito, não comprometendo
os resultados de injeção intracitoplasmática de espermatozoides (ICSI)12,13,15,16.
Discute-se a aplicabilidade clínica da MP como preditora da qualidade oocitária e dos resultados da ICSI em
humanos12,13,15,16, pois a mesma potencialmente permitiria
a avaliação do estágio de maturação nuclear oocitário17
e a visualização ou não desta estrutura celular. Todavia,
apesar de alguns estudos sugerirem que a visualização do
fuso meiótico pela MP possa ser utilizada como preditora
indireta dos resultados da ICSI14,18-23, não há consenso na
literatura sobre sua aplicabilidade clínica24.
Estudos experimentais, utilizando camundongos,
evidenciaram adequada capacidade preditora desta
metodologia para identificação de anomalias meióticas
oocitárias25,26. Todavia, o fuso celular humano apresenta
especificidades próprias, sendo necessários estudos para
comparar a acurácia desta metodologia para a predição de
normalidade do fuso e distribuição cromossômica. Devido
à dificuldade em se conseguir oócitos humanos maturados
in vivo que sejam doados para a pesquisa, não há, até o
presente, estudos comparativos da concordância entre as
técnicas de MP e MC na detecção de anomalias meióticas
oocitárias. Existe apenas um estudo10 comparando essas
duas técnicas, no qual foram analisados parâmetros quantitativos do fuso celular pela MP, comparando-os com a
análise da morfologia do fuso meiótico e da distribuição
cromossômica pela MC. Além de ter avaliado apenas um
dos dois sistemas disponíveis comercialmente, este estudo
não apresentou dados relativos à avaliação de parâmetros
quantitativos do fuso (visualização ou não da estrutura) pela
MP e sua acurácia na predição das anormalidades meióticas
oocitárias, permanecendo esta lacuna no conhecimento.
Devido à importância de serem identificadas metodologias não invasivas capazes de predizer a qualidade
oocitária em procedimentos de RA e a escassez de dados
na literatura sobre a capacidade da MP de identificação
de anomalias meióticas em oócitos humanos, foi proposta
a realização do presente estudo. Objetivou-se comparar a
concordância entre as técnicas MP e MC na avaliação do
fuso meiótico de oócitos humanos maturados in vivo,
avaliando a percentagem de oócitos com fuso celular visível e não visível à MP com normalidade e anormalidade
meióticas à MC.
Métodos
Foi realizado um estudo prospectivo de junho de 2009
a maio de 2011, no Setor de Reprodução Humana do
Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade
de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São
Paulo (FMRP-USP). Este estudo foi submetido e aprovado
pelo Comitê de Pesquisa. Todos os casais submetidos à
indução da ovulação para a realização de ICSI, que preencheram os critérios de inclusão e manifestaram o desejo de
participar do projeto, assinaram o termo de consentimento
após esclarecimentos sobre o estudo.
Ao longo dos 24 meses de duração do estudo, 23
pacientes preencheram os critérios de inclusão e manifestaram o desejo de participar, mediante a assinatura
do termo de consentimento livre e esclarecido. Foram
incluídas pacientes inférteis com idade menor ou igual a
38 anos, que apresentaram mais de sete oócitos maduros
captados após estimulação ovariana com gonadotrofinas.
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):524-9
525
Dib LA, Broi MG, Araújo MCPM, Giorgenon RC, Ferriani RA, Navarro PAAS
O bloqueio hipofisário foi iniciado utilizando agonista
do hormônio liberador de gonadotrofinas (GnRHa) dez
dias antes da realização da ultrassonografia transvaginal
basal (protocolo longo), por meio da administração de
acetato de Leuprolide (Lupron®, Abott, Brasil). As pacientes receberam 100 a 300 UI por dia de FSH recombinante – FSHr (Gonal-F®, Serono, Brasil; Puregon®,
Organon, Brasil), nos primeiros seis dias da indução.
Quando pelo menos dois folículos atingiram 18 mm de
diâmetro médio administrou-se gonadotrofina coriônica
humana (hCG) recombinante (Ovidrel®, Serono, Brasil).
A captação dos oócitos foi realizada entre 34 a 36 horas
após a administração do hCG recombinante.
