Modulo_Magico_de_Oz - Programa Círculos de Leitura
Transcrição
Modulo_Magico_de_Oz - Programa Círculos de Leitura
Módulo O Mágico de Oz L. Frank Baum Índice 01 – A função do Mágico na constituição do psiquismo, 03 02 – Observando com atenção reconhecemos o Bem e o Mal. O beijo da Bruxa Boa nos guia e protege na viagem, 05 03 – O encontro com o Espantalho e o Leão: quem foi o “corvo” em nossas vidas?, 11 04 – A história do Homem de Lata: a importância de reconhecer o mal, 15 05 – Quando aparecem os desafios, a nossa inteligência é posta a prova e os nossos talentos aparecem, 17 06 – As ajudas e perigos do caminho: “Coisas pequenas e delicadas quase me ma– taram e animaizinhos salvaram a minha vida”, 18 07 – A função do Mágico: antes e depois da viagem, 21 08 – O líder que é reconhecido por suas realizações, 27 09 – Reflexões Finais, 30 O Mágico de Oz de Frank Baum 2 1. A função do mágico na constituição do psiquismo No início da história nos é apresentado o contraste entre o ambiente árido e cinza do Kansas, onde Dorothy vive com seus tios – também cinzas – e a alegria, e espontaneidade de Dorothy, que ama e se alegra com seu cãozinho, o Totó. Era o Totó que fazia Dorothy rir e evitava que ela ficasse tão acinzentada como as coisas que estavam ao redor. Totó não era acinzentado: era um cãozinho preto com pêlo longo, sedoso – e tinha pequenos olhos negros que piscavam alegremente em cada lado do focinho engraçado e pequenino. Totó brincava o dia inteiro e Dorothy brincava com ele e o amava muito.(p.14) Pensamos então sobre o que nos torna “cinzas” ou “coloridos”. Estar “cinza” representaria ter pouca disposição para apreciar o belo que nos rodeia. O amor, a alegria e a felicidade advindos da interação com a natureza e com as outras pessoas nos torna “coloridos”. Desde o inicio surge o tema da importância da magia na vida da criança, que se manifesta na alegria com que espera a chegada do Papai Noel, e da forma como ouve os contos de fadas como Cinderela, Branca de Neve, e tantos outros... A magia precisa ser incentivado nelas, pois é um aspecto constitutivo do ser humano, base da criatividade, da arte, da imaginação. 3 Dorothy encara com paciência e tranqüilidade os difíceis desafios que vêm ao seu encontro, quando um ciclone a carrega até a estranha terra dos Munchkins. Eles a consideram uma boa feiticeira porque os livrara – sem querer – da Bruxa Malvada que os escravizava. Como a casa de Dorothy aterrissa em cima da Bruxa Má, matando-a, os Munchkins a vêem como sua salvadora, como alguém que tem poderes mágicos. Observamos como Dorothy insiste em dizer que não é Feiticeira. Pensamos em momentos quando nos dizem que somos o que não somos,o perigo que corremos de ficarmos seduzidos por uma identidade que vem dos outros. Os Munchkins continuam vendo Dorothy como Feiticeira e ela percebe que não adianta insistir pois eles não conseguiam mudar de idéia. O importante é que ela sabe que não é o que eles dizem que ela é. Ao mesmo tempo, Dorothy se vê como “uma garotinha comum”, mas nós veremos que ela se tornará uma grande líder ao longo dessa jornada: Quando Boq viu os sapatos de prata, disse: -Você deve ser uma grande feiticeira. -Por que? – quis saber Dorothy. -Porque você usa sapatos de prata e matou a Bruxa Malvada. Além disso, tem branco em seu vestido e só bruxas e feiticeiras usam branco. -Meu vestido é xadrez, azul e branco –observou Dorothy, alisando o tecido amassado. - É bondade sua usar isso – disse Boq – Azul é a cor dos Munchkins e o branco é a cor das bruxas; assim sabemos que você é uma bruxa boa. 4 Dorothy não soube o que responder àquilo, pois todas as pessoas pareciam pensar que ela era uma bruxa, e ela sabia muito bem que era apenas uma garotinha comum que por acaso viera num ciclone, de terras estranhas. (pg. 29) Se Dorothy tivesse acreditado e assumido o papel que os Munchkins queriam lhe dar, ela não teria recebido ajuda – somente admiração, adoração. Não teria feito a viagem que a tornou uma líder capaz de ajudar outras pessoas que também estavam procurando algo. Veremos que nesse sentido Dorothy não cometeu o mesmo erro de Oz, pois este ficou preso por muito tempo na idealização dos Munchkins, e no medo de ser descoberto pelas Bruxas Más. 2. Observando com atenção reconhecemos o Bem e o Mal. O Beijo da Bruxa Boa nos guia e protege na viagem Quando chega à terra dos Munchkins, apesar de surpresa, Dorothy não se apavora e observa com atenção aquelas pessoas tão diferentes. Conclui que são boas e pede-lhes ajuda para retornar ao seu lar. Eles consideram ser isso impossível, graças aos imensos obstáculos a serem enfrentados. Dorothy chora e os Munchkins, comovidos, se unem a ela. A Bruxa Boa do Norte oferece uma solução: sugere que Dorothy vá a Cidade das 5 Esmeraldas, onde vive o grande Mágico de Oz, o único que teria condições de ajudá-la. Já surge no seu conselho um tema que voltará a aparecer diversas vezes: a importância de contarmos nossa história sem medo, confiando que alguém pode nos ajudar: - Você pode caminhar. É uma longa jornada, através