O cinema norueguês
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O cinema norueguês
s ê u g e u r ema no do O cin BEAUTIFUL COUNTRY Subitamente, o cinema norueguês globalizou-se e já não se encontra isolado algures no gélido e tempestuoso norte. O recente interesse global não surge apenas por os filmes estarem enraizados na tradição local, ou por se desenrolarem placidamente num ambiente idílico, tudo isto embelezado e protegido por dinheiro do petróleo. i estem d e m e Jov ELLING no Vietname e nos EUA. Foram escolhidos actores como Nick Nolte, Tim Roth e Bai Ling. “Beautiful Country” foi seleccionado para a principal competição do Festival de Berlim em 2004. Anteriormente, Hans Petter Moland tinha já atraído atenções com “Zero Kelvin” e “Aberdeen”, ambos filmes sobre a auto-percepção masculina. “Beautiful Country” tem como tema os perigos e dificuldades Pelo contrário, os noruegueses ligados ao cinema inerentes às migrações de massas do nosso tempo. começam a sair para o mundo exterior. Como se Mas trata-se também de uma metáfora para a poderia descrever de outra forma, quando um rea- desejada reconciliação após a guerra do Vietname. lizador e uma empresa de produção da Noruega se associam num projecto delineado pelo lendário Um rapaz vietnamita-americano é adoptado depois Terrence Malick (Badlands, The Thin Red Line)? A da guerra, mas deixa a sua aldeia para ir para história não se desenrola na Noruega, mas sim no Saigão em busca da sua mãe biológica. A fuga Vietname e nos EUA. Foram escolhidos actores como continua, terminando num demoníaco navio que Nick Nolte, Tim Roth e Bai Ling. Beautiful Country foi ruma aos EUA. Tim Roth interpreta o diabólico seleccionado para a principal competição do Festival comandante. Depois das provações passadas a bordo do navio, a América não se revela o paraíso de Berlim em 2004. aguardado para os refugiados do barco. E a figura Pelo contrário, os noruegueses ligados ao cinema do pai é diferente daquilo que o rapaz imaginara. começam a sair para o mundo exterior. Como se poderia descrever de outra forma, quando um Nick Nolte tem no filme uma das suas máximas realizador e uma empresa de produção da Noruega criações como actor, num final sem histerias. se associam num projecto delineado pelo lendário “Beautiful Country” revela-se uma odisseia comoTerrence Malick (“Badlands”, “The Thin Red Line”)? vente através de destinos individuais e da nossa A história não se desenrola na Noruega, mas sim era contemporânea. Este ano Moland volta a Berlinalen com Um homem muito gentil (En ganske snill mann), uma comédia estilo gangster finlandesa com elenco estrela de atores, como Stellan Skarsgaard, Bjørn Floberg, Bjørn Sundquist e Jorunn Kjellsby. Invulgar Os filmes noruegueses são hoje invulgarmente populares, não apenas em ciclos de cinema e festivais no estrangeiro, mas também nos cinemas noruegueses. Este pequeno milagre teve origem em 2001; no novo milénio começou a grande diferença. A comédia Elling (Petter Næss) foi nomeada para um oscar. Também o documentário “Cool & Crazy” (Knut Erik Jensen) teve um grande sucesso junto do público e da crítica, tanto na Noruega como no estrangeiro. Mas os maiores progressos só ocorreram depois de 2003. Existem neste momento mais produções norueguesas do que nunca, que são levadas a sério por um público que, até aqui, se contentava com Hollywood enquanto modelo válido de cinema. É impossível transitar pelos círculos sociais sem ter visto o último filme norueguês. As receitas de bilheteira são as maiores dos últimos 20 anos e constituem 22% do mercado. NORWEGIAN FILM INSTITUTE 1 Tradra COOL & CRAZY rios, que formaram e desenvolveram talentos de maneira quase inédita. O documentário tem uma ilustre história no âmbito do cinema norueguês, em especial filmes sóbrios à procura de realismo. Em anos recentes, Sigve Endresen fez vários filmes sobre temas sensíveis que ensombram a vida norueguesa contemporânea: a toxicodependência, o cancro, a histeria das dietas. Endresen criou uma escola própria, caracterizada por um grande talento para se aproximar das personagens, sem as explorar. Outro nome digno de menção é o de Karoline Frogner, que retratou a situação dos Juntamente com o seu amigo, Elling é obrigado vagabundos em “Tradra”. a livrar-se das suas obsessões e da ansiedade social. As inibições de Elling são abrangentes e Mas Knut Erik Jensen tem, ultimamente, levado utiliza fantasias e um estilo vocal extremamente o género ainda mais longe, com os seus filmes pessoal e agudo para escapar a qualquer situação oriundos da região de Finnmark que têm merecido de tensão. O seu amigo é muito “terra a terra,” à a atenção da crítica e sucesso junto do público. sua maneira ingénua. As fabulosas interpretações Muito acima do Círculo Árctico, os membros de fazem com que a ansiedade e aflição das perso- um coro masculino tomam os seus lugares, de nagens sejam retratadam com sensibilidade, ritmo costas voltadas para a neve e o vento, enquanto e humanidade. O escritor Ingvald Ambjørnsen ao fundo o Oceano Árctico se revolve em espuma. conta-se entre os melhores colaboradores de Sob os gorros brancos, as barbas e sobrancelhas filmes noruegueses. Um homem que equaciona a dos homens são lentamente envolvidas por uma crosta de neve e gelo. época em que vive. Em 2001, um ano notável para o cinema norueguês, estreou “Elling”, um filme baseado numa popular série novelesca e que tinha já sido adaptado para os palcos com sucesso. De entre uma população de 4,5 milhões noruegueses, 700.000 decidiram sair de casa para assistir a esta comédia. Mais de meio milhão de alemães viu o filme nos cinemas. Tornou-se também num sucesso no Festival de Bombaim, após uma nomeação para o oscar. Mais tarde, o filme faz um percurso triunfal pela Europa como peça teatral. Em 2004, o homem que esteve por detrás de “Elling”, Petter Næss, realizou uma comédia com matizes ainda mais americanas, no estilo de “American Pie”. “Just Bea” trata da iniciação sexual de raparigas de 16 anos. Næss não fez uma cínica alta. Lançou luz sobre as pressões uniformizadoras e os ideais mais ou menos dúbios a que os jovens se agarram. São temas adequados à comédia. E, neste filme, não há momentos aborrecidos. Ainda em 2004, surgiram produções ainda mais variadas do que em 2003. E surgiram em resultado da proliferação de curtas-metragens e documentá- sensibilidade de um poeta, criando um documentário que atraiu um número recorde de espectadores na Noruega e a atenção internacional, mesmo nos EUA, onde a digressão do coro junto da comunidade norueguesa-americana foi filmada para numa sequela chamada “Cool and Crazy on the Road”, que não teve tanto sucesso, talvez devido às sombras do 11 de Setembro. Em 2004, Jensen fez um terceiro documentário. Desta vez, descreveu com ousadia um grupo de cabaret na região de Finnmark, no extremo norte do país. Cabaret Ártico filia-se na conhecida tradição de burlesco da Europa continental. Pessoas comuns opõem-se às autoridades. Mas também este género de causa comum não obteve sucesso. Apesar da imagem tradicional da Noruega ser confirmada nestes documentários, Jensen está estreitamente ligado à cultura da vizinha Rússia. A influência temática e estética do poeta cinematográfico Andrei Tarkovsky percorre as três longas-metragens que realizou – uma visão mística da realidade, em que abunda o simbolismo e que é frequentemente expressa através de técnicas modernistas. Os três filmes são São duras as vidas dos homens que compõem o “Stella Polaris”,“Queimada pelo Nevoieiro” e “A coro masculino de Berlevåg, tal como descritas Travessia da Escuridão”. neste documentário único chamado “Cool and Crazy”. Luz