Todo o material aspirado durante a captação dos oócitos
foi analisado para a identificação e o isolamento dos complexos oócito-cumulus. Após a conclusão do desnudamento
oocitário, realizou-se a identificação do grau de maturidade
dos oócitos, sob visualização ao microscópio de luz. Os
oócitos imaturos (em estágio de vesícula germinativa ou
metáfase I) foram descartados, já os maduros (caracterizados morfologicamente pela presença de um corpúsculo
polar – CP extruído) foram incubados por mais uma
hora (após o desnudamento oocitário) para, então, serem
avaliados pelo OCTAX ICSI GuardTM System (Medical
Technology Vertriebs-GmbH, Altdorf, Alemanha). Sete
oócitos maduros foram injetados (submetidos à ICSI) seguindo a rotina assistencial do serviço, e os demais foram
doados para o presente estudo.
Visualização do fuso meiótico por meio da
microscopia de polarização
Os fusos celulares dos oócitos com extrusão do
primeiro CP foram avaliados usando um microscópio
invertido, equipado com uma câmera de vídeo e com o
hardware do MP, o qual consiste de cristais elétricos e de
um controlador eletro-óptico (OCTAX ICSI GuardTM
System, Medical Technology Vertriebs-GmbH, Altdorf,
Alemanha). Os grupos de cristais elétricos são controlados
pelo computador por meio do software OCTAX EyeWareTM
(Universal Imaging Corp., Boston, MA, EUA). Utilizou-se
um número máximo de sete oócitos em cada placa, sendo
o tempo necessário para analisar o fuso celular pela MP e
realizar a ICSI inferior ou igual a sete minutos.
Para controlar os vieses metodológicos relativos a não
visualização do fuso secundária à realização do desnudamento celular e ao envelhecimento oocitário, padronizou-se
que o desnudamento fosse realizado de duas a três horas
após a captação oocitária e, após o mesmo, os oócitos eram
recolocados nas placas de cultivo previamente equilibradas
na incubadora, por mais uma hora, para somente depois
serem submetidos ao imageamento e à ICSI.
Os oócitos com primeiro CP foram analisados pela MP
e caracterizados quanto ao estágio de maturação nuclear
526
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):524-9
(telófase I ou metáfase II) e presença ou não de fuso celular visível. Foram considerados em telófase I, os oócitos
que apresentavam fuso celular alongado, perpendicular
à membrana oocitária, estendendo-se até o primeiro CP.
Os fusos celulares em metáfase II foram caracterizados
pela presença de fibras birrefringentes distribuídas radialmente, com a forma de barril e orientadas paralelamente
à membrana cortical (Figura 1A). Como os cromossomos
são minimamente birrefringentes, não são adequadamente
analisáveis por meio desta metodologia.
Microscopia de imunofluorescência para visualização
do fuso meiótico e distribuição cromossômica
Os oócitos maduros doados para a pesquisa foram
fixados e corados para microscopia de fluorescência, conforme previamente descrito17,18,27.
Para maior acurácia das análises, os oócitos em metáfase II foram subdivididos em analisáveis, quando se apresentavam em visão lateral ou sagital, possibilitando uma
avaliação global do fuso meiótico; e não analisáveis, quando
se apresentavam em visão polar, impossibilitando a avaliação global do fuso, apenas da disposição cromossômica28,29.
Na avaliação por imunofluorescência, o fuso meiótico foi
considerado normal quando apresentava a forma de barril
e estava disposto em posição centrípeta em relação ao CP
(Figura 1B). Os cromossomos apresentavam distribuição
normal quando estavam reunidos na placa metafásica e bem
alinhados no equador do fuso celular oocitário (Figura 1B).
Eram considerados anormais quando se encontravam
dispersos, desalinhados ou fragmentados, ou quando
havia cromatina feminina aglomerada com microtúbulos
interfásicos. Os oócitos em metáfase II foram considerados
normais quando apresentavam um fuso meiótico em forma
de barril, com cromossomos alinhados na placa metafásica
e um CP (Figura 1B); e anormais, quando apresentavam
fuso e/ou configuração cromossômica alterados.
O fuso celular foi considerado em telófase I quando
estava alongado, perpendicular à membrana plasmática
oocitária e com cromossomos distribuídos na sua porção
terminal.