de um território que algumas vezes é agradável e em outras é escuro e terrível. Entretanto, usarei toda a magia que conheço para evitar que algum mal aconteça a você. - Não quer vir comigo? – pediu a garota, que começava a encarar a velhinha como sua única amiga. - Não, não posso fazer isso – respondeu ela – mas vou beijar você, e ninguém ousa fazer mal a uma pessoa que foi beijada pela Bruxa Boa do Norte. Ela se aproximou de Dorothy e beijou-a delicadamente na fronte. Quando os lábios tocaram a garota deixaram uma marca arredondada e brilhante, como Dorothy descobriu mais tarde. - O caminho para a Cidade das Esmeraldas é pavimentado com tijolos dourados – disse a Bruxa – assim não pode errar. Quando chegar até Oz não tenha medo dele, mas conte sua história e peça que a ajude. (p. 24-25) Dorothy num primeiro momento pediu que a Bruxa Boa a acompanhasse concretamente mas compreende quando ela lhe oferece um outro tipo de ajuda, igualmente importante. Após ter recebido na testa um beijo da Bruxa Boa – que deixou marca e a acompanhará e protegerá por toda a viagem – e de ter sido presenteada com os sapatos prateados da Bruxa Má , Dorothy 6 parte, satisfeita, com Totó ao seu lado. Aquela terra era dividida em quatro partes: duas governadas pelas Bruxas Boas, e as outras duas, pelas Más. O próprio caminho rumo a Oz , explica a Bruxa Boa do Norte, será em alguns momentos agradável, em outros, “escuro e terrível”. Dorothy está sendo apresentada à realidade da vida, e à necessidade de reconhecer que no mundo há alegrias e tristezas, assim como pessoas boas e más. É importante saber que existe o bem e o mal, aprender a diferenciar um do outro. Saber que existem pessoas más não nos apavora, quando aprendemos a identificá-las e confiamos nas ajudas que nos protegem – simbolizadas aqui pelo beijo na testa da Bruxa Boa do Norte. A marca do beijo da Bruxa Boa é respeitada onde quer que Dorothy esteja: tanto o Mágico de Oz quanto os Macacos Alados e Bruxa Má respeitam essa proteção que Dorothy recebeu. A marca do beijo abre portas primeiro para que o grupo seja recebido por Oz. Depois de vencer outros tantos desafios, o grupo chega finalmente ao Palácio de Oz. Este, ao saber que a menina tem a marca de um beijo na testa e usa sapatos prateados, se dispõe a recebê-los, desde que individualmente. A cada um o Mágico de Oz se apresenta de uma forma. Em troca de realizar os pedidos de Dorothy e seus companheiros, mas para todos oferece a mesma tarefa: destruir a Bruxa Malvada do Oeste. Unidos pela tarefa em comum, proposta pelo Mágico de 7 Oz, no dia seguinte seguiram para o Oeste. A Bruxa, furiosa ao saber da sua presença, enviou lobos e corvos para eliminá-los. O Lenhador e o Espantalho conseguem vencê-los, mas são derrotados pelos Macacos Alados. Ao ver o beijo estampado na testa de Dorothy, os Macacos Alados decidem respeitá-la, conduzindo-a com o Totó e o Leão para o palácio da Bruxa. A Bruxa Má sabe que pode escravizar Dorothy pois a menina ainda não conhece como usar seu poder: “Assim, a Bruxa Malvada riu para si mesma e pensou ‘Ainda posso tornar Dorothy minha escrava, pois ela não sabe usar seu poder” (p. 100). Num primeiro momento Dorothy, “pôs-se a trabalhar sem reclamar, com a mente focalizada em trabalhar tanto quanto pudesse, pois estava contente já que a Bruxa Malvada resolvera não matá-la”(p. 101). Todas as noites Dorothy levava, escondida da Bruxa, comida para o Leão que estava aprisionado. Temida por todos os Winkies, povo que dominava, a Bruxa não ousa bater em Dorothy, “por causa da marca em sua testa” (p. 101), a marca do beijo da Bruxa Boa. Dorothy não sabia disso, e “tornouse muito triste quando começou a pensar que seria mais difícil que nunca voltar para o Kansas e ver a tia”. Ela chorava “amargamente por várias horas e Totó sentava-se ao lado dela e olhava seu rosto, ganindo baixinho para demonstrar como se sentia triste por sua pequena dona” (p. 101). 8 Sabendo que os sapatos prateados possuíam poderes mágicos a Bruxa pretendia apossar-se deles. Certo dia conseguiu apanhar um e jurou que logo se apossaria do outro. Dorothy, zangada, sem pensar, atirou sobre ela o balde de água que tinha na mão. Dentro de poucos minutos a Bruxa se derreteu completamente. Dorothy apanhou seu sapato, foi em busca do Leão e avisou aos Winkies, ali reunidos, que estavam livres da escravidão. Eles a ajudaram a resgatar o Lenhador e o Espantalho. Novamente reunidos passaram uns dias no castelo, onde Dorothy encontra o Barrete Dourado da Bruxa e resolve levá-lo, embora não soubesse do seu encantamento. Decidiram voltar para exigir de Oz o cumprimento de sua promessa. Os Winkies lamentaram, e como gostaram muito do Lenhador pediram que ficasse para governá-los. Em diferentes momentos a figura de Dorothy ilustra a função de um líder ágil, que usa seu instinto. Quando jogou água na Bruxa, o fez para se defender, sem saber que seria o suficiente para destruí-la. Vemos aqui um tema recorrente na história: poder chorar e poder sentir raiva são qualidades fundamentais, que nos ajudam de formas