e sombra, frio e solidão, afecto e visão, O escritor Alf R. Jacobsen, que é também um beleza e temor, estão em destaque, tendo por extraordinário repórter, forneceu as histórias para fundo paisagens geladas, ambientes subtilmente estes três filmes. Sem escritores, o cinema norueevocados e interiores calorosos. Mas uma subtil e guês seria impensável. Haveria menos – muito enérgica perspicácia mantém o filme com os pés menos – filmes. Mais de metade dos filmes feitos na Noruega são obras de realizadores inspirados bem firmes na terra. pela literatura e movidos pelo desejo de criar A vila piscatória de Berlevåg, em Finnmark, como novas interpretações visuais. outras pequenas comunidades rurais norueguesas, é vulnerável. Knut Erik Jensen, ele próprio oriundo Afirmação de uma região isolada, realizou este filme com a 2003, o ano de afirmação para uma nova geração NORWEGIAN FILM INSTITUTE 2 BUDDY de cineastas, não foi isento de controvérsias, apesar da aclamação da crítica e do público. Dizia-se que eram filmes superficiais que iludiam a realidade e que buscavam de forma subserviente agradar ao crescente público. Que ofereciam uma visão parcial de jovens do sexo masculino que recebiam sempre o apoio incondicional dos seus superiores e das suas escolas. Nunca enfrentavam qualquer resistência. Tinham sempre tudo. E não tencionam deixar a juventude para trás, que, segundo alguns, dura até aos 40 anos, sendo rapidamente seguida da velhice. Não tencionam abandonar o “ninho” confortável dos pais. Nem estão dispostos a fazer as escolhas necessárias para construir uma vida independente. E não estão dispostos a assumir qualquer responsabilidade. Nas margens destas comédias, pois é isso que estes filmes são, pairam algumas raparigas. Esperam pacientemente que os rapazes se decidam, antes de resolverem intervir. Afirmava-se que estas comédias eram desprovidas de enredo. Mas, no espelho mágico da comédia, capturam uma mentalidade que é quase tragicómica. O cinema norueguês adopta o ritmo contemporâneo de uma geração. Os jovens noruegueses do presente não vivem tempos heróicos. Uma certa ligeireza irónica tiranizara a anterior década. Consequentemente, é natural que se escolha uma forma de comédia algo protectora e desarmante, para reconquistar a seriedade. As questões são colocadas de forma confortável e não irónica, não para abrir conflitos, mas para os solucionar. Um filme característico deste género é “Buddy”, de Morten Tyldum, uma história sobre a amizade. Os rapazes estão divididos entre duas raparigas e Kitchen Stories vessaram a fronteira para a mais descontraída e vizinha Noruega. Empoleiravam-se em cadeiras de árbitros, ao estilo das que conhecemos dos campos de ténis, discretamente colocadas nos cantos das cozinhas. A partir desta posição, anotavam todos os movimentos que os solteirões As condições são ligeiramente mais optimistas noruegueses descreviam sobre o chão da cozinha. em “Undos”, de Magnus Martens, e em “Jonny Os gráficos resultantes deveriam resultar numa Vang”, de Jens Lien. O filme “A Mãe de Elling”, de utilização mais racional da cozinha. Eva Isaksen, apresenta preocupações menos juvenis. O filme conta o início da história da película Terá, por acaso, isto alguma semelhança com os nomeada para um Oscar, “Elling”, com astúcia e padrões racionais do liberalismo de mercado? num ambiente soturno. Os dois filmes serão seguidos de um terceiro, assinado por Petter Næss após Bent Harmer foi o criador de “Ovos”, em 1995. Tratava-se um filme relativamente marginal das uma passagem por Hollywood. franjas sobre dois irmãos reformados, num típico Os filmes noruegueses já não se distinguem por ambiente rural norueguês. Os críticos mencionaram teorias de autor e uma escrita pessoal, seguindo nomes como Samuel Beckett, Harold Pinter e Buster antes as regras e convenções dos diversos géne- Keaton, numa tentativa de identificar o espírito ros. Temos um filme de terror, “Escuras Florestas” subjacente a esta comédia de baixo orçamento, de Pål Øye, e um “thriller” em estilo de conto seleccionada para a Quinzena dos Realizadores, em de fadas sobre a pressão que a beleza causa Cannes, e vencedora de muitos prémios em todo nas meninas, “O Monstro da Beleza”, de Hilde o mundo. Esta comédia que nunca é pretensiosa, Heyer. Um filme de animação sobre o distinta- e conta com grandes interpretações por parte de mente norueguês “Capitão Sabertooth”, de Stig actores envelhecidos com o seu quê de palhaços. Bergqvist. Uma comédia romântica, “A Mulher da Minha Vida”, de Alexander Eik. Apenas para Em 2003, Hamer venceu o principal prémio da Quinzena dos Realizadores, no Festival de Cannes, nomear alguns dos filmes de 2003. a que Ovos anteriormente concorrera. “Histórias de Cozinha” é um filme excêntrico e burlesco. O Autor Bent Harmer O melhor filme norueguês deste ano de afirmação Faz alusões oblíquas a Jacques Tati, pedindo aos está repleto de críticas à racionalidade objectivista voluntaristas que querem melhorar o mundo para da década de 1950. Nesta altura, era suposto a deixarem as pessoas comuns em paz. Hamer tem social-democracia regular tudo, para benefício uma inteligência generosa mas muito acutilante. A de todos, com o seu planeamento social bem- cenografia, as interpretações, para além de outros factores, ajudaram “Histórias de Cozinha” a ganhar intencionado, firme e pouco imaginativo. inúmeros prémios e muitas merecidas críticas posiAlguns empedernidos observadores suecos atra- tivas, tanto na Noruega como no estrangeiro. ou fogem às responsabilidades da paternidade, ou evidenciam fortes sintomas de depressão juvenil. Têm de se adaptar a um mercado de trabalho que, subitamente, não está aberto a jovens com boas qualificações académicas. NORWEGIAN FILM INSTITUTE 3 Kristin LavransDATTER E essas críticas confirmam a impressão de que os cineastas noruegueses conhecem a fundo o seu meio; sendo o cinema a forma natural de expressão da presente geração. Para além disso, escolhem actores que dão seguimento às ideias e observações com naturalidade. O fascínio da literatura O cinema norueguês é impensável sem escritores e sem a literatura. Os escritores são utilizados de acordo com quem está em voga. Durante algum tempo, foi o taciturno simbolista, natural de Telemark, Tarjei Vesaas, a fornecer o material. Mais tarde, foi o inquietamente urbano Knut Faldbakken. Depois surgiu Lars Saabye Christensen, que não só reescreveu Knut Hamsun para as telas, como adaptou ao cinema os romance que escreveu na adolescência, passados na zona ocidental de Oslo. O dramaturgo Jon Fosse foi representado em palcos de todo o mundo, sendo aclamado como o novo Henrik Ibsen. As suas obras são provocadoras, o que se tornou evidente no Festival de Berlim de 2004, com a versão alemã de “Canção da Noite”, de Romuald Karmakar. A sua forma severa e as gélidas emoções criaram bastante agitação. A indústria cinematográfica norueguesa soube aproveitar os três laureados com prémios Nobel do país, que, estranhamente, não incluem o dramaturgo Henrik Ibsen. Foi necessária a intervenção da única personalidade cinematográfica norueguesa de dimensão internacional, para passar o épico drama de Sigrid Undset, “Kristin Lavransdatter”, para o grande ecrã. Liv Ullmann juntou-se ao brilhante operador de câmara sueco de Ingmar Bergman, Sven Nykvist, e a um elenco de actores noruegueses de primeira ordem, na sua O TELEGRAFISTA interpretação de três horas do primeiro volume da rado como mentalmente perturbado, o que ele se trilogia medieval de Undset, pela qual a autora apressou a negar através da publicação de um novo e brilhante romance, “On Overgrown Paths”. ganhou o Prémio Nobel da Literatura em 