Análise estatística
Inicialmente, realizou-se uma descrição da amostra, sendo as variáveis qualitativas apresentadas como
frequências absolutas e relativas.
Para comparação dos métodos de avaliação do fuso
meiótico oocitário (MP e MC), considerando a análise pela
MC como padrão-ouro, utilizou-se o teste de concordância
de Kappa: <0,0, ruim; 0,21–0,40, sofrível; 0,41–0,60,
regular; 0,61–0,80, boa; 0,81–0,99, ótima e >1,00,
perfeita. Foram também apresentados os intervalos de
confiança de 95% (IC95%) para cada variável analisada:
oócitos sem fuso celular visível à MP e com normalidade
Análise invasiva e não invasiva do fuso meiótico de oócitos humanos obtidos de ciclos estimulados: dados preliminares
A
B
Figura 1. Oócitos humanos com extrusão do primeiro corpúsculo polar, avaliados pela microscopia de polarização e/ou confocal de alto desempenho.
(A) Fuso celular em metáfase II avaliado pela microscopia de polarização; (B) fuso celular em metáfase II, apresentando-se normal em forma de barril
e com cromossomos alinhados na placa metafásica segundo análise pela microscopia confocal de alto desempenho. A cor verde representa os microtúbulos formando o fuso celular e a azul, cromossomos. Escala = 10 µm.
meiótica pela análise pela MC; com fuso celular visível à
MP e com normalidade meiótica pela análise pela MC;
sem fuso celular visível à MC e com anormalidade meiótica pela análise pela MC; e com fuso celular visível à
MC e com anormalidade meiótica pela análise pela MC.
Resultados
Foram analisados 73 oócitos frescos, oriundos de 23
pacientes. A análise pela MP evidenciou três oócitos em
telófase I (4,3%) e 70 em metáfase II (95,7%), sendo 54
com o fuso celular visível (77,1%) e 16 sem (22,9%).
A análise com MC evidenciou seis oócitos em telófase I
(8,2%) e 67 em metáfase II (91,8%). Dos 67 oócitos em
metáfase II, 47 foram fixados em visão sagital (70,1%),
sendo considerados analisáveis no presente estudo, 4
apresentaram fuso celular não visível (6%) e 16 foram
fixados em visão polar (23,9%), sendo considerados não
analisáveis. Todos os oócitos que estavam em telófase I
foram fixados em visão sagital e apresentaram análise
confocal normal. Dos 47 oócitos em metáfase II analisáveis, 28 apresentaram fuso e distribuição cromossômica
anormais (59,6%) e 19 apresentaram normalidade meiótica (40,4%).
Dos 16 oócitos com fuso celular não visível à polarização, dois deles também apresentaram fuso negativo
à análise confocal, três estavam em visão polar, dois em
telófase I e nove em visão sagital. Dos 54 oócitos com fuso
celular visível à polarização, dois oócitos apresentaram fuso
negativo à análise confocal, 13 estavam em visão polar,
um estava em telófase I e 38 em visão sagital.
Observou-se que 72,7% (8/11) dos oócitos em metáfase
II com fuso celular não visível à polarização apresentaram
anormalidades meióticas à análise confocal (IC 46,4–99,1)
e 55,6% (20/36) dos oócitos em metáfase II com fuso
celular visível à polarização apresentaram-se como oócitos
anormais à análise confocal (IC 39,3–71,8). Somente 27,3%
(3/11) dos oócitos em metáfase II com fuso celular não
visível à polarização apresentaram normalidades meióticas
à análise confocal (IC 0,01–53,6). Dos oócitos em metáfase
II com fuso celular visível à polarização, 44,4% (16/36)
apresentaram-se como oócitos normais à análise confocal
(IC 28,2–60,7). A concordância entre os métodos foi de
apenas 51,1% (Kappa: 0,11; IC95% -0,0958–0,319).
Para esta análise foram descartados os oócitos em telófase
I (n=6), aqueles com fuso negativo à imunofluorescência
(n=4) e que foram fixados em visão polar (n=16), como
observado na Tabela 1.