inesperadas em momentos de grande dificuldade, como os que Dorothy enfrentou ao longo da viagem. Dorothy sabe agir rapidamente, seguindo seu instinto, conforme o que cada situação pede. 9 Sabemos que na vida, o Mal, representado na história pelas Bruxas Más, assume diferentes formas, e nunca pode ser destruído para sempre. Assim, a Bruxa Má foi “derretida”, mas não sabemos qual forma tomará depois que for desmanchada. O importante é que naquele momento Dorothy conseguiu se libertar. Seria uma ingenuidade acreditar que se pode matar o mal – o Mal existe, está no mundo, a questão é como se proteger dele, e cada momento vai exigir de nós uma forma especifica de agir. Pensamos então: o que pode nos proteger do mal? O Mágico sabe que ele não tem poder sobre as Bruxas Más. Acreditar na magia é um fazer de conta, importante para nosso crescimento, mas não é o suficiente para nos protegermos. Pensamos que o que nos protege é o conhecimento, esse conhecimento que nos faz pensar em estratégias para nos protegermos, nos ajudando a não cair em certas armadilhas. O mal não vinga quando as pessoas usam a cabeça, tem coragem e amigos. Vemos a importância de contar a nossa historia para alguém que pode escutar e pensar em como nos ajudar --- o tema da confiança nas pessoas é essencial. 3. O Encontro com o Espantalho e o Leão – quem foi o “corvo” em nossas vidas? 10 Dorothy retoma o caminho e após um longo tempo avista em um milharal um espantalho recheado de palha, preso a um alto poste. Dorothy, vendo-o piscar um olho, se aproxima, e atendendo ao seu pedido, o retira de lá. Conversam, contam suas respectivas histórias e ele resolve acompanhá-la para pedir um cérebro a Oz. Dorothy ajuda a despertar a vontade do Espantalho de sair da situação em que se encontrava, com um argumento poderoso quando ele pergunta a ela se teria certeza que Oz o ajudaria: “Não sei dizer, mas pode vir comigo, se quiser. Se Oz não lhe der um cérebro, não pode ficar pior do que está agora” (p.32). Dorothy é bem direta ao nomear a situação do Espantalho, que concorda, acrescentando, em tom de confidencia: “Isso é verdade (...) Não me importo que minhas pernas e braços sejam empalhados...Mas não quero que as pessoas me chamem de tolo” (p. 33). Eles fazem amizade ao contar suas histórias, na medida em que vão caminhando e vencendo os obstáculos que se apresentam no caminho. Dorothy ajudou o Espantalho dando-lhe coragem. Mas a primeira ajuda foi dada por um corvo que mostrou ao Espantalho que esse, ao contrario do que pensava, não era um homem – como o próprio Espantalho lembra, ao contar para Dorothy: 11 - Esse sujeito vai assustar os corvos bem depressa. Ele parece mesmo um homem – disse o fazendeiro. - Veja, ele é um homem – disse o outro, e eu concordei com ele. (...) Tive uma vida solitária, porque não tinha nada para pensar, tendo sido feito há tão pouco tempo. Muitos corvos e pássaros vinham ao milharal, mas logo que me viam voavam longe, pensando que eu era um Munchkin, e isso me agradava muito e me fazia sentir que eu era importante. De vez em quando, um velho corvo voava por perto, e depois de olhar para mim cuidadosamente pousou no meu ombro e disse: - Fico espantado que o fazendeiro queira me enganar de maneira tão grosseira. Qualquer corvo que se preze pode ver que você está só cheio de palha. (...) Senti-me triste com isso, pois demonstrei que não era um espantalho tão bom, afinal, mas o velho corvo me confortava, dizendo: - Se você tivesse cérebro em sua cabeça, seria tão bom humano quanto qualquer um e um homem melhor do que alguns deles.” (pg.37-38) O corvo mostra ao Espantalho que este não era um homem , por lhe faltar um cérebro. Ao mesmo tempo também sugere uma solução. Ao ler essa passagem pensamos então em quem foi o “corvo” em nossas vidas. Alguém que nomeia algum ponto fraco nosso, um aspecto da nossa personalidade que precisa ainda ser desenvolvido, cumpre uma função essencial.. . Esse tema surge de novo no encontro de Dorothy com o Leão Covarde. Quando esse ruge para Totó, Dorothy fica muito brava 12 e sai para defender o amigo, desmascarando a falsa imagem de forte e corajoso que o Leão tinha construído para esconder seu medo. Podemos dizer que Dorothy foi o “corvo” na vida do Leão: - Não ouse morder Totó! Devia ter vergonha, um bicho grande como você morder um pobre cachorrinho. - Eu não mordi o cão – respondeu o Leão, esfregando o nariz com a pata. - Não, mas tentou. Você não passa de um covarde! – disse ela. - Eu sei – admitiu ele, com a cabeça baixa – Sempre soube. Mas como posso evitar? (p. 48) Dorothy quer saber porque o Leão se tornou tão covarde, e ele então lhe conta sua história: - (...) Todos os outros animais da floresta esperam que eu seja corajoso, pois o Leão é considerado o Rei dos Animais. Aprendi que se eu rugir bem alto, todas as coisas vivas se assustam e ficam fora do meu caminho. Sempre que encontro um homem fico muito assustado, mas dou um rugido e ele sempre corre tão rápido quanto pode. Se elefantes, tigres e ursos tentassem me enfrentar, eu mesmo iria fugir...sou