1928. Uma Época de Ouro Este filme foi o projecto mais caro e controverso da história do cinema norueguês e a própria Ullmann afirmou que foi o trabalho mais difícil que já levou a cabo. Mas o filme varreu a oposição para fora dos ecrãs nos cinemas do país, criando a atmosfera de uma época de ouro. Os noruegueses afluíram às salas de cinema para ver o tempestuoso encontro da corajosa Kristin com o verdadeiro amor, nos tempos da pré-reforma. Foi feita uma versão mais curta para o mercado internacional. Knut Hamsun é o Nobel da literatura norueguês que mais aliciou os cineastas, tanto pela sua vida como pela sua obra. Em 1996 estreou um longo filme biográfico – inicialmente criado como série televisiva – com três actores a encarnarem o romancista, da juventude à velhice. “O Enigma” foi realizado por Bentein Baardson, e é uma tentativa de compreender este multifacetado escritor, através de uma visão totalmente norueguesa. O sueco Jan Troel realizou uma dramatização do controverso romance documental “O Processo Contra Hamsun”, com Max von Sydow no principal papel e a actriz dinamarquesa Ghita Nørby no papel da sua mulher, Marie. Hamsun apoiou Hitler durante a Segunda Guerra Mundial, mas pediu às forças ocupantes nazis que poupassem as vidas dos noruegueses condenados à morte. Quando a guerra acabou, este norueguês, internacionalmente conhecido, foi levado a tribunal. O velho patriarca envelhecido foi decla- O julgamento foi muito embaraçoso e emotivo para todos os envolvidos. Por essa razão, a história teve de ser filmada por um estrangeiro. Contudo, controvérsias à parte, não há dúvida de que von Sydow interpreta Hamsun com grande dignidade. Trata-se de um homem que viveu no seu mundo à parte, mas que enfrentou o seu julgamento como um homem. Apesar de todos os aspectos políticos e legais, o filme é sobretudo uma história de amor comovente e trágica. Hamsun é o romancista mais adaptado na Noruega. Só os dramas de Ibsen foram mais vezes passados para o grande ecrã. O primeiro filme baseado numa história de Hamsun data de 1921, quando o cineasta dinamarquês Gunnar Sommerfeldt realizou uma versão de The “Growth of the Soil”, o romance que Hamsun ganhou o Prémio Nobel. A película foi filmada no belíssimo cenário do norte da Noruega e foi considerada perdida durante muitos anos, até ser redescoberta nos EUA e restaurada na Holanda pelo Instituto Norueguês de Cinema. Pode ser descrita como uma ilustração do romance e é hoje frequentemente exibida com a partitura original, escrita pelo maestro e violinista Leif Halvorsen. Nos tempos do cinema mudo, a partitura era enviada, no papel, para os vários cinemas. No ano seguinte, 1922, foi estreado o primeiro filme inteiramente norueguês baseado numa obra de Hamsun. Tratava-se de “Pan – Cinco Actos e um Epílogo”. Devemos mencionar aqui que o génio cinematográfico dinamarquês Carl Th. NORWEGIAN FILM INSTITUTE 4 HERMAN Dreyer filmou por duas vezes na Noruega. “A Noiva de Glomdal” simbolizava o romantismo nacional oriundo das profundezas da Noruega rural. Um abastado lavrador pretende que a filha case com um homem rico, mas ela ama outro homem. Neste filme Dreyer já revelava indícios do génio que demonstraria alguns anos mais tarde com “O Processo de Joana d’Arc”. O dinamarquês Henning Carlsen foi responsável pela melhor dramatização de um romance de Hamsun, “A Fome”, com o actor sueco Per Oscarsson numa interpretação inesquecível. Há alguns anos atrás, Carlsen regressou com “Pan/ Duas Penas Verdes”, que não estava ao mesmo nível, mas revelava, ainda assim, a atracção que a virtuosidade linguística de Hamsun ainda exerce sobre os cineastas, sejam eles noruegueses, dinamarqueses ou de qualquer outra nacionalidade. Os realizadores parecem sair-se melhor com as obras mais pequenas de Hamsun, como “O Telegrafista”, que se baseou no conto “Sonhadores”. O filme de Erik Gustavson foi seleccionado para representar a Noruega na principal competição do Festival de Berlim, em 1993. Foi a primeira vez em 19 anos que um filme norueguês obteve semelhante reconhecimento no segundo festival mais prestigiado do mundo. “O Telegrafista” não é um filme especialmente original. Mas transporta-nos para a bela costa de Nordland e para a ilha de Hamsun, Kjerringøy, território de conto de fadas por direito próprio. Os espectadores que conhecem o filme dinamarquês (vencedor de um Óscar) O “Festim de Babette” (que a escritora situara no norte da Noruega, mas que o realizador Gabriel Axel deslocou para O OUTRO LADO DO DOMINGO a muito dinamarquesa Jutlândia) e a encantadora comédia de perfume Chekoviano “Olhos Negros”, do russo Nikita Mikhalkhov, sentir-seão em casa – no que diz respeito à atmosfera do filme – na costa de Nordland e na ilha de Hamsun, Kjerringøy. E isso não se deve apenas ao grande desempenho do sueco Jarl Kulle (que também entrou em O Festim de Babette), de certa forma parecido com o de Marcello Mastroianni em “Olhos Negros”. Erik Gustavson, com a sua infalível elegância, sente-se claramente feliz na companhia da personagem principal do filme, o mulherengo e sonhador Rolandsen – o irresistível telegrafista, que cria um invento que virará a sua vida do avesso – e das variadas personagens que o rodeiam. A fotografia de Philip Øgaard não cede ao espalhafato, apesar de as paisagens de sonho do norte da Noruega, com os seus afiados picos que se erguem do mar, convidarem constantemente a exagerar no pitoresco. Ao invés, o filme é uma espécie de pintura idílica em tons pastel, retratando o estival norte da Noruega, longe do frio e tempestades tão vulgares nesta austera parte do mundo. Assim, o cinema norueguês olha sempre para o exterior. Hoje não há praticamente nenhum filme em produção que não envolva a cooperação nórdica. E os laços com os muitos programas de produção cinematográfica do resto da Europa tornam-se cada vez mais estreitos. Inspiração internacional Os cineastas noruegueses têm um justificável fascínio pelo norte da Noruega. Em 2002, a versão cinematográfica do livro da escritora do norte da Noruega Herbjørg Wassmo, “O Livro de Dina”, estreou-se com o título “Sou Dina”. Gerard Depardieu interpretou um dos papéis principais, a sueca-norueguesa Marie Bonnevie interpretou Dina. O dinamarquês Ole Bornedal (“O Guarda Nocturno”) realizou este filme pan-nórdico, que custou mais de 100 milhões de coroas norueguesas. Também este filme foi realizado na região de Hamsun. O melhor de entre estes foi seleccionado para a principal competição do Festival de Berlim, onde ganhou o prémio Anjo Azul em 1995. Foi o primeiro de uma série de prémios internacionais conferidos ao realizador Marius Holst (da escola de Gustavson) e ao seu sombrio drama mefistofélico “Que Eu Morra Aqui Ceguinho”. Este filme fala de crescer em Oslo e do aparecimento do mal num cenário norueguês do dia-a-dia. Foi escrito por Lars Saabye Christensen. Erik Gustavson pertence ao grupo de cineastas noruegueses que procurou horizontes mais vastos. No seu primeiro filme, “Blackout”, copiou o estilo das sombrias tragédias americanas da década de 1940, “o film noir”. Vários filmes mais tarde, encontramos a comédia “Herman”, um filme pleno de uma encantadora tristeza e bastante universal. A história de Gustavson é retirada da Oslo da sua infância e baseia-se no romance de Lars Saabye Christensen. “Herman” traça a história de um menino de 10 anos que perdeu o cabelo. O filme reflecte também o facto de cerca de metade dos filmes noruegueses girarem em torno das crianças e dos jovens. Tal como os outros países nórdicos, a Noruega dá uma ênfase considerável a temas ligados aos mais jovens, embora frequentemente em filmes adequados a toda a família. Gustavson