Coleção: Gestão da Saúde Pública - Universidade Federal de Santa

Transcrição

Coleção: Gestão da Saúde Pública - Universidade Federal de Santa
C oleç ão
Gestão da
Saúde Pública
Universidade Federal de Santa Catarina
Centro Socioeconômico
Departamento de Ciências da Administração
Coleção:
Gestão da Saúde Pública
Volume 1
Maurício Fernandes Pereira
Alexandre Marino Costa
Gilberto de Oliveira Moritz
Denise Aparecida Bunn
Organizadores
Editora Fundação Boiteux
Florianópolis
2013
©2013 Departamento de Ciências da Administração CSE/UFSC. Todos os direitos reservados.
Os conceitos em trabalhos assinados são de exclusiva responsabilidade de seus autores. As matérias desta
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da Saúde Pública, através da UFSC. O leitor se compromete a utilizar o conteúdo desta obra para aprendizado pessoal, sendo que a reprodução e distribuição ficarão limitadas ao âmbito interno dos cursos.
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sanções cíveis cabíveis à espécie.
O48iAutor
C691
Coleção
: Gestão
da/Saúde
: volume
1 / da
Maurício
Pereira,:Alexandre
Orientações
aos
autores
João Púbica
da Silva
e Pedro
Silva.Fernandes
– Florianópolis
DepartaMarino Costa,
Gilberto de Oliveira
Moritz,
Denise Aparecida
organizadores.
–
mento de Ciências
da Administração
/ UFSC;
[Brasília]
: CAPESBunn,
: UAB,
2010.
160p. : il. Florianópolis : Fundação Boiteux, 2013.
206p.
Inclui bibliografia
Bacharelado em Administração Pública
Inclui referências
ISBN: 978-85-7988-077-3
ISBN: 978-85-7840-084-2
1. Direito público. 2. Direito privado. 3. Direito constitucional. 4. Administração
pública. 5. Educação a distância. I. Costa, Tágory Figueiredo Martins. II. Coorde1. Saúde pública – Administração. 2. Produção científica. 3. Pesquisa. I. Pereira,
nação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Brasil). III. Universidade
Maurício Fernandes. II. Costa, Alexandre Marino. III. Moritz, Gilberto de Oliveira.
Aberta do Brasil. IV. Título.
IV. Bunn, Denise Aparecida.
CDU: 342
CDU: 614
Catalogação na publicação por: Onélia Silva Guimarães CRB-14/071
PRESIDENTA DA REPÚBLICA
Dilma Rousseff
MINISTRO DA SAÚDE
Alexandre Padilha
PREFEITO DE FLORIANÓPOLIS
Cesar Souza Júnior
VICE-PREFEITO DE FLORIANÓPOLIS
João Antônio Heinzen Amin Helou
SECRETÁRIO DA SAÚDE DE FLORIANÓPOLIS
Carlos Daniel Magalhães da Silva Júnior
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
Reitora
Roselane Neckel
Vice-Reitora
Lúcia Helena Pacheco
CENTRO SOCIOECONÔMICO
Diretora
Elisete Dahmer Pfitscher
Vice-Diretor
Rolf Hermann Erdmann
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS DA ADMINISTRAÇÃO
Chefe do Departamento
Marcos Baptista Lopez Dalmau
Subchefe do Departamento
Marilda Todescat
PROJETO MINISTÉRIO DA SAÚDE/PMF/UFSC/CSE/CAD
Coordenador do Projeto
Maurício Fernandes Pereira
Subcoordenador do Projeto
Alexandre Marino Costa
Coordenador Pedagógico
João Nilo Linhares
Coordenador Técnico
Gilberto de Oliveira Moritz
Coordenador Administrativo
Luis Carlos Cancellier de Olivo
Comissão Editorial
Luís Moretto Neto
Alexandre Marino Costa
Gilberto de Oliveira Moritz
Alessandra de Linhares Jacobsen
Maurício Fernandes Pereira
João Nilo Linhares
Marcos Baptista Lopez Dalmau
Projeto Gráfico
Annye Cristiny Tessaro
Rita Castelan Minatto
Diagramação, Capa e Ilustração
Adriano Schmidt Reibnitz
Finalização
Annye Cristiny Tessaro
Revisão de Português e Normalização da ABNT
Patrícia Regina da Costa
Sergio Luiz Meira
Sumário
Apresentação
O Processo de Acolhimento com Classificação de Risco na Unidade
de Pronto Atendimento Sul
9
13
Angela Cristina Medeiros
O Planejamento Estratégico na Gestão de Organizações Públicas
31
Camila Blum Weingartner
A Articulação entre Conselhos Locais de Saúde e Conselho Municipal
de Saúde do Município de Florianópolis: um olhar sobre a cidadania
deliberativa e o controle social 50
Débora Martini
Proposta de Implantação de um Programa de Gestão de Doenças
Crônicas na Rede Pública do Município de Florianópolis com Foco na
Redução de Morbidade Cardiovascular e na Economia de Recursos
Financeiros
75
Carlos Daniel M. S. Moutinho Júnior
Complexo Regulador de Florianópolis: gestão do acesso da atenção
especializada do Sistema Municipal de Saúde de Florianópolis
Deyse Ilza de Aquino
99
Análise dos Fatores que Influenciam a Motivação para o Trabalho de
Servidores Públicos de um Centro de Atenção Psicossocial de Álcool e
Drogas (CAPSad)
120
André Rosito Marquardt
Qualidade de Vida no Trabalho: enfoque no ambiente de trabalho das
Unidades Básicas de Saúde
143
Tatiana Domingues Scopel
Avaliação do Serviço de Odontologia: estudo em um Centro de Saúde de
Florianópolis/SC, em 2011
166
Ana Cristina Gerent Petry Nunes
Em Busca da Interdisciplinaridade: o trabalho multiprofissional na gestão
pública em saúde para a construção do Sistema Único de Saúde (SUS)
178
Débora Previatti
Perfil das Ações Judiciais de Medicamentos Atendidas até 2011 no Município
de Palhoça – Santa Catarina
190
Camila Mirian da Silva
Summary
Presentation
The Process of Reception with Risk Classification Unit Emergency Care
South
9
13
Angela Cristina Medeiros
Strategic Planning in the Management of Public Organizations
31
Camila Blum Weingartner
The Relationship Between Local Health Councils and Municipal Health
Council of the city of Florianópolis: a look at the deliberative citizenship
and social control 50
Débora Martini
Proposal to Implement a Program of Chronic Disease Management in
Public Network in Florianópolis with Focus on Reducing Cardiovascular
Morbidity and Economics of Financial Resources
75
Carlos Daniel M. S. Moutinho Júnior
Complex Regulator Florianópolis: managing access specialized care System
Municipal Health Florianópolis
99
Deyse Ilza de Aquino
Annalysis of the factors which influence work motivation of public workers
of a Psychosocial attention center for drug addiction (CAPSad)
120
André Rosito Marquardt
Quality of Life Work: focus in the work environment of Basic Healthcare
Units 143
Tatiana Domingues Scopel
Assessment of the Service of Dentistry: a study in a public health center in
Florianopolis/SC in 2011
166
Ana Cristina Gerent Petry Nunes
In Search of Interdisciplinarity: multiprofessional work in public health
management for the construction of the Unified Health System 178
Débora Previatti
Profile of Lawsuits Drug Answered by 2011 in the City of Palhoça – Santa
Catarina Camila Mirian da Silva
190
Apresentação
Apresentação
O Curso de Especialização Lato Sensu em Gestão da Saúde Pública
qualificou servidores que atuam na área da Saúde e proporcionou subsídios
para que melhorassem suas ações e contribuíssem para a qualidade dos serviços
prestados no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Esse aperfeiçoamento
foi importante, pois auxiliou na prática diária de cada profissional. Por isso,
estamos certos de que oferecemos a possibilidade de reflexão sobre a forma de
agir de cada um, principalmente com relação aos preceitos da ética e da moral.
O referido Curso, com carga horária de 420 horas foi finalizado em
dezembro de 2012 e teve como público participante servidores integrantes do
Sistema Único de Saúde (SUS), na região da Grande Florianópolis.
O sucesso do empreendimento foi indiscutível, com a aprovação de mais
de 70% do seu corpo discente. Além disso, como produto da sua aprendizagem,
cada estudante apresentou, ao final, um trabalho de conclusão de curso no
qual pôde demonstrar as habilidades e os conhecimentos adquiridos para a
análise e a solução de problemas do cotidiano da sua organização. A divulgação
dos trabalhos científicos produzidos pelos servidores integrantes do Sistema
Único de Saúde (SUS), na região da Grande Florianópolis, por ocasião da
conclusão do curso de pós-graduação em Gestão da Saúde Pública, é parte
do processo de aprimoramento do Sistema Único de Saúde, na medida em
que traz ao público a visão dos próprios servidores sobre determinados tópicos.
Compreendemos, assim, a responsabilidade do nosso sistema educacional e, em especial, do ensino superior em administração, no que se refere
a preparar profissionais para que atuem no mundo moderno. Esse é o nosso
comprometimento.
Com o intuito de documentar todos os trabalhos desenvolvidos neste
curso, serão publicadas 13 obras, divididas em volumes, cada uma com dez
artigos produzidos pelos estudantes do curso. Nesses trabalhos, será possível
constatar as dificuldades do SUS e as possíveis soluções para cada questão
levantada. Além disso, alguns trabalhos observam as melhorias já identificadas
do Sistema Único de Saúde (SUS).
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
9
Apresentação
Neste primeiro Volume, organizado pelos professores Maurício Fernandes
Pereira, Alexandre Marino Costa, Gilberto de Oliveira Moritz e Denise Aparecida
Bunn, apresentaremos o trabalho de Angela Cristina Medeiros, intitulado O
Processo de Acolhimento com Classificação de Risco na Unidade de Pronto
Atendimento Sul, em seu artigo, a autora constata que a superlotação dos
serviços de urgência e de emergência se dá principalmente por três fatores:
ineficiência de recursos tecnológicos e humanos da atenção básica, desconhecimento da população sobre quando utilizar os serviços de emergência e
falta de um sistema eficiente de referência e de contrarreferência de pacientes
a outros serviços. Em seguida será abordado O Planejamento Estratégico na
Gestão de Organizações Públicas, de autoria da estudante Camila Blum Weingartner, neste trabalho, a autora observa que o planejamento estratégico surge
como uma ferramenta muito importante para a administração, pois permite
nortear as ações gerenciais da organização dentro de um plano previamente
determinado de metas e de estratégias diminuindo, com isso, a possibilidade
de tomada de decisões equivocadas.
O terceiro trabalho, de Debora Martini, analisa a articulação entre os
Conselhos Locais de Saúde e o Conselho Municipal de Saúde do Município
de Florianópolis, este artigo traz um olhar sobre a cidadania deliberativa e o
controle social. Em seguida, Carlos Daniel M. S. Moutinho Júnior traz uma
proposta de implantação de um programa de gestão de doenças crônicas na
rede pública do município de Florianópolis, neste trabalho, o autor foca na
redução de morbidade cardiovascular e na economia de recursos financeiros.
Deyse Ilza de Aquino desenvolveu um trabalho que tem como objetivo
realizar uma avaliação da implantação do Complexo Regulador Regional de
Florianópolis/SC. André Rosito Marquardt analisou fatores que influenciam
a motivação de servidores públicos que atuam em um Centro de Atenção
Psicossocial para dependência química (CAPSad), no município de Florianópolis. Qualidade de Vida no Trabalho: enfoque no ambiente de trabalho das
Unidades Básicas de Saúde é o título do trabalho desenvolvido por Tatiana
Domingues Scopel, neste artigo, a autora, por meio de uma revisão de literatura exploratória e básica do tipo narrativa ou tradicional, analisou estudos
que apresentaram fatores relacionados à qualidade de vida no trabalho e
estudos sobre a qualidade de vida no trabalho vinculada aos profissionais da
área da saúde.
Ana Cristina Gerent Petry Nunes abordou, em seu artigo, como se dá
o acesso dos usuários ao serviço odontológico no bairro Saco Grande do
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Apresentação
município de Florianópolis. Em seguida, o trabalho de Débora Previatti, Em
busca da interdisciplinaridade: o trabalho multiprofissional na gestão pública em
saúde para a construção do Sistema Único de Saúde (SUS) discute a questão
do trabalho multiprofissional e a interdisciplinaridade no Sistema Único de
Saúde (SUS). E fechando este volume, Camila Mirian da Silva, em seu artigo,
aborda o perfil das ações judiciais relacionadas à solicitação de determinados
medicamentos até 2011 no município de Palhoça.
Desejamos a todos uma excelente leitura com expectativas para os
próximos volumes!
Maurício Fernandes Pereira
Alexandre Marino Costa
Gilberto de Oliveira Moritz
Denise Aparecida Bunn
Organizadores
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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O Processo de Acolhimento com
Classificação de Risco na Unidade de
Pronto Atendimento Sul
Aluna: Angela Cristina Medeiros1
Orientador: Mário de Souza Almeida2
Tutora: Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino3
Resumo
Abstract
Este artigo tem como objetivo propor ações
de melhoria ao processo de acolhimento
com classificação de risco realizado pelo enfermeiro, na unidade de Pronto Atendimento
Sul, localizada no Município de Florianópolis, Santa Catarina. Trata-se de um estudo de
caso com abordagem qualitativa. Constatou-se através deste estudo que a superlotação
dos serviços de urgência e de emergência se
dá principalmente por três fatores: ineficiência
de recursos tecnológicos e humanos da atenção básica, desconhecimento da população
sobre quando utilizar os serviços de emergência e falta de um sistema eficiente de referência e de contrarreferência de pacientes a outros serviços. Durante a pesquisa, foi possível
identificar alternativas de ação que permitem
lidar com as dificuldades detectadas.
This article aims to propose actions to improve the process of embracement with risk
classification performed by nurses in the
Emergency Care Unit South, located in Florianópolis, Santa Catarina. This is a case study with a qualitative approach. It was found
through this study that the overcrowding of
emergency departments and emergency is
primarily by three main factors: inefficiency
of technological and human resources of
primary health care, ignorance of the public
about when to use the emergency services
and the lack of an efficient system reference
and cross reference of patients to other services. During the research, it was possible to
identify alternative actions that would allow
dealing with the difficulties encountered.
Key words: Embracement. Risk classificaPalavras-chave: Acolhimento. Classificação tion. Emergency.
de Risco. Emergência.
1
Enfermeira especialista em Enfermagem de Emergência e Terapia Intensiva pela
Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL); graduada pela Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC). E-mail: [email protected].
2
Doutor em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina (2004).
E-mail: [email protected].
3
Mestranda do curso de Administração Universitária da Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC). E-mail: [email protected].
O Processo de Acolhimento com Classificação de Risco na Unidade de Pronto Atendimento Sul
1Introdução
A partir da criação do Sistema Único de Saúde (SUS), um dos grandes
problemas enfrentados pela população tem sido a garantia do acesso do
usuário à rede de saúde. Em geral, os serviços de urgência e emergência têm
sido reconhecidos pelos usuários como a melhor forma de buscar atendimento
por se tratar de serviços que funcionam 24 horas por dia. (BRASIL, 2004)
As unidades de urgência e emergência foram criadas com o intuito
de prestar atendimento imediato a pacientes com agravo de saúde, oferecer
serviços de alta complexidade e de diversidade para atender essa demanda
e garantir todas as manobras de sustentação à vida, dando continuidade à
assistência no local ou referenciar pacientes a outro nível de atenção. (CALIL;
PARANHOS, 2010 apud NASCIMENTO, 2011)
Por atender à livre demanda, as unidades de emergência convivem
diariamente com o problema de superlotação de pacientes, que, muitas vezes,
utilizam esse serviço de forma inadequada, seja para resolução das afecções
crônicas, seja pela dificuldade ao acesso à rede básica, entre outros.
Ciente dos problemas existentes, o Ministério da Saúde instituiu, em
2003, a Política Nacional de Atenção às Urgências (PNAU), formando uma
rede de serviços regionalizada e hierarquizada de cuidados integrais às urgências. (BRASIL, 2004)
A partir da criação dessa política, observou-se a necessidade de uma
reorganização no processo de trabalho, por isso, o atendimento ao paciente
que se dava através de filas por ordem de chegada, agora passaria por um
novo processo chamado acolhimento com classificação de risco.
Na visão de Solla (2005), o acolhimento pressupõe uma atitude da equipe
de saúde que permite receber bem e dar atenção aos usuários de forma mais
humanizada, identificando soluções adequadas às demandas apresentadas.
A classificação de risco tem por objetivo priorizar o atendimento dos
pacientes que se encontram em estado de maior gravidade, sendo realizada
por um profissional enfermeiro, que por meio da escuta e da aferição de sinais
vitais classifica o risco por cores definindo a ordem de atendimento.
A motivação para a realização deste artigo surgiu pelo fato de observar
a atuação da Unidade de Pronto Atendimento Sul há alguns anos, desde que
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Angela Cristina Medeiros # Mário de Souza Almeida # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
o atendimento aos pacientes era realizado por ordem de chegada e não pelo
sistema de classificação de risco vigente.
Com a mudança no processo de trabalho, começaram a surgir contra­‑
-tempos como a dificuldade de aceitação dos pacientes perante a classificação
de risco ordenando o fluxo de atendimento e seu encaminhamento a outros
serviços de referência.
Frente ao exposto, esta pesquisa teve como pergunta norteadora esta:
Como melhorar o processo de Acolhimento com Classificação de Risco na
Unidade de Pronto Atendimento (UPA Sul)?
Como objetivo geral da pesquisa buscou-se propor ações de melhoria
ao processo de acolhimento com classificação de risco na Unidade de Pronto
Atendimento Sul (UPA Sul).
Para alcançar o objetivo geral propõem-se os seguintes objetivos específicos:
a) Caracterizar a unidade de atendimento em estudo;
b) Descrever o processo de acolhimento com classificação de risco
realizado pelo enfermeiro;
c) Avaliar as dificuldades do enfermeiro acerca do trabalho prestado;
d) Identificar alternativas de ação que permitam lidar com as dificuldades detectadas.
2 Unidade de Emergência
As Unidades de Pronto Atendimento (UPA) são estruturas de complexidade intermediárias entre as Unidades Básicas de Saúde e as portas
de urgências hospitalares, compondo uma rede organizada de atenção às
urgências. (BRASIL, 2009)
De acordo com a Portaria GM n. 2.648, de 2011, o Ministério da Saúde
redefine diretrizes para implantação das UPAs 24 horas, esdtabelecendo como
suas competências:
a) Acolher usuários e familiares sempre que buscarem atendimento
nas 24 horas.
b) Articular-se com a Atenção Básica, SAMU, unidades hospitalares,
unidades de apoio diagnóstico e terapêutico e com outros serviços
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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O Processo de Acolhimento com Classificação de Risco na Unidade de Pronto Atendimento Sul
de atenção à saúde, construindo fluxos coerentes e efetivos de referência e contrarreferência, e ordenando esses fluxos por meio de
Centrais de Regulação Médica de Urgências e complexos reguladores
instalados na região.
c) Prestar atendimento resolutivo e qualificado aos pacientes acometidos
por quadros agudos ou agudizados de natureza clínica e prestar atendimento aos casos de natureza cirúrgica ou trauma, estabilizando os
pacientes e realizando a investigação diagnóstica inicial, de modo a
definir, em todos os casos, a necessidade ou não de encaminhamento
a serviços hospitalares de maior complexidade.
d) Fornecer retaguarda às urgências atendidas pela Rede de Atenção
Básica à Saúde.
e) Funcionar como local de estabilização de pacientes atendidos pelo
SAMU 192.
f) Realizar consulta médica em regime de pronto atendimento aos casos
de menor gravidade.
g) Realizar atendimentos e procedimentos médicos e de enfermagem
adequados aos casos demandados à unidade.
h) Prestar apoio diagnóstico e terapêutico ininterrupto nas 24 horas
do dia e em todos os dias da semana, incluindo feriados e pontos
facultativos.
i) Manter pacientes em observação, por período de até 24 horas, para
elucidação diagnóstica, e∕ou estabilização clínica.
j) Contrarreferenciar para os demais serviços de atenção integrantes
da Rede de Atenção às Urgências, proporcionando continuidade ao
tratamento com impacto positivo no quadro de saúde individual e
coletivo.
k) Solicitar retaguarda técnica ao SAMU sempre que a gravidade e a
complexidade dos casos ultrapassarem a capacidade instalada na
unidade.
As UPAs, por se tratarem de unidades de atendimento com livre demanda, acabam acolhendo todos os tipos de pacientes, desde os que não
conseguem consultas na atenção primária ou especializada, até os casos de
urgência e emergência.
Definindo conceito de emergência, Romani et al. (2009) apontam como
a ocorrência de situação crítica com potencial risco à vida, exigindo interven-
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Angela Cristina Medeiros # Mário de Souza Almeida # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
ção médica imediata; e urgência como uma ocorrência de agravo à saúde,
com risco iminente à vida, que exige intervenção rápida e efetiva por meio
de procedimentos que visem à proteção, à manutenção e à recuperação das
funções vitais acometidas.
3 Acolhimento com Classificação de Risco
A partir da década de 1990, com as mudanças na legislação do Sistema
Único de Saúde (SUS), a saúde passou a ser um direito do cidadão e dever do
Estado, nesse caso, as instituições são instigadas a reorganizar seus processos
de trabalho em busca da integralidade das ações, promovendo o acesso universal e igualitário da população aos serviços de saúde (MARQUES; LIMA,
2007). Pelo princípio da universalidade, o Estado deve garantir que todos os
cidadãos tenham acesso aos serviços de saúde, de forma que o atendimento
prestado tenha qualidade e resolutividade.
A descentralização dos serviços e das ações de saúde tem como função
transferir responsabilidades, prerrogativas e recursos aos governos municipais,
de modo que haja autonomia do nível local no uso de recursos e na definição e implementação das políticas de saúde (SOLLA, 2005). Nesse sentido,
os sistemas locais de saúde devem ter uma direção responsável, capacidade
de coordenar e de articular os recursos existentes, adequando-se à realidade
local, de forma que sejam desenvolvidas novas práticas, mais adequadas aos
problemas de saúde da população. (MATSUMOTO et al., 2007)
Segundo Santos et al. (2003), a rede de atenção à saúde é constituída
por três níveis de complexidade: as unidades de atenção primária, que são
unidades ambulatoriais e oferecem cuidados básicos de promoção, manutenção
e recuperação da saúde; unidades de atenção secundária, que podem ser ambulatoriais ou hospitalares, nas quais são prestados cuidados para afecções de
maior prevalência; e unidades de atenção terciária, constituídas pelos centros
hospitalares, caracterizados pelas internações. Os autores ainda citam que o
acesso do usuário aos serviços do SUS deve iniciar-se preferencialmente pela
atenção básica, sendo referenciado de acordo com a necessidade de recursos humanos e tecnológicos a serem aplicados para a resolução da afecção
apresentada. (SANTOS et al., 2003)
Historicamente, os serviços de emergência são reconhecidos pelos usuários como porta principal de entrada aos serviços de saúde, por se tratarem de
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O Processo de Acolhimento com Classificação de Risco na Unidade de Pronto Atendimento Sul
unidades que atendem 24 horas por dia, acolhendo a todos os usuários que
procuram o serviço, sendo eles caracterizados como urgência propriamente
dita, usuários que deveriam ter seu atendimento realizado na atenção primária
ou especializada, ou, ainda, usuários com urgências sociais. (BRASIL, 2006)
Segundo Garlet et al. (2009), a superlotação das unidades de emergência deve-se em parte às diferentes concepções que usuários, população e
profissionais de saúde têm ao definirem urgência. Outro fator é o descrédito
da população em relação aos serviços ofertados pela atenção primária e
a supervalorização do modelo curativista e hospitalocêntrico, que justifica
a grande demanda por serviços hospitalares, prejudicando a qualidade da
assistência àqueles que realmente necessitam de atendimento de urgência.
(AZEVEDO et al., 2010)
A elevada procura por consultas médicas, muitas vezes desnecessárias,
implica em custos individuais e em desperdício de recursos públicos, já que
boa parte da população não necessita de atendimento de emergência, mas
sim de atendimento de baixa complexidade, voltado para doenças crônicas
não transmissíveis, próprias do processo de envelhecimento da população
(POLL; LUNARDI; LUNARDI FILHO, 2008). Os autores ainda citam que a
superlotação, além de provocar desgaste dos profissionais devido à sobrecarga
de trabalho, causa ainda um sentimento de desperdício da vocação maior do
serviço que seria salvar vidas, bem como sua subutilização do preparo técnico.
O acesso dos usuários aos serviços de urgência e emergência se dava,
no passado, através de filas organizadas por ordem de chegada, porém, com o
aumento da demanda e a procura por esses serviços, observou-se um enorme
fluxo de circulação desordenada, tornando-se necessária a reorganização do
processo de trabalho, de forma a atender os diferentes graus de especificidade
e resolutividade na assistência. (BRASIL, 2004)
Com o intuito de qualificar a atenção nas redes de urgência e emergência, foi editada no ano de 2002 pelo Ministério da Saúde, a Portaria GM n.
2.048, que trata do Regulamento Técnico dos Sistemas Estaduais de Urgência
e Emergência, fazendo parte da Política Nacional de Atenção às Urgências
(PNAU), cujo pressuposto é garantir o acesso e o acolhimento nos serviços
de saúde, de acordo com a complexidade tecnológica, que deverá estar organizada de forma hierarquizada, prevenindo iatrogenias por manipulações ou
tratamento incorretos, evitando a morte ou as incapacidades físicas temporárias
ou permanentes. (BRASIL, 2006)
18
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Angela Cristina Medeiros # Mário de Souza Almeida # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
Para viabilizar o atendimento ao usuário que chega ao serviço de urgência e emergência, é utilizada a estratégia de implantação de acolhimento
com classificação de risco, visando reestruturar as práticas assistenciais por
meio de ações humanizadas, possibilitando incorporar critérios de avaliação
de risco. (SERVIN et al., 2010)
O Ministério da Saúde define o acolhimento como uma ação tecno-assistencial que pressupõe a mudança da relação profissional/usuário e sua
rede social através de parâmetros técnicos, éticos, humanitários e de solidariedade, reconhecendo o usuário como sujeito e participante ativo no processo
de produção da saúde. É um modo de operar os processos de trabalho em
saúde de forma a atender a todos que procuram os serviços de saúde, ouvindo seus pedidos e assumindo no serviço uma postura capaz de acolher,
escutar e pactuar respostas mais adequadas aos usuários. Implica prestar um
atendimento com resolutividade e responsabilização, orientando, quando for
o caso, o paciente e a família em relação a outros serviços de saúde para a
continuidade da assistência, e estabelecendo articulações com esses serviços
para garantir a eficácia desses encaminhamentos. (BRASIL, 2009)
Na visão de Solla (2005), o acolhimento, como proposta no Sistema
Único de Saúde, aparece como:
a) Postura∕Prática do profissional frente ao usuário em seu processo de
trabalho individual e coletivo.
b) Ação gerencial de reorganização do processo de trabalho da unidade de saúde, visando melhor atender aos usuários e a ampliar a
capacidade de identificar e resolver problemas.
c) Diretriz para as políticas de saúde, objetivando criar capacidade de
respostas às demandas, disponibilizando alternativas tecnológicas
adequadas.
O acolhimento com classificação de risco tem como objetivo ser um
dos instrumentos para organizar de melhor forma o fluxo dos pacientes que
procuram as unidades de urgência e emergência como porta de entrada.
Assim, quando o usuário chega ao setor de emergência, ele é acolhido pelo
enfermeiro que faz a escuta qualificada e o classifica com cores conforme
critérios de risco. (BRASIL, 2009)
O enfermeiro que atua na classificação de risco, além de classificar o
paciente de acordo com sua gravidade, evitando assim possíveis danos à sua
saúde, tem o papel de direcionar o paciente ao serviço de referência quando
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O Processo de Acolhimento com Classificação de Risco na Unidade de Pronto Atendimento Sul
isso se faz necessário, visto que a escolha do usuário pelos serviços de saúde
nem sempre condiz com uma situação de emergência e pode ser influenciada
por diversos fatores, como: tecnologia disponível, condições de acesso, agilidade no atendimento e vínculo dos usuários com os profissionais, serviços e
sistemas de saúde. (MARQUES; LIMA, 2007)
O processo de acolhimento com classificação de risco é feito por meio
de protocolos instituídos em cada unidade de atendimento, que permitem a
intervenção nos agravos no momento da avaliação, definindo assim a ordem
de atendimento.
Com o intuito de sugerir um protocolo direcionador, o Ministério
da Saúde elaborou uma cartilha na qual sugere a utilização de cores para
classificar a prioridade no atendimento: vermelho – considerado situação
de emergência, caracterizado pela necessidade de atendimento imediato;
amarelo – urgência, atendimento mais rápido possível; verde – caracterizado
como prioridade não urgente; e azul, cujo atendimento será feito por ordem
de chegada. (BRASIL, 2004)
4 Metodologia
Trata-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa, que apreende a
realidade e compreende os fenômenos e os processos sociais, manifestados no
cotidiano do trabalho e que têm reflexo direto e indireto na vida das pessoas
que buscam e recebem atendimento em saúde. (MINAYO, 2010)
O delineamento da pesquisa é o estudo de caso, que possibilita a investigação dos fenômenos no seu contexto real, analisando-os profunda e
intensamente. (YIN, 2005)
A coleta de dados foi realizada por meio da observação participante, em
uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA SUL), gerenciado pela Secretaria
Municipal de Florianópolis – SC. O foco de observação foi o processo de
acolhimento com classificação de risco realizado pelo enfermeiro, destacando
o atendimento à população, bem como a organização do processo de trabalho. A análise dos dados foi feita seguindo diretrizes do método qualitativo:
ordenação, classificação em estruturas de relevância, síntese e interpretação.
(MINAYO, 2010)
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Angela Cristina Medeiros # Mário de Souza Almeida # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
A interpretação possibilitou uma visão mais ampla do serviço, permitindo
desenvolver algumas estratégias de ação de forma que pudesse vir a contribuir
com a organização do processo de trabalho.
5 Análise dos Dados
A Unidade de Pronto Atendimento Sul (UPA Sul), localizada no Município de Florianópolis, funciona 24 horas por dia e é gerenciada pela Prefeitura
Municipal de Saúde, garantindo 100% do atendimento à população através
do Sistema Único de Saúde (SUS). Fundada em 10 de setembro de 2008,
a UPA Sul conta com atendimento de enfermagem, odontologia, assistência
social e três especialidades médicas (Clínica, Cirúrgica e Pediatria).
Durante o primeiro ano de funcionamento da UPA Sul não havia um
método formalizado de triagem dos pacientes que procuravam atendimento;
após a realização do cadastro inicial, eles aguardavam a consulta por ordem de
chegada. Muitas vezes, familiares ou funcionários da recepção encaminhavam
os pacientes diretamente à sala de emergência para que fossem avaliados, sem
que necessariamente se encaixassem em uma situação de risco. O atendimento
era feito sem protocolos e eventualmente partindo da percepção pessoal do
funcionário, sem registros técnicos no prontuário.
Com o aumento crescente da demanda de pacientes e tendo como consequência um maior tempo de espera até o atendimento médico, observou-se
a necessidade de uma reorganização no processo de trabalho da unidade,
alterando o fluxo de atendimento e implantando o acolhimento com classificação de risco guiado por protocolos.
Atualmente, o acesso da população ao serviço de Pronto Atendimento
Sul ocorre primeiramente com o preenchimento de um cadastro na recepção, de um sistema informatizado INFOSAÚDE. Através desse cadastro, o
paciente já é direcionado a uma especialidade (Clínica Médica, Pediatria,
Enfermagem, Clínica Cirúrgica, Odontologia, Assistência Social), conforme
a queixa relatada. Após a realização do cadastro, os pacientes aguardam ser
chamados para a realização do acolhimento com classificação de risco, salvo
em situações de emergência.
São verificados os sinais vitais (pressão arterial, temperatura, frequência
e cardíaca.) de acordo com a queixa relatada. Por meio do sistema informatizado, o enfermeiro classifica o paciente por cores (amarelo, verde, azul) e ele
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
21
O Processo de Acolhimento com Classificação de Risco na Unidade de Pronto Atendimento Sul
retorna à recepção, onde aguarda ser chamado para a consulta médica. A cor
vermelha geralmente não é classificada, pois é considerada emergência, exigindo atendimento imediato, dispensando a classificação e o tempo de espera.
Devido ao acolhimento, o enfermeiro tem a possibilidade de reorganizar
o fluxo de atendimento, contudo não é uma tarefa fácil. Pacientes classificados
como azuis (ambulatoriais), ou seja, que não se encaixam no atendimento
prioritário, muitas vezes, geram conflitos com profissionais e até mesmo com
outros pacientes, pois se sentem injustiçados pela forma de classificação.
A cultura ainda é baseada no modelo biomédico, ou seja, os pacientes
procuram a unidade de saúde com anseio de resolver seus problemas por
meio de atendimento do profissional médico e da realização de exames e
medicações, gerando insatisfação por parte de alguns pacientes em receber
o primeiro atendimento pelo profissional enfermeiro.
Alguns fatores contribuem para a aglomeração excessiva de pacientes
na Unidade de Pronto Atendimento: demanda aleatória com predomínio de
pacientes ambulatoriais, deficiência de recursos humanos (equipe médica,
enfermagem, radiologia) e sistema de atenção básica ineficiente.
Observa-se que o maior número de atendimentos concentra-se na
clínica médica, e a equipe médica compõe-se de dois clínicos por plantão,
salvo em alguns dias que esse número aumenta para três. Mesmo com três
clínicos prestando atendimento, há dias em que o tempo de espera se torna
superior a três ou quatro horas. Nesta unidade são recebidos diversos tipos
de pacientes: os que procuram atendimento por agravos agudos, os que procuram atendimento por não conseguirem marcação de consultas na unidade
básica de saúde (tanto por falta de profissionais quanto pelo número reduzido
de fichas distribuídas) e os que realmente não procuram a unidade básica de
saúde pela facilidade de encontrar profissionais de saúde, 24 horas por dia,
no pronto atendimento.
Grande parte dos conflitos gerados por pacientes e por profissionais de
saúde refere-se às diferentes concepções sobre o termo “urgência”. Na visão
do profissional de saúde, a urgência é caracterizada por uma situação de risco
em que há necessidade de uma intervenção imediata; na visão do paciente,
a concepção de urgência é bem diferente. Durante o acolhimento é possível
observar que, pela ótica do paciente, várias situações se caracterizam como
urgência: ter que pegar o filho na escola no final do dia, estar amamentando,
estar esperando há dois meses para realizar exames pelo posto de saúde (vem
22
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Angela Cristina Medeiros # Mário de Souza Almeida # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
ao pronto atendimento, pois aqui é realizado na hora), a medicação terminou
e está sem receita, entre outros.
Pela classificação de risco, o profissional enfermeiro procura ouvir a
queixa do paciente e orientá-lo a procurar o serviço de saúde mais apropriado,
orientando a função do serviço de urgência e emergência, pois muitos pacientes
procuram a Unidade de Pronto Atendimento com a perspectiva de que todos
os seus problemas sejam resolvidos ali. Mesmo com a orientação de que seu
problema de saúde não poderá ser solucionado neste local, o enfermeiro não
tem autonomia para encaminhar o paciente à unidade de referência sem que
ele seja atendido pelo médico para, então, poder ser referenciado.
A alta demanda de pacientes no serviço de pronto atendimento se dá
principalmente pela dificuldade de referência e de contrarreferência à rede
básica de saúde.
Nascimento et al. (2011 apud LOPES, 2011, p. 29 ) referem que:
A articulação entre os diferentes níveis de serviços de saúde, a
organização do fluxo de pacientes e a obtenção de referências
resolutivas, são elementos indispensáveis para se promover a
universalidade do acesso, e equidade na alocação de recursos e a
integralidade na ação prestada. Porém na prática, a inexistência de
um sistema de referência e contra referência, interfere na qualidade
do atendimento resultando em acúmulo de usuários no serviço e
insatisfação e sobrecarga dos funcionários do setor. Mesmo sendo
o usuário classificado como não grave e referenciado ao seu posto
de saúde para atendimento, a maioria dos pacientes preferem
esperar horas para serem avaliados pelo médico da emergência.
Mesmo havendo um fluxograma de atendimento em toda rede municipal, garantindo a referência e a contrarreferência de pacientes entre a Rede de
Atenção Básica, as Unidades de Pronto Atendimento, o SAMU e as Unidades
Hospitalares, é notável a dificuldade em manter esse sistema.
Há uma inversão no fluxo de atendimento, isto é, o atendimento que
deveria ser inicialmente realizado na rede básica de saúde, é iniciado no
pronto atendimento, onde é percebido que o paciente tem uma falsa ideia de
resolutividade, pois é um local no qual são realizados medicações e exames
imediatamente sem ter que esperar nas filas da atenção primária. Sendo assim, o problema de superlotação na Unidade de Pronto Atendimento vem se
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
23
O Processo de Acolhimento com Classificação de Risco na Unidade de Pronto Atendimento Sul
agravando, pois a maioria dos pacientes resiste em ser contrarreferenciado às
unidades básicas devido à demora na marcação de consultas ou de exames.
Um problema muito comum é a falta de profissionais médicos em
unidades básicas de saúde, isso faz com que os pacientes, ao procurar sua
unidade de saúde, sejam encaminhados ao pronto atendimento para todo tipo
de necessidade: renovação de receitas, encaminhamentos para especialidades
e requisição para exames, descaracterizando a função de pronto atendimento
e causando superlotação da unidade, sobrecarga e má utilização dos profissionais que ali trabalham.
É nítido que o processo de acolhimento com classificação de risco trouxe
uma melhoria na organização do atendimento ao paciente na unidade, pois
prioriza os casos de maior gravidade. Contudo, a maior parte dos usuários
que procuram esse serviço poderia ser referenciada à atenção primária, o que,
muitas vezes, não é possível devido à falta de profissionais na rede básica.
Essa situação geralmente causa uma sensação de abandono e de insatisfação por parte do usuário que precisa se deslocar de um serviço a outro
para conseguir atendimento.
Em relação às dificuldades detectadas, sugerem-se algumas alternativas
de ação, primeiramente, no que diz respeito à classificação por cores, que
definirá a ordem do atendimento ao paciente:
a) Divulgar fluxograma de atendimento e classificação de risco por
cores estabelecendo prioridades de atendimento demonstrado em
banners na recepção.
b) Fornecer pulseiras com cores da classificação de risco aos pacientes
após o acolhimento, para que acompanhem sua ordem de atendimento.
c) Designar um funcionário do setor para orientação da população
enquanto aguarda atendimento.
A divulgação da classificação de risco por cores por meio de banners
na recepção, bem como a ajuda de recursos humanos para orientar e sanar
dúvidas da população quanto ao processo de classificação de risco, constitui
em um fator importante para diminuir a tensão causada pelo tempo de espera,
melhorando a qualidade do atendimento.
As pulseiras com cores organizariam o atendimento na recepção, visto
que os pacientes saberiam sua classificação e, consequentemente, teriam ideia
do tempo de espera para o atendimento.
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Angela Cristina Medeiros # Mário de Souza Almeida # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
Em relação ao sistema de referência e de contrarreferência de pacientes,
percebe-se que na prática ainda existem grandes lacunas a serem preenchidas
nos modelos de atenção e gestão dos serviços de saúde pública. Os diversos
níveis de atenção à saúde devem formar uma rede de recursos de modo que
um complemente a ação do outro.
Para que haja resolutividade do sistema, primeiramente deve ser estruturada a rede de atenção básica. O sistema municipal de saúde deve garantir
recursos financeiros, de forma que seja suficiente o número de recursos humanos e de recursos tecnológicos, a fim de garantir à população consultas
e tratamento adequados, sem que seja necessário recorrer às unidades de
pronto atendimento para este fim.
Um esclarecimento à população sobre quando e como utilizar os serviços de emergência, bem como a capacitação dos profissionais em acolher
adequadamente o usuário nos diversos níveis de atenção, contribuirá para
um melhor funcionamento do sistema de saúde.
Para Rossaneis et al. (2011), o sucesso em reduzir a superlotação nos
serviços de saúde de emergência só é possível se for organizado o fluxo de
atendimento em toda rede de saúde, como a participação de todos os serviços
da rede, pois o grande número de atendimento nos serviços de emergência
indica baixo desempenho do sistema de saúde.
A proposta do acolhimento na unidade de pronto atendimento assume
a postura de reorganizar o processo de trabalho, identificando a demanda e
disponibilizando alternativas de tratamento mais adequadas.
Segundo Ulhoa et al. (2010), a inovação gerencial deve ser acompanhada de uma cotidiana reflexão, em relação aos critérios de acesso na porta
de entrada dos serviços de emergência, atendendo à demanda nos contextos
social, político e econômico.
Para viabilizar o atendimento aos pacientes que procuram a unidade
de pronto atendimento e precisam ser encaminhados às unidades básicas de
saúde, sugere-se a criação de um sistema de regulação de consultas informatizado, que permitiria a marcação de consultas na atenção primária, pelo
menos um dia na semana, aos casos que necessitassem do atendimento desse
serviço com mais urgência.
Sugere-se também, por meio desse sistema, agendar o acolhimento
nas unidades básicas de saúde, garantindo que o usuário seja atendido por
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
25
O Processo de Acolhimento com Classificação de Risco na Unidade de Pronto Atendimento Sul
um profissional de saúde na unidade referenciada, criando novas alternativas
para atendimento da demanda.
A partir das medidas estabelecidas, é importante que se mantenha a
articulação entre os níveis de atenção primária e urgência e emergência; para
isso, torna-se necessária a realização de reuniões periódicas entre representantes
dos diversos níveis de atenção e gestores de saúde, para definir estratégias de
melhorar o atendimento.
6 Considerações Finais
O acolhimento com classificação de risco na Unidade de Pronto Atendimento Sul possibilitou uma melhoria no que diz respeito à priorização do
atendimento em relação à gravidade dos casos, o que caracteriza a real função
de pronto atendimento.
Ainda há dificuldade de aceitação da população no que diz respeito a
esse novo método de trabalho; a partir da classificação de risco, os usuários
com menor gravidade automaticamente terão um tempo de espera superior
aos demais, contudo, grande parte desses usuários não compreende o método de classificação, sentindo-se lesados e, por isso, gerando conflitos entre
profissionais de saúde e usuários.
O acolhimento como ferramenta de gestão, além de organizar o fluxo de atendimento, possibilita que o usuário seja referenciado para outros
níveis de atendimento. Entretanto, na prática, o sistema de referência e de
contrarreferência deve estar organizado de forma que o usuário consiga ser
alocado nos diversos níveis de atenção, de acordo com sua queixa principal.
O redirecionamento dos usuários a outros serviços de saúde visa diminuir
a superlotação dos serviços de emergência, mas, para isso, é preciso que a
atenção primária esteja estruturada de forma adequada, provida de recursos
humanos e tecnológicos, a fim de assegurar o atendimento ao usuário.
A partir deste estudo, foi possível concluir que para que haja melhorias
no setor de pronto atendimento, é preciso primeiramente educar e orientar a
população quanto à utilização desses serviços; é preciso que toda a rede de
atenção à saúde esteja estruturada e pactuada, de forma que seja alcançada
a tão sonhada acessibilidade, a integralidade e a resolutividade dos serviços
em saúde.
26
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Angela Cristina Medeiros # Mário de Souza Almeida # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
Para isso, é necessária a participação ativa de gestores, dos trabalhadores
e dos usuários na construção desse processo, de forma que as dificuldades
encontradas sejam analisadas e discutidas amplamente, sempre objetivando
melhoria da assistência e qualificação nos processos de trabalho.
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
O Planejamento Estratégico na Gestão de
Organizações Públicas
Aluna: Camila Blum Weingartner1
Orientador: Mauricio Fernandes Pereira2
Tutora: Isadora Souza Bernardini3
Resumo
Abstract
Diante das inúmeras mudanças no cenário das
organizações, especialmente na gestão pública após a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), o planejamento estratégico surge
como uma ferramenta muito importante para
a administração, pois permite nortear as ações
gerenciais da organização dentro de um plano
previamente determinado de metas e de estratégias diminuindo, com isso, a possibilidade de
tomada de decisões equivocadas. Esse artigo
visa destacar a importância do planejamento estratégico como instrumento do processo
de gestão das organizações de saúde pública,
contribuindo para que elas se tornem mais eficientes. Trata-se de uma Revisão de Literatura
baseada na consulta de livros e de artigos, tanto na forma impressa quanto eletrônica.
Faced with numerous changes within the
organizations, especially in public administration after the creation of the Brazilian
Unified Health System (SUS), strategic planning emerges as a very important tool for the
administration, it allows guiding the management actions of the organization within a
predetermined plan of goals and strategies
diminishing thereby the possibility of making
wrong decisions. This article aims to highlight
the importance of strategic planning as a tool
in the process of management of public health organizations, contributing to allow them
to become more efficient. This is a Literature
Review based on consultation of books and
articles, both in print and electronic.
Palavras-chave: Planejamento Estratégico.
Gestão. Saúde Pública.
1
Key words: Strategic Planning. Management. Public Health.
Enfermeira Especialista em Emergência Pré-Hospitalar pelo Instituto Superior de Ensino,
Pesquisa e Extensão (2009). E-mail: [email protected].
2
Pós-Doutor pela USP e pela Universidade Técnica de Lisboa; Doutor em Engenharia de
Produção pela UFSC. E-mail: [email protected]
3
Mestre em Administração pela Universidade Federal de Santa Catarina (2012).
E-mail: [email protected].
O Planejamento Estratégico na Gestão de Organizações Públicas
1Introdução
Com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), em 1988, surgiram
inúmeros desafios aos gestores, em nível federal, estadual e municipal, bem
como para os trabalhadores que atuam na Rede Pública. Com a descentralização político-administrativa e a universalização do acesso aos serviços de
saúde, os gestores assumiram um papel fundamental no planejamento e na
execução dos serviços. Como parte de suas atribuições, os gestores devem
cumprir e fazer cumprir os princípios e as diretrizes do SUS, com destaque
para a resolutividade das ações, a integralidade, a igualdade e a preservação
da autonomia das pessoas na assistência à saúde, bem como a garantia de
informações e de participação da comunidade na efetivação do SUS. (KLEBA;
KRAUSER; VENDRUSCOLO, 2011)
Do administrador em saúde pública ao gerente da rede de unidades e
serviços do setor público de produção de assistência à saúde, esse personagem
contemporâneo – o gestor público – defronta-se com uma prática de grande
complexidade, resultante de novos desafios, dentre eles o de encontrar a
melhor via de obter alta resolutividade e boa qualidade técnico-científica das
ações que serão produzidas. (SCHRAIBER et al., 1999)
São grandes as dificuldades encontradas na atuação dos responsáveis
por gerir, administrar e proporcionar a prestação de serviços satisfatórios e
oferecer um atendimento digno para as necessidades de saúde dos cidadãos.