muito covarde. Mas quando eles escutam meu rugido todos fogem primeiro, e claro, eu os deixo ir. - Mas não está certo. O Rei dos Animais não deve ser um covarde – disse o Espantalho. - Sei disso – respondeu o Leão, limpando uma lágrima dos olhos com a ponta da cauda – Essa é a minha grande tristeza, que torna minha vida infeliz” (p. 50) A história do Leão nos faz pensar naquelas pessoas que pelo medo de se relacionar afastam-se das outras pessoas . Não 13 são fortes como querem parecer, pelo contrário, e sofrem bastante por ter que manter essa imagem, como o próprio Leão nos diz. Essa passagem nos faz pensar que às vezes, se as pessoas ao nosso redor imaginam que somos extraordinariamente fortes e inteligentes, acima de qualquer erro, há um risco de não podermos mostrar qualquer ponto fraco. Pelo medo, nos fechamos. Mas o fechamento, como vimos, não éa solução. A solução vem de poder falar a verdade e assim poder construir uma relação de amizade baseada na sinceridade. O Leão sentia-se pressionado a representar o papel de Rei da Selva. Somente na viagem com Dorothy e seus companheiros é que vai desenvolver sua coragem, reconhecendo a importância daquele tipo de coragem que adquirimos quando confiamos nas pessoas. 4. A história do Homem de Lata: a importância de reconhecer o mal 14 Durante o trajeto os companheiros de viagem se depararam com o Lenhador de Lata, imóvel, segurando um machado. Ele pediu-lhes que o ajudassem azeitando suas partes enferrujadas. Atendido, recupera logo os movimentos. Decide acompanhá-los na esperança de que Oz lhe dê um coração. O Lenhador de Lata tem sua história marcada pela busca do amor e o medo de viver sozinho. Quando os seus pais morrem, ele conhece uma linda Munchkin e deseja casar-se com ela, para assim não ficar só. A moça, por sua vez, diz que só se casaria com ele se construísse uma casa para eles morarem. Foi isto que ele procurou fazer. Porém, havia uma velha, para a qual a jovem trabalhava, que não queria que ela casasse. Por isso ‘comprou’ a Bruxa Malvada do Leste para fazer algo terrível contra o lenhador. A Bruxa encantou o machado do homem, fazendo com que, aos poucos, o instrumento fosse cortando seus membros, sem que ele percebesse o mal que o estava afetando. O Lenhador foi substituindo as partes do corpo por pedaços de metal, com a ajuda do funileiro. Não pára para pensar no porque se acidentava logo agora que tinha decidido se casar. Segue construindo obstinadamente a casa, o que apenas provoca mais ainda a irritação e crueldade da Bruxa: - A princípio me pareceu uma grande desgraça, pois sabia que um homem de uma perna só não poderia desempenhar muito bem a função do lenhador. Por isso fui até um funileiro e pedi para ele fazer uma nova perna de lata. A 15 perna funcionou muito bem, depois que me acostumei a ela; porém minha ação irritou a Bruxa Malvada do Leste, pois ela prometera á velha que eu não casaria com a bela moça Munchkin.(p.45) Irritada, pois ele prossegue na construção da casa, a Bruxa faz com que o machado vá cortando a outra perna, os braços, a cabeça e finalmente o coração do lenhador. Quando conta sua história para Dorothy e o Espantalho, o Lenhador reconhece sua ingenuidade por pensar que poderia sozinho vencer alguém tão perigoso: “Pensei que tivesse conseguido vencer, e trabalhei mais rápido que nunca, mas pouco sabia sobre quão cruel minha inimiga podia ser” (p. 45) Parece que o lenhador e a moça Munchkin não souberam se fortalecer mutuamente, e foram muito ingênuos. São por isso, de certa forma, responsáveis por terem se tornado alvo fácil para a crueldade da Bruxa. Na vida sempre há desafios e perigos, e por algum motivo eles não souberam lidar com os desafios, tampouco identificar a maldade. A própria moça não estava preparada para a vida, pois nem desconfiou que a sua patroa faria algo para impedir o casamento. Nesse momento pensamos sobre a importância de saber com quem estamos convivendo, e não contar toda a verdade para aqueles que podem querer impedir nosso propósito. 16 5. Quando aparecem os desafios, a nossa inteligência é posta a prova e os nossos talentos aparecem. O grupo se põe a caminho cada vez mais unido. O Espantalho usa bem as idéias, planeja; o Lenhador a todo instante livra-os de dificuldades usando seu machado; o Leão, sempre que é necessário, usa sua força ou seu uivo ameaçador. Com tais recursos conseguem livrar-se de perigos como os Kalidás, animais perigosíssimos. Surge então a pergunta: mas então eles já tinham dentro deles a inteligência, a coragem, e o coração? Concluímos que uma coisa é ter as qualidades em potencia, adormecidas dentro de nós. Outra coisa é desenvolvêlas, e isso só se dá no fazer. Existe todo um processo. Nesse sentido, poder realizar a jornada com companheiros estimula cada um deles , que, focados em cada tarefa a ser feita, em cada desafio e inesperado que surge, conseguem ao longo do caminho criar soluções e assim desenvolver as qualidades que tanto desejavam e procuravam. Em todos nós tudo está em potencia. Mas na vida, no mundo, o que está somente em potencia se desenvolve quando se torna ação. Se os personagens do Mágico de Oz não tivessem feito a viagem juntos, enfrentado os desafios, um dando coragem para o outro, se ajudando mutuamente, não teriam desenvolvido suas qualidades. Nessa 17 história podemos ver a importância do ambiente, a influência do convívio e das circunstancias, assim como de nossas ações, contribuindo para nosso desenvolvimento. 