fez também uma elogiada série de televisão baseada em “O Mundo de Sofia”, o NORWEGIAN FILM INSTITUTE 5 NOVE VIDAS “bestseller”de Jostein Gaarder dirigido a um públi- montanha russa emocional que é a mente dos co jovem. O filme foi bem trabalhado e oferecia uma adolescentes. boa introdução ao objecto filosófico do romance. Frida foi escrito por Torun Lian, cuja estreia na reaOs filmes sobre os detectives adolescentes Pelle e lização, em 1998, fôra uma sóbria tragicomédia Proffen foram extremamente populares. O primei- baseada no seu próprio romance “Só as Nuvens ro, “Morto na Estação de Oslo”, realizado por Eva Movem as Estrelas”. A história segue a jovem de Isaksen e estreado em 1990, conquistou recordes 11 anos Maria, que vê o seu irmão mais novo morde audiências com o seu retrato vivo de adoles- rer de cancro e a sua mãe a ser tolhida por uma centes com um passado de dificuldades, em que profunda depressão. “Nuvens” é um anti-filme de os conflitos entre os pais e os abusos de drogas acção, delineado pelo bom-senso e a sensibilidafaziam parte integrante do dia-a-dia. A sequela do de. Ganhou prémios em todo o mundo, porque filme, “Mentiras Letais”, que transporta os nossos não tinha medo de falar da vida com seriedade detectives adolescentes para o campo de batalha mas também com uma dose de humor – uma ambiental, foi também muito bem acolhido. O ter- mistura libertadora. Lian regressará em breve com ceiro filme da série chamou-se “Os Lobos Azuis”. o seu filme seguinte “Selma e Andy”. Todos os filmes foram escritos pelo experimentado Um cineasta Sami Ingvar Ambjørnsen. Do planalto de Finnmark emergiu há quase 20 Mas o mais encantador destes filmes sobre o anos um grande talento cinematográfico, Nils crescimento é “Frida – Directamente do Coração”, Gaup. Gaup, que pertence ao povo Sami realizou da realizadora Berit Nesheim. Frida, que original- muitos filmes. O seu primeiro filme é o melhor mente surgiu numa série de televisão norueguesa, até à data, mas o seu último projecto é um filme é uma adolescente que vive com a irmã e a mãe passado em Finnmark que conta a história verísolteira. Frida é o retrato vivo da adolescência dica de uma rebelião Sami contra as autoridades inquieta, tanto na linguagem corporal como no norueguesas, em 1852. discurso. A inesquecível interpretação de Maria Kvalheim, no papel de Frida, fez dela uma estrela A estreia de Gaup, “The Pathfinder”, foi filmada da noite para o dia, na Noruega e também no em Cinemascope em 70 milímetros, que nunca estrangeiro. “Frida” atraiu bastantes atenções tinha sido utilizado nos países nórdicos. O nos festivais internacionais, onde ganhou vários filme baseia-se numa lenda do século XIII e os prémios, incluindo do público. Na Noruega, o filme diálogos decorrem na língua indígena do povo Sami. Esta jogada arriscada, em que poucas arrastou famílias inteiras para os cinemas. pessoas acreditavam, resultou numa nomeação Nesheim foi nomeada para um Oscar, pela terceira para um Oscar e num sucesso de bilheteira a vez no caso de um filme norueguês, pelo seu filme nível internacional. Atraiu um invulgar número “O Outro Lado do Domingo”, outra demonstra- de espectadores, para um filme norueguês, e ção agridoce dos seus conhecimentos sobre a impressionou a crítica. Toda esta publicidade levou a que a subsidiária da Disney, a Buena Vista, reparasse em Gaup. Este grande estúdio acabou por decidir apoiar a sua nova produção, “O Naufrágio”. Não se tratava de uma lenda Sami sobre um rapazinho que utiliza o seu engenho para derrotar um ataque de forasteiros, com combates contra ursos ao estilo dos velhos westerns de Hollywood de permeio – das poucas ocasiões em que os índios estavam na mó de cima. Ao invés, trata-se de uma bela narrativa, amada pelos estudantes há mais de um século, que conta a história de um jovem Robinson Crusoe norueguês que, nas suas viagens pelo mundo, chega ao Pacífico Sul, o que oferece amplo lugar para o exotismo. Gaup realizou também “A Estrela do Norte”, uma aventura em que os campos em redor de Oslo passam pelo Klondike da corrida ao ouro americana, “Tashunga”, e uma versão bastante sóbria da juventude do romancista Aksel Sandemose, “Porto da Miséria”. Gaup voltou ao planalto de Finnmark com a rebelião de Kautokeino, um grande sucesso de audiência na Noruega em 2008. Ele resgata um evento esquecido de 1852, quando os Samis se revoltaram contra as autoridades norueguesas. A rebelião foi brutalmente contida. Este pouco glorioso incidente da história da colonização da Noruega é contado sem rodeios, usando modelos como Kurosawa, Leone e John Ford e filmes de faroeste. Igual o filme O guia (Veiviseren), o filme sobre um povo indígena perseguido quase ganhe forma de uma lenda. De qualquer jeito o filme é uma adaptação muito pessoal de um parte da história, em neve, nevascas e sangue. Contém contrastes velozes, escolhas existenciais que levam à traição e maldade, heroísmo e destino, NORWEGIAN FILM INSTITUTE 6 FANT PINCHCLIFF Grand Prix MULHERES sangue e fogo. E com bandos de renas disparan- montanhas. Quando a neve finalmente derrete do sobre a planície branca cintilante com uma luz nas terras baixas, os noruegueses sentem a sua falta e sentem-se impelidos a deixar as suas casas do dia mágico na tela. e a subir a grandes altitudes em busca de neve A natureza como fonte de inspiração fresca. A correlação entre paisagem e temperaAs paisagens e os sons das montanhas e do mar mento é próxima e tangível, representando um são características do cinema norueguês e estão elemento importante na arte dos cineastas noruereflectidas com grande autenticidade nos filmes de gueses, mesmo quando a paisagem não é serena Gaup. A história do cinema norueguês começou e o temperamento é consequentemente sombrio, com um drama marítimo. Em 1907, foi lançado ao quase depressivamente introvertido, ou quando é mar um barco em Frognerkilen, uma sossegada heróico e as personagens lutam contra o vento e enseada no coração de Oslo, onde o mar, verdade o clima, redes de pesca vazias e tempos difíceis. seja dita, estava tão calmo como um lago. Mas o resultado, “Perigos da Vida de um Pescador – Um Nomeações para Oscars drama no Oceano”, forneceu um espectáculo Num contexto internacional, os filmes noruetempestuoso ao retratar as duras condições de gueses tiveram mais sucesso quando narraram vida dos noruegueses ao longo dos séculos, ao aventuras e contaram os feitos dos grandes explodefrontarem a fúria dos elementos. Comparado radores polares como Roald Amundsen e Fridtjof com “Pathfinder” e a sua destreza fotográfica, Nansen. Sintomaticamente, o único Oscar que a que enche o cinema de parede a parede, este Noruega ganhou foi atribuído a um documentário primeiro filme norueguês parece extremamente sobre a viagem da jangada “Kon-Tiki” no Pacífico. datado, mas a escolha do tema é muito adequada. De certa forma, Thor Heyerdal seguia as pisadas do explorador e cientista Fridtjof Nansen: as ondas A indústria cinematográfica norueguesa recebeu quebravam-se sobre a embarcação como se esta a dádiva de uma natureza fantástica, como que estivesse nos bancos de pesca noruegueses. Seis criada por um director artístico magnânimo, com anos depois, em 1957, a Noruega obteve outra gosto pelo drama criado por contornos ondulados nomeação para um Oscar, mas Arne Skouen e o e contrastes abruptos. Os países nórdicos têm seu filme “Nove Vidas” foram vencidos pelo granuma sólida tradição de filmar paisagens como se de Fellini. “Nove Vidas” retrata também uma luta fossem quadros numa tela. Contudo, os directores pela sobrevivência, contra os elementos. A acção de fotografia noruegueses, que se contam hoje decorre durante