As organizações públicas precisam repensar permanentemente o seu papel,
visando mudanças sociais, vocação, bem como a capacidade da instituição
e do conjunto de trabalhadores.
O planejamento estratégico surge, então, como uma ferramenta muito
importante para a administração, pois permite nortear as ações gerenciais
da organização dentro de um plano previamente determinado de metas e
de estratégias diminuindo, com isso, a possibilidade de tomada de decisões
equivocadas. Volta-se para as medidas positivas que uma empresa poderá
tomar para enfrentar ameaças e aproveitar as oportunidades encontradas em
seu ambiente. (ALDAY, 2000)
Chiavenato e Sapiro (2003) dizem que planejar é conhecer e entender
o contexto; é saber o que se quer e como atingir os objetivos; é saber como
se prevenir; é calcular os riscos e saber como minimizá-los; é preparar-se
taticamente. Planejar não é apenas vislumbrar o futuro, mas é também uma
forma de assegurar a continuidade dos negócios.
32
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Camila Blum Weingartner # Mauricio Fernades Pereira # Isadora Souza Bernardini
Schraiber et al. (1999, p. 230) afirmam que
[...] a finalidade do planejamento é instruir e a da gestão é processar tal instrução sobre processos de intervenção em saúde.
Planejamento e gestão realizam ação estratégica quanto ao
trabalho em saúde.
O objetivo deste artigo é destacar a importância do planejamento estratégico como instrumento do processo de gestão das organizações de saúde
pública, contribuindo para que elas se tornem mais eficientes. Para tanto serão
apresentadas a definição do planejamento estratégico, a descrição do processo
de construção do planejamento estratégico e a identificação das vantagens de
uma organização ao realizar um planejamento estratégico.
Trata-se de uma Revisão de Literatura baseada na consulta de livros e
de artigos, tanto na forma impressa quanto eletrônica.
2 As Organizações Públicas de Saúde
O cenário das organizações públicas de saúde vem passando por grandes mudanças nos últimos anos em busca da melhoria do seu sistema de
gestão. De acordo com Rabello (2006), embora se registrem avanços quanto
à descentralização e à constituição do Sistema Único de Saúde, os serviços de
saúde enfrentam uma crise de governabilidade, de eficiência e de resolutividade.
O Ministério da Saúde e as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde são as organizações diretamente responsáveis em promover, consolidar
e implementar o Sistema Único de Saúde (SUS). Durante os anos de 1990
desenvolveu-se um processo gradativo de descentralização na saúde envolvendo
a transferência de serviços, de responsabilidades, de poder e de recursos da
esfera federal para a estadual e municipal, percorrendo as diversas áreas de
atuação como o planejamento e a programação, o financiamento, a gerência
de recursos humanos, a organização e a oferta de serviços e a participação
comunitária. (FROTA, 2009)
Para Dussault (1992 apud RABELLO 2006, p. 46),
[...] por causa da sua importância social e econômica, o setor saúde
é uma área disputada por atores que têm interesses divergentes:
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
33
O Planejamento Estratégico na Gestão de Organizações Públicas
os usuários, que querem serviços de qualidade, mas baratos;
os profissionais, que querem desenvolver seu conhecimento,
suas habilidades, sua profissão, obter uma boa renda, prestando
bons serviços; as empresas de materiais e produtos; os seguros;
os estabelecimentos privados que querem fazer bons negócios;
o Governo, que quer benefícios políticos, etc. A reflexão sobre
a organização e a gestão dos serviços de saúde deve considerar
essas particularidades e não pode contentar-se em tratar o setor
saúde como qualquer outro.
Atualmente, no setor saúde, há necessidade de se imprimir novas formas
de gestão que deem conta das mudanças sociais e do próprio setor. Assim, o
planejamento surge como importante instrumento do processo de gestão das
organizações públicas de saúde, objetivando um método de ação governamental efetivo, além de uma prestação de serviços de qualidade aos usuários.
3 Planejamento
Para Chiavenato (2004, p. 216), “[...] o planejamento constitui a primeira e mais importante função administrativa, pois é preciso planejar antes
de realizar as outras funções como organizar, dirigir, controlar, coordenar”.
Nesse sentido, Certo (2003, p. 103) diz que o planejamento é uma
atividade necessária para qualquer organização e o conceitua como “[...] o
processo de determinar como a organização pode chegar onde deseja e o
que fará para executar seus objetivos”.
Assim, os dois autores concordam que o planejamento é de suma importância para que a empresa execute as funções administrativas, podendo,
assim, organizar, dirigir, controlar e coordenar com a finalidade de alcançar
o patamar desejado pela organização.
Para Barbosa e Brondani (2005), planejar significa formular sistematicamente objetivos e ações alternativas, e, ao final, a escolha se dará sobre a
melhor ação. Também diz respeito a implicações futuras de decisões presentes,
pois é um processo de decisões recíprocas e independentes que visam alcançar
objetivos anteriormente estabelecidos.
Pode-se dizer que planejamento é o processo formalizado para gerar
resultados a partir de um sistema integrado de decisões.
34
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Camila Blum Weingartner # Mauricio Fernades Pereira # Isadora Souza Bernardini
Segundo Andion e Fava (2002), saber utilizar os instrumentos do planejamento de forma coerente, adaptando-os à realidade da organização, pode ser
uma excelente arma competitiva. Para utilizá-la de forma eficaz, é importante
que os gestores conheçam bem cada um dos elementos do planejamento e
suas funções, assim como as mudanças que estão ocorrendo no contexto
competitivo, as quais estão influenciando na própria prática do planejamento
e lançando alguns desafios para a sua gestão nas organizações.
4 Planejamento Estratégico
Para Pereira (2010, p. 47),
[...] planejamento estratégico é um processo que consiste na análise
sistemática dos pontos fortes (competências) e fracos (incompetências ou possibilidades de melhorias) da organização, e das
oportunidades e ameaças do ambiente externo, com o objetivo
de formular (formar) estratégias e ações estratégicas com o intuito
de aumentar a competitividade e seu grau de resolutividade.
O planejamento estratégico é um importante instrumento de gestão para
as organizações na atualidade. Constitui uma das mais importantes funções
administrativas e é através dele que o gestor e sua equipe estabelecem os
parâmetros que vão direcionar a organização da empresa, a condução da
liderança, assim como o controle das atividades. O objetivo do planejamento
é fornecer aos gestores e suas equipes uma ferramenta que os abasteçam de
informações para a tomada de decisão, ajudando-os a atuar de forma proativa, antecipando-se às mudanças que ocorrem no mercado em que atuam.
(ANDION; FAVA, 2002)
Trata-se de um processo essencial dentro da organização porque traça
diretrizes para o estabelecimento dos planos de ação que resultarão em vantagens competitivas. O planejamento estratégico identifica recursos potenciais,
reconhece fraquezas e estabelece um conjunto de medidas integradas que
podem ser implementadas assegurando o sucesso dos resultados planejados.
(CHIAVENATO; SAPIRO, 2003)
De acordo com Pereira (2010), o processo de planejamento é dividido
em três momentos, sendo eles:
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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O Planejamento Estratégico na Gestão de Organizações Públicas
a) Momento 1 – Diagnóstico Estratégico;
b) Momento 2 – Planejamento propriamente dito; e
c) Momento 3 – Implantação, acompanhamento e controle do Planejamento Estratégico.
4.1 Diagnóstico Estratégico
O diagnóstico estratégico é o primeiro passo do processo de planejamento e é por meio dele que a organização irá se municiar das informações
que nortearão o seu direcionamento estratégico.
É nesse momento que se descobre se a organização está passando por
grandes turbulências que podem, desde o princípio, inviabilizar o processo
todo, como é o caso de falência, membros da coalizão dominante em conflito,
mudança de diretores por indicação (muito comum em organizações públicas). Em casos como esses, o planejamento estratégico não deve ser iniciado;
primeiro terão que ser resolvidos esses problemas. São elementos que dizem
respeito a decisões estratégicas.
A coalizão dominante da organização deve estar consciente da sua responsabilidade, ou seja, ter consciência que precisa se envolver com o processo.
Saber o que realmente é um planejamento estratégico. (PEREIRA, 2011)
Pereira (2011, p. 35) afirma que
[...] esse momento é o da intenção, do discurso, da aceitação por
parte da coalizão dominante da organização, ou seja, do aceite
e do compromisso das pessoas que determinam os seus rumos
estratégicos.
4.2 Planejamento Propriamente Dito
O Planejamento propriamente dito é o momento em que todas as etapas
do processo de Planejamento Estratégico são colocadas no papel. São elas:
Declaração de Valores, Missão e Visão; Fatores Críticos de Sucesso; Análise
Externa (oportunidades e ameaças); Análise Interna (pontos Fortes e Fracos);
Matriz FOFA; Questões Estratégicas; Estratégias; e Ações Estratégicas.
Nessa etapa é muito importante a sensibilização dos membros da equipe
para a importância do Planejamento Estratégico da organização. Não pode
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Camila Blum Weingartner # Mauricio Fernades Pereira # Isadora Souza Bernardini
haver qualquer dúvida sobre o processo, para que essa dúvida não gere
resistências.
Na sensibilização busca-se identificar os possíveis focos de resistências.
Muitas vezes, essa ocorre por “ignorância” ou desconhecimento do processo
de Planejamento Estratégico.
4.2.1 Declaração de Valores
Conforme Oliveira (2007 apud PILLON, 2011 p. 76),
[...] valores, no contexto estratégico, devem representar, principalmente, os princípios e as questões éticas que a empresa deve
respeitar e consolidar ao longo do tempo e que tenham forte
influência no modelo de gestão da empresa.
São os valores que orientam e guiam as atividades e as operações da
organização; são os norteadores de comportamentos organizacionais. Tiffany
e Peterson (1998 apud PEREIRA, 2011) dizem ainda que os valores, quando
bem definidos, podem ajudar a organização a reagir de forma rápida e decisiva
frente a situações inesperadas.
Para Vasconcellos Filho e Pagnoncelli (1998 apud PEREIRA, 2011),
a Declaração de Valores tem alguns benefícios, como: criar um diferencial
competitivo perante o mercado; balizar o processo decisório da organização;
orientar o comportamento da organização; determinar o processo de formulação
estratégica; orientar o recrutamento e a seleção de pessoas para a organização;
e fundamentar o resultado e a avaliação da organização.
4.2.2 Missão
A missão é o objetivo fundamental de uma organização, ela traduz a
finalidade da empresa e consiste na definição dos seus fins estratégicos gerais.
Chiavenato e Sapiro (2003) afirmam que a missão traduz as responsabilidades e as pretensões da organização. A missão da organização representa
sua razão de ser, o seu papel na sociedade.
De acordo com Oliveira (2007 apud PILLON, 2011, p. 81),
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
37
O Planejamento Estratégico na Gestão de Organizações Públicas
[...] a missão é a determinação do motivo central do planejamento
estratégico, ou seja, a determinação de onde a empresa quer ir e
de sua razão de ser. Corresponde a um horizonte dentro do qual
a empresa atua ou poderia atuar.
Segundo Thompson e Strickland (2000 apud ANDION; FAVA, 2002),
para definir bem uma missão é preciso considerar três elementos:
a) as necessidades do consumidor ou o que está sendo atendido;
b) os grupos de consumidores, ou quem está sendo atendido; e
c) as tecnologias usadas e as funções executadas ou como as necessidades dos consumidores estão sendo atendidas.
Tendo as necessidades dos clientes como foco, a missão é definida
dentro de um horizonte de longo prazo.
Para Hartmann (1998 apud ALMEIDA, 2007), no momento de definir a
missão da organização, é preciso avaliar quais são as habilidades da empresa,
não deixando de ser realista e compreensível, sendo flexível e motivadora
com a finalidade de satisfazer às necessidades dos clientes atuais e futuros.
Porém, Pereira (2011) considera que para as organizações públicas
prestadoras de serviço, o desafio é muito maior, uma vez que a prestação de
serviço é algo intangível e de complexa mensuração, ainda mais se tratando
de qualidade percebida, pois cada um de nós pode visualizá-la de forma
completamente diferente.
4.2.3 Visão
A visão expressa onde e como a organização pretende estar no futuro.
Funciona como uma bússola, mostrando a direção na qual a organização
está caminhando. “A visão deve, sobretudo, ser coerente e criar uma imagem
clara do futuro e gerar compromisso com o desempenho”. (SERRA et al. 2003
apud PILLON, 2011, p. 42)
A partir da visão ocorre a descentralização das empresas e diminuem os
níveis hierárquicos, fazendo com que os funcionários e os parceiros decidam
e participem da concretização dos objetivos corporativos. (SERRA et al.,
2003 apud PILLON, 2011)
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Camila Blum Weingartner # Mauricio Fernades Pereira # Isadora Souza Bernardini
Andion e Fava (2002, p. 34) afirmam que “[...] a visão atua como um
elemento motivador, energizando a empresa e criando um ambiente propício
ao surgimento de novas ideias”.
Costa (2005 apud ALMEIDA, 2007), quando fala sobre visão, declara
que ela deve ser um alicerce para a empresa, tendo em vista torná-la útil para
todos os envolvidos na organização. Assim sendo, é preciso defini-la de forma
simples, objetiva e compreensiva. Sua função será explicitar o que a empresa
quer ser ou aonde quer chegar. A visão servirá de orientação para as ações e
decisões que a empresa adotará, com a finalidade de estar bem estruturada.
De acordo com Pereira (2010), a elaboração da visão deve partir de
alguns elementos para que não se torne irreal: a visão precisa motivar/inspirar os funcionários da organização; precisa ter força, caminhar em direção à
grandeza; deve ser clara, concreta e compacta; precisa adaptar-se aos valores
da organização; ser fácil de ler e de entender; ser simples e, ao mesmo tempo,
poderosa; deve mostrar aonde a organização quer chegar; abranger o espírito
desejado pela organização; chamar a atenção das pessoas; descrever a situação escolhida para o futuro; ser desafiadora, ir além do que é confortável.
A formulação da visão não é exclusividade da alta gerência da empresa.
Ela pode ser estabelecida em qualquer nível hierárquico, individualmente ou
em equipes. Para que ela funcione melhor é preciso, entretanto, que ela seja
disseminada. Portanto, pode-se dizer que “[...] a visão é mais consistente
quando a organização consegue incorporá-la em seus diferentes níveis, fazendo com que estes, de forma sinérgica, busquem alcançá-la no longo prazo”.
(ANDION; FAVA, 2002, p. 35)
4.2.4 Fatores Críticos de Sucesso
De acordo com Pereira (2010, p. 94), os fatores críticos de sucesso são as
condições fundamentais que precisam ser satisfeitas para se obter sucesso no
seu setor de atuação. Essas condições são “[...] baseadas na análise do setor
e nas forças que a organização identificou como responsáveis pela estrutura
do seu negócio”.
Assim, segundo Pillon (2011), se essas condições ou variáveis não forem
gerenciadas, elas podem prejudicar o processo do planejamento estratégico.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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O Planejamento Estratégico na Gestão de Organizações Públicas
4.2.5 Análise Externa (oportunidades e ameaças)
Toda organização, seja ela privada, governamental ou do chamado Terceiro Setor consiste em um sistema aberto, em constante
interação com o meio ambiente. Para sobreviver, as organizações
precisam de insumos (recursos humanos, recursos financeiros e
materiais), que são transformados em bens e serviços, os quais
são colocados no mercado, visando o atendimento de uma
determinada necessidade. O atendimento dessa necessidade
produz resultados que retroalimentam as organizações (receitas
e lucro, no caso da empresa; reconhecimento e efetividade social
na promoção do bem comum, no caso do Estado e de entidades
do Terceiro Setor). Portanto, a relação com o meio externo constitui um fator-chave da própria existência das organizações. Por
esse motivo, entender de que se compõe esse ambiente e como
ele se organiza torna-se essencial para a gestão das empresas.
(ANDION; FAVA, 2002 p. 29)
Segundo Oliveira (1999 apud ALMEIDA, 2007), a análise externa procura estudar a relação existente entre a organização e o seu ambiente para que
possa identificar e aproveitar possíveis oportunidades e minimizar ameaças
advindas do meio externo.
Nesse sentido, o estudo do ambiente externo pode trazer muitas surpresas, mas é de suma importância para orientar o planejamento na tomada de
providências imediatas para um melhor aproveitamento das oportunidades e/
ou para evitar as consequências negativas provenientes das ameaças. (COSTA,
2005 apud ALMEIDA, 2007)
Pereira (2010, p. 102) conceitua as oportunidades como
[...] os fatores externos que facilitam o cumprimento da missão
da organização ou mesmo as situações do meio ambiente que a
organização pode aproveitar para aumentar sua competitividade.
O autor diz, também, que as ameaças são os elementos negativos,
aqueles que criam obstáculos a sua estratégia e dificultam o cumprimento
da missão da organização, podendo ou não ser evitados quando conhecidos
em tempo hábil.
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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4.2.5.1 Análise das Variáveis Externas
Existem inúmeras variáveis ambientais que vão influenciar direta ou
indiretamente a organização. Chiavenato e Sapiro (2003) destacam alguns
ambientes muito importantes para o estudo:
a) Econômico: juros, câmbio, renda, nível de emprego, renda da população, padrão de consumo, inflação e índices de preços.
b) Político/Legal: leis, políticas governamentais de incentivo e/ou restrição, influências políticas e dos demais grupos de interesse; legislação
federal, estadual e municipal e estrutura de poder.
c) Socioculturais: preferências, tendências populacionais, cultura, nível educacional, estilo de vida e distribuição etária e geográfica da
população-alvo da empresa.
d) Ecológico: nível de desenvolvimento ecológico, índices de poluição
e legislação existente.
e) Demográfico: tamanho, densidade e distribuição geográfica da população, mobilidade da população e processo migratório, taxa de
crescimento e de envelhecimento da população, taxa de casamentos, de natalidade e mortalidade, estrutura etária, estrutura familiar
e residencial, nível de escolaridade e composição étnica e religiosa
da população.
f) Tecnológicos: pesquisa e desenvolvimento de produtos na área,
avanços tecnológicos e custos envolvidos.
A relevância de determinados aspectos para uma organização depende
de seu negócio, porte e mercado. No entanto, cabe ao administrador ter em
mente que, a longo prazo, a análise dos níveis ambientais, assim como o relacionamento existente entre eles, influenciam as operações das organizações
e são determinantes do sucesso organizacional.
4.2.5.2 Análise da Concorrência
A análise da concorrência tem como finalidade obter informações necessárias dos concorrentes, permitindo estabelecer parâmetros de comparação.
Uma alternativa para realizá-la é através do benchmarking. As informações
obtidas ajudam a conhecer a posição da empresa no setor diante dos seus
concorrentes. (PEREIRA, 2010)
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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O Planejamento Estratégico na Gestão de Organizações Públicas
De acordo com Tiffany e Petterson (1998 apud ALMEIDA, 2007), para
compreender os concorrentes é preciso entender como os clientes tomam suas
decisões, como usam os produtos, qual é a capacidade de seus concorrentes
e as estratégias adotadas por eles, e de onde virão concorrentes potenciais
futuramente.
4.2.5.3 Análise da Competitividade: o modelo de Porter
Conforme Pillon (2011), outra forma de realizar a análise do ambiente
é através das cinco forças competitivas de Porter (1989), as quais determinam
a força da organização em sua taxa de retorno sobre os investimentos aplicados. São elas: ameaça de entrada de novos concorrentes, rivalidade entre os
concorrentes existentes, ameaça de produtos substitutos, poder de negociação
dos compradores e o poder de negociação dos fornecedores.
Porter (1989 apud ALMEIDA, 2007) afirma que para obter um bom
resultado no desenvolvimento de uma estratégia, é necessário pesquisar e
analisar as fontes de cada força.
A análise dos cinco pontos pode contribuir para a avaliação dos
pontos fortes e fracos da organização, mas é preciso criar estratégias para que a empresa seja competitiva e esteja na melhor
posição possível no campo competitivo (STONNER; FREEMAN,
1995 apud ALMEIDA, 2007, p. 29)
4.2.6 Análise Interna (pontos Fortes e Fracos)
Para Almeida (1999 apud OLIVEIRA, 2007), a análise interna busca
estudar e evidenciar as deficiências e as qualidades organizacionais, ou seja,
os pontos fortes a serem otimizados e os fracos que precisam ser corrigidos. É
por meio dessa análise que se sabe quanto recurso se tem disponível e quais
os pontos vulneráveis que existem na empresa para estabelecer as estratégias.
Pereira (2010, p. 109-110) define os pontos fortes como as “[...] características ou recursos disponíveis da organização que facilitam o resultado [...]”
e os pontos fracos como “[...] características ou limitações da organização que
dificultam a obtenção de resultado”.
Tiffany e Peterson (1998 apud ALMEIDA, 2007) enfatizam que os pontos
fortes são as capacidades, os recursos e as habilidades que auxiliam a desen-
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Camila Blum Weingartner # Mauricio Fernades Pereira # Isadora Souza Bernardini
volver estratégias e a alcançar metas estabelecidas. Os pontos fracos de uma
organização correspondem à falta de capacidade de recursos em relação à
concorrência, o que pode dificultar ou até mesmo impedir o desenvolvimento
de estratégias e o alcance das metas.
Por meio da análise dos pontos fortes e fracos, a equipe que realiza o
Planejamento Estratégico poderá determinar com mais clareza as prioridades
em termos de ameaças e de oportunidades existentes no ambiente externo.
Com isso, eles terão as informações necessárias para determinar os objetivos
e as estratégias que possam aproveitar melhor as competências da empresa
e equacionar os problemas internos identificados, assim como responder às
ameaças e oportunidades percebidas externamente. (ANDION; FAVA, 2002)
Pereira (2011) destaca a importância de discutir se um elemento específico é um ponto forte ou fraco, pois no momento da programação estratégica,
as estratégias serão diferentes para os diferentes pontos.
4.2.7 Matriz FOFA
Matriz FOFA, SWOT em inglês, é a junção dos quatro elementos-chaves
da análise estratégica: Strenghts: pontos fortes; Weaknesses: pontos fracos;
Opportunities: oportunidades; Threats: ameaças. Trata-se de uma síntese da
análise externa e interna que permite identificar os elementos-chaves para
gestão da organização e estabelecer prioridades de atuação. (FISTAROL,
2007 apud MELLO, 2008)
Ansoff e Mcdonnel (1993 apud ALMEIDA, 2007) destacam a utilização
da análise SWOT, uma vez que essa análise identifica as ameaças e as oportunidades existentes confrontando-as com os pontos fortes e fracos tradicionais
da empresa. Com os resultados alcançados, a organização pode traçar estratégias e tomar decisões quanto às oportunidades a serem aproveitadas, além
de concertar os pontos fracos e de remover as ameaças que serão enfrentadas.
Segundo Pereira (2010), a organização deve fazer uma reflexão ao
término da Análise Externa e Interna e localizar todos os elementos listados
individualmente e posicioná-los na Matriz FOFA. Após, todos os pontos fortes
devem ser ligados aos pontos fracos e também com todas as oportunidades
e ameaças, sempre questionando se o ponto forte “x” ajuda a acabar com o
ponto fraco “y”, aproveitar a oportunidade “z” ou minimizar o impacto da
ameaça “w”.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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O Planejamento Estratégico na Gestão de Organizações Públicas
Para o autor, uma organização que tenha mais respostas sim estará mais
e melhor posicionada no mercado.
4.2.8 Questões Estratégicas, Estratégias e Ações Estratégicas
A palavra estratégia tem como significado “a arte do general”, sendo
esse termo utilizado ao longo dos anos, derivando-se da palavra strategos,
que significa general. Antigamente, as estratégias eram expressões usadas por
generais em seus combates, formulando meios pelos quais visavam vencer
suas batalhas. Entretanto, com o passar do tempo, a palavra estratégia foi
incorporada ao mundo dos negócios, de forma que ela começou a ser utilizada pelas organizações significando a maneira como elas se comportavam
e agiam frente ao seu ambiente.
Mintzberg e Quinn (2001 apud ALMEIDA, 2007) dizem que uma estratégia,
quando bem formulada, auxilia na alocação de recursos para a organização
e ajuda a empresa a ser ordenada para que ela tenha uma postura singular
e viável, baseando-se nas suas competências e nas deficiências internas,
agindo de forma segura diante das possíveis mudanças de seus concorrentes
e tomando providências para manter-se sustentável.
A essência da estratégia está em desenvolver vantagens competitivas
no futuro mais rápido antes do que os concorrentes possam imitar. Assim, a
melhor vantagem competitiva de todas ocorre quando uma organização tem
a capacidade de melhorar suas habilidades já existentes e de aprender novas
habilidades. (HAMEL; PRAHALAD, 1994 apud PEREIRA, 2011)
Andrews (1992 apud PEREIRA, 2010, p. 123) conceitua estratégia de
forma abrangente:
A estratégia corporativa é o padrão de decisões de uma organização que determina e revela seus objetivos, propósitos ou metas;
produz as principais políticas e planos para atingir aquelas metas
e define o alcance do negócio da organização, bem como o tipo
de organização que ela é ou deseja ser, até mesmo a natureza
da sua contribuição econômica ou não econômica, para seus
acionistas, empregados, clientes e comunidade.
Dessa forma, Chiavenato (1994 apud ALMEIDA, 2007) diz que estratégia
é um conjunto de objetivos e de políticas principais, os quais são adequados
para guiar e para orientar o comportamento da organização a longo prazo.
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Camila Blum Weingartner # Mauricio Fernades Pereira # Isadora Souza Bernardini
Pereira (2010) afirma que formular o processo estratégico de uma organização é um ponto fundamental do Planejamento Estratégico. Segundo
o autor, questões estratégicas “[...] são os grandes temas ou projetos a serem
elaborados e implementados para o Horizonte Estratégico definido na Visão”.
(PEREIRA, 2010, p. 128)
Então, a organização passa a formular as Estratégias, quantas forem
necessárias para resolver cada uma das Questões Estratégicas. E para cada
Estratégia devem-se listar Ações Estratégicas. Pois, o que fazer, muitas vezes
é até fácil, o grande desafio está em como fazer. Assim, para cada uma das
diferentes Estratégias haverá várias Ações Estratégicas.
Nas Ações, o nível de detalhamento é bastante grande, pois envolve o
como fazer. Então é importante a organização se concentrar na construção de
suas Ações Estratégicas, pois sem elas, não será possível atingir a Estratégia,
nem resolver as Questões Estratégicas, prejudicando o seu Planejamento
Estratégico. (PEREIRA, 2010)
4.3 Implantação, Acompanhamento e Controle do Planejamento Estratégico
Segundo Pereira (2011), a implantação corresponde ao momento no
qual a organização deve colocar em prática o documento de Planejamento
Estratégico. É geralmente nessa etapa que o Planejamento Estratégico começa
a dar errado, pois, muitas vezes, não é dado o devido valor para a implantação,
uma vez que as pessoas acabam voltando para as suas funções tradicionais
na organização e se esquecendo de implantar o processo de planejamento.
Por isso, a fim de garantir o sucesso na implantação do processo de Planejamento Estratégico, é importante criar uma equipe para acompanhar e para
avaliar a implantação e resolver possíveis problemas que as pessoas venham
a enfrentar neste momento.
A execução das ações estabelecidas deve ser analisada constantemente,
visando mensurar desempenho x investimento e verificar se o cronograma
está sendo cumprido. Só assim será possível identificar as dificuldades e as
prováveis falhas, possibilitando mudança de estratégia caso seja necessário.
Para Oliveira (2001 apud ALMEIDA, 2007), com base nas decisões tomadas, nas estratégias traçadas e aplicadas na organização, o papel fundamental
de controle e de avaliação é o de acompanhar o desempenho do sistema,
comparando os objetivos e os desafios propostos e quais foram alcançados.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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O Planejamento Estratégico na Gestão de Organizações Públicas
Uma ferramenta empregada para a avaliação e controle de um plano
de ação é o Balanced Scorecard (BSC), que focaliza o desempenho organizacional sob quatro perspectivas: a financeira, a dos clientes, a dos processos
internos e a do aprendizado e do crescimento. (PEREIRA, 2011)
Silva (2003) enfatiza que a proposta do BSC é tornar compreensível,
para todos os níveis da organização, a visão, a missão e a estratégia, para que
todos saibam o que fazer e de que forma suas ações impactam no desempenho
organizacional. A intenção é canalizar os esforços, evitando a dispersão das
ações e dos recursos empreendidos em prol da implementação das estratégias.
O BSC ajuda os gerentes a compreenderem interconexões dentro
da organização. Essa compreensão contribui para a transposição
de barreiras funcionais, proporcionando melhorias no processo
decisório. (KAPLAN; NORTON, 2000 apud SILVA, 2003, p. 71)
4.4 Vantagens para uma Organização ao Realizar um Planejamento Estratégico
Há vários benefícios oriundos do planejamento estratégico, como agilidade nas decisões, melhoria da comunicação, aumento da capacidade da
gerência tomar decisões, promoção da consciência coletiva, proporcionar
visão de conjunto, maior delegação de atividades, direção única para todos
e tornar mais efetiva a alocação de tempo e os recursos para a identificação
de oportunidades. (MELLO, 2008)
Além de ser um instrumento administrativo facilitador e otimizador
das interações da organização com os fatores ambientais, uma das principais
vantagens do planejamento é o estabelecimento de um curso de ação que
promova a coordenação dos recursos internos da organização com seus desafios políticos e externos.
Outra vantagem do planejamento é que ele ajuda os administradores
públicos a tomar as decisões atuais que têm a melhor chance de produzir as
consequências desejadas – tanto no presente como no futuro.
Oliveira (1988) e Greenley (1986) (apud PEREIRA, 2011) também
elencam uma série de vantagens para uma organização ao realizar um Planejamento Estratégico. Dentre elas destacam-se: minimizar os recursos e o
tempo que devem ser dedicados a corrigir erros de decisões, pois a empresa
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Camila Blum Weingartner # Mauricio Fernades Pereira # Isadora Souza Bernardini
estará focada naquilo que realmente importa para ela; permitir e ordenar
as prioridades dentro do cronograma do plano; ajudar a ordenar as ações
individuais em uma organização dirigida para o esforço global; fornecer uma
base para o esclarecimento de responsabilidades individuais e contribuir para
a motivação dos membros da organização; ampliar o horizonte de análise dos
dirigentes, orientando-os na prospecção do ambiente em que a organização
irá operar, bem como suscitar novas ideias sobre oportunidades a serem
exploradas; apontar os problemas que podem surgir antes que eles ocorram;
melhorar a canalização dos esforços para a realização de estratégias; permitir
que os gestores tenham uma clara visão do negócio.
5 Considerações Finais
Com mudanças substanciais nos modos de organização e de gestão do
trabalho e um mundo em constante movimento, o planejamento é mais do que
necessário para a manutenção das diferentes organizações visando coordenar
a política e propor estratégias e mecanismos de fortalecimento da gestão.
Por meio da revisão de literatura realizada para o desenvolvimento
deste artigo foi possível destacar o planejamento estratégico como importante
instrumento do processo de gestão das organizações de saúde pública.
O Planejamento Estratégico deve ser visto como um instrumento dinâmico de gestão, que contém decisões antecipadas sobre a linha de atuação a
ser seguida pela organização no cumprimento de sua missão.
Uma organização pode obter vários benefícios praticando de forma
correta o planejamento estratégico. Um dos benefícios é que ele ajuda os
administradores a tomar as decisões que têm a maior chance de produzir as
consequências desejadas – tanto no presente como no futuro. O Planejamento
permite aos administradores saber onde a organização está hoje em dia, quais
são os seus recursos e aonde desejam chegar.
Para tanto, é necessário que haja envolvimento e comprometimento de
todo o quadro funcional da organização em todas as fases do planejamento
estratégico. Os trabalhadores precisam ser dedicados, possuir experiência, envolvimento com o negócio da organização e, ainda, eles podem obter constante
aprendizagem para buscar novas perspectivas no processo de mudança e de
melhoria contínua. Em suma, a estratégia deve ter uma premissa inicial, que
poderá ser aprimorada com base em ideias que possam surgir.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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O Planejamento Estratégico na Gestão de Organizações Públicas
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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A Articulação entre Conselhos Locais de
Saúde e Conselho Municipal de Saúde do
Município de Florianópolis: um olhar sobre
a cidadania deliberativa e o controle social
Aluna: Débora Martini1
Orientador: Luis Moretto Neto2
Tutora: Juliana Pereira3
Resumo
Abstract
Este artigo objetiva refletir sobre a articulação
entre os Conselhos Locais de Saúde (CLS) e o
Conselho Municipal de Saúde (CMS) de Florianópolis a partir da ótica da cidadania deliberativa e do controle social. Utilizou-se como caminho metodológico a análise documental das
atas do CMS de fevereiro de 2010 a junho de
2012, considerando-se três elementos: forma
de participação dos CLS na reunião do CMS,
quantidade e tipos de demandas dos CLS, e
demandas e encaminhamentos advindas do
CMS. Evidenciou-se pouca participação dos
CLS nas Plenárias do CMS e essa, realizada,
em grande parte, através de encaminhamentos por escrito com demandas e reivindicações
locais, apesar de constatada participação de
representantes dos CLS nas Plenárias, não é
significativa.
This article aims to reflect on links between
Local Health Councils and Municipal Health
Council Florianopolis from the perspective of
deliberative citizenship and social control. Was
used as a methodological way the documentary analysis of the minutes of the Municipal
Health Council from February 2010 to June
2012 based on three elements: form of Local
Health Councils participation in the meeting of
Municipal Health Council, quantity and types
of claims and demands of Local Health Councils and referrals resulting from the Municipal
Health Council. It was evidenced little of Local
Health Councils participation in the Municipal
Health Council and the Plenary, held largely
through referrals written with local demands
and claims. Although observed participation of
representatives of Local Health Councils in Plenary, this is not significant.
Palavras-chave: Cidadania Deliberativa.
Conselhos de Saúde. Controle Social.
1
Key words: Deliberative Citizenship. Health
Councils. Social Control.
Graduada em Serviço Social pela Universidade Federal de Santa Catarina (2006).
Especialista em Saúde da Família – modalidade Residência 2007-2009 (UFSC).
E-mail: [email protected].
2
Doutor em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina (2001).
E-mail: [email protected].
3
Especialista em Gestão de Pessoas nas Organizações e Bacharel em Administração pela
Universidade Federal Santa Catarina (UFSC). E-mail: [email protected].
Débora Martini# Luis Moretto Neto # Juliana Pereira
1Introdução
A legitimação dos mecanismos de participação e de controle social na
área da saúde ocorreu a partir da promulgação da Constituição Federal de
1988, mais especificamente através da Lei n. 8.142/90, que dispõe, entre
outras dimensões, sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema
Único de Saúde. Entre os mecanismos, destacam-se os conselhos de saúde,
legitimados nos três níveis de governo – federal, estadual e municipal –, de
caráter permanente e deliberativo.
No município de Florianópolis, a partir da Resolução n. 010/2008 do
Conselho Municipal de Saúde, os conselhos de saúde passaram a estar presentes também em âmbito local através de conselhos locais de saúde, que têm
como objetivo auxiliar no controle social e no planejamento de ações na área
da saúde, visto que percebem mais facilmente as demandas da população e
do local onde estão implantados.
Esses espaços, embora não previstos em lei,
[...] se traduzem em instrumentos democráticos da população e
contribuem para a viabilização de um prestação mais eficiente de
serviços públicos e de efetivação de dinâmicas de gestão descentralizada (BRAVO, 2001; JACOBI, 1990 apud ALVES, 2004 p. 53).
Porém, é importante destacar que os conselhos locais de saúde não
possuem caráter deliberativo, apenas consultivo; e, por isso, é fundamental que
esses espaços, por serem instâncias legítimas de representação da sociedade
civil, estejam em constante articulação com o Conselho Municipal, a fim de
desenvolverem ações complementares e de forma que suas demandas e necessidades sejam postas em pauta, debatidas e deliberadas por esse Conselho.
Com base no exposto, o presente artigo tem como objetivo adensar a
reflexão acerca da articulação entre os Conselhos Locais de Saúde (CLS) e o
Conselho Municipal de Saúde (CMS) do município de Florianópolis a partir
da ótica da cidadania deliberativa e do controle social.
O caminho metodológico utilizado para elaboração desse artigo foi a
análise documental das atas do CMS de Florianópolis no período de fevereiro
de 2010 a junho de 2012 com o intuito de avaliar como se deu a articulação
dos conselhos locais de saúde nas reuniões do CMS. Esse período compreende
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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A Articulação entre Conselhos Locais de Saúde e Conselho Municipal de Saúde do Município de Florianópolis:
um olhar sobre a cidadania deliberativa e o controle social
dois momentos distintos: o primeiro, caracterizado pela vigência do Plano Municipal de Saúde 2007-2010, e o segundo, pela vigência do Plano Municipal
de Saúde 2011-2014 e pela mudança dos conselheiros e da coordenação do
Conselho Municipal de Saúde de Florianópolis.
Dessa forma, inicialmente buscou-se contextualizar brevemente a
política de saúde no Brasil e a legitimação dos conselhos de saúde como
mecanismos de participação e controle social. Em seguida realizou-se uma
reflexão, baseando-se em alguns autores, sobre o entendimento de cidadania
deliberativa, controle social e participação social com o intuito de caracterizar
ambos os espaços e fundamentar a necessidade de articulação entre eles.
Por fim, estruturou-se a apresentação dos dados da pesquisa, seus
resultados e a análise deles, que teve como método principal a análise de
conteúdo, a qual, de acordo com Bardin (1979), é um conjunto de técnicas
de análise que visa obter, através de procedimentos sistemáticos e objetivos
de descrição do conteúdo das fontes analisadas, indicadores que permitam
inferir conhecimentos acerca dessas fontes.
2 A Política de Saúde e os Conselhos de Saúde como
Lócus da Cidadania Deliberativa, da Participação e
do Controle Social
Com o advento da Reforma Sanitária Brasileira – que tinha como
principais ideais a democratização do acesso, a universalização das ações
de saúde e a descentralização dos serviços, visando ampliar a participação
e o controle social por parte da sociedade civil (BRAVO; MATOS, 2006) - e
da VIII Conferência Nacional de Saúde, ocorrida em 1986, considerada um
marco no processo de reordenamento do modelo de atenção à saúde, é que
foi instituído um sistema único de saúde e o conceito de saúde foi ampliado.
A saúde tornou-se direito de cidadania e dever do Estado, cabendo ao
Estado garantir
[...] condições dignas de vida e de acesso universal e igualitário às
ações e serviços de promoção, proteção e recuperação da saúde,
em todos os seus níveis, a todos os habitantes do território nacional, levando ao desenvolvimento pleno do ser humano em sua
individualidade. (BRASIL, 1996 apud CZERESNIA, 2003, p. 43)
52
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Débora Martini# Luis Moretto Neto # Juliana Pereira
Em seu sentido mais amplo, a saúde passou a ser resultante de condicionantes como alimentação, educação, lazer, habitação, trabalho, renda,
meio ambiente, liberdade, acesso e posse de terra e acesso aos serviços de
saúde. (BRASIL, 1997 apud PEREIRA, 1997)
Com a promulgação da Constituição Federal em 1988, materializou-se
um novo modelo de proteção social através da Seguridade Social, que passa
a ser constituída pela Saúde, Previdência e Assistência Social. Esse modelo
de proteção entende a Seguridade como dividida em dois eixos, um contributivo – Previdência Social – e outro distributivo – Saúde e Assistência Social
(PEREIRA, 2002). Pode-se afirmar que a Saúde e a Assistência inovaram o
sistema de proteção social brasileiro, proporcionando acesso universal, incondicional, igualitário e sem contrapartida aos bens e serviços disponíveis, pelo
menos no que se refere ao texto constitucional. (PEREIRA, 2002)
Em se tratando da saúde, a criação do Sistema Único de Saúde (SUS)
também é afirmada na Constituição de 1988 e as diretrizes que orientam este
sistema estão dispostas nos incisos do artigo 198:
I – descentralização, com direção única em cada esfera de governo;
II – atendimento integral, com prioridade para as atividades
preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;
III – participação da comunidade. (BRASIL, 1988, art. 198,
grifo nosso)
Regulamentado em 1990, através das Leis Orgânicas de Saúde – Lei n.
8.080/90 e Lei n. 8.142/90 –, o SUS apresentou diversos avanços no que se
refere às condições para a promoção, a proteção e a recuperação da saúde, a
organização e o funcionamento dos serviços de saúde e acerca da participação
da comunidade na gestão do SUS.
O modelo de política de saúde adotado no Brasil, depois da Constituição Federal de 1988, buscou legitimar e ampliar o acesso da população aos
serviços de saúde, concretizando a cidadania social, a participação e o controle
social por parte da sociedade civil, bem como efetivar a participação das três
esferas de governo na gestão do Sistema Único de Saúde.
Através da Lei n. 8.142/90, institui-se como mecanismos para a participação e o controle social as conferências e os conselhos de saúde. As
primeiras ocorrem a cada quatro anos e possuem caráter consultivo, tendo
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A Articulação entre Conselhos Locais de Saúde e Conselho Municipal de Saúde do Município de Florianópolis:
um olhar sobre a cidadania deliberativa e o controle social
como objetivo propiciar uma discussão entre o Estado e os diversos segmentos
da sociedade civil acerca da política de saúde e sua gestão. Já os conselhos,
órgãos colegiados, compostos por representantes do governo, prestadores de
serviço, profissionais de saúde e usuários com a finalidade de formular estratégias e controlar a execução da política de saúde (BRASIL, 1990). Ambos
estão previstos nos três níveis de governo – nacional, estadual e municipal.
Em alguns municípios, os conselhos também estão presentes em âmbito
local através de conselhos locais de saúde, que são espaços de articulação e
amadurecimento de propostas utilizadas como forma de enfrentamento dos
embates na luta pela saúde por usuários e profissionais de saúde. É um espaço
privilegiado para a discussão das questões de saúde referentes à determinada
localidade e para a elaboração de propostas que devem ser levadas e defendidas em instâncias decisórias. (BRAVO, 2001 apud ALVES, 2004)
Os conselhos de modo geral facilitariam o que se chama de cidadania
deliberativa, na medida em que possibilitam a prática cidadã de forma direta
dentro de espaços públicos democraticamente constituídos que desenvolvem
suas ações interagindo com os poderes públicos (TENÓRIO, 2012). A cidadania
deliberativa pode ser caracterizada pela legitimidade de suas decisões geradas a
partir de processos de discussão, orientados pelos princípios da inclusão – que
pressupõem a incorporação de atores individuais e coletivos antes excluídos
dos processos participativos e decisórios; do pluralismo – envolvendo uma
multiplicidade de atores, que com seus diferentes pontos de vista auxiliam na
construção das políticas públicas; da igualdade participativa – que preconiza
a isonomia efetiva de atuação nos processos decisórios; da autonomia –
apropriação indistinta do processo decisório nas políticas públicas; e do bem
comum. (VILLELA, 2012)
Os conselhos de saúde são também denominados de conselhos gestores de políticas públicas e “[...] são importantes, pois são fruto de lutas e
demandas populares e de pressões da sociedade civil pela redemocratização
do país” (GOHN, 2001, p. 84). A Lei n. 8.142/90 preconiza o caráter deliberativo dos conselhos, reconhecendo-os como “[...] parte do processo de gestão
descentralizada e participativa, e os constitui como novos atores deliberativos
e paritários”. (GOHN, 2001, p. 88)
Entretanto, exatamente por serem constituídos de forma paritária, 50%
representantes de usuários e 50% representantes do governo, os Conselhos
são canais, ao mesmo tempo, de participação coletiva e de criação de novas
relações políticas entre governos e cidadãos, e espaços de conflito e de lutas
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Débora Martini# Luis Moretto Neto # Juliana Pereira
entre interesses contraditórios, confirmados pela diversidade de segmentos da
sociedade neles representados. Logo, os conselhos não são mecanismos acima
da sociedade, nem instâncias isoladas, que se tornam imunes a conflitos de
interesses, cooptação, entre outros. (BRAVO; CORREIA, 2012)
Em outras palavras, os conselhos não são
[...] espaços neutros, nem homogêneos, pois neles existe o embate
de propostas portadoras de interesses divergentes para dar o rumo
da política específica na direção dos interesses dos segmentos das
classes dominantes ou das classes subalternas, lá representados”
(CORREIA, 2006, p. 18).
Sua atuação ora objetiva a criação de espaços de debate públicos e a
proposição de políticas públicas; ora visa ao estabelecimento de mecanismos
de negociação e pactuação entre os segmentos que compõem os conselhos.
São espaços de aprendizado de cidadania e possuem uma representatividade muito mais política do que social (CARVALHO, 1995, apud CORREIA,
2002). Porém, deve-se ressaltar, novamente, que os conselhos são espaços
contraditórios que podem servir tanto para legitimar quanto para reverter o
quadro hegemônico que está posto.
Essa ambiguidade é possível por serem os conselhos espaços que possibilitam a inclusão de novos atores, antes excluídos dos processos decisórios, pelo
fato de os diferentes agrupamentos sociais experimentarem estágios distintos
de amadurecimento político e social e por serem espaços que preconizam a
negociação e os processos de decisão como eixo central.
Entrementes, com base na dimensão conceitual de cidadania deliberativa, pressupõe-se a inexistência de privilégios nos processos decisórios. A
prática de cidadania deliberativa deveria contribuir para evitar a manutenção
da divisão entre classes dominantes e classes subalternas, evitando a estratificação e a exploração social e primando pela pactuação dos seus interesses
em função do bem comum.
No entanto, o que se percebe é que os conselhos tanto podem ser estímulos
à participação, como também ser mecanismos de concentração dos recursos
nas mãos do Estado, quando a legislação é violada havendo sonegação de
informações, nomeação de representantes da sociedade civil sem a mediação
de um processo eleitoral democrático, quando há cooptação ou intimidação de
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A Articulação entre Conselhos Locais de Saúde e Conselho Municipal de Saúde do Município de Florianópolis:
um olhar sobre a cidadania deliberativa e o controle social
conselheiros, quando os conselhos são criados apenas em lei, sem que exista
real funcionamento, e quando se observam características como clientelismo
e paternalismo presentes nas relações entre governo e sociedade civil.
