ensino de graduação em administração

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ensino de graduação em administração
O DOCENTE DE ADMINISTRAÇÃO COMO LÍDER E COMO ESTRATEGISTA
Fábio Vizeu Ferreira
Acadêmico do 5ºano do curso de graduação em Administração da UEM e bolsista do PIBIC
CNPq/UEM
Endereço: Rua Lauro E. Werneck, 895, ap 403, zona 07_Maringá PR cep 87020-020
Telefone: 44-262-7566
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João Luís Passador
Professor Doutor do curso de graduação em Administração da UEM e do curso de mestrado em
Administração UEM/UEL
Endereço: Av. Colombo, 5790, zona 07_Maringá PR cep 87020-020 – DAD
Telefone: 44-261-4306
e-mail: [email protected]
Fernando Antonio Prado Gimenez
Professor Doutor do curso de graduação em Administração da UEM e do curso de mestrado em
Administração UEM/UEL
Endereço: Av. Colombo, 5790, zona 07_Maringá PR cep 87020-020 – DAD
Telefone: 44-261-4306
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Paulo Sérgio Grave
Professor Doutor do curso de graduação da UEM e do curso de mestrado em Administração
UEM/UEL
Endereço: Av. Colombo, 5790, zona 07_Maringá PR cep 87020-020 – DAD
Telefone: 44-261-4306
e-mail: [email protected]
RESUMO
Certos assuntos surgem com evidente relevância no ensino da graduação em
Administração, tais como a liderança, a motivação e a estratégia. Sendo o docente o principal
agente que possibilita a aprendizagem da Administração, pressupõe-se que este seja detentor de
recursos diretamente relacionados a estas questões da atividade administrativa, ou seja, a
capacidade de desenvolver habilidades como a de liderar, a de permitir o desenvolvimento
motivacional e as relacionadas ao desenvolvimento de estratégias de ação. Entretanto, o
desempenho dos docentes parece demonstrar que este profissional não tem se esforçado em
desenvolver tais comportamentos, tendo muitas vezes, por outro lado, assumido um
comportamento tal que dificulta a relação discente/docente, prejudicando, por sua vez, o processo
de aprendizagem do graduando. Assim sendo, através de uma revisão na literatura do pensamento
sobre liderança e estratégia, propomos dois modelos de papéis a serem assumidos pelos docentes
da graduação em Administração que, em nosso entendimento, incentivariam a aprendizagem e
permitiriam melhor aproveitamento dos alunos quanto a formação em Administração. Antes de
tudo, nossa proposta é a de gerar uma breve discussão teórica que contribua para que o docente
possa refletir sobre seu papel de educador.
ATRIBUTOS QUE DIFICULTAM O ENSINO DA ADMINISTRAÇÃO: A COMPLEXIDADE, A
MUTIDISCIPLINARIDADE, A INSTRUMENTALIDADE VERSUS SUBJETIVIDADE.
Desde os primórdios do movimento que denominou-se por pensamento administrativo, a
discussão sobre a Administração tem sido a de que esta disciplina pode assumir diferentes
aspectos: a administração como ciência (Taylor, 1995), onde o conhecimento administrativo é
fundamentado por princípios cientificistas de objetividade, racionalidade e precisão (Morgan, 1996);
a administração como técnica social (Chiavenato, 1997), onde os aspectos elementares da
disciplina são de ordem humanista (Seixas e Grave, 1997) ou inter-grupal; a administração como
“arte” (Motta, 2000), que se configura pelo princípio de que existem fatores subjetivos na atividade
gerencial de difícil apreensão pelas formas clássicas de ensino, tais como a intuição e a
criatividade. Da mesma forma, outras disciplinas surgem no escopo de ação da Administração de
forma diversificada, tais como a informática, a contabilidade, a estatística, além de diversas áreas
das ciências sociais. Tal diversidade atesta que a Administração é, necessariamente, um objeto
complexo, assim como os objetos diretamente relacionados a esta disciplina, como as
organizações, que, segundo Morgan, “são complexas, ambíguas e paradoxais” (Morgan, 1996,
p.20).