a ocupação alemã da Noruega entre os melhores do mundo, usaram a natureza e descreve como um soldado colocado na costa de forma mais comercial do que os seus congéne- norte da Noruega luta contra o mar, a neve e res suecos, por exemplo. Os noruegueses possuem as tempestades, para cruzar as montanhas rumo uma afinidade quase mística com a natureza, na à neutral Suécia. O filme narra também a forma sua forma supostamente simples, original e impla- como ele é ajudado ao longo do caminho. cável. A experiência mais bizarra que se pode ter neste país é a peregrinação anual da Páscoa às Foi o extremo norte da Noruega – e o seu povo indígena – que proporcionaram o cenário para a nomeação seguinte de um filme norueguês para um Oscar, 30 anos mais tarde. Apesar de “Pathfinder” estar repleto de acção e acrobacias, é acima de tudo uma celebração da humanidade persistente e quase heróica, em que a câmara demonstra com amor o enorme poder da natureza. “O Outro Lado do Domingo”, de Berit Nesheim, por outro lado, tratava das conflituosas paisagens interiores. Em 2002, também “Elling” foi nomeado. Duas gerações A Noruega é desde sempre uma ‘poetocracia’ onde as vozes dos poetas soam sempre mais alto. Todos os cantos do país fomentaram algum notável poeta que influencia a agenda local ou que tenta entusiasticamente moldar a sociedade de acordo com a sua perspectiva. A indústria cinematográfica não produziu muitos indivíduos desse calibre. Durante muito tempo, os cineastas ficaram-se pelas formas populares de narrativa e foram ostensivamente desprezados por isso. A investigação demonstra neste momento como esse veredicto foi injusto. Mas é fácil compreender porque é que os cineastas se sentiam intimidados ao serem confrontados com sumidades da literatura como Knut Hamsun, o escritor mais vitalista que se pode imaginar, ou com o mais sombrio Henrik Ibsen, que reflecte melhor do que ninguém o facto de a Noruega ser a terra do mérito regulado, mais do que da alegria jovial. Contudo, é de notar que o neto de Ibsen, cujo outro avô era o dramaturgo, poeta e comentador social Bjørnstjerne Bjørnson, foi um cineasta inteligente e inovador. Tancred Ibsen, que por razões óbvias era conhecido como o ‘bi-neto’ e que sem dúvida sofreu com isso, trabalhou em vários géneros durante quase 40 anos. Este Ibsen NORWEGIAN FILM INSTITUTE 7 THE PATHFINDER movia-se constantemente entre um registo popular com uma subtil técnica narrativa. A intencionalidade de Skouen nunca esteve em dúvida, nem e outro mais sério. a sua excepcional segurança estilística, tal como Muitas pessoas acham que “Gjest Baardsen”, exemplificada em “Cold Tracks”, de 1962. Neste de Tancred Ibsen, uma optimista aventura sobre filme, um guerrilheiro da resistência durante a um alegre Robin dos Bosques à norueguesa, é Segunda Guerra Mundial efectua uma tentativa ainda hoje o melhor filme norueguês, apesar de desesperada para resolver um amor traído, mas um ter sido feito em 1939. E não apenas porque fatal erro de julgamento nas montanhas cobertas espelha características norueguesas fundamen- de neve da Noruega custa a vida a 12 refugiados tais, tais como a resistência dos espíritos livres à em fuga das forças ocupantes. Trata-se de um bom autoridade e burocracia, mas também porque as exemplo do tipo de realismo moral que caracteriza imagens das cálidas noites de Verão e da brisa as grandes obras de Skouen. fresca da montanha são um bálsamo para a alma. A Associação Norueguesa de Críticos de Cinema A carreira de Skouen terminou em 1969 com o decidiu, com a autorização de Tancred Ibsen, seu primeiro filme colorido, fotografado por Sven chamar ao prémio para melhor filme do Festival de Nykvist. A história é baseada num romance de Haugesund, norueguês ou estrangeiro, o Prémio Johan Falkberget, que retratava com ternura as vidas de pessoas comuns que trabalhavam nas Gjest Baardsen. Não foi por coincidência. minas de Røros. Então, tal como agora, o que é No ano anterior, Ibsen realizara um filme baseado importante num mundo gelado e inóspito é conseem “Fant” (“Vagabundo”), de Gabriel Scott, na guir criar algum calor humano e relações de estima região de Arcadia, um paraíso de Verão situado mútua. Liv Ullmann interpretou “An-Magrit”, uma na costa sul da Noruega. Mas Fant é uma história forte e enérgica carvoeira que se recusa a ser trasobre “fanter”, ou vagabundos, povo nómada tada como uma besta de carga sem sentimentos. É que viajava em pequenos barcos pelas vilas pis- o melhor papel que Ullmann já desempenhou num catórias, tendo a fama de amigos do alheio. O filme norueguês. actor Alfred Maurstad, que interpretou também Gjest Baardsen, fornece mais um retrato vibrante, Em 1949, a primeira realizadora norueguesa, Edith astucioso e duro. Um fragmento da história social Carlmar, fez a sua espectacular estreia. Mais tarde da Noruega acompanhado de uma boa narrativa. ganhou prestígio com uma série de inteligentes comédias, muitas vezes com temáticas sociais. ”A Outro grande pioneiro foi Arne Skouen, o acuti- Morte é uma Carícia” é um “film noir” extremalante colunista do diário liberal “Dagbladet”, que mente sofisticado, sobre uma arrebatada paixão realizou um total de 17 filmes entre 1948 e 1968. tendo como pano de fundo um dia-a-dia cinzento, Para além de “Nove Vidas” e de outros dramas revelando uma loucura oculta que ultrapassa passados durante a guerra, conquistou prestígio barreiras sociais. O filme foi alvo de um renovado com uma série de dramas contemporâneos, com interesse em anos recentes, tanto em França como temas controversos, sob a forma de documentários. na Grã-Bretanha e EUA. O realizador combinava a acutilância intelectual O único verdadeiro modernista do cinema norueguês, Erik Løchen, realizou “A Caça” em 1959, na altura em que a nova vaga francesa chegou à Noruega. Na montagem ele joga elegantemente como o tempo e o espaço, o sonho e a realidade, abandonando o cronológico e o causal, que sempre confinaram os filmes, incluindo os noruegueses. Os filmes posteriores de Løchen seguiam o credo de Jean-Luc Godard, de que os filmes deviam ter um princípio, um meio e um fim, embora não necessariamente por essa ordem. E Løchen afirmou que o seu filme “Remonstrances”, que consiste em cinco rolos de 20 minutos, pode ser exibido por qualquer ordem. O que daria um total de 15.750 versões diferentes. Para criar espaço para Løchen e para outros cineastas mais experimentais, foram criados vários esquemas de financiamento público. São uma condição necessária num mercado cinematográfico pequeno como a Noruega. Sem eles, teria sido completamente impossível desenvolver o cinema enquanto forma de arte neste país. Animação Os filmes para crianças são uma área importante, que produziu resultados excelentes. O facto de os filmes do animador Ivo Caprino se destinarem, ou não, a crianças, está aberto a discussão. Criou o seu próprio mundo de marionetas e o seu tema favorito são os contos populares noruegueses. Este multifacetado artista, resposta norueguesa a Walt Disney, criou talvez o melhor filme norueguês dos últimos 25 anos, “Pinchcliff Grand Prix”. O filme combina o matreiro humor rural com as mais sofisticadas técnicas de marionetas, fazendo deste filme uma obra-prima que, para um filme norueguês, atraiu muitos espectadores. “Pinchcliff” foi NORWEGIAN FILM INSTITUTE 8 INSOMNIA JUNK MAIL A FEBRE DA CABANA talento com o filme sobre “Jostedalsrypa”, a única rapariga de uma pitoresca aldeia nas montanhas do oeste norueguês a sobreviver à Peste Negra, por volta de 1350. “Mulheres”, estreado em 1975, marcou a ascensão do feminismo no cinema norueguês, com uma inovadora comédia improvisada sobre três ex-colegas de