A oscilação entre os interesses dos representantes dos conselhos é
frequente, visto serem esses espaços contraditórios. Assim, segundo Correia
(2005), os representantes do segmento dos profissionais de saúde ora aliam-se
às classes dominantes visando assegurar interesses corporativistas, ora aliam-se
às classes subalternas visando defender a saúde pública. Assim ocorre também
com os gestores e prestadores públicos, visto que eles podem contribuir para
o controle social desenvolvendo uma gestão transparente e democrática ou
dificultá-lo e até impedi-lo, quando, por exemplo, não respeitam o critério da
paridade, manipulam a escolha de representantes, intimidam conselheiros,
entre outros. Destaca-se que, no Brasil, ainda é comum a identificação dessas
práticas, que reproduzem a lógica do patrimonialismo, principalmente em
localidades onde a disseminação da informação e o controle social ainda
aparecem timidamente.
Segundo Bravo (2004), os conselhos são visualizados na relação Estado/
Sociedade na perspectiva de democratização da mesma, porém nem sempre
conseguem modificar essa relação. Prova disso, é trazida por Bravo (2000 apud
SOUZA, 2004) quando afirma que as escolhas das entidades representativas
dos usuários não têm sido precedidas de elegibilidade de critérios, abrindo
possibilidades de uma participação elitista e burocrática, na qual a intervenção
dos seus representantes enfatiza opiniões pessoais, subjetivas e arbitrárias.
Como consequência, os conselhos tornam-se espaços com grande risco
de burocratização – entendida a partir de suas acepções, como governo caracterizado por especializações de funções, adesão a regras fixas e hierarquia
com linhas de autoridade, responsabilidades demarcadas, intensas rotinas,
entre outros; e a partir da organização racional, que estabelece como princípios
a estrutura hierárquica formal, a gestão baseada em regras e regulamentos,
organização da mão de obra em divisões, pela impessoalidade de relações,
entre outros (MORETTO NETO, 2012) – e rotinização de seu funcionamento; e espaços de poder centralizado nas mãos do executivo, fragilizando, na
maioria dos casos sua autonomia. (DEGENNSZAJH, 2000)
Contudo, os conselhos, por serem “[...] o lócus de participação sócio-política na formulação, na deliberação, na execução, no controle e na gestão
das políticas públicas [...]” (BIDARRA, 2006, p. 50), ou seja, por estarem
inseridos no que se chama de esfera pública, ainda são um dos espaços mais
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Débora Martini# Luis Moretto Neto # Juliana Pereira
legítimos de participação e controle social; e, se utilizados de forma democrática, podem ser espaços de desenvolvimento da cidadania deliberativa.
Esses mecanismos representativos continuam sendo o principal eixo de
legitimação da relação sociedade civil e Estado, mas cada vez mais é necessário
desenvolver novas formas de participação e de envolvimento dos cidadãos
que “[...] permitam ampliar a legitimidade de decisões significativas para a
comunidade e aproximar pessoas da complexidade das decisões públicas”
(SUBIRATS, 2012, p.11). Sendo assim, faz-se necessário esclarecer o que se
está entendendo por cidadania deliberativa, participação social e controle
social neste artigo.
2.1 Cidadania Deliberativa
O conceito de cidadania durante o correr do tempo sofreu inúmeras
modificações e interpretações. Para fins deste trabalho, tomou-se como base o
conceito de cidadania deliberativa trazido por Tenório (2012), o qual, segundo ele, está diretamente relacionado com o envolvimento dos cidadãos nos
processos de decisão, planejamento e implementação de políticas públicas.
A prática da cidadania deliberativa pode ser considerada aquela por
meio da qual os processos decisórios apontam direções que favorecem a
liberdade individual, possibilitam a participação nas decisões e colaboram
para o bem comum (TENÓRIO, 2012). São aquelas que contribuem tanto
para a participação quanto para o controle social.
Cidadania deliberativa, portanto, é aquela validada a partir da esfera
pública, considerada como “[...] uma rede adequada para a comunicação de
conteúdos, tomada de posição e opiniões” (HABERMAS, 1997 apud TENÓRIO, 2012) e o espaço onde são constituídas experiências de interação social
e busca pelo atendimento das demandas coletivas. Sob essa perspectiva,
[...] a esfera pública seria o espaço de intermediação entre Estado,
sociedade e mercado, bem como a cidadania deliberativa seria o
processo participativo de deliberação baseado essencialmente no
entendimento (e não no convencimento ou negociação) entre as
partes. (TENÓRIO, 2008b apud CANÇADO, 2011, p. 82)
Esfera pública, portanto, seria o espaço onde os cidadãos poderiam
“madurar juntos novas opiniões” (INNERARITY, 2006, p. 60 apud TENO-
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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A Articulação entre Conselhos Locais de Saúde e Conselho Municipal de Saúde do Município de Florianópolis:
um olhar sobre a cidadania deliberativa e o controle social
RIO, 2012, p. 29), legitimando suas ações a partir de processos de discussão,
princípios da cidadania deliberativa, que permitam formar opiniões e construir
coletivamente e democraticamente uma decisão acerca das políticas públicas.
Além disso, a cidadania deliberativa pode ser analisada a partir de princípios como inclusão, pluralismo, igualdade participativa, autonomia e bem
comum. Inclusão avalia como a situação em questão inclui os atores sociais na
abertura de espaços e na valorização da cidadania. Refere-se à incorporação
de atores individuais e coletivos antes excluídos dos processos participativos
e decisórios (VILELLA, 2012). Pluralismo relaciona-se à descentralização
do poder e à identificação dos atores que compõem e participam das decisões. Preconiza-se que envolva uma multiplicidade de atores que, com seus
diferentes pontos de vista, auxiliam na construção das políticas públicas. Já
acerca da igualdade participativa entende-se a isonomia efetiva de atuação
nos processos decisórios; e sobre autonomia tem-se a apropriação indistinta
do processo decisório nas políticas públicas, identificando-se a capacidade
de avaliação e resolução dos problemas locais pelas próprias comunidades.
Por fim, o bem comum, justificado na melhoria das condições de vida da
população. (VILLELA, 2012)
Destarte, a cidadania deliberativa pode ser entendida como o cidadão
interagindo dentro de espaços públicos e espaços legítimos de participação,
buscando pactuar seus interesses em função do bem comum. Além dos mecanismos regulamentados de participação e controle social, como os conselhos,
outros espaços podem ser considerados propícios para o desenvolvimento da
cidadania deliberativa, como movimentos sociais, associação de bairros, sindicatos, entre outros, visto que também estão aptos a atuar junto a processos
deliberativos e de implantação de políticas públicas.
2.2 Participação Social
Etimologicamente, a palavra “participação” significa fazer parte, ter
ou tomar parte em, porém, a sua utilização vem sendo feita com sentidos e
significados completamente distintos dependendo do contexto e do espaço
onde ela está sendo utilizada.
Para Gohn (2001, p. 13-14), o processo de participação da sociedade
civil e sua presença nas políticas públicas “[...] conduz ao entendimento do
processo de democratização da sociedade brasileira”. Nesse sentido, a participação torna-se sinônimo de luta por direitos e melhores condições de vida por
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Débora Martini# Luis Moretto Neto # Juliana Pereira
parte da sociedade civil e pode ser considerada um movimento espontâneo
dos indivíduos.
A participação social, no conceito utilizado nesse artigo, objetiva fortalecer a sociedade civil para a construção de uma nova realidade, sem desigualdades, injustiças, exclusões, discriminações etc. Essa concepção se vincula
à cidadania e tem caráter plural (GOHN, 2001). Assim, diversas formas de
participação são consideradas relevantes nesta concepção de participação,
como por exemplo, grupos de jovens, de idosos ou associação de moradores.
Ainda pode ser caracterizada como uma forma de divisão de responsabilidades entre governo e comunidade, sendo a comunidade vista como parceira,
corresponsável pela construção de políticas públicas e de uma nova realidade
social. Prevê que os cidadãos tenham acesso às informações e estimula que
sejam criados e desenvolvidos meios mais eficazes de comunicação. Importa
afirmar, assim, que entre os espaços públicos que garantem a participação,
no atual cenário sociopolítico brasileiro, destacam-se os conselhos.
As experiências dos conselhos demonstram que eles podem ser espaços
importantes de participação democrática, de criação de novas relações políticas
entre governo e cidadãos e, principalmente, de conquista dos direitos e de
luta pela ampliação da cidadania. Isso se dá devido ao fato de serem espaços
permanentes, legitimados e onde há o estabelecimento de mecanismos de
negociação e pactuação – em que os sujeitos penetram na lógica burocrática
estatal para transformá-la e exercerem o controle socializado das ações e deliberações governamentais – é facilitado. (DEGENNSZAJH, 2000)
Prazeres, Loureiro e Sarmento (2004) destacam que a participação nos
conselhos está intimamente relacionada com o exercício da cidadania e envolve
diretamente o direito à participação dos cidadãos no processo de decisão das
políticas públicas, principalmente no campo dos chamados serviços sociais,
que envolvem a educação, a saúde, o saneamento básico, a recreação, a
previdência social e a assistência social, entre outros.
Na área da saúde, Correia (2006) afirma que a participação social foi
concebida na perspectiva do controle social da sociedade sobre as ações do
Estado, atuando desde a formulação de planos, de programas e de projetos,
acompanhamento de suas execuções, até a definição da alocação de recursos
para que elas atendam aos interesses da coletividade.
Com base no exposto, a concepção de participação que se está utilizando
para fins desse trabalho é a concepção vinculada à noção de cidadania, que
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A Articulação entre Conselhos Locais de Saúde e Conselho Municipal de Saúde do Município de Florianópolis:
um olhar sobre a cidadania deliberativa e o controle social
objetiva o fortalecimento da sociedade civil para a construção de uma nova
realidade social. E de forma complementar, entende-se a participação social
como “[...] o processo mediante o qual as diversas camadas sociais tomam
parte na produção, na gestão e no usufruto dos bens de uma sociedade historicamente determinada” (AMMANN, 1980, p. 61), visando o controle social.
2.3 Controle Social
O conceito de controle social foi construído nas décadas de 1980 e 1990
com o Movimento Sanitário, mas cabe ressaltar que o termo já possuiu outros
significados, servindo para designar concepções distintas, sendo a origem do
termo francesa, com o significado de contraprova, verificação, fiscalização,
exame. (ALMEIDA; NEIVA, 2006)
A concepção atual de controle social está intimamente relacionada com
a concepção de participação, legitimada pela Constituição Federal de 1988.
Essa concepção não é apenas uma luta legal por um direito adquirido; trata-se
de uma forma de potencializar a criatividade da sociedade na elaboração das
políticas públicas, visto que é ela quem, em contato com os serviços prestados,
principalmente com os serviços de saúde, percebe a efetividade ou não das
suas políticas. (SOUZA, 2004)
De modo geral, o controle social passa a ser entendido como a fiscalização
e controle das ações do Estado pela sociedade, através do acompanhamento
da formulação, execução e avaliação das políticas públicas, visando, assim,
a atender aos interesses da sociedade civil. Porém outros autores também
apontam para sua definição.
A atuação de setores organizados na sociedade civil na gestão de políticas públicas com a finalidade de controlá-las para que elas atendam, cada
vez mais, às necessidades e às demandas sociais e aos interesses da coletividade é o conceito trazido por Correia (2005) ao se referir ao controle social.
Já Carvalho (1997, apud MIOTO; NOGUEIRA, 2006) afirma que controle
social é o processo pelo qual a sociedade interfere na gestão pública de forma
a direcionar as ações do Estado para atender aos interesses da coletividade.
Para Assis e Villa (2003), o controle social é entendido como um espaço
de representação da sociedade, onde se articulam diferentes sujeitos, através
das suas representações, movimentos populares, entidades de classe, governo, entre outros. Logo, o controle social deve ser visto como um processo
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Débora Martini# Luis Moretto Neto # Juliana Pereira
contínuo de democratização e que implica no estabelecimento de uma nova
sociabilidade política e de um novo espaço de cidadania.
Destarte, o controle social envolve a capacidade que a sociedade civil
tem de interferir na gestão pública, orientando as ações do Estado e os gastos
estatais na direção dos seus interesses, tendo em vista a construção de sua
hegemonia (CORREIA, 2004). Portanto, pode-se afirmar que essa concepção
de controle social exige que a sociedade desenvolva, de diferentes formas,
sua capacidade participativa.
Em relação ao controle social na área da saúde, destacam-se alguns
autores que trazem esse conceito relacionado, principalmente, à cidadania, à
participação, aos direitos, entre outros. Entre eles, pode-se citar Barros (1998)
– quando aponta o controle social como uma forma de democratização dos
processos decisórios com vistas à cidadania e também quando traz a concepção
de gestão pública do SUS como essencialmente democrática, devendo ser
submetida ao controle da sociedade – e Cohn (2000 apud CORREIA, 2005),
que se utiliza do aspecto legal do controle social, ao afirmar que esse controle
está relacionado diretamente à participação da sociedade na legislação do
SUS e ao caracterizar os conselhos de saúde como principais canais para a
realização do controle social.
O controle social inspira os conselhos de saúde para que, com a presença
de segmentos sociais tradicionalmente excluídos, possam controlar o Estado
“assegurando políticas de saúde pautadas pelas necessidades do conjunto
social, e não somente pelos desígnios de seus setores mais privilegiados”.
(CARVALHO, 1995 apud CORREIA, 2006, p. 8)
Enfim, pode-se afirmar que o controle social na área da saúde está voltado para a defesa do SUS e sua efetivação, para a busca pela ampliação do
acesso e para a luta e defesa intransigente dos direitos à saúde. Sendo assim,
exige-se, além de leis que regulamentem o controle social sobre o Estado, uma
política nacional de saúde que venha a afirmar esse controle e a participação
da sociedade nas decisões da área da saúde.
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A Articulação entre Conselhos Locais de Saúde e Conselho Municipal de Saúde do Município de Florianópolis:
um olhar sobre a cidadania deliberativa e o controle social
3Iniciativas de Articulação entre Conselhos Locais
de Saúde e Conselho Municipal de Saúde do Município de Florianópolis
O Conselho Municipal de Saúde de Florianópolis é, talvez, um dos
mais antigos do Brasil, sendo criado em 1º de novembro de 1989 pela Lei
Municipal n. 3.291/89. É caracterizado por ser um colegiado permanente e
deliberativo com a finalidade de atuar na Política Municipal de Saúde, formulando estratégias e controlando sua execução, inclusive no que se refere aos
aspectos econômicos e financeiros, em acordo com as diretrizes e normas do
Sistema Único de Saúde. (FLORIANÓPOLIS, 1993)
Conforme as legislações nacional e municipal, o CMS deve se organizar
de forma paritária, de acordo com alterações trazidas pela Lei n. 3.970/93,
sendo 50% dos segmentos usuários, 25% representantes do segmento profissionais de saúde e 25% representantes de gestores e prestadores de serviço.
Ao todo, o CMS de Florianópolis é constituído por 26 conselheiros titulares e
26 conselheiros suplentes.
Está organizado em Plenária – instância máxima de decisão e deliberação; Mesa Diretora – composta pelo Presidente, Vice-Presidente, 1º Secretário
e 2º Secretário; Presidência – responsável pela condução dos trabalhos e,
conforme legislação, centrada na figura do Secretário Municipal de Saúde;
Câmara Técnica – órgão de assessoria à plenária; Comissões Intersetoriais –
caracterizadas por buscarem subsídios de discussão para a Plenária; Grupos
de Trabalho – organismos de assessoramento temporário da Plenária, Câmara
Técnica ou Comissões; e Secretaria Executiva – responsável pelas atividades
administrativas e logísticas necessárias ao bom funcionamento do conselho.
No município de Florianópolis, como já mencionado anteriormente,
os conselhos de saúde estão presentes também em âmbito local através de
Conselhos Locais de Saúde (CLS), criados no ano 2000 e regulamentados
pela resolução do Conselho Municipal de Saúde n. 010/2008. São órgãos
consultivos do Sistema Único de Saúde, na área de abrangência da unidade
local de saúde e estão diretamente relacionados à hierarquia do Conselho
Municipal de Saúde (FLORIANÓPOLIS, 2008). Os CLS atuam nos “
[...] níveis de planejamento local, avaliação da execução e controle
social das ações e serviços de saúde ou correlacionados à saúde,
62
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Débora Martini# Luis Moretto Neto # Juliana Pereira
colaborando na definição de prioridades e estabelecimento de
metas a serem cumpridas na área de abrangência da unidade de
saúde. (FLORIANÓPOLIS, 2008)
Os CLS têm como objetivo auxiliar no controle social e no planejamento
de ações na área da saúde, visto que percebem mais facilmente as demandas
da população e do local onde estão implantados, porém não possuem caráter
deliberativo, necessitando articular-se com instâncias decisórias municipais.
Assim, os conselhos locais de saúde são caracterizados como
[...] espaços de articulação e amadurecimento de propostas dos
usuários e profissionais de saúde no enfrentamento dos embates na
luta pela saúde. É o fórum privilegiado para que a população faça
discussões sobre as questões referentes à saúde na sua localidade,
bem como elaborar propostas a serem levadas e defendidas em
instâncias decisórias. (BRAVO, 2001 apud ALVES, 2004, p. 53)
Atualmente, existem 31 conselhos locais de saúde cadastrados no município de Florianópolis atuando em prol da melhoria da qualidade de vida
e de saúde da população. Conforme o regimento interno do CMS de Florianópolis, os CLS devem manter informações atualizadas sobre sua estrutura e
funcionamento, assim como encaminhar suas demandas para o CMS, como
forma de serem discutidas e deliberadas. (FLORIANÓPOLIS, 2006)
A articulação entre esses espaços de controle social torna-se fundamental
para o planejamento da política de saúde com a participação da comunidade,
integrando demandas locais às municipais.
Com base no exposto, visando-se alcançar os objetivos desse artigo,
analisaram-se as formas de articulação entre essas instâncias a partir da análise
documental das atas do Conselho Municipal de Saúde de Florianópolis em
dois momentos distintos: o primeiro, caracterizado pela vigência do Plano
Municipal de Saúde 2007-2010; e o segundo, pela vigência do Plano Municipal de Saúde 2011-2014 e pela mudança dos conselheiros e coordenação
do CMS de Florianópolis.
Foram analisadas 29 atas entre os meses de fevereiro de 2010 a junho
de 2012 e como critérios de análise estabeleceu-se a forma de participação dos
conselhos locais de saúde na reunião do Conselho Municipal, a quantidade e
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
63
A Articulação entre Conselhos Locais de Saúde e Conselho Municipal de Saúde do Município de Florianópolis:
um olhar sobre a cidadania deliberativa e o controle social
os tipos de demandas trazidas pelos conselhos locais de saúde e as demandas
e encaminhamentos advindas do CMS para os CLS.
No primeiro momento, período de fevereiro a dezembro de 2010, o
Plano Municipal de Saúde 2007-2010, em vigência, estabelecia como objetivo,
em relação à participação social,
[...] fortalecer a gestão democrática do SUS, reforçando instâncias
formais, ampliando a participação e a capacitação dos diversos
segmentos da sociedade para o exercício do controle social e
implantando mecanismos de defesa dos direitos da população
no Sistema (FLORIANÓPOLIS, 2007).
Entre as prioridades e compromissos estabelecidos, não havia menção
aos conselhos locais de saúde.
Neste período, em relação ao primeiro item de análise, a forma de participação dos CLS nas reuniões do CMS, observou-se que das 13 atas analisadas,
nove registraram a presença de conselheiros locais de saúde – sendo que um
deles acompanhou nove reuniões. Em apenas quatro, porém, a participação
desses conselheiros foi efetiva através da solicitação do direito a voz a fim de
apresentar demandas de seus conselhos para a Plenária da instância decisória.
Em se tratando de demandas trazidas pelos CLS, verificou-se que em
11 atas foram registrados o recebimento de ofícios, comunicações internas e
e-mails pela Secretaria Executiva do CMS com reivindicações dos CLS e, em
quatro atas, essas demandas foram apresentadas pelos próprios representantes
dos CLS. Em duas atas não houve menção alguma sobre os CLS.
Das solicitações dos CLS, que totalizaram 24 nesse período, sete estão
relacionadas às eleições deles, seja requerendo a presença de um conselheiro
municipal na data da eleição conforme legislação, seja através da validação
pela Plenária da sua mesa diretora e regimento interno; três relacionadas a
problemas como falta de recursos humanos e equipamentos nos centros de
saúde; duas convidando representante do CMS para participar das reuniões
do conselho local; duas apresentando problemas nos Centros de Saúde (CS),
como formato de marcação de consultas, entre outros; duas requerendo
reforma do CS; e duas reivindicando providências em relação a demandas
não especificadas nas atas. O restante envolvia questões como: solicitação
de espaço nas reuniões do CMS, solicitação de respostas a documentos já
encaminhados ao CMS, proteção do CS com grades, problemas relacionados
64
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Débora Martini# Luis Moretto Neto # Juliana Pereira
à coordenação do CLS, reivindicando providências em relação à demora na
marcação de consultas especializadas e exames de média e alta complexidade
e solicitando convocação de etapa municipal da IV Conferência Nacional de
Saúde Mental.
Já no que se refere às questões trazidas pelo CMS para repasse aos
CLS, há registro de três atas com solicitação de divulgação de informações
aos CLS, como o cancelamento do Fórum de Conselhos Locais de Saúde e
convite para a oficina que estabeleceria a Visão e Missão da Secretaria Municipal de Saúde, parte do planejamento estratégico e da construção do Plano
Municipal de Saúde 2011-2014. E cinco atas com registros de resposta do
CMS às demandas dos CLS.
Destaca-se, nesse período, a realização de uma reunião extraordinária
da Câmara Técnica do CMS específica para analisar a documentação dos
conselhos locais de saúde, como regimentos internos, validação de eleições,
análise da eleição da mesa diretora, entre outros e para auxiliar um conselho
local de saúde na destituição do seu coordenador, devido à sua postura impetuosa e autoritária. Dessa reunião da Câmara Técnica, surgiu a proposta
de criação de uma Comissão de Acompanhamento dos Conselhos Locais de
Saúde que foi aprovada pela Plenária do CMS.
O segundo momento, que compreende o período entre os meses de
fevereiro de 2011 a junho de 2012, caracterizou-se pela vigência do Plano
Municipal de Saúde 2011-2014, pela eleição de novos conselheiros municipais de saúde no início de 2012 e pela mudança de Secretário Municipal de
Saúde, influenciando diretamente na Presidência do CMS.
O Plano Municipal em vigor nesse período foi construído com base na
participação social, contando com a presença de conselheiros em diversas
etapas do planejamento. Em seu texto, estabelece como um dos objetivos, na
perspectiva de parcerias, estimular a participação social a partir dos conselhos
locais de saúde, incentivando ações para o fortalecimento do CMS e dos conselhos locais existentes, além de estimular a formação de novos conselhos locais.
Entre as metas estabelecidas estão: ampliar o número de CLS registrados no
CMS de 61,2% para 85%; avaliar a quantidade de participantes em reuniões
dos CLS; avaliar a satisfação dos conselheiros com sua participação nas reuniões dos conselhos locais de saúde, entre outros. (FLORIANOPOLIS, 2010)
Foram analisadas as 16 atas que compõem esse período. Dessas, 13
contaram com a participação de conselheiros locais de saúde nas reuniões –
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
65
A Articulação entre Conselhos Locais de Saúde e Conselho Municipal de Saúde do Município de Florianópolis:
um olhar sobre a cidadania deliberativa e o controle social
novamente um mesmo conselheiro acompanhando todas as 13 reuniões, com
participação esporádica de outros conselheiros – sendo que em apenas cinco
houve participação direta deles, com direito a voz junto à Plenária.
No segundo item de análise, foi possível perceber reivindicações em
12 das 16 atas estudadas, sendo que algumas chegaram a partir de ofícios,
comunicações internas e e-mails, e outras pelos próprios conselheiros municipais, que repassaram informes dos CLS para a Plenária. Entre as demandas,
que somaram ao todo 24, sete estão relacionadas às eleições de conselheiros
locais de saúde, três à falta de recursos humanos e equipamentos, duas ao
deslocamento de médicos de um centro de saúde para cobrir outro centro de
saúde, duas solicitando espaço para os CLS nas reuniões do CMS, e o restante
sobre vistorias, reforma de CS, realização do Fórum de Conselhos Locais de
Saúde, encontro de coordenadores dos CLS, participação de representante
do CMS em reuniões do CLS, divulgação dos espaços de controle social nas
escolas, visando incentivar a cidadania nas crianças e adolescentes, problemas
relacionados ao CS, ocupação de salas anexas ao CS por instituições alheias
ao serviço, solicitação de apoio à moção de repúdio e mudanças em relação
à atuação da Coordenadoria de Bem-Estar Animal do município.
No terceiro item analisado foram percebidas oito atas com demandas
do CMS para o CLS como solicitações de divulgação de eventos – entre eles
a capacitação de conselheiros e o Fórum dos Conselhos Locais de Saúde
–, demandas de divulgação do Plano Municipal de Saúde, informes da Comissão de Acompanhamento dos CLS, solicitação de divulgação do espaço
reservado na Plenária para os CLS e da criação de um link no site do CMS
para divulgação dos CLS e distribuição de relatórios e de abaixo-assinados
sobre o financiamento da saúde.
Durante esse período destaca-se a aprovação pela Plenária do Conselho
Municipal de um espaço de 15 minutos em cada reunião para os informes
dos conselhos locais, no entanto, das sete atas em que esse espaço esteve
reservado, apenas quatro foram utilizadas, sendo que em algumas os informes
foram repassados por conselheiros municipais ou pela Câmara Técnica.
A partir dos dados levantados pela pesquisa, uma reflexão crítica se faz
necessária, uma vez que se defende neste artigo a articulação dessas duas
instâncias como estratégia fundamental para a efetivação de práticas de participação e do controle social.
66
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Débora Martini# Luis Moretto Neto # Juliana Pereira
Inicialmente, faz-se necessário ressaltar que os dados colhidos pela
pesquisa apontam uma semelhança significativa entre os dois momentos no
que se refere à forma de participação dos CLS nas reuniões do CMS – onde
se percebeu a priorização do encaminhamento de documentos escritos em
relação à participação presencial de representantes dos CLS – e na quantidade
e nos tipos de demandas trazidas por eles – 24 em cada período - possibilitando uma reflexão de que a elaboração de um Plano Municipal de Saúde
com objetivos relacionados à participação e controle social e a criação ou
fortalecimento dos conselhos locais de saúde não contribuem diretamente
para a articulação entre CLS e CMS.
Todavia, no que tange às demandas vindas do CMS para repasse aos
CLS foi possível observar que houve diferença, principalmente no que se
relaciona a capacitações e ao acompanhamento dos CLS. Apesar da Comissão de Acompanhamento ser criada pela Plenária do CMS em 2010, sua
atuação mostrou-se mais significativa em 2011, quando ocorreram oficinas
de capacitação dos conselheiros e a realização do Fórum de Conselhos Locais
de Saúde. Foi nesse mesmo ano que se estabeleceu nas reuniões do CMS um
espaço permanente de informes dos CLS, possibilitando uma maior articulação
entre esses espaços.
Assim, o Plano Municipal de Saúde, quando elaborado de forma
participativa e comprometida com a sociedade civil, pode contribuir para o
comprometimento do gestor com as instâncias de controle social, tornando-se
um importante instrumento para o fortalecimento da articulação entre instâncias consultivas e deliberativas. Isso porque possibilita pensar nos conselhos
como espaços parceiros da gestão, espaços que, em nível local, percebem mais
facilmente as demandas da população e do local onde estão implantados e
podem contribuir com sugestões para a resolução dos problemas locais com
maior efetividade.
A análise documental processada indicou ainda alguns fatores que podem contribuir para a pouca articulação entre as instâncias de controle social
estudadas: primeiro, a pouca participação dos representantes dos CLS nas
Plenárias do CMS, reflexo, talvez, da compreensão de participação social dos
sujeitos sociais envolvidos nesse processo.
Partindo-se da trajetória histórica, observa-se que a demanda de participação social e controle social das políticas públicas teve início nas reivindicações dos sujeitos sociais envolvidos com a Reforma Sanitária e com a
criação do Sistema Único de Saúde, entrementes, ainda em 1988, os artigos
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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A Articulação entre Conselhos Locais de Saúde e Conselho Municipal de Saúde do Município de Florianópolis:
um olhar sobre a cidadania deliberativa e o controle social
da Constituição que tratavam desses assuntos foram vetados pelo presidente
em exercício, havendo a necessidade de regulamentação das Leis Orgânicas
da Saúde – Leis n. 8.080 e n. 8.142 no ano de 1990 – para retomar essa
discussão.
A partir de então, a participação social e a criação de espaços de controle social tornaram-se um desafio para a gestão, sendo obrigatório o funcionamento de Conselhos de Saúde, a elaboração de Planos e a criação de
Fundos de Saúde como critérios para repasse de verbas federais aos Estados
e Municípios. Ocorreu uma inversão dos papéis, ou seja, a necessidade de
regulamentar esses espaços passou a ser da gestão pública e não da sociedade
civil, possibilitando a manipulação desses espaços, sua criação apenas em
nível de legislação, sem o funcionamento adequado, entre outros.
O mesmo também pode ocorrer no que tange aos conselhos locais de
saúde, onde se avalia, com base no município de Florianópolis, que a demanda para criação desses espaços surge, na grande maioria das vezes, da
gestão municipal e/ou dos profissionais de saúde que atuam nos Centros de
Saúde. Fator que gera um enfraquecimento desses espaços, possibilita um
baixo índice de participação dos conselheiros locais nas reuniões, a falta de
entendimento deles sobre o funcionamento desses espaços e, consequentemente, a não articulação entre CLS e as instâncias deliberativas municipais.
Dessa forma, é necessário trazer à tona a discussão acerca da temática
participação social com a sociedade civil, fomentando a retomada das demandas trazidas pelos sujeitos sociais presentes no movimento de Reforma
Sanitária e incentivando a busca pela participação como forma de divisão de
responsabilidades entre governo e comunidade, sendo a comunidade vista
como parceira, corresponsável pela construção de políticas públicas e de uma
nova realidade social.
Um segundo fator é a recente integração às Plenárias do CMS de um
espaço reservado aos conselhos locais, remetendo novamente ao princípio da
cidadania deliberativa relacionado à inclusão de novos atores nas instâncias
de decisão. Por ser um espaço novo e, de certa forma, inovador, ainda deve
ser incorporado à dinâmica de trabalho dos CLS. É necessário que os CLS
tenham vontade política de, por vezes, sair do seu limite de abrangência,
propondo a constituição de uma agenda comum com outros espaços de participação e controle social, incluindo as instâncias decisórias, proporcionando
assim uma ampla discussão das políticas públicas e contribuindo para que
sejam construídas de forma participativa e atendendo às necessidades locais.
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Débora Martini# Luis Moretto Neto # Juliana Pereira
Por fim, a evidência de que uma pré-condição para a possibilidade
efetiva de articulação entre essas instâncias parte da vontade política dos
sujeitos envolvidos. Ou seja, é necessário que todos os sujeitos tenham a
compreensão da importância da participação social, do controle social e da
cidadania deliberativa como forma de construir uma política de saúde que
atenda, cada vez mais, às necessidades, às demandas sociais e aos interesses
da coletividade.
4 Considerações Finais
A partir da análise realizada neste trabalho, e tendo como base a cidadania deliberativa, preconiza-se que o cidadão interaja dentro de espaços
públicos e de focais legítimos de participação, e não somente através de
votações periódicas, intervindo nos processos decisórios de implantação de
políticas públicas, contribuindo para o rompimento da manutenção da divisão
da sociedade entre classes dominantes e classes subalternas e colaborando
para o exercício da participação e do controle social. (TENÓRIO, 2012)
Reafirma-se como articulação entre os conselhos locais e o Conselho
Municipal de Saúde de Florianópolis uma das ações mais efetivas no que se
refere à formulação de políticas públicas de saúde que contribuam de forma
direta para o desenvolvimento local e atendam aos interesses da coletividade.
No entanto, é importante ressaltar que a articulação, que tanto se primou
neste artigo, somente poderá ser construída se houver uma mudança na cultura
de participação e de controle social que oriente os sujeitos coletivos presentes
nesses espaços, possibilitando o surgimento de novos tipos de participação,
que valorize a ação coletiva, a construção de identidade, o enfrentamento de
problemas cotidianos e a criação e efetivação de direitos. (TEIXEIRA, 2002)
Assim, neste trabalho procurou-se trazer contribuições referentes à importância da articulação entre espaços legitimados de participação e controle
social no município de Florianópolis, porém cabe destacar que certamente
aqui não se encerra o debate sobre essas ações. É necessário avançar em
direção a uma prática da cidadania deliberativa que busque o fortalecimento
e a autonomia da sociedade civil para a efetivação de seus direitos sociais.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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A Articulação entre Conselhos Locais de Saúde e Conselho Municipal de Saúde do Município de Florianópolis:
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Proposta de Implantação de um Programa de
Gestão de Doenças Crônicas na Rede Pública
do Município de Florianópolis com Foco na
Redução de Morbidade Cardiovascular e na
Economia de Recursos Financeiros
Aluno: Carlos Daniel M. S. Moutinho Júnior1
Orientadora: Alessandra de Linhares Jacobsen2
Tutora: Maria Luciana Biondo Silva3
Resumo
Abstract
O envelhecimento populacional, e com ele o
aumento da prevalência das doenças crônicas,
acarreta uma necessidade de mudança no foco
dos serviços de saúde. O presente trabalho procura abordar o potencial de impacto do recurso
de gerenciamento de doenças crônicas na rede
pública de serviços de saúde em Florianópolis,
Santa Catarina, com foco na morbidade cardiovascular e na economia de recursos financeiros.
Por meio de levantamento bibliográfico e de levantamento de dados nas bases epidemiológicas
do Ministério da Saúde, constatou-se que a elaboração de uma política municipal voltada para
a área de doenças crônicas, com o conhecimento
epidemiológico de fatores de risco, e a educação
em saúde da população afetada apresentam
um potencial de impacto positivo na redução de
complicações das doenças, na qualidade de vida
e nos custos do serviço de saúde.
The aging of population and with it the increasing prevalence of chronic diseases leads to
a need for change in the focus of health services. This paper seeks to approach the potential
impact of chronic disease management in the
public health services in Florianópolis, Santa
Catarina, with a focus on cardiovascular morbidity and economy of resources. Through
bibliographic search and survey data bases in
Ministry of Health, we found that the development of a municipal policy focused on the area
of chronic diseases with epidemiological knowledge of risk factors and health education of
the affected population has a potential positive
impact in reducing complications of disease,
costs of the health service and improvement of
lifequality.
Key words: Chronic Disease Management.
Health Services Organization. Cost Analysis.
Palavras-chave: Gestão de Doenças Crôni- Processassessment in Healthcare.
cas. Organização de Serviços de Saúde. Economia em Serviços de Saúde. Avaliação de
Processos em Cuidados da Saúde.
1
Especialista em Medicina da Família e da Comunidade pela Associação Brasileira de
Medicina de Família e Comunidade. E-mail: [email protected].
2
Doutora em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina (2004).
E-mail: [email protected].
3
Especialista (Lato Sensu) em Gestão de Pessoas nas Organizações pela Universidade
Federal de Santa Catarina. E-mail: [email protected].
Proposta de Implantação de um Programa de Gestão de Doenças Crônicas na Rede Pública do Município de
Florianópolis com Foco na Redução de Morbidade Cardiovascular e na Economia de Recursos Financeiros
1Introdução
As doenças crônicas não transmissíveis são a maior causa de morte em
todo o mundo. Segundo a World Health Organization (WHO), essas doenças foram responsáveis por 36 milhões de óbitos. Nesse âmbito, as doenças
cardiovasculares foram responsáveis por 48% das mortes no grupo, seguidas
pelo câncer (21%), pelas doenças respiratórias crônicas (12%) e pelo diabetes
(3%). (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2011)
Mais de nove milhões do total de óbitos registrados em 2008 foram de
pessoas com menos de 60 anos, sendo que 90% dessas mortes – consideradas
prematuras – foram registradas em países de baixa e de média renda. (WORLD
HEALTH ORGANIZATION, 2011). Segundo a WHO, homens e mulheres que
vivem em países pobres têm cerca de três vezes mais risco de morrer antes dos
60 anos em razão de doença crônica não transmissível do que pessoas que
vivem em países de alta renda (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2005;
2011). Ainda, de acordo com a WHO, os altos níveis de pressão arterial, de
colesterol, de massa corporal e de açúcar no sangue são os fatores que aumentam a possibilidade de desenvolver doenças crônicas não transmissíveis.
Segundo o relatório da WHO sobre doenças crônicas de 2005, nos
dez anos seguintes deveria ocorrer uma redução de cerca de 3% nas mortes
causadas por doenças infecciosas, relacionadas à gestação e ao parto, e por
deficiências nutricionais, enquanto as mortes relacionadas por doenças crônicas
deveriam aumentar aproximadamente 17% no mesmo período. Com base
nesse cálculo, isso causaria um número total de 41 milhões de óbitos relacionados a doenças crônicas no ano de 2015, com profundos impactos, tanto
para a sociedade quanto para os custos nos serviços de saúde, especialmente
nos países em desenvolvimento.
Além disso, considerando o envelhecimento populacional causado
pela redução das taxas de fecundidade e pela melhora das condições de
vida e de recursos, a saúde de uma maneira geral em todo o mundo terá um
incremento significativo nas próximas décadas da prevalência das doenças
crônico-degenerativas. Essa correlação impactará brutalmente nos custos
dos sistemas de saúde. Nos Estados Unidos, por exemplo, o custo anual para
tratamento de doenças cardíacas e diabetes foi estimado para o ano de 2008
em U$ 352 bilhões e U$ 116 bilhões respectivamente. (WORLD HEALTH
ORGANIZATION, 2005; DALL, 2008)
76
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Carlos Daniel M. S. Moutinho Júnior # Alessandra de Linhares Jacobsen # Maria Luciana Biondo Silva
No Brasil, as Doenças Crônicas não Transmissíveis (DCNT) se tornaram a principal causa da carga de doenças nas últimas décadas e, em 2007,
representaram 72% dos óbitos. (SCHMIDT; DUNCAN; STEVENS, 2011).
Apesar da implementação de políticas públicas de fortalecimento, a promoção
e prevenção realizadas nos últimos anos no Sistema único de Saúde (SUS), a
epidemia de obesidade e o aumento na prevalência de doenças relacionadas
à diabetes e ao coração têm acarretado um grande impacto nos serviços de
saúde brasileiros. (SCHMIDT, DUNCAN, STEVENS, 2011; BRASIL, 2005)
Completando 24 anos, o SUS ainda enfrenta enormes desafios,
particularmente nos municípios brasileiros, com suas múltiplas e facetadas
realidades regionais. No Município de Florianópolis, por exemplo, houve um
enorme atraso de quase duas décadas na execução de uma rede municipal
hierarquizada de saúde. Nos últimos anos, a Secretaria Municipal de Saúde
de Florianópolis iniciou uma série de ações, com o eixo central na Atenção
Primária em Saúde (APS), como forma de ampliar e de fortalecer os princípios
do SUS (ZEPEDA; MOUTINHO Jr.; SARAIVA, 2010). A APS teve o número
de Equipes de Saúde da Família (ESF) ampliado, chegando, em 2012, a 116
equipes ou 93% de cobertura populacional. Cada equipe é composta por um
Médico de Família, um Enfermeiro, dois Técnicos de Enfermagem e, em média, seis Agentes de Saúde. A cada duas ESF há uma Equipe de Saúde Bucal
(ESB) ligada, composta por um Odontólogo e um Técnico de Higiene Dental.
A APS foi organizada como eixo organizador e ordenador dessa Rede
de Saúde. Para entrar nos demais níveis de atenção, como consultas e exames especializados, há a necessidade de se passar primeiramente pela ESF
de sua referência. Quatro Policlínicas no município de Florianópolis foram
reformadas e/ou construídas, nesse caso, o município passou a oferecer consultas e procedimentos de média complexidade, regulados pela ferramenta
eletrônica SISREG III do Ministério da Saúde. As Unidades de Atendimento
Pré-Hospitalar municipais, também de forma integrada, desenvolvem a lógica
de acolhimento por classificação de risco, devolvendo o paciente à APS após
estabilização do quadro agudo.
Toda a Rede de Saúde é integrada por meio de um Prontuário Eletrônico informatizado, desburocratizando o sistema, eliminando referências
e contrarreferências. Essa rede amplia o acesso à informação por parte dos
profissionais assistentes e aperfeiçoa e otimiza recursos, eliminando duplicidade
de encaminhamentos e de exames.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
77
Proposta de Implantação de um Programa de Gestão de Doenças Crônicas na Rede Pública do Município de
Florianópolis com Foco na Redução de Morbidade Cardiovascular e na Economia de Recursos Financeiros
1.1 Justificativa
Apesar da enorme importância, tanto no impacto da qualidade de vida
quanto na utilização dos serviços de saúde em todos os países, principalmente
nos países em desenvolvimento, como os BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China),
o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento do Milênio (PNUD)
não contempla em suas diretrizes a abordagem para as DCNTs. Esse fato
ganha ainda mais importância quando se considera que para o manejo e a
abordagem das doenças crônicas existem soluções efetivas e, grandemente,
custo-efetivas (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2011). Segundo a WHO,
o emprego dessas tecnologias de baixo custo e de alto impacto produziria uma
redução de 2% nas taxas de mortalidades por DCNT em todo o mundo por
ano, o que impactaria em uma redução em 36 milhões de óbitos evitáveis em
uma década. (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2005; 2011)
Programas de gestão da doença são cada vez mais incorporados aos
sistemas de saúde em todo o mundo, a fim de melhorar a qualidade e a continuidade de cuidados para as doenças crônicas, melhorando a eficiência dos
serviços de saúde e a utilização de recursos (DE BRUIN; HEIJINK, 2011). A
gestão da doença pode ser definida como um sistema de intervenção focado
no paciente, para grupos específicos, com ênfase nas exacerbações e nas
complicações, bem como no autocuidado (autogestão) e na promoção de
atividades específicas focadas de acordo com cada grupo. Geralmente, essa
gestão utiliza guidelines e métodos centrados em evidências clínicas para a
escolha da abordagem mais efetiva (MATTKE; SEID; MA, 2007). A gestão
da doença organiza uma variedade de serviços em volta de uma doença
para um indivíduo e isso contribui para elevar o nível de cuidados que essa
pessoa recebe.
Assim, de acordo com Todd et al. (1998), os objetivos da gestão da
doença incluem:
a) o encorajamento da prevenção da doença;
b) a promoção do planejamento de um diagnóstico e de tratamento
corretos;
c) a maximização da efetividade das intervenções clínicas;
d) a eliminação dos cuidados e das intervenções desnecessárias e não
efetivas;
e) a utilização apenas de diagnósticos e de terapêuticas custo-efetivas; e
78
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Carlos Daniel M. S. Moutinho Júnior # Alessandra de Linhares Jacobsen # Maria Luciana Biondo Silva
f) a melhoria contínua de resultados do processo e do próprio processo.
1.2 Objetivos
Considerando a expansão de serviços na rede municipal de Florianópolis, que abrange uma população estimada pelo Censo IBGE de 2010 (IBGE,
2010) em aproximadamente 421.000 habitantes, bem como a prevalência cada
vez maior das DCNTs, faz-se necessário indicar possíveis propostas para uma
gestão de doenças crônicas na rede pública municipal, a partir dos objetivos,
geral e específicos, apresentados a seguir.
1.2.1 Objetivo Geral
Propor a implantação de um programa de gestão de doenças crônicas
na rede pública do Município de Florianópolis com foco na redução de morbidade cardiovascular e na economia de recursos financeiros.
1.2.2 Objetivos Específicos
a) Levantar dados epidemiológicos sobre as principais causas de morbidades crônicas em Florianópolis.
b) Descrever pontos fortes e fracos do atual modo de gerenciamento
de doenças crônicas na rede municipal de serviços de saúde de
Florianópolis.
c) Apontar meios para a implantação da nova proposta de gerenciamento de doenças crônicas na rede de Florianópolis.
2 Revisão da Literatura
A gestão dos serviços na área da saúde pública tem se apresentado como
um importante fator de transformação e de operacionalização na construção
de modelos para atender às necessidades de saúde de uma população, um
bem de expectativa infinita. Na medida em que uma sociedade melhora seus
indicadores sociais e econômicos, há uma pressão por maior acesso a recursos
de saúde e a uma maior qualidade deles. Na saúde, especialmente no campo
da introdução de tecnologias, não há substituição: não se deixa de utilizar um
aparelho de raios-x com a utilização de uma ressonância nuclear magnética.
Assim, com a sobreposição de custos em novas tecnologias, há a necessidade
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
79
Proposta de Implantação de um Programa de Gestão de Doenças Crônicas na Rede Pública do Município de
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de otimização de ferramentas administrativas para oportunizar a utilização
dos recursos na área de saúde.
A partir das crises estruturais e econômicas do denominado Estado do
Bem-Estar Social (Welfare State), especialmente nos Estados Unidos e na
Europa nos anos de 1980, surge uma necessidade de que as organizações
governamentais, incluindo as de saúde, atuem com maior flexibilização, e a
participação de poder decisório ao chamado controle social. Segundo Osborne (1995), a gestão pública passa a ter a necessidade de apresentar uma
profunda transformação, saindo de uma posição apenas burocrática gerencial,
para uma ação de criatividade e de flexibilidade, além de cooperação entre
novos atores e cenários.
A proposta de um programa de gestão de doenças crônicas se alinha
com os novos cenários de busca de gerenciamento e de qualidade na medida em que preconiza que recursos podem ser usados mais efetivamente se
o doente se tornar o centro em volta do que o sistema de saúde se organiza
(HUNTER, 1997). A proposta é reforçar a mudança de paradigma, já iniciada
na reforma sanitária e na posterior expansão da Atenção Primária do país,
focando o processo saúde/doença condicionado a variáveis determinantes de
saúde, saindo de uma visão focada na doença para o indivíduo, e sua atuação
proativa como processo para a busca da qualidade de vida.
