Pensamento do Dia Pensamento do Dia

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Pensamento do Dia Pensamento do Dia
Pensamento do Dia
Economistas analisam a Economia, o Brasil
e o mundo,
mundo, na mídia diária 28 10 2010
------------------------------------------------------------------Valor Econômico - 28/10/2010
Refugiados da guerra cambial
Mario I. Blejer e Eduardo Levy Yeyati
As economias latino-americanas poderiam estimular uma política coordenada na região,
o que aumentaria seu poder de barganha, fortalecendo sua voz global. Assim, poderia
passar a desempenhar papel importante no processo de paz.
A atual guerra cambial assemelha-se a uma guerra real em dois aspectos importantes: o
confronto de desequilíbrios estruturais entre dois grandes oponentes - China e Estados
Unidos - obrigou aliados menores, também incomodados, a ficar de um lado ou de outro,
enquanto terceiros, que podem não estar engajados diretamente, sofrem danos
colaterais dos dois lados.
As economias de alto crescimento da América Latina são particularmente vulneráveis, já
que são obrigadas a enfrentar tanto a inflexibilidade da taxa de câmbio da China como o
impacto da desvalorização do dólar decorrente da política monetária expansionista do
Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA).
A dinâmica é familiar: a liquidez em dólar foge para os países emergentes em busca de
rendimentos maiores, o que pressiona suas moedas para cima. Brasil, Chile e Colômbia,
entre outros, agora se deparam com essas forças poderosas de valorização cambial. Essa
pressão é amplificada em países latino-americanos ricos em recursos naturais pelo
aumento nos preços das commodities, alta que também é provocada por uma busca
similar por risco e pelo declínio no valor do dólar.
Mas por que os países latino-americanos se preocupam com esses fluxos de capital e a
mudança de valor de suas moedas? Afinal, os influxos de capital tradicionalmente são
considerados como uma transferência positiva de poupança dos países industrializados
ricos para os mercados emergentes com escassez de capital.
O cenário pós-crise encontra a região com fundamentos macroeconômicos muito
melhores que os do mundo industrial. As posições fiscais são sólidas e o endividamento
público equivale a apenas 32% do Produto Interno Bruto (PIB) da região.
Essa visão confiante, no entanto, obscurece a perda de competitividade que a valorização
real pode provocar. De fato, a "doença holandesa" - chamada assim pelo declínio
catastrófico na competitividade industrial da Holanda, após a descoberta de gás natural
no Mar do Norte ter valorizado a moeda local - tornou-se uma preocupação séria. Em vez
dos recursos naturais, o que está prejudicando a competitividade na América Latina (e
em outros países em desenvolvimento) são os fluxos financeiros.
Um caso exemplar é o México. Nos últimos 18 meses, o peso mexicano valorizou-se 6%
a mais que o yuan, minando a capacidade do país de concorrer com as exportações
chinesas aos EUA, de longe o maior mercado para os produtos mexicanos.
Mas essa não é a única consequência da doença holandesa financeira. A política de
flexibilização monetária quantitativa do Fed amplifica o fluxo de liquidez, o que poderia
resultar em perigosas bolhas nos mercados emergentes. Ao inflar artificialmente os
ativos e a riqueza nos países receptores, os influxos de capital induzem as economias
emergentes a um excesso de consumo, criando o mesmo tipo de condições que levaram
à crise recente - só que neste caso em economias que estão bem menos equipadas que
os EUA para lidar com os riscos.
Mas o que acontecerá quando os EUA se recuperarem, reverterem a flexibilização
quantitativa e começarem a elevar as taxas de juros? Veremos uma reversão do fluxo de
capitais, tendo como resultado profundas oscilações das taxas de câmbio? Uma vez que
esse cenário continua uma possibilidade clara, a doença holandesa financeira representa
uma série ameaça aos países emergentes de alto crescimento.
Se o G-20 quiser desempenhar um papel sério, precisará intermediar uma solução para
essa situação. Infelizmente, o impasse na coordenação política mundial durante os
recentes encontros do Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial pode ser
uma demonstração dos limites da supervisão multilateral e da coordenação internacional.
Em uma tentativa desesperada de última hora, o FMI agora está inventando os
"relatórios de contágio" ("spillover reports", em inglês) para as economias mais
importantes sistemicamente, que serão realizados paralelamente com as consultas
regulares do FMI sobre as condições dos países, conhecidas como Artigo IV. A iniciativa
está destinada ao fracasso - como ocorreu com o Exercício de Supervisão Multilateral do
FMI ou as revisões do G-20 no passado recente. Mesmo se forem identificados grandes
contágios, é difícil ver como esse exercício solucionaria o problema fundamental por trás
da guerra cambial: a aparente pouca disposição dos principais participantes em conciliar
interesses nacionais vastamente diferentes.
Então, o que as economias latino-americanas deveriam fazer? Embora o Chile ainda não
tenha promovido intervenções no mercado de câmbio, Colômbia e Peru aumentaram
suas reservas internacionais de forma acentuada. O Brasil vem sendo agressivo em
termos de restrições de capital, tendo elevado duas vezes o imposto sobre os influxos
financeiros. Ações sem coordenação, no entanto, podem resultar em um ciclo vicioso de
retaliações e tornar a guerra cambial um confronto comercial total, com sérias
consequências para todas as partes envolvidas.
Como alternativa, as economias latino-americanas poderiam tentar estimular uma
política coordenada na região, onde as realidades econômicas tendem a coincidir, a
interdependência é sentida mais diretamente e o custo do contágio pode ser
internalizado mais facilmente. Esse tipo de coordenação regional pode aumentar o poder
de barganha dos países envolvidos, fortalecendo sua voz global. Dessa forma, a América
Latina poderia deixar de ser uma vítima da guerra e passar a desempenhar um papel
importante no processo de paz.
Mario I. Blejer e é ex-presidente do Banco Central da Argentina.
Eduardo Levy Yeyati é professor de Economia na Universidad Torcuato Di Tella,
em Buenos Aires, e ex-economista-chefe do Banco Central da Argentina.