6. As ajudas e perigos do caminho: “Coisas pequenas e delicadas quase me mataram e animaizinhos pequenos salvaram a minha vida” Quando navegavam por um rio caudaloso, dentro da jangada construída pelo Lenhador, o Espantalho fica preso a uma vara, no meio do rio e o grupo muito triste e desesperado por não poder fazer nada naquele momento, continua a travessia. Já na outra margem, ficam olhando desolados seu amigo preso, e tentam pensar em algo para salva-lo. É então que aparece uma cegonha que os olha lá do alto, e pergunta ao estranho grupo o que está acontecendo. Dorothy lhe explica e a cegonha resolve os ajudar. O Espantalho agradece a cegonha pela ajuda. Pensamos que todos ajudaram, pois foi a imagem do grupo desolado que chamou a atenção da cegonha. A Cegonha parou não por ter visto o Espantalho no rio, mas sim por ver a imagem de um grupo desolado. “Tanto o Leão como o Lenhador sacudiram a cabeça, porque não sabiam a resposta. Assim, eles ficaram sentados sobre a margem, olhando com tristeza e ansiedade para o Espantalho, até que uma cegonha veio voando, 18 e ao vê-los, parou para descansar à beira da água.”Eles também ajudam ao explicar para a Cegonha que o Espantalho é bem leve, que ela poderá carregá-lo sem problemas. A cegonha consegue resgatá-lo, trazendo-o de volta. Ao receber muitos agradecimentos ela diz: ”Sempre gostei de ajudar alguém em dificuldades” (p. 64). Na vida há sempre pessoas assim, como a Cegonha, dispostas a ajudar. Quando conseguimos reconhecer momentos em que precisamos ficar parados, confiando que uma solução virá, ela chega das formas mais inesperadas. Desde a Odisséia de Homero, herói é aquele que também confia e aceita ajudas, muitas vezes de desconhecidos, que aparecem naquele momento em que precisamos. Esse tema surge em muitos dos livros do nosso repertório dos Círculos de Leitura. Kouros, A Comédia Humana, Noites Brancas, O Conto da Ilha Desconhecida, e tantos outros sempre nos fazem lembrar de como faz diferença na nossa vida poder confiar que, quando fazemos nossa parte, no mundo vão surgir ajudas as mais inesperadas. Em algumas histórias, ela vem na forma de pessoas . Em outras, como no conto A Cidade dos Cinco Ciprestes, a ajuda veio através do sonho, quando o homem dorme e faz do desapontamento seu travesseiro. 19 Há outra passagem em que o tema da ajuda surge, assim como o tema dos perigos que se apresentam muitas vezes de forma disfarçada. É quando o grupo penetra num campo repleto de flores coloridas, as Papoulas Escarlates, com um perfume delicioso, que esconde um perigo: adormece as pessoas para sempre. Dorothy e Totó logo caem adormecidos, e também o Leão. Dorothy e Totó foram retirados dali facilmente, mas como o Leão era pesado demais, o Espantalho e o Lenhador não conseguiram carregá-lo, precisando assim deixá-lo para trás. Os companheiros avistaram um ratinho que fugia de um Gato do Mato. O lenhador salvou-o, matando o gato. O pequeno rato se apresenta: é a Rainha de Todos os Ratos do Campo. Para mostrar sua gratidão prometeu que ela e todos os demais ratinhos estariam sempre dispostos a ajudá-los. Dorothy e seus amigos pediram-lhe que os ajudasse a salvar o Leão. A força de milhares de ratinhos reunidos, mais a contribuição de Dorothy e seus amigos, trouxe afinal de volta o Leão, que ao saber de tudo que aconteceu conclui: - Corri tão depressa quanto consegui, mas as flores foram fortes demais para mim. Como conseguiram me tirar de lá? – perguntou ele, sentando-se e bocejando. Contaram então a história dos ratos do campo, e sobre como eles o haviam generosamente salvado da morte; e o Leão Covarde riu, dizendo: - Sempre pensei em mim como grande e terrível. Ainda assim, coisas pequenas e delicadas como flores quase me 20 mataram, e animaizinhos pequenos como ratos salvaram minha vida. (p. 73) O Leão se surpreende, como muitas pessoas se surpreendem na vida, com o fato de que as ajudas e os perigos podem vir dos lugares mais inesperados, menos óbvios. As papoulas parecem representar os perigos da vida que muitas vezes parecem inofensivos, e que até num primeiro olhar nos parecem coisas boas – como aquelas flores, tão coloridas e perfumadas. É mais comum que as pessoas sintam medo do que é maior que elas, ou mesmo daquilo que tem uma aparência terrível. Mas o Leão aprendeu que o Mal pode vir disfarçado. Daí a necessidade de aprendermos a identificar se o que nos parece bom realmente o é. . 