A gestão de doenças crônicas é bem-vinda como uma resposta estruturada, inserida numa estratégia global para um conjunto de problemas
que são evidentes em todos os serviços de saúde. Esses problemas incluem
arranjos descoordenados para a prestação de cuidados e a falta de foco na
prevenção e na promoção; a lógica de direcionamento a tratamentos agudos
em Unidades de Pronto Atendimento (UPA) ou a emergências hospitalares;
e o crescimento na utilização de condutas não baseadas em evidências. Em
última análise, a gestão da doença pode ser encarada como uma abordagem
multidisciplinar, baseada na longitudinalidade da prestação de cuidados de
saúde que, proativamente, identifica populações com ou em risco de desenvolver doenças crônicas. (COONS, 1996)
Considerando resultados de saúde para pacientes portadores de patologias
crônicas, existem evidências de impacto positivo para diabetes, insuficiência
cardíaca e depressão (OFMAN et al., 2004; ADAMS et al., 2007; STEUTEN
et al., 2007; CONSTANTINI, 2001). Ainda, estudos, cuja base foi construída
a partir de revisões sistemáticas de literatura sobre a implementação de programas de gestão de doenças, apresentaram uma variação importante entre
80
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Carlos Daniel M. S. Moutinho Júnior # Alessandra de Linhares Jacobsen # Maria Luciana Biondo Silva
o potencial de redução de custos, especialmente entre pacientes com doenças
cardíacas e doenças respiratórias crônicas (BRASIL, 2005; CONSTANTINI,
2001), particularmente no curto prazo, relacionados a uma redução nas
complicações e nas utilizações de serviços hospitalares. Entretanto, De Bruin
e Heijink (2011) e o Ministério da Saúde (BRASIL, 2005) chamam a atenção
para o fato de que, devido a uma série de diferenças entre os trabalhos, incluindo a sua metodologia e a consistência dos dados, em alguns casos não
foi levantado uma correlação estatística entre as intervenções controladas e
as usuais, ou outros não apresentaram resultados com significância estatística.
Dentro de uma rede de cuidados de saúde, os esforços bem-sucedidos
para desenvolver programas de gestão da doença que tenham por propósito
a efetividade devem considerar várias questões-chave, que, segundo Crocker
e Mangotich (2001), são estas:
a) Que população é afetada pela doença? Qual a prevalência?
b) Essa população é suficientemente grande para garantir a implementação de um programa?
c) Existem disponíveis intervenções efetivas para reduzir o risco e melhorar os resultados?
d) Há evidência (bibliografia) de potencial para reduzir o nível do risco
dos doentes através do programa?
e) É possível quantificar os resultados? Podem ser medidos os custos e
os benefícios esperados do programa?
Considerando a prevalência dentre as doenças crônicas na população,
o presente trabalho avalia programas de gestão de doenças para patologias
como hipertensão arterial, insuficiência cardíaca, diabetes e doenças respiratórias crônicas. Além do potencial de mudança na qualidade de vida com
a redução de episódios de agravamento da doença, os custos relacionados
especialmente à utilização de serviços de média e alta complexidades as tornam
elegíveis para a análise do presente estudo para a cidade de Florianópolis.
3 Metodologia
O presente trabalho é um estudo qualitativo, realizado por meio de
uma revisão da literatura de dados coletados em fontes literárias em língua
portuguesa e inglesa nas principais bases médicas científicas, como Medline,
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
81
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Lilacs, Biblioteca Cochrane e Scielo. Essas bases foram selecionadas em revisões sistemáticas ou em estudos de coortes prospectivos; através de dados
disponibilizados pela Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis, pelo
Ministério da Saúde, no Sistema de Informações em Atenção Básica (SIAB) no
Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos (SIOPS) e no DATASUS –
Ministério da Saúde. Todos os dados, quando necessário, foram organizados
e tabulados utilizando-se o programa Microsoft® Excel 2003.
Os dados levantados pelo presente estudo foram separados anualmente, tendo como referência a última década entre 2001 e 2010. Sempre que
disponíveis, foram também estendidos até o ano de 2011, ou ressaltada a sua
tendência. O gráfico do índice de envelhecimento (Figura 2) apresenta dados
de 1991 até 2009, a fim de ampliar a visão da tendência citada. Os citados
dados foram, então, organizados em histogramas ou em gráficos do tipo linha
para que se visualize melhor o resultado e a compreensão do tema em estudo.
4 Resultados
Na sequência, serão apresentados e analisados os dados coletados para
a presente pesquisa.
4.1Levantamento de Dados Epidemiológicos sobre as Principais Causas de Morbidades Crônicas em Florianópolis
O Município de Florianópolis, assim como o Brasil, vem sofrendo uma
transformação em sua pirâmide etária (Figura 1) com a redução nas taxas de
fecundidade e a ampliação da expectativa de vida ao nascer. Comparando o
período entre os últimos dois levantamentos censitários, a população acima de
60 anos de idade passou de 8,3%, em 2000, para 11,2% do total de habitantes, em 2010, ocasionando maior necessidade de se desenvolverem políticas
públicas voltadas para essa faixa etária. Além disso, é esperado também um
incremento cada vez maior na prevalência de doenças crônico-degenerativas,
além do crescimento nas causas externas de mortalidade, o que passou a ser
chamado de tripla-carga de doenças. (MENDES, 2012)
82
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Carlos Daniel M. S. Moutinho Júnior # Alessandra de Linhares Jacobsen # Maria Luciana Biondo Silva
Figura 1: Pirâmide etária Florianópolis/SC 2010
Fonte: IBGE (2010)
Outro indicador que corrobora a situação relacionada à mudança na
pirâmide etária é o índice de envelhecimento de Florianópolis (Figura 2),
calculado pelo número de pessoas acima de 60 anos de idade para cada 100
pessoas menores de 15 anos de idade no mesmo local. Esse indicador mostra
uma elevação de mais de 120% entre os anos de 1991 e 2009 no índice de
envelhecimento populacional.
Figura 2: Índice de envelhecimento em Florianópolis
Fonte: IBGE (2010)
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
83
Proposta de Implantação de um Programa de Gestão de Doenças Crônicas na Rede Pública do Município de
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Levantamentos realizados nas principais fontes disponíveis (Medline,
Lilacs, Biblioteca Cochrane e Scielo) revelaram não haver estudos suficientes
em âmbito nacional, inexistindo estudos diretos sobre Florianópolis a respeito
da prevalência de DCNTs. Para conseguir uma avaliação mais próxima dessa
prevalência, foram considerados os dados de internações hospitalares em
maiores de 30 anos de idade em Florianópolis, adquiridos através das bases
de dados do DATASUS/MS para aferir as principais causas de morbidade entre
as doenças crônicas. Também serão considerados os resultados dos estudos
do VIGITEL (GARCIA; SILVEIRA; CALDERON, 2012), entre 2006 e 2011,
que são realizados em 26 capitais brasileiras e no Distrito Federal, a fim de
monitorar a frequência e a distribuição de fatores de risco e proteção para
DCNT, por meio de entrevistas telefônicas realizadas em amostras probabilísticas da população adulta.
Por se apoiar em entrevistas telefônicas, o VIGITEL (BRASIL, 2011) não
pode aferir diretamente a frequência de fatores de risco para doenças crônicas
que necessitem de diagnóstico médico. Nesses casos, de forma semelhante à
empregada por outros sistemas de vigilância, o VIGITEL estima a frequência
de indivíduos que referem diagnóstico médico prévio do fator de risco. É evidente que as frequências estimadas dessa maneira serão influenciadas pela
cobertura da assistência à saúde existente em cada cidade, podendo, assim,
subestimar, em maior ou em menor grau, a prevalência real do fator de risco
na população. De qualquer modo, de imediato, fornecem informações úteis
para avaliar a demanda por cuidados de saúde originada pela presença do
fator. Em médio prazo, com a expansão e a universalização da cobertura da
atenção à saúde da população adulta do país, espera-se que a frequência de
casos diagnosticados se aproxime da prevalência real daquelas condições na
população, propiciando assim informações seguras para o seu acompanhamento ao longo do tempo.
Considerando ambas as fontes de dados, verifica-se que as cinco principais causas de internações hospitalares agudas ou crônicas (devido a doenças
do aparelho circulatório, respiratório, digestivo, causas externas e neoplasias)
representam juntas 63% do total de internações em maiores de 30 anos de
idade, no ano de 2011, em Florianópolis (Quadro1).
84
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Doenças do aparelho circulatório
Neoplasias
Doenças do aparelho digestivo
Causas Externas
Doenças do aparelho respiratório
Somatório
Total Internações (excetuando gravidez/parto)
2011
(%)
1.873
1.428
1.177
1.122
810
18,4%
14,0%
11,6%
11,0%
8,0%
63,0%
10.169
Quadro 1: Principais causas de internações hospitalares em maiores de 30 anos de idade
em Florianópolis no ano de 2011
Fonte: Elaborado pelo autor deste artigo
Quando se observam as patologias que usualmente estão implicadas
em condições crônicas, é possível observar que, em 2011, as principais causas de internações hospitalares por doenças crônicas estavam relacionadas a
doenças do aparelho circulatório, neoplasias, doenças do aparelho respiratório
e doenças endócrinas, que somadas representavam mais de 25% do total de
internações acima dos 30 anos de idade (Quadro 2):
2011
Doenças do aparelho circulatório
Hipertensão essencial (primária)
Outras doenças hipertensivas
Infarto agudo do miocárdio
Outras doenças isquêmicas do coração
Insuficiência cardíaca
Hemorragia intracraniana
Infarto cerebral
Acidente vascular cerebral não específico hemorrágico
ou isquêmico
Neoplasias malignas
Neoplasia maligna da mama
Neoplasia maligna de traqueia brônquios e pulmões
Outras neoplasias malignas da pele
Neoplasia maligna do cólon
Neoplasia maligna do estômago
1.203
11
15
213
467
167
127
17
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
186
1.097
163
95
76
66
60
85
Proposta de Implantação de um Programa de Gestão de Doenças Crônicas na Rede Pública do Município de
Florianópolis com Foco na Redução de Morbidade Cardiovascular e na Economia de Recursos Financeiros
2011
Doenças do aparelho respiratório
Bronquite e enfisema
Asma
Doenças endócrinas nutricionais e metabólicas
Diabetes mellitus
Total
% sobre Total de Internações > 30 anos
198
180
18
89
89
2.587
25,4
Quadro 2: Principais causas de internações hospitalares por doenças crônicas em maiores
de 30 anos de idade em Florianópolis no ano de 2011
Fonte: Elaborado pelo autor deste artigo
Segundo os dados do VIGITEL (BRASIL, 2011), em 2010, 18,4% da
população maior de 18 anos de idade eram diagnosticados com Hipertensão
Arterial Sistêmica (HAS) e 5,9% de Diabetes Mellitus, valores que se encontram
em trajetória ascendente entre os estudos de 2006 e 2010 (Figuras 3 e 4).
Percentual de adultos (com idade maior ou igual a 18 anos)
que referem diagnóstico médico de hipertensão arterial,
por sexo - Florianópolis
25
20
15
20,2
17,7
14,9
22,1
20,3
18,3
23,6
21,7
19,6
22,6
21,1
19,3
17,2
20,8
18,7
20,8
18,7
16,3
10
5
0
2006
2007
Total
2008
2009
Masculino
2010
Feminino
2011
Figura 3: Percentual de adultos que referem diagnóstico de hipertensão arterial em Florianópolis
Fonte: Adaptada de Garcia, Silveira e Calderon (2012)
86
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Percentual de adultos (com idade maior ou igual a 18 anos)
que referem diagnóstico médico de diabetes, por sexo, Florianópolis
8
7
6
5
4
3
2
1
0
5,9
6,2
5,8
4,5
5,4
2,9
2006
2007
Total
5,8
5,7
5,6
5,4
4,6
7,1
6,3
5,5
6,2
5,9
5,5
3,7
2008
2009
Masculino
2010
2011
Feminino
Figura 4: Percentual de adultos que referem diagnóstico de diabetes mellitus em
Florianópolis.
Fonte: Adaptada de Garcia, Silveira e Calderon (2012)
De acordo com a WHO, um pequeno conjunto de fatores de risco responde pela grande maioria das mortes por DCNTs e por fração substancial da
carga de doenças devido a essas enfermidades. Dentre esses fatores, destacam-se o tabagismo, o consumo excessivo de bebidas alcoólicas, a obesidade e a
inatividade física. (Figuras 5 a 8). Todos os fatores relacionados anteriormente
representam determinantes comportamentais e biológicos que podem ser
alvo de atuação das equipes de saúde para reduzir os fatores de risco para a
morbidade relacionada às DCNTs.
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Florianópolis com Foco na Redução de Morbidade Cardiovascular e na Economia de Recursos Financeiros
Percentual de adultos (com idade maior ou igual a 18 anos)
fumantes, por sexo - Florianópolis
30
25
20
15
26,4
21,9
18,7
15,8
20,2
14,5
20,6
20,2
19,9
20,1
17,6
15,4
18,4
17,4
16,4
10
17,5
14,3
11,5
5
0
2006
2007
Total
2008
2009
Masculino
2010
2011
Feminino
Figura 5: Percentual de adultos que referem uso de tabaco em Florianópolis
Fonte: Adaptada de Garcia, Silveira e Calderon (2012)
O percentual de adultos que se referem ao uso de tabaco em Florianópolis vem apresentando redução desde 2007. A partir de 2010, com sanção
da Lei n.8.042, que proíbe o fumo em espaços coletivos, potencializou-se
ainda mais a redução da utilização de tabaco no município, que poderá ser
avaliada nos próximos anos quanto a sua efetividade.
Percentual de adultos (com idade maior ou igual 18 anos)
que, nos últimos 30 dias, consumiram mais do que quatro
doses (mulher) ou cinco doses (homem) de bebida alcoólica
em uma mesma ocasião - Florianópolis
35
30
25
20
15
10
5
0
30,2
28,6
24,3
18,1
7,2
2006
18,9
10,1
2007
27
17
17,7
10,5
9,3
2008
2009
29,2
20,3
12,3
Total
Masculino
Feminino
2010
Figura 6: Percentual de adultos que referem consumo excessivo de bebidas alcoólicas em
Florianópolis
Fonte: Adaptada de Garcia, Silveira e Calderon (2012)
88
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O percentual de consumo de álcool de forma abusiva apresentou acréscimo entre 2006 e 2010, mantendo-se estável entre homens, mas o aumento
se deu devido a um crescimento de aproximadamente 70% entre mulheres,
o que sugere a necessidade de políticas públicas voltadas para esse público.
Percentual de adultos (com idade maior ou igual 18 anos)
com excesso de peso (Índice de Massa Corporal ≥ 25 kg/m2),
por sexo - Florianópolis
60
50
48,5
40
40,4
30
32,2
52,7
44
35,8
48,3
41,8
35,7
52,4
45
38,1
54,2
46,3
38,9
Total
Masculino
20
Feminino
10
0
2006
2007
2008
2009
2010
Figura 7: Percentual de adultos com IMC ≥ 25 kg/m2 em Florianópolis
Fonte: Adaptada de Garcia, Silveira e Calderon (2012)
Ocorreu um crescimento de 14,6% no percentual de adultos com sobrepeso em Florianópolis, de 2006 a 2010. Entre as mulheres, esse crescimento
chegou a 20,8% no mesmo período, e, entre homens, o percentual passou de
mais da metade da população adulta, atingindo 54,2% em 2010.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
89
Proposta de Implantação de um Programa de Gestão de Doenças Crônicas na Rede Pública do Município de
Florianópolis com Foco na Redução de Morbidade Cardiovascular e na Economia de Recursos Financeiros
Percentual de adultos (com idade maior ou igual 18 anos)
fisicamente inativos*, por sexo - Florianópolis
40
35
30
25
20
33,4
27,7
35,2
32,2
29,6
22,5
30,2
27,3
24,7
23,9
18,5
15
13,6
10
5
Total
13,3
12,2
11,3
Masculino
Feminino
0
2006
2007
2008
2009
2010
Figura 8: Percentual de adultos fisicamente inativos em Florianópolis
Fonte: Adaptada de Garcia, Silveira e Calderon (2012)
O conhecimento do número de pessoas acometidas pelas doenças
crônicas, bem como os fatores de risco associados a possibilidades de complicações dessas patologias é de crucial importância para o planejamento e
execução de ações na programação da saúde pública. Identificando e levantando estratégias, as políticas públicas podem ser pensadas a fim de propiciar
ações mais custo-efetivas e voltadas para o objetivo de redução de gravidade
na morbidade ao longo do tempo. A inserção da epidemiologia no campo do
planejamento em saúde proporciona uma efetiva contribuição na tomada de
decisões e no alcance de metas.
4.2 Descrição do Gerenciamento de Doenças Crônicas na Rede
Municipal de Serviços de Saúde em Florianópolis
O Município de Florianópolis apresentou na última década um crescimento expressivo na cobertura da Atenção Primária em Saúde. Em decorrência
dessa expansão e da entrada do município na gestão da média complexidade
a partir de 2007, houve a necessidade de reorganizar os fluxos da rede de
serviços municipais, e a opção foi a coordenação pela APS, como porta de
entrada preferencial e ordenadora dos demais níveis de atenção, seguindo
as diretrizes do SUS. O crescimento na coordenação do cuidado exigiu a
construção de fluxos e de protocolos de atenção à saúde, a fim de procurar
90
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Carlos Daniel M. S. Moutinho Júnior # Alessandra de Linhares Jacobsen # Maria Luciana Biondo Silva
garantir a melhor estratégia efetiva para cada caso. Assim, como no Ministério
da Saúde, Florianópolis historicamente trabalha com linhas de cuidado por
ciclos de vida, organizando-os por meio de Programas na APS: Saúde da
Criança, Saúde da Mulher, Saúde do Idoso, Saúde Bucal e Saúde Mental.
Posteriormente, foi ampliado o programa da Saúde da Mulher, para Saúde
do Adulto, englobando ações para a Saúde do Homem.
Está em fase ainda de construção um Protocolo de Saúde do Adulto,
que trará orientações, diretrizes clínicas e organização de serviços acerca das
Doenças Crônicas Não-Transmissíveis. Apesar de ser um documento organizado
por profissionais que compõem as equipes técnica da SMS, selecionado entre
médicos e enfermeiros que trabalham na APS ou na Média Complexidade,
o escopo do material não traz em suas linhas gerais uma proposta de gerenciamento de doenças crônicas, servindo como uma linha técnica de cuidado
para doenças crônicas.
Atualmente, dentro do contexto da APS em Florianópolis existe um
acompanhamento fragmentado das patologias crônicas que são consideradas
dentro deste trabalho, cardiovasculares e respiratórias, tanto no que diz respeito a sua prevenção primária ou secundária (pós-evento adverso) quanto ao
seguimento. Na maioria dos casos, ocorre uma escolha de conduta baseada
em experiências pessoais da equipe multiprofissional, ou o seguimento de
estratégias orientadas por protocolos do Ministério da Saúde.
Apesar disso, alguns aspectos e ações têm de ser destacados, especialmente por trabalharem com propostas de intervenção voltadas para a
promoção e a prevenção. Existe em Florianópolis, desde o ano de 2007, um
plano de intervenção ao combate do uso do tabaco, pela descentralização do
tratamento e cuidado pela APS em todos os Centros de Saúde, com realização
de grupos, distribuição de medicamentos e tratamento corresponsabilizado
entre a equipe de APS e profissionais do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF), como Psicólogos e Psiquiatras. Ainda neste trabalho, foi possível
a criação da Lei Municipal n. 8.042/2009 proibindo o consumo de tabaco
em ambientes fechados. A extensão deste trabalho vem sendo levada até as
escolas municipais e estaduais dentro do Programa Saúde do Escolar (PSE),
que também agrega outras ações de prevenção às DCNTs em longo prazo,
como alimentação saudável e atividade física nas escolas.
Outro aspecto salutar é a existência do programa municipal de atividades
físicas – Floripa Ativa, que engloba desde atividades de prevenção primária
para grupos de idosos, com caminhadas orientadas por profissionais de edu-
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
91
Proposta de Implantação de um Programa de Gestão de Doenças Crônicas na Rede Pública do Município de
Florianópolis com Foco na Redução de Morbidade Cardiovascular e na Economia de Recursos Financeiros
cação física ou nutricionistas, até atividades de prevenção secundária para
redução de risco cardiovascular após um evento adverso. Ambos os programas existem nos cinco Distritos Sanitários e são organizados pelas Equipes
de Saúde em cada bairro.
Um grande gargalo para um programa sistematizado de gerenciamento
de doenças crônicas também já encontra resposta no serviço municipal, que é
a utilização de uma ferramenta integrada de Prontuário Eletrônico em todos
os níveis de atenção (Centros de Saúde, Policlínicas e Unidades de Pronto
Atendimento). A facilidade de acesso ao prontuário e a utilização dele por
uma variedade de profissionais que acompanham o paciente potencializam o
acompanhamento do caso e reduzem intervenções repetidas. Por outro lado,
o sistema atual não proporciona o apoio de protocolos clínicos para tomada
de decisão baseados em evidências científicas.
4.3 Propostas de Abordagens no Gerenciamento de Doenças
Crônicas na Rede Municipal de Florianópolis
As intervenções para prevenção e controle de DCNT incluem diversas
ações, que têm sido monitoradas e avaliadas por meio de vários estudos. A
WHO divulgou, recentemente, as intervenções consideradas mais custo-efetivas,
quais sejam (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2011):
a) aumentar impostos e preços sobre os produtos do tabaco;
b) proteger as pessoas da fumaça do cigarro e proibir que se fume em
lugares públicos;
c) advertir sobre os perigos do consumo de tabaco;
d) restringir a venda de álcool no varejo;
e) reduzir a ingestão de sal e do conteúdo de sal nos alimentos;
f) substituir gorduras trans em alimentos por gorduras poli-insaturadas;
g) promover o esclarecimento do público sobre alimentação e atividade
física, inclusive pela mídia de massa;
h) criar programas comunitários de atividade física e alimentação
saudável; e
i) construir ambientes que promovam atividade física.
Além das ações populacionais, são consideradas efetivas as intervenções
individuais para portadores de DCNT (primária ou secundária) ou em seus
92
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Carlos Daniel M. S. Moutinho Júnior # Alessandra de Linhares Jacobsen # Maria Luciana Biondo Silva
fatores de risco associados. Tais intervenções podem ser altamente efetivas
e de baixo custo. Quando estão em conjunto, intervenções populacionais e
individuais podem potencializar a médio e longo prazo o impacto sobre os
serviços de saúde.
A adoção de um programa municipal de gerenciamento em Florianópolis deverá contemplar:
a) A construção de um Protocolo/Guideline, com as melhores intervenções custo-efetivas disponíveis para populações com DCNTs ou com
os fatores de risco cardiovasculares ou respiratórias.
b) A capacitação contínua de equipes multidisciplinares de APS, bem
como das equipes de profissionais de apoio (NASF e especialidades
de média complexidade relacionadas às DCNTs em foco).
c) A readequação da ferramenta de prontuário eletrônico, prevendo a
incorporação de guias de gerenciamento de doenças, com lembretes
e feedbacks positivos ou negativos dentro do prontuário de cada
paciente.
d) Educação em saúde voltada para a população em foco, através de
qualquer meio: rádio, TV, programas transmitidos dentro dos Centros
de Saúde, reuniões de grupos. O componente de autocuidado é o
primeiro e mais importante dentro da construção eficaz do gerenciamento de DCNTs.
A mensuração do programa de gerenciamento de DCNTs é feita por
indicadores de performance divididos em três grandes áreas, que são a de
indicadores de desfecho clínico, de processos e a de indicadores financeiros.
Todos os indicadores devem ser incorporados para análise e levantamento
de dados ao prontuário eletrônico, como ferramenta gerencial ao gestor e às
equipes de saúde. Nessa linha, alguns indicadores sugeridos são os que seguem:
a) Indicadores de desfecho clínico.
i. Doenças Cardiovasculares: Redução da pressão arterial (mmHg)/
Redução de peso (em %)/Redução de Escala de fatores de Risco;
ii. Doenças Respiratórias: aumento no VEF1 (Volume Expiratório
Forçado em 1 min.); e
iii. Para ambos: número de Internações Hospitalares/ano.
b) Indicadores de Processos.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
93
Proposta de Implantação de um Programa de Gestão de Doenças Crônicas na Rede Pública do Município de
Florianópolis com Foco na Redução de Morbidade Cardiovascular e na Economia de Recursos Financeiros
i. Aderência ao tratamento farmacológico/não farmacológico proposto; e
ii. Realização de exames anuais previstos em Protocolo.
a) Indicadores financeiros.
i. Custos diretos relacionados à doença (medicamentos, equipe de
saúde, diárias hospitalares e exames).
Indicadores são utilizados como forma de aferir resultados e indicar
caminhos. Cada indicador tem a função de, em conjunto com as ações
sugeridas, induzir modificações no trabalho da rede municipal de saúde,
com o intuito de melhorar o gerenciamento das condições crônicas e suas
complicações para a população de Florianópolis. A verificação por meio de
indicadores que possam balizar o desempenho do efeito esperado modula e
proporciona o passo consequente a qualquer atividade de programação ou
planejamento em saúde, que é a verificação da efetividade e a possibilidade
de indicar a necessidade de mudar algum fluxo ou ação dentro da rede de
serviços, se necessário.
5 Considerações Finais
Toda mudança é amparada na perspectiva de modificar um curso de
eventos. Ao mesmo tempo em que orienta para prover uma resposta a novos
desafios, a novas práticas na área de gerenciamento na saúde pública, as mudanças também trazem o aspecto ligado à quebra de paradigmas e às antigas
abordagens. Assim como um grande objeto pesado, as grandes corporações
administrativas, de saúde ou não, tendem a buscar a inércia burocrática, e
movimentar-se em uma direção nova tende a romper arranjos pessoais ou
ideológicos.
Novas ferramentas no âmbito do gerenciamento administrativo na
saúde pública trazem em seu bojo estrutural práticas de governança utilizadas
habitualmente em empresas privadas, sobretudo nos aspectos de organização,
métodos e qualidade.
As doenças crônicas, se não partem da perspectiva de cura por um
sistema de saúde, podem ser prevenidas ou controladas, por meio de detecção precoce, acompanhamento médico, práticas de vida saudáveis e uso de
medicamentos quando necessário. O objetivo do gerenciamento é promover
a educação em saúde, corresponsabilizando o indivíduo, prevenindo com-
94
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Carlos Daniel M. S. Moutinho Júnior # Alessandra de Linhares Jacobsen # Maria Luciana Biondo Silva
plicações, procedimentos invasivos e hospitalizações, diminuindo com isso o
impacto financeiro ao sistema de saúde.
A adesão ao tratamento é fundamental para que o paciente tenha condições de levar uma vida normal. Os profissionais da área da saúde devem
atuar na comunidade como um elo entre paciente e tratamento, informando
sobre a doença ao paciente e aos familiares, abordando aspectos como o
risco da não adesão às recomendações, o uso adequado dos medicamentos
indicados, bem como o estímulo à redução de fatores de risco. Quanto mais
o paciente e a família ganham a responsabilidade de atuação proativa diante
da doença crônica, melhores são os indicadores de aderência e a redução de
eventos adversos.
O envelhecimento populacional e com ele o incremento acelerado
na prevalência de doenças crônicas no Sistema Único de Saúde requerem
mensuração adequada do impacto, planejamento e execução de ações que
minimizem a sobrecarga cada vez maior nos recursos públicos. O estudo do
custo das doenças, o apoio de medidas custo-efetivas de cunho populacional
ou individualizadas e o gerenciamento de doenças crônicas representam uma
importante ferramenta para auxiliar gestores e trabalhadores do sistema de
saúde, além de contribuir significantemente com a melhor condição de vida
para os usuários desse sistema.
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98
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Complexo Regulador de Florianópolis:
gestão do acesso da atenção especializada do
Sistema Municipal de Saúde de Florianópolis
Aluna: Deyse Ilza de Aquino1
Orientador: Altamiro Damian Préve2
Tutora: Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino3
Resumo
Abstract
A Política Nacional de Regulação prevê a operacionalização da regulação do acesso definida
como uma dimensão do processo regulatório
em saúde que, por meio de Complexos Reguladores, visa conformar uma rede de cuidado
integral e equitativo. Para compreender e avaliar
de que forma se deu esse acontecimento, este
artigo tem como objetivo realizar uma avaliação da implantação do Complexo Regulador
Regional de Florianópolis/SC. Trata-se de uma
pesquisa quantitativa, exploratório-descritiva
utilizando como fonte de dados o Sistema Nacional de Regulação do MS – SISREG II e as
informações dos relatórios de Monitoramento
e Avaliação da Secretaria Municipal de Saúde
de Florianópolis/SC. O Pacto pela Saúde trouxe
uma nova perspectiva para o sistema de saúde
da Grande Florianópolis, que incluiu as Diretrizes de Regulação, e as novas regras para a Regionalização e Programação Pactuada e Integrada preestabelecidas.
The National Regulation Policy predicts the
operation of access’ regulation defined as a dimension of the health regulatory process which, through the Regulator Complex, aims to
conform an integral and equanimous network
care. In order to comprehend and evaluate the
means of these events, this article aims to evaluate the implantation of Florianópolis Regional Regulator Complex/SC. It’s a quantitative,
exploratory and descriptive research, using, as
source of datas, the Ministry Health’s Regulation National System – SISREGIII of the Brazilian Ministry of Health and the information
from the Monitoring and Evaluation reports
of the Municipal Health Department of Florianópolis/SC. The Health Pact brought a new
perspective to the Great Florianópolis region’s
health system, which includes the Regulation’s
Directives, and new rules for the Regionalization and Agreed and Integrated Programming
predetermined.
Palavras-chave: Sistema Único de Saúde. Key words: Unified Health System. Health
Política de Saúde. Avaliação em Saúde..
Policy. Health Evaluation..
1
Mestre em Saúde e Gestão do Trabalho pelo Centro de Educação de Ciências da Saúde
pela Universidade do Vale do Itajaí. E-mail: [email protected].
2
Mestre em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1985), E-mail:
[email protected].
3
Mestranda do curso de Administração Universitária da Universidade Federal de Santa
Catarina – UFSC. Formação Pedagógica para Atuação em EAD – UNOPAR. E-mail: mileide.
[email protected].
Complexo Regulador de Florianópolis: gestão do acesso da atenção especializada do Sistema Municipal de
Saúde de Florianópolis
1Introdução
Desde o início dos anos de 1990, uma série de estratégias de regulação
da política nacional de saúde vem sendo posta em prática pelo Ministério da
Saúde no Sistema Único de Saúde (SUS). Apesar da variedade observada
naquela década em razão de mudanças nos governos e nos administradores
públicos da esfera federal, algumas estratégias expressavam traços de antigas
práticas de regulação (por exemplo, as práticas de controle que eram do
INAMPS), enquanto outras representavam novas formas de regulação que
vêm sendo adaptadas no processo de construção do SUS.
A política de regulação exercida pelo administrador federal sobre o
SUS tem se baseado acentuadamente em dois eixos articulados: a edição de
normas federais, associada a variados mecanismos financeiros de indução ou
de inibição de políticas e práticas pelos administradores estaduais, municipais
e prestadores de serviços ao SUS. (OLIVEIRA, 2010)
Esses eixos se agregam a outras formas de atuação do administrador
federal do SUS que configuram estratégias de regulação da política, através
de apoio e capacidade técnica dos gerentes, capacidade de recursos humanos
para o SUS, controle e avaliação de sistemas, serviços e práticas de financiamento de pesquisas, regulação de mercados relacionados à saúde, criação de
estruturas de regulação da rede de serviços, entre outros.
O poder de regulação do administrador federal vem sendo amplamente
exercido pelas normas operacionais do SUS e por outras de portarias editadas
a cada ano pelas diversas áreas do Ministério da Saúde e por demais entidades
federais da área da saúde – como a Fundação Nacional de Saúde (Funasa),
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e Agência Nacional de
Saúde Suplementar (ANS).
As Normas Operacionais do SUS são portarias do Ministério da Saúde,
editadas a partir de 1991, e funcionaram como instrumentos de regulação
do processo de descentralização do SUS, conforme tratam dos critérios e dos
mecanismos de transferência de responsabilidades, atribuições e recursos
da esfera federal para Estados e municípios. Ao longo da década de 1990
foram editadas quatro dessas normas: as Normas Operacionais Básicas do
SUS 01/91, 01/92, 01/93 e 01/96; e as Normas Operacionais de Assistência à
Saúde – NOAS-SUS 01/01 e NOAS-SUS 01/02. (MENDES; ALMEIDA, 2005)
100
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Deyse Ilza de Aquino # Altamiro Damian Préve # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
A expressão “Regulação” é introduzida ao SUS, na NOAS 01/2002
– Norma Operacional de Assistência em Saúde, e o Ministério da Saúde
apresenta orientações de atuação para a Gestão do SUS, em ações e serviços
de controle, avaliação e auditoria, incluindo o conceito de Regulação e suas
implicações para a reorganização do modelo, visando um acesso aos serviços
de saúde com equidade. No entanto, não houve, por parte da maioria dos
Municípios, a adesão necessária para modificação do conceito de “acesso”,
até então utilizado pelos Municípios. (OLIVEIRA, 2010)
A partir do Pacto pela Saúde, introduzido pelo Ministério da Saúde no
ano de 2006, é instituída a Política Nacional de Regulação, proporcionando
aos Estados e Municípios organizar o acesso a partir da criação dos complexos
reguladores e suas centrais de regulação.
Esse pacto aborda três dimensões: o Pacto pela Vida, o Pacto em Defesa
do SUS e o Pacto de Gestão, publicado na Portaria GM/MS n. 399, de fevereiro de 2006, sendo regulamentado pela Portaria GM/MS n. 699, de março
de 2006, visando novas bases para organização da gestão do SUS, de forma
solidária, sendo traduzido em um termo de compromisso de Gestão, no qual
se definem responsabilidades sanitárias e de gestão, de resultados a serem
alcançados, possibilitando sua avaliação e controle público. Sua efetividade
se dá por meio da adesão do gestor com aprovação do Conselho de Saúde e
traz uma mudança na gestão do SUS. (NASCIMENTO et al., 2009)
O Pacto pela Saúde originou novas perspectivas para o SUS, em que
as Diretrizes de regulação, e as reformulações de regras para a Regionalização
e Programação Pactuada e Integrada são estabelecidas.
Dentro desse contexto, no ano de 2006, com a assinatura do Pacto
pela Saúde, representando o município sede para atender 22 municípios da
Macrorregião de Florianópolis, implanta-se o Complexo Regulador Regional
para atender às demandas de consultas e de exames especializados oriundos
da atenção básica de todos esses municípios. (FLORIANÓPOLIS, 2009)
Para consolidar o proposto, Florianópolis participou do projeto piloto
do Ministério da Saúde na implantação do Sistema Nacional de Regulação
– SISREG-III. Esse sistema on-line foi desenvolvido para facilitar o gerenciamento dos Complexos de Regulação e organizar o acesso, desde a atenção
básica até a internação hospitalar.
Na medida em que o Município de Florianópolis avança na Gestão de
seu Sistema de Saúde, a Diretoria de Alta Complexidade propõe ações de
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
101
Complexo Regulador de Florianópolis: gestão do acesso da atenção especializada do Sistema Municipal de
Saúde de Florianópolis
monitoramento, utilizando a ferramenta SISREG para acompanhar e avaliar
a assistência à saúde na média complexidade e na alta complexidade e o
avanço na gestão, tendo como premissa a atenção básica e a Estratégia de
Saúde da Família como porta de entrada no sistema; e as Unidades básicas
de saúde como responsáveis pelo gerenciamento do acesso do SISREG. Para
isso, a Secretaria Municipal de Saúde implanta o Protocolo de Acesso – define
e normatiza o acesso aos serviços especializados por meio das Listas de Espera
e de Regulação. Os Centros de Saúde passaram a trabalhar com cotas para
exames e consultas especializadas.
A partir de vários estudos da oferta versus demanda, o município de
Florianópolis, em 2009, assumiu algumas referências para os 21 municípios
da Grande Florianópolis, vencendo mais uma etapa do processo de adesão
segundo o cronograma do Pacto pela Saúde.
Com a definição das cotas, cada unidade e os 21 municípios da Grande
Florianópolis assumem a responsabilidade de realizar o gerenciamento local,
bem como a avaliação de sua realidade. As regionais de saúde assumem a
supervisão das Unidades de sua área de abrangência. Dessa forma, de maneira
ascendente, a Coordenação do SISREG realiza o monitoramento de toda a
rede municipal de saúde e dos 21 municípios da Grande Florianópolis supervisionando as regionais, participando das discussões sobre a distribuição das
cotas, elaborando relatórios trimestrais de acompanhamento e avaliação da
média complexidade municipal e discutindo no Colegiado Gestor da Grande
Florianópolis a oferta versus demanda das consultas e dos procedimentos de
média e alta complexidade.
Para garantir que a Atenção Básica e a Estratégia de Saúde da Família
sejam responsáveis pela entrada do usuário no Sistema, as Policlínicas foram
implantadas sem porta de entrada direta. As agendas aos serviços especializados
são das unidades locais de saúde, mantendo a lógica das cotas por unidade.
Além disso, o SISREG passa a absorver integralmente todas as agendas dos
serviços especializados (públicos e privados), garantindo um único acesso,
através do Sistema de Regulação.
Visando compreender e avaliar de que forma se deu esse acontecimento, este artigo tem como objetivo realizar uma avaliação da implantação do
Complexo Regulador Regional de Florianópolis/SC.
Para alcançar este objetivo foi avaliado o processo de implantação do
Complexo Regulador de Florianópolis e seu impacto na gestão do acesso aos
102
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Deyse Ilza de Aquino # Altamiro Damian Préve # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
serviços especializados de saúde através dos relatórios de Monitoramento e
Avaliação da Diretoria de Regulação, Controle, Avaliação e Auditoria.
2 Fundamentação Teórica
2.1A Política Nacional de Regulação: aspectos históricos e conceituais
Em 2008, implantou-se a Política Nacional de Regulação através da Portaria
GM/MS n. 1.559/2008, focada em três eixos estruturantes: recursos financeiros
para a implantação (Portarias GM/MS n. 1.571/2007 e n. 2.907/2009) e para
o custeio dos Complexos Reguladores; instrumentos para operacionalização
dos Complexos Reguladores (Plano Diretor de Regionalização, Programação
Pactuada Integrada, Projeto Centrado à Educação Profissional, Contratos/
Contratualizações, Protocolos Clínicos, Cadastro Nacional de Estabelecimentos
de Saúde, Cartão Nacional de Saúde, Programa Nacional de Avaliação de
Serviços de Saúde, Sistema Nacional de Regulação); e programa de capacitação permanente de recursos humanos. (BRASIL, 2006a)
O Ministério da Saúde (BRASIL, 2006a) define o Complexo Regulador
como uma estrutura que congrega o conjunto das ações de regulação do
acesso à assistência, de maneira articulada e integrada, buscando adequar a
oferta de serviços de saúde à demanda que mais se aproxima das reais necessidades de saúde da população. Esses serviços podem ter abrangência e
estrutura pactuadas entre gestores, com os seguintes modelos, nacional: agrupa
estado e municípios do território nacional; estadual: agrupa municípios de um
estado; regional: agrupa municípios de uma determinada região; municipal:
agrupa recursos assistenciais de um dado município; distrital: agrupa recursos
assistenciais de um distrito sanitário, dentro de um município.
A Política Nacional de Regulação prevê a operacionalização da regulação do acesso definida como uma dimensão do processo regulatório em
saúde que, por meio de Complexos Reguladores, visa conformar uma rede de
cuidado integral e equitativo. As ações de regulação estão organizadas em três
dimensões, denominadas como Regulação de Sistemas de Saúde, Regulação
da Atenção à Saúde e Regulação do Acesso à Assistência. (BRASIL, 2008)
A implantação ou a implementação de Complexos Reguladores no
Brasil tem o intuito de aperfeiçoar e organizar a relação entre a oferta e a
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
103
Complexo Regulador de Florianópolis: gestão do acesso da atenção especializada do Sistema Municipal de
Saúde de Florianópolis
demanda, qualificando o acesso da população aos serviços de saúde no
SUS, criando condições que respondam às necessidades reais por serviços
de saúde. (BRASIL, 2006b)
O Complexo Regulador é composto por uma ou mais estruturas denominadas Centrais de Regulação, estruturas que compreendem a “ação meio”
do processo regulatório. As Centrais são os locais que recebem as solicitações
de atendimento, avaliam, processam e agendam, garantindo o atendimento
integral de forma ágil e qualificada aos usuários do Sistema de Saúde, a partir
do conhecimento da capacidade de produção instalada nas unidades prestadoras de serviços. Elas atuam em áreas assistenciais inter-relacionadas como
a assistência pré-hospitalar e inter-hospitalar de urgência, as internações, além
das consultas e procedimentos ambulatoriais de média e alta complexidade.
(SOUSA, 2008)
Conforme Manual de Implantação dos Complexos Reguladores (BRASIL,
2006a), as Centrais de Regulação possuem três classificações denominadas
em Central de Regulação de Urgência, Central de Regulação de Internações e
Central de Regulação de Consultas e Exames. Esta última trata da regulação
do acesso dos pacientes às consultas especializadas, aos Serviços de Apoio
Diagnose e Terapia (SADT), bem como aos demais procedimentos ambulatoriais especializados ou não. (OLIVEIRA, 2010)
Ferreira (2007) destaca que, em nível operacional, essa classificação
do Complexo Regulador possibilita a organização do acesso dos serviços de
saúde em todos os municípios visando à Regulação do Acesso dentro das
diretrizes da Regulação da Atenção à Saúde buscando uma atenção básica
resolutiva (ordenadora e orientadora da Assistência à Saúde), que faça solicitações padronizadas pelos protocolos, encaminhamentos responsáveis e
adequados aos demais níveis de assistência, seguindo os fluxos de referências
e contrarreferências desenhadas, ainda que os estabelecimentos não estejam
localizados em seu território (definições do Plano Diretor de Regionalização
e da Programação Pactuada e Integrada).
Para a estruturação da Regulação são adotadas medidas e instrumentos que viabilizem a sua implantação/implementação exigida pelo Ministério
da Saúde como Plano Diretor de Regionalização (PDR) do Estado ou do
Município; Programação Pactuada e Integrada (PPI) do Estado; contratação/
contratualização dos serviços da região (PPI) Municipal; Plano de Regulação
– Municipal, Micro ou Macrorregional, com a identificação das necessidades
de saúde da região de abrangência (Parâmetro de Necessidade da Portaria n.
104
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Deyse Ilza de Aquino # Altamiro Damian Préve # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
1.101/02, análise da situação de Saúde de sua região); definição de quantas e
quais centrais de regulação comporão o Complexo Regulador; área de abrangência (território) e escopo (procedimentos) de cada Central de Regulação.
Outras ações destacadas são a identificação dos serviços a serem regulados (consultas/exames especializados, urgência e emergência, leitos, alta
complexidade); o conhecimento dos recursos assistenciais disponíveis em sua
área de abrangência (Identificar as Unidades Prestadoras de Serviços, oferta
de serviço – Ficha de Programação Orçamentária e TAB WIN); a conformação
de Redes Assistenciais de Forma Integrada e Hierarquizada, com definição
dos papéis de cada Unidade de Saúde e cada ente federado; a realização de
contratos com cláusulas claras quanto aos serviços a serem ofertados e garantia
de acesso à demanda regulada; a definição do fluxo de informações (unidades
solicitantes, unidades executantes); e a definição das rotinas operacionais
(horário de funcionamento, dias da semana, perfil dos profissionais, e outros).
(NÚCLEO DE ESTUDOS EM SAÚDE COLETIVA, 2012)
Para a configuração da Central de Regulação, alguns critérios operacionais na gestão pública devem ser seguidos como: atualizar o CNES, CNS,
PPI; incluir as unidades solicitantes, executantes e as administrativas, distribuir
os limites físicos – cotas e ou abrangência para cada unidade solicitante, vincular os profissionais às unidades de lotação; incluir os grupos de acesso ao
sistema informatizado; cadastrar as escalas médicas, definir os procedimentos
que serão liberados sob regulação; definir os percentuais de oferta de serviços
de cada unidade, para a Central de Regulação, para a própria unidade e Reservas Técnicas; capacitar (permanente) os recursos humanos e demais entes
do processo regulatório; exercitar a autoridade sanitária no ordenamento da
disponibilidade dos recursos assistenciais existentes; fornecer informações à
gestão sobre a utilização dos recursos físicos e financeiros, próprios e pactuados. (NASCIMENTO et al., 2009)
2.2Reorganização do SUS pela Regulação
O planejamento do sistema de saúde utiliza um arsenal de mecanismos
jurídicos e normativos que visam garantir e ampliar o acesso aos serviços e aos
procedimentos necessários para o atendimento dentro do SUS, de forma que
esses mecanismos compreendam atenção básica resolutiva, encaminhamentos,
responsáveis e adequados, e protocolos assistenciais e complexos reguladores,
entre outros aspectos. (GAWRYSZEWSKI; OLIVEIRA; GOMEZ, 2012)
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
105
Complexo Regulador de Florianópolis: gestão do acesso da atenção especializada do Sistema Municipal de
Saúde de Florianópolis
Uma política de regulação pautada pelo cuidado integral deve programar
ações-meio que facilitem a boa terminalidade das ações de atenção, como:
assegurar o acesso aos exames dos usuários da atenção básica; agilizar o processo de autorizações; e garantir o acesso dos usuários às consultas médicas,
terapias ou exames.
Gawryszewski, Oliveira e Gomez (2012) destacam que, dentre essas
ações, encontram-se as de regulação da atenção à saúde, que são responsáveis em reconhecer as demandas, classificá-las e dar a resposta exigida
por essas necessidades; e a regulação do acesso à assistência, que tem como
objetos a organização, o controle, o gerenciamento e a priorização do acesso
e dos fluxos assistenciais no âmbito do SUS, efetivada pela disponibilização
da alternativa mais adequada à necessidade do cidadão, por meio de atendimentos às urgências, às consultas, aos exames, aos leitos e a outros que se
fizerem necessários.
A regulação deve ser pensada no contexto dos princípios norteadores do
SUS, e não apenas como forma de racionalizar os parcos recursos existentes.
O Complexo Regulador tem por pressupostos básicos a universalização, a
descentralização, a regionalização e a hierarquização e deve ter por objetivo a
utilização racional de todos os meios disponíveis, a integração e maximização
da utilização de todos os recursos humanos, materiais e financeiros existentes,
sendo que sua função reguladora no SUS significa a organização dos fluxos
dos pacientes no sistema. (LOCKS, 2002)
Para que a regulação seja efetiva, ela precisa ser amparada pelo fortalecimento da atenção básica de saúde, considerada a “porta de entrada do
SUS”, por meio do acompanhamento do paciente em todas as etapas de
atendimento e possibilitando o cumprimento do princípio de integralidade.