----------------------------------Estadão Online – 27/10/2010
Discutindo com os mercados
Paul Krugman
Uma confusão com a qual costumo me deparar é a crença de que há algum tipo de
contradição entre os momentos em que eu e outros analistas defendemos que o mercado
está enganado – como quando eu fiz ao diagnosticar a formação de uma bolha no
mercado imobiliário, e também agora ao questionar as crenças otimistas do mercado em
relação à inflação – e meu argumento segundo o qual os juros baixos prejudicam a
defesa de uma austeridade fiscal imediata.
O que as pessoas parecem não entender é que em ambos os casos eu parto das leis
fundamentais da economia. São os defensores da austeridade que apelam à psicologia do
mercado para rejeitar tais leis fundamentais – e a questão, portanto, é que esta
psicologia do mercado só existe na imaginação deles.
O argumento chave contra a implementação de medidas de austeridade fiscal no
momento presente reside no fato de isso ser uma política equivocada: o resultado seria
uma economia deprimida, ao mesmo tempo produzindo um efeito positivo mínimo sobre
a posição orçamentária no longo prazo (e pode até tornar esta posição de longo prazo
ainda pior). Já fiz os cálculos repetidas vezes neste blog.
Mas os defensores da austeridade dizem que os números não importam – precisamos
fazer cortes já, agora, imediatamente, caso contrário os justiceiros dos mercados de
títulos vão atacar.
E a pergunta é: onde estão estes justiceiros? Parece que eles estão tentando nos tapear
ao emprestar ao governo dos EUA a juros reais negativos.
Assim, a questão não é que o mercado tem sempre razão, e sim que, se a ideia é sugerir
que aplacar os mercados é mais importante do que uma análise econômica racional, é
melhor ter provas de que os mercados se importam minimamente com aquilo que se
está exigindo.
---------------------------Valor Econômico - 28/10/2010
Crescimento e distribuição de renda
Márcio Pochmann
Para cada ponto percentual de queda no índice de Gini brasileiro, a China eleva
em 1,4 ponto a desigualdade na renda
Uma das principais novidades surgidas no contexto de evolução da crise global de 2008
encontra-se justamente na recuperação econômica mundial atual, cada vez mais
determinada pela dinâmica dos países não desenvolvidos. O fato de nações como China,
Brasil e Índia responderem por mais da metade do crescimento econômico pós-recessão
mundial acontece pela primeira vez desde a Grande Depressão de 1929.
Em contrapartida, o conjunto das nações desenvolvidas parece, cada vez mais,
prisioneiro do ciclo vicioso originado pela nova reprodução da armadilha japonesa,
constituída desde 1991 por força do tipo de crise que se abateu naquele país. Ou seja, a
combinação da anorexia do consumo familiar com a retenção e adiamento dos
investimentos das empresas, acrescido do desajuste fiscal e de medidas ortodoxas de
contenção do gasto social. O resultado disso reflete-se na deterioração da confiança
nacional potencializada pelo risco da deflação em meio à onda das desvalorizações
cambiais competitivas e, infelizmente, o ressurgimento da marcha protecionista. Na
sequência do desemprego em alta, ocorre a elevação nas taxas de pobreza e de suicídios
entre os países desenvolvidos.
Não parece haver dúvidas de que o abandono atual, pelos países ricos, da convergência
das políticas anticíclicas adotadas na crise de 2008 aponta para um período
relativamente longo de convivência com o baixo dinamismo econômico e piora na
distribuição de renda. Ademais, a prevalência de enormes assimetrias de poder entre a
força e os interesses das grandes corporações transnacionais e o apequenamento das
ações dos Estados nacionais, aliada ao contínuo esvaziamento das instituições
multilaterais, tende a tornar mais distante a coordenação urgente e necessária da
governança mundial.
Tal como na Grande Depressão de 1873 a 1896, que acompanhada pelo circuito da
industrialização retardatária ocorrido na Alemanha e nos Estados Unidos, permitiu surgir
- meio século depois - o deslocamento do centro dinâmico mundial assentado na
hegemonia inglesa, se percebe hoje, guardada a devida proporção, o aparecimento de
novas polaridades geoeconômicas no desenvolvimento global. China, Brasil e Índia são
crescentemente apontados como nações portadoras de futuro e de grande potencial
necessário para assumir maior centralidade na dinâmica do desenvolvimento mundial.
Por conta disso, se deve procurar compreender como o comportamento do crescimento
econômico e do padrão de distribuição de renda, especialmente na China e no Brasil, se
tornam referência de como o novo mundo poderá mover-se, com maior ou menor
expansão e ampliada ou contida desigualdade na repartição da renda. Ainda que se trate
de países muito diferentes, Brasil e China apresentam tendências recentes distintas em
relação ao crescimento econômico e à repartição da renda nacional entre seus
habitantes.
No Brasil, por exemplo, observa-se que para cada 1 ponto percentual de expansão da
economia, a China consegue crescer 2,5 pontos percentuais a mais. Entre 1995 e 2010,
o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro foi multiplicado por 1,6 vez, enquanto o PIB
chinês foi multiplicado por 3,9 vezes. O modelo veloz de crescimento econômico da China
praticamente não se alterou entre 1995 e 2003, e de 2004 a 2010 (crescimento médio
anual de 10%), ao contrário do Brasil, que registrou expansão média anual de 2,1% de
1995 a 2003, e de 4,5% de 2004 a 2010.
Por outro lado, se percebe divergência importante em relação ao padrão de desigualdade
na repartição de renda entre os brasileiros e chineses. Entre 1995 e 2010, o índice de
Gini aumentou 21% na China, enquanto no Brasil caiu 14%. Ou seja, para cada 1 ponto
percentual de queda no índice de Gini brasileiro, a China eleva em 1,4 ponto percentual o
grau de desigualdade na renda. Interessante notar ainda que, de 1995 a 2001, o
comportamento no índice de Gini se manteve relativamente inalterado, apesar das
oscilações anuais - de 2,6% para mais na China e de 0,83% para menos no Brasil.
Todavia, se constata que a partir daí houve uma grande diferenciação na trajetória da
repartição da renda na China e no Brasil. Com o crescimento econômico maior no Brasil,
o comportamento do índice de Gini tornou-se mais decrescente (-12,2%), ao passo que a
China, que manteve inalterada a trajetória de alta expansão do PIB, passou a registrar
ampliado aumento no grau de desigualdade na repartição pessoal da renda (+17,9%).