Tendo em vista que esta diversidade encontra-se presente de forma marcante no processo
formalizado de ensino de Administração, bem representado em nosso país pelos cursos de
graduação na área, podemos entender porque se costuma dizer ser algo complexo o ensino desta
disciplina. Os acadêmicos, cada vez mais, são condicionados a adquirir conhecimento sobre
questões diversas, como demonstra o desenvolvimento dos programas de ensino dos cursos de
graduação feito nos últimos anos (Gasparetto e Grave, 1993). As áreas de concentração de
pesquisas acadêmicas se ampliam cada vez mais, exigindo que os projetos assumam um carater
de multi-disciplinaridade. A busca dos profissionais da área de Administração por uma formação
continuada em outras áreas (como por exemplo a sociologia) também demonstra a necessidade de
envolvimento multi-disciplinar.
Outro aspecto do processo de aprendizagem na graduação em Administração atesta as
dificuldades no ensino desta disciplina: a ambigüidade do caráter instrumental versus subjetivo do
conhecimento administrativo (Gasparetto e grave, 1993; Seixas e Grave, 1997; Grave, 1995).
Stoner e Freeman citam as três categorias de habilidades necessárias à Administração definidas
por Katz, as habilidades técnicas, de natureza instrumental e as conceituais e humanas,
eminentemente subjetivas:
“A habilidade técnica é a capacidade de usar procedimentos, técnicas e
conhecimentos de um campo de especialização. Cirurgiões,
engenheiros, músicos e contadores têm todos habilidades técnicas em
seus campos específicos. A habilidade humana é a capacidade de
trabalhar com outras pessoas, de entendê-las e motivá-las como
indivíduos ou como membros de grupos. A habilidade conceitual é a
capacidade de coordenar e integrar todos os interesses e atividades de
uma organização.” (Stoner e Freeman, 1999, p. 8 e 9)
As características ambíguas do caráter instrumental/subjetivo expresso no ensino de
Administração são definidas, por um lado, pelas formas objetivas e ferramentais no qual se
configura o conhecimento de natureza técnica e, por outro, pela subjetividade e fluidez que são
apresentadas as teorias da categoria humana-conceitual. Por exemplo, pode-se constatar esta
diferenciação observando-se a natureza dos objetivos preteridos em certas ementas que compõem
a grade curricular do curso de Administração oferecido em uma importante universidade brasileira,
como, de regra, acontece de modo semelhante nas demais instituições do gênero, no país:
Algumas disciplinas ministradas no curso de Administração, UEM – Paraná
de natureza instrumental:
Disciplina
Matemática
Objetivo
1) Familiarizar o acadêmico com o pensamento
matemático, indispensável ao estudo das ciências; 2)
Possibilitar ao acadêmico o domínio dos conceitos e das
técnicas do cálculo; 3) Possibilitar ao acadêmico a aplicação
Estatística
Métodos e
Medidas em
Administração
do cálculo na resolução de problemas vinculados à sua área.
A disciplina Estatística para Administração visa
proporcionar ao acadêmico de Administração o conhecimento
de técnicas estatísticas para análise descritiva de dados, bem
como proporcionar o instrumental necessário para a análise
inferencial.
Proporcionar aos alunos participantes da disciplina
uma visão sobre a aplicação e o uso de métodos e medidas
administrativas no âmbito das empresas modernas.
de natureza subjetiva:
Objetivo
Fundamentar o pensamento e ação humana no
processo administrativo.
Psicologia
Fundamentar o estudo do
comportamento humano nas organizações.
Sociologia
Oportunizar ao aluno o estudo do contexto
administrativo das organizações dentro do contexto
social.
Fonte: retirado do conteúdo programático do curso de graduação em administração da
Universidade Estadual de Maringá – Paraná, disponibilizado no web site
www.dad.uem.br.
Disciplina
Filosofia
É por tudo isto, ou seja, a complexidade do objeto, o aspecto multi-disciplinar e a dicotomia
instrumental/subjetivo que auferimos ser o ensino da Administração algo de difícil realização. Neste
sentido, o adequado preparo do principal agente deste processo de ensino – o docente – deve ser
verificado como importante na qualidade da aprendizagem. As habilidades necessárias ao
administrador, nas quais pretendem ser estimuladas nos discentes através dos programas de
ensino dos cursos de graduação, devem, por analogia, estar presentes no arcabouço de
capacidades do corpo docente deste cursos, ou, pelo menos, ser de domínio destes profissionais.