7. A função do Mágico: antes e depois da viagem Como não conheciam o caminho de volta, Dorothy e seus companheiros de repente se sentiram perdidos. Dorothy decide pedir a ajuda dos Ratos do Campo e até a Rainha se apresenta. Esta, notando o Barrete Dourado, conta-lhes o segredo do seu poder: o dono do Barrete usando certas palavras pode solicitar a ajuda dos Macacos Alados por três vezes. E assim, com seu auxilio, conseguiram ser levados para a Cidade das Esmeraldas; e puderam chegar ao Palácio de Oz. Quando este os recebe, Totó, 21 que já ajudara Dorothy no inicio da historia, seguindo o Ciclone, faz cair uma cortina atrás da qual visualizaram um homem velho, pequeno. Ele parecia tão assustado quanto eles. E nada lhe restou fazer senão se revelar : “Sou apenas um homem comum”(p. 120). Finalmente Oz pode contar sua verdadeira história. Depois de tanto tempo sozinho, escondendo seu segredo, confia em Dorothy e seus companheiros. Explica que trabalhava num circo, era ventríloquo e depois tornou-se balonista. Certa vez, não conseguindo frear o balão foi levado pelos ares e acabou aterrissando na linda terra que viria a se tornar, com sua chegada, a Cidade das Esmeraldas: - Desci aos poucos e não me machuquei. Mas me encontrei no meio de estranhos, que me vendo descer das nuvens, imaginaram que eu fosse um grande Mago. Claro, eu deixei que eles pensassem que sim, porque estavam com medo de mim e prometi fazer qualquer coisa que desejassem. Só para me divertir e manter o povo ocupado ordenei que construíssem essa cidade e o meu palácio; e eles o fizeram de boa vontade e direito. (...) A Cidade das Esmeraldas foi construída há muitos anos, pois eu era jovem quando o balão me trouxe até aqui, e agora sou um homem bem velho (...) Tenho sido bom para as pessoas e elas gostam de mim, mas desde que o palácio foi construído eu me fechei aqui e não os vejo. (pg. 122). Oz explica então porque se fechou em seu Palácio e assumiu o papel de Grande e Terrível Mágico por tanto tempo: 22 - Um dos maiores medos que tenho eram as bruxas, pois não tenho nenhum poder mágico e logo descobri que as bruxas eram capazes de fazer coisas maravilhosas. (...) Felizmente as bruxas do Norte e Sul eram boas, e soube que não me queriam mal. Porém, as do Leste e do Oeste eram terrívelmente más, e se não pensassem que eu tinha mais poder do que elas teriam me destruído com certeza. (p. 122). Nessa passagem podemos refletir sobre como se chega em um novo lugar. Dorothy chegou à Cidade das Esmeraldas de forma diferente de Oz. Ele chegou sozinho e sem a marca da proteção da Bruxa Boa. Oz tampouco contou com companheiros durante o tempo em que mobilizou aquele povo a construir a Cidade das Esmeraldas. As pessoas gostavam dele como governante, mas ele estava sozinho. Oz sabia que, por estar só, não tinha forças suficientes para se proteger do Mal. Dorothy consegue vencer as forças do Mal, representadas pela Bruxa, porque conta com a ajuda de seus amigos e da marca do beijo da Bruxa Boa, simbolizando um tipo de proteção que ela merecia e que vem de algo maior . Oz sente-se muito aliviado, pois finalmente chegou a ajuda que desesperadamente há tanto tempo esperava. Vendo que as duas Bruxas Malvadas estavam mortas, agora, livre desse perigo, 23 pode partir de Oz e voltar para sua terra natal. O Mágico de Oz teve um papel muito importante na vida dos habitantes da Cidade das Esmeraldas, pois, sem ele, eles não teriam sido mobilizados a construir a cidade. Oz também teve um papel fundamental na vida de Dorothy, do Leão, do Homem de Lata e do Espantalho. Foi por acreditarem nos poderes extraordinários do Mágico que eles se puseram a caminho e foi no caminho que desenvolveram a sua amizade e os seus talentos. O conceito de crescimento que se destaca no texto leva em conta os diferentes aspectos do psiquismo – razão, sentimento, coragem. E o que se torna evidente é que, em um ser humano integrado nenhum deles se manifesta independentemente dos demais. Quando retornam a Oz eles já fizeram a travessia, cresceram e por isso podem se relacionar com o Mágico de outra forma. Eles podem entrar “nos bastidores”, por trás da magia, porque já tinham realizado a viagem.Sabem que o que os fez crescer foi poder ter acreditado no Mágico, nesse “outro que sabe o que eu ainda não sei”. Depois que passam a saber que Oz é um homem, ele passa a ter a função de um reconhecedor privilegiado, alguém que reconhece o aprendizado que fizeram na travessia, resolvendo juntos os desafios que se apresentaram no caminho. Eles pedem para o Mágico fazer o ritual de reconhecimento – quando entrega um coração para o Lenhador, o líquido da coragem para o Leão, e o cérebro para o Espantalho 24 o Mágico está fazendo um ritual de passagem. Esse ritual nos fez lembrar de outros rituais - como quando nos formamos em um curso e recebemos um diploma dos professores e diretores. O diploma simboliza um reconhecimento, e faz parte do ritual que ele seja entregue por alguém que reconhece nosso esforço e sucesso. Pensamos que é muito importante contarmos com pessoas que podem observar e reconhecer, nomear nossas conquistas. Vemos essa necessidade no diálogo dos companheiros de Dorothy com Oz: - Não pode me dar um cérebro? – perguntou o Espantalho. - Você não precisa que eu lhe