Em síntese, se nota que desde 2004 o PIB brasileiro tem crescido, como média anual,
quase a metade do ritmo de aumento do Produto Interno Bruto chinês, ao contrário do
período anterior (1995 e 2003), quando a expansão econômica brasileira representava
somente 25% do crescimento do PIB chinês. Com a maior expansão das atividades da
economia brasileira no período recente, houve concomitantemente o aprofundamento da
queda no grau de desigualdade da renda pessoal, diferentemente da situação chinesa,
com forte piora na repartição do conjunto dos rendimentos dos seus habitantes.
Essas diferenças tornam-se importantes e devem ser ressaltadas, especialmente quando
se avaliam as novas trajetórias mundiais possíveis a partir da sequência da crise nos
países desenvolvidos iniciada em 2008. Não obstante o menor ritmo de crescimento
econômico, o Brasil revela melhor trajetória de repartição da renda em relação ao
desempenho chinês recente.
Márcio Pochmann é professor licenciado do Instituto de Economia e do Centro
de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Unicamp e presidente do
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
------------------------------Valor Econômico - 28/10/2010
Superávit primário: descanse em paz
Mansueto Almeida
Aproveitou-se a capitalização da Petrobras para, mais uma vez, modificar o
resultado do primário
Um dos conceitos mais importantes para indicar o esforço fiscal do governo brasileiro
desde 1999 é o conceito de superávit primário. O superávit primário nada mais é do que
o total da receita do governo menos os gastos não financeiros, o que exclui, portanto, o
pagamento de juros. O tamanho do superávit primário sinalizaria o esforço que o
governo faz para pagar sua dívida, o principal e os juros que incidem sobre o estoque da
dívida.
Dado que não é o tamanho da dívida em si, mas sua relação com o PIB que importa para
questão de solvência, o superávit primário é normalmente divulgado como proporção do
PIB. Dependendo das variáveis como taxa de juros, estoque da dívida e crescimento do
PIB, o governo fixa uma meta de superávit primário que seja compatível com a trajetória
desejada da redução da Dívida Líquida do Setor Público (DLSP) ao longo do tempo.
Como o conceito de superávit primário tornou-se cada vez mais importante na economia
brasileira, qualquer modificação na meta desse indicador é seguida de calorosas
discussões. Assim, ao que parece, há uma grande transparência no cálculo dessa medida
e na sua avaliação. Infelizmente, esse não é mais o caso. Há cerca de quatro anos se
começou um lento e doloroso processo de "tortura no cálculo do superávit fiscal", que a
meu ver culminou com a sua morte recente. Ele de fato ainda existe, mas é na verdade
uma "espécie de zumbi" que ainda insiste em assombrar aqueles que detestam o termo
"responsabilidade fiscal" ou a tão famosa frase dos livros de economia de que "não há
almoço grátis". Os exemplos abaixo mostram os estágios que levaram à morte do
superávit primário.
A primeira "estocada" no conceito de superávit primário veio com a permissão ainda na
gestão do então ministro Antônio Palocci, em 2005, para que parcela do investimento
público no Projeto Piloto de Investimentos (PPI) pudesse ser descontada da meta do
primário. No seu início, o PPI representava apenas R$ 3,2 bilhões e, assim, descontar
esse montante do primário foi um simples arranhão não muito sério. Mas essa regra foi
substituída por outra muito mais audaciosa na gestão atual, que permite que R$ 32
bilhões do Programa de Aceleração Econômica (PAC) possam ser integralmente
descontados do cálculo do superávit primário na nova Lei de Diretrizes Orçamentárias, a
LDO (ver art. 30 do substitutivo ao projeto de lei nº 4 de 2010).
Em 2008, houve uma segunda estocada no conceito do primário na proposta da LDO de
2009 que se repetiu nos anos seguintes. Pela nova regra, não apenas gastos do PAC,
mas também os gastos autorizados no ano anterior e não executados (restos a pagar)
poderiam ser abatidos integralmente do cálculo do superávit primário. Para se ter um
ideia do que isso significa, de cerca de R$ 30 bilhões que o governo federal investiu até
setembro deste ano (pelo conceito de GND-4), R$ 19 bilhões (63%) correspondem a
restos a pagar do ano passado. Assim, essa medida permite que dezenas de bilhões de
reais adicionais, além dos gastos do PAC no ano, possam ser descontados do cálculo do
primário.
Em 2009, apesar de machucado, o conceito de superávit primário ainda era forte o
suficiente para atrair a atenção indesejada dos analistas econômicos e financeiros.
Assim, optou-se pelo uso de um novo artifício para o seu enfraquecimento. O Tesouro
Nacional passou a emprestar recursos para o Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES) que, em seguida, comprava créditos que o Tesouro Nacional
tinha a receber de estatais, aumentando, assim, a receita e o resultado primário. Essas
operações foram feitas com a Eletrobrás e alcançaram R$ 3,5 bilhões, em 2009, e mais
R$ 1,4 bilhão em setembro deste ano. Essas operações podem voltar a se repetir com a
mesma ou qualquer outra estatal.
Mas a meta de superávit primário continuava a atrair discussões inconvenientes como a
necessidade de controle dos gastos correntes para aumentar o investimento público, sem
recorrer a aumentos sucessivos de carga tributária. Assim, surgiu a capitalização da
Petrobras, uma empresa entre as maiores e mais inovadoras do mundo que, apesar do
seu sucesso já comprovado, precisa de uma relação paternalista e tutorial com o seu
acionista majoritário, a União, e com o BNDES. Assim, aproveitou-se a capitalização da
Petrobras para, mais uma vez, "modificar o resultado do primário", só que desta vez no
valor de R$ 31,9 bilhões.
A operação original autorizada e discutida no Congresso Nacional era que o Tesouro
Nacional faria cessão onerosa equivalente em até 5 bilhões de barris de petróleo que, ao
preço fixado em setembro, seria equivalente a R$ 74,8 bilhões. Essa operação significa
que a União venderia o seu direito futuro de 5 bilhões de barris de petróleo para a
Petrobras em troca de uma participação maior na empresa. Na prática, o que aconteceu
foi que o Tesouro Nacional vendeu a cessão onerosa de exploração de petróleo para
Petrobras, BNDES e Fundo Soberano, conseguindo uma receita de R$ 74,8 bilhões, e
capitalizou a Petrobras em R$ 42,9 bilhões, ficando com um saldo de R$ 31,9 bilhões que
se transformou em "superávit primário".