Em se tratando, como anteriormente exposto, as habilidades humanas parte do conjunto de
aptidões exigidas no trabalho do profissional de administração, e como a atividade de ensino
corresponde, da mesma forma, a uma inter-relação grupal/humana, utilizar-se das habilidades e
conhecimentos apresentados no programa de formação em administração é, além de adequado ao
processo de aprendizagem (pois comprova a pertinência de tais mecanismos na consecução dos
resultados grupais), uma importante forma de se obter excelência no processo de ensino.
Assim, dois assuntos amplamente tratados nos programas de ensino dos cursos de
graduação em Administração se configuram como importantes questões que contribuem para o
desempenho grupal - a liderança e a motivação – e para o desempenho organizacional – a
estratégia - podendo ambas serem tratadas como objeto de entendimento da melhoria na relação
professor/aluno e na adequada mobilização grupal.
Compreendemos, desta forma, ser a estrutura institucionalizada do processo de graduação
em Administração uma forma organizacional similar as empresas que se aplicam os
conhecimentos e habilidades sobre liderança e estratégia, pois, igualmente a estas últimas, é
constituída por um grupo de pessoas com objetivos compartilhados e necessidade por
direcionamento e que podem adotar com determinado grau de eficácia um específico processo
estratégico para a efetivação destes objetivos.
Por este pensamento, propomos uma análise do comportamento docente a luz do
entendimento sobre liderança e estratégia, seguindo a corrente teórica de certos autores. Para
tanto, construímos dois modelos metafóricos de comportamento docente – o docente como líder e
como estrategista – no intuito de compreender como tais conhecimentos podem contribuir ao
processo de ensino da Administração, e, consequentemente, efetuar melhorias na qualidade dos
cursos desta disciplina.
Definiremos papéis de acordo com Stoner e Freeman: “Num sentido amplo, ‘papel’ consiste
nos padrões de comportamento que se pode esperar de um indivíduo dentro de uma unidade
social.” (Stoner e Freeman, 1999, p. 9). Logo, utilizando-se papéis específicos para determinar o
comportamento docente preterido na presente discussão, denominaremos os dois modelos a
seguir como papel do docente 1) como líder, onde também se privilegia as habilidades que
favoreçam o desenvolvimento motivacional; e 2) como estrategista, onde a ação docente se
configura a partir de um processo de formação de estratégias de ensino.
O PAPEL DO DOCENTE COMO LÍDER
Esta perspectiva se configura pelo pressuposto de que o docente é o líder e os alunos são
os liderados, por se constituírem de um grupo coeso com objetivos compartilhados, onde o
primeiro é o agente que direciona o grupo na consecução de seus objetivos.
Apesar dos autores que discutem a liderança não apresentarem um discurso homogêneo no
tratamento da questão, todos concordam ser o líder um agente determinante da situação efetiva
deste fenômeno (Bergamini, 1994; Bennis e Nanus, 1988). Alguns, como por exemplo Bennis
(1996), atribuem ao líder qualidades muito específicas para que a relação de liderança possa
ocorrer da melhor forma, ou seja, de maneira a que o grupo atinja os objetivos que o definem como
tal, aproveitando todas as potencialidades existentes no grupo.
Bennis indica quatro habilidades básicas para a liderança eficaz: 1) seguir uma visão maior;
2) agir tendo ‘paixão’ pelo que faz; 3) manter a integridade; e 4) ter curiosidade e audácia (p.38 e
39). A visão é uma imagem mental a respeito de uma situação futura, que mobiliza os esforços em
um objetivo comum, além de ser instrumento da motivação pessoal. A paixão pelo trabalho
corresponde ao sentimento que determina o entusiasmo das ações na liderança, amenizando os
problemas advindos das limitações e equívocos pessoais e do grupo. A integridade é a conduta
coerente, que permanece sempre em acordo em relação a visão, e tem como conseqüência gerar
confiança. O sentimento de curiosidade e audácia correspondem ao aprendizado continuado para
descobrir novas possibilidades, relaciona-se com o comportamento pró-ativo necessário ao líder.
Alguns aspectos na abordagem acima sobre comportamento de líder surgem com relevância
no contexto do ensino de graduação em Administração. A seguir, discutiremos algumas formas do
docente como líder obter os atributos de visão.