dê um cérebro. Está aprendendo alguma coisa todo dia. Um bebê tem cérebro, mas não sabe muita coisa. A experiência é a única coisa que traz conhecimento e quanto mais tempo estamos na terra, mas experiência conseguimos. (p. 123) (...) - E quanto à minha coragem? – perguntou ansiosamente o Leão. - Você tem muita coragem, tenho certeza – respondeu Oz – Tudo o que precisa é um pouco de confiança em si mesmo. Não há nenhuma criatura viva que não tenha medo quando enfrenta o perigo A coragem verdadeira é enfrentar o perigo quando se está com medo, e esse tipo de coragem você tem até demais. - Talvez eu tenha, mas ...Vou ficar infeliz a menos que me dê um pouco do tipo de coragem que nos faz esquecer que estamos com medo. (p. 124) 25 Com o auxilio de Dorothy, Oz fabricou um balão que deveria levá-los de volta ao Kansas. Mas este subiu antes que a menina pudesse alcançá-lo, pois ela precisou sair correndo atrás – como no início da história – do Totó. Todos ali queriam que eles ficassem e que o Espantalho os governasse. Dorothy queria voltar para os seus tios, para o seu lar.Os Macacos Alados não puderam levá-los, não lhes era permitido entrar em outros países. Mas a aconselharam a procurar Glenda, a Bruxa Boa do Sul. Lá foram eles, esperançosos. Tiveram, como sempre, que vencer inúmeros desafios. Atravessaram inclusive uma cidade onde todos e tudo era de porcelana. Constataram o quanto seus habitantes eram medrosos, frágeis e inseguros. Nessa Cidade de Porcelana, não havia líder. E todos tinham muito medo de se machucar. O medo os fazia evitar experiências e contato com outras pessoas, e era justamente essa falta de contato humano que os tornava frágeis. Afinal, nós crescemos quando nos relacionamos com as outras pessoas. 8. O Líder que é reconhecido por suas realizações Chega um momento em que o grupo passa por uma belíssima floresta onde o Leão disse que gostaria de viver para sempre. Ali se deparam com muitos animais, que reunidos 26 discutem seus problemas. Ao avistarem o Leão dirigem-se a ele chamando-o de O Rei dos Animais. Contaram-lhe que uma feroz criatura os ameaçava, impedindo que vivessem em paz. O Leão prometeu que a destruiria se eles o elegessem de fato o Rei dos Animais. Ele cumpriu a promessa livrando-os da fera, e tornou-se seu líder, prometendo voltar logo para ocupar sua função, assim que Dorothy estivesse em segurança no Kansas. A viagem prosseguiu, e enfrentaram juntos novas dificuldades. Até que com a ajuda dos Macacos Alados chegaram a uma bela terra, rica e feliz, a terra de Glinda, a outra Bruxa Boa. Glinda recebeu-os no seu castelo. Conhecendo suas dificuldades prometeu ajudá-los. Aqui vemos de novo um tema recorrente: a importância de contarmos nossos problemas para a pessoa adequada que possa talvez nos ajudar: - O que posso fazer por você, minha menina? Dorothy contou à Bruxa toda a sua história: como o ciclone a trouxera para a Terra de Oz, como encontrara seus companheiros e as maravilhosas aventuras que tinham passado. -Meu maior desejo agora é voltar para o Kansas, porque tia Em certamente está pensando que alguma coisa horrível aconteceu comigo – contou a menina. (p. 158) Glinda ensinou a Dorothy o que fazer para retornar ao Kansas. Mas antes queria saber o que fariam os demais quando ela partisse. O Espantalho voltaria à Cidade das Esmeraldas, onde 27 agora era governador. O lenhador regressaria para governar os Winkies, seu povo. O Leão sentia-se no dever de voltar para aquela floresta onde fora eleito o Rei dos Animais e onde seria muito feliz, agora com a coragem adquirida. Então os Macacos Alados os levam para seus destinos. E os sapatos prateados – cujo segredo Glinda revelara – levaria a menina de volta ao lar: - Seus Sapatos de Prato irão carregar você pelo deserto – disse Glinda – Se soubesse do poder deles, poderia ter voltado para sua tia Em no mesmo dia em que chegou até esse país. - Bem, mas nesse caso eu não teria meu maravilhoso cérebro! Poderia ter passado a vida inteira num milharal – afirmou o Espantalho. - Nem eu teria meu belo coração – disse o Homem de Lata – e poderia ficar enferrujando para sempre naquele mesmo lugar na floresta. - E eu teria continuado um covarde para sempre – declarou o Leão – E nenhuma criatura na floresta teria nada de bom para dizer de mim. - Tudo isto é verdade, e estou contente por poder ter sido útil para esses bons amigos. Mas agora que cada um tem o que mais desejava e cada um está contente em ter uma terra para governar, acho que está na hora de voltar para o Kansas. (p. 159) Nessa passagem vemos o tema da importância de saber quando se separar. Dorothy e seus amigos ficaram juntos o tempo necessário para que cada um conseguisse o que procurava. Uma vez tendo atingido seu objetivo, chega o momento propicio para 28 a separação. As experiências vividas em comum seguem dentro de cada um como uma reserva de força, coragem, e crescimento. Os “sapatos” que tem poderes mágicos simbolizam o poder de fazer a viagem. Representam os meios que nos levam a conhecer o mundo e também nos levam de volta ao