Tabela 1. Comparação entre as técnicas de microscopia de polarização e confocal em
relação à visualização ou não do fuso meiótico de oócitos humanos maturados in vivo à
microscopia de polarização e presença ou não de anomalias meióticas à microscopia confocal
Microscopia confocal
Microscopia de
polarização
Fuso não visível
Anormal
n
%
IC95%
Normal
n
%
IC95%
Total
8
72,7
46,4–99,1
3
27,3
0,01–53,6
11
Fuso visível
20
55,6
39,3–71,8
16
44,4
28,2–60,7
36
Total
28
19
47
Anormalidade meiótica: presença de anomalias do fuso meiótico e/ou da
distribuição cromossômica; normalidade meiótica: presença de um fuso celular
normal em forma de barril, com os cromossomos distribuídos na placa metafásica.
Concordância entre os métodos: 51,1%. Kappa: 0,11 (IC95% -0,096–0,319).
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):524-9
527
Dib LA, Broi MG, Araújo MCPM, Giorgenon RC, Ferriani RA, Navarro PAAS
Discussão
Com a crescente demanda de pacientes inférteis
à procura de serviços de reprodução humana, cada vez
mais aumenta o interesse na aplicabilidade e segurança
dos métodos não invasivos para avaliação da qualidade
oocitária, importante determinante da qualidade embrionária, visando aumentar a segurança e a eficiência
dos procedimentos de RA.
Um dos principais métodos não invasivos destinados à
avaliação da qualidade oocitária por meio da análise do fuso
celular é a MP, que possibilita a visualização de estruturas
birrefringentes em células vivas, sem a necessidade de
fixação ou coloração, permitindo a utilização dos oócitos
analisados por esta metodologia nos procedimentos de
RA13,15,18,25,30,31. A análise oocitária por esta metodologia
poderia ser útil na triagem de possíveis anormalidades,
não só do fuso celular, como, indiretamente, do alinhamento cromossômico, uma vez que, na grande maioria das
vezes, estas duas alterações estão associadas26,32. Alguns
estudos13,23 evidenciaram aumento significativo na taxa de
fertilização, de clivagem e de embriões de boa qualidade
no terceiro dia de desenvolvimento de oócitos com fuso
celular visível, quando comparados àqueles sem fuso celular visível à polarização23. Isso sugere que a visualização
do fuso meiótico oocitário poderia ser um bom preditor
de fertilização pós-ICSI18-22,33 e da qualidade embrionária14,18-23. Entretanto, alguns estudos na literatura não
confirmaram essa correlação, tornando questionável sua
utilização rotineira para a seleção oocitária19,31,33. Como
até o presente não havia estudos avaliando a concordância
entre esta metodologia não invasiva e a MC na predição
de anomalias meióticas oocitárias em humanos, o presente
estudo foi realizado.
No presente estudo, observou-se que 72,7% dos
oócitos com fuso celular não visível à polarização apresentaram anormalidades meióticas à análise confocal,
sugerindo que isso está relacionado a maior probabilidade
de anormalidade meiótica oocitária, como previamente
sugerido por alguns estudos. Todavia, 55,6% dos oócitos
com fuso celular visível à polarização apresentaram-se
como oócitos anormais à análise confocal e somente
44,4% dos oócitos com fuso celular visível à polarização apresentaram-se com fuso e distribuição normal à
análise confocal. A concordância entre os métodos foi de
apenas 51,1%, evidenciando que a visualização do fuso
celular à MP não é uma boa preditora de normalidade
meiótica oocitária, tornando questionável a aplicabilidade desta metodologia na predição não invasiva da
528
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):524-9
qualidade oocitária. Estes achados são concordantes
com os apresentados por Coticchio et al.10, os quais,
ao analisarem oócitos maturados in vivo (frescos e após
descongelamento) pelo Polscope, o outro sistema de
polarização disponibilizado comercialmente, evidenciaram não haver consistência entre a análise pela
metodologia não invasiva e a confocal, sugerindo que
esta metodologia apresentou limitado valor preditivo
do grau de normalidade do fuso meiótico oocitário.
Todavia, no mesmo estudo10, as variáveis analisadas
para a comparação das técnicas foram distintas das
do presente estudo. Foram comparados os valores de
birrefringência do fuso pela análise ao Polscope entre
quatro diferentes configurações de microtúbulos (análise de parâmetros quantitativos e não qualitativos)
e distribuição cromossômica, definidas pela análise
confocal, além das medidas do eixo longitudinal do
fuso avaliadas pelas duas metodologias.