A gestão deve contar com ferramentas e apoio técnico para promover um
único e coordenado sistema gerador de ações em saúde para a população.
(SILVA et al., 2012)
O Complexo Regulador (CR) estrutura a relação entre os vários serviços, tanto ambulatoriais como hospitalares, formando uma rede de atenção,
qualificando o fluxo dos pacientes no sistema e gerando uma porta de comunicação aberta ao público em geral, através da qual os pedidos são recebidos,
avaliados e hierarquizados, dando resposta de acordo com as necessidades
de cada caso e acompanhando a solução. (OLIVEIRA, 2010)
106
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Deyse Ilza de Aquino # Altamiro Damian Préve # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
A descentralização proposta pelo SUS prevê a facilidade do acesso à
saúde. Os fatores que agem na demanda por serviços de saúde são variados,
destacando-se os aspectos que envolvem a necessidade da população e o fluxo
de programação, dentro da lógica da regionalização solidária, que devem ser
visualizados e fortalecidos como planejamento de gestão para estruturação
de uma Central de Regulação eficaz. (SILVA et al., 2012)
No Brasil, examinam-se diferentes aspectos da realidade do atendimento
à saúde após a implantação do SUS, de modo a ser necessário avançar na
implementação de alterações estruturais nas formas de organização, gestão,
regulação, controle e avaliação da oferta de serviços.
Segundo Silva (2003), algumas medidas vêm sendo tomadas, como a
estruturação, e vários desafios estão sendo enfrentados, dentre eles se destacam
a ausência de um sistema de planejamento e controle da oferta de serviços
eficaz e que proporcione informações estratégicas de apoio à decisão alocativa
nos níveis central, regional e inter-regional.
3 Metodologia
Trata-se de uma pesquisa quantitativa, entendida como uma técnica de
quantificação dos processos de coleta e utilização das técnicas estatísticas para
tratamento dos dados e avaliação dos resultados pelo método exploratório-descritivo utilizado para ampliar o conhecimento, tendo como fontes de
dados o Sistema Nacional de Regulação do MS – SISREG III, um sistema de
informação do Ministério da Saúde, acessível pelo sítio <www.sisregiii.saude.
gov.br>, e as informações dos relatórios de Monitoramento e Avaliação da
Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis/SC.
As informações foram analisadas tendo como suportes a oferta de
serviços, os prestadores de serviços próprios, filantrópicos e contratados, o
custeio dos serviços e a fila de espera. Considerou-se no geral a produção
dos serviços de média complexidade.
3.1 Local
Florianópolis, capital do Estado de Santa Catarina, possui 427.298
habitantes, conforme projeção do IBGE. Essa população, predominante
urbana, é a segunda maior do Estado, ficando atrás de Joinville, que possui
515.288 habitantes (IBGE, 2011). A taxa média de crescimento anual é de
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
107
Complexo Regulador de Florianópolis: gestão do acesso da atenção especializada do Sistema Municipal de
Saúde de Florianópolis
3%. Possuindo localidades e bairros em conurbação, Florianópolis ocupa uma
área de 436,05 km2.
O município possui em seu território 50 Unidades Básicas de Saúde,
quatro Policlínicas Municipais, duas Unidades de Pronto Atendimento e três
Centros de Apoio Psicossocial. O Hospital Universitário e o Imperial Hospital
de Caridade fazem parte da gestão municipal no que se refere às agendas de
consultas e exames de especialidades no Complexo Regulador de Florianópolis, bem como a Maternidade Carlos Correa para atendimento de cirurgias
eletivas de média complexidade. Florianópolis representa o município sede
na atenção especializada para outros 21 municípios da Grande Florianópolis,
atendendo às demandas de mais 128 unidades da atenção básica de saúde
com uma população correspondente a 540.414 habitantes. O número total
de unidades da atenção primária corresponde então, para todo o Complexo
Regulador, a 178; e a população somada corresponde a 1.055.702 habitantes.
(FLORIANÓPOLIS, 2012)
A Secretaria Municipal de Saúde, em parceria com o Ministério da
Saúde, adquiriu equipamentos de informática (computadores, impressoras,
mesas e cadeiras), através do Convênio n. 2.068/07, que trata da implantação
do SISREG em todos os 22 municípios da Região de Saúde da Grande Florianópolis, ficando a Capital como responsável pela aquisição e distribuição
dos equipamentos para os municípios, além de responsável pelo treinamento
do Sistema para todos os municípios da macrorregião.
4 Apresentação dos Resultados e Discussão
4.1Implantação do Complexo Regulador de Florianópolis e a
Gestão do Acesso Especializado à Saúde
Com o advento do Pacto pela Saúde, em seus três eixos – Pacto pela
Vida, Pacto em Defesa do SUS e Pacto de Gestão, em 2006 – o Ministério da
Saúde possibilita aos Estados e aos Municípios uma nova forma de Gestão,
definida a partir dos Termos de Compromissos de Gestão, que apresentam
as responsabilidades que serão assumidas.
O Pacto pela Saúde trouxe uma nova perspectiva para o sistema de
saúde da Grande Florianópolis, que incluiu as Diretrizes de Regulação e as
novas regras para a Regionalização e Programação Pactuada e Integrada pre-
108
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Deyse Ilza de Aquino # Altamiro Damian Préve # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
estabelecidas. Nesse contexto, no ano de 2006, o município de Florianópolis
marca sua história e inicia seu processo de transformação, saindo da inércia
e avançando rumo à consolidação do seu Sistema de Saúde. (FLORIANÓPOLIS, 2012)
É importante destacar que, concomitante ao processo que culminou
na adesão de Florianópolis ao Pacto de Gestão, a Secretaria Municipal de
Saúde implantou a área de Controle, Avaliação e Auditoria e, a partir de sua
implantação, efetuou várias ações relacionadas à organização do acesso, como:
organização da Programação Pactuada e Integrada (PPI), contratualização
dos prestadores de serviços de saúde complementar ao SUS Municipal, bem
como estabelecimento de parâmetros de distribuição de cotas de consultas
e exames especializados para os Centros de Saúde de Florianópolis, ações
estas implementadas para que o acesso especializado à saúde estivesse mais
adequado às necessidades reais da população.
Antes do Município de Florianópolis assumir a gestão, através do Pacto
pela Saúde, a única oferta especializada existente era aquela disponibilizada
pelo Estado de Santa Catarina, através da Central de Marcação de Consultas
e Exames (CMC/CIASC).
Embora todos os Centros de Saúde da Capital já utilizassem o programa
do Estado, CIASC, para realizar os agendamentos de consultas e exames, não
havia nenhuma forma regulada de acesso para permitir formas de marcação
diferenciada para os casos mais críticos. Além disso, o controle de marcação
através de listas de espera existia apenas para as consultas especializadas.
Para os exames especializados, não havia nenhuma forma de controle, o que
resultava no total desconhecimento, por parte da Gestão, acerca da necessidade daqueles serviços.
Foi em 25 de outubro de 2006 que o Sistema de Regulação (SISREG)
entrou em produção, integrando todas as Unidades Locais de Saúde. Sua
finalidade era se tornar referência regional na implantação de um Complexo
Regulador com capacidade para atender aos 21 municípios da macrorregião.
Partindo do pressuposto de que a atenção primária é a ordenadora
do cuidado, que 100% dos serviços sob a gestão municipal deveriam estar
disponíveis para os Centros de Saúde e que o acesso às policlínicas deveria
ser unicamente a partir das Unidades Locais de Saúde, foram implantadas
as primeiras ações de regulação.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
109
Complexo Regulador de Florianópolis: gestão do acesso da atenção especializada do Sistema Municipal de
Saúde de Florianópolis
Através da implantação do Protocolo de Acesso foram estabelecidos
três conceitos que passaram a nortear a regulação: rotina – compreendendo
aqueles encaminhamentos que não possuem nenhuma referência quanto à
gravidade ou à prioridade de marcação. Deverão seguir rigorosamente a ordem
cronológica de entrada na lista de espera do Centro de Saúde; prioridade:
compreendendo aqueles encaminhamentos cuja demora na marcação altere
sobremaneira a conduta a ser seguida, ou cuja demora implique em quebra do
acesso a outros procedimentos. A prioridade no atendimento será registrada
pelo médico assistente do paciente, ou indicada pelo Coordenador da Unidade,
sendo obrigatório o preenchimento de sua justificativa. Os encaminhamentos
prioritários dos agendados se darão através da regulação; e urgência: compreendendo aqueles pacientes que não podem, em hipótese alguma, aguardar
a espera através de lista de espera, sob pena de graves comprometimentos
clínicos e/ou físicos. Os encaminhamentos são registrados exclusivamente pelo
médico assistente do paciente e devem conter, detalhadamente, a justificativa
clínica e a hipótese diagnóstica.
O Complexo Regulador inova com a figura do médico regulador, mais
tarde, vindo a ser composto por outros profissionais de nível superior, criando
uma equipe de reguladores constituída por médicos, fisioterapeutas, dentistas e
enfermeiros, na Central de Regulação de Consultas e Exames Especializados.
Através dessa equipe se dá o atendimento a todos os casos que necessitem
da aplicação do Princípio da Equidade, contido na Lei Orgânica da Saúde.
A equipe também é responsável por participar da elaboração dos Protocolos
Clínicos e de acesso a serem utilizados pela Rede Municipal de Saúde. Os
processos são analisados pelos reguladores e, após a aplicação de critérios
clínicos, podem: ser autorizados para a realização do procedimento; ser devolvidos devido a inconsistências, dados incompletos e/ou falta de exames
complementares; ou ter negada a realização do procedimento.
Com isso, o acesso aos casos prioritários e urgentes passou a ser garantido,
sem interferir no agendamento de rotina, pois são destinadas vagas específicas para a regulação, que são distintas daquelas destinadas ao agendamento
da rotina, através da fila de espera, tornando o acesso mais equânime. Para
agilizar a fila de espera ocorre a distribuição das cotas físicas para os Centros
de Saúde, sendo sua distribuição realizada com base na quantidade total de
Consultas e Exames Especializados programados no SISREG (oferta Municipal),
dividido através da aplicação de Parâmetros Assistenciais e de necessidade.
110
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Deyse Ilza de Aquino # Altamiro Damian Préve # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
Para a operacionalização do Complexo Regulador de Florianópolis
definiu-se previamente a estratégia de regulação, que envolveu a abrangência da central que compreende a região geográfica de cobertura da central
de regulação, respeitando a composição de 22 municípios da 18ª Regional
de Saúde da Grande Florianópolis, expressada no Plano Diretor de Regionalização – PDR, e sua identidade cultural, econômica e social, de redes de
comunicação e infraestrutura de transportes compartilhados.
Na esfera administrativa, a abrangência regional e a respectiva gestão
foram pactuadas, em processo democrático e solidário, entre as esferas de
gestão do SUS, sendo operadas, no que se refere à referência intermunicipal,
do seguinte modo, conforme Portaria GM n. 399, de 2 de fevereiro de 2006:
em Florianópolis, esse processo se deu pelo gestor municipal com cogestão
do estado e representação dos municípios da região pactuados pela CIB e
homologados na CIT.
Em constante aprimoramento, no ano de 2009 houve a implantação da
supervisão local a partir de dados levantados trimestralmente nos relatórios
de monitoramento. Essa supervisão passou por treinamentos voltados para a
utilização do SISREG como ferramenta de gestão.
O complexo regulador de Florianópolis desenvolve quatro diferentes
modalidades de treinamento, cada um voltado para a necessidade do operador a ser treinado.
1) Treinamento introdutório: voltado aos profissionais que serão
operadores do SISREG nos serviços de saúde da atenção básica,
clínicas especializadas e hospitais que utilizarão os diversos perfis
operacionais do SISREG (perfil executante, perfil solicitante e perfil administrador), de acordo com sua função. A disponibilização
da senha de acesso ao sistema é condicionada à realização desse
treinamento.
a)Perfil executante: voltado para operadores responsáveis pela
confirmação da presença do usuário do SUS que realizaram consultas, exames e procedimentos especializados. Esses operadores
são de instituições próprias ou conveniadas além de hospitais
públicos e filantrópicos.
b)Perfil solicitante: voltado para os operadores das unidades de
saúde. É a porta de entrada do usuário no SISREG e também o
responsável por avisar aos usuários já agendados.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
111
Complexo Regulador de Florianópolis: gestão do acesso da atenção especializada do Sistema Municipal de
Saúde de Florianópolis
c)Perfil administrador: voltado para os operadores do nível
central da Secretaria de Saúde que realizam a administração
do Sistema e participam da articulação com o Controle e Avaliação e Contratualização, além de responderem por todas as
configurações do Sistema.
d)Perfil regulador: voltado aos profissionais de nível superior
que realizam a administração e o processo de regulação das
prioridades e das urgências.
2) Educação continuada: é realizada com frequência trimestral para
todos os operadores solicitantes que integram a rede municipal de
saúde e municípios conveniados. O treinamento para novos operadores ocorre diariamente conforme demanda e agenda prévia
quinzenal. Visa à atualização dos conhecimentos relacionados à
operação do sistema, à identificação e à correção das fragilidades
cotidianas.
3) Treinamento de gestão: voltado para secretários municipais, diretores, gerentes, supervisores e coordenadores de unidades locais,
visa à disseminação do SISREG como ferramenta de gestão que
possibilita o acompanhamento da realidade local.
4) Treinamento de regulação: direcionado aos profissionais médicos
e odontólogos integrantes do Complexo Regulador, responsáveis
pela regulação do acesso.
Essa ferramenta tecnológica dá início a um processo amplo de reestruturação e de organização do acesso aos serviços de saúde, envolvendo
definição de normas, procedimentos e processos de trabalho relacionados à
gestão e à assistência, havendo uma transferência do locus de controle sobre
os recursos assistenciais.
Na apresentação dos resultados, o Complexo Regulador de Florianópolis
demonstra números significativos na produção de serviços objetivando cumprir
o Pacto pela Saúde – 2006 atendendo aos municípios da Grande Florianópolis
através da negociação constante com a Comissão Intergestores Regional.
O Gráfico 1, revela a capacidade de ampliação da oferta de serviços
demonstrando a evolução de 746,42% da sua oferta inicial até o ano de 2011,
totalizando 2.272.958 exames e consultas especializadas.
112
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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2.500.000
2.265.954
2.272.958
2010
2011
2.000.000
1.169.908
1.500.000
741.895
1.000.000
500.000
0
268.539
2007
2008
2009
Gráfico 1: Produção anual de consultas e exames especializados (2007-2011)
Fonte: Florianópolis (2012)
Para poder ampliar sua oferta de exames e consultas especializadas
houve visível crescimento das unidades executantes dos serviços e, articulados
com a Diretoria de Planejamento, de acordo com o cronograma do Pacto,
foram transferidos para a gestão municipal todos os serviços especializados
em saúde, de média complexidade ambulatorial, que estavam sob Gestão
Estadual, os quais foram somados à estrutura municipal existente. Em 2006
eram quatro Unidades Especializadas Próprias, subindo para 12 atualmente.
Os Serviços Especializados Transferidos para a Gestão Municipal evoluíram
de um serviço em 2007 para 21 até 2012. (FLORIANÓPOLIS, 2012)
Mesmo com a ampliação de unidades próprias e serviços transferidos
pela gestão estadual, novos contratos e convênios com empresas privadas
foram efetivados, pois a capacidade instalada dos serviços encontrava-se
aquém das demandas da população, tornando imprescindível a utilização da
rede privada dos serviços de Saúde de forma complementar.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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Complexo Regulador de Florianópolis: gestão do acesso da atenção especializada do Sistema Municipal de
Saúde de Florianópolis
70
63
57
60
50
40
20
10
0
28
20
30
7
2007
2008
2009
2010
2011
Gráfico 2: Evolução do número de Prestadores de Serviços (2007-2011)
Fonte: Florianópolis (2012)
O Gráfico 2 demonstra que houve incremento de serviços e aumento de
800% no número de prestadores de unidades executantes próprias, conveniadas
e contratadas entre 2007 e 2011. Para tanto, a Secretaria Municipal de Saúde
passou a receber os recursos financeiros do MAC – Média e Alta Complexidade,
oriundos do Ministério da Saúde e destinados para o financiamento de toda
a estrutura necessária para a oferta e execução dos serviços especializados de
saúde, públicos e privados contratados. No Termo de Compromisso de Gestão
do Pacto, aprovado pela CIB – Comissão Intergestora Bipartite, em dezembro
de 2009, através da Deliberação n. 204/09, está registrada a relação de todos
os municípios pactuados com Florianópolis, resultando na transferência dos
recursos financeiros para a gestão municipal.
R$ 37.198.414,49
R$ 40.000.000,00
R$ 35.000.000,00
R$ 27.513.888,75
R$ 30.000.000,00
R$ 25.000.000,00
R$ 15.735.794,36
R$ 20.000.000,00
R$ 7.454.476,96
R$ 15.000.000,00
R$ 10.000.000,00
R$ 5.000.000,00
R$ 0,00
R$ 304.953,30
2007
2008
2009
2010
2011
Gráfico 3: Evolução dos repasses financeiros da Média e Alta Complexidade (MAC)
somados ao Fundo de Ações Estratégicas (FAEC) (2007-2011)
Fonte: Florianópolis (2012)
114
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Deyse Ilza de Aquino # Altamiro Damian Préve # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
Analisando o Gráfico 3, observa-se o acompanhamento dos Limites
Financeiros da Média e Alta Complexidade (MAC) somados ao Fundo de
Ações Estratégicas (FAEC), verifica-se que os valores recebidos das referências municipais da Programação Pactuada Integrada no período de 2007 a
2011 tiveram evolução de 12.098,07%, subindo de R$ 304.953,30 para R$
37.198.414,19.
Os recursos financeiros recebidos foram fatores determinantes na ampliação da oferta de consultas e exames especializados na rede de saúde de
Florianópolis, o que significou considerável aumento de trabalho, desde a
contratualização de prestadores de serviços até a ampliação de ambulatórios,
contratação de especialistas na área da saúde e mais reforço de profissionais
nas áreas de planejamento, regulação, controle, avaliação e auditoria.
5 Considerações Finais
É fato que até o ano de 2006, Florianópolis era a única capital em Gestão
Básica do Sistema Municipal habilitada pela NOAS 01/02, motivo pelo qual
aderiu ao Pacto pela Saúde em 2006, ano em que iniciou a gestão de todos os
serviços especializados de saúde, sob Gestão Municipal, todos configurados e
disponibilizados integralmente pelo SISREG dentro das atribuições da central
de regulação de consultas e exames especializados.
Florianópolis consolida o seu Complexo Regulador seguindo recomendações do Ministério da Saúde que prezam a regionalização e a hierarquização dos serviços. A cidade mantém a participação das instâncias de gestão
na construção de fluxos ordenados na busca de demanda programada e
organizada concomitante com a prestação de contas dos procedimentos e
serviços entre os gestores, articulando e integrando todos os níveis de atenção
na construção da efetiva regulação do acesso. Utiliza instrumentos de planejamento das ações de saúde, adequando as necessidades de saúde de cada
município, administrando de forma racional o fluxo de assistência à saúde da
população valendo-se do Sistema Nacional de Regulação – SISREG-III como
Instrumento da Gestão na Média Complexidade Ambulatorial.
O SISREG III possibilitou que a gestão municipal identificasse a real
necessidade de acesso, tendo como ponto de partida constatação de gargalos
existentes nas listas de espera de consultas e exames especializados, de forma
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
115
Complexo Regulador de Florianópolis: gestão do acesso da atenção especializada do Sistema Municipal de
Saúde de Florianópolis
a adequar as cotas distribuídas aos centros de saúde, bem como atender às
cotas estabelecidas para os municípios da Grande Florianópolis.
O aumento do número de cotas de consultas e exames especializados
nos últimos cinco anos após a assinatura do Pacto representou maior acesso
para a continuidade do cuidado à saúde do paciente encaminhado pelo serviço de atenção básica de todos os municípios envolvidos.
Todos os serviços transferidos para a gestão municipal foram capacitados
pelo SISREG, integrando-se ao Complexo Regulador, responsável pela distribuição da oferta de serviços especializados em saúde para a rede municipal.
O SISREG faz a integração com sistemas de informações oficiais:
SIA – Sistema de Informação Ambulatorial; SIH – Sistema de Informação
Hospitalar; SCNES – Sistema Cadastro Nacional de Estabelecimentos de
Saúde; SCNS – Sistema de Cadastro Nacional de Saúde; SISPPI – Sistema
Programação Pactuada e Integrada; e INFOSAÚDE – Sistema do Prontuário
Eletrônico, entre outros.
Na rede de atenção ocorreu acesso a 100% das Unidades de Saúde de
Florianópolis e Macrorregião. Além de estar constantemente articulado com
a Atenção Primária e com todos os serviços de Média Complexidade, entre
eles: Policlínicas, Unidade de Pronto Atendimento, Centro de Especialidades
Odontológicas, Centros de Atenção Psicossocial, incluindo a rede hospitalar,
a rede de atenção básica mantém parcerias através de Planos Operativos com
o Hospital Universitário, o Hospital de Caridade e através de Convênio com
o Hospital Maternidade Carlos Correa para a realização de cirurgias eletivas.
Também colabora com a Central Estadual de Transplantes oferecendo
acolhimento aos que necessitam de transplantes hepáticos para Blumenau,
transplantes renais, cardíacos e cirurgia de fissura de lábio e palato para
Joinville, com transporte fora do domicílio e apoiando inclusive com recursos
financeiros.
O Complexo Regulador de Florianópolis utiliza o SISREG com inovações no processo regulatório e nas regras de negócios do sistema, servindo
de suporte para mudanças no SISREG Nacional, apoiando a implantação
do SISREG Central Estadual e emancipando os municípios da grande Florianópolis a iniciarem seu processo de regulação própria. Essa prática está
disseminada de forma ampla até o momento por toda a rede de atenção em
todas as Unidades.
116
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Deyse Ilza de Aquino # Altamiro Damian Préve # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
Paralela a essa operacionalidade ocorre a participação social através
da apresentação trimestral do monitoramento das filas de espera; e qualquer
pessoa pode ser informada do seu lugar na fila e quanto tempo levará para
ser atendida, devidamente acompanhado pelo Ministério Público. A equipe
da regulação atende aos pedidos feitos pelos gestores locais e distritais para
orientação dos Conselhos Locais de Saúde. O direito à informação com transparência é uma prática totalmente alinhada à visão da Secretaria de Saúde,
pois organiza o acesso por meio da Atenção Primária trazendo os serviços de
média e alta complexidade para a gestão municipal através da organização
pelo Complexo Regulador. Existe coerência com as necessidades e identidade
organizacional, pois vêm ocorrendo desburocratização e descentralização da
marcação dos exames, através da informatização dos gargalos das demandas
existentes no SUS, incorporação do manejo da demanda e oferta pelo próprio
município, com grande expansão da oferta de serviços.
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complexos reguladores. Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
119
Análise dos Fatores que Influenciam a
Motivação para o Trabalho de Servidores
Públicos de um Centro de Atenção
Psicossocial de Álcool e Drogas (CAPSad)
Aluno: André Rosito Marquardt1
Orientadora: Alessandra de Linhares Jacobsen2
Tutora: Isadora de Souza Bernardini3
Resumo
Abstract
O presente estudo buscou identificar e analisar
fatores que influenciam a motivação de servidores públicos que atuam em um Centro de
Atenção Psicossocial para dependência química
(CAPSad), para, ampliando esse conhecimento,
melhorar a condição de motivação do ambiente
e contribuir para o entendimento do tema. Trata-se de um estudo de caso, e foi aplicado um
questionário aberto elaborado pelo autor a uma
população de 16 servidores de um CAPSad
do município de Florianópolis, SC, obtendo-se
nove respondentes. Os dados coletados foram
submetidos à Análise de Conteúdo de onde
emergiram cinco categorias: forma de lotação
no CAPSad; percepção sobre o trabalho com
dependência química; sentimentos em relação
ao trabalho com dependência química; aspectos motivadores no trabalho; e aspectos desmotivadores no trabalho.
The aim of the present study was identifying
and analyzing factors which influence the motivation of public workers of a Psychosocial attention center for drug addiction (CAPSad) to,
amplifying that knowledge, improve the motivational environment and contribute to this
subject understanding. It’s a case study, being
applied a questionnaire with open questions,
elaborated by the author to a population of
sixteen workers of a Florianópolis – SC Brazil
CAPSad, resulting in nine respondents. The
collected data undergone Context Analysis
from which emerged five categories: work assignment at CAPSad, perception of the work
with drug addiction, sentiments related to the
work with drug addiction, motivational aspects
of the work and demotivational aspects of the
work.
Key words: Motivation. Mental Health ServiPalavras-chave: Motivação. Serviços de Saú- ces. Public Workers. Drug Addiction.
de mental. Servidor Público. Dependência
Química.
1
Mestre em Ciências Médicas com ênfase em Psicofarmacologia na UFCSPA, Porto Alegre.
E-mail: [email protected].
2
Doutorado em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina
(2004). E-mail: [email protected].
3
Mestre em Administração pela Universidade Federal de Santa Catarina (2012). Possui
graduação em Ciências da Administração pela Universidade Federal de Santa Catarina
(2008). E-mail: [email protected].
André Rosito Marquardt # Alessandra de Linhares Jacobsen # Isadora de Souza Bernardini
1Introdução
A dependência química é um problema de saúde pública grave e em
expansão no mundo todo a partir das últimas décadas do século XX (PRATTA;
SANTOS, 2007). No Brasil, a preocupação com esse problema tem sido tema
frequente na mídia e tem mobilizado diversos setores da sociedade na tentativa
de enfrentá-lo exigindo novas intervenções em saúde. Segundo o Ministério da
Saúde (BRASIL, 2004), quanto a transtornos decorrentes do uso prejudicial
de álcool e outras drogas, a necessidade de atendimento regular atinge cerca
de 6% a 8% da população, embora existam estimativas ainda mais elevadas.
Os investimentos na área de tratamento em dependência química têm
se ampliado em diversas frentes como prevenção, repressão e tratamento. Em
relação ao tratamento, recursos federais vêm sendo destinados à ampliação e
à criação de serviços dedicados ao tratamento de pessoas com dependência
química. Esses são os Centros de Atenção Psicossocial para o tratamento de
pessoas com problemas com álcool e outras drogas (CAPSad).
Os CAPS são serviços estratégicos do sistema único de saúde (SUS)
criados a partir da década de 1980 como espaços que contrapõem um modelo
centrado na exclusão pela internação hospitalar, voltados para pacientes com
transtornos mentais graves, sendo a modalidade “ad” focada nos dependentes
químicos. São serviços abertos e comunitários, tendo como objetivo a reabilitação psicossocial de seus pacientes. (ABUHAB; SANTOS; MESSENBERG,
2005; FILTZOLA; MILIONI; PAVARINI; 2008)
Nesse processo de criação e de ampliação desses serviços, faz-se necessária a atenção para a qualidade deles para que o investimento realizado
gere os resultados esperados. Em um trabalho de qualificação da equipe, um
aspecto fundamental é a motivação dessa equipe, pois, sem isso, os resultados
tendem a ser piores. Segundo Dias (2009), a motivação pode ser considerada
um tema importante para as organizações, uma vez que manter as pessoas
ativas e dedicadas, assegurando-lhes uma estrutura que possibilite a satisfação
de anseios internos de crescimento psicológico e desenvolvimento profissional,
é um desafio que vem sendo abordado por diversos vieses.
A motivação para o trabalho é um tema bastante abordado por diversas
áreas do conhecimento como a psicologia, a sociologia e a administração. Ela
pode ser entendida como os motivos para realizar uma ação, ou seja, fatores
que determinam um impulso e esforço para fazer mais e melhor, alcançando
metas (DIFINI; 2002). Brunelli (2008) ressalta que é importante sempre ter
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
121
Análise dos Fatores que Influenciam a Motivação para o Trabalho de Servidores Públicos de um Centro de
Atenção Psicossocial de Álcool e Drogas (CAPSad)
em mente que a tarefa da gestão não é motivar as pessoas, uma vez que
esse é um processo íntimo e pessoal, mas, sim, criar um ambiente motivador,
estimulando que as pessoas busquem satisfazer suas necessidades próprias e
contribuam para o serviço.
Existem diversos artigos (AFFONSO; ROCHA, 2010; BRUNELLI, 2008;
COELHO; SOARES, 2006) discutindo a motivação do trabalhador público
e demonstrando a influência de diversos fatores como estabilidade, carreira,
remuneração, características específicas do trabalho e outros. Os CAPS podem apresentar ainda outros fatores que podem influenciar na satisfação e
motivação da equipe, como o fato de serem serviços inovadores com práticas
inovadoras e que muitas vezes são contraditórias com a formação clássica de
diversos profissionais. (FILIZOLA; MILIONI; PAVARINI, 2008)
Além desses aspectos, nos CAPSad o público-alvo é formado por
dependentes químicos, população com um problema de saúde que tende a
ser refratária a intervenções, com diversas recaídas e inúmeras frustrações,
representando um grande desafio para as equipes que com eles precisam
trabalhar. (DIDONET; FONTANA, 2011)
Dessa forma, o presente artigo propõe-se a analisar fatores que influenciam a motivação de servidores públicos que atuam em CAPSad, realizando
um estudo de caso de um CAPSad do município de Florianópolis, para,
ampliando esse conhecimento, buscar melhorar a condição de motivação do
ambiente e contribuir para o entendimento do tema.
2 Exposição do Tema
2.1 Os CAPSad
O Movimento da Reforma Psiquiátrica teve início no final dos anos
1970, dentro do contexto histórico e social da restauração democrática. Esse
movimento, além da luta por melhores condições de trabalho dentro dos hospitais, teve como bandeira o reconhecimento da cidadania do louco. A partir
dos anos de 1980, a crítica deixa de visar o aperfeiçoamento e humanização
do hospital psiquiátrico e passa a incidir sobre os pressupostos da psiquiatria,
mais especificamente sobre a compreensão da doença mental e sobre a manutenção do hospital psiquiátrico.
122
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
André Rosito Marquardt # Alessandra de Linhares Jacobsen # Isadora de Souza Bernardini
As diretrizes da Reforma Psiquiátrica Brasileira – desinstitucionalização,
desospitalização e garantia dos direitos dos doentes mentais – foram enunciadas na I Conferência Nacional de Saúde Mental, realizada em 1987, na
Conferência de Caracas (OMS/OPS), em 1990, e referendadas na II Conferência Nacional de Saúde Mental, em 1992 (AMARAL, 1997). A partir desse
momento, aparecem iniciativas de reformulação legislativa, a ampliação dos
atores sociais e experiências institucionais bem-sucedidas. Dessa forma, em
1992, o Ministério da Saúde editou portarias normatizando alguns aspectos do
funcionamento dos hospitais psiquiátricos, bem como incentivando a criação
de novos dispositivos.
Nesse sentido, surgem os Centros de Atenção Psicossocial, que são
considerados serviços substitutivos aos modelos de atenção vigentes aos portadores de transtornos mentais, sendo unidades de saúde para atendimento de
uma população específica, oferecendo serviço intermediário entre hospital e
atenção básica. Contam com equipe multiprofissional, oferecendo atendimento
individual e atendimento em grupos, visitas domiciliares e atendimentos às
famílias. Possuem uma dimensão política ao considerar o usuário do serviço
um cidadão pleno de direitos; e uma dimensão social no sentido de inclusão
das minorias, reconquista da cidadania e aumento de poder de contratualidade
social. (RABELO et al., 2006)
A concepção de território adotada na proposta dos CAPS busca transformar o serviço em um novo paradigma de tratamento, inserindo o usuário
no contexto de suas relações sociais, promovendo sua inclusão social. Esse
mesmo modelo de atendimento também foi incorporado para acompanhamento de pessoas dependentes de Substâncias Psicoativas (SPA). Também
se propõe a seguir o objetivo de promover a reabilitação psicossocial de seus
usuários, sem o prejuízo de serem afastados de suas famílias e comunidades,
através de acompanhamento sistemático e contínuo, de forma intensiva, semi-intensiva e não intensiva. Essa categorização configura o norte de construção
dos Projetos Terapêuticos Individuais, influenciando na frequência dos usuários
ao serviço de saúde CAPS.
Os CAPSad seguem as diretrizes e orientações gerais da Política Nacional
sobre Drogas publicada oficialmente, em 2005, pelo Ministério da Saúde, que
prevê orientações gerais e diretrizes para prevenção, tratamento, recuperação
e reinserção social; redução de danos sociais e à saúde; redução da oferta;
e estudos, pesquisas e avaliações. Neste último aspecto, a política discorre
sobre a garantia de
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
123
Análise dos Fatores que Influenciam a Motivação para o Trabalho de Servidores Públicos de um Centro de
Atenção Psicossocial de Álcool e Drogas (CAPSad)
[...] meios necessários à realização de estudos, análises e avaliações sobre as práticas das intervenções públicas e privadas, nas
áreas de prevenção, tratamento, reabilitação, redução de danos,
reinserção social e ocupacional, redução da oferta, considerando
que os resultados orientarão a continuidade ou a reformulação
dessas práticas. (BRASIL, 2005)
Essa política, entre outros aspectos, contempla a Política de Redução de
Danos que prevê a possibilidade de diminuir os danos causados pelo uso de
qualquer substância psicoativa através de estratégias de proteção e cuidado.
Os CAPS são considerados serviços de referência para casos graves,
que necessitem de cuidado mais intensivo e/ou de reinserção psicossocial,
ou ainda que ultrapassem as possibilidades de intervenção da Estratégia de
Saúde da Família (ESF) e Núcleos de Apoio da Saúde da Família (NASF).
Os CAPS também darão retaguarda às ESF e NASF, nas suas especificidades,
assessorando em demandas específicas.
Dessa forma, a abordagem do usuário de SPA a partir dessas políticas
públicas deve ser realizada em todos os níveis de atenção, sendo que os
CAPSad devem realizar a articulação com toda a rede de saúde e assistência
social para aumentar a resolutividade dos encaminhamentos combinados com
o usuário que frequenta o serviço.
Em Florianópolis/Santa Catarina, o CAPSad Continente é criado pela
resolução de 30 de março de 2005 através da deliberação do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente. O público-alvo inicial era
fundamentalmente formado por crianças e adolescentes usuários de drogas,
mas já em 2006 esse público é ampliado com a entrada de adultos. Em 2010,
foi inaugurado no município outro CAPSad, situado no bairro Pantanal.
Ambos funcionam das 8h às 18h, de segunda a sexta-feira e fornecem tratamento ambulatorial com equipe multiprofissional. O processo de trabalho
se dá através de oficinas, grupos terapêuticos e atendimentos individuais. O
trabalho busca a interdisciplinaridade para superar a fragmentação na atenção
que costumava acontecer devido à rigidez na especialização dos serviços. A
interdisciplinaridade busca o olhar para o ser humano como um todo, no seu
próprio contexto e nas relações dinâmicas do contexto onde está inserido, entendendo que essa é uma estratégia para uma maior qualificação do cuidado.
(ABUHAB; SANTOS; MESSENBERG, 2005)
124
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
André Rosito Marquardt # Alessandra de Linhares Jacobsen # Isadora de Souza Bernardini
No município de Florianópolis, a atenção em saúde mental para os
usuários de álcool e de outras drogas está articulada de forma intersetorial,
principalmente com o Programa Abordagem de Rua, Centro POP de atenção à população de rua, que é um Centro de referência especializado em
assistência social (CREAS), com a casa de apoio social ao morador de rua e
com os Centros de Referência em Assistência Social (CRAS) da Secretaria de
Assistência Social, além de toda a rede de saúde.
2.2Trabalho com Dependentes Químicos
Existem inúmeros estereótipos em relação às pessoas com problemas
por uso de drogas, muitos de caráter moral: de que seriam pessoas mal-intencionadas, sem vontade de mudar seu comportamento, que estariam
sempre envolvidas com comportamentos ilícitos. Na verdade, a maior parte
da população brasileira faz uso de alguma droga em algum momento ao longo
de sua vida, sendo que as pessoas que possuem problema com isso são uma
minoria dentro desse universo. (CARLINI et al., 2006)
O Transtorno de dependência de substâncias é uma síndrome comportamental que gera compulsão pelo uso, persistência no uso apesar de
prejuízos, apesar da intenção de reduzir ou suspender esse uso, entre outros
fatores. Diferentes padrões de uso e de intensidade dessa síndrome comportamental devem receber diferentes formas de intervenção. (COOK; EDWARDS;
MARSHAL, 2005)
Segundo Miller e Rolnick (2001), a atitude do profissional que aborda
uma pessoa com problemas com drogas é determinante para a sua motivação
ou não para a mudança de comportamento; e os conceitos prévios desses
profissionais acerca do problema interferem grandemente nessa atitude.
Os conceitos acerca da dependência química e das formas de abordagem vêm se modificando ao longo das últimas décadas e nem sempre
os profissionais que atuam com essa população no serviço público estão
atualizados nesses conceitos ou os têm realmente incorporados, deixando de
lado conceitos morais. Forman, Bovasso e Woody (2001) realizaram estudo
nos Estados Unidos demonstrando que grande parte da equipe de um serviço especializado em tratamento de dependentes químicos acreditava que
deveriam ser usadas técnicas terapêuticas que as evidências mostram serem
pouco efetivas ou contraproducentes, reforçando a visão da dificuldade de
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
125
Análise dos Fatores que Influenciam a Motivação para o Trabalho de Servidores Públicos de um Centro de
Atenção Psicossocial de Álcool e Drogas (CAPSad)
modificar crenças relacionadas às melhores estratégias terapêuticas voltadas
para essa população .
Além desses aspectos, relacionados a conceitos prévios que podem
gerar tensão e insatisfação, características próprias de pessoas com esse tipo
de problema tendem a gerar não satisfação para os profissionais, como a
tendência a recaídas no padrão de uso patológico, a baixa adesão ao tratamento, o interesse em ganhos secundários ao tratamento, mentiras e outros.
Segundo Didonet e Fontana (2011), o cuidado aos usuários de álcool e
outras drogas configura-se, muitas vezes, como uma rotina fatigante decorrente
do significativo grau de tensão dos trabalhadores na atenção a esses sujeitos.
Uma diversidade de fatores, como, por exemplo, a agressividade dos
usuários, pode contribuir para o aumento de estresse em trabalhadores de
saúde mental, exigindo do profissional tolerância e paciência. (DIDONET;
FONTANA, 2011)
2.3Motivação para o Trabalho
Diversas teorias buscam explicar os fatores envolvidos na motivação
para o trabalho. Segundo Dias (2009), motivação é a força que impulsiona
as pessoas a agirem. Necessidades não satisfeitas são os principais fatores
que condicionam a motivação. A satisfação é quando a pessoa percebe ou
sente que suas necessidades foram supridas, que estão de acordo com suas
expectativas. Para compreender melhor a relação entre satisfação e motivação
é interessante conhecer a teoria dos dois fatores, elaborada por Frederick Herzberg. Brunelli (2008) faz uma interessante revisão do trabalho de Herzberg
apontando que em seus estudos originais ele descobriu fatores que, quando
presentes, geram um alto nível de satisfação, mas quando ausentes não chegam
a gerar insatisfação proporcional, que ele chamou de motivacionais; e fatores
que quando ausentes geram grande insatisfação, mas quando presentes não
chegam a criar satisfação na mesma proporção, que ele chamou de higiênicos.
Os fatores motivacionais estariam mais associados à satisfação e incluem
atividades desafiadoras e estimulantes, que possibilitem realização, reconhecimento, desenvolvimento e progresso. Os fatores higiênicos estariam mais relacionados com insatisfação e incluem aspectos do ambiente de trabalho como
supervisão, relações interpessoais, salário, segurança e condições de trabalho.
Segundo Coelho e Soares (2006), a denominação de fatores higiênicos
de Herzberg se daria pelo fato de que, uma vez que a organização dê atenção
126
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
André Rosito Marquardt # Alessandra de Linhares Jacobsen # Isadora de Souza Bernardini
para manter esses aspectos em estado de controle, ela evitaria descontentamentos e, a partir daí, poderia poderia desenvolver trabalhos com os fatores
motivacionais.
Uma questão importante da teoria de Herzberg é ter a clareza de que
ajustes nos fatores ditos higiênicos têm pouca influência na motivação; então
intervenções voltadas para essa questão deveriam direcionar-se para aspectos
relativos às tarefas desempenhadas e ao conteúdo do trabalho. A esse entendimento tem se dado o nome de enriquecimento do cargo. (BRUNELLI, 2008)
2.4Motivação do Servidor Público
O trabalho no serviço público tem características específicas determinando
que seus gestores compreendam que nem sempre é possível a adaptação de
estratégias aplicadas no setor privado. De qualquer forma, a motivação é um
aspecto fundamental e tema de diversos estudos no setor público (BRUNELLI,
2008; AFFONSO; ROCHA, 2010; COELHO; SOARES, 2006; DIFINI, 2002;
SCHWEITZER, 2008; VIEIRA et al., 2011; VILLANOVA, 2010), justamente
em função de algumas características próprias dele.
Em função de abusos ocorridos no passado, vêm sendo realizadas
sucessivas reformas no estado brasileiro. Segundo Pereira (1996), no tempo
da monarquia, o estado brasileiro funcionava em um sistema patrimonialista
em que o patrimônio público era confundido com o privado, porque o estado
era considerado do rei. Nesse contexto, o nepotismo e o empreguismo, senão
a corrupção, eram a norma.
Como resposta à necessidade de melhora do sistema, foi adotada a
administração pública burocrática clássica, que, apesar de seu pressuposto de
eficiência, acabou demonstrando lentidão, alto custo, autorreferência e pouca
ou nenhuma orientação para o atendimento das demandas dos cidadãos.
(PEREIRA, 1996)
O passo seguinte vem se dando na implementação de uma mudança
para um modelo gerencial do sistema administrativo do estado brasileiro que
pressupõe algumas características como descentralização política e administrativa, redução dos níveis hierárquicos, pressuposto da confiança limitada ao
invés da desconfiança total, controle por resultados e administração voltada
para o cidadão. (PEREIRA, 1996)
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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Análise dos Fatores que Influenciam a Motivação para o Trabalho de Servidores Públicos de um Centro de
Atenção Psicossocial de Álcool e Drogas (CAPSad)
Apesar desse processo de reforma administrativa do estado brasileiro,
ainda são encontradas muitas características do modelo burocrático tanto na
estrutura dos serviços públicos como na mentalidade de servidores em atuação.
Schweitzer (2006) cita ainda questões importantes em relação ao trabalho no serviço público, como a estabilidade funcional e salarial, que podem
ser fatores que motivam o ingresso do servidor, mas nem sempre mantêm
motivação para o trabalho.
Outros fatores importantes de serem considerados, apontados por
Villanova (2010), são a falta de estímulos para crescimento na carreira, pouca
atratividade para cargos de chefia e a falta de autonomia para pessoas investidas
desses cargos de oferecerem benefícios aos que se destacam. Embora existam
mecanismos previstos em lei capazes de punir a má atuação de servidores
públicos, como citado por Schweitzer (2006), Villanova (2010) lembra que
tais instrumentos na prática se mostram ineficazes, trazendo na maioria das
vezes mais prejuízos do que benefícios ao serviço.
Segundo Guimarães, Jorge e Assis (2011), nos casos de serviços públicos
de saúde, existem diversos atores atuantes, gerando diferentes inter-relações
permeadas por diferentes interesses e necessidades. O processo de vivência
dessas inter-relações pode vir a ser positivo ou negativo, dependendo de
como se desenrola no trabalho. Segundo Herzberg (apud BRUNELLI, 2008),
considera-se que ambientes com inter-relações negativas possam ter caráter
desmotivador.
3 Metodologia
O presente trabalho lança mão de um estudo de caso de um CAPSad
usando de abordagem qualitativa para coletar e analisar as respostas de seus
servidores. Eles responderam a um questionário que foi construído a partir
da leitura de pesquisas na área, bem como da experiência do pesquisador
no trabalho com dependentes químicos e no serviço público. Tal questionário
conta com cinco questões abertas abordando as categorias de como se deu
a chegada ao local de trabalho, as percepções e os sentimentos relativos ao
trabalho com dependentes químicos e aspectos que motivam e desmotivam
no trabalho. Trata-se, ainda, de uma pesquisa bibliográfica, de campo e,
sobretudo, no que tange à sua finalidade, de uma pesquisa descritiva. Para a
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
André Rosito Marquardt # Alessandra de Linhares Jacobsen # Isadora de Souza Bernardini
coleta de dados, vale destacar que foi usada, também, a observação direta, em
decorrência da atuação profissional do pesquisador no ambiente em estudo.
A população-alvo do estudo foi a totalidade de servidores em atuação
no referido serviço: 19 servidores. Mas, considerando-se que, um estava em
férias e outro em licença por doença na ocasião da coleta de dados e, ainda,
que outro é o próprio autor considerou-se uma população total de 16 pessoas.
A amostra foi do tipo censitária, não comprometendo a análise, uma vez que
ela é qualitativa. Os questionários foram aplicados em outubro de 2012.
Uma vez que o autor do estudo é coordenador do serviço, para minimizar o viés nas respostas o questionário foi entregue para que cada um
respondesse individualmente sem a necessidade de identificação. Responder
ou não ao questionário foi opção individual, pois foi deixado claro que o resultado das respostas seria para uso exclusivo do referido estudo. Do universo
de 16 questionários entregues, nove foram respondidos e devolvidos em local
previamente acordado para facilitar o anonimato.
As respostas dos questionários foram analisadas através da técnica de
análise de conteúdo temática, proposta por Bardin (1977), que compreende
basicamente três etapas. A primeira fase é a pré-análise, onde se faz o contato
com as entrevistas buscando conhecer o conteúdo, estabelecendo as primeiras
impressões e caracterizando a leitura flutuante. A segunda fase implica a exploração do material, enquadrando a operação de codificação em categorias,
subcategorias e unidades temáticas. E a última fase é a do tratamento dos
resultados, onde são realizadas a síntese, inferências e interpretação dos dados.
4 Apresentação e Análise dos Dados
A apresentação dos resultados ocorre por meio da descrição de categorias, subcategorias e unidades temáticas que foram elaborados a partir da
análise de conteúdo das entrevistas, conforme a técnica de Bardin (1977)
descrita anteriormente.