Esse "saldo" poderá ser utilizado para qualquer coisa. Ou seja, esse novo "superávit
primário" pode tanto ajudar o alcance da meta de 3,30% do PIB deste ano e, portanto,
cobrir gastos que já foram efetuados, ou um eventual excesso em relação à meta atual
pode ser carregado para o próximo ano para que seja abatido integralmente da meta do
primário de 2011, como permitido pelo Art. 3º da LDO. O superávit primário morreu e
talvez fosse melhor passarmos a ter metas para a poupança pública, que é um conceito
que exclui os gastos de investimento. Mas se você ainda acredita na relevância do
conceito de superávit primário depois deste artigo, por favor, poderia me enviar o
endereço do Papai Noel?
Mansueto Almeida é técnico de planejamento e pesquisa do Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
------------------------------Correio Braziliense - 28/10/2010
Miçangas fiscais
Antonio Machado
Tesouro exalta maquilagem contábil como superavit real e se queixa do BC por
recusar a chicana
Seja lá o que sair das urnas no domingo, o eleito já tem encontro marcado com a
desnecessária barafunda criada ao redor do superavit primário - nome da retenção de
despesas do orçamento fiscal, feita com dois propósitos: 1º, amortizar pedaços da dívida
emitida pelo Tesouro Nacional, e, 2º, adequar a demanda movida a gasto público à meta
de inflação anual definida pelo governo ao Banco Central.
Os juros são função do que o governo condiciona ao BC no que se refere, como Dilma
Rousseff diria, à inflação desejada. Demanda, no juízo do BC, é parte dos fatores que a
pressionam, o que inclui o gasto público. O superavit fiscal, portanto, ajuda a contê-la.
O primeiro propósito não importa mais quanto ao objetivo original do conceito do
superavit orçamentário antes do pagamento dos juros da dívida pública federal: a
solvência do Estado. Não há dúvidas sobre nossa solidez fiscal. As agências
internacionais de risco de crédito já conferem ao Brasil a nota de bom para investimento.
O superavit, assim definido, continua relevante como instrumento de contenção da
ferramenta dos juros interbancários, vulgo Selic, que o BC utiliza para cumprir a meta
inflacionária. É de 4,5% este ano e em 2011, como fora no anterior e tem sido duro
alcançá-la.
Menos impulsos monetários na economia desaceleram o multiplicador do crédito
bancário, reduzindo a demanda agregada. É o que conta a teoria e assim fazem os
governos no mundo, dos EUA à China, embora haja quem discorde e quem se embaralhe
com o conceito.
Num momento em que tudo o que a política econômica menos precisa é de polêmica, o
ministro da Fazenda, Guido Mantega, entendeu que deveria comunicar a sua confiança
na convergência da inflação à meta de 4,5%, estando agora em 5,03% em 12 meses até
outubro, na medida de meio de mês, e subindo. Para ele, os fatores de alta são pontuais,
devidos à recuperação sazonal dos preços da alimentação.
Não é só, já que também há pressão de serviços, o que é típico de demanda aquecida,
mas não há nada grave no que se refere ao que preocupa o BC na fala de Mantega.
Inusitada foi a sequência, com o secretário do Tesouro, Arno Augustin, pondo em dúvida
conceitos de contabilidade, a pretexto de justificar a triangulação feita para engrossar a
parte da União no aumento de capital da Petrobras.
Que Dilma se acautele
Se Augustin acredita no que disse e Dilma se eleger, é prudente que ela amplie,
imediatamente, seu grupo de aconselhamento. Sabe-se que o Tesouro emitiu títulos de
dívida para a União subscrever o aumento de capital da Petrobras. Parte dos papéis foi
entregue ao BNDES e ao Fundo Soberano para que também comprassem as ações.
Os títulos recebidos pela Petrobras foram devolvidos ao Tesouro em pagamento da
cessão onerosa do direito de exploração de até 5 bilhões de barris de petróleo do pré-sal.
E o que fez o Tesouro? Tratou o repasse ao BNDES e Fundo Soberano como empréstimo
às duas entidades. Gerou com isso receita escritural de R$ 31,9 bilhões, incorporada ao
superavit primário. Mas superavit mesmo não houve.
Superavit augustiniano
Quer dizer: BNDES e Fundo Soberano ganharam uma dívida não pedida para participar
da capitalização da Petrobras. A rigor, o próprio Tesouro poderia ter subscrito as ações e
um pouco mais, o que fez, aumentando para 49% a parte do Estado no capital total da
estatal.
Deixou de fora a parte do BNDES e do Fundo para simular resultado maior de superavit
primário. E por que, se não há risco de sanções de mercado ou do FMI? Augustin chamou
de receita de concessão, e disse que seria igual às recebidas no governo FH pela
privatização da Telebrás. O BC não a reconhece como tal. Como não resultou da
contenção efetiva de gasto, não tem efeito algum sobre a demanda.
Lições para o Tesouro
Augustin insiste que está certo. Se tem alguém que acha que está errado, devemos fazer
essa discussão, ele desafiou. O economista Fernando Montero topou. Ele lembra que as
concessões de telefonia foram compradas em dinheiro por empresas privadas. A
diferença já é relevante. O problema fiscal de 1998 era de estoque de dívida acrescenta,
não de fluxo de gastos. Os juros respondiam ao risco-país, que estava condicionado à
dinâmica exponencial da dívida.
Hoje, diz, os juros reagem à inflação, pressionada pelo gasto fiscal expansionista. O
superavit necessário é o que contenha a demanda real. A situação de 1998, assim, nada
tem a ver com a de agora. Além disso, metade do mercado financeiro de hoje estava na
escola na época, ironiza. Ou seja: conta outra que essa não cola.
Conselho da indústria
A maquilagem contábil na capitalização da Petrobras foi legítima, como já registrara
Montero. O equívoco foi estendê-la à formação do superavit primário, que hoje só se
justifica se corresponder a uma economia orçamentária de verdade. No próprio governo,
há gente séria que diz a mesma coisa, e não só no BC, mas não foi ouvida.