- A visão do docente como líder
Primeiramente, a visão adotada pelo docente como líder deve estar relacionada com a
proposta institucional de uma organização de ensino superior. Para isso, pode-se recorrer a Lei de
Diretrizes e Bases (LDB – lei nº9394/96) para destacarmos alguns aspectos importantes que
devem ser previstos na visão do docente como líder. Destacamos abaixo alguns aspectos
relevantes desta lei:
- Lei de Diretrizes e Bases (LDB) – nº9394/96
Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios
de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno
desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho.
Art. 43. A educação superior tem por finalidade:
Iestimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico
e do pensamento reflexivo;
II formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos
para a inserção em setores profissionais e para a participação no
desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua;
III incentivar o trabalho de pesquisa e investigação científica, visando o
desenvolvimento da ciência e da tecnologia e da criação e difusão da cultura, e,
desse modo, desenvolver o entendimento do homem e do meio em que vive;
IV promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e
técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através
do ensino, de publicações ou de outras formas de comunicação;
Vsuscitar o desejo permanente de aperfeiçoamento cultural e
profissional e possibilitar a correspondente concretização, integrando os
conhecimentos que vão sendo adquiridos numa estrutura intelectual
sistematizadora do conhecimento de cada geração;
VI estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente, em
particular os nacionais e regionais, prestar serviços especializados à comunidade
e estabelecer com esta uma relação de reciprocidade;
VII promover a extensão, aberta à participação da população, visando à
difusão das conquistas e benefícios resultantes da criação cultural e da pesquisa
científica e tecnológica geradas na instituição.
Fonte: Lei 9394/96 (grifos dos autores).
Sinteticamente, o regimento legal acima destaca que, no ensino institucionalizado (em
especial o ensino superior, tratado no art. 43) devem ser previstas, dentre outras, cinco
competências a serem desenvolvidas no educando:
-
a habilidade profissional que possibilite sua qualificação e inserção no mercado de
trabalho (art. 2 e art 43, inciso II);
a habilidade de empreender atividade intelectual de carater científico (art. 43, incisos I
e III);
a capacidade intelectual reflexiva (art. 43, inciso I);
o entendimento do contexto da realidade atual (art. 43, inciso VI);
o desejo pela continuidade no aprendizado (art. 43, inciso V)
A visão constituída pelo docente como líder pode ser estruturada com base nos itens acima.
Além disso, deve constar formas concretas para a efetivação de tais objetivos e, além de tudo,
deve ser adequadamente comunicada aos liderados. Bennis e Nanus ressalvam a importância da
comunicação da visão ao afirmarem que, mesmo que se tenha uma boa visão, “sem comunicação
nada será realizado.” (Bennis e Nanus, 1988, p. 29). Kotter também atribui significativo valor a
comunicação da visão para o grupo quando indica que um dos erros de liderança é que “a visão é
dez vezes menos divulgada do que deveria” (Kotter, in: Champy e Nohria, 1997, p. 97).
Assim sendo, a comunicação, instrumento elementar do processo de ensino, deve ser o
mecanismo utilizado pelo professor para que os alunos se integrem aos objetivos propostos pela
‘visão’ do curso de graduação em Administração que estão cursando. O cuidado em comunicar
esta visão, ainda de acordo com Bennis e Nanus, é o de se esclarecer adequadamente quanto ao
significado destes objetivos para os membros do grupo.
- o problema da perspectiva heróica e distante do líder
Motta afirma que estudos recentes sobre liderança indicam que “a capacidade de liderar tem
muito mais da aproximação de líderes e liderados do que do seu distanciamento” (Motta, 2000,
p.213). Por esse motivo, este autor cita o problema deste distanciamento entre o líder e o seu
grupo de liderados:
“Dirigentes que insistem na distância social e na imagem de si próprio como
heróis tornam-se, na prática, indivíduos autocentralizados, amantes do poder, e que
dificilmente estabelecem com seus subordinados relações adequadas de liderança.
No máximo, conseguem estabelecer relacionamento de trabalho com um grupo
reduzido de subordinados, baseado em trocas de apoio e favores, contra o
recebimento de bajulações e lealdades inquestionáveis.” (Motta, 2000, p.213)
Assim, ressaltamos o cuidado do docente como líder em verificar se não se está utilizando
os instrumentos de poder formal de maneira a incentivar tal distanciamento. Ainda é necessário
colocar que, estudos sobre a cultura do mundo contemporâneo sugerem que as estruturas sociais
privilegiam este distanciamento, sendo necessário a reflexão sobre a legitimidade e natureza
destas estruturas de maneira a permitir maior convivência entre as pessoas (Illich, 1976).