escola que se encontram numa reunião e trocam histórias de vida e risinhos femininos. Em 1985 surgiu A longa-metragem de animação “Gurin e a Cauda “Mulheres Dez Anos Depois”, com um tom mais da Raposa”, com os seus desenhos vagamente sombrio e desiludido, mas com a espontaneidade, inspirados na Disney, foi lançado em 1998. Tal embora mais cautelosa, ainda intacta. como “Pinchcliff”, o filme baseia-se nas personagens ligeiramente barrocas e alegremente anár- Breien continuou a fazer os seus instantânequicas de uma aldeia, criadas pelo humorista e os sobre as vidas das três mosqueteiras em artista Kjell Aukrust. Rapidamente se tornou num “Mulheres III”, de 1996, em que o trio está grande sucesso de público, apesar de não possuir prestes a chegar aos 50 anos. Foi o menos bem a qualidade artística de “Pinchcliff”. Mais tarde, sucedido dos filmes, mas a série cria um registo vimos “Karlsson no Telhado”, também uma pro- ficcional das vidas e tempos das mulheres noruedução de John M. Jacobsen, baseada nos livros de guesas, através de três décadas, único na história Astrid Lindgren, e também “Capitão Sabertooth”, do cinema internacional. a versão animada das aventuras de um pirata Em 1979, Breien participou na competição prinnorueguês extremamente popular. cipal do Festival de Cannes com a comédia “Parente”, de certa forma alegremente inspirada Uma nova geração Inspirada pela Nova Vaga Francesa e por outras na música de Rossini para “La Gazza Ladra”, torrentes vitalizantes que varreram o mundo do mas que também exemplifica a actual ganância cinema na década de 1960, emergiu uma nova norueguesa, com piscadelas de olho a Ibsen. geração. Gente que não ia ao cinema apenas para Breien ganhou prémios no Festival de Veneza, em ver as últimas curiosidades, mas que incorporava os 1982, com “A Caça à Bruxa”, um filme vagamente filmes na sua maneira de pensar. Alguns chegaram inspirado em Dreyer, que mais uma vez regressa a ir para o estrangeiro estudar cinema. Talvez a às montanhas da Noruega medieval, mostrando figura mais proeminente seja Anja Breien, que une uma mulher no papel de vítima. Em 1990, Breien a espontaneidade dos sentimentos a um equilíbrio regressou com “Era Duas Vezes”, um drama académico da forma. Aspirava a ser física nuclear, romântico envolvendo Don Juan em Oslo. mas acabou numa escola de cinema em Paris. Os anos oitenta A sua afirmação surgiu em meados dos anos Quando observados em perspectiva, os multifaceta70, depois de se ter afirmado como um grande dos anos 80 – nunca houve tantas reviravoltas na dobrado para 16 línguas, um feito sem precedentes para um filme norueguês. Caprino já antes passara vários contos populares noruegueses para curtas-metragens tão intemporais como “Pinchcliff”. O norueguês de nome italiano é um contador de histórias cujo trabalho será exibido nos cinemas e na televisão noruegueses durante inúmeros anos. indústria cinematográfica norueguesa – podem ser claramente divididos ao meio. Na primeira metade, o protagonismo era das mulheres e crianças, um triunfo do feminismo. Para além de Breien, Laila Mikkelsen estava, na sua forma serena, em grande forma, com o seu filme “Crescimento”, sobre a criança de uma das chamadas ‘cabras alemãs’ durante a ocupação alemã da Noruega. Também este filme foi distribuído no estrangeiro, embora não tão amplamente como “Mulheres” anos antes. A figura mais eminente era a modelo, actriz, argumentista e realizadora Vibeke Løkkeberg. A pessoa mais fotogénica da Noruega demonstrou possuir um talento belo e selvagem, com A “Traição” estreado em 1981, uma obra neo-realista norueguesa com as cores ricas da zona pobre da Bergen do pós-guerra, onde um mundo estranho e frágil é observado através dos olhos distorcidos de uma criança. A mesma visão infantil está, até certo ponto, presente no incestuoso drama “O Selvático”, de 1986, que, tal como “A Traição”, foi exibido no Festival de Cannes. É uma espécie de canção folk cinematográfica, que foi ampliada para as câmaras, até se tornar numa ópera de cariz wagneriano oriunda do ventoso oeste da Noruega. Mesmo no fim dos anos 80 chegou outra promissora estreia. Apesar do impacto internacional de Martin Asphaug não ter sido tão grande como o de Nils Gaup com “The Pathfinder”, ele venceu também o prémio nórdico para melhor novo realizador com o seu filme “Uma Mão Cheia de Tempo”. Neste filme, o realismo moral mistura-se com o simbolismo e o realismo, ou realismo mágico. Qual foi a última vez que assistimos a um filme norueguês tão pleno de fantasia que até arcanjos usou? Talvez estes malabarismos com tempo e espaço tenham tido uma influência libertadora nas ambições artísticas de outros. NORWEGIAN FILM INSTITUTE 9 DRAGON FLIES invulgares e significativas. Durante o Festival de Cannes de 2002, “Descrente” foi o grande favorito para ganhar a Palma de Ouro, mas acabou derrotado. Subsequentemente, granjeou grande admiração em todo o mundo, apesar de na Noruega os elogios nãos serem unânimes. Os filmes posteriores de Asphaug não atingiram o mesmo elevado nível, incluindo obras para crianças e adolescentes, tal como o popular “Mentiras Letais” e o imaginativo e visualmente marcante Svampe. A partir daí, emigrou para a Suécia, onde realiza séries televisivas de alta densidade, estando agora de regresso com o thriller “Andreaskorset”. deu a ambição artística. Muitas pessoas se questionavam porque é que os contribuintes haviam de pagar os riscos que outros resolviam correr com uma câmara, ou qual era o sentido de concorrer com Hollywood segundo as suas próprias regras. Apenas “The Pathfinder” foi bem sucedido, e só porque explorou a identidade Sami, mantendo os seus pés firmemente plantados no chão gelado. Os rapazes voltam ao cinema Svend Wam e Petter Vennerød criaram uma longa série de filmes rebeldes, fazendo guerra à crítica e recebendo o forte aplauso do público. Autointitularam-se anarquistas e atacaram violentamente o sisudo realismo social que muitos crêem ter distinguido os anos 70 e 80. Os seus melhores filmes são “Eles e Nós” (1976) e a trilogia sobre a geração de 1968: “Futuro Aberto” (1983), “Adeus, Ilusões” (1985), e “Castelos no Ar” (1986). Contudo, uma obra com o estranhamente anónimo título “X” exibia uma síntese entre os princípios masculinos e femininos. Utilizando uma mistura de fotografia a cores e a preto e branco, o realizador de documentários Oddvar Einarson criou uma sensação de estranheza, de quem se encontra no planeta errado. Oslo foi retratada como uma paisagem lunar. A poética fotografia foi um pouco inspirada pela forma como o grande Tarkovsky retratava o mundo após uma catástrofe, um deserto espiritualmente atormentado. Esta obra – que oferece também uma banda sonora rock quase inaudível, que procura sugerir um possível amor entre adolescentes ainda não contaminados pela desolação do Posteriormente, Hollywood recriou “Insomnia”, de ambiente circundante – recebeu o prémio especial Skjoldbjærg, com Al Pacino como protagonista e com o Alaska como pano de fundo. do júri no prestigiado Festival de Veneza. Os homens regressaram com renovada força em meados dos anos 80. A antítese do feminismo foi “O Cinto de Orion”, imbuído de uma acção musculada e passado num cenário árctico, com ecos de política internacional e uma evocativa banda sonora. Este drama sobre a sobrevivência foi seguido de várias incursões no género do suspense. Pela mesma altura, surgiu a “sociedade limitada” como veículo para o financiamento de filmes. Era suposto este mecanismo criar uma Hollywood na Noruega do “boom” do petróleo. Dos países de língua inglesa chegavam cineastas que não encontravam apoio financeiro nos seus países, o que não acontecia