4.1Forma de Lotação no CAPSad
Essa categoria trata da forma de chegada da pessoa para trabalhar no
CAPSad. Sendo essa bastante influenciada pelo sistema de contratação e
gerenciamento de pessoas do serviço público municipal, entende-se que esse
é o foco principal dos resultados encontrados.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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Análise dos Fatores que Influenciam a Motivação para o Trabalho de Servidores Públicos de um Centro de
Atenção Psicossocial de Álcool e Drogas (CAPSad)
Foram estabelecidas duas subcategorias: decisão voluntária e decisão
involuntária. Entende-se que tal divisão de subcategorias pode ter impacto
na motivação do servidor uma vez que trabalhar em um local a contragosto
pode ter influência negativa sobre ele.
4.1.1 Decisão Involuntária
Em relação à decisão involuntária, encontra-se como primeira unidade
temática a Imposição da gestão, que denota uma contrariedade do servidor
em relação à sua lotação, podendo dificultar sua adequação na unidade, influenciando sua motivação para o trabalho, conforme ilustrado pela fala do
Sujeito 7: “[...] eu fui transferida do outro Caps [...]. Na época me perguntaram
se eu desejava sair daquela unidade, eu fui clara sobre não desejar sair, mas
a decisão de minha saída foi irrevogável”.
Outra unidade temática aponta para o único local disponível para adequar
a carga horária, ilustrado pela fala do Sujeito 4: “[...] precisava reorganizar
meus horários pedindo redução de carga horária, então a única unidade [...]
era o CAPSad”. Esse tema pode ter caráter de duas vias, uma vez que denota
um possibilidade de flexibilização de horário no serviço, o que pode ser uma
contribuição como fator higiênico positivo, mas também denota a falta de
consideração à especificidade do serviço e ao perfil do servidor no momento
de escolha da lotação.
A última unidade temática dessa subcategoria fala de uma característica clássica do serviço público que é a chamada de concurso, que se pode
perceber na seguinte fala: “[...] prestei concurso [...] aguardei ser convocada
para exercer o cargo. Neste momento de atividade profissional estou sendo
incorporada à equipe” (Sujeito 6). Como já abordado, os concursos públicos
selecionam para vagas genéricas e, muitas vezes, existem diferenças significativas em relação aos diversos locais de trabalho possíveis. Sendo que o
critério de escolha de local, muitas vezes, segue apenas a ordem de chamada
do concurso, podendo contribuir para problemas de motivação posteriores se
ocorrer incompatibilidade de interesses do servidor com os objetivos do serviço.
4.1.2 Decisão Voluntária
Em relação à subcategoria decisão voluntária, encontra-se como primeiro item a proximidade da moradia, ilustrado pela fala do Sujeito 9: “[...]
optei pelo CAPSad continente por ficar mais próximo à minha residência”.
130
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
André Rosito Marquardt # Alessandra de Linhares Jacobsen # Isadora de Souza Bernardini
Esse pode ser entendido como um fator higiênico segundo a teoria dos dois
fatores de Herzberg (apud BRUNELLI, 2008).
A unidade Ajudar pessoas fragilizadas, é ilustrada pela fala do Sujeito
2: “[...] aceitei (o trabalho) porque me identifiquei com a função de ajudar
as pessoas de alguma forma, pessoas que são totalmente discriminadas pela
sociedade [...]”, o que pode ser entendido como um fator motivacional porque fala da consonância da atividade do serviço com objetivos pessoais que
podem contribuir para a realização pessoal.
Outro fator levantado é o de interesse em dependência química, percebido
no discurso do Sujeito 8: “Tinha o intuito de atuar na área da saúde, focando
na dependência química, que é um assunto que sempre me instigou”. Uma
vez havendo interesse na área, pode contribuir para o crescimento profissional,
tornando-se um fator motivacional.
A unidade temática história familiar de dependência química fala de um
interesse na área mediado por experiência pessoal familiar, o que é ilustrado
pelo Sujeito 1: “Tenho interesse no público (do CAPSad) pois tenho antecedente familiar”. Uma vez que o fato de ter familiar com dependência química
foi um fator relacionado à escolha do local para trabalho, entende-se que é
um fator motivacional.
4.2Percepção sobre o Trabalho com Dependentes Químicos
Essa categoria fala mais especificamente das particularidades do serviço CAPSad, em relação ao seu público-alvo de dependentes químicos e das
características do trabalho em CAPS.
Foram identificadas quatro subcategorias, quais sejam: dificultoso,
significativo, desgastante e interessante. A percepção sobre o trabalho com
dependentes químicos pode ter caráter positivo ou negativo em relação à motivação. Dificultoso e desgastante tem uma conotação negativa; e significativo
e interessante uma conotação positiva.
4.2.1 Dificultoso
Dentro da subcategoria dificultoso, há quatro unidades temáticas. A
primeira fala que a dificuldade surge frente aos poucos resultados positivos
obtidos em relação ao tratamento com dependentes químicos. O Sujeito 2
aponta: “É um trabalho difícil de criar grande expectativa, tem poucos resultados
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
131
Análise dos Fatores que Influenciam a Motivação para o Trabalho de Servidores Públicos de um Centro de
Atenção Psicossocial de Álcool e Drogas (CAPSad)
positivos”. Essa questão pode estar relacionada à falta de interesse na área ou
ao superdimensionamento de expectativas em relação à essa população. Mas,
de qualquer forma, fala de um fator que pode gerar desmotivação frente às
expectativas e desejos do profissional que não são efetivados.
Outra temática fala sobre Pacientes depositam problemas na equipe.
Conforme a fala do Sujeito 5: “[...] precisa ter paciência, pois os problemas
que eles trazem muitas vezes são depositados na equipe”. Parte da característica do dependente químico é a dificuldade de ter autonomia para resolver
seus problemas, sendo necessário um entendimento disso e habilidade para
trabalhar essa questão. Quando esse não é um ponto claro, ou a pessoa não
tem habilidades ou capacitação para lidar com esse aspecto, tende a gerar
estresse e ser um fator desmotivador.
A unidade seguinte é sobre o desafio dos pacientes com relação a
limites e regras. Novamente, essa é uma característica importante da pessoa
com problemas com drogas: ter limites internos frágeis, com consequente
dificuldade de lidar com limites externos. O comentário acerca da unidade
temática anterior se aplica bem nesta.
Por fim, a unidade temática Requer paciência parece denotar a falta
dela no respondente, de modo geral, o que pode ser entendido como um
fator desmotivador um vez que tende a ser gerador de estresse.
4.2.2 Significativo
Nesta subcategoria, foram encontradas unidades temáticas que tendem
ao caráter motivacional, uma vez que significativo já trata de uma percepção
de interesse pessoal que pode contribuir para a realização.
A unidade Traz benefícios para a sociedade fala claramente dessa percepção de que o trabalho pode trazer uma realização pessoal de contribuição para
a sociedade. O Sujeito 8 afirma: “[...] acho um trabalho bastante significativo,
que dá ótimos frutos para a sociedade”.
A unidade temática seguinte fala do auxílio a uma população marginalizada que apresenta um significado de ajuda ao próximo, novamente indo
ao encontro de um objetivo pessoal que pode contribuir para a realização,
sendo motivador. Essa unidade pode ser ilustrada pela fala do Sujeito 1: “[...]
um trabalho importante, pois trabalhamos com público que é usualmente
marginalizado pela sociedade”.
132
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
André Rosito Marquardt # Alessandra de Linhares Jacobsen # Isadora de Souza Bernardini
4.2.3 Desgastante
Essa subcategoria abarca três unidades temáticas: vários tipos de intervenções; difícil melhora do paciente; e grande investimento emocional com pouco
retorno. Todas parecem associadas a risco de estresse por serem frustrantes e
com dificuldade de alcançar satisfação pessoal, podendo ter resultados desmotivadores. A fala do Sujeito 4 ilustra a subcategoria “[...] acho um trabalho
desgastante, que demanda vários tipos de cuidados, intervenções e atividades
diferenciadas de outras unidades de saúde”. Esse desgaste mencionado vai ao
encontro do relatado por Didonet e Fontana (2011) em seu estudo, quando
encontraram que os principais fatores desmotivadores estavam relacionados
à falta de motivação dos pacientes para o tratamento, às constantes recaídas
e desistências e à falta de adesão ao tratamento.
4.2.4 Interessante
Nessa subcategoria elencou-se três unidades, que são: visualização da
aplicabilidade de técnicas; valorização da vida; e superação de preconceitos,
que pode ser observada no discurso do Sujeito 2: “[...] é um trabalho muito
interessante, pois aprendi muito a superar meus próprios preconceitos”, remetendo a um caminho de realização pessoal. Todas as unidades remetem
à correlação entre crescimento pessoal e profissional, o que pode influenciar
positivamente na motivação para o trabalho.
4.3Sentimentos em Relação ao Trabalho com Dependência
Química
Essa categoria aborda as percepções emocionais relacionadas ao trabalho
com dependentes químicos que, como apresentado anteriormente, podem ser
fonte de estresse e gerar desmotivação. Foram identificadas quatro subcategorias: frustração, satisfação, felicidade e preocupação. Todas estas mostram-se
relacionadas a fatores motivacionais, segundo a teoria dos dois fatores de
Herzberg (apud BRUNELLI, 2008), e não a fatores higiênicos.
4.3.1 Frustração
O sentimento de frustração foi expresso em relação a três aspectos do
trabalho com dependentes químicos: pouca melhora dos pacientes, condição
de vai e volta e constantes recaídas. Podemos ilustrar a subcategoria com o
Sujeito 4, que diz: “[...] hoje consigo lidar com as dificuldades e frustrações
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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Análise dos Fatores que Influenciam a Motivação para o Trabalho de Servidores Públicos de um Centro de
Atenção Psicossocial de Álcool e Drogas (CAPSad)
de muitas vezes ver o paciente, depois de conseguir se reestruturar, recair
novamente”.
Todas as unidades temáticas dessa subcategoria relacionam-se ao padrão de evolução natural dos transtornos de dependência química. Apesar
de esperados são fontes de frustração para os profissionais do serviço, como
evidenciado por Didonet e Fontana (2011).
4.3.2 Satisfação
A satisfação apareceu associada à percepção de se estar aliviando o
sofrimento humano através desse trabalho, como evidenciado na fala: “Sinto-me prestando um serviço que ajuda a aliviar o sofrimento das pessoas que
não contam com outro apoio” (Sujeito 1). A percepção de resultado positivo
do trabalho pode ser fator motivacional importante, implicando o servidor na
busca de melhores práticas dentro da Unidade de Saúde.
4.3.3 Felicidade
Este sentimento evidenciado na fala do Sujeito 4: “[...] fico muito feliz
de saber que muitas vezes conseguimos fazer a diferença na vida de cada um
dos usuários deste serviço”, fala de um dos importantes fatores de motivação
que é a realização com o trabalho.
4.3.4 Preocupação
A preocupação com comportamentos de risco por parte dos pacientes,
que é evidenciada pela unidade temática dessa subcategoria, traz o risco de o
profissional envolver-se além dos aspectos técnicos com a situação apresentada
pelos pacientes, podendo ser uma fonte significativa de estresse, impactando
sua motivação para manter suas atividades profissionais. Por outro lado, pode
demonstrar comprometimento e, se bem supervisionado, o profissional pode
contribuir para o engrandecimento do serviço, obtendo satisfação com suas
práticas e, por fim, se motivando para continuar as atividades.
4.4 Aspectos Motivadores no Trabalho
Esta categoria vem do questionamento da impressão dos sujeitos da
pesquisa de quais fatores eles identificam como motivadores em seu trabalho.
Na categorização foram levantadas quatro subcategorias: equipe, desenvolvimento profissional e pessoal, percepção sobre o trabalho do/no CAPSad e
134
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
André Rosito Marquardt # Alessandra de Linhares Jacobsen # Isadora de Souza Bernardini
possibilidade de ajudar. Assim como na categoria de sentimentos, os fatores
aqui apresentados enquadram-se em fatores motivacionais, como descrito
por Herzberg (apud BRUNELLI, 2008).
4.4.1 Equipe
O trabalho em equipe foi identificado como um dos fatores compreendidos como motivadores. Ao todo sete unidades temáticas surgiram relativas
ao trabalho em equipe: competência, receptividade, comunicação clara, apoio
mútuo, divisão de responsabilidades, motivação para crescimento pessoal e
profissional e confiança recebida, evidenciando características importantes
das pessoas da equipe e de suas relações que podem contribuir para um
trabalho motivador. A subcategoria é ilustrada com a seguinte fala: “Uma
das motivações que tenho é o trabalho em equipe, pois apesar dos problemas
que ocorrem de vez em quando, a equipe consegue resolver e fazer o melhor
possível.” (Sujeito 5). A diretriz do trabalho em equipe, buscando a interdisciplinaridade, como explicitado por Abuhab et al. (2005), mostra-se como
fator importante de enfrentamento das dificuldades inerentes à população
atendida. Além disso mostra que um fator higiênico importante, que são as
relações interpessoais, está suprido.
4.4.2 Desenvolvimento Pessoal e Profissional
Esta subcategoria também fala diretamente de fatores motivadores, segundo Herzberg (apud BRUNELLI, 2008), considerando o desenvolvimento
profissional. As unidades temáticas identificadas foram a possibilidade de
aumento do conhecimento na área da saúde; experiência com dependência
química; e aplicabilidade de técnicas profissionais.
4.4.3 Percepção sobre o Trabalho Desenvolvido
As percepções do participantes a respeito do trabalho desenvolvido
apontam para a consonância com o que é estudado cientificamente na área;
eficácia do serviço; e contribuição para o desenvolvimento do trabalho. Todas refletem a percepção de qualidade e valor do mesmo, refletindo aspectos
relacionados à motivação positiva. O Sujeito 4 aponta: “(um aspecto que me
motiva é) a possibilidade de desempenhar as minhas funções e poder estar
contribuindo para o crescimento e desenvolvimento do serviço”.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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Análise dos Fatores que Influenciam a Motivação para o Trabalho de Servidores Públicos de um Centro de
Atenção Psicossocial de Álcool e Drogas (CAPSad)
4.4.4 Possibilidade de Ajudar
Outra percepção positiva aparece nesta subcategoria, evidenciada na
fala: “Um aspecto que me motiva no trabalho é ajudar as pessoas que são
excluídas da sociedade” (Sujeito 1), apontando novamente para a questão de
realização pessoal através de uma trabalho que possui especificidades e também
está voltado para pessoas marginalizadas. Interessante destacar que pode ser
um fator motivador, como proposto por Herzberg (apud BRUNELLI, 2008).
4.5 Aspectos Desmotivadores no Trabalho
Esta categoria aponta para aspectos administrativos, predominantemente higiênicos segundo Herzberg; de características do usuário dependente
químico; do ambiente de trabalho; e da estrutura de rede.
4.5.1 Administrativos
Nesta subcategoria agruparam-se as unidades temáticas baixos salários,
falta de plano de carreira, não receber insalubridade, falta de estabilidade e
falta de capacitação técnica. Tratam-se de condições administrativas de caráter predominantemente higiênico, ou seja de condições que tendem a gerar
desmotivação, como já referido.
A falta de capacitação técnica pode estar relacionada com algumas
percepções e sentimentos de caráter desmotivador em relação ao trabalho
com dependência química, como referido por Forman, Bovasso e Woody
(2011) e Didonet e Fontana (2011), uma vez que expectativas distorcidas em
relação a resultados possíveis na intervenção e falta de instrumentos efetivos
de intervenção podem estar relacionados a essas percepções e sentimentos
referidos, conforme a fala do Sujeito 7: “[...] falta de treinamento específico
em dependência para toda a equipe”.
4.5.2 Características do Usuário com Dependência Química
Uma série de características inerentes ao processo patológico e evolução natural da dependência química surgem como aspectos considerados
desmotivadores, evidenciados nas unidades temáticas: repetição de histórias;
chantagens e ameaças dos pacientes; não melhora; falta de interesse; constantes
recaídas; e situação de vulnerabilidade. A fala do Sujeito 5 ilustra a subcategoria: “[...] me desmotiva perceber a questão da não melhora dos pacientes,
136
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
André Rosito Marquardt # Alessandra de Linhares Jacobsen # Isadora de Souza Bernardini
sempre voltam com as mesmas histórias”. Essas características são trazidas por
Didonet e Fontana (2011) como fonte de sentimentos de frustração e impotência dos trabalhadores; e os autores questionam se os profissionais lotados
para realizar a tarefa de lidar com essa demanda estão preparados para isso.
4.5.3 Ambiente de Trabalho
As questões relativas ao ambiente de trabalho também se enquadram
nos aspectos higiênicos. As falas encontradas foram traduzidas em duas
unidades temáticas: ambiente difícil e de muito sofrimento; e diálogos frios e
rígidos. O Sujeito 8 fala: “[...] (me desmotivam) diálogos frios e rígidos, que
infelizmente existem nos melhores ambientes”. Ambas as unidades podem
ser vistas como a tradução de percepções de dificuldades de diálogo e pouco
apoio dentro da equipe.
4.5.4 Estrutura de Rede
Esta subcategoria traz questões de carências da rede de atenção à saúde que são percebidas como desmotivadoras, sendo identificadas: falta de
emergência psiquiátrica; inexistência de leitos psiquiátricos em hospital geral;
falta de política local para dependência; falta de rede de apoio intersetorial. O
Sujeito 4 coloca: “[...] (me desmotivam) as dificuldades de rede de apoio para
poder melhorar o trabalho”. Essas percepções de deficiências de rede podem
interferir em questões higiênicas com prejuízo nas condições de trabalho,
mas também em fatores motivacionais quando pesam sobre a percepção de
realização e desenvolvimento do trabalho.
5 Considerações Finais
Na apresentação dos resultados do presente estudo percebemos diversos fatores – fragilidades e potencialidades - que influenciam a motivação
de servidores públicos que atuam em CAPSad, e a partir dessa percepção é
possível traçar alguns caminhos de melhoria dessa realidade.
Apesar dos cuidados dispensados para favorecer o anonimato, entende-se que o fato do autor ser coordenador do referido serviço pode representar
um viés importante nas respostas, em especial relacionado ao aparecimento
de críticas em relação à gestão local.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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Análise dos Fatores que Influenciam a Motivação para o Trabalho de Servidores Públicos de um Centro de
Atenção Psicossocial de Álcool e Drogas (CAPSad)
Pode-se ressaltar que um dos objetivos da política que institui os CAPS
no pais, que é a inclusão de minorias (RABELO et al., 2006), aparece como
um fator motivacional para alguns sujeitos investigados. Essa motivação advém
da consonância desse objetivo com aspirações e crenças pessoais, que não
necessariamente são compartilhadas por todas as pessoas que atuam no serviço.
No serviço público, muitas vezes, o concurso é realizado para um determinado cargo, mas as áreas de atuação são diversas e com grande frequência
a lotação desse profissional ocorre pela abertura de vaga em determinado
local e não pela adequação de seu perfil à vaga. Dependendo da organização
do serviço para o qual é concursado, podem ocorrer grandes dificuldades
para a realocação do profissional para outro serviço que se encaixe melhor
em seu perfil pelo fato de não existirem políticas ágeis e modernas de gestão
de pessoas. Muitas vezes, o papel do setor de recursos humanos se restringe
a atividades burocráticas relativas à folha de pagamento e alocação inicial de
pessoas, sem trabalhar com conceitos de gestão de carreira, gestão por competências, treinamento e desenvolvimento, reposicionamento e recolocação,
crescimento pessoal e profissional.
Outro fator que se destaca nos resultados apresentados é em relação
às percepções e sentimentos relativos ao trabalho com dependência química.
Além dos aspectos relacionados à alocação de pessoal por competências e
aptidões, identifica-se que capacitações técnicas e programas de educação
permanente poderiam minimizar algumas dessas percepções negativas, porque
elas estão associadas a características esperadas desse público-alvo.
Ainda em relação às percepções e sentimentos sobre dependência química identifica-se diversos fatores motivacionais como: superação de preconceitos, valorização da vida, benefícios para a sociedade, auxílio à população
marginalizada, ajuda para aliviar o sofrimento humano, e fazer a diferença
na vida dos pacientes.
Apesar desses relatos de percepções motivadoras, diversos sujeitos
apresentam mais percepções negativas que positivas. Implementar estratégias
de enriquecimento dos cargos poderia ampliar a motivação dos servidores no
CAPSad continente e possivelmente também em outros CAPSad.
Os baixos salários e a falta de plano de carreira se referem à maioria dos
servidores da unidade de saúde em estudo; e as questões de falta de estabilidade
e não receber insalubridade afetam apenas uma parcela do grupo, revelando
outra questão que é a heterogeneidade dos formatos de contrato existentes.
138
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
André Rosito Marquardt # Alessandra de Linhares Jacobsen # Isadora de Souza Bernardini
Ainda em relação à falta de estabilidade e plano de carreira, Schweitzer (2006)
ressalta que esses podem ser fatores motivacionais para o ingresso no serviço
público, mas não para o trabalho, enquanto Pereira (1996) ressalta que podem
ser fatores contrários a uma administração pública eficiente.
O trabalho em equipe aparece como potencialidade motivacional
nos resultados apresentados e vai ao encontro da literatura, que coloca essa
organização como importante para o trabalho nos CAPS e que, quando funciona de forma adequada, tem grande potencial de aumentar a capacidade
resolutiva e, consequentemente, a motivação dos servidores. (MILHOMEM;
OLIVEIRA, 2007)
As inter-relações são percebidas majoritariamente como positivas e
têm um caráter higiênico, mas aparecem relatos negativos, que sugerem a
necessidade de um trabalho de melhoria da comunicação.
A identificação de fatores associados à motivação em CAPSad e a intervenção nesses fatores com o objetivo de criar um ambiente motivador pode
contribuir significativamente para a melhoria da qualidade desses serviços
ainda relativamente novos no país e dos quais se tem uma grande expectativa.
Correlacionando os resultados desta pesquisa com a literatura disponível
verifica-se que estão em consonância e, portanto, é um estudo de relevância
e que pode contribuir para a melhoria das práticas em saúde pública, onde
gestores podem acessar os fatores que motivam e desmotivam os servidores
de Capsad e, através de parcerias internas e externas, buscar melhorar a
qualidade dos serviços.
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142
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Qualidade de Vida no Trabalho: enfoque no
ambiente de trabalho das Unidades Básicas
de Saúde
Aluna: Tatiana Domingues Scopel1
Orientador: Marcos Baptista Lopez Dalmau2
Tutora: Maria Luciana Biondo Silva3
Resumo
Abstract
A Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) tornou-se, ao longo dos anos, uma questão importante no sentido de conciliar os interesses
das instituições e dos trabalhadores para promover um serviço de qualidade. Nesse intuito,
por meio de uma revisão de literatura exploratória e básica do tipo narrativa ou tradicional,
foram analisados estudos que apresentaram
fatores relacionados à qualidade de vida no
trabalho e estudos sobre a qualidade de vida
no trabalho vinculada aos profissionais da área
da saúde. Esse artigo aborda o conceito de
QVT e analisa a contribuição dada por alguns
pesquisadores nesse campo de estudo. Além
disso, analisa a influência que o trabalho dos
profissionais das Unidades Básicas de Saúde
pode exercer sobre a qualidade de vida dos
trabalhadores, de sua família e da sociedade.
Quality of Life Work (QLW) became, over the
years, an important issue in order to reconcile
the interests of workers and institutions to promote service with high quality. With this fact,
an exploratory literature review with a type
of basic or traditional narrative was made to
analyze studies that showed factors related to
quality of life at work and quality of life at work
linked to health professionals. This article discusses the concept of QLW and analyses the
contribution made by some researchers in this
field of study. Also it analyses the influence that
the professionals in the Basic Healthcare Units
can have on the quality of life of workers, their
families and in the society.
Key words: Quality of Work Life. Health Professionals. Service Quality.
Palavras-chave: Qualidade de Vida no
Trabalho (QVT). Profissionais da Saúde.
Serviço de Qualidade.
1
Graduada em Odontologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (2009).
Especialista em Saúde da Família – Modalidade a Distância pela Universidade Federal de
Santa Catarina (2012). E-mail: [email protected].
2
Doutor em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina (2003).
E-mail: [email protected].
3
Graduada em Administração pela Universidade do Vale do Itajaí (2000). Especialista em
Gestão de Pessoas nas Organizações pela Universidade Federal de Santa Catarina (2011).
E-mail: [email protected].
Qualidade de Vida no Trabalho: enfoque no ambiente de trabalho das Unidades Básicas de Saúde
1Introdução
É consenso que há um enorme desgaste e sacrifício impingido ao trabalhador moderno por causa da competitividade existente entre as empresas.
Problemas como estresse, insegurança e descaso com a ergonomia ainda são
muito comuns e interferem nos resultados esperados em qualquer serviço. A
rapidez das inovações tecnológicas, aliada ao ambiente globalizado, traz a
necessidade de as organizações atualizarem seus conhecimentos para que obtenham resultados por meio do desenvolvimento de estratégias para melhorar
a Qualidade de Vida no Trabalho (QVT). As empresas devem entender que os
aspectos mais relevantes de suas estratégias estão relacionados ao bem-estar
do profissional em seu ambiente de trabalho e a transformação desse lugar
de trabalho em um ambiente aprazível, onde todos possam sentir satisfação
na realização de atividades profissionais, sendo elas públicas ou privadas.
No setor público, apesar de passados mais de 20 anos da constitucionalização do SUS, ainda é possível constatar que o sistema enfrenta desafios
importantes para um funcionamento adequado. A Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990 prevê que a questão da saúde não é um fenômeno isolado e
não significa apenas ausência de doença. Ela resulta de diversas interações da
vida com o meio ambiente em que a pessoa está inserida, o equilíbrio afetivo
entre as pessoas, o conhecimento do próprio corpo, a solidariedade para com
os outros e o respeito, dentre outros. A partir da vigência dessa lei, a preocupação com a temática qualidade de vida no trabalho tem adquirido dimensões
significativas entre as pesquisas desenvolvidas nas áreas da administração e
das ciências da saúde, uma vez que o trabalho tem sido considerado determinante na saúde dos indivíduos, pois é através dele que as pessoas obtêm
satisfação e realização pessoal, profissional e social. Diante disso, o trabalho
se torna elemento central para se pensar na qualidade de vida, porque é por
meio dele que as pessoas têm procurado satisfazer suas aspirações.
A questão do suporte de materiais e de equipamentos para garantir uma
assistência de qualidade, o número de profissionais adequados às demandas
da população, a remuneração apropriada para os profissionais da saúde, as
longas jornadas de trabalho, a insegurança dos profissionais e a falta de condições adequadas de trabalho e de descanso são os principais fatores geradores
de estresse entre os funcionários. São também os principais desafios que devem ser enfrentados pelos gestores para melhorar a produtividade, diminuir
a rotatividade de profissionais e o absenteísmo e melhorar o atendimento à
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população. Porém, são vários os motivos pelos quais a saúde do trabalhador é
negligenciada, fazendo-se necessária uma reflexão sobre quais aspectos devem
ser melhores para que se promova a saúde tanto da população quanto dos
trabalhadores de instituições que proporcionam esse serviço.
Existem poucos estudos na literatura nacional e internacional que
abordam o conceito de qualidade entre os profissionais da área de saúde,
muito embora o senso comum considere esses trabalhos insalubres e um
risco à saúde pelas características inerentes às profissões. No Brasil, a preocupação com a questão da saúde dos trabalhadores hospitalares iniciou-se
na década de 1970, quando pesquisadores da Universidade de São Paulo
(USP) enfocaram a saúde ocupacional em trabalhadores hospitalares. Esses
estudos focaram nos acidentes de trabalho a que os profissionais da saúde
estavam expostos e registraram a ocorrência de 4.468 acidentes de trabalho
em hospitais do país. Queixas como doenças infectocontagiosas, lombalgias,
reações alérgicas, fadigas e acidentes do trabalho foram referidos por 26 grupos ocupacionais de trabalhadores hospitalares em 1977, ao passo que em
1988 um estudo realizado no Hospital das Clínicas da Universidade de São
Paulo, envolvendo 1.506 acidentes, demonstrou que as principais causas de
afastamento foram lacerações e ferimentos, contusões ou torções. Somente
na década de 1990 foram levados em conta aspectos éticos e psíquicos do
trabalho na área da saúde.
O ambiente de trabalho no qual o profissional da saúde está inserido é
um lugar de tensões constantes, que responde ao desafio da saúde com divisão do trabalho, transformando as emergências em rotina, e os profissionais
experimentam uma vivência de extrema angústia e estresse emocional. Esse
estresse ao qual os profissionais de saúde estão expostos, de forma cumulativa
e progressiva, é desencadeado por fatores como ambiente de trabalho, sobrecarga de trabalho, relações interpessoais, trabalho noturno, tempo de serviço
e condições pessoais e características da personalidade, conforme estudo
que considerou o problema entre enfermeiros brasileiros de 1982 a 2001.
A importância da identificação desses agentes estressores é essencial para a
construção de um ambiente de trabalho seguro, o que pode gerar motivação
e diminuir os riscos aos quais o grupo está exposto.
Em estudo descritivo realizado no Instituto Fernandes Figueira (RJ), no
período de 2002 a 2003, constatou-se que entre os profissionais com faixa
etária entre 20 e 50 anos – 90% do sexo feminino, com predominância de
jovens entre 20 e 29 anos – 60% tinham dupla e tripla jornada, com carga
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Qualidade de Vida no Trabalho: enfoque no ambiente de trabalho das Unidades Básicas de Saúde
horária acima de 60 horas semanais e estilo de vida não saudável em relação
ao lazer, exercício físico, repouso e sono. Entre os riscos ocupacionais identificados é possível citar o ritmo acelerado no trabalho, manutenção de posturas
inadequadas, trabalho isolado, esforço físico que produz fadiga, temperatura
inadequada, excesso de ruído, exposição à irradiação e risco de infecção.
As doenças relacionadas com as condições de trabalho detectadas foram:
distúrbios osteomusculares, varizes e estresse. Concluiu-se que os problemas
de saúde e as condições de trabalho estão inter-relacionados e é impossível
isolar causa e efeito, sendo, portanto, um ambiente estressante tanto no aspecto
físico, quanto emocional.
O presente artigo aborda a qualidade de vida dos funcionários do setor
da saúde, apresentando uma revisão teórica acerca da qualidade de vida no
trabalho. Em sequência, pretende-se focalizar o trabalho em saúde, com vistas
ao questionamento acerca da qualidade de vida dos profissionais da saúde,
frente aos desafios colocados pelo processo de trabalho na atenção básica,
seguido de uma conclusão sobre essa discussão.
2 A Qualidade de Vida no Trabalho (QVT)
São inúmeros os conceitos e os autores que relatam sobre qualidade de
vida, a qual foi definida pelo grupo de qualidade de vida da OMS (Organização Mundial de Saúde) como “[...] a percepção do indivíduo de sua posição
na vida no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive e em
relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”.
França (1997, p. 80) observa que “QVT é o conjunto das ações de uma
empresa que envolvem a implantação de melhorias e inovações gerenciais
e tecnológicas no ambiente de trabalho”.
A construção da qualidade de vida no trabalho ocorre a partir do
momento em que se olha a empresa e as pessoas como um todo, o que se
chama de enfoque biopsicossocial. Segundo Arellano (2003), esse enfoque
biopsicossocial leva em consideração três fatores, a saber, o físico, o psicológico e o meio social em que o trabalhador está inserido, por meio de ações
que refletem em um aumento na produtividade e na melhoria da imagem da
empresa tanto no contexto interno, como externamente, levando a um crescimento pessoal e organizacional. É de fundamental importância que esses
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três aspectos que integram o ser humano sejam analisados em conjunto, uma
vez que todos eles coexistem no mesmo indivíduo.
O homem deve ser visto na QVT na sua integralidade, ou seja, em
todos os aspectos que influenciam a qualidade de seu trabalho na instituição. Envolve o estado físico, psicológico, crenças pessoais, relações sociais e
relações com o ambiente e o equilíbrio entre eles. O conceito físico engloba
não apenas o quadro clínico do indivíduo (presença/ausência, gravidade/
intensidade de doença orgânica demonstrável), mas também, a adoção de
uma alimentação saudável, a não aderência a hábitos nocivos de vida e,
também, ao uso correto do sistema de saúde. O aspecto psicológico envolve
desde uma adequada capacidade de gerenciamento das tensões e do estresse
até uma forte autoestima, somadas a um nível elevado de entusiasmo em
relação à vida. O espiritual traduz um propósito de vida baseado em valores
e ética, associado a pensamentos positivos e otimistas. E o aspecto social
está relacionado à alta qualidade dos relacionamentos, equilíbrio com o meio
ambiente e harmonia familiar.
Atividades como ginástica laboral, relaxamento e rodas de conversa já
são adotadas por empresas para proporcionar um condicionamento físico e
mental previamente ao início da jornada de trabalho. Encontros das equipes
em datas comemorativas também favorecem um convívio social harmônico
e o vínculo, permitindo que as pessoas se conheçam melhor fora do ambiente de trabalho e, assim, trabalhem melhor em equipe dentro da instituição.
As empresas devem prezar pelo respeito entre seus funcionários e gestores,
compreendendo-os nas suas limitações e estimulando suas qualidades, aumentando a sua autoestima para que ele se sinta valorizado na função que exerce.
Há muito tempo que são usadas estratégias para promover a melhoria
do método de trabalho por meio de métodos físicos e matemáticos para diminuir o esforço de muitos trabalhadores, como a criação de alavancas e uso
da geometria na agricultura. No século XIX, com o advento da Revolução
Industrial, a QVT foi relegada em favor da exploração do trabalhador, visando
ao lucro e à produtividade em grande escala. Somente a partir da década de
1960, já no século XX, um grande número de pesquisadores, acadêmicos,
líderes sindicais e representantes do governo, preocupados com o bem-estar
físico e mental dos trabalhadores, começaram a se interessar pelas diversas
maneiras de estimular a produtividade à custa da melhoria das condições de
trabalho. Já nas décadas de 1980 e 1990, do muitos pesquisadores também
se dedicaram ao estudo do comportamento humano em seu ambiente de
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Qualidade de Vida no Trabalho: enfoque no ambiente de trabalho das Unidades Básicas de Saúde
trabalho e da motivação para atingir metas organizacionais. Entre eles, é
possível citar Albuquerque e França (1997) e Maximiano (2000).
Maximiano (2000) relatou que os primeiros estudos sobre a relação do
desempenho humano com o ambiente de trabalho foram feitos pelo psicólogo Elton Mayo, entre as décadas de 1920 a 1940. Esses estudos foram feitos
com um grupo de moças de uma indústria localizada na cidade de Chicago
nos Estados Unidos, e ficou conhecido como a experiência de Hawtorne. A
pesquisa desenvolvida por Mayo (1933) baseou-se na observação de um
grupo de operárias que foram observadas em ambientes separados da linha
de produção ao qual estavam familiarizadas. Ao fim da experiência verificou-se que a produção elevou-se e constatou-se que a satisfação das operárias
tornara-se evidente, pois revelou que as condições de ambiente, tratamento
igualitário, gerência mais próxima, respeito, valorização do trabalho, entre
outros, foram fatores que serviram de estímulos para as funcionárias e, dessa
maneira, abriu caminho para outros estudos sobre a qualidade de vida nas
organizações.
Esses estudos se fizeram necessários em virtude do intenso esforço
empreendido pelas organizações para aumentar a produtividade, o lucro,
para diminuir os custos e, com isso, superar a concorrência. Porém, todo
aperfeiçoamento e aumento da produção ocorreu à custa do trabalhador
moderno, causando a ele enorme desgaste físico e mental. Aspectos relacionados à satisfação no trabalho e a melhores condições para executá-lo foram
negligenciados e relegados a segundo plano. Segundo Cavassani, Cavassani
e Biazin (2006), com esses estudos, a mentalidade primitiva das organizações
sobre a exploração do trabalho humano em suas linhas de produção foi aos
poucos sendo substituída. Assim, ter a força de trabalho atrelada aos valores
da empresa tornou-se vital para a competitividade das organizações. Pois, a
sobrevivência, a permanência e o espaço no mercado dependem cada vez
mais do envolvimento das pessoas em prol dos objetivos da organização. Para
Levering (1996) não é justo que o local de trabalho seja a única coisa na vida
das pessoas. Um bom local para trabalhar possibilita, entre outras coisas, que
as pessoas tenham, além do trabalho, compromissos em suas vidas, como
família, amigos e hobbies pessoais.
Walton (apud CHIAVENATO, 1999) conceitua a QVT como o atendimento de necessidades e de pretensões humanas, com base na ideia de
humanização e de responsabilidade social. Propõe ainda um modelo com
oito categorias conceituais que devem ser consideradas na QVT.
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Dentre os principais modelos desenvolvidos com o objetivo de identificar
os aspectos que influenciam na qualidade de vida no trabalho, destacam-se
os modelos propostos por: Walton e Westley, Davis e Werther, Hackman e
Oldham (FREITAS; SOUZA, 2008):
a) Modelo de Walton (1973): estabeleceu critérios para a qualidade
de vida no trabalho. Esses critérios se dividem em oito categorias
conceituais: compensação adequada e justa, condições de segurança e saúde no trabalho, oportunidade imediata para a utilização e
desenvolvimento da capacidade humana, oportunidade futura para
crescimento contínuo e segurança, integração social na organização
de trabalho, constitucionalismo na organização de trabalho, trabalho
e o espaço total da vida do indivíduo e relevância social da vida no
trabalho. Por esse modelo, os critérios apresentados são intervenientes na qualidade de vida no trabalho de um modo geral. Sendo tais
aspectos determinantes dos níveis de satisfação experimentados pelos
clientes internos, repercutindo nos níveis de desempenho.
b) Modelo de Westley (1979): os problemas vivenciados pelas pessoas
no ambiente de trabalho podem ser classificados em quatro categorias: injustiça, insegurança, isolamento e anomia.
c) Modelo de Davis e Werther (1983): baseia-se em três grupos de
elementos: organizacionais, ambientais e comportamentais. O objetivo desses autores era chegar a cargos produtivos e satisfatórios
que trariam uma vida no trabalho de alta qualidade (RODRIGUES,
1995), fatores como supervisão, condições de trabalho, pagamento,
benefícios e projeto de cargo influenciam na QVT.
d) Modelo de Hackman e Oldham (1975): propõe que resultados positivos
pessoais e do trabalho sejam obtidos quando três estados psicológicos críticos (percepção da significância do trabalho, percepção pela
responsabilidade dos resultados e conhecimento dos reais resultados
do trabalho) estão presentes para certo trabalhador.
2.1 Áreas Envolvidas com QVT
A Qualidade de Vida no Trabalho é determinada por vários fatores,
segundo Chiavenato (2008), a QVT não é determinada somente por características individuais ou situacionais, mas principalmente pela atuação sistêmica
das características individuais e organizacionais. Esses fatores devem estar
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Qualidade de Vida no Trabalho: enfoque no ambiente de trabalho das Unidades Básicas de Saúde
conciliados uns com os outros para que tanto os colaboradores quanto a
organização tenham suas necessidades e objetivos atendidos.
Determinação do fator
1º Competência gerencial
2º Identificação com a empresa
3º Preocupação assistencial com os
funcionários
4º Oportunidade efetiva de participação
5º Visão humanista da empresa
6º Equidade Salarial
Variáveis determinantes
Apoio socioemocional
Orientação técnica
Igualdade de tratamento
Gerenciamento pelo exemplo
Identidade com a tarefa
Identificação com a empresa
Imagem da empresa
Assistência aos funcionários
Assistência familiar
Criatividade
Expressão pessoal
Repercussão de ideias dadas
Educação/Conscientização
Orientação para pessoas
Responsabilidade comunitária
Salários com equidade interna
Salários com equidade externa
Quadro 1: Principais determinantes da QVT
Fonte: Adaptado de Chiavenato (2008)
Limongi (1995) e Albuquerque e França (1997) consideram que a sociedade vive novos paradigmas dentro e fora das empresas, gerando novas
necessidades de QVT. Essa demanda recebe contribuições de outras ciências
como administração, economia, sociologia, psicologia, ecologia, engenharia,
saúde e ergonomia.
A administração vem contribuir para o ambiente complexo, competitivo
e dinâmico em que as empresas se encontram, propondo novas estratégias
para aumentar a capacidade de mobilizar recursos monetários e humanos
para aumentar a produtividade.
Já a economia enfatiza a consciência de que bens materiais são limitados
e que a sua distribuição deve ocorrer de forma equilibrada de acordo com os
direitos da sociedade. O conceito da economia está intimamente relacionado
com o que a sociologia defende, pois resgata a dimensão simbólica do que
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é compartilhado e construído socialmente, resgatando valores culturais e
antropológicos da empresa.
A área da psicologia demonstra a influência da perspectiva de vida de
cada pessoa e das decisões tomadas no seu “eu” íntimo na realização de seu
trabalho. Essa área está relacionada com o suprimento das necessidades emocionais para que haja um comprometimento com a atividade a ser realizada.
No campo da ecologia, a preservação dos insumos da natureza e a
integração dos animais com o ser humano são de extrema importância para
a continuidade da produção, visto que a matéria-prima utilizada geralmente
é não renovável, sendo que o trabalho depende da perfeita harmonia do
trabalhador com o ambiente.
A engenharia vem para otimizar o processo de trabalho por meio da
elaboração de novas formas de organização e de controle de processos, aumentando assim a produtividade através da tecnologia.
As áreas da saúde, que preconizam a integridade física, mental e social
do ser humano, contribuem de forma não só a aumentar a expectativa de vida
do trabalhador como também para aumentar sua assiduidade no trabalho.
Aqueles que apresentam comorbidades físicas e mentais não desenvolvem
de maneira satisfatória as atividades discriminadas e não conseguem criar
vínculo com a empresa.
Por fim, a ergonomia estuda a relação das condições de trabalho e o
trabalhador. Por meio de conceitos da medicina, a psicologia, a engenharia e
a ergonomia prezam pelo conforto na operação da atividade para que lesões
em decorrência do processo de trabalho sejam prevenidas.
A busca pela QVT e a implementação de ações visando melhorias para
as pessoas não podem ser consideradas como um custo nas planilhas das
organizações, uma vez que os custos com afastamentos e ações trabalhistas
são maiores do que uma medida preventiva. Zelar pelo bem-estar e pela segurança dos indivíduos é de suma importância para assegurar produtividade
e qualidade no trabalho e mais satisfação na vida familiar e pessoal. Para o
professor Lindolfo Galvão de Albuquerque da Feap/USP (LIMONGI-FRANÇA;
ASSIS, 1995, p. 28):
[...] existe uma grande distância entre o discurso e a prática.
Filosoficamente, todo mundo acha importante a implantação de
programas de QVT, mas na prática prevalece o imediatismo e os
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Qualidade de Vida no Trabalho: enfoque no ambiente de trabalho das Unidades Básicas de Saúde
investimentos de médio e longo prazo são esquecidos. Tudo está
por fazer. A maioria dos programas de QVT tem origem nas atividades de segurança e saúde no trabalho e muitos nem sequer se
associam a programas de qualidade total ou de melhoria no clima
organizacional. QVT só faz sentido quando deixa de ser restrita a
programas internos de saúde ou lazer e passa a ser discutida num
sentido mais amplo, incluindo qualidade das relações de trabalho
e suas consequências na saúde das pessoas e da organização.
Baseado nisso, percebe-se que há um reconhecimento generalizado a
respeito do valor e da necessidade da utilização de programas de QVT. Por
outro lado, as ações para a sustentação não são suficientemente convincentes
e efetivas. O maior obstáculo para a sua implementação reside na falta de
reconhecimento da sua importância estratégica e na baixa relevância financeira
desses programas, que são vistos como despesas, não como investimentos,
segundo Limongi-França e Assis (1995). A dependência da mobilização de
recursos para melhoria das condições de trabalho é um entrave na maioria
das empresas e também o principal motivo para a não aplicação das medidas
de QVT. Tal fato observa-se principalmente nas instituições públicas – e nelas
incluem-se as vinculadas ao Sistema Único de Saúde (SUS) – que dependem
de recursos do governo federal para a sua implementação. Os municípios
enfrentam ausência de financiamento adequado e suficiente, disparidade
entre demanda e financiamento do SUS, critérios inadequados de distribuição de verba orçamentária e processos burocráticos morosos. Frente a essa
problemática, a qualidade de vida dos profissionais da saúde merece ser
vislumbrada, já que conviver com essas situações pode ser desgastante para
a saúde do trabalhador, o que muitas vezes se traduz pelo sofrimento ou pelo
adoecimento do corpo e da mente.
3 Metodologia
Este estudo desenvolveu-se por meio de uma revisão de literatura do tipo
narrativa ou tradicional, através de uma pesquisa exploratória e básica, realizada on-line na base de dados LILACS, SciELO, Diários Oficiais da Prefeitura
Municipal de Florianópolis, site do Ministério da Saúde, legislação normativa
do SUS e Programa Nacional da Atenção Básica. Utilizou-se como descritor:
qualidade de vida no trabalho, saúde do trabalhador, qualidade de vida dos
profissionais da saúde. Realizou-se a seleção arbitrária dos dados e de publi-
152
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cações e ficaram incluídos no presente estudo os que apresentaram como foco
os fatores relacionados à qualidade de vida no trabalho e qualidade de vida
no trabalho vinculada aos profissionais da área da saúde. Ficaram excluídos
os demais trabalhos que não se enquadraram nos critérios mencionados A
análise deles ocorreu através da percepção subjetiva dos fatores relacionados
à qualidade de vida no trabalho e qualidade de vida no trabalho vinculada
aos profissionais da área da saúde e foram identificados vários problemas
entre os profissionais como estresse, demanda excessiva, longas jornadas de
trabalho, ambiente e materiais inadequados para a realização do trabalho e
falta de valorização profissional pela comunidade e pelos gestores.
Entre as limitações impostas para a realização do estudo é possível citar
o fato de que existem poucos trabalhos na literatura nacional e internacional
que abordam o conceito de qualidade entre os profissionais da área de saúde.
A maioria dos trabalhos incluídos no estudo está relacionado aos profissionais
da área da enfermagem, visto que trabalhos com os profissionais médicos
são escassos.