- A liderança e a administração do sentido
Como já foi ressaltado, o processo de interação na liderança se dá de forma mais
significativa quando o líder procura canalizar seus esforços no aspecto de compreender o valor e o
significado atribuído pelos liderados as diversas questões que compõem a realidade do grupo,
especialmente aquelas envolvidas com os objetivos grupais. Segundo Bergamini (1994), que a
esse processo denominou ‘administração do sentido’, esta habilidade da liderança está
diretamente relacionada com os aspectos motivacionais do grupo. Assim, as dificuldades em
desenvolver o interesse do corpo discente pelo aprendizado podem ser amenizadas a partir do
controle dos mecanismos que, de alguma forma, alteram o significado dado as atividades.
Mais uma vez é significativo a adequada comunicação dos objetivos grupais, mas também
demonstra-se relevante o entendimento dos fatores limitantes e desmotivacionais. O interesse
advém do significado dado ao processo de aprendizagem; se o aluno não perceber a validade dos
mecanismos utilizados neste processo, não empreenderá o esforço necessário. É papel do
professor informar sobre a pertinência dos instrumentos utilizados, mas tendo o cuidado de permitir
o diálogo para que não se configure nenhum tipo de comportamento autoritário por parte dele.
Por fim, o comportamento do docente como líder exige a habilidade do contínuo
aprendizado, como elucida Senge (1996) ao tratar da liderança e os já citados Bennis e Nanus.
Estes autores tratam da necessidade de o líder estar aberto às novas perspectivas, de maneira a
ampliar suas possibilidades de ação quando surgirem problemas, mas também de forma a permitir
a interação entre os indivíduos do grupo para que este utilize ao máximo de suas possibilidades
para conseguir bons resultados. Atributos básicos do comportamento para o aprendizado contínuo
são as qualidades de empatia e de adaptabilidade. A mente do docente como líder não pode ser
fechada em idéias pré-concebidas e formas rígidas; para estar apto ao aprendizado contínuo do
ato de lecionar o docente deve se questionar constantemente sobre a validade de seus modelos
mentais e formas de ação, tendo abertura para incorporar novos conceitos.
O PAPEL DO DOCENTE COMO ESTRATEGISTA
O pressuposto fundamental da vertente do docente como estrategista é o de que o curso de
graduação se configura como uma organização, ou seja, é um empreendimento envolvido em certo
grau de complexidade e inserido em um ambiente, necessitando de ações estratégicas para
coordenar as suas atividades de maneira eficaz.
A estratégia é percebida na literatura sobre Administração como um instrumento de grande
importância para o bom desempenho organizacional. É considerada, de forma mais ampla, como
um meio de se estruturar as ações organizacionais, tendo em vista que, “muito do que tem sido
escrito sobre estratégia pressupõe sua conceituação como um conjunto de diretrizes
conscientemente deliberadas que orientam as decisões organizacionais.” (Gimenez, 2000, p. 17).
Todavia, ao se tratar estratégia organizacional, certos fatores surgem com maior relevância,
especialmente nas abordagens de autores mais popularizados, como Ansoff e Porter (ibid, p. 36;
Mintzberg, et al, 2000). Trataremos destes aspectos como base para um entendimento sintetizado
do processo estratégico formalizado, para que tenhamos subsídios para discutir forma de como
este pode se configurar nos cursos de graduação em Administração.
Os elementos sempre presentes na discussão clássica sobre o processo estratégico
envolvem os fatores múltiplos que compõem a diversidade do contexto no qual a organização está
inserida. São eles: i) os fatores ambientais; ii) os fatores internos; iii) o controle e a avaliação do
processo de implementação das estratégias, assim como dos resultados obtidos pela adoção
destas.
Em se tratando de escolas de graduação em Administração, a análise do ambiente ocorre
basicamente a partir da observação das exigências do mercado de trabalho desta área em relação
as habilidades necessárias a este profissional. Considerando que, cada vez mais, se exige do
administrador uma habilitação capaz de lidar com a complexidade organizacional, onde as
múltiplas áreas se interpõem, pode-se inferir que as habilidades deste perpassam por uma efetiva
multi-disciplinaridade e pela capacidade de inter-relação por entre tais áreas de conhecimento.