Uma análise do IEDI, Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial, muito
respeitado por Mantega, aconselha o mesmo. Tão importante quanto utilizar os
instrumentos de controle de capitais, o novo governo deveria assumir, logo de início, diz
o IEDI, um compromisso crível no sentido de que uma maior folga fiscal será construída
para amparar a redução da taxa de juros e exercer menor pressão sobre o câmbio. É
isso, uma âncora fiscal, não miçangas.
----------------------------Folha de S.Paulo - 28/10/2010
Bolha: paranoia ou mistificação?
Vinicius Torres Freire
O BRASIL vivou um estouro de bolhinha em setembro, outubro de 2008. Bola de chiclete
se comparada à americana. Foi a bolha dos derivativos cambiais, que quebrou grandes
empresas e avariou outras dezenas. Em suma, as empresas faziam dívida a fim de, na
prática, apostar na valorização eterna do real. A coisa era "secreta", ocorria fora dos
mercados regulados e passou sob as pernas do Banco Central. Houve certo tumulto e
pânico, mas o problema passou longe dos bancos maiores. Enfim, o governo arrumou um
tutu para os quebrados e ajudou a consolidar uns novos oligopólios.
Bolha graúda mesmo é aquela que arrasta uma economia inteira. Começa com uma onda
de superinvestimento num negócio, a princípio, promissor. Evolui graças a dinheiro
barato ou inventado por meio de instrumentos financeiros complexos. A seguir vem uma
inflação de preços mais ou menos localizada.
Os ativos ou negócios da bolha então parecem se transformar numa cornucópia de
dinheiro. Investidores fazem dívidas a fim de entrar no negócio e aproveitar a sua
rentabilidade superestimada. O negócio se torna mais e mais caro, mas no delírio da
bolha quase ninguém é capaz de enxergar que jamais entregará o retorno esperado.
Logo abaixo da "guerra das moedas", a "bolha dos emergentes" é o assunto da moda.
Bolha de commodities. Bolhas de Bolsas e imóveis. O fato de os EUA virem a despejar
em breve mais meio trilhão de dólares na economia vai marcar a disparada final da
bolha? Ou só uma inflação controlável de ativos?
No Brasil, a torrente de dólares por ora nos preocupa mais devido ao câmbio. Parece não
haver bolhas. Pelo menos, não temos nem mercados e instrumentos financeiros
sofisticados e grandes o bastante para inflar bolhas (afora o de moedas). No mínimo, não
temos instrumentos bons para detectar os sopros da morte. O mercado imobiliário
parece aquecido e caro, mas isso está longe de ser condição de bolha.
Mas os países do Leste Asiático estão nervosos com a possibilidade de bolha (e com a
valorização de suas moedas também, claro).
Por exemplo, o discurso das autoridades econômicas sul-coreanas é, sem tirar nem pôr,
idêntico ao das nossas. Discutem a volta da tributação dos investimentos de
"estrangeiros" na dívida pública deles e, em última instância, controles administrativos
de capital ("causa distorções, mas o mercado financeiro está distorcido"). Cingapura,
China, Malásia estão com medo de bolhas.
Cada vez mais relatórios de bancos estrangeiros, americanos, europeus e japoneses,
tratam de bolha. Alguns recomendam aproveitá-la antes que acabe, caso das
commodities. Outros dizem que as Bolsas, mesmo a do Brasil, estão caras (essa métrica
é sempre duvidosa, mas são alguns bancos que o afirmam).
Um sinal da bolha imobiliária nos EUA entrou no radar das finanças já em 2002. A bolha
começou a estourar em 2006, embora então nem houvesse consenso de que se lidava
com uma bolha. Quando ficou evidente que a bolha explodia, entre 2007 e 2008, dizia-se
que o efeito seria limitado. Pois é.
As bolhas, pois, parecem transparentes, invisíveis, impossíveis ("desta vez é diferente").
Após as crises dos 1980 (Japão), 1990 (Ásia) e 2000 (EUA), o mundo parece mais
escaldado. Mas está mesmo?
---------------------------------------O Globo - 28/10/2010
País da incerteza
Miriam Leitão
Começa agora o governo Cristina Kirchner.
Esse é um dos vários inusitados da situação política do país vizinho. Faltando 13 meses
para terminar o mandato, a presidente tem, enfim, chances de governar um país. O expresidente Néstor Kirchner nunca deixou de ser o governante, impunha seu estilo e
vontade. Foi quem tirou a Argentina do fundo do poço.
Apesar dos problemas de saúde que Néstor Kirchner teve recentemente, os cenários
políticos não consideravam a hipótese do futuro imediato sem ele.
Foi o que admitiu com espanto o analista do “Clarín” Eduardo Van der Kooy. Tanto na
operação da carótida, quanto na angioplastia, os Kirchner não quiseram que a saúde do
ex-presidente ocupasse espaço no debate político. Falar da doença atrapalharia os planos
futuros do casal.
Ele era um dos candidatos à eleição do ano que vem e, mais do que isso, era o dono dos
rumos do governo da mulher, do partido do governo, e da linha política que inaugurou: o
kirchnerismo.
O futuro é uma incerteza só. A palavra em espanhol define melhor, aos nossos ouvidos
tem um som mais pesado, como se fosse mistura de incerteza e drama: incertidumbre.
Será Cristina capaz de superar o golpe emocional da morte daquele que foi seu marido
por 35 anos? Terá forças para se impor a um Justicialismo dividido pelos últimos oito
anos de comando de ferro de Néstor? Manterá o estilo de governar pelo confronto que o
marido sempre manteve e que deixou sequelas nas relações dos produtores rurais,
indústria, Igreja, Suprema Corte, Congresso e imprensa? Conseguirá Cristina Fernández
superar a sina trágica das mulheres no poder argentino? Evita morreu, jovem e bela,
antes que Juan Domingo Perón realizasse o sonho de fazê-la vice-presidente.
Isabelita, vice de Perón na década de 70, assumiu quando o marido morreu.
Aparvalhada, conduziu um governo fraco e corrupto e foi deposta pelos militares.
Cristina assumiu o poder cercada de esperanças de que fosse enfim um governo
comandado por uma mulher. Era senadora, tinha tido uma carreira política prévia.
Mesmo assim se deixou anular completamente.