4 Os Profissionais da Saúde no Ambiente de Trabalho
das Unidades Básicas de Saúde
As Unidades Básicas de Saúde adotam uma sistemática de trabalho
baseada no Programa de Saúde da Família (PSF), adotado pelo governo
federal desde 1994. A Saúde da Família é entendida como uma estratégia de
reorientação do modelo assistencial, operacionalizada mediante a implantação
de equipes multiprofissionais em unidades básicas de saúde. As equipes são
compostas, no mínimo, por um médico de família, um enfermeiro, um auxiliar
de enfermagem e seis agentes comunitários de saúde. Quando ampliada, conta ainda com: um dentista, um auxiliar de consultório dentário e um técnico
em higiene dental. Cada equipe se responsabiliza pelo acompanhamento de,
no máximo, quatro mil habitantes, sendo a média recomendada de três mil
habitantes de uma determinada área, que passam a ter corresponsabilidade
no cuidado à saúde. A atuação das equipes ocorre principalmente nas unidades básicas de saúde, nas residências e na mobilização da comunidade,
caracterizando-se como porta de entrada de um sistema hierarquizado e
regionalizado de saúde; por ter território definido, com uma população delimitada, sob a sua responsabilidade; por intervir sobre os fatores de risco aos
quais a comunidade está exposta; por prestar assistência integral, permanente
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Qualidade de Vida no Trabalho: enfoque no ambiente de trabalho das Unidades Básicas de Saúde
e de qualidade; por realizar atividades de educação e promoção da saúde.
Teoricamente, o PSF é capaz de resolver 80% dos problemas de saúde apresentados pela população. Entretanto, alguns fatores contribuem para que esse
percentual de resolubilidade não seja alcançado. Entre eles, é possível citar:
4.1 Demanda Excessiva de Pacientes
Na prática, o PSF engloba uma sobrecarga de trabalho, reflexo da grande
demanda por atendimento. A realidade nos mostra que se está diante de uma
situação em que a população cresce sem o acompanhamento do crescimento
da assistência em saúde, sobrecarregando os profissionais da área que são
responsáveis pelo atendimento à população, pressionando-os por exigência
de produtividade e agilidade no atendimento. Apesar de haver um limite de
pessoas definidos pelo Ministério da Saúde, a realidade de alguns PSF apontam
para números de atendimentos superiores com uma equipe sendo responsável
por até sete mil pessoas (SANTOS; OLIVEIRA; MOREIRA, 2006). Beck (2001)
afirma que as Unidades Básicas de Saúde têm sido locais caracterizados por
diversos fatores que favorecem ou, até mesmo, dificultam a realização do trabalho de um enfermeiro. Porém, percebe-se que esses fatores não se aplicam
somente aos enfermeiros, mas sim a todos os profissionais da área da saúde,
pois o trabalho é realizado em equipe e a presença desses fatores, de forma
isolada ou conjunta, prejudica o desenvolvimento do trabalho. Dessa forma,
esses fatores, como ausência de recursos humanos suficientes para atender
a população nas Unidades Básicas de Saúde em consequência da falta de
valorização e reconhecimento profissional, longas jornadas de trabalho dos
profissionais, falta de materiais e equipamentos adequados para a realização
do trabalho, falta de compreensão e paciência da comunidade e dificuldades
de relacionamento com os gestores, trazem impacto sobre o trabalho que está
sendo desenvolvido e para a vida cotidiana de cada um. Entre esses impactos,
é possível citar desde o cansaço e o estafe físico e emocional – que interferem
negativamente na atenção dispensada à família nos momentos em que os
profissionais estão fora do ambiente de trabalho, até o surgimento de doenças
relacionadas ao trabalho, como o estresse, transtornos neuróticos, transtornos
do sono, alcoolismo crônico, doenças do sistema osteomuscular, hipertensão
arterial, entre outros. (BRASIL, 1999)
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4.2 Insatisfações com a Remuneração Percebida
No município de Florianópolis, odontólogos recebem um salário inferior ao salário de odontólogos de cidades como Jaraguá do Sul, Joinville,
Blumenau e Gaspar, que remuneram melhor seus profissionais, comparando
com a capital. De acordo com dados do Sistema de Cadastro Nacional de
Estabelecimentos de Saúde (SCNES) e estimativos do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE) de 2012, Florianópolis conta com uma densidade de 2,2 equipes de saúde da família para cada equipe de saúde bucal
e uma média de 6.560 habitantes por equipe. Há 120 equipes de saúde da
família em Florianópolis e apenas 59 equipes de saúde bucal. Essas informações auxiliam no entendimento de que existe uma carência de profissionais
no setor, sobrecarregando o trabalho de quem está atuando nas unidades de
saúde, gerando estresse ao profissional e doenças relacionadas ao acúmulo
de trabalho. Muitas pesquisas (CREVELIM, 2005; FERRAZ; AERTS, 2005;
NASCIMENTO; NASCIMENTO, 2005; ROCHA; TRAD, 2005; SCHIMITH;
LIMA, 2004; SILVA; TRAD, 2005; TRAD et al., 2002; TCU, 2002) têm abordado o aspecto da sobrecarga de trabalho presente em todas as categorias
profissionais do PSF, consequência tanto da grande quantidade de famílias
sobre responsabilidade da equipe, como da carência de serviços de atenção
básica nas áreas de abrangência em que os PSF foram implantados, o que faz
com que esses profissionais tenham que assumir uma duplicidade de papéis
nas unidades em que trabalham.
Os baixos salários são apontados pela categoria médica do município
de Florianópolis como um dos principais motivos dos cerca de 100 pedidos de
demissão feitos de um ano e meio para cá – média de 5,5 desligamentos por
mês, o que corresponde a aproximadamente 30% dos profissionais médicos.
Segundo dados colhidos nas publicações, em Diário Oficial, da prefeitura de
Florianópolis, no período de 1º de julho de 2010 até 22 de agosto de 2012,
foram publicadas 106 exonerações de médicos lotados na Secretaria de Saúde
da capital, o que representa mais de um terço de médicos, tendo em vista que o
total de profissionais não ultrapassou 300 pessoas. Segundo Rodrigues (1999),
o compromisso com os objetivos depende das recompensas à sua realização,
e que o ser humano não só aprende a aceitar suas responsabilidades como
tende a procurá-las. Esses fatores devem ser analisados em programas de
QVT justamente para evitar o que está acontecendo com a classe médica na
capital: a escassez de profissionais em decorrência da falta de valorização – que
remete a um ciclo vicioso, no qual percebe-se que, com a falta ou o número
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Qualidade de Vida no Trabalho: enfoque no ambiente de trabalho das Unidades Básicas de Saúde
reduzido de profissionais em determinada área, isso acarreta em sobrecarga
dos que estão em atividade na tentativa de compensar a falta de colegas, visto
que a demanda não diminui e a cobrança pelo atendimento aumenta. E esse
fato gera consequências à saúde do trabalhador, já citadas no item anterior.
4.3 Longas Jornadas de Trabalho
Não se pode restringir a dignificação do trabalho exclusivamente às
questões salariais, embora essas questões sejam cruciais. A baixa remuneração
origina acúmulo de vínculos empregatícios e, consequentemente, excesso de
horas trabalhadas e pouco tempo para as demais atividades da vida, como o
lazer e a recreação. Apesar de o PSF preconizar 40 horas de trabalho semanais,
segundo Júnior e Esther (2001), os profissionais, principalmente enfermeiros,
trabalham em vários locais para obter melhores condições de vida. Essas
condições acarretam uma carga horária de trabalho exaustiva, desgaste físico
e psíquico a esses trabalhadores.
O excesso de horas trabalhadas, devido à soma de postos de trabalho,
traz cansaço e restringe ao aproveitamento da vida em família e em sociedade.
Também interfere negativamente na saúde do trabalhador, visto que, segundo
o Ministério da Saúde, o transtorno do ciclo vigília-sono é a consequência da
má adaptação à organização do horário de trabalho (trabalho em turnos ou
trabalho noturno). Nessas situações, trabalhadores das Unidades Básicas de
Saúde ainda precisam dar conta de demandas laborais diversas, incluindo
escassos intervalos para a alimentação e o descanso. Assim, o profissional
não recebe um salário justo, levando-se em conta as horas trabalhadas, os
deveres impostos e a escassez de pessoal, se fazendo necessário adequá-lo
às habilidades e ao conhecimento do profissional, podendo, esses fatores
influenciarem na permanência ou no abandono da profissão.
A luta pela jornada de 30 horas para trabalhadores da área da saúde é
uma reivindicação histórica, há mais de uma década os profissionais aguardam
essa decisão que é inclusive recomendada pela Organização Internacional
do Trabalho (OIT), como melhor medida para pacientes e trabalhadores. Foi
elaborado o Projeto de Lei n. 2.295/2000, que dispõe sobre a jornada de
trabalho de 30 horas dos Enfermeiros, Técnicos e Auxiliares de Enfermagem.
Porém, manobras regimentais impossibilitaram a votação do projeto.
De acordo com Abrahan H. Maslow, há necessidades fundamentais que
devem ser seguidas em ordem para que o indivíduo atinja sua autorrealização.
156
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Tatiana Domingues Scopel # Marcos Baptista Lopez Dalmau # Maria Luciana Biondo Silva
Entretanto, as longas jornadas de trabalho impossibilitam a realização dessas
necessidades. A primeira necessidade a ser sanada é a fisiológica. O ser humano deve estar bem nutrido, apresentar homeostase corpórea, satisfazer suas
necessidades sexuais, ter horas diárias apropriadas de sono, para que assim
esteja apto a cumprir a segunda necessidade – a segurança. O trabalhador
deve ter segurança de seu emprego, de suas condições de saúde, de suas
propriedades e de sua moral. Só assim ele poderá avançar e cumprir suas
necessidades de relacionamento. O indivíduo precisa ter amizades estáveis,
pertencer a um grupo, ter amor e admiração por sua família. Sem as horas
reservadas ao lazer, torna-se inviável suprir essa necessidade. O quarto estágio
é o da estima: o reconhecimento e confiança em suas capacidades pessoais,
bem como também confiar na capacidade alheia, respeito aos colegas são
alcançados quando há plena consciência da atividade a ser realizada, o que
demanda atenção e conhecimento. Com quatro necessidades cumpridas (fisiológicas, segurança, amor e estima), chega-se à quinta e última – a realização.
Nesse estágio, o indivíduo é capaz de desenvolver seus potenciais usando sua
espontaneidade, criatividade e conhecimento adquirido.
4.4 Ambiente de Trabalho Inadequado
É de consenso geral que ambiente inadequado e falta de recursos materiais prejudicam o desenvolvimento de qualquer trabalho. A regulamentação
sobre Meio Ambiente do Trabalho, segurança e saúde do trabalhador – está
baseada na Constituição Federal de 1988, que elevou à categoria de direito
fundamental a proteção à saúde do trabalhador.
A Constituição especifica: “Ao sistema único de saúde, compete, além de
outras atribuições, nos termos da lei: [...] VIII – colaborar na proteção do meio
ambiente, nele compreendido o do trabalho.” (BRASIL, 1988, art. 200, VIII)
No artigo 225, caput, IV, VI e § 3º:
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de
vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de
defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. […]
IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade
potencialmente causadora de significativa degradação do meio
ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará
publicidade; […]
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
157
Qualidade de Vida no Trabalho: enfoque no ambiente de trabalho das Unidades Básicas de Saúde
VI – promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino
e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente.
(BRASIL, 1988, art. 225)
Destaca-se, portanto, como princípio basilar o artigo 1º, III da Carta
Magna, que é o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana.
Portanto, todo ser humano tem direito a uma vida digna, e o meio ambiente
do trabalho deve tê-lo como parte integrante de sua plataforma, pois, como
preceitua o artigo 225, a vida deve ser de qualidade, e para que o trabalhador
tenha uma vida com qualidade, torna-se necessário um trabalho decente e
em condições seguras.
Na área da saúde, espaço, iluminação adequada, ambiente climatizado,
condições de higiene e limpeza, suporte técnico imediato, equipamentos e
materiais de trabalho em bom estado de conservação são condições mínimas
de trabalho necessárias para atender a população de maneira adequada. Em
um ambiente de trabalho adequado, os trabalhadores desempenham as suas
atividades com satisfação e, dessa forma, se sentirão importantes no processo
em que estão inseridos, tornando o trabalho prazeroso, aumentando a produtividade e será notória a redução de acidentes, de doenças ocupacionais,
absenteísmo e, como consequência, uma melhor qualidade de vida no trabalho
e redução das doenças relacionadas ao trabalho. Comprovando a afirmação,
estudo realizado por Schrader et al. (2012) sobre qualidade de vida de enfermeiros em Unidades Básicas de Saúde do município de Pelotas, RS mostrou
que as condições de trabalho foram muito enfocadas pelos trabalhadores,
visto que todos salientaram a realização de um trabalho de pior qualidade
devido à falta de condições adequadas para o trabalho. A convivência com
materiais sucateados, falta de medicamentos e equipamentos foram fatores
apontados como determinantes na qualidade de vida, pelo prejuízo que isso
traria à assistência prestada e à autopercepção do próprio trabalho, pois, do
ponto de vista da saúde mental, o ambiente de trabalho deve envolver condições psicológicas e sociológicas saudáveis e que atuem positivamente sobre
o comportamento das pessoas, evitando impactos emocionais como estresse.
4.5Incompreensão da População quanto ao Funcionamento do
Sistema
Outro fator relacionado ao estresse profissional citado na literatura é a
agressividade física e/ou verbal dos pacientes para com parentes e visitantes.
158
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Tatiana Domingues Scopel # Marcos Baptista Lopez Dalmau # Maria Luciana Biondo Silva
No estudo de Benatti e Nishide (2000), 4% dos trabalhadores mencionaram
ter sido agredidos, ao passo que em inquérito realizado na Inglaterra e no País
de Gales, o abuso verbal cometido por pacientes e parentes contra enfermeiros
ocorreu, respectivamente, em 87% e 74% dos hospitais. Contra médicos, os
números são, respectivamente, 65% e 59%.
Quanto ao PSF nas Unidades Básicas de Saúde, o estresse psicológico
gerado ocorre em decorrência da falta de compreensão e de paciência da
população ao funcionamento do sistema. Os profissionais preconizam o
atendimento pautado nos ideais preventivos do PSF; contudo, os usuários são
orientados pela lógica da necessidade. Essa dificuldade em compreender a
proposta do PSF compromete a aceitação da população que requer da equipe atendimento curativo, não valorizando o trabalho educativo e preventivo,
tendo em vista que isso minimiza o tempo destinado ao atendimento clínico.
Pesquisas apontam que a presença do PSF não supre a demanda dos usuários
que requerem um maior número de consultas e de profissionais para o atendimento, impingindo pressão por agilidade para a realização das consultas.
Isso cria atrito entre funcionários e usuários ávidos por atendimento, gerando
filas de espera e revolta para os usuários e estresse físico e emocional para
os funcionários que não conseguem suprir a demanda, favorecendo o aparecimento de doenças relacionadas ao trabalho, já mencionadas no item 4.1.
4.6 Falta de Amparo dos Gestores
A dificuldade de relacionamento com gestores também é outro fator
relacionado à QVT e relatado pelos profissionais das Unidades Básicas de
Saúde. Segundo Oliveira e Albuquerque (2008), os gestores de saúde têm
suas avaliações baseadas em aspectos operacionais como condições inadequadas de trabalho, insuficiência de capacitações e sistema de referência
ineficiente. A falta de uma liderança positiva gera ressentimentos e resistência,
com profissionais insatisfeitos atendendo de má vontade e com hostilidade.
Condições efetivamente dignas de trabalho, formas benéficas de comunicação,
alianças entre equipes de saúde, espírito crítico e questionador, entre outras
necessidades, são compatíveis e essenciais para o cumprimento de obrigações
do profissional para com a vida, a saúde e a doença da sociedade. Segundo
o Ministério da Saúde, Portaria n. 1.339/GM de 18 de novembro de 1999,
o desacordo entre patrão e colegas de trabalho gera “Neurose Profissional”,
contribuindo para que o trabalhador não encontre a QVT no trabalho, prejudicando a função exercida por ele.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
159
Qualidade de Vida no Trabalho: enfoque no ambiente de trabalho das Unidades Básicas de Saúde
Outra questão apontada como responsabilidade da gestão do PSF foi
a insuficiência de recursos humanos com perfil de PSF. Essa necessidade
deve ser suprida por meio de capacitações e de treinamento voltados para a
prevenção e para os atendimentos domiciliares, preconizados pelo programa.
Uma boa relação de comunicação entre gestor e trabalhador contribui para que todos os fatores supracitados não sejam subjugados, trazendo
consequências negativas à população e ao trabalhador. É importante que os
gestores não deixem de lado o fator humanitário e deve-se criar uma cultura
solidária e de responsabilidades para com todos os seres humanos, bem como
para com o sistema em si.
5 Considerações Finais
Percebe-se, nesse contexto, que o nível de satisfação profissional vem
se tornando fator essencial e determinante para melhorar o atendimento à
população. De acordo com Miranda et al. (2006), a preocupação com a QVT
é algo que está ligado à produtividade da instituição. Funcionários satisfeitos e
motivados são mais comprometidos com o trabalho e, com condições ótimas
de saúde aliada a um ambiente saudável, chega-se à qualidade produtiva
pretendida, pois cabe aos gestores reunir esforços para que os profissionais
sejam capazes de proporcionar um atendimento adequado num ambiente
harmonioso e não estressante. Dessa maneira, a melhoria das condições de
trabalho refletirá na assistência da enfermagem ao paciente e na qualidade de
vida de seus sujeitos. No entanto, o que se observa é que o trabalhador fica
distante de seus familiares e de situações da vida particular por jornadas longas
ou entre dois ou três empregos, tornando-se alienado, irritado e estressado.
Desse modo, afasta-se do convívio social, direcionando a maior parte de seu
tempo às atividades profissionais, deixando de lado questões subjetivas e
passando a ver o trabalho num primeiro plano, sem perceber os prejuízos que
está acumulando não apenas para si, mas também para sua família e para
seus relacionamentos. A relação entre profissional e paciente e/ou entre os
próprios profissionais colegas pode gerar conflitos mais ou menos evidentes e
atenuados, o que dependerá da pressão, da dominação e do rigor hierárquico
formando a tônica do funcionamento das equipes de saúde.
As reflexões sobre qualidade de vida deveriam ser permeadas não somente por condições para a qualidade do trabalho, mas por estratégias para
modificar, melhorar ou programar ações para garantir condições adequadas
e atendimento profissional competente, eficiente e responsável. Deve-se
160
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Tatiana Domingues Scopel # Marcos Baptista Lopez Dalmau # Maria Luciana Biondo Silva
considerar fundamental a realização de ações para satisfazer um conjunto de
necessidades tanto dos pacientes como dos integrantes da equipe de profissionais que estão atuando nas Unidades Básicas de Saúde, visando conter
os pedidos de exoneração, a rotatividade de profissionais e o absenteísmo
devido aos problemas de saúde, por meio de medidas que promovam a QVT.
Entre elas, é possível citar a contratação de novos profissionais e a valorização
deles, a redução das jornadas de trabalho, um suporte eficiente dos gestores,
a conscientização da população quanto às regras de funcionamento das Unidades Básicas de Saúde e o estímulo à aquisição de hábitos de vida saudáveis
como alimentação, atividade física frequente, descanso e lazer.
Observa-se também a importância de medidas de melhoria no ambiente
de trabalho, com unidades com espaço físico adequado e materiais em bom
estado para atender às necessidades da população, pois, se é no ambiente de
trabalho que se passa a maior parte da vida, esse deve ser um local aprazível
e saudável, onde se possa viver, criar e trabalhar com satisfação, alegria e
qualidade de vida.
Diante disso, é inegável que o trabalho tenha relevante significado na
qualidade de vida do profissional da área da saúde, pois direciona o estilo de
vida adotado por ele e por sua família. O ambiente de trabalho – e o próprio
trabalho – tem importância singular para os profissionais da área da saúde,
uma vez que quando se atribui valores positivos a ele, cria-se uma possibilidade
de melhoria da condição de vida.
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
165
Avaliação do Serviço de Odontologia: estudo
em um Centro de Saúde de Florianópolis/
SC, em 2011
Aluna: Ana Cristina Gerent Petry Nunes1
Orientador: Rogério da Silva Nunes2
Tutora: Isadora de Souza Bernardini3
Resumo
Abstract
O presente estudo de caso buscou descrever
como ocorre o acesso ao serviço odontológico no bairro Saco Grande do Município de
Florianópolis/SC. A coleta de dados foi realizada por meio de observação participante e de
análise de documentos extraídos do sistema
Info-saúde utilizado no Centro de Saúde de
Florianópolis. Os dados mostraram que no
período observado o número total de consultas realizadas foi de 13.510. Com o propósito
de identificar o número de encaminhamentos
solicitados observou-se um total de 333 encaminhamentos, equivalente a 2,4% do total das
consultas e, assim, identificou-se que a atenção
básica neste bairro consegue ser resolutiva nos
casos atendidos.
This case study aims to describe how is access
to dental care in Saco Grande neighborhood
of the city of Florianopolis/SC. Data collection
was through participant observation and analysis of documents obtained from the system
used in INFO-SAÚDE Health Center of Florianópolis. The data showed that the observed
period the total number of visits was 13,510. In
order to identify the number of referrals requested we observed a total of 333 referrals, equivalent to 2.4% of all queries, and so identified
that primary care in this neighborhood can be
in resolving cases treated.
Key words: Oral Health Team. Access.
Flow. Family Health Strategy.
Palavras-chave: Equipe de Saúde Bucal.
Acesso. Fluxo. Estratégia Saúde da Família
(ESF).
1
Doutora em Odontologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (2007). E-mail:
[email protected].
2
Doutor em Administração pela Universidade de São Paulo (1998). E-mail: rogerionunes@
cse.ufsc.br.
3
Mestre em Administração pela Universidade Federal de Santa Catarina (2012). E-mail:
[email protected].
Ana Cristina Gerent Petry Nunes # Rogério da Silva Nunes # Isadora de Souza Bernardini
1Introdução
Historicamente, o serviço de odontologia tem base curativa em que o
cirurgião dentista atuava somente após a doença instalada (REIS et al., 2009).
Pouca atenção era dada aos casos em que a pessoa procurava o centro de
saúde para simplesmente fazer a manutenção da saúde bucal. Essa situação
mudou com medidas de promoção de saúde bucal, como a fluoretação das
águas, e com a incorporação do cirurgião-dentista nas Estratégias de Saúde
da Família (ESF). (SOARES et al., 2011)
Focar na família é a base da ESF. Quando foi criada em 1994, a ESF
buscava dinamizar o SUS e suas leis orgânicas, Leis n. 8.080 e 8.142, ambas
de 1990. Pois é na família que se originam e se reforçam hábitos e valores.
Mas, foi somente no ano de 2000, com a publicação da Portaria n. 1.444,
que a equipe de saúde bucal foi introduzida na ESF. (SOARES et al., 2011;
OLIVEIRA; SALIBA, 2005)
Um estudo de Barros e Bertoldi (2002) mostra que há grandes desigualdades no acesso aos serviços de saúde. O grupo mais pobre apresentou uma
tendência de redução de acesso com a idade, contrária à tendência global
observada. Isso provavelmente é explicado pela diferença de financiamento
no atendimento: enquanto nos grupos mais favorecidos uma idade maior
propicia mais recursos para o pagamento do atendimento, no grupo mais
pobre, esse avanço na idade acaba por reduzir a oportunidade de acesso ao
sistema público.
O Programa Saúde da Família (PSF) é uma estratégia para a organização
da atenção básica que tem por objetivo a implementação da vigilância à saúde,
por meio de um conjunto de ações individuais e coletivas, voltadas para a
promoção, prevenção e tratamento dos agravos à saúde.
Em 2011, Florianópolis contava com uma população estimada de
421.240 habitantes, dados do censo de 2010 (IBGE, 2010) e uma rede de
atendimento à saúde estruturada composta por 49 Centros de Saúde. As
equipes de Saúde Bucal da Saúde da Família foram instituídas no município
a partir de agosto de 2004, como consta no Protocolo de Atenção à Saúde
Bucal. (FLORIANOPOLIS, 2012a)
O número de cirurgiões-dentistas da rede municipal de Florianópolis era
de 124 em dezembro de 2011, sendo 107 trabalhando nas diversas unidades
de saúde – Centros de Saúde, Unidade de Pronto Atendimento e Centro de
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
167
Avaliação do Serviço de Odontologia: estudo em um Centro de Saúde de Florianópolis/SC, em 2011
Especialidades Odontológicas, em atendimento clínico à população. A relação cirurgião-dentista/população em 2011 foi de um cirurgião-dentista para
cada 3.936 habitantes. (FLORIANÓPOLIS, 2012a). Um estudo realizado em
Pompéu/MG indicava uma proporção de um cirurgião-dentista para 1.700
habitantes, mostrando uma relação bem mais favorável. (ANDRADE; FERREIRA et al., 2006)
Assim, com esse estudo de caso busca-se analisar as consultas odontológicas no Centro de Saúde Saco Grande, no Município de Florianópolis,
no período de 12 meses, entre os dias 1º de junho de 2010 até 1º de junho
de 2011, para conseguir quantificar as primeiras consultas odontológicas
por área no Centro de Saúde Saco Grande, no período, além de conhecer o
número de procedimentos realizados comparando com o número de tratamentos completados; identificar o número de faltas a consultas agendadas e
conhecer o número de consultas de urgências realizadas; e avaliar o número
de encaminhamentos solicitados para atenção especializada para saber se a
atenção básica consegue ser resolutiva na sua prestação de serviço.
2 Serviço Odontológico e a Saúde Pública no Brasil
No Brasil, a cárie dental ainda é o principal fator etiológico para perda do
elemento dentário (FERREIRA et al., 2006). No estudo de 2002-2003, Projeto
SB Brasil, um levantamento epidemiológico da saúde bucal em crianças de
12 anos de idade, observou-se que 70% já apresentavam cavidades de cárie
dentária; e em adolescentes, entre 15 a 19 anos, esse valor subia para 90%.
Esse mesmo estudo no ano de 2010, já observou melhoras nas condições bucais. O primeiro estudo nacional, realizado em 16 capitais em 1986,
mostrou um CPO (Cariados/Perdidos/Obturados) aos 12 anos de 6,7, ou seja,
aproximadamente, sete dentes afetados pela doença, sendo que a maioria
dos dentes ainda estava sem tratamento. Em 2003 foi realizado o primeiro
inquérito de saúde bucal que incluiu além de todas as 27 capitais, os municípios do interior das cinco regiões, pesquisa que ficou conhecida como Projeto
SB Brasil 2003. Naquele estudo, o CPO aos 12 anos foi igual a 2,78; e nesta
pesquisa de 2010, o CPO aos 12 anos ficou em 2,07, correspondendo a
uma redução de 26,2% em sete anos. Considerando o componente do CPO
relativo especificamente aos dentes não tratados (cariados), a redução foi de
mesma magnitude (de 1,62 para 1,21).
168
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Ana Cristina Gerent Petry Nunes # Rogério da Silva Nunes # Isadora de Souza Bernardini
Entre os adolescentes de 15 a 19 anos, a média de dentes afetados foi
de 4,25, mais do que o dobro do número médio encontrado aos 12 anos.
Essa evolução do CPO entre a infância e a adolescência tem sido um achado comum em outros estudos no Brasil e no mundo. Esse dado leva a uma
reflexão sobre a cobertura prioritária oferecida à criança e sobre a resultante
epidemiológica da interrupção dessa assistência no fim do ciclo escolar. (LEAL;
TOMITA, 2006; ROCHA; GOES, 2008)
Os resultados do Projeto SB Brasil 2010 indicam que, segundo a classificação adotada pela OMS, o Brasil saiu de uma condição de média prevalência de cárie em 2003 (CPO entre 2,7 e 4,4), para uma condição de baixa
prevalência em 2010 (CPO entre 1,2 e 2,6). A evidência disponível indica
que a maior parte da redução desses danos se deve à utilização de flúor (em
cremes dentais e na água) e à melhora das técnicas de higiene bucal. Já os
serviços especializados, sejam curativos ou preventivos, não tiveram grande
impacto. (BARROS; BERTOLDI, 2002)
Algumas das atividades de prevenção da atenção básica incluem profilaxias, aplicação de flúor gel, restaurações dentárias e extrações. No ano de
2008 foram realizados mais de 140.000 procedimentos odontológicos pelos
85 cirurgiões-dentistas dos Centros de Saúde. (FLORIANÓPOLIS, 2012a)
A gestão em saúde bucal está sempre buscando melhorar e ampliar o
acesso da população aos Postos de Saúde. Assim, dados de índice epidemiológico de cárie dentária em escolares de 6 a 12 anos obtidos de acordo com
as normas da OMS (Organização Mundial de Saúde) demonstram a situação
de Saúde Bucal das crianças de Florianópolis aos 12 anos de idade: em 1995,
o índice de cárie dentária – CPO aos 12 anos de idade era de 2,71; em 2003,
no Levantamento Epidemiológico SB 2003, o índice CPO para a Região Sul
foi de 2,31; em 2008 foi realizado inquérito de cárie dentária aos 12 anos de
idade do município de Florianópolis/SC e os resultados mostraram índice CPO
igual a 0,77. Os resultados do SB Brasil 2010 – Levantamento das Condições
Bucais da População Brasileira, divulgados em outubro de 2011 e disponíveis
em: <www.saude.gov.br/bucal>, demonstram que Florianópolis é a capital
brasileira com menor índice de cáries aos 12 anos, com índice CPO de 0,77,
com 68,4% dos indivíduos dessa faixa etária livres de cárie, bem acima da
média nacional, que é de 46,6%. (FLORIANÓPOLIS, 2012b)
Para Baldani (2010), a inclusão da Equipe de Saúde Bucal na ESF e
a atual Política Nacional de Saúde Bucal (Brasil Sorridente) tem um objetivo
maior que é o de romper com o modelo assistencial tradicional, centrado no
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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Avaliação do Serviço de Odontologia: estudo em um Centro de Saúde de Florianópolis/SC, em 2011
atendimento a grupos prioritários (crianças em idade escolar) e urgências,
ampliando para toda a população o acesso aos serviços odontológicos de
adultos e idosos de baixa renda, minimizando demanda reprimida e perdas
dentárias prematuras. (BALDANI, 2010)
Em estudo de 2008, Rocha e Goes (2008) observaram não haver associação entre residir em área coberta pela ESF ou não coberta com acesso aos
serviços de saúde bucal. O que chama atenção é que, ao ajustar os fatores
de confusão na análise logística, essa proporção de acesso maior nas áreas
não cobertas pela ESF, detectada na análise bivariada, deixou de ser maior
quando ajustada por renda e escolaridade. (ROCHA; GOES, 2008)
Barros e Bertoldi (2002) verificaram diferença entre o acesso aos serviços
de saúde e os diferentes grupos de renda, observando ainda que o número
de atendimentos realizados era 16 vezes maior entre os mais pobres; porém,
eles utilizaram três vezes menos o serviço de saúde do que os mais ricos, demonstrando que a falta de cuidados com a saúde bucal quando necessitava
de atenção apresentava mais dentes envolvidos, com muito mais necessidades
de tratamento.
Já no estudo qualitativo em Grão Mogol, cidade do norte de Minas Gerais, com base em entrevistas semiestruturadas, na avaliação dos usuários, o
acesso é influenciado por diversos fatores: distância ausência de infraestrutura,
ausência de serviços, qualidade de atendimento e presença de vagas, fatores
que dificultam a acessibilidade aos serviços e, consequentemente, a resolução
dos problemas bucais. (REIS et al., 2009)
Assim, o processo saúde/doença extrapola a concepção biológica e
assume significados que são colocados como expressão da vida cotidiana,
possuindo inserção contextual, com bagagem cultural, social e pessoal, incluindo trabalho, salário, relações sociais, vida espiritual e moral.
3 Metodologia
Este estudo de caso teve como metodologia a busca ativa de dados
por meio de observação participante e de análise de documentos extraídos
do sistema Info-saúde utilizado nos Centros de Saúde de Florianópolis/SC.
Com a finalidade de delimitar o campo de investigação, optou-se por
estudar somente um Centro de Saúde (CS) do município, caracterizando-
170
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Ana Cristina Gerent Petry Nunes # Rogério da Silva Nunes # Isadora de Souza Bernardini
-se como estudo de caso descritivo. A pesquisa se caracteriza como análise
quantitativa.
A amostra analisada corresponde aos moradores do bairro Saco
Grande, aproximadamente 13.221 (IBGE, 2010), que acessaram o CS Saco
Grande entre junho de 2010 e junho de 2011. A coleta do corpus ocorreu
pela observação sistemática de dados do sistema Info-saúde, tendo como
fatores limitantes da pesquisa o fato de ser trabalho descritivo com consulta
de dados colocados no Info, podendo haver falhas no preenchimento correto
do prontuário da paciente.
4 Centro de Saúde Saco Grande
O Centro de Saúde (CS) Saco Grande é uma organização pública e
gratuita localizada na Rua Virgílio Várzea, s/n, em Florianópolis, com funcionamento das 8h às 12h e das 13h às 22h. Atende moradores dos bairros Saco
Grande e Monte Verde (aproximadamente 13.221 pessoas, segundo dados
de 2012 do IBGE, e 12.305 pessoas segundo dados do CADFAM) e possui
como colaboradores 75 funcionários, conforme dados de 2010.
O bairro Saco Grande é dividido em seis áreas (quatro delas consideradas de risco social), com seis Equipes Saúde da Família (ESF). Cada conjunto
de ruas do bairro (chamado de área) tem uma equipe responsável composta
por um médico, um enfermeiro, um cirurgião-dentista (com auxiliar de higiene
dental), um técnico de enfermagem e alguns Agentes Comunitários de Saúde. Essas equipes contam com o apoio técnico-pedagógico e assistencial de
uma equipe multiprofissional especializada (psicólogo, nutricionista, pediatra,
farmacêutico, psiquiatra, educador físico e assistente social).
As atividades realizadas no Centro de Saúde englobam atendimentos
individuais, atividades de grupo, atividades intersetoriais, visitas domiciliares e
reuniões de equipe. Muitas atividades em grupo são ali desenvolvidas, como:
Grupo de Relaxamento, Floripa Ativa (atividade física), Grupos de Puericultura, Grupos de Gestantes, Grupo Odontologia (crianças até 10 anos), Grupo
Viva a Vida (idosos), Grupo de Emagrecimento, Grupo para Pessoas com Dor
Crônica, Grupo de Acolhimento e Apoio Psicológico, Grupo Mulheres Maravilhosas (terapia ocupacional), Grupo Amanhecer (para pessoas que usam
medicação controlada – psicotrópicos) e Grupo para Fumantes, dentre outros.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
171
Avaliação do Serviço de Odontologia: estudo em um Centro de Saúde de Florianópolis/SC, em 2011
O CS Saco Grande mantém um modelo porta-aberta, a partir de modelos da Atenção Primária em Saúde e Política Nacional de Humanização
do Ministério da Saúde, com acesso facilitado e organizado para todos, na
lógica da territorialização com adscrição de clientela, tanto para demanda
programada como para a demanda espontânea. (PROGRAMA SAÚDE DA
FAMÍLIA, 2000)
A marcação de consultas com médicos, enfermeiros e dentistas, ocorre
por telefone, e-mail, ou pessoalmente no centro de saúde no início do período
com Agentes Comunitárias de Saúde (ACS), sendo as vagas ofertadas no máximo para sete dias. Os Agentes Comunitários funcionam como ligação entre
a ESF e as famílias, além do que, residem no mesmo bairro onde trabalham,
favorecendo o vínculo com a comunidade e a abordagem pelos componentes ESF (OLIVEIRA; SALIBA, 2005). A demanda espontânea é atendida no
mesmo período em que chega ao Centro de Saúde, com o acolhimento da
população repassando orientações e condutas. Quem faz a triagem para passar
os pacientes aos médicos são os técnicos de enfermagem e os enfermeiros; e
os auxiliares de saúde bucal para os dentistas.
No ano de 2011, cada equipe cadastrou um celular para receber chamadas e, assim, possibilitar marcação de consultas ou responder a dúvidas de
usuários da unidade de saúde. No mesmo período, cada equipe disponibilizou
e-mail com o intuito de oferecer outra forma para a população registrar suas
dúvidas e ter acesso a consultas agendadas. Para isso funcionar bem, em todos
os consultórios há computadores com acesso à internet, inclusive com Google
talk, o que possibilita interconsultas entre enfermeiros e médicos. Todo esse
empenho da equipe que trabalha na ESF no CS Saco Grande visa minimizar o
que a maior parte dos artigos em revisão de literatura questiona: a dificuldade
de acesso às consultas agendadas, como a necessidade de permanecer em
filas desde a madrugada para ingressar no tratamento. (MOREIRA et al., 2005)
Para conseguir engrenar esse sistema de ampliação de acesso, toda ESF
divide tarefas, assim os agentes de saúde ficam responsáveis pelas demandas
de marcação por telefone, e a demanda via e-mail é dividida entres os demais
profissionais, tudo para aperfeiçoar o acesso mais humano para a população e
para ser resolutivo. Além disso, esse procedimento oferece trabalho em equipe
na construção do plano terapêutico do paciente e de sua família. Esse processo
de trabalho é bem-visto pela gestão, uma vez que diminui a fila na frente do
CS para marcação de consultas, pois conforme depoimentos de gestores no
estudo de Leal e Tomita (2006), quando se referem à efetividade, a fila de
172
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Ana Cristina Gerent Petry Nunes # Rogério da Silva Nunes # Isadora de Souza Bernardini
usuários aguardando pelo atendimento surge como o mais forte indicador
(negativo) presente no cotidiano dos serviços de saúde. No estudos relata-se
ainda que há uma prática histórica marcada por baixa eficiência e por resolutividade, mas que há, sim, uma consciência de que é necessário melhorar,
aprimorar e ampliar esses serviços.
4 Resultados
Os dados mostraram que, no período entre 1º/06/2010 e 1º/06/2011, o
número total de consultas odontológicas realizadas foi de 13.510, lembrando
que esse número engloba todas as consultas realizadas, o que pode variar de
acordo com as necessidades de cada paciente: para uns há resolutividade em
uma ou duas consultas, outros precisam de mais atendimentos com seis ou
sete consultas agendadas. As consultas separadas por profissional cirurgião-dentista apontam: na área 330 foram 3.588; na área 331, 2.473; na área
332, 2.853; na área 333, 2.335; e na área 335, 2.261, sendo que a área 334,
é uma área descoberta, sem cirurgião-dentista atualmente, o que inviabiliza
saber em números, pois os dados que foram coletados são gerados a partir do
profissional e não por área. O que acontece é que todos os dentistas acabam
disponibilizando um pouco de vagas para atendimento dessa população, que
acaba sendo prejudicada pelo fato de não haver equipe completa para atendimento. De acordo com os dados populacionais, há uma equivalência em
relação ao número de consultas e o número da população do bairro (13.221
– IBGE, 2010); assim, pode-se estimar um atendimento/ano por habitante
no bairro (Quadro 1).
Número de ha- Número total de Primeira consul- Número de tratabitantes – IBGE consultas odon- ta odontológica mentos comple2010
tológicas
programática
tados
13.221
13.510
2.388
1.322
Quadro 1: Dados CS Saco Grande no período entre 1º/06/2010 e 1º/06/2011
Fonte: Info-Saúde (2012)
O número de consultas para primeira consulta odontológica programática
foi de 2.388 realizadas. Em relação ao número de tratamentos completados,
dos que começaram e finalizaram o tratamento, obteve-se um total de 1.312
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
173
Avaliação do Serviço de Odontologia: estudo em um Centro de Saúde de Florianópolis/SC, em 2011
pessoas. Assim, observou-se uma taxa de 54% dos que iniciam e chegam a
finalizar os procedimentos necessários para obter saúde bucal.
O número de procedimentos realizados corresponde a 21.650, sendo
que esses valores são maiores do que as consultas realizadas, porque em
uma única consulta é possível realizar mais de um procedimento, como duas
restaurações, ou sessão de profilaxia e aplicação de flúor, etc.
Ao identificar o número de faltas a consultas agendadas, observou-se
um total de 796 faltas no período, o que equivale a 5,8% sobre o total de
consultas. O que justifica é que, muitas vezes, o paciente resolve o que lhe
incomoda e não retorna para sanar outros problemas odontológicos, e quando ele falta a uma consulta sem justificar, conclui-se que não há interesse em
continuar o tratamento.
Ao conhecer o número de consultas de urgências realizadas relaciona-se que o paciente procura o serviço quando apresenta dor, e entende-se que
esses pacientes são aqueles que não procuram agendamento de consulta por
falta de tempo ou porque são desinformados quanto à forma de acesso. Normalmente, eles são recém-moradores no bairro e são orientados em relação às
marcações e às condutas no bairro. O número observado foi de 1.004 pessoas
atendidas na urgência, que equivalem a 7,4% dos atendimentos.
Número de haNúmero total de con- Número de
Número de Número de encami– IBGE
sultas odontológicas
faltas
urgências
nhamentos
2010
13.221
13.510
796
1.004
333
bitantes
Quadro 2: Dados CS Saco Grande no período entre 1º/06/2010 e 1º/06/2011
Fonte: Info-Saúde (2012)
Em estudo realizado na Bahia, foi verificada grande deficiência da
atenção básica na execução de higiene bucal supervisionada na cadeira odontológica, pois apenas 8,9% dos usuários relataram ter realizado esse tipo de
ação nesse nível de assistência. Tal evidência pode repercutir negativamente
no alcance da integralidade pretendida, integração entre níveis ou entre ações
promocionais e reabilitadoras, o que requer boa cobertura da atenção primária
para permitir a interface e a utilização adequada dos serviços de saúde bucal.
Essa utilização, por sua vez, pode também ser influenciada pela acessibilidade aos serviços, entendida como relação entre os obstáculos impostos pelos
serviços e os usuários para superarem tais dificuldades. Entre os fatores do
serviço associados à maior utilização, é possível observar a oferta adequada
174
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Ana Cristina Gerent Petry Nunes # Rogério da Silva Nunes # Isadora de Souza Bernardini
de procedimentos segundo as necessidades populacionais, a acessibilidade
geográfica e organizacional, além da definição de um profissional de saúde
para o acompanhamento de cada caso, especialmente para procedimentos
especializados. (CHAVES et al., 2010)
Com o propósito de identificar o número de encaminhamentos solicitados observa-se um total de 333 encaminhamentos, equivalente a 2,4% do
total das consultas; e assim identifica-se que a atenção básica consegue ser
resolutiva na maioria dos casos.
5 Conclusão
Assim, espera-se que informações disponibilizadas neste trabalho se
corporifiquem em mais um instrumento de gestão nos diversos níveis do
SUS, especialmente na Secretaria Municipal de Saúde da PMF e contribuam para a melhoria da atenção à saúde e da qualidade de saúde bucal dos
moradores do bairro e do município. Como toda organização pública, esta
que foi pesquisada carece de recursos financeiros para ampliar a quantidade
e a qualidade dos atendimentos oferecidos à população. O bairro do Saco
Grande apresenta áreas de interesse social e deve ser prioridade na alocação
de recursos municipais. As dificuldades encontradas evidenciam a necessidade
de ampliação da área física do CS e do número de profissionais, devido ao
crescimento desenfreado da população do bairro. A implantação do sistema
informatizado contribuiu para a otimização do serviço. A população necessita
de maior acesso aos serviços, e o sistema deve ser o mais resolutivo possível.
Para que o atendimento seja eficiente, é imprescindível que as equipes multidisciplinares estejam completas e trabalhando de forma integrada, não somente
na resolução de enfermidades como também nos trabalhos de prevenção em
escolas e creches. Assim, será possível oferecer um serviço de qualidade e
atingir o objetivo de 80% de resolutividade dos problemas na Atenção Básica.
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
177
Em Busca da Interdisciplinaridade: o trabalho
multiprofissional na gestão pública em saúde
para a construção do Sistema Único de Saúde
(SUS)
Aluna: Débora Previatti1
Orientador: Eduardo Lobo2
Tutora: Juliana Pereira3
Resumo
Abstract
O presente artigo tem como objetivo discutir a
questão do trabalho multiprofissional e a interdisciplinaridade no Sistema Único de Saúde (SUS).
Para tanto, realizou-se uma revisão bibliográfica,
abordando aspectos-chave para o debate, como
a criação e a estruturação do SUS, o surgimento
da Estratégia Saúde da Família e sua importância
para a valorização do trabalho interdisciplinar na
Saúde Pública no Brasil. São abordados também
os conceitos de autores centrais para o debate da
interdisciplinaridade e transdisciplinaridade no
SUS, como Edgar Morin, Cecília Minayo e Gastão Wagner. Traz-se para discussão também o
fato de, ao longo do tempo, ter havido iniciativas
tanto no sentido de promover a interdisciplinaridade, como a criação dos Núcleos de Apoio à
Saúde da Família, assim como outras que foram
de encontro a esta ideia, como a busca pela regulamentação do ato médico.
This article aims to discuss the issue of multidisciplinary and interdisciplinary work in the
Unified Health System (SUS). Therefore, we
carried out a literature review, addressing central aspects to the debate as the creation and
structuring of SUS, the emergence of the Family Health Strategy and its importance to the
enhancement of interdisciplinary work in Public Health in Brazil. It also takes the concepts
of central authors to the discussion of interdisciplinarity e transdisciplinarity in SUS, as Edgar
Morin, Cecilia Minayo and Gastão Wagner.
Brings up for discussion also the fact that, over
time, have been both initiatives to promote interdisciplinarity, such as the creation of Núcleos
de Apoio à Saúde da Família, as well as others
who were against this idea, as the search for
the regulation of medical act.
Key words: Interdisciplinarity. Public Health.
Palavras-chave: Interdisciplinaridade. Saúde Family Health Strategy.
Pública. Estratégia Saúde da Família (ESF).
1
Especialista em Saúde Pública, com ênfase em Saúde da Família, pelo programa de
Residência Multiprofissional em Saúde da Família da Universidade Federal do Paraná (2007).
E-mail: [email protected].
2
Pós-Doutor na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) em Educação e
Novas Tecnologias (2010). Doutor em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de
Santa Catarina (2002). E-mail: [email protected].
3
Especialista em Gestão de Pessoas nas Organizações e Bacharel em Administração pela
Universidade Federal Santa Catarina (UFSC). E-mail: [email protected].
Débora Previatti # Eduardo Lobo # Juliana Pereira
1Introdução
O Sistema Único de Saúde (SUS) foi criado a partir de discussões ocorridas na 8ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em março de 1986,
evento que foi um marco para a construção do SUS, pois foi a primeira vez
em que a população participou das discussões sobre saúde. A partir dela
modificações relativas ao setor saúde foram feitas na Constituição de 1988,
além de ser responsável pelo surgimento da Lei Orgânica de Saúde (Lei n.
8.080, de 1990), a qual rege o SUS (BRASIL, 2012).