Desta forma, a efetividade das estratégias dos cursos de graduação devem objetivar esta
formação.
Assim, ao analisar o processo de mudança curricular pelo qual passou a Universidade
Estadual de Maringá na transição da década de 80 para 90, veremos os aspectos elementares
deste objetivo de capacitação em função das exigências do mundo contemporâneo (Gasparetto e
Grave, 1993):
“Há uma tendência, em um grupo significativo de docentes do Departamento de
Administração da Universidade Estadual de Maringá, conceber a universidade como
um “centro de discussões além tecno-profissional, das grandes questões do homem,
da vida e do mundo; como um instrumento social de produção do novo conhecimento
que influirá marcadamente na cultura vigente no sentido de transformá-la, criando as
condições para uma nova e melhor sociedade, e uma ambivalência artificialmente
criada para participar na formação do homem como cidadão e profissional desta nova
ordem, nova sociedade.” (p.66)
Por este motivo, optamos pela análise das medidas do corpo docente da referida instituição
acadêmica para ilustrarmos os aspectos que configuram a atividade do docente como estrategista.
- a estratégia da UEM
O já mencionado processo de transformação curricular pelo que passou a UEM
correspondeu a uma resposta estratégica a duas exigências ambientais: a de adaptação as novas
exigências de um profissional mais habilitado a atuar em um mundo em transformação, e a
“decisão dos orgãos superiores da Universidade em adotar o regime acadêmico único de seriado
anual” (Gasparetto e Grave, 1993, p.62). A estratégia adotada para atingir a tais objetivos foi,
então, o novo projeto de ensino adotado. Através do movimento nacional que ocorreu
posteriormente a implementação deste projeto de ensino e que teve por base as mesmas diretrizes
deste último (Seixas e Grave, 1997), podemos avaliar a efetividade deste como um estratégia de
melhoria de curso.
Outras foram as medidas tomadas para a efetivação da estratégia do curso de
Administração da UEM. No âmbito da análise interna, a avaliação qualitativa da estrutura do corpo
docente representou mais significativamente, podendo ainda ser interpretada como uma análise
das forças e fraquezas. Como medidas de ajuste foram efetuados esforços internos para o
enriquecimento da capacitação dos docentes, resultando, em poucos anos, na mudança
substancial do quadro de doutores e mestres desta instituição.
O desafio posterior envolveria a consolidação do novo projeto de ensino através da atuação
do corpo docente, que se configuraria como principal agente de implementação desta estratégia.
Apesar do referido estudo de Gasparetto e Grave indicar a boa aceitação deste projeto por parte
do corpo docente, ao longo dos anos, vemos que poderiam estar ocorrendo problemas na
aplicação deste programa, tendo em vista o decrescente desempenho dos formandos da UEM no
sistema de avaliação de cursos do MEC, o denominado “provão”: o desempenho caía de ‘A’, em
1997, para duas vezes ‘B’ e depois ‘C’, nos anos posteriores.
Em função deste mal desempenho, que podemos considerar como uma resposta negativa a
efetividade na implementação da estratégia, no ano de 2000 a coordenadoria de curso decidiu criar
um instrumento que visaria diagnosticar a ineficiência na aplicação do programa de curso por parte
dos professores. Criou-se, assim, um questionário de avaliação a ser respondido pelos alunos de
todo o curso, demonstrado pelo modelo apresentado no anexo 1.
São três os focos desta ferramenta de análise: o programa, onde se verifica o seu
cumprimento e a sua adequabilidade; o desempenho do professor; a percepção do aluno quanto
ao seu próprio rendimento; a infra-estrutura do curso. A partir dos dados obtidos nesta pesquisa, o
colegiado do curso poderá direcionar os seus esforços para os pontos específicos que dificultam a
consecução efetiva do projeto de ensino.
Considerando-se, ainda, a necessidade contínua de avaliação das estratégias, os esforços
do departamento de Administração da UEM em rever o projeto pedagógico indicam esta
preocupação por parte desta instituição.