Se em alguns momentos circularam rumores de que o casamento estava abalado, a
parceria política sempre foi indissolúvel, como se os dois fossem um só. E agora? Néstor
Kirchner ficará na História por ter tirado a Argentina de um momento trágico.
Em poucos dias, na passagem de 2001 para 2002, o país teve três presidentes.
Com o país mergulhado na pior crise da sua história, o presidente Fernando de la Rúa
renunciou no meio de violentas manifestações de rua, em que os argentinos mostravam
sua fúria pela perda de poder aquisitivo e a recessão no fim do regime do câmbio fixo.
“Que se vayan todos!”, gritavam nas ruas os argentinos querendo se livrar de todos os
políticos.
Adolfo Rodríguez assumiu interinamente, decretou moratória e renunciou em seguida.
Eduardo Duhalde manteve a moratória, acabou com a paridade do peso e do dólar e
preparou a nação para as eleições. O país estava 18% menor do que em 1998, e tinha
60% da população abaixo da linha da pobreza quando em 2003 ocorreram as eleições. O
partido fundado por Perón teve três candidatos. A União Cívica Radical, de De La Rúa,
desmoralizada, estava fora do jogo. Numa reportagem que fiz sobre o país na época, o
que mais me impressionou foi uma mulher, que no meio da passeata, respondeu a uma
pergunta minha sobre a razão da manifestação: “Não há futuro, não há futuro”, disse,
aos gritos.
Nesse ambiente, Kirchner venceu e começou a organizar o país. Manteve o ministro
Roberto Lavagna e começou o caminho da recuperação.
O país cresceu forte: 11,7% em 2003, 9% ao ano de 2004 a 2007. Reduziu o ritmo em
2008, no ano passado teve recessão e em 2010 deve crescer mais de 7%. O problema é
que neste meio tempo, o casal K, como os argentinos o chamavam até ontem, fez uma
intervenção no Indec, departamento de estatísticas, jogando dúvida sobre todos os
indicadores econômicos.
A inflação subiu, mas o dado oficial está parado abaixo de 10%. Na verdade, os preços
têm subido mais de 20% ao ano. Há projeções acima de 30%.
Néstor Kirchner ocupava um espaço tão grande na política argentina que os analistas do
país tinham ontem dificuldades de ver que forças vão ser decisivas no futuro. Na
pequena lista de presidenciáveis está por exemplo o governador de Buenos Aires, Daniel
Scioli, do Partido Justicialista, e um dos possíveis candidatos, caso Cristina não queira ou
não consiga ser candidata no ano que vem. A União Cívica Radical tem duas forças, o
vice-presidente, Julio Cobos, inimigo de Cristina, e Ricardo Alfonsin.
O principal obstáculo de ambos é o fracasso do partido no poder. O empresário Maurício
Macri organizou uma frente, a Proposta Republicana, cuja maior vitória foi a do próprio
Macri para a prefeitura de Buenos Aires.
A Argentina volta a ficar, como definiu Van Der Kooy, “entre a tragédia e o drama.” A
oposição perde o amálgama que a unia para enfrentar um adversário forte; os peronistas
perdem sua força hegemônica; a presidente perde o marido e mentor; a Argentina perde
o presidente que a resgatou da crise e a jogou em inúmeros conflitos internos. O cenário
político tem hoje uma enorme interrogação.
Numa análise recente sobre as eleições do próximo ano, o cientista político argentino
Rosendo Fraga concluiu profético: “Muita coisa pode mudar em um ano, porque nunca se
deve esquecer que, em última instância, a política se constrói sobre o imprevisto.”
COM ALVARO GRIBEL
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Valor Econômico - 28/10/2010
Dólar sobe com força e já mira R$ 1,75
Eduardo Campos
A moeda americana teve um pregão de firme valorização na quarta-feira, retomando a
linha de R$ 1,72 pela primeira vez em mais de um mês.
Parte da alta pode ser atribuída à piora de humor externo, que deu fôlego ao dólar e
tirou força dos ativos de risco. No entanto, as ordens de compra por aqui não recuaram
mesmo com o pessimismo perdendo força no fim no pregão.
O assunto em pauta no campo externo era o tamanho do plano de ajuda que o Federal
Reserve (Fed), banco central americano, poderá adotar para estimular a economia.
Desde a mínima de 13 de outubro o dólar já subiu 4,05%
Cabe lembrar que muito do tom positivo das últimas semanas, que foram pautadas pela
venda do dólar e aportes em ativos de risco, foi estimulado pelas expectativas de uma
firme atuação da autoridade monetária americana na compra de títulos do Tesouro como
forma de derrubar os juros e, assim, estimular a economia.
No entanto, reportagem do The Wall Street Journal indicou que o Fed estaria estudando
a compra de algumas centenas de bilhões de dólares em títulos, enquanto alguns
agentes pensavam em trilhão de dólares.
A contribuição doméstica para essa puxada no preço da moeda americana foi incerta.
O volume no mercado à vista foi baixo, o que exclui a ocorrência de remessas relevantes
de dólares para fora do país.
Alguns operadores chamaram a atenção à movimentação de corretoras que tipicamente
operam para estrangeiros, que estariam em firme movimento de compra, indicando
zeragem de posições vendidas.
Há quem que enxergue, também, uma cautela pré-eleições, já que as últimas pesquisas
contrariaram os rumores de mercado e mostraram crescimento da candidata governista,
Dilma Rousseff.
Os operadores mais técnicos chamam atenção para o fato de o dólar ter rompido pontos
gráficos importantes, que caso confirmados, colocariam a moeda rumo a R$ 1,75.
Quanto mais explicações para um mesmo fato, maior a percepção de que esse mercado
"tem dono", ou seja, há grandes agentes defendendo ou mudando sua posição.
Ontem, o dólar comercial chegou a cair a R$ 1,703, mas encerrou o dia R$ 1,722, o que
representa uma alta de 0,93% (veja gráfico abaixo) e a maior cotação de fechamento
desde 20 de setembro, quando valia R$ 1,728. Chamou atenção o baixo volume
estimado para o mercado interbancário, apenas US$ 1,4 bilhão.
Desde 13 de outubro, quando encerrou o dia a R$ 1,655 (menor preço desde 1º de
setembro de 2008) o dólar comercial já subiu 4,05%.