lar, nosso porto seguro. Dorothy cresceu no caminho e ajudou no crescimento de seus companheiros. Ela se sentiu muito contente de ter sido útil no desenvolvimento de cada um deles, e sabe reconhecer que chegou o momento da separação, pois cada um tem uma nova tarefa especifica a cumprir. Por ter aprendido, sabe que a lembrança e o aprendizado nunca irão abandoná-los. Dorothy e seus companheiros se desenvolveram na travessia que fizeram, e representam o herói no sentido mais amplo de que nos fala a filósofa Hannah Arendt na Condição Humana: O herói revelado pela historia não precisa ter qualidades heróicas; originalmente, isto é, em Homero, a palavra herói era apenas um modo de designar qualquer homem livre que houvesse participado da aventura troiana. Em Homero, a palavra heros sem duvida implicava distinção, mas uma distinção que estava ao alcance de qualquer homem livre. Em nenhum momento tem o significado ulterior de “semideus”, resultante talvez da deificação dos antigos heróis épicos ) e do qual se podia contar uma historia. A conotação de coragem, que hoje reputamos a qualidade indispensável a um herói, já está, de fato, presente na mera disposição de agir e falar, de inserir-se no mundo e começar uma historia própria,. E esta coragem não está necessariamente nem principalmente associada a 29 disposicao de arcar com as conseqüências; o proprio ato do homem que abandona seu esconderijo para mostrar quem é, para revelar e exibir sua individualidade, já denota coragem e até mesmo ousadia.”. (pg. 99). Conforme afirmara Glinda, os sapatos têm poderes maravilhosos e conseguem colocá-la bem em frente à nova casa que o tio havia construído. O reencontro com Tia Emily foi lindo, repleto de alegria e de felicidade. Anuncia uma nova realidade – agora colorida- representada pela nova casa que tio Henry construiu. 9. Reflexões finais Como a filósofa Hannah Arendt afirma, se alguém ama o mundo e ama as crianças, vai querer apresentar o mundo a elas, para que elas se sintam fazendo parte dele e possam, quando crescerem, ter a chance de agir e criar no mundo. A melhor forma de apresentar o mundo é através das histórias que fazem parte da herança da humanidade. Se amamos o mundo e “se amamos nossas crianças o bastante para não expulsa-las do mundo, e abandoná-las aos seus próprios recursos”, as preparamos para a oportunidade de empreender alguma coisa nova e imprevista por nós, as preparamos “para a tarefa de renovar o mundo”. 30 Frank Baum, no prefácio do livro O Mágico de Oz mostra essa importância de se contar historias para as crianças, ao escrever que “o folclore, as lendas, os mitos e os contos de fadas acompanham a infância através dos tempos, pois toda criança saudável adora histórias fantásticas e manifestamente irreais. As fadas aladas de Grimm e Andersen trouxeram mais felicidade aos corações infantis do que qualquer outra criação humana”. Lewis Carrol, em Alice no País das Maravilhas, outro clássico da literatura, escreve no final sobre essa mesma idéia. A história termina com Alice acordando de seu sonho e o contando para a irmã. Esta ficou pensando nas histórias que Alice lhe contara, e sentiu que estava entrando também num sonho, igualmente maravilhoso. No seu sonho já via Alice adulta, contando historias para crianças: Por fim, ela imaginou que esta mesma irmãzinha seria no futuro uma mulher adulta, que ela conservaria nos anos mais maduros o coração simples e amoroso da sua infância, que ela reuniria ao redor de si outras criancas, fazendo os olhinhos brilharem desejosos de mais uma história estranha, talvez até com o sonho do País das Maravilhas do passado, e que ela se compadeceria de suas tristezas simples e encontraria prazer em todas as suas alegrias simples, lembrando-se da sua própria infância e dos dias felizes de verão. (p.172) Pensamos que esses livros na realidade são como sonhos, produtos do nosso mundo interno. Ilustram toda nossa riqueza 31 que desde os tempos de Homero é a mesma – a feiticeira Circe, o Ciclope, Cilas, Caribdes, a deusa Palas Atenas, Penélope...e Ulisses, que como Dorothy só queria voltar para seu lar, sua Ítaca. Sabemos do papel privilegiado que tinham os aedos na Grécia Antiga, aqueles contadores de histórias que não nos deixavam esquecer quem éramos. Nos Círculos de Leitura, continuamos a tradição milenar dos aedos, contando essas historias que, como nos lembra o poeta e filósofo Unamuno, os outros sonharam para nós: Ler, ler, ler Viver a vida que os outros sonharam Ler, ler, ler Porque a alma se esquece Das coisas que passaram 32 33 34 Círculos de Leitura 35 Realização: Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial Rua Ceará, 02 – Higienópolis - 01243-010 São Paulo – SP. Tel: (11) 3824-9633 Fax: 3825-2637 www.braudel.org.br - [email protected] 36
Documentos relacionados
Mágico de Oz e Pink Floyd: coincidência?
homem que morreu pendurado durante as filmagens. O fundo do álbum pode ser preto para simbolizar a morte. É também uma boa insinuação que a primeira música do álbum, Breathe, é destinado ao homem. ...
Leia mais