por acaso. Na Noruega encontravam-no, pelo menos até tudo desmoronar. Esta situação proporcionou bastante entretenimento aos leitores de jornais, enquanto durou. O apelo comercial resultou também num melhor contacto com o público e num crescente apoio aos filmes nacionais e ao cinema em geral. Norwave A influência de Tarkovsky pode ser bem percebida em “Para um Estranho”, de Unni Straume, um filme onírico, de sabor russo e imagens inebriantes. Straume foi convidada para o Festival de Cannes com a sua interpretação de “O Sonho”, de Strindberg, uma ambiciosa experiência. E, pela primeira vez desde 1969, o nome de Liv Ullmann constava do elenco de um filme norueguês, o que é sintomático das oportunidades desperdiçadas pelo cinema do norte. Desde “Kristin Lavransdatter”, que Ullmann abandonara a Noruega para realizar filmes e séries de televisão na Suécia, com base em argumentos de Ingmar Bergman. Embora pareçam algo difíceis de encaiMas, por entre tantas experiências com estilos, xar no cinema Norueguês, tanto “Confissões como géneros, ornamentos e fragmentos, quase se per- Descrentes” demonstraram possuir qualidades Em 1997, dois realizadores noruegueses estreantes foram seleccionados para a Semana da Crítica no Festival de Cannes, de entre um total de sete participantes internacionais. “Insomnia”, de Erik Skjoldbjærg é um filme essencial para se perceber aquilo que foi designado como “Norwave”, uma espécie eficaz de “film noir” sob o sol da meianoite, na capital do norte da Noruega, Tromsø, com uma atmosfera internacional. É tanto um thriller como um estudo psicológico de um detective da polícia que não consegue dormir, acabando por cometer um erro fatal que lhe torna a vida num caos. Aqui, o protagonista é o caos moral. Elegante e significativo a vários níveis. Pål Sletaune venceu o prémio da Semana da Crítica com o seu filme “Junk Mail” e, tal como Skjoldbjærg, conquistou o reconhecimento internacional. “Junk Mail” é uma desbragada “comédia-thriller” que tem lugar na zona mais degradada da cidade de Oslo. A personagem principal é um carteiro indolente, desleixado e amoral, mas o nosso anti-herói ainda possui uma dose de curiosidade mórbida, apesar de viver num mundo repleto de melancolia. Interpretado com um tom monótono e discreto, a cara do narrador de Sletaune oferece uma expressão lacónica e de um humor cortante. Ar fresco oriundo de alguém com muito mau hálito. Sletaune prosseguiu com “Realmente Apanhaste-me”, uma comédia sobre patifes, movida pela farsa e com narrativas que se cruzam, e onde criminosos mal sucedidos e NORWEGIAN FILM INSTITUTE 10 REPRISE outros falhados são vistos à luz de um prisma A Nova Norwave Em 2004, Erik Skjoldbjærg associou-se ao escritor ligeiramente absurdo. de guiões Nicolaj Frobenius para, juntos, adaptarem o sempre-actual “Um Inimigo do Povo” Dogma O movimento dinamarquês Dogma também contri- aos nossos dias. Os conflitos foram transferidos buiu com novos impulsos para a indústria cinemato- para uma fábrica de águas minerais localizada na gráfica Norueguesa. “A Febre da Cabana”, de Mona área pictoresca da Costa Ocidental da Noruega, Hoel, desenrola-se numa cabana nas montanhas, demonstrando que os admiradores de Ibsen, durante o Natal, com a presença de sogros polacos. como o próprio poeta, ainda hoje são capazes de O Natal torna-se, então, num total e completo infer- torpedear a arca. Ibsen e outros grandes ícones no na terra. Os esqueletos saem do armário mais culturais da Noruega, como o compositor Edvard depressa do que numa peça de Ibsen. Hoel mantém- Grieg e o violinista Ole Bull, foram homenagease fiel ao estilo e conteúdo do movimento Dogma, dos recentemente, mas também dissecados em criando um exemplo distinto de drama despojado comentários biográficos, uma forma instrutiva de que procura a verdade e capturando instantâneos fazer história mental e cultural. por meio de uma câmara portátil. Diz-se que o realizador Bent Hamer tem acesMarius Holst regressou com uma peça de câmara so ilimitado à “Quinzaine des Réalisateurs” do ao ar livre. “Dragonflies” é um filme sobre o eterno Festival de Cannes. Ele foi suficientemente arrotriângulo, que fez recordar a muitas pessoas o jado em ter filmado o sucolento romance boémio eterno protagonista escandinavo: Ingmar Bergman. de Charles Bukowski “Factotum” nos Estados Não lhe faltava a intensidade e o entendimento de Unidos, tendo como estrelas Matt Dillon e Lili uma crua luta pelo poder. Este filme também foi Taylor. Este filme levou Hamer pela terceira vez às selecções de Cannes, um sinal seguro de que a fortemente inspirado pelo movimento Dogma. Nova Norwave, a Nova Onda da Noruega, chega A Noruega possui mais realizadores capazes do mais longe do que muitas ondas anteriores. A que muitas pessoas julgavam. Mas agora, as aten- produção do “Factotum” tem que ser classificada ções estão mais viradas para os realizadores mais de multicultural. O aspecto multicultural também jovens. Talvez demasiado. Dadas as circunstâncias, brilha através do “Izzat”, um thriller muito sólido o cinema norueguês possui muitos bons directo- dos círculos imigrantes paquistaneses da Noruega, res de fotografia e directores artísticos, grandes carregado de cenas de acção rudes e de diálogos profissionais de todos os ofícios e actores com- implacáveis. Esta aventura machista encontrou a petentes. Os argumentos continuam a melhorar. sua antítese na estreia como realizadora da escriA indústria cinematográfica na Noruega é como o tora Sara Johnsen, “Kissed by Winter”, um drama clima: tempestuoso ou coberto de neve, cinzento delicado de relacionamento das regiões remotas ou solarengo, moralista e sério, como “Brand” de da Noruega, que trata de dor e privação. Ibsen, ou alegremente irresponsável como “Peer Gynt”, do mesmo dramaturgo. No seu melhor, Em 2001, a comédia “Elling” foi nomeada para os filmes noruegueses conseguem ir além do seu um Oscar. O próximo filme da série foi “Mother’s público doméstico. O clima tem sido especialmen- Elling” (2003) um pouco mais fraco. Em 2005, te benéfico desde a passagem do milénio, com a trilogia ficou completa com Petter Næss, de uma optimista promessa de renovação, tanto a volta na cadeira de realizador, com “Love Me nível artístico como de espectadores. Frio e louco, Tomorrow”. Este filme também não atingiu o nível do primeiro, mas mesmo assim gozou de uma sem dúvida. Mas também jovem e destemido. THE BOTHERSOME MAN excepcional popularidade, marcando o actor Per Christian Ellefsen como um inesquecível neurótico, e Sven Nordin como o seu amigo enfadonho. Mais variedade: no mesmo ano, Pål Sletaune lançou o seu “Next Door” inspirado em Polanski e Hitchcock. Este filme foi seleccionado para os Dias de Veneza do Festival de Cinema de Veneza, com os seus truques mágicos e armadilhas. Em 1905, a Noruega quebrou a união com a Suécia.Os primeiros cem anos em liberdade foram celebrados com o documentário “Too Much Norway”, uma jornada cinemática divertida percorrendo os trilhos da memória, ao longo do primeiro século, ilustrada com imagens comovedoras. Nos anos 70, tinha despontado na Noruega um pequeno mas influente movimento maoista, o qual mais tarde marcou presença nos media, na esfera cultural e nas universidades. Com uma acuidade notável, Hans Petter Moland ocupou-se do romance de Dag Solstad sobre o movimento e compôs o filme de longa metragem “Comrade Pedersen”, uma tragicomédia de formato internacional acerca das ideias utópicas idiossincráticas da psicologia e da sociologia do movimento. Contudo, o climax, até à data, foi o Festival de Cannes de 2006. A Noruega teve todos os quatro filmes escolhidos para a Selecção Oficial; um record