Mérito das medidas do governo? Segundo o analista de câmbio da BGC Liquidez, Mário
Paiva, é muito difícil medir a contribuição das atuações do governo via aumento do
Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nessa rodada de valorização da moeda
americana.
"As medidas ajudam, mas a influência do governo é pequena com relação ao tamanho do
mercado."
Para o analista, a tendência para o dólar segue a mesma, ou seja, perdendo força no
mundo todo. "Mas é óbvio que se o ambiente global se deteriorar, o dólar pode subir um
pouco mais."
Hoje, atenção à ata do Copom. Não é esperada alteração no viés de estabilidade do juro
básico em 10,75%. Com isso, ganha peso a leitura dos comentários do Banco Central
sobre o comportamento da inflação, demanda doméstica e ambiente internacional.
Eduardo Campos é repórter
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ECONOMIA E OUTRAS NOTÍCIAS
O Globo - 28/10/2010
Governo prevê freio nas contas em 2011
A equipe econômica acredita que o próximo presidente, qualquer que seja ele, fará um
"freio de arrumação" nas contas públicas, após expansão no período eleitoral.
Governo terá de fazer um ""freio de arrumação""
Integrantes da equipe econômica apostam que o próximo presidente vai rever
gastos e anunciar um superávit maior, sem o uso de artifícios
Beatriz Abreu, Fabio Graner e Adriana Fernandes
Apesar da frágil composição do resultado fiscal deste ano, construído à base de
engenharias contábeis, integrantes da equipe econômica apostam que, em 2011, o novo
governo deve anunciar um superávit primário maior, sem o uso de artifícios.
Independentemente de quem for o próximo presidente, a avaliação é que prevalecerá a
tradição: o anúncio de um "freio de arrumação" nas contas, depois da expansão dos
gastos no período eleitoral. A confirmação desse reforço na área fiscal será decisiva para
a definição do rumo da taxa básica de juros, a Selic, e para a trajetória da taxa de
câmbio no médio prazo, como o Banco Central já indicou em seus principais documentos.
A expectativa em setores do governo é que, se o superávit primário subir sem o uso de
truques, mas como resultado de menor expansão dos gastos, é possível que a taxa de
juros possa ficar estável - atualmente está em 10,75% ao ano - ou até mesmo ser
reduzida, dependendo do comportamento da economia doméstica e internacional.
Segundo fontes, mesmo que o governo alcance superávit maior, ainda assim será
necessário um redesenho do gasto público.
Nos últimos dois anos, o governo Lula alcançou a meta de superávit graças ao
remanejamento de créditos entre suas empresas e o abatimento dos gastos com os
investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Em 2009, a estagnação
da economia justificava o baixo superávit, mas, em 2010, com a atividade em alta, o
governo se desdobra em explicações para tentar evitar a crítica de que o aumento nos
gastos foi para atender ao calendário eleitoral.
Sem a receita extra de R$ 31,9 bilhões, repassada pela Petrobrás pela cessão de barris
da União, o resultado fiscal efetivo deste ano ficará em torno de 2,4% do PIB. É este
número que representa o quanto foi realmente retirado de circulação da economia e é
com ele que o Banco Central trabalha para traçar as estratégias de política monetária. Ou
seja, o simples ato de cumprir a meta cheia (3,3 % do PIB) representaria aumento de
quase 1% do PIB, algo próximo a R$ 40 bilhões, que seriam poupados.
Candidatos. Nos bastidores, os economistas apostam que essa ofensiva de recusar
artifícios para fechar as contas pode ser seguida pela candidata do PT, Dilma Rousseff.
Embora haja dúvidas quanto a um maior rigor na gestão das despesas pelo candidato do
PSDB, José Serra, que na campanha eleitoral lança promessas que custam caro (como o
aumento do salário mínimo para R$ 600), a expectativa é de que também se
enquadraria.
De qualquer forma, não bastará cumprir uma meta maior, ponderam algumas fontes. É
necessário, também, rever o perfil de gasto. Até agora, o governo tem elevado os
investimentos, sem tentar conter as despesas de custeio, incluindo gasto com pessoal.
----------------------------O Estado de S.Paulo - 28/10/2010
Manobra com a Petrobras paga alta do gasto
público
Cerca de metade da receita extra de R$ 31,9 bilhões obtida com a manobra contábil que
inclui recursos da capitalização da Petrobras como receita serviu para cobrir o aumento
das despesas de custeio da máquina pública neste ano. Na terça-feira, o governo
anunciou superávit primário recorde de R$ 26,06 bilhões. 0 governo contou como receita
0 pagamento, pela Petrobras, de reservas do petró1eo no pré-sal. Embora o dinheiro que
entra nos cofres da União não tenha carimbo, a arrecadação com a venda da concessão
de exploração de 5 bilhões de barris da camada de pré-sal abriu espaço para o governo
aumentar também os gastos com despesas regulares da administração, de baixo retorno
de longo prazo. E como se o governo estivesse antecipando receitas da exploração de
petróleo para bancar despes as crescentes do dia a dia.
Manobra com dinheiro da Petrobras vai cobrir alta de gastos do governo
Mais de 80% dos recursos obtidos pelo governo na capitalização serão usados
em custeio de gastos correntes e pagamento de salários
Fabio Graner e Adriana Fernandes
Cerca de metade da receita extra de R$ 31,9 bilhões obtida com a manobra contábil que
inclui recursos da capitalização da Petrobrás como receita serviu para cobrir o aumento
das despesas de custeio da máquina pública neste ano.
Na terça-feira, o governo anunciou superávit primário (economia para pagar os juros da
dívida) recorde de R$ 26,06 bilhões. O governo contou como receita o pagamento, pela
Petrobrás, de reservas do petróleo no pré-sal.
O artifício com a receita extra foi obtido porque, de um lado, o governo recebeu R$ 74,8
bilhões pela venda (cessão onerosa) de 5 bilhões de barris de petróleo do pré-sal à
Petrobrás e, de outro, pagou R$ 42,9 bilhões para comprar ações da estatal. A diferença
de R$ 31,9 bilhões é tratada como "receita de concessão".
