A influência do Google na cultura
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A influência do Google na cultura
A influência do Google na cultura Ao ler um texto de Nicholas Carr (O Google nos deixa boobos?, publicado na Atlantic, Revista da Semana, 26 de junho de 2008) passei a examinar com muito cuidado o método que utilizo para as buscas e consultas que efetuo naquela “máquina de pesquisas”. O referido autor faz notar que a concentração dele, ao ler um livro, é dissipada, após três ou quatro páginas de leitura. O que, afirma, não acontecia anteriormente à utilização continuada das buscas. Assegura ainda que algo estaria remapeando o circuito neural e reprogramando a memória. Os meios de comunicação fornecem o material para o pensamento, mas também modelam o processo de pensamento. E ao que parece a internet está minando a capacidade de concentração e contemplação. A avalanche de informações da internet impede leitura e pensamento em profundidade. Contemplação, leitura cuidadosa e meditada de determinado tema e assunto, exigem concentração. E tempo, claro. A multiplicidade de informações não permite que se faça essa introspecção, essencial e necessária. Estamos nos aproximando do dia em que tudo será dito com imagens, segundo o “New York Times”. "As fotos estão rapidamente se convertendo em um tipo de diálogo inteiramente novo", escreveu Nick Bilton "A turma de vanguarda está descobrindo que no jornal: se comunicar com uma simples imagem, quer seja uma foto do que vai haver para o jantar ou uma imagem de uma placa de rua indicando ao amigo 'ei, estou esperando por você aqui', é mais fácil que se dar ao trabalho de usar palavras." Em entrevista ao jornal La Croix, o economista Pascal Perri assegura que o serviço do Google, não é gratuito. Há contrapartida. São pesquisados elementos que, ao depois, são utilizados pelo relacionamos, mercado. nosso Saberão gosto quem comercial, somos, com cultural, quem nos esportivo. Tornamo-nos, assim, em pessoa, um serviço para o grande mercado. Pascal Perri postula separação entre as buscas pelo “moteur de recherches” e a parte comercial. Sobretudo quanto às vendas, pelo sítio. (Pascal é o autor do livro Un ami qui ne vous veut pas que du bien (Éditions Anne Carrière), professor de economia na Novancia Business School de Paris). Nicholas Carr lembra a negra profecia de Stanley Kubrick no filme 2007 - Uma Odisseia no Espaço: quando passamos a depender dos computadores para mediar nossa compreensão do mundo, é nossa própria inteligência que se achata ao nível da inteligência artificial. Romano Guardini afirma que as coisas são palavras. Aduz que: “O fato de a existência do mundo apresentar a forma de uma linguagem é justamente a razão pela qual se torna possível falar de mundo. A possibilidade do emprego da palavra não se funda apenas em o homem possuir o dom da fala e em as coisas, por seu turno, constituírem formas intencionais objetivas que podem ser reveladas graças à palavra; reside também na própria natureza verbal do mundo; vem de que o mundo emerge de um falar e subsiste no modo de uma palavra expressa. Se assim não fosse, a linguagem humana não poderia ser acolhida pelo universo. As palavras errariam nele como fantasmas.” Lia Luft escreveu também que “A palavra faz parte da nossa essência: com ela, nos acercamos do outro, nos entregamos ou nos negamos, apaziguamos, ferimos e matamos. Com a palavra, seduzimos num texto; com a palavra, liquidamos – negócios, amores. Uma palavra confere o nome ao filho que nasce e ao navio que transportará vidas ou armas.” Já foi escrito que há construção da ignorância, na atualidade porque quanto mais informação temos, menos sabemos “Pegue qualquer assunto da atualidade - por exemplo, aquecimento global. Você encontrará dezenas de estudos, porém muitos deles contraditórios. Afinal, 2008 foi um dos anos mais quentes ou mais frios dos últimos tempos? É um caso típico em que mais informação significa nome: menos conhecimento. agnotologia. É o Esse estudo fenômeno da tem um construção da ignorância, explica a revista Wired. O termo vem do grego agnosis, Robert desconhecimento, Proctor, professor de e foi história cunhado da por ciência da Universidade Stanford, nos Estados Unidos. Quando a sociedade tem dúvida sobre algum fato, diz Proctor, é porque grupos de interesse lançaram mentiras propositalmente. Os republicanos gastaram milhões para passar a mensagem de que o democrata Barack Obama era muçulmano. Grupos religiosos impulsionam as teses criacionistas como contraponto à teoria da evolução das espécies. Empresas do setor de tabaco financiam estudos relacionando o câncer de pulmão a inúmeros fatores, até calvície - tudo menos o cigarro. Diante de tantas e desencontradas informações, as pessoas vivem cercadas de dúvidas. Geralmente quando alguém não sabe sobre determinado assunto pensa que é por falta de estudo ou de atenção, mas a ignorância pode vir justamente do excesso de dados divulgados com segundas intenções. Isso não quer dizer que as ideologias sempre prestam um desserviço ao conhecimento. Valores ruins podem resultar em boa ciência. Muitos estudos sobre o câncer foram produzidos durante o nazismo, afirma Proctor, autor de dois livros sobre o assunto. A internet certamente ajudou nessa construção da ignorância. As informações sobre qualquer tema estão ao alcance de um clique do mouse, mas os próprios meios de comunicação podem ajudar a desmontar as falsas verdades. Já passamos pela revolução da informação. Está na hora da revolução da desinformação. As farsas estão cada vez mais expostas em sites como o You-Tube. Basta saber encontrá-las. A Wikipédia é outra ferramenta útil. As informações são construídas por consenso e a maior parte dos usuários se sente atendida pelo resumo disponível no site. Saber o que pensávamos saber parece ter se tornado o grande desafio dos dias de hoje.” Em conclusão: o “motor de pesquisa” é preciosíssimo. Ao utilizá-lo, há que se ater ao objetivo colimado, sem desviar o foco. E, naturalmente, saber conduzir a verificação, afastando a possibilidade de não retornar à reflexão ponderada de todo o texto.