nacional. O filme burlesco de animação, com orçamento elevado, sobre um elefante drogado, do artista subterrâneo Christopher Nielsen, “Free Jimmy”, foi apresentado na Semana de Críticos Internacionais. Foi um filme altamente ambicioso. Na mesma secção, “The Bothersome Man” de Jens Lien ganhou um prémio, o primeiro de muitos para uma tragicomédia com supersons e subtexto. Em “Un Certain Regard”, o thriller policial rápido de Stefan Faldbakken “Uro” foi seleccionado como filme de acção inspirado pelos Estados Unidos com um fim Bressonesco. Mas o mais emplogante de tudo foi a primeira Palma de Ouro da Noruega. Foi atribuída ao “Sniffer” na secção de curtas metragens, realizado por Bobbie NORWEGIAN FILM INSTITUTE 11 Peers, filme genuinamente europeu, sem diálogos, seguidor da tradição de Kafka e dos absurdistas, Tati e outros. A Nova Norwave atingiu um outro pico em Fevereiro de 2007, quando “The Danish Poet”, uma fantasia sobre a admiração de um poeta dinamarquês pelo Prémio Nobel da Literatura da Noruega, Sigrid Undset, obteve um Oscar na secção de curtas metragens de animação. Liv Ulmann narrou este opus excepcionalmente encantador e diferente. No mesmo ano, Marius Holst voltou com “Mirush”, um retrato intenso, multicultural de um rapaz do Kosovo que se encontra com o seu pai desconhecido na Noruega. Faltou pouco a este filme para ser uma obra de arte. Talvez a mais gratificante estreia durante anos tenha sido a de Joachim Trier. “Reprise” é um retrato leve, mas não insubstancial, de uma geração, à maneira espiritual de Truffaut, sobre a geração norueguesa dos anos 30, que recebeu tudo menos um sentido para a vida. Trier obteve o Prémio de Melhor Director em Karlovy Vary bem como o Prémio Diesel Discovery de Toronto, e ultimamente tem arrebatado inúmeros prémios internacionais. Encorajadas com este progresso, as autoridades norueguesas estão determinadas a investir ainda mais no desenvolvimento e diversificação do cinema a um grau ainda mais elevado. O número de produções é vasto e está a crescer, há que aumentar a exportação. O optimismo é grande. Há muito poucas imperfeições. O único revés digno de menção é que a única estrela mundial norueguesa, Liv Ullmann, não obteve fundos para a sua versão de “Uma Casa de Bonecas” de Henrik Ibsen, interpretada por estrelas internacionais. Tirando isso, o cinema norueguês está em excelentes condições, quer técnica, quer artisticamente. Pode dizer-se mesmo, em condições excepcionalmente boas. Presentemente, a ambição é ganhar, também para uma longa metragem, um dos prémios internacionais de real destaque. Considerando a temperatura geral no cinema norueguês, esta meta não parece de todo fora do alcance. Talvez a mais gratificante estreia durante anos tenha sido a de Joachim Trier. Reprise é um retrato leve, mas não insubstancial, de uma geração, à maneira espiritual de Truffaut, sobre a geração norueguesa dos anos 30, que recebeu tudo menos um sentido para a vida. Trier obteve o Prémio de Melhor Director em Karlovy Vary bem como o Prémio Diesel Discovery de Toronto, e ultimamente tem arrebatado inúmeros prémios internacionais. Encorajadas com este progresso, as autoridades norueguesas estão determinadas a investir ainda mais no desenvolvimento e diversificação do cinema a um grau ainda mais elevado. O número de produções é vasto e está a crescer, há que aumentar a exportação. O optimismo é grande. Há muito poucas imperfeições. O único revés digno de menção é que a única estrela mundial norueguesa, Liv Ullmann, não obteve fundos para a sua versão de Uma Casa de Bonecas de Henrik Ibsen, interpretada por estrelas internacionais. Tirando isso, o cinema norueguês está em excelentes condições, quer técnica, quer artisticamente. Pode dizer-se mesmo, em condições excepcionalmente boas. Presentemente, a ambição é ganhar, também para uma longa metragem, um dos prémios internacionais de real destaque. Considerando a temperatura geral no cinema norueguês, esta meta não parece de todo fora do alcance. O filme norueguês realmente restabeleceu contato com seu público, ao mesmo tempo em que foi produzido filmes que estão interessantes para os festivais estrangeiros. A estréia da Eva Sørhaug com "Almoço" (Lønsj) é um filme da categoria gourmet, que foi escolhido para os festivais de Veneza, Toronto e Londres. É minimalista, leve e nutritivo, com grandes quantidades de ingredientes do refinado cozinha do filme francês. Seguindo seis a oito destinos de Oslo que tenham que fazer escolhas, independentemente de circunstâncias e idade. Parte do filme é noir, mas sempre há grandes doses de humor disciplinado, nesta discreta descrição do destino. O retrato de infância de uma cidade menor, Stavanger, na década de 1980 em "O homem que amava Yngve" (Mannen som elsket Yngve) provou ser um grande ganhador de prêmios, com a sua vulnerabilidade e seu humor indulgente, e faz também o público se identificar com o filme. Mas o maior desafio foi provavelmente "Os invisíveis" (De usynlige) de Erik Poppe. Igual do seu filme Hawai, Oslo, Os Invisiveis é uma saltarbarreiras triunfante para o filme norueguês, um projeto ousado e talentoso que se baseia nas idéias e impulsos que não necessariamente estão na moda. Usa-se ainda mais direto o simbolismo cristão e ambiente religioso, sem medo de abordar o assunto e sem caricaturizar os pastores. Dardenne. E cava até o alicerce existencial. Este é um retrato do tempo e da cidade formigando de mentes não cultivadas. Tudo está elevado as mais altas esferas do filme, do trágico e não-redimido ao eternamente válido. Desde "Flåklypa Grand Prix" nenhum filme norueguês atraiu tantos espectadores como "Max Manus", o sabotador mais ousado durante a Segunda Guerra Mundial. E nunca foram feitas cenas de ação tão profissionais e cenografia mais precisa e completa num filme norueguês de guerra, não menos importante os efeitos especiais. A dupla de diretores Rønning e Sandberg sabe acentuar, e de elevar a temperatura de um filme. Parte do filme é rigorosamente estilizado. Pode dar impressão de uma infantilidade barulhenta, mas homens frequentemente ficam assim sob pressão. O protagonista Aksel Hennie mais uma vez mostra características que faz dele o melhor na sua geração de atores de cinema, com um olhar aberto e expressivo, uma capacidade de despertar a curiosidade, com a interpretação de um homem com raciocínio rápido, quase hiperativo, que se arrisca quando é necessário. Outra coisa é que o filme não se atenta revisar história ou filme, mas optou por uma aproximação mais tradicional e sem fricção e narra os acontecimentos de uma forma predominante impessoal. Pouco é realmente mostrado e formado de forma original. Mas a falta de assumir riscos num filme sobre tomar riscos aparece não ter importância. O público estava disposto a assistir este relato de uma parte da história prestes a ser esquecido. "Max Manus" era a principal contribuição para que o filme norueguês virou realmente atraente para o público novamente. O autor deste artigo, Per Haddal, é crítico de cinema do jornal norueguês Aftenposten Translated by Ilta Cohen Duas histórias estão entrelaçadas. Uma mãe perdeu seu filho pequeno. O condenado é solto depois de oito anos de prisão. Ele vira um organista substituto em uma paróquia. A mãe do menino assassinado passa pela igreja e descobre o organista. Como perdoar e reconciliar em condições tão extremas? As perguntas são formuladas de forma clara e urgente, sem piedade em cenas fortes, com um elenco cheio de empatia exigente e expressões intensas. Os invisívles tem ecos de Dostoievski e outros parentes artísticos, também do mundo do cinema, como Bergman e os irmãos NORWEGIAN FILM INSTITUTE 12