Interessante se faz observar, finalmente, que todas as decisões nesta instituição foram
tomadas pelo próprio corpo docente, através das contínuas reuniões de departamento realizadas
ao longo dos anos nos quais perdurou-se todo o processo. Ademais, outro fator determinante na
consecução deste processo foi a autonomia do departamento em relação a universidade, que
apresenta esta característica devido a sua estrutura matricial.
CONCLUSÃO
O presente trabalho não teve por objetivo dar soluções ao problema das dificuldades no
ensino da Administração, pois temos ciência de que uma disciplina de natureza ímpar como esta
não pode ter solução a partir de formas tão simplistas como as aqui apresentadas. Pretendemos
apenas demonstrar aspectos relevantes nesta atividade através de uma analogia aos processos de
liderar e de formação de estratégias, dois assuntos amplamente discutidos nos cursos de
graduação em Administração. Por fim, acreditamos que o ensino da Administração se configure
melhor como um processo de desenvolvimento de conhecimento do que como um simples
processo de transmissão de informações, tendo, por isso, maior significado a discussão de efetivas
formas de liderança e de administração estratégica na ampliação de tal atividade.
ANEXO 1
Fundação Universidade Estadual de Maringá
Centro de Ciências Sociais Aplicadas
Departamento de Administração
QUESTIONÁRIO DE AVALIAÇÃO
Disciplina:
Termo:
Turma:
Professor:
Escala de pontuação de 1 a 5, crescente em relação ao grau de concordância com a
afirmação.
NÚMERO DE RESPONDENTES:
A) AVALIAÇÃO DA DISCIPLINA
1. O programa da disciplina foi disponibilizado nas primeiras
semanas de aula
2. O programa apresenta todas as informações necessárias sobre
a disciplina
3. Os conteúdos e o sistema de avaliação atendem aos objetivos
do curso
4. Esta disciplina é relevante e integrada ao conjunto das outras
disciplinas do curso
5. Ela atendeu às minhas expectativas e/ou me acrescentou
importantes habilidades
B) AVALIAÇÃO DO PROFESSOR
1. Prepara adequadamente as aulas
2. Demonstra segurança e conhecimento dos conteúdos
ministrados
3. Apresenta a matéria com clareza, domínio expositivo e didática
4. Procura estimular o interesse, a participação e o respeito
mútuo em classe
5. Esclarece as dúvidas sempre que requisitado
6. Utiliza materiais de apoio e recursos pedagógicos adequados
nas aulas
7. Utiliza bem o tempo em sala de aula
8. Respeita os dias e horários de aula estabelecidos
9. Utiliza
adequadamente
sistemas
de
avaliação
de
aprendizagem
10. Eu faria outro curso ministrado por este professor
C) AVALIAÇÃO DO ALUNO
1. Meu estoque de conhecimento anterior foi suficiente para
acompanhar a disciplina
2. Procurei obter e organizar todo material de estudo com
antecedência
3. Preparei-me, adequada e antecipadamente, para as aulas
(leituras, exercícios, etc.)
( )
( )
( )
( )
( )
( )
( )
( )
( )
( )
( )
( )
( )
( )
( )
( )
( )
( )
4. Dediquei esforço sistemático e continuado ao estudo e obtive
um bom aproveitamento
D) INFRAESTRUTURA E MATERIAIS
1. As bibliografias indicadas são acessíveis
2. As condições materiais de apoio pedagógico são
adequadas (retro, vídeo, etc.)
3. Não ocorreram incidentes de natureza material que
comprometeram o andamento das aulas
( )
( )
( )
( )
BIBLIOGRAFIA
BENNIS, Warren G. A Formação do Líder. São Paulo: Atlas, 1996.
BENNIS, Warren G. e NANUS, Burt. Líderes: Estratégia para Assumir a Verdadeira Liderança.
São Paulo: Harbra, 1988.
BERGAMINI, Cecília W. Liderança: Administração do Sentido. São Paulo: Atlas, 1994.
CHIAVENATO, Idalberto. Introdução à Teoria Geral da Administração. 5. ed. São Paulo: Makron
Books, 1997.
GIMENEZ, Fernando A. P. O estrategista na pequena empresa. Maringá: {s. n.], 2000.
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GRAVE, Paulo S. Tentando construir um terceiro modo para a educação superior em
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GRAVE, Paulo S. Algumas indicações para aperfeiçoamento do projeto de execução do curso de
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