Embora o dinheiro que entra nos cofres da União não tenha carimbo, a manobra abriu
espaço para o governo aumentar não só os investimentos, mas também o gasto com
despesas regulares da administração, de baixo retorno a longo prazo. É como se o
governo antecipasse receitas da exploração de petróleo para bancar despesas do dia a
dia, que não param de crescer.
Somando os gastos com pessoal (que são contabilizados pelo Tesouro separados dos
gastos de custeio), mais de 80% dos recursos obtidos pela engenharia contábil foram
utilizados com despesas de custeio da máquina.
O tamanho do aumento das despesas de custeio neste ano já é maior que o do gasto
com investimentos, considerado prioritário para o crescimento da economia sem
pressões inflacionárias.
Sem controle. Enquanto as despesas de custeio deram, de janeiro a julho, um salto de
R$ 16,4 bilhões, o gasto com investimentos - que tem grande impacto no longo prazo aumentou R$ 11,6 bilhões. Já o gasto com pessoal subiu R$ 10,2 bilhões no ano. Esse
quadro desfavorável de perfil de gastos ocorreu apesar de os investimentos terem
acelerado em 2010 por causa da estratégia do governo desde 2009 de colocar em "ponto
de bala" ao longo deste ano eleitoral os projetos prioritários do Programa de Aceleração
do Crescimento (PAC).
Os números divulgados mostram que o governo não tem controle dos gastos correntes.
Essa conta tem sido paga, desde o ano passado, com reforço em 2010, com artifícios
contábeis que não necessariamente vão se repetir, chamados pelos analistas de
"mágicas" nas contas públicas.
O quadro de forte expansão das despesas até o fim do ano deve continuar, porque a
pressão por liberação de despesas, sobretudo de emendas parlamentares, se intensificou
após o primeiro turno das eleições para atender interesses de campanha eleitoral. O
governo já fez em setembro uma liberação de R$ 1,7 bilhão de despesas contingenciadas
do Orçamento deste ano e, segundo fontes, pode fazer novo desbloqueio. "Tem muita
gente pedindo. A pressão está grande", diz uma fonte que trabalha com o Orçamento.
Padrão. Para o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, o fenômeno está no
padrão da política fiscal dos últimos anos. Segundo ele, bancar gastos correntes se
utilizando de manobras contábeis que antecipam recursos é o "pior dos mundos".
Na visão do economista, o correto seria que esse dinheiro da Petrobrás fosse usado para
bancar mais investimentos ou elevar o superávit primário, reduzindo mais rapidamente a
dívida pública. "Seria coerente se esses recursos fossem usados em infraestrutura. O
governo deveria fazer a mágica positiva de trocar gastos correntes por investimentos em
infraestrutura. Essa seria a política que não causaria medo a nenhum analista."
Segundo Vale, quando os analistas internacionais perceberem que a política fiscal
brasileira tem recorrido a subterfúgios para cumprir as metas, em um ambiente de déficit
em conta corrente elevado, o Brasil terá problemas. Para o economista, nesse cenário a
taxa de câmbio tende a "estourar" e criar dificuldades para a economia brasileira. Por
isso, avalia, será fundamental que o próximo governo faça um ajuste fiscal mínimo,
pondo um freio nas despesas correntes.
-------------------------------O Globo - 28/10/2010
Brasil quer índice do FMI contra guerra no
câmbio
O Brasil vai propor ao G20 que o FMI crie um índice de manipulação cambial. A ideia, diz
o ministro Mantega, é classificar os países que forçam a queda de suas moedas para
exportar mais, e conter a guerra cambial. O índice embasaria ações na OMC. Em meio
aos alertas do BC de risco de bolhas. O governo não descarta e1evar o compulsório
bancário e, a longo prazo, controlar a entrada de capitais.
"O FMI não tem como administrar"
SÃO PAULO. É difícil que qualquer Banco Central do mundo aceite a intromissão do FMI
em sua política monetária, diz o exdiretor da área externa do Banco Central Carlos
Thadeu de Freitas. Recentemente, o FMI também pediu cooperação dos países para
evitar a guerra cambial.
Wagner Gomes
O GLOBO: Qual a possibilidade de o FMI conseguir apoio para um ajuste de moedas que
evite uma guerra cambial no mundo?
CARLOS THADEU: O Fundo Monetário não tem condições de administrar as
desvalorizações das moedas porque isso significa administrar as políticas monetárias de
cada país. E nenhum Banco Central vai abrir mão de administrar a sua política
monetária.
Mesmo na época em que o Brasil precisava do FMI, nós nunca aceitamos que ele
administrasse a nossa política monetária.
O GLOBO: Mas qual seria o papel do Fundo?
CARLOS THADEU: O máximo que o Fundo Monetário pode fazer é declarar que essas
desvalorizações não funcionam e que, se cada um desvalorizar a sua moeda, todos vão
perder. Eventualmente, o Fundo poderia estabelecer regras para intervenções cambiais e
para controle de capital, mas aí estaria entrando na independência do BC de cada um. O
pedido de quarentena, por exemplo, poderia ser uma saída honrosa para o FMI, mas na
prática ele não consegue fazer isso.
O GLOBO: Já que o FMI não tem poder para definir regras, o que poderia de fato fazer
para ajudar a controlar a situação?
CARLOS THADEU: O FMI poderia sugerir que fossem feitas intervenções de maneira
conjunta para tentar valorizar o dólar. Houve intervenções no mercado de câmbio da
Suíça e do Japão, mas foram intervenções isoladas.
O problema é que os Estados Unidos, principal acionista do Fundo, como já foi dito, têm
a moeda fiduciária mais importante do mundo, querem emitir essa moeda e ninguém
controla.
Um secretário de Tesouro americano disse uma frase que ficou famosa durante a
mudança de paridade do dólar. Ele afirmou: a moeda é minha e o problema é de vocês.
A mesma coisa acontece agora. A moeda é dos Estados Unidos e, se há a emissão de
mais moedas, o problema é do resto do mundo.
O GLOBO: Qual política poderia ser adotada pelos países para conter a queda do dólar?
CARLOS THADEU: Os países com taxas de juros baixas são menos vulneráveis à
entrada de dólares. Mas, para se ter isso, é preciso ter dependência menor do governo
na captação de recursos no mercado. A primeira coisa é ter uma política fiscal mais
arrumada.
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