Vale a pena ressaltar que a utilização da MP na prática
clínica prevê a necessidade de aquisição do equipamento
e de softwares, a utilização de placas com fundo de vidro,
cujo custo é significativamente maior que o das placas de
plástico habitualmente utilizadas para a realização da ICSI,
além do treinamento e gasto adicional de tempo pelos
embriologistas, o que, aliado à baixa concordância entre
esta técnica e a MC na identificação das anormalidades
meióticas em oócitos humanos, evidenciada no presente
estudo, faz questionar se a utilização desta metodologia na
rotina das clínicas de RA é realmente custo-efetiva, o que
precisa ser mais bem definido por estudos com maiores
casuísticas e metodologias pertinentes.
Pode-se concluir que a visualização do fuso da MP
não é uma boa preditora na detecção de normalidade
meiótica oocitária quando comparada à MC de elevado
desempenho. A pequena porcentagem de oócitos com
fuso visível à polarização e normais à análise confocal
torna questionável a utilidade desta metodologia como
ferramenta para a seleção não invasiva oocitária para os
procedimentos de RA.
Agradecimentos
Aos funcionários do Laboratório de Reprodução
Assistida do Hospital das Clínicas, Departamento de
Ginecologia e Obstetrícia, Faculdade de Medicina de
Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São
Paulo – FAPESP (2008/58197-6) e Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (474858/2009-0).
Análise invasiva e não invasiva do fuso meiótico de oócitos humanos obtidos de ciclos estimulados: dados preliminares
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Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(11):524-9
529
2013
ABRIL
de 11 a 13 de abril de 2013
XXXVII Congresso de Ginecologia e Obstetrícia
do Rio de Janeiro
Local: Centro de Convenções Sul América
Informações: Tel.: (21) 2285-0892 / 2265-1525
[email protected]
de 19 a 20 de abril de 2013
XVII Congresso Sul - Rio- Grandense de Ginecologia
e Obstetrícia – SOGIRGS
Centro de Eventos do Hotel Serrano – Gramado/RS
Plenarium Organização de Congressos
Fones: (51) 3311-8969 / 3311-9456 / 3311-2578
[email protected]
www.plenariumcongressos.com.br
de 24 a 26 de abril de 2013
46º Congresso de Ginecologia e Obstetrícia do
DF e 7º Congresso Internacional de Ginecologia
e Obstetrícia do DF
Local: Centro de Convenções Ulysses Guimarães
– Brasília-DF
Informações: Secretaria Executiva da SGOB
Tel.: (61) 3245-3681 / 3245-4530 / 9622-1215
[email protected] / [email protected]
www.sgob.com.br
530
MAIO
de 1º a 04 de maio de 2013
VI Congresso Mineiro de Ginecologia e
Obstetrícia / 37º Encontro Mineiro de
Ginecologistas e Obstetras
Local: Minascentro – Belo Horizonte/MG
Realização: SOGIMIG
Organização: (31) 3291-9899 – Consult Eventos
http://cmgo2013.com.br
Pratici
cidaadde,
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Anticoncepcional injetável trim
mestral de ação prolongada.1
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99% de eficácia com apenas 4 aplicações
apl
ao ano.1
Pode ser utilizado por mulheres que estão amamentando.1
Disponível
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apresentações:
sentaçõ
ações:
ões:1,1,6
Depo®-Provera® 150 mg/mL
Depo®-Provera® 150 mg/mL
Contracepção trimestral.1
Contracepção trimestral.1
ampola:
Disponível na
farmácia popular 7
seringa preenchida:
Depo®-Provera® 50 mg/mL:
Tratamento da endometriose
e reposição progestogênica.6
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mestral de ação prolongada.1
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99% de eficácia com apenas 4 aplicações
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ações:
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Depo®-Provera® 150 mg/mL
Depo®-Provera® 150 mg/mL
Contracepção trimestral.1
Contracepção trimestral.1
ampola:
Disponível na
farmácia popular 7
seringa preenchida:
Depo®-Provera® 50 mg/mL:
Tratamento da endometriose
e reposição progestogênica.6
ISSN 0100-7203
2012
Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia Novembro
nº 11
Novembro 2012
volume 34
volume 34
número 11 p. 485 - 530

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