O SUS contempla ações e serviços de saúde prestados por instituições
e órgãos públicos federais, estaduais e municipais, da administração direta e
indireta e de fundações mantidas pelo poder público. O SUS representa uma
nova concepção de saúde no país e apresenta, dentre os seus princípios doutrinários e organizativos: universalidade, equidade, integralidade, descentralização político-administrativa, resolutividade, regionalização e hierarquização,
além da participação popular. (BRASIL, 1990)
Com as mudanças nas formas de ver, pensar e de fazer saúde, presentes
no processo de origem do SUS, ocorre uma mudança de olhar na medicina,
que antes via o indivíduo somente sob o foco da biologia, para então passar a reconhecer seus aspectos culturais, sociais e econômicos na atuação
em saúde na população. Diante dessa necessidade, surge a necessidade da
busca da interdisciplinaridade (MATUMOTO; MISHIMA; PINTO, 2001) que,
segundo Minayo (2010) consiste em uma articulação entre várias disciplinas
tendo como foco o objeto, o problema ou o tema complexo, para o qual não
basta a resposta de uma só área. Trata-se, portanto, de uma estratégia para
compreender, interpretar e explicar temas complexos, que no caso do SUS,
é o usuário do sistema.
Campos (2000a) afirma que a institucionalização dos saberes e sua
organização em práticas ocorrem por meio da conformação de núcleos e
de campos. O núcleo seria uma espécie de reunião de conhecimentos em
um saber e a conformação de certo padrão concreto de compromisso com
a produção dos valores de uso. O núcleo seria responsável por demarcar a
identidade de uma área de saber e prática profissional e o campo, seria um
espaço de limites imprecisos, no qual uma disciplina ou profissão buscaria em
outras o apoio para executar suas tarefas teóricas e práticas.
O objetivo geral desta pesquisa é analisar como a proposta de interdisciplinaridade pode permear as políticas e as ações em saúde pública. Entre os
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
179
Em busca da interdisciplinaridade: o trabalho multiprofissional na gestão pública em saúde para a construção do
Sistema Único de Saúde (SUS)
objetivos específicos estão estes: problematizar o conceito de interdisciplinaridade; e contextualizar o papel do trabalho interdisciplinar em saúde no Brasil.
2 Exposição do Tema
2.1 O Sistema Único de Saúde (SUS)
O Sistema Único de Saúde (SUS) foi criado pela Constituição Federal
de 1988 e regulamentado pelas Leis n. 8.080/90 e n. 8.142/90, Leis Orgânicas
da Saúde. Sua criação teve como objetivo principal modificar o contexto de
desigualdade na assistência à Saúde existente até aquele momento. Foi um
marco na história da saúde pública brasileira: tornou obrigatório o atendimento público a qualquer cidadão e proibiu quaisquer cobranças de dinheiro.
(BRASIL, 2012)
Entre os estabelecimentos que fazem parte do Sistema Único de Saúde
encontram-se os Centros e Postos de Saúde, os hospitais, os laboratórios, os
hemocentros, os bancos de sangue, além de fundações e institutos de pesquisa,
como a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Instituto Vital Brazil. Por meio do
SUS, todos os cidadãos passaram a adquirir o direito à realização de consultas,
exames, internações e tratamentos nas Unidades de Saúde vinculadas ao SUS
das esferas tanto municipal, como estadual e federal, sejam elas privadas ou
públicas, contratadas pelo gestor público de saúde. (BRASIL, 2012)
O Sistema Único de Saúde (SUS) constitui o sistema público de saúde
vigente no Brasil. Antes da sua criação, a atenção à saúde apresentava caráter
curativista, centrada no profissional médico, e seguia o modelo assistencial
hospitalocêntrico. Após a sua criação, houve um redirecionamento das políticas públicas de saúde, as quais se consolidaram por meio de princípios que
passaram a organizar e a nortear a implantação do sistema: integralidade,
universalidade, equidade, regionalização, hierarquização, descentralização
administrativa e participação popular. (SANTOS; CUTOLO, 2003)
O Ministério da Saúde implantou em 1994 o Programa de Saúde da
Família (PSF). Tal programa estaria relacionado ao contexto da atenção primária à saúde, realizada nos Centros e Postos de Saúde. Dentre os critérios
para o seu funcionamento estava a atuação em saúde através de uma equipe
multiprofissional, composta inicialmente por médicos, enfermeiros e auxiliares
de enfermagem, a qual atuaria em uma população territorialmente definida
e com ênfase na promoção e prevenção da saúde, em detrimento de ações
180
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Débora Previatti # Eduardo Lobo # Juliana Pereira
curativas (BRASIL, 2000b). Tal programa, com o tempo, deixou de ser programa para transformar-se em uma estratégia de governo, pois se mostrou
bem adaptado à realidade sanitária do país. (SANTOS; CUTOLO, 2003)
A Estratégia Saúde da Família (ESF) vem se fortalecendo desde então
no dia a dia dos diversos centros de saúde do país. As equipes de Saúde da
Família esforçam-se para implantá-la buscando conservar os principais requisitos preconizados pela estratégia e exercer os princípios do SUS. Porém,
na atuação diária observam-se diversas dificuldades e contradições. Um dos
maiores desafios é o trabalho interdisciplinar, que será tratado aqui.
2.2 A Interdisciplinaridade
Não se sabe, em princípio, quais são as disciplinas que devem compor
uma abordagem interdisciplinar, pois quem as definirá será o próprio objeto,
a partir da sua complexidade. Nesse sentido, a interdisciplinaridade não pode
ser vista como “[...] uma camisa de força para juntar pessoas, e nem para
acomodar interesses [...]”, ela ultrapassa a multidisciplinaridade e a multiprofissionalidade e, ao mesmo tempo, conta com elas. (MINAYO, 2010, p. 436)
A interdisciplinaridade é colocada como questionadora dos mandatos
sociais e legais das profissões e das suas rígidas fronteiras de competências
exclusivas. Com isso, ela reforça a importância de mecanismos grupais e
institucionais na democratização da gestão dos serviços e na produção do
cuidado. (VASCONCELOS, 1997)
Segundo Vasconcelos (apud ALMEIDA FILHO, 1997), a interdisciplinaridade exige a identificação de uma problemática comum, levantando-se
uma axiomática teórico-política básica, e de uma plataforma de trabalho em
conjunto, na qual se estabelecem os princípios e os conceitos fundamentais.
Há um esforço para o entendimento desses conceitos, e isso gera “fecundação
e aprendizagem mútua”, a qual não ocorre pela simples adição ou mistura,
mas sim por uma recombinação dos elementos internos.
Para Gomes e Deslandes (1994), a interdisciplinaridade não anula a
disciplinaridade. Assim como não significa a justaposição de saberes, também
não anula a especificidade de cada campo de saber. Ela implica os envolvidos a
apresentarem uma consciência dos limites e das potencialidades de cada campo
de saber e, com isso, ocorre uma abertura em direção de um fazer coletivo.
Morin (2007) vai definir e destacar duas espécies de articulação entre
disciplinas: a interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade. Segundo ele, a
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
181
Em busca da interdisciplinaridade: o trabalho multiprofissional na gestão pública em saúde para a construção do
Sistema Único de Saúde (SUS)
interdisciplinaridade caracteriza-se por diferentes disciplinas reunidas, porém
cada uma afirmando seus próprios direitos e suas próprias soberanias em
relação às outras disciplinas. Pode também querer dizer troca e cooperação,
transformando-se, assim, em algo orgânico. Já a transdisciplinaridade seria
uma denominação mais ampla, definida como, em geral, composta de esquemas cognitivos que atravessariam as disciplinas. A transdisciplinaridade
seria uma reunião das redes complexas de inter, poli e transdisciplinaridade
que operaram e desempenharam um papel fecundo na história das ciências
(MORIN, 2007). Ou seja, mais do que unir diferentes disciplinas, o autor
propõe uma espécie de fusão de conhecimentos buscando a construção de
um novo, em conjunto.
Para Morin (2007) é importante observar em que meio as disciplinas
nascem, como colocam seus problemas e como se transformam. Afirma ele
que as disciplinas devem ser, ao mesmo tempo, abertas e fechadas – elas
devem se comunicar umas com as outras. Questiona para que serviriam os
conhecimentos isolados se não os confrontássemos uns com os outros, com
o objetivo de se formar uma configuração capaz de responder às nossas expectativas, necessidades e interrogações cognitivas. (MORIN, 2007)
Campos (2000b) acredita que se admite hoje que há uma inevitável existência de um certo grau de indefinição de limites entre as disciplinas. Para ele,
isso aconteceria igualmente com os campos de prática. Dessa maneira, quase
todo campo científico ou de práticas seria interdisciplinar e multiprofissional.
Diante desses pontos de discussão dos autores citados, percebe-se que
atuar interdisciplinarmente não constitui uma tarefa simples. Serão discutidos ,
a seguir, alguns aspectos desse tipo de trabalho na Saúde Pública no nosso país.
2.3O Trabalho Interdisciplinar no Contexto da Saúde Pública
no Brasil
O trabalho interdisciplinar como vimos até agora surgiu, de maneira mais
concreta, no Brasil, com a implantação, pelo Governo Federal, da Estratégia
Saúde da Família, em 1994. Porém, nem sempre foi dessa forma. O trabalho
interdisciplinar não era tão valorizado, pois girava em torno da figura do
médico, que era auxiliado por enfermeiros e por auxiliares de enfermagem.
Peduzzi (2001, p. 103) acredita que a proposta da realização do trabalho
em equipe na área da saúde tem ocorrido como estratégia para enfrentar o
intenso processo de especialização presente nesta área – processo que tem
182
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Débora Previatti # Eduardo Lobo # Juliana Pereira
tendência a “[...] aprofundar verticalmente o conhecimento e a intervenção
em aspectos individualizados das necessidades de saúde, sem contemplar
simultaneamente a articulação das ações e dos saberes”.
Um tema a ser abordado quando se fala de interdisciplinaridade na
saúde no Brasil é o “ato médico”. Em 1989 surge, pela primeira vez, o debate
sobre a necessidade de regulamentação do ato médico. A partir desse momento sucederam-se diversas discussões sobre o assunto. A ideia proposta ia
de encontro ao trabalho multiprofissional e interdisciplinar na Saúde Pública
no Brasil. Para Silva e Rocha (2008), longe de apresentar uma perspectiva
multidisciplinar,
[...] que alcançaria uma integração produtiva pelo viés de um
trabalho cotidiano, o apelo, de modo contrário, reside no fato
de que haja um profissional disposto a recolher tudo o que,
pretensamente, se acharia fora do contexto médico, produzindo
interferências nocivas ao bom andamento da ação médica prevista
sob a égide tecnicista. (SILVA; ROCHA, 2008, p. 70)
Na contramão disso, uma iniciativa contribuiu para a questão da interdisciplinaridade e o trabalho multiprofissional no SUS: foi a criação dos
Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF). O Ministério da Saúde criou
os NASFs mediante a Portaria GM n. 154, de 24 de janeiro de 2008. Foram
criados para apoiar a implantação da Estratégia Saúde da Família e com
o objetivo de ampliar a abrangência, a resolutividade, a territorialização, a
regionalização e a ampliação das ações da Atenção Primária à Saúde no
Brasil. Um NASF é composto por uma equipe, que apresenta profissionais de
diferentes áreas de conhecimento e atuam em conjunto com os profissionais
das equipes de Saúde da Família. Os profissionais do NASF deveriam, então,
agir como compartilhadores e apoiadores das práticas em saúde nos territórios
sob responsabilidade das equipes.
3 Metodologia
Para Chizzoti (2003), a pesquisa qualitativa hoje abrange um campo
transdisciplinar, dentro das ciências humanas e sociais, assumindo tradições
ou multiparadigmas de análise. O termo “[...] qualitativo implica uma partilha
densa com pessoas, fatos e locais que constituem objetos de pesquisa, para
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
183
Em busca da interdisciplinaridade: o trabalho multiprofissional na gestão pública em saúde para a construção do
Sistema Único de Saúde (SUS)
extrair desse convívio os significados visíveis e latentes [...].” (CHIZZOTI,
2003, p. 221)
A presente pesquisa trata-se de uma pesquisa qualitativa de revisão
bibliográfica sobre a questão do trabalho interdisciplinar no Sistema Único
de Saúde, visto como fator importante para a sua construção e, consequentemente, para a melhoria da saúde geral da população.
Para tal fim, foram levantados trabalhos de autores clássicos nesta área
de pesquisa como, internacionalmente, Edgar Morin, através da abordagem
da complexidade e a inter e transdisciplinaridade; e, no Brasil, Gastão Wagner
e Maria Cecília Minayo, que tratam, respectivamente, sobre a questão da gestão do trabalho interdisciplinar no SUS e sobre o seu conceito e possibilidade
de implantação nas práticas de saúde. Além disso, foram buscados artigos
científicos que tratam tanto sobre questões teóricas da interdisciplinaridade
como sobre as políticas e programas de governo com foco no tema. Outras
fontes utilizadas foram dados do Ministério da Saúde sobre políticas, ações e
programas relacionados à gestão do trabalho interdisciplinar no SUS.
4 Análise e Resultados
Como obstáculos ao trabalho interdisciplinar no SUS, podem ser identificados os obstáculos epistemológicos, os institucionais e os psicossociológicos
(GUSDORF apud GOMES; DESLANDES, 1994). Esses autores apontam
ainda, entre as dificuldades para a interdisciplinaridade
[...] (a) a forte tradição positivista e biocêntrica no tratamento
dos problemas de saúde; (b) os espaços de poder que a disciplinarização significa; (c) a estruturação das instituições de ensino e
pesquisa em departamentos, na maioria das vezes sem nenhuma
comunicação entre si; (d) as dificuldades inerentes a experiência interdisciplinar tais como a operacionalização de conceitos,
métodos e práticas entre as disciplinas. (GOMES; DESLANDES,
1994, p. 109)
Para Minayo (2010), a visão interdisciplinar foi devastada já, nos
primórdios, em Descartes, e ainda hoje sua filosofia predomina, já que o
pensamento teórico moderno passou a valorizar a compartimentalização da
ciência. Apesar de haver vertentes que desejam questionar e ultrapassar o
184
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Débora Previatti # Eduardo Lobo # Juliana Pereira
saber compartimentado, de maneira geral, a ciência permanece fragmentada,
unidisciplinarizada e voltada à especialização. (MINAYO, 2010)
A partir da divisão do trabalho, surgiram muitas ocupações. No campo
da Saúde passaram a existir diversas delas, das quais 13 foram reconhecidas
pelo Conselho Nacional de Saúde (2012) e enquadradas no setor, em 1997:
os assistentes sociais, os biólogos, os profissionais de Educação Física, os enfermeiros, os farmacêuticos, os fisioterapeutas, os fonoaudiólogos, os médicos,
os médicos veterinários, os nutricionistas, os odontólogos, os psicólogos e os
terapeutas ocupacionais. (GUIMARÃES, 2012)
Com a Estratégia Saúde da Família carregando entre seus princípios e
valores o da interdisciplinaridade, novas ocupações foram incluídas no processo
de trabalho da Atenção Primária. O olhar, que era centrado no profissional
médico, passou a considerar uma equipe de trabalho multiprofissional, que
incluía enfermeiros, auxiliares de enfermagem, odontólogos e auxiliares de
consultório odontológico. A variedade de profissionais aumentou, ainda, intensamente, com a criação dos NASFs, onde foram incluídas diversas profissões,
variando conforme a escolha dos gestores públicos.
Entretanto, como foi já apontado por Minayo (2010), apesar do crescente
número de profissionais atuando na Atenção Primária à Saúde, a ciência ainda
insiste em manter o conhecimento compartimentalizado. Assim, a interdisciplinaridade permanece, então, como um grande desafio à Saúde Pública. E
a transdisciplinaridade, então, ainda mais próxima da utopia.
Sobre a questão da especialidade das disciplinas se tornar um obstáculo
para a interdisciplinaridade, além do viés técnico, é possível um viés de análise
sobre a visão da Saúde Pública como um campo político, o qual se constitui
em um espaço de hegemonia de uma disciplina ou de articulação cooperativa
entre disciplinas. A Saúde Pública trata-se de um campo de correlação de
forças, intimamente relacionado com a consciência social e política presentes
no confronto das práticas. Há, hoje, uma inegável complexidade do objeto
de Saúde Pública. (GOMES; DESLANDES, 1994)
Bourdieu acredita que os agentes sociais apresentam relações de disputa pelo monopólio do poder de força social. A profissão, para o autor, no
saber científico, é uma “[...] construção social, produto de todo um trabalho
social de construção de grupo e de uma representação dos grupos [...]”, os
quais possuem um ritual próprio (BOURDIEU, 1998, p. 40). Para Foucault já
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
185
Em busca da interdisciplinaridade: o trabalho multiprofissional na gestão pública em saúde para a construção do
Sistema Único de Saúde (SUS)
se via a questão da luta pelo poder na Saúde visando o controle dos corpos
(FOUCAULT, 2001).
Logo, ao contrário do que acredita Minayo – que a interdisciplinaridade
não pode ser vista como “uma camisa de força para juntar pessoas, e nem
para acomodar interesses” – o campo da Saúde está repleto destes e há vários
exemplos de que há uma luta particular de cada “grupo de ocupações” em
vista dos seus próprios interesses, em detrimento da idéia da Saúde Coletiva
como um campo interdisciplinar. Um dos principais deles, como colocaram
Silva e Rocha (2008), foi o “ato médico”. Em virtude de manter (não de
conquistar) o controle sobre os corpos, e não perdê-los para as outras profissões da saúde, iniciou-se essa luta pelo ato médico, que visa não à inter ou à
transdisciplinaridade, mas à restrição da atuação de outros profissionais em
atividades que fazem fronteira com a área médica. Em contrapartida, essa ação
gerou nos outros profissionais de saúde uma reação, que não se caracteriza
também pela busca da interdisciplinaridade necessariamente. O discurso faz
referência a ela – pois só dessa forma estes profissionais seriam incluídos –
porém deseja-se, da mesma forma, a luta pelo monopólio do poder.
Isso foi observado na realização da busca por artigos científicos que
abordam aspectos relacionados aos resultados que vêm sendo obtidos com
o NASF na Saúde Pública: os artigos, em sua maioria, foram escritos por
profissionais de saúde e defendem claramente os interesses de cada ocupação
– psicólogos, fonoaudiólogos, farmacêuticos, educadores físicos – argumentando sobre aspectos relacionados às suas profissões no NASF.
5 Considerações Finais
Existem barreiras inúmeras para alcançar resultados, na Saúde Pública,
de trabalhos interdisciplinares. Dentre elas, há aquelas que envolvem o saber
científico, que apresenta, ainda hoje, caráter compartimentalizado, assim
como no que se refere às disputas políticas entre as diferentes disciplinas ou
ocupações, na luta pelo monopólio do poder.
O ato médico tem sido uma ação que vai de encontro à ideia de inter
e transdisciplinaridade na Saúde Pública e se constitui em um dos principais
exemplos de como as profissões buscam mais atender aos interesses dos
profissionais de uma mesma ocupação. Deseja-se aí preservar o monopólio
sobre o controle dos corpos, em detrimento das demais profissões. Observa-
186
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Débora Previatti # Eduardo Lobo # Juliana Pereira
-se também esse fenômeno na produção do saber científico pelas demais
profissões, no qual a abordagem sobre a multiprofissionalidade na Saúde
Pública, apesar de parecer ir ao encontro de uma interdisciplinaridade, como
os que abordam aspectos relacionados ao NASF, na realidade, tratam apenas
de questões relativas às suas próprias ocupações nesses cenários. A variedade
de profissionais que surgem com iniciativas como a criação dos NASF trouxe
a multiprofissionalidade, mas não necessariamente a inter e, muito menos, a
transdisciplinaridade.
A interdisciplinaridade é extremamente necessária para a Saúde Pública
dada a complexidade de seu objeto. Se atingida essa interdisciplinaridade, a
busca pela transdisciplinaridade deve ser a nova meta, na qual o conhecimento
ultrapassa o saber cartesiano e objetivo, e permite realmente compreender o
sujeito na sua complexidade.
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
189
Perfil das Ações Judiciais de Medicamentos
Atendidas até 2011 no Município de Palhoça –
Santa Catarina
Aluna: Camila Mirian da Silva1
Orientador: Luis Carlos Cancellier de Olivo2
Tutora: Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino3
Resumo
Abstract
A Constituição Federal de 1988 reconheceu o
direito à saúde como direito fundamental a ser
garantido pelo Estado aos cidadãos. Portanto,
é imprescindível a análise da contingência gerada pelo amplo acesso à saúde caracterizado
como direito universal e, especialmente, a celeuma da dispensação de medicamentos importante é a crescente judicialização da questão, que tem respingado sobremaneira nos
municípios, comprometendo o planejamento
de políticas públicas e onerando os cofres públicos. Assim sendo, o presente trabalho teve
por objetivo analisar o perfil das solicitações
de medicamentos por demanda judicial no
município de Palhoça – Santa Catarina até dezembro de 2011. O estudo caracterizou uma
análise documental, dos processos judiciais
demandados contra o município de Palhoça
desde 2003 até 2011.
The CF (1988) recognized the right to health
as a fundamental, guaranteed by the State.
Therefore essential to the analysis of contingency generated by universal access to health and especially the stir of dispensing drugs
and the growing issue of legalization, which
has burdened the municipal coffers, undermining public policies. This study aimed to
analyze the profile of these requests in the
county court of Palhoça, SC, from 2003 until December 2011. The study is an analysis
of documentary processes, totaling 246, all
attended today. We collected the number of
lawsuits and different products ordered and
carried out a survey of the county accounting of spending on medicines in primary
care and lawsuits (2009-2011) highlighting
the 10 most requested.
Key words: Legalization of Drugs. Health
Palavras-chave: Judicialização de Medica- Care Access. Pharmaceutical Assistance.
mentos. Acesso à Saúde. Assistência Farmacêutica.
1
Especialista em Gestão e Auditoria em Sistemas de Saúde – IPOG (2012). E-mail:
[email protected].
2
Doutor em direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (2003). E-mail: cancellier@
uol.com.br.
3
Mestranda do curso de Administração Universitária da Universidade Federal de Santa
Catarina – UFSC. Formação Pedagógica para Atuação em EAD – UNOPAR. E-mail: mileide.
[email protected].
Camila Mirian da Silva # Luis Carlos Cancellier de Olivo # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
1Introdução
O direito à saúde constitui-se em elemento fundamental do estado de
bem-estar social, uma vez que cabe ao Estado prover as necessidades essenciais mínimas para a sobrevivência de seus cidadãos.
Portanto, é imprescindível à análise da contingência gerada pelo amplo
acesso à saúde caracterizado como direito universal e especialmente a celeuma
da dispensação de medicamentos e a crescente judicialização da questão, que
tem respingado sobremaneira nos municípios, ente mais próximo dos cidadãos
que demandam em juízo. O panorama atual é de aumento significativo das
demandas judiciais em diferentes regiões do país, o que tem sido motivo de
preocupação e intenso debate entre os gestores de saúde, especialmente pelo
fato de que as decisões são predominantemente favoráveis ao autor da ação
e porque representam inegável impacto sobre a estruturação dos serviços no
SUS e sobre os gastos públicos.
Assim sendo, o presente estudo se caracterizou por ser uma análise documental dos processos judiciais demandados contra o município de Palhoça
(SC) desde 2003 até 2011. Todos esses processos atendidos até os dias de
hoje totalizam 246 ações judiciais.
Essas ações judiciais têm como principal objetivo requerer medicamentos,
mas há também a solicitação de outros produtos, como dietas especiais, tiras
reativas para glicosímetro, fraldas, entre outros.
Foram coletados os seguintes dados: número de ações judiciais e número
de produtos diferentes solicitados. Os dados foram obtidos de duas maneiras:
análise de planilha no Excel de controle de atendimentos da Diretoria de Assistência Farmacêutica de Palhoça e consulta dos processos judiciais arquivados
na Diretoria já citada.
Foi realizado também um levantamento, junto ao setor de contabilidade
do município, dos gastos com medicamentos em ações judiciais e atenção
básica dos anos de 2009 a 2011.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
191
Perfil das Ações Judiciais de Medicamentos Atendidas até 2011 no Município de Palhoça – Santa Catarina
2 O Sistema Único de Saúde (SUS) e a Constituição Federal de 1988
O artigo 196 da Constituição Federal de 1988 define a saúde como
direito, sugerindo um conceito de saúde ampliado, para além do simples
estado de “não doença”:
A saúde é direito de todos e dever do Estado garantido mediante
políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de
doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário
às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
(BRASIL, 1988, art. 196)
O Sistema Único de Saúde foi fruto da Constituição Federal de 1988,
que assegura o pleno exercício do direito social à saúde, sendo regulamentado pelas Leis Orgânicas da Saúde (LOS) Lei n. 8.080, de setembro de 1990
(BRASIL, 1990a), e Lei n. 8.142/90, de dezembro de 1990. (BRASIL, 1990b)
A Lei n. 8.080/90 dispõe sobre a organização e funcionamento do SUS,
estabelecendo a competência e as atribuições de cada esfera de governo, regulando as ações e serviços de saúde em todo território nacional, bem como
define as condições para promoção, proteção e recuperação da saúde, pautada
nos princípios da universalidade, equidade, integralidade, regionalização e
hierarquização, resolubilidade, descentralização, participação da comunidade e complementação do setor privado (BRASIL, 1990a). A Lei n. 8.142/90
regulamenta a participação da comunidade na gestão do SUS, por meio das
conferências e conselhos de saúde. Trata, também, da alocação de recursos
do fundo nacional de saúde, bem como das definições para as transferências
intergovernamentais. (BRASIL, 1990b)
O artigo 1º da Constituição Brasileira de 1988 caracteriza a ideia de
Estado democrático de direito baseado na dignidade da pessoa humana e
da centralidade dos direitos fundamentais: a) a liberdade, isto é, a autonomia da vontade, o direito de cada um eleger seus projetos existenciais; b) a
igualdade, que é o direito de ser tratado com a mesma dignidade que todas
as pessoas, sem discriminações arbitrárias e exclusões evitáveis; c) o mínimo
existencial, que corresponde às condições elementares de educação, saúde e
renda que permitam, em uma determinada sociedade, o acesso aos valores
192
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Camila Mirian da Silva # Luis Carlos Cancellier de Olivo # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
civilizatórios e a participação esclarecida no processo político e no debate
público. (BRASIL, 1988)
O processo de implantação do SUS tem sido orientado por normas
operacionais, resoluções e portarias, as quais definem as competências de
cada esfera de governo e as condições para que Estados e Municípios possam assumir as ações de saúde. Nesse sentido, foram publicadas três Normas
Operacionais Básicas (NOB/SUS 01/91, NOB/SUS 01/93 e NOB/SUS 01/96).
Em 2001, foi publicada a Norma Operacional da Assistência à Saúde (NOAS/
SUS 01/01), que foi revista em 2002 (NOAS/SUS 01/02). (CONASS, 2004)
Na perspectiva de superar problemas políticos, técnicos e administrativos
na gestão do SUS, foi aprovado, pelo Conselho Nacional de Saúde e publicado
na Portaria n. 399, de 22 de fevereiro de 2006, o Pacto pela Saúde, o qual
envolve ainda o compromisso de ampliar a mobilização popular e o movimento
em defesa do SUS. O referido pacto apresenta três componentes: Pacto pela
Vida, Pacto em Defesa do SUS e Pacto de Gestão do SUS. (BRASIL, 2006a)
2.1 Assistência Farmacêutica
Historicamente, a Assistência Farmacêutica foi uma atividade executada
de forma centralizada, especialmente a partir da criação da Central de Medicamentos (CEME), em 1971. Ao longo de seus 26 anos de existência, a CEME
foi o principal ator das ações relacionadas aos medicamentos e à assistência
farmacêutica no país. Nesse período, o Instituto Nacional de Assistência Médica
da Previdência Social (INAMPS) gerenciava os medicamentos destinados a
atender a população previdenciária, por meio das Centrais de Distribuição
de Medicamentos. (GOMES, 2004)
Apesar do direito à Assistência Farmacêutica ter sido explicitado no
artigo 6º, da Lei n. 8.080, de 1990, sua institucionalização como elemento
essencial à recuperação da saúde ocorreu com a instituição da Política Nacional
de Medicamentos (PNM) por meio da Portaria n. 3.916, de 30 de outubro de
1998 (BRASIL, 1998). Dentre as prioridades da reorientação da Assistência
Farmacêutica: A estruturação da Assistência Farmacêutica (AF) é um dos
grandes desafios que se apresentam aos gestores e profissionais do SUS, uma
vez que sua reorientação propõe uma mudança no modelo de organização e
na forma de gerenciamento, tendo por base uma nova lógica de atuação. Não
deve se limitar apenas a aquisição e distribuição de medicamentos, exigindo
para a sua implementação a elaboração de planos, programas e atividades
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
193
Perfil das Ações Judiciais de Medicamentos Atendidas até 2011 no Município de Palhoça – Santa Catarina
específicas, de acordo com as competências estabelecidas para cada esfera de
governo. O processo de descentralização exige que os gestores aperfeiçoem
e busquem novas estratégias, com propostas estruturantes que garantam a
eficiência de suas ações, consolidando os vínculos entre os serviços e a população, promovendo o acesso, o uso racional e a integralidade das ações.
(BRASIL, 1998)
Além da referida Portaria, a Resolução n. 338, de 6 de maio de 2004,
do Conselho Nacional de Saúde, aprovou a Política Nacional de Assistência
Farmacêutica (PNAF), como parte integrante da Política Nacional de Saúde,
definindo, novamente, em seu artigo 1º, o que vem a ser Assistência Farmacêutica:
A Assistência Farmacêutica trata de um conjunto de ações voltadas
à promoção, proteção e recuperação da saúde, tanto individual
como coletiva, tendo o medicamento como insumo essencial e
visando o acesso e ao seu uso racional. Este conjunto envolve
a pesquisa, o desenvolvimento e a produção de medicamentos
e insumos, bem como a sua seleção, programação, aquisição,
distribuição, dispensação, garantia da qualidade dos produtos
e serviços, acompanhamento e avaliação de sua utilização, na
perspectiva da obtenção de resultados concretos e da melhoria
da qualidade de vida da população. (BRASIL, 2004, art. 1º)
Dentre as formas de promover o uso racional de medicamentos, destacam-se a implantação e utilização da Relação Nacional de Medicamentos
Essenciais – RENAME (BRASIL, 2010). Essa lista é atualizada a cada dois
anos por comissão no Ministério da Saúde. Os recursos federais, estaduais e
municipais só poderão ser utilizados para a compra de medicamentos contemplados nesta relação. Para aquisição de qualquer outro medicamento, deverá
ser utilizado recurso próprio do Município.
2.1.1 Assistência Farmacêutica em Santa Catarina
A Secretaria de Estado da Saúde (SES/SC) possui na sua estrutura a
Diretoria de Assistência Farmacêutica (DIAF), subordinada à Superintendência
de Vigilância em Saúde (DIAF, 2011), e as principais competências da DIAF são:
a) Participar da formulação e implementação da Política Estadual de
Assistência Farmacêutica e de Medicamentos.
194
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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b) Normatizar, promover e coordenar a organização da Assistência
Farmacêutica, nos diferentes níveis de atenção à saúde, obedecendo
aos princípios e diretrizes do SUS.
c) Orientar, capacitar e promover ações de suporte aos agentes envolvidos no processo.
d) Formular, propor diretrizes e coordenar as ações de produção estatal
de medicamentos.
A partir da publicação da Portaria n. 2.577/2006, a disponibilização de
medicamentos, em termos de Componente de Medicamentos de Dispensação
Excepcional – CMDE (atualmente chamado de Componente Especializado
de Assistência Farmacêutica – CEAF) é aquela destinada ao tratamento de
agravos inseridos nos seguintes critérios:
1. Doença rara ou de baixa prevalência, com indicação de uso
de medicamento de alto valor unitário ou que, em caso de uso
crônico ou prolongado, seja um tratamento de custo elevado; e
2. Doença prevalente, com uso de medicamento de alto custo
unitário ou que, em caso de uso crônico ou prolongado, seja um
tratamento de custo elevado desde que:
2.1 Haja tratamento previsto para o agravo no nível da atenção
básica, ao qual o paciente apresentou necessariamente intolerância, refratariedade ou evolução para quadro clínico de maior
gravidade, ou
2.2 O diagnóstico ou estabelecimento de conduta terapêutica para
o agravo estejam inseridos na atenção especializada. (BRASIL,
2006c)
Os gestores estaduais são os responsáveis pela aquisição e dispensação dos medicamentos pertencentes ao CMDE, enquanto o financiamento
para a aquisição destes medicamentos ocorre, principalmente, com recursos
financeiros do Ministério da Saúde e com a complementação, na forma de
cofinanciamento, da Secretaria de Estado da Saúde.
2.1.2 Assistência Farmacêutica em Palhoça
A Diretoria de Assistência Farmacêutica do município de Palhoça tem
como princípio desenvolver a Assistência Farmacêutica, a qual consiste num
conjunto de ações voltadas à promoção, proteção e recuperação da saúde,
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
195
Perfil das Ações Judiciais de Medicamentos Atendidas até 2011 no Município de Palhoça – Santa Catarina
por meio da promoção do acesso aos medicamentos e o seu uso racional. Tais
ações consistem na seleção, programação, aquisição, distribuição e avaliação
de sua utilização, na perspectiva da obtenção de resultados concretos e da
melhoria da qualidade de vida da população (DIAF, 2012). Objetiva também
definir a Relação Municipal de Medicamentos Essenciais (REMUME), a partir
das necessidades decorrentes das especificidades regionais da população, bem
como assegurar a dispensação adequada dos medicamentos.
O município possui além da Farmácia Básica (dispensação dos medicamentos padronizados pela REMUME), a Farmácia de Alto Custo onde se
encontram os seguintes serviços: dispensação dos medicamentos do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica e dos medicamentos
adquiridos por via judicial.
2.2 A Judicialização como Acesso a Medicamentos
Atualmente, um dos maiores desafios para os gestores de saúde é
constituído pelas ações judiciais que solicitam produtos, tratamentos e/ou
procedimentos de saúde, muitas vezes não disponibilizados pelo Sistema Único
de Saúde (SUS). Isso gera individualização da demanda em detrimento do
planejamento e da gestão dos problemas de saúde em sua dimensão coletiva
e levam à desorganização do serviço. A garantia de acesso universal e igualitário às ações e aos serviços de saúde é tão importante quanto o atendimento
integral. (CHIEFFI; BARATA, 2010)
Da mesma forma, Lopes (2008) afirma que apesar de saber que a saúde
é um direito de todos e, por conseguinte, é dever do Estado propiciar condições
a esse exercício por meio de políticas públicas, tal direito não é garantido nos
moldes legais previstos, de forma a atender dois dos seus princípios básicos:
a universalidade de acesso e a integralidade dos tratamentos. Essa deficiência
estatal pode ser considerada uma das causas de tantas demandas judiciais.
O setor saúde sofre diariamente pressão dos diversos grupos médicos
comerciais para a incorporação de novas tecnologias. No que se refere a medicamentos, a situação se mostra cada vez mais complexa. A campanha que
a indústria farmacêutica realiza sobre os médicos possui um impacto muito
grande, fazendo com que eles venham a prescrever esses medicamentos dias
após seu lançamento no mercado. Percebendo que as novas tecnologias precisam
ser apresentadas, campanhas de marketing são realizadas de forma maciça,
bem como visitação em consultórios do próprio SUS. (MANFREDI, 2009)
196
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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O Poder Judiciário não tem como avaliar se determinado medicamento
é efetivamente necessário para se promover a saúde e a vida, mesmo que
instruído por laudos técnicos. A politização das decisões judiciais também é
um problema concreto. Há uma forte tendência de os magistrados decidirem
em favor da parte mais fraca.
3 Análise e Resultados
Seguem os resultados com os dados obtidos, apresentados nos Gráficos
1 a 4. Os dados estão em números absolutos e em percentual.
O Gráfico 1 mostra a evolução do número de ações judicias, com uma
concentração maior de casos nos anos de 2009 a 2011.
Gráfico 1: Evolução do número de ações judicais
Fonte: Elaborado pela autora deste artigo
O Gráfico 2 foi realizado para enfatizar que na maioria dos casos os
processos judiciais estão associados à solicitação de mais de um medicamento.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
197
Perfil das Ações Judiciais de Medicamentos Atendidas até 2011 no Município de Palhoça – Santa Catarina
Gráfico 2: Comparação do número de ações judiciais x solicitações
Fonte: Elaborado pela autora deste artigo
Para ilustrar mais facilmente o quantitativo, foram selecionados os dez
medicamentos/insumos mais requeridos e apresentados no Gráfico 3.
Gráfico 3: Dez produtos mais solicitados em ações judiciais
Fonte: Elaborada pela autora deste artigo
No Gráfico 4 foi feito um comparativo de custos com medicamentos de
atenção básica e ordens judiciais nos anos de 2009, 2010 e 2011.
198
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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Gráfico 4: Evolução dos custos na aquisição de medicamentos da atenção básica e dos
custos para atender às demandas judiciais no período de 2009 a 2011
Fonte: Elaborado pela autora deste artigo
A Tabela 1 apresenta o registro de ações judiciais por ano, com início da
demanda em 2003. E novamente é demonstrado um comparativo de número
de ações x solicitaçãoes de diferentes medicamentos.
Ano
Processos
Solicitações
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
3
5
15
15
23
36
63
50
36
6
12
44
38
81
106
183
84
89
Tabela 1: Relação número de ações judicias x número de solicitações
Fonte: Elaborada pela autora deste artigo
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
199
Perfil das Ações Judiciais de Medicamentos Atendidas até 2011 no Município de Palhoça – Santa Catarina
Ao analisar a evolução do número de ordens judicais contra o município
de Palhoça, observou-se uma maior demanda em 2009. Da mesma forma,
o Gráfico 2 mostra que as quantidades de medicamentos solicitadas também
foram maiores neste ano. Nos anos de 2010 e 2011, o número de ações
diminuiu. É provavel que essa diminuição tenha ocorrido pela inclusão na
REMUME de alguns medicamentos que até então não eram disponibilizados,
como Clopidogrel, Sinvastatina, Espironolactona, Propatilnitrato e Losartana
(estes medicamentos estão entre os mais solicitados em ações judiciais, como
está demonstrado no Gráfico 3). A Tabela 1 mostra que geralmente cada ação
judicial está requerendo mais de um medicamento.
No Gráfico 4 observa-se a evolução dos custos com medicamentos da
atenção básica e com demandas judiciais. Em 2009, o investimento em atenção básica foi de R$ 534.084,74 e em 2010 R$ 804.434,00. Com o aumento
no investimento ocorreu uma diminuição de gastos com ordens judiciais,
que passaram de R$ 642.425,58 em 2009 para R$ 319.096,74 em 2010.
Essa diminuição já era esperada, pois como foi já citado, em 2010 houve a
inclusão de alguns medicamentos que até então não eram disponibilizados
no município. Em 2011 foram gastos com atenção básica R$ 1.296.937,66 e
com ordens judiciais R$ 515.168,27. Mesmo com o investimento crescente em
medicamentos da atenção básica, os gastos com ações voltaram a aumentar.
Provavelmente justificado pelo aumento de ações de medicamentos com
custo muito elevado, como por exemplo: Etanercepte 50mg (valor aproximado R$ 7.000,00/mês), Pazopanib (R$ 4.200,00/mês) e Adalimumabe (R$
8.000,00/mês). É fato que o aumento nos gastos da Secretaria Municipal de
Saúde para atender às demandas geradas pelas ações judiciais, associado a
um engessado e limitado orçamento para investimento em saúde e à Lei de
Responsabilidade Fiscal – que estabelece limite ao gasto público – representa
enorme desafio aos planejadores e gestores do SUS, pois compromete os
recursos disponibilizados para outras ações de saúde.
Os dez produtos mais solicitados foram: Clopidogrel, Propatilnitrato,
Ácido Acetilsalicílico, tiras reativas, Insulina Lantus, Brometo de Tiotropio,
Formoterol+Budesonida, Sinvastatina, Espironolactona e Losartana.
3.1.1 Clopidogrel
O Clopidogrel é um inibidor da agregação plaquetária e, de acordo com
a Deliberação da Comissão Intergestores Bipartite 206/2009, o medicamento
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Camila Mirian da Silva # Luis Carlos Cancellier de Olivo # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
foi incorporado ao elenco da Assistência Farmacêutica na Atenção Básica;
portanto, a partir de 2010, passou a ser fornecido por Palhoça (SC).
3.1.2 Propatilnitrato
O Propatilnitrato é o segundo medicamento mais solicitado judicialmente
e foi introduzido na terapêutica no tratamento agudo das crises de angina
de peito; a RENAME 2010 recomenda a não inclusão deste medicamento.
Mas ainda assim, o município o incluiu na REMUME em 2010, com a devida
aprovação do Conselho Municipal de Saúde. Com essa medida, nos anos de
2010 e 2011, houve apenas uma ação solicitando este medicamento.
3.1.3 Ácido Acetilsalicílico (AAS)
O medicamento Ácido Acetilsalicílico 100mg encontra-se padronizado
na Assistência Farmacêutica na Atenção Básica e ainda assim é o terceiro
medicamento mais solicitado. Vale ressaltar que não foi encontrado processo
judicial solicitando exclusivamente o medicamento ácido acetilsalicílico, ou
seja, esse medicamento faz parte de uma prescrição contendo vários medicamentos. Uma hipótese levantada por Chieffi e Barata (2009) é que os
pacientes, ao entrarem com ação judicial, solicitam todos os medicamentos
necessários ao seu tratamento de saúde constantes na prescrição, incluindo
aqueles padronizados, como é o caso do ácido acetilsalicílico 100mg.
3.1.4 Insulina Lantus e Tiras Reativas para Medida de Glicemia
A Insulina de longa ação Glargina (Lantus) não faz parte das listas oficiais de medicamentos distribuídos pelo poder público. Alternativamente, é
disponibilizada a insulina humana NPH e Regular. As tiras reativas são disponibilizadas, porém por alguns meses ficaram indisponíveis no município, devido
aos atrasos em compras. Associada a esse fato está a falta de informação dos
profissionais da saúde e dos pacientes a respeito da padronização.
3.1.5 Brometo de Tiotropio
Entre as nove ações judiciais do Brometo de Tiotropio, quatro são de
2010. Esse medicamento não está padronizado pelos programas do Ministério da Saúde. Ao prover, via judicial, medicamentos não padronizados e
habitualmente mais caros, sem evidências que os efeitos na doença sejam
realmente melhores, estar-se-á destinando mais recursos per capita a poucos,
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
201
Perfil das Ações Judiciais de Medicamentos Atendidas até 2011 no Município de Palhoça – Santa Catarina
em detrimento de garantir, para a maioria, os medicamentos essenciais para
controle das doenças mais frequentes.
3.1.6 Formoterol + Budesonida
Existe protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para o uso de
Formoterol+Budesonida, porém o consenso é apenas para os pacientes portadores de asma grave, ou seja, pacientes que não se enquadram nesta situação
não recebem o medicamento pelo Componente Especializado, encontrando
como única forma de acesso a ação judicial.
3.1.7 Sinvastatina
A Sinvastatina era fornecida pelo CEAF para tratamento de dislipidemias,
porém com a publicação da Portaria n. 2.982/2009 passou a ser adquirida por
meio da Assistência Farmacêutica na Atenção Básica, compondo o elenco de
medicamentos a serem disponibilizados pelos municípios e Distrito Federal,
para atendimento das linhas de cuidado do CEAF, atendidos os critérios estabelecidos no Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (BRASIL, 2009a).
Com essa mudança nos anos de 2010 e 2011 ocorreu apenas uma ordem
judicial com este medicamento.
3.1.8 Espironolactona e Losartana
Esses medicamentos não eram padronizados no município até 2009.
Com a Deliberação da Comissão Intergestores Bipartite n. 206/2009, os medicamentos Espironolactona e Losartana foram incorporados ao elenco da
Assistência Farmacêutica na Atenção Básica, inclusive ocorrendo um aumento
da contrapartida estadual. Esses medicamentos totalizam 16 ações judiciais,
e a maioria das ações está concentrada no período até 2009, pois em 2010
houve apenas duas e em 2011 nenhuma.
4 Considerações Finais
Com os resultados obtidos no presente trabalho, foi possível concluir
que, ao longo do período analisado, houve aumento no número de ações
judiciais, deferidas contra o Município de Palhoça, solicitando medicamentos, bem como no número de solicitações de produtos diferentes; porém o
volume financeiro gasto por Palhoça teve uma diminuição em 2010, com
novo aumento em 2011, provavelmente justificado pelo aumento de ações
202
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Camila Mirian da Silva # Luis Carlos Cancellier de Olivo # Mileide Marlete Ferreira Leal Sabino
de medicamentos com custo muito elevado. Os dez produtos mais solicitados
foram: Clopidogrel, Propatilnitrato, Ácido Acetilsalicílico, tiras reativas, Insulina
Lantus, Brometo de Tiotropio, Formoterol+Budesonida, Sinvastatina, Espironolactona e Losartana. Nos casos dos medicamentos incluídos na REMUME,
em 2010, houve uma considerável queda nas solicitações.
A elevação do direito à saúde ao patamar de direito fundamental, pela
Constituição Federal de 1988, ensejou aos cidadãos recorrerem ao Poder Judiciário, a fim de solicitarem seus tratamentos de saúde. O fenômeno, que vem
sendo chamado de “judicialização da saúde”, tem causas complexas e pode
estar relacionado ao maior acesso à informação dos usuários do sistema, à
alta probabilidade de ganho da causa, ao processo moroso de estruturação da
assistência farmacêutica, à indução dos prescritores e à influência da indústria
farmacêutica e da propaganda de medicamentos.
A explosão do número de ações judiciais e, consequentemente, dos
gastos para atendê-las, é motivo de preocupação para os gestores do SUS.
Isso porque elas ocasionam desorganização da Assistência Farmacêutica, inviabilizam o planejamento de políticas públicas e desrespeitam os princípios
do SUS, pois garantem direitos individuais em detrimento da coletividade.
A questão orçamentária é frequentemente colocada em pauta, pois,
enquanto as necessidades de saúde são praticamente infinitas, os recursos
para atendê-las não o são. Diante disso, é necessário reconhecer que o fornecimento de medicamentos, por decisão da Justiça, compromete a dispensação
gratuita regular, pois os governos precisam remanejar recursos vultosos para
atender a situações isoladas.
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Este livro é parte integrante do material didático do Curso de Especialização
Lato Sensu em Gestão da Saúde Pública oferecido na modalidade a distância.

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